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KYLLO vs. UNITED STATES - A garantia da privacidade como limite aos poderes
investigatórios do Estado na visão da Suprema Corte dos E.U.A.
Leandro Bittencourt Adiers
Advogado no Rio Grande do Sul
O presente estudo tem por objetivo compartilhar com os leitores um caso recente e
paradigmático envolvendo tecnologia a privacidade na Suprema Corte Norte Americana,
analisando a método hermenêutico utilizado naquele sistema judicial e também o modo
como aquela Corte delimita os poderes fiscalizatórios e investigatórios do Estado em face
aos direitos e garantias individuais, considerando as presentes e futuras possibilidades
tecnológicas. Seguem a tradução do acórdão e os comentários:
SUPREMA CORTE DOS ESTADOS UNIDOS
NO. 99-8508
DANNY LEE KYLLO – REQUERENTE X ESTADOS UNIDOS
No Mandado para a Corte de Apelação dos Estados Unidos para o Nono Circuito.
Scalia, J., relatou a decisão da corte, concordando Souter, Thomas, Ginsburg e Breyer,
discordando Stevens, Rehnquist, O'Connor e Kennedy
11 de junho de 2001
JUSTICE SCALLIA: Este caso apresenta a questão se o uso de um dispositivo de termoimagem focalizado em uma residência a partir da via pública para detectar certa quantidade
de calor dentro da casa constitui-se em uma “busca” dentro do significado da Quarta
Emenda.
Em 1991 o Agente William Elliott do Departamento do Interior dos Estados Unidos veio a
suspeitar que marijuana estava sendo cultivada no interior de uma casa pertencente ao
requerente Danny Kyllo, parte de um triplex na Rhododendron Drive, em Florence,
Oregon. O cultivo de marijuana dentro de um ambiente fechado tipicamente exige
lâmpadas de alta-intensidade. A fim de determinar se a quantidade de calor estava
emanando da casa do requerente consistia com o uso de tais lâmpadas às 3:20 da
madrugada em 16 de janeiro de 1992, o Agente Elliott e Dan Haas usaram um
equipamento Agema Thermovision 210, para produzir termo-imagens afim de observar o
triplex. As termo-imagens detectaram radiação infra-vermelha, que virtualmente todos os
objetos emitem, mas que não são visíveis a olho-nu. O aparelho de imagem converte a
radiação em imagens baseadas no calor relativo – preto é frio, branco é quente, sombras de
cinza conota diferenças relativas; deste modo, ele opera de forma parecida com uma vídeo
câmera mostrando imagens por calor. O rastreamento da casa de Kyllo levou apenas alguns
minutos e foi executado do banco de passageiro do veículo do agente Elliot do outro lado
da rua em frente a casa e também na rua de trás da casa. O scan mostrou que o teto sobre a
garagem e a parede lateral da casa do requerente eram relativamente quentes comparadas
ao resto da casa e substancialmente mais quente que as casas dos vizinhos no triplex. O
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Agente Elliot concluiu que o requerente estava usando um determinado tipo de lâmpadas
para cultivar marijuana em casa, que de fato estava. Baseado em dicas de informantes,
faturas e as termo-imagens, um Juiz Federal concedeu uma garantia autorizando uma busca
na casa do requerente e os agentes encontraram uma operação de cultivo em recinto
fechado envolvendo mais de 100 plantas. O requerente foi indiciado por produção de
marijuana, em violação à lei 21 USC parágrafo 841 (a) (1). Este não obteve sucesso para
suprimir e evidência obtida de sua casa e então entrou com um pedido de “guilty”
condicional.
A Corte de Apelação do Nono Circuito manteve a ordem de prisão no caso por considerar
como uma prova evidenciária relativamente a pertinência das termo-imagens. Ao
reconduzir à prisão a Corte Distrital considerou que o equipamento Agema 210 “é um
dispositivo não invasivo que não emite raio ou luz e mostra uma imagem visual clara do
calor sendo irradiado do lado de fora da casa”, ele “não mostra qualquer pessoa ou
atividade dentro das paredes da estrutura”, “o dispositivo usado não pode penetrar
paredes ou janelas para revelar conversas ou atividades humanas”, e “nenhum detalhes
íntimos da casa foram observados”. (Supp.App. to Pet. For Cert. 39-40). Baseado nestas
considerações, a Corte Distrital manteve a validade da autorização/ordem que contava em
parte com as termo-imagens e reafirmou sua recusa pela moção para suprimi-las. Uma
Corte de Apelação dividida inicialmente reverteu/revogou, 140 F 3d 1249 (1998), mas esta
opinião foi retirada e o painel (após uma alteração na composição) confirmou, 190 F 3d
1041(1999), com o Juiz Noonan discordando. A Corte sustentou que o requerente tinha
mostrado nenhuma expectativa subjetiva de privacidade pois ele não teve o cuidado para
ocultar/disfarçar o calor que escapava de sua casa, id, na 1046, e ainda se o tinha, não havia
uma razoável expectativa objetiva de privacidade uma vez que o equipamento de imagem
“não expõe quaisquer detalhes da intimidade da privacidade de Kyllo”, somente “focaliza
o calor de modo amorfo” no telhado e parede externa”, id, na 1047. Ele garantiu 'certiorari',
530 US 1305 (2000).
II
A Quarta Emenda estabelece que “o direito das pessoas de estarem seguras em suas
individualidades, casas, papéis e efeitos, contra buscas e capturas desarrazoadas, não
podem ser violadas”. “No âmago” da Quarta Emenda “mantém o direito do homem de
recolher-se dentro de sua própria casa e lá estar livre da intromissão governamental
desarrazoada”. Silverman v. United States, 365 US 505, 511 (1961). Com poucas
exceções, a questão se uma busca não autorizada em uma casa é razoável e portanto
constitucional deve ser respondida não. Ver Illinois v. Rodriguez, 497 US 177, 181 (1990);
Payton v. New York, 445 US 573, 586 (1980) .
