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FACULDADE DE SÃO BENTO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM FILOSOFIA
MESTRADO ACADÊMICO
Hugo Américo Pita Lisman
EDUCAÇÃO E EDUCADOR: INTERPRETAÇÃO DE UMA
SITUAÇÃO HISTÓRICA À LUZ DO EXISTENCIALISMO DE
SARTRE
São Paulo
2011
FACULDADE DE SÃO BENTO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM FILOSOFIA
MESTRADO ACADÊMICO
EDUCAÇÃO E EDUCADOR: INTERPRETAÇÃO DE UMA
SITUAÇÃO HISTÓRICA À LUZ DO EXISTENCIALISMO DE
SARTRE
HUGO AMÉRICO PITA LISMAN
Dissertação
apresentada
ao
Programa
de
Pós-Graduação Stricto Sensu em Filosofia da
Faculdade de São Bento do Mosteiro de São
Bento de São Paulo, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Filosofia.
Área de Concentração: Ética e Política
Orientador: Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva
São Paulo
2011
HUGO AMÉRICO PITA LISMAN
EDUCAÇÃO E EDUCADOR: INTERPRETAÇÃO DE UMA
SITUAÇÃO HISTÓRICA À LUZ DO EXISTENCIALISMO DE
SARTRE
Esta dissertação foi julgada adequada
obtenção do
título
de
Mestre
em
para a
Filosofia
aprovada em sua forma final pelo Orientador e pela
Banca Examinadora.
Banca Examinadora:
Orientador: ____________________________________
Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva
Doutor Universidade de São Paulo – BR – USP / 1989
Prof. Dr. ____________________________________________
____________________________________________________
Prof. Dr. _____________________________________________
_____________________________________________________
Coordenador do PPGFSB: _______________________________
Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos familiares e amigos que se
fizeram presentes nessa jornada.
AGRADECIMENTOS
Ao Programa de Pós-Graduação em Filosofia, PGFSB,
pela oportunidade de realização de trabalhos em
minha área de pesquisa.
Aos colegas do PPGFSB
pelo seu auxílio nas
tarefas desenvolvidas durante o curso e apoio na
revisão deste trabalho.
Ao coordenador Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva.
RESUMO
A dissertação tem por objetivo procurar entender e localizar o ponto de partida,
o início e os motivos pelos quais a profissão de professor/educador está atualmente
desvalorizada, desprezada, abandonada e ridicularizada.
O objetivo é entender o motivo deste deslocamento de valor que a sociedade faz
da atividade do professor, tão valiosa e importante para a emancipação do povo e o
engrandecimento de uma nação.
Esta imagem de professor, que os outros constroem, mas que ele muitas vezes
introjeta, corresponde a um aspecto da filosofia da existência de Sartre, ligado as relações
intersubjetivas que ocorrem numa dada situação. Por isso recorremos às idéias do filósofo
para que se possa compreender melhor um fenômeno social e histórico que é também vivido
como angústia, alienação ou má-fé por aqueles a quem a degradação social, no contexto da
sociedade utilitária, parece ter roubado a capacidade de resistência.
ABSTRACT
The dissertation aims to find, understand and locate the starting point, the start
and the reasons why the profession of teacher / educator is currently undervalued, neglected,
abandoned and ridiculed.
We want to understand is why this shift value that society makes the activity of
the teacher, so valuable and important for the emancipation of the people and the greatness
of a nation.
This image of the teacher, the others built, but he often interjects reflects one
aspect of Sartre's philosophy of existence, on interpersonal relationships that occur in a
given situation. We used the ideas of the philosopher so we can better understand a social
and historical phenomenon that is also experienced as anxiety, alienation or bad faith by
those to whom the social degradation in the context of utilitarian society, seems to have
stolen the ability to resistance.
Sumário
Introdução.................................................................................................................................1
1. Capítulo 1.1– Uma visão filosófica sobre a condição do educador ............................................3
1.2- Profissão em crise..............................................................................................................4
1.3- Ingredientes que contaminam............................................................................................4
1.4- Introjetando a síndrome do “Patinho Feio”.......................................................................6
1.5- O papel da Filosofia..........................................................................................................6
2. Capítulo 2.1-A fundamentação histórica............................................................................12
2.2 - A imprensa.....................................................................................................................12
2.3- A escola...........................................................................................................................13
2.4- Educação para o controle das almas................................................................................15
2.5-Educação Enfadonha E Os Professores Pobres Diabos...................................................17
2.6- A Educação na sociedade da administração....................................................................19
2.7-Pedagogia libertária..........................................................................................................24
2.8- Pedagogia libertária no Brasil.........................................................................................27
2.9- Marketing e Publicidade no controle...............................................................................32
2.10- A escola nova Brasileira em época de transição...........................................................36
2.11- Cecília Meireles cronista de educação..........................................................................39
3. Capítulo 3.1 Subjetividade e existência em Sartre.............................................................42
3.2- Liberdade em situação....................................................................................................47
3.3- Alteridade ou intersubjetividade: “O olhar” de O ser e o nada......................................50
3.4- Crítica da razão dialética (1960) Sartre e o marxismo...................................................53
3.5- Questão de método..........................................................................................................55
4.Capítulo 4.1- Interpretação da educação e dos educadores à luz do existencialismo de
Sartre.......................................................................................................................................57
4.2- A história de outrora confirma a situação de agora........................................................58
4.3- A educação para a manutenção da sociedade de interesses............................................59
4.4- Sartre e o problema da educação....................................................................................61
4.5- A cristalização por meio do “Olhar”...............................................................................64
4.6- A metáfora hegeliana no pensamento de Sartre.............................................................66
4.7- Entendendo a situação.....................................................................................................67
CONCLUSÃO.......................................................................................................................73
BIBLIOGRAFIA....................................................................................................................81
1
INTRODUÇÃO
A dissertação tem por objetivo procurar entender e localizar o ponto de
partida, o início e os motivos pelos quais a profissão de professor/educador está
atualmente desvalorizada, desprezada, abandonada e ridicularizada.
Entende-se que recaiu sobre este trabalho uma opinião generalizada e
dada como verdadeira, única e de grande aceitação social, até por parte dos educadores
e educadoras. Estes que, ao mesmo tempo, são professores e fazem parte da sociedade
de que alguma maneira acabaram introjetando esse tipo de opinião.
Uma crítica destrutiva que vai silenciosa e sorrateiramente minando o
valor, a auto-estima e a confiança de muitos educadores e educadoras.
Tantas profissões são valorizadas e tidas como a dos sonhos, guardadas
apenas para grandes homens e mulheres; outras são reconhecidas como as mais
respeitadas por toda a opinião pública e credenciadas por todas as outras profissões. A
profissão bombeiros é, por exemplo, creditada como uma das mais nobres e dignas de
nossa sociedade. Os bombeiros são capazes de arriscar suas vidas pelos outros em troca
de nada, apenas por salvar vidas, uma vez que seus salários são baixíssimos.
Porém, se por um lado ser educador é menosprezado e lastimável, por
outro é reconhecidamente valorizado. Entre jogadores de futebol e juízes a palavra
“professor” é usada como forma de respeito, obediência e submissão absoluta. Os
pupilos de todas as equipes de futebol adotaram uma maneira de mostrar admiração e
respeito supremo ao comandante ou técnico, e esta forma é chamá-lo “professor”
Pode-se notar ainda neste meio que, quando um técnico refere-se ao juiz,
dirige-se a ele como “professor” para, uma vez mais, mostrar também uma forma
respeitosa de intervenção e ao mesmo tempo se colocando numa posição de subjugado
ante o juiz da partida.
Nesta pesquisa de dissertação de mestrado em filosofia da educação quer
se entender é o motivo deste deslocamento de valor que a sociedade faz da atividade do
2
professor, tão valiosa e importante para a emancipação do povo e o engrandecimento de
uma nação.
Por que tantos educadores aceitam como inegável e imutável a situação e
apenas vêem passar os dias numa incansável conta pela espera da aposentadoria?
Impotentes, escravizados, relegados, subservientes, muitas vezes conformes e partícipes
da opinião generalizada. A angústia diária de exercer uma profissão tão desacreditada é
de certa maneira desacreditar em si mesmo. Em que momento da história esse problema
se iniciou e chegou até a atualidade? Discutir a degradação da profissão de educador na
segunda metade do século XX período em que surgiram as primeiras organizações de
escolas.
Uma imagem de professor, que os outros constroem, mas que ele muitas
vezes introjeta, corresponde a um aspecto da filosofia da existência de Sartre, ligado as
relações intersubjetivas que ocorrem numa dada situação. Por isso recorremos às idéias
do filósofo para que se possa compreender melhor um fenômeno social e histórico que é
também vivido como angústia, alienação ou má-fé por aqueles a quem a degradação
social, no contexto da sociedade utilitária, parece ter roubado a capacidade de
resistência. Não se trata de “aplicar a filosofia de Sartre a um tema extrínseco. Trata-se
de utilizar algumas noções da filosofia da existência para reconhecer uma situação em
que os aspectos sociais e históricos, bem como os existenciais, se cruzam em relações
dialéticas características da realidade humana
O primeiro capítulo trata-se de um artigo de mesmo tema, que relata a
inquietação e as angústias como educador, o que foi a mola propulsora desses estudos e
da vontade de entender melhor a situação que os educadores e educadoras vivem (os) no
dia a dia. Este capítulo que coincide com a abertura deste trabalho, diz respeito à
situação atual do educador.
3
CAPÍTULO 1
1.1- UMA VISÃO FILOSÓFICA SOBRE A CONDIÇÃO
DO EDUCADOR
“Tudo é precioso para aquele que foi, por muito tempo, privado de tudo”.
Friedrich Nietzsche
Com este título, não é difícil de acreditar que todos, ou pelo menos uma
grande parte, educadores ou não, são consciente ou inconscientemente levados a fazer
uma varredura imediata, um tipo de viagem mental avaliativa sobre sua carreira
profissional. Dirigido especialmente aos educadores, contudo, pode ser aplicado a
qualquer outro ramo ou atividade profissional.
Por alguns segundos, a ação de educar é colocada numa balança. Essa
balança refere-se àquela usada como símbolo da justiça e do direito, descritos como
duas bandejas dependuradas por correntes a uma barra de ferro na horizontal, presa
exatamente no meio por outra barra na vertical, formando uma espécie de pêndulo. Esse
aparelho explicita que para haver equilíbrio é obviamente necessário que os pesos sejam
exatamente iguais. Ao se fazer uma analogia com esse mecanismo, vimos que em dados
momentos pode ser colocado de lado toda uma conquista, tudo o que é adquirido no
setor intelectual, o reconhecimento de amigos, família e a satisfação pessoal; não
obstante, na outra parte da balança, vem o financeiro, a valorização e o reconhecimento
da sociedade.
Em meio a todo esse embrolho, encontra-se a forma como o indivíduo
“Eu”, o ser humano pensante, seja reconhecido na profissão.
O que se espera é uma reflexão acerca da profissão de educador, sem o
questionamento
de
metodologias,
técnicas,
formação
continuada,
métodos
governamentais de avaliações ou exigências do mercado educativo. O intuito do levante
4
dessa problemática é de como o profissional educador se vê e se enxerga dentro de toda
essa dinâmica.
1.2- PROFISSÃO EM CRISE
Profissão em crise. Não há uma precisão no momento histórico que essa
carreira passou a ser desrespeitada pelos que não a compõem. Não obstante, esta fama
ganhou notoriedade com quem deveria defender a classe, principalmente por quem de
certo modo faz parte dela. A exemplo, pode ser citada a infeliz frase do então famoso
prefeito de São Paulo, Paulo Salim Maluf, que dizia na época, referindo-se às
professoras da prefeitura no momento em que reivindicavam melhores condições de
trabalho e salário, que as mesmas não eram mal pagas, e sim mal casadas. Além de
ignorar a presença masculina no setor, fez explicitamente apologia à incompetência na
escolha da profissão, como também à escolha equivocada do parceiro, como se uma
pudesse compensar a outra.
Ao tentar racionalizar a colocação do então prefeito Maluf, observamos
que, em seu entendimento, as senhoras que escolheram a profissão de educadora, uma
vez mal remuneradas, dever-se-iam casar com um homem de posses para a
compensação da renda. As que não haviam logrado a felicidade, na opinião do prefeito,
de compartilhar a vida com um homem bem-sucedido financeiramente, não poderiam
ser educadoras, pois para elas não haveria compensação de renda. Enfim, em sua
concepção, as que reclamavam eram as mal-casadas.
Deve pesar sobre o relato citado que há outra versão sobre a expressão popular “malcasada”, a qual não merece que seja empregado nenhum tipo de referência ou
comentário, mesmo pela condição de mau gosto.
1.3- INGREDIENTES QUE CONTAMINAM
Mas, o que há por trás desse tipo de manifestação, provinda de um líder
político e como ela pode repercutir e influenciar a opinião sobre uma profissão?
Parece que a intenção do prefeito, no ato irresponsável do ataque à reivindicação das
professoras, foi a do menosprezo à profissão, resultando por fim, na ofensa generalizada
a todas as mulheres, sejam professoras ou não.
5
No primeiro caso, tratava-se de uma evidência clara de ataque às professoras, com o
intuito único de desvio do ato de pedido legítimo de melhores condições de trabalho e
melhoria dos salários. Uma agressão machista, como ingrediente que unido a outros,
agrava e fomenta o desrespeito às pessoas que se dedicam à educação não só de uma
cidade, mas de todo um país. Pessoas formadas que acreditam em um ideal de igualdade
de conhecimento, livres de qualquer preceito político ou religioso, educadores que estão
à frente das salas de aula, as quais serviram de espaço para a formação de indivíduos
que hoje podem encontrar-se nos mais variados cargos e profissões, inclusive de
professores.
Entretanto, ainda há pessoas desatentas formadoras de nossa sociedade
que não elaboraram uma interpretação cuidadosa, seja do pronunciamento político
usado apenas como exemplo ilustrativo, seja de qualquer outro tema que se apresente, e
que são envolvidas pelos meandros da desatenção de apreciação intelectualizada,
bombardeadas pelas opiniões que se difundem na massa sem fazer uso de precisão de
peso e medida. Há um rigor necessário quando se quer formar opinião com a balança
da igualdade e da justiça. Se deixarmos de lado todos esses critérios, somos e
continuaremos sendo, presas fáceis. Por fim, continuaremos agindo como sujeitos de
um erro crasso, caindo na incapacidade ou inabilidade de reconhecer que esse citado
exemplo pode produzir, afetar, propagar, incutir e até modelar opiniões nubladas
inferindo aos indiretamente relacionados, àqueles que não enxergam a profissão do lado
de dentro. Simultaneamente, pode suscitar acordo e aceitação nos que estão diretamente
relacionados, os que compõem o rol da educação. Esse é exatamente o foco da
inquietação, o qual, consecutivamente, resulta no alvo reflexivo e objeto de estudo que
merece ser compartilhado com toda a sociedade, em especial, os professores.
Este tipo de situação fragiliza, menospreza e relega esta profissão,
remetendo-a aos anais das menos procuradas e respeitadas, intervindo, obviamente na
qualidade da educação e de tudo que um educador ou educadora possa desenvolver.
O que vemos são educadores e educação subjugados a um estágio próximo, se já não
estiverem, de subserviência da escravidão velada e sofrida, da morte silenciosa e
agonizante da relação do educador, do amor e prazer com sua profissão.
Essas
afirmações referem-se ao congelamento que muitos de nós sucumbimos ante as opiniões
massacrantes e diversas sobre nosso labor. Congelados, fragilizados, subjugados e
6
subservientes, admitimos permissivamente; basta que emirja o que pode se chamar de
senso comum em sociedade, opinião que de alguma maneira se aceita e se ventila como
a verdadeira, única e imutável, resultando muitas vezes em um propósito negativo, que
sobrecai nos ombros do educador e principalmente no papel que desempenha na
sociedade.
1.4- INTROJETANDO A SÍNDROME DO “PATINHO FEIO”
Essa sensação de impotência diante do sentido comum nos guia
silenciosa e sorrateiramente cada vez mais a introjetar o que não somos.
Cair na armadilha inconsciente dessa introjeção é, ao mesmo tempo, fomentar e
corroborar com o sentido comum instaurado por muitos educadores e grande parte da
sociedade intelectual.
A falta de vontade e de potência é uma ação, pois até a ausência de ação
é uma ação, a ação de introjetar aquilo que não se é, ao mesmo tempo em que se aceita
como sendo.
Ao relatar vivências, sentimentos e sofrimentos abertamente, este
trabalho almeja mostrar inicialmente uma inquietação sobre o tema, que aflige
principalmente o educador.
1.5- O PAPEL DA FILOSOFIA
A busca de apoio na filosofia parece ser lógica, uma vez que essa é a arte
do pensar, relativizar e reflexionar a incansável busca por múltiplas facetas da
misteriosa humanidade. A história revela que o primeiro pensador grego a usar a palavra
filosofia pode ter sido Pitágoras de Samos1, no século VIII a.C. Há várias definições
1
Pitágoras nasceu em Samos, uma das ilhas do Dodecaneso na Grécia e provavelmente recebeu instrução
matemática e filosófica de Tales e de seus discípulos. Após viver algum tempo entre jônicos, viajou pelo
Egito e Babilônia - possivelmente indo até a Índia. Durante suas peregrinações, ele absorveu não só
informações matemáticas e astronômicas como também muitas idéias religiosas. Quando voltou ao
mundo grego, Pitágoras estabeleceu-se em Crotona, na Magna Grécia (na costa sudoeste da atual Itália),
onde fundou a Escola Pitagórica dedicada a estudos religiosos, científicos e filosóficos. À Pitágoras são
atribuídas várias descobertas sobre as propriedades dos números inteiros, a construção de figuras
geométricas e a demonstração do teorema que leva seu nome (cujo enunciado já era conhecido pelos
babilônios). Os próprios termos Filosofia (amor a sabedoria) e Matemática (o que é aprendido) seriam
7
para seu significado. Um entre os muitos, não referindo-se apenas a filósofos, que
tentaram ou de alguma maneira conseguiram conceituar o vocábulo Filosofia foi
William Shakespeare, com uma frase que sintetiza tudo: “O Filósofo é um mítico em
busca da verdade velada. Só pensamos naquilo que cremos, e só cremos naquilo que
queremos. O mito para a Filosofia é vital, pois cria ícones possíveis do mundo das
idéias. [...] Há mais mistérios entre os céus e a terra do que pressupõe a vossa vã
Filosofia”.
Entretanto, gera-se um convite para que, unidos e apoiados em legados
filosóficos, possamos vislumbrar alternativas para minimizar, reconhecer e pontuar,
tanto no sentido comum estabelecido pela opinião generalizada que desdenha e
menospreza educadores, como na profissão em forma de escravizante introjeção. Esses
fatores se dão em grande parte na classe de educadores e educadoras, já portadores
dessa síndrome, a qual por permissão denominará de “patinho feio da sociedade”.
Não há, de maneira alguma, a pretensão de solucionar o conflito relacionado, entretanto,
é pertinente refugiar-se em opções reflexivas para de alguma forma minimizar a
condição em que os educadores se encontram, por meio do engendro do fundamento
filosófico.
Segundo a teoria hegeliana, a relação “senhor/escravo” baseia-se e
fundamenta-se na aceitação de uma condição preestabelecida, ou seja, o senhor sabe que
é o dominador e o escravo, o dominado. Todavia, não basta que o segundo apenas seja
escravo, ele se sente escravo e sequer questiona essa situação.
O escravo nem em pensamento sonha com a liberdade ou reconhece que necessita como
ser humano libertar-se da escravatura. Ao contrário, o senhor espera que o dominado
seja totalmente inconsciente e incapaz de se enxergar livre, apenas deve entender que
assim deve ser, pois desta maneira, o escravo colabora para que a relação se dê por
completa, fortalecendo, alavancando e creditando o senhor. Com isso, esse senhor é
elevado ao grau máximo do domínio, por outro lado, o escravo é lançado ao nível mais
baixo que a condição humana pode experimentar. Há um processo de transfiguração em
um objeto, em uma coisa, em algo que pertence ao senhor.
Cabe a dúvida sobre uma possível transformação do indivíduo em coisa,
criações de Pitágoras para descrever suas atividades intelectuais. Extraído
http://www.ime.usp.br/~leo/imatica/historia/pitagoras.html em 11/11/2009 às 11h47.
do
site:
8
ao hipoteticamente não ser esse, capaz de se enxergar e deixar dominar por um conceito.
É assim que deve ser, e ao mesmo tempo há um credenciamento do senhor, para que
essa relação seja fortalecida e legitimada.
Para que haja uma relação perfeita nos moldes mais perversos, faz-se
necessário um “dominador” e um “dominado-coisa”. Não é tarefa árdua encontrar o
“dominador”, pois já discutimos a síndrome de patinho feio e a entendemos como
proposição social. Sendo assim, somos “dominador” e “dominado-coisa”.
