Democracia e inovação na gestão local da saúde - PEEP

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Democracia e inovação na gestão local da saúde - PEEP
DEMOCRACIA E INOVAÇÃO NA
GESTÃO LOCAL DA SAÚDE
CENTRO BRASILEIRO DE ESTUDOS DE SAÚDE
(CEBES)
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
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Sonia Fleury
DEMOCRACIA E INOVAÇÃO NA
GESTÃO LOCAL DA SAÚDE
Copyright © 2014 dos autores
Todos os direitos desta edição reservados a
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A partir de foto da Fazenda Água Limpa, de autoria de Sonia Fleury
Copidesque e revisão
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Normalização de referências
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Apoio aos autores
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Catalogação na fonte
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica
Biblioteca de Saúde Pública
F618d
Fleury, Sonia
Democracia e inovação na gestão local da saúde. / Sonia Fleury – Rio de Janeiro:
Cebes / Editora FIOCRUZ, 2014.
480p. : il. ; tab. ; graf.
ISBN: 978-85-88422-17-9
1. Inovação Organizacional. 2. Descentralização. 3. Democracia. 4. Sistema
Único de Saúde - organização & administração. I. Título.
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AUTORA
Sonia Fleury
Psicóloga, mestre em Sociologia e doutora em Ciência Política. Professora titular na Escola
Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EBAPE/FGV)
e pesquisadora aposentada da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). Militante da Reforma
Sanitária, foi membro das diretorias do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) e da
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO).
COAUTORES
Assis Mafort Ouverney
Economista, mestre em Administração Pública e doutorando em Administração pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EBAPE/
FGV). Pesquisador do Departamento de Ciências Sociais da Escola Nacional de Saúde Pública
Sergio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ).
Felipe Barbosa Zani
Administrador, mestre em Administração Pública pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EBAPE/FGV). Pesquisador do Programa de
Estudos da Esfera Pública (PEEP/EBAPE/FGV).
Renato Cesar Möller
Graduado em Comunicação Social e em Administração, mestre em Administração Pública
pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas
(EBAPE/FGV) e doutor em Psicologia Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ).
Thais Soares Kronemberger
Cientista Social, mestre em Ciência Política pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
Pesquisadora do Programa de Estudos da Esfera Pública (PEEP/EBAPE/FGV).
Sumário
Prefácio | 11
Fernando Abruucio
Apresentação | 15
Sonia Fleury
PARTE 1 - DESCENTRALIZAÇÃO, DEMOCRATIZAÇÃO DO PODER LOCAL E INOVAÇÃO NA
SAÚDE | 23
1. Democracia, Poder Local e Inovação | 25
Sonia Fleury
2. A Construção da Municipalização da Saúde: estratégias normativas | 81
Assis Mafort Ouverney
3. Democratização do Poder Local e as Dimensões da Inovação em Saúde: desafios metodológicos da
investigação | 121
Sonia Fleury, Assis Mafort Ouverney e Renato Cesar Möller
PARTE 2 - PROCESSO DE DESCENTRALIZAÇÃO E DINÂMICAS DE INOVAÇÃO LOCAL EM
SAÚDE: UM ESTUDO LONGITUDINAL | 199
4. Renovação das Elites Locais em Saúde: perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde | 201
Sonia Fleury e Assis Mafort Ouverney
5. Governança Local no Sistema Único de Saúde: a dimensão social | 289
Sonia Fleury, Assis Mafort Ouverney, Thais Soares Kronemberger e Felipe Barbosa Zani
6. Modernização da Gestão Local do SUS: a dimensão gerencial | 335
Sonia Fleury, Assis Mafort Ouverney, Thais Soares Kronemberger e Felipe Barbosa Zani
7. Organização Local da Atenção à Saúde no SUS: a dimensão assistencial | 385
Sonia Fleury, Assis Mafort Ouverney, Thais Soares Kronemberger e Felipe Barbosa Zani
8. Alterações e Persistências nos Padrões de Inovação Local em Saúde | 415
Sonia Fleury, Assis Mafort Ouverney, Renato Cesar Möller, Thais Soares Kronemberger e Felipe Barbosa Zani
Lista de Gráficos | 465
Lista de Tabelas | 475
Lista de Quadros | 476
Lista de Figuras | 477
Siglas
ABRASCO – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
AIH – Autorização de Internação Hospitalar
BF – Bolsa Família
CAPS – Centros de Atenção Psicossocial
CEBES – Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
CES – Conselho Estadual de Saúde
CIB – Comissão Intergestores Bipartite
CIS – Comissão Interinstitucional de Saúde
CIT – Comissão Intergestores Tripartite
CMS – Conselho Municipal de Saúde
CNES – Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde
CONASEMS – Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde
CONASS – Conselho Nacional de Secretários de Saúde
DATASUS – Departamento de Informática do SUS
DL – Desenvolvimento Local
EBAPE – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas
ESF – Estratégia Saúde da Família
FAE – Fator de Apoio ao Estado
FAEC – Fundo de Ações Estratégicas e de Compensação
FAM – Fator de Apoio ao Município
FEM – Fator de Estímulo à Municipalização
FGV – Fundação Getulio Vargas
FIDEPS – Fator de Incentivo ao Desenvolvimento do Ensino e da Pesquisa Universitária em Saúde
FINBRA – Finanças do Brasil
FNS – Fundo Nacional de Saúde
FUNASA – Fundação Nacional de Saúde
GPAB – Gestão Plena da Atenção Básica
GPSM – Gestão Plena do Sistema Municipal
INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
MUNIC – Pesquisa de Informações Básicas Municipais do IBGE
NIE – Novo Institucionalismo Econômico
NOAS – Norma Operacional da Assistência à Saúde
NOB – Norma Operacional Básica
NPM – New Public Managment (Novo Gerencialismo)
ONG – Organização Não Governamental
OP – Orçamento Participativo
OS – Organizações Sociais
OSCIP – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
PAB – Piso da Atenção Básica
PACS – Programa de Agentes Comunitários de Saúde
PC do B – Partido Comunista do Brasil
PCB – Partido Comunista Brasileiro
PCCN – Programa de Combate às Carências Nutricionais
PCCS – Plano de Carreira, Cargos e Salários
PDR – Plano Diretor de Regionalização
PDT – Partido Democrático Trabalhista
PEEP – Programa de Estudos da Esfera Pública
PFL – Partido da Frente Liberal
PL – Partido Liberal
PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
POI – Programação e Orçamentação Integrada
PP - Partido Progressista
PPB – Partido Progressista Brasileiro
PPI – Programação Pactuada e Integrada
PPS – Partido Popular Socialista
PSB – Partido Socialista Brasileiro
PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira
PSF – Programa de Saúde da Família
PT – Partido dos Trabalhadores
PTB – Partido Trabalhista Brasileiro
PV – Partido Verde
RCA – Recursos para Cobertura Ambulatorial
SES – Secretaria Estadual de Saúde
SIA – Sistema de Informações Ambulatoriais
SIH – Sistema de Informações Hospitalares
SNA – Sistema Nacional de Auditoria
SPSS – Statistical Package for the Social Science (Software de Estatística para Ciências Sociais)
SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
TFA – Teto Financeiro da Assistência
UCA – Unidade de Cobertura Ambulatorial
UCR – Unidade de Capacitação da Rede
UN – United Nations (Nações Unidas)
Qualquer prefácio constitui uma tentativa de se convidar o leitor
para que leia o livro em questão. Neste caso, há pelo menos cinco razões para sugerir fortemente a leitura desta obra. A primeira
diz respeito ao estudo pormenorizado do processo de descentralização na área da saúde, mais especificamente nos governos municipais brasileiros. A amplitude e a profundidade dessa reflexão
a torna, desde já, referência obrigatória sobre tal tema.
Além disso, por meio dos textos que compõem a obra
é possível analisar tal política em três dimensões, a saber: a democrática, a gerencial e a assistencial. Desse modo, construiu-se
aqui uma abordagem sistêmica original, tendo em vista que essas
perspectivas geralmente são tratadas de forma separada, ou, no
máximo, duas delas se interligam.
A escolha metodológica é outra razão que realça a qualidade deste livro. Adotou-se uma combinação de visão histórico-institucional com técnicas quantitativas, algo ainda
(infelizmente) pouco usual no estudo das políticas públicas.
E a novidade metodológica não parou por aí: os dados utilizados para analisar os municípios derivaram de dois surveys com
amostras representativas de governos locais, em coletas realizadas em 1996 e 2006. Desse conjunto de dados, foi possível se
obter uma visão longitudinal e nacional sobre a questão que
envolve a capacidade dos municípios no que se refere à política
de saúde, observando padrões e assimetrias na federação brasileira que não haviam recebido ainda uma análise tão consistente e rigorosa pela literatura.
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Prefácio
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Mais um elemento ímpar deste livro, tornando-se uma quarta razão para lê-lo, reside no
estudo sobre a capacidade de inovação dos governos locais no campo da saúde, ressaltando seus
avanços e limites. Trata-se de uma temática importantíssima caso o Brasil queira, nas próximas
décadas, levar adiante o projeto da Constituição de 1988 de tornar os municípios peças-chave
de nosso federalismo.
Todas as quatro razões anteriores já seriam suficientes para a indicação desta obra de
grande fôlego. Encontrou-se, no entanto, ao longo da prazerosa leitura, uma razão muito mais
interessante para os estudiosos do Estado brasileiro. O livro estruturado por Sonia Fleury, ao
estudar a saúde, constitui uma das análises mais significativas do processo de descentralização
de políticas públicas, pois esse setor tornou-se referência para os demais no plano intergovernamental. E aqui vale referir-se ao contexto mais geral, antes de voltar às conclusões da pesquisa.
A tradição do Estado brasileiro moderno, cuja construção iniciou-se com Getúlio Vargas, foi marcada pela centralização das principais atividades governamentais e pela subordinação de estados e municípios à União. No modelo varguista, ademais, não havia grande espaço
para a participação da sociedade na definição e controle das ações estatais. A Constituição de
1988 procurou romper com tal legado, sobretudo por meio da descentralização das políticas
públicas e, no âmbito desse processo, pela ampliação dos canais participativos no plano local.
Se fosse destacar o ponto mais importante das mudanças efetuadas, este seria o novo e inédito
papel atribuído aos municípios, que se tornaram entes federativos e, assim, livraram-se do formato classicamente exposto por Vitor Nunes Leal.
O dia seguinte a esse processo constitucional regia-se pelo otimismo: os municípios
tornar-se-iam mais autônomos nos planos político e financeiro, de tal maneira que a descentralização geraria democratização local, melhor desempenho da gestão pública e maior espaço
para a inovação em políticas. Esse quadro tocquevilliano foi colocado em xeque logo nos primeiros passos da implementação da municipalização em várias áreas.
A visão hegemônica se inverteu na segunda metade da década de 1990. A literatura
evidenciava que os pressupostos anteriores não condiziam com a realidade. A autonomia não
havia ocorrido da mesma maneira para todos, em razão da desigualdade federativa existente
entre os milhares de governos locais – e a autonomia que vigorava nem sempre era bem vista,
uma vez que havia se transformado de hobbesianismo local para sinônimo de municipalismo autárquico. A democratização nem sempre acompanhava a descentralização, da mesma maneira
que a melhoria da governança municipal também não havia se tornado a regra.
Diante de tal diagnóstico, reformas foram feitas para melhorar o processo de coordenação de políticas nos municípios. Políticas nacionais indutivas, com sólidos estímulos financeiros, foram empregadas para melhorar e homogeneizar em maior grau as ações dos gover-
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PREFÁCIO
nos locais. Houve ainda programas destinados a aperfeiçoar a gestão pública municipal, com
capacitação dos agentes locais e disseminação de técnicas gerenciais. Em grande medida, o
modelo adotado foi o de sistemas de políticas públicas presente em várias áreas, cujo objetivo
seria combinar nacionalização de políticas e metas com a implementação descentralizada dos
programas e serviços. A saúde foi a grande inspiradora desse processo e entendê-lo, como o
faz brilhantemente esta obra – Democracia e Inovação na Gestão Local da Saúde –, pode trazer
lições para as demais políticas.
Nessa linha argumentativa, é de enorme valia constatar como a “musa inspiradora”, o
SUS, não foi um projeto implantado de maneira linear. A municipalização não chegou de uma
só vez e não obteve o mesmo impacto para todos os governos locais. Ademais, ao analisar a tripla dimensão da descentralização – a democrática, a gerencial e a da política em si –, a pesquisa
consegue demonstrar as dificuldades para combinar tais aspectos, algo que se repete noutras
políticas. Em parte de suas conclusões, coloca-se em questão o quanto os municípios podem,
de fato, realizar o desejo de autonomia expresso pela Constituição de 1988.
Existem, porém, duas outras linhas desta obra que rompem com a visão reinante na literatura atual, que se posiciona entre o pessimismo quanto ao municipalismo e a visão de que
o federalismo já foi recentralizado para a União, para o bem e para o mal. A primeira e mais
importante conclusão é a que revela que, mesmo com todos os limites dos governos municipais
e com a ampliação das funções do governo federal, a descentralização na saúde foi capaz de
melhorar a democratização, a gestão e os serviços na maioria dos municípios, e de forma crescente, se considerarmos os períodos comparados (1996 e 2006). Ainda há desigualdades entre
as municipalidades em seu desempenho, mas elas se reduziram no período estudado.
Tal conclusão não retira os aspectos problemáticos do fenômeno. Sem dúvida alguma o
livro não pode furtar-se ao fato de que ainda há muito para avançar em termos de autonomia municipal no que tange à democratização e às capacidades gerenciais, não apenas no conjunto dos
governos locais, mas também, e categoricamente, na desigualdade de condições que há entre eles.
Contudo, o sentido da obra aponta não para a inevitabilidade da centralização ou do fracasso do
municipalismo. Houve avanços na descentralização na saúde para o plano local e faz-se necessário
descobrir como continuar nessa trilha. Não se trata mais da visão ingênua pós-1988, que não
percebia os limites e os males do municipalismo puro. No entanto, se quisermos aperfeiçoar o
federalismo, teremos de encontrar alternativas para fortalecer a autonomia local, paralelamente
à adoção de políticas nacionais e formas cooperativas de relacionamento intergovernamental. De
que modo propor e compreender essas novas tarefas constitui o desafio maior para os estudiosos
do federalismo daqui por diante, que deverão abandonar a dicotomia rudimentar centralização
versus descentralização e trocá-la pela combinação de autonomia com interdependência.
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Ao fim da leitura, percebe-se a enorme tarefa existente para fortalecer e aprimorar a gestão municipal brasileira no campo da saúde. Quem sabe estudiosos de outras políticas públicas
possam fazer pesquisas na mesma linha, a fim de entender a dinâmica local numa visão tão
ampla quanto a oferecida pela obra organizada por Sonia Fleury. Novas perguntas e especificidades, vistas de forma comparada, poderão nos ajudar a compreender de forma mais precisa o
caleidoscópio federativo brasileiro no plano das políticas públicas.
Fernando Abrucio
Doutor em Ciência Política, professor do doutorado em
Administração Pública e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGV/SP)
Apresentação
Em junho de 1995, fui convidada a participar do XI Encontro Nacional de Secretários Municipais de Saúde em Maceió.
Durante o vôo, comecei a me perguntar quem seriam, àquela
época, os gestores locais do sistema de saúde para os quais eu
falaria. Vieram-me à mente recordações de minha vivência no
interior e conjecturei que, seguramente, seriam médicos, homens, brancos, filhos de médicos, fazendeiros e/ou de famílias
de políticos tradicionais no local, em uma faixa etária de 35 a
55 anos. Grande foi a minha surpresa ao constatar o enorme
afluxo de gestoras e gestores, que se envolviam fortemente nos
grupos de debates técnicos e discussões políticas, e, principalmente, a incrível diversidade de perfis que se apresentavam a
uma observação despretensiosa. Dessa experiência, surgiu uma
genuína curiosidade científica, um desejo de conhecer aquilo
que intuí ser uma transformação molecular, que se estava processando nos municípios, como parte do processo de descentralização em curso. Como minha curiosidade inicial sobre quem
seriam os gestores municipais de saúde não pôde ser respondida
pela presidência do CONASEMS, à época sob a direção de Gilson Cantarino, começamos juntos a pensar em desenvolver uma
investigação nacional sobre o tema. Desde essa fase inicial até
o final da segunda aplicação da pesquisa, o que envolveu uma
década, contamos, em todas as direções do CONASEMS e dos
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Sonia Fleury
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
COSEMS, com aliados inestimáveis na viabilização da aplicação dos questionários e na abertura de
espaços em seus encontros para a apresentação dos resultados parciais encontrados. Sem esse apoio,
não teria sido possível alcançar os resultados que agora apresentamos e dos quais esperamos que eles
possam se beneficiar.
A pergunta que este projeto pretendeu responder foi o que ocorrera, na década estudada,
como fruto do aprofundamento da descentralização na saúde, em termos de inovação na gestão gerencial introduzida pelos gestores municipais de saúde e, em que medida as mudanças tanto no perfil do gestor quanto em suas ações poderiam indicar uma democratização do poder local no Brasil.
A pesquisa de campo, com aplicação de questionários, foi realizada em dois momentos, em
1996 e em 2006. Na primeira etapa, o estudo foi financiado pelo Projeto Nordeste do Ministério
da Saúde/PNUD, sob a coordenação de Agenor Álvares, entusiasta desta investigação desde o primeiro momento. Em 2006, Agenor Álvares era Ministro da Saúde e, novamente, junto com sua
equipe, apoiou a repetição da pesquisa, considerada de interesse do Ministério. Por meio de um
financiamento do CNPq/Ministério da Saúde, obtivemos os recursos para realização da segunda
etapa, que nos permitiria comparar os dados e verificar o que ocorrera em uma década no processo
de descentralização em saúde. Nas duas etapas, contamos também com o apoio do CONASEMS
na distribuição dos questionários aos secretários municipais de saúde e na coleta dos mesmos após
o preenchimento1. A EBAPE também nos apoiou com recursos do PROPESQUISA em ambas as
fases.
Os estudos dos processos de descentralização, em geral, atêm-se ao desenho da sua estratégia, das funções que são deslocadas para os níveis subnacionais e dos arranjos institucionais, que
alteram as relações entre os entes governamentais. Mesmo sendo abrangentes, têm como principal
limitação o fato de tratar um processo complexo e caracterizado por avanços e recuos, em um corte
sincrônico, ou seja, uma fotografia de um momento, que é incapaz de dar conta da intricada dinâmica, somente passível de ser mais bem compreendida em uma análise longitudinal ou diacrônica.
Por essa razão, a pesquisa foi realizada em duas etapas, compreendendo um período de dez anos.
O contexto político e econômico variou grandemente nesse intervalo. Fruto da democratização a descentralização no Brasil, esse ambiente buscou responder às demandas locais e sociais por
maior participação no poder. Ocorrendo no âmbito de uma reforma do Estado, de cunho democratizante, em reação ao hipercentralismo promovido pelo regime autoritário de 1964, a redistribuição
de recursos, atribuições e encargos, por suposto, deveria produzir um novo padrão de relações intergovernamentais, com um deslocamento de poder em favor da esfera municipal, assim como um
novo padrão de relações entre o Estado e a sociedade, com um deslocamento de poder em direção
aos diversos grupos de interesse presentes na arena societária.
Agradecemos à Direção Nacional do CONASEMS pelo apoio na realização do pré-teste do questionário no XXII
Congresso do CONASEMS, nas pessoas de Beatriz Dobachi e José Enio Servilha Duarte, assim como às direções
dos COSEMS dos estados pelo empenho na fase de distribuição e coleta dos questionários.
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16
A presentação
A orientação descentralizadora foi expressa na Constituição Federal de 1988 e teve na trajetória
do SUS a experiência mais elaborada de construção de um novo pacto federativo. A Saúde foi a área de
política social em que o modelo descentralizador participativo foi mais ampla e radicalmente aplicado,
passando a servir de padrão para outras áreas das políticas públicas. O Sistema Único de Saúde (SUS)
é dotado de um arcabouço jurídico-normativo, que se materializa em uma arquitetura institucional sofisticada, ao redesenhar as relações intergovernamentais e seus mecanismos de coordenação e pactuação,
assim como fortalecer o controle e a participação de diferentes atores da sociedade civil. No entanto, a
adversidade da conjuntura macroeconômica durante sua implantação bem como as disputas internas ao
setor tornaram-se obstáculos concretos nessa trajetória de deslocamento do poder. A década estudada
contemplava não apenas a herança da reforma democratizante do Estado, expressa na Constituição
Federal e nas Leis Orgânicas, assim como as limitações institucionais, fruto de uma longa tradição centralista e concentradora dos recursos e da rede de atenção à saúde. A elas somaram-se os impasses causados pelas limitações estruturais, impostas por um contexto econômico recessivo e recentralizador das
finanças públicas, bem como as mudanças decorrentes da implantação de um novo projeto de reforma
do Estado, baseado nos pressupostos de redução das atribuições do setor público e favorecimento da
compra de serviços. Finalmente, as abissais carências na área gerencial e de infraestrutura sanitária antepunham-se ao incessante processo de desenvolvimento de políticas e programas, que buscavam viabilizar
a ampliação da cobertura e o exercício do direito à saúde. Uma intrincada teia, que englobava atores do
setor público, de empresas privadas e de associações da sociedade civil, compunha a complexa arena, na
qual a construção do sistema descentralizado de saúde ia tomando forma.
Ainda que a investigação não tenha almejado analisar esse contexto macro, no qual se desenrolou
a implantação do SUS, seus resultados refletem, em muitos pontos, os impasses e direcionamentos que
permitiram ao processo de descentralização avançar ou retroceder.
No período de 1996-1997, foi realizada pela EBAPE/FGV a pesquisa inicial, intitulada Municipalização da Saúde e Poder Local no Brasil2, contando com a colaboração de pesquisadores da ENSP,
com a participação de Antonio Ivo de Carvalho, e da UERJ, com a participação de Renato Möller. Esta
investigação buscou verificar as possíveis transformações que estariam ocorrendo na gestão municipal da
saúde, baseadas na descentralização, tomando como unidade de análise o gestor ou o secretário municipal de saúde. Foram investigados seu perfil profissional, político e social e as inovações introduzidas
quanto à participação social, aos mecanismos gerenciais e ao modelo assistencial.
O desafio, nessa primeira etapa, foi traduzir os conceitos de democracia e poder local, descentralização e inovação em termos operacionais, de forma que nos permitisse realizar uma pesquisa quantitativa, de alcance nacional, por meio da distribuição de um questionário a todos os gestores municipais
de saúde.
Municipalização da Saúde e Poder Local no Brasil. Coordenação: Sonia Fleury da EBAPE/FGV e Antônio Ivo
de Carvalho da ENSP/FIOCRUZ. Pesquisadoras: Norha Manotas, Renata Bloch e Simone Nevares. Responsável pelo processamento dos dados: Renato Möller.
2
17
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Partiu-se da hipótese de que a descentralização levaria à democratização da esfera local de governo,
na medida em que alterações provocadas no perfil do gestor e no processo de gestão induzissem modificações na composição e na direcionalidade do poder local, ampliando assim a gama de interesses sociais,
expressos e atendidos pelo sistema municipal de saúde. Assumindo esses dois focos de análise, foi concebido
um modelo analítico assentado em dois conceitos ou categorias centrais: a diversificação e a inovação.
A diversificação, para qualificar as eventuais alterações no perfil do gestor – entendido como o
mandatário do poder governamental local na área da saúde – expressiva de alterações na acessibilidade do
cargo a setores socialmente mais amplos da população, assim como de alterações no universo de referentes
culturais, técnicos e cognitivos de seus ocupantes. A verificação da ampliação desse espectro confirmaria a
tendência democratizante.
A inovação, para qualificar as mudanças de desenho institucional assim como da dinâmica de
funcionamento, eventualmente ocorridas no processo de gestão, que possam ser significativas de um
alargamento da gama de interesses sociais contemplados bem como da busca de obtenção de melhores
resultados. Para fins de melhor caracterizar a natureza e o conteúdo da inovação, o processo de gestão
foi decomposto em três dimensões: social, relativa às relações entre Estado e sociedade, participação e
controle social; gerencial, relativa às questões de eficiência e produtividade; e assistencial, relativa aos
programas de atenção implantados localmente.
Os resultados coletados na primeira etapa apontaram dinâmicas distintas na difusão das inovações em relação às três dimensões consideradas. Foi construído um índice geral de inovação, o que
nos permitiu comparar as gestões municipais dos municípios situados nos seus extremos, ou seja, os
mais e menos inovadores, de acordo com as características do perfil do gestor e com o porte e situação
geográfica do município.
Com base nessa metodologia original e com a construção de uma excepcionalmente rica base
de dados nessa primeira etapa, buscamos aplicar um novo questionário dez anos depois, de forma a
compreender a trajetória da inovação e da democratização do poder local ao longo do processo de
descentralização da saúde.
Porém, durante essa década, o SUS passou por significativas transformações seja em continuidade às mudanças iniciadas no processo de Reforma Sanitária, seja face às limitações estruturais
apresentadas. Com isso, a organização do sistema de saúde nos municípios foi se adaptando às novas
responsabilidades estabelecidas pela política de saúde no Brasil. Principalmente, a partir da segunda
metade da década de 1990, maiores mudanças ocorreram, em especial, no que diz respeito ao modelo de atenção à saúde, por intermédio do estímulo de ações voltadas para a atenção básica. Nesse
período, as normas operacionais tiveram significativa importância, acelerando o processo de descentralização dos recursos federais e criando incentivos às mudanças na lógica assistencial, por meio de
programas dirigidos às populações mais carentes e às práticas preventivas. Além de acrescentar novos
procedimentos à atenção básica, houve também estímulo à criação de sistemas e serviços de saúde, que
ultrapassassem os limites territoriais dos municípios.
18
A presentação
O desafio na segunda etapa da investigação foi o de manter a mesma metodologia anteriormente desenvolvida, de forma a permitir a comparação com os resultados anteriores, porém incorporando
questões que abordassem as mudanças assinaladas na organização do SUS e nas formas de atenção.
O novo questionário foi desenvolvido com base nas considerações de especialistas3. A segunda etapa
da pesquisa Municipalização da Saúde: inovação na gestão e democracia local no Brasil, realizada em
2006/2007, representou um esforço de análise longitudinal do fenômeno da descentralização no setor
saúde, tendo como base as transformações no exercício do poder local e na inovação gerencial, tomando como suporte os resultados apurados uma década antes.
A hipótese que orientou a segunda etapa da pesquisa supunha a continuidade na diversificação
dos perfis dos gestores, mas, como resultado do processo de aprofundamento e consolidação da descentralização, esperava-se redução das discrepâncias observadas nos resultados da primeira pesquisa,
em relação às dinâmicas das diferentes dimensões da inovação: social, gerencial e assistencial. Assim,
todas elas apresentariam uma distribuição com tendência aproximada à curva normal.
Nessa etapa, tivemos também o cuidado de adotar, na construção do índice geral de inovação,
uma ponderação diferenciada, de acordo ao porte do município. Com a assessoria de Maurício de
Vasconcellos foi feito um desenho amostral mais rigoroso.
Embora tenha sido confirmada nossa hipótese geral de uma progressiva aproximação entre as
três dimensões do fenômeno da inovação, surpreendentemente a dinâmica da inovação apresentou
resultados, que indicaram, claramente, que essa aproximação não se deu pelo avanço da inovação
daquelas dimensões que tinham uma pontuação mais baixa em 1996, a saber, a assistencial seguida
pela gerencial. Para nossa surpresa, ficou demonstrado que esse fato foi decorrente de um enorme
avanço na inovação assistencial, ao mesmo tempo em que ocorreu um retrocesso em relação à dimensão gerencial.
A identificação do problema da gestão como o ponto crítico da política descentralizada de
saúde merece a atenção das autoridades governamentais, exigindo hoje esforço semelhante ao que
foi realizado para superar a defasagem na inovação assistencial, como constatado pelos resultados
da pesquisa. No entanto, há que se considerar que este fato não pode ser tratado isoladamente, pois
sua ocorrência é também explicada pelo contexto geral, que determinou a subordinação das políticas
públicas ao esforço de estabilização macroeconômica. Portanto, sua superação também requererá a
construção de novas medidas de incentivo à reforma do Estado e à capacitação e valorização profissional em todas as esferas de governo.
Essas e outras orientações para a política de saúde, formação profissional e associativismo vão
ser encontradas em cada um dos capítulos desse livro, onde são apresentados os dados com as análises
Foi realizada uma oficina de trabalho para discutir a metodologia e adaptar os instrumentos às transformações
do SUS, contanto com a presença da equipe da pesquisa e especialistas como Antônio Ivo de Carvalho, Silvio
Fernandes, Lenaura Lobato, Odorico Monteiro de Andrade e Patrícia Ribeiro, a quem agradecemos as generosas
contribuições. Nessa etapa participou como assistente da pesquisa Maria Gabriela Monteiro.
3
19
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
e conclusões sobre o aspecto abordado, o que nos permitiu prescindir de uma conclusão geral. No
entanto, a mesma emoção de surpresa que me tomou, quando iniciamos essa pesquisa, ainda segue
vigente, pois os resultados encontrados mostram uma dinâmica ainda surpreendentemente desconhecida. Permito-me comentar apenas o quanto foi inesperado encontrar que a participação
de mulheres, negros, jovens e não médicos, indicadores da democratização do poder local, é mais
expressiva em municípios de menor porte, já que nos grandes centros, como fruto da competição
mais acirrada, persiste o padrão tradicional de liderança.
A estrutura do livro está dividida em duas partes: na primeira, – Descentralização, Democratização do Poder Local e Inovação na Saúde –, encontram-se três capítulos que representam o
marco teórico e metodológico da investigação.
O capítulo 1 – Democracia, Poder local e Inovação – traz a discussão sobre os fundamentos teóricos da democracia, na discussão da relação entre Estado, sociedade e cidadania, de forma
a permitir formular proposições analíticas que orientam a compreensão do fenômeno estudado
na pesquisa. Em seguida, discute os conceitos de governabilidade e governança na literatura contemporânea e busca aplicá-los ao estudo proposto na investigação. Finalmente, trata dos estudos,
que buscam relacionar poder local à inovação, bem como dos modelos de difusão das inovações.
No capítulo 2 – A Construção da Municipalização da Saúde: estratégias normativas – busca-se discutir, inicialmente, o conceito de descentralização e apresentar os modelos, as razões e as
estratégias geralmente empregadas para descentralizar políticas públicas. Na sequência, discute-se
a evolução das estratégias normativas de descentralização do SUS, nos anos 1990, comparando
o conteúdo das Normas Operacionais Básicas (NOBs) de 1991, 1993 e 1996, baseada em seis
aspectos fundamentais: a orientação federativa, a divisão de competências federativas, a natureza
dos instrumentos de descentralização, a estratégia de coordenação regional, os requisitos de adesão à estratégia de descentralização e o modelo de transferências financeiras intergovernamentais.
Ao final, são analisadas as implicações das estratégias adotadas no período para a capacidade de
inovar dos municípios.
No capítulo 3 – Democratização do Poder Local e as Dimensões da Inovação em Saúde:
desafios metodológicos da investigação – são apresentados, inicialmente, os objetivos e as hipóteses, que nortearam a pesquisa nas duas versões, assim como as categorias conceituais, que
permitiram tornar os conceitos centrais de democratização e inovação operacionais para a coleta,
a tabulação, a análise e a verificação dos resultados. Em seguida, constam os detalhes do processo
de construção e de aperfeiçoamento do instrumento de coleta de dados, as fases de distribuição
e retorno do mesmo, assim como a análise da representatividade amostral dos dados, a tabulação
das informações coletadas e, finalmente, os procedimentos de análise dos resultados e de construção do Índice de Inivação (ID).
A segunda parte do livro – Processo de Descentralização e Dinâmicas de Inovação Local
em Saúde: um estudo longitudinal – é composta por cinco capítulos, que contêm os resultados da
20
A presentação
pesquisa com a análise das mudanças observadas no perfil dos gestores, na gestão das secretarias
municipais de saúde, nas dimensões social, gerencial e assistencial e nos padrões de inovação.
O capítulo 4 – Renovação das Elites Locais em Saúde: perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde – discute as relações entre descentralização, democratização e elites gestoras locais
da política de saúde. Em seguida, são apresentadas as mudanças observadas no perfil dos secretários municipais de saúde no período de 1996-2006, baseadas nas características socioeconômicas
(características pessoais, origem social e situação atual), profissionais (qualificação e trajetória
profissional), de trajetória política e vida pública (experiência político-eleitoral, experiência associativa e participação política em saúde) e na relação com o cargo de Secretário (experiência no
cargo, motivos de designação/ aceitação e expectativas para o futuro).
No capítulo 5 – Governança Local no Sistema Único de Saúde: a dimensão social – discutem-se as relações entre descentralização e a configuração da governança local no setor saúde,
considerando os aspectos da relação Estado-sociedade. São apresentadas, inicialmente, as mudanças observadas na dinâmica entre os atores políticos na elaboração e execução do orçamento
e na definição de prioridades em saúde. Em seguida, aborda-se o funcionamento dos conselhos
municipais de saúde, os processos e instrumentos de prestação de contas das secretarias municipais de saúde, as informações disponibilizadas à população e, finalmente, as forças de apoio e
oposição à gestão.
O capítulo 6 – Modernização da Gestão Local do SUS: a dimensão gerencial – aborda
as relações entre descentralização e aperfeiçoamento gerencial dos governos locais no SUS. São
apresentadas, em seguida, as transformações ocorridas na gestão das secretarias municiais de saúde nos aspectos de gestão de pessoas, compras e serviços, regionalização e impacto da informação.
Finalmente, são apresentadas as mudanças sucedidas nas formas de obtenção de apoio técnico e
de construção de parcerias empregadas pelas secretarias municipais de saúde.
O capítulo 7 – Organização Local da Atenção à Saúde no SUS: a dimensão assistencial
– discute a relação entre descentralização e organização da atenção à saúde. Na sequência, são
apresentadas as mudanças observadas na forma e qualidade do acesso à média e à alta complexidade, nos mecanismos de identificação de demanda reprimida, nos recursos empregados na
organização da atenção à saúde. Finalmente, são abordados os níveis de difusão das ações e programas nacionais.
Finalmente, no capítulo 8 – Alterações e Persistências nos Padrões de Inovação Local em
Saúde – são apontadas as transformações e a resiliência observadas na difusão de inovações no
período de 1996-2006. Inicialmente, são apresentados os padrões encontrados de inovação no
âmbito nacional, por região e por porte populacional. Em seguida, são mostradas as relações
entre os padrões de inovações e as características da gestão nas dimensões social, gerencial e assistencial. Finalmente, são relacionados os padrões de inovação com o perfil dos gestores mais e
menos inovadores.
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Por acreditar que a descentralização seja um processo que se desenvolve com base em uma
trajetória histórica e institucional peculiar, delimitada pelos projetos políticos em disputa e pelas
limitações estruturais, mais que oferecer conclusões acabadas, esse estudo indica importantes
pistas para aqueles que se dedicam a estudar e a redefinir os rumos da construção do sistema
descentralizado de saúde. O produto mais importante que podemos oferecer a todos que, generosamente, distribuíram e responderam os questionários ou participaram de outra forma no
apoio à pesquisa, bem como aos novos gestores do SUS, é uma base metodológica para o estudo
do processo de descentralização, com vistas a compreender sua dinâmica e suas relações com a
democratização do poder local e com a inovação na gestão local.
Em 2016, uma nova década se cumpre e seria uma fabulosa oportunidade para conhecer o
que mudou em relação às décadas anteriores!
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PARTE 1
DESCENTRALIZAÇÃO, DEMOCRATIZAÇÃO DO
PODER LOCAL E INOVAÇÃO NA SAÚDE
Capítulo 1
Democracia, Poder
Local e Inovação
1. Fundamentos teóricos da democracia: Estado, sociedade,
cidadania
Que relações puderam ser construídas na recente experiência brasileira entre democracia, poder local e inovação? Esse tema
serviu de fio condutor desta investigação, que buscou com base na
análise empírica da construção do Sistema Único de Saúde (SUS)
responder a uma questão clássica da teoria política sobre as relações entre democracia e poder local, apoiada neste enquadramento setorial. Para isso, foram estudadas as possíveis influências da
descentralização na renovação das elites locais, nas condições de
governança e na capacidade de inovação na gestão pública.
A relação entre associativismo e eficácia dos governos locais é fundamental na análise política e tem sido discutida desde os clássicos. Tocqueville (1977) encontrou no associativismo
da sociedade americana a força motriz da busca do bem comum,
reconhecendo que a política generaliza o gosto e o hábito da associação, promovendo assim o aperfeiçoamento da associação
civil. No entanto, alerta para o paradoxo produzido pelas ideias
democráticas, baseadas na igualdade dos indivíduos, que levariam à uniformidade da legislação, o que favorece a centralização
e concentração dos poderes. A tensão entre poder local e governo
central, com as ameaças às liberdades individuais, o faz recomendar a fixação de limites ao poder social, como forma de dar aos
particulares certos direitos e lhes garantir o gozo inconteste destes direitos, conservando sua independência, força e originalidade
(Tocqueville, 1977).
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Sonia Fleury
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A importância da criação de instituições que promovam a individualidade é também uma
preocupação de John Stuart Mills, para quem a garantia da diversidade individual, face aos riscos da
uniformidade da democracia e ao temor da ditadura da maioria, associa-se à defesa do governo local:
“local provision is able to put to use local goodwill, enthusiasm and knowledge. Services can be more easily
tailored to the requirements of local people which can vary greatly from one place to another”. (Mills apud
Bremner, 2011: 1).
Se a complementaridade e a tensão existentes entre diversidade, associativismo e democracia
igualitária perpassam a teoria política, também está presente a dialética entre centralização e descentralização. Ao identificar a associação política como a reivindicação com êxito do monopólio legítimo
da coação para realizar as ordens vigentes, Weber (1991) não deixa de assinalar que a forma de legitimação racional-legal está baseada em que todo direito pode ser estatuído de modo racional, sendo a
judicatura a aplicação destas regras e a administração o cuidado responsável pelos interesses previstos
nesta associação (Weber, 1991).
Segundo ensina Perry Andersen (1984), paradoxalmente, encontram-se no absolutismo as bases estruturais dos fundamentos das relações entre Estado e cidadania e entre Estado e mercado. A
separação entre economia e política que tipifica o Estado moderno requereu, na Europa Ocidental,
sua precedência por diferentes tipos de monarquias absolutas, que introduziram o exército e a burocracia civil de forma permanente, o sistema fiscal nacional, a codificação do direito e os princípios do
mercado unificado.
Em outros termos, pode-se deduzir que a forma jurídica e a administração burocrática são
a contraface estatal dos direitos igualitários da cidadania, aplicados com base em critérios legais e
impessoais. No entanto, se o pressuposto racional-legal, de universalidade das relações contratuais
e de exercício da cidadania requerem a concentração do poder, não implicam, necessariamente, um
formato de administração centralizada.
A tensão entre centralização e descentralização é vista como essencial à ordem capitalista por
Rosa de Luxemburgo (1988). No entanto, o centralismo requerido para gerar a necessária homogeneidade na expansão capitalista se tornará prontamente um despotismo obscurantista, burocrático e
policial, entrando em contradição com a exatidão e a eficácia exigidas na produção.
A economia burguesa exige das repartições públicas uma sutileza e uma capacidade de adaptação
tais que a burocracia centralista, rígida e estereotipada por natureza, é incapaz de dar. Daí parte a
necessidade de se corrigir o rumo da moderna centralização, e assim, surge simultaneamente uma
tendência natural para o autogoverno local. Este tipo de instituição oferece a possibilidade de
uma mais adequada adaptação do aparelho estatal às necessidades sociais, mas também, devido à
influência direta e à coparticipação da sociedade nas funções públicas (Luxemburgo, 1988: 108).
Portanto, não foram estranhas ao desenvolvimento das sociedades modernas as dinâmicas paradoxais entre centralização e concentração do poder como parte da construção das democracias
modernas, assim como a conflituosa relação entre os seus princípios básicos referentes à defesa das
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
liberdades individuais e a busca coletiva por proteção social. Entretanto, o predomínio do Estado
sobre a sociedade ou os limites impostos ao exercício do poder estatal variaram, historicamente,
de acordo com as vias de transição ao capitalismo, o que certamente determina as dinâmicas entre
poder central e local, autoridade política e associativismo.
Foi possível identificar duas vias de transição ao capitalismo, em cada uma das quais o equacionamento entre estes polos foi realizado de forma distinta, gerando diferentes formatos institucionais da relação Estado e sociedade. Na via liberal, a burguesia se torna classe hegemônica e
dominante, rompendo com o padrão de relações tradicionais e conduzindo à economia de mercado. Seu credo liberal coloca obstáculos ao intervencionismo estatal com a defesa intransigente
das liberdades individuais e dos poderes intermediários representados pelo associativismo local,
opondo-se, porém, a todo tipo de tutela e de medidas de proteção social. Outra via de transição
é identificada como modernização conservadora (Moore, 1966), transformismo (Gramsci, 1968)
ou revolução pelo alto (Lênin, 1980), denominando um processo de transição capitaneado pelo
Estado, que propicia a articulação de uma coalizão conservadora entre as classes dominantes tradicionais e emergentes. A ausência de uma classe hegemônica que defenda os princípios liberais
propicia intervencionismo estatal e centralização autoritária, ainda que favoreça o desenvolvimento
de medidas tuteladas de proteção social.
A relação entre a dinâmica do mercado e a organização do poder político por meio de democracias representativas supõe como eixo articulador o processo de modernização capitalista. Considerando que as transições ao capitalismo comportaram mais de uma via, nas quais as relações
entre Estado e sociedade são marcadamente distintas, Bendix (1966) formula sobre o tema uma
proposição geral:
Ali onde a industrialização é obra de uma nascente classe empresária, é provável que esta classe
busque o reconhecimento social dos grupos governantes ao mesmo tempo em que suas ideias
e atividades econômicas desafiem muitos aspectos das tradições destes grupos. (...) Quando
a industrialização tem lugar em um país com um regime centralizado e autocrático, a classe
empresária buscará o reconhecimento de suas atividades econômicas por parte do governo
especialmente sob a forma de privilégios que facilitarão tais atividades (Bendix, 1966: 21-22).
Na teoria política contemporânea, a preocupação desloca-se desde a relação entre Estado e sociedade até a institucionalidade, que assegure a estabilidade das democracias, vista como dependente
do tipo de desenvolvimento dos sistemas políticos desde oligarquias fechadas até o governo de muitos,
ou poliarquia. Dahl (1997) identifica sequências históricas diferenciadas no desenvolvimento dos
sistemas políticos, cujas trajetórias podem seguir por um dos dois componentes da democracia, que
definem o eixo da liberalização (ou institucionalização da contestação pública) ou o eixo da inclusividade (ou participação). A perspectiva mais favorável à estabilidade da democracia seria, na visão desse
autor, o desenvolvimento baseado em regras partilhadas no interior de uma elite mais homogênea,
antes da abertura do sistema político já consolidado à participação das camadas populares:
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quando o sufrágio é ampliado antes de as artes da política competitiva terem sido assimiladas e
aceitas como legítimas entre as elites, a busca de um sistema de garantias mútuas provavelmente
será complexa e consumirá tempo (Dahl, 1997: 54).
Além da institucionalidade, outras variáveis, que condicionam o desenvolvimento dos sistemas
políticos, seriam: o nível de desenvolvimento econômico, a homogeneização por meio da educação e
comunicação e a criação de uma ordem social mais pluralista do que centralmente dominada, garantida a inexistência de desigualdades extremas (Dahl, 1997). Em outros termos, o próprio desenvolvimento do mercado via processo de industrialização daria conta da diversificação funcional, social e
econômica necessária à construção de uma sociedade pluralista, ao provocar a elevação das aspirações
e a dispersão dos recursos políticos.
Schumpeter (1984) forneceu argumentos econômicos para embasar essa orientação política
liberal, ao estabelecer a relação entre produção capitalista e ampliação das elites por meio da inovação.
A renovação das elites econômicas é vista como inevitável no processo evolutivo do capitalismo, o qual
está condicionado pela sua intrínseca capacidade de produzir inovações:
O impulso fundamental que inicia e mantém o movimento da máquina capitalista decorre dos
novos bens de consumo, dos novos métodos de produção ou transportes, dos novos mercados, das
novas formas de organização industrial que a empresa capitalista cria (Schumpeter, 1984: 112).
Essa destruição criativa, como o autor a denominou, revoluciona internamente a produção
econômica, criando incessantemente uma nova estrutura que a substitua. O capitalismo, ademais,
produziria uma nova civilização, racional e científica, portanto, propiciadora de inovações, pois eliminaria ideias místicas e românticas “e assim reformula não só nossos métodos de atingir nossos fins
como também os próprios fins” (Schumpeter, 1984: 167).
No entanto, essa racionalidade requer o descarte das ideias clássicas sobre a democracia, fundadas em valores como o bem comum, para se transformar em um método que pode ser discutido
racionalmente. E conclui que “o método democrático é aquele acordo institucional para se chegar a
decisões políticas em que os indivíduos adquirem o poder de decisão através de uma luta competitiva
pelos votos da população” (Schumpeter, 1984: 336).
À competição pela liderança entre as elites corresponde o papel dos eleitores para selecionar,
pelo voto da maioria, aqueles que serão os governantes. Quanto mais pluralista for a sociedade, mais
opções o eleitor terá para eleger, sendo a aceitação da regra da maioria a base da governabilidade. Neste sentido, apesar da crescente diferenciação funcional e diversificação dos interesses nas sociedades
modernas, a própria interação competitiva deveria ser suficiente para agregar interesses com vistas à
formação das maiorias.
Contemporaneamente, a sociedade civil passa a indicar uma arena de autonomia e liberdade
fora do Estado, onde a associação voluntária, plural e mesmo conflituosa é assegurada pela existência da democracia formal. Enquanto a abordagem teórica pluralista dá primazia à esfera privada, no
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
elitismo a esfera privada que mantém significado teórico diz respeito à dimensão da esfera pública,
correspondente à ordem institucional dominante (Romano, 2009). A teoria das elites políticas pressupõe que elas encontram sua força no fato de serem organizadas, podendo por isto usar a máquina
estatal para a realização de seus interesses enquanto os grupos dirigidos são mais numerosos, divididos
e desarticulados.
O tema da dispersão do poder na corrente pluralista, ou de sua concentração nos elitistas,
afasta-se da mera polarização entre democracia e autoritarismo, na versão da teoria das elites de
Mosca, ao discutir diferentes modos de formação das classes políticas, segundo seu poder seja transmitido por herança ou buscando realimentar-se nas classes inferiores (Bobbio, Matteucci & Pasquino,
1995). Em outros termos, a dispersão e o associativismo não asseguram mais a busca de construção
de maiorias eleitorais, enquanto a circulação e a renovação das elites podem ser um canal para a representação de interesses de novos grupos dirigentes. Enquanto os pluralistas buscam explicar as políticas
públicas com base na capacidade de organização dos diferentes grupos da sociedade, para inserir seus
interesses na agenda pública, os elitistas chamam a atenção para a diferenciação de recursos de poder
na sociedade e na influência que exercem sobre o Estado.
Além da identidade coletiva, é necessário ter em conta o nível da estrutura de oportunidades
socioeconômicas, na qual um grupo emerge e atua, já que as formas e práticas institucionais que são
proporcionadas ao grupo de interesse dentro do sistema político conferem status público à sua atuação
e não a outros. Offe − um autor cuja obra se insere no marxismo contemporâneo − se pergunta como
as mudanças funcionais na política pública afetam a estrutura institucional da política, tomando a
organização dos grupos de interesse como uma variável dependente da decisão da política pública
(Offe, 1989). Essa questão é fundamental na discussão dos processos de descentralização, posto que,
frequentemente, o governo central mantém controle da institucionalidade e pode definir políticas que
alteram a estrutura de oportunidades de organização dos grupos de interesse locais.
A articulação e a crescente interpenetração das arenas de decisão públicas e privadas são enfatizadas pela corrente do corporativismo, para a qual o ajuste, diante tanto da diferenciação funcional
quanto da maior interação entre Estado e sociedade, seria dado pela constituição de um todo organicamente interdependente (Schmitter, 1998; Stepan, 1980). A centralidade assumida pelo aparato
estatal de políticas públicas não implica, porém, na associação imediata entre corporativismo e autoritarismo centralizador (Stepan, 1980), já que o mesmo comporta formatos tanto inclusivos como
exclusivos. Estas novas formas de ajuste funcional das relações Estado e sociedade permitiriam diferentes conexões com a democracia, sendo o corporativismo estatal um controle autoritário do Estado
sobre as representações da sociedade e o corporativismo societário um crescimento da sociedade sobre
a arena política, em prol da negociação e legitimação das ações governamentais. No entanto, ambos
são fruto de reação das elites a percepções de crise de participação e ao controle, decorrentes do processo de modernização, sendo necessário usar o aparelho de Estado para forjar um novo equilíbrio na
relação da sociedade com o Estado.
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
No sistema político brasileiro encontram-se ambos os tipos de corporativismo – sendo o melhor exemplo do corporativismo estatal o sindicalismo corporativista implantado por Vargas – que
passaram a conviver com representações competitivas e plurais como as Centrais Sindicais. Recentemente, a criação de uma nova arquitetura institucional para a participação social deu origem a inúmeros Conselhos Setoriais, Comissões Intergovernamentais e Conferências, conformando um sistema
inovador de corporativismo societário.
A emergência do corporativismo é decorrente de uma transformação estrutural, por intermédio
da qual o Estado passa a ser autorizado a ser aquele que garante, por meio da ampliação das tarefas de
regulação e integração, a dinâmica do capitalismo. Isso requer maior experiência profissional, maior
capacidade contratual e de legitimação participativa, que só os monopólios organizados de representação podem garantir (Schmitter, 1998). Assim, a governança depende da capacidade dos sistemas
corporativos de sustentar a modernização das demandas por meio de soluções negociadas, com a responsabilidade dos dirigentes e a des-ideologização destas demandas por meio da participação inclusiva
e do estabelecimento de poderes contrabalanceados.
Dentro desta perspectiva, a social democracia que substitui a hegemonia liberal, na Europa,
pelo Estado do Bem-Estar Social é vista como um novo tipo de transformismo, estabelecendo um
compromisso entre trabalhadores e capitalistas acerca de condições econômicas possíveis de atender
aos interesses materiais sob o capitalismo, mesmo que com isso sejam solapadas as organizações classistas radicais (Przeworski, 1989). Da mesma maneira, pode-se entender que as pressões sociais, advindas
do movimento municipalista em conjunto com as do movimento sanitário, na transição democrática,
exigiram a descentralização como condição de governabilidade, o que implicou na criação de uma
nova institucionalidade capaz de expressar e dar continuidade a esse compromisso entre governo
central e elites locais.
A criação de uma nova institucionalidade democrática, além da representação eleitoral, é vista
como condição para a superação das críticas da democracia representativa como mecanismo eficaz de
agregação dos interesses e resolução dos conflitos em um contexto em que predominam: o crescente
poder de veto do capital, a progressiva complexidade técnica e a burocratização do processo de planejamento governamental, além das negociações informais entre grupos de interesse e burocratas (Offe,
1990). Tais fatores reduziriam a credibilidade das autoridades governamentais e colocariam em risco
as condições de governabilidade. Como solução para estes problemas que decorrem dos limites ou da
ausência de mecanismos efetivos de prestação de contas e de participação da população, Hirst (1992)
defende uma combinação entre a democracia representativa e os mecanismos corporativos de representação funcional dos interesses, que geram canais formais de influência recíproca entre governantes
e governados.
Para Offe (1989), o tipo ideal de corporativismo depende do número de grupos abrangidos e
do número de dimensões englobadas na atribuição de status público aos grupos de interesses. Os tipos
de status público são: status de recursos que designa o grau em que os recursos de uma organização
30
D emocracia , P oder L ocal e I novação
de interesse são supridos pelo Estado; status de representação, que define o grau em que o alcance da
representação é definido por meio de decisão política, status de organização, diz respeito ao grau em
que são reguladas as relações internas entre os membros da organização, e, status de procedimento
denomina o grau em que as organizações de interesse são licenciadas, reconhecidas e convidadas a
assumir um papel na política pública.
Portanto, o grau de autonomia ou de dependência das organizações da sociedade em relação
ao Estado quanto aos recursos, à representação política, à regulação da organização e aos procedimentos é que definirá o tipo de corporativismo como democrático ou não. Por exemplo, no modelo
corporativo que passou a vigorar no Brasil a partir dos anos 1930, a atribuição de status público para
assegurar a representação classista requereu a interferência estatal em relação a recursos, organização e
procedimento, o que reduziu a autonomia das organizações, reduziu sua capacidade de representação
e exacerbou o controle estatal sobre elas.
Mesmo assim, seguiram persistindo na estrutura de poder no Brasil as relações de patronagem
e clientelismo, que se caracterizam pela troca centrada no intercâmbio hierarquizado entre clientes
demandantes e patrões com poder de influência nas agências que administram o acesso aos recursos
públicos (Romano, 2009). Ou seja, enquanto no clientelismo há uma personalização informal do
acesso aos recursos públicos, no corporativismo há uma formalização do status público dos grupos organizados e autorizados a participar no processo decisório. Já nos modelos de representação em Conselhos, criados com a democratização, a atribuição de status público, embora envolva primordialmente
a representação, pode também incluir atribuições de status de recursos, aumentando a dependência
em relação ao Estado.
A compatibilização e as contradições entre as gramáticas políticas que organizam as relações de
exercício do poder no sistema político brasileiro vão adquirir maior complexidade na situação atual,
em que a linguagem da universalidade dos direitos da cidadania passa a ser identificada como a melhor tradução da própria democracia. Neste sentido, Nunes (2003) destaca a existência de diferentes
gramáticas, dependendo do grau de personalismo ou generalização, para identificar as relações entre
Estado e sociedade no Brasil: clientelismo e universalismo como polos, entre os quais se situariam o
corporativismo e o insulamento burocrático.
Se o sistema de representação política é uma das mediações necessárias entre Estado e sociedade, a outra mediação é a relação que se estabelece entre Estado e indivíduos, por meio da cidadania,
que compreende uma espécie de igualdade básica associada com o conceito de participação integral na
comunidade (Marshall, 1967). A garantia estatal de direitos e deveres formais associados ao status de
cidadania permitiu a compatibilização entre uma perspectiva igualitária no interior de uma sociedade
onde impera a desigualdade de classes, o que para Marshall (1967) tornou a cidadania, sob certos
aspectos, o arcabouço da desigualdade legitimada.
O caráter histórico e expansionista da cidadania é analisado por Marshall com base no caso
da Inglaterra, por meio do desenvolvimento diferenciado e combinado de componentes jurídicos –
31
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
direitos civis, políticos e sociais – e os correspondentes componentes institucionais – tribunais, parlamento, sistema educacional e serviços sociais. Sua historicidade em cada sociedade está dada por ser
a cidadania nada mais que uma hipótese, que rearticula o Estado à sociedade por meio de um status
jurídico-político, mas cuja realização – concessão e/ou conquista − será sempre uma materialização
concreta de relações de força, valores e instituições (Fleury, 2003a).
Por outro lado, não se pode ignorar que a expansão da cidadania, para além das liberdades negativas implícitas nos direitos civis, vai requerer cada vez mais a intervenção estatal até mesmo no caso
dos direitos civis, que também cobram a ampliação de algum tipo de institucionalidade que os salvaguarde. No entanto, os direitos sociais, por se consistirem em poderes, exigem a ampliação inexorável
da intervenção estatal. Impossível dissociar a conquista dos direitos sociais do fortalecimento do papel
do Estado, demandando uma crescente institucionalização da proteção social. Por isso, Bobbio (1993:
21) considera os direitos civis e os sociais como direitos antinômicos, pois “quanto mais aumentam os
poderes dos indivíduos, tanto mais diminuem as liberdades dos mesmos indivíduos”.
No entanto, a antinomia assinalada não aponta no sentido de que exista uma precedência
lógica ou uma irreversibilidade do curso ascensional da cidadania, como consideram muitos autores.
Afirmativas de consequências deletérias para o sistema político, no caso de inversão da ordem de
introdução dos direitos da cidadania, partem do pressuposto da identificação da democracia com as
liberdades civis e sua posterior expansão no curso já descrito como a via da liberalização. Essa posição
decorre de uma leitura incorreta do trabalho de Marshall, como afirma Held (1999) criticando a leitura evolucionista feita por autores como Giddens, já que Marshall assumia, em um enfoque contingente da mudança social, que as instituições e o complexo de direitos se desenvolvem em seu próprio
ritmo, sob a égide de múltiplas forças e princípios. A historicidade e especificidade da construção da
cidadania são decorrentes da ocupação destes espaços de disputa pelos sujeitos socialmente constituídos e do controle e vigilância pelo Estado, sejam estes sujeitos a classe trabalhadora ou os movimentos
sociais que hoje em dia reivindicam a igualdade com diversidade, ou direitos difusos, supranacionais.
Esta posição diverge radicalmente daquela que vê como uma das mazelas da construção da cidadania no Brasil o que é identificado como a inversão da sua ordem natural, na qual os direitos civis,
seguidos dos políticos, teriam que anteceder os direitos sociais, garantindo o reforço da convicção
democrática, tal como explicita Carvalho (2003):
A cronologia e a lógica da sequência descrita por Marshall foram invertidas no Brasil. Aqui, primeiro vieram os direitos sociais, implantados em um período de supressão dos direitos políticos e
de redução dos direitos civis por um ditador que se tornou popular (...). A pirâmide dos direitos
foi colocada de cabeça para baixo.
Santos (1993) vai além ao ver nesta trajetória a gênese da desordem, pois afirma que o recurso
à política social para resolver o problema de participação, em contexto de escassa institucionalização
política, deixou como saldo um modelo burocrático de produção da política, o que leva a política
social a deixar de ser um instrumento de integração política para ser um obstáculo à institucionaliza-
32
D emocracia , P oder L ocal e I novação
ção liberal. Neste sentido, as condições de governabilidade estariam ameaçadas não pela ausência de
redistribuição e inserção econômica, mas pela carência de uma sólida cultura cívica compartilhada que
respaldasse a institucionalidade e o exercício do poder.
O problema da governabilidade, na visão de Fleury (2003b), não está fundado na inversão de
um processo evolutivo inexorável da cidadania, mas sim na contradição paradoxal que se estabelece
entre a tentativa de manter uma ordem jurídica e política baseada no princípio da igualdade básica
entre os cidadãos e, ao mesmo tempo, preservar o maior nível de desigualdade do mundo no acesso à
distribuição de riqueza e aos bens públicos. As desigualdades entre indivíduos, grupos sociais e regiões
subtraem legitimidade ao exercício do poder e impossibilitam a coesão social.
No caso latino-americano, as lutas pela inclusão social na condição de cidadania, iniciadas
pelos movimentos e organizações sociais baseadas em suas carências e na incapacidade do Estado em
atendê-las, têm sido o principal elemento na construção de novos sujeitos políticos e na transformação
da institucionalidade existente (Forewaker & Landman, 1997; Fleury, 2003b). No Brasil, foi possível,
dessa forma, forjar uma nova tessitura baseada nas lutas sociais, em que se difundiu a consciência do
direito a ter direitos (Telles, 2006), projetando uma institucionalidade na qual a primazia dos direitos
foi assumida como parâmetro público a balizar o debate sobre justiça e legitimidade. O reconhecimento destes novos atores em uma esfera pública ampliada teve a capacidade de transportar suas
demandas e carências, sejam elas materiais, sejam de reconhecimento da identidade, desde o âmbito
do privado para a arena pública.
Certo é que desde a construção do Estado do Bem-Estar modificaram-se as relações entre Estado e sociedade, gerando, por um lado, uma forma institucionalizada de intermediação de interesses, a
atribuição de status público não só aos grupos como também aos indivíduos. A democracia adquiriu
um conteúdo substantivo definido pela condição de igualdade socialmente construída, enquanto o
Estado tornou-se ampliado em suas funções e instituições. Por outro lado, a sociabilidade foi afetada
com o deslocamento do conflito da esfera da produção para o consumo, compatível com o desenvolvimento do capitalismo, recriando as condições de coesão e pertencimento a uma comunidade
nacional.
Assim, a democracia passaria a incorporar outros componentes, além do funcionamento do
sistema institucional de garantia dos direitos civis e políticos, resumidos como “a oportunidade de
formular, exprimir e ter preferências igualmente consideradas na conduta do governo” (Dahl, 1997:
27). Trata-se de incluir no Estado democrático de direito, dimensões relativas à administração pública,
identificadas pela existência da efetividade das ações estatais via políticas públicas e pela governança,
relacionada à responsabilização dos agentes públicos e à existência de uma rede complexa de prestação
de contas daqueles que exercem o poder, ou accountability (O’Donnell, 2002; Pnud, 2004).
Além dos marcos políticos e jurídicos, a democracia passa a ser considerada em termos das
práticas institucionais e da cultura política, que organizam os comportamentos tanto dos agentes estatais como dos indivíduos em torno de valores igualitários da cidadania. O’Donnell (2002) denomina
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
“áreas marrons” a persistência em muitas das democracias latino-americanas de espaços territoriais
onde a legalidade do Estado não chega a alcançar, prevalecendo as relações de poder personalistas,
patrimoniais e mafiosas. Já outros autores chamam atenção para a convivência de diferentes práticas
e valores políticos, combinando uma nação moderna formada por leis constitucionais e administrada
pelo Estado, com uma coletividade tradicional onde a pessoa se define pelo lugar que ocupa na trama
relacional (Da Matta, 1988).
Estas contribuições chamam a atenção tanto para ausências quanto para a convivência de lógicas distintas, ou uma multiplicidade de sistemas de valores cívicos, que resultariam no que Santos
(1993) caracterizou como um híbrido institucional, que comprometeria a eficácia das políticas públicas baseadas em uma expectativa comum de comportamento da sociedade. No entanto, os fatores
que reproduzem estas distintas lógicas, encontradas tanto em relação à institucionalidade como em
relação à cultura política, devem ser buscados onde são produzidos por uma lógica de acumulação
singular que resultou em uma dissociação pragmática entre desenvolvimento capitalista e democracia
(Fernandes, 1976).
Nestas condições, a construção do Estado e a consolidação da nacionalidade, das quais o desenvolvimento da cidadania é, ao mesmo tempo, produto e parte essencial do processo de institucionalização do poder político, prescindiu na história brasileira da dimensão republicana da democracia, pela
qual entendemos não apenas o estabelecimento de regras abstratas universais como, fundamentalmente, a separação entre o público e o privado. Nesse enquadramento, as centralizações e descentralizações, que se conjugaram com regimes autoritários e democráticos, até recentemente não deixaram de
ser um jogo de compatibilização entre interesses de elites enquistadas nos governos central e regional.
A possibilidade de transcender esses limites se colocou no Brasil nos anos de 1970 e 1980, quando
a reivindicação do aumento da autonomia e do poder local projetou-se como defesa dos direitos da
cidadania.
Estas contribuições nos permitem entender o processo de democratização do poder local, com
base em algumas linhas de investigação que serão enunciadas a seguir:
1. O processo de transformação produtiva e social brasileiro, sob a égide do Estado autoritário e de uma coalizão de poder reacionária e excludente, gerou estruturas institucionais centralizadas e pouco permeáveis às demandas de inclusão regional e social,
porém fortemente articuladas aos interesses capitalistas, regionalistas e corporativos.
Exclusão, inclusão estratificada, benefícios convertidos em privilégios face à inexistência de regras universalmente aplicadas quanto à distribuição de recursos públicos,
são problemas recorrentes que passaram a ser enfrentados na construção de uma nova
ordem democrática.
2. A transição à democracia associou as demandas por inclusão social com os requisitos
de autonomia dos governos locais e renovação das elites dirigentes aos reclamos de
transformação da estatalidade, de forma a permitir que diferentes grupos de interesse
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
pudessem disputar a construção da agenda pública, sob a égide da justiça social e dos
direitos da cidadania.
3. A crescente complexidade e diversificação da sociedade brasileira plasmou-se na construção de uma nova institucionalidade pública, que comportasse diferentes formas de representação, com novos canais de interlocução e decisão entre agentes públicos e grupos da
sociedade civil aos quais foram atribuídos status público como partícipes da gestão pública.
4. A introdução de novas regras universais encontrou resistências consolidadas em práticas e
valores tradicionais cujas gramáticas preservam privilégios e mantêm a desigual distribuição de recursos, não apenas sabotando os princípios universalistas ao repor hierarquias,
mas, ao entrelaçar-se com eles, subvertendo-os e desacreditando as inovações institucionais
propostas.
5. A reorganização e modernização das formas de dominação e subordinação dos interesses
majoritários aos mecanismos de reprodução econômica e política provocaram perda de
legitimidade das propostas de modernização democratizantes, em função da baixa eficácia
apresentada pelas políticas públicas que materializassem a distribuição de poder e recursos
públicos.
6. A exigibilidade dos direitos deixa progressivamente de ser uma vertente da democratização
do poder local, diante dos limites materiais e políticos de sua prática, separando-se contraditoriamente como judicialização da política e como defesa da institucionalidade.
2. Governabilidade e governança
O processo de democratização foi acompanhado da erupção de novos atores com suas demandas tradicionalmente olvidadas, que reivindicavam mudanças políticas e institucionais que se materializassem em arenas e regras onde a transação de disputas e conflitos pudesse se dar com a ampliação da
participação no processo decisório, que define prioridades na alocação de recursos públicos.
A necessidade de construção de um pacto de poder que compatibilize autonomias locais com o
exercício do poder pelo governo central, em condições de grande diversidade territorial, tem sido desde então um dos desafios da democracia brasileira. A existência de profundas heterogeneidades em um
contexto no qual ganham força tendências centrípetas, que acompanham a democratização, repõem
a questão da governabilidade e governança no centro da discussão política. A busca da unidade na
diversidade e da autonomia com interdependência encaminhou-se para o desenho de um modelo de
federalismo cooperativo, marcadamente no campo das políticas sociais, no qual os três níveis governamentais concorrem para enfrentar o desafio da universalização da cobertura.
O enquadramento das questões relativas à representação, participação e redistribuição passa a
se dar nos marcos da busca de um novo desenho institucional, resguardadas as condições de estabilidade do exercício e da alternância do poder. Retoma-se o tema da governabilidade, que já ocupara
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
o debate acadêmico na América Latina nos anos de 1960, como parte de uma inflexão conservadora das teorias da modernização e desenvolvimento político. Nelas, a mobilização em torno
das demandas de participação e redistribuição, que emergiram como fruto da modernização, foi
identificada como disfuncional para a estabilidade do sistema político (Martins, 1994).
Apesar da fragilidade conceitual do termo governabilidade, é inegável sua força como
categoria estratégica (Fiori, 1997), já que, no passado, operou a dissociação entre o processo de
modernização e a construção democrática, entendendo que a sobrecarga das demandas junto à
debilidade institucional das democracias latino-americanas comprometeria a ordem necessária
para garantir o desenvolvimento econômico. Na discussão sobre a consolidação da democracia
na América Latina, essa temática da crise iminente de governabilidade retornou com bastante
expressão, ressaltando o risco de instabilidade institucional face ao excesso de demandas sociais
e devido à incapacidade de o sistema político processá-las (Martins, 1994; Lamounier, 1992).
As demandas sociais não são vistas como concretização da democracia, mas como ameaças que
podem provocar desordem política e econômica. Teme-se pela volta do populismo, entendido
como ação de governantes que se comprometem com o atendimento de tais demandas sem se
preocupar com a estabilidade do sistema econômico e político.
No momento atual, o tema da governabilidade não pode ser dissociado da nova ordem
mundial, na qual as reformas de Estado e as privatizações se impõem como condições para assegurar a preservação da estabilidade e do ambiente econômico como facilitador da acumulação
globalizada. A atualização deste debate retomaria a noção central de ordem, agora vista como
sinônimo de equilíbrio macroeconômico (Fiori, 1997), sendo a governabilidade traduzida como
a capacidade de manter coalizões políticas comprometidas em efetuar reformas estruturais, que
assegurem a estabilidade macroeconômica.
Por outro lado, a necessidade de construção de um novo pacto federativo, que garanta a
distribuição mais desconcentrada do poder, implica em investimentos públicos que reduzam as
disparidades entre regiões e indivíduos. Paradoxalmente, ao tomar a estabilidade macroeconômica como parâmetro da governabilidade, as restrições financeiras impostas aos Estados nacionais impedem a construção de democracias estáveis por meio da universalização da cidadania
entrelaçando seus componentes civis, políticos e sociais com um projeto de desenvolvimento
nacional. A equalização jurídica sem a redução das desigualdades extremas leva à dissociação
entre a participação e a redistribuição nas novas democracias, que se expressa na tensão entre
expectativas redistributivas frustradas e na imposição do ajuste fiscal. Demarcam-se, assim, os
limites da democracia na região, sendo as políticas sociais redistributivas e universalistas fortemente restringidas em sua execução e efetividade, aumentando as responsabilidades atribuídas
aos governos locais sem que sejam igualmente promovidas suas capacidades. Portanto, mais do
que a defasagem entre o excesso de demandas que não alcançam ser processadas por um sistema
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
institucional frágil, as ameaças à governabilidade decorreriam da subordinação das necessidades
e dos direitos sociais aos ditames da estabilização econômica em um contexto de supremacia dos
interesses do setor financeiro. Esse contexto macroeconômico impõe a recentralização dos recursos fiscais e do processo decisório, em clara contradição com os processos de descentralização em
curso. Desta forma, impede-se a transformação nas formas de exercício do poder e na maneira
tradicional de fazer política.
O atraso nas formas de fazer política e de entender a política impõe um ajuste estrutural que
rompa com os padrões históricos e contemple a diferenciação social que gerou nova complexidade da
estrutura social, com um processo concomitante de multiplicação e debilitação dos atores sociais, tornando sua representação cada vez mais difícil. Assim, os problemas atuais de governabilidade radicam
no atraso da política com respeito ao dinamismo das mudanças na sociedade latino-americana (Calderón & Lechner, 1998). Amplia-se a brecha entre Estado e sociedade, entre uma institucionalidade
estatal rígida e centralizada, porém dotada de baixo potencial de incorporação política em face de uma
estrutura social cada vez mais complexa (Diniz, 1997).
A necessidade de transformar a institucionalidade política para dar conta da complexidade de
um sistema multipolar de interesses requer uma transformação tanto da institucionalidade estatal
quanto dos canais de articulação desta com os interesses da sociedade, sem o que não se pode assegurar
estabilidade ao sistema político e consolidar a democracia:
Corremos el riesgo de una ‘modernización sin modernidad’; es decir, un proceso a espaldas o
en contra la voluntad ciudadana y, por lo mismo, sumamente inestable. La gobernabilidad
democrática se ve cada vez más afectada tanto por la incapacidad de las mayorías de participar
en la recreación y adecuación de las instituciones sociales, como por la incapacidad de estas por
reconocer los nuevos derechos individuales y colectivos de los ciudadanos (Calderón & Lechner,
1998: 13-14).
Diante de tais constrangimentos, as recentes democracias na região foram incapazes de promover a real expansão da cidadania, possibilitando apenas a instalação de regimes eleitorais competitivos
que, no entanto, não resultaram na geração de uma cultura democrática e de instituições políticas
universais. Por isso, foram identificadas como democracias minimalistas ou delegativas (O’Donnell,
1993) face à baixa capacidade de intervenção pública efetiva e à ausência de responsabilização dos
governantes, ou como regimes híbridos, isto é, democracias eleitorais com um estilo autoritário-tecnocrático de gestão econômica (Malloy, 1993).
Os requerimentos de composição de amplas coalizões eleitorais com vistas a assegurar a governabilidade em um sistema presidencialista com partidos nacionais fracos e interesses regionais
poderosos tornam os governantes prisioneiros de alianças com setores conservadores, aos quais são
oferecidas benesses e prebendas na gestão pública. Aliada ao caráter autoritário e tecnocrático da
gestão econômica, a gestão política conservadora se traduz na reprodução de gramáticas políticas
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
personalizadas e clientelistas, comprometendo a eficácia das políticas públicas e os programas para
os quais os dirigentes foram eleitos.
A ausência da dimensão republicana e a naturalização de práticas patrimonialistas em nome
da governabilidade terminam por levar ao enfeudamento do aparato estatal por poderosos interesses
privados, o que impede a generalização da dimensão igualitária da cidadania, por meio de processos
reais de inclusão, redistribuição e reconhecimento de outros sujeitos políticos. A prevalência destas
desigualdades frente ao Estado e no acesso aos bens públicos solapa permanentemente as dimensões jurídica e institucional das políticas universais, fragilizando a institucionalidade democrática
e impedindo a constituição de uma comunidade política, que é o fundamento da coesão social.
Isso possibilita a preservação de uma normatividade oculta, que organiza as condutas coletivas e
as interações sociais, que admite a passagem da igualdade entronizada nos códigos legais para uma
estrutura hierarquizada de poder, que se faz prevalecer na reprodução das estruturas sociais (Da
Matta, 1983).
Todos os fatores apontados impedem que as políticas públicas universalizem a cidadania,
seja pela subordinação das políticas sociais à estabilidade macroeconômica, ou pela incapacidade de
alteração da estrutura institucional tradicional de forma a refletir a nova complexidade social, seja
ainda pela manutenção de alianças políticas que perpetuam as práticas conservadoras e clientelistas
em detrimento da dimensão republicana, mantendo a lógica relacional hierarquizada no acesso aos
bens públicos. Desta forma, terminaram gerando ou promovendo condições que comprometem
a eficácia das ações públicas, favorecem a corrupção, impedem a responsabilização dos gestores e
frustram as expectativas populares. O setor público passa a ser visto com reservas, atribuindo-se ao
arranjo institucional estatal o fracasso das políticas públicas em termos de efetividade e eficácia.
O deslocamento que se processa deixa de questionar a natureza do pacto de poder para focar
a atenção no arranjo institucional que viabilize seu exercício, e a governabilidade cede lugar à ênfase
na governança. A importância de tratar da institucionalidade por trazer à tona a questão da gestão
pública não deveria, no entanto, obscurecer o debate sobre as relações de poder, já que a primeira é
também a materialização da segunda.
Os estudos sobre governança tendem a ter como foco o desenho institucional e as regras de
organização da participação dos atores nas disputas relativas às políticas públicas, visando acomodar
interesses e aumentar a eficácia, eficiência e sustentabilidade das políticas governamentais. Além
disso, tratam da transparência e coordenação na execução destas atividades com foco na responsabilização e prestação de contas pelas autoridades governamentais. Assim, a ênfase na governança
desloca a discussão política implícita na governabilidade, sobre o pacto de poder e o modelo de
desenvolvimento, para uma área mais propriamente técnico-administrativa, referida ao desenho e
à implementação das políticas. Para alguns autores, a própria governabilidade democrática é uma
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
variável dependente da capacidade dos governos de serem responsáveis e responsivos perante os
governados (Azevedo & Anastasia, 2002).
Ainda que o conceito de governança não se limite ao formato institucional e administrativo
do Estado, o desenho institucional é visto como crucial na definição do processo decisório e das formas de interlocução com os grupos organizados da sociedade. A governança depende da criação de
canais legítimos, eficientes e institucionalizados, da mobilização e do envolvimento da comunidade
na elaboração e implementação das políticas e da capacidade operacional da burocracia governamental na sua ação de provisão e regulação das políticas públicas.
A discussão sobre governança voltou-se para as falhas dos governos, sendo fortemente influenciada pela literatura do New Public Managment (NPM) - novo gerencialismo - e pelo Novo
Institucionalismo Econômico (NIE), cuja ênfase está colocada nos processos e mecanismos, que
impeçam que agentes públicos utilizem as oportunidades e recursos disponíveis em função de seus
próprios interesses. Portanto, a efetividade das políticas dependeria menos dos seus objetivos que
do sistema de incentivos e sanções estabelecidos, além da requerida transparência e responsabilização dos agentes públicos.
O resgate do valor público nas ações governamentais deixa de ter um conteúdo normativo
para ser atribuído, fundamentalmente, a uma cadeia complexa de relações entre agente e principal,
de forma a resguardar que os interesses dos cidadãos sejam considerados como principais pelos
agentes envolvidos (Przeworski, 1989). Nestas cadeias as relações assumem a forma de contratos entre os participantes e diferentes formatos de prestação de contas passam a ser exigidos dos
gerentes: para cima em relação às chefias, horizontal, entre os membros da organização, ou para
baixo quando envolvem o controle social, além daqueles implícitos nos direitos do consumidor no
mercado (Ferlie et al., 1996). Assim, a prestação de contas (accountability) deixa de ser vista como
uma relação entre servidores e eleitores, passando a incorporar a relação de agentes públicos com
os interessados, os stakeholders, considerada essencial para assegurar a governança (Pacheco, 1999).
Adicionalmente, a atribuição de responsabilidades é também requerida seja em termos de responsividade vertical ou ligação do governo com os cidadãos, seja por responsividade horizontal, relativa
às divisões funcionais e controles recíprocos entre órgãos do governo (Domingues Filho, 2004). A
noção de responsividade diz respeito a uma gestão sensível e que sabe responder ou corresponder
aos interesses dos diferentes grupos de stakeholders; por isso, Dowbor (2007) a vê como necessariamente mais democrática. Emerge uma noção de governança participativa (Dowbor, 2007) ou
governança local centrada no cidadão (Shah, 2006), como forma de superar tanto a administração
pública tradicional como o NPM. Assim, a ênfase desloca-se tanto da burocracia quanto da perspectiva do consumidor para situar-se nos atores interessados ou stakeholders, como resumido no
quadro abaixo.
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Quadro1 - Three models of public administration
Public Administration
Public Management
Responsive Governance
Citizen-state Relationship
Obedience
Entitlement
Empowerment
Accountability of
Senior officials
Politicians
Customers
Citizens, stakeholders
Guiding principles
Compliance with rules
and regulations
Efficiency and results
Accountability, transparency
and participation
Criteria for success
Output
Outcome
Process
Key attribute
Impartiality
Professionalism
Responsiveness
Fonte: UN, World Public Sector Report, 2005: 7.
No relatório das Nações Unidas identifica-se que o modelo de governança responsiva surgiu
como resposta aos problemas criados pela aplicação do NPM, sendo a ênfase deslocada dos princípios de mercado para a responsabilidade e participação. No entanto, considera-se que os valores
centrais do serviço público sejam a imparcialidade, profissionalismo e responsabilização, ou seja,
que cada um dos modelos de administração pública enfatiza um deles.
O modelo de governança (...) enfatiza um governo aberto e que se relaciona com a sociedade
civil, mais responsabilizada e melhor regulada por controles externos e a lei. Propõe-se que a
sociedade tenha voz através de organizações não governamentais e participação comunitária.
Portanto, o modelo de governança tende a se concentrar mais na incorporação e inclusão dos
cidadãos em todos os seus papeis de atores interessados (stakeholders), não se limitando a satisfazer
clientes, numa linha mais afinada com a noção de “criação de valor público” (UN, World Public
Sector Report, 2005: 13).
Apesar de se propor a superar o modelo da NPM, esta proposta de governança centrada no
cidadão é assumida pelas agências internacionais como parte da evolução natural na administração
pública, fundamentando-se também na teoria da agência, que estabelece a separação de funções, na
diferenciação entre agente e principal e na contratualização das relações entre eles (Fleury, 2003c).
Em outros termos, há uma identificação do interesse público com a lógica contratual privada, transformando o governo em um conjunto de agências que se relacionam por meio de contratos com
outras agências, públicas ou privadas. A criação do valor público seria dada por esta rede de relações
contratuais e pelos mecanismos de avaliação do desempenho e da prestação de contas, aos quais se
adiciona o componente de participação. A avaliação do desempenho do governo é feita com base
em sua capacidade como facilitador de uma rede de provedores (Shah, 2006). A novidade aqui é
que há um reconhecimento das imperfeições dos mercados de bens públicos, devido à assimetria de
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
informações, cuja solução levaria a um modelo de asseguramento privado (consumidor inteligente)
conjuntamente ao aumento da participação dos cidadãos.
Os princípios básicos que orientam as reformas institucionais neste modelo de governança
centram-se no respeito à preferência dos cidadãos (o que implica na livre escolha e, portanto, na competição e na responsabilização), que levaria a trabalhar melhor pelo menor custo, com o aumento da
qualidade e do acesso.
No entanto, a participação dos cidadãos usuários é tratada de forma equivalente à participação
dos demais interessados, sejam eles organizações privadas lucrativas ou não, que estão vinculadas a
esta rede de serviços. O papel do governo é o de mobilizador desta rede e garantidor dos princípios
mencionados, diluindo sua responsabilidade como provedor de bens públicos. O valor público surgiria destas interações entre agente e principal, não guardando relação com a propriedade estatal e com
os sistemas públicos de serviços.
Esta perspectiva desconhece a diferença de recursos de poder entre os diferentes interessados,
bem como a capacidade de alguns atores de capturar as arenas públicas em benefício próprio, em
detrimento do interesse público.
No Brasil a reforma administrativa conduzida por Bresser-Pereira (1996) foi justificada como
necessária para eliminar a administração patrimonial, suplantar a administração burocrática e introduzir a administração gerencial. As atividades de prestação de serviços nas áreas de políticas públicas,
inclusive sociais, foram consideradas de natureza pública, porém não exclusivamente estatal, devendo,
pois, serem regidas pelo princípio da competitividade entre entes públicos e privados. Neste sentido,
a noção de público descola-se da natureza da propriedade, pública ou privada, reconhecendo-se a
existência de um espaço público não estatal, também denominado de terceiro setor. A gestão privada
de serviços públicos como os de saúde passa a ser enfatizada como forma de suplantar a administração
estatal burocrática e aumentar a eficiência na prestação dos serviços.
Esta reforma pretendeu aumentar a capacidade decisória do governo e sua efetividade na prestação dos serviços. No entanto, o enfraquecimento da capacidade financeira, política e operacional
do Estado comprometeram seriamente a sua competência naquela que seria sua função mais relevante
neste modelo, qual seja a regulação dos mercados no sentido de assegurar os bens públicos e os direitos cidadãos, pressuposto necessário para diferenciar o Estado social-liberal do mero Estado liberal
(Bresser-Pereira, 2009).
Por outro lado, as imposições em relação à manutenção do equilíbrio fiscal pelos entes subnacionais, em especial a Lei da Responsabilidade Fiscal, limitaram a autonomia dos governantes no manejo
dos recursos orçamentários, principalmente em relação a gastos com pessoal. Dessa forma, tornou-se um
poderoso incentivo para que as políticas sociais locais, grandes incorporadoras de mão de obra, fossem
contratadas fora do setor público, em organizações não governamentais chanceladas pelo governo como
de interesse público, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Publico (OSCIP), ou Organizações
Sociais (OS), criadas com a finalidade específica de assumir a gestão de um bem público.
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Além da contratação na prestação de serviços públicos, a perspectiva do institucionalismo
econômico vê a governança em redes como meio de assegurar que as decisões sejam baseadas no
mais amplo consenso, superando as falhas tanto do governo quanto do mercado (Shah, 2006).
Neste caso, a governança diz respeito ao conjunto de instituições e regras que fixam os limites e
os incentivos para a constituição e o funcionamento de redes interdependentes de atores governamentais, do setor privado e da sociedade civil, assumindo a importância de uma ação combinada
para o desenvolvimento (Prats, 2004).
A diluição da noção central de governo em um conceito de governança mostra que as fronteiras entre Estado, mercado e sociedade se mesclaram. Mas, a pouca ênfase no sistema político não
é isenta de uma orientação que privilegia o mercado e que transforma cidadãos em consumidores,
organizações sociais em parceiros e capitalistas em stakeholders, em nome da busca de governança
(Fleury, 2003c). No entanto, a governança, para Guy Peters (2003), segue como atributo dos governos centrais, posto que sua atividade primordial seja a articulação de um conjunto de objetivos
e prioridades comuns à sociedade, e não apenas aos meios e mecanismos de execução das políticas.
A despolitização do debate em torno da governança e da reforma administrativa procurou
desqualificar a burocracia, considerando-a como antítese tanto da eficiência quanto da democracia, com base na sua inflexibilidade, ênfase procedimental exagerada e defesa de interesses
corporativos. Não foi reconhecida, dessa forma, a necessidade da burocracia meritocrática como
imprescindível para assegurar o tratamento igualitário pressuposto na condição de cidadania, bem
como foram ignorados os riscos de substituição da administração burocrática por modelos gerenciais voltados para os interesses empresariais. Só mais recentemente, a crise econômica europeia
elucidou quão inflexíveis são os contratos de parceria firmados entre governos e empresas privadas,
cujos custos tiveram que ser assumidos pelo setor público.
A dilapidação e o desprestígio das carreiras públicas, a redução das atribuições e funções
estatais, a ausência de um projeto de desenvolvimento e a introdução de mecanismos gerenciais
de mercado ou quase mercado criaram um ambiente desfavorável às políticas responsáveis por
assegurar os direitos sociais conquistados com a democracia.
A diluição da centralidade das noções de governo e do poder político fez parte do modelo
empresarial, que se aplicou à privatização do Estado e que foi fortemente impulsionada pelos organismos econômicos internacionais. A governança, nesse caso, escamotearia a relação e a responsabilidade entre governantes e governados, afetando o princípio da garantia de direitos, substituídas
pelos automatismos anônimos da empresa e do mercado, afetando assim toda a sociabilidade:
(...) despojado da capacidade de governar as complexidades da sociedade de mercado e sem o
poder suficiente para monopolizar legitimamente o caos da nova ordem global, as violências e os
terrorismos que este mesmo mercado produz o Estado deixa também de ser o lugar privilegiado
do direito (Parga, 2009: 112).
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D emocracia , P oder L ocal e I novação
O paradoxo neoliberal, no entanto, é apontado por Calderón e Lechner (1998: 22), ao identificarem que o projeto de substituição do Estado pelo mercado e da política pela economia termina
por perpetrar o primado da política, já que o desmantelamento do Estado só pode ser feito com base
em uma profunda intervenção política.
Após anos de aplicação do receituário liberal na América Latina, a conclusão de Ocampo (2008)
é que a excessiva ênfase nos instrumentos mais do que nos princípios que deveriam guiar as políticas
sociais terminou derrotando esta visão estratégica, ao não ser capaz de atingir as metas de crescimento
econômico e combate à pobreza na região. No entanto, a subordinação do investimento e do gasto
social aos parâmetros econômicos de combate à inflação, a manutenção do superávit primário para o
pagamento dos serviços da dívida e do câmbio flutuante, aliada à desorganização das carreiras públicas
e à introdução de diferentes parcerias público-privadas continuam a ser o cenário predominante no
qual a consolidação dos direitos sociais transita com dificuldades.
A prevalência deste modelo de reforma do Estado a partir dos anos 1990, no entanto, não
impediu que perspectivas críticas se fizessem presentes no debate teórico e também no enfrentamento
político, desenhando uma estratégia democratizante para a reforma do Estado (Fleury, 2003c). Em
outros termos, postulou-se que a consolidação da democracia impõe uma mudança do Estado que
transcenda a reforma administrativa e retome a discussão sobre a questão do pacto de poder, para que
tenha em conta a necessidade de reorganização da economia nacional frente à economia mundial e
que incorpore a essencialidade e relevância da integração social no projeto de desenvolvimento.
Trata-se da busca de um novo modelo de desenvolvimento que dá primazia à concepção participativa e deliberativa da democracia, à reinvenção político-institucional e à renovação do perfil
dos administradores públicos, que Paula (2005) denomina como administração pública societal. A
subordinação das políticas estatais a critérios objetivos de justiça distributiva deve gerar uma nova
institucionalidade e dinâmica operacional, orientadas por critérios impessoais, objetivos, universais em um processo decisório participativo e um poder de gestão compartilhado com a sociedade
(Fedozzi, 1997). Além do caráter normativo, a atualização do sistema político e do modo de fazer
política é cada vez mais requerida para fazer frente à necessidade de adequá-lo diante da complexidade
de uma sociedade crescentemente diferenciada e das transformações sociais impostas pelas inovações
tecnológicas e pela valorização do conhecimento. A complexidade impõe novos métodos e melhores
conhecimentos, gerando a demanda por uma nova perspectiva de gestão que seja estratégica, cooperativa, democrática, participativa e solidária (Nogueira, 1994). A revalorização dos governos locais é
parte dessa nova conjuntura.
Shah (2006) considera que existem cinco perspectivas teóricas que buscam explicar os modelos
de governo local. Algumas delas, como o federalismo fiscal e a NPM, estão voltadas para superar as
falhas do mercado e entregar bens públicos de forma eficiente e equitativa. Outras, como a escolha
racional e o NIE, enfatizam a superação das falhas do governo. Por fim, a teoria da governança em
rede busca arranjos institucionais, que superem tanto as falhas do mercado quanto as do governo.
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Encontra-se nessa última perspectiva − da governança em redes − uma convergência entre os modelos
de reforma do Estado de orientação liberal e também de orientação democratizante, já que se impõe
a ambas o cenário de enfrentamento de questões como a complexidade, a escassez de recursos ou
ausência do monopólio de informações e a necessidade de novas formas de coordenação estratégica.
As transformações pelas quais passaram o Estado e a sociedade, como consequências do processo de modernização, caracterizaram-se pela crescente diferenciação do tecido social, o que colocou
novas necessidades em relação ao processo de coordenação social. Lechner (1997) identifica dois
paradigmas tradicionais de coordenação: por um lado, a coordenação política exercida pelo Estado
de forma centralizada, hierárquica pública e deliberada. Por outro lado, o paradigma de coordenação
via mercado implica em ações descentralizadas, privadas, horizontais e não deliberadas (equilíbrio
espontâneo dos interesses). Se bem que o paradigma do mercado esteja mais capacitado para enfrentar as demandas atuais de diversificação territorial e funcional, ele se mostra incapaz de fazer face às
necessidades de redistribuição e equidade.
