As esquizofrenias segundo Eugen Bleuler e algumas concepções

Transcrição

As esquizofrenias segundo Eugen Bleuler e algumas concepções
As esquizofrenias segundo Eugen Bleuler e algumas
concepções do século XXI
Rui Durval
Sumário
Inspirado na releitura de “Dementia Praecox ou o Grupo das Esquizofrenias” (Eugen
Bleuler, 1911) comparo a descrição e conceptualização do autor com as de estudos mais
recentes, publicados depois de 2000, com o intuito de estimular não apenas a atenção aos
autores clássicos mas para as teorias e achados mais recentes.
1
Introdução
Muitas vezes se diz que não inventamos nada, apenas reformulamos ideias já antigas.
No estudo científico da esquizofrenia deparamo-nos frequentemente com este fenómeno,
por exemplo: talvez exista mesmo um biótipo relacionado com a esquizofrenia, como
pensavam os investigadores antigos (Sheldon, William H., 1942).
Estudos recentes parecem demonstrar uma tendência ao ectomorfismo, particularmente
nos doentes do sexo masculino, provavelmente muitas vezes mascarada pela obesidade
induzida pelos neurolépticos (Pailhez, G. et al., 2009).
Pequenas Anomalias Somáticas (“Minor Physical Anomalies”) (PAS) parecem estar
correlacionadas com pelo menos algumas formas de esquizofrenia. As PAS (ex: alterações da
forma das sobrancelhas, das orelhas ou dos pés) são: 1) pequenas marcas de alterações
genéticas; 2) resultado de agressão pré-natal ou 3) resultantes de desarmonias do
desenvolvimento, precisamente três grupos de factores implicados na etiopatogenia das
esquizofrenias (Compton, M.T. and Walker, E.F., 2009).
Inspirado na releitura de Bleuler apresento uma reflexão (numa perspectiva
principalmente clínica) sobre o conceito de esquizofrenia, comparando antigas metáforas com
estudos mais recentes.
“As associações perdem a sua coerência. Dos mil fios condutores do
pensamento a doença interrompe [cinde] de forma irregular ora uns tantos, ora
muitos, ora a maior parte deles.” (Eugen Bleuler, 1911)
Esta é uma excelente metáfora de Bleuler para descrever o que a clínica evidencia ser uma
perturbação básica da expressão sindromática das esquizofrenias. Mas em concreto
corresponde a quê?
Qual a relação entre a nosologia e a patologia?
De acordo com (Hardy'Bayle, M-C et al. 2003) poderá esta “cisão dos pensamentos”
corresponder a duas deficiências cognitivas básicas: dificuldade em processar informação
contextual e deficiente Teoria da mente (ver adiante)
2
As esquizofrenias
“Hoje sabemos que predisposições hereditárias desfavoráveis interagem com
experiências de vida desfavoráveis, mas não se encontram configurações
genéticas únicas ou experiências destruidoras bem determinadas, em vez disso
são múltiplas as disposições físicas e mentais, inatas ou adquiridas, que
constituem a predisposição para a esquizofrenia. A teoria mais aceitável para a
origem das esquizofrenias é que resultam de desarmonias de uma variedade de
influências no desenvolvimento da personalidade. Como explicação: O traço de
personalidade genérico que favorece a esquizofrenia não consiste em vários genes
patológicos mas antes da defeituosa interacção - ou desarmonia - das
características inatas” (Manfred Bleuler, 1963)
O filho Manfred, 50 anos depois de seu pai inventar a designação ‘esquizofrenia’, conclui
assim que as esquizofrenias parecem ter etiologia múltipla e representarem doenças que são a
via final comum desses diversos factores causais.
Usando a recente técnica designada ‘Associação a todo o genoma’ (“genome-wideassociation”) (Duan, I.; Sanders, A.R. and Gejman, P.V., 2010) concluem que existem várias
regiões cromossómicas com polimorfismos associados a esquizofrenia, parecendo serem
genes reguladores, que a hereditariedade é poligenética, e que existem alguma sobreposição
com a hereditariedade das doenças dos espectros autista e bipolar.
São várias as esquizofrenias ou uma única doença via final comum da interacção de
diversos factores? Ou a perspectiva de espectro clínico da esquizofrenia é um conceito mais
adequado?
A título de revisão da matéria, como fez Manfred Bleuler, resumindo em 1963 50 anos de
esquizofrenia (Manfred Bleuler, 1963), no Quadro 1 apresentam-se 22 verdades
contemporâneas de consenso sobre esquizofrenia (MacDonald, A.W. and Schulz, S.C., 2009).
2.1
O que quer dizer a palavra esquizofrenia
“Não podemos, infelizmente, subtrairmo-nos à desagradável tarefa de forjar
um novo termo para este grupo nosológico. (…) Chamo à Demência Precoce
Esquizofrenia porque conformo pretendo demonstrar, a cisão das funções
psíquicas mais diversas é uma das suas características mais importantes. Por
razões de comodidade uso esta palavra no singular, apesar deste grupo incluir
provavelmente diversas doenças”. (Eugen Bleuler, 1911)
Para Bleuler as esquizofrenias são um grupo nosológico de doenças que se manifestam
por uma cisão (spaltung) das funções psíquicas. Assim definido o grupo das doenças
designadas por esquizofrenia tem uma expressão e evolução clínicas semelhantes.
Esta definição agrupa as doenças com base em alterações básicas, nucleares, no
funcionamento psicológico do doente: e não apenas na expressão sintomática.
A ideia continua a agradar aos clínicos e aos investigadores, ainda que como candidatos a
essa(s) alterações básicas tenham sido propostas as mais diversas disfunções (ex: Fatemi, S.H.,
2009; Kantrowitz, J.K. & Javitt, D.V., 2010; Lazar, N.L. 2011).
Dizemos que um doente sofre de esquizofrenia quando apresenta um síndroma
esquizofrénico, quando evolui para deterioração, mas excluímos as formas ditas secundárias
(ex: psicose tóxica transitória).
Cada síndroma e cada evolução são expressão de diversas formas da doença, ou
diferentes doenças, ou apenas a expressão de etiopatogenia diversa?
Será a Esquizofrenia (no sentido de Bleuler: as esquizofrenias) serão uma maleita, no
sentido de síndroma que produz sofrimento ou experiência de disfunção, uma perturbação ou
uma doença.
Bleuler parece querer distinguir as ‘psicoses – episódio psicótico’ das esquizofrenias que
evoluem para a cronicidade e resultam de uma constituição ou carácter esquizofrénico (Eugen
Bleuler, 1911).
No conceito de Bleuler as esquizofrenias são um traço e não um estado.
2.2
Esquizofrenia nasceu na clínica
Sem nos interrogarmos sobre a verdade e/ou a utilidade da forma nosológica parece-nos
inegável que o conceito nasceu na observação clínica e seguimento continuado dos pacientes
e na reflexão sobre a prática clínica. Esta é a tradição europeia, antes e depois de Bleuler (a
começar pelo seu filho Manfred) . Só com os trabalhos que conduziram à DSM 3 pela primeira
vez estudos sistemáticos influenciaram a nosologia (Spitzer, R.D., 2001).
