pensando o brasil - instituto pensando brasil
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1 PENSANDO O BRASIL Uma publicação do Instituto Pensando o Brasil ANO 2 - Nº 3 - JANEIRO DE 2016 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA AMAZÔNIA JOÃO MEZARI LIXO ZERO RODRIGO SABATINI PENSANDO A MÚSICA DE CONCERTO NO BRASIL HENRIQUE AUTRAN DOURADO O BRASIL QUE EMERGE DA CRISE RICARDO FERRAZ EXPEDIENTE 3 Presidente Maria Estela Kubitschek Lopes Vice Presidente Executivo Fábio Chateaubriand Borba Diretor do Fórum Pensando o Brasil Gabriel Azevedo Diretor de Projetos José Tomás de Vasconcellos Gouvêa Conselho Fiscal Alexandre de Campos, Daniel Perrelli Lança, Davi Lago Conselho Consultivo Andrea Carreiro Kubitschek Lopes, Henry Isaac Sobel, Hervé Nicolas Linder, Rodrigo Paulo de Padua Lopes Pensando o Brasil é uma publicação trimestral do Instituto Pensando o Brasil, focada no debate público nacional. Copyright © dos trabalhos publicados pertence a seus autores. Editor Fábio Chateaubriand Borba Conselho Editorial Carlos Maciel (Université de Nantes) Charles Cesconetto (GeoFilmes) João Cesar Kubitschek Lopes (Instituto Pensando o Brasil) Kelly Maurice (Worldfund) Michel Schlesinger (Congregação Israelita Paulista) Rodrigo Prando (Universidade Presbiteriana Mackenzie) Sebastián Baldunciel (América Latina ONGs) Sérgio Fausto (Instituto Fernando Henrique Cardoso) Projeto Gráfico e Revisão Agência HIGGS SUMÁRIO PENSANDO O BRASIL, EM TEMPOS DIFÍCEIS PG 3 - APRESENTAÇÃO PG 4 - DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA AMAZÔNIA PG 15 - LIXO ZERO PG 20 - PENSANDO A MÚSICA DE CONCERTO NO BRASIL PG 25 - O BRASIL QUE EMERGE DA CRISE A terceira edição da Revista Pensando o Brasil tinha tudo para ser um resumo de 2015, mas optou-se que ela não seria. Num ano que começou com o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff e com ele as crises política e econômica, a recessão e o desemprego, os escândalos de corrupção e os crimes ambientais, decidiu-se não só tratar do delicado momento que vive o país, como também trazer as boas ações, com resultados, que contribuem para o desenvolvimento do Brasil. Falta o governo fazer a sua parte. Convidamos especialistas, muito brilhantes, de diversas áreas, para pensar o Brasil nesta terceira edição. Abrimos a revista com João Batista Mezari. Diretor administrativo e financeiro da Moto Honda da Amazônia, explica a Zona Franca de Manaus e a sua importância para o desenvolvimento econômico do norte brasileiro e as práticas sustentáveis do polo industrial amazônico. Rodrigo Sabatini, presidente do Instituto Lixo Zero Brasil analisa a gestão de resíduos sólidos e o conceito de redução da produção de lixo no país. Henrique Autran Dourado, diretor executivo do Conservatório de Tatuí, nos introduz ao pensamento da música de concerto no Brasil, da vinda da família real aos dias atuais. Fechamos a edição com Ricardo Ferraz, jornalista da TV Cultura, que faz uma leitura da crise econômica e política, e as oportunidades para o país. Boa leitura! Maria Estela Kubitschek Lopes A Zona Franca de Manaus, inaugurada em 1967, terá, a partir de 2023, mais 50 anos de prorrogação. Mas será que está claro para todos a importância de sua existência? A criação da ZF foi um marco na história do Estado do Amazonas. Ela veio para definir não só um polo industrial, desbravar e assegurar uma fronteira pouca habitada, mas também e, principalmente, para preservar a riquíssima floresta tropical, além de promover a integração econômica e social das populações isoladas em uma região extremamente deficitária. Como um dos resultados da criação do Polo Industrial de Manaus, hoje o Amazonas é o estado com maior índice de preservação da floresta, que se estende por outras regiões: Acre, Rondônia, Roraima, Amapá, Pará, Tocantins, Maranhão, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, representando 71% do território brasileiro. JOÃO MEZARI NA AMAZÔNIA DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL 5 Contudo, ainda temos sérios problemas de infraestrutura na região, que nestes quase 50 anos tiveram pouca ou nenhuma evolução. Até hoje, por exemplo, não há uma saída por terra em direção aos maiores mercados do País, fator que dificulta sobremaneira o escoamento dos produtos aqui produzidos. A BR 163 Cuiabá – Santarém esta sendo morosamente construída há anos e, a BR 319 Manaus – Porto Velho é um sonho distante. E foi justamente devido às dificuldades logísticas e outras questões estruturais que os benefícios fiscais da Zona Franca foram criados. Do contrário, não seria viável a implantação e sobrevivência das empresas que aqui se instalaram. Hoje, o Polo Industrial de Manaus é uma realidade que movimenta a economia no norte do País. O advento deste polo resultou na criação de centenas de milhares de empregos, permitindo também fixar o ribeirinho (pessoas que vivem às margens dos rios amazônicos), em seu habitat e fazer com que ele não