UMA CONSEQÜÊNCIA DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA

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UMA CONSEQÜÊNCIA DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA
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Artigo de Revisão
ABORTO “UMA CONSEQÜÊNCIA DA GRAVIDEZ NA
ADOLESCÊNCIA”
ABORTION “A CONSEQUENCE OF PREGNANCY IN THE
ADOLESCENCE”
Aline da Silva Braga1
Lucélia Aparecida Oliveira Rios
Norma Suely Braga Valle
1
Faculdade do Futuro
1
1
ABSTRACT
The risks that the pregnancy in the adolescence may impose are of
great importance. Preventive measures must be taken even before
an undesirable pregnancy. One of the main consequences of early
pregnancy is the abortion, which is particularly relevant in Brazil’s
Public Health. The objective of this study is to provide a review of
the literature concerning what are the consequences of an abortion
induced by an early pregnancy for the adolescent’s life. Brazilian
st
Ministry of Health Directive #980/GM, dated December 21 , 1989,
regulates the PROSAD (Health and Attention Program to the
Adolescent). The majority of adolescents follow friends’ advices
Braga et al.
Rev. Edu., Meio Amb. e Saúde 2008; 3(1):76-88.
RESUMO
Os riscos que a gravidez na adolescência pode proporcionar são
uma grande preocupação. Deve-se iniciar a prevenção antes
mesmo que ocorra uma gravidez indesejada. Uma das principais
conseqüências que acompanham a gestação precoce é o aborto,
sendo de alta relevância na Saúde Pública do Brasil. O objetivo do
estudo foi realizar uma revisão literária acerca das repercussões
que o aborto ocasionado por uma gravidez precoce representa na
vida da adolescente. A portaria n° 980/GM de 21/12/1989 do
Ministério da Saúde regulamenta o PROSAD (Programa Saúde e
Atenção ao Adolescente). Os adolescentes, em sua maioria,
distanciam-se dos pais, seguindo conselhos e comportamentos
ditados pela mídia e amigos que os cercam, resultando na
liberdade mal regrada como mecanismo compensatório da
ausência dos pais. Sem perceber as conseqüências, o desejo
sexual manifesta-se de maneira mais intensa. O jovem pode ser
surpreendido com uma gravidez não planejada. É relevante
considerar as repercussões tanto para a gestante quanto para o
concepto. Essas podem evoluir para o abortamento ou até mesmo
para a morte materna. Mais do que Programas de Saúde precisase de profissionais comprometidos, que busquem, no
aprimoramento técnico e científico, a reflexão de sua prática e
apaixonem-se pela arte de cuidar.
Palavras-Chave: aborto, adolescência, gravidez precoce,
assistência
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and behaviors, beyond those imposed by the communication
media, rather than their parent’s ones. This causes them to
experiment an uncontrolled liberty as a compensatory mechanism
for the parent’s absence. Without realizing the consequences,
sexuality appears in a more intense way. The adolescent may be
surprised by a non-planned pregnancy. It is important to consider
both the consequences for the mother and for the fetus. These
consequences may result in abortion or even in the mother’s
death. We need, more than just health programs, compromised
people who, through technical and scientific development, will think
of their professional practice and will get involved in the art of
taking care.
Key-words: abortion, adolescence, early pregnancy, assistance
INTRODUÇÃO
A gravidez durante a adolescência recebeu da sociedade considerável atenção
na metade e no final dos anos 70 (Ziegel 1985). Sabe-se que é considerada como um
grande problema de Saúde Pública no Brasil como também em outros países. A
situação vem agravando-se a cada dia, pois muitas vezes tem como conseqüência a
prática do aborto, que constitui-se em uma das principais causas de morbi-mortalidade
relacionadas à gravidez na adolescência. Só no ano de 1998, mais de 50 mil
adolescentes foram atendidas em hospitais públicos para se submeterem a curetagem
pós-aborto, sendo que cerca de 3 mil foram realizadas entre jovens com idade entre 10
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e 14 anos (Brasil 1999).