No campo das políticas públicas, um fenômeno recente, cada vez mais frequentemente observado, é a existência de redes, ou as estruturas policêntricas, que envolvem diferentes atores, organizações
ou nódulos, vinculados entre si, baseados no estabelecimento e na manutenção de objetivos comuns e
numa dinâmica gerencial compatível às interdependências e adequada para a geração de coordenação
entre eles. (Fleury & Ouverney, 2011). Particularmente na América Latina, a proliferação de redes
de políticas sociais deve-se aos dois macrofenômenos que definem o contexto atual destas políticas,
quais sejam os processos de descentralização e de democratização que marcaram essas sociedades nas
últimas décadas. Tanto a descentralização supõe a inclusão dos governos subnacionais nos processos
de formulação e implementação das políticas sociais, quanto a democratização favoreceu a emergência
e consolidação de um rico tecido social composto por uma diversidade de atores políticos alicerçados
em torno das demandas sociais.
Porém, como fenômeno geral, as redes são fruto da desterritorialização dos mercados e das
políticas econômicas globalizadas com os consequentes processos supranacionais de integração regional. A emergência de redes de políticas representaria a tentativa de criação de novas formas de
coordenação, capaz de responder às necessidades e características do contexto atual, em que o poder
se apresenta como plural e diversificado. As redes de políticas são concebidas como formas particulares de governança dos sistemas políticos modernos, centrando-se na estrutura e nos processos por
meio dos quais as políticas públicas se estruturam. Para Cole e John (1995), o interesse em adaptar
o conceito de redes de políticas para estudar padrões de governança local reside no reconhecimento
da multiplicidade dos atores locais dependentes uns dos outros e cuja cooperação pode ajudá-los a
enfrentar pressões externas, reduzir as incertezas e aumentar a eficiência em suas ações políticas. No
entanto, conservam sua autonomia e suas identidades individuais, embora compartilhando responsabilidades para a gestão de políticas em comum e desenvolvendo um padrão de interdependência
coordenada (Rhodes, 1986).
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Dentro desta perspectiva há um deslocamento da ênfase dos estudos anteriores de governança,
centrada no processo decisório envolvido na construção da agenda pública e na formulação da política, que passa a ver a implementação das políticas em rede como o lugar central de construção de consensos e superação dos conflitos e de interesses particularistas. Existe uma forte tendência no campo
das políticas sociais para a criação de redes locais, que vinculam fortemente a gestão das políticas ao
território e a uma população específica. Sua aplicação ao campo das políticas sociais decorre da concomitante redução do tamanho e dos recursos disponíveis para o governo central, evidenciando sua
incapacidade para dar resposta efetiva tanto aos mais complexos problemas sociais como aos anseios
de autonomia local.
As suposições implícitas na governança em redes são de que as sociedades modernas caracterizam-se pela diferenciação social e setorialização, o que sugere crescimento político, mas tem implicações sobre a diversificação e a desagregação da capacidade dos atores de responder isoladamente e de
forma efetiva aos problemas complexos para os quais seus recursos se mostram limitados. Da mesma
forma, a crescente mobilização da sociedade civil, que cobra atenção em respeito às diferenças sociais
e a organização de um setor não governamental que atua cada vez mais no campo das políticas sociais,
bem como o aumento da ação social das empresas, contribuem para o aumento dos conflitos e a diversificação dos atores envolvidos nas redes de políticas.
Adquirem relevância as propostas de descentralização das políticas públicas nas quais o poder
local assume papel fundamental na articulação entre organizações governamentais, empresariais e sociais, ampliando a rede de ação pública por meio da inclusão de novos atores políticos. Na rede, eles
estabelecem um padrão de relações não hierárquicas e independentes, relativamente estável, baseado no
entendimento de que a cooperação é a melhor maneira para alcançar as metas comuns (Börzel, 1997).
Consequentemente, há uma tendência para a crescente interdependência funcional entre atores
públicos e privados na consecução de uma política, sendo as redes de políticas o meio para garantir a
mobilização dos recursos dispersos e dar uma resposta eficaz aos problemas de políticas públicas. As redes de políticas envolvem tanto a mobilização de atores e os movimentos sociais em torno de um problema político quanto a gestão de estruturas de interdependência, caracterizadas por relações intergovernamentais e interorganizacionais. Em ambos os casos, a gestão das políticas públicas coloca novos
problemas de coordenação de interdependências entre diferentes nódulos de uma rede que não tem
a autoridade hierárquica como princípio fundamental da sua organização. A descentralização política
e administrativa tende a gerar estruturas de redes, ainda que sejam do tipo em que predominam as
relações intergovernamentais. Se os processos de descentralização provocam uma fragmentação inicial
da autoridade política e administrativa, eles precisam gerar formas novas de coordenação, que buscam
garantir a eficácia da gestão das políticas públicas. O perigo para as autoridades locais é decorrente da
perda da coesão garantida pelos sistemas centralizados e pelo fortalecimento da autonomia e independência funcional das unidades sem o desenvolvimento de contrapesos que garantam a integração do
sistema de políticas, a agregação e coerência necessárias ao êxito dos governos locais (Pratchett, 1994).
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No entanto, a descentralização tende a transcender as relações intergovernamentais quando
ela envolve o componente de participação social. As redes locais de políticas sociais criam possibilidades
de participação da população na formulação e gestão das políticas sociais, além de ressaltar o papel de
liderança dos governos locais na articulação de atores públicos e privados, o que, ao invés de um enfraquecimento do Estado, sinaliza em direção à sua transformação. As redes de políticas sociais têm sido
vistas como instrumento fundamental para a gerência das políticas sociais, pois permitem a construção
de novas formas de coletivização, socialização, organização solidária e coordenação social, compatíveis
com a transformação tanto da sociedade civil quanto do Estado (Junqueira & Inojosa, 1992).
Neste sentido, as redes transcendem o papel de mero instrumento gerencial, na medida em que
permitem gerar relações baseadas na confiança (capital social) e nos processos gerenciais horizontalizados
e pluralistas (esfera pública democrática). No entanto, a existência de estruturas policêntricas não pode
escamotear a persistência da desigual distribuição do poder, nem as dificuldades gerenciais inerentes ao
processo de gestão pública em uma estrutura reticular.
Diante dessas questões, o debate sobre o papel do Estado ressurge. A constatação de Prats (2004)
é que, apesar das mudanças na administração pública, devidas ao aumento de discricionariedade e interdependência funcional, o Estado democrático de direito ainda segue como instância decisiva para a
governabilidade, embora seu papel tenha mudado, pois, cada vez mais, ele será um “gestor de interdependências”, entre desafios, atores e estratégias situados no largo eixo local-global.
Outros autores identificam uma baixa estatalidade, por meio das quais diferentes atores buscariam coordenadamente suplantar essa carência. Estudos sobre a governança em condições de baixa
estatalidade assumem que, nestes casos, ela é alcançada com o envolvimento de atores não estatais, e de
forma não hierárquica, incluindo a barganha e a competição. Esta rede de governança não complementa
a estatalidade hierárquica, mas tem que prover equivalentes funcionais ao Estado. Portanto, a governança
em áreas de baixa estatalidade é uma governança de múltiplos níveis, cujos elos entre o nível local com o
nacional, o regional e o global baseiam-se em uma soberania compartilhada (Risse & Lehmkuhl, 2006),
já que a provisão de bens públicos é parcialmente suprida por agentes externos ao Estado.
Estes estudos, muitos deles tendo como base países africanos, têm importância por chamarem a
atenção para o etnocentrismo do conceito de estatalidade e para a ficção da separação entre público e privado, que alimentam a noção de soberania de Estados totalmente consolidados na comunidade internacional.
Além disso, buscam demonstrar que a debilidade do Estado não se transforma necessariamente em uma
ausência de ordem política ou em uma situação de ingovernabilidade hobbesiana. Isto porque assumem que
o conceito de governança diz respeito aos vários modos de institucionalização da coordenação social para
produzir coletivamente regras ou prover bens coletivos. Assim, identificam haver situações de governança
pelo governo, ou a existência de redes cooperativas, o que significaria governança com o governo e situações
de autorregulação social pela sociedade civil, ou seja, governança sem governo. As soluções de governança
compartilhada ocorrem tanto em situações de Estados consolidados, articulados em redes supranacionais,
como em casos de autogovernança pela sociedade civil, na ausência do Estado como garante a lei.
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No entanto, toda esta construção está baseada na situação de ausência de um Estado integralmente funcional, capaz de implementar políticas públicas efetivas e garantir os direitos e a ordem pública. Essa condição de excepcionalidade, porém, distancia-se dos requerimentos apontados em países
que buscam consolidar a democracia em situações de elevada diferenciação funcional, mobilização
social e demandas por aprofundar uma transformação que já está se processando nas relações entre
Estado e sociedade. Essa envolve o redesenho das relações entre o poder político nos níveis global,
nacional, regional e local.
Em outros termos, fenômenos concomitantes relativos à complexidade social crescente, diferenciação funcional, ausência do monopólio de recursos e capacidades, às transformações nas funções
administrativas do Estado, à desconcentração do poder, descentralização da administração e desterritorialização da economia, baixa capacidade ou ausência do Estado, são todos eles fatores que contribuiriam para novas modalidades de coordenação de múltiplos nódulos interdependentes em uma
estrutura reticular de políticas públicas.
É necessário, porém, ter em conta as limitações das redes de políticas no cumprimento de certas funções públicas, de caráter nitidamente estatal, como, por exemplo, a garantia de direitos sociais
e a regulação. Finalmente, é imprescindível enfrentar os novos desafios impostos pelos processos de
fragmentação e exclusão social, que impedem a geração de consensos e ameaçam as condições de
governabilidade e governança nas sociedades, diluindo a confiança e impedindo a horizontalidade
pressuposta na construção das redes.
Contrariamente àqueles que veem no modelo atual de desenvolvimento a dissolução do protagonismo estatal, outra corrente afirma que a rearticulação entre Estado e sociedade por intermédio
de um projeto de desenvolvimento integral e sustentável repõe a necessidade da efetividade da intervenção estatal, ainda mais quando a distribuição, além da acumulação, se coloca como crucial. O
equacionamento da questão da iniquidade não pode ser deixado ao mercado, assim como o próprio
mercado requer um conjunto de normativas que assegurem seu pleno funcionamento (Rueschemeyer
& Evans, 1985).
A necessidade de resgatar o papel do Estado no desenvolvimento leva Stephan (apud Skocpol,
1985) a afirmar que o Estado deve ser visto além do governo, ou seja, como o sistema administrativo,
legal, burocrático e coercitivo, uma vez que ele tem um papel crucial na estruturação não só das relações da sociedade civil como da autoridade pública, mas também organiza muitas relações cruciais
no interior da própria sociedade civil. As ações estatais afetam a cultura, encorajam a ação coletiva e
a formação de certos grupos, dificultam a composição de outros e levantam determinados problemas.
Neste sentido, influenciam as próprias elites proprietárias no capitalismo.
O Estado, ainda que não possa escapar de ser um meio de dominação coerente com os interesses das elites, será disputado por vários grupos, buscando usá-lo para realizar seus interesses particulares, o que pode levar à sua captura, fragmentação ou paralisia, argumentam Rueschemeyer e
Evans (1985). Isso coloca o desafio de manter sua unidade como capacidade de ação, apesar do
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reclamo de ser o guardião dos interesses universais da sociedade. Este problema torna-se mais
agudo quando as ações estatais requerem a descentralização para aumentar a eficiência, já que
uma burocracia altamente centralizada leva à perda de informação e priva as subunidades de
iniciativa.
Evans (1995) postula que a autonomia estatal é fundamental para garantir a sua coerência
e unidade, mas não é suficiente, posto que o Estado desenvolvimentista necessita ter a habilidade
de transformar a própria sociedade. Ou seja, ele deve ser ao mesmo tempo, autônomo o suficiente
para garantir sua unidade, mas não ficar insulado e sim imerso em uma rede de relações sociais
que lhe permita ter maior informação e incidência. Autonomia com inserção são conceitos aparentemente contraditórios, mas constituem-se na chave para o sucesso do Estado desenvolvimentista: enquanto a autonomia protege o Estado da captura por interesses particulares e perda de
direção, a sua conexão com as redes de atores sociais aumenta a coesão em torno de um projeto
coletivo (Evans, 1995).
Se a perspectiva do desenvolvimento territorial privilegia a descentralização e a governança
em redes locais, sem maior preocupação com a questão distributiva, a proposta da autonomia
permite entender a estratégia da ação estatal na condução do desenvolvimento industrial, mas
mostra-se insuficiente para dar conta da construção de um projeto de desenvolvimento social. A
articulação entre elites dirigentes burocráticas e empresariais pode ser propulsora de um projeto
de crescimento com aumento da exclusão social. Os componentes de autonomia e inserção não
levam em conta que a redistribuição não é mero fruto do crescimento, mas da democratização
do Estado.
Já a emergência de uma perspectiva integral e sustentável do desenvolvimento passa a
entendê-lo como uma transformação da sociedade, que vai além das relações tradicionais e das
formas de pensar usuais, deslocando o eixo do paradigma do desenvolvimento desde os temas
econômicos aos aspectos redistributivos. Neste sentido, a sustentabilidade do desenvolvimento
depende de uma forma de participação que vá além da votação e da representação, incorporando
processos de diálogo aberto e o compromisso ativo da cidadania. Em outros termos, o desenvolvimento de capacidades, por meio de processos redistributivos com forte presença de políticas
transparentes que evitem a concentração da riqueza e do poder, constitui a base do novo paradigma do desenvolvimento (Stiglitz, 2000; Hanzel, 1991; Thomas, 2001; Sen, 2000).
Vê-se, pois, superada a tradicional ideologia do desenvolvimentismo (Cardoso, 1977),
visto como sinônimo de ordem e grandeza da prosperidade nacional, sendo os eixos centrais
desse novo paradigma do desenvolvimento o empoderamento e a sustentabilidade. No entanto,
esse autor também não problematiza a questão do poder, o que fica evidente na sua incapacidade
de diferenciar entre poder de (habilidade) e poder sobre (controle), segundo análise de Pieterse
(1992), que assinala sua incapacidade de compreender a distância entre empoderamento como
aquisição de habilidades ou como busca de controle e de emancipação.
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Visto como mudança na correlação de forças e no aumento das possibilidades de subjetivação e emancipação é preciso ter em conta que o desenvolvimento social requer mais que habilidades, compreendendo a expansão da esfera pública em que os sujeitos confrontam suas identidades e
projetos em torno da distribuição de recursos. A efetividade da esfera pública, segundo Habermas
(1992), só se torna politicamente relevante na medida em que permite que os participantes na
economia, por meio de seu status de cidadão, possam acomodar mutuamente ou generalizar seus
interesses de forma a assegurar que o poder estatal seja transformado em um meio fluido de autoorganização social.
Assim, as tendências desagregadoras do mercado precisam ser contrabalanceadas por um papel
primordial do Estado na igualação dos cidadãos e na transação dos conflitos dentro de regras claras
de acesso aos bens públicos. Por outro lado, a existência de sujeitos que se interpelam mutuamente é
responsável pela coesão social, o que remete, por fim, a compreender a consciência cidadã e seus reclamos de maior participação, como o maior bem público das democracias recentes. Na ausência destas
condições, a transformação da estrutura produtiva e a modernização de todos os sistemas funcionais
podem reproduzir o que Lechner (2000) identificou como o paradoxo da modernização no Chile, que
dissociou modernidade da subjetividade. Sua constatação é que os notáveis êxitos da modernização
coexistem com um difuso mal-estar social, que se exprime por sentimentos de incerteza e insegurança,
que ele identificou como o medo da exclusão, o medo ao outro e o medo à falta de sentido.
Por um lado, a negação da cidadania implica a ausência de garantias legais de sua reprodução
e sua subordinação às incertezas e diferenciações do mercado, e, por outro lado, a lacuna de vínculos
civis e de espaços de reconhecimento por meio dos quais se traduzem os dramas cotidianos, individuais e coletivos, na linguagem pública dos direitos (Telles, 2006).
A exigibilidade dos direitos requer a existência de uma burocracia autônoma, como condição
e fundamento para ser o suporte material da igualdade política dos cidadãos, distinguindo-se da administração patrimonial, cujo uso de bens públicos de forma discricionária e diferenciada denega a
igualdade e a universalidade dos direitos. No entanto, a sociedade mobiliza-se e cobra do Estado um
governo republicano e, contraditoriamente, a sua ausência gera um processo de construção de milhares de organizações que promovem a auto-organização da comunidade em torno dos seus interesses
particulares, predominantemente os situados na esfera da reprodução, que cria uma esfera pública
não estatal, que gera novas formas de autonomia e inclusão alternativas, como afirma Genro (1997).
Estas organizações são mediadoras da ação política direta dos cidadãos e criam condições para inserir
seus interesses e reformar o exercício do poder político ao nível local. Diferentemente da perspectiva
da governança em situações de baixa estatalidade, a organização da sociedade busca a expansão da
esfera pública por meio da extensão e gozo da cidadania, o que só pode existir com o fortalecimento
e democratização do Estado.
Dessa dialética entre expansão de regimes democráticos com cidadania restringida surge uma
forte pressão pela mudança da institucionalidade e do aprofundamento da democracia. Defende-
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mos a tese que afirma que a limitada construção da democracia na região introduziu a reivindicação
cidadã de um direito de quinta geração (além dos direitos civis, políticos, sociais e difusos), que
corresponde à demanda por uma gestão deliberativa das políticas públicas, em especial, das políticas
sociais (Fleury, 2003a).
A construção de uma esfera pública fortalecida requer a superação da exclusividade dos mecanismos de representação territorial por meio do sistema eleitoral e da disputa partidária combinada
a uma administração burocrática weberiana. Esses, que foram os suportes da cidadania universal
mostraram-se frágeis e foram incapazes, nos casos dos países em desenvolvimento, de incluir, na esfera
pública, múltiplos grupos de excluídos. O sistema de representação de base territorial e a competição
eleitoral são imprescindíveis para garantir a pluralidade e a representação democrática, mas são insuficientes, em função da distribuição desigual dos recursos e dos mecanismos de exclusão social, para
assegurar a universalização da cidadania.
A experiência de construção de uma esfera pública ampliada requer uma nova estatalidade,
criada, muitas vezes, como fruto da auto-organização da sociedade em torno de suas necessidades
transformadas em demandas cidadãs. Questões de governabilidade e governança não podem ser equacionadas se for desconhecida a necessidade de construção de uma nova arquitetura institucional do
poder, que permita acomodar as tensões relativas ao inacabado pacto federativo com aquela emergente
com a revitalização da estrutura corporativa e, ademais, contemple novas formas de participação com
inovações na cogestão das políticas públicas. Mas, isto requer profunda transformação das estruturas
estatais e das práticas políticas tradicionais, de forma a permitir que os interesses, até então excluídos,
possam ser inseridos na agenda pública e disputar recursos em condições publicamente arbitradas.
Podem ser extraídas algumas proposições dessa discussão, tais como:
1. Com a democratização aumenta o desafio de construção de um pacto de poder que compatibilize autonomias locais com o exercício do poder pelo governo central, em condições
de grande diversidade social e territorial. A existência de profundas heterogeneidades em
um contexto no qual ganham força tendências centrípetas, que acompanham a democratização, repõem a questão da governabilidade e governança no centro da discussão política.
A busca da unidade na diversidade e da autonomia com interdependência encaminhou-se
para o desenho de um modelo de federalismo cooperativo, marcadamente no campo das
políticas sociais, no qual os três níveis governamentais concorrem para enfrentar o desafio
da universalização da cobertura.
2. Mais do que a defasagem entre o excesso de demandas que não alcançam serem processadas
por um sistema institucional frágil, as ameaças à governabilidade decorreriam da subordinação das necessidades e dos direitos sociais aos ditames da estabilização econômica em um
contexto de supremacia dos interesses do setor financeiro. Esse contexto macroeconômico
impõe a recentralização dos recursos fiscais e do processo decisório, em clara contradição
com os processos de descentralização em curso.
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3. Assim, é perpetrado um modelo autoritário e centralizado de decisões, reiterando o atraso
nas formas de fazer política e de entender a política, incapaz de dar conta da diferenciação
social que gerou nova complexidade da estrutura social, com um processo concomitante
de multiplicação e debilitação dos atores sociais, tornando sua representação cada vez mais
difícil. Assim, os problemas atuais de governabilidade radicam no atraso da política com
respeito ao dinamismo das mudanças na sociedade.
4. A ausência da dimensão republicana e a naturalização de práticas patrimonialistas em nome
da governabilidade terminam por levar ao enfeudamento do aparato estatal por poderosos
interesses privados, o que impede a generalização da dimensão igualitária da cidadania,
por meio de processos reais de inclusão, redistribuição e reconhecimento de outros sujeitos
políticos. A prevalência destas desigualdades frente ao Estado e ao acesso aos bens públicos solapa permanentemente as dimensões jurídica e institucional das políticas universais,
fragilizando a institucionalidade democrática e impedindo a constituição de uma comunidade política, que é o fundamento da coesão social.
5. O setor público passa a ser visto com reservas, atribuindo-se ao arranjo institucional estatal
o fracasso das políticas públicas em termos de efetividade e eficácia. O deslocamento que se
processa deixa de questionar a natureza do pacto de poder para focar a atenção no arranjo
institucional que viabilize seu exercício, e a governabilidade cede lugar à ênfase na governança. Os estudos sobre governança tendem a ter como foco o desenho institucional e as
regras de organização da participação dos atores nas disputas relativas às políticas públicas,
visando acomodar interesses e aumentar a eficácia, a eficiência e a sustentabilidade das políticas governamentais. Além disso, tratam da transparência e da coordenação na execução
destas atividades, com foco na responsabilização e prestação de contas pelas autoridades
governamentais.
6. A diluição da centralidade das noções de governo e do poder político fez parte do modelo
empresarial que se aplicou à privatização do Estado e foi fortemente impulsionada pelos
organismos econômicos internacionais. A governança, nesse caso, escamotearia a relação
e a responsabilidade entre governantes e governados, afetando o princípio da garantia de
diretos, substituídas pelos automatismos anônimos da empresa e do mercado, afetando
assim toda a sociabilidade.
7. As suposições implícitas na governança em redes são de que as sociedades modernas caracterizam-se pela diferenciação social e setorialização, o que sugere crescimento político,
mas tem implicações sobre a diversificação e desagregação da capacidade dos atores de
responder isoladamente e de forma efetiva aos problemas complexos para os quais seus
recursos mostram-se limitados. Da mesma forma, a crescente mobilização da sociedade
civil que cobra atenção em respeito às diferenças sociais, a organização de um setor não
governamental que atua cada vez mais no campo das políticas sociais e o aumento da ação
social das empresas contribui para o aumento dos conflitos e a diversificação dos atores
envolvidos nas redes de políticas.
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8. Fenômenos concomitantes relativos à complexidade social crescente, diferenciação funcional, ausência do monopólio de recursos e capacidades, transformações nas funções administrativas do Estado, desconcentração do poder, descentralização da administração e
desterritorialização da economia, baixa capacidade ou ausência do Estado, são todos eles
fatores que contribuiriam para novas modalidades de coordenação de múltiplos nódulos
interdependentes em uma estrutura reticular de políticas públicas.
9. É necessário, porém, ter em conta as limitações das redes de políticas no cumprimento de
certas funções públicas, de caráter nitidamente estatal, como, por exemplo, a garantia de
direitos sociais e a regulação. Finalmente, é imprescindível enfrentar os novos desafios impostos pelos processos de fragmentação e exclusão social, que impedem a geração de consensos e ameaçam as condições de governabilidade e governança nas sociedades, diluindo a
confiança e impedindo a horizontalidade pressupostas na construção das redes. Ao tomar o
governo como mobilizador de redes de atores, cuja participação é garantida, desconhece-se
a absurda desigualdade de recursos entre atores distintos como empresas e usuários, permitindo que interesses poderosos possam capturar agências estatais.
3. Poder local e inovação
Diferentes fatores impulsionaram, nos anos recentes, processos de descentralização, muitas vezes desde perspectivas contraditórias, tanto decorrentes da necessidade de redução do gasto e do tamanho do governo central como da necessidade de atender às demandas cidadãs, por meio de uma nova
institucionalidade para o pacto federativo, aprofundando a democracia ao nível local, assegurando a
descentralização do poder e acercando o processo decisório da cidadania.
Os defensores do governo local, enquadrados na corrente normativa, argumentam que ele oferece maiores oportunidades de participação política e controle social; uma distribuição mais eficiente
de recursos e fornecem uma base de oposição ao governo centralizado (Souza, 1999). Na Europa,
o fortalecimento dos governos locais também foi consequência do seu papel na expansão do Welfare
State, o que levou à reivindicação de maior autonomia para a realização destes compromissos. Já o
argumento de que o governo local limita a concentração do poder e consegue dar melhores respostas
às demandas da população por sua proximidade com a comunidade é mais recente, caracterizando
uma terceira fase de defesa por parte dos localistas.
Já os estudos de caráter empírico veem o governo local de acordo às distintas experiências analisadas: como um sistema de relações de clientelismo e de tutela entre lideres e liderados; dentro do
modelo econômico-desenvolvimentista como um promotor do Desenvolvimento Local (DL); como
um provedor de bens de consumo coletivo ou um estimulador do consumo e da concorrência entre
prestadores de serviços públicos (Souza, 1999).
A principal discussão, no entanto, concentra-se em torno do conceito de autonomia, como
capacidade de formular políticas e executá-las sem constrangimentos externos, com liberdade para
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definir a agenda política local e influenciar a agenda nacional nas políticas que afetem seus interesses.
Para tanto, os governos locais necessitam ter capacidade política e institucional para a representação
dos interesses locais e capacidade econômico-financeira que assegure os recursos necessários ao desenvolvimento das ações locais com base em receitas próprias e divisão entre as três esferas de governo
acerca da prestação de serviços (Souza, 1999).
Autores vinculados ao institucionalismo histórico assumem que uma parte integral do desenvolvimento capitalista deve ser creditada à intervenção estatal, já que os custos das transações, sem
uma institucionalidade normativa, seriam demasiadamente altos para o mercado. Porém, reconhecem
que as mudanças atuais, em direção à autonomia local, afetam a institucionalidade e a capacidade
estatal. A importância do Estado, segundo Skocpol (1985), decorre não apenas da ação dos servidores
em torno de objetivos definidos nas políticas, mas pelo fato de que sua estrutura organizacional afeta a
cultura política e dinâmica societária, encorajando a formação de grupos e selecionando temas que entrem na agenda pública. A ação unificada do Estado na defesa dos interesses universais é ameaçada, no
entanto, pelo fato de que ele seja tanto um ator como uma arena de disputa de interesses conflitantes,
problema que é agravado quando a busca de maior eficiência leva à descentralização das ações estatais.
Enquanto a centralização burocrática é apontada como responsável pela perda de informações
importantes para a ação efetiva do Estado, privando os níveis subnacionais de iniciativa, a descentralização apresenta ameaças à coesão e coordenação das várias subunidades. Rueschemeyer e Evans
(1985) apontam uma situação paradoxal na qual quanto mais o Estado deseja penetrar a vida social e
econômica, mais os líderes das unidades subnacionais podem agir simplesmente como unidades em
uma cadeia de comando descendente, o que requer o insulamento destas unidades descentralizadas do
comando central. No entanto, ao dar autonomia a estas subunidades, o Estado cria um sério problema
de coesão e coordenação, especialmente ampliado quando elas são capturadas por grupos de interesse
da sociedade civil. O dilema entre habilidades para penetrar na sociedade por meio da descentralização e a perda de coerência do Estado requer o desenvolvimento de mecanismos efetivos de integração,
que permitam combinar a dispersão geográfica com coordenação efetiva.
Para evitar a porosidade das unidades descentralizadas e sua possível captura, que gera a perda
de unidade da ação estatal, são propostos os seguintes mecanismos de coordenação:
A distinctive esprit de corps among higher civil servants can function as a fluid form of coordination,
especially when it coalesces with the emergence of civil servants as a status group. Planning at the center and central control of financial resources for decentralized agencies may achieve coordination, but
central resource control is often difficult to balance with real delegation of decision making. Another
integration mechanism is the creation of dual bureaucratic structure in which a strand of offices more
responsive to intentions of the center parallels the operative main-line organizations (Rueschemeyer
& Evans, 1985: 56).
O equilíbrio ideal entre concentração e dispersão do poder para unidades autônomas segue sendo a
questão crucial no debate sobre descentralização, democracia e eficácia da gestão pública. No entanto, é preci-
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so sair da perspectiva linear de ver essa relação como unilateral, pois, mesmo em sistemas mais centralizados,
uma decisão não surge tipicamente como uma opção isolada, mas, sim, por meio de um demorado processo
de integração, do qual, além do centro de poder, também participam diversos subcentros. Dreitzel e colaboradores (1975: 43) afirmam sobre os riscos da falta de equilíbrio na gestão das organizações e sistemas:
Em termos formais, essa relação pode ser descrita da seguinte forma: se o centro ou o ápice da organização
concentra poder demais, a variedade “ideológica” e a criatividade necessárias podem ser destruídas, pois
os subcentros sofreriam a pressão do conformismo. Isso leva às ritualizações dos procedimentos de ação,
típicos à burocracia. Se, porém, os subcentros se tornam demasiadamente poderosos, a autoridade das
posições dirigentes será reduzida à negociação de compensações entre os diversos grupos interessados; os
valores básicos da organização correriam o risco de perder sua primazia.
Os céticos em relação à descentralização alegam que esta pode ameaçar a democracia, na medida em
que a captura dos recursos pelas elites regionais provoque um ressurgimento do autoritarismo. Além disso, temem que diminua a coerência da comunidade política nacional e fragilize a coordenação das políticas sociais,
favorecendo a ocorrência de instabilidades fiscais. Por fim, alertam que a descentralização pode aumentar ou
adicionar iniquidades quanto ao acesso e à participação dos cidadãos (Selee, 2004). Já aqueles que defendem
a descentralização como uma estratégia de democratização, que reconecta a cidadania com o Estado, baseiam
seus argumentos em três afirmações:
1. Os governos subnacionais tendem a ser mais responsáveis (accountable) perante a cidadania, já que
os cidadãos podem monitorar melhor os governos locais e porque o vínculo entre as ações governamentais e os resultados é mais claro. Assim, eles podem usar o seu voto e fazer suas escolhas com
base nos resultados sobre os programas para os quais querem pagar impostos.
2. Criar oportunidades para os cidadãos desenvolverem novas práticas de participação dentro de
arenas locais, recuperando a comunidade como um espaço político importante para se engajar
em ações de solução de problemas coletivos, possibilitando o desenvolvimento da noção de bem
comum. Nas arenas locais, as pessoas podem se engajar ativamente no processo político, mais além
da prestação de contas retrospectiva (accountability) que sustenta a democracia no nível nacional.
Isto permite à cidadania o desenvolvimento de uma consciência cívica que lhes possibilita a argumentação sobre política e programas.
3. Permitir maior inclusividade de diferentes setores da sociedade, tais como aumentar a participação
no processo decisório dos governos locais das mulheres e de grupos minoritários. (Selee, 2004).
Em ambos os casos, defensores e céticos apresentam premissas válidas para enquadrar a relação entre
níveis organizacionais centrais e periféricos. No entanto, é necessário aprofundar a discussão sobre os objetivos e as racionalidades implicados nos processos de descentralização, já que para eles convergem propósitos e
ideologias díspares.
Um balanço efetuado em relação à descentralização em saúde, citado por Bremner (2011), permitiu
construir o seguinte quadro sobre seus objetivos e os argumentos utilizados neste debate, apontando suas
54
D emocracia , P oder L ocal e I novação
distintas racionalidades bem como as críticas que foram levantadas em cada caso. Fica, pois, claro que a estratégia da descentralização não pode resolver ou ocultar dilemas políticos e institucionais relativos às prioridades
atribuídas aos diferentes e, muitas vezes, incompatíveis objetivos, estratégias e racionalidades.
Quadro2 - Objectives, rationales and controversies of health decentralization
Objectives
Rationales
Issues and controversies
To improve technical efficiency
Fewer levels of bureaucracy and greater
cost consciousness at local level
Separation of purchaser and provider
functions in market-type relations
Main require certain contextual
conditions to achieve it
Incentives are needed for managers
Market-type relations may need to some
negative outcomes
To increase alloca- Better matching of public services to
tive efficiency
local references
Improved patient responsiveness
Increase inequalities among
administrative unites
Tensions between central and local
governments and between different local
governments
To empower local
governments
Concept of local participation is not
completely clear
The needs of local governments may
still be perceived of local needs
More active local participation
Improved capacities of local
administration
To increase inExperimentation and adaptation to local
novation of service conditions
delivery
Through increased autonomy of local
governments and institutions
Increase inequalities
To increase accountability
Concept of public participation is not
completely clear
Accountability needs to be clearly
defined in terms of who is accountable
for what and to whom
Through public participation
Transformation of the role of central
government
To increase quality Through integration of health services
of health services and improved information systems
Through improved access to health care
services for vulnerable groups
To increase equity
Through allocate resources according to Reduces local autonomy
local needs
Decentralization may improve some
Through enabling local organizations
equity measures but may worsen others
to better meet the needs of particular
groups
Through distribution of resources
towards marginalized regions and groups
(through cross-subsidy mechanism)
Fonte: Saltman et al.apud Bremner, 2011: 2.
55
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A experiência brasileira demonstra que todos esses objetivos podem existir de forma concorrente, posicionando os diferentes atores envolvidos na defesa de alguns em detrimento de outros,
superpondo-se de forma a gerar contradições ou sinergias com o contexto nacional. A dinâmica entre
forças que direcionam o processo de descentralização em uma ou outra direção é responsável pelas idas
e vindas em um curso que é sempre distante de ser linear.
Grande parte do debate a respeito dos impactos da descentralização sobre o poder local está
voltado para responder à questão relativa ao grau de fortalecimento do poder local que afetaria a
eficiência econômica e a institucionalidade democrática. Os vários argumentos podem ser agrupados
em relação à tensão entre a dimensão fiscal da descentralização, relativa à capacidade de arrecadação
de cada nível e a dimensão político-administrativa, que diz respeito à competência na prestação dos
serviços.
Alguns autores defendem a separação entre descentralização dos serviços e descentralização
fiscal, alegando que os princípios fiscais devem ser preservados na escolha do nível de taxação,
enquanto a provisão de serviços pode ser descentralizada e não precisa sequer ser função do setor
público (Shah, 2006).
Já o teorema da descentralização postula o contrário: “each public service should be provided by
the jurisdiction having control over the minimum geographic area that would internalize benefits and costs
of such provision” (Oates, 1972: 55).
Este teorema está baseado na suposição de que a proximidade com os residentes não só leva
ao melhor entendimento de suas demandas como encoraja a responsabilidade fiscal e a eficiência,
além de eliminar camadas desnecessárias de jurisdição, provocar maior competição interjurisdicional
e inovação.
No entanto, na maioria dos países em desenvolvimento com longa tradição de centralização,
seria inviável tomar esse teorema como base dos processos de descentralização, face à excessiva centralização dos recursos fiscais e ao pobre desenvolvimento econômico local, incapaz de gerar localmente
os recursos necessários aos benefícios daquela população. As dificuldades em atender a essas condições
se fazem sentir em relação ao comprometimento da autonomia local e também em relação à diluição
das responsabilidades entre os níveis governamentais, seccionadas em termos dos encargos fiscais e
administrativos.
Não restam dúvidas que a questão fiscal parece ser um ponto nevrálgico desta discussão sobre
descentralização, pois ela define o grau de autonomia e dependência dos governos locais, comprometendo o arranjo consociativo. Bernal e Batiz (2010) mostram que houve uma mudança recente de posição na literatura sobre federalismo fiscal. Nos anos de 1980, a centralização era justificada com base
no argumento de que os governos subnacionais somente deveriam cumprir funções de provisão de
bens quando pudessem oferecê-los de forma mais eficiente que o governo central. Mais recentemente,
a literatura sobre federalismo fiscal defende que aos governos centrais correspondem funções de esta-
56
D emocracia , P oder L ocal e I novação
bilização e distribuição, enquanto a função de prestação de serviços é compartilhada com os governos subnacionais, na medida em que estes possam oferecer bens públicos de maneira mais eficiente
e com maior possibilidade de adaptar-se às preferências dos agentes em seus territórios específicos.
Alternam-se, pois, dois princípios fiscais, o da subsidiariedade e o residual. Segundo o princípio da subsidiariedade, os impostos, gastos e função regulatória devem ser exercidos pelo nível
mais baixo de governo a não ser que exista uma razão convincente para que seja alocado a níveis
mais altos de governo. Já o princípio residual, que é geralmente aplicado aos países unitários, reza
o oposto. Da mesma forma, enquanto o princípio da adequação fiscal diz que as rendas devem ser
alocadas o mais perto possível das necessidades, os demais princípios fiscais de eficiência econômica, equidade nacional e capacidade administrativa, tendem a favorecer o nível central (Shah, 2006).
No caso brasileiro, a análise dos debates realizados pelo Conselho Nacional de Secretários
Estaduais de Saúde (CONASS) e Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) por Medeiros (2011) apontam como consequências da descentralização de serviços sob
controle financeiro centralizado do repasse de recursos e dos gastos, problemas de precarização
das relações trabalhistas dos profissionais de saúde e déficits de sustentabilidade dos programas de
atenção descentralizados, iniciados com as proibições impostas pelo Ministério da Saúde (MS) –
com a NOB/91− e acentuados pela política fiscal, com a Lei de Responsabilidade Fiscal de 2000.
Os gestores encontram nessas restrições as maiores ameaças à governança e desenvolvimento locais.
Pesquisas recentes têm buscado demonstrar a relação entre a descentralização fiscal e o DL,
afirmando que aquela contribui para o desempenho econômico e político na medida em que as políticas locais são mais sensíveis às necessidades locais e regionais de infraestrutura e capital humano.
Desde o estabelecimento da nova economia institucional, avalia-se que para que a descentralização
favoreça a produtividade e o crescimento econômico, é necessário que o governo ofereça os bens
públicos e simultaneamente mantenha os incentivos para fomentar as inversões do mercado (Bernal
& Batiz, 2010).
Esta perspectiva exógena coloca a ênfase no papel do Estado centralizado e burocrático
como responsável pelo desenvolvimento macroeconômico nacional, com desconhecimento das
capacidades locais (Arocena, 1999). Outra perspectiva enfatiza as potencialidades da sociedade
local. O enlace do território com as relações sociais constitui a “sociedade local” quando este
território é portador de uma identidade coletiva que se expressa em normas e valores e em um
sistema de relações de poder constituído no processo de produção de riquezas (Arocena, 1995).
Neste sentido, o DL recoloca a perspectiva do ator como central, já que o local é visto como uma
construção simbólica de uma identidade e de um sentimento de pertencimento, um imaginário
da comunidade.
Da mesma forma, Pintos (2008) classifica os fatores que funcionam como facilitadores e
inibidores do DL como cognitivos, organizativos, relacionais, culturais, normativos, econômicofinanceiros.
57
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Com relação aos aspectos culturais e relacionais, o mesmo autor aponta como facilitadores do
DL o fato de que sejam tomados em conta os saberes locais, que podem aportar soluções originais
aos problemas. Também atuam favoravelmente ao tomar em conta as relações de poder existentes
entre o município e os cidadãos, bem como gerando espaços onde valores e normas podem ser compartilhados. No entanto, a persistência de práticas clientelistas e prebentárias coloca em risco o DL,
pois a cultura centralista e personalista provoca escassa renovação das elites, bloqueando a inserção de
agentes dinâmicos como mulheres e jovens.
Sobre os aspectos organizativos facilitadores do DL, apontam-se as formas estabelecidas de
participação social que estimulam a ação coletiva. Já as dificuldades organizativas ocorreriam em três
níveis. No nível macro, quando o Estado nacional não tem estratégias coerentes para o DL. No meso,
quando a política desenhada centralmente termina por transferir para o território unidades executivas
que estabelecem débil conexão com o tecido local. No nível micro, quando as estratégias, sejam elas
desenhadas em qualquer nível, não podem gerar sinergias entre os atores por carência local de recursos
humanos e know how.
Os aspectos normativos que facilitam o DL decorrem do estabelecimento de marcos jurídicos e
de regras de funcionamento que definem claramente as competências envolvidas. No entanto, atuam
negativamente se o marco jurídico for definido nacionalmente de maneira a considerar a realidade
local de forma homogênea ou com pouca flexibilidade para se ajustar à organização e ao associativismo
locais.
Com relação aos aspectos econômico-financeiros e infraestruturais, eles funcionam como facilitadores quando existem fontes estáveis de financiamento e capacidades financeiras dos agentes locais.
Os investimentos em infraestrutura são imprescindíveis para potencializar o território e provocar a
melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Já a carência de inversões tende a preservar a disparidade
de acesso aos serviços, em especial quando a necessidade de inversões transcende a capacidade municipal. As disparidades entre as atribuições dos governos locais e sua forte dependência de recursos
financeiros dos governos regional e nacional indicam a necessidade de repensar o pacto federativo em
termos mais solidários, sob o risco de comprometer o DL.
Por ser um processo que envolve múltiplas dimensões e enorme complexidade, a descentralização não apresenta um resultado claro e unívoco. Bremner (2011) faz um balanço da experiência
europeia em relação à descentralização da saúde, chamando a atenção para o fato de que este não é
um processo sem retorno; ao contrário, as experiências de vários países mostram movimentos sucessivos de descentralização, recentralização e posterior descentralização, na busca do correto balanço
entre os dois polos. Analisando os argumentos usados pelos defensores tanto do centralismo quando
da descentralização em saúde, o autor conclui que ambos os lados utilizam o aumento da eficiência e
o fortalecimento da democracia em defesa de seu ponto de vista. A ausência de evidências em torno
de uma ou outra posição, em especial em um campo tão complexo e multi-institucional como o da
58
D emocracia , P oder L ocal e I novação
saúde, levou o autor a concluir que o êxito da descentralização é altamente dependente do contexto
cultural, institucional e legal pré-existente, no qual este processo tem lugar (Bremner, 2011). Há que
se ter em conta, ademais, a existência de corpos intermediários, como regiões, metrópoles etc., que
influenciam fortemente este processo.
Diferenças puderam ser encontradas mesmo entre os países nórdicos, caracterizados por modelo estatal de cidadania universal com um sistema único caracterizado pelo alto nível de generosidade
nos benefícios e na cobertura universal de várias necessidades. O princípio que orienta este sistema é
a cobertura baseada na necessidade e não na contribuição ou posição no mercado de trabalho, além
da redução da dependência familiar daqueles que necessitam de cuidados. Nos países nórdicos houve
um grande impulso da descentralização nos anos de 1990, mas o aumento das desigualdades regionais
levou a um controle mais centralizado depois de 2000, sendo que, nos anos mais recentes, podem-se
perceber diferenças entre a Dinamarca, que manteve o universalismo, e a Suécia, que tornou seu sistema mais seletivo. O caso sueco tem sido muito estudado por essas características de recentralização
e seletividade.
No caso da Suécia, Trydegard e Thorslund (2010) assinalam a tensão potencial entre os dois
principais princípios da política social, a saber, o universalismo e a autonomia local. Eles argumentam
que, enquanto a política universalista é estabelecida pelo nível nacional, sua implementação depende
de autoridades locais altamente independentes, constituindo o que denominam “welfare municipalista”.
Sua conclusão é que o modelo de autoridade descentralizada é favorável a dar lugar ao aumento das
disparidades locais, enquanto a centralização geralmente leva a maior uniformidade.
As disparidades regionais na Suécia eram francamente dependentes da continuidade de variáveis contextuais e históricas (path-dependence), sendo que as desigualdades aumentavam na medida
em que o governo central contava com débeis instrumentos de controle e supervisão. No entanto, a redução da autonomia local com o aumento da recentralização reduziu as disparidades, ao mesmo tempo em que enfraqueceu o universalismo, definido pelos seguintes critérios: benefícios e serviços devem
ser baseados em legislação, disponível para serem utilizados em todo o País por todos os cidadãos que
tenham necessidade, independentemente de sua renda ou local de residência (Burau & Kroger, 2004).
O caso sueco mostra que não se trata de um jogo de soma zero, no qual ou se aumenta o universalismo ou a autonomia municipal, pois o enfraquecimento do welfare municipalista aumentou a
homogeneidade, mas também significou redução e seletividade na cobertura. Tanto a autonomia municipal, com sua tendência ao aumento das disparidades, quanto o centralismo, com um universalismo seletivo, são frutos de um mesmo contexto de redução do gasto público. Isto porque a autonomia
foi condicionada à captação de recursos por parte das municipalidades, em um contexto recessivo,
assim como a recentralização com redução e seletividade obedeceu à necessidade de redução do gasto
público do governo central.
Estudos levados a cabo em vários países da América Latina que atravessaram processos de descentralização nos anos de 1980 e 1990, a maioria deles induzidos de cima para baixo, constatam que
59
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
houve importantes transformações do papel dos governos local e regional. No entanto, os resultados
demonstram que não há dados conclusivos sobre as vantagens do processo de descentralização na
região, já que eles estão fortemente condicionados pelos contextos prévios de descentralização nos
países nos quais foram implementados. Portanto, o sucesso da descentralização, assim como de outras
iniciativas de reforma do Estado com vistas a aumentar a sua responsabilidade frente aos cidadãos,
foi condicionado pelo contexto histórico e político no qual tiveram lugar. Ou seja, onde houve uma
larga tradição centralista foi mais difícil induzir mudanças em prol da descentralização. Já o efeito da
descentralização sobre a governança democrática mostrou-se díspar:
On the one hand, decentralization has broadened spaces of electoral competition and generated important experiences of innovation in many sub national governments. On the other hand, in other
sub national areas, it has reinforced and revived authoritarian regional and local power structures
that centralized government has been designed to control. This analysis forces us to look at the uneven
tapestry of state-society relations in each of the countries (Selee, 2004: 4-5).
Pode-se ainda comprovar que o processo de descentralização, mesmo com severas restrições,
possibilitou maior autonomia e atribuiu novas funções ao nível local, o que, apesar da enorme disparidade de capacidades, gerou uma teia de atores locais. A capacidade de resistência das lideranças
locais às tentativas posteriores de recentralização em vários países como Argentina, Brasil, Venezuela,
demonstrou a eficácia da descentralização para o adensamento do poder local, apesar de não ter resultado em uma ação unitária, posto que submetido às clivagens partidárias (Selee, 2004).
Em estudo sobre o governo do Ceará no Brasil, Tendler (1999) também procura desmistificar
afirmações correntes como aquelas que supõem que uma sociedade civil forte seja um pré-requisito
para um bom governo e também que tais ONGs são autônomas em relação ao governo. Em seu estudo conclui que as melhorias no governo local revelaram-se menos decorrentes da descentralização
do que de uma dinâmica de três direções entre o governo local, a sociedade civil e um governo central
dinâmico. Embora associações cívicas e ONG fossem frequentemente atores importantes nesses casos,
sua atuação, em muitos exemplos, foi viabilizada pela ação do próprio governo.
Apesar das diferenças, a literatura permite fundamentar a hipótese de investigação acerca dos
vínculos entre a descentralização e a democratização do poder local, não como uma relação causal
necessária, mas como a maior probabilidade de que o aumento do poder local favoreça a diversificação
dos atores envolvidos na política pública. A possibilidade de captura do poder local pelas elites tradicionais, ao invés da sua renovação, seria resultante de situações nas quais o processo de descentralização não implicou em mudanças institucionais que favorecessem o aumento da participação social, do
controle social, da responsabilização dos gestores e da prestação de contas. Neste caso, a descentralização não provocaria mudanças nem no aparelho institucional governamental nem na sociedade local.
Quando a descentralização ultrapassa a esfera administrativa como deslocamento desde o nível
central do governo até o nível local, implicando em um movimento simultâneo de deslocamento do
poder desde o Estado para a sociedade, novos arranjos institucionais participativos e nova tessitura so-
60
D emocracia , P oder L ocal e I novação
cial são esperados. O fortalecimento do poder local passa por reconhecer as relações entre o território,
o governo local, a cidadania e a institucionalidade democrática.
A democratização do poder local é fundamentalmente um processo político de transformação
institucional e política com vistas à expansão da cidadania, seja ela manifesta desde a perspectiva do
direito à cidade, defendido por Lefebvre (2004) como a exigência de uma planificação voltada para as
necessidades sociais, seja pelo requerimento de um modelo cívico
O componente cívico supõe a definição prévia da civilização(...) que se quer, o modo de vida
que se deseja para todos, uma visão comum do mundo e da sociedade, do indivíduo enquanto
ser social e das suas regras de convivência(...). O componente territorial supõe, de um lado, uma
instrumentação do território capaz de atribuir a todos os habitantes aqueles bens e serviços indispensáveis, não importa onde esteja a pessoa; e, de outro lado, uma adequada gestão do território,
pela qual a distribuição geral dos bens e serviços públicos seja assegurada (Santos, 1996: 5).
Portanto, trata-se de uma mudança social que deve envolver aspectos culturais e normativos,
que dizem respeito ao imaginário construído para o uso do território, aspectos econômicos e financeiros envolvidos no desenvolvimento local e aspectos políticos e institucionais que impliquem na
criação de novos canais de articulação entre governo e sociedade local, além de arenas públicas onde
os cidadãos possam manifestar livremente suas preferências e buscar acordo em relação à definição de
prioridades nas políticas públicas.
Dessa forma, vincula-se a mudança no poder local a processos de inovação social, já que o DL
implica necessariamente na busca de progresso, o que carrega uma conotação de virtude ao transformar e criar novos modelos de organização e produção, mas, fundamentalmente, por alterar as próprias
premissas sobre a realidade (Motta, 1997).
A noção de inovação está imbricada com a ideia do desenvolvimento, já que não há desenvolvimento sem inovação, embora possa haver inovação sem desenvolvimento (Sutz, 1997). Entendese desenvolvimento como um processo sustentável de crescimento econômico com redistribuição
social, que implica também a ampliação da esfera pública democrática com o reconhecimento e a
inclusão de novos atores e a transformação dos processos de decisão e distribuição do poder. Desenvolvimento requer, portanto, inovações tecnológicas e institucionais que alteram as estruturas
tradicionais de produção e reprodução social. Esse processo de destruição criativa é intrínseco à
estrutura produtiva capitalista competitiva, impulso que leva à busca de novos bens de consumo,
novos métodos de produção ou transporte, novos mercados e novas formas de organização industrial (Schumpeter, 1984).
Além da produção industrial, a inovação gerencial pode se dar em termos de invenção de novas
ideias, de conversão destas ideias em produtos e processos, de sua difusão e aprendizagem organizacional. “A inovação é um processo de procura, descoberta, experimentação, desenvolvimento, imitação
e adoção efetiva de novos produtos, novos processos de produção ou novos arranjos organizacionais”
(Dosi, 1988: 37).
61
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
As abordagens para o estudo da acumulação de competências tecnológicas dividem-se em relação ao padrão “produção-investimento-inovação” e aquelas que privilegiam a influência dos processos de aprendizagem (Figueiredo, 2001). Neste último caso, uma das ênfases recai sobre o papel
da liderança na construção de coalizões e consensos e na superação das crises. Portanto, além da
experimentação, a inovação implica em processos sociais e institucionais relacionados à difusão de
conhecimentos já que: “O processo de inovação corresponde à invenção e implementação de novas
ideias, que são desenvolvidas e conduzidas por pessoas, por sua vez relacionadas a outras pessoas, em
um determinado contexto institucional” (Van de Vem & Rogers, 1988: 72).
Em qualquer de suas acepções, a inovação é vista como um valor positivo (Downs & Mohr,
1976), associada a mudanças benéficas (Coopey, Keegan & Emler, 1998) e tomada como agregadora
de valor à sociedade (Langley, 1995). No entanto, Dougherty (1996) identifica algumas tensões inerentes ao processo de inovação. A primeira tensão encontra-se na relação entre os ambientes interno
e externo da organização, isto é, entre as operações organizacionais rotineiras e as reais necessidades
dos clientes. Outra tensão ocorre entre as práticas antigas e as novas, cada qual relacionada a produtos
antigos e novos, que coexistem na organização e competem pelos recursos disponíveis. Uma terceira
tensão é observada na disparidade entre os eventos planejados e os imprevistos, tensão esta acirrada
pelo processo de avaliação que se ocupa exclusivamente das metas traçadas e não incorpora o reconhecimento de novos elementos, emergentes no decurso da inovação. A última tensão decorre da necessidade de liberdade de criação das pessoas que, ao mesmo tempo, têm a responsabilidade de alcançar
metas estabelecidas, resultando numa relação conflituosa entre autonomia e prestação de contas dos
indivíduos envolvidos no processo de inovação.
Outro desafio está em transferir a criatividade dos indivíduos à inovação organizacional. Isso
demanda algumas características individuais, como a motivação, a personalidade, as expectativas e
metas desafiadoras, bem como certas características organizacionais como a orientação para a inovação, o que envolve tecnologia, cultura, valores e capacidade de aprendizagem (Glynn, 1996; Bell &
Pavitt, 1995). A acumulação de competências tecnológicas torna-se tão crucial como a capacidade de
criar as condições organizacionais e sociais que possam garantir sua institucionalidade e sustentabilidade, ou seja, a consolidação e difusão desta inovação.
Finalmente, a inovação é também vista como um processo de transformação social. Para Tobar
e Pardo (2000), a inovação tecnológica envolve novos atores, novos papéis, novos valores. Só há mudança tecnológica quando mudam as relações sociais e de modelos de compreensão da realidade. Marcuse (apud Douglas, 1999) relaciona a tecnologia, como modo de produção, a formas de organizar e
perpetuar (ou modificar) as relações sociais. O processo tecnológico é tanto um resultado de uma nova
racionalidade, como, por seu lado, dissemina novos padrões de individualidade e de comportamento,
funcionando como um instrumento de controle e dominação.
O processo de inovação tem o efeito de reconstruir os sistemas de relações sociais e a estrutura
de regras e recursos que reproduzem aqueles sistemas. Pode-se falar de uma inovação social quando as
62
D emocracia , P oder L ocal e I novação
mudanças alteram os processos e as relações sociais, alterando também as estruturas de poder a abertura do Estado aos novos atores sociais, às suas demandas e formas organizativas. Inovações tecnológicas
no setor público não podem deixar de ser acompanhadas de inovação gerencial, capaz de transformar
os processos e tecnologias administrativos em direção à construção de instituições públicas, que favoreçam o processo de fortalecimento da sociedade civil e sua capacidade de influenciar e controlar as
políticas públicas.
Um ponto importante a ser considerado diz respeito aos tipos de instituições ou organizações
que seriam mais propensas à inovação e que apresentariam maior resistência à mudança. Guerreiro
Ramos (1966) fez um levantamento das perspectivas teóricas que revelam o conflito entre a burocracia e a inovação. Para muitos autores, ninguém pode ser, ao mesmo tempo, um correto burocrata e
inovador. O progresso é precisamente aquilo que as regras e os regulamentos não preveem; está necessariamente fora do campo da atividade burocrática. Segundo esses autores, jamais se poderia admitir
que a burocracia pudesse assumir papel de agente ativo de mudanças sociais, notadamente orientadas
para a superação do status quo. No entanto, mudanças positivas exigem boa dose de estabilidade, capacidade de gerar uma cultura de inovação contínua e a coordenação das competências tecnológicas
acumuladas. Paradoxalmente, um processo de mudança bem sucedido necessita de flexibilidade e de
apoio em elementos estáveis. Neste sentido, não se pode descartar a possibilidade de as instituições
burocráticas desenvolverem processos inovadores, já que a dificuldade de inovação é mais bem identificada como um problema das organizações complexas (Dougherty, 1996) do que das organizações
governamentais.
Estudos recentes sobre organizações da sociedade civil e dos governos locais também apontam as dificuldades destas organizações para desempenharem-se de forma flexível e inovadora (Telles,
2006; Tendler, 1998), desmistificando mitos grandemente difundidos, que identificam os governos
centrais como burocráticos e resistentes à inovação.
Pinho e Santana (1998) buscam relacionar o pensamento shumpeteriano, voltado para análise
do processo de inovação nos sistemas produtivos do capitalismo, aos sistemas políticos, permitindo
sua abordagem no plano da gestão pública. Para os autores, no plano político, os governos também
têm de viver no contexto de “destruição criativa”, não podendo ser compreendidos sob a hipótese da
calmaria. No entanto, a especificidade dos sistemas políticos deve ser realçada:
1) governos não sucumbem exatamente da mesma forma que setores econômicos (...) Governos
são socorridos por níveis maiores de governo e/ou pelo Tesouro, ou ainda problemas e soluções
são empurrados para gerações futuras, mascarando a situação existente; 2) fica muito difícil medir
o impacto que uma destruição criativa provocada por um governo causa em outros governos, ou
seja, medir, identificar que determinados governos soçobram por conta da destruição criativa à
qual eles não foram capazes de resistir ou de interagir (Pinho & Santana, 1998: 3).
A aplicabilidade do modelo Schumpeteriano às inovações na administração pública é bastante
limitada. Enquanto na estrutura Keynesiana a ênfase recai sobre a administração da demanda, em
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Schumpeter ela aponta para o investimento autônomo, incorporando inovações técnicas que constituem a base do desenvolvimento econômico. Este modelo, no entanto, negligencia mudanças no
ambiente durante o processo de difusão, que pode demorar décadas, bem como mudanças na própria
inovação. A difusão da inovação não se limita a uma cópia de carbono, mas frequentemente envolve
uma cadeia de inovações adicionais. Daí a importância das políticas públicas nos casos de invenções que, depois, se tornam inovações, já que elas não podem surgir da demanda que inexiste
(Freeman, 1984).
O setor da saúde é um caso exemplar de inovação tanto industrial quanto em políticas, organização de sistemas e processos gerenciais, especialmente porque nas últimas décadas tem enfrentado desafios estruturais decorrentes da velocidade das mudanças tecnológicas e da consolidação de
transformações demográficas. Reformas institucionais foram desenvolvidas em resposta a pressões
financeiras e organizacionais que os sistemas enfrentaram nas últimas décadas. Foram introduzidas
inúmeras medidas orientadas para o aumento da eficiência com o estímulo à competição, aumento
das responsabilidades individuais e restrições de uso de certos medicamentos e procedimentos. Além
disso, medidas de recentralização e reorganização do sistema de financiamento e de alocação de recursos, com vistas à redução dos custos do sistema de saúde, foram observadas na maioria dos países.
Melhorias do acesso e qualidade têm sido perseguidas, ainda que muitas vezes sejam consideradas
como um subproduto do aumento da eficiência.
Estudos chamam a atenção para a velocidade das inovações na pesquisa biomédica, o que
impõe como questão central a criação de conexões entre estas e a busca de intervenções valiosas por
menor custo, em um sistema de conhecimento altamente complexo, no qual a inovação no sistema de
entrega de serviços é considerada o elo mais fraco do processo. No entanto, a arquitetura do sistema
de saúde é considerada a moldura básica para entender as mudanças e os fatores facilitadores e aqueles
que obstruem a mudança.
The so called “iron triangle” (Renhart apud Saltman & Calltorp, 2011) defines dimensions that can
be linked to most health care system to identify ways to influence the process of innovation: who pays
(structure of financing in the system) who delivers (the organizational structure of payers, uniformity
of multiplicity, private/public, etc.) and who judges the quality (actors and measures to define and measure outcomes and quality. To steer a health system requires handling these contradictory perspectives,
balancing strongly conflicting forces and (at least on the surface) conflicting goals as well (Saltman &
Calltorp, 2011: 8).
Já as inovações no campo social surgem muitas vezes de condições adversas, nas quais nem o
mercado nem o setor público conseguiram responder às necessidades da população. Em certos casos
de privação e exclusão estruturais, surgem sujeitos ativos que forjam comunidades conscientes de seus
direitos e promovem a transformação social. Nesse sentido, trata-se de um processo de auto-organização do grupo na articulação dos recursos próprios, mas é também um processo exógeno, de mobilização de apoios externos. Para Herrera e Ugarte (2008), o problema das inovações como processo
64
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social é sua invisibilidade, o que acarreta dificuldades de ampliar-se fora do nível local e implementar
políticas públicas que transcendam o nível local de difusão da inovação e de extensão dos benefícios.
Enquanto muitos estudos enfatizam ao máximo o papel da sociedade civil no desenvolvimento
de inovações sociais, outros atribuem ao governo local um papel fundamental de articulador dos recursos locais na busca de soluções inovadoras. Porém, a análise de experiências concretas tem demonstrado que se trata de um processo no qual estão imbricados fatores ligados tanto ao associativismo
local quanto à orientação ideológica dos governantes, além da capacidade de ambos de transformar as
estruturas institucionais como resultante da relação dialética entre Estado e sociedade.
No Brasil, foi com base no debate sobre a descentralização, o pacto federativo e a reforma do
Estado, na década de 1980, que se retomou a valorização do poder local (Coelho, 1996). Apoiado no
desenvolvimento de um projeto inovador de democratização do poder local por algumas prefeituras,
este pacto foi incorporado como ação modernizadora de ação municipal. O autor relaciona a democratização do poder local à ação econômica empreendedora nos municípios, cujos traços centrais são
relacionados ao processo político de construção de uma esfera pública democrática e inclusiva:
Democratização da sociedade e do Estado com a constituição de uma esfera pública democrática
e politicamente ativa, articulando as formas institucionais de uma democracia representativa com
as formas diretas de representação da sociedade;
Inverter prioridades de governo em relação às formas tradicionais de governar, direcionando
nossos recursos – humanos e financeiros – para as áreas mais carentes. Recuperar a qualidade do
serviço público e garantir a igualdade de acesso aos serviços urbanos básicos;
Publicizar os serviços essenciais, desprivatizar o Estado, democratizá-lo, transformar o estatal em
público (Coelho, 1996: 45).
Considerando a inovação como o rompimento com os padrões tradicionais de gestão, relativos
às relações de poder entre os atores locais e com a identidade entre poder econômico e elites locais,
Moura e Pinho (1993) relacionam alguns aspectos inovadores na gestão pública municipal:
Tendência à democratização das relações governo-sociedade, o que vem se dando através da implementação de mecanismos e processos de natureza pública, no sentido da informação, consulta
e/ou negociação em torno de problemáticas e políticas;
Alteração da relação tradicional de subordinação/dependência na perspectiva da afirmação da
autonomia municipal. Uma das principais alternativas é o desenvolvimento de uma política de
recursos próprios municipais;
Conteúdo propriamente dito das políticas e programas municipais, cuja ótica volta-se mais para
o que denomina de promoção da cidadania ou do social (Moura & Pinho, 1993: 293-295).
Alguns autores enfatizam como centrais na inovação social tanto a satisfação das necessidades
quanto o direito à participação social:
Referring to social innovation mainly stems from: the satisfaction of basic human needs; an increased
level of political participation from deprived groups; and, increasing access to social-political capacity
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and access to resources needed to enhance rights to enable satisfaction of human needs and participation. However, social innovation is path – and context-dependent which implies that the impact of
innovative social practices can only be understood through a multiscalar analysis of its historical and
geographical roots (Novy & Leoubolt, 2005: 2003).
Com base nos projetos selecionados pelo Programa Gestão Pública e Cidadania, da FGV,
em 1997, Pinho e Santana (1998) constroem categorias para expressar a inovação na esfera
subnacional, embora alertem que essas categorias não esgotam as possibilidades de inovação,
tais como gestão democrática, descentralização e desburocratização do serviço público, incorporação dos excluídos e minorias, resgate de valores tradicionais e desenvolvimento de valores
que apontam para problemas atuais e futuros. Analisando essas experiências, os autores observam que, no caso da gestão pública, ou seja, um sistema social, a inovação está associada muito
mais à mudança de postura e de posicionamento ideológico do que à inovação tecnológica.
No entanto, as experiências inovadoras na gestão pública não podem ser vistas somente
como produto do aumento da participação, ela mesma ora vista como facilitadora, ora vista
como a própria inovação. Para assegurar a participação, as políticas públicas precisam introduzir tecnologias de planejamento e gestão, capazes de viabilizar a vontade expressa nas arenas
participativas, de forma a gerar consensos, definir prioridades, alocar recursos de maneira
eficiente, eficaz e sustentável. Nesse sentido, estudos das Nações Unidas recomendam o desenvolvimento de habilidades que possam transformar a participação em políticas efetivas:
This framework is followed by a ‘menu of skills’ needed for civic engagement, among them
the following:
-
Skills in participation management;
Skills in transforming participation into substance for policy inputs;
Skills in training civil society for policy dialogue; and
Skills in developing accreditation strategies for civil society (UN, World Public Sector
Report, 2008: 12).
A experiência considerada mais importante de participação ocorrida na região da América Latina foi o Orçamento Participativo (OP) de Porto Alegre, cuja análise reforça os aspectos
contextuais de caráter cultural e político, que condicionam o processo de participação popular
no governo local. Fedozzi (2000) considera que esta experiência contou a seu favor com o
capital social acumulado pela tradição de associativismo e por uma cultura cívica presente em
parcelas significativas da sociedade civil, como fruto das ações coletivas e da cultura política
disseminada na trajetória dos movimentos sociais e partidos políticos de esquerda, que lutavam
pelos direitos à cidade e à cidadania. No entanto, o autor chama a atenção para aspectos que
não foram salientados nas análises de outros, em especial, o fracasso de tentativas anteriores
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de natureza exclusivamente legal para a criação de mecanismos de participação em conselhos
populares.
Já o êxito do OP é creditado à postura da administração local, que se propôs a efetuar
uma radical democratização do Estado, abrindo-o para um modelo de cogestão dos recursos
públicos, cuja dinâmica assegurava efetivos resultados para a população. Esse modelo permitiu
ao governo e à sociedade enfrentarem as tensões que se manifestaram nos conflitos entre representação parlamentar e semidireta, entre corporativismos regionalistas e o planejamento global
da cidade, e entre a racionalidade administrativa e a política de cogestão.
A conclusão de Fedozzi (2000) sobre a relação entre poder local e democracia é taxativa quanto
à necessidade de materialização da participação da cidadania em termos de ganhos materiais proporcionados pela política pública, longe das inovações institucionais:
A adesão a um projeto de democratização radical do Estado requer um vínculo entre participação
e resultados materiais, sob pena de corrosão da base objetiva que sustenta a credibilidade popular
no processo de participação social (Fedozzi, 2000: 170).
Por outro lado, esse autor assinala a necessidade de uma profunda transformação do
aparato institucional do Estado, de forma que a administração municipal se torne capaz de
receber os inputs da cidadania, bem como de submeter-se à sua pressão e controle, sendo, para
isso, necessário quebrar as barreiras burocráticas.
Neste sentido, sua análise afasta-se dos modelos ideais que postulam relações de automatismo entre descentralização, fortalecimento do governo local e aumento da participação
cidadã, e propõe que uma reforma democrática radical da administração local é requerida para
dotá-la destas capacidades que não são inerentes ao processo de descentralização do poder,
visto apenas pelo ângulo da sua distribuição em níveis intergovernamentais.
Assim, a descentralização e a participação democrática tanto podem ser induzidas pela
sociedade quanto pelo Estado, desde o nível local ou desde o nível central, em movimentos
sinérgicos ou contraditórios, em idas e vindas que dependem de situações concretas. Nesta
investigação procura-se conhecer os gestores locais de saúde em relação ao seu perfil pessoal,
político e profissional, pois esses dados nos indicariam a confirmação de que a descentralização
teria provocado maior ou menor diversificação do perfil dos gestores. A diversificação das elites administrativas locais é um indicador importante da democratização do poder local, desde
que a democracia seja vista como uma trajetória a partir do domínio oligárquico exclusivo em
direção à inclusão social de grupos diversificados no exercício do poder político.
Outro desafio a ser enfrentado é a superação do caráter experimental das inovações sociais, sujeitas a instabilidades nas mudanças dos governos locais e incapazes de generalizar-se
como política nacional, o que representaria o aprofundamento da democratização do Estado.
Nesse sentido, não basta falar de inovação social como resultado localizado de um processo de
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descentralização, pois apenas se a inovação se difundir ela provocará transformações sociais universalizáveis e sustentáveis. O localismo inovador pode ser uma etapa importante que se aproveita
da riqueza das informações possibilitadas pela proximidade entre governo e cidadania, mas ela
deverá ser necessariamente suplantada pela sua generalização nacional, em que os direitos universais da cidadania se situam em permanente diálogo com os avanços civilizatórios e as transformações institucionais no mundo, em uma relação sinérgica entre níveis local, nacional e global.
O tema da difusão das inovações insere-se, pois, em um processo comunicacional entre Estado e sociedade e entre administração nacional, regional e local. Esse é o segundo desafio enfrentado pela investigação que realizamos sobre a difusão das inovações no sistema de saúde no Brasil.
Segundo Rogers (2003), a comunicação é um processo no qual os participantes criam e
compartilham informação em busca de um entendimento mútuo. Já difusão é um tipo especial
de comunicação, que diz respeito à propagação de mensagens que são percebidas como novas
ideias. Não se trata meramente de um processo unidirecional de persuasão, mas de uma interação
em que ambos os participantes contribuem para o resultado final. Por ser novidade, envolvem
certo grau de risco em sua difusão. Ainda, segundo esse estudioso, os principais elementos na
difusão de novas ideias são (1) a inovação; (2) sua comunicação por meio de certos canais; (3)
durante certo tempo; (4) entre os participantes de um sistema social.
Para Rogers (2003), a adoção das inovações depende das características de cada um desses
elementos identificando que as características das inovações que podem influenciar sua adoção
ou rejeição são a percepção de vantagens, sua compatibilidade com o sistema de crenças e experiências anteriores; o grau de complexidade para ser entendida; a possibilidade de experimentação
(trialability); visibilidade aos demais. As inovações serão adotadas mais rapidamente na medida
em que ofereçam mais vantagens relativas, sejam mais compatíveis com as situações existentes,
demonstrem simplicidade, permitam experimentação e possam ser visibilizadas.
A difusão vai ser influenciada também pelos canais de comunicação que tanto devem vincular atores similares, conformando modelos a serem adotados, quanto envolver grupos diferenciados que se comunicam por esses canais, de forma a assegurar um campo maior de difusão. Já
o tempo de difusão diz respeito à distância entre a inovação e sua adoção, porque esse processo
envolve cinco passos: conhecimento; persuasão; decisão; implementação e confirmação (Rogers,
2003). Os indivíduos buscam informações que diminuam suas incertezas em relação à adoção
da inovação ou pela decisão de rejeitá-la durante todo esse processo. A informação é importante
também nas fases subsequentes, de implementação e confirmação, tanto para a manutenção do
processo quanto para a difusão da inovação.
A difusão é vista como a realização do processo de mudança social, pois é quando a inovação se espalha por meio de um processo que altera a estrutura e o funcionamento do sistema.
No entanto, a difusão não se dá de forma uniforme em toda a estrutura, sendo a adoção de-
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pendente dos perfis diferenciados daqueles que aceitam mais rapidamente ou não a inovação.
Os perfis diferenciam entre aqueles que rapidamente adotam as inovações, a maioria que adota
precocemente, a maioria dos retardatários e, por fim, os mais retardatários.
A caracterização dos que adotam inovações foi assim estabelecida por Rogers, como uma
curva normal:
Figura1 - Adopter categorization on the basis of innovativeness (Rogers, 2003: 281)
Nossas preocupações vão além da identificação dos mais ou menos inovadores, pois buscamos
entender, com base no seu perfil político, profissional e social, quem seriam os gestores mais ou menos
propensos à inovação. Além disso, a articulação do gestor em redes associativas pode influenciar sua
capacidade de incorporar e desenvolver inovações, bem como o próprio desenvolvimento da política
em um sistema integrado de prestação de serviços.
Utilizando o esquema teórico definido por Rogers pode-se ver que alguns dos aspectos das
redes favorecem a difusão das inovações, tais como a existência prévia de um padrão de interação
e de canais de comunicação, a prática de diálogo em torno de processos decisórios participativos, o
aumento da visibilidade das inovações, a consolidação de lideranças inovadoras que possam ser persuasivas e levem à imitação; a possibilidade de debates sobre as incertezas e as vantagens auferidas por
aqueles que já adotaram as inovações. O uso sistemático de incentivos também pode alterar o padrão
de difusão e sua velocidade na expansão, embora não assegure um grau elevado de adesão e, portanto,
ameace a sua sustentabilidade.
Embora a maior parte dos estudos de inovação seja dedicada aos indivíduos, as estruturas organizacionais devem também ser consideradas tanto como facilitadoras ou como obstáculos à inovação
quanto com relação à sua difusão. A centralização do poder em um sistema ou organização é vista
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como um obstáculo à inovação, devido à dificuldade de este poder central estar informado e aberto às
demandas localizadas. No entanto, tomada a decisão de aprovação de uma inovação, sua difusão pode
ser facilitada pelo uso concentrado desse poder decisório na fase de sua implementação.
Figura2 - Independent variables related to organizational innovativeness (Rogers, 2003: 411)
As redes são vistas como organizações altamente complexas; por isso, a rede não seria o ambiente mais favorável à criação de conhecimentos, já que apenas um grupo reduzido de indivíduos tende
a assumir os riscos iniciais da experimentação. Se a produção de conhecimentos inovadores depender
de decisões coletivas, ela pode ser postergada até a desistência ou mesmo rejeitada pela maioria mais
conservadora. Portanto, a rede só não será um obstáculo à inovação na medida em que ela assegure a
autonomia dos seus participantes para criarem novas alternativas. Da mesma maneira, os estágios de
decisão sobre adotar ou rejeitar a inovação e colocá-la em execução podem ser mais difíceis de serem
superados na medida em que dependam de decisões coletivas, que estão relacionadas aos megaobjetivos da rede. Se eles puderem ser adotados de forma autônoma, sem prejuízo dos objetivos comuns,
a rede, ao contrário, é um facilitador da difusão de conhecimentos e informações. As redes possuem
conectividade entre seus membros, o que facilitaria grandemente a difusão de informações por meio
da visibilidade e persuasão, mais sustentáveis que a distribuição de incentivos pelo nível central.
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Os estudos sobre o SUS como uma rede de difusão de inovações ainda são escassos. Sigiyama
(2008) comparou a difusão de políticas inovadoras no Brasil por meio de dois programas que foram
desenhados pelo governo central e adotados pelos municípios – o Bolsa Família (BF) e o Programa
de Saúde da Família (PSF) – e encontrou resultados distintos sob o ponto de vista das motivações
individuais para replicar modelos inovadores. As motivações para a adoção de políticas inovadoras
nos municípios foram estudadas com base nas variáveis identificadas pelas principais correntes da
teoria política como determinantes no processo decisório: os incentivos políticos, a ideologia e as
redes sociais.
Apesar de a metodologia de estudos de casos não permitir generalizações, suas conclusões indicam que os argumentos baseados na teoria da escolha racional, ou seja, a suposição de que a adoção da
inovação seria consequência dos benefícios auferidos em um cálculo maximizador, foram afastadas no
referido estudo. Os incentivos políticos inerentes à transferência de recursos do PBF e os custos de assumir as responsabilidades da atenção familiar e de convencimento dos pacientes para inscreverem-se
no PSF não foram determinantes na adoção de ambos os programas pelas autoridades municipais. A
autora buscou explicar as motivações com base em outros fatores que o cálculo racional, encontrando
na ideologia um importante fator explicativo para a adoção de programas como as transferências de
renda por políticos de partidos comprometidos com as questões sociais e a superação da pobreza. No
entanto, como a reação inicial dos sanitaristas de esquerda em relação ao PSF foi de rejeição ao modelo
visto como de focalização, em contradição com os ideais universalistas do SUS, o fator ideológico já
não seria suficiente para explicar sua difusão. A mudança de posição em relação ao PSF e à sua ampla
difusão e aceitação posterior é explicada pela autora com base na existência de fortes redes de profissionais, características do movimento da reforma sanitária, e sua atuação na difusão das inovações. Ela
identifica a importância de redes difusoras existentes na área de políticas de saúde como ABRASCO,
CEBES e CONASEMS, como responsáveis pela persuasão de lideranças importantes, levando-as a
mudar de posição em relação ao PSF e passarem a difundir a inovação entre seus membros. Essas redes
garantiram a maior rapidez e sustentabilidade da difusão dos programas inovadores de saúde do que a
indução pelo governo central no caso da educação e da assistência.
A necessidade de aprofundar os estudos da rede formada pelo SUS é crucial para o desenvolvimento de políticas públicas e envolve questões relativas a todos os estágios da inovação e difusão
mencionados. No entanto, consideramos que a inovação na área social deva ser tratada de forma mais
aprofundada, pois se trata de um fenômeno complexo que engloba diferentes dimensões nas quais se
podem estudar as inovações, suas características, sua difusão e seus diferentes ritmos.
Nesta linha de estudos buscamos articular, de forma sincrônica, efeitos mútuos entre a descentralização a democratização do poder local e a difusão de inovações. A questão que se persegue é a
identificação de experiências inovadoras que permitam a construção de uma esfera pública democrática, entendendo assim a dinâmica criadora desde a interação entre Estado e sociedade.
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Coube a nós localizar a relação entre as questões centrais aqui tratadas no debate teórico
– inovação, democracia, cidadania e emancipação - no âmbito das políticas públicas, buscando
evidências de situações que possam ser replicáveis. Situações nas quais, no desenvolvimento das
relações entre Estado e sociedade, as transformações se materializam em políticas que são sensíveis
às demandas plurais, oriundas de grupos diferenciados e que possibilitam ações governamentais indutoras da organização social, capazes de gerar mecanismos públicos de negociação e redistribuição
dos recursos.
O eixo investigativo fundamenta-se na análise do grau em que políticas públicas conseguem
responder aos problemas envolvidos na construção de esfera pública democrática, no sentido de expansão da cidadania por meio da resolução de questões relativas à integração, participação, distribuição e constitucionalização.
Tomando os eixos da integração, da participação e da distribuição, podem ser definidos os
parâmetros que vão guiar esta observação da inovação social, que diz respeito às transformações necessárias (tanto no Estado quanto na sociedade) à construção da cidadania e ao combate à exclusão.
De fato, a inovação social é o processo de transformação e densificação da esfera pública e diz
respeito à expansão da cidadania por meio do tripé integração, participação e distribuição, tendo –
no limite – como consequência fundamental, a possibilidade de construção de sujeitos autônomos e
emancipados, cuja inserção na esfera pública está constitucionalmente definida.
Dessa forma, tão mais inovadora será a política pública quanto maior for sua capacidade de
congregar, simultaneamente, altos índices de integração, participação e distribuição. A esfera pública
ampliada permite a construção da identidade de projeto dos diversos atores assim como sua incorporação de forma diferenciada. Viabiliza a construção de sujeitos como atores sociais, uma vez que
as políticas possuem, além das dimensões material e institucional, uma dimensão simbólica, espaço
privilegiado da subjetividade e da formação de identidades coletivas.
De acordo com nossa compreensão sobre inovação em políticas públicas, procuramos contemplar um conjunto de indicadores que revelem a inovação em saúde com base em três dimensões:
social, gerencial e assistencial. Ainda que possam ter velocidades distintas, elas devem convergir para
propiciar que o aumento da participação social possa provocar também transformações na administração estatal e gestão local do sistema de saúde que estejam voltadas para aumentar a qualidade no
atendimento das demandas.
A inovação foi assim estudada com base em três dimensões:
a) A dimensão social, que diz respeito à relação do poder público com a sociedade, que implique em aumento da participação na definição de prioridades e no desenho das políticas
públicas, o efetivo controle social, a prestação de contas, e a responsabilização dos servidores.
b) A dimensão gerencial diz respeito à introdução e/ou manutenção de processos administrativos inovadores na gestão municipal em busca do aumento da eficiência e da eficácia da gestão
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potencializando a melhoria de processos e utilização de recursos internos ou externos, e instrumentos de informação para captação e escalonamento da demanda.
c) A dimensão assistencial engloba diferentes ações e/ou programas, que estão direcionados
para aquilo que se convencionou chamar “a ponta da linha”, ou seja, instrumentos gerenciais
que visam ampliar a qualidade e a efetividade da atenção à saúde, bem como a introdução de
novos programas e ações incentivados pelo poder central.
A hipótese geral é que o processo de descentralização de recursos e atribuições legais para a
gestão municipal contribui tanto para a democratização do sistema de poder quanto para o aperfeiçoamento da capacidade de gestão da esfera local. Portanto, espera-se que, com o aprofundamento da
descentralização no setor saúde, os municípios apresentem um espectro mais diversificado no perfil
dos gestores e maior capacidade para desenvolver competências de gestão caracterizadas por maior
eficácia e eficiência tanto no plano interno quanto na dimensão interorganizacional que abrange a relação com outras esferas do Estado (relações intergovernamentais) e com entidades da sociedade civil
e do mercado. Em processo de construção coletiva, será inovadora a política que propiciar a integração
na condição de cidadania quando alcançar conjugar participação com redistribuição, assegurando a
exigibilidade do direito universal à saúde com a transformação radical das formas tradicionais e clientelistas de exercício do poder público, alterando simultânea e irreversivelmente Estado e sociedade.
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Capítulo 2
A Construção da
Municipalização da Saúde:
estratégias normativas
Assis Mafort Ouverney
1. Introdução
Esse capítulo tem por objetivo apresentar e discutir como as estratégias
estabelecidas para conduzir o processo de municipalização do SUS, ao
longo do período de 1990 a 2001, lidaram com questões essenciais, tais
como o número e o tipo de entes para onde se descentraliza, a extensão de funções e as responsabilidades a serem transferidas, o ritmo do
processo, a amplitude das áreas delegadas, a relação entre o centro e os
entes subnacionais (coordenação federativa) e o grau de discricionariedade fiscal conferido a esses.
Para tal, são analisados seis aspectos fundamentais de cada uma
das normas operacionais que regularam a descentralização no período:
a orientação federativa, a divisão de competências federativas, a natureza dos instrumentos de descentralização, a estratégia de coordenação
regional, os requisitos de adesão à estratégia de descentralização e o
modelo de transferências financeiras intergovernamentais.
Nesse período, foram elaboradas e implementadas, de forma
sequencial, três grandes estratégias de descentralização, expressas, em
geral, em normas operacionais (NOB 1991, 1993 e 1996), que promoveram mudanças significativas no arranjo federativo de organização,
gestão e financiamento do SUS, transformando um sistema concentrado na União em outro em que os municípios, apoiados pelos estados,
desempenham um amplo conjunto de responsabilidades e gerenciam
um volume expressivo de recursos e unidades de saúde.
Assim, a participação dos estados e, principalmente, dos municípios foi ampliada de forma paulatina por meio de diferentes estratégias
81
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
que refletem tanto as opções de política quanto as circunstâncias de formulação e implementação de
cada momento. Entretanto, apesar da percepção imediata de um movimento geral crescente e intensificador do caráter descentralizado do exercício das funções da política de saúde, há certo consenso na
literatura setorial de que esse processo tem se caracterizado por diversas formas de heterogeneidade.
Primeiro, em virtude das adversidades e incertezas colocadas por um contexto de esgotamento do modelo desenvolvimentista, reforma do Estado e priorização da agenda macroeconômica de estabilização monetária, os tempos legal, financeiro e gerencial de implementação foram
muito diferentes (Noronha & Tavarez, 2001). À instituição do SUS na Constituição de 1988,
seguiu-se a regulamentação pelas Leis Orgânicas, já em um contexto politicamente menos favorável, e houve a transferência de unidades e profissionais para estados e municípios bem como
a formação das bases institucionais essenciais do sistema de saúde, em âmbito nacional, já no
início da década de 1990 (Machado, 2007; Pasche et al., 2006). Mas, a definição de condições
sustentáveis de financiamento e de planejamento da gestão ocorreu ao longo do período e ainda
é um desafio constante (Ugá et al., 2003; Fleury et al., 2011).
Segundo, em decorrência disso, o início e o desenrolar dos movimentos de transferência de
poder, as atribuições e os recursos não foram nem automáticos nem regulares, mesmo havendo disposições constitucionais que definiam a descentralização como um dos princípios de organização do
SUS. As divergências de modelo para a descentralização entre a reforma sanitária e o projeto neoliberal
de Estado, a instabilidade política e financeira setorial e as incertezas sobre a capacidade imediata dos
entes subnacionais para assumir as responsabilidades e gerenciar recursos, entre outros, levaram a um
processo de descentralização paulatino, conduzido e regulado pela União, construído com base em
pactos temporários e movimentos de tentativa e erro (Levicovitz, Lima & Machado, 2001; Santos &
Andrade, 2007).
Houve períodos de ruptura e aprofundamento da descentralização, mas houve períodos de
estagnação. Os estados e os municípios foram incorporando-se ao processo por ondas de adesão,
sendo que, apenas ao final da década de 1990, a descentralização atingiu todo o território nacional.
Cada uma das fases da descentralização teve tempos de formulação e implementação diferentes e um
conjunto expressivo de inovações institucionais de diversas naturezas (conselhos de saúde, fundos,
sistemas de informação, sistemas de transferência de recursos, modelos de indução de capacidades
gestoras, comissões intergestores etc.) foi construído nesse processo, conformando um projeto de
vanguarda sem precedentes na política social brasileira (Fleury, 2001).
Terceiro, a descentralização se desenvolveu com mais intensidade baseada em um conjunto de
estados e municípios dotados de estruturas, recursos e capacidade gerencial acima da média do País.
A expansão da autonomia para o exercício de funções de política de saúde, a condução de processos
administrativos e a gestão de recursos financeiros ocorreram primeiro em grupo pequeno de municípios de maior porte, em geral capitais de estados e cidades-polo regionais, para depois contemplar um
conjunto mais amplo de municípios (Arretche & Marques, 2002). Assim, as estratégias de descentra-
82
A C onstrução da M unicipalização . . .
lização e seus condutores tiveram de construir formas diferentes de coordenação federativa, capazes de
lidar com as diversidades existentes no território nacional. Apesar da natureza simétrica do federalismo brasileiro, a descentralização da política de saúde se desenvolveu com base em um padrão assimétrico de relações intergovernamentais (Lima, 2007). Em um contexto de redução do papel Estado e de
contenção de gastos, houve pouco espaço orçamentário para construir planos de investimento, o que
levou à necessidade de priorizar os esforços nos municípios com maior capacidade de levar a estratégia
à frente e com maior concentração populacional. A incorporação de estados e municípios, além de
paulatina e regulada, foi diferenciada em termos de níveis de autonomia expressos em modalidades de
habilitação para estados e municípios.
Em síntese, esse conjunto de heterogeneidades, enfatizado pela literatura setorial como características inerentes à implementação do SUS, mostra que houve a necessidade de flexibilidade e adaptação constante das estratégias de descentralização para permitir fazer avançar o projeto de universalidade do acesso, em um ambiente de políticas públicas, caracterizado por grandes assimetrias regionais
e locais de desenvolvimento, recursos e capacidade de gestão, uma tradição centralizadora e de pouca
atuação dos governos locais, uma orientação política neoliberal, uma política econômica voltada para
a estabilização monetária e equilíbrio fiscal estrito, conflitos federativos por investimentos (guerra
fiscal) e um sistema privado subsidiado por incentivos fiscais, entre outros.
A inexistência de condições adequadas não inviabilizou o processo de implementação do SUS
porque, entre outros fatores, a estratégia de descentralização foi plástica o suficiente para lidar com as
adversidades e permitir o estabelecimento de condições de construção de pactos viáveis entre União,
estados e municípios. Em consequência, cada uma das estratégias de descentralização, expressas nas
normas operacionais mencionadas acima, consiste em um pacto possível de implementação do SUS
em contextos político-institucionais diferentes.
Nesse capítulo, busca-se discutir como as estratégias de descentralização foram sendo moldadas
no período de 1990 a 2001, permitindo que elas se transformassem em um importante elemento de
construção institucional do processo de implementação do SUS. O efeito das regras não é o único
fator a influenciar as potencialidades e os limites de um processo de descentralização, uma vez que
outros elementos também influenciam seu rumo tais como o legado prévio da política, o jogo político
entre os principais atores envolvidos, a orientação das reformas econômicas, fiscais e administrativas
externas ao setor, entre outros. Entretanto, o conteúdo das regras sempre possui papel relevante, uma
vez que ele engloba, em alguma medida, a influência dos demais fatores, ao mesmo tempo em que
exerce um impacto expressivo em especial sobre o jogo político entre os atores envolvidos (Hall &
Taylor, 2003).
Para tal, o presente texto está organizado em cinco seções além dessa introdução. Na seção 2 são
apresentados os aspectos fundamentais do debate internacional sobre a descentralização de políticas
públicas, enfocando os modelos, as razões e as estratégias mais empregadas. Na seção 3, apresentase tanto a estratégia empregada para implementar o SUS no período de 1990−1992, constante da
83
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
NOB 1991, como suas limitações e contradições como modelo de descentralização. Na seção 4 são
discutidos os fundamentos da NOB 1993, que orientaram a estratégia que efetivamente promoveu a
descentralização para um formato municipalizado, enquanto na seção 5 consta a síntese do modelo
de descentralização inscrito na NOB 1996 que, na sequência do processo de implementação do SUS,
teve como objetivo consolidar a municipalização e fortalecer a capacidade de coordenação dos estados
e da União. Finalmente, na seção 6, a título de conclusão do capítulo, é discutida a evolução das estratégias empregadas para promover a descentralização do SUS no período 1990-2001 e seus impactos
sobre a municipalização da saúde.
2. Descentralização: modelos, razões e estratégias
Ao longo das duas últimas décadas, tem sido bastante expressivo o esforço realizado em diversos
países, nos mais variados campos das políticas públicas, para promover processos de transferência de
responsabilidades, atribuições e recursos desde o nível central dos Estados Nacionais para governos
regionais e locais, instituições privadas e organizações não governamentais (Dillinger, 1996).
A descentralização tem representado desde então um componente essencial dos movimentos
de Reforma do Estado tanto nos países centrais como nos países em desenvolvimento, evidentemente, por razões variadas. Esses motivos podem envolver, em ambos os contextos, tanto justificativas
operacionais como ampliar a eficiência de programas, reduzir os custos de estruturas administrativas,
aumentar a capacidade de inovação das burocracias e expandir a cobertura de políticas setoriais, até a
obtenção de objetivos maiores como fomentar o crescimento econômico, ampliar a equidade social e
promover a democracia, entre outros (Bankauskaite & Saltman, 2007).
