AS ORIGENS DO CINEMA ANALISADAS QUADRINHO A
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AS ORIGENS DO CINEMA ANALISADAS QUADRINHO A
AS ORIGENS DO CINEMA ANALISADAS QUADRINHO A QUADRINHO Glauco Madeira de Toledo. Professor do Curso de Comunicação Social do Instituto Municipal de Ensino Superior de Bebedouro – Victório Cardassi – IMESB-VC. R. Nelson Domingos Madeira, 300, Parque Eldorado, Bebedouro/SP. E-mail: [email protected] Wiliam Machado de Andrade. Mestrando em Ciências da Comunicação na ECA – USP. Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, São Paulo/SP. E-mail: [email protected] PALAVRAS-CHAVE: Cinema; história em quadrinhos; narrativas. INTRODUÇÃO: As linguagens apropriadas pelo cinema para o seu desenvolvimento vêm de diversas fontes. A herança narrativa do cinema “vem antes dos music-halls, das histórias em quadrinhos, dos espetáculos de lanterna mágica, do circo e do teatro popular, do que dos romances do século XIX e do teatro clássico” (VANOYE e GOLIOT-LÉTÉ, 1994). Neste sentido, em busca de suas raízes, este trabalho visa analisar, mais de perto, uma das supostamente mais importantes influências do cinema, a história em quadrinhos (hq), no intuito de apontar quantitativamente essa relevância. RELEVÂNCIA: Ao grande volume de produções cinematográficas que vêm sendo realizadas recentemente que adaptam obras das hq tem sido atribuído um suposto “boom” (YUGE, 2002), como se apenas no tempo presente a sétima arte tenha descoberto a nona. Esta explosão, baseada em filmes protagonizados por personagens como “Blade”, “X-Men” e “Homem-Aranha” parece ser resultante apenas das novas possibilidades tecnológicas que têm permeado as narrativas audiovisuais, conforme tem sido noticiada. A descoberta ou redescoberta trazem um olhar distinto para o comunicador, no sentido de se evitar a reinvenção da roda. METODOLOGIA: Tal influência poder-se-ia dar de formas diversas, dentre as quais destacaremos a existência de adaptações em quantidade, anteriores à década de 1990, que marca o início do suposto “boom”, com o início da franquia de “X-Men”. Um cadastro mundial destas obras pode ser encontrado em “Lo schedario de cine-comics” (FORMIS, 2007). DISCUSSÃO: Com relação às adaptações intermidiáticas é preciso analisar uma época em que nem o cinema nem as hq tinham sido formalmente reconhecidos, mas em que se nota a interferência dos quadrinhos na realização de obras dos irmãos Lumière (um de seus maiores sucessos): o filme “L’arrouseur arrosé” (FRA, 1895). Esta é uma adaptação da hq de Herman Vogel publicada em 1887 na revista Quantin, com o título de “L’Arroseur”. Tanto é que à época se dizia que a publicação teria servido de storyboard para o filme. Ainda no século XIX se registra a exibição de outras duas adaptações das hq: “The Yellow Kid” em 1897, baseado em tiras cômicas para jornais criadas por Richard Outcault, o autor que primeiro estabeleceu um personagem fixo (o próprio garoto amarelo) nas tiras, que traziam a cada edição um personagem diferente; e Happy Hooligan em 1900, de Frederick Burr Opper. Durante a década de 1901-1910 temos mais quatro obras em live-action, ou seja, com atores reais. Destacam-se aqui, também de Outcault, “Buster Brown” (no Brasil, “Chiquinho”), e “Dreams of a Rarebit Fiend”, de Winsor McCay, autor de “Little Nemo”; personagem de quadrinhos, deste filme e de animações. É dito que McCay previu, nos quadrinhos, vários recursos que o cinema veio a desenvolver posteriormente: “...usando amplamente as cores, antevendo o futuro cinemascope, as lentes 70 mm, as grandes angulares, os ângulos insólitos, captando a vista do leitor com grandes quadros dominantes” (MOYA, 1996). Outro exemplo da intersecção quadrinhos-cinema é a série de desenhos animados da personagem Krazy Kat, de George Herriman. Criada para as hq em 1911, Krazy migra para o cinema de animação em 1916 e leva consigo o visual das hq, bem como algumas