Impressionam os exemplos constantes de casos concretos (vd. Eugen Bleuler, 1911). Foi
no empirismo da clínica que se forjou o conceito. As relações apercebidas, eventualmente
muitas erradas e enviesadas pela falibilidade, pelos preconceitos e inclinações dos clínicos,
indicavam a existência de um padrão, uma forma sobre o fundo, designado então por ‘O
Grupo das esquizofrenias’.
2.3
Dimensões e Síndromas esquizofrénicos
A tentativa de identificar sub-espécies de esquizofrenia estudando as variantes
sindromáticas clínicas tem encontrado alguns padrões, como são exemplo a célebre divisão em
Tipo 1, com predomínio de sintomas positivos e Tipo 2 negativa, a que corresponderiam
etiopatogenias e prognósticos diferentes (Johnstone, E.C., 1989).
Investigadores do Centre Esquirol, em Caen, França estudaram o agrupamento estatístico
de sintomas medidos pelo PANSS numa população de doentes e encontraram os seguintes
clusters: 1) Desorganização, 2) Sintomas Positivos, 3) Sintomas Negativos, 4) Mistos e 5)
“esquizofrenia simples como definida por Bleuler” (Dollfus, S. et al., 1996).
No Quadro 2 resumem-se as conclusões do estudo de (Goghari, V. M. et al. 2010) que
parece indicar uma correspondência entre a expressão clínica e as alterações anátomofuncionais.
As subdivisões antigas em tipos perderam consistência teórica e segundo os estudos
americanos para o DSM V, deixaram de ser utilizadas na clínica (vd. APA 2011).
2.4
Fronteiras do conceito
“ (…) Define-se esquizofrenia [como psicose] por aquilo que não é (não
afectiva; não orgânica; etc…). A definição não considera conjuntos de sintomas
negativos ou positivos (ou combinados) como específicos da esquizofrenia.”
(citado de Maj, M. 1998)
Apesar dos estudos e reclassificações no fim, na clínica, o diagnóstico faz-se pela negativa,
excluindo os casos que não são esquizofrenia, como lembrava o professor napolitano Mario
Maj, em 1998, a propósito da DSM IV.
Se virmos esta definição das esquizofrenias como consequência inevitável da procura,
clínica, do diagnóstico diferencial teremos então que definir as fronteiras com outros estados
ou traços psicóticos.
No quadro 3 listam-se essas condições limites de acordo com (Nancy Andreansen, 1998).
Serão as esquizofrenias entidades taxonómicas, i.e. ‘taxa’ (singular: táxon) ou “categorias
latentes não-arbitrárias” (Grove, W.M. 2004) da classificação natural das doenças ?
Um excelente estudo de revisão crítica dos critérios da DSM IV conclui que não existe
evidência para duvidar de um modelo de distribuição único da esquizofrenia mas persiste a
questão se existe mesmo um grupo de esquizofrenias com critérios de classificação que
verdadeiramente identifiquem subtipos. A questão se a esquizofrenia é (um táxon ou) apenas
um extremo da distribuição normal na população está em aberto e deveria ser objecto de
estudo em amostras comunitárias de grande dimensão e com os indicadores adequados
(Linscott, R. J. et al. 2010).
2.5
Esquizofrenia doença
A esquizofrenia doença, doença unitária, existe enquanto conceito institucional e
cultural, com definições e atribuições diversas conforme o conceito seja utilizado pelas várias
subculturas psiquiátricas e psicológicas, pelos doentes e familiares ou pela comunidade e
media, núcleo central da noção
de estigma (ver p.ex: http://aeapeesquizofrenia.blogspot.com/2009/12/vencer-o-estigma-da-esquizofrenia.html).
Os anos de investigação foram acrescentando provas de consenso que o conceito
corresponde a uma entidade clínica: no Quadro 4 indicam-se as principais características
clínicas da esquizofrenia, integrando diversas perspectivas (Parnas, J. 2011).
Num estudo de revisão de comparações de critérios de diagnóstico (designados por
estudos de polidiagnóstico) os AA afirmam que o que parece faltar, para existir mais do que a
pouca concordância encontrada, é a existência de consenso sobre o que é de facto a
esquizofrenia: 1) Uma orientação para a vida subjectiva que altera a percepção do mundo
(autismo na concepção de Bleuler); 2) uma falta de unidade da consciência; 3) a existência de
sintomas característicos; 4) a evolução com inevitável deterioração; 5) um constructo
multidimensional; ou 6) outra coisa (Jansson, L.B. and Parnas, J. 2007).
O dinamarquês Joseph Parnas tem estudado o conceito de esquizotaxia (Meehl, P.E. 1990), e a
relação da experiência alterada do self , com a esquizofrenia, ou com formas “assintomáticas”,
indicadoras de vulnerabilidade, como a existência de traços de carácter ou personalidade
esquizotípica, caracterizados por a) disfunção do Self; b) sintomas negativos; e c) perturbação
formal do pensamento (Raballo, A. and Parnas, P. 2011).
Associada à necessidade de melhor operacionalizar os estudos genéticos, e de considerar
os efeitos epigenéticos e do meio ambiente tem sido desenvolvido o conceito de
Endofenotipo, ou conjunto de marcadores endofenotípicos: São marcadores associados à
doença, hereditários, independentes do estado, i.e. marcadores de traço, presentes com mais
frequência em familiares de doentes do que na população geral. (Thaker, G.K. 2008)
Se existem endofenotipos da esquizofrenia esta passará mais facilmente ao estatuto de
doença, para além da utilidade clínica destes marcadores na ajuda ao diagnóstico e quem sabe
na definição de estratégias de prevenção.
O estudo dos movimentos de procura e seguimento com o olhar (“scan paths”) revelam
alterações típicas em doentes e seus familiares, com grande sensibilidade e especificidade,
sendo sérios candidatos a marcadores endofenotípicos de esquizofrenia (… ou de
‘esquizovunerabilidade’) (Beedie, S.A. Et al. 2011).
Outro marcador biológico poderá ser a perturbação na percepção olfactiva: (1) a
percepção olfactiva está alterada em doentes (2) estas alterações existem em indivíduos
saudáveis mas com risco genético (3) São específicos da esquizofrenia e (4) poderão ser
indicadores de risco de desenvolver a doença (Turetsky,B.I. et al. 2009).
3
Alterações Primárias de Bleuler
A tradição académica associa à conceptualização da esquizofrenia a mnemónica dos
quatro AA, que se mantém neste texto. A mnemónica tem sido útil mas imprecisa. Em Bleuler
os 3 primeiros AA são ‘funções simples alteradas’ enquanto que Autismo é uma ‘função
complexa’ (Eugen Bleuler, 1911).
3.1
Associações (perturbação das associações)
“Nós consideramos, portanto, a perturbação das Associações como primária,
na medida em que se trate de uma diminuição ou nivelamento de afinidades; os
bloqueios e as cisões sistemáticas são secundários”. (Eugen Bleuler, 1911)
Embora na tradição falemos sempre dos quatro AA, sintomas básicos, para Bleuler só a
perturbação das associações de ideias era primária, todas as outras manifestações da doença
eram secundárias.
