ExperienciasNacionais - Red Latinoamericana de Historia Oral

Transcrição

ExperienciasNacionais - Red Latinoamericana de Historia Oral
Experiências nacionais,
temas transversais:
subsídios para uma história
comparada da América Latina
Flavio M. Heinz
(Org.)
Experiências nacionais,
temas transversais:
subsídios para uma história
comparada da América Latina
OI OS
EDITORA
2009
© Dos Autores – 2009
[email protected]
Editoração: Oikos
Capa: Marcelo Garcia dos Santos
Fotos da capa:
1. Ao largo de Tenerife, Ilhas Canárias, navio de imigrantes de Hamburgo
em rota para o Rio de Janeiro (março de 1887). Acervo do Museu Histórico
Visconde de São Leopoldo.
2. R. Nº 2080: Arquivo da Emigración Galega (Santiago de Compostela,
España), “Vigo”, c. 1955, Foto Bene. (Transatlántico “Santa Cruz”, que
realizó muchos viajes hacia la América del Sur, transportando pasajeros).
Revisão: Do Organizador
Arte final: Jair de Oliveira Carlos
Impressão: Rotermund S. A.
Editora Oikos Ltda.
Rua Paraná, 240 – B. Scharlau
Caixa Postal 1081
93121-970 São Leopoldo/RS
Tel.: (51) 3568.2848 / Fax: 3568.7965
[email protected]
www.oikoseditora.com.br
E96
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma
história comparada da América Latina. / Organizado por
Flavio M. Heinz. – São Leopoldo: Oikos, 2009.
328p.; 16 x 23 cm.
ISBN 978-85-7843-116-7
1. História comparada – América Latina. 2. Análise histórica.
3. História social. I. Heinz, Flávio M.
CDU 98(=4)
Catalogação na Publicação:
Bibliotecária Eliete Mari Doncato Brasil – CRB 10/1184
Em memória de
Blanca Zeberio (Orieta),
historiadora arguta
e colega generosa.
Sumário
Comparações e comparatistas ..................................................................... 9
Flavio M. Heinz
Ana Paula Korndörfer
A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) .................. 21
Maurice Aymard
Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma
experiência de pesquisa .............................................................................. 44
Rosa Congost
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda
mitad del siglo XIX. El partido como problema ........................................... 56
Marta Bonaudo
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes
de la revolución ............................................................................................ 74
Raúl O. Fradkin
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar”
fue la consigna ............................................................................................ 127
Susana Bandieri
A fronteira manejada: apontamentos para uma história social da
fronteira meridional do Brasil (século XIX) ........................................... 145
Mariana Flores da Cunha Thompson Flores
Luís Augusto Farinatti
O comerciante, o estancieiro e o militar: noções divergentes de
honra entre as elites do Rio Grande do Sul no início do século XIX .... 178
Karl Monsma
Los actores sociales de la ganadería patagónica: políticas públicas
y formas asociativas en las primeras décadas del siglo XX ................ 196
Graciela Blanco
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna
en Argentina. Ni “feudal” ni “comunista”: El caso de la
Provincia de Jujuy ..................................................................................... 217
Ana Teruel
María Teresa Bovi
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa en la Descripción
Amena de la República Argentina de Estanislao Zeballos....................... 252
Sandra Fernández
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las
migraciones gallegas hacia la Argentina ............................................... 285
Nadia Andrea De Cristóforis
Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil,
de novo ........................................................................................................ 316
Adriano Codato
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Comparações e comparatistas
Flavio M. Heinz*
Ana Paula Korndörfer**
As páginas que compõem este livro traduzem o esforço de especialistas de História do Brasil, da Argentina, da França e da Espanha em
somar suas experiências de pesquisa e trabalho de reflexão para o avanço da empresa comparativa. Estão aqui reunidos alguns dos textos apresentados em um colóquio científico destinado a aproximar especialistas
interessados neste avanço, o II Encontro da Rede Internacional Marc
Bloch de Estudos Comparados em História – Europa/América Latina,
realizado em Porto Alegre em outubro de 2008.1 Estes textos expõem,
em sua diversidade temática e complexidade metodológica, as dificuldades inerentes à realização da história comparada, mas também sugerem pistas e soluções para superá-las.
Como sói acontecer em coletâneas do gênero, há um amplo gradiente de variação entre os textos no que diz respeito à sua maior ou
menor proximidade com a metodologia ou perspectiva comparatista.
Com efeito, a ideia orientadora do colóquio não era a de, ingenuamente,
fundar uma prática comparatista, mas antes de colocar, lado a lado, pesquisadores experientes que tivessem a comparação como um elemento
possível e desejado de seu trabalho, permitindo que a reflexão e a prática de pesquisa de uns e outros se deixassem contaminar pelas experiên* Programa de Pós-Graduação em História da PUCRS, coordenador do Laboratório de
História Comparada do Cone Sul (CNPq/PUCRS).
** Doutoranda em História, CNPq/PUCRS.
1
Nem todos os textos apresentados no II Encontro da Rede Marc Bloch estão incluídos
neste volume. Alguns textos apresentados no Encontro, notadamente aqueles de autoria
de pesquisadores do Projeto de cooperação acadêmica existente entre UNCPBA (Tandil,
Argentina) e Unisinos (Brasil), serão objeto de publicação específica. Agradecemos à
coordenadora brasileira deste projeto, Marluza Harres, da Unisinos, pelo apoio e colaboração para a viabilização da atual publicação.
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Comparações e comparatistas / Flavio M. Heinz e Ana Paula Korndörfer
cias dos colegas. Assim, há textos onde a reflexão sobre a comparação
histórica tem grande destaque e outros em que a experiência singular
de pesquisa deste ou daquele tema prevalece sobre os traços comparatistas. Em todos os casos, contudo, um mesmo perfil de pesquisa se descortina: rigor e qualidade no trabalho investigativo, riqueza das fontes
utilizadas e clareza metodológica, alguns dos requisitos básicos do sucesso não apenas da empresa comparatista, mas de toda boa historiografia.
A comparação em História
Duas frases da historiadora norte-americana Deborah Cohen, no
ensaio preparatório do workshop “Europe in comparative and crossnational perspective”, provocativamente intitulado Comparative History:
buyer beware, parecem bem sinalizar as dificuldades suscitadas pelo binômio história comparada: “Comparative history has few detractors. Formally, at least, it may have even fewer practitioners”2. Com efeito, a história
comparada – nas palavras de Cohen, “ao lado da história quantitativa,
uma das ‘queridinhas’ dos pesquisadores nos anos 1970” –, segue, apesar de suas dificuldades, conquistando corações. E isso se deve, nos parece, mais pela suposição de sua eficácia do que pelos resultados alcançados pelos historiadores ‘comuns’ que a ela se dedicaram ao longo das
últimas décadas. Assim, o método comparativo atrairia simpatias de um
público que, em sua esmagadora maioria, não faz história comparada.
Mas o que explica o charme desta disciplina/especialidade, subentendendo-se que seu fascínio é amplamente superior à sua capacidade de mobilizar pesquisadores? Não há uma, mas várias respostas
possíveis para esta pergunta. Uma primeira resposta é aquela que aponta para a ausência de um rol claro de procedimentos a serem seguidos, o
que, apesar dos atrativos, dificulta sua difusão. Assim, se é verdade que
todos já escutaram falar de método comparativo, a maioria não sabe
exatamente como fazer, como aplicá-lo. Mais grave, quando alguém se
lança a buscá-lo, via de regra, não encontra respostas objetivas quanto às
suas etapas e consecução.
2
COHEN, Deborah, “Comparative History: buyer beware”, GHI Bulletin, n. 29 (Fall 2001),
p. 23.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Dir-se-ia que a melhor maneira para se apropriar de uma determinada metodologia ou teoria é partir para suas leituras canônicas, o que
não é totalmente falso, mas que representa uma certa simplificação da
realidade. No caso da História comparada, o cânone dos cânones é Bloch,
e de Bloch, dois artigos: Por uma história comparada das sociedades européias
e Comparação, respectivamente, de 1928 e 1930. Ora, Bloch nos oferece
linhas gerais para pensar a comparação, não um manual de procedimentos. A popularização dos dois artigos como porta de entrada da história comparada também pode não ter ajudado muito, uma vez que a
perspectiva de análise, logo o modus operandi do historiador, poderia ser
melhor percebida na leitura do conjunto de sua obra do que nos textos
de divulgação sobre as virtudes do método.
Uma segunda resposta pode ser encontrada na dificuldade e complexidade da empresa comparatista. Maturidade intelectual e erudição
são características exigidas aos que se aventuram na comparação histórica, condições necessárias, mas não suficientes, é certo, para o seu sucesso. O comparatista se destaca como quem realiza um feito extraordinário: para além do necessário domínio de sua história nacional, aventura-se também no conhecimento de outras histórias nacionais. Se considerarmos a crescente especialização da profissão e o crescimento exponencial dos conhecimentos – produzidos em diferentes espaços disciplinares – passíveis de serem incorporados numa história nacional, a
tarefa parece simplesmente gigantesca. Por definição, o comparatismo
não seria tarefa de iniciantes.
Colocado assim, parece claro que os fatores de desestímulo ao
aparecimento de novos postulantes à condição de historiador comparatista são mais importantes do que os estímulos. Jürgen Kocka chama a
atenção para a crescente dependência que um amplo estudo de comparação histórica terá de literatura secundária e seu distanciamento em relação a fontes e idiomas próprios de alguns dos casos em análise.3 De toda
forma, o conjunto de dificuldades para a aplicação do método revela uma
das estratégias de sucesso do comparatismo entre historiadores: o trabalho de equipe e a divisão de tarefas entre especialistas nacionais.
3
KOCKA, Jürgen. “Comparison and Beyond”. History and Theory. V. 42, n. 1, February
2003, p. 41.
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Comparações e comparatistas / Flavio M. Heinz e Ana Paula Korndörfer
Por fim, uma terceira resposta para o descompasso entre o grande
prestígio do método e o pequeno número de seus efetivos utilizadores
diz respeito à natureza das sensibilidades políticas e intelectuais no período de sua disseminação. Nação e nacionalismo são duas dimensões
evidentes do êxito do Estado e da sociedade burguesa da segunda metade do século XIX – momento no qual é preciso localizar a consolidação da disciplina histórica –, mas também são expressões centrais da
perigosa precipitação das radicalizações políticas e intelectuais dos anos
1920/30. Assim, superar o quadro nacional e mergulhar no âmbito europeu ou, ao menos, cotejar outras histórias nacionais, poderia ter significado um olhar sobre o outro que, para além dos óbvios contornos psicanalíticos, sinalizava um certo posicionamento político. Este posicionamento, uma espécie de linha de frente contra a sedução de uma história nacional instrumentalizada e submetida ao chauvinismo intelectual
ambiente, provavelmente atraiu muitos historiadores para o comparatismo. É possível sugerir que, ainda hoje, longe da conjuntura europeia
que a militância intelectual de Bloch conheceu, a comparação de histórias
nacionais conserva um certo atrativo cosmopolita e internacionalista,
em contraponto ao particularismo de certas histórias regionais e mesmo
nacionais.
Mas, retomando o primeiro ponto, a pergunta que nos afeta mais
diretamente aqui é: há efetivamente um método da história comparada? Para um certo número de estudiosos contemporâneos, a história
comparada, no sentido de um conjunto claro e ordenado de procedimentos que, aplicados a determinada situação, permitem auferir resultados concretos, não existe. Como delineamento geral do método, Bloch
indicava a necessidade de escolha de fenômenos nos quais houvesse
certas semelhanças entre os fatos observados e dessemelhanças em relação ao meio, o acompanhamento de sua evolução no tempo, a percepção das continuidades, a busca de influências entre uma sociedade e
outra, e a busca das causas ou o sentido das causalidades. O editor de
Comparative Studies in Society and History, Raymond Grew, citado por
Maria Lígia Coelho Prado, entende que o historiador francês propunha
menos um método e mais uma forma de pensar. Para Grew “não haveria propriamente um método comparativo”. O “uso da comparação [em
Bloch] era uma maneira de alcançar diferentes perspectivas no campo
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
da pesquisa. [Tratar-se-ia de um] modelo que prescinde da elaboração
de estruturas formais e que se apresenta mais como uma forma de pensar o objeto do que como uma metodologia”4. Mesmo Kocka, talvez o
mais importante historiador comparatista em atividade, coordenador
daquele que é possivelmente o maior empreendimento internacional
do gênero, a pesquisa sobre as burguesias europeias do século XIX, chama a atenção para uma dimensão mais subjetiva das virtudes do método: “a comparação ajuda a tornar o ‘clima’ da pesquisa histórica menos
provinciano”5!
Para ele, a comparação na pesquisa histórica responde a quatro
propósitos: heurístico, descritivo, analítico e paradigmático. Em relação
ao primeiro, Kocka sugere que a abordagem comparativa permite localizar questões e problemas que, de outra forma, seriam possivelmente
negligenciados ou ignorados. Kocka ilustra o propósito com a célebre
identificação de Bloch da questão de estruturas de apropriação da terra
similares aos “enclosures” no sul da França, uma “revelação” que ao
mesmo tempo dá perspectiva ao caso clássico inglês e tensiona de forma objetiva a historiografia agrária e regional francesa. No plano descritivo, a comparação se presta a iluminar os perfis dos casos singulares, contrastando-os com outros. Kocka exemplifica este propósito com
o grande número de caracterizações particularistas dos fenômenos históricos do tipo Sonderweg alemão ou Excepcionalismo americano. Neste aspecto, poderíamos reconhecer a função descritiva da comparação na historiografia regional ou nacional, por exemplo, na identificação de tipos
diferentes de “regionalismo”, como o “regionalismo gaúcho” de Joseph
Love, de viés autoritário e fortemente ideológico, em contraste com regionalismos menos “particularistas” de outras regiões do país; ou, ainda, a pretensa semelhança dos regimes políticos varguista e peronista.
Em relação à função analítica, a comparação se mostra indispensável na
formulação e na resposta a questões causais. E afirma Kocka, sem antes
deixar de assinalar que fora Weber o ‘pioneiro deste tipo de ambiciosa
comparação’: “William Sewell e outros sublinharam que a comparação
PRADO, Maria Ligia Coelho. “Repensando a história comparada da América Latina”. Revista
de História, Universidade de São Paulo, n. 153, 2005, p. 19.
5
KOCKA, op. cit., p. 39 (tradução nossa).
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Comparações e comparatistas / Flavio M. Heinz e Ana Paula Korndörfer
pode ter o lugar de um experimento indireto que facilitaria o ‘teste de
hipóteses’. Ainda que possamos ser céticos em relação a esta reivindicação, não há dúvida de que a comparação é indispensável para historiadores que gostam de formular questões causais e oferecer respostas causais”. Por fim, a função paradigmática da comparação aparece na abertura que ela oferece ao historiador, distanciando-o daquilo que conhece
melhor e ampliando sua capacidade de problematizar seus temas de
pesquisa. Neste sentido, Kocka oferece uma extraordinária leitura dos
problemas das formações profissionais excessivamente “nacionais” e do
peso das historiografias regionais de viés marcadamente particularista:
“Historiadores estão com frequência muito concentrados na história de
seu próprio país ou região. Por causa disso, a comparação pode ter um
efeito de ‘desprovincialização’ e liberação, de abertura dos olhos, com
consequências para a atmosfera e o estilo da profissão”6.
Para concluir, duas palavras sobre as tensões entre o comparatismo histórico e as novas tendências historiográficas de privilegiar a dimensão supranacional ou internacional dos processos. Referimo-nos às
histórias chamadas interconectadas, ou “connected histories”, que se
popularizaram entre os historiadores por permitir que o objeto de pesquisa conduza o investigador. Diferentemente dos estudos comparativos, modelizados, estruturados e, sobretudo, definidos a partir de unidades de análise mais ou menos rígidas, como o estado nacional e suas
instituições, ou ainda, suas unidades regionais (como fizeram Joseph
Love, Robert Levine e John Wirth na análise de três estados brasileiros
na primeira fase republicana), a história conectada persegue um tema,
um objeto que migra entre diferentes classes, grupos sociais, identidades étnicas ou profissionais, e, sobretudo, passa relativamente impune
pelas fronteiras regionais e nacionais. Uma disciplina genuinamente ‘nacional’ como a história se deixa assim seduzir pela possibilidade de que
o aspecto universalizante presente na circulação mundial de determinada ideia ou produto cultural se deixe apreender, não no quadro de sua
inscrição nacional, mas nos traços por vezes erráticos de sua recepção
em diferentes populações. Retomando Cohen, é preciso dizer que ambas as histórias, a comparativa e as ‘histórias cruzadas’ ou interconecta-
6
KOCKA, p. 41 (tradução nossa).
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
das, têm em comum o fato de sustentarem sua legitimidade na habilidade de ver algo que as histórias nacionais obscurecem, ainda que com
diferentes motivações e resultados: “Depois de tudo, a história comparada está preocupada fundamentalmente com diferenças e semelhanças, frequentemente com questões de causalidade. Histórias transnacionais, em contraste, podem nos falar sobre circulação transnacional, sobre a história das trocas culturais, sobre fenômenos internacionais”7.
Os textos
O inventário de temas aqui propostos retoma alguns dos temaschave do comparatismo histórico, daquele que se realiza há muito tempo no hemisfério norte, é certo, mas também daquele esboçado por historiadores das duas margens do Rio Uruguai: fronteira, elites políticas,
homens públicos e imigração são apenas alguns deles. Debrucemo-nos
sobre eles um instante:
O texto de Maurice Aymard que abre esta coletânea, apresentado
na sessão de abertura do II Encontro da Rede Internacional Marc Bloch,
intitula-se A longa duração hoje: balanço de meio século (1958 – 2008). Erudito e metodologicamente instigante, Aymard propõe uma discussão sobre a noção de longa duração a partir da publicação, nos Annales E. S.
C., em 1958, do célebre artigo de Fernand Braudel, “Histoire et sciences
sociales. La longue durée”. Constatando o impacto internacional do texto de Braudel ao longo do último meio século, Aymard propõe-se a explorar alguns aspectos do texto e a situá-lo no contexto de sua elaboração, a abordar suas formas de recepção/adaptação e a perguntar-se sobre sua influência e possível atualidade.
O texto de Rosa Congost, historiadora do espaço agrário espanhol,
foi aquele da conferência de encerramento do evento. Escrito em tom
pessoal, como afirma a própria autora, Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma experiência de pesquisa, narra o percurso de reflexão
e as percepções da autora em torno da história comparada. Afirmando
não conceber outra maneira de realizar estudos históricos, Rosa Con-
7
COHEN, p. 24 (tradução nossa).
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Comparações e comparatistas / Flavio M. Heinz e Ana Paula Korndörfer
gost aponta que a comparação permite ao historiador analisar melhor a
realidade investigada, ajudando-o a situar os problemas estudados em
coordenadas de espaço e tempo. Estabelecendo diálogos com Maurice
Aymard e Marc Bloch, e abordando suas experiências pessoais de investigação sobre a propriedade na Catalunha “entre os séculos XVIII a
XX”, a autora discute os desafios e os “ganhos” da comparação em análises históricas.
O objetivo da historiadora Marta Bonaudo, da Universidade Nacional de Rosário, no terceiro dos textos aqui reunidos, é aproximar-se
da complexa experiência de conformação/configuração de instâncias
de mediação entre a sociedade civil e o Estado – os partidos – na Argentina da segunda metade do século XIX. Analisando as experiências e
reflexões sobre a política e os partidos em Santa Fé, entre 1853 e 1890, a
partir de fontes como periódicos e correspondências, Bonaudo discute
os dilemas e as tensões que marcaram a dinâmica das construções republicanas e nacionais como a organização da vida política e de um sistema representativo.
Raúl Fradkin aborda as tradições militares forjadas no espaço do
Rio da Prata durante o período colonial enfocando, principalmente, o
século XVIII. Neste sentido, Fradkin se propõe a identificar as características das formações armadas que se configuraram no espaço da Intendência de Buenos Aires – milícias, corpos veteranos, entre outras – e
as tradições que se forjaram em torno dessas formações, buscando comparar a experiência de Buenos Aires com outras do Prata, investigando
especificidades e variações regionais. Tradiciones militares coloniales. El
Río de la Plata antes de la revolución, texto embasado em vasta bibliografia, deve ser entendido, segundo o autor, como parte de uma preocupação maior: desvelar a natureza e as características das forças beligerantes que intervieram no ciclo de guerras aberto no Rio da Prata entre as
décadas de 1810 e 1870 para compreender melhor as possibilidades de
intervenção política dos setores sociais subalternos, bem como a incidência da guerra e das tradições militares na configuração de suas culturas políticas.
Susana Bandieri, historiadora da região patagônica, propõe-se a
discutir o processo de “argentinização” da Patagônia nas primeiras décadas do século XX. Apontando a crescente penetração estatal na região
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
patagônica no período em questão, Bandieri analisa a Ley de Fomento
de los Territorios Nacionales, de 1908, e outras ações realizadas neste
sentido, a partir da década de 1920 e, principalmente, nas décadas de
1930 e 1940, auge do pensamento nacionalista. De acordo com Bandieri,
a partir dos anos 1920, com o crescimento da preocupação em “argentinizar” a região – criar a identidade nacional e proteger a soberania –, o
Estado nacional ampliou sua presença na Patagônia através, por exemplo, da criação de sucursais do Banco de la Nación Argentina em centros fronteiriços da região, da transformação de San Carlos de Bariloche
em centro turístico internacional, da criação de escolas de fronteira e da
exploração de recursos como petróleo e gás. Assim como outros autores
presentes neste volume, Bandieri defende, em La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna, a necessidade de se transcender as análises tradicionais sobre fronteira.
Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti propõem, a partir de uma reflexão historiográfica sobre a questão
da fronteira no estudo da sociedade dos confins meridionais do Brasil
no século XIX, formas alternativas de análise do espaço fronteiriço. Em
A fronteira manejada: apontamentos para uma história social da fronteira meridional do Brasil (século XIX), Thompson Flores e Farinatti discutem as
visões opostas de “fronteira-barreira” e de zona de fronteira completamente integrada para, a partir daí, proporem a discussão sobre o “manejo da fronteira”. Refutando as ideias de fronteira como espaço que
isola/separa as partes ou que as integra totalmente, os autores apontam
a necessidade de se perceber que viver em uma zona de fronteira – no
caso, a região sudoeste do Rio Grande do Sul –, ao longo do segundo e
do terceiro quartéis do século XIX, era uma situação que propunha possibilidades e problemas diversos para os agentes, conforme sua posição
social; as relações com a fronteira e os significados atribuídos a ela pelos
sujeitos eram dinâmicos, históricos. Articulando vasta bibliografia e documentação, como processos-crime e inventários post mortem, os autores buscam exemplificar como grandes estancieiros, líderes militares,
subalternos – pequenos produtores e peões –, perseguidos pela justiça,
escravos e comerciantes se relacionaram, a partir de seu posicionamento social, com a situação de fronteira.
Karl Monsma aborda a honra masculina enquanto capital simbólico em O comerciante, o estancieiro e o militar: noções divergentes de honra
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Comparações e comparatistas / Flavio M. Heinz e Ana Paula Korndörfer
entre as elites do Rio Grande do Sul no início do século XIX. Analisando os
conflitos do comerciante João Francisco Vieira Braga com o estancieiro
Boaventura José de Oliveira e com o militar Antônio Francisco Pinto de
Oliveira, Monsma discute as diferenças nas noções de honra de segmentos distintos da elite no Rio Grande de São Pedro Imperial – ponto
importante para compreender os conflitos apresentados –, bem como as
formas, também distintas, com que os envolvidos realizavam a defesa
da honra. Merecem destaque, na discussão trazida por Monsma, as associações estabelecidas entre honra e palavra.
Assim como Susana Bandieri, Graciela Blanco também elegeu a
Patagônia argentina como recorte de sua investigação. Em Los actores
sociales de la ganadería patagónica: políticas públicas y formas asociativas en
las primeras décadas del siglo XX, os principais objetivos de Blanco são
três: analisar o processo de ocupação e distribuição da terra na Patagônia, destacando o final do século XIX e o início do século XX; caracterizar os atores sociais que se configuraram a partir das distintas formas
de apropriação da terra e sua exploração através da criação extensiva de
gado, tais como proprietários, arrendatários e “ocupantes”; e, por fim,
buscar uma aproximação dos conflitos emergentes e da ação das organizações corporativas surgidas na Patagônia neste período, como a Federación de Sociedades Rurales de la Patagonia.
Ana Teruel e María Teresa Bovi, da Universidade Nacional de Jujuy, elegeram a complexa e variada realidade socioeconômica da província de Jujuy, no século XIX, para abordar as transformações dos direitos de propriedade no período, explorando questões relativas a como
estes direitos foram formulados depois da expropriação das comunidades indígenas. Em Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina. Ni “feudal” ni “comunista”: El caso de la Provincia de
Jujuy, Teruel e Bovi centram sua análise na gestão do governador Eugenio Tello na década de 1880 (1883 – 1885), momento de inflexão mais
claro, segundo as autoras, entre a antiga ordem e a nova, cujos valores
básicos eram o trabalho e a propriedade privada.
A fronteira também é tema do texto El desierto y sus confines. Contexto y narrativa en la Descripción Amena de la República Argentina de Estanislao Zeballos, de Sandra Fernández, da Universidade Nacional de Rosario. Fernández analisa Descripción Amena de la República Argetina, obra
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
em três tomos publicada ao longo da década de 1880 e que representa a
cosmovisão do espaço pampeano na ótica de Estanislao Zeballos, homem público rosarino com trânsito pelos caminhos da ciência e pelo
mundo editorial. Entrecruzando informações biográficas e contexto, a
autora traz trechos da Descripción e analisa como Zeballos, representante do homem moderno de fins do século XIX e início do século XX argentino, abordou temas como a construção do Estado nacional e a necessidade do ingresso da Argentina na modernidade.
Nadia Andrea De Cristóforis, da Universidade de Buenos Aires –
UBA, propôs-se a compreender como operaram os mecanismos de assistência oficial no último ciclo da imigração galega para a Argentina,
entre 1946 e os primeiros anos da década de 1960, e em que medida a
ação destes mecanismos incidiu sobre a conformação e as características
sociodemográficas desta imigração. Apontando os estudos sobre imigração como campo fértil para aprofundar as reflexões sobre os problemas da comparação e sobre a escolha da escala de análise, De Cristóforis analisa a colaboração entre o Comité Intergubernamental para las
Migraciones Europeas (CIME), o Instituto Español de Emigración (IEE)
e a Comisión Católica Española de Migración (CCEM) na organização e
funcionamento do Plan de Reagrupación Familiar. Em Los mecanismos
de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones gallegas hacia la Argentina, a autora apresenta e contextualiza o Plan de Reagrupación Familiar, a doutrina eclesiástica sobre a imigração e o papel desempenhado pela Comisión Católica Española de Migración no funcionamento
do Plan, entre outras questões.
Por fim, no texto que fecha este volume, Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil, de novo, Adriano Codato, cientista
político da Universidade Federal do Paraná, apresenta argumentos em
favor de um “necessário e urgente” retorno aos estudos sobre o Estado
Novo para compreender a reestruturação do universo das elites na primeira metade do século XX, ponto capital, segundo o autor, do processo
de transformação capitalista do Brasil. Abordando aspectos da história
política do período e da historiografia, Codato destaca a modificação da
posição dos atores no campo político e a transformação do próprio campo do poder no Brasil depois de 1930, enfocando questões relativas aos
políticos profissionais. O autor defende a utilidade de se conhecer, atra-
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Comparações e comparatistas / Flavio M. Heinz e Ana Paula Korndörfer
vés de estudos prosopográficos, o perfil da nova classe política nacional
para uma melhor avaliação das mudanças sociopolíticas do período.
Devido às semelhanças e afinidades ideológicas entre as elites intelectuais de Brasil e Argentina entre 1920 e 1940, o autor propõe que o texto
sirva como um “roteiro” de questões possíveis à história e à historiografia argentinas.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
A longa duração hoje: balanço de meio século
(1958-2008)*
Maurice Aymard**
O artigo de Fernand Braudel dedicado à longa duração aparece
nos Annales E.S.C. em 19581. Braudel acaba de se ver confiadas, após a
morte de Lucien Febvre (em setembro de 1956), ao mesmo tempo a presidência da VIª Seção da EPHE (da qual ele fora secretário desde sua
criação, em 1948, ao mesmo tempo fundador e diretor do Centro de Pesquisas Históricas) e a direção dos Annales. Nascido em 1902, ele sabe
que, salvo algum acidente, tem diante de si 15 anos para impor sua marca. Para isso se preparara, e ele decide dar a este artigo a forma de um
discurso programático. Sua intenção não é somente científica. É fixar as
orientações que propõe não apenas para a disciplina histórica, mas, mais
ainda, para o conjunto das ciências humanas e sociais, no quadro de sua
aproximação, o que representa, a seus olhos, uma prioridade ao mesmo
tempo intelectual e estratégica. Fiel ao seu hábito de nunca se tornar
prisioneiro das palavras que emprega, hesita entre duas expressões para
designá-las: “ciências sociais” (no título) e “ciências do homem” (das
quais constata, já na primeira linha, a “crise geral”, e que darão seu nome
à nova instituição que se prepara para criar, a Maison des Sciences de
l’Homme). A primeira das duas denominações irá se sobrepor à segun-
*Conferência de abertura do II Encontro da Rede March Bloch de Estudos Comparados em
História – Europa América Latina, em 21 de outubro de 2008. Publicado originalmente
sob o título “La longue durée aujourd’hui. Bilan d’un demi-siècle (1958-2008)”. In: CURTO,
Diego R. et alii (editors). From Florence to the Mediterranean and beyond: Essays in
honor of Anthony Molho. Firenze: Leo. S. Olschki, 2009. Traduzido por Flavio M. Heinz.
**Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS); antigo administrador da Maison des
Sciences de l’Homme de Paris.
1
BRAUDEL, Fernand. “Histoire et sciences sociales: La longue durée”. Annales E.S.C.,
XIII, 4, p. 725-753, 1958.
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
da apenas em 1975, por ocasião da transformação da VIª Seção da EPHE
em EHESS (Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais), mas então
sofrerá a concorrência das “ciências do homem e da sociedade”, designação escolhida pelo CNRS, que coexistirá até os dias atuais com as
“ciências humanas e sociais”, mais fáceis para traduzir para o inglês.
Mas o essencial, em 1958, está situado alhures: no fato de que a longa
duração é para ele a carta mestra – e, de fato, a única – que lhe permite
reivindicar para a história, ao lado das matemáticas, um papel de congregar as ciências do homem. Elas sofrem, a seus olhos, de um defeito
maior: o de concentrar sua atenção no presente, e de não levar em consideração as realidades e as dinâmicas do passado que, estima, são indispensáveis para compreender o presente.
O artigo foi lido, citado e traduzido para diversas línguas, mas
sua recepção privilegiou o que dizia respeito à história e, com frequência, deixou em segundo plano o que dizia respeito às demais ciências do
homem. As razões deste descompasso entre as intenções do autor e a
recepção pelos seus leitores mereceriam, sem dúvida alguma, ser especificadas. Duas me parecem ter pesado de forma determinante. A primeira: a aliança proposta entre história e ciências sociais se colocava em
muitos países em termos diferentes, em particular em todos aqueles onde
a história era classificada pelos próprios historiadores entre as humanities
(Estados Unidos) ou entre as Geisteswissenschaften (Alemanha). A segunda
lhe é complementar: é a história que, nos anos 1960, constituiu a linha
de frente*** da influência dos Annales no exterior, e também é ela a responsável pela adesão de ao menos uma parcela dos historiadores a uma
identificação de sua disciplina com as ciências sociais.
Esta adesão se dá por volta de 1968 nos Estados Unidos, em datas
posteriores em outros países, mas ela se dá também no momento em
que, na própria França, a antropologia toma o lugar da economia como
interlocutora principal e, em certa medida, como modelo para os historiadores. Ora, o artigo de 1958 apostava de fato em diferentes cenários.
De um lado, ele afirmava a ruptura da história com a concepção événementielle com a qual se identificara por tanto tempo e, com o tempo,
dava razão a Simiand, cuja crítica a Langlois e Seignobos, “Méthode
historique et sciences sociales”, publicada em 1903 na Revue de Synthèse
***Aile marchante, no original. N. do T.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Historique, será por ele reeditada nos anos 1960 nos Annales. Por outro
lado, ele procurava identificar as pontes e os contatos possíveis entre os
setores mais avançados da pesquisa nas outras disciplinas. Mas visava
também, em outro plano, a explicitar aquilo que separava as ambições
da história dos objetivos que Claude Lévi-Strauss acabava de fixar para
a antropologia. Isto o conduzia a sublinhar uma dupla oposição: aquela
entre a pesquisa das regras, ao mesmo tempo simples e gerais, mas válidas para sociedades de dimensões limitadas, e as idas e vindas incessantes entre modelos e realidades sociais cuja complexidade parece inesgotável e é constantemente relançada ao historiador das sociedades mais
próximas de nós, e aquela entre a longa duração dos historiadores – um
tempo “quase imóvel, lento a passar” – e o “tempo imóvel” da antropologia estrutural, que bem se contentaria de deixar à história apenas as
migalhas do acontecimento.
Todo sucesso tem suas contrapartidas. Para um texto, duas delas
são as mais frequentes. Por um lado, ele é chamado a circular cada vez
mais fora de seu contexto, a ser lido com olhos diferentes em função de
outros debates, seja para ser reivindicado como modelo a seguir, seja
para ser criticado ou recusado: basta pensar na célebre fórmula de Keynes “in the long run we are all dead”, que foi utilizada por muitos historiadores para rejeitar uma história suspeita de colocar entre parênteses as
decisões, as maneiras de pensar e de sentir, as trajetórias individuais e
coletivas, as emoções e paixões dos homens concretos, e para reivindicar para a história o tempo da vida contra aquele da morte. Por outro
lado – e o preço a pagar é ainda mais elevado –, o título do texto acaba
por bastar a si próprio, por circular só e por oferecer àqueles que o
citam a ilusão de que podem dispensar-se de sua leitura: a prática do
namedropping não vale apenas para os autores, mas também, como se
sabe, para as palavras da moda. O impacto internacional do artigo de
Braudel ao longo dos últimos 50 anos o expôs particularmente a este
duplo risco. Ele se tornou uma referência obrigatória. Mas por isso teria
ele conservado uma influência real sobre as orientações recentes da pesquisa tanto em história quanto em ciências sociais? Em outras palavras,
ele se manteria atual ou teria se tornado um texto entre outros, datado
historicamente, cujo impacto poderia ser seguido e medido, mas, no fundo, estava ultrapassado, pois fora deixado de lado ou substituído por outras proposições metodológicas ou teóricas, dotadas de uma real capacidade heurística e que teriam deslocado o debate para outros terrenos?
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
Tentarei responder aqui estas questões, na ordem. Logo, inicialmente, irei reler o próprio texto, na sua totalidade e complexidade, para
situá-lo novamente em seu contexto. E, em seguida, mostrar as formas e
as modalidades de recepção dele, quer conscientes e confessadas, quer
silenciosas e mesmo involuntárias, mas igualmente reais: ou, se preferirmos, segui-lo e medir sua influência e posteridade. E, enfim, na terceira etapa, perguntarei sobre sua atualidade.
O texto tem sua data – 1958 – e deve ser lido por aquilo que é, isto
é, como um programa proposto por um homem que, cercado pela aura
que seu Mediterrâneo lhe valera dez anos antes, acaba de aceder às responsabilidades universitárias, que para isso se preparara por muitos
anos2. E Braudel está bem decidido a não deixar passar a oportunidade
que lhe confere, no contexto francês e internacional da época, a dupla
direção que lhe coube. De um lado, aquela dos Anais, fundados em 1929,
dirigidos com firmeza por Lucien Febvre depois da morte de Marc Bloch
de 1944 a 1956, e que conseguiu se impor como uma revista de combate,
engajada em uma revisão drástica e uma modernização das maneiras
de fazer, de conceber e de escrever a história. De outro, aquela da VIª
Seção da EPHE, uma instituição recente, criada apenas dez anos antes, e
então em plena expansão face à Universidade tradicional. Uma instituição que encarna a necessidade de ensinar não apenas saberes adquiridos, que se ocuparia apenas de transmitir, mas a própria pesquisa em
execução. Enfim, uma instituição capaz de atrair, para os numerosos
postos colocados à sua disposição, tanto quanto professores confirmados, dispondo já de uma posição acadêmica de prestígio numa Faculdade ou no Collège de France, quanto pesquisadores que a Universidade
mantivera até então à distância, ou que não podia recrutar porque eram
estrangeiros, e que estavam entre os melhores de sua geração: assim,
um Jean Meuvret, na França, bibliotecário na Escola Normal Superior,
ou um Etienne Balazs, sinólogo de primeiro nível, de origem húngara,
2
Conferir G. GEMELLI. Fernand Braudel e l’Europa universale. Veneza: Marsílio, 1990,
que sublinha as principais etapas desta preparação, desde a criação do Centre de Recherches
Historiques da VIª Seção, que Braudel dirige, até a viagem aos Estados Unidos no outono
de 1955, organizada nesta perspectiva por Clemens Heller em ligação com Edward d’Arms,
um dos responsáveis da Fundação Rockefeller, em sua contribuição à redação do IV Plan,
nos diferentes artigos que ele publica precisamente nestes mesmos anos e que se encontram
reunidos no primeiro volume de seus Écrits sur l’histoire, publicados 11 anos mais tarde,
em 1969 (Paris, Flammarion).
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
que encontrara refúgio como trabalhador agrícola numa fazenda do sudoeste no final dos anos 1930. Ou ainda excluídos e dissidentes do Leste
e do Oeste, numerosos no clima da Guerra Fria – um Daniel Thorner,
um Ignacy Sachs ou um Georges Haupt. E, enfim, e sobretudo, os jovens
que chegavam aos 30 na década de 1950 (Jacques Le Goff, François Furet
ou Emmanuel Le Roy Ladurie), que tinham suas obras pela frente, mas
em relação aos quais era necessário ter a audácia de apostar. Esta instituição, que leva o nome de “Seção de Ciências Econômicas e Sociais”,
apresenta o paradoxo, ao menos aparente, de ter sido fundada por
historiadores – Lucien Febvre, Fernand Braudel, Charles Mozaré – e
de ser dirigida desde sua fundação, e ainda por outros 25 anos (até
1985 e, depois, entre 1995 e 2004) por historiadores. A intuição de Braudel é compreender que esta posição, para ser aceita pelas outras disciplinas e mantida, deve ser justificada por um programa que deverá
atingir três objetivos.
Em um primeiro momento, ele deverá mostrar não a superioridade intrínseca da história, que não está absolutamente garantida, mas
sim sua capacidade, no momento em que é, sem dúvida, a menos constituída cientificamente das ciências do homem e não para de tomar emprestado das outras (economia, geografia, ciências políticas, demografia, etc.) e de lhes fornecer, em contrapartida, o que lhes falta: uma inserção no passado das sociedades que elas estudam essencialmente no tempo presente (mesmo a antropologia e a etnologia, cujo alvo principal, no
caso das sociedades ditas “primitivas”, ainda era o presente como testemunho vivo de um passado e de uma “origem” do homem, especialmente do homem vivendo em sociedade). A história, reivindica Braudel, está
aí, presente, à sua disposição, para lhes trazer as chaves de acesso àquilo que lhes falta e do qual, ele lembra, têm absoluta necessidade: sem
sua ajuda, elas estão condenadas ao fracasso.
Mas também lhe será necessário, em um segundo momento, mostrar que os historiadores também estão interessados pelas mais recentes
questões que mobilizam as ciências sociais. As dimensões inconscientes
da vida dos homens e das sociedades, as estruturas, os modelos, e quase
ainda mais as matemáticas sociais, estatísticas ou qualitativas: matemáticas que, com certo avanço sobre os historiadores, os economistas3, os
3
O que não impede Braudel de condená-los por permanecerem quase sempre “prisioneiros
da atualidade mais breve [...] encurralados por esta restrição temporal.” Um julgamento
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
linguistas e os antropólogos, à imagem de Claude Lévi-Stauss, reencontraram em seu caminho, e cujos recursos souberam mobilizar para “vencer a escalada das ciências exatas” ou, em outras palavras, obter êxito na
passagem da observação, da descrição e da classificação – sempre necessárias, mas insuficientes isoladamente – à elaboração de regras suficientemente gerais, no limite válidas em todos os tempos e em todos os
lugares, em todas ou quase todas as sociedades. A história, repete-lhes
ele, tomou claro conhecimento de suas descobertas e, por sua vez, engajou-se no mesmo caminho. Ela está pronta para jogar com eles, sem reticências, o jogo das matemáticas, mas sem por isso renunciar à inesgotável complexidade das realidades sociais. Com efeito, ela não poderia (e
ele é cioso em marcar sua diferença, através da oposição entre dois caminhos, um redutor e outro globalizante) contentar-se com uma abordagem exclusivamente microssocial, que limitaria sua ambição em estabelecer, em relação a grupos muito restritos de indivíduos, regras cuja
validade seria, em seguida, estendida ao conjunto.
Para o diálogo que este artigo – apresentado como uma chamada
à discussão – quer estabelecer com as outras ciências sociais, Braudel
pode, assim, avançar três pistas que deveriam permitir que se compreendessem: a das matemáticas, é claro, mas também a do espaço e a do
tempo. De um lado, então, a geografia ou, se se preferir, a ecologia (40
anos antes do termo ser retomado por Peregrine Horden e Nicholas
Purcell)4, em nome do princípio da “redução necessária de toda realidade social ao espaço que ela ocupa”. De outro, a longa duração, que não
é outra coisa, insiste, que “uma das possibilidades de uma linguagem
comum em vista de uma confrontação entre as ciências sociais” e que
representa o aporte próprio da história, ou, melhor, de uma história nova
que terá superado a tentação de atenção exclusiva ao acontecimento e
ao individual. Esta longa duração é sempre relativa a outras, sejam mais
longas ou, ao contrário, mais breves. Ela se identifica, em sua extensão
mais ampla, com aquelas das sociedades e das civilizações humanas,
mas engloba outras, mais curtas, mesmo que cada uma destas durações
retome, por sua conta, uma parte da herança daquelas que a precedecontra o qual Witold Kula decidirá defendê-los, colocando em evidência tudo o que as
duas disciplinas têm a aprender uma com a outra: KULA, W. “Histoire et économie: La
longue durée”, Annales E.S.C., XV, 2, p. 294-313, 1960.
4
HORDEN, P.; PURCELL, N. The Corrupting Sea: A Study on Mediterranean History.
Oxford: Blackwell, 2000.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
ram – aquelas das economias, das religiões ou das culturas. Mas ela é
ela mesma englobada em outras, infinitamente mais longas, que começaram bem antes da aparição das primeiras sociedades e mesmo dos
primeiros homens: assim as da terra ou do clima, com as quais o homem
teve de compor para poder elaborar suas próprias respostas, ou ainda
as das espécies animais e vegetais, entre as quais aprendeu a fazer suas
escolhas, domesticando e adaptando umas a suas próprias necessidades, caçando, ao contrário, outras até as eliminar, pois eram consideradas nocivas ou perigosas.
Voltado ao presente e ao futuro, para o qual Braudel define uma
estratégia intelectual de cooperação entre disciplinas, em vista da ocupação de uma posição dominante no campo das ciências sociais e humanas cujo centro será ocupado pela história, tal programa é, para ele,
também o ponto de chegada de seu próprio percurso pessoal, da maturação de seu pensamento e, sobretudo, de sua visão do espaço e do tempo, entre Argélia, França, Brasil e Alemanha: este percurso o conduziu
de uma pesquisa inicialmente centrada em Felipe II e o Mediterrâneo,
quer dizer, em um estudo que poderia ter sido tradicional ou clássico
sobre a política externa de uma grande potência da época em uma das
direções de sua expansão, para um livro cujo personagem central se tornou o próprio Mediterrâneo5. Este mesmo percurso o levou a construir
seu livro em torno de três diferentes temporalidades, correspondendo a
três níveis de leitura da realidade social e humana: aquela dos acontecimentos, que é a do vivido pelos homens, mas também a que eles registraram, ao menos em parte, nas fontes escritas que nos deixaram; aquela
dos movimentos de conjunto das sociedades, da economia, da política,
da guerra, que marcam a duração de um longo século XVI; e, enfim, a
longa duração, que ele intitula, no Mediterrâneo, “a parte do meio”, e
que organiza em torno de duas disciplinas que eram, no momento em
que escreve o livro, as únicas a colocar o longo tempo no centro de suas
análises: a geografia humana e a etnografia.
Uma etapa intermediária desta reflexão nos é fornecida hoje pela
recente publicação, sob o título de “L’histoire, mesure du monde”6, da
BRAUDEL,Fernand. La Méditerranée et le monde méditerranéen à l’époque de Philippe
II. Paris: Armand Colin, 1949. Em português: BRAUDEL, Fernand. O Mediterrâneo e o mundo
mediterrânico na época de Filipe II. São Paulo: Martins Fontes, 1984, 2 v. (N. do T.).
6
Les écrits de Fernand Braudel; t. II: “Les ambitions de l’histoire”. Paris: Editions de Fallois,
1997, p. 11-83.
5
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
parte conservada das notas, reescritas por dois de seus ouvintes num
pequeno caderno timbrado de seu Oflag**** e por ele corrigidas, das
conferências que realizara durante seus cinco anos de reclusão na Alemanha, primeiro no campo de Maiença (1941-42), depois no de Lübeck
(1943-44). Este texto, que se pode ler hoje como o esboço de um livro que
nunca será acabado e publicado, permite-nos dispor de outro parâmetro, anterior ao seu livro sobre o Mediterrâneo (defendido como tese em
1947, mas publicado somente em 1949), e de fato contemporâneo de sua
redação ou, antes, de suas redações sucessivas: não é por acaso que ele
dedica uma parte importante de seu desenvolvimento às formas e aos
conteúdos de um diálogo ao mesmo tempo possível e necessário entre
as ciências sociais. Além disso, sabemos, sobreviver esses cinco anos
num campo de prisioneiros foi, para ele, não apenas escrever e isolar-se
do presente: foi também olhar para além dos acontecimentos que se identificavam com a sucessão de vitórias alemãs, amplamente anunciadas
pelas rádios e pelos jornais locais, e projetar-se no futuro. Sua repetida
afirmação sobre elas, retomada por seus companheiros de prisão, em
tom de blague: “É apenas um acontecimento”, inscrevia-se na mesma
linha que a célebre frase de Churchill: “De derrota em derrota vamos
em direção à vitória final”.
Restaria ainda explorar a pista das fontes eventuais e, mais amplamente, de seus precedentes, tanto na história como em outras disciplinas. Para ficarmos com a França, Marc Bloch, defensor de uma história regressiva, voltando do presente em direção ao passado, tentara dar
destaque tanto às continuidades longas (como em seu artigo sobre as
falsas novidades)7 quanto às sedimentações sucessivas: entre Alemanha e França, a área de extensão do open field ignora e, portanto, precede
o estabelecimento das fronteiras políticas8. Por seu lado, Lucien Febvre
acentuara a pluralidade dos tempos dos homens, na qual via um verdadeiro desafio para os historiadores. Ainda antes de Braudel, a equipe de
****Oflag, acrônimo de Offizierslager, campo de prisioneiros para oficiais, durante a Primeira
e a Segunda Grande Guerra.
7
BLOCH, Marc. “Réflexion d’un historien sur les fausses nouvelles de la Guerre”. Revue
de Synthèse historique, XXXIII, p.13-35, 1921. Em português: “Reflexões de um
historiador sobre as falsas notícias da guerra”. In: BLOCH, Marc. História e historiadores.
Textos reunidos por Étienne Bloch. Lisboa: Teorema, 1998, p. 177-198 (N. do T.).
8
BLOCH, Marc. Les caracterères originaux de l’histoire rurale française. Paris: Armand
Colin, 1952, capítulo II.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
sábios que acompanha Napoleão no Egito nos lembra o papel de laboratório científico que O Mediterrâneo havia desempenhado, desde a segunda metade do século XVIII, mobilizando a atenção tanto das ciências da
natureza (zoologia, botânica, geologia, etc.) quanto das ciências do homem que se estavam constituindo (história, geografia, arqueologia, etnografia): papel cuja herança Braudel irá, precisamente, recolher e capitalizar, para reapropriá-la e reformulá-la em termos diferentes. De fato,
a concepção de longa duração que elabora por ocasião da redação de O
Mediterrâneo distancia-se, claramente, de todas as proposições do tipo
de Toynbee ou de Spengler, que se reduzem, a seus olhos, a formas de
leitura sub specie aeternitatis da história dos homens e a generalizações
desencarnadas. A longa duração não existe sozinha, mas em referência
a outras durações mais curtas, que Braudel reagrupa, pela comodidade
e simplicidade de sua exposição, como o faz para as próprias longas
durações, em torno de dois polos principais: aquelas dos movimentos
de conjunto indo da década ao século e aquela dos acontecimentos. A
longa duração não define um tempo imóvel, mesmo que ele possa ser
percebido como tal pelos atores, mas um tempo quase imóvel, que passa
lentamente. Ela só se opõe ao acontecimento na medida em que este é
usualmente identificado com o excepcional, com o que acontece apenas
uma vez. Ela é constituída de pequenos fatos e gestos regularmente repetidos, sem neles se pensar, por serem evidentes. É tecida de regularidades silenciosas – um silêncio em relação ao qual o papel da história é
precisamente de explicitar e fazer falar. No entanto, mesmo que seja
feita de regularidades e repetições que podem surgir quase da mesma
forma, ela é ao mesmo tempo construção, sedimentação e mudança, e
todas as três se dão em uma escala temporal infinitamente maior (um
ou vários milênios) que aquela do tempo familiar aos historiadores. Daí
a questão que Braudel coloca, ao final de uma longa enumeração de
regularidades do clima, tal como foram percebidas, vividas e interiorizadas pelos homens à época: “O clima mudou desde o século XVI?” Ela
abre o caminho à escrita de uma verdadeira história do clima, enfim
livre de todo impressionismo jornalístico.
A mesma distinção entre tempo imóvel e tempo quase imóvel permite a Braudel se distanciar de Lévi-Strauss, mesmo que saudando seu
empreendimento: “sua tentativa, nestes temas, me parece a mais inteligente, a mais clara, a melhor enraizada na experiência social, de onde
tudo deve partir e para onde tudo deve voltar”. Nela ele percebe as
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
seduções, mas também os perigos, a ameaça para a história de ser rejeitada ao lado do acontecimento. Compartilha a ambição de “transpor a
superfície da observação para atingir a zona dos elementos inconscientes ou pouco conscientes” e “extrair as leis mais gerais de estrutura”.
Mas ele denuncia, nas respostas dadas, seus limites. Estas são formuladas a partir “de grupos restritos onde cada indivíduo é, por assim dizer,
observável”, situam-se “no encontro do infinitamente pequeno e da duração muito longa”, mas “circulam apenas numa das inumeráveis rotas
do tempo, aquela da duração muito longa, ao abrigo dos acidentes, das
conjunturas, das rupturas”. Contra a redução a uma leitura modelizada
de uma “vida social muito homogênea”, que permite “definir de forma
certeira as relações humanas simples e concretas, pouco variáveis”, ele
reivindica para a história, no extremo oposto, a infinita complexidade
do social, a multiciplicidade das inumeráveis rotas do tempo. À redução do real “a elementos miúdos, a toques finos, idênticos, cujas relações se possam analisar precisamente”, para delas extrair as “leis de
estrutura mais geral”, ele opõe da parte da história uma iniciativa mais
experimental, feita de idas e vindas entre realidades observadas e modelizações. Os modelos, sempre provisórios, sempre simplificados, devem igualmente ser sempre submetidos à prova da realidade, como os
movimentos dos navios que, lançados ao mar após terem sido construídos – para utilizar a metáfora que ele aprecia – são observados até que
afundem. A racionalização, a modelização são para o historiador sempre aproximações cujo mérito é relançar a análise: a longa duração será,
portanto, sempre uma explicação entre outras. O mesmo se dará em
relação à economia-mundo, no terceiro volume de Civilisation matérielle,
Economie et Capitalisme, intitulado Le temps du Monde (1979): ela não é
mais que uma “ordem face a outras ordens”.
Este modelo, uma vez lançado ao mar, seguiu seu curso, cujas etapas, mudanças de rota, incidentes de percurso, escalas nos é necessário
repetir agora. Sem dúvida era inevitável que ele escapasse em parte a
seu construtor e idealizador e que outros buscassem utilizá-lo, por sua
vez, e tomar o controle dele, modificando, como acontece seguidamente
em relação aos navios, o nome, os portos de atracagem e as bandeiras.
Se Fernand Braudel nunca reivindicou nem o comando nem a propriedade exclusiva, também nunca deixou de utilizá-lo nas diferentes etapas de seu próprio percurso.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Primeiro, o percurso institucional: as orientações dadas à VIª Seção através do recrutamento de jovens pesquisadores, historiadores,
antropólogos, economistas, psicólogos sociais, demógrafos, geógrafos,
que, em sua maioria, adequaram para seu próprio uso, cada a um à sua
maneira e com toda a liberdade, a noção de longa duração, como aliás
ele lhes havia sugerido, reconhecendo que cada realidade social observada remete à sua própria definição e delimitação da longa duração,
válida para ela e apenas para ela.
Em seguida, o percurso intelectual, que conduzirá Braudel a declinar dos usos da longa duração em função de quatro objetos principais, fora do próprio Mediterrâneo. Les mémoires de la Mediterranée, livro
redigido em 1968-69, mas publicado 30 anos depois9, lhe servirá para
percorrer novamente a trajetória histórica antes de Grécia e Roma.
O primeiro destes objetos serão as civilizações, em seu manual
sobre o tempo presente, reeditado sob o nome de Grammaire des civilisations10: neste ele oferece a definição mais englobante delas (elas são ao
mesmo tempo espaços, sociedades, economias, mentalidades coletivas,
assim como continuidades), mas reafirma fortemente que não podem
ser compreendidas e analisadas senão sob a condição de tomá-las em
sua mais longa duração. Uma duração mais longa do que os elementos
com os quais o observador contemporâneo por vezes tende a identificálas: assim as religiões, sobre as quais escreve, com certo sentido da antecipação, que são retardatárias, que se apropriaram de civilizações já estabelecidas, solidamente implantadas, que as haviam precedido11.
O segundo destes objetos, já presente no artigo de 1958 (p. 51),
estará no cerne das explicações de Civilisation matérielle12: as “prisões de
BRAUDEL, Fernand. Les mémoires de la Méditerranée: préhistoire et antiquité. Paris:
de Fallois, 1998.
10
BRAUDEL, Fernand. Grammaire des civilisations. Paris: Arthaud, 1987 (este texto retoma
a parte principal, por ele redigida, do manual destinado às classes finais dos liceus franceses
e consignada por S. Baille e R. Philippe em Le monde actuel, histoire et civilisations.
Paris: Belin, 1963).
11
Citaremos em relação a este tema as duas afirmações da página 54 (“a religião é o traço mais
forte no coração das civilizações, ao mesmo tempo seu passado e seu presente”) e da p. 73
(Cristandade e Islã: “estas novas religiões recuperaram o corpo das civilizações já existentes.
A cada vez foram a alma delas, desde o início tiveram a vantagem de se encarregarem de uma
rica herança, de um passado, de todo um presente, e desde logo um futuro”).
12
BRAUDEL, Fernand. Civilisation matérielle et capitalisme. Paris: Armand Colin, 1967,
que, na versão final em três volumes da obra, Civilisation matérielle, économie et
capitalisme, XVe-XVIIIe siècle, receberá um novo título: Les structures du quotidien.
9
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
longa duração”, representadas, para as principais dentre elas, por suas
escolhas técnicas fundamentais, e primeiramente a das plantas das quais
fizeram a base de sua alimentação – o trigo, o arroz (com a passagem
ulterior à irrigação), o milho, o painço, os tubérculos. A cada vez estas
escolhas orientam, condicionam e limitam as decisões ulteriores das
sociedades que as fizeram.
O terceiro objeto será o capitalismo entre o séculos XV e XVIII, ao
qual ele dedica o terceiro volume de sua trilogia, publicada em 1979, Les
temps du Monde: trata-se, a seus olhos, de uma construção ao mesmo
tempo original, que deve, pois, ser estudada nela mesma, inseparável
do capitalismo industrial que a seguiu e que ela vislumbra, e comparável com outros capitalismos que dominaram períodos mais ou menos
longos da história de outras civilizações, como a fenícia, a grega e a romana da Antiguidade, ou a da China. No caso desta, de importância
central para qualquer comparação com a Europa moderna, é preciso
analisar o capitalismo ao mesmo tempo local, colocado sob vigilância
do poder político, e exterior a ela, em todo o Sudeste asiático, onde muito cedo ele encontra as liberdades que lhe faltam em seu país.
O quarto objeto, enfim, será aquele de La identité de la France13, em
relação ao qual se dedica a demonstrar que esta identidade é tecida, ao
mesmo tempo, por continuidades, por escolhas muito antigas e por rupturas, por permanências e por construções progressivas, por unidade e
por diversidade. Demonstra também que ela carrega a marca do Estado
que foi, ao longo dos séculos, um dos atores principais, mas não o único,
de sua construção, e que ela é a este respeito tudo menos eterna.
Mas essas utilizações pessoais e diferentes do tema da longa duração pelo próprio Braudel, para construir demonstrações históricas a
cada vez também diferentes, não devem levar a esquecer que outras
também subiram bordo do navio, dele tomaram posse e adaptaram o
tema às suas próprias necessidades, nem sempre – o que pouco importa
– reconhecendo suas dívidas. Contentar-me-ei aqui em assinalar os episódios principais que acompanharam as mutações sucessivas da pesquisa histórica.
O primeiro se identifica com a deposição das alianças disciplinares que ocorre no fim dos anos 1960: a história toma volens nolens suas
13
BRAUDEL, Fernand. L’identité de la France. 3 v. Paris: Arthaud-Flammarion, 1986-90.
32
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
distâncias em relação à economia, que, de toda forma, afasta-se dela, e
constrói com a antropologia uma nova parceria, da qual retirará um triplo enriquecimento. Em primeiro lugar, a ampliação de seus temas de
estudo a um conjunto de questões até aqui ignorado ou deixado de lado,
pois as considerava fora de sua alçada. Estas se tornam, em alguns anos,
parte integrante do “território do historiador” caro a Emmanuel Le Roy
Ladurie: o parentesco e a aliança, é claro, mas também os mitos e as
crenças, as relações interpessoais e as práticas sociais, as técnicas no sentido mais amplo do termo, o corpo, as representações de si e do outro,
da vida, da morte e do tempo, as relações de sexo e de gênero, etc. Em
seguida, a apropriação de um vocabulário conceitual, utilizado inicialmente com a paixão do neófito, e progressivamente dominado, e as problemáticas correspondentes. Enfim, a terceira ampliação – espetacular –
do campo das fontes utilizadas e a transformação da maneira de lê-las e
interpretá-las: passa-se assim, em particular, dos textos aos objetos, com
a abolição da fronteira que os separara, e de uma leitura desses documentos que se pretendia exclusivamente crítica e objetiva a uma pesquisa sistemática da ligação estreita entre as fontes e seus autores, que
as produziram e que, conscientemente ou não, explicitamente ou não,
as carregaram de sentido, que precisamos hoje redescobrir.
Mesmo que a referência à longa duração braudeliana não apareça
sempre aí, ela está no cerne da própria conduta dos mais exigentes destes historiadores que exploram as vias abertas pela antropologia e buscam criar a moda em vez de se contentar em segui-la. A empresa se
situa, de fato, em uma dupla continuidade. De um lado, aquela da linha
fixada por Lucien Febvre, em 1932, em sua lição inaugural no Collège
de France: “os textos sim, mas todos os textos” – e não uma simples
seleção subjetiva dentre eles feita pelo historiador –, “os textos sim, mas
não apenas os textos” – e, portanto, também outras marcas, objetos e
signos que nos deixaram, voluntária e conscientemente ou não, as gerações e as sociedades que nos precederam, que redescobrimos ou que
chegamos a reconstituir, e que aprendemos a ler. De outro lado, aquela
da história inconsciente, da história das formas inconscientes do social,
que Braudel privilegiara em seu artigo, tomando emprestado de LéviStrauss uma citação que este fizera de Marx em Anthropologie Structurale: “os homens fazem a história, mas ignoram que a fazem”, mas para
apressar-se em acrescentar que esta história que diz respeito ao “tempo
33
A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
estrutural [...] é com frequência mais claramente percebida do que acreditamos”.
Se então os historiadores ganharam amplamente, foi porque eles
foram bem-sucedidos em impor aos antropólogos sua concepção do tempo, reintegrando as áreas estudadas pelos seus parceiros ao mesmo tempo na duração longa de uma temporalidade lenta, mas com certeza não
imóvel, e no contexto social no qual os homens aprendem rapidamente
a manipular as regras em vez de se contentarem em aplicá-las ou a elas
se submeterem. Isto é o que Pierre Bourdieu lembrará ao afirmar que a
tarefa do sociólogo é explicar e explicitar, ao mesmo tempo, as regras e
as exceções que lhes são feitas, sem, no entanto, questioná-las definitivamente. E o que fará Braudel dizer que tinha um ponto em comum
com o pensamento de Bourdieu: ambos consideravam que toda sociedade dedica 85 ou 90% de suas energias para se reproduzir. Estes 10 a
15% fazem a diferença em relação a uma visão determinista da história
na qual leitores apressados tentaram, com frequência, enclausurar Braudel: a longa duração dá lugar às iniciativas do indivíduo, apenas se contenta em limitar seu alcance, enclausurando-o “em um destino que ele
mal fabrica, em uma paisagem que desenha atrás dele e à sua frente as
infinitas perspectivas da longa duração”14.
Levada por esta aliança que domina as transformações da disciplina histórica a partir do fim dos anos 60, a história se renova profundamente a partir de seu interior. De um lado, as problemáticas elaboradas para o período compreendido entre os séculos XIII e XVIII passam
por uma indiscutível expansão, tanto a jusante como a montante, tocando tanto a história dos séculos XIX e XX, com a social history anglo-saxã,
quanto da Alta Idade Média e da Antiguidade. De outro lado, elas deixam os limites da Europa para tocar outras áreas geográficas e culturais,
desde o México e os Andes ao Sudeste Asiático, para o qual Bernard
Lepetit justamente propôs observar, no livro de Denys Lombard, Le Carrefour javanais15, o último grande livro braudeliano, regressando do passado mais próximo ao mais longínquo, como sugeria Marc Bloch, analisando, tal como o arqueólogo, os estratos sucessivos acumulados ao longo do tempo, de maneira a reconciliar continuidades e rupturas. Em
14
15
BRAUDEL, Fernand. La Mediterranée..., 1966, I, p. 520.
LOMBARD, Denys. Le Carrefour javanais. Paris: EHESS, 1990, 3 v.
34
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
outro plano, a história das mentalidades, tal como se define a partir do
início dos anos 1970, rompe aparentemente com as problemáticas de
inspiração braudeliana, que, por muito tempo, privilegiaram a economia e os determinismos da vida material, e desloca sua atenção para
outras direções. Mas ela não apenas retoma, à sua maneira, o próprio
conceito de longa duração, como afirma constituir o campo de aplicação
privilegiado dele, afirmando que são as mentalidades que evoluem o
mais lentamente, que elas têm dificuldade em interiorizar a mudança,
estão sempre atrasadas em relação ao real e ao presente e fornecem,
portanto, a chave de uma duração mais longa, que é aquela, ao mesmo
tempo herdada e incessantemente re-atualizada, das maneiras de pensar, de decidir e de viver dos homens.
Outras pistas poderiam ser seguidas para mostrar, por exemplo,
como duas concepções da longa duração, a dos antropólogos e a dos
historiadores, puderam coexistir e interagir: basta pensar neste ponto
de oposição entre o Mediterrâneo dos historiadores e o dos antropólogos16. Uma dezena de anos depois do livro de Braudel, que orientará
durante várias décadas a maioria das pesquisas dos historiadores, os
programas do “Mediterrâneo dos antropólogos” são definidos a partir
do final dos anos 1950 em torno do estudo da Europa do Sul, vista e
analisada como encarnando “a outra Europa”, testemunha do “passado
que perdemos” ou que estamos perdendo, e não mais a da primeira
modernidade de uma Europa em expansão. Mas muitos dos participantes deste novo empreendimento tendem a esquecer que estas maneiras
de pensar e de viver e esta organização cultural do social são em grande
parte construções recentes, cujas etapas de criação a história pode precisamente reconstituir, sobre o duplo fundo da continuidade de comportamentos atestados pelo passado e da clivagem que se constituiu entre a
Europa do norte e do nordeste e a Europa do sul e do sudeste – a primeira tendo desempenhado um papel ativo, e mesmo decisivo, na construção da imagem da segunda.
Para a América pré-colombiana e, depois, colonial, a “etnohistória” de John Murra, introduzida na Europa por Ruggiero Romano e, em
16
Cf. ALBERA, D.; BLOK, A.; BROMBERGER, C. (Org.). L’anthropologie de la Méditerranée. Anthropology of the Mediterranean. Paris: Maisonneuve & Larose; Maison Méditerranéenne des Sciences de l’Homme, 2001; ALBERA, D.; TOZY, M. (Org). La Méditerranée des anthropologues. Paris: Maisonneuve & Larose; Maison Méditerranéenne des Sciences de l’Homme, 2005.
35
A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
seguida, por Nathan Watchel (que coordenou com o mesmo John Murra o número especial dos Annales intitulado “Antropologia histórica das
sociedades andinas”)17, se constituiria em outro exemplo de síntese, desta
feita infinitamente mais convincente e melhor acabada, entre os aportes
da etnologia e da história. Em um nível mais profundo, poder-se-ia perguntar se a conversão iniciada, a partir de meados dos anos 1970, por
muitos antropólogos, especialmente africanistas, em direção a temas europeus, não contribuiu para a modificação, de maneira ainda mais significativa, das próprias condições do diálogo, criando novos campos de
cooperação e de mútua fecundação entre antropologia e história. Basta
pensar no impacto dos trabalhos de um Jack Godoy sobre a história longa da alfabetização e da família: os historiadores encontraram nele a
chave das inflexões fundamentais que podiam lhes ajudar a identificar
as rupturas que recortam a longa duração em sequências sucessivas e os
descompassos cronológicos entre regiões e meios sociais diferentes. “Lenta a passar e a se transformar”, a longa duração não passa em todo lugar
no mesmo ritmo e não toma sempre os mesmos caminhos.
Onde estamos hoje? A referência à longa duração ficou para trás,
aceitada como uma evidência, mencionada como referência obrigatória,
mas doravante privada de toda eficácia real, ao menos para uma história, na Europa ocidental, cada vez mais atraída pelo presente e preocupada pela explicitação de seus procedimentos narrativos? Deixarei de
lado todos os falsos problemas, essencialmente imputáveis a uma leitura superficial dos textos de Braudel, no entanto muito nuançados, a este
respeito. Bastará lembrar uma vez por todas que a longa duração não se
define, ou, em todo caso, não apenas, por um número de séculos ou de
milênios, mas pela duração da vida do objeto histórico estudado, que
fixa, caso a caso, a escala temporal – e, com frequência, também, espacial
– da análise. E que ela também não é o passado, mas aquilo que, no
passado, “explica o presente” e, portanto, em particular a presença do
passado no presente, mantida viva e ativa pelas decisões, os gestos, as
maneiras de viver, de pensar e de reagir dos indivíduos concretos. Procurando traços da longa duração no século XVI, Braudel não procedeu
de maneira diferente: seu arquivo, cuja digitalização está começando no
17
MURRA, John; WATCHEL, Nathan (Org.). “Anthropologie historique des sociétés
andines”, número especial de Annales E.S.C., XXXIII, 5-6, 1978.
36
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
marco de um programa sobre a gênese dos textos literários, é uma
sequência de anotações de pequenos fatos repetidos, observações de
época. Ele se servirá deles para reconstituir as regularidades, cujos traços se mantiveram vivos até os nossos dias, mas cujas origens se encontram bem distantes no passado. A longa duração é, de fato, tecida de
eventos menores e singulares. Esta conduta não tem nada de impressionista: ela explica e justifica a fórmula “dix fois pour une”*****, frequentemente retomada por ele. Ela lhe permite uma dupla atualização do
Mediterrâneo: no presente de hoje, para nós seus leitores, em relação ao
longo século XVI do qual nos fala e no qual quer nos fazer entrar, mas
também no presente do século XVI, em relação aos seus múltiplos passados que recuam longe no tempo, do que os atores da época possuíam
consciência mais ou menos clara.
A questão central me parece, de fato, outra. Ela diz respeito menos à própria longa duração do que a seus mecanismos de funcionamento, que são aqueles da repetição, pelos indivíduos, mas também pelos
grupos e as instituições, de gestos, de comportamentos, de maneiras de
pensar e de decisões que tendem a se distanciar pouco da regra e, portanto, a confirmá-la, admitindo-se que, ao interpretá-la, pode-se desviála à margem.
A dupla referência de Fernand Braudel à geografia e à etnologia o
conduziu a destacar, no Mediterrâneo, de um lado, as escolhas efetuadas
ao longo de milênios pelas sociedades que construíram e humanizaram
o espaço mediterrâneo, e que, em seguida, funcionam como constrangimentos ou predeterminações para as decisões daquelas que as sucederam, e, de outro, as tradições transmitidas de geração em geração pelos
próprios atores, particularmente no marco da família. Para explicar a
transmissão da tradição nas sociedades rurais, Marc Bloch já havia sublinhado que a educação das crianças era, com frequência, atribuída aos
avós, que lhes asseguravam os cuidados enquanto os pais trabalhavam
nos campos. Braudel, de sua parte, havia colocado o último capítulo de
sua primeira parte, “A unidade humana”, sob o signo dos caminhos e
das cidades, ou seja, de ordenamento durável do espaço concebido como
espaço de circulação e de trocas.
***** Expressão que poderia ser traduzida, literalmente, por “dez vezes por uma”, e que
indica algo frequente, repetido, evidente (N. do T.).
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
A primeira pista, aquela dos constrangimentos, esboçada já no
artigo de 1958, foi ulteriormente formalizada por ele, como havíamos
mencionado, em 1967 (em Civilisation matérielle), sob o nome de “prisões
de longa duração”. Estas se identificam com as escolhas, efetuadas pelas sociedades em um momento muito remoto de seu passado, a respeito dos cereais aos quais irão recorrer para assegurar a maior parte de
sua alimentação: escolhas ao mesmo tempo técnicas, econômicas, culturais e sociais, que se revelarão constrangedoras e irreversíveis e fixam
para as sociedades o campo dos possíveis.
Esta mesma pista foi retomada em meados dos anos 1980 pelos economistas, com o artigo de Paul David sobre o teclado da máquina de escrever18, sob o nome de dependência temporal. A expressão lhes serve para
designar as escolhas técnicas, mas também institucionais e sociais, cuja
duração propõem explicar – apesar de sua irracionalidade em certos casos intrínseca – pela racionalidade dos custos de transação, que desencorajam os investimentos necessários para questioná-las. A explicação é tentadora, mas nenhuma verificação experimental foi feita, nem qualquer
contabilização precisa, quando seria simples fazê-lo – assim, por exemplo, a propósito da Suécia, quando aderiu à condução dos automóveis
pela mão direita, ou da Grã-Bretanha, quando renunciou, para sua moeda, ao velho sistema carolíngio “libra-soldo-dinheiro” e adotou o sistema
decimal. No entanto, estes dois casos teriam permitido colocar em números, de forma bastante precisa, estes “custos de transação”, frequentemente
invocados como explicação final mas raramente calculados.
Os historiadores da alimentação, ao contrário, estudaram bastante como os europeus conseguiram, no século XX, ao cabo de uma série
de mudanças e progressos agronômicos e comerciais que haviam começado em meados do século XVIII, superar os embaraços de um regime
alimentar no qual o trigo tinha de assegurar a maioria das calorias e das
proteínas, e passaram progressivamente a um regime no qual a maioria
das proteínas é garantida pela carne e pelos laticínios, e a maioria das
calorias pelas gorduras e açúcares rápidos. E eles seguem de perto as
transformações em curso na alimentação dos países industrializados e
18
DAVID, Paul. “Clio and the Economics of QWERTY”. American Economic Review. Papers
and Proceedings, LXXV, p. 332-337, 1985; “Understanding the Economics of QWERTY:
The Necessity of History”. In: Economic History and the Modern Economist. Organizado
por W. N. Parker. London: Basil Blackwell, 1986, p. 30-49.
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
urbanizados, com forte redução de aportes calóricos sugeridos (as 1.800
a 2.000 calorias cotidianas, que há meio século representavam a fronteira da subalimentação, são hoje propostas como o ideal para nossas populações adultas sedentárias, dispensadas de todo de qualquer esforço
físico em seu trabalho), a diminuição das gorduras, dos açúcares e das
proteínas animais, os progressos dos legumes e das frutas, o privilégio
dado às vitaminas, aos elementos minerais, ou a estes recém-chegados
ao poder, um pouco misteriosos (mas cujo impacto publicitário é forte),
que são os ômega 3, 5 e outros...
As duas pistas (a dos constrangimentos e a da tradição) se encontram reunidas em Braudel com base em sua definição do conceito de
“civilização”. A seus olhos, todas as civilizações se inscrevem em um
espaço e em uma duração infinitamente mais longa que aquela do político ou mesmo da religião. Mas ele toma o cuida de precisar que estas se
definem ao mesmo tempo por aquilo que dão aos outros, pelo que lhes
tomam emprestado (daí uma margem de inovação no cerne da longa
duração), mas também pelo que recusam, para afirmar a sua reserva e
sua diferença. Esta prudência, justificada pela experiência do passado,
foi, com frequência, esquecida, em todos os debates posteriores ao 11 de
setembro, por todos os discípulos de Huntington atraídos pela ideia de
uma guerra inevitável entre civilizações concebidas como conjuntos
petrificados e incapazes de se comunicar entre si e, ainda mais, identificadas principalmente com sua dimensão apenas religiosa.
A segunda pista, a da tradição, viu-se recentemente submetida a
uma dupla crítica. A primeira, de Eric Hobsbawm e de Terence Ranger,
sobre a invenção da tradição19, opõe os mecanismos de construção “ativa” da tradição à visão, excessivamente simples, de uma pura transmissão passiva, e faz destas tradições construídas objetos de história, datáveis no tempo, situáveis no espaço, atribuíveis a atores sociais e institucionais identificáveis, reinterpretados mais ou menos livremente pelas
sucessivas gerações em função de suas necessidades do momento. Isto
as leva do estatuto de “descrições objetivas”, que os especialistas das “
tradições populares” tinham se dado por objetivo registrar, para protegê-las do esquecimento e compreender, por dentro, as sociedades que
as viviam no presente, ao estatuto de “representações”, que devem en19
HOBSBAWM, Eric J.; RANGER, T. (Coord.). The Invention of Tradition. Cambridge:
Cambridge University Press, 1983.
39
A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
contrar seu lugar numa história social da cultura e numa história cultural da sociedade. A segunda crítica se encontra no pano de fundo das
posições dos antropólogos que, à imagem de Marshall Sahlins, sugerem
substituir a fórmula “quanto mais isso muda, mais permanece a mesma
coisa” (o tempo imóvel) pela formulação inversa: “quanto mais isso é a
mesma coisa, mais isso muda”, que nos aproxima do tempo quase imóvel, que passa lentamente, mas compreendendo sempre uma parte de
mudança que Fernand Braudel propusera. Mas ela acrescenta aí o fato
de que a inovação, por forçar as portas do conservadorismo das sociedades, tem a necessidade de se esconder atrás do respeito da tradição.
A forma pela qual o passado contribui para modelar o presente
constitui, pois, uma questão mais viva e atual que nunca no campo das
ciências sociais. Esta é uma questão cuja resposta deve ser buscada, ao
mesmo tempo, do lado do passado – as “mensagens” que ele nos transmitiu, os caminhos que nos preparou, mas também o que aprendemos a
conhecer, o que buscamos saber e o que escolhemos reter sobre ele, pois a
memória é tecida de esquecimentos e de redescobertas –, e do presente –
a forma pela qual as sociedades, de forma consciente ou não, explícita ou
não, reinterpretam esse passado e o “atualizam”, e os mecanismos de sua
incorporação, aceitação e apropriação, geração após geração, que Bourdieu havia colocado no cerne de suas análises do habitus, e que ditam as
astúcias que permitem, a cada vez, ao morto apoderar-se do vivo. Mesmo
que o interesse dos pesquisadores tenha se deslocado das obrigações materiais em direção aos modelos culturais, a ambição segue a mesma.
Mas essa questão, que diz respeito ao próprio funcionamento da
longa duração, não deve deixar que seus outros usos sejam esquecidos:
primeiramente, aquele que consiste, para estudar um objeto histórico,
qualquer que seja, em tomá-lo na totalidade de sua mais longa duração,
para estabelecer seus limites e identificar suas principais rupturas ou
inflexões, sinalizar uma periodização e definir, justificando-os em seguida, o momento e o lugar nos quais concentra a observação e a análise. A história do livro será, pois, para tomar apenas um exemplo, uma
história de cinco séculos e meio, se a relacionamos àquela da imprensa e
se admitimos que os meios digitais, sem que nela tenham posto um ponto
final, representam um momento de inflexão fundamental. Isso porque
eles vêm pôr em questão o monopólio do livro, como forma de referência de comunicação e de circulação do texto escrito, de maneira ainda
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
mais eficaz, posto que passaram a controlar, na origem, a própria composição do texto até a camera ready copy. Mas a história do livro é uma
história de um milênio ou mais, se identificamos seu nascimento com
aquele da passagem do volumen ao codex, que modifica profundamente
os modos de apresentação e, mais ainda, de leitura do texto. E será uma
história mais longa ainda, da ordem de três milênios ou mais, se a identificamos com aquela dos próprios textos literários, de sua fixação, de
sua transmissão pelo escrito, de sua “publicação”, de sua conservação
nas bibliotecas públicas ou privadas: tal será também o tempo das religiões do livro. E este recorte, em durações de tamanho diferentes, poderá ser ainda clareado e tornado mais complexo se ampliamos a história
do livro àquela da leitura, igualmente rica de ensinamentos. A longa
duração não é una, mas plural, segundo o objeto estudado e as questões
que lhe são postas.
Todos estes usos e estas representações da longa duração como
repetição não idêntica, mas quase idêntica, fazem parte hoje da bagagem comum das ciências sociais, aí incluída a história. As críticas formuladas em 1951 por Bernard Baylin, ou, em 1968, por Stuart Hugues20,
nas quais ambos denunciavam a ausência de qualquer ligação entre as
três temporalidades do Mediterrâneo, não são mais citadas senão como
testemunhos do efeito surpresa provocado pelo livro à época e da incompreensão gerada em alguns, mal-estar diante deste questionamento
de seus hábitos e certezas. Como Anthony Molho observou corretamente, o que estes historiadores, vinculados apenas à representação linear
de um tempo que passa no mesmo ritmo, recusavam era precisamente
essa pluralidade dos tempos que Braudel procurava distinguir para pôr
em evidência suas múltiplas interações21. Mas é preciso também levar
em conta tudo o que mudou ao longo destes últimos 50 anos, tanto no
conteúdo e nos métodos das ciências sociais quanto na relação que têm
ou buscam ter com as ciências exatas: os próprios termos com os quais
Braudel pôde formular estas duas questões, e que constituem o cerne de
seu artigo de 1958, foram sensivelmente re-orientados. E a tarefa que
BAYLIN, B. “Braudel’s Geohistory – A Reconsideration”. Journal of Economic History,
XI, 3-1, p. 277-282, 1951; STUART HUGHES, H. The Obstructed Path: French Social
Thought in the Years of Desperation, 1930-1960. New York: Harper & Row, 1967.
21
MOLHO, Anthony. “Like Ships Passing in the Dark: Reflections on the Reception of La
Méditerranée in the U.S. Review, XXIV, 1, p. 139-162: 155-157, 2001.
20
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A longa duração hoje: balanço de meio século (1958-2008) / Maurice Aymard
nos cabe é levar isso em conta, para pormos em dia as respostas que,
hoje, poderíamos oferecer.
As ciências sociais, incluindo a história, viveram duas transformações fundamentais, aparentemente contraditórias e, de fato, complementares.
A primeira foi aquela da ampliação em direção às origens do tempo histórico. A história não começa mais com a Suméria. Com efeito, a
revolução científica da arqueologia aboliu a fronteira da invenção da
escrita que servia para distinguir a história da pré-história e aquela, frequentemente associada à anterior, da oposição entre “sociedades frias”
e “sociedades quentes”: ela aproximou os antropólogos, os arqueólogos
e os historiadores, quer trabalhassem sobre a Europa, quer sobre as outras grandes áreas geográficas e culturais do mundo, e mobilizou muitos técnicos de análise, de medida, de modelização e de informatização
emprestados das ciências exatas. A comparação das Memórias do Mediterrâneo, de Fernand Braudel (redigido em 1968-69), com o La mer partagée, de Jean Guilaine (1994)22, permite medir o caminho percorrido em
duas décadas e aclara uma perspectiva na qual se inscreve o Sabbat des
sorcières, de Carlo Ginzburg23. Deste ponto de vista, a “revolução neolítica”, iniciada cerca de 12 mil anos antes de nossa era, em diferentes
regiões de nosso planeta (o Oriente Próximo, o México e os Andes, a
China, a Nova Guiné), fixa hoje a unidade de análise comum aos historiadores, aos arqueólogos e aos antropólogos. Mas como nenhuma revolução faz, nunca, tábua rasa do que a precedeu, ela coloca o problema
das continuidades – mais ou menos subterrâneas – com as etapas anteriores do controle dos recursos da natureza, que estavam na base da
organização das sociedades de caçadores-coletores que não desapareceram na noite para o dia.24
A segunda foi aquela do lugar atribuído aos atores individuais e
às relações que eles tecem entre si nas decisões tomadas no cotidiano, e
que o pesquisador, com distanciamento, lê como ditadas pela necessidade, mas que foram então vividas como escolhas mais ou menos conscientes e racionais entre diferentes soluções possíveis.
GUILAINE, Jean La mer partagée: la Méditerranée avant l’écriture, 7000-2000 av. J.-C.
Paris: Hachette, 1994.
23
GINZBURG, Carlo. Storia notturna: Una decifrazione del sabba. Turin: Einaudi, 1989.
24
Cf. “Nouveaux regards sur la révolution néolithique”, entrevista com Jean-Paul Demoule
e Jean Guilaine, Le Monde, 28-29 de setembro de 2008.
22
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Esta dupla transformação explica a situação atual das ciências sociais, na qual duas posições principais tendem a se opor. De um lado,
com efeito, encontramos todos aqueles que colocam, no centro de suas
análises e de suas explicações, os mecanismos (educação e aprendizagens diversas, representações sociais, obrigações aceitas e, mesmo, reivindicadas, etc.) que levam os indivíduos a fazer voluntariamente “a
escolha do necessário” e a retomar, por sua conta, a herança do passado.
Em compensação, de outro encontramos todos aqueles que, desconfiados em relação a qualquer forma de determinismo (quer reivindiquem
ou não sua filiação ao individualismo metodológico), privilegiam a racionalidade das decisões dos atores e se contentam em explicar os limites destas decisões em razão dos limites da informação de que eles dispunham no momento em que as tomaram.
Uma das formas de superar estas oposições seria, sem dúvida,
seguir as pistas que as ciências exatas definiram e traçaram para suas
próprias necessidades e que ainda hoje encontram, com algumas exceções, apenas um eco limitado nas ciências sociais: elas merecem hoje ser
sistematicamente exploradas. Assim, por exemplo, aquelas que nos foram oferecidas ao longo dessas últimas décadas, as análises da disseminação, da bifurcação e do caos, da complexidade ou, ainda, a análise
estocástica. Com efeito, elas abrem o caminho a outras leituras e a outras interpretações da longa duração, que possuem em comum o fato de
aí introduzir a própria ideia de ruptura e de mudança, e de orientar as
ciências sociais em direção às representações não lineares do tempo e,
ao mesmo tempo, às análises das sociedades em termos de sistemas dinâmicos. As perspectivas que elas nos propõem, em mais de um ponto,
são radicalmente diferentes daquelas que guiaram a concepção e a redação do artigo de 1958. Mas têm o mérito de nos oferecer outras soluções possíveis às questões nele colocadas. A estas, Braudel propôs uma
primeira série de respostas cujos limites, apesar de sua fecundidade e
impacto na pesquisa ulterior, hoje percebemos melhor. Contudo, uma
coisa é certa: na medida em que convidam a questionar as certezas que
ele à época partilhava com os especialistas, e que são ainda aquelas de
muitos dentre nós, elas teriam certamente fascinado Fernand Braudel.
43
Comparação e análise histórica
Reflexões a partir de uma
experiência de pesquisa*
Rosa Congost**
Antes de tudo, quero agradecer aos organizadores deste Encontro
e, em particular, aos meus amigos Andrea Reguera e Flavio Heinz, que
me convidaram para participar e me deram a honra, não merecida, de
fazer esta conferência de encerramento. A oportunidade de me dirigir a
um conjunto de pesquisadores que trabalham em áreas muito distintas
e muito distante das minhas tem sido sempre especialmente estimulante para mim. Este estímulo, que experimentei de forma inesperada, quase espontânea, em minha primeira visita a Tandil há 15 anos e que, desde então, aconselho a todos os historiadores, constitui, penso, uma manifestação da força e das vantagens da comparação na história. Esta é a
ideia que quero compartilhar hoje com vocês e que justifica o tom pessoal de minha exposição, pelo qual espero que me desculpem.
Se há alguns meses aceitei, com muito gosto, o convite para participar deste II Encontro Marc Bloch, não foi apenas pela amizade que me
une aos organizadores, ou pela admiração que sinto pela obra dos fundadores dos Annales, mas porque compartilho, ou creio compartilhar,
com uns e outros a necessidade de reivindicar a perspectiva comparada
nos estudos históricos.
Confesso que a expressão “história comparada” me desperta dois
tipos de reações. A primeira é de relativa comodidade. Sinto-me cômoda com o qualificativo de “história comparada”. Satisfaz-me e me lison-
* Texto apresentado à sessão de encerramento do II Encontro da Rede Marc Bloch de Estudos Comparados de História – Europa/ América Latina, na PUCRS, em Porto Alegre, no
dia 24/10/2008. Tradução de Mariana Flores da Cunha Thompson Flores.
** Universidade de Girona, Espanha.
44
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
jeia que alguém diga que meus trabalhos e minhas pesquisas são exercícios de história comparada. Contudo, a segunda reação é de certo desconcerto. Porque estes trabalhos e essas pesquisas não foram concebidos com o objetivo de fazer “história comparada”. Em todo caso, não
com esse objetivo como meta principal.
Quero dizer que nunca, no momento de escolher ou elaborar um
projeto de pesquisa, pensei: vou fazer um projeto de história comparada. Talvez porque essa “grande dama”, como chamava Febvre, inspirame ainda muito respeito... No entanto, não creio que esta seja a principal razão... Por que, então, para alguns, pertenço ao grupo de historiadores que realizam história comparada? Por que, como acabo de dizer,
eu mesma me identifico com este rótulo e, portanto, situo-me neste grupo? Talvez porque cite bibliografia de outros países? Talvez porque tenda a fazer referência a espaços e tempos distintos daqueles que constituem o objeto de meu estudo? Se é assim, no meu caso, nem uma coisa
nem outra constituem um mérito. O fato é que não sei fazê-lo de outra
forma. Não saberia, não sei definir o espaço e o tempo do meu objeto de
estudo sem fazer referências a outros espaços e outros tempos.
Se chamamos a essa necessidade método comparativo, enfoque
comparativo, então quase sim, posso afirmar que eu pratico este método, ou tento praticá-lo. Mais ainda, posso afirmar que não concebo outra maneira de praticar a análise histórica. E, seguramente, a chave se
encontra nessa palavra, na palavra “análise”. Esta exposição teria sido
bem diferente se tivesse decidido intitulá-la “Comparação e síntese histórica” ou “Comparação e narração histórica”. O método comparativo
para mim tem significado na medida em que me ajuda a cumprir um
objetivo que, a primeira vista, poderia parecer diametralmente oposto à
história comparada: o objetivo de saber situar corretamente, precisamente, finamente, cada problema estudado, cada realidade histórica,
em suas justas coordenadas de espaço e tempo. Interiorizada desta forma, a perspectiva da história comparada é para mim, e para muitos, a
única forma possível de escrever a história, entendida como uma forma
de colocar “problemas históricos”, de escrever “história fundamentada” ou de “pensar historicamente”. Creio que também era assim para
Marc Bloch, Lucien Febvre, Ernest Labrousse, Pierre Villar... E me apresso
em dizer que é muito mais meritório nestes casos do que no meu.
As características de nossos Encontros de história comparada me fazem intuir que meu modo de pensar é compartilhado por muitos de vocês.
45
Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma experiência de pesquisa / Rosa Congost
O interesse pela história comparada nos uniu, mas a maioria dos trabalhos
que temos apresentado tem falado de uma realidade concreta. Escutandonos uns aos outros, debatendo, temos aprendido muitas coisas novas sobre
realidades diferentes, mas só teremos feito justiça ao título deste Encontro
se tivermos interiorizado, um pouco mais, a necessidade de comparar realidades para analisar melhor a realidade que estamos investigando.
De fato faz muitos anos que isto ocorre. Quer dizer, faz muito anos
que os historiadores descobriram as vantagens de lerem uns aos outros.
Mas nunca é demais nos lembrarmos disto.
Outros haverão de julgar os resultados, mas penso que aqui reside a autêntica potencialidade do método comparativo, aquela que atraía
a Marc Bloch. Não basta incluir na bibliografia uma lista de referências
estrangeiras. Não basta mostrar conhecimento erudito de outras sociedades. Tampouco basta, nem é necessário, tornar explícita no título de um
livro, por exemplo, ou de um colóquio, ou de uma conferência, a intenção
de comparar realidades históricas de espaços e tempos distintos...
Com esta introdução quis enfatizar que a história comparada, ou
ao menos um tipo de historia comparada, é, para alguns de nós, uma
consequência, um resultado, um reflexo de uma atitude diante da pesquisa histórica, de um hábito, de uma forma de pensar, que alguns historiadores da minha geração aprenderam de seus professores e que consiste, basicamente, no fato de ter muito presente, quando pesquisamos,
quando estudamos uma realidade, outros estudos, outras realidades...
Para quê? Com que objetivo? A resposta é fácil: para analisar e compreender melhor a realidade que estamos pesquisando. E é a partir daqui
que o argumento se complica. De que tipo de realidade estamos falando? A resposta agora tem que ser forçosamente geral e, aparentemente,
ambígua: “depende”. Mas este “depende” não é banal. Dizer que existem muitas realidades históricas dignas de ser estudadas, além de dizer
algo óbvio, é sugerir que há muitas maneiras possíveis de utilizar a comparação na história, muitas escalas de história comparada, para dizê-lo
com a expressão que dá título a este colóquio, e que todas elas podem
ser igualmente válidas e legítimas.
Fiquei tentada, sobretudo depois de relê-los, a preparar esta intervenção a partir de dois célebres artigos de Marc Bloch, datados de 1928
e 1930, sobre o tema, tão atuais me pareceram. Desisti de fazê-lo porque
Maurice Aymard havia realizado um exercício semelhante no Encontro
anterior. Por essa razão, minha reflexão tenderá a estabelecer um diálo46
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
go, uma continuidade com aquelas reflexões de Maurice Aymard sobre
“a história comparada hoje”. Na sua exposição, Aymard relembrava que
a necessidade de um programa de história comparada havia sido defendida muito antes de Bloch, em fins da década de 1870, e, portanto, também a reivindicação de uma história científica e a reivindicação de um
método histórico. Maurice Aymard termina seu artigo perguntando-se
a respeito do caminho seguido pela história comparada depois de Marc
Bloch. E comenta aquelas mudanças que considera mais relevantes nas
últimas décadas: entre outras, certa perda de peso da História no conjunto das ciências sociais e, também, certa perda de peso da Europa no
cenário mundial.
No texto referido, Aymard constatava certo esgotamento dos modelos e das estratégias de pesquisa que haviam dominado até os anos 80
do século XX. Por isso, dizia, faz-se necessário “inventar novos objetos
de estudo, escolher novos ângulos de observação e revisar criticamente
os objetos anteriormente selecionados”. Estou convencida de que apenas a perspectiva da história comparada pode nos ajudar nesta tarefa.
Também estou convencida de que é uma tarefa que não pode ser realizada por um historiador de forma individual. Apenas o diálogo entre
diferentes pesquisadores e a existência de equipes de trabalho – locais,
nacionais e internacionais – podem ajudar a vencer “o perigo maior” da
tarefa que temos nas mãos: “a incapacidade dos pesquisadores de se
alimentarem de conhecimentos necessários para desenvolver a comparação na escala mundial: conhecimentos linguísticos, bibliográficos e historiográficos, e conhecimentos de diferentes campos”.
Na opinião de Aymard, a necessidade de superar o eurocentrismo
inicial, que marcou o nascimento e a afirmação da História, tem um resultado historiográfico: a ideia de uma história mundo: “Quer dizer, dar lugar a outras disciplinas diferentes da História, que tem privilegiado o
estudo de sociedades extraeuropeias, e criar as condições de uma verdadeira cooperação entre historiadores e especialistas de outras disciplinas”.
Estou de acordo com Maurice Aymard na reivindicação de um
espaço mais amplo para a história comparada, “para colocá-la a serviço
de uma história do mundo, que Bloch não poderia ter intuído”. A condição, claro está, é não confundir história comparada com história mundial,
nem tampouco com história internacional, porque, frequentemente, por
trás desses rótulos se escondem simples trabalhos de síntese histórica que,
na melhor das hipóteses, servem para pôr em evidência a falta de pes47
Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma experiência de pesquisa / Rosa Congost
quisas históricas. E sob a condição de saber adotar, na análise histórica
do problema estudado, a perspectiva que permita estudá-lo em uma
escala adequada. Por exemplo, nos muitos estudos interessados na construção histórica de determinados fenômenos – tais como os direitos de
propriedade, ou os diversos mercados – a comparação entre Estados e a
perspectiva a longo prazo podem nos ajudar a formular determinadas
hipóteses de trabalho, embora sua comprovação empírica vá requerer,
na maioria das vezes, uma escala mais humana: no espaço, a escala local
ou regional; e no tempo, a escala do “curto e médio prazo”.
