Um Complemento ao Memorando de Entendimento
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Um Complemento ao Memorando de Entendimento
Um Complemento ao Memorando de Entendimento: 35 Ideias para um Portugal Irreconhecivelmente Melhor Pedro G. Rodrigues1 Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) Universidade Técnica de Lisboa Versão 3.1 – 24 Junho 2011 Sumário A economia portuguesa enfrenta o maior desafio desde a sua adesão à CEE em 1986. Apesar do programa da Troika (FMI, BCE e Comissão Europeia) ser muito exigente, as suas medidas são apenas condições necessárias e não suficientes para nos tirar da crise. Este é essencialmente um programa de estabilização financeira; não é um modelo de desenvolvimento económico a adoptar. O que falta e que margem de manobra temos são as perguntas que motivam este artigo que pretende contribuir para um futuro Complemento ao Memorando de Entendimento. Fiel a oito princípios de base, são sugeridas várias medidas accionáveis, classificadas em cinco áreas de intervenção. 1 E-mail: [email protected]. Agradeço os comentários e contributos de João Catarino, Helena Monteiro, Patrícia Palma, Eduardo Lopes Rodrigues, Ana Romão e Mariana Abrantes de Sousa. Assumo a responsabilidade por todos os erros e omissões. “Quem quer algo encontrará sempre um caminho; quem não quer encontrará uma desculpa.” - Stephan Dolley Jr. Introdução Portugal vive um momento sem precedentes na sua história recente. Em virtude dos múltiplos erros de política económica cometidos e das várias oportunidades menos bem aproveitadas, particularmente desde a nossa adesão à área do euro, Portugal encontra-se hoje numa posição de menor soberania, uma posição que é a consequência natural de uma crise de dívida externa. Aparentemente sem margem de manobra, temos dois anos (ou menos) para o que não fomos capazes de fazer nos últimos dez. O tempo escasseia e, só por isso, é inútil e até contraproducente apurar agora de forma aprofundada as causas e os responsáveis pela situação difícil em que nos encontramos. Mas o Tempo encarregar-se-á disso. O recém-constituído Governo tem por missão concretizar, nos prazos estabelecidos, um ambicioso e vasto conjunto de medidas acordadas com a chamada Troika num Memorando de Entendimento. Para que todos entendam a escala do desafio que, como País, temos de superar, vale a pena recorrer a uma analogia futebolística. “Para seguir em frente, Portugal está obrigado a ganhar à Argentina, e tem de vencer por uma diferença de dois ou mais golos. Lionel Messi e Diego Milito estão em grande forma, enquanto Cristiano Ronaldo está lesionado e Fábio Coentrão está no banco, por castigo.” Nestas circunstâncias pode Portugal ganhar? Em futebol, como na vida, tudo é possível! Basta o sonho, a vontade, o empenho e, claro, um pouco de sorte à mistura. Mas se, objectivamente, a meta é “vencer à Argentina por uma diferença de dois ou mais golos”, para o conseguir é efectivamente preciso ter jogado melhor. Para vencer, é preciso convencer. Por este motivo, por mais exigentes que sejam as actuais obrigações de Portugal perante as instâncias internacionais (e são!), estas são apenas condições necessárias e não suficientes para uma recuperação económica que se deseja rápida e sustentável. Neste enquadramento, então, temos de nos perguntar: (i) “O que falta no Memorando de Entendimento?” e (ii) “Que margem de manobra temos?”. São precisamente estas as duas perguntas que motivam este artigo que visa apresentar algumas ideias para um futuro complemento ao Memorando de Entendimento. O Memorando de Entendimento efectivamente estabelece as bases de um programa de estabilização financeira com vista a restabelecer as condições mínimas para que Portugal volte a financiar-se directamente junto dos mercados. É o seu principal objectivo. Se bem que existam preocupações e medidas de natureza mais estrutural, estes são objectivos secundários. Em suma, não compete à Troika sugerir o modelo de desenvolvimento económico que devemos seguir. Quanto à segunda pergunta, o compromisso com a Troika estabelece como meta “ganhar à Argentina por uma diferença de pelo menos dois golos”, mas não nos podem dizer como 1 devemos jogar. É essa a nossa margem de manobra. Já não podemos discutir as metas que foram objecto de um acordo alargado, mas podemos discutir a melhor forma de os atingir. A flexibilidade na implementação do Memorando de Entendimento está na composição da política económica. Para dar um exemplo no âmbito da política orçamental, os objectivos intertemporais quanto aos grandes agregados das finanças públicas como o saldo orçamental e a dívida pública, medidos em percentagem do PIB, são neste momento indiscutíveis, mas isso não impede a escolha (algo condicionada, é verdade) entre uma variedade de políticas de despesa e de receita. Nos últimos tempos o Presidente da República tem apelado a uma participação mais activa da Sociedade Civil quer na discussão quer na determinação de possíveis soluções para os problemas que enfrentamos. Numa sociedade plural como a nossa, este é um processo a dinamizar dado que permite mais facilmente encontrar os caminhos que são social e politicamente mais sustentáveis. Sendo a Universidade um fórum privilegiado para analisar e sugerir caminhos alternativos à luz do conhecimento científico, é neste contexto que surge este artigo. Fazendo o ISCSP parte da Universidade Técnica de Lisboa, uma universidade pública que é financiada principalmente pelos contribuintes, o apelo do Presidente da República não poderia deixar de ser respondido. Em jeito de um contributo parcelar, este artigo apresenta algumas ideias para um futuro complemento ao Memorando de Entendimento. Não pretende, de todo, ser exaustivo. Apenas se identificam cinco áreas de intervenção nas quais se entende ser urgente agir. Sendo este um documento aberto à participação de todos, convidam-se desde já todos aqueles que queiram dar o seu contributo. Nesse sentido, o objectivo é dar o pontapé de saída para um processo mais abrangente e de maior envolvimento da Sociedade Civil. O resto do artigo está estruturado da seguinte forma. Nas próximas cinco secções são focadas as áreas de intervenção que foram escolhidas. A secção final encerra com algumas conclusões. Antes de entrar na primeira área de intervenção – Crescimento económico sustentável – vale a pena elencar os princípios que norteam as medidas que serão sugeridas. Entende-se que chegou o momento de rompermos com alguns comportamentos do passado. Assim, não só temos de ser mais exigentes e disciplinados, como precisamos de adoptar novas atitudes. Estão subjacentes às medidas detalhadas de seguida os seguintes princípios: 1. Maior credibilidade das instituições; 2. Melhor governação, com mais transparência e melhor prestação de contas; 3. Maior defesa do contribuinte e do consumidor; 4. Mais rigor na utilização dos recursos públicos e privados; 5. Melhor partilha do risco; 6. Mais solidariedade e maior cooperação entre todos os Portugueses; 7. Maior enfoque na competitividade internacional e no ajustamento externo; e ainda 8. Melhores incentivos para trabalhar, poupar e empreender. 