Capítulo Três A Prática e a Problemática do Precedente 3.1

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Capítulo Três A Prática e a Problemática do Precedente 3.1
Capítulo Três
A Prática e a Problemática do Precedente
3.1
Precedente em Duas Direções
É característico do direito voltar-se para trás. Ao contrário da maioria das formas de
decisão sobre políticas públicas [policy-making], que se interessam pelas suas consequências
futuras, tomar decisões no âmbito do direito é estar sempre preocupado em olhar por cima dos
ombros. É comum no direito, e menos frequente em outras áreas, que não seja suficiente para
uma dada decisão produzir resultados desejáveis no futuro; essa decisão deve também se originar
de decisões anteriores sobre questões similares, ou, no mínimo, ser consistente com essas
decisões anteriores. Na verdade, o compromisso do raciocínio jurídico em tomar decisões de
acordo com precedentes vai ainda mais longe. Ao tipicamente exigir que decisões judiciais sejam
feitas de acordo com precedentes, o direito se compromete com a noção de que, muitas vezes,
uma decisão que siga os precedentes é melhor do que uma decisão correta, e que,
frequentemente, é mais importante uma dada decisão seguir os precedentes do que ter as
melhores consequências.
A prática do precedente é mais complexa do que indica o esboço do parágrafo anterior, e
este capítulo se dedica a explorar as variações em torno do tema básico de que esperamos que os
tribunais sigam ou obedeçam precedentes – decisões do passado. Mas, antes de entrarmos
demais em detalhes complexos, é importante distinguir entre duas maneiras diferentes pelas
quais a obrigação de seguir precedentes surge em um dado sistema jurídico. Uma delas nós
chamamos de precedente vertical. Normalmente, espera-se que tribunais inferiores sigam as
decisões previamente tomadas por tribunais superiores no âmbito de sua competência
jurisdicional, e é útil compreender essa relação entre inferior e superior na “cadeia de comando”
como sendo vertical. Juízes federais de primeira instância [Federal district courts] são obrigados
a seguir os precedentes dos tribunais recursais [courts of appeals] da sua região [circuit], e os
tribunais recursais são obrigados a seguir os precedentes da Suprema Corte. O mesmo vale para
os sistemas estaduais, que tipicamente possuem uma estrutura similar e impõem obrigações
equivalentes aos seus juízes e tribunais. De fato, nós nos referimos aos tribunais como
“inferiores” e “superiores” precisamente porque tribunais superiores exercem autoridade sobre os
inferiores, uma autoridade que se manifesta principalmente na obrigação dos tribunais inferiores
de tratar como vinculantes as decisões dos tribunais superiores.
Além da obrigação de seguir as decisões dos tribunais que estão acima na hierarquia
judicial, também se espera dos tribunais que sigam suas próprias decisões anteriores, embora
isso seja menos óbvio e, às vezes, mais controvertido. A relação aqui é horizontal, porque a
obrigação se dá entre um dado tribunal hoje e o mesmo tribunal no passado. Precedente
horitontal não é, portanto, uma questão de tribunais inferiores seguindo os superiores, mas sim
uma hierarquia artificial, imposta, entre o antes e o depois. A decisão anterior é superior não
porque venha de um tribunal mais elevado; a decisão anterior se torna superior só por ser
anterior. Essa obrigação judicial de seguir suas próprias decisões é tipicamente conhecida como
stare decisis – um termo jurídico que significa “mantenha o que foi decidido” [stand by the thing
decided] – e é uma forma distinta de limitação por precedentes. Pela doutrina do stare decisis,
espera-se que um tribunal decida questões da mesma forma pela qual ele próprio as decidiu no
passado, ainda que a composição do tribunal tenha mudado, ou mesmo se a composição for a
mesma, mas seus integrantes tiverem mudado de ideia. Da mesma forma que o precedente
vertical, o stare decisis – precedente horizontal – diz respeito a seguir as decisões de outros.
Mas, ainda que ambas as formas de precedentes, vertical e horizontal, envolvam seguir decisões
de outros, a diferença entre um tribunal seguir a decisão de um tribunal superior e seguir suas
próprias decisões anteriores é, em muitos contextos, suficientemente importante para merecer ser
enfatizada desde já, mesmo antes de vermos em detalhes quais são as implicações da obrigação
de seguir outras decisões, e antes de examinarmos os problemas que surgem na prática dessas
obrigações.
3.2
Precedente – A Ideia Básica
O princípio fundamental da tomada de decisão de acordo com precedentes é o de que
tribunais devem seguir decisões passadas – isto é, dar as mesmas respostas às mesmas questões
jurídicas que tribunais superiores ou anteriores deram no passado. Boa parte da nossa discussão
girará em torno de saber o que conta como “a mesma questão jurídica”, mas, primeiramente,
precisamos examinar que tipo de obrigação é o dever de seguir precedentes. Para tanto, será útil
introduzir algumas clarificações terminológicas adicionais. Embora no caso do precedente
vertical a decisão anterior venha de cima, e no caso do precedente horizontal – stare decisis – ela
venha do mesmo tribunal no passado, em ambos se espera que o tribunal siga uma decisão de um
caso anterior em um novo caso. Para tornar a discussão mais clara, podemos chamar o tribunal
que está decidindo agora de tribunal atual e a controvérisa que ele está examinando de caso
atual. E podemos chamar o tribunal anterior (inclusive quando se tratar do mesmo tribunal de
hoje, mas em um caso anterior) de tribunal precedente, e sua decisão de caso precedente. Dessa
forma, questões envolvendo a força e as consequências do precedente sempre envolverão o
efeito, sobre os problemas colocados no caso atual, diante do tribunal atual, de uma decisão
tomada pelo tribunal precedente no caso precedente.
Podemos agora tratar da natureza da obrigação de seguir precedentes. Inicialmente,
compreender a ideia de precedente requer que diferenciemos aprender com o passado, de um
lado, e seguir o passado apenas pelo fato de ser passado, de outro lado. Aprender com o passado
não é, de modo algum, raciocinar com base em precedentes. O tribunal atual pode aprender com
um caso anterior, or ser persuadido por uma decisão decisão passada, mas a decisão de fazer a
mesma coisa que outro tribunal fez em uma ocasião anterior não se baseia na atribuição de status
de precedente ao caso passado. Ao contrário, a decisão exemplifica a fundamental capacidade
humana de aprender com os outros e com o passado. Em diversos momentos, o tribunal atual vai
considerar persuasivo o raciocínio de um outro tribunal, mas, se o tribunal atual estiver
genuinamente convencido do mérito daquele raciocínio, não estará de forma alguma se pautando
por – obedecendo – precedentes.1 Para entendermos por que esse é o caso, vamos pegar um
exemplo não-jurídico simples: imagine que estou cozinhando um ovo. Eu o cozinho por seis
minutos e fico satisfeito ao descobrir que o ovo foi cozido exatamente ao meu ponto preferido.
Consequentemente, não é motivo de surpresa que, na próxima vez em que cozinhar um ovo, eu o
faça por seis minutos. Aprendi com o “caso” anterior, mas, quando cozinho o segundo ovo por
seis minutos nas próximas vezes, não estou fazendo isso porque cozinhei o ovo por seis minutos
na primeira vez. Estou cozinhando o ovo por seis minutos porque seis minutos é o tempo certo.
Sei disso porque aprendi com minha ação anterior, mas, em ocasiões subsequentes, tomarei essa
decisão por causa do que eu então já terei aprendido.
1
A concepção de seguir ou obedecer apresentada aqui é consistente com aquela encontrada na literatura de teoria do
direito, grande parte da qual discutese há ou não uma obrigação moral de obedecer o direito. Ver Donald H. Regan,
Reasons, Authority, and the Meaning of “Obey”: Further Thoughts on Raz and Obedience to Law, 3 Can. J.L. &
Jurisp. 3 (1990).
Esse tipo de aprendizado a partir de experiências passadas pode ser encontrado em
muitos outros processos de tomada de decisão na esfera pública. Quando Ronald Reagan
concorreu à Presidência em 1980, ao contrário de candidatos anteriores do Partido Republicano,
ele procurou enfatizar em sua campanha questões potencialmente atraentes para sindicalistas
ligados ao Partido Democrata e para os Democratas do Sul, assumindo posições compatíveis
com as preferências desses grupos.* A estratégia deu certo e foi posteriormente adotada por outro
candidatos do Partido Republicano. Mas esses outros candidatos seguiram a estratégia de Reagan
não porque Reagan a tivesse utilizado, mas sim porque o sucesso de Reagan os convencera de
que essa era a estratégia certa.
O mesmo fenômeno existe no direito.2 No caso Henningsen v. Bloomfield Motors, Inc.,3 a
Suprema Corte de Nova Jersey considerou a disparidade de poder de barganha entre uma
concessionária de automóveis e o típico consumidor de carros tão grande que considerou
inválida a renúncia por parte de um comprador – ainda que por escrito e assinada – do que
seriam as garantias usuais para esse tipo de contrato. Uma vez que Henningsen tenha sido
decidido, imagine que um desembargador de um outro estado leia a decisão em Henningsen e
fique convencido de que ela expressa a concepção mais razoável possível sobre como lidar com
renúncias de responsabilidade contratual em uma era de negociações empresariais e transações
impessoais de consumo. Antes de ler a decisão, ele nunca havia pensado na possibilidade de o
poder de barganha entre as partes ser desigual, nem imaginado que os termos de um contrato
poderiam ser afastados fora das hipóteses de fraude, força maior [duress] ou incapacidade. Mas a
leitura de Henningsen o convenceu a modificar suas crenças sobre o caráter supostamente
sagrado dos contratos. Ele agora acredita que há circunstâncias em que cláusulas contratuais
escritas e assinadas devem ser afastadas mesmo quando não há fraude explícita nem qualquer
outro dos fundamentos tradicionais para se recusar aplicabilidade a um contrato. Nesse sentido,
quando surge a oportunidade, ele chega a uma conclusão consistente com a decisão do caso
Henningsen e elabora uma decisão que basicamente segue o raciocínio daquele caso.
