Yo! I bet`cha can learn ebonics: pluralidade cultural no
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Yo! I bet`cha can learn ebonics: pluralidade cultural no
Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 Yo! I bet’cha can learn ebonics: pluralidade cultural no desenvolvimento de material didático voltado para o ensino de língua inglesa. Cláudia Cristina Mendes Giesel1 Romulo Pereira da Silva2 Resumo Este artigo almeja inserir a diversidade cultural, como proposta pelos PCN (1997), explorando outras vertentes da língua inglesa. Além disso, destaca a história, estrutura e uso do Black English, revelando-se útil para analisar tais variações em qualquer língua, e não somente sua forma-padrão. Os temas transversais abordados nessa pesquisa citam a importância da pluralidade cultural nas aulas de Inglês. Para isso, utilizam-se os conceitos de PCN (1997), Oliveira (2013), Ferreira (2011), Santos (2011), Lira (2007). A estrutura do Ebonics é apresentada por Grim (2010), Fickett (1972) e Spears (2001). Foram elaboradas quatro unidades, abordando diferentes tópicos voltados à raça, etnia e a questões sociais. Foram usados os conceitos da Reorientação Curricular (2006). Palavras-chave: Língua Inglesa; pluralidade cultural; material didático; Black English. Abstract This paper addresses cultural diversity, as proposed by the PCN (1997), exploring other aspects of the English language teaching. Moreover, it highlights the history, structure and use of the Black English. The cross-cutting themes, addressed by the PCN, cite the importance of cultural plurality in English classes. For this, we use the concepts of PCN (1997), Oliveira (2013), Ferreira (2011), Santos (2011), Lira (2007). The Ebonics structure is presented by Grim (2010), Fickett (1972) and Spears (2001). An educational material addressing different topics related to race and ethnicity was developed by concepts of Curriculum Reorientation (2006). Keywords: English; cultural plurality; educational material; Black English. 1 Pós-doutora em Sociolinguística pela Universidade de Vigo, Ph.D. em Educação e Mestre em Linguística Aplicada/Inglês pela Iowa State University. Professora da Universidade Veiga de Almeida e da Faculdade Educacional da Lapa/PR - [email protected] 2 Licenciado em Letras Português/Inglês pela Universidade Veiga de Almeida - [email protected] Janeiro/Junho de 2016 – pág.18 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 Introdução A comunicação entre as pessoas é algo imprescindível e a língua de um povo torna-se um dos fatores fundamentais para esse contato. A respeito da língua e de suas transformações, pode-se citar o exemplo da língua inglesa, que tem sofrido diversas mudanças com o passar dos séculos. Essas mudanças ocorreram por diversos motivos principalmente devido à classe social, econômica ou cultural dos falantes. O tema desta pesquisa refere-se a uma variante linguística da língua inglesa, o Black English (doravante BE), no intuito de demonstrar a possibilidade de aplicar o African American Vernacular English, também chamado de AAVE, no ensino de língua estrangeira através da elaboração de um material didático. Isso foi feito na tentativa de abordar as demais vertentes de uma língua, estabelecendo uma conexão com as questões sociais e culturais inseridas em dito contexto. Acredita-se que a origem do BE se deva ao comércio dos escravos oriundos da África Ocidental e Central que chegavam à América, por volta do século XVI, para trabalhar nas colônias. Através do processo de separação e de uma aculturação forçada, a linguagem dos africanos escravizados começou a transformar-se num dialeto que daria origem à variante do inglês usada pelos escravos, chamada pidgin. Esse pidgin caracterizava-se por ser uma mistura da língua franca, com base no inglês coloquial dos marinheiros, e de diversos idiomas africanos. Através desse fenômeno, deu-se origem ao creoles, um inglês crioulo falado nas Sea Islands, no litoral do estado da Carolina do Sul. A evolução natural e a propagação dessa variante resultaram no Black English, o inglês dos negros, falado em muitas comunidades nas grandes metrópoles estadunidenses. Tal variante espalhou-se pelo país e acabou ganhando fama nacional e atenção nos círculos político, social e acadêmico, além de tornar-se um identificador