destrua o meio ambiente ao seu redor. Com mais de 1,5 milhões de metros quadrados, o estado do Amazonas tem por volta de 98% de suas florestas preservadas, e, através da evapotranspiração desta floresta sob o sol tropical, devolve a água para a atmosfera na forma de vapor de água, formando os agora chamados “Rios Voadores”, que levarão novas chuvas para o resto do Brasil. Para completar, além da exuberante flora, temos os nossos rios que, se considerarmos a vazão total na conjunção com o Oceano Atlântico, oferecem 01 (um) litro de água por dia em média para cada habitante do planeta. Somente estes exemplos já demonstram a necessidade de cuidados especiais com a Floresta. Um ecossistema tão carente e extenso como este requer seriedade e comprometimento de todos os brasileiros para sua manutenção. E é por isso que nós, representantes das empresas do PIM, trabalhamos arduamente para manter a integridade deste sistema industrial e comercial, que propiciam em sua totalidade uma alavancagem regional e estratégica para o país. Um item de vital importância para o Estado do Amazonas é o setor secundário. A Zona Franca fez com que a maior parte do PIB amazonense se concentrasse em Manaus. A atividade industrial não evoluiu para o interior, onde a extração de matérias primas ou pequenos beneficiamentos, principalmente do ramo madeireiro, operam com pouca ou nenhuma produtividade. A melhor forma de iniciar uma mudança neste quadro seria a interiorização da indústria, um sonho antigo que esbarra na questão logística. Temos uma região gigantesca, maior que muitos países juntos, mas com baixa capacidade de escoamento ou desenvolvimento. Este sem dúvida será um desafio que deverá ser enfrentado em breve pelos governos e setores privados. Floresta Amazônica 7 Somente assim o Estado poderá fazer uma melhor distribuição de renda, equilibrando as forças. Dentro deste desafio entendemos que o desenvolvimento sustentável, que implica em defesa do meio ambiente, será muito importante para manter o atual status de preservação de nossas florestas. A criação em 2007 da Fundação Amazonas Sustentável (FAS) pelo governo do Estado vem permitindo o desenvolvimento de projetos voltados para esta realidade e muitas empresas estão se aliando à fundação para, em conjunto, levarem aos mais longínquos recantos da Amazônia uma nova possibilidade de geração de renda. Entendo que muito precisa ser feito, este é apenas um passo de uma longa caminhada, mas cidadãos, empresários, profissionais de empresas privadas e governantes com espírito empreendedor e que sabem do potencial da região, podem iniciar uma revolução neste sentido. Finalizando esta etapa, é premente que o estado diversifique sua economia, reduzindo gradativamente a dependência do PIM. Para que isso tenha viabilidade, basta buscar 9 o que de melhor temos nesta terra: o polo piscicultor, devido à variedade de peixes existentes; atividades agrícolas, buscando aqueles produtos que melhor se adaptem ao clima e tipo de terras aráveis; além do turismo riquíssimo e a mineração. Se estes pilares forem explorados devidamente, um novo amanhã virá sobre os amazônidas e mesmo sobre o Brasil. A ZFM tem hoje em seu parque industrial mais de 500 empresas dos setores de duas rodas, eletroeletrônico, termoplástico, mecânico, metalúrgico, entre outros, que empregam 108.000 pessoas diretamente em seus processos fabris, os quais são monitorados e auditados pela Superintendência da ZFM, órgão federal ligado ao MDIC-Ministério da Indústria e Comércio. Neste contexto, preciso destacar a importância que teve o sonho de um homem, Soichiro Honda, fundador da Honda Motor Company, nossa matriz no Japão. Ele teve a atitude visionária de, junto com muitos desbravadores, levantar uma fábrica de motos no meio da floresta tropical, enfrentando dificuldades hercúleas de logística e recursos humanos. Apesar das adversidades ele visualizava neste avanço uma possibilidade de abrir novos mercados para seus produtos. E foi assim que, em 1976, a Moto Honda da Amazônia iniciou a produção em Manaus, já tendo produzido mais de 20 milhões de motocicletas, além de produtos de força que atendem as mais variadas necessidades do mercado brasileiro e exportador. Desde os primórdios, nossa fábrica precisou ser verticalizada, transformando materiais primas como alumínio, aço, polipropileno e outros em peças para uma gama variada de produtos. Atualmente produzimos mais de 34 modelos e versões de motocicletas, propiciando a criação de 8.000 empregos diretos e mais de 2.000 indiretos, através dos 33 fornecedores nacionais e estrangeiros, que aqui vieram para atender a nossa demanda de produção e entrega “Just-In-Time”. A Honda, uma empresa global criada em 1948, tem em suas diretrizes básicas suprir as necessidades dos seres humanos sem comprometer o futuro das próximas gerações, buscando nosso desenvolvimento econômico e material sem agredir o meio ambiente. Nosso objetivo sempre será o uso