Por outro lado, a questão antecedente se ou não uma “busca” com base na Quarta Emenda
tenha ocorrido não é tão simples sob nossos precedentes. A permissão de uma inspeção
visual comum de uma casa costumava ser clara pois, no século 20 nossa jurisprudência da
Quarta Emenda estava ligada a intromissão da common-law. Ver Goldman v. United Stas,
316 US 129, 134-136 (1942); Olmstead v. United States, 277 US 438, 464-466 (1928). De
acordo com Silverman v. United States, supra, na 510-512 (intromissão técnica não
necessária para violação da Quarta Emenda; é suficiente se há “intromissão atual em uma
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área constitucionalmente protegida”). Inspeção/exame visual foi inquestionavelmente legal
pois “o olho não pode pela lei da Inglaterra ser culpado de uma intromissão”. Boyd v.
United States, 116 US 616, 628 (1886) (citando Enlick v. Carrington, 19 How. St. Tr. 1029,
95 Eng. Rep. 807 (KB 1765). Nos temos desde então separado a violação dos direitos de
uma pessoa sob a Quarta Emenda de uma violação por intromissão de sua propriedade, ver
Rakas v. Illinois, 439 US 128, 143 (1978), mas a legalidade da exploração visual não
autorizada de uma casa ainda tem que ser preservada. Como nós observamos na California
v. Ciraolo 476 US 207, 213 (1986), “a proteção da casa sob Quarta Emenda nunca foi
ampliada para exigir uma lei que obrigue os oficiais para cobrirem seus olhos quando
passarem por uma casa em vias públicas”.
Um pensamento obrigatório que a nova validação racional poderia ser examinar uma parte
da casa que está em plano público de vista, embora seja uma “busca”, apesar da ausência
de intromissão, não é “desarrazoada” sob a Quarta Emenda. Ver Minnesota v. Carter 525
US 83, 104 (1998) (Breyer, J. concordando com o julgamento). Mas de fato nos mantemos
aquela observação visual não é “busca” realmente – talvez a fim de preservar algo mais
intacto em nossa doutrina que as buscas não autorizadas são presumidamente
inconstitucionais. Ver Dow Chemical v. United States, 476 US 227, 234-235, 239 (1986).
Avaliando quando 'uma busca não é uma busca', nós aplicamos algo ao contrário do
princípio primeiro anunciado em Katz v. United States, 389 US 347 (1967). Katz envolveu
uma escuta oculta através de um aparelho de escuta eletrônica colocado no lado externo de
uma cabine telefônica – uma localização não dentro do catálogo (pessoas, casas, papéis e
efeitos”) que a Quarta Emenda protege contra busca desarrazoada. Nós sustentamos que a
Quarta Emenda entretanto protegia Katz da escuta oculta não autorizada porque ele
“justificadamente contava” com a privacidade da cabine telefônica. Id., em 353. De acordo
com a citação do Juiz Harlan este concorda descrevendo que a busca em violação à Quarta
Emenda ocorre quando o governo viola uma expectativa subjetiva de privacidade que
sociedade reconhece como razoável. Ver id., no 361. Nos temos subseqüentemente
aplicado este princípio para manter que a busca da Quarta Emenda não ocorre – mesmo
quando a localização explicitamente protegida de uma casa é tocada – a menos “o
indivíduo manifestou uma subjetiva expectativa de privacidade no objeto da busca
rechaçada” e “a sociedade está disposta a reconhecer que a expectativa é razoável”.
Ciraolo, supra, na 211. Nós aplicamos este teste na manutenção que não é uma busca para a
polícia usar uma caneta registradora na companhia telefônica para determinar quais
números foram discados em uma casa privada, Smith v. Maryland, 442 US 735, 743-744
(1979), e nós aplicamos o teste em duas diferentes ocasiões para sustentação que uma
intromissão aérea de uma casa privada e arredores não constitui-se em busca, Ciraolo,
supra, Florida v. Riley, 488 US 445 (1989).
O caso atual envolve policiais em uma via pública envolvidos em mais que uma observação
à olhos nu de uma casa. Nós reservamos inicialmente o julgamento de quanto o
aperfeiçoamento tecnológico de uma percepção comum a partir do ponto de vantagem, se
algum, é muito. Enquanto nós mantivemos uma fotografia aérea ampliada de um complexo
industrial na Dow Chemical, nós observamos que achamos que o “importante que não é
uma área imediatamente adjacente a uma residência privada, onde as expectativas de
privacidade são mais intensas”, 476 US, na 237, n. 4 (ênfase na original).
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Poderia ser tolo sustentar que o grau de privacidade assegurados aos cidadãos pela Quarta
Emenda não tenha sido inteiramente afetado pelos avanços tecnológicos. Por exemplo, de
acordo com os casos discutidos acima fica claro que a tecnologia possibilitando o vôo
humano tem exposto a vista pública (e portanto, nós temos dito, para observação oficial)
partes descobertas da casa e sua cobertura que antes eram privadas. Ver Ciraolo, supra, na
215. A pergunta que nós confrontamos hoje é quais os limites que existem sobre este poder
da tecnologia para encolher o domínio da garantia privada.
O teste Katz – se o indivíduo tem uma expectativa de privacidade que a sociedade está
preparada para reconhecer como razoável – vem sendo freqüentemente criticada como
periférica e, desta forma, subjetiva e imprevisível. Ver 1 W. LaFave, Busca e Apreensão
parágrafo 2.1 (d), pp. 393-394 (3d ed. 1996); Posner, A Incerta Proteção da Privacidade
pela Suprema Corte, 1979 S. Ct. Ver. 173, 188; Carter, supra, na 97 (Scalia, J.,
concordante). Mas, ver Rakas, supra, na 143-144, n.12. Enquanto pode ser difícil para
refinar Kalz quando a busca de áreas tais como cabines telefônicas, automóveis ou ainda o
telhado ou partes descobertas das residências são a questão, no caso de uma busca do
interior das casas – o protótipo e portanto área mais comumente litigada de proteção da
privacidade - existe um critério pronto, com raízes profundas no common law, de um
mínimo de expectativa de privacidade que existe, e que é reconhecida como sendo
razoável. Retirar a proteção desta expectativa mínima poderia ser permitir tecnologia para a
polícia desgastar a privacidade garantida pela Quarta Emenda. Pensamos que a obtenção
através de uma tecnologia de qualquer informação referente ao interior de uma casa que
não poderia de outra forma ter sido obtida sem uma intromissão física dentro de uma área
constitucionalmente protegida”, Silverman 365 US, na 512, constitui em busca – no
mínimo onde (como aqui) a tecnologia em questão não é geral de uso público. Isto assegura
a preservação de um grau de privacidade contra o governo que existia quando a Quarta
Emenda foi adotada. Com base neste critério, a informação obtida através de um
equipamento que fornece termo-imagens neste caso foi um produto de busca.