étnico forte para muitos na comunidade afro-americana (GRIMM, 2010). O objetivo geral desta pesquisa é, portanto, apresentar e aplicar o BE ao ensino de língua inglesa. A pesquisa é qualitativa e o corpus será baseado em um material didático composto de quatro unidades a fim de serem trabalhadas nas aulas de Inglês. Busca-se inserir a diversidade cultural, como é proposto pelos PCN (1997), explorando outras formas de expressão, para que, a partir dessa premissa, os alunos tenham uma Janeiro/Junho de 2016 – pág.19 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 visão aberta e crítica sobre as diferenças linguísticas em um mesmo idioma. Além de destacar a história, estrutura e uso de uma variante linguística, essa pesquisa visa contribuir para a análise de variações em qualquer outra língua, e não somente na sua forma-padrão. 2. O ensino de língua estrangeira e a importância da pluralidade cultural O ensino de língua estrangeira ministrado no ensino médio, por exemplo, do Inglês, não é tão atrativo segundo alguns alunos, pois as aulas são, com frequência, maçantes e descontextualizadas. O foco das aulas é posto geralmente na gramática ou em textos a serem traduzidos sem qualquer instrução prévia acerca de técnicas de leitura. Há, portanto, um empobrecimento do ensino de línguas nas escolas, tornando-o inferior em eficácia e atrativo se comparado com as outras matérias do currículo. De acordo com os PCN (BRASIL, 1998, p.25), o papel do ensino de línguas caracteriza-se por: Ser parte indissolúvel do conjunto de conhecimentos essenciais que permitem ao estudante aproximar-se de várias culturas e, consequentemente, propiciam sua integração num mundo globalizado. A partir do contato com as línguas estrangeiras, o aluno começa a ter acesso ao conhecimento de outras culturas e diferentes formas de ver o mundo à sua volta, o que lhe faculta uma formação mais sólida e abrangente. O conteúdo, o contato com as semelhanças e diferenças entre as várias culturas e a constatação de que os fatos sempre ocorrem dentro de um contexto, entre outros fatores, são aspectos que permitem estabelecer de maneira clara diversas formas de relações entre as línguas estrangeiras e as outras disciplinas que integram a área (BRASIL, 1998, p.26). Dessa forma, aprender somente a gramática de forma isolada não garante, de fato, um pleno aprendizado: é preciso que o aluno possua um bom domínio da competência sociolinguística, da competência discursiva e da competência estratégica. São esses os propósitos maiores do ensino de línguas estrangeiras no ensino médio. A instituição e a coordenação pedagógica devem fazer um planejamento para que todas as disciplinas possam andar em conjunto, de modo que o professor de línguas consiga Janeiro/Junho de 2016 – pág.20 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 abordar um conteúdo que se relacione com outras matérias, tais como Geografia, História ou Sociologia, relacionando à gramática da língua, simultaneamente, aspectos sociais e culturais. É preciso que haja uma autorreflexão dos docentes de línguas estrangeiras de instituições, tanto municipais quanto estaduais, para pôr em prática o que os PCN recomendam, adotando medidas que atinjam e despertem o interesse dos jovens, expondo-se as demais formas de cultura de maneira dinâmica e contextualizada, e colocando em prática os conceitos da competência comunicativa, pois uma língua é o veículo de comunicação de um povo e será através dela que o povo transmitirá sua cultura, tradição e conhecimentos. Um tema muito importante, e que deve ser trabalhado nas escolas, é a questão da aceitação das diferenças e de sua acolhida harmoniosa. Os temas transversais no meio social são uma ferramenta primordial para o respeito aos diferentes grupos e culturas, porque a sociedade brasileira é formada não apenas de diferentes etnias, mas ainda por imigrantes de diferentes países. Por isso, cabe à escola investir na superação da discriminação, possibilitando que os alunos conheçam a riqueza e a beleza representada pela diversidade etnocultural que compõe o patrimônio sociocultural brasileiro (OLIVEIRA, 2013). Onde há diversidade, é possível que também haja, infelizmente, o preconceito e a discriminação. Mesmo assim, a cultura africana deve ser apresentada aos alunos desde os primeiros ciclos. Há uma