Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no

Transcrição

Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no
Luci Kikuchi
Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no
Inglês Britânico
Belo Horizonte
2001
Universidade Federal de Minas Gerais
Luci Kikuchi
Vogais Altas e Glides no Português Brasileiro e no
Inglês Britânico
Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Letras: Estudos Lingüísticos
como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Lingüística, na linha de pesquisa
Estrutura Sonora da Linguagem.
Área de concentração: Lingüística
Orientadora: Profa. Dra. Thaïs Cristófaro Silva
UFMG
Belo Horizonte
Faculdade de Letras da UFMG
2001
K62v
Kikuchi, Luci
Vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico
[manuscrito] / Luci Kikuchi. - 2001.
Xiii, 156 f. , enc. : il., color, graf. Tab.
Orientadora : Thaïs Cristófaro Silva
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais,
Faculdade de Letras.
Bibliografia : f. 147-156
1. Gramática comparada e geral – Fonologia – Teses. 2. Língua
portuguesa – Fonética – Teses. 3. Língua inglesa – Fonética –
Teses. 4. Língua portuguesa – Vogais – Teses. 5. Língua inglesa –
Vogais – Teses. 6. Língua portuguesa – Gramática comparada –
Inglês – Grã-Bretanha – Teses. 7. Língua inglesa – Gramática
comparada – Português – Brasil – Teses. 8. Aquisição da
segunda linguagem – Teses. 9. Nasalidade (Fonética) – Teses.
I. Silva, Thaïs Cristófaro. II. Universidade Federal de Minas Gerais.
Faculdade de Letras. III. Título.
CDD : 414
Dissertação defendida e aprovada em 3/12/2001, pela banca examinadora constituída pelos
professores:
Profa. Dra. Thaïs Cristófaro Silva (orientadora)
Universidade Federal de Minas Gerais
Prof. Dr. César Reis
Universidade Federal de Minas Gerais
Prof. Dra. Carmen Lúcia Matzenauer Hernandorena
Universidade Católica de Pelotas
À Renata e ao Ubiratan
AGRADECIMENTOS
Este trabalho é fruto de muito esforço meu e de minha orientadora, Thaïs. Sem ela, este
fruto não teria brotado, crescido e amadurecido. Com ela, além de realizar este sonho que é esta
dissertação, cresci como profissional, pessoa, lingüista. Foi ela que me ensinou que “aluno aprende
melhor com carinho”, “quando aluno procura o professor, é porque precisa de ajuda”, mudando
minha postura como profissional. Não tenho palavras para agradecê-la.
Aos meus pais por terem me proporcionado esta educação e este incentivo. Sou o que sou
graças a eles. O alto investimento e o exemplo impecável do papai. Tenho certeza que ele está em
algum lugar desta eternidade feliz e orgulhoso. Mamãe, que me criou guerreira através de seu
exemplo e educação. Ao Boya e ao Eidi, meus discretos e equilibrados irmãos.
Ao Ubiratan que compartilhou todos os meus problemas, ou nossos. Obrigada por seu
apoio e por me ter dado esta criatura linda chamada Renata, que me deu o título de mãe durante o
mestrado.
Um agradecimento especial aos meus alunos e colegas da Unimontes por todo o apoio que
me foi dado em todos os sentidos. E principalmente aos meus alunos do 4o. e 6o. período que se
preocuparam comigo e meu estado de saúde. Agradeço a FAPEMIG e à UNIMONTES pelo apoio
financeiro e moral.
Agradeço meus chefes, colegas e os alunos do CCAA. Aos meus amigos, Ju, Andréia,
Andrey, Carmen, Aloísio, Edu, Marina, Beth, Helena, enfim todos que me escutaram, apoiaram
durante estes anos de luta. Aprender é uma luta árdua.
À Cida, por ter cuidado da minha Renatinha enquanto tentava recuperar uma noite de sono
perdida. E claro, à guerreira número 2 da casa, Helena, que vem lutando comigo há sete anos. E
que durante este mestrado, ficou com Rê dia e noite para eu finalizar esta obra. Helena é um
exemplo de amizade, fidelidade e dignidade.
Aos professores da UFMG que me apoiaram e me ensinaram muito.
“When he aims straight, he shoots higher
than man can see - past the stars –
to the place where all dreams are really born.”
Linda Goodman
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS.....................................................................................................
LISTA DE TABELAS.....................................................................................................
10
RESUMO..........................................................................................................................
11
12
1
INTRODUÇÃO.................................................................................................
1.1
Objeto de estudo................................................................................................
13
1.2
Justificativa........................................................................................................
13
1.3
Organização do trabalho....................................................................................
14
1.4
Objetivos e Hipótese..........................................................................................
18
20
2
FONÉTICA........................................................................................................
2.1
Introdução............................................................................................................
21
2.2
A Produção dos sons da fala...............................................................................
21
2.3
As Vogais...........................................................................................................
22
2.4
Propriedades articulatórias.................................................................................
25
2.4.1
Altura do corpo da língua....................................................................................
26
2.4.2
Grau de anterioridade/posterioridade da língua................................................
27
2.4.3
Arredondamento dos lábios...............................................................................
28
29
2.5
Propriedades articulatórias das vogais..............................................................
30
2.5.1
Vozeamento.......................................................................................................
30
2.5.2
Qualidade vocálica..........................................................................................
32
2.5.3
Nasalização........................................................................................................
33
2.5.4
Duração..............................................................................................................
34
2.5.5
Tensão................................................................................................................
35
2.5.5
Notação dos segmentos vocálicos......................................................................
36
2.6
O Método das vogais cardeais............................................................................
37
2.7
As Propriedades acústicas..................................................................................
42
2.8
Os Correlatos acústicos das propriedades articulatórias....................................
50
2.9
A
52
Sílaba...............................................................................................................
54
2.10
Acento.................................................................................................................
57
2.11.1
Vogais altas e glides no português brasileiro....................................................
57
2.11.2
As Vogais altas no português brasileiro............................................................
2.12
Os Ditongos no português brasileiro.................................................................... 61
2.12.1
Vogais altas e glides no inglês britânico...........................................................
65
2.12.2
As Vogais altas no inglês britânico...................................................................
65
2.12.3
Os Ditongos do inglês britânico........................................................................
69
2.12.3
Os Glides /j, w/ no inglês britânico..................................................................
72
2.13
Conclusão..........................................................................................................
73
3
FONOLOGIA..................................................................................................
76
3.1
Introdução..........................................................................................................
76
3.2
O Modelo fonêmico...........................................................................................
77
3.2.1
Introdução..........................................................................................................
77
3.2.2
Fonemas.............................................................................................................
78
3.2.3
Distribuição complementar................................................................................
79
3.2.4
Variação livre....................................................................................................
80
3.2.5
Princípio de pressão estrutural...........................................................................
80
3.2.6
A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português brasileiro.......
82
3.2.6.1 A Alofonia de /i/ no português brasileiro..........................................................
83
3.2.6.2 A Alofonia de /u/ no português brasileiro.........................................................
88
3.2.6.3 Conclusão..........................................................................................................
91
3.2.7
92
A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no inglês britânico..............
57
3.2.7.1 Os Fonemas /i, u, , /................................................................................... 92
3.2.7.2 Os Ditongos no inglês britânico........................................................................
95
3.2.7.3 Os Glides [j, w] no inglês britânico..................................................................
97
3.2.7.4 Conclusão...........................................................................................................
99
3.2.7.5 Conclusão geral de fonêmica.............................................................................
99
3.3
O Modelo gerativo padrão................................................................................. 102
3.3.1
Introdução.......................................................................................................... 102
3.3.2
Os Traços distintivos.........................................................................................
103
3.3.3
Traços de classes principais..............................................................................
104
3.3.4
Traços de corpo da língua................................................................................. 105
3.3.5
Traços relacionados com o formato dos lábios.................................................
3.3.6
Traços prosódicos.............................................................................................. 106
3.3.7
As Vogais altas e os glides no português brasileiro..........................................
105
107
3.3.7.1 Introdução......................................................................................................... 107
3.3.7.2 Processos fonológicos no português brasileiro................................................. 109
3.3.7.3 Conclusão..........................................................................................................
3.3.8
112
As Vogais altas e glides no inglês britânico..................................................... 113
3.3.8.1 Introdução......................................................................................................... 113
3.3.8.2 Processos fonológicos no inglês britânico......................................................... 114
3.3.83 Conclusão.......................................................................................................... 116
3.3.8.4 Conclusão geral do modelo gerativo padrão..................................................... 116
3.4
O Modelo da fonologia autossegmental...........................................................
117
3.4.1
As Vogais altas e os glides no português brasileiro..........................................
121
3.4.1.1 Os Glides pré-vocálicos..................................................................................... 123
3.4.1.2 Os Glides pós-vocálicos..................................................................................... 128
3.4.1.3 A Vogal alta longa............................................................................................. 130
3.4.1.4 Conclusão.......................................................................................................... 131
3.4.2
As Vogais altas e os glides no inglês britânico .............................................. 131
3.4.2.1 Conclusão.......................................................................................................... 136
3.4.2.2 Conclusão do modelo autossegmental............................................................... 136
3.5
O Modelo teórico da otimalidade....................................................................... 137
3.5.1
Introdução.......................................................................................................... 137
3.5.2
Formalismo da teoria da otimalidade................................................................ 140
3.5.3
Análise das vogais altas e glides no português brasileiro pela teoria da
otimalidade........................................................................................................ 142
3.5.4
Análise das vogais altas e glides no inglês britânico pela teoria da
otimalidade........................................................................................................ 145
3.5.5
Conclusão geral................................................................................................. 147
4
CONCLUSÃO.................................................................................................. 148
5
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................... 151
LISTA DE FIGURAS
1
O Sistema respiratório e fonatório.....................................................................
23
2
O Trato vocal.....................................................................................................
24
3
O Limite vocálico..............................................................................................
25
4
Posição da língua na produção das vogais cardeais..........................................
28
5
Tipos de arredondamento dos lábios.................................................................
30
6
As Oito vogais cardeais.....................................................................................
38
7
Vogal alta falada por um homem a uma freqüência fundamental
de 120 hz............................................................................................................
44
8
Gráfico de freqüência de formantes vogais........................................................
50
9
Esquema do esforço muscular e da curva da força silábica ..............................
52
10
As Vogais altas do português de Belo Horizonte...............................................
59
11
F1 e F2 no português europeu, português brasileiro e as vogais cardeais..........
60
12
Os Ditongos[ai] e [aυ] no português brasileiro.................................................. 61
13
As Vogais altas do inglês RP.............................................................................
65
14
Espectrogramas das vogais altas do inglês.......................................................
67
15
Os Ditongos do RP............................................................................................
69
16
Diagrama da teoria da otimalidade...................................................................
136
LISTA DE TABELAS
1
As VC1 a VC8...................................................................................................
39
2
As VC9 a VC16.................................................................................................
40
3
As VC17 a VC22...............................................................................................
40
4
Resultados de J.C. Wells obtidos em 1962........................................................
46
5
Alofones das vogais altas no português brasileiro.............................................
58
6
Valores das F1 e F2 das vogais altas, medidos em Hz......................................
60
7
Ocorrência de vogais altas, ditongos e glides do português brasileiro e no
inglês britânico..................................................................................................
8
75
Os Alofones do fonema /i/ no português brasileiro. Sendo que V=vogal,
C=consoante.......................................................................................................
87
9
Os Alofones do fonema /u/ no português brasileiro ..........................................
91
8
Tabela comparativa de vogais altas e glides no português brasileiro e no
inglês britânico..................................................................................................
99
9
Traços distintivos para as vogais altas no português brasileiro......................... 107
10
Traços utilizados na caracterização de /i,u,j,w/ no português brasileiro........... 108
11
Traços distintivos dos alofones das vogais altas e glides no português
brasileiro...........................................................................................................
108
12
Traços distintivos das vogais altas e glides no inglês britânico........................
113
13
Tableau da língua hipotética.............................................................................
141
14
Tableau da representação de "lua"....................................................................
143
15
Tableau da representação de "pai"....................................................................
144
16
Tableau da representação de "see"....................................................................
146
17
Inventários fonéticos e fonológicos das vogais altas no português brasileiro e
no inglês britânico.............................................................................................
149
RESUMO
Este trabalho faz uma análise fonética e fonológica das vogais altas /i, u/ e glides
/j, w/ no português brasileiro e no inglês britânico RP (Received Pronunciation). O RP
foi escolhido por considerado modelo de pronúncia no ensino do inglês britânico aos
aprendizes de inglês como segunda língua (MCARTHUR, 1992). Esta pesquisa apontará
semelhanças e diferenças nas vogais altas /i, u/ e os glides /j, w/ nos dois sistemas
sonoros. Estes sons foram escolhidos pela alta ocorrência nas línguas naturais. Este
trabalho também pretende descrever os traços articulatórios e acústicos desses sons e
pretende contribuir para o estudo fonético e fonológico das vogais altas e glides.Também
pretende mostrar e entender melhor a distribuição complementar destes sons para
pesquisas futuras em lingüística e em lingüística aplicada.
ABSTRACT
The present work analyses the high vowels /i, u/ and the glides /j, w/ in Brazilian
Portuguese and British English (RP). This particular English dialect was chosen for being
considered a model of pronunciation for the teaching of English as a second language.
(MACARTHUR, 1992). This study will show similarities and differences among the high
vowels /i, u/ and the glides /j, w/ in the sound systems of the two languages. These
sounds have been chosen due to its high occurrence in the natural languages. This research
also describes articulatory and acoustic features of these sounds and intends to contribute
for the phonetic and phonological study of the high vowels and glides of the natural
languages. It also shows the complementary distribution of these sounds in order to
contribute to future researches in linguistics and applied linguistics.
13
1. INTRODUÇÃO
1.1 O Objeto de estudo
As línguas do mundo alternam segmentos vocálicos e consonantais na constituição
de enunciados. Foneticamente, os segmentos consonantais são produzidos com algum tipo
de obstrução no fluxo de ar nas cavidades acima da glote, no trato oral, podendo haver
fricção ou não. Na produção dos segmentos vocálicos, em oposição, não ocorre obstrução
ou fricção no trato oral. A categorização dicotômica de consoantes e vogais é explícita
foneticamente a partir da obstrução ou não da passagem da corrente de ar pelo trato vocal.
No entanto, alguns segmentos podem não ter interpretação fonológica tão explícita quanto
ao seu estatuto como vogal ou como consoante. Estes segmentos serão denominados glides
neste trabalho1.
Os glides são segmentos que podem ser fonologicamente interpretados em algumas
línguas como vogais e em outras línguas como consoantes (Trask, 1996). Foneticamente,
tanto os glides quanto as vogais, são sons produzidos continuamente e sem fricção. Neste
trabalho, trataremos dos glides palatais e velares.2 Glides palatais podem ser transcritos
como /j, y, , /. Glides velares podem ser transcritos como /w, j, /.
Alguns sons da fala são ditos universais devido a sua ocorrência em todas ou em
quase todas as línguas naturais. As vogais altas [i,u] e a vogal baixa [a] fazem parte
1
“A palavra glide, de que também nos valemos, já se encontra documentada da Literatura Lingüística
Portuguesa” (BISOL ,1989). A classificação fonética tradicional denomina os glides, semivogais.
14
deste inventário universal. De acordo com Picket (1999), há três vogais correspondentes
aos três extremos de constrição no trato oral. Picket denomina estas vogais como “vogais
de ponta” que em princípio ocorrem em todas as línguas naturais e podem ser classificadas
como:
Vogais de ponta
. [i] – posição anterior e alta da língua, lábios estendidos
. [u] – posição posterior e alta da língua, lábios arredondados
. [a] – posição baixa e central da língua, lábios estendidos
Estas três vogais fazem parte de um sistema vocálico triangular e simétrico
considerado básico nas línguas naturais (Roca/Johnson, 1999). Elas são tão comuns que
são referidas como o padrão das três vogais básicas. Jakobson afirmou que [i,a,u] são
universalmente os três primeiros fonemas vocálicos que se manifestam na fala da criança
(Schane, 1973).
As vogais altas e os glides foram escolhidos como tema de pesquisa devido a sua
alta ocorrência nas línguas naturais, pela alternância possível entre os glides e as vogais
altas e pelo estatuto fonológico variável destes sons, ora como vogais, ora como
consoantes.
1.2 Justificativa
2
Alguns autores consideram [r] como glide na análise do inglês (O'CONNOR, 1980). Os argumentos para
esta opção seguem da interpretação fonológica assumida.
15
Pretendemos demonstrar nesta seção, que as vogais altas /i, u/ podem ser
agrupadas como pertencendo a uma classe natural. Dizemos que dois segmentos pertencem
a uma classe natural quando um ou mais dos requisitos relacionados a seguir, são
preenchidos (Hyman, 1975):
•
Os dois segmentos submetem-se a mesma regra fonológica;
•
Os dois segmentos juntos mudam em ambientes específicos;
•
Um segmento é transformado em outro segmento através de uma regra fonológica;
•
Um segmento é derivado no ambiente de outro segmento.
Essencialmente, todos os elementos pertencentes a uma certa classe natural
apresentam comportamento semelhante. Os segmentos da classe natural condicionam ou
são submetidos a um processo fonológico devido a alguma característica fonética que é
compartilhada por estes segmentos.
Por exemplo, é comum o fato de ocorrer a palatalização de consoantes no contexto
de vogais altas. Dizemos que ocorre um processo de palatalização. Este processo é
motivado pelo fato da vogal alta anterior [i] ser produzida pela aproximação da língua ao
palato duro. Este fenômeno de palatalização ocorre em várias línguas, dentre elas o
papago, o kongo do sul e o português do Brasil. Vamos discutir cada um destes casos a
seguir. Considere em (1) os dados do papago (Halle & Clements, 1994).3
(1)
3
a. [bidZim]
virar-se
b. [tapan]
repartir
c. [hidod]
cozinheiro
d. [tkid]
vacinar
Língua da família Uto-Asteca, falada no estado do Arizona (USA) e no México.
16
e. [atwid]
atirar
f. [tuku]
tornar-se preto
g. [dasp]
pressionar com a mão
h. [toha]
tornar-se branco
i. [duki]
chuva
j. [hwid]
cheiro
k. [tiha]
contratar
l. [toi]
esquentar
m. [widut]
ritmo
n. [tatad]
pés
o. [kitud]
construir uma casa para
p. [dodom]
copular
q. [tatam]
tocar
No papago, as oclusivas [t, d] estão em distribuição complementar com as
africadas [t, d]. Estes grupos de segmentos ocorrem em ambientes exclusivos.
Precedendo a vogal alta e suas variantes ocorrem as africadas alveopalatais [t, d]. Nos
demais ambientes, ou seja, antes de outras vogais ocorrem as oclusivas alveolares [t, d].
Examine os dados abaixo, que são do congo do sul (Halle & Clements, 1994).4
(2)
4
a.[tobola]
ter um buraco
b.[tina]
cortar
c.[kesoka]
ser cortado
d. [nkoi]
leão
e. [zena]
cortar
f. [ima]
esticar
g. [kasu]
emagrecer
h. [tiba]
banana
i. [nselele]
cupim
j. [loloni]
lavar
k. [zevo]
então
l. [aimola]
esmola
Língua da família Bantu, falada em Angola.
17
m. [nzwetu]
nossa casa
n. [kunezulu]
para o céu
o. [tanu]
cinco
No kongo do sul, os segmentos consonantais alveolares [t, s, z] encontram-se em
distribuição complementar com as consoantes palatais [t, , ]. Podemos perceber que as
consoantes alveolares tornam-se palatais quando precedem as vogais altas anteriores.
Precedendo as outras vogais, as consoantes alveolares ocorrem.
Em alguns dialetos do português brasileiro, como por exemplo o de Belo Horizonte,
as oclusivas alveolares [t, d] são palatalizadas quando seguidas da vogal alta anterior.
Considere os dados abaixo:
(3)
a. [tatu]
“tatu”
b. [tu]
“tua”
c. [ti]
“tia”
d. [tt]
“teto”
e. [dat]
“data”
f. [di]
“dia”
g. [dus]
“duas”
h. [atls]
“atlas”
i. [tres]
“três”
Os exemplos acima demonstram que as consoantes africadas [t, d] ocorrem
seguidas da vogal alta anterior [i]. Nos demais ambientes, ou seja, antes das demais vogais
e seguidas de consoante na mesma sílaba, ocorrem as consoantes [t, d].
18
Podemos concluir pelos exemplos apresentados em (1-3) que as vogais altas
anteriores podem desencadear o fenômeno fonológico conhecido como palatalização. Ou
seja, quando uma consoante oclusiva alveolar precede uma vogal alta anterior é
transformada em consoante africada através do fenômeno fonológico da palatalização.
As vogais altas numa mesma classe natural, em várias línguas naturais, apresentam
a alternância entre vogais altas e os glides correspondentes. Por exemplo, no francês há três
semivogais correspondentes às vogais altas, havendo alternância entre as três vogais altas e
seus respectivos glides, (Schane,1973). A alternância (e/ou variação) entre vogais altas e
glides é atestada também em espanhol e em italiano.
Considerando-se que as vogais altas são segmentos tidos como universais e
considerando-se também que estes segmentos podem ser agrupados numa mesma classe
natural, optamos em investigar o comportamento das vogais altas e dos glides no português
brasileiro e no inglês britânico. Na próxima seção, apresentamos a organização geral desta
dissertação.
1.3 Organização do trabalho
Este trabalho está dividido em duas partes principais: “Fonética” (capítulo 2) e
“Fonologia” (capítulo 3). Os dados desta pesquisa são oriundos de fontes secundárias que
descrevem e analisam vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Os
