I Curso de Férias em Fisiologia

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I Curso de Férias em Fisiologia
I Curso de Férias em
Fisiologia - UECE
Realização: Instituto Superior de Ciências Biomédicas
Mestrado Acadêmico em Ciências Biológicas
Apoio:
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Trato Gastrointestinal
Laboratório de Fisiologia Experimental
Digestão e Absorção
1. Conceito
A. Digestão: Processo no qual as moléculas ingeridas são convertidas para formas
que podem ser absorvidas pelas células epiteliais do trato gastrointestinal.
B. Absorção: Processo no qual as moléculas são transportadas através das células
epiteliais que revestem o trato gastrointestinal para penetrarem no sangue ou na
linfa. Ocorre por transporte ativo e/ou por difusão.
2. Base Anatômica da Absorção
Existem milhões de pequenas vilosidades que se projetam cerca de 1mm acima da
superfície da mucosa, elas aumentam cerca de 10 vezes a área absortiva. Válvulas
Coniventes: pregas da mucosa intestinal, que aumentam em 3 vezes a área da mucosa.
As células epiteliais na superfície das vilosidades são caracterizadas por terem borda em
escova, consistindo em até 1000 microvilosidades, que aumentam 20 vezes a área
exposta ao conteúdo intestinal. Assim a combinação de válvulas coniventes com as
vilosidades e as microvilosidades aumenta a área de absorção da mucosa talvez em
outras 1000 vezes, resultando em uma área total muito grande, 250 ou mais metros
quadrados, para todo o intestino delgado.
O sistema vascular tem disposição adequada para a absorção de líquidos e
substâncias dissolvidas para o sangue porta e a disposição do vaso quilífero central para a
absorção pelos linfáticos.
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Fig. 1 - Esquema ilustrativo da mucosa intestinal
3. Digestão dos Carboidratos
 Principais carboidratos da dieta:
 Amido (polissacarídeo) - alimentos não-animais, principalmente nos cereais
 Sacarose (dissacarídeo) - açúcar da cana-de-açúcar
 Lactose (dissacarídeo) - leite
 Outros carboidratos: amilose, glicogênio, álcool, ácido láctico, ácido pirúvico,
pectinas, dextrinas.
 Celulose: carboidrato não absolvido pelo organismo humano
Os únicos monossacarídeos dietéticos quem são bem absorvidos são: glicose,
galactose e frutose.
Os carboidratos são digeridos até seus monossacarídeos
constituintes, enzimas específicas combinam Hidrogênio e radicais hidroxilas, derivados da
água, com os poli e dissacarídeos e desse modo, separam os monossacarídeos uns dos
outros. Esse processo é denominado hidrólise: R´-R´´ + H2O ----> R´H + R´´OH.
A digestão do amido começa na boca com a ação da alfa-amilase (Ptialina), que
hidrolisa o amido, quando o alimento chega ao estômago, a alfa-amilase é inativada pelo
ácido gástrico (pH menor que 4,0). A alfa-amilase pancreática é muito ativa, completando
este
processo.
Originam
principalmente
maltose.
A
digestão
subsequente
dos
oligossacarídeos é realizada por enzimas denominadas oligossacaridases localizadas na
membrana da borda-em-escova do epitélio do duodeno e jejuno: lactase, sacarase,
3
maltase (glico-amilase), alfa-dextrinase.O duodeno e o jejuno proximal tem a mais alta
capacidade de absorver os açúcares.
Síndromes de Disabsorção dos Carboidratos
 Síndrome de disabsorção de Lactose
- Deficiência de lactase
 Intolerância congênita à Lactose
- Deficiência de sacarase
 Síndrome de disabsorção de glicose-galactose
- Deficiência de SGLT1
4. Digestão de Proteínas
As proteínas são formadas de aminoácidos unidos através de ligações peptídicas. A
digestão de proteínas envolve o processo de hidrólise, enzimas proteolíticas combinam
íons hidroxila e íons hidrogênio derivados da água com as moléculas de proteínas para
decompô-las em seus aminoácidos constituintes. Nos humanos normais essencialmente
toda a proteína ingerida é digerida e absorvida.