Disse antes que minha geração deve muito a seus professores. Durante os anos de minha formação como estudante de História, nos anos 70,
havia certo consenso, entre os historiadores, que nos familiarizou com o
enfoque comparativo. A maioria dos historiadores, marxistas ou não, considerava que em toda a Europa haviam dominado, na época medieval,
sociedades que podiam ser consideradas feudais e, na época moderna, sociedades que estavam experimentando a transição do feudalismo ao capitalismo. Estas referências ofereciam um marco teórico compartilhado por
todas as áreas europeias, e inclusive pelas não europeias, o que, sem dúvida, facilitava a comparação entre as diferentes realidades. No entanto, o
peso do referencial teórico era tão forte que muito frequentemente os historiadores não se envolviam em projetos reais de pesquisa empírica. Frequentemente se davam por supostos e predeterminados os problemas históricos de uma época determinada e também se davam por supostos e predeterminados os grupos sociais de um espaço. Também poderia parecer
fora da discussão a identidade dos protagonistas da história, no sentido
dos protagonistas da mudança histórica. As palavras “feudalismo” e “capitalismo” encerravam, para muitos, muitas vezes, estruturas fixas e relações sociais predefinidas, grupos sociais predefinidos e também um fio condutor da história. Estas circunstâncias condicionavam os estudos das dinâmicas e as relações sociais de cada sociedade, que, muitas vezes, adquiriam
mais um tom descritivo de síntese que de análise.
Mas a consciência dos perigos de abusar de modelos teóricos não
pode ter como consequência a rejeição da elaboração rigorosa e científica do discurso histórico. Essa elaboração, que requer tanto o trabalho
nos arquivos quanto a formulação de novas hipóteses de trabalho, revela-se mais necessária do que nunca. Os novos estudos de caso podem
agora ser muito mais ricos que antes, porque agora estamos mais conscientes da necessidade de acompanhar a reflexão teórica com o trabalho
48
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
de arquivo... e de que o uso de determinado vocabulário não pode servir para simplificar a realidade. Para essa “combinação fundamentada”
– e razoável – da “prática teórica e da descrição concreta” o método
comparativo se revela muito útil e necessário.
Marc Bloch escreveu sobre a perspectiva da história comparada a
partir de sua experiência de pesquisa. Explicou que graças ao método
comparativo soube situar e interpretar, na história de algumas regiões
da França, o processo de cercamento de campos, que alguns historiadores franceses haviam ignorado. Este simples episódio, sobre o qual Marc
Bloch escreveu em várias ocasiões, permite-me destacar três aspectos
do método comparativo que me parecem relevantes:
1) Com este comentário, Bloch situa um problema concreto, o da
transformação da propriedade da terra, como um problema cuja análise
requer a perspectiva da história comparada.
2) O episódio explicado por Marc Bloch também serve para detectar outro problema: o das distintas tradições historiográficas nos diferentes países. Na Inglaterra, em fins do século XIX, os historiadores já
haviam concedido muita importância ao processo de cercamento de campos. Na França, por outro lado, o grande historiador Fustel de Coulanges havia negado que este processo houvesse ocorrido. Depois do comentário de Marc Bloch, portanto, percebemos a necessidade de dialogar com historiadores de outros países.
3) Por último, o breve comentário de Marc Bloch também nos faz
notar que o historiador não pode viver de costas ao mundo presente. O
diálogo do historiador com o presente quase sempre se reflete na formulação de perguntas que nos permitem aprofundar uma realidade histórica determinada ou colocar novos problemas históricos. O presente é
o tempo que Fustel de Coulanges desconhece porque, conta-nos Marc
Bloch: “Não é, em absoluto, faltar com sua grande memória recordar
que ele não era daqueles para quem o mundo exterior existe intensamente. É algo certo que nunca deve ter olhado com muita atenção para
as terras de trabalho que, de maneira singular, em todo o norte e o leste
da França, sugerem imperiosamente a lembrança do open-field inglês.
Sem afeição particular pela agronomia, as discussões sobre a abertura
de campos que, no momento mesmo em que recebia a carta de Seebohm, tinha lugar nas Câmaras haviam-no deixado indiferente”.
Essas três ideias ilustram as virtudes do método comparativo para
a análise histórica. A citação de Marc Bloch se refere ao tema da proprie49
Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma experiência de pesquisa / Rosa Congost
dade da terra. Minha experiência de pesquisa também, o que facilita
cruzar com suas reflexões. A importância da propriedade não é um tema
novo entre os historiadores. Alguns podem pensar que é um tema esgotado porque já desempenhava um papel central nos modelos e nas estruturas dominantes na história dos anos 60. Mas se reconhecemos a
importância do tema da propriedade na história das sociedades, e penso que é difícil não reconhecê-lo, o desafio que se impõe é outro: abordálo de modo novo. A este desafio dediquei a maior parte de minhas pesquisas, onde a perspectiva da história comparada, a mesma que colocou
em evidência os limites do enfoque dos anos 60, revelou-se inteiramente necessária para mim. Minha experiência de pesquisa, meu trabalho
empírico, tem se centrado sobretudo na documentação, localizada nos
arquivos dos séculos XVIII e XIX de uma região concreta, a região de
Girona, situada no nordeste catalão. Mas na interpretação desses documentos aprendi muito sobre dois tipos de comparação, no tempo e no
espaço: a) no tempo, tem sido fundamental o diálogo com alguns medievalistas e modernistas que trabalham sobre a mesma área, assim como
algumas notícias de exasperante atualidade, algumas sobre temas de
sempre, como processos de ocupação ou reocupação de terras, outras
sobre problemas novos, como os problemas derivados da insegurança
jurídica dos novos direitos de propriedade intelectual; b) no espaço, tem
sido fundamental o diálogo e o intercâmbio intelectual com os estudos
históricos sobre sociedades europeias – e nos últimos anos são muito
interessantes os processos de descoletivização vividos nos países da Europa oriental – e sobre sociedades não europeias. Entre estas últimas
têm exercido papel determinante as latino-americanas, como tentarei
explicar, mas não unicamente: é preciso estar muito atento às reformas
iniciadas na China, por exemplo.
Posso ilustrar esta forma de integrar a comparação na análise histórica a partir de algumas anedotas pessoais, que têm a ver com as sociedades latino-americanas. Na primeira vez que viajei para a Argentina,
o “descobrimento” da importância da enfiteuse na legislação liberal argentina ajudou nas minhas reflexões a respeito da legislação sobre a propriedade na Espanha liberal. Lembro também quando fui convidada por
Marta Bonaudo para fazer uma conferência em Rosário. Escolhi como
tema de reflexão as leis sobre a respiga (respigueo) na França, Inglaterra e
Espanha, porque me pareceu um bom marco para reivindicar a perspectiva da história comparada. Mas, durante o colóquio, soube que tal costu50
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
me não era conhecido na Argentina. Sequer me havia passado pela cabeça essa possibilidade. As referências à respiga na Bíblia tinham me convencido de que se tratava de um direito “natural”. Mas, do ponto de vista
da história comparada, também era bastante ilustrativa a não exportação
deste costume pelos colonizadores espanhóis aos países americanos.
A terceira experiência foi para mim a mais reveladora. Há algum
tempo recebi a tarefa de realizar a resenha de um livro sobre o fim das
propriedades coletivas em diversos países da Europa e América Latina.
O título do livro é: Les proprietés collectives face aux attaques liberales, publicado em 2003. Esta tarefa me obrigou a estabelecer comparações entre os
distintos processos descritos no livro. Lendo, aprendi muito sobre cada
um dos processos vividos em cada país, mas também aprendi sobre a
dificuldade de compará-los. Refiro-me, sobretudo, à comparação entre o
ocorrido na Espanha e na América Latina. Aparentemente, a mais fácil. O
vocabulário utilizado era o mesmo e as leis da metrópole, com as quais
estava familiarizada, haviam condicionado durante séculos a gestão das
comunidades indígenas. As leis liberais que os novos governos latinoamericanos independentes implementaram também se inspiraram claramente nas leis liberais do Estado espanhol. Mas não era possível comparar as florestas públicas espanholas e as comunidades indígenas dos países latino-americanos. Nos trabalhos referentes aos países da Europa Ocidental, os autores costumavam estimar que o conjunto dos direitos de
propriedade coletivos, quando eram vigentes, constituía um complemento
aos direitos derivados da propriedade individual. Nos países da América
Latina, por outro lado, os pesquisadores concebiam a propriedade coletiva como a forma habitual de gerir os recursos de uma parte da sociedade,
aquela correspondente à população índia, mas organizada pelos europeus, e a partir de uma linguagem própria da legislação castelhana, em
comunidades indígenas. As propriedades coletivas que ali se contemplavam não tinham nada a ver com as espanholas.
Por essa razão cheguei a me perguntar se tinha sentido comparar os
processos de desaparecimento da propriedade coletiva em ambas as sociedades, de caracteres tão distintos. Mas, paralelamente a essa reflexão, fui
reforçando algumas ideias para a análise histórica dos processos estudados. No livro, os autores, tanto europeus como latino-americanos, haviam
dado, sobretudo, informações muito úteis e muito fáceis de comparar sobre normas e leis. Mas praticamente todos os trabalhos sugeriam que as
diferentes normas puderam encobrir e permitir muitos processos de usur51
Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma experiência de pesquisa / Rosa Congost
pação de terras e direitos, sobre os quais não sabíamos nada. De meu ponto
de vista, é na análise histórica de cada um destes processos que a perspectiva da história comparada pode se revelar muito útil.
Penso que estamos todos de acordo de que a aparição da palavra
internacional, e inclusive a aparição do adjetivo comparado, e mundial
nos títulos de um colóquio não garantem a perspectiva da história comparada. Esta só é assegurada pela maneira de enfocar o o tema objeto de
estudo do pesquisador. Por isso, quando Marc Bloch falava de história
comparada, tendia a pôr exemplos retirados de suas próprias pesquisas. E sei que, enquanto me escutam, muitos de vocês estão confrontando suas experiências com as minhas.
No meu caso, todas as comparações, em pequena e em grande
escala, na escala temporal e na escala espacial, têm reforçado as mesmas
ideias e as mesmas necessidades em torno da análise histórica, que queria compartilhar com vocês. Talvez possam notar que são três ideias
que podem ser aplicadas tanto às minhas anedotas pessoais quanto às
de Marc Bloch. São estas:
1) Em primeiro lugar, nem tudo é comparável. Os mesmos discursos, as mesmas palavras, inclusive leis com o mesmo conteúdo formal,
podem se referir a realidades muito diferentes.
2) Que realidades históricas sejam comparáveis não depende dos
historiadores, mas os historiadores devem estar conscientes de que muitas vezes os discursos historiográficos de cada país podem condicionar
a “comparabilidade” de forma negativa: sugerindo que duas realidades
são muito mais comparáveis do que o são na realidade, ou o inverso,
tornando invisíveis elementos comparáveis.
3) Em terceiro lugar, e como consequência do exposto anteriormente, algumas realidades dificilmente podem ser “descobertas”, “apreendidas”, sem a perspectiva da história comparada.
Não se trata apenas de assumir que nos encontramos diante de realidades diferentes – isso já sabíamos antes de empreender o estudo de cada
realidade –, mas de aprender a interpretar cada uma delas. O triunfo de
determinadas ideias sobre a propriedade, para recuperar nosso exemplo,
pode ter evitado, por exemplo, a necessidade de estudar determinadas práticas sociais que não se encaixavam no modelo finalmente triunfante.
Este último “vazio” convida a refletir sobre um aspecto que encontramos presente em muitas pesquisas de história social: o possível desajuste entre o conteúdo das normas, das leis, e as práticas reais. Dedicarei a
52
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
última parte dessa fala para mostrar, através de duas noções tomadas de
países diferentes do meu, a influência que a visão comparada tem exercido em minha forma de enfrentar, na análise histórica, esse possível desajuste. Ambas as expressões têm sido úteis em minhas reflexões sobre a
realidade catalã, que é a realidade objeto de meu estudo: uma das expressões é francesa: mauvais gré. A outra, que descobri pouco antes de ser
convidada para este evento, é, justamente, brasileira: grilagem. Tentarei
demonstrar de que forma estas expressões podem nos ajudar a compreender diferentes realidades históricas. Proponho esta reflexão como exemplo de algo que para Marc Bloch se achava na base de sua reivindicação
da perspectiva da história comparada. Escutemo-lo:
“Certos fenômenos, por razões de ordem estritamente documental, ou em
função de uma relevância muito grande de alguns de seus efeitos imediatos, são, em uma sociedade dada, extremamente visíveis; em outros meios
– parecidos ou muito distanciados – fenômenos de características semelhantes, sem talvez ter sido menos decisivos, puderam ter uma ação mais
surda e um curso menos visível. A comparação incita a descobri-los.”
Começarei pela prática do mauvais gré. Por que me interessei por
essa prática? Quero começar explicando como a descobri. Foi na tese
doutoral de Pierre Villar sobre a Catalunha. Pierre Villar analisa textos
das Cortes catalãs do século XV, que se referem a ameaças e violências
dos camponeses servos contra os senhores e propõe interpretá-los como
uma manifestação do tipo mauvais gré. Pierre Villar conhecia os trabalhos de George Lefebvre e, concretamente, sua tese sobre Les paysan du
Nord pendant la Revolution Française. Neste trabalho Lefebvre falava das
práticas de mauvais gré nestas zonas da França, durante o século XVIII,
embora se soubesse que existiam desde a Idade Média. As práticas do
mauvais gré consistiam em uma resistência individual, mas também coletiva, dos arrendatários despojados pelos proprietários. A sobrevivência dessa prática durante o século XIX, apesar do código penal francês,
está refletida brilhantemente nas páginas de Balzac. No século XX, alguns juristas ainda escreveram sobre a vigência deste modo de atuar.
De fato, o mauvais gré pode se aplicar a diferentes épocas e diferentes
países. O romance do escritor valenciano Vicente Blasco Ibañez La barraca é inspirado em um caso flagrante de mauvais gré. O filme El prado de
Sheridan também. As reflexões de E. P. Thompson sobre “economia moral”, ou as de James C. Scott sobre as armas de resistência dos fracos,
também oferecem muitos pontos de comparação.
53
Comparação e análise histórica: reflexões a partir de uma experiência de pesquisa / Rosa Congost
Mas ainda era necessário dar outro passo. As práticas de mauvais
gré podiam ser utilizadas por pessoas ricas, poderosas? De fato, os conflitos de interesses que as práticas de mauvais gré revelam podem ser
interpretados como um conjunto de ações e reações em torno de uma
lei, que não constituem necessariamente formas de resistência das classes dominadas às classes dominantes. Reforcei essa ideia ao analisar o
desaparecimento dos bens comunais na Catalunha durante o século
XVIII. Muitos proprietários catalães, não precisamente pobres, protagonizaram uma apropriação arbitrária de terras comunais. Antes que as
leis liberais as protegessem, essas atitudes arbitrárias de homens ricos,
ou de homens que enriqueciam tornando-se proprietários, também se
baseavam em um desafio às leis, também eram uma espécie de mauvais
gré. A visão da propriedade como algo que ia se construindo adiante
das leis, revelada pelo caso catalão, ganhou peso comparativo com a
utilização de uma referência, coletada por Marc Bloch no Berry de 1786,
à “grande obra da propriedade”, e uma expressão tomada de empréstimo de Karl Marx, a dos “proprietários práticos”, para explicar o conteúdo do conjunto de leis e códigos liberais que, desde meados do século
XIX, protegeram os direitos de propriedades particulares.
Nos últimos anos, alguns problemas da atualidade são os que mais
têm me convencido da necessidade de mudar a forma tradicional de
analisar historicamente os direitos de propriedade. Uns, aos quais já me
referi em outras ocasiões, são os problemas relacionados com os direitos de propriedade intelectual e com as novas piratarias. Mas os outros
problemas atuais que mais me chamam a atenção têm a ver com os
processos de ocupação de terras na América Latina. Compreendam que
eu acabe fazendo referência a eles. As leituras de jornais sobre acontecimentos na América Latina me ajudaram a observar de modo mais completo e mais definitivo, e, em todo caso, mais humano, as características
inerentes à “obra da propriedade”... Além disso, encontrei uma palavra
no Brasil, “a” palavra, para definir as práticas dos homens ricos para burlar os códigos, quer dizer, para realizar um mauvais gré ao inverso: a “grilagem”. Um método para dar aos documentos, e aos supostos títulos de
propriedade, a aparência de antiguidade. Quando conheci a existência
deste método e desta palavra, quando soube que existia O Livro Branco da
Grilagem de Terra no Brasil, editado pelo Ministério da Política Fundiária e
do Desenvolvimento Agrário, em 2000, consegui compreender melhor e
ver com mais clareza algo que até aquele momento apenas havia vislum54
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
brado de modo obscuro quando tentava explicar a “história de bens comunais” de “bens comunais sem história” de minha região catalã: tinha
que pesquisar todas as armas das quais os protagonistas da história, tanto os fracos, quanto os não tão fracos, como os mais fortes se valiam.
O presente não explica a evolução das coisas, quer dizer, a história.
É a evolução das coisas, quer dizer, da história, que explica o presente. É
a história, a velha e a nova, que explica, por exemplo, as diferentes concepções, definições e os diferentes artigos dos códigos europeus e latinoamericanos do século XIX... e seu cumprimento ou não. É também a história, a velha e a nova, que explica que os códigos de muitos países latinoamericanos se refiram hoje aos direitos dos indígenas como direitos originais e que esse simples fato transforme em revolucionários os antigos
proprietários que não estão dispostos a renunciar a “seus” direitos.
A história humana tem alguns atores. A análise histórica só se revela
frutífera se admite como hipótese de trabalho a importância das decisões
dos diferentes atores sociais, condicionadas sem dúvida por muitos elementos que se devem ter em conta, mas que podem condicionar muitos
outros e podem dar lugar a resultados históricos insuspeitos por esses atores. Mas isso não nos exime de analisar estas decisões, decisões que podem
ir muito além das leis, das instituições formais e dos canais de informação
institucionalizados – que são os mais fáceis de investigar – a respeito da
vida, da terra, dos recursos, do meio ambiente, das mudanças tecnológicas,
quer dizer, em torno das mudanças históricas. E para levar a cabo essa análise é necessário partir de uma concepção complexa e dinâmica da sociedade,
dos grupos sociais e das relações sociais que dificilmente se alcançará sem
uma perspectiva comparada, no espaço e no tempo, em escala humana.
Esta é a reflexão que quis compartilhar com vocês hoje. Muito obrigada.
55
Una reflexión en torno a los mediadores políticos
en la segunda mitad del siglo XIX
El partido como problema
Marta Bonaudo*
“Una de las enseñanzas de la ciencia política, corroborada por la historia de las
naciones, es que ningún pueblo organizado bajo una forma de gobierno
constitucional puede marchar con buen éxito, si no cuenta en su seno con partidos
serios, dignos y capaces de asumir las funciones y responsabilidad del poder y de
la oposición.”
A.B.C José Nicolás Matienzo-19041
El enunciado de Matienzo tocaba un centro neurálgico de la vida
de una comunidad política que desde la crisis de 1890 y en los primeros
años del siglo XX se enfrentaba al desafío de configurar nuevas
legitimidades en el campo de la representación ante una sociedad que
se masificaba paulatinamente. Uno de los tópicos centrales de las
reformas de Joaquín V. González y de Indalecio Gómez entre 1902 y
1912 fue el de la construcción de partidos políticos de nuevo cuño2. La
urgencia de dar respuesta a tal desafío aparecía una y otra vez tanto en
la voz de los publicistas como en el debate parlamentario determinando
un verdadero punto de inflexión en relación a las discusiones de la
segunda mitad del siglo XIX. En dicho siglo, diversos pensadores
latinoamericanos y argentinos consideraron a tales agrupaciones no
inherentes al sistema republicano de gobierno e incluso, no pocos, las
percibieron contradictorias al mismo por cuanto asumieron que la forma
partido podía violentar las conciencias individuales e impedir la
* CONICET/ISHIR/UNR.
1
Matienzo, J. N. La política argentina. Establecimiento Gráfico: Robles y Cía, Buenos Aires,
1904.
2
Botana, Natalio. El orden conservador. Hyspamérica, Buenos Aires, 1977.
56
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
formación de una voluntad general.3 Impelidos por los desafíos de la
construcción de la República y la Nación, los liberales argentinos, por
ejemplo, debatieron largamente, durante los veinte años que separaron
la primera ley electoral ( 1857) de la última significativa del período(1877),
sobre diversas cuestiones relativas al sufragio, su localización, la
identidad ciudadana, las diferencias entre electores y elegibles pero la
cuestión partido sólo tuvo referencias marginales en las Cámaras
Legislativas y nunca fue objeto de una formulación explícita de carácter
normativo.4 No obstante, el ensayo y la prensa recuperaron a lo largo de
cinco décadas experiencias, reflexiones, críticas en torno a lo que los
contemporáneos denominaban, a veces indistintamente, facciones, partidos
o clubes.
El objetivo central de estas páginas reside entonces en acercarse a
esa compleja experiencia de conformación y práctica de tales instancias
de mediación, analizando estos partidos tanto desde las perspectivas
teóricas que alimentaron sus posibilidades de emergencia como desde
las condiciones sociales que les dieron vida.
Tal como lo planteó Raffaele Romanelli, en la construcción de un
sistema representativo asentado en un discurso que enfatizó siempre un
papel de unificación, de nacionalización, de socialización y de educación del
ciudadano, el liberalismo decimonónico se enfrentó al problema de
adaptar el principio individualista a las fuertes asimetrías sociales y a las
relaciones de respeto y de paternalismo que caracterizaron a las
sociedades de la época5. Fue, como diría Escalante remedando a Agnes
Heller, introducir al interior de sistemas habituales de relación un nuevo
conjunto de ideas acerca de la vida pública, de virtudes para la
convivencia y para la organización de la vida política, en suma dotar a
la moralidad pública de un modelo cívico.6 Este, en su dimensión modélica,
Palti, Elías. ¿De la República posible a la República verdadera? Oscuridad y transparencia de los
modelos políticos. Historiapolítica.com, pp. 5.
4
Bonaudo, Marta. Argentinos, ciudadanos, electores. Legisladores y publicistas en la búsqueda de
alternativas para la construcción y representación de una comunidad política. Una mirada
exploratoria. Ponencia presentada a las Jornadas Inter/Escuelas- Departamentos de Historia,
UNT, 2007
5
Romanelli,Raffaele. Sistemas electorales y estructuras sociales. El siglo XIX europeo. En Forner,
Salvador(coord) Democracia, elecciones y modernización en Europa. Cátedra, Madrid,1997,
p. 38.
6
Escalante Gonzalbo, Fernando. Ciudadanos Imaginarios. El Colegio de México, México
D.F, 1992, p. 32.
3
57
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
se estructuró en torno a ciertos ejes: el respeto del orden jurídico, la
responsabilidad de los funcionarios, la participación ciudadana, la
protección de los derechos individuales. Pero además, en tanto fruto
histórico del diálogo entre tres diferentes tradiciones -la republicana, la
liberal y la democrática- reposó sobre una muy peculiar definición de lo
público y sobre un tipo humano específico: el ciudadano7 ¿A qué refería
Escalante con esta afirmación? Al hecho de que, en tal modelo, lo público
aparecía como sinónimo de política y gobierno y, paralelamente, emergía
una idea de espacio público concebido como una configuración de prácticas
a través de las cuales se abordaban las cuestiones comunes en forma
pacífica.8 Ahora bien, ¿cómo conciliar las imágenes modélicas con la
dinámica efectiva de los propios actores? ¿Cómo pensar la identidad
del actor básico, la del ciudadano cual individuo racional, responsable y
solidario en lo público frente a actores ambiciosos, egoístas, limitados,
con escasas miras hacia el interés común? ¿Cómo compatibilizar, diría
Annino, a ese individuo de la norma frente a los grupos de la sociedad?9.
¿Cómo imponer, frente a otras morales, a la política imaginada como un
nuevo orden de normas y valores, al Estado como institucionalización
del bien común, al ciudadano capaz de afirmar su lealtad hacia las
instituciones políticas y su solidaridad con sus pares? La dinámica de las
construcciones republicanas y nacionales se vio atravesada por todos
estos dilemas y aquéllas debieron asumir el desafío que implicaba el
intento de viabilizar una moral cívica al interior de sociedades fuertemente
desiguales y construidas alrededor de una multiplicidad de sujetos
sociales atravesados por vínculos parentales, corporativos, comunitarios.
Por ende, la configuración de un sistema representativo y de instancias
de mediación entre la sociedad civil y el Estado se vio sometida a
profundas tensiones que, en definitiva, resignificaron los vínculos
precedentes, ubicando al mismo individuo en una nueva posición frente al
poder político10
Cuando explorábamos las miradas pergeñadas en torno al proceso
de construcción del sistema de representación por publicistas y políticos
Ibidem, p.35.
Ibidem.
9
Annino, Antonio. “El voto y el XIX desconocido”. Universidad de Florencia-Cide en http:/
/www.foroiberoideas.com.ar, 2004.
10
Ibidem.
7
8
58
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
de la realidad argentina en la segunda mitad del siglo XIX, surgían una
y otra vez reflexiones reiterativas. Una de las más frecuentes y resistente
fue, sin duda, la del rechazo al partido-parte. Frente al desafío de la
República, de la Nación, la sensación era que había que dejar atrás ese
debate. El imperativo era alejarse de la sombra de unitarios y federales y,
bajo las lógicas de unidad en torno a los principios, consolidar la moral
cívica. Mitre urgía en 1858 con su diagnóstico a avanzar en dicha
consolidación: …Pugnan en estos países dos elementos opuestos, que forman
la composición de dos partidos, el uno que tiende a la explotación de la sociedad,
y ha menester el amparo de los gobiernos personales, el otro que aspira a la
moralidad, al trabajo, a la consideración pública, y ha menester de un orden
regular de cosas, que sólo puede existir bajo el imperio de las instituciones… El
triunfo de uno de esos elementos que se organizó en partido político llamándose
a sí propio “federal”, al cual se agregan con el notable de fusionistas todos los
intereses bastardos o egoístas, importaría la elevación del gobierno personal,
que de nuestro modo de ser, tiene que hacerse necesariamente brutal y sangriento.
El triunfo del elemento opuesto, a quien se obligó a organizarse en partido
político, en defensa propia, con el nombre de unitario, al cual se ha reunido toda
la juventud honrada y generosa que venera los grandes sacrificios y las grandes
virtudes, importa el mantenimiento del gobierno representativo que nos rige,
bajo el cual la ley es una verdad, una realidad la justicia, un hecho el respeto a
los derechos y garantías del último ciudadano…11
Pensaba que ese partido unitario- que él denominaba partido de la
libertad- era el único portador de la verdad, al que habían convergido
todos los otros que defendían las normas y la justicia y que, por ende,
con su consolidación culminaba ese proceso, refundiéndose en el organismo
del pueblo por la asimilación de sus intereses y tendencias, con los intereses y
las tendencias de la universalidad de los ciudadanos…12
Ese partido- pueblo, convocante de la totalidad de los ciudadanos,
fue, sin duda, uno de sus argumentos discursivos fuertes tanto en la
lucha contra la Confederación como durante su presidencia. Sin embargo,
el mitrismo no logró concretarlo y operó como una parte más en la disputa
política. José Hernández aludía indirectamente a ello cuando en 1869
Mitre, B. Los Debates,14/2/1858 en Halperín Donghi, Tulio, Proyecto y construcción de
una Nación. Biblioteca Ayacucho, Caracas, 1980, p. 168.
12
Mitre, B. Los Debates, 15/2/1857 en Halperín Donghi, Tulio, op.cit, p. 181.
11
59
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
recuperaba la dirección que se había proyectado desde el triunfo de
Pavón (1861) y continuaba sosteniendo el deber ser del nuevo orden: …
Los partidos no tienen ya razón de ser. Se han disuelto al día siguiente de Pavón.
No hay más que ciudadanos argentinos bajo los auspicios de la constitución
nacional. La fusión moral desde entonces es un hecho, pues que ya no existe la
desinteligencia de las opiniones, la separación de los partidos excluyentes…La
fuerza de los principios es la que está destinada a absorber a los
partidarios y a confundirlos en los propósitos comunes de la vida social
y política.13
La tensión entre el ser y el deber ser se proyectaba aún en las décadas
de los ochenta y noventa, oponiendo a las agrupaciones regidas por
intereses personales y liderazgos fuertes ante aquéllas que hacían de los
principios y de los programas su bagaje central y apelaban
concomitantemente a las opiniones independientes y francas. 14 Tales
condiciones debieron incidir en las dificultades para regularlas y, por
ende, explicarían, en parte, la marginalidad del tópico partido en el debate
institucional durante aquellas coyunturas en que se discutían las leyes
electorales así como la no existencia de reglamentaciones al respecto.15
En 1873, por ejemplo, cuando un sector- evidentemente ligado a los
grupos progresistas- intentó sostener el criterio del sufragio secreto, uno
de sus voceros, el diputado Igarzábal, incorporó una de las escasas
referencias a los partidos: …el voto secreto tiene la ventaja de no hacer
depender al elegido, del partido que lo elija, porque es indudable que el
representante que no lleva nombre propio, no queda jamás á la merced de ese
partido, y entonces puede dedicarse con todas sus fuerzas y con la suficiente
independencia, á llenar los deberes de representante del pueblo…tiene también
la ventaja de no producir en cada una de las Provincias esas divisiones profundas
que quedan siempre después de una elección hecha…16
Paradigmáticamente, el argumento en defensa de la no publicidad
del voto- perspectiva también duramente cuestionada en el seno del
Hernández, José. El Río de la Plata, 1º/12/1869 en Halperín Donghi, Tulio,op.cit., p. 278.
Matienzo, op. cit, p. 21
15
Ver, entre otros, a Annino, Antonio, op. cit.,. Una excepción en este plano, por lo menos
hasta lo conocido actualmente, parece ser el Estatuto que en 1857 se estableció para la
clubes bonaerenses. Al respecto ver González Bernaldo, Pilar, Civilidad y política en los
orígenes de la Nación Argentina, Buenos Aires, FCE, 1999, p. 287.
16
Congreso Nacional. Cámara de Diputados. Diario de Sesiones de 1873. Buenos Aires,
Imprenta El Nacional, 1874, pp. 617.
13
14
60
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
liberalismo decimonónico 17- propuso una relación entre elector y
representante que reiteraba la necesidad de colocar por sobre los intereses
de partes, el interés general encarnado en la figura del pueblo. Era ratificar,
como lo marcaría Rosanvallon, el monismo como principio, tratando de
arrinconar los fantasmas de una noción de partido ligada a un orden
fracturado por rivalidades de poder u oposiciones de intereses por temor
a que dicho orden atentara contra la que concebían como una todavía
frágil unidad nacional. Se estaba aún lejos, de acuerdo con este autor, de
una legitimación filosófica del pluralismo, relacionado con formas de
organización de la vida política en una sociedad de individuos.18
La sociabilidad política, ¿una experiencia de nuevo cuño
o transmutación de otras?
¿Cómo se proyectaban estas miradas macro, de publicistas o
políticos involucrados en el debate constitucional del poder central y en
las dimensiones de la representación, en espacios locales o regionales?
Si a lo largo de los años que corrieron entre 1853 y 1890 en Santa
Fe – un área de la región pampeana- el debate institucional relativo al
tópico partido estuvo casi ausente, éste se desplegó, en cambio, en
periódicos y entre publicistas y políticos.
¿Cuáles fueron los principales ejes del mismo?
Ciertas reflexiones que el diario La Capital de Rosario realizaba altamente preocupado por la dinámica política en 1868- podrían ofrecer
un primer acercamiento al debate. Este se centraría inicialmente en cómo
traducir en clave de moral cívica la práctica partidaria pensada cual
instancia real de mediación entre la sociedad civil y el Estado, ambos en
sus tramos constitutivos. Luego de hacer un recorrido por la historia del
surgimiento de los clubes políticos en Gran Bretaña, Estados Unidos y
Francia, el editorialista recuperaba los objetivos que los mismos deberían
haber concretado en la realidad argentina a la caída de Rosas:… educar
al pueblo en las prácticas de la democracia,… uniformar la opinión pública por
medio del debate leal y franco,… hacer real y efectiva la libertad de sufragio,
y…encumbrar la soberanía popular, árbitra de los destinos de la Nación.19 El
Ver, entre otras, las interesantes reflexiones de Elías Palti, op. cit.
Rosanvallon, Pierre. Le peuple introuvable. Editions Gallimard, Paris, 1998, pp. 173 y ss.
19
La Capital, 21/1/1868.
17
18
61
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
deber ser propuesto se enfrentaba con un diagnóstico desolador desde el
espejo de Buenos Aires que, para el columnista, reflejaba el sistema electoral
de toda la República:… De los Clubs de la Chupandina, de la Pandilla, de los
Crudos, de los Cocidos, salieron los ciudadanos turbulentos que desenfrenados
e iracundos rasgaban los registros, despedazaban las meses y convertían cada
Parroquia en un campo de batalla. El Club Libertad(la pandilla y los crudos)
con registros falsificados, con los peones de la aduana y del ferro-carril,
acaudillados por sus respectivos capataces, con la mas decidida protección oficial
en todo tiempo, y hasta con el apoyo de la soldadesca armada, triunfó primero
del Club Independencia(los chupandinos) y después del Club del Pueblo(los
cocidos), ambos opositores al esclusivsmo(sic) y monopolio del Libertad, quedando
este hasta ahora dueño del campo electoral y contando hoy mas que nunca con
los mismos poderosos pero indignos elementos! Aunque el objeto de las elecciones
cambie, los manejos electorales siempre son los mismos; los votos en pro se
compran, los en contra se escamotean, los registros se falsifican, la ley se viola y
los ciudadanos honrados abandonan los comicios…20
La contundencia de las imágenes propuestas por e l periodista
ponía en cuestión la potencial viabilidad de un modelo de moral cívica
en una trama societal cuyos actores eran partícipes de otros códigos
morales, de otros hábitos y prácticas en su vida cotidiana, fuertemente
arraigados en la tradición y la costumbre.
¿Planteaba el caso argentino, en su ejemplo bonaerense pero
también santafesino, tan profunda incompatibilidad con la idea de un
interés público que estuviese más allá del juego de los intereses particulares;
con la vigencia de las normas o con una participación real que pudiera
encuadrarse en las formas institucionales?
La respuesta a tales interrogantes sólo podría abrirse poniendo a
foco la experiencia de la configuración de los partidos en tales espacios.
Es indudable que luego del pacto constitutivo de 1853, las elites
consolidaron sus visiones liberales y republicanas del mundo y la sociedad
con la pretensión de traducirlas en una organización política de
dimensiones nacionales, con miras a superar las trabas y fragmentaciones
existentes en la etapa precedente. Guiados por el ideal de configurar un
régimen representativo de tipo parlamentario, sus miembros intentaron
dar continuidad al control del gobierno de la sociedad que venían
20
Ibidem.
62
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
detentando desde la etapa independiente. Sin embargo, sus
representaciones en torno al poder, sus imaginarios, su discursividad,
sus rituales y prácticas debieron confrontar recurrentemente con las
experiencias materiales y simbólicas de las morales precedentes. En
consecuencia, la concepción del partido no podía escapar a tales marcas.
El término se vinculó, a veces, con configuraciones mayores destinadas
a pervivir a lo largo del tiempo como expresión de una opinión que se
presuponía mayoritaria. El desafío de tener que uniformar tal opinión
en las tramas locales y regionales, al tiempo que la proyectaban hacia
una dinámica tendencialmente nacional, implicó la resolución de
cuestiones de diverso tipo.
En primer lugar, las organizativas, para lo cual los partidos debieron
conformar clubes o centros localizados en cuarteles o parroquias urbanas
o en diferentes núcleos poblacionales menores destinados a realizar los
denominados trabajos electorales. No obstante, en el lenguaje periodístico
y de la vida cotidiana, ambos términos-partido y club- se tornaron no
pocas veces en equivalentes. Pese a ello, mientras el nucleamiento mayor
pareció pervivir a lo largo de las décadas, los menores prácticamente
perdían visibilidad transcurrida la coyuntura electoral. Un rasgo
distintivo de las configuraciones mayores residía en sus nomenclaturas.
Ellas de algún modo pretendían expresar valores o representaciones de
totalidades o de unidad o bien evocar coyunturas claves de la historia
transcurrida: Club de la Libertad, del Pueblo, Partido Constitucional,
Club 25 de Mayo, etc. Pese a ello, la reticencia frente a tales
agrupamientos- por su informalidad así como sus transmutaciones a lo
largo de las contiendas electorales- provocó que, con frecuencia, ellos
fueran objeto de miradas peyorativas y estigmatizantes que los
identificaran como bandos, camarillas, círculos o facciones21 Tales modos
de interpelarlos encerraban, sin embargo, algunos indicios valiosos. Uno
de estos era que si bien las lógicas de la representación liberal pretendían
alejarse de cualquier reflejo de la realidad social en su proyectada
construcción de la ciudadanía política, las instancias de mediación y
unificación de la opinión que se conformaron con tal finalidad- los
partidos- se vieron fuertemente permeadas por dicha trama. Motorizados
21
Ejemplos de ello emergen de editoriales como los de El Ferrocarril, 15/6/1884;El
Independiente,8/7/1884; 13/8/1884; El Corondino, 1/12/1884.
63
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
desde las elites, ellos desempeñaron un importante papel en la
reactualización de las instituciones representativas-como lo marcó Pilar
González para el caso de Buenos Aires- 22 pero no pudieron escapar a
los códigos de la sociabilidad precedente y al juego de los vínculos23. A
lo largo de esas décadas, la mayoría de estos agrupamientos se movieron
en un espacio de fronteras lábilmente definidas que prolongó en sus
interacciones y en sus pautas organizativas públicas, las lógicas de una
sociabilidad privada. Durante los cincuenta y los sesenta, al apelar a
quienes tenían una natural afinidad, participaban de un idéntico sentimiento,
24
se lo hacía bajo el término de amistad o utilizando el vocablo de socio:
A los socios
Del Club del Pueblo
Se invita a todos los socios del Club del Pueblo y a los que simpaticen con
sus ideas a una reunión general que tendrá lugar el Domingo 28 del corriente a
las 12 y media del día en el Teatro de la Esperanza.
Se recomienda la más puntual asistencia
La Comisión25
La comunicación periodística no parecía diferir demasiado de la
que hubiera podido editarse notificando una reunión social del Club
del Orden- espacio de ocio tradicional de la elite capitalina- , de una
asociación étnica o incluso de la Sociedad de Beneficencia. Lentamente
el lenguaje iría conduciendo a la convivencia de los amigos con los
conciudadanos:.. En los Departamentos de la Capital, Coronda y San José,
nuestros compatriotas se preparan a disputar con entusiasmo el triunfo electoral
y a la elevar a la primera magistratura de la Provincia, a nuestro distinguido
conciudadano don Mariano Cabal…26 Ya hacia fines de la década del
setenta, se integraría la noción del afiliado, a veces sin que las otras
desaparecieran:…hace dos horas á, que por orden del comandante de un
batallón, Pedro Larrechea y encargado de la Gefatura(sic), porque el Gefe(sic)
Político Gaitán esta mañana salió para los Barrancos, han sido citados varios de
González Bernardo, P., op. cit., p. 265 y ss.
Hemos analizado esta experiencia en Revisitando a los ciudadanos de la República Posible
Santa Fe, 1853-1890. En Anuario del IHES Nº18, Tandil,UNCPBA, 2003, pp.213-232.
24
Gian Luca Fruci. Los grupos antes de los grupos. Apuntes para el estudio de las constelaciones
políticas en el Parlamente de la Italia Liberal en Zurita, R- Camurri, R.,eds Las elites en Italia
y en España(1850-1922), PUV, Valencia, 2008, pp.98.
25
El Rosario, 27/8/1864;14/10/1864; El Trueno, 22/12/1864.
26
La Capital 13/12/1867.
22
23
64
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
nuestros amigos y como no han querido presentarse a la citación han sido llevados
presos don Bernardino López y Javier Maciel…esto viene a demostrar que estos
hombres quieren de todo tranco prohibirnos que reunamos nuestros afiliados….27
Tal forma de interpelación a sus miembros resultaba, a su vez,
congruente con una concepción partidaria que no pretendía reproducir
en su interior – más allá del discurso- las lógicas de igualdad. ligadas a
las nuevas identidades ciudadanas. Impelidos por la soberanía del número,
aspiraron a incrementar los niveles de inclusión pero siempre en clave
subordinada. Tanto su estructura como sus prácticas estuvieron
marcadas por el principio de distinción. Cuando propios y extraños
describían la composición de los partidos o de los clubes fijaban su mirada
en cuántos miembros éstos tenían de prestigio y poder, de qué grupo o
clase participaban fulano o mengano28, ya que estos indicios les permitían
concluir dónde estaba lo que algunos denominaban los centenares de
ciudadanos honrados o la mayoría de la opinión pública 29 Por debajo se
ubicaban, entre otros, también diferenciados nominativamente, los
batallones de paisanos, los infelices peones de carretas- transeúntes- cuando
no la soldadesca frente a los avecindados, reconocidos como jornaleros.30
Si la vecindad aparecía como un signo de identificación positiva no lo
era aquélla que se vinculaba al empleo público o dependía de las rentas
del Tesoro. Durante el período analizado, ambos partidos- el de la
Libertad y el del Pueblo- pudieron cruzar acusaciones al respecto, ya
que si hasta el levantamiento de 1868 el primero controló
coyunturalmente las instancias de gestión, en las décadas siguientes el
segundo fue el partido de Gobierno. Cual partidos de la Libertad o del Pueblosiempre en la búsqueda de convertirse en partido gubernamental- rara
vez se pensaron como partido- parte. Al contrario, hicieron lo posible
para ser el todo y para lograrlo apelaron a estrategias legales e ilegales
con miras a inhibir políticamente a sus adversarios.
Los espacios del gobierno, de la sociabilidad y de la mediación
política a través de los partidos aparecieron con frecuencia como meras
El Independiente, 372/1878.
El Ferrocarril, 13/8/1864. Comentando la candidatura de Don Mariano Amigo decía: “La
oposición ha procurado darse prestigio con un nombre que los sucesos de Buenos Aires rodearon
con una cierta aureola, como defensor del Gobierno Nacional y aliado de la clase mercantil y seria
de la Capital…”
29
El Rosario, 4/10/1864; 22/8/1864.
30
Ibidem, El Rosario 22,/8/1864; 15/9/1864;27/9/1864;El Comercio, 5/9/1875.
27
28
65
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
prolongaciones de una única, dinámica y dura disputa notabiliar por el
poder. La trama de los vínculos atravesaba esos ámbitos compartidos
dentro de los cuales, la lucha por posiciones y lugares parecía proyectarse
sin solución de continuidad de unos a otros, llegando incluso a incorporar
a quienes por su condición de minoridad no integraban el espacio público
estricto, las mujeres: …Poco tiempo hace tuvo lugar la renovación de la
Comisión directiva de la Sociedad de Beneficencia y, sin trabajos de ningún
género, sin concierto ni compromiso alguno, todo el personal que salió electo
pertenece al partido liberal por la sencilla razón de que allí casi todas las socias
pertenecen a él…Escudados con el ridículo y falso pretexto de que esta elección
había sido el resultado de trabajos hechos por los liberales, empezaron los
situacionistas31 los suyos con todo sigilo, para sorprender a sus adversarios en
la elección de la comisión directiva del Club del Orden, que se acercaba…32.
La asociación política estaba tan impregnada de los códigos
societales que ni el organigrama de las Comisiones Directivas partidarias
se diferenciaba de cualquiera de tales instancias asociativas33 ni los
espacios de reunión se habían configurado específicamente. Resultaba
paradigmático que, recurrentemente, se apelara o bien a los ámbitos
privados como la casa familiar o la estancia o bien a aquellos semipúblicos
como los del club social, los hoteles o el teatro.
Tampoco el lenguaje cotidiano adquirió especificidad en los modos
de nominar. Esto afectó tanto a las formas organizativas como a la
apelación de sus miembros. Así, por ejemplo, para referirse a los núcleos
menores de una estructura partidaria, se recurría, a veces, a términos no
estrictamente políticos sino fuertemente impregnados por la lógica
mercantil en la que se involucraban muchos de esos hombres:
El domingo 2 del corriente tuvo lugar en el distrito Ludueña una reunión
general de vecinos del Departamento de San Lorenzo al objeto de formar un
club sucursal del central del “Pueblo”34
Como contrapartida, los conceptos de centros políticos o clubes
seccionales vinculados a la denominación de las unidades de base, sólo
Nombre con el que también se reconocía al Partido del Pueblo.
La Capital,5/3/1885.
33
El Rosario, 5/10/1865. …La Comisión Directiva de ese club…Presidente Don Ramón Araya;
Secretario Don Luciano Gallegos; Vice Don Casimiro Rivadeneira; Vocales Don Pedro
Araya, Don Pedro La Torre, Don Juan P. Benitez/ siguen 17 nombres más/
34
El Rosario, 5/10/1864;8/10/1864.
31
32
66
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
se hicieron frecuentes en la década del ’80, al calor de la experiencia del
llamado Partido Constitucional (1883), el cual operó a modo de espejo en
el que debió reflejarse la propia reorganización del Partido del Pueblo, su
adversario en la lid electoral. En dicha coyuntura, como lo hemos
analizado en otro momento,35 la organización partidaria de aquél se
complejizó, siguiendo las pautas establecidas por la Convención que le
diera origen y el reglamento interno que lo estructuraba. Apareció en
escena con el objetivo de regularizar las prácticas republicanas y poner
distancia con las tramas personales y los códigos societales sobre las
que éstas se asentaban. Impersonal y principista, apoyado en un
programa general, intentó construir una estructura de representación
en su interior que tuviera como punto de partida el club local del pueblo
cabecera de cada departamento. Si su lenguaje pretendió empaparse de
los códigos cívicos, con frecuencia alternó las apelaciones al ciudadano
político a secas con aquellas al ciudadano territorial o vecino. Paralelamente
propuso una dinámica representacional desde abajo hacia arriba, a través
de la participación directa y secreta de sus afiliados por medio del voto,
tanto para gestar las comisiones internas como para la proclamación de
las candidaturas. Sin embargo, tensionado en su interior por una trama
heterogénea de actores, se enfrentó rápidamente al dilema de representar
al conjunto de los ciudadanos u operar como simple mediador de elites
y, frente al mismo, terminó desestructurándose.
El diálogo político y las candidaturas
a través de las experiencias partidarias
La preeminencia de las pautas de sociabilidad de las elites no sólo
impactó en los modos de organizar o nominar sino que afectó otras
dimensiones del hacer político. En cierto sentido, algunas prácticas políticas
parecieron ser una mera prolongación de las conversaciones habituales
sobre asuntos privados. En la correspondencia política se hizo un uso
reiterado de la estrategia coloquial. Esta se expresó no sólo en la apelación
hacia el interlocutor epistolar como querido o distinguido amigo, querido
general, mi querido doctor, mi querido protector. También se detectaba en la
35
Ver Bonaudo, Marta. De representantes y representados. Santa Fe finisecular(1883-1893) en
Sábato, Hilda(coord) Ciudadanía política y formación de las naciones. México D.F, FCE,
1997, pp. 270-294.
67
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
manera de encauzar el dialogo destinado a definir prácticas políticas,
especialmente cuando estas revelaban- a veces crudamente- la visión
patrimonial del Estado que las elites de uno y otro partido compartían:
…Temo mucho de la prudencia ó mejor dicho de la modestia de Ud. Pida recursos
pronto que se los van a dar y pague bien y con tiempo á los amigos. Colóquelos á
todos, y sea Ud. el Gobernador; sino lo hace así, va Ud. á sentirlo más tarde…36
La idea de privacidad de la correspondencia, aunque esta resultara
violentada, les permitía también desnudar las estrategias para lograr
acuerdos o superar crisis: …vine por reiterados llamados del Gobernador y
de algunos amigos por quienes supe que la cuestión Senador no andaba bien,
pues los Diputados no se reunían y había peligro de división; felizmente conseguí
que se reunieran y los uniformé y ya sabes que fue electo el candidato que me
indicó el Presidente, nuestro amigo Gelabert…
Sabes bien que nada me importa la Diputación; que me han elegido contra
mi voluntad pero sí debe importarnos el que los aliados de Mitre no salgan con
la suya, convirtiendo por medio de la sorpresa y la audacia en triunfo su
derrota…37
Resultaba evidente aquí, como en otras realidades decimonónicas,
que la cuestión de los acuerdos y las negociaciones, de las candidaturas
así como la compleja articulación entre elites locales y elites situadas en
el Gobierno Central no eran temas para discutir con el conjunto de los
ciudadanos y, por ende, se resolvían en el juego cruzado de la legítima
influencia de los poderes centrales con los notables portadores de influencia
natural en sus propios distritos. La negociación de influencias apuntaba
indudablemente a la capacidad de movilizar y transferir lealtades,
adhesiones, alianzas desde una compleja trama clientelar que se integraba
a partir de ese momento a la forma partido. Una pintura clara de esa
dinámica esbozaba Gabriel Carrasco, a través de las páginas de El
Mensajero en 1883: …Producida la candidatura de Tejedor, Iriondo, que sólo
buscaba donde podría sacar la tajada más grande, se dirigió(según las cartas de
Sarmiento)diciendo que no estaba lejos de apoyar la candidatura de Tejedor;
autorizaba al cura Zaballa, actual gobernador nominal de Santa Fe, para que se
la mostrara.
Colección Iriondo. Caja 2, Carpeta 12,fº. 22, Paraná,29/1/1868 de Pascual Rosas a Iriondo.
Archivo Histórico Provincial.(AHP).
37
Idem, Carpeta 13, fºs 25 y 27. Carta de Derqui a Iriondo, 13/5/1876(AHP).
36
68
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
¿Qué buscaba Iriondo, con esa carta?....Mandaba negociar su influencia;
y como entonces era gobernador de Santa- Fe, ponía en un platillo de la balanza
a la provincia, esperando que en la otra pusiera Tejedor su precio…(subrayados
en el original)38
La figura del candidato hacía visible la relación entre el estado de
la organización partidaria y la influencia de las estructuras sociales así
como daba cuenta de las posibilidades o límites para un paulatino
proceso de desterritorialización de la política. Desde el poder central
nacional o provincial resultaba urgente modificar la concepción de la
política concebida exclusivamente como asunto local para transformarla
lentamente en cuestión provincial o nacional. Si bien, como lo señalaron
muchos historiadores, estas sociedades estuvieron fuertemente
enraizadas sobre el territorio y las candidaturas a representantes
emergían de los dirigentes reconocidos y naturales de la comunidad, hubo
injerencias continuas de los poderes, el provincial sobre el local, el central
sobre los provinciales, a través de las cuales, y en no pocas circunstancias,
los candidatos triunfantes fueron impuestos. Paralelamente cabe señalar
que tal imposición fue, con frecuencia, también el resultado de un
verdadero proceso de circulación de los miembros de las elites: hombres
que desde el poder central bajaban al espacio provincial, interactuaban
alternativamente en dos o más espacios provinciales o de la ciudad
capital migraban hacia los departamentos.
Dos ejemplos- a modo de mirador de los juegos de poder -nos lo
ofrecen, en primer lugar, una carta de M.J Yañez a Iriondo en 1883:
…He reflexionado mejor respecto al asunto Diputación y veo claro que
después de haberse dignado Ud. hablar al Señor Presidente de la República con
referencia a este asunto, no es posible que yo haga el papel de retroceder en
sentido contrario…Una vez mas querido Doctor; querido protector desde mi
niñez, mas biendicho, le seré eternamente agradecido por tanto y tan marcado
bien que siempre me ha hecho, desde que siendo niño me nombró Receptor de
Diligencias del Juzgado del Crimen…39
Luego un editorial de El Mensajero:… De la provincia de Santa Fe se
dice lo siguiente: no presentando el Dr. Iriondo garantías seguras de su apoyo
al candidato Juárez Celman/ sostenido por el presidente Roca/, el gobierno
38
39
El Mensajero, 20/1/1883.
Colección Iriondo, Carpeta 18,Fº 2, 1883. AHP.
69
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
nacional está preparando el terreno al Dr. Pizarro, enemigo acérrimo de Rocha/
candidato adversario para la presidencia/para que le suceda al Dr. Zavalla
en el gobierno de Santa Fe…40
Imágenes disímiles pero congruentes que nos muestran al mismo
tiempo las reciprocidades que alimentaban los vínculos así como la
capacidad de presión que podía ejercerse al momento de apoyar o
rechazar un candidato pensado como garante de una sucesión. Si estas
escenas del poder comienzan a recrearse desde la etapa Confederación
y de secesión de Buenos Aires, adquieren paulatinamente más fuerza
en las sucesivas presidencias y, claramente, terminan de consolidarse
con el ascenso de Roca al gobierno.
En comunidades políticas como aquellas, en las cuales durante
décadas no se regularon a través de procedimientos formales ni la
presentación de las candidaturas ni las campañas electorales, unas y
otras irían viéndose afectadas por los cambios que sobre las relaciones
de poder podía generar la aparición de nuevos actores. Si inicialmente
el orden natural de las cosas se asentó en los criterios de preeminencia
social, tornando innecesaria la presentación del candidato a los electores
a través de un programa ya que los mismos podían reconocer con
facilidad las condiciones de fortuna, prestigio, honorabilidad, ilustración o
servicio de las que aquél era portador, esto se modificó con la salida a
escena de otros actores o de nuevas generaciones, particularmente la de
jóvenes formados ya en el Colegio de la Inmaculada, ya en el Colegio
Nacional o los provenientes de las aulas universitarias. Estos comenzaron
a vincularse con la política sin un capital social que los precediera, motivo
por el cual si bien no utilizaron las denominadas Profesiones de Fe41 que
en el mundo europeo de la segunda mitad del siglo XIX fueron
significativas, si apelaron a otras estrategias de presentación ante la
comunidad política. En este sentido fue paradigmática la propuesta de
40
41
El Mensajero, 22/1/1883.
Mitre hizo una Profesión de Fe como periodista al editar Los Debates. Planteada como un
compromiso con el público y los ciudadanos, seguramente debió impactar en su accionar
político. Halperín Donghi, Tulio, op. cit., pp160-166. Como contrapartida, Nicasio Oroño,
senador de la Nación, escribía en 1876, a sus compatriotas y comprovincianos un manifiesto
destinado a dar cuenta de la labor desarrollada a lo largo de nueve años. El objetivo de
Oroño es crear un precedente por el cual el legislador- concluído su mandato- se someta
republicanamente “al fallo de la opinión”. Ver Nicasio Oroño Obras Completas,UNLAcademia Nacional de la Historia, Santa Fe, 2004,Tomo I, pp. 467-479.
70
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Estanislao Zeballos, originario de Santa Fe pero tempranamente alejado
de su vida social y política. Zeballos, aspirando a convertirse en candidato
a la gobernación de la provincia, primero por el Partido Autonomista
Nacional y luego a través del Partido Constitucional, utilizó como una
de sus estrategias para el ingreso a la lid política santafesina la escritura
de La región del trigo. A través de la obra, Zeballos pretendió, sin duda,
mostrar su conocimiento de una realidad provincial que se había
modificado profundamente desde su infancia y, paralelamente,
evidenciar- desde ese diagnóstico- su capacidad de acción con miras a
avanzar en el desarrollo de la misma. El Zeballos candidato se presentaba
ante la sociedad como un hombre con otro tipo de capacidades para
gobernar. Si bien la obra tuvo una buena recepción, más allá de ciertos
detractores, resultó insuficiente para catapultarlo a la escena pública y
en su disputa para ser nominado candidato debió apelar a otras vías de
construcción de consenso. Indudablemente, como el estudiante de La
Gran Aldea de Lucio V. López, debía hacerse hombre de opinión, lo cual no
resultó tarea fácil. La crónica periodística, una vez más, ofrece pistas al
respecto:…Primeramente buscó hacerse de elementos propios, que no tenía,
para ver si llegaba a hacerse hombre de opinión en los elementos del finado D.
Simón Iriondo, acercándose a los coroneles Córdoba, Vazquez, Barrera y
hombrándose con los subalternos de éstos.
Desechado por estos, que bien pronto lo exhibieron en la picota pública,
dando a luz las cartitas consabidas, que dieron la medida de la falta de tino
político del doctor Zeballos, de sus ciegas ambiciones por hacerse jefe de partido….
Fue entonces que puso los puntos a la juventud que ayer recién ha
aparecido en excena(sic) de la vida pública; y el mismo día que el partido oficial
se unía, un círculo zeballista, para levantar su candidatura, contrariando a los
hombres de valer que habían figurado en política, sacrificando su fortuna, su
salud, su tranquilidad; que ponían al servicio de esa candidatura su bolsillo y
diarios populares, el candidato conspiraba contra ese partido, aconsejando a
esos jóvenes, sin experiencia y muchos hasta sin conciencia de lo que hacían,
para que se separasen de los hombres de tradición…42
La historia de la candidatura de Zeballos como la de muchos otros
recién llegados por edad, por capital social y político, fue la de un fracaso
pero también la de una búsqueda de alternativas. Lo viejo y lo nuevo-
42
La Capital, 12/12/1885.
71
Una reflexión en torno a los mediadores políticos en la segunda mitad del siglo XIX / Marta Bonaudo
tensionados en un peligroso equilibrio- terminaron socavando las
posibilidades del candidato pero también evidenciaron las fisuras y los
desajustes que atravesaban aquellas formas partidarias que, como el
partido Constitucional, pretendían romper los moldes anteriores del hacer
político e instituir las bases de una moral cívica
Las imágenes precedentes dejan al descubierto que el proceso real
de elección de candidatos era recurrentemente enajenado a la masa de
ciudadanos. Estos operaban en realidad como el coro en el marco de la
convalidación y la celebración, produciéndose en esas instancias una
particular interacción entre los ámbitos de sociabilidad notabiliares y
los típicos de los sectores subalternos. Ellos- totalmente alejados de la
idea de un hombre, un voto- eran partícipes de la representación teatral43,
de los banquetes, de las fiestas, de las movilizaciones vivando a los
candidatos, de los intercambios afectivos y/o materiales y ratificaban
con sus prácticas el carácter colectivo de la dinámica electoral. Esto, sin
embargo, no inhibía entre ellos el despliegue de otras racionalidades así
como de una capacidad de resistencia, rechazo o mutación en relación a
las lógicas dominantes.44
El modelo de representación política, que se resistía a ser sustituido,
se asentaba en unos partidos y unos candidatos que sólo en la
discursividad representaban a la opinión pública, al pueblo, a una voluntad
general. La práctica colocaba a los candidatos y a los representantes como
portavoces de intereses particulares, con enormes dificultades para
pensarse cual intérpretes de un interés general. En la disputa política
estas cuestiones quedaban claramente evidenciadas, tanto cuando los
adversarios calificaban a los partidarios del Libertad o del Pueblo como
familias-gobierno como cuando en la puja por las candidaturas se
demandaba un candidato afín al partido gubernista o a las intereses del
grupo. Pero los condicionamientos para la emergencia de potenciales
mecanismos de control- tanto en el campo de la opinión pública como
en el electoral- tornaban casi imposible garantizar la presencia de partidos
que asumieran la representación de la ciudadanía y no fueran meros
intermediarios entre las elites y el Estado o como lo plantea para el caso
mexicano Escalante, gestores de la desobediencia controlada de sus clientelas.45
Romanelli, Raffaele, op. cit., p. 38.
Bonaudo, Marta, Revisitando al ciudadano…, op. cit., pp. 225 y ss.
45
Escalante Gonzalbo, F., op. cit., p. 51.
43
44
72
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Todo esto nos conduce finalmente a poner en la escena las mutuas,
numerosas y virulentas acusaciones que unos y otros se aplicaban cuando
perdían las elecciones. Apelando a conceptos como los de fraude o
amoralidad consideraron siempre a los otros gestores de una anarquía moral,
asumiendo como contrapartida posiciones regeneracionistas en nombre
de las cuales participaron incluso en conatos revolucionarios.
¿Cómo encuadrar el fraude o la no moral en este contexto? Era
indudable que el modelo de moral cívica les había proporcionado una
herramienta significativa en la construcción institucional. Pero también
que, imbuídos de otras lógicas relacionales que se confrontaron con el
imaginario cívico, ellos terminaron afectando dicha institucionalidad.
En nombre de tal imaginario pudieron señalar como fraudulenta o inmoral
una táctica o una estrategia política. Era inmoral la violación recurrente
del orden jurídico, era inmoral su visión patrimonial del Estado y la
utilización de los recursos públicos- junto a los que aportaban
privadamente-cuando se convertían en partido de Gobierno y
financiaban a sus clientes; era inmoral la violencia ejercida sobre los
derechos individuales; era cometer fraude, defraudar la voluntad soberana,
cuando apelaban a todas aquellas tácticas de desvirtuación de un ejercicio
ciudadano individual y autónomo. Ahora bien, frente a la paulatina pérdida
de consenso expresada en la disminución clara del número de electores
y en la búsqueda, por parte de diversos actores de formas alternativas
de demanda y representación, ¿significaba que diferentes sujetos
comenzaban a privilegiar la moral cívica frente a las otras? No es fácil
afirmarlo, lo que resulta evidente es que 1890 colocó a las elites ante una
significativa crisis de legitimidad, crisis que al estallar ubicaría en el
centro de la escena y del debate parlamentario el problema del partido.
73
Tradiciones militares coloniales.
El Río de la Plata antes de la revolución
Raúl O. Fradkin*
“No se trata de asimilar por la fuerza sino, por el contrario, de distinguir;
no se trata de construir, como en el juego de las fotografías superpuestas,
una imagen falsamente convencional y borrosa, sino de destacar, por
contraste, al mismo tiempo que los caracteres comunes, las originalidades.”1
Con sencillez M. Bloch precisaba algunos de los principales
desafíos de la historia comparada, un modo de hacer historia que – como
bien ha afirmado M. Aymard- estaba en el corazón de una concepción
de la historia que no podía alcanzar su meta sino superando la
descripción de situaciones particulares.2 Como es sabido, Bloch distinguía
diferentes usos de las comparaciones pero remarcaba que el “más
importante objetivo” era la “percepción de las diferencias”.3 El uso que
haré aquí de estas recomendaciones será, por cierto, limitado. Mi objetivo
es indagar las tradiciones militares que se forjaron en el espacio
rioplatense durante la época colonial. Se trata de un acercamiento
inspirado por una preocupación de mucho mayor alcance y que excede
las posibilidades de esta presentación: develar la naturaleza y las
* Universidad Nacional de Luján/Universidad de Buenos Aires. [email protected]
1
BLOCH, Marc, Historia rural francesa. Caracteres originales, Barcelona, Crítica, 1978, p.28.
[1931]
2
AYMARD, Maurice, “¿Qué historia comparada, hoy?”, en BONAUDO, Marta, REGUERA,
Andrea y ZEBERIO, Blanca (coords.), Las escalas de la historia comparada. Dinámicas sociales,
poderes políticos y sistemas jurídicos, Buenos Aires, Miño y Dávila Editores, 2008, Tomo I,
2008, pp. 13-25. También ver AYMARD, Maurice, “Historie et comparaison”, en H. ATSMA
et A. BURGUIERE (eds.), Marc Bloch aujourd’hui. Historie comparée & Sciences sociales, Paris,
EEHSS, 1990, pp. 279-298 y HAUPT, Heinz-Gerhard “La lente émergence d’une historie
comparée”, en Passés Recomposés. Champs et chantiers de l’historie, París, Éditions Autrement,
Série Mutations, Nº 150/151, 1995, pp. 196-207.
3
BLOCH, Marc, “Comparación” [1930], en Historia e historiadores, Madrid, Akal, 1999, p.
112.
74
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
características de las fuerzas beligerantes que intervinieron en el ciclo
guerrero abierto en el Río de la Plata entre las décadas de 1810 y 1870
para comprender mejor las posibilidades de intervención política de los
sectores sociales subalternos y la incidencia de la guerra y de las
tradiciones militares en la configuración de sus culturas políticas. Lo
que sigue, por tanto, debe ser leído sólo como un punto de partida que
apunta en esa dirección.
Indagar estas cuestiones supone internarse en una variedad de
aspectos imposibles de abordar en una sola presentación.4 Por lo tanto,
aquí me centraré en identificar las características de las formaciones
armadas que se conformaron en el espacio de la Intendencia de Buenos
Aires y las tradiciones que en torno a ellas se forjaron.
Algunas facetas han sido solventemente tratadas por la historiografía
argentina que se ocupa del siglo XIX. T. Halperín Donghi precisó las
relaciones entre las formaciones militares y la elite política revolucionaria
así como la dimensión social y fiscal del proceso de militarización5 y G. Di
Meglio indagó las relaciones entre este proceso y la configuración de la
plebe urbana como actor político en Buenos Aires.6 A su vez, también se
ha indagado la centralidad de las milicias en la configuración del régimen
En trabajos anteriores me ocupé de otros aspectos: una evaluación de largo plazo en “¿Qué
tuvo de revolucionaria la revolución de independencia?”, Nuevo Topo/revista de historia y
pensamiento crítico, N° 5, 2008, pp. 15-44. Un análisis de las modalidades de la guerra en “Las
formas de hacer la guerra en el litoral rioplatense y el retorno de un viejo problema: guerras
de independencia y guerras civiles”, ponencia a las XXI Jornadas de la AAHE, Caseros, 23 al
26 de setiembre de 2008. Una exploración preliminar de la cultura política “plebeya” en
“Cultura política y acción colectiva en Buenos Aires (1806-1829): un ejercicio de exploración”,
en FRADKIN, Raúl (editor), ¿Y el pueblo dónde está? Contribuciones para una historia popular de
la revolución de independencia en el Río de la Plata, Buenos Aires, Prometeo Libros, 2008, pp. 2766. Junto a Silvia Ratto hemos indagado la incidencia de la guerra en las zonas fronterizas en
“Conflictividades superpuestas. La frontera entre Buenos Aires y Santa Fe en la década de
1810”, en Boletín Americanista, en prensa y “Territorios en disputa. Liderazgos locales en la
frontera entre Buenos Aires y Santa Fe (1815-1820)” (en colaboración con Silvia Ratto), en
Raúl Fradkin y Jorge Gelman (compiladores), Desafíos al Orden. Política y sociedades rurales
durante la Revolución de Independencia, Rosario, Prohistoria Ediciones, 2008, pp. 37-60.
5
HALPERÍN DONGHI, Tulio, “Gastos militares y economía regional: el Ejército del Norte
(1810-1817)”, en Desarrollo Económico, Vol. 11, N° 41, 1971; Revolución y guerra. Formación de
una élite dirigente en la Argentina criolla, Buenos Aires, Siglo XXI, 1972; “Militarización
revolucionaria en Buenos Aires, 1806-1815”, en Tulio HALPERÍN DONGHI (comp.), El
ocaso del orden colonial en Hispanoamérica, Buenos Aires, Sudamericana, 1978, pp. 121-157 y
Guerra y finanzas en los orígenes del Estado argentino, Buenos Aires, Prometeo Libros, 2005
(primera edición, 1982).
6
DI MEGLIO, Gabriel, ¡Viva el Bajo Pueblo! La plebe urbana de Buenos Aires y la política entre la
Revolución de Mayo y el Rosismo, Buenos Aires, Prometeo Libros, 2006.
4
75
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
político poscolonial, la impronta de los servicios militares y milicianos
sobre la población rural y los estrechos vínculos entre las milicias y la
construcción de la ciudadanía.7 Recientemente, H. Sábato ha llamado la
atención sobre una cuestión crucial: que los ejércitos de línea y las fuerzas
milicianas sirvieron de apoyo al despliegue de concepciones y tradiciones
políticas diferentes y competitivas hasta bien avanzado el siglo XIX.8
Apoyándome en estas contribuciones, mi perspectiva tomará rumbos
diferentes, al menos, en dos direcciones. Por un lado, dado que esta
producción se ha concentrado en el proceso abierto por los
acontecimientos de 1806/7 intentaré rastrear la impronta de las
tradiciones militares coloniales. Por otro, dado que estos estudios se
concentraron en la experiencia bonaerense, intentaré compararla con
otras del mismo espacio rioplatense.
¿A qué me refiero con tradiciones militares? Básicamente al
conjunto de concepciones, normas, prácticas y experiencias forjadas en
torno a la organización militar y miliciana colonial. Por cierto, esas
tradiciones emergían de la matriz común del imperio español pero no
fueron simplemente su réplica. Por una parte, porque esa matriz estaba
lejos de ser exclusivamente hispana y se nutría de la densa experiencia
estatal y militar desarrollada en Europa desde el siglo XVI y de las
tensiones que emanaban con la portuguesa. Por otro, porque las formas
que adoptó la organización militar imperial no respondían sólo a los
designios o a las aspiraciones de sus mandos militares sino también a
las experiencias que emergían de los espacios coloniales y que, pese a
sus notas comunes, eran irreductibles. Es ello, entonces, lo que invita a
adoptar una perspectiva comparada que permita precisar especificidades
y variaciones regionales.
Al respecto puede consultarse CANSANELLO, Carlos, De Súbditos a Ciudadanos. Ensayo
sobre las libertades en los orígenes republicanos. Buenos Aires, 1810-1852, Buenos Aires, Imago
Mundi, 2003; GARAVAGLIA, Juan Carlos, “Ejército y milicia: los campesinos bonaerenses
y el peso de las exigencias militares, 1810-1860”, en Anuario IEHS, N° 18, 2003, pp 153-187;
SÁBATO, Hilda y LETTIERI, Alberto (comps.), La vida política en la Argentina. Armas, votos
y voces, Buenos Aires, FCE, 2003.
8
SÁBATO, Hilda, “El ciudadano en armas: violencia política en Buenos Aires (1852-1890)”,
en Entrepasados. Revista de Historia, Año XII, Nº 23, 2002, pp. 149-171; “Milicias, ciudadanía
y revolución: el ocaso de una tradición política. Argentina, 1880”, en Ayer. Revista de Historia
Contemporánea, N° 70, 2008; “Cada elector es un brazo armado. Apuntes para una historia
de las milicias en la Argentina decimonónica”, en BONAUDO, Marta, REGUERA, Andrea
y ZEBERIO, Blanca (coords.), Las escalas…, pp. 105-124 y Buenos Aires en armas. La revolución
de 1880, Buenos Aires, Siglo XXI, 2008.
7
76
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
1. Las jurisdicciones territoriales en el espacio rioplatense
Nuestra atención estará concentrada en ese espacio difuso y de
fronteras abiertas y permeables que era el rioplatense.9 Principalmente
atenderemos a los territorios que conformaron la Intendencia de Buenos
Aires pero también a aquellos que estaban bajo la jurisdicción de los
Gobiernos de Montevideo, de las Misiones y de la Capitanía de Río
Grande, dada su incidencia en la experiencia militar rioplatense.
Como es sabido, la reorganización borbónica asignó un lugar
relevante a lo militar y la Corona privilegió a los oficiales de alta
graduación para reclutar sus principales funcionarios. Como advirtió L.
Campbell durante dos siglos el ejército había jugado un papel muy
secundario en la estructuración del orden colonial dado que la autoridad
habían residido en una burocracia reclutada en el estamento eclesiástico
y la nobleza titulada; sin embargo, durante el siglo XVIII “la vida política
se militarizó”.10 El Río de la Plata no fue una excepción y todos los virreyes
e intendentes tuvieron este origen. Sin embargo, aquí – como en Chile –
esta situación era anterior.11
Desde comienzos del siglo XVII la mayor parte de este espacio
estuvo bajo la jurisdicción de las Gobernaciones de Buenos Aires y
Asunción, estructuras de gobiernos por lo demás débiles para ejercer
una autoridad efectiva sobre las pocas ciudades existentes y los vastos
territorios asignados. Con todo, las autoridades coloniales se habían
afirmado durante el siglo XVIII, sobre todo, por la formación del gobierno
El lector encontrará un panorama preciso y actualizado en DJENDEREDJIAN, Julio C.,
Economía y sociedad en la Arcadia criolla. Formación y desarrollo de una sociedad de frontera en
Entre Ríos, 1750-1820, Tesis de Doctorado, Facultad de Filosofía y Letras de la Universidad
de Buenos Aires, 2003; FREGA, Ana, Pueblos y soberanía en la revolución artiguista,
Montevideo, Ed. Banda Oriental, 2007; GARAVAGLIA, Juan Carlos, Pastores y labradores
de Buenos Aires. Una historia agraria de la campaña bonaerense, 1700-1830, Buenos Aires,
Ediciones de la Flor/IEHS/Universidad Pablo de Olavide, 1999. GELMAN, Jorge,
Campesinos y estancieros. Una región del Río de la Plata a fines de la época colonial, Buenos
Aires, Editorial Los Libros del Riel, 1998. OSÓRIO, Helen, O imperio portugués no sul da
américa: estancieiros, lavradores o comerciantes, Porto Alegre, UFRGS Editora, 2007.
10
CAMPBELL, León, “Cambios en la estructura social y administrativa en el Perú colonial a
fines del siglo XVIII”, en MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan y KUETHE, Allan (eds.),
Soldados del Rey. El Ejército Borbónico en América Colonial en vísperas de la Independencia,
Castellón, Ed. Universitat Jaume I, 2005, pp. 231-252.
11
JARA, Alvaro, Guerra y Sociedad en Chile, Santiago de Chile, Editorial Universitaria, 1971;
MOUTOUKIAS, Zacarías, “Gobierno y sociedad en el Tucumán y Río de la Plata, 1550-1800”,
en Nueva Historia Argentina, Tomo 2, Buenos Aires, Sudamericana, 2000, pp. 355-411.
9
77
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
político y militar de Montevideo y el que emergió en las misiones después
de la expulsión de la Compañía de Jesús.12 La Intendencia de Buenos
Aires fue puesta en funcionamiento en 1782 y a partir de 1788 su jefatura
y la Superintendencia de Hacienda quedaron en manos del mismo Virrey.
De este modo, este Virrey-Intendente no sólo era el Capitán General del
Virreinato sino que ejercía su autoridad directa sobre los gobiernos
político-militares dotados de un amplio margen de autonomía (como
los de Montevideo o Yapeyú), sobre las zonas que quedaron bajo la
autoridad de una Comandancia Militar como la de Frontera instituida
en Buenos Aires en 1780, los emplazamientos costeros como Carmen de
Patagones – convertida en sede de comandancia en 1785- y algunas zonas
de nueva colonización en el sur de Entre Ríos desde 1783 y también en
la Banda Oriental, tanto en Colonia como en Maldonado.13
El vasto espacio que sólo en parte gobernaba la Intendencia asistió
en las últimas décadas coloniales a un notable crecimiento demográfico
y fue escenario de una primera expansión ganadera.14 A su vez, se fue
conformando una trama de poblados rurales de muy disímiles
magnitudes, trayectorias y estatutos: esa trama contenía muy pocas
ciudades (Buenos Aires, Montevideo, Santa Fe, Corrientes y Maldonado
declarada ciudad en 1786), 22 villas que tenían derecho a contar con sus
cabildos, 20 parroquias, 28 pueblos de indios y 10 fuertes fronterizos.
Estas 85 aglomeraciones tenían muy distinta dimensión y en gran parte
eran muy nuevos: 58 se habían formado a lo largo del siglo XVIII y 22
entre 1778 y 1800. Lo importante es que desde estas aglomeraciones debía
organizarse el control de los territorios y poblaciones así como las fuerzas
militares y milicianas.15
Para un análisis de las relaciones entre la elite santafesina y la gobernación de Buenos
Aires véase BARRIERA, Darío, “La ciudad y las varas: justicia, justicias y jurisdicciones
(Ss. XVI-XVII)”, en Revista de Historia del Derecho, Nº 31, 2003, pp. 69-98 y TARRAGÓ,
Griselda y BARRIERA, Darío, “Elogio de la incertidumbre. La construcción de la confianza:
entre la previsión y el desamparo (Santa Fe, Gobernación del Río de la Plata, siglo XVIII”,
en Revista Historia, N° 48, 2008, pp. 183-223.
13
LYNCH, John, Administración colonial española (1782-1810). El sistema de intendencias en el
Virreinato del Río de la Plata, Buenos Aires, EUDEBA, 1962
14
Un tratamiento comparativo de esta primera expansión ganadera en DJENDEREDJIAN,
Julio C., “¿Un aire de familia? Producción ganadera y sociedad en perspectiva comparada:
las fronteras rioplatenses a inicios del siglo XIX”, en Jahrbuch für Geschichte Lateinamerikas,
Vol. 41, 2004, pp. 247-274.
15
Un análisis del papel de los poblados en Buenos Aires en BARRAL, María E. y FRADKIN,
Raúl O., “Los pueblos y la construcción de las estructuras de poder institucional en la
12
78
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Por su parte, el imperio portugués había avanzado antes en mejorar
su sistema de autoridades en el extremo sur del Brasil y cobraría mucho
mayor solidez en la segunda mitad. A través de un itinerario sinuoso y
no carente de oscilaciones, la autoridad de Río de Janeiro había crecido
hasta convertirse en capital del novel Virreinato; para 1759, el régimen
de capitanías hereditarias había sido desplazado y reconvertido a un
sistema bajo directa autoridad de la Corona. Así, en 1713 se había
establecido la capitanía de Río Grande de San Pedro, en 1720 la de Minas,
en 1738 la de Santa Catarina y en 1748 las de Goiás y Mato Groso.16 Se
trataba de un intento por afirmar la autoridad de la burocracia imperial
y mejorar sustancialmente la defensa de la frontera que suponía
dificultosas negociaciones con los grupos de poder local.
Como resultado de esta situación y de la persistente beligerancia
fronteriza desde 1680, se fue operando una creciente militarización a
ambos lados de la frontera pero ella solo muy en parte se sostenía en
recursos y capacidades estatales. Del lado hispano, las limitadas fuerzas
existentes debían afrontar desafíos de muy diversa naturaleza que
imponían diferentes exigencias: la defensa de los emplazamientos
costeros frente a las amenazas de incursiones marítimas de otras
potencias; la defensa de la extensa frontera “seca” con los portugueses;
la defensa de las fronteras con los indios no sometidos del chaco y las
pampas pero también con algunas tribus que se mantenían autónomas
en el mismo litoral; la persecución del creciente número de cuatreros,
bandidos y changadores; y también, debían contribuir a reprimir las
sublevaciones, como las ocurridas en el área guaranítica en 1754 o en los
campaña bonaerense (1785-1836)” en Raúl O. Fradkin (Director) El poder y la vara. Estudios
sobre la justicia y la construcción del estado en el Buenos Aires rural, 1780-1830, Buenos Aires,
Prometeo Libros, 2007, pp. 25-58.
16
SILVA GOUVÊA, María de Fátima, “Poder político e administracao na formacao do
complexo atlântico português (1645-1808)”, en FRAGOSO, Joao, BILCALHO, María F. y
GOUVÊA, María (org.), O Antigo Regime nos trópicos. A dinâmica imperial portuguesa (sécalos
XVI-XVIII), Río de Janeiro, Civilizacâo Brasileira, 2001, pp. 285-315. CALSANZ FALCÓN,
Francisco José, “La lucha por el control del Estado: administración y elites coloniales en
Portugal y Brasil en el siglo XVIII. Las reformas del despotismo ilustrado y la sociedad
colonial”, en Historia General de América Latina, Vol. IV: Procesos americanos hacia la redefinición
colonial, París-Madrid, Ediciones UNESCO/Editorial TROTTA, 2000, pp. 265-283.
MANSUY, Andrée y SILVA, Diniz, “Portugal y Brasil: la reorganización imperial, 17501808”, en Bethell, Leslie (ed.), Historia de América Latina, Tomo 2, Barcelona, Crítica, 1990,
pp. 150-182.
79
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Andes en 1780. Las autoridades tuvieron que encontrar modos de
afrontar estas contradictorias necesidades que exigían formas de
organización militar muy diferentes. Conviene detenerse en analizar sus
principales características y tratar de precisar sus especificidades.
2. La organización militar imperial
La organización de la defensa de las colonias se había mantenido
sin alteraciones sustanciales entre fines del siglo XVI y mediados del
XVIII. Fue por entonces que la Corona comenzó a adoptar una nueva
concepción, la “defensa total”. Esa nueva orientación incluía la
construcción de fortificaciones, el desarrollo de la Armada, la dotación
de regimientos regulares, una mayor atención y coordinación de la
defensa de las fronteras con los indios y el “arreglo” de las milicias. No
parece aventurado afirmar, por tanto, que fue por entonces que tomó
forma el ejército imperial en América. Para ello, la Corona se vio forzada
a desplegar un notable esfuerzo fiscal pero a partir de 1786 la necesidad
de reducirlo derivó en la disminución de los contingentes, justamente
cuando los requerimientos de la defensa se acrecentaban.17
A mediados del siglo XVIII, los ejércitos imperiales padecían varias
de las limitaciones características de los modelos existentes pero
acentuadas por las condiciones logísticas, organizativas, sociales y
culturales que imponía la situación colonial. Entre ellas se han señalado
las dificultades para realizar grandes movimientos de tropas, las
tradiciones vigentes de contratar fuerzas mercenarias y el peso de las
17
ARCHER, Christon, El ejército en el México borbónico, 1760-1810, México, FCE, 1983 y
“Militares”, en SOCOLOW, Susan y HOBERMAN, Louisa. (comps.), Ciudades y sociedad en
Latinoamérica colonial, Buenos Aires, F.C.E., 2002, pp. 215-254; GÓMEZ PÉREZ, Carmen, El
sistema defensivo americano, siglo XVIII, Madrid, MAPFRE, 1992; MARCHENA
FERNÁNDEZ, Juan, Ejército y milicias en el mundo colonial americano, Madrid, MAPFRE,
1992; FRADERA, Josep M., Colonias para después de un imperio, Barcelona, Ediciones
Bellaterra, 2005. KUETHE, Allan “Carlos III. Absolutismo ilustrado e imperio americano”,
en MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan y KUETHE, Allan (eds.), Soldados del Rey…, pp. 1730 y “Decisiones estratégicas y las finanzas militares del XVIII”, en MARCHENA, Juan y
CHUST, Manuel (eds.), Por la fuerza de las armas. Ejército e independencias en Iberoamérica,
Castelló de la Plana, Publicaciones de la Universitat Jaume I, 2008, pp. 83-100. MARICHAL,
Carlos, La bancarrota del virreinato. Nueva España y las finanzas del imperio español, 1780-1810,
México, FCE, 1999. WEBER, David, “Borbones y bárbaros. Centro y periferia en la
reformulación de la política de España hacia los indígenas no sometidos”, en Anuario
I.E.H.S., Nº 13, 1998, pp. 147-171.
80
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
aristocracias en las estructuras militares.18 Sólo muy limitadamente los
ejércitos del imperio pudieron superarlas y su colapso durante la crisis
imperial abierta en 1808 parece demostrarlo. Sin embargo, en ellos
también se evidenció una tendencia a la innovación como lo puso en
evidencia el mejoramiento de la cartografía, el incremento de la flota, el
mejoramiento de las fortificaciones y la artillería, el recurso cada vez
más frecuente a las órdenes escritas y un cierto desarrollo y sofisticación
de la burocracia militar, como lo mostraba la conformación de un cuerpo
específico de ingenieros a partir de 1762. Aún así, los ejércitos del Rey
seguían siendo ejércitos de antiguo régimen y contenían una
heterogeneidad de cuerpos y estatutos que le eran inherentes. Ello
limitaba fuertemente su profesionalización y la aristocracia seguía
teniendo un peso decisivo en la oficialidad que, al parecer, era todavía
aún mayor en las colonias.19 A falta de una academia de formación
profesional – salvo para los ingenieros- los cadetes se formaban en los
mismos regimientos y para ello no lo se estipularon normas para
seleccionarlos entre la nobleza sino que su admisión quedaba a decisión
de los comandantes lo que favorecía el favoritismo y los lazos clientelares.
Sin embargo, Además, a pesar de muchas disposiciones en contrario y
de la proclamada preferencia por los reclutas voluntarios, los métodos
de reclutamiento compulsivo estaban a la orden del día, tanto que fue
en el siglo XVIII cuando se generalizó la célebre quinta, conocida como
el “impuesto de sangre”.20
MCNEILL, William, La búsqueda del poder. Tecnología, fuerzas armadas y sociedad desde el 1000
d.c., Madrid, Siglo XXI, 1998, pp.175-180
19
En el Ejército de América el 67% de los oficiales eran considerados “nobles” pero entre los
nacidos en América los “nobles” llegaban al 100%; no era la situación en la península
donde hacia 1808 eran aristócratas sólo el 23%: MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan, “La
expresión de la guerra El poder colonial, el ejército y la crisis del régimen colonial”, en
Historia de América Andina, Quito, Universidad Andina Simón Bolívar, Vol. 4., 2003, pp.
79-128; GARCÍA CÁRCEL, Ricardo, El sueño de la nación indomable. Los mitos de la guerra de
la independencia, Madrid, Temas de Hoy, 2007, p. 136
20
BORREGUERO BELTRÁN, Cristina, “Antiguos y nuevos modelos de reclutamiento en el
Ejército borbónico del siglo XVIII”, en MARCHENA, Juan y CHUST, Manuel (eds.), Por la
fuerza de las armas…pp. 63-82. Como es sabido, la transformación en reclutas de los
perseguidos por cuestiones penales ocupó un lugar relevante la satisfacción de las
necesidades de mano de obra para la Armada Real: De las HERAS, José L., “Los galeotes
de los Austrias: la penalidad al servicio de la Armada”, en Historia Social, N° 6, 1990, pp.
127-140. Ver al respecto LINEBAUGH, Peter y REDIKER, Marcus, La hidra de la Revolución.
Marineros, esclavos y campesinos en la historia oculta del Atlántico, Barcelona, Crítica, 2005.
18
81
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
A su modo, los ejércitos de la monarquía hispana expresaban la
llamada la “revolución militar”21, ese conjunto de innovaciones operadas
desde el siglo XVI y que incluyeron un uso más intensivo de la artillería
y de las armas de fuego, la construcción de fortificaciones, el predominio
de la infantería sobre la caballería y el incremento de los ejércitos
permanentes. Ello trajo aparejado un sustancial aumento de los costos,
de modo que en la capacidad gubernamental para sustentarlos se hallaba,
cada vez más, un eje fundamental en torno al cual giraba el resultado de
los conflictos. Ahora bien, los atributos de esa “revolución militar” no
se habían implantado firmemente en América hispana cuando a fines
del siglo XVIII, una nueva era militar se estaba abriendo en el mundo
occidental: la revolución francesa trajo consigo una sustancial
modificación de las concepciones estratégicas orientándolas hacia la
obtención del máximo grado de movilidad de las fuerzas militares y un
aumento nunca antes visto del personal movilizado así como de las
concepciones políticas que sustentaban los esfuerzos militares y que se
expresó en el lema de la “nación en armas” y la aspiración a
profesionalizar el cuerpo de oficiales. Con ello, también, otras formas
de hacer la guerra – la llamada “guerra irregular” – adquirieron una
nueva centralidad.22
El Ejército de América estaba integrado por el Ejército de Dotación,
el Ejército de Refuerzo y las milicias. Conviene resaltarlo desde un
comienzo: las milicias eran concebidas como fuerzas auxiliares del
ejército y como parte de él. Una segunda observación debe también ser
subrayada desde un principio: la “Ordenanza de su Majestad para el
regimiento, disciplina, subordinación y servicio de sus ejércitos” de 1768
– un cuerpo normativo que orientó la vida militar hispanoamericana
hasta bien avanzado el siglo XIX – contemplaba la existencia de tres
tipos de cuerpos armados: el ejército permanente, las “milicias
PARKER, Geoffrey, La revolución militar. Innovación militar y apogeo de occidente, 1500-1800,
Madrid, Alianza, 1990.
22
Desde comienzos del XIX los ensayos y tratados sobre la “petite guerre”, la “guerra
irregular”, la “guerra de partidas” o “de guerrilla” tuvieron amplia difusión en el mundo
occidental y el análisis de las experiencias en España, Prusia y Rusia pero también en
Argelia ocuparon un lugar cada vez más relevante y fueron conocidas por los dirigentes
políticos y militares hispanoamericanos. Véase, por ejemplo, GRANDMAISON, La Petite
Guerre ou Traité du Service des Troupes legeres en Campagne, París, 1756, DECKER, Ch., De la
Petite Guerre selon l’esprit de la Stratégie Moderne, París, J. Corréad, 1845.
21
82
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
provinciales” y las “milicias urbanas”. En lo que sigue veremos la
incidencia notable de ambas observaciones.
Al comenzar el siglo XIX el Ejército de Dotación contaba con 29
regimientos y unos 35.000 efectivos que constituían el 87% de los
veteranos en América, aunque no es improbable que se haya reducido a
25.000 en los años siguientes. La política oficial había pretendido que
esos efectivos se reclutaran en la península, preferentemente entre
hombres “honrados”, pero los resultados fueron muy diferentes y para
entonces sólo habían nacido en ella el 16,4% de la tropa cuando en el
siglo XVII eran el 80%. Sin embargo, el aumento de las tropas regulares
había sido sustancial dado que para 1700 podía estimarse que sumaban
tan solo unos 6.000 efectivos.23 Los integrantes de ese ejército no sólo
habían nacido mayoritariamente en América sino que el 85% había nacido
en la misma ciudad donde prestaba servicio. Por otra parte, las
pretensiones de profesionalizar a la tropa estaban lejos de haberse
alcanzado, al punto que un 74% practicaba otro oficio mientras estaba
enrolado. Entre la oficialidad la situación no era demasiado diferente:
un 18% había nacido en la península y el 70% en la misma ciudad donde
prestaba servicio.24 Estos datos evidencian el “acriollamiento” de las
tropas veteranas, sus estrechos vínculos con las ciudades donde tenían
asiento y el fracaso del intento de reclutarlas en la península. Sin embargo,
esa notable americanización del Ejército de Dotación era mucho más
limitada a nivel del generalato y no llegaba al 20%, de modo que los
altos mandos seguían en manos de peninsulares. Era, además, un ejército
insuficiente para repeler una agresión externa sin recurrir a las milicias
y carecía de capacidad para contener una insurrección generalizada.25
Los cambios sustanciales, por lo tanto, tuvieron que darse en las
milicias y su transformación fue una empresa que abarcó tanto a las
peninsulares como a las de Indias. En la península su reorganización
MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan, “El Ejército de América y la descomposición del orden
colonial. La otra mirada en un conflicto de lealtades”, en Militaria. Revista de cultura militar,
N° 4, 1992, pp. 63-91. MCFARLANE, Anthony, “Los ejércitos coloniales y la crisis del
imperio español, 1808-1810”, en Historia Mexicana, N° 229, 2008, pp. 229-288.
24
MARCHENA F., Juan, “Sin temor de Rey ni de Dios. Violencia, corrupción y crisis de
autoridad en la Cartagena colonial”, en MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan y KUETHE,
Allan (eds.), Soldados del Rey…, pp. 31-100. (p. 41-42)
25
PIQUERAS, José M., “Revolución en ambos hemisferios: común, diversa(s),
confrontada(s)”, en Historia Mexicana, Vol. 229, 2008, pp. 51-52
23
83
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
comenzó hacia 1734 cuando la Corona dispuso formar 37 regimientos
de milicias, “en proporción a los vecindarios y reglados en lo posible a
la disciplina de los regimientos de infantería veterana”. En 1766, estos
regimientos fueron aumentados a 42 y para entonces contaban con 35.316
plazas. Sin embargo, la instauración del nuevo sistema de “milicias
disciplinadas” no las uniformó completamente y siguieron existiendo
diversas formas de organización miliciana, en especial, las compañías
de “milicia urbana”. Además, las modificaciones en el servicio miliciano
tuvieron que ser acompañadas con algunas transformaciones de sus
mecanismos de financiamiento, tornarlo un sistema más centralizado y
mejor reglamentado. El esfuerzo reorganizador, entonces, se desplegó
simultáneamente en la metrópoli y en las colonias donde las milicias se
rigieron por sus respectivos reglamentos aunque primero tuvieron como
referencia el peninsular de 1734 y luego adoptaron el dictado para Cuba
aunque no dejaron de adaptarse a las circunstancias locales. Como ha
señalado A. Kuethe, el régimen miliciano había evolucionado durante
los siglos XVI y XVII en forma provisional, sin una planificación
centralizada ni una organización estandarizada. La situación cambió
durante la Guerra de los Siete Años y para 1763 estaba en marcha su
decidida reforma en Cuba y en los dos años siguientes empezó a ponerse
en marcha en Puerto Rico, Nueva España, Caracas, Perú y Buenos Aires,
dónde expresamente se instruyó que se adoptara el modelo cubano.26
Aquí, la Real Cédula del 19 de enero de 1769 dispuso que “el pie
de las milicias regladas” de la isla se compusiera de cinco batallones de
“infantería de blancos”, dos de “pardos libres” y uno de “morenos libres”
más un regimiento de caballería y otro de dragones; era un total de 6.700
infantes y 800 de caballería y dragones todos con goce del fuero militar.27
De esta manera, el régimen miliciano en las colonias debía combinar el
respeto del patrón territorial y los atributos de la organización social
segmentada. La obligación del servicio miliciano, por tanto, era parte
inherente e inseparable de la condición de vecino pero excedía con creces
COLÓN DE LABRIÁTEGUI, Félix, Juzgados militares de España y sus Indias, Tomo II, Madrid,
Imprenta Real, 1817, pp. 379-389. KUETHE, Allan, “Las milicias disciplinadas en América”,
en MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan y KUETHE, Allan (eds.), Soldados del Rey..., pp. 101126.
27
VALLECILLO, Antonio, Ordenanzas de S. M. para el régimen, disciplina, subordinación y servicio
de los ejércitos, Tomo III, Madrid, Imprenta de Andrés y Díaz, 1854, pp. 48-49.
26
84
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
a este segmento social.28 De esta situación emergerían no pocas de las
tensiones posteriores.
Con el nuevo régimen de milicias “regladas” o “disciplinadas” se
trataba de transformar las antiguas milicias de voluntarios sostenidas y
comandadas localmente, en una estructura que cobrara mayor amplitud,
estuviera además mejor entrenada, prestara un servicio en espacios
mucho más amplios que la defensa de la propia localidad y que quedara
más subordinada a los mandos militares veteranos. Para atraer a los
milicianos se dispuso que gozaran del fuero militar y recibieran
remuneración durante el servicio activo; para mejor su preparación y
ejercer un control mayor sobre ella se dispuso que los milicianos fueran
comandados y entrenados por una plana mayor veterana. La reforma,
por tanto, no sólo buscaba mayor eficacia sino también centralizar su
conducción y modificar las relaciones históricas entre milicianos y
veteranos. De suyo, ello implicaba también transformar las relaciones
entre autoridades locales y superiores. Esta doble tensión que contenía
la reforma de las milicias resulta central a la hora de evaluar tanto su
eficacia como las tensiones que generó.