lei, em vigor desde 2003, que se refere a esse assunto. Ferreira (2011, p.119-120) retrata a importância do ensino da cultura afro-brasileira e cita a lei federal: As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorraciais (2003) trazem a Lei Federal nº 10639, que modificou a LDB (Lei Federal nº 9394/1996), que estabeleceu as diretrizes e bases da educação nacional, incluindo, no currículo oficial da rede de ensino, o tema sobre História e Cultura Afro-Brasileira, instituindo, inclusive, o dia 20 de novembro como o dia da Consciência Negra. Com o advento da Lei Federal nº 10639/2003 ficou evidente, portanto, a preocupação com os cidadãos afrodescendentes. Sendo assim, é importante enfatizar que tal lei só foi efetivada devido às lutas do chamado Movimento Negro. Janeiro/Junho de 2016 – pág.21 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 O conhecimento sobre a cultura africana é de suma importância, pois, através desse aprendizado, espera-se que o aluno entenda mais sobre a sua própria cultura e também sobre a herança que os povos africanos deixaram para o Brasil. A partir disso, Ferreira (2011, p.120) ressalta ainda a importância da luta para que essa lei entrasse em vigor. E acrescenta: É importante enfatizar que tal lei só foi efetivada devido às lutas do chamado Movimento Negro. A lei existe, mas para que ela possa continuar a valorizar os afrodescendentes que tanto foram (e ainda são) estigmatizados em todos os setores sociais, é necessária a união de todos, assumindo a responsabilidade de continuar mudando a realidade dos cidadãos que sofrem preconceito neste país. A iniciativa do movimento negro foi importantíssima e cabe às escolas implantarem atividades voltadas para essa questão para que, desde os primeiros ciclos, o preconceito já seja discutido em sala, abordando-se a realidade do cidadão negro e a sua discriminação presente na sociedade, de modo que os alunos tenham consciência e saibam argumentar sobre o assunto. 3. Trabalhando a pluralidade cultural nas aulas de Inglês A língua inglesa é repleta de cultural spot e de curiosidades que deixam os alunos bastante interessados nas aulas, porém é preciso que haja criatividade e inovação. Pode-se abordar a pluralidade cultural e ainda abordar um lado diferente da língua, trazendo cada vez mais cultura para os alunos. Em relação à pluralidade cultural no ensino de língua inglesa, Santos (2011, p. 56) afirma que: Uma proposta de ensino intercultural de línguas deve incentivar o passeio por diferentes mundos, com vistas à superação de preconceitos e conflitos que possam decorrer do encontro destes mundos. O diálogo é o ponto chave para o sucesso das relações interculturais. No estudo de caso de Santos, ela observou a performance em sala de aula de um professor de língua inglesa, o qual abordou em suas aulas as questões da cultura Janeiro/Junho de 2016 – pág.22 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 negra, quase não abordadas nos livros didáticos em inglês. Ela observou que o professor aplicou diversas atividades para abordar esse assunto, dentre elas uma atividade que consistia na análise de informações não verbais de duas propagandas envolvendo pessoas negras, veiculadas em diferentes partes do mundo. Os alunos ficaram surpresos com o conteúdo racista das propagandas estrangeiras e outros demonstraram acreditar que esse conteúdo poderia também ser encontrado em propagandas brasileiras. Além dessas atividades, também fizeram leituras de biografias, narrativas e histórias sobre personagens negros. Com isso, tiveram o contato com imagens positivas do negro que quase não são mostradas nos materiais didáticos (SANTOS, 2011). Lira diz que os efeitos das novas diretrizes dos PCN, no que se refere ao tema transversal “pluralidade cultural”, só terão efeito nos alunos se, primeiramente, forem internalizadas pelos professores (LIRA, 2007). Desse modo, eles poderão mudar de atitude perante a sala de aula, colocando em prática as novas diretrizes. Uma vez ocorrendo essa mudança, os alunos serão em seguida beneficiados por ela. Sabe-se, porém, que não será uma tarefa fácil de ser cumprida. A mudança de atitude dos alunos não ocorre rapidamente, mas faz parte de um processo de transformação interna, pois será a partir do professor ao reformular suas estratégias de ensino, que “o