dados do português brasileiro são do dialeto padrão de Belo Horizonte. Os dados do inglês
19
são do inglês britânico, o R.P. (Received Pronunciation).5 Quando pertinente, avaliamos
dados adicionais para corroborar ou refutar uma proposta de análise.
O capítulo 2, ''Fonética'', discute inicialmente a relação entre a fonética e a
fonologia. Procede-se então a descrição fonética articulatória e a caracterização acústica
das vogais altas e glides. As descrições fonéticas baseiam-se nos estudos de Pike (1943);
Abercrombie (1967); Jones (1969); Câmara Júnior (1970); Bisol (1989); Callou & Leite
(1990); Ladefoged (1996); Cagliari (1998) e Cristófaro Silva (1999a). Além da descrição
articulatória, as vogais são descritas pelo método das vogais cardeais e este método
considera parâmetros articulatórios e auditivos na descrição dos segmentos vocálicos.
Discute-se ainda, a noção de sílaba e de acento, pois tais noções são importantes para a
descrição e análise apresentadas para as vogais altas e glides no português brasileiro e no
inglês britânico.
O capítulo de ''Fonologia'' discute análises fonológicas potenciais das vogais altas e
glides no português brasileiro e no inglês britânico em quatro modelos fonológicos: O
Modelo Fonêmico, o Modelo da Fonologia Gerativa Padrão, o Modelo Autossegmental e o
Modelo da Otimalidade. Cada uma destas análises pretende indicar os pontos positivos de
cada modelo e indicar aspetos a serem aprimorados nas propostas teóricas subseqüentes. O
Modelo Estrutural ou a Fonêmica foi escolhido por ser um modelo fonológico pioneiro. O
Modelo da Fonologia Gerativa Padrão proposto por Chomsky & Halle (1968), influenciou
todas as teorias fonológicas que o seguiram. O Modelo da Fonologia Autossegmental de
Goldsmith (1990), salienta-se por dar um estatuto teórico à sílaba (que passa a operar como
5
Received Pronunciation (RP) é a forma de pronúncia mais descrita em livros de fonética de inglês britânico
e tradicionalmente ensinado a aprendizes de inglês como segunda língua ou língua estrangeira.
20
constituinte). O último modelo a ser discutido, o da Otimalidade, é o modelo dos anos 90,
o modelo corrente.
1.4 Objetivos e Hipótese
O objetivo deste trabalho é apresentar um estudo fonético e fonológico das vogais
altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Tal estudo é relevante pelo fato
de não contarmos com trabalhos anteriores, cujo objetivo específico seja o de analisar as
vogais altas e glides em profundidade nestas duas línguas. Os objetivos específicos deste
trabalho são:
•
Descrever foneticamente as vogais altas e glides no português brasileiro e inglês
britânico em termos articulatórios e acústicos, explicitando seus ambientes de
ocorrência e identificando o comportamento destes segmentos na estrutura silábica.
•
Descrever e avaliar o comportamento fonológico das vogais altas e glides no
português brasileiro e no inglês britânico.
•
Analisar a pertinência e adequação de quatro modelos fonológicos para a análise
das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
Tomamos como hipótese básica que as vogais altas e os glides operam de maneira
diferente na estrutura sonora do português brasileiro e no inglês britânico. Portanto, esta é a
hipótese a ser investigada nesta pesquisa. Acreditamos que se compreendermos o
comportamento destes sons nas duas línguas, contribuiremos também para a discussão
teórica do ensino e aprendizado de inglês ou português como segunda língua. Portanto,
21
como objetivo final, este trabalho pretende servir como orientação para pesquisas futuras
tanto na área de concentração da lingüística como na área da lingüística aplicada.
2. FONÉTICA
2.1 Introdução
A lingüística é a ciência que estuda os fenômenos ligados à linguagem humana, que
procura explicar os princípios e características que regulam as estruturas da língua. É
dividida em áreas, entre as quais, a fonética e a fonologia, (Cagliari, 1997). Ambas as
ciências estudam os sons usados na fala ou o sistema sonoro de uma língua, sendo a
fonética a base para a fonologia.
A fonética é a ciência que apresenta métodos de descrição fisiológica, física e
classificação dos sons das línguas naturais (Cristófaro Silva, 1999a). A fonética permitenos descrever os mecanismos e os processos que estão envolvidos na produção da fala. O
papel principal do foneticista é descrever o que acontece tanto com o falante durante sua
fala, quanto com o ouvinte quando a capta (Ladefoged, 1982). Numa perspectiva mais
ampla, podemos dizer que a fonética baseia-se na produção, percepção e transmissão dos
sons da fala. A fonética pode ser dividida em áreas de interesse que são:
•
Fonética articulatória: É a área de investigação mais antiga, conseqüentemente a
mais sólida dentro da fonética lingüística (Cagliari & Massini-Cagliari, 2001). A
fonética articulatória consiste no estudo da produção da fala do ponto de vista
fisiológico e articulatório. Os sons da fala são descritos a partir dos movimentos
atestados no aparelho fonador que estão envolvidos na articulação.
22
•
Fonética auditiva: Estudo da percepção da fala. Ou seja, como as ondas sonoras da
fala são analisadas e identificadas pelo ouvido e o cérebro humano (Crystal, 1997).
•
Fonética acústica: Estudo das propriedades físicas dos sons da fala a partir de sua
transmissão do falante ao ouvinte. Descreve como estes sons são transmitidos a
partir das propriedades físicas ou acústicas. (Cagliari & Massini-Cagliari, 2001).
•
Fonética instrumental: Estudo das propriedades físicas da fala, com o suporte de
instrumentos laboratoriais. Existem muitos instrumentos disponíveis atualmente
para o estudo da produção da fala, como equipamento para gravar a fala, ou para
analisar as propriedades acústicas da fala ou para investigar a fisiologia das cordas
vocais.
A fonética investiga também os sons em relação uns aos outros, analisa a
organização dos segmentos em unidades maiores (como sílabas, por exemplo) e avalia a
organização do acento e de estruturas supra-segmentais (como o ritmo e a entoação). Neste
trabalho, limitaremos à avaliação segmental das vogais altas e glides. A descrição fonética
apresentada é baseada em propriedades articulatórios, auditivos e acústicos.
2.2 A Produção dos sons da fala
Os sons da fala são produzidos com algum tipo de interferência em uma corrente de
ar em movimento no trato vocal. A corrente de ar é a fonte de energia dos sons da fala. A
interferência na corrente de ar usada para a produção dos sons da fala é denominada
23
mecanismo de corrente de ar. A FIG.1 a seguir representa o sistema respiratório e o
fonatório.
FIGURA 1 O Sistema respiratório e fonatório.
FONTE - CRYSTAL, 1997. p. 124.
O sistema respiratório compreende os pulmões que são órgãos esponjosos contidos
dentro de uma cavidade formada pela caixa torácica e o diafragma. No sistema respiratório
tem-se ainda os músculos pulmonares, os tubos brônquios e a traquéia. Quando o
diafragma, que é um músculo, move-se para cima, há compressão da caixa torácica,
fazendo a corrente de ar fluir em direção oposta aos pulmões. Este é o mecanismo de
corrente de ar mais comum nas línguas do mundo - o mecanismo de corrente de ar
pulmonar egressivo. Neste mecanismo, o ar expelido dos pulmões em direção à boca e/ou
ao nariz. No português e no inglês, as línguas em estudo, todos os segmentos são
produzidos com o mecanismo de corrente de ar pulmonar egressiva.
24
Há também o sistema fonatório que se localiza na laringe. Neste sistema ocorre o
vozeamento (ou sua ausência) na produção dos sons. As cordas vocais são responsáveis
pelo vozeamento.
O sistema articulatório compreende a faringe, a língua, o nariz, os dentes e os
lábios. O sistema articulatório é responsável pela modificação na estrutura da cavidade oral
através do movimento dos articuladores indicados acima. Considere a FIG. 2 abaixo, que
representa o trato vocal com os articuladores passivos e ativos envolvidos na produção dos
sons da fala.
FIGURA 2 O Trato vocal
FONTE - SMALL, 1999, p. 42.
Os sons da fala são articulados com a modificação do trato vocal, a ação dos
articuladores ativos e passivos, e com a passagem da corrente de ar. Assim são produzidos
os segmentos vocálicos e consonantais. No caso das vogais, ocorre primordialmente a
modificação da posição da língua. Uma pequena alteração na configuração da língua causa
efeitos articulatórios, auditivos e acústicos significativos. Na próxima seção, definimos o
25
conceito de segmento vocálico e procedemos à descrição dos segmentos a serem
investigados nessa dissertação.
2.3 As Vogais
Segmentos ou fones são os sons da fala que compõem um enunciado. Estes
segmentos podem ser arranjados em padrões diferentes para formar sílabas, que por sua
vez formam palavras, que finalmente formam um enunciado. Os segmentos podem ser
divididos em duas categorias: vogais e consoantes. As vogais são produzidas sem
obstrução no trato vocal e na articulação das consoantes há obstrução no trato vocal. Estas
categorias – vogais e consoantes - são definidas por este critério fonético básico que se
relaciona à obstrução (ou não) do trato vocal.
Jones (1969), estabeleceu uma linha vocálica na altura do palato na boca,
simbolizada pela linha pontilhada que aparece na FIG. 3 abaixo.
FIGURA 3 O Limite vocálico
FONTE - JONES, 1969. p. 13
26
Durante a articulação de um som, se a língua ultrapassar a linha vocálica ocorre um
som friccional que caracteriza um segmento consonantal. Por outro lado, se a língua não
ultrapassar a linha vocálica (e, portanto, se não ocorrer fricção audível), teremos a
produção de um segmento vocálico.
Contudo, durante a produção da fala, há uma constrição ou estreitamento em
alguma parte do trato vocal tanto na produção dos segmentos vocálicos, quanto nos
consonantais (Picket, 1999). Os segmentos vocálicos, em termos fisiológicos, são sons
tipicamente produzidos com a aproximação ou constrição dos articuladores, mas com
ausência de obstrução ou fricção no trato vocal. Os segmentos consonantais, por outro
lado, são produzidos com estritura6. A produção dos segmentos consonantais envolve um
contato ou aproximação de áreas dos articuladores ativo e passivo relativamente maior,
ultrapassando a linha vocálica proposta por Daniel Jones. (cf. FIG. 3).
Entendemos como segmento vocálico qualquer som que seja produzido com a
língua abaixo da linha que define o limite vocálico. Ao ingressar na linha do limite
vocálico ocorre a fricção, que caracteriza um segmento consonantal.
2.4 Propriedades articulatórias
As propriedades articulatórias descritas nesta seção, que são utilizadas para a
classificação dos segmentos vocálicos são baseados em Cagliari (1981); Ladefoged (1982);
Cristófaro Silva (1999a) e Cagliari & Massini-Cagliari (2001). Os segmentos vocálicos
6
Estritura é a posição assumida pelo articulador ativo em relação ao passivo, indicando como e em que grau
a passagem da corrente de ar através do aparelho fonador (ou trato vocal) é limitada neste ponto
(ABERCROMBIE, 1967. p. 44). A partir da natureza da estritura, classificamos os segmentos consonantais
quanto à maneira ou modo de articulação (CRISTÓFARO SILVA, 1999a).
27
podem ser classificados ou descritos por três traços articulatórios básicos mencionados
abaixo.
1. Altura do corpo da língua;
2. Grau de anterioridade/posterioridade da língua;
3. Arredondamento ou não dos lábios.
A seguir cada um destes traços articulatórios será considerado separadamente.
2.4.1 Altura do corpo da língua
Os segmentos vocálicos podem ser classificados como altos, médios ou baixos,
quanto a altura da língua na cavidade oral no eixo vertical. Quando, na produção de um
segmento vocálico, a língua encontra-se na parte superior da cavidade oral em um ponto
alto, estes segmentos vocálicos produzidos são chamados vogais altas.
Os segmentos /i/ e o /u/, objetos desta pesquisa, são classificados como vogais
altas, pois durante sua produção, a língua encontra-se elevada dentro da cavidade oral. Os
segmentos vocálicos produzidos quando o corpo da língua encontra-se em um ponto baixo
em oposição ao ponto alto, são denominados vogais baixas, por exemplo, o /a/. Quando a
posição da língua é intermediária, temos vogais médias.
Dependendo da língua, pode haver alturas intermediárias, quanto à caracterização
das vogais médias. Na descrição do português, há quatro níveis de altura: alta, média-alta,
média-baixa e baixa (Cristófaro Silva, 1999a). Na descrição do inglês, Ladefoged (1982)
considera três níveis de altura: alta, média e baixa.
28
FIGURA 4 Posição da língua na produção das vogais cardeais.
FONTE – JONES, 1969. p. 19 - 20.
A FIG. 4 acima, indica a posição da altura da língua durante a articulação dos
segmentos vocálicos. No diagrama da esquerda, o segmento /i/ é classificado como alto.
Os segmentos /e, / são classificados como médios e o segmento /a/ é classificado como
baixo. Já no diagrama da direita, o segmento /u/ é classificado como alto, os segmentos
/o, / classificados como médios. E o segmento // é classificado como baixo. A
diferença entre o diagrama da esquerda é da direita está no grau de anterioridade e
posterioridade da língua, que será discutido a seguir.
2.4.2 Grau de anterioridade/posterioridade da língua
Os segmentos vocálicos podem ser classificados também pelo grau de anterioridade
e posterioridade da língua. Neste caso, é considerada a posição da língua no eixo horizontal
da cavidade bucal, dividindo-a em três partes. Se, na produção da vogal, o corpo da língua
estiver na parte da frente da cavidade bucal, a vogal é classificada como anterior. Se o
corpo da língua estiver na parte média da cavidade bucal, a vogal é classificada como
29
central e, finalmente, se o corpo da língua estiver na parte de trás da cavidade bucal, a
vogal é classificada como posterior.
Na FIG. 4, as vogais do diagrama da esquerda são classificadas como vogais
anteriores /i, e, , a/. As vogais do diagrama da direita são classificadas como vogais
posteriores: /u, o, , /. Dos segmentos a serem analisados neste trabalho, podemos,
portanto, classificar a vogal /i/ como anterior e a vogal /u/ como posterior.
2.4.3 Arredondamento dos lábios
O terceiro parâmetro articulatório envolvendo os segmentos vocálicos é a posição
assumida pelos lábios. Durante a produção de um segmento vocálico os lábios podem estar
arredondados ou estendidos. O arredondamento nos lábios resulta no alongamento da caixa
de ressonância.
Na maioria das línguas do mundo, há uma relação previsível entre as dimensões
fonéticas de grau de posterioridade da língua e arredondamento dos lábios. As vogais
anteriores são, em geral, produzidas com os lábios estendidos e as vogais posteriores são
produzidas com os lábios arredondados. No entanto, podem ser encontradas vogais
posteriores estendidas e vogais anteriores arredondadas, (Ladefoged, 1996). No francês, a
vogal simbolizada por [y], é alta, anterior e arredondada. No japonês, a vogal alta
posterior, [], é produzida com os lábios estendidos.
30
No português, o segmento [u] é produzido com os lábios arredondados e o
segmento [i] é produzido com os lábios estendidos. Este padrão que é apresentado no
português ocorre na maioria das línguas naturais. A Fig. 5 abaixo apresenta as posições dos
lábios quanto ao arredondamento, sugerida por Jones (1969).
FIGURA 5 Tipos de arredondamento dos lábios
FONTE - JONES, 1969. P. 17
(a) Lábios estendidos (b) Posição neutra (c) Arredondamento aberto (d) Arredondamento fechado
Na Fig. 5 acima, os lábios encontram-se estendidos em (a), na posição neutra em
(b), em posição de arredondamento aberto em (c) e finalmente em posição de
arredondamento fechado em (d) (Jones, 1969).
2.5 Propriedades articulatórias das vogais
Nesta seção, trataremos da noção de vozeamento e de qualidade vocálica. Estas
duas noções são muito importantes para a compreensão dos segmentos vocálicos.
2.5.1 Vozeamento
O ar que sai dos pulmões para a produção dos sons da fala, sobe pela traquéia,
laringe e neste ponto, passa entre dois pequenos músculos denominados cordas vocais. Se
as cordas vocais estiverem separadas, como geralmente estão quando respiramos
31
normalmente, a corrente de ar que sai dos pulmões passará livremente em direção à boca.
Porém, se as cordas vocais estiverem se aproximando, deixando apenas uma abertura
estreita para a passagem da corrente de ar, esta corrente de ar causará vibração das cordas
vocais.
Os sons produzidos com a vibração das cordas vocais são chamados de sons
vozeados. Por sua vez, os sons produzidos com as cordas vocais abertas, (quando não
ocorre vibração das cordas vocais) são denominados sons desvozeados. O grau de
vozeamento dos segmentos é, em geral, importante para a distinção dos sons nas línguas
naturais. Por exemplo, em português, temos as palavras “faca” /faka/ e “vaca” /vaka/
sendo que o que basicamente distingue estas palavras é o som inicial. O som /f/ é
desvozeado e o som /v/ é vozeado.
As vogais produzidas isoladamente são tipicamente vozeadas, ou seja, produzidas
com a vibração das cordas vocais. No entanto, dependendo do contexto, os segmentos
vocálicos podem ser desvozeados. Ou seja, se pode ter segmentos vocálicos produzidos
com ausência de vozeamento. Em certos contextos, quando os segmentos adquirem uma
característica fonética de sons vizinhos, uma vogal tende a se tornar desvozeada. Por
exemplo, no português brasileiro, o som // final que antecede o /t/ em ‘pato’ /pat/, pode
ser classificado como desvozeado. Isso se deve ao fato da vogal final // assimilar a
propriedade de desvozeamento do som anterior /t/, que é um segmento desvozeado.
Utiliza-se o símbolo de um círculo colocado abaixo da vogal para indicar o
desvozeamento. A ausência deste diacrítico expressa que a vogal é vozeada.
32
2.5.2 Qualidade vocálica
Todos os sons ou segmentos vocálicos e consonantais de uma língua possuem uma
qualidade de som distintiva e única associada a um único formato do trato vocal e um
padrão vibratório correspondente ou ressonância. Cada som da fala tem uma única
característica de ressonância que não o deixa ser confundido com outro som. A qualidade
transforma cada som em uma entidade única (Small, 1999).
Durante a articulação dos sons da fala, a língua e outros articuladores modificam a
sua posição no trato vocal. Esta mudança de posição dos articuladores modifica, portanto,
o espaço de ressonância ou freqüências naturais de vibração da corrente de ar no trato
vocal, para produzir os sons vocálicos e consonantais diferentes. Os três traços
articulatórios das vogais expostos acima – ou seja, altura do corpo da língua, grau de
anterioridade/posterioridade da língua e arredondamento dos lábios - contribuem para a
determinação da qualidade vocálica ou timbre de um segmento vocálico.
A qualidade de um som vocálico depende do formato da caixa de ressonância (a
cavidade pulmonar, a cavidade bucal e a cavidade nasal) no trato vocal. Portanto, a posição
assumida pela língua no eixo da cavidade bucal (no sentido vertical e horizontal)
associados ao formato dos lábios, caracteriza a qualidade de uma vogal (Abercrombie,
1967). Por exemplo, a vogal [i] representa a vogal alta anterior não-arredondada oral, com
qualidade diferente da vogal [] que também é vogal alta anterior não-arredondada oral.
33
2.5.3 Nasalização
Qualquer segmento – consoante ou vogal - pode ser oral ou nasal. Um segmento é
nasal quando o mesmo é produzido com o abaixamento do véu palatino, permitindo que a
corrente de ar ou parte desta escape pelo nariz. Este abaixamento do véu palatino altera a
área de circulação da corrente de ar no trato vocal (nas cavidades oral e nasal) e altera a
qualidade vocálica. No entanto, a nasalização altera muito pouco a qualidade vocálica, por
isso, ao transcrever os segmentos vocálicos nasais, a maioria dos autores usa os mesmos
símbolos vocálicos, com o acréscimo de um “til” (~) colocado acima da vogal oral. Por
exemplo, [a] oral e [a], sua correspondente nasal.
Em algumas línguas há o contraste entre vogais orais e nasais (Ladefoged, 1982).
Por exemplo, em português, “vi” [vi] e “vim [vi]. Contudo, as vogais nasais são segmentos
marcados que ocorrem em poucas línguas naturais. Os segmentos orais são não-marcados e
ocorrem em todas as línguas naturais.
A nasalização é a articulação secundária vocálica mais comum, sendo as vogais
nasais [i,a,u] as mais freqüentes nas línguas naturais (Maddieson, 1984a apud Ladefoged,
1996). Isso é decorrente do fato de suas correspondentes orais [i,a,u] serem as vogais mais
freqüentes nas línguas do mundo (Ladefoged, 1996).
A nasalidade e a altura da língua na articulação das vogais estão intimamente
relacionadas. Para que uma vogal alta [i] ou [u] seja nasalizada, é necessário apenas um
34
pequeno abaixamento do véu palatino, permitindo então, o acesso do fluxo de ar à
cavidade nasal. Por outro lado, uma vogal baixa como [a] necessita de um abaixamento
relativamente bem maior em relação às vogais altas, para que seja percebida como uma
vogal nasal, pois a configuração do trato vocal é bem diferente durante a produção da
vogal nasal [a] e a vogal oral [a].
Apesar de ser uma articulação vocálica muito comum, não analisaremos os
segmentos vocálicos nasais neste trabalho. Nosso objetivo é descrever e analisar os
segmentos orais vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Como
vogais nasais ocorrem no português brasileiro, mas não no inglês britânico, restringimos ao
estudo das vogais orais.
2.5.4 Duração
A duração ou quantidade vocálica de um segmento é um traço de descrição
importante e relevante, em particular, para este estudo. Muitas línguas do mundo têm a
distinção contrastiva de vogais breves e longas. (Ladefoged, 1996). Por exemplo, no
japonês, as palavras [odi:san] “avô” e [odisan] “tio” diferem quanto à duração da
vogal alta [i]. No primeiro exemplo, a vogal [i] é longa e no segundo exemplo a vogal [i] é
breve. Observe que a vogal longa é indicada pelo uso do diacrítico []. A ausência deste
diacrítico indica que a vogal é breve.
A quantidade é uma medida comparativa: sempre em relação a uma vogal longa,
necessariamente há uma vogal breve. Observe o contraste entre vogais longas e breves em
35
inglês: [li:v] ''leave'' viver e [lv] ''live'' morar. Nesta língua, além do parâmetro vogal
longa-breve ser relevante se observa que ocorre concomitantemente a mudança de
qualidade vocálica: [i:] e [].
2.5.5 Tensão
Os segmentos vocálicos podem também ser classificados como tensos e frouxos. Os
segmentos frouxos são aqueles segmentos produzidos com menor esforço muscular em
relação a um segmento tenso.
Por exemplo, no português brasileiro, os segmentos
vocálicos frouxos tendem a ocorrer em posição átona final, como em “sapo” [sap],
“táxi” [taks]. Já os segmentos tensos, em português, ocorrem em posição tônica e
pretônica como em “jacu” [aku] e “Paris” [paris]. Podemos concluir que no português
do Brasil a relação entre segmentos vocálicos tensos e frouxos é intimamente associada à
proeminência acentual ou tonicidade.
No inglês, a relação entre os segmentos vocálicos tensos e frouxos está relacionada
à estrutura silábica. As vogais tensas podem ocorrer no final de palavras e sílabas, como
em “he” [hi:] ou “too” [tu:]. Por outro lado, os segmentos vocálicos frouxos não ocorrem
em final de palavra e de sílabas, e devem obrigatoriamente ser seguidos de uma consoante
como em “had” [hæd], “look” [lk].
Tipicamente, a oposição entre vogais tensas e frouxas é expressa pela adoção de
símbolos diferentes. Em inglês, temos uma série de pares de vogais com qualidades
36
diferentes (que também se distinguem por serem longas e breves) e muitos autores adotam
símbolos diferentes para identificá-las: i,  , u, , , æ, etc.
2.5.6 Classificação dos segmentos vocálicos
A notação dos segmentos vocálicos diz respeito à maneira ou à ordem de
apresentação das propriedades articulatórias. Deve-se apresentar as informações na
seguinte ordem:
•
Altura da língua na cavidade oral
•
Anterioridade ou posterioridade da língua na cavidade oral
•
Posição de arredondamento dos lábios
A vogal [i] é classificada como ''vogal alta anterior não-arredondada''. A vogal
[u] é classificada como ''vogal alta posterior arredondada''. Informações referentes às
propriedades articulatórias secundárias devem seguir na parte final das informações
classificatórias. A vogal [i] classificada como ''vogal alta anterior não-arredondada nasal'' e
a vogal [] é classificada como ''vogal alta posterior arredondada frouxa''.
Tipicamente, não se indica o grau de vozeamento. Contudo, caso este fator seja
relevante para a classificação do segmento, a informação classificatória deve vir ao final.
Tem-se para []: ''vogal alta posterior arredondada nasal desvozeada''.
37
Na próxima seção, descreveremos o Método das Vogais Cardeais. Tal Método tem
um caráter complementar à descrição articulatória apresentada nas páginas precedentes.
2.6 O Método das vogais cardeais
O método das Vogais Cardeais oferece um instrumental que permite a descrição e
interpretação dos segmentos vocálicos que ocorrem nas línguas naturais cujas qualidades
vocálicas são variadas (Jones, 1969). Este método é até hoje muito utilizado, pois relaciona
os correlatos articulatórios, auditivos e acústicos (Cristófaro Silva, 1999a). O método das
Vogais Cardeais será utilizado neste trabalho para descrever e interpretar os segmentos
vocálicos do inglês e do português. Tal método permite descrever e representar as vogais
simples, ditongos e tritongos.
A idéia de adotar um sistema de pontos de referência para a classificação de vogais
foi proposta por A. J. Ellis em 1844. A nomenclatura “cardeal” foi usada pela primeira vez
por A.M. Bell em 1867, inspirando-se nos pontos cardeais. Daniel Jones reapresentou o
método em 1917, em número de oito vogais cardeais, classificando as vogais do inglês a
partir deste, tornando-o amplamente usado desde então. Abercrombie (1967) desenvolveu
a proposta de Jones até o ponto que se encontra hoje (Cristófaro Silva, 1999b).
Oito vogais cardeais, distribuídas de forma eqüidistante numa figura em forma de
um trapézio, formam a base do sistema de Daniel Jones, (FIG. 6 a seguir). As vogais
cardeais de 1 a 8 são articuladas com o ponto mais alto da língua no limite da linha
periférica da área vocálica. A área vocálica é parte da área da cavidade bucal onde a língua
assume posições diferentes para a articulação de vogais sem causar contato, fricção ou
38
obstrução. Isto caracterizaria a produção de um segmento consonantal. A área vocálica é
delimitada pela linha periférica que, se ultrapassada, há fricção ou obstrução, produzindo
um segmento consonantal (Cristófaro-Silva, 1999b).
FIGURA 6 As Oito vogais cardeais
FONTE: LADEFOGED & MADDIESON, 1996. p. 285.
As vogais cardeais de 1 à 8 são chamadas vogais periféricas por Jones (1969) e
estas vogais são pontos de referência para todas as vogais das línguas naturais. É
importante salientar que estas oito vogais foram selecionadas de forma arbitrária, ou seja,
não correspondem ao sistema vocálico de nenhuma língua natural. Por coincidência, pode
acontecer de alguma língua conter uma ou mais vogais das oito vogais cardeais.
O método propõe um recurso de descrição de vogais a partir de propriedades auditivas que
caracterizam uma vogal dentro da área vocálica, que é representada por uma figura em
forma de trapézio, muitas vezes chamado de quadrilátero. O ponto da linha periférica para
a posição mais avançada e mais alta da língua na cavidade bucal, é a vogal cardeal no. 1, ou
VC1. A VC1 é representada pelo símbolo i.
39
O mesmo procedimento pode ser adotado para definir os outros pontos na linha
periférica, ou seja, a articulação do ponto mais baixo e mais posterior possível antes de