2 I. CRESCIMENTO ECONÓMICO SUSTENTÁVEL Na primeira área de intervenção escolhida estabelece-se como objectivo: Criar as condições para uma convergência real acelerada, corrigindo os desequilíbrios macroeconómicos e valorizando a Portugalidade. O crescimento económico é uma condição sine qua non para o sucesso do programa de ajustamento económico e financeiro firmado pelo acordo tripartido. É assim porque, sem um crescimento robusto do PIB, será improvável conseguir a inversão da tendência insustentável de aumento do endividamento público em percentagem do PIB. Também, por maiores que sejam os cortes na despesa pública com vista ao equilíbrio das finanças públicas (e estes ajustamentos devem ocorrer preferencialmente do lado da despesa para que a correcção orçamental seja duradoura), sem crescimento económico as diversas bases fiscais encolherão ainda mais rapidamente, colocando Portugal sistematicamente em incumprimento quanto aos objectivos relativos ao saldo orçamental em percentagem do PIB. É necessário adoptar um novo modelo de desenvolvimento porque não é recomendável conseguir acelerar o crescimento económico em Portugal à custa do agravamento de desequilíbrios macroeconómicos, como é o caso do endividamento externo excessivo. Neste contexto, é urgente procurar medidas que estimulam o crescimento económico, mas de forma sustentável, i.e. de forma a poder continuar por tempo indeterminado. É difícil escolher os sectores que serão bem sucedidos na economia portuguesa no futuro. Por este motivo, é preferível criar as condições necessárias e melhorar o contexto para que os sectores líder possam emergir naturalmente. Neste domínio são determinantes, por exemplo, a estabilidade política, um bom sistema judicial, um sistema fiscal simples e previsível, uma Administração Pública mais leve e menos burocrática, uma força de trabalho qualificada, saudável e motivada, e ainda uma Sociedade Civil mais atenta e participativa. Nesta primeira área de intervenção são apresentadas nove ideias que visam criar as condições para uma convergência real acelerada em Portugal. Este é um desafio que, por si só, mereceria um artigo em separado. Nesse sentido, as recomendações que se seguem devem ser vistas como o ponto de partida para um debate decisivo e incontornável. As propostas que, de seguida, são apresentadas focam a obtenção de ganhos de competitividade através de incrementos na produtividade do trabalho, focam também a necessidade de desincentivar a aquisição, a crédito, de bens de consumo que são importados, e centram-se ainda no estímulo à poupança, e numa estratégia de desenvolvimento regional que atenua a tendência da desertificação rural, entre outras ideias. 3 I.1 Em sede de IRC, um crédito fiscal para o investimento em máquinas e equipamentos A Alemanha pode ser mais competitiva que Portugal na produção de determinado bem apesar de ter um custo total do trabalho por cada hora contratada mais elevado? Sim! Basta que em cada hora de trabalho o trabalhador alemão que é contratado produza um maior número de unidades desse bem do que o trabalhador português. Se assim for, os custos do trabalho por cada unidade produzida serão mais baixos na Alemanha do que em Portugal. Este fenómeno explica por que razão um país, como a Bélgica, com remunerações horárias brutas mais elevadas e uma taxa de contribuições patronais para a Segurança Social mais elevada possa ser preferido como o destino de um projecto de investimento directo estrangeiro. Os custos do trabalho por unidade produzida são uma medida de competitividade na produção de um determinado bem. Os chamados CTUPs são influenciados não apenas pelas remunerações brutas que são pagas ao empregado e pela taxa à qual os empregadores contribuem para a Segurança Social, mas são igualmente influenciados pela produtividade do trabalhador, i.e. pelo número de unidades produzidas em determinado período de tempo. Uma possibilidade (meramente teórica) de melhorar o índice de competitividade é baixar a remuneração bruta do trabalhador. Contudo, esta via não é recomendável, simplesmente porque muito provavelmente o trabalhador tornar-se-á menos produtivo, baixando assim efectivamente a competitividade. Outra possibilidade é baixar a taxa social única, i.e. a taxa à qual os empregadores contribuem para a Segurança Social. Uma terceira alternativa que não tem sido muito discutida no debate em Portugal sobre a competitividade é desenvolver políticas públicas com vista a aumentar a produtividade do trabalhador, i.e. criar as condições para que este produza um maior número de unidades desse bem por cada hora trabalhada. Tal como a redução da taxa social única, estas políticas públicas também precisam de ser financiadas. A grande diferença, contudo, é que sem um aumento da sua produtividade, o trabalhador não pode exigir nem esperar um aumento da sua remuneração em termos reais. A produtividade do trabalho pode ser aumentada de duas formas que, aliás, são complementares e reforçam-se uma à outra. A primeira forma é com mais e melhor capital humano, algo que será o enfoque da Medida II.4 mais adiante, referente à formação profissional. A outra forma de tornar o trabalhador mais produtivo é colocando à disposição de cada trabalhador mais bens de capital. Isso requer um investimento por parte das empresas em máquinas e equipamentos. É do conhecimento de todos que os nossos pares na UE são tipicamente mais produtivos que nós porque têm mais máquinas e equipamentos com que trabalhar. Neste enquadramento, propõe-se a atribuição, em sede de IRC, de um crédito fiscal para o investimento em máquinas e equipamentos (excepto veículos ligeiros) usados na actividade da empresa. Conclui-se, assim, que nem são os baixos salários que nos tornam mais competitivos, nem são os salários mais elevados um obstáculo à nossa competitividade. O que importa são os baixos 4 custos do trabalho por unidade produzida, algo que pode ser obtido com um aumento da produtividade de cada trabalhador. Entre a redução da Taxa Social Única e uma política pública que vise o aumento da produtividade, entende-se que a segunda alternativa é melhor porque dá mais garantias ao trabalhador de vir a beneficiar de um salário real mais elevado. I.2 Subsidiamento cruzado do crédito à actividade económica pelo crédito ao consumo Propõe-se que existam incentivos para que o crédito à actividade económica a taxas bonificadas seja compensado por taxas agravadas aplicadas ao crédito ao consumo. Trata-se de uma distorção virtuosa que o mercado de crédito em Portugal deve induzir. Sugere-se que o crédito bonificado financie preferencialmente as pequenas e médias empresas (PMEs), podendo também abranger as despesas inerentes a uma reorganização empresarial com vista a ganhos de eficiência, ao emparcelamento de terras agrícolas, ao investimento em máquinas e equipamentos, à formação profissional, e a projectos de investigação e desenvolvimento que impliquem num prazo muito curto a contratação de novos trabalhadores. I.3 Desagravamento fiscal da poupança dirigida ao desenvolvimento económico Português Com vista a atrair o capital necessário para financiar um crescimento económico mais rápido, propõe-se um desagravamento fiscal significativo dos rendimentos de capital resultantes da poupança privada canalizada para o Fundo de Desenvolvimento Luso (a constituir). I.4 Orientação da Caixa Geral de Depósitos como banco de fomento económico Propõe-se que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) não seja privatizada e que seja orientada para o fomento da actividade económica em Portugal. Isso implica que, quando solicitada, a CGD poderá prestar apoio técnico, logístico e jurídico às PMEs e ainda auxiliar o planeamento estratégico, assim como mediar as actividades de fusões e aquisições, com vista a que o maior número possível de PMEs venham a ser cotadas na bolsa de valores. Vale a pena estudar o exemplo do banco KfW na Alemanha. No futuro, a Caixa Geral