de todos os recursos de forma racional, para que estes se mantenham em condições de usufruto futuro, compromisso expresso na Declaração Ambiental da Empresa, que norteia todas as nossas atividades. Um projeto recente que ilustra a dimensão do nosso compromisso ambiental é o parque eólico da Honda, localizado na cidade de Xangri-Lá (RS). Com nove aerogeradores de altíssima tecnologia, produzimos um total de 95.000 MW de energia limpa por ano, volume suficiente para suprir 100% da necessidade da fábrica de automóveis Honda, em Sumaré, no interior de São Paulo. Com a operação do parque, iniciada em novembro de 2014, conseguimos reduzir em 2,2 mil toneladas de CO2, ou em 30%, o volume de emissões geradas pela unidade por ano. E é com o mesmo objetivo, de redução contínua de emissões e impactos ambientais, que investimos e trabalhamos em todas as nossas unidades e operações. O caminho para um ambiente mais saudável Nos esforços da Honda para ser uma empresa desejada pela sociedade, observou-se a gestão ambiental como uma responsabilidade social fundamental, ao lado da segurança e da qualidade. Ao definir objetivos e colocar em prática iniciativas ambientais concretas, em linha com a Declaração Ambiental da Honda, a empresa trabalha para superar as expectativas dos seus clientes e da sociedade. Hoje, mais de 60% de nossas motos são dotadas do sistema FFV (Flex Fuel Vehicles), que se baseia no inovador sistema de injeção eletrônica PGMFi, desenvolvido pela Honda, permitindo a mistura de etanol e gasolina com qualquer combinação entre os dois combustíveis, esta tecnologia faz parte do conceito Honda Flex One, que é um empenho da companhia em 11 inovação para mobilidade sustentável, aliando alta performance e baixa emissão de poluentes em todos os produtos. A Honda mantém uma reserva ambiental em Rio Preto da Eva (AM), que preserva 674 hectares de mata nativa e 305 hectares de árvores derivadas de reflorestamento, especialmente algumas espécies ameaçadas de extinção. A produção de frutas como laranja, banana, coco, limão, entre outros, é doada para os restaurantes populares que a Honda patrocina na cidade de Manaus. A empresa também possui a primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural localizada no Igarapé do Mindu em Manaus (AM), com 16,4 hectares, que compõe o chamado Corredor Ecológico Urbano do Mindu. Estas reservas ambientais tiveram capacidade de carboneutralizar o equivalente ao dobro do que é emitido pela fábrica de motocicletas. Em nossa fábrica, uma moderna estação de tratamento de efluentes com capacidade diária de 2.584 litros trata 100% da água utilizada no processo produtivo. Na estação, após passarem por processos bioquímicos de purificação, os efluentes, seguem para uma lagoa de estabilização, quando parte do volume passa a abastecer o sistema de irrigação de jardins. O restante volta para a natureza, preservando o ecossistema. Outro exemplo é o reuso da água de condensação dos compressores de ar. Com esta medida, 755 mil litros do recurso são economizados por ano, em média. Com o objetivo de usar o sistema amazônico de hidrovias, foi desenvolvido, a partir de 2012, o projeto de transporte de motocicletas via cabotagem. Buscando minimizar os altos custos de logística e reduzir as emissões de CO2 no transporte de nossos produtos, passamos a utilizar navios no transporte para as grandes cidades da costa brasileira. Hoje a cabotagem respondendo por quase 30% do nosso volume de deslocamentos, permite uma variação dos modais e eliminou a emissão de 12,5 kg de CO2 por motocicleta transportada. Este projeto continua em expansão, dependendo somente de melhorias na precária infraestrutura portuária do País para evoluir. Aqui na região, um dos problemas são as grandes vazantes do Rio Amazonas, fator que contribui para o aumento de custos quando, como exemplo, em uma pequena área de aproximadamente 2 (duas) milhas náuticas, chamada Tabocal, a profundidade no período de seca não permite o trânsito de navios com carga completa. Neste caso, mais uma das inúmeras necessidades de nossa região é um trabalho de aprofundamento de alguns metros neste trecho do Rio e monitoramento posterior para que se evitem acidentes graves e até interrupção do tráfego de navios, fato que só não é pior devido ao belo trabalho dos práticos da região. São pequenos exemplos da precariedade que a logística enfrenta em sua missão árdua de retirar os produtos da ZFM. Ainda dentro do escopo da redução dos impactos ambientais no processo logístico e, sempre pensando em evolução, a Honda procurou eliminar o altíssimo descarte de resíduos metálicos das embalagens de motos nas concessionárias de todo o Brasil. Desde 2003, após eliminar o uso de madeira e papelão, criamos o sistema de racks vaivém, que evoluiu até atingir 96% de todas as motos transportadas, sejam estas em carretas ou navios. De lá para cá eliminou a vinda para Manaus pelo Rio, de uma grande parcela de carretas ao usar