Ref: Caso No. 12.361 Gretel Artavia Murillo y otros (“Fecundación in

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Ref: Caso No. 12.361 Gretel Artavia Murillo y otros (“Fecundación in
SR. SECRETARIO EJECUTIVO
PABLO SAAVEDRA ALESSANDRI
CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS
SAN JOSÉ. COSTA RICA
Señor Secretario:
Ref: Caso No. 12.361 Gretel Artavia Murillo y otros (“Fecundación in Vitro”) Costa Rica - Amicus
Curiae
Marcelo Ernesto Ferreyra em representacao de Heartland Alliance1, da Coalizão de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros, Transexuais, Travesti e Intersexuais (LGBTTTI) na
América Latina e no Caribe para trabalhos na Organização dos Estados Americanos (OEA)2 e da
Campanha por uma Convenção Interamericana de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos3, Rosa
Posa em representacao de AKAHATA4, Bruna Andrade Irineu5, Caio Fabio Varela6 y Mario Pecheny7,
y por las calidades esgrimidas, y baseado nos instrumentos internacionais de direitos humanos,
1
Aliança Heartland busca progredir em direitos humanos e responder às necessidades das populações vulneravies
como pobres, os isolados, e os desabrigados. Através do fornecimento de serviços e da promoção de soluções
permanentes que levam a uma sociedade com mais justica global.
2
ACoalizãoLGBTTTIdaAméricaLatinaeCaribedaOEAéumaassociaçãoregionalquevisavisibilidade
estratégica,advocaciaemobilizaçãoparagarantirempenhototaleconsistentedaOEAeseusistema
regionaldeproteçãodosdireitossereshumanosvoltadasaproteçãoepromoçãodosdireitoshumanosdas
pessoasLGBTInasAméricas.
3
ACampanhatemcomomissaocolocaremdebatepublicoasexualidadeereproduçãocomoumaquestão
de direitos em nossa sociedade; Gerar conteudos confiáveis, precisos, a fim de que todas as pessoas e
organizações com elementos para formar os seus próprios critérios em áreas assoladas por mitos e
preconceitos,; Especificar as diretrizes legais e da política de direitos sexuais e direitos reprodutivos,
promovendo articulações locais para conduzir o processo de toda a região; e Alertar sobre violações de
direitoshumanosnestasáreas,eemrelaçãoapossíveiscontratempospolítico,institucionalerespondera
elas.
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AKAHATA – Grupo de Trabalho em sexualidades e géneros é uma articulacao de pessoas comprometidas com os
direitos humanos que os uniu a trabalhar em temas relacionados com os géneros, sexualidades e seus direitos
derivados, desde uma perspectiva que abarque os aspectos sociais, culturais, económicos, legais e todos os outros que
favorecam a promocao e protecao do exercicio da sexualidade plena, baseada na igualdade de gênero, liberdade, o
respeito a diversidade e o gozo , sem nenhum tipo de coercao ou abuso de poder.
5
Ativista pelos Direitos Humanos LGBT no Brasil, Assistente Social, Professora da Universidade Federal do Tocantins
(UFT), Coordenadora do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Extensão em Sexualidade, Corporalidades e Direitos (UFT) e
Doutoranda em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
6
Defensor de direitos humanos, ativista LGBT no Brasil, bacharel em Relacoes Internacionais. Trabalha com Direitos
Humanos e seus mecanismos internacionais.
7
Doutor em Ciencia Política pela Universidade de París, professor regular da Universidade de Buenos Aires,
Pesquisador do Conselho Nacional de Investigacoes Científicas y Técnicas, com sede no Instituto Gino Germani.
Trabalha sobre derechos humanos em relacao a saude, gênero e sexualidade.
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como os principios de Yogyakarta8 trazemos a luz desta corte, na qualidade de amicus curiae no
Caso No. 12.361Gretel Artavia Murillo y otros (“Fecundación in Vitro”) Costa Rica, questao
especificas no que tange a garantia da utilizaçao dos métodos de reproducao assistida,
especialmente a fertilizaçao in Vitro , por LGBTIs ( Lésbicas, gays, bissexuais, Trangeneros e
Intersexuais).