Fazemos parte da sociedade que por sua vez é constituída, em parte, por educadores,
isso quer dizer que estamos com a sociedade, pois somos a sociedade.
Sartre não descreve nem naturalmente, nem psicologicamente os fenômenos dentro das
disciplinas filosóficas, ele usa a ontologia.
Entretanto, em O ser e o nada, de Sartre resvala em problemas
metafísicos, porém o filósofo acha que não produz teoria e não descreve a conduta
humana e, sim, a fenomenologia. Sartre recupera o conceito de sujeito como existência.
“Queremos definir o ser do homem na medida em que condiciona a aparição do nada,
ser que nos apareceu como liberdade” (SARTRE, 1997, p. 68).
Existir significa desejar ser; o desejo de ser significa projetos. O sujeito é um sujeito
existencial, é um agente histórico; na filosofia sartriana, não há nenhum projeto em que
não haja ação.
O sujeito projeta-se e projeta para se constituir e constituir o mundo em que quer viver.
Para que aconteça a existência histórica, são necessários dois quesitos: condições
subjetivas (“história pessoal”) e condições objetivas (“história geral”).
Não se pode chamar causa e efeito, trata-se de entender a dialética entre cada um dos
dois processos e as relações entre eles.
Há uma vinculação com o pensamento marxista, pois o marxismo é
ligado à história. Vale dizer que os homens fazem livremente a história quanto à
história tem o poder de determinação sobre os homens. “A história de todas as
sociedades que existiram até hoje tem sido a história das lutas de classes” (MARX,
1988, p. 75). A dialética ocorre conservando as diferenças numa tensão - esse é o
verdadeiro pensamento dialético.
O primeiro ato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitam a satisfação
9
dessas necessidades, a produção da própria vida material, e de fato este é um ato
histórico, uma condição fundamental de toda a história, que ainda hoje, como há
milhares de anos, deve ser cumprido todos os dias e todas as horas, simplesmente para
manter os homens vivos (Cf. MARX, 1987, p. 39).
Sartre parece afirmar em seu pensamento que o homem é sujeito da história e sujeito à
história:
[...] a consciência define-se como sendo aquilo que não é e não
sendo aquilo que ela é. Enquanto o Ser-Em-Si é inteiramente
preenchido por si mesmo e sem nenhum vazio, a consciência é
constituída por uma descompressão de ser. Essa fissura, ou
deslocamento, é a marca do nada no interior da consciência. O
nada é um „buraco‟ mediante o qual se constitui o Ser-Para-Si
(SARTRE, 1978, p. XI).
Sujeito, gramaticalmente significa o agente da ação, aquele que pratica a
ação e o que é sujeito de sua história.
Podemos ainda dizer que somos escravos e senhores do conceito, transformamo-nos em
criadores e criaturas do patinho feio. Somos escravos de nós mesmos. Sartre remete-nos
à ideia de que nos projetamos e projetamos o mundo que queremos viver.
Na filosofia sartriana, há dois quesitos: o histórico pessoal e o histórico geral, e nós
fazemos parte dos dois, tanto na opinião social como na profissão que recai sobre essa
opinião.
Buscamos, então, fazer parte desta história; não obstante, como encontrar meios e força
para modificá-la?
O forte não precisa mostrar sua força nem sobrepor-se a outros para mostrar-se forte.
Em Nietzsche e a filosofia de Deleuze, é a “moralidade escrava”.
Seriam os
educadores/escravos tão fortes que chegam a amedrontar os senhores. Segundo o
pensamento nietzschiano, são fortes os que não precisam demonstrar sua força e aqueles
que usam a ostentação de força são os verdadeiros fracos.
10
Em Nietzsche, a relação essencial de uma força com outra nunca
é concebida como um elemento negativo na essência. Em sua
relação com uma outra, a força que se faz obedecer não nega a
outra ou aquilo que ela não é, ela afirma sua própria diferença e
se regozija com essa diferença (DELEUZE, 1975, p. 7).
Não há profissão que não tenha passado pelo banco da escola, nem
mesmo a profissão de educador, que, por sua vez, é um contínuo aprendiz.
O professor é forte, mas ironicamente é por meio da força que por vezes tentam
conformá-lo à ideia de ser supérfluo e incapaz.
Quisessem aceitar e permitir a dialética senhor/escravo ao mostrarem os verdadeiros
fortes ou a força desprendida em fazê-los crerem ter o domínio.
Entretanto, surge uma grande preocupação exposta no pensamento social. Karl Marx
desenvolveu uma série de pertinentes pensamentos, obtendo a atenção do mundo, entre
eles a “mais-valia” e o “Socialismo”. Até hoje seu legado norteia vários pensadores na
incessante busca de uma sociedade mais justa.
A igualdade de direitos cívicos como a liberdade irrestrita de opinião são
legítimas e necessárias para que todos, individualmente, possamos expressá-la e não
supô-la idêntica como se todos pensassem da mesma maneira dentro de uma sociedade.
Não obstante, como mensurar numa sociedade os pensamentos sobre a ação educadora e
os educadores, uma vez que se tem a impressão que todos senhores e que todos os
educadores são os senhores e ao mesmo tempo escravos?
Como transfigurar esse valor que já está enraizado em ambos, social e
moralmente? Como modificar um valor que se tornou como verdadeiro introjetado por
muitos educadores como a indelével marca desta profissão?
Na condição de voltar ao pensamento de Nietzsche dada as inúmeras leituras e
discussões acerca do controverso filósofo alemão, pode-se dizer que, por um lado,
houve um grande e impactante susto, causado pela extrema violência com a qual
Nietzsche filosofa, marca da filosofia do martelo. Contudo, Nietzsche mudou o modo de
11
filosofar: na transvaloração, há uma conversão em bom o que antes era mal e em ruim o
que antes era bom. Já a moral do ressentimento diz que o forte é livre para exteriorizar
sua força ou não: e, quando a exterioriza, é ruim. O filósofo alemão nunca negou as
dificuldades da vida e da dor, critica a moral como uma contra-natureza, que é a moral
da tradição cristã e socrática; a moral platônico-socrática; a ideia de uma ordem moral
do mundo; e que nega a vida, justificando-se em Deus.
Nietzsche muitas vezes declara aberta e francamente o quão angustiante é
viver; entretanto, foi provavelmente o maior defensor e norteador dos escravos e dos
plebeus contra as imposições dos senhores e tudo que por analogia eles representam.
Com a sua “vontade de potência positiva” mostrou ao mundo que era possível inverter a
dialética senhor/escravo, bem como seria possível chegar enfim à “transvaloração de
valores”.
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CAPÍTULO 2
2.1- A FUNDAMENTAÇÃO HISTÓRICA
Neste capítulo iniciar-se-á a pesquisa da educação brasileira, como base
para que se possa entender a sua trajetória histórica e a sua relação com educadores e os
momentos políticos e sociais que estava inserida. Para tanto, tomar-se-á como
fundamento norteador o livro: “Outras histórias da educação do Iluminismo à Indústria
Cultural” (1823-2005), da autora Sonia Marrach.
2.2- A IMPRENSA
A imprensa merece um aparte sobre o grande valor que desempenhou na
construção do novo país que surgiria, contudo, para alguns jornalistas, tratava-se de uma
nova forma de se fazer notícias.
Cipriano Barata comenta que uma nova concepção histórica surgia em
meados da Independência de 1822, em Pernambuco, que em sua opinião surgia um
novo produto jornalístico político: a opinião pública.
“A opinião pública faz a história”: a imprensa de opinião do início do século XIX sofre
algumas mudanças, pois não se retratavam mais fatos heróicos ou grandes façanhas
nascidas entre vinhos em salões.
Fez-se um movimento, uniu-se Pernambuco, aclamou-se o
imperador etc., mas tudo isso foi operado pela opinião pública e
pelo estado das relações políticas entre Brasil e Portugal. [...]A
13
opinião pública é essa Rainha do Mundo, que tudo governa, que
estabeleceu muitos reinos sobre as ruínas de Roma, que tem
destruído as pretensões dos Papas, que tem combatido o
despotismo e feito as revoluções na América do Norte e do Sul,
que derrubou Bonaparte etc.(SL, 2.7.1823,n.26 p.54)
Entende-se então que a história já não é mais um produto oriundo das
ações de reis ou príncipes ou outros soberanos, não é obra de indivíduos importantes e
poderosos, a história passa pela imprensa de opinião, e esta é chamada a que “dá luzes
ao povo” (p.55). A imprensa coloca-se como preceptor do povo, aquela que fiscaliza,
que denuncia os arranjos políticos, os conluios, a história passa a ser feita pela opinião
pública. A opinião pública e o encontro do povo com a razão é o povo informado,
esclarecido. A força da opinião depende apenas de conseguir impor-se em relação aos
poderosos.
A força da opinião pública é reconhecida no Brasil e não é de estes
tempos. Pode-se entender que desde os primeiros tempos de Brasil independente a
opinião pública assumia caráter elucidativo do público.
Nestes tempos de mundo globalizado e de internet a opinião pública
sobre o educador é massificada e implacável. A força dessa opinião negativa e
tendenciosa recai forte sobre a educação e o educador, formando uma opinião
massificada como negativa, que responsabiliza apenas um lado: o corpo docente.
Depositada sobre os ombros dos educadores, esta opinião isenta políticas públicas e o
abandono sofrido pela educação, espalhando-se e criando consenso esclarecedor contra
toda uma classe.
2.3- A ESCOLA
A organização da escola Brasileira do XIX refletia a situação social em
que o país se encontrava, a verticalização da estrutura social norteava a ordem escolar.
O Brasil sofria com uma sociedade de oligarquias proeminentes em que os grupos
dirigentes eram compostos por poucas famílias. A sociedade era hierarquizada
14
demarcada por rígidos obstáculos raciais e de classes. A educação conforme HenriIrénée(1969) constitui um fenômeno secundário, subordinado à civilização, da qual
representa um resumo. A escola inicia a juventude na cultura real de uma civilização, de
uma sociedade. A educação reflete o momento social.
Pode-se usar como referência a obra de Machado de Assis para
compreender as mudanças entre o rito e o mito do esclarecimento, a transformação do
ritual revolucionário da educação democrática no mito da modelagem ou controle das
almas. Sob a visão de Sidney Chalhoub, no texto machadiano é possível encontrar mais
que histórica, é uma fonte histórica e interpretativa da exploração da ideologia
senhorial. Em sua obra há exemplo de posição ambivalente, como na personagem
Helena.
“condenada a uma introjeção dos valores e significados que
organizam o mundo a partir do ponto de vista de Estácio. A
contemplação exclusivista do próprio nariz, tão saliente em
Estácio e Brás, seria a essência de um ser político específico,
historicamente determinado, aqui apelidado de classe senhorial”.
[...]
A obra machadiana “buscava representar a classe senhorial no período em que vivera o
ápice de seu poder e prestígio social, ou seja, entre os anos 1840 e o aprofundamento da
crise política que resultaria na lei de 28 de setembro de 1871” (Chalhoub,2003, p.24-5).
No Brasil monárquico os discursos parlamentares falavam em educação
para todos, porém o que se via na prática era um descaso total e educação para poucos.A
ausência de educação básica deve-se ao fato de repressão externa, ao controle as
ameaças e até uso de violência física, não refere-se apenas aos escravos, esse controle
recaia também nos homens livres e pobres, chamados “mestiços”, “pardos”, “cabras” e
“crioulos”, que na teoria eram livre e na prática submetidos e presos à lógica do controle
das almas e do mito da educação para todos.
15
Durante o Segundo Reinado (1840-1889) a escola era para os grandes
comerciantes e para os proprietários rurais de grande porte, os meninos eram os únicos
que freqüentavam a escola, para as meninas restavam apenas os cursos de línguas, piano
e aulas de refinamento, porém apenas as famílias mais abastadas mandavam as meninas
aos conventos franceses e as aulas eram ministradas por mestres estrangeiros.
Os currículos das instituições de ensino no período seguiam o modelo
padrão clássico francês voltado para língua, literaturas antigas e modernas, retórica,
história, filosofia e religião. Apenas no final do império a matemática e a ciência natural
ganharam terreno. A metodologia era o “decoreba”, e questionado uma vez por um exaluno o professor explicou que era a forma de garantir que o educando não cometesse
gafes ou recaísse em distorções do que devia ter entendido.
“Menino, estudante que não decora só não diz besteira quando
compreende o ponto, e isso não acontece sempre.Por isso tomei
o partido de exigir sempre que me decorassem a matéria, porque
desse modo não diriam tolices, embora sem compreender o
assunto”(Needel,1993,p.77).
2.4- EDUCAÇAO PARA O CONTROLE DAS ALMAS
Foram os acadêmicos que formaram o quadro político e administrativo
do Império, os de outrora estudantes e agora bacharéis. Entenda-se, quando se diz de
“outrora estudantes” que refere-se às mesmas pessoas, àqueles poucos que tinham
acesso à educação, os filhos dos poderosos, dos grandes comerciantes e dos grandes
donos rurais. Sofreram o principal efeito da vida acadêmica dos “ aprendizes do poder”
constitui uma elite de políticos profissionais coesa e diversa, que
sintetizava harmonia e contradição, que expressava tantos os
16
interesses agrários quanto os urbanos e- sobretudo- que se
constituía como agrupamento multifacetado, porém, que
representava a única parcela politicamente organizada da
sociedade.(Adorno,1988,p.155)
Os bacharéis fora das salas de aulas eram formados e disciplinados sob o
modelo de interesse do Estado Monárquico, capazes de manter e controlar o aparato
administrativo, ainda que não acreditassem em sua legitimidade estavam habilmente
convencidos de sua legalidade. Eis a transformação de iluminismo/esclarecimento, que
propunha a educação democrática, em mito da modelagem do controle das almas.
Poucos escritores, de refinada intuição, tais como Machado de Assis e Eça de Queirós,
foram capazes de identificar o que nos tempos atuais se confirmam com as pesquisas
fundamentadas nos trabalhos de Sonia Marrach, Sérgio Adorno, Sérgio Buarque de
Holanda, Fernando de Azevedo, Paulo Mercadante, entre outros. Ao longo do século
XIX viveu-se a passagem da busca do esclarecimento ao mito do controle das almas.
O jovem país livre passa por muitas transformações e para novos
comandos, os quais em seu livro Sonia chamou de a nobreza de toga que representavam
a continuidade da colônia, vale lembrar que o lema de seu conservadorismo era
reformar para conservar.
Tempos de crise no velho mundo senhorial e a nobreza de toga, filha da
aristocracia rural, minou aos poucos um dos esteios da monarquia e de suas classes, que
já havia se transformado.
Quando a campanha de abolição foi iniciada, restavam ainda
dois milhões de escravos [...].A humanidade estava por demais
adiantada para que se pudesse defender em princípio a
escravidão , como o haviam feito nos Estados Unidos.A Raça
latina não tem dessas coragens.O sentimento de ser a última
nação de escravos humilhava a altivez e emulação de país
novo.[...].Nossos proprietários emancipavam aos centos os seus
escravos, em vez de se unirem para linchar os abolicionistas,
17
como fariam os criadores de Kentucky ou os plantadores da
Luisiana.[...]
Nabuco, Joaquim (1963,p.193-4)
2.5- EDUCAÇÃO ENFADONHA E OS PROFESSORES POBRES DIABOS
O mundo burguês era moderador, conservadorismo era seu lema e a
juventude representa a inquietação, o rompimento da tranqüilidade, o fim do equilíbrio,
do enfadonho. A burguesia desconfiava do ímpeto da juventude. Aí o segredo da
educação enfadonha, do desinteresse pela escola e pelo método tradicional escolar.
Os jovens, que por instinto sempre pretendem alterações rápidas
e radicais, eram, pois, considerados como elemento perigoso,
que pelo maior tempo possível deveria ficar afastado ou ser
reprimido. Por isso não havia razão para que nos tornassem
agradáveis os anos de escola; deveríamos fazer jus a toda forma
de ascensão mediante paciente espera. (Zweig,1953,p.38)
E com os educadores não era diferente. Vítimas ou não da transição em
que a escola era submetida, os professores também eram obrigados, os bons ou os ruins,
a jogarem o jogo da educação aristocrática da obediência com vistas a uma formação de
aceitação e sublimação. O plano de ensino estabelecido e imposto pelo Estado aos
educadores. Os educandos tinham apenas obrigações e principalmente a da docilidade
permanecendo assim até que atingissem a maturidade e aí então, conheceriam seus
direitos. Vivia-se uma época na qual os cabelos grisalhos, os óculos, a moderação e a
experiência eram muito valorizados. A pedagogia tradicional encontrava apoio, uma vez
que a voz dos pais era irrefutável assim como a dos professores.
18
Também os nossos professores não tinham culpa da falta de
atrativo daquela atividade escolar. Não eram bons nem maus,
não eram tiranos nem camaradas prestimosos, mas sim pobres
diabos que, presos escravos ao esquema, ao plano de ensino
estabelecido pelo Estado, tinham de executar a sua tarefa como
nós a nossa, e se sentiam- isto percebíamos claramente- tão
felizes como nós quando ao meio-dia tocava o sino da escola,
que a eles e a nós dava liberdade. Não gostavam de nós, não nos
odiavam, e mesmo não tinham motivo para isso, pois não
sabiam a respeito de nós. Ainda após alguns anos só conheciam
pelo nome poucos de nós; de acordo com o método de ensino de
então, nada lhes preocupava senão verificar quantos erros o
“aluno” cometera no último exercício. Eles estavam sentados em
cima, na cátedra, e nós embaixo, nos bancos, perguntavam e
tínhamos que responder; fora disso não havia entre eles e nós
relação alguma, pois entre o professor e o aluno, entre a cátedra
e o banco escolar, entre o visível que estava em cima, e o visível
que estava embaixo, se achava a barreira invisível, a
“autoridade” que impedia todo o contato. (Zweig 1953,p.40)
“A ausência de união espiritual entre Zweig e seus professores era tanta
que simplesmente esquecera o nome e a fisionomia de todos” (Marrach, Sonia. 2009,
p.106.)
A educação não formava e tampouco discutia a sociedade. A imposição
do estado forjava uma sociedade moldada aos parâmetros pré-estabelecidos pelo estado
e os educadores, por conseguinte, submetidos ao mesmo.
19
2.6- A EDUCAÇÃO NA SOCIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO
Pode-se entender que se vivia um momento que a administração, o
estado, procurava o domínio de poucos sobre muitos e para que esse domínio ocorresse
havia de ser planejado em todos os setores da sociedade. Acontecia tanto no controle da
informação pública, nos meios de comunicação, e a educação não era ignorada e
incluía-se como fator importante a educação em massa sob os rígidos regulamentos do
planejamento estratégico estatal.
Segundo Mannheim:
Trata-se de uma sociedade que passou pela transição do laissezfaire para a sociedade administrada, planificada. Isto é, uma
sociedade com grandes técnicas sociais de controle do
comportamento humano, que favorecem o predomínio da
minoria sobre a maioria. Assim, no campo militar, por exemplo,
enquanto os exércitos do século XVIII e XIX eram equipados
com fuzis e canhões, os do século XX possuíam “bombas
aviões, gases e unidades mecanizadas. Um homem armado de
fuzil ameaça apenas umas quantas pessoas, porém o que possui
uma bomba pode ameaçar milhares. Isso quer dizer que em
nossa era a modificação da técnica militar contribui muito para a
possibilidade de domínio da minoria”
(Mannheim, 1973, p.14
apud Marrach, Sonia. 2009, p.116)
A tendência à concentração ocorreu em todos os setores e a produção
mecanizada de idéias feitas pelos meios de comunicação, agiu no sentido de controle
social. As novas possibilidades técnicas permitiram ainda o controle da educação e da
ciência.
20
Os efeitos da primeira guerra mundial sobre a cultura e os indivíduos
também incidiram sobre a cultura burguesa tradicional; o pós primeira guerra, aliado ao
mundo do controle, o mundo da burocracia e das grandes organizações aniquilaram os
indivíduos por meio dos controles sociais e como resultado a clássica burguesia foi
devorada pela Indústria Cultural. Quiçá interprete-se melhor a educação contemporânea
entendendo-se que a cultura burguesa, seja ela erudita ou tradicional, dos livros ou de
óperas, de teatros ou da música deixou de ser hegemônica há muito tempo, ficando
restrita a pequenos grupos de intelectuais das classes altas e médias, aos vanguardistas
artistas e as áreas específicas das universidades. Compreende-se então que daí surgiu
uma indústria cultural do ensino, a cultura dominante sobre as grandes massas regida
pelos e para os interesses das grandes organizações. A cultura para o controle de massa
afetou profundamente a educação e o esclarecimento, produzindo o que se chamou
Indústria da Cultura do Ensino no final do século XX.
Para muitos, a época da
catástrofe o século XX foi o século das técnicas sociais de controle, da sociedade
administrada, planificada, em que poucos tinham poder sobre muitos.
Para Eric Hobsbawn o século XX ficou conhecido como “era da
catástrofe” (1914-1945); duas guerras mundiais, uma revolução, duas formas de
totalitarismo.
