B11 – Caracterização, avaliação e recuperação estrutural

Transcrição

B11 – Caracterização, avaliação e recuperação estrutural
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Caracterización, evaluación y recuperación estructural de
edificios históricos
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções
históricas
Characterization, evaluation and structural recovery of historic
buildings
Boletín
Técnico
Esequiel Mesquita, Esmeralda Paupério, António Arêde & Humberto Varum
Asociación Latinoamericana de Control de Calidad, Patología
y Recuperación de la Construcción - ALCONPAT Int.
INTERNACIONAL
Elaboración de:
INTERNACIONAL
PREFÁCIO
Com o grande desenvolvimento atual dos meios de
comunicação e de transporte, há efetiva possibilidade
e necessidade de integração dos profissionais dos
países Ibero-americanos, conscientes de que o futuro
inscreve-se numa realidade social onde o conhecimento
científico e o desenvolvimento tecnológico são as
ferramentas corretas a serem utilizadas em benefício
da sustentabilidade e qualidade de vida de nossos
povos.
É missão e objetivo da ALCONPAT (Asociación
Latinoamericana de Control de Calidad, Patología
y Recuperación de la Construcción) ser um forte
instrumento de união, desenvolvimento e difusão
dos conhecimentos gerados pela comunidade da
construção civil, com foco nos materiais e na gestão
da qualidade de obras em andamento, no estudo dos
problemas patológicos, na manutenção, recuperação
e proteção do enorme patrimônio construído e na
prevenção de falhas de projeto e construção em obras
novas.
Desde sua fundação no ano de 1991 em Córdoba,
Argentina, os membros da ALCONPAT Internacional
e de suas delegacias e entidades nacionais, vêm
organizando cursos, seminários, palestras e, nos
anos ímpares o tradicional e reconhecido congresso
científico CONPAT, já realizado de forma itinerante
em doze diferentes países de Ibero-américa.
Com o objetivo de fortalecer essa integração e
valorizar ainda mais a Construção Civil desses
países, a ALCONPAT instituiu, em 2011, a “Comisión
Temática de Procedimientos Recomendables” sob a
profícua coordenação do Prof. Dr. Bernardo Tutikian,
ora reconduzido á essa coordenação pela Presidente
Profa. Angélica Ayala, eleita na Assembléia Geral
do Conselho Diretor ocorrida em Lisboa durante o
CONPAT2015, para o período 2015-2017.
Essa Comissão tem o objetivo de levantar temas de
interesse da comunidade, buscar um especialista que
se disponha a pesquisar e escrever sobre o assunto,
voluntariamente, e divulgar esse conhecimento na
comunidade Ibero-americana.
O conteúdo deve ser claro, objetivo, com bases
científicas, atualizado e não muito extenso, fornecendo
a cada leitor profissional as bases seguras sobre
um tema específico de forma a permitir seu rápido
aproveitamento e, quando for o caso, constituir-se num
ponto de partida seguro para um desenvolvimento
ainda maior daquele assunto.
O resultado dessa iniciativa foi cristalizado com a
publicação dos 10 primeiros textos lançados em forma
de fascículos seriados, cuja série ou coletânea se
denomina “O QUE É NA CONSTRUÇÃO CIVIL?”.
Se tratam de textos conceituais visando o nivelamento
do conhecimento sobre as principais “palavras de
ordem” que hoje permeiam o dinâmico setor da
Construção Civil, entre elas: Sustentabilidade,
Qualidade, Patologia, Terapia, Profilaxia, Diagnóstico,
Vida Útil, Ciclo de Vida, e outras, visando contribuir
para o aprimoramento do setor da construção assim
como a qualificação e o aperfeiçoamento de seus
profissionais.
Por ter um cunho didático, os diferentes temas são
abordados de modo coerente e conciso, apresentando
as principais etapas que compõem o ciclo dos
conhecimentos necessários sobre aquele assunto.
Cada fascículo é independente dos demais, porém o
seu conjunto constituirá um importante referencial de
conceitos utilizados atualmente na construção civil.
Estes textos foram escritos exclusivamente por
membros da ALCONPAT, selecionados pela sua
reconhecida capacidade técnica e científica em suas
respectivas áreas de atuação. Os autores possuem
vivência e experiência dentro de cada tópico abordado,
através de uma participação proativa, desinteressada
e voluntária.
O coordenador, os autores e revisores têm doado
suas valiosas horas técnicas, seus conhecimentos,
seus expressivos honorários e direitos autorais à
ALCONPAT Internacional, em defesa de sua nobre
missão. Estima-se essa doação em mais de 550h
técnicas de profissionais de alto nível, a uma média
de 50h por fascículos, acrescidas de pelo menos mais
220h de coordenação, também voluntária.
Todos os recursos técnicos e uma visão sistêmica,
necessários ao bom entendimento dos problemas,
estão disponíveis e foram tratados com competência
e objetividade, fazendo desta coletânea uma consulta
obrigatória. Espera-se que esta coletânea venha a ser
amplamente consultada no setor técnico-profissional
e até adotada pelas Universidades Ibero-americanas.
Esta coletânea é mais um esforço que a ALCONPAT
Int. realiza para aprimoramento e atualização do corpo
docente e discente das faculdades e universidades,
assim como para evolução dos profissionais da
comunidade técnica ligada ao construbusiness,
valorizando indistintamente a contribuição da
engenharia no desenvolvimento sustentado dos países
Ibero-americanos.