de Depósitos poderia adoptar as mesmas valências. I.5 Profunda reorganização de processos, aproveitando o potencial das TICs O tempo é talvez o recurso mais valioso que temos. E se não for adequadamente rentabilizado, seremos forçados a trabalhar mais horas para obter o mesmo resultado, com prejuízos 5 evidentes para o nosso lazer, a nossa vida pessoal e familiar, e até para a produtividade do país. Assim, o lema a adoptar deverá ser “trabalho mais eficaz, e não trabalho com maior esforço” (work smarter, not harder). Propõe-se que todas as organizações repensem os seus processos internos e, sempre que tal seja proveitoso, implementem as tecnologias de informação e de comunicação (TICs) onde forem mais adequadas. O objectivo deverá ser a simplificação do workflow para garantir que a informação circule para onde deve ir, sem perdas de tempo. I.6 Redesenho do sistema judicial Português O arcaísmo e a ineficácia do sistema judicial Português é um assunto complexo. A excessiva morosidade, o sentimento de impunidade, e o desigual acesso à Justiça são as queixas de muitos cidadãos. Este Complemento ao Memorando de Entendimento apenas considera a importância do sistema judicial para o crescimento económico em Portugal. Existem, obviamente, outras vertentes sobre os quais importa reflectir, com destaque natural para a equidade e a igualdade de acesso à Justiça. Contudo, uma análise mais abrangente e aprofundada está fora do âmbito deste documento. O bom funcionamento de um sistema económico depende de um sistema judicial eficaz e eficiente. Nesta relação, são inúmeros os factores determinantes, desde a defesa dos direitos de propriedade, a aplicação dos contratos e o cumprimento dos prazos de pagamento, até ao combate ao crime e à corrupção, passando também pela promoção indirecta da meritocracia. Na taxonomia dos problemas que afligem a Justiça em Portugal, salientam-se duas classes: uma que diz respeito ao desenho do sistema, e outra relativa aos incentivos. Analisa-se, de seguida, cada classe de problemas. É uma característica do sistema judicial Português o facto de dar mais importância aos chamados “erro tipo I” do que aos “erros tipo II”. Um erro tipo I ocorre sempre que se condena um inocente. Um erro tipo II acontece sempre que não se condena um culpado. Neste contexto, propõe-se um redesenho jurídico com o objectivo de dar igual importância aos dois tipos de erros. A outra classe de problemas diz respeito aos incentivos. Há coimas e penas que são demasiado leves, dada a probabilidade de ser apanhado e dada a possibilidade de “empatar” durante algum tempo uma decisão final nos tribunais. A prevaricação e a violação da Lei não podem ser a decisão óptima, em valor esperado, para um agente racional, i.e. para um cidadão ou uma empresa que, sabendo a probabilidade de ser apanhado, optam por violar a Lei porque assim os benefícios esperados são maiores que os custos esperados. Neste contexto, propõe-se uma revisão de todas as coimas e penas. Ainda a respeito dos incentivos, o direito ao recurso deve, obviamente, ser salvaguardado, mas os atrasos nos processos deverão ter reflexo nas indemnizações finais, de forma a incentivar 6 quer um andamento mais rápido quer uma resolução entre as partes litigantes fora do circuito dos tribunais. Por fim, no contexto da prescrição das dívidas ao Fisco, propõe-se que a dotação orçamental destinada à Justiça seja condicionada positiva e negativamente à recuperação efectiva dos montantes em dívida. I.7 Uma rede de reguladores sectoriais, em melhor articulação com a Comissão Europeia Uma política de regulação eficaz que garante a concorrência é um elemento fundamental para um crescimento económico saudável. Neste sentido, propõe-se estabelecer uma rede de reguladores sectoriais centrada num regulador transversal a toda a economia e, de seguida, optimizar a sua articulação com a Comissão Europeia. I.8 A generalização de uma atitude 5P Este complemento ao Memorando de Entendimento estaria incompleto se não incluisse pelo menos uma sugestão na área comportamental. O facto de não se poder enquadrar na carteira de medidas de um Governo não diminui, de todo, a importância de consciencializar os Portugueses a adoptarem uma nova atitude perante os seus problemas, valorizando objectivamente o que há de bom em Portugal e o que há a mudar. Este é um processo que leva tempo. Mas é cada vez mais determinante salientar que nem tudo o que vem do estrangeiro deve ser transposto cegamente à realidade Portuguesa, sem as devidas adaptações ao terreno. A Portugalidade é um valor a preservar, mas não deve ser a desculpa para não evoluirmos. Neste contexto, sugerem-se cinco afinações a fazer, adoptando assim o que se designa por uma atitude 5P: Maior proactividade; Maior participação; Maior pragmatismo; Maior pontualidade; e Maior Portugalidade. I.9 O programa “Alimentar, Vestir, e Mobilar” como estratégia de desenvolvimento regional Apesar de reconhecer, como princípio, que é difícil escolher os sectores que, no futuro, virão a ser os motores da economia Portuguesa, sugere-se, como estratégia de desenvolvimento regional o programa “Alimentar, Vestir, e Mobilar”. 7 Este programa alicerça-se em três pilares: (i) a predilecção mundialmente reconhecida dos Portugueses pela sua gastronomia e uma alimentação de qualidade, assim como pelo vestuário, calçado, mobiliário e artigos de casa de bom gosto, (ii) o aproveitamento dos recursos naturais em Portugal, com particular destaque para o Alqueva e para as florestas; e (iii) a projecção da Portugalidade como marca internacional, que merece um tributo à sua altura. Esta é uma estratégia de desenvolvimento do território nacional não urbano que visa não só contrariar o processo de desertificação rural em curso, como também promover maior solidariedade entre regiões, algo que poderá ser conseguido dada a elevada complementariedade dos bens a produzir. Vale a pena reconhecer que beneficiarão também desta estratégia de desenvolvimento, algumas directa outros indirectamente, as actividades do design, do turismo, da construção civil, da moda, do têxtil e, também, do comércio. Naturalmente, a concretização no terreno deste programa poderá exigir a negociação com as instâncias da União Europeia. Contudo, entende-se que é preferível para a imagem de Portugal no exterior sentar-se à mesa por este motivo do que pela obrigação de restruturar a dívida. “Os bons hábitos formados enquanto jovem fazem toda a diferença.” - Aristóteles II. RECURSOS HUMANOS Na segunda área de intervenção escolhida estabelece-se como objectivo: Uma maior qualificação e especialização dos recursos humanos. No quadro da globalização, a competitividade da economia portuguesa depende crucialmente do aumento da produtividade dos seus trabalhadores. Neste contexto, só uma crescente qualificação e especialização podem assegurar essa condição de sobrevivência. De seguida são feitas cinco recomendações, com um espectro de incidência bastante alargado. Estas sugestões têm como objectivo principal equipar as sucessivas gerações de Portugueses com “asas” para que possam “voar” mais alto e mais longe. Para tal propõe-se uma reorganização do currículo do ensino básico, uma antecipação das escolhas vocacionais, uma aproximação dos universitários à vida activa, benefícios fiscais para a formação profissional, e ainda um melhor aproveitamento das potencialidades dos sobredotados. 