Reconhecendo a fonte com a qual aprendeu, e também para fornecer orientação para as pesquisas
*
N.T.: Schauer está se referindo aos chamados Southern Democrats, políticos sulistas que, embora membros do
partido Democrata e favoráveis à expansão dos poderes regulatórios estatais e das competências da União Federal,
característicos da coalizão do New Deal formada nos anos 30, mantiveram certas posições mais próximas do partido
Republicano em temas como igualdade racial.
2
Ver Larry Alexander, Constrained By Precedent, 63 S. Cal. L. Rev. 1 (1989); Lon L. Fuller, Reason and Fiat in
Case Law, 59 Harv. L. Rev. 376 (1946): Frederick Schauer, Precedent, 39 Stan. L. Rev. 571 (1987).
3
161 A.2d 69 (N.J. 1960).
de outros, ele faz referência à decisão de Nova Jersey. Mas a sua decisão de hoje não é ditada
pela existência do caso de Nova Jérsey – ele não está obedecendo a decisão de Nova Jersey. Ele
chegou à sua decisão atual porque, tendo sido persuadido pelo raciocínio de Henningen, passou a
acreditar que cláusulas contratuais leoninas [unconscionable] baseadas em disparidades extremas
no poder de barganha das partes em relações de consumo não devem ser aplicadas pelo
judiciário. Da mesma forma que o meu aprendizado sobre o tempo de cozimento de um ovo a
partir da minha tentativa anterior, e da mesma forma que candidatos a cargos politicos
aprendendo com estratégias bem sucedidas de seus antecessors, o juiz nesse caso hipotético não
tomou sua decisão no caso atual apenas porque foi assim que o tribunal de Nova Jersey decidiu,
nem por estar de qualquer forma obrigado a seguir um tribunal de Nova Jersey. Ele chegou a
essa decisão porque havia aprendido algo com um caso anterior – algo que agora genuinamente
reflete suas convicções atuais. Isso não é muito diferente de ter aprendido sobre o tema em um
livro de economia ou filosofia, ou mesmo em uma conversa na academia de ginástica. O fato de
a fonte do aprendizado ter sido um tribunal de outro estado é pouco ou nada mais do que uma
coincidência.
Esses exemplos ilustram uma maneira comum pela qual juízes usam casos mas que não é,
em sentido estrito, uma forma de raciocinar com base em precedente – na verdade, o status de
decisão judicial do caso anterior não fez diferença alguma. Em contraste, raciocinar com base em
precedente – e talvez seja até mesmo um erro chamar isso de “raciocínio” – é seguir uma decisão
anterior não porque o tomador de decisão neste caso tenha sido convencido pelo raciocínio do
caso precedente. Raciocinar com base em precedente implica seguir ou obedecer uma decisão
anterior unicamente por causa do seu status de decisão de um tribunal superior ou de decisão
passada do mesmo tribunal. Um juiz de primeira instância em Nova Jersey, por exemplo, pode
ler Henningsen e ainda assim acreditar que todas as cláusulas contratuais não-fraudulentas
devem ser estritamente aplicadas nos seus próprios termos, e que a preocupação com os
consumidores expressas pelo tribunal em Henningsen está fora de lugar. Mesmo após a leitura da
decisão Henningsen, ele não está convencido. Ainda assim, independentemente do quanto
continue a acreditar na estrita aplicabilidade de cláusulas contratuais escritas, e ainda que
acredite que o caso Henningsen foi decidido de forma equivocada, ele está obrigado, enquanto
juiz de primeira instância dentro da mesma jurisdição, a seguir Henningsen, apesar de estar
convencido de que a decisão foi um erro. E o mesmo ocorre com o stare decisis. Se, em 1970,
dez anos após Henningsen, a maioria da Suprema Corte de Nova Jersey fosse composta por
juízes que não integravam o tribunal na época do caso Henningsen, e se esses novos ministros
acreditassem que Henningsen foi decidido de forma equivocada, as obrigações relativas ao stare
decisis ainda assim os teriam obrigado a decidir a mesma questão de forma idêntica. Eles teriam
sido forçados a seguir uma decisão que consideravam errada só pelo fato de ela existir como
decisão anterior do mesmo tribunal. Como colocou de forma direta o teórico do direito britânico
P.S. Atiyah, “o conceito de um sistema de precedente é tal que obriga os juízes a seguirem em
alguns casos decisões com as quais não concordam.”4
A esta altura, a ideia básica já deve ter ficado clara. Quando tribunais estão vinculados
por precedentes, têm a obrigação de seguir um precedente não porque concordam com essa
decisão, mas inclusive quando acham que ela foi um erro. É a fonte ou status do precedente que
lhe dá a sua força, e não a solidez do seu raciocínio5, nem a convição por parte do tribunal atual
de que o resultado indicado pelo precedente estava certo. Quando se argumenta, por exemplo,
que mesmo os Ministros da Suprema Corte que acreditam que o caso Roe v. Wade6 *foi decidido
de forma incorreta devem seguir esse precedente em casos subsequentes, o argumento não é (ou
não é somente) o de que esses Ministros deveriam mudar de opinião quanto a Roe v. Wade. Ao
contrário, o argumento é que esses Ministros devem seguir Roe mesmo se continuarem achando
que esse caso foi decidido de forma incorreta.
3.3
Uma Ideia Estranha
Agora que vimos como seguir precedentes obriga os juízes a tomar decisões diferentes
daquelas que, no seu melhor entendimento, teriam tomado na ausência do precedente, podemos
perceber como a vinculação a precedentes é em vários aspectos contra-intuitiva, ao menos do
ponto de vista dos juízes vinculados. Da perspectiva deles, a obrigação de seguir precedentes –
sejam eles verticais ou horizontais – frequentemente os orienta a tomar uma decisão que
4
P.S. Atiyah, Form and Substance in Legal Reasoning: the Case of Contract, in The Legal Mind: Essays for Tony
Honoré 19, 27 (Neil MacCormick & Peter Birks, orgs., 1986).
5
“Se o precedente for verdadeiramente vinculante [para o juiz], e se ele é leal ao princípio do state decisis, nem por
um instante ele chegará a considerar que razões substantivas poderiam ser dadas para sustentar uma decisão
oposta” Atiyah, supra nota 3, p. 20.
6
410 U.S. 113 (1973).
*
N.T. Trata-se do famoso caso, decidido em 1973, no qual a Suprema Corte dos EUA afirmou que a constituição do
país contém um direito implícito à “privacidade” que, em linhas gerais, garante às mulheres a liberdade de realizar
aborto até o fim do primeiro trimestre de gestação.
acreditam estar errada.7 Mas por quuais razões funcionaria o direito dessa forma, e por que
exigiria o sistema jurídico dos seus juízes tomar decisões diferentes daquelas que eles tomariam
de acordo com o seu melhor entendimento profissional?
Com relação ao precedente vertical, as justificativas para vinculação são razoavelmente
óbvias. Assim como se espera que crianças obedeçam seus pais mesmo quando não concordam
com eles, assim como se espera que soldados obedeçam às ordens dos sargentos ainda que
acreditem que elas estão erradas, assim como se espera dos católicos que sigam as determinações
do Papa mesmo se essas determinações lhes parecem equivocadas, e assim como se espera dos
empregados que sigam as instruções dos seus superiores, espera-se de juízes de tribunais
inferiores que sigam as “instruções” dos tribunais acima deles, dentro do que os militares
chamam de “cadeia de comando”. Qualquer que seja nossa opinião sobre a obrigação que
Ministros da Suprema Corte contrários a Roe v. Wade têm de obedecer essa decisão anterior da
própria Corte, parece natural esperar que tribunais inferiores sigam Roe enquanto aquela decisão
não for anulada [overruled]8. Com relação ao precedente vertical, a vinculação não parece ser
nada além de uma versão, dentro do sistema jurídico, do mesmo tipo de autoridade hierárquica
existente na maioria das instituições governamentais e não-governamentais.
Os argumentos em favor dos precedentes horitontais, porém, são menos óbvios. A
presença do princípio do stare decisis é generalizada no common law,9 mas é bem menos
frequente em contextos não-jurídicos. Não esperamos dos cientistas, por exemplo, que cheguem
às mesmas conclusões que seus predecessores pelo simples fato de que seus predecessores
chegaram àquelas conclusões. Seria motivo de surpresa se o Congresso começasse a tomar certas
decisões apenas porque Congressos anteriores as tomaram. E ninguém crê que Presidentes
devam seguir decisões de seus predecessores com as quais estão em desacordo. De fato, livros
de lógica tipicamente tratam argumentos baseados em precedentes como falácias, porque o fato
7
O Ministro Scalia [N.T.: da Suprema Corte dos EUA], que discorda da aplicação de stare decisis no nível da
Suprema Corte, já afirmou que “[a] função da ideia de [stare decisis] é fazer com que nós digamos que aquilo que é
falso em uma análise adequada deve não obstante ser tomado como verdade.” Antonin Scalia, A Matter of
Interpretation: Federal Courts and the Law 139 (Amy Guttman, org. 1997).