Nesse sentido, a descentralização tem estado associada a um conjunto de reformas de aperfeiçoamento da organização dos sistemas políticos, das estruturas administrativas, e dos sistemas tributários
e fiscais nacionais, tornando-se um conceito de natureza positiva e quase um fim em si mesmo, qualidade somente contestada por movimentos mais recentes de recentralização, promovidos em alguns
países europeus (De Vries, 2000).
Cohen e Peterson (1996) identificam esse processo atual como a terceira onda internacional
de descentralização, em que, apesar da multiplicidade de razões, se sobressaem os aspectos políticos,
uma vez que se valoriza a construção de práticas democráticas e de boa governança no nível local, em
contraposição à ênfase conferida aos aspectos administrativos na era pós-colonial dos anos 1960 e nas
questões relacionadas ao desenvolvimento econômicos nos anos 1970-1980.
2.1 Modelos: definindo descentralização
A descentralização é um dos conceitos mais utilizados nas ciências sociais e a difusão de seu
uso tem sido seguida de diversificação de significados, o que, na visão de vários autores, ampliou sig-
84
A C onstrução da M unicipalização . . .
nificativamente as dificuldades de convergência conceitual. Os fatores apontados como responsáveis
são a apropriação diferenciada de conceitos entre a academia e as agências governamentais, as diversas
abordagens teóricas empregadas para fundamentar a descentralização, o reduzido intercâmbio entre
as tradições nacionais, a formação de comunidades especializadas que privilegiam dimensões específicas da descentralização, entre outros (Cohen & Peterson, 1996). Em geral, é possível distinguir
duas abordagens: uma com ênfase em formatos de descentralização e outra que foca em dimensões
do processo.
Na primeira abordagem, proveniente da literatura em administração pública, define-se descentralização como um conjunto de modalidades de transferência das funções de planejamento, tomada
de decisão ou gestão do governo central e suas agências para unidades hierarquicamente subordinadas
ao governo central, organizações locais, agências regionais, autoridades funcionalmente especializadas,
organizações não governamentais ou instituições privadas. Dessa forma, quando se considera especialmente o grau de autoridade e poder, ou o escopo de funções, que o governo central de um Estado
soberano transfere para outras instituições ou com elas compartilha, pode-se distinguir entre quatro
formas principais de descentralização (Rondinelli, 1983):
1) Desconcentração: envolve a transferência de autoridade administrativa e as responsabilidades, no âmbito da hierarquia do governo central, por meio do deslocamento de
funções dos ministérios, para seus próprios escritórios regionais, agências especializadas,
ou até a mudança ou cessão de responsabilidades para governos locais e regionais que são
parte da estrutura do governo central;
2) Delegação: compreende a transferência de funções para autoridades regionais ou locais especializadas, organizações paraestatais ou unidades especiais de implementação de
projetos, que operam livre das regulações do governo central para a seleção e contratação
de pessoal, orçamentação, aquisição de bens e serviços etc.. Essas entidades atuam como
agentes do Estado para o desempenho das funções citadas, mas a responsabilidade última permanece sendo do governo central;
3) Devolução: consiste na transferência de funções e de capacidade para a tomada de decisões do governo central para autoridades locais e regionais legalmente constituídas como
estados, províncias, municípios, distritos etc.
4) Transferência para instituições não governamentais (privatização): envolve o deslocamento das responsabilidades de atividades e funções do setor público para o setor privado ou organizações quase-públicas que não são parte da estrutura governamental.
As quatro formas de descentralização são tipos ideais que oferecem referencial consistente para
dimensionar tanto o padrão de inserção do governo central no processo de descentralização quanto
a composição público-privada do novo arranjo de provisão de bens e serviços. Nesse sentido, a delegação pode ser considerada um modelo intermediário entre desconcentração e devolução em termos
85
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
de combinação entre maior ou menor regulação federal, mas, nos três primeiros ainda permanece a
preponderância da provisão pública. Apenas no quarto modelo há o compartilhamento de funções e
responsabilidades com a sociedade e com o mercado.
Além disso, a sequência de modelos de descentralização identifica uma tendência predominante nos anos oitenta e noventa, em que as organizações sociais e empresas privadas lucrativas passaram a
exercer maior número de funções antes conduzidas exclusivamente pelo Estado, em virtude da difusão
das ideias e modelos do New Public Management (Hood, 1991; Osborn & Gaebler, 1993).
Entretanto, as reformas conduzidas em vários continentes têm produzido arranjos descentralizados, que não são exatamente algum dos tipos ideais apresentados, formando configurações que
representam variações internas de cada uma das modalidades ou mesmo formatos híbridos de dois ou
mais deles. Estudos comparativos de programas de descentralização conduzidos em diversos países asiáticos, latino-americanos e europeus mostram que, na maioria dos casos, os arranjos são combinações
de desconcentração e delegação, devolução e desconcentração, ou mesmo ambos com a presença de
instituições não governamentais e/ou privadas.
Além disso, mesmo dentro de cada um dos tipos são encontradas variantes expressivas: devolução para níveis regionais ou locais, delegação para entidades governamentais quase independentes
como empresas públicas ou para entidades não governamentais, desconcentração no âmbito do governo central ou para entidades regionais ou distritais, entre outras (Rondinelli, McCullough & Johnson,
1989; Fleury, 1990; Bossert, Larrañaga & Meir, 1989; Bankauskaite, Saltman & Vrangbaek, 2004).
Na segunda abordagem, a descentralização é definida como um processo multidimensional de
natureza fiscal, administrativa e política, caracterizado pela transformação de um arranjo unitário ou
monolítico de exercício de responsabilidades (atribuições), capacidade decisória e gestão de recursos
(físicos, humanos, financeiros, etc.), em geral representado pela União (ou uma de suas agências),
em outros arranjos de natureza policêntrica, caracterizados por graus variados de combinação entre
autonomia e regulação entre um centro e os demais núcleos interdependentes regionais e/ou locais
(Falleti, 2005; Rodden, 2005).
As possibilidades de modelos para esses arranjos descentralizados são muito amplas, e variam de
acordo com um conjunto diverso de fatores. De acordo com essa concepção, um sistema de provisão
de políticas públicas descentralizado é aquele em que as entidades centrais desempenham papel menos
proeminente em uma ou mais das dimensões essenciais mencionadas (Schneider, 2003). Nessa perspectiva, coloca-se ênfase nas possibilidades de mensurar quanto uma política pública é descentralizada
e de analisar as relações existentes entre cada uma de suas dimensões.
2.2 Razões e fundamentos: justificando a descentralização
Os motivos apontados para fundamentar a necessidade de descentralizar são os mais diversos
e provêm de várias tradições teóricas no campo das ciências sociais. Em geral, considera-se que a
86
A C onstrução da M unicipalização . . .
descentralização produz efeitos positivos sobre um amplo conjunto de questões relacionadas ao
funcionamento do Estado moderno, tais como democratização dos processos decisórios, ampliação da equidade no acesso ao bem-estar, eficiência na alocação de elevados volumes de recursos,
coordenação adequada e flexível de estruturas e funções gerenciais, melhoria da qualidade dos bens
e serviços públicos, entre outros (Shah & Sana, 2006; Arretche, 1996; Rondinelli, 1983; Vrangbæk,
2007). Os principais argumentos empregados para sustentar processos de descentralização são os de
natureza política, econômica e gerencial.
Na tradição da ciência política governos locais com maior autonomia são valorizados por produzirem ambientes mais propícios ao exercício de prerrogativas democráticas (Tocqueville, 1977).
Schneider(2003) argumenta que as teorias políticas que se ocupam da descentralização focam em
seu potencial para promover a mobilização dos atores políticos locais e ampliar sua capacidade de
articulação, agregação de interesses, organização e contestação. Segundo ele, em sistemas politicamente descentralizados, os cidadãos definem sua identidade e interesses com base na dinâmica local
e as orgnizações, como partidos e movimento sociais, operam localmente e competem por meio de
processos eleitorais em torno de soluções para questões e problemáticas da comunidade municipal
(Schneider, 2003). Essa dinâmica, se acompanhada da formação de instituições consistentes, pode
levar à formulação e à implementação de políticas inovadoras mais próximas às reais necessidades
da população assim como à formação de comunidades comprometidas com valores republicanos
(Putnam, 1993).
Estudos econômicos apontam para a capacidade dos sistemas descentralizados de políticas públicas de alocar recursos com mais eficiência do que os centralizados e, consequentemente, maximizar
o bem-estar social da população e produzir maior equidade. De acordo com Bossert(1998), essa abordagem conhecida como local fiscal choice foi desenvolvida por economistas para analisar as escolhas de
governos locais no emprego de recursos próprios e de transferências governamentais, sendo aplicada
em federações com tradição de governos locais com autonomia constitucionalmente definida e volume expressivo de recursos fiscais gerados localmente. Segundo o autor, parte-se da perspectiva de que
os governos locais competem entre si por eleitores, que migram entre os municípios, buscando satisfazer suas preferências em termos de qualidade das políticas públicas e de custos na forma de menores
impostos. Os gestores buscam estratégias de arrecadação e alocação de recursos que mais satisfaçam os
eleitores, o que pode conduzir à maximização da eficiência alocativa dos recursos públicos.
A descentralização fiscal fundamenta-se na abordagem econômica dos sistemas federativos,
em que, de acordo com o princípio da subsidiariedade, o governo central deve cuidar de políticas
macroeconômicas de estabilização, conduzir processos de distribuição de renda e prover bens públicos
nacionais, o que permite que os governos locais foquem sua atenção em esforços para produzir bens
públicos, cujo consumo é moldado por preferências locais. Governos locais possuem maior capacidade para adaptar as características finais de seus serviços às preferências, gostos e costumes dos cidadãos
que vivem sob sua jurisdição (Oates, 1999; Shah & Sana, 2006).
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Os argumentos gerenciais favoráveis à descentralização provêm da administração pública e
da teoria organizacional, e enfatizam a capacidade dos governos locais para desenvolver estruturas
administrativas mais ágeis, adaptativas, responsáveis e transparentes ao controle da sociedade. De
Vries (2000) sintetiza um amplo conjunto de razões favoráveis à descentralização, destacando como
suas virtudes intrínsecas as capacidades para reduzir níveis de coordenação, construir processos de
planejamento mais inclusivos, ampliar a capilaridade da implementação de programas, simplificar
o monitioramento e a avaliação dos resultados, ampliar a aprendizagem relacionada aos fatores
culturais (religiosos, étnicos, políticos etc.), fomentar arranjos diversificados de desenvolvimento
econômico, entre outros.
Vários outros motivos de natureza gerencial são mencionados na literatura para justificar a
descentralização, tais como a redução dos bloqueios de comunicação da burocracia, o aperfeiçoamento da qualidade das informações sobre as realidades locais e regionais, a promoção de inovações nos arranjos de provisão de bens públicos, a ampliação da responsabilidade dos gestores
com a qualidade dos serviços (Rondinelli, Nellis & Cheema, 1983; Osborn & Gaebler, 1993;
Dillinger, 1996).
2.3 Estratégias para a descentralização
A diversidade de razões ou objetivos que motivam o desencadeamento de processos de descentralização, associada a um conjunto amplo de fatores da conjuntura política e econômica, além
das próprias características estruturais de constituição de cada país como nação, produz uma multiplicidade de arranjos possíveis de transferência de funções e recursos do governo central para outros
entes. Assim, embora tenham ocorrido processos de intercâmbio de experiências e modelos entre
países, a adoção de estratégias específicas para descentralizar políticas e programas governamentais
parece ser uma experiência singular e determinada, em sua maior parte, pela dinâmica interna do
sistema político e econômico de cada nação (Rondinelli, 1983; Eaton, 2001; Bankauskaite, Saltman & Vrangbaek, 2004).
Portanto, dadas as singularidades nacionais e as motivações, a literatura aponta como decisões importantes a serem tomadas para compor uma estratégia de descentralização aquelas relativas
ao número e ao tipo de entes para onde se descentraliza, à extensão de funções e responsabilidades
a serem transferidas, ao ritmo do processo de descentralização, à amplitude das áreas a serem transferidas, à relação entre o centro e os entes descentralizados (coordenação federativa) e ao grau de
discricionariedade fiscal dos entes descentralizados (Saltman & Vrangbæk, 2007).
Cada uma das estratégias expressas nas normas operacionais, no período de 1990 a 2001,
buscou articular soluções específicas para responder a cada uma dessas decisões, sendo que, em geral, as soluções adotadas baseiam-se em um patamar definido pela estratégia anterior e condicionam
as escolhas realizadas na estratégia seguinte. As contradições e os limites observados no processo de
88
A C onstrução da M unicipalização . . .
implementação de uma norma, em geral, orientam a formulação da norma seguinte, de forma que
se pode observar uma cadeia de aprendizagem de estratégia.
A análise de cada uma das normas operacionais foi realizada com base em seis aspectos
fundamentais:
1. Orientação federativa: esferas consideradas alvos essenciais e secundários da descentralização;
2. Divisão de competências federativas: distribuição de responsabilidades entre as esferas
da federação;
3. Natureza dos instrumentos de descentralização: tipo de instrumento privilegiado por
cada estratégia de descentralização;
4. Estratégia de coordenação regional: regras específicas, incentivos e instrumentos para
induzir a articulação regional entre os municípios;
5. Requisitos de adesão à estratégia de descentralização: conjunto de pré-condições a serem
cumpridas por estados e municípios para que pudessem ser considerados inseridos legalmente na estratégia de descentralização;
6. Modelo de transferências financeiras intergovernamentais: conjunto de modalidades
empregadas pelo gestor federal para transferir recursos financeiros para estados e municípios.
3. A NOB 1991: a municipalização tutelada (1991-1992)
Em um contexto político desfavorável à implementação do SUS, em virtude do posicionamento explicitamente contrário à descentralização do Presidente Collor, a NOB 1991 foi formulada com
base em um processo centralizado, sem consulta aos atores envolvidos na reforma sanitária. Assim,
após o conflituoso processo de aprovação das Leis Orgânicas da Saúde (LOS), em 1990, não houve a
construção de uma estratégia consistente de descentralização voltada para aprofundar as reformas do
sistema de saúde de acordo com os novos princípios constitucionais.
Em consequência, não houve mudanças expressivas para adaptar as estruturas federais de coordenação federativa, mas apenas a transferência desordenada de funcionários federais para estados
e municípios, conformando uma “operação de desmonte” dos quadros administrativos federais no
setor. Além disso, ao longo de todo esse período, houve incertezas sobre o aporte de recursos das novas fontes estabelecidas no orçamento da seguridade social e observou-se queda expressiva no volume
global do financiamento setorial.
3.1 Orientação federativa
O arranjo estabelecido pela NOB 01/1991 significava, essencialmente, que à União caberia a
formulação e o planejamento e aos estados e municípios o exercício das funções de prestação de servi-
89
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
ços e de gestão de informações necessárias à operacionalização dos fluxos financeiros e documentais
do processo de descentralização (Carvalho, 2002). Os estados e municípios passaram a operar como
meros prestadores de serviços, com pouca ou nenhuma autonomia em relação ao planejamento e
regulação da política de saúde. Todo o processo passou a ser conduzido pelo MS, a partir do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), que definia as regras de
transferência de recursos e ainda possuía prerrogativas de controle da execução física, financeira e
orçamentária de estados e municípios.
3.2 Divisão federativa de competências
O posicionamento do governo era de que as Leis Orgânicas não continham detalhamento
suficiente para operacionalizar a descentralização e que estados e municípios ainda não detinham
capacidade satisfatória para ter autonomia de gestão de sua política de saúde, merecendo, no máximo, “um crédito de confiança”1. O texto da NOB 01/1991 não definiu um escopo muito consistente de divisão de funções de política pública para as três esferas, atendo-se de forma mais detalhada
aos aspectos de natureza operacional como também àqueles relacionados ao gerenciamento dos
serviços e ações de saúde, assim como ao controle, acompanhamento e à fiscalização da aplicação
dos recursos.
A participação dos estados e municípios na formulação e no planejamento de políticas nacionais ficou bastante comprometida em virtude do fechamento dos canais federativos de pactuação,
já que não havia previsão explícita na NOB 01/1991 nesse sentido. O texto menciona o Plano
Nacional de Saúde e o Plano Quinquenal do Ministério da Saúde, porém não cita a possibilidade
de participação dos entes subnacionais. Esses poderiam elaborar seus respectivos planos de saúde e a
Programação e Orçamentação em Saúde (POS) baseados em diretrizes estabelecidas pelo Conselho
Nacional de Saúde. A possibilidade de integrar o planejamento regional era mínima e o desenho
proposto induzia a fragmentação.
A inexistência de transferências financeiras automáticas reduzia as possibilidades de que o
planejamento de estados e municípios refletisse as reais necessidades regionais e locais de saúde. O
financiamento proviria das três esferas, sendo as transferências federais a fonte principal dos recursos (calculados com base em critérios populacionais dos entes subnacionais). Por sua vez, estados e
municípios deveriam destinar no mínimo 10% de seus orçamentos, como requisito para o recebimento das transferências federais. Os estados receberiam os recursos de transferências federais destinados aos municípios que não cumprissem os requisitos exigidos na norma. Coube à União grande
O Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) foi instituído pelo Decreto 94.657 de 20 de julho de
1987, sendo uma estratégia de aprofundamento do processo de descentralização iniciado nas Ações Integradas
de Saúde (AIS), e se fundamentava nas diretrizes político-institucionais discutidas e aprovadas na VIII Conferência Nacional de Saúde voltadas para a formação de um sistema de saúde descentralizado, hierarquizado em
rede e permeável à participação ao controle da sociedade civil.
1
90
A C onstrução da M unicipalização . . .
parte das funções relacionadas à regulação do sistema de saúde e dos provedores (contratual), assim
como o controle, a auditoria e a avaliação dos fluxos financeiros.
O INAMPS e suas diretorias regionais foram designados para monitorar e controlar a legalidade e a pertinência da aplicação dos recursos transferidos pela União por meio de relatórios padronizados e sistemáticas de prestação de contas. Estados e municípios participariam da avaliação técnica e
regulação de forma subsidiária, fornecendo informações e por meio da cooperação com os trabalhos
do INAMPS. Os conselhos estaduais e municipais foram citados como entes fiscalizadores da execução dos planos e aplicação dos recursos financeiros. Não foram estabelecidas disposições explícitas
sobre a regulação de acesso a ações e serviços de saúde. A provisão de serviços de saúde ficaria majoritariamente a cargo das unidades municipais de saúde e, de forma subsidiária, aos estados.
3.3 A natureza dos instrumentos de descentralização
Os instrumentos condutores do processo de descentralização também conferem ênfase, nesse
período, à coordenação centralizada do processo. Optou-se pelo emprego combinado de convênios
firmados diretamente entre o INAMPS e cada um dos estados e municípios, sistemas de informações
de acompanhamento e controle da produção de serviços prestados e incentivos financeiros vinculados
ao cumprimento de um conjunto de prerrogativas por parte dos entes subnacionais.
Os convênios permitiam estabelecer uma relação jurídica direta entre os INAMPS e os municípios, reduzindo o peso das secretarias estaduais. A instituição do Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA/SUS) e do Sistema de Informações Hospitalares (SIH/SUS) possibilitava ao INAMPS
acompanhar e controlar o volume de produção de ações e serviços de saúde, realizado pelos municípios, mecanismo essencial para controlar o montante de recursos que deveriam ser transferidos aos
estados e municípios.
O modelo manteve a estratégia de convênios com o INAMPS, empregada no período do
2
SUDS , mas sob um arcabouço institucional federativo bem diferente. Antes, os estados gerenciavam os recursos por meio de um modelo unificado de orçamentação, Programação e Orçamentação
Integrada (POI), e uma instância política de negociação e pactuação com os municípios, Comissão
Interinstitucional de Saúde (CIS). No novo arranjo a relação da União era direta com os municípios
e exercida, essencialmente, por meio de coordenação técnica, gerencial e financeira.
A possibilidade do emprego de uma estratégia mais consistente de coordenação política, que se
iniciasse com o debate técnico com estados, municípios e demais atores setoriais, parece não ter sido
sequer cogitada, dado o insulamento pretendido pelo Ministério da Saúde. A instituição da Comissão
Intergestores Tripartite (CIT), fórum maior de construção de consensos federativos do SUS, ocorreu
somente em 22 de julho de 1991, por meio da Portaria MS N. 1.180/91, alguns dias após a reedição
Nesse capítulo, não serão apresentados os grupos de transferência na modalidade de remuneração por serviços
produzidos, uma vez que o objetivo da NOB era justamente eliminar essa possibilidade ao longo de seu período
de implementação. Logo, apresento apenas a composição estabelecida para a modalidade “fundo a fundo”.
2
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
da NOB 91. Além de ter sido instituída por portaria, fato que permite contestações sobre a legitimidade legal das decisões, seu funcionamento parece ter sido bastante esporádico e restrito a atividades
de assessoramento técnico até 1993 (Lucchese et al., 2003; Miranda, 2003).
3.4 A estratégia de coordenação regional
A NOB 91 não definiu qualquer estratégia de regionalização. Os estados detinham apenas
algumas prerrogativas de natureza operacional, tais como a distribuição de Autorização de Internação
Hospitalar (AIH), o repasse de recursos de investimentos aos municípios, a consolidação de planos
municipais de saúde, etc. Caberia também às secretarias estaduais de saúde a responsabilidade pela
atenção ambulatorial quando os municípios não cumprissem os requisitos para recebimento de recursos.
A estratégia de coordenação regional e de fomento às relações intermunicipais ficou restrita
a essas poucas funções das secretarias estaduais e à possibilidade de formação de consórcios entre os
próprios municípios, cujos fluxos financeiros seriam regulados pelo INAMPS. Em comparação com
o que fora preconizado pela Constituição e pelas Leis Orgânicas e até mesmo com a configuração
operada no Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) isso representava um expressivo
retrocesso.
3.5 Requisitos de adesão à estratégia de descentralização
Para que os municípios recebessem as transferências financeiras era necessário que cumprissem
requisitos de natureza institucional (implantação de conselho e fundos municipais de saúde e de uma
comissão para definir o plano de carreira), gerencial (elaboração do plano municipal, da Programação
e Orçamentação da Saúde (PROS) e relatório de gestão) e orçamentários (recursos de contrapartida
no valor de 10% do orçamento municipal como meta).
3.6 O Modelo de transferências financeiras intergovernamentais
Regras gerais
A estratégia de financiamento completava a estrutura centralizada de coordenação exercida
pelo INAMPS. A base do modelo de transferências adotado era o pagamento por produção direto ao
prestador de serviços, com critérios diferentes de alocação de recursos para a cobertura ambulatorial,
atenção hospitalar, investimento na rede existente e estímulo à municipalização. O modelo de transferências automáticas foi postergado e somente iniciado em 1994, mesmo assim para um conjunto
muito reduzido de municípios (Lima, 2007).
Atenção ambulatorial
Na atenção ambulatorial, os prestadores públicos, privados e filantrópicos passaram a ser remunerados diretamente pelo sistema de cobertura ambulatorial e os montantes repassados a estados e
92
A C onstrução da M unicipalização . . .
municípios teriam como base o valor da Unidade de Cobertura Ambulatorial – UCA −, calculada por
estado, considerando os critérios de população, capacidade instalada, qualidade e desempenho técnico
da rede de serviços de saúde (INAMPS, 1991).
O montante total a ser transferido para os estados e municípios seria obtido multiplicando o
valor da UCA pela respectiva população. O valor a ser transferido diretamente aos municípios correspondia a um resíduo financeiro do montante total calculado após o pagamento direto dos prestadores
(públicos, privados e filantrópicos), da reserva de um percentual de 10% ao gestor estadual e dos
ajustes de proporcionalidade populacional entre estados na federação e entre os municípios dentro de
cada estado.
Atenção hospitalar
Na atenção hospitalar, os pagamentos seriam executados com base nos valores informados no
Sistema de Informações Hospitalares (SIH) sendo definido, no texto da NOB 91, que cada estado
receberia anualmente um volume de Autorização de Internações Hospitalares (AIH) equivalente a
10% de seu estoque de população. A Secretaria Estadual de Saúde (SES) repassaria, mensalmente, aos
municípios que cumprissem os requisitos para tal, um duodécimo do volume de AIH equivalente a
8% de suas respectivas populações. Os 2% restantes seriam retidos em um fundo estadual de compensações de demanda (INAMPS, 1991).
Os municípios poderiam requisitar AIH adicionais ao fundo de compensações para uso no
pagamento de serviços de referência estadual ou a outros municípios vizinhos por meio de consórcios
formais ou articulações microrregionais informais. Os municípios ficariam responsáveis pela distribuição do volume de AIH recebidas entre provedores privados, filantrópicos e públicos, devendo sempre
dar prioridade a este último.
Investimentos na rede
Os recursos para investimento ficaram restritos à modernização tecnológica dos equipamentos
das unidades já existentes da pública estadual ou municipal e seriam gerenciados pela SES (INAMPS,
1991). O montante a ser alocado em cada um dos estados para investimentos, denominado de Unidade de Capacitação da Rede (UCR), correspondia a um percentual escalonado de 1% a 5% do total
de recursos recebidos para cobertura ambulatorial alocado de forma inversamente proporcional a esse.
Incentivos à municipalização
Finalmente, os municípios que cumprissem adequadamente os requisitos para serem considerados “municipalizados dentro da norma” receberiam um adicional de 5% sobre o valor total da
cobertura ambulatorial, como Fator de Estímulo à Descentralização (FEM).
A NOB 91 também estabeleceu a possibilidade de os municípios se associarem com o objetivo
de formar consórcios administrativos para articulação e integração da rede a partir da presença de
93
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
um município-polo. Os municípios com rede de menor complexidade custeariam os procedimentos ofertados pelos municípios de referência. Caberia ao INAMPS reter os valores e transferi-los ao
município-polo. A relação do INAMPS com os consórcios seria estabelecida também por meio de
convênios (INAMPS, 1991).
4. NOB 1993: o início da transição efetiva para a municipalização (1993-1997)
O contexto setorial alterou-se favoravelmente à implementação do SUS, uma vez que o impeachment do Presidente Collor coincidiu com um processo de rearticulação política do movimento
sanitário, em âmbito nacional, em torno da defesa da efetiva implementação do SUS e da garantia
da descentralização de recursos e autonomia de gestão para os entes subnacionais. Tal movimento
convergiu para os debates realizados na IX Conferência Nacional de Saúde e na formação de uma
coalizão setorial de governo marcada pela presença expressiva de quadros de orientação municipalista
na direção do Ministério da Saúde.
Diversos fatores favoreceram também o avanço do processo de descentralização, entre eles
a promoção de mudanças na estrutura organizacional do Ministério da Saúde, com a extinção do
INAMPS, a reorganização de estruturas especializadas de coordenação gerencial como o Fundo Nacional de Saúde (FNS), além da criação de outras como o Sistema Nacional de Auditoria – SNA. Por
outro lado, as dificuldades relacionadas à estabilidade das fontes de financiamento permaneceram,
agravando-se após a extinção, em 1993, dos aportes de recursos provenientes do Ministério da Previdência Social, o que gerou insegurança para estados e municípios assumirem a gestão do SUS.
A elaboração da estratégia de descentralização, em 1993, foi um processo de ampla consulta e
discussão, que envolveu gestores estaduais e municipais, entidades da sociedade civil, pesquisadores
etc. As contribuições desse processo foram reunidas em um documento intitulado “A Ousadia de
Cumprir e Fazer Cumprir a Lei”, que consistiu na base da estratégia contida na NOB 93.
4.1 Orientação federativa
A estratégia de descentralização contida na NOB 93 (Brasil, 1993) efetivamente incorporava os
estados e, especialmente, os municípios como entes federados responsáveis pela condução da política
de saúde em seu território. Buscou-se estabelecer um arranjo com características federativas, transcendendo o padrão de concentração de competências exclusivamente na União definido na NOB 91,
que acarretava a verticalização das relações e a subordinação dos entes subnacionais. Nesse sentido, a
estratégia expressa na NOB 93 tinha como objetivo fazer a transição entre um modelo de gestão da
política de saúde próximo a um padrão de Estado unitário para outro típico de federações.
No novo modelo, a União reservou-se as prerrogativas de estabelecer um padrão nacional para
o processo de descentralização e instituir um arcabouço de governança federativa para conduzir e
mediar politicamente todo o processo de descentralização, embora de maneira compartilhada com os
94
A C onstrução da M unicipalização . . .
estados e municípios. As funções de natureza mais operacional, tais como cadastramento de prestadores, programação, pagamento, etc., passaram a ser paulatinamente transferidas para a responsabilidade
de estados e municípios. Assim, coube à União definir as regras do jogo para garantir a construção de
um sistema de saúde unificado nacionalmente, tarefa nem sempre muito fácil quando se inicia um
processo de descentralização.
A instituição de um padrão nacional expresso nas NOB especializou o papel da União na função de regulação sistêmica, tarefa que foi sendo aprofundada aos poucos por meio da publicação de
portarias relativas a políticas setoriais. Obviamente que, embora essa tarefa ficasse a cargo da União,
doravante ela seria compartilhada com estados e municípios por meio de uma governança nacional tripartite, compondo claramente um padrão de federalismo integrado. A participação dos entes
subnacionais foi ampliada, porém, de maneira assimétrica: estados e municípios adquiriram maior
autonomia e responsabilização de forma proporcional ao tamanho de suas redes de serviço e de sua
capacidade técnica e operacional.
4.2 Divisão de competências federativas
No plano das relações intergovernamentais, o modelo introduzido pela NOB 93 representou
uma mudança expressiva em relação à NOB 91, indo ao encontro dos anseios de maior autonomia
dos entes subnacionais e dos atores setoriais. Nesse sentido, o novo modelo resgatava a orientação
descentralizadora estabelecida não só no texto dos principais documentos setoriais de formulação,
como o relatório da VIII Conferência Nacional de Saúde, mas também as disposições contidas na
Constituição de 1988 e nas Leis Orgânicas da Saúde.
A nova orientação cooperativa refletia-se também no processo de condução da descentralização e no escopo de funções a serem desempenhadas por estados e municípios. O gerenciamento do
processo de descentralização passou a ser baseado na ação política e técnica conjunta e articulada nos
três planos da federação. No âmbito nacional, todo o processo de definição das diretrizes operacionais
de implantação do SUS passou a ser conduzido por meio das negociações diretas entre representantes
da União, estados e municípios, no âmbito da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), que se tornou importante centro decisório da política de saúde. A representação dos três entes seria paritária,
sendo que estados e municípios estariam presentes por meio de suas entidades corporativas oficiais,
respectivamente, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) − e o Conselho Nacional
de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS).
Esse padrão se reproduzia no plano estadual, onde representantes do estado e dos municípios
realizariam os pactos necessários à implementação do SUS estadual no âmbito da Comissão Intergestores Bipartite (CIB). Em ambos os planos, o respectivo conselho de saúde seria a instância deliberativa máxima, o mesmo ocorrendo no âmbito local, onde o conselho municipal de saúde atuaria na
formulação de estratégias e no controle da execução de Política Municipal de Saúde. As CIB passaram
a ser os fóruns de maior relevância na condução operacional da descentralização, já que todas as deci-
95
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
sões dessa natureza seriam tomadas no seu interior. Divergências aqui seriam resolvidas pelo respectivo
Conselho Estadual de Saúde (CES), ou pela CIT. As diligências maiores que permanecessem seriam
dirimidas pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS).
As funções a serem desempenhadas por estados e municípios também foram ampliadas de
forma expressiva quando comparadas com o modelo da NOB 91. A amplitude das funções a serem
transferidas dependia da complexidade da estrutura de serviços local e regional, o que permitia ao estado ou ao município habilitar-se em uma das três modalidades de adesão definidas na NOB 93. Cada
uma das modalidades correspondia a um nível de responsabilidades e autonomia gerencial e financeira
diferentes. Esse desenho flexível admitia a construção de formas diferenciadas de relações intergovernamentais entre a União e os entes subnacionais, possibilitando a aproximação mais coerente com a
diversidade local e regional do País.
Para os municípios, foram definidas as modalidades incipiente, parcial e semiplena. Na modalidade incipiente, o município se encontrava na fase inicial de ampliação de suas responsabilidades
já que ele iniciava o desenvolvimento de competências de gestão da política de saúde: organização de
informações sobre a estrutura de unidades do município (cadastramento e monitoramento), gerenciamento futuro de unidades próprias, desenvolvimento de ações de adensamento da atenção básica,
controle e avaliação dos serviços etc.
No segundo patamar de descentralização, na modalidade de gestão parcial, os municípios deveriam demonstrar um conjunto consistente de competências de gestão e estruturas organizacionais,
financeiras e assistenciais que os habilitava a aprofundar seu papel na gestão direta das unidades ambulatoriais públicas e de parte dos recursos do montante destinado ao município. Parcela expressiva
ainda seria gerenciada pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), caso estivesse habilitada em uma
modalidade da NOB 93.
Finalmente, na modalidade semiplena, os municípios teriam o maior grau de autonomia possível, naquele momento inicial do processo de descentralização, para o desempenho de funções de
política de saúde, gestão das unidades e recursos financeiros, sendo responsável pela coordenação de
todas as unidades públicas de saúde do município, por todo o processo de cadastramento, contratação, controle e avaliação dos prestadores filantrópicos e privados e o desempenho de todas as funções
de formulação, planejamento e programação.
Nesse nível mais elevado de descentralização, os municípios recebiam diretamente “fundo a
fundo” todos os recursos a ele destinados por direito pela legislação do SUS, algo vedado aos municípios habilitados nas demais modalidades de gestão. Portanto, a natureza das relações intergovernamentais se definia, então, com base em um modelo de descentralização processual e transitório,
em que a União se relacionava com estados e municípios de acordo com a capacidade de assumir
responsabilidades de cada um dos entes e transferia a eles autonomia e volume de recursos em nível
correspondente às responsabilidades assumidas.
96
A C onstrução da M unicipalização . . .
4.3 A estratégia de coordenação regional
A NOB 93 não estabeleceu qualquer estratégia específica de indução de arranjos regionalizados de serviços de saúde. De acordo com o texto da norma, a regionalização deveria resultar da
atividade voluntária e consociativa de municípios adjacentes, em que os mesmos deveriam se articular de maneira funcional de acordo com suas características geográficas e perfis de oferta. Assim,
não foram definidas formalmente sistemáticas de planejamento regional obrigatório, sob condução
das Secretarias Estaduais de Saúde (SES)ou conduzidas com base na articulação dos municípios de
cada região de saúde.
Apesar disso, a instituição de uma instância de governança estadual e a ampliação das funções
das Secretarias Estaduais de Saúde (SES) permitiu expandir a capacidade de coordenação regional
e integração estadual de algumas funções de política de saúde. A instituição da CIB como fórum
principal de negociação e decisão dos aspectos operacionais da descentralização do SUS possibilitou
não só fornecer legitimidade à governança estadual, mas também ampliar as prerrogativas do gestor
estadual no processo decisório da política. Entretanto, o papel a ser exercido pelos estados e o grau
de autonomia correspondente para exercer a coordenação estadual da política de saúde dependiam
da condição de gestão em que cada um deles estivesse habilitado. Da mesma forma que para os
municípios, foram estabelecidas três modalidades de transição para a participação dos estados de
acordo com a evolução da complexidade de sua rede de serviços e nível de qualidade de gestão.
As possibilidades de exercício de prerrogativas e responsabilidades de gestão da política de
saúde, que restabeleciam (em parte) as funções exercidas pelas Secretarias Estaduais de Saúde (SES)
no SUDS, estavam disponíveis apenas nas modalidades parcial ou semiplena. Para os estados que
não conseguissem comprovar, junto à CIT, capacidades técnica e gerencial para atingir tais níveis de
responsabilização restaria seu enquadramento na modalidade incipiente, que lhes permitiria apenas
exercer funções muito básicas de gestão da política, com praticamente nenhuma prerrogativa de
coordenação regional.
Na modalidade de gestão parcial, o estado tinha um conjunto mais amplo de responsabilidades e prerrogativas, tais como conduzir a programação integrada dos municípios, gerenciar
informações cadastrais dos prestadores, gerir recursos de investimentos, coordenar redes de referência estadual, gerenciar o cadastramento, a programação, a distribuição de cotas ambulatoriais e
hospitalares e conduzir políticas de alta complexidade. Finalmente, na modalidade de gestão semiplena, estados que lograssem capacidades de gestão mais consistentes poderiam ter sua autonomia
ampliada para exercer, além das prerrogativas acima mencionadas, as relativas à gestão completa da
rede de serviços de saúde desde o planejamento até o pagamento de prestadores. Da mesma forma,
sua autonomia na gestão financeira também seria ampliada para contemplar a gestão de todos os
recursos correspondentes ao teto financeiro da política de saúde no estado.
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
4.4 A natureza dos instrumentos de descentralização
A estratégia de coordenação compartilhada entre União, estados e municípios, que fundamentou o modelo de descentralização da NOB 93, também se refletiu na escolha dos instrumentos
priorizados para conduzir o processo de implementação. Adotou-se um arcabouço formado por um
conjunto variado de instrumentos de natureza política, financeira, jurídica e gerencial, que ampliava
o leque de possibilidades de coordenação federativa à disposição da União. Em síntese, a estratégia da
NOB 93 articulava instâncias de pactuação política (CIT e CIB), portarias de adesão por condição de
gestão, sistemas de informação para acompanhamento e controle da produção de serviços, relatórios
de gestão comprobatórios do cumprimento das responsabilidades assumidas por condição de gestão e
incentivos financeiros vinculados ao cumprimento de um conjunto de requisitos específicos de cada
condição de gestão.
A mudança de status na forma de inserção de estados e municípios, de meros prestadores de
serviços ao Ministério da Saúde para gestores efetivos do SUS, implicava em alterações expressivas
no formato das relações intergovernamentais, mas somente poderia ocorrer mediante o emprego de
instrumentos que fornecessem mais ênfase nos aspectos políticos e gerenciais.
O centro do processo de descentralização passou a ser a pactuação entre os entes federados no
âmbito das comissões intergestores no plano nacional e estadual. Todo o processo de gerenciamento
da implementação do novo modelo de descentralização seria conduzido com base em processos políticos ocorridos nessas instâncias, indo desde a análise dos pleitos de habilitação de estados e municípios,
nas condições de gestão prescritas na NOB 93, até a pactuação sobre a distribuição de recursos relativos aos tetos financeiros de transferências intergovernamentais e o controle e avaliação dos serviços
prestados. Assim, todos os aspectos de natureza operacional relativos ao processo de descentralização
no âmbito estadual estavam sujeitos à regulamentação da Comissão Intergestores Bipartite (CIB) de
cada estado. Em estados ainda sem CIB ou Conselho Estadual de Saúde (CES), as decisões seriam
conduzidas no âmbito da CIT. Em casos extremos de divergência, o Conselho Nacional de Saúde
(CNS) poderia ser acionado.
4.5 Requisitos de adesão à estratégia de descentralização
Tendo em vista que o modelo estabelecido pela NOB 93 era mais complexo do que o da NOB
91, houve ampliação expressiva dos requisitos exigidos de estados e municípios para se tornarem
gestores do SUS. Os municípios habilitados, independentemente da condição de gestão, deveriam
comprovar o funcionamento regular do conselho e do fundo municipal de saúde, incorporar as unidades ambulatoriais estaduais e federais presentes em seu território, dispor de médico próprio para
emitir AIH, demonstrar capacidade técnica para programar e acompanhar a produção de serviços de
saúde e manter o registro de dados sobre informações epidemiológicas e de vigilância sanitária entre
outros exigidos pelo Ministério da Saúde. Outras exigências eram feitas aos municípios habilitados
nas condições de gestão parcial e semiplena.
98
A C onstrução da M unicipalização . . .
Esses municípios deveriam apresentar à CIB a comprovação da existência de comissão de elaboração do Plano de Carreira, Cargos e Salários (PCCS) e da aplicação da contrapartida de recursos
próprios do tesouro municipal, além do plano de saúde e do relatório de gestão atualizados anualmente. Finalmente, os municípios em gestão semiplena ainda deveriam apresentar à CIB um termo
de compromisso, aprovado pelo CMS, com as metas e indicadores de resultado a serem cumpridas em
cada ano e manter os sistemas de informação SIA/SUS e SIH/SUS atualizados. Os requisitos exigidos
dos estados para atuarem como gestores do SUS seguiam o mesmo padrão, sendo as exigências praticamente as mesmas (e também de acordo com a modalidade de gestão), com apenas alguns acréscimos
como a comprovação do funcionamento regular da CIB.
4.6 O modelo de transferências financeiras intergovernamentais
Regras gerais
A engenharia relativa à transferência de recursos financeiros provenientes da União, instituída
na NOB 93, manteve uma parte significativa do modelo de alocação de recursos e da metodologia de
cálculo, relativa aos montantes a serem recebidos pelos estados e municípios, porém mudou de forma
expressiva a modalidade de transferência dos recursos. Na NOB 91, os estados e municípios não foram incorporados ao SUS como unidades efetivas de gestão da política de saúde, mas apenas em uma
modalidade correspondente aos prestadores de serviços privados e filantrópicos.
A partir da instituição da NOB 93, os entes subnacionais passaram a exercer atividades de planejamento, programação, gestão e avaliação da rede própria e contratada, o que levou à mudança no
formato das transferências federais de pagamento aos prestadores para transferências diretas “fundo a
fundo”, ou seja, do Fundo Nacional de Saúde (FNS) para os fundos estaduais e municipais de saúde.
Tal sistemática foi sendo aplicada paulatinamente à medida que os municípios aderiam às condições de gestão, tendo iniciado sua implementação apenas a partir de 1994, em virtude de problemas
relativos ao financiamento do SUS, no período. Como visto acima, sua aplicação estava prevista
somente para os municípios em gestão semiplena. A NOB 93 manteve o formato de fracionamento
das transferências para a atenção ambulatorial, atenção hospitalar, incentivos à estadualização e à municipalização e recursos para investimentos.
Atenção Ambulatorial
Na atenção ambulatorial, o montante dos recursos a serem transferidos era dimensionado com
base em um valor monetário per capita, a UCA, calculado de forma específica por estado, de acordo
com um conjunto de critérios, que abrangiam população, capacidade instalada, complexidade da
rede, desempenho financeiro e desempenho da auditoria estadual do ano anterior. Os valores específicos de cada estado seriam multiplicados pela respectiva população resultando no total estadual de
Recursos para Cobertura Ambulatorial (RCA).
99
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Assim, os estados teriam valores diferentes de volumes para o financiamento das ações e serviços de saúde ambulatoriais decorrentes das diferenças de valores da UCA e da população. Os valores
da UCA seriam atualizados de acordo com as diretrizes orçamentárias do FNS e sempre que houvesse
variação na tabela de procedimentos ambulatoriais do SUS. Os repasses seriam realizados por cotas
mensais, resultando na transferência de duodécimos (valor total da RCA dividido por 12).
A NOB 93 definiu também um teto financeiro mensal de base histórica para recebimento de
recursos para o financiamento de ações ambulatoriais para estados e municípios. O valor seria correspondente a média do próprio gasto entre janeiro e dezembro de 1992, com ajustes, de acordo com a
capacidade potencial de produção de serviços, a complexidade da rede e a população atendida. Nos
municípios sem histórico, seria estimado um valor por esses critérios mencionados de ajuste. O teto
dos estados corresponderia à diferença entre o valor total transferido para o estado e a soma dos tetos
dos respectivos municípios habilitados em alguma modalidade de gestão.
Atenção hospitalar
A sistemática de cálculo adotada na NOB 93 também seguia a mesma metodologia já instituída na NOB 91. A definição do montante de recursos a serem transferidos para cada estado e seus
municípios para o custeio das internações hospitalares era fundamentada em um quantitativo de AIH
(correspondente a 10% da população total do estado) que seria multiplicado pelo valor médio histórico das AIH emitidas pelo estado no período de janeiro a dezembro de 1992. A verificação do histórico
seria realizada por meio dos registros no SIH-SUS. Esse valor seria corrigido também pelas variações
observadas na tabela de remuneração de procedimentos hospitalares do SUS.
Desse total destinado ao estado, 80% seriam alocados para os municípios e 20% ficariam sob
gestão da Secretaria Estadual de Saúde (SES). Essa distribuição poderia ser alterada mediante acordo
na CIB, aprovado pelo CES. Os montantes seriam distribuídos por meio de duodécimos. Os cálculos
para cada município deveriam levar em conta a respectiva média histórica do valor das AIH. Esses
poderiam solicitar AIH adicionais a SES ou a municípios vizinhos. A circulação de AIH entre os municípios seria administrada por uma câmara estadual de compensações.
Incentivos à estadualização e à municipalização
A NOB 93 também previa incentivos financeiros adicionais de custeio para estimular o processo de descentralização, contando com duas modalidades de transferência específica para tal: o Fator de
Apoio ao Estado (FAE) e o Fator de Apoio ao Município (FAM). O FAE era direcionado aos estados
habilitados nas modalidades de gestão parcial e semiplena e tinha destinação específica, devendo ser
empregado em atividades de tratamento fora de domicilio, aquisição de medicamentos especiais e
provisão de órteses e próteses ambulatoriais.
O FAM era voltado para todos os municípios habilitados, independente da condição da gestão,
e não tinha uma destinação específica a não ser o fato de ser utilizado como gasto de custeio. Ambos os
100
A C onstrução da M unicipalização . . .
incentivos correspondiam a 5% do valor das transferências para cobertura ambulatorial calculada para
cada estado. No caso do FAM, o valor deveria ser rateado proporcionalmente entre os municípios de
cada estado. Ambos os incentivos eram repassados pelo FNS por meio de parcelas mensais.
Recursos para investimentos
Além dos incentivos à descentralização, a NOB 93 também previa transferência para investimentos na rede de serviços. Sua alocação se daria prioritariamente para os estados habilitados nas modalidades de gestão parcial ou semiplena. Não estava detalhada, na NOB 93, a metodologia de cálculo
dos montantes a serem transferidos, sendo apenas mencionado que a alocação ocorreria de acordo
com o previsto no Plano Nacional de Prioridades de Investimento. Esse seria elaborado com base nos
respectivos planos municipais e estaduais, em sistemática ascendente. O gerenciamento dos recursos
ficaria a cargo das Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e sua alocação, em cada estado, deveria seguir
o plano estadual de prioridades de investimento.
5. A NOB 1996: a consolidação da plena responsabilidade municipal (1998-2001)
O avanço da descentralização no período de implementação da NOB 93 permitiu a formação
de uma base institucional expressiva para o aprofundamento do processo de transferência de responsabilidades e recursos para os entes subnacionais. A descentralização tornara-se uma realidade setorial
e a participação de estados e municípios abrangia todos os aspectos da política de saúde, conformando
um modelo de federalismo integrado de base tripartite.
Por outro lado, a agenda de estabilização monetária e de reformas liberais de reconfiguração do
papel do Estado na economia e nas políticas públicas brasileiras resultou em um expressivo fortalecimento da União frente a estados e municípios no campo fiscal, no processo legislativo e na coordenação das políticas públicas (Abrúcio, 2005). Além disso, o acirramento da crise de endividamento
público dos estados reduziu sua capacidade de coordenação e de investimento. A NOB 96 foi formulada nesse contexto, com amplo e extenso processo de debate entre o Ministério da Saúde, CONASS
e CONASEMS, porém sua implementação foi marcada também pela instabilidade nas fontes de
financiamento e com mudanças expressivas realizadas pelo Ministério da Saúde no modelo original.
5.1 Orientação federativa
O arranjo de relações intergovernamentais contido do texto da NOB 96 (Brasil, 1996) fundamentava-se em um federalismo integrado de bases claramente municipalistas (especialmente quando
se considerava a função de provisão de serviços diretamente à população). Apesar da reafirmação da
natureza integrada do federalismo, marcada pelo compartilhamento de funções e recursos, há um
esforço explícito contido no texto da NOB 96 para delinear um arranjo mais claro de competências
para cada ente da federação, de forma a especializar cada um em papéis complementares no âmbito
101
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
do SUS. Esse desenho buscava compor um arcabouço mais funcional de organização e integração federativa onde a União e os estados atuariam criando as condições e o suporte organizacional, gerencial
e financeiro necessários para consolidar a municipalização.
O objetivo primordial da estratégia contida na NOB 96, considerando o arranjo federativo
setorial, era promover e consolidar o pleno exercício, por parte do poder público municipal e do
Distrito Federal, da função de gestor da atenção à saúde. Portanto, a estratégia de descentralização da
NOB 96 é essencialmente municipalista, pois visa ampliar o leque de atribuições e recursos sob responsabilidade das secretarias municipais de saúde, efetivando sua posição como responsáveis diretas
pela provisão dos serviços de saúde junto à população.
Na concepção subjacente ao texto da NOB 96, o município consistia no lócus principal de provisão de serviços de saúde, o que compreendia a necessidade de contemplar nesse nível da federação
a integralidade da atenção. Assim, o “SUS municipal” era reafirmado como a célula fundamental do
SUS nacional ou, conforme define o próprio texto da NOB 96, o subsistema composto pela totalidade das ações e serviços de saúde organizados em rede hierarquizada para o atendimento integral de
sua própria população.
Por outro lado, como observado acima, já havia nesse momento uma avaliação de que uma das
consequências indesejadas da municipalização era a possível fragmentação do complexo de unidades
de provisão de serviços de saúde. Emerge do texto da NOB 96 uma preocupação em direcionar a
atuação da União e dos estados na articulação e integração regional e nacional do SUS.
5.2 Divisão de competências federativas
O escopo de divisão de competências e responsabilidades entre os entes federados foi delineado
com muito mais clareza do que nas estratégias anteriores expressas nas NOB 91 e 93. Pela primeira
vez, houve um esforço significativo para definir os papéis a serem exercidos pelos municípios, estados
e a União em torno de um arcabouço de trabalho conjunto, que buscava ao mesmo tempo explicitar
os papéis específicos de cada ente e compor um arranjo complementar e integrado de gestão.
A integração seria obtida por meio de uma dinâmica técnica e política fundamentada em um
ideal de federalismo ascendente, porém de natureza cooperativa e consensual. Assim, caberia ao gestor
estadual, em comum acordo com os gestores municipais, construir estratégias de articulação das bases
locais da política de saúde e resolver os conflitos que, porventura, surgissem. A integração entre os sistemas estaduais de saúde, por conseguinte, deveria ser realizada pelo Ministério da Saúde em conjunto
com os gestores estaduais. A divisão de competências entre os entes federativos, explicitada no texto
da NOB 96 buscava seguir essa lógica.
O papel a ser desempenhado pelos municípios estava relacionado diretamente à complexidade
da rede de unidades de serviços de saúde existente em seu território e à capacidade técnica para gerenciar tal rede. Essa orientação fundamentava-se no fato de que sua inserção no SUS direcionava-se cada
vez mais para exercer a função de prestador direto de serviços à população. Buscava-se, dessa forma,
102
A C onstrução da M unicipalização . . .
por meio da estratégia contida na NOB 96, consolidar a plena responsabilização dos municípios pelo
atendimento imediato das necessidades de saúde da população, ou seja, por ser porta de entrada do
sistema de saúde.
As demais ações a serem desempenhadas pelos municípios envolviam funções assessórias à prestação de serviços, as quais eram importantes por fornecerem o suporte adequado ao pleno exercício do
papel de gestor do SUS municipal, ou seja, contratar serviços privados e profissionais, elaborar planos
e programações de serviços, gerenciar recursos financeiros, gerar informações para os níveis estadual
e nacional, realizar pagamentos, avaliar os serviços etc. Seguindo a lógica de que os municípios deveriam buscar a plena responsabilização pela atenção integral a seus cidadãos, porém sem ignorar as disparidades presentes no amplo universo das administrações públicas municipais brasileiras, a estratégia
contida na NOB 96 manteve o arcabouço de modalidades hierarquizadas de adesão, adaptando-o e
simplificando-o.
A hierarquização passou a ser baseada no nível de atenção ofertado pelo município e, em vez
de três modalidades, apenas duas: Gestão Plena da Atenção Básica (GPAB) e Gestão Plena do Sistema Municipal (GPSM). Diferentemente da configuração de modalidades ascendentes e transitórias
proposta na NOB 93, o novo escopo de condições de gestão era mais simples, porém mais funcional
em termos sistêmicos. Na NOB 93, o objetivo era compor um leque escalonado de possibilidades de
adesão ao SUS (algo transitório) capaz de abarcar uma gama ampla de situações municipais em termos
de rede de serviços de saúde. Na NOB 96 o objetivo era consolidar um modelo mais duradouro (quase
definitivo) de organização municipal da provisão de serviços de saúde.
Na modalidade de Gestão Plena da Atenção Básica (GPAB), o município é responsável apenas
pelo primeiro nível de acesso e utilização de serviços de saúde, devendo, portanto, prover as ações e
serviços básicos de saúde e cuidar para que os cidadãos tenham acesso a serviços de natureza mais
complexa em municípios adjacentes dotados de recursos especializados. Para tal, o município era
responsável por gerenciar as unidades ambulatoriais próprias, do estado e da União em seu território,
introduzir a adstrição de clientela, programar o volume adequado de oferta própria e as necessidades
de referenciamento de procedimentos ambulatoriais e hospitalares externos, entre outras.
Os municípios habilitados em (GPSM) deveriam se responsabilizar pela integralidade da atenção a seus munícipes, além de cuidar para que a população referenciada de outros municípios, para a
realização de procedimentos ambulatoriais de natureza mais especializada ou para internações hospitalares, também fosse atendida. Algumas atividades mais complexas de gestão, especialmente de caráter
logístico e informacional, também foram definidas, no texto da NOB 96, como sendo de responsabilidade dos municípios em GPSM: a operação de centrais de controle de procedimentos ambulatoriais
e hospitalares, a administração de procedimentos ambulatoriais de alto custo e hospitalares de alta
complexidade, entre outros.
De certa forma, o município habilitado em GPSM deveria se preparar para exercer o papel de
polo regional de oferta de serviços não disponíveis em municípios habilitados em GPAB. Assim, a
103
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
estratégia contida na NOB 96 articulava as condições de gestão em torno a uma lógica mínima
de coordenação regional, com o suporte da União.
5.3 A estratégia de coordenação regional
A NOB 96 é a primeira norma a introduzir de forma explícita elementos de indução de
arranjos regionalizados de serviços de saúde, embora não haja no texto da mesma nenhuma
estratégia consistente de regionalização da atenção à saúde. A lógica proposta combinava os
fundamentos da governança política federativa, introduzida por meio da NOB 93 – negociações
e pactuações consensuais entre os gestores municipais mediadas pelo gestor estadual nas CIB –
por meio da formalização de um instrumento de natureza gerencial, a Programação Pactuada e
Integrada (PPI).
Assim, dois fundamentos são essenciais para compreensão das possibilidades e limites da
proposta de coordenação regional inscrita no texto da NOB 96. O primeiro refere-se à natureza
da relação federativa que está na base da estratégia de integração: a regionalização é concebida no
texto da NOB 96 como um processo espontâneo de articulação política intermunicipal, decorrente da necessidade de complementar vazios de oferta de serviços de saúde.
De acordo com essa lógica, uma vez que os sistemas municipais de saúde apresentavam
níveis diferentes de complexidade em termos de oferta de serviços, é esperado que o gestor de
um município busque negociar junto a gestores de outros municípios o acesso a exames e tratamentos não disponíveis em seu território. Segundo as disposições da NOB 96, esse processo de
negociação deveria ocorrer exclusivamente entre os gestores municipais envolvidos, permitindose, no máximo, a mediação do gestor estadual.
Em cada estado, a Comissão Intergestores Bipartite (CIB) (regional ou estadual) deveria
ser o lócus especial dos acordos relativos ao compartilhamento de recursos, ao monitoramento
político do cumprimento dos acordos e resolução de possíveis conflitos. O segundo fundamento
consiste no tipo de dispositivo privilegiado para promover a integração regional: a movimentação
de fluxos de autorização de serviços e de recursos financeiros correspondentes. Para permitir o
monitoramento técnico do intercâmbio de exames, consultas e internações entre os municípios,
foi introduzida a Programação Pactuada e Integrada (PPI) como instrumento a ser gerenciado no
âmbito regional pela Secretaria Estadual de Saúde (SES).
A PPI deveria ser elaborada com base na compatibilização das programações de cada município, relativas à oferta e à demanda intermunicipal de serviços de saúde para cada ano. As
pactuações fundamentais eram de natureza bilateral (entre os municípios de um estado), cabendo
ao gestor estadual proceder à compatibilização dos fluxos programados de intercâmbio de oferta
regional e das respectivas compensações nas transferências financeiras a serem alocadas em cada
fundo municipal de saúde. Embora não representasse um processo consistente de regionalização,
pois não estava baseado em sistemática sólida de planejamento sustentado em indicadores epide-
104
A C onstrução da M unicipalização . . .
miológicos e sanitários, procura ampliar de forma incremental as prerrogativas de coordenação
regional exercidas pelo gestor estadual.
Nesse sentido, a estratégia de descentralização contida no texto da NOB 96 conferia especial
atenção aos quatro papéis a serem desempenhados pelo gestor estadual: apoio aos municípios, responsabilização direta (eventual e transitória) pela provisão de serviços, coordenação regional e gestão do
sistema estadual de saúde.
5.4 A natureza dos instrumentos de descentralização
O conjunto de instrumentos e dispositivos empregados para implementar o modelo de descentralização, inscrito na NOB 96, teve como base o arcabouço que já vinha sendo utilizado no processo
de implementação da NOB 93. Uma vez que o objetivo era aprofundar a implementação do modelo
de descentralização, consolidando a plena responsabilidade municipal pela provisão da atenção integral à população, foram realizados aperfeiçoamentos e adaptações nos instrumentos já em operação
e introduzidos alguns dispositivos para dar conta das novas responsabilidades que seriam assumidas
pelos entes federados.
Portanto, procurou-se aperfeiçoar e consolidar o formato de governança da coordenação federativa, que articulava um conjunto variado de dispositivos de natureza contratual, informacional, financeira e gerencial em torno de uma dinâmica política de negociação e pactuação federativa exercida
no âmbito das instâncias intergestores e conselhos no âmbito estadual e nacional.
O que se pode observar da leitura da NOB 96 é um esforço tanto para acrescentar novos dispositivos de coordenação quanto para promover maior organicidade ao conjunto do sistema de saúde
uma vez que esse era um imperativo para consolidar a municipalização. Visto que se buscava passar
de um modelo de descentralização que era transitório, para outro, concebido como pleno, tornavase necessário ratificar e aperfeiçoar o modelo que já estava implementado e que havia permitido um
avanço expressivo na descentralização.
A questão fundamental era que o arcabouço já implementado nos últimos cinco anos deveria
ser consolidado para manter um equilíbrio fundamental entre níveis mais elevados de descentralização
e a sustentação de graus mínimos de unificação nacional. À medida que se ampliava a autonomia dos
estados e municípios para assumirem plenamente a gestão do SUS no âmbito de seus territórios –
objetivo primordial da NOB 96 – tornava-se essencial adensar a regulamentação dos aspectos operacionais da implementação do SUS, para que não houvesse a fragmentação em diversos sistemas locais
e regionais de saúde.
A lógica explícita no texto da NOB 96 era a seguinte: para que a municipalização avançasse
ao seu estágio pleno, o conjunto de instrumentos e dispositivos de coordenação federativa empregado para promover a implementação do SUS deveria ser aperfeiçoado e incrementado, de maneira a
permitir que as instâncias estadual e nacional pudessem exercer devidamente seu papel de articulação
sistêmica e de suporte estratégico.
105
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
5.5 Requisitos de adesão à estratégia de descentralização
Apesar de haver uma expressiva continuidade nos fundamentos de operação entre a NOB 96 e
a NOB 93, não houve uma estratégia específica de migração imediata para a habilitação dos estados
e municípios. Esses tiveram que apresentar novamente a documentação comprobatória, sinalizando
que o objetivo era estabelecer um novo contrato federativo, em base um pouco diferente do anterior.
Para solicitar o pleito junto à CIB, os municípios candidatos à habilitação em Gestão Plena da
Atenção Básica (GPAB) deveriam encaminhar a documentação que comprovasse: o funcionamento
do conselho e do fundo municipal de saúde, a elaboração do plano municipal de saúde, a implementação da PPI do estado, a capacidade técnica e administrativa para contratação, o pagamento, o controle
e a auditoria dos serviços sob sua gestão, o volume de gastos do ano anterior e a dotação para o atual
(com contrapartida de recursos próprios), a capacidade de desenvolvimento de ações de vigilância epidemiológica e recursos humanos para supervisão e auditoria da rede sob sua gestão, além da presença
de médico para autorização de procedimentos, controle e auditoria.
Para os municípios candidatos à modalidade de GPSM, ainda se exigia que apresentasse o
relatório anual de gestão do último ano aprovado pelo conselho e que comprovasse a capacidade de
oferta do rol de procedimentos incluídos no Piso de Atenção Básica (PAB) (acrescido de serviços de
apoio diagnóstico em patologia clínica e radiologia básicas) e a estruturação de ações relacionadas ao
Serviço Nacional de Auditoria (SNA).
Um conjunto semelhante de comprovações também foi exigido dos estados, sendo que havia
também responsabilidades específicas para cada condição de gestão, com destaque para a comprovação do funcionamento da CIB, da elaboração da programação pactuada e integrada ambulatorial,
hospitalar e de alto custo e do componente estadual do SNA. Além disso, os estados que pleiteavam
a condição de gestão avançada tinham que comprovar que 60% dos municípios eram habilitados na
NOB 96 (ou 40%, desde que neles residissem 60% da população) e dispor de 30% do valor do TFA
Teto Financeiro da Assistência (TFA) comprometidos com transferências regulares e automáticas para
os municípios.
Já para os estados que pleiteassem a gestão plena do sistema estadual, os requisitos adicionais
eram comprovar a operacionalização de mecanismos de controle de serviços ambulatoriais e hospitalares (ex.: centrais de controle de leitos e internação, marcação de consultas etc.), dispor de 80%
dos municípios habilitados na NOB 96 (ou 50%, desde que neles residissem 80% da população) e
dispor de 30% do valor do TFA comprometidos com transferências regulares e automáticas para os
municípios.
5.6 O modelo de transferências financeiras intergovernamentais
Regras gerais
O modelo de transferências financeiras intergovernamentais manteve alguns fundamentos do
padrão implementado por meio da NOB 93, porém introduziu inovações importantes, inclusive na
106
A C onstrução da M unicipalização . . .
própria sistemática de composição e organização global das transferências no âmbito do SUS como
um todo. A NOB 96 reafirmou o compromisso com o aprofundamento da modalidade de repasses
automáticos e regulares “fundo a fundo”, compreendida como o pilar financeiro do processo de consolidação da descentralização do SUS e da responsabilidade municipal na gestão da política de saúde.
Entretanto, caso o município ou estado não reunisse as condições ou não pleiteasse a habilitação na
NOB 96, os recursos federais seriam transferidos por meio da modalidade de “pagamentos por remuneração direta por prestação de serviços”.
A lógica de compor as transferências por grupos vinculadas às despesas específicas, calculadas
com base populacional (valores per capita) foi também incorporada, tornando-se uma tendência doravante cada vez mais expressiva no modelo relações fiscais federativas na política de saúde no Brasil.
Tais modalidades passaram a ser empregadas como contrapartida específica para a implementação de
políticas e programas setoriais, o que levou à diversificação dos incentivos na composição das transferências intergovernamentais do SUS.
Por outro lado, a divisão das transferências de custeio por atenção ambulatorial, atenção hospitalar e incentivos adicionais à descentralização (estadualização e municipalização), deu lugar a um
arcabouço mais complexo organizado por tetos financeiros globais, compostos por tetos específicos
de grupos de despesa. O valor financeiro a ser transferido a cada estado e município era calculado
com base no volume e na natureza das ações e serviços de saúde, conforme definido na Programação
Pactuada e Integrada (PPI).
O modelo estabelecido no texto original da NOB 96 foi modificado, posteriormente, por um
conjunto de portarias editadas pelo Ministério da Saúde em dezembro de 1997, o que tornou o arcabouço de transferências ainda mais complexo, pois houve alterações nos grupos de composição interna dos tetos, nos valores a serem alocados e nas regras de aplicação dos recursos�3. As transferências de
custeio passaram a ser gerenciadas e operacionalizadas, principalmente, por meio dos tetos financeiros
da assistência (hospitalar e ambulatorial), da vigilância sanitária e da vigilância epidemiológica e controle de doenças.
Os recursos de investimento, por sua vez, passaram a ser alocados pelo Ministério da Saúde,
com base no plano estadual de prioridades de investimentos, pactuados na CIB e aprovados pelo CES,
sendo o limite de recursos definido conforme o orçamento federal da saúde. Além disso, a NOB 96 é
O volume de alterações realizadas foi tão expressivo que alguns autores chegam a afirmar que o Ministério da
Saúde instituiu unilateralmente um modelo diferente de relações fiscais federativas, conduzindo a um processo
ainda maior de fragmentação das transferências e de recentralização do financiamento do SUS (Barros, 2003;
Carvalho, 2002; Arretche, 2005). Nesse texto, apresento uma síntese do modelo de transferências com base nas
disposições do texto da NOB 96 e das portarias que definiram o volume de recursos a serem transferidos para
os estados e municípios para o ano de 1999: Portaria GM/MS 531, de 30 de abril de 1999 (Brasil, 1999a),
da Portaria SAS/MS 184, de 30 de abril de 1999 (Brasil, 1999b) e da Portaria Conjunta SAS/SE 04, de 24 de
maio de 1999 (Brasil, 1999c). O orçamento federal de 1999 já incorporava as alterações realizadas no modelo
de transferências intergovernamentais nos anos de 1997 e 1998.
3
107
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
a primeira norma a prever a possibilidade de ressarcimento pelos estados e municípios, em virtude do
atendimento de usuários detentores de planos de saúde. Outra inovação importante foi a instituição
de valores adicionais de transferências específicas condicionados à obtenção de resultados positivos
nos indicadores de saúde da população.
Custeio das ações de assistência ambulatorial e hospitalar
O conjunto de recursos da esfera federal para transferências intergovernamentais, destinados ao
custeio das ações e serviços de saúde, em um determinado ano, configurava o teto financeiro global,
sendo que seu correspondente em cada estado (teto financeiro global do estado) ou município (teto
financeiro global do município) era definido com base na PPI. O teto financeiro global de cada estado
abrangia o teto financeiro global dos respectivos municípios. Em cada uma das três esferas, o teto
financeiro global era composto pela soma dos tetos financeiros da assistência, da vigilância sanitária e
da vigilância epidemiológica e controle de doenças.
Os recursos das transferências intergovernamentais relativos ao financiamento das ações de
atenção à saúde poderiam ser transferidos tanto pela modalidade “regular e automática fundo a fundo”
quanto por meio de “remuneração por serviços produzidos”�.
Na modalidade de transferências regulares e automáticas “fundo a fundo”, o teto financeiro
da assistência à saúde era composto pelos montantes relativos ao Piso da Atenção Básica (PAB) −,
Assistência de Média e Alta Complexidade e do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC).
Piso da Atenção Básica
Os recursos que compunham o Piso da Atenção Básica, uma das principais inovações da NOB
96, eram destinados a consultas médicas em especialidades básicas, atendimento odontológico básico, atendimentos básicos por outros profissionais de nível superior e nível médio, entre outros. O
montante a ser transferido era calculado multiplicando-se um valor mínimo per capita, definido pelo
Ministério da Saúde, pela população de cada município.
A composição do elenco de procedimentos cobertos pelo PAB deveria ser proposta pela CIT
e aprovada pelo CNS. Segundo o texto da NOB 96, esse valor nacional deveria ser reajustado periodicamente tendo como base, no mínimo, o incremento médio da tabela de procedimentos do SAISUS. As transferências do PAB eram compostas por uma parte fixa (PAB fixo) e outra variável (PAB
variável), cujos componentes no ano de 1999 eram os relacionados às Ações Básicas de Vigilância
Sanitária, ao Programa de Combate às Carências Nutricionais (PCCN), ao Incentivo ao Programa
de Assistência Farmacêutica Básica, ao Incentivo ao Programa de Agentes Comunitários de Saúde
(PACS) e ao Programa de Saúde da Família (PSF) bem como ao incentivo à descentralização das unidades assistenciais da Fundação Nacional de Saúde�.
A transferência de recursos relativa à parte fixa era realizada diretamente do FNS aos fundos
municipais, exceto nos casos de municípios não habilitados, quando as transferências eram feitas para
108
A C onstrução da M unicipalização . . .
o respectivo fundo estadual de saúde. A transferência dos recursos relativos à parte variável do PAB
dependia da adesão voluntária dos municípios a cada um dos programas setoriais acima mencionados,
sendo que o valor e as regras de utilização eram definidos por meio de portarias específicas, editadas
pelo Ministério da Saúde. Esses incentivos específicos, em especial os relacionados ao PACS e ao PSF,
tinham como objetivo apoiar estados e municípios na introdução de um novo modelo de atenção no
SUS, pautado em fundamentos de demanda programada, vínculo e cuidado longitudinal.
Média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar
Os recursos para o financiamento das ações de média e alta complexidade hospitalar eram
direcionados para os procedimentos ambulatoriais mais complexos não cobertos pelo PAB e para as
internações hospitalares. A definição dos montantes a serem transferidos era realizada com base no
planejamento conjunto de estados e municípios consolidado na PPI estadual, e os limites eram os
tetos estabelecidos pelo Ministério da Saúde, em portaria anual específica (que, na maioria das vezes,
eram atualizados ao longo do ano), de acordo com as restrições orçamentárias federais.
Os cálculos para a elaboração da PPI consideravam um conjunto de critérios específicos para
cada grupo de procedimentos, e envolviam séries histórias de produção (registradas no SIA−SUS e
SIH−SUS), parâmetros populacionais, metas de produção, índices de cobertura, custos, entre outros.
Os recursos eram transferidos diretamente do FNS para o fundo municipal de saúde dos
municípios habilitados na condição de Gestão Plena do Sistema Municipal (GPSM), ou ao fundo
estadual de saúde, em casos de municípios não habilitados nessa condição. Uma vez definidos os
limites financeiros federais de transferências intergovernamentais para cada ano (tetos financeiros dos
recursos federais da assistência), os recursos programados para cada estado (tetos financeiros estaduais
da assistência) eram alocados para os respectivos municípios, compondo os tetos de acordo com os
critérios definidos e pactuados na PPI do estado.
Para o ano de 1999, o Ministério da Saúde definiu a programação dos recursos federais da
média e alta complexidade em torno dos seguintes blocos de transferências: assistência ambulatorial,
de média e alta complexidade, e hospitalar em geral, câmara estadual de compensação, assistência
oncológica ambulatorial, terapia renal substitutiva, assistência farmacêutica/medicamentos excepcionais, fator de incentivo ao desenvolvimento do ensino e pesquisa em saúde (FIDEPS), impacto das
portarias GM/MS nº 2920, 3432, 3477/98 e 479/99, e incremento da oferta e/ou qualidade de serviços. Cada um desses blocos representava uma fração do teto global da assistência e seus valores eram
transferidos em parcelas mensais.
Ações estratégicas e compensação
O Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC) foi criado em 1999 com a finalidade
de arcar com os custos dos procedimentos de alta complexidade em pacientes com referência interestadual (cuja gestão ficava a cargo da Câmara Nacional de Compensação) e dos decorrentes da
109
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
execução de ações consideradas estratégicas. A criação do FAEC está relacionada à necessidade de o
Ministério da Saúde intensificar o controle gerencial sobre a aplicação dos recursos relativos ao financiamento de ações e serviços de alto custo, considerados estratégicos por serem direcionados a grupos
prioritários da população.
Além disso, buscou-se regular com mais precisão o intercâmbio de recursos entre os estados
para o conjunto de procedimentos de alta complexidade, inicialmente por meio da Câmara Nacional
de Compensações e, posteriormente, pela Central Nacional de Regulação da Alta Complexidade.
Em 2001 a composição do FAEC abrangia os seguintes blocos de recursos específicos: Ações
Assistenciais Estratégicas (campanhas de cirurgias eletivas, transplantes, cirurgias para correção de
deformidades craniofaciais, medicamentos excepcionais, kits para carga viral para diagnóstico da
AIDS, reagentes para diagnóstico da AIDS, cirurgia bariátrica, diagnóstico do câncer de colo uterino, incentivo para cura do paciente com tuberculose), Incentivos (INTEGRASUS, descentralização
das unidades assistenciais da FUNASA, Assistência Hospitalar às Populações Indígenas), novas ações
programáticas (triagem neonatal, humanização do parto) e Central Nacional de Regulação da Alta
Complexidade. A partir de 2001, os pagamentos a prestadores cobertos com recursos do FAEC passaram a ser realizados diretamente pelo Ministério da Saúde, independente da condição de gestão do
estado ou do município.
6. Trajetória das estratégias de descentralização do sus e implicações sobre a capacidade de inovar dos municípios
Uma vez sintetizadas as características de cada uma das três normas operacionais que balizaram
a implementação do SUS, no período de 1990 a 2001, cabe analisar como tais normas evoluíram
ao tratar algumas questões fundamentais relacionadas à descentralização da política de saúde, em
especial as relativas ao número e ao tipo de entes para onde se descentraliza, à extensão de funções e
responsabilidades transferidas, ao ritmo do processo, à amplitude das áreas transferidas, à relação entre
o centro e os entes subnacionais (coordenação federativa) e ao grau de discricionariedade fiscal que
esses últimos detêm.
A análise da abordagem dessas questões permite compreender os potenciais e os limites implícitos ao processo de descentralização da saúde no SUS, uma vez que tais elementos informam quais
entes ampliaram suas responsabilidades, que funções receberam, qual a velocidade de resposta esperada desses entes, como devem operar em conjunto, que autonomia possuem para manejar recursos,
quais os mecanismos construídos para garantir a responsabilização de tais entes, entre outras questões
importantes a serem respondidas no âmbito de um processo de descentralização.
A primeira questão refere-se ao número e ao tipo de entes para onde se descentraliza, ou seja,
quais os alvos preferenciais do processo de descentralização para os quais se pretendeu transferir o
conjunto mais expressivo de responsabilidades, em especial as relacionadas diretamente à prestação de
110
A C onstrução da M unicipalização . . .
serviços à população. Nesse sentido, com ênfases diferentes, as três normas operacionais definem de
forma explícita o município como o lócus principal para a transferência das responsabilidades de provisão e condução dos processos de gestão imediatamente a ela relacionados, tais como contratação de
profissionais, compra de insumos e equipamentos, seleção e cadastramento, faturamento e pagamento
de prestadores privados, programação, entre outros.
Os estados também adquirem prerrogativas de forma paulatina com a NOB 93 e 96, sendo
essas mais de coordenação sistêmica regional. Embora estados e municípios tenham sido postos em
condições de igualdade com os prestadores privados na estratégia definida na NOB 91, sem exercer
qualquer função típica de um ente federado relativa ao planejamento e programação da própria rede
de serviços, a provisão de serviços de saúde ficou majoritariamente a cargo das unidades municipais
de saúde e, de forma subsidiária, aos estados. Mesmo sendo o INAMPS a instituição que detinha as
principais funções na política de saúde, a NOB 91 estabeleceu uma relação direta entre União e os
municípios por meio da assinatura de convênios, configurando uma relação que, mesmo de forma
vertical, privilegiava os municípios em detrimento dos estados. Esses perderam grande parte de suas
funções de coordenação regional exercidas no SUDS.
Ao tomar como lema “A Municipalização é o Caminho”, a estratégia da NOB 93 iniciou efetivamente o processo de institucionalização das secretarias municipais de saúde como núcleos de gestão
do SUS, ampliando suas prerrogativas e incluindo a possibilidade de que os municípios assumissem
quase que por completo a rede de serviços existente em seu território. Embora o fizesse de maneira
seletiva ao instituir condições diferenciadas de gestão, em que apenas na modalidade semiplena tal
possibilidade estava disponível, a NOB 93 abriu a possibilidade para que houvesse a transferência dos
principais centros de provisão de serviços públicos de saúde (capitais e cidades de grande porte) para
o comando municipal.
A NOB 96 seguiu a mesma tendência e teve como objetivo consolidar a plena responsabilização municipal pela provisão de serviços de saúde, estabelecendo que, no mínimo, os municípios
deveriam se responsabilizar de forma plena pela gestão da atenção primária em seu território. Nesse
processo, os estados foram colocados sempre como possível retaguarda, para assumir a gestão das
unidades ambulatoriais e hospitalares em caso de não adesão dos municípios, além de ampliar suas
prerrogativas de mediação política regional e gestão do sistema estadual.
A transferência de funções e responsabilidades aos entes subnacionais foi realizada de maneira seletiva e em etapas crescentes de responsabilização, compondo um processo heterogêneo e
incremental de ampliação de autonomia dos entes subnacionais. A estratégia estabelecida na NOB
91 praticamente não transferiu qualquer função relevante de gestão para estados e municípios, a
não ser aquelas típicas de um movimento de desconcentração, ou seja, atividades de natureza operacional (cadastramento de prestadores, autorização de AIH, faturamento, elaboração de relatórios
de gestão etc.). Nessa estratégia, não se atentou às possibilidades diferenciadas quanto à capacidade
para assumir responsabilidades dos estados e municípios brasileiros, criando um arranjo restrito
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
e homogêneo de adesão, configurando um retrocesso no movimento setorial de descentralização
iniciado na década de 1980.
As duas normas posteriores mostraram intenção de efetivamente transferir funções e ampliar a
autonomia dos entes subnacionais, porém partiram de avaliações distintas sobre o estágio de implementação do SUS e adotaram objetivos diferentes. Embora ambas tenham empregado modalidades
hierarquizadas de habilitação, na NOB 93 o objetivo consistia em ampliar ao máximo o leque de possibilidade de adesão de forma a reduzir os limites provenientes do quadro extremamente diferenciado
de capacidades institucionais dos estados e municípios brasileiros.
Essa estratégia baseava-se na avaliação de que o estágio de descentralização do SUS era incipiente e que era necessário contemplar todas as possibilidades existentes, desde os entes com baixa
capacidade técnica e gerencial até os com capacidade para gerenciar toda a rede. Já, na NOB 96, o
diagnóstico era de que a descentralização estava mais avançada e que era possível aprofundar o modelo
instituído por meio da NOB 93, desta vez definindo apenas duas modalidades capazes de consolidar
a responsabilização dos municípios em assumir ao menos a atenção básica.
O ritmo do processo de descentralização manteve uma relação estreita com a estratégia paulatina de transferência das responsabilidades aos entes subnacionais, avançando também de forma
heterogênea e incremental no âmbito do universo de estados e município brasileiros (Tabela 1). A
NOB 91 vigorou entre janeiro de 1991 e abril de 1993 e, em virtude da inadequação de sua estratégia,
o volume de municípios que assinaram convênios com o INAMPS foi bastante reduzido, sendo 321
em 1991, 565 em 1992 e 188 em 1993, totalizando ao final desse ano 1.074 municípios. A NOB 93
vigorou entre maio de 1994 e novembro de 1997 e representou um marco no processo de descentralização do SUS, em virtude do elevado volume de adesão obtido junto aos municípios. Ao final dos
três anos de implementação, eram 3.129 municípios habilitados, dos quais 144 municípios estavam
habilitados na condição de gestão semiplena, 618 na condição parcial e 2.367 na condição incipiente.
112
A C onstrução da M unicipalização . . .
Tabela 1 - Evolução do número de municípios habilitados, segundo Norma Operacional – 1991-2001
Ano
Norma Operacional /
municípios habilitados por ano
Total de Municípios
Habilitados - Brasil
(cumulativo)
1991
321
1992
565
886
1993
188
1074
NOB 91
321
NOB 93
Incipiente
Parcial
Semiplena
1994
1836
537
24
2397
1995
295
75
32
2799
1996
192
6
81
3078
1997
44
0
7
3129
TOTAL
2367
618
144
NOB 96
GPAB
GPSM
1998
4600
449
5049
1999
254
47
5350
2000
73
27
5450
2001
25
41
5516
TOTAL
4952
564
Fonte: Elaboração própria baseada em dados do Ministério da Saúde (Brasil, 2002).
A NOB 96, por sua vez, vigorou entre o período de dezembro de 1997 e dezembro de 2001 e
consolidou a adesão municipal ao SUS, uma vez que, ao final desse período, a quase totalidade dos
municípios brasileiros estava habilitada em uma das duas modalidades de gestão, sendo 4.952 em
GPAB e 564 em GPSM.
A amplitude das áreas transferidas no âmbito da política de saúde foi sendo expandida também
de forma incremental. A descentralização iniciou-se por algumas áreas com maior peso ou consideradas prioritárias e foi se ampliando aos poucos para outras áreas. A atenção à saúde e o controle social
113
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
já contavam com ações descentralizadas na primeira metade da década de 1990 (Moreira & Escorel,
2009), assim como a área de gestão financeira.
O escopo da NOB 91 já previa que estados e municípios constituíssem fundos para o recebimento de recursos intergovernamentais e que estabelecessem conselhos para formular a política de
saúde e controlar e avaliar a execução de metas e a aplicação de recursos. A comprovação do pleno
funcionamento desses dispositivos esteve presente também na NOB 93 e na NOB 96, porém passaram a conferir ênfase cada vez mais expressiva às questões relacionadas à atenção à saúde, área que
tem representado desde então a principal concentração de regulamentação das normas operacionais.
As atividades de mediação e negociação federativa foram introduzidas pela NOB 93, com a
instituição da CIT e das CIB nos estados, permitindo que estados e municípios atuassem no processo
político de elaboração e implementação das estratégias de descentralização do SUS.
Na NOB 96, as prerrogativas desses fóruns foram ampliadas e decisões de maior relevância
passaram a ser exercidas de forma conjunta entre os gestores, nas três esferas da federação. Algumas
áreas da política de saúde como a vigilância sanitária e epidemiológica apenas iniciaram o processo de
descentralização com a edição da NOB 96 (De Seta & Dain, 2010). Da mesma forma, as atividades
de planejamento regional foram minimamente introduzidas pela NOB 96 para serem exercidas pelas
secretarias estaduais de saúde, sem configurar o devido tratamento desse tema com vistas a construir
um processo consistente de regionalização.
A relação entre o centro e os entes descentralizados, ou seja, a dinâmica de coordenação federativa foi marcada por uma dupla tendência, caracterizada, por um lado, pela ampliação da inserção
política e gerencial dos entes subnacionais e, por outro lado, pelo crescimento da capacidade de regulação sistêmica do nível federal, em especial no âmbito normativo e financeiro.
Na medida em que a descentralização necessariamente implica na partilha de responsabilidade
entre União, estados e municípios, não teria sido possível manter uma coordenação federativa baseada
na condução unilateral do nível federal. O cálculo de adesão dos estados e municípios ao SUS tinha
como um dos elementos principais a expansão de suas prerrogativas de participação na condução dos
rumos da política de saúde, em especial em três momentos específicos do ciclo de formulação e implementação das estratégias de descentralização do SUS.
O primeiro, no âmbito federal, durante a fase de elaboração das estratégias de descentralização,
que define o padrão nacional de implementação do SUS no curto prazo. Tal padrão é estabelecido
no momento de elaboração de cada norma operacional e consiste em um pacto federativo a ser implementado, em geral, ao longo de um período de aproximadamente três a cinco anos seguintes. O
segundo, na esfera regional e local, ao longo do processo de implementação das normas operacionais
nos momentos de interpretação e aplicação das regras do processo de descentralização.
Finalmente, a terceira situação importante de defesa dos interesses dos entes subnacionais é na
esfera federal, ao longo do processo de implementação, quando da revisão de aspectos específicos de
cada norma operacional. Ao longo do período analisado (1990-2001), é possível observar que estados
114
A C onstrução da M unicipalização . . .
e municípios ampliaram expressivamente sua capacidade de interferir nos rumos da descentralização,
no primeiro e no segundo momento, mas o peso da União sempre foi maior no terceiro momento.
Na elaboração e execução da NOB 91, a participação de estados e municípios foi praticamente
nula, uma vez que o desenho da estratégia foi realizado pela burocracia do Ministério da Saúde e as
principais prerrogativas de decisão sobre a implementação da norma em âmbito regional e de revisão
em âmbito federal foram quase que exclusivamente reservadas ao INAMPS.
Com a NOB 93, que levou a operacionalização da CIT e das CIB e a legitimação do caráter
político setorial do CONASS e do CONASEMS, estados e municípios passaram a ter a prerrogativa
real de interferir no processo de elaboração das normas operacionais e também de conduzir sua aplicação nos espaços regional e local (Ribeiro, 1997).
O processo de elaboração das NOBs 93 e 96 levou, pelo menos, seis meses cada uma e teve ampla discussão com representantes dos estados, municípios, academia e representantes da sociedade civil
(inseridos no CNS). Além disso, com base na NOB 93, todos os aspectos de natureza operacional das
NOB passaram a ser decididos entre os representantes dos estados e municípios, no âmbito das CIB.
Por outro lado, a União sempre conservou contrapesos federativos de natureza centrípeta, ao
manter a CIT e o CNS como fóruns superiores (ou fóruns de revisão) para analisar casos de gestores
estaduais e municipais que se declararam prejudicados por decisões regionais. Entretanto, o peso
maior da União sempre esteve concentrado em sua capacidade de estabelecer e rever padrões relacionados a aspectos específicos de cada estratégia de descentralização, em especial no que se refere à
regulamentação da implementação de programas setoriais de relevância nacional, como PACS, PSF,
DST/AIDS, assim como na aplicação de recursos em grupos de procedimentos de alta complexidade.
Assim, durante o período de implementação da NOB 96, quando se multiplicaram os programas setoriais e se intensificaram os conflitos pelo financiamento dos procedimentos de alta complexidade (por conta das dificuldades de manejar as compensações financeiras intermunicipais e interestaduais), foi que novamente se aceleraram as tendências centralizadoras da dinâmica federativa do SUS.
São pontos altos desse fortalecimento da União tanto o conjunto de portarias, editado em dezembro
de 1997, que alteraram a NOB 96 de forma significativa (levando representantes dos gestores estaduais e municipais a falarem em NOB 98) quanto a criação do FAEC.
A natureza das relações intergovernamentais, no âmbito do SUS, ao longo do processo de descentralização no período analisado, está relacionada de forma muito estreita com o grau de discricionariedade fiscal, setorialmente conferido aos entes descentralizados. Dois fatores foram fundamentais
para se definir quanta autonomia passaram a ter os entes subnacionais para alocar recursos de acordo
com suas intenções: quanto as normas operacionais (e regras federais similares) lograram disciplinar
o uso de recursos próprios investidos por estados e municípios e a rigidez das regras que regularam o
uso dos incentivos financeiros provenientes das transferências federais.
As três normas operacionais continham dispositivos normativos que buscavam constranger estados e municípios a alocar patamares mínimos de recursos próprios em saúde. A NOB 91 continha,
115
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
entre um dos requisitos para que estados e municípios recebessem recursos federais, a contrapartida
de recursos próprios no valor de 10% do total de seu orçamento. A NOB 93 também definiu como
requisito de habilitação em todas as três condições de gestão para estados e municípios que esses comprovassem, respectivamente, à CIT e às CIB correspondentes, o gasto anual de recursos provenientes
de arrecadação própria; porém, não fixou patamares mínimos.
A NOB 96 estabeleceu, por sua vez, que os entes nacionais comprovassem a contrapartida do
ano anterior e a previsão orçamentária para o ano atual, sem também estabelecer qual o percentual
mínimo. De forma complementar à NOB 96, a Portaria GM/MS 531, de 30 de abril de 1999, adiciona um dispositivo mais rígido, que permite à União reduzir proporcionalmente o volume de transferências da atenção básica e da média e alta complexidade para os municípios que não mantiverem
seu patamar de gastos próprios em relação ao ano anterior.
Apesar dessas regulamentações inseridas pelas normas operacionais, há evidências na literatura
que indicam que seu cumprimento não ocorreu, o que levou à necessidade de aprovação da Emenda
Constitucional n. 20/2000, cujo impacto foi posterior ao período aqui analisado (Piola & Biasoto
Junior, 2003; Ugá & Marques, 2005). Assim, na aplicação dos recursos próprios, houve expressiva
discricionariedade fiscal por parte de estados e municípios, algo completamente diferente do verificado quando se analisam os incentivos financeiros provenientes das transferências federais.
Todas as três normas foram rígidas ao disciplinar a aplicação das transferências intergovernamentais; porém, é possível observar um trade-off interessante na forma de reduzir a discricionariedade
dos entes subnacionais entre o modelo de regulamentação de transferências da NOB 91 o da NOB
96: migrou-se da modalidade de pagamento direto por produção para transferências “fundo a fundo”
ao mesmo tempo em que se diversificaram e fragmentaram internamente as transferências, ao vincularem seu emprego em gastos de implementação de programas setoriais.
Essas características do modelo de descentralização adotado pelo SUS no período 1990-2001
tiveram implicações significativas sobre a capacidade de inovação dos municípios. A escolha inscrita
nas NOB 91, 93 e 96 de afirmação do município como o lócus preferencial para a transferência de
funções, recursos e responsabilidades significava que havia um padrão de inovação a ser perseguido
pelas estratégias de descentralização do SUS como ideal para a organização dos serviços de saúde.
Esse padrão foi o construído em torno das experiências locais de cidades de médio e grande
porte que, ao longo das décadas de 1970 e 1980, desenvolveram experiências de medicina comunitária com modelos participativos de gestão e foco nos determinantes sociais da saúde, dentre as quais
podem ser citadas Montes Claros, Niterói, Campinas, Londrina, entre outras. Essas experiências deveriam ser os polos inovadores do sistema de saúde, que seriam tomados como núcleos de difusão de
práticas e modelos de gestão da atenção à saúde.
Porém, a inovação fundamentada em saltos de qualidade teve de ceder lugar a um padrão de
natureza “adaptativa e incremental”, considerando as condições adversas do contexto caraterizado por
grandes assimetrias regionais e locais de desenvolvimento, recursos e capacidade de gestão, uma tra-
116
A C onstrução da M unicipalização . . .
dição centralizadora e de baixa inserção dos governos locais, uma orientação política neoliberal, uma
política econômica voltada para a estabilização monetária e o equilíbrio fiscal, conflitos federativos
por investimentos (guerra fiscal) e a coexistência com um sistema privado subsidiado por incentivos
fiscais, entre outros.