Nunca se matou tanto na história humana como, com tecnologia
desenvolvida pelo próprio homem. E foi no século XX que as
massas começaram a participar da vida social e política. Daí as
exigências de novas formas de controle social, dentre elas
destaca-se a educação, que passou a atingir as novas classes
médias e o proletariado, pois cresceu o medo do esclarecimento
das massas.(Hobsbawn, 1997 apud Marrach,Sonia. 2009, p.118.)
“O
medo
do
Iluminismo
conseguiu
sobreviver
( Enzensberger,1995,p.45 in Marrach, Sonia.2009, p.118)
ao
próprio
Iluminismo”
21
A educação substituiu o Iluminismo, que por sua vez estava a serviço do
controle social exigido pelo estado por meio de políticas educacionais. O que outrora
almejavam os filósofos da Ilustração e pela burguesia revolucionária fora trocado, pois,
já não servia, agora havia que se preparar operários para as indústrias e funcionários
para a burocracia. Mannheim escreveu sobre o problema e Sonia Marrach diz que assim
ele se exilou em Londres em 1914 e que a sociedade das técnicas sociais, de controle
burocrático, tendem a um planejamento autoritário em que poucas pessoas decidem a
vida de muitos. Então, se desejamos uma sociedade com planejamento participativo,
temos que ensinar aos jovens o que é democracia e o que é um planejamento
participativo e como se faz. A juventude não nasce com a consciência democrática.
A escola do século XIX era compartimentada, ensinava matemática,
história, geografia, ciências e valores eternos para crianças e jovens das classes
tradicionais e proprietárias, que já traziam consigo as normas de civilidade e bom
comportamento.
No século XX a escola é colocada num compartimento à parte da
sociedade da vida. Há o nascimento de partidos e movimentos que arrebanham as
massas, que começam a participar da vida social. Mannheim propõe uma educação para
a vida, pois ele acreditava que a vida para os jovens tornou-se incompreensível. É
diferente viver em um pequeno povoado no qual se entende como tudo funciona e viver
em uma sociedade contemporânea industrial e administrativa, cujas forças sociais e
econômicas atuam de forma invisível, e assim veladamente, nada se entende. A
sociedade torna-se um enigma para o jovem.
O crescimento de uma sociedade que ninguém entende, em que ninguém
se entende provoca crise de valores, crise de autoridade e liberdade, provoca o desajuste
social a falta de senso e de bom senso comum, um total desajuste pessoal e social de
como o indivíduo se vê, se sente inserido e socialmente participativo. Como participar e
entender o que não se entende?
Necessita-se uma escola não compartimentada, capaz de superar a
escolástica, uma educação capaz de emancipar o educando de fazê-lo entender e
22
interpretar os conflitos individuais e coletivos, levar os educandos a uma apreciação da
sociedade e um esclarecimento mais complexo dos fatos.
Trata-se de um esclarecimento mais complexo que coloca para a
escola a necessidade de refazer o “elo de entre as disciplinas que
tratam dos assuntos humanos”, pois “é impossível imaginar um
professor que não enfrente, dia a dia, dificuldade de
comportamento dos alunos que, convenientemente observadas,
não passam de sintomas de conflitos dentro da família, da
comunidade,
entre
diversos
grupos
de
idade,
etc.
(Mannheim,1973,p.78 apud Marrach, Sonia. 2009, p.119)
Desta maneira, a autora comenta que os problemas escolares ganham
uma dimensão humana muito mais profunda e enfrentá-los no cotidiano exige uma
educação em que as ciências humanas são o elo para aprofundar e ampliar a consciência
humana, para com ela desvendar e compreender as motivações do ser humano, suas
mazelas, suas misérias, suas angústias, seus enigmas e os enigmas de uma sociedade.
A consciência que o educando deve adquirir significa a capacidade de
perceber prontamente e compreender o conjunto da situação em que se encontra, não
apenas para situar-se e empreender a ação de acordo com os fins que ele mesmo
preestabelece, mas também com o objetivo de fundamentá-la em uma visão globalizada.
Entenda-se a necessidade de criar um elo entre a educação e a sociedade
contemporânea, a ampliação do indivíduo e sua capacidade de tolerância com seus
problemas e conflitos.
“Alguns pensadores como Zweig, Mannheim, Einstein, Adorno e Erich
Fromm, embora com linhas de pensamentos diferenciadas compartilham do mesmo
ponto de vista citado na página anterior”. (Marrach, Sonia. 2009 p.119)
23
A consciência, dessa visão global, mais profunda da sociedade é
fundamental para o indivíduo viver em sociedade em épocas de mudança. Menciona
Mannheim
É impossível que venhamos, depois desta guerra, a mais
desumana de toda a história, a condições de tempo de paz, sem
contar com ajuda dos professores para atacar essas tendências
desintegradoras. Hoje ninguém pode pensar na paz após guerra
como um mero retorno às condições do pré-guerra. Haverá
demasiadas convulsões, e, por conseguinte, uma necessidade
premente de regeneração fundamental de nossa sociedade. Na
sociedade de antanho, era possível passar de mão em mão
hábitos, costumes e uma filosofia de vida estabelecida, que
habilitavam o indivíduo a exercer papéis sociais mais ou menos
predeterminados. Numa sociedade como a nossa, só uma
educação para a mudança pode auxiliar-nos. (Mannheim 1973,
p.79 apud Marrach, Sonia. 2009, p.119)
A reafirmação da necessidade constante de revisão do sistema
educacional como fundamento para desvelar um educando capaz de reconhecer-se em
sociedade e entender as mudanças sociais e os efeitos destas mudanças trazem consigo.
Um indivíduo capaz de reconhecer-se partícipe de um momento histórico como parte da
história e ator dessa mesma história. O problema encontra-se em entender a quem
educar? O que ensinar? Mudança social em que direção?
24
2.7 - PEDAGOGIA LIBERTÁRIA
Um das questões cruciais que aparecem na discussão da educação em seu
perfil tradicional e o autoritarismo e o dogmatismo sistematicamente incluídos na
função educativa. A educação libertária buscou substituir tais características por uma
formação em que o aluno fosse desde o início o sujeito do processo. Essa concepção
tem raízes no anarquismo político desta mesma época.
A crença central do movimento Anarquista era uma educação
primeiramente associada à revolução e livre de qualquer comando do estado, pois como
se entende, os anarquistas não confiavam em nenhum tipo de governo, ainda que o
governo fosse revolucionário. Os anarquistas acreditavam no progresso da humanidade,
do homem do século XIX. Tinham convicção que a educação deveria despertar anseios
individualizados e mentalidades libertárias. Por Sonia Marrach, segundo Malatesta,
“não existem homens excepcionais nem partidos providenciais
capazes de substituir a vontade própria de fazer o bem pela
força. A vida toma sempre as formas que resultam do contraste
dos interesses e idéias daqueles que pensam e querem. Portanto,
provocamos a todos a pensar e a querer” ( Luizzeto,1987,p.44
apud Marrach Sonia,2009, p.124)
O mundo vivia um momento de transição entre os séculos XIX e XX,
nesta época surge um educador espanhol que colocou as práticas libertárias a serviço da
educação. Francisco Ferrer (1859-1909) criou as escolas livres com uma disposição
incansável de desafiar a educação oficial e a confessional, as escolas gerenciadas pelo
estado. Ferrer é oriundo da geração que sofreu grandes mudanças na Espanha com as
invasões napoleônicas. Período de mudanças políticas e culturais, assim como o
crescimento das artes e da literatura.
No plano político, com a maioridade de Isabel II (1843), emerge o
reformismo com a manutenção da tradicional união Igreja e Estado. Em 1869 a
25
liberdade de culto é votada pela primeira vez na Espanha. A rainha refugia-se na França.
As cortes proclamam a República. O exército era o único dono do poder ostensivo.
Apesar do acordo entre estado e Igreja, as ideias democráticas aos poucos conseguem
penetrar.
Ferrer entre outros revolta-se contra o passado político espanhol e contra
a burguesia mais interessada no poder do Estado que na liberdade. Revolta-se contra a
carência da educação que havia na Espanha de 1845.
O “ensino primário obrigatório, conforme lei 21 de Julio de 1838,não foi efetivado.
Quatro milhões de habitantes, em dezesseis, sabiam ler. Durante os 30 anos posteriores,
até 1907, essa cifra elevou-se para 6 milhões em 18 milhões de habitantes”
(Tragtenberg,1982,p.97 in Marrach, Sonia, p.125).
Francisco Ferrer, entre muitas escolas e universidades, funda também “a
editorial” para publicar obras pedagógicas racionalistas. Percebeu que o ensino das
escolas laicas tornava-se tão deturpado e preconceituoso como o das escolas católicas e
oficiais, e mostrou seu desapontamento assim:
Deus foi substituído pelo Estado; a virtude cristã pelo dever
cívico; a religião pelo patriotismo; a submissão e a obediência
ao rei, ao aristocrata e ao clero pelo atacamento ao funcionário,
ao
proprietário
e
ao
patrão
[...]
[Daí que] a idéia de ensino não deveria ser acompanhado de
nenhum qualificado; responde, unicamente, à necessidade e ao
dever que sente a geração atual de preparar a nova geração,
entregando-lhe o patrimônio da sabedoria humana” ( apud
Luizzeto, 1987, p.60 apud Marrach Sonia, 2009, p.129)
26
Ferrer cria a escola moderna, uma escola com propostas diferentes, uma
escola liberal, uma forma de educação que visava a um ensino racional e científico, livre
do domínio do estado e da Igreja. Baseava-se nos princípios da razão e da ciência.
Fundamentada “Desenvolvimento da dignidade e da independência pessoal, e não na
piedade e na obediência”; fundada “ na abolição da ficção divina, causa eterna e
absoluta da servidão”( in Marrach, Sonia, 2009, p.126)
Defendia a união entre a teoria e a prática, um ensino ligado à realidade, onde o saber
retórico e livreiro é substituído pelas indagações, pela capacidade de unir razão,
sensibilidade e método científico. Numa sociedade profundamente patriarcal e
hierárquica a nova escola de Ferrer propunha uma prática de educação de coeducação
das classes sociais para promover o companheirismo e as relações horizontais.
Promoveu a coeducação de gêneros com o intuito de educar integral e harmoniosamente
a homens e mulheres. A escola libertária acabou com algumas práticas rotineiras das
escolas tradicionais.
1) A disciplina férrea pela disciplina necessária. Em vez de impor uma disciplina na
qual se fingia obediência e atenção e em segredo se brincava.
2) Fim dos programas oficiais. Estabelecidos por uma autoridade centralizadora, criava
uma uniformidade educacional. Oferecia a livre iniciativa e a originalidade.
3) Eliminar o sistema vertical de exames, classificação e notas, que gerava rivalidade e
rancor entre os educandos.Promovia relações de desenvolvimento da liberdade e da
solidariedade.
Época de crise da sociedade burguesa, ebulição social e ascensão do
movimento operário, a questão social era tratada como caso de polícia, um momento em
que não havia direitos sociais, nem políticos, nem educacionais. A educação era
extremamente elitista. A ausência de estado na cultura, na área trabalhista, na educação,
na área previdenciária, impede o acesso da classe trabalhadora à educação a aos bens
culturais.
Em meio a toda essa dinâmica a educação estreita a relação com os
movimentos sociais e com isso demonstra a preocupação com um mundo melhor. E a
parir daí será o norteador da nova educação. A escola tradicional entra em crise e abrese o caminho para a proposta libertária de educação. Uma escola articulada com a
27
ideologia popular e a cultura anarquista. A nova escola promulgava uma educação
emancipadora, com ideologia anarquista, que buscava esclarecer o trabalhador e
promover uma sociedade livre, sem Estado.
2.8- PEDAGOGIA LIBERTÁRIA NO BRASIL
Após a abolição da escravatura no Brasil, e temos de lembrar que o
Brasil foi um dos últimos países em que ocorreu de fato o fim da escravidão, inicia-se o
processo de substituição dos escravos por trabalhadores. Quantidades e quantidades de
imigrantes oriundos da Espanha, da Itália, do Japão, da Arábia e da Suíça chegam para
fazer o serviço de lavoura e os primeiros citadinos, acelera-se a transição entre a
sociedade agrária-escravocrata e sociedade urbano-industrial. Em 15 de novembro de
1889 o Marechal Deodoro da Fonseca proclamou a República, o povo não entendia o
que ocorria e ignorava o significado de República que é a coisa pública , o bem público
do qual todo cidadão deveria cuidar e representar de forma democrática.Ao contrário o
que se viu foi uma República dos militares, dos coronéis, do voto de cabresto, da
política do café com leite, do liberalismo nos quadros do coronelismo, da enxada e do
voto, bem estudados por Vitor Nunes Leal(1948)
O Brasil passava pelo processo da industrialização, provocado pela
dificuldade das importações causadas pela explosão da primeira guerra mundial que
fechava os mercados e obrigava aos países importadores a industrializar-se rapidamente.
A necessidade promulgou a industrialização brasileira. As indústrias nasciam e os
imigrantes garantiam a mão de obra. Os operários trabalhavam 12, 14, 16 horas diárias e
desconheciam qualquer tipo de direito, nem seguro saúde ou previdência social. Porém
esta situação mobilizou muitos imigrantes, principalmente italianos e espanhóis, que
traziam consigo a cultura de lutas sociais e políticas. Nasceria, então, o movimento
operário anarquista, que lutava por uma sociedade livre, coletivista e sem Estado.
Nas primeiras décadas do século XX fundaram-se muitas escolas e
universidades, centros culturais, bibliotecas e grupos de teatros com o único intuito de
promover o esclarecimento no sentido de autoemancipação
28
“verificamos o nascimento de uma classe operária sem vínculos
diretos com a cultura nacional, mas, pelo contrário, sendo uma
combinação internacional de tradições culturais europeias
diversas, trazidas com os imigrantes, com experiência [...]
advinda do trabalho camponês, do trabalho escravista do
pequeno setor artesanal e industrial das cidades (Harman,1983,
p.68)
As escolas libertárias eram mantidas por doações e pagamento de
mensalidades por alguns alunos que podiam pagar, as escolas sobreviveram
precariamente por seis anos, de 1913 a 1919, um período de grande ascensão do
movimento operário anarquista e de grande repressão a partir da grave de 1917. Na
época dos fechamentos das escolas livres havia 150 alunos. As escolas em sua maioria
eram ministradas por professores que trabalhavam em outras escolas e davam suas
contribuições nas escolas libertárias.
Em 1914 foi inaugurada a universidade popular de ensino livre
no Rio de Janeiro. Esta universidade seguia a proposta de Ferrer
y Guardiã. Era dirigida por Elísio de Carvalho, Vitor Schobnel,
Tito de Miranda e Mota Assunção, que integram o conselho
administrativo. Os cursos eram Direito, Psicologia, História,
Sociologia, Antropologia, literatura, Matemática e Biologia(
Rago,1997)
O objetivo da escola tradicional é adaptar o indivíduo à
sociedade, formando personalidades dóceis com os superiores, e
autoritárias com os inferiores, a pedagogia libertária é contra o
exercício do poder e o verticalismo da hierarquia social. A
pedagogia libertária visa à formação integral do indivíduo capaz
de interagir igualmente com outros indivíduos, em sociedade
onde todos possam conviver de forma horizontal. Assim
sacrifica os dogmas, a cultura oficial, as autoridades estatais e
29
eclesiásticas, para formar um indivíduo que tenha iniciativa,
criatividade, imaginação, vontade própria, capacidade de
observação, independência, enfim, autonomia intelectual.
Diferente das escolas de massas, que vê a criança como um
pequeno selvagem que precisa ser civilizado, os anarquistas
acreditavam no princípio da bondade natural de Rousseau. A
matriz do pensamento libertário e iluminista, fundamentada na
concepção rousseauniana da bondade natural do homem.
( Marrach, Sonia, 2009, p.131)
Ferrer opta por uma educação libertária, sem prêmios ou castigos, uma
educação que procura ministrar os conhecimentos de acordo com tendências e as
curiosidades da criança. Diferentemente da concepção originária do vocábulo educar
que vem do latim educare e significa “endireitar o que está torto”.
Na educação libertária o professor se aproveita das curiosidades e
oportunidades para chegar ao conhecimento. O ensino, das escolas livres, deve ser
prazeroso, por meio de jogos e atividades lúdicas, rompendo as barreiras entre trabalhos
manuais e intelectuais.
“ falando mais ao olhar que ao ouvido, dedicando-se mais à
inteligência do que à memória, esforçando-se por desenvolver
harmônica e integralmente seus órgãos.O professor tem pouco a
ensinar, mas deve observar muito, e aproveitar as circunstâncias
para que seu aluno descubra por si mesmo os inúmeros fatos de
todo o gênero, as múltiplas relações que mantém entre si”
( Rago, 1997, p.150).
Porém, diferentemente da matriz iluminista, em que o filósofo e o
professor passam, ou seja, levam conhecimento ao povo, esclarecem o povo, na
educação libertária é diferente se valoriza a auto-aprendizagem, se individualiza, ao
30
contrário de uma educação de massa que se passa de mesma forma para todos,
ignorando as diferenças cognitivas e a capacidade que o indivíduo tem de aprender por
si só. Nas escolas livres se valoriza a iniciativa pessoal, embora se trabalhasse em
grupos de alunos e professores, porém, tratava-se de valorizar o interesse e o
conhecimento individual de cada educando. Sobre esse ponto de vista a escola
tradicional e a escola de massificação uniformizam os indivíduos e a segunda massifica
o conhecimento, todos indistintamente devem aprender o determinado pelo programa
oficial do curso em que o educando se encontra, todos têm que chegar ao conhecimento
ao mesmo tempo, ignorando-se diferenças individuais de conhecimento prévio e a
velocidade de apreensão. Os conceitos fundamentais na educação libertária de Ferrer
são os de autodidatismo e autoemancipação, vinculados às práticas sociais anarquistas.
É importante sinalizar que o autodidatismo é inerente à capacidade humana de
conhecer. Forma importante de conquistar liberdade individual, o sujeito do
conhecimento afirma-se opondo-se ao ensino massificado despolitizado de transferência
de noções desarticuladas e fragmentadas em doses homeopáticas.
Tragtenberg foi um grande exemplo de autodidatismo por resistência às
práticas de dominação escolar e por sobrevivência intelectual. Tornou-se professor
universitário e expressivo crítico do regime militar entre os anos 60 e 80. Durante seus
anos de escola adorava ler, porém não aguentava as regras escolares. Era leitor de livros
proibidos e costumava ler escondido e frequentar a biblioteca municipal de São Paulo e
em algumas de suas “universidades”como ele dizia conheceu Antonio Candido,
Florestan Fernandes e outros intelectuais, com os quais passou a conviver e a discutir.
Frequentou outras bibliotecas e Centros Culturais Anarquistas. Esses centros culturais
tinham papel de formação política e cultural.
O indivíduo acreditava ver claro, o esclarecimento era favorecido pela
polarização ideológica, ou se estava de um lado ou do outro, havia certa clareza nas
posições ideológicas e políticas. Comparando aos novos tempos com a massificação da
cultura o esclarecimento está muito mais difícil, pois não se encontra mais definições
políticas e posições culturais. Marrach faz uso das palavras de Ferro para ilustrar tal
situação:
31
Hoje em dia, através da televisão e do cinema, as pessoas estão
mais bem informadas do que há 30 anos atrás. Isso produz uma
chuva de informações que são bem gravadas pelo público, más
não são coordenadas, são totalmente disparatadas. Há 30 anos
havia menos informação, mas, como havia polarização
ideológica, o individuo era chamado a aderir ou a combater, e,
assim acreditava ver claro, enquanto hoje se sabe que não é
possível ter clareza de nada. (FERRO, Marc 2004, p.3 apud
Marrach, Sonia, 2009, p.136)
Segundo as palavras de Ferro, hoje, com a massificação das informações
o indivíduo as recebe, porém não consegue coordená-las e interpretá-las. Parte da
imprensa, seja ela escrita, radiofônica ou audiovisual, veicula informações tendenciosas
e vinculadas a interesses políticos, patronais e comerciais. A imensa quantidade de
informações sobre diversos temas de interesses coletivos apenas chegam às grandes
massas se aprovadas e vistoriadas pelo crivo dos interessados de que esta, ou aquela
informação, se ventile entre a massa. A seleção e restrição de informações, assim como
o tempo controlado das pautas são minuciosamente calculados para ministrar o
conhecimento de muitos, subjugados as considerações de poucos. Estes, os
controladores da informação, avaliam o tempo das matérias; algumas não se delongam
com assuntos se não reverenciam seus interesses patronais ou políticos, encurtando e
administrando em um pequeno flash, por outro lado, em uma demonstração de domínio
e força superior total de controle, pautam autopropagandas e artigos nos quais
visivelmente respondem a apelos emocionais com fins de domínio do conhecimento; é o
informar desinformando. Informam o que lhes interessa e distorcem o que lhes afetaria
se a grande massa chegasse ao esclarecimento. O esclarecimento está cada vez mais
distante, pois sabe-se que o conhecimento se faz com uma avaliação da informação,
porém, frente aos televisores a massa entrega-se aos impulsos visuais e auditivos sem
perceber que controlam pensamentos e emoções e, por conseguinte, retiram-lhe a
possibilidade de esclarecimento. A falta de esclarecimento evidencia e justifica a falta
32
de entendimento e quão difícil pode ser avaliar a situação real ou velada da sociedade, o
indivíduo sequer se reconhece como partícipe envolvido e crítico do processo de
desenvolvimento social.
