10 TW um Desafio para a Energia Nuclear até 2050

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10 TW um Desafio para a Energia Nuclear até 2050
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10 TW um Desafio para a Energia Nuclear até 2050 Roberto de Miranda Musser, CIENAM/UFBA genda de governos, por isso, o consumo energético em crescimento passou a considerar em seu balanço alguns fatores ambientais, tais como a emissão de gases de efeito estufa resultantes da queima de combustíveis fósseis e o alagamento de grandes áreas de florestas. Busca‐se um método de geração de energia limpa. Neste sentido, a energia nuclear, produzida a partir do átomo de urânio, passou a ser considerada uma fonte lim‐
pa e apresenta‐se como uma alternativa importante aos combustíveis fósseis na produção de eletricidade. As vantagens comparativas pautam‐se no baixo volume I. INTRODUÇÃO de emissão de gás carbônico (CO2), principal responsável Em 1938 foi demonstrada a existência de novos elemen‐ pelo efeito estufa e a existência de reservas consideráveis tos radioativos produzidos pela irradiação de nêutrons e de urânio no planeta. descoberta as reações nucleares provocadas por nêutrons Quanto às desvantagens a energia nuclear apresenta: al‐
lentos. to custo de implantação; possível insegurança em relação Estas descobertas foram derivadas dos trabalhos de Enri‐ ao armazenamento do lixo nuclear; risco de armas de des‐
co Fermi, que em 1929 apresentou um de seus trabalhos truição em massa; e vazamentos como os ocorridos em intitulado “Sociedade Italiana por um Congresso da Ciên‐ Chernobyl, Sarov e Three Mile Island. cia” onde preconizava como única possibilidade para novas II. TECNOLOGIAS DE GERAÇÃO DE ENERGIA NUCLEAR descobertas da física a modificação do núcleo interno dos átomos. Fermi aos 37 anos recebeu o prêmio Nobel de Física e A. Tipos de Reatores nos Estados Unidos participou das etapas subseqüentes do O desenvolvimento da tecnologia avançou de forma sig‐
Projeto Manhattan como consultor geral, principalmente nificativa em relação ao tipo de reator, segurança das usi‐
pelo seu amplo conhecimento interdisciplinar. nas, tipo de reação e rendimento das reações utilizadas nos Nos meados dos anos 30 do século passado foi possível reatores nucleares. controlar pela primeira vez a fissão nuclear dos átomos, A tecnologia disponível apresenta uma gama de métodos quando foi obtida concretamente uma conclusão acerca do de produção de energia núcleo‐elétrico que vão desde os uso dos núcleos radioativos na produção de energia. menos eficientes, que geravam 6MW, até os mais eficien‐
Inicialmente o potencial energético dos núcleos foi utili‐ tes reatores de terceira geração os PWR (Pressurized Water zado, tanto, pelos Estados Unidos quanto pela União Sovié‐ Reactor), BWR (Boling Water Reactor) e os potentes tica para fins bélicos. Terminada a Segunda Guerra Mundial ESBWR (Economic Simplified Boiling Water Reactor), que direcionaram‐se gradativamente para uso civil do potencial chegam a gerar cerca de 1520 MW. nuclear na produção de energia elétrica, produzida a partir Das 436 usinas atualmente em operação no mundo, 345 da energia calorífica liberada durante o processo de fissão são do tipo de reator de água pressurizada, sinal de sua nuclear. eficiência e rendimento. A primeira usina foi a de Obninsk na, então, União Sovié‐
Estão em desenvolvimento os reatores de quarta gera‐
tica com capacidade de produção efetiva de 6MW, o sufici‐ ção com previsão de funcionamento para 2030 com capa‐
ente para abastecer na época vinte mil casas, que se com‐ cidade ainda não divulgada. A tecnologia aponta para o paradas às demandas de energia elétrica das casas atuais acoplamento de um acelerador de partículas e utilizar os representa o atendimento de apenas 10% deste total. rejeitos das usinas nucleares convencionais como combus‐
