doenças reumáticas nos cuidados de saúde primários

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doenças reumáticas nos cuidados de saúde primários
DOENÇAS REUMÁTICAS
NOS CUIDADOS DE SAÚDE
PRIMÁRIOS
DOS SINTOMAS AO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:
O PAPEL DA MEDICINA GERAL E FAMILIAR
Raquel Braga1, Luís Filipe Cavadas1, José Agostinho Santos2
Especialista em Medicina Geral e Familiar, Unidade Saúde Familiar Lagoa, Unidade Local de Saúde de
1
Matosinhos
2
Interno de Medicina Geral e Familiar, Unidade Saúde Familiar Lagoa,
Unidade Local de Saúde de Matosinhos
DOENÇAS REUMÁTICAS
NOS CUIDADOS DE SAÚDE
PRIMÁRIOS
DOS SINTOMAS AO DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:
O PAPEL DA MEDICINA GERAL E FAMILIAR
Raquel Braga1, Luís Filipe Cavadas1, José Agostinho Santos2
Especialista em Medicina Geral e Familiar, Unidade Saúde Familiar Lagoa, Unidade Local de Saúde de
1
Matosinhos
2
Interno de Medicina Geral e Familiar, Unidade Saúde Familiar Lagoa, Unidade Local de Saúde de
Matosinhos
A dor musculosquelética constitui um desafio para o Médico de Família
(MF), sendo uma das queixas mais frequentes na consulta de Medicina
Geral e Familiar (MGF).
As queixas do foro reumático, por se relacionarem em grande parte
com doenças crónicas e incapacitantes, necessitam de uma correcta
abordagem pelo MF. Estudos mostram que as queixas do foro osteoarticular, codificadas pelo capítulo “Sistema musculosquelético” (L) da
International Classification for Primary Care (ICPC) se encontram entre
os motivos de consulta mais frequentes a nível dos Cuidados de Saúde
Primários (CSP).
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A abordagem da dor musculosquelética espelha características da MGF,
como a abrangência da prática clínica, a modelação holística e a medicina centrada na pessoa. Este sintoma está inserido, por vezes, em quadros vagos, incipientes e mal definidos e associado a outras queixas que
poderão ser tão preciosas como confundidoras. A caracterização minuciosa da dor e do restante quadro clínico apresentado torna-se essencial.
Com o objetivo de facilitar a abordagem desta patologia, neste capítulo
descrevemos as causas mais comuns de monoartralgia, poliartralgias e
raquialgia fazendo uma abordagem segundo o método de registos de
Weed e utilizando, como forma de sistematização, a estrutura do seu
componente SOAP (Subjetivo – Objetivo – Avaliação – Plano).
Traçamos também linhas de investigação e orientação futuras, onde
destacamos a necessidade de desenvolver protocolos de boas práticas
clínicas no estudo e diagnóstico precoce; critérios clínicos e radiológicos, bem como marcadores laboratoriais cada vez mais sensíveis e específicos, que auxiliem de forma mais eficiente no estudo e referenciação
dos doentes; trabalhos de investigação acerca do impacto destes problemas na vida da pessoa com doença reumática, bem como na sua família
e no seu enquadramento laboral; programas de intervenção a nível do
doente com problemas do foro da Reumatologia em CSP, que possibilitem o correcto diagnóstico, referenciação e articulação de cuidados.
Abordagem da dor musculosquelética em
Medicina Geral e Familiar
A dor musculosquelética constitui um desafio para o Médico de Família
(MF). Sendo uma das queixas mais frequentes na consulta de Medicina
Geral e Familiar (MGF), a abordagem deste sintoma espelha algumas
das características desta especialidade: a abrangência da prática clínica e a modelação holística. O MF, como primeiro contacto do doente
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reumatológico com o Sistema Nacional de Saúde, enfrenta diariamente
diversos quadros sintomáticos, que podem encaixar em qualquer uma
das vertentes do triângulo biopsicossocial e que obrigam a uma interpretação segundo uma medicina centrada na pessoa que o MF vai conhecendo consulta após consulta, fruto da continuidade própria desta
especialidade (1).
A dor musculosquelética reveste-se de especial importância neste contexto, podendo ser produto tanto de uma perturbação do humor como de
uma patologia articular, entre outras. Segundo um modelo holístico, este
sintoma está inserido, por vezes, em quadros vagos, incipientes e mal definidos e associado a outras queixas que poderão ser tão preciosas como
confundidoras. A caracterização minuciosa da dor torna-se, portanto, essencial. Assim, é fundamental a colheita de uma história clínica rigorosa e
um exame físico metódico, que potenciem a probabilidade de um correto
diagnóstico diferencial e uma boa orientação, bem como uma possível
referenciação para os Cuidados de Saúde Secundários (2-4).
As queixas do foro osteoarticular, codificadas pelo capítulo “Sistema
musculosquelético” (L) da International Classification for Primary Care
(ICPC) encontram-se entre os motivos de consulta mais frequentes a
nível dos CSP (5, 6), sendo as raquialgias (sinais/sintomas lombares) o
motivo mais frequente segundo Jordão (6). Nos utentes consultados em
CSP, com idades compreendidas ente os 25-64 anos, este é o capítulo que
está mais representado (6). Neste contexto os sintomas osteoarticulares
estão presentes em cerca de 10% das consultas, encontrando-se logo a
seguir à hipertensão arterial como o motivo mais frequente de consulta
médica acima dos 55 anos (7). Este fato é confirmado por dados obtidos
na população portuguesa, pela tese de Jordão, que corrobora esses resultados para o grupo etário acima de 65 anos (5).