2.9- MARKETING E PUBLICIDADE NO CONTROLE
Há algum tempo o Marketing e a Publicidade de massa tem decidido
eleições, derrubado e eleito presidentes, entre outras provas cabais de domínio massivo.
Hoje não se encontram mais as antigas e bem definidas ideologias partidárias, os
partidos e seus políticos, que o constituem, não carregam consigo a cara e a ideologia de
outrora, esvaindo o sentido claro de forma de pensamento que em outros momentos era
absolutamente entendido pela massa. Esvaído de ideologia e filtrado pelos controles dos
meios de comunicação de massa, a cultura política perde sentido e confunde o
eleitorado comum, àquele que antigamente podia facilmente definir-se ao seguir um
partido que afirmava suas características. O indivíduo encontrava nos partidos
semelhanças na forma de vida social em que acreditava.
Diferentemente da cultura de massa que fundiu a propaganda à
publicidade e levou tudo ao mercado, a cultura libertária na primeira década do século
XX usava a propaganda a serviço da difusão das ideias anarquistas e da divulgação das
práticas sociais e pedagógicas do movimento. A propaganda das Escolas Livres era feita
pelo jornal A Lanterna, um dos jornais que mais as divulgou.
Esta Escola servir-se-á do método indutivo demonstrativo
objetivo, e basear-se-á na experimentação, nas afirmações
científicas e raciocinadas, para que os alunos tenham uma idéia
clara do que se lhes quer ensinar. Educação Artística, Intelectual
e Moral- Conhecimento de tudo quanto nos rodeiamConhecimento das ciências e das artes- Sentimento do belo, do
verdadeiro e do real- Desenvolvimento e compreensão sem
esforço e por iniciativa própria –As matérias a serem iniciadas,
33
segundo o alcance das faculdades de cada aluno- constarão de
leitura, caligrafia, gramática, aritmética, geometria,geografia,
botânica, zoologia, mineralogia, física, química, fisiologia,
história, desenho, etc. (Hardman, 1983,p.75)
O anúncio evidencia a opção pelo método científico, voltado para o
entendimento da realidade, fazendo com que o educando pensasse e entendesse a
realidade em que vivia, ao contrário de uma cultura de massificação em que o educando
era preparado para algum fim. Os educandos na escola livre eram personalizados e
aprendiam dentro de seu ritmo, independente de sua idade e da série em que se
encontravam, a individualidade era muito valorizada, como também as curiosidades e os
anseios e a vontade de aprender de cada educando. O trabalho era norteado com base
nas vontades levantadas pelo próprio educando, não havia um planejamento fechado,
igualitário e geral.
Também foi na primeira década do século XX que iniciou-se o combate
entre os meios de comunicação. A publicação de anúncios como o citado eram comuns
nos jornais de movimento anarquista, contudo, com a difusão desta ideologia e
crescimento do esclarecimento que os jornais proporcionavam, surgiu o levante
contrário. Era o início dos jornais de cultura de massa produzidos pela Igreja e o
Estado.Vejamos artigo produzido pelo jornal A Plebe.
Os padres, coitados, andam às tontas para ver se conseguem
escorar o edifício da sua seita parasitária [...] eles lançam mão
de todos os recursos de catequização a fanatismo. Domingo, na
igreja do Belenzinho, houve sessão cinematográfica com o
intuito evidentíssimo de atrair para aí meia dúzia de pobres de
espírito. De modo que a igreja- que já era taverna, casa de
tavolagem, bordel elegante e frege tenebroso- acrescentou,
agora, a todas essas boas qualidades, a de casa de. . .
espetáculos! (Hardman, 1983, p.78)
34
O artigo retratava a grande preocupação que os anarquistas tinham com o
aumento da cultura de massa estabelecido pela Igreja e o Estado. Outro fator importante
era o crescimento do extraordinário poder de comunicação e persuasão da linguagem
cinematográfica.
Lembrando um pouco a história pregressa durante os primeiros anos de
República, o que caracterizava o momento histórico era a exploração das indústrias, no
auge da crise burguesa em versão liberal, época marcada pela ausência de lazer de
massa. Houve espaço para o crescimento de cultura popular e para o desenvolvimento
pedagógico libertário. Não existia legislação trabalhista, fato que fortalecia a revolta
contra a tirania das fábricas e do Estado, alimentando a luta de classes cultivada pelos
movimentos operários idealizados pelos imigrantes que trouxeram a experiência das
lutas sociais de seus países de origem.
Para os libertários, a escola pública no modelo iluminista, assim como a
religiosa, era vista como uma escola opressora, repressora, de doutrinação ideológica e
de intervenção na cultura popular. Os iluministas colocaram em discussão a escola
pública em prol do esclarecimento, por outro lado, os adeptos da escola libertária
mostraram que o iluminismo ficou reduzido a uma forma de controle e domesticação,
que reduzia a imaginação criativa dos educandos. Segundo Enzensberger
A substituição do conceito de iluminismo pelo de educação
associada à preocupação de pôr fim ao analfabetismo das massas
foi uma notícia boa demais para ser verdadeira. Os povos
aprenderam a ler e a escrever não por vontade própria, mas
porque se viram obrigados a tanto. A emancipação deles foi
simultaneamente uma cassação dos seus direitos. A partir de
então, o ato de aprender passou a ser controlado pelo Estado e
suas agências: a escola, o exército e a justiça. ( Enzensberger,
1995, p. 47- 139)
A pedagogia libertária queria resgatar o Iluminismo clássico, o de
Rousseau, a noção de autoemancipação como forma de substituir a escola opressora e
35
doutrinária, em que o educando tinha que reproduzir conceitos, educandos presos
durantes horas em uma sala de aula. Ao contrário, idealizavam uma escola aberta, em
que educando pudesse desenvolver a curiosidade, a vontade de entender, os desejos de
conhecimento espontâneo, de forma lúdica e prazerosa.
Ao contrário da pedagogia de massa a pedagogia libertária foca a
educação no educando, desenhando e estabelecendo juntos educador e educando as
metas e prioridades que devem ser trabalhadas, com vistas sempre em aproveitar as
curiosidades e os interesses do educando na busca da construção do conhecer
esclarecedor.
Um educando que participa de sua educação e de sua formação como o
protagonista da mesma, por outro lado, a pedagogia da igualdade que não respeita as
curiosidades dos educandos, afastava cada vez mais o autodidatismo, o envolvimento e
o protagonismo do educando e transformava-o em um repetidor de conteúdos.
Conteúdos sem significado, sem bases sólidas, sem porquês, havia de se estudar, pois
urgia a necessidade de cumprir com o conteúdo programático imposto pelo Estado.
Programas estabelecidos que seguiam as normas de educação do controle das
almas.Uma educação opressora, castradora e ausente, uma educação que desrespeitava
as diferenças e punia a genialidade da criatividade colocando a todos no bojo da
mesmice.
Enquanto uma resgatava a vontade de conhecer e reconhecer a forma de
pensar e aprender e reaprender por meio de atividades emancipadoras, em que o
educando é figura indispensável e a mais importante dentro do processo de ensino
aprendizagem, na outra, a educação vem em blocos engessados de conhecimento como
única forma correta de ver os fatos e entendê-los como irrefutáveis e inquestionáveis.
Os educandos eram meros expectadores, criaturas de absorção de retenção de realidades
e valores inquestionáveis.
36
2.10- A ESCOLA NOVA BRASILEIRA ÉPOCA DE TRANSIÇÃO
Os novos tempos e os velhos problemas se misturavam em meio à
transição entre a sociedade burguesa em sua versão liberal para a sociedade industrial
administrativa, somado aos efeitos da primeira Guerra Mundial e, sobretudo, a partir
dos anos 20, anos de crise da velha República. Vivia-se uma explosão de movimentos e
de lutas sociais, com diferentes tendências políticas e ideológicas que buscavam
mudanças
em
vários
setores.
Depois
da
sociedade
Agrária-escravocrata
e
posteriormente pelo Urbano Industrial, a sociedade clamava por mudanças e
exteriorizava a sua vontade organizada em grupos, como o Comunista e o Integralista.
Na esfera cultural surgiu o Movimento Modernista, que contestava o estudo realista
parnasianista e cultivava o gosto pela pesquisa e a busca da compreensão da realidade
nacional, vinculada às novas tendências vanguardistas européias.
Com a semana de arte Moderna de 1922 os professores, educadores,
escritores, intelectuais e jornalistas expressaram os anseios pela renovação educacional
do País. O movimento expressou o pensamento liberal democrático da Escola Nova,
que adequava a educação à realidade vivida pelos educandos, de forma que, colocava-se
o esclarecimento a serviço da razão voltado ao desenvolvimento da ordem social e
econômica atual. Para seus idealizadores a escola nova era um laboratório de vida
democrática que dever-se-ía transformar em agente de desenvolvimento social,
econômico, político, cultural da sociedade capitalista liberal-democrática.
[...] constituiu uma das maiores expressões desta corrente, e teve
grande influência nos educadores brasileiros que atuaram entre
as décadas de 1920 – 1960, como Fernando Azevedo, Anísio
Teixeira e Cecília Meireles. Esta última só se tornou conhecida
como educadora escola-novista recentemente, após a publicação
de suas Crônicas de Educação [...] Anísio Teixeira doutorou-se
37
na Universidade de Colúmbia, onde conheceu o mestre da
Escola Nova, que tanto influenciou seus trabalhos. Fernando de
Azevedo, redator do célebre Manifesto dos pioneiros de 1932,
fez seus o pensamento da Escola Nova, então, endossada pela
maioria
dos
intelectuais
e
educadores
da
época.
(Jonh Dewey 1859-1952 apud Marrach,Sonia, 2009, p. 170)
A ideia era fazer uma educação para esclarecer o povo, para criar a
cidadania, propunha-se uma ampla reforma na educação. Precisava-se educar para a
cidadania, o povo tinha de aprender a cuidar da República e de tudo que fosse público.
A escola foi eleita como a instituição que reformularia a República,
“Tratava-se de esclarecer o povo, de formar a cidadania para reconstruir a República”
(Boto 1996).
Tempo de terreno fértil para a expansão das ideias da escola nova, uma
vez, que a economia cafeeira crescia e trazia consigo a multiplicação das atividades
urbanas com o crescimento dos setores de serviço público e de serviços, assim como o
crescimento das atividades financeiras. Tudo contribuía para a necessidade de se formar
cidadãos capazes de trabalhar nas máquinas das indústrias, havia-se de preparar o
funcionário para trabalhar no comércio, de escritórios técnicos, de planejamento, o
contador, o professor, o funcionário público, sem esquecer as carreiras tradicionais
como médico, engenheiro e advogado, militares e burocráticos da República. Período de
grande “entusiasmo pela educação e de otimismo pedagógico1”
O primeiro foi resposta ao estado republicano de educar a população, e o
segundo, a crença nos novos modelos educativos. Tudo isso deu base à reforma
educativa feita por Fernando Azevedo, Anísio Teixeira e Sampaio Dória em diversos
estados da federação, entretanto, o momento exigia muito mais que o que se fazia,
exigia uma reforma educacional de toda a nação, já que a escola nova prepararia o
indivíduo para o trabalho, para a cidadania e para o desenvolvimento da nação. Pode-se
comparar a Semana de Arte Moderna de 1922 como um marco e divisor de águas para a
1
Termos utilizados por Jorge Nagle, 1978 na Primeira Conferência Brasileira de Educação comenta
MARRACH, Sonia, 2009, p. 171 em Outra histórias da educação Do Iluminismo à Indústria Cultural (
1823-2005)
38
arte contemporânea brasileira, com o manifesto dos pioneiros da nova educação,
publicado no Jornal O Estado de São Paulo. Após balanço de 43 anos de regime
republicano em 1932, Fernando Azevedo afirma que na “hierarquia dos problemas
nacionais, nenhum sobreleva em importância e gravidade do da educação”( AZEVEDO,
Fernando, 1932, p. 59), Fernando propõe uma educação em que alargue os limites para
além das classes sociais, uma educação em que todos tenham as mesmas chances, que
se faça uma educação sem hierarquias de classes, e sim, por capacidade. Acreditava que
a educação não devia ser para poucos, devia ser para todos sem distinção de classes ou
credos e, conseqüentemente um dever do estado. Um estado capaz de dar oportunidades
de igualdades básicas para então selecionar os mais capazes, principalmente no ensino
médio e superior.
Os pensadores da escola nova acreditavam que a educação era a única
forma e a chave para o progresso individual. Os idealizadores da escola nova desejavam
uma escola única para crianças de 7 a 15. Era preciso garantir a laicidade e a
obrigatoriedade do ensino da gratuidade e da coeducação dos gêneros, das classes e das
etnias para se harmonizarem com os direitos do Homem e do Cidadão. Após a escola
primária e o ginasial, hoje nomeadas de Ensino Fundamental I e Fundamental II,
somente os melhores, os que por merecimento chegariam à escola secundária e à
superior, hoje conhecida por Ensino Médio e Superior. Cada nível teria seu papel,
caberia a escola primária ministrar o ensino básico a todos de modo que todos pudessem
competir em regime de igualdade.
Assim à escola secundária caberia unificar para evitar o divórcio entre os
trabalhadores manuais e intelectuais. A escola forneceria uma base comum cultural
geral durante três anos, para então possibilitar a escolha entre humanidades, ciências,
física, matemática etc ou a seção de preferência manual, a escola técnica, em que os
alunos poderiam escolher entre cursos profissionalizantes agrícolas, industriais,
comerciais etc. Apenas depois disto os mais capazes iriam para as universidades.
Na Universidade, caberia a ela ampliar os conhecimentos científicos e
culturais, mudando a mentalidade estatal, e abrindo o quadro à formação de diversas
profissões que exigem conhecimento científico mais profundo, não ficando apenas
restritos aos cursos mais tradicionais como Medicina, Engenharia e Direito.
À
universidade caberia sobretudo a formação de professores para todos os graus de ensino.
39
Daí o papel fundamental das ciências humanas e pedagógicas para
divulgar as ciências e a cultura por meio de instituições sociais. A universidade
proporcionaria ao indivíduo um meio de conquistar espírito crítico, capacidade de
síntese, coerência nas ideias e os princípios metodológicos e teóricos necessários à
conquista do método do pensamento científico. As ideias de Fernando Azevedo
nortearam a criação da USP em 1934, durante o governo de Armando Salles de
Oliveira, uma grande marca entre as grandes conquistas que o manifesto trouxe consigo
para o benefício da cultura. Por um lado em meados do século XX parecia que tudo
caminhava para o sucesso de uma nova organização escolar que ia ao encontro das
necessidades do ainda jovem país. Por outro lado e do outro lado, em época do
manifesto dos pioneiros, a intervenção do estado na economia, na área social,
educacional e trabalhista, por meio de uma ditadura de 15 anos que sacrificou os
conceitos centrais de democracia e liberdade do manifesto. A ditadura instituiu a
modernização conservadora pela força. A escola, durante a ditadura passaria por outra e
nova reformulação à sua frente o mineiro Francisco Campos que remodelou apenas a
escola secundária dividindo-a em dois ciclos: Durante os três primeiros anos se
ministrava uma base cultural geral, aí então o aluno optaria entre os cursos clássico,
científico, normal ou técnico, em diversas áreas do conhecimento.
2.11- CECÍLIA MEIRELES, CRONISTA DE EDUCAÇÃO
A Ditadura trouxe consigo um grande retrocesso no caminho galgado
pelo país, é deveras difícil comensurar os malefícios que a ditadura causou. Viveu-se o
fim da liberdade de expressão e liberdade de produções literárias, censurar sobre todos
os meios de comunicação, tortura, assassinatos, controle total e absoluto garantido por
meio de violência. Época em que não se respeitava nenhum tipo de direito civil. Nas
escolas, voltou-se ao controle total do estado. A nova organização sobre a nova
organização visava responder aos interesses da ditadura e evitar qualquer tipo de
esclarecimentos. O sonho de uma educação esclarecedora e para todos ficaria
engavetado por 15 anos.
40
Muitos intelectuais e pensadores em geral se exilaram em outros países,
muitos foram presos e alguns mortos e torturados. Intelectuais que ficaram encontraram
algumas formas de lutar contra o regime que assolava o Brasil. Nesta pesquisa vale
lembrar a poeta, Cecília Meireles, que “procurava o verdadeiro nome das coisas, que
nunca deixou de diferenciar o sonho de realidade, o ideal do real”. Sonia (p.178).
Assim disse sobre a reforma de educação de Francisco Campos
“Chama-se isso de liberal. [...] Oh! Mas, afinal, sejamos
coerentes. Façamos o déspota. Façamos o vizir, façamos, de
certo modo, o César do século XX. Mas conservemos a
significação dos nomes.” [...]” nos coloca nas velhas situações
de rotina, de cativeiro de atraso que aos olhos atônitos do mundo
proclamarão, só por si, o formidável fracasso da nossa
malograda revolução. [...] Pois na sociedade que desejamos, os
homens e as mulheres adquirem liberdade por meio da
educação. É preciso, portanto, facilitar-lhes a evolução, o
desenvolvimento, as capacidades – coisas impensáveis na
Reforma Francisco Campos, que constitui um feixe de
“pontudos espinhos de taxas”, uma verdadeira “reforma de
preços” (MEIRELES, Cecília, 2001, p. 24)
Cecília Meireles acredita que o grande problema da educação é o medo
da liberdade, e ao mesmo tempo é o maior desafio do mundo moderno. A liberdade é o
problema fundamental da educação humana.
“E fomos educados para o medo”( Drummond ,1973, p. 81).
O grande segredo é enfrentar os medos, segundo Cecília Meireles , temos medo da
liberdade, medo da vida, medo de tudo.... somos refratários a tudo à evolução, às
mudanças, à educação, à vida. Quando encontramos uma maneira repetida de realizar
alguma atividade nos agarramos à forma num meio de segurança e conforto do
41
conhecido. Costumamos confundir educação com modos afáveis dos que tem certo
número de fórmulas de cortesia.
Questionada
Meireles
-
Então
o
que
é
Educação
com
E
maiúsculo?
- Educação para a vida . Responde Cecília - E o que é a vida? O que é a vida para
uma criança?
Cecília ( 2001, p. 12) extrai do livro de Piaget o diálogo abaixo entre o educador e uma
criança:
- Tu achas que água vive?
- Água também vive. Tudo vive. Se não vivesse, não estava no mundo. Como é que
podia estar no mundo se não vivesse.
[ Ela comenta] tudo que está no mundo, segundo essa menina, vive. A prova de que
vive é esta: estar, ser. Quanto ao por que dessa vida, confessa a incapacidade de o
definir.
No mundo acelerado, correndo contra o tempo na direção supostamente
do progresso, o indivíduo se concentra em manter o equilíbrio, em busca de evitar o que
parece pior. Entretanto neste olhar de auto-sobrevivência deixa-se de lado uma
apreciação mais ampla do que rodeia, perde-se o olhar atento, vigilante, e perde-se a
capacidade de apreciar a vida. Cecília questiona se a vida não é alguma coisa de sentido
mais profundo, de alguma coisa mais lenta, feita de coisas interiores? Essa vida mais
interior e mais profunda passa pela busca da liberdade. Liberdade interior, liberdade de
reconhecer, liberdade social e política.
42
CAPÍTULO 3
Pode-se ver algo sartriano no questionamento da Cecília Meireles. O
medo de exercer a liberdade é algo inerente ao ser humano. Meireles refere-se do medo
à liberdade seja ela na educação, ou de existir em uma sala de aula, ou em uma
sociedade democrática, anarquista ou ditatorial, ou o problema de existir em sua
amplitude, sem nenhuma referência à profissão ou credo. Em todas as situações o
indivíduo não está livre da influência que a situação histórica, política e social exercem
sobre a sua vida. Cecília Meireles entende que, de alguma maneira, o indivíduo agarrase a uma forma repetida de fazer as coisas, pois assim sente-se confortável e seguro,
considera o ser humano refratário a mudanças, pois as teme. Para Meireles, o medo da
liberdade é o grande problema da educação e do mundo moderno. O terceiro capítulo
fez com que esta pesquisa buscasse os fundamentos do existencialismo sartriano, pois,
como se sabe, o grande filósofo francês não dedicou seu trabalho à educação, dedicouse a elucidar a luta que é exercer a liberdade e o quão angustiante e frustrante podem ser
as escolhas. Nota-se leve pensamento sartriano nos comentários e nos pensamentos de
Cecília Meireles. Portanto, neste quarto capítulo estudar-se-á a filosofia existencialista
de Sartre como fundamentação filosófica para entender a questão da liberdade.