De uma forma global a demanda por energia cresce pro‐ tível. gressivamente e de forma bastante consistente. B. A Química dos Reatores A preocupação ambiental faz parte permanente da a‐
Durante o processo de reações nucleares os isótopos de alguns elementos apresentam a capacidade de emitir ener‐
Roberto de Miranda Musser é aluno do Doutorado Interdisciplinar de gia. A base é o princípio demonstrado por Albert Einstein Energia e Ambiente. (e‐mail: [email protected]). que nas reações nucleares ocorrem uma transformação de Resumo ‐ Este trabalho apresenta uma visão crítica em relação à geração de energia elétrica proveniente de fonte nuclear, apresentando as possibilidades de expansão e tecnologias em comparação com a utilização atual e pers‐
pectivas futuras às reservas mundiais de urânio e a posi‐
ção do Brasil neste contexto. Palavras‐chave — Elétrica, Energia, Geração, Nuclear, U‐
rânio. 2
massa em energia. A reação nuclear é a transformação da composição do núcleo atômico em um ou mais elementos. Esse processo pode ocorrer espontaneamente ou provocado mediante técnicas de bombardeamento de nêutrons. Duas formas são conhecidas na transformação de ener‐
gia nuclear em calor. A primeira é a fissão nuclear, onde o núcleo atômico se subdivide em duas ou mais partículas e a segunda a fusão nuclear, na qual ao menos dois núcleos atômicos se fundem para produzir um novo núcleo. O uso da energia nuclear para movimento, calor e gera‐
ção de eletricidade consiste no controle das reações nucle‐
ares. Outro aspecto importante relaciona‐se com o ciclo do combustível que pode ser aberto ou fechado. No ciclo a‐
berto ou ciclo de “uma via só”, o urânio é utilizado e o resí‐
duo armazenado em depósitos geológicos. Para o ciclo fe‐
chado, o plutônio existente no combustível queimado é extraído quimicamente e convertido em combustível para uso em outra usina nuclear. A reciclagem de todos os elementos transurânicos (como por exemplo, o plutônio), é uma tendência importante co‐
mo uma tecnologia futura e com isso, quase todos os com‐
ponentes de vida longa dos resíduos serão eliminados. Entretanto, atualmente o combustível reciclado é mais caro e ainda existe a possibilidade latente do desvio do plutônio produzido para uso em armas nucleares. Sem con‐
tar que existe bastante urânio a preço razoável para sus‐
tentar o aumento no número de usinas nós próximos ses‐
senta anos. Assim uma tendência para os próximos anos são as usinas de ciclo aberto. III. UTILIZAÇÃO DA ENERGIA NUCLEAR NO MUNDO A. Posicionamento Global O relatório sobre o status e a perspectiva da energia nu‐
clear no mundo, disponibilizado pela International Atomic Energy Agency (IAEA, AIEA ‐ Agência Internacional de Ener‐
gia Atômica), demonstra que os reatores nucleares são a terceira maior fonte de geração de energia e responsáveis por aproximadamente 17% da produção de energia elétrica no mundo (figura1), ficando apenas atrás do carvão e do gás natural. Os Estados Unidos é o país que mais gera energia de fon‐
te nuclear com uma capacidade instalada de 106.476 MW para uma produção de energia de 842.360 GW/h, o que corresponde a 32% da produção total. Para efeito compa‐
rativo este valor é de aproximadamente o dobro do que foi produzido por todas as fontes disponíveis no Brasil. A França com 76,3% do total de energia elétrica gerada a partir da fonte nuclear está na segunda colocação em rela‐
ção ao mundo com 17% e 438,6 GWh de energia produzi‐
da. No Japão são cerca de 30 % da energia produzida o que representa 9% do total global equivalente a 251,75 GWh. O Instituto Japonês de Economia (IEEJ) informou que a neces‐
sidade de energia elétrica até 2030 implicará no crescimen‐
to para 40%, com isso, a operação das atuais usinas terá um horizonte ampliado para no mínimo 60 anos, além da necessidade de construir pelo menos mais 10 usinas. Os países emergentes ainda são pouco representativos em relação à energia elétrica proveniente de fonte nuclear. A Índia com 2% de toda a energia produzida, representa 13,17 GWh. Estão planejadas para os próximos anos a con‐