novo” será dado aos alunos. Lira (2007, p.11) também ressalta a importância do papel do professor em sala: É necessário que o professor compreenda o ambiente sociocultural em que o aluno está inserido, reconhecendo seus direitos como aprendiz de uma segunda língua, procurando adaptar o conteúdo das aulas para assuntos e conveniências que possam ser do interesse dos alunos. Para isso, é necessário haver uma empatia do professor para com seus alunos e uma maior interação em sala de aula. A interação professor/aluno/professor é de importância fundamental no ensino/aprendizagem de línguas, pois sem ela o ensino seria abordado de uma forma unilateral e verticalizada, nem sempre respeitando os direitos e os anseios dos alunos. Está ligada diretamente à forma como o professor percebe o aluno e para isso se faz necessário compreender esse aluno como um ser holístico, levar em conta sua condição de criatura cognitiva, sociolinguística e cultural. Segundo Santos (2011, p.7) em relação à postura do professor no ensino de Inglês ao abordar outras culturas, afirma que: O professor deve ter identificação com o ensino crítico e reflexivo de inglês, também com as questões étnico-raciais, muito mais do que formação Janeiro/Junho de 2016 – pág.23 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 acadêmica e profissional para desenvolver o trabalho proposto, já que sua prática parece estar diretamente condicionada às crenças, valores e posicionamentos ideológicos formados a partir de suas identificações/identidade. Segundo Júnior (2006), ele trabalhou em sala a atitude reflexiva a respeito da pluralidade cultural após presenciar situações de falta de respeito de alunos brancos, usando apelidos contra alguns alunos negros e gordos. Com isso, utilizou o diálogo entre eles, ensinando o inglês a fim de descobrirem as diferenças e o respeito. Segundo Oliveira (2003, p.10), ele assumiu a posição de “coordenador de debates” e também “participante do círculo de cultura” com os alunos na condição de educador e eles de educandos, dialogando e frisando a solidariedade e o respeito. Para colocar em prática sua pesquisa, ele utilizou cartazes, livro didático, entrevistas e debates. Teve como resultado novas maneiras de se comportar e agir diante das diversidades culturais na convivência entre homens e mulheres e o exercício do respeito mútuo. Fez com que os alunos entendessem que, dentro da mesma sala, há diferenças no modo de pensar, agir, na aparência física, credo, profissão dos pais etc. Ele também mostrou que essas situações não justificam que haja falta de respeito, pelo contrário, deve-se agir com solidariedade e cidadania. Através dos vocábulos referentes às profissões na língua inglesa, introduziu-os durante as discussões (differences, diversity, values, cultures, respect) e expressões que tivessem o valor devido ao objetivo da discussão (they all must be respected and valued; different professions have different subjects; stressed jobs). A partir disso, pôde-se enfatizar a existência das várias profissões, suas afinidades, diferenças, valores e respeito, configurando traços culturais no interior de quaisquer culturas. A atenção que o docente deve ter em sala é imprescindível, pois ele deve ter uma visão ampla dos alunos. Ocorrem às vezes situações em que o professor não dá a devida assistência ao aluno ou não percebe alguma dificuldade ou deficiência, tratandoo com indiferença. Essa interação e empatia tornam a aula mais produtiva e contribuem para que diversos assuntos sejam abordados de maneira dinâmica, clara e efetiva. Quando o professor acredita no potencial de seus alunos e trabalha totalmente em conjunto, nota-se a qualidade nos resultados obtidos e a satisfação por parte da classe. Vale lembrar que lidar com cada aluno, cada história de vida que trazem, não é uma Janeiro/Junho de 2016 – pág.24 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 tarefa fácil, porém, se houver dedicação e amor no que se faz, tudo se tornará mais prazeroso. 