 Estômago:
 Pepsinogênio => pepsina
 Intestino delgado:
 Secreção pancreática: Tripsina, Quimiotripsina, Carboxipeptidase, Elastase
 Intestino delgado: A borda em escova do duodeno e do jejuno contém
inúmeras
 peptidases (aminopolipeptidase e dipeptidases)
5. Digestão de Lipídios
Na dieta humana além dos triglicerídeos existem também pequenas quantidades de
fosfolipídios, colesterol e ésteres do colesterol. Como os lipídios são apenas ligeiramente
solúveis em água, cada estágio de seu processamento gera problemas especiais para o
trato gastrointestinal. Quase toda a gordura da dieta consiste em triglicerídeos (gorduras
neutras), que são combinações de três moléculas de ácidos graxos e uma única molécula
de glicerol. A digestão dos triglicerídeos é efetuada por enzimas lipolíticas que separam as
moléculas de ácidos graxos do glicerol (hidrólise).
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No estômago os lipídios tendem a separar-se em uma fase oleosa, os triglicerídeos
sofrem ação inicial da lipase lingual e lipase gástrica.
No duodeno e intestino delgado os lipídios são emulsificados, com ajuda dos ácidos
biliares. A grande área superficial das gotículas da emulsão permite o acesso das enzimas
lipolíticas hidrossolúveis a seus substratos. Sobre a influência da lipase pancreática a
maior parte da gordura é decomposta em 2-monoglicerídeos e ácidos graxos. Ocorre ação
também da lipase entérica.
Os produtos da digestão dos lipídios formam pequenos agregados moleculares,
conhecidos como micelas, com os ácidos biliares. As micelas são tão pequenas que
conseguem difundir-se entre as microvilosidades e permitem a absorção de lipídios.
6. Etapas da Digestão Química
Os processos químicos constituem a transformação das grandes moléculas de
proteínas, lipídios, glicídios e ácidos nucléicos em pequenas moléculas que serão
absorvidas para corrente sanguínea através da mucosa intestinal. Neste processo intervêm
as enzimas que são secretadas pelas glândulas anexas ao tubo digestivo.
NA CAVIDADE ORAL: deve-se à ação de enzimas da saliva que é secretada pelas
glândulas salivares parótidas, submaxilares, sublinguais e em outras glândulas salivares
menores. A principal enzima da saliva é a amilase salivar (ptialina). Outras enzimas
presente na saliva como a maltase e catalase são de menor importância porque são
produzidas em quantidades menores. A saliva tem pH entre 6,4 - 7,5, que favorece a ação
da amilase salivar. Esta catalisa a hidrólise de polissacarídeos (amido, glicogênio e seus
derivados). A digestão do amido (polissacarídeo) pela saliva produz oligossacarídeos e
maltose. Quando o alimento é colocado na boca, reflexos nervosos estimulam a secreção
da saliva, especialmente se o alimento é saboroso ou apetitoso. Tal controle é realizado
pelo sistema nervoso autônomo. O SNP estimula secreção e o SNS inibe a secreção.
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Fig. 2 - Esquema do sistema digestivo humano
DIGESTÃO NO ESTÔMAGO: no estômago o alimento sofre a ação do suco gástrico que é
secretado pelas glândulas localizadas na parede estomacal. O muco é produzido pelas
glândulas pilóricas e cárdicas do estômago e lubrifica o bolo alimentar, além de proteger a
parede do estômago contra a ação das enzimas gástricas e do HCl. O HCl apresenta as
seguintes funções: facilita a absorção de ferro; proporciona um pH ótimo para a digestão
protéica; ativa o Pepsinogênio à Pepsina; age contra os germes restringindo a fermentação
microbiana (ação germicida). As enzimas do suco gástrico são: pepsina, lípase gástrica,
amilase gástrica. A pepsina é uma enzima proteolítica (digere proteínas em peptídeos),
que atua num meio altamente ácido (pH = 2,0) e acima de pH = 5,0 apresenta pouca
atividade proteolítica, tornando-se inativa. A lípase gástrica (tributirase) age sobre a
tributirina (um tipo de gordura encontrado no leite e seus derivados), quase não tem
atividade lipolítica sobre as gorduras comuns. A amilase gástrica não desempenha papel
importante na digestão do amido. A secreção gástrica é regulada por mecanismos
nervosos e hormonais. A regulação hormonal é realizada por meio de dois hormônios:
gastrina e enterogastrona. A gastrina é produzida pela mucosa da região pilórica do
próprio estômago e tem ação estimulante sobre a secreção gástrica. A enterogastrona é
produzida no intestino delgado (duodeno) em presença de gordura e inibe a secreção
gástrica.