haver contato entre a língua e a úvula, corresponde à vogal [a], a VC5. As três vogais logo
abaixo da VC1 no trapézio, correspondem aos pontos das vogais cardeais VC2 = e, VC3 =
 VC4 = a. As vogais cardeais restantes, que ficam no trapézio em direção ascendente em
relação à VC5, são a VC6 = , VC7 = o e VC8 = u. Estas vogais podem ser descritas em
termos de categorias de classificação vocálica, como:
TABELA 1
As VC1 a VC8
As vogais de 1 a 5 não são arredondadas e de 6 a 8 são arredondadas.
Alta
Anterior
VC1 i
Posterior
VC8 u
Média-alta
VC2 e
VC7 o
Média-baixa
VC3 
VC6 
Baixa
VC4 a
VC5 
FONTE - ABERCROMBIE, 1967. p. 154
A aplicação deste método consiste em primeiramente, aprender a pronunciar as oito
vogais cardeais, e para classificar uma vogal de uma língua natural, deve-se pedir a um
nativo desta que a pronuncie. A partir daí, comparar a postura da língua durante a produção
desta, com a da vogal ou vogais cardeais mais próximas, até que se possa determinar a
posição específica da língua durante a articulação do segmento em questão. A identificação
de uma vogal baseia-se em critérios articulatórios e auditivos.
40
A princípio, as oito vogais cardeais são suficientes para a descrição de qualquer
segmento vocálico de qualquer língua natural. Porém, foram estabelecidas catorze vogais
cardeais secundárias, relacionadas com as vogais cardeais primárias. O quadro abaixo
ilustra os segmentos correspondentes aos pontos VC9 a VC16. As VC9 a VC16 que
também são pontos fixos, de qualidade invariável.
TABELA 2
As VC 9 a VC16
VC9 y
VC11 œ
VC13 
VC15 
VC10 ø
VC12 
VC14 
VC16 
FONTE - ABERCROMBIE, 1967. p. 161
A TAB. 3 abaixo ilustra os símbolos correspondentes aos segmentos vocálicos
correspondentes aos pontos VC17 a VC22.
TABELA 3
As VC17 a VC22
VC17 
VC19 
VC21 
VC18 
VC20 
VC22 
FONTE - ABERCROMBIE, 1967. P. 161.
As vogais cardeais de secundárias de 9 à 18 estão localizadas na linha periférica do
trapézio e as vogais cardeais de 19 a 22 são centrais. Das VC9 a VC16 têm-se a mesma
posição de língua que nas vogais primárias VC1 a VC8. A diferença está na posição dos
lábios, as VC9 a VC13 são arredondadas e as VC14 a VC16 não são arredondadas. As
vogais cardeais secundárias restantes, VC17 a VC22 localizam-se na parte central da área
vocálica. Sendo as vogais cardeais VC18, VC20 e VC22, produzidas com labialização e as
VC17, VC19 e VC21 sem labialização.
41
Tomando como referência as 22 vogais cardeais mencionadas anteriormente, podese identificar qualquer segmento vocálico de qualquer língua natural. O procedimento de
descrição é o mencionado na página 39 e se baseia em critérios articulatórios e auditivos.
Para indicar alteração na qualidade vocálica do segmento analisado em relação a uma
vogal cardeal, podemos usar os seguintes diacríticos:
levantado – qualidade mais alta
abaixado – qualidade mais baixa
retraída – qualidade mais posterior
avançada – qualidade mais anterior
Os ditongos também podem ser identificados no diagrama das vogais cardeais.
Estes sons, os ditongos, são sons que consistem de um movimento articulatório ou deslize
da língua de uma vogal a outra (Clark & Yallop, 1990). Os ditongos são também tratados
como uma seqüência de segmentos, sendo um dos segmentos interpretados como uma
vogal e o outro interpretado como um glide. O glide refere-se aos segmentos vocálicos sem
proeminência acentual nos ditongos (Cristófaro Silva, 1999b). Glides são segmentos
assilábicos que co-ocorrem com um segmento vocálico. Um ditongo pode ser composto de
(vogal e glide) ou (glide e vogal). A seqüência (vogal e glide) é denominada ditongo
decrescente. A seqüência (glide e vogal) é denominada ditongo crescente.
Os glides em um ditongo podem ser representados por vários símbolos fonéticos.
Glides palatais podem ser transcritos como /j, y, , /. Glides velares podem ser transcritos
42
como /w, , /. A transcrição diferente dos glides depende da interpretação fonológica
dada ao segmento no sistema sonoro.
Tipicamente, quando o glide é simbolizado por [j, y], ele é interpretado
fonologicamente como consoante e quando o glide é simbolizado por [, ], ele é
tipicamente interpretado como vogal. Este trabalho adota o símbolo [j] para o glide
interpretado fonologicamente como consoante e o símbolo [] para o glide interpretado
como vogal. Em ambos os casos, o símbolo adotado para o glide será adjacente a uma
vogal. Argumentos que sustentem a interpretação do segmento em questão como vogal ou
consoante, serão apresentados na segunda parte, a de fonologia.
No diagrama das vogais cardeais, os ditongos são indicados por uma flecha que
marca o ponto inicial e o ponto final do ditongo. Um destes pontos não terá proeminência
acentual e indicará o glide. Diagramas expressando a representação dos ditongos serão
apresentados quando da descrição das vogais altas e glides em cada uma das línguas em
questão. Na próxima seção, avaliamos as propriedades acústicas relacionadas aos
segmentos vocálicos.
2.7 As Propriedades acústicas
Ao utilizar os órgãos da fala, movimentamos as moléculas de ar próximas de nossa
boca e as deslocamos. Quando uma molécula de ar colide em outra e oscila para frente e
para trás em relação ao seu ponto de repouso, produz o som, no caso, o som da fala. Estas
moléculas no trato vocal são postas em movimento pela ação das cordas vocais. Toda vez
43
que as cordas vocais abrem e fecham, produz-se um pulso de ar e estes pulsos vibram o ar
no trato vocal, produzindo um número de freqüências distintas.
O movimento máximo das moléculas de ar para longe do ponto de repouso é
chamada de amplitude de vibração. Um ciclo completo a partir deste ponto à amplitude
máxima em uma direção e novamente de volta é denominado um ciclo. O período de
tempo que a molécula leva para fazer o ciclo é denominado período do ciclo e freqüência
de vibração é o número de ciclos – movimento das moléculas de ar para frente e para trás –
a cada segundo. É também o número de aberturas e fechamentos das cordas vocais em um
segundo. Sua unidade de medida é o Hertz (Hz). Por exemplo, se as cordas vocais fazem
100 movimentos em um segundo, dizemos que a freqüência deste som é de 100 Hz.
A altura melódica (“pitch”) está relacionada à freqüência de vibração, ou seja,
quanto mais alta a freqüência, mais alto o tom, (O’Connor, 1973). As vogais são
acusticamente definidas por dois ou três tons característicos ou formantes, podendo ser
visualizados no padrão de espectro de um som da fala. (Ladefoged, 1982). Entendemos
como formante, a concentração de energia acústica, ou a ressonância do trato vocal na
produção de um som da fala, (Picket, 1999). Os formantes que caracterizam as vogais são
resultantes dos formatos diferentes da língua no trato vocal.
Usamos o espectrógrafo para ter a representação visual dos traços acústicos dos
sons da fala, na forma do espectrograma. Este é uma representação visual dos traços
acústicos dos sons da fala e mostra o espectro de um som. Por sua vez, espectro é a gama
de freqüências que compõem uma onda sonora. Ao analisar uma vogal no espectrograma, a
intensidade de cada freqüência é mostrada pelos traços mais escuros da marca. As barras
44
horizontais escuras são os formantes (O’Connor, 1973). Em uma análise espectrográfica, o
eixo horizontal representa a freqüência e o vertical representa a amplitude. Por exemplo, os
componentes acústicos da vogal alta longa [i:] representando as ressonâncias no trato vocal
durante sua produção, podem ser mostrados no espectro de freqüência abaixo:
FIGURA 7 Vogal alta falada por um homem a uma freqüência fundamental7
de 120 Hz.
FONTE - CRYSTAL,1997. P. 135.
Cada pico ou amplitude de algumas freqüências demonstrados na ilustração acima,
representa um formante. O primeiro formante é representado por F1, o segundo por F2 e o
terceiro por F3, todos caracterizam a vogal alta anterior longa [i].
Todas as vogais e algumas consoantes têm formantes e a disposição dos formantes,
principalmente os dois primeiros é que possibilita diferenciar vogais, ou reconhecê-las na
fala de dois ou mais falantes distintos (Crystal, 1997).
Trataremos aqui, da caracterização acústica de vogais e glides. Vimos que glides
correspondem a segmentos vocálicos sem proeminência acentual (cf. seção 5.7). Sendo
7
Freqüência fundamental é a freqüência básica na qual um som vibra, geralmente abreviado como F0
(CRYSTAL, 1997).
45
assim, a discussão que se segue menciona a categoria vogal, porém na prática, engloba
tanto as vogais quanto os glides.
Os segmentos vocálicos são caracterizados, em geral, por três formantes e os
demais formantes (F4, F5, etc.) não são necessários para a especificação lingüística de um
segmento vocálico, (O’Connor, 1973). Os formantes são numerados de acordo com a
ordem de suas freqüências, do mais baixo ao mais alto. São chamados de primeiro
formante (F1), segundo formante (F2), terceiro formante (F3) e assim por diante. O
primeiro e o segundo formantes estão intimamente ligados ao formato do trato vocal, ou
seja, ao movimento dos lábios, língua, faringe e mandíbula, na articulação das vogais e
consoantes. É importante primeiramente, concentrar-se nos dois primeiros formantes na
produção de segmentos vocálicos. A freqüência dos formantes é determinada por três
fatores, (Picket, 1999): o comprimento do trato orofaríngeo, o local de constrição no trato e
o grau de estreitamento das constrições. E de acordo com estes fatores, Picket delineou
regras a seguir.
O comprimento do trato orofaríngeo depende do tamanho físico do falante. Este
afeta os locais de freqüência de todos os formantes do segmento vocálico, permitindo
prever onde estará o pico do formante no caso de crianças, mulheres ou homens. As
freqüências médias dos formantes da vogal estão inversamente proporcionais ao
comprimento do trato orofaríngeo.
As formas articulatórias diferentes do trato orofaríngeo afetam os locais dos
formantes. Para tal, devemos considerar os pontos de constrição na articulação das vogais,
ou seja, a primeira regra é que a freqüência de F1 diminui por qualquer constrição na
46
metade frontal da parte oral do trato vocal. Quanto maior a constrição, menor o F1.
Portanto, se a parte mais alta da língua estiver próxima ao meio do palato ou à frente deste,
o F1 é mais baixo em freqüência que 500 Hz, que é a medida neutra. (Picket, 1999).
A vogal alta anterior [i] é um exemplo disso. Na TAB. 4 abaixo, as vogais [i] e []
têm a freqüência do F1 mais baixa que 500 Hz, que são 300 Hz e 360 Hz respectivamente.
Como a constrição desta vogal é grande e é feita na parte frontal do trato vocal, a
freqüência de F1 diminui. Quanto maior a constrição, menor a freqüência do F1.
TABELA 4
Resultados de J.C. Wells, obtidos em 1962
F1
F2
i: heed
300 Hz
2300 Hz
 hid
360 Hz
2100 Hz
 hood
380 Hz
950 Hz
u: who
300 Hz
940 Hz
FONTE: GIMSON, 1970. p.98
A segunda regra de Picket (1999), relaciona o F2 com a constrição da parte traseira
da língua. A freqüência de F2 tende a abaixar devido a uma constrição na parte traseira da
língua e quanto maior a constrição, menor o F2. A vogal alta [u], por exemplo, é articulada
com a língua elevada na parte traseira do palato. O efeito é abaixar a freqüência de F2. De
fato, esta vogal é formada por um estreitamento grande, a parte traseira da língua fica
muito próxima ao palato mole, portanto freqüência de F2 é baixa por causa desta
constrição pequena. Nos dados abaixo, em relação às F2 das vogais altas anteriores, as
47
posteriores [] e [u], têm as freqüências de F2 mais baixas, ou seja, 950 Hz e 940 Hz em
relação a 2300 Hz e 2100 Hz.
A terceira regra apresentada em Picket (1999), relaciona a constrição anterior da
língua com o F2. Ou seja, a freqüência de F2 aumenta em uma constrição anterior da
língua. E quanto maior a constrição na parte anterior da língua, maior a freqüência do F2.
(Picket, 1999). A constrição da vogal alta [i] é a maior, portanto, sua freqüência no F2 é
mais alta. Podemos observar este fato nos dados de Wells (1962), apud Gimson (1970),
que são apresentados na TAB. 4, na página anterior. Também podemos observar nesta
tabela, que o F1 da vogal alta anterior [i] é mais afastado que o F2 em comparação à vogal
alta posterior [u], (Cagliari, 1997).
A regra final proposta por Picket (1999), relaciona os efeitos do arredondamento
dos lábios nos formantes. As freqüências de todos os formantes abaixam com o
arredondamento dos lábios. Portanto, quanto mais arredondada a vogal, maior a constrição
e mais baixos são os formantes. Nos dados de Wells da TAB. 4, a vogal [u] é a mais
arredondada e suas freqüências de formantes são as mais baixas.
Os glides [w] e [j] possuem os traços acústicos das vogais altas [u] e [i]
respectivamente, por isso são chamados com freqüência de semi-vogais. (Crystal, 1997).
Ou seja, a estrutura dos dois ou três primeiros formantes do [i] é semelhante ao do [j]. E
de maneira análoga a estrutura dos dois ou três primeiros formantes do [u] é semelhante ao
do [w]. O primeiro formante, F1, pode ser aproximadamente 240 Hz para os dois glides e
48
o F2 pode variar de 2.280 a 3.600 Hz para [j]. Já para o [w], o segundo formante pode
variar de 360 a 840 Hz (Gimson,1970, p. 213). Os formantes dos glides podem também
variar de acordo com as vogais adjacentes, por exemplo em [aja], o primeiro formante
desce e o segundo sobe à medida que a língua movimenta de [a] para [j]. Então, o
primeiro formante sobe e o segundo desce novamente, à medida que a língua volta à sua
posição original da vogal [a].
Contudo, o glide [w] difere da vogal [u] em três aspectos. Primeiramente, há uma
constrição maior nos lábios no [w] em relação à vogal, isto abaixa a intensidade dos
formantes F1 e F2 e causa uma maior redução no F3 e nos formantes mais altos. O
segundo aspecto que difere o glide [w] da vogal [u], é que a posição da língua na
produção do glide pode variar de acordo com as vogais adjacentes. Uma constrição
levemente posterior da língua pode acompanhar a constrição do [w] nos lábios. Por outro
lado, o segmento vocálico [u] precisa ter uma constrição na parte posterior da língua junto
com a constrição nos lábios.
O terceiro aspecto que diferencia o glide [w] da vogal [u] está na velocidade do
movimento do trato oral na produção de cada segmento. Esta é maior na produção do [w]
49
nos movimentos entre duas vogais. Por exemplo, a transição de F1 na abertura de [w] para
[a] é mais rápida que na transição de [w] para [i]8.
Podemos perceber através de análise espectrográfica, que um ditongo é realmente
um movimento, um deslize entre dois elementos vocálicos, (além de envolver um
movimento articulatório perceptível), pois o espectrograma mostra a transição de
formantes a partir de posições típicas de uma vogal para posições características de outra
vogal, (Gimson, 1970). Os ditongos são semelhantes às vogais longas, ou seja, sua duração
é maior.
Nesta seção, apresentamos a descrição das propriedades acústicas das vogais altas e
os glides. Vimos que as vogais podem ser especificadas pela freqüência dos dois primeiros
formantes, F1 e F2. Quanto maior a constrição da língua em relação ao palato na
articulação das vogais, menor o valor de F1. E quanto maior a constrição na parte traseira
da língua, menor o valor de F2. Portanto, na articulação da vogal alta anterior [i], o valor
de F1 é baixo e o valor de F2 é alto.
Na vogal alta posterior [u], o valor de F1 e o de F2 são baixos (TAB. 4), os
ditongos têm a duração de uma vogal longa, visível no espectrograma. É também possível
visualizar a mudança de posição da freqüência do primeiro para o segundo formante,
durante a modificação do formato do trato vocal na configuração de uma vogal para a
outra. Os glides [j,w] quando combinados com vogais têm as freqüências semelhantes aos
Não encontramos como correlato articulatório a comparação entre [i] e [j]. Contudo, evidências
demonstram características semelhantes.
8
50
ditongos. A diferença é que a constrição no trato oral na articulação dos glides é maior em
relação às suas vogais altas correspondentes [i, u].
2.8 Os Correlatos acústicos das propriedades articulatórias
As freqüências dos formantes são inversamente relacionadas às propriedades
articulatórias tradicionais e quando analisamos um gráfico de freqüência de formantes de
vogais, constatamos que o arranjo no gráfico é o mesmo que o que estamos acostumados a
ver nas descrições articulatórias tradicionais. Atualmente, os gráficos de formantes são
geralmente usados para representar as qualidades vocálicas, pois a qualidade vocálica
depende das freqüências dos formantes (Ladefoged, 1982). Considere a FIG. 8 abaixo:
FIGURA 8. Gráfico de freqüência de formantes de vogais
FONTE - CRYSTAL, 1997. p. 135.
O gráfico de freqüência de formantes ilustrado na FIG. 8 mostra que o padrão
resultante é muito semelhante à descrição articulatória das vogais através do método das
vogais cardeais. Se compararmos a posição dos segmentos vocálicos no diagrama das
vogais cardeais com as mesmas vogais no gráfico da FIG. 5, constatamos uma semelhança
51
bastante grande. No entanto, a relação entre a informação articulatória e a informação
acústica não é maior porque as propriedades articulatórias baseiam-se apenas no ponto de
constrição maior da língua, enquanto que as propriedades acústicas derivam das
ressonâncias do trato vocal integral (Crystal, 1997).
Os espectrogramas são indicadores confiáveis da qualidade relativa de um
segmento vocálico. E também, é clara a relação dos formantes no espectrograma e a sua
relação com a articulação dos segmentos vocálicos, ou seja, a freqüência do primeiro
formante mostra a altura vocálica com precisão. A distância entre o primeiro e o segundo
formantes reflete o grau de posterioridade da língua. No entanto, o grau de arredondamento
dos lábios não é demonstrado claramente, podendo haver confusão em sua interpretação,
(Ladefoged, 1982).
Podemos
concluir
que
as
duas
propriedades
acústicas
e
articulatórias
complementam-se, não devemos afirmar que os métodos da fonética acústica sejam
superiores em relação aos da fonética articulatória. Pode haver maior precisão visual no
caso da análise acústica. Porém, um método não elimina a importância do outro, na
verdade, um complementa o outro. Uma outra evidência a favor da fonética articulatória é
citada por Ladefoged, onde os espectrogramas não medem graus de nasalização. Para
identificá-la com maior precisão, técnicas como a palatografia é muito mais eficiente. Isto
justifica a interação entre abordagens distintas para descrever os segmentos.
Antes de procedermos à descrição fonética das vogais altas e glides no português
brasileiro e no inglês britânico vamos apresentar duas noções muito importantes para este
trabalho. Estas noções são de ''sílaba'' e de ''acento''.
52
2.9 A Sílaba
A maioria das pessoas, sendo de preferência falantes nativos da língua em questão,
consegue dizer sem dificuldade quantas sílabas contém em uma palavra ou em um
enunciado. Porém, com freqüência os falantes têm dificuldade em dizer exatamente onde
uma sílaba começa e onde termina.
A sílaba pode ser considerada uma unidade
reconhecida por todo e qualquer falante (Abercrombie, 1967).
Uma definição importante para este trabalho é a de sílaba. Adotamos a teoria da
sílaba apresentada em Stetson (1951), que define a sílaba em termos do mecanismo de
corrente de ar pulmonar. Esta teoria fundamenta que os músculos respiratórios contraem e
relaxam a uma taxa de aproximadamente cinco vezes por segundo, para que o ar seja
expelido em uma sucessão de pequenos golpes. Cada contração, junto com o golpe de ar
resulta na produção de uma sílaba. Uma sílaba, portanto, é o produto do modo que o
mecanismo de corrente de ar pulmonar funciona. Sua base é o pulso torácico.
Em vista disso, a sílaba é essencialmente um movimento dos órgãos da fala e não
uma característica do som da fala. Portanto, a base de uma sílaba é uma breve contração
dos músculos respiratórios e esta expele uma pequena quantidade de ar dos pulmões. Este
ar expelido necessita de uma passagem no trato vocal em um momento de sua produção, e
assim, formam-se os segmentos.
A sílaba pode ser compreendida como um movimento muscular que se intensifica,
atingindo um pico ou núcleo e depois uma redução progressiva, conforme demonstrado por
Cagliari (1981) no diagrama representado na FIG. 9 a seguir.
53
FIGURA 9 Esquema do esforço muscular e da curva da força silábica
FONTE - CAGLIARI, 1981. p. 101.
De acordo com a FIG. 9, podemos afirmar que a sílaba é composta de três partes:
um pico ou núcleo que é obrigatório. O núcleo é geralmente preenchido por um segmento
vocálico. As outras duas partes são periféricas e opcionais e são preenchidas por segmentos
consonantais. As partes periféricas podem ser denominadas margens da sílaba.
No português, o núcleo da sílaba é sempre um segmento vocálico. No inglês, o
núcleo da sílaba pode ser preenchido por uma consoante que é tipicamente uma lateral ou
uma nasal. Um exemplo de sílaba cujo núcleo é preenchido por uma consoante em inglês é
a palavra “little” [lt.l] em que a consoante [l] ocupa o núcleo ou pico de uma sílaba.
Utilizamos um ponto final [.] para indicar o limite silábico.
Considere no português, a palavra “pai” [pa]. O núcleo da sílaba da palavra [pa]
é uma vogal: [a]. Os segmentos periféricos [p] e [] ocupam posições não nucleares. É
importante salientar que os glides nunca ocupam uma posição de pico nuclear e não podem
ser picos silábicos. As vogais tipicamente ocupam o núcleo de uma sílaba.
A sílaba pode ser composta por combinações diferentes de consoantes e vogais. No
entanto, certas seqüências não são permitidas. Existem regras que governam a ordem em
54
que os sons ocorrem na sílaba e estas regras são denominadas regras fonotáticas. Por
exemplo, a vogal [] não ocorre na posição final de sílaba no inglês, caso contrário, há
violação das regras fonotáticas nesta língua. Isto porque somente vogais longas ocorrem
em final de palavras no inglês.
Finalizando, apresentamos a distinção entre sílabas leves e pesadas. Em várias
línguas esta distinção é muito importante, pois o estatuto da sílaba – como pesada ou leve pode refletir nas regras de atribuição de acento.
A constituição da sílaba determina o peso silábico. Denominamos sílaba leve a
sílaba cujo pico silábico é constituído por apenas uma vogal ou de um monotongo. A sílaba
pesada contém um pico silábico constituído por (vogal+consoante) ou (vogal+glide) ou
(vogal+vogal). Este último podendo ser ditongo ou vogal longa.
A noção de sílaba é muito importante para a discussão do acento. Isto porque o pico
ou núcleo da sílaba é que recebe o acento. Discutiremos a seguir esta noção.
2.10 O Acento
Os sistemas vocálicos do português e do inglês são analisados neste trabalho, em
relação ao acento, daí a importância de defini-lo. O acento incide sobre a sílaba tônica ou
acentuada e este é produzido com um pulso torácico reforçado, ou seja, há um jato de ar
mais forte na produção de uma sílaba tônica em relação às sílabas átonas ou não
acentuadas. Tomemos a palavra “livro” [li.vr], onde a primeira sílaba [li] é tônica e a
segunda sílaba [vr] é uma sílaba átona. A vogal acentuada na sílaba tônica é percebida
55
auditivamente como tendo uma duração mais longa e é também produzida com um volume
mais alto. Esta pronúncia mais alta permite-nos diferenciar as vogais acentuadas das não
acentuadas.
Podemos dizer que uma sílaba mais longa e mais alta, seja em seu tom ou em seu
volume, é uma sílaba acentuada (Callou & Leite, 1990). O português utiliza o acento de
intensidade, que tem papel distintivo em palavras como ‘sábia’ [sab] e ‘sabia’ [sabi]
e sabiá [sabia].
As vogais tônicas ou acentuadas carregam o acento mais forte da palavra ou o
acento primário. A vogal tônica é a vogal que, em relação às outras vogais das outras
sílabas da palavra, tem a proeminência acentual, ou aquela a que é atribuído o acento
primário. A vogal tônica de um enunciado é marcada por um apóstrofo anterior à vogal ou
sílaba acentuada: “pá” [pa].
As vogais não acentuadas ou átonas podem ser pretônicas ou postônicas. Ao
contrário das sílabas tônicas, as sílabas átonas podem receber um acento secundário ou
totalmente isentas de acento. As vogais pretônicas antecedem o acento tônico, como por
exemplo, a primeira sílaba de “sapé” [sap]. As vogais postônicas sucedem o acento
tônico, como a segunda sílaba da palavra “pera” [per]. A vogal átona também pode ter o
acento secundário representado pelo apóstrofo colocado na parte inferior antes da vogal ou
sílaba com este acento, como em “cajá” [kaa].
56
A duração de uma vogal pode ser afetada pelo fato da vogal ocorrer em sílaba
tônica ou átona no inglês. Nas sílabas do inglês, a mesma vogal pode ser percebida como
mais longa se ocorrer na sílaba tônica, em relação à mesma vogal em sílaba átona, (Laver,
1994). Exemplos são as palavras “credit” [kred.t] crédito e “sit” [st] sentar. Apesar das
duas palavras apresentarem o mesmo segmento [], este terá duração maior na sílaba tônica
em “sit” em relação à mesma vogal de “credit”, que ocorre na sílaba átona. Isto acontece
devido ao fato da variação em proeminência da sílaba, pois quanto mais proeminente a
sílaba, no caso, a sílaba tônica, maior o esforço muscular em sua produção. A sílaba tônica
também dispõe de tom mais alto, maior volume e maior duração ou esforço articulatório,
refletindo na performance dos segmentos que a constituem. Por isso, o segmento vocálico
é percebido com maior duração na sílaba tônica em relação ao seu correspondente em
sílaba átona.
A relação entre o acento primário, secundário e sua ausência, compõe o ritmo de
línguas denominadas acentuais. O ritmo tem a função lingüística de organizar a cadeia
segmental a uma estrutura acentual. No entanto, nem todas as línguas naturais utilizam este
sistema. Em oposição a este sistema de ritmo, estão as línguas tonais cujos núcleos ou
picos silábicos carregam tons. Um tom é definido por alturas melódicas. O tom pode ser
alto, médio, baixo ou tons intermediários como ‘médio-alto’. O dialeto chinês mandarinês
é um exemplo de língua tonal.
Fornecemos até aqui, um instrumental teórico que teve por objetivo contribuir para
a análise das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico a ser
apresentada nessa dissertação. Esta análise é apresentada nas seções que se seguem.
57
2.11 Vogais altas e glides no português brasileiro
No português brasileiro há três tipos de vogais: os monotongos ou vogais simples,
os ditongos e os tritongos. Quando a articulação é percebida durante um tempo como
constante essa vogal é chamada de monotongo ou vogal simples. O ditongo é articulado
quando o movimento da língua começa em um ponto qualquer da área vocálica e acaba em
um outro ponto nesta área. Nos tritongos, há três pontos audíveis, permitindo o
reconhecimento mais fácil do início, do ponto de desvio e do fim da trajetória da língua na
cavidade bucal (Cagliari, 1981). Exemplos envolvendo as vogais altas e glides no
português brasileiro estão apresentados abaixo:
(4)
Monotongo:
si
[si]
Ditongo:
pau [pa]
Tritongo:
qual [kwa]
Relembramos que neste trabalho, usaremos os símbolos [, u] para os casos em que
o glide comporta-se fonologicamente como uma vogal. Utilizaremos os símbolos
[j, w] para os casos em que o glide se comporta como consoante. Trataremos inicialmente
dos monotongos no português.
2.11.1 As Vogais altas no Português Brasileiro
A TAB. 5 a seguir, mostra os alofones do fonema /i/ e /u/ no português brasileiro.
58
TABELA 5
Alofones das vogais altas no Português Brasileiro
Vogais Altas
Anterior
Não arrredondada
i
ex.: vida [vida]
Tônicas Orais
i
Pretônicas Orais
Postônicas Mediais
ex.: pirata [pirat]