8
Foi em um caso envolvendo aborto, por exemplo, que o Juiz Emilio Garza observou que “[p]ela segunda vez na
minha carreira judicial, sou forçado a seguir uma decisão da Suprema Corte que eu considero ofensiva à
Constituição” Causeway Medical Suite v. Ieyoub, 109 F.3d 1096, 1113 (5 th Cir. 1997) (Garza, J., voto concorrente).
9
Nem sempre foi assim. Embora as obrigações relativas a precedentes verticais datem dos primórdios dos tribunais
recursais no século XVIII ou até antes disso, as limitações impostas pelo stare decisis não foram aceitas antes do
século XIX. Ver Thomas R. Lee, Stare Decisis in Historical Perspective, 52 Vand. L. Rev. 647 (1999); Edward M.
Wise, The Doctrine of Stare Decisis, 21 Wayne L. Rev. 1043 (1975).
de que alguém chegou a uma determinada conclusão no passado não diz nada sobre se essa
conclusão é ou não correta no presente.10 Mesmo no direito, a ideia de vinculação ao precedente
com frequencia soa estranha, e Oliver Wendell Holmes observou certa vez que era “revoltante”
que tribunais se vissem vinculados a precedents que “persistem... por nenhuma boa razão além
do fato de que... foi assim que se decidiu no tempo de Henrique IV.”11 E Jeremy Bentham, que
era muito bom em odiar coisas, reservou um ódio especial para o sistema de precedentes em
geral e para o stare decisis em particular, descrevendo-o como “agir sem razão, em declarada
exclusão da razão, e portanto em oposição à razão.”12
Entretanto, como Holmes reconheceu em outros momentos, ao contrário de Bentham, há
coisas a serem ditas a favor do princípio do stare decisis. Um argumento a seu favor foi
reconhecido pelo Ministro Brandeis em sua famosa observação de que “na maioria dos casos é
mais importante resolver [a questão] do que resolvê-la corretamente ”13 Na vida, e em especial
no direito, é importante que as coisas estejam resolvidas para que outros possam se pautar por
essas decisões e guiar seu comportamento de acordo com elas. Uma empresa que planeje realizar
uma operação comercial precisa saber quais transações são legalmente permissíveis e quais não
são, e essa confiança e segurança seria perdida se houvesse um risco muito grande de que as
regras jurídicas aplicáveis estivessem continuamente sujeitas a mudanças.
Da perspectiva
daqueles que se sujeitam aos limites do direito, os ganhos obtidos com aperfeiçoamentos
marginais nas regras jurídicas raramente são suficientes para compensar as perdas causadas por
não se poder contar nem mesmo com um sistema de regras jurídicas imperfeitas e precedentes
imperfeitos.
Da perspectiva do tribunal vinculado, stare decisis traz consigo as vantagens da
eficiência cognitiva e decisória. Nenhum de nós é capaz de manter tudo em aberto ao mesmo
tempo, e mal poderíamos operar se nossas decisões fossem constantemente passíveis de
redefinição. Sobretudo em um tribunal, onde o estreitamento do escopo da discussão aumenta
nossa capacidade de argumentar de maneira precisa, tratar algumas coisas simplesmente como
resolvidas facilita a vida do tribunal, da mesma forma em que facilita a vida de quem precisa
10
Ver, p.ex., D.Q. Mcinerny, Being Logical: A Guide to Good Thinking 142 (2005); Christopher W. Tindale,
Fallacies and Argument Appraisal 201 (2007).
11
Oliver W. Holmes, The Path of the Law, 10 Harv. L. Rev. 457, 469 (1897).
12
Jeremy Bentham, Constitutional Code, in 1 Collected Works of Jeremy Bentham 434 (F. Rosen & J.H. Burns,
orgs, 1983).
13
Burnet v. Coronado Oil & Gas Co., 285 U.S. 393, 406 (1932) (Brandeis, J., voto divergente).
planejar sua vida e suas atividades em torno das decisões tomadas por tribunais. O Ministro
Cardozo, quando ainda era um juiz do Tribunal de Apelação de Nova York [New York Court of
Appeals], observou que “a carga de trabalho dos juízes aumentaria a um ponto insustentável se
cada decisão tomada pudesse ser reaberta em todo e qualquer caso,”14 e nessa expressiva frase
ele registrou o fato de que nossa capacidade de ação é limitada, e de que, para fazer bem algumas
coisas, precisamos deixar outros problemas para uma outra ocasião.
Ao reconhecer que definição e consistência na solução de controvérsias são por si só
importantes, a regra do stare decisis promove uma série de valores que estão de alguma forma
relacionados à ideia de estabilidade. Estabilidade não é a única coisa que importa, é claro, e
mesmo Brandeis reconhecia que, da mesma forma que às vezes é mais importante resolver as
coisas do que resolvê-las corretamente, às vezes é mais importante resolver as coisas
corretamente do que resolvê-las incorretamente ou imperfeitamente só para encerrar a discussão.
Entretanto, por mais importante que seja decidir de forma correta em alguns momentos, seguir o
passado sem levar conta a sua correção é central para o funcionamento do direito. Na verdade,
longe de ser um tolo apêndice a um sistema de tomada de decisões cujo propósito é chegar à
decisão mais correta neste exato momento, o stare decisis reflete algo profundo e duradouro
sobre um sistema de tomada de decisões que frequentemente serve aos valores da estabilidade,
consistência, definição [settlement], e respeito ao passado, ao mesmo tempo em que outras
instituições do governo e outros sistemas de tomada de decisão permanecem sendo mais
flexíveis, menos estáveis, menos previsíveis e mais concentrados no futuro.
3.4
Sobre a Indentificação de um Precedente
É fácil falar que um tribunal deve seguir uma decisão passada – seja a sua própria, no
caso do stare decisis, seja a de um tribunal superior, no caso de precedente vertical – mas quase
nunca é fácil determinar o que conta como uma decisão passada. Em algumas ocasiões, essa será
uma tarefa simples e direta. Por exemplo, um caso da Suprema Corte envolvendo a
permissibilidade de um estado eliminar qualquer possibilidade de se realizar um aborto
dificilmente escaparia de um confronto direto com Roe v. Wade como precedente relevante. Se
alguém alegasse em Nova Jersey que consumidores adquirindo automóveis de concessionárias
devem obedecer de forma estrita ao que está escrito no contrato assinado, incluindo cláusulas de
14
Benjamin N. Cardozo, The Nature of the Judicial Process 149 (1921).
renúncia de garantias, o caso Henningsen dominaria as discussões. E, se a questão envolver qual
de duas leis conflitantes deve ser aplicada a uma série específica de casos, 15 a determinação feita
pelo tribunal sobre essa questão abstrata de interpretação jurídica vai estabelecer o direito
aplicável a casos futuros. Mais comumente, porém, não chegamos nem perto desse nível de
clareza quanto a quais casos contam como precedentes. Mais importante ainda, quase nunca é
óbvio o significado da decisão nesses casos [what those cases will be taken to stand for].
A tarefa de identificar o precedente relevante e o holding* o
que ele expressa é
problemática principalmente porque não existem dois eventos exatamente iguais. Ou seja, jamais
haverá dois casos exatamente iguais. No caso Raffles v. Wichelhaus,16 por exemplo, a a Corte do
Exchequer** na Inglaterra concluiu que não havia encontro de vontades e, portanto, não havia
contrato formado quando um comprador de algodão pensou que estava comprando algodão
sendo transportado em um navio chamado Peerless, enquanto o vendedor pensou que estava
vendendo um carregamento de algodão em um navio diferente, mas que por acaso também se
chamava Peerless. Os casos posteriores a Raffles serão diferente em alguns aspectos, no mínimo
quanto à época em que ocorreram. Mesmo assim, seria tolice argumentar que Raffles não foi um
precedente para casos similares que ocorreram em Londres em vez de Liverpool, ou nos quais os
navios se chamavam Excelsior em vez de Peerless, ou nos quais o carregamento era de chá em
vez de algodão. Quando há um caso precedente que é tão semelhante ao caso atual a ponto de as
eventuais diferenças parecerem triviais, juízes e advogados costumam dizer que o precedente
“tem base firme” [“on all fours”] e, nesses casos, a identificação do precedente raramente gera
maiores problemas.
Tipicamente, porém, as diferenças entre o caso atual e um possível caso precedente são
mais substanciais que aquelas entre Raffles e um caso similar em que as únicas diferenças sejam
os nomes dos navios, os portos de chegada e o tipo de carregamento. Quando isso ocorre, surgem
dois problemas interrelacionados. O primeiro diz respeito à identificação inicial do precedente
relevante. Há alguma decisão anterior que mereça ser tratada como caso precedente? O segundo
15
Ver Anastasoff v. United States, 223 F.3d 898 (8 o Cir. 2000), extinto por perda do objeto, 235 F.3d 1054 (8o Cir.
2000).
*
N.T. O termo holding e seu equivalente ratio decidendi serão explicados mais adiante neste capítulo. Por enquanto,
entenda-se holding como “regra de decisão”, is to é, como a regra que teria servido de premissa maior para
fundamentar o resultado da decisão do tribunal.
16
2 H. & C. 906, 159 Eng. Rep. 375 (Ex. 1864).
**
N.T. A Court of the Exchequer era um tribunal superior do sistema jurídico inglês com jurisdição e competências
variadas ao longo de sua existência, que foi formalmente dissolvido em 1880 por um ato do Parlamento.
envolve definir o significado desse caso precedente para a decisão do caso atual. Em um mundo
no qual não há identidade completa entre dois ou mais casos ou eventos, essas tarefas envolvem
determinar se há similaridade relevante entre um dado caso precedente possível e o caso atual,
pois somente quando a resposta for afirmativa é que o tribunal atual estará obrigado a seguir o
que o tribunal precedente dispôs.