Desde a perda das associações de Bleuler passando pelo estudo das perturbações do
pensamento (Docherty, A.R. et al., 2011), a investigação e a clínica definem hoje o que tem
sido designado por ‘desorganização conceptual’, a principal ou uma das dimensões da
esquizofrenia (Lesh, T.A. Et al. 2011).
O modelo Hardy-Bayle: Em 2003 investigadores do ‘Centre Hospitalier de Versailles em
França propuseram um modelo que considera duas anomalias cognitivas, que existem em
todos os pacientes com desorganização esquizofrénica e que são centrais na patofisiologia da
dimensão desorganização das esquizofrenias:
1. Défice de integrar informação contextual de forma a seleccionar uma resposta
adequada.
2. Défice de Teoria da Mente.
O conjunto destes dois défices (primários) produz secundariamente as alterações da
linguagem típicas da esquizofrenia (Hardy-Bayle, M-C et al. 2003).
Os doentes apresentam deficiente capacidade para tomar em consideração a informação
contextual ao processarem a informação. Esta alteração manifesta-se por interpretações
erróneas da função referencial da linguagem, da deixis#, e por dificuldades na
metarrepresentação. A principal manifestação destas alterações são a deficiente capacidade
para integrar os diversos níveis e tipos de informação (Patniyot, N.S. 2011)
Muitos e variados estudos mostram que os doentes que sofrem de esquizofrenia tem
dificuldades específicas na forma como se apercebem das intenções, pretenções, desejos,
ideias, conhecimentos e crenças das outras pessoas. Esta dificuldade da teoria que fazem da
mente dos outros (“Teory of Mind (ToM)) reflecte-se na forma como usam a linguagem e
interpretam a fala de outros. Como estes doentes também revelam dificuldades de
planeamento e no uso pragmático da linguagem são habitualmente, na observação clínica,
menos capazes de influenciar ou manipular os outros ou mesmo de fazer batota (Brüne, M.,
2005).
Regressando à clínica o que observamos nos doentes não são directamente nem as
alterações das Associações de ideias nem as alterações do Pensamento, mas sim o modo como
se exprimem através da linguagem. As alterações da linguagem na esquizofrenia (esquizofasias
poderíamos assim designá-las se usássemos o termo de forma mais lata), são facilmente
avaliáveis na prática clínica e talvez constituam o sinal primário da doença.
O estudo das alterações da linguagem usando a escala ‘Clinical Language Disorder Rating
Scale (CLANG)’ revelou a seguinte estrutura factorial da escala: 1) Disfunção Semântica; 2)
Excesso; 3) Pobreza; 4) Disartria; 5) Prosódia. (os últimos dois factores correspondentes a
apenas um item da escala).
Usando esta escala os AA encontraram alta correlação entre as alterações
(particularmente as semânticas) e a presença de sintomas de primeira ordem.
No Quadro 5 comparo algumas das descrições de perturbação das associações originais de
Bleuler com os itens da escala citada.
Concluem que esta escala parece ter maior especificidade no diagnóstico de esquizofrenia
do que os sintomas de 1ª ordem de Schneider. (Ceccherini-Nelli, A. and Crow, T.J. 2003)
Esta pode ser uma medida clínica da Desorganização que Bleuler conceptualizou como
Spaltung.
As alterações clínicas da linguagem podem ser a manifestação da deficiente lateralização
cerebral esquerda das funções da linguagem, consequência do homo sapiens ter adquirido a
capacidade linguística segundo a teoria de Thimoty Crow (Crow, T.J. 2000).
As alterações formais do pensamento e da linguagem são acompanhadas de déficite
cognitivo mais alargado, podem ser sua causa ou consequência.
A propósito da ‘discognição’ esquizofrénica aconselho a leitura do artigo do Grupo de
Trabalho em Esquizofrenia da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental:
“Globalmente, o GTE considerou a necessidade de utilização de baterias de
avaliação padronizadas que contemplem a avaliação da neurocognição, da
cognição social e da funcionalidade, sendo consensual a utilização da bateria do
grupo MATRICS para a avaliação da neurocognição. Foi igualmente reconhecido
que os défices da memória verbal e da atenção poderão constituir os melhores
factores preditores da funcionalidade na esquizofrenia. Para além disso, o grupo
estabeleceu a cognição social como uma área prioritária no estudo da
esquizofrenia.” (citado de VAZ-SERRA, A. Et al. 2010)
3.2
Afecto embotado
Bleuler entende o comprometimento afectivo típico da esquizofrenia ao mesmo tempo
como um empobrecimento, nos sintomas como a indiferença e a superficialidade afectivas, e
uma desregulação dos afectos: hipersensibilidade, défice de capacidade de modulação
afectiva, labilidade afectiva, Expressão oscilante dos afectos. Parece intuir também uma
dimensão de incongruência e inadequação afectivas: paratimia, risos imotivados (Eugen
Bleuler, 1911).
Mais recentemente emergiram as noções da existência de uma anedonia geral como
condição básica da ‘esquizotimia´ (Cohen, A.S. et al. 2011), e em particular a anedonia social
(esta também associada ao autismo).
O défice hedónico na esquizofrenia, é uma diminuição de resposta a estímulos com
estados afectivos positivos mas sobretudo uma dificuldade em antecipar o prazer. A estas
dificuldades juntam-se as dificuldades em exprimir emoções e em interpretar as emoções dos
outros, pelo que esta dificuldade hedónica tem características diferentes da anedonia na
depressão. Esta característica afectiva é típica não apenas da esquizofrenia mas também das
alterações do carácter relacionadas (esquizotipia) (Watson,D. & Naragon-Gainey, K. 2011).
Ao componente afectivo embotado junta-se a ausência de motivação e a abulia
componentes essenciais do chamado síndroma dos sintomas negativos: a dimensão
amotivação/abulia (Foussias, G. & Remington, G. 2011).
Nos doentes estudados encontram-se muitas vezes capacidades hedónicas relativamente
intactas, aparentemente alteradas por disfunção nas capacidades de aprendizagem em
resposta a reforço, de prever a gratificação e de processar os erros de avaliação, que
constituem na realidade mais uma deficiência no ‘querer’, no ‘desejar’. Os estudos funcionais
parecem indicar que esta disfunção resulta de uma deficiente interacção entre o estriado e o
córtex dorsal pré-frontal (Lysaker, P.H. & Lysaker, J.T. 2010b).
3.3
Ambivalência
A dimensão ou sintoma básico menos compreendida na conceptualização de Bleuler é a
Ambivalência.
Este sintoma complementa a descrição da afectividade dos esquizofrénicos e estende o
conceito de presença simultânea de sentimentos antagónicos (ou múltiplos: ‘multivalência’)
para os seus análogos comportamentais volitivos, ambitendência, e cognitivos, ambivalência
intelectual. A ambivalência e é resultado da desregulação dos afectos e contribui para a
mesma desregulação.