Las ordenanzas de milicias fueron – para decirlo con las palabras
de M. Chust y J. Marchena – la “piedra angular del estado borbónico”.29
Sin embargo, los resultados de la reforma miliciana fueron
extremadamente dispares. En este sentido, el contraste entre Cuba y
Nueva España ha sido señalado por A. Kuethe como un modelo para el
imperio completo, dado que por lo general la reforma obtuvo mejores
resultados en las costas y tuvo mucho menor alcance en las tierras
interiores. No parece exagerado, entonces, concluir que la incapacidad
imperial para mantener bajo control la expansión del sistema miliciano
fue uno de los mayores fracasos de la política imperial y que en ningún
caso parece haber sido más exitoso que en Cuba.30 Además de dispares,
Acerca de la condición flexible y negociada de la vecindad, véase el lúcido artículo de
HERZOG, Tamar, “La vecindad: entre condición formal y negociación continua. Reflexiones
entorno de las categorías sociales y las redes personales”, en Anuario IEHS, Nº 15, 2000,
pp. 123-132.
29
CHUST, Manuel y MARCHENA, Juan “De milicianos de la Monarquía a guardianes de la
Nación”, en CHUST, Manuel y MARCHENA, Juan (eds.), Las armas de la Nación.
Independencia y ciudadanía en Hispanoamérica (1750-1850), Iberoamericana, pp. 7-14.
30
KUETHE, Allan, “Las milicias disciplinadas ¿fracaso o éxito?, en ORTÍZ ESCAMILLA,
Juan (coord.), Fuerzas militares en Iberoamérica, siglos XVIII y XIX, México, El Colegio de
México/El Colegio de Michoacán/Universidad Veracruzana, 2005, p.19-26.
28
85
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
los resultados fueron desalentadores para las autoridades: se trataba,
decían, “sólo listas de hombres” y “creaciones verdaderamente
metafísicas, sin ninguna utilidad real”.31
A esta altura parece necesario recordar que “milicia” es un término
antiguo, polisémico y que portaba una compleja historia y que se hará
todavía más compleja en el siglo XIX. Para 1734, cuando la reforma de
las milicias peninsulares estaba en sus comienzos, el Diccionario de la
Real Academia definía a las milicias como “cuerpos formados de vecinos
de algún País o Ciudad que se alistan para salir a la campaña en su
defensa, quando lo pide la necesidad y no en otra ocasión.” Esta era la
concepción tradicional y arraigada y con ella debieron lidiar las
autoridades borbónicas puesto que las milicias eran entendidas como
parte inseparable de los derechos y obligaciones de la estructura
corporativa-territorial del Antiguo Régimen. Para 1803, el mismo
diccionario distinguía ahora dos acepciones más, siguiendo lo establecido
en las ordenanzas de 1768: las “milicias provinciales”, término al que se le
asignaba el mismo significado que a milicia y las “milicias urbanas” que
eran definidas como “Cierto número de compañías que residen fijas en
varios pueblos a las órdenes de sus comandantes que son por lo común
los Gobernadores de las plazas”. Este doble significado y denominación
era un aspecto central en la historia de las milicias en el mundo
iberoamericano y, a su modo, también aparecía en el imperio portugués a
través de la distinción entre las milicias “de ordenanza” y las “auxiliares”
Lo cierto es que mientras las fuerzas veteranas se habían hecho
cada vez más americanas en su composición, en las milicias esta situación
era todavía más acusada. J. Machena señaló que la conjunción de la
vanidad social en las elites locales, su miedo a una convulsión racial y la
necesidad de asegurar el orden las llevó a “fortalecerse tras la institución
militar colonial” de modo que “los soldados del Rey terminaron por
31
De esta forma, en el virreinato peruano se produjo una notable ampliación de las milicias
(unos 50.000 efectivos hacia 1763 y el doble en la década siguiente) aunque más tarde ese
nivel de alistamiento no se pudo ni se quiso mantener.: CAMPBELL, León, “Cambios en
la estructura…, p. 244. La situación no parece haber sido muy diferente en Nueva España
donde tras veinte años de reforma las milicias, con sus 40.000 efectivos, seguían siendo “la
espina dorsal” de la organización militar mientras las fuerzas veteranas no llegaban a
6.000 efectivos. Más aún, para 1794 la fuerza realmente disponible era mucho menor a la
establecida y sólo sumaba unos 4.700 hombres, sumando veteranos y milicianos: ARCHER,
Christon, El ejército…, pp. 39-40, 50 y 55.
86
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
estar a su servicio”.32 Y, en el mismo sentido, A. Kuethe concluyó que
tanto por el papel que los criollos tenían en el financiamiento del ejército
como porque éste se había convertido en un medio de acumulación de
autoridad y prestigio, se había transformado en una institución
“autónoma” y “autosupervisada”.33
3. Las peculiaridades rioplatenses
¿Hasta qué punto estos rasgos dan cuenta de la experiencia
rioplatense? No podemos aquí reconstruir la historia militar rioplatense
pero sí apuntar algunos de sus rasgos principales.34 Pero antes conviene
detenerse en un aspecto del cual no puede prescindirse: el largo ciclo de
confrontación hispano-portugués y las simultáneas medidas de
reorganización de la defensa desde mediados del siglo XVIII.
En Brasil, el régimen de milicias fue estructurado con las
ordenanzas de 1570 que estipularon el enrolamiento obligatorio de los
moradores entre 18 y 60 años, con la exclusión de hidalgos y sacerdotes;
ello supuso, además, la adopción de la estructura de tercios tomada de
los castellanos quienes, a su vez, la habían adoptado de los suizos. Sin
embargo, la experiencia militar brasileña lejos estuvo de ser una mera
imitación, adquirió características específicas y generó un modo peculiar
de concebir y hacer la guerra. En particular, se trató de una experiencia
militar colonial construida a partir del “derecho” que tenían quiénes
prestaban servicio a obtener indios cautivos y tierras en compensación.
De esta manera, las estructuras milicianas tendieron a reforzar las
jerarquías sociales preexistentes entre los hombres libres y a definir con
mayor fuerza la rigidez de las fronteras sociales.35 Durante la segunda
MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan y KUETHE, Allan, “Presentación. Militarismo, revueltas
e independencias en América latina”, en MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan y KUETHE,
Allan (eds.), Soldados del Rey…, pp. 7-16.
33
KUETHE, Allan, “Carlos III. Absolutismo ilustrado…,p. 28
34
El estudio más completo e imprescindible sigue siendo BEVERINA, Juan, El Virreinato de
las Provincias del Río de la Plata. Su Organización Militar, Buenos Aires, Círculo Militar,
Biblioteca del Oficial, 1992. Entre los trabajos más recientes: GOYRET, José Teófilo,
“Huestes, milicias y ejército regular”, en TAU ANZOÁTEGUI, Víctor (dir.), Nueva Historia
de la Nación Argentina, Tomo II, Planeta, Buenos Aires, 1999, pp. 351-382.
35
PUNTONI, Pedro, “A arte da guerra no Brasil: tecnologia e estratégia militares na expansao
da fronteira da América portuguesa (1550-1700)”, en CASTRO, Celso, IZECKSOHN, Vitor
y KRAAY, Hendrick (org.,), Nova História Militar Brasileira, Río de Janeiro, Editora FGV,
2004, pp. 43-66.
32
87
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
mitad del siglo XVIII las autoridades intentaron reorganizar la defensa
trasladando unidades veteranas desde otras regiones del imperio y
ampliando los cuerpos de auxiliares y de ordenanzas. En este punto, las
estrategias hispanas y portuguesas eran muy semejantes.
Ahora bien, ello suponía una puesta en tensión de las relaciones
entre autoridades centrales y poderes locales y resultaba particularmente
compleja en un sistema de administración estructurado en torno a
instancias de intermediación y que dejaba un amplio margen de
autonomía efectiva de las estructuras políticas periféricas.36 Las fuerzas
milicianas existentes constituían “la espina dorsal” del orden colonial y,
por tanto, eran también espacios de negociación de los vínculos entre la
metrópoli y la colonia. De esta manera, si la temporaria pérdida de La
Habana y Manila fue para el imperio español la demostración que era
impostergable la reorganización militar, un lugar equivalente tuvo para
el portugués la ocupación hispana de Colonia del Sacramento y la villa
de Río Grande en 1762. Ello se manifestó mediante una reorganización
de la defensa que implicó el establecimiento de tres regimientos de
infantería de línea en la capital, el reforzamiento de la dotación de Santa
Catarina y una notable ampliación del espacio de lo militar en la sociedad
colonial, sobre todo, a través de la constitución del mayor número posible
de cuerpos de milicias.
Sin embargo, las pretensiones oficiales encontraron un límite
preciso en las resistencias que ofrecieron las elites locales y ellas
forzaron a entablar recurrentes negociaciones y compromisos en la
medida que los gobernadores no podían prescindir de su apoyo. En
tales condiciones, la supuesta universalidad del servicio miliciano se
empantanó ante la densa trama de privilegios que estructuraban el
orden colonial y fueron las ordenanzas localmente estructuradas y
sostenidas las que tuvieron a su cargo la tarea de organizar las levas
para abastecer a las fuerzas de línea limitando de este modo también
la fortaleza de las fuerzas veteranas. Ello, sin duda, dificultaba la
satisfacción de las necesidades gubernamentales que tan tardíamente
como en 1796 decidieron transferir la administración del reclutamiento
a la Intendencia General de Policía.
36
HESPANHA, António M., “A constituicao do Imperio portugués. Revisao de algunos
enviasementos correntes”, en O Antigo Regimen…, pp. 163-188.
88
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
En consecuencia, esas instancias de mediación realizaban una
“traducción local” de las órdenes del gobierno imperial de modo que
las instituciones militares importadas de la metrópoli adquirían en la
colonia nuevos contornos: así, las milicias imaginadas inicialmente como
la expresión de una “nobleza de la tierra” incorporaban a principios del
siglo XIX regimientos de mulatos, pardos y libertos; en forma análoga,
si el reclutamiento para las tropas de línea estaba teóricamente
restringido a los blancos, en la práctica no era lo que sucedía y para
entonces la totalidad de las tropas regulares de Bahía era reclutada
localmente. Más aún, en 1766 fueron reorganizadas las milicias y se
formaron nuevos cuerpos auxiliares que debían estar integrados “sem
excecao de nobres, plebeus, brancos, mesticos, pretos, ingénuos e
libertos” y mientras se disponía la formación de destacamentos forzados
para el sur fueron transferidos al Brasil tres regimientos portugueses y
tropas de las Azores.37
Sin embargo, todas las evidencias consultadas indican que el
fortalecimiento de las milicias durante la segunda mitad del XVIII no
permitió construir fuerzas que le resultaran confiables a las autoridades
coloniales así como que esa desconfianza era aún acentuada respecto de
las milicias de la frontera sur. Por lo tanto, en esta frontera el ejercicio de
la autoridad, el reclutamiento para las tropas de línea, su abastecimiento
y la movilización de las milicias dependían casi completamente de la
colaboración de los núcleos locales de poder. Esa frontera sur era
imprecisa, móvil y permeable y las dificultades para afirmarla se debían
ante todo a que se intentaba imponer en un espacio en el cual no había
diferencias marcadas en cuanto a los patrones demográficos, sociales y
productivos que se intentaba bajo la jurisdicción de ambos imperios.
Las tropas veteranas en la frontera, por otra parte, eran reducidas y para
la década de 1780 sólo rondaban los 720 efectivos. Además, presentaban
permanentes deserciones que, al parecer, eran más frecuentes entre los
oriundos de la zona que entre los paulistas.
No era, por cierto, una situación muy diferente a la que afrontaban
las autoridades de Montevideo o de Buenos Aires aunque ellas solían
37
PAGANO DE MELO, Christiane F., “A guerra e o pacto: a política de intensa mobilizacao
militar nas Minas Gerais” y FARIA MENDES, Fabio, “Encargos, privilégios e directos: o
recrutamento militar no Brasil nos séculos XVIII e XIX”, en CASTRO, Celso, IZECKSOHN,
Vitor y KRAAY, Hendrick (org.), Nova História…, pp. 67-86 y 111-137 respectivamente.
89
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
describir con envidia la situación de sus rivales. A estas autoridades se
les hacía extremadamente difícil controlar ese espacio fronterizo habitado
por una población móvil sobre la que ejercían muy limitada autoridad y
que estaba atravesado por una gama de circuitos clandestinos de
comercialización y transitado por desertores, esclavos fugados, partidas
de bandidos, cuatreros y changadores. De cualquier modo, la
militarización de la frontera hispano-portuguesa constituyó el principal
acicate para la estructuración militar del área rioplatense. Y ello traía
aparejado sus dilemas pues la mayoría de las fuerzas milicianas existentes
se habían formado y entrenado para la defensa de las ciudades y la lucha
de frontera con los indios de modo que su preparación era escasamente
adecuada para afrontar este tipo de confrontación. Así, la guerra de 1801
demostró la extraordinaria debilidad defensiva de la frontera hispana.
Para entonces, la dotación de tropa veterana hispana era prácticamente
inexistente en los pueblos misioneros – sólo había un destacamento de
doce Dragones – y se demostró que no podía ser suplida desde Buenos
Aires o Montevideo. La frontera, por lo tanto, quedaba a merced de las
invasiones en tiempo de guerra y, en tiempos de paz, de las partidas de
ladrones que “hacen causa común con los infieles Charrúas y Minuanes”.
Más aún, les preocupaba que los pobladores portugueses – que “no caben
en sus terrenos fronterizos”- atravesaban la frontera y que las milicias
de Río Pardo estuvieran “sobre un pie de rigorosa disciplina”,
perfectamente vestidas y armadas y superaran los 3.000 hombres.38
Las fuerzas veteranas
Hasta 1631 Buenos Aires basó su defensa exclusivamente en el
servicio de milicia de los vecinos. Desde entonces contó además con
“compañías de presidio”, tropas veteranas rentadas por la Real Hacienda
y que debían – supuestamente – reclutarse en la península. La presencia
del presidio era decisiva en la ciudad, tanto por su incidencia
demográfica como mercantil. De este modo, su oficialidad era inseparable
de la trama de poder de la ciudad.39
Informe del subinspector general Marqués de Sobremonte, 1802, en BEVERINA, Juan, El
Virreinato…, Anexo 19, pp. 437-443.
39
TRUJILLO, Oscar, La rebelión de Portugal en Buenos Aires: elite, instituciones y poder político,
Tesis de Maestría en preparación, Universidad Nacional de Luján, Capítulo 3.
38
90
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Para 1718 esas compañías fueron sustituidas por nuevas unidades
veteranas que sumaban unos 450 efectivos y que, en los años siguientes
llegaron al millar. De este modo, en la década de 1740 puede estimarse
que había en la ciudad un soldado veterano cada 12 habitantes. Esa tropa
veterana en la década de 1760 llegó a oscilar entre 3.000 y 4.600 efectivos
y era, sin duda, enorme para una ciudad que rondaba los 24.000
habitantes. Algunos datos comparativos permiten advertirlo: era una
dotación muy poco inferior a la novohispana, semejante a la de Cuba y
superior a la de Lima-El Callao. De este modo, mientras Buenos Aires
llegaba a tener un soldado cada 5,1 habitantes, La Habana contaba con
uno cada 7,6 y Lima con uno cada 15,2.40 Dicho en otros términos, la
impronta militar en la vida de la ciudad había sido y seguía siendo
decisiva.
Estas fuerzas eran casi completamente de infantería, a excepción
de unos 500 Dragones y de los 144 integrantes del cuerpo de Artillería.
Sin embargo, en su mayor parte eran contingentes de refuerzo, como los
casi mil efectivos del Regimiento de Mallorca enviados en 1765. Sin
embargo, para entonces, el estado de la tropa era dramáticamente
descrito por sus mandos. Por ejemplo, el virrey Vértiz recordaría años
después la impresión que le causó al hacerse cargo de su cargo de
inspector general en 1768: las tropas “sólo tenían el nombre de tal” y el
soldado “asistía sólo al cuartel a dormir”. Pero había algo peor: ese
soldado estaba
“acostumbrado a no recibir castigo por sus delitos, por no asistirse
puntualmente con el prest, formaba complot y se sublevaba con cualquier
pretexto”.41
Los datos de las dotaciones hacia 1771 (Buenos Aires: 4682 efectivos, Cuba: 4.731 y LimaEl Callao: con 3.404) provienen de CAMPBELL, León “Cambios en la estructura…, p. 243.
Los de población de SOCOLOW, Susan y HOBERMAN, Louisa. (comps.), Ciudades…, p.10.
Una idea precisa acerca de la magnitud relativa de la dotación de Buenos Aires la ofrece el
siguiente dato: en 1762, antes de la reorganización militar que la tuvo por epicentro, La
Habana contaba con 2330 efectivos, es decir una fuerza semejante a la que dispondría
Buenos Aires en su regimiento de infantería. KUETHE, Allan, “Las milicias disciplinadas
¿fracaso o éxito?, en ORTÍZ ESCAMILLA, Juan (coord.), Fuerzas militares en Iberoamérica,
siglos XVIII y XIX, México, El Colegio de México/El Colegio de Michoacán/Universidad
Veracruzana, 2005, p.20
41
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 238. Esta rebeldía e indisciplina no era, por cierto,
patrimonio exclusivo de los veteranos del Río de la Plata: MARCHENA F., Juan, “Sin
temor de Rey…
40
91
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Para 1772 las fuerzas veteranas habían sido agrupadas en tres
unidades: el nuevo regimiento de infantería de Buenos Aires, el de
Dragones y el del Artillería que eran considerados fijos y apenas
superaban los 1.100 efectivos. El gobernador atribuía esta situación al
dilatado tiempo de servicio, las continuas deserciones, la escasez de
reclutas y su avanzada edad. La situación, al parecer, mejoró un poco en
los años siguientes, sobre todo, después de la impresionante expedición
que comandó Pedro de Cevallos en 1776 con más de 9.000 hombres – la
mayor de la historia colonial rioplatense- y que habría de derivar en la
formación del Virreinato del Río de la Plata: a su regreso el comandante
dispuso que quedaran agregados unos 800 hombres.42
De esta manera, hacia 1781 el Virreinato contaba con 2.505 efectivos
veteranos. Pero, ¿cómo estaban distribuidos en su vasto territorio? En la
capital sólo había 341 (el 13,6%). A Charcas habían sido desplazados 310
(12,3%) y en la costa patagónica había 171 (6,8%). En cambio, en
Montevideo había 962 (38,4%). Conviene registrar que el total de tropas
veteranas acantonadas en distintos puntos del territorio oriental era
mayor pues había 341 en Maldonado (es decir, los mismos efectivos que
en la capital) y 198 en Colonia. Sumaban, así, 1661 (el 66,3%). En contraste,
las Misiones sólo contaban con 14 efectivos, Santa Fe apenas con 7,
Córdoba sólo con uno mientras no había ninguno en el Paraguay.43 Este
patrón de distribución de la tropa veterana es por demás significativo y
advierte ante la realización de generalizaciones abusivas. La mayor parte
del Virreinato carecía de tropas veteranas, en Buenos Aires su número
había decrecido sustancialmente y la mayor parte estaban en la Banda
Oriental y, particularmente, en Montevideo.
¿Cuánto cambió esta situación en los años siguientes? Conviene
apuntar algunas de las evidencias disponibles. En 1789 se reorganizó el
regimiento Fijo de Infantería dotándolo de tres batallones y con 2.067
plazas asignadas. Para 1802 estaba establecido que debía haber 4.305
efectivos pero sólo estaban cubiertas las plazas de 2.509 y dos años
después el faltante seguía superando los 2.000. Ahora, una parte
importante (1.460) estaba en Buenos Aires pero esta cifra resulta
engañosa. 1.049 correspondían a un cuerpo veterano muy particular, el
42
43
BEVERINA, Juan, El virreinato…,pp. 201-203.
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 418.
92
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
de Blandengues que significaba el 41% de los veteranos realmente
existentes en la jurisdicción. De esta manera, Buenos Aires, que se había
convertido en una de las capitales coloniales con más rápido crecimiento
demográfico, había pasado a tener un veterano cada 27 habitantes
mientras que en Montevideo esa relación puede haber sido de uno cada
8. Para toda la Intendencia estaba previsto que hubiera 4.305 veteranos
pero la junta de guerra de 1805 calculaba que sólo contaba con 2.18544, es
decir, casi la misma dotación del Fijo de Infantería de Buenos Aires pocos
años antes. Era claro, entonces, que pese a los sucesivos planes el estado
de las fuerzas veteranas en el Plata no mejoraba.
En buena medida, ello se debía a que el reclutamiento de estas
tropas afrontaba dificultades insalvables y bien lo demostraba el
recurrente faltante de efectivos para cubrir las plazas establecidas. Aquí
también se pretendió que esos veteranos fueran reclutados en la
península pues, como afirmaba el virrey Vértiz en 1783
“la experiencia me ha manifestado que el reclutar en este país es de
ninguna utilidad […] y observé que, lejos de ser conveniente, era muy
perjudicial, pues el que entraba desertaba al instante.”
Más aún, para 1800 el subinspector general debió suspender el
accionar de “las partidas de recluta” ante las generalizadas deserciones
que afrontaba. De esta manera, mientras las autoridades imperiales
insistían en implementar un reclutamiento local, las virreinales preferían
cubrir las plazas vacantes atrayendo voluntarios de las unidades de
refuerzo antes de su regreso, plantar la bandera de recluta en la península
y, sobre todo, el envío de contingentes de reemplazo a lo que la Corona
era ahora completamente renuente. Es cierto que en 1783 se dispuso
poner la bandera de reclutamiento en La Coruña y en 1802 los virreyes
propusieron dejarla allí exclusivamente para reclutar infantes e instalar
otras en diversos puntos de Andalucía para abastecer al regimiento de
Dragones. Su argumento no podía ser soslayado: la bandera en La Coruña
no sólo era insuficiente sino que no había suministrado ningún recluta
durante la guerra de 1801 y por ello fue preciso intentar reclutamiento
en Paraguay y Córdoba: pero, para decirlo con las palabras del
subinspector general
44
GOYRET, José, “Huestes…”, pp. 372-375.
93
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
“sólo he podido conseguir no hacer mayor la baja y el desengaño de que
todo esfuerzo es en vano para promover en estos países la afición al
servicio de soldado, por la abundancia de los efectos necesarios para la
vida en la campaña y la libertad que ésta ofrece.”45
Esa recluta peninsular – se suponía – debía realizarse entre hombres
“honorables” pero los resultados fueron bien distintos, entre otros
motivos porque en 1773 se dispuso que fuera entre los incursos en
primera deserción entre quienes se seleccionasen los efectivos de
reemplazo. Por estos y otros motivos, la estructura militar se convirtió
en uno de los canales de la inmigración peninsular y los soldados
provenían de las clases bajas, la mitad eran labradores y el resto ejercía
trabajos artesanales o de servicios.46
Esas dificultades en buena medida provenían de los montos de
las remuneraciones y de los habituales atrasos con que eran percibidas.
Según el virrey Vértiz
“El soldado de Infantería goza al mes de ocho pesos de pré; el de Caballería
y Dragones, nueve; unos y otros un peso de gratificación en lugar de la
ración que recibían en especie, de modo que el infante junta nueve pesos
y el dragón diez; hoy, por los atrasos del Real Erario, se les suministra a
todos media paga y gratificación ración; con lo que el soldado de
Infantería percibe cinco pesos, y cinco y medio el de Caballería o
Dragones”. 47
En síntesis, el Río de la Plata tenía una experiencia militar colonial
signada por una intensa presencia de tropas veteranas, pero fue una
presencia inestable y de tendencia no sólo decreciente sino cada vez
más concentrada en Montevideo. Por tanto, la defensa de la capital, antes
de 1806, ya descansaba en buena medida en las milicias. Fuera de ambas
ciudades sólo había reducidas fuerzas veteranas en Colonia y
Maldonado. En el resto del territorio todo dependía de las milicias y de
los Blandengues.
Esas fuerzas veteranas eran mayoritariamente de infantería y no
se trataba de una excepcionalidad rioplatense. Por el contrario, en los
ejércitos del Rey la abrumadora mayoría de las tropas eran de infantería.
BEVERINA, Juan, El virreinato…, pp. 225-231y 437.
PÉREZ, Mariana, “Los soldados - inmigrantes: el ejército como vía migratoria de los
peninsulares pobres al Río de la Plata durante el período tardo colonial”, ponencia
presentada a las VI Jornadas de AEPA, Neuquén, 14 al 16 de noviembre de 2001.
47
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 255.
45
46
94
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Se trata de un fenómeno más vasto que abarcó a casi todos los ejércitos
de la época y que si había comenzado bajo el influjo de Federico de
Prusia alcanzó su máxima intensidad durante la experiencia napoleónica.
Lo mismo sucedía en América: así, en 1806 en la Nueva España sólo
11% de las tropas veteranas eran de caballería y en Perú se reducían a la
escolta del Virrey y a dos batallones asentados en Chiloé y Guayaquil.
En este aspecto, el ejército de América era semejante al peninsular donde
a la caballería pertenecían el 15% de los efectivos.48
En el Río de la Plata las fuerzas veteranas contaban con una
reducida caballería, un regimiento de Dragones – que en rigor era una
fuerza de infantería montada- y que hacia 1789 tenía una tropa de 720
plazas, cuando hasta entonces eran 516. No sólo era, por cierto, una
dotación de caballería veterana extremadamente reducida para las
exigencias que suponía la defensa de las fronteras indígena y portuguesa
sino que además no era plenamente de caballería. En este aspecto,
también, las autoridades virreinales tenían una opinión diferente de las
imperiales y consideraban mucho más necesarios que a los Dragones
que a las tropas de infantería y hasta llegaron a proponer en 1805
convertir el regimiento de infantería en dos de Dragones.49 Propuestas
de este tipo iban se apartaban claramente de las concepciones estratégicas
dominantes y aunque no fueron escuchadas por Madrid expresaban muy
claramente las exigencias rioplatenses.
Las soluciones tenían que ser locales y provinieron de los cuerpos
de Blandengues de la Frontera. Como lo recordaría años después Lucio
V. Mansilla el cuerpo “era más bien una especie de milicia rural, que
una tropa de línea” y constituía “una verdadera caballería ligera”.50
Inicialmente estaban armados con una carabina pero luego adoptaron
la lanza como arma preferente y un machete que no tardó en ser
reemplazado por un sable común con vaina de latón. En un principio, se
ARCHER, Christon, El ejército… pp 381-382; LUQUI-LAGLEYZE, Julio M., “Por el Rey…,
p. 33 y 149. GARCÍA CÁRCEL, Ricardo, El sueño…pp. 125-126. Hacia 1808, el ejército
imperial contaba con 138.241 efectivos de los cuales 113.424 eran de infantería, 16.623 de
caballería, 6.697 de artillería y 1.223 de ingenieros: CUENCA TORIBIO, José Manuel, La
Guerra de la Independencia. Un conflicto decisivo (1808-1814), Madrid, Encuentro, 2006, p. 20.
49
BEVERINA, Juan, El virreinato…, pp. 211-212.
50
MANSILLA, Lucio V. “Dos palabras sobre la caballería argentina por el capitán don…”,
en La Revista de Buenos Aires. Historia Americana, Literatura y Derecho, Tomo II, Buenos
Aires, Imprenta de Mayo, 1863, pp. 67-68.
48
95
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
trató de una milicia de caballería destinada a la defensa de la frontera
con los indios organizada en Santa Fe en la década de 1720 e implantada
en Buenos Aires a mediados de siglo, una decisión que expresaba el
fracaso de una estrategia de defensa de las fronteras asentada en milicias
a ración y sin sueldo. Este cuerpo, solventado con fondos locales y
reclutado entre la “gente del país”, terminó por ser convertido
definitivamente en veterano en 1784 y se dispuso que contara con 600
plazas (aunque pocas veces alcanzó efectivamente esa dotación) y que
su comandante oficiara al mismo tiempo de Comandante de la Frontera
de Buenos Aires. Mientras tanto, la compañía de Blandengues de Santa
Fe también había sido convertida en veterana, en una fuerza “de sueldo
continuo, satisfecho por el ramo de arbitrios de aquella ciudad”.51 La
experiencia, sino exitosa, la única posible – fue retomada por las
autoridades virreinales y en 1797 se formó el cuerpo de Blandengues de
la Frontera de Montevideo y aquí el objetivo era con 800 plazas. Para
ello, se procedió a disponer un indulto a vagos, cuatreros y desertores
salvo aquellos acusados de homicidio o de haber enfrentado con armas
a las partidas celadoras e incluso – como decía Cipriano de Melo – “los
mejores son los que han andado en el trajín clandestino”, aunque ellos
también tendrían que presentarse al menos con seis caballos.52 Aún así,
para 1802 a este cuerpo le faltaba el 50% de sus efectivos y la situación
no habría de mejorar en los años siguientes.
Como puede verse, entonces, todos los cuerpos veteranos
independientemente de sus características, afrontaron insuperables
problemas de reclutamiento. Pero, aún así, para defender esas vastas
fronteras las autoridades solo podían apelar a los Blandengues.
Obviamente, las unidades de caballería de lanceros no eran ni una novedad
ni exclusivas del Río de la Plata53 pero aquí parecen haber adquirido una
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 217.
PIVEL DEVOTO, Juan, Raíces coloniales de la revolución oriental de 1811, Montevideo, 1952,
pp. 36-37.
53
Por ejemplo, había en Veracruz siete escuadras destinadas a vigilar las costas que sumaban
unos 1000 hombres reclutados entre blancos, mestizos, pardos y morenos libres, en su
mayor parte agricultores: DE LA SERNA, Juan Manuel, “Integración e identidad, pardos
y morenos en las milicias y cuerpos de lanceros de Veracruz en el siglo XVIII”, en ORTÍZ
ESCAMILLA, Juan (coord.), Fuerzas militares en Iberoamérica, siglos XVIII y XIX, México, El
Colegio de México/El Colegio de Michoacán/Universidad Veracruzana, 2005, p. 61-74 y
JUÁREZ MARTÍNEZ, Abel, “Las milicias de lanceros pardos en la región sotaventina
durante los últimos años de la colonia”, idem, pp. 75-91.
51
52
96
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
relevancia particular y la experiencia de los Blandengues es interesante
porque ilustra con suma claridad acerca de la existencia de formas híbridas
que no pueden reducirse a una dicotomía entre veteranas y milicianas. A
su vez, porque esta experiencia anticipa tanto un proceso que más tarde
será decisivo (la necesidad de transformar fuerzas milicianas en veteranas)
como la extrema dificultad para organizar una caballería veterana con
estos endebles precedentes coloniales.
Para operar esa transformación no sólo debía modificarse el status
legal de las tropas. También debía resolverse el espinoso problema del
financiamiento de una fuerza de servicio permanente y remuneración
continua. La solución implementada no podía ser más sugestiva: en
Buenos Aires y Montevideo los costos fueron afrontados por la
implantación del llamado ramo de guerra (un impuesto sobre las
extracciones de cueros) y en Santa Fe apelando a los arbitrios de la ciudad.
Se esperaba, de este modo, conformar una fuerza veterana de caballería
sujeta al comando de autoridades superiores pero sostenida localmente
y reclutada entre los “hijos del país”.54
Esa transformación suponía también la necesidad de modificar su
distribución, armamento y entrenamiento. Durante su fase miliciana los
Blandengues habían sido una fuerza de lanceros móvil y sin acantonamiento
fijo. La reorganización del cuerpo a partir de la década de 1750 supuso un
cambio en la forma de practicar el servicio que pasó a realizarse en y desde
las nuevas guardias de frontera que comenzaron a organizarse y que se
completaron a fines de la década de 1770. La pretensión de dotarlos de
armas de fuego, en cambio, quedó incumplida y no es extraño pues era una
dificultad permanente y característica en un territorio donde “no hay espadas
ni aun para dos Regimientos, ni carabinas.”55
La utilización por parte de los gobernadores y luego de los intendentes de recursos locales
para sostener fuerzas que cumplieran misiones que excedieran el plano de la defensa
local no sólo creaba instancias de autoridad que quedaban en principio fuera de la influencia
de los notables del lugar sino que era vista como un agravio a sus derechos y privilegios y
no dejó de concitar resistencias. Lo sucedido al gobernador del Tucumán en 1767 fue, en
este sentido, paradigmático y expresa la resistencia a una reforma miliciana que empleaba
los milicianos para planes de defensa más general pero apropiándose de recursos locales:
PAZ, Gustavo, “La hora del Cabildo: Jujuy y su defensa de los derechos del ‘pueblo’ en
1811", en Fabián HERRERO (comp.), Revolución. Política e ideas en el Río de la Plata durante la
década de 1810, Buenos Aires, Ediciones Cooperativas, 2004, pp. 149-166.
55
Informe del subinspector general marqués de Sobre Monte, 1802, en BEVERINA, Juan, El
virreinato…, p. 442.
54
97
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Pero además, la transformación de los blandengues en veteranos
no traía consigo la disminución de las exigencias que recaían sobre las
milicias para la defensa de las fronteras. Dado que los tres cuerpos de
Blandengues (el de Buenos Aires, la compañía de Santa Fe y el
Montevideo) debían sumar unos 1.500 hombres (a los que cabría agregar
una “compañía de partidarios” de 100 plazas que estaba situada en la
frontera de Córdoba 56) eran insuficientes para asegurar la defensa
fronteriza, ésta seguía descansado en las milicias rurales.57 Aún así, dado
que el resto de las fuerzas veteranas estaban concentradas en algunos
puntos precisos, en la mayor parte de las zonas rurales los Blandengues
fueron las únicas fuerzas veteranas existentes. Era preciso, por tanto,
elegir entre ellos a quienes entrenaran y disciplinaran a las milicias rurales
y el comandante del cuerpo en Buenos Aires era, al mismo tiempo, el
Comandante de Frontera y el jefe de las milicias de campaña. Pero eran,
una fuerza muy poco veterana, por cierto.
Pese a todas sus peculiaridades el reclutamiento reproducía las
mismas dificultades que afrontaban los otros cuerpos y por más que las
disposiciones oficiales establecieron que los integrantes de las compañías
debían ser gente de “honrado nacimiento y buenos procederes” en la
práctica los reclutas provenían de los sectores sociales más bajos de la
campaña y particularmente de los inmigrantes del interior sujetos a la
leva. De este modo, si la tropa veterana de origen peninsular terminó
reclutándose en los sectores bajos de la población española, los
Blandengues estuvieron integrados mayoritariamente por migrantes
internos y campesinos y reconocimiento sin arraigo social. Frente a unos
y otros, los milicianos podían expresar otras aspiraciones aunque
improbablemente fueran todos vecinos honorables. Esta escasa
honorabilidad del servicio veterano sin duda debe haber influido en las
dificultades de reclutamiento. Y a ellos se sumaban otros problemas: si
bien la remuneración prometida era relativamente alta, el blandengue
Los “partidarios” eran milicianos de origen campesino que guarnecían la extensa frontera
de la antigua Gobernación del Tucumán con el Chaco.
57
MARFANY, Roberto, “El cuerpo de Blandengues de la Frontera de Buenos Aires (17521810)”. Humanidades. La Plata. Tomo XXIII, 1933, pp. 313-374 y MAYO, Carlos y Amalia
LATRUBESSE, Terratenientes soldados y cautivos: la frontera 1736-1815, Mar del Plata,
Universidad Nacional de Mar del Plata, 1993. NÉSPOLO, Eugenia, “La “Frontera”
bonaerense en el siglo XVIII un espacio políticamente concertado: fuertes, vecinos, milicias
y autoridades civiles-militares”, en Mundo Agrario, Vol. 7, N° 13, 2006.
56
98
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
debía costearse el uniforme, alistarse con sus propios caballos y pagarse
la manutención al tiempo que recibía su paga en forma irregular y con
descuentos. En este aspecto, también los Blandengues eran un cuerpo
veterano muy peculiar que mantenía varios de los aspectos distintivos
del servicio de milicia.
Dragones y Blandengues eran unidades de naturaleza diferentes.
Según el Diccionario de la Real Academia de 1780 el Dragón era una “clase
de soldados, que aunque van montados tienen obligación de desmontarse
y pelear a pie como la infantería cuando se les mandare, por lo cual no
calzan botas fuertes como los soldados de a caballo” y en 1803 lo definía
como un “Soldado que hace el servicio igualmente a pie que a caballo”.
En tal sentido, los Dragones eran una tropa que requería una especial
preparación y un armamento acorde con esta versatilidad. En cambio,
el Blandengue era definido en 1803 como “Soldado armado con lanza,
que defiende los límites de la provincia de Buenos Aires”. Si los Dragones
eran un cuerpo que provenía de la experiencia militar europea, los
Blandengues emergían del medio local y las habilidades que requería
su desempeño como su armamento lo expresaba con claridad.
Había, además, otros motivos para que las autoridades locales se
inclinaran a fomentar los Blandengues en lugar de ampliar los
tradicionales Dragones: sus oficiales cobraban sueldos menores, iguales
a los de la infantería (un capitán de Dragones cobra 80 $ mensuales y los
de infantería o de Blandengues 50$) y servían “en caballos propios” (al
igual que las milicias) mientras a los Dragones se los debía dar la Real
Hacienda. Si bien el soldado blandengue tenía un prest superior al infante
“este exceso queda compensado con que está obligado a vestirse, a comer
y a montar siempre caballos propios, no debiendo tener menos de
cinco”.58 En estas condiciones no sorprende que se recomendara reclutar
como Blandengues a hombres casados ni la dificultad para lograrlo.
Las dificultades para contar con fuerzas de caballería no eran pocas,
empezando por la provisión de caballos. Entre los Dragones los caballos
eran provistos por la Real Hacienda y hasta 1780 su reposición era
58
AZARA, Félix de, “Informe sobre la nueva constitución de las tropas del Río de la Plata
propuesta por el virrey” en Memorias sobre el estado rural del Río de la Plata en 1801, demarcación
de límites entre el Brasil y el Paraguay a últimos del siglo XVIII e informes sobre varios particulares
de la América meridional española. Escritos póstumos de Don Félix de Azara, Madrid, Imprenta
de Sanchos, 1847, pp. 98-103 (p. 100-101).
99
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
resuelta por una partida que administraba el comandante de la unidad.
A partir de entonces, se dispuso que la reposición debía quedar a cargo
de las “estancias del Rey” aunque es dudoso que hayan podido cumplir
esta misión: para 1794, por ejemplo, la que existía en la Banda Oriental
sólo contaba con 583 caballos.59 En tales condiciones, la provisión de
caballos siguió dependiendo de la propia tropa o de los auxilios que se
imponía a los pobladores de la campaña. Por lo tanto, no es casual que
los Blandengues tuvieran estipulada la obligación de comprar, mantener
y renovar sus caballos y que los milicianos estuvieran obligados a acudir
al servicio con caballos propios. Más aún, los aperos de montar que
usaban Dragones, Blandengues y milicianos debía ser costeados por la
tropa.
Un informe de 1790 nos ofrece una imagen bastante precisa de los
diferentes cuerpos veteranos. El Regimiento de Infantería de Buenos
Aires – que en realidad prestaba servicio sobre todo en Montevideo y
otras parajes orientales – estaba sostenido por la Real Hacienda y para
su recluta se consideraba que “no se puede contar con la gente del país”
por lo que se apelaba a la “saca” de individuos de otros cuerpos que
habían estado en estas provincias y a la partida de reclutamiento
establecida en La Coruña. El de Dragones, también era sostenido por la
Real Hacienda, reclutado del mismo modo pues se señalaba que “es
poca la gente del país que puede admitirse en las calidades que se
requieren”. Y lo mismo sucedía con las asambleas de infantería y
caballería encargadas de entrenar a las milicias. En cambio, los
Blandengues de Buenos Aires se sostenían con el llamado ramo de guerra
que provenía de un descuento de dos reales por cuero que fuera
exportado mientras que la compañía de Blandengues de Santa Fe lo hacía
gracias a los arbitrios de esa ciudad. En ambos casos, se reclutaban entre
“gente del país”, la tropa debía costearse su vestuario y comprar y
mantener sus caballos.60
Las fuerzas veteranas en el Río de la Plata, entonces, ofrecían un
panorama bastante claro: habían llegado a tener una dimensión
significativa en las décadas de 1760 y 1770 impactando notablemente en
la vida de las ciudades de Buenos Aires y Montevideo. Pero luego la
59
60
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 252 y 431.
BEVERINA, Juan, El virreinato…, Anexo 22, pp. 450-452.
100
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
tendencia fue francamente decreciente, sobre todo desde 1787 cuando
la corona dispuso suspender el envío de unidades de reemplazo.
Predominaba entre ellas la infantería pero menos de lo que se
acostumbraba; esa infantería había sido reclutada mayoritariamente en
la península mientras que la mayor parte de la caballería veterana
provenía de los Blandengues y era reclutada localmente. A su vez, casi
la totalidad de la infantería veterana estaba concentrada en Montevideo
y Buenos Aires y su incidencia siguió siendo mucho mayor en la primera
que en la segunda.
La concentración de las fuerzas veteranas en ambas ciudades no
obedecía sólo a las razones que dictaba la estrategia. Las autoridades
militares locales tenían muchas quejas de los veteranos disponibles y
advertían con claridad los efectos que traía dispersarlos por distintos
puntos de la campaña. Por ejemplo, en 1790, Olaguer Feliú – por entonces
subinspector general- la describía como una tropa estaba “sin instrucción
alguna”, que estaba dedicada a
“ocupaciones muy ajenas a su instituto, inutilizan en poco tiempo su
vestuario, pierden la subordinación y no se puede decir con verdad que
son soldados, sino unos peones de campo, separados enteramente de
toda instrucción militar.”61
La situación parece haber empeorado en los años siguientes y las
dramáticas experiencias de las invasiones inglesas lo pusieron de
manifiesto. Por eso el Cabildo de Buenos Aires se quejaba de unos
oficiales subalternos que “han hecho su carrera en el pasatiempo, el juego,
el baile, el paseo” y de una escasez de tropas que había adquirido tal
magnitud que tanto el regimiento Fijo de Infantería como los Dragones
y los Blandengues tenían tantos oficiales como soldados.62 La defensa
frente a las invasiones, en consecuencia, debía descansar en las milicias.
Las milicias coloniales
Pero, ¿qué sucedía con las milicias? Desde el siglo XVI el servicio
miliciano había descansado primero en los encomenderos y sus clientelas
y luego en el conjunto de los vecinos y sus dependientes. En Buenos
61
62
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 238.
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 238.
101
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Aires, y la mayor parte del espacio que abarcó su Intendencia, la
incidencia de las encomiendas fue muy limitada por lo que el servicio
recayó desde un comienzo en los batallones de “Voluntarios españoles”
y de “Forasteros”, en gran parte portugueses. En los primeros recaía el
servicio de Dragones y en los segundos el de infantería. De este modo,
la estructura miliciana tradicional reproducía la de los cuerpos veteranos.
Sin embargo, dada su condición de frontera abierta, las reiteradas
amenazas de incursiones extranjeras y su historia de confrontación con
los portugueses, se forjó en el espacio litoral una tradición miliciana
mucho más diversa que abarcaba a amplios sectores de la sociedad. Esa
tradición tenía improntas precisas que habrían de perdurar: eran fuerzas
destinadas a la defensa local, estaban integradas localmente, eran
sostenidas por los vecinos que, además, tenían la facultad de “elegir” a
sus jefes.
Como en todo el virreinato peruano, en 1764 comenzó su
reorganización dentro de una concepción según la cual las fuerzas
veteranas debían funcionar como “cabeza” de las llamadas “milicias
provinciales” y era en ellas en las cuales debía descargarse el peso de la
defensa. Esas milicias pasaron a denominarse Cuerpos de Milicias
Provinciales y la estrategia oficial consistió en impulsar la formación
del mayor número que fuera posible y asignarles el goce del fuero a sus
oficiales.63 En función de esta política se estableció que hubiera en la
ciudad de Buenos Aires un “Batallón de Españoles” de infantería y un
cuerpo de 168 “negros libres”; también se formaron diversas unidades
milicianas de caballería: una de 400 “pardos”, otra de 300 “indios
guaraníes”, otra de 300 “indios ladinos” así como un “Regimiento
Provincial de Caballería” compuesto de 1.200 efectivos y para cuyo
alistamiento se estipulaba que debía procurarse que “la gente de cada
Compañía se aliste por calles y barrios los más cercanos entre sí”; por
último, se estableció que hubiera también 100 milicianos sirviendo en la
artillería y 60 en la maestranza, lo que hacía un total previsto para la
defensa de la ciudad de 3.379 efectivos de milicias. Para la frontera con
los indios se dispuso que existieran “compañías sueltas” de caballería
(esas compañías de reserva y sin entrenamiento militar y uniforme a las
que se recurría cada vez con mayor frecuencia) con 2.198 hombres (695
63
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 239 y 263-266.
102
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
en Conchas, 632 en Luján, 380 en Arrecifes y Pergamino, 220 en Matanza
y 271 en Magdalena). De esta manera, para la década de 1760 se esperaba
que hubiera en la ciudad una cantidad semejante de efectivos veteranos
y milicianos, lo que indica el peso notable que los primeros seguían
manteniendo en la estructura defensiva a pesar de esta primera
reorganización de las milicias y la intención de multiplicar al máximo
posible sus cuerpos. Además, debía haber 600 milicianos en Montevideo,
1.524 en Santa Fe, 500 en Corrientes y 300 en Soriano, Víboras y Rosario
del Colla.64 La futura Intendencia, entonces, debía contar con unos 7.600
milicianos alistados.
La constitución de unidades milicianas integradas por pardos,
mulatos y libertos no era, por cierto, una excepcionalidad rioplatense y
expresaba tanto la propia historia colonial como el modo en que se
traducía en las colonias los reglamentos milicianos peninsulares. En el
área caribeña se remonta a finales del siglo XVII pero fue durante la
reforma militar borbónica que se constituyó en una de sus facetas más
extendida y más conflictiva en la medida que abrió canales de ascenso
social.65 La peculiaridad rioplatense, en todo caso, parece haber residido
en otro aspecto: la importancia que durante mucho tiempo tuvieron las
milicias de indios guaraníes. Su movilización para defender Buenos
Aires, Colonia del Sacramento o Montevideo había sido frecuente y se
apoyaba en la capacidad jesuita de organizar una extendida estructura
miliciana en las misiones que llegó a movilizar en algunos momentos
entre 3.000 y 7.000 hombres. Sin embargo, los jesuitas resistían estas
prestaciones y desde la década de 1740 el crecimiento que tuvieron otras
fuerzas milicianas hizo menos necesario recurrir a su colaboración.66 Más
En 1771 las milicianos de caballería de la campaña de Buenos Aires eran 2.087: BEVERINA,
p. 272-275; Reseña Histórica…, pp. 82-86
65
BELMONTE POSTIGO, José L., “El color de los fusiles. Las milicias de pardos en Santiago de
Cuba en los albores de la revolución haitiana”, en CHUST, Manuel y MARCHENA, Juan
(eds.), Las armas de la Nación. Independencia y ciudadanía en Hispanoamérica (1750-1850),
Iberoamericana, pp. 37-52. VINSON III, Ben, “Los milicianos pardos y la construcción de la
raza en el México colonial”, en Signos Históricos, N° 4, 2000, pp. 87-106. DE LA SERNA, Juan
Manuel, “Integración e identidad, pardos y morenos en las milicias y cuerpos de lanceros de
Veracruz en el siglo XVIII”, en ORTÍZ ESCAMILLA, Juan (coord.), Fuerzas militares en
Iberoamérica, siglos XVIII y XIX, México, El Colegio de México/El Colegio de Michoacán/
Universidad Veracruzana, 2005, p. 61-74 y JUÁREZ MARTÍNEZ, Abel, “Las milicias de lanceros
pardos en la región sotaventina durante los últimos años de la colonia”, idem, pp. 75-91.
66
MORNER, Magnus, Actividades políticas y económicas de los jesuitas en el Río de la Plata,
Buenos Aires, Hyspamerica, 1985, p. 124.
64
103
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
aún, después de la guerra guaranítica de 1754 – cuando para derrotar a
los pueblos sublevados los españoles debieron movilizar unos 2.000
efectivos y los portugueses unos 3.00067- las autoridades prefirieron
apelar lo menos posible a este tipo de milicias. Y menos pensaron en
hacerlo después de la expulsión de la Compañía en 1767. Esas milicias
indígenas eran la expresión de un fenómeno más amplio que excedía el
accionar jesuita y había militarizado extremadamente a la población
campesina del Paraguay al punto que hacia 1760 el 25% de los varones
paraguayos debía cumplir con este servicio.68 La intensa experiencia
miliciana de los pueblos misioneros incluía otra dimensión que no puede
ser pasada por alto y que continuó después de la expulsión: el
hispanizado sistema de gobierno impuesto a estos pueblos incluía no
sólo la elección de los miembros de sus cabildos sino que anualmente
también debían designarse “todos los empleos militares”, los de
cuidadores de faenas y los maestros de oficio “de modo que en cada
pueblo pasan de 80 y aun de 100 los que ocupan oficios, y si el pueblo es
corto, todos se vuelven mandarines, y quedan pocos a quien mandar” e
incluso “a los ejecutores de las prisiones y castigos llaman sargentos”.
Más aún, el día de año nuevo se les entregaba las varas y bastones a los
alcaldes y demás cabildantes “y a los oficiales militares las insignias
correspondientes”.69 De este modo, desde tiempos jesuitas, el Río de la
Plata forjó una tradición de formación de milicias auxiliares integradas
por grupos indígenas y que eran movilizadas a larga distancia.
Una década después la jurisdicción de Buenos Aires mantenía los
niveles de alistamiento que ya había alcanzado y para 1774 contaba con
HENIS, Tadeo Xavier, “Diario histórico de la rebelión y guerra de los pueblos guaranís,
situados en la costa oriental del río Uruguay del año 1754”, en de Angelis, Pedro, Colección
de Obras y Documentos relativos a la Historia Antigua y Moderna de las Provincias del Río de la
Plata, Tomo Quinto, Buenos Aires, Imprenta del Estado, 1836, p. 44. AVELLANEDA,
Mercedes y QUARLERI, Lía, “Las milicias guaraníes en el Paraguay y el Río de la Plata:
alcances y limitaciones (1649-1756)”, en Etudos Iberoamericanos, Vol. XXXIII, N° 1, 2007, pp.
109-132.
68
GARAVAGLIA, Juan C., “Campesinos y soldados: dos siglos en la histo-ria rural del
Paraguay”, en Garavaglia, Juan C., Economía, sociedad y regiones, Buenos Aires, De la Flor,
1987, pp. 193-260.
69
DOBLAS, Gonzalo de, “Memoria histórica, geográfica, política y económica sobre la
Provincia de Misiones de indios guaranis”, 1785, en Pedro de Angelis, Colección de Obras y
Documentos relativos a la Historia Antigua y Moderna de las Provincias del Río de la Plata, Tomo
Tercero, Buenos Aires, Imprenta del Estado, 1836, pp. 42-43.
67
104
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
7.471 milicianos alistados, 6.122 españoles y 1.243 de las castas sin contar
el aporte que pudieran ofrecer los pueblos de las misiones. Sin embargo,
las autoridades virreinales que sostenían que podían suministrar un
“poquísimo socorro” en caso de invasión por lo que insistían en la
necesidad de contar con “tropas regladas”. De acuerdo a su descripción
en 1781
“La mayor parte de esta gente aborrece el servicio, la sujeción y vida
culta, porque reina en ellos la desidia y son naturalmente vagantes:
rehusan concurrir a las salidas contra los enemigos, aun citados para su
propia defensa, la de su casa, familia y hacienda, y en campaña no tiene
límite su deserción, particularmente los solteros por la facilidad con que
subsisten en los campos por la abundancia de caballos, ganado y caza.
Sobre este pie han vivido en lo pasado y, a corta diferencia, en lo presente,
sin que basten amonestaciones, amenazas y castigos para evitar su fuga,
la falta de disciplina, la inobediencia y la relajación en todo. Cuando
fuesen éstas de mejor calidad, no se puede contar con ellas en la actualidad
para socorrer esta banda […se refiere a la Banda Oriental…] porque la
mayor parte está avecindada en la frontera, que es dilatada y fácil a
invadir por diversos caminos distantes entre sí.”70
Este diagnóstico expresa con suficiente claridad varias de las
dificultades que hallaba la organización de la defensa en base a las
milicias y los limitados resultados que se habían alcanzado al comenzar
los años 80 con su reorganización en la década de 1760. Sin embargo, no
por ello las milicias dejaban de ser un aspecto central en las estructuras
de poder local.71 A ese nivel los grados milicianos eran parte inseparable
de los honores que definían el status de los vecinos a pesar de la extrema
dificultad que se presentaba para uniformar a las milicias. Pese a todo,
las evidencias sugieren que las unidades milicianas de caballería gozaban
de una cierta distinción. No era una novedad, por cierto, ya que hasta la
década de 1760 a los batallones de infantería estaban destinados los
forasteros mientras en la caballería servían los “vecinos españoles”, al
punto que en 1772 el regimiento de caballería miliciano fue depurado
“de ciertos oficiales contraídos a ocupaciones y comercios menudos,
repugnantes a tal distinción”, como recordaría el virrey Arredondo en
Borrador de oficio del virrey Vértiz al ministro Gálvez, Montevideo, 30 de abril de 1781,
en BEVERINA, Juan, El virreinato…, Anexo 13, pp. 413-418.
71
ARECES, Nidia, “Milicias y faccionalismo en Santa Fe, 1660-1730”, en Revista de Indias,
Vol. LXII, N° 226, 2002, pp. 585-614; GONZÁLEZ, Marcela, Las milicias, origen y organización
durante la colonia, Centro de Estudios Históricos, Córdoba, 1995.
70
105
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
1790. Para entonces algunos de aspectos habían cambiando poco: en 1784
todavía el cuerpo de infantería estaba integrado en gran parte por
forasteros y “gente ambulante”.72 De esta manera, las evidencias sugieren
que mientras las concepciones estratégicas imperantes tendían a
privilegiar a la infantería frente a la caballería – y la decisión de hacer
descansar las fuerzas de caballería en las milicias era una de sus
expresiones – las prácticas milicianas locales seguían asignando un lugar
de mayor distinción a los cuerpos de caballería.
La existencia de distintos tipos de milicias traía aparejada la
necesidad de su distinción y, en este sentido, la carencia de uniformes
no era un problema menor. Así lo ponía en evidencia el plan que había
presentado el virrey Arredondo en 1793 que limitaba a los oficiales y
sargentos el uso obligatorio del uniforme mientras que preveía que los
cabos y soldados pudieran prestar servicio “en su traje de paisanos”;
para distinguirlos, por lo tanto, el virrey estipuló que
“para que los cabos y soldados sean conocidos como milicianos reglados,
deberán usar siempre de cucarda encarnada en el sombrero, a excepción
de los Blandengues Provinciales, que deberían usar de una cinta de
estambre o cerda encarnada y cosida en la copa del sombrero redondo
que acostumbran usar.”73
A juzgar por las evidencias posteriores se trató de prácticas que
arraigaron profundamente y fueron perdurables reapareciendo en las
montoneras decimonónicas.
Aún así, el esfuerzo de las autoridades estuvo orientado a
conformar las milicias de caballería de campaña, un cuerpo que hacia
1780 comprendía 45 compañías sueltas y 2.300 efectivos “sin vestuario
militar” y para cuyo alistamiento se recurría a “todas las gentes capaces
de tomar armas en la campaña” y que se organizaban por partido bajo el
mando de un Sargento Mayor.74 Esta organización seguía vigente para
1800 y los informes imperiales lo registraban con claridad:
“En la Campiña de Buenos-Ayres estan alistados todos los hombres
capaces de tomar las armas, repartidos en Cuarenta y cinco Compañías,
sin vestuario militar y a cargo de un Sargento Mayor de Milicias
domiciliado en el mismo Partido, y acuden a oponerse a los indios infieles
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 277-279.
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 251.
74
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 282.
72
73
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
quando intentan atacar las haciendas de la Frontera, su fuerza es mayor
o menor según lo poblado del Partido, pues todos son Soldados.”75
“Todos son soldados”… la expresión no podría ser más
significativa y pone de manifiesto que, a pesar de las quejas recurrentes
de las autoridades, la extensión del servicio miliciano había cobrado
una enorme amplitud. Lo que interesa destacar, entonces, es que el Río
de la Plata había desarrollado una tradición de caballería veterana de
matriz miliciana – en rigor cabría decir que ésta la era la verdadera
tradición de caballería – y a la vez contaba con una extendida tradición
miliciana que asignaba un también un lugar relevante a la caballería, se
había desarrollado en buena medida al margen del control de las
autoridades militares y era comandada y sostenida localmente. Hay algo
más, a pesar de muchos criterios y valores de la época, estas
circunstancias hacían difícil que el servicio de caballería supusiera un
alto grado de honorabilidad.
Una cuestión no ha sido evaluada suficientemente: ¿hasta qué
punto avanzó el nuevo régimen de milicias disciplinadas? Las evidencias
disponibles sugieren que lo hizo en forma limitada y dispar. Por lo
pronto, la confianza que en ellas tenían las autoridades era mínima y no
dejaban de señalar reiteradamente que los milicianos “aborrecen la
sujeción, la obediencia y la disciplina, son propensos al complot y
rebelión” y que “En campaña no tiene límite su deserción, llevándose a
veces la caballada.”76 Virreyes como Vértiz eran conscientes que en
muchos regimientos “sólo existían sus planas mayores, pues los soldados
eran imaginarios, o donde mas, gente alistada en el papel” al punto que
había llegado a la conclusión que “tanto número de milicianos alistados
sirven sólo de confusión”. En estas condiciones, el programa que impulsó
durante su gobierno (1778-83) incluyó la concentración en unos pocos
regimientos disciplinados. Sin embargo, también tomó otra decisión.
“el resto del vecindario le redujese a cuerpos de milicias urbanas, al modo
que las hay en España, para emplearlas sólo en el último caso.”77
Estado Militar de España. Año de 1801, p. 143. Disponible en: http://
hemerotecadigital.bne.es/
76
BEVERINA, Juan, El Virreinato…, p. 280.
77
BEVERINA, Juan, El Virreinato…, p. 284. No muy distinta era la situación en las provincias
interiores del Virreinato al punto que a principios de la década de 1790 el Inspector General
sostenía que en ellas no había “cuerpo alguno formal, sino una multitud de Oficiales sin
tener a quien mandar”; p. 294.
75
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Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Esta evidencia es importante pues muestra que a mediados de la
década de 1780 si bien las autoridades virreinales no renunciaban al
objetivo de instaurar el sistema de milicias disciplinadas habían optado
también por fomentar el régimen de milicias urbanas. Y esta situación
habría de perdurar. Así, para 1790, el Inspector General seguía
sosteniendo que “para proceder al establecimiento de las Milicias de
esta Provincia es indispensable un dato conocido del número de sus
habitantes y de las calidades de ellos”, recordaba que las instrucciones
de 1764 estipulaban que se formase el mayor número de cuerpos posible
y calculaba que los efectivos milicianos alistados eran 5.070.78 Pero ¿qué
clase de milicias eran, entonces, las que existían hacia 1790? Las dudas
al respecto no invaden sólo a los historiadores…
En su informe Olaguer Feliú señalaba: “Estas milicias no tienen
declaración de regladas ni de urbanas”, es decir, no tenían un estatuto
claramente definido. A pesar de ello, – advertía – “parece que deben
reputarse en esta última clase” puesto que “no tienen empleo ni plaza
con sueldo” pero “tienen Asambleas veteranas de sueldo continuo para
su instrucción, en que se ejercitan todos los domingos en que el tiempo
lo permite”. Recordaba también que una Real Orden del 15 de marzo de
1781 estableció el goce del fuero militar para los oficiales, sargentos y
cabos pero exceptuó a los soldados “porque estando alistado todos los
que son capaces de tomar las armas, quedaría sin autoridad la jurisdicción
Real ordinaria”. Por tales motivos, y frente a la “necesidad de hacer
apreciables a los sujetos de más distinción y comodidad los empleos de
estas Milicias” proponía una solución: que “se declaren en la clase de
regladas”.79 La reforma miliciana, por tanto, seguía en ciernes para 1790.
La cuestión, por supuesto, no se limitaba al virreinato platense
sino que abarcaba a todos los dominios coloniales: por eso, en 1791 la
Corona dispuso que los cuerpos formados sin su expresa aprobación no
tendrían derecho a gozar del fuero.80 Resulta claro, entonces, que para
1790 la reforma de las milicias era una tarea pendiente, que ambos
sistemas de milicias continuaban vigentes y que de alguna manera las
decisiones de las autoridades acentuaron esta coexistencia y terminaron
BEVERINA, Juan, El Virreinato…, p. 296-297 y Anexo 25
BEVERINA, Juan, El Virreinato…, p. 454
80
VALLECILLO, Antonio, Ordenanzas de S. M. para el régimen, disciplina, subordinación y servicio
de los ejércitos, Tomo III, Madrid, Imprenta de Andrés y Díaz, 1854, p. 52.
78
79
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
por contribuir a limitar la reforma miliciana. Para 1793 la estrategia de
contención del gasto fiscal comenzaba a hacerse sentir con mayor
intensidad y la Corona ya había suspendido la remisión de contingentes
veteranos de reemplazo lo que acentuaba la escasez de oficiales para
disciplinar las milicias. Más aún, poco después suprimió los núcleos
veteranos que conformaban las asambleas.
A contramano de esta situación el plan de milicias que en 1793
presentó el virrey Arredondo para la jurisdicción de Buenos Aires
establecía la adopción del reglamento cubano de milicias – algo que, en
rigor, ya se había establecido en 1769 – pero, aclarando, “en cuanto lo
permitan las circunstancias locales del país”; proponía que el número
de compañías urbanas no debía ser fijo sino de acuerdo al “sobrante de
mozos después de alistadas las Milicias regladas” (ratificando así la
existencia de un doble régimen miliciano) y recomendaba establecer
cuerpos de Blandengues Provinciales “a imitación de los que hay de
frontera”, con lo que no hacía sino profundizar las dualidades pues estaba
fomentando cuerpos milicianos de Blandengues en la misma época que
los antiguos habían sido transformados en cuerpos veteranos. Su plan
preveía alistar 6.362 milicianos distribuidos del siguiente modo: 4.162
de “milicias regladas” (1.720 de infantería y 2.442 de caballería) y 2.200
de “milicias urbanas”. Para la ciudad de Buenos Aires preveía la
existencia de 1.654 milicianos “disciplinados” y 300 “urbanos” y para
Montevideo de 1.308 “disciplinados” y 150 “urbanos”. En el resto de las
zonas, en cambio, la pretensión de contar con milicianos disciplinados
era mucho más modesta: para la campaña y frontera de Buenos Aires se
quería alistar 640 disciplinados y 1.200 urbanos; en Santa Fe, 200 y 150;
en Corrientes, 100 y 100; en Gualeguay, Soriano, Víboras/Espinillo, 60 y
50; en Colonia/Rosario, 30 y 50; y en Maldonado/Minas/San Carlos, 50
y 100. Cabe señalar algo más: en todos estos casos las milicias
disciplinadas debían ser de caballería y corresponderían a los
denominados Blandengues Provinciales.81 El plan se apartaba de las
directivas metropolitanas y no fue aprobado. Aún así resulta de interés
considerarlo pues pone claramente en evidencia el juego de espejos que
lo inspiraba: así como las milicias debían asemejarse a los cuerpos
81
BEVERINA, Juan, El Virreinato…, p. 301.
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Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
veteranos que habrían de auxiliar, lo mismo sucedía entre los dos tipos
de milicias y entre los Blandengues.
Si este plan era ambicioso no se quedó a la saga el que sí fue
aprobado en 1801 y que estableció un reglamento para las milicias
disciplinadas para todo el virreinato. Se pretendía conformar una fuerza
de 14.141 hombres, de los cuales 6.160 corresponderían a la Intendencia
de Buenos Aires. El alistamiento debía abarcar a todos los hombres
hábiles entre 16 y 45 años quedando a decisión del Virrey el tiempo de
servicio. ¿Sería una fuerza de servicio continuo o sólo esporádicamente
sería convocada? Tanto por razones financieras como de defensa pero
también políticas, parece haberse preferido dejar la decisión en manos
del Virrey. A su vez, se establecía que el comando de los regimientos y
escuadrones de caballería estaría a cargo de personal miliciano, en claro
reconocimiento de las dificultades para proveerlos de una plana mayor
veterana. Como vemos, se esperaba contar con una fuerza miliciana para
la Intendencia que era menor a lo previsto cuatro décadas antes pese al
notable incremento de la población. Sin embargo, el plan era muy
ambicioso pues pretendía que todas esas milicias fueran disciplinadas
por lo que puede afirmarse que significaba la pretensión de llevar
efectivamente adelante la incompleta reforma de las milicias.
Pero es muy dudoso que pudiera llevarse a cabo. Por lo pronto,
para Buenos Aires y para Montevideo preveía la misma cantidad de
milicianos cuando la población de la primera era cuatro sino cinco veces
mayor que en la segunda. Por otra parte, el mismo reglamento estipulaba
quienes estaban exceptuados de este servicio – los comerciantes de
conocido caudal, los abogados y escribanos, los mayordomos y capataces
de haciendas de consideración, médicos y boticarios, maestros, el
personal del culto, etc.-, aunque se establecía que no lo estarían de
alistarse en los cuerpos de milicias urbanas.
De esta manera, el reglamento que anunciaba su intención de
“reglar” a todas las milicias no podía evitar la convalidación del doble
sistema y reforzaba las distinciones sociales entre uno y otro. Tal es así
que la información oficial disponible parece indicar que el esfuerzo por
convertir en disciplinadas no abarcó a todas las milicias ni a todo el
Virreinato. Para 1806, las autoridades de Madrid sólo tenían registradas
como “milicias disciplinadas de infantería” a las disponibles en Buenos
Aires y Montevideo y como “milicias disciplinadas de caballería” a las
110
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
existentes en las Intendencias de Buenos Aires, Córdoba, Salta y Asunción
y a las dependientes del Gobierno de Montevideo. En cambio, registraban
“milicias urbanas” de infantería en Santa Cruz de la Sierra, La Paz y
Potosí – dónde, además, persistía el cuerpo del Gremio de Azogueros –
y como “milicias Provinciales de caballería” a las existentes en
Cochabamba, Tarija y Cinti. Independientemente de la eficacia que haya
tenido la transformación de las milicias en “disciplinadas” la diversidad
de situaciones era evidente.82
El nuevo reglamento no dejó de suscitar oposiciones, entre ellas la
del Cabildo de Montevideo y del gremio de Hacendados que temían
que se agudizara la ya crónica escasez de mano de obra por el
alistamiento general. Para ese cabildo no había dudas, la campaña era
“la escuela práctica de toda especie de delitos y el refugio seguro de
toda clase de delincuentes” pero depositaba la solución en una poderosa
expedición que asegurada y purgara el territorio. Aún así, cuando esa
expedición se puso en marcha en 1804, los hacendados resistieron las
contribuciones que se les quiso imponer lo que derivó en un fuerte
conflicto con el Virrey.83
Al mismo tiempo, las prácticas efectivamente imperantes tendían
a diluir las distinciones precisas entre milicias disciplinadas y cuerpos
veteranos pues la notoria disminución de estos efectivos hacía necesario
recurrir cada vez con mayor intensidad a aquellos, extendiendo los
tiempos de su servicio a sueldo. Una situación que, si no era nueva,
tendió a hacerse más sistemática a partir de 1797 cuando se intentó
concentrar todas las fuerzas veteranas en Montevideo. De esta forma, la
junta de guerra realizada en Montevideo el 17 de julio de 1797 dispuso
poner a sueldo las compañías de milicias “que se consideren precisas”
para guarnecer la capital, Colonia “o cualquier otro paraje en lugar de la
tropa veterana”. Incluso, para aumentarla esa tropa en Montevideo se
dispuso trasladar 400 Blandengues de la frontera de Buenos Aires.84
¿Cuál era para entonces la disponibilidad de fuerzas? En la Banda
Oriental se contaba con 1.901 efectivos veteranos distribuidos 1.352 en
Estado Militar de España. Año de 1806, pp. 149-157. Disponible en: http://
hemerotecadigital.bne.es/
83
PIVEL DEVOTO, Raíces…pp. 72-95.
84
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 391.
82
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Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Montevideo, 170 en la frontera y 379 en las guardias de campaña; a su
vez, se contaba con 4.303 milicianos, de los cuales sólo 892 estaban en la
ciudad aunque estaba en formación un cuerpo de Blandengues en
Maldonado de 700 hombres. Ello hacía una fuerza movilizada de 6.204
efectivos. En la capital, en cambio, se contaba con 2.351: de ellos eran
veteranos tan solo 506 y 400 estaban en la frontera; el resto eran milicianos
aunque en esta cuenta no entraban los integrantes de las 45 compañías
de milicias de campaña. 85 No extraña, entonces, la visión que imperaba
entre las autoridades de Madrid para quienes “cuasi con nada de esto
puede contarse; no solo por su efectiva nulidad militar, sino porque
buena parte de tales milicias, como tal vez todas las de América, sólo
existen en las listas”, un diagnóstico repetido a pesar del paso de los
años y los sucesivos planes de reforma.86
En todo caso, lo importante es que la reforma miliciana sólo estaba
en sus comienzos cuando todo el orden político y militar regional se vio
bruscamente alterado hacia 1806. Con la invasión británica, en la capital
el número de milicianos creció exponencialmente y para octubre de 1806
sumaba 7.255 (1.142 hombres en la artillería, 4.538 de infantería y 1.575
de caballería). Esa movilización, notable por su amplitud, había seguido
los clivajes sociales: de este modo, la antigua distinción entre cuerpos
de “forasteros” y de “vecinos españoles” aparecía reproducida y
ampliada por la formación de cuerpos por lugares de origen; a su vez, la
que ya se conocía y practicaba entre éstos y los de castas o indios, ahora
se ponía de manifiesto en la formación de de una unidad de “negros
libres” sino también de un cuerpo de “esclavos”. 87 Esa tremenda
ampliación se había operado siguiendo el modelo de milicias “urbanas”
y así lo reconocía claramente la junta de guerra celebrada el 12 de junio
de 1807: “las tropas levantadas para la defensa de esta capital después
de su reconquista no son milicias regladas, sino cuerpos voluntarios
formados por la necesidad.”88 La dualidad del régimen miliciano que
expresaba la vigencia de tradiciones diferentes mostraba ahora toda su
vigencia.
BEVERINA, Juan, El virreinato…, pp. 395-397.
AZARA, Félix de, “Informe sobre la petición de las tropas hecha por el Virrey de Buenos
Aires para contrarrestar a los portugueses”, en Memorias… , pp. 104-109.
87
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 340.
88
BEVERINA, Juan, El virreinato…,p. 332.
85
86
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Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
De esta forma, la intensa movilización estaba dando renovada
vitalidad al modelo tradicional de “milicias urbanas” que era, en
definitiva, mucho más afín al previamente existente a la reforma militar
borbónica que al régimen de milicias disciplinadas que se había intentado
instaurar. Más aún, esta renovada centralidad de las milicias urbanas
iba a afectar seriamente a la ya débil formación de las milicias
disciplinadas: para decirlo con las palabras del subinspector general
Pedro Arze en esos cuerpos se habían alistado
“individuos de las milicias regladas de Infantería y Caballería de ella,
quedando por este motivo deshechos los dos regimientos que con
aprobación de Su Majestad se establecieron aquí”.89
En la capital al menos, la masiva movilización se había convertido
en un serio golpe a los esfuerzos reformistas de las milicias. Pero, también
había cambios, al menos en los sistemas de entrenamiento: así lo anotaba
al menos un anónimo soldado en su diario:
“Se a dado a saber a todos los nuevos cuerpos el modo de aser el ejercicio
a la francesa moderna que todos los abitantes de Bs. As. estan aprendiendo
el manejo del fusil, asta los colegiales y escuelas estan aprendiendolo.”90
A su vez, aunque se enfatizaba la condición de voluntarios de los
milicianos, lo cierto es que no faltaron medidas para su alistamiento
forzoso: de este modo, el 20 de noviembre de 1806 se ordenó la inmediata
presentación de todos los individuos entre 16 y 50 años que no estuvieran
alistados.91 Y, poco después, la orden volvió a repetirse incluyendo a los
esclavos que no fueran imprescindibles.92 Más aún en febrero de 1807 la
edad mínima de alistamiento fue rebajada a 14 años.93
El sostenimiento de esa enorme fuerza miliciana no sólo iba a
consumir buena parte de los fondos de la Caja de Buenos Aires sino que
habilitó la formación de relaciones clientelares. Algunos cuerpos, como
los Húsares de Pueyrredón, fueron formados, uniformados y mantenidos
por sus jefes y lo mismo sucedió con el batallón de Cántabros Montañeses
según anotaba su jefe en su correspondiente razón de méritos.94
BEVERINA, Juan, El virreinato…, p. 340
Diario de un Soldado, Buenos Aires, AGN, 1960, p. 51.
91
AGN, IX, 8-10-8 f. 286-287.
92
AGN, IX, 8-10-8 f. 293-294.
93
AGN, IX, 8-10-8 f. 295-298.
94
GELMAN, Jorge, Un funcionario en busca del Estado. Pedro Andrés García y la cuestión agraria
bonaerense, 1810-1822, Bernal, UNQ, 1997, pp. 49-52.
89
90
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Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
Es dudoso que los intentos del virrey Cisneros en 1809 de
reconvertir estos cuerpos urbanos en disciplinados llegaran a tener éxito,
tanto por el contexto político como por la dramática escasez de oficialidad
veterana. Según se informaba
“los principales son de edad tan avanzada que ya no pueden hacer
servicio por tales desiertos y de las demás clases inferiores hay muchos
inútiles.” 95
De esta manera, hacia 1810 José M. Salazar – el comandante del
apostadero naval de Montevideo – no tenía dudas:
“todos los males de estas provincias de seis años a esta parte dimanaban
de la falta de fuerza militar veterana”.96
Este diagnóstico expresaba con claridad el acelerado debilitamiento
de las fuerzas veteranas virreinales antes de la revolución, aún en la ciudad
que había sido su principal emplazamiento. Allí para 1806 no eran más de
1.000 efectivos y en 1809 fue el virrey Cisneros quien dispuso el traslado a
la península de los “excedentarios” de la Marina hallando no poca
resistencia entre los marinos. Era, además, una clara impugnación de una
de las principales orientaciones de la reforma borbónica – como era la
expansión del sistema de milicias – y, sobre todo, de las decisión de reducir
primero y anular después los contingentes de refuerzo. Expresa, también,
sus consecuencias políticas: con un ejército veterano debilitado, la
ampliación del sistema de milicias quedaba sin capacidad efectiva de
controlarlo y subordinarlo y podía autonomizarse. Lo que la experiencia
rioplatense estaba confirmando era que la eficacia de la reforma miliciana
dependía de la solidez de las fuerzas veteranas, una relación que a su vez
expresaba la que había entre poderes locales y superiores. En ambas
dimensiones la reforma expresaba los límites que había alcanzado.
Epílogo
Estas consideraciones permitieron precisar algunas de las
tradiciones militares del Río de la Plata a partir de las cuales se desarrolló
AZARA, Félix de, “Informe sobre la petición de las tropas hecha por el Virrey de Buenos
Aires para contrarrestar a los portugueses”, en Memorias… , p. 109.
96
José M. Salazar a Gabriel de Ciscar, Montevideo, 16 de julio de 1810, en Mayo Documental,
Tomo XII, Buenos Aires, Facultad de Filosofía y Letras, 1964, pp. 187-188.
95
114
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
la militarización revolucionaria. La intensa presencia de fuerzas
veteranas marcó la vida urbana, sobre todo la de Montevideo pero
durante mucho años también a Buenos Aires. Sin embargo, también
permitió la forja de un tipo peculiar de caballería veterana (los
Blandengues), reclutada y desplegada en el medio rural. A su vez, aunque
el “arreglo” de las milicias fue limitado, diversificó las tradiciones
milicianas. Se trataba de un conjunto abigarrado que incluía la que
suministraban las prácticas tradicionales y que de alguna manera
pervivía en las milicias “urbanas” y en las “compañías sueltas”; la
tradición de las milicias indígenas, sobre todo guaraníes; la nueva
tradición que se gestó en torno a las milicias “regladas”; la existencia de
una arraigada tradición de cuerpos milicianos de pardos y morenos; y,
de algún modo también la tradición miliciana que perduró entre los
Blandengues.
El Virreinato del Río de la Plata llegaba a la crisis imperial de 1810
con fuerzas veteranas decrecidas, debilitadas y concentradas en escasos
puntos. De todas ellas, la que aparecía como más consolidada y consistente
–a pesar de todas las dificultades que afrontaba – era la menos veterana y
la menos imperial de todas: los cuerpos de Blandengues. Por su parte, las
milicias estaban en un momento de máxima expansión y portaban una
heterogénea y diversa tradición. Los intentos de perfeccionarlas,
uniformarlas y subordinarlas a través de su transformación en “milicias
disciplinadas” habían quedado cuanto mucho a mitad de camino y
ponían de manifiesto una extrema diversidad regional. Aún dentro del
espacio de la Intendencia de Buenos Aires esa diversidad era notable y
no puede ser soslayada. Por eso, no conviene extrapolar la situación –
mucho mejor conocida, por cierto- de la capital virreinal al conjunto de
la Intendencia y, menos todavía, al conjunto del Virreinato.
El análisis efectuado permite situar con mayor precisión las
características y la naturaleza de las fuerzas que confrontaron durante
las guerras de la revolución. Y, aunque el tema merece un tratamiento
pormenorizado que no podemos ensayar aquí, conviene anotar algunos
de sus rasgos para dar cuenta del imperio de las tradiciones coloniales y
de las posibilidades que ofrecían.
La resistencia montevideana a la revolución no sólo se sustentó
hasta la llegada de contingentes de refuerzo en las reducidas fuerzas
veteranas que le quedaban sino también en las milicias de la ciudad y
115
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
aún en parte de las rurales y en una porción de los Blandengues. De este
modo, la resistencia “realista” que se hizo fuerte en la ciudad expresaba
una coalición social mucho más amplia que aquella que podían ofrecer
los europeos. Bien en claro lo ponía un bando del gobernador Vigodet
de julio de 1812 cuando establecía que “Todos los habitantes y vecinos
de sin distinción serán desde hoy soldados” y por ello debían “elegir”
para prestar servicio alguno de siguientes cuerpos: el Fijo de Buenos
Aires, el de Dragones, los Blandengues, los voluntarios de Madrid y
Sevilla, las milicias provinciales de infantería, del comercio, de catalanes
o de los “emigrados”.97
La elite de esta ciudad encontró en el fidelismo y en la estrecha
alianza con las autoridades militares un camino para canalizar sus
aspiraciones autonomistas frente a la capital. Pareciera ser que
Montevideo ratifica una situación más general advertida por J. Marchena:
“Dada la estructura del mando y dada también la composición de la
oficialidad de las mismas y su estrecha vinculación con las elites locales,
el comportamiento de las guarniciones en cuanto a una opción política,
estuvo determinado por la postura que adoptara el patriciado local”.98
¿Qué puede decirnos la historia comparada de Montevideo y
Buenos Aires al respecto? Existe consenso entre los historiadores en
señalar que a diferencia de la aristocracia limeña la elite de Buenos Aires
habría tenido escaso interés por acceder a estos cargos: aquí los militares
ocupaban un segundo rango en la elite social, se hallaban en una situación
de “aislamiento relativo” y ponían en evidencia fuertes tendencias
endogámicas de modo que fueron sobre todo los descendientes de los
oficiales quienes optaron por seguir la carrera militar conformando una
“estructura de comando cerrada”.99 Sin embargo, estas consideraciones
parecieran ser más válidas para los últimos años coloniales que para los
anteriores pues hasta la década de 1780 tanto los jefes veteranos como
los milicianos habían sido parte sustancial de las tramas de poder local.
Esta situación, cambió en las últimas dos décadas de dominio colonial
Gaceta de Buenos Aires, 31 de julio de 1812.
MARCHENA FERNÁNDEZ, Juan, “La expresión de la guerra… p. 109.
99
CAMPBELL, León, “Cambios en la estructura…, p. 245. KUETHE, Allan, “Las milicias
disciplinadas…, pp. 101-126. HALPERÍN DONGHI, Tulio: “Militarización…”, pp. 124126. JOHNSON, Lyman, “Los efectos de los gastos militares en Buenos Aires colonial”, en
HISLA, N° IX, 1987, pp. 41-57.
97
98
116
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
pero volvió a cambiar decididamente a partir de 1806 a través del nuevo
equilibrio de poder que generaron las jefaturas de los cuerpos milicianos.
Lo que es seguro es que estas apreciaciones no parecen válidas
para todo el espacio. Si no lo son para Montevideo – donde las relaciones
entre la elite urbana y las jefaturas militares y navales eran
extremadamente estrechas – menos aún, parecen serlo para las campañas
donde la presencia de tropas veteranas era no sólo reducida sino muchas
veces inexistente. En ellas, aunque los hacendados tenían serias
dificultades para controlar a la población rural, por ello mismo vieron
en las jefaturas de milicias o de Blandengues instancias adecuadas para
consolidar su autoridad aunque este no fuera suficiente para asegurarles
un lugar frente a la elite urbana.100 De este modo, la distribución de las
fuerzas dibujó una geografía que habría de tener una notable incidencia
en las guerras de la revolución.
La tradición militar colonial incluía otro aspecto decisivo para
ambas ciudades: la importancia del gasto fiscal destinado a estos fines.
Era, como vimos, una dimensión muy antigua de esta tradición pero
había adquirido una enorme significación con la instauración del
Virreinato. Como es sabido, fue factible a través de la transferencia de
recursos desde las tesorerías altoperuanas a la Caja de Buenos Aires. En
este sentido, la tradición militar había sido – y lo seguiría siendo en el
siglo XIX- parte esencial del patrón de acumulación de la elite
mercantil.101 De esta forma, entre 1776 y 1805 el aumento del gasto se
explica, sobre todo, por los esfuerzos para mejorar las fortificaciones y
la infraestructura naval pero a partir de 1806 casi completamente por
los gastos destinados a sueldos militares que crecieron hasta hacerse
insostenibles. Sin embargo, el sostenido incremento del gasto no resolvió
las dificultades para reclutar la oficialidad y la tropa ni aseguró su
vestuario, remuneración a tiempo y aprovisionamiento adecuado. En
tales circunstancias, la masiva militarización miliciana posterior a 1806
MAYO, Carlos, “Landled but not Poweful: The Colonial Estancieros of Buenos Aires (17501810)” en Hispanic American Historical Review, Vol. 71, N° 4, 1991, pp. 761- 779. FRADKIN,
Raúl O., “El gremio de hacendados en Buenos Aires durante la segunda mitad del siglo
XVIII”, en Cuadernos de Historia Regional, N° 8, 1987, pp. 72-96.
101
Un meticuloso tratamiento de un ejemplo paradigmático en GELMAN, Jorge, De mercachifle
a gran comerciante. Los caminos del ascenso en el Río de la Plata colonial, Huelva, Universidad
Internacional de Andalucía/ Universidad de Buenos Aires, 1996.
100
117
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
provocó un aumento sustancial de las remuneraciones que empujó hacia
arriba el nivel general de salarios. No extraña, por tanto, que las disputas
políticas entre 1806 y 1810 tuvieran como uno de los ejes claves la
desmovilización de las milicias y sus niveles de su remuneración.
Pero, ¿qué sucedía fuera de estas ciudades? La experiencia
borbónica también legaba otro componente a esa tradición. La Ordenanza
de 1782 instituyó Intendentes “de Ejército y Provincia”, una
denominación que expresaba con claridad la concepción acerca del tipo
de gobierno – a la vez “político y militar”- que inspiraba la decisión. Por
cierto, no era completamente nueva y resumía una larga experiencia
histórica pero ahora se acentuaba y se generalizaba al punto que se
intentó construir un gobierno de este tipo en esas áreas de nuevo
poblamiento que tuvieron decisiva intervención en la movilización
política de la era revolucionaria. En este sentido conviene recordar que
Félix de Azara, quién había formulado precisas recomendaciones para
reorientar la política de fronteras que incluían la formación de pueblos,
el reclutamiento de los Blandengues entre hombres casados y la
asignación de tierras en propiedad, también sostenía que
“como todo pueblo es un seminario de enredo, es preciso que a los diez
años primeros no haya casa capitular, alcaldes y cabildos, ni más jefe
que el militar y que éste lo sea en todo.”102
El consejo expresaba no sólo una modificación sustantiva en la
estrategia de poblamiento estratégico implementada que se había
impulsado desde la década de 1780 y que había dado lugar a la formación
de una miríada de nuevos poblados, muchos de ellos convertidos en
villas, dotados de cabildos y autorizados a organizar sus propias milicias.
Se expresaba así toda una concepción del gobierno territorial que habría
de perdurar notoriamente acentuada con la revolución.
Esos comandantes se fueron transformando en los personajes
centrales de las áreas fronterizas y, como advertía Pedro A. García hacia
1810 para la Guardia de Luján, todos los avances que se habían obtenido
se debía completamente a la “eficacia de uno u otro comandante”: ellos
102
AZARA, Félix de, “Diario de un reconocimiento de las Guardias y Fortines que guarnecen
la línea de frontera de Buenos Aires para ensancharla”, 1797, en DE ANGELIS, Pedro,
Colección de Obras y Documentos relativos a la historia antigua y moderna de las Provincias del
Río de la Plata, Buenos Aires, Plus Ultra, 1972, Tomo VIII, Vol. A, p. p. 159.
118
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
habían sido quienes atrajeron soldados y población a su entorno lo que
les permitía contar con 100 milicianos auxiliares “sin violencia ni
gravamen”. El arquetipo, para García, era un “comandante tan político
y militar” como Francisco Balcarce, el primer integrante de un amplio
linaje militar bonaerense: auxiliaba de su peculio a los nuevos pobladores,
los mantenía “distante de las parcialidades, confusión e ignorancia de
un alcalde pedáneo, manejado tal vez por un charlatán que sólo se
distingue de los otros en saber formar muy mal cuatro renglones”.103 En
otros términos, Azara y García disponían de un diagnóstico bastante
coincidente. Sin embargo, once años después el mismo García ofrecía
uno bien diferente y mucho más desencatado: denunciaba, entre otros
males que padecía la población rural, “unas tenebrosas habitudes de
despotismo militar han aniquilado el ánimo del vecindario de campaña”.
De este modo, la comisión que había inspeccionado la línea de fronteras
“tuvo la desgracia de no encontrar en toda la línea mas que uno solo que
llenase las intenciones del gobierno. Todos los demás eran ciertamente
criminales, pero a ninguno se removió. Esta degradación de aquellos
militares, propiamente de revolución, no puede mancillar el honor del
cuerpo en general.” 104
Estamos, así, ante una de las dimensiones más opaca y menos
conocida de la concepción de “gobierno político y militar” que había
expandido la reforma borbónica y que la revolución no solo hizo suya
sino que llevó a su último término: el impacto de la reforma militar en
los poblados rurales. Inspirados por esa concepción las autoridades
tardocoloniales habían logrado instaurar en un lugar central de la vida
social de las áreas de frontera a los comandantes militares. Y, a través de
ellos, habían logrado extender enormemente el servicio de milicias. En
este sentido, el ejemplo del sur entrerriano resulta emblemático: a fines
de la década de 1790 allí estaban alistados un 30% de los varones adultos;
la inmensa mayoría de estos milicianos residían fuera de los poblados y
buena parte eran indígenas provenientes de las misiones; para atraerlos
al servicio, las autoridades debieron recurrir a pagar el prest en pesos de
plata y al uso generalizado del fuero militar.105 Ese derecho a cobrar en
GELMAN, Jorge, Un funcionario en busca del Estado. Pedro Andrés García y la cuestión agraria
bonaerense, 1810-1822, Bernal, UNQ, 1997, p. 100.
104
GELMAN, Jorge, Un funcionario…, pp. 174-175.
105
DJENDEREDJIAN, Julio C., Economía…, Capítulo 8.
103
119
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
moneda no era una conquista menor de los milicianos entrerrianos y
expresa bien su capacidad de negociación puesto que el entramado de
proveedores que abastecía a las fuerzas movilizadas había convertido
sus actividades en un peculiar equivalente del reparto forzado de
mercancías.106 La autoridad de los capitanes de milicia y del comandante
militar en esta zona se había transformado en decisiva pero aquí la
dotación de fuerzas veteranas era nula y la de Blandengues
extremadamente escasa: de este modo, el ejemplo entrerriano sugiere
que incluso allí donde se avanzó en la reforma miliciana, el resultado
fue parcial, seguramente no devino en la subordinación miliciana pero
forjó una arraigada tradición de movilización miliciana para la defensa
local y una instancia primordial para la constitución de liderazgos locales.
Estos liderazgos iban a mostrarse influyentes en el comienzo de la
revolución. El cuadro de situación lo pintaba con claridad Juan Michelena
en una a Salazar, comandante del apostadero de Montevideo, enviada
desde Colonia del 23 de abril de 1811:
“Esto esta muy próximo a la completa ruina. ¿Qué domina el legítimo
Gobierno? Montevideo y la Colonia, ¿y estos puntos a qué están
reducidos? al pequeño distrito de sus murallas. Tu mismo padeces
equivocación pues me dices en tu apreciable que en la campaña se ha de
hacer mas con la intriga, que con las armas: te engañas de medio a medio:
la campaña la sujetarán las bayonetas, bien de tropas portuguesas que
pidamos, o de las que de España vengan, y después de destruidos los
insurgentes, que componen todos los hombres habitantes de ella”.107
No podemos aquí tratar en detalle el cuadro de situación y las
razones que lo explican. Sin embargo, no puede dejar de advertirse que
la geografía política que esta carta describe reproduce – fiel y
puntillosamente – la geografía de la distribución de las fuerzas militares
en la colonia y su distinta naturaleza: Montevideo y Colonia, sedes
principales de las reducidas fuerzas veteranas se mantuvieron fieles a la
Regencia y lograron sumar las milicias de ambos emplazamientos y una
porción de las rurales.
Fuera de ellos, la insurgencia ganó rápidamente la partida. Esa
campaña era el territorio de los Blandengues y de ellos la insurgencia
GELMAN, Jorge, “Un ‘repartimiento de mercancías’ en 1788: los sueldos ‘monetarios’ de
las milicias de Corrientes”, en Cuadernos de Historia Regional, N° 3, 1985, pp. 3-17.
107
Gaceta de Buenos Aires, 23 de mayo de 1811
106
120
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
oriental extrajo sus principales oficiales de comando y el núcleo de su
fuerza armada. Pero en ella concitó la adhesión de las milicias rurales,
sobre todo, de esas “compañías sueltas” que venían a ser la forma que
adoptaban las milicias urbanas en la campaña y que sino fueron al menos
suministraron el formato organizativo a la insurgencia oriental. A partir
de ambas fuerzas el artiguismo conformó las “Divisiones Orientales”,
su intento de transformar las milicias en un ejército mientras recurría, y
cada vez con mayor intensidad, al apoyo de las milicias auxiliares
indígenas.
En Buenos Aires, en cambio, la revolución se nutrió principalmente
de las milicias que emergieron de las invasiones inglesas y que eran
cuerpos de naturaleza híbrida construidos sobre el modelo de las milicias
urbanas pero de servicio permanente, remuneración continua, goce del
fuero y sin subordinación alguna las escasísimas fuerzas veteranas. A
partir de ellas, la revolución intentó forjar ejércitos veteranos y para ello
apeló inicialmente al modelo borbónico. En tales condiciones, los ejércitos
que comandaba la revolución porteña estuvieron compuestos
principalmente por fuerzas de infantería y mucho costó dotarlos de una
caballería que no fuera miliciana. La insurgencia oriental, en cambio,
conformó una fuerza armada en la cual la caballería era absolutamente
predominante.
La transformación de las milicias en cuerpos veteranos fue uno de
sus principales desafíos de la revolución pero no fue el único. La
dirigencia revolucionaria también se embarcó en una masiva ampliación
de las milicias e intentó, con mayor intensidad aún que las autoridades
borbónicas, convertirlas en milicias disciplinadas. No casualmente la
revolución hizo suya el reglamento de 1801 para reglar a sus milicias
pero tampoco pudo evitar tener que lidiar con la heterogeneidad de
tradiciones milicianas. Es importante registrarla para evitar demasiado
simples y formalistas. Aunque la concepción que regía la formación de
milicias asociaba las condiciones de vecino y miliciano – y cada vez lo
haría con la de ciudadano y miliciano- ello no había impedido que
abarcaba también a las castas urbanas, a los pobladores de la campaña,
a los indios. Por lo tanto, las milicias eran uno de los cauces que se abrían
para ampliar y disputar los derechos inherentes a la vecindad y, a través
suyo, los de la ciudadanía. Pero, la impronta colonial no habría de
desaparecer y durante mucho tiempo la costumbre y la práctica de formar
121
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
cuerpos milicianos separados se mantuvo, como también lo hicieron
dentro de las fuerzas veteranas.
La militarización revolucionaria debió operarse a partir de estas
heterogéneas tradiciones. Por lo tanto, no puede ser considerada
simplemente como la transformación de los cuerpos milicianos en
ejércitos de veteranos. Y, sobre todo, no puede considerarse ni entenderse
de este modo porque al mismo tiempo que intentaba esta transformación
(que suponía en buena medida forjar un ejército veterano siguiendo el
modelo borbónico), la revolución empujó la transformación de las
milicias en “disciplinadas” pero no pudo evitar recurrir a la
multiplicación de las antiguas milicias “urbanas”… aunque ahora se
llamaran “cívicas”. Se trata de una cuestión central pues el revitalizado
sistema de “milicia urbana” adoptaba ahora nuevos ropajes y
denominaciones. De esta manera, para 1815 Buenos Aires no sólo contaba
con milicias disciplinadas sino también con una “Brigada Cívica”
organizada en tercios y bajo autoridad directa del Cabildo. A su vez, en
su campaña a los Regimientos de Caballería que contaban con planas
mayores veteranas – generalmente reclutada entre los Blandengues – se
sumaba un número indeterminado de “compañías sueltas también de
milicias” en casi todos los pueblos. Por lo tanto, mientras muchos
milicianos eran convertidos en veteranos se multiplicaban también los
milicianos “disciplinados” pero también de los “cívicos” y los integrantes
de las “compañías sueltas”.108 La forma de milicia anterior a la reforma
borbónica resurgía transformada por las condiciones y las necesidades
del proceso revolucionario: ahora incluía una decidida expansión al
ámbito rural y adoptaba nuevas denominaciones como “milicia
patriótica”, “milicia nacional”, “brigada cívica” o “guardia nacional”.