3.1- SUBJETIVIDADE E EXISTÊNCIA EM SARTRE
Há muitas referências de Sartre na história da filosofia, porém alguns
historiadores costumam dizer que foi a partir de Hegel e Heidegger que Sartre
fundamentou seus estudos. É de Hegel que provém à possibilidade de compreensão da
realidade por via de sua historicidade, a prioridade do devir sobre o ser, a negação como
o impulso do movimento constituinte do real, a razão dialética e o papel da totalidade
do conhecimento. De Heidegger Sartre herda a noção de existência como ser-no-mundo
e a necessidade de compreender a subjetividade pela temporalidade que a constitue.
43
Primeiramente Sartre demonstrou diferenças com a tradição no que diz
respeito à subjetividade metafísica e à subjetividade formal. Para Sartre o movimento é
a conseqüente superação da subjetividade tradicional. O movimento constitui a
consciência e toda consciência é consciência de, com isso, a realidade pode ser atribuída
a consciência, porém uma consciência é somente movimento.
Sartre chegou a esta conclusão quebrando o conceito tradicional
moderno de interioridade como ponto de partida da consciência. A partir desse
movimento intencional compreende-se o que Sartre chama de Para-si, a consciência ou
sujeito, contrária à ideia tradicional de consciência e subjetividade como substância ou
identidade.
O sujeito não é algo que se mantenha idêntico, variando apenas nos
atributos acidentais. O Para- si evoca o movimento da consciência em busca de sua
totalização, que se encontra fora dele e que seria a identidade. Este movimento faz
pensar o sujeito em caminho de autoconstituição e não como uma forma constituída;
pelo contrário, o movimento em busca de completude na transformação de elevar-se do
Para-si ao Em-si.
Se pensarmos no sujeito em movimento (Para-si) voltado para si
chegamos ao que seria o fim do caminho, o ser em sua completude o estatuto máximo, o
Em-si, o ser completo, o ser da tradição moderna, o ser em si, como se de alguma
forma o Em-si fosse o padrão de ser.
Para entender melhor a diferença entre o ser Em-si e o Para-si, pode-se
inicialmente dizer que o Para-si é a negação do Em-si, entretanto caímos na armadilha
da indefinição; se o ser Em-si é o ser acabado, em sua plenitude e completude, como
padrão de ser, qual é o ser do Para-si, se acabamos de reconhecer que o Para-si é o
movimento da consciência em reconhecimento exterior da realidade do mundo, maneira
pela qual o Para-si vai se constituindo por meio deste movimento. Existem então, dois
seres em cada ser? Não, não há dois seres no mesmo indivíduo; o que há, sim, são
modalidades, se levarmos em conta que a existência precede a essência e o ser da
realidade humana consiste na existência. Logo, existir é uma modalidade de ser que se
opõe ao modo essencialista do Em-si. A diferença encontra-se entre o ser Em-si que se
reconhece como ser completo e repousa em si mesmo, na sua completude, e o ser Parasi cuja existência se define pela sua incompletude e pelo movimento de vir-a-ser.
44
O Para-si é o movimento de vir-a-ser, e muito embora o sentido do
vocábulo remeta à contradição no vocabulário tradicional, a contradição ou mal
entendido consiste em que, no caso da realidade humana, ser significa existir, pois vir-aser se deve entender como o que está em busca de se transformar em ser o que ainda não
o é. Embora se aceite que uma maneira de definir o Para-si é a negação do Em-si, não
há entre eles uma dependência do Para-si com o Em-si. Basta clarear que o Para-si traz
em si o não-ser e faz que seja definido como o que não é Em-si. Portanto, o ser Em- si é
referência fundamental e aquilo que o Para- si não é em si e só pode ser compreendido
em relação ao ser pleno. O Para- si é a negação do Em- si e, este, permanece como sua
referência. Então o estatuto do Para-si é a negação do que é constantemente referido ao
Em-si, comparando como o ser nega o não–ser.
Não obstante, Sartre comenta que o não-ser não é simplesmente o
contrário de ser, pois esta dualidade acarretaria estatuto de positividade às modalidades.
O Para-si não é o Em-si, como no exemplo se diz: Que um carro não é preto, querendo
dizer que o carro é azul, neste caso, a negação é imediatamente seguida pela afirmação.
O carro não é preto, pois é azul e não poderia ser de duas cores ao mesmo tempo.
Quando Sartre diz que o Para- si é a negação do Em-si, não diz que ele não é uma coisa,
pois é outra, como no exemplo da cor do carro. O Para-si pode ser definido não pela
negação do Em-si, a sua realidade consiste em negação do ser, na falta de ser, na sua
incompletude, por isso que ele é movimento, e não algo que está no movimento, ele é o
próprio movimento, é o vir-a-ser. Concebido com radicalidade, ele é a própria mudança.
O Para-si possui um caráter de autoconstituição: o sujeito não é, ele se
constitui no movimento de subjetivação. O sujeito está sempre em constante construção
em seu movimento, em constante subjetivação e em ação de subjetivar-se, construindo
aquilo que se torna, pois não há nada no caminho à sua espera. E como não há essência
e nenhuma outra instância determinante, o sujeito será exatamente a sua
autoconstituição, ele será o que ele fizer dele mesmo. Pois na busca incessante do Parasi o sujeito é livre para suas escolhas e a liberdade é, primeiramente, uma
indeterminação no nível ontológico. O sujeito é livre, sendo assim, o que constitui o
sujeito é o próprio movimento, a indeterminação é a constituição do Para-si. O processo
de existência de constituição da subjetividade, da formação do indivíduo mesmo, é
inseparável do exercício da liberdade.
45
A descrição desse processo é o tema de O ser e o nada, que por
isso traz como subtítulo Ensaio de Ontologia fenomenológica.
Não se trata de produzir uma teoria metafísica que explique o
sujeito e sua relação com o mundo e os objetos; tampouco se
trata de elaborar uma psicologia que desvende as características
do ego e de suas vinculações. Assim como Husserl pretendia,
com a fenomenologia, voltar “às próprias coisas”, assim também
Sartre pretende, com o método fenomenológico, uma descrição
da subjetividade em termos das próprias condutas concretas.
Não é caso de explorar a ideia do sujeito ou de sua consciência,
mas sim de descrever compreensivamente as condutas que
manifestam a consciência e a subjetividade. (SILVA, Franklin;
O Filósofo e seu Tempo, 2009, p. 109 in PECORARO, Rossano,
Os Clássicos da Filosofia Vol. III)
Contudo, este movimento do vir-a-ser, da busca de sua consciência, da
construção do Para-si, pois a consciência é vista como o movimento, de acordo com
Sartre e de acordo com a interpretação existencial da intencionalidade, movimento em
constituição da subjetividade, é primeiramente designado como Para-si. Entretanto, vale
sinalizar que para Sartre há dois significados para o termo mencionado; o primeiro Parasi está ligado à reflexividade, ou seja, voltado para si mesmo, visa a si mesmo no ideal
de coincidência; o outro é o processo propriamente dito, o sujeito no processo de existir,
no seu processo de completude, os dois significados se encontram, uma vez que existir é
vir-a-ser e o processo de constituição caminha para si mesmo, os dois convergem, logo
pode-se entender que a consciência de si é a consciência de algo que não se é. O
indivíduo tem consciência do que é e o do que não é. Ou como diz Sartre:
“A realidade humana é o ser cujo ser está além de si” (Idem, p.109)
Esta forma de existir e de constituir Para-si é explicada pela constante
projeção de mim mesmo, o indivíduo está constantemente se projetando, é uma relação
46
entre o ser e o não ser, o ser agora, comparado ao ser que será. O ser da realidade
humana é constantemente projetado ao que virá-a-ser. O ser que ele se autoconstituirá.
Este projeto de autoconstituição está sempre à frente do ser, isto faz que, de alguma
maneira, entenda-se que o ser está adiante, lançado fora de si, como projetado, adiante,
como um projétil, em constituição no decorrer do processo.
Ao projetar-se o ser se assume no futuro, que é justamente a constituição
da subjetividade que virá-a-ser. O Para-si é a realidade humana cujo ser não é
determinado essencialmente, constata-se nesse sentido que o Para-si é a negação do Emsi. O Em-si pode ser entendido como o ser na acepção essencialista da filosofia
tradicional. A fenomenologia da existência de Sartre parte da oposição entre o ser e o
nada, porque o Para-si, que é vazio de ser, só pode ser pensado em relação ao Em-si que
é a plenitude do ser, a completude do ser. Pode-se pensar no ser da realidade humana
como no ser que designa existência, o ser da essência e da plenitude o vir-a-ser é o ser
em autoconstituição, pelo projeto de ser, na medida em que o ser é tudo que falta à
realidade humana.
Daí a paradoxal frase: “O homem é o que não é e não é o que é”. Pois
sua realidade consiste em negar o ser que o constitui, é a negação da essência e o projeto
consiste em vir-a-ser diante de si, negando, superando o que veio a ser o ser que o
constituiu. Transformando o Para-si num percurso nunca completado, um projeto que
lhe escapa ao ser, numa realidade que sempre foge do ser como num contínuo projeto de
ser e refazer-se, algo como uma totalização sempre incompleta. Projeto de vir-a-ser de
uma realidade que não atinge o ser. “A transcendência é o movimento para-ser que,
enquanto constitutivo de existência, só deixará de acontecer com a morte, que é a
interrupção do processo de fazer-se (fazer-se ser); autoconstituição do sujeito”. (SILVA,
Franklin; O Filósofo e seu Tempo, 2009, p. 107 in PECORARO, Rossano, Os Clássicos
da Filosofia Vol. III)
Em meio a todo esse processo o sujeito se vê e se reconhece e toma
consciência de si, pois não se trata de um objeto, o qual, de acordo com suas
características, pode ser definido. O sujeito não é resultado de uma cadeia de causas,
entendendo-se que a realidade humana é um resultado, uma vez que não há ser dado
como causa e efeito de causalidade, em suma o sujeito, compreendido como realidade
47
humana, não pode conhecer-se como objeto. A impossibilidade da objetivação
representa uma dificuldade talvez insuperável para o conhecimento do Para-si. Porém,
não é apenas esse experimento que o sujeito vive em sua existência, há outras relações
que devem ser levadas em consideração, tal como a completude no movimento, o fato
de o sujeito deparar-se com outros Para-si. Logo, o Para-si não apenas se opõe ao Em-si
como fator de realidade constitutiva do Para-si, como também a oposição de um Para-si
a outro Para-si é formadora de subjetividade. Essa relação entre sujeitos, constitutiva da
subjetividade, resulta em consequências no percurso do sujeito em direção de si, afeta o
Para-si.
3.2- LIBERDADE EM SITUAÇÃO
Os sujeitos, ao se depararem uns com os outros no decurso do devir,
(Para-si) de certa maneira exercem algum tipo de influência nos processos de
subjetivações dos sujeitos. Outra consequência seria a consciência de si, um
autoconhecimento lato, como já se viu o sujeito não pode se por como objeto para si
mesmo, este fato não deve ser entendido como se o sujeito não tem consciência alguma
de si, entenda-se que não se trata de uma consciência tética. Não há um afastamento
suficiente para que o sujeito se veja e se conheça. A reflexão é um movimento derivado,
que acontece pegado à consciência não- tética de si.
O sujeito que estava, conforme as teorias tradicionais, imediatamente
presente a si, no existencialismo Sartriano está sempre longe de si, no processo de autoconstituição de si mesmo, que implica em estar sempre no processo do vindo-a-ser,
jamais o sujeito coincide com ele mesmo, fator pelo qual a reflexão não significa voltarse para si mesmo. Reflexão implica em perda de espontaneidade, por que o sujeito só se
vê se o movimento de vir-a-ser se detiver e cristalizar em uma representação de si
mesmo. É sujeito na medida em que vive o contínuo processo de se constituir, porém
pode-se entender que uma maneira de definir a realidade humana seria que o ser
consiste em existir, entretanto esse processo implica no ser fora de si, sempre adiante e
essa forma de existir Para-si fundamenta o projeto.
48
A realidade humana é fundamentada pelo processo de existir por meio
de projetos, é um constante vir-a-ser, o ser da realidade humana nunca descansa, está
em constantes projetos que constituirá o paradoxo de não ser o que é, e ser o que não é.
O ego nunca repousa em si mesmo, porque seu ser consiste em projetar-se para
constituir-se. O tempo tem papel muito importante no projeto, pois como se constitui
sempre adiante, numa constante negação do presente, fazendo do futuro mais forte e
marcante que o agora, lançando ao futuro que é o tempo forte, o vir da formação da
subjetividade. Projetar-se implica em escolhas de ações, e as escolhas levam a pensar
em liberdade de escolhas e de ações ligadas aos projetos. Pode-se entender que para
Sartre há uma vinculação entre a Liberdade e os projetos.
A vinculação entre os projetos e as escolhas é a manifestação concreta do
exercício de liberdade do ser, porém a liberdade da realidade humana é exercida dentro
de um contexto e esse contexto é de certa maneira limitador, este contexto Sartre chama
de situação. O sujeito é livre, entretanto, dentro de uma liberdade situada, ou seja, não
há liberdade sem situação e não há situação sem liberdade. Sartre divide essa situação
dentro da qual o indivíduo tem que exercer sua liberdade em duas vertentes: a primeira
ele chama de facticidade e pode-se entender como fatos da realidade do indivíduo; o
lugar onde vive a situação política, o momento histórico, o tempo, a família, a situação
econômica, entorno social. Em relação a todos esses fatos, o indivíduo nada pode fazer
para mudá-los, pois quando nasceu já existiam e, é neste contexto que o indivíduo tem
que exercer sua liberdade. Surge a questão: como se pode exercer a liberdade plena, ao
mesmo tempo em que se está sujeito a todos esses fatores que, muitas vezes
constrangem e tendem a determinar a existência?
A resposta está na relação do
indivíduo com o meio, a representação, uma realidade à qual o sujeito atribui
significação. Segundo Sartre não existe fato que não possa receber uma significação,
vale a pena sinalizar que no mundo humano não existem fatos brutos, ou seja,
destituídos de sentido humano, pois, neste caso, seria desconhecido e completamente
estranho à experiência. Pois quando se vive um fato, se atribui a ele imediatamente uma
significação. Essa significação é livremente atribuída, de acordo com a importância que
se dá aos fatos. A maneira que se interpreta algo ou alguma coisa. As significações
variam de acordo com a forma que o sujeito relaciona os fatos à sua realidade.
49
Assim, por exemplo, alguém que nasce operário num país
capitalista pode atribuir pelo menos duas significações a esse
fato: pode conformar-se com a situação de ser explorado como
se esta representasse um destino; ou pode tentar mudar essa
situação militando em prol da transformação social. Ambas as
atitudes são possíveis e a adoção de qualquer uma delas depende
do projeto que o sujeito institui livremente para si e para a
coletividade. No plano dos fatos naturais essa atribuição é
igualmente viável; uma montanha representa para o camponês, a
sobrevivência através do cultivo; para o engenheiro que
pretende abrir uma estrada, representa um obstáculo a transpor;
para o alpinista um desafio etc. Para muitos de nós, o gelo do
ártico, representa a impossibilidade de sobrevivência, mas para
os lapões e esquimós representa o meio de vida. Os fatos não
são apenas fatos, são possibilidades que se abrem através de
significação a eles atribuídas. (SILVA, Franklin; O Filósofo e
seu Tempo, 2009, p. 110 in PECORARO, Rossano, Os
Clássicos da Filosofia Vol. III)
Entende-se então que uma relação entre existência e liberdade nos
impede de aceitar uma natureza humana totalmente constituída. Como a existência se
constrói por meio de projetos, de ações, e essas ações passam pelo crivo da
singularidade do sujeito, que é o exercício de liberdade demonstrado através das
escolhas e tudo isso submetido ao mundo em que se vive, no momento em que se vive,
e a situação que se apresenta, em que nada se pode fazer para mudá-la. De acordo com o
visto, é mais correto chamar de condição e não de natureza humana. A condição é o que
se constrói no processo de existir como autoconsciência e a consciência do mundo em
que o indivíduo vive. É algo que não define o indivíduo essencialmente, mas assinala a
singularidade do modo de ser, isto é, o de existir de cada sujeito.
50
3.3- Alteridade ou intersubjetividade: “O olhar” de O ser e o nada
Além da facticidade, que é o conjunto de fatos, naturais e sociais, que
constituem o contexto em que o sujeito exerce a sua liberdade, outro grande
componente da situação é a alteridade ou intersubjetividade. Esse componente Sartre
chama de ser-para-outro, essa relação com outras subjetividades, outras consciências,
outras liberdades, com outras singularidades. O ser exerce a sua liberdade a sua
subjetividade, junto a outras liberdades e outras subjetividades; a intersubjetividade. A
intersubjetividade é um problema difícil para a tradição e para Sartre não foi diferente,
trata-se de tarefa árdua. Explicar a relação entre um Para-si e outro Para-si, uma vez que
para a estrutura sartriana o Para-si é e se constitui projetando-se, o sujeito não coincide
com ele mesmo, é como se de alguma maneira o sujeito estivesse sempre à frente,
mesclado a outro, e chega-se até a confundir o eu de um Para-si com o eu de outro
Para-si, pois estruturalmente o Para-si já é Para outro. A grande dificuldade encontra-se
em entender que o eu de um Para-si não é o eu do outro Para-si. O eu que um Para-si vê
no outro Para-si não é o seu.
Entretanto, Sartre diz que o sujeito torna o outro objeto de seu olhar, é
como se no fluxo de sua existência o objetivasse, nesta passagem por entre um sujeito
com outro num trajeto do seu movimento, um sujeito fixa o outro e atribui a este, com o
qual se cruzou no processo de existir, significado essencial. Um sujeito fixa o outro em
dado momento do fluxo de seu existir e o transforma em objeto de seu olhar, pois o
sujeito só pode apanhar o outro nesse momento, momento em que se cruzam os
“existires”. O sujeito vê o outro como sujeito constituído, não o vê como sujeito se
constituindo e, é por isso que o sujeito estabelece essência objetiva no sujeito com o
qual cruzou, o outro Para-si.
A essência com a qual o sujeito determina o outro
muitas vezes pode adjudicar ao outro uma essência que o sujeito não é, e a
probabilidade do erro é muito grande, como o próprio Sartre dizia: “Eu não posso existir
no outro”. Sartre agride a língua, transformando o verbo intransitivo existir com a
expressão existir no outro, quiçá para melhor explicar que não se pode acompanhar o
movimento de outro sujeito, chegando assim a melhor esclarecimento da alteridade,
cujo tema nem a tradição conseguia explicar. Pode-se interpretar também nessa
dialética, pois até este momento se discutiu o efeito do olhar voltado para quem olha,
51
entretanto Sartre, no livro O ser e o Nada, chama a atenção para outro detalhe, o outro
em que o olhar recai, pode ao reconhecer que está sendo visto e nesse instante rebate
sobre ele uma imagem fixa de objetivação do outro sujeito, este ao se ver visto, sofre
uma objetivação e que poderá até mesmo aceitá-la, assimilá-la como si - mesmo.
Quando um sujeito confere ao outro uma identidade pela qual o reconhece, ocorre a
objetivação, a liberdade do outro , que é sua consciência, será para o primeiro sujeito a
cristalização da identidade objetivada do outro, é por meio das condutas do outro que o
sujeito o objetiva e o cristaliza, e lhe refere identidade, estabelecendo assim a sua
identidade objetivada e fixada. Tenta-se de entender melhor assim o que Sartre chama
de conflito de liberdades, pois um sujeito objetiva outro em meio a liberdade exercida
ou vivida em situação, ou seja, na intersubjetividade. Sartre chega a seu entendimento
de subjetividade e os conflitos da intersubjetividade partindo do capítulo sobre a luta
das consciências( O senhor e o escravo) da Fenomenologia do espírito de Hegel, porém
em Hegel, segundo Sartre, o conflito se dá num contexto e no final as dimensões
subjetivas e objetivas seriam superadas pela totalidade que as reconciliaria, por outro
lado para Sartre essa finalidade não seria atingida, pois no pensamento sartriano a
subjetividade total ou a subjetividade constituída seria a identidade. Entretanto, como se
trata em Sartre, a formação de subjetividade no processo de existir, o percurso é
interminável. A subjetividade nunca se dá por constituída e, por conseguinte a
consciência, que é a totalização da subjetividade, também não chega à totalidade, essa
busca da consciência nunca cessará, a não ser com a morte. A realidade humana nunca
chegará a uma totalidade idêntica a si, porém sempre buscará um processo de
totalização, o qual, nunca chegará ao ponto final, um ponto final inatingível. Contudo,
vale a pena sinalizar que para Sartre a busca da totalização intangível que seria a
concretização da identidade plena é a mola propulsora do processo de existir, que tem
como projeto fundamental o desejo de ser. Sartre entende que esse desejo de ser nunca é
anulado, independentemente da condição existencial em que o sujeito se encontra. Há
um fenômeno existencial que Sartre chama de má-fé, que seria como se o sujeito, para
tentar fugir da angústia de ser livre, ou seja, de sua constante constituição por meio de
sua liberdade, escolhesse assumir uma identidade fixa, como uma essência total.