Os neurocientistas propõem a existência de dois sistemas de avaliação cognitiva, um para
a positividade e outro para a negatividade, resultando a ambivalência da activação simultânea
de ambos. A ambivalência (particularmente relevante para estímulos positivos) correlaciona-se
com a duração da doença, o grau actual de psicopatologia, a anedonia e as competências para
as actividades de vida diárias. Não é diferente nos doentes com predomínio de sintomas
positivos ou negativos. A ambivalência, que resulta de uma deficiente processamento
emocional precoce, influencia negativamente as competência afectivas mais complexas e a
funcionalidade do doente (Trémeau, F. et al. 2009).
A anedonia, sintoma também por vezes associado á ambivalência parece relacionar-se
com hipofunção frontal enquanto a ambivalência seria correlacionada com hiperfunção
cerebelosa (Park, K.M. 2009).
3.4
Autismo
“Chamamos Autismo ao desligamento da realidade combinado com a
predominância relativa ou absoluta da vida interior.”(e mais adiante) “Para os
doentes o mundo autístico é tão verdadeiro como o mundo real ainda que por vezes
uma outra realidade.” (Eugen Bleuler, 1911)
Bleuler entende o mundo irreal do doente com esquizofrenia como um mundo interno
(autista) e a atitude do doente uma retirada para esse seu mundo interno, e relaciona este
autismo com a perda do contacto com a realidade exterior e com o evitamento e negação da
mesma realidade exterior.
Como teorizaram autores mais recentes na esquizofrenia existe não apenas deficiente
capacidade de relacionamento com o mundo exterior, com a realidade, mas também com o
self. A esquizotipia e a esquizofrenia são as versões saudável e doente desta deficiente relação
com o self. O indíviduo afectado sofre de insegurança ontológica, o self está destruturado,
dividido (Laing, R. D. 1959).
A progressiva retirada do mundo real para o mundo autista acompanha (e é acompanhada
de) a deterioração e os sintomas negativos típicos da doença.
Os estudos sobre a vivência e experiência consciente dos doentes com esquizofrenia e a
análise dos relatos da doença na primeira pessoa são escassos. Comparando seis diferentes
conceptualizações, parece haver acordo em que os doentes se sentes diminuídos desde o
início da doença, sentem menos vitalidade, menos capacidade para se relacionarem com o
mundo e os outros, menor sentimento de unidade e de identidade. As teorias mais recentes
concordam ainda na existência de um sentimento de ameaça ao self que resulta no
evitamento interacção social. As discordâncias entre as vários autores são em aspectos como
quando e como aparecem estas alterações, se são constantes, se são prévias ou apenas
existem em períodos de agudização e se, ou como, podem ser alvo de reabilitação (Lysaker,
P.H. and Lysaker, J.T. 2010a).
A região cerebral designada por Insula tem sido relacionada com a introcepção, a resposta
emocional somática, e a estados cognitivos complexos, sendo a unidade funcional para a
diferenciação entre self e não-self. É a principal região cerebral implicada no reconhecimento
da expressão emocional facial. A região anterior está relacionada com sistemas de neurónios
espelho, com a integração emocional, a empatia e o sentimento de si, a região posterior com o
processamento de informação perceptiva multimodal e unificação da experiência perceptiva.
As funções atribuídas á insulam são lateralizadas havendo dominância esquerda para a
prosódia, e o reconhecimento de emoções. As alterações morfológicas e funcionais nesta
região são frequentes nos doentes com esquizofrenia e correlacionam-se com as alterações do
self, estando na base de vários fenómenos secundários (p.ex: alucinações auditivas resultantes
da percepção de auto-vocalizações como estímulos exteriores) (Wyliea, K.P. and Tregellasa,
J.R. 2010).
4
Funções intactas
“Ao contrário das psicoses orgânicas, não encontramos na esquizofrenia, com
os meios actuais de investigação, perturbações directas da sensibilidade, da
memória, da consciência ou da motricidade.”(Eugen Bleuler, 1911, sublinhado por
mim)
Muitas das funções consideradas intactas, são uma forma de Bleuler nos ajudar a
encontrar o diagnóstico diferencial, principalmente com as causas orgânicas.
Com os actuais meios de investigação sabemos que existem alterações, frequentemente
subclínicas, como por exemplo da sensório-percepção: Estão documentadas alterações
auditivas, visuais, olfactivas e somatosensoriais. Se o paciente não sente o mundo como as
outras pessoas então também não pode interpretá-lo da mesma forma, as alterações
sensoriais podem mesmo ser primárias no processo da esquizofrenia (Javitt, D.C., 2009).
As alterações da memória, particularmente nos domínios da memória verbal e da
memória de trabalho, são centrais no deficit cognitivo da esquizofrenia, em conjunto com
alterações da vigilância e atenção, do quociente intelectual, da linguagem e do funcionamento
executivo (VAZ-SERRA, A. et al., 2010).
Alterações da motricidade têm sido associadas ao síndroma catatónico e à deterioração
(Ena, S. et al. 2011)
5
Sintomas acessórios (e secundários)
Por outros considerados como as manifestações mais importantes para a identificação da
doença, os delírios e as alucinações são, para Bleuler, sintomas acessórios, secundários ao
processo de cisão mental. Estes sintomas podem também ocorrer em outras psicoses.
No entanto, nos estudos de diagnóstico, são parte da dimensão dos sintomas positivos e
são os que tem maior concordância entre observadores e maior sensibilidade no diagnóstico
da esquizofrenia (Jansson, L.B. & Parnas, J., 2007).
Uma meta-análise de 104 estudos das funções cognitivas em doentes com esquizofrenia
demonstra maior relação das disfunções cognitivas com a dimensão ‘desorganização
conceptual’ do que com a ‘distorção da realidade’ sugerindo que estas são duas dimensões
independentes da expressão sindromática da esquizofrenia (Ventura, J. et al., 2010).
Existem três tipos de alucinações auditivas: 1) as não verbais, que estão associadas a
fenómenos neurológicos de tipo ictal; 2) as auditivas verbais do tipo memória intrusiva de
evento traumático (relacionadas com verbalizações durante o acontecimento traumático),
mais frequentemente encontradas nas PPTS; e 3) as auditivas verbais do tipo ‘fala interna’
(“inner speach”) estas mais típicas da esquizofrenia (Jones, S.R., 2010).
6
Da relação entre nosologia e patologia
A esquizofrenia poderá vir a assumir plenamente o estatuto de doença (ou grupo de
doenças), quando compreendermos se existe e qual é a relação entre a nosologia e a
patologia, por exemplo como a teoria dopaminérgica (Tost, H.;Alam, T. & Meyer-Lindenberg,
A. 2011) está relacionada com a expressão e evolução clínicas ( Howes, O.D. & Kapur, S.,
2009).
Em 2009, Klaas Stephan, Karl Friston e Chris D. Frith, de uma forma surpreendente,
propuseram um novo sentido para a cisão das associações, para a dissociação do pensamento,
propondo que esta resulta de uma realidade isomórfica, a ‘disconectividade’ neurológica
(Stephan, K. E. et al., 2009), uma teoria análoga à metáfora de Bleuler.