balsas a granel denominadas “Swimming Warehouse”, quando as motos somente entram em carretas a partir de Belém, com ganhos em todos os aspectos da cadeia logística. Em 2014, ao passar a usar gás natural, em substituição do GLP, nos processos de geração a vapor, secagem de peças da pintura alumínio e fusão do alumínio para a fabricação de motocicletas, a fábrica em uma primeira etapa gerou redução de 1.510 toneladas de CO2 por ano, devido ao GN emitir 50% menos CO2 do que o carvão e 20% menos que os demais combustíveis derivados de petróleo. Buscando levar nossos ideais de preservação ambiental a toda a cadeia produtiva, estimulamos nossas concessionárias para que busquem o título de Green Dealer, concedido pela Honda às revendas que destinam 100% de seus resíduos de forma correta e eficiente. Para que isto seja possível, a Honda auxilia com a indicação de empresas especializadas em destinação adequada de resíduos e audita 13 periodicamente as concessionárias para re-certificação no programa. A fábrica de motocicletas de Manaus, além de certificada com a ISO14000, faz parte do programa GHG PROTOCOL, que avalia os resultados da emissão de gases de efeito estufa por corporações brasileiras. Neste ano de 2015 a empresa foi novamente recomendada para receber o Selo Ouro, ao divulgar o inventário de emissões de CO2. A recomendação é resultado do nosso empenho, desde 1995, com a adoção do conceito GREEN FACTORY, que prevê a administração do processo produtivo a partir de diretrizes sustentáveis, que contemplam gerenciamento de resíduos, eficiência energética, uso racional da água e redução de emissões atmosféricas. Para concretizar a Visão Ambiental e ter uma participação crucial na criação de uma sociedade de impacto zero, a Honda procura usar suas tecnologias e atividades de negócio para contribuir no combate às mudanças climáticas e às questões energéticas e de escassez de recursos. Para isso, formulou o conceito Triplo Zero (3 zeros). O primeiro deles é zero emissão de CO2, melhorando as tecnologias já existentes e expandindo o uso de energia renovável para zerar emissões no futuro. As metas são ousadas: reduzir em 30% as emissões de CO2 por unidade, sejam estas carros, motocicletas ou produtos de força. Depois a meta será cortar as emissões pela metade até 2050. A segunda meta é zero risco energético, que visa através da diversificação das fontes de energia, criando tecnologia ambientalmente inovadora ou fonte de energia alternativa, eliminar completamente os riscos energéticos provenientes de combustíveis fósseis. A terceira é a busca por zero resíduo, com ações e esforços para concluir o ciclo de vida de todos os materiais e reciclá-los completamente, eliminando todo o desperdício. Nossa meta é chegar este ano a 95% de taxa de reciclagem de motocicletas. São objetivos desafiadores. Mas buscaremos estas metas através de produtos de alta eficiência e revolucionários. E, para isso, as pesquisas não param. A Honda procura trazer para seus produtos tudo o que venha a beneficiar o cliente final e gerar o menor impacto possível na sociedade. Para isso nunca mediu esforços e continuará a cada dia na batalha para conquistar suas metas. Finalizando, comento que para que nossos objetivos sejam perpetuados, é essencial um trabalho com foco em educação. A forma de passar conhecimento para as comunidades é fundamental para influenciar as pessoas a pensarem e praticarem atitudes que irão beneficia-las diretamente e preparar as gerações futuras para cuidarem cada vez mais do meio ambiente. Por isso, trabalhamos incansavelmente na divulgação de medidas e atitudes que cada um pode adotar para cuidar melhor do lugar onde vivem e, dentro deste espírito, incentivamos o reflorestamento, patrocinamos a criação de aterros para tratamento de resíduos urbanos, desenvolvimento de hortas caseiras, realização de gincanas ambientais nas escolas ribeirinhas, entre muitas outras ações. São inúmeras atividades realizadas, mas sempre nos parece pouco, frente ao imenso desafio de nossa região. Por isso, a empresa como um todo pensa e age de forma similar ao pensamento de John Elkington, que cunhou a expressão tripé da sustentabilidade – a ideia de que todo negócio deve observar seus impactos econômicos, sociais e ambientais. Os três temas cada vez mais farão parte das reuniões estratégicas das empresas. Não podemos mais ficar à margem desta urgência, que é a defesa do nosso único habitat, o planeta Terra. Somos coparticipantes deste movimento. Devemos participar com todas as nossas forças e, neste caso a Honda é um exemplo mundial, assim como a própria Zona Franca que, plantada em uma região de 1,5 milhão de quilômetros quadrados de árvores preservadas, é alvo de estudos científicos que apontam que, ao concentrar a atividade econômica em uma área física reduzida e com baixo índice de utilização dos recursos florestais, garantiu a preservação de 98% da mata nativa do Amazonas. Portanto, é um local a