clusão da construção de 6 usinas e 18 planejados para inici‐
ar a construção até 2012. A perspectiva da necessidade de energia de um país com mais de 1,15 bilhão de habitantes, atraem o mercado de fornecedores nucleares que esperam até 2020 encomendados de aproximadamente 25 novos reatores (cerca de 20 GW). A China foi responsável pela produção de aproximada‐
mente 65 GWh de energia elétrica de fonte nuclear o que significa cerca de 2,15% de sua necessidade de energia elé‐
trica. O planejamento aponta para uma capacidade instala‐
da de 35 GW em 2015, com ampliações para 55 GW em 2020 e 70 GW em 2025. Com esta capacidade instalada a China passará a ser responsável por 5% de geração por fon‐
te nuclear em 2030. O governo chinês prevê a construção de 54 novas usinas nucleares nos próximos 30 anos um montante de investi‐
mentos da ordem de 300 bilhões de dólares o que torna a China o maior comprador em potencial. O Brasil foi responsável pela geração de 14 GWh ou 3,12% da energia elétrica do país. Em termos globais isso representa 0,52% da geração por fonte nuclear no mundo. Esta é uma característica do perfil energético do Brasil no que diz respeito a geração de energia elétrica. O país é e‐
minentemente abastecido por energia hidrelétrica cuja geração representou mais de 90% do total. Existe no Brasil em operação 2 usinas nucleares (Angra 1‐ PWR, 657 MW e Angra 2 PWR, 1350 MW), e uma usina em construção (Angra 3 PWR, 1405 MW). B. O Custo da Geração de Eletricidade Figura 1 ‐ Panorama da utilização de energia nuclear em 2008. Fonte: IEAE. Segundo o MIT (Massachusetts Institute of Technology) o preço da energia elétrica proveniente de fonte nuclear está em torno de US$ 0,67, bem acima dos US$ 0,42 das provenientes de carvão e dos US$ 0,58 proveniente do gás natural. 3
D. Políticas Públicas de Incentivo Observa‐se que a energia elétrica gerada em usinas nu‐
cleares é mais cara que a gerada nas usinas a carvão e gás, mesmo considerando o urânio uma matéria prima barata. Isso se explica pelos elevados custo de instalação. Algu‐
mas iniciativas como diminuição do tempo para construção das usinas, melhorias de operação e manutenção poderiam baixar o custo de produção. Uma das possibilidades para tornar este tipo de fonte de energia economicamente viável pode pautar‐se na questão das emissões de grandes quantidades de gases de efeito estufa comparativamente com outras fontes de energia elétrica, como carvão e gás natural, atribuindo, por exem‐
plo, um “imposto de emissão de carbono” Para o MIT a energia nuclear se torna competitiva com uma internacionalização dos custos das emissões de CO2 por volta de US$ 100‐200/tonelada. Atualmente nas bolsas de transação de carbono européias estes valores se apro‐
ximam de US$ 30/ tonelada. Uma iniciativa neste sentido já começa a ser adotada no continente europeu onde as permissões para gerar emis‐
sões de carbono são negociadas em mercado aberto. No futuro, isto pode vim a ser usado no balanço econômico da produção de eletricidade em todo o mundo, dando um grande impulso para a energia nuclear. Uma resolução da AIEA foi adotada com o objetivo de promover o desenvolvimento às aplicações nucleares em países em desenvolvimento. O intuito é de reduzir a distância entre o consumo médio anual dos países desenvolvidos (cerca de 8.600 kWh por habitante na OECD) e os do continente africano, uma vez que a melhoria deste indicador é a mola propulsora do progresso e bem estar da população mais pobre. Atual‐
mente esta distancia é de 170 vezes. Alguns governantes consideram a ampliação internacio‐
nal da energia nuclear uma opção à mudança climática e uma alternativa às oscilações do preço dos produtos ener‐
géticos, principalmente quanto à incerteza sobre os com‐