É importante realçar que cerca de 52% dos pacientes com queixas articulares não recorrem ao médico e que os que recorrem o fazem em média
menos de uma vez por ano. Cerca de 37% dos pacientes com dores articulares não se encontram em tratamento e outros 30% automedicam-se (7).
281
Aproximadamente em uma em cada sete consultas com médicos dos
CSP o doente apresenta a dor articular como motivo de consulta (8).
Relativamente ao tipo de problemas, que constam da avaliação dos utentes consultados em CSP, constata-se que, entre os 20 problemas de saúde
identificados mais frequentes, se encontram cinco problemas do foro
osteoarticular nomeadamente osteoartrose da coluna — L84 (7,37%),
outras osteoartroses/estados afins — L91 (2,52%), osteoartrose joelho
— L90 (1,62%), deformações adquiridas da coluna — L85 (1,52%) e
osteoporose — L95 (1,38%) (6).
Dos sintomas ao diagnóstico diferencial da
monoartralgia, poliartralgia e raquialgia
O primeiro passo para a abordagem de qualquer dor musculosquelética
será a determinação da origem do sintoma referido. Poderá tratar-se de:
1. Dor articular?
2. Dor óssea?
3. Dor musculo-tendinosa?
4. Dor irradiada, nomeadamente visceral?
Uma história clínica, que tem em conta o paciente inserido no seu
contexto psicossocial, e um exame objetivo igualmente metódico são
imprescindíveis a uma correcta abordagem das monoartralgias, poliartralgias e raquialgias.
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Subjetivo (S):
Para além dos dados sociodemográficos e antecedentes pessoais e familiares, uma detalhada exploração desta dor é fundamental (2-4, 9):
1. Localização: primariamente será importante pedir ao paciente para
apontar o local doloroso e posteriormente questionar se tem o mesmo sintoma em outras áreas corporais
2. Contexto: será essencial questionar em que situações surge o sintoma e conhecer a sua variação ao longo das 24 horas
3. Cronologia: o clínico deverá averiguar se o início foi súbito ou insidioso e se a sua evolução cursa com mais ou menos de 6 semanas,
dor crónica versus dor aguda, respetivamente
4. Qualidade: descrição subjetiva da dor pelo paciente
5. Quantidade: o uso da escala analógica da dor poderá ser útil numa
boa parte dos doentes
6. Fatores de alívio e agravamento: é também essencial questionar o
que leva ao alívio ou agravamento da dor, nomeadamente: se o repouso melhora ou agrava, se a atividade alivia ou piora ou se alguma
medicação tentada anteriormente teve sucesso no alívio sintomático
7. Outras queixas associadas: outros sintomas associados poderão
fornecer informação valiosa na busca da causa da dor. Será de considerável importância questionar registo de picos febris, hipersudorese nocturna, edema/rubor articular ou fadiga muscular, assim como
inquirir sobre alterações a nível de alguns aparelhos e sistemas:
a. Alterações do padrão alimentar
b. Alterações cutâneas
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c. Alterações sensoriais, essencialmente visuais
d. Alterações gastrointestinais
e. Alterações geniturinárias
8. Antecedentes pessoais e dados sociodemográficos: poderão constituir dados relevantes a idade, o sexo e o país de origem, assim como
doenças já diagnosticadas, internamentos, cirurgias e traumatismos
anteriores
9. Antecedentes familiares: a história familiar pode ser um fator de
risco, nomeadamente para desenvolvimento de espondilite anquilosante, artrite psoriática ou artrite enteropática
Objectivo (O):
Um exame físico fornecerá dados clínicos que colocarão o MF na pista
de um diagnóstico, desde que sistematizado em (2-4, 9):
1. Dados antropométricos e sinais vitais: Essencialmente peso, estatura e temperatura. Estas medições traduzirão, em comparação com
os valores anteriores, um eventual atraso de crescimento, emagrecimento ou picos febris, que consistem em sinais de alerta
2. Aspeto geral: a importância do aspeto geral reflete-se na perceção
clínica de como aquela dor musculosquelética poderá afetar o paciente
3. Marcha: algumas alterações na marcha no paciente poderão ser verdadeiramente defensivas ou antálgicas
4. Pele, fâneros e mucosas: a presença de pele descorada eleva a
suspeição de uma anemia (anemia de doença crónica? doença
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hematológica?), enquanto mucosas que revelem úlceras aftosas recorrentes podem constituir um dado importante a conjugar com
outras alterações (lúpus eritematoso sistémico? doença inflamatória
intestinal?)