ser valorizado ao se definirem políticas de investimento. São exemplos ativos de que devemos seguir neste cami- Administrador, é diretor Administrativo Financeiro da Moto Honda da Amazônia. O nosso país passa por diversas crises: politica, econômica, social, ambiental e ética. Todas estão correlacionadas mas posso refletir sobre esse cenário traçando possíveis caminhos e soluções a partir da crise ética, usando como exemplo a Política Nacional de Resíduos Sólidos - a Lei 12.305 de agosto de 2010. Rodrigo Sabatini João Batista Coelho Mezari LIXO ZERO nho ou seremos tachados de meros espectadores frente aos vários descaminhos do nosso mundo. Com engajamento e a disseminação da educação podemos garantir que o futuro seja mais aprazível. E neste ponto eu digo que a responsabilidade corporativa voltada para a sustentabilidade tornou-se condição indispensável para a sobrevivência dos negócios e da sociedade. PONTO DE PARTIDA PARA TRANSFORMAÇÃO CULTURAL 15 Foram 18 anos de tramitação entre congresso e outros órgãos públicos até que a Lei fosse aprovada. Ela regulamenta de quem é a responsabilidade na hora de encaminhar os resíduos para o destino correto, tanto para produtores quanto para consumidores. É uma lei considerada moderna quando comparada à legislações semelhantes em outros países. Seu maior destaque é a obrigação, para setores públicos e privados, que criem um plano de trabalho para se enquadrar nas exigências da Lei (fechamento dos lixões, diagnostico e planejamento das ações a serem tomadas por parte dos municípios, estados e grandes geradores), estabele uma hierarquia de tratamento (conscientização, redução, reuso, reciclagem, compostagem e só então disposição final, sempre em aterros sanitários) e o estabelecimento da corresponsabilidade, dividida entre o governo (que estabelece as normas), a indústria, o comércio e o consumidor. O “lixo” que produzimos é um forte sinal de como vemos a sociedade e qual nossa respon- Foto: Sem autor sabilidade na mesma. Revela como cuidamos de nossa casa e cidade, qual é o nosso papel, o dos outros cidadãos e o do estado. Quanto mais responsáveis somos pelos nossos resíduos ou quanto menos delegarmos aos outros a responsabilidade de dar um destino final ao que descartamos, maior será nosso nível de civilidade. Maior nosso comprometimento com o outro, com todos. Apesar de ter sido aprovado em 2010, a Lei 12.305 vem sendo descumprida desde o princípio. As gestões ineficientes dos municípios falharam em fazer um diagnóstico de como é a gestão de resíduos sólidos local e não concluíram um planejamento de ações para se adequar a nova lei. Menos de 30% efetuaram essa etapa. É importante ressaltar que mais de 80% dos municípios brasileiros tem menos de 25 mil habitantes e eles chegam a gastar até 20% do orçamento com a gestão do LIXO. A lei vem também sendo boicotada pela indústria, que não quer assumir a responsabilidade sobre o que produz. 17 19 Um argumento comum é que a população brasileira não está preparada para tal nível de evolução na gestão dos resíduos sólidos. Mas é justamente dos brasileiros que surgem as iniciativas para um Brasil sem lixo: estão separando seus resíduos mesmo sem infraestrutura, sabendo que a maior parte será desprezada em algum lixão, dada a ineficiência dos governantes e o interesse das empresas estabelecidas em boicotar o processo de transformação, que ameaça o seu negocio atual. É o povo brasileiro que exige uma solução e tenta, ainda que sem direção, fazer o seu melhor. No meio a tantas crises, o lixo pode ter um valor de transformação no comportamento e na cultura. Primeiro, precisamos planejar com foco em uma meta comum. Como se fosse um programa de “qualidade total” ou de “melhoria continua”, temos como refêrencia o conceito Lixo Zero, que tem como objetivo desenvolver um sistema ético, econômico, eficiente e visionário para orientar as pessoas a mudarem seus estilos de vida. Também há práticas para fomentar ciclos naturais, onde todos os materiais descartados sejam projetados para retornarem a cadeia de produção. A partir deste, focando no comportamento ético de assumir as responsabilidades por suas escolhas, pelo consumo e consequências dos mesmos, teremos uma sociedade economicamente mais forte, não baseada no desperdício, mas sim na eficiência, conservando nossos recursos naturais e diminuindo a crise ambiental que nos assola. Com base nestes princípios, poderemos seguir as palavras do Papa Francisco, líder católico do mundo (lembremos que o Brasil possui a maior população católica do mundo): sejam revolucionários, mudando o curso da historia de uma sociedade baseada no descarte (material, humano, politico e social) para uma sociedade baseada no respeito, na preservação e no cuidado. Apesar das dificuldades oriundas da incompetência pública e descrença do setor privado, pode-se notar um movimento na socieda- de, de forma autônoma, rumo ao lixo zero. A crise econômica tem pressionado neste