bustíveis fósseis. Por outro lado esta iminente expansão da energia nuclear em todo o mundo requer responsabilidade. Cerca de 50 países visam ter fontes energéticas nuclea‐
res, e que as potências em expansão querem multiplicar o número de usinas em seu território. Especificamente a Chi‐
na, Índia e Estados Unidos devem ter um grande cresci‐
mento de seu parque gerador nuclear. No caso americano à necessária substituição das usinas em final de vida útil e no caso da Índia e China para atender ao crescente e constan‐
te aumento de consumo. C. Reservas Mundiais de Urânio E. Acordos de Cooperação Internacional O urânio é metal encontrado em formações rochosas da crosta terrestre. É extraído sob a forma de minério e poste‐
riormente purificado e concentrado sob a forma de um sal de cor amarela (yellowcake). Esta “torta de urânio” é maté‐
ria prima para produção da energia em um reator nuclear. As reservas mundiais estão estimadas em 5.469.00 tone‐
ladas e as principais reservas estão distribuídas na tabela abaixo tabela 1. O desenvolvimento e o crescimento responsável da e‐
nergia nuclear têm como requisito as cooperações bi e mul‐
tilaterais. Vários países têm intensificado a busca por par‐
cerias no âmbito da exploração do urânio e inovações tec‐
nológicas no campo do enriquecimento e da geração de energia. Alguns acordos de cooperação internacional merecem destaque, dentre eles o dos Estados Unidos e França e os do Brasil com a França e a União Européia. EUA X França O grupo francês AREVA e o norte americano NORTHROP GRUMMAN criaram a empresa ‐ AREVA NEWPORT NEWS LLC –, com início de operação prevista para 2011, e com objetivo de fabricar componentes pesados, tais como, va‐
sos do reator, tampa do reator, gerador de vapor e pressu‐
rizador. A expectativa da AREVA é de construir até 7 reatores no território americano nos próximos anos. Essa estratégia visa mitigar um gargalo industrial para componentes pesa‐
dos. Paralelamente a AREVA investirá uma soma multibilioná‐
ria no enriquecimento de urânio por centrifugação. Para isso, solicitou ao órgão regulador americano – NRC, uma licença para construir e operar a planta de Eagle Rock pró‐
xima a Idaho Fall. Brasil X França O Brasil assinou um memorando de entendimentos com a França através da AREVA com o objetivo de cooperação industrial na ampliação do parque de usinas nucleares e na fabricação de combustível. Os principais pontos contem‐
Tabelas 1 ‐ Principais reservas de urânio no mundo. País Toneladas de U % no Mundo Austrália 1.243.000 23% Cazaquistão 817.000 15% Rússia 546.000 10% África do Sul 435.000 8% Canadá 423.000 8% USA 342.000 6% Brasil 278.000 6% Fonte: IAEA. O Brasil ocupa o 7o lugar do ranking, com 278,7 mil tone‐
ladas em reservas conhecidas correspondendo a cerca de 6% do volume total mundial. Vale ressaltar que apenas 25% do território foram prospectados. As jazidas estão localizadas principalmente na Bahia, Ceará, Paraná e Minas Gerais, conforme informações das Indústrias Nucleares do Brasil (INB). A principal delas, em Caetité, Bahia, possui 100 mil toneladas, volume suficiente para abastecer o complexo nuclear de Angra I, II e III por 100 anos. 4
plam um programa nuclear com uma estrutura administra‐
tiva, jurídica e contratual definida, além da excelência téc‐
nica nos comissionamentos e operação de usinas nucleares e a troca de informações quanto ao ciclo do combustível. Brasil X União Européia O governo brasileiro firmou com a Comunidade Européia de Energia Atômica (Euratom) um acordo para pesquisa na área de fusão nuclear que englobará troca de informações científicas e técnicas, intercâmbio de cientistas e engenhei‐
ros, organização de seminários e realização de estudos e projetos. F. Crescimento Atual Em 2008, oito novas usinas tiveram suas obras iniciadas, na Coréia do Sul, na Rússia, na França e na China e em 2009, duas tiveram suas obras finalizadas no Japão: Hama‐