As ameaças constantes ao SUS e o risco de não implantação levaram à adoção de estratégias
mais conservadoras de descentralização, concentrando capacidade regulatória na União, para garantir
o caráter nacional da política, e avançando paulatinamente a partir de núcleos onde a complexidade
da rede e a capacidade de gestão eram mais consistentes.
Como resultado, o leque de possibilidades de inovação ficou restrito a consolidar os requisitos
mínimos de gestão exigidos pelas normas operacionais a cada etapa, com o objetivo de formar uma
base mais consistente, que permitisse produzir acréscimos de qualidade na etapa seguinte do processo.
Assim, manter o sistema avançando nacionalmente fazendo o “feijão com arroz”, apoiado em
estratégias adaptativas e incrementais, tornou-se o padrão de inovação dominante da descentralização
do SUS. A concentração de capacidade regulatória na União implicou na adoção constante de padrões
nacionais, que produziram um trade-off entre a garantia de avanços sistêmicos e ganhos de qualidade
local, optando, na maioria das vezes, pela primeira opção.
O estabelecimento de modalidades rígidas de transferência de responsabilidade (condições de
gestão das NOB), atreladas a incentivos financeiros, criou um sistema nacional, que padronizou o
processo de descentralização, circunscrevendo, em vários casos, os potenciais locais de criatividade no
campo da gestão e da atenção, baseados em regras rigorosas do emprego e da prestação de contas dos
recursos provenientes das transferências federais.
Finalmente, o vácuo de propostas consistentes de articulação regional proporcionado pelas estratégias constantes das normas operacionais do período resultou em praticamente nenhum estímulo
para que houvesse o compartilhamento de práticas inovadoras de gestão e organização da atenção à
saúde entre os municípios.
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Capítulo 3
Democratização do
Poder Local e as
Dimensões da
Inovação em Saúde:
desafios metodológicos
da investigação
O processo de descentralização do SUS deu origem a novas configurações
no conjunto de atores presentes na arena política e no formato e conteúdo das estruturas de gestão do Estado, principalmente nos sistemas
locais. Ao longo da trajetória de duas décadas foram instituídas novas
instâncias decisórias, estruturas gerenciais, mecanismos de coordenação, formas de alocação de recursos, programas de atenção à saúde, entre outros dispositivos que definem o arcabouço do SUS.
Esse capítulo descreve a metodologia utilizada na pesquisa
“Municipalização da Saúde: Inovação na Gestão e Democracia Local
no Brasil”, que teve como objetivo dimensionar e analisar de forma
comparada os efeitos do processo da descentralização da política de
saúde sobre a configuração política e gerencial da esfera local, em dois
momentos diferentes da trajetória do SUS, os anos de 1996 e 2006.
Foram estudadas nesses dois momentos as mudanças ocorridas
na configuração e no modo de funcionamento do sistema de poder
municipal, baseadas na descentralização das ações e nos serviços de saúde, caracterizando-as quanto ao seu eventual caráter democratizante das
relações locais de poder e seu efeito inovador sobre a dinâmica e os
processos de gestão.
Tendo em vista a natureza complexa da descentralização e suas
implicações para o sistema local de saúde, tornou-se necessária a elaboração de uma metodologia específica, inédita na literatura tanto de
descentralização quanto de política de saúde, elaborada inicialmente
em 1996 e aperfeiçoada para a realização da segunda versão da pesquisa em 2006.
121
Sonia Fleury
Assis Mafort Ouverney
Renato Cesar Möller
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A primeira versão da pesquisa foi realizada em 1996, ano de edição da NOB 96, em meio ao
processo de descentralização do SUS; e, a segunda, em 2006, em um contexto marcado pela consolidação do sistema descentralizado no momento inicial de implantação do “Pacto pela Saúde”.
Os resultados obtidos na primeira versão da pesquisa identificaram assimetrias e lacunas em relação
aos efeitos do processo de descentralização, em relação tanto à democratização quanto à inovação,
e motivaram o estudo em um segundo momento para permitir comparar tendências ao longo do
processo.
Este capítulo apresenta a estratégia metodológica elaborada para coleta e análise dos dados
e sua comparação nos dois momentos estudados do processo de descentralização do SUS. A seção
1 apresenta os objetivos e as hipóteses que nortearam a pesquisa nas duas versões. A seção 2 trata
da operacionalização de categorias conceituais que permitiram definir indicadores para os conceitos centrais de democratização e inovação, permitindo, assim, a coleta, a tabulação, a análise e
a verificação dos resultados. A seção 3 apresenta o processo de construção e aperfeiçoamento do
instrumento de coleta de dados, enquanto a seção 4 descreve as fases de distribuição e retorno dos
questionários, assim como a análise da representatividade da amostra. A seção 5, por sua vez, aborda o processo de tabulação das informações coletadas, enquanto a seção 6 apresenta a estratégia de
análise dos resultados, com destaque para o processo de elaboração e aperfeiçoamento do Índice de
Inovação. A seção 7 por fim, aborda as limitações da metodologia adotada.
1. Objetivos e hipóteses
O objetivo geral da pesquisa consiste em dimensionar e analisar as possíveis transformações
ocorridas na gestão municipal da saúde, com base na descentralização, caracterizando-as quanto
ao seu eventual caráter democratizante e inovador. Trata-se de comparar os resultados obtidos nas
pesquisas de 1996 e 2006, o que permite uma análise diacrônica do processo de descentralização.
De modo geral, os estudos dos processos de descentralização coletam e analisam dados obtidos em
certo ponto, em um corte sincrônico, o que é uma limitação, pois, sendo este um processo dinâmico e complexo, só pode ser compreendido ao longo do seu desenvolvimento, em uma perspectiva
diacrônica.
A hipótese que orientou a pesquisa consiste em afirmar que o processo de descentralização na área
de saúde teria contribuído para a democratização do sistema de poder local na medida em que permitiu
maior diversificação no acesso aos cargos de dirigentes locais do sistema de saúde, possibilitando a renovação das elites locais e a inserção de interesses de um espectro mais amplo de atores sociais. A segunda
hipótese da pesquisa relaciona o processo de descentralização com a difusão das inovações, possibilitando
o aperfeiçoamento da capacidade de gestão dos sistemas locais de saúde em relação à interação com a
sociedade, introdução de programas e estratégias e novas práticas administrativas.
122
D emocratização do P oder L ocal . . .
A descentralização levaria à democratização e ao aperfeiçoamento da gestão da esfera local de
governo, na medida em que, por meio de alterações provocadas no perfil do gestor e nos processos
de gestão, induziria modificações na composição e na direção do poder local. Esse processo ampliaria tanto a gama de interesses sociais atendidos pelo sistema municipal de saúde quanto permitiria
a introdução de novas práticas políticas e de gestão.
Os dois movimentos fundamentais de reforma democrática apresentados na proposta de
construção do SUS se expressariam por meio de deslocamentos do poder desde o nível central em
direção ao local e desde o aparato estatal em direção à sociedade civil. O cruzamento destes dois
vetores de deslocamentos geraria um quadrante onde a nova gestão local encontraria maior participação social, gerando novas condições de governança local e condições favoráveis para ampliar
o grau de democratização da política de saúde e da alocação de recursos, bem como a eficácia e a
eficiência da gestão pública.
Isto porque a maior proximidade das estruturas de organização e gestão de serviços dos cidadãos permitiria ampliar a esfera pública por meio da inserção de interesses plurais na agenda local.
A maior capacidade de pressão sobre os gestores por resultados mais efetivos induziria melhorias na
organização e gestão das secretarias municipais e na qualidade da provisão de serviços. Por outro
lado, a descentralização de recursos e responsabilidades permitiria o aumento da capacidade de
gerenciar de forma autônoma os recursos transferidos para a esfera local, o que funcionaria como
um estímulo efetivo para a ampliação da capacidade técnica e da responsabilização do gestor local.
Como será visto com mais detalhes na seção seguinte, a democratização da esfera local foi
abordada por meio do perfil dos gestores municipais, considerando-se tanto as características socioeconômicas como sua trajetória profissional e política. Já a inovação foi tratada com base em três
dimensões: a social, referente às relações Estado-sociedade, a gerencial, que abrange os processos
e a dinâmica de gestão, e a assistencial, relativa às estruturas e ações de provisão de programas e
serviços de saúde.
A pesquisa de 1996 apontou uma assimetria no processo de inovação, com desenvolvimento mais acentuado na dimensão social em detrimento das demais dimensões. Contudo, o processo de descentralização do SUS aprofundou-se significativamente nessas duas dimensões a partir
de 1998 com a efetiva transferência da rede de serviços às esferas subnacionais, a regularização
dos fluxos de transferências financeiras automáticas fundo a fundo, a diversificação e a ampliação
da cobertura dos programas assistenciais como Saúde da Família e Agentes Comunitários de
Saúde, entre outros.
Assim, a hipótese que orientou a segunda versão da pesquisa foi que com o aprofundamento do processo de descentralização ao longo do tempo, poderia haver maior convergência entre
as três curvas da inovação, com a recuperação das velocidades de inovação relativas às dimensões
gerencial e assistencial.
123
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
2. Estrutura conceitual
Após a formulação das hipóteses referentes à democratização e aperfeiçoamento gerencial na
esfera local, os conceitos centrais operacionalizados para verificação foram a diversificação das elites
gerenciais locais e a inovação na gestão, respectivamente definidos da seguinte forma:
• A diversificação foi utilizada para qualificar as alterações na composição da elite gerencial −
aqui entendida como a mandatária do poder governamental local na área da saúde − expressas pelas mudanças na acessibilidade ao cargo a setores sociais mais amplos, de forma a aproximar o estrato dos gestores da composição geral da população. Da mesma maneira, eram
esperadas modificações na percepção dos gestores em relação a aspectos culturais, técnicos
e cognitivos. A verificação da ampliação desse espectro confirmaria uma tendência democratizante, ou seja, quanto maior fosse a a diversificação do perfil das elites governamentais
locais mais intenso seria o processo de democratização impulsionado pela descentralização;
• A inovação foi utilizada para qualificar as mudanças de desenho institucional assim como da
dinâmica e do funcionamento do sistema, eventualmente ocorridas no processo de gestão,
que possam expressar um alargamento da gama de interesses sociais contemplados no seu
funcionamento e nos resultados. A ocorrência de inovações que assegurassem o interesse
público de forma eficaz e efetiva denotaria ampliação do caráter republicano na gestão de
saúde, portanto, um avanço na construção democrática. Para fins de melhor caracterizar a
natureza e o conteúdo da inovação, o processo de gestão foi decomposto em três dimensões:
o Dimensão Social: entende-se a relação estabelecida entre a gestão municipal e os diferentes setores da sociedade. Destacam-se nesta discussão a capacidade que a sociedade
apresenta para exercer o controle social tanto na definição de prioridades quanto na
transformação de tais prioridades em fatos de política pública, mediante a alocação
de recursos. Também faz parte desta dimensão a responsabilidade social dos gestores,
expressa pela prestação de contas de suas ações à sociedade. Finalmente, definiu-se a
comunicação estabelecida entre gestores e sociedade como elemento fundamental na
democratização da gestão pública.
o Dimensão Gerencial: diz respeito à introdução e/ou manutenção de processos administrativos inovadores na gestão municipal de saúde, recomendados pelos organismos formuladores das políticas do setor. Incluem-se neste caso aspectos relativos ao
aumento da eficiência e eficácia da gestão, potencializado pela utilização de recursos
externos à secretaria (como parcerias, consórcios etc.), bem como aspectos relativos
à valorização da dimensão técnica da gestão (assessorias, sistemas de informação,
instrumentos de gestão de recursos, políticas de pessoal etc.). Foram também considerados os aspectos relativos à captação da demanda pelo gestor municipal e sua
transformação em parâmetros para redirecionar a política de saúde.
124
D emocratização do P oder L ocal . . .
o Dimensão Assistencial: engloba diferentes ações e/ou programas direcionados para
aquilo que se convencionou chamar “a ponta da linha”, ou seja, instrumentos gerenciais que visam alterar a qualidade e a efetividade da atenção à saúde. Entre eles, destacam-se as ações voltadas para a racionalização dos recursos (como centrais de marcação de consulta ou de ambulância, fichas de referência etc.). Também se incluem
nesta dimensão ações e programas fomentados pelo nível central com o objetivo de
alterar o modelo de atenção à saúde, com ênfase na prevenção e na desospitalização.
O estudo foi realizado tomando como unidades de análise o dos(as) secretários(as) municipais
de saúde e a sua gestão na secretaria municipal de saúde. Tanto as informações sobre o perfil quanto
aquelas relativas à gestão municipal foram obtidas com base nas percepções dos(as) gestores(as).
Tendo em vista a amplitude do universo nacional de secretários e secretarias municipais de
saúde, o extenso conjunto de informações a serem coletadas, as possíveis dificuldades operacionais
de obtenção de dados in loco e o custo correspondente, optou-se por unificar as estratégias de coleta
de informações em um único instrumento: um questionário a ser respondido pelos(as) secretários(s)
municipais de saúde. Assim, as informações relativas às duas unidades de análise foram obtidas de
uma única fonte de informações, o(a) secretário(a) municipal de saúde.
Essa sequência de categorias de análise, que inclui desde as hipóteses até o instrumento de
coleta de dados, está organizada na estrutura conceitual da pesquisa, delineada de forma detalhada na
figura: Inovação Secretário(a) Municipal de Saúde Secretaria Municipal de Saúde.
Figura 3 - Estrutura conceitual da pesquisa municipalização da saúde
125
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A estrutura do questionário fundamenta-se em dois blocos, um com questões relacionadas ao
perfil do gestor e outro às características da gestão, agrupadas em categorias, atributos, variáveis e indicadores que consistem no desdobramento analítico sequencial estabelecido para os conceitos centrais,
de forma a torná-los operacionalizáveis na realidade concreta dos(as) secretários(as) e das secretarias
municipais de saúde.
Essa estrutura permitiu, como será visto mais à frente, tanto captar as informações de maneira
organizada em blocos conceituais quanto construir um Índice de Inovação, o que possibilitou delinear
dois grupos compostos, respectivamente, por gestores mais e menos inovadores, de forma a compará-los.
3. Construção e aperfeiçoamento do instrumento de coleta de dados
O estudo da diversificação do perfil dos gestores privilegiou quatro categorias em ambas as
edições da pesquisa: o perfil socioeconômico, o perfil profissional, a trajetória política e vida pública e
a relação com o cargo de ssecretário(a).
A origem e situação social bem como as características pessoais do gestor foram definidas para
analisar o perfil socioeconômico do gestor, enquanto para o perfil profissional foram selecionados dois
conjuntos de atributos, um sobre a qualificação e outro sobre a trajetória profissional.
O estudo da trajetória política abrangeu as experiências políticas, eleitorais e associativas do(a)
gestor(a), em geral, assim como sua participação política na área de saúde. Finalmente, o estudo da
relação com o cargo de secretário incluiu a experiência no cargo, as razões de designação e aceitação e
as expectativas de futuro do(a) gestor(a).
O desenho da investigação pode ser observado na estrutura metodológica expressa nos Quadros 3 e 4, em que estão estabelecidas as relações entre as categorias, atributos, variáveis e questões que
compõem o questionário.
Para o estudo das características da gestão, como afirmado acima, foram definidas três dimensões. Na dimensão social, concentrou-se a coleta de dados sobre a elaboração e execução do orçamento, o estabelecimento de prioridades, a relação com o conselho municipal de saúde, a prestação de
contas, o fluxo de informações e os atores relevantes.
Na dimensão gerencial, os atributos selecionados foram o uso das informações na gestão, o
modelo de organização de compras e serviços, a gestão de pessoas, o apoio técnico, as parcerias e a
regionalização.
Finalmente, a dimensão assistencial contemplou o acesso e a estrutura assistencial de programas
oferecidos à população. Um quarto bloco de questões buscou sintetizar as percepções dos gestores
sobre suas realizações, frustrações e expectativas futuras de gestão.
A estrutura completa de análise com o desdobramento dos atributos em variáveis e questões
está apresentada nos quadros abaixo.
126
D emocratização do P oder L ocal . . .
Quadro 3 − Disposição das questões do gestor por categoria, atributo e variável
Categoria
Atributo
Variável
Questões
Município/origem
D’’
Instrução pai/mãe
I’’
Município/residência
J’’
Tempo residência
K’’
Salário/outra fonte renda
L’’, M’’
Idade
F’’
Sexo
E’’
Raça
G’’
Estado civil
H’’
Instrução/Curso superior
P’’
Profissão
N’’
Curso capacitação
O’’
Experiência
anterior em saúde
D
Experiência de
direção em órgão púbico
E
Experiência
anterior como secretário de saúde
F
Esfera em que trabalhou
G
Atividades extra
secretaria
H
Filiação a partido político
I, J
Participação como candidato em eleição
K, L
Licenciamento de cargo eletivo
M
Experiência
associativa
Filiação a sociedade civil
N, O
Participação política em
saúde
Participação em eventos, entidades
representativas e instâncias de pactuação
R1, R2, R3,
R4, R5, S
Experiência no cargo
Estabilidade/
Continuidade
B
Razões da indicação
P
Razões da aceitação
Q
Origem social
Situação atual
Perfil
socioeconômico
Características
pessoais
Qualificação
Perfil
profissional
Trajetória
profissional
Experiência políticoeleitoral
Trajetória política
e vida pública
Relação com o
cargo de
Secretário
Designação/
Aceitação
C,C’’
Expectativas para o futuro
Fonte: elaboração própria dos autores.
127
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quadro 4 − Disposição das questões da gestão por categoria, atributo e variável
Categorias
Atributos
Variáveis
Questões
Elaboração e execução
do orçamento
Influência dos atores
T, U
Importância dos itens (itens relevantes)
X
Influência dos atores
V
Conselho Municipal de
Saúde
Funcionamento do conselho
Y1, Y2, Y3,
Y4, Y5
Prestação de contas
Interlocutores/instrumentos e mecanismos
Z, A’
Fluxo de informações
Tipo informações
oferecidas
B’
Oposição à gestão
X’
Apoio à gestão
Y’
Instrumentos e desdobramentos das informações recebidas
C’, D’
Modalidades de aquisição
E’
Formas de terceirização de serviços
L’
Controle de qualidade
M’
Forma de gestão
F’
Política de capacitação
G’
Formas de contratação de profissionais
J’
Mecanismos adicionais
de remuneração
K’
Apoio técnico
Entidades
H’
Parcerias
Modalidades
I’
Regionalização
Estratégia de organização
N’, O’, P’,
Q’, R’
Estabelecimento de
prioridades
Dimensão
Social
Atores relevantes
Impacto da
informação
Compras e serviços
Dimensão
gerencial
Gestão de pessoas
(continua)
128
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
Categorias
Atributos
Acesso
Dimensão
assistencial
Estrutura assistencial
Percepção
dos
Secretários
Variáveis
Questões
Forma e qualidade do acesso à média e alta complexidade
S’, T’
Mecanismos de identificação de demanda reprimida
U’
Recursos
G’
Ações e programas
W’
Realizações
Z’
Frustrações
A’’
Expectativas da gestão
B’
Fonte: elaboração própria dos autores.
Como esperado, foi necessário fazer atualizações no questionário inicial nesta segunda pesquisa, com vistas a compatibilizar o instrumento com as mudanças ocorridas na década em relação à
política e à gestão de saúde. Os acréscimos e alterações estão concentrados, em sua maioria, nas características da gestão, o que evidencia a significativa ampliação do escopo dos instrumentos de gestão
do SUS, presentes nas secretarias, ou, pelo menos, disponíveis para apropriação. O questionário final
aplicado em 2006 encontra-se no Anexo I e os acréscimos e alterações feitos em relação ao questionário aplicado em 1996 são destacados no Anexo II.
4. Distribuição, coleta e amostragem
A distribuição do questionário aos(às) gestores(as) procurou contemplar o universo nacional de
secretários municipais de saúde, tendo em conta as regiões e os diversos portes populacionais do País.
Na pesquisa de 1996, o questionário foi enviado por correio às secretarias municipais de saúde
dos 4973 municípios brasileiros, acompanhado de uma carta de apresentação, com esclarecimentos
sobre o propósito da pesquisa e sobre as instituições patrocinadoras. Durante as três primeiras semanas após a postagem, que ocorreu em fins de novembro e início de dezembro, o boletim eletrônico
Linha Direta do CONASEMS, que atinge semanalmente três mil municípios, divulgou o seu apoio à
pesquisa, reforçando o apelo de resposta aos questionários.
Em 1996, o processo de envio e recebimento dos questionários levou de 4 a 5 meses e
resultou na obtenção de uma taxa de retorno de 28,6 % do universo municipal à época, com a
seguinte distribuição:
129
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Tabela 2 – Total de municípios, municípios respondentes e percentuais de resposta por unidade
da federação – 1996
REGIÃO NORTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios
Respondentes
(%)
Acre
22
2
9,1%
Amazonas
62
14
22,6%
Amapá
15
3
20,0%
Pará
128
22
17,2%
Rondônia
40
10
25,0%
Roraima
8
2
25,0%
Tocantins
123
25
20,3%
TOTAL NORTE
398
78
19,6%
REGIÃO NORDESTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios
Respondentes
(%)
Alagoas
100
19
19,0%
Bahia
415
51
12,3%
Ceará
184
33
17,9%
Maranhão
136
16
11,8%
Paraíba
171
20
11,7%
Pernambuco
177
37
20,9%
Piauí
148
27
18,2%
Rio Grande do Norte
152
26
17,1%
Sergipe
75
9
12,0%
TOTAL NORDESTE
1558
238
15,3%
(continua)
130
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
REGIÃO CENTRO-OESTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios
Respondentes
(%)
Goiás
232
46
19,8%
Mato Grosso do sul
77
32
41,6%
Mato Grosso
117
36
30,8%
TOTAL CENTROOESTE
426
114
26,8%
REGIÃO SUDESTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios
Respondentes
(%)
Espírito Santo
71
31
43,7%
Minas Gerais
756
250
33,1%
Rio de Janeiro
81
28
34,6%
São Paulo
625
254
40,6%
TOTAL SUDESTE
1533
563
36,7%
REGIÃO SUL
Estados/região
Total de Municípios
Municípios
Respondentes
(%)
Paraná
371
140
37,7%
Rio Grande do sul
427
186
43,6%
Santa Catarina
260
103
39,6%
TOTAL SUL
1058
429
40,5%
TOTAL BRASIL
4973
1422
28,6%
Fonte: elaboração própria dos autores.
Observaram-se taxas de retorno mais elevadas para as regiões sul e sudeste, com preponderância
da primeira sobre a segunda, seguidas das regiões centro-oeste e norte e, por fim, a região nordeste que
registrou o menor volume percentual de respondentes.
131
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Tabela 3 − Distribuição dos questionários respondidos por porte populacional – 1996
Porte Populacional
(habitantes)
Total de Municípios
Municípios Respondentes
(%)
Até 5.000
1067
271
25,4%
De 5.001 a 20.000
2544
661
26,0%
De 20.001 a 50.000
903
300
33,2%
De 50.001 a 200.000
376
153
40,7%
Acima de 200.000
83
37
44,6%
TOTAL
4973
1422
28,6%
Fonte: elaboração própria dos autores.
Valendo-se da mesma estratégia adotada em 1996, o processo de coleta de dados pela aplicação
do questionário foi iniciado, nesta segunda versão da pesquisa, no Congresso Nacional de Secretarias
Municipais de Saúde – realizado na cidade de Recife entre 19 e 22 de junho de 2006. O objetivo da
distribuição do questionário no Congresso foi realizar um pré-teste para verificar sua adequação. Após
o pré-teste, os questionários foram distribuídos para os gestores municipais por meio dos Conselhos
de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS).
Nos estados onde o ritmo de retorno era considerado suficiente em termos amostrais mantevese apenas a parceria com os COSEMS, enquanto nos demais houve necessidade de reenvio direto
do questionário e realização de ligações telefônicas aos secretários municipais de saúde em diversos
momentos.
A coleta e a distribuição dos questionários enviados diretamente aos secretários via correios
durou cerca de oito meses e teve ritmos variados de retorno entre os estados e as regiões do País. Ao
final desse período, foram recebidos 19,5% dos questionários enviados com a seguinte distribuição
por região e unidade federada:
132
D emocratização do P oder L ocal . . .
Tabela 4 − Total de municípios, municípios respondentes e percentuais de resposta por unidade
da federação – 2006
REGIÃO NORTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios Respondentes
(%)
Rondônia
52
7
13,5
Acre
22
0
0,0
Amazonas
62
4
6,5
Roraima
15
8
53,3
Pará
143
20
14,0
Amapá
16
0
0,0
Tocantins
139
4
2,9
TOTAL NORTE
449
43
9,6%
REGIÃO NORDESTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios Respondentes
(%)
Maranhão
217
27
12,4
Piauí
223
32
14,3
Ceará
184
33
17,9
Rio Grande do Norte
167
31
18,6
Paraíba
223
31
13,9
Pernambuco
185
8
4,3
Alagoas
102
20
19,6
Sergipe
75
32
42,7
Bahia
417
37
8,9
TOTAL NORDESTE
1793
251
14,0%
(continua)
133
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
REGIÃO CENTRO-OESTE
Estados/região
Total de Municípios
Municípios Respondentes
(%)
Mato Grosso do Sul
78
22
28,2
Mato Grosso
141
25
17,7
Goiás
246
43
17,5
TOTAL CENTROOESTE
465
90
19,4%
REGIÃO SUDESTE
Estados/região
Total deMunicípios
Municípios Respondentes
(%)
Minas Gerais
853
244
28,6
Espírito Santo
78
19
24,4
Rio de Janeiro
92
32
34,8
São Paulo
645
125
19,4
TOTAL SUDESTE
1668
420
25,2%
REGIÃO SUL
Estados/região
Total deMunicípios
Municípios Respondentes
(%)
Paraná
399
133
33,3
Santa Catarina
293
106
36,2
Rio Grande do Sul
496
40
8,1
TOTAL SUL
1188
279
23,5%
TOTAL BRASIL
5563
1083
19,5
Fonte: elaboração própria dos autores.
Nas regiões sudeste (25,2%) e sul (23,5%), foram obtidos índices mais elevados de resposta ao
questionário, em contraste com a região norte onde o índice de retorno foi de 9,6%, desta vez superada pela região nordeste (14,0%).
O escalonamento por porte populacional evidenciou uma distribuição inversa de taxa de retorno em relação ao tamanho das faixas de população definidas. Para os municípios maiores de 400 mil
134
D emocratização do P oder L ocal . . .
habitantes a taxa foi de 100%, equivalente a um censo, decrescendo a cada estrato até chegar a 16%
nos municípios com menos de 10 mil habitantes.
Essa característica da distribuição amostral é extremamente positiva em termos de representatividade, uma vez que as faixas formadas por municípios de maior porte populacional possuem
também maior amplitude, com composição mais heterogênea, exigindo amostras percentualmente
mais extensas para conferir representatividade.
Em termos de porte populacional, o padrão encontrado em 2006 foi o mesmo de 1996, ou
seja, quanto maior o porte populacional do estrato, maior o percentual de retorno.
Tabela 5 − Distribuição dos questionários respondidos por porte populacional – 2006
Estados/região
Total deMunicípios
Municípios Respondentes
(%)
Até 10.000
2672
440
16,5%
De 10.001 a 20.000
1298
232
17,9%
De 20.001 a 50.000
1026
208
20,3%
De 50.001 a 100.000
313
79
25,2%
De 100.001 a 200.000
130
47
36,2%
De 200.001 a 400.000
77
30
39,0%
Acima de 400.000
47
47
100,0%
TOTAL
5563
1083
19,5%
Fonte: elaboração própria dos autores.
A baixa da taxa de retorno dos questionários nas duas versões da pesquisa pode ser explicada pela variação da força política das entidades representativas dos secretários municipais
de saúde que apoiaram a pesquisa e pelo aumento do número de perguntas do questionário.
4.1 Representatividade estatística da amostra
Durante o processo de retorno dos questionários da pesquisa de 2006, foram produzidas
avaliações periódicas do volume e da distribuição territorial da amostra a fim de garantir sua
consistência e representatividade bem como a validade da expansão dos resultados apurados
para o universo dos municípios brasileiros.
O ajuste definitivo foi realizado na fase final de coleta dos questionários (dez/2006fev/ 2007), por meio de uma análise de representatividade amostral, que procurou verificar
135
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
se as estimativas obtidas pela amostra de municípios estavam enviesadas quando comparadas
com informações obtidas em fontes exógenas (detalhamento do plano amostral no Anexo III).
Supondo que os municípios respondentes constituam uma amostra probabilística, foram calculados os pesos amostrais e obtidas estimativas para os parâmetros populacionais conhecidos.
Assim, foram elaborados cenários distintos de planos amostrais para avaliar a qualidade das
estimativas vis-à-vis aos valores populacionais obtidos por outras fontes.
Tendo em vista a diversidade do universo estudado, optou-se pelo emprego de amostragem aleatória estratificada, cujos testes demonstraram maior eficiência em relação à amostragem aleatória simples ou aleatória com probabilidade de seleção de municípios, proporcionalmente ao tamanho. Foram utilizadas como variáveis de estratificação a localização geográfica
(grande regiões e unidades da federação), o tipo de gestão (plena do sistema e plena da atenção
básica) e porte populacional do município (até 20.000, de 20.001 a 50.000; de 50.001 a
100.000; de 100.001 a 200.000; de 200.001 a 400.00; e, acima de 400.000)1.
A composição de planos amostrais estratificados estabelecida por meio dessas variáveis
buscou minimizar o efeito de certas características da população estudada e da forma como
se coletaram as informações. A estratificação geográfica (regiões e unidades da federação) teve
como objetivo reduzir as diferenças regionais sobre os resultados, enquanto a estratificação
por tipo de habilitação foi utilizada para minimizar a tendência verificada durante a coleta de
maior taxa de retorno entre os municípios em Gestão Plena do Sistema Municipal. Da mesma
forma, a estratificação por porte populacional contempla a redução do viés provocado pela
diferença de domínio de recursos.
A seleção dos parâmetros de comparação a serem utilizados na verificação da representatividade da amostra foi sustentada pelas seguintes fontes de informação: a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC 2005) 2 (IBGE, 2005), o Departamento de Informática
do SUS (DATASUS, 2005) e o Finanças do Brasil (FINBRA) – Dados Contábeis do Brasil
(STN, 2005).
Após a seleção de 26 variáveis consideradas relevantes para a caracterização do universo
municipal brasileiro, apoiada nos planos amostrais estratificados, procedeu-se à comparação
entre os limites de confiança estimados da amostra e os valores elaborados com base na população, cujos resultados estão na Tabela 6.
Para a análise e a comparação dos resultados da pesquisa de 2006, foram utilizadas 8 em vez de 6 estratos de
porte populacional, buscando ampliar o detalhamento para permitir maior quantidade de informações. Na pesquisa de 1996, o número de estratos utilizado foi menor, o que obrigou à agregação de algumas faixas utilizada
na pesquisa de 2006 para tornar viável a comparação, como será visto na seção referente à tabulação dos dados.
2
Em 2005, a MUNIC foi distribuída com as informações referentes ao Suplemento de Assistência Social.
1
136
D emocratização do P oder L ocal . . .
Tabela 6 − Limites de confiança para as estimativas segundo o plano amostral adotado na simulação, que utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal, adotando
um nível de significância de 5%
Estimativas
População
Respondentes
Limite inferior
Limite Superior
PIB - Preços correntes (x1000)
1.723.099.425
1.510.538.573
2.372.057.706
Produção ambulatorial (apresentada)
2.354.969.316
2.182.066.759
3.002.909.049
Produção ambulatorial (aprovada)
2.157.976.538
1.998.697.726
2.776.245.427
Encaminhamento de urgência e
emergência
1.175.578
902.897
1.149.771
Número de famílias acompanhadas 27.470.739
PSF
26.879.381
30.595.390
Número de hipertensos cadastrados 79.990.435
80.430.067
97.232.404
Número de nascidos vivos
1.333.655
1.298.270
1.541.152
Número de internações
11.242.695
10.499.306
14.087.334
Número de beneficiários da
assistência médica suplementar
34.896.207
24.078.220
51.539.216
Famílias com abastecimento
de água pela rede pública
19.381.032
19.306.640
24.042.527
Número óbitos infantis
53.233
48.540
63.105
Total de funcionários ativos da
administração direta
4.326.876
4.135.194
4.916.237
Total de funcionários ativos da
administração direta
- Ensino superior
893.023
830.278
1.136.809
Existência de Lei de zoneamento ou 1.143
equivalente
1.023
1.260
Existência de plano diretor
807
1.047
Existência de coordenação compar- 1.748
tilhada com efetiva participação do
poder público e da sociedade para
revisão ou elaboração do Plano Diretor
1.676
1.982
Existência de consórcio público
intermunicipal na área da saúde
1.853
2.129
804
1.906
(continua)
137
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Tabela 6 − Limites de confiança para as estimativas segundo o plano amostral adotado na simulação, que utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal, adotando
um nível de significância de 5%
(continuação)
Estimativas
População
Respondentes
Limite inferior
Limite Superior
Existência de convênio de parceria 587
com setor privado na área da saúde
552
754
Existência de plano municipal de
assistência social
5.087
5.064
5.252
Existência de conselho municipal
de assistência social
5.496
5.467
5.538
Existência de conselho municipal de 5.540
saúde
5.545
5.569
Participação da prefeitura em
convênio e/ou parceria para
desenvolver ações na área de
assistência social
3.409
3.299
3.648
Realização de serviços na área de 5.355
assistência social pela prefeitura
5.365
5.481
Receita orçamentária
143.887.165.082
120.187.720.657
190.702.961.460
Despesa orçamentária
137.041.910.395
114.432.866.757
179.995.557.006
Despesa total com Saúde
30.864.194.038
27.019.610.300
39.780.633.058
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (PEEP, 2009).
Os limites estimados com base na amostra dos questionários respondidos fornecem um intervalo consistente de representatividade amostral, uma vez que apenas três variáveis apresentam
um ajuste inadequado − número de hipertensos cadastrados, existência de plano diretor e existência
de conselho municipal de saúde − o que confere representatividade às informações coletadas e segurança para sua expansão para a população dos municípios brasileiros.
5. Tabulação dos dados
O processo de transformação dos dados brutos coletados em informações adequadas à análise
prevista envolveu uma modelagem computacional realizada em software de análise de dados específico para esse fim, o Statistical Package for Social Science (SPSS). Foram utilizadas duas matrizes de
configuração da estrutura de processamento dos dados.
138
D emocratização do P oder L ocal . . .
A primeira foi composta pela programação dos critérios de expansão das características da
amostra para a população de municípios. Foram utilizados os mesmos critérios empregados na análise
estatística de representatividade da amostra (porte populacional, modalidade de habilitação e região
geográfica), em cujas bases foram gerados os pesos atribuídos a cada subconjunto dos questionários
respondidos. Essa primeira matriz tinha como objetivo inferir de forma adequada e proporcional, para
o universo estudado, os resultados descritivos sobre o perfil dos gestores e as características da gestão.
Uma vez realizada a expansão, foi possível inferir as informações nacionais relativas ao perfil
do gestor e às características da gestão dos sistemas municipais de saúde. Para cada uma das questões
gerou-se um conjunto de tabelas descritivas por porte do município e região geográfica, acrescentando
a variável modalidade de gestão na versão 2006. Em seguida, foram construídas as tabelas comparativas entre as pesquisas de 1996 e 2006 para as questões comuns nas duas versões. Nesse caso, foram
necessários alguns ajustes voltados a atenuar diferenças tais como as mudanças no formato das questões comuns, a estrutura de classificação de porte populacional adotada, entre outras3.
A segunda matriz continha a configuração estabelecida ao final do processo de revisão do Índice
de Inovação. Registre-se que, nessa segunda etapa, as informações resultantes já estavam expandidas
da amostra para a população. Nessa segunda matriz, obteve-se, para cada um dos municípios, os
escores inovação geral e por dimensões baseados na estrutura de respostas constantes no respectivo
questionário.
6. Análise dos resultados e o Índice de Inovação
A análise das informações foi realizada em duas fases. A primeira, de natureza descritiva, buscou
identificar as tendências captadas pelo questionário tanto em termos do perfil dos(as) secretários(as)
municipais de saúde quanto das características de gestão das secretarias. As análises foram realizadas
tanto para os resultados obtidos em 2006 quanto comparativamente com os de 1996, sempre buscando observar sua evolução em uma década de implementação do SUS.
Uma segunda análise, mais qualificada teórica e metodologicamente, ateve-se ao fenômeno da
inovação buscando, apoiado em padrões de comparação entre os grupos de gestores mais e menos
inovadores, identificar as variáveis essenciais que determinariam esta distinção. Por meio da revisão da
literatura sobre inovação e da análise de informantes qualificados − acadêmicos e gestores experientes − em oficinas de trabalho, estabeleceu-se uma escala de classificação numérica de cada uma das
respostas possíveis de serem fornecidas pelos(as) secretários(as) municipais de saúde, que compõe uma
matriz de pontuação elaborada para dimensionar o nível de inovação em cada município.
Em alguns casos, os percentuais contidos nas tabelas de dados que acompanham os gráficos gerados excedem
os 100% devido à existência de questões que permitiam múltiplas respostas não excludentes pelos gestores
municipais de saúde e/ou devido à desconsideração de itens de resposta como “outros” ou “não respondeu”, na
elaboração dos gráficos.
3
139
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Em outros termos, introduziu-se um componente qualitativo, com ponderação das respostas relativas às características da gestão, de tal forma que se pudesse traçar um contínuo em uma
escala de graus de inovação. O somatório inicial dos pontos é realizado para cada uma das três
dimensões da análise da inovação na gestão, em que se definiu uma estrutura de classificação dos
municípios ao longo de um continuum variando entre mais e menos inovadores, formando um
Índice de Inovação (Anexo IV).
A disposição do conjunto nacional de municípios sobre o espectro que vai do menor valor
pontuado na matriz de inovação até o maior escore foi dividido em quintis, agrupando em cada
um deles o conjunto de respondentes cuja pontuação se situou dentro destes limites. A plotagem
dos municípios neste contínuo de variação da inovação produziu uma curva geral de distribuição
estatística da inovação municipal em saúde, uma vez que cada uma das três dimensões está incluída neste índice geral de inovação, mas também pode ser diferenciada pela pontuação nas questões
que lhe são específicas. Assim, é possível identificar uma curva de inovação para cada uma das
dimensões analisadas, além do índice geral de inovação. Isto permite comparar a evolução da
inovação tanto em termos do índice geral quanto dos seus componentes relativos às dimensões
da inovação. Essa comparação permite analisar as tendências do processo de inovação em termos
da valorização dos aspectos sociais, gerenciais e assistenciais na construção dos sistemas locais de
saúde.
A fim de considerar as variáveis mais significativas na determinação do grau de inovação
dos municípios foram selecionados dois grupos situados nos polos extremos do espectro da inovação, ou seja, no primeiro e no quinto quintil, formando grupos opostos de municípios mais e
menos inovadores. A comparação entre as características dos dois blocos permitiu identificar as
diferenças tanto do perfil dos mais e menos inovadores quanto selecionar os elementos relevantes
capazes de produzir processos de inovação, sem ser necessário introduzir um novo elemento de
juízo, qual seja arbitrar onde começa a inovação.
6.1 Construção do Índice de Inovação
Como afirmado na introdução, o dimensionamento do impacto da descentralização sobre
as características da gestão foi realizado com base em um instrumento analítico denominado Índice de Inovação (ID). Sua construção envolveu duas fases principais: o debate conceitual sobre
inovação local no SUS e a estratégia de sua operacionalização.
O debate sobre a inovação foi motivado por quatro fatores considerados essenciais: o contexto político e econômico da década, as características estruturais do universo de municípios
brasileiros, a concepção de modelo de atenção e o momento de evolução do SUS.
A análise do contexto socioeconômico e político nacional da década 1996-2006 ressalta a
realização de uma série de reformas estruturais, que reduziram os recursos e as condições institucionais de materialização do padrão de política social inscrito na Constituição Federal de 1988.
140
D emocratização do P oder L ocal . . .
Esse processo teria produzido reflexos significativos sobre as estruturas e as competências locais
de gestão do SUS nas três dimensões da gestão adotadas: social, gerencial e assistencial.
Essas condições estruturais “impostas” às administrações locais em saúde formariam uma fronteira de restrições ao potencial de aperfeiçoamento dos sistemas locais de saúde, conduzindo os(as)
gestores(as) locais à buscar “formas de adaptação” para conseguir implantar políticas, programas e
unidades de atenção à saúde para a população. Essa fronteira seria composta por contingenciamentos
financeiros, legais, de recursos e competências, que a maioria dos municípios brasileiros não teria
capacidade de transpor. Assim, os gestores estariam “inovando” por meio do desenvolvimento de
estratégias de adaptação ao possível.
Nessa concepção, a inovação é vista menos como busca por um padrão ideal formado por
políticas, programas, estratégias instrumentos e estruturas, consideradas de excelência em gestão de
políticas públicas e mais como uma sequência de processos de ajustamento às insuficiências da condição institucional do Estado brasileiro, resultante de uma década de reformas estruturais de ajuste
macroeconômico. Essas condições estruturais imporiam restrições à autonomia da gestão em saúde,
reduzindo o potencial de aperfeiçoamento dos sistemas locais de saúde.
Um segundo aspecto a ser considerado no dimensionamento da inovação em âmbito local
seria a heterogeneidade das características que definem o universo de municípios brasileiros. Os
principais aspectos enfatizados foram: o porte populacional, a condição de habilitação de gestão e
a região geográfica.
Os três fatores foram considerados como fontes de restrição à autonomia dos municípios
para inovar. O porte populacional é um indicador de volume de receitas e consistência da infraestrutura, assim como de capacidade instalada de serviços e ações de saúde. Considerando que, segundo dados do IBGE de 20054, aproximadamente 90,8% dos municípios brasileiros possuem até
50 mil habitantes, e que apenas 7,6% estão entre 50 e 200 mil, os demais formam um contingente
com capacidade financeira, administrativa e estrutura de serviços de saúde muito acima dos demais.
As grandes regiões metropolitanas e os municípios considerados de grande porte teriam um amplo
diferencial de autonomia e margem concreta para inovar em relação aos municípios considerados
de médio e pequeno porte5.
Portanto, assumiu-se que as exigências e as condições de inovação não são as mesmas para diferentes portes de municípios e estabeleceu-se um parâmetro distinto para os três grupos identificados
como diferenciados, a saber: pequenos, médios e grandes (acima de 200 mil mais as grandes regiões
metropolitanas). Concretamente, isto se refletiu em uma ponderação diferenciada para cada um dos
grupos em relação à matriz de inovação, como explicitado no Anexo IV.
Informações constantes da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC), (IBGE, 2005).
Nesta pesquisa foram considerados como de pequeno porte os municípios com até 20 mil habitantes; médio
porte entre 20 e 200 mil; grande porte entre 200 e 400 mil; e grande região metropolitana com mais de 400
mil habitantes.
4
5
141
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Outra distinção considerada foi a relativa à condição de habilitação dos municípios e ao seu
impacto na capacidade de inovação. Apesar da edição do Pacto pela Saúde em 2006, que iguala os
municípios quanto à condição de habilitação, essa distinção foi considerada inicialmente nos debates, tendo em vista que as diferenças estabelecidas entre habilitação em GPAB e GPSM desde a
NOB 96 haviam permeado toda a década considerada.
Os municípios habilitados na primeira condição possuem restrições de autonomia na medida em que sua responsabilidade estava limitada à implementação e gestão do arcabouço institucional do sistema (secretaria, fundo, conselho etc.) e às ações de atenção primária, incluindo vigilância
sanitária e epidemiológica básica.
Os serviços e ações secundários e terciários, onde está alocado maior volume de recursos, especialmente os de natureza regional, são gerenciados apenas por municípios em GPSM ou pelo gestor estadual. Esses municípios possuem autonomia plena para programar, implantar, gerir, monitorar, regular e avaliar todo o conjunto de ações e serviços, detendo maiores condições de promover
transformações de caráter inovador. Entretanto, após uma série de debates e análises de variáveis,
ficou evidente que havia grande correlação entre o porte do município e a habilitação em gestão.
Os municípios em GPSM eram em sua grande maioria municípios de médio e grande porte
e/ou situados na região metropolitana. Sendo assim, como já havia sido estabelecida uma pontuação diferenciada para o porte populacional, optou-se por não considerar a modalidade de habilitação como critério na estrutura de pontuação do índice, evitando a dupla carga de pontos.
A heterogeneidade regional foi a terceira característica estrutural a ser debatida como possível
elemento influenciador na capacidade de inovar dos municípios. Nessa linha, os municípios localizados na região norte, por exemplo, estariam sujeitos a condições estruturais de gestão singulares,
demonstradas por uma série de indicadores demográficos, socioeconômicos e culturais, distribuição
desigual de serviços e profissionais, além de barreiras diferenciadas de acesso da população às ações e
serviços de saúde. Haveria, na região norte, maiores dificuldades de fixar profissionais e implementar programas, políticas e unidades de saúde.
O debate sobre a questão regional buscou inicialmente analisar as diferenças entre as regiões
em termos tanto de indicadores setoriais (estrutura de serviços, gasto público, acesso etc.) quanto
dos resultados da própria pesquisa. As comparações realmente mostraram singularidade para a região norte em vários indicadores e em uma parcela representativa das respostas coletadas por meio
do questionário.
Entretanto, a atribuição de graus de inovação foi considerada para o município individualmente, de acordo com as respostas do gestor às questões do questionário, o que nos levou à análise
das diferenças intrarregionais específicas da região norte. Evidenciou-se que, mesmo dentro da região norte, há municípios de médio e grande porte com autonomia e capacidade maior para inovar
do que a maioria dos municípios brasileiros de pequeno porte, sejam eles do sul, do sudeste ou de
outra região.
142
D emocratização do P oder L ocal . . .
Assim, mesmo reconhecendo as especificidades da região norte, atribuir peso diferencial poderia produzir distorções no Índice de Inovação, em virtude de fornecer um tratamento uniformizado
a um universo regional e local marcado por diferenças. O tratamento mais adequado seria construir
um critério misto, selecionando os municípios do norte por porte populacional para compor grupo
de pontuação específico, o que pode ser feito em novas edições da pesquisa.
Além do debate relativo ao contexto socioeconômico e político e às características estruturais
dos municípios brasileiros, dois outros critérios orientaram a definição dos parâmetros de inovação da
pesquisa. O primeiro refere-se à natureza do modelo de atenção à saúde e foi empregado para orientar
a definição do grau de inovação das respostas em questões da dimensão assistencial. Políticas, programas e ações de atenção à saúde, orientados por fundamentos alternativos ao modelo biomédico assistencial e privatizante como ações de prevenção e promoção à saúde, seriam considerados inovadores
por propor novas abordagens de valorização do ser humano em sua integralidade sendo considerados
responsáveis por sistemas de saúde mais sustentáveis e eficazes.
O segundo critério surgiu nas discussões básicas do conceito de inovação e sua relação com o
que é novo. Essa abordagem da inovação acabou por convergir para considerar a inovação como sendo
aquilo que é novo em relação ao seu contexto. Assim, algumas políticas, programas, estratégias e instrumentos poderiam ser considerados “inovadores” em 1996, no processo inicial de implantação do
SUS (como PACS e PSF), mas já não o seriam em 2006. Com base nos parâmetros conceituais acima
definidos, buscou-se construir, de forma concreta, a estrutura operacional do Índice de Inovação.
A estratégia de operacionalização teve como desafio a necessidade de compatibilizar a expansão
do questionário, o conceito de inovação adotado e a manutenção de um padrão de comparabilidade
com a pesquisa de 1996. Dessa forma, mesmo tendo de incorporar as transformações do conceito de
inovação no SUS em dez anos e a expansão da quantidade de questões consideradas na pontuação,
evitaram-se mudanças muito radicais que pudessem inutilizar os resultados gerados para comparar
com os da pesquisa de 1996.
A estrutura de pontuação do índice segue a estrutura de organização do questionário. Do conjunto total das questões relativas às características da gestão (ver Quadro 4) foram selecionadas as que
possuíam impacto sobre o fenômeno da inovação. Uma escala variando de -1 a 2 foi utilizada para
ponderar o grau de inovação do conjunto de respostas possíveis em cada questão. O núcleo original
da escala na pesquisa de 1996 variava de -1 a 1, sendo que o escore +2 foi adotado em 2006 como
pontuação adicional para qualificar as experiências municipais de pequeno e médio porte que apresentassem determinadas características consideradas muito inovadoras para esse porte populacional.
Basicamente, o conjunto selecionado possuía três formatos de respostas: binário, escalonado e
estruturado, baseado em componentes principais. No primeiro, as perguntas permitiam apenas sim
ou não como resposta; no segundo, as respostas estavam organizadas em graus ou frequência (por
exemplo, influência pequena, média, grande ou nenhuma,), ambos com um conjunto definido, sem
opção de abertura ao respondente. No terceiro, havia um conjunto composto por opções principais,
143
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
selecionadas após pesquisa em literatura e consulta aos especialistas da área, sendo algumas com
abertura adicional para livre resposta ao(à) gestor(a) (por exemplo, formas de contratação de
serviços: pregão eletrônico, pregão presencial, licitação tradicional e dispensa por emergência,).
A escala foi aplicada aos três formatos de maneira diferenciada sempre qualificando os itens
de resposta de forma que perguntas escalonadas ou estruturadas poderiam ter somatório maior de
pontos por possuírem maior número de possíveis respostas tidas como inovadoras. Como consequência dos parâmetros estabelecidos nos debates conceituais sobre a inovação local em saúde,
cada uma das repostas às questões foi classificada quanto ao grau de inovação. Respostas consideradas inovadoras recebiam grau +1, respostas neutras 0, respostas que representavam práticas
retrógradas de gestão −1 (por ex. não prestar contas, não possuir política de capacitação etc.) e,
finalmente, respostas que representavam, além de práticas inovadoras, um esforço adicional em
relação às condições estruturais de porte do município foram contempladas com escore +2.
A aplicação do escore de inovação ao conjunto de questões selecionadas gerou uma matriz em Excel, contendo a estrutura geral de valores do Índice de Inovação composto por uma
pontuação em termos absolutos, que poderia variar desde -28 até +159 pontos nos municípios
de pequeno porte e +121 nos demais (ver Anexo IV). Para possibilitar a comparação com a estrutura do índice de 1996, esses valores foram convertidos em uma escala relativa variando de 0
a 100 pontos. Na sequência, foi analisada a aferição do grau de inovação geral e por dimensões
(social, gerencial e assistencial) para cada município, de acordo com a estrutura de respostas do
respectivo questionário.
Cabe lembrar que o número de questões em cada dimensão é diferente e, portanto, cada
uma possui um peso diferenciado na composição do índice, sendo esperado que haja assimetria
no peso de cada dimensão sobre a definição dos municípios mais inovadores.
7. Limitações metodológicas
Entre as limitações do estudo, primeiramente deve-se observar que a definição de inovação
está fundamentada em um marco conceitual que envolve um conjunto de pressupostos valorativos considerados com relação ao modelo concebido para o SUS. Nesse sentido, três implicações
merecem destaque. Primeiro, para referenciais diferentes de organização de sistemas de saúde e
para concepções diferentes do SUS altera-se o conceito do que seja inovador e, o que, portanto,
alteraria a classificação e disposição dos municípios.
A segunda implicação é relativa às limitações na capacidade de comparação entre as duas
versões da pesquisa quanto à inovação, uma vez que o que era inovador no SUS, em 1996, em
muitos casos, como mostra a ampla literatura analisada, já não o era mais em 2006.
Por fim, o diferencial de inovação encontrado entre os municípios consiste em um indicador relativo, na medida em que o Índice de Inovação se fundamenta em julgamentos valorativos,
144
D emocratização do P oder L ocal . . .
conferidos aos atributos que compõem cada dimensão, os quais estão respaldados pela comunidade de especialistas e pela literatura setorial.
O tratamento da amostra nas duas versões da pesquisa foi feito de forma diferenciada. Em
ambos os casos, como visto, os questionários foram enviados na intenção de se fazer um censo, uma
vez que foram enviados para todos os municípios. Ainda que não comprometa os resultados obtidos,
a não realização de um processo de amostragem prévio ao envio e coleta dos questionários eleva o risco
de se incorrer em perda de representatividade ao se aumentar a tendência de coletar, em sua maioria,
questionários provindos de municípios cujos(as) secretários(as) estão mais propensos a responder e
divulgar seu trabalho.
Geograficamente, devido ao baixo índice de retorno dos questionários para a região norte, em
2006, deve-se ter em mente as restrições relativas às possíveis inferências a serem feitas para essa parte
do País, principalmente se for levado em conta o fato de essa região ter características bastante peculiares quando comparada com as demais regiões do País.
Tendo em vista que somente na edição de 2006 da pesquisa foi realizado um estudo de representatividade amostral, a construção das curvas de inovação e a elaboração das tabelas para a edição de
1996 têm como base a configuração inicial da amostra, sem a posterior expansão para o universo. Da
mesma forma, deve-se ter cuidado com as comparações entre as duas versões para o extrato populacional acima de 200 mil habitantes, uma vez que, em 1996 a amostra captada foi de 46% dos municípios
contrariamente à edição de 2006, na qual se alcançou a cobertura total.
O potencial de avaliação da pesquisa está restrito à comparação entre dois momentos específicos da história do SUS (1996 e 2006), o que permite indicar tendências, em especial quando consolidadas na década, mas que têm capacidade limitada para apreender movimentos entre estes dois
momentos da pesquisa, como em qualquer estudo do gênero.
Cabe, finalmente, lembrar as limitações inerentes ao próprio instrumento de coleta de dados. A
utilização do questionário como única fonte primária para as informações fundamentais da pesquisa,
sendo baseado na percepção do gestor, pode gerar certa margem de diferença em relação à realidade.
145
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Referências
COCHRAN, W. G. Sampling Techniques. 3. ed. New York: John Wiley & Sons, 1977.
DEPARTAMENTO DE INFORMÁRICA DO SUS (DATASUS). Infomações de Saúde, 2005. Disponível
em: www.datasus.gov.br. Acesso em 20 de janeiro de 2007.
FLEURY, S. Municipalização da saúde: inovação na gestão e democratização local no Brasil. Projeto de Pesquisa.
Rio de Janeiro, 2005.
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ (FIOCRUZ). Sistema de monitoramento de indicadores de mortalidade
infantil. Disponível em: <http://www.monitorimi.cict.fiocruz.br/base.htm>. Acesso em: 7 fev. 2007.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Perfil dos municípios brasileiros
2005: gestão pública. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/munic2005/index.php>. Acesso em: 16 jan. 2007.
PROGRAMA DE ESTUDOS SOBRE A ESFERA PÚBLICA (PEEP/EBAPE/FGV). Pesquisa Municipalização
da Saúde: inovação na gestão e democracia local no Brasil. Relatório Técnico. Rio de Janeiro, 2009.
SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL (STN). Finbra – Finanças do Brasil: dados contábeis dos
municípios, 2005. Disponível em: <www.tesouro.fazenda.gov.br/estados_municipios/index.asp>. Acesso em:
31 jan. 2007.
146
D emocratização do P oder L ocal . . .
Anexo I – Questionário de 2006
Municipalização da saúde: inovações na gestão e democracia no Brasil
Prezado(a) Secretário(a): A aplicação deste questionário tem por objetivo recolher informações que
permitam traçar o perfil atual dos Secretários Municipais de Saúde. Pedimos a você que responda o
mais espontaneamente possível. Caso sinta necessidade, utilize o verso da folha para complementar
suas respostas. Obrigado.
SOBRE SUA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
A. Em que município você atua como Secretário(a) de Saúde?
Município: ______________________________UF: __
B. Você ocupa a função de Secretário(a) de Saúde do Município...
1.( ) desde o início da gestão anterior (PULE PARA D)
2.( ) desde o início da gestão atual (PULE PARA D)
3.( ) após o início da gestão atual (PROSSIGA)
C. No caso de ter assumido após o início da gestão atual, isso ocorreu em razão de candidatura
do(a) Secretário(a) anterior?
1.( ) Sim
2.( ) Não
D. Antes de assumir o cargo, você já havia trabalhado na área da saúde?
1.( ) Sim
2.( ) Não
E. Você já ocupou anteriormente função de direção em órgão público?
1.( ) Sim, somente na área de saúde
2.( ) Sim, mas não na área de saúde
3.( ) Sim, na área de saúde e também em outras áreas
4.( ) Não, nunca ocupei função de direção em órgão público
147
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
F. Você já ocupou anteriormente o cargo de Secretário(a) de Saúde?
1.( ) Sim. Em quais municípios? _________________
2.( ) Não
G. Qual era a sua situação profissional anterior? (assinale mais de uma alternativa, se for o caso)
1.( ) Profissional autônomo(a)
2.( ) Funcionário(a) de esfera pública
3.( ) Funcionário(a) de esfera privada no setor saúde
4.( ) Funcionário(a) de esfera privada em outros setores
5.( ) Proprietário(a)/Empresário(a)
6.( ) Não trabalhava
H. Você ainda realiza atividades extra-Secretaria de Saúde?
1.( ) Sim. Qual atividade? ________________________________________________________
2.( ) Não
SOBRE SUA TRAJETÓRIA POLÍTICA
I. Você está filiado(a) a algum partido?
1.( ) Sim. Qual? _______________________________
Há quanto tempo? _____________________
2.( ) Não
J. Você já foi filiado(a) a algum outro partido?
1.( ) Sim. Quais? ______________________________
2.( ) Não
K. Você já se candidatou a algum cargo público?
1.( ) Sim. Em que ano? __________________________
2.( ) Não
L. Você já foi eleito(a) para algum cargo público? (assinale mais de uma alternativa, se for o caso)
1.( ) Sim. vereador(a)
2.( ) Sim, prefeito(a)
3.( ) Sim, vice-prefeito(a)
4.( ) Sim, deputado(a)
148
D emocratização do P oder L ocal . . .
5.( ) Sim, outros. Cite: ____________________________
6.( ) Não
M. Você atualmente está licenciado(a) de algum cargo eletivo?
1.( ) Sim. vereador(a)
2.( ) Sim, prefeito(a)
3.( ) Sim, vice-prefeito(a)
4.( ) Sim, deputado(a)
5.( ) Outros. Cite: _______________________________
6.( ) Não
N. De qual(is) das associações abaixo você participa
ou já participou?
1.( ) Associações de moradores. Quantos anos? ____
2.( ) Associações profissionais. Quantos anos? ____
3.( ) Associações religiosas. Quantos anos? ____
4.( ) Clubes de serviços. Quantos anos? ____
5.( ) Clubes sociais e desportivos.Quantos anos? ____
6.( ) Sindicatos. Quantos anos? ____
7.( ) Outra: ___________________ Quantos anos? ___
8.( ) Não participo/Não participei
O. Caso tenha participado em associações, qual a importância dessa experiência para o exercício
da função de Secretário(a) de Saúde?
1.( ) Alta
2.( ) Média
3.( ) Baixa
4.( ) Nenhuma
SOBRE SUA DESIGNAÇÃO
P. Assinale o grau de importância que os itens abaixo tiveram na decisão de designar seu nome
para o cargo de Secretário(a) de Saúde:
a) Capacidade de liderança
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
149
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
b) Confiança pessoal
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
c) Experiência administrativa
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
d) Experiência técnica
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
e) Indicação da categoria profissional
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
f ) Indicação política
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
g) Relação de parentesco
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
h) Outro motivo. Qual? __________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
i) Outro motivo. Qual? __________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
Q. Assinale o grau de importância que os itens abaixo tiveram na sua decisão de ocupar o cargo
de Secretário(a) de Saúde:
a) Acumular experiência profissional
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
b) Adquirir força política
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
c) Assumir desafios
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
d) Aumentar prestígio
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
e) Melhorar o currículo
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
f ) Prestar serviço à comunidade
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
g) Compromisso com a área de saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
h) Missão partidária
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
i) Outro motivo. Qual? _____________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
j) Outro motivo. Qual? _____________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
150
D emocratização do P oder L ocal . . .
Palestrante
Ouvinte
Outros
a) VIII Conferência Nacional
Delegado
R1. De qual(quais) destas Conferências Nacionais de Saúde você
participou? (Circule o número que
corresponde à sua modalidade de participação)
Não participei
SOBRE SUA PARTICIPAÇÃO EM EVENTOS NA ÁREA DE SAÚDE
0
1
2
3
4
1
2
3
4
1
2
3
4
d) XI Conferência Nacional
0
1
2
3
4
e) XII Conferência Nacional
0
1
2
3
4
Outros
0
0
Ouvinte
b) IX Conferência Nacional
c) X Conferência Nacional
R2. Você participou de alguma Conferência Estadual de Saúde?
Delegado
Palestrante
a)
1
2
3
4
b)
1
2
3
4
c)
1
2
3
4
d)
1
2
3
4
e) l
1
2
3
4
Ouvinte
Outros
(Em caso positivo, cite e circule o número
que corresponde à sua modalidade de participação)
Delegado
Palestrante
R3. Você participou de alguma Conferência Municipal de Saúde?(Em caso positivo, cite e circule o número que corresponde
à sua modalidade de participação)
a)
1
2
3
4
b)
1
2
3
4
c)
1
2
3
4
d)
1
2
3
4
e) l
1
2
3
4
151
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
R4. Você participou de algum Encontro Nacional de Secretários de Saúde?
1.( ) Sim, uma ou duas vezes
2.( ) Sim, três ou quatro vezes
3.( ) Sim, cinco vezes ou mais
4.( ) Não/Nunca participei
R5. Você participou de algum Encontro Regional de Secretários de Saúde?
1.( ) Sim, uma ou duas vezes
2.( ) Sim, três ou quatro vezes
3.( ) Sim, cinco vezes ou mais
4.( ) Não/Nunca participei
S. Assinale os espaços de pactuaçãointergestores e instituições representativas da(s) qual(quais)
você participa ou já participou:
a) Conselho Municipal de Saúde
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
b) Conselho Nacional de Representantes Estaduais de Saúde (CONARES)
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
c) Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS)
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
152
D emocratização do P oder L ocal . . .
d) Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS)
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
e) Comissão Intergestores Tripartite (CIT)
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
f ) Comissão Intergestores Bipartite (CIBs)
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
g) Comissão Intergestores Bipartite Regional (CIBs Regional)
1.( ) Participo/Já participei
De que forma?
1.1 ( ) Como dirigente
1.2 ( ) Como membro do conselho de representantes
1.3 ( ) Como participante
2.( ) Não participo/Nunca participei
SOBRE O ORÇAMENTO MUNICIPAL
T. Assinale o grau de influência que os atores abaixo têm na elaboração do orçamento municipal:
a) Prefeito(a)
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
b) Secretário(a) de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
153
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
c) Outros secretários
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
d) Conselho Municipal de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
e) Judiciário
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
f ) Associações da Sociedade Civil
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
g) Políticos locais
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
h) Consultores ou empresas de consultoria externa
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
i) Outro. Qual?____________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
j) Outro. Qual? ___________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
U. Assinale o grau de influência que os atores abaixo têm na execução dos gastos de saúde: a)
Prefeito(a)
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
b) Secretário(a) de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
c) Outros secretários
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
d) Conselho Municipal de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
e) Judiciário
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
f ) Associações da Sociedade Civil
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
g) Políticos locais
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
h) Consultores ou empresas de consultoria externa
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
i) Outro. Qual? ___________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
154
D emocratização do P oder L ocal . . .
j) Outro. Qual? ___________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
SOBRE O ESTABELECIMENTO DE PRIORIDADES
V. Assinale o grau de influência que os atores abaixo têm no estabelecimento das prioridades em
saúde (Plano Municipal de Saúde):
a) Prefeito(a)
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
b) Secretário(a) de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
c) Outros secretários
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
d) Conselho Municipal de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
e) Judiciário
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
f ) Associações da Sociedade Civil
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
g) Políticos locais
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
h) Consultores ou empresas de consultoria externa
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
i) Outro. Qual? _________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
j) Outro. Qual? _________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
X. Assinale o grau de importância que os itens abaixo têm no estabelecimento das prioridades
em saúde no seu município:
a) Parecer do corpo técnico
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
b) Propostas de Conselhos ou Conferências de Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
c) Solicitações de políticos locais
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
d) Sugestões de outras esferas (Bipartite, Estado ou União)
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
e) Demanda espontânea (solicitações individuais ou de comunidades)
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
155
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
f ) Pressão dos meios de comunicação de massa
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
g) Incentivos financeiros do Ministério da Saúde
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
h) Decisões do judiciário
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
i) Pressão de Associações da Sociedade Civil
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
j) Outro. Qual? _________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
k) Outro. Qual? ________________________________
1.( ) Alta 2.( ) Média 3.( ) Baixa 4.( ) Nenhuma
SOBRE O CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE
Y1. O Conselho Municipal de Saúde possui sede própria?
1.( ) Sim
2.( ) Não
Y2. O presidente do Conselho é o(a) próprio Secretário(a) Municipal de Saúde?
1.( ) Sim
2.( ) Não
Y3. A ocupação no cargo de presidente do Conselho foi por meio de eleição?
1.( ) Sim
2.( ) Não
Y4. As resoluções do Conselho são divulgadas junto à sociedade?
1.( ) Sim. Como? _______________________________________________________________
2.( ) Não
Y5. Existe um canal efetivo de troca de informações entre a Secretaria de Saúde e o Conselho?
1.( ) Sim. Qual? ________________________________________________________________
2.( ) Não
SOBRE PRESTAÇÃO DE CONTAS
Z. Assinale a quem a Secretaria de Saúde presta conta de seus gastos:
01.( ) Associações da sociedade civil
02.( ) Câmara de Vereadores
156
D emocratização do P oder L ocal . . .
03.( ) Conselho de Saúde
04.( ) Prefeito(a)
05.( ) Comissões intergestores
06.( ) Outras secretarias
07.( ) Outro órgão municipal. Qual? _____________
08.( ) Outros. Cite: _____________________________
09.( ) Não presta contas
A’. Assinale o(s) mecanismo(s) utilizado(s) pela Secretaria de Saúde para a prestação de contas
de seus gastos:
01.( ) Balancetes periódicos
02.( ) Audiência pública
03.( ) Meios de comunicação (rádio, TV, jornais, etc.)
04.( ) Internet
05.( ) Locais públicos
06.( ) Outros. Cite: ______________________________
07.( ) Nenhum
SOBRE INFORMAÇÕES OFERECIDAS E RECEBIDAS
B’. Assinale as informações regularmente oferecidas à população por intermédio dos meios de
comunicação disponíveis:
1.( ) Divulgação de ações e campanhas
2.( ) Funcionamento de serviços
3.( ) Informação específica para os conselhos ou semelhante
4.( ) Resultados da gestão
5.( ) Outros. Cite: _______________________________
6.( ) Nenhuma
C’. Assinale os instrumentos ou mecanismos utilizados para receber informações e/ou demandas da população:
01.( ) Conselho Municipal de Saúde
02.( ) Ficha ou formulário de avaliação/caixa de sugestões
03.( ) Ouvidoria especializada
04.( ) Pesquisa de opinião
05.( ) Serviço tipo disque-denúncia
06.( ) Meios de comunicação (rádio, TV, jornais etc.)
157
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
07.( ) Internet
08.( ) Atendimento no gabinete
09.( ) Outros. Quais? ____________________________
10.( ) Nenhum
D’. As demandas ou as denúncias recebidas tiveram desdobramentos na gestão da Secretaria?
Assinale qual(quais):
1.( ) Punição ou remanejamento de funcionários
2.( ) Mudanças no funcionamento de serviços (horário, por exemplo)
3.( ) Criação de novos serviços
4.( ) Avaliação da gestão
5.( ) Outros. Quais? _____________________________________________________________
6.( ) Nenhum
SOBRE FORMAS DE GESTÃO
E’. As compras e contratações de sua Secretaria são realizadas principalmente por:
1.( ) Pregão eletrônico
2.( ) Pregão presencial
3.( ) Licitação tradicional
4.( ) Dispensa de licitação em virtude de emergência
F’. A gestão de recursos humanos na sua Secretaria é feita por:
1.( ) Órgão de recursos humanos dentro da Secretaria de Saúde
2.( ) Secretaria de Administração da Prefeitura
3.( ) Instituições privadas
4.( ) Cooperativas
5.( ) Outros. Quais? _____________________________
G’. A sua Secretaria tem:
1.( ) Política de educação permanente
2.( ) Política própria de capacitação
3.( ) Cursos e treinamentos oferecidos pelos governos estadual ou federal
4.( ) Outros. Quais? _____________________________
5.( ) Nenhum deles
158
D emocratização do P oder L ocal . . .
H’. Assinale de quem a Secretaria de Saúde recebe apoio técnico:
01.( ) Agências internacionais
02.( ) Comissão Bipartite
03.( ) Consultoria privada
04.( ) COSEMS
05.( ) CONASEMS
06.( ) Consórcio Intermunicipal
07.( ) Governo estadual
08.( ) Governo federal
09.( ) Organizações não governamentais
10.( ) Universidade
11.( ) Outros. Cite: ______________________________
12.( ) Nenhum
I’. Assinale as modalidades de parceria (ações desenvolvidas em conjunto) implementadas em
sua secretaria:
01.( ) Com Consórcio intermunicipal
02.( ) Com Governo estadual
03.( ) Com Governo federal
04.( ) Com instituições de ensino e pesquisa
05.( ) Com outros setores do Governo municipal
06.( ) Com igrejas
07.( ) Com organizações não-governamentais
08.( ) Com empresas privadas
09.( ) Com Oscips
10.( ) Com outras. Cite: _________________________
11.( ) Nenhuma
J’. Os profissionais que trabalham na sua Secretaria
foram contratados por:
1.( ) Poder público
2.( ) Cooperativas de profissionais
3.( ) Empresas de terceirização de mão de obra
4.( ) Consórcio Intermunicipal
5.( ) Organização não governamental
6.( ) Outras. Cite: _______________________________
K’. Há pagamentos adicionais para profissionais? Quais?
1.( ) Pagamento de adicionais por desempenho
2.( ) Pagamento além da tabela do SUS
159
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
3.( ) Complementação salarial por fundação privada
4.( ) Não efetua pagamentos adicionais
5.( ) Outros. Cite: _______________________________
L’. Quais são as formas de terceirização de serviços de saúde utilizados na sua Secretaria?
01.( ) Contrato com rede privada
02.( ) Convênio com rede filantrópica
03.( ) Convênio com Oscip
04.( ) Convênio com ONG
05.( ) Contrato de gestão com OS
06.( ) Venda de serviço privado em unidade pública
07.( ) Outras. Cite: ______________________________
M’. Para quais dos serviços abaixo a sua Secretaria tem mecanismos de controle da qualidade?
1.( ) Serviços próprios
2.( ) Serviços contratados
3.( ) Serviços conveniados
4.( ) A Secretaria não tem mecanismos de controle
da qualidade dos serviços
N’. Seu município participa de alguma estratégia pactuada de regionalização de serviço:
1.( ) Regionalização pela Noas 2002
2.( ) Consórcio Intermunicipal
3.( ) PPI
4.( ) Outros. Quais? _____________________________
5.( ) Não participa
O’. Se você participa, você considera que, para o seu município, essa estratégia:
1.( ) Avança em relação à situação anterior
2.( ) É indiferente
3.( ) Piorou em relação à situação anterior
P’. Seu município participa da elaboração do Plano Diretor de Regionalização?
1.( ) Sim
2.( ) Não
3.( ) Não sei do que se trata
160
D emocratização do P oder L ocal . . .
Q’. Se não participa, você atribui a:
1.( ) Não tem interesse
2.( ) Porque é centralizado na Secretaria Estadual
de Saúde
3.( ) Não é elaborado
4.( ) Outros. Quais? _____________________________
R’. Como é elaborado o Plano Diretor de Regionalização no seu estado?
1.( ) Mediante consulta do gestor estadual aos municípios
2.( ) Por meio de negociações na CIB
3.( ) Por meio de negociação em CIBs regionais
4.( ) Outros. Cite: _______________________________
SOBRE A ASSISTÊNCIA À SAÚDE
S’. O acesso aos serviços de média e alta complexidade se dá, principalmente, por:
1.( ) Demanda espontânea
2.( ) Central de marcação de consultas
3.( ) Central de marcação de exames
4.( ) Encaminhamento das Unidades Básicas de Saúde
5.( ) Outros. Cite: _______________________________
T’. O acesso da população de seu município aos serviços de média e alta complexidade é:
1.( ) Insuficiente
2.( ) Parcialmente suficiente
3.( ) Plenamente suficiente
U’. Quais os mecanismos que você utiliza para identificar a demanda reprimida?
01.( ) Pesquisa de opinião
02.( ) Ouvidoria
03.( ) Demanda do Conselho Municipal de Saúde
04.( ) Demanda de Associações da Sociedade Civil
05.( ) Decisão judicial
06.( ) Filas nos serviços
07.( ) Outros. Cite: ______________________________
08.( ) Nenhum deles
161
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
V’. Qual(is) desses recursos sua Secretaria possui:
01.( ) Cartão do usuário
02.( ) Cadastramento por base georreferenciada
03.( ) Equipe de saúde mental
04.( ) Central de ambulância
05.( ) Central de informações
06.( ) Central de internações
07.( ) Central de marcação de consultas ou equivalentes
08.( ) Distrito sanitário
09.( ) Policlínica Especializada e/ou Centro de Especialidades
10.( ) Centro Especializado em Odontologia - CEO
11.( ) SAMU
12.( ) Agente comunitário de saúde
13.( ) Centro de Atenção Psicossocial - CAPS
13.1 ( ) CAPS Geral
13.2 ( ) CAPS AD
13.3 ( ) CAPS I
14.( ) Outras. (Especifique no campo “Observações do Respondente” na última página)
W’. Assinale as ações ou programas adotados em sua Secretaria:
01.( ) Vigilância sanitária
02.( ) Vigilância epidemiológica
03.( ) Controle de endemias
04.( ) Programa de Saúde da Família - PSF
05.( ) PSF Bucal
06.( ) Programa Brasil Sorridente
07.( ) Sistema de coleta de exames de patologia
08.( ) Programas de atenção à saúde de crianças e gestantes
09.( ) Acompanhamento de gestantes e lactantes de risco
10.( ) Programas de atenção à saúde de idosos
11.( ) Avaliação da mortalidade infantil e materna
12.( ) Prevenção e atenção de gravidez precoce
13.( ) Política de prevenção do câncer de colo, útero, mama
14.( ) Programas de combate à violência doméstica
15.( ) Programas para doenças crônicas como diabetes, hipertensão, asma
16.( ) Programa DST/AIDS
17.( ) Estratégia de acolhimento ao usuário
162
D emocratização do P oder L ocal . . .
18.( ) Programa Farmácia Básica
19.( ) Terapias alternativas
20.( ) Acompanhamento domiciliar
21.( ) Internação domiciliar
22.( ) Outras. (Especifique no campo “Observações do Respondente” na última página)
OPOSIÇÃO E APOIO À SUA GESTÃO
X’. Que forças sociais você considera que fazem maior oposição à sua gestão?
01.( ) Câmara de Vereadores
02.( ) Conselho Municipal de Saúde
03.( ) Outras secretarias municipais
04.( ) Prestadores privados de serviços
05.( ) Fornecedores de insumos e equipamentos
06.( ) Profissionais de saúde
07.( ) Servidores públicos
08.( ) Associações da Sociedade Civil
09.( ) Secretário de finanças
10.( ) Meios de comunicação de massa
11.( ) Partidos políticos
12.( ) Outros. Cite: ______________________________
Y’. E quais as forças sociais que dão maior apoio à sua gestão?
01.( ) Câmara de Vereadores
02.( ) Conselho Municipal de Saúde
03.( ) Outras secretarias municipais
04.( ) Prestadores privados de serviços
05.( ) Fornecedores de insumos e equipamentos
06.( ) Profissionais de saúde
07.( ) Servidores públicos
08.( ) Associações da Sociedade Civil
09.( ) Secretário de finanças
10.( ) Meios de comunicação de massa
11.( ) Partidos políticos
12.( ) Outros. Cite: ______________________________
163
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
REALIZAÇÕES E FRUSTRAÇÕES
Z’. Em sua opinião, qual foi a realização mais importante de sua Secretaria neste governo?
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
A’’. E qual foi a experiência que lhe causou maior
frustração?
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
SOBRE SUAS EXPECTATIVAS
B’’. Se outra força política vencer as próximas eleições, você considera que as principais diretrizes,
programas e ações de sua Secretaria, em termos gerais:
1.( ) Terão continuidade
2.( ) Serão interrompidas
3.( ) Não sei
C’’. Quando você deixar de ser Secretário(a) de Saúde, quais são seus planos profissionais?
1.( ) Dedicar-se exclusivamente à área privada
2.( ) Continuar na área pública em função de direção
3.( ) Continuar na área pública, porém sem função
de direção
4.( ) Concorrer a cargo eletivo
5.( ) Reassumir cargo eletivo
6.( ) Outros. Cite: _______________________________
DADOS PESSOAIS
D’’. Município de nascimento:
Município: ______________________________________________
Estado: _________________________________________________
164
D emocratização do P oder L ocal . . .
E’’. Sexo:
1.( ) Masculino
2.( ) Feminino
F’’. Idade:
______ anos
G’’. Raça:
1.( ) Asiática
2.( ) Branca
3.( ) Indígena
4.( ) Negra
5.( ) Parda
H’’. Estado civil:
1.( ) Solteiro(a)
2.( ) Casado(a) ou vive com companheiro(a)
3.( ) Descasado(a)
4.( ) Viúvo(a)
I’’. Instrução do pai ou da mãe (do que tiver maior escolaridade):
1.( ) Sem escolaridade
2.( ) Primário
3.( ) Ginasial
4.( ) Colegial/Científico/Normal (2º grau)
5.( ) Superior
6.( ) Pós-graduado
J’’. Município de residência:
Município: __________________________________________
Estado: _____________________________________________
K’’. Há quanto tempo reside no município?
______ anos
165
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
L’’. Qual é o seu salário como Secretário(a)? (salário + gratificações - descontos)
R$ ____________________
M’’. Além do salário de Secretário(a) de Saúde, você tem outra fonte de renda?
1.( ) Sim, somente na área pública
2.( ) Sim, somente na área privada
3.( ) Sim, tanto na área pública como na privada
4.( ) Não
N’’. Qual é a sua profissão?
_________________________________________
O’’. Você fez algum curso visando à capacitação para exercer o papel de dirigente? Caso a resposta seja afirmativa, assinale a(s) modalidade(s)
01.( ) Finanças públicas
02.( ) Legislação
03.( ) Orçamento
04.( ) Planejamento
05.( ) Recursos humanos
06.( ) Saúde pública
07.( ) Outros. Cite: ______________________________
08.( ) Não
P’’. Qual foi o grau de instrução mais alto que você obteve?
01.( ) Primário incompleto
02.( ) Primário (1ª a 4ª série) completo
03.( ) Ginasial (5ª a 8ª série) completo
04.( ) Colegial/Científico/Normal (2º grau) completo
05.( ) Superior completo. Cite: ____________________
06.( ) Pós-graduação. Cite: ______________________
07.( ) Mestrado. Cite: ____________________________
08.( ) Doutorado. Cite: __________________________
Prezado(a) Secretário(a)
166
D emocratização do P oder L ocal . . .
Se você preencheu o questionário ainda durante o XXII Congresso Nacional das Secretarias
Municipais de Saúde, por favor, entregue-o no stand do CONASEMS.
Caso contrário, envie o questionário respondido no mais breve prazo possível para:
Sônia Fleury
Praia de Botafogo, 190, Sala 518
CEP 22250-900 Rio de Janeiro - RJ
- Obrigado por responder a este questionário –
OBSERVAÇÕES DO RESPONDENTE
167
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Anexo II – Modificações introduzidas no questionário em 2006
Na pesquisa de 1996, antes da versão definitiva o questionário foi testado junto a 80 Secretários, por ocasião do XII Encontro Nacional de Secretários Municipais de Saúde, realizado no Rio de
Janeiro, no mês de julho de 1996. Com as modificações feitas com base no teste, o questionário foi
submetido a especialistas reunidos na oficina de trabalho “Gestão municipal da saúde: diversificação,
inovação e democratização”, evento patrocinado pela pesquisa com a finalidade de consolidar o marco
conceitual e metodológicos para o estudo empírico das realidades municipais6.
A revisão e atualização do questionário da pesquisa de 2006 foram efetivadas em uma oficina
com informantes qualificados na área de saúde7, que teve como objetivo torná-lo capaz de captar as
transformações ocorridas no SUS após 10 (dez) anos de descentralização, desde a primeira versão da
pesquisa em 1996. Todas as alterações feitas foram posteriormente validadas pelos pesquisadores que
compuseram a oficina inicial. Segue abaixo uma síntese das principais alterações realizadas por foco
de análise:
a. Perfil do Gestor: as alterações buscaram, essencialmente, aperfeiçoar o formato das questões
elaboradas em 1996, sendo acrescidas de duas novas perguntas sobre a realização de atividades extra secretaria (questão H) e o licenciamento para exercício de cargo eletivo (questão M).
As demais alterações incidiram sobre a forma das questões procurando, fundamentalmente,
inserir escalas de qualificação das respostas. Essas escalas são de três tipos: quantitativas (p.
ex., quantos anos – 1, 2, 3 ou mais anos), de graus (p. ex., influência alta, média, baixa ou
nenhuma) ou categorias (p. ex., participação como delegado, palestrante, ouvinte, outros). As
questões alteradas por essa estratégia foram: N, O, P, Q, R1, R2, R3, R4, R5 e S. Quatro outras questões do perfil do gestor também receberam alterações menos significativas buscando,
fundamentalmente, ampliar as opções de resposta: questões G, X’, Y’ e C’’;
b.Características da Gestão: as alterações nesse âmbito buscaram tanto ampliar a quantidade
de questões para captar novos aspectos do sistema de saúde, resultantes das transformações
ocorridas desde 1996, quanto aperfeiçoar o formato das questões existentes. O acréscimo de
Realizada em outubro de 1996, a oficina contou com a presença de seis especialistas especialmente convidados,
além de secretários, alunos e professores da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (EBAPE) e
da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), representando o encerramento da etapa preparatória do trabalho
empírico.
7
Estiveram presentes, na oficina, pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas, Escola Nacional de Saúde Pública
Sérgio Arouca, Universidade Federal Fluminense (UFF) e gestores federais, estaduais e municipais com o objetivo de atualizar a metodologia da pesquisa: aperfeiçoar o instrumento de coleta de dados, debater a caracterização
do gestor e da gestão local em saúde, levantar informações sobre bases de dados nacionais relevantes, discutir os
resultados da pesquisa de 1996 e construir novas hipóteses para a pesquisa de 2006, analisar a estratégia de coleta
de dados, entre outros essenciais ao planejamento da pesquisa.
6
168
D emocratização do P oder L ocal . . .
novas questões ocorreu, em sua maioria, na dimensão gerencial, embora a dimensão assistencial também tenha tido acréscimo significativo. Na dimensão gerencial, foram incorporadas
12 (doze) novas questões distribuídas em três novos blocos de atributos:
i. Compras e Serviços: com questões específicas sobre modalidades de aquisição
(E’), formas de terceirização de serviços (L’) e controle de qualidade (M’);
ii. Gestão de Pessoas: com questões voltadas para formas de gestão (F’), política
de capacitação (G’), formas de contratação de profissionais (J’) e mecanismos
adicionais de remuneração (K’);
iii. Regionalização: com cinco questões sobre estratégias de organização no espaço
regional (N’, O’, P’, Q’ e R’);
Na dimensão assistencial, foram acrescentadas quatro questões distribuídas em dois blocos de
atributos (o primeiro novo e o segundo já existente):
1. Acesso: com duas questões voltadas para captar a forma e a qualidade de acesso
à média e à alta complexidade (S’ e T’);
2. Estrutura Assistencial: com uma questão sobre recursos de atenção à saúde
(G’);
Finalmente, na dimensão social, apenas uma questão foi acrescentada, sobre a execução do
orçamento municipal de saúde (U).
Além do acréscimo de questões nas três dimensões, outros aperfeiçoamentos foram efetuados,
buscando, da mesma forma que no perfil do gestor, inserir escalas de qualificação ou ampliar o leque
de repostas possíveis. No primeiro caso, foram alteradas as questões V e Y1, e no segundo, foram
aperfeiçoadas as questões T, X, Z, A’, C’, H’, I’, U’ e W’.
O fato de a maioria das alterações realizadas no questionário estarem relacionadas à dimensão
gerencial pode indicar que, na percepção dos pesquisadores e gestores consultados, os aperfeiçoamentos realizados em uma década de transformações no SUS estejam concentrados, em sua maioria,
em buscar estratégias e instrumentos para gerenciar a complexidade do sistema e ampliar o grau de
eficiência do mesmo.
169
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Anexo III - Relatório de representatividade amostral8
Este relatório tem por finalidade apresentar os métodos utilizados para avaliar a representatividade da amostra de municípios da Pesquisa sobre a Municipalização da Saúde: inovações na gestão e
democracia no Brasil, e a qualidade de suas estimativas em nível nacional.
Para coletar as informações da pesquisa foram enviados questionários aos Secretários de Saúde
dos 5.563 municípios brasileiros9, sendo o índice de retorno de aproximadamente 19%. Em decorrência da estratégia de obtenção dos dados junto aos municípios (realização de um censo), da alta taxa
de não resposta e da possibilidade de os resultados corresponderem aos de uma amostra de voluntários, foi necessário realizar um estudo para avaliar o grau de viés de resposta, a fim de verificar se as
respostas obtidas podem ser tratadas como as de uma amostra probabilística de municípios.
O estudo consiste, basicamente, em verificar se as estimativas obtidas pela amostra de municípios são enviesadas quando comparadas com informações obtidas em fontes exógenas. Para tanto, foi
preparada uma base de dados, que contém variáveis provenientes de fontes diversas, como a Pesquisa
de Informações Básicas Municipais do IBGE, o banco de dados do Sistema Único de Saúde (DATASUS) e as Finanças do Brasil - Dados Contábeis dos Municípios, correlacionadas com as levantadas
pela pesquisa. Supondo que os municípios respondentes constituem uma amostra probabilística, foram calculados os pesos amostrais e obtidas estimativas para os parâmetros populacionais conhecidos.
Assim, foram elaborados cenários distintos de planos amostrais para avaliar a qualidade das estimativas vis-à-vis os valores populacionais obtidos por outras fontes. Além de descrever esses cenários
de simulação e avaliar as estimativas obtidas, este relatório define alguns procedimentos de estimação
que podem ser seguidos para a expansão dos resultados da pesquisa.
Amostragem
Assim como na pesquisa de 1996, a forma utilizada para a obtenção das informações junto aos
municípios foi a realização de um censo. No entanto, de um total de 5.563 questionários enviados aos
Secretários de Saúde dos municípios, foram recebidos apenas 1.083 questionários preenchidos, o que
corresponde a uma taxa de não resposta de 80,5% por parte dos municípios.
Para avaliar o impacto que este processo de obtenção das informações pode gerar na estimação
dos resultados, foram realizados exercícios de simulação, via estimação de totais de variáveis consideradas importantes pelo grupo de trabalho e que teriam algum tipo de relação com as variáveis de
interesse da pesquisa.
Inicialmente, três propostas de plano amostral foram analisadas: (1) Amostragem aleatória simples de municípios; (2) Amostragem aleatória estratificada de municípios; e (3) Amostragem aleatória
8
9
Elaborado com base em relatório técnico do consultor Mauricio de Vasconcellos.
Exclusive Brasília.
170
D emocratização do P oder L ocal . . .
com probabilidade de seleção de municípios proporcional ao tamanho, no caso, o número total
de habitantes ou de domicílios.
Durante os primeiros exercícios, que utilizaram o método de amostragem com probabilidade de seleção proporcional ao tamanho, verificou-se que um número significativo de
municípios deveria ser incluído na amostra da pesquisa, pois estes teriam probabilidade de
inclusão maior do que um. Uma vez que seria inviável coletar tal número de questionários
adicionais, dentro do prazo estipulado para o término das operações de coleta das informações,
este método foi descartado.
Desta forma, entre os três planos amostrais sugeridos, optou-se por trabalhar com amostragem estratificada de municípios, uma vez que este método apresentou melhores resultados
do que a amostragem aleatória simples.
As variáveis de estratificação foram selecionadas e fornecidas pelo grupo de trabalho,
sendo estas:
• Localização geográfica (Grandes Regiões ou Unidades da Federação);
• Tipo de gestão do sistema de saúde municipal (Gestão Plena de Atenção Básica
e Gestão Plena de Sistema Municipal); e
• Porte do município quanto ao número de habitantes10 (Até 20.000, de 20.001
a 50.000, de 50.001 a 100.000, de 100.001 a 200.000, de 200.001 a 400.000
e mais de 400.000 habitantes).
Desta forma, foram analisados os planos amostrais com os seguintes esquemas de estratificação: (1) Grandes regiões; (2) Grandes regiões e tipo de gestão; (3) Grandes regiões, tipo
de gestão e porte municipal11; (4) Unidades da federação12; (5) Unidades da federação e tipo de
gestão. Em cada um destes planos, avaliou-se também a possibilidade de considerar municípios
de grande porte, com mais de 400.000 habitantes, como estratos certos de seleção.
A estratificação geográfica dos municípios, segundo grandes regiões e unidades da federação, foi utilizada com o intuito de diferenciar as características regionais, as quais podem
ter grande influência nos resultados. Durante o processo de coleta das informações, foi constatado que municípios com tipo de gestão Plena do Sistema Municipal tinham maior chance
de responder os questionários. Este fato decorreu do próprio processo de seleção, isto é, um
Municípios com população estimada pelo IBGE para o ano de 2005 (IBGE, 2005).
Alguns estratos gerados nesta simulação foram agregados segundo o porte, já que alguns não conteriam qualquer município na amostra.
12
Para algumas unidades da federação da região norte, não houve informação para qualquer município. Em
virtude disto, no exercício (2) os estratos por unidades da federação foram agregados formando um único estado
para esta região.