sentido. Há uma conscientização maior, uma tomada de consciência que faz pensar antes de consumir, analisar a verdadeira necessidade do produto, se o fabricante é responsável, se o comércio foi justo ou se houve exploração humana. A redução do consumo, embora imposta pela crise financeira, tem nos ajudado a refletir, a nos tornarmos uma sociedade menos perdulária, mais eficiente. O reuso tem se tornado uma opção e é neste setor onde há mais empregos e oportunidades. Precisamos do conhecimento de costureiras, marceneiros, mecânicos e tecnicos. Precisamos dar valor ao que temos, cuidar ao invés de descartar. A reciclagem já ocupa um lugar no nosso vocabulário, embora menos de 2% do lixo produzido no país seja reciclado. Existem países que alcançam taxas de reciclagem de 50%, então melhorar não é impossível. Apesar de sermos um país agrícola, importamos mais de 80% do fertilizante usado nas lavouras. Desperdiçamos cascas, talos, fo- lhas e restos que poderiam ser compostados e devolvidos a terra para a produção de comida. Ainda temos a cultura do descarte e do desperdício. Ainda temos a visão do infinito. Agora, com a fim certo da água nos grandes centros urbanos, as florestas sendo devastadas e os rios poluídos, é hora de repensar. Nossa cultura não foi alterada a balas de canhão, como foi o velho mundo durante as grandes guerras mundiais. Talvez por este motivo, não tivemos as privações que ensinaram outros povos a preservar. Porém hoje temos a consciência de que vivemos em um só planeta, e que há muitas oportunidades em um futuro de escassez. Desde que adotemos a cultura do cuidar. Rodrigo Sabatini Engenheiro, é presidente do Instituto Lixo Zero Brasil. A rnold Schönberg (1874-1951), um dos expoentes da música do século 20, não foi um experimentalista inconsequente – muito pelo contrário, é autor de tratados de harmonia tradicional e contraponto. Disse ele: “a grande tarefa do educador consiste em conhecer o que foi feito no passado, estabelecer rumos para o presente e projetar aquilo que, presumivelmente, deverá acontecer”. Assim, pensemos o Brasil da música de concerto, dos primórdios à atualidade. Henrique Autran Dourado DE CONCERTO NO BRASIL PENSANDO A MÚSICA 21 A vinda de família real para o Brasil, no início do século 19, é o ponto inicial. Com D. João de Bragança, a música e seu ensino foram introduzidos no Reino. Em 1816, chega ao Brasil um importantíssimo músico austríaco, Sigismund von Neukomm (1778-1858), que foi aluno de Joseph Haydn, nascido na mesma casa onde 22 anos antes veio ao mundo Wolfgang Amadeus Mozart. Professor de D. Pedro I e de boa parte da família real, Neukomm tinha como protegido especial o jovem Padre José Maurício, um compositor de mão cheia, de importantíssima obra. Neukomm apaixonou-se pela modinha brasileira, da qual foi grande incentivador aqui e na Europa, e compôs dezenas delas. Ele também orientou outros inúmeros talentos, inclusive Francisco Manuel da Silva, autor do Hino da Abdicação, de 1831, depois transformado em Hino Nacional Brasileiro por Deodoro da Fonseca. Há que se destacar o contexto da letra do Hino Nacional: em 1922, um decreto presidencial de Epitácio Pessoa torna ofi- cial a letra de Osório Duque Estrada. Houve um contraponto estético entre os poetas da Semana de 22 e a letra do Hino Nacional, certo descompasso entre as concepções oficiais e as dos artistas: naquele mesmo ano, acontecera a Semana de Arte Moderna, um marco na cultura brasileira. Artistas como Mário de Andrade, Anita Malfati, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira, Drummond, Menotti Del Picchia, Victor Brecheret e Di Cavalcanti, a fina flor da modernidade de então, fizeram uma reflexão conceitual na arte brasileira. Por outro lado, a “Semana” teve, em relação à música, um nome maior agregado ao evento: Heitor Villa-Lobos. Que negou sua participação no movimento modernista, afirmando apenas que veio pago para abrilhantá-lo, bem ao seu estilo (“Não fiz nada, nada, nada, nada especial de Arte Moderna”, disse em entrevista, em 1957). Com o regime Republicano, a música de concerto entra em novo ritmo e compasso. O Conservatório de Música, fundado pelo Decreto Imperial nº 238 de 1841 por D. Pedro II, foi erguido em 1848 às expensas de duas loterias anuais, passou a chamar-se Instituto Nacional de Música e por fim Escola Nacional de Música, agregada à então Universidade do Brasil (hoje UFRJ). Mário de Andrade (1893-1845), autor de “Paulicéia Desvairada”, também da Semana de 1922, foi o responsável por um revigoramento na música de concerto brasileira: Em 1935, ele era Diretor de Cultura da cidade de São Paulo, conhecido e renomado estudioso e professor do Conservatório Dramático e Musical, onde orientou nomes de vulto como Camargo Guarnieri (19071993). Nomeou o musicólogo Martin Braunwieser (1901-1991) para o cargo de Instrutor de Canto Coral dos Parques e Jardins de São Paulo, o que o levou a uma publicação sobre os principais erros ao