DIGESTÃO NO INTESTINO: As enzimas encontradas no intestino delgado decorrem do
suco pancreático, secretado por um órgão anexo ao aparelho digestivo, o pâncreas. Suco
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pancreático: é secretado pelo pâncreas (parte exócrina), seu pH é de 7,8 - 8,2 devido ao
alto teor em bicarbonato. As enzimas desse suco são: Tripsina, quimotripsina, carboxi e
amino-peptidase,
amilase pancreática, lípase pancreática, ribonuclease e desoxirribonuclease.
TRIPSINA: é sintetizada nas células pancreáticas na forma do precursor inativo
(tripsinogênio). A ativação do tripsinogênio é, realizada pela enzima enteroquinase
(produzida pelo intestino delgado). O
tripsinogênio também pode ser ativado pela própria tripsina (autocatálise). Esta enzima
atua sobre proteínas inteiras ou parcialmente digeridas produzindo frações menores
(peptídeos).
QUIMOTRIPSINA:
é
produzida
pelo
pâncreas
na
forma
de
quimotripsinogênio que é ativado pela tripsina, passando, então a quimotripsina. Esta
enzima age sobre proteínas inteiras ou parcialmete digeridas produzindo frações menores
(peptídeos). CARBOXI e AMINO PEPTIDASE: digerem peptídeos a aminoácidos pela
região carboxi e amino
terminal, respectivamente. AMILASE PANCREÁTICA: hidrolisa os polissacarídeos a
dissacarídeos. OBS: Alguns polissacarídeos, como a celulose e a quitina, não são
hidrolisados pelas amilases humanas. LIPASE PANCREÁTICA: hidrolisa as gorduras
neutras, ácidos graxos e glicerol. NUCLEASES: (ribonuclease e desoxirribonuclease)
hidrolisam, respectivamente, o ácido ribonucléico e o desoxirribonucléico a frações
menores (nucleotídeos).
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Fig. 3 - Estômago e mucosa gástrica
A secreção pancreática é regulada por mecanismo nervoso e também hormonal. A
visão, o cheiro, o paladar e também a chegada do bolo alimentar ao estômago
desencadeiam impulsos parassimpáticos através do nervo vago até o pâncreas,
determinando uma secreção moderada do suco pancreático.
A chegada do alimento ao intestino delgado estimula a mucosa duodenal a produzir os
hormônios secretina e pancreosina, que, por sua vez, estimulam o pâncreas a secretar o
suco pancreático. A secretina é produzida em resposta à estimulação da acidez do bolo
alimentar que chega ao intestino delgado. O suco pancreático, que chega no duodeno, é
altamente rico em bicarbonato que tem por finalidade neutralizar a acidez do bolo alimentar
e, assim, garantir a ação das enzimas pancreáticas que funcionam em pH ligeiramente
alcalino e neutro.
Outro anexo do aparelho digestivo é a vesícula biliar que armazena um líquido
denominado Bile.
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A BILE emulsifica as gorduras, é produzida pelo fígado a partir de hemácias velhas
e é armazenada na vesícula biliar. Não apresenta enzimas digestivas. Possui sais biliares
(glicolato e taurocolato de sódio) que emulsionam as gorduras, facilitando a ação das
lípases (aumentam a superfície de ação). Outra função dos sais biliares é solubilizar os
produtos finais da digestão lipídica, facilitando assim a sua absorção através da mucosa
intestinal. A presença de gordura no intestino delgado estimula a mucosa duodenal a
produzir o hormônio colecistoquinina, o qual age determinando a contração da parede da
vesícula que, então, elimina a bile para o intestino.