Mérida - México, dezembro de 2015
Prof. Paulo Helene
Presidente de Honor ALCONPAT Internacional
Prof. Bernardo Tutikian
Coordinador Comisión Temática de Procedimientos
Recomendables
Junta Directiva de ALCONPAT Internacional (bienio dez.2015/dez. 2017):
Presidencia:
Presidencia de Honor:
Vicepresidente Administrativo:
Vicepresidente Técnico:
Secretario Ejecutivo:
Director General:
Gestor:
Profa. Angelica Piola Ayala
Prof. Paulo Helene
Arq. Margita Kliewer
Profa. Pedro Garcés Terradilos
Prof. José Manuel Mendoza Rangel
Dr. Pedro Castro Borges
Prof. Dr. Bernardo Tutikian
Sede permanente ALCONPAT:
CINVESTAV Mérida México
http://www.alconpat.org
Dr. Pedro Castro Borges
Presidente Congreso CONPAT 2017
Arq. Margita Kliewer
Comisiones Temáticas:
Publicaciones
Dr. Pedro Castro Borges
EducaciónProfa. Liana Arrieta de Bustillos
Membrecía
Prof. Roddy Cabezas
PremiaciónProfa. Angélica Piola Ayala
Procedimientos Recomendables
Prof. Bernardo Tutikian
Relaciones Interinstitucionales
Prof. Luiz Carlos Pinto da Silva Filho
Historia ALCONPAT
Prof. Dante Domene
Boletín de Notícias
Arq. Leonardo López
Missão da ALCONPAT Internacional:
ALCONPAT Internacional es una Asociación no lucrativa de profesionales dedicados a la industria de la construcción
en todas sus áreas, que conjuntamente trabajan a resolver los problemas que se presentan en las estructuras desde la
planeación, diseño y proyecto hasta la ejecución, construcción, mantenimiento y reparación de las mismas, promoviendo
la actualización profesional y la educación como herramientas fundamentales para salvaguardar la calidad y la
integridad de los servicios de sus profesionales
Visão da ALCONPAT Internacional:
Ser la Asociación de especialistas en control de calidad y patología de la industria de la construcción con mayor
representatividad gremial y prestigio profesional reconocido internacionalmente, buscando siempre el beneficio social
y el óptimo aprovechamiento de los recursos humanos, materiales y económicos para la construcción de estructuras
sustentables y amigables con el medio ambiente.
Valores de ALCONPAT Internacional:
Ciencia, Tecnología, Amistad y Perseverancia para el Desarrollo de América Latina.
Objetivos da ALCONPAT Internacional:
ARTÍCULO 1.2 del Estatuto. ALCONPAT se define como una asociación sin fines de lucro, cuyos fines son:
a) Contribuir al desarrollo científico y técnico de toda la comunidad Latinoamericana relacionada con la construcción
y sus materiales, con énfasis en la gestión de la calidad, la patología y la recuperación de las construcciones.
b) Actuar como un interlocutor cualificado, tanto de la propia sociedad civil como de sus poderes públicos representativos.
c) Promover el papel de la ciencia y la tecnología de la construcción y sus materiales, y contribuir a su difusión como
un bien necesario que es para toda la sociedad Latinoamericana y Iberoamericana.
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INTERNACIONAL
ALCONPAT Internacional
Asociación Latinoamericana de Control de Calidad, Patología y
Recuperación de la Construcción
Boletín Técnico
Caracterización, evaluación y recuperación
estructural de edificios históricos
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural
de construções históricas
Characterization, evaluation and structural recovery
of historic buildings
Esequiel Mesquitaa
Esmeralda Paupériob
António Arêdec
Humberto Varumd
1. Introdução
históricas
focados para desenvolvimento de novos materiais
(CH) podem ser definidas como um grupo de
Em
termos
gerais,
construções
e sistemas estruturais para aplicações futuras nas
construções que sendo fator de identidade de um
construções, as CH constituem ainda um campo
povo, apresentam um substancial valor cultural
pouco explorado. Muitos dos métodos construtivos e
para a sociedade. Contudo, o valor cultural de
dos materiais empregados nas CH não apresentam
uma construção não deve ser associado a um tipo
seus comportamentos conhecidos, o que dificulta a
específico de método construtivo, ou ao tamanho
preservação e reabilitação destas construções.
e complexidade do monumento, mas pode estar
Assim, estudar as CH é interessante não só como
relacionada com a idade desta construção e o papel
contribuição direta para a valorização e preservação
que ela desempenhou para o desenvolvimento de
da memória de uma determinada sociedade,
sua sociedade (CIB, 2010).
como também permite o desenvolvimento de
Ao contrário das construções contemporâneas,
técnicas de reabilitação para estas construções
em que as propriedades estruturais de seus
que, quando eficazmente aplicadas, permitem a
componentes
serem
recolocação destas construções como parte ativa
exaustivamente estudadas, além do fato que boa
em suas comunidades, e assim para a redução da
parte dos esforços científicos atualmente estão
necessidade de construção de novas estruturas.
e
de
seus
materiais
Eng. Civil, Doutorando em Engenharia Civil na Faculdade de Engenharia Civil da Universidade do Porto, 4200-465, Porto, Portugal.
E-mail: [email protected]
b
Eng. Civil, Instituto da Construção, Faculdade de Engenharia Civil da Universidade do Porto, 4200-465, Porto, Portugal.E-mail:
[email protected]
c
Doutor, Professor Associado na Faculdade de Engenharia Civil da Universidade do Porto, 4200-465, Porto, Portugal. E-mail: [email protected]
d
Doutor, Professor Catedrático na Faculdade de Engenharia Civil da Universidade do Porto, 4200-465, Porto, Portugal. E-mail:
[email protected]
a
ALCONPAT Int.