8 II.1 Um currículo do ensino básico que privilegia a Portugalidade, a ciência e a criatividade Propõe-se uma revisão curricular do ensino básico, com vista a dar ao aluno a “vontade de voar”. Este novo currículo deve procurar cultivar as sete formas de inteligência (verbal, lógicomatemática, musical, espacial, cinestésica, intrapessoal e interpessoal), com vista ao desenvolvimento humano em pleno e à sua maior empregabilidade no futuro. Os programas educativos devem assentar em três pilares. No primeiro pilar que assenta no conceito de Portugalidade, procura-se desenvolver o raciocínio verbal através do reforço da língua portuguesa, nas vertentes oral e escrita, valorizando a cultura portuguesa e reforçando um sentido de pertença a uma Comunidade Lusófona. No segundo pilar que assenta na Ciência, procura-se desenvolver o raciocínio lógico através do reforço da matemática e das tecnologias de informação e de comunicação (TICs), apresentando-as como instrumentos ou ferramentas para a descoberta da Ciência. A proactividade, a engenhosidade, o trabalho em equipa e a capacidade de resolução de problemas devem ser encorajados. No terceiro e último pilar que assenta na Criatividade, procura-se desenvolver a individualidade, a imaginação e a auto-estima do aluno. Um currículo do ensino básico organizado em torno destes três pilares formará melhor os recursos humanos de que Portugal precisa para o resto deste século. Quanto aos conteúdos dos programas educativos, recomenda-se um reforço das matérias com mais interesse para o dia-a-dia dos cidadãos, focando na boa nutrição, na literacia economico-financeira, e na cidadania, por exemplo. Quanto aos métodos de ensino, recomenda-se que os métodos clássicos sejam significativamente complementados por métodos inovadores, recorrendo por exemplo a jogos e a sessões de debate entre os alunos. II.2 Uma antecipação das escolhas vocacionais para o 7.º ano de escolaridade Depois do ensino básico ter dado ao aluno a “vontade de voar”, o ensino secundário deve equipá-lo com as “asas”. Propõe-se que as escolhas vocacionais decorram no 7.º ano para permitir ao aluno, como acontece noutros países (como por exemplo na Alemanha), definir mais cedo os seus objectivos de carreira e treinar as suas aptidões com vista a um desempenho de excelência. Sendo a especialização a alavanca do crescimento económico, a antecipação das escolhas vocacionais será não apenas uma fonte de direcção e de motivação para os jovens, como também será uma oportunidade para o País aproveitar o quanto antes as competências profissionais nas mais diversas áreas. II.3 Uma maior aproximação à vida activa no ensino pós-secundário Propõe-se que a partir do segundo ano do ensino superior (universitário ou politécnico) os alunos que ainda não trabalham participem em projectos da iniciativa de entidades públicas ou privadas. Esta participação não deve ser remunerada porque não é um estágio, e deve ocorrer em simultâneo com a actividade lectiva, com créditos que contam para o curso. 9 II.4 A concessão de benefícios fiscais em sede de IRC e de IRS para formação profissional As acções de formação profissional, devidamente certificadas, que forem propostas pela entidade empregadora e que forem aceites pelo empregado devem permitir a ambos, até determinado limite, beneficiar de um desagravamento fiscal no ano seguinte. Em ambos os casos, o benefício fiscal em sede de IRC e em sede de IRS apenas deverá incidir sobre a variação, de um ano para outro, do volume de negócios e do rendimento bruto (categoria A ou B), respectivamente, desde que a variação seja positiva. II.5 A criação de polos universitários para a interacção entre sobredotados Numa economia que assenta cada vez mais no conhecimento, os sobredotados são uma franja crucial dos recursos humanos em quem vale a pena investir. São os indivíduos que, com maior probabilidade, poderão ajudar a criar bens e serviços de elevado valor acrescentado. Se desapoiados e desmotivados, são também aqueles que mais facilmente emigrarão. Nenhum país, e Portugal muito menos, deverá ficar satisfeito com a perda de um recurso tão importante quanto este. Assim, à semelhança do que já existe noutros países, propõe-se que junto das Universidades sejam criados polos de interacção entre sobredotados. Os critérios de elegibilidade deverão ser os que são internacionalmente aceites pelos profissionais da psicologia. O objectivo destes polos é criar um espaço onde, nos seus tempos livres, o sobredotado possa interagir quer com docentes e investigadores universitários quer com outros sobredotados que partilhem os mesmos interesses. III. FISCALIDADE, FINANÇAS PÚBLICAS E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Na terceira área de intervenção escolhida fixam-se como objectivos: • • • Garantir um financiamento sustentável da despesa pública, com as menores distorções para a economia, e da forma mais equitativa possível; Usar a racionalidade económica para limitar os projectos públicos com encargos intergeracionais muito significativos; e Generalizar a todo o Sector Público Alargado a orçamentação e a gestão orientadas para o desempenho. 10 Nesta secção dedicada essencialmente à política orçamental são apresentadas ao todo doze ideias, cinco no âmbito da fiscalidade, cinco no âmbito das finanças públicas, e finalmente duas ideias para uma melhor gestão dos recursos humanos da Administração Pública. III.1 Simplificação e estabilização das normas fiscais Para muitos cidadãos a interacção com a Administração Tributária custa-lhes quase tanto quanto os impostos que têm de pagar. Não obstante o progresso do Fisco nos últimos anos adoptando processos inovadores como as declarações electrónicas que ajudam a aliviar o cumprimento fiscal, a crescente complexidade do articulado da Lei e as sucessivas alterações à mesma criam situações difíceis de gerir até para um jurista da especialidade, e muito mais para o cidadão comum. Neste contexto, é imperativo que as normas fiscais sejam mais simples e que sejam mais estáveis ao longo do tempo. Uma legislação avulsa e cumulativa como a que temos resulta muitas vezes ou das cedências de um Governo a grupos de pressão, ou das melhores intenções por parte do Legislador. Contudo, como os agentes económicos ajustam sempre o seu comportamento face a uma alteração fiscal, os resultados acabam por ficar aquém ou são mesmo contrários ao que o Legislador pretendeu inicialmente. Para além do desperdício de recursos associado aos custos (técnicos, administrativos e de pessoal) para acompanhar e manter uma máquina fiscal demasiado complexa, uma legislação opaca e difícil de interpretar não só aumenta os custos de contexto e de cumprimento dos cidadãos e das empresas, como induz um resultado menos equitativo do ponto de vista social, dado que são os agentes económicos com mais recursos que contratam contabilistas e outros profissionais da fiscalidade para aproveitar a complexidade da Lei para minimizar o imposto a pagar. Quanto à importância da estabilidade das normas fiscais ao longo do tempo, esta prende-se não só com uma maior previsibilidade, minimizando assim os custos de aprendizagem e de conhecimento de como funciona o sistema fiscal, mas prende-se também com uma redução das distorções sobre a economia. Como a carga excedente associada a um imposto é proporcional ao quadrado da taxa, variações da mesma ao longo do tempo, mesmo preservando a sua média, induzem maiores perdas de bem estar do que mantendo inalterada a taxa. Este é um motivo suficientemente importante para justificar, sempre que possível, a estabilidade das normas fiscais ao longo do tempo. III.2 Alargamento das bases fiscais Uma receita fiscal resulta da aplicação