oka 1 e 2, com respectivamente 515 e 806 MW Segundo o MIT as perspectivas de crescimento contem‐
plam um cenário no qual a geração de eletricidade em usi‐
nas nucleares poderia triplicar, chegando a 1 TW em 2050. Cenários mais otimistas da Agência de Energia Nuclear (NEA) órgão da Organização para Cooperação e Desenvol‐
vimento Econômico (OECD), a participação nuclear na ge‐
ração energética do planeta pode chegar a 22% até 2050, principalmente pelo aumento da demanda por energia em países como China e Índia. Para que essa demanda seja atendida estima‐se que se‐
rão necessários aproximadamente 1,3 TW, o que represen‐
ta 1400 reatores operando. Isso significa que o atual mon‐
tante de energia gerada será multiplicado por quatro. Caso estas previsões se concretizem, muitas usinas com base em gás ou a carvão seriam desativadas, poupando o mundo de emissões de CO2 na ordem de 1 bilhão de tone‐
ladas/ano. Contudo, para que seja conseguida a estabilização nas emissões dos gases do efeito estufa é preciso que 7 bilhões de toneladas de CO2 deixem de ser emitidas anualmente até 2050. As ações globais devem ser no sentido de con‐
centrar esforços na geração de energia com pouca emissão de CO2. Neste sentido, a energia nuclear apresenta‐se como a principal e a mais estabelecida fonte de produção de e‐
nergia sem a emissão direta de CO2. De qualquer forma num cenário onde a demanda por energia mundial apresenta uma ordem de grandeza de 10 TW algumas considerações devem ser observadas: a) 10TW de energia proveniente exclusivamente de fonte nuclear significa a construção de 6579 usinas do tipo ESBWR (Economic Simplified Boiling Water Reactor), com geração média de 1520 MW (esta é a usina com maior capacidade de produção que existe). b) Neste ritmo será necessária a construção anual de 164, um número é praticamente inviável, consideran‐
do que o atual ritmo de usinas em construção no mundo não passa de 20. c) Mas mesmo considerando a hipótese de que a energia nuclear venha a suprir uma demanda de 10 TW, um grande esforço tecnológico deverá ser feito principal‐
mente na melhoria da tecnologia de construção das usinas, dos reatores, e obtenção de matéria prima, que vai desde a descoberta de novas jazidas ao repro‐
cessamento do combustível utilizado. G. A Contribuição do Brasil As pesquisas no campo da energia nuclear foram inicia‐
das no Brasil nos anos 1940, mesmo enfrentando reações adversas de diversas potencias econômicas da época, ale‐
gando uma possível utilização bélica da tecnologia nuclear. Atualmente o Brasil está entre os países que dominam todo o processo de produção de combustíveis para usinas nucleares e um dos três, ao lado dos Estados Unidos e Rús‐
sia que dominam o processo de enriquecimento. Outro ponto relevante são as jazidas identificadas de a‐
proximadamente de 300.000 toneladas de urânio e de um grande potencial para descoberta de novas jazidas. Conforme dados divulgados pela EPE – Empresa de Pes‐
quisa Energética, o planejamento energético para os pró‐
ximos anos busca alternativas para diversificação da matriz elétrica e dentre elas, a construção de 4 a 8 usinas nuclea‐
res num horizonte até 2030, localizadas no nordeste e no sudeste do país. IV. OS ASPECTOS SOCIOAMBIENTAIS Segurança das plantas em operação é essa a principal barreira à opção nuclear, aliado ao adequado descarte dos rejeitos radioativos, possibilidade de proliferação de armas nucleares, além dos elevados custos envolvidos. A. Risco de Acidentes Alguns acidentes graves ocorreram nas operações de u‐
sinas nucleares, como por exemplo, os ocorridos nas usinas de Chernobyl, Three Long Island e Sarov, entretanto contri‐
buíram de forma significativa para o aperfeiçoamento de uma nova geração de reatores nucleares. Nesses casos, os principais acidentes ocorreram com usinas de primeira e segunda geração. Angra II, por exemplo, uma usina de terceira geração já incorpora em seu reator tipo PWR um sistema de alimenta‐