5. Gânglios linfáticos cervicais, supraclaviculares, axilares, inguinais: uma particular atenção deve ser dada à pesquisa de adenomegalias que possam encaixar num quadro infecioso arrastado, doença
hematológica, doença sistémica ou doença maligna local
6. Auscultação cardiopulmonar: S1 e S2 abafados e atrito pericárdico
poderão coexistir numa pericardite, a valorizar em determinados
contextos
7. Abdómen: algumas alterações ao exame abdominal poderão significar anomalias possíveis em doença inflamatória intestinal, doença
inflamatória pélvica ou lúpus eritematoso sistémico
8. Coluna vertebral: o exame cuidado da coluna vertebral poderá ser
tão essencial na abordagem das raquialgias assim como das monoartralgias ou poliartralgias. Ao exame cuidado da coluna vertebral, essencialmente pela inspeção e palpação, pode ser notada uma atrofia
ou contractura muscular ou alterações vertebrais como escoliose ou
hiperlordose. A dor na palpação das apófises espinhosas é pouco tranquilizadora (fratura patológica ou traumática?). Haverá limitação na
flexão / extensão / rotação interna / rotação externa? Se sim, esta limitação está associada a rigidez? O teste de Schöber poderá ser realizado
perante a suspeita de uma rigidez da coluna inferior: o médico deverá
marcar com uma esferográfica um ponto situado a 10cm acima da interseção da coluna lombar com a linha que une as duas cristas ilíacas.
Quando o doente se encontrar na maior flexão possível da coluna, é
medida a distância entre o ponto de interseção e o já marcado. Uma
variação superior a 5cm entre esta última medição e os 10cm marcados documenta ausência de rigidez apreciável da coluna lombar
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9. Membros: será necessário pesquisar a nível dos membros se existe
atrofia muscular, força mantida ou dor na palpação dos músculos,
das proeminências ósseas ou das inserções tendinosas. A avaliação
articular minuciosa é de extrema importância
• Inspecção: sinais inflamatórios visíveis (edema? rubor?) e atrofia
muscular peri-articular
• Palpação: dor na pressão da entrelinha articular? Calor? Crepitação?
Tumefação articular: consistência óssea ou elástica? Derrame intra-articular palpável?
• Mobilidade: mobilidade a nível da flexão / extensão / abdução / adução/ rotação interna / rotação externa? Hipermobilidade? Limitação
da mobilidade com rigidez? Mobilidades ativa e passiva dolorosas
(mais típica da dor articular)? Mobilidade passiva não-dolorosa
(mais típica da dor muscular)?
Avaliação (A):
Na 3ª etapa da sua consulta, o MF reune uma série de dados que lhe permitirão fazer um primeiro diagnóstico diferencial. Os diferentes graus
de suspeição determinarão o pedido de alguns exames complementares.
Será, então, o ponto da consulta em que o MF relembrará, de forma
breve, as causas mais prováveis de diferentes quadros clínicos.
Monoartralgia
A monoartralgia é suspeita em caso de presença de sinais inflamatórios
(dor, tumefação, derrame articular, impotência funcional, calor e rubor)
numa única articulação (Quadro I.) (7).
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Quadro I. Causas de Monoartralgia
Artropatia com expressão habitualmente monoarticular
Patologia
Causa
Comentário
Artrite séptica
Aguda: Bactérias piogénicas
Pode ser fatal e afetar a
integridade articular
Crónica: Tuberculose e
brucelose
Gota
Artrite por microcristais
Causa mais frequente de
monoartrite aguda nos CSP
Poderá envolver mais
do que uma articulação
(caracteristicamente,
em indivíduos obesos,
hipertensos, alcoólicos
crónicos)
Artrite por
pirofosfato cálcico
(condrocalcinose)
Artrite por microcristais
Patologia meniscal ou
ligamentosa
Traumatismo ou
degenerescência dos discos ou
ligamentos
Artrite pós-traumática
Traumatismo
Artrite por corpo estranho
Corpo estranho
Reumatismo palindrómico
Conectivopatia auto-imune de
Habitualmente
causa desconhecida
monoarticular
Mais frequente no sexo
feminino e em idades
avançadas
Afeta predominantemente
as pequenas articulações
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Osteonecrose asséptica
Perda temporária ou
permanente da irrigação
sanguínea
Denominações diferentes de
acordo com a localização:
- Legg-Calve-Perthes: cabeça
do fémur
- Kohler: navicular
- Freiberg: cabeça do
segundo metatarso
- Kienböck: semi-lunar
- Sever: tuberosidade do
calcâneo
- Calve: corpo vertebral
- Scheurmann: epífise
vertebral
Síndrome de OsgoodSchlatter
Causa desconhecida
(prováveis microtraumatismos
repetidos)
Febre mediterrânea familiar
Mutação que afeta ambos os
alelos do gene marenostrin
encoding fever gene (MEFV)
Tumores ósseos justaepifisários
Tumoral
Sinovioma
Neoplasia maligna
proveniente de tecido
tenossinovial das articulações
e das células sinoviais de
tendões e bursas
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Doença autossómica
recessiva que afeta
principalmente populações
do mediterrâneo (judeus,
arménios, árabes, turcos)
caraterizada por crises
recorrentes de febre e
inflamação da serosa,
resultando em dor
abdominal torácica ou
articular
Hidrartrose intermitente
Desconhecida
Ocorre em mulheres,
caracterizando-se por
episódios de sinovite
preferencialmente nas
grandes articulações, mais
comummente os joelhos
O que distingue esta
patologia de outras
periódicas como o
reumatismo palindrómico é
a periodicidade previsível
do quadro, com um ou dois
episódios mensais e exames
laboratoriais normais
durante a crise
Oligoartrite ou poliartite com possível inicio monoarticular
Patologia
Causa
Sindroma de Reiter, artrites
reactivas
Desenvolve durante ou logo
após uma infeção bacteriana,
geralmente geniturinária ou
gastrointestinal
Espondilite anquilosante
com artrite periférica
Desconhecida
Artrite crónica juvenil
Desconhecida
Artrite psoriática
Desconhecida
Artrite enteropática
Doença de Crohn e colite
ulcerosa
Artropatia hemofílica
Hemofilia A e B grave
Comentário
Doença poliarticular,
caraterizada por rigidez
articular e dor crónica
Resulta de hemartroses de
repetição, que atingem
sobretudo o tornozelo, o
joelho e o cotovelo
Artrite reumatoide
Desconhecida
As causas mais frequentes de monoartralgia estão representadas a negrito.