A possibilidade do estabelecimento dos standards relativos a reproducao assistida, a partir do
caso costarricense, nos traz a possibidade de analizar o caso atraves da perspectiva de garantía de
direitos, sendo levado em consideracao nao somente a possilidade de ser um método alternativo de
reproducao ao casos conhecidos como de infertilidades e outras dificuldades relacionadas a saude,
especialmente das mulheres, mas ser visto como um instrumento que garante a defesa dos
seguintes direitos:
1) Direito a igualdade e a nao discriminacao
2) Direito ao desfrute do mais alto nivel possivel de saude
3) O Direito de formar uma familia
Discutir questões localizadas historicamente no campo da privacidade, politizando e
afirmando identidades, experiências e vivências demarcam o solo arenoso da subalternização do
feminino e da opressão das sexualidades não-hegemônicas. As lutas por direitos sexuais buscam
incluí-los no marco dos direitos humanos, discutindo democracia sexual e justiça no espaço público
das lutas sociais.
Refletimos aquí sobre os direitos humanos da população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais,
travestis e transexuais) argumentando acerca do direito ao acesso a Reprodução Assistida.
Entende-se por Reprodução Assistida, um conjunto de técnicas, utilizadas por médicos/as
especializados/as, com a manipulação de gametas, que tem como principal objetivo tentar viabilizar
a gestação de mulheres com dificuldades de engravidar. Ou seja, inseminação artificial, fertilização
in vitro e suas variantes.
Este processo deve ser compreendido no âmbito do direito de acesso à reprodução,
estabelecendo o lugar de cada um/a - homens, mulheres, heterossexuais, homossexuais, pais,
mães e filhos/as, através dos elementos da biologia, genética, consanguinidade ou da adoção e que
moldam os sentidos do que pode ser assumido como uma família a partir dos padrões de gênero e
sexualidade. Deste modo, a reprodução assistida passa a ser um instrumento que contorna não
apenas a infertilidade dos casais heterossexuais, mas também oferece a possibilidade de uma
mulher gestar um embrião sem qualquer vínculo genético consigo própria ou com um parceiro e
ainda dispensar o ato sexual com um homem. Ou seja, garante, entre outras, a possibilidade de que
8
Documento adoptados por un grupo de expertos distinguidos en derecho internacional y derechos humanos, como fruto
de una reunión convocada por la comisión internacional de juristas y el Servicio internacional de derechos humanos en
Yogyakarta, Indonesia, en noviembre de 2006.
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mulheres lésbicas , solteiras e sozinhas , e inclusive mulheres, que independente de sua orientacao
sexual e identidade de genero, que nao desejam ter relacoes sexuais possam reproduzir. Bem
como, dar a possibilidade de reproducao a homens solteiros e casais gays.
Os debates que circunscrevem a regulamentação da Reprodução Assistida em vários
países tem trazido à tona o “pânico moral” que envolve discursos sobre o modelo legítimo de família,
especialmente quando se trata da exclusão da possibilidade de um pai, levando provar uma inversao
hierarquica. No entanto, os debates públicos sobre a paternidade, o abandono recorrente dos/as
filhos/as pelo pai não tem ocorrido. Fernanda Vieira (2009), afirma que há um discurso de que a
sociedade tem o “dever” de proteger a criança da possibilidade de “ausência paterna” em casos de
Reprodução Assistida por casais de lésbicas ou mulheres solteiras , mas ao mesmo tempo as
maternidades têm sido penalizadas pelo sexismo, aqui entendido como desigualdades produzidas
pela supervalorização do masculino em detrimento do feminino. Além disso, há uma defesa
recorrente do modelo de família e reproduçao cristä, que por si já exclui todas as outras formas de
arranjos familiares.
Portanto, é necessário questionar: o que se torna essencial em um processo de
constituição de uma família? O desejo de uma gestação ou a qualificação para uma gestação? A
manutencao de um unico modelo, como dito na maioria das vezes cristáo, no fere a laicidade dos
Estados? Se o Estado, agente regulador destes processos e garantidor dos direitos universais, optar
pela qualificação dos sujeitos, haverá uma hierarquização no direito a parentalidade, o que se torna
deliberadamente anti-democrático e violador dos direitos humanos.
Conforme Roger Raupp Rios (2002), “a exclusão de pessoas do universo de beneficiários
de uma eventual política pública de saúde envolvendo a reprodução assistida, tomando como
parâmetro sua conformidade a uma única e determinada espécie de comunidade familiar (aquela
derivada do casamento ou da união estável – que não deixa de ser uma espécie de casamento
potencial) configura uma discriminação”.