O problema da determinação da similaridade relevante pode ser ilustrado com dois casos
frequentemente usados para explorar a natureza da decisão baseada em precedentes. O primeiro
é a decisão do Juiz Cardozo no Tribunal de Apelações de Nova York [New York Court of
Appeals] no caso MacPherson v. Buick Motor Company.17 Com um alto nível de particularismo,
a decisão no caso MacPherson dispôs que a Buick Motor Company, fabricante de automóveis de
passeio, seria responsável, perante um comprador de um carro da marca Buick, por danos
causados por rodas defeituosas fabricadas por uma outra companhia, mas incorporados pela
Buick na fabricação de seus automóveis, apesar da ausência de liame contratual [privity of
contract]* entre o comprador e a Buick Motor Company. Mas ainda que MacPherson possa ser
um precedente bastante óbvio para um caso envolvendo um Oldsmobile ou um Toyota com o
mesmo defeito, e para um caso envolvendo outras partes defeituosas em vez das rodas, a maioria
dos casos futuros não será tão similar. Se, por exemplo, o dano em um caso subsequente tiver
sido causado por uma substância estranha [foreign substance] em um produto normalmente
menos perigoso que um carroainda deveríamos considerar MacPherson como o precedente
aplicável [controlling precedent]? Imagine que, algum tempo depois de 1916, ano em que
MacPherson foi decidido, surge em Nova York um caso que lembra Donoghue v. Stevenson, o
análogo britânico do caso MacPherson.18 No caso Donoghue, a consumidora, Sra. Donoghue,
estava no Café Wellmeadow, na cidade de Paisley, Escócia, quando seu acompanhante pediu um
copo de cerveja de gengibre** para ela. Sra. Donoghue já tinha bebido metade do copo, e o
proprietário o encheu mais uma vez. Nesse momento, pedaços de um caramujo morto rolaram da
17
111 N.E. 1050 (N.Y. 1916).
N.T.: A doutrina de privity of contract nos EUA determinava originalmente que um contrato só criava direitos e
obrigações para as partes contraentes, impedindo assim que um terceiro processasse ou fosse processado por uma
das partes por questões relacionadas com o contrato. Com o passar dos anos, a doutrina passou a incorporar uma
série de exceções. Além disso, sobretudo a partir do caso MacPherson, as regras relativas a responsabilidade civil
extracontratual passaram a abranger várias situações que antes não poderiam ser levadas ao judiciário por força da
noção de privity of contract.
18
[1932] A.C. 562 (H.L.).
**
N.T. No original, ginger beer, um tipo de bebida criada no século XVIII, originalmente alcóolica, mas hoje
produzida como refrigerante.
*
opaca garrafa de cerveja para dentro do copo da Sra. Donoghue. A aparência e o cheiro do
caramujo em decomposição causaram desconforto gástrico e choque mental na Sra. Donoghue,
que, posteriormente, processou o fabricante
da cerveja de gengibre (que também tinha
engarrafado a bebida).
Assim como no caso MacPherson, o fabricante processado no caso Donoghue alegou que
a Sra. Donoghue não poderia acioná-lo dada a ausência de liame contratual entre fabricante e
consumidor. Se esse caso tivesse surgido em Nova York, após o caso MacPherson, a autora da
ação certamente teria argumentado que essa questão já tinha sido decidida no passado, obrigando
assim o tribunal a chegar à mesma conclusão do caso MacPherson. Mas, por sua vez, o réu teria
argumentado que os casos eram diferentes, e que MacPherson não teria adotado a proposição de
que a existência de algum liame contratual era desnecessária em um caso que não involvesse
maquinário inerentemente perigoso, como automóveis. E, sendo essas as duas posições em
conflito, como é que o tribunal atual – no caso da cerveja de gengibre pós-MacPherson – poderia
definir se MacPherson deve ou não ser encarado como um precedente, e o que exatamente está
disposto nesse precedente
É precisamente essa questão que tem sido objeto de debate por gerações e gerações.
Segundo uma visão comum, o caso precedente funciona como um precedente não apenas para
casos mais ou menos idênticos que possam surgir no futuro, mas também para casos semelhantes
– casos que envolvam fatos similares. Mas o que é que torna similares duas situações fáticas que
não são idênticas? Não temos dúvida de que casos envolvendo Toyotas são similares a casos
envolvendo Buicks, mas devemos considerar que um recipiente opaco, contendo uma substância
estranha e repugnante, é similar ou diferente de um carro com uma roda defeituosa? Não existe
nada de “naturalmente” similar, é claro, entre as duas situações de fato, como tampouco existe
qualquer coisa de “naturalmente” diferente. Elas têm em comum o fato de serem transações de
consumo, e de que, em ambos os casos, um defeito causou dano ou mal-estar, sendo que esse
defeito não era imediatamente aparente (e é por isso que o fato de a garrafa ser opaca é
importante no caso Donoghue). Elas são diferentes porque carros são diferentes de cerveja de
gengibre; carros são caros e cerveja de gengibre não é; e são vendidos em concessionárias
específicas de determinado fabricante, mas cerveja de gengibre é vendida em cafés que vendem
todo tipo de bebida. Como quaisquer dois conjuntos de fatos, os fatos do caso MacPherson e os
fatos do caso da cerveja de gengibre são semelhantes em alguns aspectos e diferentes em outros.
E, se esse é o caso, como deve o tribunal atual decidir se os dois são suficientemente semelhantes
a ponto de o primeiro ser um precedente (vinculante) para a decisão no segundo?
Uma possibilidade é que algumas coisas simplesmente são semelhantes a outras, e,
assim, a responsabilidade do direito é a de tratar como semelhantes as coisas que são realmente
semelhantes entre si em um sentido profundo e pré-jurídico. Nessa perspectiva, o que faz com
que uma variação de MacPherson com Toyotas no lugar de Buicks e envolvendo freios em vez
de rodas seja suficientemente semelhante ao caso MacPherson é que Toyotas são semelhantes a
Buicks no sentido de que ambos são carros de passeio, e freios são semelhantes a rodas no
sentido de que ambos são partes de automóveis que podem causar sérios danos se forem
fabricadas de forma defeituosa. Mas essa abordagem da ideia de semelhança – que parte da
premissa de que existem semelhanças naturais – não funciona. MacPherson, como sabemos, foi
um caso sobre responsabilidade civil e fabricação defeituosa, mas em casos subsequentes
envolvendo regulação do mercado de ações ou da atividade bancária pode não ser tão claro assim
que a empresa Toyota, sediada no Japão, deve ser tratada da mesma forma que a empresa Buick
Motor, sediada em Detroit. E se as rodas fossem compradas diretamente de um fabricante de
rodas, mas os freios fossem fabricados pela própria companhia que fabrica os automóveis, então
em alguns casos de responsabilidade civil por danos ao consumidor freios podem não ser mais
semelhantes a rodas em qualquer sentido relevante.
Filósofos costumam falar de tipos naturais [natural kinds] para se referir a coisas que são
fundamentalmente diferentes umas das outras, e não porque essa diferença seja resultado de
categorização ou classificação feitas por seres humanos. Zebras são diferentes de pedras não
porque seres humanos assim decidiram, mas porque são diferentes em sua natureza. O que torna
uma zebra uma zebra e o que torna uma pedra uma pedra não é algo decidido por seres humanos
ou por suas instituições, mas pelo desenho natural do universo. Mas, mesmo no que se refere a
tipos naturais, o direito tem seus próprios valores e fins e, portanto, pode escolher tratar como
semelhantes coisas que são naturalmente diferentes. É o que ocorre quando o direito aplica as
mesmas regras de responsabilidade por danos ao consumidor tanto para vendas de plantas quanto
para vendas de garrafas d’água, e o fato de que as mesmas regras de responsabilidade podem ser
aplicadas em ambos os casos é independente do fato de que plantas e água são tipos naturais
distintos. De outro lado, o direito pode adotar regras diferentes para coisas que são naturalmente
semelhantes. O diamante que eu compro é (geralmente) meu aos olhos do direito, mas o
diamante que eu furto (geralmente) não é, e esse é o caso ainda que o diamante que eu compro e
o diamante que eu furto sejam semelhantes em um sentido natural e pré-jurídico.
Se até mesmo tipos naturais não são naturalmente semelhantes para o direito, então nada
é naturalmente semelhante para o direito. Duas coisas podem parecer semelhantes em um sentido
pré-jurídico, mas isso normalmente ocorre porque a semelhança entre elas se baseia em alguma
finalidade ou necessidade em comum. A maioria das pessoas considera bolsas vermelhas e
bolsas azuis como semelhantes, por exemplo, porque cumprem uma função semelhante, mas, se
a questão fosse determinar se elas combinam com um dado par de sapatos, as duas bolsas não
seriam mais consideradas tão semelhantes assim. Tampouco seriam semelhantes em um caso de
propriedade intelectual em que cores diferentes podem fazer com que certos produtos sejam mais
facilmente distinguíveis um do outro. Da mesma forma, Toyotas podem não ser semelhantes a
Buicks para os fins da legislação que regula tarifas de importação, e vodka é semelhante a água
aos olhos dos oficiais de segurança dos aeroportos, mas não aos olhos de quem precisa aplicar
leis que proíbem a venda de álcool a menores de idade. Assim, a sugestão de que existem certas
semelhanças naturais capazes de responder à questão de quais casos são semelhantes a outros
parece nos conduzir a um caminho bastante enganoso.