Com base em estudos que citam, os AA propõem que existe uma deficiência na
plasticidade sináptica, devida a uma deficiente resposta dos receptores NMDA (N-metil-Daspartato) à neuromodulação pela dopamina, serotonina e acetilcolina. Mais que as alterações
corticais e subcorticais documentadas na base da patologia estaria a existência de diminuição
e erros da conectividade neuronal e das sinapses (sendo as zonas cerebrais de relativa atrofia
resultantes da deficiente conectividade). Defendem que esta teoria explicaria as várias
manifestações clínicas e até a resposta ao tratamento dos doentes com esquizofrenia
(Stephan, K. E. et al., 2009).
7
Conclusões
Neste artigo ficaram de fora muitos outros temas relevantes para a compreensão da
doença, da sua etiopatogenia, sua expressão clínica e evolução, assim como não era nosso
objectivo abordar aspectos como o tratamento e a reabilitação.
A produção científica sobre o tema esquizofrenia é actualmente imensa: fazendo uma
pesquiza no PubMed verifica-se que o número de referências bibliográficas tem um
crescimento aproximado de 40% em 5 anos (Gráfico 1) e quase triplicou (2,7x) desde 1985.
Apesar de tanto conhecimento publicado as principais questões, que surgiram a Bleuler
quando cunhou o conceito de esquizofrenia, de alguma forma persistem actuais. A prática
clínica, a experiência e a investigação têm consolidado e fundamentado o conceito, e como
Bleuler, continuam a busca de explicações unificadoras para os fenómenos da doença.
Actualmente investe-se inclusive em estratégias de prevenção e definição de risco para a
esquizofrenia, tentando definir uma espécie de potencial ‘pré-esquizofrenia’ (ver por exemplo
a excelente revisão de Correll, C.U. et al., 2010).
Os doentes concretos sofrem de grave disfunção da maioria das capacidades mentais e
continuam a necessitar da nossa ajuda, sejam quais forem as teorias.
Bibliografia
Minha classificação: * interessante; ** importante; ***de ‘leitura obrigatória’
APA (2011) vd. http://www.dsm5.org/proposedrevision/Pages/
SchizophreniaSpectrumandOtherPsychoticDisorders.aspx
Angrill, A. Et al.(2009) 'Schizophrenia as Failure of Left Hemispheric Dominance for the
Phonological Component of Language' PLoS ONE 4(2): e4507 **"
Beedie, S.A. Et al.(2011) 'Atypical scanpaths in schizophrenia: Evidence of a trait- or statedependent phenomenon?' J Psychiatry Neurosci;36(3)150-64 *
Bentall, R.P. & Fernyhough, C.(2008) 'Social Predictors of Psychotic Experiences: Specificity
and Psychological Mechanisms' Schizophrenia Bulletin vol. 34 no. 6 pp. 1012–1020
"Birkett, P.B.L.(2011) 'Hodological resonance, hodological variance, psychosis, and
schizophrenia: a hypothetical model' Frontiers in Psychiatry Volume 2:Article 46 "
Brüne, M.(2005) '‘‘Theory of Mind’’ in Schizophrenia: A Review of the Literature'
Schizophrenia Bulletin vol. 31 no. 1 pp. 21–42 *
Ceccherini-Nelli, A. & Crow, T.J.(2003) 'Disintegration of the components of language as
the path to a revision of Bleuler’s and Schneider’s concepts of schizophrenia' British Journal of
Psychiatry 182: 233-240 **
Cermolacce, M. et al.(2010) 'What is Bizarre in Bizarre Delusions? A Critical Review'
Schizophrenia Bulletin vol. 36 no. 4 pp. 667–679
Cohen, A.S.(2010) 'A framework for understanding experiential deficits in schizophrenia.'
Psychiatry Res. 178(1):10-6
Cohen, A.S. et al.(2007) 'Neuropsychology of the Deficit Syndrome: New Data and Metaanalysis of Findings To Date' Schizophrenia Bulletin vol. 33 no. 5 pp. 1201–1212 *
Cohen, A.S. et al.(2011) 'The state-trait disjunction of anhedonia in schizophrenia:
potential affective, cognitive and social-based mechanisms.' Clin Psychol Ver 31(3):440-8
Compton, M.T. & Walker, E.F.(2009) 'Physical Manifestations of Neurodevelopmental
Disruption: Are Minor Physical Anomalies Part of the Syndrome of Schizophrenia?'
Schizophrenia Bulletin vol. 35 no. 2 pp. 425–436 *
Correll, C.U. et al.(2010) 'Research in People with the Psychosis Risk Syndrome: A Review
of the Current Evidence and Future Directions' J Child Psychol Psychiatry. 51(4): 390–431 ***
Crow, T. J.(2000) 'Schizophrenia as the price that Homo sapiens pays for language: A
resolution of the central paradox in the origin of the species' Brain Res Ver 31: 118–129 ***
DeLisi, L.E.(2001) 'Speech Disorder in Schizophrenia: Review of the Literature and
Exploration of Its Relation to the Uniquely Human Capacity for Language' Schizophrenia
Bulletin, Vol. 27, No. 3: 481-496 **
Docherty, A.R. et al.(2011) 'Alogia and formal thought disorder: differential patterns of
verbal fluency task performance.' J Psychiatr Res. 45(10):1352-7
Dollfus, S. et al.(1996) 'Identifying Subtypes of Schizophrenia by Cluster Analyses'
Schizophrenia Bulletin, 22(3): 545-555 *
Duan, I.; Sanders, A.R. & Gejman, P.V.(2010) 'Genome-Wide Approaches to Schizophrenia'
Brain Res Bull. 83(3-4): 93–102 **
Ena, S. et al.(2011) 'Unraveling the differential functions and regulation of striatal neuron
sub-populations in motor control, reward, and motivational processes' Frontiers in Behavioral
Neuroscience Volume 5: Article 47 *
Eugen Bleuler(1911) 'Dementia Praecox ou o Grupo das Esquizofrenias' edição portuguesa
Climepsi editores, 2005, Lisboa ***
Fatemi, S.H.(2009) 'Potential Microbial Origins of Schizophrenia and Their Treatments'
Drugs Today (Barc). 45(4): 305–318.
Foussias, G. & Remington, G.(2011) 'Negative Symptoms in Schizophrenia: Avolition and
Occam’s Razor' Schizophrenia Bulletin 36(2): 359–369 **
"Goghari, V. M. et al.(2010) 'The Functional Neuroanatomy of Symptom Dimensions in
Schizophrenia: A Qualitative and Quantitative Review of a Persistent Question
Schizophrenia: A Qualitative and Quantitative Review of a Persistent Question' Neurosci
Biobehav Rev. 34(3): 468 **"
Grove,
W.M.(2004)
'Taxon:
Is
http://www.psych.umn.edu/faculty/grove/125taxonconceptisit.pdf
It
Taxonic?'