Neste documento, pretende-se apresentar uma
na componente ativa das cidades.
proposta de avaliação estrutural para as CH que
O método apresentado no presente Boletim
contemple desde a etapa de análise documental
Técnico: Caracterização, avaliação e recuperação
até a caracterização da estrutura e a definição de
estrutural de construções históricas – será abordado
medidas de recuperação, contemplando assim o
com recurso aos casos de estudos desenvolvidos
ciclo da reabilitação e, se necessário, com recurso
no âmbito do trabalho desenvolvido pelo Instituto
à monitorização. Ressalta-se neste documento que
da Construção da Faculdade de Engenharia da
a reabilitação estrutural deve ser entendida como o
Universidade do Porto (IC-FEUP), como forma
processo de manutenção, recuperação e conservação
de tornar o mais compreensível os conceitos
das CH com foco para reinserção destas construções
apresentados da realidade a ser praticada.
2. Construções históricas: uma classe especial de estruturas a serem
protegidas
As CH desempenham um papel relevante na
como o centro histórico da cidade do Porto, formado
sociedade contemporânea. Isso porque elas são a
por um conjunto de casas vernaculares datadas
representação física de parte da história de suas
algumas do século XIII, ou valor individual, como o
comunidades e, por vezes, evidenciam, além da vida
Coliseu Romano, que por si só é um denso registro
cotidiana das comunidades passadas, os avanços
das atividades desenvolvidas na atual região da
no desenvolvimento da história da humanidade.
Itália entre os séculos I e VI (Figura 1).
Estas construções podem ter um valor de conjunto,
Figura 1. (a) Construções históricas à margem do Rio Douro, em Porto, e (b) Coliseu Romano, Roma, Itália.
A valorização do património cultural imóvel
oportunidade de desenvolvimento econômico para
associado aos critérios de autenticidade tem
suas comunidades. Na Europa, o turismo cultural
motivado nas CH o desenvolvimento de técnicas
tem uma grande importância no sector económico.
de apoio à manutenção, recuperação e conservação
Assim, considerar as CH (independentemente de
destas construções. Contudo, nas últimas décadas,
serem tombadas ou não) como estruturas frágeis,
a inclusão destas construções como parte ativa das
vulneráveis ou símbolo do atraso, constitui uma
cidades tem acelerado ainda mais este processo de
visão bastante equivocada das potencialidades
preservação (LOURENÇO, 2014).
destas construções que, uma vez bem mantidas,
Reabilitar as CH e torná-las parte ativa no
podem apresentar critérios de segurança, iguais ou
contexto econômico local, seja na forma de museus
até superiores aos das construções contemporâneas.
ou na forma de hotéis, ou ainda de restaurantes
Um estudo realizado por Varum et al. (2006)
ou residências, e assim pode ser uma grande
demostrou que técnicas de reforço estrutural podem
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Boletín Técnico 11
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
ser aplicadas à CH de modo a não comprometerem
desenvolvimento científico no âmbito da proteção
as características construtivas da construção e
do património (UNESCO, 1972).
garantir que os limites de segurança da construção
Em 1994, a Carta do Villa Vigoni, preconizava
estejam dentro dos limites de segurança aceitáveis
que especial atenção e prioridade deveria ser dada à
para os códigos atuais.
conservação de CH de caráter religioso, em especial
Neste sentido, o processo de reabilitação das CH
a templos especificamente católicas. Porém, no
é interessante por que permite a adequação destas
mesmo ano, no Japão, foi redigida a Carta do Nara
construções às novas necessidades dos usuários, e
sobre autenticidade, garantindo a diversidade
reduz a necessidade de que novos edifícios sejam
cultural, considerando que o património de cada
construídos, colaborando para a valorização da
um é o património de todos (ICOMOS, 1994).
cultura local e para a sustentabilidade, através
Como
passo
de
avanço
nas
políticas
de
da preservação destas construções, contribuindo
preservação das CH, em 2000, na Carta de Cracóvia
ainda para o desenvolvimento e fortalecimento do
pela primeira vez é referida explicitamente a
turismo regional.
reabilitação estrutural. Este documento salienta
A fim de concorrer para a preservação das
que, para a adoção de medidas de manutenção
CH, agências governamentais e organizações
e reparos, é necessário realizar um plano de
internacionais, como a UNESCO, por exemplo,
reforço voltado para proteção de longa data e
que classifica e reconhece o valor cultural destas
conservação das CH. Recomenda ainda que a
construções para a humanidade, têm desenvolvido
equipe de intervenção seja multidisciplinar e que
políticas relacionadas a salvaguarda do patrimônio.
a reconstrução de parte representativa das CH seja
Todavia, discussões sobre as práticas de conservação
evitada, devendo, sempre que possível, preservar os
de CH não são recentes, pois em 1931, na Carta de
aspetos originais dos interiores (ICOMOS, 2000).
Atenas, foram abordados diretrizes para a proteção
Com o objetivo de fornecer diretrizes gerais
os monumentos históricos (LOPES & CORREIA,
para a conservação e restauro estrutural das CH,
2014).
o ICOMOS (2003) recomenda uma metodologia de
Na Carta de Atenas foi defendida a importância
avaliação estrutural baseada em quatro etapas
edifícios
fundamentais, que são: 1) coleta de dados, 2)
históricos sem discriminação quanto ao estilo
caracterização estrutural, 3) diagnóstico e 4) adoção
arquitetônico, bem como salientada a importância
de medidas preventivas e de reparação (Figura
da conscientização internacional para preservação
2). Adicionalmente, neste mesmo documento, o
destes (LOPES & CORREIA, 2014).