Isso não significa dizer que o direito nunca leva em conta diferenças existentes no mundo
pré-jurídico para determinar o que é e o que não é semelhante. Em The Path of the Law,19
Holmes apresenta a seguinte história, provavelmente apócrifa:
Há um caso de um juiz de paz de Vermont que recebeu uma ação movida por um fazendeiro
contra outro, que teria quebrado um dos seus recipientes para fazer manteiga. Após refletir
longamente, o juiz de paz disse que havia procurado na legislação, mas não encontrara nada
sobre recipientes para fazer manteiga, e decidiu em favor do réu.20
Holmes estava obviamente ironizando o juiz de paz de Vermont, e o seu ponto era que
ninguém que não seja um matuto sem treinamento em direito poderia imaginar que “recipiente
para fazer manteiga” pudesse ser uma categoria juridicamente relevante. Isso fica claro quando
Holmes prossegue observando que:
“[a]plicações de regras rudimentares de direito dos contratos ou de responsabilidade civil estão
enfronhados dentro de tópicos como Ferrovias ou Telégrafos ou.... Transporte Naval …, ou estão
reunidos sob um título arbitrário que faça sentido para pessoas de mente prática, como Direito
19
20
10 Harv. L. Rev. 457 (1897).
10 Harv. L. Rev. at 474-75.
Mercantil. Se um homem ingressa no mundo do direito é proveitoso que procure dominá-lo, e
dominá-lo significa ser capaz de olhar através de todos os eventos dramáticos e discernir as
verdadeiras bases para se fazer profecias.”21
Essa pequena história de Holmes se tornou famosa, mas, mesmo assim, é possível que
Holmes tenha se equivocado.22
É verdade que o direito frequentemente trata de forma
semelhante coisas que são diferentes em um sentido pré-jurídico ou extra-jurídico, como ocorre
quando usa categorias jurídicas como “contrato” para abranger contratos de trabalho e contratos
de compra e venda de alface, e quando a categoria de “ação” [security] sob a Lei de Ações
[Securities Act ] de 1933 é entendida como abrangendo não apenas ações e títulos, mas também
apólices de seguro, certas contas bancárias, e alguns tipos de participação proprietária fracionada
[fractional ownership interests] sobre terra, cavalos de corrida, pinturas a óleo, árvores frutíferas
e vinho.23 Contudo, com igual frequência, e cada vez mais a cada dia, o direito baseia suas
determinações de semelhança jurídica em semelhanças existentes no mundo extra-jurídico. Sob a
liderança de Karl Llewellyn, cujas contribuições para o Realismo Jurídico serão discutidas no
Capítulo Sete, grande parte do Código Comercial Uniforme [Uniform Commercial Code] foi
desenhada de modo a refletir e acompanhar de perto as práticas de comerciantes de carne e osso
em suas transações diárias.24 O fato de que a maioria dos aspectos dos contratos relativos à
compra e venda de ações é regulada por legislação federal específica sobre ações, e não pelo
direito estadual relativo a contratos, mostra que a genuína distinção entre ações e outros objetos
passíveis de compra e venda se reflete também no direito. E o fato de que, muito antes de se
tornar um Ministro da Suprema Corte, Louis Brandeis pôde ser co-autor de um artigo intitulado
O Direito dos Açudes [The Law of Ponds]25, exemplifica a forma pela qual categorias jurídicas
como “açude” são, com mais frequência do que Holmes supunha, construídas sobre categorias
do mundo pré-jurídico. Holmes pode ter acertado no sentido de que não existe nada parecido
com “Direito dos Recipientes de Manteiga”, mas estava bastante equivocado quando sugeriu que
não poderia existir algo como “Direito dos Recipientes de Manteiga”.
21
Id. p. 475.
Ver Frederick Schauer, Prediction and Particularity, 78 B.U. L. Rev. 773 (1998).
23
Ver, p.ex., Rutheford B. Campbell, Jr., Racing Syndicates as Securities, 74 Ky. L.J. 691 (1985).
24
Ver, p.ex., Zipporah Batshaw Wiseman, The Limits of Vision: Karl Llewellyn and the Merchant Rules, 100 Harv.
L. Rev. 465 (1987).
25
Samuel D. Warren & Louis D. Brandeis, The Law of Ponds, 3 Harv. L. Rev. 1 (1989).
22
Dessa forma, é possível que, em alguns contextos, determinações de semelhança para fins
de se avaliar o que e para que fins deve ser encarado como precedente reflitamo sentido jurídico
do que é semelhança apenas para fins jurídicos, e, em outros, juízos de semelhança que, embora
nem naturais, nem imutáveis, têm sua origem no mundo exterior ao direito. Mas, enquanto essas
duas possibilidades existirem, e enquanto até mesmo determinações pré-legais de semelhança e
diferença dependerem do contexto e da finalidade da comparação, parece impossível concluir
que uma determinação legal de semelhança é apenas uma questão de se ver se os fatos do caso
atual são realmente semelhantes aos fatos do caso precedente.
Se o caminho da semelhança natural é falso, devemos buscar uma outra coisa que possa
nos dizer se e quando um caso passado que se pretende tomar como precedente é de fato um
precedente para o caso atual sendo examinado pelo tribunal. E essa outra coisa é com frequência
identificada com o que se chama, especialmente em jurisdições de common law fora dos Estados
Unidos, de ratio decidendi do caso precedente – o fundamento ou razão da decisão do tribunal.26
Precisamos saber não apenas o que o tribunal precedente decidiu, mas também por que o tribunal
decidiu daquela forma. Nesse ponto, uma visão comum na Inglaterra e em outros países é a de
que, da mesma forma que as regras, os precedentes têm justificativas ou razões subjacentes ao
resultado afirmado na decisão, e um caso precedente é um precedente válido [good], e portanto
vinculante, para todos os casos futuros que caiam no âmbito da ratio decidendi do caso
precedente. Até aqui, tudo bem, mas e como devemos fazer para sabermos por que o tribunal
precedente decidiu da forma que decidiu? Como podemos saber qual foi a ratio decidendi? Uma
possibilidade é olhar para os fatos do caso precedente, conforme descritos pelo tribunal
precedente, e pegar esses fatos, em conjunto com o resultado do caso, como sendo a ratio
decidendi – e, de fato, foi nesse sentido a influente proposta do teórico do direito Arthur
Goodhart.27 Mas, no fim das contas, a solução de Goodhart não é de muita valia. Suponha que os
fatos sejamos seguintes: o Sr. MacPherson comprou um Buick de um revendedor que comprara o
26
Ver Geoffrey Marshall, What is Binding in a Precedent?, in Interpreting Precedents: A Comparative Study 503
(D. Neil MacCormick & Robert S. Summers, orgs., 1997).
27
Goodhart, que era Americano, foi Professor de Teoria do Direito em Oxford de 1931 a 1951. Sua tese de que a
ratio decidendi consistiria na combinação dos fatos relevantes, conforme expressos pelo tribunal, com o resultado do
caso foi apresentada em Arthur L. Goodhart, Determining the Ratio Decidendi of a Case, 40 Yale L. Rev. 161
(1930). A tese de Goodhart deu origem a um vigoroso debate alguns anos mais tarde. Ver Arthur L. Goodhart, The
Ratio Decidendi of a case, 22 Mod. L. Rev. 117 (1959); J.L. Montrose, Ratio Decidendi and the House of Lords, 20
Mod. L. Rev. 124 (1957); J.L. Montrose, The Ratio Decidendi of a Case, 20 Mod. L. Rev. 587 (1957); A.W.B.
Simpson, The Ratio Decidendi of a Case, 20 Mod. L. Rev. 413 (1957); Julius Stone, The Ratio Decidendi of the
Ratio Decidendi, 22 Mod. L. Rev. 597 (1959).
carro da Companhia Buick Motor, e a roda do Buick quebrou, causando ferimentos no Sr.
MacPherson, e o resultado do caso foi que o Sr. MacPherson venceu a disputa contra a
Companhia Buick Motor. Com essas informações, nós continuaremos sem saber o nível de
abstração, ou nível de generalidade, no qual esses fatos devem ser compreendidos, e sem mais
elementos não podemos saber por que o tribunal decidiu do jeito que decidiu.28 Foi por causa de
alguma coisa relativa aos Buicks, ou aos carros em geral, ou por algo relativo às rodas, ou a
relações de consumo, ou a produtos inerentemente perigosos (como eram tratados os carros em
1916), ou ainda por outro elemento completamente diferente. Sozinhos, os fatos e o resultado
não vão fornecer as razões para a decisão do tribunal precedente, e sem as razões, nós não temos
como dizer se MacPherson é um caso sobre Buicks, um caso sobre rodas de carros, um caso
sobre carros, um caso de relações de consumo, ou ainda algo totalmente diferente. De maneira
semelhante, se um tribunal decide que uma pessoa que vende ilegalmente bebidas alcóolicas a
um menor de idade é responsável por danos relativos ao consumo de álcool que venham a ser
causados por aquele menor de idade,29 devemos entender isso como sustentando (ou
determinando) a imposição desse tipo de responsabilidade por ato de terceiro [vicarious liability]
a alguém que legalmente vende bebida alcóolica a um adulto? Ou a alguém que vende
ilegalmente uma arma que posteriormente vem a ser utilizada em um roubo? Ou que legalmente
vende uma arma que vem a ser utilizada para o mesmo propósito? E o caso Donoghue v.