De esta forma, el Estatuto Provisional de 1815 dedicó el Capítulo
II a las “Milicias Provinciales” y establecía que estarían regidas por el
reglamento de 1801; en cambio, el Capítulo III estaba destinado a las
“Milicias Cívicas”109 que tenían un objetivo preciso. “No deberá nunca
Pocos autores han hecho hincapié en esta cuestión. Con lucidez recientemente ha llamado
la atención sobre este aspecto central ARAMBURO, Mariano José, Buenos Aires ciudad en
armas. Las milicias porteñas entre 1801 y 1823, Tesis de Licenciatura, Facultad de Filosofía y
Letras, Universidad de Buenos Aires, 2008;
109
Se precisaba que todos los “habitantes del Estado nacido en América”, los extranjeros con
cuatro años de domicilio, los españoles europeos con carta de ciudadano y los africanos y
pardos libres serían “soldados cívicos, excepto los que se hallen incorporados en las tropas
108
122
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
la Brigada hacer servicio fuera de la Ciudad, y sus arrabales, pues de
ella toma la denominación de Cívica para defenderla.” Dos años después,
el Reglamento Provisorio aprobado por el Congreso pretendía darle
alcance “nacional”: su capítulo II estaba dirigido a aquellas milicias que
ahora eran denominadas “Nacionales” y repetía que continuaba vigente
el reglamento de 1801; el capítulo III estaba destinado a reglar “las
Milicias Cívicas”, disponía su creación “dentro del recinto” de las
ciudades, villas y pueblos y que se integraran exclusivamente con
“vecinos” que contasen con propiedades superiores a 1000 pesos, por
dueños de tienda abierta o por cualquiera que ejerciera un oficio público.
Estas “milicias cívicas” eran imaginadas como una fuerza de defensa
local, con una composición social más elevada y se disponía que sólo
tendrían goce del fuero los veteranos destinados a ellas como jefes,
sargentos o cabos.
Lo importante, entonces, es que se pretendía establecer claras
distinciones, no sólo entre veteranos y milicianos, sino también entre
diferentes tipos de milicias, fueran las “provinciales” o “nacionales”
(semejantes a las disciplinadas borbónicas) o las “urbanas” o “cívicas”
(que mostraban la vigencia de una tradición miliciana anterior a la
reforma revitalizada y atravesada por las experiencias vividas desde
1806). La consagración de esta doble estructura miliciana, entonces,
expresaba el reconocimiento de los límites que imponía la realidad así
como testimoniaba la impronta de las tradiciones coloniales. Entre unos
y otros tipos de milicias había diferencias sustanciales y dos nos parece
necesario volver a remarcar puesto que las autoridades revolucionarias
afrontaron dilemas y problemas muy semejantes a las borbónicas: por
un lado, las milicias “provinciales” o “nacionales” debían estar prestas
a prestar servicio en un espacio que excedía con creces la defensa de la
localidad; por otro lado, las primeras debían estar mucho más sujetas y
subordinadas al ejército veterano fungiendo como fuerzas auxiliares y
auténtico ejército de reserva. Más aún, la misma pretensión de
“disciplinar” las milicias en 1817 alude a la matriz borbónica de los
ejércitos revolucionarios. Prueba de ello era la vigencia tanto del
de línea y Armada.” Para este generalizado alistamiento se fijaba como edad mínima los
quince años y como máxima los sesenta.
123
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
reglamento de 1801 para regir las milicias como de las ordenanzas de
Carlos III para regir los ejércitos.110
La distinción entre diferentes tipos de milicia no era un mero tributo
a la tradición. Suponía una concepción que tenía un núcleo central y que
bien se expresaba en el Reglamento de 1817: los integrantes de las milicias
“nacionales” eran considerados “soldados del Estado” y, por tanto, sus
“comandantes natos” debían ser los gobernadores-intendentes, los
tenientes de gobernador y los subdelegados designados por el gobierno
superior; en tanto “soldados del Estado”, estos milicianos debían “acudir
a la defensa del Estado y al auxilio y reposición de los Ejércitos de línea”.
Esas “milicias nacionales”, entonces, debían fungir de ejército de reserva
y sus miembros podían pasar a las fuerzas veteranas. Muy diferente era
la situación de las “milicias cívicas” que quedaban bajo el comando de
los cabildos y que el reglamento imaginaba sólo “dentro del recinto” de
las ciudades, las villas y los pueblos. Desde este punto de vista, la “milicia
cívica” recogía la experiencia de los batallones de voluntarios de “vecinos
españoles” y de “forasteros” que habían existido desde el siglo XVII y,
por eso mismo, se imaginó que fueran integradas por vecinos arraigados
y respetables, al estilo de las llamadas “milicias honradas” de la
península.111
Se trataba, por tanto, de un complejo proceso que adaptaba
tradiciones mientras introducía innovaciones. En consecuencia, la
revolución estaba impulsando un proceso de militarización que contenía
una notable ampliación de las fuerzas veteranas, un crecimiento mayor
de la infantería frente a la caballería y un aumento sin precedentes del
sistema de milicias regladas mientras multiplicaba las milicias “cívicas”
Gobierno Superior Provisional de las Provincias Unidas del Río de la Plata, Instrucciones
de los Comisarios de Guerra de las Provincias Unidas del Río de la Plata, Buenos Aires, Imprenta
de los Niños Expósitos, 1812 y “Títulos de las Reales Ordenanzas que de orden de la
Excma Junta se entresacan de ellas” [1814], en MAILLÉ, Arturo, La Revolución de Mayo a
través de los impresos de la época, Buenos Aires, Tomo V, 1966, pp. 355-529. LOZA, Emilio,
“Organización militar, 1811-1813”, en LEVENE, Ricardo (dir.), Historia de la Nación
Argentina desde sus orígenes hasta la organización definitiva en 1862, Vol. V, Segunda sección,
Buenos Aires, ANH, 1941, pp. 513-526.
111
ESDAILE, Charles, Napoleón contra España. Guerrillas, bandoleros y el mito del pueblo en armas
(1808-1814), Buenos Aires, EDHASA, 2006; MOLINER PRADA, Antonio, La guerrilla en la
guerra de independencia, Madrid, Adalid, 2004. THONE, John, La guerrilla española y la derrota
de Napoleón, Madrid, Alianza Editorial, 1999.
110
124
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
y las “compañías sueltas” de voluntarios. El dilema de la dirigencia
revolucionaria residía en que mientras cada vez más tenía al ejército
“regular” como base social de sustentación no podía sino multiplicar
las fuerzas milicianas y depender de su colaboración. Las desalentadoras
experiencias que emergían de una fuerza estructurada mediante la leva
forzada la obligó a apelar a las milicias, pero las consecuencias de esta
decisión (la influencia política local, la necesidad de “negociar” las
condiciones del servicio a través de una compleja trama de mediaciones,
la extensión del fuero que reforzaba el papel de los jefes, su reticencia a
emprender campañas ofensivas, etc.) no tardaron en desalentarla.
Visto en conjunto, este proceso muy lejos está de expresar
simplemente un tránsito de la milicia a ejércitos “veteranos” y
“profesionales”. Esta diversidad de tradiciones, por lo tanto, no fue
anulada con la revolución al mismo tiempo que ella creaba otras nuevas.
En consecuencia, parece necesario resistir tanto las dicotomías
simplificadoras como las continuidades lineales y las tentaciones
nominalistas.
A primera vista, los ejércitos veteranos y las milicias parecen dos
polos opuestos pero sólo adquieren esa imagen cuando se los piensa
como tipos ideales y se los analiza exclusivamente a partir de las
normativas o de los discursos políticos de legitimación. Pero las prácticas
no eran simplemente la expresión de esas normas o la materialización
de esos discursos. Más que dos polos opuestos conviene pensar en un
continuo inestable y cambiante de situaciones, un conjunto de formas
híbridas sustentado en una diversidad de tradiciones que habilitaban
diferentes usos. La historia revolucionaria y posrevolucionaria lo iba de
poner claramente de manifiesto.
Apenas se repasan las trayectorias y los desafíos de los ejércitos
revolucionarios puede advertirse que el ejército borbónico ofrecía la
matriz a partir de la cual la dirigencia revolucionaria intentó forjar los
suyos. El intento parece haber sido incompleto y, a fin de cuentas
frustrado, pero signó el decurso de los antagonismos durante las guerras
de la revolución. Y, sobre todo, impregnó la visión que de ellos tenía la
oficialidad revolucionaria y la propia imagen que ella quiso forjarse de
sí misma. Esa oficialidad había surgido de la convergencia de jefes de
milicias, líderes locales, algunos oficiales de los ejércitos del Rey y
también algunos mercenarios extranjeros, lo que traía aparejado no pocas
125
Tradiciones militares coloniales. El Río de la Plata antes de la revolución / Raúl O. Fradkin
tensiones. 112 Sin embargo, la experiencia guerrera y política había
desarrollado su autoconciencia como núcleo dirigente de la nueva
sociedad. En este aspecto también la historia comparada puede
suministrar pistas y ayudar a recuperar el horizonte de los actores.
Unos pocos ejemplos permiten advertirlo. Hacia 1815, Carlos M. de
Alvear no dudaba en asimilar las formas de hacer la guerra de los
“anarquistas” con el “el estilo de los Cosacos.”113 Al año siguiente Juan J.
Viamonte calificaba a sus enemigos entrerrianos de “Tártaros
Orientales”.114 En realidad, la idea no era nueva ya la había enunciado el
gobernador de Montevideo Vigodet cuando dudada de la fidelidad de
los Blandengues reclutados entre una población rural que vivía, según
decía, “peor que tártaros”.115 De modo análogo, en 1816 era M. Belgrano
quien equiparaba a los “montoneros” con los cosacos y asemejaba sus
dilemas a los sufridos por el Rey de Prusia y Napoleón contra ellos.116
Esta visión de la confrontación en el litoral revolucionario en clave
orientalista hacía inevitable que los jefes porteños se vieran enfrentando
los desafíos de “la intemperie de los Desiertos”.117 De algún modo,
entonces, a mediados de la década de 1810 se estaban configurando algunas
de las claves interpretativas que serían parte sustancial de la lectura
romántica de la realidad rioplatense. Esta percepción del oponente definía
también la autopercepción de esta dirigencia militar que afanosamente
intentaba construir un ejército de matriz borbónica cada vez más adaptado
al modelo napoleónico. La perspectiva comparada de estas guerras no
sólo puede ser un recurso historiográfico prometedor sino que parece que
formaba parte del universo mental de sus protagonistas.
Como señalaba José M Paz a propósito de Juan R. Balcarce, miembro de un destacado
linaje militar bonaerense: “Era de aquellos pocos americanos que desde el tiempo de la
monarquía había seguido la carrera de las armas y por consiguiente tenía la pretensión de
ser considerado como un veterano”, PAZ, José M., Memorias póstumas, Buenos Aires,
Editorial Trazo, 1950, Tomo I, p. 21.
113
Carlos de Alvear, Relación de las fuerzas, Río de Janeiro, 27 de junio de 1815, Archivo
Artigas, Tomo XXX, pp.7-10.
114
Juan J. Viamonte al Director, 19 de marzo de 1816: Archivo Artigas, Tomo XXIX, pp.336338.
115
BENTARCUR, Arturo, El puerto colonial de Montevideo. Los años de la crisis (1807-1814),
Montevideo, Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, 2006, p. 88.
116
Manuel Belgrano a Ignacio Álvarez Thomas, Rosario, 5 de abril de 1816, en Epistolario
belgraniano, Buenos Aires, Taurus, 2001, p. 291.
117
Javier de Viana al Gobierno, Buenos Aires, 26 de noviembre de 1814, Archivo Artigas,
Tomo XVII, pp. 149-150.
112
126
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
La redefinición de las fronteras:
cuando “argentinizar” fue la consigna
Susana Bandieri*
A manera de presentación
“Asociar el término frontera al concepto de frontera militar o frontera
administrativa sería mantenerse al margen de los progresos en las ciencias
sociales, particularmente si se trata de estudiar una frontera tan permeable como
la propia” (S. Villalobos y J. Pinto Rodríguez, Comp., Araucanía. Temas de
historia fronteriza, Temuco, Chile, Ediciones Universidad de la Frontera,
1985: 6).
Hace ya varios años que quienes venimos estudiando la historia
patagónica en perspectiva regional, planteamos la necesidad de
reorientar los estudios del fenómeno fronterizo para trascender los
análisis tradicionales, exclusivamente centrados en las cuestiones bélicas
y en las hipótesis de conflicto derivadas de los diferendos limítrofes
entre Argentina y Chile, para avanzar en la comprensión del
funcionamiento de la sociedad, la economía y la cultura en las áreas de
frontera. De hecho, cuando se pretende realizar una aproximación que
supere la mera descripción histórica a la región más austral de América
Latina, incorporada definitivamente a la soberanía de los Estados
nacionales en la segunda mitad del siglo XIX, resulta imposible
desconocer el hecho de que la cordillera de los Andes sirvió
históricamente, y desde las primeras etapas de ocupación indígena, de
eje vertebrador de un espacio socialmente integrando, que actuó y
sobrevivió por encima de los límites políticos y administrativos
impuestos al territorio luego de su conquista militar. No es posible
estudiar entonces la historia patagónica atendiendo solamente a sus
* Unidad Ejecutora en Red ISHIR-CEHIR/CONICET, Universidad Nacional del Comahue,
Neuquén, Argentina ([email protected])
127
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
límites territoriales, sin considerar la importancia de un área de frontera
con existencia propia donde se habría conformado, a lo largo del proceso
histórico, un espacio social de singulares características, gran dinamismo
y alta complejidad.
Ya en la etapa colonial –y seguramente antes si atendemos a los
registros arqueológicos-, los pueblos originarios manejaban una vasta red
de caminos e intercambios que abarcaba ambas márgenes de la cordillera.
Avanzado el siglo XVIII, un ancho corredor interregional, por el cual
circulaban ganados y bienes diversos, atravesaba el norte de la Patagonia
entre el Río de la Plata y Chile. Los grupos cordilleranos oficiaban de
excelentes intermediarios entre los ganados de las pampas argentinas y la
demanda chilena, que requería de importantes cantidades de sal, carnes,
cueros y sebo para su propio consumo y para su exportación al centro
minero potosino y a otros asentamientos hispanos sobre el Pacífico Sur.
En esas condiciones, los campos de las áreas andinas resultaban excelentes
para el acondicionamiento de los ganados antes de someterlos al esforzado
cruce de los Andes. Aunque las situaciones de conflicto estaban siempre
presente y violentos enfrentamientos se sucedían con regularidad, las
relaciones entre las sociedades indígenas e hispano criollas se
incrementaron a lo largo de todo el siglo XVIII, alcanzando niveles muy
importantes de intercambio económico, social y cultural.
Ya en el siglo XIX, los procesos independentistas de ambos países
derivaron en mayores presiones territoriales y nuevos posicionamientos
de los sujetos fronterizos en aras de mantener la dominación de los
espacios cordilleranos hasta que, en la segunda mitad del siglo y
mediante sendas campañas militares, se terminó por incorporar
definitivamente el espacio indígena a la soberanía de los respectivos
Estados nacionales, Argentina y Chile, resolviendo el secular conflicto a
favor de los sectores dominantes.
El efecto inmediato de la conquista militar fue el establecimiento
de los límites administrativos de los nuevos territorios incorporados a
la soberanía estatal y el fortalecimiento de la idea de que la cordillera de
los Andes, en tanto límite político, constituía una barrera aislacionista.
En este sentido, se afirmaba su condición de “espalda” de un país cuya
orientación se pensaba exclusivamente hacia el Atlántico, desconociendo
los contactos que desde antiguo caracterizaron el funcionamiento de las
áreas andinas.
128
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Esta visión formó parte incluso de la historia nacional construida
en esos años al servicio del proceso de consolidación del Estado-nación
argentino y perduró hasta la actualidad en variada bibliografía, tanto
histórica como geográfica.1 Las investigaciones más recientes permiten
sin embargo demostrar que la débil presencia estatal en la región derivó
en una marcada continuidad de tales relaciones hasta avanzado el siglo
XX. Luego, posteriores etapas de consolidación de las respectivas
situaciones nacionales, tanto en Chile como en la Argentina, llevaron a
la aplicación de barreras económicas y políticas que, unidas a la carencia
de una infraestructura moderna y adecuada en comunicaciones, cortaron
de manera prácticamente definitiva el tradicional intercambio económico
y sociocultural entre ambos países, en un proceso gradual iniciado en la
década de 1920, profundizado en los años 30 y concluido a fines de la
segunda guerra mundial. De hecho, puede decirse que recién al tomar
forma concreta el régimen de industrialización sustitutivo de
importaciones que reemplazó al modelo agroexportador después de la
crisis de 1930, y definirse otras estrategias territoriales de corte
nacionalista que derivaron en la preocupación por “argentinizar” la
Patagonia, se tornó particularmente importante la consolidación de un
mercado interno, y por ende, la afirmación de las fronteras en tanto límites
nacionales. Más adelante, períodos de fuertes disputas ideológicas y
políticas, y las siempre latentes hipótesis de conflictos armados, actuaron
como obstáculos que limitaron las posibilidades reales de una integración
económica y social entre ambos países, acentuando el rol de los límites
territoriales en detrimento de la frontera como espacio de interacción.
La periferia andina
Tal y como venimos diciendo, sucesivos avances en la
investigación histórica regional nos han llevado a sostener que el área
andina patagónica tuvo una posición periférica y marginal respecto
del modelo de inserción del país en el sistema internacional vigente,
con fuerte orientación atlántica, lo cual habría derivado en la
supervivencia de los contactos socioeconómicos con las ciudades y
1
Romero, Luis Alberto, coord., La Argentina en la escuela. La idea de nación en los textos escolares,
Buenos Aires, Siglo XXI, 2004.
129
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
puertos del sur chileno.2 Por ese mismo motivo, mientras el ganado
ovino era desplazado de la llanura pampeana a los territorios
patagónicos con litoral atlántico, como consecuencia del auge cerealero
y de la importancia de la carne refinada con destino al frigorífico, las
áreas andinas siguieron produciendo ganados destinados a satisfacer
la demanda de los centros y puertos del Pacífico, en tanto mantenían
una muy débil inserción con el conjunto nacional. Un espacio común
de inversiones de capital, explotaciones ganaderas, flujos de población
y variados vínculos socioeconómicos y culturales caracterizaron
entonces a esta región fronteriza, aprovechando la permeabilidad de
los Andes en algunos sectores de la Patagonia –particularmente los
ubicados en la actual provincia de Neuquén-, donde los pasos son
relativamente bajos y facilitan el cruce de un lado a otro de la cordillera.
Más al sur, en la zona que los historiadores regionales han llamado
la “región autárquica de Magallanes”, se dio una situación similar.3 Allí
también resulta evidente la expansión de los capitales y de los flujos de
inmigración procedentes de Chile, principalmente de Punta Arenas y
de la isla de Chiloé, hacia la zona de Santa Cruz y Tierra del Fuego,
conformando una misma región que, al menos hasta la década de 1920,
funcionó con una dinámica propia y relativamente desvinculada de los
centros políticos de los respectivos Estados nacionales: Buenos Aires y
Santiago. A la luz de estos estudios, y al menos hasta esos años, la
significativa dependencia económica de los territorios más australes de
Argentina con el área de Magallanes y su capital Punta Arenas parece
indiscutible, al menos en lo que se refiere a la provisión de lanas y carnes
ovinas con destino a los mercados europeos. La posibilidad de
comunicación directa con esos mercados a través del estrecho de
Magallanes, facilitada por la inexistencia de impuestos aduaneros y la
débil presencia de ambos Estados en la región, favorecieron tal proceso
de integración.
Es variada y numerosa la producción de la autora en estos temas. A modo de síntesis,
puede consultarse de S. Bandieri, Historia de la Patagonia, Buenos Aires, Sudamericana,
2005.
3
Véase Elsa Barbería, Los dueños de la tierra en la Patagonia Austral, 1880-1920, Santa Cruz,
Universidad Federal de la Patagonia Austral –UFPA-, 1995, y Mateo Martinic B., “Patagonia
austral: 1885-1925 Un caso singular y temprano de integración regional autárquica”, en S.
Bandieri, Coord., Cruzando la cordillera… La frontera argentino-chilena como espacio social,
Neuquén, CEHIR-UNCo., 2001.
2
130
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Se puede afirmar entonces que, en el mismo momento en que las
principales regiones ganaderas argentinas destinaban sus esfuerzos a
mejorar las razas carniceras con destino al frigorífico y a la exportación
al mercado europeo del Atlántico, la ganadería patagónica se orientaba
con doble dirección. Mientras en el sur, lanas y carnes ovinas se derivaban
hacia los frigoríficos magallánicos y el puerto de Punta Arenas, en las
áreas andinas del centro y norte patagónico se comercializaban vacunos
en pie para satisfacer la demanda de los centros del Pacífico. Cabe
destacar la manifiesta preocupación de los funcionarios de esa etapa
por cortar, sin éxito, las prácticas sociales vigentes entre las poblaciones
del interior rural, como aquella generalizada de casarse y anotar el
nacimiento de los hijos en Chile, por ejemplo. Esto no era otra cosa que
una expresión más de la integración que, de hecho, existía alrededor del
área cordillerana, así como de la persistencia de una forma de
organización social y territorial vigente desde muy antiguo. Asimismo,
en muchas áreas andinas patagónicas la provisión de bienes de consumo
desde allende los Andes era una constante hasta avanzadas las dos
primeras décadas del siglo XX, así como también lo fue el uso de la
moneda de ese origen como el medio circulante mas generalizado.4
No hubo durante esa etapa, como podrá verse a continuación,
avances significativos en el proceso de penetración estatal en la región,
más allá de la acción represiva de los ejércitos sobre los grupos indígenas,
de la fuerte centralización administrativa ejercida en el marco del
gobierno de los territorios nacionales5 y de los evidentes esfuerzos de la
justicia federal por disciplinar a la sociedad local, pero las necesidades
básicas de los habitantes de la Patagonia quedaron desatendidas por
largos años permitiendo, de hecho, la continuidad de las prácticas antes
descriptas.
S. Bandieri, “La Patagonia: Mitos y realidades de un espacio social heterogéneo”, en Jorge
Gelman, comp., La Historia Económica Argentina en la encrucijada: Balances y perspectivas,
Buenos Aires, Asociación Argentina de Historia Económica-Prometeo Libros, 2006.
5
Los Territorios Nacionales fueron entidades creadas específicamente para la administración
de las superficies ganadas al indio en la década de 1880 (Chaco y Patagonia). Sin alcanzar
el status jurídico de las antiguas provincias argentinas, las autoridades de los territorios se
elegían desde el poder central, lugar desde donde se administraban también las rentas. Sus
habitantes no pudieron elegir sus gobernadores, como tampoco participar en las elecciones
de las máximas autoridades del país hasta mediados de la década de 1950.
4
131
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
La penetración material
“…la conquista del desierto por las armas, que Usted ha realizado [refiriéndose
a Julio Argentino Roca y su campaña militar contra los indios], no está
completa, falta agregarle la conquista por el riel, para ‘argentinizar’ la Patagonia”
(Ezequiel Ramos Mexía, Mis Memorias 1853-1935, Buenos Aires, Librería
y Editorial La Facultad. 1936:205)
En textos ya clásicos sobre la formación del Estado nacional
argentino6 se definen cuatro formas distintivas de penetración estatal
en el proceso de construcción social y ejercicio del poder político a lo
largo de la segunda mitad del siglo XIX, las que se denominan: represiva,
cooptativa, material e ideológica.7 Hemos hecho mención expresa en
otros trabajos al accionar coercitivo del Estado sobre las sociedades
indígenas y al fuerte control del poder central que implicó la
perdurabilidad de la forma jurídica de los Territorios Nacionales en lo
que hace a la posibilidad de ejercer los plenos derechos de la ciudadanía
política a sus habitantes. 8 Nos dedicaremos en este avance a la
localización de obras y servicios públicos como elemento de penetración
material de fuerte carga simbólica a la hora de pensar en la
profundización del proceso de “argentinización” de la Patagonia.
El intento más temprano en este último sentido, aunque fracasado
en su mayor parte, lo constituyó el proyecto de desarrollo patagónico
elaborado por el ministro de obras públicas del presidente Figueroa
Alcorta, Ezequiel Ramos Mexía, que se concretó en la “Ley de Fomento
de los Territorios Nacionales” nº 5.559 del año 1908. El ministro formó
parte del grupo de profesionales que, a comienzos del siglo XX, ingresó
Oscar Oszlak, La formación del Estado Argentino, Buenos Aires, Ed. de Belgrano, 1982, y
“Reflexiones sobre la formación del Estado y la construcción de la sociedad argentina”, en
Desarrollo Económico, Nº 84, Buenos Aires, IDES, 1982:531-545.
7
Estos textos de Oszlak, de matriz weberiana, son hoy discutidos por su mirada
excesivamente centrada en el rol del Estado en el proceso de construcción social. Esta mirada
“desde arriba” quita sin duda protagonismo a los sujetos sociales que parecen no tener
capacidad de reacción alguna frente al mismo proceso. Sin embargo, las formas de
penetración que el autor menciona pueden resultar un instrumento didáctico interesante a
la hora de plantear el tema propuesto.
8
Este trabajo retoma algunos temas y debe considerarse continuación del presentado en el
Primer Encuentro de la Red Internacional Marc Bloch de Estudios Comparados Europa-América
Latina, realizado en la UNCPBA, Tandil, en mayo de 2006 (Véase S. Bandieri, “La dimensión
regional como alternativa analítica para pensar otros espacios y nuevas periodizaciones”,
en S. Bandieri, G, Blanco y M. Blanco, Coord., Las escalas de la historia comparada, Tomo 2.
Empresas y empresarios. La cuestión regional, Buenos Aires, Miño y Dávila, 2008).
6
132
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
en la administración pública como una expresión más de los movimientos
reformistas que sacudían por entonces al orden liberal, aún cuando se
compartieran sus ideas de fondo. Los reclamos por una mayor
intervención estatal en el orden económico habían logrado en ese
momento un mejor posicionamiento, especialmente visible a partir del
año 1906 9 y, en ese sentido, deben interpretarse sus proyectos y
concreciones en la función pública nacional. Dentro del llamado grupo
de los “liberales reformistas” de principios del nuevo siglo, Ramos Mexía
compartió plenamente el lenguaje político en el que se expresaba el
contexto ideológico de la época, en cuanto a promover cambios y
renovaciones en el orden institucional a partir de las decisiones políticas
que se tomasen desde el propio Estado, al cual se reservaban
intervenciones diversas.10
Desde distintos lugares de la sociedad civil y del propio gobierno,
miembros de la facción reformista planteaban la necesidad de incorporar
nuevos rubros a la agenda de problemas que se debían resolver en la
Argentina de la época. Distintos proyectos innovadores intentaban
superar las limitaciones percibidas en el modelo socio-económico
vigente, reclamándose al Estado algunos cambios necesarios en el sistema
político y en las bases económicas y sociales del país. La formulación
política de la ley de fomento apoyaba una mayor intervención estatal en
aquellas zonas – como los territorios nacionales – todavía ajenas al interés
de los capitales privados. La propuesta de Ramos Mexía percibía las
deficiencias del modelo en cuanto hacía al desarrollo igualitario de las
regiones y, sobre todo, cuestionaba la política agraria de los gobiernos
conservadores. Las nuevas tierras públicas debían ser pobladas y
colonizadas y, para ello, el tendido de ferrocarriles estatales de fomento
resultaba una medida prioritaria. Pero el proyecto avanzaba incluso en
propuestas más reñidas con la ortodoxia liberal de la época, como lo
Las actitudes más decididas a favor del proteccionismo estatal que se tomaron a partir de
1906 han sido reconocidas por varios autores, entre ellos Carlos Díaz Alejandro, Ensayos
sobre la Historia económica argentina, Buenos Aires, Amorrortu, 1975:275-279. Aunque los
niveles reales de intervención estatal deben entenderse en términos de la época, resulta
importante reconocer la percepción que de ello tenían los actores, entre ellos el propio
Ramos Mexía, que se sentía formando parte de un proyecto de mayor intervencionismo
estatal (E. Ramos Mexía, Mis Memorias, op. cit., 1936:254).
10
Eduardo Zimmermann, Los liberales reformistas. La cuestión social en la Argentina 1890-1916,
Buenos Aires, Sudamericana, Editorial de San Andrés, 1995.
9
133
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
demuestra la misión Bailey Willis y sus esfuerzos por estudiar el posible
desarrollo industrial de la zona.11
La ley de fomento contemplaba un amplio plan de obras públicas
a desarrollarse en los territorios de Chaco, Formosa y la Patagonia. En el
pensamiento de Ramos Mexía, el desarrollo de estas áreas requería de
una presencia muy activa del Estado nacional mediante la construcción
de líneas férreas de fomento que sirvieran a la consolidación del mercado
interno –por cuanto los ferrocarriles privados sólo cubrían las zonas
productoras de carnes y granos que les aseguraban mayores beneficios, la realización de obras de navegación, la regulación de las crecientes y
la canalización de los ríos, atendiendo también a su aprovechamiento
energético, así como la división y venta de las tierras fiscales bajo una
efectiva política de colonización y poblamiento. El vasto plan de obras
públicas proyectado para los territorios nacionales se dividía en dos
partes: aquellas que podían hacerse con el concurso financiero de las
grandes compañías de ferrocarriles, que obtendrían a cambio un aumento
considerable de su tráfico, y las que no podían hacerse con ese apoyo
financiero por encontrarse fuera de su radio de interés.
Respecto de la Patagonia, tres líneas de penetración se pensaron
para los territorios del sur: los ferrocarriles estatales de San Antonio
Oeste a San Carlos de Bariloche, con una extensión a Valdivia, en Chile,
y los de Comodoro Rivadavia y Puerto Deseado al lago Buenos Aires y
a la zona cordillerana, para unir esta última con las rutas del este. Ello se
completaría con un trazado de trocha angosta de norte a sur que enlazaría
los fértiles valles andinos entre sí, y a estos con la costa a través de los
tendidos anteriores, asegurando una fluida comunicación con los
potenciales mercados del Atlántico y del Pacífico. De esta forma se
reconocía la tradicional articulación mercantil de las áreas andinas
patagónicas con el sur de Chile, que perduró según vimos sin mayores
variantes hasta avanzado el siglo XX.
11
El ministro contrató al Ing. Bailey Willis, reputado miembro del Departamento de
Investigaciones Geológicas del gobierno de los Estados Unidos, para la realización de una
serie de estudios en la Patagonia, que incluían la instalación de industrias con fuentes
energéticas alternativas y renovables como el agua. Con innumerables cuestiones
burocráticas se entorpeció la continuidad de la misión hasta que prácticamente concluyó
con la renuncia de Ramos Mexía (S. Bandieri, “Pensar una Patagonia con dos océanos: el
proyecto de desarrollo de Ezequiel Ramos Mexía”, en Quinto Sol, Revista de Historia
Regional, UNLP, 2009).
134
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
El proyecto fue desnaturalizado casi de inmediato cuando el
ministerio de hacienda modificó su estructura financiera. Mientras el
plan de obras públicas de Ramos Mexía se sostendría a través de la
colonización de las tierras fiscales valorizadas por los ferrocarriles, el
gobierno decidió solicitar a esos fines un empréstito. Si bien la
construcción de la mayoría de los ferrocarriles proyectados se inició, su
costo pesó sobre la deuda pública y pocas veces se llegó al destino
propuesto. El fracaso del proyecto colonizador, en opinión de Ramos
Mexía, incentivó la formación de latifundios muchas veces
improductivos, desvirtuando la idea inicial de construir ferrocarriles que
incentivaran el poblamiento de las tierras fiscales, como era el eje central
de la ley de fomento.
De los proyectos iniciales poco y nada se cumplió, por cuanto el
tendido de rieles sólo permitió articulaciones parciales sin llegar nunca
a integrar a los distintos territorios patagónicos entre sí ni a cubrir la
franja cordillerana en su conjunto.12 En el norte de la región, el tendido
de las vías férreas programadas alcanzó niveles algo más significativos.13
Luego de varios años sin avance alguno, el tendido finalmente concluyó
en el lago Nahuel Huapi en el año 1934, coincidiendo con la puesta en
marcha del proyecto nacional de explotación turística de San Carlos de
Bariloche, sin que nunca se concretara la extensión transcordillerana.
Varios años después, la población de Esquel, en el área andina
chubutense, se convertiría en punta de rieles del ferrocarril de trocha
angosta – más conocido como “la trochita” – que en Ingeniero Jacobacci
se uniría con el anterior. Fue éste pequeño tramo la única expresión del
La primera de estas líneas, cuya construcción se inició en 1909, debía unir la costa con la
cordillera entre Puerto Deseado y el lago Buenos Aires, para entroncar allí con la línea del
Nahuel Huapi. Del trazado original sólo se terminó en 1914 el tramo de 283 km entre el
puerto y la Colonia Las Heras. Del ramal a Colonia Sarmiento y Comodoro Rivadavia,
sólo se habilitó en 1912 el tramo inicial entre el puerto y esta última localidad, cubriéndose
un recorrido adicional al servicio de una estancia de la zona. Otros tendidos de penetración
del Ferrocarril Nacional Patagónico unirían mas tarde algunos puertos con áreas específicas
del interior regional. Un mapa de las líneas férreas de la Patagonia con los tramos
proyectados por la Ley de Fomento y aquellos efectivamente construidos, puede verse en
José María Sarobe, La Patagonia y sus problemas, Buenos Aires, Editorial Centro de Estudios
Unión para la Nueva Mayoría, 1999:289.
13
En 1910 se inició la construcción del ramal que debía unir el puerto de San Antonio Oeste
con San Carlos de Bariloche a través de la meseta rionegrina para llegar luego a Valdivia.
En 1917 los rieles llegaron a Ing. Jacobacci y en 1929 a Pilcaniyeu, en el territorio de Río
Negro, y allí se detuvieron hasta 1934.
12
135
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
proyectado ferrocarril norte-sur que debía unir los fértiles valles
cordilleranos.
Como parte del mismo plan, el problema del riego fue encarado
decididamente por el ministro Ramos Mexía a partir de la construcción
de un vasto sistema de canales y desagües. En 1910 se inició la
construcción de las obras del dique sobre el río Neuquén –hoy dique
Ing. Ballester- para derivar las crecientes y del canal de riego que
permitiría la puesta en producción inicial del valle inferior de ese río,
concluidas en 1916, con lo cual se iniciaría el cambio productivo que
haría de la fruticultura, años mas tarde, el cultivo por excelencia en el
alto valle del río Negro. Un rol preponderante en ello cumplió la empresa
británica del Ferrocarril Sud, que financió poco más del 50% del costo
inicial de las obras.14
Aun cuando los resultados, en este caso, fueron más efectivos, la
concepción central del proyecto en cuanto a la integración de los
territorios nacionales patagónicos, nunca se concretó. No caben dudas
de que la decisión política respecto de una mayor intervención estatal
en la Patagonia no estaba aún consolidada. Severos cuestionamientos
debió enfrentar el ministro a la hora de discutirse sus proyectos en el
Congreso. Tanto los sectores vinculados a la exportación de lana como
los importadores de tejidos, así como el sistema ferroviario privado,
asociados al viejo esquema de funcionamiento económico, se oponían a
cualquier modificación que implicara una pérdida de beneficios. Los
ferrocarriles estatales propiciados por Ramos Mexía eran sentidos como
posible competencia por los transportes ferroviarios que los capitales
ingleses monopolizaban en el norte de la Patagonia. A la hora de
sancionarse la ley de fomento, según vimos, el Congreso cambió el
proyecto inicial introduciendo importantes modificaciones. Los planes
de expansión patagónica quedaron postergados por la imposibilidad de
obtener fondos con destino a obras públicas nacionales, a la vez que se
acusaba a Ramos Mexía de abusos y derroches presupuestarios en una
interpelación parlamentaria realizada en 1912, obligándolo a renunciar.
14
S. Bandieri y G. Blanco, “Pequeña explotación, cambio productivo y capital británico en el
Alto Valle del río Negro”, revista Quinto Sol nº 2, Santa Rosa, UNLPam., 1998.
136
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
La preocupación por “argentinizar” la Patagonia
Años más tarde, la preocupación por una más efectiva presencia
estatal en la Patagonia se volvía una realidad. En la década de 1920, la
conexión con Chile era percibida todavía como una cuestión muy
importante y, ahora, peligrosa, habida cuenta de los conflictos obreros
producidos en las estancias santacruceñas en los años 1921/22, de los
cuales se culpaba, entre otros – y muy exageradamente, por cierto –, a
los trabajadores anarquistas y comunistas procedentes de Chile. La falta
de un “sentimiento de argentinidad” en los territorios patagónicos
empezó a ser sentida entonces como un verdadero problema que había
que solucionar, tema que se incrementó durante la década de 1930 con
el fortalecimiento de las posiciones nacionalistas en los ámbitos de
gobierno.
Los funcionarios públicos – gobernadores, jueces, inspectores de
tierras y de escuelas, entre otros – argumentaban insistentemente a favor
de la toma de una serie de medidas correctivas como eran la instalación
de regimientos, la fundación de escuelas elementales, la formación de
maestros del lugar, la obligación de denunciar los nacimientos en el país,
la celebración de fiestas patrias y la ampliación y mejoramiento de las
comunicaciones. Con buen criterio, no desprendían la situación vigente
de una presunta ocupación territorial ni de un avance de la soberanía
nacional de un país sobre el otro, sino de las consecuencias lógicas de
una forma de organización social del espacio que fue incluso anterior a
la fijación de límites entre las naciones y que guardaba relación directa
con la formación de economías regionales complementarias, hecho
atribuido, en muchos casos, a la lejanía de los centros de poder.
Precisamente, esa preocupación por “argentinizar” llevó a algunos
organismos a tomar medidas específicas, como fueron la creación de
sucursales del Banco de la Nación Argentina en varios centros fronterizos
de la región.
En mayo de 1934 también concluyó, como adelantamos, la línea
ferroviaria entre el puerto de San Antonio y San Carlos de Bariloche
iniciada en 1910, pero no ya como parte de un proyecto integrador de la
Patagonia como el que se planteara en la ley de fomento de 1908, sino al
servicio de un modelo de desarrollo turístico internacional manejado
por el propio Estado a través de la recientemente creada Dirección de
Parques Nacionales. Exequiel Bustillo, su primer director, cambió
137
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
definitivamente el perfil fronterizo de la localidad de San Carlos de
Bariloche, convirtiéndola en un centro turístico de nivel internacional.15
De ese modo se pensaba actuar de manera más concreta en el
fortalecimiento de la frontera y en la “argentinización” de los territorios
patagónicos.16 Los cambios en la urbanización de Bariloche, bajo el diseño
del arquitecto Alejandro Bustillo, hermano del anterior, se acompañaron
con una dotación importante de servicios (agua corriente, pavimento,
cloacas, etc.) y una amplia red de caminos dentro del área del Parque
Nacional. El Automóvil Club Argentino, el hospital regional, el Banco
de la Nación Argentina, la avenida costanera y la catedral, concluida en
1947, todos con idéntico estilo arquitectónico, propio de una aldea suiza,
fueron parte del mismo proceso de modernización, con el acuerdo de
las autoridades municipales que también se favorecieron con los cambios.
Sin duda que estas importantes obras demandaron ingentes esfuerzos
presupuestarios que la Nación estuvo dispuesta a hacer, en parte por
las conexiones personales de Bustillo con las administraciones
conservadoras de la época, pero mayormente por el interés, ahora
explicitado, de consolidar la jurisdicción argentina en las áreas fronterizas
de la Patagonia, cuestión que se profundizó con el golpe militar de junio
de 1943, que marcó el fin de la era Bustillo al cambiar el perfil elitista de
Bariloche por un turismo de carácter más popular. Pero su definitiva
orientación hacia los centros argentinos ya estaba consolidada.17
La localidad de Neuquén, por su parte, adonde se había trasladado
la capital del territorio de igual nombre a la llegada del Ferrocarril Sud,
en el año 1904, no contó con conexión terrestre con el vecino territorio
de Río Negro –con la sola excepción del puente ferroviario- hasta
avanzada la década de 1930. Hasta entonces, un precario servicio de
balsa sobre el caudaloso río Neuquén era el único medio para cruzar
hombres y bienes y comunicar la capital con el resto del país. En el año
1937 se inauguró, finalmente, el puente carretero que unió a este territorio
con el de Río Negro.
Laura Méndez, “Circuitos económicos y relaciones sociales en espacios de frontera. San
Carlos de Bariloche: de pueblo de frontera a centro turístico internacional (1880-1935)”.
Tesis Doctoral, UNCPBA, Tandil, 2005, inédita.
16
Eduardo Bessera, Políticas de Estado en la Norpatagonia Andina. Parques Nacionales,
desarrollo turístico y consolidación de la frontera. El caso de San Carlos de Bariloche (19341955), Tesis de Licenciatura, UNCo., agosto 2008, inédita.
17
Laura Méndez, Circuitos económicos y relaciones sociales…, op. cit., 2005.
15
138
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
La creación de escuelas de frontera y la generalización de rituales
escolares 18 también se intensificó en la década de 1930, cuando la
necesidad de crear una “identidad nacional” en los territorios
patagónicos fue declarada de interés prioritario por el Estado nacional.
Estas escuelas, creadas en espacios rurales fronterizos, mayoritariamente
ocupados por indígenas y pobladores de origen chileno –considerados
como “población problema”-, 19 eran entendidas, en tanto divulgadoras
del discurso patriótico nacional, como las herramientas más importantes
en la construcción de un ideal colectivo de nación.20
La construcción de infraestructura en caminos y comunicaciones
mediante el accionar de la Dirección Nacional de Vialidad, creada en
1932,21 la edificación de puentes, la conclusión de líneas férreas y la
creación de organismos nacionales con intervención directa en la región,
fue la respuesta a los “peligros” que para el nacionalismo de la época
amenazaban no sólo a la cultura, sino también, y especialmente, al
territorio nacional. En ese mismo sentido, se incrementó la explotación
de los recursos petroleros, gasíferos y carboníferos bajo el control del
Estado, como veremos a continuación, y se crearon dependencias
militares en los espacios más estratégicos a los efectos de proteger la
supuesta vulnerabilidad de la soberanía nacional que se suponía
amenazada desde diversos frentes.22
Brígida Baeza, “Las prácticas sociales de conmemoración en el Departamento Tehuelches.
Los actos cívicos en la época territoriana”, en Brígida Baeza y Daniel Marques (comp.),
Resistir en la frontera. Memoria y desafíos de la sociedad de Gobernador Costa y el Departamento
Tehuelches, Comodoro Rivadavia, Municipalidad de Gobernador Costa y Subsecretaría de
Cultura de la Provincia de Chubut, 2003.
19
María C. Meccozzi, La escuela pública en una sociedad de frontera. La creación de la Escuela n º
118 ¿Necesidad vecinal o imposición estatal?, trabajo presentado para la aprobación del
Seminario de Historia Regional, carrera de Historia UNCo., Sede San Carlos de Bariloche,
2006, inédito.
20
Destaca un documento del Consejo Nacional de Educación de 1930 “…la imprescindible
tarea de argentinizar cada vez más a la Patagonia, de inculcar constantemente la enseñanza
patriótica y nacionalista, de infundir en las escuelas y en los vecindarios el culto a nuestros
héroes y símbolos, el amor a la libertad y veneración a nuestras instituciones” (El Monitor
de Educación, Buenos Aires, 1930:132, cit. en Mecozzi, 2006:8).
21
La red de rutas y caminos terrestres construida por el Estado, unida al auge de la industria
automotriz mundial, permitió afianzar la integración del territorio nacional. La ruta 3,
que recorría la costa atlántica, y la 40, que bordeaba la cordillera sirvieron, en el caso de la
Patagonia, para fortalecer la circulación regional de bienes y personas.
22
Varios regimientos se instalaron en diversas áreas de la Patagonia, en tanto que en 1938 se
creaba Gendarmería Nacional como fuerza encargada de la vigilancia fronteriza.
18
139
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
El Estado empresario
Otra modalidad importante a la hora de marcar una presencia muy
activa del Estado nacional en la Patagonia se vincula con la explotación
de los recursos petroleros y gasíferos, especialmente importantes en la
cuenca del golfo San Jorge, con centro en Comodoro Rivadavia, en el
territorio del Chubut, y en Plaza Huincul, en el territorio de Neuquén.
En ambos casos se desplegó, sobre comienzos de la década de 1920, un
importante accionar estatal directamente vinculado a la
“argentinización” de los yacimientos y a la generación de un fuerte
vínculo identitario de los trabajadores con las empresas y, por ende, con
el Estado-nación. La cuestión se agudizó en las décadas de 1930 y 40,
acorde con los avances en este sentido que promoviera el presidente
Justo en los territorios nacionales y a los intereses similares que
sostuvieron los grupos militares que lideraron la revolución de 1943.
En esa misma dirección se dispuso, por decreto del Poder Ejecutivo
Nacional del año 1944, la creación de una zona militar en Comodoro
Rivadavia con el objeto de proteger los recursos hidrocarburíferos de la
región, entendida como área de seguridad frente a los cambios en el
contexto internacional que implicaba el desarrollo de la Segunda Guerra
Mundial, próxima a definirse. Bajo el nombre de Gobernación Militar,
la nueva división jurisdiccional perduró hasta el año 1955, favoreciendo
una importante política de inversiones por parte del Estado. Entre las
facultades de los nuevos gobernadores militares se privilegiaba un fuerte
control social con el objeto de mantener el orden y la moral pública.
Para explicar este proceso debemos ubicarnos a comienzos de la
década de 1920, cuando se produjo una caída coyuntural de los precios
internacionales del petróleo que provocó el retiro de muchas de las
empresas instaladas en el país. Pero este comportamiento de las
inversiones privadas se relaciona también con un cambio de política
iniciado por el radicalismo en el poder, que insistió ante el Congreso
para modificar la legislación hasta entonces vigente, excesivamente
permisiva, alentando la nacionalización y la explotación fiscal de los
recursos del subsuelo nacional. Ello derivó en la creación de la “Dirección
General de Yacimientos Petrolíferos Fiscales” –YPF- en el año 1922 y en
el decreto de enero de 1924 que ampliaba la reserva fiscal en los territorios
nacionales de la Pampa y Patagonia a una superficie de más de 32
millones de hectáreas. Se establecían además normas estrictas para
140
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
acceder a los cateos en las zonas no reservadas, trabando así la expansión
de las explotaciones privadas que para 1927 se había reducido
drásticamente.
Bajo la enérgica administración del Gral. Enrique Mosconi al frente
de YPF se abrió en 1922 una nueva etapa, decisiva en el desarrollo del
petróleo nacional. 23 La producción fiscal se duplicó y aumentó
considerablemente la capacidad de almacenaje y transporte estatal con
la flota petrolera argentina, a la vez que se inició la capacitación de
técnicos y geólogos nacionales, consolidándose en este período la
integración vertical de la industria petrolera en manos del Estado.
Como forma de asegurar el control y la normal provisión de
petróleo al mercado interno, se impondría desde el Estado una estructura
de carácter militar a los yacimientos, lo cual daría características
específicas al desarrollo de la actividad. Asimismo, se impuso una acción
reguladora del mercado interno por parte de la empresa estatal,
acompañada por un fuerte control de la fuerza de trabajo.
Simultáneamente, la empresa puso en marcha una serie de políticas de
bienestar y asistencia al trabajador –equiparables a las medidas
“bismarckianas” adoptadas durante el Segundo Imperio Alemán-24 para
asegurar la producción y evitar los conflictos laborales. Control y
contención social fueron entonces una parte muy importante de la gestión
empresarial del Estado en esta etapa, iniciándose además una explícita
política para homogeneizar y promover la identificación de los
trabajadores petroleros con la empresa nacional. Esto se acompañó con
el reclutamiento de mano de obra en las provincias del norte argentino
para reemplazar gradualmente a los inmigrantes extranjeros, a la vez
que se desarticulaban las organizaciones obreras independientes que
habían protagonizado algunos conflictos en la etapa anterior. Los
trabajadores del petróleo fueron instalados en campamentos especiales
donde se ejercía un fuerte control por parte de la empresa, a la vez que
Para el desarrollo de estos temas, véase Daniel Cabral Marques y Edda Crespo, “Entre el
petróleo y el carbón: Empresas estatales, trabajadores e identidades sociolaborales en la
Patagonia Austral (1907-1976)”, en Susana Bandieri, Graciela Blanco y Gladys Varela (dir.),
Hecho en Patagonia… La historia en perspectiva regional, Neuquén, Serie Publicaciones CEHIR,
EDUCO -Editorial UNCo.-, 2006.
24
Daniel A. Cabral Marques, “Las empresas estatales extractivas y la configuración de
identidades sociales ligadas al mundo del trabajo en la Patagonia Austral (1907-1955)”,
tesis de Maestría en Historia, Universidad Nacional de Mar del Plata, marzo 2008, inédita.
23
141
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
se satisfacían las necesidades básicas de las familias proveyéndoles de
proveedurías para el abastecimiento de alimentos y vestimentas,
viviendas, educación, salud y esparcimiento. La administración de YPF
intervenía de diversas maneras en el manejo administrativo de los
municipios cercanos, con una fuerte ingerencia en el caso de Comodoro
Rivadavia, como parte de un mayor control de la situación regional en
su conjunto.
Yacimientos Petrolíferos Fiscales, en calidad de agente estatal,
participaba en todo el proceso productivo como una empresa integrada
que controlaba los procesos de exploración, explotación, industrialización
y comercialización. Puede decirse que durante varios años, y pese a los
cambios políticos, el Estado siguió ejerciendo una clara direccionalidad
interventora a través de sus empresas YPF y Gas del Estado, a las cuales
se agregaría, en la década de 1940, la explotación de carbón en las Minas
de Río Turbio y la creación de Yacimientos Carboníferos Fiscales – YCF
–, produciendo efectos socioespaciales característicos a través del
asentamiento permanente de mano de obra y del arraigo de numerosos
agentes de servicios en las zonas de explotación. En todos los casos se
repetía el esquema del campamento o villa central donde se instalaban
las viviendas –divididas en sectores según fueran para el personal
jerárquico o los obreros- y todos los servicios necesarios, incluidos salud,
educación, clubes y otros espacios de sociabilidad, con lo cual se
aseguraba la estabilidad de la fuerza de trabajo y se promovía la
formación de una identidad comunitaria y de un sentido de pertenencia
que se trasmitía de generación en generación, donde los trabajadores se
sentían miembros de una “gran familia” identificada con la empresa
estatal y con la nación. Esto, a la vez que aseguraba al Estado una
organización centralizada y bien disciplinada, promovía en los obreros
una idea de pertenencia colectiva que los diferenciaba de otros
trabajadores, creando sus propias tradiciones identitarias que superaban
incluso los límites territoriales que pudiese eventualmente haber entre
los yacimientos. Especial hincapié se hacía en que todos los trabajadores
vinculados a estas empresas estuviesen convencidos de estar realizando
una tarea muy importante para el desarrollo nacional. A esos mismos
fines comenzó a festejarse todos los 13 de diciembre, a partir de 1947, la
“Fiesta Nacional del Petróleo”. Importantes dosis de endogamia –
casamientos entre miembros de las familias petroleras- se generaron por
142
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
las mismas causas, así como fueron frecuentes variadas formas
asociacionistas, muy visibles en la formación de cooperativas, clubes
sociales, cuadros de fútbol, etc.25
Conclusiones
No caben dudas de que el proyecto de una mayor intervención
estatal en la Patagonia, propuesto por la ley de fomento de los territorios
nacionales formulada por Ezequiel Ramos Mexía en la primera década
del siglo XX, no alcanzó el apoyo necesario de los grupos liberales que
por entonces controlaban el gobierno nacional, que seguramente
compartían la visión de la marginalidad periférica que estas áreas tenían
para el progreso argentino en ciernes, basado de manera casi exclusiva
en el desarrollo agropastoril de la pampa húmeda.
Otra fue la situación cuando, con el auge del pensamiento nacionalista
de las décadas de 1930 y 40, comenzó a visualizarse a la Patagonia como un
“área problema” que requería de una urgente intervención del Estado para
completar el proceso de “argentinización”, extremadamente débil todavía
en lo que hacía a la defensa de los intereses nacionales, especialmente
reflejados en la amenaza territorial que parecía implicar la eventual
expansión chilena. El territorio estatal, por la creciente influencia del
pensamiento geopolítico, se convirtió entonces en un elemento central a la
hora de fijar identidades nacionales, y los antiguos espacios fronterizos
comenzaron a ser interpretados, y por ende incorporados por la sociedad,
como verdaderos límites entre los Estados, ya sea en el sentido de una barrera
de clausura del territorio o como una zona crítica de tensión y conflictos.
Consecuentemente con esas imágenes, una serie de medidas “correctivas”
empezaron a aplicarse en el caso patagónico.
Es así que las restricciones arancelarias para cortar definitivamente
el intercambio comercial espontáneo a través de la cordillera de los Andes
impuestas por el Estado nacional entre los años 1930 y 1945; la construcción
de rutas, puentes carreteros y ferrocarriles sobre mediados de la década
25
Estas características, además de las estrictamente económicas, deben tenerse especialmente
en cuenta a la hora de comprender las manifestaciones sociales producidas en la Patagonia
a raíz de la privatización de las empresas del Estado en la década de 1990, especialmente
en el caso de YPF donde la incidencia de la empresa en la economía y sociedad regional
era mayor y generaba más valor agregado.
143
La redefinición de las fronteras: cuando “argentinizar” fue la consigna / Suzana Bandieri
de 1930; la creación de la Dirección Nacional de Parques Nacionales en
1934 bajo la gestión Bustillo, que cambió el perfil de pueblo de frontera de
San Carlos de Bariloche en centro turístico internacional; la conversión de
los habitantes de los territorios nacionales en ciudadanos plenos de la
nación en un demorado proceso que se extendió a lo largo de la década de
1930 y se concretó recién a mediados de la década de 1950; la habilitación
de sucursales del Banco de la Nación Argentina en las poblaciones
fronterizas a lo largo de las décadas de 1930 y 40, la creación generalizada
de escuelas de frontera en esos mismos años, la definición de áreas de
control militar y la significativa presencia del Estado empresario en la
explotación de los recursos petroleros, gasíferos y carburíferos, son todos
elementos que coinciden en época y marcan la necesidad de avanzar en
una nueva periodización para la definición de las fronteras como límites
en los espacios patagónicos, en directa relación con las formas de
penetración más efectivas del Estado nacional a lo largo del siglo XX que
coinciden con afirmaciones territoriales y simbólicas de una presencia que,
hasta entonces, y con pocas excepciones, era escasamente significativa.
144
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
A fronteira manejada:
apontamentos para uma história social da
fronteira meridional do Brasil (século XIX)
Mariana Flores da Cunha Thompson Flores*
Luís Augusto Farinatti**
Este artigo abriga uma reflexão sobre o tratamento historiográfico da
questão da fronteira no estudo da sociedade dos confins meridionais do
Brasil, no século XIX. Realiza-se uma análise historiográfica para, a seguir, propor um caminho ainda pouco explorado nesses estudos. Discute-se duas visões opostas: a “fronteira-barreira”, que isolaria populações;
e a zona de fronteira completamente integrada, onde a existência de limites nacionais não teriam verdadeira influência nos processos sociais e
econômicos. Indo em outro sentido, a proposta apresentada neste trabalho insiste na importância do estudo dos diversos grupos sociais das
sociedades de fronteira, pouco visíveis nos estudos realizados até agora.
Trata-se do estudo das maneiras como a situação de fronteira influenciava diferentemente atores com posições sociais diversas, como eles criavam estratégias para lidar com essa situação, como a fronteira podia assumir, assim, significados diversos e como isso mudava com o tempo.
Dessa forma, propõe-se aqui a importância do estudo sistemático da produção social da fronteira.
Introdução
A imagem do Rio Grande do Sul como uma terra de fronteira está
enraizada na historiografia. Os significados atribuídos a esse fato, porém, não gozam da mesma unanimidade. Da “fronteira-barreira”, que
separaria radicalmente os rio-grandenses de seus vizinhos platinos, passou-se à idéia de uma zona de fronteira bastante integrada. Nas versões
* Doutoranda em História pela PUCRS.
** Departamento de História da Universidade Federal de Santa Maria; doutor em História
Social pela UFRJ.
145
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
mais radicais desta última abordagem, a alteridade entre populações e
o limite político entre os Estados nascentes no século XIX foram esmaecidas até o apagamento. A zona de fronteira tendeu, então, a ser vista
como um espaço onde as populações fronteiriças desenvolveriam uma
identidade comum, mais importante até do que seus sentidos de pertencimento a um ou outro país.
Neste trabalho, buscamos debater essas idéias e propor formas
alternativas de abordar a história das populações que viveram na grande zona de fronteira que envolvia a área meridional do Rio Grande do
Sul, o norte do Uruguai e as províncias do litoral argentino, sobretudo
Corrientes. Detemo-nos principalmente ao longo do segundo e do terceiro quartéis do século XIX. Mais especificamente, analisamos aqui a
fronteira sudoeste do Rio Grande do Sul. Em sua parte “brasileira”, a
região abrangia o município de Alegrete, e os de Uruguaiana e Santana
do Livramento, que se desmembraram daquele, respectivamente, nos
anos de 1846 e 1857.1
Limites Instáveis
A expansão luso-brasileira sobre os territórios disputados com o
Império Espanhol, no oeste do atual território do Rio Grande do Sul,
acelerou-se em 1801, com a incorporação da área dos “Sete Povos das
Missões”, a noroeste. Aquela estava longe de ser uma “terra de ninguém”.2 Tribos de indígenas charruas e minuanos faziam daqueles campos a sua morada. Tinham se tornado destros no manejo do cavalo, arrebanhavam gado e estabeleciam relações que podiam passar do enfrentamento ao comércio com os assentamentos portugueses, a leste,
guaranis, ao norte/oeste e espanhóis, ao sul.3 Da mesma forma, havia
Neste período, o município de Alegrete englobava também as áreas onde se localizam hoje
os municípios de Quaraí, Rosário do Sul e Manoel Viana, os quais obtiveram suas
emancipações nos anos de 1875, 1876 e 1992. SILVEIRA, Hemetério José Velloso da. As
Missões Orientais e seus antigos domínios, 1979.
2
Sobre as atividades de arreamento e comércio de gado envolvendo animais vindos daquela
área, ao longo do século XVIII, ver: HAMEISTER, Marta Daisson. O Continente do Rio Grande
de São Pedro: os homens, suas redes de relações e suas mercadorias semoventes, 2002 e GIL, Tiago
Luís, Infiéis Transgressores: os contrabandistas da fronteira (1760-1810), 2003.
3
Sobre alianças do minuanos com o líder Rio-grandense Rafael Pinto Bandeira em fins do
século XVIII, ver: GIL, Tiago Luis. Infiéis Transgressores...,2003.
1
146
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
mais de século que os guaranis missioneiros utilizavam a região para o
estabelecimento de suas estâncias. Não se tratava simplesmente de arrear gado. Além disso, eles organizavam postos para amansar as reses e
estabelecer o processo de criação. Era o caso, por exemplo, dos missioneiros de Japejú, o mais meridional dos 30 Povos, que já desdobravam
em quatro suas estâncias na desembocadura do rio Quaraí, em 1704.4 A
conformação da sociedade que se construiu naquela zona de fronteira,
ao longo do século XIX, foi a resultante do choque e das relações mantidas por migrantes vindos de diferentes origens – tanto guaranis missioneiros quanto luso-brasileiros, hispano-platinos, charruas e minuanos.
Ao sul dos Sete Povos, passando o rio Ibicuí, localizava-se a região de boas pastagens povoada por grandes manadas de gado não domesticado, em uma área contínua que englobava o futuro território da
região da Campanha Rio-grandense e do norte da Banda Oriental. Nas
primeiras décadas do Oitocentos, houve uma aceleração no movimento
de ocupação daquelas terras pelos luso-brasileiros.5 Esse processo se solidificou ainda mais porque a Banda Oriental tornou-se parte do Império Português (1821) e depois brasileiro, como Província Cisplatina.
Por sua vez, a independência do Uruguai, em 1828, ocorreu sem a
formalização da fixação dos limites daquele país com o Brasil. Esta oficialização somente se efetivou em 1851, mas continuou sendo alvo de
contestações diplomáticas mesmo depois. No mesmo sentido, ao longo
de todo o século, as diplomacias de ambos os países, e também a da
Argentina, seguiram pretendendo ampliar os territórios a custa de seus
vizinhos. Porém, desde 1828, havia uma divisa provisória que era sustentada na prática. Embora pudessem haver controvérsias quanto a algumas áreas limítrofes, as autoridades uruguaias e brasileiras estavam
estabelecidas e buscavam exercer sua jurisdição, cada uma de seu lado
do limite nacional. No seu extremo ocidental, que interessa mais direta-
MORAES, María Inés. La ocupación del espacio y la formación de paisajes agrarios en Uruguay,
2006, p.p. 70-71.
5
Naturalmente, essa expansão não se deu sobre uma “terra de ninguém”. Desde muito
antes de 1801 os guaranis missioneiros e também diversos bandos de arreadores, formados
por súditos mais ou menos fiéis das coroas ibéricas, além de indígenas charruas e minuanos,
cruzavam aquele espaço arrebanhando e comercializando gado. Ver: HAMEISTER, Marta
Daisson. O Continente do Rio Grande de São Pedro: os homens, suas redes de relações e suas
mercadorias semoventes., 2002 e GIL, Tiago Luís. Infiéis Transgressores: os contrabandistas da
fronteira (1760-1810), ,2002.
4
147
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
mente a este trabalho, a linha divisória era marcada pelo rio Quaraí. Os
súditos do Imperador eram os donos de muitas das terras e animais no
Estado Oriental (como era designada a República do Uruguai na maioria dos documentos brasileiros), sobretudo nos territórios localizados
ao norte do Rio Negro. Isso acabaria por colocar aquelas áreas em relação direta com a região da Campanha Rio-grandense, ao longo de todo
o século XIX.6
Por sua vez, a divisa entre o Brasil e a província argentina de Corrientes era mais estável, consubstanciada no Rio Uruguai. Também ali
havia grande troca social e econômica, especialmente com o município
brasileiro de Uruguaiana, que tinha um porto sobre aquele rio.
Destaque-se que, além de terem que lidar com um nascente limite
nacional, as populações daquela zona fronteiriça também experimentaram, mesmo após 1828, momentos de sobreposição de soberanias, como
foi o caso da área dominada pelas autoridades da República Rio-Grandense, nunca reconhecida pelo Império e que os governantes platinos
reconheciam ou não, conforme sua própria conveniência. O mesmo acontecia, por exemplo, no Estado Oriental durante fins da década de 1840,
quando existia um governo em Montevidéu, que dominava a cidadeporto, enquanto os opositores haviam estabelecido uma autoridade que
se pretendia legítima em Cerrito, e governavam o interior.
Da fronteira-barreira à comunidade plenamente integrada
Desde cerca de 1925 até meados da década de 1970, os intelectuais
ligados à chamada “matriz lusitana” da historiografia rio-grandense fincaram pé na imagem da fronteira como barreira, como separação entre
duas realidades distintas, no caso o Brasil e as regiões de fala espanhola
do sul da América.7 Para esta corrente, a linha divisória nacional assumia
BARRÁN, José Pedro; NAHUM, Benyamin. História Rural Del Uruguai Moderno, vol. I, 1967.
BARRIOS PINTOS, Antonio. Historia de la Ganaderia en el Uruguay, 1971. SALA DE TOURON,
Luzía; DE LA TORRE, Nelson; RODRÍGUEZ, José Carlos. Evolución Económica de la Banda
Oriental, 1967. SOUZA, Suzana Bleil. Os Homens da Fronteira: estancieiros e força de trabalho
na fronteira norte uruguaya, 2002.
7
Ieda Gutfreind, propõe os conceitos de “matriz lusitana” e “matriz platina” como categorias
de análise, onde enquadra estes historiadores preocupados em buscar origens da sociedade
rio-grandense. Enquanto a primeira “matriz” defendia que esta sociedade teria se forjado
sob influência portuguesa, a segunda acreditava numa influência platina na sua formação.
Segundo a autora, a “matriz lusitana” foi a que “falou mais alto, impondo sua voz, calando seus
6
148
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
uma existência quase a-histórica, como se o destino do Estado Nacional
brasileiro fosse, necessariamente, o de assumir a forma territorial que
tomou depois. De viés claramente nacionalista, tais obras subestimavam as trocas culturais e as relações sócio-econômicas do Brasil meridional com o Prata hispânico. Além disso, argumentavam que a posição
de “ponta-de-lança” brasileira, no sul da América, teria tornado os riograndenses ainda mais identificados com o Brasil e opostos aos “castelhanos” platinos.
Um bom exemplo dessa forma de pensar está na obra de Moysés
Vellinho, que atribuiu ao “espírito de fronteira” um caráter eminentemente
militar. O autor defendia que o constante “entrechoque com um inimigo”,
ou seja, com o outro lado da fronteira-limite, possibilitara ao habitante
desse espaço a formação de um sentimento de pertencimento nacional
e, conseqüentemente, o estabelecimento de uma relação de alteridade
frente ao estrangeiro. Nas suas palavras: “esse sentimento militante de fronteira, curtido na guerra, em muitas guerras, iria crescer, expandir-se em sentimento político de integração e solidariedade nacional. (...) Eis por que o Brasil
se apresentava ao espírito do fronteiro como um só corpo.”8
Essa visão era diversa daquela sustentada por Alfredo Varella e de
Manoelito de Ornellas.9 Esses e outros autores apontaram a existência de
vinculações importantes entre a sociedade que se formava no sul do Brasil e seus vizinhos platinos. Porém, como observou Ieda Gutfreind, apesar de reconhecerem a influência platina no Rio Grande do Sul, esses historiadores também estavam guiados pela idéia pré-concebida de nação e
de Estado, identificadas com a unidade territorial político-administrativa
adversários.” São considerados autores vinculados à “matriz lusitana”: Aurélio Porto, Souza
Docca, Othelo Rosa e Moysés Vellinho. Compondo a “matriz platina” a autora relaciona:
Alfredo Varella, João Pinto da Silva, Rubens de Barcellos e Manoelito de Ornellas.
GUTFREIND, Ieda. A Historiografia Rio-grandense, 1998. Sabemos que a análise proposta
por Ieda Gutfreind já foi repensada alguns aspectos. Contudo, parece-nos que, enquanto
levantamento abrangente da historiografia rio-grandense, ainda é um trabalho de extrema
relevância. Uma pesquisa importante, nesse sentido de reavaliar o paradigma das matrizes,
é a de Letícia Nedel que aponta para que esta cronologia aplicada à matriz platina, que se
estende da década de 1920 até 1970, acaba por homogeneizar o grupo de autores, encobrindo
pontos de inflexão que ocorreram nesse ínterim. NEDEL, Letícia B. Um Passado Novo para
uma História em Crise: regionalismo e folcloristas no Rio Grande do Sul (1948-1965), 2005. Tese
de Doutorado.
8
VELLINHO, Moysés. Fronteira, 1975, p.211.
9
VARELA, Alfredo. História da Grande Revolução, 1933 (6 volumes). ORNELLAS, Manoelito
de. Gaúchos e beduínos: origem étnica e formação social do Rio Grande do Sul, 1948.
149
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
que o país possuía no tempo em que eles escreviam suas obras.10 Aqui
interessa salientar que, mesmo assim, esses trabalhos abriram espaço para
a superação da idéia da fronteira meridional como uma área onde a divisa nacional pudesse isolar as populações que viviam de ambos os lados.
Nesse sentido, seria mais correto considerar que havia apenas alguns aspectos de divergências entre as “matrizes”, do que oposições
ideológicas veementes. Isso pode ser atribuído ao fato de que ambas
“partiam da idéia de nação e de estado, identificando-os com os limites políticosadministrativos. Em relação ao estado sulino, subestimaram o mobilismo, a ação,
o movimento de áreas geográficas bastante extensas(...).”11 Nesse sentido, percebemos que havia uma noção geral de fronteira onde, em primeiro plano, o que valia era exaltar a condição “original” de brasileiros dos riograndenses.12
Mais recentemente, uma série de estudos vem situando o Rio Grande do Sul dentro do “espaço platino”, “região platina” ou “espaço fronteiriço platino”.13 Além de fazer parte do processo de extensão colonial
portuguesa e consolidação do Império brasileiro em terras meridionais,
o Rio Grande do Sul integrou, também, um espaço de características
comuns com a província de Buenos Aires, a Banda Oriental (atual UruGUTFREIND, Ieda. Op.cit. p. 145-149.
Idem, p. 196.
12
Gutfreind aponta, ainda, que outros autores, como Caio Prado Júnior em Formação do
Brasil Contemporâneo, Guilhermino César em Contrabando no Sul do Brasil e Alice Canabrava
em Comércio Português no Rio da Prata já mostravam uma vinculação inconteste da fronteira
meridional com as regiões hispano-platinas. GUTFREIND, Ieda. Op.cit. p. 145-149.
13
Entre outros: LEITMAN, Spencer. Raízes Sócio-econômicas da Guerra dos Farrapos, 1979.
OSÓRIO, Helen. Apropriação da Terra no Rio Grande de São Pedro e a formação do espaço platino,
1990. REICHEL, Heloisa Jochims. Conflito e Violência na Campanha Platina: séculos XVIII e
XIX, 1993. PADRÓS, Enrique Serra. Fronteira e Integração fronteiriça: elementos para uma
abordagem conceitual, 1994. OSÓRIO. Helen. O espaço platino: fronteira colonial no século XVIII,
1995. _____. O Império Português no Sul da América: estancieiros, lavradores e comerciantes,
2007. SOUZA, Susana Bleil de. A fronteira do sul: trocas e núcleos urbanos - uma aproximação
histórica, 1995. PICCOLO, Helga. “Nós e os outros”: conflitos e interesses num espaço fronteiriço
(1828-1852), 1997. REICHEL, Heloisa Jochims; GUTFREIND, Ieda. As Raízes Históricas do
Mercosul: a região platina colonial, 1996. GUAZZELLI, César Augusto. O Horizonte da Província:
a República Rio-Grandense e os Caudilhos do Rio da Prata (1835-1845), 1998. PADOIN, Maria
Medianeira. Federalismo Gaúcho: fronteira platina, direito e revolução, 2001. HAMEISTER,
Martha Daisson. O Continente do Rio Grande de São Pedro: os homens, suas redes de relações e
suas mercadorias semoventes, 2002. GIL, Tiago Luís. Infiéis Transgressores..., 2003. PANIAGUA,
Edson Monteiro. Fronteiras, violência e criminalidade na região platina. O caso do município de
Alegrete (1852-1864), 2003. SOUZA, Susana Bleil; PRADO, Fabrício Pereira. Brasileiros na
Fronteira Uruguaia..., 2004.
10
11
150
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
guai) e as províncias do litoral argentino (Corrientes, Entre Rios e Santa
Fé). Apesar da heterogeneidade de abordagens dentre essas obras, elas
compartilham a percepção de que havia profundas ligações sociais, econômicas, militares, culturais e políticas entre as sociedades que habitaram esse espaço, forjadas desde os tempos coloniais. Além disso, enfatizam que havia muitas características comuns entre elas, como a presença de áreas de boas pastagens naturais; o papel central, ainda que não
exclusivo, desempenhado pela produção pecuária; a combinação de formas diversas de trabalho “livre”, escravo e familiar; a onipresença do
contrabando; a existência de uma instabilidade institucional e de uma
verdadeira endemia bélica nos séculos XVIII e XIX. Naturalmente, as
relações que permeavam esse espaço não excluíam o conflito. Este, em
variadas manifestações, foi também um traço estrutural da fronteira.
Essas obras recentes têm apontado o importante papel das interações entre sujeitos muito diversos no processo de construção da sociedade dessa fronteira. Desde os tempos coloniais e durante as primeiras
décadas do século XIX, antes que fossem praticamente dizimados, grupos indígenas charruas e minuanos adaptaram-se à presença de grandes manadas de gado e sobreviviam desempenhando sua própria política de alianças, guerra e comércio com os diversos outros blocos populacionais que os circundavam.14 Por sua vez, os guaranis missioneiros
também participaram ativamente da transformação da paisagem agrária e fizeram parte dos exércitos em luta na primeira metade do século
XIX: combateram nas hostes de Tomás de Rocamora, Rivera, Bento Manoel e, sobretudo, de Artigas. Infelizmente, ainda carecemos de estudos
específicos sobre a forte participação que tiveram na composição da população que habitava os campos da fronteira, ao longo do Oitocentos.15
O mesmo se dá quanto aos escravos, forros e pretos e pardos livres, que
começam a ter sua presença analisada, mas que ainda reclamam trabalhos mais profundos.16
No que se refere ao período colonial, uma série de autores têm
reiterado o anacronismo do emprego da noção de fronteira assemelhada
GOLIN, Tau. A Fronteira, vol I, 2002, p.p. 235-236, 254, 266.
Para os séculos XVII e XVIII, ver: NEUMANN, Eduardo Santos. Uma fronteira tripartida: a
formação do continente do Rio Grande – século XVIII, 2004.
16
Ver: FARINATTI, Luís Augusto. Escravos do Pastoreio: pecuária e escravidão na fronteira
meridional do Brasil (Alegrete, 1831-1850), 2006.
14
15
151
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
a uma linha divisória entre Estados Nacionais. Ao contrário, ganhou
ênfase a visão da fronteira como uma região, uma zona de encontro de
áreas extremas que não isolava as populações, mas, ao contrário, as colocava em contato.17 Por outro lado, em fins da época colonial, o termo
fronteira também era empregado para designar uma realidade geográfica mais específica nos confins do Rio Grande de São Pedro. A vila de
Rio Grande representava o último núcleo urbano da colonização portuguesa ao sul, e a vila de Rio Pardo tinha o mesmo papel, a oeste. As
regiões logo além dessas vilas eram designadas pelos contemporâneos
como “Fronteira do Rio Grande” e “Fronteira do Rio Pardo”.18 O emprego do termo fronteira para designar aqueles espaços indica que aqueles
eram vistos como lugares instáveis, com a presença de “outros”, uma
região de onde vinha o perigo de ataques inimigos, mas sugere, também, que tais áreas eram vistas como campos possíveis para a expansão
da colonização. Sobre esses espaços controversos, o povoamento luso se
estendia, estâncias eram organizadas, sesmarias doadas, posses estabelecidas, faziam-se arriadas de gado e contrabando de mercadorias.
Por sua vez, o limite nacional entre Brasil e Uruguai foi uma novidade do século XIX e demorou a instalar-se. Como já foi dito, ele ainda
estava em fase de construção e consolidação, ao longo de boa parte do
século. Além disso, os trabalhos recentes têm ressaltado que a linha divisória era porosa. Ou seja, ela continuou permitindo um fluxo constante
de pessoas, idéias e mercadorias, além de ser atravessada por espessa teia
de relações sociais entre habitantes dos dois lados. No Estado Oriental, as
áreas ao norte do rio Negro estavam profundamente conectadas tanto
com a grande zona pecuária no Brasil, que ia até o rio Ibicuí, como também com as charqueadas de Pelotas e com o porto de Rio Grande. Em
contraposição, durante o conflito farroupilha, os estancieiros da Campanha rio-grandense enviavam costumeiramente suas tropas de gado
Para uma visão geral dos debates sobre fronteira nas ciências sociais, ver: ZIENTARA,
Benedickt. Fronteira, 1999. Ver também o apanhado historiográfico sobre os estudos norteamericanos em relação ao tema de fronteira em: DJENDEREDJIAN, Julio. Economía y Sociedad
en la Arcadia Criolla: Formación y desarrollo de una sociedad de frontera en Entre Ríos, 1750 –
1820, 2003, p.p. 12-22. O autor elabora uma importante reflexão que parte da a obra de F.J.
Turner, passando pela escola dos “borderlands” até os debates atuais. Ver o clássico estudo
de: TURNER, Frederick Jackson. The frontier in American History, 1958.
18
OSÓRIO, Helen. Apropriação da Terra no Rio Grande de São Pedro e a formação do espaço platino,
1990. GIL, Tiago Luís. Infiéis Transgressores..., 2003.
17
152
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
para os saladeros de Montevidéu.19 Tais regiões também mantinham relações com as províncias argentinas de Entre-Rios e Corrientes, sobretudo com as áreas em que essas províncias tocavam o rio Uruguai.
Parte da historiografia recente, porém, foi além de constatar a importância das relações entre sujeitos que habitavam as várias regiões
dessa grande zona de fronteira ou a semelhança sócio-econômica que
compartilhavam. De forma difusa em algumas obras e mais explicitamente em outras, surgiu a noção de uma região de fronteira que “constituía uma área sem limites para seus habitantes”20 e que acabava por conformar um espaço onde a população fronteiriça, de ambos os lados, estabelecia mais relações de identidade entre si do que com o restante dos
países a que pertenciam. Essas idéias têm sido aplicadas, de forma bastnate incisiva, para as ligações do sul e sudoeste do Rio Grande do Sul
com a região norte da República do Uruguai. Como veremos, essa interpretação não se sustenta quando se passa ao estudo do material empírico e parece estar muito distante de explicar a experiência dos sujeitos
que viveram naquela fronteira, ao longo do Oitocentos.
É certo que a fronteira não deve ser considerada como uma linha
divisória, mas sim como um espaço. O espaço deve ser compreendido
como produto da ação humana, um locus onde atividades produtivas e
relações sociais ocorrem e que, ele mesmo, se constrói e vai ganhando
significado pela ação dos sujeitos históricos em um contexto social específico. Nesse sentido, concordamos que “a fronteira não é uma linha,
mas um espaço que se define mais por seus atributos sócio-econômicos e o limite, como conceito, é essencialmente político.”21 Da mesma forma, também é
correto que a fronteira nacional era algo novo que buscava instituir-se
no século XIX, e que os habitantes daquele espaço lidavam com essa
novidade a partir de concepções que guardavam traços fortes de outra
experiência de fronteira: a fronteira colonial, em expansão.
Além disso, também parece certo afirmar que toda e qualquer fronteira carrega consigo a característica intrínseca da ambigüidade, uma
vez que é “confins e limite de país, tanto separa Estados quanto os põem em
GUAZZELLI, César Augusto. O Horizonte da Província..., 1998.
COLVERO, Ronaldo. Negócios na madrugada: o comércio ilícito na fronteira do Rio Grande do
Sul, 2004. p. 83.
21
PICCOLO, Helga. “Nós e os outros”: conflitos e interesses num espaço fronteiriço (1828-1852),
1997. p. 218.
19
20
153
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
contato”22. Embora a fronteira enquanto limite seja “uma abstração que
não tem existência real fora do mapa geográfico”23, levar em conta a questão
da contradição da fronteira, que tanto delimita quanto relaciona duas
comunidades nacionais é fundamental para compreendê-la em quanto
um espaço dinâmico. Para Enrique Padrós24, com ou sem o respaldo
institucional as comunidades internacionais se relacionam e, nesse sentido, é possível afirmar que inexistem “fronteiras-barreiras” onde houver um mínimo de população estabelecida. Assim, o cotidiano fronteiriço promove a integração das comunidades internacionais antes mesmo
de qualquer projeto oficial de integração. Se o Estado pretende que a
fronteira desempenhe o papel de controle/barreira, demonstra sua completa alienação em relação à realidade.
Contudo, não é possível concordar quando se conclui a partir daí
que, ao se relacionarem, as comunidades internacionais de fronteira acabam formando uma zona de transição com dinâmica própria, um “novo
espaço”25, que se diferencia das características de origem dos países em
contato. Ou seja, afirmar que na região estudada houve o fenômeno apontado por Benedict Zientara, quando escreve que “as populações que vivem
numa zona de fronteira dão origem a uma comunidade fundada em interesses
particulares”26. O mesmo ocorre quando Suzana Bleil de Souza afirma
que a integração fronteiriça entre os habitantes da fronteira Brasil-Uruguai foi plena até as primeiras décadas do século XX. Nas suas palavras:
“nessa fronteira não existia ainda a percepção do ‘eu’ e do ‘outro’. A fronteira
era a grande comunidade do ‘nós’”27.
Já é ponto pacífico que é inviável tratar uma fronteira como um
limite efetivo entre duas comunidades. No entanto, acreditamos que
considerá-la como um espaço de plena integração também é problemático. Não se trata de negar as diversas relações de integração possíveis
de se estabelecer em uma fronteira, contudo, não se pode esquecer a
existência de elementos que vão demarcando, de forma dinâmica a altePADRÓS, Enrique Serra. Fronteira e Integração fronteiriça: elementos para uma abordagem
conceitual, v.17. n.1/2, jan/dez, 1994. p. 68.
23
ZIENTARA, Benedikt. Fronteira. In: Enciclopédia Einaudi, 1989. p. 307.
24
PADRÓS. Op. cit. p. 68-70.
25
Idem. p. 66.
26
ZIENTARA, Benedikt. Op. cit. p. 309. (Grifo nosso).
27
SOUZA, Susana Bleil de. A fronteira do sul : trocas e núcleos urbanos - uma aproximação
histórica. In: Fronteiras no Mercosul. Porto Alegre : UFRGS, 1994. p. 78-89 p. 81.
22
154
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
ridade dessas comunidades. O Estado, por exemplo, se faz presente nesses espaços através de um aparato burocrático específico e, justamente,
por tratar-se de um território que está em constante contato com o “outro”, faz necessário que o governo busque favorecer, reiterar ou instituir
ali algumas marcas de identidade ou pertencimento. Além disso, o simples fato de viver na fronteira, mesmo que o sentimento de pertencimento nacional ainda seja algo frágil, demarca a questão da “estrangeiridade”, ou melhor, do ser estrangeiro, especialmente no século XIX, onde
o significado de uma fronteira vai se definindo como sendo o local de
vizinhança com outro país.28
Isso é certo ainda que consideremos que, de fato, não temos limites nacionais consolidados até fins do século XIX. Podemos usar esse
termo, mas sempre tendo em conta que, diferentemente de hoje, esses
limites propriamente nacionais estavam em construção, como os próprios Estados Nacionais que ajudavam a compor. Naquela época, de fato,
na fronteira entre Brasil, Uruguai e Argentina, não existiam fronteiras
especificamente nacionais, havia, isso sim, fronteiras as quais, o antropólogo Alejandro Grimson, denomina de “provinciais”. Neste sentido,
mesmo que não houvesse ainda uma identidade nacional, não é possível descartar a existência de outros tipos de identidade/alteridade. Por
“provincial” o autor entende
“a la existencia de un poder regional com dinamica propia cuya inserción ‘nacional’ definitiva no se encontraba asegurada de antemano. Esas fronteras provinciales existieron en términos economicos, de soberania, política y, crecientemente, en términos identitarios”.29
GRIMSON, Alejandro. La Nación en sus limites – contrabandistas y exilados em la frontera
Argentina - Brasil, 2003, p. 24.
29
Idem. p.62-63. Essa idéia da fronteira e identidade provincial de Grimson, remete ao
conceito de “regiões-provincias” de José Carlos Chiaramonte que demonstra que do
momento logo após a independência do que viria a ser a Argentina (1816) até a queda de
Rosas (1852), não havia a possibilidade de se constituir uma nação em função da força dos
poderes regionais (provinciais) que não davam espaço para a formação de um grupo
dirigente interprovincial. O fato é que esta “questão regional” é vista, em geral, como um
empecilho à organização nacional. O que Chiaramonte busca mostrar é justamente que
não se trata de empecilho, uma vez que a possibilidade de nação nem mesmo estava
colocada, mas a organização em “província-região” foi o maior grau de coesão que a excolônia podia oferecer após a derrubada do poder colonial e, apesar da fragmentação,
manteve o vínculo que possibilitou sua sobrevivência e a constituição posterior da nação.
CHIARAMONTE, José Carlos. Mercaderes del litoral. Economia y sociedad en la Província de
Corrientes, primera mitad del siglo XIX, 1991.
28
155
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
Enfim, os trabalhos recentes elaboraram uma crítica correta e contundente às concepções de uma historiografia de matriz nacionalista,
que havia consagrado a idéia de “fronteira-barreira”. Porém, é também
necessário ter cuidado para não cair no extremo oposto. É preciso atentar para o fato de que esse limite nacional, ainda que incerto e discutido
ao longo do Oitocentos, ensejava que se buscasse instituir soberanias
distintas de ambos os lados, e que os sujeitos precisavam lidar com essa
situação. O limite nacional, por certo, não era uma barreira intransponível e não impedia trocas e circulação de pessoas, mercadorias e idéias.
Mas é imperioso reconhecer que esses movimentos que se faziam de um
lado a outro eram diferentes dos que se faziam dentro de um mesmo
país. Para ficar com um exemplo: para um estancieiro do município brasileiro de Alegrete, levar gado para o Estado Oriental (a República do
Uruguai) implicava em cuidados com aspectos que não existiam quando se tratava de levá-lo para São Gabriel, o município vizinho, ainda
que as distâncias pudesses ser as mesmas. Assim, os sujeitos que habitavam aquele espaço precisavam incluir em seus cálculos formas de
manejar a fronteira.
Mesmo que a oficialização dos limites tenha demorado, a situação
de fronteira não era nada indefinida ou nebulosa para os sujeitos que
habitavam aquele espaço, ao contrário, era algo conhecido e manejado
por aqueles atores. É exatamente por terem a clareza da existência desses limites que eles eram capazes de manejar a situação de fronteira a
seu favor, como acontecia quando, como veremos, lançavam mão das
diferentes identidades/alteridades que dispunham.
Na documentação que pesquisamos, encontramos freqüentemente a referência explícita àquele espaço como sendo a Fronteira30. Além
disso, são comuns as falas que se utilizam da expressão “o outro lado”
para designar o país vizinho ou “a linha de fronteira” para referir-se ao
limite entre um país e outro.
Essas menções são bastante comuns em Processos Crimes de Apreensão de Contrabandos, sendo que o caso a seguir se presta bem para
servir como exemplo.
30
A utilização do termo Fronteira na documentação referente à Alegrete no século XIX
também foi notada e apontada por Graciela Bonassa. GARCIA, Graciela B. O domínio da
terra: conflitos e estrutura agrária na campanha rio-grandense oitocentista, 2005. p.13 (nota de
rodapé 3).
156
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
No dia 11 de janeiro de 1851, “na Linha devisória do Quaray”, mais
precisamente no “Paço do Baptista”, Paulo Martins foi apreendido por
dois Guardas Nacionais do destacamento do dito passo com uma carreta carregada de mercadorias que não haviam passado pelo controle alfandegário. O referido Paulo alegou que “não tinha a intenção de cruzar
para o Estado Oriental” e nem de fazer negócio com as mercadorias. Em
seu depoimento afirmou que:
“tendo vindo a esta Villa [refere-se a Alegrete] com huã carga de couros a
vender, alguns moradores da costa de Quarahin seus conhecidos, fizerão-lhe
diversas encommendas, que depois de compradas, o supplicante fez conduzir na
mesma carreta, em que trouxe os couros”.31
Conforme a explicação de Paulo Martins ocorreu que, quando retornou de Alegrete com as encomendas feitas por seus vizinhos, como
morava em Quaraí “muito próximo da linha de fronteira com o Estado Oriental”, ao se dirigir a sua casa acabou sendo confundido com um contrabandista e preso pelos guardas.
As relações estabelecidas de um lado e outro do instável limite
nacional, portanto, podem ser chamadas de “transfronteirças” “porque
atraviesan el límite material de la frontera política, y no porque las fronteras
simbólicas vinculadas a la nacionalidad no sean significativas”32. Na perspectiva de Grimson, devemos considerar que é no âmbito dos vínculos interpessoais que são negociadas e disputadas as identidades existentes.
Enfim, cabe então perguntar: se não era uma zona cindida em duas
partes estanques, nem um espaço de plena integração, então como se
deve tratar esse espaço social de fronteira?
Manejar a fronteira
A proposta apresentada aqui consiste, em primeiro lugar, no estudo da fronteira a partir das relações e experiências dos sujeitos e grupos
sociais que ali viveram. Nesse sentido, é preciso evitar tratar a fronteira
como uma entidade homogênea, que pode ser classificada com apenas
uma definição. Ao contrário, parece muito mais útil considerá-la através das inúmeras relações sociais que eram possíveis de serem estabeleAPERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 78. Nº2711.
Ano 1851.
32
GRIMSON. Op.cit. p. 26.
31
157
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
cidas naquele espaço. Sobretudo: há necessidade de perceber quais as
implicações concretas que a situação de fronteira trazia para os habitantes daquelas paragens, tanto na busca de resolução de problemas práticos (como a viabilização da economia pecuária ou do comércio atravessando a linha divisória), quanto nas implicações simbólicas (como a questão da construção da alteridade e da identidade dos grupos sociais naquele espaço).33
É necessário interrogar como os habitantes da fronteira, de sua
parte, construíram significados e estratégias para lidar com o fato de
viverem em um espaço conformado por uma zona de fronteira, com um
limite nacional de permeio. E mais, é preciso perceber que viver em
uma fronteira era uma situação que propunha problemas e possibilidades diversos para os agentes, conforme fosse a sua posição social. Era a
partir dela que esses sujeitos inventavam modos de lidar com a existência de um limite nacional, em processo de construção. Por exemplo, as
famílias abastadas da Fronteira, que contavam, entre seus integrantes,
com estancieiros, comerciantes e oficiais militares tinham percepções acerca dessa situação e formas de lidar com ela, que eram diferentes, por exemplo, daquelas articuladas por grupos subalternos como famílias de pequenos produtores, carreteiros, peões e escravos.34
Dessa forma, apresenta-se uma “fronteira dinâmica” capaz de, num
mesmo espaço e tempo, revelar a constituição de variados significados
para diferentes agentes. Não nos referimos aqui a diferentes compreensões de fronteira, ou diferentes tipos, tais como “fronteira comercial”,
“fronteira cultural”, “fronteira demográfica”, etc.; mas à construção de
diferentes relações sociais dentro de um mesmo espaço de fronteira. É
preciso considerar todos os tipos de interações possíveis de serem estabelecidas nesse espaço percebendo a existência de diferentes grupos com
interesses variados.
Não se deve restringir essas relações possíveis apenas às das duas
“nacionalidades” em contato ou às relações que esses grupos fronteiri-
Uma abordagem muito próxima da proposta aqui é bem desenvolvida na recente
dissertação de mestrado de Márcia Volkmer. VOLKMER, Márcia Solange. Onde começa ou
termina o território pátrio – Os estrategistas da fronteira: empresários uruguaios, política e a
indústria do chraque no extremo oeste do Rio Grande do Sul (Quarai 1893-1928), 2007.
34
FARINATTI, Luís Augusto. Confins Meridionais: famílias de elite e sociedade agrária na fronteira
meridional do Brasil (1825-1865), 2007.
33
158
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
ços estabelecem com seus Estados centrais. Os atuais estudos sobre fronteiras – aqueles que já superaram as perspectivas mais tradicionais e
percebem a fronteira como um espaço de integração – em geral não expressam a heterogeneidade social e cultural das sociedades que analisam
e tomam a fronteira como um espaço que compreende estritamente relações duais (entre as comunidades nacionais de fronteiras ou entre essas
comunidades e os Estados). Certamente, “as disputas [e relações estabelecidas] entre sectores sociales de la frontera son más que la forma local de los
conflictos superpuestos entre estados naciones y entre estado y sociedad”35.
Se aceitamos que é preciso descer no nível da ação e interação de
diferentes sujeitos e grupos para compreender a produção social da fronteira no espaço e tempo estudados aqui, um segundo ponto surge a seguir: as relações e significados atribuídos à fronteira pelos sujeitos eram
dinâmicas. Eram dotados de historicidade e isso, por óbvio, deve entrar
nas considerações dos historiadores.
De fato, as fronteiras não são espaços rígidos, pelo contrário, atualizam-se constantemente através de diversas práticas. Investigar uma
fronteira demanda estudar seu processo de contínua recriação, não o
restringindo aos movimentos de avanços e recuos do limite geográfico e
político, mas dando ênfase a como ela foi “cotidianamente producida, recreada y repoducida por los diferentes agentes sociales que intervienen en ese
espacio”36
Grimson trabalha com o conceito de “fronteirização”37, que é bastante elucidativo para a nossa perspectiva de análise. Este conceito aponta
para o fato de que a fronteira nunca será um dado fixo, mas algo instável, dinâmico e sempre disputado. E sendo produto histórico da ação
humana é, constantemente, re-significada, assumindo diferentes sentidos para os diversos atores sociais em diversos contextos. Dessa forma,
é possível perceber, em momentos históricos específicos, como esses
sujeitos se organizam e se relacionam demonstrando
“que las relaciones se estructuran por la posición que cada agente ocupa(...). En
especial, nos sirve para pensar los contrastes entre distintas estructuras de la
coyuntura que derivan de políticas diferentes del Estado, de realidades económicas distintas y de intereses divergentes de los actores”38.
GRIMSON. Op.cit. p. 25-26.
Idem. p. 25.
37
Idem. p. 43-44.
38
Idem. p. 45.
35
36
159
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
É fundamental perceber que existem diferentes grupos de interação, onde cada sujeito possui interesses particulares e situações socioculturais específicas. Se os agentes estão sempre socialmente posicionados, então essa posição certamente influencia na forma como a condição de fronteira entrava em suas experiências. Esses grupos, ou sujeitos,
podem estabelecer determinadas relações em certos momentos que poderão parecer impossíveis e contraditórias em outros contextos. É o aspecto da “fronteirização”, portanto, que possibilita que as diversas relações entre os diversos grupos se refaçam constantemente, mesmo que
assumindo características até mesmo incoerentes e opostas às relações
que havia anteriormente. Evidente que não é nada simples trabalhar
com um esquema de heterogeneidade social e de incoerência, até mesmo porque, como afirma o antropólogo norueguês Fredrik Barth: “somos treinados a suprimir os sinais de incoerência e de multiculturalismo encontrados”39. Contudo, é necessário considerar que em cada momento os
sujeitos estarão ocupando um determinado lugar e adotando um determinado procedimento. O posicionamento dos atores em um dado momento nem sempre será condizente com posicionamentos anteriores,
ou melhor: “cada pessoa está ‘posicionada’ em virtude de um padrão singular
formado pela reunião, nessa pessoa, de partes de diversas correntes culturais,
bem como em função de suas experiências particulares.”.40
Em qualquer momento, em função das “posições” ocupadas, a
vivência e as trocas na fronteira podem gerar efeitos negativos e positivos para seus sujeitos ou grupos sociais. Algum efeito produzido pela
fronteira que pode ser utilizado a favor de certo grupo, também pode
ser elemento desestabilizador para outro. Ou nas palavras de Ricci e
Medrano: “(...) al estudiar cada frontera debemos siempre hacer un balance
que venga a demonstrar los efectos negativos y los constructivos por ella provocados, mismo porque, esos efectos puedem invertir-se con el pasar del tiempo”41.
O que significa que, em um momento específico, a relação de um determinado grupo com a condição de fronteira pode estar sendo produtiva,
BARTH, Frederik. A análise da cultura nas sociedades complexas, 2000. p. 109.
Idem. p.137.
41
RICCI. Maria Lucia de Souza Rangel e MEDRANO, Lilia Inês Zanotti de. El papel del
contrabando y la interacción fronteriza del Brasil sureño com el Estado Oriental del
Uruguay: 1850-1880, 1990. p.258.
39
40
160
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
mas por tratar-se de um espaço dinâmico, sempre pode ocorrer a inversão dessa situação.
Para apreender essa heterogeneidade e essa dinâmica, é preciso
ultrapassar as interpretações apriorísitcas, os modelos pré-concebidos a
partir de frágeis bases empíricas e mergulhar na sociedade estudada.