Em concordância com a argumentação, é salutar traçar um panorama global dos direitos
sexuais e reprodutivos da população LGBT. Desde a Conferência Internacional sobre População e
Desenvolvimento, no Cairo, em 1994 e da Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim, em
1995, tem se consolidado uma terminologia relacionada aos direitos sexuais. É importante salientar
que este debate surge no âmbito das discussões sobre desenvolvimento populacional e sobre a
mulher. No texto do Cairo, o diálogo sobre o acesso ao planejamento familiar destina-se a homens e
mulheres, contudo, há menção especial as mulheres quando nesta conferência se reafirma o seu
“empoderamento”, no campo das políticas públicas, como condição estrutural para o
desenvolvimento social.
Além disso, a inclusão no Programa de Ação de uma definição de saúde reprodutiva,
enquanto “estado geral de bem-estar físico, mental e social em todos os aspectos relacionados ao
sistema reprodutivo e ás suas funções e processos” e dos direitos reprodutivos, como “direito de
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decidir livre e responsavelmente pelo número de filhos/as, espaçamento dos nascimentos,
momentos de tê-los, a dispor das informações e meios necessários para isso”. O que demonstrou
consenso internacional no reconhecimento da demanda de direitos reprodutivos e sexuais. No ano
posterior, pode-se avançar na discussão destes direitos na Conferência da Mulher, em Pequim,
onde se consagrou o entendimento de que os direitos humanos das mulheres incluem o “direito a ter
controle de sua sexualidade, incluído sua saúde sexual e reprodutiva, e decidir livremente sobre
essas questões, sem estarem sujeitas à coerção, discriminação ou violência”.
Neste sentido, ressalta-se ainda, conforme análises de Adriana Viana e Paula Lacerda
(2004), que os direitos humanos das mulheres vêm em sua constituição histórica, atrelados a um
conjunto de mudanças em relação à violência contra a mulher envolve outro processo de
transformação em relação ás concepções de família. Entretanto, no Cairo a compreensão de
“família” recebe uma ressalva na medida em que reconhece “diversas formas de família em
diferentes sistemas culturais, sociais e políticos”. Assim, nas recomendações destinadas ao apoio ás
famílias, destaca-se o acesso aos direitos relacionados à reprodução, sendo estes ampliados para
indivíduos, e não apenas a “casais”, o que implica no reconhecimento da diversidade familiar e que
também foi reiterado em Pequim e em conferências posteriores.
Considerando Cairo e Pequim como marcos no debate dos direitos sexuais e reprodutivos,
é importante salientar que, ao que se refere à aplicação internacional dos direitos humanos
específicos à população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), foram os
Princípios de Yogiakarta, em 2006, que inauguram a discussão sobre direito a não discriminação por
orientação sexual e identidade de gênero.
Em consonância, sublinha-se o “Princípio 24 – Direito de Constituir Família”, que reafirma:
“Toda pessoa tem o direito a constituir família, independente de sua orientação sexual ou identidade
de gênero. As famílias existem em diversas formas. Nenhuma família pode ser sujeita à
discriminação com base na orientação sexual ou identidade de gênero de qualquer de seus
membros”. Recomenda-se uma série de medidas para que os Estados efetivem este princípio,
destaca-se o seguinte item: “a) Tomar todas as medidas legislativas, administrativas e outras
medidas necessárias para assegurar o direito de constituir família, inclusive pelo acesso à adoção
ou procriação assistida (incluindo inseminação de doador), sem discriminação por motivo de
orientação sexual e identidade de gênero”. Bem como propoe no “Princípio 17 – Direito a Disfrutar
do mais alto nivel possivel de saúde” que em seus pontos B e F que os Estados: “Adotem todas as
medidas legislativas, administrativas e outras medidas necessárias para garantir que todas as
pessoas tenham acesso às instalações, bens e serviços de atendimento à saúde, inclusive à saúde
sexual e reprodutiva, e acesso a seu próprio histórico médico, sem discriminação por motivo de
orientação sexual ou identidade de gênero”, e “Garantaram que todos os programas e serviços de
saúde sexual e reprodutiva, educação, prevenção, atendimento e tratamento respeitem a
diversidade de orientações sexuais e identidades de gênero, estando igualmente disponíveis para
todas as pessoas, sem discriminação”.
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Recentemente publicou-se o relatório de recomendações das Organizações das Nações
Unidas – ONU aos Estados para a proteção dos direitos humanos LGBT, cuja quarta recomendação
refere-se a “Proibição de discriminação com base na orientação sexual e/ou identidade de gênero”.