Stevenson pode ser um precedente para um caso em que a garrafa é transparente e, portanto,
passível de inspeção por parte do consumidor? Apesar da concepção de Goodhart, em nenhum
desses casos podemos dizer que a descrição dos fatos feita pelo tribunal combinada com o
resultado do caso nos fornece uma resposta.
Se, nesses casos, a mera descrição dos fatos e o resultado não são suficientes para nos
dizer o que o caso precedente realmente “significa” [“stands for”], então é tentador dizer que a
questão de semelhança jurídica é ela mesma determinada pelo direito. E é por isso que análises
sobre precedentes, incluindo a de Goodhart, geralmente falam não em fatos, mas em fatos
relevantes [material facts]. Quando concluíam que o holding do caso – termo mais usual do que
ratio decidendi nos EUA, embora haja pequenas diferenças de significado entre os dois termos –
seria uma combinação dos fatos relevantes e o resultado, Goodhart e outros resolveram o
28
Ver John Bell, The Acceptability of Legal Arguments, in The Legal Mind: Essays for Tony Honoré 45, 47 (Neil
MacCormick & Peter Birks, orgs., 1986).
29
Ver, p.ex, Congini v. Portersville Valve Co., 470 A.2d 515 (Pa. 1983).
problema do nível de generalidade, mas, em contrapartida, minaram o cerne da sua concepção.
Para Goodhart, teria sido um equívoco dizer que o carro ser um Buick era um fato relevante,
porque a “Buick-dade” [“Buick-ness”] não era mais relevante que o fato de o sobrenome do Sr.
MacPherson começar com a letra “M”. Nessa perspectiva, um fato é relevante quando uma regra
jurídica o torna juridicamente importante. É uma regra jurídica que nos diz quando duas coisas
são semelhantes, e, portanto, é uma regra jurídica que nos diz qual o nível de generalidade em
que os fatos devem ser compreendidos e descritos pelo tribunal em questão. Seria uma regra
jurídica, portanto, que nos diria que “automóvel” é uma categoria juridicamente relevante,
enquanto “Buick”, não. Contudo, embora muitas vezes seja esse o caso, contar com uma regra
jurídica para nos dizer quais casos são materialmente semelhantes e quais não são é fugir da
própria questão que estamos tentando responder. Se o critério para definir relevância vem de fora
do caso precedente – de uma lei, por exemplo – então é a lei que está fazendo todo o trabalho, e
isso não seria de modo algum uma situação de vinculação a precedentes. Isto é, se uma lei diz
que as propriedades p, q, e r são relevantes, e se o caso precedente exibe essas propriedades,
então a busca por essas propriedades no caso atual é uma busca pelas propriedades que a lei, e
não o caso precedente, tornaram juridicamente relevantes. O mesmo se aplica a determinações de
relevância feitas por um ou vários casos diferentes do caso precedente. Se uma regra jurídica préexistente torna parte do caso precedente relevante, então devemos olhar para a fonte de tal regra
e simplesmente aplicá-la, em vez de imaginarmos que é o caso precedente que está exercendo
um efeito limitador sobre nossa decisão. Se é uma regra jurídica que nos diz por que “Buickdade” não é uma propriedade juridicamente relevante, então um tribunal em um caso pósMacPherson deveria estar seguindo essa regra, e não qualquer coisa relativa ao caso
MacPherson em si.
É difícil compreender, portanto, de que forma a relevância pode se originar da mera
descrição de fatos, ainda que de fatos materiais. Se uma regra externa a esses fatos determina a
relevância, então é essa regra, e não o caso precedente, que está desempenhando a tarefa. E se a
determinação de materialidade não vem de uma regra externa ao caso, então é como se a ideia de
vinculação por precedente fosse ilusória, porque não existe nada que impeça o tribunal atual de
sair apontando semelhanças sempre que quiser chegar a um resultado consistente com o obtido
em um caso anterior, e sair apontando diferenças sempre que quiser chegar ao resultado oposto.
E, como duas situações de fato quaisquer sempre serão semelhantes uma à outra em alguns
aspectos e diferentes em outros, responder que é o direito que determina a relevância é na
verdade não dar resposta alguma.
Contudo, antes de nos desesperarmos por completo e chegarmos à conclusão de que, na
verdade, precedentes não limitam de forma alguma as decisões, é preciso lembrar que, na
esmagadora maioria dos casos, o tribunal precedente não apenas nos dá os fatos e o resultado, ou
conclusão, mas também nos diz por que chegou àquela conclusão específica. Em outras palavras,
a questão não é tanto fazer a extração da ratio decidendi de um caso, como de simplesmente ler o
que o tribunal disse que seria a ratio decidendi naquele caso.30 Se, no caso MacPherson, o Juiz
Cardozo tivesse dito algo como “temos que chegar a esse resultado porque consumidores têm
uma capacidade menor de detectar ou corrigir defeitos de fabricação, e porque fabricantes como
Buick tem uma capacidade maior de suportar e se proteger contra esse prejuízo”, então ficaria
muito mais fácil dizer que MacPherson é um precedente para qualquer caso envolvendo uma
relação entre um consumidor e um fabricante, e isso ocorreria porque teriam sido exatamente
essas as palavras do Juiz Cardozo.
Às vezes, um tribunal vai ser ainda mais claro e simplesmente anunciar qual é a regra
usada no caso. Se o Juiz Cardozo tivesse dito, “entendemos que, em todos os casos envolvendo
um consumidor e um fabricante, o fabricante tem o dever de indenizar o consumidor por
defeitos de fabricação, independentemente do liame contractual entre fabricante e consumidor”,
a questão relativa ao que foi decidido no caso – isto é, em relação ao que deve ser tratado como
um precedente – iria virtualmente desaparecer, já que haveria uma regra gerada pelo tribunal e
que poderia ser aplicada a casos futuros.31 Mas mesmo quando a regra decisória [holding] não é
sinalizada de forma tão explícita, as palavras do tribunal continuam sendo a estrela guia nessa
busca. Quando solicitado a dizer por que chegou a um determinado resultado, o tribunal vai
30
A extração da ratio decidendi é muito mais importante na Grã-Bretanha do que nos EUA, porque, na prática
adotada pelos tribunais recursais Britânicos, assim como em alguns outros países da Commonwealth, não há
nenhuma exigência de que o tribunal produza uma única decisão majoritária ou uma decisão em nome da instituição
como um todo. Os três, cinco ou mais juízes que apreciam um caso tipicamente elaborarão suas próprias decisões
individuais. O resultado obtido pela maioria desses juízes é o resultado do caso, mas determinar o que a decisão
realmente significa é inevitavelmente um processo de determinar quais proposições jurídicas e quais razões foram
capazes de angariar o apoio da maioria dos juízes. Dessa forma, se o Juiz A decide a favor do autor pelas razões x, y,
e z, o o Juiz B decide a favor do autor pelas razões p, q, e x, e se o Juiz C decide a favor do réu, então a ratio
decidendi é x, a única razão compartilhada pela maioria dos juízes. Nos sistemas em que essa prática de decisões
individuais não existem, como é o caso dos Estados Unidos (exceto na medida em que uma Suprema Corte cada vez
mais dividida parece estar se movendo nessa direção), a questão de se determinar a ratio decidendi é menos
complexa.
31
Ver Larry Alexander, Constrained By Precedent, nota 2 supra.
descrever os fatos do caso como exemplos de um tipo [type] mais geral do que aquele exemplo
particular – chamado pelos filósofos de “instância” [“token”] – que acabou surgindo naquele
caso específico. Dessa forma, quando, por exemplo, a Suprema Corte decidiu o caso New York
Times Co. v. Sullivan,32 que, tomando como base a Primeira Emenda, reformou dramaticamente
o direito dos EUA sobre difamação [libel]** , ela não estava descrevendo o autor da ação, o
Comissário Sullivan, apenas como um oficial de polícia (o que, por si só, já teria sido uma
abstração de Sullivan como indivíduo e do trabalho específico que ele desempenhava), mas
como um “agente público". E a Corte descreveu o New York Times não apenas como o singular
New York Times, e nem mesmo como apenas um jornal, mas sim como “a imprensa”. Como
resultado, New York Times v. Sullivan se apresentou desde o início como um precedente para
todo e qualquer processo de difamação iniciado por agentes públicos contra veículos de
imprensa, e isso ocorreu precisamente porque, e apenas porque, foi exatamente o que a Suprema
Corte disse. Se a Corte tivesse descrito Sullivan como um oficial de polícia, e se, em um caso
subsequente, alguém argumentasse que New York Times v. Sullivan teria sido um precedente
para casos em que a vítima fosse um agente público, sendo ou não um policial, um dos lados
teria argumentado que a melhor leitura de Sullivan é a que vê o caso como aplicável a todos os
agentes públicos, enquanto o outro lado defenderia uma interpretação mais estrita, mas nenhum
dos lados teria sido capaz de sustentar que a sua intepretação preferida seria obrigatória por
força do caso anterior, como teria sido possível se o caso se encaixasse diretamente nas palavras
empregada na decisão da Suprema Corte.33
3.4
Sobre Holdings e Dicta
O jurista atento certamente notará alguma tensão entre a discussão acima e a tradicional
distinção entre o que é o holding de um caso e o que são os dicta que podem acompanhá-lo.34
Na perspectiva tradicional,35 o holding – que é muito próximo, mas não idêntico, à ratio
32
376 U.S. 254 (1964).
N.T.: O crime de libel nos EUA é comparável ao tipo penal de “difamação” previsto no Código Penal Brasileiro.