Legenda: CSP – Cuidados de Saúde Primários.
289
Oligo/Poliartralgia
Dor localizada em uma ou mais articulação que pode irradiar a outras
articulações ou à região peri-articular. Não deve ser confundida com
mialgias (cuja origem é muscular, podendo irradiar para articulações),
nem com entesopatias (dor e inflamação na zona de inserção do tendão
no osso). A lista de causas do poliartralgias é extensa. O MF deverá relembrar, no ponto de partida da sua Avaliação (A), as causas mais frequentes. Entre as mulheres jovens (25 – 50 anos), as causas mais comuns
são a artrite reumatoide (AR), o lúpus eritematoso sistémico (LES) e a
infeção gonocócica, enquanto entre os homens situados na mesma faixa
etária, as maiores prevalências correspondem à espondilite anquilosante (EA), artrite reativa ou síndroma de Reiter e infeção gonocócica. Para
indivíduos com idades superiores a 50 anos, osteoartrose, AR, artrites
cristalinas, polimialgia reumática e síndrome paraneoplásico encontram-se entre as etiologias mais vulgares (Quadro II.) (4, 7).
Quadro II. Causas de Poliartralgia (2-4, 9-17)
Patologia
Causa
Comentário
Infeção viral
Parvovírus humano B19,
vírus hepatotróficos
(particularmente, VNB e
VHC)
Poliartralgias com menos de 6
semanas de evolução
Não raramente associadas a
sintomas prodrómicos (exantema,
febrícula)
Envolvimento típico: pequenas
articulações + simétrico + sem
componente axial + padrão
inflamatório + M/H = 3:1 – 4:1
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Síndroma de Reiter
ou artrite reativa
Após ou durante infeção
gastrointestinal por
Salmonella, Shigella,
Campylobacter e Yersinia;
doença inflamatória pélvica
por Chlamydia trachomatis
e Neisseria gonorrhoeae
Afeta indivíduos jovens com
vida sexual ativa e com padrão
inflamatório, migratório e
oligoarticular (joelho, tibiotársica e
tarso)
Podem coexistir sintomas articulares,
genitais, urinários, cutâneos e
oculares
A tríade clássica – artrite, uretrite e
conjuntivite – ocorre apenas em um
terço dos casos, e o quadro clínico
acompanhado de sinais mucocutâneos é pouco frequente
Artrites cristalinas
Gota, doença de depósitos
de pirofosfato de cálcio
(pseudo-gota)
Artrite
reumatoide
(AR), Lúpus
Eritematoso
Sistémico (LES),
Polimiosite /
Dermatomiosite,
Esclerodermia,
Síndrome de
Sjögren, Síndrome
de Behçet,
Polimialgia reumática
Doenças reumáticas
sistémicas
AR: doença reumática sistémica mais
comum
Envolvimento típico: pequenas
articulações (metacarpofalângicas,
metatarsofalângicas, interfalângicas
proximais,carpo) e grandes
articulações + simétrico + com
componente axial (cervical) + padrão
inflamatório + M/H = 3:1 – 4:1 +
possível associação com nódulos
cutâneos
LES: tem início em mulheres jovens
Envolvimento típico: pequenas
articulações (interfalângicas
proximais) + simétrico + sem
componente axial + padrão
inflamatório + M/H = 9:1 + possível
associação com rash malar, úlceras
orais, alopecia, alterações do foro
psiquiátrico (depressão, psicose)
291
Púrpura de HenochSchönlein, Poliartrite
nodosa, Arterite de
células gigantes,
Granulomatose de
Wegener
Doença vascular sistémica
Espondilite
anquilosante
(EA), Artrite
psoriática, Artrite
enteropática
Espondiloartropatias
EA: espondiloartropatia mais comum
Envolvimento típico: Componente
axial + grandes articulações (anca,
ombro) + assimétrico, geralmente +
padrão inflamatório + M/H = 1:3
+ possível associação com uveíte
anterior ou entesite (tendinite de
Aquiles e fasceíte plantar)
Artrite psoriática
Envolvimento típico: grandes
articulações e pequenas articulações
(interfalângicas distais) + simétrico
ou assimétrico + com ou sem
componente axial + padrão
inflamatório + M/H = 1:1 + possível
associação com placas eritematodescamativas características +
ornicodistrofia com pontuado ungueal
peculiar + dactilite
Hiperparatiroidismo,
Hipertiroidismo,