ção através de varetas que compõem um elemento com‐
bustível, isso é utilizado para impedir a fusão das varetas e vazamento de material radioativo. Dessa forma o elemento combustível está localizado em reator fechado onde há a inserção de barras de controle feitas de uma liga de Cádmio que absorve nêutrons e pode parar a reação a qualquer momento. Este conjunto fica montado dentro de um vaso de pressão que, por sua vez, está inserido em uma estrutura de concreto reforçado com cerca de 5m de espessura de base que serve como uma segunda barreira de proteção. O conjunto está conectado a um circuito secundário de água, isolando o contado da água irradiada com a do gerador e por fim uma barreira de contenção que possui um volume maior que o dos vapores gerados para o caso de uma pos‐
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sível explosão do reator, além de servir como um escudo aos benefícios provenientes dessa tecnologia. Contudo as radiações nucleares são empregadas de mo‐
para ataques externos como terremotos e quedas de avi‐
do seguro, direta ou indiretamente, em diversas atividades ões. presentes em nosso cotidiano. Um exemplo é a utilização B. Resíduos das técnicas nucleares na cura ou prevenção do câncer de Uma solução definitiva para os rejeitos radioativos ainda milhões de pessoas. carece de solução, que quando associado ao risco de aci‐
Neste aspecto as resistências da sociedade e de grupos dentes se constituem nos elementos de segurança aos contrários a energia nuclear alertam para que o perigo dos quais se deve dispensar a maior atenção possível, pois se acidentes do passado voltem a acontecer, pois a ampliação constituem como os mais perigosos do processo de produ‐ das usinas termonucleares para a geração de energia elé‐
ção da energia. trica aumenta a probabilidade de acidentes e o volume de Entretanto, talvez o tratamento dos rejeitos radioativos resíduos que deverá ser estocado. seja o maior problema em relação à energia nuclear, pois O grande obstáculo está na forma de produção e geren‐
todos os atuais locais onde são armazenados os resíduos ciamento dos resíduos radioativos produzidos pelas usinas. nucleares são provisórios. Na França, por exemplo, onde 76 % das necessidades ener‐
Os rejeitos têm origem nas diversas fases do processo de géticas são supridas por usinas nucleares, a desaprovação manipulação de materiais nucleares, tanto daqueles oriun‐ da população com o gerenciamento de resíduos é de 55%. dos das usinas termonucleares quanto da fase de minera‐ E cerca de 80% da população européia acredita que não há ção e do reprocessamento do combustível nuclear na fase uma forma segura de descartar esses resíduos nucleares. final. O urânio não queimado e o plutônio formado são retira‐
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS dos dos produtos gerados na fissão nuclear. As normas da O número de projetos desenvolvidos pelos países tem Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) definem que crescido de forma alinhada com a demanda por energia esses resíduos são classificados de acordo com o nível de elétrica. A fome por energia do mundo necessita de respos‐
radioatividade: baixo, médio ou alta atividade. tas rápidas e de fontes menos poluentes, com isso, os paí‐
Mesmo estocados e monitorados permanecerão por um longo tempo como uma fonte de poluição e perigo em po‐ ses avaliam como uma forma de produção bastante prová‐
tencial. Dessa forma uma destinação incorreta ou vazamen‐ vel a energia nuclear. No aspecto ambiental e econômico energético existem to de resíduos radioativos provenientes das usinas nuclea‐