Mantendo sempre a aspiração de se atingir, ao final do processo, uma explicação global, é necessário descer aos horizontes particulares e às interações interpessoais (relações de conflito, negociação e solidariedade)
colocando a necessidade da descoberta através de procedimentos exploratórios, onde cada situação deve ser devidamente contextualizada
e especificada, para que seja compreendida nos seus próprios termos.42
Uma análise desse tipo, com uma contextualização profunda de
casos concretos, excederia as pretensões deste artigo. Porém, pensamos
que seja útil, neste momento, apontar, ainda que superficialmente, como
alguns grupos e sujeitos históricos se relacionaram, a partir de seu posicionamento social, com a situação de fronteira estudada e como essas
relações assumiram um caráter dinâmico. Os exemplos dados a seguir,
cremos, servem para embasar as hipóteses expostas até aqui, ao mesmo
tempo em que sugerem campos para investigações mais profundas, em
pesquisas futuras.
Os grandes estancieiros, os líderes militares e a fronteira
Ao longo do século XIX, houve a presença maciça de brasileiros,
sobretudo rio-grandenses, proprietários de terras com gados no norte
do Uruguai, os quais, muitas vezes, também possuíam propriedades no
Rio Grande do Sul.43 Segundo Susana Bleil de Souza e Fabrício Prado,
no ano de 1857 “estimava-se que os rio-grandenses possuíssem cerca de 30%
do [norte do] território oriental”44. A região ao norte do Rio Negro era
como uma “extensão dos campos de pastoreio do Rio Grande”45 e essa invernada de engorda dos gados era fundamental para o abastecimento das
charqueadas de Pelotas. Segundo um levantamento realizado em 1850,
BARTH. Frederik. Op.cit., 2000 p.177.
SOUZA, Suzana Bleil de & PRADO, Fabrício Pereira. Brasileiros na fronteira uruguaia:
economia e política no século XIX, 2004.
44
Idem. p.133. Grifo meu.
45
Idem. p. 134.
42
43
161
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
eram, pelo menos, 1.181 os brasileiros que tinham estâncias no Uruguai46.
O expediente de possuir terras nos dois países podia permitir que se
diminuísse os efeitos nocivos das guerras. Quando ela acontecia em um
dos lados da fronteira, os estancieiros procuravam levar seu gado para
o outro.47
No entanto, se por um lado era vantajoso manter propriedades no
Uruguai, por outro também havia complicações, uma vez que, freqüentemente, estas propriedades eram alvo de embargos e confiscos empreendidos por milícias de líderes uruguaios. Até o início da Guerra dos
Farrapos (1835-1845), o Uruguai recebeu o afluxo de proprietários brasileiros e durante os primeiros anos do conflito, pode-se dizer que os
criadores rio-grandenses salvaguardaram suas reses nos campos orientais. Quando findou a guerra no Império, a debilitada economia riograndense necessitou lançar mão de seus gados “estocados” no país vizinho, no entanto, encontrou o Uruguai afundado em uma guerra civil e
abastecendo-se do gado disponível nas propriedades rurais.
Em 1848, numa medida extremada na tentativa de reter o gado no
Uruguai quando a campanha encontrava-se devastada, o chefe blanco
Oribe proíbiu que se atravesse gado para o Rio Grande do Sul passando
a ser considerado contrabando tal prática. Contudo, não eram somente
as forças blancas que empreendiam tais embargos. Eram freqüentes as
mesmas reclamações em função de ataques das tropas coloradas de Rivera. A partir desse momento, iniciavam-se as “califórnias”, expedições
comandadas por estancieiros rio-grandenses que, alegando quererem
compensar o prejuízo acarretado por tal embargo, reuniam suas milícias
privadas para adentrar na Banda Oriental, aprender gados e saquear propriedades. Essas agitações iam contra a postura política de neutralidade
adotada pelo Império, que não queria intrometer-se nos assuntos da jovem república uruguaia, e acabaram por gerar tensões diplomáticas.
Uma lista foi composta pelos comandantes de fronteiras, indicando os prejuízos sofridos pelos proprietários brasileiros. Susana Bleil de
Souza e Fabrício Prado apontaram que cerca de 9% dos declarantes estavam com seus bens embargados, enquanto outros 8% haviam aban-
SOUZA, Susana Bleil; PRADO, Fabrício Pereira. Brasileiros na Fronteira Uruguaia..., 2004,
p.p. 130-131. Ver também: FARINATTI, Luís Augusto. Confins Meridionais..., 2007.
47
GUAZZELLI, César Augusto. O Horizonte da Província..., 1998.
46
162
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
donado suas propriedades.48 Segundo essas listas, cerca de 17% dos proprietários brasileiros não estariam podendo usar suas estâncias uruguaias
nos anos finais da década de 1840. Naturalmente, os números descritos
acima correm sério risco de estarem superestimados, já que buscavam
ressaltar as agressões que teriam sido perpetradas pelo governo “blanco” e embasar possíveis indenizações. Todavia, ainda que os índices fossem menores, eles seriam significativos, uma vez que mesmo os proprietários que estavam utilizando suas estâncias sofriam uma série de restrições quanto ao manejo e comercialização de seus rebanhos.49 Os embargos relatados nas listas tinham se dado, na maioria dos casos, porque os
proprietários tentavam passar tropas, clandestinamente, para o Brasil.
Contudo, essa situação não era igual para todos os estancieiros
brasileiros que tinham interesses em terras uruguaias. Manoel José de
Carvalho alegava que seu rebanho de 30.000 animais estava diminuído
em, pelo menos, 4.000 reses, em virtude das carneações feitas por uma
força militar do exército de Oribe. A maioria dos proprietários listados
declarava problemas semelhantes. Porém, há também outras em que o
Comandante da Fronteira apenas anotou “Ignoram-se os prejuízos que
tem sofrido”. Por sua vez, ao lado do nome de Seginando Lopes, do
campo e do gado que possuía, no espaço onde normalmente estavam
relatados os prejuízos sofridos pelos estancieiros, está uma anotação
curiosa: “tem percebido muitos lucros.”50 Essa insinuação de colaboracionismo com os “blancos”, como também aquelas situações onde não
se sabem haver prejuízo apontam para o fato de que a reiteração da
produção pecuária naquela zona fronteiriça era condicionada pelas relações políticas que se estabelecia.
Enfim, a mesma fronteira que oferecia a esses proprietários a possibilidade de manter propriedades rurais de ambos os lados e transitar
com seu gado a fim de estocá-lo onde lhes fosse mais conveniente, também poderia ser prejudicial à medida que estas propriedades e gados
ficavam vulneráveis aos constantes conflitos que acometiam esse espaço. Em tal contexto, era impossível levar a cabo a produção pecuária em
larga escala sem atentar para o fato de que o limite nacional impunha
SOUZA, Susana Bleil; PRADO, Fabrício Pereira. Brasileiros na Fronteira Uruguaia..., 2004,
p. 131.
49
Idem., 2004, p.p. 125-131.
50
FARINATTI, Luís Augusto. Op. Cit, 2007.
48
163
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
soberanias distintas e que as conjunturas políticas variavam de lado a
lado.
Foi exatamente a continuação da situação de guerra século XIX
adentro que permitiu a reprodução da grande importância assumida
pelos comandantes militares sul-riograndenses naquele contexto. Eles
não possuíam mais os poderes sobre a distribuição de terras e de grandes butins em gado, como havia acontecido até a década de 1820. Contudo, a conservação da endemia bélica até, pelo menos, o final da Guerra do Paraguai, em 1870, permitiu que seguissem gozando de poder e
prestígio. Comandavam recrutamentos, indicavam oficiais de segunda
linha, conseguiam suprimentos e montarias para abastecer os exércitos,
teciam suas próprias políticas de aliança com líderes militares orientais,
correntinos e entrerrianos.51
Um equívoco comum nas obras que se referem à Fronteira Meridional do Brasil, é associar diretamente os grandes estancieiros com os
chefes militares de segunda linha ou até do exército. De fato, se não a
totalidade, pelo menos a larga maioria dos altos oficiais milicianos e,
depois, da Guarda Nacional, eram grandes estancieiros. Porém, o contrário não é verdadeiro. Entre as 16 maiores fortunas de uma amostra de
205 inventários post mortem de Alegrete (o principal município pecuário
da Campanha Rio-Grandense), um tinha suas principais atividades centradas no comércio e 15 na criação de gado.52 Destes, apenas 4 haviam
ocupado cargos de altos oficiais e 2 haviam sido tenentes sem nunca ter
ocupado comando de fronteira ou mesmo de distritos militares. Os outros 9 sujeitos jamais ocuparam qualquer cargo militar de primeira ou
segunda linha. Entre eles estavam as duas principais fortunas da amostra pesquisada.
Isso não significa, por outro lado, que a produção pecuária estivesse desligada das atividades militares. Acontece que a ligação entre
elas nem sempre se dava de forma direta. A maioria daqueles grandes
estancieiros que nunca ocuparam postos de oficiais militares tinha alianças parentais, estabelecida via matrimônio, com estancieiros-militares: em geral um genro, cunhado ou o pai de alguma de suas noras.53
Idem. Especialmente o capítulo “4”.
FARINATTI, Luís Augusto. Op. Cit, 2007.
53
Idem.
51
52
164
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Estes últimos eram minoria entre os grandes estancieiros, mas tinham
uma posição privilegiada como mediadores das relações entre a guerra,
a fronteira e aquela sociedade. Nesse sentido, tem sido ressaltado pela
historiografia o grau de autonomia que eles conseguiam assegurar no
cultivo de alianças individuais com outros líderes militares. Para ficar
apenas com o exemplo mais eminente dessas alianças, citemos o caso
amplamente conhecido das relações pessoais existentes entre o líder farroupilha Bento Gonçalves e o chefe uruguaio Lavalleja.54
Os subalternos e os perseguidos pela justiça
Por sua vez, as populações subalternas também se movimentavam pelas áreas fronteiriças, em busca de melhores condições. Em estudo sobre a família dos líderes militares Gumercindo e Aparício Saraiva,
o historiador norte-americano John-Charles Chasteen fez uma interessante retrospectiva da trajetória de um grupo de pequenos produtores
através da Fronteira.55 Por volta de 1830, Francisco Saraiva e sua mulher
Maria Angélica, avós de Gumercindo e Aparício, haviam decidido migrar do sul do Rio Grande e arrendar um campo em Cerro Largo, no
Estado Oriental. Esse campo ficava em terras dos Correia, uma família
de grandes estancieiros brasileiros. Francisco e Maria Angélica possuíam apenas alguns poucos escravos e, nas novas terras, eram vizinhos de
alguns de seus parentes, o que sugere que os laços parentais podiam
estar na base dessa estratégia que envolvia movimentos transfronteriços. Lá ficaram até depois de 1845 quando, tendo Francisco já falecido,
Maria Angélica e alguns de seus filhos voltaram para o Rio Grande do
Sul, aparecendo como proprietários de uma pequena parte de terras em
Arroio Grande, no extremo-sul da província rio-grandense.
Como observou Chasteen, é provável que o final do conflito Farroupilha, em combinação com o aumento das violências da Guerra Grande, tenha influenciado a decisão da família em retornar ao Brasil. Segundo o autor, os filhos do casal que permaneceram no Uruguai podem
ter ficado arranchados em terras de parentes ou de outros estancieiros
PICCOLO, Helga. “Nós e os outros”: conflitos e interesses num espaço fronteiriço (18281852), 1997. p. 219.
55
CHASTEEN, John Charles. Fronteira Rebelde, 2003, p.p. 38-45.
54
165
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
brasileiros, que parecem ter preferido seus compatriotas como agregados. Um deles, de nome Francisco, como o pai, trabalhava como posteiro em uma estância no Uruguai, durante a década de 1850.
Assim, movimentar-se de um lado a outro dos imprecisos limites
nacionais não parece ter sido uma exclusividade da estratégia dos mais
ricos estancieiros. No mesmo sentido, entre os peões que foram se empregar na Estância da Palma, pertencente ao Brigadeiro Ortiz, em Alegrete, em 1853, estavam o “castelhano Alexandre” e o “castelhano Fernandez”.56 Sobrenomes de origem hispânica aparecem também, com freqüência, entre os peões de tropas que eram contratados por Manoel José
de Carvalho para reunir o gado da sua Estância de Japejú, em Uruguaiana, e começar a conduzí-lo para as charqueadas. Em contrapartida, entre os peões que empregava na estância que possuía no Estado Oriental,
existiam diversos brasileiros.57 Veja-se bem, o limite nacional não impedia esses deslocamentos, mas os condicionava.
De outra parte, era comum que os perseguidos pela justiça em um
dos lados da divisa nacional fugissem para o Estado vizinho. O fato de
que a fronteira pode servir como fuga e esconderijo para aqueles que
cometem crimes do outro lado sempre foi algo sabido pelos fronteiriços
e, também, um recurso utilizado pelos que por ventura cometessem crimes, como o caso do entrerriano João Pedro “Sapato” que, em 1864 em
Quaraí, roubou a casa de Manoel Justino de Oliveira e foi preso em Santana do Livramento ao tentar evadir-se para o Estado Oriental.58 Nesse
sentido, freqüentemente as autoridades relacionaram a incidência da
criminalidade na fronteira com a grande presença de estrangeiros.
A possibilidade de cometer um crime e refugiar-se no outro país
era, na verdade, utilizada dos dois lados da fronteira, como em um caso
de “sedução de escravos”. O réu, o liberto “cabra Antonio”, roubou uma
escrava (sua amante) e ambos fugiram para o Estado Oriental. Para tanto, Antonio matou o dono da escrava, José Gonçalves Pereira, e feriu o
menor Manoel, Dona Iria e o escravo Adão para empreender o rapto.59
APERS. Inventários post mortem. Alegrete. Cartório de Órfãos e Ausentes: M. 08, N. 111, A.
1852.
57
APERS. Inventários post mortem. Alegrete. Cartório do Cível e Crime, m. 01, n. 07, a. 1853-7.
58
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Quaraí. Maço 21, nº 752, 1864.
59
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 80, nº2807, 1855.
56
166
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Nesse caso, a fuga para o Estado Oriental não só traria a liberdade para
a escrava, mas também serviria como esconderijo para o criminoso.
Casos de pessoas que cometiam crimes e tentavam refúgio no país
vizinho são bastante freqüentes na documentação e, na realidade, não
há como verificar se mais brasileiros cometiam crimes e fugiam para o
Estado Oriental e para Argentina, ou se o inverso. No entanto, em 1856,
o presidente da província Jeronymo Francisco Coelho referia-se ao aumento da criminalidade no Rio Grande do Sul apontando duas causas
relacionadas à presença da fronteira e aos estrangeiros:
(...) a facilidade com que esses criminosos se passam por qualquer ponto de nossa
vasta fronteira para os Estados vizinhos, com um dos quais somente temos tratado para a extradição, porém está sujeita a tão morosas formalidades, que completamente inutilizam os fins do tratado; (...) criminosos dos Estados vizinhos
vem clandestinamente para o nosso território aumentando o numero dos primeiros (...).60
Esta perspectiva que relacionava a criminalidade aos estrangeiros
parecia estar realmente difundida. Referindo-se à conduta moral da população do Rio Grande do Sul, o viajante francês Nicolau Dreys escreve
o seguinte: “injusto seria atibuir-se exclusivamente aos filhos do Rio Grande
alguns excessos que ali se podem cometer, quando a verdade é que são quase
sempre aqueles excessos obras de estrangeiros”.61
É notável nos processos criminais instaurados nos municípios brasileiros da fronteira, o fato de que quando há um estrangeiro envolvido
a sua nacionalidade é constantemente referida. Isso não se dá apenas na
qualificação do réu ou das testemunhas, mas na própria “fala” dos depoentes e autoridades quando se referem a esses sujeitos. Quando era
necessário identificar a origem de sujeitos que habitam o outro lado da
fronteira, a referência se faz das seguintes formas: o argentino ou o oriental “Fulano de tal”, ou correntino, quando prevalece a identidade provincial. Não se pode deixar de perceber que há a nítida referência a um
tipo de alteridade nesse procedimento e, sendo assim, a idéia, já criticada, de que nessa fronteira a integração reinava a ponto de os fronteiriços constituírem uma identidade específica, que não conferia com as
características de nenhum dos países em contato, fica fragilizada.
60
61
AHRGS. Relatório do Presidente da Província do Rio Grande do Sul. A-7.03.
DREYS. Nicolau. Notícia descriptiva da Província do Rio Grande de São Pedro do Sul, 1961.
p.153.
167
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
Os Escravos e a Fronteira
Em outro processo de “sedução de escravos”, aberto em 1856, onde
o réu era estrangeiro, o advogado do autor da ação, proprietário dos
escravos seduzidos, faz menção à freqüência desse tipo de crime e ao
fato de que a maioria desses “sedutores” eram estrangeiros orientais.
Em um trecho do documento diz o seguinte:
“Como são frequentes na Província estes factos de seducção de escravos, e conducção d’elles para os Estados vizinhos, perpetrados por aventureiros extrangeiros, que esquicidos da hospitalidade com que são recebidos entre nós, com
facilidade se prestão a causar grandes prejuízos aos proprietátios Brasileiros; há
uma necessidade urgente de q. sejão punidos exemplarmente taes criminosos.”62
A escravidão havia sido abolida em 1842 no Estado Oriental e desgastara-se mesmo antes em Entre-Rios e Corrientes. Durante as décadas
de 1840 e 1850, a escravidão ainda desempenhava um papel estrutural
na pecuária sulina.63 Naqueles anos, os senhores brasileiros seguiam levando seus escravos para suas propriedades no Uruguai, e buscavam
disfarçar a escravidão com contratos de trabalho, mas esse procedimento foi ficando cada vez mais difícil, tanto pela repressão das autoridades
uruguaias, quanto pela ação dos próprios escravos, que começavam a
usar esse fator em seu proveito.64 Ou seja, se, para os senhores, esse fato
fazia com que a fronteira trouxesse um ingrediente a mais nos cuidados
que precisavam desenvolver, para os escravos aquele espaço aparecia
como possibilidade de liberdade.
Segundo Helga Piccolo65, na “Relação dos escravos fugidos para o Estado Oriental pertencentes a diversas pessoas desta província” consta que no
ano de 1850 o número de escravos fugidos do Rio Grande do Sul foi de
192. Em um levantamento feito nos Processos Crimes de Alegrete, Santana do Livramento, Quaraí e Uruguaiana, entre os anos de 1850 e 1864,
encontramos diversos processos de “sedução de escravos”. Os réus des-
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 81. Nº 2838,
1856.
63
FARINATTI, Luís Augusto. Op. Cit, 2007
64
Sobre esses contratos ver: ZABIELLA, Eliane. A Presença Brasileira no Uruguai e os Tratados
de 1851 de Comércio e Navegação, de Extradição e de Limites, 2002, p.p. 82-98. BORUCKY,
Alex; CHAGAS, Karla; STALLA, Natalia. Esclavitud y Trabajo – Un estudio sobre los
afrodescendientes en la frontera uruguaya (1835-1855), 2004, p. 186.
65
AHRGS, Lata 531, Maço 1 – Estatísticas. Apud. PICCOLO, Helga. Op.cit. p.220.
62
168
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
ses processos, os “sedutores”, são pessoas livres ou libertas que, a princípio, têm motivações econômicas ao abraçarem tal empreitada, uma
vez que os escravos lhes pagavam pequenas quantias pelo “atravessamento”, como no caso de um pardo livre e peão, o baiano Clarimundo,
que convenceu três escravos de seu patrão, Joaquim Marcelino Vasconcellos, a fugirem para o Estado Oriental.66
Em outro processo, no entanto, não consta que houvesse tido a
interferência de alguém para incitar a fuga. Trata-se de uma tentativa
de insurreição e fuga de treze escravos. Neste caso, percebe-se que a
possibilidade da liberdade do outro lado da fronteira estava colocada
para estes escravos mesmo sem a atuação de um “sedutor”.67
A fuga seguida de liberdade que a fronteira oferecia para os escravos, se por um lado era prejudicial aos proprietários de escravos, por
outro, obviamente, era positivo para os cativos.68 Porém, ao levar à risca
a noção de que num mesmo momento a situação de fronteira pode proporcionar efeitos negativos e positivos para seus grupos sociais, os significados da fronteira podem se inverter a qualquer momento. Dessa
forma, é possível compreender o caso da parda Theodora, ocorrido em
1859.69
Nascida no Estado Oriental e, portanto, livre ou liberta, lá vivia
com João Bentaberry. Tendo vindo morar com sua madrinha no Rio
Grande do Sul, ocorreu que o marido de sua madrinha a vendeu como
escrava. O processo se deu entre João Bentaberry, amasio de Theodora,
que queria sua companheira de volta, as pessoas que compraram a suposta escrava e que não abriam mão de sua aquisição, e o juiz responsabilizado por ter permitido que a parda fosse vendida como escrava quando sabia que ela era uma oriental livre. Infelizmente, como não consta o
desfecho do processo, não se sabe qual foi o destino de Theodora. No
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 78, nº2717, 1851.
Além deste processo, os seguintes são semelhantes: Alegrete – Maço 77, nº 2697, 1850,
Maço 189, nº 5512. Uruguaiana – Maço 60, nº2336, 1854. Santana do Livramento – Maço 38,
nº1553, 1863.
67
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 85, nº2984, 1863.
68
Ver importante trabalho recente de Silmei Petiz a respeito de fugas de escravos pela
fronteira. PETIZ, Silmei de Sant’Ana. Buscando a liberdade: as fugas de escravos da província
de São Pedro para o além-fronteira (1815-1851), 2006.
69
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 83. nº 2901,
1859.
66
169
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
entanto, esse momento de sua vida ao qual tive acesso demonstra o dinamismo desse espaço, ou seja, a mesma facilidade que se coloca para
os escravos da fronteira rio-grandense de fugirem para o “outro lado” e
conquistarem sua liberdade, no sentido inverso, teve resultado negativo para uma parda desse mesmo lugar.
Outro exemplo das relações entre escravidão, liberdade e fronteira aparece em um estudo recente de Keila Grinberg. A autora analisou
as ações de liberdade, todas bem sucedidas, movidas, na década de 1860,
por escravos que transitaram na fronteira Brasil-Uruguai. Esses cativos,
que pertenciam a senhores que tinham propriedades dos dois lados do
limite nacional, promoveram suas ações judiciais tendo como base a lei
de proibição do tráfico, de 1831. Os senhores da fronteira meridional
faziam os escravos passarem de uma a outra propriedade, conforme a
necessidade de seu trabalho. Quando retornavam do Uruguai para o
Brasil, alguns escravos, começaram a impetrar ações de liberdade com
base no fato de que haviam entrado no Brasil após a lei de 1831 e que
eram, portanto, livres. Além disso, as decisões eram influeciadas pelo
“princípio do solo livre”, ou seja, pela “idéia de que o solo livre pode
conferir liberdade a um indivíduo”.70 Esse é um caso em que o manejo
da fronteira se formalizou e se tornou explícito, mas estratégias menos
formalizadas para lidar com aquela realidade deviam estar inscritas nas
práticas correntes de muitos outros habitantes da zona de fronteira, como
temos tentado apontar aqui.
Comércio lícito e comércio ilícito na Fronteira
Também o comércio realizado nesse vasto espaço fronteiriço precisava ter em conta a questão dos limites. Ali, a prática do contrabando
estava bastante disseminada. O contrabando exigia um aparato organizacional para que pudesse se reiterar. Ele era praticado por diversos
tipos de sujeitos, desde Companhias de Comércio que mantinham linhas regulares de importação de produtos e só pagavam as respectivas
taxas quando eram apanhadas, até membros das camadas subalternas,
que praticavam o comércio ilícito para vender pequenas quantidades
70
GRINBERG, Keila. Escravidão, alforria e direito no Brasil oitocentista: reflexões sobre a lei de
1831 e o “princípio da liberdade” na fronteira sul do Império brasileiro, 2007, p. 279.
170
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
de mercadorias ou apenas para consumo próprio. Em qualquer dos casos, os agentes sabiam que aquela era uma transação ilegal, gerada pela
existência de distintos códigos jurídicos engendrados por Estados específicos e que exigia uma estratégia própria para sua realização.71
Nesse sentido, os comerciantes da fronteira também se enfrentavam com questões de demarcação de identidade/alteridade. As tensões
existentes entre eles, de ambos os lados, podiam ficar aparentes nos Processos Crimes de Apreensão de Contrabando quando os contrabandistas eram estrangeiros.
Em um processo de Autos Crimes de Execução de Contrabando
em Alegrete no ano de 185172, os réus, Helijalde & Hermanos, aparentemente, tentaram um acerto com o Agente da Coletoria, João Chrisostomo da Fonseca, funcionário não autorizado a cobrar as taxas alfandegárias, para passar suas mercadorias. Os negociantes processados alegaram em sua defesa o fato de serem estrangeiros imigrados há poucos
anos e que, portanto, ignoravam as leis do país. Na sentença, que condena os réus por crime de contrabando, o posicionamento do juiz procura
enfatizar que os réus se tratavam de estrangeiros e dizendo que estes
contrabandistas além de causarem “prejuízo a Fazenda Nacional” também
causam “grande mal aos negociantes deste lugar”. Os réus apelam da sentença e passam a basear suas alegações também em questões de “identidade nacional” dizendo que estavam sendo vítimas de perseguição por
parte de negociantes e que este tipo de procedimento da justiça afastava
os estrangeiros trabalhadores deste país.
Em outro processo, no ano de 185273, o acusado de crime de contrabando, o argentino Pedro Emílio Vidal, também sugere estar sofrendo perseguição, neste caso por parte do Inspetor da Alfândega Thomaz
Francisco Flores, uma vez que sabia de outros comerciantes que tiveram procedimento igual ao dele e que, no entanto, não tiveram suas
cargas apreendidas. Coincidência ou não, o que se pode apontar é que
às outras cargas de mercadorias que vinham junto com as de Pedro E.
THOMPSON FLORES, Mariana F. da C. Contrabando e contrabandistas na fronteira oeste do
Rio Grande do Sul (1851-1864), 2007.
72
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 78. Nº 2720.
Ano 1851.
73
APERS. Poder Judiciário. Cível e Crime. Processos Crime. Alegrete. Maço 78. Nº2729.
Ano 1852.
71
171
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
Vidal pertenciam a comerciantes brasileiros e portugueses com os quais
nada aconteceu.
Em 12 de fevereiro de 1851, a Câmara de Vereadores de Uruguaiana elaborou uma proposta de Posturas para a participação de comerciantes estrangeiros naquele município. O que justificava a necessidade
de tal código de posturas era que:
“tomando em consideração que o commercio da mesma villa e seu termo he em
grande parte manejado por indivíduos estrangeiros, os quais ao mesmo tempo
em que desfrutão por este lado todas as vantagens e gozos privativos aos cidadãos brazileiros, estão izentos do serviço público de que estes estão onerados, e
que a continuação de tal commercio he notoriamente nociva aos negociantes
nacionaes, já porque a aglomeração de gêneros de negocio importados e dispostos
nesse município pelo estrangeiro tem produzido o esmorecimento do comercio
nacional já porque aquelle commercio em lugar de concorrer para o progresso do
município contribue para seu decrescimento e ruina em razão de não ter estabilidade e permanecer só o tempo conveniente para a venda da factura, a qual se
retirão os negociantes com o numerário desfalcando o município e a mesma Província de sua riqueza intriseca.”74
Os comerciantes da fronteira tinham, nesse espaço, o privilégio,
se podemos assim dizer, de fazer contrabando. No entanto, se os comerciantes rio-grandenses da fronteira podiam trazer produtos contrabandeados e lucrar as taxas de alfândega, ao mesmo tempo, deviam conviver com comerciantes do “outro lado” que se utilizavam do mesmo recurso.
Contudo, essa utilização da diferença de “nacionalidade” constitui um recurso aplicado em situações específicas em que se mostra profícua. Na realidade, em diversos processos fica perceptível a existência
de alianças entre comerciantes “nacionais” e estrangeiros, ou seja, não
havia naturalmente, ou necessariamente, uma oposição entre esses dois
grupos de comerciantes. O fato de pertencer a outro país não constitui
um problema a priori, a diferença pode ser abertamente reivindicada
quando isto se fizer proveitoso, ou pode ser tranquilamente superada
em detrimento de outros interesses.
Dessa forma, sabendo que o recurso da reivindicação da identidade nacional assim como pode ser utilizado pode ser suprimido, é importante ter em conta que os sentimentos de pertencimento não podem
74
AHRGS. Câmara Municipal de Uruguaiana – Correspondência Expedida. A.MU-337.
Cx.182. Ano 1851.
172
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
ser tomados como como ponto de partida para estabelecer algum padrão de comportamento ou associação desses fronteiriços. Ou seja, não
se deve explicar comportamentos das pessoas, de forma apriorística,
por sua nacionalidade: por serem brasileiros, orientais, correntinos, argentinos. Mas também não se deve pensar que essas identidades não
participavam daquelas interações e conflitos. Eram manejadas de acordo com a posição dos atores nas situações concretas, e era assim que se
construíam, se reproduziam, se transformavam: em constante interação
com as relações sociais. Insistimos: não se deve esquecer que eram múltiplas e variadas as possibilidades de identidade/alteridade e que cada
uma delas era manejada pelos fronteiriços dentro da sua posição, fazendo com que a condição de fronteira se apresente de forma diferente para
cada grupo em determinadas situações.
Considerações Finais
Em resumo, a zona de fronteira estudada era atravessada por um
grande número de relações sociais de diversos matizes. As populações
de ambos os lados não estavam isoladas. Moviam-se e migravam, elas
mesmas, de parte a parte. Contudo, não há como considerar que esse
fato pudesse retirar de todo a importância da existência de um limite
político entre Estados nascentes, ao longo do século XIX. Ao contrário, a
existência de um limite nacional, ainda que instável, e de conjunturas
político-militares muito variáveis, tinham de ser levados em conta nas
estratégias dos agentes históricos.
A situação de fronteira influenciava diferentemente a vida de atores socialmente posicionados; de acordo com essa posição eles elaboravam estratégias para lidar com ela. Fazendo isso, entendiam a situação
de maneira diferente e davam significados diversos a ela. Assim, a fronteira podia ser, ao mesmo tempo, espaço de integração, de demarcação
de alteridade, de perigo, de oportunidade, de liberdade. A relação dos
diversos sujeitos e grupos com a fronteira sugere que, como observou
Fredrik Barth, “pessoas situadas em posições diferentes podem acumular experiências particulares e lançar mão de diferentes esquemas de interpretação,
ou seja, podem viver juntas, mas em mundos diferentemente construídos”.75
75
BARTH, Fredrik. Por um maior naturalismo na conceptualização das sociedades, 2000, p. 176.
173
A fronteira manejada / Mariana Flores da Cunha Thompson Flores e Luís Augusto Farinatti
Ao invés de tratar os moradores da fronteira como uma categoria
homogênea (“os fronteiriços” ou “os brasileiros da fronteira”), que lhes
emprestaria características a priori, é mais útil indagar-se sobre as formas pelas quais os atores e grupos socialmente posicionados tinham
vivências, produziam significados e estratégias para viver com/na fronteira. E, de outra parte, inquirir as formas pelas quais essas vivências
influenciaram nas próprias construções identitárias que eles elaboravam. Ou seja, nos parece bastante pertinente dirigir o estudo para a análise dos papéis desempenhados pela situação de fronteira nas ações e
relações sociais dos sujeitos e, ao mesmo tempo, investigar a fundo a
própria produção social da fronteira.
Referências bibliográficas
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O comerciante, o estancieiro e o militar:
noções divergentes de honra entre as elites
do Rio Grande do Sul no início do século XIX
Karl Monsma*
Em novembro de 1829, o Alferes Boaventura José de Oliveira e sua
mulher, Isabel Francisca de Andrade, concordaram em vender sua Estância da Muzica ao comerciante Comendador João Francisco Vieira Braga, morador da cidade-porto de Rio Grande, por 16 contos (16.000 milréis).1 Com esta compra, Vieira Braga, que havia enriquecido, em parte,
com o aprovisionamento do exército brasileiro durante a Guerra Cisplatina, esta bem posicionado geograficamente para lucrar com a paz. A
estância consistia em mais ou menos seis léguas quadradas no atual município de Dom Pedrito. A localização perto da fronteira com o Uruguai
era conveniente tanto para a venda de gado às charqueadas de Pelotas
como para a compra e venda de gado contrabandeado.
Parece que João Francisco e Boaventura nunca haviam se conhecido pessoalmente. Negociaram a venda por correspondência ao longo
de um período de dois meses e meio, com a ajuda do Marechal de Campo Sebastião Barreto Pereira Pinto, Comandante Interino do Exército do
Sul, que representou Vieira Braga. Na sua carta concordando com a ven-
* Professor Titular do Programa de Pós-Graduação em História e Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais, Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), São Leopoldo,
RS, Brasil. Agradeço a ajuda do Dr. Gilberto Centeyo Cardoso, diretor da Biblioteca RioGrandense, e dos funcionários dessa instituição. Na fase inicial, esta pesquisa recebeu foi
financiada pela Comissão Fulbright (American Republics Research Program). Atualmente
recebe financiamento do CNPq (Bolsa Produtividade em Pesquisa e Auxílio à Pesquisa –
processo 472722/2007-7).
1
Escritura, venda da Estância da Muzica a João Francisco Vieira Braga (doravante JFVB),
São Gabriel, 10/04/1830, Biblioteca Rio-Grandense (BRG), Rio Grande, RS, Lata 28, Questão
Boaventura José de Oliveira (QBJO). Com exceção de citações dos documentos, a ortografia
dos nomes (por exemplo, Yzabel, Joze) foi transcrita com a versão predominante hoje.
178
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
da, Boaventura reclamou das despesas adicionais ocasionadas pela demora em fechar o negócio e disse que venderia a estância: “com a Condição Só q’ hei de reçeber o pro pagamto em S. Gabriel em prata e aSim
me cobro de 300000 tanto mil rs qe Gastei Sem adiantar coza alguma”
(grifo no original), dizendo também que por ocasião do primeiro pagamento “façaremos Escritura o q’ agora não hé preçizo pois Basta Só a ma
palavra de honra Sendo mais Segura do q’ a ma propia firma”.2 João
Francisco se queixou da dificuldade de pagar em prata, mas concordou
com essas condições. Alguns meses depois, efetuou o primeiro pagamento e tomou posse da estância.
Vieira Braga devia dois pagamentos adicionais de 2 contos cada, a
serem pagos com intervalos de um ano. As relações entre os dois homens se azedaram quando Boaventura foi a Pelotas cobrar o segundo
pagamento um ano depois. Boaventura achava que o saldo seria pago
em prata. Depois alegou que o Marechal Barreto havia lhe garantido
oralmente que Vieira Braga pagaria todo o preço da propriedade em
prata. Mas Vieira Braga insistiu que devia os 4 contos restantes em moeda de cobre, apontando a escritura assinado por Boaventura por ocasião do primeiro pagamento, que dizia que ele havia recebido 12 contos
em prata, mas não especificava a natureza dos outros pagamentos. A
reação ultrajada de Boaventura, porém, sugere que ele realmente esperava ser pago com moeda de prata. Com a ajuda de José Antonio Pimenta, publicou um artigo em um jornal de Porto Alegre difamando João
Francisco e contando sua versão da disputa, emitindo, assim, um desafio público a Vieira Braga.
O artigo apareceu no Correio da Liberdade no dia 9 de julho de 1831,
assinado pelo “Amigo dos Homens de bem”, e acusava Vieira Braga de
ser um tratante mentiroso, apesar de se apresentar publicamente como
homem honrado.3
Quasi nunca a honra e a probidade dos homens pode regularse pelo
caracter, que o seu exterior nos representa: as mais das vezes se nos figurão taes, que parecia um attentado só a suposição de que serião capazes
de faltar á verdade, aquelles mesmos, em cujo coração não reside mais
que o embuste, e a mentira; e commumente soppomós indigno de commetrer uma vileza o que, quando se tracta de seus interesses particula-
2
3
Boaventura José de Oliveira a JFVB, Estância da Muzica, 10/11/1829, L28, QBJO.
Cópia em BRG, L28, QBJO.
179
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
res, nenhuma duvida tem em os practicar com o maior descaramento,
illudindo impunemente a fé de seus tractados e ajustes á sombra da preponderancia, e representação que entre a sociedade tem injustamente
adquerido.
Para Boaventura, Vieira Braga usou a escritura da estância para
burlar seu acordo: “quiz o dito Braga paga-los em cobre apegando se
para isto a um ponto mal entendido da Escritura”. Depois de uma discussão, Boaventura, segundo seu relato, decidiu aceitar o cobre, mas
reservou o direito de continuar exigindo o pagamento em prata. Vieira
Braga pediu para ele passar numa loja no dia seguinte para receber o
dinheiro, mas quando Vieira Braga apareceu no dia marcado com o esboço de um recibo para Boaventura copiar, dizendo que receberia o dinheiro depois, Boaventura se recusou a passar o recibo antes de receber.
O cunhado de Vieira Braga, Domingos Rodrigues Ribas, entregou o dinheiro de cobre em pagamentos menores ao longo dos dois dias seguintes e depois apresentou o esboço de um recibo que não mencionava a
natureza da moeda usada no pagamento, “por assim convir aos interesses e boas intenções do Sr. Braga: porem Boaventura que já via a forma,
porque o intentavão enganhar, passou sim o recibo, mas não segundo o
rascunho, que lhe foi dado: fez as declarações, que julgou convenientes”.
Ribas aceitou o recibo com alguma relutância, mas reapareceu nessa noite com dois outros homens, “ordenando que se lhe passasse o recibo por
um terceiro rascunho, que apresenta, ou do contrario se lhe entregasse o
dinheiro, para cujo effeito trazião já aquellas mesmas horas uma ponta de
negros: e não se fiando no honrado Boaventura, que era capaz de quardar
milhões sem recibo, nem lhe queria confiar por uma noite uma somma,
de que elle mesmo era proprietario”. Ribas só foi embora quando Boaventura entregou o dinheiro ao dono da casa onde estava hospedado.
Obrigou Ribas ao Dono da casa a ficar por depositario com manifesta
afronta deste honrado homem [Boaventura], que em S. Francisco de
Paula recebeo por esta occasião os maiores vexames, com espanto de
todos as pessoas, que conhecem seus honrados sentimentos: [Ribas]
cedeo por fim á razão, e se retirou; mas o honrado Boaventura, considerando de noite que era melhor entregar o dinheiro, e receber o recibo
que passara, do que expor se a ser atacado, quando se retirasse, e roubado por similhantes salteadores, que até podião attentar contra a sua
vida, assim o fez.
Aparentemente Boaventura voltou para sua casa nova em São Gabriel sem o dinheiro. Sentia-se profundamente insultado não somente
180
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
pela tentativa de lhe pagarem em cobre, mas também pela suspeita e
falta de educação que Ribas demonstrara. A ameaça de mandar um grupo de escravos para forçá-lo a devolver o dinheiro era uma rejeição clara da palavra de honra de Boaventura. Parece que foi por isso que ele
acusou Ribas de ser um salteador, o que Ribas, por sua vez, interpretou
como um insulto grave.
Voltando ao início da história, embora Boaventura tenha acusado
João Francisco de tentar fraudá-lo, não está claro que este queria enganá-lo, dada a obsessão com a lisura ou, pelo menos, em manter a aparência dela, evidente no resto da sua correspondência. João Francisco
entendia, ou disse que entendia, que somente o primeiro pagamento, de
12 contos, devia ser de prata. O fato de que a escritura não especificava
a natureza dos 4 contos restantes sustentava sua interpretação. Por outro lado, Boaventura, baseando-se nas palavras do Marechal Barreto,
representante de Vieira Braga, acreditava que todo o preço da estância
seria pago em prata. Ele prestou pouca atenção ao que estava escrito no
contrato porque, afinal, todos os envolvidos eram homens de honra, e o
que importava para homens de honra era a palavra empenhada (oralmente).
Para Boaventura, Vieira Braga era um comerciante urbano calculista e sem-vergonha que queria se aproveitar das tecnicidades da palavra escrita para fraudar um homem de honra, que ainda acreditava que
a palavra de um homem importava. No seu artigo, Boaventura e Pimenta usaram as palavras “honra” ou “honrado” 12 vezes, oito das quais
para descrever Boaventura. O texto só comentava a honra de João Francisco Vieira Braga ironicamente.
Não se pode duvidar que o Sr. Braga desde o principio deste negocio
teve sinistras intenções [...] Desmentir a todas as pessoas, que assistirão
ao ajuste, pertendendo pagar em cobre, só porque na escriptura não está
bem declarado, será o modo de proceder dos homens de honra!!! Ah, Sr.
Redactor, se a palavra não obriga os homens, qual será a escriptura, que
os obrigará!
Entretanto, se realmente acreditasse que Vieira Braga fosse um
homem sem honra, Boaventura não teria se dado o trabalho de escrever
o artigo. Somente atacou a honra de João Francisco porque acreditava
que ele realmente tivesse honra a perder. Com efeito, dizia que João
Francisco não merecia a honra que os outros lhe concediam, que lhe
faltava o sentido de honra internalizado que gera sentimentos fortes de
181
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
obrigação moral. Segundo Boaventura, João Francisco somente apresentava o aspecto honrado para esconder seu cerne interesseiro e calculista.
A decisão de levar a disputa para a esfera pública e a descrição idealizada do homem honrado no artigo também sugerem que o conceito de
honra ressoava entre todas as elites da época. Não era somente uma
obsessão de estancieiros interioranos.
Mas Vieira Braga e Ribas claramente se consideravam homens
honrados e defenderam sua honra na Justiça. Depois de o Júri de Acusação decidir que o artigo realmente constituía “abuso de liberdade da
imprensa”, eles processaram José Antônio Pimenta e, posteriormente,
Boaventura José da Oliveira.4 Segundo a acusação formal preparada por
seu advogado, “em detrimento da honra, e probidade com que em todos os tempos se tem distinguido [Vieira Braga e Ribas] acabão de ser
atrosmente calumniados, e injuriados”. O artigo estava cheio de insultos e mentia a respeito da forma do pagamento devido e do tratamento
sofrido por Boaventura quando foi fazer a cobrança. Depois de repassar
as “insolencias, injurias, e falsidades” do artigo, a acusação concluía que
“ninguem deixará de notar no impresso denunciado o aluvião de injurias,
que muito de proposito se cuspirão sobre o bom conceito, honra, e caracter [de Vieira Braga e Ribas].”5
Seria um erro acreditar que o avanço do mercado e dos cálculos
racionais minava a importância da honra, que era fundamental para grandes comerciantes como Vieira Braga e Ribas. Entretanto, as características mais salientes da honra mercantil eram um tanto distintas dos aspectos da honra enfatizados no mundo rural de Boaventura. O desentendimento entre eles e o conflito dela resultante se derivaram, em grande parte, de noções distintas de honra. Para compreender a evolução deste confronto, é importante indagar sobre a natureza da honra e por que
ela era importante na Província de São Pedro na primeira metade do século XIX.
4
5
Sobre o funcionamento dos júris na época, cf. Flory, 1981, p. 115-27.
José de Paiva Magalhães Calvet, “Libello accusatorio […] contra o R. citado José Antonio
Pimenta”, 09/03/1832, BRG, L28, QBJO.
182
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
A honra no Rio Grande do Sul imperial
A honra é uma avaliação da pessoa por parte de outros integrantes da comunidade, mas também é internalizada na forma de um “sentido de honra”, que orienta o comportamento honrado (Stewart, 1994, p.
9-21). Alguns pesquisadores definem a honra hierarquicamente, como
distinção e precedência (Pitt-Rivers, 1965, p. 19-77; Pitt-Rivers, 1968, p.
503-11). Outros a percebem como a respeitabilidade básica ou um tipo
de consideração concedida por uma comunidade a todos os integrantes
em conformidade com certas regras fundamentais (Campbell, 1964, p.
268-97; Stewart, 1994). Neste sentido, a honra é o reconhecimento, por
parte de outros, de que a pessoa possui um sentido de honra internalizado. Este “direito ao respeito” é pré-requisito essencial para a honra no
sentido da distinção e pode ser pensado como o “direito à honra”
(Stewart, 1994).
A honra hierárquica é uma forma de capital simbólico (Bourdieu,
1977, p. 171-83). Como a honra toma, tipicamente, formas bem diferentes para homens e mulheres, focaliza-se aqui somente a honra masculina. A honra hierárquica afere o valor social relativo de um homem, seu
valor para sua família, para parceiros de trocas, para sua comunidade,
para seu país. Dado o direito básico ao respeito, os homens acumulam o
capital simbólico da honra por meio de uma conjunção de, por um lado,
privilégio, riqueza e poder e, por outro, atos honrados, que demonstram a internalização do sentido de honra e, muitas vezes, são facilitados pela posse de recursos e poder. Além de ser valorizada por si só, a
honra traz outros benefícios. Um homem honrado tem tanto os recursos
como a fibra moral necessários para assumir e cumprir compromissos,
o que significa que ele é um parceiro valioso e confiável para diversos
tipos de trocas (Bourdieu, 2000; Herzfeld, 1980). Portanto, a honra suscita a colaboração dos outros. O capital simbólico da honra serve como
crédito nas relações de troca que continuam ao longo do tempo (Bourdieu, 1977, p. 80-81).
O capital simbólico, difícil de aferir e validado pela opinião dos
outros, pode evaporar rapidamente (Bourdieu, 1977, p. 181-82). Aqueles que não defendem sua honra contra desafios a perdem (Stewart,
1994, p. 64-71). Nos grupos que valorizam a honra, os homens são bastante sensíveis a ofensas e só podem desconsiderar um desafio se provir de alguém tão inferior que não merece uma resposta (Bourdieu,
183
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
2000; Campbell, 1964, p. 280-81; Pitt-Rivers, 1965, p. 31). Em geral, a
honra pesa mais nos contextos onde lealdades pessoais são mais importantes para a segurança e o sucesso (Pitt-Rivers, 1965, p. 58-61; Pitt-Rivers, 1968, p. 509-10; Schneider, 1971, p. 17).
As lealdades pessoais e a honra necessária para sustentá-las eram
essenciais por vários motivos na Província de São Pedro do Rio Grande
do Sul no início do século XIX. Boa parte do campo era um mosaico de
propriedades com limites vagamente definidos ou sobrepostos, e os que
reivindicavam as mesmas terras frequentemente recorriam à violência
física e à intimidação ou lutavam na Justiça. A vigilância constante e a
capacidade de mobilizar aliados no campo, na burocracia do Estado e
na Justiça eram essenciais para proteger as terras contra as pretensões
de vizinhos. Defender as terras era uma questão de honra, prova de que
um homem podia proteger o patrimônio familiar. Como um parente de
João Francisco Vieira Braga escreveu durante uma disputa por terras,
“jamais deixarei de sustemtar o meu direito, não olhando ao interece, e
sim a onrra, por não acobertar a nossa regineração, pr qm estamos obrigados a dar a vida, pa flecidade de nossos vindouros.”6
Quando João Francisco Vieira Braga comprou a Estância da Muzica
de Boaventura de Oliveira, uma parte das terras era contestada na Justiça.7 Boaventura havia recebido uma sesmaria de 3 léguas quadradas em
1816, mas havia ocupado mais ou menos 6 léguas, e algumas partes das
terras adicionais eram disputadas por vizinhos (César, 1978, p. 25-27).
Vieira Braga tinha confiança de que podia obstar qualquer ameaça à sua
posse da estância. Ele era participante frequente de disputas na Justiça
– tanto nas suas próprias como nas de outros –, mobilizando seus contatos no Estado para solicitar aos juízes decisões favoráveis. Informou
seu capataz que a disputa sobre as terras da Estância da Muzica “he
nada, porque já mais posso deixar de ser ouvido para ser esbulhado da
ma propriedade”.8 Quando a Justiça era lenta, a violência e a intimidação
Francisco José Gonçalves da Silva a JFVB, Serrito (Jaguarão), 14/07/1821, BRG, L25. Cf.
Bourdieu, 1977, p. 182, onde discute fenômenos análogos entre os Kabyle.
7
João Fernandes da Silva a JFVB, Estância da Muzica, 09/12/1832, BRG, L26; JFVB a João
Fernandes da Silva, Rio Grande, 13/02/1833, BRG, L27, Copiador de cartas a João Fernandes
da Silva.
8
JFVB a João Fernandes da Silva, São Francisco de Paula, 25/12/1832, BRG, L27, copiador
de cartas a João Fernandes da Silva.
6
184
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
serviam para defender as terras. Em 1834, outro vizinho havia invadido
uma parte da estância, e João Francisco exortou o capataz à ação vigorosa:
Devo prevenillo que se elle, ou qualquer outro tentar occupar algum
terreno do que está dentro das devizas desse campo, vmce deve não consentir, requerendo logo ao Juiz de Paz para fazer conter a cada hum nos
seus limites, e quando o Juiz deixe de fazer justiça (o que não he de esperar) em tal cazo deve vmce obstar com força a qualqr tentativa que fação,
pois a Ley me permite assim fazelo, e eu respondo por todo o mal que
lhe possa sobrevir.9
Proteger as terras que reivindicavam era importante tanto para
Boaventura como para João Francisco, mas os horizontes deste último
eram mais amplos. A honra também era um recurso importante para
manter suas relações políticas e comerciais. Na ausência das instituições modernas de avaliação de crédito, a honra permitia a confiança nas
trocas comerciais, servindo como garantia simbólica. Os grandes comerciantes da província de São Pedro se envolviam em muitas trocas a longa distância e transações que se estendiam no tempo, sem correspondência imediata, mas sempre com parceiros conhecidos ou recomendados por conhecidos. João Francisco mantinha relações duradouras com
agentes no Rio de Janeiro e em Rio Grande (depois de se mudar para
Pelotas). Ele emprestava dinheiro a estancieiros, charqueadores e comerciantes sem mais garantia, em muitos casos, que a honra do devedor.
A manipulação astuta das relações pessoais era importante para
influenciar os políticos e os funcionários do Estado. Seja qual for a coesão que se possa identificar entre os bacharéis que ocupavam a maioria
dos altos cargos do Estado imperial, esses homens também estavam ligados com as elites locais por laços de parentesco e troca.10 João Francisco Vieira Braga arranjava a eleição de políticos, e em troca podia indicar
seus preferidos para cargos locais. Sua eficácia como intermediário dependia de sua honra, que sintetizava sua influência e confiabilidade.
João Francisco Vieira Braga era um participante entusiástico desse sistema de patronagem, embora só tenha alcançado o auge de sua influência algumas décadas depois de seu conflito com Boaventura de
9
10
20/11/1834, BRG, L27, Rio Grande, Copiador de cartas a João Fernandes da Silva.
Carvalho (1996) mostra a importância da formação e socialização comuns dos bacharéis
que entravam no serviço do Estado. Graham (1990) demonstra laços cruciais de dependência
mútua entre as elites políticas e as elites locais, sobretudo os fazendeiros.
185
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
Oliveira. Os Vieira Braga ilustram as estratégias familiares econômicas e políticas comuns no Brasil imperial. Além de ser estancieiro e
comerciante, João Francisco ocupou vários cargos políticos. Na cidade
de Rio Grande, foi juiz almotacel, tesoureiro do selo, vereador, administrador do contrato do quinto dos couros e diretor da obra da nova alfândega; na década de 1830, foi juiz de paz em Pelotas, deputado na Assembléia Provincial e vice-presidente da Província de São Pedro do Rio
Grande do Sul.11 Dois dos irmãos de João Francisco se formaram pela
Academia de Direito de São Paulo: Antônio virou desembargador em
Porto Alegre e Miguel, inspetor chefe da Alfândega de Rio Grande que
João Francisco construíra (Magalhães, 1993, p. 126-7).12 Os outros quatro irmãos, Francisco, Manuel, Joaquim e Vicente, eram estancieiros na
freguesia de Boqueirão (atual São Lourenço do Sul), distrito do município de Pelotas, onde ocuparam vários cargos e podiam influenciar, se
não controlar, quase qualquer eleição.
A relação política mais valiosa de João Francisco Vieira Braga,
porém, era o genro de sua irmã, seu compadre o conselheiro Antônio
Rodrigues Fernandes Braga, bacharel que foi presidente da Província
de São Pedro brevemente em meados da década de 1830, até ser deposto pela Revolução Farroupilha, e depois virou desembargador na Corte.
Depois da Guerra Farroupilha, João Francisco, que havia passado a maior
parte da guerra na Corte, usaria suas relações com Fernandes Braga e
outros contatos da Corte para se tornar intermediário chave entre o sul
da província e o governo imperial. Esta posição dependia de sua honra,
que servia como garantia de que ele era influente e confiável. Usar suas
relações (capital social) para fazer favores lhe rendia mais honra (capital simbólico), que facilitava a ampliação de sua rede de relações. Por
sua vez, tanto a honra como a rede de relações eram úteis nas suas transações comerciais.
JFVB, Exposição sucinta dos serviços prestados a S. M. o Imperador e à Nação [1840]. In:
Spalding, 1969, p. 134-8.
12
Miguel, que esperava enriquecer com o cargo, morreu naufragado menos de um ano depois
de tomar posse (Miguel Vieira Braga a Maria Angelica Barbosa, 01/11/1839, Rio Grande,
BRG L26; Azevedo s. d., p. 84). Tanto Azevedo como Guilhermino César (1978) afirmam
erroneamente que Miguel era filho natural de João Francisco Vieira Braga. As cartas da
família Vieira Braga deixam claro, porém, que era irmão legítimo (Miguel Vieira Braga a
Maria Angelica Barbosa, 01/11/1839, Rio Grande, BRG L26; JFVB a Vicente Manoel
d’Espindula, Pelotas, 15/10/1874, BRG L29, Copiador 124).
11
186
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Em suma, Vieira Braga tinha bons motivos para defender sua honra
contra contestações. Não era uma obsessão irracional desvinculada de
preocupações “reais”; era pré-requisito básico para trocas personalizadas e, por isso, essencial para o sucesso em um mundo onde as relações
pessoais eram as únicas que realmente importavam. João Francisco nasceu e cresceu nesse mundo, e a honra permeava suas disposições e esquemas cognitivos. Portanto, não temos motivo para pensar que ele tenha parado para calcular os custos e benefícios em potencial antes de
responder ao desafio de Boaventura. O mesmo se aplica a Boaventura.
Definições divergentes de honra
A natureza do duelo – no jornal e na Justiça – entre Boaventura e
Vieira Braga sugere definições divergentes de honra. Para estancieiros
como Boaventura, que moravam nas suas propriedades, a grande maioria das trocas que não eram simples e imediatas envolviam a interação
face a face prolongada dispensando, portanto, contratos escritos e complexos. Posteiros e alguns outros trabalhadores recebiam salários mensais, e agregados ganhavam acesso à terra em troca da proteção dos
limites das propriedades e trabalho eventual. Todos os estancieiros que
moravam no campo também se envolviam em redes informais de troca
com outras elites rurais: colaboravam com vizinhos nos rodeios e na
separação dos rebanhos; emprestavam escravos para fazer currais ou
construções; ajudavam na perseguição a ladrões ou escravos fugidos;
votavam em políticos indicados por conhecidos em troca de favores das
autoridades locais indicadas por esses políticos.13 Todos guardavam
contas mentais de favores prestados e recebidos, e classificavam aqueles com quem interagiam como “amigos” confiáveis ou como ingratos
13
Esta breve descrição da vida nas estâncias se baseia principalmente nas instruções que
JFVB preparou para seu capataz depois de comprar a Estância da Muzica e sua
correspondência subsequente com o capataz (JFVB, Instruções dadas ao Sr. João Fernandes
da Silva capataz da Estância da Muzica, 28/07/1832, BRG, L27, Estância da Muzica
[publicado, com alguns erros de transcrição, em César, 1978, p. 37-48.]; João Francisco
Vieira Braga, Copiador de cartas a João Fernandes da Silva, 1832-5, BRG, L27, Estância da
Muzica). Também aproveitei a correspondência dos irmãos Vieira Braga que viviam nas
suas estâncias, sobretudo Vicente (BRG, L27). Veja também Bell, 1998; Cardoso, 1962;
Chasteen, 1995, p. 21-35; Farinatti, 2007; Freitas, 1981; Laytano, 1950; Leitman, 1975; Lobb,
1970; Maestri, 1984; Queiroz, 1977; Santos, 1984; Slade, 1971; Xavier, 1964.
187
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
desleais e, portanto, desonrados. Mas manter contas escritas de favores
teria violado o espírito dessas trocas, sugerindo que a pessoa não confiava nos outros e não queria conservar relações colaborativas duradouras
(Blau, 1986, p. 88-114). A uma pessoa assim faltavam a lealdade e a capacidade de assumir compromissos que distinguiam o homem de honra.
Vieira Braga também se envolvia em trocas com pessoas que conhecia pessoalmente, mantinha relações duradouras com agentes e parceiros, e misturava os diferentes campos de troca, mas estava muito mais
acostumado com obrigações escritas e complexas, que estendiam as trocas no espaço e no tempo, permitindo sua continuidade sem a interação
face a face. A estância era somente um dos seus investimentos diversificados. Nessa época, ele tinha armazéns na cidade de Rio Grande e se
identificava principalmente como um comerciante que negociava com
Rio de Janeiro. Também comprava charque dos estancieiros e charqueadores da margem da Lagoa dos Patos e lhes vendia provisões.14 A facilidade com a palavra escrita e com a contabilidade era essencial para o
sucesso nesse mundo de parcerias, escrituras, fianças, títulos, juros e
taxas de câmbio. Contas cuidadosas, contratos claros e atenção aos detalhes, junto com a honestidade e a lealdade, tornavam um comerciante
confiável para seus parceiros de negócios e, portanto, eram constitutivos da honra mercantil. Promessas gerais e verbais sugeriam desleixo e
falta de comprometimento, não honra.
As elites rurais e urbanas também defendiam sua honra de maneiras distintas. John Chasteen apresenta evidências de que os homens
da região da fronteira, inclusive estancieiros, geralmente defendiam sua
honra com brigas de punhal (Chasteen, 1990, p. 47-64), mas as elites
urbanas preferiam brigar na Justiça ou nas colunas dos jornais. Ou seja,
as elites urbanas duelavam com palavras, geralmente palavras escritas.
Era comum os litigantes “desperdiçarem” dinheiro em recursos com
poucas chances de sucesso; desistir por motivos meramente econômicos implicava covardia vergonhosa. Ganhar na Justiça significava humilhar os inimigos. Mais de 20 anos depois, quando ganhou uma causa
na Relação da Corte, João Francisco Vieira Braga escreveu: “Nada me
14
Cf. José da Costa Santos a JFVB, Fazenda de São Lourenço, 12/11/1821, 16 junho 1822, 12/
08/1822, BRG, L25; Manoel Machado Pereira a JFVB, 31/08/1821, BRG, L25; Francisco
Vieira Braga a JFVB, Rio de Janeiro, 03/08/1822, BRG, L25; Francisco Vieira Braga a JFVB,
São Lourenço, 21/08/1828.
188
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
póde ser mais agradavel do que triumfar dos meus adversarios, que
tanto se empenhão em prejudicar-me.”15 Para atacar a honra de João
Francisco, que morava longe, na cidade de Rio Grande, e teria desprezado um desafio físico de qualquer maneira, Boaventura precisava emitir
um desafio “urbano”, na forma da calúnia que publicou, mas isso acabou favorecendo João Francisco, que tinha muito mais experiência no
uso de palavras e leis como armas.
O processo contra Boaventura e Pimenta por “abuso de liberdade
de imprensa” e as evidências que Vieira Braga e seu advogado anexaram para provar que ele era um homem honrado enfatizam suas contas
cuidadosas e seu cumprimento exato de contratos. A acusação inicial
afirma que o artigo com a crítica a Vieira Braga e Ribas inclui “expressoens
afrontosas com o fito de deprimir sua fama, e credito”, e uma das piores
delas é a declaração de que João Francisco “com o maior discaramento
ilude a fé de seus tractados, e ajustes”.16 Para provar sua honra, João
Francisco e Ribas solicitaram atestados de autoridades públicas e dos
comerciantes de Porto Alegre e Rio Grande. Vinte comerciantes de Porto Alegre assinaram uma declaração dizendo que Vieira Braga e Ribas
“tem sempre merecido o melhor conceito, atenta a boa fé, probidade, e
honra com que se hão portado em todas as suas transaçoens mercantis”.17 Quarenta comerciantes de Rio Grande atestaram que Vieira Braga
“sempre gozando de muito credito, e havido por mto exacto em suas
Contas, verdadeiro, e pontual no cumprimento dos seus contratos”.18 O
Marechal Sebastião Barreto Pereira Pinto declarou, sobre Vieira Braga,
que “tenho ouvido falar aos que com ele tem relassõens comerciáis com o
maior elogio, pelo fiel, e cabál cumprimento dos seus trátos, e tranzassõens”.19 João Francisco também anexou atestados provando que havia
sido eleito ou nomeado para vários cargos oficiais, que evidenciavam
não somente que ele era importante, mas também que era digno da confiança da monarquia e de seus pares.
JFVB a Antônio Rodrigues Fernandes Braga, Pelotas, 15/12/1857, BRG, L29. Vieira Braga também presumia que a outra parte recorresse para que o processo fosse julgado uma vez mais.
16
José de Paiva Maglhães Calvet, Libello accusatorio […] contra o R. citado José Antonio
Pimenta, 09/03/1832, BRG, L28, QBJO.
17
14/03/1832, BRG, L28, QBJO. A semelhança entre essa declaração e a acusação contra
Pimenta sugere que o advogado Calvet escreveu os dois documentos.
18
09/03/1832, BRG, L28, QBJO.
19
Porto Alegre, 16/03/1832, BRG, L28, QBJO.
15
189
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
As evidências que Boaventura apresentou para se defender não
estão anexadas ao processo porque, depois que Pimenta apresentou uma
carta de Boaventura assumindo a responsabilidade pelo artigo, o júri
absolveu Pimenta, e Vieira Braga e Ribas processaram Boaventura na
comarca de Cachoeira, onde Boaventura morava.20 Foi impossível localizar o novo processo; portanto, não sabemos o resultado final deste conflito. Entretanto, Boaventura, com a ajuda de Pimenta, havia apresentado seus argumentos no artigo, construindo uma narrativa para o tribunal da opinião pública em que um comerciante velhaco usou documentos enganosos para fraudar um estancieiro honesto, que sempre honrava sua palavra. João Francisco, com a ajuda de seu advogado, apresentou uma narrativa para o juiz e o júri em que um comerciante meticuloso, que sempre cumpria seus tratos e merecia a confiança do Estado e do
público, foi atacado injustamente por um rústico semialfabetizado que
não queria cumprir um ajuste formal. Ambos usaram suas noções de
honra para se apresentar de maneira favorável. Para a sorte de Vieira
Braga e de Ribas, a primeira fase do julgamento aconteceu em Porto
Alegre, onde os jurados eram homens da elite urbana como eles. Por
outro lado, é possível que o júri da comarca interiorana de Cachoeira
tenha se identificado com a definição de honra de Boaventura.21
Coragem e dever cumprido
Poucos meses antes de encetar as negociações com Boaventura de
Oliveira sobre a compra da Estância da Muzica, João Francisco Vieira
Braga sofreu outra afronta, desta vez de um oficial militar e de uma
maneira bem menos pública, que fornece mais evidências sobre a natureza das diferenças nas noções de honra de segmentos distintos da elite.
Ao fim da Guerra Cisplatina, muitos equipamentos e provisões militares ficaram na região da fronteira, e o exército requisitou bois dos estancieiros para removê-los. O oficial militar (aparentemente Sargento
Maior) Antônio Francisco Pinto de Oliveira mandou tirar nove bois da
Fazenda da mãe de Vieira Braga, sem consultar a este, e deixou um recibo para posterior pagamento. Em resposta, Vieira Braga escreveu uma
20
21
Boaventura a José Antônio Pimenta, São Gabriel, 11/06/1831, BRG, L28, QBJO.
Os júris geralmente eram dominados por integrantes das elites locais, que podiam influenciar
os jurados mesmo quando eles mesmos não serviam nos júris (Flory, 1981, p. 123).
190
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
carta áspera a Pinto de Oliveira e outra reclamando dele ao Marechal de
Campo Sebastião Barreto Pereira Pinto, o mesmo comandante que representaria Vieira Braga nas negociações iniciais com o estancieiro Boaventura. Pinto de Oliveira respondeu a Vieira Braga com uma carta irônica, mas não abertamente insultuosa, e enviou outra mais maldosa ao
Marechal Barreto Pereira Pinto, que a entregou a João Francisco.
Embora Pinto de Oliveira escrevesse como militar, suas noções de
honra eram parecidas em vários aspectos com as dos estancieiros da fronteira, e parece que ele também era estancieiro, porque havia doado bois
próprios. Pinto de Oliveira escreveu ao Marechal Pereira Pinto que Vieira
Braga merecia a “ms austéra correcção”, mas, “lutando com= os meus
Estimulos”, ele havia respondido de forma moderada à provocação de
Vieira Braga.22 Ele escreveu a Vieira Braga que este estava “fazendo de
nada huma comprida Estoria, e de huma mosca hum Elefante” e o lembrou de que o exército fora a “Salvação dos haveres [dos moradores], e de
todos os habitantes”. Ele mesmo havia contribuído com dez bois, “tanto pa
exemplo dos mais, como pelo interece q’ devia tomar na percizão, apezar
de ficar exposto a pagar os meus Carretos, e comtudo me não queixo”.23
Pinto de Oliveira tentava envergonhar Vieira Braga, em vez de
questionar sua honra diretamente. Sua carta ao Marechal Pereira Pinto
era bem mais insultuosa, mas não constituía um desafio direto a João
Francisco porque não foi endereçada a ele e não era pública (Pitt-Rivers,
1965, p. 25-7). A carta de João Francisco ao oficial Pinto de Oliveira era,
segundo este, “o mais atrevido e insultante”.24 Vieira Braga foi o único
estancieiro a protestar, mas Pinto de Oliveira de fato havia sido generoso com ele e sua mãe aceitando os novilhos tambeiros que o capataz
forneceu em vez de verdadeiros bois de trabalho. O motivo real da raiva de João Francisco era um conflito anterior:
Este sugeito Exmo. Sn_r funda a sua contrariede sobre a ma inteireza por
não querer annuir ao mto q’ se empenhou pr escrita q’ conservo pa qe eu
obrase o ms excandalozo despotismo contra seu proprio Tio Nicolao Lo-
Antônio Francisco Pinto de Oliveira a Sebastião Barreto Pereira Pinto, Quartel do Bom
Desterro, 25/05/1829, BRG, L27, Correspondência especial.
23
Antônio Francisco Pinto de Oliveira a JFVB, Quartel do Bom Desterro, 13/05/1829, BRG,
L27, Correspondência especial.
24
Antônio Francisco Pinto de Oliveira a Sebastião Barreto Pereira Pinto, Quartel do Bom
Desterro, 25/05/1829, BRG, L27, Correspondência especial. Infelizmente o acervo de Vieira
Braga não inclui uma cópia da carta que mandou a Pinto de Oliveira.
22
191
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
pes Soares, e fazendo=lhe ver a im=moralide da sua pertenção, sei qe
ficara vechadicimo, e ao mmo tpo meu declarado Inimigo.
Além do mais, Pinto de Oliveira havia suportado grande sofrimento para cumprir sua missão, enquanto Vieira Braga vivia em conforto na cidade de Rio Grande:
O q’ fis foi conduzir pesoalme a Boyada lutando com huma geral Inundação, e suportando o rigor de hum des=abrido temporal, molhado de
manham athe a noite pelo interece q’ tomava de chegar a tempo de ser
útil da mma forma qe arostando=me a todos os perigos, tive a honrra de
entregar a V.Exa. em S. Rafael o auxilio q’ pude levar de cavalhada, entreto q’ João Braga no Ro Grde debaixo de coberta enchuta emtronizado
na ms infatuada soberba, com= a penna na mão empregando os seus
conhecidos talentos em sensurar dos qe andão expostos, e briozame trabalhando, e os Hiates promptos pa voar ao ms minimo anuncio de Inimigo, em lugar de rehunir-se a forsa armada [...] Eis os Eroes qe fazem
Guerra em tempo de Pás.
Em contraposição a isso, os soldados desmobilizados haviam sido
“afastados pr huma tropa de gado, mandando huns rolar=se dentre de
surroens, outros em trages de mer”.
Apesar da falta de publicidade, que seria necessária para caracterizar este conflito como uma luta de honra, Pinto de Oliveira e Vieira
Braga travaram um quase duelo pelas cartas, cada um tentando convencer o Marechal Barreto Pereira Pinto – o “juiz” neste caso – de sua honradez e da falta de honra do outro.
Pinto de Oliveira apresenta um conjunto de contrastes nítidos entre o mundo dele e o de Vieira Braga. Um trabalha; o outro critica. Um
aguenta o vento e a chuva; o outro permanece enxuto e confortável. Um
porta uma espada, mas é moderado; o outro usa uma pena, mas é descontrolado. Um enfrenta o perigo; o outro foge. Um coloca o dever e a
lealdade acima de tudo; o outro sacrifica seus próprios parentes para
obter vantagens. Transparecem aqui o respeito pela resistência física e o
desprezo pela fraqueza e covardia que Norbert Elias (1996) identifica
como típicos dos códigos de honra de grupos guerreiros. Elias contrasta
a honra guerreira com o “código moral” típico da burguesia, mas o uso
das palavras “honra” e “honrado” por parte de Vieira Braga e Ribas para
caracterizar a si mesmos e suas práticas comerciais sugere que, para os
grandes comerciantes brasileiros do século XIX, honestidade e contas cuidadosas integravam um código de honra comercial.
192
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Tanto Boaventura como Pinto de Oliveira afirmaram que Vieira
Braga usava a palavra escrita para lesar e se aproveitar dos outros. Suas
contas cuidadosas e a insistência em ser consultado sobre requisições
militares evidenciavam a falta de capacidade para confiar nos outros, o
que mostrava que ele mesmo não era digno de confiança. Sua riqueza,
influência e habilidades com a pena o tornavam ainda mais perigoso para
os homens honrados. Pinto de Oliveira também associava a confiabilidade com a coragem e o trabalho duro, em contraposição à covardia e ao luxo
do comerciante urbano embusteiro. Toda a maneira de viver dos ricos urbanos era vagamente efeminada e, portanto, traiçoeira e desonrosa.
Conclusões
Em todos os três casos, a honra é uma avaliação pública da confiabilidade do indivíduo e, portanto, de seu valor como parceiro em vários tipos de trocas, mas a maneira de avaliar a honra difere conforme o
grupo social em que cada indivíduo se insere, porque a natureza das
redes de relações e das trocas varia entre grupos. Para o estancieiro Boaventura, imerso em um mundo de relações locais face a face, a honra é
evidenciada sobretudo pelo cumprimento da palavra, junto com a disposição de responder a insultos pessoalmente mediante a violência física. Para o militar Pinto de Oliveira, a honra se mostra pela coragem e
pela disposição de aguentar sofrimentos para cumprir o dever, justamente as qualidades que tornam um soldado confiável para seus companheiros e um oficial respeitado pelos subordinados. Para o comerciante Vieira Braga, por outro lado, empenhado em construir e manter uma
ampla rede de relações a longa distância com outros comerciantes, com
políticos e com altos funcionários do Estado, o que envolve necessariamente a palavra escrita, a honra se prova pela contabilidade cuidadosa
e pelo cumprimento exato dos contratos. A defesa da honra, para Vieira
Braga, é realizada preferencialmente pela palavra escrita, também nas
colunas dos jornais ou nas peças processuais, e pode ser encomendada a
outros, principalmente advogados. Para desafiar o distante Vieira Braga, o estancieiro e o militar precisavam usar a palavra escrita, a única
maneira possível de atingir sua honra. Mas o comerciante gozava de
grandes vantagens nos duelos de caneta que se seguiram.
193
O comerciante, o estancieiro e o militar / Karl Monsma
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195
Los actores sociales de la ganadería
patagónica: políticas públicas y formas
asociativas en las primeras décadas del siglo XX
Graciela Blanco*
Introducción
La Patagonia argentina comprende una extensa superficie al sur
de los ríos Colorado y Barrancas, sobre la que se conformaron a partir
de 1884 cinco territorios nacionales en los que es posible observar una
realidad social, económica y cultural marcada por la diversidad y los
contrastes. Con importantes diferencias fisiográficas entre las áreas
andinas, de meseta y costeras, los territorios fueron objeto de distintas
formas de poblamiento, ocupación y puesta en producción a partir de
1880, aunque orientadas centralmente por el desarrollo de la actividad
ganadera extensiva.
La organización político-administrativa de los nuevos territorios
patagónicos dependería del Estado nacional, el que a través del Poder
Ejecutivo fue estableciendo las pautas para su organización y
funcionamiento. Asimismo, fue desde el centro del país y del poder que
se definieron y aplicaron las políticas públicas destinadas a distribuir
las tierras incorporadas al dominio soberano del Estado luego de las
campañas militares que despojaron a la sociedad indígena, procediendo
al traspaso de las superficies a manos privadas. Como resultado de ese
proceso de distribución/apropiación de las tierras públicas, en los
territorios del sur se fue definiendo un núcleo minoritario de grandes
propiedades, con importante disponibilidad de capital y escasa
población, que conviviría con un número muy significativo de pequeños
* Doctora en Historia, Profesora Adjunta de Historia Argentina en la Universidad Nacional
del Comahue, Neuquén, Argentina. Investigadora Adjunta en el CEHIR-ISHIR-CONICET.
196
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
y medianos propietarios, arrendatarios y ocupantes de hecho de campos
fiscales, en un proceso que se fue desarrollando no sin tensiones.
Las políticas de los gobiernos radicales de la década del ’20,
referidas sobre todo a las tierras públicas y al régimen aduanero,
provocaron asimismo situaciones muchas veces cuestionadas por
amplios sectores de productores. Sumado a ello, el impacto de la
posguerra y de la crisis internacional de 1930 más adelante, otorgaron
mayor visibilidad al conflicto y potenciaron la conformación de
organizaciones representativas de los productores, a través de las cuales
se canalizaron mayoritariamente las demandas hacia el Estado nacional.
Este trabajo plantea, en primer lugar, el análisis del proceso de ocupación
y distribución de la tierra en Patagonia, a partir de las políticas de los
gobiernos nacionales en la materia y de los resultados de la aplicación
de la legislación resultante. En segundo lugar, procura caracterizar los
actores sociales que fueron configurándose a partir de las distintas formas
de apropiación del recurso tierra y su puesta en explotación ganadera
extensiva. Finalmente, y teniendo en cuenta el funcionamiento
socioeconómico regional, los cambios en las políticas de tierras y
aduaneras y el impacto de la primera posguerra y de la crisis de 1930, la
ponencia intenta una primera aproximación a los conflictos emergentes
y al accionar de las organizaciones corporativas surgidas en esos años
en la Patagonia.
La Patagonia se ocupa y la tierra se privatiza
Alvaro Barros, como coronel del ejército nacional en la frontera
sur, expresaba en la década de 1870 lo siguiente: “Nadie pondrá en duda,
esperamos, que la ganadería es la fuente de nuestra riqueza [...] y sin
embargo, lejos de adelantar, en vez de enriquecer, vivimos en perpetua
crisis, bajo la cruel amenaza de la ruina. ¿Por qué? Porque la propiedad
rural carece absolutamente de garantías. [...] resulta esencial para la
conservación de nuestra amenazada riqueza y para su futuro
enriquecimiento: 1º- Seguridad y garantías para la propiedad rural; 2ºExtensión de los campos de pastoreo. Para llegar a establecer lo primero
(garantías sobre la propiedad rural) es necesaria la supresión de los
indios, y la reforma práctica del sistema administrativo de la campaña.
Para tener lo segundo (extensión de los campos de pastoreo), es
197
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
indispensable también la supresión de los indios, a fin de entrar en
tranquila posesión de los campos de cuyo dominio ellos nos privan”.1
Este reclamo pronto sería parte del proyecto de Julio Argentino
Roca y se concretaría con el avance militar sobre el espacio ocupado por
la sociedad indígena y la consecuente incorporación de la Patagonia a la
soberanía nacional y a la explotación productiva. La finalización de las
campañas militares y la organización administrativa de los cinco
territorios nacionales del sur fue acompañada por una política de tierras
que terminaría beneficiando a determinados sectores socio-económicos
y mostraría una clara contradicción entre un discurso que planteaba la
intención de poblar y una realidad que no se correspondería con ello.
La incorporación coactiva de los territorios del sur se correspondió
entonces con las necesidades expansivas del modelo agroexportador,
que requería de la incorporación de nuevas tierras a la producción. En
ese contexto y en función de las posibilidades productivas, la
organización social del espacio patagónico estuvo marcada en sus
comienzos por el desarrollo de una actividad ganadera
predominantemente ovina, y en menor medida bovina y caprina, así
como de una agricultura bajo riego en algunas áreas.
Las nuevas tierras del sur, ahora bajo el dominio soberano del
Estado nacional, comenzarían a ser entregadas bajo distintas formas de
tenencia a partir de un conjunto de normas que legislaron la forma de
distribución del recurso.2 Con base en esas leyes liberales, en las dos
últimas décadas del siglo XIX se vendieron títulos públicos sobre las
tierras a conquistar para financiar las campañas militares; se “premio” a
quienes las llevaron a cabo; se promovió la colonización privada
otorgándose extensiones que variaron entre 40 y 80.000 ha y se remataron
en Buenos Aires importantes superficies patagónicas. Como resultado
de ello, los beneficiarios, en muchos casos miembros de las elites de
poder económico y político del centro del país o estrechamente
vinculados a ellas -Uriburu, Castells, Avellaneda, Sorondo, Alsina,
BANDIERI, Susana (2006), “Del discurso poblador a la praxis latifundista: La distribución
de la tierra pública en la Patagonia”, en Mundo Agrario, Vol. 11, CEHR-UNLP, 1er. Semestre
2006.
2
BANDIERI, Susana y BLANCO, Graciela (2009), “Política de tierras en los Territorios
Nacionales: entre la norma y la práctica”, en Graciela Blanco y Guillermo Banzato (comp.),
La cuestión de la tierra pública en Argentina. A 90 años de la obra de Miguel Angel Cárcano,
Rosario, Prehistoria Ediciones, en prensa.
1
198
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Zorrilla, Repetto, Seeber, entre otros-, se transformaron en propietarios
de grandes extensiones y especularon con su valorización enajenándolas
algunos años después. Pocos fueron los que pusieron las tierras así
obtenidas en producción. De este modo gran parte de las superficies
patagónicas y generalmente las que presentaban mayor aptitud para la
explotación ganadera fueron enajenadas y terminaron en poder de unos
pocos propietarios para fines del siglo XIX. Los intentos de democratizar
el acceso a la tierra pública entregando superficies en pequeñas parcelas,
para explotaciones ovinas en colonias que gozarían eventualmente del
apoyo estatal, fracasaron por la desacertada elección de las tierras, la
insuficiente extensión de las unidades productivas proyectadas y la falta
del apoyo prometido.3
Con el cambio de siglo y en el marco del surgimiento de un grupo
reformista dentro de los sectores en el gobierno, se derogaron todas las
leyes de tierras anteriores y se buscó, a través de una nueva ley en 1903,
terminar con las irregularidades en la distribución del recurso. Pero ya
la mayor parte de la tierra, como se dijo, había sido entregada en las
décadas previas, por lo que la venta de superficies en parcelas menores
-2.500 ha- mostró una menor transferencia de tierras públicas en
propiedad y derivó, en algunos casos, en su posterior concentración por
parte de quienes ya se habían instalado en la región. Mayor significación
tuvo la entrega de hasta 20.000 ha en arrendamiento, por cuanto la ley
planteaba la opción de adquirir la mitad de esa superficie en propiedad
al finalizar el contrato. Esta modalidad sería muy importante en el
territorio santacruceño y en menor medida en el resto patagónico,
transformándose en una de las formas de tenencia predominantes en
las primeras décadas del siglo XX junto a la propiedad ya consolidada o
en combinación con ésta.4
La propiedad y el arrendamiento fueron entonces las formas de
tenencia centrales sobre las que se legisló. Los grandes propietarios/
arrendatarios se constituyeron así en los actores sociales característicos
del espacio patagónico a partir del referido proceso de distribución y
BLANCO, Graciela (2001), “El Estado argentino en el desarrollo ganadero de Patagonia: la
distribución de la tierra y los inversores privados en Neuquén a principios del siglo XX”,
en M. Valencia y S. Regina de Mendonça (organizadoras), Brasil e Argentina. Estado,
Agricultura e Empresarios, Río de Janeiro, Vicio de Leitura/Universidad nacional de La Plata.
4
BANDIERI, Susana y BLANCO, Graciela (2009), en prensa, op.cit.
3
199
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
apropiación de las tierras en las dos últimas décadas del siglo XIX. Entre
ellos se encontraban compañías públicas y privadas con sede en Londres,
como la Sheep Farming -con campos también en Tierra del Fuego-, LaiAike y Monte Dinero en Santa Cruz; la Cía. De Tierras del Sur con
extensiones en Chubut, Río Negro y Neuquén, entre otras, todas ellas
controlando superficies que iban desde 150.000 a 650.000 ha.5 También
fueron importantes las sociedades anónimas organizadas en Chile por
ciudadanos de ese país e inmigrantes de diverso origen radicados allí ingleses, alemanes, españoles, franceses, etc.-, que se constituyeron
específicamente con el objeto de adquirir y explotar tierras en el sur
argentino y muy especialmente en las áreas andinas y en el sur de Santa
Cruz y Tierra del Fuego, áreas que reconocían una ancestral vinculación
económica y social con los espacios chilenos colindantes desde
Concepción a Punta Arenas. Nos referimos a la Sociedad Explotadora
de Tierra del Fuego, la Sociedad Comercial y Ganadera Chile-Argentina,
la Sociedad Ganadera Gente Grande, entre otras, con superficies similares
a las anteriores.6 Por último, empresarios provenientes de otras regiones
de Argentina, especialmente del área pampeana, con más o menos
capital, también se transformaron en propietarios y/o arrendatarios en
Patagonia: Jorge y Rodolfo Newbery, los hermanos Lafontaine, Luis
Zuberbuller, Teodoro de Bary, Fernando Zingoni, José Menéndez,
Mauricio Braun, etc. 7 Estos grandes propietarios/arrendatarios
convivieron con otros medianos y pequeños que compraron y/o
arrendaron en las áreas no ocupadas entre las grandes propiedades o en
MIGUEZ, Eduardo (1985), Las tierras de los ingleses en la Argentina, 1870-1914, Buenos Aires,
Editorial de Belgrano.
6
BARBERÍA, Elsa M. (1995), Los dueños de la tierra en la Patagonia Austral, 1880-1920, Santa
Cruz, Universidad Nacional de la Patagonia Austral; BANDIERI, Susana y BLANCO,
Graciela (1998), “Propietarios y ganaderos chilenos en Neuquén: una particular estrategia
de inversión (fines del siglo XIX y comienzos del XX)”, en Estudios Trasandinos, Año 2, nº 2,
Santiago de Chile; BELFIORI, Martha C. (1977), “Tierra del Fuego. Destino de la tierra
pública”, en KaruKinka. Cuaderno Fueguino, nº 19-20, Buenos Aires.
7
Un análisis particularizado de algunos de estos casos en BLANCO, Graciela y BLANCO,
Mónica (2008), “Expansión de la frontera productiva y oportunidades para el crecimiento
empresario en el espacio pampeano-patagónico”, en S. Bandieri, G. Blanco y M. Blanco,
coord., Las Escalas de la Historia Comparada. Empresas y empresarios. La historia regional, Tomo
II, Buenos Aires, Miño y Dávila Edit.; BLANCO, Graciela (2009), “Un empresario ganadero
en un espacio periférico: las estrategias de acumulación de la familia Zingoni en Neuquén
(primera mitad del S. XX), en Naveg@mérica. Revista electrónica de la Asociación Española de
Americanistas, Nº 2, Murcia, España.
5
200
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
zonas con mayores dificultades para el desarrollo de una producción
rentable.
La contracara de estos propietarios/arrendatarios fueron los meros
ocupantes, aquellos que no poseían título legal sobre las superficies en
las que se instalaron. En muchos casos se trataba de descendientes
directos de los antiguos dueños de la tierra –los indígenas-, despojados
y sometidos a las nuevas relaciones de producción; en otros, de
pobladores inmigrantes mayoritariamente chilenos, herederos de una
situación pasada y ahora intrusos del nuevo orden social. Todos ellos
convertidos a partir de entonces en crianceros con escaso ganado, muchas
veces trashumantes, en serias condiciones de marginalidad social. La
línea sur rionegrina, el norte neuquino y algunas áreas de la meseta
chubutense y santacruceña fueron lugares en los que se asentaron estos
sujetos sociales. Ello llevó a que en 1899 el gobierno nacional autorizara
a los gobernadores de los Territorios a conceder el pago del derecho de
talaje a quienes hicieran pastar sus ganados en los campos fiscales bajo
su jurisdicción, con la declarada intención de conceder cierto respaldo
legal a los ocupantes. En 1925, con argumentos similares, se estableció
por Decreto que los ocupantes de tierras fiscales debían solicitar permisos
precarios de ocupación a la Dirección General de Tierras, los que serían
concedidos previo pago por año adelantado. Se hacía explícito que
quienes no arrendaran o tuvieran estos permisos serían considerados
intrusos.8 También se intentó regularizar la situación de los ocupantes
de hecho de tierras fiscales a partir de la aplicación de la ley de Derechos
Posesorios, que sólo tuvo alguna incidencia en el valle inferior del
territorio de Río Negro, donde el 30% de los solicitantes ratificó la
posesión.9
Sin embargo, la intención de conceder cierto respaldo legal a los
ocupantes difícilmente tuvo los resultados esperados debido a las
deficientes condiciones de funcionamiento de las administraciones
locales en un territorio extenso y poco comunicado. Los ocupantes se
BLANCO, Graciela (2009), “Tierra y ganado en la Patagonia: políticas públicas y
conflictividad en las primeras décadas del siglo XX”, en Anuario del Centro de Estudios
Históricos “Prof. Carlos Segreti”, Córdoba, en prensa.
9
RUFFINI, Martha (2006), “Estado y propiedad de la tierra en el Territorio Nacional de Río
Negro; la cuestión de los ocupantes (1884-1892)”, en E. Cruz y R. Paoloni, (comp.), La
propiedad de la tierra. Pasado y presente, Anuario del CEIC/3, Córdoba, Alción Editora.
8
201
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
vieron empujados a instalarse con sus animales en tierras marginales en
cuanto a aptitud ganadera y muchas veces debían trasladarse con su
ganado, de acuerdo a las estaciones, a los campos altos de veranada o
los más bajos de invernada. En algunos casos estos campos eran fiscales,
pero en otros debieron indefectiblemente recurrir –por la intensidad de
las privatizaciones en algunas áreas- al pago de pastaje o al
arrendamiento a particulares para que sus animales pudieran alimentarse
y sobrevivir. En ocasiones la realidad del ocupante era mucho mas dura
aún. Se veía frecuentemente sometido al abuso de arrendatarios que les
subarrendaban la tierra -expresamente prohibido por ley- a precios altos,
o de comerciantes, jueces de paz o policías que les cobraban talaje o
arrendamiento, la mayoría de las veces sobre superficies en las que no
tenían derechos legítimos. No fueron pocos, asimismo, los casos en que
funcionarios menores malversaron bienes testamentarios o realizaron
secuestros ilegales de hacienda de quienes eran simples ocupantes de
hecho. En el caso del reclamo de derechos posesorios, los gobernadores
y los jueces de paz de los territorios nacionales jugaron un papel
protagónico en la asignación de estas tierras, pues estaba a su cargo
compilar la información necesaria, mediante la declaración de testigos,
para comprobar el tiempo de ocupación de los peticionantes y el capital
invertido.10 Su actuación fue discrecional y muchas veces impugnada
por los propios actores y por el Estado nacional, aunque no modificada.
Los ocupantes sin título, que no alcanzaron la propiedad, fueron una
constante en todo el proceso de expansión de la frontera como puede
verse en otros trabajos sobre el área bonaerense.11
Diversas fuentes –informes de dependencias públicas territorianas, notas, prensa,
expedientes judiciales, etc.- dan cuenta de estas situaciones conflictivas al interior de las
sociedades en formación. A modo indicativo, puede verse el análisis de algunas de ellas
en los trabajos de PERREN, Joaquin, “Cuando la resistencia es invisible a los ojos.
Repertorios de acción campesina en el Territorio Nacional del Neuquén (1885-1920)”; de
ARGERI, María E. “Hábitos masculinos, relaciones de poder y estatalidad. Río Negro,
1880-1940”, y de FINKELSTEIN, Débora y NOVELLA, María M., “Actividades económicas
y procesos de construcción social en las áreas andinas de Río Negro y Chubut”, todos
incluidos en S. Bandieri, G. Blanco y G. Varela, Directoras (2006), Hecho en Patagonia. La
historia en perspectiva regional, Neuquén, CEHIR-EDUCO.
11
Con relación a este tema, véase particularmente el análisis de BANZATO, Guillermo (2005),
La expansión de la frontera bonaerense. Posesión y propiedad de la tierra en Chascomús, Ranchos y
Monte (1870-1880), Universidad Nacional de Quilmes, pp.100-110 y 175-195.
10
202
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Esta caracterización extremadamente sintética puede plantear una
imagen errónea de los sujetos sociales vinculados a la ocupación y puesta
en producción de las tierras patagónicas, caracterizada por la presencia
dominante de las grandes explotaciones por un lado y de los ocupantes
por otro. Nada más lejos de una realidad que, cuando se profundiza en
el estudio de diferentes casos, se muestra compleja, con una estructura
agraria heterogénea, con diversas formas de acceso a la tierra y a la
producción según el período en el que se iniciaron las explotaciones, el
tipo de tenencia de la tierra, la disponibilidad de capital o acceso al
crédito, las condiciones de utilización de mano de obra y las posibilidades
de llegar con mayor o menor intermediación a los mercados
demandantes.12 Simultáneamente, como en todo espacio “nuevo” en el
que comenzaba a organizarse la vida económica, social, política e
institucional, se fue definiendo también en Patagonia, desde fines del
siglo XIX, un significativo sector comercial que articuló a través de sus
operaciones mercantiles y financieras a todos los actores del ámbito rural
y rural-urbano. Asimismo, el Estado nacional fue lentamente
consolidando su presencia en los territorios a través de las autoridades
políticas y de control, como la justicia y la policía en un proceso lento y
no exento de conflictos.13
La actividad ganadera en la organización social del espacio
Fue la actividad ganadera, como se dijo, la que caracterizó la
incorporación de la mayor parte del territorio patagónico al modelo
agroexportador vigente en Argentina durante la segunda mitad del siglo
XIX y primeras décadas del XX. Los territorios con litoral marítimo, cuyos
puertos naturales permitían una rápida conexión con los mercados del
Atlántico, fueron escenario del corrimiento del ovino desde la llanura
pampeana, situación que reflejan claramente los censos ganaderos
BLANCO, Graciela (2006), “Las explotaciones ganaderas en Patagonia: sujetos sociales,
articulación comercial y organización socio-espacial”, en S. Bandieri, G. Varela y G. Blanco.,
coord., op.cit.
13
BANDIERI, Susana (2005), “Asuntos de familia. La construcción del poder en la Patagonia:
el caso de Neuquén”, en Boletín del Instituto Ravignani. Buenos Aires, UBA, segundo
semestre, n. 28; LLUCH, Andrea (2004), Comercio, crédito y producción en el agro pampeano a
comienzos del siglo XX. Los almacenes de ramos generales en el Territorio Nacional de la Pampa a
través de estudios de caso. Tesis Doctoral, Tandil, Universidad Nacional del Centro.
12
203
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
nacionales a partir de 1895. Las tierras de la meseta y del área costera
más cercanas al mercado bonaerense como el norte de Santa Cruz,
Chubut y Río Negro, fueron esencialmente productoras de lana cuyo
destino era satisfacer la demanda de la industria textil europea. La lana
era trasladada a Buenos Aires o bien embarcada directamente a los
mercados europeos desde los puertos costeros. En cuanto a la
comercialización de animales en pie, los ovinos -y en menor medida
bovinos- criados en la región, eran trasladados desde algunas
importantes estancias del área a campos en propiedad o arrendamiento
en la provincia de Buenos Aires, donde se los engordaba para su venta a
los frigoríficos o en los mercados de Avellaneda o Liniers.14
Las zonas andinas en cambio –oeste de Neuquen y Río Negro y
noroeste de Chubut-, alejadas de los centros costeros y con
características fisiográficas que las hacían particularmente aptas para
la producción de vacunos, se vincularon estrechamente con el área del
Pacífico, mostrando la pervivencia de circuitos económicos utilizados
por la sociedad indígena. Ello fue posible por la existencia de un
mercado demandante constituido por los centros urbanos y las
agroindustrias del sur chileno, que sería cubierto por el ganado bovino
de la región andino-patagónica; por las facilidades que los numerosos
pasos fronterizos de la región ofrecían para trasponer fácilmente la
cordillera en muchas zonas; y por un régimen aduanero caracterizado
como de “cordillera libre”. Esta vinculación comercial sería entonces
fundamental en las primeras etapas para el desarrollo de la actividad
ganadera en zonas alejadas de los centros atlánticos, que encontraba
en el mercado chileno las condiciones necesarias para la colocación de
sus productos. Contribuye también a explicar la importante inversión
que realizaron comerciantes y hacendados chilenos en la compra de
tierras en esas zonas.15
Véase BARBERIA, Elsa (1995), op.cit.; BLANCO, Graciela (2002), Tierra, ganado y empresas
en Neuquén. Poder público e inversiones privadas (1880-1970). Tesis doctoral, UNLP;
DUMRAUT, Clemente I. (1992), Historia de Chubut, Colecc. Historia de Provincias, Plus
Ultra, Buenos Aires.
15
Véase al respecto los siguientes artículos, incluidos en Bandieri, Susana, coord. (2001),
Cruzando la Cordillera…La frontera argentino-chilena como espacio social, Neuquén, CEHIREDUCO: BANDIERI, Susana, “Estado nacional, frontera y relaciones fronterizas en los
Andes norpatagónicos: continuidades y rupturas”; BANDIERI, Susana y BLANCO,
Graciela, “Invirtiendo en tierras y ganados: capitales chilenos en la frontera norpatagónica”;
NOVELLA, María Marta y FINKELSTEIN, Débora, “Frontera y circuitos económicos en el
área occidental de Río Negro y Chubut”.