se cantar o Hino Nacional Brasileiro. Tanto na música quanto na letra, os piores vícios foram coletados por esse austríaco-brasileiro da mesma Salzburg de Mozart e Neukomm. Retomando um pouco o passado, foram fundados o Teatro Municipal do Rio de Janeiro, de 1909, e o Teatro Municipal de São Paulo, em 1911. Havia no país apenas uma bela casa 23 de óperas, a do Amazonas, fruto do rico Ciclo da Borracha, no estado em que abundavam as seringueiras que lhe deram prosperidade. Os chamados “barões do café” da elite paulistana não podiam aceitar que companhias de ópera passassem a fazer o périplo Milão – Amazonas - Rio de Janeiro indo diretamente para o famoso Colón, de Buenos Aires, saltando São Paulo! Em 1950, marco de uma grande rixa em uma época efervescente, houve um embate entre os nacionalistas alunos de Guarnieri e os que foram seduzidos pelo dodecafonismo de H. J. Koellreuter (1915-2005), modernidade que dividira as tendências em composição - de um lado os que adotaram a novidade e do outro os defensores do que seria a autêntica música brasileira. O tempo tratou de diluir a cisão e o país retomou seu rumo musical, sem traumas. Em 1940 foi fundada a Orquestra Sinfônica Brasileira, pelo maestro José Siqueira, sob a batuta de Eugen Szenkar. Em 1954, a OSESP, Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, que anos mais tarde foi Heitor Villa Lobos 25 Professor, contrabaixista e compositor, é diretor executivo do Conservatório de Tatuí. Basta acompanhar o noticiário para notar que uma névoa espessa encobriu o horizonte político e econômico do país. Se estivéssemos na proa de um barco, teríamos a impressão de navegar à deriva e em mar revolto. As crises política e econômica têm levado as empresas a segurar investimentos, a cortar gastos, e a demitir. Trabalhadores vivem assombrados por fantasmas que julgavam ter deixado para trás, como a inflação alta e o desemprego. Ricardo Ferraz Henrique Autran Dourado E stamos em uma barca que parece furada, mas uma nova agenda surgirá depois que o país fizer a travessia da crise. QUE EMERGE DA CRISE Em 2008, ergue-se a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, sob a batuta de Fábio Mechetti, que recebeu como casa a modelar Sala Minas Gerais. Recife se reergue sob a liderança de Marlos Nobre e novos grupos vão se consolidando, com nítido crescimento de qualidade. O Conservatório de Tatuí, 60 anos completados em 2014, é considerado um paradigma do ensino de qualidade, organizado como os melhores da Europa e EUA, e assume uma posição de destaque no cenário brasileiro, especialmente após ser transformado em Organização Social (2006), como a Osesp e a coirmã paulistana Emesp. Aos 46 anos de fundação, a Escola Municipal de São Paulo faz coro a essas unidades de formação que, a despeito da grave crise financeira por que o país está passando, vão preparar os músicos para, lembrando o Schönberg do início deste texto, projetar hoje “aquilo que, presumivelmente, deverá acontecer” na música de concerto e orquestral brasileira. O BRASIL reestruturada por Eleazar de Carvalho, para enfim ser acolhida no melhor auditório do país, a Sala São Paulo (1999, gestão Mário Covas). A orquestra foi readequada para se tornar um grupo modelo para a América Latina. Em 1960, penúltimo ano da gestão Juscelino Kubitschek, foi criada a Ordem dos Músicos do Brasil, regulamentando a profissão de músico, até então sem situação definida, via CLT. (Em 1964, o golpe militar interveio na direção da OMB, da qual faziam parte Eleazar de Carvalho e José Siqueira, e seus rumos foram desviados dos propósitos originais). Em 1961, último ano de JK, foi criada a Orquestra Sinfônica Nacional da Rádio MEC. Em 1972, a Orquestra Petrobras Pró-Música acresce mais um grupo de qualidade ao Rio de Janeiro, e ressurgem orquestras em Ribeirão Preto (de 1931), Campinas (1929), reestruturada em 1975, entre outras. Para piorar, as notícias de Brasília são desanimadoras para a comandante (ainda não inventaram o termo “comandanta”). Em pé de guerra com Congresso, com a popularidade em níveis recordes de desaprovação, sem demonstrar a menor capacidade de articulação política, Dilma Roussef caminha no fio da navalha, entre o impeachment e a continuidade de um governo que acabou antes de ter começado. 