de uma taxa estatutária a uma base fiscal, devidamente ajustada de isenções e excepções, e posteriormente corrigida de deduções à colecta. Assim, conclui-se que, para aumentar a receita fiscal ou se aumentam as taxas estatutárias, ou se 11 reduzem os benefícios fiscais. A segunda alternativa é conhecida como o alargamento da base fiscal. Há uns anos o alargamento da base fiscal foi defendido com um argumento de equidade: “Se todos pagarem, todos pagam menos”. A ideia é que se deve prosseguir o combate à fraude e fuga fiscais para que todos os contribuintes que já pagam impostos possam pagar um pouco menos. É portanto um argumento de justiça social. Contudo, há também um argumento de eficiência. Na circunstância em que é necessário aumentar a receita fiscal, é mais eficiente alargar a base (reduzindo benefícios fiscais) do que aumentar as taxas. É assim porque a carga excedente, i.e. a distorção sobre a economia criada pelo imposto, é proporcional ao quadrado da taxa. Vale também a pena relembrar que, num contexto de consolidação orçamental onde a despesa primária está sob forte contenção, poderá haver a tentação de aumentar a despesa fiscal como solução alternativa. É assim porque a despesa fiscal (i.e., a receita fiscal que o Estado deixa de receber por ter concedido um benefício fiscal) não está sujeita ao mesmo escrutínio e controlo que se aplica à despesa pública no geral. Assim, propõe-se um significativo alargamento de todas as bases fiscais através de uma revisão de todos os benefícios fiscais (incluindo isenções e exclusões). A título de exemplo do potencial para o alargamento da base, relembra-se que 80% da receita efectiva de IRS é por conta das categorias A e H (remunerações por conta de outrem e pensões). As restantes categorias parecem estar algo sub-representadas. A proposta de revisão de todos os benefícios fiscais não implica que deixem de existir. Apenas se recomenda que sejam limitados aos casos em que há forte evidência a sugerir que um desagravamento fiscal pode induzir um bom comportamento por parte do agente económico. Por exemplo, não parece despropositado a existência de benefícios fiscais para incentivar os dadores de sangue com tipos mais raros, ou haver um desagravamento fiscal proporcional à pegada de carbono que for compensada. III.3 Eliminação das taxas reduzidas do IVA, acompanhada por uma menor retenção na fonte Esta medida tem três partes que são indissociáveis. Propõe-se primeiro eliminar as duas taxas reduzidas de IVA (actualmente nos 6% e 13%), de seguida manter a taxa geral de IVA em 23%, e por fim desagravar a retenção na fonte em sede de IRS em €30 por mês, por cada membro do agregado familiar. Uma taxa única de IVA permite pôr fim a inúmeras distorções de mercado que existem. A situação actual em que certos bens são tributados a uma taxa de IVA mais baixa faz com que, em termos relativos, o consumidor tenda a optar mais por eles em desfavor dos bens tributados a uma taxa mais elevada. Esta distorção causa-lhe uma perda de bem-estar ou de utilidade porque o consumidor não leva o cabaz que levaria se a carga tributária fosse indiscriminada. Uma situação livre destas distorções de mercado teria também a vantagem de promover uma afectação mais eficiente de recursos na economia. Por exemplo, o facto do 12 vinho estar sujeito à taxa mínima de 6% induz a sobre-utilização de terras no Alentejo para este fim, que poderiam ter um uso alternativo economicamente mais rentável para a sociedade. A manutenção da taxa geral do IVA em 23% permite desincentivar o consumo (incentivando assim a poupança) e permite que o esforço do ajustamento orçamental com vista a equilibrar as finanças públicas seja suportado por todos e não apenas por pensionistas ou por funcionários públicos, como seria o caso se, em alternativa, se procedesse a mais um corte nas pensões e ou nas remunerações ilíquidas. Segundo a teoria económica, quanto mais alargada for a base de incidência fiscal, menores serão as perdas de bem-estar associadas. Neste contexto, é portanto recomendável, quer para promover uma maior equidade quer uma maior eficiência, que o ajustamento orçamental que é necessário fazer seja distribuído pelo maior número possível de agentes económicos. A última parte da medida III.3 – que prevê um pequeno desagravamento do IRS – visa tornar progressiva a eliminação das taxas reduzidas de IVA. Assim, um aumento da taxa média do IVA que resulta da uniformização não tem de ser regressiva. Nesse caso, os agentes económicos com maior rendimento pagarão uma taxa efectiva de imposto sobre o consumo que é, de facto, mais elevada. Calcula-se que os €30 mensais por cada membro do agregado familiar que se propõe atribuir sejam suficientes para compensar o agravamento das despesas de consumo de uma família da classe média. Um agregado familiar numa situação económica mais desfavorável beneficiaria desta medida. Por fim, vale a pena também destacar que, como se propõe que o desagravamento da retenção na fonte apenas se aplique aos rendimentos do trabalho e às pensões, esta medida faz com que quem viva de outros rendimentos que não estes acabe por pagar mais em impostos. No actual contexto de crise orçamental em que nos encontramos e onde, por sugestão do Presidente da República, a sociedade deve procurar minimizar o esforço pedido às pessoas em pior situação económica, esta medida afigura-se como socialmente justa, premiando quem, com o seu trabalho, contribui (ou já contribuiu) para a sociedade. III.4 Isenção de IRS aos cidadãos portadores de uma deficiência de pelo menos 70% Propõe-se isentar de IRS os rendimentos brutos anuais até cem vezes o valor do Indexante de Apoios Sociais (IAS), i.e. cerca de €42 000 em 2011, de que são titulares os cidadãos com deficiência medicamente comprovada igual ou superior a 70%. Entende-se que é imoral e de uma profunda injustiça social sujeitar a este imposto os cidadãos que, por razões que lhe são totalmente alheias, já sobrevivem muito condicionados. III.5 Desincentivo fiscal ao crédito pessoal e uma redução mais rápida do valor em dívida É urgente reduzir rápida e substancialmente o endividamento das famílias, em especial no segmento do crédito pessoal. 13 Neste contexto, propõe-se o agravamento muito significativo do imposto de selo que incide sobre a utilização do crédito pessoal, e ainda, o aumento do valor mínimo a pagar em cada mês para 20% do saldo devedor. III.6 Um maior equilíbrio entre a Administração Central e a Administração Local Propõe-se uma redução da dimensão global do Estado, reforçando a Administração Local. Com vista a concretizar uma política de maior proximidade das populações e mais orientada para as suas necessidades, recomenda-se uma forte recomposição da despesa pública com uma transferência gradual de algumas responsabilidades do Estado para as autarquias. No caso dos bens públicos cuja incidência geográfica transcende os limites de uma determinada autarquia (os chamados club goods), sugere-se a concertação entre municípios. Estes acordos intermunicipais já são uma realidade em certas áreas de intervenção. Sugere-se, ainda, a revisão da Lei de Finanças Locais, com vista a a) garantir as fontes de financiamento para as novas responsabilidades a atribuir, b) estabelecer as normas para uma orçamentação orientada para o desempenho, e c) adequar as restrições sobre a capacidade do poder local contrair nova dívida às possibilidades economico-financeiras do País. III.7 Implementação alargada da orçamentação e gestão orientadas para o desempenho Propõe-se que seja