O Governo sustenta, contudo, que o aparelho deve ser mantido porque ele detecta “somente
calor radiado de uma superfície externa da casa”, Introdução para United States 26. A
discordância torna este um ponto principal, ver post, na 1, asseverando que há uma
diferença fundamental entre o que é chamado observações “fora da parede” e
“intromissão através da parede”. Mas apenas como um equipamento de termo-imagens
capta somente calor emanado de uma casa, também um poderoso microfone direcionado
capta somente os sons emanados de uma casa e o satélite capaz de rastrear a partir de
muitas milhas longe captar somente luzes visíveis emanadas de uma casa. Nós rejeitamos
tal interpretação mecânica da Quarta Emenda no caso Katz, onde o dispositivo de escuta
escondida captava somente ondas de sons que alcançavam o exterior de uma cabine
telefônica. Revertendo/anulando esta colocação poderia deixar o proprietário da casa à
mercê da vantagem tecnológica – incluindo tecnologia de imagem que poderia discernir
qualquer atividade humana na casa. Enquanto a tecnologia usada no presente caso foi
relativamente rudimentar, a regra que adotamos deve levar em conta sistemas mais
sofisticados que já estão em uso ou em desenvolvimento. A confiança da dissidência na
distinção entre a observação “fora da parede” e “através da parede” é completamente
incompatível com a crença da dissidência, que nós discutimos abaixo, que as observações
utilizando termo-imagens de detalhes íntimos de uma casa não é admissível. Os
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dispositivos de termo-imagens mais sofisticados continuam a medir “fora da parede” ao
invés de “através da parede”; a desaprovação da dissidência destes dispositivos de termoimagens mais sofisticados, ver post, na 10, é mais um reconhecimento de que não existe
diferença substancial nesta distinção. De acordo com a extraordinária posição da
dissidência que qualquer coisa conhecida através de “uma inferência" não pode ser busca,
ver post, na 4-5, que pudesse validar ainda a tecnologia “através da parede” que a
dissidência pretende desaprovar. Certamente a dissidência não acredita que a tecnologia de
radar através da parede ou de ultrasom produz uma luminosidade 8-por-10 Kodak que não
precisa de análise (por exemplo, a produção de interferências). E, é claro, a nova
proposição que a inferência isola uma busca é manifestamente contrária ao United States v.
Karo, 468 US 705 (1984), onde a polícia “deduziu” a partir de uma ativação de um
“beeper” que uma certa lata de éter estava na casa. A atividade policial foi mantida como
sendo uma busca e a busca foi mantida como ilegal.
O Governo também afirma que a termo-imagem foi constitucional porque ela não “detecta
atividade provada que ocorre dentro das áreas privadas”. Resumo para United States 22.
Ela aponta que na Dow Chemical nós observamos que uma fotografia aérea ampliada não
revela qualquer “detalhe da intimidade”, 476 US, na 238. Dow Chemical, entretanto,
envolveu uma fotografia aérea ampliada de um complexo industrial, que não compartilha
inviolabilidade do lar da Quarta Emenda. A proteção do lar da Quarta Emenda nunca foi
ligada às medidas de qualidade ou quantidade da informação obtida. Em Silverman, por
exemplo, nós tornamos claro que qualquer invasão física da estrutura da casa, “mesmo
através de uma fração de polegada” era muito, 365 US, na 512, e existe certamente
nenhuma expectativa da garantia exigida pelo oficial que apenas estoura a porta da frente e
não vê nada além do tapete interno no piso do corredor. Na casa, nossos casos mostram
todos os detalhes, porque a área inteira é mantida a salvo dos olhos intrometidos
governamentais. Além disso, Karo, supra, a única coisa detectada pela busca física que foi
além do que os oficiais legalmente puderam observar em uma “simples olhada” foi o
número de registro de uma plataforma giratória fonográfica. Estes foram detalhes íntimos
porque eles eram detalhes da casa , simplesmente como o era o detalhe de o quanto quente
– ou ainda como relativamente quente – Kyllo estava aquecendo sua residência.
Limitando a proibição de termo-imagens para “detalhes íntimos” poderia não só ser errado
em princípio; poderia ser impraticável na aplicação, falhando para fornecer uma
“ponderação operável entre as necessidades da aplicação da lei e os interesses protegidos
pela Quarta Emenda”, Oliver v. United States, 466 US 170, 181 (1984). Para começar, não
há necessariamente uma conexão entre a sofisticação do equipamento de vigilância e a
“intimidade” dos detalhes que ele observa – o que significa que um não pode dizer (e a
polícia não pode estar assegurada) que o uso de um equipamento relativamente rudimentar
em questão aqui irá sempre ser legal. O equipamento Agema Thermovision 210 pode
revelar, por exemplo, a que horas a cada noite uma senhora da casa toma seu banho diário –
um detalhe que muitos poderiam considerar íntimo, e um sistema muito mais sofisticado
pode detectar nada mais íntimo do que o fato de que alguém esqueceu uma luz ligada. Não
podemos, em outras palavras, desenvolver uma regra aprovando somente que uma
vigilância através das paredes que identifica objetos não maiores que 36 por 36 polegadas,
mas teríamos que desenvolver uma jurisprudência especificando quais as atividades da casa
são íntimas e quais não são. E ainda quando (se algum dia) esta jurisprudência estiver
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plenamente desenvolvida, nenhum policial poderia estar apto a saber antecipadamente se
sua vigilância através das paredes capta algum detalhe íntimo – e mais não estaria apto a
saber antecipadamente se isto é constitucional.