Dentre os principais fatores que, provavelmente, leva à gravidez precoce
indesejada é a atividade sexual praticada cada vez mais cedo, influenciada pela
globalização e falta de diálogo com os pais, já que assuntos relacionados à
sexualidade ainda representam um tabu dentro do grupo familiar. A falta de interesse e
as poucas informações prestadas à população também colaboram para agravar o
quadro. Fato que não deveria ocorrer, uma vez que, na atualidade, conta-se com
diversas modalidades de acesso à informação como a internet, rádios, programas de
televisão, empresas, revistas entre outros.
Evidenciam-se, em uma gravidez precoce, problemas familiares, emocionais e
biológicos, que contribuem para o aumento do índice de morbi-mortalidade da mãe e
do bebê. Como agravante, gera problemas socioeconômicos, resultado do abandono
Aborto “Uma Conseqüência da Gravidez na Adolescência
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da escola, da maior dificuldade de inserção no mercado de trabalho, da diminuição do
padrão de vida, da desestruturação familiar e, conseqüentemente, aumento da
pobreza.
O Programa de Saúde da Família possui ações de promoção e prevenção à
saúde, como palestras dirigidas, salas de esperas, métodos contraceptivos,
orientações relacionadas às DST’s, porém não abrange a gravidez na adolescência de
forma exclusiva. Nessas unidades, geralmente a distribuição de contraceptivos não
atendem à demanda da população. Para a assistência adequada da gestante
adolescente, é imprescindível que, além do conhecimento da obstetrícia, o profissional
detenha também conhecimentos acerca da adolescência (Corrêa 1994).
Analisando-se dados de um município do interior de Minas Gerais, fornecidos
pelo Data SUS entre os anos de 2002 a 2005, verifica-se que, do total de nascidos
vivos em 2002, 0,27% deles eram filhos de adolescentes na faixa etária de 10 a 14
anos, e 17,54%, na faixa etária de 15 a 19 anos, havendo um aumento importante de
gravidez na adolescência com diminuição da faixa etária (Tabela 1). Esses dados
motivaram a realização do presente trabalho, no que tange a atuação do enfermeiro na
Tabela 1: Apresentação comparativa da faixa etária de mães residentes de uma cidade
localizada no Leste de Minas Gerais nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 (Fonte:
DataSus 2002, 2003, 2004, 2005).
Faixa Etária das
Mães/Nascidos
Vivos
Total de Nascidos
Vivos
10 a 14 anos
15 a 19 anos
Outras
Períodos Pesquisados
2002
2003
2004
2005
Quant.
%
Quant. % Quant. % Quant. %
1.454
100
1.398 100 1.463 100 1.460 100
4
0,28
7
0,50
4
0,27
5
0,34
255
17,54
2,44 0,17 16,1 1,10
263 18,01
1.195 82,19 1.389 99,32 1.443 98,62 1.192 81,64
Segundo dados do IBGE (2004/2005), houve um ligeiro aumento na proporção
de meninas de 15 a 17 anos de idade com filhos, passando de 6,8% para 7,1%. Esse
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atenção básica à saúde.
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dado demonstra que as ações atualmente desenvolvidas nesta área não estão
conseguindo alcançar os objetivos propostos. Diante do exposto, é necessário
aprofundar os conhecimentos na questão, entendendo que as ações de enfermagem
vão muito além do cuidado direto com o paciente.
Visto que o pressuposto assunto é de grande relevância para a saúde pública do
Brasil, os objetivos do trabalho são: realizar revisão literária acerca das repercussões
que o aborto ocasionado por uma gravidez precoce representa na vida da adolescente,
e conhecer o trabalho desenvolvido para o adolescente na atenção básica, propondo
ações de prevenção à gravidez precoce, promoção à saúde, educação continuada com
conscientização familiar, na tentativa de reverter este quadro na sociedade.
O presente estudo constituiu-se na busca de conhecimento teórico através de
pesquisa bibliográfica. Os dados foram avaliados, objetivando o levantamento dos
problemas referentes à prestação dos serviços ao adolescente na atenção básica,
sugerindo estratégias de intervenção do enfermeiro para que possam interferir
positivamente nos indicadores analisados.
Adolescência
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Segundo a Organização Mundial da Saúde, adolescente é o indivíduo que se
encontra entre os 10 e 20 anos de idade. Nos termos do Estatuto da Criança e do
Adolescente (Brasil 1990), considera-se adolescente aquele entre 12 e 18 anos de
idade (art. 2º). O termo adolescência deriva do termo latim “adolecere” que se define
como crescer na maturidade, uma etapa vista como parte distinta do desenvolvimento.