generalizada a todas a entidades do Sector Público Alargado, sem excepção (mas com as devidas adaptações, sempre que necessário), os princípios da orçamentação e gestão orientadas para o desempenho, em conformidade com as boas práticas identificadas por exemplo pela OCDE. Esta reforma do quadro de financiamento e de prestação de contas das entidades públicas requer que a dotação orçamental para o ano seguinte seja em grande parte condicionada pelo desempenho recente, se não puder ser justificado convincentemente um mau desempenho. Esta medida pressupõe, também, a adopção do princípio da plurianualidade, estabelecendo objectivos e metas para cada um dos anos seguintes, num quadro macroeconómico credível e realista. III.8 Acompanhamento regular dos serviços partilhados na Administração Pública Os serviços partilhados (shared services) já permitiram na Administração Pública uma redução quer de estruturas quer de processos redundantes, que passaram a ser executados de forma mais profissional e a um custo médio por operação mais baixo. Contudo, com vista a acautelar eventuais riscos quanto ao desempenho, recomenda-se um acompanhamento regular e avaliações pontuais para garantir a continuidade e qualidade dos serviços prestados. 14 III.9 Aplicação da Lei que limita os compromissos assumidos com parcerias público-privadas A actual inexistência de limites orçamentais, ano a ano, referentes aos encargos com as parcerias público-privadas (PPP), e o facto de que escapam efectivamente ao ciclo de controlo orçamental, induz a opção por PPPs vis-à-vis empreitadas. A consequência desta situação é um aumento tendencialmente insustentável do endividamento externo do país, com reflexos no rating da República. Propõe-se assim que seja aplicada, na íntegra, a alínea L do Artigo 31.º da Lei de Enquadramento Orçamental (LEO, Lei N.º 22/2011 de 20 de Maio), que determina limites máximos aos compromissos a assumir com contratos de parceria entre o sector público e o sector privado. O cumprimento desta alínea visa acautelar os riscos macroeconómicos e para as finanças públicas decorrentes dos contratos PPP. Defende-se, ainda, a equiparação de todos os contratos de concessão e subconcessão (incluindo as municipais) para efeitos do enquadramento orçamental ao abrigo do Artigo 31.º da LEO, porque o que interessa são os encargos totais, independentemente do subsector onde existem e da forma que assumem. A bem da transparência e da prestação de contas, propõe-se também que seja preparado um plano estratégico de projectos PPP, revisto anualmente, a ser aprovado em Conselho de Ministros e posteriormente submetido à Assembleia da República. Neste plano estratégico define-se e implementa-se um quadro plurianual de despesa onde estão inscritos os encargos orçamentais futuros, ano a ano e projecto a projecto. Este instrumento é vital para poder garantir o alisamento dos encargos totais do plano pelos vários orçamentos anuais. III.10 Melhor acompanhamento pelo Estado dos contratos de parceria público-privada Com o intuito de promover a boa governação das parcerias público-privadas (PPPs) e um maior escrutínio dos compromissos plurianuais de despesa que lhe estão associados, propõe-se um novo quadro institucional. Em concreto, propõe-se que o Ministério das Finanças se articule melhor com as tutelas sectoriais, com vista a implementar um novo modelo de gestão integrada dos contratos PPP. Sugere-se a criação de uma Agência de PPPs com os mesmos poderes neste domínio que o Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público (IGCP) tem na dívida pública. Assim, recomenda-se a adopção ou reforço das seguintes competências: No âmbito de uma política de investimento público mais selectiva, priorizar os projectos públicos e limitar aqueles com encargos intergeracionais muito significativos, privilegiando assim os projectos com maior bancabilidade e em que existe um consenso público estável e alargado sobre a sua desejabilidade;2 2 Para priorizar os diferentes projectos públicos em carteira recomenda-se uma análise à contabilidade geracional dos mesmos. 15 Aplicar o Comparador do Sector Público para que a opção pelo regime PPP (em alternativa à empreitada) apenas ocorra quando se comprovam ganhos de eficiência por recorrer ao sector privado; No contexto da repartição óptima dos vários riscos entre os parceiros de um determinado projecto PPP, elaborar um plano de gestão dos riscos para o concedente (i.e. o Estado) em cada contrato e construir uma matriz dos riscos onde se estima o impacto financeiro dos mesmos;3 Gerir a carteira de projectos em todas as fases e garantir que os projectos estão cadenciados de forma mais apropriada, em função das condições do mercado em cada momento; Obrigar os organismos da Administração Pública com responsabilidade de serviço público a acompanhar regular e sistematicamente as cláusulas de desempenho dos contratos de concessão; e ainda Revisitar cada um dos contratos PPP em vigor, com vista a escrutinar a legalidade quer das adjudicações quer das renegociações e ainda com vista a garantir o bom Value for Money na óptica do contribuinte, ao longo de todo o contrato. Vale a pena salientar que há uma muito significativa assimetria de informação e de organização entre os parceiros (público e privados) que resulta da inexistência de uma base de dados do concedente com o registo sistematizado dos elementos de cada processo, o que invalida um acompanhamento e controlo efectivos. Assim, com vista a conservar uma memória institucional de todos os processos, sugere-se que seja criada uma base de dados única sobre todos os concursos e os contratos. Recomenda-se, também, adaptar de forma mais adequada os sistemas de informação de suporte às decisões e à posterior monitorização. Finalmente, para além dos sistemas de informação é crucial ter um equipa profissional e estável, com comprovada experiência na (re)negociação de grandes projectos, na interacção com os mercados de capitais, e na avaliação de projectos de investimento segundo critérios pré-definidos. O actual funcionamento das comissões nomeadas é criticável, pois são nominativas, temporárias, têm demasiada rotação e os negociadores escolhidos são menos experientes que os seus pares do sector privado, com um grave prejuízo para os interesses do Estado- 3 Com o objectivo de, no futuro, evitar situações como as novas super-SCUT, onde o concedente (i.e. o Estado) paga em função da “disponibilidade” do serviço, deve-se assegurar que o concessionário tem o incentivo de validar as previsões de tráfego e assim adequar a oferta à procura projectada. 