Postônicas Finais
Posição tônica + Vogal epentética

Posterior
Arredondada
u
ex.: mula [mula]
u ()
ex.: mulata [mulat]

(u)
ex.: ótica [tk]
ex.: pílula [pill]


ex.: mole [ml]
i
ex.: digno [diin]
ex.: mato
[mat]
u
ex.: rugby [huibi]
Existem seis vogais altas com qualidade e duração diferentes no português
brasileiro: [i, , i, u, , u]. O segmento [i] é classificado articulatoriamente como vogal
alta anterior e o [u], vogal alta posterior. Ambas as vogais são tensas e podem ocorrer em
posição tônica. Estes segmentos vocálicos podem ocorrer também em posição pretônica e
em posição postônica medial em alternância com suas correspondentes tensas (TAB. 5). Os
segmentos vocálicos frouxos [, ] ocorrem tipicamente em posição postônica medial ou
final. Estes segmentos podem ocorrer ainda em posição pretônica e neste caso, alternam
com a vogal tensa correspondente.
A vogal alta longa também pode ocorrer no português brasileiro, em posição tônica,
seguida de uma consoante e uma vogal alta epentética. Como em “digno”, [diin], a
vogal alta anterior longa ocorre sempre em posição tônica. A inserção da vogal epentética
59
após a consoante que se segue ao segmento vocálico tônico alonga a vogal. Já no caso em
que ocorre o encontro consonantal (ou seja não ocorre a vogal epentética), a vogal tônica
não é longa: [din] (Cristófaro Silva, 2001).
O diagrama das vogais cardeais que se segue (FIG. 10) ilustra as vogais altas
[i, , u, ] do português de Belo Horizonte (cf. Cristófaro Silva, 1999b).
FIGURA 10 As Vogais altas do português de Belo Horizonte
FONTE – CRISTÓFARO SILVA, 1999b. p. 146.
Pode-se observar na FIG. 10 que as vogais altas [i, u] em português localizam-se
mais próximas da linha limítrofe da área vocálica do que as vogais [, ]. Além de se
localizarem numa posição centralizada, as vogais [, ] são mais baixas que as suas
correspondentes tensas (ou seja [i, u]).
Passemos à caraterização acústica das vogais do português brasileiro. Infelizmente,
não conseguimos obter análises das vogais altas para o português de Belo Horizonte.
Sendo assim, lançamos mão do trabalho de Callou; Leite & Moraes (1996). Estes
60
pesquisadores analisaram dados das seguintes capitais: Recife, Salvador, Rio de Janeiro,
São Paulo e Porto Alegre. Considere a FIG. 11 abaixo:
FIGURA 11 F1 e F2 no português europeu, português brasileiro e as vogais cardeais
FONTE - CALLOU; LEITE; MORAES, 1996. p. 153.
A FIG. 11 ilustra a caracterização acústica das vogais tônicas do português europeu
e do Brasil em relação às vogais cardeais (Callou; Leite & Moraes, 1996). Os autores
compararam as médias gerais do primeiro (F1) e segundo formantes (F2) obtidas através
de cálculo de valores médios das cinco capitais brasileiras especificadas anteriormente. Os
dados do português europeu são de Delgado-Martins (1973) e a FIG. 11 indica ainda as
médias das vogais cardeais estabelecidas por Catford (1988). Os dados numéricos das
freqüências estão demonstradas na TAB. 6 abaixo.
TABELA 6
Valores das F1 e F2 das Vogais Altas, medidos em Hz
Vogais Cardeais
Português Europeu
Português Brasileiro
F1
F2
F1
F2
F1
F2
240
2400
294
2343
353
2161
250
595
315
678
u
FONTE – CALLOU; LEITE; MORAES, 1996. p. 45.
358
928
i
61
Com relação à dimensão vertical F1, as vogais altas /i, u/ no português brasileiro
são significativamente mais baixas que as mesmas vogais no português europeu. Em
relação às vogais cardeais as vogais altas no português brasileiro são mais baixas,
chegando a apresentar alturas similares às vogais cardeais /e/ e /o/.
Com relação ao F2, verifica-se que as vogais altas do português brasileiro são mais
centralizadas e as vogais altas do português de Portugal são mais próximas às vogais altas
das Vogais Cardeais. Os glides em ditongos serão discutidos na próxima seção.
2.11.2 Os Ditongos no português brasileiro
Definimos um ditongo como uma seqüência de segmentos vocálicos, sendo um
interpretado como vogal e o outro como um glide. O segmento vocálico é aquele que tem
proeminência acentual. O glide é um segmento que não recebe acento. No ditongo, os dois
segmentos são pronunciados numa mesma sílaba, sendo o segmento vocálico núcleo ou
pico da sílaba. Por exemplo, na palavra “pau” [pa], o segmento [a] é o segmento
vocálico, portanto ocupa o pico silábico e o segmento [] corresponde ao glide. O
diagrama das Vogais Cardeais apresentado na FIG. 12 abaixo, ilustra os ditongos [a] e
[a] no português brasileiro.
62
FIGURA 12 Os Ditongos [a] e [a] no português brasileiro
FONTE – CRISTÓFARO SILVA, 1999. p. 143
Podemos observar na FIG. 12, que os ditongos [a] e [a] no português brasileiro
têm início na área vocálica delimitada para a vogal [a]. O ditongo [a] direciona-se no
diagrama das vogais cardeais para a área vocálica da vogal []. No caso do ditongo [a]
ocorre o movimento em direção da área vocálica da vogal []. Observamos que nos dois
casos o ditongo termina na área vocálica referente ao segmento vocálico frouxo [, ]. Em
(5), são apresentados os ditongos crescentes do português brasileiro.
(5) Ditongos crescentes do português brasileiro
a. [jo]
“acionista”
ac[jo]nista
b. [i] ou[e] ou []
“série”
sér[i]
c. [a] ou []
“séria”
sér[a]
d. [] ou [o]
“sério”
sér[]
e. [] ou [e]
“tênue”
tên[]
f. [a] ou []
“árdua”
árd[a]
g. [o] ou [u] ou []
“vácuo”
vác[o]
Em (5 a), é ilustrado um exemplo que contém o ditongo [jo]. Neste caso, a
ocorrência do ditongo é obrigatória. Em (5 b-g), o ditongo pode apresentar uma pronúncia
63
alternativa que é ilustrada para cada caso. Em (5 b-d), o ditongo inicia-se na área vocálica
de [] e em (5 e-g), o ditongo inicia-se na área vocálica de []. Nos exemplos abaixo, são
ilustrados os ditongos decrescentes do português brasileiro9.
(6) Ditongos decrescentes do português brasileiro
a. [a]
“pai”
p[a]
b. [e]
“lei”
l[e]
c. []
“réis”
r[]s
d. [o]
“boi”
b[o]
e. []
“mói”
m[]
f. []
“flui”
fl[u]
g. [a]
“pau”
p[a]
h. [e]
“meu”
m[e]
i. []
“céu”
c[]
j. [o]
“sou”
s[o]
k. [i]
“viu”
v[i]
l. [ai] ou [a]
“vaidade”
v[ai]dade ou v[a]dade
m. [eu] ou [e]
“reunião”
r[eu]nião ou r[e]nião
Nos exemplos de (6 a-f), o ditongo termina na área vocálica de []. Nos exemplos
de (6 g-k), o ditongo termina na área vocálica de []. Nos casos ilustrados em (6 a-k), a
ocorrência de um ditongo é obrigatória.
Nos casos ilustrados em (6 l-m), o ditongo decrescente pode alternar com uma seqüência
de vogais. Em português, ocorrem também glides intervocálicos. Exemplos são
apresentados em (7).
9
Ditongos decorrentes da vocalização do /l/ não são considerados nessa dissertação. Ex.: “sol” [s].
64
(7) Glides intervocálicos
a. [a]
“saia”
s[a]a
b. [e]
“teia”
t[e]a
c. [o]
“goiaba''
g[o]aba
Há controvérsia quanto à interpretação de glides intervocálicos. (cf. Cristófaro
Silva, 1992, Collischon, 1996). Isto porque glides intervocálicos podem ser interpretados
como vogais ou consoantes. Para os propósitos da descrição aqui apresentada, sugerimos
que o glide comporta-se como um segmento vocálico que será transcrito por [].10
Argumentos que apóiam esta proposta são apresentados posteriormente.
As seqüências denominadas tradicionalmente como tritongos no português
brasileiro são constituídas de (oclusiva velar+glide posterior+vogal). Alguns exemplos
deste caso são “quais”, “Uruguai”. Neste tipo de seqüência, há controvérsia quanto à
interpretação fonológica da oclusiva velar e glides. (cf. Cristófaro Silva, 1995, Couto,
1996).
Contudo, há consenso quanto ao fato do glide [w] co-ocorrer com a consoante oclusiva e
não apresentar alternância com a vogal alta correspondente. Sendo assim, nessa
dissertação, esse glide sistematicamente será transcrito por [w] como em [kw]ais ou
Uru[w]ai.
10
Glides intervocálicos com [] são raros no português brasileiro: ''Cauê''.
65
Esta seção apresentou a descrição fonética das vogais altas orais, dos ditongos e dos
glides no português brasileiro. A seguir, descreveremos as vogais altas e os glides no
inglês britânico.
2.12 Vogais altas e glides no inglês britânico
O inglês britânico RP é geralmente descrito como tendo vogais breves, vogais
longas e ditongos (Jones, 1997). A duração vocálica pode ser distintiva em várias línguas,
como no inglês. No inglês americano, a diferença entre vogais longas e breves é por vezes
analisada como uma diferença entre vogais tensas e frouxas. As vogais tensas são em geral,
mais longas em duração e requer maior esforço muscular em relação à produção de uma
vogal tensa.
Assume-se ainda, que os glides comportam-se como segmentos consonantais em
alguns casos no inglês. Estes contextos de ocorrência serão discutidos neste trabalho.
Nestes casos os glides são representados pelos símbolos /j, w/.
2.12.1 As Vogais altas no inglês britânico
Os exemplos em (1) ilustram palavras que contém vogais altas longas e breves.
(8)
Vogais longas:
Vogais breves:
[i]
“beat”
bater
[u]
“boot”
porta-malas
[]
“ship”
navio
[]
“put”
colocar
66
O diagrama das vogais cardeais apresentado na FIG. 13 representa as vogais altas
ilustradas em (1).
FIGURA 13 As Vogais altas do inglês RP
FONTE – JONES, 1997. p. viii.
Ladefoged (1982) sugere que as vogais breves e longas do inglês sejam descritas de
acordo com suas ocorrências nas sílabas. Mais especificamente, em sílabas fechadas e
abertas. As sílabas fechadas terminam em um som consonantal e as sílabas abertas
terminam em um som vocálico. As vogais breves sempre ocorrem em sílabas fechadas (e
são, portanto, excluídas da posição final de palavra). As vogais longas ocorrem em sílabas
abertas e também em sílabas fechadas por uma ou mais consoantes. Considere os exemplos
em (9) que ilustram a restrição descrita acima, para as vogais altas longas e breves:
(9)
Vogal alta breve []
a. [ft]
“fit”
ajustar
b. [fst]
“fist”
pulso
c. [bk]
“book”
livro
d. [plz]
“pulls”
puxa (verbo)
67
Vogal alta longa [i]
e. [fi]
“fee”
honorários
f. [fit]
“feet”
pés
g. [fist]
“feast”
festa
h. [lu]
“glue”
cola
i. [lus]
“loose”
solto
“fools”
tolos
j. [fulz]
Os exemplos de (9 a-d) ilustram vogais altas breves ocorrendo em sílabas fechadas.
Os exemplos em (9 e-j) ilustram as vogais altas longas ocorrendo em sílabas abertas ou
fechadas. Os exemplos em (9) ilustram casos em que as vogais ocorrem em monossílabos e
a vogal alta é a última (e única) sílaba na palavra. Contudo, a restrição referente à
ocorrência de vogais breves em sílabas fechadas opera também em meio de palavra.
Exemplos são (o ponto final indica o limite silábico): [st.i] ''city'' cidade e
[bl.k] “bullock” bovino.
As vogais altas longas [i, u] podem ocorrer também, antes de outra vogal alta,
que se encontra em sílaba tônica. Geralmente, nestes casos ocorre o sufixo –ing. Exemplos
são: “skiing” [ski], “canoeing” [knu]. A seguir apresentamos espectrogramas das
vogais altas no inglês britânico.
68
FIGURA 14 Espectrogramas das vogais altas do inglês.
FONTE - LADEFOGED, 1982. p. 194.
A FIG. 14 mostra os espectrogramas das vogais altas anteriores e posteriores
longas-tensas [i, u] e breves-frouxas [, ] (Ladefoged, 1982). As vogais foram
produzidas por um falante nativo do inglês britânico. A freqüência do primeiro formante
F1 é inversamente proporcional à altura da vogal. Por outro lado, a freqüência do segundo
formante diminui com a posterioridade da vogal. Quanto mais anterior a vogal, mais alta a
freqüência (Ladefoged, 1982). Podemos observar também que as vogais longas [i, u]
ocupam temporalmente (em ms) mais tempo do que as vogais breves [, ] corroborando
assim, a relevância da oposição vogal longa-breve em inglês.
As vogais altas tensas e breves [i, u] podem ocorrer em posição final de sílaba em
duas situações especiais, pois dissemos anteriormente que em posição de final de sílaba
espera-se apenas ocorrer vogais altas longas. Contudo, os casos em que a vogal alta tensa
69
curta ocorre são bem específicos e expressam a neutralização de vogais longas e breves.11
Esses dois casos são:
1) quando uma vogal alta é seguida de uma outra vogal “radio” [re.di.o] rádio,
“actual” [æk.tu.l] real;
2) quando em posição átona final (neste caso só ocorre [i]): “happy” [hæp.i] feliz,
“pretty” [prt.i] bonito.
A seguir consideramos os ditongos no inglês britânico.
2.12.2 Os Ditongos do inglês britânico
O inglês tem ditongos decrescentes e ditongos centralizados. Trataremos
inicialmente, dos ditongos decrescentes. Estes ditongos são formados por dois segmentos
(a vogal e o glide) e funcionam como vogais longas. Sendo assim, espera-se encontrar
ditongos decrescentes em final de sílaba (ou seja, em sílaba aberta) e em sílabas fechadas.
Os exemplos de (10) ilustram este caso:
(10)
a. [pa]
pie
torta
b. [pras]
price
preço
c. [krast]
Christ
Cristo
A FIG. 15 a seguir ilustra os ditongos decrescentes no inglês britânico. Estes
ditongos podem terminar na área vocálica de [] ou [].
11
“Neutralização” é um conceito fonológico que será discutido na segunda parte deste trabalho.
70
FIGURA 15 Os Ditongos no RP.
FONTE - JONES, 1997. p. viii.
Exemplos de cada um dos ditongos apresentados em na FIG. 15 aparecem a seguir.
(11)
a. [e]
[fek]
“fake”
farsa
b. [o]
[so]
“so”
então
c. []
[b]
“boy”
garoto
d. [a]
[ka]
“cow”
vaca
O inglês britânico apresenta três ditongos decrescentes que terminam na área
vocálica de [] e dois ditongos decrescentes que terminam na área vocálica de []. Isto
totaliza cinco ditongos decrescentes. Consideremos os ditongos centralizados. Ditongos
centralizados apresentam um movimento articulatório da vogal em direção ao centro do
espaço vocálico. Os ditongos centralizados são três:
(12) Ditongos centralizados
a. []
[p]
“poor”
pobre
b. []
[t]
“tear”
lágrima
c. []
[b]
“bear”
urso
71
Podemos observar que o segundo elemento do ditongo centralizado é o “schwa''
[]. Esta vogal é central, frouxa e não-arredondada. Os ditongos centralizados ocorrem
tipicamente no inglês britânico (mas não no inglês americano). Os ditongos centralizados
são decorrentes da perda do “r” em final de sílaba que ocorreu no inglês britânico e que
ocasionou a ditongalização da vogal precedente. E claramente, depois da perda do “r”, o
schwa [] permaneceu (Roca & Johnson, 1999). Nos exemplos de (13), apresentamos a
pronúncia típica no inglês americano para as palavras com ditongos centralizados,
ilustradas em (12).
(13)
a. [pr]
“poor”
pobre
b. [tr]
“tear”
lágrima
c. [br]
''bear''
urso
A perda do “r” em posição final de sílaba resultou também no desenvolvimento dos
tritongos no inglês britânico. Os tritongos em inglês podem ser considerados como uma
seqüência de (ditongo+vogal). Os ditongos nesta seqüência podem ser: /a,a,e,o,/
precedendo um “shwa” []. Exemplos de tritongos em inglês são:
(14)
a. [tad]
“tired”
cansado
b. [a]
“hour”
hora
c. [le]
“layer”
camada
d. [lo]
“lower”
mais baixo
e. [k]
“coyer”
mais modesto
72
Os tritongos em (14), ocorrem somente no inglês britânico onde houve a perda do “r” em
posição final de sílaba. Na próxima seção, consideramos os glides /j, w/ no inglês
britânico.
2.12.3 Os Glides /j, w/ no inglês britânico
Conforme dito anteriormente, adotamos os símbolos /j, w/ para representar os
casos em que os glides se comportam como consoantes. Este fato será demonstrado
posteriormente. Os casos que /j, w/ ocorrem no inglês britânico consistem de uma
seqüência de glide+vogal. Trataremos dos glides /j/ e /w/ separadamente. O glide /j/
ocorre em:
1. Em posição inicial de palavra:
(15)
a.“yes”
[jes]
sim
b.“union”
[ju:nin]
união.
2. Seguido às consoantes [p, b, t, d, k, m, n, h] quando a vogal seguinte é [u]:
(16)
a. “pew”
[pju]
banco de igreja
b. “beauty”
[bjuti]
beleza
c. “attune”
[tjun]
afinar
d. “duke”
[djuk]
duque
e.“queue”
[kju]
fila
f. “music”
[mjuzk]
g. “new”
[nju]
novo
h. “hue”
[hju]
gritaria
música
73
O glide /w/ ocorre em:
1. Posição inicial de palavra:
(17)
a. “we”
[wi]
nós
b. “one”
[wn]
um
a. “twelve”
[twlv]
doze
b. “dwell”
[dwl]
morar
[we]
longe
2. Seguindo /t, d/:
(18)
3. Posição intervocálica:
(19)
a. “away”
4. Em consoante complexa (oclusiva velar+glide):
(20)
a. “queen”
[kw]
rainha
b.“Gwen”
[w]
Gwen (nome próprio)
Esta seção apresentou a descrição fonética das vogais altas orais, dos ditongos e dos
glides no inglês britânico. A seguir, concluímos a parte de fonética sumarizando a
discussão apresentada nas páginas precedentes.
2.13 Conclusão
Este capítulo, intitulado ''Fonética'', apresentou inicialmente, os conceitos
necessários para se proceder a análise fonética das vogais altas e glides em estudo. Estes
conceitos compreendem a classificação articulatória e acústica dos segmentos vocálicos.
Noções complementares como a da sílaba e do acento, foram tratadas.
74
Na página seguinte, é apresentada a TAB. 7 que sumariza todos os casos de
ocorrência de vogais altas, ditongos e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
Generalizando, podemos afirmar que a distribuição das vogais altas e glides no português
brasileiro está relacionada à tonicidade. No inglês britânico, podemos dizer que a
distribuição das vogais altas e glides está relacionada à estrutura silábica. Após o resumo
das vogais altas e glides a ser apresentado na página seguinte, procederemos à análise
fonológica dos segmentos descritos nesta parte de Fonética.
75
vida
mole
rugby
u
mula
huibi
mula

mato
mat
o
estaciona
estasona
o
sério
sro
e
série
sre
a
e
a
o
séria
tênue
árdua
vácuo
sra
tene
ahda
vako
a
e

o

u
a
e

o
i
pai
lei
réis
boi
mói
flui
pau
meu
céu
sou
viu
pa
le
hs
bo
m
flu
pa
me
s
so
vi
aa
saia
goiaba
saa
oaba


e
ua
gibóia
iba
Medéia
teia
cuia
meda
tea
kua
kw
quase
kwaz
w
guarda
wahda
Decrescentes
Intervocálicos
Ditongos
Oclusiva +
glide
o
vida
ml
fee
i