Hipotiroidismo,
Acromegalia
Patologia das glândulas
endócrinas / Alterações
hormonais
Sinais e sintomas a nível de
outros sistemas: alterações do
trânsito intestinal, alterações do
foro psiquiátrico (perturbação da
ansiedade, depressão), alterações
do foro ginecológico (perturbações
do ciclo menstrual), alterações do
apetite, entre outros
Metástases ósseas,
mieloma múltiplo
Malignidade
Habitualmente, em indivíduos mais
idosos
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Osteoartrose
generalizada
Alterações degenerativas
Habitualmente, em indivíduos mais
idosos
Geralmente poupa as articulações do
ombro, cotovelo e tornozelo, exceto
se antecedentes de traumatismo
prévio ou distúrbios metabólicos
Envolvimento típico: grandes
articulações dos membros inferiores e
pequenas articulações (1ª articulação
carpometacarpiana, interfalângicas
proximais e distais) + simétrico ou
assimétrico + com componente axial
+ padrão mecânico + M/H = 1:1 –
2:1
Fibromialgia
Desconhecida
Envolvimento típico: poliartralgias
inespecíficas + simétrico + com
componente axial + padrão
essencialmente mecânico+ M/H
= 9:1 + possível associação com
perturbações do sono, síndrome do
cólon irritável, síndrome das pernas
inquietas + mialgias generalizadas
(pontos dolorosos específicos no
exame físico)
As causas mais frequentes de oligo/poliartralgia estão representadas a negrito.
Legenda: VHB: vírus da hepatite B; VHC: vírus da hepatite C; M/H: razão taxas de incidência
mulheres/homens.
Raquialgia
Dor a nível da coluna vertebral, com ou sem irradiação. A raquialgia, de
acordo com a localização, pode ser dividida em cervicalgia, dorsalgia,
ou lombalgia.
293
Cervicalgia
A cervicalgia atinge cerca de 18% da população, tornando-se mais frequente com o avançar da idade, ocorrendo em cerca de metade dos indivíduos com idade superior a 45 anos (9).
Cervicalgia Comum
Cervicalgia mais frequente que se diagnostica após exclusão de outras
causas e se caracteriza por dores cervicais associadas a perturbações
estáticas ou posturais, miofasciais ou ósteo-articulares degenerativas.
Pode ser intermitente e envolver os segmentos cervicais superiores (tendo irradiação para a região suboccipital) ou envolver os segmentos médios ou inferiores (com irradiação frequente para a região dorsal alta).
No Quadro III. (7, 8, 9)são apresentadas e descritas as principais entidades clínicas de Cervicalgia.
Quadro III. Causas de Cervicalgia
Patologia
Causa
Comentário
Cervicalgia funcional
ou por sobrecarga
Posturas corporais incorretas
Frequentes
Patologia degenerativa
cervical
Espondilose cervical
Necessitam de diagnóstico e
correcção
Uncartose
Artrose intrapofisária cervical
Síndrome simpático cervical
posterior
294
Radiculopatia cervical
Patologia degenerativa cervical
e hérnia discal
Irradiação da dor para
o membro superior
(cervicobraquialgia) ou para
a cabeça (nevralgia occipital)
Acompanha-se de queixas
neurológicas
Em idades jovens é causada
por hérnias discais e em
idades avançadas por
patologia degenerativa
Mielopatia cervical
Complicação grave da
artrose cervical que surge
geralmente após os 60 anos
O quadro típico não se
baseia na dor, mas antes
numa paraparésia espástica
e de alterações sensitivas nos
membros superiores, com
distribuição polirradicular e
bilateral
Cervicalgia de origem
traumática
Lesões com ou sem fractura
Mialgias agudas
cervicais
Torcicolo espasmódico
Síndrome miofascial
Traumatismo; infecções ou
inflamações; distensão muscular
Mesmo sem fractura,
podem surgir as “lesões em
chicote” que originam dor
intensa, contractura, perda
da mobilidade, cefaleia
occipital, vertigens, fadiga e
défice neurológico
Dor e contractura muscular
exacerbadas por pressão nos
pontos gatilho
Acompanham-se de limitação
da rotação ipsilateral e flexão
contra-lateral, sendo o exame
neurológico normal.