4. Sintaxe do AAVE A estrutura do AAVE difere-se do inglês-padrão em razão de uma mudança na sintaxe, na semântica e na concordância dos termos. Spears (2001, p.5) explica e exemplifica algumas peculiaridades do AAVE: Há uma transformação linguística (onde forma e/ou significado passaram por importantes alterações) encontrada no Inglês Afro-americano que os linguistas chamam de semiauxiliar “come” em frases como a seguinte (é usada a ortografia do Inglês-padrão ): “She come telling me that trash”. “He come coming in here acting like a fool.” Spears (2001, p. 6) refere-se ao uso do “come” da seguinte forma: No segundo exemplo, “come” é o semiauxiliar, enquanto que “coming” é o verbo de movimento mais familiar. O semiauxiliar “come”, que expressa indignação ou desaprovação, se encontra em funções idênticas em várias línguas crioulas do Caribe (o que algumas pessoas chamam de “patois”, “crioulo”, ou kweyòl) e em pelo menos uma língua do Oeste Africano, falada por algumas pessoas escravizadas (e pessoas livres e trabalhadores contratados também) que chegaram às Américas, ou seja, a língua Bambara. O semiauxiliar “come” é um exemplo especialmente útil porque mostra claramente os vínculos entre os EUA, outras partes da afro-América (áreas nas Américas com uma influência fortemente Africana) e da África. O quadro a seguir refere-se também às mudanças características do AAVE. A divisão dos tempos verbais e a combinação dos auxiliares são marcantes e bastante Janeiro/Junho de 2016 – pág.25 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 distintas. As formas dos verbos no particípio tornam-se auxiliares e o verbo “to be” não é flexionado, como no inglês-padrão em (am, is, are). O quadro abaixo apresenta as fases e os tempos verbais com o verbo “to fly”. Tabela sobre os tempos verbais do AAVE Phases/Tenses of AAVE Phase Past Example Pre-recent I been flown it. Recent I done fly it. Pre-present I did fly it. Inceptive I do fly it. I be flyin it. Present Future Immediate I'm a-fly it. Post-immediate I'm a-gonna fly it. Indefinite future I gonna fly it. Fickett, Joan G. (1972), "Tense and aspect in Black English". Segundo Fickett (1972), o AAVE não necessariamente apresenta o marcador de pretérito de outras variedades do inglês (ou seja, o -ed de worked), caracterizando-se por um sistema de tempo verbal opcional com quatro passados e dois tempos futuros ou fases. Conforme Green, “I flew it é gramatical, mas done (sempre átono) é usado para enfatizar a natureza concluída da ação...” (GREEN 2002, p. 60-62). Além disso, Fickett afirma que, “como verbos auxiliares de fase, been e done devem ocorrer como o primeiro auxiliar; quando eles ocorrem como o segundo, eles carregam aspectos adicionais...” (FICKETT 1972, p. 19). Alguns linguistas e falantes acreditam que o AAVE seja uma língua e não simplesmente uma variante dialetal. Esse tipo de pensamento gerou diversas discussões e causou polêmica no âmbito educacional. Em relação às outras variantes do inglês Janeiro/Junho de 2016 – pág.26 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 americano, em 1940, destacavam-se três grandes dialetos: o setentrional, o Delaware e o dialeto sulista, falado de Delaware até a Carolina do Sul. Alguns linguistas acreditam que o Black English seja uma língua e não uma variante dialetal devido ao fato de, em todas as regiões onde é falado, apresentar a mesma fonética, sintaxe e léxico1. Há também outras nomenclaturas para a divisão das variantes do inglês, tais como: General Northern (região norte em geral), Midland (região central do país) e General Southern (região sudeste do país). Segue abaixo um mapa dos Estados Unidos, que ilustra as regiões e seus respectivos dialetos. Delaney, Robert (2000) A dialect map of American English. 5. O ebonics e a sala de aula: o caso de Oakland, na Califórnia Em 1996, uma escola do distrito de Oakland, nos EUA, aprovou uma deliberação declarando que o ebonics fosse o idioma principal dos estudantes afroamericanos. A resolução também declarou que o ebonics fosse uma língua em seu próprio direito e não um dialeto do inglês. Diante da enorme oposição nacional à resolução Ebonics de Oakland, esse movimento radical mudou-se para um movimento mais conservador. Com isso, Oakland retraiu sua declaração de independência linguística e reafirmou a meta pedagógica tradicional de ensinar aos alunos o inglês- Janeiro/Junho de 2016 – pág.27 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 padrão. Segundo Baron (2000, p. 1), em relação à polêmica educacional em Oakland e sobre a política do uso da língua padrão sob outras variações: A controvérsia do Ebonics em Oakland lembra-nos