Chama-se de má-fé, no sentido sartriano, a tentativa de fugir das escolhas, de descansar
na zona de conforto. Má-fé consiste na fixação de uma identidade, como se o sujeito
desempenhasse um papel que se confundisse com ele mesmo.
52
Segundo Sartre, cada sujeito inventa a sua trajetória, postulando valores e
sequência de ação, contudo, ao agir e ao exercer as decisões o sujeito leva consigo o
peso da universalidade, entende-se como se o sujeito levasse consigo a decisão de todos
os sujeitos, a ação e a decisão se revestem de um valor imperativo uma vez que
assumidas pelo sujeito. Quando o sujeito escolhe para si, está escolhendo para todos. Há
uma relação dialética, segundo o pensador, entre o singular e o universal, pode-se dizer
que o sujeito encarna o universal, não apenas se submete a ele. O peso de todo o
universo sobre quem está decidindo, talvez se tenha aí parte da explicação pela qual
Sartre dizia que ser livre é angustiante. O sujeito faz a todo o momento a opção singular
e o faz por todos os homens: em cada decisão reinventa o homem. A liberdade no
pensamento sartriano traz consigo o peso da responsabilidade de fazer de si reflexo de
suas escolhas, o fardo da responsabilidade pode ser ao mesmo tempo radical, pois sobre
o existencialismo de Sartre pesa um grande rigor moral e um afastamento definitivo do
relativismo.
O sujeito, a partir de sua gratuidade e contingência, assume a
humanidade não como uma generalidade extrínseca, mas a
encarna na imanência de cada opção. Esse humanismo difícil
consiste na impossibilidade de dividir com qualquer instância
externa ao universo humano o exercício da liberdade e o peso da
responsabilidade inerente no processo de existir [...](SILVA,
Franklin; O Filósofo e seu Tempo, 2009, p. 113 in PECORARO,
Rossano, Os Clássicos da Filosofia Vol. III)
O processo de existir pode ser visto como o conjunto de projetos das
escolhas do sujeito por meio dos quais o sujeito se transcende pela vontade sempre
renovada de ser, é o desejo de ser que impulsiona o processo, porém neste processo o
sujeito leva consigo a irremediável situação de se deparar com desejos sempre
insatisfeitos, pois o desejo de ser é constitutivamente impossível de se realizar. O Parasi, que é a busca da totalização impossível do sujeito, feita por meio de suas escolhas
53
com impedimentos tais como a facticidade e a intersubjetividade, essa dialética na busca
da essência constituída, na busca do Em-si, nunca se completará, então, ao mesmo
tempo em que serve como marco regulador de dialética funciona como horizonte
inatingível.
A realidade humana é constituída pela falta, o que não deve ser entendido
como a necessidade de completar algum elemento, mas como a constante falta de
completude do ser na projeção em movimento ao inatingível e essa falta também pode
ser interpretada como um elemento de obstáculo ao mesmo tempo em que não se
entende exatamente o que falta. A totalização que nunca chega à totalidade entenda-se
como situação, elementos limitantes e ao mesmo tempo possibilidades de exercício da
liberdade. Neste sentido, exercer a liberdade pode ter um caráter dramático que envolve
escolhas e o exercício de liberdade dentro de uma situação que pode se apresentar como
radical e originária ao se deparar com todo tipo de obstáculo.
3.4- Crítica da razão dialética (1960) - Sartre e o marxismo
Sabe-se que a liberdade é exercida dentro de uma situação, a qual o
sujeito não pode escolher viver ou não viver, que é o que Sartre chama de facticidade, e
seria o conjunto de fatos que determinam e limitam as escolhas: dentre essa facticidade
encontra-se o momento histórico em que o sujeito se encontra. O sujeito exerce a sua
liberdade limitada pelo contexto histórico, trata-se de uma situação concretamente
determinada e pode-se entender que a existência do sujeito também é histórica, portanto
há uma relação entre a história pessoal e a história universal, fato estudado por Sartre
em seu livro em 1960 Crítica da razão dialética, considerado um monumento teórico e
que fez com que por algum tempo se entendesse que Sartre teria abandonado a
perspectiva existencialista e se convertido ao marxismo.
Entretanto o que se viu foi uma crítica a uma relação realmente dialética
entre a história singular subjetiva e a história geral ou universal. Após a leitura do
ensaio sobre a ontologia de 1943 e o empreendimento crítico-histórico de 1960,
podemos entender a conexão entre as duas obras, com aspectos de ênfases que mais as
54
diferenciam do que sugere o abandono por Sartre da filosofia existencialista; pelo
contrário, Sartre passa a fazer pesadas críticas ao marxismo.
Segundo as leituras pode-se entender que ao escrever a crítica da razão
dialética o que Sartre queria era exatamente criticar o marxismo, e a pedra fundamental
entre as diferenças filosóficas que deu o toque de polêmica foi a questão sujeito singular
(questão subjetiva) e a condição objetiva (questão universal). Para os marxistas a
relação era vista como determinação causal, o marxismo entendia que a consciência
subjetiva só poderia ser efeito ou reflexo das condições objetivas que se manifestam
num determinado regime. O sujeito histórico não poderia ser mais do que um
transmissor do movimento gerado pelas condições objetivas, comparando o sujeito
histórico a correias que transmitem o movimento mecanicamente sem intervenção
alguma de sua singularidade, pois qualquer tipo de pensamento singular, ou intervenção
subjetiva, era considerada idealista e, por conseguinte, um pensamento com cunho de
ideologia burguesa.
Sartre em contrapartida mostrou que o materialismo histórico não deveria
ser orientado nos dogmas marxistas, não deveria ser pensado a partir das determinações
objetivas como causa geral do movimento histórico e a ação do sujeito como simples
efeito dessa causa determinante, pois sendo assim o sujeito não age dialeticamente,
apenas reproduz o raciocínio linear da racionalidade analítica que insiste em mostrar a
determinação do efeito pela causa, como única instância produtora de realidade. Essa
relação mostra um encadeamento linear em que se simplifica a dialética prevalecendo
apenas um dos lados em detrimento do outro, trata-se do efeito histórico como o único
que prevalece em detrimento da subjetividade do sujeito histórico. Esse raciocínio faz
com que se conceda realidade apenas a um elemento da dialética, a objetividade, e faz
do outro elemento apenas efeito da causa. O efeito não pode conter mais do que a causa,
como já disse Descartes: o predicado já está a priori contido no sujeito. Logo a tensão
dialética não comporta encadeamento linear, a tensão dialética se dá quando a cada um
dos elementos lhes é atribuído realidade suficiente para criar um vínculo de não
depende exclusivamente de nenhum deles, mais exatamente do vínculo que se forma
entre eles, ou seja, o contraditório que se forma entre os elementos. Pensando nisso não
se pode entender que o sujeito seja apenas efeito unilateral da objetividade histórica em
que se vê inserido, como um efeito particular de uma causa geral extremadamente
determinante de caráter linear.
55
Para Sartre a relação seria muito pobre se submetida ao esquema causaefeito. Já no estudo abordado pelo pensador no livro O ser e o nada Sartre descreve que
a subjetividade não é dada, mas é constituída pelo sujeito em relação com as suas
escolhas. O sujeito faz a interiorização do mundo que se lhe apresenta; confere ao fato
significados ligados à sua subjetividade e singularidade e o exterioriza constituindo seu
mundo histórico, e assim Sartre acredita ser fiel ao espírito da tese de Marx: O sujeito
faz a história que o faz. Logo pode-se entender que o sujeito é agente da própria história
e da história universal, ao mesmo tempo em que a história universal age sobre o sujeito,
o sujeito também a constitui. Entende-se que isso explica a dialética entre o sujeito
histórico e a universalidade objetiva, pois o processo se dá pela oposição
exteriorização/interiorização. Em suma escapa-se da idéia de sujeito como efeito da
história , assim como da história como efeito de consciência.
O sujeito dá significado no mundo em que se encontra, em meio a todos
os fatores já mencionados, uma vez apreciados decide agir, e em sua ação o sujeito é
sujeito da história e sujeito à história, não há história sem intervenção de um sujeito,
assim como o sujeito sempre sofrerá limitações provenientes dessa história e, em meio a
essa dialética, é que ambos se constituem.
3.5- Questão de método
Portanto, a grande questão de método era para Sartre encontrar a forma de compreender
a dialética entre subjetividade e história, foi por isso que Sartre expôs seu projeto de
crítica à razão dialética, associado à tarefa de Kant. Sartre procurou de alguma maneira
relacionar uma ciência materialista histórica ligada a dimensões subjetivas e objetivas
com as quais se chega ao conhecimento dessa história.
Como já se viu, não podendo ser reduzido a reflexo idealizado da
objetividade histórica universal, o sujeito é uma consciência em autoconstituição, um
sujeito constituinte da história, no processo de singularização, significação, ao mesmo
tempo em que é constituído por ela. Então como já vimos que todo sujeito no processo
de existir sofre com a objetivação histórica, porém com a mediação entre a
interiorização e a exteriorização o sujeito responde individualmente de uma maneira
56
singular definindo as condições de sua própria autoconstituição, portanto o sujeito é em
parte determinado pela objetivação universal e ele responde com a mediação de sua
singularidade, pois se todos os sujeitos respondessem da mesma maneira não haveria
singularização e a tese dos marxistas estaria correta, pois o que prega o marxismo é a
ignorância do sujeito em sua singularidade subjetiva, e reproduz a generalidade
conceitual da razão. O sujeito como reprodutor de objetividade. Como se os sujeitos
fossem efeitos determinados por causas determinantes.
Quando o marxismo ignora a singularidade subjetiva, reproduz a
generalidade conceitual da razão analítica e produz um
conhecimento abstrato que repousa no dogma da causalidade
renomeado como determinismo histórico. Os sujeitos seriam
efeitos determinados de causas determinantes se a história fosse
governada por uma lógica analítica. O problema dos marxistas é
que, apesar de se dizerem dialéticos, persistem na adoção de
esquemas analíticos de compreensão e por via desse equívoco
congelam o movimento histórico em conceitos abstratos. Assim
entendemos que compreender a relação dialética entre
subjetividade e história significa compreender a relação entre
liberdade e determinismo. (SILVA, Franklin; O Filósofo e seu
Tempo, 2009, p. 116 in PECORARO, Rossano, Os Clássicos da
Filosofia Vol. III)
Deve-se entender então que segundo Sartre há uma dialética entre
determinismo e liberdade, porém há de se sinalizar que Sartre nunca foi a favor de uma
ou outra, basta lembrar que em O “Ser e o Nada” a objetividade era vista como
possibilidade, logo se pode entender que o sujeito histórico é livre e determinado, porém
não se deve, na tentativa de interpretar o paradoxo da existência histórica, eliminar o
sujeito ou a história ou aliar o sujeito à história, em suma, nem eliminá-los ou conciliálos numa totalidade conceitual. “O sujeito é sujeito da história e sujeito à história”.
57
CAPÍTULO 4
Neste capítulo confrontar-se-ão e ao mesmo tempo unir-se-ão às bases
estudadas tanto da trajetória da educação como a filosofia existencialista de Sartre, para
que, com esses fundamentos, se faça uma tentativa de esclarecer a maneira como o
educador e a educação se encontram nos dias atuais. Não se tem a pretensão de resolver,
nem sequer esgotar o problema em que a educação e o educador se encontram, contudo,
que ao menos se possa entender melhor a relação de educação e do educador com o
medo da liberdade à luz da filosofia existencialista.
4.1- Interpretação da educação e dos educadores à luz do existencialismo de Sartre
A educação, como se viu com as pesquisas feitas pode-se dizer que teve
início com a chegada dos portugueses ao Brasil, com os famosos catequizadores,
momento em que o objetivo era a disseminação da igreja católica na nova colônia
portuguesa. Vinham do velho continente pessoas com um único pensar: fazer fortuna no
novo mundo. Novas oportunidades se abriam a comerciantes, desempregados, políticos,
jovens, negociantes, bancários, especuladores, nobres ligados aos reis de Portugal etc.
Tempo em que ler e escrever era para pouquíssimas pessoas. No Brasil monárquico os
discursos parlamentares falavam em educação para todos, porém o que se via na prática
era um descaso total e educação para poucos. A ausência de educação básica, segundo
Marrach, deve-se ao fato de repressão externa, ao controle das ameaças e até uso de
violência física, Sonia não se refere apenas, em seu livro, aos escravos, esse controle
recaía também nos homens livres e pobres, chamados “mestiços”, “pardos”, “cabras” e
“crioulos”, que na teoria eram livres e na prática submetidos e presos à lógica do
controle das almas e do mito da educação para todos.
58
4.2- A história de outrora confirma a situação de agora
Após resumo do que já havia sido visto como fundamentação e dados da
trajetória da educação especialmente no Brasil, e, para poder concluir, é necessário
entender o processo histórico da educação. É necessário inserir-se numa perspectiva
histórica para entender o presente. O presente é produto de um processo histórico, só é
possível pensar no futuro e os problemas que se vai enfrentar se compreender o passado
histórico que resultou na situação da educação do presente. Foram as políticas
educacionais que levaram a educação ao processo que estamos hoje. Na origem deste
presente que estamos inseridos, existem marcos históricos que a explicam. No final do
século XVIII europeu ocidental explode a Revolução Francesa, que foi construída ao
longo dos séculos XV, XVI e XVII, desenvolvendo uma nova classe social: a burguesia.
Os burgueses enriquecem por meio da exploração e querem mais espaço político. A
revolução francesa culmina quando surge um novo homem por meio da racionalidade e
que quer acabar com os conceitos concebidos sobre a influência da igreja. A luz do
conhecimento virá através da razão humana e não de luz divina. Além da revolução
francesa, aparece a revolução industrial, surgindo o operário. A revolução francesa é
uma revolução do povo, que tem como símbolo a bandeira dos ideais de igualdade,
liberdade e fraternidade. As condições da classe trabalhadora são miseráveis e aparecem
dois movimentos: um justificando esta realidade e outro criticando esse horror de
realidade das cidades capitalistas. A sociedade que surgiu é uma sociedade histórica. A
acumulação de capital se dá pela exploração do trabalhador, produz riqueza por um lado
e pobreza, miséria pelo outro, isto é inerente ao capitalismo.
O século XIX é o século do capitalismo e do anticapitalismo, produzindo
insatisfação. É preciso justificar a desigualdade real e ela aparece ao longo do século
XIX. O que na realidade existe são desigualdades de oportunidades e não igualdade
entre os homens. Cria-se uma educação de mecanismos produtores de desigualdade
entre os homens, de desigualdade entre as raças, etnias, indivíduos e classes.
59
4.3- A educação para a manutenção da sociedade de interesses
O discurso da carência cultural dos pobres é outra justificativa que
aparece mais tarde para desarmar esta sociedade que não é nada igualitária, liberal e
fraterna, pelo contrário, é competitiva, competição desvairada por um lugar. O sonho de
igualdade não se realizou, também não, pela justificativa das teorias racistas que
mistificam como sendo uma falha individual e na realidade é produção de uma
economia social. O olhar sobre o outro não é neutro, é informado, conformado por
concepções das quais todos herdam. A visão de mundo é justificada na escola para uma
sociedade desigual. Os indivíduos têm que pensar como pensa toda a sociedade para
manter o sistema formador de uma sociedade desigual, e a escola é um instrumento
conservador, mantenedor deste sistema, e as políticas públicas educacionais
conhecedoras disto manipulam os atores participantes da escola. Quem são os atores
principais das educação: educandos e educadores.
Segundo Maria Helena Patto, na palestra do dia 29 de
novembro de 2008 na FE da USP: “Dom Pedro I falava: “Eu
sou a ciência”. Ele acreditava ser superior ao resto da
população existente no Brasil. Ela também coloca que o
Conde de Gobinau, francês, visitou Dom Pedro, resultando
sua visita em um livro no qual escreve que a raça mais pura é
a francesa. O Conde de Gobinau defendia a idéia de que os
mestiços, do Brasil, eram degenerados, os índios eram
malandros, também colocava que os brasileiros eram a ralé
da raça humana”.
Estas ideias são as que tiveram influência na construção do pensamento
brasileiro. Este espírito classificatório ou justificador das classes raciais tiveram enorme
influência no atual cotidiano, e faz parte do dia a dia na educação e na sociedade. Estas
teorias que falam que os mestiços são degenerados, que os negros e índios eram o pior
60
do país, evidentemente bloquearam o desenvolvimento e o progresso do país. Como
poderia crescer um país assim?
O Brasil era uma sociedade escravocrata sem os direitos à cidadania,
educação, saúde, emprego e à vida, constituída como uma colônia em cima de dois
pilares, como diz Maria Helena Patto:
“de um lado, a transformação dos direitos em favor dos que mandam”. Isso, hoje, cria
um vínculo que abafa o direito à crítica. O povo não percebe e confunde favor com
direito. “Do outro lado, a sociabilidade com a violência entre as classes”.
As relações atravessadas por uma grande violência que não precisa nem
ser justificada, começando pela violência com os escravos. O Brasil é um país que foi
construído na violência, o domínio pela violência. Este histórico da construção do
pensamento da sociedade brasileira faz perceber que no Brasil nunca houve um
empenho de garantir o ensino das classes populares. Há, sim, falta de interesse de
educar deveras as classes populares, pois povo educado e escolarizado sabe de seus
direitos, é crítico e luta por seu lugar na sociedade. Os professores também são vítimas,
pois os preceitos e o estereótipo de educador incompetente ou que é educador por não
ter outra opção foi propositalmente ou não estabelecido e instaurado desde o Brasil de
outrora e vem sendo reiterado no de agora pelas políticas educacionais. A educação de
massa transforma os professores e professoras nos algozes da educação, e, aos olhos da
sociedade, os únicos e verdadeiros culpados, isentando as políticas educacionais e seus
dirigentes, e, uma vez mais, convencendo a grande massa. Os moldes da educação de
agora e os de outrora maquilam inúmeras mudanças, fala-se de novos rumos da
educação, surgem novos chavões, contudo ambas, a educação antiga ou atual,
coincidem no mais perverso da cultura de dominação e controle das almas, que se pode
resumir em educar para a manutenção da sociedade de interesses, em lugar de educar
para a transformação/formação de uma sociedade igualitária em que não se valorizem os
indivíduos pela raça ou posição social. Que a educação seja uma ferramenta
emancipadora e libertária. Após pesquisa e avaliação da situação tanto da educação e do
educador em que ambos são vítimas dos controles e posto a serviço das políticas
educacionais com direcionamentos de interesses sociais e econômicos, passar-se-á a
61
uma avaliação costurando o existencialismo sartriano com a vida dos educadores, as
educadoras e suas relações com a educação à luz do pensamento de Sartre.
4.4- Sartre e o problema da educação
Para Sartre existir é existir em movimento e esse movimento é visto
como a autoconstituição do ser e, por conseguinte da consciência. Trata-se da incessante
busca do indivíduo para ser na sua plenitude, na sua impossível completude, como o ser
Em-si, o qual, o Para-si nunca alcançará. Pode-se costurar um paralelo na vida dos
educadores e educadoras, pois o educador busca todo dia reverter a situação na qual se
encontra que entende-se como a busca do ser que não é, na negação do ser que é,
inclusive na opinião de outros (adiante se discutirá a relação com Para-outros).
Ao negar o educador que é, pois não aceita e acredita que pode
ser melhor, o educador projeta-se na afirmação do que não é. Faz o que Sartre chama do
futuro mais forte que o presente, em uma negação do agora com o fortalecimento do
futuro. Lança-se no amanhã, guardando a promessa de um professor melhor e como
conseqüência uma educação melhor. Nessa procura interminável num caminho em que
nada o espera e que nunca acaba e não o leva a lugar nenhum, pois não há o fim do
caminho, nem tampouco a conformação, um momento de tranqüilidade e conforto, pois
o educador nunca coincidirá com ele mesmo e os projetos só cessarão com a morte.
O que causa a angustia no educador é esse renovar de todos os
dias. Para Sartre é a liberdade, e ser livre no pensamento sartriano não é prerrogativa de
alguns, é de todo ser humano e ser livre não é adjetivo positivo, a liberdade para Sartre é
angustiante, pois se deve decidir todos os dias a todos os instantes os rumos, o agir e o
atuar. Logo, como dizia Sartre, negar o presente na afirmação dos projetos do futuro, é
de alguma maneira existir no futuro, como se o educador fosse outro, e conseguinte
existir num momento melhor, ainda que este seja efêmero. Ainda que o futuro seja a
reiteração do presente, o sujeito, no caso, o educador, por meio da escolha que é o
exercício constante da liberdade de certa maneira vive a possibilidade com mais força
do que vive a realidade.