ICOMOS recomenda que em todas as situações
da
manutenção
e
reabilitação
dos
Em 1964, três décadas após a Carta de Atenas,
em que medidas de recuperação ou reforço sejam
foi redigida a Carta de Veneza que mantém
necessárias,
as
características
construtivas
uma atualidade notável. Esta carta reafirmou
originais da construção intervencionada devem
a
adequados
ser preservadas, considerando não apenas a
na preservação e reabilitação de monumentos
aparência estética, mas também a compatibilidade
históricos,
que
e a reversibilidade entre a medida de intervenção
monumentos históricos podem ser, para além de
adotada e o sistema construtivo da construção
construções imponentes, um conjunto de modestas
em processo de intervenção. Este documento
construções que, com o tempo, adquiriram um
salienta, que os materiais estruturais e as técnicas
significado cultural (LOPES & CORREIA, 2014).
tradicionais de construção fazem parte do valor
importância
de
incluindo
procedimentos
a
concepção
de
Em consequência do estado de implementação
cultural de uma construção, à semelhança do
das políticas relacionadas a salvaguarda do
que acontece para os elementos decorativos e
patrimônio histórico, em 1972, a degradação das
arquitetónicos.
CH foi o tema principal da Convenção da UNESCO
Mais recentemente, em 2011, a Carta de Madrid
sobre a Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e
(ICOMOS, 2011) reconhece a importância das
Natural, que resultou na entrega de propostas de
construções históricas da idade contemporânea,
Esequiel Mesquita , Esmeralda Paupério , António Arêde and Humberto Varum
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ALCONPAT Int.
Figura 2. Metodologia de avaliação estrutural para construções históricas proposta pelo ICOMOS.
alargando o conceito de patrimônio, de modo
a contribuir para preservação de construções
patrimônio contemporâneo.
Contudo,
mesmo
havendo
diretrizes
também do século XX. É importante salientar que
internacionais que abordem o tema da proteção
a Carta de Madrid teve um impacto muito maior
do patrimônio histórico, é válido ressaltar que
para sociedades mais recentes, como é o caso dos
as políticas de salvaguarda variam de região pra
países da América, que essencialmente tiveram o
região, de acordo com o entendimento e grau de
início após o século XVI, do que em sociedades mais
consciência da sociedade sobre a necessidade de
antigas, como é o caso da Europa, e que de fato veio
proteção das CH. Assim sendo, a metodologia aqui
a contribuir para o reconhecimento do valor cultural
proposta deve ser adaptada, sempre que houver
destas construções e para o desenvolvimento
necessidade, aos critérios das políticas locais de
de
salvaguarda do patrimônio.
políticas
de
conservação
ligadas
ao
3. Método de avaliação estrutural de construções históricas
Um método de avaliação da segurança estrutural
de sistemas sensoriais não-destrutivos em tempo
das CH, com recurso a técnicas de monitorização,
contínuo. É importante referir que os mecanismos
é apresentada na Figura 3. Logo, os conceitos de
adicionais de aquisição de informações sobre as
monitorização (ver NERY, 2013) são incorporados
propriedades da CH avaliada são baseado na
ao processo de avaliação, e ainda, especial
utilização de ensaios não-destrutivos, como forma
consideração é dada à questão da compatibilização
de minimizar a intrusão do processo de avaliação
entre as técnicas de recuperação propostas e as
estrutural nessas construções.
características originais do sistema estrutural bem
O método de avaliação estrutural (Figura 3) de
como ao critério de reversibilidade. É valido salientar
CH apresentada neste boletim será descrita com
que neste documento a monitorização estrutural
recurso exemplificativo a casos de estudo de caso
deve ser entendida como o processo de aquisição de
desenvolvido pelo IC-FEUP, como forma de tornar
dados sobre a ocorrência de um determinado dano,
mais evidente e claro os passos a serem adotados no
bem como sobre sua progressão, através do uso
processo de avaliação estrutural.
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Boletín Técnico 11
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
Figura 2. Metodologia de avaliação estrutural para construções históricas proposta pelo ICOMOS.
Esequiel Mesquita , Esmeralda Paupério , António Arêde and Humberto Varum
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ALCONPAT Int.
3.1 Análise documental
A primeira etapa do processo de avaliação
a comunidade local auxiliarão a equipe técnica
estrutural de uma CH constitui-se pela análise
no entendimento a cerca do valor cultural da
documental,
recolher
construção, e, consequentemente, na definição do
informações sobre o histórico da estrutura, de
nível de intervenção a ser realizada ou estabelecer
modo abranger desde sua construção até possíveis
limites de alterações que possam ser realizados
intervenções realizadas, que possam auxiliar as
nos elementos estruturais sem que a memória
etapas futuras de trabalho da equipe técnica.
construtiva do edificado seja alterada.
que
tem
por
objetivo
A realização desta etapa é importante, por que
É nesta etapa em que as informações históricas
o levantamento destas informações são utilizados
sobre a CH a ser inspecionada são recolhidas,
para situarem a equipe técnica quanto a localização
fornecendo subsídios que possibilitarão à equipe
do edifício, suas dimensões, tipologia, etc. E no
técnica o planejamento adequado sobre a realização
caso de existência de relatórios técnicos, é possível
da inspeção estrutural, e ainda se anteverem
coletar em tempo hábil informações sobre as
quanto as situações que poderão encontrar durante
propriedades da estrutura. Em adição, informações
a etapa de inspeção
sobre o histórico da construção e sua relação com
3.2 Inspeção
Para
que
uma
avaliação
estrutural
seja
“Inspeção” (Figura 4) é fundamental à aquisição
bem-sucedida deve-se conhecer em detalhes os
de informações gerais sobre o estado atual de
elementos componentes dos sistemas estruturais,
conservação da estrutura, bem como permite a
bem como seu funcionamento. Assim, a etapa de
validação das informações recolhidas durante a
Figura 4. Realização da inspeção técnica na laje de cobertura da Igreja de Santo António, Portugal (Fonte: ARÊDE et al., 2015).
etapa de “Análise documental”.