O padrão proposto pela dissidência – se a tecnologia oferece a “equivalência funcional da
atual presença na área sendo observada”, post , na 7 – poderia parecer quase similar/igual
para nós mesmos à primeira vista. Os dissidentes concluem que Katz foi um caso, mas
então inexplicavelmente asseveram que se o mesmo equipamento de escuta somente
revelasse o volume da conversação, a vigilância poderia ser permitida, post, na 10. Logo se,
sem a tecnologia, a polícia não pudesse discernir o volume sem estar atualmente presente
na cabine telefônica, Juiz Stevens poderia concluir que uma busca tenha ocorrido. De
acordo com Karo, supra, na 735 (Stevens, J. concordando em parte e discordando em parte)
(“Encontro um pouco de conforto nas noções da Corte que nenhuma invasão de
privacidade ocorre até que um ouvinte obtenha alguma informação significativa através do
uso de um equipamento... Uma banheira é uma área menos privativa quando um
encanador está presente mesmo se estiver virado de costas”). O mesmo poderia ser
mantido para o calor interno de uma casa se somente uma pessoa presente em casa poderia
perceber o calor. Apesar da força dirigida da dissidência, apesar de sua citação do padrão
acima, parece ser uma disfunção entre diferentes tipos de informação – se o “proprietário
da casa pudesse ainda se importar que alguém soubesse”, post, na 10. A dissidência não
oferece nenhum guia prático para a aplicação deste padrão, e pelas razões já discutidas,
acreditamos não poder ser nenhuma. As pessoas em suas casas, assim como a polícia,
merecem mais precisão.
Temos dito que a Quarta Emenda traça “uma linha firme na entrada da casa”, Payton ,
445 US , na 590. Esta linha, pensamos, não deve ser somente firme mas também clara –
que exige uma especificação clara sobre aqueles métodos de investigação/vigilância que
exigem um mandado. Enquanto é certamente possível concluir de uma fita de vídeo de um
equipamento de termo-imagem que ocorreu neste caso que nada “significativo”
comprometeu a privacidade do proprietário da casa tenha ocorrido, temos que ter uma visão
mais ampla sobre o sentido original da Quarta Emenda daqui para frente.
“A Quarta Emenda deve ser construída à luz do que nós consideramos uma busca e
apreensão razoável quando ela for adotada, e na maneira como irá conservar os interesses
público bem como os interesses e direitos individuais dos cidadãos.” Carroll v. United
States, 267 US 132, 149 (1925).
Quando, como aqui, o Governo usa um dispositivo que não é de uso do público em geral,
para explorar detalhes de uma casa que poderia previamente ter sido desconhecido sem
uma intromissão física, a vigilância é uma busca e presumivelmente desarrazoada sem um
mandado.
Uma vez que mantivermos a termo-imagem como sendo uma busca ilegal, irá permanecer
para a Corte Distrital determinar se, sem a evidência que ela fornece, a emissão do
mandado de busca neste caso foi sustentada através da causa provável – e se não, se existe
qualquer outra base para sustentar a admissão da evidência que a busca relacionada ao
mandado produziu.
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O julgamento da Corte de Apelação está revogado; o caso está 'remanded' para
procedimentos adicionais com base nesta opinião.
JUIZ STEVENS, com quem o Chefe de Justiça, JUIZ OCONNOR, e JUIZ KENNEDY
acompanham, divergindo.
Há, em meu julgamento, a distinção de magnitude constitucional entre vigilância “através
da parede” que dá ao observador ou ao ouvinte acesso direto a informação em área
privada, por um lado, e o processo de conhecimento usado para traçar inferências a partir
de uma informação de domínio público, por outro lado. A Corte vem habilidosamente
fazendo uma regra que pretende tratar com as observações diretas de dentro da casa, mas o
caso anterior ao nosso meramente envolve deduções indiretas de vigilância “fora da
parede”, que é, observação de exterior da casa. Estas observações foram feitas com um
equipamento de termo-imagem relativamente primitivo que colhia dados expostos no lado
externo da casa do requerente, mas não invade qualquer interesse constitucionalmente
protegido na privacidade. Entretanto, acredito que a supostamente regra da “linha clara”
que a Corte vem criando em resposta às suas preocupações sobre o futuro dos
desenvolvimentos tecnológicos não é necessária, imprudente e inconsistente com a Quarta
Emenda.
Não há a necessidade para a Corte construir uma nova regra para decidir este caso, à
medida em que está controlada por princípios estabelecidos a partir de nossa jurisprudência
da Quarta Emenda. Um destes mais importantes princípios, é claro, é que as “buscas e
apreensões dentro de casa sem um mandado são presumivelmente desarrazoadas”. Paylon
v. New York , 445 US 573, 586 (1980). Mas é igualmente estabelecido que as buscas e
apreensões da propriedade de algo visível são presumivelmente razoáveis. Ver, is, na 586587. Se aquela propriedade é residencial ou comercial, os princípios básicos são os
mesmos: “O que uma pessoa reconhecidamente expõe ao público, mesmo que em sua
própria casa ou escritório, não é objeto de proteção pela Quarta Emenda”. California v.
Ciraolo, 476US 207, 213 (1986) ( citando Katz v. United States , 389 US 347, 351 (1967);
ver Florida v. Riley, 488US 445, 449-450 (1989); California v. Greenwood, 486 US 35, 4041 (1988), Dow Chemical v. United States, 476 US 227 , 235-236 (1986); Air Pollution
Variance v. Western Alfafa Co., 416 US 861, 865 (1974). Isto é o princípio implicado aqui.
Enquanto a Corte “dá uma visão à frente” e decide este caso baseado amplamente no
potencial de tecnologia ainda a ser desenvolvida que deve permitir vigilância través da
parede, ante, na 11-12; ver ant, na 8, n. 3, este caso não envolve nada mais que a vigilância
fora da parede por força da lei os oficiais captam informações expostas ao público em geral
a partir do lado externo da casa do requerente. Tudo que a camera infravermelha fez neste
caso foi passivamente medir o calor emanado a partir das superfícies externas da casa do
requerente; tudo que estas medidas mostraram foram diferenças relativas nos níveis de
emissão, vagamente indicando que algumas áreas do telhado e as paredes externas estavam
mais quentes que as outras. Como ainda as imagens infravermelhas mostram, ver
Appendix, infra, nenhum detalhe relativo ao interior da casa do requerente foi revelado. A
menos que uma vasculhada com raio-x , ou outras técnicas possíveis de observação através
da parede, a detectação de radiação infravermelha emanada da casa não realiza “uma
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penetração física não autorizada dentro da propriedade”, Silverman v. United States, 365
US 505, 509 (1961), ou nem “obtém informação que não poderia ter obtido através de uma
observação do lado externo do telhado da casa”. Unites States v. Karo, 468 US 705, 715
(1984).