É um período que requer atenção, pois essa etapa de mudanças entre infância e idade
adulta pode acarretar ou não problemas futuros para o desenvolvimento de um
determinado indivíduo.
É nesse período que ocorrem transformações físicas, psicológicas que afetam o
indivíduo em seu desenvolvimento. Passa-se a busca do novo, há descoberta de si
mesmo. As meninas evidenciam seus atributos que as levam da infância à maturidade
adulta. Os meninos percebem que estão numa nova etapa de suas vidas, causando
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muitas vezes desequilíbrio psicológico por ainda não entenderem a nova realidade a
eles apresentada. ”É um período de agitação interna, e esta tem como reflexo externo
aquele desencontro do corpo” (Azevedo 2002).
Os adolescentes começam a perceber o sexo oposto como algo atraente. O
desejo de um contato maior aumenta. Assim percebem suas fragilidades e também as
diferenças as quais devem ser respeitadas. É também nesse período que os
adolescentes, em sua maioria, distanciam-se dos pais, seguindo conselhos e
comportamentos ditados pela sociedade através da mídia e amigos que os cercam.
Acham tudo muito normal sem perceber as conseqüências que podem acarretar para
suas vidas num futuro muito próximo. “Com a puberdade e com as novas vivências da
adolescência, o desejo sexual se manifesta de maneira mais intensa e com objetos
mais definidos acarretando uma gravidez não planejada” (Canella 1998).
Como mecanismo de compensação da ausência dos progenitores, por
problemas de estruturação da família, a liberdade é mal regrada, resultando na não
imposição de limites. Isso tem dificultado o diálogo entre pais e filhos, sendo este, a
mola mestra para a solução das dificuldades encontradas no processo de condução
dos filhos. Os pais por sua vez, por não entenderem seus filhos e sentirem-se
ou inadequados, gerando conflitos e o afastamento entre pais e filhos. A incapacidade
de lidar com essa nova realidade faz com que o adolescente não adquira uma base
sólida, dificultando suas vivências, marcadas por sucessivas conturbações nesta etapa.
Sexualidade
Um dos grandes desafios enfrentados pelos programas de saúde hoje diz
respeito à gravidez precoce e as conseqüências encontradas nessas condições. Sabese que são inúmeros os fatores que levam a esse desfecho. Um deles é a questão da
sexualidade, pois é nesse período que as descobertas são feitas, o novo torna-se
atraente e o jovem sente-se livre para experimentar papéis adultos diversos entre eles.
A curiosidade principal observa-se na iniciação da relação sexual, em uma época em
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impotentes, tomam na maioria das vezes atitudes drásticas, usando recursos violentos
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que, no entanto, falta-lhes a experiência, a responsabilidade e o significado real de um
envolvimento sexual.
A partir de certa idade, na fase de transição entre a infância e a adolescência,
meninos e meninas, começam a sofrer transformações corporais muito evidentes
devido às alterações hormonais. São alterações fisiológicas, características da
adolescência chamada de puberdade. Os meninos começam a apresentar mudanças
como pêlos no corpo, engrossamento da voz, aparece às espinhas, o pênis e os
testículos começam a desenvolver-se. Nas meninas despontam os seios, arredondam
as formas, aparecem os pêlos pubianos e surge a primeira menstruação chamada
menarca.
Do ponto de vista psicológico, a situação altera-se. É possível observar uma
oscilação no humor do adolescente e muitas vezes agem com impulsividade exagerada
a determinado assunto. “Como período de organização final das aquisições, a
adolescência atualiza e reflete todas as crises e dificuldades inquisitadas no processo
de desenvolvimento” (Passaport et al. 1982). E é neste processo que o adolescente vai
estabelecer sua identidade perdendo definitivamente sua condição de criança. Devido a
isso, é comum que o mesmo apresente comportamento ora infantil ora adulto. Aparece
nesta fase de desenvolvimento o interesse pelo sexo oposto. Começam a namorar e
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preparam-se para uma vida sexual adulta.