A inspeção deve ser realizada por um corpo
construção e o seu valor patrimonial, bem como
auxiliar no estabelecimento das propostas de
técnico multidisciplinar, como recomenda a Carta
caracterização
e
recuperação
dos
elementos
de Cracóvia (ICOMOS, 2000). Esta equipe de
constituintes dos sistemas estruturais da CH
avaliação, deverá ser montada de acordo com as
avaliada.
necessidades da obra, incluindo, essencialmente,
Nesta etapa, especial atenção deve ser dada aos
profissionais da área da engenharia, arquitetura e
sistemas estruturais, às seções e vãos dos elementos
arqueologia, que devem visitar toda a construção
e, naturalmente, aos materiais que os executam.
podendo, depois, só avaliar parte da estrutura. A
Paralelamente deverá ser feito um mapeamento
equipe técnica multidisciplinar tem como principal
dos danos e de informações adicionais sobre a
objetivo fornecer informações, de acordo com suas
estrutura que se considerem relevantes.
respetivas áreas de estudo, que caracterizem a
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Boletín Técnico 11
De modo sumarizado, pode-se dizer que a etapa
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
de inspeção tem por objetivos promover:
Adicionalmente, é durante a “Inspeção” que ensaios
a.a observação global do estado da construção;
preliminares não-destrutivos podem ser realizados,
b.a validação das características geométricas da
como forma de adquirir informações mais específicas
construção obtidas durante a etapa de “Análise
que auxiliem no processo da avaliação estrutural. Em
documental”;
geral, é ainda durante a “Inspeção” que um registo
c.
a validação do funcionamento do sistema
estrutural;
fotográfico é realizado, não só dos danos observadas,
mas também dos detalhes que caracterizam a CH.
d.a identificação dos métodos construtivos e dos
Deve-se ressaltar que a inspeção não deve ser
materiais utilizados, incluindo a identificação e
encarada como uma única etapa a ser realizada no
diagnóstico dos danos.
início dos trabalhos de avaliação estrutural das CH,
Com base na informação obtida na etapa de
devendo-se recorrer a ela sempre que necessário.
inspeção, poderá seguir-se ou não ao planejamento
Contudo, a partir das informações levantadas
de qual sistema de monitorização deverá ser
durante a “Análise documental” é possível otimizar
implementado na CH, e, nomeadamente, que tipos
o número de visitas necessárias. Maiores detalhes
de grandezas serão mensuradas e seguir com uma
sobre a realização de inspeção em construções
caracterização mais detalhada das componentes
históricas podem ser consultados em Paupério
estruturais e seus materiais, quando for o caso.
et al. (2013).
3.3 Monitorização estrutural de HC
A inclusão de ferramentas de monitorização no
é uma decisão que deve ser tomada em acordo com
âmbito da avaliação estrutural de CH é motivada,
todas as partes envolvidas no processo de avaliação
principalmente, pelas características não-intrusivas
estrutural, inclusive os proprietários.
de seus sistemas sensoriais e necessidade em se
No
caso
de
decisão
afirmativa
sobre
a
acompanhar o comportamento destas construções
implementação de um sistema de monitorização,
ao longo do tempo. Desta forma, o tempo necessário
escolher que tipo deve ser implementado numa
para realização de uma potencial intervenção será
construção requer, para além de experiência
reduzido, uma vez que a utilização da monitorização
dos técnicos responsáveis, uma boa pesquisa de
como
de
mercado sobre os tipos de sensores disponíveis
conhecimento sobre o comportamento dos sistemas
para uma dada aplicação e a observância de
estruturais poder fornecer informações sobre o
seus prós e contras. Ainda, é fundamental o
estado atual de desenvolvimento de um dano.
estabelecimento de um determinado nível de
ferramentas
de
apoio
a
aquisição
No método de avaliação estrutural de CH
resposta do sistema requerido pelo usuário, pois
apresentado na Figura 3, é possível observar o
a utilização de ferramentas de monitorização,
relevante papel que um sistema de monitorização
além de serem utilizadas como mecanismo para o
pode apresentar para um processo de avaliação
acompanhamento da evolução dos danos e medição
estrutural, em que o sistema de monitorização
de respostas estruturais provocadas por eles
fornece informações para as diversas etapas do
numa etapa de diagnóstico, é também muito bem-
processo de avaliação (caracterização, modelagem,
vinda para aplicação em CH em ótimo estado de
análise estrutural, análise de risco e intervenção).
conservação para fins de deteção do surgimento de
Todavia a decisão sobre a implementação ou não
danos, ou ainda para a realização de estudos sobre
de um sistema de monitorização em uma CH
a predição da vida útil estrutural.
depende de vários fatores, entre os quais destacam-
Desse
modo,
como
forma
de
orientar
os
se: a natureza e intensidade do dano, as incertezas
proprietários e os técnicos sobre a escolha quanto
envolvidas sobre o estado de desenvolvimento do
do sistema de monitorização, uma metodologia de
dano, da necessidade de validação da eficiência da
classificação é apresentada na Tabela 1
intervenção realizada e dos recursos disponíveis, e
Quanto maior for o nível de resposta requerido
Esequiel Mesquita , Esmeralda Paupério , António Arêde and Humberto Varum
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ALCONPAT Int.
Tabela 1. Classificação dos sistemas de monitorização de acordo com o nível de resposta.