Hardy-Bayle, M-C et al.(2003) 'The Cognitive Basis of Disorganization Symptomatology in
Schizophrenia and Its Clinical Correlates: Toward a Pathogenetic Approach to Disorganization'
Schizophrenia Bulletin, 29(3):459-471 ***
Howes, O.D. & Kapur, S.(2009) 'The Dopamine Hypothesis of Schizophrenia: Version III—
The Final Common Pathway' Schizophrenia Bulletin vol. 35 no. 3 pp. 549–562 *
"Jansson, L.B. & Parnas, J.(2007) 'Competing Definitions of Schizophrenia: What Can Be
Learned From
Polydiagnostic Studies?' Schizophrenia Bulletin vol. 33 no. 5 pp. 1178–1200 **"
Javitt, D.C.(2009) 'Sensory Processing in Schizophrenia: Neither Simple nor Intact'
Schizophrenia Bulletin35(6):1059–1064 *
Johnstone, E.C.(1989) 'The assessment of negative and positive features in schizophrenia'
Br J Psychiatry Suppl.:41-4
Jones, S.R.(2010) 'Do We Need Multiple Models of Auditory Verbal Hallucinations?
Examining the Phenomenological Fit of Cognitive and Neurological Models' Schizophrenia
Bulletin vol. 36 no. 3 pp. 566–575 **
Kantrowitz, J.K. & Javitt, D.V.(2010) 'N-methyl-D-aspartate (NMDA) receptor dysfunction
or dysregulation: the final common pathway on the road to schizophrenia?' Brain Res Bull.
83(3-4): 108–121 *
Kuperberg, G.R.(2008) 'Building Meaning in Schizophrenia' Clin EEG Neurosci. 39(2): 99–
102
Laing, R.D.(1959) 'The Divided self' Penguin Books, 1995 *
Lazar, N.L.(2011) 'Contribution of nonprimate animal models in understanding the etiology
of schizophrenia' J Psychiatry Neurosci 36(4):E5-29
Lesh, T.A. Et al.(2011) 'Cognitive Control Deficits in Schizophrenia: Mechanisms and
Meaning' Neuropsychopharmacology REVIEWS 36, 316–338 *
Linscott, R.J. et al.(2010) 'Seeking Verisimilitude in a Class: A Systematic Review of
Evidence That the Criterial Clinical Symptoms of Schizophrenia Are Taxonic' Schizophrenia
Bulletin vol. 36 no. 4 pp. 811–829 **
Lysaker, P.H. & Lysaker, J.T.(2010) 'Schizophrenia and Alterations in Self-experience: A
Comparison of 6 Perspectives' Schizophrenia Bulletin vol. 36 (2):331–340 **
Lysaker, P.H. & Lysaker, J.T.(2010) 'Goal Representations and Motivational Drive in
Schizophrenia: The Role of Prefrontal–Striatal Interactions' Schizophrenia Bulletin vol.
36(5):919–934 **
MacDonald, A.W. & Schulz, S.C.(2009) 'What We Know: Findings That Every Theory of
Schizophrenia Should Explain' Schizophrenia Bulletin vol. 35 no. 3 pp. 493–508 **
"Maj, M.(1998) 'The critique of DSM-IV operational criteria for schizophrenia' Brit J
Psychiatry 172:458–460 **"
Manfred Bleuler(1963) 'Conception of Schizophreniia Withinthe Last Fifty Years and
Today' Proceedings ofthe Royal Society ofMedicine Volume 56: 945-53 *
Manfred Bleuler(1984) 'What Is Schizophrenia?' Schizophrenia Bulletin 10, no. 1, 1984 *
Meehl, P.E.(1990) 'Toward an Integrated Theory of Schizotaxia, Schizotypy and
Schizophrenia' Journal of Personality Disorders 4:1-99 **
Micoulaud-Franchi, J.A. Et al.(2011) 'Toward an exploration of feeling of strangeness in
schizophrenia: Perspectives on acousmatic and everyday listening.' J Abnorm Psychol. 2011
Dec 12. [Epub ahead of print]
Moskowitz, A. & Heim, G.(2011) 'Eugen Bleuler's Dementia praecox or the group of
schizophrenias (1911): a centenary appreciation and reconsideration.' Schizophr Bull.
37(3):471-9
Nancy C. Andreasen(1988) 'The American Concept of Schizophrenia' Schizophrenia
Bulletin 15,4 *
Park, K.M.(2009) 'Anhedonia and ambivalence in schizophrenic patients with frontocerebellar metabolic abnormalities: a fluoro-d-glucose positron emission tomography study.'
Psychiatry Investig. 6(2):72-7
Parnas, J.(2011) 'A Disappearing Heritage: The Clinical Core of Schizophrenia'
Schizophrenia Bulletin vol. 37 no. 6 pp. 1121–1130 **
Patniyot, N.S.(2011) 'Thought disorder in schizophrenia: impairment in contextual
processing via integrative failures in cognition.' Med Hypotheses. 77(4):568-72 *
Pearlson, G.D. & Folley, B.S.(2008) 'Schizophrenia, Psychiatric Genetics, and Darwinian
Psychiatry: an Evolutionary Framework' Schizophrenia Bulletin vol. 34 no. 4 pp. 722–733
"Picard, H. et al.(2008) 'The Role of the Cerebellum in Schizophrenia: an Update of Clinical,
Cognitive, and Functional Evidences' Schizophrenia Bulletin 34(1):155–172 "
Raballo, A. & Parnas, P.(2011) 'The Silent Side of the Spectrum: Schizotypy and the
Schizotaxic Self' Schizophrenia Bulletin vol. 37 no. 5 pp. 1017–1026 *
Sheldon, William H.(1942) 'The Varieties of Temperament (A Psychology of Constitutional
Differences)' Harper & Brothers
Spitzer, R.D.(2001) 'Values and Assumptions in the Development of DSM-III and DSM-III R:
An Insider’s Perspective and a Belated Response to Sadler, Hulgus, and Agich’s “On Values in
Recent American Psychiatric Classification”' J Nerv Ment Dis 189: 351–359 ***
Stephan, K. E. et al.(2009) 'Dysconnection in Schizophrenia: From Abnormal Synaptic
Plasticity to Failures of Self-monitoring' Schizophrenia Bulletin vol. 35 no. 3 pp. 509–527 ***
Thaker, G.K.(2008) 'Neurophysiological Endophenotypes Across Bipolar and Schizophrenia
Psychosis' Schizophrenia Bulletin vol. 34 no. 4 pp. 760–773 *
Tost, H.;Alam, T. & Meyer-Lindenberg, A.(2011) 'Dopamine and Psychosis: Theory,
Pathomechanisms and Intermediate Phenotypes' Neurosci Biobehav Rev. 34(5): 689–700
Trémeau, F. et al.(2009) 'In support of Bleuler: objective evidence for increased affective
ambivalence in schizophrenia based upon evocative testing.' Schizophr Res. 107(2-3):223-31
Turetsky,B.I. et al.(2009) 'Scents and Nonsense: Olfactory Dysfunction in Schizophrenia'
Schizophrenia Bulletin vol. 35 no. 6 pp. 1117–1131 *
van Lutterveld, R. et al.(2011) 'The neurophysiology of auditory hallucinations – a
historical and contemporary review' Frontiers in Psychiatry Volume 2: Article 28 **
VAZ-SERRA, A. Et al.(2010) 'Cognição, Cognição social e funcionalidade na esquizofrenia'
Acta Med Port 23: 1043-1058 ***
Ventura, J. et al.(2010) 'Disorganization and Reality Distortion in Schizophrenia: A MetaAnalysis of the Relationship between Positive Symptoms and Neurocognitive Deficits'
Schizophr Res. 121(1-3): 1–14 *
Waters, F.A. & Badcock, J.C.(2010) 'First-Rank Symptoms in Schizophrenia: Reexamining
Mechanisms of Self-recognition' Schizophrenia Bulletin vol. 36 no. 3 pp. 510–517 *
Watson, D. & Naragon-Gainey, K.(2011) 'On the Specificity of Positive Emotional
Dysfunction in Psychopathology: Evidence from the Mood and Anxiety Disorders and
Schizophrenia/Schizotypy Psychopathology: Evidence from the Mood and Anxiety Disorders
and Schizophrenia/Schizotypy' Clin Psychol Rev. 30(7): 839–848 **
Wyliea, K.P. & Tregellasa, J.R.(2010) 'The Role of the Insula in Schizophrenia' Schizophr
Res. 123(2-3): 93–104 ***
#
Deixis designa o conjunto de palavras ou expressões (expressões deícticas) que têm como função ‘apontar’
para o contexto situacional. Deste modo, essas palavras ou expressões, ao serem utilizadas num discurso,
adquirem um novo significado, uma vez que o seu referente depende do contexto. Por outras palavras, a deixis
pode ser definida como o conjunto de processos linguísticos que permitem inscrever no enunciado as marcas da
sua enunciação, que é única e irrepetível. Assim, assinalam o sujeito que enuncia (locutor), o sujeito a quem se
dirige (interlocutor), o tempo e o espaço da enunciação.