16 Concedente, uma vez que dificilmente se replicam as boas práticas e facilmente se repetem os mesmos erros. III.11 Uma simplificação da mobilidade na Administração Pública Ao longo dos próximos anos, em virtude do quadro de consolidação orçamental, o crescimento do emprego no sector público continuará fortemente condicionado. Como tal, é indispensável promover o uso mais eficiente dos recursos humanos à disposição das entidades públicas, em função das competências de cada um. Com vista a dotar a Administração Local dos meios humanos de que necessita, no âmbito do ponto I.2 já apresentado, referente a um maior equilíbrio entre a Administração Central e a Administração Local, propõe-se uma simplificação do regime de mobilidade. Vale a pena também salientar que, enquanto não for possível abrir novos concursos na Administração Pública, os trabalhadores que se encontram actualmente em mobilidade devem poder continuar nesse regime por tempo indeterminado. III.12 Permitir a acumulação de rendimentos na Administração Pública, sem prejuízo do desempenho Enquanto as progressões de carreira estiverem congeladas na Administração Pública, e enquanto subsistirem os cortes nominais quer nas remunerações quer nas pensões, recomenda-se que seja também suspensa a dedicação em exclusividade e que seja permitida a acumulação de outros rendimentos. Esta medida visa permitir aos trabalhadores e pensionistas que assim o desejarem procurar outras fontes de rendimento, tanto no sector privado como no sector público, com vista a complementar o montante em falta. Por exemplo, existem muitos aposentados da Administração Pública que só não leccionam porque o regime actual lhes é desfavorável. Esta situação consubstancia um desperdício da experiência adquirida ao longo de décadas que deverá ser aproveitada. Vale a pena salientar que a subsistência do actual regime que não permite a acumulação de rendimentos reduz a base fiscal efectiva em sede de IRS. Dito de outra forma, há receita de IRS que poderia ser cobrada e não o é, simplesmente porque a acumulação de rendimentos não é permitida. Contudo, a permissão de acumular rendimentos só deve ser concedida enquanto o desempenho do trabalhador nas suas actuais funções não for negativamente afectado pela acumulação. Esta condição visa salvaguardar a qualidade do serviço prestado aos cidadãos. 17 IV. POLÍTICAS SOCIAIS Na quarta área de intervenção escolhida estabelece-se como objectivo: Ganhos de saúde e de protecção social, ao menor custo para a economia. Com vista a reforçar a protecção social dos Portugueses, num quadro de consolidação orçamental e de ajustamento economico-financeiro, apresentam-se de seguida mais cinco propostas. O que têm em comum é procurar garantir que existirão sempre recursos suficientes para os que mais necessidades de protecção social têm, quer no presente, quer no futuro. Nesse sentido, torna-se indispensável optimizar processos, racionalizar a despesa pública e atenuar riscos. IV.1 Reafectação de recursos para quem mais precisa, através de um sistema de créditos Diz-se frequentemente que a saúde tem custos mas (praticamente) não tem preço. O problema da saúde em Portugal é que quem dela usufrui não enfrenta, na prática, nenhuma restrição orçamental que lhe sinaliza a escassez dos recursos utilizados. O preço ao qual é disponibilizado ao utente um acto médico, um meio complementar de diagnóstico, uma terapêutica ou um medicamento é uma fracção do seu custo para o erário público. Para contornar este problema, sem impôr a cada utente que pague a totalidade do custo associado, propõe-se que cada cidadão disponha de um cartão electrónico pre-carregado com um determinado número de créditos. O reforço deste cartão electrónico poderá ocorrer em duas circunstâncias distintas: (i) pela aplicação de uma condição de recursos, e (ii) pela aplicação dos princípios da prática médica baseada na evidência (evidence-based medicine). A primeira circunstância tem como objectivo a diferenciação positiva, dando mais recursos a quem é mais pobre. A segunda circunstância garante a minimização do desperdício e a salvaguarda de recursos para os casos que, do ponto de vista médico, são mais urgentes, sem que isso tenha impacto no tratamento adequado a cada doente. Por exemplo, um utente com determinada doença crónica precisa de um determinado tratamento, cuja frequência e duração deverão ser definidos em função de padrões científicos. Este sistema de créditos poderá ser alargado a toda a política social, aplicando-se não apenas na saúde mas também na assistência social e nos cuidados a idosos. A vantagem é que cada cidadão ao longo da sua vida gere, por si, um determinado número de créditos. Isto implementa efectivamente uma restrição orçamental e desincentiva a fraude que hoje se verifica quando, por exemplo, um idoso com baixos rendimentos pede medicamentos que são para um seu familiar, apenas para beneficiar de uma maior comparticipação do erário público. 18 O actual sistema não só é insustentável finaceiramente, como é profundamente injusto uma vez que permite a redistribuição de recursos para quem, tendo possibilidades e devendo pagar mais, não o faz. IV.2 Extinção dos subsistemas públicos de saúde, excepto para forças militares e policiais Recomenda-se a extinção de todos os subsistemas públicos de saúde, à excepção dos subsistemas dedicados às forças militares e policiais, para determinados actos médicos directamente relacionados com a sua actividade. Deverão ser excluídos desses subsistemas especiais de saúde os familiares dos mesmos, uma vez que não exercem a mesma actividade. Esta medida visa acabar com a discriminação efectiva dos cidadãos em função do seu empregador. IV.3 Maior segurança rodoviária, através de um sistema de pontos A sinistralidade rodoviária tem um custo muito significativo para as famílias afectadas, para o contribuinte que é obrigado a financiar um risco que é, em parte, evitável, e também para a economia, uma vez que se reflecte em horas de trabalho, estudo e lazer que deixam de ser realizadas. Propõe-se que a uma carta de condução esteja associada um determinado número de pontos sendo que o titular da mesma perde pontos com transgressões graves. Na eventualidade do condutor já não ter um número mínimo de pontos para poder circular, tem de voltar a tirar a carta. Recomenda-se que seja possível o reforço do número de pontos através de iniciativas como a formação em condução defensiva, não ter registado nenhuma acidente rodoviário há pelo menos cinco anos, não ter acusado álcool no sangue numa operação stop, etc. Um sistema assim premiaria o bom comportamento e desincentivaria a irresponsabilidade. IV.4 Transformação dos Certificados de Reforma num verdadeiro PPR público Nas próximas décadas, muito provavelmente, a componente por repartição (pay-as-you-go) do sistema público de pensões português será insuficiente para ir ao encontro quer das expectativas dos Portugueses quer das suas necessidades na reforma. Neste contexto defende-se o complemento de pensão por capitalização. Contudo, contrariamente à opinião pública, esta solução não requer, necessariamente, a privatização da Segurança Social. Como tal, propõe-se um reforço do Regime Público de Capitalização, transformando os actuais Certificados de Reforma num verdadeiro plano poupança reforma (PPR), mas de natureza pública. Vale a pena relembrar que, no seu formato actual, os Certificados de Reforma 19 padecem de falta de liquidez, não garantem o capital que lhes é confiado, e não oferecem uma rendibilidade garantida. O que se propõe, em concreto, é que o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social abra um concurso público internacional e contratualize com um fundo de investimento a gestão financeira de uma tranche das novas entregas (na modalidade de reforço ou constituição de novos Certificados de Reforma), com vista a garantir uma determinada rendibilidade garantida e com um perfil de risco adequados, a uma comissão mais baixa. A vantagem deste arranjo é que permite obter comissões de gestão muito mais baixas do que se cada cidadão, por si próprio, constituisse ou reforçasse um PPR do sector privado. IV.5 Redução das contribuições sociais dos empregados, em função do número de filhos Propõe-se uma redução em um ponto percentual na taxa de contribuição do empregado para o sistema de protecção social (Segurança Social ou Caixa Geral de Aposentações) por cada filho que tiver. O envelhecimento da população é um sério risco para a sustentabilidade