Nível
Objetivo
Fornece informações sobre:
1
Emergência de danos
identificação da ocorrência do dano
2
Localização dos danos
surgimento dos danos e localização
3
Caracterização dos danos
geometria e intensidade dos danos, além das informações
oferecidas pelos níveis anteriores
4
Caracterização do risco estrutural
o estado atual da estrutura tendo em conta a ocorrência
dos danos e sua influência na segurança estrutural, em
somatório com as informações dos níveis anteriores
Predição da vida útil
a previsão do comportamento da estrutura, para um
dado intervalo de tempo, tendo em conta os danos
detetados no atual momento e suas respetivas evoluções
e consequências pra segurança estrutural
5
pelos usuários, maior será a variabilidade dos
respostas da frequência natural da estrutura
sensores a serem empregados, bem como o número.
podem indicar alterações nas propriedades do
Aplicações que almejem o nível 1, por exemplo,
sistema estrutural em estudo. Enquanto sistemas
basicamente são constituídos pela utilização de
classificados no nível 3 requerem sensores mais
acelerômetros, em que alterações bruscas nas
específicos e localizados.
3.4 Caracterização estrutural
A etapa de “Caracterização estrutural” tem por
Os resultados obtidos pela caracterização devem
finalidade recolher informações mais específicas
ser usados, de forma a complementar às informações
sobre as características da CH que devem ser
recolhidas quer pela “Análise documental”, quer
levadas em conta na avaliação estrutural, para
durante a “Inspeção”, podendo servir como base
proposição de um plano de recuperação. Assim,
para uma eventual construção de um modelo
neste boletim, a etapa de caracterização foi dividida
numérico, quando for o caso.
em três subgrupos conforme mostrados da Figura
A “Caracterização estrutural” é a etapa do
3, todavia, a caracterização deve ser realizada em
processo de avaliação de uma estrutura em que
função dos danos observados na etapa de inspeção,
a prioridade é a aquisição de informações sobre
podendo englobar mais fatores (além dos três
o funcionamento do sistema estrutural e sobre
mencionados) ou ser mais específica em torno de
as propriedades resistentes destes componentes.
algum deles.
Para tal, tanto ensaios estáticos quanto dinâmicos
(Figura 5) podem ser utilizados, ou ainda aplicações,
com consideração sempre a métodos não destrutivos,
mais específicas de caracterização, como as subtarefas apresentadas na Figura 3, nomeadamente:
“Caracterização geométrica”, “Caracterização de
danos” e “Caracterização material.”
Um exemplo prático de caracterização estrutural
pode ser encontrado em Costa et al. (2012) em que
o Mercado do Bolhão, em Porto, teve sua estrutura
avaliada (Figura 6.a). Neste caso de estudo, a
partir das informações coletadas pela análise de
laudos e documentos técnicos, inspeção técnica
Figura 5. Detalhe de um acelerômetro instalado em uma construção
histórica (Fonte: COSTA et al., 2013).
10
Boletín Técnico 11
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
e caracterização estrutural foi possível realizar
e
compará-los
o cálculo dos esforços atuantes na estrutura
resistentes:
com
seus
respetivos
esforços
“Para tal, foram considerados no cálculo dos esforços cada um dos painéis de laje L1
(Figura 6.b e 6.c) de modo individual, com recorrência a um modelo conservativo de cálculo,
em que considerou-se o funcionamento unidirecional de cada um dos painéis L1, no sentido no
menor vão simplesmente apoiado em vigas. Porém, através do modelo conservativo de cálculo
adotado, verificou-se que dada a pequena espessura da laje, com reduzida quantidade de
armaduras, a resistência dos elementos não eram suficientes sequer para suportarem as cargas
lá instaladas. Imediatamente, pôs-se em causa o modelo de cálculo conservativo adotado para
o cálculo dos esforços resistentes, e verificou-se que, de fato, o funcionamento da estrutura
analisada assemelha-se ao funcionamento de uma grelha, em que todos os elementos do
sistema estrutural (painéis e vigas) participam ativamente do conjunto resistente da estrutura
(COSTA et al., 2012)”.
Assim, optou-se pela realização de um ensaio
de carga (Figuras 6.d e 6.e) como forma forma de
estabilidade do sistema estrutural, e caracterizar o
comportamento do sistema estrutural (Figura 6.f).
averiguar as reais condições de funcionamento e
Figura 6. Mercado do Bolhão: (a) vista aérea, (b) planta do primeiro nível do mercado, (c) detalhe da laje onde o ensaio de carga foi realizado, (d)
vista dos transdutores de deslocamento instalados sob o piso 1, (e) detalhe da realização do ensaio de carga e (f) resultado dos deslocamentos
em função da carga aplicada (Fonte: COSTA et al., 2012).
Uma outra forma de validar o comportamento dos
modos de vibração da estrutura) e não destrutivos.
sistemas estruturais de CH é através da realização
A caracterização geométrica, a que se refere o
de ensaios dinâmicos (Figura 5). Essa técnica
presente boletim, deve ser focada no detalhamento
é bastante utilizada, uma vez que é de simples
das características geométricas dos elementos
aplicação (essencialmente através de acelerômetros
componentes dos sistemas estruturais. Dependendo
instalados em pontos da estrutura e recolha de
do número de elementos e das características
espectros de acelerações, dos quais podem ser
que quer levantar, podem ser utilizadas técnicas
obtidas as frequências naturais, amortecimento e os
mais ou menos sofisticadas. Na Figura 7, por
Esequiel Mesquita , Esmeralda Paupério , António Arêde and Humberto Varum
11
ALCONPAT Int.
exemplo, dadas as dimensões e o elevado número
Relógio de Caminha, recorreu-se ao uso do Laser
de elementos estruturais componentes da Torre
Scanning.
Figura 7. Levantamento geométrico realizado na Torre Relógio de
Caminha, Portugal, com auxílio do Laser Scanning (Fonte: COSTA
et al., 2013).