295
Artropatia inflamatória
Artrite reumatoide
Espondilite anquilosante
30% dos doentes com artrite
reumatoide têm cervicalgias
com ritmo inflamatório e
rigidez matinal
Pode dever-se a luxação
atlanto-odontoideia anterior
(ou vertical)
A espondilite anquilosante
condiciona cervicalgia
de ritmo inflamatório com
rigidez acentuada
Espondilodiscites
infecciosas
Infecção por Staphylococcus
aureus Mycobacterium
tuberculosis e Brucella mellitensis
Neoplasia primária ou
metástase
Tumores malignos ou benignos
Compressão local
Geralmente agravam com
o decúbito e aliviam com a
marcha
No caso de tumores malignos
(metástases de carcinomas
da mama, próstata, pulmão,
tiroide, rim, linfoma e
mieloma) as dores são
progressivas, intensas, sem
ritmo definido, resistentes ao
tratamento e associadas a
mau estado geral
Podem ser consequentes
a tumores intramedulares,
siringomielia, lesões
vasculares
Síndroma do plexo
braquial
Traumatismo por estiramento
Cervicalgia referida
Cardiopatia isquémica
A história clínica orienta para
o diagnóstico da patologia
principal
O exame da coluna é normal
Tumores do vértice pulmonar
296
Patologia irritativa:
patologia pancreática; hérnia
hiatal; úlcera gástrica; patologia
biliar; patologia aórtica
Lesões da articulação acrómioclavicular
Dorsalgia
A dorsalgia pode ser devida a alterações locais do aparelho locomotor,
bem como a projecção dorsal de afecção de outros órgãos intratorácicos
ou intra-abdominais. A mobilidade limitada deste segmento faz com
que a patologia mecânica tenha menor importância que a do segmento
cervical e lombar. A grande maioria das dorsalgias é de causa desconhecida, autolimitada no tempo e de prognóstico benigno (Quadro IV.) (7).
A dorsalgia inespecífica é a mais frequente ocorrendo em 80% dos casos.
Quadro IV. Causas de Dorsalgia
Patologia
Causa
Comentário
Degenerativa
Discartrose torácica
Insidiosa e pouco sintomática
devido à pouca mobilidade do
segmento dorsal
Osteoporose
Metabólica
Pode condicionar dores por microfractura ou achatamento vertebral
Anomalias do
alinhamento e da
estática
Cifose e escoliose
Dorsalgia postural mecânica
Doença de
Scheuermann
Cifose acentuada que tem
normalmente início na
puberdade
Condiciona dor intensa por
alteração postural
297
Hiperostose
esquelética difusa
idiopática (DISH ou
doença de ForestierRotés)
Hiperostose vertebral
anquilosante
Doença de Paget
Doença do metabolismo
ósseo, associados a
alterações ósseas típicas
Frequente (20 % da população)
Atinge sobretudo os homens entre
60 e 70 anos
Deteção radiológica
Geralmente é assintomática,
e diagnosticada através de
radiografia feita por outro motivo
qualquer (Ex: Rx de tórax)
Pode condicionar dor
A fosfatase alcalina encontra-se
aumentada
Afeta sobretudo indivíduos na
quinta década de vida
Fratura
Dorsalgia com sinais de alarme
Infecção
Neoplasia
Primária ou metástase
Dorsalgia produzida
por dor referida
Por doença coronária
isquémica, pericardite,
aneurisma da aorta torácica,
carcinoma brônquico,
úlcera péptica, esofagite,
pancreatite, neoplasias
digestivas ou doenças
hepatobiliares
Lombalgia
Sintoma muito frequente na população, sobretudo entre os 55 e os 65
anos. Pode evoluir muitas vezes para a cronicidade e tem repercussões
sociais e económicas importantes. Na sua maioria pertence ao grupo
das lombalgias comuns. Pode ser aguda (lumbago) com início abrupto após um esforço, intensa e com agravamento com a mobilização. Se
298
não houver sinais clínicos de alarme, de radiculopatia ou neurológicos,
efetua-se ciclo de analgesia, dispensando exames complementares de
diagnóstico.
A lombalgia crónica persiste para além de 3-6 meses, sendo mais incapacitante. A dor é difusa, mecânica e mal definida, podendo ocorrer sensação de fraqueza muscular e hipostesia, sem correlação com
a avaliação. Origina um exame objetivo pobre e sinais inconsistentes.
Associada muitas vezes a perturbações psicossociais e fatores laborais.
No No Quadro V. (7, 8, 9) são apresentadas e descritas as principais
entidades clínicas da Lombalgia. A dor lombar inespecífica é a mais frequente, ocorrendo em 85% dos casos de Lombalgia.
Quadro V. Causas de Lombalgia
Patologia
Causa
Comentário
Lombalgias de esforço
ou por sobrecarga
Hiperlordose, hipotonia
da musculatura
abdominal, hipertonia
muscular posterior,
dismetrias, hallux
valgus, etc
Na maioria dos casos não é
conhecida a causa, sendo esta
atribuída a causas músculoligamentares, mecânicas e
degenerativas
Alterações estruturais e
degenerativas da coluna
lombar
Discartroses, artrose
interapofisaria
posterior, escoliose,
espondilolistesis,
espondilolise, etc
A dor da artrose interapofisária
posterior é insidiosa, exacerbada ao
final do dia, ao levantar da cama e
com a extensão
Pode ocasionar irradiação para a
face posterior das coxas (acima dos
joelhos)
A dor da escoliose pode ocasionar
contracturas associadas
299
Dor lombar secundária
Inflamatória: espondilite
anquilosante,
espondilartropatias
Infeccioso: osteomielite
e espondilodiscite
Tumoral: tumores ósseos
benignos (osteoma
osteoide, hemangioma,
osteocondroma, etc.)
ou malignos (mieloma
múltiplo, linfoma,
metástases ósseas, etc.)