financeira do sistema público de pensões e que tem também uma solução demográfica – o reequilíbrio do rácio de dependência. V. CIDADANIA E GOVERNAÇÃO Nesta quinta área de intervenção pretende-se: Mais cidadania e melhor governação, com vista à credibilização das instituições políticas. As sugestões que a seguir são apresentadas são apenas a ponta do icebergue. As quatro ideias adiantadas têm em vista, entre outros objectivos, uma maior blindagem da governação aos grupos de interesse, um reforço da literacia política, económica e financeira de todos os cidadãos, a avaliação recorrente das políticas públicas, uma política de maior proximidade às populações orientada para as suas necessidades e dentro das possibilidades do País, uma responsabilização pessoal efectiva pela execução das políticas, e ainda uma maior separação entre o técnico e o político no âmbito dos cargos de direcção no Sector Público Alargado. V.1 Um novo modelo de financiamento partidário Recomenda-se alterar o modelo de financiamento dos partidos políticos em Portugal. Propõese a criação de um Fundo de Cidadania, gerido pela Assembleia da República, e alimentado exclusivamente pelas receitas de um determinado imposto que deverão ser consignadas a este 20 fim. O imposto em causa, e que é devido no final do ano, incide percentualmente sobre a capitalização bolsista média desse mesmo ano das empresas cotadas em bolsa. Nenhuma outra fonte de financiamento, pública ou privada, deverá ser permitida por Lei. Para além de financiar os partidos políticos com assento parlamentar, sob a coordenação da Assembleia da República, o Fundo de Cidadania poderá também financiar i) programas de cidadania e de literacia economico-financeira concretizados por entidades públicas ou privadas devidamente certificadas para tal, e ainda ii) a realização de trabalhos de avaliação recorrente das políticas públicas, elaborados por observatórios, think-tanks, centros de investigação ou outras entidades públicas ou privadas, já existentes ou a criar, com demonstrada competência tecnico-científica para o fazer. Este novo modelo de financiamento apresenta várias vantagens, das quais se destacam: a) o de blindar, de forma mais eficaz, a acção governativa às iniciativas dos grupos de interesse que poderão, pelo seu peso económico, ou distorcer as condições de concorrência do mercado e ou influenciar indevidamente a afectação de recursos públicos para proveito próprio, b) o de permitir, de forma mais isenta, à Assembleia da República o acesso regular a estudos que visam o escrutínio técnico das opções de política a tomar, e, ainda, c) o de garantir, ainda que indirectamente, um maior alinhamento de interesses quer entre as diversas forças políticas com assento parlamentar quer entre os avaliadores das políticas públicas no sentido em que o desenvolvimento económico deixa de ser visto como um jogo de soma nula onde o ganho de uns é sempre à custa de outros. De forma muito simples, todos passam a ter o incentivo a pensar nas medidas de política que, ao mesmo tempo, aumentam a capitalização bolsista (que financia o Fundo de Cidadania) e contribuem para um melhor nível de vida da população. Vale a pena referir que, de todos os agentes económicos e em condições de igualdade de oportunidades, as empresas cotadas na bolsa portuguesa são as que mais beneficiam quer de uma boa governação em Portugal quer de um escrutínio técnico mais profissional e isento das opções de política. Por este motivo, entende-se que deverão ser chamadas a financiar o Fundo de Cidadania. V.2 Uma maior responsabilização pessoal pela execução de uma política pública Recomenda-se a responsabilização do ministro sectorial perante a Assembleia da República pela execução física e financeira do programa que tutela ou co-tutela, justificando eventuais desvios e incumprimentos face a metas pre-estabelecidas. V.3 Uma maior separação entre a esfera política e a esfera técnica na ocupação de cargos dirigentes no Sector Público Alargado Propõe-se a utilização de um sistema de pontos como um dos critérios de seriação no processo de escolha de candidatos para cargos dirigentes no Sector Público Alargado. O objectivo desta proposta é garantir que é dada preferência às personalidades com competência técnica 21 comprovada na gestão de entidades públicas que operam em domínios relevantes para o cargo a preencher. A cada dirigente deverá ser atribuído, ou pela Inspecção-Geral de Finanças ou pelo Tribunal de Contas, uma classificação em função do seu trabalho recente. Cargos de direcção que são de maior responsabilidade deverão exigir um número mínimo de pontos mais elevado. Sugere-se, ainda, que exista efectivamente um período alargado de “nojo” depois de deixar a direcção ou chefia de uma entidade pública ou a ocupação de um cargo público, para evitar eventuais situações de conflito de interesses. V.4 Um reforço do currículo de cidadania na escola Com vista a estimular o interesse pela política e também consciencializar as próximas gerações da importância das escolhas políticas mais informadas, propõe-se um reforço do currículo de cidadania na escola. Neste domínio, a experiência recente com vista à sensibilização dos cidadãos para a importância da defesa do meio ambiente, em geral, e para a reciclagem, em particular, é um case study interessante que poderia ser aplicado à política. “Se não fazes parte da solução, então fazes parte do problema.” - Provérbio africano “Tens de ser a mudança que queres ver no Mundo.” - Mahatma Gandhi Conclusão Portugal vive um momento particularmente crítico, não só em termos económicos e financeiros mas também em termos políticos e sociais. Em breve entraremos na quarta década de democracia, mas antes disso a Sociedade Portuguesa terá de enfrentar o seu maior teste de resistência desde o 25 de Abril. No campo económico este desafio determinará, muito provavelmente, se conseguimos, a prazo, manter um nível de vida próximo dos nossos pares na União Europeia, a que nos habituámos, ou se, em alternativa, convergimos a passos largos para um país sem perspectivas 22 de melhoria e que vai empobrecendo. Em termos financeiros, o desafio determinará se a geração mais nova e a que vier a seguir estarão ou não aprisionadas por um nível de endividamento insuportável. Em termos políticos ditará a viabilidade (ou não) da transparência total como estratégia de governação em Portugal. E finalmente, em termos sociais este teste de resistência responderá à pergunta “Como reagem os Portugueses quando, sob enorme pressão, lhes é pedido um esforço de ajustamento muito significativo, com a expectativa, a prazo, de um Portugal melhor?”. É tempo de encontrar o mais rapidamente possível uma estratégia de saída que seja credível, interna e externamente, e que não se limite ao Memorando de Entendimento. Este artigo apresenta um conjunto de ideias accionáveis, um contributo para o debate de como sair da crise em que nos encontramos. É uma resposta ao apelo do Presidente da República para uma Sociedade Civil mais interventora. Se é verdade que ninguém deve ficar à margem deste processo de mudança, parece indiscutível que aos economistas cujas remunerações são pagas pelos contribuintes portugueses a Sociedade pode e deve pedir muito mais. Se, em conjunto, não formos capazes de resolver as nossas diferenças e encontrar uma plataforma de entendimento, podemos ter a certeza que as próximas gerações de Portugueses não nos perdoarão. Tenho esperança que Portugal venha a surpreender pela positiva a comunidade internacional. Não seria a primeira vez. 23