Para uma visão mais detalhada e outros exemplos
localização) serviu de base não só para focar os esforços
de caracterização geométrica podem ser consultados
no âmbito do diagnóstico em elementos específicos do
os trabalhos desenvolvidos por Arêde et al. (2013) e
sistema estrutural (arcos e pilares), como também
Guedes, Arêde & Paupério (2013).
corroborou para a implementação de um sistema
Através das informações recolhidas nas etapas
de monitorização (Figura 8), verificou-se que a
anteriores, uma caracterização mais detalhada
caracterização dos danos compreende a uma etapa
dos danos deve ser realizadas. Nesta sub-etapa,
igualmente importante às etapas descritas. Além
pretende-se, além de identificar a natureza dos
da identificação e localização dos danos, a recolha
danos (fissuras, corrosão, deslocamentos de paredes,
de informações quanto a intensidade destes, fornece
inclinação de pilares, etc.), identificar sua localização
subsídios mais específicos para a avaliação do estado
nos elementos componentes do sistema estrutural,
global da CH. No caso de fissuras, por exemplo, uma
bem como caracterizar sua intensidade.
boa maneira de se fazer isto é verificar as dimensões
Tomando como exemplo o caso da Igreja de Santo
António de Viana (ARÊDE et al., 2015), em que a
caracterização dos danos (quanto a ocorrência e
12
Boletín Técnico 11
das aberturas, área e sentido da propagação e ainda a
verificação quanto a progressão do dano.
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
Figura 8. (a) Detalhe da localização de uma fissura num pilar da nave da Igreja de Santo António de Viana,
Portugal e (b) localização da fissura no plano de monitorização (Fonte: ARÊDE et al., 2015).
Em seguimento à proposta metodológica de
estrutura da cobertura, foram realizados ensaios
avaliação estrutural, caracterizar a composição e as
de determinação do teor de água dos elementos
propriedades dos materiais das CH é importante, por
através do uso do higrómetro e ainda avaliação da
que, além de verificar o estado de conservação destes
velocidade de penetração de uma agulha em algumas
materiais, permite a aquisição de conhecimentos
peças de madeira com auxílio do equipamento
necessários à etapa de diagnóstico e reabilitação,
Resistograph® (Figura 9). Através do ensaio com
uma vez que é aqui estabelecido um limite quanto
o Resistograph® é possível identificar diferenças
a que tipos de materiais poderão ser utilizados sem
entre as densidades das fibras da madeira, através
descaracterizar as características da construção.
da comparação entre as velocidades que a agulha
Contudo, nem sempre esta sub-etapa é necessária,
do Resistograph® apresenta para perfurar um
sendo mais indicada quando houver a necessidade
determinado
de observação ou compreensão de materiais ou
valores de velocidades representam fibras mais
fenómenos pouco descritos na literatura.
densas, enquanto maiores valores de velocidade
elemento
de
madeira.
Menores
Essencialmente, a necessidade de realização
de penetração da agulha podem indicar a presença
da caracterização material é consequência da
de vazios e, assim, indicar a degradação interna do
natureza
etapas
elemento. A partir dos resultados do higrômetro,
anteriores. Contudo, esta etapa pode ser subdivida
observou-se que o teor médio de água presente
em dois momentos: o primeiro a ser realizado in
nos elementos analisados era de 12%, um valor
situ com recurso a meios não-destrutivos (sempre
que aponta para um bom estado de conservação.
que possível), e o segundo realizado em laboratório,
Pelos resultados obtidos pelo Resistograph® foi
devido a natureza mais específica dos ensaios a
possível observar que os elementos de madeira
serem executados.
apresentavam-se dentro de uma mesma faixa de
dos
danos
observados
nas
No processo de avaliação do Mercado do Bolhão
(COSTA et al., 2012), a fim de se caracterizar
valores, o que indicou a boa integridade das peças
ensaiadas.
a integridade dos elementos de madeira da
Esequiel Mesquita , Esmeralda Paupério , António Arêde and Humberto Varum
13
ALCONPAT Int.
Figura 9. (a)Detalhe da cobertura do Mercado do Bolhão, (b) realização do ensaio de resistência da madeira com o Resistograph® e (c)
espectro de resistência à perfuração. (Fonte: COSTA et al., 2012).
Ensaios que indiquem a composição química dos
que considere as propriedades dos materiais seja
materiais constituintes do sistema estrutural das
adotada, a fim de que problemas futuros sejam
CH também podem ser realizados para que, na
evitados.
etapa de diagnóstico, uma medida de intervenção
3.5 Modelagem numérica
Sempre que houver elementos suficientes para
como alvenarias de pedra, adobe e madeira, concretos
que se proceda com a modelagem numérica da
com armadura lisa, que em relação aos sistemas
estrutura em avaliação, esta deve ser realizada. A
justificativa para tal se dá devido às incertezas de
funcionamento dos sistemas estruturais das CH,
quer pelo número de intervenções que possam ter
sido realizadas, quer pela fragilidade dos próprios
elementos (em virtude dos danos) ou ainda pela
existência
de
diferentes
métodos
construtivos
numa mesma estrutura. Assim, com recurso das
informações recolhidas na etapa de caracterização,
os modelos numéricos podem ser calibrados para
que se tornem mais próximos quanto possível da
realidade da construção intervencionada.
Outro pronto de interesse pra que a modelagem
numérica da estrutura ou de parte dos elementos
estruturais seja realizada é quanto a limitação de
informações sobre o comportamento de sistemas
14
Boletín Técnico 11
Figura 10. (a) Configuração dos pontos utilizados nos ensaios
dinâmicos e (b) modelo numérico construído com recurso ao FEM
(Fonte: COSTA et al., 2013).
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
estruturais contemporâneos são pouco estudadas.
detalhes desta abordagem podem ser consultados
A Figura 10 mostra um caso de aplicação de
em Guedes, Arêde e Paupério (2013). Para
ensaios dinâmicos para modelagem numérica
exemplos adicionais consultar Ortega et al. (2015) e
realizado na Torre Relógio de Caminha. Maiores
Voltsis et al. (2013).