Doenças ósseas
metabólicas
Dor lombar referida
Patologia articular
(patologia da anca e
da pelve)
Ocorre como sintoma de afecções
não raquidianas
Doenças viscerais
(cólica renal;
pielonefrite, Ca do
cólon, aneurisma da
aorta abdominal)
Outros: herpes zoster,
etc
Hérnia discal – causa
mais frequente
Outras: osteófitos
posteriores do
corpo vertebral e
das articulações
interapofisarias, estenose
do canal medular
300
Dor lombar mecânica agravada com
a flexão
Canal lombar estreito
Mais frequente acima dos 55 anos. Origina lombalgia insidiosa, raquialgia em repouso e de esforço, claudicação neurogénica (que agrava em
ortostatismo) e agravamento da dor com a extensão lombar.
Lombalgia com compressão radicular
Dor lombar com irradiação abaixo do joelho, acompanhada de queixas
neurológicas (parestesias, hipostesia, abolição dos reflexos osteotendinosos e por vezes défices motores). A compressão radicular resulta frequentemente de hérnia discal e mais raramente de lesão tumoral ou infecciosa.
A radiculopatia L4 (lombocruralgia) condiciona dor e disestesia na
face póstero-lateral da coxa e face antero-interna da perna. Condiciona
diminuição da força do quadricípite (extensão da perna) afetando o reflexo rotuliano e positividade no teste de dorsiflexão e inversão do pé.
A radiculopatia L5 (lombociatalgia) condiciona dor e disestesia na face
póstero-lateral da coxa e face antero-interna da perna.
Plano (P):
Os exames laboratoriais poderão conferir uma maior certeza no diagnóstico suspeito, mas não são diagnósticos por si só. Se uma causa reumatológica é suspeita, o MF poderá ter alguns testes laboratoriais a usar
parcimoniosamente e a interpretar no contexto da apresentação clínica.
Apenas a história clínica (S – Subjetivo) e o exame físico e resultados de
exames auxiliares prévios (O – Objetivo) poderão levar a uma suspeita
(na A – Avaliação) e, portanto, determinar o pedido dos exames laboratoriais necessários (P – Plano).
301
A conjugação de hemograma e velocidade de sedimentação dos eritrócitos (VS) sem alterações, bem como um valor normal do doseamento
de proteína C reativa (PCR), reduz a probabilidade de infeção ou neoplasia (4, 9, 10).
Perante resultados analíticos normais, o mais razoável será adoptar uma
atitude expectante (wait and see), um dos princípios básicos a nível da
Reumatologia e da MGF. Pelo contrário, se existem sinais de atividade
biológica como o aumento dos reagentes de fase aguda (VS e PCR elevadas), trombocitose ou anemia normocítica e normocrómica, dever-se-á
iniciar um estudo dirigido para despiste de patologia osteoarticular inflamatória ou neoplásica.
Os anticorpos antinucleares (ANAs) devem ser interpretados de acordo com a probabilidade pré-teste de doença reumatológica para cada
doente em particular. No contexto dos CSP, essa probabilidade pré-teste é geralmente baixa, pelo que a maioria dos resultados positivos são
falso-positivos. O pedido do restante perfil reumatológico laboratorial
não é, habitualmente, recomendado. Poderá conduzir a falso-positivos e, portanto, a custos desnecessários e a ansiedade no doente. Cada
teste será melhor utilizado segundo um senso clínico apropriado (4,
9-11). Dados laboratoriais como o antigénio leucocitário humano B27
(HLA-B27) e o fator reumatoide (FR) não se revelam indispensáveis
no diagnóstico, pelo que são mais apropriados em contexto de consulta hospitalar, que serve uma população com sintomatologia mais
selecionada (4).
Uma história clínica com dados sugestivos de dor “preocupante” ou alterações encontradas no exame físico justificam o pedido de um estudo
imagiológico. Por vezes, as radiografias simples podem ser normais,
mesmo perante alta suspeição clínica, mas este constitui o estudo imagiológico inicial na maior parte dos quadros apresentados. Perante alta
suspeição clínica e estudo radiológico negativo ou a merecer melhor
esclarecimento, a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética poderão ser adequadas (2-4, 9).
302
A parte final do plano consiste na terapêutica (não-farmacológica, farmacológica ou cirúrgica). O tratamento indicado dependerá, naturalmente, do diagnóstico suspeito.
O tratamento não farmacológico pode incluir o repouso da articulação
afetada. No caso das lombalgias agudas é preconizado informar o paciente do curso benigno e auto-limitado, sendo o repouso relativo recomendado nunca superior a 2 dias, mantendo uma atividade dentro dos limites
que permitam não ter dor. Após este período o paciente poderá retomar o
seu trabalho habitual (18, 19). Este paciente deverá ser esclarecido quanto
à contraindicação do repouso absoluto, informando-o que o prolongamento do repouso reduz a probabilidade de recuperação, incrementa a
probabilidade de transformação em dor crónica e atrasa o retorno ao local de trabalho (7). Finalmente, o MF não deverá esquecer a abordagem
biopsicossocial do seu paciente, explorando as causas orgânicas, psicogénicas ou ocupacionais associadas às dores lombares (20).