u
city
fit
boot
u
actual

book
æktl
bk

poor
p
beer
b

bear
b
but
Cresc
i

u
Inglês britânico
fi
sti
ft
i

Decrescentes
Português brasileiro
digno
din
a
e

a
o
pie
fake
boy
cow
so
pa
fek
b
ka
so
a
o
hour
lower
a
lo
e
layer
le

a
coyer
tired
k
tad
Intervocálicos
i
Crescentes
V ogais
TABELA 7 Ocorrência de vogais, ditongos e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
Oclusiva+glide
Glides em início
palavra
Seguindo
/ptkhnb
m/ e antes
de /u/
kw
queen
w
Gwen
kwin
wn
jV
wV
yes
will
js
wl
pju
pew
pju
tju
attune
tjun
kju
queue
hju
nju
bju
mju
hue
new
beauty
music
kju
hju
nju
bjuti
mjuzk
76
3. FONOLOGIA
3.1 Introdução
A fonologia é o ramo da lingüística que investiga como os sons da fala são
distribuídos nas estruturas das línguas naturais, formando seus sistemas sonoros (Katamba,
1989). A fonologia interpreta os resultados fonéticos em função dos sistemas sonoros das
línguas e dos modelos teóricos lingüísticos existentes. Seu principal objetivo é investigar
os princípios que governam o modo de organização dos sons nas línguas naturais e explicar
suas variações.
Um procedimento comum visando caracterizar a estrutura sonora de uma língua é
primeiramente, determinar quais sons são lingüisticamente significativos e como estes sons
se combinam para formar enunciados. O próximo passo empreendido na pesquisa
fonológica é comparar sistemas sonoros diferentes, levantar hipóteses sobre o
comportamento de tais sistemas e por fim, tentar generalizar como os sistemas sonoros
operam-se nas línguas naturais (Crystal, 1997).
O sistema sonoro de uma língua pode ser analisado fonologicamente em nível
segmental, ou seja, procede-se à análise dos segmentos consonantais e vocálicos. No
entanto, várias outras características fonológicas afetam os segmentos, tais como a sílaba,
as palavras, as frases e as sentenças. A análise de traços fonológicos de unidades maiores
que o segmento, é uma preocupação de vários modelos fonológicos. Padrões de ritmo,
tempo, volume, tom de voz, são geralmente estudados pela fonologia supra-segmental na
escola americana e na prosódia na escola européia (Crystal, 1997).
77
Este terceiro capítulo, intitulado ''Fonologia'', pretende discutir algumas análises
fonológicas para as vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico. Os
sons em estudo serão discutidos em diferentes modelos teóricos. Primeiro, serão expostos
os passos de uma análise fonológica estrutural, indicando o estatuto fonológico destes sons
nas línguas em estudo. Esta análise é baseada no modelo fonêmico de Pike (1947).
Posteriormente, trataremos das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês
britânico na perspectiva de modelos gerativo, na fonologia autossegmental e na teoria da
otimalidade.
3.2 O Modelo fonêmico
3.2.1 Introdução
Um dos objetivos da fonologia é descrever o sistema sonoro de uma língua, ou seja,
o conjunto de elementos abstratos relacionados entre si que o falante utiliza para
discriminar e delimitar as unidades significativas de sua língua (Mori, 2001). Esta
descrição do sistema de uma língua pode ser feita através da identificação dos fonemas
desta língua e através de testes com critérios de oposição, distribuição complementar,
semelhança fonética, variação livre e pressão estrutural.
A fonêmica propõe-se a analisar a cadeia sonora das línguas a partir de
pressupostos teóricos de tendência estruturalista. Um dos objetivos da fonêmica é
converter a linguagem oral para a linguagem escrita, base do livro de Kenneth Lee Pike,
“Phonemics: a technique to reduce languages to writing” publicado em 1947.
78
3.2.2 Fonemas
Os fonemas são determinados de acordo com sua função para diferenciar palavras,
ou seja, a diferença fonêmica é distintiva ou contrastiva. O fonema é uma unidade de som
capaz de contrastar o significado da palavra. O critério para identificar fonemas em uma
língua é encontrar duas palavras com cadeia de sons idêntica, mas com a diferença em
apenas um som, em um mesmo ambiente. Este grupo de duas palavras é denominado par
mínimo.
Consideremos alguns pares mínimos do português: “mar” [mah]12, “bar” [bah],
“dar” [dah], “lar” [lah]. Estes exemplos são itens lexicais com diferença somente no som
do ambiente inicial. Podemos interpretar a primeira consoante de cada palavra acima como
fonemas consonantais do português, pois sua substituição acarreta em mudança de
significado. O mesmo procedimento pode ser seguido para a identificação de fonemas
vocálicos. Como nos exemplos “pira” (do verbo pirar) [pi] e “pura” [pu], em que a
substituição dos fonemas vocálicos /i/ e /u/ da primeira sílaba de cada palavra altera o
significado. A partir do teste do par mínimo pode-se concluir se os sons ou fones em
estudo tratam-se de fonemas ou não. Dois sons são considerados fonemas distintos quando
no teste do par mínimo demonstramos a oposição entre estes sons.
12
O fone ou som é representado por colchetes [ ].
79
3.2.3 Distribuição complementar
A distribuição complementar estabelece que, se dois fones ocorrem em ambientes
mutuamente exclusivos, podem ser considerados alofones de um mesmo fonema. Esta
noção fundamenta-se no princípio de Pike (1947), no qual os sons tendem a ser afetados
por contextos lingüísticos específicos. Estes contextos podem ser os sons vizinhos, a
posição de ocorrência em unidades maiores (sílaba, palavra, etc.), os elementos suprasegmentais, ou as informações lexicais e gramaticais (palavras simples ou compostas, por
exemplo).
O primeiro passo na busca em classificar fones como alofones de um mesmo
fonema é que estes devem ter semelhança fonética. Pois, por partilharem alguma
propriedade fonética os sons são considerados pares suspeitos. Por outro lado, dois fones
com pontos de articulação distantes, dificilmente seriam alofones de um mesmo fonema.
Por exemplo, os fones [t] e [] possivelmente não serão alofones de um mesmo fonema em
nenhuma língua. O motivo que exclui [t] e [] como alofones é a distância dos pontos de
articulação (alveolar e velar respectivamente) e a diferença de vozeamento também. Sendo
o [t] desvozeado e [] vozeado.
Dois fones são tipicamente alofones de um mesmo fonema se tiverem semelhanças
articulatórias
(Mori,
2001).
Contudo,
a
semelhança
articulatória
não
implica
categoricamente em alofonia. No português, os sons [t] e [t] são alofones de um mesmo
fonema: o fonema /t/. Os segmentos [t] e [t] têm semelhança fonética. No português, [t]
e [t] ocorrem em ambientes exclusivos e por isto são classificados como alofones de um
80
mesmo fonema. O som [t] ocorre antes de /i/ e o som [t] ocorre nos demais ambientes.
Dizemos que o fonema /t/ tem os alofones [t] e [t].
3.2.4 Variação livre
Quando alguns sons foneticamente semelhantes encontram-se em ambiente comum
sem modificar o significado da palavra, dizemos que estes sons ou alofones estão em
variação livre (Cagliari, 1997). Como por exemplo, na palavra “dia” em que temos as
pronúncias [di] ou [di]. Dizemos que os alofones [d] e [d] dos exemplos acima, estão
em variação livre. O falante pode usar tanto uma forma quanto a outra, pois não altera o
significado da palavra “dia”.
A variação livre não é condicionada por nenhum contexto estrutural que defina a
ocorrência ou não de sons em distribuição complementar. Em geral, as variantes livres são
condicionadas por fatores externos, não estruturais. Dentre estes, podemos mencionar a
velocidade da fala, a formalidade ou não da situação da fala, a classe social dos
informantes, o sexo, a idade, etc. Estes fatores são chamados de variantes sociolingüísticas.
A sociolingüística estuda os aspectos sociais da língua (McArthur, 1992).
3.2.5 Princípio de pressão estrutural
O Princípio de Pressão Estrutural analisa segmentos que podem ter mais de uma
interpretação fonêmica. Esta definição toma como base a organização estrutural de uma
81
língua na interpretação dos fonemas. Este conceito é muito importante para a análise
fonológica deste trabalho por envolver os glides [j, w].
O Princípio de Pressão Estrutural assume que seqüências características de sons
exercem pressão estrutural na interpretação fonêmica de segmentos suspeitos ou
seqüências de segmentos suspeitos. A interpretação de segmentos suspeitos ou de
seqüências de segmentos suspeitos depende da interpretação silábica de cada seqüência de
segmentos em uma determinada língua. Interpretação silábica é a análise de um segmento
como consonantal ou vocálico em relação à estrutura silábica ou em relação às regras
fonotáticas da língua em estudo. Pike (1947) apud Cristófaro Silva (1999a), demonstra o
Princípio de Pressão Estrutural através de uma língua hipotética. Considere os dados em
(21).
(21)
a. [ma]
gato
b. [bo]
correr
c. [su]
céu
d. [sa]
folha
e. [ia]
lua
f. [tsa]
dez
A lista de palavras acima consiste em seis monossílabos. Todos os exemplos
apresentados em (21 a-d) têm a estrutura silábica CV (consoante+vogal). Em (21 e),
temos a palavra [ia] que apresenta uma seqüência de vogais. Em (21 f), temos a palavra
[tsa] que apresenta uma seqüência de duas consoantes e uma vogal. Os casos de (21 e-f)
impedem de assumirmos que esta língua apresenta como único padrão silábico a estrutura
CV (consoante+vogal). Contudo, se em (21 e) – no exemplo [ia] - a vogal alta não tem
82
proeminência acentual, podemos assumir que temos uma seqüência de (glide+vogal).
Como glides podem ser associados a consoantes, dizemos que em [ia], nesta língua,
temos uma sílaba CV que será fonologicamente transcrita como /ja/. No caso de (21e),
podemos assumir que [ts] de fato representa um único segmento africado e temos
também uma sílaba CV que será transcrita como /tsa/.
O Princípio de pressão estrutural é utilizado na análise de segmentos que
foneticamente são ambivalentes. Este é o caso, por exemplo, dos glides, que dependendo
da língua, podem ter uma interpretação fonológica como vogal ou como consoante (Mori,
2001). Tendo em vista a organização do modelo fonêmico apresentado nessa seção,
apresentamos, a seguir, a análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português
brasileiro e no inglês britânico separadamente.
3.2.6
A Análise fonêmica das vogais altas e dos glides no português brasileiro
No português brasileiro, as vogais altas tensas /i/ e /u/ são fonemas vocálicos. São
considerados fonemas, pois sua substituição pode acarretar em uma mudança no
significado. Isso é demonstrado nos exemplos abaixo:
Contraste fonêmico entre /i/ e /u/
(22)
a. /lia/
“lia”
/lua/
“lua”
b. /pira/
“pira”
/pura/
“pura”
83
Nos exemplos em (22), observamos pares de palavras cujas cadeias sonoras são
idênticas. Cada par constitui um par mínimo. Nas cadeias sonoras de (22), a diferença está
apenas em um fonema, no caso, o fonema vocálico tônico. As palavras da primeira coluna
acima contêm o fonema /i/ e as palavras da segunda coluna contêm o fonema /u/. A cada
palavra em (22), é atribuído um significado distinto. Isto determina /i, u/ como dois
fonemas distintos. A seguir, analisaremos a alofonia de cada um dos dois fonemas /i/ e /u/
separadamente.
3.2.6.1 A Alofonia de /i/ no português brasileiro
Na análise apresentada aqui, sugerimos que o fonema /i/ possui quatro alofones no
português: [i, , i, j]. Em posição tônica, a ocorrência do alofone [i] é obrigatória, seguido
tanto de consoante quanto de vogal. Os exemplos abaixo demonstram este fato (2):
(23)
a. Olimp[i]ada
b. s[i]laba
c. sac[i]
O alofone [i] pode ocorrer opcionalmente, quando em posição átona pretônica
seguido de consoante.13 Neste caso, há variação livre entre os alofones [i] e []. Considere
os dados em (24):
(24)
a. p[i]rata
b. s[i]r[i]gaita
13
p[]rata
s[]r[]gaita
Os casos em que a vogal alta é seguida de vogal serão abordados posteriormente.
84
O alofone [i] também ocorre em posição postônica final em variação livre com o
alofone []. Considere os dados em (25)14:
(25)
a. val[i]
val[]
b. sobr[i]
sobr[]
c. fom[i]
fom[]
O alofone [i] ocorre também em posição postônica medial em variação livre com o
alofone [] . Considere os dados em (26):
(26)
a. pál[i]do
pál[]do
b. pérf[i]do
pérf[]do
c. ót[i]mo
ót[]mo
O alofone [i] pode alternar com o glide [] em variação livre quando em posição
pretônica precedida por vogal (27 a-c) ou em posição pretônica seguida de vogal (27 d-f).
(27)
14
a. v[ai]dade
v[a]dade
b. m[oi]cano
m[o]cano
c. j[ui]zado
j[u]zado
d. p[ia]da
p[a]da
e. p[io]neiro
p[o]neiro
f. cr[ia]dagem
cr[a]dagem
Em algumas variedades do português brasileiro, diferente de Belo Horizonte, ocorre uma vogal tensa [e]
neste contexto: val[e], sobr[e], fom[e].
85
O alofone glide [] pode alternar com a vogal [i] em posição postônica átona,
seguida de vogal. Contudo, prevalece a preferência no português brasileiro pelo alofone
glide [] neste contexto.
(28)
a. sáb[]a
sáb[i]a
b. vár[]as
vár[i]as
c. gêm[]os
gêm[i]os
O alofone glide [] também tem ocorrência obrigatória em posição postônica
precedida de vogal, em ditongos decrescentes, como em (29):
(29)
a. s[e]va
b. b[e]jo
c. b[a]xo
Há casos em que sempre ocorre um glide em posição posvocálica pretônica, como
em [a]morés. Em outros casos, há alternância entre uma seqüência de vogais e uma
seqüência de (vogal+glide). Um exemplos desse último caso é v[ai]dade (com uma
seqüência de vogais) e v[a]dade (com uma seqüência de (vogal+glide)).
Este trabalho assume que em casos como [a]morés, o ditongo é parte da
representação lexical da palavra. Em casos em que uma seqüência de vogais alterna com
seqüência de (vogal+glide) como em v[a]dade e v[ai]dade, o ditongo é decorrente de
alofonia. Assumimos, portanto, que ditongos decrescentes podem ser formados a partir de
86
duas vogais em seqüência – como em “vaidade” – ou podem ser parte da informação
proveniente do componente sonoro – como em “Aimorés”.
Se os ditongos decrescentes são derivados ou lexicalmente presentes é um tópico
polêmico no português (cf. Cristófaro Silva, 1999a). A proposta aqui assumida tem por
objetivo diferenciar casos em que há alternância entre seqüência de (vogal+vogal) e
(vogal+glide) em posição pretônica – como em “vaidade” – e casos em que
obrigatoriamente ocorre uma seqüência de (vogal+glide) pretônico – como em “Aimorés”.
O alofone glide [] também tem ocorrência obrigatória em posição intervocálica
postônica (30 a-c) ou pretônica (30 d-f):
(30)
a. sa[]a
b. idé[]a
c. cu[]a
d. go[]aba
e. ma[]ô
f. ba[]uca
O alofone [i] ocorre quando seguido de uma consoante que por sua vez é seguida
de uma vogal [i] epentética15 e outra consoante. A vogal epentética separa o encontro
consonantal. Quando a vogal epentética não ocorre o alofone na posição tônica é a vogal
alta tensa [i]. Os exemplos abaixo demonstram as duas possibilidades:
15
Epêntese é um processo fonológico onde há a adição de um segmento ou som em uma palavra. No caso em
questão, a vogal [i] é epentética.
87
a. s[i]g[i]no
(31)
b. V[i]c[i]tor
s[i]gno
V[i]ctor
Há finalmente, os casos em que formas contendo o infixo –sion- que
obrigatoriamente apresentam uma seqüência de glide e vogal. Observe que na palavra
“estaciona”, temos obrigatoriamente um glide prevocálico. Nestes casos, o alofone
/j/ ocorre por estar vinculado à consoante procedente e à vogal seguinte, tem
comportamento consonantal. Neste caso, representamos fonemicamente o ditongo por /jo/.
O quadro seguinte resume a discussão de alofonia do fonema /i/.exposta nesta seção.
TABELA 8
Os alofones do fonema /i/ no português brasileiro. Sendo V=vogal, C=consoante.
posição tônica seguida de C ou V (obrigatório)
[i]
/i/
posição átona seguida de C (opcional)
p[i]a
v[i]da
v[i]tal
v[]tal
final
val[i]
val[]
medial
ar[i]do ár[]do
Pretônica
Postônica
posição pretônica precedida de V (opcional)
v[ai]dade v[a]dade
posição pretônica seguida de V (opcional)
p[ia]da p[a]da
Posição postônica seguida de V (opcional)
[]
posição átona seguida de C (opcional)
sáb[i]a sáb[]a
Pretônica
Postônica
v[]tal
v[i]tal
final
val[i]
val[]
medial
ar[i]do ar[]do
postônica seguida de V
sáb[]a sáb[]a
[]
posição pretônica seguida de V (opcional)
p[ia]da p[a]da
glide
posição postônica seguida V (opcional)
sáb[i]a sáb[]a
Posição
átona
adj. a
vogal
posição pretônica precedida de V (opcional)
v[a]dade v[ai]dade
posição postônica precedida de V (opcional)
s[e]va
posição postônica intervocálica
s[a]a
[i]
posição tônica seguida de C1$C2[V epentética]
s[i]g[i]no
[j]
Formas com o infixo –sion-
Na[sjon]al
88
A TAB. 8 da página anterior, resume os alofones do fonema /i/ no português brasileiro.
Observamos que o acento é muito relevante na análise fonêmica. Os alofones do fonema
/i/ são [i, , i, j].
3.2.6.2 A Alofonia de /u/ no português brasileiro
Neste trabalho, sugerimos que o fonema /u/ no português brasileiro possui quatro
alofones, [u, , u, w]. Primeiramente, o alofone [u] ocorre obrigatoriamente em posição
tônica seguido de consoante ou vogal. Como em:
(32)
a. tat[u]
b. l[u]a
c. t[u]mulo
O alofone [u] pode ocorrer opcionalmente, quando em posição átona pretônica
seguido de consoante.16 Neste caso, há variação livre entre os alofones [u] e [].
Considere os dados em (33):
(33)
16
a. c[u]rral
c[]rral
b. l[u]gar
l[]gar
Os casos em que a vogal alta é seguida de vogal serão abordados posteriormente.
89
O alofone [u] também ocorre em posição postônica final em variação livre com o
alofone []. Considere os dados em (34)17:
(34)
a. vas[u]
vas[]
b. cal[u]
cal[]
O alofone [i] ocorre também em posição postônica medial em variação livre com o
alofone [] . Considere os dados em (35):
(35)
a. acúm[u]lo
acúm[]lo
b. túm[u]lo
túm[]lo
O alofone [u] ocorre em alternância com o glide [] em posição pretônica
precedida de vogal (36 a-c) ou seguida de vogal (36 d-f).
(36)
a. re[u]nião
re[]nião
b. pre[u]cupação
pre[]cupação
c. c[u]elho
c[]elho
d. m[u]ambeiro
m[]ambeiro
e. emp[u]eirado
emp[]eirado
f. menstr[u]ação
menstr[a]ção
O alofone glide [] pode alternar com a vogal [u] em posição postônica átona
seguida de vogal. Contudo, prevalece a preferência no português brasileiro pelo alofone
glide [] neste contexto.
17
Em algumas variedades do português brasileiro, diferente de Belo Horizonte, ocorre uma vogal tensa [o]
neste contexto: vas[o], cal[o]
.
90
(37)
a. árd[]a
árd[u]a
b. inóc[]a
inóc[u]a
c. ingên[]a
ingên[u]a
O alofone glide [] ocorre obrigatoriamente, em posição postônica precedida de
vogal, em ditongos decrescentes18
(38)
a. pa[]sa
b. ca[]sa
O alofone [u] ocorre no português brasileiro quando seguido de uma consoantes,
uma vogal epentética [i] e outra consoante. Considere o exemplo em (39)19.
(39)
a. r[u]g[i]by
Há casos em que o glide /w/ ocorre conjuntamente com uma consoante oclusiva
velar. Exemplos deste caso são: “guarda”, “quase”. Neste caso, o glide /w/é parte da
consoante. Por ter este estatuto consonantal, este glide será transcrito fonemicamente por
/w/.
A TAB. 9 que se segue resume a discussão de alofonia do fonema /u/ apresentada
nas páginas precedentes.
18
19
O processo de vocalização do /l/ como em “tal” não é considerado neste trabalho.
Este foi o único exemplo encontrado.
91
TABELA 9
Os Alofones do fonema /u/ no português brasileiro.
posição tônica seguida de C ou V (obrigatório)
/u/
[u]
posição átona seguida de C (opcional)
r[u]a
Pretônica
Postônica
m[u]la
c[u]rral c[]rral
Final
Cal[u]
cal[]
Medial cúm[u]lo cúm[]lo
posição pretônica precedida de V (opcional)
r[eu]nião r[e]nião
posição pretônica seguida de V (opcional)
c[u]ca c[]ca
posição postônica
Árd[]a
posição átona seguida de C (opcional)
[]
Pretônica
Postônica
[] posição pretônica seguida de V (opcional)
glide posição postônica seguida V (opcional)
posição
átona
adj. a
vogal
c[]rral
árd[]a
c[u]rral
Final
Cal[]
cal[u]
Medial cúm[u]lo cúm[]lo
c[u]ca c[]ca
Árd[]a
árd[]a
posição pretônica precedida de V (opcional)
r[eu]nião r[e]nião
posição postônica precedida de V
c[a]as
[u]
posição tônica seguida de C1$C2 [V epentética]
r[u]g[i]by
[w]
Seqüenciais de (oclusiva velar+glide)
g[wa]rda
3.2.6.3 Conclusão
No português brasileiro, os segmentos /i/ e /u/ são fonemas, pois representam
unidades fonológicas distintas. As vogais frouxas [, ], as longas [i, u], os glides [, ]
são alofones ou variantes contextuais ou livres. As vogais [, ] ocorrem somente em
posição átona. As vogais longas [i, u] só ocorrem na posição tônica seguida por uma
consoante e uma vogal epentética. Os glides [, ] correm somente em ditongos crescentes
ou decrescentes, muitas vezes apresentando alternância entre a vogal alta e o glide
correspondente. No caso que os glides /j, w/ ocorrem em português, estes segmentos se
comportam como segmentos consonantais.
92
Concluindo, podemos afirmar que /i, u/ são fonemas no português e que a alofonia
referente a estes segmentos opera em sintonia com a estrutura acentual. Os segmentos
/j, w/ também são fonemas em português, mas apresentam ocorrência restrita. O glide /j/
ocorre somente em formas com o infixo –sion-, como em “estaciona”. O glide /w/ ocorre
como consoante em um grupo restrito de palavras que apresenta seqüências de (oclusiva
velar+glide) como “guarda”, “quase”. Na próxima seção, apresentamos a análise das
vogais altas e dos glides no inglês britânico.
3.2.7 A Análise fonêmica das vogais altas e glides no inglês britânico
3.2.7.1 Os Fonemas /i, u, , /
No inglês britânico, os segmentos /i, u, , , j, w/ são considerados fonemas. Ou
seja, a substituição de qualquer um destes segmentos vocálicos implica em mudança no
significado como demonstrado nos pares mínimos em (1):
(40)
a. “sheep”
[ip]
ovelha
“ship”
[p]
navio
b. “feet”
[fit]
pés
“fit”
[ft]
ajustar
c. “leap”
[lip]
pular
“lip”
[lp]
lábio
d. “Luke”
[luk]
Luke
“look”
[lk] olhar
e. “shoed”
[ud]
calçou
“should”
[d] deveria
f. “fool”
[ful]
tolo
“full”
[fl]
cheio
g. “year”
[j]
ano
“ear”
[]
orelha
h. “woozy”
[wuzi]
alcoolizado
“oozy”
[uzi] lodoso
93
Os pares mínimos dos exemplos de (1 a-f) demonstram que há oposição entre vogal
longa e breve no inglês britânico. Podemos dizer que a duração vocálica é fonologicamente
distintiva no inglês (cf. Jones, 1969). A análise de Jones leva em consideração a qualidade
vocálica e também as duas categorias de duração: longa e breve.
Quanto aos glides /j, w/, estes operam como fonemas distintos (em contraste com
sua ausência). Isto é demonstrado em (40 g-h). A seguir, apresentamos separadamente a
análise das vogais altas, ditongos dos glides no inglês britânico.
Vimos que a duração vocálica constitui um traço fonológico distintivo no inglês.
Há uma especificidade de comportamento das vogais longas e breves em inglês que está
relacionado ao fato da sílaba ser fechada ou aberta. Sílabas fechadas terminam em
consoantes e sílabas abertas terminam em vogais. Podemos fazer a seguinte generalização
em termos distribucionais para as vogais longas e breves do inglês: 20
•
As vogais breves /, / ocorrem somente em sílabas fechadas.
•
As vogais longas /i, u/ podem ocorrer em sílabas abertas ou fechadas.
Os exemplos abaixo ilustram o que foi afirmado acima:
(41)
20
a. “fit”
[ft]
ajustar
b. “fist”
[fst]
pulso
c. “put”
[pt]
colocar
d. “fee”
[fi]
honorários
e. “feet”
[fit]
pés
f. “feast”
[fist]
festa
As afirmações que se seguem são válidas para quaisquer vogais longas e breves. Contudo, ilustramos
abaixo apenas os casos que envolvem vogais altas.
94
Seguindo o que foi previsto acima, não se deve esperar encontrar vogais breves no
final de sílabas ou palavras em inglês. Isto é porque em final de sílaba e palavra, espera-se
sempre que ocorra uma vogal longa. Contudo, há casos em que vogais tensas breves
ocorrem em final de sílaba e palavra. Considere os exemplos que a seguem:
(42)
(43)
Final de palavra em sílaba átona
a. “happy”
[hæpi]
feliz
b. “easy”
[izi]
fácil
c. “argue”
[ju]
discutir
d. “value”
[vælju]
valor
a. “react”
[riækt]
reagir
b. “hilarious”
[hlearis]
hilário
c. “actual”
[æktjul]
real
d. “voluptuous”
[vlptus]
voluptuoso
Antes de outra vogal
Os casos de (42) e (43) podem ser explicados com a noção de neutralização. A
neutralização expressa o fato de que há a perda de contraste fonêmico em contexto
específico. No inglês, os fonemas // e /i/ perdem o contraste fonêmico em sílaba átona
final
ou
quando
seguidos
de
outra
vogal.
Dizemos
que
os
fonemas
/i, / e /u, / neutralizam-se neste contexto. Jones (1969) sugere os símbolos /i, u/ para
expressar a neutralização nestes casos.21
Há casos no inglês em que ocorre uma vogal curta tensa /i, u/ sem envolver a neutralização. Isto decorre
do fato de no inglês as palavras poderem ser pronunciadas de duas maneiras diferentes: forma fraca e forma
forte. Este fenômeno está intimamente relacionado à prosódia e abordá-lo aqui, nos desviaria do propósito
central deste trabalho.
21
95
3.2.7.2 Os Ditongos no inglês britânico
Passamos agora a considerar os ditongos. Há cinco ditongos decrescentes no inglês
RP, que são constituídos por seqüência de vogal e glide. Sendo que o primeiro segmento é
proeminente (e, portanto uma vogal) e, o segundo segmento é um glide. Ao contrário do
português – que pode ter alternância entre ditongos e seqüência de vogais como em
va[i]dade ou va[]dade ou em c[u]ca e c[]ca – os ditongos no inglês são unidades
estáveis. Ditongos em inglês não alternam com seqüências de vogais.
Este fato nos leva a considerar que os ditongos são lexicalmente definidos. Para
corroborar esta perspectiva, devemos considerar o padrão acentual do inglês. Os ditongos
decrescentes (junto com as vogais longas e sílabas travadas) tendem a atrair o acento. Este
fenômeno é conhecido como um caso em que a língua é sensível à quantidade do peso
silábico. Os ditongos, as vogais longas e as sílabas travadas constituem sílabas pesadas.
São justamente as sílabas pesadas que atraem o acento em línguas sensíveis à
quantidade do peso silábico. Sendo assim, podemos assumir que os ditongos no inglês são
parte da informação lexical da língua. Exemplo de ditongos decrescentes em inglês são:
(44)
a. [e]
[fek]
“fake”
farsa
b. [a]
[pa]
“pie”
torta
[so]
“so”
então
d. []
[b]
“boy”
garoto
e. [a]
[ka]
“cow
vaca
c. [o]
96
No inglês britânico, temos ditongos centralizados que são decorrentes do
cancelamento do ''r'' em final de sílaba.
(45)
inglês britânico
inglês americano
a.
[p]
[p]
“poor''
pobre
b.
c.
[t]
[b]
[t]
[b]
”tear”
''bear''
lágrima
urso
O segundo elemento do ditongo centralizado é o “schwa” [] que ocorre no mesmo
lugar em que ocorre o ''r'' no final de sílaba no inglês americano. A perda do ''r'' em posição
final de sílaba resultou também no desenvolvimento dos tritongos no inglês britânico. Os
tritongos em inglês podem ser considerados como uma seqüência de (ditongo+schwa). Os
ditongos nesta seqüência podem ser: /a, a, e, o, /. Exemplos de tritongos em inglês
são:
(46)
a. [a]
[tad]
“tired”
cansado
b. [a]
[a]
“hour”
hora
c. [e]
[le]
“layer”
camada
d. [o]
[lo]
“lower”
mais baixo
e. []
[k]
“coyer”
mais modesto
Estes tritongos ocorrem somente no inglês britânico, onde houve a perda do “r” em posição
final de sílaba. Estes ditongos centralizados são decorrentes da perda do ''r'' em final de
sílaba no inglês britânico e não estão relacionados à alternância com as vogais altas
correspondentes. Na próxima seção, consideramos os glides /j, w/ no inglês britânico.
97
3.2.7.3 Os Glides [j, w] no inglês britânico
Os exemplos que seguem (47) demonstram o contraste fonêmico entre os glides
/j, w/ e a ausência de qualquer segmento.
(47)
a. “year”
[j]
ano
“ear”
[]
b. “woozy”
[wuzi]
alcoolizado
“oozy”
[uzi] lodoso
orelha
Nesta seção, pretendemos demonstrar que os glides /j, w/, em inglês, comportamse
como
segmentos
consonantais.
Do
ponto
de
vista
fonético,
os
glides
/j, w/ correspondem aos segmentos vocálicos. Isto porque há passagem livre da corrente
de ar durante a produção destes segmentos. Durante a produção de /j, w/, o corpo da
língua encontra-se na mesma posição da produção das vogais altas /i, u/. A diferença entre
a articulação das vogais altas e glides correspondentes, está no estreitamento maior entre os
articuladores, ou seja, a língua está mais próxima ao palato na produção dos glides. A
maior proximidade entre a língua e o palato pode dar aos glides o estatuto de consoante
(Schane, 1973).
A interpretação fonológica dos glides no inglês britânico como consoante, pode ser
demonstrada pela regra gramatical que especifica a forma do artigo definido. O artigo
definido ''the'' é pronunciado [], quando a palavra que o segue se inicia por vogal. Por
sua vez, quando precede palavras iniciadas em consoante o artigo definido é pronunciado
[]. Considere os dados em (48):
98
(48)
.
a. “the apple”
[ æpl]
a maçã
b. “the pear”
[ p]
a pera
c. “the year”
[ j]
o ano
d. “the one-hour limit”
[ wn a lmt]
o limite de uma hora
Podemos perceber pelos exemplos de (48), que os glides em questão devem ser
interpretados como consoante, pois a forma [] ocorre. A forma [] é aquela que é
prevista para os casos que o artigo é seguido de consoante (cf. 48 b). Observamos que em
“the year” [ j], o ano e, em “the one-hour limit” [ wn a lmt], o limite de uma
hora, a forma do artigo definido “the” no inglês, é realizado como []. A discussão
acima, referente a forma assumida pelo artigo definido quando a palavra seguinte se inicia
por um glide, corrobora a análise de que os glides /j, w/ comportam-se como consoantes
no inglês.
O glide /j/ também ocorre em inglês quando precedido de consoantes e seguido da
vogal /u/. Exemplos são: “new” [nju] novo, “attune” [tjun] afinar,“beauty” [bjuti]
beleza, “music” [mjuzk] música. Nestes casos, assumimos que o glide comporta-se
como consoante pelo fato deste co-ocorrer com uma consoante (que precede o glide),
formando uma unidade. Nestes casos, o glide preserva a sua estrutura, não alternando com
a vogal alta correspondente.
Finalmente, há casos em que o glide /w/ ocorre conjuntamente com uma consoante
oclusiva. Exemplos deste caso são: “twelve” [twlv] doze, “dwell” [dwl] morar. Neste
99
caso, o glide /w/ é parte da consoante. Por ter este estatuto consonantal, tal glide será
transcrito fonemicamente por /w/.
3.2.7.4 Conclusão
No inglês britânico, os segmentos vocálicos /i, , u, / são fonemas. As vogais
tensas curtas [i, u] ocorrem como uma decorrência da neutralização entre vogais longas e
breves em contextos específicos (posição átona final e quando seguidos de uma vogal). As
vogais altas breves /, / ocorrem somente em sílabas
fechadas.
As vogais longas
/i, u/ podem ocorrer em sílabas abertas ou fechadas. Os ditongos decrescentes são
estáveis no inglês, ou seja, não há a alternância entre o glide e a vogal alta. Os glides
/j, w/ são interpretados como consoantes.
3.2.7.5 Conclusão geral de fonêmica
Apresentamos a análise das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês
britânico, sob a perspectiva do modelo fonêmico. É apresentada a seguir uma tabela
comparativa das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
TABELA 8
Tabela comparativa de vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
fonemas
Vocálico
Português brasileiro
i, u
Inglês britânico
i, , u, 
consonantal
j,w
j, w
i, , u, 
i, u
alofones e neutralização
100
A TAB. 8 mostra que os fonemas vocálicos do português, ou seja /i, u/,
correspondem aos casos de neutralização no inglês. Por outro lado, os fonemas vocálicos
do inglês, ou seja, /i, , u, /, correspondem aos alofones em português. Os fonemas
consonantais /j, w/ ocorrem nas duas línguas. Vale, entretanto ressaltar, que os contextos
de ocorrência dos fonemas /j, w/ são completamente diferentes nas duas línguas. Em
português, /j/ com o estatuto de consoante, ocorre em formas com o infixo –sion(“estaciona” [estasjon]) e em inglês, /j/ ocorre em início de palavra seguido de vogal
(“year” [j] ano) com o estatuto de consoante. E, após certas consoantes e seguido da
vogal /u/ (“music” [mjuzk] música). Em português, /w/ ocorre em seqüências de
(oclusiva velar + glide) (“quase” [kwaz]) e em inglês, /w/ ocorre em início de palavra
seguido de vogal (“water” [wt] água) e em seqüências de (oclusiva+glide) (“twice”
[twas] duas vezes). Em ambas as línguas, o glide /w/ tem o estatuto fonológico de
consoante.
O modelo fonêmico nos permite organizar os segmentos em categorias específicas.
Pode-se organizar as unidades funcionalmente relevantes (os fonemas) e as unidades que
variam em contextos estruturais específicos ou devido a fatores não estruturais (alofones).
Contudo, o modelo fonêmico apresenta problemas em formular generalizações sobre a
estrutura sonora.
101
Observe, por exemplo, que no português brasileiro, a alofonia de /i/ e /u/ é
operacionalmente semelhante. Por exemplo, as vogais frouxas [, ] ocorrem em sílabas
átonas. Contudo, a relação entre os alofones [] e [] não pode ser expressa no modelo
fonêmico. O modelo fonêmico permite expressar apenas a relação entre /i/ e o alofone []
e entre /u/ e o alofone []. Mas, de fato, o alofone [] e o alofone [] estão relacionados
ao mesmo fenômeno: que determina que vogais tensas podem se manifestar como frouxas
quando em sílaba átona.
Podemos dizer que o modelo fonêmico não permite expressar as generalizações
encontradas nas línguas naturais. Este foi um argumento forte para apoiar a proposta do
modelo fonológico gerativo padrão. A fonologia gerativa padrão introduz a noção de
processo que relaciona alofones entre si e expressa as generalizações na estrutura sonora
das línguas naturais.
Outro problema do modelo fonêmico é quanto a considerar o fonema como unidade
mínima de análise. A fonologia gerativa padrão assume que os fonemas (que de fato são
determinados segmentos na fonologia gerativa) são compostos de traços distintivos.
Relações estabelecem-se entre segmentos que compartilham propriedades expressas por
traços distintivos. Processos fonológicos regulam a organização da estrutura sonora.
102
3.3 O Modelo gerativo padrão
3.3.1 Introdução
O Modelo Gerativo Padrão em fonologia é parte da Gramática Gerativa
Transformacional proposta por Chomsky, 1968 apud Cagliari, 1997. Chomsky demonstrou
que as análises estruturais anteriores eram inadequadas em muitos aspectos. Na sua
proposta, Chomsky considerou o conhecimento lingüístico interno do indivíduo como
sendo a ''competência'' do falante e o uso real desta língua em situações reais foi
denominado ''desempenho''. Chomsky argumenta que a lingüística deve se preocupar com
o estudo da competência e não se restringir ao estudo do desempenho. Ao estudarmos
dados de desempenho poderemos explicitar o comportamento da competência. Portanto,
uma descrição das regras que governam a estrutura da competência, seria o objetivo mais
importante do modelo gerativo (Crystal, 1997).
Na fonologia, a forma de superfície (relacionada ao desempenho) é representado
entre [ ] e a forma subjacente (relacionada à competência) é representada por / /. As
representações fonológicas são sujeitas aos processos fonológicos de uma língua. Os
processos fonológicos expressam as alternâncias segmentais e são formalizados por regras
fonológicas. As regras fonológicas são elaboradas na forma A
B / C_D (Sendo A, B, C,
D categorias opcionais). O símbolo A corresponde à descrição estrutural, o símbolo B
corresponde à mudança estrutural e C e D correspondem aos ambientes que contextualizam
as regras. As regras fonológicas geram novas estruturas por meio de transformações.
103
Schane (1973) propõe as seguintes categorias para classificar os processos
fonológicos:
1) Assimilação;
2) Processo fonológico na estrutura silábica;
3) Enfraquecimento e fortalecimento;
4) Neutralização.
O modelo gerativo introduz a noção de processos fonológicos que são formalizados
por regras cuja formalização envolve os traços distintivos.
3.3.2 Os Traços distintivos
Vimos que no modelo fonêmico, o fonema é considerado a unidade básica da
fonologia. No entanto, há uma série de evidências mostrando que várias propriedades
específicas dos sons seriam as unidades básicas da fonologia, não o fonema. O fonema de
fato seria constituído por um conjunto de propriedades, denominadas traços distintivos,
que se realizam simultaneamente.
A teoria dos traços foi introduzida por Jakobson, Fant e Halle em 1952, apud
Katamba (1989), no livro “Preliminaries to speech analysis” e posteriormente em
“Fundamentals of language” em 1956, por Jakobson e Halle. Estes autores postularam
traços definidos em termos acústicos, privilegiando as propriedades físicas dos sons.
Consideraram estes traços universais, ou seja, poderiam definir as propriedades dos
104
fonemas de qualquer língua natural. Este sistema foi criticado por não levar em conta os
traços articulatórios dos sons.
De todos os trabalhos que adotaram a noção de traços distintivos, o mais difundido
foi o SPE (“The Sound Pattern of English”) de Chomsky & Halle (1968) apud Katamba
(1989). Chomsky & Halle propuseram uma revisão na teoria dos traços distintivos
apresentados em Jackobson, Fant & Halle (1952) e Jackobson & Halle (1956) apud
Katamba (1989). No livro “The Sound Pattern of English”, os autores substituíram os
traços definidos acusticamente por traços com correlatos articulatórios. O número de traços
distintivos foi aumentado substancialmente, porém continuaram com a propriedade binária.
São assumidos dois coeficientes ou valores, o sinal (+) indicando a presença do traço e o
sinal (-) indicando a ausência do traço (Katamba, 1989). Apresentamos a seguir, a lista dos
traços distintivos relevantes para esta pesquisa.
3.3.3 Traços de classes principais
Os traços de classes principais definem as principais classes de sons relevantes em
uma análise fonológica. São traços distintos que dividem os segmentos fonológicos de uma
língua em classes lingüisticamente significativas. As definições a seguir estão baseadas nos
trabalhos de Katamba (1989) e Mori (2001).
Silábico [silábico]: Sons silábicos são sons que funcionam como núcleo silábico e os nãosilábicos ocorrem como margens na sílaba. Normalmente, os sons silábicos são mais
proeminentes auditivamente que os sons adjacentes não-silábicos. As vogais são silábicas e
no inglês, por exemplo, consoantes como [l] em “bottle” ou [n] em “cotton” são silábicas.
Consonantal [consonantal]: Sons consonânticos são sons produzidos com uma constrição
ao longo da linha central do trato vocal. Esta constrição pode ser total ou parcial. Os sons
não consonânticos não apresentam essa constrição. Assim, as vogais e os glides [w, j] em
105
estudo são [-cons]. As consoantes plosivas, nasais, líquidas, fricativas, africadas são
[+cons].
3.3.4 Traços do corpo da língua
Os traços do corpo da língua caracterizam as movimentações da língua em relação à
posição neutra. No SPE, a posição neutra do corpo da língua refere-se à posição assumida
na produção de uma vogal média anterior.
Alto [alto]: Sons altos são produzidos com uma elevação do corpo da língua acima da
posição neutra e os não-altos são produzidos sem esta elevação. As vogais altas, glides [j,
w], são sons [-alto].
Baixo [baixo]: Sons baixos são produzidos com o corpo da língua abaixado em relação à
posição neutra e os não-baixos não apresentam esta característica. As vogais altas, sons em
estudo, são [-baixo].
Recuado [recuado] ou [posterior]: São sons produzidos com uma retração do corpo da
língua de sua posição neutra. Os sons produzidos com o corpo da língua em posição neutra
ou sem esta retração são chamados não-recuados. O glide [w] é [+recuado]. A vogal alta
[i] é [-recuado] e a [u] é [+recuado].
Raiz da língua avançada [ATR] (Advanced Tongue Root): A raiz da língua é puxada em
direção à parte anterior do trato vocal, o que faz com que a cavidade faríngea aumente e
produza uma elevação do corpo da língua. Os sons [-ATR] são produzidos numa posição
neutra. Também pode diferenciar as vogais tensas [+ATR] das frouxas [-ATR].
3.3.5 Traços relacionados com o formato dos lábios
Estes traços caracterizam o estreitamento da passagem da corrente de ar tanto pelo
arredondamento dos lábios, quanto pela constrição das vogais ou consoantes labiais.
Somente um traço desta categoria será utilizado neste trabalho:
Arredondado [arredondado] Os sons arredondados são produzidos com o arredondamento
dos lábios, como na vogal alta posterior do português [u]. Os não-arredondados são
produzidos com a distensão dos lábios ou sua posição neutra como em [i].
106
3.3.6 Traços prosódicos
Os traços prosódicos ou supra-segmentais que são geralmente associados com a
sílaba ou palavra, são difíceis de serem descritos em termos fonéticos. O sistema proposto
por Chomsky & Halle (1968) inclui três traços e somente dois são relevantes para esta
análise22:
Longo [longo]: Este traço refere-se à duração de um segmento. Uma vogal pode ser
[+longa] ou [-longa]. Neste último caso, temos uma vogal curta.
Acento [acento]: Todas as sílabas tônicas em uma palavra são mais proeminentes que as
átonas, mas a manifestação de tonicidade varia. A sílaba tônica é percebida como mais
forte devido a uma associação de tom mais alto, maior duração e maior intensidade do
sinal, que é percebido como volume. Essa maior intensidade da sílaba tônica era
considerada característica da vogal, não propriamente da sílaba.
Nas páginas precedentes, caracterizamos os traços distintivos propostos pela
Fonologia Gerativa Padrão que serão utilizados nesse trabalho. Um outro aspecto
importante deste modelo envolve a formalização de processos fonológicos que expressam
as generalizações em regras. A explicitação de todo o mecanismo que rege a formalização
de regras fonológicas nos desviaria do propósito deste trabalho. Optamos, portanto, em
discutir os processos fonológicos relacionados às vogais altas e glides no português
brasileiro e no inglês britânico. Pretendemos avaliar as contribuições da Fonologia
Gerativa Padrão e ao mesmo tempo, apontar as falhas que contribuíram para o surgimento
de novas propostas teóricas. Nas páginas que se seguem apresentamos uma proposta de
análise de vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
22
O terceiro traço (que não utilizaremos) é “tom”. Este traço é utilizado na descrição de línguas tonais, onde
a mudança de tom é utilizada para diferenciar o significado das palavras ou demonstrar distinções
gramaticais.
107
3.3.7 As Vogais altas e os glides no português brasileiro
3.3.7.1 Introdução
Nesta seção, apresentaremos uma análise através do modelo gerativo das Vogais
Altas e Glides no português brasileiro. Esta análise está baseada em trabalhos de Azevedo
(1981) e Katamba (1989). Consideremos inicialmente os traços distintivos utilizados na
caracterização dos segmentos vocálicos altos do português brasileiro /i, u/.
TAB. 9
Traços distintivos para as vogais altas no português brasileiro
[alta]
[baixa]
[anterior]
[posterior]
/i/
+
−
+
−
/u/
+
−
−
+
FONTE: AZEVEDO, 1981. p. 11.
As vogais /i, u/ são [+alta, -baixa]. Estas vogais se diferenciam quanto aos traços
[anterior, posterior]. A vogal /i/ tem os valores [+anterior, - posterior] e a vogal /u/ tem os
valores [-anterior, +posterior]. Estes traços são aqueles relevantes para a caracterização dos
segmentos /i, u/. Contudo, se considerarmos os segmentos /j, w/, vamos necessitar de
outros traços distintivos. As vogais altas são [-consonantal], [+silábico] e /j, w/ são
[+consonantal], [-silábico]. O traço [arredondado] também é relevante para caracterizar as
vogais altas e glides. A TAB. 10 a seguir mostra a especificação dos traços para
/i, u, j, w/.
108
TABELA 10
Traços utilizados na caracterização de /i, u, j, w/ no português brasileiro.
/j/
−
−
+
−
+
−
−
[consonantal]
[silábico]
[alta]
[baixa]
[anterior]
[posterior]
[arredondado]
/w/
−
−
+
−
−
+
+
/i/
−
+
+
−
+
−
−
/u/
−
+
+
−
−
+
+
FONTE - AZEVEDO, 1981. p. 12
A matriz fonológica de /i, u, j, w/ foi apresentada acima. A TAB. 11 abaixo,
específica os traços para a matriz fonética das vogais altas e glides no português brasileiro
que compreende os segmentos [i, , j, i, u, , w, u].
TABELA 11
Traços distintivos dos alofones das vogais altas e glides no português brasileiro.
i