Por outro lado, o uso ordinário dos sentidos deve possibilitar um vizinho ou transeuntes a
observar o calor emanado da construção, particularmente se o estiver emanando, como foi o
caso aqui. Adicionalmente, qualquer membro do público pode observar que uma parte da
casa é mais quente que a outra parte ou um prédio próximo se, por exemplo, a água da
chuva evapora ou a neve derrete em taxas diferentes através da superfície. Tal uso dos
sentidos não poderia converter em uma busca desarrazoada se, ao invés disso, um vizinho
ao lado permitisse que um oficial entrasse em sua propriedade para verificar sua percepção
com um termômetro sensível. Nem, em minha visão, tal observação torna-se uma busca
desarrazoada se feita de uma distância com o auxílio de um dispositivo que simplesmente
revela que o exterior de uma casa, ou uma área da casa, é muito mais quente que a outra.
Nada mais ocorreu neste caso.
Além disso, a noção de que as emissões de calor do lado externo de uma residência é uma
questão privada implicando as proteções da Quarta Emenda (o texto do qual garante o
direito das pessoas “a estarem seguras em suas ... casas” contra desarrazoadas buscas e
apreensões não é somente sem precedentes, mas também muito difícil para tomar
seriamente. Ondas de calor, como aromas que são gerados de uma cozinha, ou em um
laboratório ou esconderijo de opium, entram no domínio público se e quando eles deixam
um prédio. Uma expectativa subjetiva que elas poderiam permanecer privada não é
somente implausível mas também certamente não “uma que a sociedade está preparada
para reconhecer como razoável”. Katz 389 US , 361 ( Harlan, J., concordante).
Para estar certo o proprietário do imóvel têm uma expectativa razoável de privacidade
relativamente ao que ocorre dentro da casa e a proteção da 4a emenda contra invasões
físicas de uma casa poderia ser aplicada às suas funções equivalentes. Mas o equipamento
neste caso não penetra as paredes da casa do requerente e enquanto ele não captar detalhes
da casa que estavam expostos ao público, ante, na 10, ele não obtém “qualquer informação
relativa ao interior da casa”, ante, na 6. Nas próprias palavras da corte baseadas no que as
termo-imagens mostraram com relação ao lado externo da casa do requerente os oficiais
concluíram que o requerente estava envolvido em uma atividade ilegal dentro da casa.
Ante, na 2. Isto poderia ser quase absurdo caracterizar seus processos de conhecimento
como buscas a menos que se eles entendessem (corretamente) que o requerente estivesse
cultivando marijuana em sua casa ou (errôneamente) que “a senhora da casa estava
tomando seu banho diário”. Ante, na 10-11. Em ambos os casos as únicas conclusões que
os oficiais alcançaram relativamente ao interior da casa foram no mínimo tão indiretas
quanto aquelas que poderiam ser deduzidas dos conteúdos de lixo descartado, ver california
v. greenwood, 486 us 35 (1988) ou dados de uma caneta registradora, ver smith v.
maryland, 442 us 735 (1979), ou, como neste caso, registro de citações judiciais, ver
190fed1041, 1043 (ca91999). Pela primeira vez na sua história a corte assumiu que uma
inferência pode implicar em uma violação à 4 a emenda. Ver ante, na 8.
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Não obstante as implicações da decisão de hoje há um forte interesse público em evitar
litígio constitucional sobre o monitoramento das emissões vindas das casas e das
interferências derivadas destes monitoramentos. Apenas como “não pode-se razoavelmente
esperar que a polícia desvie seus olhos de uma atividade criminosa que poderia estar
sendo observada por qualquer membro do público”, Greenwood, 486 Us, na 41, logo
muitos oficiais públicos não deveriam ter que evitar seus sentidos ou seus equipamentos de
detectar emissões em domínio público, tais como calor excessivo, rastros de fumaça, odores
suspeitos, gases, partículas de airborn ou emissões radioativas, quaisquer das quais poderia
identificar perigo à comunidade. Em meu julgamento monitorando tais emissões com
(tecnologia de aumento dos sentidos), ante, na 6, e trazendo conclusões úteis a partir do
monitoramento, é um serviço público inteiramente razoável.
Por outro lado o interesse privado antagonizado é o mais comum. Após tudo, as casas
geralmente são isoladas para manter o calor dentro ao invés de evitar a detectação do calor
saindo e não me parece que a sociedade irá sofrer a partir de uma regra que exija que um
eventual proprietário de uma casa, que tanto pretende enquadrar-se em atividades incomuns
que produz atividades extraordinárias de calor e deseja ocultar esta produção das pessoas de
fora para certificar-se de que a área externa está bem isolada. Conforme US v. Jacobsen,
466 us 109,122 (1994) (“a concepção de um interesse na privacidade que a sociedade está
preparada para reconhecer como razoável é pela sua natureza criticamente diferente da
mera expectativa, contudo bem justificada, que certos fatos não se tornarão a atenção das
autoridades”). O interesse em ocultar o calor escapando dos limites da casa de alguém não
ganha a significação de “grande mal contra o qual se dirigem as palavras da 4 a emenda” a
“invasão física da casa”. US dist. Court for easten Dist. Of Mich, 407 us 297, 313 (1972),
e é difícil acreditar que este é um interesse que os fundadores pretendiam proteger em nossa
constituição.
A partir do momento em que o que estava envolvido neste caso não era nada mais que
buscar indícios a partir de uma vigilância fora das paredes, através de qualquer vigilância
através da parede, a conduta dos oficiais não equivale a uma busca e foi perfeitamente
razoável.