gags típicas. Mas esta migração era predominantemente dos personagens e não propriamente temática, uma vez que “as adaptações animadas se baseavam no que rapidamente se tornaram fórmulas de piadas mais que o estilo original de humor do artista” (SOLOMON, 1994). Além disso, essa transposição carregou para o cinema de animação os balões dos quadrinhos, talvez para resolver uma questão pertinente para Herriman, já que Kat “pronuncia” palavras da língua inglesa com a grafia incorreta, mais remetendo à sonoridade que à ortografia. Essa característica distingue o desenho de gato-e-rato de outras obras cinematográficas, que utilizavam cartelas com texto, ou somente mímica. Ainda na década de 1910 registra-se “Bringing Up Father” (“Pafúncio e Marocas”, aqui). O autor, George McManus, de tão parecido com os próprios desenhos veio a viver Pafúncio no cinema mais de uma vez. Com mais cinco obras na década de 1920 e trinta e seis na década de 1930, as adaptações já naquela época faziam volume e eram notoriamente bem recebidas no mercado cinematográfico, pois caso contrário seu volume não estaria em ascensão. É aqui que temos os primeiros “Flash Gordon” e “Mandrake”. Na década seguinte marcamos mais quarenta e dois títulos, com o surgimento dos primeiros “Fantasma”, “Superman” e “Batman”. Se a saúde das adaptações não vai superbem, mal não vai... Até que, em 1954, Fredric Wertham lança o livro “Seduction of the Innocent”, pregando inquisidoramente contra os quadrinhos, com direito a fogueiras de gibis. Ele prega, entre outras coisas, que as hq fazem mal para o desenvolvimento moral e intelectual dos leitores (majoritariamente crianças). Isso gera a censura do governo americano, inglês e outros, o que acaba diminuindo ou extinguindo a aceitação e o interesse pelos quadrinhos e, conseqüentemente, pelas adaptações. Nesta década se registra apenas treze obras. Em 1963 as produções reagem. Vinte e uma são registradas até o fim de 1969. A censura vai deixando a cena, até ser ignorada completamente, na década de 1970; temos então trinta e cinco obras, o que é uma retomada que toma fôlego novo com o “Superman – o filme” de 1978, com Christoper Reeve. Há mais trinta e oito obras na década de 1980. Setenta e duas produções: os anos noventas trouxeram outra disposição, sem dúvida. Muito mais obras foram adaptadas, mas havia muito mais por vir: Oitenta obras de 2001 a 2007, número que ainda vai crescer, provavelmente. O mercado cinematográfico parece ter redescoberto os leitores de hq. CONCLUSÃO: Tendo em vista os constantes encontros históricos entre o cinema e as histórias em quadrinhos é possível perceber que estas duas artes são virtualmente indissociáveis, tornando o suposto “boom” de adaptações recentes apenas um evidente reencontro. O patamar tecnológico do cinema atual permite uma série de recursos visuais dos quais os filmes de outrora não dispunham e isso traz à tela adaptações que antes não atingiriam a verossimilhança com os quadrinhos, cujo design é, muitas vezes, atração inseparável do roteiro. As telas, entretanto, vão sendo impregnadas do nanquim que tinge celulóides de filmes no mundo todo, desde o início do universo narrativo do cinema. REFERÊNCIAS FORMIS, Steno. Lo schedario de cine-comics. In Cine-Comics: dalla matita alla pallicola. Disponível em <http://www.midianweb.it/cinecomics/schede/main_1.asp>. Acesso em: 28 mar. 2007, à 01h30min. MOYA, Álvaro de. História da história em quadrinhos. São Paulo: Brasiliense, 1996. SOLOMON, C. The history of animation: enchanted drawings. New York: Random House, 2ª ed., 1994, p. 28. VANOYE, Francis e GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Ensaio sobre a análise fílmica. Campinas: Papirus, 1994, p. 25. YUGI, Cláudio. Cinema vive “boom” de adaptações de quadrinhos. In Bonde. Disponível em: <http://www.bonde.com.br/colunistas/colunistasd.php?id_id_artigo=78>. Acesso em 20 de março de 2007, às 23h30min.