j
i
u

w
u
[consonantal]
−
−
−
−
−
−
−
−
[silábico]
+
+
−
+
+
+
−
+
[alta]
+
+
+
+
+
+
+
+
[baixa]
−
−
−
−
−
−
−
−
[anterior]
−
−
−
−
−
−
−
−
[posterior]
−
−
−
−
+
+
+
+
[arredondado]
−
−
−
−
+
+
+
+
[tenso]
+
−
−
+
+
−
−
+
109
Um dos problemas do sistema de traços é que a especificação de valor para um
traço implica na especificação de valor para outro traço. Por exemplo, os segmentos
[+altos] são [-baixos]. Um outro problema do modelo seria a relação entre as matrizes
fonética e fonológica. Contudo, a formalização das regras fonológicas possibilitaram
expressar generalizações e este aspecto encobriu (parcialmente) os problemas inerentes ao
modelo. A seguir, apresentamos alguns processos fonológicos relevantes na caracterização
da estrutura sonora do português brasileiro.
3.3.7.2 Processos fonológicos no português brasileiro
Os processos fonológicos são formulados de maneira simples, econômica e
objetivam refletir generalizações. As regras fonológicas formalizam os processos
fonológicos. Consideremos alguns processos expressos pelas RF (regras fonológicas) que
são apresentados a seguir.
RF1: Redução da tensão em posição átona.
+alto
+silábico
-longo
[-ATR]
/
_______
[-acento]
A RF1 prevê que os segmentos /i, u/ transformam-se em seus correspondentes
frouxos [] e [], quando em posição átona ou não acentuada.
Esta regra permite
generalizar que ''vogais altas tornam-se frouxas em sílaba átona'' incluindo aqui, as duas
110
vogais altas [i, u]. A RF1 é uma regra opcional que explica a alternância entre vogais altas
e glides em exemplos como:
(49)
val[i]
val[]
áv[i]do
áv[]do
v[i]tal
v[]tal
cal[u]
cal[]
cúm[u]lo
cúm[]lo
c[u]rral
c[]rral
RF2: Perda de silabicidade (formação de glides).
[+alta]
[-silábico]
/
([+silábico]) __________ ([+silábico])
[-acento]
A RF2 expressa que uma vogal alta realiza-se como o glide correspondente, quando
seguido ou precedido de vogal, e também, quando entre vogais. Esta regra permite
generalizar que “vogais altas tornam-se glides quando adjacentes a uma outra vogal”.
Novamente, a regra inclui as duas vogais altas [i, u]. A RF2 é uma regra opcional que
explica a alternância entre vogais altas e glides em exemplos como:
(50)
a. sáb[i]a
sáb[]a
b. p[ia]da
p[a]da
c. v[ai]dade
v[a]dade
d. árd[]a
árd[u]a
e. c[u]ca
c[u]ca
f. r[eu]nião
r[e]nião
111
Um problema com RF2 é que devido a seu caráter opcional deveríamos ter formas
alternantes para os seguintes exemplos:23
(51)
a. s[e]va
b. d[e]tada
c. s[a]a
d. c[a]sa
Contudo, nos exemplos acima um glide ocorre obrigatoriamente. Nestes casos,
temos que assumir que os segmentos /j, w/ estão presentes na representação subjacente.
Outra alternativa seria marcar lexicalmente as palavras com glide obrigatório. A
opcionalidade ou obrigatoriedade da RF2 é um problema na descrição. Outro problema
está no formalismo em RF2. A presença dos parênteses pode indicar também, a ausência
total dos glides. Por outro lado, se os dois parênteses fossem excluídos, a regra seria
invalidada.
Vejamos a RF3 que caracteriza o alongamento de vogal decorrente de epêntese.
RF3: Alongamento de vogal decorrente de epêntese24
+alta
+acento
+longa
____
+consonantal
-contínuo
$
i*
+consonantal
-contínuo
A RF3 determina que uma vogal alta passa a ser longa quando seguida de uma
oclusiva (oral) em posição final de sílaba que por sua vez, é seguida de um i* (i-epentético)
Casos em que ditongos decrescentes ocorrem em exemplos como [mes] “mês” não serão tratados neste
estudo por não serem típicos do português de Belo Horizonte.
23
24
$ simboliza o limite silábico.
112
e de outra oclusiva (oral ou nasal), mais uma vez, a regra inclui as duas vogais altas [i, u].
A RF3 explica exemplos como:
(52)
a. d[i]g[i]no
b. abr[u]p[i]to
Nos exemplos de (52), quando não ocorre a epêntese temos uma vogal curta:
d[i]gno e abr[u]pto (ou seja, a RF3 não se aplica). Finalmente, temos os casos de palavras
com o infixo –sion- (como “estaciona”) e os casos de seqüências de (oclusiva velar+glide
posterior) em que o glide é especificado na representação subjacente (ver TAB. 12).
3.3.7.3 Conclusão
Apresentamos as regras que caracterizam os processos fonológicos envolvendo as
vogais altas e glides no português brasileiro. Este modelo tem a vantagem de relacionar as
duas vogais altas do português nos processos de redução da tensão em sílaba átona, perda
de silabicidade e alongamento da vogal decorrente da epêntese. Vimos que no modelo
fonêmico, as variações envolvendo as vogais altas /i, u/ são tratadas como casos não
relacionados. Um dos méritos do modelo gerativo é justamente vincular segmentos sonoros
em termos de seu comportamento na estrutura sonora.
Porém, este modelo apresenta problemas. Um deles está relacionado aos casos em
que o glide alterna com a vogal alta correspondente (cf. (50)) e os casos em que o glide não
alterna com a vogal alta correspondente (cf. (51)). Um outro fator importante a ser
observado, é que a sílaba e o acento estão presentes na formulação das regras. Note,
contudo, que nem a sílaba, nem o acento têm qualquer tipo de estatuto teórico no modelo
113
gerativo. Além destas questões, há o fato do modelo gerativo possuir um poder excessivo
de abstração propiciando a postulação de formas subjacentes muito abstratas. A seguir,
apresentamos uma proposta de análise das vogais altas e glides no inglês britânico sob a
ótica do modelo gerativo.
3.3.8 As Vogais altas e os glides no inglês britânico
3.3.8.1 Introdução
Nesta seção, analisaremos as vogais altas e glides no inglês britânico sob a ótica do
modelo gerativo. A tabela que se segue apresenta os traços distintivos dos segmentos:
TABELA 12
Traços distintivos das vogais altas e glides no inglês britânico.
i

j
u

w
[consonantal]
−
−
−
−
−
−
[silábico]
+
+
−
+
+
−
[alta]
+
+
+
+
+
+
[baixa]
−
−
−
−
−
−
[anterior]
−
−
−
−
−
−
[posterior]
−
−
−
+
+
+
[arredondado]
−
−
−
+
+
+
[tenso]
+
−
−
+
−
−
[longo]
+
−
−
+
−
−
114
A TAB. 12 da página anterior ilustra a matriz fonológica das vogais altas e glides
no inglês britânico. Os únicos segmentos adicionais a ocorrerem na matriz fonética são
/i, u/. Passamos então, a avaliar os processos fonológicos.
3.3.8.2 Processos fonológicos no inglês britânico
Considere a RF4 que descreve a ocorrência de vogal breve em final átono de
palavra e quando adjacente a outra vogal.
RF4: Perda da propriedade [+longo]
+silábico
+alto
[-longo]
/
_______
[-acento]
##
[+silábico]
O processo descrito em RF4 determina que uma vogal alta torna-se breve em duas
situações (as chaves demonstram contextos exclusivos): 1) quando em final de palavra em
sílaba átona ou 2) quando seguido de uma vogal em sílaba não acentuada. A RF4 permitenos agrupar os casos ilustrados em (53):
(53)
a. “happy”
[hæpi]
feliz

b. “value”
[vælju]
valor
c. “react”
[riækt]
reagir
d. “actual”
[æktjul]
real
O processo expresso pela RF4 agrupa as vogais altas /i, u/ e também relaciona
dois contextos que propiciam a redução da vogal. Este, de fato, é um grande mérito do
modelo. contudo, novamente verificamos que o acento e a sílaba (simbolizada por # por
115
coincidir com o final de palavra) ocorrem na notação de RF4, mas não têm um estatuto
teórico no modelo gerativo. Podemos ainda, expressar no modelo gerativo o caso de
inserção de glides:
RF5: Inserção de glides
Ø
-consonantal
-silábico
+anterior
/
[+consonantal] ____
+silábico
+alto
+posterior
+longo
A RF5 descreve que há inserção de um glide /j/ quando ocorre um segmento
consonantal que é seguido da vogal /u/.25 A RF5 explica casos como:
(54)
25
a. “beauty”
[bjuti]
beleza
b. “attune”
[tjun]
afinar
c. “music”
[mjuzk]
música
d. “new”
[nju]
novo
De fato há restrições quanto às consoantes que podem preceder o glide. Contudo, por propósitos
descritivos indicamos apenas a característica do segmento como [+consonantal].
116
3.3.8.3 Conclusão
No caso do inglês britânico, podemos explicitar que as vogais tornam-se curtas em
posição átona ou em final de palavra ou quando adjacente a outra vogal. Podemos afirmar
também, que ocorre a inserção de um glide em contexto específico (entre uma consoante e
a vogal /u/). Contudo, uma vez que a sílaba não tem estatuto teórico no modelo gerativo,
torna-se inadequado generalizar que vogais breves ocorrem em sílabas fechadas e vogais
longas podem ocorrer em sílabas fechadas ou abertas. Novamente, o acento e a sílaba são
indicados na formalização das regras fonológicas, mas, ao mesmo tempo, estas unidades
não possuem estatuto teórico a ser levado em consideração.
3.3.8.4 Conclusão geral do modelo gerativo padrão
O modelo gerativo oferece um instrumental de formalização bastante rico. Há
também o mérito de ser possível agrupar unidades sonoras que compartilham
comportamento semelhante (em nosso caso as vogais altas). Por outro lado, o modelo
gerativo padrão oferece uma possibilidade muito ampla de abstração. Veja por exemplo,
que não há nenhuma motivação para se inserir o glide /j/ na RF5. Esta falta de motivação é
uma das falhas do mecanismo de formalização do modelo gerativo padrão.
Há também, o problema de que o modelo gerativo padrão utiliza a sílaba e o acento
no formalismo de representação. Contudo, tais elementos não são incorporados à teoria e
nem mesmo explicita-se como tais unidades operam. Este último ponto, quanto à falta de
estatuto teórico do acento e da sílaba, foi mola propulsora para a formulação de propostas
teóricas subseqüentes.
117
A seguir, discutiremos o modelo da Fonologia Autossegmental, que é um os
modelos de fonologia ''não-linear''. Os modelos não lineares incorporam a sílaba e o acento
à descrição fonológica. Isto oferece um avanço teórico que será demonstrado na próxima
seção.
3.4 O Modelo da fonologia autossegmental
A noção de sílaba como unidade fonológica foi gradativamente sendo aceita a partir
de trabalhos como de Kahn (1976) e Hooper (1976) apud Biondo (1983). No entanto, sua
incorporação à fonologia gerativa, somente aconteceu na década de 80 (Clements &
Keyser 1983; Harris, 1983). Desde então, as pesquisas que giram em torno da natureza e a
importância da sílaba na fonologia têm aumentado (Collischonn, 1996). Há vários modelos
que analisam a sílaba, porém este trabalho restringir-se-á ao modelo autossegmental.
O modelo autossegmental propõe que a análise fonológica é melhor explicitada ao
se incorporar a sílaba como constituinte. A análise da sílaba proposta por Goldsmith (1990)
teve inicialmente, como base, fenômenos fonológicos que ocorrem nas línguas tonais.
Limitar-nos-emos apenas aos aspectos da silabificação, pois é o que é pertinente a este
trabalho. Tomamos como base os trabalhos de Biondo (1993) e Bisol (1989). A fonologia
autossegmental postula que:
•
Há uma representação subjacente ou representação lexical para cada forma a ser
analisada, que espelha o conhecimento lingüístico internalizado que o falante
nativo tem de sua própria língua. O processo que uma forma subjacente sofre até
atingir sua forma de superfície é denominado processo de derivação;
118
•
Há níveis organizados hierarquicamente;
•
Há princípios gerais que atuam autonomamente em cada nível e regras particulares,
selecionadas e ativadas diferentemente em cada língua.
Segundo a teoria, para que uma estrutura seja bem formada, deve obedecer todo o
princípio de um nível, que é organizado hierarquicamente. Caso contrário, ocorre a má
formação desta estrutura. O nível que interessa diretamente ao estudo da estrutura silábica
é o nível da palavra, o nível “P”, onde a silabificação é uma condição de boa formação
sobre as representações. A principal motivação que existe nesta teoria, para propor uma
estrutura interna básica para a sílaba, é o fato da sílaba ser descrita tradicionalmente como
um agrupamento de consoantes e vogais (cf. Malmberg, 1955 apud Biondo, 1993). Este
agrupamento determina um constituinte fonológico composto de três partes:
•
uma cadeia de 0 ou mais consoantes denominada onset ou ataque;
•
um segmento vocálico, ou núcleo;
•
uma cadeia mais curta de zero ou mais consoantes denominada coda ou cauda;
•
O símbolo σ representa o nó silábico, ou simplesmente uma sílaba.
σ
O
R
N
t
r
C
e
s
Figura 7. Estrutura da sílaba
119
A teoria autossegmental prevê também, que a estrutura silábica é organizada
somente sobre a camada CV (consoante e vogal). Cada posição disponível na árvore
silábica associa-se a uma ou mais posições da camada CV. A quantidade e ordem de
segmentos que podem se associar aos elementos da sílaba, se deve principalmente, as
restrições refletidas pelo princípio de sonoridade, em conjunção com as condições de
licenciamento silábico em cada língua.
Bloomfield (1933) apud Biondo (1993), postula que a sonoridade inerente a cada
um dos segmentos podia prever a ordem destes dentro do onset e da coda. Isso fez surgir
um princípio que estipula que as sílabas tendem a ser construídas a partir de um crescendo
de sonoridade até alcançarem o pico sonoro e então, diminuírem a sonoridade.
Entendendo como sonoridade, uma escala que reflete o grau de abertura do aparelho vocal
durante a produção de um som, podemos estabelecer a hierarquia demonstrada abaixo. Ou
seja, os elementos mais sonoros poderão ocupar a posição de núcleo silábico e os menos
sonoros, as posições periféricas.
+
vogais
sonoridade
- baixas
- médias
- altas
glides [j, w]
líquidas [r, l]
nasais
_
- fricativas
obstruintes - africadas
- oclusivas
(Biondo, 1993).
Outro princípio que se relaciona com a estrutura interna da sílaba é o princípio de
licenciamento silábico. Este princípio postula que todo auto-segmento ou conjuntos de
120
traços fonológicos de uma língua deve receber uma autorização dos licenciadores silábicos
ao nível “P” para que possam ser realizados foneticamente, caso contrário, serão apagados,
(Biondo, 1993, p. 41). O nó silábico σ é o principal licenciador da sílaba.
Os outros dois princípios da teoria são o da direcionalidade da criação de estrutura
silábica e o princípio do onset máximo. O princípio da direcionalidade da sílaba estabelece
que as línguas optam por organizar a silabificação da (esquerda direita) ou da
(direita esquerda). Biondo (1993), argumenta que na silabação do português brasileiro é
um onset mais importante do que uma coda, ou seja, uma sílaba é construída com o menor
número possível de licenciadores.
Em português, o centro da sílaba é sempre uma vogal. Em outras línguas, algumas
consoantes podem ser o centro da sílaba. Contudo, o núcleo de uma sílaba é tipicamente
preenchido por vogais. Sílabas que terminam em vogais são ditas sílabas abertas ou livres.
Em oposição temos sílabas fechadas ou travadas, que são aquelas que terminam em
consoantes pós-vocálicas. Só algumas consoantes podem ocorrer em posição pós-vocálica,
fato que varia de língua para língua. No português brasileiro, as sílabas livres predominam
sobre as travadas.
Goldsmith (1990), chamou a atenção para o fato de que a sílaba não pode ser
desprezada em nenhuma teoria fonológica, pois este elemento está intimamente ligado aos
processos fonológicos das línguas. As regras segmentais podem ser alteradas de acordo
com a estrutura silábica. Em adição, as regras prosódicas envolvendo tom e acento também
estão ligadas à estrutura silábica das palavras. Estes motivos levam a fonologia
121
autossegmental a estudar a sílaba e os fenômenos a ela vinculados. Portanto, a partir da
sílaba, faremos uma análise dos segmentos em estudo na Fonologia Autossegmental.
3.4.1 As Vogais altas e os glides no português brasileiro
Iniciaremos a análise dos segmentos do português brasileiro pelas vogais altas em
posição tônica. O acento pode ser considerado lexical26 ou não lexical. Portanto, em
posição tônica ou acentuada, temos vogais altas tensas /i, u/, que serão picos silábicos,
como mostra o diagrama abaixo:
(55)
s
σ
w
σ
O
R
O
R
x
x
x
x
N
26
N
p
i
∅
a
r
u
∅
a
Consideramos que no português brasileiro o acento é lexical. Ou seja, esta informação é determinada no
léxico, (CRISTÓFARO SILVA, 1992). Há controvérsia quanto a este tópico (cf. BISOL,1992; LEE, 1994).
Contudo, explorar este tópico transcende o propósito do presente trabalho.
122
Como demonstrado em (55), não há dúvidas quanto a análise das vogais altas
/i, u/ em posição tônica. Explica-se também o caso de epêntese do glide intervocálico em
“pia” [pia] e “rua” [hua]. O modelo autossegmental permite postular e visualizar a
ocorrência de segmentos como decorrente da propagação de um segmento. O espraiamento
ou propagação de um segmento permite que uma posição silábica seja preenchida.
Considere (56).
(56)
O
R
O
R
x
x
x
x
i

