Garçons kosher

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Garçons kosher
Garçons kosher
Já ouviu falar em garçons kosher?
Festas com cardápio judaico têm jovens de quipá na brigada de serviço.
Fonte Revista Veja SP
Por Sara Duarte
04.06.2008
Judeus praticantes que trabalharam no casamento de Ivo e Eleonora Rosset: só eles podiam
tocar nas bebidas
O casamento de Eleonora e Ivo Rosset, realizado há duas semanas na Casa Fasano, chamou
atenção por um detalhe incomum: entre os oitenta garçons, uma dezena usava quipá. Para
celebrar sua união civil, o casal recebeu 400 convidados com um almoço kosher. Além de um
cardápio elaborado segundo preceitos da Torá, o livro sagrado do judaísmo (leia quadro),
foram servidas garrafas do vinho Château Giscours e do champanhe Laurent-Perrier,
confeccionados sob a rígida orientação de rabinos.
Para não perder a característica de alimentos sagrados, tais bebidas só podem ser
manuseadas por judeus praticantes, ou seja, que respeitam os diversos preceitos religiosos,
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entre eles o Shabat. O estudante de direito Sami Cytman foi um dos jovens recrutados para a
tarefa. Ele e os colegas receberam 200 reais cada um para atuar por algumas horas como
garçons especializados. Questionado pelos presentes, Cytman explicava que, "do momento
em que é rompido o lacre até o consumo da última gota", as garrafas teriam de ficar sob a
vigilância de um judeu praticante.
O costume a que ele se referia é aplicado a um tipo específico de bebida kosher: as chamadas
não-mevushal, elaboradas à base de uva e não pasteurizadas.
Fotos Fernando Moraes e Mario Rodrigues
Tradição: com um lança-chamas, o rabino Richard Tamezgui "casheriza" a cozinha do
Leopolldo Itaim. À esq., o estudante Sami Cytman serve vinho kosher no bufê França
Antes restrito a festas religiosas, o cardápio judaico é servido atualmente em bufês como
França, Leopolldo Itaim, Charlô e Casa Fasano. Cada um deles realiza ao menos cinco
eventos kosher por mês. A comerciante Rita França, sócia do bufê que leva seu sobrenome,
afirma que, nos últimos tempos, virou tendência recrutar jovens judeus para trabalhar em tais
festas. "Eles despertam a simpatia dos convidados, que percebem estar diante de um ritual
especial", diz. Organizar um banquete kosher exige uma preparação muito diferente da de uma
festa comum. Em primeiro lugar, os membros mais tradicionais da comunidade só freqüentam
bufês que tenham a aprovação de sua sinagoga.
Dias antes do evento, um rabino precisa ir ao local para "casherizar" a cozinha. Munido de um
maçarico ou lança-chamas, o religioso faz orações e direciona o fogaréu para as panelas, a
bancada de aço inox e o fogão industrial. Utilizando água quente, higieniza pratos, copos e
talheres. "O calor elimina os vestígios de outros alimentos, purificando o ambiente para que a
comida possa ser preparada", afirma o rabino Richard Tamezgui. Quando ele termina o
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serviço, o ambiente é lacrado e só é reaberto na hora de preparar o jantar.
Do momento em que se acende o fogo até o fim da festa, cada detalhe da refeição kosher
precisa ser fiscalizado por uma autoridade religiosa judaica. Por isso, supervisores como
Eduardo Tamezgui, irmão do rabino Richard, costumam trabalhar tanto quanto os cozinheiros.
Na semana passada, Eduardo permaneceu cinqüenta horas ao lado da equipe da Casa
Fasano para garantir que um jantar oferecido pela construtora Cyrela Brazil Realty saísse
conforme o previsto.
"É meu dever certificar que todos os produtos utilizados no preparo dos pratos são kosher",
conta. "Quanto aos alimentos naturais, como verduras, legumes e cereais, devo analisá-los
detalhadamente para verificar a existência de impurezas ou insetos." Profissionais como ele
recebem de 300 a 800 reais por evento. Além da fiscalização propriamente dita, precisam
peneirar a farinha de trigo e quebrar os ovos de galinha um a um, com o objetivo de eliminar os
que contenham vestígios de sangue.
Fernando Moraes
A quatro mãos: o trabalho do cozinheiro Robson Lima, da Casa Fasano, é fiscalizado pelo
supervisor Eduardo Tamezgui
Os bufês têm de abrir suas instalações para a casherização e possuir duas cozinhas
separadas: uma para o preparo de carnes e outra para o de laticínios. É necessário ainda
adaptar o cardápio. As massas são feitas com leite kosher ou de soja, o hambúrguer é de
carne vegetal e os doces levam chocolate amargo, sem leite. Por todo esse cuidado, as casas
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de festas costumam cobrar cerca de 20% mais dos clientes que optam pelo serviço kosher.
"Apesar de trabalhoso, é um tipo de evento lucrativo, e a procura vem aumentando ano a ano",
explica Guilherme Crissiuma, do Leo-polldo Itaim.
Andrea Fasano e Patrícia Filardi, sócias da Casa Fasano, passaram a prestar serviços para a
comunidade judaica há um ano e meio e também não têm do que reclamar. "O mais
recompensador é conseguir fazer comida kosher digna das melhores cozinhas internacionais",
diz Andrea. "Em vez de pratos tradicionais judaicos, fazemos a mesma massa e o mesmo
risoto que deram fama ao Fasano, mas seguindo os preceitos da Torá."
As regras da comida judaica
Do hebraico "adequado, próprio, autorizado", kosher é todo alimento fiscalizado e aprovado
pelo Rabinato Judaico. Não se trata de um tipo de culinária, mas de um processo de preparo
que obedece a preceitos da Torá, que existe há quase 6 000 anos
• É proibido misturar carne e laticínios em uma mesma refeição. Na cozinha onde se preparam
carnes não se manuseia ou armazena leite, e vice-versa
• Só se come carne de mamíferos ruminantes com cascos fendidos, como o boi e o cordeiro
• Entre as aves, são permitidos apenas frango, pato, peru e ganso
• Das espécies de peixes, são liberadas todas as que têm escamas e nadadeiras
• O consumo de crustáceos e frutos do mar é proibido
• Da fabricação até o engarrafamento, as bebidas à base de uva – suco, vinho, champanhe e
conhaque – têm de ser supervisionadas por autoridade judaica
• Frutas, verduras e cereais são fiscalizados para garantir que estejam livres de insetos e
impurezas
• O fogão deve ser aceso por um judeu praticante. Se a chama apagar, somente ele pode
reacendê-la
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• Desde que seus ingredientes levem o selo do Rabinato (à esq.), refeições da culinária
italiana, brasileira ou oriental são consideradas kosher. Nos sites www.bdk.com.br e www.bk
a.com.br
há listas com todos os alimentos certificados
Fontes: Braulio Pasmanik, colunista de gastronomia revista Gula, e Roberto Cohn, supervisor
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