Estes documentos internacionais corroboram com o entendimento das demandas LGBT
circunscritas no campo dos direitos humanos e reconhece a dificuldade do acesso aos direitos
universais por esta população, demonstrando a necessidade de reafirmá-los jurídico-legalmente.
Nos países cuja regulamentação da Reprodução Assistida ocorreu ou está em processo, o
que se percebe é o recrudescimento de uma moral na qual o padrão conjugal de família reconhece
apenas as relações heterossexuais estáveis. A conjugalidade não-reprodutiva, principalmente
homossexual, não está em conformidade com os valores morais e os padrões de normalização da
“família legítima”. Luiz Mello (2005) denomina este fenômeno de regulação da cidadania baseada no
“familismo anti-homossexual”, aonde o “vazio jurídico” relativo aos direitos conjugais e parentais
desta população sustenta a negação da condição de cidadania de lésbicas, gays, travestis e
transexuais. A partir da instituição da família heterossexual como modelo único, qualquer
possibilidade de invenção de novas formas de vida se torna praticamente impossível e ilegítima
socialmente.
Destaca-se que a preservação do “lugar” do homem na família e a ausência de sacralidade
que reveste a maternidade, pilares que evidenciam o heterossexismo – normalização da
heterossexualidade como única forma legítima de exercício da sexualidade – demonstram
nitidamente formas de regulação do corpo da mulher. Especialmente as mulheres pobres, mulheres
solteiras, mulheres negras e lésbicas encontram-se sob os limites de uma moralidade injusta
socialmente, posto que, um Estado Democrático de Direito deve manter um padrão moral que possa
ser compartilhado por pessoas de moralidades diferentes.
Por outro lado, a concretizacao de garantia de direitos à população LGBTI, tendo como
exemplo o casamento igualitário na República Argentina são favoráveis a reprodução das e por
famílias LGBTis. Portanto a interpretação preconceituosa, sexista e heteronormativa passa a violar
as leis vigentes.
O Estado detém a responsabilidade na regulamentação, e não no controle, dos direitos
sexuais e reprodutivos da população, e uma democracia efetiva agrega as pessoas LGBTI em seus
processos decisórios e as legitima enquanto sujeitos de direitos sociais, civis, econômicos, políticos,
sexuais, reprodutivos e humanos. E esta legitimidade só se torna possível na medida em que este
Estado assume para si a vulnerabilidade de um segmento que historicamente não teve acesso a
estes direitos devido às hierarquias sexuais e de gênero. Uma política sexual efetivamente
democrática compreende o exercício pleno da sexualidade, a saúde reprodutiva e os direitos
reprodutivos atender essa população, que será a usuária destes serviços sociais. Atentar as
desigualdades de classe no acesso as estes serviços, enquanto direito universal, para que no caso
da Reprodução Assistida não prevaleça à reprodução estratificada, cujo discurso da qualificação de
“quem deve” ou “quem pode” constituir família perpassa também as hierarquias de classe social.
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A regulação da Reprodução Assistida pelos Estados ocasiona um efeito político e social,
que não deve onerar segmentos historicamente discriminados como as pessoas LGBT. O índice de
mortalidade por crimes motivados pela orientação sexual e a existência de países onde há a
criminalização das homossexualidades não corroboram com os princípios da igualdade e da
universalidade intrínseco aos Direitos Humanos. É dever ético do Estado que se regulamente a
Reprodução Assistida observando o direito de todas/os, independente de orientação sexual,
identidade de gênero, estado civil, raça/etnia e classe social, a procriar e constituir família com
garantia ao acesso a meios para que isso ocorra com segurança e proteção social. endo em vista
também, a que nao sua nao relugacao configura a reproducao assistida como um comercio ilegal e
não um direito humano, sem a existencia de qualquer monitoramento e controle por parte dos
Estados.
Destarte encerra-se retomando o pensamento de Hannah Arendt, quando esta afirma que
“a essência dos direitos humanos é o direito a ter direitos”. Qualquer forma de não-reconhecimento
de direitos a determinando grupo ou violação de um direito universal por discriminação a um
segmento social é uma forma de violência. Portanto, um Estado só é legitimo de fato e de direito
quando governa possibilitando o direito a ter direitos para todos/as os grupos e segmentos
populacionais.
Marcelo Ernesto Ferreyra
Rosa Posa
Bruna Andrade Irineu
Caio Fabio Varela
[Escribirtexto]
Mario Pecheny
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