a
p
r
u

a
A análise dos glides intervocálicos apresentada em (56), não aparece em outras
propostas de: fonêmica e gerativa. Na fonologia gerativa, deveríamos postular a inserção
de um segmento (o glide), mas sem ter nenhuma motivação para tal proposta. A análise
apresentada em (56), decorre do fato de segmentos poderem se propagar para posições
adjacentes e é fruto do modelo autossegmental.
Quando a vogal alta ocorre em posição átona pretônica seguida de consoante ou
vogal, há alternância entre /i, u/ e /, /. Ou seja, há alternância entre as vogais altas
tensas e frouxas na sílaba fraca no padrão wsw, conforme (57) a seguir.
123
(57)
w
O
s
R
O
N
w
R
O
R
N
N
p
i
r
a
t

p

r
a
t

Quando as vogais altas frouxas estão em posição átona – seguida ou precedida de
vogal - podem alternar com seus correspondentes glides. Como em p[i]ada ~ p[]ada,
va[i]dade ~ va[]dade, c[u]eca ~ c[]eca, re[u]nião ~ re[]nião. A alternância entre
vogal-glides pré e pós-vocálicos pode ser compreendida como perda de uma posição
nuclear. Consideremos os glides pré-vocálicos.
3.4.1.1 Os Glides pré-vocálicos
De acordo com o modelo autossegmental, os glides pré-vocálicos podem ter três
representações: em onset ramificado (58 a), em consoante complexa (58 b) e em ditongo
leve (58 c).
(58)
(a) O
R
(b) O
N
a
r
x
x
x
p

a d a
d

a
R
(c) O
N
x
p
a r d
N
x


x x x
a d a
a
R
p 
a
r
d 
a d a
a
124
O diagrama (58 a) demonstra os glides em onset27 ramificado. Se esta análise tiver
validade, a seqüência consoante-glide em onset ramificado terá o mesmo comportamento
que outra palavra com o onset ramificado. Tomemos como exemplo “prato”, que tem
como onset ramificado, uma consoante oclusiva e uma líquida. Se a palavra “piada”
também possui um onset ramificado (composto de uma oclusiva e um glide), esta estrutura
(onset ramificado) deve se comportar da mesma maneira que a palavra “prato”. Se
omitirmos o segundo segmento do onset de “prato”, subentende-se que “pato” seja “prato”.
Pois em linguagem corrente falada, esta palavra pode ser realizada com a omissão da
líquida “r”. Tomemos outra palavra com o onset também ramificado, “precisa”. Na
linguagem falada, esta palavra pode ser produzida com a mesma líquida omitida sem haver
quebra na comunicação. Ou seja, o onset pode perder a segunda ramificação, sem alterar o
significado.
Cristófaro Silva (1992), discute que encontros consonantais no português brasileiro
podem ocorrer com a omissão da líquida “r, l”. Por exemplo, na palavra “precisa”, pode-se
ter [pi]cisa como pronúncia alternativa. Considere exemplos com onset ramificado sendo
que a líquida pode ser omitida.28
(59)
a. [ezepl]
[ezep]
“exemplo”
b. [otr]
[ot]
“outro”
c. [flame]
d. [braziler]
[fame]
“Flamengo”
[baziler]
“brasileiro”
Simbolizaremos os glides em posição de onset por [j, w].
Existem alguns casos onde pode haver uma palavra diferente com a omissão da líquida no onset
ramificado. Como em cobre – Kobe.
27
28
125
e. [koprimid]
[koprimid]
“comprimido”
Os exemplos acima mostram que o segundo segmento do onset, uma consoante
líquida, pode ser omitida sem alterar o significado da palavra. No entanto, o
comportamento de (consoante-glide) não é o mesmo, pois o glide, não pode ser omitido.
Exemplos são apresentados em (60).
(60)
a. [pad]
* [pad]
“piada”
b. [d]
* [d]
“ódio”
c. [kka]
d. [ahda]
* [kka]
“cueca”
* [ahda]
“árdua”
Podemos considerar que o diferente comportamento de (consoante+líquida) e de
(consoante+glide) é uma evidência contra a hipótese de silabificação de glides prévocálicos como um onset ramificado.
A segunda possibilidade de análise para glides pré-vocálicos é demonstrada pelo
diagrama em (58 b). Neste caso, temos os glides representados como consoantes
complexas, seguidas por uma vogal em posição nuclear. As consoantes complexas
apresentam certas restrições quanto aos segmentos que possam ocorrer em posição
consonantal. Se as seqüências de glide e vogal correspondem à representação de uma
consoante complexa, deveriam apresentar as mesmas restrições. No português, a
seqüências de (consoante+w) apresentam restrições quanto a consoante – que deve ser
uma consoante velar: “quase” [kwazi] e “lingüiça”
[liwisa]. Tipicamente, em
seqüências de consoante e glide como em “piada, “cueca” e “sábia”, “árdua”, não há
restrição consonantal. Qualquer consoante do português pode preceder uma seqüência de
glide-vogal, onde o glide pode alternar com sua vogal alta correspondente. Portanto, esta
126
segunda possibilidade de análise não é a mais apropriada para os glides pré-vocálicos, pois
o comportamento fonológico deveria ser o mesmo das consoantes complexas.
A terceira possibilidade de análise para glides pré-vocálicos, é a demonstrada em
(58 c), ou seja, o glide silabificado em um ditongo leve. Cristófaro Silva (1992), assume
que um ditongo leve “consiste de dois segmentos associados a uma única posição
esqueletal” e cita que “este ditongo, na literatura fonológica é denominado de ditongo
crescente29.
A primeira evidência a favor da análise de glides pré-vocálicos como ditongo leve,
vem do comportamento do acento em português. No português, o acento pode cair na
última, penúltima ou antepenúltima sílaba. Se o glide pré-vocálico corresponde a um
ditongo leve, temos que ele é equivalente a uma única posição nuclear. Sendo assim, numa
palavra como ''família'' com uma seqüência de (glide+vogal) na última sílaba, podemos
esperar um padrão acentual como ''fámilia''. Isto corresponderia ao acento na antepenúltima
sílaba (sendo a penúltima sílaba ''mi'' e a última sílaba ''lia''). Contudo, sempre que temos
um glide pré-vocálico, o acento recai na sílaba que precede esta seqüência. Isto quer dizer
que a os glides pré-vocálicos devem seguir da junção de duas vogais em um ditongo leve.
29
Para BISOL, (1989) “o ditongo leve tem alternância do glide com uma vogal simples, sem causar mudança
de sentido”. Para KAYE, (1985), um ditongo leve é um núcleo não ramificado associado a dois segmentos.
Para o caso em discussão assumimos que no ditongo leve, duas vogais são associadas a uma única posição
esqueletal.
127
Outra evidência para analisar o glide pré-vocálico como parte de um ditongo leve, é
o comportamento fonológico do glide em posição inicial de palavra. O glide pode
comportar-se como vogal, ou como ditongo ou como consoante. Consideremos o dialeto
do português brasileiro carioca.
(61)
a. “as armas”
[az axma]
b. “os ossos”
[z s]
c. “os elefantes”
[z elefat]
d. “os bois”
[ bo]
e. “as vacas”
[a vak]
f. “os jatos”
[ at]
g. “os iates”
[z at]
h. “os iogurtes”
[z ouxt]
i. “os Uerequemas”
[z erekemas]
Vemos em (61 a-c), que antes de palavra iniciada em vogal o artigo definido plural
tem [z] como segmento final. Em (61 d-f), vemos que o segmento final do artigo definido
plural é [, ] antes de palavras que se iniciam por consoantes. Em (61 g-i), vemos que
quando ocorre uma seqüência de (glide+vogal) o segmento final do artigo definido plural é
[z], que é o mesmo segmento que ocorre quando a palavra se inicia em vogal. Concluímos
que glides pré-vocálicos comportam-se como vogais.
A última evidência para a silabificação dos glides pré-vocálicos, é o fato de que não
há restrição quanto a consoante que precede a seqüência glide e vogal. Qualquer consoante
pode preceder o glide. Concluímos que a melhor interpretação para o glide pré-vocálico é
como ditongo leve. Neste caso, o glide pré-vocálico é derivado de uma seqüência de
vogais. Pode ocorrer a alternância entre o glide e a vogal alta correspondente.
128
Resta-nos avaliar o glide pré-vocálico quando este não alterna com a vogal alta
correspondente. Estes são o caso de “estaciona” e “quase”, “guarda”. Assumimos que estes
dois casos representam um glide ocorrendo na representação lexical. Em formas com o
infixo –sion-, como em “estaciona” o glide pré-vocálico é parte da representação de um
ditongo leve que é definido lexicalmente (nos casos de “piada”, “cueca”, o glide é
derivado). Nos casos de “quase”, “guarda”, assumimos que o glide é parte da representação
de consoantes complexas que tipicamente apresentam restrições segmentais (que neste
caso se restringe às oclusivas velares). Consideramos a seguir os glides pós-vocálicos.
3.4.1.2 Os Glides pós-vocálicos
Os glides pós-vocálicos quando em posição pretônica podem ou não apresentar
alternância com a vogal alta correspondente. Considere (1).
(62)
a.“gaitista”
[atst]
*[aitist]
b.“Aimorés”
[amors]
*[aimors]
c. “saudade”
[sadad]
*[saudad]
d. “aurora”
[arr]
*[aurr]
e.“moicano”
[mokan]
~
[moikanu]
f. “vaidade”
[vadad]
~
[vaidad]
g. “reunião”
[hena]
~
[heunia]
h. “preocupação”
[prekpasa]
~
[prekpasa]
Observamos em (62 a-d), que o glide pós-vocálico não alterna com a vogal alta
correspondente. Nos (62 e-h), o glide pode alternar com a vogal alta correspondente.
Nestes casos, o glide encontra-se em posição pretônica. Neste trabalho, assumimos que as
palavras do grupo (62 a-d) apresentam ditongos lexicalmente definidos. Neste caso, os
129
glides pós-vocálicos estão presentes nas representações lexicais. O argumento para esta
abordagem é que não é permitida a alternância do glide com a vogal alta correspondente.
Assumimos nas palavras de (62 e-h), que o glide pós-vocálico é derivado de uma
seqüência de vogais. A alternância entre o glide e a vogal alta correspondente apóiam esta
abordagem.
Consideremos a seguir, os glides intervocálicos. Em posição postônica, os glides
intervocálicos podem ser silabificados como (63 a) onset, (63 b) ditongo leve, (63 c) coda
e (63 d), forma ambissilábica, como demonstram os diagramas a seguir. Sendo que quando
a vogal alta ocupa uma posição de onset ou outra que não seja a posição nuclear, é
foneticamente manifestada como um glide palatal (como em 15 a, c).
(63)
a. O
R
O
R
N
O
b.
R
N
x
x
x
x
x
s
a

a
s
c. O
R
O R
N C
d.
R
N
N
x
x
a
O
N
O
R

a
R
N
C
N
x
x
x
x
x
x
x
x
s
a

a
s
a

a
A primeira proposta, de assumir que o glide intervocálico encontra-se em onset,
permitiria que o acento caísse na penúltima posição nuclear antes do glide. Uma forma
130
como ''lácaio'' seria possível, o que de fato não ocorre. Quando o glide intervocálico
ocorre precedendo a vogal correspondente ao sufixo de gênero, o acento cai na vogal
imediatamente anterior ao glide: ''lacáio'' (Cristófaro Silva, 1992). Refutamos assim, a
hipótese de glide intervocálico em onset.
A segunda possibilidade, (63 b), é de que o glide intervocálico encontra-se em
ditongo leve. De maneira análoga ao caso da silabificação do glide intervocálico em
posição de onset, esperar-se-ia um padrão acentual como ''lácaio'' que, como já vimos, não
ocorre. Isso exclui a silabificação do glide intervocálico em ditongo leve.
A segunda possibilidade (63 b), é de glide em ditongo leve. Esta opção elimina a
possibilidade de interpretação de glide em posição marginal. Elimina também, a terceira
proposta (63 c), que pode ocorrer, de glide em coda. Tanto a possibilidade de glide em
coda quanto glide em ditongo leve, podem ocorrer. Portanto, a proposta que assumimos é a
proposta 68 d, como o glide ambissilábico, ou seja, o glide pode terminar uma sílaba ou
iniciar a próxima. Esta proposta engloba a proposta b e c ao mesmo tempo, portanto, sendo
a mais apropriada.
3.4.1.3 A Vogal alta longa
No português brasileiro, a vogal alta anterior longa [i] pode ocorrer em posição
tônica quando precede uma consoante oclusiva no final de sílaba e quando o primeiro
segmento da próxima sílaba também for uma consoante oclusiva (oral ou nasal) que, por
sua vez, é seguido de uma vogal epentética: [diin ], [abrupit].
131
As vogais longas são associadas a duas posições esqueletais (como os ditongos
pesados). Sugerimos que o alongamento da vogal no português brasileiro é decorrente de
um processo de alongamento compensatório. Ou seja, ao ocorrer a epêntese da vogal [i],
uma posição adicional ocorre na posição tônica. Este aspecto necessita de maior
exploração que no momento não pudemos investigar.
3.4.1.4 Conclusão
Vimos na análise das vogais altas e glides no português brasileiro, que muitas
generalizações podem ser feitas ao adotar o modelo da fonologia autossegmental. Dentre
estas generalizações, temos as motivações por um glide intervocálico em palavras como
“pia”, “rua”; evidências da estrutura silábica e do padrão acentual para a representação de
(glide+vogal) como ditongo leve como em ''família''; o estatuto de vogal de seqüências
(glide+vogal) no início de palavras como ''os iates''; interpretação como consoantes
complexas das seqüências de (oclusiva velar+glide) como em ''quase, guarda'' e a
interpretação de glides intervocálicos como segmentos ambissilábicos. Consideramos a
seguir, a análise das vogais altas e glides no inglês britânico.
3.4.2 As Vogais altas e os glides no inglês britânico
No inglês britânico, os segmentos vocálicos /i, u, , / ocupam sempre a posição
nuclear. As vogais longas constituem um núcleo pesado com duas posições esqueletais (cf.
(64 a)) e as vogais breves constituem um núcleo leve (cf. (64 b)). Sendo a duração ou
quantidade um fator importante na estrutura sonora do inglês, este modelo permite que este
132
fato seja fonologicamente representado. A representação das vogais longas e breves é
apresentada a seguir.
(64)
a.
R
b.
N
x
R
N
x
x
i

u

Podemos generalizar e afirmar que em inglês, somente as sílabas pesadas ocorrem
em final de sílaba. Explicamos porque as vogais longas (ditongos e sílabas com consoantes
pós-vocálicas) ocorrem em final de sílaba. Explicamos também, porque as vogais breves
não ocorrem em final de sílabas. Resumindo, podemos dizer que em inglês a sílaba deve
terminar com duas posições esqueletais (e excluímos assim as vogais breves dessa
posição). Se duas vogais ocorrem juntas no inglês, sempre temos um hiato ou seqüência de
duas vogais em sílabas distintas. Quando numa seqüência de vogais a primeira das duas
vogais é longa, há a redução da quantidade vocálica (Kreidler, 1989).
(65)
a. “neon"
[ni.n]
⇒
[ni.n]
b. “cruelty”
[kru.l.ti]
⇒
[kru.l.ti]
Considere a representação de “neon".
σ
(66)
O
σ
R
R
N
x
n
x
x
i
N
C
x
x