II
Ao invés de tentar responder à pergunta se o uso de termoimagem neste caso foi ainda
alegadamente desarrazoado a Corte vêm criando uma regra que pretende provar uma linha
essencial para o dia quando “sistemas mais sofisticados tenham a capacidade de ver
através das paredes e outras barreiras opacas”. Ante, na 8 e n 3. A nova regra cunhada
envolve “obtenção através de tecnologia de aumento de sentido qualquer informação
relativa ao interior da casa que não poderia ser de outra forma obtida sem a intromissão
física dentro de uma área constitucionalmente protegida... no mínimo onde (como aqui) a
tecnologia em questão não é de uso público geral”. Ante, na 6-7. No meu julgamento, as
novas regras da Corte são de uma só vez muito gerais e muito estreitas e não é justificada
pela explicação da Corte para sua adoção. Como eu sugeri, eu gostaria de erguer um
impedimento constitucional para usar a tecnologia de aumento de sentido a menos que ela
forneça seu uso com um equivalente funcional da atual presença na área sendo investigada.
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Ao invés disso a atenção da Corte para traçar uma linha que “não somente não é firme mas
também não é clara”, ante, na 12, os contornos dessa nova regra são incertos porque sua
proteção aparentemente dissipa tão logo a relevante tecnologia estiver em uso público, ante,
na 6-7. Ainda o quanto o uso é um uso público ainda não definido pela opinião da Corte, o
que torna duvidoso assumir que a termoimagem usada neste caso não satisfaz este critério.
De qualquer modo, colocando de lado sua possibilidade de esclarecimento, este critério é
algo perverso porque parece como que o tratamento para a privacidade irá crescer ao invés
de diminuir conforme o uso de equipamentos invasivos torne-se mais prontamente
disponível.
Está claro contudo, que a categoria de tecnologia de aumento de sentido coberta pela nova
regra, ante, na 6, é muito ampla. Poderia, por exemplo, englobar potencial mecânico
substituído por cachorros treinados para reagir quando eles farejam narcóticos. Mas em
United States v. Place, 462us696, 707 (1983), nós mantivemos que o cão farejador que
“revelou somente a presença ou ausência de narcóticos” não “constitui uma busca dentro
do significado na 4 a Emenda” e deve seguir que o equipamento de aumento de sentido que
identifica nada além de atividade ilegal não é uma busca também. Apesar disso, o uso deste
dispositivo poderia ser inconstitucional sob as regras da Corte como poderia ser o uso de
um outro novo dispositivo que possa identificar o odor de uma bactéria morta ou produtos
químicos para fazer um novo tipo de autoexplosão, mesmo se os dispositivos (como cães
farejadores) são “ambos tão limitados na maneira e no conteúdo das informações que eles
revelam". Ibid. Se nada mais que aquele tipo de informação poderia ser obtida através do
uso de dispositivos em um local público para monitorar as emissões de uma casa, então seu
uso poderia não ser mais objetável que o uso da termoimagem neste caso.
A aplicação da nova regra da Corte para “qualquer informação referente ao interior da
casa”, ante, na 6, também é desnecessariamente ampla. Se ela toma equipamentos
sensoriais para detectar o odor que identifica uma conduta criminal e nada mais, o fato de
que o odor emana do interior de uma casa não poderia colocá-lo sob a proteção
constitucional Ver supra, na 7-8. O critério contudo é muito extenso naquela informação
“referente ao interior da casa” aparentemente não é apenas uma informação obtida através
de suas paredes, mas também, informação concernente ao exterior de uma construção que
poderia conduzir à (contudo muitas) “inferências” ao que deve estar dentro. Sob esta visão
ampla eu suponho que um oficial usando uma câmara infra vermelha para observar um
homem silenciosamente entrando numa porta lateral de uma casa à noite, carregando uma
pizza, deve concluir que seu interior está agora ocupado por alguém que gosta de pizza e
fazendo isso o oficial poderia ser culpado de conduzir uma busca inconstitucional da casa.
Devido à nova regra aplicar-se a informação a respeito do interior da casa é muito estreita e
muito ampla. Claramente a regra que está designada para proteger os indivíduos de uma
intromissão excessiva do uso de equipamentos de aumento de sentido não deve ser limitada
para a casa. Se tal equipamento fornecesse ao seu usuário o equivalente funcional de acesso
a local privado, tal como, por exemplo, uma cabine telefônica envolvida em Katz ou no
escritório comercial, então a regra deve ser aplicada para uma área igual à do lar. Ver Katz
389us na 351 (“a 4a Emenda protege pessoas, não lugares”).
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A exigência final da nova regra da Corte de que a informação “não poderia por outro lado
ter sido obtida sem uma intromissão física dentro de uma área constitucionalmente
protegida”, ante, na 6, também amplia muito da forma como a Corte a aplica. Conforme
observado a Corte efetivamente trata o processo mental de análise de dados obtidos de
fontes externas como equivalente a uma intromissão física dentro da casa. Ver supra na 45.
Conforme eu tenho explicado entretanto, o processo de dedução a partir de dados em
domínio público não deveria ser caracterizado como uma busca.
As duas razões adiantadas pela Corte como justificativas para a adoção de sua nova regra
são ambas não convincentes. Primeiro a Corte sugere que sua regra é compelida pela nossa
manutenção em Katz, porque naquele caso, como neste a vigilância consistia em nada mais
que o monitoramento de ondas emanadas de uma área privada em uma área de domínio
público. Ver ante na 78. Ainda que existam diferenças críticas entre os casos. Em Katz o
dispositivo de escuta eletrônica posto do lado externo de uma cabine telefônica permitiu
que os oficiais captassem o conteúdo da conversa dentro da cabine, tornando-os um
equivalente funcional de invasores, porque eles obtiveram a informação que por outro lado
estava disponível somente para alguém dentro de uma área privativa; poderia ser como se
neste caso a imagem térmica apresentasse uma vista de uma atividade que gerava calor
dentro da casa do requerente. Em contraponto a termo imagem aqui revelava somente as
quantidades relativas de calor irradiando de uma casa; poderia ser como se em Katz, o
dispositivo de escuta revelasse somente o volume relativo de som saindo da cabine que
presumidamente era discernível no domínio público. Certamente existe um diferença
significativa entre a geral e a bem estabelecida expectativa de que estranhos não vão ter
acesso direto aos conteúdos de comunicações privadas, de um lado, melhor dizendo, a
expectativa teórica que um eventual proprietário de uma casa poderia ainda incomodar-se
se alguém observasse as quantidades relativas de calor emanadas das paredes de sua casa,
por outro lado. É pura hipérbole para a Corte sugerir que a recusa de estender a manutenção
de Katz para este caso poderia deixar o proprietário da casa à mercê da tecnologia que
pudesse discernir todas as atividades humanas dentro da casa, ante, na 8.