10
11
171
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
censo com características de uma amostra de voluntários. Assim, empregou-se esta variável no
processo de estratificação para, de certa forma, tentar minimizar esta diferença de comportamento dos gestores. Como os municípios de grande porte possuem características distintas dos
demais municípios, principalmente no que se refere à análise de variáveis quantitativas, tais
como receitas e despesas orçamentárias, optou-se por também fazer uso desta variável para a
estratificação dos municípios.
A utilização de estratos certos de seleção para municípios com mais de 400.000 habitantes foi determinada por limitações operacionais. Devido ao curto prazo restante para a coleta
dos questionários, o grupo constatou que um corte diferente na definição dos estratos certos
poderia gerar uma quantidade de municípios - que deveriam ser incluídos na amostra - muito
superior ao que seria possível. Logo, sendo 47 o número de municípios com mais de 400.000
habitantes (menos do que 1% do total), o grupo de trabalho estabeleceu como meta a obtenção
dos questionários para a totalidade deste grupo de municípios, possibilitando a realização de
um exercício onde todos fossem selecionados e considerados como estrato certo de seleção, ou
seja, com probabilidade de inclusão na amostra igual a um.
Uma vez que as quantidades populacionais de interesse foram definidas como totais das
variáveis, admitiu-se o pressuposto de que a estimação seria por domínios13 de interesse para
variáveis que não tinham informações para todos os municípios. Neste caso, os domínios de
interesse considerados foram às respostas positivas ao determinado item.
Base de dados
Para analisar o impacto na qualidade das informações da pesquisa que o processo de
obtenção dos questionários poderia gerar, foram selecionadas variáveis de diferentes fontes de
informação, que deram origem à base de dados do estudo. As fontes de informações utilizadas
foram: (1) Pesquisa de Informações Básicas Municipais; (2) Banco de dados do Sistema Único
de Saúde – DATASUS; e (3) Finanças do Brasil − Dados Contábeis dos Municípios.
A Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC), desenvolvida pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística, é uma pesquisa de caráter censitário realizada em todos
os municípios do País. Trata-se, basicamente, do levantamento de informações sobre a estrutura, dinâmica e funcionamento das instituições públicas municipais, em especial a prefeitura,
compreendendo também diferentes políticas e setores que envolvem o governo municipal e a
municipalidade. No ano de 2005, através do Suplemento de Assistência Social, foram coletadas
pela primeira vez as informações sobre a assistência social no âmbito municipal. No Quadro 5
estão as variáveis selecionadas da MUNIC 2005 para compor a análise amostral da pesquisa.
Domínios de estudo, são quaisquer subconjuntos da população para os quais se deseja obter ou produzir
estimativas separadas, baseadas em amostra maior.
13
172
D emocratização do P oder L ocal . . .
Quadro 5 − Variáveis do questionário básico (Gestão) e do suplemento (Assistência Social) selecionados para a análise amostral da pesquisa
Gestão
1.Total de funcionários ativos da administração direta
2. Total de funcionários ativos da administração direta - ensino superior
3. Existência de lei de zoneamento ou equivalente
4. Existência de plano diretor
5. Existência de coordenação compartilhada com efetiva participação do poder público e da sociedade
para revisão ou elaboração do Plano Diretor.
6. Existência de consórcio público intermunicipal na área da saúde
7. Existência de convênio de parceria com setor privado na área da saúde
Suplemento
8. Existência de plano municipal de assistência social
9. Existência de conselho municipal de assistência social
10. Existência de conselho municipal de saúde
11. Participação da prefeitura em convênio e/ou parceria para desenvolver ações na área de
assistência social
12. Realização de serviços na área de assistência social pela prefeitura
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (PEEP, 2009).
O Banco de dados do Sistema Único de Saúde (SUS) é mantido pelo Departamento
de Informática do SUS (DATASUS) − órgão da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde,
sendo responsável pela coleta, processamento e disseminação das informações sobre saúde,
disponibilizando informações sobre assistência à saúde da população, os cadastros (rede assistencial) das redes hospitalares e ambulatoriais, o cadastro dos estabelecimentos de saúde, além
de informações sobre recursos financeiros, informações demográficas e socioeconômicas. O
Quadro 6 traz o conjunto de varáveis selecionadas junto aos bancos de dados do DATASUS
para a análise amostral da pesquisa.
173
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quadro 6 − Variáveis do Banco de dados do Sistema Único de Saúde, selecionadas para a análise
amostral da pesquisa
DATASUS
1. Produção ambulatorial (apresentada e aprovada)
2. Encaminhamento de urgência e emergência
3. Número de famílias acompanhadas pelo PSF
4. Número de hipertensos cadastrados
5. Número de nascidos vivos
6. Número de internações
7. Número de beneficiários da assistência médica suplementar
8. Famílias com abastecimento de água pela rede pública
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (PEEP, 2009).
As informações do FINBRA, Finanças do Brasil − Dados Contábeis dos Municípios, são extraídas dos balanços consolidados municipais e organizadas pela Secretaria do Tesouro Nacional do
Ministério da Fazenda. Uma vez que cabe aos municípios repassar seus dados à Secretaria, via Caixa
Econômica Federal, sua cobertura é parcial, variando a cada ano. Para o ano de 2.005, 4.356 municípios brasileiros, entre os 5.563 existentes, apresentaram estas informações, resultando numa cobertura
de 78,3%. No Quadro 7 estão reunidas as varáveis selecionadas do FINBRA para a análise amostral
da pesquisa.
Quadro 7 − Variáveis das Finanças do Brasil - Dados Contábeis dos Municípios - selecionadas
para a análise amostral da pesquisa
FINBRA
1. Receita orçamentária
2. Despesa orçamentária
3. Despesa total com saúde
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (PEEP, 2009).
174
D emocratização do P oder L ocal . . .
Resultados
Nesta seção são apresentados alguns resultados obtidos neste estudo. A Tabela 7 a seguir mostra
um resumo da operação de coleta dos questionários por unidade da federação, indicando o número de
municípios existentes, o número de municípios respondentes e as taxas de resposta obtidas.
Tabela 7 − Total de municípios, municípios respondentes e percentuais de resposta por unidade
da federação - 2006
Código
Estados
Total de Municípios
Municípios
Respondentes
(%)
11
Rondônia
52
7
13,5
12
Acre
22
0
0,0
13
Amazonas
62
4
6,5
14
Roraima
15
8
53,3
15
Pará
143
20
14,0
16
Amapá
16
0
0,0
17
Tocantins
139
4
2,9
21
Maranhão
217
27
12,4
22
Piauí
223
32
14,3
23
Ceará
184
33
17,9
24
Rio Grande do Norte
167
31
18,6
25
Paraíba
223
31
13,9
26
Pernambuco
185
8
4,3
27
Alagoas
102
20
19,6
28
Sergipe
75
32
42,7
29
Bahia
417
37
8,9
31
Minas Gerais
853
244
28,6
32
Espírito Santo
78
19
24,4
33
Rio de Janeiro
92
32
34,8
(continua)
175
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
Código
Estados
Municípios
Respondentes
(%)
35
São Paulo
645
125
19,4
41
Paraná
399
133
33,3
42
Santa Catarina
293
106
36,2
43
Rio Grande do Sul
496
40
8,1
50
Mato Grosso do Sul
78
22
28,2
51
Mato Grosso
141
25
17,7
52
Goiás
246
43
17,5
-
Total
5563
1083
19,5
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (PEEP, 2009).
Após a análise dos resultados obtidos com a realização dos exercícios de simulação, o grupo
de trabalho optou pelo plano amostral que adota amostragem aleatória simples com estratificação de
municípios, segundo grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal como melhor opção. Desta
forma, a Tabela 8 apresenta os resultados para este cenário.
Tabela 8 − Parâmetros populacionais e estimativas obtidas, segundo o plano amostral adotado
na simulação que utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal
Estimativas
População
Respondentes
Respondentes
(estrato certo
para 400mil)
PIB - Preços correntes (x1000)
1.723.099.425
1.941.298.140
1.836.912.215
Produção ambulatorial (apresentada)
2.354.969.316
2.592.487.904
2.470.717.809
Produção ambulatorial (aprovada)
2.157.976.538
2.387.471.576
2.278.304.000
Encaminhamento de
urgência e emergência
1.175.578
1.026.334
1.027.805
Número de famílias acompanhadas 27.470.739
PSF
28.737.385
28.040.164
Número de hipertensos cadastrados
88.831.235
87.245.727
79.990.435
(continua)
176
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
Estimativas
População
Respondentes
Respondentes
(estrato certo
para 400mil)
Número de nascidos vivos
1.333.655
1.419.711
1.384.014
Número de internações
11.242.695
12.293.320
11.659.390
Número de beneficiários da
assistência médica suplementar
34.896.207
37.808.718
35.932.905
Famílias com abastecimento de água 19.381.032
pela rede pública
21.674.583
21.089.077
Número de óbitos infantis
53.233
55.822
53.466
Total de funcionários ativos da
administração direta
4.326.876
4.525.715
4.388.943
Total de funcionários ativos da
administração
direta - Ensino superior
893.023
983.543
962.627
Existência de Lei de zoneamento
ou equivalente
1.143
1.142
1.142
Existência de plano diretor
804
927
922
Existência de coordenação
compartilhada com efetiva
participação do poder público e da
sociedade para revisão ou
elaboração do Plano Diretor
1.748
1.829
1.830
Existência de consórcio público inter- 1.906
municipal na área da saúde
1.991
1.996
Existência de convênio de parceria 587
com setor privado na área da saúde
653
651
Existência de plano municipal de
assistência social
5.087
5.158
5.158
Existência de conselho municipal
de assistência social
5.496
5.503
5.503
Existência de conselho municipal
de saúde
5.540
5.557
5.557
Participação da prefeitura em
3.409
convênio e/ou parceria para desenvolver ações na área de assistência
social
3.474
3.472
Realização de serviços na área de
assistência social pela prefeitura
5.355
5.423
5.423
Receita orçamentária
143.887.165.082
155.445.341.059
148.405.103.732
Despesa orçamentária
137.041.910.395
147.214.211.881
141.199.247.930
Despesa total com Saúde
30.864.194.038
33.400.121.679
31.855.048.725
Fontes: IBGE (2005), DATASUS (2005) e STN (2005).
177
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Além desses resultados foram calculadas medidas de precisão para cada plano amostral adotado
no estudo. Os dados da Tabela 9, a seguir, permitem avaliar a precisão relativa em termos de coeficiente de variação associados às estimativas, caso tivesse sido implementada uma amostra probabilística.
Tabela 9 − Coeficientes de variação (%) estimados, segundo o plano amostral adotado na simulação, que utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal
Estimativas
Respondentes
Respondentes (estrato
certo para 400mil)
PIB – Preços correntes (x1000)
11,32
4,99
Produção ambulatorial (apresentada)
8,08
2,11
Produção ambulatorial (aprovada)
8,31
2,21
Encaminhamento de urgência e emergência
6,14
5,78
Número de famílias acompanhadas PSF
3,30
1,88
Número de hipertensos cadastrados
4,83
3,08
Número de nascidos vivos
4,36
1,92
Número de internações
7,45
2,86
Número de beneficiários da assistência médica
suplementar
18,53
2,50
Famílias com abastecimento de água pela rede
pública
5,57
2,65
Número de óbitos infantis
6,66
1,56
Total de funcionários ativos da administração direta
4,40
1,43
Total de funcionários ativos da administração direta Ensino superior
7,95
2,39
Existência de Lei de zoneamento ou equivalente
5,30
5,29
Existência de plano diretor
6,59
6,67
Existência de coordenação compartilhada com
efetiva participação do poder público e da sociedade
para revisão ou elaboração do
Plano Diretor
4,26
4,26
(continua)
178
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
Estimativas
Respondentes
Respondentes (estrato
certo para 400mil)
Existência de consórcio público intermunicipal na
área da saúde
3,54
3,55
Existência de convênio de parceria com
setor privado na área da saúde
7,87
7,87
Existência de plano municipal de assistência social
0,93
0,93
Existência de conselho municipal de assistência
social
0,33
0,33
Existência de conselho municipal de saúde
0,11
0,11
Participação da prefeitura em convênio e/ou
parceria para desenvolver ações na área
de assistência social
2,57
2,57
Realização de serviços na área de assistência social
pela prefeitura
0,54
0,54
Receita orçamentária
11,57
2,75
Despesa orçamentária
11,36
2,58
Despesa total com Saúde
9,75
2,25
Fontes: IBGE (2005), DATASUS (2005) e STN (2005).
Caso fosse implementada uma amostragem probabilística de municípios, a análise dos resultados não estaria comprometida. Os resultados da Tabela 9 apresentam ganhos em eficiência no que diz
respeito à estimação das quantidades populacionais de interesse, quando é adotado um plano amostral
estratificado como exercício de simulação. No entanto, este exercício deve ser interpretado com ressalvas técnicas devido ao método de coleta de informações.
A Tabela 10 enfatiza a importância do processo de amostragem na seleção do conjunto de
dados, ao implementar procedimentos de ponderação das observações e considerar as características
de desenhos amostrais das pesquisas no momento da estimação da variância. Para algumas variáveis
sugeridas pelo grupo de trabalho, consegue-se obter uma estimativa por intervalo de qualidade desejável do ponto de vista estatístico.
179
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Tabela 10 − Limites de confiança para as estimativas, segundo o plano amostral adotado na
simulação, que utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal, adotando um nível de significância de 5%
Respondentes
Respondentes
(estrato certo para 400mil)
Estimativas
População
Limite inferior
Limite Superior
Limite inferior
Limite Superior
PIB - Preços
correntes
(x1000)
1.723.099.425
1.510.538.573
2.372.057.706
1.657.302.557
2.016.521.873
Produção
ambulatorial
(apresentada)
2.354.969.316
2.182.066.759
3.002.909.049
2.368.501.733
2.572.933.886
Produção
ambulatorial
(aprovada)
2.157.976.538
1.998.697.726
2.776.245.427
2.179.446.107
2.377.161.892
Encaminhamento de urgência e
emergência
1.175.578
902.897
1.149.771
911.375
1.144.236
Número de famílias acompanhadas PSF
27.470.739
26.879.381
30.595.390
27.004.333
29.075.995
Número de
hipertensos
cadastrados
79.990.435
80.430.067
97.232.404
81.976.475
92.514.979
Número de nascidos vivos
1.333.655
1.298.270
1.541.152
1.332.031
1.435.997
Número de
internações
11.242.695
10.499.306
14.087.334
11.005.975
12.312.805
Número de beneficiários da assistência médica
suplementar
34.896.207
24.078.220
51.539.216
34.173.334
37.692.476
Famílias com
abastecimento
de água pela
rede pública
19.381.032
19.306.640
24.042.527
19.992.484
22.185.671
Número de
óbitos infantis
53.233
48.540
63.105
51.832
55.101
Total de funcionários ativos
da administração direta
4.326.876
4.135.194
4.916.237
4.266.121
4.511.766
(continua)
180
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
Respondentes
Estimativas
População
Total de
funcionários
ativos da
administração
direta - Ensino
superior
Respondentes
(estrato certo para 400mil)
Limite inferior
Limite Superior
Limite inferior
Limite Superior
893.023
830.278
1.136.809
917.619
1.007.636
Existência de Lei
de zoneamento
ou equivalente
1.143
1.023
1.260
1.024
1.261
Existência de
plano diretor
804
807
1.047
801
1.042
Existência de
coordenação
compartilhada
com efetiva
participação do
poder público
e da sociedade
para revisão ou
elaboração do
Plano Diretor
1.748
1.676
1.982
1.677
1.983
Existência de
consórcio público intermunicipal na área da
saúde
1.906
1.853
2.129
1.858
2.135
Existência de
convênio de
parceria com
setor privado na
área da saúde
587
552
754
550
751
Existência de
plano municipal
de assistência
social
5.087
5.064
5.252
5.064
5.252
Existência de
conselho
municipal de
assistência
social
5.496
5.467
5.538
5.467
5.538
Existência de
conselho
municipal de
saúde
5.540
5.545
5.569
5.545
5.569
(continua)
181
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
Respondentes
Estimativas
População
Participação da
prefeitura em
convênio e/ou
parceria para
desenvolver
ações na área
de assistência
social
Respondentes
(estrato certo para 400mil)
Limite inferior
Limite Superior
Limite inferior
Limite Superior
3.409
3.299
3.648
3.297
3.647
Realização de
serviços na área
de assistência
social pela prefeitura
5.355
5.365
5.481
5.365
5.481
Receita
orçamentária
143.887.165.082
120.187.720.657
190.702.961.460
140.393.571.828
156.416.635.636
Despesa
orçamentária
137.041.910.395
114.432.866.757
179.995.557.006
134.059.593.585
148.338.902.275
Despesa
total com Saúde
30.864.194.038
27.019.610.300
39.780.633.058
30.450.148.391
33.259.949.058
Fontes: IBGE (2005), DATASUS (2005) e STN (2005).
Considerações finais
Em decorrência da estratégia de obtenção dos dados junto aos municípios (censo) e da
alta taxa de não resposta, foram verificados indícios de que a amostra atual da pesquisa não seja
representativa da população alvo, ou seja, a totalidade dos municípios brasileiros. Possivelmente,
uma parte significativa dos municípios respondentes seja formada por municípios que realizaram
algum tipo de inovação na área da saúde e possuíam algum interesse na divulgação destas realizações, ao responderem o questionário, trazendo viés aos resultados finais.
Embora os resultados referentes à precisão relativa sejam aceitáveis do ponto de vista da
amostragem, o vício na estimativa pontual compromete uma análise estatística. Mesmo que para
algumas variáveis os parâmetros populacionais não sejam superestimados, de forma significativa,
para o plano amostral adotado pelo grupo, deve-se ter em mente que estes exercícios de simulação
não podem ser conclusivos, pois a amostra não foi realizada de forma probabilística e as variáveis
utilizadas na estimação não foram selecionadas pelo grupo adotando critérios estatísticos.
Considerando as informações deste estudo, seria mais adequado que os resultados da pesquisa fossem conclusivos somente para a população de municípios respondentes à pesquisa. No
entanto, há possibilidade de analisar resultados para municípios com mais de 400 mil habitantes, uma vez que, neste caso, foi feito um censo, que não introduz erros devidos ao processo de
amostragem.
182
D emocratização do P oder L ocal . . .
Este estudo mostra que pesquisas futuras devem ser baseadas em algum critério probabilístico
para a seleção da amostra, a fim de garantir a imparcialidade e permitir o cálculo de medidas de precisão associadas às estimativas a serem obtidas.
Procedimentos de estimação
Nesta seção estão dispostos alguns procedimentos de estimação adotados para a expansão dos
resultados da pesquisa, permitindo um tratamento estatístico para fins de inferência.
Sendo as quantidades populacionais de interesse definidas como totais das variáveis, pode-se
admitir o pressuposto de que a estimação seja feita por domínios de interesse. Neste caso, deve-se
definir uma variável di que identifique o domínio a ser estimado:
N
Nd = ∑ di
i =1
onde,
na população.
corresponde ao tamanho ou o número de observações pertencentes ao domínio
Seja y a variável de interesse pesquisa. Logo,
define a variável de estudo no domínio d da população.
Assim, o total populacional da variável y na população para o domínio de interesse d pode ser
definido da seguinte maneira:
.
N
N
Yd = ∑ y id = ∑ y i d i
i =1
i =1
A variância da variável y no domínio, seguindo uma amostra aleatória simples é dada por:
1 Nd
(yid − Yd )2
S =
∑
N d − 1 i =1
2
d
Yd =
onde,
1
Nd
N
∑y
i =1
id
equivale à média da variável na população para o domínio de interesse.
183
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A estimação dos parâmetros definidos anteriormente pode ser, então, feita da seguinte forma:
Yˆ d =
Nd
nd
n
∑y
i =1
id
, um estimador para o total Yd na amostra selecionada;
( )
n  S2
2
V Yˆd = N d 1 − d  d
 N d  nd , a variância do estimador Yˆ d ; e
( )
n  s2
2
Vˆ Yˆd = N d 1 − d  d
 N d  nd , o estimador desta variância, onde
s =
2
d
yd =
1
nd
1 n
( yid − y d )2
∑
nd − 1 i =1
, a variância amostral da variável y para o domínio d da amostra;
n
∑y
i =1
id
a média amostral da variável y no domínio d da amostra.
Como foram adotados planos amostrais estratificados na realização do estudo, as estimativas
dos parâmetros são obtidas pela soma dos resultados de cada estrato de seleção.
Assim, para uma amostra estratificada o total estimado de característica de interesse para certo
domínio de interesse é definido da seguinte maneira:
e
H
n
Yˆd = ∑∑
h =1 i =1
Nd h
y idh
nd h
onde, h corresponde ao índice associado ao h-ésimo estrato da população.
Sua variância pode então ser definida por:
( )
 S 2hd

n
 dh
( )
 s 2hd

n
 dh
H
n
2
V Yˆd = ∑ N d h 1 − d h
Nd h
h =1

e seu estimador obtido por meio de:
H
n
2
Vˆ Yˆd = ∑ N d h 1 − d h
Nd h
h =1

Vale ressaltar que para o caso dos exercícios em que se considerou a utilização de estratos certos
para os municípios com mais de 400.000 habitantes, o cálculo da variância se faz apenas pela soma
das estimativas das variâncias obtidas nos demais estratos.
184
D emocratização do P oder L ocal . . .
Anexo IV – Matriz de pontuação - Índice de Inovação
Quadro 8 - Dimensões, Variáveis, Fontes, Indicadores e Estrutura de Pontuação do Índice de
Inovação
DIMENSÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
Influência
do CMS na
elaboração do
orçamento
Questão T
SOCIAL
Elaboração
do orçamento
Influência de
associações
da sociedade
civil na
elaboração do
orçamento
Questão T
SOCIAL
Elaboração
do
orçamento
Influência de
políticos locais
na elaboração do
orçamento
Questão T
Elaboração
do
orçamento
Influência de
consultores ou
empresas de
consultoria
externa na
elaboração do
orçamento
Execução
do
orçamento
Influência
do CMS na
execução do
orçamento
Questão U
SOCIAL
Execução
do
orçamento
Influência de
associações da
sociedade civil
na execução do
orçamento
Questão U
SOCIAL
Execução
do
orçamento
Influência de
políticos locais
na execução do
orçamento
Questão U
Execução
do
orçamento
Influência de
consultores ou
empresas de
consultoria externa na execução
do orçamento
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
Elaboração
do
orçamento
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Nenhuma
-1
-1
-1
-1
Alta
1
1
1
1
Alta
-1
-1
-1
-1
Nenhuma
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Nenhuma
-1
-1
-1
-1
Alta
1
1
1
1
Alta
-1
-1
-1
-1
Nenhuma
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Questão T
Questão U
(continua)
185
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
DIMENSÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
Influência
dos atores
no Plano
Municipal
de Saúde
Influência de
outros secretários
no estabelecimento de prioridades
em saúde
Influência
dos atores
no Plano
Municipal
de Saúde
Influência do CMS
no estabelecimento de prioridades
em saúde
Questão V
SOCIAL
Influência
dos atores
no Plano
Municipal
de Saúde
Influência de
associações da
sociedade civil no
estabelecimento
de prioridades em
saúde
Questão V
SOCIAL
Influência
dos atores
no Plano
Municipal
de Saúde
Influência de
políticos locais no
estabelecimento
de prioridades em
saúde
Influência
dos atores
no Plano
Municipal
de Saúde
Influência de
consultores ou
empresas de consultoria externa no
estabelecimento
de prioridades em
saúde
Questão V
Importância dos
itens
Parecer do corpo
técnico
Questão X
Importância dos
itens
Propostas de
conselhos ou
conferências de
saúde
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
Importância dos
itens
Solicitações de
políticos locais
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Nenhuma
-1
-1
-1
-1
Alta
1
1
1
1
Alta
-1
-1
-1
-1
Nenhuma
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Alta
1
1
1
1
Média
1
1
1
1
Nenhuma
-1
-1
-1
-1
Alta
-1
-1
-1
-1
Nenhuma
1
1
1
1
Questão V
Questão V
Questão X
Questão X
(continua)
186
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
SOCIAL
Importância dos
itens
Deamanda espontânea (solicitações
individuais ou de
comunidades)
Questão X
Alta
-1
-1
-1
-1
SOCIAL
Importância dos
itens
Pressão dos
meios de comunicação de massa
Questão X
Alta
1
1
1
1
SOCIAL
Importância dos
itens
Pressão de
associações da
sociedade civil
Questão X
Alta
1
1
1
1
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
Sim
1
1
1
1
não
1
1
1
1
DIMENSÃO
VARIÁVEIS
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
Funcionamento do
Conselho
CMS com sede
própria
Funcionamento do
Conselho
Ocupação do
cargo de
presidente por
meio de eleição
Questão Y3
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Funcionamento do
Conselho
Existe um
canal efetivo
de troca de
informações
entre a
secretaria
de saúde
e o conselho
Questão Y5
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Interlocutores
Associações
da
sociedade civil
Questão Z
Sim
1
1
1
1
Sim
1
1
1
1
Não
-1
-1
-1
-1
SOCIAL
SOCIAL
SOCIAL
Interlocutores
Conselho
de Saúde
Questão Y1
Questão Z
SOCIAL
Interlocutores
Comissões
Inter-gestores
Questão Z
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Interlocutores
Não presta contas
Questão Z
Sim
-1
-1
-1
-1
(continua)
187
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
SOCIAL
Instrumentos e mecanismos
Nenhum
Questão A'
Não
-1
-1
-1
-1
SOCIAL
Instrumentos e mecanismos
Audiência
pública
Questão A'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Instrumentos e mecanismos
Meios de comunicação
Questão A'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Instrumentos e mecanismos
Internet
Questão A'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Instrumentos e mecanismos
Locais públicos
Questão A'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Instrumentos e mecanismos
Nenhum
Questão A'
Sim
-1
-1
-1
-1
SOCIAL
Tipos de
informação
oferecida
Funcionamento
de serviços
Questão B'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Tipos de
informação
oferecida
Informação
específica para
os conselhos ou
semelhante
Questão B'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Tipos de
informação
oferecida
Resultado da
gestão
Questão B'
Sim
1
1
1
1
SOCIAL
Tipos de
informação
oferecida
Nenhuma
Questão B'
Sim
-1
-1
-1
-1
(continua)
188
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
Conselho
municipal
de saúde
Questão C'
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
Ficha ou
formulário de
avaliação/
caixa de
sugestões
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
Sim
1
1
1
1
Questão C'
Sim
1
1
1
1
Ouvidoria
especializada
Questão C'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
Pesquisa
de opinião
Questão C'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
Serviço tipo
disquedenúncia
Questão C'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
Meios de
comunicação
Questão C'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Formas de
recebimento
de informações e/ou
demandas
Internet
Questão C'
Sim
2
1
1
1
(continua)
189
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
GERENCIAL
Desdobramento das
demandas e/ou
denúncias
recebidas
Punição ou
remanejamento de
funcionário
Questão D'
GERENCIAL
Desdobramento das
demandas e/ou
denúncias
recebidas
Mudanças
no funcionamento dos
serviços
GERENCIAL
Desdobramento das
demandas e/ou
denúncias
recebidas
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
Sim
1
1
1
1
Questão D'
Sim
1
1
1
1
Criação
de novos
serviços
Questão D'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Desdobramento das
demandas e/ou
denúncias
recebidas
Avaliação da
gestão
Questão D'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Desdobramento das
demandas e/ou
denúncias
recebidas
Nenhum
Questão D'
Sim
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
Modalidades de
aquisição
Pregão
eletrônico
Questão E'
Sim
2
1
1
1
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
aquisição
Não
1
1
1
1
Pregão
presencial
Questão E'
(continua)
190
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
DIMENSÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
GERENCIAL
Controle de
qualidade
Serviços
próprios
Questão M'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Controle de
qualidade
Serviços
contratados
Questão M'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Controle de
qualidade
Serviços
conveniados
Questão M'
Sim
1
1
1
1
Controle de
qualidade
A Secretaria
não tem
mecanismos
de controle
de qualidade
dos serviços
Questão M'
Sim
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
Forma de
gestão de
pessoas
Órgão de
recursos
humanos
dentro da
Secretaria
de Saúde
Questão F'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Política de
capacitação
Política de
educação
permanente
Questão G'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Política de
capacitação
Política
própria de
capacitação
Questão G'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Política de
capacitação
Nenhum
Questão G'
Sim
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
(continua)
191
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
GERENCIAL
Formas de
contratação
de profissionais
Consórcio
intermunicipal
Questão J'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Mecanismos
adicionais
de remuneração
Pagamento
de adicionais por desempenho
Questão K'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Mecanismos
adicionais
de remuneração
Pagamento
além da
tabela do
SUS
Questão K'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Entidades
de apoio
técnico
Agências
internacionais
Questão H'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Entidades
de apoio
técnico
Consultoria
privada
Questão H'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Entidades
de apoio
técnico
CONASEM
Questão H'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Entidades
de apoio
técnico
Consórcio
intermunicipal
Questão H'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Entidades
de apoio
técnico
Universidade
Questão H'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Entidades
de apoio
técnico
Nenhum
Questão H'
Sim
-1
-1
-1
-1
(continua)
192
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com consórcio intermunicipal
Questão I'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com instituições de
ensino e
pesquisa
Questão I'
Sim
2
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com outros
setores do
governo
municipal
Questão I'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com igrejas
Questão I'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com organizações não
governamentais
Questão I'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com empresas privadas
Questão I'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Com OSCIPS
Questão I'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Modalidades de
parcerias
Nenhuma
Questão I'
Sim
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
Estratégia
de regionalização
predominante
Regionalização pela
NOAS 2002
Questão N'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Estratégia
de regionalização
predominante
Consórcio
intermunicipal
Questão N'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Estratégia
de regionalização
predominante
Não participa
Questão N'
Sim
-1
-1
-1
-1
(continua)
193
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
GERENCIAL
Planejamento da
regionalização
Sim
Questão P'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Planejamento da
regionalização
Não
Questão P'
Sim
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
Planejamento da
regionalização
Não sei do
que se trata
Questão P'
Sim
-1
-1
-1
-1
Planejamento da
regionalização
Sim
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
Não tem
interesse
Não
-1
-1
-1
-1
GERENCIAL
Planejamento da
regionalização
Por meio de
negociações
na CIB
Questão R'
Sim
1
1
1
1
GERENCIAL
Planejamento da
regionalização
Por meio de
negociações
em CIBs
regionais
Questão R'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Forma de
acesso à
média e alta
complexidade
Demanda
espontânea
Questão S'
Sim
-1
-1
-1
-1
ASSISTENCIAL
Forma de
acesso à
média e alta
complexidade
Central de
marcação
de consultas
Questão S'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Forma de
acesso à
média e alta
complexidade
Central de
marcação
de exames
Questão S'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Forma de
acesso à
média e alta
complexidade
Encaminhamento das
unidades
básicas de
saúde
Questão S'
Sim
1
1
1
1
Questão Q'
(continua)
194
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
ASSISTENCIAL
Mecanismos de
identificação de
demanda
reprimida
Pesquisa de
opinião
Questão U'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Mecanismos de
identificação de
demanda
reprimida
Ouvidoria
Questão U'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Mecanismos de
identificação de
demanda
reprimida
Demanda do
CMS
Questão U'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Mecanismos de
identificação de
demanda
reprimida
Filas de
serviços
Questão U'
Sim
-1
-1
-1
-1
ASSISTENCIAL
Mecanismos de
identificação de
demanda
reprimida
Nenhum
Questão U'
Sim
-1
-1
-1
-1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Cartão do
usuário
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Cadastramento por
base georreferenciada
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Equipe
de saúde
mental
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Central de
ambulância
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Central de
informações
Questão V'
Sim
2
1
1
1
DIMENSÃO
(continua)
195
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
DIMENSÃO
VARIÁVEIS
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Central de
marcação
de consultas
ou equivalente
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Distrito
sanitário
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Policlínica
especializada e/ou
centro de
especialidades
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Centro
especializado em
odontologia
– CEO
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
SAMU
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Agente
comunitário
de saúde
Questão V'
Sim
1
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Centro de
atenção
psicossocial – CAPS
GERAL
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Centro de
atenção
psicossocial
– CAPS AD
Questão V'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Recursos
assistenciais
Centro de
atenção
psicossocial
– CAPS I
Questão V'
Sim
2
1
1
1
(continua)
196
D emocratização do P oder L ocal . . .
(continuação)
DIMENSÃO
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
VARIÁVEIS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
PFS bucal
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Programa
Brasil sorridente
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Sistema de
coleta de
exames de
patologia
Questão W'
Sim
2
1
1
1
Ações e
programas
Programa
de atenção
à saúde de
crianças e
gestante
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Acompanhamento de
gestantes e
lactantes de
risco
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Programa
de atenção
à saúde de
idosos
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Avaliação da
mortalidade
infantil e
materna
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Prevenção
e atenção
de gravidez
precoce
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Política de
prevenção
do câncer
de colo, útero, mama
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Programas
de combate
à violência
doméstica
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
(continua)
197
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
DIMENSÃO
ASSISTENCIAL
VARIÁVEIS
Ações e
programas
Programa
DST/AIDS
FONTES
(QUESTÕES)
INDICADORES
(ITEM DE
PONTUAÇÃO)
ESTRUTURA DE PONTUAÇÃO
Peq
porte
Médio
porte
Grande
porte
Regiões
Metropolitanas
Sim
2
1
1
1
Não
-1
-1
-1
-1
Questão W'
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Estratégia
de acolhimento ao
usuário
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Programa
farmácia
básica
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Terapias
alternativas
Questão W'
Sim
2
1
1
1
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Acompanhamento
domiciliar
Questão W'
Sim
2
2
2
2
ASSISTENCIAL
Ações e
programas
Internação
domiciliar
Questão W'
Sim
2
2
2
2
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (PEEP, 2009).
198
PARTE 2
PROCESSO DE DESCENTRALIZAÇÃO E
DINÂMICAS DE INOVAÇÃO LOCAL EM SAÚDE:
UM ESTUDO LONGITUDINAL
Capítulo 4
Renovação das Elites Locais
em Saúde: perfil dos(as)
secretários(as)
municipais de saúde
Sonia Fleury
Assis Mafort Ouverney
1. Contexto
As Secretarias Municipais de Saúde (SMS) constituemse na autoridade sanitária encarregada de gerenciar os sistemas
locais de saúde nos municípios do Brasil. Seus dirigentes fazem
parte dos governos locais eleitos, sendo o secretário ou secretária
escolhido para exercer esta função pelo prefeito. Suas responsabilidades foram ampliadas, significativamente, ao longo do processo de descentralização das políticas sociais estabelecido pela
Constituição de 1988, como parte da institucionalização de um
padrão de proteção baseado no conceito de seguridade social,
como parte importante da estratégia de inclusão social e democratização da sociedade brasileira.
Nesse processo, foi criado o Sistema Único de Saúde
(SUS) fundamentado nos princípios da universalidade, integralidade, equidade, descentralização e participação da sociedade.
Ao longo da década de 1990, o processo de descentralização
aprofundou-se significativamente por meio da transferência de
funções, recursos e responsabilidades setoriais aos municípios
na gestão das políticas de saúde, fortalecendo o papel dos(as)
gestores(as) locais.
De acordo com a legislação setorial, os(as) secretários(as)
municipais de saúde são atores políticos importantes na definição dos rumos da política de saúde no País, uma vez que possuem atribuições legais e gerenciais sobre uma série de aspectos
do SUS, além de gerenciarem uma proporção significativa de
201
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
unidades de prestação de serviços e de recursos financeiros do sistema. Também possuem participação política nas instâncias decisórias do sistema em âmbito estadual e nacional, por meio de
suas representações corporativas, respectivamente, os Conselhos de Secretarias Municipais de Saúde
(COSEMS) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS).
Em virtude de seu engajamento privilegiado nos principais fóruns decisórios nacionais,
os(as) secretários(as) municipais de saúde possuem elevada capacidade de articulação política e suas
posições influenciam praticamente todas as estratégias nacionais e regionais de condução da política de saúde. Possuem ainda influência sobre a agenda dos legislativos e partidos políticos, além de
estabelecerem alianças com diversas instituições do setor saúde, de outras áreas de política pública
e com grupos de defesa de direitos humanos e da cidadania.
Desta forma, o empoderamento das secretarias municipais de saúde promovido pela descentralização representa um processo de adensamento da democracia na medida em que coloca o Estado mais próximo da realidade da população e permite sua participação nos rumos da construção
nacional.
Assim, a expansão das atividades dos governos locais representa importante movimento de
reforma do Estado, de redefinição do modelo federativo brasileiro, de transformação das relações
Estado−sociedade e de formação de novos sujeitos políticos, ampliando o potencial de consolidação
da democracia brasileira.
Na medida em que consiste em um lócus importante de exercício do poder público e de
elevada capacidade de influência sobre as políticas setoriais no âmbito local, o cargo de secretário
municipal de saúde representa um espaço dinâmico de competição política para as elites locais
e torna-se elemento importante do estudo da natureza da configuração do poder local. A maior
homogeneidade ou heterogeneidade de requisitos pessoais, profissionais, de origem e trajetória profissional e política dos(as) secretários(as) fornece subsídios para a análise da estrutura de ocupação
do poder local e do padrão de governança democrática subjacente.
A diversidade dos atributos do secretário municipal representa maior amplitude de recrutamento para além de grupos tradicionais de poder, o que indica uma relação positiva entre descentralização e democratização do poder local.
Assim sendo, espera-se que a formação do SUS, ao criar uma nova configuração institucional
da organização da política de saúde, tenha representado um incentivo ao rompimento com padrões
políticos tradicionais expressos no patrimonialismo e na privatização da coisa pública que asseguraram o monopólio do exercício do poder por parte das elites locais.
Para analisar esta hipótese, utiliza-se um conjunto de dados, nacionalmente representativos, de um questionário respondido pelos dirigentes das secretarias municipais de saúde, em
dois momentos diferentes do processo de descentralização, em 1996 e em 2006. Foram analisadas as tendências gerais de mudança no perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde
durante esta década.
202
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
2. Descentralização, democratização e elites gestoras locais da política de saúde
Historicamente, ao longo do processo de construção nacional do Brasil, os governos locais
foram associados a um modelo de organização política caracterizado pelo entrelaçamento das esferas
pública e privada, configuração essa expressa nas relações pessoalizadas entre agentes políticos e econômicos tradicionais e os(as) gestores(as) das administrações municipais.
Os governos locais representaram, em boa parte da trajetória histórica do País, espaços de
exercício do poder das oligarquias regionais formadas por famílias proprietárias de terras e grandes
comerciantes, vinculados à economia agroexportadora, sendo os defensores de um padrão tradicional
de cultura e organização social (Carvalho, 2007).
O comprometimento do interesse público em favor de manutenção do status e da preponderância das elites patrimonialistas oligárquicas marcou a formação nacional, tendo se perpetuado
ao longo da história, apesar do processo de urbanização, industrialização e modernização do País
(Melo, 2010).
Se bem tenha havido uma mudança no arranjo federativo com a centralização e concentração
de poder após a Revolução de 1930, marco da construção do Estado nacional moderno, o governo
central não prescindiu do apoio dos coronéis para o controle da política local, afinada com o poder
central. Mesmo no curto período democrático inaugurado com a Constituição de 1946, os municípios não foram contemplados com recursos necessários para uma administração mais autônoma,
requerendo sempre a ajuda dos poderes estadual e federal. Desta forma, tais arranjos federativos pouco
favoreceram a autonomia do poder local e o fortalecimento das administrações locais para o desempenho de funções de política pública e prestação de serviços à população. Esse padrão somente foi alterado com a Constituição de 1988 (Andrade, 2007), que estabeleceu um novo regime de distribuição
de competências federativas, de distribuições de recursos tributários e de gestão das políticas sociais,
configurando um vigoroso movimento de descentralização para os municípios.
Ao reduzir e alterar as atribuições do governo central e transferi-las às esferas subnacionais,
a descentralização impulsiona um movimento de redefinição da estrutura do Estado centralizador,
reforçado ao longo do regime ditatorial, caracterizado pela reduzida amplitude do leque de interesses
inseridos na condução das decisões nacionais. Esse padrão se materializava na centralização dos recursos tributários no nível nacional, tornando os entes subnacionais alinhados automaticamente ao poder
central, e na redução dos atores políticos capazes de influenciar na definição das políticas públicas.
O ápice deste processo é encontrado no período autoritário, com a redução dos círculos de poder ao
comando militar e a outros atores civis articulados em torno desse núcleo.
A transição democrática, com a Constituição de 1988, introduziu um novo desenho de sistema político que propiciou o empoderamento de novos atores no cenário político nacional, criando
meios para aumentar a sua capacidade efetiva de condução dos rumos das políticas públicas, o que
tem permitido o reconhecimento da diversidade de demandas sociais anteriormente excluídas e sem
capacidade de expressão. A ampliação do escopo de atores e interesses produz efeitos democratizantes
203
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
em todo o território nacional na medida em que fortalece a esfera local como espaço de decisão e
ativa relações que ocorrem na micropolítica de cada município, permitindo a emergência de novas
lideranças e articulações em torno de novos projetos locais em cada um dos municípios brasileiros.
Para uma corrente de pensamento, a descentralização terminaria por ter consequências deletérias ao progresso nacional, posto que o longo ciclo de esvaziamento do poder local e seu aparelhamento por setores privados retrógrados inviabilizariam o desenvolvimento nacional, que sempre
foi articulado desde o nível central. No entanto, a corrente que se tornou hegemônica na condução
do processo de transição democrática acreditou que a descentralização representa uma estratégia de
revigoramento da cultura cívica por instituir espaços inovadores de produção de práticas republicanas, em que a inserção de novos atores e a expansão da esfera de competitividade política conduzem
ao desenvolvimento de condições mais concretas de expressão das necessidades da população.
Se bem seja necessário reconhecer a baixa capacidade técnica da administração pública local,
a aposta foi que a intensidade desse movimento poderia, ao longo do tempo, criar novas práticas
políticas e tecnologias institucionais capazes de ampliar a efetividade e a eficiência das políticas
disponibilizadas à população. Para superar os entraves decorrentes de um processo centralizador
que estagnou a administração municipal seria necessária uma descentralização condicionada ao
cumprimento de certas metas e requisitos, capaz de aumentar progressivamente a capacidade local
em afinidade com a doutrina do SUS.
A proximidade do Estado em relação ao cidadão, proporcionada pela descentralização, amplia a permeabilidade das decisões e permite revigorar os padrões conservadores de exercício do
poder, que marcam tanto as trajetórias políticas brasileiras como a latino-americana, caracterizadas
pela predominância de oligarquias regionais patrimonialistas associadas a burocracias estatais centralizadoras (Fleury, 2006).
A descentralização cria um ambiente propício ao rompimento com as estruturas tradicionais
de autoridade, ao introduzir novas formas de acesso e exercício do poder assim como a emergência
de novos atores. Esses elementos se materializam na formação de novas lideranças, nas articulações
internas e externas à esfera local, nas agendas de debate e de formação de políticas e nos programas
governamentais.
Novos atores, ao ampliar o universo de agentes que tomam decisões, preenchem o espaço
antes ocupado exclusivamente por atores tradicionais, possibilitam a incorporação de novos interesses e valores. Da mesma forma, impulsionam a formação de coalizões mais amplas e inclusivas,
permitem a formação de novas alianças com setores excluídos e minoritários, assim como podem
introduzir padrões mais técnicos e profissionais de formulação e implementação de políticas,
entre outros.
No entanto, uma ameaça a este processo encontra-se na forte tradição de coronelismo e
mandonismo locais que terminou por entronizar este poder despótico e elitista como única forma
de acesso dos cidadãos do interior aos benefícios do poder público.
204
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Logo, um dos aspectos de maior relevância para a democracia se refere ao impacto do processo de descentralização sobre a natureza do Estado brasileiro proporcionando a formação e renovação das elites gestoras municipais responsáveis pelo exercício das responsabilidades e gestão das
estruturas e recursos relativos às políticas públicas descentralizadas (Fleury, 2003).
Tal mudança representa um movimento de renovação das elites locais em direção a um padrão mais democrático na medida em que permite que novos atores exerçam o poder, reconstruam
suas identidades e favoreçam a emergência de formas mais inclusivas de articulação, novas atitudes
para com a coisa pública e maior permeabilidade aos interesses presentes na sociedade civil.
Os(as) secretários(as) municipais de saúde, portanto, como atores que detêm a condução
política dos sistemas locais de saúde, representam uma elite política setorial instituída pelo processo
de descentralização da política de saúde, e como tal, portadora das prerrogativas e recursos para a
implementação do projeto de democratização do Estado.
A renovação e o comprometimento dessa elite local representam, portanto, uma questão central para o desenvolvimento da democracia nacional e um aspecto essencial relacionado ao sucesso
da estratégia de descentralização. A aproximação dessa elite de padrão mais diversificado significa
uma importante inovação em termos de trajetória política nacional, na medida em que o sistema de
poder no campo da política de saúde possa ser mais permeável e democrático do que as estruturas
mais antigas e tradicionais de Estado.
Para isso, os critérios de recrutamento para o cargo devem expressar novos valores, que não
os padrões tradicionais de acesso por meio de redes patrimonialistas fechadas e organizadas com
base em vínculos de parentesco e alianças clientelistas. A diversidade de composição dessa elite deve
estar presente também nos aspectos de filiação partidária e engajamento institucional, assim como
a ocupação do cargo deve expressar a acessibilidade e diversidade de raça, gênero, formações profissionais, origens socioeconômicas e vinculações partidárias.
Da mesma forma, é desejável que estejam presentes práticas de renovação e alternância de
poder, de formação de lideranças, de ampliação do conhecimento das realidades locais, de qualificação e profissionalização da gestão e de compromisso com os princípios republicanos da administração pública. Por outro lado, também se deve esperar que essa nova elite tenha capacidade de
articulação com os diversos domínios da sociedade e do Estado, nas três esferas federativas, assim
como esteja setorialmente articulada com seus pares de forma orgânica, permitindo a representação
local em agendas regionais e nacionais.
O perfil do gestor consiste em um elemento de análise não só da composição da elite, mas
também dos condicionantes estruturais de acesso e exercício do poder que permeiam e organizam
o universo maior da democracia brasileira. Nossa hipótese é que o processo de descentralização
político-administrativo conduza à democratização da esfera local de governo, por meio da diversificação do perfil do gestor na medida em que seja capaz de induzir modificações na composição da
elite local.
205
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
3. Hipóteses e fontes de dados
O objetivo desse capítulo consiste em analisar os impactos do processo de descentralização sobre o perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde, comparando as características
dos(as) gestores(as) nos anos de 1996 a 2006, por porte do município e região de saúde do País.
A hipótese estabelecida é que o processo de descentralização de recursos e atribuições legais para a gestão municipal contribui tanto para a democratização do sistema de poder quanto
para o aperfeiçoamento da capacidade de gestão da esfera local. Portanto, é esperado que, com
o aprofundamento da descentralização, o perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde seja
mais diversificado e mais qualificado, em virtude da necessidade de gerenciar sistemas de saúde
mais complexos em expansão e mais engajados em processos de interdependência com outros
níveis de governo, organizações da sociedade civil e do setor privado.
A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário enviado aos(as) secretários(as)
municipais de saúde, em âmbito nacional. O retorno dos questionários atingiu 28,6% e 19,5%
do universo nacional de municípios, em 1996 e 2006, respectivamente, com distribuição estatística representativa para o universo nacional.
3.1 Variáveis de estudo
O questionário é formado por dois blocos de questões: um relativo ao perfil do gestor e
outro às características de gestão das secretarias municipais de saúde em três dimensões: social,
gerencial e assistencial. A análise do perfil do gestor, objeto desse capítulo, abrange suas características socioeconômicas e profissionais, a trajetória política e vida pública e a relação com o
cargo de secretário.
O perfil socioeconômico dos(as) gestores(as) foi estudado por meio de suas características pessoais (idade, sexo, raça e estado civil), sua origem social (município de origem e grau de
instrução do pai ou mãe) e sua situação atual (municípios de residência, tempo de residência,
salário e outras fontes de renda).
Para a análise do perfil profissional, foram feitas perguntas relacionadas à qualificação
(instrução, profissão e cursos de capacitação) e à trajetória profissional do gestor (experiência
anterior em saúde, experiência de direção em órgão púbico, experiência anterior como secretário de saúde, esfera em que trabalhou e atividades extra secretaria).
A análise da trajetória política e da vida pública dos(as) gestores(as) locais foi realizada
privilegiando sua experiência político-eleitoral (filiação a partido político, participação como
candidato em eleição e licenciamento de cargo eletivo), sua experiência associativa (filiação a
organizações da sociedade civil) e sua participação política na área de saúde (participação em
eventos, entidades representativas e instâncias de pactuação).
206
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Finalmente, os(as) secretários(as) de saúde responderam a questões sobre sua relação
com o cargo de secretário, abrangendo sua experiência no cargo (estabilidade e continuidade),
as motivações que levaram à sua designação e aceitação do cargo (razões de indicação e de aceitação) e suas expectativas para o futuro.
No total, os(as) secretários(as) municipais, de saúde responderam a 36 questões em cada
uma das edições da pesquisa (1996 e 2006), na forma de distribuição definida no Quadro 9
abaixo. Nas variáveis “experiência anterior como secretário de saúde”, “esfera de governo em
que trabalhou”, “filiação a sociedade civil”, “participação em eventos, entidades representativas
e instâncias de pactuação”, “razões da indicação” e “razões da aceitação”, foram promovidas,
em 2006, alterações em questões existentes na primeira edição da pesquisa de 1996.
Novas questões foram acrescentadas para as variáveis “atividades extra secretaria”, “licenciamento de cargo eletivo” e “filiação à sociedade civil”. Tais alterações e acréscimos ocorreram
em virtude da necessidade de aperfeiçoar e atualizar o instrumento de coleta de dados em relação às mudanças ocorridas no cenário político institucional da política de saúde.
Quadro 9 - Categorias, atributos e variáveis de análise do perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde
Categoria
Atributo
Variável
Município de origem
Origem social
Instrução do pai ou mãe
Município de residência
Situação atual
Tempo de residência
Salário e outra fonte renda
Perfil
socioeconômico
Idade
Sexo
Características pessoais
Raça
Estado civil
207
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(continuação)
Categoria
Atributo
Variável
Instrução/Curso superior
Qualificação
Profissão
Curso capacitação
Experiência anterior em saúde
Perfil profissional
Experiência de direção em órgão púbico
Experiência anterior como SS
Trajetória profissional
Esfera em que trabalhou
Atividades extra secretaria
Filiação a partido político
Experiência político-eleitoral
Participação como candidato em eleição
Licenciamento de cargo eletivo
Trajetória política e
vida pública
Experiência associativa
Filiação a sociedade civil
Participação política em saúde
Participação em eventos, entidades representativas e
instâncias de pactuação
Experiência no cargo
Estabilidade e Continuidade
Razões da indicação
Relação com o cargo
de Secretário (a)
Designação/ Aceitação
Razões da aceitação
Expectativas para o futuro
Fonte: elaboração própria dos autores.
3.2 Estratégia de análise de dados
As respostas dos(as) gestores(as) foram inseridas em uma base de dados digital, agregando-se a cada
questionário códigos de classificação relativos à edição da pesquisa (1996 ou 2006), à região do País onde se
situa o município (norte, nordeste, centro-oeste, sul ou sudeste) e ao porte populacional do mesmo (0-5, +520, +20-50, +50-200, +200 mil habitantes).
208
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Na edição de 2006, as faixas populacionais utilizadas continham um detalhamento maior que
as da pesquisa anterior, de forma a permitir o contraste mais preciso com o padrão de organização de
dados socioeconômicos e de gestão pública, adotado oficialmente em âmbito nacional pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Utilizando o Statistical Package for Social Science (SPSS) foram elaboradas tabelas, que agrupavam informações por região e por porte populacional para cada uma das questões respondidas
pelos(as) secretários(as) municipais de saúde nas duas edições da pesquisa.
Com o objetivo de inferir, de forma adequada e proporcional para o universo estudado, os
resultados amostrais descritivos sobre o perfil dos(as) gestores(as) e as características da gestão, foram utilizados os critérios empregados na análise estatística de representatividade da amostra (porte
populacional, modalidade de habilitação e região geográfica), em cujas bases foram gerados os pesos
atribuídos a cada subconjunto dos questionários respondidos.
Na fase final de análise e tratamento dos dados, as tabelas foram unificadas de forma a permitir
uma análise comparada entre os dois momentos de realização da pesquisa por região geográfica e porte
populacional, possibilitando um olhar integrado sobre o comportamento do perfil do secretário de
saúde.
4. Resultados
4.1 Perfil Socioeconômico
4.1 .1 Características Pessoais
A descentralização tem produzido um padrão mais diversificado, em termos de gênero, seguindo a tendência de expansão do espaço feminino em cargos de liderança, verificada em várias outras
áreas da gestão pública e privada. A distribuição por sexo demonstra equilíbrio, não havendo diferença significativa entre a presença feminina (50,1%) e masculina (49,2%). Esse padrão representa
uma evolução muito expressiva, na medida em que o percentual de mulheres em 1996 era de apenas
39,7%.
A presença das mulheres é maior nas regiões nordeste (54,9%) e norte (58,6%), na qual houve
aumento mais expressivo em relação ao patamar de 1996 (42,3%). A presença das mulheres também
cresceu expressivamente na região sudeste (+14,5%), apesar de ainda ser a região onde há menor percentual de secretárias municipais de saúde (45,6%).
209
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 1 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por sexo, segundo a região
do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Apesar do aumento da presença feminina em todas as regiões, essa tendência mais progressista
ainda é mais lenta nas regiões centro-oeste, sudeste e sul. Este padrão mais conservador, correlacionado com as regiões com maior poder aquisitivo, também se repete em relação aos municípios maiores.
Embora a presença feminina também tenha avançado em praticamente todos os portes, ela é bem
menor nos maiores municípios.
Em geral, a presença das mulheres como gestoras é elevada nos municípios com população até
200 mil habitantes, variando entre 53,7% nos municípios de 5-20 mil habitantes e 41,8% nos municípios de 50-200 mil habitantes. Nos grandes municípios (+200 mil hab.) a presença de mulheres é
bem menor (25,2%), apesar do enorme avanço registrado na década. Com exceção dos municípios de
0-5 mil hab., em relação a 1996, houve aumento da presença feminina em todos os portes. Os maiores
índices foram registrados nos municípios acima de 20 mil habitantes, especialmente nos municípios
de 50-200 mil hab. (+18,3%).
210
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 2 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por sexo, segundo o porte
populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A resistência a padrões mais diversificados de composição do perfil dos(as) gestores(as), verificada nas áreas de maior progresso econômico também pode ser visualizada, com mais importância, na
questão racial. A quase totalidade dos(as) secretários(as) de saúde declarou-se branco (69,3%) ou pardo
(26,4%), ocorrendo expansão desse último grupo em todas as regiões com ritmos diferenciados. Negros
(2,6%), asiáticos (0,3%) ou indígenas (0,1%) representam valores muito pequenos e não sofreram expansão significativa entre uma versão da pesquisa e outra.
A presença de pardos é maior nas regiões norte (64,9%) e nordeste (41,6%) e bem menor nas
regiões sul (7,2%) e sudeste (13,8%). Esse padrão também foi observado para 1996 e se intensificou, em
2006, com o crescimento mais expressivo dos pardos nas regiões norte e nordeste (+22,6% e +12,6%).
211
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 3 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por raça, segundo a região
do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A tendência à expansão dos que se declaram pardos é um fenômeno registrado tanto em municípios pequenos quanto médios e grandes, tendo praticamente duplicado o percentual em todos os
portes populacionais, com exceção dos municípios acima de 200 mil hab. (5,4% em 1996 para 9,4%
em 2006). Entretanto, de forma semelhante à distribuição por gênero, a diversificação do perfil em
termos de raça também esbarra no porte populacional. Em 2006, nos municípios com população
de até 50 mil habitantes havia maior presença de pardos (27,5%/0-5 mil hab., 27,5%/5-20 mil hab.
e 27,8%/20-50 mil hab.) e foi onde se registrou maior crescimento no período (+15,2%/0-5 mil
hab., +17,7%/5-20 mil hab. e +15,5%/20-50 mil hab.), ampliando os diferenciais de presença de
pardos entre os portes populacionais. Nos municípios maiores é bem menor o percentual de pardos
(18,4%/50-200 mil hab. e 9,4%/+200 mil hab.).
212
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 4 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por raça, segundo o porte
populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Apesar da tendência de crescimento da idade dos(as) gestores(as), a distribuição dos(as)
secretários(as) por faixa etária mostra bastante diversidade, com predomínio de gestores(as) jovens
na faixa até 40 anos (39,7%) ou de idade mediana entre 41 e 50 anos (36,6%), sendo menor o
grupo que possui mais de 50 anos (21,4%). O percentual de secretários(as) na faixa de 0-40 anos
diminuiu em relação a 1996, enquanto houve aumento nas faixas acima dos 40 anos.
Entre as regiões, é possível identificar três perfis etários. Um perfil em que predominam os
mais jovens (0-40 anos) e de idade mediana (40-50 anos), observado nas regiões norte e sul; outro
com prevalência de gestores(as) de idade mediana e mais elevada (acima de 50 anos), presente no
sudeste e no centro-oeste; e, finalmente, um terceiro de idade jovem e mais elevada, registrado no
nordeste.
Em 1996, era possível visualizar, grosso modo, dois padrões de perfil etário. Um com expressiva presença de gestores(as) jovens e de idade mediana, observável nas regiões norte, nordeste
e centro-oeste, e outro onde havia maior presença dos(as) gestores(as) de mais idade. No primeiro
grupo houve redução significativa de gestores(as) mais jovens em todas as três regiões. No conjunto,
213
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
as alterações da década aproximaram a região norte da estrutura etária do sul, a região centro-oeste
da estrutura do sudeste, e o nordeste desenvolveu um padrão diferente dos demais.
Possíveis explicações para o amadurecimento no perfil etário dos(as) gestores(as) podem ser
encontradas em fatores tais como a origem e capacitação. Na medida em que estão sendo recrutadas
pessoas com mais tempo de residência no município, como será visto mais à frente, a tendência
é ter menos jovens entre os(as) secretários(as), principalmente considerando que, em sua maioria,
os(as) secretários(as) vêm de outros municípios e os(as) gestores(as) estão levando mais tempo em
processos de qualificação.
Gráfico 5 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por faixa etária, segundo a
região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
214
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Mesmo assim, a concentração de secretários(as) em faixas jovens pode indicar que há renovação constante dos quadros e motivação das novas gerações para atuarem como gestores(as) locais. Por
outro lado, o crescimento da idade média dos(as) gestores(as) pode representar a necessidade de maior
preparação para o exercício do cargo. Nesse caso, a descentralização estaria conduzindo à profissionalização da gestão local, em saúde, como exigência para fazer frente a sistemas municipais cada vez mais
complexos e exigentes.
Esse processo é mais intenso ainda nos municípios maiores. Assim, enquanto nos municípios
de 0−5 mil habitantes os(as) gestores(as) com até 40 anos representam 48,4% e os(as) gestores(as) na
faixa de 40−60 anos somam 46,3%. Já nos municípios de 200 mil habitantes essa relação é de 13,5%
e 75,4%, respectivamente.
Esse padrão se intensificou desde 1996, o que indica que há relação com o aprofundamento da descentralização em todos os portes, tornando mais seletivos os critérios de entrada dos(as)
gestores(as), principalmente nas áreas mais urbanizadas, onde provavelmente os sistemas são mais
complexos e há maior competitividade. Essa tendência se evidencia com mais intensidade nos municípios acima de 200 mil habitantes, onde houve expressiva redução de secretários(as) nas faixas até 40
anos (-16,2%) e de 41 a 50 anos (-12%) e amplo crescimento na faixa acima de 50 anos (+26,6%).
Estes dados levam a crer que a renovação provocada pelo início do processo de descentralização
tenha sido maior, como parte da renovação democrática das elites dirigentes. Durante a década estudada, o arrefecimento deste padrão etário jovem, em especial nos grandes municípios, indica tanto a
profissionalizarão dos(as) gestores(as) como a geração de uma elite dirigente mais estável.
215
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 6 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por faixa etária, segundo o
porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Os(as) secretários(as) municipais de saúde seguem sendo, em sua grande maioria, casados(as)
ou pessoas que vivem com companheiros(as) (74,6%), não havendo alterações significativas em relação ao patamar de 1996 (77,3%).
4.1.2 Origem social
Os(as) secretários(as) municipais de saúde são atores sociais produto de um processo de intensa
mobilidade geográfica, uma vez que mais da metade (64,3%) nasceu em município diferente daquele
em que atua profissionalmente. Essa característica apresentou pouca alteração entre os anos comparados (1996−2006) no conjunto nacional, com pequena ampliação do percentual dos(as) secretários(as)
que atuam no município onde nasceram (+2,2%).
216
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Mais da metade dos(as) secretários(as) municipais de saúde nasceu em município diferente
daquele em que atua como secretário de saúde (64,3%), não havendo alteração significativa em relação a 1996 (67,5%). Essa característica é mais acentuada no centro-oeste (74%) e norte (71,7%),
região esta na qual se registrou redução expressiva dos(as) gestores(as) recrutados em outros municípios em relação a 1996 (-10,4).
Gráfico 7 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por município de nascimento, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O recrutamento de profissionais originários de outro município pode indicar que os critérios de seleção
para o cargo não sejam os de parentesco ou filiação a grupos locais, políticos e corporativos tradicionais.
Esses critérios não estão relacionados à importância do município, sendo verificados percentuais elevados em todos os portes, com significativa redução da tendência nos municípios com população acima de 200
mil habitantes (78,4% para 60,6%) em relação a 1996.
217
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 8 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por município de nascimento, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Além da origem externa ao município onde atuam, os(as) secretários(as) são produto de um
processo de forte ascensão social, uma vez que quase a totalidade provém de famílias cuja mãe ou o pai
possuem primário (42,4%), antigo ginásio (17,7%) ou com ensino médio (17,5%). É baixo o percentual de secretários(as) com pais sem escolaridade (6,3%) ou com nível superior (10,8%) e pós-graduação
(3,6%). As transformações da década não alteraram as condições de recrutamento para o cargo, com
pequeno crescimento dos(as) secretários(as) que são filhos(as) de pais com ensino médio, superior e pósgraduação.
Tomando como ponto de corte o grupo cujos pais tinham ensino fundamental, que abrange
66,4% dos(as) gestores(as), não se verifica variação significativa entre as regiões, exceto na região norte,
onde há mais secretários(as) com pais que possuem até o fundamental (77,7%) e, consequentemente, é
menor o número daqueles(as) com pais com escolaridade acima do fundamental (22,3%). Essa diferença
é produto do aumento de secretários(as) com pais sem escolaridade na região em 2006, e da redução dos(as)
gestores(as) com pais com ensino médio. Nas demais regiões não foram observadas variações desde 1996.
Neste sentido, a ascensão social é ainda mais acelerada na região norte que nas demais do País.
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R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 9 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por maior grau de instrução
do pai ou da mãe, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Novamente a hipótese de uma elite em ascensão social é reafirmada, o que demonstra que a
descentralização proporciona maior democratização dos espaços de exercício de poder, antes tradicionalmente ocupado por atores cuja origem familiar era predominantemente encontrada entre os
econômica e socialmente mais favorecidos.
Esse padrão encontra variações importantes, no entanto, apenas em relação ao porte populacional dos municípios. De forma geral, quando se estabelece o ensino fundamental como ponto
de corte para análise, verifica-se que a correlação é bastante evidente. Em 2006, enquanto nos
municípios de até 5 mil habitantes a relação entre os pais que possuem até o ensino fundamental
e os que possuem maior grau de instrução é de 71,6% e 25,6%, nos municípios maiores de 200
mil essa relação é de 47,6% e 49,2%, respectivamente. Já nas faixas populacionais intermediárias
a relação varia de forma inversamente proporcional ao tamanho. Esse padrão não sofreu alterações
em relação a 1996.
Essa evidência pode indicar que nos municípios maiores o maior nível de educação dos pais
pode representar a base de inserção social e de formação de redes sociais e políticas, necessárias
219
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
como apoio para galgar posições institucionais mais elevadas. Famílias de menor grau de instrução
teriam menor probabilidade de oferecer tais bases.
Novamente, configura-se maior mudança nos municípios menores, maiores beneficiários do
processo de descentralização.
Gráfico 10 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por maior grau de instrução
do pai ou da mãe, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.1.3 Situação Atual
Embora sejam, em sua maioria, recrutados(as) fora do município, os(as) secretários(as)
demonstram engajamento social local nos municípios, uma vez que grande parte deles(as) reside no
município em que exerce sua função (82,5%), especialmente nas regiões norte (97,3%) e centro-oeste
(95,5%). Essa parece ser uma tendência duradoura porque se mantém praticamente em todas as regiões com o aprofundamento da descentralização do SUS.
220
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 11 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por município de residência, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Isso pode indicar que a dinâmica do cargo exige a necessidade de elevado conhecimento da
realidade local, sem a qual se torna muito difícil fornecer respostas adequadas aos problemas cotidianos de gestão. Por outro lado, uma consequência da descentralização é aumentar a oferta de atrativos
para que profissionais mais qualificados sejam trazidos para o interior, criando ali condições para seu
enraizamento.
A relação mais próxima do(as) secretário(as) com a comunidade é um requisito essencial de
ocupação do cargo, independentemente do porte do município. O mesmo percentual elevado se observa em todos os portes e não houve mudanças significativas em relação ao padrão de 1996, exceto
na região norte, onde ocorreu aumento dos(as) secretários(as) que residem no município (+11,4%).
221
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 12 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por município de
residência, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A hipótese de elevado enraizamento local adquire maior sustentabilidade quando se verifica
que 74,5% dos(as) gestores(as) residem no município por mais de 10 anos e que esse percentual é
crescente em relação a 1996, em todas as regiões do País. O processo de descentralização exige cada
vez mais gestores(as) comprometidos(as) com o conhecimento da realidade local, tendência essa que
é mais intensa nas regiões mais desenvolvidas do País. Os municípios dessas áreas possuem realidades
sociais e políticas mais diversificadas, além de sistemas de saúde mais complexos.
222
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 13 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por tempo de residência
no município em que atuam, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Da mesma forma, nos municípios maiores onde a urbanização e o sistema de saúde são mais
complexos é maior o percentual de secretários(as) com mais de 10 anos de residência, corroborando
a tese de que sistemas locais mais complexos exigem gestores(as) mais enraizados na realidade local.
Além do que, as regiões mais desenvolvidas oferecem mais oportunidades de ascensão, o que representa um espaço de atração mais forte para permanência. Isso reforça a tese de uma estabilidade da elite
em ascensão socioeconômica.
223
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 14 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por tempo de residência
no município em que atuam, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.1.4 Renda
Em 2206, mais da metade (61,9%) dos(as) secretários(as) ganhava até R$ 2.000,00, uma parte significativa (17,4%) situava-se na faixa de R$ 2.000,00 a R$ 3.000,00 e um grupo menor tinha salários acima de
R$ 3.000,00 (12,9%). Em termos nacionais, esse padrão não apresentou modificações desde 1996.
Tais níveis salariais, quando comparados com a remuneração de mercado, não representam ganhos
financeiros significativos, o que pode indicar que o exercício do cargo representa algo mais do que uma atrativa
fonte de renda e/ou permite obtenção de fonte complementar de renda.
Na região norte, em relação à média nacional, havia mais secretários(as) com salários até R$ 2.000,00
(72,6%) e menos com salários acima de R$ 3.000,00 (5,8%), enquanto na região centro-oeste foi menor o
contingente de gestores(as) com salários até R$ 2.000,00 (52,4%) e maior com salários entre R$ 2.000,00
a R$ 3.000,00 (26,2%). Na região sudeste está o maior contingente de gestores(as) com renda acima de R$
3.000,00 (15,0%). Exceto a expansão significativa, ocorrida no percentual de gestores(as) com salários até R$
2.000,00 (50,9% para 61,9%) na região sudeste, não houve alterações importantes na distribuição regional.
224
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 15 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por faixa salarial, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Obviamente que, no interior das regiões, quando se comparam os níveis salariais entre os
municípios com portes populacionais diferentes, verificam-se grandes desequilíbrios de remuneração, apesar das semelhanças apresentadas quanto à ascensão no quesito educacional. Nesse sentido, o
maior nível educacional das famílias dos(as) secretários(as) dos municípios de grande porte populacional parece ser um diferencial em situações de maior competitividade.
As diferenças apresentadas também em relação aos aspectos de gênero e raça indicam que os
grandes municípios brasileiros, onde há maior competitividade por posições mais bem remuneradas,
tendem a serem mais conservadores no seu padrão de recrutamento, apresentando menor diversidade
no perfil dos(as) gestores(as).
Há diferenças expressivas entre municípios maiores e menores, que cresceram entre as duas edições da pesquisa. Em 2006, nos municípios com 0-5 mil e 5-20 mil habitantes, grande parte dos(as)
secretários(as) ganhava até R$ 2.000,00 (85,7% e 73,0%, respectivamente). Esses contingentes eram
bem menos expressivos em 1996 (43,2 e 49,4% respectivamente). Essa mudança acarretou redução
expressiva de secretários(as) com ganhos nas faixas superiores.
225
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Em 2006, nos municípios com 20-50mil habitantes mais secretários(as) estavam na faixa de R$
2.000,00 a R$ 3.000,00 e menos acima de R$ 3.000,00. Por sua vez, nos municípios de 50-200 mil
habitantes, havia mais secretários(as) na faixa de 2.000,00 a R$ 3.000,00 e menos na faixa até 2.000,00.
Por outro lado, nos municípios com mais de 200 mil habitantes, quase a totalidade (89,0%)
dos(as) secretários(as) tinha, em 2006, remuneração acima de R$ 3.000,00, o que representa um crescimento expressivo em relação ao patamar de 1996 (66,6%).
Em síntese, entre as duas edições da pesquisa, houve aumento expressivo da diferença salarial
entre gestores(as) dos municípios menores e maiores. Nos municípios com até 50 mil habitantes, ocorreu crescimento do percentual de secretários(as) com salários nas faixas menores e redução nas faixas de
maior valor monetário, ocorrendo o contrário com os municípios com mais de 50 mil habitantes.
Gráfico 16 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por faixa salarial, segundo o
porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Consequentemente, os(as) secretários(as) de municípios menores buscaram fontes de renda
adicionais para compensar a defasagem em relação aos municípios maiores. Entretanto, essa é uma
prática observável em todos os portes e regiões do País.
226
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Em 2006, parte expressiva (59,3%) dos(as) secretários(as) possuía outra fonte de renda além
do salário do cargo, distribuída entre os que a obtêm somente na área pública (23,9%), somente na
área privada (23,9%) ou em ambas (11,5%). Em 1996, havia mais secretários(as) com renda extra
(75,3%), sendo a redução provocada pela significativa queda entre os que possuem renda extra em
ambas as esferas em relação ao patamar de 1996 (-15,3%). Nas demais categorias não houve variação.
Na região sul, desde 1996, há menos(as) secretários(as) com renda extra (31,6%), menos ainda
em 2006 (48,8%). Nas regiões norte e nordeste, o setor público é a fonte principal de renda extra
(37,2% e 41,2%), ao passo que nas demais regiões a ênfase é no setor privado (36,7% no centro-oeste,
32,1% no sudeste e 28,8% no sul). É importante ressaltar que na região centro-oeste, o setor privado
cresceu significativamente como fonte de renda extra em relação ao patamar de 1996 (+12,8%).
Gráfico 17 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por fonte adicional de
renda, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
227
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A tendência de concentração de rendimentos se acentua quando se analisa a distribuição por porte e se verifica que, quanto maior o município maior é o conjunto de secretários(as) que possui outra fonte de renda, especialmente os(as) que possuem outra fonte privada ou de dupla natureza. Obviamente,
nos grandes municípios são maiores as oportunidades de trabalho, principalmente quando se considera
o elevado grau de concentração da oferta em saúde no Brasil.
Assim, o percentual de secretários(as) que possui outra fonte de renda cresce com o porte populacional dos municípios, indo de 47,4% nos municípios com 0-5 mil habitantes a 67,1% naqueles
com mais de 200 mil habitantes. Cabe registrar que, nos municípios com 50-200 mil habitantes, esse
percentual é ainda maior (70,2%).
Também há correlação entre porte e o fato de possuir renda extra de fonte privada, uma vez que
o percentual varia de 20,2% nos municípios de até 5 mil habitantes a 36,3% nos municípios entre 50 e
200 mil�. Da mesma forma, há correlação entre renda extra de dupla natureza (pública e privada) e porte
do município: o índice vai de 9,7% nos menores (até 5 mil habitantes) até 22,7% nos maiores (acima de
200 mil habitantes). O padrão de variação em relação ao porte é o mesmo de 1996.
Gráfico 18 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por fonte adicional de renda, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
228
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Consolida-se, desta forma, um padrão de remuneração da nova elite política, que inclui elevada
diferenciação entre os(as) gestores(as), de acordo com o porte do município, o que poderia ser justificado pela complexidade inerente aos maiores municípios assim como pelo valor do custo de vida.
Mas, para além da diferenciação no valor da remuneração, estabelece-se um padrão mais consolidado
de acordo ao maior tamanho do município, que envolve também a estruturação de uma relação simbiótica entre público e privado na gestão da saúde, já que o(a) gestor(a) tende a receber sua renda dos
dois setores concomitantemente.
4.2 Perfil Profissional
4.2.1 Qualificação
O grau de instrução dos(as) secretários(as) municipais de saúde tem crescido ao longo do processo de implantação do SUS, o que pode significar que a descentralização esteja impulsionando a
qualificação dos(as) gestores(as). À medida que mais responsabilidades e recursos são transferidos aos
municípios, a gestão dos sistemas locais de saúde tem se tornado mais complexa e exige maior preparação. A grande maioria possui superior completo (29,8%) ou pós-graduação� (37,5%), sendo menor
o grupo com apenas ensino médio, primário ou ginásio (31,4%).
Em comparação com o padrão encontrado em 1996, boa parte dos(as) secretários(as) com graduação, que somavam 68,8% do total, avançaram na pós-graduação�. Por outro lado, o contingente de
secretários(as) com apenas ensino médio também aumentou em todas as regiões, embora em pequena
proporção.
Novamente, é possível distinguir três padrões de composição de escolaridade. O primeiro observado na região norte e caracterizado pela predominância de gestores(as) com ensino médio e graduação; o segundo padrão presente nas regiões centro-oeste e sul, com maior presença de gestores(as)
com ensino médio e pós-graduação e, finalmente, o padrão mais qualificado de gestores(as) com
graduação e pós-graduação que caracteriza as regiões sudeste e nordeste.
229
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 19 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por grau de instrução,
segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Evidencia-se que quanto maior o porte maior o nível de instrução dos(as) gestores(as). Os(as)
gestores(as) com ensino médio representam quase a metade nos municípios menores (45,0% - 0-5
mil hab.) e apenas 1,6% nos municípios com mais de 200 mil habitantes. Por outro lado, os(as)
gestores(as) com pós-graduação, mestrado ou doutorado ocupam mais espaço com o crescimento do
porte do município, indo de 18,5% (0-5 mil hab.) a 62,7% (+ 200 mil hab.).
Novamente, é possível supor que nas áreas de maior urbanização existem melhores condições
de aperfeiçoamento e maior demanda por profissionais com nível mais elevado de instrução em geral;
portanto, os(as) secretários(as) necessitam ser mais qualificados e possuir mais oportunidades para
tal. Em todos os portes houve aumento dos(as) gestores(as) com ensino médio e pós-graduação em
contrapartida à queda do percentual de gestores(as) com ensino primário, médio e graduação. Isso
pode demonstrar que o acesso ao cargo leva cada vez mais em conta critérios meritocráticos, em contraposição a outros fatores de natureza patrimonial e clientelista.
230
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 20 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por grau de instrução,
segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A ampliação do grau de qualificação é concomitante à diversificação de especializações na formação dos(as) gestores(as). O padrão tradicional, onde predominam profissões da área de saúde, cedeu lugar a outras áreas de formação, diversificando o perfil dos(as) gestores(as) em termos de matriz
de composição profissional.
Em 2006 encontramos que quase a metade dos(as) secretários(as) municipais é formada
na área de saúde (44,9%), sendo 11,2% médicos. Os(as) secretários(as) com formação na área de
administração somam 10,1%, os(as) funcionários(as) públicos(as) 10,3% e os da área de ciências
humanas representam 10,2%. As demais áreas não informadas somam 19,2%. Em relação a 2006,
houve redução significativa da presença de médicos(as) (-20,0%) e expansão das demais áreas não
informadas (+12,1%). Essa mudança ocorreu em todas as regiões e portes populacionais.
Não há padrões visíveis de aproximação e diferenciação de regiões. De forma geral, as regiões
centro-oeste e sul possuem menos profissionais nas áreas de saúde, incluindo médicos(as), e mais
administradores(as), funcionários(as) públicos(as), empresários(as) e outros profissionais. Nas demais
regiões há composições diferentes.
231
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 21 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por profissão, segundo a
região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O crescimento do caráter multidisciplinar na gestão local em saúde avança mais nos municípios
de menor porte. O percentual total dos(as) gestores(as) com formação nas áreas de saúde aumenta de
33,0% nos municípios de 0-5 mil habitantes a 64,5% nos municípios com mais de 200 mil habitantes. Nos municípios menores (até 5 mil habitantes) apenas 3,1% dos(as) gestores(as) são médicos(as),
enquanto nos maiores (+200 mil hab.) esse índice sobe para 48,4%. Essa diferença pode refletir a
desigualdade de distribuição dos profissionais médicos no território nacional, concentrados nas áreas
de maior urbanização e em atividades de mercado. Da mesma forma, repete-se aqui o padrão conservador e menos diversificado no recrutamento dos maiores municípios, onde a elite gestora de saúde é
menos diversificada em relação aos pequenos e médios municípios.
As demais profissões da área de saúde ocupam espaço crescente entre os municípios até 50
mil habitantes (0-5 mil/29,9%; 5-20 mil/35,7% e 20-50 mil/36,7%), mas perdem lugar para os(as)
médicos(as) daí em diante, reduzindo o percentual (50-200 mil/28% e +200 mil/16,1%). A diversificação de expertises e aportes de matrizes de conhecimento, apesar da ampliação observada em relação
a 1996, ainda encontra barreiras à expansão nos espaços onde há maior disputa de poder, notadamente os municípios com mais de 200 mil habitantes.
232
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
O peso dos(as) secretários(as) que são das áreas de ciências humanas e administração ou são
funcionários(as) públicos não apresenta variação tão significativa com o porte, diferentemente do que acontece com outras áreas não identificadas, que reduzem à medida que se aumenta o porte. Ainda em relação a
1996, houve a uniformização da presença das áreas de ciências humanas e administração, que apresentavam
variação decrescente com o porte.
Gráfico 22 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por profissão, segundo o porte
populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A tese de uma elite mais qualificada e com formação multidisciplinar é confirmada quando se observa a formação específica para o exercício do cargo de secretário municipal de saúde. Em relação a 1996,
houve crescimento do percentual de gestores(as), que se especializaram em quase todas as áreas de conhecimento sob consulta e houve redução dos que não apresentavam nenhuma qualificação para o cargo.
Em termos gerais, a maioria tem feito capacitação específica para o exercício do cargo (67,6%),
com destaque para as áreas de saúde pública (39,7%), planejamento (25,6%), legislação (14,9%), recursos
humanos (18,1%), finanças públicas (14,8%) e orçamento (14,7%). Os(as) secretários(as) com capacitação
específica para o exercício do cargo são mais numerosos(as) no sudeste (68,8%) e menos no norte (56,3%).
233
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
É possível afirmar também que os(as) secretários(as) estejam buscando formação em mais de uma
área, pois o somatório dos que fizeram cursos específicos ultrapassa os 100%. Da mesma forma, a diversificação é bastante clara, tendo em vista que o crescimento registrado foi menor nas áreas tradicionais de
planejamento e saúde pública e maior nas demais, com exceção dos que fizeram cursos em legislação.
A tendência de crescimento e diversificação da qualificação é observável em todas as regiões do
País, com maior intensidade no sudeste. Na região norte encontra-se o menor conjunto de secretários(as)
qualificados em geral (43,7%) e de forma específica nos cursos de saúde pública (19,4%), finanças (7,9%),
orçamento (7,7%) e outros (8,0%).
Em relação a 1996, enquanto nas demais regiões houve crescimento de secretários(as) qualificados
(as) em todas as modalidades, exceto recursos humanos (20,6% em 1996 para 18,1% em 2006), na região
norte houve pequena redução dos que se qualificaram no geral (-4%) e, especificamente, em saúde pública
(-17,8%). Nos demais cursos o crescimento foi quase insignificante, exceto em legislação (+11,5%).
Gráfico 23 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por capacitação específica para
exercer o papel de dirigente, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
234
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Novamente o porte do município influencia a intensidade da tendência verificada. De forma
geral, houve crescimento e diversificação da qualificação em todos os portes, com exceção da área de
recursos humanos.
Como resultado, quanto maior o porte do município maior o percentual de secretários(as) com
capacitação para exercer o cargo, indo de 57,9% nos municípios menores (0-5 mil hab.) a 84,8% nos
municípios de 50-200 mil hab. Nos municípios maiores (+200 mil hab.), o percentual é um pouco
menor (79,7%).
Essa correlação é mais expressiva ainda nas áreas de conhecimento de maior destaque entre
os(as) secretários(as). Se nos municípios menores (até 5 mil habitantes), 33,5% tinham formação em
saúde pública e 22,4% em planejamento, nos municípios maiores (+ 200 mil hab.) os índices sobem
para 49,2% e 35,2%, respectivamente.
Esse padrão se repete para os(as) secretários(as) que possuem formação em legislação, finanças
e orçamento e outras áreas não informadas. Os municípios maiores de 200 mil habitantes apresentam percentuais mais elevados de capacitação, quando comparados aos médios (50-200 mil hab.),
somente para os grupos de secretários(as) com cursos de saúde pública e planejamento. Esse padrão,
caracterizado pela ampliação da qualificação vinculada ao porte, não apresentou alteração significativa
em relação a 1996, observando-se crescimento dos(as) gestores(as) qualificados em todos os portes,
exceto nos municípios com mais de 200 mil habitantes. Esse crescimento foi maior nos municípios
com população de 50 a 200 mil habitantes.
Esta maior expansão da qualificação em municípios de porte médio em relação aos grandes
municípios pode indicar um ciclo de qualificação que começa nos maiores municípios e tende a se
espraiar para os demais, como em outros processos de inovação.
235
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 24 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por capacitação específica para
exercer o papel de dirigente, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.2.2 Trajetória Profissional
A experiência de trabalho é um requisito importante para o acesso ao cargo de secretário(as)
municipal de saúde, mas não é um fator determinante, na medida em que é crescente o percentual de
secretários(as) que nunca havia trabalhado na área antes. Essa constatação reforça a tese de uma elite
diversificada que absorve cada vez mais gestores(as) com outras formações profissionais, além das áreas
tradicionais de ciências da saúde.
Por outro lado, o fato de 73,8% dos(as) secretários(as) ter declarado possuir experiência anterior em saúde demonstra que, mesmo sendo um recrutamento aberto aos profissionais de outras áreas,
a profissionalização e o conhecimento do setor seguem sendo um requisito essencial de exercício do
cargo. No centro-oeste está o maior percentual de gestores(as) com experiência anterior (79,1%) e, no
236
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
sul, o menor (68,5%). Somente na região nordeste houve redução significativa de secretários(as) com
experiência anterior na área (89,9% para 74,7%).
Gráfico 25 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior
na área de saúde, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quanto maior o porte do município maior é a presença de secretários(as) que já havia trabalhado antes
na área de saúde, passando de 67,2% nos municípios de 0-5 mil habitantes a 89,0% nos municípios com mais
de 200 mil hab. Assim, nos municípios de maior porte e com sistemas mais complexos prevalece o padrão
mais tradicional, onde a experiência anterior na área é um fator que possui mais peso para o acesso ao cargo
de gestor(as).
Em relação a 1996, em todos os portes houve pequena redução do percentual de secretários(as) com
experiência prévia em saúde, exceto nos municípios de 0-5 mil habitantes, cujo aumento da exigência de experiência anterior na área pode indicar um requerimento de maior qualificação específica do gestor(as).
237
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 26 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior na
área de saúde, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Da mesma forma que a experiência anterior na área, a ocupação de cargo de direção, seja ou
não na área de saúde, é cada vez mais importante para o acesso ao cargo, o que indica que a diversificação do perfil tem sido acompanhada de profissionalização do gestor(as). Mais da metade dos(as)
secretários(as) (64,6%) já exerceu a direção de órgão público antes de assumir o cargo, sendo 37,8%
somente na área de saúde, 13,3% em outras áreas e 13,5% na saúde e em outras áreas. Esse quadro
não apresentou mudanças significativas na década, observando-se pequeno crescimento em relação
aos patamares de 1996.
A presença de secretários(as) que já exerceram a direção de órgão público é menor no sudeste
(59,1%) e maior nas regiões norte (78,4%) e nordeste (69,8%), especialmente dos que já exerceram
direção somente na área de saúde (43,0% norte e 44,6% nordeste). Na região norte também estão
mais presentes, em relação à média nacional, os(as) secretários(as) com experiência prévia de direção
somente em outras áreas (20,7%). Não há variações regionais na presença de secretários com experiência prévia de direção tanto na área de saúde quanto em outras áreas. Em relação a 1996, houve
crescimento expressivo de gestores(as) com experiência prévia na região norte (+15,7%).
238
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Na medida em que houve o aprofundamento do processo de descentralização com a transferência de mais atribuição e recursos para a esfera local, a função de secretário(as) exige mais conhecimento
e experiência, especialmente em direção. Mas, é interessante notar que a experiência em direção de
órgão público na área de saúde, embora seja um elemento importante, também não é determinante
para o acesso ao cargo.
Gráfico 27 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior
em direção de órgão público, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
239
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quanto maior o porte do município, maior o percentual de secretários(as) com experiência
prévia de direção em órgão público, variando entre 46,4% nos municípios menores (0-5mil hab.)
a 92,9% nos municípios maiores (+200 mil hab.). O mesmo ocorre com os(as) secretários(as) que
possuem experiência prévia em direção somente na área de saúde (23,9%/0-5 mil a 57,4%/.+200 mil
hab.). Cabe destacar que nos municípios com mais 200 mil habitantes, em relação à média nacional,
é menor a presença de secretários(as) com experiência de direção somente em outras áreas (7,9%) e
maior dos que possuem experiência tanto em saúde quanto em outras áreas (27,6%).
Assim, nos municípios de maior porte, que possuem um padrão menos diversificado quanto
ao perfil do gestor e cujos sistemas de saúde são mais complexos de se gerenciar, a experiência em
direção é importante para qualificar o gestor(as), seja na área de saúde seja em outras áreas da administração pública. Isso porque nos municípios com mais de 200 mil habitantes, houve redução dos(as)
gestores(as) com experiência prévia somente em saúde (-10,2%) e aumento dos(as) gestores(as) com
experiência tanto em saúde quanto em outras áreas (+11,4%). Nesses municípios são poucos os que
chegaram ao cargo de secretário(a) municipal sem passar por outras experiências de direção em órgão
público, assim como são cada vez mais numerosos(as) os que já atuaram na direção de outras áreas.
Em relação a 1996, houve expressivo aumento de gestores(as) com experiência prévia como
dirigentes de órgãos públicos, nos municípios de 5-20 mil habitantes (+10,3%), 20-50 mil hab.
(+12,5%) e 50-200 mil hab. (+16,0%).
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R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 28 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior
em direção de órgão público, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O exercício prévio do cargo de secretário(as) não é essencial ao recrutamento, o que ratifica a
tese de uma elite em ascensão política e com elevado grau de renovação de seus quadros. Do universo
pesquisado, 76,2% dos(as) secretários(as) municipais de saúde não tinham ocupado anteriormente
este cargo, com poucas variações regionais, especialmente no norte (81,7%) e no nordeste (72,4%).
Em relação a 1996, houve pouca expansão dos(as) secretários(as) com experiência prévia no cargo no
universo nacional (+7,3%) e um pouco mais na região nordeste (+10,4%).
241
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 29 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior como
Secretário de Saúde, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A experiência prévia como secretário(as) é um pouco mais valorizada nos municípios maiores,
onde a competição é maior e esse atributo pode ser um elemento diferencial. Nos municípios menores
(0-5 mil hab.), os(as) gestores(as) que já haviam sido secretários(as) em outra ocasião representavam
apenas 17,2%, enquanto nos municípios com população entre 50 e 200 mil habitantes esse percentual atingiu 30,2% em 2006, observando-se pequeno declínio do percentual nos municípios maiores
de 200 mil habitantes (28,3%).
Em termos gerais, em relação a 1996, em todos os portes houve aumento do percentual de
secretários com experiência prévia no cargo, com destaque para os municípios de 50-200 mil habitantes (+13,8%). É possível supor que o fato de ser secretário(as) possa projetar o gestor(as) para
oportunidades políticas maiores, o que poderia explicar o pequeno percentual dos(as) gestores(as) que
retornam ao cargo.
242
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 30 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior como
Secretário(a) de Saúde, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O conhecimento da máquina pública permanece sendo um requisito importante para o exercício do cargo. A grande maioria dos(as) secretários(as) era funcionário da esfera pública (67,2%)
antes de assumir o cargo, sendo que um contingente menor era profissional autônomo(a) (22,9%),
funcionário(a) da esfera privada (18,9%) ou empresário(a) (13,1%).
Em relação a 1996, houve expressiva redução dos(as) secretários(as) que eram profissionais
autônomos(a) (-15,8%), observada em todas as regiões e portes populacionais, o que deve estar em
correspondência com as mudanças no mercado de trabalho. Também chama a atenção o elevado percentual dos(as) gestores(as) públicos que se identificam como oriundos do setor privado, num total
de 32,0%. Este dado também corrobora a tese dos vínculos entre setores públicos e privado no SUS.