Há uma associação entre a liberdade do educador e as
62
possibilidades que se apresentam que é o que caracteriza a condição humana como o ser
dos projetos, e com o educador na avaliação de sua atuação não é diferente, o educador
faz as escolhas sempre pensando na melhoria da educação e de seu desempenho como
educador.
A liberdade de todo educador é sempre exercida dentro de um contexto
determinado, que Sartre chama de situação. Este contexto para o educador, além do
contexto focar-se-á na parte profissional, entenda-se no tipo de escola em que trabalha,
seja ela pública ou privada, o educador não está imune ao contexto/ situação. Não há
nada que se possa fazer o educador pode ter nascido na época do Brasil colônia ou no
nordeste ou até em São Paulo de agora, talvez trabalhe numa escola católica ou
protestante, numa escola judia, ou em uma escola laica. Ainda pode ser uma escola que
segue o método tradicional, uma escola em que há no mínimo cinco instrumentos
avaliativos e noutra que há dois. Uma escola em que há um planejamento
interdisciplinar ou em uma escola que não se fazem projetos. Uma escola da periferia ou
uma escola de alto padrão financeiro. Todos esses fatores da situação em que o
professor exerce a sua profissão Sartre chama de facticidade, um contexto de fatores
situacionais e sociais. Pois então como o educador pode exercer sua profissão de direito
uma vez que necessita exercê-la junto às exigência da facticidade? O educador está em
uma realidade humana a qual Sartre chama de significação, ou seja, qual é o significado
que cada educador dá aos fatos que se apresentam no caminho do exercício de sua
profissão. Para um educador quiçá signifique o fim do mundo trabalhar como educador
em uma favela, pois o significado que ele deu é negativo: não obstante, outro educador
entenda como a sua grande missão e use esse fato, não como regulador e limitador, e
sim como possibilidade. A possibilidade de ajudar centenas de educandos carentes e
usar seu conhecimento como alavanca de emancipação intelectual. Para Sartre a
facticidade tem um caráter castrador, mas ao mesmo tempo em que é limitador,
significa também, possibilidade, não há no mundo humano fatos brutos destituídos de
sentido humano. Assim como a montanha representa o sustento do agricultor, é para o
engenheiro um obstáculo a ser vencido e um desafio para o alpinista. Enfim, para os
educadores as escolhas, de lugar, de missão, ou distância para exercer sua função são
feitas pelo crivo do exercício da significação. Um educador, escolhe o filme “O crime
do padre Amaro”, para que com os educandos discutam valores morais, sociais em um
63
projeto junto a outras disciplinas, usando este filme para fomentar um tema transversal,
e talvez a direção do colégio não entenda como o filme adequado, e o educador se verá
obrigado a seguir outra estratégia, logo e assim em sucessivos eventos os educadores
têm, como se diz popularmente, de dançar conforme a música, num exercício
interminável entre a liberdade e a limitação da facticidade em particular do educador.
Exercer sua liberdade pode ser, e na maioria das vezes é, angustiante e frustrador.
Quantos e quantos momentos o educador se vê e enxerga seu trabalho junto aos
educandos como mera propaganda da escola, situação na qual se ressalta mais a
aparência e o impacto visual em detrimento do atitudinal, conceitual, transformador de
educandos em artífices de seu próprio caminho, protagonistas de sua vida e de sua
educação do trabalho realizado. As famílias presenciam mostras culturais que mais
parecem desfiles de egos e ostentações, papéis comuns em escolas que atendem
discentes com grande poder aquisitivo. Tais situações fomentam e corroboram o atual
conceitual atribuído por parte discentes e familiares sobre a educação e do educador/a.
A facticidade aí são para os educadores: a escola que procura seus interesses de
inúmeros sentidos, sejam eles comerciais ou econômicos e transformam mostras
culturais em propaganda. A política educacional pré-estabelece o modelo de educação,
assim como determina os livros que devem ser usados em escolas públicas, fundamenta
e determina o formato da educação nacional, em blocos blindados e engessa a educação.
Diretrizes que limitam e selecionam o que deve ser abordado ou não nas escolas
públicas e privadas.
Outro componente da situação em que os educadores e todos os seres
humanos exercem a sua liberdade, segundo a filosofia sartriana, é intersubjetividade, o
Para-si de outros sujeitos, o Para-outro que os educadores encontram na constituição do
ser, o educador se depara com outras liberdades, outras consciências, entre essas
consciências há coordenadores, outros educadores, senhores pais, mães e responsáveis,
diretores ou diretoras, diretorias de ensino etc. No existir em projetos, existir em
movimento em meio a facticidade, que já é angustiante, há de se somar a relação com
outros indivíduos.Outros indivíduos que seguem a sua história e que, em alguns
momentos, e aceitar-se-ia dizer em inúmeros momentos, rompe-se o silêncio do
movimento e da significação singular, da avaliação silenciosa e continuada da formação
do ser no anseio angustiante da plenitude numa inconsciente busca do Em-si, modelo de
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ser da tradição moderna, aquele que descansa em berço esplêndido que é essência e
símbolo de completude, o ser em excelência. Esse romper do silêncio se dá com o
encontro de um Para-si com outro Para-si, nesta relação é mais um obstáculo em que o
educador defronta-se com outras consciências, com outros movimentos, com outros
projetos. Desde a tradição este é um tema de grande dificuldade. Sartre chama de
Alteridade, que para o filósofo significa exercer a liberdade em meio a outros sujeitos
que também exercem a sua liberdade, a intersubjetividade como foi classicamente
classificada, e o Sartre designou com a expressão ser-para-outro. A dificuldade se
encontra, segundo a filosofia sartriana, em primeiramente em supor a representação de
si, e, em seguida reconhecer a representação do outro, na filosofia tradicional o sujeito
não podia transferir para outro a intuição de existir, motivo pelo qual na filosofia
tradicional esta questão encontra-se em aberto. Por outro lado na filosofia de Sartre o
Para-si já é de certa maneira Para-outro, por conta do afastamento do ser nos projetos, o
ato de pró... jetar implica em lançar à frente, como viver o projeto adiante mais forte até
que a realidade vivida no momento, quiçá pode-se entender, porque o Para-si é de
alguma maneira um Para-outro, logo é nesse caminho dos projetos que os indivíduos se
cruzam e o grande nó que surge é entender que o eu de um sujeito não é o eu de outro.
Nas palavras de Sartre “O eu que não sou eu”.
4.5- A cristalização por meio do “Olhar”
Sartre trata desse assunto em “O olhar” de “O ser e o Nada” entretanto,
esclarecer a intersubjetividade não é tarefa fácil. Sartre usa o olhar como metáfora que
se encontra nessa relação. Os educadores ao se depararem com outras consciências e
outras liberdades em meio aos projetos individuais sofrem o que se chamou de
cristalização do outro, que seria a objetivação de um sujeito para o outro, entende-se que
nenhum sujeito pode viver o que o outro vive, porém podem-se cruzar no exercício de
existir. Neste momento ocorre o fenômeno do olhar, naquele instante em que um sujeito
se cruza com outro, é cristalizado, objetivado. Um sujeito atribui essência ao outro por
meio da observação do olhar, o transforma em ser constituído, deixa-se de lado toda a
incompletude do ser, um sujeito simplesmente atribui ao outro por meio do olhar a sua
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impressão e o cristaliza, determinando a sua essência, objetivando o outro. Ao objetivar
o outro o sujeito abandona o princípio do existencialismo sartriano de ser em
constituição. Ora se um ser está em constante movimento, em auto-constituição não se
poderia considerá-lo constituído e determinar a sua essência, uma vez que um sujeito
não pode acompanhar a existência do outro, a singularidade do outro sujeito é invadida
e cristalizada.
Há uma parte da obra de Sartre em que ele agride a língua transfigurando
o verbo intransitivo existir para esclarece em muito o trecho tão importante e ao mesmo
tempo tão difícil de explicar e diz ; “Eu não posso existir no outro” . Pode-se entender
que o fato de que um sujeito não acompanhe o existir alheio, o impossibilitaria de
opinar ou fazer qualquer juízo de valor sobre este ou aquele sujeito que se cruzaram na
existência, na intersubjetividade, seja numa reunião de trabalho, no trânsito, na
academia ou em qualquer momento da vida. Talvez esta representativa e
importantíssima parte da obra sartriana ajude a entender a situação vivida pela educação
e os educadores. Para todo ser existir em liberdade é angustiante e some-se a facticidade
a intersubjetividade que fomenta e ao mesmo tempo limita a liberdade de um educador
em seu Para-si e as relações com outros Para-si. Observe-se o educador na
intersubjetividade com outros educadores. A liberdade entre educadores talvez seja mais
pesada se comparada a outras profissões, pensada do lado de dentro, pois na luta das
consciências, inconscientemente, ou não, há educadores que determinam hierarquia de
matérias, determinando algumas como as mais importantes e outras como menos
importantes no processo de ensino aprendizagem. Ao adjudicar matéria com
importância pode-se entender educador dessa determinada matéria como importante ou
não, objetivando educador e matéria numa única constituição, relegados a um único
patamar préestabelecido por outros e hierarquizado pelo determinismo de escolas e
parâmetros curriculares. Surge então um dos maiores obstáculos da liberdade na
intersubjetividade entre Para-outros ou como Sartre diz o ser-para-outro. Muito além da
dolorosa constituição do ser em liberdade, há a liberdade de ser educador hierarquizado
e determinado cristalizado como sendo o de menor expressão no que tange ao global do
processo de aprendizagem. Nesta luta de consciências há os educadores que aceitam
essa posição e se entregam numa espécie de simbiose com o sistema, que não se
assumem como indivíduos, se assumem dentro do sistema, acreditam que nada pode ser
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feito, que assim é, e assim deve continuar. Porém outros educadores acreditam e não se
acomodam, culpam sim o sistema, entretanto, continuam enfrentando-o e renovando os
votos de um ser em constituição, pois a situação para Sartre é ao mesmo tempo
determinante, limitadora e reguladora de possibilidades, com as quais se poderia
explicar a singularidade humana, com o significado que cada educador dá aos fatores
contingentes com os quais, tem de exercer a sua liberdade. Em meio a esta situação, a
escolha do educador exercida por meio da liberdade e significação dos fatos confirma
de certa forma que a relação entre existência e liberdade impede de aceitar uma natureza
humana constituída, e que é pela liberdade que se constrói a existência, da qual o
educador dispõe mesmo em relação a que não pode mudar, e com a qual se torna artífice
de sua própria condição. Tal como diz Sartre seria mais pertinente chamar de condição
humana em lugar de natureza humana. Logo, alguns educadores com a clara finalidade
de evitar a condição de uso de sua liberdade se acomodam numa espécie de simbiose.
Toda liberdade começa por uma negação, um sujeito só pode pensar em deixar de ser
preso se estiver preso, o princípio de liberdade exige a negação de uma situação, o
educador ao sucumbir ao sistema procura evitar o desgaste das escolhas, evita a angustia
do exercício da liberdade.
4.6- A metáfora hegelina no pensamento de Sartre
A realidade humana nunca será uma totalidade idêntica a ela mesma, será
sempre um processo de totalização que nunca chegará ao final. Contudo os educadores
exercem ao mesmo tempo seus papéis de senhores e escravos. A dialética senhor/
escravo é uma metáfora das antigas guerras gregas. Lembrando essas guerras sabe-se
que os guerreiros que perdiam nas batalhas eram capturados e convertidos em escravos
dos vitoriosos. Os vencidos já sabiam dessa condição, os que abandonavam a luta em
prol da vida, sabiam que a partir desse momento decretariam a sua escravidão. Os
guerreiros eram conscientes e entendiam a condição e assim faziam a sua escolha.
Lutavam até a morte ou se entregavam e aceitavam a escravidão. A metáfora se voltada
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para os educadores pode-se usar uma como exemplo entre muitas formas de escravidão
o caso mencionado a priori: educadores das matérias tidas como as importantes em
detrimento das matérias tidas como as menos importantes. Nesta espécie de luta de
consciências o escravo é o educador da matéria menos valorizada e o senhor o educador
da matéria mais importante. Porém esta situação dialética, segundo Sartre só ocorre se o
educador escravo aceita a condição de menos relevante, pois há uma dependência do
Senhor (matéria mais relevante) e esta relação apenas se completa e chega ao mais
perverso da relação quando o escravo admite e aceita essa relação, confirmando e
corroborando com a afirmação do senhor. A relação dos ser-para-outro dos educadores
entre educadores é apenas um obstáculos que compõem o universo da intersubjetividade
do educador. Outro seria a intersubjetividade entre outros Para-si tais como
coordenadores e diretores com os quais a luta das consciências exerce um poder muito
mais limitante que da relação com outros colegas: primeiramente é a insatisfação e o
questionamento de por que as figuras com as quais os educadores das consideradas
matérias menos importantes não podem contar com a intervenção dos dirigentes dos
colégios, que assistem aos conflitos com parcimônia e aceitação revoltante, segundo as
imposições de ordem organizacional, mais de agrado patronal que conceitual, e o que
prevalece é o que os pais e familiares vão pensar. O que vale é a manutenção da
aparência e da propaganda do colégio. A grande e última relação de intersubjetividade
ressaltada, pelo menos neste trabalho, é a intersubjetividade com a sociedade em geral,
todos os que não participam diretamente do lado de dentro da educação. Seria a
intersubjetividade com alunos, pais, responsáveis e outras profissões.
4.7- Entendendo a situação
Talvez com a pesquisa se logre entender um pouco o descrédito sobre os
educadores e a educação, se a história explica a trajetória da educação, pode-se dizer
que ela traz consigo arrastando junto o educador em geral. A história da educação, por
um lado, fundamenta a situação da educação e, acredita-se muito difícil desassociar a
educação do educador, pois os dois se fundem e se confundem, por outro, o
existencialismo de Sartre pode ajudar a esclarecer com o apoio do capítulo “O olhar” do
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“O ser e o nada” a situação do educador ante a sociedade em geral. Viram-se problemas
de ordem interna entre subjetividade educador-educador, educador-patronais e
educador-educador-patronais, agora refletir-se-á sobre a intersubjetividade entre
educador-sociedade.
A história mostrou por que grande parte da carga de responsabilidade do
fracasso educacional que assola o Brasil é adjudicada ao tipo de educação que se faz no
país, contudo a história não isentou os educadores em geral, pois não há educação sem
educadores, assim como não há educadores sem educação. Esta situação tráz à tona uma
fase na trajetória histórica do Sartre em que se pensou que fosse marxista, pois
comentava e discutia o marxismo. Sartre focou muito seu estudo na dialética entre a
história e o sujeito, diferenciando do pensamento marxista convencioanal que focava o
analítico em lugar do dialético.
Segundo Marx o sujeito era apenas entendido como simples correia de
transmissão da situação histórica em que vivia, sem nenhum tipo de interferência, uma
vez que qualquer tipo de interferência pessoal, independente, era vista como ideologia
burguesa. Por outro lado, Sartre em estudo do marxismo movimento o qual, Sartre
acreditava estar sendo o mais fiel possível, dizia que o homem não poderia ser pensado
como apenas causa do efeito da situação histórica, apenas num pensamento analítico
racional, em que, o sujeito é resultado da história em que está inserido, para Sartre a
história era possibilidade e reguladora do sujeito, numa dialética em que nem um nem
outro poderiam ser conciliados ou eliminados, transformando a frase de Marx “O
homem faz a historia que o faz”em uma frase sartriana “O homem é sujeito da história e
sujeito à história”.
Pode-se concluir que o sujeito é ao mesmo tempo constituidor da história
e constituído pela história em que está inserido. O sujeito age dentro de um determinado
momento histórico, social, político e educacional, é nesta situação que o educador
exerce a sua liberdade, por meio de escolhas, com fundamentações significativas, com a
intermediação da facticidades, com as implicações do olhar cristalizador, os Para-si que
se cruzam em um momento no percurso do ser em busca da sua identidade, porém como
já foi dito, não se pode acompanhar o existir do outro, aí poder-se-ia entender a
cristalização dos Para-si dos outros para com os Para-si dos educadores e por
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conseguinte a educação. A educação e os educadores foram objetivados pelo olhar dos
outros Para-si, em suma o olhar dos outros significa tornar os educadores e a educação
objeto da visão objetiva. Nunca se verá a educação e os educadores como se
constituindo, ao contrário se vê como constituído. É a imagem da constituição que faz
às vezes da essência que a educação e os educadores não possuem, porém que o
educador passa a possuir para os Para-si que vem o educador como objeto de sua
objetivação. O educador que se vê sendo visto e no qual reflete a sua imagem que e
fixada e objetivada pode até mesmo ser assimilada como real e os educadores, não
todos, como de alguma maneira acabam introjetando a objetivação de outros Para-si, e
aceitam a cristalização.
É por meio do olhar, e a soma de objetivações sejam elas de grande
veiculação ou de objetivação singular que os Para-outros chegam à essência objetivada
dos educadores. Importante dizer que para Sartre não existe ser constituído, não há ser
completo e nunca se chegará à essência, à completude de um ser. Pois o processo de
existir é de constituição que só cessará com a morte. Contudo a totalidade e a identidade
plena estão presentes no horizonte, no futuro, como processo existencial, como projeto
fundamental de desejo de ser, porém existir exige ser em liberdade, alguns educadores
no anseio de fugir da angústia de liberdade que implica em escolhas, o que há de ser em
forma de projetos, usam um fenômeno existencial que Sartre chamou de má-fé que seria
um mecanismo que o sujeito encontra de encarnar uma personagem como se assim
fosse a sua essência. Sartre para explicar esse fenômeno existencial, utiliza como
exemplo o garçom de café, que carrega consigo os traços de sua própria personagem,
como se viver um garçom fosse a sua essência. O individuo exerce e credita a sua
profissão tal qual a sua essência, como de alguma maneira abandona a liberdade dura,
que é a obrigação de escolher seu rumo.
Esta é a maneira, com a qual, muitos educadores, por meio da má-fé,
criam uma personagem de professor-objetivado com traços de sua própria personagem,
fato que demonstra uma tentativa de renúncia à liberdade, fugir da liberdade significa
não ter que decidir e ao não decidir escapa da angústia da escolha e a procura incessante
da sua auto constituição. Pois o existir é movimento, e a busca da identidade em
projetos. Ao evitar a liberdade por meio da mesmice da Má-fé o educador cria um
sistema de proteção com o qual evita a angústia de ter que exercer a sua liberdade. O
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educador por meio da má-fé repete sempre a mesma ação educativa eliminando
qualquer tipo de intervenção singular, reage como simples efeito do sistema, e o culpa.
Rende-se numa espécie de subserviência. Poder-se-ia entender que este fenômeno se
chama má-fé, já que existir é inevitável e existir exige projetos e a renovação dos
mesmos, porém, o educador acredita que aceitar essa condição sem nenhum tipo de
racionalização dialética entre situação, facticidade e significação é por algum tempo
livrar-se da inoportuna e insaciável cobrança que a liberdade exerce. O indivíduo/
educador num apelo ao desespero anula a sua singularidade humana e abandona a sua
apreciação da situação e utiliza-se da má-fé, contudo até a má-fé é uma demonstração
de ação reproduzida pelo efeito causado pela angustia que é existir como educador
cristalizado, um educador objetivado, por outros Para-si que determinam a essência dos
educadores e por extensão da educação. A objetivação sobre os educadores recai sobre a
educação e vice versa, entende-se depois das leituras e pesquisas para a fundamentação
deste trabalho que em muitos momentos tanto no caminho traçado pela educação e do
educador, como na história da evolução nacional da educação que todos se fundem em
um único elemento e, se, como fundamentação inicial voltasse a mencionar as críticas
de Sartre sobre o marxismo, poder-se-ia comparar o que se chamou de pedra de toque
da polêmica se encontraria alguma similaridade entre a educação de massa e a relação
com o educador cristalizado.
A pedra da polêmica Sartre x marxismo consiste nas condições subjetivas
(sujeito singular) e condições objetivas (universal histórico). A consciência subjetiva é
apenas resultado do efeito da condição objetiva. O sujeito era para os marxistas apenas
o reflexo do sistema em que se encontrara. A relação é unilateral, trata-se de uma
relação analítica na que prevalece o regime de relações de produção e a condição
subjetiva é apenas condutor de transmissão do movimento gerado pela condição
objetiva. O sujeito histórico é apenas um reprodutor reflexivo de determinado regime. O
sujeito é considerado apenas como resultado da história universal na qual desenvolve
sua liberdade, segundo a crítica de Sartre em “Questão de Método”.
Sartre acredita que o sujeito por meio da apreciação subjetiva, ou seja, a
significação faz uma interiorização dos fatos constituindo valores e agindo conforme
71
seu critério referendando um processo entre interiorização/exteriorização. O sujeito
sartriano age conforme a significação que dá a facticidade, a subjetivação da
objetividade universal, uma relação entre a sua história e a história em que está inserido,
entretanto Sartre acreditava ser fiel ao pensamento marxista que dizia que o sujeito faz a
história que o faz, pois ao mesmo tempo em que o sujeito fazia a sua história singular
com limitações impingidas pela história universal, em que, se encontrava criava uma
nova história, pois a história universal também sofre as intervenções do sujeito. Para
Sartre o sujeito estava submetido à história e também era agente da história criando a
sua própria história subjetiva e participando da história universal.