3.6 Avaliação estrutural
No seguimento do processo de avaliação de
sucesso, pois, por vezes, elementos decorativos
uma CH, a análise estrutural distingue-se da
podem passar a impressão de serem elementos
caracterização estrutural (visto no item 3.4) pelo
estruturais, e vice-versa, levando a compreensão
seu foco. Enquanto na “Caracterização estrutural”
sobre o funcionamento da estrutura para longe do
o objetivo é a recolha de informações sobre as
comportamento real.
propriedades resistentes dos componentes, na
É válido lembrar que a análise estrutural deve
“Avaliação estrutural” busca-se avaliar a interação
ocorrer obrigatoriamente em dois momentos: 1)
entre os diversos elementos da construção e
para validação do funcionamento da estrutura,
identificar seu comportamento sob efeito dos
logo após a recolha de informações, e 2) durante o
danos, bem como estabelecer uma análise global
delineamento do reforço estrutural, como modo de
do comportamento estrutural da CH com fins de
verificação da eficiência do reforço proposto a ser
diagnóstico.
executado. Por isso que a construção de um modelo
No âmbito das CH, um bom nível de informação
recolhidas na etapa de caracterização é essencial
numérico poderá ser útil para antever a eficiência
do método de intervenção a ser realizado.
para que a “Avaliação estrutural” seja feita com
3.7 Intervenção (Reforço/Recuperação)
A medida de intervenção estrutural a ser adotada
bem planejada, compatível e eficiente pode ser
em uma CH deve ser criteriosamente analisada, face
dado através do caso do Castelo de Guimarães
ao funcionamento da estrutural a longo prazo, com
(Figura 11), em que uma das oito torres do castelo
respeito as características construtivas do edificado.
apresentou abertura de fissuras, essencialmente
A utilização de materiais que descaracterizem ou
nas juntas, em forma de V, com o vértice na base
que, de algum modo, não sejam compatíveis com os
do cunhal. Esta torre se assentava sobre um
materiais utilizados originalmente nas CH devem
maciço rochoso, que, devido o descalçamento de seu
ser evitados. Um exemplo desta incompatibilidade
entorno e cortes realizados no sentido vertical, com
entre os materiais originais e os materiais
aparente redução do volume original do maciço,
utilizados numa intervenção é a utilização de
teve um acréscimo nas tensões de compressão, em
argamassas de cimento, ao invés de argamassas de
consequência do próprio peso da torre, e sofreu
cal, para o preenchimento de juntas em alvenarias
esmagamento,
de pedra, que potencializam a ocorrência de reações
diáclase do maciço, que corresponde ao sentido de
de natureza alcali-agregado.
abertura das fissuras evidenciadas na torre.
resultando
no
surgimento
da
Um bom exemplo de medida de intervenção
Esequiel Mesquita , Esmeralda Paupério , António Arêde and Humberto Varum
15
ALCONPAT Int.
Figura 11. Torre do Castelo de Guimarães com evidência da fratura e detalhe da medida de reforço utilizada.
(Fonte: FONSECA, 2008).
Desse modo, após a identificação da origem
Após a constatação de que os movimentos da
principal dos danos observados, a medida de
torre haviam cessados, optou-se pela realização
intervenção realizada centrou-se na consolidação
de um preenchimento das juntas com argamassa
do maciço através de pregagens (Figura 11), e
de cal e continuação da monitorização, a fim de se
ainda, recolocação de rochas na base dos maciços,
verificar futuros deslocamentos.
a fim de atenuar a formação de fluxos de água.
Assim
como
mencionado
no
item
3.6,
é
Em zonas em que evidenciou-se a desagregação da
aconselhável que durante o processo de escolha
rocha, efetivou-se a aplicação de injeções de uma
sobre qual método de reforço deve ser aplicado, o
paste consolidante. Em paralelo a estas medidas,
efeito deste reforço no funcionamento da estrutura
um sistema de monitorização foi instalado na torre
deve ser avaliado previamente, e escolhido de
para que os deslocamentos (em virtude da abertura
acordo com a compatibilidade com as características
das fissuras) fossem observados.
da CH, de modo a não descaracterizá-la.
4. Considerações finais
O Boletim Técnico - Caracterização, avaliação e
desenvolvidos no percurso do trabalho realizado
recuperação estrutural de construções históricas –
no Instituto da Construção-FEUP, ao longo da
apresentado neste documento, apresenta uma série
descrição da metodologia proposta, como forma
de recomendações que devem ser observadas no
de melhor exemplificar sua aplicabilidade. É
âmbito da aplicação em CH.
valido ressaltar que a metodologia aqui proposta
Uma
metodologia
de
avaliação
estrutural
distingue-se dos métodos de avaliação já descritos
para CH com recurso a utilização de métodos de
na literatura através de sua abordagem totalmente
monitorização é proposta neste documento. De
focada para os casos de CH.
modo geral, são intercalados casos de estudos,
16
Boletín Técnico 11
Espera-se que as recomendações descritas neste
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções históricas
boletim possam vir de encontro às necessidades de
casos de estudos e trabalhos no âmbito da avaliação
implementação do estado atual da literatura na
estrutural das CH, tornando as abordagens mais
área da conservação e manutenção do patrimônio, e
assertivas e eficientes.
ainda, que sirvam de base para o desenvolvimento de
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Boletins Técnicos Alconpat
BT 11 – Esequiel Mesquita, Esmeralda Paupério,
António Arêde & Humberto Varum
Caracterización, evaluación y recuperación estructural de
edificios históricosl
Caracterização, avaliação e recuperação estrutural de construções
históricas
Characterization, evaluation and structural recovery of historic
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