Em relação à média nacional, os(as) gestores(as) que são funcionários(as) públicos(as) são mais
numerosos no norte (77,4%) e nordeste (76,7%) e menos no sul (59,3%). Já os(as) que são profissionais autônomos possuem maior presença no sudeste (27,9%) e no centro-oeste (26,7%) e menor no
norte (15,3%). Finalmente, os(as) empresários(as) possuem maior destaque no centro-oeste (21,0%)
e menor no norte (9,4%) e no nordeste (7,8%).
243
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
O processo de profissionalização dos(as) gestores(as) parece incluir, necessariamente, uma trajetória
que contemple o domínio das especificidades da administração pública, requisito essencial à construção de
estratégias viáveis de execução de políticas e programas governamentais.
Em relação a 1996, essa tendência se intensificou principalmente nas regiões norte, nordeste e centrooeste. No entanto, em 2006, no sul e no sudeste houve expansão dos as) funcionários(as) do setor privado,
entre os quais, boa parte não é do setor saúde. Ou seja, onde existe um mercado mais dinâmico em saúde
existe uma tendência de que este forneça mais gestores(as) para a área pública.
Em relação a 1996, esse padrão não apresentou muitas alterações importantes, exceto dos funcionários(as)
públicos(as) no sudeste (-9,9%) e de profissionais autônomos em todas as regiões (média de -14,2%).
Gráfico 31 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por situação profissional
anterior ao cargo de Secretário(a) de Saúde, segundo a região do País� − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O tamanho do setor saúde não atua no sentido de permitir que mais funcionários(as) da esfera
privada tenham acesso ao exercício do cargo de secretário(a), reduzindo o espaço dos funcionários(as)
públicos(as). Em geral, quanto maior o porte populacional do município maior o percentual de
secretários(as) que são funcionários(as) públicos(as) (63,4%/0-5 mil hab. a 77,2%/+200 mil hab.) ou
244
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
profissionais autônomos(as) (17,0%/0-5 mil hab. a 30,7%/+ 200 mil hab., sendo 40,7%/50-200 mil hab.)
antes de se tornarem secretários(as) de saúde. Para as categorias de proprietário/empresário e funcionário da
esfera privada não foram observadas variações significativas em relação ao porte do município.
Esse fato pode indicar que a crescente institucionalidade do SUS, que aumenta com o porte dos
municípios, representa um filtro de seleção para o exercício do cargo, sendo mais permeável àqueles que
estão, há mais tempo, familiarizados com a política de saúde.
Gráfico 32 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por situação profissional anterior ao cargo de Secretário(as) de Saúde, segundo o porte populacional dos
municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quando assumem o cargo, grande parte dos(as) secretários(as) municipais permanece
desempenhando atividades profissionais fora de sua função (44,2%). Há variações regionais
importantes: é maior a presença dos que realizam atividades adicionais ao cargo na região
centro-oeste (56%) e menor nas regiões norte (32,5%) e sul (34,6%). Não há informações para
comparação em relação a 1996.
245
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 33 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por realização de atividades extra secretaria, segundo a região do País� − 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O tamanho do setor saúde não interfere no tempo de dedicação do gestor(a) às atividades
exclusivas da função. Pelo contrário, nos municípios menores (até 5 mil habitantes), o percentual
de secretários(as) que se dedicam a atividades extra secretaria (34,4%) é menor do que nos grandes
municípios (55,1%/+200 mil hab.). Esse percentual é maior ainda nos municípios de 50-200 mil
hab. (58,6%).
Não há informações correspondentes na edição de 1996 da pesquisa. Embora sem dados
que permitam a comparação durante a década estudada, este dado, associado ao grande número
daqueles(as) que se identificam como empresários(as) ou profissionais da esfera privada, pode indicar que, mesmo atuando como gestor(as) do sistema, o dirigente não deixa de exercer atividades
privadas.
246
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 34 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por realização de atividades extra secretaria, segundo o porte populacional dos municípios − 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.3 Trajetória política e vida pública
Além de significativa inserção na máquina pública e forte enraizamento local, o engajamento
político-partidário consiste em um elemento importante na definição dos(as) secretários(as) municipais de saúde como elite local. Mais da metade dos(as) secretários(as) é filiado a algum partido político
(60,4%), não havendo diferença significativa em relação ao patamar de 1996, no âmbito nacional
(62,3%).
Nas regiões centro-oeste (78,9%) e sul (69,8%) são maiores os índices de filiação partidária,
em contraposição com a região sudeste (52,1%) onde está o menor contingente de secretários(as)
filiados(as).
Em termos regionais, em relação a 1996, entretanto, houve diferenças significativas com ampliação dos(as) secretários(as) filiados(as) a partido no norte (+6,4%) e nordeste (+4,8%), e especialmente centro-oeste (+13,4%) e redução no sudeste (-6,7%) e sul (-3,2%). Como resultado, no centrooeste e no sul, os(as) secretários(as) possuem maior tendência à filiação partidária (78,9% e 69,8%,
respectivamente), em contraste com o sudeste (52,1%).
247
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 35 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por filiação a algum
partido político, segundo a região do País −1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Essa constatação leva à hipótese de que os(as) secretários(as) municipais de saúde constituem-se
em uma elite situada entre a burocracia setorial, a elite profissional e a elite política local, uma vez que,
como já exposto acima, eles possuem também inserção local de médio prazo e, em sua maioria, são
recrutados(as) entre funcionários(as) que possuem carreira no serviço público.
Não se verifica, em geral, relação entre porte populacional do município e filiação partidária
dos(das) secretários(as), sendo apenas mais baixa nos municípios considerados médios, ou seja, de 20
a 50 mil habitantes (49,9%) e de 50 a 200 mil (51,6%). Em relação a 1996, houve decréscimo significativo de filiação nesses dois extratos populacionais (-11,4% e -14,4%, respectivamente).
248
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Se, nos municípios de médio porte, a filiação partidária é menos importante para o acesso e
exercício do cargo, isso pode indicar a predominância de um padrão mais técnico de gestão, ou, ao
contrário, que o recrutamento seja feito em base em vínculos pessoais. A hipótese de maior importância da capacidade profissional parece mais consistente ao se cotejarem estes dados com aqueles
referentes à crescente exigência de qualificação dos(as) gestores(as).
Gráfico 36 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por filiação a algum partido político, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A diversidade da formação do perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde está presente também, e cada vez mais, na natureza da filiação partidária. Quase a metade (40,2%) dos) secretários municipais de saúde é filiada a partidos de centro, 31,8% a partidos de direita e 20,2% a partidos de esquerda�.
249
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A filiação a partidos de esquerda é maior na região sudeste (25,5%) e menor na região centrooeste (14,4%), enquanto nos partidos de direita a filiação é maior no centro-oeste (37,3%) e menor
no sudeste (25,3%). Já, em relação aos partidos de centro, há maior filiação no centro-oeste (45,3%)
e menor no norte (33,9%).
Em relação a 1996, houve transformações importantes. Enquanto em todas as regiões houve
aumento da filiação aos partidos de esquerda, especialmente no norte (+13,5%) e sudeste (+16,2%),
no centro-oeste houve estagnação (-0,5%). Cabe também destacar a expressiva redução da filiação aos
partidos de direita no nordeste (-12,0%) e no sudeste (-10,0%). Em geral, PFL, PP e PMDB foram
os que mais perderam filiação e PT e PL os que mais receberam filiação, o que mostra que a política
local tende a acompanhar a liderança política nacional.
Gráfico 37 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde filiados a algum partido
político por legenda partidária, segundo a região do País − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
250
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Quanto maior o porte menor é o índice de filiação aos partidos de direita, variando entre
36,0% nos municípios com 0-5mil hab. e 18,3% nos com mais de 200 mil hab. Essa tendência linear
não se verifica na filiação a partidos de esquerda e centro, exceto nos grandes municípios (+200 mil
hab.) onde, em relação à média nacional, há maior filiação a partidos de esquerda (48,0%) e menor
a partidos de centro (21,1%). Esse padrão não apresentou variações significativas em relação a 1996.
Cabe ressaltar que os deslocamentos de filiação ocorridos na composição dos quatro partidos
majoritários em cada porte não foram tão intensos como o verificado nas regiões, ou seja, apenas houve mudança no núcleo dos partidos de maior filiação nos grandes municípios (+ 200 mil hab.), onde
PFL e PSB suplantaram o PP e o PDT. Nos demais portes, o PP foi o partido que mais perdeu espaço
e o PT o que mais ganhou, considerando, sempre, os quatro maiores partidos.
Gráfico 38 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde filiados a algum partido
político por legenda partidária, segundo o porte populacional dos municípios − 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
251
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
O engajamento político dos(as) secretários(as) municipais de saúde indica um perfil de jovens militantes, na medida em que a maioria possui (65,9%) até 10 anos de filiação, sendo que
quase a metade (41,1%) possui menos de 5 anos.
Os que possuem filiação de até 5 anos são mais numerosos(as) nas regiões norte (55,8%) e
centro-oeste (55,5%), enquanto os(as) que possuem mais tempo de filiação (mais de 10 anos) são
mais expressivos(as) nas regiões sul (23,3%) e sudeste (19,2%). Quanto à filiação entre 6 e 10 anos,
não há variações regionais significativas.
A filiação recente pode refletir a idade média da maioria dos(as) gestores(as) que é pequena,
assim como a relevância de outros fatores para o acesso ao cargo além do compromisso político. De
certa forma, o engajamento partidário de longa data não é pré-requisito para o acesso ao cargo, o
que pode indicar a predominância da competência técnica e gerencial como elemento essencial de
exercício da função.
Gráfico 39 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde filiados a algum partido
político por tempo de filiação partidária, segundo a região do País − 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
252
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Não foram observadas variações no tempo de filiação entre municípios de diferentes portes,
exceto nos grandes municípios (+200 mil hab.) onde, em relação à média nacional, há mais secretários
filiados(as) até 5 anos (56,7%) e menos na faixa de 6 a 10 anos (5,4%). Para os que são filiados entre
6 e 10 anos, quanto maior o porte do município menor o percentual de secretários (28,9%/0-5 mil a
5,4%/+ 200 mil hab.).
Os(as) secretários(as) que têm mais de 10 anos de filiação são mais numerosos(as) nos municípios com população de 20-50 mil (26,3%) e acima de 200 mil habitantes (23,0%). Não há informações correspondentes na edição de 1996 da pesquisa.
Considerando que os municípios maiores possuem um padrão mais homogêneo e conservador
de perfil dos(as) gestores(as), parece que a filiação partidária não consiste em um elemento importante
desse padrão.Porém, é justamente nos municípios de grande porte onde está o maior percentual de
secretários(as) com menos tempo de filiação.
Gráfico 40 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde filiados a algum partido
político por tempo de filiação partidária, segundo o porte populacional dos municípios –2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
253
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Por outro lado, percebe-se que a ascensão ao cargo não se dá majoritariamente pela via
partidária, o que supõe a força dos demais requisitos de acesso ao cargo frente ao poder das
elites partidárias locais.
O perfil de jovens militantes confirma-se quando se verifica que grande parte (62,4%)
dos(as) secretários(as) não foi filiada a algum outro partido antes do atual. Essa constatação
pode reforçar a hipótese de uma elite em ascensão política, que utiliza ainda outros canais, que
não somente a via partidária. A filiação anterior é um pouco mais elevada nas regiões norte
(40,3%) e centro-oeste (43,7%), em contraste com o sudeste, que apresenta o menor percentual (32,8%). Não há informações correspondentes na edição de 1996 da pesquisa.
Gráfico 41 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde filiados a algum partido
político por filiação a algum outro partido, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A baixa filiação anterior a outros partidos pode indicar ainda uma elite em constante
renovação, pois o menor índice de circulação entre partidos reflete também a entrada recente
na política partidária. É interessante registrar que essa parece ser uma condição estrutural do
perfil, na medida em que não há variações significativas entre os portes populacionais.
254
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
A entrada recente na política pode indicar também que o setor saúde possui elevada capacidade de produção de novos quadros que valorizam a atuação local. Como visto anteriormente,
ambas as edições da pesquisa mostraram a maioria dos(as) secretários(as) de saúde é jovem.
Gráfico 42 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde filiados a algum
partido político por filiação a algum outro partido, segundo o porte populacional dos
municípios − 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A hipótese de uma elite em ascensão encontra suporte, também, no baixo percentual de
secretários que já se candidatou a cargo público (25,2%). Em relação a 1996, não houve alteração
significativa quanto aos(às) secretários(as) que já foram candidatos(as) a cargo público (21,2%),
ocorrendo crescimento mais expressivo de secretários(as) candidatos(as) nas regiões norte e centro-oeste (ambos com + 10,2%). Os(as) que já se dedicam à construção de uma carreira política
há certo tempo não cobiçam a posição.
255
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 43 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por candidatura a cargo
público, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Apenas nos municípios de 0-5mil habitantes, esse percentual é um pouco maior (31,8%), não
havendo variações regionais significativas. O cargo de secretário(as) pode significar uma posição importante para jovens técnicos em ascensão, mas parece não ser cobiçado por aqueles que visam galgar
cargos políticos de maior relevância na esfera local.
256
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 44 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por candidatura a cargo
público, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Se o acesso ao cargo exige cada vez mais formação específica e longa trajetória interna no setor
público, como já visto, inclusive com ocupação de funções de direção, carreiras políticas não parecem
ser compatíveis com esse perfil.
Isso pode indicar um processo de modernização e profissionalização setorial, dado que os ocupantes do cargo terão menor propensão a utilizar a pasta como instrumento de projeção eleitoral. A
análise por porte confirma que esse é um fenômeno estrutural, pois o tamanho do orçamento ou a
projeção da pasta, verificada em municípios maiores, possui pouca influência sobre essa configuração.
Entre os cerca de um quarto dos(as) secretários(as) que já se candidataram, houve maior busca
por posições em espaços locais de governo. Isso pode ser visualizado quando se observa que grande
parte dos(as) secretários(as) que se candidatou o fez em eleições municipais, onde o cargo máximo
é de prefeito(a). Os anos em que se verificam maior percentual de candidaturas foram sempre os de
eleições municipais, o que pode indicar que puxar voto para o(a) prefeito(a) pode ser um dos critérios de acesso ao cargo para aqueles que trilham a via partidária. Houve aumento das candidaturas
nos anos mais recentes, o que confirma a formação de uma elite política florescente. Nas três últimas
257
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
eleições, na média, a região sul apresentou o maior percentual de secretários(as) que se candidataram,
tendência oposta à da região centro-oeste.
Gráfico 45 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde já candidatos a cargo público por ano da candidatura, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
De qualquer forma, isso não significa que a secretaria de saúde seja colocada no jogo eleitoral
como prática majoritária, uma vez que são poucos os que se candidatam. As variações por porte dos
municípios apontam uma tendência interessante em relação aos municípios de grande porte. Os(as)
secretários(as) que se candidataram nas eleições de 1996 eram mais numerosos nos pequenos municípios, tendência essa que se inverteu nas eleições de 2004. A mudança de tendência pode indicar a
necessidade de maior profissionalização para ocupar o cargo de secretário(a) nos municípios maiores.
Nas eleições de 1988, 1992 e 2000 não houve alterações significativas por porte.
Cabe ressaltar ainda que nos municípios de grande porte a secretaria municipal de saúde adquire maior projeção política. Nos anos de 1994 e 1998, quando ocorreram eleições nacionais e regionais, houve percentual significativo de secretários(as) que se candidataram, fenômeno representado
no gráfico de forma agregada pela categoria demais anos, mostrando uma vez mais que a politização
nacional reproduz-se no âmbito local.
258
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 46 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde já candidatos a cargo
público por ano da candidatura, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Somente 17,6% dos(as) secretários(as) já se elegeram para exercer cargos públicos, sendo
11,9% para o cargo de vereador(a) e 6,7% para os demais cargos (prefeito(a), vice-prefeito(a),
deputado(a) e outros). Os que possuem experiência anterior como políticos(as) eleitos(as) são proporcionalmente mais numerosos(as) na região norte (25,3%), especialmente para os demais cargos
(9,7%), enquanto na região sul é maior o percentual dos que já foram eleitos(as) vereadores(as)
(17,2%). Não houve alterações significativas em relação a 1996.
Portanto, a secretaria municipal pode ser um espaço de projeção para novos líderes setoriais,
mas não é cobiçada por aqueles que já possuem carreira política mais longa.
259
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 47 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência
anterior como político eleito, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quanto maior o porte populacional dos municípios menor o percentual de secretários(as) que
já se elegeram para cargo público, indo de 20,8% nos municípios de 0-5 mil a 11,0% nos municípios
com mais de 200 mil hab. Essa diferença é ainda maior no cargo de vereador (15,7% e 3,5%, respectivamente). Esse padrão não se alterou significativamente em relação a 1996. Confirma-se, portanto,
um padrão de recrutamento mais técnico-profissional do que político dos(as) gestores(as).
260
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 48 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por experiência anterior
como político eleito, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Da mesma forma, a tese de que os(as) secretários(as) municipais de saúde são uma nova elite
em ascensão política é confirmada pela baixa presença dos que estão licenciados(as) de cargos eletivos.
Da mesma forma, apenas 5,6% dos(as) gestores(as) estão licenciados(a) de cargo político, sendo 3,6%
para vereador(a) e 2% para os demais cargos. Os maiores índices de licenciaturas atuais para cargos
políticos são observados nas regiões norte (11,1%) e sul (8,8%), especialmente de vereador (a) (11,1%
e 7,6%, respectivamente).
261
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 49 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por licenciatura atual de
algum cargo político, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O mesmo padrão é encontrado quando os dados são distribuídos por porte populacional
dos municípios. Há pouca variação por porte no percentual dos(as) que estão licenciados(as) para
cargo público (6,6%/0-5 mil e 3,2%/+ 200 mil). Não há informações correspondentes na edição
de 1996 da pesquisa.
262
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 50 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por licenciatura atual de
algum cargo político, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Apesar da visibilidade da posição, os dados demonstram que os(as) secretários(as) municipais de
saúde são uma elite, que opera fora da prática tradicional da política brasileira de circulação entre cargos
dos três poderes, pelo menos até ocupar o cargo de secretário(a).
Filiação à Sociedade Civil
Além de significativo enraizamento na comunidade local, evidenciado pelo tempo de residência
nos municípios de atuação, longa trajetória na carreira da administração pública local e expressiva filiação partidária, os(as) secretários(as) municipais demonstram elevada inserção na sociedade civil local.
Tais características lhes conferem um posicionamento de elite mediadora entre a comunidade, a burocracia setorial, a elite política e os diversos atores políticos organizados nas entidades associativas locais.
Em torno de dois terços (67,8%) dos(as) secretários(as) municipais de saúde participam ou já
participaram de entidades associativas, tendo ocorrido significativa redução quando comparado com o
patamar de 1996 (84,0%). Os(as) secretários(as) da região sul são os que mais participam de entidades
associativas (78,8%), enquanto no sudeste estão os menos engajados (63,0%). Na medida em que houve redução de forma similar em todas as regiões, o padrão de disparidades regionais se manteve. Esta
redução na participação dos(as) secretários(as) é consonante com as mudanças na mobilização social no
período, porém chama atenção a baixa inserção social dos(as) gestores(as) do sudeste.
263
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Os(as) que participam costumam se engajar em sua maioria em associações profissionais
(25,6%), associações religiosas (22,5%) e clubes esportivos (19,8%), sendo menor a participação em
sindicatos (16,2%), clubes de serviços (12,9%) e associações de moradores (11,0%). Em relação a
1996, houve expressiva redução da participação em associações profissionais (-18,1%), clubes sociais
e desportivos (-21,8%) e clubes de serviços (-13,6%).
Nas regiões sul e sudeste, segue-se o padrão nacional de preponderância da participação em
associações profissionais (27,4% e 21,1%), religiosas (32% e 23,5%) e clubes sociais e desportivos
(35,7% e 22,3% respectivamente).
Em relação a 1996, nas regiões sul e sudeste, os clubes de serviços perderam espaço entre os três
tipos de entidades com mais filiação para as associações religiosas, que registraram menor redução do
engajamento dos(as) secretários(as). Nas regiões norte e nordeste, foram os clubes sociais e desportivos que perderam espaço para as associações religiosas. Na região centro-oeste, por sua vez, os clubes
sociais e de serviços e os clubes sociais perderam espaço para as associações religiosas e os sindicatos,
uma vez que tiveram menor redução de participantes.
Essas diferenças institucionais de participação podem evidenciar necessidades diferentes de
suporte político e legitimação social para o exercício do cargo, o que demonstra a diversidade dos(as)
secretários(as) como elite setorial, inclusive em sua vinculação associativa, o que lhe fornece olhares
diferentes sobre a realidade local.
264
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 51 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por participação em entidades associativas, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A tendência de redução do engajamento pode indicar que o setor da saúde está perdendo capacidade de mobilização social e suporte comunitário, estando o perfil do(a) secretário(a) migrando para
um padrão mais técnico e burocrático. Essa tendência pode estar relacionada tanto à desmobilização
política, verificada desde o início da década de 1990, quanto à maior complexidade gerencial, adquirida pelo SUS com o avanço da descentralização.
A natureza estrutural do fenômeno confirma-se pela redução também em todos os portes populacionais, exceção feita à participação em sindicatos nos municípios de 0-5 mil habitantes. Em
termos gerais, quanto maior o município maior o percentual dos que participam ou já participaram
de atividade associativa, indo de 65,3% (5-20 mil hab.)� a 83,3% (+ 200 mil), padrão esse que não se
alterou em relação a 1996.
265
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quanto maior o porte maior também o percentual de engajamento em associações profissionais (18,2%/0-5 mil a 66,0%/+200 mil) e clubes de serviço (9,6%/0-5 mil a 25,1%/+200 mil).
Situação inversa ocorre em relação às associações de moradores (12,3%/0-5 mil a 4,0%/+200 mil) e
associações religiosas (33,1%/0-5 mil a 15,8%/+200 mil).
Cabe ressaltar que a diferença mais expressiva entre o padrão de participação em entidades associativas dos(as) secretários(as) de municípios menores e maiores consiste na filiação a associações profissionais que atinge patamares mais elevados nos municípios maiores, bem acima das demais formas
de filiação. Esse diferencial de participação em associações profissionais não se alterou de forma significativa em relação a 1996, exceto na redução da participação em todas as modalidades de entidades.
Gráfico 52 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por participação em entidades associativas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
266
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
É interessante observar que, apesar da redução dos(as) secretários(as) que participam ou já
participaram em associações, grande parte deles (74,0%) atribui alta ou média importância a esse
tipo de experiência para o exercício da atual função de gestor(a) local. Essa percepção é compartilhada
pelos(as) gestores(as) em todas as regiões do País, sendo mais forte no norte (82,0%) e menos no nordeste (68,1%). Com certeza, além de ampliar o conhecimento sobre a realidade local, o engajamento
é fonte de suportes na ascensão política e base de legitimação do exercício do cargo.
Gráfico 53 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por grau de importância
atribuída à experiência de participar em associações, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
É importante registrar que a percepção da relevância da participação em associações da sociedade civil na trajetória profissional dos(as) gestores(as) não varia com o porte, sendo elevada tanto
nos pequenos quanto nos grandes municípios. Isso demonstra a importância dessas instituições como
espaço de construção da governança local. Nesses espaços institucionais são reafirmados valores e
posicionamentos sobre os diversos interesses dos grupos da sociedade local e construídas alianças
de suporte para ascensão e sustentação no cargo. Nesse sentido, a diversidade de engajamento social
dos(as) secretários(as) pode representar que a descentralização tenha promovido maior permeabilidade do Estado aos mais diversos grupos de interesse, presentes no universo local. Não há informações
correspondentes na edição de 1996 da pesquisa.
267
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 54 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por grau de importância atribuída à experiência de participar em associações, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Além de elevada inserção no ambiente associativo local, os(as) secretários(as) possuem forte engajamento político setorial tanto em âmbito local quanto regional. A formação do SUS impulsionou
o adensamento institucional federativo setorial e estreitou as relações políticas entre os(as) gestores(as)
das três esferas.
Praticamente a totalidade dos(as) secretários(as) (98,0%) participa ou já participou de eventos
vinculados à política de saúde, patamar esse que não apresenta diferenças significativas por região ou
porte populacional. Houve pequeno crescimento em todas as regiões e portes populacionais, exceto
nos municípios acima de 200 mil habitantes, onde houve redução, embora de pouca magnitude.
As agendas locais e regionais são consideradas de elevada relevância para os(as) gestores(as).
Os encontros regionais de secretários(as) municipais de saúde (86,1%) e as conferências municipais
(67,3%) são os eventos mais frequentados, seguidos dos encontros nacionais (44,1%) e das conferências estaduais (43,4%). Nas conferências nacionais de saúde, a participação é expressivamente menor
(30,7%). Os espaços mais importantes para os(as) gestores(as) municipais são claramente identificados como aqueles nos quais encontram seus pares e discutem os problemas relativos à região, os quais
se afirmaram como lócus tanto de discussão e formulação da política setorial quanto de construção de
redes políticas e mobilização de atores da sociedade.
268
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Por outro lado, a comparação entre os dados relativos às duas edições da pesquisa aponta uma mudança
importante. O processo de institucionalização do SUS tem deslocado, aos poucos, a inserção política dos(as)
gestores(as) dos fóruns de interação com a sociedade civil para as agendas e disputas internas à gestão intergovernamental. Em relação a 1996, enquanto a participação nos encontros nacionais de secretários(as) municipais de saúde se ampliou (+18,3%), houve redução nas conferências estaduais de saúde (-14,9%), quando
observados os patamares da edição de 1996. Seguindo o mesmo padrão, embora em menor magnitude, houve
crescimento da participação em encontros regionais (+ 7,2%) e redução nas conferências municipais de saúde
(-7,9%).
Os(as) secretários(as) de municípios de maior projeção política e com maiores orçamentos tendem a se
projetar em espaços de maior visibilidade, notadamente os eventos políticos nacionais Assim, quanto maior o
porte populacional maior a participação dos(as) secretários(as) municipais em conferências nacionais de saúde
(média 5,26%/ 0-5 mil a 17,42%/+ 200 mil) e nos encontros nacionais de secretários(as) municipais de saúde
(33,0%/0-5 mil a 68,5%/+ 200 mil). Entretanto, isso não significa que falta valorização da participação em
eventos regionais e locais por parte dos(as) secretários(as) dos municípios maiores já que, independentemente
do porte do município, estes espaços regionais são muito valorizados pelos(as) gestores(as).
Gráfico 55 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por participação em eventos políticos da área de saúde, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
269
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A participação nos encontros regionais é menor no norte (71,7%) e não apresenta variação
por porte, situação esta que não se alterou entre as duas edições da pesquisa, apesar do significativo
crescimento da participação observado na região nordeste (+ 16,9%) e nos municípios menores
(+11,4% / 0-5 mil hab.).
A participação nos encontros nacionais é maior no nordeste (54,3%) e menor no sul (30,6%)
e cresce com o porte do município, indo de 33% (0-5mil hab.) a 68,5% (+200 mil hab.). Em
relação a 1996, houve crescimento expressivo em todas as regiões (entre 17% e 25%), exceto na
região sul (+5,9%). Também aumentou a participação em todos os estratos populacionais (+11,4%
a +27,2%), exceto nos maiores municípios (+0,9%).
Nas conferências estaduais, é maior o número de participantes no nordeste (57,6%) e menor
no sudeste (25,5%). Em relação a 1996, houve redução expressiva em todas as regiões, com variados graus que acentuaram a diferenças regionais. Entre os portes populacionais não há diferenças
significativas de percentual de participação, situação diferente de 1996 quando essa crescia com o
porte (46,9%/0-5 mil hab. a 81,1%/+ 200 mil hab.). Essa mudança ocorreu em virtude da redução
mais expressiva da participação nos municípios de maior porte (-14,4%/20-50 mil hab.; -28,3/50200mil e -43,8%/+200 mil).
Nas conferências nacionais, não há variações significativas por região, mas a participação
cresce com o porte (média 5,3%/0-5mil hab. a 17,4%/+200 mil hab.). Em relação a 1996, houve
redução expressiva da participação nos grandes municípios (-24%).
270
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 56 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por participação em
eventos políticos da área de saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A participação em espaços de pactuação intergestores(as) e instituições representativas,
de caráter mais permanente do que as conferências e encontros, também apresentou índices
elevados. Praticamente todos os(as) secretários(as) (96,8%) participam dos conselhos municipais de saúde, sem variações por região ou porte, o que reafirma a consolidação do arcabouço
institucional do SUS, também no que se refere ao processo decisório federativo e à representação política setorial dos(as) gestores(as) municipais.
Há, entretanto, graus diferenciados de participação: enquanto os espaços de pactuação
de âmbito nacional apresentam menores percentuais, provavelmente, em virtude da seletividade e custo da participação, essa participação nas comissões intergestores(as) bipartite – CIB,
é expressiva (59,1%), sendo mais elevada no centro-oeste (83,4%) e crescente com o porte do
município (50,1%/0-5 mil hab. a 74,8%/+200 mil hab.). Da mesma forma, a participação nas
CIB regionais também é significativa (56,5%), com maior índice no sudeste (69,5%) e menor
no norte (34,3%). Aqui, a participação também cresce com o porte (50,5%/0-5 mil hab. a
64,6%/+ 200 mil hab.)�.
271
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 57 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por participação nos espaços de pactuação intergestores(as) e instituições representativas, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por outro lado, a participação na CIT, em virtude de seu caráter nacional, é mais restrita
(17,3%), sendo mais elevada no centro-oeste (23,7%) e no sul (24,7%) e crescente com o porte
(16,5%/0-5 mil hab. a 26,8%/+200 mil hab.).
O mesmo padrão se repete na participação nas entidades representativas dos(as) gestores(as).
A grande maioria dos(as) secretários(as) também participa nos COSEMS (68,9%), especialmente na
região norte (89,1%), com participação crescente com o porte (61,2%/0-5 mil hab. a 82,7%/+200
mil hab.). Já no CONASEMS, entidade também de representação nacional, essa participação é mais
seleta (24,6%), sendo maior no centro-oeste (29,3%) e nos grandes municípios (38,6%). Não há
informações correspondentes na edição de 1996 da pesquisa.
272
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 58 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por participação nos espaços de pactuação intergestores(as) e instituições representativas, segundo o porte populacional
dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Novamente, observa-se a consolidação de um padrão de participação fortemente voltado para a
relação entre os(as) gestores(as) municipais de uma mesma região/estado. Esta tendência de participação
em encontros de gestores(as) encontra correspondência no fortalecimento das instâncias de participação de
âmbito local e regional (CIB, COSEMS, Encontros regionais), bem como expressa uma preocupação com
a articulação intermunicipal no enfrentamento das demandas de saúde. Esta situação pode indicar maior
autonomia política em relação ao nível central, na formulação e implementação da política de saúde, o que
seria desejável como resultado da descentralização, mas também pode indicar um comportamento mais
voltado para a organização de atores regionais para aumentar seu poder de negociação com o nível central.
4.4. RELAÇÃO COM O CARGO DE SECRETÁRIO
4.4.1 Experiência no cargo, estabilidade/continuidade e tempo no cargo
O processo de descentralização de recursos e atribuições aos (às) gestores(as) locais tem
ampliado a estabilidade da gestão, o que contribui para a consolidação do SUS como política de
Estado. Entre as duas edições da pesquisa é maior o percentual de secretários(as) que está há mais
tempo no cargo. Em 2006, grande parte dos(as) secretários(as) estava no cargo desde o início da
273
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
gestão anterior (20,1%) ou da atual (43,4%), sendo menor o grupo que está há menos tempo,
ou seja, que iniciou o exercício do cargo após o início da gestão atual (36,5%). Em relação a
1996, houve crescimento da proporção de secretários, que estão desde o início da gestão anterior
(+10,1%) ou da atual (+8,7%), e expressiva redução dos que estão há menos tempo no exercício
do cargo (-17,4%).
Na região norte, são menos numerosos os(as) secretários(as) que estão desde o início da
gestão anterior (8,5%) ou da atual (37,0%), tendo maior expressão os que estão há menos tempo
no exercício da função (54,5%), o que demonstra menor estabilidade do cargo. Em relação a
1996, não houve alterações expressivas nesse padrão, apesar da queda percentual expressiva de
secretários(as) que estão no cargo após a gestão atual nas regiões nordeste (-26,9%) e centro-oeste
(-24,9%). Estes dados, no entanto, podem ter sido bastante influenciados pelo período do mandato no qual a pesquisa foi aplicada nos dois casos.
Gráfico 59 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por tempo de ocupação
no cargo, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
274
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
O tamanho do sistema de saúde pressupõe maiores desafios e pressões constantes e mais intensas sobre o(a) gestor(a), o que pode reduzir a estabilidade do cargo. Isso pode ser visto pelo fato de que
quanto maior for o porte do município, maior será o percentual dos(as) secretários(as) que estão no
cargo apenas após a gestão atual, variando de 28,4% (0-5 mil hab.) a 44,1% (+200 mil hab.).
Em 1996, o percentual de secretários(as) que havia assumido após a gestão atual era maior em
todos os portes, o que indica que o processo de descentralização ampliou a estabilidade do SUS, em
geral, e não só em municípios com características específicas. Entretanto, as diferenças de estabilidade
do cargo se acentuaram em relação a 1996, uma vez que houve redução mais expressiva da instabilidade nos municípios menores, visualizada por meio do percentual de secretários(as) que estão no cargo
após a gestão atual (-22,2%/0-5 mil hab. a -10,0%/+200 mil hab.).
Gráfico 60 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por tempo de ocupação
no cargo, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
275
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
4.4.2 Motivo de substituição
Entre os que assumiram após a atual gestão, são poucos os que o fizeram em razão de candidatura do secretário(a) anterior (4,2%), patamar esse que diminuiu, significativamente, em relação a
1996 (20,3%). Essa redução pode indicar o crescimento dos(as) secretários(as) com um perfil mais
burocrático e mais comprometido com o domínio das questões técnicas da gestão, mas também pode
ser resultante da proximidade das eleições no momento da aplicação dos questionários.
Esse percentual é maior na região norte (11,4%), situação inversa em relação a 1996, quando
o norte registrava o menor percentual (13,5%). Essa inversão se deve ao fato de a redução ser muito
pequena em relação à ocorrida nas demais regiões.
Gráfico 61 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde em decorrência ou não de
candidatura do Secretárioanterior, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
276
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Gráfico 62 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde em decorrência ou não de candidatura do Secretário anterior, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.4.3 Designação/aceitação e razões da indicação
A confiança pessoal (78,5%), a capacidade de liderança (54,5%), a experiência administrativa (42,8%) e a experiência técnica (36,5%) foram, respectivamente, apontadas como os
motivos de maior relevância na designação para o cargo de gestor(a) municipal de saúde, sendo
avaliados como de alta influência pelos(as) gestores(as) para sua nomeação. Motivos como indicação política (30,7%), de categoria profissional (26,5%) e parentesco (6,8%) tiveram menor relevância em sua designação. Ressalta-se que, em 1996, mais secretários(as) apontaram a experiência
administrativa (35,6%) do que a liderança (32,1%) como motivo de designação.
Em relação a 1996, houve significativo crescimento do número de secretários que declararam como motivos de sua designação a capacidade de liderança (+22,4%), a indicação de categoria profissional (+16,2%) e a confiança pessoal (+14,0%). O fato de haver crescimento em todos
os fatores de designação significa que cada vez mais é necessário combinar diversas competências
para o acesso ao cargo.
Em cada região, os motivos apontados estão na mesma sequência e com percentuais semelhantes, com poucas variações. As diferenças mais expressivas estão entre as regiões sul (84,2%) e
norte (73,7%) quanto ao motivo confiança, sul (59,9%) e nordeste (48,3%) em relação ao mo-
277
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
tivo capacidade de liderança, e norte (37,5%) e centro-oeste (16,8%) no que se refere ao motivo
indicação de categoria profissional. Em 1996, a estrutura de distribuição regional dos motivos de
designação era mais variada. Por exemplo, considerando os quatro principais motivos apontados
e seus respectivos percentuais, apenas as regiões norte e centro-oeste possuíam uma estrutura de
distribuição semelhante.
Houve crescimento expressivo do número de secretários(as) que apontam a confiança
pessoal como motivo de designação nas regiões centro-oeste (+17,0%), sudeste (+18,0%) e sul
(+19,1%), assim como daqueles que mencionam a capacidade de liderança nas regiões nordeste
(21,8%), centro-oeste (24,3%), sudeste (29,3%) e sul (22,7%). Houve expansão também da
quantidade de secretários que mencionam indicação de categoria profissional nas regiões norte
(+24,7%), sudeste (+18,3) e sul (+20,3%).
Portanto, os critérios de confiança, liderança, experiência administrativa e técnica, parecem configurar um padrão de designação, que se aproxima mais de um perfil de qualificação
profissional do que de política, já que a indicação política, corporativa e familiar são os motivos
menos apontados.
Gráfico 63 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por motivo de designação ao
cargo, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
278
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Em relação ao porte do município, há três tendências observáveis. A confiança é considerada altamente
relevante como motivo de designação em todos os portes populacionais, sem diferenças expressivas de percentual. Mas, destacamos um grupo no qual quanto maior o porte maior o percentual de secretários(as) municipais que mencionam os motivos capacidade de liderança (50,7%/0-5 mil hab. a 63,8%/+ 200 mil hab.),
experiência administrativa (34,7%/0-5 mil hab. a 67,8%/+ 200 mil hab.) e experiência técnica (23,3%/0-5
mil hab. a 57,9%/+ 200 mil hab.). Finalmente, em um outro grupo entre os(as) secretários(as) dos municípios com mais de 200mil habitantes o percentual dos que apontam indicação política e indicação de categoria
profissional (ambos com 19,7%) é um pouco menor do que a média das demais regiões.
Em relação a 1996, houve mudanças no padrão de variação com o porte. A capacidade de liderança
e a indicação da categoria profissional como motivos de designação ao cargo apresentaram um aumento
expressivo em todos os portes populacionais, em detrimento da indicação política que não sofreu variações
significativas durante a década 1996−2006. A confiança pessoal passou a ser mais valorizada como critério de
ocupação ao cargo de secretário de saúde, sobretudo nos municípios de 20 a 50 mil hab. (+19,5%) e acima de
200 mil hab. (+ 20,9%).
Gráfico 64 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por motivo de designação
ao cargo, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
4.4.4 Razões da aceitação
Os motivos alegados pelos(as) secretários(as) que pesaram na decisão de ocupar o cargo foram: prestar serviço à comunidade (87,2%), assumir compromisso com a área de saúde (85,9%), assumir desafios
(74,8%) e acumular experiência profissional (61,2%). Motivos como melhorar o currículo (46,9%), aumentar o prestígio (12,2%), adquirir força política (10,5%) ou missão partidária (10,5%) foram apontados
pelos(as) secretários(as) municipais de saúde como os de menor peso em sua decisão de aceitar o cargo.
Em relação a 1996, houve significativo crescimento do número de secretários(as) que declararam
como motivos de sua aceitação a melhoria do currículo (+31,2%), assumir desafios (+27,5%) e acumular
experiência profissional (+13,8%).
A distribuição regional não apresenta diferenças significativas em relação ao padrão nacional, uma
vez que, para os motivos prestar serviços à comunidade, compromisso com a área de saúde, assumir desafios, acumular experiência profissional e melhorar o currículo, os percentuais são muito próximos à média
nacional em todas as regiões. Também, em 1996, não havia diferenças regionais significantes em relação ao
padrão nacional.
Gráfico 65 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por motivos na sua decisão de ocupar o cargo, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
280
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Em relação ao porte do município, quanto maior o município menor o percentual de secretários
(as) que declarou melhorar o currículo (51,5%/0-5 mil hab. a 27,8%/+200 mil hab.) como motivo de
aceitação do cargo. Nos demais casos, não há variação com o porte. Durante a década 1996-2006, aumentaram de forma significativa os percentuais de secretários que decidiram ocupar o cargo por motivos
de assumir desafios, acumular experiência profissional e melhorar currículo, com destaque para os municípios menores, em detrimento dos municípios acima de 200 mil hab. Os aumentos mais expressivos
concentram-se em assumir desafios nas faixas populacionais de 0-5 mil hab. (+32,4%); 5-20 mil hab.
(+26,6%) e de 20 a 50 mil hab. (+ 32,4%), e também em melhorar o currículo (+ 34,5%/ 0-5 mil hab.;
+26,9% / 5-20 mil hab.; +37,6% / 20-50 mil hab.; + 34,1% / 50-200 mil hab).
Gráfico 66 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por motivos na sua decisão de ocupar o cargo, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.4.5 Expectativas para o futuro
A maioria dos(as) secretários(as) municipais de saúde (60,1%) pretende, após o término do exercício
do cargo, continuar na área pública, alguns em funções de direção (24,0%) e outros sem cargo (36,1%). São
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poucos(as) os que visam se dedicar exclusivamente ao setor privado (18,0%), ou exercer função política como
concorrer (9,1%) ou reassumir (6,0%) cargo eletivo.
Os(as) que querem continuar na área pública, porém sem cargo, são proporcionalmente mais
numerosos(as) na região nordeste (43,9%), enquanto os que buscam funções de direção se destacam no norte
(30,9%). Consequentemente, os(as) que pretendem se dedicar à área privada estão em maioria nas demais
regiões. Em comparação com o padrão de 1996, houve crescimento do número de secretários(as) com expectativas de permanecer na área pública, em todas as regiões, especialmente no nordeste (+30,0%), região onde
menos secretários(as) tinham expectativas de continuar na área pública sem cargos. Neste sentido, pode-se
afirmar que a consolidação da descentralização tem tornado mais atrativa a permanência no setor público.
Gráfico 67 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por suas expectativas profissionais após o término da gestão, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Há correlação positiva entre o porte e o percentual de secretários(as) que pretendem continuar na
área pública em função de direção (16,7%/0-5 mil hab. a 28,8%/+200 mil hab.), e negativa em relação
àqueles(as) que querem concorrer a cargo eletivo (10,3%/0-5 mil hab. a 5,1%/+200 mil hab.) ou reassumir
cargo eletivo (11,1%/ 0-5 mil hab. a 5,8%/+ 200 mil hab.). Esse padrão já estava presente em 1996.
282
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Gráfico 68 – Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por suas expectativas
profissionais após o término da gestão, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
5. Discussão e conclusão
O objetivo deste capítulo foi identificar os padrões de recrutamento dos ocupantes do cargo
de secretário(a) municipal de saúde, com vistas a analisar os graus de diversidade encontrada entre
eles(as), o que expressaria uma democratização do exercício do poder local, tradicionalmente concentrado em elites oligárquicas. Neste sentido, foi necessário entender as bases do poder desta nova elite
de secretários para avaliar em que medida elas se identificam ou se distanciam das formas tradicionais
de mandonismo local, que caracterizaram a historiografia nacional.
Essa hipótese estabelece que o processo de descentralização ocorrido no Brasil, na implantação e
consolidação do SUS, criou um conjunto de mecanismos institucionais e formas de participação, redesenhando o federalismo nesta área e, assim, induzindo a um novo modelo de governança, que permite uma
combinação entre progressiva qualificação técnica dos(as) gestores(as), maior diversidade na composição
desta elite emergente e maior articulação dos mesmos com outros atores da sociedade civil.
Ao contrário do postulado conservador original da teoria das elites - formulado por Pareto e
Mosca - que afirma a distinção entre as massas desorganizadas e a homogeneidade e a organização das
elites - forma-se a hipótese (Bobbio, 1983: 387), ainda com base em Mosca, que, quando o poder
283
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não se transmite por herança, ele se transmitirá por meio da retroalimentação, que se processa
pelo recrutamento de membros das classes inferiores. Este processo de renovação das elites oligárquicas tradicionais daria origem aos regimes democráticos. Assim, como na clássica análise
de Gaetano Mosca, a democraticidade de uma sociedade não se dá pelo fato de existir uma elite,
mas pelo modo como esta elite é recrutada e pelo modo como exerce o poder (Bobbio, 1983:
388). Ou seja, a democracia não exclui as elites, o que ela requer é certo princípio de formação
das elites, que foi caracterizado sob o conceito de diversidade, para indicar a probabilidade igual
de ser recrutado para o exercício deste cargo público, cumpridos os requisitos que caracterizam a
qualificação para a gestão, sem discriminações de outras ordens.
O recrutamento em bases técnicas e o aprofundamento do processo de qualificação dos(as)
gestores(as) são indicadores de substituição de uma lógica política tradicional por outra, que impõe a qualificação profissional como parte dos critérios de ocupação do cargo.
Por outro lado, o exercício do poder também indica a maior consolidação da democracia,
na medida em que o gestor(a) se sente comprometido(a) com as instâncias de participação social,
estabelece vínculos com as diferentes associações sociais e participa das comissões de pactuação
entre agentes federativos.
Os resultados confirmaram as hipóteses, demonstrando que os(as) gestores(as) municipais
de saúde possuem um perfil bastante diversificado, representativo da sociedade brasileira e das
profissões qualificadas para esta função. Apesar das diferenças regionais apontadas, a presença de
mulheres aumentou significativamente na década estudada, bem como houve maior identificação
com grupos sociais minoritários ou em desvantagem socioeconômica.
Um dado, no entanto, surpreende, ao mostrar que, ao contrário desta tendência geral de
aprofundamento da diversidade com o processo de descentralização da saúde, nos municípios
de maiores portes, que se caracterizam por maior oferta de serviços complexos e onde existem
profissionais mais bem qualificados, onde é maior a disputa pela ocupação deste cargo e onde se
encontram os(as) gestores(as) mais bem remunerados, persiste um padrão mais conservador de
recrutamento. Ou seja, nestes casos, a diversificação do perfil dos(as) gestores(as) é significativamente menor.
Com relação à renovação das elites locais e à consolidação de uma nova elite de gestores(as)
municipais de saúde, é impressionante a magnitude do fenômeno de ascensão social, quando
comparados os dados da educação dos(as) secretários(as) com os de seus progenitores. Filhos de
pais com baixo nível educacional, os(as) gestores(as) municipais de saúde, em especial em municípios menores e médios, representam o esforço da sociedade em buscar qualificação profissional
como forma de ascensão social.
Esta trajetória implica no deslocamento dos(as) profissionais de um município a outro,
mas, o fato de já terem um período de enraizamento no município, onde exercem sua função,
mostra que existe considerável estabilidade na circulação desta elite profissional.
284
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Os dados sobre qualificação dos(as) gestores(as) mostram uma evolução constante na busca por melhor qualificação, tendência generalizada, mas que aumenta com a oferta de cursos nas
regiões mais bem dotadas. Em relação à pesquisa anterior, houve mudanças significativas, com
maior número dos(as) gestores(as) com maior qualificação e redução daqueles sem qualificação.
Da mesma forma, houve diversificação das profissões, formação multidisciplinar e maior busca das
especializações profissionais mais importantes para o exercício do cargo, tais como saúde pública
e planejamento. Mesmo assim, aspectos mais técnicos como finanças e legislação passam, cada vez
mais, a fazer parte do rol de especializações dos(as) gestores(as), como resultado das novas atribuições e responsabilidades advindas com a descentralização.
A trajetória profissional dos(as) gestores(as) também expressa a diversidade desta nova elite,
ainda que a experiência anterior em saúde continue a ser dominante. Além disso, a ocupação anterior de cargo de direção, mesmo que não seja no setor saúde, passa, cada vez mais, a ser requisito
para o recrutamento do gestor(a). Estas duas tendências de maior qualificação estão em expansão
na década estudada, o que corrobora o papel indutor da descentralização.
A remuneração obtida pelos(as) gestores(as) varia bastante, em termos regionais e de acordo
ao porte do município. Mais da metade, no entanto, situa-se em um mesmo patamar básico. Também mais da metade dos(as) secretários(as) possui outra fonte de renda, o que mostra a insuficiência
da remuneração do cargo, tendência que aumenta com o porte do município.
Um pouco menos que a metade continua a desempenhar atividades fora da sua função, o que
se acentua com o aumento do porte do município. Como uma parcela superior à metade se identificou como oriunda do setor privado, seja como profissional, seja como empresária, fica claro que
a manutenção de atividades extra-função pode representar um canal de integração entre interesses
públicos e privados que ocorre por fora dos controles sociais instituídos pelo SUS.
Ainda que o cargo de secretário(a) seja parte do governo local eleito, a relação com a carreira
política não parece tão estabelecida entre os(as) gestores(as), ou seja, eles parecem se colocar como
mediadores(as) entre a burocracia, os políticos de profissão e os atores sociais que representam a comunidade. Embora filiados(as) a partidos políticos, em geral há mais de 10 anos, os(as) gestores(as)
têm baixas expectativas e pouca experiência em relação a cargos eletivos. Por outro lado, apresentam
experiência anterior de participação em associações sociais, que, apesar de declinante na década, é
altamente valorizada pelo gestor(a) como forma de adquirir conhecimentos sobre a realidade e de
estabelecer vínculos.
No momento atual, o engajamento maior tem se dado na participação em ambiente associativo setorial, entre as várias estruturas e instâncias criadas com a descentralização e a institucionalização do SUS. Em especial, ganha relevância a participação em eventos regionais e nacionais com
seus pares. Esta forma de associativismo demonstra a importância deste ator coletivo no cenário
nacional, com grande capacidade organizativa e de difusão de conhecimentos e valores. Também
representa uma necessidade de fortalecimento do ator coletivo para melhorar as condições de ne-
285
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
gociação com o nível central. No entanto, esta atividade de caráter corporativo, onde ocorre a
disputa interna à gestão, termina por competir de forma desfavorável com a participação dos(as)
gestores(as) em outros fóruns de deliberação, com representação da sociedade civil.
Os dados obtidos a respeito da relação com o cargo são extremamente interessantes porque evidenciam a percepção do(a) gestor(a) sobre as fontes do poder desta elite. Fundamentalmente, forma,
apontados como mais significativos, os critérios de confiança, liderança, experiência administrativa
e técnica, o que configura um padrão de designação, que se aproxima mais do perfil de qualificação
profissional do que de política, já que a indicação política, corporativa e familiar foram os motivos
menos apontados.
Observa-se, pois, um processo de crescente profissionalização e qualificação da função de gestão
da saúde, o que está associado a um elevado engajamento e participação nos fóruns setoriais. A substituição de indicações meramente políticas por critérios profissionais é sentida pelos(as) gestores(as),
assim como sentem a necessidade de buscar aperfeiçoar-se e qualificar-se para o exercício da função.
No entanto, a ação política deste ator coletivo está tendendo a ser mais circunscrita ao âmbito setorial
do que ao político, à competição e à associação em redes de gestores(as) mais do que por meio de vínculos partidários e participações em associações sociais. Esta concentração no âmbito da gestão setorial
é desejável porque mostra a necessidade de uma elite profissional qualificada, mas corre o risco de,
se aprofundada, isolar estes atores da dinâmica política e social que esteve na raiz de sua emergência
como elite política.
Este risco existe, mesmo que a razões de aceitação da designação para o cargo, mais fortemente
apontadas, reafirmem o compromisso dos(as) gestores(as) com o bem-estar da comunidade, com a
gestão da saúde e os desafios profissionais envolvidos.
Em relação às expectativas futuras, a maioria dos(as) gestores(as) pretende continuar na área
pública, com ou sem cargo de direção, o que indica que a descentralização valorizou o cargo do(a)
gestor(a) municipal, tornando-o e também o exercício da função pública, mais atrativos.
286
R enovação das E lites L ocais em S aúde . . .
Referências
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PROGRAMA DE ESTUDOS SOBRE A ESFERA PÚBLICA (PEEP/EBAPE/FGV). Pesquisa Municipalização da Saúde: inovação na gestão e democracia local no Brasil. Relatório técnico. Rio de Janeiro, 2009. Relatório.
287
Capítulo 5
Governança Local no
Sistema Único de Saúde:
a dimensão social
Sonia Fleury
Assis Mafort Ouverney
Thais Soares Kronemberger
Felipe Barbosa Zani
1. Introdução
A estrutura da política de saúde em vigor no Brasil é tributária das lutas empreendidas no âmbito da reforma sanitária,
entendida como um processo de transformações na estrutura de
poder, no aparato institucional e no acesso à saúde. Com caráter contra-hegemônico, opunha-se às estruturas tradicionais e
arcaicas de gestão em saúde e defendia um projeto alternativo,
baseado na agregação de forças políticas e sociais em torno da
democratização do Estado e na construção de um aparato institucional democrático, descentralizado e com autoridade única
em cada esfera de governo (Fleury & Lobato, 2009).
A inserção das propostas da reforma sanitária na política
de saúde foi viabilizada pela Constituição Federal de 1988, marco normativo do Sistema Único de Saúde (SUS), que se fundamenta na universalidade e integralidade da cobertura, no reconhecimento dos direitos sociais de cidadania, bem como em um
arranjo organizacional descentralizado e estruturado com base
na esfera municipal caracterizado por um arranjo institucional
que favorece o federalismo cooperativo e uma perspectiva participativa de cogestão Estado/sociedade. Tal diretriz guarda forte
relação com o projeto de reforma sanitária, assumia como eixo
central da sua proposta a participação social como estratégia de
democratização social (Fleury, 2005a).
A participação local no desenvolvimento e na gestão da
política de saúde em um sistema descentralizado envolve a res-
289
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
ponsabilidade por atribuições legais, a gerência e a gestão das unidades de serviços de saúde, o financiamento e pagamento a prestadores, o compartilhamento decisório sobre as políticas regionais e
nacionais e a formação da vontade política através das conferências, onde se delineiam e se acordam
acerca das estratégias regionais e nacionais de políticas de saúde.
A municipalização, como processo de reestruturação do Estado e de sua ação sobre a realidade
social, impulsiona um duplo movimento de democratização representado na transferência de competências e recursos à esfera local e de compartilhamento decisório com a sociedade civil organizada
(Fleury, 2001). Como resultado, ampliou-se o conjunto de atores formalmente habilitados a influenciar a formulação de estratégias, a elaboração de políticas e programas e a gestão de ações e serviços de
saúde, assim como as instâncias e processos decisórios foram redefinidos.
Esses dois movimentos de transferência de capacidade decisória – do central para o local e do
Estado para a sociedade civil – são indissociáveis e deveriam convergir para a busca de ampliação da
eficácia e da eficiência das políticas públicas, formando um padrão de organização do Estado que se
tornou referência para outras áreas sociais como assistência social, meio ambiente e segurança, dentre
outras.
Assim, o universo local de governança da saúde, entendido como o conjunto de atores e instituições, instâncias e processos, que compõem a agenda pública e definem as ações de tomada de
decisões, controle social e avaliação, subjacentes às políticas municipais de saúde, não só gerencia a
maior parte dos recursos do setor como também possui espaço privilegiado no processo de construção
da política de saúde em âmbito regional e nacional.
Esse capítulo tem como objetivo analisar os impactos do processo de descentralização sobre a
configuração da governança, no âmbito do poder local no setor saúde, quanto ao seu caráter democratizante, comparando as tendências da relação entre Estado e sociedade nos anos de 1996 e 2006. A hipótese formulada supõe que o processo de descentralização na área de saúde tenha proporcionado não
só maior aperfeiçoamento da capacidade de gestão municipal, como também maior democratização
do poder local, na medida em que permitiu um novo formato de governança local, mais responsivo
e participativo.
O texto está estruturado em cinco seções, além dessa introdução e das referências. A seção 2
apresenta o papel das relações Estado-sociedade na formação da governança local do SUS. A seção 3
descreve o método adotado na pesquisa para averiguar as tendências esperadas de inovação para a esfera local na dimensão social. Na seção 4 apresentamos os principais resultados da pesquisa referentes
à dimensão social, apoiada na influência dos atores políticos na elaboração e execução do orçamento
municipal, no que foi considerado relevante na definição de prioridades para a política de saúde, nas
características da relação com o conselho municipal de saúde, nos mecanismos e destinatários dos
processos de prestação de contas pelas secretarias municipais de saúde, nas informações regularmente
oferecidas à população pelos meios de comunicação e, por fim, na composição das forças de apoio e
oposição à gestão local em saúde. Na seção 5 analisam-se comparativamente os resultados obtidos em
290
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
uma década, buscando compreender as implicações do processo de descentralização da política de saúde
sobre a democratização do poder local e as principais da governança local em saúde.
2. A Governança local do SUS e o papel das relações Estado-sociedade
As relações que caracterizam a governança local em saúde compreendem um conjunto de estruturas relativo às relações de intermediação de interesses entre os atores sociais e a burocracia estatal,
desenvolvido como parte da institucionalização do SUS. Esse desenho está fundamentado na concepção
de que o Estado deve conter mecanismos institucionais de controle e de incorporação de interesses
plurais, que possam servir de contrapesos às tentativas de subordinação da política pública a interesses
particulares.
A existência de canais institucionalizados de inserção de demandas e interesses diversos busca
transformar o processo decisório centralizado e concentrado, e, por conseguinte, a gestão das políticas
de atenção à saúde. Assim, são necessárias novas atitudes e competências de gestão comprometidas com
a produção de resultados coletivos no campo sanitário local. Supondo a existência de interesses divergentes na construção de processos de articulação política e de mediação de conflitos, exige-se que os(as)
gestores(as) atuem permanentemente no processo de construção de agendas de compartilhamento de
percepções e ajustes de interesses.
Os mecanismos institucionais mais robustos para a promoção da participação social são os conselhos de saúde, instituições existentes em cada nível governamental que fomentam o exercício do controle
social e, além disso, promovem o diálogo e a construção de decisões coletivas por intermédio da cogestão
paritária entre Estado e sociedade civil. Os conselhos se consolidaram como desenho institucional não
apenas da política de saúde, mas também das demais políticas públicas, ampliando a esfera pública e
permitindo a expansão e o exercício da cidadania (Fleury, 2005b).
A institucionalização dos conselhos é confirmada pela pesquisa realizada por Moreira e Escorel
(2009), cujos resultados apontam a criação de conselhos de saúde em 5.564 municípios brasileiros, envolvendo um contingente de cerca de 72.000 conselheiros titulares, dos quais 36.000 representam o segmento dos usuários do sistema de saúde, tendo sido indicados por 28.000 entidades da sociedade civil.
É fato que os conselhos de saúde são considerados uma importante conquista como mecanismo
institucional voltado para a democratização das relações entre Estado e sociedade. A constituição dos
conselhos de saúde foi resultado de uma forte mobilização social do movimento sanitário deflagrada no
final da década de 1970. Tal atuação foi determinante ao longo do processo de construção do SUS, que
prevê em seu marco normativo a participação da sociedade civil na elaboração, gestão e acompanhamento da política de saúde, por meio da sua inserção nos conselhos e nas conferências (Avritzer, 2009).
Constituem-se, pois, em espaço de participação na organização de uma original institucionalidade democrática, sem o qual o direito à saúde não poderia efetivar-se como direito de cidadania ativa (Guizardi
& Pinheiro, 2006).
291
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Apesar de serem espaços inovadores no processo de cogestão com o Estado, diversos estudos
realizados sobre os conselhos de saúde apontam entraves no funcionamento destas instâncias de
participação. É necessário, pois, compreender até onde a dinâmica do funcionamento destas instâncias tem permitido que essas características inovadoras se traduzam em práticas políticas inovadoras
(Tatagiba, 2002).
Além dos conselhos, outro instrumento de interação entre Estado e sociedade são as conferências de saúde, presentes nos três níveis governamentais, caracterizadas como espaços de formação da
política e de interpelação e argumentações mútuas entre os atores sociais. As temáticas são discutidas
de forma ascendente do nível municipal para o nacional em conferências convocadas para este fim,
nas quais são aprovados os acordos firmados e eleitos os delegados que irão representar cada nível no
seguinte. O processo culmina com a conferência nacional, por meio da qual é elaborada uma carta
com as diretrizes da política, acordada desde as bases. As conferências funcionam como um processo
formador de política, identidades e projetos compartilhados, de tal forma que preserva o espaço da
política como um espaço de mobilização e negociação (Fleury, 2005b).
As conferências, caracterizadas como fóruns máximos de discussão e deliberação da política de
saúde, têm-se constituído em espaços públicos dentro dos quais os interesses dos setores populares são
representados publicamente e nos quais os representantes desses setores têm participado do processo
de tomada de decisão da política de saúde (Cortes, 2002).
Embora seja evidente a institucionalização do processo de participação da sociedade organizada
na definição de prioridades, estratégias e metas da política de saúde nas três esferas da federação, permanece ainda por se consolidar a capacidade efetiva de influência no processo decisório e no exercício
do controle social (Monteiro & Fleury, 2006).
A efetividade destes arranjos participativos está condicionada por variáveis inerentes ao funcionamento democrático destas instâncias, como a determinação de quem ocupa a presidência do conselho e a forma de escolha para tal cargo (Avritzer, 2009), disponibilidade de recursos para a operação
dos conselhos (ex: sede própria), canais de articulação com a secretaria de saúde, comunicação efetiva
com a população, entre outros.
Pesquisas com conselheiros apontaram o predomínio do caráter apenas consultivo dessas instâncias, em detrimento de seu papel decisório, enfatizando que, em algumas situações, os canais
de participação operam somente na legitimação de decisões previamente definidas pelo Executivo
(Labra, 2009; Escorel & Moreira, 2009). Ou, ainda, assinalaram o predomínio dos interesses de corporações profissionais sobre os de usuários e demais atores que participam das instâncias colegiadas
(Cortes, 2009).
Idealizadores e participantes desses mecanismos tinham a expectativa de que tais inovações participativas fossem capazes de romper com o cenário de dominação e desigualdade social existente na
definição de prioridades políticas. Defendia-se que a articulação entre os(as) gestores (as), os burocratas, os prestadores de serviços, os profissionais de saúde e os usuários do sistema de saúde aumentaria
292
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
a responsiveness e a accountability dos governos. Dessa forma, os representantes no governo seriam
permeáveis às demandas dos atores sociais tradicionalmente excluídos do processo decisório de
tomada de decisões políticas. Assim, as instâncias de participação possibilitariam uma governança
favorável ao processo democrático e reduziriam a permanência de padrões autoritários de decisão e
relações clientelísticas entre Estado e sociedade (Cortes, 2009).
A criação de níveis adequados de governança envolve o desenvolvimento de relações de complementaridade, através da escuta das demandas sociais e da prestação de contas entre burocracia e
demais atores envolvidos na política de saúde, para além do conselho de saúde (câmara de vereadores, associações da sociedade civil, prefeito, comissão de intergestores etc).
Tais relações permitem e impulsionam a ação organizada no sentido de ampliar a capacidade
de monitoramento e fiscalização de metas e resultados, o que contribui significativamente para
ampliar tanto a responsabilização da gestão quanto a eficiência da ação estatal. Para tanto, é necessária a utilização de diferentes mecanismos de prestação contas (balancetes periódicos, audiências
públicas, meios de comunicação, internet etc), que regularmente ofereçam diferentes informações
aos atores (sobre ações e campanhas, funcionamento de serviços, resultados da gestão etc).
A legislação do SUS determina que o(a) gestor(a) em saúde deve garantir um canal de comunicação permanente com o Legislativo e com a população. É responsabilidade do(a) gestor(a) a
prestação de contas ao conselho municipal de saúde, em audiência pública, a cada trimestre. A falta
do cumprimento dessa norma pode acarretar uma ação de improbidade administrativa do prefeito
por parte do Legislativo (Brasil, 2009c). Além disso, deve-se avaliar a diversificação e ampliação dos
atores, mecanismos e informações envolvidos no processo de prestação de contas, que extrapolem
os parâmetros legalmente estabelecidos.
A governança local da saúde compreende o conjunto de atores envolvidos nos processos
constantes de tomada de decisões relativos às políticas municipais de saúde, sendo imprescindível
analisar a influência dos atores locais sobre o estabelecimento das prioridades em saúde bem como
sobre a elaboração e execução do orçamento setorial, processos cuja importância é reforçada pelo
aparato normativo que veda a implementação de programas ou projetos não inclusos no plano
municipal de saúde ou no orçamento municipal.
No entanto, a busca de democratização do poder pode enfrentar a resistência de oligarquias
locais, devido ao espaço tradicionalmente reservado a esses atores sociais na deliberação e na fiscalização do sistema de saúde (Rabelo, 2011). O modelo restrito de governança em saúde confere
às oligarquias locais, associadas ao prefeito e ao secretário municipal, competência praticamente
exclusiva sobre a definição das prioridades em saúde e sobre o ciclo orçamentário. O processo de
municipalização, ao transferir responsabilidades para o município no planejamento e na execução
das políticas públicas, na definição de prioridades e na utilização dos recursos, deve precaver-se
da mera “prefeiturização” da política, simbolizada pela concentração de poderes no prefeito e no
secretário de saúde.
293
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Em que pese o papel nuclear desempenhado pela secretaria de saúde, a participação ativa de
outras secretarias municipais na política de saúde permite a implementação de ações intersetoriais,
que promovem impacto organizacional na gestão da política. É no âmbito municipal que se concretiza a integração interinstitucional e a ação intersetorial que constitui um novo mecanismo de
planejar, executar e controlar a prestação de serviços, promovendo, desta forma, uma articulação
dos diversos segmentos da organização governamental e dos seus interesses (Junqueira, 1997).
A intersetorialidade requer uma mudança de cultura organizacional, um reordenamento da
estrutura organizacional, que envolve a atuação e a convergência de interesses de diversos grupos
para a construção de alianças na implementação de ações que possam dar respostas resolutivas aos
problemas enfrentados pela população (Junqueira, 1997). O envolvimento de outras secretarias
municipais nas ações em saúde e na definição de prioridades em saúde demonstra a possibilidade de
atuação intersetorial e de integração de outras políticas públicas na gestão setorial, com a finalidade
de dar respostas mais eficazes e eficientes às demandas da população.
Além do arranjo intersetorial das secretarias municipais, há o alinhamento interfederativo.
O papel desempenhado pelo Ministério da Saúde (MS) por meio dos incentivos financeiros para
os municípios, em especial, no que concerne à atenção básica, tem impactado significativamente
o governo local em saúde. O processo de descentralização e municipalização da saúde transferiu
aos municípios responsabilidades e atribuições na formulação e na condução da política de saúde,
sobretudo após a implementação da NOB 96 – Norma Operacional Básica. Porém, ao longo desse
processo, verifica-se a que o MS tem exercido o papel de indutor na gestão da política de saúde
municipal.
O Programa da Saúde Família (PSF), por exemplo, constitui um conjunto de medidas e iniciativas que objetivam o fortalecimento da atenção básica, de acordo com os princípios e diretrizes
do SUS. O incentivo dado pela NOB 96 à implantação do PSF foi significativo a partir de meados
de 1998, quando os municípios passaram a receber o Piso da Atenção Básica (PAB), inaugurando
a modalidade de transferência per capita de recursos federais para os municípios (Marques & Mendes, 2002).
A despesa do MS com transferências aos estados e municípios habilitados no SUS, para
despesas de alta e média complexidade e da atenção básica, aumentou no período de 1997-2000,
de 28,66% para 61%, respectivamente, indicando a importância do MS sobre essa forma de financiamento e o reforço do governo federal na formulação da política de saúde, no campo da atenção
básica. Contudo, isso impede que os municípios planejem uma política de saúde mais adequada
às necessidades locais, visto que a NOB 96, ao constituir um importante instrumento na operacionalização da descentralização do SUS com a realização de transferências diretas do tipo fundo a
fundo no campo da atenção básica, pode estar constituindo um entrave ao avanço da elaboração de
uma política local de saúde. Ao receberem os recursos do governo federal para a atenção básica os
gestores locais acabam concentrando suas ações neste nível de atenção (Marques & Mendes, 2002).
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G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Neste sentido, a incorporação dos municípios, no final da década de 1990, aos programas assistenciais para recebimentos de recursos financeiros do governo federal teve reflexos no processo de
descentralização, podendo ser caracterizado como uma política tutelada, que causa impedimentos aos
(às) gestores (às) municipais para definirem sua própria política de saúde (Marques & Mendes, 2002).
As consequências de tal processo podem ser a recentralização e a perda da capacidade inovadora da
gestão local.
Outro ator que nos últimos anos tem influenciado a governança local em saúde é o Judiciário,
devido ao grande número de ações em desfavor do SUS com a consequente proliferação de decisões
judiciais e suas implicações para a política de saúde. Tal fenômeno vem sendo denominado de “judicialização da política de saúde”. O direito à saúde garantido constitucionalmente tem sido foco de
atuação do poder judiciário, que, cada vez mais, tem se manifestado nos assuntos relacionados à saúde
pública, comportando-se como verdadeiros formuladores de políticas públicas. A positivação de tal
direito traz novas implicações para a atuação do Estado na formulação e implementação de políticas
de saúde, mas altera o equilíbrio entre os poderes e impacta a própria atuação do poder judiciário, que
passa a decidir sobre a garantia do direito à saúde que, por sua própria natureza, é caracterizado por
questões políticas e técnicas (Delduque, Marques & Romero, 2009).
Com isso, a intervenção do poder judiciário na política e na prestação de serviços públicos de
saúde acaba por incidir sobre a política na área da saúde, em especial sobre a arena local, onde se situa
a responsabilidade pela prestação dos serviços.
Portanto, para além dos canais institucionais de governança local como os conselhos de saúde,
outros atores exercem influência na tomada de decisões, no planejamento e na disposição de recursos
na área de saúde. Entre eles pode-se mencionar a participação de outras secretarias municipais, mediante a realização de ações intersetoriais, a predominância do Executivo local e do próprio secretário
de saúde na condução das decisões governamentais; a interferência do poder judiciário nas ações de
direito à saúde; a influência de políticos locais no controle dos assuntos municipais; o papel indutor
do Ministério da Saúde (MS) por meio da transferência de incentivos financeiros aos municípios.
Compreender a configuração desse universo da gestão local em saúde, no que se refere às relações entre gestores (as) e a sociedade civil, torna-se essencial não só para avaliar o papel do controle
social, mas também o desenvolvimento de subsídios de aperfeiçoamento do processo de descentralização, o modelo federativo, os modelos de gestão e a organização da provisão de serviços, entre outras
questões fundamentais, que se apresentam como desafios atuais do sistema.
3. Metodologia
O objetivo desse capítulo consiste em analisar os impactos do processo de descentralização
sobre a configuração da governança local em sua dimensão social, comparando as características de
relação Estado-sociedade nos anos de 1996 e 2006.
295
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A hipótese específica é que o processo de descentralização de recursos e atribuições legais
para a gestão municipal contribui tanto para a democratização do sistema de poder quanto para o
aperfeiçoamento da capacidade de gestão da esfera local. Portanto, é esperado que, com o aprofundamento da descentralização, as relações entre Estado e sociedade tornem-se mais transparentes e
responsáveis, o que caracterizaria um novo padrão de governança local.
Para a análise das características da governança local foram selecionados sete atributos da dimensão social: elaboração e execução do orçamento, definição de prioridades, prestação de contas,
conselho municipal de saúde, fluxos de informações oferecidas à sociedade e atores relevantes na
gestão local em saúde. Cada atributo se desdobra em uma variável estudada da governança local,
que, por sua vez, se desdobra em uma questão respondida pelos(as) gestores(as). Com relação à elaboração e à execução do orçamento, foi selecionado um conjunto de atores que pudessem exercer
influência nestas questões. São eles: prefeito(a), secretário(a) de saúde, outros(as) secretários(as),
conselho municipal de saúde, judiciário, associações da sociedade civil, políticos locais, consultores
ou empresas de consultoria externa e mais dois itens de livre escolha do(a) gestor(a).
Também se buscou coletar a percepção dos(as) secretários(as) municipais de saúde quanto
ao grau de importância dos seguintes itens no estabelecimento de prioridades em saúde: parecer
do corpo técnico, propostas de conselhos ou conferências de saúde, solicitação de políticos locais,
sugestões de outras esferas (comissão bipartite, estado ou União), pressão dos meios de comunicação de massa, incentivos financeiros do Ministério da Saúde, decisões do judiciário, pressão de
associações da sociedade civil, mais dois itens de livre escolha do(a) gestor(a).
Além disso, foram investigados quais atores exercem influência no estabelecimento de
prioridades na gestão local em saúde, abrangendo: prefeito(a), secretário(a) de saúde, outros(as)
secretários(as), conselho municipal de saúde, judiciário, associações da sociedade civil, políticos locais, consultores ou empresas de consultoria externa, mais dois itens de livre escolha do(a) gestor(a).
O funcionamento do conselho de saúde também foi incluído como atributo para caracterizar
a relação Estado-sociedade, em especial, quanto às questões relativas a ter sede própria, à forma de
escolha do presidente do conselho, à divulgação das resoluções do conselho junto à sociedade e à
existência de canal efetivo de troca entre o conselho e a secretaria de saúde.
Quanto à prestação de contas, buscou-se verificar a quem as secretarias de saúde prestam
contas de seus gastos, compreendendo as associações da sociedade civil, a câmara de vereadores, o
conselho de saúde, prefeito(a), as comissões intergestores, outras secretarias e outros órgãos municipais. O propósito consiste em verificar se houve a institucionalização da prática de prestação
de contas e se ocorreu a ampliação de atores e instâncias aos quais os(as) secretários(as) de saúde
prestam contas.
Além disso, buscou-se pesquisar quais os mecanismos utilizados pelas secretarias de saúde para a
prestação de contas de seus gastos, tendo como opções os balancetes periódicos, a audiência pública, os
meios de comunicação (rádio, televisão, jornais, etc.), a internet e a divulgação em locais públicos.
296
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Acerca do atributo fluxo de informações, foram consideradas variáveis que aferissem as informações regularmente oferecidas à população pelos meios de comunicação disponíveis, incluindo a
divulgação de ações e campanhas, o funcionamento dos serviços, as informações específicas para o
conselho municipal (ou semelhante) e os resultados da gestão. Tal atributo tem como objetivo analisar
se, durante a década de 1996-2006, houve institucionalização da prática de divulgação de informações
à população, bem como a diversificação do tipo de informação fornecida à sociedade.
Por fim, buscaram-se verificar quais são as forças sociais de maior apoio e/ou oposição à gestão
municipal em saúde, a fim de verificar se o avanço do processo de descentralização permitiu a ampliação e diversificação dos atores sociais que apoiam à gestão, bem como a caracterização de tais forças.
Em todos os atributos acima, foi aberta a possibilidade de o(a) gestor(a) indicar opções de resposta não
disponibilizadas no questionário.
A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário enviado pelo correio aos(as)
secretários(as) municipais de saúde, com dois blocos de questões: um relativo ao perfil do(a) gestor(a)
e o outro às características da gestão em três dimensões: social, gerencial e assistencial. Este capítulo
abrange apenas os resultados da dimensão social, que compreende questões referentes à relação estabelecida entre a gestão municipal e os diversos atores da sociedade.
4. Resultados
4.1. Influência dos atores na elaboração do orçamento
Em 2006, os(as) prefeitos(as) (82,0%) e os(as) secretários(as) de saúde (49,5%) foram os atores
que mais exerceram influência na elaboração do orçamento municipal. Por outro lado, o Conselho
Municipal de Saúde, instância de participação e deliberação da política de saúde pela sociedade civil,
também foi considerado por 28,3% dos(as) secretários(as) como um ator de alta influência na definição dos recursos municipais. Atores como o judiciário (12,3%), entidades da sociedade civil (10,4%)
e consultores (9,6%) foram menos citados.
A predominância do prefeito não sofre variações regionais, enquanto o secretário possui maior
influência na região sul (59,7%) e menor na região sudeste (44,5%). Variações regionais também
foram observadas na influência do conselho municipal de saúde, com maior peso nas regiões centrooeste (36%) e sul (35,5%), sendo menos expressivo no sudeste (20,6%) e no norte (20,7%).
Na região sul, foram encontrados níveis mais elevados influência de quase todos os atores,
quando comparados aos níveis apresentados em outras regiões, como pode ser visto no caso do peso de
outros(as) secretários(as) (26,5%), do judiciário (18,6%) e de associações da sociedade civil (14,8%).
A influência do prefeito(a) também não muda muito com o tamanho do município, sendo
um pouco menor nos municípios com mais de 200mil hab. O(A) secretário(a) de saúde possui maior
expressão nos municípios com mais de 200mil hab. (66,9%) e menor nos municípios com população
de 5-20mil habitantes (43,1%), ao passo que o conselho municipal, em um padrão quase oposto, é
297
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
mais influente nos municípios de 0-5mil habitantes (37,8%) e menos nos municípios com mais de
200mil hab.(19,5%). É importante destacar também que é nos menores municípios onde o judiciário
e os políticos locais possuem mais influência.
Na década de 1996 a 2006, aumentou a influência do(a) secretário(a) de saúde (+24,5%) e do
conselho municipal de saúde (+13,3%) na elaboração do orçamento municipal, ao passo que houve
redução da influência exercida pelos políticos locais (-8,6%).
As mudanças na influência dos atores mostraram-se bastante homogêneas entre as regiões, com
algumas exceções. O conselho municipal de saúde ampliou mais sua influência nas regiões centrooeste (23,6%) e sul (19,9%), perdendo espaço no norte (-4,9%). Por sua vez, os políticos locais tiveram sua influência reduzida com mais intensidade nas regiões norte (-15,8%), centro-oeste (-14%) e
nordeste (-12,5%).
Gráfico 69 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por influência dos atores sociais
na elaboração do orçamento, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por outro lado, quando se considera o porte do município houve diferenças expressivas nas
transformações ocorridas. A influência do prefeito aumenta nos municípios com população entre
20-50mil hab. (+11,2%), mas diminui nos grandes municípios com mais de 200mil hab. (-9,9%).
O peso do conselho municipal aumentou especialmente nos municípios pequenos e médios
(0-5mil/+18,6% e 20-50mil./+16,1 %), mas se reduziu nos municípios maiores acima de 200mil hab.
298
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
(-2,1%). Finalmente, é importante ressaltar que nos grandes municípios há redução da influência
de uma série de atores e apenas o(a) secretário(a) municipal de saúde amplia significativamente seu
espaço no processo decisório.
Gráfico 70 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por influência dos atores sociais
na elaboração do orçamento, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.2. Influência na execução do orçamento
Em 2006, o prefeito (70,5%), o(a) secretário(a) de saúde (70,2%) e o conselho municipal
de saúde (33,6%) foram os atores que mais exerceram influência na execução dos gastos em saúde.
Os demais atores obtiveram um percentual considerado inexpressivo quando comparado a estes
três atores.
Segundo a variação regional, é importante destacar que a influência do prefeito é maior nas
regiões norte (74,1%) e nordeste (76,9%), do que na região sul (59,7%). Correspondentemente,
o sul do País destaca-se pela expressiva influência do secretário de saúde na execução dos gastos
(82,2%), em comparação com o norte (60,3%) e o nordeste (63,0%). O mesmo pode ser observado
em relação à influência do conselho municipal de saúde, que alcança na região sul um percentual
significativo (44,7%), em detrimento da região norte (23,6%). Portanto, encontramos padrões
mais concentrados de exercício de poder em algumas regiões e mais desconcentrado em outras,
mesmo no interior do nível local.
299
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 71 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores
sociais na execução dos gastos em saúde, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em relação ao porte populacional, observa-se variação na influência do(a) secretário(a) de
saúde, considerada mais expressiva nos municípios de 20-50mil hab. (79,6%), de 50-200mil hab.
(78,1%) e acima de 200mil hab. (89,0%).
Além do(da) secretário(a) de saúde, a importância do conselho municipal de saúde também
apresenta variação por porte populacional, exercendo influência mais significativa nos municípios
de 0-5mil hab. (42%), quando comparado aos municípios de grande porte populacional: 50-200
mil hab. (29,8%) e acima de 200mil hab. (28,3%). Pode-se se observar um padrão de influência em
relação a este ator, visto que quanto maior o porte populacional menor a influência do conselho na
execução dos gastos em saúde. Esse fato nos induz a pensar que a democratização depende do porte
populacional, o que implicaria a necessidade de processar a descentralização no interior dos grandes
municípios.
É importante ressaltar que, enquanto o prefeito(a) exerce maior influência na execução dos
gastos nos municípios de 0-5mil hab. (74,0%) e de 5-20mil hab. (71,0%), o(a) secretário(a) de saúde
destaca-se nos municípios acima de 20 mil hab.; 20-50mil hab. (79,6%); de 50-200mil hab. (78,1%)
e acima de 200mil hab. (89,0%).
300
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 72 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores
sociais na execução dos gastos em saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.3. Influência na definição de prioridades em saúde
Em 2006, segundo os(as) secretários(as) municipais de saúde, a definição das prioridades do
setor saúde em nível local era influenciada, em sua maioria, por orientações técnicas (62,8%), por
propostas de conselhos e conferências (58,3%) e pelos incentivos financeiros do Ministério da Saúde
(50,3%). Demandas diretas da comunidade local (26%) e sugestões de outras esferas de governamentais tinham menor influência (33,2%).
Esse padrão apresenta uma variação regional interessante entre as regiões sul e norte. Na primeira, há um equilíbrio entre o peso das orientações técnicas e propostas dos conselhos e conferências,
deixando os incentivos financeiros do nível central em segundo plano. Na segunda, a inserção da sociedade civil pelas instâncias democráticas cede espaço frente ao elevado peso das áreas técnicas e dos
incentivos financeiros do ministério. Além disso, na região norte o peso das demandas espontâneas é
maior do que nas demais regiões, o que é indicativo de falta de planejamento sistemático.
O tamanho do município também parece ser um fator que produz diferenças de influência na
definição de prioridades, quando são comparados os extremos. Nos municípios com população acima
de 50mil habitantes, especialmente os maiores de 200mil hab., o peso do parecer técnico da burocracia é muito maior do que as propostas das instâncias democráticas ou de incentivos financeiros do
301
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
ministério. Em contraponto, nos municípios com menos de 5mil habitantes, o peso dos incentivos
financeiros do Ministério da Saúde é bem menor do que nos demais municípios.
Na década de 1996 a 2006, aumentou a influência das orientações técnicas da burocracia
(+13,6%), enquanto houve redução expressiva da influência de solicitações individuais da sociedade
(-43,5%) e de políticos locais (-15%)�.
Houve poucas variações regionais nesse padrão. A redução da influência de solicitações individuais ou de comunidades foi menor na região norte (-24,9%), enquanto que, no centro-oeste, observou-se
maior queda das solicitações de políticos locais (-27%). Também nas regiões norte (+24,4%) e centrooeste (+25,7%) estão os maiores índices da expansão da influência do parecer do corpo técnico.
Gráfico 73 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos procedimentos adotados para a definição de prioridades em saúde, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
É importante destacar também que, enquanto nos municípios de 0-200mil hab. houve expansão da influência das orientações do corpo técnico, nos municípios com mais de 200mil houve
redução (-18,3%). Também nesses municípios observou-se a menor redução da influência de solicitações de políticos locais (-5%). Em ambos os casos, os patamares já eram diferenciados em relação
aos municípios menores, ocorrendo apenas maior homogeneização. Cabe ressaltar também que nos
municípios acima de 50mil hab. houve expressiva redução da influência das propostas de conselhos e
conferências, especialmente nos municípios com mais de 200mil hab. (-36,4%).
302
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 74 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos procedimentos adotados para a definição de prioridades em saúde, segundo o porte populacional
dos municípios– 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 2006, o(a) secretário(a) municipal de saúde (86,2%), o(a) prefeito(a) (57,4%) e o conselho municipal de saúde (57%) foram, na maioria dos municípios, os atores com mais elevada influência sobre a definição de prioridades no setor saúde.
Esse padrão apresenta poucas variações regionais, com o(a) secretário(a) municipal de saúde
(91,6%) e o conselho municipal de saúde (63,6%), com maior expressão na região sul e menor nas
regiões nordeste (82,2%) e norte (53,7%), respectivamente. Por outro lado, o prefeito é mais influente
no norte (62,6%) do que no sul (53,9%).
303
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 75 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores
para a definição de prioridades em saúde, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O tamanho do município parece afetar de forma linear apenas a influência do conselho municipal de saúde, que é maior nos municípios com até 5mil hab. e (65,1%) e menor nos municípios com
mais de 200mil hab. (48%). Em relação ao prefeito, as diferenças extremas estão entre os municípios
de 0-5mil (66,7%) e 5-20mil hab. (52,4%), enquanto a influência dos(as) secretários(as) municipais
de saúde é maior nos municípios de 50-200mil (92,0%) e menor nos municípios de 5-20mil hab.
(83,6%).
304
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 76 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores
para a definição de prioridades em saúde, segundo o porte populacional dos municípios– 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.4. Funcionamento do conselho municipal de saúde
Em 2006, a maioria dos conselhos não possuía sede própria (90,6%) e tinha o secretário(a)
municipal de saúde como presidente (63,8%), eleito(a) pelos conselheiros (70,4%). Grande parte dos
conselhos divulgava suas resoluções (67,4%), especialmente pelos meios de comunicação (26,5%), e
possuía canais efetivos de comunicação com a secretaria municipal de saúde (84,7%), sendo as reuniões de trabalho o meio mais utilizado (38,7%).
Em geral, o fato de não possuir sede própria, divulgar resoluções e possuir um canal efetivo
de comunicação representa um padrão nacional, que não apresenta variações regionais significativas.
Entretanto, a região sul (41,7%) utilizava mais os meios de comunicação para divulgar informações do que a região norte (14,4%), e as reuniões de trabalho, como canais efetivos de comunicação com a secretaria municipal de saúde (48,1%) do que a região centro-oeste (29,6%).
Na região nordeste, há, relativamente, mais conselhos cujo(a) secretário(a) de saúde é o(a) presidente (79%) quando se compara com as regiões centro-oeste (35,7%) e norte (46,1%). No centrooeste, os conselhos com presidentes eleitos são relativamente mais numerosos (86%).
305
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 77 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por sede própria, segundo a
região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Gráfico 78 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por presidência do secretário(a) de
saúde, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
306
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 79 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por eleição para a presidência,
segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Gráfico 80 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por divulgação das resoluções,
segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
307
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 81- Distribuição dos conselhos municipais de saúde por forma de divulgação das resoluções, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
308
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 82 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por existência de canal efetivo de
troca de informações entre a secretaria e conselho de saúde, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
309
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 83 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde pelo canal efetivo de troca de informações entre a secretaria e conselho de saúde, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em geral, quanto maior for o município menor é a proporção dos conselhos que não têm
sede própria (0-5mil/96,7% a +200mil/62,3%). Nos municípios com população acima de 50mil
habitantes (50-200mil/53,9% e +200mil/54,4%), a presença de conselhos cujo(a) presidente é o
secretário(a) municipal de saúde é relativamente menor do que nos municípios nas duas faixas abaixo
(5-20mil/66,1% e 20-50mil/66,5%).
O tamanho do município não altera a proporção de conselhos que fazem eleição para a escolha
do(a) presidente, que divulgam resoluções nem dos que possuem um canal de comunicação direta
com a população. O uso de meios de comunicação é menor em municípios com população menor
de 5mil habitantes.
310
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 84 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por sede própria, segundo o porte
populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Gráfico 85 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por presidência do secretário(a) de
saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
311
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 86 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por eleição para a presidência,
segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Gráfico 87 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por divulgação das resoluções,
segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
312
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 88 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por forma de divulgação das resoluções, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 89 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde por existência de canal efetivo de
troca de informações entre a secretaria e conselho de saúde, segundo o porte populacional dos
municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
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G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 90 - Distribuição dos conselhos municipais de saúde pelo canal efetivo de troca de informações entre a secretaria e conselho de saúde, segundo o porte populacional dos municípios
– 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.5. Prestação de contas das secretarias municipais de saúde
Instituições e Atores
Em 2006, quase a totalidade dos(as) secretários(as) prestava contas ao conselho municipal de
saúde (92,7%), grande parte ao prefeito (78,8%) e à câmara de vereadores (74,7%), e apenas uma
parcela à sociedade civil (23,9%).
A quantidade de secretários(as) que presta contas ao conselho municipal de saúde, ao prefeito
e à câmara de vereadores não apresenta diferenças regionais. Na região sul, há mais secretários(as) que
prestam contas a associações de moradores e a outras entidades da sociedade civil (33,6%), enquanto
nos municípios acima de 200 mil hab. é um pouco mais difundida a prática de prestação de contas à
câmara de vereadores (90,8%) e a entidades da sociedade social (32%).
Na década de 1996 a 2006, houve aumento na difusão da prática de prestação de contas à câmara de vereadores (+48,5%), ao conselho municipal de saúde (+28,4%) e às associações da sociedade
civil (+21,6%).
315
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Houve poucas variações regionais em relação a esse padrão. No centro oeste a difusão da prática
de prestação de contas ao conselho municipal de saúde foi um pouco maior que nas demais regiões
(39,8%), o mesmo acontecendo na região sul (30,6%) no que se refere à prestação de contas às entidades da sociedade civil.
Gráfico 91 - Distribuição das secretarias municipais de saúde por instituições a quem presta
contas, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quanto menor o município maior foi a expansão da prática de prestação de contas (05mil/+37,8% a +200mil/+4,8%), o que uniformizou os patamares e universalizou a prática no País.
No caso da prestação de contas à câmara de vereadores e a entidades da sociedade civil, houve aumentos uniformes.
316
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 92 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por instituições a quem presta
contas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Instrumentos e mecanismos
Em 2006, grande parte das secretarias de saúde prestava contas por meio de balancetes periódicos (76,9%), quase a metade por intermédio de audiência pública (45,3%), e uma parcela menor
utilizava outros meios como locais públicos (23,7%) e meios de comunicação (19,6%).
Há variações regionais nas preferências de utilização de todos os meios citados. Os balancetes
são mais utilizados no centro-oeste (88,7%) e menos no norte (68,8%). Na região sul, há mais secretarias que utilizam audiência pública (73,5%), locais públicos (32,9%) e meios de comunicação
(30,9%). Na região nordeste, por sua vez, há menos secretarias que prestam contas por meio de audiência pública (24,2%) e locais públicos (20%), enquanto, na região norte, é menor o emprego de
meios de comunicação em geral (6,2%).
Quanto maior o porte do município maior a propensão a utilizar audiência pública para prestar
contas ao público (0-5mil/43,8% a +200mil/79%). Os grandes municípios com mais de 200mil hab.
emprega um pouco menos os locais públicos (17,6%) e os meios de comunicação (13,8%), quando
comparados aos demais.