A farmacoterapia para as patologias do foro reumatológico tem sofrido diversas alterações nos anos recentes com a introdução dos Disease
Modification Anti-Rheumatic Drugs (DMARDs). Apesar do seu enorme
impacto na qualidade de vida de inúmeros doentes com patologia reumatológica, as questões em torno da sua toxicidade e de eventuais efeitos laterais inesperados mantêm-se. Estes aspetos tornam os DMARDs
tão particulares, que é habitualmente em consulta hospitalar que eles
são iniciados, pelo que fogem ao âmbito da MGF.
Quanto ao tratamento farmacológico de controlo sintomático de monoartralgias, poliartralgias ou raquialgias este poderá ser usado nos
CSP, sendo também, frequentemente, o primeiro recurso terapêutico
em cuidados hospitalares. O paracetamol ou os anti-inflamatórios não-esteróides (AINEs) são os mais utilizados. Existe uma grande variedade
de AINEs pertencentes às diferentes famílias farmacológicas, todas elas
autorizadas para uso em adultos. Outras opções terapêuticas consistem
em opióides ou corticoides que devem ser usados segundo a escala da
dor (2-4, 9).
303
Os tratamentos de medicina física e reabilitação e programas de exercícios podem ser úteis, sobretudo na dor lombar crónica. Para o tratamento das lombalgias agudas, exercícios de reeducação não são aconselhados.
Tratamentos alternativos podem passar por aplicação local de frio e de
calor, utilização de suportes lombares, acupunctura entre outros.
Critérios de referenciação
Monoartralgias (7)
—— Suspeita de artrite séptica (febre, antecedentes de toxicodependência intravenosa, comportamento sexual de risco, uretrite recente) –
referenciação urgente.
—— Para punção do líquido articular, ou para exames complementares
de diagnóstico que não são acessíveis em CSP.
Poliartralgias (7)
—— Devem ser referenciados as poliartrites para confirmação diagnóstica ou para estudo complementar diagnóstico dirigido.
—— Em caso de poliartralgias resistentes ao tratamento.
304
Raquialgias (7, 8)
—— Doentes com défices neurológicos rapidamente progressivos devem
ser atempadamente referenciados a neurologia ou neurocirurgia.
—— Doentes com sinais sugestivos de compressão da cauda equina ou de
compressão medular devem ser sujeitos a internamento urgente (ex:
défices neurológicos bilaterais de novo, retenção urinária, incontinência urinária e anestesia em sela).
—— Suspeitas de osteomielite e abcesso epidural.
—— Dorsalgia intensa e intratável após 4 a 6 semanas de terapêutica conservadora, ou se há défice neurológico devem indicar referência a
ortopedia ou neurocirurgia urgente.
—— Mais de 2 episódios de dor radicular por ano em pacientes com hérnia discal devem indicar referência a ortopedia ou neurocirurgia.
—— Lombalgia que não melhora com outros tratamentos, lombalgia
inespecífica subaguda ou que condiciona dor crónica durante mais
de 3 meses.
—— Para realizar exames complementares de diagnóstico que não são
acessíveis em CSP.
Linhas de investigação futura e prioridades na
orientação das pessoas com doenças reumáticas
A alta prevalência de queixas do foro reumático justifica um estudo
mais aprofundado e actualizado acerca do verdadeiro impacto que estas
doenças têm na prática da MGF. Por se tratarem, em grande parte, de
305
doenças crónicas e incapacitantes é necessário desenvolver e actualizar
protocolos de boas práticas no diagnóstico precoce e estudo dos casos,
pelo desenvolvimento de marcadores clínicos, laboratoriais e radiológicos cada vez mais sensíveis e específicos, cujo custo-benefício favoreça
a sua utilização em contexto de CSP e que auxiliem de forma mais eficiente o estudo e referenciação dos doentes.
Seria importante desenvolver uma rede de articulação de cuidados que
permitisse efectivamente que doentes com suspeita de diagnóstico de
doença reumatológica em estadios iniciais tivessem uma pronta resposta e acessibilidade a tratamentos modificadores do curso da doença, de
controlo da dor e de prevenção da incapacidade funcional. Igualmente
importante é o seguimento do doente com doença avançada, bem como
estar preparado para lidar com a complexidade que envolve a polimedicação, os efeitos laterais e interacções da medicação, a multimorbilidade, bem como a gestão funcional e psico-social das sequelas da doença.
Tratando-se de um dos principais motivos de consulta em MGF e de um
problema de saúde quase tão prevalente como os problemas do foro cardiovascular, área em que existem programas de saúde bem delineados e
implementados nos CSP, poderia ser interessante desenvolver um programa de saúde dirigido ao doente portador de doença reumatológica,
em que se procedesse ao diagnóstico e sinalização do doente, a técnicas
de ensino, de capacitação e de auto-cuidados acerca da doença, bem
como a intervenções multidisciplinares, incluindo a vertente nutricional, a psicológica e a de reabilitação.
Essencial também, seria desenvolver trabalhos de investigação acerca
do impacto destes problemas na vida das pessoas com este tipo de problema, bem como nas suas famílias e no seu enquadramento laboral.
Pelo exposto ao longo deste capítulo, torna-se fulcral desenvolver um
programa de intervenção a nível do doente com problemas do foro da
Reumatologia em Cuidados de Saúde Primários, que possibilite o correcto diagnóstico, sinalização, referenciação e articulação de cuidados.
306
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