Segundo, a Corte argumenta que a permissibilidade da “vigilância através da parede” não
pode depender de uma distinção entre a observação “de detalhes íntimos” tais como uma
“senhora da casa tomando seu banho diário” e noticiando somente “o tapete no chão” ou
“objetos não menores que 36x36 polegadas” ante na 1011. Este argumento inteiro assume,
é claro que a imagem térmica neste caso poderia ou desempenharia uma “vigilância
através da parede” que poderia identificar qualquer detalhe que “poderia previamente ser
desconhecido sem uma intromissão física”. Ante, na 1112. De fato, o dispositivo não
poderia, ver n 1 supra, e não estaria, ver apendix, infra, capacitando seu usuário de
identificar tanto uma senhora da casa, o tapete no chão ou qualquer outra coisa dentro da
casa se menor ou maior que 36x36 polegadas. Na verdade as vagas imagens térmicas da
casa do requerente que são reproduzidas no apendix foram submetidas por ele à Corte
distrital como parte de um relatório originando a pergunta se o dispositivo poderia ainda
tomar “imagens infravermelhas precisas e consistentes” do lado externo de sua casa. A
defesa do réu 107, p 4. Mas mesmo se o dispositivo pudesse fidedignamente mostrar
diferenças extraordinárias nas quantidades de calor emanadas de sua casa concluindo a
inferência que havia algo suspeito ocorrendo dentro da residência – uma conclusão que os
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oficiais não precisaram ser sherlocks para chegar – não qualifica como uma “vigilância
através da parede”, muito menos uma violação da 4a Emenda.
III
Embora a Corte esteja propriamente e louvavelmente preocupada sobre os tratamentos da
privacidade que possam fluir dos avanços da tecnologia disponível para os profissionais
que fazem cumprir a lei, ela vem lamentavelmente falhando em observar com cuidado o
experimentado e verdadeiro conselho de repressão judicial. Ao invés de concentrar no caso
concreto representado pelo precedente, a Corte vem conduzindo seus esforços para criar
uma regra geral para o futuro, poderia ser mais inteligente dar aos legisladores uma
oportunidade não impeditiva para atacar estas questões emergentes ao invés de projetar
prematuros impedimentos constitucionais. Eu respeitosamente discordo.
COMENTÁRIOS
1.- A técnica de interpretação no sistema judicial norte-americano.
Inicialmente, nota-se a utilização dos critérios histórico, teleológico, sistemático e
tópico de interpretação de modo integrado, de modo a obter unidade. A motivação e a
fundamentação são feitas de forma explícita e exaustiva, fornecendo os critérios utilizados
pelo julgador para diferenciar e igualar a partir da identificação, avaliação e explicitação do
núcleo e síntese de cada precedente pertinente ao tema em questão. O método, antes de
tudo, mostra honestidade, evidenciando o desejo de expor clara e didaticamente os motivos
da decisão, avaliando o caso concreto no contexto geral e especulando as conseqüências da
decisão para a manutenção da estrutura lógico/racional do sistema, sua coerência com os
precedentes pertinentes, seus efeitos sobre os sujeitos diretamente envolvidos e seus
reflexos sociais, bem como os impactos gerados pela mutação histórica e cultural na atual
interpretação ou aplicação de antigas decisões, compatibilizando-as com as exigências
presentes, evitando rupturas.
A possibilidade de uso da técnica não se restringe ao sistema da common law, uma
vez que ninguém nega a natureza criadora da jurisprudência. Em nosso sistema, todavia,
apesar da exigência constante do Regimento Interno do STF e STJ (que não deveriam e
nem poderiam criar normas processuais, de competência privativa do Congresso Nacional),
no sentido de que o dissídio jurisprudencial deve ser demonstrado a partir do cotejo
analítico entre o caso sub judice e os paradigmas, não bastando a mera transcrição de
ementas, o que constatamos no dia a dia é que sentenças e acórdãos são fundamentados a
partir da transcrição de ementas, ou somente assim, sem aprofundar justificativas de
semelhança e divergência entre as hipóteses (o que é sistematicamente feito pelos Tribunais
locais em sede de juízo de admissibilidade de recursos, desprezando a técnica que cobra das
partes). O laconismo e a precariedade de fundamentação, no mais das vezes restrita a mera
transcrições, inviabiliza, na prática, qualquer cotejo, além de evidenciar uma tendência de
negar-se a explicitar as razões da decisão, mesmo quando instado a tal via embargos de
declaração com objetivo expresso de prequestionamento.
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13
Outro problema, em termos de descontinuidade, é a nossa tendência de, ao invés de
respeitar a constituição, contínua e inexoravelmente trabalharmos mais para reformá-la do
que para aplicá-la, vendo-a como um obstáculo indesejado e desnecessário a ser removido.
O que ontem, ou até ontem, era vedado, hoje é possível e amanhã é impositivo. Enquanto
um sistema verdadeiramente democrático constitui a esfera de atuação do Estado a partir do
limite traçado pelos direitos e garantias individuais e coletivos, nós nos subordinamos à
mentalidade de que tudo é feito, criado ou permitido através do Estado todo poderoso,
gerador e implementador do 'bem comum'. Sob esta crença, todo e qualquer 'entrave' ao
regular funcionamento da burocracia messiânica pode e deve ser removido. Cotidianamente
verificamos descabida ponderação entre o efetivo direito ou garantia e o imponderável
(interesse público, a justiça social, o bem comum), sempre pendendo para o hipotético fim
legitimador que jamais se realiza e efetivamente restringindo ou anulando os limites de
proteção, numa cultura de crescente e incondicional submissão do indivíduo.
No sistema norte-americano, nota-se que o respeito aos princípios da motivação e
fundamentação não esgotam-se na mera construção lógica de análise 'suficiente' para
justificar a conclusão, mas sim na necessidade de, de forma didática e transparente,
evidenciar todas as premissas que embasaram o veredito, demonstrando, ponto a ponto, as
identidades e divergências entre os precedentes aplicáveis ou invocados (ônus que avoca a
si, ao passo que, entre nós, é acometido às partes). Mostra-se mais democrática na medida
em que busca uma resposta que convença pela força do argumento, ao passo que entre nós
vige a fórmula de que, se a resposta dada atende aos critérios técnicos, é ela suficiente,
ficando envolta na autoridade conferida pela coercibilidade, e não necessariamente pela
lógica e correção dos argumentos, muitas vezes inexistentes ou apenas 'colacionados' de
outros casos em que sequer é feito um cotejo a fim de demonstrar uma mínima semelhança.