Na década de 1996 a 2006, nos itens que estiveram presentes nas duas pesquisas, é possível
destacar o crescimento da prestação de contas pelos meios de comunicação (+9,8%), que cresceu mais
nas regiões sul (+15,8%), centro-oeste (+21,1%) e sudeste (+15,2%), e nos municípios com população de 50-200mil hab. (+14,3%).
317
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 93 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos utilizados para
prestação de contas, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Gráfico 94 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos utilizados para
prestação de contas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
318
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
4.6. Fluxo de informações
Em 2006, quase a totalidade das secretarias oferecia à população informações sobre ações e
campanhas (95,7%); a grande maioria sobre o funcionamento de serviços públicos (72,9%), e quase a
metade sobre questões comunicadas aos conselhos (48,1%) e resultados da gestão (37,9%).
Há poucas variações regionais. Os municípios da região norte divulgam menos informações específicas enviadas aos conselhos e semelhantes (32,6%) e sobre o funcionamento de serviços (61,2%),
enquanto a região sul divulga mais informações relativas aos resultados de gestão (46,4%).
Em geral, os municípios com população entre 50-200mil habitantes são os que mais utilizam
todos os meios de divulgação de informações quando comparados com os de outras regiões, especialmente sobre o funcionamento de serviços (84,9%) e sobre questões específicas enviadas aos conselhos e semelhantes (58,3%). Os municípios da região norte (29,7%) e com população até 5mil hab.
(30,1%) são os que menos divulgam informações sobre resultados de gestão.
Na década de 1996 a 2006, as práticas de divulgação de informações sobre resultados de gestão
(+19,3%) e sobre o funcionamento de serviços (+14,5%) foram as que mais apresentaram expansão,
seguidas da divulgação de informações sobre ações e campanhas de saúde (+10,7%) e informações
para conselhos (+9%).
A expansão na divulgação de resultados de gestão mostrou-se bastante uniforme entre as regiões, enquanto houve assimetrias na difusão de informações aos conselhos: maior crescimento no sul
(+17,4%) e centro-oeste (+14,9%) e decréscimo no norte (-11%).
Na região sul, houve menor crescimento da prática de divulgação de informações sobre ações e
campanhas de saúde (+6,7%) e sobre o funcionamento de serviços (+7,3%), mas a região apresentava
patamares mais elevados em 1996 (90,5% e 66,7%, respectivamente).
319
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 95 - Distribuição das secretarias municipais de saúde por informações oferecidas à população, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em geral, quanto maior for o porte do município menor será o crescimento da prática de divulgação de informações sobre ações e campanhas de saúde, funcionamento dos serviços e dados para
os conselhos municipais. No caso dos municípios com mais de 200mil hab., houve decréscimos no
grau de difusão. Na divulgação de resultados de gestão, o crescimento foi mais uniforme, exceto nos
grandes municípios, onde foi menor. Em todas essas situações, o patamar de difusão era maior nos
grandes municípios já em 1996. Os dados sobre comunicação e divulgação de ações apontam para
um porte municipal mais favorável a essa interação com a sociedade, entre 50mil e 200mil habitantes,
o que os distingue, por diferentes razões, das dificuldades enfrentadas pelos muito pequenos e pelos
muito grandes.
320
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 96 - Distribuição das secretarias municipais de saúde por informações oferecidas à população, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.7. Apoio e oposição à gestão
Em 2006, as principais forças de oposição eram os partidos políticos (37,5%) e a câmara de
vereadores (28,8%). Outros atores foram menos citados pelos(as) secretários(as) municipais de saúde,
tais como profissionais de saúde (13,1%), prestadores de serviços e meios de comunicação de massa
(11,2%), servidores (11%) e o secretário de finanças (10,6%).
Não há variações regionais significativas, exceto na região norte, onde a câmara de vereadores é
mais citada (39,8%), em contraposição aos partidos (29,1%) que foram menos mencionados do que
nas demais regiões.
321
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 97 - Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por oposição à gestão,
segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Nos municípios com mais de 200mil hab., a câmara de vereadores foi menos citada como
força de oposição (11,5%). Os prestadores privados são mais mencionados nos municípios acima
de 50mil hab. (50-200mil/20,9% e +200mil/25,1%). O mesmo ocorre com profissionais de saúde
(50-200mil/20,9% e +200mil/21,3%) e o meios de comunicação de massa (50-200mil/35,1% e
+200mil/32,4%). Cabe mencionar ainda que os partidos são menos mencionados nos municípios
com mais de 200mil hab. (29,3%).
Portanto, com o aumento do porte do município perdem importância opositores oriundos do
sistema político e ganham destaque aqueles vinculados ao mercado e aos interesses corporativos.
322
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 98 - Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por oposição à gestão,
segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A grande maioria dos(as) secretários(as) menciona o conselho municipal (89,7%), os profissionais de saúde (76,7%) e as outras secretarias municipais (70,1%) como os principais apoiadores de
sua gestão. Uma parcela expressiva dos(as) secretários(as) também menciona os servidores públicos
(50,7%), o secretário de finanças (43,9%) e a câmara de vereadores (42,3%) como aliados. Não há
variações expressivas, exceto no sudeste onde os outros(as) secretários(as) (63,3%) e o secretário de
finanças (36,5%), em especial, foram menos citados, assim como no centro-oeste, onde a câmara
de vereadores foi mais citada (50%). Portanto, enquanto a oposição parte do sistema político e dos
prestadores privados no mercado, o apoio à gestão local em saúde é de natureza setorial e interna aos
instrumentos de governança da saúde.
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 99 - Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por forças sociais de apoio
à gestão, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
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G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Gráfico 100 - Distribuição dos(as) secretários(as) municipais de saúde por forças sociais de
apoio à gestão, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na década de 1996 a 2006, houve poucas mudanças no padrão de forças de oposição à gestão,
considerando, inclusive, variações regionais e de porte populacional. É possível destacar a redução no
percentual (-9,5%) de secretários(as) que menciona os prestadores privados como força de oposição,
especialmente na região centro-oeste (-13,9%). Na região norte, houve uma expressiva expansão da
câmara de vereadores como força de oposição (16,7%).
Em termos de porte populacional, foram mencionadas variações significativas apenas nos municípios com mais de 200mil hab., onde ocorreu redução no conjunto de secretários(as) que mencionaram a câmara de vereadores (-23,6%) e outras secretarias municipais (-18,2%) como forças de
oposição à gestão.
Entretanto, quando são consideradas as forças de apoio à gestão, houve aumentos expressivos
no percentual de secretários(as) que mencionaram o conselho municipal de saúde (14,5%), os profissionais de saúde (17,9%) e as outras secretarias municipais de saúde (21,5%). Esse crescimento ocorre
em todas as regiões com poucas variações, diferentemente do que ocorre quando se considera o porte
dos municípios.
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
As variações relativas ao conselho municipal são as mais expressivas, indo, em escala decrescente, de + 19,3% (0-5mil hab.) a -2,5%(+200mil hab.). É importante destacar também que, nos grandes
municípios (+200mil hab.), em oposição aos demais portes populacionais, houve pouca ampliação do
número de secretários(as) que mencionaram outras secretarias municipais (+2,7%), e significativo aumento dos que apontaram a câmara de vereadores (+33,7%) como força expressiva de apoio à gestão.
Novamente observa-se que os mecanismos e atores da governança setorial e até intersetorial
não têm funcionamento efetivo quando o município é muito grande, o que reforça a noção de que
seria necessário operar uma descentralização interna à municipalidade para que a governança local
funcionasse a contendo.
5. Discussão
A análise geral dos resultados para os sete atributos pesquisados - elaboração e execução do orçamento; estabelecimento de prioridades; funcionamento do conselho municipal de saúde; prestação
de contas; fluxo de informações; apoio e oposição a gestão – permite afirmar que houve modificações
na relação Estado-sociedade em direção ao padrão mais democrático de governança local.
Em 1996, praticamente havia apenas um ator com elevada influência (o prefeito) e os demais
possuíam pouca capacidade de inserção no processo decisório. Porém, durante a década 1996-2006,
foi possível visualizar a ampliação da influência do(a) secretário(a) de saúde e do conselho municipal de saúde no processo decisório local. Esse padrão é visível com mais intensidade na definição de
prioridades em saúde, onde a influência do(a) secretário(a) é quase universal, sem variações regionais
expressivas de porte, e a do conselho já atinge mais da metade dos municípios, com menor expressão
apenas nos grandes municípios (+200mil hab.).
Percebe-se que, no período 1996-2006, houve maior participação e diversificação de atores políticos com influência na elaboração do orçamento e na definição de prioridades em saúde, indicando
maior permeabilidade à inserção de interesses plurais com assento nos conselhos, e também pelo fortalecimento do poder técnico-político setorial, representado pelo próprio secretário e por consultores.
Na elaboração do orçamento, a influência dos atores setoriais é menor. Apenas o secretário municipal possui alta influência em mais da metade dos municípios, exceto nas regiões nordeste e sudeste
e nos municípios com população de 5-20mil hab. Aqui o prefeito possui maior força, mas evidencia-se
o fortalecimento da autoridade local, fenômeno este impulsionado pela descentralização e o emprego
da mediação financeira como forma de afirmação de sua autoridade. Similaridades podem ser observadas em relação à execução dos gastos em saúde, visto que o peso político do prefeito e do secretário
municipal de saúde é maior em detrimento de outros atores. A influência do prefeito é mais expressiva nas regiões norte e nordeste, enquanto no sul e centro-oeste a força do(a) secretário(a) de saúde é
maior. As variações de peso político entre esses dois atores são mais expressivas nos municípios acima
de 20 mil habitantes, onde o(a) secretário(a) de saúde pode ter maior influência.
326
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
Devido à força política do prefeito e do(a) secretário(a) de saúde na elaboração e execução
do orçamento, cabe destacar que o processo de descentralização não é equivalente ao fenômeno da
prefeiturização da política, caracterizado pela concentração de poderes no Executivo municipal.
A governança local, ao contrário, promove a articulação plural entre os diversos atores sociais no
processo de tomada de decisão da política, em consonância com a gestão pública mais transparente
e responsiva.
Por outro lado, concomitantemente à consolidação dos atores setoriais, é possível visualizar
novos atores, que se inserem, aos poucos, nos processos decisórios da política local de saúde, como
o judiciário, os(as) secretários(as) de outras pastas e as entidades da sociedade civil. A consolidação
dessa tendência pode ampliar a capacidade de permeabilidade do poder local e o espaço de inserção
de demandas plurais. Essa tendência é mais intensa na região sul.
Sobre essa questão, é importante ressaltar que o envolvimento de outras secretarias municipais na governança local em saúde favorece a intersetorialidade das políticas públicas, que ocasiona
impactos na articulação e integração de ações públicas com o objetivo último de dar respostas mais
eficientes e eficazes à população.
Além disso, deve-se atentar para a influência do judiciário na condução da política de saúde,
visto que a positivação do direito à saúde pode ocasionar implicações na atuação do Estado na gestão da política. O envolvimento de tal ator social na governança local em saúde provoca a reflexão
sobre os limites do poder judiciário na proteção do direito à saúde e seu impacto na gestão em
saúde.
Em relação à definição de prioridades em saúde, observa-se que o adensamento da dinâmica
institucional setorial também permitiu ampliar o espaço para os elementos técnico e democrático,
reduzindo o peso de pressões individuais diretas e fragmentadas, vindas dos diversos grupos de
interesse local. Esse movimento de fortalecimento do arcabouço de governança local convive, no
entanto, com a estratégia de descentralização, caracterizada ainda pelo elevado peso da esfera federal, que interfere no processo decisório local, por meio do uso de incentivos financeiros vinculados
à implantação de programas nacionais.
Os resultados sugerem uma possível tensão entre autonomia local e indução federal, na
contradição entre maior capacidade decisória e responsabilidade pela implementação de políticas
e menor domínio pleno de recursos para fazê-las. Essa tensão parece adquirir níveis diferentes, de
acordo com a condição socioeconômica do município, como pode ser vista nas diferenças de influência dos incentivos financeiros do ministério entre as regiões sul e norte. Da mesma forma, segundo os(as) secretários(as), municípios maiores e com mais recursos dependem menos dos incentivos
do nível central e enfatizam o peso das decisões técnicas, inclusive em detrimento das demandas de
conselhos e conferências.
Comparando com as informações disponíveis em 1996, é evidente o fortalecimento do elemento técnico da gestão em detrimento do jogo fragmentado de intermediação de interesses, seja
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
diretamente exercido, seja por meio da influência de políticos locais. É interessante notar as tendências diferenciadas de transformação nesse processo de modernização local. À primeira vista, seria
lógico supor que quanto maior a expansão do elemento técnico maior seria a redução da influência
de formas individualizadas de pressão, exatamente como ocorreu na região centro-oeste.
Entretanto, na região norte, também onde houve expansão expressiva do elemento técnico,
uma vez que foi a região onde houve menor redução de demandas fragmentadas. Em determinados
contextos, elementos de modernização podem ser mesclados aos padrões anteriores, formando tendências diferenciadas de transformação.
Da mesma forma, movimentos de modernização parecem não ser lineares, como pode ser
visto no caso das transformações ocorridas nos maiores municípios, onde houve redução expressiva
da influência de propostas de conselhos e conferências, que já se encontravam em patamares elevados
em 1996.
No que concerne ao funcionamento do conselho municipal de saúde, pode-se concluir que
representa um ator relevante no processo de mudança do padrão local de governança em saúde, na
medida em que insere a sociedade civil no processo decisório relativo às políticas locais de saúde.
Nesse ponto, segundo os(as) secretários(as), há avanços importantes em sua institucionalidade como a
eleição do presidente pelos conselheiros, a divulgação de resoluções e a formação de canais rotineiros
de negociação com o Executivo. Isso fortalece o padrão mais horizontal de governança local, onde
a sociedade civil, representada no conselho, pode fazer valer suas demandas frente à força do poder
Executivo. Por outro lado, ainda permanecem entraves à ampliação de sua autonomia como o fato
de a grande maioria não possuir sede própria e ter como presidente o próprio secretário municipal de
saúde. Essa tensão entre estruturas mais ou menos autônomas de conselho parece ser afetada mais com
o porte do município do que com o nível de desenvolvimento regional. Nos municípios com mais de
50mil habitantes há mais conselhos com sede própria e cujo presidente não é o secretário municipal
de saúde, variações essas que não ocorrem entre as regiões.
Além disso, o conselho municipal de saúde conquistou espaço e se tornou um ator relevante
durante a década 1996-2006, o que pode ser demonstrado pela sua influência significativa nas variáveis pesquisadas, como a elaboração e a execução do orçamento e a definição de prioridades em saúde.
Porém, estas instâncias participativas ainda possuem no seu funcionamento características políticas
tradicionais, que impactam diretamente na sua efetividade democrática e deliberativa e abrem espaço
para práticas conservadoras, no âmbito da relação entre Estado-sociedade.
No que diz respeito à prática de prestação de contas, observou-se que a aquisição de legitimidade em todas as regiões e portes populacionais e suas modalidades mais tradicionais - expressas na
exigência legal de apresentação a atores oficiais como o conselho, o prefeito e a câmara de vereadores
- estão praticamente institucionalizadas no setor saúde na esfera local.
Em alguns espaços como a região sul e os grandes municípios (+200mil hab.), é possível visualizar o início da segunda etapa desse processo, que corresponde à prestação de contas, para além do
328
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
exigido pelos marcos legais, como mostra a prática de rendição de contas à sociedade civil, que possui
uma amplitude democrática maior, mas que ainda é menos difundida.
Mesmo outros atores, que não são destinatários legais da prestação de contas do poder Executivo, estão sendo considerados relevantes para a prestação de contas, embora os percentuais ainda
sejam reduzidos, se comparados com os do prefeito, da câmara de vereadores e do conselho de saúde.
Os balancetes periódicos, que são instrumentos contábeis legalmente exigidos, já estão amplamente difundidos ao passo que uma segunda geração de instrumentos como audiências públicas,
locais públicos e meios de comunicação tem seu emprego ampliado, com maior velocidade de difusão,
em alguns espaços como a região sul. Nesse caso, mesmo em municípios de grande porte, a difusão de
inovações dessa segunda geração ainda mostra um movimento contraditório.
A comparação entre as duas edições da pesquisa reforça essa percepção, uma vez que o crescimento da prática de prestação de contas à câmara e aos conselhos foi maior do que a difusão da
prestação de contas a entidades da sociedade civil. Nesse sentido, a institucionalidade legal parece ser
um elemento modernizador importante, necessária mesmo nas regiões mais desenvolvidas e nos municípios com mais recursos técnicos e financeiros. Sem a pressão do marco legal, algumas inovações
têm difusão inicial reduzida e assimétrica, como podem ser vistas no caso da prática de prestação de
contas pelos meios de comunicação.
O mesmo movimento pode ser observado quando se analisam as práticas de oferta de informações à população. O padrão mais tradicional de oferta, que envolve informações básicas como ações e
campanhas e funcionamento de serviços, encontra-se plenamente difundido e institucionalizado em
todo o País, com alguns espaços onde a difusão ainda é um pouco menor como a região norte, o que
pode ser compreendido pela especificidade territorial da região.
Informações de natureza política e gerencial (informações direcionadas ao conselho e aos resultados de gestão), de conteúdo mais estratégico, ainda não têm sua difusão plenamente institucionalizada no País, representando uma tendência com maior potencial de modernização e democratização
do poder local. A difusão dessa tendência, nas duas situações citadas, é menor na região norte. A
difusão de informações direcionadas ao conselho e resultados de gestão é maior nos municípios com
população acima de 50mil habitantes.
De forma geral, pode-se concluir que os resultados indicam uma mudança em processo na
configuração da gestão local da política de saúde em direção a um padrão de governança mais democrático e transparente de relação Estado-sociedade. Esse padrão tem adquirido, de acordo com as
informações obtidas na pesquisa, as seguintes características:
• Mais atores possuem influência na elaboração do orçamento e na definição de prioridades
setoriais, notadamente aqueles empoderados pela institucionalidade do SUS (secretário e
conselho municipal de saúde). A influência dos atores do setor de saúde é maior na definição
de prioridades, ao passo que o prefeito tem maior poder nas decisões orçamentárias;
329
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
• É maior a relevância de elementos técnicos e de participação social no processo decisório de
definição de prioridades, assim como o peso da indução financeira do nível central do sistema, enquanto políticos locais tradicionais perdem espaço;
• As instâncias de inserção da sociedade civil foram fortalecidas em alguns aspectos, representando um movimento de consolidação institucional como os avanços observados nos conselhos municipais de saúde, mas convivem com barreiras à expansão de sua autonomia;
• É mais amplo o conjunto de atores a quem as secretarias prestam contas, assim como o tipo
de meio que se emprega para tal, o que representa um processo de consolidação da prática em
quase todos os municípios brasileiros;
• Mais informações são oferecidas à população sobre um conjunto diversificado de assuntos,
ampliando a transparência da ação pública;
Os avanços observados nas relações Estado-sociedade adquirem - como vistos na análise de
resultados - amplitude nacional, o que representa a institucionalização de elementos modernizadores
na prática política do País. Esse movimento confirma a relevância de reformas institucionais na promoção de transformações na cultura cívica local.
Entretanto, esse processo possui níveis de intensidade diferentes. Em geral, é possível distinguir
duas ondas de modernização das relações Estado-sociedade, que correspondem a amplitudes diferentes de democratização da governança local e apresentam graus diferentes de difusão no País.
A primeira onda é formada por mudanças quase sempre de menor impacto democratizante,
as quais já manifestam índices elevados de difusão no território nacional. São elementos típicos dessa
primeira onda a inserção do secretário municipal de saúde, na elaboração do orçamento, e do secretário e do conselho municipal de saúde, na definição de prioridades em saúde, assim como o emprego
de parecer técnico e das propostas de conselhos e conferências.
Pode, ainda, ser citada a prática de divulgação de resoluções pelo conselho e a definição de
canais efetivos de comunicação entre ele e a secretaria municipal de saúde, assim como a prática de
prestação de contas ao prefeito e à câmara de vereadores. Finalmente, o uso de balancetes periódicos
para a prestação de contas e a divulgação apenas de informações sobre ações e campanhas e sobre o
funcionamento dos serviços também podem ser incluídos nessa categoria.
A análise transversal dessas práticas mostra que sua difusão atingiu patamares bem homogêneos, no território nacional, e que as regiões ou portes onde os índices são menores não apresentam
diferenças elevadas em relação à média nacional. Isso pode indicar que, com o passar do tempo, a
consolidação do arcabouço institucional da política pode superar as barreiras socioeconômicas à democratização.
É importante mencionar também que mesmo práticas que estão mais difundidas podem sofrer
retrocessos, como pode ser visto no caso da influência das propostas de conselhos e conferências
330
G overnança L ocal no S istema Ú nico . . .
na definição de prioridades, que registrou redução em todas as regiões e em quase todos os portes
populacionais.
A segunda onda de inovação pode ser representada por um conjunto de inovações que, associadas a práticas já consolidadas, possibilitam, em geral, maior horizontalização das práticas decisórias
e maior transparências das ações do Estado. Podem ser classificados nessa categoria: a participação
do conselho municipal na elaboração do orçamento e da sociedade civil na definição de prioridades, a propriedade própria de sede para o conselho e a presença de um presidente que não seja o(a)
secretário(a) municipal, a prestação de contas periódica para entidades da sociedade civil, o uso de
audiência pública e de locais públicos para prestar contas, e finalmente, a divulgação de informações
requisitas pelos conselhos e relativas a resultados de gestão para a população.
Embora não seja uma barreira de impedimento, os resultados indicam que, em geral, condições
socioeconômicas mais favoráveis, em um primeiro momento, podem fornecer maior suporte para a
introdução da inovação. No entanto, o porte do município, altamente correlacionado com sua capacidade econômica indica que existe um tamanho ideal para que os instrumentos da governança local e
os atores vinculados ao sistema público tenham maior efetividade em sua ação. Municípios pequenos
apresentam, em geral, baixa capacidade técnica e são muito submetidos ao poder da prefeitura. Já
municípios muito grandes mostram dificuldades em fazer que os mecanismos de governança setorial
sejam efetivos na democratização do poder local. Novos atores de mercado passam a jogar um papel
muito maior e o conselho municipal perde influência. Portanto, parece que o porte intermediário
de 50mil a 200mil habitantes é onde atores e instrumentos de governança local funcionam melhor.
O que sinaliza a necessidade de descentralização intramunicipal, para adequação entre a arquitetura
institucional da democracia setorial e porte da administração local.
331
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
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333
Capítulo 6
Modernização da
Gestão Local do SUS:
a dimensão gerencial
Sonia Fleury
Assis Mafort Ouverney
Thais Soares Kronemberger
Felipe Barbosa Zani
1. Introdução
Nos últimos anos, parte expressiva da literatura sobre federalismo e relações intergovernamentais no Brasil tem se dedicado a promover uma revisão dos processos de descentralização
ocorridos em várias políticas públicas, responsáveis por transformar de forma significativa o papel dos governos locais no País.
Segundo esses autores, a descentralização portaria promessas
inconclusas de democratização, associadas à participação social
nas decisões governamentais, accountability e modernização do
Estado, que resultariam em melhores padrões de governabilidade, maior capacidade de inovação e maior eficiência e efetividade na gestão pública (Abrúcio, 2006; Farah, 2000; Azevedo &
Anastasia, 2002).
Apesar da ampla produção sobre descentralização nos
últimos anos, praticamente, não há na literatura nacional estudos de corte longitudinal que ofereçam subsídios empíricos
para uma avaliação acurada de um fenômeno processual. Esse
capítulo busca justamente contribuir para suprir essa deficiência,
analisando diacronicamente os impactos da descentralização da
política de saúde nas últimas duas décadas sobre o processo de
modernização gerencial dos governos locais, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
As secretarias municipais de saúde passaram a gerenciar
a grande maioria das unidades públicas de provisão de serviços
de saúde no domínio do SUS, além de assumir também a
335
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
responsabilidade formal pela contratação, monitoramento e avaliação (gestão) de amplo conjunto de
unidades privadas. Segundo informações disponíveis para o ano de 2010 no Cadastro Nacional de
Estabelecimentos de Saúde (CNES), administrado pelo Ministério da Saúde, de um total de 221 056
estabelecimentos de saúde, 59 663 (27%) eram municipais, o que corresponde a aproximadamente
95,6% da oferta pública de estabelecimentos de saúde que, incluindo as unidades estaduais e federais,
totalizavam 62 437 unidades em 2010 (Brasil, 2010).
A formação de estruturas e capacidades de gestão suficientes para assumir tamanha empreitada e dar conta das novas responsabilidades exigiu a formação de competências complexas, somente
possível mediante a incorporação e difusão de um extenso conjunto de inovações impulsionadas pelo
processo de descentralização. Essas inovações foram realizadas nas dimensões sociais, assistenciais e gerenciais. Neste último caso, envolvem diversas áreas como gestão de pessoas, compras governamentais,
gestão da informação, planejamento, gestão de contratos, gestão da qualidade, entre outras.
A tipologia estabelecida por Rondinelli (1981) para o estudo da descentralização destaca os
graus de autonomia envolvendo a transferência de responsabilidades de planejamento, gestão, arrecadação e aplicação de recursos, desde o governo central para as unidades territoriais. Estudos mais
recentes sobre governança local têm enfatizado o papel destes fatores institucionais, políticos, administrativos e fiscais como condicionadores e não só resultantes da descentralização.
A descentralização é compreendida nesse capítulo como um processo de difusão de mecanismos institucionais decorrentes da constitucionalização do regime universal de proteção social, o que
representa uma ruptura com o padrão histórico segmentado de proteção social no Brasil (Fleury,
1994). Nesse sentido, os desafios da descentralização setorial são mais ousados porque não se trata
apenas da transferência de recursos e de poder entre níveis de governo, mas também da mudança da
relação entre Estado e cidadãos, em busca de uma governança democrática (Fleury, 2005). Abrúcio
(2006) advoga que, além da criação de um ambiente intergovernamental positivo, a descentralização
demanda a constituição de boas estruturas administrativas no plano subnacional já que a promessa de
ganhos de eficiência baseados na descentralização depende das capacidades institucionais e administrativo-financeiras dos entes locais.
Nesse capítulo argumenta-se que a descentralização contribuiu para a modernização da gestão
local, na medida em que tem difundido inovações em diversas áreas de competência das secretarias
municipais de saúde, mesmo tendo sido baseada em uma estratégia contraditória e insuficiente em um
ambiente político e econômico desfavorável.
As evidências para tal provêm de estudo longitudinal do processo de descentralização do Sistema Único de Saúde (SUS) - realizado em âmbito nacional em dois momentos, em 1996 e 2006,
com informações coletadas junto aos (às) secretários(as) municipais de saúde em resposta a um questionário aplicado nestes dois momentos. A possibilidade de ter uma base de dados original sobre um
fenômeno processual como a descentralização permitiu comparar a evolução durantes esta década,
demonstrando que houve significativos avanços na modernização gerencial das secretarias municipais
336
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
de saúde. Apesar das assimetrias verificadas entre os municípios de diferentes regiões e portes populacionais, foram encontrados significativos aperfeiçoamentos gerenciais em áreas essenciais da gestão da
política local de saúde, tais como gestão da informação, gestão de pessoas, estabelecimento de parcerias, e celebração de convênios de apoio técnico, entre outros.
Esse capítulo está estruturado em quatro seções, além dessa introdução e das referências bibliográficas. A seção 2 discute os principais aspectos relacionados ao contexto político e econômico
em que foi implementada a estratégia de descentralização do SUS. A seção 3 descreve a metodologia
adotada na pesquisa, enquanto a seção 4 apresenta os principais resultados referentes à gestão local do
sistema de saúde. A última seção do capítulo analisa as principais tendências observadas no processo
de modernização das secretarias de saúde, assim como as insuficiências decorrentes da precariedade do
contexto e da insuficiência da estratégia de descentralização.
2. Descentralização e modernização gerencial dos governos locais no SUS: contexto desfavorável
e estratégia insuficiente
O período de desenvolvimento do SUS coincidiu com a emergência de uma nova agenda de
reformas fundamentada na redefinição do projeto nacional, com importantes transformações na estrutura política do País (relações Estado/sociedade, relações intergovernamentais e entre os poderes
na União), na estrutura e capacidade de intervenção estatal e nos fundamentos do modelo econômico
(políticas fiscal, cambial, industrial etc.).
A abertura processada na esfera pública durante a década de 1980, com a incorporação de
variados atores e interesses na definição da agenda governamental, os anos 1990 representaram um
ponto de inflexão nesse processo ao produzir o insulamento das principais instâncias decisórias e o
fechamento dos canais do Estado à inserção das demandas sociais (Diniz, 2004; Alves, 2000; Loureiro
& Abrúcio, 1999).
No plano federativo, as reformas estruturais operaram a reconcentração de poder na União,
obtida por meio da redução da autonomia das esferas subnacionais e do fortalecimento da capacidade
de coordenação federativa do gestor federal. Para tanto foram utilizados diversos instrumentos como
indução financeira e regulação legal, programas de controle do endividamento dos estados e municípios, intervenção e privatização dos bancos estaduais, promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal,
desvinculação de recursos das contribuições sociais, ampliação assimétrica da carga tributária, entre
outros (Melo, 2006; Couto & Arantes, 2002; Arretche, 2002; Abrúcio, 2005).
A reforma administrativa do Estado privilegiou a formação de núcleos estratégicos, transferindo ao mercado atividades produtivas e compartilhando funções com a sociedade civil, o que resultou
na redução de sua estrutura, composição de quadros e alcance de sua capacidade planejadora. A agenda de reformas estruturais, que direcionou o Estado para atividades de regulação de mercado e centralizou a agenda macroeconômica em torno da estabilização monetária (Beluzo & Carneiro, 2003;
337
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Lopreato, 2000) teve impactos significativos sobre o setor saúde. Isto porque reduziu a disponibilidade
de recursos na área social, intensificou a verticalização das relações federativas com poucos estímulos ao
compartilhamento de funções, além de produzir incentivos à individualização da proteção, entre outros.
O processo de descentralização em saúde foi conduzido pela União e empregou a pactuação
de marcos normativos temporários (as normas operacionais) associados a instrumentos de indução financeira como referenciais de condução e direcionamento das esferas subnacionais, especialmente os
municípios, na formação de capacidades de gestão e provisão de serviços de saúde. A adesão de estados
e municípios às condições padronizadas permitiu a construção de bases institucionais regulares (Ribeiro,
1997), resultando na transferência progressiva de responsabilidades sanitárias, na expansão da oferta de
serviços, na mudança de modelos e práticas de cuidado, no estabelecimento de processos estáveis constantes de negociação e pactuação, entre outros (Levicovitz, Lima & Machado, 2001).
Nesse processo, um aspecto central da capacidade de gestão subnacional diz respeito à estrutura
de recursos humanos em vista do expressivo contingente e da complexa variedade de ocupações profissionais envolvidas no setor saúde, que além de determinarem a eficiência administrativa de uma política
social abrangente, são diretamente responsáveis pela prestação de serviços. Em termos orçamentários, os
dispêndios com recursos humanos representam aproximadamente 60% dos orçamentos dos hospitais e
90% das unidades ambulatoriais (Banco Mundial, 2007).
A autonomia local para gerir os recursos humanos, definindo políticas direcionadas à seleção,
retenção, qualificação, remuneração e avaliação dos profissionais é vista como um fator importante para
aumentar a efetividade da descentralização. O grau de autonomia das unidades de gestão de recursos humanos, mesmo quando descentralizados, esbarra na rigidez das normas legais, que restringem as possibilidades de adoção de modelos gerenciais compatíveis com a contemporânea organização das relações de
trabalho e que permitem a adequada seleção, manutenção e avaliação dos funcionários (Banco Mundial,
2007, Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde – Conass, 2011b).
A legislação impõe limites para gastos com pessoal, o que dificulta a realização rotineira de concursos públicos, enrijece a reposição ou substituição oportuna dos trabalhadores (Conass, 2004), acarretando a combinação de múltiplas formas de contratação dos profissionais, adicionando à contratação
via poder público outras formas de ingresso como as empresas de terceirização e as cooperativas de
profissionais.
A terceirização de mão de obra na administração pública tem sido alvo de debates de ordem legal
– vedações às atividades-fim, cômputo para o cálculo dos limites estipulados pela LRF (Ferraz, 2007) – e
de ordem sociológica, no que tange à precarização dos vínculos trabalhistas refletida nos menores salários, rotatividade, diminuição da proteção social etc.
A coexistência de funcionários em diferentes regimes de contratação é vista como responsável pela
fragmentação institucional, redução da governabilidade bem como aumento de conflitos e desmotivação
dos profissionais como resultado dos desequilíbrios de remuneração e de estabilidade dos vínculos empregatícios (Banco Mundial, 2007; Conass, 2011b; Cherchglia, 1999).
338
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Enquanto a contratação via concurso público permite reduzir o passado clientelista e patrimonialista, a ausência de carreiras definidas e a competição com o mercado de trabalho privado provocam
demandas pela adoção de mecanismos de remuneração adicional para os profissionais do SUS ou de
preservação de um duplo vínculo com o setor público e privado. Por outro lado, o engessamento legal
na gestão do funcionalismo público é visto como responsável pelo imobilismo e perda de qualidade
no serviço público de saúde.
Políticas como o pagamento variável em função do desempenho têm sido debatidas e mesmo
introduzidas, apesar das fortes clivagens ideológicas em torno deste tema. Contudo, Viacava et al.
(2004) argumentam que, expandindo o entendimento de performance para além de análises focadas
exclusivamente no custo–efetividade do sistema de saúde, as informações geradas por esses processos
avaliativos podem contribuir para a redefinição de processos, pactuação de metas e para o desenvolvimento individual.
Já a qualificação dos profissionais por meio de políticas de educação próprias dos municípios
é propícia à criação de identidade institucional e ao aprendizado organizacional (Conass, 2011b) e
aproxima a educação aos problemas cotidianos, que extrapolam as salas de aula como espaços de ensino (Brasil, 2009a). A política de formação deve incorporar não só a dimensão científico-tecnológica,
mas também a ético-política, com a valorização da humanização das relações interpessoais, respeito à
diferença, preservação e defesa da vida (Paim & Teixeira, 2007).
Outro sistema administrativo importante na política de saúde é a gestão de compras e serviços.
A gestão de materiais é responsável por 20% dos recursos setoriais, o que explica a austeridade da
normatização, preocupada em coibir a corrupção. Diplomas legais como a “Lei de Licitações”, em
virtude das exigências e dos prazos dilatados, provocam a morosidade dos procedimentos de compras,
afastando eventuais fornecedores, elevando os preços ofertados e atrasando a celebração de contratos
(Banco Mundial, 2007).
Com isso, entre os principais motivos aventados para a escolha da dispensa de licitação estão
os atrasos no processo de compras. Esta modalidade licitatória, legalmente aplicável a aquisições de
pequeno valor e a situações excepcionais (casos de emergência, por exemplo), ao afastar a concorrência pública, confere significativo poder discricionário ao agente público, que pode obter vantagens
indevidas. A dispensa de licitação também pode refletir a falta de planejamento por parte dos(as)
gestores(as), hipótese frequentemente combatida pelos tribunais de contas.
A morosidade dos procedimentos licitatórios ocorre também em modalidades como convite,
tomada de preço ou concorrência. O pregão presencial e, sobretudo, o pregão eletrônico são procedimentos muito mais ágeis pelo encurtamento de prazos e inversão de fases, agregando ainda ganhos de
eficiência em virtude da oferta de lances pelos licitantes (Conass, 2011a).
A licitação pode ser aplicada tanto para a compra de bens quanto para a aquisição de serviços. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 199, § 1º, dispõe que “as instituições privadas
poderão participar de forma complementar do Sistema Único de Saúde, segundo diretrizes deste,
339
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as
sem fins lucrativos”.
A terceirização de serviços de saúde, por intermédio de Organizações Sociais (OS), Organizações não Governamentais (ONGs), rede privada, ou qualquer outro tipo organizacional, também é
campo repleto de questionamentos jurídicos e ideológicos, o que não impede sua disseminação. Matos e Pompeu (2003), com base nos dados oferecidos pelos Cadastro Nacional dos Estabelecimentos
em Saúde (CNES), revelam o complexo entrelaçamento entre a rede assistencial pública e privada,
comprovada, por exemplo, pelo expressivo número de estabelecimentos privados cadastrados no sistema que prestam serviço ao SUS.
Autores como Paim e Teixeira (2007) apontam como parte do modelo gerencialista preconizado pela reforma neoliberal, a disseminação de organizações sociais, não governamentais, da sociedade
civil de interesse público, levando à desresponsabilização do Estado e à fragmentação institucional da
política de saúde. Por outro lado, seus defensores alegam que este movimento pode imprimir maior
agilidade aos processos de compras, fomentar o estabelecimento de instrumentos formais de pactuação de resultados e reduzir o clientelismo político na indicação dos cargos de direção (Quinhões,
2009). Certo é que a disseminação dessas modalidades de contratação fora do serviço público também
tem sido fomentada pela necessidade de não ultrapassar o limite imposto para os gastos com pessoal
pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
De todo modo, a contratação de serviços da rede privada demanda esforços regulatórios sobre
os serviços oferecidos, requerendo uma capacidade operacional de contratação, seguimento e avaliação por parte do poder público já que a terceirização infla os problemas da cadeia agente – principal
quanto ao monitoramento da qualidade dos serviços ofertados. Contudo, segundo Matos e Pompeu
(2003), o baixo nível de formalização das relações público-privadas, desloca os esforços regulatórios
para questões mais basilares como a definição clara do objeto, quantidade e valor dos serviços comprados, quando, evidentemente, os contratos também devem funcionar como indutores da melhoria
da qualidade dos serviços.
A compra de serviços privados pelo SUS tem obedecido à lógica da oferta dos prestadores
privados, em função da histórica fragilidade estatal no planejamento das necessidades de complementação da rede pública e da pressão exercida pelos atores privados em virtude do perfil da capacidade
instalada. Neste sentido, as estratégias de regionalização em saúde constituem-se em vigorosas ferramentas para a definição da demanda de contratação de serviços em base hierarquizada e regionalizada
(Matos & Pompeu, 2003; Silva, 2011).
Com relação à produção, a área de saúde constitui-se em importante frente dos sistemas nacionais de inovação e de geração de emprego e renda e, consequentemente, da estratégia de desenvolvimento econômico e industrial dos Países. No entanto, a interação do setor público responsável por
resguardar os direitos da cidadania com interesses empresariais, regidos pela ótica do lucro, tem sido
vista como problemática, em especial na prestação de serviços. Por isso, a inserção da política de saúde
340
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
na estratégia de desenvolvimento econômico tem sido relegada pelo pensamento crítico sanitarista ou
abordada, de maneira defensiva frente à pressão empresarial pela incorporação de novos produtos e
processos no sistema (Gadelha, 2006).
Em relação à gestão, considera-se que além do fortalecimento da capacidade de planejamento
do Estado, que asseguraria a prevalência do interesse público na compra de serviços de agentes privados, a regionalização do sistema de saúde contribui decisivamente para a concretização da integralidade do atendimento e para a eficiência da política pela maior racionalidade sistêmica na utilização dos
recursos e na oferta assistencial (Silva, 2011).
São distintas as estratégias adotadas para a regionalização dos serviços de saúde. O Plano Diretor de Regionalização (PDR), operacionalizado por meio da Programação Pactuada e Integrada (PPI),
preconiza a organização das unidades estaduais em módulos assistenciais com graus crescentes de
complexidade na oferta dos serviços. O mesmo plano objetiva garantir à população o acesso integral
aos serviços de saúde, ao aumentar a capacidade gerencial do sistema, reduzir o impacto das pressões
de oferta em prol das necessidades de saúde e fomentar relações cooperativas com a melhor definição
de responsabilidades interfederativas (Brasil, 2002; Fleury & Ouverney, 2007).
O desenho da regionalização dos serviços de saúde, expresso no PDR, deve ser elaborado pelo
ente estadual e apresentado para discussão nas instâncias de articulação e pactuação (CIBs) e nas
instâncias de articulação de atores sociais (conselhos estadual e municipal de saúde) visando conferir
legitimidade e coerência ao plano (Brasil, 2002). Em que pesem as críticas sobre a perda de autonomia
municipal e a recentralização provocada por um instrumento que é elaborado e operacionalizado pelas
secretarias estaduais de saúde (Paim & Teixeira, 2007; Trevisan & Junqueira, 2007).
Os consórcios intermunicipais de saúde também figuram como instrumentos da estratégia de
regionalização dos serviços adotada pelos municípios para obterem ganhos de escala na aquisição de
bens e de escopo na oferta de serviços assistenciais de maior complexidade, além de organizarem o
fluxo de pacientes na rede hospitalar. São responsáveis por conferirem capacidade administrativa e
eficiência às ações governamentais (Ribeiro & Costa, 2000).
A modernização da gestão local da política saúde, no entanto, envolve tanto a formação de
capacidades administrativas internas relacionadas aos aspectos essenciais da gestão, comuns a todas as
políticas públicas (gestão de pessoas, informações, recursos financeiros, estruturas físicas etc.), quanto
competências setoriais específicas de articulação com outras esferas de Estado (relações intergovernamentais) e com a sociedade civil e mercado (relações macro políticas). Isto é, o fortalecimento da
capacidade das gestões locais também exige o estabelecimento de redes de articulação com os agentes
privados e com outras esferas governamentais para a construção de projetos coletivos no Sistema Único de Saúde (SUS).
Os governos locais devem institucionalizar mecanismos que permitam a identificação das demandas portadas pela população, combinando o contato com instâncias de representação social (conselhos municipais de saúde), ferramentas que identifiquem estatisticamente a opinião do universo de
341
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
cidadãos abarcados pelo sistema (pesquisa de opinião), meios interativos (internet), dentre outros
mecanismos que democratizem os canais de ausculta e manifestação da população.
Em resposta às demandas identificadas, as secretarias municipais devem oferecer respostas
concretas, que evidenciem capacidade de planejamento e permeabilidade do poder público em
relação aos grupos com os quais pretende construir relações de parceria. As respostas a denúncias
e queixas podem envolver medidas restritas como sanções diretas aos agentes públicos; mudanças
ao nível organizacional, como a criação de novos serviços; a avaliação da gestão para corroborar e
aprofundas as demandas recebidas; ou ainda alguma combinação entre tais artifícios para potencializar sua ação responsiva.
A inserção das gestões locais com atores privados, governamentais ou da sociedade civil é
vista como inovadora quando busca o estabelecimento de relações de apoio técnico e/ou de parcerias no nível horizontal (comissão bipartite, consórcio intermunicipal, COSEMS, CONASEMS,
outros setores do governo municipal), nível vertical (governo estadual, governo federal) ou com
organizações privadas (agências internacionais, consultoria privada, ONGs, universidades, igrejas,
OSCIPS). Tais laços de cooperação visam à criação de agendas setoriais, buscam a intersetorialidade da política de saúde, o aprofundamento dos vínculos com a sociedade civil e o intercâmbio de
conhecimento crítico e estratégico etc.
3. Metodologia
As informações discutidas nesse capítulo provêm da pesquisa Municipalização da Saúde e Poder Local no Brasil, desenvolvida com o objetivo de estudar as mudanças ocorridas na configuração e
no modo de funcionamento do sistema de poder municipal, baseada na descentralização das ações e
serviços de saúde, caracterizando-as quanto ao seu eventual caráter democratizante e modernizador.
Partiu-se da premissa de que a descentralização levaria ao aperfeiçoamento da capacidade de gestão
local, na medida em que, por meio de alterações provocadas no perfil do(da) gestor(a) e no processo
de gestão, poderia estar induzindo modificações na composição e na direcionalidade do poder local,
ampliando assim a gama de interesses sociais atendidos pelo sistema municipal de saúde.
Para fins de melhor caracterizar a natureza e o conteúdo da inovação, o processo de gestão
foi decomposto em três dimensões: social, gerencial e assistencial. Por dimensão social entende-se a
relação estabelecida entre a gestão municipal e os diferentes atores da sociedade, enquanto a dimensão assistencial engloba diferentes ações e/ou programas, que estão direcionados para aquilo que se
convencionou chamar “a ponta da linha”, ou atenção à saúde. Neste capítulo serão tratados apenas
os impactos da descentralização sobre a inovação gerencial, entendida como mudanças do desenho
institucional e da dinâmica de funcionamento, eventualmente ocorridas no processo de gestão local
e que contemplem a introdução ou aperfeiçoamento de instrumentos gerenciais que visam alterar a
qualidade e a efetividade dos processos de administração da atenção à saúde.
342
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Ou seja, a dimensão gerencial, objeto deste capítulo, compreende a introdução, aperfeiçoamento e manutenção de processos administrativos identificados como responsáveis por aprimorar a
gestão municipal de saúde, sendo frequentemente recomendados pelos organismos formuladores das
políticas do setor. Incluem-se neste caso aspectos relativos ao aumento da eficiência da gestão (compras
e licitações, gestão de pessoas, gestão da informação, etc.) potencializada pela utilização de recursos
externos à secretaria (como parcerias, consórcios etc.) e aspectos relativos à valorização da dimensão
técnica da gestão (assessorias etc.). Foram também considerados os aspectos relativos à captação da
demanda pelo(a) gestor(a) municipal e à sua transformação em parâmetros para redirecionar a política
de saúde.
Entre eles destacam-se ações voltadas para a racionalização dos recursos (como centrais de
marcação de consulta ou de ambulância, fichas de referência etc.). Também se incluem nesta dimensão ações que visam à alteração do modelo de atenção à saúde, com ênfase na prevenção e redução da
hospitalização.
Tomando como unidade de análise o Secretário Municipal de Saúde, e assumindo-o como fonte de informação principal da pesquisa, foi construído um modelo analítico que permitiu a elaboração
do instrumento e da estratégia de coleta de dados. Para analisar a gestão municipal de saúde, tomouse como parâmetro a capacidade percebida pelos(as) secretários(as) de introduzir diferentes tipos de
inovação nas dimensões social, gerencial e assistencial.
Na dimensão gerencial, foco desse capítulo, foram selecionados seis atributos considerados essenciais à gestão inovadora: impacto da informação recebida da população, compras e serviços, gestão
de pessoas, apoio técnico, parcerias e regionalização. A seleção desses atributos foi realizada com base
na revisão da literatura e na consulta a especialistas de instituições acadêmicas e governamentais das
três esferas de governo que atuavam junto à descentralização do SUS. Os questionários foram aplicados em dois momentos distintos, 1966e 2006, tendo sido enviados pelo correio, o que requereu,
nos dois períodos, uma espera de cerca de quatro meses para recebimento das informações. O fato de
ser uma pesquisa comparativa de um fenômeno dinâmico necessitou proceder a uma adaptação para
que o questionário mais recente pudesse incorporar, dentro das mesmas categorias, novos atributos e
variáveis transformados em questões atuais da política e gestão de saúde. Essa atualização ocorreu nas
oficinas de trabalho com especialistas e gestores(as) acima citados(as) e resultou na inclusão de novas
questões no questionário.
Na dimensão gerencial foram incorporadas 12 (doze) novas questões distribuídas em três novos
blocos de atributos: compras e serviços: (modalidades de aquisição, formas de terceirização de serviços e controle de qualidade), gestão de pessoas (formas de gestão, política de capacitação, formas de
contratação de profissionais e mecanismos adicionais de remuneração), regionalização (todas as cinco
questões).
Em ambas as edições, os questionários foram distribuídos a todos os municípios do País. O
tratamento dos dados utilizou o software de análise de dados SPSS. Foram utilizadas duas matrizes de
343
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
configuração da estrutura de processamento dos dados. Em 1996, o retorno foi de 28%, variando de
15,3 a 40,5% entre as regiões. Em 2006, o retorno total foi 19,5%, com variação regional de 9,6 a
25,2%. Enquanto em 1996 optou-se por considerar a amostra de questionários recebidos como autorrepresentativa, em 2006 foi feito um trabalho estatístico de ponderação por expansão da amostra para
torná-la representativa. Essa ponderação foi efetuada em função do volume menor de questionários
respondidos, o que motivou o apoio de análises estatísticas de representatividade durante a coleta de
informações.
Uma vez realizada a expansão, tornou-se possível inferir as informações nacionais relativas ao
perfil do(a) gestor(a) e às características da gestão dos sistemas municipais de saúde. Para cada uma
das questões gerou-se um conjunto de tabelas descritivas por porte do município e região geográfica,
acrescentando a variável modalidade de gestão na versão 2006. Em seguida, foram construídas as
tabelas comparativas entre as pesquisas de 1996 e 2006 para as questões comuns nas duas versões.
Nesse caso, foram necessários alguns ajustes voltados a atenuar diferenças tais como as mudanças no
formato das questões comuns, a estrutura de classificação de porte populacional adotada, entre outras.
A segunda matriz continha a configuração estabelecida ao final do processo de elaboração e revisão do
índice de inovação, indicador esse que não será tratado nesse capítulo.
4. Resultados: inovações na gestão local em saúde
A descrição dos resultados da pesquisa está organizada pelas diferentes variáveis que, sequencialmente, discorrem sobre o cenário nacional, cenário regional e cenário por porte populacional, e, a
comparação desses resultados na década estudada em termos nacionais e as variações por região e por
porte populacional.
Os itens relativos à gestão de pessoas, às compras de serviços e à regionalização referem-se apenas aos dados do questionário de 2006, enquanto os itens sobre impacto da informação, apoio técnico
e parecerias, como foram usados nos dois questionários, permitem a comparação entre 1996 e 2006.
4.1 Gestão de pessoas
Em 2006, a gestão de recursos humanos das secretarias de saúde era realizada predominantemente pela secretaria de administração da Prefeitura (83,0%). As demais formas de gestão ainda eram
pouco utilizadas - órgão de recursos humanos dentro da secretaria de saúde (21,3%), instituições
privadas (3,3%) e cooperativas (1,9%) – padrão que se repete indiscriminadamente entre as regiões.
344
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 101 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por gestão de recursos humanos,
segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na análise por porte populacional, entretanto, pode-se destacar que quanto maior o município,
mais secretarias de saúde gerenciavam os recursos humanos por meio de órgão próprio da secretaria
de saúde (60,9% nos municípios entre 50 e 200 mil habitantes, e 72,3% nos municípios com mais
de 200 mil).
345
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 102 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por gestão de recursos humanos,
segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em relação à política de capacitação, em 2006, grande parte das secretarias municipais de saúde
valeu-se dos cursos e treinamentos oferecidos pelos governos estadual e federal (82,4%). Aproximadamente um terço das gestões de saúde dispunha de política de educação permanente (37,9%) e/ou de
política própria de capacitação (32,0%).
As secretarias de saúde da região sul foram aquelas que mais implementaram política própria
de capacitação (42,7%) e/ou de educação permanente 46,8%), esta última pouco comum no centrooeste (23,3%) e no norte (28,4%).
346
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 103 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por política de capacitação,
segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na análise por porte do município verificou-se que a disseminação da política de educação
permanente e da política própria de capacitação está relacionada ao tamanho do município, sobretudo
naquelas localidades com mais de 200 mil habitantes (65,7% e 66,9%, respectivamente).
347
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 104 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por política de capacitação, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 2006, a forma de contratação de profissionais utilizada por praticamente todas as secretarias de saúde foi o Poder Público (93,9%). Pouco difundidas eram as contratações via consórcio
intermunicipal (3,5%), cooperativas de profissionais (3,4%), organização não governamental (3,4%)
e/ou empresas de terceirização de mão de obra (7,2%), mais frequente na região sul (15,0%).
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M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 105 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por forma de contratação, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A análise por porte populacional indica que as contratações por intermédio do Poder Público
e /ou de empresas de terceirização de mão de obra foram mais freqüentes, conforme o aumento do
tamanho do município. Nos municípios com mais de 200 mil habitantes destacaram-se as contratações por meio de terceirização (34,6%), cooperativas de profissionais (28,6%) e/ou organização não
governamental (15,1%).
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Gráfico 106 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por forma de contratação, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 2006, verificou-se que a maioria das secretarias de saúde não adotou incentivos (53,1%)
para remuneração por desempenho. Somente 22,1% das secretarias de saúde realizaram pagamentos
adicionais por desempenho, 12,0% realizaram pagamento além da tabela do SUS, e 3,1% efetuaram
complementação salarial por fundação privada.
As gestões locais de saúde da região centro-oeste foram as que mais realizaram pagamento de
adicionais por desempenho (32,2%), e/ou pagamento além da tabela do sus (22,9%). Os pagamentos
adicionais são menos comuns nas secretarias de saúde das regiões sul (39%) e sudeste (42,6%).
350
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 107 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipos de pagamentos adicionais para profissionais, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O pagamento de adicionais é mais comum à medida que aumenta o porte do município. Similarmente, quanto maior o porte populacional, maior o percentual de secretaria de saúde que efetuava
pagamento de adicionais por desempenho. É importante notar que os municípios de 50 mil a 200 mil
habitantes foram aqueles que mais realizaram pagamento além da tabela do SUS (23,6%).
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Gráfico 108 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipos de pagamentos adicionais para profissionais, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.2 Compras e serviços
Em 2006, a grande maioria das secretarias municipais de saúde optou por realizar as compras e
contratações por meio de licitação tradicional (88,4%), tendo o pregão presencial (16,3%) e o pregão
eletrônico (9,8%) pouca inserção nas gestões de saúde. Dispensa de licitação em virtude de emergência foi utilizada por 22,7% das secretarias de saúde.
Nas regiões sudeste e sul, contudo, verifica-se maior difusão do uso do pregão presencial (23,7%
e 23,6%, respectivamente) e do pregão eletrônico (14,0% e 14,8%, respectivamente).
352
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 109 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por mecanismos de compras e
contratações, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O padrão de adesão às modalidades licitatórias guarda forte relação com o porte populacional.
Percebe-se que quanto maior o município, menor a utilização da licitação tradicional. Consequentemente, as modalidades de pregão são mais utilizadas quanto maiores forem os municípios. Vale destacar que os municípios com 50 mil a 200 mil habitantes são aqueles que mais se valeram da dispensa
de licitação em virtude de emergência (35,9%).
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Gráfico 110 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por mecanismos de compras e
contratações, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Segundo os(as) secretários(as) municipais de saúde, em 2006, a maior parte das secretarias
municipais de saúde firmava contrato com a rede privada (44,8%), seguido de convênio com a rede
filantrópica (27,7%). São incomuns as demais modalidades de terceirização consideradas: convênio
com Oscip, convênio com ONG, contrato de gestão com OS. É interessante notar que 24,0% dos(as)
secretários(as) municipais de saúde não responderam a essa questão, o que pode indicar a dificuldade
de explicitar sua posição em tema polêmico. Porém, embora sendo prática ilegal, alguns municípios
praticam a venda de serviços privados em unidades públicas (7,5%).
A região norte sustentava o menor percentual de terceirização por meio de contrato com a rede
privada (30,5%). Os convênios com a rede filantrópica foram menos frequentes nas regiões norte
(10,1%) e nordeste (16,3%), e mais comuns no sudeste (44,5%). No sul destacam-se os convênios
com Oscip (11,7%).
354
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 111 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por forma de terceirização de
serviços, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A análise por porte populacional demonstra que, quanto maior o município, sobretudo nos
municípios com mais de 50 mil habitantes, mais comum são os contratos com rede privada, convênios com rede filantrópica, com Oscip, com Ongs, e com OS.
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Gráfico 112 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por forma de terceirização de
serviços, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 2006, mais da metade das secretarias municipais de saúde possuía mecanismos de controle
sobre a qualidade dos serviços próprios (51,6%). A qualidade dos serviços contratados e conveniados
era pouco controlada pelas secretarias de saúde (23,6% e 19,2%, respectivamente). Na verdade, mais
de um terço das gestões locais de saúde não dispunham de mecanismos de controle de qualidade sobre
os serviços (36,6%).
A análise por região revela que as secretarias do sul eram as que mais controlavam os serviços
conveniados (27,9%), ao passo que os serviços contratados eram pouco avaliados no Norte (8,3%).
356
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 113 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por mecanismos de controle de
qualidade, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Verifica-se, com base no porte populacional, que os grandes municípios, com mais de 200
mil habitantes, mas principalmente os municípios de médio porte, entre 50 mil e 200 mil habitantes, incorporam os mecanismos de controle de qualidade, seja para serviços próprios (59,5% e
62,9%, respectivamente), serviços contratados (42,1% e 48,4%), seja para serviços conveniados
(38,6% e 39,5%).
357
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 114 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por mecanismos de controle de
qualidade, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.3 Regionalização
Quase a totalidade das secretarias municipais de saúde participava da Programação Pactuada e
Integrada (PPI) como estratégia de regionalização de serviço (91,7%), tendo em vista a obrigatoriedade instituída pela legislação do SUS. Participavam de consórcio intermunicipal e da regionalização
pela NOAS 2002 aproximadamente um terço das secretarias (35,3% e 33,4%, respectivamente).
Porém, a participação em consórcio intermunicipal foi mais significativa nas regiões sudeste
(51,2%) e sul (70,0%), e, pela ótica do porte populacional, nos municípios até 5 mil habitantes
(45,8%).
358
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 115 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por participação em estratégia
pactuada de regionalização de serviço, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por outro lado, quanto maior o porte do município, menor a adesão aos consórcios e a PPI, e
maior a regionalização pela NOAS 2002.
359
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 116 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por participação em estratégia
pactuada de regionalização de serviço, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Verificou-se uma percepção positiva da maioria dos(as) secretários(as) em relação à estratégia
pactuada de regionalização que participam, pois consideraram que avançaram em relação à situação
anterior (82,2%) sem que fosse possível verificar variações significativas quanto à região ou ao porte
populacional.
360
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 117 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por percepção quanto à estratégia pactuada de regionalização de serviço, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
361
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 118 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por percepção quanto à estratégia pactuada de regionalização de serviço, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A elaboração do Plano Diretor de Regionalização (PDR) contou com a participação de aproximadamente metade das secretarias de saúde (56,7%), bem distribuídas entre as regiões.
362
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 119 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por participação do município
da elaboração do plano diretor de regionalização, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Foram mais atuantes as secretarias dos municípios com porte populacional de 50 a 200 mil
habitantes (71,5%) e mais de 200 mil habitantes (66,6%).
363
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 120 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por participação do município
da elaboração do plano diretor de regionalização, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O principal motivo da não participação na elaboração em alguma estratégia pactuada de regionalização foi a centralização do processo na secretaria estadual de saúde (64,2%). Tal alegação
foi mais expressiva na região centro-oeste (76,6%) e menos significativa no norte (38,3%). Os(as)
secretários(as) de saúde desta região alegaram que a estratégia de regionalização não foi elaborada
(29,3%).
364
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 121 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por motivo de não participação
em alguma estratégia pactuada de regionalização, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na análise por porte populacional, verifica-se que quanto maior o porte, mais frequentes são
as alegações de que a não elaboração de estratégia pactuada de regionalização justificava a ausência do
município.
365
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 122 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por motivo de não participação em alguma estratégia pactuada de regionalização, segundo o porte populacional dos
municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por fim, as formas de elaboração do Plano Diretor de Regionalização dividiram-se entre negociações na Comissão Intergestores Bipartite (CIB) (36,6%), negociações em CIBs regionais (33,7%)
e consulta do(a) gestor(a) estadual aos municípios (27,7%).
A estratégia de elaboração do PDR pelas secretarias de saúde da região centro-oeste mais comum foi a negociação na CIB (45,2%) enquanto a estratégia menos comum foi a consulta do(a)
gestor(a) estadual aos municípios (15,2%). No caso do sudeste, a elaboração do Plano ocorreu predominantemente mediante negociação na CIBs regionais (44,2%).
366
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 123 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por elaboração do plano diretor
de regionalização, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quanto ao porte populacional do município, observa-se que quanto maior ele for, mais
comum será a elaboração do PDR mediante negociação na CIB, realizada por mais da metade dos
municípios com mais de 200 mil habitantes (55,3%).
367
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 124 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por elaboração do plano diretor
de regionalização, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
4.4 Impacto da informação
Quanto aos mecanismos para captação de demandas�, em 2006 as secretarias municipais de saúde utilizaram-se do conselho municipal de saúde (88,3%) e/ou do atendimento no gabinete (68,8%)
para receber informações e demandas da população. Subsidiariamente, foram utilizados os meios de
comunicação (39,2%), formulários de avaliação/sugestão (32,3%) e pesquisas de opinião (28,3%).
Ainda é muito incipiente a utilização de ouvidoria especializada (14,0%), da internet (11,8%) e do
serviço de disque denúncia (8,1%). No entanto, somente 0,1% das secretarias não utilizavam qualquer artifício para receber informações da população.
Observam-se na região Norte encontram-se as secretarias de saúde que, em geral, menos utilizam mecanismos para captar as demandas. Por outro lado, a região sul destacava-se por apresentar as
secretarias de saúde que mais se valem desses instrumentos, em especial o atendimento no gabinete
(77,0%), a pesquisa de opinião (39,3%) e a ouvidoria especializada (20,4%).
368
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 125 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por instrumentos utilizados para
captação de demandas da população, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na análise por porte populacional, verifica-se que, à exceção do conselho municipal de saúde e do atendimento no gabinete, a utilização dos demais instrumentos guarda relação com porte
populacional, de forma que quanto maior o tamanho do município, sobretudo a partir dos 20 mil
habitantes, maior a utilização desses mecanismos de captação de demandas da população. Nos municípios com 50 mil a 200 mil e naqueles com mais de 200 mil habitantes, destacavam-se a utilização
de ouvidoria especializada (46,1% e 70,0%, respectivamente) e dos meios de comunicação (73,4% e
75,4%, respectivamente). O uso de disque denúncia (46,1%) e internet (43,5%) foram mais comuns
nos grandes municípios, acima de 200 mil habitantes.
369
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 126 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por instrumentos utilizados para
captação de demandas da população, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na década 1996-2006, observa-se a ampliação da difusão de todos os mecanismos de captação de
demanda, a saber: conselho municipal de saúde (74,6% em 1996 para 88,3% em 2006), formulário de
avaliação (23,4% para 32,3%), pesquisa de opinião (17,6% para 28,3%), ouvidoria especializada (5,7%
para 14,0%) e disque denúncia (4,6% para 8,1%).
Na variação por região, observa-se que, em geral, a utilização dos referidos instrumentos disseminou-se pelas regiões ao longo da década. Vale ressaltar, na região centro-oeste, que mais gestões locais
de saúde passaram a receber demandas e informações por meio de conselho municipal de saúde (59,3%
para 88,9%), ao passo que, no nordeste destaca-se a disseminação da ficha de avaliação (14,7% para
28,1%) e, na região sul, são relevantes os aumentos na pesquisa de opinião (19,3% para 39,3%) e ouvidoria especializada (5,6% para 20,4%).
Na variação por porte populacional também se verifica a disseminação dos mecanismos de captação de demandas em todas as faixas populacionais, com destaque para a utilização da ouvidoria nos municípios de 50 mil a 200 mil habitantes (10,5% para 46,1%) e acima de 200 mil habitantes (18,9% para
70,0%). Também são relevantes os aumentos na utilização da pesquisa de opinião e de ficha de avaliação
nos municípios com mais de 200 mil habitantes (24,3% para 48,0% e 24,3% para 42,8%, respectivamente) e do conselho de saúde nos municípios com menos de 5 mil habitantes (64,9% para 88,8%).
370
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Com relação à resposta das secretarias de saúde às demandas recebidas, em 2006, a maioria das
gestões efetuou mudanças no funcionamento dos serviços (66,5%), embora as secretarias também tenham considerado as demais ações: avaliação da gestão (56,4%), criação de novos serviços (52,6%), e
punição ou remanejamento de funcionários (48,5%). Poucas secretarias não adotaram qualquer medida
(4,2%) nesse sentido.
Observa-se que na região Norte menos secretarias de saúde introduziram mudanças no funcionamento de serviços (45,0%) e avaliação da gestão (44,0%) em resposta às demandas recebidas. As secretarias do nordeste foram as que mais avaliaram a gestão (62,7%) enquanto as secretarias do centro-oeste
optaram por punir ou remanejar seus funcionários (66,7%).
Gráfico 127 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por medidas adotadas em resposta às demandas recebidas, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em relação ao porte populacional, verifica-se a reação dos(as) secretários(as) de saúde às demandas recebidas em relação com o tamanho do município, de tal sorte que, em geral, quanto maior o
porte do município, mais secretarias de saúde valeram-se de mudanças no funcionamento de serviços,
avaliação da gestão, criação de novos serviços, punição ou remanejamento de funcionários, sobretudo
nos municípios com mais de 50 mil habitantes.
371
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 128 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por medidas adotadas em resposta às demandas recebidas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na década 1996-2006, à semelhança das variações notadas na utilização dos instrumentos de captação de demandas, observou-se maior adoção de todas as medidas consideradas, especialmente avaliação
da gestão (28,8% para 56,4%) e punição ou remanejamento de funcionários (34,0% para 48,5%),
enquanto a criação de novos serviços pouco variou (52,5% para 52,6%). Portanto, ao longo da década,
reduziram-se os casos de secretarias inertes às demandas recebidas (12,2% para 4,2%).
Na variação por região, verificou-se maior resposta às demandas da população em praticamente
todas as regiões ao longo do período. Vale destacar o comportamento das gestões de saúde do nordeste
que, após as denúncias/demandas recebidas, tornaram mais frequente a avaliação da gestão (28,2% para
62,7%), punição ou remanejamento de funcionários (25,6% para 47,4%) e mudanças no funcionamento dos serviços (51,7% para 67,0%). No centro-oeste tornaram-se mais comuns a punição ou o
remanejamento de funcionários (40,7% para 66,7%) e a criação de novos serviços (39,8% para 48,8%).
Em relação ao porte do município, observam-se, nas diferentes faixas populacionais, mais secretarias de saúde que puniram ou remanejaram funcionários, avaliaram a gestão e/ou efetuaram
mudanças no funcionamento dos serviços. Verificam-se retrações de secretarias de saúde, que optaram
pela criação de novos serviços nos municípios com 20 mil a 50 mil, com 50 mil a 200 mil e, principalmente, com mais de 200 mil habitantes (81,1% para 73,8%).
372
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
A maioria das secretarias municipais de saúde, em 2006, recebia apoio técnico� do governo
estadual (80,2%) seguido do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS) (60,9%) e
do governo federal (51,6%). Também eram significativos os apoios recebidos da comissão bipartite
(37,3%), da consultoria privada (16,2%) e da universidade (16,2%).
Pela distribuição regional, percebe-se que o apoio técnico do COSEMS era mais expressivo
no norte (92,1%), no centro-oeste (72,4%) e no nordeste (67,0%). Ressalta-se que as regiões sul
(29,3%), nordeste (27,5%) e centro-oeste (23,7%) recebiam mais apoio técnico do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS).
Foi discrepante o percentual de secretarias das regiões sul (58,2%) e sudeste (44,5%), que recebiam apoio de consórcio intermunicipal em relação ao norte (5,4%) e nordeste (5,9%). No centrooeste o apoio da comissão bipartite (50,7%) foi mais significativo em comparação com as demais
regiões. as consultorias privadas eram mais frequentes no nordeste (18,7%) e no sudeste (19,5%).
Gráfico 129 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por origem do apoio técnico
recebido, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em relação ao porte populacional, observou-se que nos municípios com mais de 200 mil habitantes foi menos expressivo o apoio técnico recebido do governo estadual (69,2%), do COSEMS
(40,0%), da comissão bipartite (29,0%) e de consórcio intermunicipal (13,2%). Por outro lado,
373
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
nestes municípios com mais de 200 mil habitantes, são mais frequentes o apoio técnico recebido
do governo federal (77,3%) e de consultoria privada (29,8%). O apoio recebido pelas universidades
foi mais significativo nos municípios de 50 mil a 200 mil habitantes e acima de 200 mil habitantes
(30,2% e 62,2%, respectivamente).
Verifica-se também que quanto maior o porte populacional, mais frequente é o apoio recebido
de parte das organizações não governamentais. De forma oposta, consórcio intermunicipal foi mais
expressivo nos municípios com até 50 mil habitantes, principalmente nos municípios com até 5mil
habitantes (42,9%). O apoio da comissão bipartite também era comum para os pequenos municípios,
com até 5.000 habitantes (43,3%).
Gráfico 130 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por origem do apoio técnico
recebido, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na década 1996-2006, observa-se aumento generalizado na oferta de apoio técnico, sobretudo
pelo governo federal (24,2% para 51,6%) e pelo COSEMS (37,5% para 60,9%). Esta tendência não
se verificou somente em relação à comissão bipartite (38,7% para 37,3%), às organizações não governamentais (7,4% para 5,8%) e às agências internacionais (1,5% para 0,8%).
374
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
A variação regional segue a tendência observada ao longo da década, isto é, o aumento generalizado na oferta de apoio técnico, no qual se destacou o aumento do apoio do COSEMS no norte
(29,5% para 92,1%) e no centro-oeste (46,0% para 72,4%).
A variação por porte populacional, de maneira semelhante, revela aumento generalizado. Verifica-se significativo aumento no apoio técnico recebido pelos pequenos municípios, com menos de
5.000 habitantes, do governo estadual (46,9% para 79,1%), do COSEMS (28,8% para 60,3%) e do
governo federal (18,5% para 52,0%).
4.5 Parcerias�
Em 2006, a maioria das secretarias de saúde estabeleceu parceria com o governo estadual
(75,8%), com o governo federal (61,1%), e/ou com outros setores do governo municipal (60,3%).
Também eram relevantes as parcerias com igrejas (34,8%), instituições de ensino e pesquisa (25,2%),
consórcio intermunicipal (40,5%) e organizações não governamentais (23,8%).
As parcerias com consórcio intermunicipal foram pouco frequentes na região norte (14,5%) e
nordeste (10,5%), ao contrário do cenário verificado no sudeste (59,7%) e no sul (75,4%).
Gráfico 131 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por modalidades de parceria,
segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
375
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Em relação ao porte populacional, verificou-se que a parceria com o governo federal foi mais
expressiva nos municípios com mais de 200 mil habitantes (80,8%). Os convênios com instituições
de ensino e pesquisa e com organizações não governamentais foram mais expressivos nos municípios
de 50mil a 200mil habitantes (51,6% e 45,8%, respectivamente) e com mais de 200mil habitantes
(77,7% e 54,8%, respectivamente).
Destacou-se também que quanto maior o porte populacional, maior o percentual de municípios que possui parcerias com outros setores do governo municipal. Por outro lado, a parceria com
consórcio intermunicipal foi mais significativa nos pequenos municípios, com até 5mil habitantes
(52,8%) e de 5mil a 20mil habitantes (41,4%), sendo incomuns nos grandes municípios com mais
de 200.000 habitantes (17,6%).
Gráfico 132 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por modalidades de parceria,
segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na década 1996-2006, aumentaram de forma generalizada as modalidades de parcerias firmadas, principalmente com os governos estadual (38,7% para 75,8%) e federal (18,4% para 61,1%),
bem como com outros setores do governo municipal (45,2% para 60,3%). Na variação regional,
376
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
observam-se aumentos generalizados nas parcerias firmadas, com destaque para os consórcios intermunicipais no sudeste (42,5% para 59,7%) e no sul (37,2% para 75,4%).
Quanto à variação por porte populacional, além do aumento generalizado observado, destacaram-se os aumentos das parcerias dos municípios com até 5mil habitantes com os governos estaduais
(28,8% para 78,8%), outros setores do governo municipal (35,8% para 58,4%), com o consórcio
intermunicipal (35,1% para 52,8%), e instituições de ensino e pesquisa (7,7% para 21,8%). As parcerias com estas instituições também aumentaram expressivamente nos municípios entre 50.000 a
200.000 habitantes (37,3% para 51,6%) e com mais de 200.000 habitantes (59,5% para 77,7%).
5. Discussão
O processo de descentralização impulsionou um conjunto de mudanças na estrutura e na dinâmica de gestão dos municípios, na medida em que passaram a gerenciar, nas duas últimas décadas,
volumes expressivos de recursos para responder às responsabilidades legalmente recebidas. Somam-se
a esse movimento o crescimento da consciência cidadã que pressiona por serviços de melhor qualidade, os processos de reforma do Estado que colocaram a questão da eficiência da ação governamental
no centro do debate e a revolução das tecnologias de informação que permitiram o desenvolvimento
de inovações em diversos campos da administração pública.
A gestão de recursos humanos da política de saúde, provavelmente em virtude do volume de
profissionais, ainda é centralizada na secretaria de administração da prefeitura no caso dos municípios
de pequeno porte, sendo efetuada por unidade específica das secretarias de saúde nos médios e grandes
municípios, indicando o grau de autonomia dos(as) gestores(as) locais quanto ao principal recurso da
área de saúde que são seus profissionais.
A institucionalização dessa prática pode contribuir para ampliar o nível de qualificação e de
profissionalização da saúde, na medida em que permite o planejamento de atividades de desenvolvimento de pessoas, o estabelecimento de parcerias, a implantação de políticas de avaliação etc.
Outro dado significativo é que grande parte das secretarias municipais de saúde efetiva suas
contratações por intermédio do Poder Público. A adoção de modalidades alternativas de contratação,
como cooperativas de profissionais e/ou ONGs, é significativa somente nos grandes municípios. Já a
utilização de consórcio intermunicipal para efetuar contratações é incomum em todas as faixas populacionais, com maior presença entre os municípios de pequeno porte, que precisam se associar para
enfrentar problemas comuns e organizar os fluxos entre eles.
A opção majoritária pela contratação por meio do Poder Público evita a fragmentação institucional, os conflitos motivados pela convivência entre distintos vínculos empregatícios e pela precarização do trabalho. No caso do ingresso mediante concurso público, implanta-se o mérito como critério
de acesso à burocracia estatal, em detrimento das práticas de clientelismo político, e a estabilidade do
vínculo favorece a consolidação de carreiras estatais.
377
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Por outro lado, a política de recursos humanos da saúde pouco incorporou mecanismos de
remuneração adicional, que poderiam favorecer a atração de profissionais qualificados na competição com o mercado privado, além de fornecer incentivos para a permanência na carreira. Ao que
parece, a remuneração adicional em função do desempenho é utilizada como mera estratégia de
complementação salarial, tendo em vista sua maior utilização na região centro-oeste em relação aos
municípios situados no eixo sul e sudeste, regiões estas em que a oferta e a remuneração dos profissionais são, em média, maiores quando comparadas às demais localidades.
Entretanto, é importante registrar que os municípios de médio porte (50-200mil hab.) foram
os que mais utilizaram pagamentos além da tabela do SUS, o que indica a necessidade de incorporar
formas alternativas de remuneração além das disponíveis, oficialmente, para atrair profissionais.
É possível observar a institucionalização da prática de oferta de cursos e treinamentos oferecidos pelo governo estadual ou federal em todas as regiões e portes. No entanto, as políticas próprias
de capacitação e de educação permanente, focadas nos problemas cotidianos, na equipe de trabalho
e que poderiam permitir a criação de identidade institucional, encontram maior difusão somente
na região sul e nos grandes municípios.
Quanto à estrutura para a aquisição de bens e serviços, as secretarias municipais de saúde
continuam utilizando as modalidades licitatórias tradicionais, mas que também asseguram maior
transparência, a despeito das críticas de falta de flexibilidade e aumento dos prazos. Verifica-se que
ambos os tipos de pregão, considerados procedimentos licitatórios potencialmente mais ágeis e vantajosos para o poder público, ainda são pouco utilizados pelas secretarias de saúde. Seu uso é mais
comum nos municípios de médio e grande porte, situados no eixo sul-sudeste. Vale lembrar que o
pregão eletrônico foi regulamentado somente em 2002.
Destaca-se que aproximadamente um quarto das secretarias de saúde, sobretudo nos municípios de médio porte populacional, valeu-se da dispensa de licitação em virtude de emergência,
situação de caráter excepcional que confere ao(à) gestor(a) local significativo poder discricionário
e, consequentemente, flexibilidade para efetuar suas compras e contratações, mas cujos valores
praticados podem ser prejudiciais à administração pública. Esse quadro pode refletir a fragilidade
no planejamento para a aquisição de bens e serviços, no âmbito das secretarias de saúde, dos municípios de médio porte.
Aparentemente, o tema da terceirização de serviços de saúde ainda é controverso entre os(as)
gestores(as) da política de saúde, dado que quase um quarto optou por não responder a questão.
Prevalecem os formatos tradicionais de contratação de serviços do SUS, construídos com base em
parcerias com as redes privadas e, em menor grau, com organizações filantrópicas.
A terceirização é parcialmente coberta por esforços regulatórios de controle sobre a qualidade dos serviços prestados, provavelmente em virtude da fragilidade das relações contratuais. Mais
de um terço das secretarias não efetua qualquer tipo de controle e, quando o faz, volta-se para os
serviços próprios. O controle sobre serviços contratados ou conveniados é mais habitual nos mu-
378
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
nicípios de médio e grande porte, mas desproporcionalmente inferior à quantidade de secretarias
municipais deste porte, que possuem contratos de terceirização.
A regionalização, elemento essencial para a consolidação dos princípios do SUS e para o
incremento da capacidade de planificação, apresentou avanços substanciais. Os dados revelam
que a PPI, de adesão obrigatória, é o principal instrumento para o planejamento da regionalização da política de saúde.
Os consórcios municipais são significativos nas regiões sul e sudeste, bem como nos
pequenos municípios, maiores interessados nos ganhos de escala e de escopo propiciados pelos
consórcios. A estratégia proposta pela NOAS, segundo os(as) gestores(as), teve inserção positiva nos médios e grandes municípios. A configuração vigente para a regionalização dos serviços
foi amplamente aprovada pelos(as) secretários(as) de saúde na comparação com a situação
anterior.
Da mesma forma, é possível observar a significativa valorização do Plano Diretor de
Regionalização pelas secretarias de saúde, sobretudo nos médios e grandes municípios, elaborados por meio das instâncias de pactuação intergovernamentais, contradizendo as tendências
de centralização na secretaria estadual de que se revestem as instruções normativas do PDR.
Observa-se um movimento de diversificação dos instrumentos utilizados pelas secretarias de saúde para captar demandas da população ao longo da década 1996-2006. Entretanto,
o uso de mecanismos mais democráticos e representativos, a exemplo dos conselhos municipais
de saúde, não significou o abandono de artifícios mais tradicionais de contato com o público,
como é o caso do atendimento no gabinete, frequente nas diferentes regiões, com predomínio
da região sul do País, e nos diferentes portes populacionais.
É interessante notar que a difusão de mecanismos menos comuns de captação de demanda reflete as assimetrias nacionais, como pode ser observado na diferença entre as regiões norte
e sul no uso de pesquisas de opinião, ouvidoria, meios de comunicação e internet.
A incorporação de mecanismos que demandam razoável infraestrutura (disque denúncia), ou mesmo de ferramentas de tecnologia de informação como a internet, a plataforma
para o desenvolvimento de políticas de governo eletrônico, foi frequente somente nos grandes
municípios, com mais de 200 mil habitantes.
A diversificação e a democratização dos mecanismos de captação de informações são
acompanhadas pela maior permeabilidade das gestões locais de saúde às demandas apresentadas pela população, sobretudo nos médios e grandes municípios, fato que pode estar relacionado à maior consistência dessas estruturas para captar tais demandas e para adotar medidas
corretivas.
A difusão das respostas oferecidas pelo poder público (mudança no funcionamento dos serviços, criação de novos serviços, remanejamento de funcionários e avaliação da gestão) foi bastante
significativa em todas as regiões, embora apenas as duas últimas apresentassem expansão na década.
379
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Aparentemente o poder público preocupa-se com a eficácia de suas respostas, tendo em
vista o aumento generalizado das ações adotadas ao invés do privilégio de modalidades específicas,
o que pode ser consequência dos esforços de adequação das respostas à diversidade de demandas
apresentadas.
É possível observar o efeito positivo do formato institucional do SUS sobre as práticas de gestão
dos governos locais. A ênfase conferida pela institucionalidade da política ao federalismo cooperativo
tem impulsionado a formação de relações de interdependência com outros agentes, como pode ser
vista na busca de apoio técnico e na formação de parcerias.
O apoio técnico é oferecido basicamente por instâncias intergovernamentais, figurando o COSEM como importante órgão setorial de apoio no nível horizontal, como também verticalmente com
os governos estadual e federal. Este quadro foi consolidado ao longo da década, entre as diferentes
regiões e portes populacionais.
A relação com atores privados (consultoria privada, agências internacionais) ou da sociedade
civil (ONGs) foram menos usuais, inclusive nos municípios de médio e grande porte. O apoio de universidades, importante lócus de estudos e debate técnico-político, é observado com maior frequência
nos municípios de médio e grande porte, normalmente onde se encontram estas instituições.
É importante notar que, na década considerada, os pequenos municípios também passaram a
receber apoio dos governos federal e estadual, além do COSEMS. O estreitamento de laços de cooperação técnica com entidades setoriais (COSEM e CONASEMS) é mais bem percebido nas regiões
fora do eixo sul-sudeste, cumprindo importante papel de difusor de inovações.
Da mesma forma, observa-se a ampliação e a diversificação de formas de parceria, firmadas pelas secretarias de saúde ao longo da década, novamente com destaque para a consolidação das relações
intergovernamentais.
Também é importante ressaltar as parcerias com outros setores do governo municipal, com
crescimento significativo no período, indicando maior intersetorialidade na implementação da política local de saúde, dinâmica mais comum nos municípios de médio e grande porte. São estes os municípios também que estreitaram vínculos com a sociedade civil via parcerias firmadas com ONGs. Por
outro lado, os municípios de menor porte populacional valorizam os vínculos com setores tradicionais
da sociedade civil, como as igrejas.
Em síntese, a análise dos resultados da pesquisa na dimensão gerencial permite afirmar que
houve avanços expressivos na estrutura, nos mecanismos e nas competências de gestão das secretarias
municipais de saúde em diversas áreas. Em geral, apesar das restrições impostas pela agenda de estabilização monetária e pela ausência de uma estratégia deliberada de reforma do Estado, os municípios
adquiriram capacidade para contratar, formar e gerenciar seus próprios profissionais, empregar incentivos adicionais de remuneração, quando necessário, adquirir bens e serviços de acordo com a legislação, realizar o controle de qualidade dos serviços contratados e conveniados, estabelecer parcerias,
mobilizar apoio técnico e construir relações de cooperação com outros municípios.
380
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
No entanto, a transferência de estruturas de provisão de serviços e a formação de bases institucionais de planejamento e controle social encontraram durante seu processo de formação um quadro
de profundas assimetrias no nível local, o que resultou em fragilidades e descontinuidades no potencial de governança, financiamento e resolutividade do sistema. A ausência de um contexto favorável e
de uma estratégia mais articulada de reforma do Estado repercutiu de forma significativa nos aspectos
mais concretos e operacionais da gestão local, limitando a capacidade de difusão de inovações.
Portanto, a formação dessas capacidades não foi uniforme, sendo privilégio de um grupo de
municípios de maior porte, que detém volumes maiores de recursos orçamentários e financeiros e
situam-se em regiões mais desenvolvidas. Foi nessa dimensão gerencial que encontramos maior peso
de fatores regionais e do tamanho dos municípios para explicar diferenças encontradas e limitações
na difusão das inovações. Considerando a diversidade que caracteriza o contexto socioeconômico e
federativo brasileiro e seus impactos sobre a forma como se difunde e se institucionaliza esse movimento de modernização setorial nos governos municipais, seria recomendável desenvolver estratégias
mais flexíveis e adaptadas às peculiaridades locais e regionais. Portanto, a ênfase deve ser colocada na
superação das desigualdades em termos de capacidades gerenciais, não apenas nas diferenciações em
termos de estrutura material. Como um bem intangível, as iniquidades em termos de capacidade
afetam o exercício do direito à saúde e podem comprometer a democratização impulsionada pela
descentralização.
381
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
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383
Capítulo 7
Organização Local da
Atenção à Saúde no SUS:
a dimensão assistencial
Sonia Fleury
Assis Mafort Ouverney
Thais Soares Kronemberger
Felipe Barbosa Zani
1. Introdução
A implementação do Sistema Único de Saúde (SUS) tem
permitido significativos redirecionamentos na estrutura pública de
políticas e serviços de saúde em direção à universalidade e à integralidade, ampliando a equidade no acesso e na utilização. Esses
avanços têm se manifestado em todo o campo da atenção à saúde,
ou seja, abrangem as ações de promoção, prevenção, cura e reabilitação, voltadas para indivíduos, grupos específicos (crianças, mulheres, negros etc.) e coletividades, em todos os níveis de complexidade
tecnológica (cuidados primários, secundários e terciários).
Em termos de organização dos serviços de saúde, é possível
visualizar três grandes conjuntos de provisão de serviços institucionalmente unificados sob o SUS, porém com baixa articulação gerencial e coordenação clínica: a atenção básica, compreendendo o
programa de agentes comunitários de saúde, a estratégia da saúde
da família e as unidades básicas e ambulatórios hospitalares; a média complexidade, formada por unidades ambulatoriais e hospitalares especializadas públicas e privadas contratadas; e, as redes de
alta complexidade, de referência nacional em várias especialidades
médicas como oncologia, nefrologia, cardiologia, etc. De forma
geral, esses três subsistemas de provisão correspondem a configurações específicas de estruturas de oferta no que diz respeito ao mix
público-privado, densidade tecnológica dos fatores de produção,
governança territorial, formas de acesso e alocação de recursos
financeiros e modalidades de pagamento a unidades prestadoras.
385
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Essa configuração segmentada internamente produz obstáculos significativos tanto para a articulação de políticas e saberes clínicos específicos do setor saúde (promocionais, preventivos, curativos, reabilitadores, etc.), quanto para a integração com as demais políticas e sistemas de provisão de benefícios sociais
da seguridade. Além disso, termina por manifestar a prioridade de um modelo de atenção curativo sobre
uma atenção integral da saúde.
Paralelamente, e impulsionado por estímulos fiscais e de marketing, o setor suplementar de provisão
de serviços de saúde se expandiu, abarcando parcela significativa da população brasileira, tornando-se um
motor significativo de produção e movimentação de recursos físicos, humanos e financeiros. Os fluxos
recursos humanos, financeiros, institucionais e tecnológicos entre o setor suplementar e o SUS são intensos
e pouco visíveis para os usuários e estudiosos.
Portanto, desenvolveram-se simultaneamente dois sistemas de atenção à saúde, segmentados internamente, formando um híbrido institucional, que produz resultados negativos para a política de saúde tais
como barreiras de acesso, racionalização forçada de recursos (tetos restritivos e filas com prazo desproporcional à média), desigualdades regionais de acesso e utilização de serviços, descontinuidade do cuidado, baixa qualidade da atenção prestada, evasão de recursos, perda de qualidade de vida das pessoas, manutenção
de patamares elevados de falecimentos por mortes evitáveis, entre outros.
Devem-se considerar ainda as pressões decorrentes das mudanças nas demandas, face às transformações nos perfis demográficos e epidemiológico da população brasileira e as mudanças socioeconômicas,
com alterações sobre hábitos de vida, o que tem acarretado o crescimento das doenças crônicas. A incorporação da noção de direito à saúde e também de direito do consumidor atuam como fator de aumento da
demanda por utilização dos serviços.
Diversos esforços têm sido engendrados no sentido de construir arranjos assistenciais, caracterizados
por maior funcionalidade e racionalidade organizacionais no âmbito do SUS, especialmente os de base
regional. Apesar da dispersão do conjunto de unidades de atenção em diversos regimes jurídicos (público,
privado, filantrópico), desde meados da década de 1990, quando a descentralização tomou fôlego, aumentaram os esforços normativos buscando adicionar mecanismos legais, financeiros e de gestão para contrapor
os vetores políticos, institucionais, gerenciais e financeiros que levam à fragmentação da organização da
estrutura de atenção à saúde. Portanto, ocorre simultânea e sucessivamente um movimento contraditório
de fragmentação e busca de coordenação das unidades descentralizadas do sistema de saúde.
Como resultado, diversos avanços foram produzidos no sentido de ampliar o grau de integração das
estruturas de provisão de ações e serviços de saúde do SUS, especialmente nos anos mais recentes, quando a
temática da regionalização adquiriu maior ênfase e tem impulsionado o desenvolvimento de estratégias de
planejamento regional, regulação, integração informacional, unificação gerencial etc.
Entretanto, esses esforços ainda não foram suficientes para romper as linhas de fragmentação, impostas pela configuração estrutural do sistema, o que acarreta a presença simultânea de avanços e impasses
no aperfeiçoamento das estruturas de organização da atenção à saúde no SUS, bem como na melhoria da
qualidade dos serviços.
386
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Esse capítulo tem como objetivo analisar os impactos da descentralização sobre as características da organização da atenção à saúde no SUS, baseados na percepção dos(as) secretários(as) municipais obtida na pesquisa Municipalização da Saúde e Poder Local no Brasil, por meio de um corte
diacrônico realizado por meio da aplicação de um questionário em 1996 e 2006.
Para tal, o texto está estruturado em cinco seções, além dessa introdução e referências bibliográficas. A seção 2 discute os desafios do aperfeiçoamento da organização da atenção à saúde durante
o processo de descentralização do SUS. A seção 3 descreve a metodologia adotada na pesquisa em
relação aos aspectos organização da atenção à saúde abordados nas duas edições do estudo. Por sua
vez, a seção 4 apresenta os principais resultados da pesquisa, referentes à dimensão assistencial, fundamentados na forma de acesso e na oferta dos serviços de média e alta complexidade, nos mecanismos
de identificação de demanda reprimida, nos recursos de organização da atenção à saúde e nas ações e
programas disponíveis no município. Na sequência, a seção 5 discute os resultados obtidos buscando
relacioná-los com o contexto atual de consolidação do SUS, apresentando as considerações finais.