res ou os aparelhos de raios‐x, por exemplo, se caracteri‐ inúmeras vantagens, fazendo com que a energia nuclear zam pelo alto grau de periculosidade, podendo causar mu‐ apresente às melhores alternativas ao futuro energético. Dentre os pontos favoráveis destacam‐se as poucas danças nas estruturas das células. quantidades de emissões de gases de efeito estufa quando Comparativamente com o lixo produzido nas residências e nas indústrias o lixo radioativo apresenta um nível de comparados com a geração com base nas tradicionais usi‐
controle de poluição muito maior e mais rígido em relação nas a óleo e gás. Outros aspectos além da redução na emis‐
são do CO2 geradas durante todo o ciclo de produção são a a destinação e gerenciamento. Todo este cuidado deve‐se ao fato de que o lixo nuclear utilização de pequenas faixas territoriais, a independência possui a capacidade de permanecer ativo por milhares de da sazonalidade climática, pouco ou quase nenhum impac‐
anos, o que requer um monitoramento constante. Um e‐ to sobre a biosfera e as grandes quantidades de reservas de xemplo pragmático foi o do acidente ocorrido em Goiânia urânio existentes. Por outro lado, alguns dos principais entraves para a ex‐
com o Césio‐137. pansão da energia nuclear são: os resíduos radioativos ge‐
C. Riscos e Benefícios da Tecnologia Nuclear rados; a necessidade de isolamento da central após o seu O limiar entre a utilização da tecnologia pode ser usado encerramento do seu ciclo de vida; os altos custos para tanto para fins pacíficos quanto bélicos. O que não significa implantação de uma usina nuclear; e o estigma negativo um privilégio específico da tecnologia nuclear, ciências co‐ criado pela sociedade. mo a biologia, engenharia genética, nanotecnologia, ele‐
Para os próximos 40 anos os prognósticos relativos à e‐
trônica dentre outras também vivem esta dicotomia. Neste nergia nuclear apontam para uma tendência de forte cres‐
sentido uma visão para a melhoria da qualidade de vida da cimento. Previsões otimistas estimam que este crescimento população deve ser o norteador. possa ficar na faixa de 3 a 5 vezes em relação aos patama‐
As bombas lançadas em 1945 sobre as cidades japone‐ res atuais, chegando a valores de 1 a 1,5 TW. sas de Hiroshima e Nagasaki são exemplos de como o co‐
O Brasil, neste contexto terá papel importante, pois já se nhecimento científico pode ser usado de bastante pragmá‐ consolidou como um dos principais protagonistas e é um tica no sentido da força. Esse fato histórico fez com que a dos poucos países que dominam todo o processo de produ‐
energia nuclear se tornasse um estigma até hoje e obriga ção, além de possuir reservas significativas de urânio, tor‐
uma discussão ponderada no que diz respeito aos riscos e nando‐o auto‐suficiente no atendimento das demandas 6
atuais e futuras das suas usinas e para o fornecimento dos excedentes para outros países durante décadas. VI. REFERÊNCIAS [1] BRASIL‐ Eletronuclear, Panorama da energia nuclear no mundo, disponível em: http://www.eletronuclear.gov.br/pdf/panorama.pdf. Acessado em: 20/11/2010. [2] CNEM, Apostila Educativa Energia Nuclear, disponível em: http://www.cnen.gov.br/ensino/apostilas/energia.pdf. Acessado em 15/09/2010. [3] DEUTCH, J. M. & MONIZ, E. J. Energia de Fissão. Scienti‐
fic American Brasil, V.48, 47p, 2008. [4] GONÇALVES, O. D. A promissora potencialidade nucle‐
ar do Brasil. Scientific American Brasil, n 32(edição es‐
pecial), 22p, 2009. [5] IAEA, disponível em: www.iaea.org/NewsCenter/News/.../obninsk.html. [6] Acessado em 15/09/2010. [7] IAEA, Energy electricity and nuclear power estimates for the period up to 2030. [8] IAEA, Nuclear technology rewiew. [9] J. D. Lee, Química Inorgânica não tão Concisa, 5ª ed., Edgard Blucher Ltda., S. Paulo, 462‐477p, 2001. [10] MARTINS, J. B, História da Energia Nuclear, disponível em: www.cnen.gov.br. Acessado em 16/09/2010. [11] Relatório do Instituto Tecnológico de Massachusetts “The Future of Nuclear Power” disponível em: http://web.mit.edu/nuclearpower/pdf/nuclearpower‐
full.pdf. Acessado em 15/10/2010.