Segundo Corrêa (1994), o sexo surge nesta época como uma forma de suprir
necessidades e cumprir papéis diversos como: aliviar angústia, obter uma aceitação
perante o parceiro, suprir carências de afeto, manifestar inconformismo e rebeldia, obter
maior grau de independência. Os adolescentes devem estar cientes de que, quando
imaturos para tal decisão, podem experimentar situações complicadas como gravidez
inoportuna e vivenciar uma situação conflituosa.
Evidencia-se então o grande desejo da descoberta do outro e com isso vão
vivenciando experiências na prática sexual sem os devidos cuidados, sem atentar para
as responsabilidades a serem assumidas pelos mesmos, causando para eles próprios
um futuro frustrante.
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Adolescência e Gravidez
A descoberta da gravidez atua como fator gerador de intensa angústia. A família
é um dos primeiros obstáculos que o adolescente precisa vencer. Os pais de modo
geral sentem-se desorientados sem saber como agir em relação ao problema que, na
maioria das vezes, é tratado com agressividade e sem estrutura.
A mãe adolescente tem maior morbmortalidade por complicações na gravidez,
no parto ou puerpério. A taxa de mortalidade é duas vezes maior que em gestantes
adultas, cerca de 1.654 casos de mortes maternas foram notificados em 1994 (em
média, 4,6 por dia). Estima-se que 10% desses casos estejam ligados ao aborto. Dados
do Ministério da Saúde apontam que, das 1.643 mortes maternas reportadas em 1993,
242 (14,8%) se referiam a mães de 10 a 19 anos (Brasil 1999).
Desde 1977/1978 a OMS (Organização Mundial de Saúde) passou a considerar
a gravidez na adolescência como de alto risco, devido às repercussões sobre a saúde
da mãe e do bebê. A adolescente, por não ter sua formação fisiológica completamente
desenvolvida, possui fatores biológicos dentre os quais se podem citar a imaturidade
fisiológica, a ossatura da pelve em desenvolvimento, estando o útero não preparado
complicações que mulheres em idade fértil apropriada (Brito et al. 1997).
Algumas complicações clínicas são melhores observadas durante uma gravidez
precoce: distocias de contrações, anemia, baixa resistência a infecções, hipertensão,
pré-eclâmpsia, eclampsia, infecção urinária entre outros. Segundo (Corrêa 1994), os
bebês nascidos dessas gestantes podem sofrer baixo peso ao nascer, baixo apgar,
além de malformação congênita, doenças perinatais até mortalidade infantil.
Aborto
Enfrentar uma gravidez é para o adolescente abdicar das liberdades que
desfruta junto ao grupo em que está inserido. Significa modificar completamente a sua
vida, desde os aspectos emocionais e físicos, alheios à sua vontade, até seu
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para receber e deixar desenvolver nele um novo ser. Assim apresenta mais riscos de
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comportamento diante da sociedade.
Algumas jovens preferem não vivenciar tais problemas e uma das opções que
encontram é o aborto. O procedimento, que geralmente é praticado por pessoas não
especializadas, pode ocasionar complicações que comprometem o futuro reprodutivo
desta jovem, atrapalhando seu psicológico, enfrentando, mais cedo ou mais tarde
dolorosos sentimentos de culpa.
O aborto é a interrupção da gravidez antes da viabilidade fetal, ou seja, antes da
28ª semana, podendo ser espontâneo ou provocado. Diz-se de aborto precoce quando
surge até a 20ª semana e o peso do feto não excede a 400g; e tardio da 20ª a 28ª
semana, oscilando o peso entre 400g a 1000g (Costa 2001).
O Código Penal Brasileiro, art.124, dispõe que constitui crime provocar aborto
em si mesmo, ou consentir que o provoquem. No entanto, prevê exceção em dois
casos: "do aborto necessário", se houver risco de vida da gestante e em gravidez
resultante de estupro. No primeiro caso, é obrigatório que o aborto seja praticado por
um médico e que não haja outro meio de salvar a vida da gestante. Art.128 I. No
segundo, chamado de "aborto sentimental", dependerá da comprovação da ocorrência
de estupro - Art. 128 II. Cabe ressaltar que, a gravidez em menores de 14 anos, é
pressuposto automático (Prado 2002).