O sujeito da enunciação/locutor é o ponto central a partir do qual se estabelecem todas as coordenadas do
contexto: eu é aquele que diz eu no momento em que fala; tu é a pessoa a quem o eu se dirige; agora é o momento
em que o eu fala; aqui é o lugar em que o eu se encontra; isto é um objecto que se encontra perto do eu, os tempos
verbais indicam um tempo anterior, simultâneo ou posterior ao momento da enunciação (ex.: escrevi, escrevo,
escreverei). Com efeito, é o sistema de coordenadas referenciais (EU/TU—AQUI—AGORA) da enunciação que
possibilita a atribuição de sentidos referenciais.
“A própria palavra deixis, pelo seu sentido etimológico, está associada ao gesto de “apontar”.
(vd. “Apoio a Português” 11 /6/ 2007 http://apoioptg.blogspot.com/2007/06/deixis.html)
1.1.1 Quadro 1 (Parte 1 de 2): Os 22 factos consensuais sobre esquizofrenia
Adaptada de MacDonald, A.W. & Schulz, S.C., 2009
N
Factos
Dúvidas
Factos Básicos
A esquizofrenia tem
sindromática heterogénea
uma
expressão
1
Existem subtipos?
É uma doença comum afectando cerca de 0,7%
2 da humanidade
Mais frequente no sexo masculino, excepto
3 quando de início tardio
4
Como se explicam as diferenças na
prevalência?
O que explica esta diferença ou é
apenas um viés na análise dos dados?
Começa no final da adolescência e inicio da
idade adulta, mais raramente na infância e pouco
vezes na meia idade e depois. É mais precoce no
sexo masculino.
As formas que se iniciam antes da
adolescência e depois da meia idade são
esquizofrenias ou outras doenças?
A concordância hereditária é grande atingindo
mais de 50% em gémeos
Existem
uma
ou
predisposições genéticas ?
Qual o
ambientais?
5
6
Quais os factores que determinam
as diferentes expressões sindromáticas?
Todos os fármacos antipsicóticos têm acção
antagonista dopaminérgica D2. O medicamento
mais eficaz e de maior espectro é a Clozapina
peso
dos
várias
factores
Qual a explicação para esta relação
com a dopamina? Existem outros
sistemas implicados?
Factos Etiológicos
Existem diferentes regiões cromossómicas
7 associadas á existência da doença
8
Existem alterações cognitivas (executivas) e
atrofia (substancia cinzenta em geral e hipocampo)
em familiares de 1º grau saudáveis
Qual a verdadeira relevância destes
achados
Os endofenotipos podem ajudar os
estudos genéticos?
Podem ajudar a fazer prevenção?
9
São factores de risco bem estabelecidos: Ser
migrante de 2ª geração, ter pais idosos, ter Ac´s
contra
Toxoplasmosis
gondii,
deficiências
alimentares pré-natais, uso continuado de
canabinóides, complicações obstétricas, ter crescido
em ambiente urbano e ter nascido no inverno ou
primavera
Estes e outros factores de risco são
independentes ou estão relacionados?
Como interagem com os factores
genéticos?
Factos Terapêuticos
1
0
Embora a resposta aos medicamentos seja
muitas vezes imediata para alguns doentes podem
encontrar-se melhoria só após várias semanas de
tratamento
Quais são os mecanismos de acção
dos fármacos que explicam estas
diferenças
1
1
A exposição prolongada a anfetaminas pode
desencadear sintomas tipo esquizofrenia em
algumas pessoas. Uma dose única pode fazer
reaparecer sintomas em esquizofrénicos.
Qual a explicação para as
diferenças entre uso crónico e agudo e
sua relação com vulnerabilidade?
Doses únicas de PCP ou Ketamina (antagonista
provocar
sintomas
tipo
Poderão vir a haver fármacos com
acção NMDA com interesse clínico
Intervenções psicossociais como treino de
competências sociais, remediação cognitiva,
intervenção familiar e psicoterapia, ajudam a
melhorar alguns sintomas
Estes efeitos são específicos e
mantidos a longo prazo?
Quanto mais tempo sem tratamento pior a
Será possível identificar doentes em
fase prodrómica e criar programas de
prevenção?
1 NMDA) podem
2 esquizofrenia
1
3
1 evolução e prognóstico
4
1
5
O risco de suicídio é muito alto (aprox. 5%)
Como fazer a prevenção?
1.1.2 Quadro 1 (Parte 2 de 2): Os 22 factos consensuais sobre esquizofrenia
Adaptada de MacDonald, A.W. & Schulz, S.C., 2009
N
Factos
Dúvidas
Factos Patológicos
Estudos histológicos postmortem identificam
Estas alterações são causa ou
Existem alterações no metabolismo do GABA
Poderão vir a haver fármacos com
acção a este nível?
1 anomalias dos neurónios préfrontais e do consequência
6 hipocampo com deficientes arborização e migração.
1
7
Os ventrículos laterais e 3º estão alargados e a
Que significado tem esta ligeira
1 substância cerebral diminuída mesmo em doentes atrofia?
8 com o 1º episódio
O hipocampo os córtices temporal e préExiste relação entre a atrofia e a
1
frontal
assim
como
o
tálamo
estão
diminuídos
sintomatologia?