14
204
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
El área fueguina y el centro-sur de Santa Cruz, por su parte, fueron
escenario de la llegada de algunos empresarios británicos instalados en
las Islas Malvinas, así como de una importante expansión de sectores
económicos provenientes del extremo sur de Chile que adquirieron y/o
arrendaron tierras a ambos lados de la cordillera, instalaron más tarde
casas comerciales e instituciones bancarias, abrieron caminos interiores
y perfeccionaron el transporte marítimo, constituyéndose en los
principales artífices del desarrollo de una ganadería ovina en esa región
austral, que producía lanas y carne ovina congelada para el mercado
europeo. Contribuyeron a ello la inexistencia de impuestos aduaneros
hasta 1918 –excluida Tierra del Fuego-, el crecimiento de la navegación
marítima y de cabotaje por el estrecho y la débil presencia de los
respectivos estados nacionales en esos años.16
En cuanto a la organización del trabajo, dependiendo de la
importancia de las explotaciones se incrementaba el número de
trabajadores con diferentes responsabilidades –administradores,
mayordomos, capataces, etc.-. Con el objeto de utilizar al máximo los
recursos productivos disponibles –específicamente la tierra- y disminuir
las pérdidas producidas por riesgos climáticos o robos, era muy común
la práctica de establecer en la estancia uno o más “puestos” ganaderos.
El puestero, según la forma de pago acordada, establecía con el estanciero
contratos que podían ser al tercio, al cuarto, de invernada o mensual.
Aunque a veces se pactaba la percepción de un sueldo, en general se
trataba de contratos de aparcería por el cual el propietario entregaba un
pedazo de tierra –el puesto- con un determinado número de animales,
encargándose luego de su comercialización. El puestero se comprometía
al cuidado de los mismos percibiendo una parte de los aumentos en el
número de ganado (la mitad, el tercio o el cuarto según el contrato), al
tiempo que la mayoría de las veces se desempeñaba como peón a sueldo
para las actividades de rodeo y esquila en la estancia. Tradicionalmente
el puesto ha estado ligado al ganado ovino, pero en las áreas andinas
también se observa su utilización para el cuidado de vacunos. Los peones,
por su parte, podían ser trabajadores permanentes o temporarios y
16
BARBERIA, Elsa Mabel (1995), op.cit.; y MARTINIC BEROS, Mateo (2001), “Patagonia
Austral: 1885-1925 un caso singular y temprano de integración regional autárquica”, en
Bandieri Susana, coord. (2001), op.cit.
205
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
desempeñaban diferentes tareas en el establecimiento ganadero, aunque
paulatinamente fueron especializándose en algunas de ellas y
definiéndose como alambrador, esquilador, enfardador de lana, etc. En
función de ello, podían ser trabajadores permanentes o temporarios.
La fuerza de trabajo libre era en la Patagonia mayoritariamente
chilena –sobre todo en las primeras décadas- y en menor medida estaba
compuesta por indígenas, inmigrantes muchas veces oriundos de los países
de origen de los productores y pobladores de otras regiones del país. En
lo que hace a los trabajadores chilenos, estos mostraban una alta movilidad
geográfica determinada, a su vez, por las fluctuaciones del mercado laboral
trasandino y por las coyunturas políticas internacionales, lo que hizo que
la oferta de mano de obra no fuera uniforme a lo largo de la primera
mitad del siglo XX. Así, por ejemplo, cada vez que las relaciones argentinochilenas se tensionaban, se producían importantes procesos migratorios
hacia el país trasandino, o a la inversa cuando la situación económica
chilena generaba desocupación.17
Si bien la ganadería ovina continuó expandiéndose en gran parte
del espacio patagónico y el número de cabezas crecería a un ritmo
vertiginoso, debió sin embargo enfrentar numerosos problemas
vinculados a la nuevas políticas de tierras; a factores climáticos –grandes
sequías o importantes nevadas que reducían las majadas y por ende la
producción-; a las fluctuaciones en el precio internacional de la lana; a la
falta de mano de obra en algunos períodos; o a políticas que establecían
retenciones aduaneras o afectaban el tipo de cambio para la exportación,
frente a lo cual comenzaron a organizarse desde la década de 1910
distintas organizaciones o sociedades rurales representativas de sus
intereses a través de las cuales canalizar sus reclamos al gobierno
territoriano y al nacional.
Las políticas públicas y las formas asociativas
en las décadas de 1920 y 1930
Con la llegada del partido radical al poder, en la figura de Hipólito
Irigoyen, se modificaron algunos aspectos referidos a la política de tierras
17
BLANCO, Graciela (2002), op.cit.; BARBERIA, Elsa Mabel (1995), op.cit; LUIZ, María Teresa
y SCHILLAT, Mónica (1997), La frontera austral. Tierra del Fuego, 1520-1920, Universidad
de Cádiz, España.
206
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
públicas. Por un lado, se inició una investigación administrativa y
parlamentaria a fin de descubrir irregularidades cometidas por el régimen
conservador en la aplicación de las leyes de tierras, que puso especial
énfasis en revisar las concesiones realizadas en el territorio de Santa
Cruz, donde importantes compañías de capitales chilenos habían
concentrado considerables superficies. Se probó así la concentración y
se decretaron las caducidades sobre numerosas concesiones de
arrendamiento, opciones a compra y propiedades, pero la defensa
presentada por los concesionarios fue dilatando la efectiva recuperación
de las tierras y las caducidades nunca se concretaron, aunque generaron
sin duda una preocupación.18
Por otro lado, el gobierno radical decidió suspender en 1917 la
adjudicación de tierras en propiedad y entregarlas sólo en arrendamiento
a título precario sin el derecho a compra de parte de la superficie. Esto
fue ratificado en años posteriores y sostenido por veinte años hasta que
los gobiernos conservadores dejaran sin efecto la medida. En cuanto a
los ocupantes, en 1925 se autorizó a la Dirección General de Tierras a
otorgar permisos precarios de ocupación de lotes pastoriles en territorios
nacionales, para lo cual debían pagar un año adelantado. Quienes no
arrendaran ni tuvieran esos permisos serían considerados intrusos, como
ya se adelantara.19
Pese a ello, la importante demanda de lana y el constante aumento
en los precios de los productos pecuarios durante la Primera Guerra
Mundial, incentivaron la ocupación y puesta en producción de las tierras
patagónicas aún no ocupadas, impulsando a muchos arrendatarios y
ocupantes a tomar el financiamiento ofrecido por las casas comerciales
instaladas en los territorios patagónicos con el fin de adquirir el plantel
ganadero inicial y la construcción de los edificios y mejoras
indispensables -alambrados, aguadas, etc.-, instalándose en terrenos más
áridos y alejados de los centros de comercialización. Fue precisamente
el optimismo generalizado de esos años y la disponibilidad de dinero
circulante, lo que llevó a las casas comerciales o sociedades anónimas –
Cfr. GIRBAL-BLACHÁ, Noemí (1989), Política de tierras, 1916-1930: ¿Reforma, orden o
“reparación agraria”?, Buenos Aires, CEAL, Serie Conflictos y Procesos de la Historia
Argentina Contemporánea nº 28; BARBERIA, Elsa M. (1995), op.cit.
19
BANDIERI, Susana y BLANCO, Graciela (2009), en prensa, op.cit.
18
207
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
desde las muy importantes “Anónima Sociedad Importadora y
Exportadora de la Patagonia” o “Lahusen y Cía.”, hasta los llamados
bolicheros locales como la familia Zingoni- a conceder con liberalidad los
créditos solicitados por los estancieros ya instalados o los nuevos
pobladores.20 A esta política se sumaron los bancos privados existentes
en los pueblos de la costa o el mismo Banco de la Nación Argentina. Las
condiciones eran en general desventajosas dado que en la mayoría de
los casos los ocupantes no podían garantizar el préstamo con títulos de
propiedad o contratos de arrendamiento. Los propietarios de casas
comerciales, por su parte, recurrieron a distintos mecanismos para la
provisión de dinero a productores sin capital. En algunos casos formaron
sociedades con los ocupantes, aportando lo necesario para la instalación
del campo y distribuyendo las ganancias; en otros, otorgaron créditos
que eran pagados con parte de la producción obtenida. También adquirió
considerable importancia en esos años el llamado contrato de prenda
agraria como garantía especial de préstamos en dinero, mediante el cual
podían prendarse máquinas, aperos e instrumentos de labranza, animales
de cualquier especie y sus productos y frutos, con activa participación
del Banco Nación y de las casas comerciales. Para los años de 1930, gran
parte de la hacienda de estos productores se encontraba gravada como
20
La firma comercial comúnmente conocida como “La Anónima”, perteneciente a la sociedad
que originalmente conformaron José Menéndez y Mauricio Braun, tuvo su sede central y
punto de abastecimiento de mercaderías en Punta Arenas hasta 1919, trasladando luego
su centro de operaciones a la ciudad de Buenos Aires. Contaba para esos años con sucursales
en los puertos atlánticos –Río Gallegos, Santa Cruz, San Julián, Comodoro Rivadavia y
Puerto Madryn- y en diversos puntos el interior patagónico, con agentes en las principales
capitales europeas y con una flota propia para el traslado de los productos a importar y
exportar. Lahusen y Cía., de origen alemán, fue fundada en 1881 en Buenos Aires para la
comercialización de lanas, comenzando pronto a recorrer el territorio patagónico y abrir
sucursales de comercios de ramos generales, a la vez que centros para la compra de lanas
y cueros en Comodoro Rivadavia, Trelew, Sarmiento, Nueva Lubecka, Puerto Madryn y
Esquel, surtiendo a los productores de todos los materiales que requerían y comercializando
sus lanas. Zingoni y Cía. S.A. fue fundada a principios del siglo XX por Fernando Zingoni
en el territorio de Neuquén, trasladando su sede central a la Capital Federal en el año
1923. Para ese entonces, contaba con casas comerciales que abastecían parte importante
del interior del territorio -en Sañicó, San Ignacio, Las Coloradas, Catan Lil-, a la vez que
dedicaban al acopio y comercialización de la producción ganadera de un considerable
número de productores pequeños y medianos de la región. Todos ellos eran a su veza
importantes ganaderos. Cfr. BARBERIA, Elsa Mabel (1995), op.cit., pp. 150-155; Graciela
BLANCO (2002), op.cit., cap. V; Revista Argentina Austral, Año I, nº5, 1929, p. 17.
208
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
garantía de los préstamos haciendo difícil la supervivencia de las
explotaciones en momentos de crisis.21
La crisis de la posguerra trastocó ese estado de cosas y los
pobladores se vieron imposibilitados de cumplir con sus obligaciones,
situación que afectó también a las casas comerciales proveedoras de
capital. De hecho, la posguerra trajo aparejado la caída en la demanda y
los precios de la lana, a lo que se sumó la aplicación de leyes que
reservaban el comercio a los buques de bandera nacional provocando
una notoria disminución del transporte de cabotaje. Asimismo, los
frigoríficos existentes estaban instalados sobre la costa lo que dificultaba
y encarecía -por el notable costo de los fletes- la comercialización de la
carne.
Simultáneamente, el gobierno nacional realizó importantes
modificaciones en la política aduanera –en consonancia con políticas
similares del gobierno chileno para la misma época-, dejando sin efecto
el sistema de “cordillera libre” y reimplantó en el sur el régimen aduanero
para los productos importados. Modificó así las condiciones existentes
para el comercio con Chile, generándose un incremento extraordinario
de los artículos alimenticios y de vestir y dificultades cada vez mayores
para comerciar con el país trasandino. Para 1920, los problemas se
multiplicaron para productores y comerciantes, produciéndose la ruina
económica de muchos de ellos. 22 En ese contexto, la constitución
simultánea de un orden político en los territorios nacionales, con el
paulatino asentamiento del mandato estatal sobre una población de base
esencialmente rural, unida a la transformación del régimen económico
en un sentido claramente capitalista, fue generando una dinámica social
de particulares características donde el despliegue de la coerción
provocaba distintas formas de resistencia y negociación.
En la década de 1920, comenzaron a hacerse sentir con fuerza
diferentes reclamos de los productores patagónicos a través de
publicaciones locales, regionales y nacionales, así como de numerosos
BLANCO, Graciela (2003), op.cit., pp.244-262; BARBERIA, Elsa Mabel (1995), op.cit., pp.
155 y sgtes.; FINKELSTEIN, Débora y NOVELLA, María M., op.cit., 2006.
22
Elsa M. BARBERIA (1995), op.cit.; Susana BANDIERI (2001), op.cit., pp. 345-374; Graciela
BLANCO (2002), op.cit., cap. V; Graciela CISELLI (1999), Bailando al compás de la lana. El
ovino: motor del desarrollo comercial de Puerto Deseado (1881-1944), Comodoro Rivadavia,
UNPSJB, pp. 60-76.
21
209
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
petitorios dirigidos a las autoridades que eran presentados
individualmente o canalizados a través de las corporaciones
representativas de los intereses ganaderos que se habían organizado para
entonces. Como se dijera, desde 1910 se habían comenzado a organizar
sociedades Rurales en Puerto Deseado, Rio Gallegos, Esquel, Colonia
San Martin, Valle del Chubut, San Julian, Santa Cruz, Neuquén, y
Camarones, las que en la década de 1930 se unieron en la Federación de
Sociedades Rurales de la Patagonia. Las demandas incluían la rebaja en
el canon de arrendamiento, la prolongación del plazo de pago de los
mismos, la realización de mensuras de los lotes, la renovación de las
prendas agrarias, el otorgamiento de títulos de arrendamientos cuyas
solicitudes no se habían resuelto para poder ofrecer mayores garantías
en la procuración de créditos, la baja en los fletes marítimos para el
transporte de la lana y la suspensión de los desalojos que sobre mediados
de la década se intensificaron en la Patagonia.
A estos reclamos de los productores, se sumarían los de los peones
rurales de Santa Cruz, cuya situación se había agravado como
consecuencia de la escasez y encarecimiento de los productos de
consumo básicos, la disminución de los salarios por la abundante
disponibilidad de mano de obra no calificada y los efectos del proceso
inflacionario, la estacionalidad de las tareas rurales y las duras
condiciones de vida y de trabajo. En el marco de un crecimiento
significativo de la organización y de la lucha obrera a nivel nacional,
se originó el primer reclamo de los trabajadores santacruceños en
septiembre de 1920, solicitando a los empresarios mejoras en las
condiciones de trabajo. El rechazo del petitorio fue seguido de una
huelga reprimida por los estancieros, con el apoyo de la policía del
territorio y las “guardias blancas” de la Liga Patriótica. Tras un acuerdo
en el que arbitró el nuevo gobernador del territorio pero que fue
incumplido por los sectores patronales, se inició en 1921 un movimiento
huelgístico que se expandió por la Patagonia austral y fue duramente
reprimido por tropas del ejército nacional.23
23
Un minucioso tratamiento de estos conflictos puede verse en los clásicos trabajos de
BORRERO, José M. (1967), La Patagonia Trágica, Buenos Aires, Ed. Americana; y de BAYER,
Osvaldo (1972), Los vengadores de la Patagonia trágica, Buenos Aires, Galerna, 3 tomos. Para
una buena síntesis, véase BANDIERI, Susana (2005), Historia de la Patagonia, Buenos Aires,
Sudamericana, pp. 334-344.
210
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Al iniciarse la década de 1930 la situación se vería agravada
por la crisis internacional de esos años, con sus efectos sobre la
economía agroexportadora, y por la inestabilidad política que provocó
el derrocamiento de Yrigoyen en su segundo gobierno, todo lo cual
repercutió fuertemente en la Patagonia. Nuevamente la notoria
disminución de la demanda internacional de lanas y la baja de su
precio, el endeudamiento de los productores, la escasez de las
mercaderías de consumo básicas y el incremento de su costo, la
quiebra de firmas comerciales pequeñas y las dificultades de los
productores menos capitalizados para comercializar sus animales,
fueron una constante. Simultáneamente, los comerciantes y ganaderos
más importantes consolidaban su posición y el Estado nacional
avanzaba en el sentido de profundizar su presencia institucional y
de control en los territorios nacionales, profundizando las medidas
tendientes a cortar los vínculos económicos de las áreas andinas con
Chile y terminar el funcionamiento espacial históricamente articulado
en torno a la cordillera de los Andes.
Una situación que hace eclosión por esos años es la relacionada
con la tenencia precaria de la tierra que habían planteado los decretos
de los gobiernos radicales. Quienes accedieron a la tierra a partir de
entonces o buscaron regularizar su situación mediante un contrato de
arrendamiento o un permiso de ocupación, en su mayoría con escaso o
nulo capital disponible, se vieron ante la necesidad de designar gestores
que realizaran los trámites ante la Dirección de Tierras y Colonias en la
capital federal. Estos intermediarios contaban con información sobre la
calidad de los lotes, llevaban un control de terrenos libres y ocupados,
mantenían vinculaciones con sociedades anónimas regionales y tenían
–probablemente- la anuencia de empleados y funcionarios del organismo
encargado de la distribución de la tierra pública. Su servicio implicaba
un costo para el interesado en obtener una parcela. Quien no podía pagar
esos servicios carecía de la información necesaria para evitar el acceso a
terrenos de menor calidad o la superposición de solicitudes sobre los
mismos que, más tarde, podía obligarlo a dejar el campo ocupado. En
ese contexto, los llamados palos blancos y los traficantes de tierras se hicieron
conocidos personajes del territorio patagónico. Los primeros solicitaban
y obtenían la concesión de tierras a partir de su círculo de relaciones y
rápidamente las transferían a los interesados. Los segundos propiciaban
211
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
el desalojo de lotes sobre los que había terceros interesados, denunciando
a sus ocupantes ante las autoridades y aprovechando las mejoras
introducidas por el poblador original. Algunas veces, incluso,
renegociaban con éstos la recuperación del lote exigiendo un
sobreprecio.24
Asimismo, la campaña emprendida por los gobiernos radicales en
contra del latifundio improductivo y del acaparamiento de tierras alcanzó
su máxima expresión en la presión ejercida sobre los grandes
propietarios/arrendatarios cuyas concesiones fueron cuestionadas e
incluso declaradas caducas y en los desalojos de aquellos pobladores
que arrendaban u ocupaban sin contrato alguno. En esa década de 1920,
un importante número de pobladores en tierras fiscales, con todo su
capital invertido en mejoras y comprometidos con crecidas deudas,
fueron desalojados o vivieron bajo la incertidumbre de que esa
posibilidad se concretara, generalmente sin la sustanciación de un juicio
y con la pérdida de las mejoras introducidas.25
En el contexto de la crisis económica de los años treinta, el
Ministerio de Agricultura tomó algunas medidas que pretendían dar
respuesta –aunque limitada y coyunturalmente- a los reclamos
individuales y colectivos de los ganaderos patagónicos. En 1931 se rebajó
el canon de arrendamiento y el derecho de pastaje sobre tierras fiscales
en los territorios del sur para ese año, fijando el cálculo del mismo sobre
la base de la capacidad de la tierra, las distancias al lugar de embarque o
venta y la superficie arrendada. Al mismo tiempo, se creaba una
Comisión Especial para el estudio de los problemas del sur, con el objeto
de adoptar las medidas necesarias para atenuar la profunda crisis de
esos años. Tales medidas, sin embargo, no resultaron todo lo benéficas
que se esperaba, por cuanto en su aplicación se estimó en exceso la
Véase BARBERIA, Elsa Mabel (1995), op.cit., pp.148-149; CISELLI, Graciela (1999), op.cit.,
pp.44-45; Revista Argentina Austral, nº 74, agosto 1935, pp.20-21; “Memorial de la Sociedad
Rural Argentina al Ministro de Agricultura de la Nación”, transcripto en Argentina Austral,
Año VII, nº 31, marzo 1936, pp.29-32.
25
Las denuncias en ese sentido se observan de manera reiterada en diferentes publicaciones:
Revista Argentina Austral, Año I, nº 9, marzo 1930, p. 14 y Año III, nº 34, abril 1932, pp.2025; Periódico El libre del Sur, Esquel, 25 de enero de 1930. Véase especialmente el artículo
de FISCH, Ricardo, “No tomen tierras fiscales en sub-arriendo. No negocien con los
concesionarios. Carta abierta a los pobladores de la Patagonia”, Revista Argentina Austral,
Año III, nº 32, febrero, 1932, pp. 20-21.
24
212
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
capacidad ganadera de los campos, se computaron mal las distancias a
los puertos de embarque, etc.26
Tanto la Sociedad Rural Argentina, como las restantes sociedades
rurales patagónicas y los gobernadores de los territorios, reclamaron
insistentemente en esos años en relación a la política de tierras públicas, a
la reformulación de las condiciones de los arrendamientos –aumento de
los plazos establecidos o posibilidades de renovación por nuevos períodos,
fijación de las superficies concedidas en función de la capacidad productiva
y no de la extensión, reducción del canon-; a la disminución del monto a
cobrar por derecho de pastaje; y al restablecimiento del derecho a compra
de hasta la mitad de la tierra arrendada que fijaba la ley de 1903 y que se
encontraba suspendido desde hacía varios años. Así se expresaron en la
Conferencia de Sociedades Rurales celebrada en Puerto Deseado en febrero
de 1932, en el Congreso de Municipalidades de los Territorios Nacionales
realizado en Buenos Aires en julio de 1933, y en la Conferencia Económica
Territorial realizada en Río Gallegos en marzo de 1937.27
Esos años de la década de 1930 reflejaron, asimismo, el desarrollo
de un nacionalismo extremo que se ligaba a la idea de argentinización
de la población, muy presente en algunos funcionarios nacionales. Es el
caso del Director General de Tierras, Melitón Díaz de Vivar, quien en
respuesta a los cuestionamientos de los pobladores del sur y de sus
organizaciones corporativas elevó un informe al Ministerio de
Agricultura en el que se expresaba en estos términos:
“El Sud se llenó de compañías extranjeras en su mayor parte, y este es
hoy el elemento que en toda forma se opone a que se cumpla la ley y las
disposiciones en vigor, echando mano a cualquier recurso [...] Es muy
conocida la influencia de personas o de compañías de los países limítrofes
en las tierras fiscales: personas o compañías que no están aquí sino
representadas por sus administradores o capataces y que son por lógica
patriotas con su país [...]”. Y se preguntaba: “¿Conviene a nuestro país
este elemento que aboga por el suyo, que gasta lo que recoge afuera y
Revista Argentina Austral, Año II, nº 20, febrero 1931, pp. 53-54. “Petición de la Sociedad
Rural de Puerto Deseado al Ministerio de Agricultura”, transcripta en Argentina Austral,
Año III, nº 27, sept. 1931, p. 53.
27
Revista Argentina Austral, Año VII, nº 82, abril 1936, pp. 34-42. “Memorial de la Sociedad
Rural Argentina al Ministro de Agricultura”, Revista Argentina Austral, Año II, nº 19, enero
1931, pp. 27-28; “Memoria de la Gobernación de Santa Cruz al Ministerio del Interior”, 9
de agosto de 1932; Expte. nº 9628 de 1936, iniciado por la Secretaría de la Presidencia de la
Nación sobre reclamos presentados por el Gobernador del Territorio de Río Negro, AJLTN.
26
213
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
que no tiene hijos en la Argentina? ¿Por qué no van estos allá, al terruño
que quieren y dejan a este país para los suyos?”.28
Para el año 1937, algunos cambios en el panorama político nacional,
sobre todo la designación de Cárcano como Ministro de Agricultura,
provocaron una modificación importante en la política de tierras en el
sentido requerido por los pobladores del sur argentino. Ese año, como
parte de una decisión más profunda de incorporar la Patagonia al
desenvolvimiento económico del país, se dictó el decreto que restituyó
el derecho a la compra de la mitad de la superficie arrendada. Poco
después se dejó sin efecto la autorización efectuada a la Dirección de
Tierras para otorgar posesiones provisorias, permisos precarios o
provisionales de ocupación y se ofrecieron públicamente en
arrendamiento las tierras fiscales, enviando a los gobernadores y a las
sociedades rurales la nómina de los lotes disponibles. Se estableció
asimismo dar preferencia a los solicitantes que tuvieran residencia
efectiva y permanente en el territorio y a los que justificaran poseer
haciendas propias. Simultáneamente, se establecieron los servicios
agronómicos y veterinarios, las estaciones experimentales y las
observaciones meteorológicas, así como el asesoramiento técnico y los
estudios para la mejor comercialización de los productos. Se proyectaron
también las obras públicas necesarias, a través de la Dirección Nacional
de Vialidad, para una mejor y más eficiente comunicación de las distintas
regiones patagónicas con los puertos y centros de consumo.29 Todas estas
medidas se enmarcan precisamente en una política orientada a una
mayor intervención del Estado en la economía, que incluía llevar adelante
un conjunto de medidas tendientes a la definitiva integración de los
espacios regionales a la economía nacional y a la conformación y
consolidación de un mercado interno.
Esas políticas fueron percibidas por la mayoría de los pobladores
de la Patagonia de manera positiva y como síntomas de un cambio en la
relación entre el Estado nacional y los territorios.30 Sin embargo, ello no
Revista Argentina Austral, Año VII, nº 81, marzo 1936, p. 40.
“Memorial presentado al Ministerio de Agricultura de la Nación por las Sociedades Rurales
de la Patagonia”, Revista Argentina Austral, Año IX, nº 97, julio 1937, pp. 27-31; Revista
Argentina Austral, Año IX, nº 99, noviembre 1937, pp. 11-12.
30
Revista Argentina Austral, Año IX, nº 103, marzo 1938, p. 64. Se dedican 31 páginas de la
revista al relato pormenorizado de la visita de Cárcano y a los discursos pronunciados por
los distintos responsables de las entidades representativas de los intereses de los pobladores
patagónicos.
28
29
214
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
implicaría una convivencia sin tensiones a partir de entonces. De hecho,
las organizaciones representativas de los productores patagónicos
continuarían reclamando insistentemente, entre otras cuestiones, la
liberación del control de cambios para la exportación de lanas, aduciendo
condiciones desiguales de los productores sureños con respecto a los
demás ganaderos y productores del país; o el apoyo económico oficial a
través de subsidios como los otorgados en esos años a los productores
de otras zonas.31 Cabe recordar que, simultáneamente, en la década de
1930 la sociedad patagónica multiplicaba sus acciones orientadas a lograr
la incorporación de los territorios nacionales a la vida institucional del
país, a partir del reconocimiento de los derechos políticos cuya concreción
venía siendo largamente postergada.32
Consideraciones finales
La política estatal referida a las tierras públicas en las dos últimas
décadas del siglo XIX, se limitó básicamente a brindar seguridad a los
empresarios a partir de un régimen legal de características fuertemente
liberales, influyendo en ello el desconocimiento de la calidad y
posibilidades de los terrenos transferidos a los particulares. La
abundancia, fácil acceso y bajos precios de la tierra y el escaso control
estatal posterior a la entrega, en combinación con el objetivo de los
empresarios de generar ganancia incrementando la producción, generó
el carácter extensivo de la actividad ganadera regional y el
acaparamiento de terrenos, limitado sólo por la disponibilidad de
capital y las vinculaciones con miembros del aparato estatal. Las
mejores tierras se vendieron a bajos precios y prácticamente sin
exigencias en grandes superficies, con escasas inversiones; mientras
las tierras de menor calidad y peor ubicadas en relación a los centros
de consumo y transformación se ofrecieron a mayores costos, en
superficies menores y con importantes exigencias en cuanto a
inversiones. Este proceso no estuvo exento de conflictos, sobre todo
los generados entre los ocupantes efectivos de los campos y los nuevos
31
32
Revista Argentina Austral, Año X, nºs 109, 114, 115 y 118 de 1938.
Esos derechos políticos incluían la representación parlamentaria, gobiernos electivos,
cambios en el régimen municipal y el nombramiento de funcionarios con arraigo en la
región y conocimiento de la problemática patagónica.
215
Los actores sociales de la ganadería patagónica / Graciela Blanco
propietarios, característicos por otra parte de los movimientos
expansivos de la frontera interna.
Los cambios introducidos a principios de siglo por un sector
reformista dentro de los grupos liberal-conservadores en el poder, no
tuvieron un impacto lo suficientemente importante como para revertir
una estructura de la propiedad que en gran medida se había ya definido.
Su consecuencia más significativa fue la conformación de un importante
sector de arrendatarios en el espacio patagónico. Los gobiernos radicales
en cambio, en su decidida causa contra el régimen, buscaron diferenciarse
de un pasado que consideraban ominoso sancionando algunas normas
referidas a las tierras públicas que poco o nada cambiaron la situación
que se cuestionaba, aunque sí provocaron situaciones muchas veces
injustas y ampliamente cuestionadas que perjudicaron a importantes
sectores de pequeños y medianos productores, arrendatarios u ocupantes
de hecho de tierras fiscales. Igual efecto negativo tuvieron sobre estos
sectores otras políticas orientadas a consolidar el control estatal y la
integración de un mercado interno, al desarticular definitivamente el
funcionamiento socioeconómico que vinculaba las áreas andinas
patagónicas con el espacio chileno colindante. Estas políticas, unidas al
impacto de la posguerra y de la crisis internacional de 1930, otorgaron
mayor visibilidad al conflicto y potenciaron la conformación de las
organizaciones representativas de los productores que adquirieron un
importante protagonismo en la canalización de las demandas hacia el
Estado nacional. Sin duda, las respuestas favorables obtenidas a lo largo
de los años ’30 por los productores patagónicos deben ser entendidas en
el marco de las transformaciones políticas y económicas de esos años,
de los cambios operados en la sociedad regional patagónica y de la
relación de fuerzas puesta en juego por sus protagonistas.
216
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Aportes al estudio de la conformación
de la propiedad moderna en Argentina.
Ni “feudal” ni “comunista”:
El caso de la Provincia de Jujuy
Ana Teruel*
María Teresa Bovi**
Luego de la desamortización:
las condiciones de realización de la propiedad
La historiografía agraria latinoamericana que se ocupó de las
transformaciones de los derechos de propiedad territorial en el siglo
XIX ha puesto énfasis en un proceso crucial, especialmente en los países
de una fuerte base demográfica indígena: la denominada
desamortización y desvinculación de las tierras de comunidades
indígenas. Mucho se ha escrito sobre el tema poniendo en evidencia la
complejidad y lo inacabado del proceso. En Argentina el interés que
prestaron los historiadores a la suerte de las tierras de comunidades
indígenas con derechos de propiedad durante la colonia, es relativamente
reciente y se ha reducido a quienes investigan problemáticas regionales,
entendidas en este caso como las extra pampeanas. Sin embargo, en las
* Dra. en Historia. Investigadora Independiente del Consejo Nacional de Investigaciones
Científicas y Técnicas (CONICET) en la Unidad de Investigación en Historia Regional
partícipe de la Unidad de Investigaciones Socio Históricas Regionales (ISHIR). Profesora
de la Universidad Nacional de Jujuy, Argentina. Autora de libros y artículos sobre
problemáticas relativas a historia agraria y a fronteras indígenas. E-mail
[email protected]
** Prof. en Historia y en Ciencias Jurídicas y Políticas. Investigadora en formación en la
Unidad de Investigación en Historia Regional-UNJu. Profesora de la Universidad Nacional
de Jujuy. Participa en proyectos de investigación sobre historia política.
217
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
provincias del Noroeste, los estudios sobre la conformación de la
propiedad moderna no pueden prescindir del conocimiento de estos
cambios en los derechos de propiedad operados entre la colonia y la
República. Esa preocupación guía actualmente buena parte de nuestras
investigaciones.1
En esta ocasión nos preguntamos ¿cómo se reformulan los derechos
de propiedad luego de consumada la expropiación de las comunidades
indígenas? La provincia norteña de Jujuy resulta un excelente laboratorio
para plantear la pregunta, pues su realidad socioeconómica en el siglo
XIX es extraordinariamente compleja y variada, lo que permite tratar el
problema no sólo de las antiguas tierras de comunidad, sino de las nuevas
fronteras abiertas a la colonización y de las haciendas en vías de
transformación en modernos centros agroindustriales. Nos permitimos
entonces tomar prestada la propuesta que formulara Rosa Congost, de
estudiar “las condiciones de realización de la propiedad”, indagando
su dinamismo en el seno de la sociedad en movimiento, y recordando
que el tipo de derechos de propiedad que un Estado decide proteger en
un momento determinado se halla en relación con los intereses concretos
de unos grupos sociales específicos, 2 que, agregamos nosotros, se
encolumnan tras un proyecto determinado.
Decidimos entonces centrar el problema en un momento y un actor
político cruciales en el ordenamiento de la propiedad de la provincia.
Crucial el momento, en tanto se intentaba sentar las bases del nuevo
orden capitalista; crucial el hombre, tanto por la claridad de sus objetivos
como por la resolución para lograrlos. Nos referimos a la gestión del
gobernador Eugenio Tello en la década de 1880.
¿Quién era este hombre y actor político que trascendió al ámbito
nacional y que en Jujuy se proyectó como promotor del ordenamiento
Este artículo es producto de la articulación de dos líneas de investigación: la del orden
político y las referidas a las problemáticas de la propiedad de la tierra. El estudio se enmarca
en el proyecto “Jujuy en el espacio regional, de la Puna a las Yungas” de la Universidad
Nacional de Jujuy. La ocasión es propicia para agradecer los comentarios y aportes de
nuestros colegas, tanto del mencionado proyecto, como los recibidos en el II Encuentro de
la Red Internacional “Marc Bloch” de Estudios Comparados en Historia- Europa-América
Latina, realizado en la Pontificia Universidad Católica de Río Grande do Sul, Porto Alegre
(Brasil), en octubre de 2008. Un especial agradecimiento a Rosa Congost por su estímulo
intelectual y su lectura de la versión preliminar.
2
Congost, Rosa, Tierras, leyes e historia. Estudios sobre “la gran obra de la propiedad”, Barcelona,
Crítica, 2007.
1
218
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
territorial, jurídico, económico y social modernizador? Hijo de un
comerciante español, nació en Jujuy en 1849 y continuó la actividad de
su padre en medio de muchas otras: fue jefe de Telégrafos, por un período
maestro en Catamarca, profesor en el flamante colegio Nacional de Jujuy
y Diputado a la Legislatura Provincial por los departamentos de
Humahuaca (1876-1878) y capital (1879, 1880, 1883). En 1881, siendo
secretario de la Legislatura, casa con María Sánchez de Bustamante
Quintana, vinculándose así con una de las familias tardo coloniales más
destacadas en el ámbito de la política local.
A los 34 años de edad asumía interinamente el ejecutivo provincial,
cargo que ejerció a título de gobernador propietario entre 1883 y 1885.
Durante su gobierno no sólo se ocupó del ordenamiento territorial, sino
que promovió una política de “modernización y progreso”, reflejada en
la fundación de escuelas, entre ellas la Normal Nacional de señoritas
bajo la dirección de la maestra norteamericana Juana Stevens; la
prolongación del ferrocarril Central Norte de Tucumán a Jujuy3; y
modernas obras públicas.
Al finalizar su mandato se desempeñó como ministro del
gobernador José María Álvarez Prado, hasta 1886, cargo que debió dejar
al ser electo senador nacional para el periodo 1886-1895. Al mismo tiempo
que ejercía la senaduría nacional era presidente de la Legislatura provincial
(1887-1888) y diputado por los departamentos de Cochinoca (1886, 1889)
y Valle Grande (1890, 1894). Luego fue designado sucesivamente
gobernador del Territorio Nacional de Chubut (1895) y del Territorio
Nacional del Rio Negro (1898). Murió en Buenos Aires en 1924.
Valga esta pequeña referencia para situar la amplitud del ámbito
político en el que se movía nuestro personaje, cuya actuación, sin
embargo, hasta el momento no fue estudiada de forma integral. Antes
de entrar de lleno al estudio del ordenamiento de la propiedad,
dedicaremos un párrafo a la situación previa en la provincia.
3
Los jujeños sostenían la traza de Tucumán á Cobos, como estación intermedia, para seguir
después hasta Salta, teniendo por objetivo final a Jujuy y Bolivia por la quebrada de
Humahuaca, mientras que los salteños sustentaban la traza por la quebrada del Pasaje y el
valle de Lerma, teniendo por objetivo inmediato a Salta y desde ahí hacia Bolivia por la
quebrada del Toro. Esta disputa, llevó a Tello a publicar un folleto titulado: Prolongación
del Ferro-Carril C. Norte. Artículos publicados en “La Union” Demostrando la conveniencia de
preferir la traza por Cobos, Jujuy, Imprenta de P. Sarapura, 1884, demostrando la conveniencia
que sería, para la Nación y la provincia, la traza por Cobos.
219
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
Caracterización de la estructura agraria de Jujuy
La cuestión de la propiedad de la tierra en la provincia de Jujuy,
lindante con la República de Bolivia, tiene la complejidad de la de las
regiones andinas en general, con la cesura entre tierras altas y tierras
bajas, diferenciadas no sólo desde el punto de vista ecológico, sino por
sus características, étnicas, sociales e históricas. Es importante la
compresión de este fenómeno pues las problemáticas que se plantean
respecto a la propiedad de la tierra son de diferente naturaleza en uno y
otro lado. Intentaremos caracterizarlas de manera sintética.
Las tierras altas comprenden dos regiones de la provincia: el
altiplano o Puna, que se encuentra por encima de los 3.000 mts de altura
sobre el nivel del mar; y la Quebrada de Humahuaca, históricamente un
corredor natural encerrado entre montañas, que comunica las tierras
bajas con las altas (ver Mapa). Ambas regiones fueron las de mayor
poblamiento en tiempos prehispánicos y también las dominadas por el
incario. Asimismo fueron el objetivo de la conquista española, para poder
asegurar el dominio del Tucumán, y sobre ellas se entregaron
tempranamente mercedes de tierras y encomiendas, a la vez que se
reducía a sus habitantes en pueblos de indios con tierras comunales.
Sin embargo, la ciudad española cabecera de la jurisdicción, San
Salvador de Jujuy, fue fundada en las tierras bajas, en un fértil valle.
Más al oriente, se abría la frontera con el Chaco, en tierras selváticas
(Yungas o valles subtropicales) de transición hacia la llanura chaqueña.
Esta región de frontera, habitada por indígenas de economía cazadora
recolectora, con un alto grado de movilidad, comenzó a ser penetrada
tardíamente, en la segunda mitad del siglo XVIII, con el asentamiento
de misiones, fuertes y haciendas que tuvieron, en su mayoría, origen en
mercedes reales otorgadas como premio a los servicios prestados en la
frontera. A diferencia de las tierras altas, e incluso de las del valle de
Jujuy, la corona no reconoció nunca propiedad ni posesión de la tierra a
estos indígenas. Por otra parte, durante las primeras décadas del siglo
XIX, se consideraba el dominio de esta región aún incompleto y seguía
denominándosela como “frontera” o desierto, aunque fuese la zona más
fértil de la provincia.
Las tierras más valiosas y apetecibles eran la de los valles
templados cercanos a la ciudad de Jujuy, donde se practicaba la
agricultura, para abastecer al mercado local, y la ganadería. Pero eran
220
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
los alfalfares destinados al engorde del ganado en tránsito hacia el Alto
Perú los que daban dinamismo a la región. Allí la propiedad fue
paulatinamente subdividiéndose, aunque subsistían grandes fundos. En
general, eran explotados directamente por sus propietarios, que
empleaban mano de obra criolla (arrendatarios con obligación laboral,
puesteros o simplemente jornaleros).
En cambio, en la región de frontera, la tierra tuvo poco valor por
considerarse aún insegura, y, desde los comienzos de los asentamientos
españoles, se caracterizó por grandes dominios territoriales. Unas pocas
haciendas producían rudimentariamente azúcar, mieles y aguardiente,
a la vez que ensayaban el cultivo de productos tropicales, y criaban
vacunos que se destinaban también al mercado altoperuano y local.
Desde el siglo XVIII estas haciendas se habían servido de indígenas de
origen chaqueño, fundamentalmente para el trabajo temporario de la
cosecha de caña de azúcar. En la década de 1870 esta región, que había
sido marginal en la provincia, adquirió relevancia con la modernización
técnica de las fábricas de azúcar asentadas en los departamentos de San
Pedro y Ledesma, emprendida inicialmente con capitales de la vecina
provincia de Salta y de Jujuy. Así, la existencia de los modernos ingenios
revalorizó la propiedad, a la vez que su producción comenzó a generar
rentas para el fisco cada vez más importantes. Mucho se discutió sobre
el rol de estos ingenios como enclaves capitalistas en la provincia. Lo
cierto es que generaron un mercado de mano de obra que superó pronto
sus límites y que fue a través de la producción azucarera que Jujuy se
integró al mercado nacional. Pero este es un desenlace de la historia
algo posterior al período tratado, aunque fue este el momento de su
nacimiento. Lo que nos interesa destacar es que estas haciendas, en
transición hacia modernos ingenios, tuvieron una organización similar
a la del “central” cubano” o de las plantaciones e ingenios del litoral
peruano, ejerciendo un absoluto dominio de los pueblos que se
originaron en su interior, del comercio, de la administración territorial,
y de todos los aspectos de la vida cotidiana de trabajadores y pobladores
de la región.
Tanto en los valles centrales, como en los subtropicales de frontera,
las propiedades tuvieron su origen en mercedes coloniales o compras
realizadas a la corona, luego trasmitidas hereditariamente o por
compraventa. En general, podemos decir que el advenimiento de la
221
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
República no implicó demasiados cambios en el status de la propiedad,
dado que no hubo tierras concedidas a los indígenas ni a los pueblos,
salvo las ejidales de la ciudad capital, cuyo análisis excluimos acá. Esta
era la situación en términos generales, sin embargo es necesario aclarar
algunas situaciones puntuales. En lo que fue el curato Rectoral, y luego
departamento Capital, en tierras ubicadas en sus bordes jurisdiccionales,
hubieron dos pueblos de indios: el de Ocloyas (que había sido
encomendado y aparentemente había recibido tierras) y el de Yala. Más
adelante veremos que sus descendientes se sumarán, en la segunda mitad
del siglo XIX, a los reclamos por la propiedad que iniciaron los pobladores
de la Puna y Quebrada de Humahuaca. La otra situación a destacar es
que, en la frontera, las tierras de lo que había sido la misión jesuítica, y
luego franciscana, de San Ignacio de los Tobas, ya en decadencia a fines
de la colonia, fue en parte vendida al comandante del fuerte de Ledesma
(ese fue el origen de la hacienda homónima); y, en los comienzos de la
República, otra porción fue vendida a un inmigrante francés (Pablo Soria)
y los sobrantes declarados fiscales en la década de 1820. En ninguna de
estas transacciones se tuvo en cuenta a los indígenas, cuyo estadio de
“salvajismo”, para lo cánones de la época, los mantenía en status de
menores y necesitados de tutela.
Diferente fue la situación en las tierras altas, donde se centraron
los primeros debates republicanos en torno al carácter de la propiedad y
de los dominios directo e indirecto. Habíamos anticipado que allí, durante
la colonia, se había reducido a indígenas en pueblos con tierras
comunales, a la vez se habían establecido haciendas españolas que
contenían una buena parte de la población indígena en carácter de
“arrenderos”, un régimen similar al del “colono” en Bolivia. La
concentración de propiedad fue mayor en la Puna que en la Quebrada
de Humahuaca, pero ambas regiones fueron apetecidas por su papel
importante en el tránsito de animales y productos al Alto Perú, y por la
existencia de un considerable núcleo de población que proporcionaba
mano de obra por la “obligación de servicio personal” que implicaba el
régimen de arrendatario, a la vez que rentas por el derecho de pastaje o
por practicar la agricultura, en la zonas donde la naturaleza lo permitía.
El comienzo del régimen republicano puso fin al tributo indígena
y a la encomienda. Si bien ésta última ya tenía poca relevancia en el
territorio argentino, una de las excepciones fue la de la Puna, donde se
222
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
había mantenido con vigor la de los indígenas de Casabindo y Cochinoca.
La legislación avanzó luego sobre los cacicazgos y comunidades,
ordenando, en 1825, dividir los terrenos entre los mismos indígenas a
título de propiedad privada, medida que no se hizo efectiva hasta el año
1838, cuando se dictó la ley de enfiteusis para la Quebrada de
Humahuaca. Tras esta ley, las antiguas tierras comunales se consideraron
fiscales por derecho de reversión, argumentando que la propiedad de
las tierras indígenas durante la colonia, en última instancia, era del rey,
mientras que los comuneros habían gozado de su usufructo a cambio
del pago del tributo. Por lo tanto, los indígenas originarios tendrían
derecho preferencial al solicitar la concesión de los terrenos que antes
ocupaban, bajo el pago de un canon del 3% de su tasación. Inspirada en
las leyes de Castilla, según fundamentaban los legisladores en su decreto
reglamentario de 1839, subsistía aún el concepto de los dominios
divididos: el “dominio útil”, que ejercían los indígenas, y el “dominio
directo”, que ahora pasaba al fisco provincial. Esta situación se mantuvo
hasta finales de siglo, sin embargo se dieron los primeros pasos hacia la
plena propiedad en 1855, en los terrenos ejidales de los pueblos de la
Quebrada, siempre que fueran “solares edificados”, que se entregaron a
título de propiedad a sus ocupantes. En 1860 la ley de venta de tierras
públicas fue el paso siguiente, permitiendo a los particulares (fueran o
no enfiteutas), comprar al Estado el dominio directo.4
La enfiteusis afectó sólo a la Quebrada de Humahuaca, donde se
evidenció una activa participación del Estado respecto al destino de las
tierras de comunidad. Al contrario, en la Puna se mantuvo el status quo
hasta la década de 1870. Allí, para los indígenas de Casabindo y
Cochinota que habían poseído tierras en comunidad, la supresión de la
encomienda les había significado que, de hecho, el antiguo tributo fuera
transformado en un canon de arriendo. De esta manera, la familia
Campero, heredera de los ricos marqueses de Tojo, propietaria de la
4
Estudio más detallados sobre la enfiteusis en Jujuy se encuentran en Madrazo, Guillermo,
“El proceso enfitéutico y las tierras de indios en la Quebrada de Humahuaca (Provincia de
Jujuy, República Argentina). Período Nacional”, en Revista Andes Nº 1, Salta, CEPIHA,
Universidad Nacional de Salta, 1991; Bushnell, David, “La política indígena en Jujuy en la
época de Rosas”, en Revista Historia del Derecho, Buenos Aires, Instituto de Investigaciones
del Derecho, 1977; y Díaz Rementería, Carlos J., “Supervivencia y disolución de la
comunidad de bienes indígena en la Argentina del siglo XIX”, en Revista Historia del Derecho
“R. Levene”, 30, Buenos Aires, 1995.
223
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
gran hacienda de Yavi, sumaba ahora las tierras de Casabindo y
Cochinoca como si hubiese obtenido merced sobre ellas.
En este caso no hubo participación estatal alguna para regularizar
la propiedad, hasta el año 1872. Fue entonces cuando los indígenas de
Cochinoca y Casabindo, cuestionaron los títulos legítimos de propiedad
de Fernando Campero. El gobierno provincial las declaró entonces
fiscales, dado que, efectivamente, el otorgamiento de la encomienda
durante la colonia no implicaba derechos de propiedad territorial. El
reclamo de los arrendatarios fue acompañado de levantamientos en toda
la Puna, que se extendieron durante tres años. Los rebeldes fueron
derrotados, en 1875, en la batalla de Quera, pero dos años después, por
fallo de la Suprema Corte de Justicia de la Nación, las tierras de
Casabindo y Cochinoca fueron declaradas propiedad de la provincia,
bajo los mismos argumentos que había posibilitado la enfiteusis en la
Quebrada de Humahuaca.5 De esta forma, los antiguos arrendatarios de
Campero, en Cochinoca y Casabindo, pasaron a serlo del fisco, mientras
que el resto de los pobladores puneños, de hecho la mayoría,
permanecían bajo el régimen de “arrenderos” de otros grandes fundos
particulares.
Este breve panorama intenta reflejar la situación de la propiedad
territorial hacia 1870. Por esa época, y según el primer censo nacional,6
Jujuy tenía 40.379 habitantes, de los cuales 3.072 vivían en la ciudad
capital y una cifra algo superior en la aglomeración, considerada urbana,
de la hacienda Ledesma. En el resto de la provincia ningún pueblo
sobrepasaba las 600 personas. Esta sociedad, eminentemente rural, se
caracterizaba por la concentración de la propiedad territorial. El catastro
del año 1872,7 registraba 753 propiedades rurales en toda la provincia,
Para estudios puntuales sobre la problemática en la Puna, ver Madrazo, Guillermo, Hacienda
y encomienda en los Andes. La puna argentina bajo el marquesado de Tojo. Siglos XVII a XIX,
Buenos Aires, Fondo Editorial, 1982; Rutledge, Ian, Cambio agario e integración. El desarrollo
del capitalismo en Jujuy, ECIRA, 1987, Fidalgo, Andrés, ¿De quién es la Puna?, Jujuy, 1988;
Paz, Gustavo, “Resistencia y rebelión campesina en la Puna de Jujuy, 1850-1875”, en Boletín
del Instituto de Historia Argentina y Americana Dr. Emilio Ravignani, III, Buenos Aires, 1991,
entre muchos otros artículos del autor.
6
Primer Censo de la República Argentina. Verificado los días 15, 16 y 17 de setiembre de
1869. Buenos Aires, Imprenta El Porvenir, 1972.
7
Archivo Histórico de la Provincia de Jujuy (en adelante AHJ). Catastro de las propiedades
urbanas y rurales de Jujuy, año 1872. Se trata de uno de los primeros catastros completos de
la provincia, el anterior, de 1855, fue sumamente rudimentario.
5
224
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
distribuidas muy irregularmente en las diferentes regiones, según puede
observarse en el cuadro 1. En los valles centrales, cercanos a la capital, la
mediana propiedad tenía una importante presencia, tanto en numero
(representaban un 57% del total) como en valor fiscal (42%). La
subdivisión de la propiedad se había producido sin injerencia estatal.
En cambio, la parcelación en la Quebrada de Humahuaca fue fruto de la
ley de ventas de las tierras enfitéuticas. Allí encontramos una gran
cantidad de pequeñas parcelas (59%), probablemente en manos de
pobladores nativos que habían logrado comprarlas, que coexistían con
un importante número de propiedades medianas (32%) y unas pocas,
pero grandes haciendas, que significaban el 9% del total de propiedades,
pero representaban el 49% del valor total de la tierra en la región.8
En cambio, tanto la Puna como los valles subtropicales presentaban
una gran concentración de tierras en manos de unos pocos propietarios.
En el altiplano, 14 hacendados y el fisco provincial, tras la expropiación
a Campero, ejercían el dominio territorial de la región y concentraban el
97% del valor fiscal de la tierra. El resto de las propiedades (sólo 15) era
unas pocas casas particulares y de comercio en los pueblos.
En los valles subtropicales, tres enormes haciendas azucareras
dominaban tierras y pobladores: Ledesma, San Lorenzo-Campo
Colorado y San Pedro. Como en el caso de la Puna, concentraban más
del 90% del valor fiscal. Al oriente de la región, en la zona de Santa
Bárbara, fuera del dominio azucarero, se extendían tierras dedicadas a
la ganadería que la provincia consideraba fiscales y estaban en litigio.
La gestión de Eugenio Tello en Jujuy
“[El gobernador] Ve desde luego, que su territorio que tiene cincuenta
mil quilometros cuadrados, donde la naturaleza ha depositado el germen
de todas las riquezas, cuenta solo con cuarenta y tantos mil habitantes,
tenemos pues desierta la mayor parte de la Provincia, y como una
consecuencia de esto, el estacionarismo mas completo en todas las ramas
del progreso. Ve además que la Provincia encuentra un positivo obstáculo
para su desarrollo en ciertos males de orden público, que tienen viciada
la atmósfera social, figuran entre ellos ese espíritu violento que se ha
8
Teruel, Ana A., “La incidencia de la tenencia de la tierra en la formación del mercado de
trabajo rural en la provincia de Jujuy, 1870-1910””, en Población y Sociedad, Nro 2, Tucumán,
Fundación Yocavil, 1994.
225
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
dado á las luchas políticas acarreando el consiguiente malestar; las faltas
de las garantías constitucionales que protegen el derecho de propiedad,
como sucede en la mayor parte de los Departamentos de la Puna y
Quebrada donde se proclaman los perniciosos principios del comunismo;
la capacidad de ladrones de profesión que infectan la Provincia, como
una amenaza positiva para el desarrollo de la industria primaria y
finalmente la vagancia que sustrae tantas fuerzas útiles al progreso del
país.”9
Propiedad y trabajo, sostiene Bonaudo,10 eran los valores básicos
sobre los que se construiría el nuevo orden burgués en Argentina. En la
provincia de Jujuy, en el extremo Norte del país, la gestión gubernamental
de Eugenio Tello (1883-1885), a quien pertenecen las palabras citadas,
fue el momento de inflexión más claro entre el antiguo y el nuevo orden.
Pero a diferencia de Roca, quien en el discurso inaugural de su gestión
presidencial, en 1880, consideraba al país libre de conmociones internas,
Tello no podía decir lo mismo en 1883 respecto de su provincia.
Efectivamente, en Jujuy, la década de 1870 estuvo signada por
conflictos internos entre los sectores que se aglutinaban alrededor de la
vieja política provincial,11 por un lado, y aquellos que proponían llevar a
cabo la modernización. Los conflictos entre el poder ejecutivo y la
Legislatura llevaron al gobierno nacional a intervenir la provincia en
1870, 1877 y 1879. La elección, en marzo de 1880, de Plácido Sánchez de
Bustamante, garantía del apoyo de la provincia de Jujuy a la política del
presidente Roca, no superó las dificultades entre el poder ejecutivo y el
legislativo, provocando la renuncia del mandatario. Su sucesor, Pablo
Blas, quien respondía en el orden político nacional a la persona de Dardo
Rocha, no tuvo mejor suerte con la Legislatura, elevando también él su
renuncia al cargo de gobernador.12 Fue entonces cuando Julio A. Roca
Archivo Histórico de la Legislatura de Jujuy (en adelante AHLJ). Mensaje del Poder Ejecutivo
a la Honorable Legislatura de la Provincia. Jujuy, Junio 22 de 1883. Caja Documentos Nº 39,
Año 1883.
10
Bonaudo, Marta, “A modo de Prólogo”, en Nueva Historia Argentina. Liberalismo, Estado y
orden burgués (1852-1880), Buenos Aires, Sudamericana, 1999, T. IV. p. 15.
11
El diario La Democracia los llamaba “…los apóstoles de la política vieja, de esa política de
expoliación y exclusión que ha mantenido a la provincia, en un deplorable atraso
[...]”.Citado en Sánchez de Bustamante, Teófilo, Biografías Históricas de Jujuy, San Salvador
de Jujuy, Universidad Nacional de Jujuy, 1995, p. 342.
12
Paz, Gustavo, “El gobierno de los “conspicuos”: familia y poder en Jujuy, 1853-1875", en
Sábato, Hilda y Lettieri Alberto (Comps.) La vida política en la Argentina del siglo XIX. Armas,
votos y voces, Buenos Aires, Fondo de Cultura Económica, 2003.
9
226
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
actuó de artífice de un acuerdo entre las dos facciones tradicionalmente
rivales en la provincia,13 por un lado la liderada por Domingo T. Pérez –
presidente del “Club del Pueblo” y posterior jefe del partido autonomista
provincial, y por el otro la de Eugenio Tello, quien ejerciendo la
presidencia de la Legislatura, asumía interinamente el ejecutivo
provincial.14
En virtud de esa alianza, Eugenio Tello fue elegido en mayo de
1883 gobernador constitucional y Domingo Pérez ministro general de
gobierno, iniciándose en Jujuy un período de estabilidad política,
habiéndose afianzado -mediante tal conciliación de facciones- el
alineamiento de la política provincial con la del Estado nacional.15 A
partir de ese momento, será también en Jujuy el Partido Autonomista
quién se mantendrá en la esfera de la dirigencia política hasta 1918.
Programa de Tello
Los propósitos de su gobierno, así como el diagnóstico que hace
de los males de la realidad provincial y de sus posibles soluciones, están
plasmados en sus dos primeros mensajes a la Legislatura (en 1883 y
1884).16 Su objetivo no se diferencia mucho de lo que podría haber
enunciado otro mandatario en la época:
“El P. Ejecutivo preocupado como se encuentra de promover el bienestar
y engrandecimiento de la Provincia se esfuerza en buscar los resortes
Alonso, Paula, “La política y sus laberintos: el Partido Autonomista Nacional entre 1880 y
1886”, en Sábato, Hilda y Lettieri, Alberto (Comps.) La política en la Argentina del siglo
XIX…op.cit.
14
Un mes después Tello escribía al Presidente Roca: “Desde el 18 del corriente estoy
encargado del mando gubernativo de la Provincia. Comprendo a quien merezco el honor;
debe estar seguro que la situación actual es robusta y respondera decididamente a los
nobles propósitos de V.E… En el “Eco de Córdoba” he visto que me clasifican de
Gobernador equívoco. Es completamente desautorizado el dicho, y puedo asegurarle que
nuestro amigo D. Juan Sola y yo le respondemos a V.E. de Salta y Jujuy; no por especulación,
sino por simpatías y convencimientos”. Archivo General de la Nación. Carta de Eugenio
Tello a Julio A. Roca, Jujuy, Abril 7 de 1883, Fondo General Julio A. Roca, Legajo 1258.
15
Paz, Gustavo, “La Provincia en la Nación, la Nación en la Provincia. 1853-1918”. En Teruel,
Ana y Lagos, Marcelo (Dir.), Jujuy en la Historia. De la colonia al siglo XX, Jujuy, UNIHR –
EDIUNJU, 2006.
16
AHLJ. Mensaje del Poder Ejecutivo a la Honorable Legislatura de la Provincia. Jujuy, Junio 22
de 1883. Caja Documentos Nº 39, Año 1883 y Mensaje del Gobernador de la provincia al abrir
las sesiones de la Legislatura en Enero de 1884. Jujuy, Imp. De la Unión, 1884.
13
227
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
que puedan imprimirle eficazmente una marcha progresiva por las vías
de un adelanto moral y material para que así pueda ocupar el puesto
que les corresponde entre las demás Provincias Argentinas.”17
Procurar el “adelanto moral y material” era casi un slogan de la
época, pero lo que diferenció a Tello de otros gobernadores de la
provincia es que, en la consecución de tales propósitos, superó el plano
discursivo anunciando un amplio programa con reformas que
rápidamente puso en práctica.
Tello estaba indudablemente compenetrado de las corrientes de
pensamiento que sustentaron el orden nacional que empezaba a
construirse, y en el que había colaborado aunque desde puestos sin mayor
notoriedad.18 Era un liberal, pero fundamentalmente un hombre práctico.
Si bien sus discursos enunciaban preceptos básicos del liberalismo, el
núcleo de los mismos no era la exposición teórica, sino las acciones a
seguir, tal el espíritu positivista, en el aspecto que señala Hale, de que el
dogma sostenía que la nueva sociedad, de carácter industrial, debía ser
“administrada”, por hombres prácticos que conocieran las finanzas y
supieran preparar presupuestos.19
El diagnóstico que hace Tello de la realidad provincial se basa
en su experiencia política previa, pero fundamentalmente en el
conocimiento puntual producto de la observación personal. A los tres
meses de asumir el mando de gobernador emprendió una visita en la
que recorrió todos los departamentos de la provincia. Habló con los
pobladores, recogiendo sus quejas; con los propietarios, con los que
ejerció una mezcla de demostración de ejercicio de poder y
negociación; relevó el estado económico, la potencialidad y la
producción de cada localidad. A su regreso a San Salvador solicitó a
la Legislatura licencia con la finalidad de trasladarse a la capital de
la República, argumentando:
“[…] mi presencia en los Departamentos de la Provincia que acabo de
visitar importa el compromiso de realizar obras urgentes, para cuya
AHLJ. Mensaje … 1883, op.cit.
Tello decía haber iniciado su carrera pública en 1871 en calidad de fundador técnico de los
Telégrafos de la Nación, habiendo fundado también el telégrafo de Jujuy. Carta a Benjamín
Villafañe, Buenos Aires, setiembre de 1924. Transcripta en Sierra e Iglesias, Jobino, Acerca
de la fundación del pueblo de San Pedro, Ediunju, 1996, p. 23.
19
Hale, Charles, “Ideas políticas y sociales en América Latina (1870-1930)”, en Bethell, Leslie
(Ed.), Historia de América Latina, Barcelona, Crítica, 1991, T. 8.
17
18
228
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
ejecución puede contribuir generosamente la Nación, ya que a la Provincia
no le es posible atender a todas sus necesidades”20
Producto de su viaje al interior de la provincia es el diagnóstico
que hace de la situación, tal como describimos a continuación,
centrándonos en los aspectos relativos a la estructura agraria, al sustento
legal y a las finanzas:
Diagnóstico de la situación provincial
Poco antes de morir, en el ánimo de dejar constancia de su accionar
público, y en un momento donde volvían a agitarse los reclamos sobre
tierras y el fantasma del “comunismo” que el creía haber contribuido a
eliminar, Tello escribió, en 1924, a Benjamín Villafañe, entonces
gobernador de Jujuy, diciéndole: “Jujuy era feudal y lo reconstruí”.21
Efectivamente, aquello que Tello denominaba feudal, era una sociedad
de rasgos señoriales, caracterizada, desde el punto de vista de las
estructuras agrarias, por la hacienda latifundista que permitía a sus
propietarios disponer de un poder que aseguraba el control de tierras y
hombres. Si bien el carácter de la hacienda era diferente según la región
de la provincia que se tratara, había rasgos comunes inherentes a este
tipo de propiedad, que son lo que Tello expuso ante la Legislatura en
1883 y 1884. Allí decía:
“Con excepción de la Capital y de los dos Perico, en los demás la
propiedad se halla concentrada. Hasta el extremo de que en San Pedro,
Ledesma, Rinconada, Santa Catalina, Valle Grande y Yavi, la capital de
cada uno de esos departamentos pertenece a un solo propietario.
Siendo depresivo de la dignidad de un pueblo este régimen […]”22
Esto implicaba la imposibilidad de autonomía de los gobiernos
municipales respecto de los propietarios de los fundos en los que se
AHLJ. Caja Documentos N°39, Año 1883. Nota del 1° de octubre de 1883.
Carta a Benjamín Villafañe, 1924, en Sierra e Iglesias, Jobino, Acerca de la fundación…,op.cit
22
AHLJ. Mensaje … 1884., op.cit. Administrativamente la provincia se dividía en
departamentos. Estos eran, en tiempos de Tello, cuatro en la región de la Puna (Santa
Catalina, Rinconada, Yavi y Cochinoca), tres en la Quebrada de Humahuaca ( Tumbaya,
Tilcara y Humahuaca); otro, el de Valle Grande, en la zona transicional entre ésta y la
región de valles subtropicales o Yungas (donde estaban los de Ledesma y San Pedro); y
tres más en los valles bajos y templados cercanos a San Salvador de Jujuy (Capital, Perico
del Carmen y Perico de San Antonio).
20
21
229
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
encontraban inmersos los pueblos, un límite al poder del Estado que se
consideraba intolerable en una nación moderna. Pero Tello veía también
germinar en el latifundio otros dos males. El más urgente y acuciante
era la subversión de los arrendatarios de origen indígena que
cuestionaban la legitimidad de los títulos de propiedad:
“Sabéis y consta de documentos que hasta el día en que me encargué del
gobierno, el derecho de propiedad era públicamente desconocido en gran
parte de la Puna y Quebrada.
Como sobre ese derecho reposa el orden social, y sobre el orden social el
constitucional, resultaba que desaparecido aquel, esta provincia no estaba
en condiciones de Estado confederado.”23
Pero no menos importante para el Gobernador era el hecho de que
los latifundios inmovilizaban la tierra como factor de atracción de
población. A tono con Avellaneda, cuyas propuestas y postulados seguía
fielmente,24 intentaba regularizar los derechos de propiedad adquiridos
durante la colonia
“Las mercedes de grandes extensiones de terreno que concedían los Reyes
de España, traían consigo una condición muy difícil de cumplir. Era la
de poblar las tierras. No se poblaban y de ahí provenían las nuevas
mercedes, las confusiones de límites, los pleitos y por fin la inseguridad
de la propiedad, constantemente amenazada por la posible subversión.
Una merced importaba una donación condicional, establecida en el
antiguo sistema de poblar. Así lo confirma luminosamente nuestro
publicista argentino, el Dr. Avellaneda.”25
Una vez regularizados los derechos de propiedad sería posible
abocarse al fomento de la población, ofreciendo tierras fiscales, si fuera
necesario en forma gratuita, a los inmigrantes, pero también dando la
posibilidad de acceder a la propiedad a los pobladores nativos,
gestionando la subdivisión y venta,
“Y por mas claro que parezca, debo insistir en recordar que la tierra baldía
no constituye la riqueza de un Estado. La tierra en sí, con los tesoros que
la naturaleza ha depositado en su seno, de nada vale, si el genio del
hombre no la cultiva y explota esos tesoros. Poblar es enriquecerse, así
como gobernar es poblar.
AHLJ. Mensaje … 1884, op.cit
Nos referimos al Estudio sobre las leyes de tierras públicas, de autoría de Nicolás Avellaneda,
del año 1865.
25
AHLJ. Mensaje … 1883, op.cit.
23
24
230
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Busquemos entonces población que cultive los inmensos terrenos de que
se trata; traigamos hombres que al radicarse en ellas, paguen contribución,
consuman efectos sujetos a impuestos y promuevan una corriente
abundante de importación y exportación. Así habremos alcanzado un
positivo adelanto industrial y económico.
¿Y cómo atraemos esa población industriosa? Muy fácilmente. Después
de vender preferentemente por precios módicos, á los actuales ocupantes
que reconocen al fisco como exclusivo propietario, fracciones de terrenos
suficientes para la industria primaria, que es a la que se dedican, tenemos
todavía espacio bastante para llamar á la inmigración extranjera.”26
Tello citaba a Avellaneda en su discurso y retomaba la idea básica
de Adam Smith: la tierra por si sola, no constituye riqueza. Tampoco
convenía al Estado la venta de grandes extensiones de tierras fiscales
como recurso financiero, sino que la tierra debía ponerse al servicio de
la producción, creando propietarios industriosos y responsables, que
consuman, produzcan y paguen impuestos.
“[…] solamente con la importación de pobladores industriosos, que se
distingan por sus hábitos de trabajo, conseguiremos una doble conquista:
una moral, al tener ciudadanos virtuosos y otra económica, al garantir
un considerable aumento de la renta pública. Para ello busquemos un
estímulo y un aliciente que los atraiga á estas regiones. El no puede ser
otro que la tierra […]”27
Al promover esta política, Tello se refería especialmente al destino
de tierras del oriente de la provincia, lindantes con el Chaco (Santa
Bárbara), que estaban en litigio entre la provincia y unas pocas personas
que alegaban poseer su propiedad. Pero esta era una parte del problema
de la propiedad en Jujuy. La otra cuestión, que el gobernador veía con
preocupación, era la falta de regulación de los derechos de propiedad
en las regiones de población indígena andina, que había tenido
reconocimiento de tierras durante la colonia. Estaba aún muy fresca la
memoria del alzamiento de los indígenas puneños de 1873; es más, el
mismo Tello había formado parte de las tropas gubernamentales que lo
sofocaron en la batalla de Quera. El reclamo de los arrendatarios de los
latifundios de la Puna, a los que se sumaban otros de la Quebrada de
Humahuaca y de Valle Grande, no había disminuido; en realidad no
hacía más que incrementarse desatando continuas denuncias de falsedad
de los títulos de propiedad de los poseedores de latifundios.
26
27
Ibid.
Ibid.
231
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
“Parece un sueño que en la república Argentina se hable de comunismo,
y sin embargo es sabido que en el año de 1873 brotó una idea de funestas
consecuencias entre los indígenas de la Puna; la denuncia de los terrenos
que consideraban fiscales. La idea hirió como un rayo a la raza indígena,
que se conserva casi originaria, pero no ya con el carácter de simple
denuncia, sino proclamando públicamente el comunismo, fundado en
que “Dios había creado el mundo para todos sus hijos”, y llegó vez que
desconocieran abiertamente órdenes emanadas de la Justicia Federal” 28
Era necesario, a ojos del gobernador, y en general de toda la élite
dirigente jujeña, cortar de raíz estas veleidades “comunistas”. De más
está decir que este comunismo agitado como fantasma no respondía a
las ideas de Marx, sino que los indígenas alegaban haber poseído tierras
en comunidad durante la colonia, tierras que ahora denunciaban como
fiscales, en una estrategia que le permitiera terminar con la opresión de
los patrones, y que había dado buenos resultados en el caso de las de
Cochinoca tras el fallo de la Suprema Corte de Justicia en 1877.
Pero ni “feudal” ni “comunista”, el nuevo orden debía basarse en
el estricto respeto por la propiedad privada unívoca. La originalidad de
Tello consistió en vislumbrar que la solución al problema no era sólo la
coerción, a la que también acudió,29 sino que a la par atendió los reclamos
de los arrendatarios indígenas, prestó oídos y falló en los casos de
denuncias contra la legitimidad de títulos de las tierras en cuestión. Si
bien en todos los casos reconoció la validez de los derechos de sus
propietarios, obligó a los mismos a demostrarlos, y luego de ello ordenó
reconocerlos y cumplir con el pago del respectivo canon de
arrendamiento. Pero dado que en la mayoría de estos casos se trataba de
propietarios ausentistas y los arrendatarios eran los productores directos,
decidió convertirlos en propietarios de parcelas, intercediendo para que
pudiesen comprar las fincas, en el convencimiento de que “el propietario
planta, cultiva, edifica y transforma, por que le guía un interés
permanente”. De esta manera los convertía en gendarmes de la
propiedad privada:
28
29
AHLJ. Mensaje …1884, op.cit.
En su mensaje de 1883 anunciaba haber ordenado “el recojo de las armas dispersas en
toda la Provincia, para cortar el germen de frecuentes alarmas; ha intimado a los que
desconocen el derecho de propiedad, que serán sometidos por la fuerza de las armas, si
continúan en sus amenazadores propósitos; debe disponer una pesquisa general de los
ladrones que merodean en la Provincia, cometiendo frecuentes robos de ganado” AHLJ.
Mensaje … 1883, op.cit.
232
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
“Entre nosotros que aun no ha desaparecido el espíritu de socialismo, es
menester criar apóstoles del trabajo que como dueños de la tierra respeten
y hagan respetar el derecho de propiedad, que es el fundamento sobre
que reposa el orden social.”30
Por otra parte, el firme propósito de Tello era dotar a la provincia
de los instrumentos legales del nuevo orden para poder implementar
los principios del Código Civil e imponer claramente la nueva propiedad.
Pero ocurría que, según sus palabras:
“Para la generalidad, nuestras leyes son letra muerta, porque no han
circulado lo bastante, y porque están agotadas las ediciones.
Desde que me encargué del gobierno, recibo de las Provincias y
Departamentos frecuentes pedidos de nuestras leyes, y paso por el
disgusto de no satisfacerlos, porque no tenemos ejemplares.” […]
Mientras que otras provincias vienen obedeciendo a un plan de reformas,
nosotros carecemos hasta de lo esencial. El enjuiciamiento civil, como lo
dijo bien el ex gobernador Dr. Blas, no comprende disposiciones para
juicios de litis espensas [sic, se refiere a litisexpensas], de discernimientos
de tutelas, de prestación de alimentos, de división de cosas comunes, de
herencia vacante; y aún el título de las testamentarias de aplicación
frecuente, es deficiente.”31
Faltaban códigos de procedimiento, código rural, registro oficial
de leyes, y hasta archivos gubernamentales. Su breve gestión fue activa
también en ese sentido, dotando a la provincia del archivo gubernamental
y del poder judicial, además de una compilación de leyes y decretos.
Convencido que las disposiciones oficiales que garantizaban los intereses
agrícolas y ganaderos eran insuficientes y aisladas y, siendo “la
agricultura y ganadería las principales fuentes que constituyen la riqueza
pública, es de nuestro deber fomentarlas, dictando leyes, ante todo
proteccionistas de aquellas”; 32 para lo que nombró una comisión que
estudiara el Código Rural de Salta a fin de implementarlo en Jujuy,
aunque su sanción fue bastante posterior (1893).33
El otro pilar del nuevo orden lo constituía la renta estatal. Es ya
sabido que a partir de 1853 las provincias cedieron los impuestos
Ibid.
Ibid.
32
AHLJ. Caja Documentos N° 41, Año 1885. Nota del Poder Ejecutivo Provincial a la
Honorable Legislatura del 4 de marzo de 1885.
33
AHJ. Registro Oficial. Compilación de Leyes y Decretos de la Provincia de Jujuy. T III
1869-1886, Jujuy, Imprenta tipográfica de José Petruzzeli, 1887. Ley del 17 de marzo de
1885 ordenando una comisión para la redacción del Código Rural.
30
31
233
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
aduaneros a la Nación recibiendo en compensación subsidios, a la vez
que comenzaron el proceso de reemplazar los antiguos impuestos
coloniales por nuevas contribuciones. El impuesto a la propiedad
territorial y a la mobiliar (ganadería y agricultura) fue una de ellas, sin
embargo el presupuesto de Jujuy se componía en más de un 40% de los
subsidios nacionales.34
“La Provincia de Jujuy por entero produce cuarenta mil pesos de renta
anual, tiene cuarenta mil habitantes. Esto es: la renta esta en relación a
un peso por cada uno.
Es triste decirlo, que como estado confederado, no produzca de renta ni
la mitad de lo que produce la Municipalidad de la ciudad de Salta.
Seguramente que la causa de esto está en la falta de población, que trae
consigo la falta de producción.”35
Pero no sólo era la falta de población potencialmente contribuyente,
sino aún lo imperfecto de los catastros y la evasión de propietarios y
productores. Tello lo sabía, como sabía también de la resistencia que
ocasionaba la regulación de los impuestos. Finalmente, fue recién durante
su gestión que se ordenó que los pagos y la contabilidad se hicieran en
pesos nacionales, supliendo los pesos bolivianos que corrían
habitualmente.
La tarea de “sentar un nuevo orden burgués”, tal como la describe
Bonaudo a nivel nacional en el período transcurrido entre 1853 y 1880,
es emprendida sistemáticamente en Jujuy en esa última década y Tello
jugó un rol muy importante al menos en lo que se refiere a la regulación
e imposición de los principios de la propiedad privada, que es lo que
puntualmente nos interesa tratar acá.
Tello y el ordenamiento de la propiedad en la provincia
Autonomía de los pueblos
Uno de los aspectos más importantes por los que es recordada la
figura de Tello en la provincia es la fundación de pueblos. Ya habíamos
adelantado que en su mensaje de 1884 el gobernador planteaba la
Boto, María Salomé, “Política de recursos jujeña durante el proceso de conformación del
estado nacional: 1853-1885”, en Campi, Daniel (coord.), Jujuy en la Historia. Avances de
Investigación, Jujuy, UNJu, 1993. Vol. I
35
AHLJ. Mensaje … 1883, op.cit.
34
234
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
urgencia de dar solución a la autonomía de los pueblos, ya que tanto en
los valles subtropicales como en la Puna eran propiedad de los
hacendados, lo que para el gobernador era un estado “depresivo de la
dignidad” y también signo de “feudalismo”. Si bien contaba con un
instrumento legal para disponer expropiaciones, una ley de 1870 por la
que se declaraba “expropiables por causa de utilidad pública los terrenos
ocupados por los pueblos de Valle Grande, Yavi, Rinconada; Cochinoca,
Casabindo, Santa Catalina, San Pedro, Ledesma, Perico del Carmen y
Perico de San Antonio”,36 Tello intentó en lo posible no confrontar con
los propietarios, utilizar el mecanismo de la expropiación sólo en los
casos donde no hubiera otra solución, y recurrir a la fundación de nuevos
pueblos en otros.
Si bien la referida ley no se había puesto en práctica hasta la llegada
de Tello al gobierno, ya para esa época los pueblos de Perico del Carmen
y de San Antonio en los valles templados, habían alcanzado autonomía
territorial. Faltaba arreglar la cuestión en la Puna y en los departamentos
azucareros.
En la Puna el tema se tornaba espinoso por lo sensible de la
situación desde la década de 1870, dados los cuestionamientos de parte
de los arrendatarios a los derechos de propiedad de los hacendados, de
la negativa a pagar arriendos y los múltiples reclamos elevados al poder
ejecutivo y judicial. El fallo de la Corte Suprema de Justicia de 1877 en el
caso de Cochinoca y Casabindo, había sentado un importante
antecedente en cuanto a la posibilidad de ilegitimidad de los títulos
coloniales. Pero no era el propósito de Tello alentar ataques a la
propiedad considerada “legítima”, más aún cuando la provincia misma
se había convertido en propietaria de las tierras expropiadas a Campero
tras ese fallo judicial y, en ese carácter, comenzaba a afrontar también la
resistencia de los nativos a pagar arriendos. Dotar de autonomía
territorial a los pueblos, trazar las tierras de ejido y entregar a sus
habitantes títulos de propiedad era un primer paso para limitar las
atribuciones de los hacendados. En el departamento de Cochinoca la
medida fue de fácil resolución, ya que la fundación que dispuso Tello
para la villa cabecera, en Abra Pampa, se hizo en tierras fiscales. Fundada
con el nombre de Siberia Argentina, en 1883, la Legislatura autorizaba
36
Registro Oficial…, op.cit. Ley del 8 de abril de 1870.
235
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
al poder ejecutivo a “ceder gratuitamente en propiedad a los particulares
que deseen edificar, lotes de terrenos para casas y solares, debiendo los
cesionados pagar el derecho territorial correspondiente”.37 En el mismo
departamento Tello ordenó, en 1884, la fundación de otro pueblo, con el
nombre de Patricios, en el lugar conocido como Puesto del Marqués. Al
contrario, en el departamento de Yavi, la villa homónima era el centro
de la hacienda de la familia Campero, la misma que había sido
expropiada en Cochinoca. Aquí Tello decidió buscar otra solución,
desplazando la capital del departamento a otro sitio. Luego de recorrer
la región y decidir que La Quiaca, en el camino hacia Bolivia, donde se
hallaba la Aduana Nacional, era el punto adecuado, obtuvo la cesión
gratuita por parte del propietario de la finca, Ascencio Quispe, para
fundarla capital del municipio. El proyecto fue sometido a la
Legislatura,38 sin embargo dicha fundación no se concretó hasta el año
1907, cuando La Quiaca se convirtió en terminal del Ferrocarril Central
Norte. Respecto a los otros dos pueblos de los departamentos de Rinconada
y Santa Catalina, si bien en su mensaje de 1884 Tello dice haber dispuesto
“el señalamiento, mensura, delineación y amojonamiento del área de
terreno destinado para pueblo y ejidos”, estos continuaron inmersos en
las haciendas.
Otras dos villas más fueron fundadas en la provincia. En la
Quebrada, en el departamento de Humahuaca, la de Uquía, previa
indemnización a sus propietarios.39 En el departamento de Valle Grande,
zona de transición entre las tierras altas y las bajas, el pueblo homónimo,
tras la cesión gratuita a la provincia que hicieron los campesinos al
comprar la gran finca que abarcaba casi toda la superficie departamental.
Más adelante nos referiremos a ello.
En los valles cálidos del oriente las tierras estaban bajo absoluto
dominio de las haciendas azucareras. Pero a diferencia de las de la Puna,
Decreto de la Honorable Legislatura de 14 de agosto de 1883. Ibid. Tello manifestaba que
la fundación de ese pueblo se haría cuando la Honorable Legislatura le prestase aprobación,
por ser de su exclusiva atribución decretar la creación de pueblos, villas y ciudades, según
lo establecido en el art. 38, Inc. XIX de la Constitución provincial. AHLJ. Caja Documentos
N° 40, Año 1884. Nota del Poder Ejecutivo a la Honorable Legislatura, 14 de enero de
1884.
38
AHLJ. Caja Documentos N° 40, Año 1884. Nota de Tello dando cuenta de sus gestiones
para fundar el pueblo de La Quiaca, en los terrenos que le fueron cedidos por Ascencio
Quispe, 14 de enero de 1884.
39
Registro Oficial…, op.cit. Creación de la villa de Uquía, Ley del 7 de marzo de1885.
37
236
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
estas haciendas eran explotadas activamente por sus propietarios,
estaban en pleno proceso de modernización tecnológica y sus ingenios
azucareros empezaban ya a emerger como el sector económico más
promisorio de la provincia. Los poblados de San Pedro y de Ledesma,
se habían formado en el núcleo de estas haciendas, donde se encontraban
las respectivas “salas” o residencia principal de los propietarios y, en su
proximidad, las fábricas de azúcar, las proveedurías y las viviendas de
empleados y trabajadores. Durante la visita que realizó a la provincia, a
poco de asumir su mandato, Tello se trasladó a San Pedro, y tras largas
negociaciones con su propietario, Miguel Francisco Aráoz, obtuvo su
inicial consentimiento para efectuar la expropiación de las tierras
destinadas a trazar la nueva villa. Cuando años después Tello se refería
a este episodio, lo recordaba como uno de los principales triunfos de su
gestión por la resistencia inicial de Aráoz, a quien le dijo “este pueblo es
una toldería de indios”,40 refiriéndose efectivamente a las tiendas que
los nativos del Chaco, ocupados en la zafra, asentaban en las
proximidades. Pero seguramente no fue el argumento del progreso de
la civilización lo que convenció al propietario, sino la determinación del
gobernador y promesas de apoyo en gestiones a nivel nacional destinadas
a apresurar la llegada del ferrocarril a Jujuy, indispensable para que el
azúcar local pudiera acceder al mercado nacional.
Así, por decreto del 30 de julio de 1883 Tello disponía la expropiación
de terrenos para la fundación del pueblo de San Pedro, delegando en el
hijo del propietario su mensura y delimitación de tierras para solares y
ejidos. A pesar de la aparente aceptación, la resistencia de Aráoz se
manifestó a través de la dilación de la tarea encomendada, por lo cual el
gobernador comisionó a otra persona para que la hiciera, lo que recién
finalizó en 1885. Los terrenos expropiados pasaron a poder de la provincia,
que no asumió directamente la indemnización pues la ley de 1870, que
autorizaba al poder ejecutivo a efectuar estas operaciones, preveía que
“La expropiación se perfeccionará a medida que se presenten al PE
interesados, solicitando la adjudicación de los solares delineados,
abonándose entonces al propietario el precio fijado a aquellos”.41 Así se
dispuso que los interesados en adquirirlos pagaran directamente al
propietario, bajo cierto control del gobierno de la provincia.
40
41
Carta a Benjamín Villafañe, en Sierra e Iglesias, Jobino, Acerca de la fundación…, op.cit.
Registro Oficial…, op.cit. Ley del 8 de abril de 1870.
237
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
En el caso de Ledesma, el Gobernador procedió de manera similar,
expropiando los terrenos y ordenando delinear el pueblo en 1883. Al
año siguiente debió reiterar por otro decreto la orden,42 ya que su
propietario, Ovejero, empleó la misma táctica de dilación que había
intentado Aráoz, pero con más éxito, pues mientras que la fundación de
San Pedro como pueblo autónomo se logró, no ocurrió lo mismo en
Ledesma, donde recién en 1901 se efectivizó la donación de tierras por
parte de la empresa para lo que se denominó “Pueblo Nuevo”, hoy
Libertador General San Martín. ¿Que resortes movió el propietario de
Ledesma, que no tocó Aráoz, para evadir la ley? ¿Tello mismo lo consintió
o fueron los gobernadores posteriores? Hasta el momento no se ha
hallado documentación que permita discernirlo, aunque es un clásico
tópico en la historiografía provincial el poder que ejercieron los ingenios
y los vínculos de sus propietarios a nivel provincial y nacional.
Este episodio, al igual que las dificultades para la autonomía de
los poblados de la Puna, ilustra sobre el peso de la estructura socioeconómica que prevalecía en la provincia y sobre los escollos y
resistencias que pudo haber afrontado Tello al intentar sentar la
propiedad moderna.
Un aspecto interesante a destacar es que, tanto en la ley de 1870
como en los decretos para la fundación de pueblos, todavía se
contemplaban tierras para dotarlos de “ejidos o pastos comunes” y, en
los casos de expropiación, esas tierras, que no podrían ser vendidas a
título individual, serían pagadas por la provincia. Es decir que aún se
contemplaba el acceso de los vecinos de las villas a pastos comunes.
Aparentemente el espíritu desamortizador no había llegado más que a
la propiedad indígena y religiosa.
Subdivisión y venta de latifundios a los arrendatarios
Tello participaba de aquella generación de argentinos que habían
concebido el nuevo orden como una república de ciudadanos
propietarios, que contribuyeran al fisco y defendieran con las armas la
nación. La impronta de los principios del liberalismo era muy clara en
su pensamiento y acción respecto al entendimiento de la propiedad como
42
Registro Oficial…, op.cit. Decreto del 18 de abril de 1884.
238
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
principio básico del orden y del progreso: sólo al propietario le mueven
las ansias de mejorar sus fundos. La consecución del progreso individual,
contribuiría al de la nación, a la vez que se convertiría al ciudadano
propietario en un defensor de ese orden, en la medida en que éste le
demostrara ser el más propicio.
Quizás la nota de mayor singularidad de Tello dentro de los
hombres de su generación fue la coherencia de su acción con este
principio. Esta nueva nación de propietarios incluiría no sólo a los
posibles inmigrantes, que ya de por sí eran entendidos como portadores
del espíritu del trabajo y el progreso, sino también a los nativos. En este
sentido Tello pareciera escapar de los diagnósticos pesimistas respeto a
lo que se podía esperar de la población originaria. Aún así, delineó una
política diferenciada para unos y otros; mientras que postulaba que al
inmigrante se le debía dar tierra en forma gratuita, nunca consideró este
mecanismo para los nativos desposeídos, pero sí los alentó y propició,
incluso con la ayuda financiera del Estado, para que compraran la tierra.
Sin duda estas medidas no pueden ser analizadas fuera del contexto
en el que se produjeron, de la amenaza del “comunismo” por parte de
los indígenas arrendatarios, y de las características de las haciendas
involucradas. No se trataba de las del oriente azucarero en marcha hacia
el modelo capitalista, sino de aquellas que encarnaban el viejo modelo
“feudal”, a decir del gobernador, “haciendas de arrenderos”, al decir de
Madrazo,43 resabios del orden colonial.
También resabios del orden colonial eran los argumentos con que
los nativos defendían sus derechos a la tierra. En dos interesantes
peticiones al Ejecutivo provincial 44, una de 1881 elevada por los
“naturales y vecinos” de Rodero-Negra Muerta (departamento de
Humahuaca)45, y otra por los del departamento de Valle Grande, en 1882,
se denunciaban como terrenos públicos dichas tierras, en las que, decían
“moramos desde nuestros antepasados”. Los fundamentos de ambos
reclamos, basados en las Leyes de Indias, son idénticos, y adjudicaban
Madrazo, Guillermo, Hacienda y encomienda en los Andes…, op.cit.
Fue gobernador en el periodo 01/04/80 a 15/03/82 el Dr. Plácido Sánchez de Bustamante,
y desde 16/03/82 a 17/03/83 el Dr. Pablo Blas.
45
AHJ. Caja de documentos Nº 2, Año 1881. Denuncia de las tierras de Rodero, Negra Muerta
ubicadas en las tierras del departamento de Humahuaca, julio de 1881.
43
44
239
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
el despojo (se dice textualmente pérdida del dominio directo) a la
situación posterior a la guerra de independencia:
“Como indios y naturales de Valle Grande teníamos tierras propias y
estábamos amparados por las Leyes de la Recopilación de Indias pagando
tributos para vivir tranquilos según nos consta un padrón formado en el
año 1806 por un Gobernador llamado Martín Flores y mas recibos que se
pagaron los tributos a S.M. del Rey hasta el año 1811; pero vino la guerra
de la independencia, desconociendo nuestros derechos y después de
servir con nuestras personas y bienes ha resultado que se los han quitado
nuestras tierras a nuestros padres […]”.46
Los petitorios fueron acompañados por la acción directa. Durante
diciembre de 1882 hubo gran agitación en esas regiones. El Comisario
de Humahuaca envió telegramas al Gobernador diciendo que “se habían
reunido como 400 indios y que repartían la noticia de que Maidana había
llegado de Buenos Aires con un Dr. para que les reparara las tierras.
Que en Santa Catalina Laureano Saravia los estaba entrenando y
uniformando. Que tramaban lanzarse contra la capital y que también se
habían sumado los habitantes de Valle Grande”. Los dos líderes
nombrados habían sido partícipes de la rebelión de la Puna de 1872, por
lo que es de imaginar la alarma con que se recibió la noticia. Finalmente
los cabecillas fueron detenidos.47
Estos sucesos ocurrieron unos meses antes de que Tello asumiera
la gobernación de la provincia. Pero fue durante su mandato en que
falló por la cuestión de la propiedad de las tierras denunciadas como
fiscales en Valle Grande. Después de un estudio de los títulos de
propiedad, que debieron presentar los denunciados, y de una visita al
departamento, Tello dictaminó, en agosto 16 de 1883:
“[…] después de haberme cerciorado de los lugares denunciados, de cerca
o desde la distancia; después de haber estudiado los títulos de propiedad
mencionados; después de haber meditado con el juicio que conviene a
un alto magistrado de la provincia; después de haber comprendido que
difícilmente vendrá a estos lugares de despeñaderos horribles otro
gobernador, por lo mismo convenía un estudio detenido y dar opiniones
aunque sean oficiosas, para procurar evitar tanto pleito y tantas molestias
que se viene originando y complicando desde habrá más de cien años;
AHJ. Caja de documentos Nº 1, Año 1882. Nota al Gobernador de la provincia de Jujuy, 27
de abril de 1882.
47
AHJ. Caja de documentos Nº 2, Año 1882. Telégrafo Nacional, correos enviados del 10 al
15 de diciembre de 1882.
46
240
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
después de haber observado que los indígenas están fanatizados por tener
la propiedad de las tierras denunciadas y que es un mal social que se ha
convertido en un atroz comunismo, difícil de combatirlo, después de
haber visto que la manera fácil de traerlos al orden es inclinarles el respeto
a la propiedad, pero que si quieren ser dueños de la tierra, el gobernador
les ayudará para que las compren a su dueño. Fallo declarando que los
lugares que se expresan denunciados por fiscales, no son fiscales, y están
en el deber de abonar sus arriendos y reconocer a sus actuales propietarios
o poseedores mientras que no las adquieran legalmente por compra o de
otro modo. Para perpetua memoria de esta resolución dese al registro
oficial y notifíquese a quienes corresponda […]”48
Tello cumplió su promesa gestionando la compra a Benita Costas
de Valle, en 1884, de una de las mayores fincas de Valle Grande,
recabando el dinero necesario entre sus arrendatarios. “Los indígenas
han hecho los más ingentes sacrificios para reunir el dinero, dando los
más pobres de ellos hasta cuatro pesos, en el interés de tener un palmo
de tierra”, informaba el gobernador a la legislatura, a la vez que
solicitaba se les exima del pago de la alcabala, por ser pobres y por
haber demostrado patriotismo y generosidad al ceder gratuitamente a
la provincia para pueblos cinco áreas de terreno en Pampichuela,
Caspalá, Santa Ana, Valle Grande y Calilegua. 49 La operación se
concretó bajo la figura de pro-indiviso, parcelándose en el año 1887,
bajo responsabilidad del ya ex gobernador, comisionado para entregar
las boletas respectivas.50
En cuanto al otro caso, el denunciado por los arrendatarios de
Rodero-Negra Muerta, involucraba a un personaje muy importante
en la política provincial, José María Álvarez Prado, quien
administraba la finca en calidad de esposo de Filomena Padilla de
Prado, viuda de Macedonio Graz. En su gestión como gobernador,
entre 1874 y 1876, Álvarez Prado había comandado las tropas que
derrotaron a los puneños en Quera. Durante el mandato de Tello
presidió un tiempo la Legislatura y fue electo gobernador para el
período 1885-1887, cuando Tello fue ministro de gobierno y luego
presidente del órgano legislativo. Si bien el expediente sobre la
cuestión se había cerrado en 1882, con fallo favorable a Filomena
AHJ. Caja de documentos Nº 1, Año 1882.
AHLJ. Caja Documentos N°41, Año 1885. Nota del 13 de enero de 1885.
50
Registro Oficial…op.cit. Decreto del Poder Ejecutivo, 25 de noviembre de 1886.
48
49
241
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
Padilla de Prado, 51 durante la gestión de Álvarez Prado- Tello, los
arrendatarios compraron la hacienda.52
Finalmente, el tercer caso de subdivisión de una hacienda por
compra de sus arrendatarios es el de Yoscaba, en la Puna (departamento
de Santa Catalina) también ríspido en cuanto a sus orígenes, pues su
dueña, Corina Aráoz, residente en Salta, era la viuda de Fernando
Campero (propietario de la gran hacienda de Yavi y damnificado tras la
expropiación de Cochinoca y Casabindo). Eugenio Tello intercedió ante
la propietaria y ante el Banco de la Nación para que otorgara un crédito
con garantía del Estado Provincial, de manera que, en 1886, los
arrendatarios pudieron comprar la finca.53
En los tres casos se trataba de tierras poco apetecibles, salvo para
los campesinos que las habitaban. También de haciendas cuya propiedad
había sido largamente cuestionada, lo que nos hace suponer que la
solución alentada por Tello no sólo era favorable a los nativos, sino
también a los propietarios, cuya situación se volvía cada vez menos
sostenible. Así, al regularizar la propiedad, Tello aseguraba el orden:
“Sin que importe jactancia puedo decir que hemos salvado del naufragio,
porque ahora los indígenas están sometidos, reconocen el derecho de
propiedad, respetan el principio de autoridad, y algo más, están prontos
a sostener mi gobierno en caso necesario.”54
Si bien José María Álvarez Prado reconocía en sus escritos de defensa de la propiedad de
su esposa que no había título originario de merced, decía que constaba que en 1772 Gregorio
Zegada la compró a María Isabel Murguía mediante escritura pública extendida en España
y luego ratificada en Jujuy. Macedonio Graz, la había comprado a los herederos de Zegada
en 1862 y a su muerte quedó en poder se su viuda, Filomena Padilla de Prado. AHJ. Caja
de documentos Nº 2, Año 1881.
52
AHLJ. Caja Documentos N° 43, Año 1887. Nota al gobernador, 4 de junio de 1887, de los
compradores de la finca Rodero.
53
AHLJ. Caja Documentos N° 42, Año 1886. Nota al Gob. de la provincia, 13 de octubre de
1886, de José María Maidana, a nombre propio y de sus representados en la cuestión de la
compra de la finca Yoscaba, solicitando se les exima del pago de alcabala. En 1887 el
gobernador, José María Álvarez Prado, exonera del pago de los derechos de transferencia
a sus compradores. AHLJ. Caja Documento N° 43, Año 1887. Nota del Poder Ejecutivo a la
Honorable Legislatura, enero 28 de 1887. Para un estudio con más detalles ver Paz, Gustavo,
“Tierra y resistencia campesina en el Noroeste Argentino. La Puna de Jujuy, 1875-1910”,
en Barragán Rosana et al, Bolivia y América Latina en el siglo XIX, La Paz, Institute Francais
de Etudes Andines, Coordinadora de Historia, 1997 y Cardoso, Esteban, Historia Jujeña.