A diferença se estabelece entre a intenção de convencer e o poder de submeter.
2.- A garantia à privacidade como limite inamovível em restrição aos poderes
investigatórios do Estado.
A decisão da Suprema Corte Norte-Americana, como visto, avalia os efeitos da
evolução tecnológica em face à 4ª emenda, que fornece proteção aos indivíduos, suas
residências e papéis diante de buscas 'não razoáveis'. A noção de razoabilidade encontra-se
vinculada, ou submetida, à dedutibilidade lógica, ou à justificação racional da inferência,
que deve condicionar-se à causa provável de um fato provado.
Ao estabelecer uma regra não apenas para o caso em julgamento, mas manifestar
uma preocupação com fatos futuros e o nível aceitável de intromissão que anuncia-se com o
avanço tecnológico, evidencia a Corte que estes avanços estão gerando possibilidades cada
vez maiores de violação da privacidade e intimidade alheias, colocando à prova os limites
de proteção e os direitos e garantias individuais
O voto condutor mostra-se ponderado, na medida em que equipara à intromissão
física a evidência obtida através de equipamento que, embora não demonstre maiores
elementos do local (ou 'detalhes íntimos', na acepção da corrente vencida), fornece
informações que somente poderiam ser percebidas por alguém presente no local. Desta
forma, independentemente de que através da chamada 'tecnologia de ampliação de sentidos'
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não obtenha-se a própria prova do fato investigado, o resultado pode ser o mesmo se dos
dados obtidos com sua utilização vier a ser considerada 'razoável' a inferência a partir deles
extraída, bem como suficiente para a expedição de um mandado de busca, obtendo-se,
então, 'licitamente', o que antes seria ilícito.
A preocupação da Corte é salutar e propõe uma importante reflexão acerca de quais
sejam, atualmente, as definições de intromissão, agressão e violência, dissociando-a de atos
meramente físicos e de pronto constatáveis. A aparente distância e imperceptibilidade que
meios modernos oferecem aos investigadores para devassar vidas, hábitos e atos das
pessoas, sem que estas sequer tenham a consciência ou a suspeita de que estejam
submetidas a este tipo de conduta, evidencia que, no âmbito das conseqüências, hoje o
cidadão encontra-se muito mais desamparado da proteção legal do que em tempos
pretéritos, sempre lembrando ser praticamente impossível defender-se diante de uma prova
técnica a não ser pela via da invalidação. Ora, como a mera ausência de 'presença física'
poderia descaracterizar a invasão, se hoje, sem a presença física, se obtém muito mais
dados e elementos do que antigamente eram obtidos através de uma busca 'in loco'? Em que
argumentos fundamentar-se-ia a conclusão de que a violência consistente em adentrar
fisicamente em uma residência contra a vontade de seu habitante é maior, ou
substancialmente diferente, do que a obtenção de dados íntimos contra a vontade ou mesmo
consciência do investigado, pelo simples fato da ausência de contato físico?
A partir do paradigma citado, mostra-se útil e necessário construir uma doutrina no
sentido de que a proteção à intimidade e privacidade não restringe-se à impossibilidade de
utilização criminal da informação obtida em violação às garantias constitucionais, mas
também que esta garantia compreende o direito de evitar não apenas o uso ou eficácia
processual da informação, mas também a necessidade de criação de meios de impedir o seu
conhecimento por terceiros sem a anterior e expressa anuência do titular das garantias. Do
contrário, esvaziar-se-ia o seu núcleo, que encontra um último limite de definição na sua
utilidade para o indivíduo considerado como um fim em si mesmo, e não como
instrumento. A garantia, portanto, deve fornecer proteção efetiva contra o acesso e o
conhecimento desautorizado pelo titular, e não apenas do uso processual do dado íntimo. A
expectativa justificada, ou razoável, de intimidade e privacidade, decorre da segurança das
experiências passadas e merece ser preservada no presente, sem rupturas ou
descontinuidades, evitando-se interpretações restritivas ou literais em privilégio da
manutenção do seu original conteúdo, sentido e alcance.
Em nossa opinião, o princípio da dignidade humana somente é respeitado na medida
em que preserva a liberdade do indivíduo. E não apenas na esfera criminal, mas também no
âmbito dos poderes de fiscalização do Estado sobre o cidadão. Em nosso sistema vêm
sendo atribuído um conteúdo preponderantemente materialista ao conceito de dignidade,
identificando-a com poder aquisitivo a ser prestado pelo Estado via 'redistribuição de
renda'. Neste contexto, onde deve preponderar o 'bem comum' e a 'justiça social', o Estado
pretende meios cada vez mais invasivos e intensos de controle e fiscalização, a fim de
implementar o conceito que o Partido tem do que seja o 'bem comum', objetivando, sob o
falso motivo da 'inclusão social' de alguns, a 'submissão social' de todos. Sob a falácia de
aplacar a fome do ser humano, põe em segundo plano a sua alma e o seu espírito,
violentando sua natureza.
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A Corte Norte Americana tomou uma posição corajosa, manifestando uma
importante preocupação, no sentido de estabelecer limites não apenas diante das
possibilidades atuais de intromissão, mas também das futuras, sob pena de esvaziar o
núcleo do direito à intimidade e privacidade e, neste sentido. agiu com ponderação ao
permitir concluir que as 'expectativas razoáveis' de privacidade não devem ser
'progressivamente' diminuídas em face às novas tecnologias. O interesse público de ordem
e segurança que autoriza outro tipo de interpretação harmoniza-se com a doutrina fascista,
de absoluto controle e submissão do sujeito ao Estado através da manipulação da
linguagem, da filtragem da informação, da construção artificial da cultura, do dirigismo
econômico e da utilização do Direito como forma coercitiva de imposição de valores e
indução de condutas, confundindo meios e fins. São as considerações que submetemos à
reflexão dos leitores.
Leandro Bittencourt Adiers
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