9
Alterações funcionais Frontais, Temporais e
2
subcorticais
0
Qual a relação específica com os
sintomas
Factos Comportamentais
Alterações nos testes cognitivos, especialmente
2
memória
verbal, QI e função executiva
1
Qual a especificidade e importância
funcional destas alterações?
A disfunção cognitiva corresponde a pior
e
Como melhorar estas disfunções
para melhorar a adaptação funcional
2 funcionamento e adaptação social e laboral,
2 menor autonomia
1.1.3 Quadro 4: Caracteristicas clinicas da esquizofrenia por níveis descritivos
Adaptado de (Parnas, J., 2011)
Sinais
Sintomas
Designaç
ão da Gestalt
Orientaçã
existencial
Pert. das várias
modalidades
da
expressão / Bizarria
Perplexidade
Paratimia:
Modulação
afectiva
diminuida
ou
inadequada
Ambivalência
polivalência
/
Pert. das
associações:
‘‘Spaltung’’
Diminuição da
presence do eu
Projectos
“loucos”
Paramimia:
desorganização
expressão facial
Perda de sentido,
vazio, não-ser (depressão)
Falta
de
unidade
da
consciência
Hiperreflexibilidade
Desenvolvim
nto de Interess
em
filosofi
misticismos.
Adesão a sei
políticas
religiosas
alternativas
Ataxia
intrapsíquica
Diminuição da
imersão no Mundo
Sentimento
clinico de alteraç
da
orientaç
existencial
da
Paracinésia:
Maneirismos
e
movimentos
esteretipados
dos
olhos, face ou corpo
Discordân
Estrutura
da
subjectividade
cia
Hiper-reflexibilidade
Instabilidade
da
vivência
na
primeira pessoa
Inação
Postura rígida:
Hiperextensão
lombar, flexão do
pescoço, falta de
movimento
dos
braços
(Gebundenheit)
Pert.
do
self:
Diminuição da presença
do
self,
deficiente
perspectiva na primeira
pessoa, descorporização,
despersonalização,
espacialização da vida
mental
Instabilidade e
superficialidade das
emoções
Pert. do curso do
pensamento:
Pert. Do olhar:
esquivo ou fixo ou
vigilante: excessivo
paralelismo
dos
eixos oculares
Perda
das
fronteiras do Eu: Falta de
Bloqueio,
perceptualização
Autismo
Alteração
temporalidade
da
Alterações do
embodiament
pressão,
Alterações da
inter-subjectividade
sentimento de identidade,
opacidade da consciência,
Desvitalização,
Solipsismo/randiosida
de
Impenetrabilida
de,
falta
de
reciprocidade
afectiva, rigidez
Experiência
subjectiva do fenómeno
de espelho
Indiferença
Insegurança
e
ansiedade ontológicas,
medo da existência,
medo de dissolução
Pert. formais do
pensamento:
Perturbações
da
atenção e da percepção
(auditivas e visuais).
Sensações
corporais
anómalas.
Discurso vago,
descarrilamento,Me
tonímia
Outros Sinais
Comportamento
Negativismo,
empolado,
com antagonismo,
maneirismos
excentricidade
Fenómeno
do Espelho
Isolamento
Comportam
social,
desapego, ento
ansiedade social
desapropriado
ou bizarro
1.1.4 Quadro 2: Neuroanatomia funcional dos síndromas esquizofrénicos
Resumido de (Goghari, V. M. et al. 2010)
Região cerebral afectada
Síndroma Esquizofrénico
C. Frontal Dorsal lateral
Desorganização
C. Frontal Ventral lateral
Não está relacionada com os sintomas negativos
Sintomas negativos
C. Frontal Mediano
Alogia, embotamento afectivo, autismo
Sintomas Positivos, paranóia
C. Temporal
Alterações da cognição social
Alucinações
Amígdala,
Hipocampo
parahipocampo
Estriado ventral
e
Alterações cognitivas da linguagem
Síndroma paranóide persecutório
Percepção errada/aumentada de perigo
Sintomas negativos
Anedonia, desmotivação
1.1.5
Quadro 5: Relação entre a descrição de Bleuler e uma escala clínica de alterações
da linguagem
Sintomas descritos (Eugen Bleuler, 1911)
Ausência de finalidade do pensamento
Itens da Escala CLANG (Ceccherini-Nelli, A. and Crow, T
2003)
6. Discourse failure (loss of overall goal)
5. Referential failures (unclear links)
Condensação
2. Abnormal syntax (abnormal grammar structure)
Pensamento dissociativo/incoerente
3. Excess syntactic constraints (excessive grammar)
16. Neologisms
17. Paraphasic error (substitution by imprecisewords)
Associações por assonância
1. Excess phonetic association (sound-based associations)
Associações indirectas
4. Lack of semantic association (loss of semantic relationship
Tendência para a estereotipagem
7. Excess details
8. Lack of details
9. Aprosodic speech (flat,monotonous speech
Desinteresse / isolamento activo
Bloqueio do pensamento
Ecolália, Ecopraxia
11. Pragmatic disorder (defective knowledge of the world)
14. Poverty of speech
15. Pressure of speech
10. Abnormal prosody (bizarre quality of voice)
12. Dysfluency (abnormal rhythm)
13. Dysarthria (articulation difficulties)
1.1.6 Quadro 3: Conceito e de esquizofrenia e suas fronteiras
(Adaptado de Nancy C. Andreasen 1998)
Conceito de Esquizofrenia
Psicose invariavelmente presente
Cronicidade estabelecida
Evidência de deterioração
Exclusão de características afectivas
Exclusão de características “orgânicas”
Fronteiras: Psicoses
Outras psicoses relacionadas com a esquizofrenia
Pert. Esquizomorfa (mesma definição, duração < 6 meses)
Pert. Delirante (sem deterioração)
Psicose breve reactiva (factor precipitante, duração breve)
Pert. Esquizoafectiva (persistência dos sintomas psicóticos sem os sintomas afectivos)
Outras psicoses relacionadas com as doenças Afectivas
Psicose Maníaca ou depressiva com incongruência do humor
Psicose Maníaca ou depressaiva com humor congruente
Fronteiras: Não Psicoses
Do espectro Esquizofrénico
Personalidade esquizofreniforme
Personalidade paranóide
Personalidade esquizóide
Do espectro Afectivo
Pesonalidade Borderline
Ciclotimia
Distimia
1.1.7 Figura 1: Insula (Córtex Insular ou Lóbulo da Insula)
Figura adaptada de http://www.auladeanatomia.com/neurologia/insula.jpg
1.1.8 Gráfico 1: Crescimento das publicações sobre esquizofrenia nos últimos 25
anos
(pesquiza PubMed)
Número de referências
22000
20670
20000
artigos
18000
revisões
16000
Crescimento (~ 40% de 5/5 anos)
14668
14000
12000
11101
9806
10000
8000
8722
7162
6000
4000
2000
0
1985-1989
1990-1994
1995-1999
2000-2004
Publicados entre
2005-2009
2010-2011