que, embora o Inglês das ex-colônias britânicas tenha entrado sozinho na cena literária, cultural e política, ao ponto em que falamos de outras variantes do inglês pelo mundo, as variedades de inglês do que podem ser consideradas como colônias internas, cidades internas e os socialmente marginalizados, continuam a ser estigmatizadas por falantes de variedades mais estimadas. A afirmação de Baron (2000) é interessante, pois o ebonics sofria totalmente preconceito pela sociedade americana e era visto de forma negativa nas escolas, tratando-se de uma língua da minoria pobre da periferia, o que não causaria “prestígio” a ninguém, se comparado a outros dialetos originados do inglês. Houve de fato um equívoco em Oakland porque ninguém queria ensinar o ebonics para os alunos, pois eles já o traziam de seus lares e do meio social. O intuito dessa resolução seria apresentar aos professores a língua que os alunos traziam para a escola e, através dessa língua, ensinar a língua-padrão para aqueles que não são fluentes nela. Dessa forma, aplicar-se-ia uma metodologia de forma bilíngue, fazendo com que os alunos traduzissem do ebonics para o padrão. Vale lembrar que não há uma imposição da língua-padrão sobre o BE, o principal objetivo é fazer com que esses estudantes consigam adequar-se a diferentes situações, sabendo usar a melhor forma de comunicação, a depender do contexto exposto. Com relação aos diferentes falares, os PCN (1997, p.26) indicam que: A questão não é falar certo ou errado, mas saber qual forma de fala utilizar, considerando as características do contexto de comunicação, ou seja, saber adequar o registro às diferentes situações comunicativas. É saber coordenar satisfatoriamente o que falar e como fazê-lo, considerando a quem e por que se diz determinada coisa. É saber, portanto, quais variedades e registros da língua oral são pertinentes em função da intenção comunicativa, do contexto e dos interlocutores a quem o texto se dirige. A questão não é de correção da forma, mas de sua adequação às circunstâncias de uso, ou seja, de utilização eficaz da linguagem: falar bem é falar adequadamente, é produzir o efeito pretendido. No dia 18 de dezembro de 1996, houve o reconhecimento do ebonics como língua independente e não simplesmente um dialeto. A partir disso, viu-se como que a declaração de independência do Black English. Esse fato também pôde ser interpretado Janeiro/Junho de 2016 – pág.28 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 como uma voz de clamor em favor do reconhecimento da sociedade negra que mora na periferia e que, infelizmente, é marginalizada e esquecida pelo sistema opressor branco. Naquela época, as notícias espalharam-se por todas as mídias e os críticos rapidamente começaram a denegrir a imagem do Black English com uma visão totalmente preconceituosa e negativa, no intuito de persuadir facilmente a opinião da sociedade. Com relação ao preconceito sofrido, os falantes do BE sofreram, e ainda sofrem bastante descriminação e quando o preconceito não é explicito, mascara-se. A sociedade não está preparada para acolher e respeitar os direitos das minorias. É evidente que a revolução linguística em Oakland falhou porque foi vista como radical demais pelo público e mídia americana. Apesar do slogan de revolução, os professores e administradores das escolas de Oakland compartilham uma visão linguística conservadora que não dava atenção à língua que os alunos traziam para a escola, mas, pelo contrário, aplicava um padrão de correção vago, idealizado e mal compreendido, que os alunos deveriam assimilar. 6. Material voltado para a apresentação do ebonics: dando voz às minorias O material elaborado tem por objetivo principal apresentar outra vertente da língua inglesa e seus temas sociais envolvidos na tentativa de sair dos temas-padrão das aulas de Inglês e enfatizar a presença da sociedade negra no contexto do ebonics. Com base nos PCN (1998) e na proposta de se trabalhar a pluralidade cultural, e tendo em vista a lei 10639/03, que diz respeito à inserção do ensino da cultura afro-brasileira nas instituições escolares, esse material almeja alcançar o pensamento crítico dos alunos e ampliar a sua visão de mundo ao debater alguns temas sociais relacionados ao ebonics. A sua estrutura baseia-se no material de reorientação curricular (2006) voltado para o ensino de língua estrangeira para os níveis fundamental e médio. O material é composto por quatro unidades que retratam o ebonics em diferentes temas, porém somente uma unidade será mencionada neste artigo. As unidades são compostas pelos gêneros textuais como, por exemplo: letra de música, tirinhas, imagens etc. O objetivo desse material é abordar as questões da sociedade negra e uma variante da língua inglesa que muitos alunos não conhecem e sequer sabem que existe. Segue abaixo o exemplo da unidade 1 do material. Janeiro/Junho de 2016 – pág.29 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 Unidade 1 O tema principal da primeira unidade refere-se ao preconceito racial e à discriminação. Nesta unidade, pode-se trabalhar a questão racial e trazer aos alunos o que eles entendem sobre o assunto. A proposta de um debate seria interessante para que cada um pudesse expor suas opiniões e chegarem todos a um consenso. Um trecho da música de Kanye West retrata o tema da unidade, e o gênero música também pode ser trabalhado, envolvendo essas questões. A apresentação do vocabulário busca fazer uma comparação entre o inglês-padrão e o ebonics, não com o intuito de mostrar qual é o certo e qual é o errado (pois não há errado), mas sim de apresentar as duas formas que podem ser ditas na língua inglesa. Após a gramática, há uma tarefa a mais a ser feita, que consiste em fazer uma pesquisa mais aprofundada que resultaria em atividades tais como: montar um projeto de ação, elaborar campanhas na escola contra a discriminação, distribuição de folders e cartazes ao redor da instituição. Com a participação e o envolvimento do docente e dos alunos, poderão surgir trabalhos significativos, que contribuam para a desconstrução de hierarquias raciais de poder. UNIT 1 Ebonics and discrimination LET’ S TYNK ‘BOUT DAT! Janeiro/Junho de 2016 – pág.30 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 • Você acha que existe racismo no Brasil? De que forma? • E em outros lugares do mundo? • A discriminação impede que negros consigam bons empregos e melhorem de vida? • Você já sofreu ou presenciou discriminação racial? Descreva. • Quantas raças você acha que existem? 1- Read the part of a song of the rapper Kanye West. New Slaves - Kanye West fonte: www.vagalume.com.br. My momma was raised in an era when Clean water was only served to the fairer skin Doing clothes you would have thought I had help But they wasn't satisfied unless I picked the cotton myself You see it's broke nigga racism That's that "don't touch anything in the store" And this rich nigga racism That's that "come here, please buy more" What you want, a bentley? Aur coat ? a diamond chain? All you blacks want all the same things Used to only be niggas now everybody playing Spending everything on alexander wang New slaves Y'all throwing contracts at me, you know that niggas don't read Throw 'em some maybach keys, fuck it, c'est la vie I know that we the new slaves, y'all niggas can't fuck with me Y'all niggas can't fuck with ye, y'all niggas can't fuck with ye I'll move my family out the country, so you can't see where I stay So go and grab the reporters, so I can smash their recorders See they'll confuse us with some bullshit like the new world order Meanwhile the dea, teamed up with the cca They tryna lock niggas up, they tryna make new slaves Janeiro/Junho de 2016 – pág.31 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 2- Faça a leitura silenciosa do texto: • identifique as palavras transparentes; • identifique as palavras conhecidas; • tente captar o sentido geral do texto; • tente entender o sentido de palavras desconhecidas pelo contexto; • relacione o conteúdo do texto ao conhecimento que você já tem. 3- Responda as seguintes questões: a- Qual o assunto da canção de Kanye West? __________________________________________________________________. b- Qual o objetivo da canção? ( ) entreter ( rimas ) fazer uma crítica à sociedade racista ( ) informar ( ) fazer c- Quem é Kanye West? ___________________________________________________________________. d- O que significa a palavra niggas? Transcreva uma frase e explique o seu sentido. ___________________________________________________________________. e- A expressão Y’all pode ser substituída por qual