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Não existem dúvidas de que o aborto é um problema social de grande magnitude
em todo o mundo e voltou a ser discutido atualmente devido à aprovação de um
plebiscito sobre sua legalização realizada em março de 2007 pelo atual Ministro da
Saúde Jose Gomes Temporão e tem enfrentado diversos protestos populares. Segundo
ele, o aborto é uma ferida aberta no país e leva sofrimento e morte às mulheres e às
famílias por ser realizado muitas das vezes clandestinamente.
Sabe-se que é muito alta a freqüência de abortamentos provocados entre
adolescentes como também os inúmeros problemas advindos daí. Realizar um aborto
não elimina os problemas psicológicos de uma gravidez indesejada, nem para a
adolescente nem para o seu parceiro. O abortamento é uma situação de grande conflito
e não se faz sem deixar marcas e repercussões no equilíbrio emocional e que, com
certeza, mulher alguma aprecia.
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Intervenção do enfermeiro
A orientação da sexualidade deve começar desde a infância, através de um bom
relacionamento familiar principalmente na figura dos pais. A adolescência é um bom
momento para uma abordagem mais ampla, em que o papel da família é importante na
conscientização, nos valores e na auto-imagem. É nela que se constroem padrões
culturais que irão refletir durante toda a vida.
Pode-se dizer que os pais desempenham papéis de socializadores e passam
para seus filhos valores e crenças, demonstrando a eles o desenvolvimento normal da
vida. O que se percebe é que nem sempre os pais conseguem falar o que o
adolescente realmente precisa ouvir quanto às suas necessidades, ou mesmo não
querem falar sobre tais assuntos, achando que os filhos nunca irão sai da condição de
criança.
Os pais reagem diante da filha adolescente grávida, com surpresa, decepção,
raiva, culpa ou alegria e também com questionamento do tipo “por que isto aconteceu?”
“onde foi que eu errei?” “será que dei liberdade demais a minha filha?”. Na verdade a
gravidez na adolescência vem demonstrar um fato que costuma ser ignorado no
para um bom esclarecimento e assim um bom desenvolvimento da personalidade. A
cultura,
a
família e
a
própria
individualidade
sintetizam
os
sentimentos
e
questionamentos sobre os comportamentos, problemas e promessas dos filhos em
relação ao futuro.
Dúvidas sobre sexualidade e relacionamento são muito freqüentes nesta etapa
da vida, devendo ser discutidos em família se esta possuir diálogo. O atual modo de
vida familiar não permite que os pais fiquem muito tempo com os filhos o que leva a um
distanciamento desde a infância. A tentativa de resgate, quando acontece, dá-se na
adolescência quando surgem evidências de que algo de “anormal” está ocorrendo com
o filho (Ramos et al. 2000).
É necessário que o enfermeiro tenha uma visão holística acerca do adolescente,
englobando seu contexto familiar. A proposta de um trabalho em busca da redução do
Braga et al.
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ambiente familiar. A sexualidade do adolescente que deve ser tratada entre pais e filhos
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alto índice da gravidez na adolescência deve conter, além de orientação, estratégias
com grupos educativos também com adolescentes, procurando conscientizá-los dos
riscos e conseqüências que a gravidez precoce pode proporcionar, demonstrando as
várias formas de prevenção. Oferecer instrução quanto aos métodos contraceptivos,
pois muitos conhecem, mas não sabe como utilizá-los, trabalhar com campanhas e
palestras educativas em lugares mais freqüentados por adolescentes, conscientizar nos
bairros trabalhando não apenas com o adolescente, mas sim, inserindo-o no grupo de
forma que se sinta útil. Estas estratégias podem ser efetivadas através do enfermeiro,
dentro do Programa de Saúde da Família, já que este é peça fundamental para o
desenvolvimento do trabalho dentro da saúde pública (Abrão et al. 2002).
A gravidez precoce é um problema que também envolve adolescentes do sexo
masculino, devendo também ser acolhido no planejamento das ações em saúde. O
enfermeiro deve estabelecer um vínculo com o adolescente levando-o a interessar-se e
procurar o atendimento da unidade. Para que isso ocorra, é necessário que o
enfermeiro tenha uma boa equipe, sendo esta multidisciplinar, em que o médico,
enfermeiro, agentes comunitários estejam inseridos no programa e trabalhem de forma
coesa (Barros 2006).