Batalla de Quera. Edición del autor, Jujuy, 2000.
54
Mensaje del Gobernador de la provincia al abrir las sesiones de la Legislatura en Enero de 1884.
Jujuy, Imp. De la Unión, 1884.
51
242
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Tierras fiscales y colonización
Hacia la década de 1880 la provincia poseía una considerable
cantidad de tierras, que habían sido declaradas fiscales en diferentes
momentos y regiones. Las de la Quebrada de Humahuaca, en 1839
cuando se dictó la ley de enfiteusis. Las de Cochinoca y Casabindo, en la
Puna, tras el fallo judicial de 1877. Las de Santa Bárbara, en los valles
subtropicales hacia el Chaco, que habían sido declaradas fiscales en 1873
y, nuevamente, durante el gobierno de Tello, en 1883. Los tres casos
involucraban a diferentes actores y circunstancias, por lo que los
trataremos por separado.
Respecto a las tierras enfitéuticas, Tello alentó la compra del
dominio directo a quienes tenían su tenencia, de manera de perfeccionar
la plena propiedad, posible desde la ley de 1860 ya mencionada. El cobro
del canon enfitéutico no había significado un ingreso de mucha
consideración para el fisco provincial, $400 bolivianos en los años 1881,
1882 y 1883, que significaban menos del 1% de los ingresos totales. En el
año 1885 ingresaron $1.157 moneda nacional (equivalente a 1.606 bol.)
en calidad de redenciones enfitéuticas y $173 m/n (equivalente a 240
bol.) por el canon de aquellas cuyo dominio directo conservaba el
Estado.55 Esto hace suponer que fue en este período donde se puso
prácticamente fin a la enfiteusis.
Respecto a las de Casabindo y Cochinoca, Tello no introdujo
modificaciones a lo dispuesto por la ley de 1880 que establecía:
“Art. 1° Las tierras dejadas por disposiciones reales a las antiguas
comunidades de los pueblos de Casabindo y Cochinoca, que se han
declarado propiedad de la Provincia por sentencia de la Suprema Corte
Nacional, se reservan en el dominio de la Provincia, para que sus
productos por pastajes y arriendos que paguen sus actuales ocupantes y
los demás que en adelante quieran establecerse en ellas, formen parte de
la renta del Tesoro Público Provincial.
Art. 2° El expresado arrendamiento se pagará sobre el número de ganados
de toda especie que los ocupantes tuvieren, a razón de 6 reales por cada
ciento de ovejas y cabras y medio real por cabeza de ganado vacuno,
caballar, llamas o burros […]”56
Registro Oficial…, op.cit. Renta General de la Provincia. Hasta 1884 los presupuestos
provinciales se hicieron en bolivianos, a partir de 1885 en moneda nacional, a un cambio
de 0,72 pesos argentinos por cada boliviano.
56
Registro Oficial…, op.cit. Ley del 8 de abril de 1880.
55
243
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
En estos casos se ejerció toda la coerción necesaria para imponer
el reconocimiento de la propiedad del fisco, dado que la renuencia al
pago de arriendos continuaba y estos significaban un ingreso nada
despreciable, alrededor de $2.500 bolivianos en 1883 y 1884. En 1885, ya
durante el mandato de Álvarez Prado (Tello Ministro de Gobierno), se
dictó el decreto del 26 de diciembre de 1885, fundado en que:
“El PE de la provincia
Habiendo denunciado en nota del 2 de este mes, el Comisionado cobrador
de arriendos fiscales de Casabindo y Cochinoca, Julián Benicio, que
algunos locatarios resisten al pago de arriendo, causando con el mal
ejemplo y sus consejos la desmoralización de los demás; lo que importa
a infracción a la ley del 8 de abril de 1880, tiende a restablecer los
perniciosos efectos de la comuna o sea el desconocimiento público de la
propiedad
Decreta
Art. 1. Los Comisionados de las tierras públicas que no estuviesen dadas
en enfiteusis, expulsarán de ellas en el término legal a los locatarios que
resistan el pago de sus arriendos, procediendo sumariamente en la
prueba, sin perjuicio del embargo y remate de bienes para cubrir la deuda,
gastos y costas que se originen, conforme a la ley del 15 de marzo de
1883.”57
Pero las mayores expectativas del gobernador se depositaban en
las tierras del oriente de la provincia, en pleito con quienes alegaban su
propiedad, y sobre las que Tello planificaba instalar colonias de
inmigrantes ultramarinos.
“Esta última región es pues la mas importante de la Provincia, abarcando
próximamente una extensión de mil doscientas leguas cuadradas, y sin
embargo es la menos productiva y poblada, á tal extremo que en el año
pasado apenas ha producido de renta al tesoro de la Provincia, la
insignificante suma de doscientos sesenta pesos.
Ella se presenta al cultivo del café, de la caña de azúcar y del algodón; al
beneficio del kerosene y la cría de ganado, como fuentes inagotables de
riqueza. Estos hermosos territorios, que prometen un gran porvenir para
la industria y que se prestan a esa clase de producciones, puede decirse
con fundamento, que tienen un fácil contacto con los mercados del mundo,
por su proximidad al río Bermejo, cuya navegación es un problema de
posible solución.”58
Registro Oficial…, op.cit. Decreto 26 de diciembre de 1885. Recién en 1891, el gobierno de
la provincia decidió poner en venta estas tierras.
58
Mensaje 1883…op.cit.
57
244
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
El pleito no involucraba a las haciendas azucareras, sino a aquellas
tierras más hacia el Chaco que habían sido objeto de mercedes coloniales,
cuya validez el gobierno provincial no reconocía pues no se había
cumplido con la condición de poblarlas. Tello decidió avanzar sobre
estas tierras reiterando la ley que las declaraba fiscales y autorizaba al
poder ejecutivo a vender todos aquellos terrenos o estancias que se
encontraran despoblados, como así los que hubiesen sido poblados con
“posterioridad a la fecha en que fueron declarados administrativamente
del dominio de la provincia, por decreto gubernativo del año 1850” y las
que estuviesen pobladas con anterioridad a dicha declaratoria, sin
reconocer propietario particular alguno con justo título. Se aclaraba que
en la venta serán preferidos los actuales poseedores y que se reservaría
hasta 50 leguas cuadradas para que fueran cedidas gratuitamente a
inmigrantes agricultores.59
La cuestión de estas tierras de Santa Bárbara y Maíz Gordo generó
mucho ruido en la provincia y, finalmente, los latifundistas más
importantes lograron conservarlas, para poco años después venderlas,
fraccionadas, entre otros, a Ovejero, propietario del ingenio Ledesma.
El intento de Tello ocasionó denuncias, tanto por considerar a la ley
inconstitucional, como por sospechas de negociaciones emprendidas por
el gobernador para obtener la expropiación. Así lo sostenía Tomás R.
Alvarado en 1890 en carta a Domingo Pérez, en la que se quejaba por la
confiscación de sus terrenos y acusaba que:
“U. sabe que el Gobernador Eugenio Tello hizo dictar la famosa Lei de
18 de Diciembre de 1883 confiscando las tierras de Santa Bárbara i Maíz
Gordo, propiedad de los S S. Iriarte i Lozano ofreciendo lotes como en la
Tablada á los Diputados que la sancionaron como ofreció al Gral Roca,
Presidente entonces, i á muchos otros para que le ayudaran á consumar
el despojo mas atentatorio que puede cometerse en un estado argentino.”60
Continuaba su larga carta denunciando negociaciones de Tello en
las referidas tierras durante su gestión como senador nacional. Aunque
no poseemos documentación que nos permita dilucidar qué elementos
de veracidad pudiera contener tal la denuncia, citamos la carta por
Registro Oficial…, op.cit. Ley del 18 de diciembre de 1883. Declarando fiscales los terrenos
al este de la Totorilla y los existentes en Santa Bárbara y Maíz Gordo.
60
Archivo Domingo T. Pérez. Carta de Tomás R. Alvarado a Domingo Pérez. Buenos Aires,
septiembre 3 de 1890.
59
245
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
ilustrativa de los intereses que se movilizaban en el caso y la permanencia
de Tello en la política provincial finalizada su gestión como gobernador,
potenciada por sus conexiones en la política nacional.
Consideraciones finales
Sin duda la época y el actor político analizados significaron la
coronación en Jujuy de un largo camino hacia la consolidación de la
propiedad privada. La primera etapa del camino ya estaba desbrozada al
asumir Tello la gobernación, nos referimos a la desamortización de la
propiedad y la expropiación de los terrenos comunales indígenas. La
segunda etapa, cuyos inicios podemos fijar en la gestión de Tello, intentó
legitimar la propiedad resultante de las primeras reformas y sentar nuevas
bases para evitar los conflictos sociales peligrosos para el nuevo orden
basado en la imposición de las normas capitalistas y la incorporación de
la provincia al mercado nacional.
Podemos resumir la política implementada por el gobernador
según las soluciones que vislumbró a los considerados “males” que
aquejaban a la provincia. Frente a la estructura agraria de ancien régime,
“feudal” según sus palabras, propició la subdivisión de los latifundios
cuyos productores directos eran campesinos subsumidos en una relación
con los propietarios de la tierra, casi de servidumbre. En los casos
tratados, en los que sus gestiones al respecto llegaron a término, se atuvo
a un principio que consideraba basal: el respeto por la propiedad privada.
Así, ante las pruebas presentadas por los indígenas en torno a los
antecedentes inmemoriales de ocupación de esas tierras y posterior
despojo durante la colonia o en los tempranos tiempos republicanos; y
los títulos originarios de compra o mercedes presentados por quienes
oficiaban de propietarios de dichos fundos, optó siempre por legitimar
a éstos últimos. No obstante, y en consideración al malestar social y
continuos conatos de sublevaciones, consideró que la solución era tornar
a estos “arrenderos” en propietarios, pero operando siempre dentro de
las leyes del nuevo orden, esto es: propiciando la compraventa, que sin
la mediación del Estado y el otorgamiento de créditos, hubiese sido
imposible. De esta forma terminaba con otro de los males: “las veleidades
comunistas”. Tello intentaba erradicar de raíz, entre los indígenas, la
memoria y las ansias de retornar a un antiguo orden de posesión de la
246
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
tierra en común. Quiso transformarlos en campesinos propietarios y
convencidos defensores de las bondades de la propiedad privada;
ciudadanos productivos y activos contribuyentes del fisco.
A esta altura del relato, el lector seguramente se preguntará si lo
logró. La historia posterior demuestra que no completamente, en primer
lugar porque sólo en algunos lugares puntuales los “arrenderos” llegaron
a comprar la tierra. En partes donde esto ocurrió, como en el caso de
Valle Grande, los conflictos se apaciguaron. En otras subsistieron, como
en la Puna, donde hubieron casos en los que la diferenciación social
dentro del campesinado posibilitó que antiguos “arrenderos”, ahora copropietarios, fueran concentrando tierras y volvieran a reproducir el
esquema de servidumbre sobre sus antiguos pares. Sin embargo esta no
fue la situación general, sino la pervivencia de los antiguos latifundios
en las tierras altas, por lo que los reclamos y conflictos se prolongaron
hasta 1949 cuando el presidente Perón decretó su expropiación.61
Pero retomemos el hilo del momento tratado. Es importante
destacar la política diferencial de Tello respecto a los latifundios y a
como lograr esa capa social de pequeños y medianos productores
agropecuarios. En lo que veníamos describiendo, queda claro que el
gobernador consideraba perjudiciales socialmente e improductivas en
manos de latifundistas a estas propiedades predominantes en las tierras
altas, y que la vía para crear pequeños productores libres era la compra
de la tierra. Se trataba de la población nativa.
En el caso de la apetecible población inmigrante, portadora del
espíritu del trabajo y del progreso, el acceso a la propiedad debería ser
gratuito, pues la intención era radicarla en las regiones más despobladas,
de antigua frontera con el Chaco, potencialmente rica pero aún salvaje.
En este caso, para revertir tales tierras a la esfera fiscal, sí se cuestionaron
los títulos de propiedad de quienes decían haberlas recibido en mercedes
coloniales y no las habían poblado. La resistencia de los damnificados a
tales medidas fue grande y los logros gubernamentales escasos.
61
La persistencia del problema en las tierras altas de la provincia durante los gobiernos
radicales, en la década de 1920, es tratada en Fleitas, M.S. y Teruel, Ana, “Política y
movilización campesina en el norte argentino. La cuestión de la tierra indígena en el
proceso de ampliación de la democracia” en Revista Andina, Centro Bartolomé de Las Casas,
Cuzco, Perú, Nº 45, segundo semestre del 2007, pp. 41-65.
247
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
Pero había en la provincia un tercer tipo de latifundio: el de los
ingenios azucareros. A estas empresas apostaba Tello, en particular, y la
dirigencia política, en general, como vía de desarrollo en la provincia.
Allí la concentración de la propiedad no era percibida como negativa,
sólo bastaba que las villas que habían tenido su origen en el seno de las
haciendas azucareras perdieran ese carácter de feudalidad y obtuviesen
su autonomía territorial. Ello implicaba tocar intereses de los propietarios
azucareros, a quienes si bien se les garantizaba una indemnización, se
los privaba del control directo de la población. Pero la pérdida bien se
resarcía con el apoyo gubernamental para asegurar que el azúcar pudiera
ser competitivo en el mercado nacional.
Por último, a fin de ponderar los cambios ocurridos en la
propiedad, es interesante comparar dos registros de propiedad territorial
pertenecientes a momentos inmediatamente previos y al final del período
tratado. En ambos casos se excluye a las propiedades de San Salvador
de Jujuy, la ciudad capital de la provincia.
Cuadro 1. Variación del número de propiedades privadas registradas
en Jujuy entre 1872 y 1904
Región
Catastro 1872
Catastro 1904
Quebrada de Humahuaca
353
1.421
Valles centrales
322
1.115
Valles subtropicales o yungas
48
792
Puna
30
338
753
3.667
Total provincia
Fuente: Teruel, Ana A., “La incidencia de la tenencia de la tierra en la formación del mercado de
trabajo rural en la provincia de Jujuy, 1870-1910”, en Población y Sociedad, Nro 2, Tucumán,
Fundación Yocavil, 1994
El notorio aumento del número de propiedades se debe a diferentes
factores que formaron parte de la expresa política de Tello y de algunos
de los gobernadores que le sucedieron: perfeccionamiento de los
mecanismos de registro catastral cuyo objetivo era la recaudación del
248
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
impuesto territorial, transformación de los enfiteutas de la Quebrada de
Humahuaca en propietarios de pleno dominio, subdivisión de latifundios
(claramente perceptible en la Puna y en los valles subtropicales donde
incluimos al departamento de Valle Grande), venta de terrenos fiscales
y nuevas propiedades registradas en las villas cuya fundación
mencionamos a lo largo de este trabajo.
Si bien la brevedad del mandato gubernamental, establecido en
dos años en ese entonces, puede poner en juicio cuánto es dable atribuir
a Tello de estas reformas, debemos recordar que una característica del
régimen político dominante a fines del siglo XIX era la continuidad, y
aún la superposición, en otras funciones gubernamentales. El senado
era el lugar por excelencia de la permanencia en el poder, tan es así que
Botana lo denomina “invernada de gobernadores”.62 Muchas de las
reformas descriptas que fueron iniciadas durante la gestión de Tello como
gobernador, tuvieron su concreción años después. Ello habla también
de toda una generación de políticos partícipes de las mismas ideas e
intereses. En este sentido creemos que Tello, por la claridad de su
pensamiento y la energía con que actuó, es la punta del iceberg que
permite vislumbrar el programa modernizador en torno a la propiedad
en Jujuy.
62
Botana, Natalio, El Orden Conservador. La política Argentina entre 1880 y 1916, Buenos Aires,
Sudamericana, 1979.
249
Aportes al estudio de la conformación de la propiedad moderna en Argentina / Ana Teruel e María T. Bovi
Anexos
Mapa: Jujuy en el espacio Sudamericano.
250
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Mapa: Provincia de Jujuy en la actualidad.
Departamentos y regionalización propuesta.
251
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa
en la Descripción Amena de la
República Argentina de Estanislao Zeballos
Sandra Fernández*
Cuando el viajero miró hacia atrás y vio que el camino
estaba intacto, se dio cuenta de que sus huellas no lo
seguían, sino que lo precedían.
Misterios del Tiempo de Alejandro Jodorowski**
Breve introducción
El epígrafe de este artículo en realidad no es un fragmento literario,
es una minificción1. Mínimo en su brevedad sintetiza la percepción y
concepción de la obra de Zeballos. Así poco más de veinticinco palabras
dilucidaban crudamente la imagen de la forma estética y expresiva
elegida por este autor y hombre político: para Estanislao no había sido
importante lo pasado, (visto, oído y relatado), sino la ejemplaridad de
sus relatos en lo por venir. El norte dentro de su obra de viaje nunca
estuvo puesto en las expectativas del impacto de lo exótico, no retoma
plenamente la experiencia y modelo Humboltiano para exponer su
cuadro de sensaciones de viaje, no es tampoco sólo la perspectiva
pragmática de los viajeros de la “vanguardia capitalista”: el horizonte
de Zeballos era impulsar un modelo del que se sentía parte y actor
* CONICET – Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas-/UNR –Universidad
Nacional de Rosario – Argentina. [email protected] [email protected]
** Citado en La extrema brevedad. Microrrelatos de una y dos lìneas de David Lagmanovich
(2006).
1
Los microrelatos son ejemplos de lo minúsculo, sus apenas dos líneas despiertan
desconcierto pero también admiración de lectores y críticos. Reducen a un mínimo la
expresión y se convierten en la mayoría de los casos en metáforas comprensivas.
252
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
fundamental, en donde el desierto operaba como una frontera discursiva
que imponía con palabras lo que materialmente era imposible aún de
mensurar.
Zeballos delineó sus obras como un gesto político -casi podríamos
decir que fue un acto de propaganda- que tendría como principal
interlocutor a la clase política del momento, encarnada en la figura central
de Roca. Pero Zeballos, aún en los tempranos ochenta era un hombre
público que también transitaba los caminos de la ciencia2, con múltiples
contactos en el mundo editorial3. Conocedor del desarrollo creciente del
público lector, que ampliaba sus espacios de lectura más allá de los
matutinos y las gruesas bibliotecas de la oligarquía, Zeballos conocía
que sus textos también iban a contar con un público más extenso,
partícipe de un mercado editorial que se delineaba y crecía con el paso
de los años y con la consecuente transformación social del ingreso a la
modernidad.
Esta evolución llegaría a su cenit durante las primeras décadas
del siglo XX, con la exaltación de la prensa escrita, la aparición de las
revistas ilustradas y culturales, y las novelas por entregas; con la
consagración de los escritores y periodistas como profesionales de la
palabra, y con la inevitable estructuración de un campo de lectores que
superaba ampliamente los sectores ilustrados de las elites. Cabe
consignar que muchas de estas alternativas editoriales recibieron
estímulos oficiales, otras respondieron a mecenas privados, otras tantas
fueron publicaciones de autor, pero no importa cual fuera el origen de
la inyección de recursos que les permitiera salir a la luz, todas ellas se
A comienzos de 1872 ingresa a la Universidad de Buenos Aires iniciando conjuntamente
las carreras de abogacía y ciencias exactas. Por esta época funda, con sólo 18 años, la Sociedad
de Estímulo Científico (1872), que será más tarde la Sociedad Científica Argentina. Al volver
de su viaje siguiendo la avanzada de Roca funda en 1879, un nuevo espacio en donde
vuelven a anudarse las estrategias de gestión y gobierno con el discurso y la acción
científicos: el Instituto Geográfico Argentino –luego Instituto Geográfico Militar-, del cual
será presidente durante los primeros años.
3
Por ejemplo durante la epidemia de fiebre amarilla (1871), en la que tiene una activa
participación, entabla relación con José C. Paz, en ese entonces secretario de la Comisión
de Salubridad, y propietario del diario La Prensa. El vínculo con la familia Paz y su diario
continuaría hasta su muerte. De esta relación Zeballos elaboraría uno de sus perfiles más
definidos: el de periodista, llegando a ser jefe de redacción y director del diario de su
amigo, cargo al que renuncia en 1877, manteniendo siempre la condición de redactor aún
cuando realizaba las más variadas actividades políticas y profesionales.
2
253
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
encargarían de alimentar los anaqueles de una vasta red de bibliotecas
públicas y privadas, personales y colectivas4.
Por lo tanto existía algo en los pasos de Zeballos alrededor de su
Descripción Amena de la República Argentina que invocaba una textualidad
profundamente impregnada del contexto político-ideológico de la época.
La explícita estructuración de sus textos en torno de una voluntad de
concebirlos como ejemplos vívidos del antes y el después de la efectiva
organización del Estado le permitieron explorar tanto el relato de viaje
como la descripción informativa –profusa por cierto-, científica y
burocrática de esos cambios; a la par de considerarlos como reza su título
como una pintura amena, capaz de seducir e informar didácticamente a
un gran público.
Por otro lado la extensa obra de Zeballos es una obra que habla de
la frontera, desde una acepción propia de un intelectual de la segunda
mitad del XIX en tanto parte, segmento de un país que divide lo
civilizado, lo habitado, de lo que todavía no ha sido colonizado, del
desierto: el desierto considerado como ausencia, el desierto pensado
como espacio vacío5. Desde este costado la frontera es lo que separa la
civilización de la barbarie, desde una clásica oposición sarmientina por
cierto, oposición que también representa el enfoque de buena parte de
la ilustración criolla americana. Idea de forntera que tal como afirma
David Weber (1998:147-171), era mutuamente compartida tanto por los
hispano-criollos como por los indígenas, y en su espacio ambos grupos
Por ejemplo Noemí Girbal-Blacha y Diana Quattrocchi-Woisson (1998: 20) destacan que en
el veinte aniversario de la revista Nosotros, la publicación expresaba que era la única en su
género que había sobrevivido sin auxilios del gobierno o sin ayuda pecuniaria de sociedades
especializadas en el cultivo de alguna disciplina o en la propaganda de alguna tendencia.
Hay que resaltar además que existían figuras que funcionaron como mecenas, y que en la
realidad actuaban como fuentes de financiamiento alternativo. A pesar de lo descripto no
se hallaban aún extendidas plenamente las grandes editoriales, quedando aún en la figura
del editor librero la salida de buena parte de la producción editorial, sin obstar para que
comenzara a delinearse cada vez más la profesionalización de la figura del editor.
5
Mónica Quijada (2002:105) expresa claramente la influencia de Turner en las definiciones
de frontera expresadas en los disccionarios anglosajones, influencias que no son constatadas
por la autora en iguales textos españoles, pero que sin embargo son emergentes de una
sensibilidad de la población americana: “Y digo sorprendentemente, porque está claro en toda la
documentación hispanoamericana, tanto colonial como republicana, que ésta es la conceptualización
de la frontera que más presente está en el ánimo de los pobladores de la sociedad mayoritaria, es decir, el margen del territorio poblado por occidentales y modificado por los ritmos de la ocupación. Se
trata tanto de un espacio como de una suerte de línea civilizatoria, que en Hispanoamérica está a
veces señalada por la presencia de lo militar”.
4
254
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
la visualizaban, operaban sobre ella y actuaban en función de ella; y
ambos grupos, en definitiva, la transgredían.
Describir amenamente: la obra y sus contornos
El ingreso al Colegio Nacional le permite a Zeballos atisbar en sus
deseos literarios y periodísticos. Escribe en esta etapa, su primera novela
– Zálide o el amor de los salvajes (1866) – totalmente influenciada por los
temas relativos del “desierto” y sus habitantes autóctonos. Asimismo
durante ésta experiencia funda el periódico estudiantil “El Colegial”, el
cual dirige y es donde escribe buena parte de sus editoriales. Había
comenzado la primera fase de su preparación.
Posteriormente se lanzó de lleno a la descripción de viaje,
estructurada en su mayor obra: Descripción amena de la República
Argentina6, completando esta tradición con otras dos novelas: Callvucurá
y la dinastía de los Piedras (1884) y Painé y la dinastía de los Zorros (1886).
Su Descripción amena de la República Argentina tiene tres tomos que
aparecieron secuencialmente a lo largo de la década de 1880. Viaje al país
de los araucanos se publica en 1881; La rejión del trigo y A través de las
cabañas se editaron respectivamente en 1883 y 1887. Cada uno de ellos
transitan diferentes tópicos pero su conjunto representa la completa
cosmovisión del espacio pampeano desde la óptica de Estanislao.
Si pensamos en esta obra de forma integral observamos que su
propósito fue mostrar la versatilidad de un espacio: “la pampa”; espacio
que Zeballos conocía muy bien desde su infancia 7 y que se había
Zeballos, Estanislao, Descripción amena de la República Argentina, 3 Tomos, Buenos Aires,
Peuser, 1881-1883-1888.
7
Especialmente en la parte inicial de La rejión del trigo, Zeballos describe en distintos
fragmentos sus recuerdos infantiles y de su primera adolescencia en los campos de
Desmochados, pago cercano a Rosario, su lugar de nacimiento, y que a posteriori de la
colonización se conocería como el área de La Candelaria dentro de la línea del ferrocarril
del oeste-santafesino. Recordemos que su familia no provenía de la elite colonial santafesina,
y su nacimiento en Rosario fue fortuito, producto de los traslados de su padre. Estanislao
Zeballos padre, había sido Teniente Coronel del General López, y esta cercanía hizo que
fuera nombrado capitán del puerto de Rosario en diciembre de 1848. Dos años más tarde –
1851- en tanto activo adherente a la causa urquicista se asienta de forma más o menos
definitiva en la ciudad portuaria, donde va a radicar a su familia, formada a partir del
matrimonio con Felisa Juárez y Correa, y desde donde además iba a ejercer como Juez de
Policía. Como parte de su carrera burocrática el padre de Zeballos es enviado en 1861 a
Montevideo, donde se traslada junto con su familia, para regresar en 1863 nuevamente a
6
255
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
encargado de recorrer en sus escapadas científicas8 o acompañando la
retaguardia del ejercito de Roca9. Por ello siempre la “pampa” como
desierto, como frontera, como confín, o como mejor ejemplo de
transformación es el teatro ideal para sus descripciones.
En las tres obras, el espacio narrativo conferido al relato de viaje
es importante pero muchas veces no central. Hay marcadas diferencias
entre lo que Zeballos relata como sus experiencias viandantes en cada
uno de los tomos de la Descripción…; en Viaje al país de los araucanos
evidentemente se conforma como núcleo central de su texto; en La rejión
del trigo es el prologómeno ideal con significativas alusiones a su propia
memoria, con referencias muchas veces colocadas dentro de un plano
sensible, para un extensísimo informe sobre la evolución de la
colonización en Santa Fe; en A través de las cabañas pasa a ser simplemente
un relato autojustificatorio del periplo sobre las tierras del extremo sur
santafesino recientemente ganadas al “desierto”.
Rosario. En el ambiente rosarino de la Confederación la familia Zeballos anuda los lazos
que marcarían buena parte de la trayectoria de Estanislao. Muerto su padre en julio de
1865, la Cámara de Representantes de la provincia le acuerda una pensión, y obtiene la
protección de Oroño, al momento gobernador de Santa Fe, siendo el propio Nicasio Oroño
quien propone su nombre, para acceder a una banca dentro del Colegio Nacional.
8
Su activa participación en una asociación como la Sociedad Científica Argentina le permite
incursionar en un área de la arena pública sumamente sensible en la sociedad moderna: el
discurso y el análisis científico. Es allí en donde comienza a tener relación con el amplio
espectro de jóvenes argentinos lanzados de lleno a las distintas facetas de la modernidad.
Se relaciona, por ejemplo con Francisco Moreno en distintas trabajos conjuntos o auspiciando
a través de la Sociedad Científica los primeros viajes de exploración de este último a las
zonas de los ríos Negro y Limay, llegando hasta Nahuel Huapi. En este camino es el propio
Zeballos quien continuando con estas prácticas en 1876, realiza en colaboración con Reid y
Moreno “Una excursión orillando el Río Matanzas” y publicando en ese mismo año su estudio
geológico de la provincia de Buenos Aires. Por estos años es designado como miembro
Honorario del Círculo Científico. Culminando estas actividades en 1878 presenta el informe
sobre el túmulo prehistórico de Campana, a partir de las exploraciones realizadas un año
antes con el Ing. Pedro Pico, dando lugar a partir de esta excavación al inicio sistemático por
parte de la Sociedad Científica, de las investigaciones arqueológicas en el país.
9
En 1879 acompañado de su hermano el teniente Federico Zeballos y un fotógrafo, con los
instrumentos indispensables para levantar una carta de los territorios recorridos inicia su
primer viaje importante, supuestamente a sus expensas a la norpatagonia. En su recorrido
encuentra en un médano cerca de la laguna Guiñe-Malal, el archivo del gobierno de Salinas
Grandes: comunicaciones de campaña entre el gobierno argentino y los caciques araucanos,
las cartas de los jefes de frontera, las cuentas de comerciantes que ocultamente servían a
los “vándalos”, las listas de las tribus y sus jefes, dependientes del cacicazgo de Salinas, las
pruebas de la complicidad de los araucanos en las guerras civiles, diccionarios, las cuentas
corrientes con los comerciantes. Recoge abundante información que sería luego sustancial
al momento de escribir Viaje al país de los araucanos, dedicado al gobierno nacional.
256
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Sin lugar a dudas Zeballos narra la “pampa” y le otorga sentido
fundamentalmente luego de haberla “vivido”10, aunque no hay que
desconocer por cierto las influencias de lecturas realizadas. Dada su
formación dentro del Colegio Nacional y su posterior interés científico,
varios textos de los considerados de ineludible lectura debieron pasar
por sus manos. Entre ellos casi con certeza se puede pensar en el Viaje a
las regiones equinocciales del Nuevo Continente de Alexander von Humboldt
(París, 1807). Es conocido que los escritos de Humbolt tuvieron un alto
impacto en las elites criollas americanas11 y permitieron que apareciera
todo una serie de escritos volcados a su evocación o mejor aún a la casi
repetición de su canon descriptivo. La perspectiva científica de Humboldt
sumada a su prosa poética donde la naturaleza americana cobra vida,
fue también un elemento muy significativo en la difusión de su obra.
Por lo tanto su valor científico, su presencia estética, hicieron de Viaje…
un texto común dentro de la enseñanza y la difusión de conocimiento.
Basta citar entre ellos los Viajes por Europa, Africa y América de
Domingo F. Sarmiento 12, en donde el sanjuanino no sólo repasa a
Humboldt recurriendo a su libro para los epígrafes, sino en la elección
de las formas narrativas más allá de la interesante construcción de su
texto a partir de largas cartas a sus amigos sudamericanos. Por el
contrario en la Descripción amena…, realizada casi cuarenta años más
tarde de la de Sarmiento, Zeballos escasamente retoma los elementos
centrales de la tradición humboldtiana. Las huellas de Humboldt pueden
rastrearse en él a través de su vocación científica, y el esfuerzo puesto en
intentar hacer de sus textos una obra literaria, pero éstos son sus límites,
las fronteras intelectuales que no rebasa, y que no intenta superar13.
Así si el trasfondo científico puede evocarse en Zeballos a través
de la obra Humboldt, su pragmática narrativa tiene vínculos directos
Específicamente este tópico fue analizado en el texto La región del trigo de Estanislao Zeballos,
de libro de viajes a catálogo de mudanzas de Fernández y Navarro (2004)
11
Es conocida su influencia estética en intelectuales tan importantes como Bello y Sarmiento.
Un exquisito análisis de estos vínculos se encuentra en el ahora ya clásico texto de Mary
Louise Pratt (1997) Ojos Imperiales.
12
Los Viajes por Europa, Africa y América 1847-1849 de Sarmiento fueron publicados en dos
tomos, en 1849 y 1851 respectivamente. El cuerpo del trabajo consta de 11 cartas a amigos
de Sarmiento, un ensayo donde relata exhaustivamente su viaje por los Estados Unidos, y
más de 100 páginas de minuciosas rendiciones de cuentas.
13
Lejos está Zeballos de lo que Pratt (1997: 216) reconoce en Humboldt como “la estética de lo
sublime” en directa relación a la exquisita descripción planteada por el barón en sus Viajes…
10
257
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
con los sucesivos libros escritos por los viajeros de la “vanguardia
capitalista”14, venidos a las tierras argentinas con afán pragmático y
economicista15.
Como bien afirma Pratt estos viajeros solían adoptar en sus escritos
una postura conscientemente anti-esteticista, donde la naturaleza tenía
bastante menos interés para estos aventureros económicos que el que
había tenido para Humboldt y sus seguidores más refinados. La
descripción negativa del paisaje donde por ejemplo la pampa era
conscientemente vista y narrada como un desierto era aplicada también
al mundo social americano. Así la sociedad hispanoamericana en su
conjunto era imputada de atrasada, de indolente y, en especial, de incapaz
para explotar los numerosos recursos naturales de que disponía. Sus
formas de vida basadas en la subsistencia, los sistemas de intercambio
no monetarios y las economías regionales autosuficientes representaban
una humillación para el capitalismo en plena etapa expansiva. El discurso
de los autores de la vanguardia capitalista estaba claro: América debía ser
transformada en un escenario de trabajo y eficiencia; su población colonial debía
dejar de ser una amorfa y venal masa indolente, carente de ambición, jerarquía,
buen gusto y dinero, para convertirse en mano de obra asalariada y en mercado
para los bienes de consumo metropolitanos. En alguna medida estos objetivos
podían ser compartidos por los criollos ilustrados que pretendían
organizar los gobiernos y proyectos en sus respectivos territorios, en tal
sentido aunque no impugnaron este discurso tampoco lo hicieron propio,
en principio porque no eran la vanguardia capitalista sino sus anfitriones, y
por ello expresaron por otros medios sus aspiraciones republicanas y
modernizadoras (Pratt 1997: 259/271).
La interpretación sobre la vanguardia capitalista desarrollada por
Pratt, entra en discusión o mejor aún se complementa con la que Adolfo
Prieto16 publicaría cuatro años más adelante. Para Prieto son la lectura
Ver específicamente los textos citados de Pratt (1997) y Prieto (1996).
Fue común que numerosos viajeros ingleses –personal técnico, empleados de grandes
compañías, diplomáticos y funcionarios de menor cuantía, aventureros y empresariosrealizaran durante la primera mitad del siglo XIX un periplo que se iniciaba en el Río de la
Plata, transitaba por la pampa argentina, llegaba a Cuyo desde donde se cruzaba a Chile y
posteriormente se partiera a Perú, desde donde al final se regresaba a Europa.
16
Los viajeros ingleses y la emergencia de la literatura argentina de Adolfo Prieto es editada por
Sudamericana en 1996; la primera edición de Pratt en inglés es publicada por Routledge
en 1992 [es la que Prieto cita], y su versión castellana es de la editora de la UNQ de 1997.
14
15
258
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
de estos autores como John Miers, Francis Bond Head, Joseph Andrews,
Edmond Temple, Samuel Haigh, las que influyen directamente sobre la
organización de una literatura vernácula de la mano de figuras como
Mármol, Echeverría, Alberdi y Sarmiento.17 Ambos introducen la noción
de que la perspectiva de los intelectuales criollos se encontró influenciada
por efecto de acción, reacción y reflejo de la producción de una literatura
de viajes metropolitana, por cierto heterogénea que dejó sus rastros en
las formas de escritura adoptadas por estas generaciones de autores y
hombres públicos americanos.
Esta visión pragmática, totalmente centrada alrededor del ingreso
de América, y en especial de Argentina a la modernidad, es retransitada
en todas las obras de Zeballos. Aunque Estanislao reserva siempre un
lugar a lo científico, también a lo familiar -muchas veces de la mano de
la anécdota- siempre su descripción de viaje sobre el espacio y las
personas queda contrastada con la ferviente necesidad de que la “nación”
ingrese al mundo del progreso. Así si la transformación necesaria no ha
ocurrido aún, Zeballos elige lamentarse largamente por la incapacidad
de “nuestro pueblo” para encontrar el rumbo de la integración con el
mundo capitalista18; por el contrario si en tanto observador advierte que
estos cambios considerados “fundamentales” se han concretado o están
El objetivo de Prieto tal como lo indica en su introducción es identificar algunos de los
lectores de los viajeros ingleses al Río de la Plata, en esencia Alberdi, Echeverría, Gutiérrez,
Mármol y Sarmiento, siguiendo el “sistema de citas reproducido o inferido de sus propios escritos
posteriores…de una serie que para ellos, con más naturalidad que para nosotros, recortaba el tejido
global de la literatura de viajes… Desde luego, no el enunciado de la percepción de la serie pero sí
la insistencia en ese enunciado pretende convertirse en una de las categorías de análisis del presente
estudio… (Prieto, 1996: 22)
17
Recordemos rápidamente que la interpretación central de Pratt sobre este tema es que la
influencia estética de Humboldt sobre la intelectualidad criolla, en tanto compuesta por
sujetos con ascendientes marcadamente europeizantes, es estética y científica, y que conlleva
la firme convicción de una reinvención de América. Para esta autora la influencia de los
viajeros de la vanguardia capitalista en este plano es ínfimo debido a su visión excesivamente
pragmática del mundo americano originada en el objetivo económico de sus exploraciones.
Para Prieto, por el contrario, muchos de estos viajeros resultan centrales en la conformación
literaria del grupo de intelectuales argentinos que vive la transición de las guerras civiles y
la organización del Estado nacional. Pero si la perspectiva de Pratt es marcadamente
contextualista, con un sustrato de análisis antropológico muy fuerte, la posición de Prieto,
se reconoce, desde los tiempos de El discurso criollista en la formación de la argentina moderna
(1988, 2006), en una tradición de análisis literario temporalmente situado.
18
Esto puede observarse muy contundentemente en el primero de los tomos de la descripción
amena: Viaje al país de los araucanos.
259
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
en vías de serlo, se sentirá satisfecho y no escatimará palabras para hablar
de las ventajas que se han conseguido19.
Por otro aunque no existan certezas de la lectura de Viajes de
Sarmiento, Zeballos también se refleja en la obra de sanjuanino. El
esfuerzo por pensar un espacio, y constituirlo a través de la palabra se
concibe como una misión civilizadora; luego estará la propaganda y la
consagración de un discurso como ejemplo de la acción del gobierno;
esto que en trabajos anteriores hemos significado como la particular
mirada “oficial” de un viajero como Zeballos20. En este sentido Zeballos
y por supuesto también Sarmiento definen su diferencia, para permitir
un autoreconocimiento y fundamentalmente para ser reconocidos por
los demás, en este borde expresado en el conflicto desierto/civilización,
en donde la definición del otro no se plasma desde el aislamiento sino
precisamente desde le contacto de ahí la importancia de los «ethnic
boundaries» fijados por Barth (1969, 1991), que implican también espacios
donde se produce la competencia por los recursos, y de allí la negación
del otro como figura empática. Son estos recursos los que recrudecen la
mirada de estos intelectuales criollos que varias décadas más tarde de la
revolución se constituyen en las palabras autorizadas para relatar y
configurar esa frontera entre la barbarie y la civilización21.
Por otro lado tanto Zeballos como Sarmiento se constituyen como
observadores sociales, que en su condición de miembros de los sectores
dominantes locales, fijan lo que miran y describen desde esa condición. Por
lo tanto esa mirada que construyen sella una imagen homogénea y coherente
de su discurso: la idea del desierto, la fuerte percepción de la
inconmensurabilidad de la pampa, la recurrente figura del espacio vacío y
la negación del “otro” americano en la forma del indígena y el criollo pobre.
Pero esta perspectiva no se advierte con tan meridiana claridad en
la comparación de Viajes y Descripción…, sino en la paridad entre esta
Específicamente estas afirmaciones pueden encontrarse en La Rejión del Trigo y A través de
las Cabañas; pero también han sido abordadas por Ernesto Bohoslavsky (2008).
20
Esta condición de “viajero oficial” que caracteriza el accionar de Estanislao Zeballos puede
encontrarse desplegada en sendos textos de Fernández y Navarro (2004, 2002), y Navarro
y Fernández (2001).
21
Zeballos también se consagra como un viajero que observa Europa en un texto manuscrito
de comienzos del siglo XX Diario de Viaje a Europa (1903-1904), conservado en el Archivo
de Luján (Buenos Aires) que lleva su nombre. Sobre este escrito se puede consultar dos
excelentes trabajos de Rogelio Paredes (1997a, 1997b)
19
260
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
última y la obra fundamental de Sarmiento: el Facundo. El lugar común
en ambos es el desierto; pero si Sarmiento monta el escenario de Facundo,
mejor aún del conflicto de la civilización y la barbarie, fundamentalmente
sobre el espacio pampeano que no conocía sino por mentas al momento
de la publicación de su obra más conocida22, Zeballos lo realiza siempre
sobre un territorio que ha transitado.
Volviendo a la comparación con el libro de viajes de Sarmiento,
este es un sugestivo relato de la mirada de un americano europeizado
sobre ciudades y países considerados los mejores espejos para reflejar y
comparar la realidad latinoamericana23.
En el caso de Zeballos, este autor trama un texto de viaje sobre lo
“conocido”, es decir sobre un contexto que a pesar de las dramáticas
transformaciones que estaba registrando presenta un sustrato anterior
común y reconocible; desde una perspectiva estrictamente moderna que
lo considera como tensión de búsqueda y cambio, y que plasma esta
experiencia en escritura e imágenes. Entonces por un lado se encuentra
esta pampa anterior, hecha desierto, y por otro la nueva pampa, rebosante
de vacas, cereales y europeos trabajadores.
Por ello los textos reunidos en la Descripción amena... condensan
distintas líneas de acercamiento respecto de la narración de viajes. En
Viaje al país de los araucanos, Zeballos se consustancia con una perspectiva
que lo tiene como el observador-descriptor de la avanzada del
“Sabe usted que no he cruzado la pampa desde Buenos Aires, habiendo obtenido la descripción de
ella de los arrieros sanjuaninos que la atraviesan todos los años, de los poetas como Echeverría, y de
los militares de la guerra civil. Quiérola, sin embargo, y la miro como cosa mía. Imagínomela
yerma en invierno, calva y polvorosa en verano, interrumpida su desnudez por bandas de cardales
y de viznagas” fragmento de la carta de Sarmiento a Juan María Gutiérrez, fechada en
Milán el 6 de mayo de 1847, que forma parte del texto Viajes… p. 348 [SARMIENTO,
Domingo Faustino (1981) Viajes, Ed. de Belgrano, Buenos Aires, pp. 621; Texto tomado de
la publicación en Santiago de Chiles por la “Imprenta de Julio Belin y Cía”, en 1848, bajo el
título de VIAJES EN EUROPA, AFRICA Y AMERICA. El Diario de Gastos se reproduce
de la edición del “Museo Histórico Sarmiento”], citado por Adolfo Prieto (1996: 183).
23
De hecho el libro de Sarmiento es uno de los primeros grandes textos de viaje que abordan
esta perspectiva realizando a través de sus largas cartas un ejercicio comparativo de las
realidades europeas, norafricanas y especialmente estadounidenses con las sociedades
criollas americanas de la primera mitad del siglo XIX. Quizás para este último caso un
antecedente de importancia fuera el texto de Chateaubriand, Viaje a la América, de 1832;
conocido en los círculos literarios de Hispanoamérica. Para Prieto (1996: 170) ese
conocimiento había impregnado la obra de Alberdi no sólo a partir de la obra de
Chateaubriand, sino también de Hugo y Lamartine: el romanticismo estaba allí, al alcance
del “poder de plasmación poética de la naturaleza sobre todos sus hijos”.
22
261
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
“progreso”. Allí nos presenta un desierto conquistado, pero desierto aún.
La naturaleza, el paisaje son elementos básicos en su descripción, y se
presentan como el continente de los que “no eran” y los que “ya no son”
–por sobre todo indios y criollos pobres-. Mientras que en La rejión del
trigo y A través de las cabañas Zeballos se esfuerza por revelarnos un
desierto ya transformado, ya aggiornado a los cambios que la inteligencia
nacional venía proponiendo. Se deleita en mostrar con detalles esta
evolución, en detenerse en el montaje discursivo entre la pampa de su
niñez, amenazada por las tribus indígenas y esa pampa ahora “prodiga”
ejemplo de colonización y progreso (Fernández y Navarro, 2004).
De este modo Descripciones… representa la cosmovisión discursiva
de Zeballos en torno del modelo de estado y nación consolidado a partir
de 1880 y centrado en esta oposición binaria de civilización y barbarie
que por otra lado recorre buena parte de la literatura vernácula del
momento, y también la del relato de viaje típico del siglo XIX.
Las huellas que preceden al autor
Estanislao Zeballos nace en una coyuntura muy especial de la
Argentina del siglo XIX: el proceso de constitución del Estado nacional,
específicamente durante los primeros años del ensayo de la
Confederación Argentina, que enfrentaba la secesión de la provincia de
Buenos Aires. Si su nacimiento se correspondía temporalmente con el
proceso abierto por las expectativas generadas por Urquiza en el marco
de hacer viable su proyecto de gobierno; su primera juventud se
encontraría condicionada por los avatares de la construcción del Estado
ahora unificado.
En 1866 llega a Buenos Aires gracias al impulso dado por la elite
santafesina, que veía en el joven Zeballos la encarnación del proceso de
consenso entre facciones iniciado en la década del sesenta. Las
obligaciones de Zeballos no eran institucionalmente hablando una
cuestión de estado, sino que pueden ser observadas desde un plano
simbólico. El rol del que es investido Estanislao es el de ser un joven
representante de la elite santafesina que busca congraciarse con el
gobierno nacional. La formación de jóvenes dirigentes en el clima de
frágil unidad que proporcionaban los primeros años de la organización
nacional era un objetivo central para superar la apenas reciente antinomia
262
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
entre porteños y provincianos. La fortaleza de esta posición es tal que se
evidencia con meridiana claridad en las propias palabras de Zeballos:
“En este Colegio en 1866 se reunían un grupo de niños reclutados en la capital
provisional y en todas las provincias de la República. La administración MitreCosta anhelaba la nacionalización de los ideales en aquellos tiempos de
enardecidos localismos”24.
Pero la instancia del Colegio Nacional era sólo un peldaño en la
carrera que Estanislao pretendía. Si bien sus pasiones se inclinaban en
torno de la exploración, la observación de la naturaleza, su historia y
sus fenómenos, no pretendía postergar otros hitos como el periodismo,
la literatura, y en especial una formación profesional que le abriera no
sólo las puertas a un mejor pasar económico, sino en especial que fuera
la llave para un intercambio relacional tanto en términos sociales como
políticos.
Zeballos cubrió las expectativas puestas en él integrándose
activamente a la vida pública. Sus múltiples tareas y funciones así lo
demuestran; pero la balanza de gratitudes hacia los que habían hecho
posible su recorrido no se inclinó directa e inmediatamente hacia sus
comprovincianos. Fundamentalmente en el juego de compensaciones
Zeballos reservaría un lugar destacado para los sobresalientes hombres
de ese Estado nacional que se estaba construyendo y que se sentían
protagonistas de este proceso. Para ello Zeballos se concibe y se proyecta
como un hombre público que debe su esfuerzo a la nación, no a su
provincia natal. El excesivo apego provinciano no se vislumbra en sus
acciones. La obligación sentida por Zeballos era para con la república y
la correspondencia que él experimenta tendría que ver con el ritmo
entrecortado y peligroso del intercambio de ayudas y servicios. Así
Zeballos, aún en estos años de juventud, se constituiría personal y
públicamente a través de una fuerte y creciente participación dentro de
la clase dominante.
Zeballos multiplica sus esfuerzos en la década de 1870. Su precoz
y vertiginosa vida pública se disocia en diferentes actividades entre las
cuales la narración de experiencias y relatos de viaje ocupan buena parte
de su producción escrita. Como dijimos más arriba es también en esa
24
Zeballos, Estanislao, En la niñez y en la muerte. 1866-1909 en Revista de Derecho, Historia y
Letras, Buenos Aires, Tomo 33, Buenos Aires, 1909, pp. 447- 448.
263
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
década iniciada en los años setenta en donde Estanislao Zeballos con
poco más de veinte años inicia una carrera política y burocrática
ascendente y multifacética, que resume buena parte de las aspiraciones
hegemónicas del sector al cual representaba. Al volver de su viaje tras el
ejército de Roca funda en 1879, un nuevo espacio en donde vuelven a
anudarse la vidriera pública con las estrategias y deseos privados: el
Instituto Geográfico Argentino25, del cual será presidente durante los
primeros años. También comienza la escritura de los sucesivos tomos
de Descripción amena… y se vuelca a una decidida y activa participación
dentro de la política oligárquica. En el levantamiento contra Avellaneda
es secretario de Mitre, en 1879 es elegido diputado para la Legislatura de
Buenos Aires26. A comienzos de 1880 en los levantamientos por las
candidaturas de Roca o Tejedor se incorpora a las fuerzas gubernamentales
de Entre Ríos, Santa Fe y Córdoba al mando del coronel Racedo. En
septiembre de 1880, Zeballos es elegido diputado nacional (1880-1884)
por el distrito federal en una lista del Partido Republicano. Se opone
decididamente a la política de Roca, por ello en 1882 trata de impugnar
los diplomas de diputados roquistas por haber sido electos mediante el
fraude, lo que le implica no ser reelecto en el período siguiente, su lugar
en la lista lo ocupa Ataliva Roca. Entre 1884-1888 es diputado nacional
por Santa Fe, aspirando en 1885 a la candidatura a la gobernación de Santa
Fe sostenido por el Partido Constitucional, confrontando con las
candidaturas de José Gálvez (Club del Pueblo) apoyado por el roquismo,
y la de Agustín de Iriondo. Entre 1888 y 1889 es reelecto como diputado
nacional. Renuncia para ser ministro de Relaciones Exteriores (1889) de
Juarez Celman; después de 1890 renuncia pero Pellegrini lo confirma en
el cargo, para continuar con la problemática de límites con Chile.
Entre 1888 y 1894 permanece ausente del país, ya que es nombrado
como delegado argentino ante la Corte permanente de arbitraje de La
Haya; además en 1893 es designado como ministro plenipotenciario en
Washigton por el problema de límites con Brasil, aunque en 1895 ante
las duras críticas emitidas por su actuación, renuncia.
La institución ha continuado su quehacer hasta el presente siendo en la actualidad el
Instituto Geográfico Militar, que por otra parte conserva un importante archivo sobre
Estanislao Zeballos.
26
Es elegido por el Centro Popular, una tercera fuerza que concurre a los comicios con una
lista de conciliación entre mitristas y autonomistas, y otra de autonomistas puros,
encabezada por él mismo y por José C. Paz.
25
264
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Entre 1898 y 1904 no participa en política ya que se había convertido
en un opositor de Roca, criticando abiertamente abiertamente su política
exterior, pero también el paternalismo presidencial llegando a presentar
además un programa de reconstrucción nacional, con las siguientes bases:
moralización administrativa, reorganización de la vida política de los
partidos y resurrección y robustecimiento de las autonomías provinciales,
y rechazando los pactos de mayo (1902) con Chile. En este tiempo
intensifica su actividad dentro de la Revista de Derecho, Historia y Letras,
y en sus estudios de abogado de Buenos Aires, Rosario y Bahía Blanca.
En 1906 vuelve a la cartera de Relaciones Exteriores llamado por
Figueroa Alcorta. Resistencias internas (los roquistas y los republicanos
de Emilio Mitre y el diario La Nación) y externas: el canciller del Brasil
-Rio Branco-, dada la vocación armamentista de Zeballos, lo llevan a
renunciar en 1908.
Entre 1912-1916, con la Ley Saenz Peña es elegido nuevamente
diputado nacional por Capital Federal como candidato del Partido de la
Unión Nacional, presidiendo la Cámara de Diputados por ser una
personalidad “neutral”. Todas estas actividades las va desarrollando
conjuntamente con la docencia en el Colegio Nacional, el Colegio Militar,
el Liceo Naval y la Universidad de Buenos Aires (donde llega a ser decano
de Filosofía y Letras, y de Derecho), y una multitud de cargos de gestión
que van desde minúsculas evaluaciones para el gobierno de Santiago
del Estero, hasta ocupar la Dirección de Correos y Telégrafos. Siempre
interesado por propiciar y actuar distintas entidades asociativas de
carácter científico y profesional27, y por sobretodo en ser protagonista
en ellas, en el final de su vida (1919) funda la Rama Argentina de la
International Law Association, que presidió desde entonces y hasta su
fallecimiento en Europa (Liverpool, 1923), a donde se dirigía para presidir
un congreso jurídico internacional luego de una gira académica por los
Estados Unidos, invitado por el Institut of Politics de la Universidad de
Harvard para participar en su ciclo “Conferencias de Williamstown”.
Como se observa Zeballos se constituye en una buena síntesis del
hombre moderno de fines del siglo XIX y principios de XX argentino.
Esta diversidad de actividades encuentra un eje ordenador que trasciende
a todas ellas e incluso al actor, y este es el grupo al que pertenece. Si por
27
Internacionalmente fue miembro de la Real Academia Española, la Junta de Historia y
Numismática Americana y del Institut du Droit International.
265
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
un lado esta heterogeneidad es un denominador común en los miembros
de esta elite dirigente, por otro es necesaria para legitimar la pertenencia
a la misma.
Una dispersión similar a sus tareas aparece en la obra de Zeballos.
Escribe artículos periodísticos, relatos de viaje, trabajos de carácter
etnográficos y descriptivos, obras de derecho público y privado y textos
sobre los temas más diversos. La coherencia está dada nuevamente por
esa elite dentro de la cual y para la cual escribe y que necesita darse
determinadas pautas culturales e ideológicas. Su madurez intelectual y
política se desarrolla a la par del Estado que se estaba gestando;
correspondiéndose su obra con la asceleración que el paso de la nueva
nación imponía.
En la vorágine de los acontecimientos de la vida pública del cambio
finisecular decimonónico, Zeballos cuidó con especial esmero su perfil
intelectual y científico. Para ello no sólo se vinculó activamente con los
hombres del grupo dirigente participando en la arena política,
disputando su espacio dentro del gobierno, procurándose su ámbito de
legitimidad y gestión, sino buscando y obteniendo un reconocimiento
dentro de actividades propias de un hombre de letras y de ciencia.
Es que tal como afirma Halperín (2000: 56) los nuevos intelectuales
buscaban deslindarse de una identidad construida a partir de su
pertenencia a uno de los subsectores de la elite, reivindicando en cambio
un lugar eminente como premio de su excelencia en tanto intelectuales;
su formación ahora los autorizaba a elaborar ideas y conocimientos acerca
de la sociedad, a partir de un esfuerzo de análisis que proclama como su
único objetivo la búsqueda de la verdad.
Sus textos fueron una piedra angular en este su proyecto de vida;
pero no debemos descuidar tampoco su tarea como periodista y
fundamentalmente la que resulta su empresa más emblemática y también
más tardía: la Revista de Derecho, Historia y Letras28. Como referencia
28
Fundada y dirigida por Zeballos se edita por primera vez en 1898 y se prolonga en 76
extensos volúmenes hasta su muerte en 1923. En rigor la revista contiene ensayos de interés
académico y público, redactados por el mismo Zeballos y varios de sus contemporáneos
argentinos y extranjeros. En sus páginas se publicaron decenas de artículos, algunos de
ellos de trascendencia para la historia intelectual argentina. Merecen destacarse el famoso
ensayo crítico de José Ingenieros acerca del libro de Juan A. García “La Ciudad Indiana”, el
trabajo de Ramos Mejía “Las multitudes argentinas”.
Un trabajo específico sobre esta publicación es el realizado por Gisela Galassi, Julieta López
y Gabriela Contreras (2004).
266
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
cabe consignar que para Zeballos esta publicación se constituía como el
escenario de los “espíritus selectos”29, aquellos capaces de interpretar y
llevar adelante las metas trazadas por la organización de la nación; y
estos no eran más que sus pares, formados y firmemente consolidados
en las lides públicas, como él en las últimas décadas del siglo XIX. La
revista cierra la parábola de Estanislao y sus huellas con el lema resaltado
al comienzo de cada uno de sus tomos: scribere est agere.
La rejión del trigo
De las tres obras que componen la Descripción Amena, La rejión
del trigo descolla por representar como ninguna el cotejo entre el antes y
después de la aplicación proyecto de modernización. Las discrepancias
entre el territorio de Desmochados30 de la temprana juventud de Zeballos,
lábil y permeable frontera del centro-sur santafesino, zona de contacto
entre criollos e indios, y la consolidada “región del trigo” de los años
ochenta del siglo XIX, poblada de inmigrantes, sembrada de trigo y
recorrida por el ferrocarril se convierte en el eje del discurso de Estanislao.
Tal inquietud se recorre a lo largo de todo el texto; texto de poco
más de 330 páginas, estructurado en base a tres líneas argumentales: la
anécdota, el viaje y los informes oficiales. En el inicio Zeballos introduce
la anécdota de su niñez y su primera juventud, reafirmando el canon
literario que como afirma Nicolás Rosa (2001: 25) es modelo de viaje
iniciático que siempre comienza en anécdota pero que no resigna en ella
la real dramatización de la aventura humana. Así la breve anécdota
enreda al relato de viaje, narración que se precia en describir los cambios
suscitados en el paisaje de la pampa santafesina; la pampa transformada
de su niñez, poblada de hombres extranjeros laboriosos, revestida de
“Consideramos un deber y un honor ofrecer estas páginas a todos los espíritus selectos que
contribuyen a la civilización argentina y americana con una brillante y severa devoción a las letras”
(...) en sus páginas no hallaran hospitalidad las disertaciones frías sin ideales y sin forma” Revista
de Derecho, Historia y Letras, Tomo I,Buenos Aires, 1898, p. 5.
30
Desmochados es el nombre que en el siglo XIX se le daba a la región al sur/sur-oeste de la
ciudad de Rosario. Esta área fue la privileðgiada como área de colonización por los
proyectos de influyentes empresarios privados. Su cercanìa con el puerto fluvial de Rosario,
hizo que tempranamente se la uniera con el ferrocarril y que se diagramaran sucesivas
ofertas colonizadoras en las tierras antes dedicadas a la ganadería, y que en la práctica
representaban un área de contacto con los grupos de pueblos originarios de la extensa
“frontera” sur argentina.
29
267
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
trigo, próspera y pródiga. Del viaje en carro de su infancia, al viaje en
tren, del galope inseguro por los caminos abiertos con indios asechando,
al trote cancino por la estetizada campiña segura y feliz, donde las
evocaciones a la forntera están totalmente ausentes.
Superado el viaje, la dos terceras partes de su libro reproducen,
como piezas de su gran rompecabezas, informes oficiales de diversa
índole, recorriendo desde la población, la agricultura, hasta la
urbanización y el ferrocarril. Aquí se elude intencionalmente la narración
de la experiencia viandante, adquiriendo relevancia la información oficial
vinculada más a la propaganda de los órganos de gobierno encargados
con fruición a recolectarla.
Sin embargo no debemos confundirnos, estas dos últimas partes
sólo adquieren relevancia en la medida de esta introducción que Zeballos
monta, donde la anécdota, pero también la reconstrucción del recuerdo
son las poderosas imágenes sobre la que edifica su argumento de
reificación del ingreso a la modernidad.
Persiguiendo el cánon humboldtiano inaugura su texto
describiendo su concepción geográfica de la nueva república
sudamericana, muy anclada por cierto a las divisiones configuradas
durante los tiempos del rosismo y la Confederación:
“La República Argentina estaba dividida en dos grandes agrupaciones
geográficas: el Interior y el Litoral; y entre el Interior y el Litoral mediaba la
extensión inmensa de la Pampa” (p.13)
Pero también su relato redunda en torno de una nueva cartografía
sensible que imponía desde fines de los años cuarenta la calificación de
la Pampa como desierto, y por consiguiente como territorio valdío, es
decir sin presencia blanca y carente de “civilización”. Por ello la
recurrencia justificatoria a los vívidos recuerdos del ayer, de su temprana
juventud, es donde esta imagen se exalta. Su memoria está imbuida de
un presente en donde ese pasado sólo puede ser evocado negativamente.
El recuerdo de Zeballos no es romántico, no existe una mirada bucólica
y contenida de la pampa del ayer, sino por el contrario en el contraste se
refuerza la persuación en torno de las bondades de la modernidad.
“En 1878, á los catorce años, volví á la Candelaria y no vagaron los ojos en aquel
solitario desierto que durante mis primeros años crucé cien veces, cuando la
población apenas asomaba tímidamente concentrándose en fortines, y los
araucanos recorrian los campos y no era posible alejarse á cien metros de la
trinchera sin peligro de la vida!”(p.27)
268
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
El abrazo al desierto
Nos ahoga el desierto! El desierto es la muerte, la barbarie, la soledad cuando
menos! p. 181.
Zeballos recorre en su texto la transitada imagen del relato de viaje
alrededor del desierto. Esta idea de ausencia sobre un territorio que no
ha sido ocupado vehementemente por el hombre blanco es un lugar
común para las descripciones del siglo XIX. Su homologación con la
muerte, mejor aún con el ahogo de la muerte, e inmediatamente con la
barbarie, una barbarie más cercana a la crueldad que a la incultura, le
permiten llevar al lector transitivamente a la fácil antítesis sarmientina.
Sin embargo Zeballos propone una pista más sugestiva y aparentemente
más ingenua, la soledad también es sinónimo para el desierto. Para
Zeballos como para tantos descriptores del diecinueve la otredad es un
tema Hrecurrente. Sistemáticamente la constitución desde la descripción
y la calificación del “otro” permite mediante una operación lógica pero
también material autoreferenciarse desde un lugar de poder. En este
caso no sólo la del hombre blanco europeo que recorre tierras “ignotas”
del planeta, sino como el representante de un proyecto, de un modelo
que debe ser impuesto en el espacio social pampeano. La soledad es
síntoma y reflejo a la vez de la condición de este proyecto en las décadas
de la consolidación del Estado nacional. Como síntoma se va a ver
explicitado en que ahuyentado el indígena, incorporado el extranjero,
aún no se ha completado la construcción del nuevo ciudadano argentino,
porque lo que Zeballos señala como criollos distan bastante aún de este
ideal y se constituyen muchas veces sólo como el referente metonímico
de la patria. Así para Zeballos, en palabras de Halperín, el desierto en su
soledad espera la nación. En tanto reflejo es más visceral, ya que es el
propio narrador el que esta solo y describe sin punto de referencia para
identificarse, lo que ve no es parte de su mundo real e ideal; bajo esa luz,
está solo.
La barbarie también recorre el tiempo. Es la barbarie de su niñez
en la pampa que rodea a Rosario:
“Al caer la tarde del 25 de setiembre de 1864 palpitaba una extraña agitación en
las estancias de los distritos limítrofes de los Desmochados y la Candelaria,
sobre ambas márgenes del rio Carcarañá. Los chasquis volaban de un
establecimiento a otro y entre estos mismos y sus esparramados puestos.
Los peones corrian en sus mejores caballos recojiendo las haciendas vacunas...
Las pesadas tropas de carretas con sus innumerables boyadas, los árreas con sus
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El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
tropillas de preciosas y adiestradas mulas, las caravanas de carros que corrian
sobre el haz de este desierto, sirviendo al intercambio del Litoral con toas las
regiones del interior, ... acampaban al pié mismo de las azoteas; y de todos lados
converjian á refujiarse en ellas grupos de familias atribuladas y sollozantes..
[...]
Los indios habian burlado la vigilancia de la línea y acampaban en las orillas de
la zona poblada de los Desmochados y de la Candelaria.
[...]
Qué solemne horror el de estos dias! Los campos talados, arrebatados los ganados,
cautivas las familias, horrendamente inmolados los jóvenes mas apuestos y
vigorosos del lugar! La comarca estaba envuelta en el silencio de los cementerios
y en los hogares y en la pampa se sentia el espanto de la muerte!” (pp. 25-26)
Y es la barbarie que secunda a las prósperas colonias cercanas a
Rosario.
“Hace diez años que esta comarca era constantemente perseguida y ensangrentada
por los indios. El peligro ha desaparecido ya y solamente quedan como resabios
entre el vulgo, los temores de nuevas irrupciones de los bárbaros.” (p. 147).
Barbarie que ya no es sólo desarticulada por el Estado, sino que es
compelida a retirarse por la avanzada de los colonos.
“Durante mi visita á las colonias reinaba, en las más fronterizas, cierta alarma,
producida por un invasión de montaraces. Dos jóvenes colonos se habian
aventurado con sus rifles á perseguir á los bárbaros hasta las guaridas selváticas,
y cuando se temblaba por ellos, regresaron victoriosos, introduciendo
triunfalmente hasta la plaza del Pilar una carrada de cadáveres: eran siete indios
muertos por ellos! “ (p. 147).
La persecución es cacería, es victoria y es triunfo; y en su crueldad
también el fiel reflejo de un desierto habitado por futuros muertos. Allí
la idea de vacío, de nada es compelida por el acto de desaparición del
otro. El desierto no esta vacío, sino que está lleno de “otros” que sólo
son en la medida de su exterminio.
En el relato de Zeballos también aparece otro ingrediente; ese
desierto depositario de la barbarie no sólo es pampa, es, también en las
riberas del Paraná y orillas de los bosques chaqueños, selva. En tal sentido
Estanislao Zeballos retoma colateralmente en su descripción una de las
manifestaciones principales de la otredad en el pensamiento europeo: la
distinción entre tierras tropicales y tierras templadas. Zeballos plantea,
tal como afirma David Arnold (2000), un nuevo giro a la otredad, la de
comprenderla en su dimensión conceptual y no sólo física; de este modo
llamarle “los trópicos” a una parte del planeta se convirtió con el paso de
270
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
los siglos en una manera occidental de definir, con respecto a Europa algo
culturalmente ajeno y ambientalmente distintivo. Las selvas existían sólo
en yuxtaposición mental a la normalidad percibida en las tierras templadas.
“En otro lugar había sido sorprendido en los bosques un colono italiano por una
tribu viajera. No tenía armas y los bárbaros lo asaltaban, enristrando sus lanzas,
en son de mortal amenaza. Pero el colono llevaba un instrumento de cobre y
empezó á tocar un vals. Los indios sorprendidos al principio se dividieron en dos
bandos. Pedían los unos la muerte del cautivo, mientras otros y entre ellos todas
las mujeres, defendían su vida, abogaban por su libertad y escuchaban extasiados
la música improvisada” (p. 147-148).
También introduce en alguno de sus párrafos la seducción de la
barbarie por la cultura. Secundario en el juego de oposiciones instalada
por Zeballos, el antagonismo entre barbarie y cultura se enfrenta con los
condicionamientos simbólicos típicos de la literatura de viajes del s. XIX.
La cultura va de la mano del varón blanco, quien en el relato de Zeballos
puede interpretar música y así defenderse de los indígenas. La barbarie
se fragmenta y adquiere visos de naturaleza comprensiva de la mano de
las mujeres, capaces de dar cuenta del sentimiento y del cuidado; y donde
finalmente, en el juego de trasposiciones, tal naturaleza identificada con
las benefactoras figuras femeninas, será seducida y controlada por ese
representante del mundo europeo.
Estos elementos señalados además actuarán como telón de fondo
del objetivo último de Zeballos: la consolidación del modelo de desarrollo
agroexportador. Así describirá a los colonos inmigrantes no sólo
referenciándose en el enfrentamiento con el indígena, sino además en
tanto héroes y paradigmas del proyecto político encarnado por el propio
Zeballos.
“El alimento de nuestro organismo es la población, y apenas nos ocupamos
subsidiariamente del tópico, aguardando que nos devore la anemia!
Reacción! Brazos! Brazos! Brazos! Esta debe ser la bandera que nos apasione, ya
que hasta ahora solo nos fascinan las luchas electorales, porque se resuelven en
distribución de empleos y comodidades!
Todos los grandes problemas argentinos están subordinados al problema de la
población. Sin ella no hemos de ser ricos, sin ella no seremos libres, sin ella no
avasallaremos la barbarie de los desiertos que forman las seis octavas partes de la
Nación.” (p. 181).
Lejos de ser metafórico el lema “gobernar es poblar” transita de
forma explícita las páginas escritas por Zeballos. Como nunca, su visita
271
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
a las colonias santafesinas le sirve de excusa para machacar sobre tales
afirmaciones31.
“No obstante, la bondad del clima de los terrenos feraces y bosques exuberantes,
esta rejión ha sido poblada con lentitud, por los peligros y desgracias que solia
ocasionar la proximidad de los indios, dia á dia mas reducidos y alejados del
teatro de aquella civilización progresista” (p. 145)
Al solemne horror de los días pasados, en claroscuro Zeballos
contrasta el auge de la civilización, ya que no sólo se había alejado el
fantasma de los malones de forma definitiva, sino casi como un efecto
mágico las comarcas santafesinas habían mutado en un muy breve lapso
en el paradigma del proyecto colonizador.
“En Santa Fé se apoya la zona principal colonizada, que caracteriza propiamente
la Rejión del Trigo. En el departamento de la capital florecen, efectivamente, las
principales colonias de la República...” (p. 145)
Volviendo al problema del indio retomado consecuentemente por
Zeballos a lo largo de su obra, es de resaltar que existe en la descripción
trazada por este autor un abuso de procedimiento manifestado en la
ausencia en torno de la consideración nostálgica por el paisaje abierto,
la vida sin frontera, y aún la épica del combate con el indio. Duramente
Zeballos de nuevo abunda sobre los cánones clásicos de civilización vs.
barbarie en la imposibilidad de su texto y de sus ideas de combinar las
articulaciones de otros discursos.
“Pocos años hace que los campos del Salado eran temidos y permanecían solitarios.
Hoy la estancia los domina por completo, su valor ha crecido un trescientos por
ciento y la colonia de estrangeros se lanza á ellos, adivinadora audaz del porvenir”
(p. 149).
“Sobre estas llanuras cubiertas de pasto fuerte, con pequeños bosques á la margen
del Paraná, á veces arenosas, escasamente recorridas por aguas superficiales,
con lagunas dulces, que se secan enjugadas por terrenos ávidos... han levantado
los colonizadores el gran monumento de la Civilización Agrícola Argentina. “
(p. 150)
El antagonismo se arrastra también hacia la figura del inmigrante.
En su llegada es pobre, ignorante, corto, está sólo y desvalido, su
minoridad trasciende la decisión del viaje, la ruptura con su comunidad
y sus tradiciones. El exclusivo contacto con la pampa transformada lo
31
Para ampliar este tópico ver el texto “Zeballos, la parábola de la narración. Un estudio de
‘La rejión del trigo’ como libro de viaje” de Sandra Fernández y Fernando Navarro (2002).
272
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
convierte en una figura ejemplar, ahora es otro. Es que el modelo no
sólo transfigura el paisaje, no sólo expulsa al indio, no sólo solapa al
mundo rural de la Confederación y el rosismo, muda al sujeto social
privilegiado en el esquema oficial de desarrollo:
“...Mirad al colono en el muelle, pobre, desvalido, conducido hasta allí después
de haber sido desembarcado á espensas del Gobierno, sin relaciones, sin capital,
sin rumbos ciertos, ignorante de la geografía argentina y de la lengua castellana,
lleno de zozobras...
Venid ahora conmigo á ver á este mismo inmigrante en el primer grado de su
transformación social. Hélo aquí! Sale á recibirme en su hogar, porque tiene ya
un hogar. Su espontaneidad y la expresión de alegría sincera de su semblante
tostado y percudido, dicen con verdad el bienestar de su alma. ¡Cuán hermoso es
el contraste! Oídlo!...
El hombre es robusto, hábil y moral. No tiene vicios, ni veleidades” (p.34)
La representación del mundo que Zeballos proyecta está en directa
concordancia con el lugar que el hombre ocupa en el mismo. Para ello
nada mejor que partir de una diferenciación o más aún, una
contraposición como la que narra. La segunda imagen provista para el
colono esta directamente relacionada con el concepto de progreso, y
ratifica el desarrollo de la cosmovisión de Zeballos. Este paisaje
disciplinado y domesticado del mundo colonial, donde los hombres
nuevos que lo habitan se convierten en simbólicos estandartes de la
propaganda de Estanislao, y justamente al convertirse en elementos
emblemáticos, son epicentros y disparadores a su vez de un conjunto de
representaciones tendientes a la construcción de lo real. Tal como afirma
Balandier (1992) la producción de estas imágenes, su manipulación y
reordenamiento no hacen más que conducirnos a la presentación de su
sociedad y legitimación.
“Es aquí donde el viajero puede recorrer sorprendido cuarenta leguas de tierra
de Norte á Sur y cincuenta de Este a Oeste, por entre calles de plantaciones de
cereales festoneadas de zanjas, álamos y sauces, deteniéndose á cada paso en las
confortables moradas de los colonos, que se suceden cada quinientos metros y
distraido por los grandes establecimientos industriales, dónde se prepara ó
complementa la elaboración del suelo. […]
“He aquí la rejión … que he recorrido dos veces con embeleso y con patriótico
enternecimiento: en el invierno, cuando los rastrojos presentaban el aspecto
sombrío de un país quemado que revive, en el Verano, cuando relampagueaban
los trigos sazonados, como espigas de oro. “ (p. 150).
Para Zeballos además este contexto El marco oportuno y
conveniente se encontraba protegido en los ejes centrales del proyecto
273
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
del Estado argentino, desde la letra de la Constitución Nacional y desde
la práctica política y social implementada por sus hombres públicos.
“No existe país sobre la tierra dónde los estrangeros gocen de mayor amparo de
estímulos mas positivos y de privilegios mas atrayentes y completos que en la
República Argentina.
Conservan desde luego su nacionalidad y su religión, al amparo de una
constitución adelantadísima, que ofrece sus derechos y garantías á todos los
hombres del mundo que quieran habitar el suelo argentino.” (p. 182).
“La igualdad ante la ley es un hecho para todos los habitantes, no solamente en
la distribución del impuesto, sinó en el uso y el goce de todos los derechos civiles.
Así, los estrangeros son admitidos en los empleos públicos, sin mas condicion
que la de idoneidad para desempeñarlos; y el pueblo argentino es en este sentido
tan liberal y generoso que el Congreso, interpretando sus aspiraciones con
fidelidad, rechazaba en 1882 un proyecto de ley que tendia á excluir á los
estrageros de los empleos políticos y administrativos. “ (p. 182-183).
La nación y la república amparan el arraigo del extranjero pues
bien como dice Zeballos éste es tanto más sólido, cuanto mayor es el
bienestar moral y respeto que se le brinda al inmigrante, pero tales
cualidades sólo pueden ser aprehendidas en tanto y en cuanto se le
agregue la abundancia y la facilidad de bienes materiales. El inmigrantes
sólo podrá aspirar a ser ciudadano si es próspero; sino seguirá siendo
sólo un inmigrante más. La dicotomía no se presenta en ser argentino o
extranjero, criollo o inmigrante sino en la coyuntura de una identidad
basada en la propiedad y la acumulación económica.
“Ver en la tierra de su hospedage el tránsito libre y honrado de la bandera que
cubrió su cuna, es reunir todas las satisfacciones morales, hermanadas la dicha
del hogar con las alegrías cívicas, por la conjunción en el lugar de su residencia
del culto de la familia y de la propiedad con el amor de la Pátria.
¿Y cómo lograrlo? Aclimatando, por decir así, el emblema, los próceres, las ideas
y las obras del estragero en nuestro suelo. “ (p. 184-185).
Zeballos asume esa sociedad colonial del sureste santafesino como
un fenómeno posible de explicar la realidad de la identidad que se
pretendía trazar desde el modelo de nación que lo involucra directamente,
parcializándola al referir sus condiciones de producción a una
determinación absoluta; sólo es posible hacer visible a esos individuos
que se apropian de un “mundo” en “conversación” con los otros sólo en
tanto pares, en un contexto modélico. Los colonos se “apropian” del
universo de la frontera, su acción la desconfigura, la corre, la civiliza.
“Los hijos de suizos, alemanes, franceses ó italianos que predominan en la colonia
y generalmente de madres argentinas, hablan las lenguas de sus padres y el
274
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
castellano; y como tipos fisonómicos ostentan los rasgos vigorosos de los bretones,
con todas sus virtudes para la tarea agrícola y para la vida social. “ (p. 158-159).
El carácter de la relación individuo-sociedad propuesta por
Zeballos no presupone una paridad relacional. En su relato la identidad
se reafirma en relación con otras identidades, resaltando su distintividad,
y necesitando como condición crear desde fuera una conciencia de
comunidad o por lo pronto algún grado de ella.
Esa acción para Zeballos no es más que la concreción de una
conducta apropiada que lleva implícita una serie de elementos que no
hacen más que delinear el perfil deseado para los pobladores de la
pampa. Zeballos no solamente modifica la percepción de la cotidianeidad
de la campaña sino que también en aras de esta reconstrucción, deja de
lado aspectos de dicho acontecer que tiñeron buena parte de la vida
decimonónica32.
Este bagaje simbólico mediatizado por un tono moralizante dibuja
la senda por la cual transita la modelización de las conductas individuales
y colectivas, las mismas, atravesadas por la justificación científica y la
racionalidad económica actúan como catalizadores de adhesiones al
sistema de valores, a través del cual la interiorización de aquellos conduce
directamente a una acción común (Baczko, 1991).
En esta reelaboración del mundo de Eulojia Llanos, Zeballos exalta
el ideal del expansionismo como empresa, en el estricto sentido de este
término. El progreso se evidencia en la transformación productiva y en
la racionalidad económica como referente de legitimación.
“...Los talleres mecánicos, los molinos, la viabilidad escelente, las
máquinas agrícolas, los buques que ensayan la navegación del Carcarañá
henchidos del fruto de sus comarcas, todo esto encanta al argentino, le infunde
fé en los soñados destinos de la Pátria, le revela la nueva faz de nuestra sociabilidad
con un movimiento vertiginoso que subyuga unas veces y aturde las otras...”
(p. 36)
En esta lógica el rol del inmigrante es el marcado por la
laboriosidad, como referente de conducta apropiada: “Estos espectáculos
32
La mayor parte de los escritos de época dan cuenta de un estilo de vida peculiar, de un
espacio y un tiempo signados por luchas independentistas conflictos civiles, disponibilidad
de hombres para la pelea, ámbitos de sociabilidad relacionados con el juego y el alcohol,
que perfilan y se constituyen en elementos inherentes de una cotidianeidad marcada por
la presencia de una violencia vivida como natural. (Diodati-Liñán, 1993)
275
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
edificantes son comunes en la colonia Candelaria, cuyo sistema exige al colono
mas que aptitudes y voluntad...” (p. 35); y contrariamente a las anteriores
estrategias discursivas del autor aparece el desempeño de los viejos
residentes del lugar. En la voz de Eulojia se traza el recorrido de los que
habían sabido esperar algo de las consecuencias mediatas de la
unificación nacional.
Sin embargo estas narraciones marcan un nuevo punto de inflexión
alrededor del discurso y modelo hegemónico.
“Así la colonia Candelaria es una lección para los que se ocupan en Sur América
de la colonización. Es la obra esclusiva del capital particular, que no recibió
jamás subsidios oficiales, transformando una estancia de diez leguas solitaria y
ensangrentada ayer, en una campiña europea, cuyo espectáculo edifica de tal
suerte las vecindades que todo el Depantamento del Rosario se llena de labradores
formados por su ejemplo y que tienen mas de veinte leguas cuadradas bajo arado
y segadora...” (pp. 35-36)
En todo el relato de Zeballos es posible encontrar en forma explícita
la sofisticación alcanzada por la ideología del colonialismo del siglo XIX
en un discurso plagado de moralizaciones y ejemplos. Zeballos nunca
habilita la posibilidad en este escrito de enfrentar, aún sutil o
ingenuamente, el concepto mismo de civilización con el que, en última
instancia, se justifican y habilitan estos proyectos. La reproducción
discursiva de Zeballos es llana, por momentos hasta cándida pero efectiva
a la hora de imponer la “oficialidad” de un discurso elaborado desde un
texto que pretende introducir el relato de un viaje.
Finalmente los atributos señalados por Zeballos se tornaban
vigorosos y plenos en el escenario de la pampa regenerada. El paisaje en
tanto naturaleza adquiría en términos humboldtianos su condición de
protagonista, ya que no se puede separar de su contexto histórico y su
búsqueda de difuminación con el todo.
La fibra cívica, exaltada con los resplandecientes progresos, precipitaba las
palpitaciones del corazon y la civilización agrícola, abriéndome su seno, me llenaba
de patriótico orgullo. Parecíame que el grandioso espectáculo de la Pampa
regenerada por el brazo del hombre, vestia su esplendor de gala para incitarme á
tomar la pluma y saludar la transformación de la República; y palpitaban en mi
memoria, como una vaga y misteriosa melodía que se oye en sueños, las palabras
del himno: Al Gran Pueblo Argentino, Salud! “ (p. 167).
276
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
La frontera del tiempo descripta amenamente
En toda la obra de Zeballos la idea general de desarrollo y progreso
contenida en la incorporación de la Argentina a la división internacional
del trabajo era clara y decisiva, es en La rejión del trigo donde emerge con
poderosa fuerza la carga comparativa de las transformaciones
evidenciadas sensiblemente por el autor. En tal sentido Zeballos introduce
el tratamiento de la sociedad tradicional de las primeras décadas
independientes como una parábola, en donde la anécdota, la descripción
diacrónica del paisaje y la experimentación del cambio político, y por ende
la transformación social se confunden en una articulación contenida
singularmente en la imagen de una mujer, Eulojia Llanos.
“Era de su número Doña Eulojia Llanos, de una familia de estancieros del distrito
de los Desmochados, comarca frecuentemente invadida por los araucanos, teatro
de conmovedoras desgracias y de sangrientos episodios” (p. 14)
De este modo Zeballos asocia simbólicamente a la sociedad anterior
a Pavón y a la naturaleza “casi bárbara”, aún no devenida en paisaje con
la figura femenina de una ilustre matrona del interior, en un juego en
donde sus contornos expresan no sólo la idea de un paisaje virreynal y
postindependiente, sino la cruda oposición entre razón y sentimiento.
“Sufragio Popular y Gobierno Libre eran para Doña Eulojia términos del
Sanscrito, frases de una lengua, cuya existencia misma ignoraba” (p. 16)
Recordemos que la asociación de lo femenino con la naturaleza es un
tópico sumamente transitado en los análisis de estos últimos años, aún en
los estudios sobre viajeros, pero singular para el tratamiento de los textos
de Zeballos. En tal sentido Eulojia, alma sensible, perspicaz administradora
del hogar familiar, es incapaz de comprender el ideario de la Ilustración
tamizado por la revolución de la independencia y los años de guerra civil.
“El gobierno era para ella un hombre...” (p.16)
“Ella ignoraba el origen y el fin de la Autoridad, y solamente había reconocido,
después de los Virreyes, tres Señores, tres Potestades, tres Gobiernos: Don
Estanislao López, en los tiempos heróicos de Santa Fé, Don Juan Manuel de
Rosas bajo la Tiranía, y el general Don Justo José de Urquiza en la Éra de la
Libertad” (p.17)
Los ecos de la representación ciudadana, la división de poderes
pautadas por la Constitución de 1853, no recorren, en los ojos de la
Eulojia, descripta por Zeballos, el análisis de un mundo que se
transforma. Pero más aún Zeballos otorga a la figura de Eulojia la
277
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
representación de una sociedad de antiguo régimen condicionando la
comparación con la modernidad sobre cuatro líneas claramente
delineadas: régimen de gobierno, modelo económico, relaciones sociales
y transfiguración del espacio.
“Aquella época [la de la juventud de Eulojia] define en Santa Fé la lucha
encarnizada entre el espíritu primitivo y las nuevas ideas, entre los hábitos
coloniales, modificados por el sentimiento de la Pátria y por las influencias sociales
y políticas de los caudillos, y los altos designios del Progreso...” (p. 19)
“Esta victoria debía transformar á Santa Fé en tierra nueva, arada por las fuerzas
de una reacción europea, no completa todavía, pero siempre en progreso: y
presajiaba el predominio en la población, en las industrias y en la sociabilidad,
de los elementos inmigrados, que hallaban en la tierra de la Buena Esperanza su
país de promisión” (p.19)
“Las consecuencias se hicieron sentir con los caracteres odiosos de una calamidad.
Es peculiar de los hombres primitivos y de las sociedades embrionarias huir de la
luz que redime como de la llama que quema, y Doña Eulojia fue de las primeras
que maldijo la victoria de los gringos y de los agentes del progreso que la habían
asegurado, y que para ella eran como el granizo para los sembrados” (p.20)
“La imaginación adormecida de aquella mujer, que había nacido en la Pampa y
criádose á la sombra de los sonrientes sauces del rio Paraná, despertaba iluminada
por la fosforescencia del dolor, y recorria el campo mutilado [por el trazado del
ferrorarril] de los Desmochados, el camino solitario del Norte, la huerta sin
quinoa, el horno sin pan y la Pátria de los Lopez cruzada por los porteños
vencedores” (p. 21)
Estos párrafos se muestran como una secuencia histórica de
legitimación de Estanislao y su mundo normalizado por la modernidad.
En la confrontación se encuentran el mundo de Eulojia, a la vez su mundo
de la niñez33, y su nuevo mundo levantado con el afán de los cambios
progresivos que finalmente transformarán a las gentes y los espacios al
compás de la innovación.
Sin embargo el asunto nos mueve a preguntarnos sobre que
cimientos Zeballos construye esta simple pero eficiente red de
significaciones, canalizadas en dos ejes: el recuerdo y la nostalgia.
El recuerdo del viaje, inscripto en el relato es, el viaje como recuerdo
o más bien el recuerdo como viaje. Viaje que es inicio (como comienzo)
y retorno, implica que el tiempo es memoria del espacio y posibilidad
de otro tiempo que se avisora. Es en este desarrollo de la temporalización
que la contigencia del pasado se borra, se anula, aunque no se olvida,
por la promesa de lo nuevo que está por estallar.
33
El propio Zeballos describe en su libro su paso por la casa de Eulojia Llanos (p.22).
278
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Renato Rosaldo (1991:71-87) introduce el noción de nostalgia
imperialista para caracterizar la peculiar paradoja de desear o recuperar
desde la descripción aquello a lo que se ha alterado o destruido
intencionalmente, en muchos casos empleando la fórmula del “anhelo
inocente”, tanto para capturar la imaginación de la gente como para
esconder su complicidad con la dominación a menudo brutal.
De este modo es posible pensar las imágenes textuales de Zeballos
reduciéndolas al anhelo inocente planteado por Rosaldo a simplemente
anhelo, donde sólo la regeneración de lo que se ha alterado se utiliza en
código de búsqueda de legitimación personal y colectiva. En tal sentido
la mirada sobre lo que se perdió es solapadamente nostálgica, contenida
en el progreso oportuno marcado por la transfiguración de un mundo
rural regional suscitadas al calor de los cambios sostenidos por el ingreso
al capitalismo.
“– Bendito sea Dios, hijito! ¡Qué te habia é conocer! ¡Estás hecho un porteño!
Y ¿cómo no te habiais de hacer gente entre esos hombres tan buenos?...
Mi sorpresa era completa. Habia en la casa de Doña Eulojia una transformación
radical y era precisamente en su espíritu.
La Unificación Nacional por la incorporación de Buenos Aires, que Doña Eulojia
habia anatematizado en 1862 con acento sacerdotal, era ahora para ella la causa
eficiente de los grandes adelantos de la Pátria, que habian proporcionado á su
familia el bienestar y la abundancia...” (p. 39)
Es que la Eulojia de Zeballos supera tal como afirma Williams (2001:
63) lo que parece ser un orden antiguo, una sociedad “tradicional”, que
continúa apareciendo, como una idea, hasta cierto punto basada en la
experiencia, en comparación con la cual puede medirse el cambio
contemporáneo. Sin embargo, el uso de la referencia retrospectiva tiene
su propia lógica; ya que el cambio es tan extendido y prolongado que
resulta muy sencillo percibir una transformación fundamental de la vida
rural pampeana, pero donde a su vez en muy difícil definir el punto de
inflexión donde este cambio se plasma.
“Ella me esplicó los sucesos de los últimos tiempos que habían sido parte á
modificar sus vistas. La casa estaba alquilada á comerciantes de Buenos Aires.
El campo de los Desmochados habia sido vendido por una suma fabulosa, con
relacion á los precios de 1864, y el comprador era un rico hacendado de Otra
Provincia34. Además sus nietos eran vecinos acaudalados y negociantes en la
Colonia Candelaria.” (p. 39)
34
“Así llaman los paisanos de Santa-Fé á Buenos Aires” (p.36)
279
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
Siguiendo este argumento la estrategia de Zeballos para desmontar
este “ayer” consagrado a el mundo tradicional es la resignificación de
Eulojia, con la traslación de su significado hacia la “Patria” y la “Nación”.
“Hé dicho que la Pátria Vieja, como ella la llamaba, se le aparecía bajo la forma
de un caudillo victorioso y espléndido, López ó Urquiza. La Pátria Nueva, Buenos
Aires incorporada á sus hermanas é imponiéndoles su influencia despues de la
batalla de Pavon, era también un hombre para ella. Era aquel Capitan que, al
frente de las huestes vencedoras en la estancia de Palacios, habia desfilado por
las calles del Rosario, las banderas desplegadas y al aire los himnos militares.”
(p. 40)
Concientemente Zeballos se identifica con la clásica idea de
civilización transmitida en los relatos de viajeros de la primera mitad
siglo XIX, relatos e idea que como enuncia Prieto (1996:11-23) contribuyen
a elaborar un perfil en la literatura de argentina inmediatamente
posterior35, haciendo hincapié en sus enunciados de la insistencia de
esta idea.
Además la naturaleza escasamente literaria de sus obras, permite
que el acento sobre su trabajo sea colocado en el carácter ejemplar,
didáctico, científico y propagandístico. Dicho de otro modo, lo que se
evidencia en Zeballos es la escasa ingenuidad, en la casi torpeza
declarativa puesta en tensión en sus relatos, alrededor del “benéfico”
impacto de la modernización.
“El retrato de Mitre estaba en aquel hogar antiguo, como las bayonetas porteñas
en los cuarteles del Rosario: por el derecho irresistible de la Victoria” (p.17)
“Al retirarse fijó los ojos en la pared al lado del nicho de la virgen, y su fisonomía,
plácida y triste, se iluminó de improviso con resplandores de ira y de venganza,
y precipitándose sobre el retrato del general Mitre, lo arrancó de la pared, corrió
al patio y lo arrojó al pozo, gritando con rabia epiléptica: -Este es!”36 (p. 22)
La recuperación del retrato de Mitre, personificación del progreso
oportuno, es el reflejo discursivo de la máxima ejemplar de Zeballos:
ahora existe una identidad civilizada, que a través de la razón y también
de las “mejoras” en las condiciones materiales de vida, se procrean y se
Recordemos que en su obra Prieto (1996) trabaja específicamente sobre Echeverría, Mármol,
Alberdi y Sarmiento.
36
“El episodio que narro es rigurosamente exacto. Mi familia habia salido del Rosario á pasar una
temporada de campo y yo vivia en casa de Doña Eulojia Llanos para no perder el colejio. Entonces
tuvo lugar esta escena de que fuí testigo. Mitre habia inaugurado personalmente los trabajos del
ferro-carril Central y esto era para mi noble y vieja amiga el mayor pecado del general” (p. 22).
35
280
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
extienden en la antes refractaria sociedad del interior. Es que siguiendo
a Ricoeur la identidad de una persona, de una comunidad, está hecha
de estas identificaciones con valores, normas, ideales, modelos, héroes,
en los que la persona y la comunidad se reconoce; de este modo el
reconocerse dentro de contribuye al reconocerse en (Ricoeur, 1993:116).
La frontera política también se ha alargado, los resabios urquisistas,
los ecos federales, la memoria de las guerras civiles se diluyen en ese
momento delineando nuevos bordes, nuevos límites y nuevos intersticios
de representación
La región del trigo: un discurso confinado
“…quién no dijera que ese es el mérito y el objeto de un viaje, en el que
el viajero es forzosamente el protagonista, por aquella solidaridad del
narrador y la narración, de la visión y de los objetos, de la materia de
exámenes y la percepción…” Sarmiento, Viajes
Zeballos es un tipo particular de observador, que impone una
comparativa distancia con la región del trigo que nos describe en su
texto de viajes. Su vuelta al pasado (su pasado en el paisaje santafesino)
no abunda melancólicamente en lo que se ha perdido con el “progreso”
sino que es el espejo donde mirar los sucesos contemporáneos; y su
mirada presente es legítima en la medida en que se constituye en
paradigmática para la Argentina Moderna.
Su poderoso montaje textual es sencillo. En él no aparece la
anotación científica, ni la efusión estética, ni la preocupación humanística.
Su relato de confidencias y peripecias personales son simplemente
excusas frágiles para introducir su pragmática línea de tratamiento. Es
en el acto de exteriorización del relato donde Zeballos se reconoce, se
recuerda , se reflexiona y se proyecta.
Deliberadamente Zeballos se identifica con la clásica idea de
civilización transmitida en los relatos de viajeros de la primera mitad
siglo XIX, relatos e idea que como enuncia Prieto contribuyen a elaborar
un perfil en la literatura de argentina inmediatamente posterior. “Scribere
est agere”, reza en cada uno de sus escritos posteriores, a manera de
“anexos” a sus relatos de viajes, escribe compulsivamente para mostrar,
para convencer, para concretar en escritos aquello que en la realidad se
resistía a materializarse.
281
El desierto y sus confines. Contexto y narrativa... / Sandra Fernández
Toda la fuerza retórica desplegada por Zeballos se funda en la
figura de la antítesis. La expresiva dialéctica de lo mismo y lo diferente,
del desierto y la civilización, del indígena y el blanco, del criollo y el
extranjero, están alertando de que urge una intervención para no perder
el tren en el despliegue del progreso; en esa clave el gran relato de viajes
de Zeballos es el gran relato de la administración discursiva de lo otro,
del Otro.
Por eso la frontera en Zeballos no está presentada desde
exclusivamente la territorialidad del espacio, sino en una serie de
elementos que también componen una aplicación más variada y rica del
concepto. Metafóricamente la frontera funciona como una aspiración
del modelo del que Estanislao formaba parte, en tanto borde que debía
correrse de la mano del propio Estado pero también de los sujetos que
encarnaban los ideales de ese mismo Estado; por un lado los hombres
políticos y por otro también los ejecutores de base del programa los
inmigrantes. En idéntico sentido la frontera además es un confín
discursivo contra un pasado que tendía a sobrevivir demasiado más allá
de Caseros, representado en las formas de vida, las relaciones de poder
y sociales de la campaña santafesina de las décadas post-revolucionarias.