Contudo pode
costurar um paralelo entre a pedra da polêmica entre Sartre e o pensamento marxista e o
tema em destaque, pois se entende que para muitos educadores a educação é para o
educador os limites em que esse educador está inserido. E há alguns educadores que são
meras correntes de transmissão dessa educação de massa, assim repassam as imposições
da educação que reflete em uma educação engessada e castradora, numa simetria com o
pensamento marxista no que tange a esta comparação se refere: a história universal
como causa e o sujeito como efeito, assim como, a educação como efeito sobre o
educador como causa. Num pensar marxista o relacionamento linear de uma simples
causa do efeito abandonando a dialética que se faz necessária em que nenhum dos
elementos podem ser desconsiderado nem conciliados, logo, em uma fundamentação
mais sartriana a relação entre educador e educação seria dialética e, salvo incorrer em
erros, uma vez que verdadeiramente Sartre e Marx não criaram estas frases se eles as
tivessem feito seriam inicialmente a de Marx “O educador faz a educação que o faz.”
mantendo de certa maneira fidelidade ao seu pensamento daria uma relação de causa e
efeito, em que o universal estabelecido pela educação traz consigo toda as limitações e
obrigações de uma educação de massa. Como se a educação universal fosse responsável
pelo efeito do trabalho produzido pelos educadores e os educadores fossem apenas
reprodutores dessa educação sem nenhuma interferência singular, pois qualquer
interferência singular seria tida como idealista e de educadores que sonham com uma
educação com a qual não se pode trabalhar, considerados adeptos da escola libertária e
com isso sonhadores que querem esconder a realidade.
Em seguida pensa-se a de Sartre “O educador é sujeito da educação e
sujeito à educação” mantendo, se é possível, fidelidade ao pensamento sartriano em
72
crítica a Marx, pois para o grande filósofo existencialista em simetria dialogada entre a
sua filosofia e esta pesquisa se poderia entender que o educador por meio de sua
interiorização, a sua singularidade, decide os caminhos da aula e da maneira que
formulara mecanismos para que os alunos acessem o conhecimento, logo se a educação
vem com as limitações e suas imposições o educador recebe uma educação na qual está
inserido ao mesmo tempo em que cria uma educação por meio de seus critérios de
escolhas.
O educador faz a educação por meio de sua singularidade ao mesmo
tempo em que é moldado pela educação e seus parâmetros, numa dialética entre o
educador e a educação, em que nenhum dos dois termos pode ser eliminado. O educador
como o agente da educação o grande promotor do processo de ensino aprendizagem e o
modelo de educação como limitadora, porém uma realidade com a qual o educador nada
pode fazer, a princípio, pois, é a realidade de modelo de educação que lhe é impingida.
Os dois termos procuram manter uma tensão, atribuindo a cada um deles
a realidade suficiente para sustentar um vínculo que não depende exclusivamente de
nenhum deles, mas, precisamente, do vínculo tenso e contraditório que se estabelece.
Logo, pode-se entender que o educador e seu trabalho é uma realidade singular que se
defronta com a condição do modelo de educação universal. Essa relação comporta a
ação do educador como agente da educação e a educação como agente sobre o
educador. A educação age sobre o educador no sentido de determiná-lo e o educador
age sobre a educação na medida em que esta decorre de sua ação.
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CONCLUSÃO
Se por um lado, exercer a liberdade em tempos atuais e, em específico,
em relação à profissão de educador com a sua carreira, outros educadores, os
educandos, a sociedade, a educação em termos regimentais e, finalmente, a relação do
educador com ele mesmo, traz consigo obrigações intermináveis, frustrações e angústias
difíceis de explicar e a sensação de impossibilidade de superação, por outro, se acredita
que este fenômeno existencial, que Sartre tanto clarificou, entender-se-ía melhor se
voltássemos aos tempos medievais, época em que o homem sentia-se de certa forma
seguro em exercer a sua liberdade dentro dos limites rigidamente estabelecidos.
Descreve Fromm uma época em que o filho do camponês sentia-se muito tranquilo e
seguro, pois sabia que seu futuro e seu segmento de história seria trabalhar nas terras de
sua família, assim como aprendera e assim seria com seu filho.
O homem daquela época acreditava que chegar ao sucesso era ter a
capacidade de plantar, colher e negociar o necessário para garantir o sustento próprio e
o dos seus. As pessoas trabalhavam para viver, ao contrário de viver para trabalhar.
Havia, segundo Fromm, uma unicidade entre o homem e a natureza, o homem não se
via como um ser independente. Ligado à natureza e aos seus afazeres para a sua
sobrevivência trazia segurança e significado à vida do homem medieval.
A relação com Deus era mais de confiança e amor do que de dúvidas e
temor. A grande característica da sociedade medieval em contraste com a atual é a
ausência de liberdade individual. Inicialmente, todos os indivíduos encontravam-se
agrilhoados, nas palavras de Fromm, ao seu papel na ordem social. O homem tinha
pouquíssimas chances de mudar de posição social, ou deixar de negociar com o mesmo
comprador e no preço determinado, pois os seus atos já estavam, de alguma maneira,
direcionados.
Muitos tinham que usar determinado tipo de vestimenta e alguns jamais
deixaram o local onde nasceram, porém, se por um lado o homem medieval não se
sentia livre no sentido moderno de liberdade, não se encontrava isolado e insignificante.
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O homem permanecia ligado ao seu papel e ao lugar onde nasceu e, desta maneira,
sentia-se seguro, estruturado e, logo, sem margens para dúvidas ou insegurança. Havia
relativamente pouca competição entre os homens, e a ordem social era concebida como
algo imutável, aceitável entendido como natural. Dentro de sua esfera social, o homem
tinha de fato liberdade para expressar seu ego. Pode-se entender que, embora não
houvesse individualismo considerado nos moldes da forma moderna, aquela no sentido
de escolha irrestrita entre as muitas possibilidades que há de maneira de viver (esta
possibilidade irrestrita é também abstrata), havia individualidade no sentido concreto de
vida real.
A sociedade medieval não despojava o indivíduo de seu direito à
individualidade, pois o homem medieval não tinha consciência de indivíduo, o homem
não havia quebrado seus vínculos primários, o homem não se concebia indivíduo, salvo
exceção ao seu papel social e que se pode chamar de papel natural. Se um forasteiro que
chegasse à cidade fosse considerado um estranho, e de fato era, pois se tratava da
primeira vez que pelo local passava, este forasteiro poderia ser considerado tão estranho
como os que não faziam parte de um mesmo grupo, enfim, até as pessoas que
conviviam em mesmo espaço, porém em grupos diferentes, eram consideradas tão
estranhas como aquelas vistas pela primeira vez, já que o conceito de indivíduo dava-se
se ele fosse membro de algum grupo, incorporado pela sua raça, família ou algum tipo
de categoria.
“Na idade Média, ambos os lados da consciência humana o que se voltava para dentro assim como o que se voltava para
fora – permaneciam adormecidos ou semidespertos sob um véu
comum. O véu era feito de fé, ilusão e preconceito infantil,
através dos quais o mundo e a história eram revestidos de
estranhas cores. O homem só se dava conta de si mesmo como
membro de uma raça, povo, partido, família ou corporação
através de uma categoria geral qualquer”. (FROMM, Erich; O
medo à liberdade, 1962, p.44)
75
O homem medieval não tinha consciência de liberdade se pensada no
sentido moderno, entretanto, a história da liberdade em moldes atuais poderia ter tido
seu início com o que Fromm chamou de “individuação”. O homem iniciou a sua
independência, ou seja, reconheceu-se como independente da natureza e dos outros
homens com os quais se relacionara. O indivíduo se reconheceu uno, separado
organicamente dos outros indivíduos com os quais formava um grupo e que dividia
tarefas e entendia a posição que cada um exercia para viver em sociedade. A leitura
sobre a sociedade medieval era absolutamente clara para o homem daquela época.
Talvez para alguns, a maneira de viver na idade média consistia apenas,
de certa maneira, em tentar manter o controle de posição social ou evitar que o
indivíduo sequer pensasse em ascender socialmente; contudo, para o indivíduo medieval
o significado de sua vida era seguir no mesmo patamar em que havia nascido, pois
assim sentia-se significante e seguro. Entendia seu papel no andamento de sua vida, da
vida em coletividade e a relação com a natureza. Vivia de seu trabalho e trabalhava
para sua necessidade. Sentia-se importante e partícipe, pois entendia a formação e o
desenvolvimento da sociedade da época. O poder estava restrito ao estado e à igreja,
entretanto, o poder do dinheiro e a quebra da coletividade e com o nascimento dos
novos endinheirados surgia um novo poder, quiçá mais forte que todos os outros juntos:
o poder do mercado. O mercado passou a reger tudo.
As exigências do mercado forjavam o novo indivíduo, este agora envolto
em uma sociedade em que as relações dos grupos passaram a ser extrínsecas e
inorgânicas. Os grupos continuavam existindo, porém regidos pelo poder e assolados
pelas exigências do mercado. A individuação trouxe o individualismo, que por sua vez
trouxe a dependência ao dinheiro. Com a dependência do poder absoluto do
mercado/dinheiro sob a batuta dos novos endinheirados, o homem medieval perdeu a
relação natural com as obrigações sociais e deixou de reconhecer-se como indivíduo
importante e participativo integrante de uma sociedade, velado pela liberdade de
escolher e conforme seu esforço poderia ascender ou decrescer socialmente, pois agora,
com o poder do dinheiro, se o possuísse poderia até comprar e usar as roupas que
desejasse, não havia mais obrigações e determinações. A estrutura social e a
personalidade do homem medieval mudariam com o fim da idade média. A unidade
enfraqueceu, o capital e a iniciativa junto à competição ganharam importância. Surge a
nova classe endinheirada. O estilo de vida tradicional medieval seria abalado. O
76
indivíduo emerge da sociedade feudal rompendo o vínculo primário que lhe dava
segurança com restrições. Por um lado se viu o surto da poderosa classe: a endinheirada,
que com o espírito da iniciativa privada e a ambição se animaram e, como
consequência, a classe feudal perdeu status. Por outro lado, multiplicavam-se massas de
trabalhadores explorados e politicamente anulados.
A partir do século XII, nobres e burgueses passaram a viver juntos
dentro dos muros das cidades, a casta passou a ser ignorada, o berço e a origem menos
relevantes que a riqueza. O resultado foi o fim da estrutura social feudal e o surgimento
do indivíduo na acepção moderna. O homem, ao se descobrir como entidade isolada,
descobre-se também perdido, pequeno e percebe-se, mesmo em grupo, absolutamente
só. A relação com a liberdade está sob suspeita, e para Fromm, não se trata de um fato
novo vivido a partir do fim da idade média, com a queda do sistema feudal; portanto,
para ele, esta desconfiança talvez possa ter iniciado com a escolha de Adão.
Metaforicamente, ao cair na tentação do pecado, Adão fez a sua primeira escolha e
trouxe consigo todas as consequências de seu ato - o rompimento com o paraíso, e
também como consequência o suposto abandono de Deus, fazem o nascimento do livre
arbítrio, para Adão e toda a humanidade: o fardo de se governar.
Governar-se é fazer suas escolhas, e o homem, durante muitos anos,
segue em grupos ainda que ignorando o sentido de individualidade conhecido
atualmente, agrupado acorde a situação social, política ou familiar. Em meados do fim
da idade média e o com o crescente domínio totalitarista do mercado (mercado regido
pelo poder dos endinheirados), as relações dos grupos perderam força e os indivíduos se
transformaram em uma massa homogênea, confirmando e chegando ao auge do
totalitarismo esmagador. Um totalitarismo que transforma a todos os indivíduos em
seres iguais, levando todos a uma sensação de pequenez e insignificância ante o poderio
gigantesco do mercado/dinheiro que domina a situação. O mercado rege preços,
salários, moda, gostos e obriga a todos a se encaixarem em suas normas. A
solidariedade com os semelhantes, pelo menos com os membros da mesma classe, foi
substituída pela alienação, os indivíduos transformados em objetos, manipulados e até
destruídos, caso isso atendesse o objetivo pessoal de outro. A liberdade trouxe: o
sentimento de força e o de pequenez, isolamento e dúvida. No sistema medieval, o
capital era servo do senhor, porém, no sistema moderno, o capital é o senhor. No
sistema capitalista, o sucesso, as vantagens passam a ser mais importantes que o
77
indivíduo e a ter um fim em si mesmo. O homem é apenas um dente da engrenagem do
vasto sistema econômico, no qual o indivíduo é usado para chegar aos objetivos do
sistema. Trata-se de uma relação análoga, na qual o indivíduo garante o sucesso do
sistema em detrimento de sua vida e de seu “eu”. Há uma anulação total do indivíduo
transformando a todos em iguais, servos do sistema, mais dentes da engrenagem. É
importante se ganha muito dinheiro, insignificante, no caso contrário; entretanto,
sempre um dente da engrenagem para servir a uma finalidade do sistema, uma
finalidade totalmente alheia, diferentemente da dialética medieval entre o sistema e o
indivíduo. O homem trabalhava e fazia parte do sistema, e o fim era seu sustento para a
sua própria felicidade.
A pequenez, a solidão e o sentimento de abandono levam o indivíduo
moderno a um paradoxo. Assim como o homem medieval, ele procura grupos por
diferentes critérios e categorias, no intuito de identificar-se e logo sentir conforto e
amenizar o sofrimento que traz a um sentimento de abandono. Por outro lado, a
identificação fomenta e corrobora com o mercado, pois identificar pode-se também
entender como a busca pelos idênticos, os iguais, que é a premissa do totalitarismo do
mercado que transforma a todos em uma massa uniforme. As relações em grupo são
extrínsecas e inorgânicas, os grupos são abstratos. O homem reconhece-se como “livre”
e a situação econômica incentiva a iniciativa privada do novo indivíduo e mostra-se
como o único meio de afirmação e diminuição do sentimento de insegurança e
insignificância, porém, a possibilidade de iniciativa está limitada a muito poucos. Para a
grande maioria resta a subserviência impingida pelo mercado e pelos senhores dos
grandes negócios. As mudanças sociais trazem consigo uma espécie de substituição da
autoridade externa pelo domínio da autoridade interiorizada. A “consciência” perde
significado, é como se a autoridade externa não desempenhasse mais um papel de
destaque na vida do indivíduo.
Com as vitórias políticas da nascente classe média, a autoridade
externa perdeu prestígio e a própria consciência do homem
assumiu o lugar antes ocupado pela autoridade externa. Esta
modificação afigurou-se a muitos como sendo a vitória da
liberdade. Submeter-se a ordens vindas de fora (pelo menos em
78
questões espirituais) [...] mas a vitória sobre as suas inclinações
naturais e o estabelecimento do domínio de uma parte do
indivíduo, sua natureza, por outra, sua razão, vontade ou
consciência assemelhavam-se à essência mesma da liberdade. A
análise demonstra que a consciência governa com rigor tão
grande como de autoridade externa e, outrossim, que
frequentemente o conteúdo das ordens expedidas pela
consciência do homem são ditadas, em última instância, não
pelas exigências do eu individual, porém por exigências sociais
que assumiram a dignidade de normas éticas. O império da
consciência pode ser ainda mais severo que o das autoridades
externas, pois desde que o indivíduo encara as ordens dela como
sendo dele próprio, como irá rebelar-se contra si mesmo?
(FROMM, Erich; O medo à liberdade, 1962, p.135)
A consciência passa a exercer a grande pressão sobre o novo homem,
torna-se uma luta de contradições aumentando ainda mais a insatisfação e o sentimento
de pequenez, desamparo e insignificância, uma vez que a luta é contra a própria
consciência.
Ela disfarça-se como senso comum, ciência, saúde mental,
normalidade, opinião pública. Nada exige além do que é
evidente por si mesmo. Parece não empregar pressão, mas
apenas uma persuasão suave. Quer se trate de uma mãe dizendo
à filha “Gostaria que você não fizesse questão de sair com esse
rapaz” ou de um anúncio sugerido “Fume esta marca de
cigarros. Você sentirá seu frescor”, é o mesmo ambiente de sutil
sugestão de que está realmente embebida toda a nossa vida
social. (FROMM, Erich; O medo à liberdade, 1962, p.135)
79
A luta da massa contra o poder autoritário tem marcado em muitos
momentos a história da humanidade, entretanto, as lutas que marcaram a humanidade e
fizeram história tinham um poder claro, aparente para todos, e as vitória das massas
sobre esses poderes desenvolviam (e desenvolvem) a independência, a coragem e
muitas vezes forjam a grandeza e orgulho de um povo. Ao passo que a autoridade
interiorizada, se bem visível em nome da opinião pública, das leis de mercado, do
poderio do patrão, nas normas rígidas da moda e do dinheiro, em resumo, a regência do
mercado - esta autoridade - o mercado -, que pode-se chamar de um comando anônimo,
pois não está personificado em ninguém especificamente, como tal torna-se um regime
de comando invisível. Como se, de alguma forma, o indivíduo passasse a ser seu
próprio comandante e algoz, como se fosse atingido por algo indefinido, intocável,
porém muito poderoso. Logo, se intocável e invisível, não há nada nem ninguém para
contrarreagir. A “consciência” personifica todos os comandos e é como um regente
absoluto de autoridade máxima, como uma espécie de Deus, uma vez que não há como
se desvencilhar dela, sempre bombardeando os pensamentos, funciona como uma
espécie de freio, impulso e o grande regulador de tomadas de decisões. Como se o
indivíduo tivesse invadido, em seu pensamento, o rigor do peso da ética, a cobrança do
sucesso, deve-se ter a capacidade de inovar todos os dias, a obrigação da competência,
conhecimento contemporâneo na ponta da língua, o zelo pelo seu trabalho, as
obrigações sociais, políticas, civis e acreditasse em Deus.
O homem moderno tenta resolver a massificação de seu eu e procura o
equilíbrio dialético entre o individualismo que separava e a comunidade que unia da
idade média, porém, não há como voltar atrás à velha sociedade comunitária. Procura a
afirmação como indivíduo e acaba anulando o seu eu. Na tentativa de restabelecer a
integridade de seu ego, ele se incorpora a forças que o ultrapassam e às quais ele mesmo
terá de se submeter e acaba destruindo o eu individual, como resultado, esta forma de
fuga confere-lhe uma identidade falsa, que aumenta o círculo vicioso entre a fuga e o
aumento da sensação de abandono, angústia, insignificância e a busca sem norte de seu
verdadeiro eu.
Neste trabalho não se pretendia livrar o ser humano do sofrimento de ter
que fazer escolhas todos os dias, nem tampouco do aterrorizante medo de ser livre,
porém, de alguma maneira, se pensou em recorrer a um caminho com a intuito de
elencar origens e circunstâncias com o intenção apenas de, senão eliminá-lo, entendê--
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lo. Entende-se que o que motivou inicialmente este trabalho era abordar apenas a
profissão de educador, esta, tratada com desrespeito e sublimada aos caprichos do
mercado e da regência de uma educação de massa, contudo, ao passar pelos caminhos
percorridos pela educação, somados à filosofia Sartriana e com a finalização dos
pensamentos de Fromm, pode-se reconhecer que não se trata de um fenômeno
existencial limitado apenas a uma profissão. Todos os seres humanos, independente de
carreira, credo ou posição social vivem este fenômeno existencial.
Os educadores, tema deste trabalho, sofrem o grande medo de ser livres,
temem a exposição social, ao mesmo tempo em que fazem parte da sociedade. Fazem a
educação ao mesmo tempo em que a educação os faz. Vivem a grande dificuldade de
decodificar uma sociedade regida pelo mercado, ao mesmo tempo em que o mercado
determina as suas ações. O mercado, que rege a educação para o domínio das almas,
para os interesses políticos e das grandes corporações, regimenta, molda e transforma a
todos numa massa homogênea, atingindo o máximo de sua eficiência, involucrando a
todos numa cegueira velada e confusa, pois não há personificação autoritária, o grande
controle da massa é interno, “inconscientemente” a “consciência” é a grande autoridade.
O mercado atinge o sujeito em seu maior crítico e máxima autoridade “ele mesmo” - pois passa a ele a responsabilidade da liberdade, pois em uma visão de
mercado, as oportunidades estão aí para todos, se alguns chegam à riqueza (que pode-se
traduzir como poder e felicidade), os que não chegam, nas palavras veladas do mercado
e da nova sociedade livre, seria por incompetência ou falta de empenho. O sol está para
todos e só alguns o aproveitam. A autoridade disfarça-se como senso comum, a opinião
pública e pressão social passam a exercer junto à consciência a autoridade máxima.
“O medo de si mesmo é o maior controle que pode existir”.
81
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