pronome? ___________________________________________________________________. f- Em qual trecho da canção Kanye a presença de sua mãe é citada? Explique o sentido do trecho. ___________________________________________________________________. Janeiro/Junho de 2016 – pág.32 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 VOCABULARY AND GRAMMAR 4- Observe as palavras destacadas nas frases abaixo: EBONICS You see it's broke nigga racism. INGLÊS-PADRÃO You see it’s broken nigger racism. Y'all throwing contracts at me. You all are throwing contracts at me. They tryna lock niggas up. They are trying to lock niggers up. They gon' say now. They are going to say now. A construção dessas frases encontra-se em ebonics. Ebonics é uma variante da língua inglesa, predominantemente falada por negros, que alguns também consideram como uma língua independente. A sua estrutura se difere do inglês-padrão tanto na escrita quanto na pronúncia de algumas palavras. Ela está ligada à cultura hip-hop também. Logo, é claro que se pode observar a presença dessa variante linguística em letras de rappers. 5- Agora volte ao texto e responda: o conhecimento que você acabou de construir através da música de Kanye West possibilita que você faça uma leitura mais aprofundada do texto? LEMME WORK MO’ ON DIS!! 6- Há outros lugares onde o ebonics pode ser encontrado, diferente das letras de hiphop? Onde mais? Pesquise sobre a sua origem e locais de influência. 7- Elabore um projeto na sua escola que fomente grupos a trabalharem contra o preconceito e a discriminação racial. Janeiro/Junho de 2016 – pág.33 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 7. Considerações finais De acordo com o material desenvolvido neste trabalho, conclui-se que a sua aplicação será de grande significância para que as aulas de Inglês tenham uma abordagem ampla sobre o idioma, mostrando tanto a realidade da norma culta como a coloquial. Além disso, é uma ferramenta que promove a pluralidade cultural em sala juntamente com a abertura de discussões sobre temas sociais e culturais relacionados ao Black English. É fundamental a questão da leitura trabalhada nas unidades, onde os conceitos de pré-leitura, leitura e pós-leitura estão inseridos. Observou-se também a questão dos gêneros textuais presentes no material, proporcionando uma diversidade na leitura, no intuito de os alunos entenderem e lerem através de diversos gêneros. É também uma maneira de deixar a leitura com um teor mais atrativo aos jovens, diversificando os textos e literaturas exigidas no currículo. É interessante que os textos sejam apresentados de uma maneira diferente. O material desenvolvido, cujo temário envolve alguns temas sociais, colabora para a mudança na construção do pensamento crítico dos alunos, além de expandir a sua visão de mundo, ao abordar questões de cidadania. O papel do professor também será um fator importantíssimo para que as unidades sejam conduzidas de maneira eficaz. O seu background é fundamental para que as questões e levantamentos que surgirem, sob a sua orientação, levem a promover um debate sadio e produtivo. O professor deverá agir como um facilitador ao abordar as unidades, fazendo com que alguns paradigmas e conceitos sejam desconstruídos no intuito de trabalhar e implantar novas maneiras de enxergar o meio. Dessa forma, mesmo que minimamente, os alunos sairão com um pensamento diferente sobre o preconceito linguístico, a discriminação racial, dentre outros temas. A partir desse material, pode-se analisar também a própria língua portuguesa e as diferentes formas de comunicação. Pode-se abordar a norma culta em comparação com a forma coloquial, demonstrando aos alunos que não há um “falar errado”, mas, de acordo com as questões sociais, etárias ou regionais, determinado grupo comunicase de forma diferente de outro. O papel principal desse projeto é, portanto, a abordagem de uma cultura diferente presente na mesma língua inglesa, para que haja respeito às demais culturas e às formas de expressões linguísticas em qualquer idioma. Janeiro/Junho de 2016 – pág.34 Revista Interdisciplinar da Universidade Veiga de Almeida ISSN: 14148846 Nota: 1 Disponível em: <http://variacoeslinguisticasnoingles.blogspot.com.br>. Acesso em: 21 de janeiro de 2015 às 10:00. Referências BARON, D. 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