Em sua maior parte os sais biliares são reabsorvidos pelo intestino e a seguir reutilizados
pelo fígado várias vezes, antes de serem transformados em biliverdina (pigmento que da
a cor às fezes). SUCO ENTÉRICO: é produzido pelo epitélio glandular das criptas de
Lieberkuhen, localizadas no intestino delgado.
O suco entérico (intestinal) contém muco, cuja função é proteger a parede intestinal
contra uma autodigestão, e as enzimas: enteroquinase, erepsina e as enzimas
produzidas pelo pâncreas: lípase, amilase, maltase, lactase e sucrase. Seu pH está na
faixa de 6,5 a 7,5. A enteroquinase, além do papel de ativadora do tripsinogênio, digere
peptídeos a aminoácidos.Importantes estímulos diretos ou reflexos regulam a secreção do
intestino delgado. A distensão do intestino e estímulos táteis ou irritantes resultam em
intensa secreção do suco intestinal. A secretina um dos principais hormônios produzidos
pelo intestino delgado, tem ação sobre as células do ducto pancreático e do trato biliar,
aumentando a secreção de bicarbonato, o que produz um suco pancreático aquoso
alcalino.
O quadro 1 resume a localização das enzimas envolvidas no processo digestivo,
seus substratos e seus produtos de hidrólise. A quadro 2 resume a ação dos hormônios
envolvidos na regulação do processo digestivo. Esses quadros encontram-se nas páginas
seguintes.
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Quadro 1:Enzimas participantes da digestão dos alimentos
10
Quadro 2: REGULAÇÃO HORMONAL DO PROCESSO DIGESTIVO
HORMÔNIO
LOCAL
TECIDO
AÇÃO
FATORES QUE
ESTIMULAM A
11
DE SECREÇÀO
ALVO
Gastrina
Estômago
Estômago
(glândulas
gástricas)
Secretina
Pâncreas
Duodeno
Fígado
Duodeno
estimula
secreção
dos compostos
alcalinos do
suco
pancreático
Vesícula
Estimula
contração e
esvaziamento
Estômago
7. Referências Bibliográficas
distensão do estômago pelo
alimento e por proteínas
parcialmente digeridas
estimula ácido
sobre o duodeno
aumenta
velocidade de
secreção da
bile
Pâncreas
biliar
Peptídeos
inibitórios;
contração
gástrica
estimulam as
glândulas
gástricas e
asecreção do
pepsinogênio e
do
HCl
Estimula
liberação de
enzimas
digestivas
Colecistocinina
Duodeno
LIBERAÇÃO
diminui
atividade
de contração
do
estômago
ácidos graxos e
proteínas
parcialmente
digeridas no
duodeno
presença de
gorduras e
carboidratos no
duodeno
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KOEPPEN, B. M. & STANTON, B. A. (2009). Berne & Levy: Fisiologia,
6ª ed., Ed. Elsevier, Rio de Janeiro, RJ. HALL, J.
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Elsevier, Rio de Janeiro, RJ. BERNE, R. M., LEVY,
M. N., KOEPPEN, B. M. & STANTON, B. A. (2004). Fisiologia, 5ª ed.,
Ed. Elsevier, Rio de Janeiro, RJ.
AIRES, Margarida de Mello (2008) Fisiologia, 3ª ed., Ed. Guanabara
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GANONG, W. F. (2006) Fisiologia Medica, 22ª ed., Artmed
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COSTANZO, L. S. (2011). Fisiologia, 4ª ed., Ed., Elsevier, Rio de
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LEVY, M. N.; KOEPPEN, B. M.; STANTON, B. A. (2006).
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SILVERTHORN, D. U. (2010) Fisiologia Humana - uma abordagem
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13
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Houssay, 7ª ed., Ed. Artmed, Porto Alegre.

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