27 Se, no curto prazo, o cenário não permite fazer projeções para o desfecho da crise, é possível, ao menos, tentar enxergar adiante das brumas. Como em outras ocasiões, o nevoeiro há de se dissipar, revelando um novo horizonte. Qual será ele irá depender dos rumos a serem dessa barca onde todos nos encontramos. Analisemos, pois, alguns pontos: Economia A primeira e mais obvia conclusão é que o governo perdeu a capacidade de fazer o motor do navio girar. Durante os oito anos do governo Lula, o modelo calcado na inserção de milhões de pessoas na faixa mínima de consumo, impulsionado pelas águas calmas da atividade econômica mundial, garantiu o crescimento. Mas foi só o mar virar, para a situação ficar mais complicada. Dilma tocou o barco com o motor à meia bomba para conquistar a permanência no timão, só agora contou aos passageiros que a gasolina não será suficiente para completar a travessia. Por mais que economia seja um assunto árido nas vidas das pessoas, o recado ficou claro para os próximos 29 governantes: não se brinca com responsabilidade fiscal. Essa é uma conquista tão cara à população quanto os benefícios sociais dela decorrentes. Outra mensagem que emerge das brumas é que ninguém mais está disposto a remar. Aumentar a carga tributária não parece, portanto, ser a alternativa para tirar o barco do nevoeiro. Só as reformas tributária e previdenciária serão capazes de azeitar o motor novamente e é preciso criar condições políticas de enfrentar esses temas tão adiados. Um novo modelo, capaz de sustentar o crescimento econômico, ainda não surgiu como alternativa. A oposição parece mais disposta a chacoalhar o barco do que discutir uma nova agenda. Abandonar bandeiras históricas e ameaçar a responsabilidade fiscal com uma pauta bomba no Congresso Nacional, por exemplo, é rumar em direção à tormenta. Política A bússola que indicava sempre o caminho da esquerda ficou desorientada. Além disso, as frequentes denúncias envolvendo integrantes da cúpula do Partido dos Trabalhadores nos casos de corrupção da Operação Lava Jato contribuem para esvaziar o forte apelo da legenda junto à população, especialmente entre os mais pobres. O próprio PT sofre as pressões dos movimentos populares, com quem sempre foi umbilicalmente ligado, por abandonar a agenda social. A rota escolhida pelo governo trabalhista tem forte cunho liberal, sendo implementada por um imediato na pasta da Fazenda formado nas fileiras dos grandes bancos brasileiros. Assim, a esquerda corre sério risco de ser fatiada entre o Psol e Rede partidos que se apresentam como o “novo” para o eleitorado. Para a social democracia, as chances de finalmente voltar ao poder parecem ser grandes em 2018. No entanto, o desafio de construir uma alternativa sólida de saída do nevoeiro parece ser ainda mais urgente do que a decisão de optar ou não pela narrativa do impeachment da “comandanta” do navio. Sob Lula e Dilma, o país apostou em um modelo desenvolvimentista com resquícios das políticas do anos setenta, praticamente ignorando os desafios do século 21. A alternativa a ela, no entanto, não está clara sob a batuta do PSDB. Questões ambientais (como a preservação da Amazonia e a redução das emissões de carbono) urbanas (como a mobilidade e a moradia nas grandes cidades), educacionais (como a melhoria da qualificação da mão de obra e, consequentemente, da produtividade das empresas), de saúde (como a prevenção de doenças) são importantes demais para passarem ao largo de uma agenda que parece apenas se preocupar com a retomada do crescimento e o compromisso de uma gestão responsável, a marca do partido. Instituições Além do nevoeiro, essa barca chamada Brasil passou a ser fortemente influenciada por uma corrente marítima que parece desagradar, ao mesmo tempo, a ponte de comando e a casa de máquinas. Tanto integrantes do governo, quanto parlamentares são frequentemente citados nas delações premiadas da operação Lava Jato. O juiz Sergio Moro e o Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, já deram demonstrações de que não irão poupar integrantes da oposição e nem do governo. O Supremo Tribunal Federal também demonstrou estar disposto a punir quem quer que seja para acabar com a escrita da Justiça para poucos, tão recorrente no país. Não seria exagero, portanto, enxergar na Lava Jato uma corrente marítima rumo a um porto mais seguro, principalmente quanto à ética na vida pública. Contudo, outras instituições levantam dúvidas se essa rota será de fato seguida ou se haverá pressão para lutar contra ela. O Tribunal de Contas da União, por exemplo, recomendou, corretamente, ao Congresso Nacional a rejeição das contas da presidente Dilma no exercício de 2014. Mas sobre o relator do caso, Augusto Nardes, pesam acusações na operação Zelotes e de favorecimento na concessão de patrocínios de empresas públicas ao instituto de um sobrinho do ministro. O próprio Congresso Nacional não dá sinais de que irá agir com rigor quanto às suspeitas de corrupção envolvendo deputados e o próprio presidente da Casa. Qualquer que seja o desfecho da crise, é desejável que o Brasil saia dela maior do que entrou. Se do ponto 31 de vista econômico isso se mostra muito pouco provável – a expectativa do mercado é de retração de 3% do PIB em 2015 – seria importante fortalecer a democracia brasileira por meio de suas instituições. É isso o que se espera de governantes que venham a assumir a condução desse transatlântico. Agora, ou em 2018. Ricardo Ferraz Jornalista, é repórter e apresentador na TV Cultura. facebook.com/pensandoobrasil _pensandobrasil institutopensandoobrasil pensando0brasil www.pensandoobrasil.com.br