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284
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Los mecanismos de asistencia oficial
en el último ciclo de las migraciones gallegas
hacia la Argentina*
Nadia Andrea De Cristóforis**
Introducción
Los estudios migratorios se presentan como un campo
particularmente fértil para profundizar las reflexiones en torno a los
problemas de la comparación y de la elección de la escala de análisis. En
los últimos años, la historiografía sobre el tema ha demostrado la riqueza
de las miradas comparativas, en sus diferentes variantes o modelos. De
este modo, se han desarrollado una gran diversidad de perspectivas:
desde aquellas más lineales (el seguimiento de un grupo migratorio,
contrastando su situación en la sociedad de partida con la lograda en el
ámbito de destino), hasta aquellas de tipo convergente (la indagación
* Este trabajo forma parte de los siguientes proyectos de investigación: UBACyT S830 (UBA);
PICT 2006 Nº 1641 (Agencia Nacional de Promoción Científica y Tecnológica) y PIP 114200801-00216 (CONICET). Una versión preliminar del mismo fue aceptada para su
publicación en la Revista População e Família, del Centro de Estudos de Demografia
Histórica da América Latina (CEDHAL), de la Universidade de São Paulo. Quisiera
expresar mi agradecimiento a Alicia Bernasconi, Xosé Manoel Núñez Seixas y Pilar Cagiao
Vila, por sus valiosas orientaciones en relación con la búsqueda documental y bibliográfica
ligada a este estudio.
** Doctora en Historia por la Universidad de Buenos Aires. Investigadora del Consejo
Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas de la Argentina y de la Universidad de
Buenos Aires, donde también ejerce la docencia. Miembro del Comité de redacción de
Estudios Migratorios Latinoamericanos y del Consejo consultivo de la Revista do Corpo Discente
do Programa de Pós-Graduação em História da UFRGS. Editora, junto con Alejandro Fernández,
del libro Las migraciones españolas a la Argentina. Variaciones regionales (siglos XIX y XX),
Buenos Aires, Biblos, 2008. Autora de Proa al Plata: las migraciones de gallegos y asturianos a
Buenos Aires (fines del siglo XVIII y comienzos del XIX), Madrid, CSIC, e/p. Publicó además
diversos trabajos sobre la inmigración española en la Argentina, en medios académicos
nacionales y extranjeros. [email protected]
285
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
de distintos colectivos migratorios, en el marco de un mismo espacio de
llegada) o divergente (el examen de una misma corriente migratoria,
pero en diferentes áreas receptoras).1 El empleo de estos dos últimos
enfoques se ha revelado como muy valioso, al favorecer la identificación
de los aspectos específicos y generales de determinados flujos de
población, alentando los ejercicios explicativos tendientes a clarificar
las similitudes y diferencias existentes entre los mismos.
En cuanto al problema de la escala de la comparación, ya en su
célebre artículo de 1928 Marc Bloch introducía la noción de “medio
social”, aludiendo a la posibilidad o conveniencia de utilizar un marco
más flexible y dinámico que el determinado por los Estados nacionales,
capaz de superar las limitaciones impuestas por estos últimos.2 Como
tantos otros campos historiográficos, el de las migraciones ha ofrecido
interesantes oportunidades para repensar la cuestión de la escala, ya
sea en el sentido de la clásica dicotomía macro-micro, o en la diversidad
de recortes (continental, nacional, regional, provincial, municipal,
parroquial, entre muchos otros) desde los cuales pueden ser concebidos
los procesos migratorios.3 De este modo, se ha logrado avanzar en el
análisis crítico de las vías por las cuales se constituyen dichos recortes:
por un lado, por la imposición burocrático-administrativa, que
condiciona la producción de la documentación histórica; y por otro lado,
por el reconocimiento de zonas de coherencia cultural, política y
económica, a partir del tratamiento cuanti y cualitativo de la información
que brindan las fuentes. Si bien esta última estrategia es más compleja y
laboriosa, resulta más atractiva que la primera, en la medida en que
contribuye a generar una visión más genuina y completa de los
fenómenos indagados.
A lo largo de este trabajo examinaremos un fenómeno histórico
que nos permitirá volver a plantear los problemas que acabamos de
Nancy L. Green, “L´histoire comparative et le champ des études migratoires”, en Annales
ESC, Nº 6, 1990, pp. 1341-1344; Idem, “The Comparative Method and Poststructural
Structuralism – New Perspectives for Migration Studies”, en Journal of American Ethnic
History, Vol. 13, N° 4, 1994, pp. 13-16.
2
Marc Bloch, “Pour une histoire comparée des sociétés européennes”, en Mélanges Historiques,
París, S.E.V.P.E.N., 1963, pp. 17-18.
3
V. al respecto las recientes observaciones de Fernando Devoto, en el prefacio a la obra
editada por Nadia De Cristóforis y Alejandro Fernández, Las migraciones españolas a la
Argentina. Variaciones regionales (siglos XIX y XX), (“Colección La Argentina Plural”), Buenos
Aires, Ed. Biblos, 2008, pp. 9-11.
1
286
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
mencionar (el de la escala y el de la comparación), desde nuevas
coordenadas espacio-temporales. Trataremos de comprender cómo
operaron los mecanismos de asistencia oficial, en el último ciclo de la
inmigración gallega en la Argentina. Para ello, analizaremos el
funcionamiento del Instituto Español de Emigración, que tuvo a su cargo
la implementación de las políticas gubernamentales en materia de
migración. También examinaremos el papel desempeñado por la
Comisión Católica Española de Migración, que colaboró con el citado
organismo, en los procesos de reagrupación familiar continental y
ultramarina. El propósito será indagar hasta qué punto la acción oficial
y su entramado institucional incidieron sobre la conformación y
características socio-demográficas de los flujos del noroeste hispánico
que se dirigieron a la Argentina.
Sabido es que luego del fin de la Segunda Guerra Mundial, las
corrientes españolas hacia el exterior se revitalizaron progresivamente,
manteniendo como destinos predominantes los países hispanoamericanos
(hasta 1960) y posteriormente, los europeos (desde 1961). Entre 1946 y
1958 las principales regiones que contribuyeron a alimentar estos flujos
fueron Galicia y Canarias. La primera aportó un 46% a las corrientes con
dirección a Hispanoamérica, mientras que la segunda, un 12%.4 Además,
en el mencionado período Galicia presentó la tasa emigratoria más elevada
(76, por cada diez mil habitantes censados en 1950), en comparación con
el resto de las regiones peninsulares.5
El último ciclo de inmigración gallega en la Argentina tuvo lugar
en este contexto de recuperación de la emigración española hacia
América, entre 1946 y los primeros años de la década de 1960.
Lamentablemente, aún no se ha podido cuantificar con exactitud el
número de gallegos que arribaron a la Argentina en esta etapa, debido
a algunos problemas que presentan las fuentes disponibles (por
ejemplo, la no especificación de la procedencia regional, en el caso de
las Estadísticas del Movimiento Migratorio de la Dirección Nacional de
Migraciones), o a la falta de una sistematización completa de la
información contenida en otra valiosa documentación (los libros de
Salvador Palazón Ferrando, Capital humano español y desarrollo económico latinoamericano.
Evolución, causas y características del flujo migratorio (1882-1990), Valencia, Institut de Cultura
“Juan Gil-Albert”, 1995, p. 294.
5
Op. cit.
4
287
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
desembarco). Por indicios indirectos,6 presumimos que los gallegos
fueron el principal grupo peninsular, desde un punto de vista regional,
como lo habían sido desde los inicios del largo ciclo inmigratorio europeo
hacia la América austral, a partir de 1830. Además, suponemos que el
ritmo de sus llegadas se habría incrementado hasta comienzos de la
década de 1950 (siguiendo la pauta de los españoles en general), para
decaer posteriormente de manera paulatina (ver el Gráfico 1). De
cualquier modo, lo que se ha logrado comprobar es que la Argentina
perdió atractivo como destino migratorio gallego a partir del inicio de
los años sesenta, momento en que la mayor parte de las corrientes
originadas en el noroeste hispánico comenzó a dirigirse hacia países
europeos, tales como Alemania, Suiza, Francia, Holanda, Inglaterra o
Bélgica, entre otros.7
De este modo, a lo largo de nuestro artículo privilegiaremos la escala
regional de análisis, aunque combinándola con otras (nacional, provincial
o parroquial), cuando el estudio lo requiera. Al mismo tiempo,
intentaremos dejar planteados algunos ejercicios comparativos: por una
parte, nuestra mirada sobre las corrientes gallegas tendrá como
presupuesto el modelo divergente al que aludíamos inicialmente, siendo
factible proseguir el examen en relación con otros destinos americanos
donde los procesos de reagrupación familiar cobraron gran importancia,
como el venezolano o brasileño. Por otra parte, nuestro argumento se
desarrollará en torno a una constante confrontación entre el
comportamiento de las corrientes gallegas “asistidas” (concentrándonos
en las que tuvieron lugar entre 1957 y 1963) y las “espontáneas”
(especialmente, las de 1924, 1949 y 1950). También contrastaremos las
características y dinámica de los flujos migratorios españoles en general y
gallegos en particular. En definitiva, exploraremos algunas variables que
ofrece la historia comparada en el campo de los estudios migratorios,
brindando resultados preliminares de investigación, que podrán
profundizarse con indagaciones de más largo alcance.
Nos referimos a los informes de diferentes funcionarios representantes del gobierno español
en la Argentina, que se conservan en el Archivo del Ministerio de Asuntos Exteriores de
Madrid, España (en adelante, AMAE).
7
Entre 1960 y 1967, Alemania recibió el 42% de los emigrantes gallegos que se salieron hacia el
Viejo Continente, Suiza el 33%, Francia el 16% y Holanda, Inglaterra y Bélgica, tomados
conjuntamente y junto con otros destinos minoritarios, el 9%. Cfr. Francisco Sánchez López,
Emigración española a Europa, Madrid, Confederación Española de Cajas de Ahorros, 1969, p. 32.
6
288
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
1. La emigración asistida: el Plan de Reagrupación Familiar
A mediados de la década del cincuenta, y tras el fin de la etapa de
más fuerte aislamiento internacional, el gobierno franquista logró una
cierta rehabilitación y aceptación en el exterior, que favoreció, entre otras
cuestiones, su ingreso en la ONU en 1955 y en el Comité
Intergubernamental para las Migraciones Europeas (CIME), en 1956.8
Este reposicionamiento en la política exterior se acompañó de una nueva
atención a los problemas “domésticos” (los conflictos sociales y el
estancamiento económico), que amenazaban la estabilidad del régimen.
Para garantizar la continuidad y supervivencia de este último, Franco
impulsó la implantación de una nueva política económica, concebida
por una elite tecnocrática y destinada a lograr el desarrollo económico
del país, su modernización e integración en el seno del capitalismo
mundial.9
Este giro de la política económica coincidió con una nueva visión
acerca del papel de la emigración en general. Esta última comenzó a ser
concebida como un acto esencialmente individual y radicalmente libre,
pero que requería la intervención y fiscalización del Estado. Sólo este
último podía garantizar la efectivización del derecho a emigrar, al brindar
al potencial emigrante la información y asistencia necesarias para salir
El CIME tuvo su origen en una Conferencia reunida en Bruselas en diciembre de 1951, en
la cual se resolvió crear un instrumento para restaurar el equilibrio entre las “naciones
superpobladas” y las “insuficientemente pobladas” por medio de la migración organizada
y asistida de los europeos. La participación de España en el CIME fue producto de largas
negociaciones, que se iniciaron en 1952 y se prolongaron por varios años. Algunos aspectos
que dificultaron esta incorporación fueron, entre otros: el monto de la cuota que debía
aportar España al CIME, o la posibilidad de que este último terminara trasladando
refugiados republicanos, a países que no fueran los latinoamericanos, de lengua castellana.
Cfr.: AMAE, R 5283, Exp. 16 (1945-1957), Dirección General de Asuntos Consulares,
“Participación de España en el Comité Intergubernamental provisional para los
movimientos migratorios de Europa”, 21 de abril de 1952; AMAE, R 5283, Exp. 16 (19451957), Dirección General de Política Económica, “Participación de España en el Comité
Intergubernamental provisional para los movimientos migratorios de Europa”, Madrid,
28 de mayo de 1952.
9
Sobre los aspectos comentados en este párrafo y en el siguiente, v. los clarificadores trabajos
de María José Fernández Vicente, Émigrer sous Franco. Politiques publiques et stratégies
individuelles dans l´émigration espagnole vers l´Argentine et vers la France (1945-1965), Lille,
ANRT, 2005, pp. 83-93; e Idem, “En busca de la legitimidad perdida. La política de
emigración del régimen franquista, 1946-1965”, en Estudios Migratorios Latinoamericanos,
Año 19, Nº 56, 2005, pp. 15-22.
8
289
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
del país natal e instalarse en el de destino.10 Además, dentro del gobierno
empezó a cobrar fuerza la idea de que la emigración debía contribuir al
desarrollo económico, no sólo amortiguando los efectos más negativos
de los planes de estabilización (en especial, las elevadas tasas de
desempleo), sino también estimulando el crecimiento, a través de la
llegada de remesas, que significaban un importante aporte de divisas
para la economía española.
En esta coyuntura donde existía un importante consenso para
fortalecer el papel del Estado en la canalización de la emigración española
hacia el exterior, en función de objetivos de desarrollo más generales,
algunos sectores del ala más liberal y modernizadora del régimen
franquista y la Iglesia promovieron el surgimiento de un organismo
estatal encargado de asumir el conjunto de competencias en materia de
emigración. Por Ley de 17 de julio de 1956 fue creado el Instituto Español
de Emigración (IEE), que fue adscripto al Ministerio de Trabajo a partir
del 9 de mayo de 1958. Según lo establecido por la Ley de 1956, el IEE
tenía la finalidad de realizar la política emigratoria del gobierno,
promoviendo en cada momento las medidas necesarias y una acción
tutelar en beneficio de los españoles que decidieran migrar. En este
sentido, el IEE debía ocuparse de estudiar los problemas ligados a la
emigración, asesorar al gobierno sobre las disposiciones a adoptarse en
la materia, organizar los flujos colectivos y las repatriaciones, facilitar a
los emigrantes la obtención de medios económicos e instrumentos de
trabajo, intervenir en la contratación de pasajes, proporcionar
gratuitamente la documentación necesaria para el traslado y asistir a los
migrantes en su lugar de destino.11
El IEE contaba con dos entidades colaboradoras para el desarrollo
y ejecución de planes y programas migratorios: la Organización Sindical,
en lo que se vinculaba a los emigrantes temporales y fronterizos, y la
Comisión Católica Española de Migración (CCEM), en lo atinente a los
procesos de reagrupación familiar. Estos últimos habían concitado la
Carlos Ma. R. de Valcárcel, “Conferencia”, en Ministerio de Trabajo, Instituto Español de
Emigración, II Congreso de la emigración española a ultramar, Madrid, 1960, p. 59; AMAE, R
9621, Exp. 7 (1958-1967); Álvaro Rengijo Calderón, “Emigración y empresas privadas”,
Conferencia pronunciada en la Cámara Oficial de la Industria de la provincia de Madrid,
18 de noviembre de 1965, p. 2.
11
Ministerio de Trabajo, Memoria de la labor realizada en 1958, Libro IV, Instituto Español de
Emigración, Madrid, 1960, p. 10.
10
290
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
atención del gobierno desde tiempo atrás, cuando eran percibidos como
el mejor mecanismo para estimular los flujos de españoles hacia el
exterior. En efecto, ya desde 1948, momento en que se discutían las
condiciones para la firma del Tratado de Emigración con la Argentina,
surgieron dentro de las órbitas oficiales argumentos a favor de una
emigración basada en el “llamado” de un emigrante establecido en
ultramar, al resto de su familia o a sus paisanos. Las razones que se
esgrimían en ese entonces para favorecer este tipo de corriente eran
varias: el hecho de que los emigrantes trasladados en virtud de un
llamado gozarían de libertad y de mejores informaciones para buscar
un trabajo, dentro de la sociedad de destino (evitando caer en manos de
empleadores especuladores, como los que podían actuar en el caso de la
emigración contratada); la asistencia y ayuda que podían ofrecer los ya
establecidos en ultramar, al recién llegado (favoreciendo una integración
no traumática al ámbito de acogida); o el beneficio que supondría para
el Estado español no tener que correr con los gastos de posibles
repatriaciones, en la medida en que aquel que se desplazaba por el
llamado de un pariente o conocido podía encontrar en estos últimos
redes de contención para su inserción en la nueva sociedad.12 Hacia
mediados de la década de 1950 los fenómenos de reagrupación familiar
se justificaban con motivos similares, con el matiz de que la preocupación
del gobierno por las repatriaciones había crecido, desde el momento en
que una ley del 18 de julio de 1956 responsabilizó al Estado español de
la repatriación de los emigrantes que así lo requerían, con el único
requisito de que estos últimos demostraran que no poseían los medios
económicos para financiarse el viaje por sí mismos.13
Los programas de reagrupación familiar puestos en marcha por el
IEE tenían como finalidad declarada atender a imperativos morales
ligados a la emigración, aunque, como ya aclaramos, existieron razones
económicas que estimularon su organización. Dichos planes estuvieron
AMAE, R 2052, Exp. 39, José María de Areilza (Embajador de España en la Argentina),
“Sobre proyecto relativo a la emigración española en la Argentina”, Buenos Aires, 3 de
marzo de 1948; AMAE, R 1731, Exp. 3, Informe sin fecha.
13
Ma. Emelina Martín Acosta, “Emigración canaria a Argentina: algunos ejemplos de la
Comisión Católica Española de Migración, a mediados del siglo XX”, en Pilar Cagiao Vila
y Eduardo Rey Tristán (eds.), De ida y vuelta. América y España: los caminos de la cultura.
Simposio Internacional de la Asociación Española de Americanistas, Santiago de Compostela 2 y 3
de septiembre de 2005, Universidade de Santiago de Compostela, 2007, p. 393.
12
291
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
encaminados a revitalizar las corrientes humanas hacia Francia y hacia
distintos países americanos. El programa relacionado con estos últimos
logró un amplio alcance y se institucionalizó por un acuerdo entre el
CIME y el IEE, en 1956. Contó desde sus inicios con la colaboración de la
Comisión Católica Española de Migración, que a través de sus
Delegaciones Diocesanas, quedó a cargo de localizar a las personas
reclamadas, informarlas y orientarlas hasta el momento de su embarque.
El espacio de acción privilegiado por la Iglesia, para llevar adelante estas
tareas, fue la parroquia: en ella reclutaba a sus asistentes (en general,
mujeres que ayudaban en la búsqueda de las personas reclamadas) y
difundía su pastoral sobre la emigración.
2. La doctrina eclesiástica sobre la emigración
Hacia mediados del siglo XX las disposiciones pontificias en materia
de emigración eran abundantes y poseían una larga data. Sin embargo, en
1952, a instancias del Papa Pío XII, la doctrina eclesiástica sobre la emigración
fue sistematizada e institucionalizada en una nueva Constitución Apostólica,
la Exsul Familia, que estableció la pauta de actuación pastoral con los
emigrantes hasta fines de la década del sesenta. El objetivo principal de la
Exsul Familia era la asistencia espiritual de los emigrantes de distintas
nacionalidades, sin descartar, en un segundo plano, el socorro material. La
nueva regulación fue justificada en el contexto del crecimiento de los flujos
humanos, tras el fin de la Segunda Guerra Mundial, y en el imperativo de
contemplar y dar solución a los problemas planteados por las migraciones.14
El cuidado espiritual de los emigrantes quedó confiado a un órgano de la
Santa Sede, la Sagrada Congregación Consistorial, que se articuló con las
demás instituciones que actuaban en el campo de la emigración (de carácter
internacional, nacional, diocesano o parroquial) a través de un nuevo oficio,
el Delegado para las obras de emigración.15
Parágrafo 78, Título segundo, “Exsul Familia”, en Comisión Católica Argentina de
Migraciones, Iglesia y Migraciones. Documentos, Buenos Aires, Ediciones CCAM-CEMLA,
1988, p. 40.
15
Parágrafos 82, 83 y 84, Título segundo, “Exsul Familia”, en Comisión Católica Argentina
de Migraciones, op. cit., p. 41-46. Para un interesante análisis sobre las disposiciones
contenidas en la Exsul Familia, en relación con la emigración italiana, v. Alicia Bernasconi,
“De Pergamino a La Boca en veinte años: los Scalabrinianos y la asistencia a los inmigrantes
italianos, 1940-1961”, ponencia presentada en las Xº Jornadas Interescuelas / Departamentos
de Historia, Rosario, 20 al 23 de septiembre de 2005, inédita.
14
292
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
En la Exsul Familia la emigración fue concebida principalmente
como un derecho de las personas, que tenía que ejercitarse libremente.
Sin embargo, la emigración, como derecho natural del hombre, quedó
subordinada en su ejercicio al bien común de los Estados involucrados
en el proceso migratorio (el de partida y el de llegada).16 Incluso más, en
consonancia con la tendencia que se registraba en las esferas
gubernamentales de varios países europeos, la Exsul Familia reconocía y
admitía el papel de los Estados en el proceso migratorio, rol que
podríamos caracterizar como “facilitador” y “tutelar”.
A través de la mencionada Constitución y de diversas
manifestaciones discursivas, la Iglesia expresaba en todo momento su
preocupación por los “problemas” derivados de la emigración y asumía
la función de velar por la solución de los mismos. Según la Santa Sede,
los principales inconvenientes eran los religiosos y morales, por el
debilitamiento de la autoestima y la pérdida de la dignidad humana
que en general involucraba el desplazamiento hacia una tierra extraña.
Además, otro motivo de alarma era la influencia que otras religiones o
“ideologías ateístas y materialistas” podían ejercer sobre los emigrantes,
conduciéndolos a debilitar su fe en Cristo y a cuestionar el orden
establecido por Dios.17 Estas consecuencias no deseadas de la emigración
llamaban la atención de las autoridades eclesiásticas de distintos países
y regiones europeos.18 Dentro de Galicia se destacaban los dilemas
involucrados en las salidas hacia el exterior, en especial, las que tenían
como destino el Viejo Continente, donde según la institución eclesiástica,
los emigrados quedaban expuestos a la influencia de protestantes y
comunistas y terminaban perdiendo su fe y quebrantando sus vínculos
maritales.19
Parágrafo 62, Título primero, “Exsul Familia”, en Comisión Católica Argentina de
Migraciones, op. cit., p. 32.
17
Secretaría de Estado de Su Santidad, “Carta dirigida al Presidente de la Junta de las Semanas
Sociales de España”, en Semanas Sociales de España, XVIII Semana – Vigo-Santiago – 1958,
Los problemas de la emigración española, Madrid, 1959, pp. 15 y 16.
18
Para un examen de las preocupaciones derivadas de la situación de los migrantes italianos
en Argentina, en la segunda posguerra, V. Alicia Bernasconi, “Los Misioneros
Scalabrinianos y la inmigración de la última posguerra en Argentina en la perspectiva de
L´Emigrato Italiano (1947-1956)”, en Estudios Migratorios Latinoamericanos, Año 16, Nº 49,
2001, pp. 615 y 616.
19
Boletín Oficial del Arzobispado de Santiago de Compostela, 20 de noviembre de 1956, p. 599,
citado por Xosé Luis Mínguez Goyanes, “Emigración e xerarquía eclesiástica (1952-1969).
Unha aproximación á cuestión”, en Estudios Migratorios, Nº 3, 1997, p. 141.
16
293
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
En función del diagnóstico crítico realizado, la Iglesia se propuso
asumir ciertas tareas, tendientes a mitigar los problemas observados:
preparar espiritualmente a los emigrantes, con el objeto de que lograran
una armoniosa y rápida integración en la sociedad de destino; ayudarlos
con informaciones seguras y provechosas sobre los contratos de trabajo;
evitarles gastos injustificados en la tramitación de los documentos y
facilitar los procesos de reunificación familiar.20 Además, la Iglesia insistía
en la necesidad de lograr una mejor coordinación de las actividades
desplegadas por las diferentes organizaciones católicas, encargadas de
implementar la política sobre migración, a través de la acción de una
entidad supranacional.21 De hecho, desde 1951 existía una Comisión
Internacional Católica de Migración, que tenía como unos de sus objetivos
la expansión de las organizaciones católicas nacionales a ella asociadas.
En este contexto general el IEE alentó la participación de la Comisión
Católica Española de Migración en la conducción de los flujos peninsulares
hacia el exterior. La CCEM reflejaba y defendía los principios de la Exsul
Familia sobre la emigración, entendiéndola como un derecho natural del
hombre, pero supeditada al bien común del colectivo social. Como
afirmaba el Director de la CCEM, Monseñor Fernando Ferris: “Algo que
no puede perderse nunca de vista es que la emigración debe mirar al bien
del individuo, cuya libertad hay que respetar, siempre naturalmente que
el Bien Común no exija su sacrificio”.22 Monseñor Ferris también reconocía
los problemas suscitados por la emigración y clarificaba el papel que la
Iglesia estaba llamada a cumplir. En este sentido, mantenía que la
institución eclesiástica no podía fomentar la emigración, sino que debía
procurar que discurriera por cauces humanos y cristianos, evitando los
riesgos, previniendo peligros y remediando males acaecidos.23
Ahora bien, más allá de estos elementos doctrinarios subrayados,
la Iglesia en general y la CCEM en particular cumplieron un rol específico
dentro del fenómeno emigratorio hacia el exterior, a partir de la puesta
en marcha de los planes de reagrupación familiar. A continuación nos
detendremos en el funcionamiento de la CCEM, en vinculación con el
Secretaría de Estado de Su Santidad, art. cit., pp. 16 y 17.
Ángel Orbegozo (Publicista de la Oficina de Información y Estadística de la Iglesia),
“Organizaciones nacionales e internacionales para la solución de los problemas
migratorios”, en Semanas Sociales de España …, cit., p. 247.
22
Ultramar, Nº 9, junio de 1960, Oficina de América, La Coruña, s./p.
23
Ibidem.
20
21
294
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Plan de Reagrupación Familiar con ultramar, que es el que nos interesa
particularmente.
3. El papel de la CCEM dentro del
Plan de Reagrupación Familiar con ultramar
¿Por qué motivos la Comisión Católica Española de Migración quedó
a cargo de la implementación del Plan de Reagrupación Familiar con
ultramar, dentro de España? En primer lugar, dicho programa parecía
satisfacer uno de los fines planteados por la doctrina católica en materia
de migración: la estabilidad moral y social de los sujetos trasladados y del
resto de su familia. La reconstitución de los núcleos familiares era
visualizada como un mecanismo eficiente para lograr un estilo de vida
orientado por los principios éticos establecidos por la Iglesia. El IEE estaba
dispuesto a asumir los costos económicos de tales reagrupamientos (entre
otros, la disminución en las remesas enviadas por emigrados en ultramar),
o los culturales (la progresiva desvinculación de los emigrados de su
patria), en función del criterio de evitar la separación de las familias, que
era percibida como una situación perjudicial y engendradora de
innumerables males.24
En segundo lugar, debemos recordar que en la década de 1950 se
había producido un acercamiento entre el franquismo y los sectores
eclesiásticos que habían impulsado la implementación de un nuevo
modelo de desarrollo económico, con lo cual existían condiciones para
que los últimos fueran llamados a desempeñar un papel más importante
dentro de las políticas gubernamentales sobre migraciones, a través del
pedido de colaboración con el IEE.
En tercer lugar, la Iglesia española poseía una importante presencia
a nivel parroquial, con lo cual, estaba preparada para actuar de
articuladora entre la esfera pública y la población en general. En efecto,
hacia 1957 el delegado del CIME en España, el Sr. Storich, se manifestaba
asombrado por la eficacia con que la CCEM llevaba a cabo la tarea de
reagrupación familiar dentro de Galicia, y relacionaba estos resultados
positivos con el carácter de la organización eclesiástica peninsular y el
elevado grado de colaboración prestado por un gran número de sus fieles:
24
Carlos Ma. R. de Valcárcel (Director General del IEE), “Conferencia”, cit., p. 67; Instituto
de Estudios Políticos, Emigración: Política Social y seguridad social, Madrid, 1960, p. 21.
295
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
Esa red capilar de la Comisión llegando hasta las parroquias más pequeñas
es en verdad admirable. En ese viaje a Vigo también me llamó la atención
el ver a las señoritas de la mejor sociedad gallega preocupadas por cuidar
y atender a los emigrantes, con un cariño que sólo la caridad de estas
mujeres de auténtico espíritu cristiano vinculadas a las tareas de la CCEM
puede explicar. Este volcarse de la sociedad por los emigrantes no lo había
visto en ninguna parte. También me llamó la atención la diligencia con se
efectúan las localizaciones de las familias de los emigrados. Yo, que conozco
bien Galicia, sé que los pueblos son una serie de caseríos, alejados unos de
otros hasta kilómetros, y sin apenas vías de comunicación; en el centro o
en un extremo del valle está la iglesia. El localizar allí un apellido, que se
repite hasta el infinito en la comarca, es casi imposible; pues bien, estos
Delegados de la Comisión Católica lo han logrado.25
Para la puesta en marcha del Programa de Reagrupación Familiar,
la CCEM dispuso de sesenta y cuatro oficinas diocesanas, tres
provinciales, ocho de asistencia en puertos de embarque y una Oficina
Central en Madrid, todos ellas destinadas a preparar social y moralmente
al emigrante que deseaba partir.26 Además, unas 20.000 parroquias
españolas prestaron su colaboración. Los curas párrocos fueron
importantes en el desempeño de diversas tareas: la solución de problemas
en la documentación necesaria para que el reclamado pudiera partir, la
organización de la colecta anual que se llevaba a cabo en ocasión del
“Día del Emigrante” o la información y asesoramiento a los potenciales
migrantes, entre otras. También actuaron como intermediarios entre estos
últimos y sus familiares en ultramar.27 En efecto, como afirmó María
Emelina Martín Acosta, muchas veces las esposas de los emigrantes que
se encontraban en situación crítica en su tierra natal, por la falta de
recursos económicos, acudían al párroco, pidiéndole ayuda para localizar
a su marido en ultramar. El cura escribía entonces a la oficina de la
Comisión Episcopal de Madrid, informando del domicilio presuntivo
del emigrado. En la Comisión consultaban las listas de los párrocos de
“Entrevista con Mr. Storich, delegado del C.I.M.E. en España”, en Boletín Informativo de la
Comisión Católica Española de Migración, Nº 10, Abril-Junio de 1957, Madrid, p. 4.
26
Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración, Nº 11, Septiembre de 1957,
Madrid, pp. 8-10.
27
Para un trabajo de gran interés, sobre la acción de los sacerdotes como mediadores en el
proceso inmigratorio y en la inserción laboral de trabajadores friulanos en Villa Flandria,
en la Argentina, v. Mariela Ceva, “Los mediadores religiosos en la inmigración de
trabajadores friulanos a Villa Flandria en la segunda posguerra”, en Alicia Bernasconi y
Carina Frid (eds.), De Europa a las Américas. Dirigentes y liderazgos (1880-1960), (Colección
“La Argentina Plural”), Buenos Aires, Ed. Biblos, 2006, pp. 113-125.
25
296
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
las Diócesis americanas y enviaban una carta a aquel religioso que
supuestamente estaba próximo al emigrado, con el fin de que lo visitara
y lo convenciera de la necesidad de reagruparse con los suyos.28
Sin embargo, y más allá de cómo se gestara el “llamado”, el
Programa de Reagrupación Familiar suponía la sucesión de algunos
pasos formales: el emigrante instalado en América reclamaba a su/s
pariente/s en el Consulado español correspondiente (de manera
espontánea, o impulsado por el cura de su parroquia de procedencia y/
o resto de su familia, como acabamos de señalar). El Ministerio de
Asuntos Exteriores de Madrid entregaba las cartas de llamada recibidas
a la Oficina Central de la CCEM. Esta última trataba de conectarse con
los reclamados, a través de las Delegaciones diocesanas y de las
parroquias. El IEE, la Dirección General de Seguridad y las
representaciones diplomáticas de los países americanos en España debían
colaborar con la tramitación de la documentación, en especial, cuando
la obtención de esta última se tornaba compleja, en el caso de las mujeres
solas o con menores, que se trasladaban por el llamado de sus maridos,
padres u otros parientes. Una vez preparados para la partida, los
reclamados debían ser conducidos al puerto, recibiendo la adecuada
asistencia en lo referente al hospedaje y a los últimos trámites antes del
inicio del viaje. Las listas de los embarcados eran enviadas por avión al
puerto de destino, donde las Comisiones Católicas de Inmigración o los
capellanes de emigrantes estaban responsabilizados de conducir a los
recién llegados junto con sus familiares o conocidos, con el objeto de
favorecer su adaptación dentro de la nueva sociedad.29
En el caso argentino, la organización eclesiástica destinada a acoger
a estos inmigrantes enmarcados en el Plan de Reagrupación Familiar
era bastante débil o presentaba un incipiente desarrollo. En primer
término, la Comisión Católica Argentina de Inmigración (CCAI) fue
fundada en 1953 y recién a partir de 1962 comenzó a intervenir en el
traslado de españoles. Para el último año mencionado había facilitado
el desplazamiento de veinte peninsulares y había contribuído con el inicio
de los trámites migratorios de otros cincuenta. Como podemos apreciar,
28
29
Ma. Emelina Martín Acosta, cap. cit., p. 396.
“Plan de reagrupación de familias”, en Boletín Informativo de la Comisión Católica Española
de Migración, Nº 26, Diciembre de 1958, Madrid, p. 6.
297
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
estas cifras eran muy exiguas. La CCAI se encargaba principalmente de
la asistencia a refugiados que huían de los regímenes comunistas, como
los húngaros o yugoslavos, o de ofrecer préstamos para viajes, con la
intermediación de la Comisión Católica Internacional de Migración o
del Alto Comisionado de las Naciones Unidas.30 En segundo término,
en la época analizada no se han registrado misioneros españoles de
emigrantes en la Argentina. Las evidencias que disponemos para el año
1963 ponen de manifiesto que mientras que otras colectividades
extranjeras instaladas en nuestro país tenían una minoritaria presencia
de misioneros de su propia nacionalidad (por supuesto, insuficiente en
relación con el número total de emigrantes de la colectividad
correspondiente), la española carecía por completo de ellos.31 Esto
contrasta con el caso de otros países de destino de la emigración
peninsular, donde existían sacerdotes españoles dedicados a asistir a
los migrantes (en Brasil, por ejemplo, había nueve en 1968 y en Venezuela
o Australia, en el mismo año, dos).32 Esta débil estructura eclesiástica
destinada a acoger a los inmigrantes españoles no impidió sin embargo
que los peninsulares incluídos en el Plan de Reagrupación arribaran a
nuestro país y se integraran a su sociedad. Creemos que fueron
principalmente las familias y conocidos ya emigrados los que orientaron
y facilitaron el proceso de desplazamiento desde el ámbito de destino,
si bien en el espacio de partida otras organizaciones internacionales y
nacionales, laicas y religiosas, colaboraron con el mismo.
La participación en el Programa de Reagrupación Familiar suponía
ciertas ventajas económicas, para el emigrante. Por un lado, una reducción
en el coste del pasaje, que guardaba proporción con el grado de parentesco
Pbro. Antonio Orehar (Tesorero de la CCAI y Director Nacional de la Colectividad
Eslovena), “La obra de la C.C.A.I. y la Jornada de la Inmigración”, en Inmigración e
Integración, Terceras Jornadas de Estudio de la Comisión Católica Argentina de Inmigración,
Buenos Aires, 1964, pp. 54 y 55. Para un estudio preliminar sobre las tareas desempeñadas
por la CCAI en la segunda posguerra cfr. Daniela La Pietra y Abelardo Jorge Soneira,
“Iglesia y migraciones: un balance de 50 años. El caso de la Comisión Católica de
Migraciones (1951-2001)”, en X Jornadas sobre Alternativas Religiosas en América Latina, Buenos
Aires, 2000, disponible en: http://www.ceil-piette.gov.ar/areasinv/religion/relpub/
jornadas/IIcom1/1soneira.html.
31
P. Ernesto Milan (Secretario General de la CCAI), “El Apostolado inmigratorio en la
Argentina”, en Inmigración e Integración, cit., p. 52.
32
“Ultramar”, en Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración, s/Nº, 22 de
marzo de 1968, Madrid, p. 8.
30
298
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
existente entre el reclamado y el emigrado. Para ello, se establecieron tres
grupos de reclamados, que se beneficiaron en distinta medida con el
descuento.33 Por otro lado, la Comisión Internacional Católica de Migración
ofrecía un sistema de préstamos de viaje, que era gestionado por la CCEM.
El préstamo cubría alrededor del 75% del valor del billete. El resto lo ponía
el emigrante, quien debía devolver la cantidad que había recibido, sin
recargo ni interés, una vez instalado en el país de destino, a partir del
tercer mes de su llegada, y en dieciocho mensualidades.34 Según el balance
realizado por la CCEM, sobre la marcha de este sistema, desde comienzos
de 1957 y hasta el 31 de marzo de 1958, la distribución por países de
destino de estos préstamos arrojaba como resultado una preeminencia
de Brasil (38 emigrantes que se dirigieron a este último país se
beneficiaron de estos préstamos), seguido por Colombia (27), Venezuela
(25), Canadá (18), Argentina (13), Uruguay (11), Santo Domingo(5),
Chile(3), Perú (3) y Australia (2).35 El balance correspondiente al año
1961 dio como resultado un absoluto predominio de Brasil (1.084
préstamos), seguido por Canadá, Venezuela, Perú, Colombia, Australia,
Argentina (esta última, con 59 préstamos) y demás naciones. 36 Los
problemas de este sistema de financiamiento eran que, si bien como se
puede apreciar por las cifras comentadas, la cantidad de préstamos
otorgados tendió a aumentar con el transcurso del tiempo, los mismos
resultaban de cualquier modo insuficientes, en virtud de la demanda
existente. Por otra parte, la distribución de dichos fondos se restringía o
favorecía a determinados países de destino y categorías de migrantes,
es decir, no respondía a un criterio de repartición equitativa.37
Los del Grupo A (cónyuge del llamante, hijos menores de 18 años, hijos mayores de 18
años incapacitados para el trabajo, novias casadas por poder antes de embarcar) no debían
pagar nada. Los del Grupo B (padres del llamante, padres políticos, hijos mayores de 18
años, abuelos, nietos, hermanos huérfanos menores de 18 años, pupilos sometidos a la
tutela del llamante) abonaban en España 30 dólares, y los del Grupo C (otros parientes y
compañeros de profesión u oficio del reclamante), 50 dólares. En todos los casos, el
reclamante en ultramar debía pagar 40 dólares. Además, el CIME cobraba a todos los
varones emigrantes, comprendidos entre los 18 y 50 años, unos 10 dólares, que debían
abonarse en España. Cfr. “Plan de Reagrupación de Familias”, Boletín Informativo de la
Comisión Católica Española de Migración, Nº 22, agosto de 1958, Madrid, p. 6.
34
Ultramar, Nº 9, junio de 1960, Oficina de América, La Coruña, s./p.
35
“Préstamos de viaje”, en Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración,
Nº 18, abril de 1958, Madrid, p. 7.
36
“Préstamos de viaje concedidos a través de la Comisión Católica Española de Migración
en 1961”, en op. cit., Nº 64, febrero de 1962, Madrid, p. 10.
37
Ángel Orbegozo, art. cit., pp. 247 y 248.
33
299
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
Una última ventaja para los migrantes que se trasladaban a la
Argentina con intervención de la Comisión Internacional Católica de
Migración (y de las organizaciones nacionales asociadas a ella) consistía en
la exención del pago de derechos consulares, del mismo modo que ya se
procedía con las personas que se desplazaban al mencionado país, a través
del CIME.38 Tengamos en cuenta que desde 1953 la Argentina mantenía
con esta última institución programas de reagrupación familiar y de
atracción de mano de obra industrial y rural, cuyos principales beneficiarios
eran los italianos y españoles, con peso variable según los años.39
4. Los orígenes y destinos de los migrantes de la CCEM
En cuanto a las provincias de origen de los emigrantes españoles
acogidos al Plan de Reagrupación Familiar, contamos con la información
correspondiente a los embarques efectuados en 1959, como se puede
apreciar en el Cuadro 1 del Anexo. En este último también figuran las
salidas transoceánicas de españoles entre 1946 y 1958, según sus
provincias de procedencia, con el objeto de contrastar las áreas de origen
de los flujos más espontáneos que tuvieron lugar entre 1946 y 1958 y los
asistidos, que se desarrollaron en el marco del mencionado programa.
Si bien la comparación sugerida adolece de algunos problemas (en las
corrientes de 1946 a 1958 se contabilizaron los embarques hacia todos
los destinos y en las de 1959, sólo hacia las naciones americanas incluídas
en el Plan de Reagrupación Familiar;40 en el primer caso se trata de un
período y en el segundo, sólo de un año) nos permite esbozar algunas
conclusiones preliminares sobre la cuestión planteada.
En relación con los flujos desplegados entre 1946 y 1958, el mayor
número de migrantes era oriundo de Pontevedra, La Coruña, Santa Cruz
de Tenerife y Orense (en orden decreciente), mientras que en el caso del
Plan de Reagrupación del año 1959, la mayor parte procedía de Santa
Cruz de Tenerife, La Coruña, Pontevedra y Madrid (en orden también
Decreto Nº 14.549, 21 de noviembre de 1960. Cfr. AMAE, R 6220, Exp. 94, José María
Alfaro, “Exención pago derechos consulares”, Buenos Aires, 28 de noviembre de 1960.
39
Dirección Nacional de Migraciones de la Argentina (Buenos Aires), Estadística 1953-1971;
Idem, Inmigración, Año II, Nº 5, Buenos Aires, 1960.
40
Ello no modifica demasiado los parámetros de comparación, dado que entre 1946 y 1958
los principales destinos de la emigración española fueron los americanos.
38
300
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
decreciente). La coincidencia en la preeminencia de la provincia de
Canarias y las dos de Galicia resulta de gran interés. Por un lado,
recordemos que estas tres unidades jurisdiccionales poseían puertos de
embarque con una histórica vinculación con América. Por otro lado, la
CCEM había instalado en dichas provincias importantes servicios de
asistencia al emigrante y en particular, en los puertos de Vigo, La Coruña
y Santa Cruz de Tenerife (los otros puertos y aeropuerto en los que tenía
presencia la CCEM eran Barcelona, Cádiz, Las Palmas, Bilbao, Santander
y Barajas).41 El hecho de que el componente principal de las corrientes
asistidas se originara en áreas que ya tenían una larga tradición
emigratoria con destino a América, confirmaría que en realidad la
estructura de la CCEM se apoyó en las redes emigratorias preexistentes
y que su acción fue más eficiente justamente en las provincias donde las
salidas espontáneas había alcanzado una importante dimensión
numérica desde las primeras décadas del siglo XIX.
Dentro de Galicia, la distribución de los emigrantes del Plan de
Reagrupación Familiar, por provincias de origen, fue similar a la presentada
por los emigrantes de los flujos espontáneos examinados (un predominio
notorio de Pontevedra y La Coruña, seguidas por Orense y Lugo, en orden
decreciente –ver el Cuadro 1-). Ello estaría avalando una vez más la idea de
que en lo relativo a su procedencia, las corrientes asistidas de 1959
mantuvieron grandes líneas de continuidad con las de los años precedentes.
Desde 1956 y hasta 1965 la CCEM colaboró con el reagrupamiento
familiar de unos 67.498 españoles, que se dirigieron a los diferentes países
americanos beneficiados con el programa (Venezuela, Brasil, Argentina,
Uruguay, Colombia, Chile y Paraguay),42 según las cantidades consignadas
en el Cuadro 2. Como queda de manifiesto en este último, los destinos
que recibieron más migrantes del Plan de Reagrupación Familiar, a lo
largo de casi una década, fueron Venezuela y Brasil.43 Ahora bien, resulta
interesante señalar que los balances realizados en los primeros años de
este programa indicaron que la Argentina fue inicialmente el principal
espacio receptor de los embarcados (ver el Cuadro 3) lo que podría ser la
expresión de un fenómeno de reagrupación familiar que contó en una
Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración, Nº 11, septiembre de 1957,
Madrid, pp. 8-10.
42
Cabe aclarar que con el transcurso del tiempo, otros países quedaron incluídos de manera
más informal dentro del plan (por ejemplo: Panamá, Costa Rica y Ecuador).
41
301
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
primera etapa con un gran desarrollo en relación con nuestro país, para
luego fortalecerse en naciones como Venezuela y Brasil, al compás de
las variables condiciones económicas, sociales y políticas prevalecientes
en cada una de ellas.
5. Los gallegos que tramitaron su traslado a la Argentina
a través de la CCEM
Lamentablemente, hasta el momento desconocemos el número
exacto de inmigrantes gallegos que arribaron a nuestro país dentro del
Plan de Reagrupación Familiar gestionado por la CCEM. La
documentación que permitiría tener una idea aproximada de esta cantidad,
las fichas elaboradas por los curas párrocos españoles, sobre cada
individuo reclamado desde América,44 están dispersas (en distintos
organismos e instituciones) o desaparecidas, y además, sólo dan cuenta
de aquellos embarques programados (pero no necesariamente
concretados). Asimismo, la preocupación por sistematizar la información
contenida en estas fichas es relativamente reciente, en consonancia con el
hasta ahora limitado interés por las vinculaciones entre emigración e
Iglesia, dentro del ámbito peninsular.45 Contrariamente a lo ocurrido en
otros países emigratorios, como Italia, por ejemplo, la preocupación por
el papel de la Iglesia en el proceso emigratorio español aún no ha logrado
un amplio desarrollo, ni desde el lado de la sociedad de partida ni desde
los diferentes países de recepción. En relación con la acción particular de
la CCEM en la segunda posguerra, las investigaciones también son escasas:
disponemos de un trabajo que la considera en función de la relación entre
Por el momento no podemos reconstruir el número anual de españoles embarcados dentro
del Plan de Reagrupación Familiar, según los diferentes países de destino, por lagunas
existentes en las fuentes de información disponibles.
44
En el caso de Galicia, esas fichas debían ser enviadas a la Delegación Diocesana de Santiago
o a las oficinas provinciales de La Coruña o Pontevedra. V. Xosé Luís Mínguez Goyanes,
art. cit., pp. 164 y 165.
45
Una importante excepción a esta última tendencia comentada está dada por los trabajos de
Óscar Álvarez Gila. Cfr. de este autor: “Apuntes historiográficos para el estudio del clero
rioplatense”, Separata de Qué es la Historia de la Iglesia, XVI Simposio Internacional de Teología
de la Universidad de Navarra (Colección “Simposios Internacionales de Teología”, Nº 16),
Pamplona, 1996, pp. 387-396; Idem, “La vinculación entre clero e inmigración vasca en
Argentina: razones y formas”, en Hispania Sacra, Vol. 50, Nº 102, 1998, pp. 557-587; Idem,
“La emigración de clero secular europeo a Hispanoamérica (siglos XIX-XX): causas y
reacciones”, en Hispania Sacra, Vol. 53, Nº 108, 2001, pp. 559-576, entre otros.
43
302
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
la jerarquía eclesiástica y la emigración en Galicia y otro donde se la
examina en vinculación con la salida de canarios a la Argentina, a mediados
del siglo XX.46 De cualquier modo, consideramos que faltarían estudios
de mayor alcance, tendientes a examinar el funcionamiento de la CCEM
en un contexto más extenso, tomando en consideración distintos grupos
migratorios y diferentes destinos, con propósitos comparativos.
Sin embargo, y a un nivel documental, resulta de interés destacar
que el Arquivo da Emigración Galega (Santiago de Compostela) se ha
propuesto rescatar las fichas de la CCEM, al menos en lo relativo a los
emigrantes del noroeste hispánico, logrando hasta el momento recuperar
una copia de las fichas que se encontraban en la Oficina Provincial de La
Coruña. Esta fuente es muy valiosa, por los datos personales que aporta
sobre los reclamados desde distintos destinos americanos. A partir de
las fichas correspondientes a los gallegos llamados desde Argentina,
entre 1957 y 1963 (inclusive), hemos tratado de indagar algunos rasgos
socio-demográficos de un universo de 731 personas (muestra elegida al
azar). Se trata de sujetos que pretendían partir para nuestro país, aunque
no sabemos con certeza si en todos los casos lo hicieron finalmente.
Algunos de ellos aprovecharon los préstamos de viaje que ofrecían los
organismos católicos de emigración, mientras que otros se beneficiaron
con los descuentos en los pasajes, característicos del Plan de
Reagrupación Familiar, ya comentados anteriormente. De cualquier
modo, se dificulta conocer con exactitud las proporciones de los
comprendidos en cada una de estas dos situaciones.
Si nos concentramos en el conjunto indagado, podemos afirmar
que la mayoría estaba constituído por mujeres (61%) y el resto por
varones (39%). Este predominio del componente femenino estaba
vinculado con el mecanismo básico que sustentaba el Programa de
Reagrupación Familiar (los “llamados”, como ya hemos visto). Los
parientes que predominaron en la realización de estos reclamos fueron
los padres, hermanos, cónyuges e hijos (en orden decreciente), en
especial, los de sexo masculino (Ver el Cuadro 4). Cabe destacar que el
caso gallego se diferencia del español en general, donde los llamados
eran efectuados por hijos, cónyuges, hermanos y padres (en orden
46
Xosé Luís Mínguez Goyanes, art. cit., pp. 127-169; Ma. Emelina Martín Acosta, cap. cit.,
pp. 391-401.
303
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
decreciente).47 Sería de interés indagar si la emigración asistida de fines
de la década de 1950 se articuló principalmente con los flujos de los
años posteriores a la Segunda Guerra Mundial o con los anteriores al
desencadenamiento de la Guerra Civil Española. Por el momento nos
inclinamos a suponer que un gran número de los padres reclamantes de
los gallegos analizados podría haber arribado en la inmediata posguerra.
Las proporciones de casados y solteros eran iguales, en el grupo de
emigrantes gallegos de ambos sexos examinado (46% en cada caso), siendo
el porcentaje de viudos mucho menor (8%). Entre los españoles de ambos
sexos, reclamados desde Argentina en 1959, eran más numerosos los solteros
(52%), seguidos por los casados (41%) y los viudos (7%). El elevado
porcentaje de casados entre los gallegos, arriba señalado (46%), constituye
la expresión de un flujo asistido que involucraba el reagrupamiento de
familias, sobre la base de la existencia de una red bastante densa de familiares
y conocidos ya establecidos en nuestro país. La comparación con la
composición por estado civil de las corrientes gallegas de entreguerras,
donde no operaban mecanismos impersonales de fomento de las
reagrupaciones familiares y donde los casados de ambos sexos alcanzaban
sólo al 38%, permitiría reforzar la idea anteriormente esbozada.48
En cuanto a las edades, en los flujos asistidos de 1957 a 1963 tuvo
mayor peso el grupo comprendido entre los 15 y 29 años (ver el Gráfico
2). Sin embargo, si comparamos la composición por edades de estas
corrientes tardías, en contraste con las más tempranas de 1924 (Cuadro
5), comprobaremos que la proporción de los jóvenes de 15 a 29 años en
los flujos asistidos era mucho menor que en el caso de los espontáneos,
al tiempo que en estos últimos el porcentaje de niños y ancianos era
bastante más bajo que en los primeros.
Para el caso español que comentamos en este párrafo y en otros subsiguientes, nos basamos
en la información disponible, correspondiente al año 1959 (Cfr. Ministerio de Trabajo,
Memoria de la labor realizada en 1959, cit., pp. 46 y 47). Si bien la comparación entre el caso
gallego y el español adolece de limitaciones (se fundamentará en datos de un período para los gallegos- y de un año -para los españoles-), creemos de interés aludir a algunas
conclusiones provisorias que se desprenden de la misma.
48
El dato presentado se obtuvo a partir del estudio de 973 inmigrantes gallegos que ingresaron
a la Argentina en el primer trimestre de 1924, a partir de la información que contiene la
“Base de Datos” del Centro de Estudios Migratorios Latinoamericanos (Buenos Aires,
Argentina). En los párrafos que siguen, cuando hagamos referencia a los inmigrantes de
1924, aludiremos siempre a los datos suministrados por esta “Base de Datos”. Agradecemos
a Alicia Bernasconi por facilitarnos la consulta de la misma.
47
304
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Más de la mitad de los gallegos reclamados entre 1957 y 1963 (63%)
desempeñaban en su tierra natal actividades de tipo primario (en
especial, se reconocían como “labradores”, “agricultores” o “marineros”)
y un 27% podrían ser clasificados como artesanos y operarios (en este
grupo predominaban las “modistas”, “costureras”, “carpinteros” y
“mecánicos”). La importante proporción de migrantes dedicados a tareas
de índole primaria también estuvo presente entre los gallegos de 1924 y
dentro de otro conjunto de gallegos examinado por nosotros, arribado a
la Argentina en los primeros trimestres de 1949 y 1950, con porcentajes
que alcanzaron al 58%, en el primer caso, y 57%, en el segundo, lo que
sugeriría importantes continuidades en cuanto a la inserción socioprofesional de los universos de migrantes indagados.49
En relación con los destinos hacia los cuales pensaban dirigirse
los gallegos que tramitaron su traslado a través de la CCEM,
prevalecieron la Capital Federal y la Provincia de Buenos Aires (de
manera conjunta acapararon el 97% de los migrantes en consideración)
(Cuadro 6). En general, los destinos declarados de estos gallegos
coincidían con los de los reclamantes. Dentro de la Provincia de Buenos
Aires, los ámbitos de mayor atracción fueron los Partidos del Conurbano
Sur, en especial, Avellaneda y Lanús. Recordemos que, según los estudios
de Ruy Farías, Avellaneda (que antiguamente incluía a Lanús) poseía
una larga tradición como espacio de asentamiento de los inmigrantes
del noroeste hispánico, que se puede remontar a fines del siglo XIX.50
Ninguno de los otros Partidos del Conurbano o del resto de la Provincia
de Buenos Aires alcanzaron un peso tan importante, como Avellaneda
y Lanús. El papel de la Capital Federal y la Provincia de Buenos Aires
como destinos preferenciales también fue constatado en el caso de los
flujos gallegos de principios de 1949 y de 1950, donde ambas
jurisdicciones absorbieron conjuntamente el 96% de los 928 inmigrantes
Para el examen de los gallegos llegados a la Argentina en los primeros trimestres de 1949
y 1950 (ver también el párrafo que sigue) empleamos los libros de desembarco, que
actualmente se encuentran en el Archivo General de la Nación (Argentina).
50
Entre 1890 y 1930 los gallegos constituían alrededor del 70% de los españoles establecidos
en Avellaneda. V. Ruy Farías, “Peones, obreros y jornaleros: patrones de asentamiento e
inserción socioprofesional de los gallegos en Avellaneda y Lanús, 1890-1930”, en Idem
(comp.), Buenos Aires Gallega. Inmigración, pasado y presente, Temas de Patrimonio Cultural
Nº 20, Buenos Aires, Comisión para la Preservación del Patrimonio Histórico Cultural de
la Ciudad de Buenos Aires, 2007, pp. 83-90.
49
305
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
examinados. Esta localización urbana o semi-urbana, en la ciudad de
Buenos Aires o en ámbitos próximos a la misma, entraba en tensión con
uno de los objetivos que había orientado la política migratoria de los
gobiernos argentinos desde la Segunda Guerra Mundial (y que tenía
sus raíces en ideas de la élites dirigentes del siglo XIX): la canalización y
arraigo de la inmigración en el agro. En efecto, a partir de 1946, y más
fuertemente a comienzos de la década del cincuenta, el peronismo se
preocupó por estimular la inmigración que pudiera insertarse en tareas
agropecuarias, además de aquella compuesta por técnicos y obreros
especializados para la actividad industrial.51 Esta inclinación por la
inmigración con destino rural perduró luego de la caída de Perón, lo
que pone en evidencia que los procesos de reagrupación familiar no
siempre satisficieron todos los principios o prioridades establecidos en
las políticas migratorias argentinas de la época.
6. Conclusiones
El último ciclo de la emigración gallega a la Argentina comenzó
tras el fin de la Segunda Guerra Mundial y se cerró de manera paulatina
en los primera mitad de 1960. En una etapa inicial, la recuperación de
las corrientes del noroeste hispánico hacia el exterior se basó
principalmente en la fuerza de los mecanismos de traslado espontáneos,
en especial, la reactivación de cadenas migratorias que habían
permanecido adormecidas durante los prolongados años de
enfrentamientos bélicos (la Guerra Civil española y la Segunda Guerra
Mundial). Pero desde mediados de la década de 1950 empezaron a cobrar
fuerza los mecanismos de asistencia impersonales, sustentados
formalmente en el estímulo estatal y en el accionar de instituciones
internacionales y nacionales, laicas y religiosas.
En efecto, a partir de 1956 el gobierno franquista delegó en el
Instituto Español de Emigración (que luego fue adscripto al Ministerio
de Trabajo) la tarea de estudiar y fomentar los flujos hacia el exterior, en
el marco de la implementación de políticas económicas de desarrollo
51
En 1952 se llegó a establecer que a partir del 22 de febrero de ese año no se concederían
permisos de ingreso a la República, a aquellos recién llegados que quisieran radicarse dentro
de un radio de cien kilómetros de la Capital Federal (a excepción de los parientes en primer
grado que vinieran a integrar núcleos familiares o trabajadores especializados que arribaran
con un contrato y garantías de colocación). Decreto Nº 3.721, 22 de febrero de 1952.
306
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
que atribuyeron nuevas funciones a las salidas de personas y a la
movilidad humana en general. El IEE se apoyó en la CCEM para llevar
a cabo los planes de reagrupación familiar acordados con el CIME, dado
que existían condiciones ideológicas y políticas que favorecieron por
primera vez un acercamiento formal entre una institución gubernamental
y otra religiosa, con el fin de asistir y canalizar las corrientes hacia
ultramar. Detrás de la declarada preocupación por los aspectos morales
y espirituales involucrados en la lógica de reagrupamiento familiar se
escondían motivos económicos más profundos, que condujeron al IEE a
depositar en la CCEM la responsabilidad de llevar adelante el programa
en cuestión. La última institución mencionada cumplió de manera eficaz
con el cometido encomendado, valiéndose de la red capilar de las
parroquias, que fueron el espacio privilegiado de su actuación.
A partir del análisis del papel desempeñado por la CCEM en el
ámbito gallego hemos comprobado que, más allá de la intervención formal
de los poderes públicos y eclesiásticos en el proceso emigratorio, el mismo
se siguió apoyando en gran medida en la vitalidad de los lazos establecidos
entre el emigrado y sus familiares y conocidos en el noroeste hispánico.
De allí que la emigración asistida adquiriera una dimensión numérica
mayor en las provincias donde la espontánea ya tenía un amplio desarrollo,
por condiciones geográficas (cercanía a la costa y a los puertos) o históricas
(larga tradición de vinculaciones con ultramar, motivada en factores
económicos, sociales y culturales). Una vez más, los flujos hacia América,
esta vez canalizados por el Estado y la Iglesia, se vertebraron en función
de las redes primarias transoceánicas preexistentes.
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307
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
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308
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y características cuantitativas, (Colección “Cruzar el Charco”), Colombres,
Fundación Archivo de Indianos, 1994.
309
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
ANEXO
Gráfico 1: Emigración española transoceánica y hacia la Argentina (1946-1965)*
* En el período analizado, se entiende por “emigración transoceánica” la que se dirige a América.
Fuente: César Yáñez Gallardo, La emigración española a América (S XIX y XX). Dimensión y
características cuantitativas, (Colección “Cruzar el Charco”), Colombres, Fundación Archivo de
Indianos, 1994, pp. 37, 38 y 76 (Nos basamos en las cifras de las estadísticas españolas que brinda
este autor y no en las argentinas).
Cuadro 1: Distribución provincial de la emigración española, luego de la
Segunda Guerra Mundial
Provincias de Emigración
origen de los transoceánica
emigrantes
(1946-1958)
Porcentajes Emigración Porcentajes
Oficinas de la
del total
dentro del
del total
CCEM en puertos
(Columna 2) P.R.F. (1959) (Columna 4)
o aeropuertos
Santa Cruz de
Tenerife
63.373
11,2%
2.016
20,1%
Puerto
Pontevedra
84.092
14,9%
1.351
13,5%
Puerto
La Coruña
83.592
14,8%
1.317
13,2%
Puerto
Madrid
27.406
4,9%
658
6,6%
Aeropuerto
Orense
55.713
9,9%
564
5,6%
—-
Barcelona
48.427
8,6%
505
5,0%
Puerto
Las Palmas
6.141
1,1%
489
4,9%
Puerto
310
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Oviedo
30.562
5,4%
326
3,3%
—-
Lugo
35.368
6,3%
317
3,2%
—-
León
10.170
1,8%
307
3,1%
—-
Granada
9.273
1,6%
267
2,7%
—-
Valencia
12.000
2,1%
163
1,6%
—-
Málaga
6.693
1,2%
154
1,5%
—-
Santander
6.508
1,2%
136
1,4%
Puerto
Almería
8.394
1,5%
130
1,3%
—-
Sevilla
3.179
0,6%
107
1,1%
—-
Salamanca
3.988
0,7%
106
1,1%
—-
Zaragoza
3.975
0,7%
88
0,9%
—-
Vizcaya
13.185
2,3%
87
0,9%
Puerto
Alicante
3.900
0,7%
85
0,8%
—-
Burgos
3.063
0,5%
70
0,7%
—-
La Rioja
3.597
0,6%
55
0,5%
—-
Albacete
536
0,1%
54
0,5%
—-
Córdoba
1.512
0,3%
52
0,5%
—-
Guipúzcoa
4.751
0,8%
51
0,5%
—-
Murcia
2.484
0,4%
50
0,5%
—-
Cádiz
2.783
0,5%
46
0,5%
Puerto
Baleares
6.614
1,2%
45
0,4%
—-
Tarragona
1.658
0,3%
45
0,4%
—-
Valladolid
1.230
0,2%
41
0,4%
—-
Zamora
4.051
0,7%
37
0,4%
—-
Navarra
4.331
0,8%
36
0,4%
—-
Lérida
1.228
0,2%
30
0,3%
—-
Jaén
1.057
0,2%
26
0,3%
—-
Cáceres
911
0,2%
25
0,2%
—-
Palencia
762
0,1%
20
0,2%
—-
Toledo
593
0,1%
19
0,2%
—-
Ciudad Real
504
0,1%
18
0,2%
—-
Ávila
743
0,1%
15
0,1%
—-
Guadalajara
326
0,1%
14
0,1%
—-
Huelva
328
0,1%
13
0,1%
—-
Huesca
440
0,1%
12
0,1%
—-
311
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
Soria
783
0,1%
12
0,1%
—-
Gerona
1.283
0,2%
11
0,1%
—-
Badajoz
486
0,1%
9
0,1%
—-
Teruel
606
0,1%
9
0,1%
—-
Álava
835
0,1%
7
0,1%
—-
Cuenca
218
0,0%
7
0,1%
—-
Segovia
221
0,0%
4
0,0%
—-
Castellón
657
0,1%
3
0,0%
—-
564.530
100,0%
10.009
100,0%
—-
Total
Fuentes:
Columna 2: Salvador Palazón Ferrando, Capital humano español y desarrollo económico latinoamericano.
Evolución, causas y características del flujo migratorio (1882-1990), Valencia, Institut de Cultura “Juan
Gil-Albert”, 1995, p. 295.
Columna 4: Ministerio de Trabajo, Memoria de la labor realizada en 1959, Libro IV, Instituto Español
de Emigración, Madrid, 1960, p. 48.
Cuadro 2: Personas trasladadas dentro del Plan de Reagrupación Familiar,
según países de destino (1956-1965)
Países de destino
Nº personas reagrupadas
Venezuela
24.344
Brasil
18.588
Argentina
15.259
Uruguay
6.037
Colombia
1.630
Chile
1.331
Paraguay
171
Panamá
78
Costa Rica
55
Ecuador
Total
5
67.498
Fuente: “Reagrupación familiar en ultramar”, en Boletín Informativo de la Comisión Católica Española
de Migración, Nº 109, Marzo-Abril de 1966, Madrid, p. 7.
312
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Cuadro 3: Personas trasladadas dentro del Plan de Reagrupación Familiar,
según países de destino (1956-1959)
Países de destino
Nº personas reagrupadas
Nº familias reagrupadas
Argentina
10.626
4.938
Venezuela
9.004
4.331
Brasil
7.335
3.800
Uruguay
3.129
1.441
Colombia
677
379
Chile
559
293
Paraguay
79
33
Costa Rica
3
2
31.412
15.217
Total
Fuente: “Resumen del Plan R. F.”, en Boletín Informativo de la Comisión Católica Española de Migración,
Nº 39, Enero de 1960, Madrid, p. 7.
Cuadro 4: Parentesco del reclamante en la Argentina con el reclamado en Galicia
o en España en general (Plan de Reagrupación de Familias)
Españoles reclamados (1959)
Reclamantes
Gallegos reclamados (1957-1963)
Nº
%
Nº
%
Padres
251
16%
210
30%
Hermanos
291
19%
158
23%
Cónyuges
341
22%
119
17%
Hijos
377
24%
90
13%
Otros
303
19%
125
18%
Total
1.563
100%
702
100%
Fuentes:
Columna 2: Ministerio de Trabajo, Memoria de la labor realizada en 1959, Libro IV, Instituto Español
de Emigración, Madrid, 1960, p. 46.
Columna 4: Arquivo da Emigración Galega, Fichas de la Comisión Católica Española de Migración
de La Coruña, 1957-1963.
313
Los mecanismos de asistencia oficial en el último ciclo de las migraciones... / Nadia A. De Cristóforis
Gráfico 2: Distribución por edades de 704 migrantes gallegos (de ambos sexos)
que tramitaron su traslado a la Argentina a través de la CCEM (1957-1963)
Fuente: Arquivo da Emigración Galega, Fichas de la Comisión Católica Española de Migración de
La Coruña, 1957-1963.
Cuadro 5: Distribución por edades de los gallegos de ambos sexos, arribados a
la Argentina de manera espontánea (1924) o que tramitaron su traslado por la
CCEM (1957-1963)
Gallegos “espontáneos”
(1er. trimestre 1924)
Grupos de edades
Gallegos “asistidos”
(1957-1963)
Nº
%
Nº
%
0-14
100
9%
217
31%
15-29
585
55%
255
36%
30-44
259
24%
113
16%
45-59
104
10%
70
10%
60 y +
Totales
14
1%
49
7%
1.062
100%
704
100%
Fuentes:
Columna 2: Base de Datos del CEMLA.
Columna 4: Arquivo da Emigración Galega, Fichas de la Comisión Católica Española de Migración
de La Coruña, 1957-1963.
314
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
Cuadro 6: Destinos declarados de 697 migrantes gallegos que tramitaron su
traslado a la Argentina a través de la CCEM (1957-1963)
Destinos
Capital Federal y Pcia. Bs. As.
Destinos deslindados
%
4
394
21
201
41
17
0,6%
56,5%
3,0%
28,8%
5,9%
2,4%
Córdoba
1
0,1%
Rosario
11
1,6%
Entre Ríos
3
0,4%
Mendoza
2
0,3%
Santa Cruz
2
0,3%
697
100,0%
Total
Capital Federal
Buenos Aires*
GBA Norte**
GBA Sur
GBA Oeste
Resto Pcia. Bs. As.
Nº emigrantes
* Resulta imposible discernir si se trataba de la Capital Federal o la Provincia de Buenos Aires.
** GBA: Gran Buenos Aires.
Fuente: Arquivo da Emigración Galega, Fichas de la Comisión Católica Española de Migración de
La Coruña, 1957-1963.
315
Elites, políticos e instituições políticas:
o Estado Novo no Brasil, de novo
Adriano Codato*
O título deste capítulo merece, antes de qualquer coisa, uma explicação preliminar. Por que o Estado Novo “de novo”? Porque acredito
que seja necessário e urgente voltar ao estudo desse subperíodo da história política nacional para compreender mais e melhor um ponto capital
do processo de transformação capitalista do Brasil: a reestruturação do
universo das elites – políticas, econômicas, ideológicas e sociais – na
primeira metade do século XX. Dados os paralelismos óbvios e as afinidades ideológicas entre as elites intelectuais do Brasil e da Argentina
entre os anos 1920 e 1940 (que envolvem os diagnósticos sobre a crise, as
alternativas aventadas, as representações da nação, a imagem projetada
de si etc.)1, este texto deve servir também como um roteiro resumido de
questões que podem ser postas à historia e à historiografia argentina a
título de comparação.
Essa volta ao Estado Novo sugerida aqui tem a ver com a necessidade de recuperar a dimensão histórica dos estudos políticos. Esse programa de pesquisa não é um projeto puro e simples de combate ao presentismo da Ciência Política nacional, nem um apelo contra o quantitativismo, ora dominante nas Ciências Sociais brasileiras. Na realidade, o
que se pretende, neste curto ensaio, é enumerar alguns princípios interpretativos geradores de novas hipóteses de pesquisa. Trata-se, em resumo, de recombinar alguns elementos – conhecidos e desconhecidos –
* Programa de Pós-graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná (UFPR);
doutor em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
1
Ver, em especial, José Luis Bendicho Beired, Sob o signo da nova ordem: intelectuais autoritários
no Brasil e na Argentina. São Paulo: Edições Loyola, 1999; e Tulio Halperin Donghi, La
Argentina y la tormenta del mundo: ideas e ideologías entre 1930 y 1945. Buenos Aires: Siglo
XXI, 2004.
316
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
para recriar uma nova agenda de pesquisas orientadas empiricamente e
que possa servir de base para relevar semelhanças e diferenças entre a
história política brasileira e a história política argentina.
Este ensaio está organizado em quatro partes. Na primeira, destaco o que me parece um ponto cego importante nas análises tradicionais
sobre as transformações do capitalismo no Brasil: o papel e o lugar dos
políticos profissionais. Esse tópico tem a ver não apenas com as óbvias
modificações ocorridas no campo político no pós-1930, com a redefinição de mandantes e mandados, mas constitui (ou melhor: pode constituir) uma porta de entrada útil para entender as mudanças no próprio
campo do poder. Daí o seu principal interesse.
Na seqüência, isolo o que me parecem ser duas variáveis chave
para toda essa discussão: a organização burocrática do regime ditatorial e,
aí dentro, a questão, já bem discutida, da representação formal de interesses. O caso é que esses dois assuntos e principalmente a relação entre
eles foram tematizados em função apenas de dois agentes sociais “fundamentais”: os trabalhadores urbanos e os empresários industriais. Elaboro uma explicação sobre por que os políticos profissionais, tão importantes no regime anterior (1889-1930), sumiram do mapa – da historiografia e da sociologia, não da História.
Na terceira parte deste ensaio lembro que as soluções corporativistas e clientelistas, em oposição ao liberalismo oligárquico como o método
usual de solução de conflitos políticos e agregação e expressão de interesses e sociais durante a República Velha, não resolvem, por si só, a
questão mais delicada que é a de que fazer enfim com as antigas e outrora influentes classes políticas regionais.
A última seção do ensaio enfatiza a existência de uma pluralidade
de aparelhos político-burocráticos, construídos para fazer frente, ou viabilizar, a presença e a participação de diferentes grupos de elite. Eles
estão na origem da mudança, decisiva, dos critérios de recrutamento
para a constituição da nova elite estatal que deve comandar o processo
de construção do Estado nacional no Brasil depois de 1930. Nas conclusões, proponho a retomada de uma agenda de pesquisa e um método
mais adequado a ela e aos temas aqui discutidos.
317
Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil, de novo / Adriano Codatto
I. Campo do poder e fundamentos do poder
Ninguém ignora que entre os anos 1930 e 1945, grosso modo, houve
uma redefinição da hierarquia entre os grupos dominantes (elites agrárias, industriais, comerciais), redefinição essa que repercutiu inclusive e
principalmente sobre a “classe política” brasileira. É suficiente recordar
aqui três acontecimentos, mais ou menos simultâneos, que tiveram uma
influência direta sobre o ordenamento dos políticos de carreira e da sua
carreira política. Em primeiro plano, a substituição das lideranças tradicionais, graças à ascensão dos “revolucionários” de 1930; como conseqüência dessa troca, o processo de nacionalização das forças políticas,
que concluiu o ciclo dos partidos políticos regionais e pôs fim à hegemonia inconteste do Partido Republicano Paulista. Isso se deu em meio
à transformação do Estado federal num Estado “forte” (isto é, com grande
capacidade de intervenção na economia e na sociedade), graças à constituição de um aparelho de poder centralizado.
Esses eventos, resumidos bruscamente aqui, tiveram um alcance
maior do que se imagina. Houve, em grande medida, não só uma modificação da posição dos atores no campo político, mas uma metamorfose
do próprio campo do poder2. Da mesma maneira, houve não só uma mudança da ideologia política dominante (do liberalismo oligárquico para
o estatismo autoritário), mas dos fundamentos do poder (recursos políticos, predicados sociais, capacidades econômicas), o que terminou por
alterar mesmo os princípios de legitimidade e os modos de operação do
sistema político.
Há, todavia, um ponto cego na literatura sobre “os anos Vargas” e
em especial sobre essa fase do “período populista” (1930-1964). Poucos
trabalhos acadêmicos se dedicaram a estudar as elites políticas e, especialmente, analisar de maneira mais detida o papel e o lugar dos políticos
2
O campo do poder é a fração do espaço social global composta pelas formas mais eficazes
(“dominantes”) de capital. É um artifício teórico para diferenciar os tipos dominantes de
capital. Os capitais que formam o campo do poder variam historicamente em função da
história e o estado das relações de força entre as espécies de capital (e por derivação, entre
as classes relativas a tais capitais). Por isso, qualquer definição que postule que “o campo
do poder é formado pelos capitais x, y, z” é falsa. O campo do poder não passa de um
artifício teórico para esclarecer melhor a estrutura do topo da pirâmide social. Já o campo
político corresponde estritamente aos espaços sociais onde opera e é eficaz o capital
propriamente político. Ver, entre outras referências, Pierre Bourdieu, La noblesse d’État:
grandes écoles et esprit de corps. Paris: Les Éditions de Minuit, 1989, p. 371 e segs.
318
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
profissionais no processo de transformação capitalista da sociedade brasileira.
Além de tudo, o assunto mais geral que serve de moldura e viabiliza
esse processo – as transformações político-institucionais do Estado e do
regime depois de 1930 e durante o Estado Novo – está faz um bom tempo fora da agenda de pesquisas da Ciência Política e da Sociologia Política brasileiras. A idéia corrente é que se trata de um tema já suficientemente debatido pela Historiografia e (aparentemente) esgotado.
Voltemos ainda que por um momento à história política do período.
II. A historiografia, a história e os políticos de profissão
Na cerimônia de instalação da Assembléia Constituinte, em 15 de
novembro de 1933, Getúlio Vargas leu um volumoso relatório administrativo. Aí se incluíam os gastos dos Ministérios da Guerra e da Viação,
o dispêndio anual com as compras de café, a reestruturação da ferrovia
Central do Brasil, a questão dos limites de fronteira, as obras contra as
secas, e por aí afora. Antes de revisar os prodígios do Governo Provisório (1930-1934), o redator julgou que seria adequado enfeitar o texto com
um tratado de história política do Brasil, um balanço sobre a conjuntura
pós-revolucionária e uma aula sobre “O Estado moderno”. Ao abordar
o assunto do recém editado Código Eleitoral, uma antiga reivindicação
dos “revolucionários” de 1930, o Presidente lembrou o seguinte:
A composição do Estado, como aparelho político e administrativo, pressupõe, nos regimes democráticos, a legitimidade da representação popular. Conhece-se, sobejamente, em que consistia essa representação,
antes do movimento revolucionário [de 1930]: alistamento inidôneo, eleições falsas e reconhecimentos fraudulentos. Ora, o que legitima o poder é o
consentimento dos governados; logo, onde a representação do povo falha,
este poder será tudo, menos órgão legal da soberania da Nação3.
Esses tópicos – a estrutura do Estado, o caráter do regime, o tipo de
legitimidade –, reunidos no capítulo da reorganização política do País,
serão o assunto imprescindível dos anos trinta no Brasil e as variações
quanto ao modo de medir o “consentimento dos governados”, ou me-
3
Getulio Vargas, Mensagem lida perante a Assembléia Nacional Constituinte, no ato de sua
instalação, em 15 de novembro de 1933. In: ______. A nova política do Brasil. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1938, vol. III: A realidade nacional em 1933; Retrospecto das realizações do
governo (1934), p. 28-29; grifos meus.
319
Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil, de novo / Adriano Codatto
lhor, de dirigir a participação dos chefiados, desde as elites até as massas, será a paixão dos protagonistas e dos cientistas da política dessa
época. Tanto é assim que tanto a história política quanto a história das
idéias políticas do primeiro governo Vargas (1930-1945) têm como base
terapias institucionais e reformas constitucionais fundamentadas em uma
série de objetivos comuns entre ideólogos e a nova classe dirigente. Era
mais do que urgente organizar a Nação, orientar o Povo, fortalecer o
Estado e desenvolver o País. Nesse sentido, o Estado Novo, o regime
que enfim viabilizou esses propósitos, não foi certamente a realização
plena de uma idéia, mas seu figurino não ficou muito distante das aspirações práticas dos teóricos do autoritarismo4.
Da engenharia política que resultou desse encontro entre os novos agentes políticos e intérpretes do Brasil nos anos 1930 e 1940, dois
pontos são mais relevantes e constituem o ponto de partida da minha
discussão: a organização institucional do regime ditatorial e, dentro dela,
a questão política e ideológica da representação de interesses em contextos “não democráticos”.
As duas variáveis – instituições e interesses – estão conectadas. A
estrutura do regime (mais do que suas práticas “informais”) condiciona, em sentido amplo, as formas e os mecanismos de representação. Essas variáveis, por sua vez, impõem, de maneira estrita, os parâmetros
do programa – em grande parte improvisado, diga-se – de recrutamento e remanejamento de indivíduos e grupos no universo das elites políticas, alterando tanto sua hierarquia, quanto sua ecologia, isto é, suas
relações com o meio ambiente político.
A primeira relação causal (entre a forma do regime e o modo de
representação de interesses) já foi bem estudada pela Sociologia Política
e pela História Política brasileiras. Contudo, a maioria das análises dedicou-se a explicar o comportamento político e a estrutura que molda
esse comportamento de dois agentes sociais, apenas: os trabalhadores
urbanos, controlados pela estrutura sindical oficial e/ou pelo populismo presidencial, e os empresários industriais, submetidos a formas “corporativistas” de representação de interesses5. Como o Estado Novo já
Para essa constatação, ver, entre outros, Daniel Pécaut, Os intelectuais e a política no Brasil:
entre o povo e a nação. São Paulo: Ática, 1990, p. 46 e segs.
5
Para uma discussão abrangente desse tópico, ver Maria Antonieta P. Leopoldi, Política e
interesses: as associações industriais, a política econômica e o Estado na industrialização
brasileira. São Paulo: Paz e Terra, 2000.
4
320
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
foi, sintomaticamente, assimilado a um regime político sem política (a
opinião é de Thomas Skidmore6) e, por dedução, sem políticos (exceto
aqueles que gravitavam em torno do Presidente e que faziam, por suposto, a política da Presidência), a ausência dos mecanismos liberais de
representação de interesses (partidos, eleições, parlamentos etc.) dissimulou o lugar e o papel da “classe política” sem que ela tivesse, todavia, sido anulada ou houvesse simplesmente desaparecido7. Como conseqüência, os políticos profissionais tornaram-se ora invisíveis, ora secundários, ora importantes apenas porque integravam, através das Interventorias Federais nos estados, um esquema político cujo objetivo e
meios os ultrapassavam intencionalmente: a nacionalização das estruturas de dominação através da centralização do poder executivo no Executivo federal.
O sumiço dos políticos de carreira dos estudos políticos é um assunto em si mesmo. Por que essa percepção? Basicamente por dois motivos, arrisco. Em primeiro lugar porque a tentação mais comum é a de
assimilar “política” à “política democrática”, esta definida restritivamente como “competição eleitoral”. Em segundo lugar porque se preferiu
acreditar que durante esse período a “administração” de uma burocracia em vias de se profissionalizar substituiu a “política” dos grupos de
interesse.
Focado nas classes fundamentais, esse ponto de vista não deixa de
ser curioso, já que a historiografia política do período 1930-1937 (ou
mesmo do período 1937-1945) foi durante bom tempo, e em grande parte, uma crônica tradicional dos acontecimentos políticos tradicionais,
reduzidos a alguns personagens políticos, ou “atores”, e a suas ações/
opções “estratégicas”. Testemunha disso são os vários estudos descritivos e os ensaios políticos sobre esse intervalo de tempo. Refiro-me aqui
aos trabalhos, muitíssimo bem documentados, de Hélio Silva e Edgard
Carone, mas também aos ensaios clássicos de Virginio Santa Rosa (O
Ver, para a fundamentação dessa opinião, Thomas E. Skidmore, Brasil: de Getúlio Vargas
a Castelo Branco, 1930-1964. 10ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992, p. 61-62.
7
Em seu depoimento ao CPDOC, o ex-deputado do PSD pernambucano e ministro da
Agricultura do governo Café Filho, José da Costa Porto, ressalta “uma coisa curiosa” e que
freqüentemente não tem chamado a atenção dos analistas: “o golpe de 10 de Novembro
acabou com a política mas não podia acabar com as lideranças políticas. As lideranças
continuaram”. Valentina da Rocha Lima (coord.), Getúlio: uma história oral. 2ª. ed. Rio de
Janeiro: Record, 1986, p. 135.
6
321
Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil, de novo / Adriano Codatto
sentido do tenetismo), Barbosa Lima Sobrinho (A Verdade Sobre a Revolução
de Outubro de 1930), José Maria Bello (História da República), Pedro Calmon e tantos outros8.
III. Clientelismo, corporativismo, parlamentarismo:
limites da solução antiliberal
Tendo essas informações bibliográficas em mente, gostaria de insistir sobre outras razões para entender o problema de por que “os políticos” têm usualmente ficado de fora dos estudos de Sociologia Política
quando se trata de explicar a configuração do espaço político entre 1937
e 1945, o que inclui suas regras escritas (suas instituições) e não escritas
(sua lógica implícita), e a serventia dos seus operadores para a nacionalização da política brasileira e a “modernização” do capitalismo brasileiro.
Antes de tudo em toda essa discussão há um ponto no horizonte e
que valeria a pena ter sempre presente, já que ele joga, nesse contexto
histórico, um papel capital: a formação e a transformação do Estado
nacional brasileiro no pós-1930 Não é possível entender o processo necessariamente complexo de State building sem ter presente todos os (ou
a maioria dos) agentes sociais, seus lugares e seus papéis, já que nem
tudo decorre “do capitalismo” e das suas metamorfoses.
Quando se retoma um assunto central para esse período – quais
são os novos meios e modos da representação de interesses – é possível mostrar que a reconstituição do processo político brasileiro no pós-1930 implica com algumas interpretações da política brasileira do pós-1930. Essas lições, ao tratarem do mesmíssimo problema, não dão a devida atenção para o alcance e as conseqüências das várias soluções institucionais
formuladas pelo Estado Novo ao longo de seu desenvolvimento para
8
Ver a compilação de Ana Lígia Medeiros e Mônica Hirst (orgs.), Bibliografia histórica: 193045. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982. Para uma análise dos efeitos do campo
político sobre a historiografia do campo político (Virginio Santa Rosa, Barbosa Lima
Sobrinho, José Maria Bello, Pedro Calmon etc.), consultar Vavy Pacheco Borges, Anos trinta
e política: história e historiografia. In: Freitas, Marcos Cezar de (org.), Historiografia brasileira
em perspectiva. São Paulo: Contexto, 1998, p. 159-182. Um comentário da produção sobre a
história regional e sua submissão à ideologia oficial do regime pode ser lido em Sandra
Jatahy Pesavento, Historiografia do Estado Novo: visões regionais. In: Silva, José Luiz
Werneck da (org.), O feixe e o prisma: uma revisão do Estado Novo. Rio de janeiro: Zahar,
1991, p. 132-140.
322
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
fazer frente a vários tipos de interesses – sociais, econômicos, sindicais,
burocráticos etc. –, insistindo quase sempre ou na vigência do clientelismo tradicional, ou na supremacia do corporativismo estatal, por oposição,
ou em substituição, ao parlamentarismo liberal.
Ninguém ignora que o corporativismo, tendo assumido fumos de
doutrina oficial do Estado9, não se limitou, no Estado Novo, a ser uma
homenagem à ideologia da moda – como testemunham aliás o sindicalismo de Estado e a Justiça do Trabalho. Entretanto, ele nunca se converteu num princípio de organização da sociedade ou num sistema completo de governo, como em outros países. Isso se deveu, possivelmente,
não a dificuldades operacionais, mas à ausência de um único projeto
para vincular os grupos e classes sociais, através de suas “entidades”,
ao aparelho do Estado. Alvaro Barreto anota, a propósito, a existência
de pelo menos quatro modelos distintos de “corporativismo”, sustentados por quatro tipos de forças distintas: os políticos profissionais, o
empresariado paulista, os intelectuais e os tenentes10. Numa situação
assim em geral a resultante é nenhuma.
Por sua vez, o clientelismo foi muitas vezes concebido e apresentado como o custo político a ser pago às oligarquias tradicionais em troca da racionalização de algumas práticas e de algumas partes do aparelho do Estado. Mesmo Eli Diniz, que não desconhece a complexidade
da “estrutura de poder” do Estado Novo (a existência de diversos níveis
Cf. o artigo 140 da Constituição de 1937: “A economia da produção será organizada em
corporações, e estas, como entidades representativas das forças do trabalho nacional,
colocadas sob assistência e proteção do Estado, são órgãos deste e exercem funções
delegadas de poder público”. Citado a partir de Walter Costa Porto, A Constituição de
1937. Brasília: Escopo, 1987, p. 72.
10
Ver Alvaro Augusto de Borba Barreto, Representação das associações profissionais no
Brasil: o debate dos anos 1930. Revista de Sociologia e Política, n. 22, p. 119-133, 2004. “Duas
questões estiveram em pauta e em torno delas formaram-se os diferentes grupos em
disputa: a natureza das organizações e a função que ocupariam no aparato estatal. A defesa
da organização e administração autônomas das entidades foi a bandeira de luta do
empresariado, notadamente o industrial, frente ao governo de Vargas e a seus apoiadores,
que queriam disciplinar e definir o processo de formação das associações de classe. [...]
No que tange ao papel a ser exercido pelas entidades, havia duas opções: funções
deliberativas ou consultivas, a chamada “representação parlamentar” ou em “conselhos
técnicos”. No primeiro grupo, militava um amplo leque de personagens, em que se
destacavam: o governo Vargas, o Clube Três de Outubro, o Bloco do Norte, mais a bancada
constituinte dos empregados e a maioria da dos empregadores. A favor da segunda idéia
apareciam vários intelectuais e, principalmente, o CIESP-FIESP, que atuou ao lado da
Chapa Única por São Paulo Unido” (p. 129).
9
323
Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil, de novo / Adriano Codatto
decisórios com comandos próprios e clientes distintos), bem ao contrário, chama a atenção para ela, não vê, por exemplo, no esquema Interventorias/Departamentos Administrativos e no sistema dos conselhos
econômicos “corporativos” instituições específicas submetidas a lógicas
específicas. Ao que parece, elas são tão somente formas diferentes do
mesmo processo de transposição do conflito político (no primeiro caso)
e do conflito social (no segundo) para o aparelho do Estado como um
recurso funcional, ao lado de todos os outros tentados no primeiro governo Vargas (racionalização burocrática, centralização decisória, reforço da autoridade nacional etc.), para fundamentar e ampliar sua “autonomia relativa”11.
Na realidade, as disposições práticas, as fórmulas institucionais e
os arranjos políticos que valem para os conselhos de política econômica
e suas respectivas agendas decisórias não valem, ipso facto, para acomodar as antigas e outrora influentes classes políticas regionais. Elas não
são apenas a parte menor do problema visto que a viabilidade da transformação capitalista do país depende também disso e da nova equação
para recrutar e conformar, a partir da velha elite política, a futura elite
estatal.
IV. Por uma visão sociológica das instituições do Estado
Todavia, o defeito mais grave da maior parte das análises políticas sobre o período não, penso, é desconhecer a multiplicidade de aparelhos estatais e a variedade de interesses e, por extensão, de métodos
de agregação de interesses a eles conectados (clientelismo, corporativismo, parlamentarismo). Está antes em reconhecer a existência de diferentes “órgãos políticos” e derivar essa variedade a partir das funções
“constitucionais”, isto é, legais, formais desses órgãos.
O formalismo jurídico dessas visões, onde o exemplo nativo pode
ser encontrado nas várias “teorizações” a respeito da superioridade da
organização política do Estado Novo diante da Constituição de 1934,
está justamente em desconsiderar que a existência de aparelhos políticos
11
Eli Diniz, O Estado Novo: estrutura de poder; relações de classes. In: Fausto, Boris (org.),
História geral da civilização brasileira. Tomo III: O Brasil Republicano, 3º. vol. Sociedade e
Política (1930-1964). 5ª. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1991, p. 107-120, especialmente.
324
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
diferentes (interventorias, departamentos administrativos, conselhos técnicos, órgãos de assessoria, aparelhos ideológicos) decorre da presença de
forças políticas diferentes, e não o contrário. Logo, quanto mais elites, mais
aparelhos; e não quanto mais aparelhos, mais elites.
Sobre isso, Gaetano Mosca lembra, com o perdão do sociologismo, que o equilíbrio entre os aparelhos de Estado ou a subordinação de
um aparelho a outro é o resultado do equilíbrio ou da subordinação das
diferentes frações da “classe dirigente” entre si12. O estudo de determinadas instituições deveria ao menos ter presente as forças sociais determinadas que animam tais instituições.
A opinião de Mosca sugere que devemos ter sempre em vista três
aspectos ao tratar dos problemas referidos à “classe política” e à representação de interesses: i) a profusão de elites políticas (e suas lutas internas); ii) a multiplicidade de interesses a representar (e suas discrepâncias);
e iii) a quantidade de aparelhos políticos (e, em especial, seus tipos) que
canalizam, e às vezes redefinem, essa elites e esses interesses. A topografia do sistema estatal e a maior ou menor complexidade das instituições políticas do regime político – bem como as formas de representação admitidas como mais legítimas, mais eficientes, mais eficazes –
mudam, segundo elem conforme muda o “comportamento” dessas variáveis.
Isso posto, não se julga adequadamente essa temporada da história política nacional se não se repensa quais são os direitos de entrada
no universo das elites, isto é, os meios e os modos de ingresso no microcosmo político, ele próprio em plena transformação.
Os meios compreendem, resumidamente, as pré-condições (os
“atributos”) que um grupo de elite tem de exibir para ter acesso à arena
política. Eles tanto são sociais, isto é, envolvem origem, formação, profissão etc., quanto políticos, ou seja, envolvem cargos, postos e posições na
carreira pública. Os modos abrangem as instituições ou, mais propriamente, os mecanismos institucionais que servem de caminho (as “ave-
12
É o que se depreende, por exemplo, da seguinte passagem: “[...] um órgão político, para
ser eficaz e limitar a ação do outro, deve representar uma força política, deve ser a
organização de uma autoridade e uma influência social que represente algo na sociedade,
frente à outra que se encarna no órgão político que se deve controlar”. Gaetano Mosca, La
clase política. México: Fondo de Cultura Económica, 1992, p. 194-195.
325
Elites, políticos e instituições políticas: o Estado Novo no Brasil, de novo / Adriano Codatto
nidas”, na expressão de Anthony Giddens) para que os profissionais da
política se constituam como tais13.
Visto que o sistema político, em especial durante o regime do Estado Novo, era muito fechado e burocratizado, é impossível referir-se
ao processo de recrutamento das elites políticas sem pensar nas instituições
estatais (e em sua configuração particular) que o tornaram possível. Nesse
caso específico, minha suposição é que o critério de recrutamento (o
“como”) deve ser bem mais importante que a fonte de recrutamento (o
“quem”), sem que se possa, evidentemente, desconsiderá-lo. De toda
forma, o modo de ingresso e suas exigências implícitas e explícitas contribuem decisivamente para modificar o próprio perfil da elite.
A meu ver, a vantagem, ao levantar esse problema, é que se pode
indicar tanto a função social quanto o significado político dos aparelhos
burocráticos que dão acesso privilegiado ao universo político. Por outro
lado, quando se identifica os locais de ingresso no jogo, pode-se isolar,
para fins de análise, o grupo de elite eleito e apontar, o mais fielmente
possível, as “qualidades” (social backgrounds) que o tornaram apto para
o exercício do poder. Esse procedimento metodológico, por assim dizer,
permite não só localizar e identificar esse agente social que aparentemente desapareceu durante a ditadura do Estado Novo, mas mostrar
como, quando e onde a elite política pôde metamorfosear-se em elite
estatal.
Conclusões
A Revolução de 1930 e em especial o Estado Novo (1937-1945) são
momentos de redefinição das hierarquias na estrutura social e no universo das elites políticas. O regime ditatorial viabilizou, graças ao autoritarismo que bloqueou outras alternativas políticas, uma tripla conversão: i) do predomínio das elites estaduais para o predomínio das elites
nacionais; ii) do arranjo político garantido por um Estado federal para um
arranjo político garantido pelo Estado centralizado; e iii) a conversão de
uma economia baseada exclusivamente no capitalismo comercial para uma
economia baseada progressivamente no capitalismo industrial.
13
Ver Anthony Giddens, Elites in the British Class Structure. In: Stanworth, Philip e Giddens,
Anthony (eds.), Elites and Power in British Society. Cambridge: Cambridge University Press,
1974, p. 4.
326
Experiências nacionais, temas transversais: subsídios para uma história comparada da América Latina
O segundo e o terceiro processos foram entendidos pela literatura
especializada como os processos de “construção do Estado brasileiro” e
de “modernização do capitalismo nacional”, respectivamente. Já as transformações no mundo político, cuja face mais visível e mais espetacular
foi o declínio dos partidos da oligarquia e das lideranças tradicionais,
foram percebidos ora como conseqüência lógica dessas macro-transformações, ora como pré-requisito histórico necessário para impor um novo
projeto de desenvolvimento. Sustentamos que tanto a construção da
capacidade estatal de intervenção na vida social nacional, quanto as transformações propriamente econômicas no pós-30 não podem ser explicadas inteiramente sem entender o destino dos políticos profissionais na
nova estrutura de dominação.
Esse novo enfoque, ou mais exatamente, esse novo/velho objeto
recuperado permite repensar duas questões mais amplas do que aquelas referidas exclusivamente às trocas de lugar entre grupos de elites e
partidos na cena política e à comutação da ideologia política liberaloligárquica pelo autoritarismo burocrático.
Há, nesse momento, tanto uma reforma do campo do poder quanto
dos fundamentos do poder. Nesse sentido, seria especialmente útil conhecer o perfil da nova classe política nacional que pilota os aparelhos do
Estado. Estudos prosopográficos ou biografias coletivas são, no caso, o
instrumento mais adequado para avaliar a profundidade e a direção
dessas mudanças sócio-políticas. Um programa de pesquisa – comparativo – bem poderia começar daqui.
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no ato de sua instalação, em 15 de novembro de 1933. In: _____. A nova política
do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1938, vol. III.
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