Em outubro de 1988, o Ministério da Saúde oficializou o PROSAD (Programa de
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Saúde e Atenção ao Adolescente) objetivando promover a saúde, identificar grupos de
risco e detectar precocemente os agravos para que se realize o tratamento adequado e
a reabilitação. Foram consideradas como áreas prioritárias a sexualidade e a saúde
reprodutiva do adolescente.
Para haver a inserção da orientação sexual, o enfermeiro deve procurar
estabelecer parcerias, trabalhar com palestras nas escolas de primeiro grau
desenvolvendo atividades educativas com enfoque na promoção da qualidade de vida,
discutindo permanentemente junto à equipe de trabalho e à comunidade o conceito de
adolescência, envolvendo a parte sexual, enfatizando ao mesmo tempo os direitos de
que os adolescentes dispõem. Outro ponto fundamental seria a distribuição de métodos
contraceptivos em escolas e postos de saúde, bem como campanha e orientação para
que as pessoas percam a inibição de pegá-los (Costa e Carbone 2003).
Aborto “Uma Conseqüência da Gravidez na Adolescência
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Levando-se em conta a adolescente que por ventura tenha engravidado, o
enfermeiro deve resgatá-lo imediatamente, inserindo-o no tratamento adequado,
encaminhando-a para gestação de alto risco com acompanhamento através de visitas
domiciliares, incentivando a participação em grupos educativos, transmitindo apoio e
confiança para que a mesma sinta a importância do tratamento e dê continuidade a ele
evitando assim a possibilidade de um futuro aborto (Costa e Carbone 2003).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A adolescência é um período de turbulências físicas e psicológicas. Observa-se
a dificuldade de enfrentar a gravidez e a adolescência, quando ocorrem ao mesmo
tempo. Grave é saber que essa situação está, hoje em dia, ocorrendo cada vez mais no
Brasil como também no mundo.
Embora quase todos tenham acesso às informações e aos métodos
anticoncepcionais,
alterações
nos
padrões
de
comportamento
sexual
estão
contribuindo para um aumento de caso de gravidez na adolescência. A mídia ao
mesmo tempo em que oferece informações contribui para este problema.
Após a confirmação do aumento do índice de adolescentes grávidas que estão
enfermeiro. Programas
especiais,
realizados
pelo
enfermeiro
para
gestantes
adolescentes, não só diminui os riscos durante a gestação como também previne que
estas adolescentes venham a engravidar novamente.
A questão da sexualidade ainda é considerada um tabu entre a família e a
sociedade. Isso acarreta situações indesejáveis para o adolescente como a gravidez
precoce que o faz optar pelo aborto como solução imediata. Conversar sobre
sexualidade é muito mais do que transmitir informações, é ultrapassar barreiras como
idade e valores, para que se desenvolva a proximidade no intuito de que se obtenha
uma boa percepção do filho, por mensagens que não sejam restritas e nem
permissivas, buscando entender como estão vivendo sua sexualidade, procurando criar
um clima de confidencialidade, valorizando o diálogo, a liberdade individual e a
experiência vivenciada por eles.
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propensas a praticar um aborto, é de fundamental importância a intervenção do
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Acredita-se que a gravidez precoce pode ter um relevante declínio desde que
sejam desenvolvidas ações voltadas para o comportamento do adolescente, dentro do
contexto em que ele vivencia suas descobertas e dificuldades. A parceria com outros
setores da sociedade como escolas e instituições não governamentais, podem ser de
grande auxílio, mas há que se considerar que é a família o porto seguro do
adolescente, assim sendo não pode ser ignorada, uma vez que o seu papel é
fundamental no processo de condução dos jovens.
O alto índice da gravidez precoce demonstra que a algo está falho e que a
saúde pública não segue o Estatuto da Criança e do Adolescente e não utiliza os meios
disponíveis como o PROSAD.
Em razão da gestação na adolescência ser um problema multidimensional, é
imprescindível o estímulo a programas inovadores que incluam todos os adolescentes
e sua família.
Diante do exposto, conclui-se que mais do que programas de saúde, precisa-se
de profissionais comprometidos, principalmente enfermeiros, que busquem no
aprimoramento técnico e científico a reflexão de sua prática, incorporem a nossa
identidade, apaixonem-se pela arte de cuidar.
Rev. Edu., Meio Amb. e Saúde 2008; 3(1):76-88.
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