Mais especificamente, libel refere-se apenas à difamação praticada por meio escrito ou impresso. Nos EUA, a
difamação por meio de expressão oral é chamada de slander.
33
Isso não significa que a versão hipoteticamente menos abrangente da decisão em New York Times v. Sullivan não
teria sido relevante para um caso subsequente que procurasse justamente ampliar o alcance daquela decisão, e a
natureza de argumentos desse tipo será objeto do Capítulo Cinco.
34
Voltaremos ao tópico de holdings e dicta no Capítulo Nove, que analise ainda mais de perto a natureza das
decisões judiciais.
35
Ver, p.ex., Glanville Williams, Learning the Law 62-88 (10a ed., 1978).
**
decidendi – é a regra jurídica que determina o resultado do caso. Então, quando dizemos que o
holding no caso International Shoe Co. v. Washington36 é o de que os estados podem exercer
jurisdição pessoal sobre réus que estejam fora do estado, desde que exista um mínimo de
contatos com o estado, de modo a não ofender o devido processo legal, teremos afirmado uma
regra jurídica. Às vezes, o tribunal está criando uma regra nova, e às vezes está simplesmente
ecoando uma expressão da regra encontrada em um caso anterior ou destilada a partir de
múltiplos casos precedentes. Não há nada de muito misterioso na noção de holding – é a regra
jurídica que, quando aplicada aos fatos do caso específico, gera o resultado. Então, não é errado
dizer que, no caso International Shoe, a Corte entendeu que deve haver contatos mínimos entre o
réu e o estado onde tramita a ação para justificar a aplicação de jurisdição pessoal, mas tampouco
é errado incluir na noção de holding as razões subjacentes à regra e a aplicação dessa regra aos
fatos do caso específico. Nesse sentido, poderíamos descrever o holding no caso International
Shoe como sendo a combinação da exigência de um mínimo de contato com a afirmativa da
Corte de que seria injusto esperar que um réu se defenda em um processo movido em um estado
com o qual não possui praticamente nenhuma ligação, sendo essa afirmativa geral por sua vez
combinada à conclusão de que, dado que os vendedores da International Shoe Company tinham
feito negócios em Washington, haveria contatos sufficientes para sustentar a aplicação de
jurisdição pessoal.
Não há nada na descrição de holdings feita acima que seja por si só problemático. O
tribunal afirma a regra de direito na qual baseia sua decisão, aplica essa regra aos fatos diante de
si, e proclama um resultado. E isso é o holding. Os problemas começam quando um tribunal não
diz explicitamente qual é o seu holding, e deixa por conta dos leitores a tentativa de determinálo. Na perspectiva tradicional, isso pode ser feito por meio da combinação entre o relato judicial
dos fatos relevantes e o resultado afirmado pelo tribunal, mas, pelos motivos vistos acima, isso é
insatisfatório. Se o tribunal não diz por que os fatos relevantes são relevantes, tudo que nos resta
é um relato dos fatos que pode ser interpretado em numerosos níveis de abstração. Ficamos sem
nenhuma noção sólida de qual teria sido o entendimento do tribunal, e sem nenhuma maneira de
aplicar a decisão precedente no futuro de forma confiável. Somente ao afirmar o seu holding é
que o tribunal permite que tribunais subsequentes efetivamente se pautem por (e obedeçam a)
seu holding, pois, sem essa declaração, o holding pode ser praticamente qualquer coisa. Mas,
36
326 U.S. 310 (1945).
com essa declaração, e com nosso entendimento do papel central que ela cumpre na definição do
holding, a própria ideia do que é um holding, assim como a ideia de ratio decidendi, torna-se
bem menos misteriosa.
Tradicionalmente, tudo que não integre o relato dos fatos, e nem o holding é considerado
obiter dictum – uma expressão latina que significa literamente “algo dito de passagem”. É algo
extra, não estritamente necessário para atingir, justificar ou explicar o resultado do caso.
Usualmente designadas pela forma abreviada dicta, essas afirmações desnecessárias usualmente
são observações do tribunal sobre questões que não foram de fato colocadas pelo caso, ou
conclusões sobre pontos que são desnecessários para o resultado efetivamente atingido pelo
tribunal, ou explicações abrangentes acerca de toda uma área do direito, ou simplesmente
adendos em larga medida irrelevantes. No caso Marbury v. Madison,37 o Presidente da Suprema
Corte John Marshall entendeu que a Lei de Organização Judiciária de 1791, que havia sido
invocada para justificar a jurisdição da Corte naquele caso, era inconstitucional. Mas ele também
disse que a Supreme Corte possuía o poder necessário para exercer jurisdição sobre o Presidente
dos Estados Unidos, uma conclusão que enfureceu o Presidente Thomas Jefferson, sobretudo
porque era totalmente desnecessária para a conclusão da Corte e, portanto, tinha claro caráter de
dicta. Se, no fim das contas, a Corte não tinha jurisdição sobre a matéria, então não havia
qualquer necessidade de se dizer qualquer coisa que fosse sobre quem poderia estar sujeito à sua
jurisdição hipotética. Em um exemplo de impacto muito menor, no caso Flood v. Kuhn38, que
manteve a histórica imunidade do baseball profissional ao direito antitruste, o Ministro
Blackmun incluiu na decisão várias páginas sobre história, poesia, literatura e grandes nomes do
baseball ao longo dos tempos, conteúdo cuja desnecessidade para a decisão do tribunal – e,
portanto, cujo status de dicta – seria difícil de negar.
Entretanto, se fornecer razões para suas decisões é parte do que esperamos que tribunais
façam, e se fornecer razões é a chave para o funcionamento efetivo de um sistema baseado em
precedentes, então a tradicional distinção entre holding e dicta pode ser mais problemática do
que normalmente se pensa. Como uma razão é necessariamente mais abrangente do que o
resultado para o qual essa razão funciona como uma razão,39 fornecer uma razão é dizer algo
37
5 U.S. (1 Cranch) 137 (1803).
407 U.S. 258 (1972).
39
A ideia básica é que o que torna uma razão uma razão é o fato de ela ser mais geral do que aquilo para que ela
pretende ser uma razão. Quando digo que vou ao ginásio regularmente porque isso me ajuda a perder peso, estou
38
mais abrangente do que o necessário para decidir o caso em questão. E isso parece ser dicta. Mas
o que é tecnicamente considerado dicta – isto é, não necessário para o resultado – é precisamente
o que nos permite fazer generalizações a partir de um caso bastante específico e, assim, usá-lo
como precedente no futuro. Então, embora nos extremos a distinção entre holding e dicta seja
moderadamente clara – a afirmação de uma nova regra de direito, como New York Times Co. v.
Sullivan, é parte do holding, e as divagações do Ministro Blackmun sobre a história do baseball
são dicta – a implementação do sistema de precedentes em si depende do que, estritamente
falando, é dicta, e isso nos deveria fazer pensar duas vezes antes de contar demais com essa
distinção, por mais venerável que seja a sua procedência.
3.5
Sobre a Força do Precedente – Anulação, Distinção e Outros Tipos de Escape
Um dos objetivos de se distinguir entre precedente vertical e precedente horizontal foi o
de preparar o terreno para a explicação de como os dois limitam de maneiras diferentes as
decisões de tribunais subsequentes. Normalmente, referimo-nos a precedentes verticais como
vinculantes [binding]. Isto é, geralmente se entende que um tribunal inferior não tem escolha
senão obedecer um precedente de um superior. Tribunais estaduais de primeira instância em
Nova York não podem decidir ignorar MacPherson v. Buick, da mesma forma que não podem
ignorar uma lei estadual aprovada pela assembleia legislativa daquele estado, e tribunais federais
e estaduais nos Estados Unidos devem tratar decisões da Suprema Corte em casos como Roe v.
Wade e International Shoe v. Washington como atos que estabelecem o direito [laying down the
law], tanto figurativa, quanto literalmente .40
Do caráter vinculante das decisões de tribunais superiores não se segue que não haja
nenhuma margem de manobra [play in the joints] na esfera dos tribunais inferiores, mesmo
quando parece haver um precedente bem “no alvo” [“on point”] . Às vezes, pode-se argumentar
que a decisão do tribunal superior é simples dicta, e que não há nenhuma parte do holding que
seja vinculante para os tribunais inferiores. Esse é um argumento teoricamente possível, porque
mesmo a doutrina do precedente vertical tem sido tradicionalmente entendida como restrita ao
dizendo que me ajudar a perder peso é uma razão para qualquer ação (embora não necessariamente uma razão
conclusiva), e não apenas para a minha ida ao ginásio nesta ocasião. Para uma explicação completa, ver Frederick
Schauer, Giving Reasons, 47 Stan. L. Rev. 633 (1995).
40
Na realidade, é claro, o direito que está sendo definido aqui incluiria as mais recentes decisões sobre o tema,
incluindo Planned Parenthood of Southeastern Pennsylvania v. Casey, 505 U.S. 833 (1992), no caso do aborto, e
Burnham v. Superior Court, 495 U.S. 604 (1990), Bendix Autolite Corp. v. Midwesco Enterprises, Inc., 486 U.S.
888 (1988), e World-Wide Volkswagen v. Woodson, 444 U.S. 286 (1980), no que se refere à jurisdição pessoal.
que o tribunal superior de fato decidiu, sem incluir as outras coisas que ele acabou também
mencionando no caminho. Na prática, porém, um advogado que defenda, perante um tribunal
inferior, um resultado claramente inconsistente com as palavras de uma decisão de um tribunal
superior tem uma íngreme escalada pela frente. Os argumentos no sentido de que as palavras
inconvenientes são simples dicta, e não parte da ratio decidendi, geralmente são mal-sucedidos.