n
néon
crueldade
133
Podemos perceber em (66), que há três posições nucleares seguidas ou
consecutivas. Quando isso ocorre, a seqüência de elementos tende a ser reduzida em inglês.
Neste caso, ocorre a perda de uma posição esqueletal nuclear que pertence ao núcleo
pesado. Esta tendência de constituintes semelhantes não ocorrerem em posições adjacentes
nas representações fonológicas, que segue do o Princípio de Contorno Obrigatório (OCP)
(Roca & Johnson, 1999). Sugerimos que a redução da vogal longa no inglês é decorrente
da aplicação de OCP.
Posições nucleares em inglês podem ocorrer em seqüência em duas condições. A
primeira condição é quando as duas posições nucleares pertencem ao mesmo núcleo e
incluímos aqui, as vogais longas e os ditongos decrescentes. A segunda condição é quando
cada uma das posições nucleares pertence a sílabas distintas. As duas condições aplicam-se
com exclusividade: ou preserva-se a vogal longa ou restringe-se ao máximo que ocorra
somente duas posições nucleares consecutivas em sílabas distintas.
Em inglês, somente as vogais longas ocorrem em final de sílaba:
(67)
a. “sea”
[si]
mar
b. “spa”
[spa]
spa
c. “loo”
[lu]
jogo de cartas
d. “saw”
[s]
viu
Entretanto, em duas condições específicas vogais breves ocorrem no final de sílaba
ou palavra em inglês. O primeiro caso é quando em posição átona final (68).
(68)
a. “happy”
[hæpi]
feliz
b. “city”
[sti]
cidade
c. “argue”
[ju]
discutir
d.. “value”
[vælju]
valor
134
O segundo caso, é quando ocorre uma vogal alta seguida de outra vogal (69).
(69)
a. “react”
c. “actual”
[riækt]
[æktjul]
reagir
real
Para entendermos o primeiro caso, devemos levar em conta que o inglês é uma
língua sensível ao acento (Kreidler, 1989). Se ocorrer uma sílaba pesada (com vogal longa,
ditongo ou consoante pós-vocálica) o acento recai sobre ela. Quando consideramos as
palavras que têm uma vogal breve em final de palavra, verificamos que a grande maioria
destas palavras é formada com o sufixo –y: “happy”, “easy”, etc.30 Uma possibilidade, é
assumir que estas formas são lexicalmente marcadas e são formas que permitem vogais
breves em final de palavra.
Quanto aos ditongos decrescentes em inglês, estes são lexicalmente dados.
Considerando-se que o acento é sensível ao peso silábico, observamos que junto com
vogais longas e sílabas travadas os ditongos atraem o acento. Sendo assim, os ditongos
decrescentes são unidades lexicalmente estáveis e não derivados.
Os ditongos crescentes (“poor” [p] pobre, “tear” [t] lágrima “bear" [b] urso) e os
tritongos ([a] “tired” [tad] cansado, [a] “hour” hora , [e] “layer” [le]
camada, [o] “lower” [lo] mais baixo, [] “coyer” [k] mais modesto) do inglês
britânico, ocorrem como decorrência do cancelamento do “r” em final de sílaba. No
30
Em poucos casos não há evidências para um sufixo – como em “city” [sti] cidade – e nos poucos casos
em que uma [u] breve ocorre em final de palavra obviamente não temos o sufixo: “value” [vælju] valor,
“argue” [ju] discutir.
135
Modelo Autossegmental, o contexto consonantal de final de sílaba é denominado coda. As
codas são constituintes instáveis e o cancelamento do “r” neste contexto, pode ser
explicado como conseqüência da instabilidade dos segmentos na posição de coda.
Existem casos de (oclusiva+w) como em “queen” [kwin] rainha, “twelve”
[twlv] doze, “dwell” [dwl] morar. Neste caso, o glide /w/ é parte da consoante e são
interpretados como consoantes complexas pois há restrições segmentais. Nos casos em que
[j, w] ocorrem no início de palavra o glide é interpretado como ocupando uma posição
(consonantal) de onset. Pode-se explicar porque a forma do artigo indefinido será “a” para
palavras que se iniciam com consoantes e com os glides [j, w] e a forma do artigo
indefinido será “an” para palavras que se iniciam com vogal.
(70)
a. “a pear”
[ p]
uma pera
b. “a year”
[ j]
um ano
c. “a one-hour limit”
[ wn a lmt]
um limite de uma hora
d. “an apple”
[n æpl]
uma maçã
A forma do artigo indefinido em inglês demonstra que nos casos de (7 a-c), o onset
é preenchido ou com uma consoante ou um glide. Em (7 d), o onset é preenchido por
“n”que separa a vogal do artigo e a vogal do substantivo. Explicamos a ocorrência das duas
formas do artigo indefinido em inglês.
136
3.4.2.1 - Conclusão
Na análise do inglês britânico, pelo modelo de fonologia autossegmental, podemos
observar que assumindo a sílaba como constituinte e a relacionando com o padrão acentual
explicaremos que as sílabas pesadas atraem o acento, podemos expressar porque as sílabas
com vogais breves não ocorrem em final de palavra, os ditongos crescentes e os tritongos
se originam do cancelamento do “r” na posição de coda, explicamos o comportamento
análogo das consoantes e dos glides [j, w] em início de palavra. Um caso que não foi
tratado nesta discussão do inglês, é o da inserção do glide [j] entre algumas consoantes e a
vogal longa [u] como em “music” [mjuzk] música. Embora seja possível formalizar
este processo no modelo da fonologia autossegmental, não há motivação que o justifique.
3.4.2.2 Conclusão do modelo autossegmental
Nas páginas precedentes, foram apresentadas análises das vogais altas e glides no
português brasileiro e no inglês britânico pelo modelo da fonologia autossegmental. Neste
modelo, a sílaba é considerada uma unidade importante na análise fonológica. A atribuição
do acento está relacionada à estrutura acentual. Por incorporar a sílaba à análise, tivemos
ganhos em expressar as generalizações (sobretudo quanto a relação entre estrutura silábica
e padrão acentual no inglês) e oferecemos motivações para processos fonológicos (como
da alternância entre vogal+glide no português brasileiro). Apresentamos a seguir a análise
das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico, no modelo da
Otimalidade.
137
3.5 O Modelo teórico da otimalidade
3.5.1 Introdução
A discussão sobre as vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês
britânico a ser apresentada baseia-se nos trabalhos de Barlow & Gierut (1999); Cagliari
(1999); Lee (2001); Giangola (1998) e Monahan (2001). Proposta por Prince & Smolensky
em 1993 apud Barlow & Gierut (1999), a Teoria da Otimalidade, que daqui para frente
denominaremos TO, é a proposta teórica mais recente para explicar como a gramática
interna emerge da representação mental à representação de superfície. As representações
mentais, nesta teoria, são denominadas input e as representações de superfície output.
Os modelos anteriores à TO (modelos pós-Fonologia Gerativa) eram de natureza
derivacional, operados por regras que geravam as representações de superfície. Diferente
dos modelos anteriores, a Teoria da Otimalidade não formula regras, mas estabelece
restrições. Estas restrições são escalonadas em uma certa ordem determinando o output
mais ótimo31 em relação à gramática de cada língua em estudo, como resultado final do
input inicial (Cagliari, 1999).
A TO propõe restrições que entram em conflito, deixando apenas a melhor opção
de output. A relação entre input e output32 são mediadas por duas entidades em TO: o GEN
e o EVAL. O GEN gera para cada forma de input, uma gama de candidatos possíveis para
output. O avaliador (EVAL) escolhe o output mais ótimo ao considerar um grupo de
31
Usaremos o recurso de fonte itálico para indicar a forma selecionada como ótima pela TO.
Utilizaremos os termos input e output e não suas respectivas traduções (entrada e saída) por serem estes
termos técnicos.
32
138
restrições universais (CON). O output ótimo é aquele que viola menos restrições
(Karttunem, 1998).
Abaixo, um esquema da gramática segundo a Teoria da Otimalidade, onde o input é
a palavra inglesa “cat”. O GEN gera outputs como [kæt], [kæt], [kæ], [tæ], [æt],
assim como [bb] e [mu]. É função do EVAL determinar que candidato é mais ótimo de
acordo com a gramática inglesa. A representação mais harmônica é [kæt], que é
representado abaixo como o output, por violar menos restrições.
/kæt/
Representação do input
GEN
kæt
kæt
kæ
tæ
æt
bb
mu
etc.
candidatos
EVAL
(restrições)
[kæt]
FIGURA 16 - Diagrama da teoria da otimalidade
FONTE - ARCHANGELLI, 1997. p. 1484
Representação do output
139
As restrições podem ser de dois tipos, de marcação e de fidelidade. As restrições de
fidelidade asseguram que as representações de output sejam semelhantes às de input.
Portanto, as restrições de fidelidade impedem que palavras como [bb] e [mu] sejam
escolhidas como as mais ótimas para o input /kæt/. As restrições de marcação requerem
que as formas de output não sejam marcadas em estrutura. As propriedades não marcadas
das línguas são aquelas que são consideradas as mais básicas nas línguas naturais, por
estarem presentes em todas, ou quase todas as gramáticas. No entanto, todas as formas de
input devem ser processadas (parsing). “Parse” significa que um segmento da
representação do input emerge na representação de output. Abaixo, alguns exemplos de
restrições de fidelidade e marcação (MacCarthy & Prince, 1995 apud Barlow & Gierut,
1999):
MAX: Os segmentos no input devem corresponder aos segmentos no output.
(Sem apagamento). Dado o input /kæt/ e se seu output for [kæ], esta forma
viola a restrição MAX, pois o segmento /t/ não foi processado.
DEP: Os segmentos no output devem corresponder aos segmentos no input. (Sem
inserção). O output [kæt] viola esta restrição, pois o [] do output não faz parte da
representação do input.
IDENT [TRAÇOS]: Os traços de ponto e modo de articulação e vozeamento dos
segmentos do input devem chegar à superfície nos segmentos correspondentes no output.
A forma [bb] viola esta restrição de fidelidade aos traços. Pois, a oclusiva velar
desvozeada /k/ no input ocorre como uma oclusiva bilabial vozeada /b/ no output. A
vogal baixa anterior não arredondada
[æ] no input é uma vogal média posterior
arredondada [] no output. Estas “infidelidades” nos pontos de articulação dos segmentos
constituem violações de restrições como IDENT-PONTO e IDENT-VOZEAMENTO.
Estas restrições exigem que os traços manifestem-se no output.
*COMPLEX: Evite encontros consonantais.
É importante salientar que MAX e DEP são restrições de fidelidade segmental e a
IDENT é de fidelidade de traços. As restrições de marcação requerem que os outputs sejam
140
estruturalmente não marcados. A restrição *COMPLEX proíbe outputs estruturalmente
marcados. A marcação refere-se à complexidade de uma estrutura com relação a uma outra
estrutura. Há uma relação de marcação entre encontros consonantais e consoantes isoladas.
Todas as línguas permitem a forma de consoante isolada, mas nem todas as línguas
permitem a ocorrência de encontros consonantais.
A relação entre as restrições de fidelidade e de marcação depende da sua
violabilidade. Nem todas as restrições são plenamente satisfeitas. Porém, as restrições de
fidelidade podem ser violadas para satisfazer restrições de marcação altas no
escalonamento. Pode também, ser que as restrições de marcação sejam violadas para
satisfazer restrições de fidelidade altas no escalonamento. As restrições são consideradas
parte da Gramática Universal. Porém, uma restrição pode ter um ranqueamento alto em
uma língua, mas baixo, em outra língua.
A TO é uma teoria lingüística aplicável a todos os níveis da gramática não só ao
nível fonológico. Embora tenha sido muito aplicada aos estudos fonológicos, atualmente
está sendo aplicada em outras áreas, sobretudo na sintaxe. Podemos observar que a TO é
um modelo simples, porém, as possibilidades de aplicação são tão grandes que a tornam
um modelo complexo.
3.5.2 Formalismo da teoria da otimalidade
Analisaremos a seguir, uma língua hipotética. Nesta língua, a restrição hipotética
*D tem ranqueamento mais alto em relação a outra restrição de fidelidade. A restrição de
marcação proíbe a ocorrência do segmento [D], enquanto a restrição de fidelidade exige
141
que [D] ocorra no output, uma vez que ocorre no input. O ranqueamento destas duas
restrições pode ser formalizado como em (71):
(71)
Língua Hipotética 1: *D>>Faith-D
O tableau33 (TAB. 13) a seguir, mostra o input /ABCD/ da língua hipotética na
primeira célula superior à esquerda. Os possíveis candidatos fornecidos pelo GEN estão
nas células abaixo do input. O GEN fornece um número infinito de candidatos, porém
apenas dois são indicados no tableau para ilustrar o caso em questão. As restrições estão
ranqueadas nas células da coluna do meio, de cima para baixo. O asterisco indica violações
nas restrições pelos candidatos. Algumas são fatais, a ponto dos candidatos serem
excluídos. Esta violação fatal é simbolizada por (*!). O símbolo ☺ que será utilizado para
indicar o candidato ótimo.
Língua Hipotética 1: /ABCD/
[ABC]
TABELA 13
Tableau da língua hipotética
a.
b.
☺
/ABCD/
*D
ABCD
*!
ABC
FAITH-D
*
FONTE - BARLOW & GIERUT, 1999. p. 1485
Sendo o ranqueamento *D>>Faith-D, podemos afirmar que a restrição de [D] no
output é ranqueada mais alta do que a fidelidade de [D]. Sendo assim, a violação de *D é
fatal. A violação de Faith-D ocorre, mas como esta restrição é ranqueada abaixo de *D a
33
O termo “tableau” será utilizado neste trabalho.
142
forma ABC é escolhida como ótima. A próxima seção fará uma análise das vogais altas e
glides no português brasileiro, utilizando a TO.
3.5.3 Análise das vogais e glides no português brasileiro pela teoria da otimalidade
Esta análise está baseada em dados discutidos nos artigos de Giangola (1997),
“Constraint interaction and Brazilian Portuguese glide distribution” e na monografia de
Monahan (2001), “Evidence of transference and emergence in the interlanguage”.
Faremos uma análise crítica comparativa destes trabalhos, por este motivo nem todos os
casos analisados anteriormente, estão presentes. Devido à complexidade e profundidade da
TO, escolhemos fazer apenas a revisão dos trabalhos de Giangola e Monahan . Caso
contrário, este trabalho iria muito além dos seus objetivos.
Giangola (1997), em seu trabalho, primeiramente divide os dados em três grupos:
alternância vogal-glide, consoante-glide, e epêntese de glide. Os dados são do dialeto
baiano falado em Salvador, Bahia. Este autor assume que a sílaba no português é
constituída por onset (Consoante+Consoante), núcleo (Vogal ou glide) e na coda somente
as consoantes /L, R, N, S/ são permitidas. Sendo o onset e a coda opcionais e o núcleo
sempre presente e obrigatoriamente constituído por uma vogal.
Giangola (1997), afirma que onsets são opcionais em termos de distribuição, como
em “lua”. Fato que resulta o ranqueamento superior de DEP34 sobre a exigência de que
34
DEP: Todo elemento do output é um elemento do input, ou seja, é proibida a epêntese, (Cagliari, 1999).
143
todas as sílabas devam ter onsets, como demonstra a distribuição abaixo. Os exemplos
“pia” e “rua” também se encaixam nesta análise de duas vogais VV, em hiato.
No tableau abaixo, (TAB. 14) apresentamos a análise da palavra “lua”. O input
/lua/ para não violar DEP, deve surgir no output com todos os seus elementos. O primeiro
candidato, [lu.a] viola a restrição ONSET, pois a segunda sílaba não contém um onset. O
segundo candidato, [lu.wa], viola DEP pois existe a inserção de um segmento na segunda
sílaba. A primeira opção é a ótima, pois a violação da restrição onset é menos grave que a
violação de restrição DEP.
TABELA 14
Tabela da representação de “lua”
/lua/
☺
DEP
a) lu.a
b)lu. a
ONSET
*
*!
FONTE - GIANGOLA, 1997. p. 148
O table au seguinte, (TAB. 15), há a análise da seqüência VG. Demonstra-se a
preferência de silabificação VG sobre VV. O ranqueamento é o mesmo do caso acima, em
que resulta em sílabas sem onsets. DEP>>ONSET. A epêntese é também proibida. Os
exemplos “aimorés” e “seiva”, também podem seguir a mesma análise apresentada para
“pai” em (5).
144
TABELA 15
Tableau da representação de “pai”
/pa/
☺
DEP
ONSET
a) pai
b) pa.i
c) pa. i
*!
*!
FONTE - GIANGOLA, 1997. p. 149
A análise para seqüências de vogal+glide ilustrada acima, explica casos como
“pai”, “Aimorés”, “seiva”, “pau”, “saudade”, “causa”. Contudo, há problemas em explicar
quando ocorre a alternância entre vogal+glide e seqüência de vogais em posição pretônica,
como em “vaidade”, “reunião”.
O output com uma seqüência de vogais é o selecionado como ótimo. Giangola
(1997), não explica a alternância entre a seqüência de vogais altas e glides e apenas indica
que a forma com o hiato é a selecionada. Glides intervocálicos, como em “saia”, não são
abordados por Giangola (1997). Contudo, podemos supor que este autor os interpreta como
uma seqüência de vogal+glide seguido de vogal. Casos com as consoantes complexas,
como em “quase”, “guarda”, também não são discutidos por este autor. Casos com
ditongos pré-vocálicos, como em “estaciona”, devem ser assumidos como estando
presentes no input, embora este caso também não seja abordado.
Como podemos observar nos casos discutidos anteriormente, a Teoria da
Otimalidade explica a ocorrência de hiatos (“pia, lua, piada, cueca”) e os casos dos
ditongos decrescentes (“pai, causa”). Estes casos são analisados com um mecanismo
145
simples de ranqueamento de restrições. Um dos problemas da análise de Giangola (1997) é
não considerar a alternância entre glides e vogais altas correspondentes em posição
pretônica (“piada”, “cueca”, “Maisena”, “reunião”). De fato, a análise da variação ou de
formas alternantes é um problema para a TO. Contudo, têm sido desenvolvidas muitas
pesquisas nesta área. A seguir, consideramos a análise das vogais altas e glides no inglês
britânico.
3.5.4
Análise das vogais e glides no inglês britânico pela teoria da otimalidade
A análise do inglês pela TO neste trabalho, faz uma revisão dos trabalhos de Monahan
(2001) e Green (2001). Monahan (2001), analisa a estrutura silábica no inglês e Green
(2001) discute as vogais do inglês.35 Detemo-nos ao trabalho de Green (2001), que está
relacionado com o tema deste trabalho.
Green (2001), descreve as vogais do inglês como tendo a distinção entre vogais tensas
e frouxas (tense e lax). Tensão e duração geralmente co-ocorrem no inglês, ou seja, as
vogais frouxas são breves e as vogais tensas são longas. As vogais tensas-longas podem
ocorrer em sílabas finais e as vogais frouxas-breves não.
A proposta de Green é de que o pé binário (FTBIN), exige que os pés tenham no
mínimo duas moras. A restrição, TNS< - >μ determina que as vogais sejam tensas quando
bimoraicas.
35
Apesar do fato deste trabalho pesquisar o RP, utilizaremos os trabalhos destes autores que se baseiam no
GA (“General American”). Contudo, nos casos analisados não é relevante a distinção dialetal.
146
Green (2001), propõe que sílabas abertas, FTBIN e TNS< - >μ permitem apenas
vogais tensas em seu output. As vogais altas [,] e [i, u] não contrastam neste
ambiente, pois as vogais frouxas [,] não ocorrem em final de sílaba ou em sílabas
abertas no inglês. Portanto, não importa qual dos dois segmentos aparece no input, pois
apenas a vogal tensa [i] vai aparecer na forma de output. A tableau abaixo (TAB. 16)
analisa a palavra “see”.
TABELA 16
Tableau da representação de “see”
(α) /s/
TNS<->μ
FTBIN
(β) /s/
s
α
*!
s
si
☺
*!
*!
si
IDENT (tenso)
*
β*
α
β*
α*
β
α*
β
FONTE - GREEN, 2001. p. 13.
As vogais longas e ditongos são associados a duas moras. Esta restrição é violada
quando as vogais tensas são átonas. As vogais tensas átonas podem ocorre em posição
postônica como em “pretty” /prti/ bonito, ou podem ocorrer em hiato (“radio”
[redio] rádio, “actual” [æktjul] real).
147
A análise de Green (2001), não discute os casos em que o glide [j] ocorre entre uma
consoante e a vogal [u], como em “music” [mjuzk] música. Estes casos são problemas
para as análises pelos modelos fonêmico, gerativo e autossegmental. Este é um caso que
envolve variação e os ambientes estruturais não estão bem delimitados (cf. Harris (1994)).
3.5.5 Conclusão geral
A TO permite análise do componente sonoro através do ranqueamento de restrições
que expressam o comportamento das estruturas sonoras das línguas naturais. Além de
expressar as marcações encontradas nas línguas a TO oferece um mecanismo de
formalização bastante simples e de fácil visualização. Um dos problemas da TO é a
interpretação da variação.
148
4. CONCLUSÃO
Esta dissertação teve por objetivos específicos:
•
Descrever foneticamente as vogais altas e glides no português brasileiro e inglês
britânico em termos articulatórios e acústicos, explicitando seus ambientes de
ocorrência e identificando o comportamento destes segmentos na estrutura silábica.
•
Descrever e avaliar o comportamento fonológico das vogais altas e glides no
português brasileiro e no inglês britânico.
•
Analisar a pertinência e adequação de quatro modelos fonológicos para a análise
das vogais altas e glides no português brasileiro e no inglês britânico.
O Capítulo 2 deste trabalho apresentou a descrição fonética proposta. Podemos
concluir que o inventário sonoro referente às vogais altas e glides do inglês britânico e do
português brasileiro é idêntico, apresentando os segmentos: [i, i, , u, u, , j, w]. Há
particularidades articulatórias que foram apontadas para cada língua. Há também
particularidades da distribuição dos segmentos nas duas línguas.
O Capítulo 3 deste trabalho apresentou a descrição fonológica proposta. Discutimos as
vogais altas e glides do inglês britânico e do português brasileiro. Dentre as vogais altas e
glides no português brasileiro, temos como segmentos fonológicos /i, u, j, w/. Os sons
[i, , u, ] ocorrem como variantes (ou alofones em termos fonêmicos) em condições
149
específicas. Dentre as vogais altas e glides no inglês britânico, temos como segmentos
fonológicos /i, , u, , j, w/. Os sons [i, u] ocorrem como variantes (ou alofones em
termos fonêmicos) em condições específicas.
Concluindo, podemos dizer que os glides /j, w/ têm estatuto fonológico de consoante
nas duas línguas. Exemplos do português são: “estaciona”, “quase”, “guarda”. Exemplos
do inglês são: “year” ano, “water” água, “music” música, “queen” rainha, “twice” duas
vezes. Quanto às vogais altas, temos uma troca entre os inventários fonéticos e fonológicos
nas duas línguas, como mostra a TAB. 18.
TABELA 17
Inventários fonéticos e fonológicos das vogais altas no português brasileiro e no inglês britânico.
Fonético
fonológico
Português brasileiro
/i, , u, /
/i, u/
Inglês britânico
/i, u/
/i, , u, /
As vogais tensas breves /i, u/ têm estatuto fonológico no português (ou fonemas) e
operam como variantes (ou alofones) em inglês. Já as vogais /i, , u, /, têm estatuto
fonológico no inglês e operam como variantes (ou alofones) em português.
Quanto à adequação dos modelos fonológicos, podemos dizer que cada proposta
teórica contribui para a melhor compreensão do comportamento das vogais altas e glides
nas línguas em estudo. Espera-se que as discussões apresentadas nesta dissertação, possam
150
contribuir para que profissionais que trabalham com o ensino e aprendizagem de segunda
língua compreendam melhor os sistemas sonoros do inglês britânico e do português
brasileiro, sobretudo quanto ao comportamento das vogais altas e glides.
151
5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1
ABERCROMBIE, David. Elements of general phonetics. Edinburgh: Edinburgh
University Press, 1967. 203 p.
2
ARCHANGELLI, Diana. Optimality theory: an introduction to linguistics in the
1990s. In: ______ ; LANGENDOEN, D. Terence. Optimality theory an overview.
Malden, Mass.: Blackwell, 1997. (Explaining linguistics, 1). apud BARLOW,
Jessica; GIERUT, Judith A. Optimality theory in phonological acquisition. Journal
of Speech Language and Hearing Research, Rockville, v. 42, n. 6, p. 1482-1498,
dec. 1999.
3
AZEVEDO, Milton M. A contrastive phonology of Portuguese and English.
Washington, D. C.: Georgetown University Press, 1981. 113 p.
4
BARLOW, Jessica; GIERUT, Judith A. Optimality theory in phonological
acquisition. Journal of Speech Language and Hearing Research, Rockville, v. 42,
n. 6, p. 1482-1498, dec. 1999.
5
BIONDO, Delson. O estudo da sílaba na fonologia auto-segmental. Revista de
Estudos da Linguagem, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 37-51, jan.-jun. 1993.
6
BISOL, Leda. O acento e o pé métrico binário. Cadernos de Estudos Lingüísticos,
Campinas, n. 22, p. 59-80, 1992.
7
BISOL, Leda O ditongo na perspectiva da fonologia atual. Delta, São Paulo, v. 5,
n. 2, p. 185-224, 1989.
152
8
BLOOMFIELD, L. Language. New York: Henry Holt, 1933. apud BIONDO,
Delson. O estudo da sílaba na fonologia auto-segmental. Revista de Estudos da
Linguagem, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 37-51, jan.-jun. 1993.
9
BONILHA,
Giovana
Ferreira
Gonçalves.
Aquisição
dos
ditongos
orais
decrescentes: uma análise à luz da teoria da otimidade. 2000. 236 f. Dissertação
(Mestrado em Letras) - Universidade Católica de Pelotas, Escola de Educação,
Pelotas.
10
BORBA, Francisco da Silva. Introdução aos estudos lingüísticos. 12. ed.
Campinas: Pontes, 1998. 316 p.
11
BROWN, H. Douglas. Teaching by principles: an interactive approach to language
pedagogy. Englewood Clifs: Prentice Hall, 1994. 467 p.
12
CAGLIARI, Luiz Carlos. Análise fonológica: introdução à teoria e à prática com
especial destaque para o modelo fonêmico. Campinas. Ed. do autor, 1997. 119 p.
(Espiral. Série lingüística, 1).
13
______. Elementos de fonética do português brasileiro. 1981. 185 f. Tese (Livredocência) - Unicamp, Departamento de Lingüística, Campinas.
14
______; MASSINI-CAGLIARI, G. Quantidade e duração silábicas em português
do Brasil. Delta, São Paulo, v. 14, n. esp., p. 47-59, 1998.
15
______. Apresentação sucinta da teoria da otimalidade na fonologia. (apostila de
curso não editada). Unicamp, 1999.
16
______. Fonética. In: MUSSOLINI, F.; BENTO, A. C. (Org.). Introdução à
lingüística - domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. v. 1, p. 105-146.
153
17
CALLOU, Dinah; LEITE, Yonne Iniciação à fonética e à fonologia. Rio de
Janeiro: J. Zahar, 1990. 125 p.
18
______.; ______; MORAES, João A. O vocalismo do português do Brasil:
caracterização acústica. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 31, n. 2, p. 27-40, jun.
1995.
19
CÂMARA JÚNIOR, J. Mattoso. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis:
Vozes, 1970. 114 p.
20
CATFORD, John Cunnison. Fundamental problems in phonetics. Bloomington:
Indiana University Press, 1977. 278 p.
21
_______. A Practical introduction to phonetics. Oxford: Clarendon Press, 1988.
apud CALLOU, Dinah; LEITE, Yonne; MORAES, João A. O vocalismo do
português do Brasil: caracterização acústica. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 31, n.
2, p. 27-40, jun. 1995.
22
CHOMSKY, Noam; HALLE, Morris. The sound pattern of English. New York:
Harper & Row, 1968. 470 p. (Studies in language).
23
CLARK, John; YALLOP, Colin. An introduction to phonetics and phonology.
Oxford, UK: B. Blackwell, 1990. 400 p.
24
CLEMENTS, G. N. & KEYSER S. J. CV phonology. Cambridge: MIT Press, 1983.
25
COLLISCHONN, Gisela. A sílaba em português. In: BISOL, Leda (Org.)
Introdução aos estudos de fonologia do português brasileiro. 2. ed. Porto Alegre,
EDIPUCRS, 1996. p. 95-130
154
26
COUTO, Hildo H. As seqüências qu- e gu- mais vogal. Revista de Estudos da
Linguagem, Belo Horizonte, v. 2, n. 4, p. 35-43, jul.-dez. 1996.
27
CRISTÓFARO SILVA, Thaïs. Fonética e fonologia do português: roteiro de
estudos e guia de exercícios. São Paulo: Contexto, 1999a. 254 p.
28
______. A interpretação de glides intervocálicos no português. Letras de Hoje,
Porto Alegre. v. 31, n. 2, p. 169-176, 1996.
29
______. O método das vogais cardeais e as vogais do português brasileiro. Revista
de Estudos da Linguagem, Belo horizonte, v. 8, n. 2, p. 127-151, jul.-dez. 1999b.
30
______. Nuclear phenomena em Brazilian Portuguese. 1992. 134 f. Tese
(Doutorado) - University of London, Department of Phonetics and Linguistics,
London.
31
______. The phonological representation of velar stop-glide sequences. In: SOAS
working papers in linguistics and phonetics 2. London: University of London,
School of Oriental and African Studies, Dept. of Phonetics and Linguistics, 19911992. p. 315-338.
32
CRYSTAL, David. The Cambridge encyclopedia of the English language.
Cambridge: Cambridge University Press, 1995. 489 p.
33
______. The Cambridge encyclopedia of language. Cambridge: Cambridge
University Press, 1997. 480 p.
34
FUDGE, Erik C. (Ed.) Phonology: selected reading. Harmondsworth, Midd.:
Penguin, 1973. 383 p. (Penguin modern linguistics reading).
155
35
GIANGOLA, James P. Constraint interaction and Brazilian Portuguese glide
distribution. NELS, v. 27, p. 143-157, 1997.
36
GIMSON, A. C. An introduction to the pronunciation of English. 2. ed. London: E.
Arnold, 1970. 320 p.
37
GOLDSMITH, John A. Autosegmental and metrical phonology. Oxford, UK: B.
Blackwell, 1990. 376 p.
38
GREEN, A. D. The tense-lax distinction in English vowels and the role of parochial
and
analogical
constraints.
Available
from
<http://roa.rutgers.edu/view.php3roa=464> . 2001.
39
HALLE, Morris; CLEMENTS, G. N. Problem book in phonology: workbook for
introductory courses in linguistics and in modern phonology. Cambridge: MIT
Press, 1994. 196 p.
40
HARRIS, John. English sound structure. Oxford, UK: Blackwell, 1994. 316 p.
41
HARRIS, J. W. Syllable structure and stress in Spanish. Cambridge: MIT Press,
1983.
42
HOOPER, J. B. The syllable in phonological theory. Language 48, 1972.
43
HYMAN, Larry M. Phonology: theory and analysis. New York: Holt, Rinehart and
Winston, c1975. 268 p.
156
44
IOUP, Georgette; WEINBERGER, Stephen H. (Ed.) Interlanguage phonology: the
acquisition of a second language sound system. Cambridge, Mass.: Newbury,
c1987. 423 p. (Series on issues in second language research).
45
JAKOBSON, R.; FANT, G. & HALLE, M. Preliminaries to speech analysis: the
distinctive features and their correlates. Cambridge: MIT Press, 1952.
46
JONES, Daniel. The pronunciation of English. 4th ed., rev. and enl. Cambridge,
UK: Cambridge University Press, 1969. 223 p.
47
______. English pronouncing dictionary. 15th ed. Cambridge: Cambridge
University Press, 1997. 559 p.
48
JONES, W. E.; LAVER, J. (Ed.) Phonetics in linguistics: a book of readings.
London: Longman, 1973. 345 p. (Longman linguistics library, 12).
49
KAHN, D. Syllable-based generalizations in English phonology. 1976. Tese
(doutorado) – MIT, New York.
50
KARTTUNEM, Lauri. The proper treatment of optimality in computational
pronology.
Xerox
Resarch
Centre
Europe.
Available
from
<http//epine.Xerox.fr/publis/mltt/pto/node9.html. 1998.
51
KAYE, Jonathan. Phonology: a cognitive view. Hillsdale: L. Erlbaum, 1989. 172 p.
(Tutorial essays in cognitive science).
52
KATAMBA, Francis. An introduction to phonology. London: Longman, 1989. 328
p. (Learning about language).
157
53
KENSTOVICZ, Michael J. Phonology in generative grammar. Cambridge, Mass,
Blackwell, 1994. 704 p. (Blackwell textbooks in linguistics).
54
KEYS, Kevin. Discourse level phonology in the language curriculum: a review of
current thinking in teaching pronunciation in EFL courses. Linguagem & Ensino,
Pelotas, v. 3, n. 1, p. 89-105, 2000.
55
KREIDLER, Charles W. The pronunciation of English: a course book in
phonology. Oxford, UK: B. Blackwell, 1989. 335 p.
56
LADEFOGED, Peter. A course in phonetics. 3rd ed. London: Hartcourt Brace &
Jovanovich, 1982. 300 p.
57
______. Elements of acoustic phonetics. 2nd ed. Chicago: University of Chicago
Press, 1996. 216 p.
58
______; MADDIESON, Ian. The sounds of the world's languages. Oxford, UK:
Blackwell, 1996. 425 p. (Phonological theory).
59
LASS, Roger. Phonology: an introduction to basic concepts. Cambridge:
Cambridge University Press, 1984. 362 p. (Cambridge textbooks in linguistics).
60
LAVER, John. Principles of phonetics. Cambridge, UK: Cambridge University
Press, 1994. 707 p.
61
LEE, Seung-Hwa. A regra do acento em português: outra alternativa. Letras de
Hoje, Porto Alegre, v. 29, n. 4, p. 37-42, 1994.
158
62
______. Teoria da otimalidade e silabificação do PB. Belo Horizonte: Faculdade
de Letras da UFMG, 2001. 13 p.
63
LIGHTBOWN, Patsy; SPADA, Nina. How languages are learned. Oxford, UK:
Oxford University Press, 1993. 135 p. (Oxford handbooks for language teachers).
64
MCARTHUR, Tom (Ed.). The Oxford companion to the English language. Oxford:
Oxford University Press, 1992. 1184 p.
65
MACCARTHY, John & PRINCE, Allan. Faithfulness and reproductive Identity. In
Beckman, Dickey and Urbanczyk (org.). Papers in optimality theory. University of
Massachusetts Occasional Papers, 18. Amherst: GLSA, 1995. 249-384.
66
MADDIESON, Ian. 1984a. Patterns of sounds. Cambridge: Cambridge University
Press, 1984a. apud LADEFOGED, Peter; MADDIESON, Ian. The sounds of the
world's languages. Oxford, UK: Blackwell, 1996. 425 p. (Phonological theory).
67
MAJOR, Roy C. Stress and rhythm in Brazilian Portuguese. Language Journal of
the Linguistics Society of America, Baltimore, v. 61, n. 2, p. 259-283, jun. 1985.
68
MALMBERG, B. A Fonética. Lisboa: Livros do Brasil, 1954. p. 115-122. apud
BIONDO, Delson. O estudo da sílaba na fonologia auto-segmental. Revista de
Estudos da Linguagem, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 37-51, jan.-jun. 1993.
69
MARTINS, M. R. Delgado. Análise acústica das vogais orais tônicas em português.
Boletim de Filologia, v. XXIII, n. 3-4, p. 303-314, 1973. apud CALLOU, Dinah;
LEITE, Yonne; MORAES, João A. O vocalismo do português do Brasil:
caracterização acústica. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 31, n. 2, p. 27-40, jun.
1995.
159
70
MASSINI-CAGLIARI, Gladis. Em busca dos parâmetros do ritmo do português
arcaico. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 29, n. 4, p. 101-112, 1994.
71
MONAHAN, Philip J. Evidence of transference and emergence in the
interlanguage. Miami: University of Florida, 2001. 51 p.
72
MORI, Angel C. Fonologia: introdução à lingüística - domínios e fronteiras. In:
MUSSOLINI, F.; BENTO, A. C. (Org.). Introdução à lingüística - domínios e
fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. v. 1, p. 147-179.
73
O'CONNOR, J. D. Better English Pronunciation. Cambridge: CUP, 1980. 150 p.
74
_______. Phonetics. Baltimore: Penguin, 1973. 320 p.
75
PICKET, J. M. The acoustics of speech communication: fundamentals, speech
perception, theory and technology. Boston: Allyn and Bacon, c1999. 404 p.
76
PIKE, Kenneth Lee. Phonemics: a technique for reducing languages to writing. Ann
Arbor: The University of Michigan Press, 1947. 254 p.
77
PIKE, Kenneth Lee. Phonetics: a critical analysis of phonetic theory and a technic
for the practical description of sounds, Ann Arbor: The University of Michigan
Press, c1943. 182 p. (University of Michigan Publications. Language and
Literature, 21).
78
ROACH, Peter. English phonetics and phonology: a practical course. 2nd ed.
Cambridge: Cambridge University Press, 1991. 262 p.
160
79
ROCA, Iggy; JOHNSON, Wyn. A course in phonology. Oxford, UK: Blackwell,
1999. 725 p.
80
______. Generative phonology. London: Routledge, 1994. 307 p. (Linguistic theory
guides).
81
SCHANE, Sanford A. Generative phonology. Englewood Cliffs, N.J.: Prentice
Hall, 1973. 127 p. (Foundations of modern linguistics).
82
SELINKER, Larry. Rediscovering interlanguage. London: Longman, 1992. 288 p.
(Applied linguistics and language study).
83
SMALL, Larry. Fundamentals of phonetics: a practical guide for students. Boston:
Allyn & Bacon, 1999. 360 p.
84
SPENCER, Andrew. Phonology theory and description. Oxford: Blackwell, 1996.
322 p. (Introducing linguistics, 1).
85
STEINBERG, Martha. Pronúncia do inglês norte-americano. 3. ed. São Paulo:
Ática, 1995. 80 p. (Princípios).
86
STETSON, Raymond Herbert. Motor phonetics. In: ARCHIVES neérlandaises de
phonétique expérimentale. 2nd. ed. Amsterdam: The Hague, 1951.
87
TRASK, R. L. A dictionary of phonetics and phonology. London: Routledge,
c1996. 424 p. (Linguistics/Reference).
161
88
WELLS, J. C. A Study of the formants of the pure vowels of British English. 1962.
Dissertação (Mestrado) – University of London, London.
89
WETZELS, W. Leo. Consoantes palatais como geminadas fonológicas no
português brasileiro. Revista de Estudos da Linguagem, Belo Horizonte, v. 9, n. 2,
p. 5-15, jul.-dez. 2000.
[email protected]

Documentos relacionados