O mesmo não ocorre, porém, quando o advogado ou o juiz podem distinguir o caso atual
do caso precedente. Embora se possa dizer que a existência de um precedente vinculante
decidido por um tribunal superior obriga o tribunal inferior a segui-lo, o mais preciso seria dizer
que a existência de um precedente vinculante obriga o tribunal inferior a segui-lo ou a distinguilo do caso atual. Na prática, boa parte da argumentação jurídica envolve a tentativa de um dos
lados de afirmar que um dado caso de um tribunal superior determina a decisão no caso atual,
enquanto o outro lado insiste que os dois casos são suficientemente diferentes para que o
resultado no caso precedente não precise ser também o resultado no caso atual.
Por exemplo, lembre-se do caso Riggs v. Palmer,41 no qual o Tribunal de Apelações de
Nova York decidiu que Elmer Palmer, por ter assassinado seu avô, não poderia receber sua parte
na herança prevista no testamento do avô, apesar do literalmente disposto na Lei de Testamentos
de Nova York. Muitos anos depois, o efeito de Riggs como precedente veio a ser central para um
caso chamado Youssoupoff v. Columbia Broadcasting System, Inc.42 Neste caso, um homem que
havia sido um co-conspirador no assassinato de Rasputin (o conselheiro da família real Russa)
em 1916, alegou invasão de privacidade por conta de um filme televisivo da CBS em que ele
figurava como personagem. A ação foi ajuizada na justiça estadual de Nova York, de modo que
Riggs seria determinante [controlling] se fosse aplicável. A CBS alegou que a inegável
participação de Youssoupoff no assassinato de Rasputin o trouxe para o âmbito de aplicação do
princípio de que “ninguém pode se beneficiar de sua própria torpeza” anunciado em Riggs.
Youssoupoff contra-argumentou que os casos deveriam ser diferenciados porque o ato que
praticara não estaria relacionado com a quantia que ele agora buscava obter judicialmente. E,
concordando com Youssoupoff, o tribunal negou a Riggs o caráter de precedente com força
vinculante neste caso, dizendo que a situação de fato no caso atual era suficientemente
41
42
115 N.Y. 506 (1889).
265 N.Y.S. 754 (Sup. Ct. 1965).
distinguível da do caso precedente para não haver obrigação alguma, por parte do tribunal, de
chegar ao mesmo resultado a que o tribunal superior havia chegado em Riggs.
Um outro exemplo, mais uma vez de Nova York, pode ser encontrado nos casos Campo
v. Scofield43 e Bravo v. C.H. Tiebout & Sons, Inc.44 Ambos são casos de tribunais inferiores
envolvendo usuários “em cadeia” [“downstream”]* de um produto defeituoso fabricado
negligentemente que lhes causou dano, exatamente como em MacPherson v. Buick. E, em
ambos, os autores das ações alegaram que McPherson seria determinante. Mas, em cada um dos
casos, os réus alegaram que MacPherson seria distinguível dos casos atuais, e os tribunais
concordaram. No caso Campo, o tribunal concluiu que MacPherson seria aplicável somente a
defeitos que não poderiam ter sido razoavelmente identicados pelo usuário, e, portanto, um
defeito “óbvio e patente” não poderia embasar um pedido de indenização contra um distante
fabricante, mesmo que o fabricante tenha sido negligente. E, no caso Bravo, o fato de o autor não
ter instalado um dispositivo de segurança exigido por lei tornou mais uma vez MacPherson
distinguível, mesmo sendo um caso de negligência do fabricante, e mesmo que, caso a ação
tivesse sido proposta por um consumidor direto, teria havido responsabilidade do fabricante,
independentemente da violação da exigência legal de segurança por parte do consumidor.
Nesses e em inúmeros outros casos, o advogado de uma parte alega que o caso atual está
situado no âmbito de um precedente vinculante, enquanto o advogado da outra parte tenta
distingui-lo. E os argumentos tomam essa forma precisamente porque o tribunal inferior é
forçado [compelled] a chegar, no caso atual, ao mesmo resultado do caso precedente sempre que
os fatos não forem distinguíveis. No que se refere ao stare decisis, porém, as coisas são
diferentes. Aqui, os argumentos costumam lembrar os que aparecem em casos de precedente
vertical, com uma das partes se embasando em uma decisão anterior do tribunal, enquanto a
outra parte tenta distingui-la. Mas, mesmo quando não existe fundamento plausível para se
distinguir os casos, a obrigação de obedecer uma decisão anterior raramente é absoluta no
mesmo sentido que a obrigação de obedecer uma decisão de um tribunal superior.
Diferentemente do que ocorre com tribunais inferiores diante de decisões vindas de cima,
tribunais enfrentando suas decisões passadas têm a capacidade de anulá-las [overrule them]
43
95 N.Y.S.2d 610 (App. Div. 1950).
243 N.Y.S.2d 335 (Sup. Ct. 1963).
*
N.T.; A expressão “downstream” é empregada aqui para destacar o fato de que não houve contato direto e
imediato entre o fabricante original do produto e o usuário que sofreu o dano.
44
ocasionalmente.45 Eles podem admitir que o caso atual apresenta a mesma questão decidida no
caso precedente, mas, mesmo assim, decidem rejeitar a decisão anterior.
Embora tribunais possam ocasionalmente anular suas próprias decisões, essa prática
requer mais do que a simples convicção de que a decisão anterior estava errada. Se essa
convicção fosse suficiente, stare decisis perderia totalmente o sentido, já que o ponto central
dessa prática é precisamente o de que um tribunal deve tratar uma decisão anterior como
vinculante tão somente pelo fato dessa decisão existir, e não por considerá-la correta. Se um
tribunal pudesse anular uma de suas decisões passadas sempre que achasse que ela estava
equivocada, então não haveria de fato um princípio de stare decisis nesse sistema jurídico.
Em algumas situações, porém, um tribunal vai estar convencido de que uma de suas
decisões passadas é extremamente errada, ou que as consequências de um holding anterior
equivocado são tão graves a ponto de exigir a anulação do precedente. Quando, no caso Brown v.
Board of Education46, a Suprema Corte anulou Plessy v. Ferguson,47 que determinou que
instalações públicas segregadas, mas iguais*, eram compatíveis com a constituição, os Ministros
que decidiram Brown embasaram sua ação na existência do que estavam convencidos que seria
uma grave injustiça constitucional. O mesmo ocorreu quando a Suprema Corte, no caso Mapp v.
Ohio48, anulou Wolf v. Colorado49, determinando que provas obtidas de forma ilícita seriam
inadmissíveis tanto em processos criminais na justiça federal, quanto na justiça estadual. Nesses
e em outros casos, o ato de anular se baseia não na percepção atual de que um erro foi cometido
no passado, mas na percepção atual de que foi cometido no passado um erro que extrapola
totalmente o alcance dos erros normais, seja no seu tamanho, seja na gravidade das suas
consequências. Ao decidir anular uma de suas decisões passadas, a Suprema Corte dos Estados
45
Antes da Declaração de Práticas sobre Precedente Judicial de 1966, mesmo a Câmara dos Lordes na Inglaterra
estava proibida de anular seus próprios precedentes, sob o argumento de que esse poder caberia exclusivamente ao
Parlamento. E a prática continua sendo bem menos comum na Inglaterra do que nos Estados Unidos, indicando que
a norma de stare decisis é mais forte lá do que aqui. Ver Rupert Cross, Precedent in English Law (3a ed., 1977).
46
347 U.S. 483 (1954).
47
163 U.S. 537 (1896).
*
N.T.: Na decisão no caso Plessy v. Ferguson, de 1896, a maioria dos membros da Suprema Corte entendeu que a
segregação racial em acomodações públicas, especialmente em vagões de trem, não violava a Décima Quarta
Emenda (Cláusula de Igualdade) da Constituição dos EUA, sob o argumento de que a separação física não
expressaria um juízo de inferioridade dos negros em relação aos brancos. Isto é, se a qualidade das acomodações
fosse equivalente, brancos e negros seriam “separados, mas iguais” [separate, but equal]. Plessy foi uma das mais
criticadas decisões na história da Suprema Corte dos EUA e veio a ser anulada em 1954, no caso Brown v. Board of
Education, também mencionado por Schauer.
48
367 U.S. 643 (1961).
49
338 U.S. 25 (1949).
Unidos descreveu esse acentuado ônus como uma exigência de “justificativa especial” [“special
justification”]50. Na Inglaterra, o critério é o de que a decisão passada deve ser “manifestamente
equivocada” [“manifestly wrong”].51 Os qualificativos – “especial” e “manifestamente” – são
importantes, porque deixam claro que o princípio de stare decisis perde o sentido se um tribunal
se sentir livre para anular toda e qualquer decisão passada que considere errada. Ao expressarem
critérios mais rigorosos para identificação e avaliação da suas consequências de um erro passado,
esses qualificativos garantem que a obrigação de um tribunal de seguir suas próprias decisões
passadas será um genuíno limite à atuação desse tribunal, ainda que não seja uma obrigação
absoluta, nem insuperável.
50
51
Dickerson v. United States, 530 U.S. 428, 443 (2000); Arizona v. Rumsey, 467 U.S. 203 (1984).
Vee William Twining & David Miers, How to Do Things with Rules 318 (4a ed., 1999).

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