2. Descentralização e aperfeiçoamento da estrutura de atenção à saúde: avanços e barreiras aos
princípios do SUS
De forma geral, os aspectos considerados relevantes para que atenção à saúde apresente desempenho satisfatório enfatiza diversas dimensões, entre as quais podem ser destacadas: suficiência de
unidades, profissionais, insumos e recursos de custeio; organização adequada do processo de trabalho
em saúde no interior das unidades; acesso e qualidade da atenção prestada envolvendo a humanização
do atendimento; eficácia da intervenção, articulação e integração entre as unidades com diferentes
tecnologias; distribuição territorial equitativa; ajustamento do conteúdo das ações e serviços às necessidades e às especificidades da população, e o emprego eficiente dos recursos (Artmann & Rivera,
2008; Silva, 2008; Mendes, 2007; Conill, 2007; Noronha, 2003; Campos, 1999; 2000; Barrenechea,
Uribe & Chorny, 1990).
O desempenho do sistema de saúde em cada um desses requisitos está associado a um amplo
conjunto de condições institucionais, sendo resultado do desenho adequado do modelo de atenção,
da construção de estratégias de planejamento regional, da definição acerca da alocação de recursos
e modalidades de pagamento a provedores, da construção de sistemas informativos, de transporte,
de apoio diagnóstico, terapêutico e de assistência farmacêutica, do desenvolvimento de um quadro
qualificado e compromissado de profissionais, da definição de um volume suficiente de recursos
financeiros para o setor, da constituição de sistemas de contratualização com as unidades de provisão de serviços, da instituição de mecanismos de governança capazes de proporcionar estabilidade
política e eficiência gerencial, entre outros (OMS & OPS, 2008; Paim, 2001; Silva & Magalhães,
2008; Santos & Andrade, 2007; Lima, 2007; Ipads, 2007; Navarrete et al., 2005; Hartz & Contandriopoulos, 2004).
387
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
A literatura sobre a evolução desses aspectos da atenção à saúde no período de implantação do
SUS revela um quadro caracterizado pela combinação entre avanços e a presença de desafios e barreiras ainda muito difíceis de superar.
De forma geral, observa-se expressiva ampliação da oferta pública de ações e serviços de saúde,
especialmente na atenção primária organizada com base no Programa Saúde da Família (PSF), que
atinge praticamente todos os municípios brasileiros. De acordo com o Ministério da Saúde (MS), os
níveis de cobertura no final de 2008 eram de 96,2% para os agentes comunitários de saúde, 94,1%
para as equipes de saúde da família e 82,6% para as equipes de saúde bucal1. Essa expansão tem permitido construir uma base para a mudança no modelo de atenção à saúde por meio da institucionalização de práticas de promoção e prevenção. Obviamente, a difusão da Estratégia da Saúde da Família
também amplia o acesso, pelo menos às tecnologias de menor densidade e permite ainda organizar
minimamente capacidades de articulação com outras políticas.
Da mesma forma, desde o início do processo de implantação do SUS, os sistemas nacionais
de referência da alta complexidade têm sido expandidos e aperfeiçoados por meio de diversas estratégias normativas, financeiras e tecnológicas (especialmente informacionais), o mesmo ocorrendo com
políticas e programas verticais voltados para grupos populacionais ou agravos específicos, nos quais o
Ministério da Saúde tem assumido papel de relevância na parceria com estados e municípios.
Durante esse processo, diversas estratégias e mecanismos foram desenvolvidos e empregados,
buscando tanto ampliar a oferta quanto intensificar a integração funcional e a racionalização do uso
de recursos, apesar do baixo padrão de financiamento setorial. Podem ser mencionadas, nesse sentido,
iniciativas tais como o desenho de incentivos financeiros vinculados a ações e programas e específicos,
a normatização de aspectos gerenciais e financeiros, a organização de redes assistenciais especiais, a
instituição de sistemas de alta complexidade, a organização de campanhas temáticas, a transferência
de unidades, recursos e responsabilidades para estados e, principalmente, municípios, entre outros
(Machado, 2007).
As experiências inovadoras em sistemas locais de saúde proporcionadas pela descentralização
têm permitido a experimentação de novos modelos de atenção e o desenvolvimento de práticas humanizadoras e democráticas, capazes de orientar a construção de novos paradigmas de organização
do processo de trabalho em saúde. Diversas iniciativas, fomentadas ou não pelo gestor federal, se
difundiram pela esfera local, tais como a formação de equipes multiprofissionais, o emprego de práticas de alimentação saudável, a difusão de programas de exercícios físicos e cuidados de promoção, a
desinstitucionalização da atenção à saúde mental, programas de internação domiciliar, estratégias de
acolhimento e humanização do atendimento, uso de práticas alternativas à homeopática, como hoEsses percentuais dizem respeito à presença da Estratégia da Saúde da Família nos municípios, o que convive
com graus diferenciados de abrangência territorial interna. Nem todos os municípios possuem cobertura de
100% em seu território. Também há diferenças de cobertura quando são comparados os portes populacionais:
quanto maior o município, menor a presença de equipes de saúde da família (Brasil, 2010).
1
388
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
meopatia, acupuntura, fitoterapia etc. (Escudeiro & Souza, 2009; Santos et al., 2006; Solla, 2005;
Silva et al., 2005; Pinheiro, 2001).
Essas inovações impulsionaram movimentos de ampliação da qualidade da atenção à saúde
prestada no SUS, tendo como fundamentos a humanização do serviço, a construção do usuário
como sujeito, a formação de vínculos com a comunidade e a observação das especificidades e necessidades da população local. A circulação e difusão das experiências, bem como sua rotinização,
seguimento e avaliação seguem sendo um desafio na melhoria da qualidade da atenção. Por outro
lado, a banalização das práticas desumanas, justificadas como resultante da precariedade dos serviços, tem sido um limite à melhoria da qualidade dos serviços no SUS e termina implantando, na
prática, modalidades de contradireito à saúde (Fleury, 2011).
A concentração da oferta de profissionais, insumos e unidades assistenciais nas grandes metrópoles, fruto do processo histórico de urbanização brasileiro, tornou a regionalização um imperativo em qualquer estratégia de ampliação de acesso. Já em 1996, os formuladores da NOB 1996
perceberam os limites, nesse contexto, da municipalização como estratégia para a garantia de acesso
universal, integral e equitativo. Diversos mecanismos de integração, em sua maioria de natureza
horizontal, foram desenhados e implantados desde então, buscando ampliar a articulação regional
no SUS, podendo ser citados a Programação Pactuada e Integrada (PPI), os arranjos territoriais
(módulos, microrregiões, regiões, macrorregiões), sistemas de gestão (complexos reguladores, protocolos eletrônicos, etc.), os instrumentos de planejamento (planos diretores de regionalização e de
investimentos), os mecanismos de governança (colegiados de gestão regional, comissões intergestores microrregionais), entre outros (Fleury & Mafort, 2007; Santos & Andrade, 2007).
Mais recentemente, seguindo tendência da agenda internacional de reformas dos sistemas
de saúde que enfatiza a necessidade de maior integração, diversas iniciativas das três esferas de
governo têm fomentado a adoção de mecanismos de formação e gestão de redes regionalizadas de
atenção à saúde. O papel do gestor estadual tem sido fortalecido como articulador dos sistemas
municipais, com o objetivo de promover a coordenação adequada entre os níveis de atenção de
cuidados primários, secundários e terciários. Esse processo tem sido caracterizado também pela
difusão de uma série de mecanismos de gestão da clínica e adoção de instrumentos de gestão
da informação. Por fim, o planejamento regional tem reaparecido com grande frequência como
elemento de fortalecimento do papel do Estado no setor saúde (Silva, 2008; Mendes, 2007; Navarrete et al., 2005).
Entretanto, apesar dos avanços obtidos e dos esforços para reduzir as barreiras à atenção
universal, integral e equitativa, diversos obstáculos ainda permanecem na fronteira de aperfeiçoamento da atenção à saúde, relacionados à insuficiência de profissionais, de oferta de serviços de
média complexidade, de insumos e equipamentos de apoio e diagnóstico, de medicamentos, entre outros. Há ainda expressivas diferenças regionais e, mesmo, locais, o que dificulta a ampliação
da qualidade da atenção do sistema como um todo.
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3. Metodologia
O objetivo desse capítulo é contribuir para a análise do impacto do processo de descentralização
sobre a qualidade da organização da atenção à saúde no SUS.
A hipótese da pesquisa, que deu origem a esse capítulo, é que o processo de descentralização de
recursos e atribuições legais para a gestão municipal contribui tanto para a democratização do sistema de
poder quanto para o aperfeiçoamento da capacidade de gestão e da prestação de ações e serviços de saúde
da esfera local. Portanto, é esperado que, com o aprofundamento da descentralização no setor saúde, a
atenção à saúde prestada pelos municípios seja caracterizada tanto pela diversificação da oferta de ações
e serviços quanto pelo aperfeiçoamento dos mecanismos de acesso e utilização da rede.
A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário, enviado por correio, em 2006,
aos(as) secretários(as) municipais de saúde em âmbito nacional, formado por dois blocos de questões.
Um relativo ao perfil do(a) gestor(a), voltado para a democratização das elites locais, e o outro relativo às
características da gestão em três dimensões: social, gerencial e assistencial.
A pesquisa foi realizada nos anos de 1996 e 2006, o que permitiu comparar os efeitos do processo
de descentralização nessa década. Apesar de a metodologia da pesquisa fundamentar-se em uma análise
diacrônica do processo de descentralização, boa parte das questões sobre a dimensão assistencial está
presente apenas na versão de 2006, tendo sido inseridas durante o trabalho de revisão e validação do
questionário, com objetivo de captar as novas práticas e instrumentos introduzidos pelos municípios, em
decorrência do aprofundamento do processo de descentralização do SUS.
Esse capítulo abrange apenas os resultados da dimensão assistencial, que compreende os
atributos relacionados ao acesso e à rede de ações e serviços de saúde ofertados à população pelos
governos locais.
O retorno dos questionários atingiu 28,6% e variou de 15,3% a 40,5% entre as regiões, em 1996,
e um total de 19,5%, em 2006, com variação regional de 9,6% a 25,2%. Enquanto em 1996 optou-se
por considerar a amostra de questionários recebidos como autorrepresentativa, em 2006 foi feito um trabalho estatístico de ponderação por expansão da amostra para torná-la representativa. As respostas foram
reunidas em uma base de dados eletrônica e tabuladas por grande região geográfica (norte, nordeste, centro-oeste, sudeste e sul) e porte populacional (0-5mil, 5-20mil, 20-50mil, 50-200mil e >200mil hab.).
O estudo da dimensão assistencial engloba a análise de diferentes ações e/ou programas, que estão
direcionados para aquilo que se convencionou chamar “a ponta da linha”, ou seja, instrumentos gerenciais que visam alterar a oferta, a qualidade e a efetividade da atenção à saúde. Entre eles destacam-se
ações voltadas para a racionalização dos recursos (como centrais de marcação de consulta ou de ambulância, fichas de referência etc.). Também se incluem nesta dimensão ações que visam alterar do modelo
de atenção à saúde, com ênfase na prevenção.
Os dados coletados trazem informações referentes à dimensão assistencial em relação as expectativa de aperfeiçoamento da organização da atenção à saúde, decorrentes do processo de descentralização
para dois atributos selecionados: acesso e composição da oferta de ações e serviços de saúde.
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M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
A análise da qualidade do acesso a bens e serviços do SUS busca compreender não só como ocorre
o acesso atual, mas também como os(as) gestores(as) locais identificam a demanda reprimida. Desta forma,
foram pesquisadas a forma e a qualidade do acesso à média e à complexidade, assim como os mecanismos de
identificação de demanda reprimida.
Por sua vez, buscou-se conhecer mais sobre a estrutura de atenção à saúde, perguntando aos(às)
secretários(as) municipais sobre os recursos disponíveis em sua rede e sobre as ações e programas de saúde
ofertados para a população.
4. Resultados
Forma e qualidade do acesso à média e alta complexidade
A maioria dos(as) gestores(as) municipais afirmou que, em 2006, o acesso às ações e serviços de média
e alta complexidade era realizado principalmente por meio de mecanismos de organização da demanda, como
centrais de marcação de consultas (63,8%), encaminhamento de unidades básicas de saúde (51,5%) e centrais
de marcação de exame (50,5%). Apenas os(as) secretários(as) da região norte apontaram a utilização mais
frequente do acesso por meio de demanda espontânea (40%), ou seja, sem planejamento da oferta.
Gráfico 133 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por formas de acesso a serviços de média e alta complexidade, segundo a região do País - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
391
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Segundo os(as) secretários(as) municipais, a utilização de mecanismos de planejamento para
atenção à demanda é bastante expressiva em todos os municípios, independentemente do porte populacional. É importante ressaltar que os municípios com mais de 50 mil habitantes possuem índices
mais elevados de utilização de centrais de marcação de consultas (50-200mil/73% e +200mil/74,4%)
e de exames (50-200mil/62,2% e +200mil/58,8%). Por outro lado, a utilização do encaminhamento
por unidades básicas de saúde é menor nos municípios com população acima 200mil hab.
Gráfico 134 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por forma de acesso a serviços de
média e alta complexidade, segundo o porte populacional dos municípios - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na percepção de quase todos(as) os(as) secretários(as) municipais de saúde, o acesso da população, em seu município, aos serviços de média e alta complexidade era insuficiente (51,1%) ou
parcialmente insuficiente (44,9%). O diagnóstico é o mesmo em todas as regiões do País. Curiosamente, na região norte é bem maior o percentual de secretários(as) que afirmam que o acesso é apenas
parcialmente suficiente (61,7%), dado que se coaduna com a predominância da demanda espontânea
como modalidade de acesso.
392
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 135 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de suficiência da oferta
de ações e serviços de média e alta complexidade, segundo a região do País - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O consenso amplo em torno da insuficiência de acesso a cuidados secundários e terciários
também se mantém no mesmo patamar em todos os municípios, independentemente do porte
populacional, mesmo nos municípios onde há mais oferta de recursos e profissionais como nos
grandes municípios, mas também mais demanda. Nos municípios com mais de 50mil habitantes, o
diagnóstico de suficiência parcial é um pouco mais frequente do que o de insuficiência, parecendo
indicar novamente que esse é o porte ideal para implantação tendencialmente sustentável do modelo
descentralizado do SUS.
393
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 136 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de suficiência da
oferta de ações e serviços de média e alta complexidade, segundo o porte populacional dos
municípios- 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 2006, para a maioria dos(as) secretários(as) (65,5%), a pressão da população expressa na
formação de filas de serviços era o mecanismo mais utilizado para a identificação de demanda reprimida. Outras estratégias ainda são pouco empregadas como as demandas vindas do conselho municipal
de saúde (33,3%) e as pesquisas de opinião (20,7%). A utilização de meios alternativos a esses mecanismos é bem menos expressiva ainda, como pode ser observada nos baixos índices de secretários(as),
que mencionaram as ouvidorias, as demandas de entidades da sociedade civil, as decisões judiciais e
outras.
Em geral, não se verificam diferenças regionais expressivas para os três mecanismos que possuem índices de difusão mais elevados. A utilização de filas de serviços foi apontada com mais frequência pelos(as) secretários(as) das regiões sudeste (74,3%) e sul (71,4%), em contraposição à região
norte (42,4%). Também, na região norte, estão os índices mais baixos de utilização de ouvidorias
(6,0%), demandas de associações da sociedade civil (2,1%) e decisões judiciais (0,7%). As duas regiões
mais desenvolvidas do País, sudeste e sul, também possuem índices mais expressivos de utilização de
decisões judiciais como formas de identificação de demanda reprimida (8,3% e 7%, respectivamente).
É importante ressaltar que na região centro oeste é um pouco mais elevado o emprego de pesquisa de
opinião (29,3%), ouvidorias (14,2%) e demandas da sociedade civil (13,1%).
394
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 137 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por mecanismos de identificação
de demanda reprimida, segundo a região do País - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em geral, quanto maior o porte populacional do município, maior o percentual de secretários(as)
que apontam a utilização dos diversos mecanismos de identificação de demanda reprimida, com exceção das pesquisas de opinião, que apresentam o mesmo percentual de uso independentemente do
tamanho da população. Como resultado, emerge um padrão assimétrico onde há, de um lado, sistemas de governança municipal em saúde com diversas formas de detecção da insuficiência de serviços,
representados especialmente nos municípios com mais de 200mil habitantes, e, de outro, apenas a
opção da fila de serviços como mecanismo quase exclusivo para o diagnóstico da deficiência, não fossem as demandas encaminhadas via conselho municipal de saúde, cuja difusão como mecanismo de
transmissão de demanda reprimida também é baixa.
395
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 138 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por mecanismos de identificação
de demanda reprimida, segundo o porte populacional dos municípios- 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Os recursos de organização da atenção à saúde mais difundidos, segundo os(as) secretários(as) de saúde,
foram os sistemas de coleta de patologias (74,9%), o cartão do usuário (62,8%) e a central de marcação de
consultas (57,4%). Os demais recursos mencionados possuem pouca difusão entre os governos locais, mesmo
os mais citados, como a central de ambulância (28,7%) e o cadastramento em base georeferenciada (21,7%).
Não há diferenças significativas entre os padrões regionais de distribuição dos recursos de organização
da atenção que seguem, em linhas gerais, o mesmo formato nacional, cabendo destacar apenas a maior difusão do cartão do usuário na região sul (71,7%), das centrais de ambulância nas regiões sudeste (36,5%) e
sul (34,7%). Por outro lado, é importante destacar a menor difusão da central de consultas (ou equivalente)
nas regiões norte (46,5%) e centro-oeste (41,2%) e do cadastramento de base georeferenciada e da central de
informações na região norte (10,7% e 3,2%, respectivamente).
Comparando as informações fornecidas pelos(as) secretários(as) municipais de saúde durante a década
estudada, observa-se que houve aumento da difusão do cartão do usuário (+9,1%), com maior intensidade
nas regiões norte (+16,8%) e sul (+24,5%) e da central de marcação de consultas (+9,3%), especialmente nas
regiões norte (+18,3%) e nordeste (+27,6%).
Por outro lado, chama atenção a redução da presença de centrais de ambulância (-19%), notadamente
nas regiões centro-oeste (-16,9%) e sudeste (-20,9%) e das centrais de internação (-8,9%), com maior intensidade nas regiões centro-oeste (-11%) e sul (-13%).
396
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 139 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de recurso para a organização da atenção à saúde, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em geral, quanto maior o porte populacional do município, mais ampla é a difusão dos recursos de organização da atenção à saúde, com exceção dos sistemas de coleta de exames de patologia e do
cartão do usuário. Comparando as duas edições da pesquisa, com exceção dos sistemas de coletas de
exames de patologia, observa-se que foi ampliada, de forma expressiva, a difusão do cartão do usuário
nos municípios com mais de 200mil habitantes (+23,3%). Aumentos ainda mais expressivos foram
verificados na difusão de centrais de marcação de consultas, nos municípios com população entre 20
e 50mil hab.(+26%), 50 e 200mil hab. (+34,3%) e mais de 200mil hab. (+31,5%).
Em contraposição, foram verificadas reduções na presença de centrais de marcação de consultas, nos municípios com menos de 5mil hab. (-13,1%) e centrais de ambulâncias nos municípios com
menos de 50 mil habitantes: -26,1% (0-5mil hab.), -18,4% (5-20mil hab.) e -15,4%(20-50mil hab.).
Essas reduções poderiam encontrar justificativa na pouca operacionalidade de tais instrumentos em
pequenos municípios. Mas, cabe também registrar a redução significativa na formação de distritos sanitários (-29,4%), verificada nos municípios com mais de 200 mil habitantes. Esse dado aponta para
os limites da descentralização, internamente aos grandes municípios.
397
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 140 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de recurso de organização da atenção à saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Entre ações e programas que foram consultadas na primeira versão da pesquisa, apresentadas
no gráfico 141, quase todas apresentam expressiva difusão pelo território nacional, com exceção das
terapias alternativas e de programas de internação domiciliar. Com exceção desses últimos, os demais
são financiados por políticas nacionais, o que mostra o efeito indutor do financiamento nacional. O
processo de difusão dessas ações e programas, no território nacional, já se mostrava expressivo na primeira edição da pesquisa, em 1996, destacando-se os acréscimos ocorridos com a presença de agentes
comunitários de saúde (+ 36,5%) e o programa de saúde da família (+66,9%).
Os níveis elevados de presença das ações e programas de atenção à saúde verificam-se em todas
as regiões em um padrão bastante homogêneo, o que sugere a relevância das políticas de caráter nacional na promoção da igualdade. A obtenção desse patamar elevado e homogêneo foi obtido com a
expansão diferenciada de cada ação ou programa entre as regiões, como pode ser visto pelo incremento
mais significativo da vigilância epidemiológica e do controle de endemias na região norte (+ 42,7%
e +38%, respectivamente), da vigilância sanitária, do controle de endemias e do programa saúde da
família na região nordeste (+37%, +38% e +73,8%, respectivamente), do programa de agente comu-
398
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
nitário de saúde na região sudeste (+55%), acompanhamento domiciliar no centro-oeste (+40,7%) e
internação domiciliar no sul (+34,2%).
Em síntese, é possível observar que os incrementos de difusão mais expressivos, em sua maioria,
foram feitos nas regiões norte e nordeste. Um caso oposto extremo a esse padrão consiste no programa
de agentes comunitários, cujos índices de difusão já eram mais elevados nas regiões norte e nordeste e
teve posterior difusão em outras regiões.
Gráfico 141 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo a região do País – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quando são comparados os níveis de difusão de ações e os programas de atenção à saúde de
municípios de tamanho populacionais diferentes, também se verifica a mesma homogeneidade vista
entre as regiões, o que reforça a tese da relevância das políticas promovidas pelas instâncias centrais
do SUS. A expansão das ações e dos programas em ritmos diferenciados, ao longo dos portes populacionais, com ênfase nos municípios com população até 20mil habitantes, foi a responsável pela
uniformidade encontrada, assim como a que ocorreu entre as regiões. Nos municípios com população
até 5mil hab. estão os índices mais elevados de expansão dos programas de vigilância epidemiológica
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
(+27,2%), agente comunitário de saúde (+44,7%), controle de endemias (+35,1%), acompanhamento domiciliar (+32,1%) e internação domiciliar (+27,9%). Por sua vez, nos municípios de 5 a 20mil
habitantes estão os maiores incrementos percentuais das ações de vigilância sanitária (+27,2%), do
acompanhamento domiciliar (+31,8%) e do programa saúde da família (+70,1%).
Gráfico 142 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas de
atenção à saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Segundo as informações fornecidas pelos(as) secretários(as) municipais de saúde, a difusão das
ações e dos programas pesquisados por nós apenas em 2006 também atinge níveis elevados, com graus
extremamente significativos de homogeneidade regional, apesar de algumas exceções. Os programas
voltados para doenças crônicas, o programa farmácia básica e as políticas de prevenção de câncer de
colo do útero e mama são, ao mesmo tempo, os de maior cobertura nacional e os que apresentam
maior homogeneidade na distribuição regional.
A difusão das demais ações e programas também é expressivamente homogênea, mas verificase sempre uma região ou, em casos extremos, duas, onde são encontrados índices menores do que
400
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
as demais. A maioria desses índices mais baixos de difusão encontra-se na região norte, como pode
ser visto nos casos dos programas de atenção à saúde da criança e da gestante (76,2%), do programa
PSF Bucal (80,2%) e das políticas de avaliação da mortalidade infantil e materna (54,4%). As demais
ocorrências de níveis mais baixos de difusão estão na região sudeste no programa PSF Bucal (68%) e
no programa DST/AIDS (65,9%).
Gráfico 143 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo a região do País – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A homogeneidade da difusão dos programas pesquisados apenas no questionário da segunda
edição da pesquisa (2006) é ainda maior quando comparados ao longo dos extratos de tamanho populacional. As cinco políticas ou programas de maior difusão apontados pelos(as) secretários(as) municipais (programas de doenças crônicas, programa farmácia básica, as políticas de prevenção de câncer
de colo do útero e mama, os programas de atenção à saúde da criança e da gestante e o programa PSF
Bucal) são novamente os que apresentam maior equidade na distribuição territorial. Nos demais, a
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
exemplo do que ocorre entre as regiões, há sempre alguns diferenciais que se manifestam em diversos
portes analisados, sem um padrão aparente de ocorrência.
Gráfico 144 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Diferentemente das ações e programas de elevada difusão, os de média propagação no território
apresentam significativas assimetrias regionais com poucas exceções, notadamente o caso do Programa
Brasil Sorridente ou dos programas de atenção à saúde dos idosos, que apresentam índices mais baixos
apenas na região norte. Em geral, há um padrão de difusão diferenciado, composto por taxas mais
elevadas na região sul, e taxas mais baixas na região norte. São ilustrativos do primeiro caso os níveis de
difusão na região sul dos programas de atenção ao idoso (68,2%), programas de prevenção de gravidez
precoce (68,2%), estratégias de acolhimento ao usuário (25,4%) e centros especializados em odontologia (18,1%). No caso da região norte, podem ser destacados os baixos índices de implementação
dos programas de atenção ao idoso (38%), programas de prevenção de gravidez precoce (41,6%),
estratégias de acolhimento ao usuário (4,6%) e centros especializados em odontologia (2,6%).
402
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 145 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo a região do País - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A assimetria regional presente na implantação dos programas de média difusão também pode
ser verificada na comparação por porte populacional. Aqui é possível distinguir claramente duas tendências diferentes de difusão. A primeira, sem um padrão aparente, foinverificada nos programas
de prevenção à saúde dos idosos e de prevenção e atenção à gravidez precoce, apesar de em ambos a
presença mais elevada estar nos municípios com mais de 200mil habitantes.
A segunda tendência revela um padrão de difusão caracterizado pela correlação positiva entre
porte populacional e amplitude da difusão das ações e programas de atenção à saúde, o que permite
a formação de um leque amplo de serviços nos grandes municípios enquanto evidencia-se carência
nos menores. O monitoramento das tendências futuras é importante para verificar se as assimetrias
observadas são resultantes do baixo índice de implementação e irão desaparecer com o tempo, como
nos programas de maior difusão, ou se as diferenças se perpetuarão. Ou seja, há uma letargia esperada
na difusão de inovações mais complexas, mas também podem existir obstáculos insuperáveis para um
dado nível econômico e populacional.
403
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 146 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo o porte populacional dos municípios - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por fim, o padrão de difusão das ações e programas de menor índice de implementação no
território nacional é semelhante ao de média difusão, porém as assimetrias são ainda maiores. As
comparações regionais mostram que os percentuais mais elevados de difusão estão nas regiões sul e
sudeste, em alguns casos no centro-oeste, e os menores quase sempre na região norte. Essas assimetrias
são muito claras, por exemplo, na difusão dos programas de combate à violência doméstica.
404
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Gráfico 147 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo a região do País - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A intensificação das assimetrias nas ações de programas de baixa difusão é ainda maior quando
a comparação é feita por porte populacional. Em geral, como pode ser observado no caso dos Centros
Gerais de Atenção Psicossocial (CAPS GERAL) (67,5%), sua difusão é bastante expressiva nos municípios com mais de 200mil habitantes, sendo que nos municípios médios (50 a 200mil habitantes)
há significativa difusão, mas em patamares menos expressivos, enquanto nos demais municípios (com
menos de 50mil habitantes), são praticamente inexpressivos os índices de difusão.
405
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 148 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por tipo de ações e programas
de atenção à saúde, segundo o porte populacional dos municípios - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
5. Discussão
O modelo de organização da atenção à saúde adotado no País reflete o pacto nacional construído em torno a valores que encerram o direito à saúde como direito universal da cidadania.
Assim, balizam as ações de proteção social, assumindo escolhas de estratégias e diretrizes de natureza
institucional e organizacional do sistema. Essas diretrizes abrangem escolhas consideradas adequadas
quanto ao modelo de relações federativas, às relações entre público e privado, ao escopo de cuidados
de cada nível de atenção e à relação entre eles, ao planejamento territorial e à disposição das unidades
de provisão, ao padrão de governança política e à distribuição de responsabilidades, entre outros aspectos de modelagem do sistema.
Em geral, sistemas inspirados pela experiência Britânica do pós Segunda Guerra Mundial, adotam sistemas nacionais de saúde com a provisão ampla de ações e serviços de saúde tanto em termos
de abrangência dos grupos populacionais quanto no que se refere à abrangência de ações e serviços
de saúde.
A natureza do sistema político, econômico e cultural de cada País molda as demais escolhas
institucionais daí decorrentes, resultando em diferenças nacionais apesar da mesma orientação universalista, como pode ser percebido por meio das diferenças entre os sistemas britânico, canadense,
406
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
espanhol, italiano etc. O que é comum a todos eles é o compromisso com o direito universal à saúde
e com a equidade na provisão de ações e serviços de saúde para a população, o que somente é obtido
por meio de estruturas integradas de cuidados, organizadas sob a forma genérica de redes atenção à
saúde. A construção desse modelo envolve a territorialização, com a porta de entrada definida para
aceso ao sistema, a articulação entre os de níveis de atenção, mecanismos de referência e contra referência, sistemas integrados de gestão (compras, finanças, gestão de pessoal etc.) e apoio (transporte
sanitário, protocolos, farmácia, centrais de regulação etc.), e comando político territorial unificado.
Esse modelo de organização da atenção à saúde é diretriz organizacional expressa no art. 198 da
Constituição Federal, de 1988, onde se afirma que as ações e serviços de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único.
Porém, deficiências, tensões e conflitos subjacentes à política nacional e de saúde, provenientes da existência de diferentes projetos de sociedade, tornam o processo de implementação da
descentralização um centro de disputas que resulta em avanços, mas também impõe barreiras, e
mesmo retrocessos, ao longo do tempo.
Esse tem sido o pano de fundo de construção do SUS, desde o início da década de 1990, e
grande parte das características atuais de organização da atenção à saúde refletem essas contradições, como pode ser visto na percepção dos(as) secretários(as) municipais de saúde, sintetizada nos
resultados acima apresentados.
A oferta de ações e programas de atenção à saúde tem se diversificado constantemente, incorporando inovações como terapias alternativas, acompanhamento domiciliar, programas voltados
para doenças crônicas, políticas específicas voltadas para saúde da criança e da gestante, programa
de atenção à saúde dos idosos, estratégias de acolhimento do usuário, entre outros.
Essas iniciativas não só proporcionam mudanças relevantes na concepção das práticas de
cuidado e na relação profissional-usuário, como também atualizam o sistema de saúde em relação
às modificações processadas no padrão demográfico da sociedade brasileira nas últimas décadas, as
quais exigirão mais ações voltadas para cuidados continuados em virtude do crescimento de condições crônicas.
Entretanto, o padrão de difusão da oferta de ações e serviços de saúde ainda esbarra no atraso
socioeconômico do País, como pode ser percebido na constatação de que os programas e políticas de
maior cobertura no território nacional somente atingiram expressão em regiões menos desenvolvidas e
municípios de menor porte quando já estavam difundidos em boa parte das áreas mais desenvolvidas.
Esse processo demonstra um padrão assimétrico de difusão que privilegia as áreas mais desenvolvidas, com raras exceções. Essa tese ganha mais fundamento quando são analisadas as ações e os
programas de menor cobertura nacional e quando se depara com um padrão bastante concentrador
de difusão em relação acerta inovações na atenção à saúde. Cabe reiterar a relevância das políticas de
caráter nacional, que demonstram capacidade de se contrapor às desigualdades regionais de domínio
de recursos e uniformizar o acesso a ações e serviços de saúde.
407
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Considerando ainda que serviços de média e alta complexidade são mais caros, devendo ser
providos territorialmente de forma concentrada, para garantir ganhos de escala e escopo, é extremamente importante o compromisso com um modelo regionalizado de descentralização. Tona-se muito
difícil expandir a oferta de ações e os serviços de saúde, garantindo equidade e eficiência sem um
modelo de governança regional, que sustente a unificação de processos de planejamento, coordenação
e articulação mínima de estruturas de gestão.
Da mesma forma, a sustentação de políticas nacionais para a correção de desigualdades regionais e locais exige um compromisso em torno de um padrão de financiamento que permita a
implantação de estruturas de provisão, a fixação de recursos humanos e sua qualificação, a contratação
de serviços necessários, entre outros. Bases sólidas de governança e sustentabilidade financeira são prérequisitos para a construção de sistemas integrados e eficientes de atenção à saúde, capazes de garantir
a continuidade do cuidado e a atenção integral.
Além da suficiência e diversidade da oferta de ações e serviços de saúde, o acesso é outra questão
fundamental do sistema. No modelo tradicional de redes de atenção, o acesso é planejado, especialmente para os serviços especializados, onde se necessita de ganhos de escala econômica. A ampliação
da estratégia da saúde da família e das políticas de regulação tem permitido avanços importantes no
sentido de formar bases iniciais para a definição de uma porta de entrada no SUS, assim como instituir mecanismos de racionalização da oferta existente. Em sua maioria, os(as) secretários(as) afirmam
que o acesso a serviços de média e alta complexidade já ocorre por meio do encaminhamento de unidades de atenção primária ou por centrais de marcação de consulta.
A institucionalização dessa prática possibilitará a difusão de medidas de prevenção e promoção
da saúde, um dos pontos forte da atuação da estratégia da saúde da família. Da mesma forma, permitirá, como há muito desejado, o controle da utilização excessiva e desnecessária de procedimentos
especializados. Para tal, é necessário que se avance na qualificação do trabalho da ESF, para que ela
disponha de mais conhecimento especializado e estrutura tecnológica, de forma a permitir a resolução
de agravos mais complexos e o acompanhamento conjunto dos usuários junto às áreas especializadas.
Além disso, aqui surge novamente a questão das desigualdades regionais, como pode ser percebido no percentual mais elevado dos(as) secretários(as) da região norte, que apontam a predominância
do acesso por meio de demanda espontânea. A maior utilização de centrais de marcação de consultas
e de exames em municípios com +50mil habitantes reflete a maior oferta de serviços especializados
nessas áreas, o que impulsiona o uso mais intenso de mecanismos de racionalização, especialmente considerando as dificuldades financeiras, que limitam a oferta desses serviços pelo setor público.
Ainda que não tenha sido objeto desse estudo a averiguação acerca da qualidade dos serviços, face ao
instrumento utilizado na coleta ser limitado à percepção do(a) gestor(a), pode-se inferir uma baixa
qualidade associada à ausência de planejamento da oferta.
Em termos de composição da oferta, o volume dos serviços de média e alta complexidade
consiste no principal entrave ao avanço do SUS, como pode ser avaliado pela percepção de quase
408
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
todos(as) os(as) secretários(as) sobre a insuficiência total ou parcial da oferta. Essa é uma deficiência tão expressiva que mesmo nos grandes municípios, onde tradicionalmente há mais recursos, o
diagnóstico dos(as) gestores(as) é o mesmo, reduzindo um pouco a percepção de insuficiência total.
Os estrangulamentos na oferta contrastam com a perspectiva do direito universal e do
dever do Estado, tanto que a sociedade tem desenvolvido diversas formas de pressionar o poder público, as quais acabam se transformando em importantes instrumentos de identificação
de demanda reprimida. Apesar de as filas nos serviços serem o principal mecanismo para tal,
já é possível identificar diversas outras formas que estão adquirindo expressão tais o CMS,
as ouvidorias, as demandas de associações da sociedade civil, as ações judiciais, entre outros.
Esse movimento ainda possui menor intensidade nas áreas menos desenvolvidas do País, notadamente na região norte e nos municípios com menos de 20mil habitantes, onde o leque de
possibilidades permanece mais restrito. Novamente, as diferenças de padrão geral de desenvolvimento são cruciais.
Apesar de ainda pouco difundida, é interessante notar a iniciativa prévia dos governos
locais para o desenvolvimento de instrumentos como as pesquisas de opinião, o que pode auxiliar processos de planejamento mais consistentes no futuro.
Essa tendência também é vista na presença de outros recursos de organização da oferta,
entre os quais os mais difundidos, segundo a percepção dos(as) secretários(as) municipais de
saúde, são os sistemas de coleta de exames de patologia, os instrumentos de identificação de
usuários (cartão do usuário) e a central de marcação de consultas. Outros mecanismos, como
centrais de ambulâncias, cadastramento em base georeferenciada e centrais de informação ainda são pouco difundidos. Esses mecanismos podem representar ganhos expressivos de racionalização de recursos e de ampliação equitativa da oferta, se fundamentados em processos de
planejamento e estratégias de regulação bem elaborados e implementados.
Finalmente, assim como em outros aspectos analisados, foram observadas assimetrias
regionais na difusão desses recursos, com maior difusão do cartão do usuário na região sul
(41,7%) e das centrais de ambulância nas regiões sudeste (36,5%) e sul (34,7%) e menor difusão da central de consultas nas regiões norte (46,5%) e centro-oeste (41,2%).
Em conclusão, a análise dos resultados sugere um movimento de expansão e aperfeiçoamento da estrutura local de atenção à saúde, em direção a um padrão com maior cobertura e
eficiência de organização. Esse padrão tem adquirido, de acordo com as informações da pesquisa, as seguintes características:
• Ampliação e diversificação de ações e programas de atenção à saúde, com inovações na
organização do modelo de atenção, voltadas para grupos determinados da população
(crianças, mulheres, idosos etc.) e o tratamento de agravos específicos (diabetes, câncer,
transtornos mentais etc.);
409
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
• Maior incorporação de mecanismos de organização da oferta de ações e serviços de saúde, com ganhos de racionalização de recursos financeiros, humanos, tecnológicos e de
insumos médicos;
• Maior utilização de estratégias de acesso coordenado a ações e serviços de média e alta
complexidade, buscando superar barreiras de utilização de cuidados secundários e terciários;
• Maior emprego de estratégias de identificação de demanda reprimida, procurando ampliar o grau de resposta do sistema às necessidades da população.
Esses aperfeiçoamentos permitem ampliar a integralidade da oferta, avançar nas bases de
mudança do modelo de atenção, introduzir elementos de uma cultura de planejamento e eficiência na ação pública, aumentar o grau de resolutividade do sistema, fortalecer a integração
entre os níveis de atenção e ampliar a articulação com outras políticas.
Como afirmado no início do capítulo, a formação de um modelo de redes de atenção
à saúde, com desempenho satisfatório, depende tanto da suficiência da oferta de unidades,
profissionais e insumos quanto de outros fatores como a organização adequada do processo
de trabalho em saúde, no interior das unidades, o acesso aos usuários, a qualidade da atenção
prestada (humanização do atendimento e eficácia da intervenção) e o ajustamento do conteúdo
das ações e serviços às necessidades e às especificidades da população.
Essa sincronia de processos requer estratégias conexas em planos diferentes e paralelos
e exigem um padrão de difusão de inovações mais intenso e homogêneo do que o apresentado
pelos resultados da pesquisa. Como se percebe claramente na análise das ações dos programas
de atenção à saúde, a assimetria tanto entre regiões quanto entre portes populacionais é uma
característica do padrão de difusão da oferta.
Nesse caso, é possível visualizar claramente três padrões diferentes de inovação com graus
bem variados de difusão. O primeiro caracterizado pela ampla difusão no território nacional,
independente de região e porte, resultado de processos de duas décadas de implementação,
grande parte impulsionado por incentivos financeiros patrocinados pelo Ministério da saúde.
Outros dois, de média e baixa difusão, caracterizados por elevada assimetria regional e de porte
populacional, compostos por ações e programas com menos tempo de implementação, alguns
deles também financiados pelo nível central.
As mesmas diferenças podem ser encontradas na difusão das estratégias de identificação de demanda reprimida e nos mecanismos de organização da atenção à saúde. Geralmente
há um grupo com elementos de elevados índices nacionais e baixa diferenciação por porte e
região, que corresponde à primeira onda de inovação, e um segundo grupo, com diversos elementos de índices nacionais baixos de difusão e elevada diferenciação entre as regiões e portes
populacionais.
410
M odernização da G estão L ocal do S U S . . .
Estes resultados podem ser tributados ao modelo de indução do centro para a periferia,
que garantiu a unidade do SUS, mas como só usou basicamente instrumentos financeiros de
alocação de recursos de forma fragmentada, levou à inovação por ondas, mas não à difusão
horizontal. Além disso, reduziu a autonomia dos municípios para pensar em soluções originais
mais adequadas às demandas locais.
411
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
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413
Capítulo 8
Alterações e Persistências
nos Padrões de Inovação
Local em Saúde
Sonia Fleury
Assis Mafort Ouverney
Renato Cesar Möller
Thais Soares Kronemberger
Felipe Barbosa Zani
1. Introdução
A inovação é parte consubstancial do desenvolvimento
porque este envolve processos de mudança que requerem a solução de problemas e o enfrentamento de desafios em relação
ao uso dos recursos, à sustentabilidade dos processos e à busca
da maior efetividade e eficiência na gestão. Assim, o desenvolvimento de um sistema universal de saúde abrange a solução de
problemas, a experimentação, a imitação, a criação de alternativas e sua difusão em diferentes âmbitos e espaços, sejam eles
relativos a processos gerenciais, sejam mais propriamente relacionados ao desenho de programas ou criação de produtos como
novas tecnologias e insumos, e à entrega de serviços.
De acordo com a metodologia adotada na pesquisa,
inovação pode ser apreendida com base em duas unidades de
análise, quais sejam as características da gestão e o perfil dos(as)
gestores(as). Foi possível verificar a difusão de inovações nas
dimensões social, gerencial e assistencial, comparando-as entre
si e em dois momentos da investigação, 1996 e 2006. No capítulo referente à metodologia (capítulo 3), detalhamos o processo de construção do Índice de Inovação, com base nas respostas a questões essenciais selecionadas por especialistas para
diferenciar entre aqueles classificados como mais inovadores e
aqueles considerados menos inovadores, de acordo com a sua
pontuação, obtida pelo somatório das respostas que dariam a
tais questões.
415
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Como existem grandes variações na capacidade de introduzir inovações em função do porte do município, foi realizada uma ponderação específica para pequenos municípios, distinta daquela usada para médios
e grandes municípios, com atribuição de pesos diferenciais nas respostas a estas questões. Assim, em uma
resposta considerada inovadora para um município de médio ou grande porte que recebesse peso +1, ela
receberia um acréscimo, tornando-se +2, no caso de a inovação ter sido adotada por um pequeno município.
A escala de ponderações variou de -2 a +2, sendo aplicada apenas às questões escolhidas como diferenciais
para a inovação na gestão, excluindo, portanto, questões relativas ao perfil do(a) gestor(a) e outras que não
permitiriam tal discriminação.
O escore total obtido nestas questões permitiu colocar cada respondente em um contínuo correspondente ao Índice de Inovação na gestão local em saúde. Posteriormente, foram selecionados os dois extremos,
ou seja, o quintil relativo aos mais e o quintil relativo aos menos inovadores, para que fossem identificadas
as características do perfil dos(as) gestores(as) que preponderam nos dois grupos. O objetivo, portanto, não
foi determinar onde começa a inovação nem, muito menos, quem inova mais ou inova menos, mas buscar
conhecer aqueles fatores mais fortemente associados à capacidade de inovação.
Dado que na primeira pesquisa de 1996 foi encontrada grande variação da inovação entre as dimensões
estudadas – social, gerencial e assistencial – a hipótese de trabalho para a segunda pesquisa, em 2006, foi que o
aprofundamento da descentralização levaria à maior difusão da inovação, o que resultaria na aproximação entre as curvas relativas às diferentes dimensões da inovação, assemelhando-as ao desenho de uma curva normal,
em forma de sino, situando-as em intervalos semelhantes. Além disso, um aumento da inovação se expressaria
pelo deslocamento dos valores médios e modais, com a condução das curvas ao longo do contínuo para uma
maior concentração de gestores(as) no polo mais próximo da inovação.
O texto está estruturado em quatro seções, além dessa introdução e das referências bibliográficas. A
seção 2 apresenta a distribuição nacional da inovação nas dimensões social, gerencial e assistencial, enquanto a
seção 3 analisa a difusão da inovação por grandes regiões geográficas do País. Na seção 4, são apresentados os
resultados por porte populacional e a seção 5 analisa a relação entre os padrões de inovação, as características
da gestão e o perfil dos gestores. Finalmente, na seção 6, encontra-se a discussão dos resultados obtidos.
2. Padrões nacionais de inovação
Em 2006, a distribuição das secretarias municipais de saúde ao longo do continuo do índice de inovação mostrou um padrão semelhante a uma curva normal, o que significa que havia poucos não inovadores
assim como poucos muito inovadores, sendo que a grande maioria estava concentrada no centro do contínuo
da inovação em relação à introdução de inovações. No entanto, observaram-se diferenças significativas entre
as curvas das três dimensões.
Os níveis de difusão da inovação foram mais elevados na dimensão assistencial, seguida pela dimensão
social. A maioria dos municípios nessas duas dimensões tem escores de inovação concentrados entre o terceiro
e o sexto decis, o que significa que atingiram entre mais de 20% e 60% do total máximo de pontuação previsto
pelo índice. Na dimensão gerencial, a maioria dos municípios atinge apenas pontuações que correspondem de
416
A lterações e P ersistências nos . . .
10% a 40% do máximo, mostrando uma enorme letargia na difusão da inovação gerencial.
Interessa observar que mesmo a maior difusão da inovação nas dimensões assistencial e social, bem
como sua melhor distribuição, deve ser confrontada com a reduzida inovação do conjunto dos municípios,
pois, a grande maioria pontua até 60% do escore total de inovação previsto. Observa-se que essas duas dimensões diferenciam-se apenas em relação ao número de municípios que se concentram nesta faixa, sendo
que a dimensão social suplanta em número de municípios a dimensão assistencial na faixa modal. Fica clara a
debilidade da inovação gerencial, cuja curva se desloca para a esquerda, concentrando a maioria dos municípios no polo menos inovador em 2006.
Gráfico 149 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por decil de inovação, segundo
dimensões da inovação – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Esse padrão é diferente daquele apresentado nos resultados da pesquisa de 1996�1, podendo ser
visualizadas diferenças tanto em termos do grau médio de inovação, obtido pelas secretarias em geral,
quanto no que se refere aos formatos específicos de cada dimensão.
Em geral, a dispersão é muito maior, e grande parte dos escores está situada até o quinto decil.
Comparando os dados de 1996 aos de 2006, os resultados indicam que os limites institucionais para
É importante ressaltar que as curvas de inovação foram construídas de forma diferente para as duas versões da
pesquisa. Em 1996, adotou-se a amostra em si para construir as curvas, enquanto, em 2006, foi utilizado um
plano amostral, que permitiu extrapolar os resultados para a população nacional dos municípios.
1
417
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
incorporar inovações eram maiores, pois a primeira pesquisa apresentou concentração de escores localizada mais à esquerda, ou seja, mais próximos do polo menos inovador.
Da mesma forma, as assimetrias entre as dimensões são mais acentuadas em 1996 quando se
compara com os resultados obtidos em 2006. Na primeira pesquisa, as três dimensões possuem tanto
maiores intervalos de concentração quanto padrões de dispersão de escores bastante diferentes.
Comparando as curvas encontradas em 2006 (gráfico 149) com aquelas apresentadas em 1996
(gráfico 150), fica nítido o movimento em relação à maior homogeneização do processo de inovação,
com a redução das discrepâncias apresentadas em 1996, em relação à incorporação das inovações nas
três dimensões. Esta maior aproximação da capacidade de inovação nas três dimensões corrobora
nossa hipótese de que uma das consequências do aprofundamento do processo de descentralização
que seria a maior difusão das inovações. No entanto, fica claro que a dinâmica deste processo se deve,
fundamentalmente, aos avanços observados na área assistencial. A baixa difusão das inovações nessa
dimensão, observada na edição da pesquisa em 1996, foi superada e a distribuição de sua curva, em
2006, aproximou-se do padrão mais avançado observado na dimensão social.
Gráfico 150 – Distribuição das secretarias municipais de saúde por decil de inovação, segundo
dimensões da inovação – 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
418
A lterações e P ersistências nos . . .
Avaliando as três curvas de inovação em 1996 percebe-se claramente que a construção do SUS propiciou inicialmente avanços na inovação social, mas preservou um desenho de baixa inovação em relação à
dimensão assistencial, enquanto na dimensão gerencial estabeleceu-se um padrão intermediário de inovação.
Em 1996 a distribuição para a dimensão assistencial mostra um padrão homogêneo para os dois primeiros decis e escores linearmente decrescentes para os demais níveis, em uma curva quase invertida, onde a
maioria inovava muito pouco. Na dimensão gerencial, já era possível observar um padrão de curva normal,
porém com alta concentração entre o terceiro e o quinto decis, com maior convergência de escores em torno
da média. Na dimensão social, a concentração dos escores estava localizada entre o quarto e o sexto decis, o que
denota não só a obtenção de escores mais elevados, mas também a existência de um grau maior de dispersão
dos escores em torno da média de difusão da inovação.
Comparando as inovações em 1996 e 2006, observa-se um deslocamento das curvas ao longo do
contínuo de inovação. A inovação social mantém-se em patamares similares nas duas décadas, em termos da
distribuição do número de secretários(as), ao longo do contínuo de inovação, com pequena variação, que pode
ser atribuída, inclusive, às diferenças no instrumento de coleta dos dados. No entanto, houve redução similar
dos extremos desta curva, já que houve diminuição tanto dos menos inovadores quanto dos mais inovadores,
consolidando um padrão de inovação menos disperso. A maior concentração no espectro da inovação social
demonstra que houve maior difusão dessas inovações antes e durante essa década, porém menor capacidade
de acelerar o processo de difusão das inovações sociais.
O que ocorreu com a inovação gerencial nesta década merece ser analisado por especialistas, autoridades nacionais e gestores locais, pois apresenta uma clara involução, em contradição com as expectativas
gerais. Houve um significativo deslocamento desta curva em direção ao polo de menor inovação com a maior
concentração de municípios situando-se em 2006 entre 0 e 30% do escore de inovação, enquanto, em 1996,
a maioria estava situada entre 20 e 50% do índice de inovação. Certamente o aprimoramento do instrumento
da pesquisa pode ser parcialmente responsável por esse resultado. No entanto, apenas as mudanças realizadas
no instrumento não seriam capazes de explicar a regressão observada.
Portanto, pode-se concluir que, como previsto, houve maior aproximação entre as dimensões analisadas da inovação, representando maior homogeneização no processo de difusão da inovação, com maior
concentração nos valores intermediários e redução dos extremos de maior e menor inovação, em especial no
que concerne à dimensão social, primeira a ser consolidada na construção do SUS descentralizado. Observou-se um intenso e consistente processo de transformação na inovação assistencial, com grande difusão das
inovações entre os municípios e com aumento significativo do grau de inovação, representado pelo efetivo
deslocamento da maior parte dos municípios em direção aos valores médios e de maior pontuação no grau
de inovação.
Com relação à dimensão gerencial, observou-se um fenômeno de menor intensidade, porém na direção inversa, com o deslocamento da curva em direção ao polo de menor inovação. Os dados sobre inovação
social mostram tanto sua estabilização quanto a necessidade de repensar os instrumentos atuais de indução, de
forma a possibilitar um novo incentivo para avançar na inovação nesta dimensão. Os resultados demonstram
também a efetividade das políticas e dos programas assistenciais, conduzidos nesta década, que deram lugar à
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
maior transformação no curso da inovação local em saúde, situada na entrega dos serviços. O uso de incentivos
financeiros como instrumento único para induzir a inovação não assegura sua sustentabilidade, que deve ser
reforçada com transformações culturais e organizacionais, além da construção de suporte social que impeça
recuos futuros. Já o desempenho da dimensão gerencial nesta década apresentou retrocesso e chama a atenção
para sua defasagem em relação às demais dimensões. Certamente, esse é o gargalo atual do SUS, assim como
a melhoria na dimensão assistencial foi o desafio da década passada.
Por fim, há que se considerar que, mesmo com todos os avanços, o espaço para inovação e difusão da
inovação, nas três dimensões, ainda representa um problema a ser enfrentado pelas políticas públicas, com a
identificação das limitações persistentes.
Quando se consideram apenas os municípios menos inovadores, observa-se que também, em 2006,
curvas de distribuição em formato normal, mas com concentração de escores entre o primeiro e o quarto decis.
Observou-se que, da mesma forma que o padrão geral, houve maior convergência no nível de inovação entre
as curvas das dimensões social e assistencial, quando comparadas com a dimensão gerencial, que apresentou
concentração em níveis menores de inovação.
Enquanto nas curvas das dimensões social e assistencial, os escores de inovação estavam agrupados em
sua maioria entre o segundo e o quarto decis, na curva da dimensão gerencial os escores estavam reunidos em
sua maioria no primeiro, segundo e teceiro decis.
Gráfico 151 – Distribuição das secretarias municipais de saúde menos inovadoras por decil de
inovação, segundo dimensões da inovação – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
420
A lterações e P ersistências nos . . .
Comparativamente, na década de 1996-2006, entre os menos inovadores, houve avanços
signiticativos no padrão de distribuição da inovação na dimensão social e, especialmente, na dimensão assistencial, enquanto observou-se certa estagnação na dimensão gerencial. Ou seja, nessa última
dimensão, repetiu-se para os municípios menos inovadores o padrão geral já identificado.
Na dimensão social, houve crescimento expressivo de secretarias com escores no quinto decil e
redução daquelas com escores no primeiro decil. Na dimensão assistencial, a redução dos escores no
primeiro e no segundo decis foi ainda maior, com expressiva ampliação das secretarias que apresentaram escores de inovação no terceiro e quarto decis, intervalo em que havia baixíssima concentração
em 1996. Cabe ainda ressaltar que, em 1996, havia um pequeno grupo de secretarias municipais de
saúde que atingiram escores acima de 60% do total dos menos inovadores.
Na dimensão gerencial, por outro lado, grande parte das secretarias menos inovadoras apresentou, em 2006, escores localizados entre o primeiro e o terceiro decis, configuração essa que não
apresentou mudança significativa em relação a 1996. Apenas um grupo muito pequeno de secretarias
atingiu o escore de inovação acima de 30% do total.
Gráfico 152 – Distribuição das secretarias municipais de saúde menos inovadoras por decil de
inovação, segundo dimensões da inovação – 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
421
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Já entre as secretarias de saúde mais inovadoras, a diferenciação entre os padrões setoriais de inovação é muito maior, tanto no que se refere ao intervalo de concentração dos escores quanto em sua dispersão.
Na dimensão gerencial, observou-se maior dispersão, estando as secretarias municipais de saúde
concentradas em grupos mais ou menos iguais entre o terceiro e o quinto decis. Na média, o escore obtido
é menor do que o observado nas demais dimensões. Na dimensão social, o padrão de distribuição das secretarias de saúde caracteriza-se pela concentração de escores no quinto decil, com menor dispersão em torno
da média quando comparado com o padrão observado nas duas outras dimensões. Há ainda um grupo
menor de secretarias que atinge escores de inovação mais elevados, chegando no máximo até 80% do total.
Entretanto, foi na dimensão assistencial que os escores atingiram níveis mais elevados, concentrando-se no quinto, sexto e sétimo decis, mas com um padrão de dispersão um pouco mais amplo do que o
observado na dimensão social. Em função disso, há um grupo considerável que atinge escores entre 70% e
90% do total de inovação.
Estes resultados revelam que mesmo entre os mais inovadores, não tem havido capacidades para
inovar na dimensão gerencial e a dimensão social da inovação também apresenta resultados baixos. Na
verdade, o alto escore que classificou estes municípios como mais inovadores deveu-se, fundamentalmente,
à inovação na área assistencial.
Gráfico 153 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais inovadoras por decil de
inovação, segundo dimensões da inovação – 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
422
A lterações e P ersistências nos . . .
Quando essa configuração é comparada com o padrão observado em 1996, os resultados sugerem mudanças expressivas na distribuição da inovação entre os municípios mais inovadores durante
a década. Essas mudanças ocorreram no grau de inovação e na distribuição dos escores em cada uma
das dimensões.
Na dimensão assistencial, as secretarias municipais de saúde apresentavam, em 1996, níveis
bem mais baixos de inovação, com grupos situados entre o segundo e o quinto decis, configurando
uma dispersão elevada. Nesse sentido, na década, a mudança na dimensão assistencial foi que os municípios mais inovadores ampliaram consideravelmente os escores de inovação e reduziram a dispersão
em tomo da média.
Na dimensão gerencial, o comportamento da inovação foi exatamente o contrário do verificado
na dimensão assistencial. A concentração dos escores no quinto, sexto (em especial) e sétimo decis
deu lugar a um padrão mais disperso com distribuição mais horizontal entre o terceiro e e quinto
decis, como visto acima, onde a média dos escores de inovação retrocedeu a níveis menores do que os
observados em 1996.
Gráfico 154 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais inovadoras por decil de
inovação, segundo dimensões da inovação – 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
423
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Finalmente, na dimensão social observou-se ainda uma mudança diferente do que ocorreu
nas demais. Em 1996, as secretarias municipais de saúde apresentaram escores de inovação com
maior concentração entre o quinto e o sétimo decis, sendo o padrão mais elevado de inovação entre
as três dimensões.
Nesse sentido, em uma década, as secretarias de saúde mais inovadoras apresentaram redução
do índice de inovação na dimensão social e migraram para um padrão de inovação mais no quinto
decil. A Tabela 11, abaixo, resume as mudanças nos intervalos de maior concentração dos escores
por decis para as três dimensões da inovação:
Tabela 11 - Intervalos de maior concentração de escores por decis nas dimensões social, gerencial e assistencial
Menos Inovadores
Mais Inovadores
Anos
Social
Gerencial
Assistencial
Social
Gerencial
Assistencial
1996
2° e 3°
1º a 3º
1° e 2°
5° a 7°
5º a 7º
2º a 5º
2006
2º a 4º
1º a 3º
2º a 4º
5°
3º a 5º
5º a 7º
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Comparando os intervalos de maior concentração dos municípios menos inovadores entre as
duas edições da pesquisa, é possível perceber que os municípios romperam barreiras de inovação e
atingiram escores mais elevados em todas as dimensões, exceto na gerencial onde os escores permaneceram concentrados nos três primeiros decis. Por outro lado, entre os municípios mais inovadores parece ter ocorrido um fenômeno contrário, com a concentração de escores migrando para decis
mais baixos, com exceção da dimensão assistencial. Esse dois movimentos somados resultam na
concentração dos escores de inovação em intervalos médios de decis nas três dimensões, reduzindo
a amplitude da distribuição da inovação.
3. Padrões regionais de inovação
Em 2006, a maior parte das gestões municipais em saúde mais inovadoras foi encontrada nas
regiões sul (39,0%), sudeste (28,9%) e nordeste (21,6%), que juntas alcançaram 89,5%, do total
dos mais inovadores.
424
A lterações e P ersistências nos . . .
Já os menos inovadores concentraram-se no nordeste (36,7%) e no sudeste (28,9%), regiões
que juntas representaram 65,6% do total dos menos inovadores. Ao estabelecer a comparação entre
os mais e os menos inovadores, verifica-se diferença percentual significativa na região sul (39,0% nas
gestões mais inovadoras e 11,8% nas menos inovadoras) e na região nordeste (21,6% nas gestões mais
inovadoras e 36,7% nas menos inovadoras).2
Gráfico 155 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
região geográfica – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 1996, as gestões mais inovadoras concentravam-se nas regiões sudeste (46,2%) e sul
(35,1%), enquanto as gestões menos inovadoras concentravam-se nas regiões sudeste (37,3%) e nordeste (25,3%).
Na década 1996-20063, a região nordeste aumentou tanto a concentração de gestões mais
inovadoras (10,8% em 1996 para 21,6%, em 2006) quanto menos inovadoras (25,3% em 1996 para
36,7%, em 2006). Por outro lado, na região sudeste ocorreram reduções percentuais significativas das
Em regra, considera-se como significativo para a descrição dos dados, a variação percentual acima de 10% na
comparação entre os percentuais das gestões municipais de saúde mais inovadoras e menos inovadoras.
3
A comparação entre os percentuais das gestões municipais de saúde mais inovadoras e menos inovadoras é
efetuado em relação ao percentual total de 1996 e 2006.
2
425
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
gestões mais inovadoras (46,2% em 1996 para 28,9% em 2006) e também das menos inovadoras
(37,3% em 1996 para 28,9% em 2006).
De forma geral, é possível, na década estudada, visualizar um padrão de distribuição da inovação composto por dois grupos de regiões:
• Grupo 1 – caracterizado pela baixa presença de ambos os conjuntos (mais e menos
inovadores): composto pelas regiões norte e centro-oeste. Esse grupo apresentou pouca
variação dos percentuais de participação no conjunto de municípios mais e menos inovadores;
• Grupo 2 – caracterizado pela elevada presença de ambos os conjuntos (mais e menos
inovadores). Pode ser dividido em três subgrupos:
o Região sudeste: apresentou redução do percentual de sua participação nos dois
conjuntos (mais e menos inovadores);
o Região nordeste: apresentou ampliação do percentual de sua participação nos
dois conjuntos (mais e menos inovadores);
o Região sul: apresentou expansão de sua participação no conjunto dos mais
inovadores e redução no conjunto dos menos inovadores;
Não é possível afirmar a existência de relação entre inovação local em saúde e região geográfica,
uma vez que é justamente nas regiões onde há maior concentração de municípios mais inovadores
que se verifica também a presença mais significativa dos municípios menos inovadores. Isso significa
que não há difusão de inovações regionalmente, dado que requer repensar o papel do nível estadual
na difusão de inovações.
Entretanto, é importante ressaltar que a região sul ampliou sua participação nos mais inovadores e reduziu a participação dos menos inovadores, quebrando a proporcionalidade observada em
1996. Também é de se notar que, na região nordeste, a ampliação da participação dos mais inovadores
foi bastante superior à ampliação da participação dos menos inovadores, o que sinaliza uma importante tendência favorável à inovação. Tendência inversa, desfavorável à inovação, é observada na dinâmica
ocorrida no sudeste.
Outra visão da distribuição regional da inovação pode ser adquirida comparando-se em cada
região o percentual de municípios mais e menos inovadores nos dois momentos da pesquisa. Em
1996, era possível distinguir dois grupos:
• Grupo 1 – formado pelas regiões sudeste e sul, onde o percentual dos municípios mais
inovadores superava aquele dos menos inovadores;
426
A lterações e P ersistências nos . . .
• Grupo 2 – formado pelas regiões nordeste, centro-oeste e norte, onde o percentual dos
menos inovadores superava aqueles mais inovadores;
As mudanças ocorridas em 2006 na distribuição da inovação produziram uma nova configuração, composta por três grupos:
• Grupo 1 – formado pelas regiões nordeste e norte, com predominância dos menos inovadores;
• Grupo 2 – formado pelas regiões sudeste e centro-oeste, com equilíbrio entre mais e
menos inovadores;
• Grupo 3 – formado pela região sul, com predominância dos municípios mais inovadores.
4. Padrões de inovação por porte populacional
Em 2006, tanto as gestões municipais de saúde mais inovadoras como as menos inovadoras
concentraram-se em municípios de 5.000 a 20.000 habitantes (57,0%, 60,4%, respectivamente) e em
municípios de até 5.000 habitantes (25,7%, 23,1%, respectivamente).
Em 1996, as gestões municipais de saúde mais inovadoras concentravam-se em municípios de
5.000 a 20.000 habitantes (35,5%), de 50.000 a 200.000 habitantes (25,1%) e de 20.000 a 50.000
habitantes (20,4%), enquanto as gestões municipais de saúde menos inovadoras concentravam-se
em municípios de menor porte populacional: de 5.000 a 20.000 habitantes (52,7%) e até 5.000
habitantes (28,1%). Observa-se que o aprofundamento da descentralização permitiu a difusão das
inovações para os pequenos municípios, até 20 mil habitantes, que foram aqueles que mais avançaram em relação a sua posição anterior.
427
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 156 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
porte populacional dos municípios – 1996/2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Ao contrário, na década 1996-2006, houve diminuições significativas nos percentuais das
gestões mais inovadoras em municípios de médio e grande porte populacional, ou seja, de 20.000 a
50.000 habitantes (20,4% em 1996 para 4,7% em 2006) e de 50.000 a 200.000 habitantes (25,1%
em 1996 para 8,2% em 2006).
Portanto, é importante destacar que houve aumentos significativos nos percentuais das gestões mais inovadoras em municípios de menor porte populacional, isto é, até 5.000 habitantes
(9,7% em 1996 para 25,7% em 2006) e de 5.000 a 20.000 habitantes (35,5% em 1996 para 57,0%
em 2006).
As mudanças observadas em relação ao deslocamento e difusão da inovação para municípios
de menor porte podem ser explicadas, em parte, pelo peso que adquiriu a inovação na dimensão
assistencial, subsidiada pelo Ministério da Saúde desde a metade da década de noventa.
Na década, é possível distinguir um padrão de diferenciação entre o comportamento dos
mais e menos inovadores em relação ao porte: enquanto os mais inovadores migraram dos municípios médios para os pequenos, os municípios de pequeno permanecem concentrando a maior parte
428
A lterações e P ersistências nos . . .
dos menos inovadores. Portanto, houve uma forte dinâmica de diferenciação da inovação entre os
pequenos municípios.
5. Padrões de inovação por características da gestão e perfil do gestor
A análise da inovação na política local de saúde buscou destacar as principais diferenças existentes entre os dois grupos, quais sejam, gestões de saúde mais e menos inovadoras. Buscou ainda
contextualizar o fenômeno em relação ao quadro verificado na década passada.
A caracterização da inovação, portanto, pautou-se na identificação daqueles elementos contidos em cada dimensão considerada neste estudo (social, gerencial e assistencial), mas também no perfil
dos(as) secretários(as) municipais de saúde, que apresentaram as maiores diferenças na comparação
entre os grupos dos mais inovadores e menos inovadores�.
5.1 Dimensão social
Em 2006, em relação ao processo de definição de prioridades em saúde, elaboração e execução orçamentária, as gestões de saúde mais inovadoras, em contraposição às menos inovadoras,
destacaram-se pela identificação como atores influentes no estabelecimento das prioridades para esta
política pública o secretário municipal de saúde (91,8% mais inovadores x 71,0% menos inovadores), o conselho municipal de saúde (70,2% mais x 37,2% menos) e as associações da sociedade civil
(25,6% mais x 5,8% menos). A influência do prefeito era semelhante em ambos os casos (61,4% mais
x 50,7% menos).
Em 2006, também era expressiva a diferença entre mais e menos inovadores quanto à influência no estabelecimento das prioridades em saúde das propostas dos conselhos ou conferências municipais (81,5% mais x 30,3% menos).
Ambos os grupos também diferiram quanto ao item influência exercida pelo parecer do corpo
técnico (74,6% mais x 42,3% menos). Isto demonstra a compatibilidade, e, mesmo a necessidade de
interação entre as deliberações oriundas de instâncias de participação social com aquelas de cunho
eminentemente técnico para a geração de práticas inovadoras.
Por outro lado, não se observa diferença significativa entre mais e menos inovadores quanto
à importância, na definição das prioridades em saúde, de formatos tradicionais como a solicitação
dos políticos locais (7,5% mais x 12,2% menos) ou mesmo a demanda espontânea (30,4% mais x
22,5% menos).
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 157 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
influência no estabelecimento das prioridades em saúde - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 1996, observa-se que os mais inovadores consideravam com maior intensidade, para o estabelecimento de prioridades em saúde, as propostas dos conselhos ou das conferências de saúde (84,2%
mais x 34,2% menos), o parecer do corpo técnico (67,0% mais x 31,5% menos) e as sugestões de outras
esferas (38,7% mais x 28,1% menos). Os menos inovadores valiam-se mais recorrentemente da demanda
espontânea (60,2% mais x 70,5% menos) e da solicitação de políticos locais (12,5% mais x 39,5% menos).
No período 1996-2006, observa-se que a importância do parecer do corpo técnico aumentou tanto
para os mais inovadores (67,0% em 1996 x 74,6% em 2006) quanto para os menos inovadores (31,5%
em 1996 x 42,3% em 2006). A demanda espontânea, por sua vez, diminui sua importância nas gestões
mais inovadoras (60,2% em 1996 x 30,4% em 2006) e menos inovadoras (70,5% em 1996 x 22,5% em
2006). A solicitação de políticos locais foi bastante reduzida nas gestões menos inovadoras ao longo da década (39,5% em 1996 x 12,2% em 2006). Verifica-se, portanto, que ambos os grupos, ao longo da década,
passaram a valorizar critérios técnicos e estruturados para o estabelecimento de prioridades, em detrimento
de artifícios como demanda espontânea e solicitações de políticos locais.
A elaboração do orçamento em saúde nas gestões mais inovadoras, em 2006, vis a vis as gestões menos inovadoras, era influenciada pelo secretário municipal de saúde (62,6% mais x 34,4% menos) e pelo
conselho municipal (43,4% mais x 13,4% menos). Nesta linha, a execução dos gastos em saúde também
era influenciada, nas gestões mais inovadoras, pelo secretário municipal (82,6% mais x 52,9% menos) e
pelo conselho municipal (46,0% mais x 20,3% menos).
430
A lterações e P ersistências nos . . .
Embora o prefeito fosse em 2006 uma figura igualmente importante para mais e menos inovadores na elaboração orçamentária (78,7% mais x 78,5% menos) e na execução dos gastos em saúde
(63,9% mais x 73,7% menos), os dados revelam certa autonomia dos(as) secretários(as) municipais
das gestões mais inovadoras durante o ciclo orçamentário da política sob sua responsabilidade.
A influência dos conselhos municipais de saúde não era acompanhada pelas associações da
sociedade civil, que pouca influência exerciam na elaboração do orçamento (18,4% mais x 4,2%
menos) e na execução dos gastos em saúde (15,2% mais x 2,4% menos), embora com maior peso nos
municípios mais inovadores.
Também em 2006, enquanto o parecer do corpo técnico influenciava a definição das prioridades em saúde, sobretudo nas gestões mais inovadoras (74,6% mais x 42,3% menos), os consultores
gozaram, em ambos os grupos, de limitada importância na elaboração do orçamento (11,6% mais x
9,7% menos) e na execução dos gastos de saúde (5,5% mais x 0,7% menos). Além disso, em 2006,
não se observava diferença, entre mais e menos inovadores, quanto à fraca influência de políticos locais
na elaboração do orçamento (13,8% mais x 8,1% menos) e na execução dos gastos em saúde (5,6%
mais x 4,7% menos).
Gráfico 158 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
influência na elaboração do orçamento e na execução dos gastos saúde - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Quanto à transparência na gestão, incluindo prestação de contas e divulgação das informações,
as gestões de saúde mais inovadoras, em 2006, utilizaram com mais intensidade os diferentes mecanismos para a prestação de contas: balancetes periódicos (86,3% mais x 67,1% menos), mas também
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
audiências públicas (63,1% mais x 24,1% menos), locais públicos (47,4% mais x 11,1% menos),
meios de comunicação (42,1% mais x 4,9% menos) e internet (25,5% mais x 3,2% menos).
Já em 1996, quase um terço das gestões menos inovadoras não utilizava qualquer mecanismo
para prestação de contas (0,4% mais x 32,9% menos). O balancete periódico era o mecanismo para a
prestação de contas que claramente diferenciava ambos os grupos de secretarias de saúde (88,9% mais
x 52,4% menos).
Na comparação da década 1996-2006, verifica-se que o uso dos meios de comunicação aumentou para os mais (19,4% em 1996 x 42,1% em 2006) e menos inovadores (3,4% em 1996 x 4,9%),
mas o fenômeno foi bem mais intenso no primeiro grupo. Verifica-se também a redução das secretarias de saúde menos inovadoras que não utilizam qualquer mecanismo para a prestação de contas
(32,9% em 1996 x 7,3% em 2006).
Gráfico 159 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
mecanismo utilizado para a prestação de contas - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
As instituições privilegiadas na prestação de contas pelas secretarias mais inovadoras eram,
em 2006, a câmara de vereadores (90,1% mais x 61,1% menos), o conselho de saúde (99,7% mais
x 78,6% menos), o prefeito (85,5% mais x 65,6% menos) e, com menos intensidade, as associações
da sociedade civil (47,1% mais x 8,5% menos). As gestões mais inovadoras prestavam contas a um
conjunto maior de atores, enquanto que dentre as menos inovadoras persistia um resíduo que não
prestavam contas (0% mais x 3,4% menos).
432
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 160 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
instituições a que a secretaria de saúde presta contas - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Desde 1996, as secretarias mais inovadoras já prestavam contas a um conjunto maior de
atores do que as menos inovadoras, enquanto dentre as menos inovadoras era elevado o percentual
que não prestava contas (0,4% mais x 18,2% menos). As diferenças entre ambos os grupos eram
mais expressivas quando a prestação de contas se referia aos conselhos municipais de saúde (89,8%
mais x 30,3% menos), à câmara de vereadores (39,4% mais x 14,4% menos) e ao prefeito (69,9%
mais x 58,9% menos).
Gráfico 161 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
instituições a que a secretaria de saúde presta contas - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
433
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
No período 1996-2006, os dois grupos alargaram o conjunto de atores destinatários de sua
prestação de contas. Destaca-se que os menos inovadores passaram a prestigiar os conselhos municipais na prestação de contas, reduzindo a enorme diferença que existia em 1996 (30,3 em 1996 x
78,6% em 2006). A prestação de contas para associações da sociedade civil tornou-se prática comum
para os mais inovadores ao longo da década (4,3% em 1996 x 47,1% em 2006), enquanto os menos
inovadores continuaram praticamente ignorando este ator (4,3% em 1996 x 8,5% em 2006).
A divulgação sobre ações e campanhas, em 2006, era a modalidade de informação oferecida
à população pelas gestões mais e menos inovadoras indistintamente (100% mais x 89,7% menos).
Já nas demais modalidades, observa-se a expressiva superioridade das gestões mais inovadoras: informação específica para os conselhos (78,5% mais x 28,6% menos), resultados da gestão (64,8%
mais x 21,4% menos) e funcionamento dos serviços (89,4% mais x 53,6% menos). Ainda em
2006, poucas eram as secretarias menos inovadoras, no entanto, que não divulgavam informações
(0% mais x 1,5% menos).
Gráfico 162 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
tipo de informação oferecida à população - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 1996, o quadro era semelhante ao atual, exceto pela substancial diferença entre gestões
mais e menos inovadoras quanto à divulgação sobre ações e campanhas (95,3% mais x 69,5% menos),
praticamente universalizada em 2006. Ademais, 10% das secretarias menos inovadoras não divulgavam qualquer tipo de informação à população em 1996.
434
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 163 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
tipo de informação oferecida à população - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em síntese, durante a década 1996-2006, a análise das secretarias de saúde mais inovadoras, no
que tange à dimensão social, revela transparência em sua gestão, ilustrado com utilização de diferentes
estratégias para a prestação de contas, que são dirigidas tanto para os atores legalmente destinatários
como também para o conjunto ampliado da sociedade.
A análise das gestões mais inovadoras nesta dimensão também destaca o conselho municipal de
saúde como instância influente na definição das prioridades em saúde, na elaboração e execução do orçamento desta política, assim como no recebimento de informações da secretaria de saúde. Aparentemente, estes espaços de participação social transformaram-se em canais privilegiados, se não exclusivos, para a
interlocução da sociedade com o Estado, haja vista a limitada influência das associações da sociedade civil
na definição de prioridades e na execução orçamentária da política de saúde, tanto nas gestões menos
quanto nas gestões mais inovadoras, com leve vantagem para as últimas.
A relevância do conselho municipal de saúde nas gestões mais inovadoras, em 2006, pode decorrer de características assumidas por estas instâncias como canal efetivo de troca de informações com
a secretaria de saúde (94,3% mais x 70,5% menos), concretizado por meio de reuniões (45,9% mais x
29,2% menos); pela divulgação de suas resoluções (85,5% mais x 56,2% menos), sobretudo pelos meios
de comunicação (35,3% mais x 14,9% menos); e, pela realização de eleição para a presidência (77,1%
mais x 58,6% menos). Tais diferenças conferem maior legitimidade aos conselhos de saúde vinculados
às gestões mais inovadoras, como interlocutores privilegiados da sociedade com a secretaria de saúde.
No entanto, os conselhos de saúde vinculados às gestões mais e menos inovadoras apresentavam,
em 2006, fragilidades comuns, como a inexistência de sede própria (85,2% mais x 91,2% menos) e a
ocupação do cargo de presidência pelo próprio secretário de saúde (62,8% mais x 59,1menos), traços
que indicam a perda de autonomia frente ao poder executivo.
435
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 164 – Distribuição dos conselhos municipais de saúde vinculados às secretarias mais e
menos inovadoras por características de funcionamento - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por fim, em 2006, percebe-se maior apoio às gestões mais inovadoras em relação a todos os atores considerados. As maiores diferenças entre os grupos mais e menos inovadores advinham do apoio
dos servidores públicos (68,8% mais x 38,5% menos), das associações da sociedade civil (47,3% mais
x 16,4% menos) e dos meios de comunicação em massa (41,0% mais x 13,0% menos).
Gráfico 165 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
forças sociais de apoio à gestão - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
436
A lterações e P ersistências nos . . .
Em 1996, observava-se que as secretarias de saúde mais inovadoras recebiam apoio das associações da sociedade civil (59,5% mais x 21,2% menos), do conselho municipal de saúde (88,2%
mais x 50,7% menos), de outras secretarias municipais (67,0% mais x 31,2% menos) e dos servidores
públicos (53,0% mais x 31,8% menos).
Gráfico 166 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
forças sociais de apoio à gestão - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na comparação da década, verifica-se o crescimento do apoio dos profissionais de saúde às
gestões mais (59,1% em 1996 x 82,9% em 2006) e menos inovadoras (51,0% em 1996 x 68,9%
em 2006). Observa-se ainda que, se em 1996 o conselho municipal de saúde conferia maior apoio às
secretarias mais inovadoras (88,2% mais x 50,7% menos), enquanto em 2006 passou a apoiar indistintamente as gestões locais de saúde, com ligeira vantagem para os mais inovadores (94,5% mais x
83,3% menos). Esse alinhamento do Conselho com a gestão da secretaria, independentemente de sua
capacidade de inovação, é preocupante, pois indica sua influencia e institucionalização ao longo da
década, mas também perda de sua autonomia crítica.
Em relação às forças sociais de oposição, pouco expressivas para mais e menos inovadores, a
única diferença significativa em 2006, entre ambos os grupos, dizia respeito aos prestadores de serviços do setor privado (18,8% mais x 5,3% menos). Nas administrações mais e menos inovadoras,
os opositores mais atuantes, em 2006, eram os partidos políticos (42,4% mais x 34,2% menos) e a
câmara de vereadores (26,5% mais x 34,1% menos). Os dados revelam que a oposição às gestões locais
da política de saúde não se orientam pela capacidade de inovação da administração pública.
437
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Em 1996, as secretarias mais inovadoras, em relação às menos inovadoras, enfrentavam maior oposição
dos prestadores privados de serviços (33,7% mais x 9,2% menos). Porém, na comparação da década, observase a redução generalizada das forças sociais opositoras para mais e menos inovadores, exceto em relação à câmara de vereadores, que intensificou sua oposição no caso das gestões menos inovadoras (22,6% em 1996 para
34,1% em 2006). A relação com o setor privado, que era mais tensa para as secretarias mais inovadoras, perdeu
esse caráter ao longo da década, o que indica uma naturalização da relação entre o setor público e o privado.
O quadro abaixo sintetiza as principais características apresentadas, em 2006, pelas secretarias municipais de saúde mais inovadoras na dimensão social em comparação com as secretarias municipais menos
inovadoras.
Quadro 10 - Caracterização das gestões mais inovadoras na dimensão social - 2006
Particularidades das secretarias de saúde mais inovadoras na dimensão social
O Conselho Municipal de Saúde influenciava a definição das prioridades da política de saúde, bem como
a elaboração e a execução do orçamento municipal, mas perdeu a capacidade de discriminar seu apoio
às secretarias mais inovadoras;
O Secretário Municipal de Saúde detinha autonomia sobre a definição das políticas de saúde, incluindo
o orçamento;
Maior transparência na gestão obtida pela diversificação dos mecanismos utilizados para a prestação
de contas e dos atores a quem se direciona, para além daqueles legalmente exigidos, bem como pela
diversificação das informações oferecidas à população;
Governança erigida sob o apoio político recebido de diferentes fontes, das quais constam funcionários
públicos, sociedade civil e mídia.
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
5. 2 Dimensão gerencial
Em 2006, as gestões de saúde mais inovadoras, na comparação com as gestões menos inovadoras, utilizaram com maior intensidade diferentes mecanismos para captação de demanda da população, entre os quais
se destacavam o conselho municipal de saúde (97,5% mais x 71,6% menos), os meios de comunicação em
massa (59,2% mais x 21,6% menos), as pesquisas de opinião (54,1% mais x 12,7% menos) e os formulários
de avaliação/caixa de sugestões (50,1% mais x 15,0% menos). Por outro lado, o atendimento no gabinete,
considerado um dos mecanismos tradicionais de gestão, também era mais frequentemente utilizado nas secretarias de saúde mais inovadoras (82,3% mais x 64,1% menos).
Além disso, em 2006, as gestões municipais mais inovadoras, comparativamente, incorporaram mais
ferramentas de tecnologia de informação que permitem o desenvolvimento de práticas de governo eletrônico
(e-gov), dinamizando o processo de captação de demandas, haja vista a utilização da internet como mecanismo
438
A lterações e P ersistências nos . . .
de interlocução com a sociedade (25,7% mais x 1,7% menos), ainda que este universo corresponda a pouco
mais de um quarto das secretarias de saúde. Da mesma forma, as gestões mais inovadoras faziam maior uso dos
serviços de disque denúncia (17,7% mais x 2,4% menos), mas a prática ainda era muito incipiente.
Gráfico 167 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
mecanismos utilizados para captação de demandas da população - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Observa-se que desde 1996 as gestões mais inovadoras utilizavam com maior frequência todos os mecanismos de captação de demandas considerados, com destaque para a diferença quanto a
ouvir o conselho municipal de saúde (94,1% mais x 46,8% menos), cuja diferença reduziu em 2006
(97,5% mais x 71,6% menos).
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DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 168 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
mecanismos utilizados para captação de demandas da população - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na comparação da década 1996-2006, verifica-se a expressiva redução das gestões menos inovadoras
que não utilizavam qualquer mecanismo para receber demandas da população (32,7% em 1996 para 0,4%
em 2006). No período, as secretarias mais inovadoras, em comparação às menos inovadoras, passaram a
utilizar com maior intensidade as pesquisas de opinião (24,4% em 1996 para 54,1% em 2006) e os formulários de avaliação/caixa de sugestões (38,5% em 1996 para 50,1% em 2006).
Quanto às medidas adotadas em resposta a demandas recebidas, em 2006, as secretarias mais inovadoras valeram-se, com muito mais intensidade, de todas as opções consideradas, o que indica seu maior
grau de permeabilidade às solicitações da população: mudanças no funcionamento de serviços (84,2% mais
x 47,9% menos), avaliação da gestão (75,1% mais x 38,9% menos), criação de novos serviços (73,6% mais
x 34,3% menos) e punição ou remanejamento de funcionários (63,9% mais x 35,1% menos).
440
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 169 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
medidas adotadas em resposta às demandas recebidas - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Esta situação é semelhante àquela verificada em 1996. A diferença é que houve, ao longo da década,
uma forte redução de secretarias menos inovadoras que não adotavam medidas em função das demandas
recebidas (43,7% em 1996 para 9,9% em 2006), de forma que mais e menos inovadores aproximaram-se
no período 1996-2006, embora a diferença entre ambos os grupos continue significativa.
Gráfico 170 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
medidas adotadas em resposta às demandas recebidas - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
441
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quanto ao formato de compras e serviços, especificamente em relação aos procedimentos de compras e contratações utilizados, não há diferenças substanciais entre mais e menos inovadores em 2006.
Os dois grupos utilizaram prioritariamente a licitação tradicional (89,9% mais x 88,3% menos). Modalidades licitatórias que poderiam conferir maior flexibilidade e economicidade ao processo de aquisição
de bens e serviços, tais como pregão presencial (19,2% mais x 8,9% menos) e pregão eletrônico (17,9%
mais x 2,3% menos), ainda eram muito incipientes, com maior expressão nas gestões mais inovadoras.
Não se observou diferença marcante no processo de terceirização de serviços na comparação entre
as gestões mais e menos inovadoras em 2006, salvo os convênios com a rede filantrópica (41,0% mais
x 14,6% menos). As demais modalidades – contrato de gestão com OS (6,3% mais x 2,6% menos),
convênios com OSCIP (10,2% mais x 2,7% menos) ou ONG (7,6% mais x 2,0% menos) - eram similarmente pouco utilizadas por ambos os grupos. A modalidade mais utilizada era o contrato com a
rede privada (48,2% mais x 36,5% menos). Vale destacar que praticamente um terço das gestões menos
inovadoras optou por não responder a questão (16,0% mais x 32,2% menos).
Também em 2006, ainda em relação a compras de serviços, a institucionalização de mecanismos
de controle de qualidade dos serviços ofertados era muito maior nos municípios mais inovadores, quer
dizer, mecanismos voltados para os serviços próprios (79,1% mais x 31,3% menos), para os serviços
contratados (50,0% mais x 8,2% menos) e para os serviços conveniados (43,3% mais x 5,0% menos).
De fato, a inexistência de tais mecanismos ainda era comum nos municípios menos inovadores (14,0%
mais x 54,8% menos).
Gráfico 171 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
características de compras e serviços - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
442
A lterações e P ersistências nos . . .
Quanto à gestão de pessoas, em 2006, especificamente em relação à forma de contratação de
profissionais, inexistiam maiores diferenças entre as gestões mais e menos inovadoras, inclusive na
embrionária utilização de consórcio intermunicipal (4,2% mais x 2,0% menos). A contratação predominantemente ocorria por intermédio do poder público em ambos os grupos (97,2% mais x 90,8%
menos).
Embora a gestão de recursos humanos, em 2006, estivesse concentrada na secretaria de administração da prefeitura (83,1% mais x 85,1% menos), mais frequentemente as gestões mais inovadoras
possuíam órgão de recursos humanos dentro da própria secretaria de saúde (34,2% mais x 10,6%
menos).
Em 2006, as gestões mais inovadoras destacavam-se pela oferta a seus funcionários de política
de educação permanente (64,6% mais x 16,0% menos) e de política própria de capacitação (56,0%
mais x 13,3% menos) ainda que os cursos e treinamentos fossem oferecidos predominantemente pelos
governos estadual e federal (90,1% mais x 70,3% menos).
As gestões mais inovadoras também se destacavam, em 2006, por realizarem pagamento de
adicionais por desempenho a seus profissionais (33,3% mais x 11,6% menos), mas esta política ainda
era limitada a poucas secretarias de saúde. O pagamento além da tabela do SUS era ainda mais restrito (18,9% mais x 8,2% menos). Isto é, a incorporação de políticas de gestão por desempenho era
incomum inclusive nas gestões mais inovadoras, e a prática de pagamentos adicionais aos funcionários
ainda não estava institucionalizada, embora houvesse diferença significativa entre o percentual de secretarias de ambos os grupos que não efetuava pagamentos adicionais (43,2% mais x 61,8% menos).
Gráfico 172 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
características da gestão de pessoas - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
443
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
O recebimento de apoio técnico, em 2006, era significativamente maior no caso das gestões
locais de saúde mais inovadoras, principalmente nos casos do governo federal (73,2% mais x 31,4%
menos), comissão bipartite (60,6% mais x 22,8% menos), consórcio intermunicipal (52,0% mais x
18,2% menos), CONASEMS (42,1% mais x 10,5% menos) e universidades (39,1% mais x 6,8%
menos). Apoio de agências internacionais era incomum nos dois grupos (2,5% mais x 1,0% menos).
Gráfico 173 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
apoio técnico recebido - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Essa situação em relação ao apoio técnico assemelhava-se àquela encontrada em 1996. O recebimento de apoio técnico era maior para as secretarias mais inovadoras, sobretudo de parte dos
COSEMS (56,0% mais x 18,5% menos), das universidades (32,3% mais x 0,3% menos), do governo
federal (41,6% mais x 10,6% menos) e da comissão bipartite (52,7% mais x 24,4% menos).
444
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 174 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
apoio técnico recebido - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Observa-se, ao longo da década, a expansão das diferentes fontes de apoio técnico para as gestões mais e menos inovadoras, destacando-se o papel do governo federal. Houve ampliação do apoio
dos COSEMS, tanto aos municípios mais inovadores (56,0% em 1996 x 72,7% em 2006) quanto
aos menos inovadores (18,5% em 1996 x 51,7% em 2006), ao contrário do movimento observado
quanto ao governo federal e à comissão bipartite, que intensificaram o apoio aos municípios mais
inovadores.
As modalidades de parcerias, em 2006, seguiam a tendência do apoio técnico, isto é, maior
número no caso das secretarias mais inovadoras, embora as parcerias estivessem ainda mais concentradas neste grupo do que em relação ao recebimento de apoio técnico. As maiores diferenças eram
verificadas nas parcerias com o governo federal (78,3% mais x 41,9% menos), outros setores do
governo municipal (77,5% mais x 32,9% menos), igrejas (54,3% mais x 20,1% menos), instituições
de ensino e pesquisa (53,7% mais x 7,7% menos) e organizações não governamentais (42,1% mais x
8,4% menos). Não obstante estas diferenças expressivas, poucas secretarias de saúde menos inovadoras
não haviam firmado qualquer parceria (0,4% mais x 7,1% menos).
445
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 175 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
modalidade de parceria - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Novamente, em 1996, o quadro era semelhante: as parcerias com secretarias mais inovadoras
eram mais frequentes do que no caso das menos inovadoras, principalmente com outros setores do
governo municipal (68,8% mais x 18,2% menos).
Gráfico 176 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
modalidade de parceria - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
446
A lterações e P ersistências nos . . .
Durante a década 1996-2006 houve uma concentração das parcerias na direção das
gestões mais inovadoras, sobretudo por parte do governo federal, consórcio intermunicipal e
instituições de ensino e pesquisa. Por outro lado, as secretarias de saúde menos inovadoras,
que não tinham qualquer parceria, diminuíram significativamente (35,7% em 1996 para 7,1%
em 2006).
Por fim, quanto à regionalização, em 2006 era bem mais intensa a participação das
gestões mais inovadoras em consórcios municipais (60,9% mais x 20,4% menos) e na NOAS
2002 (49,5% mais x 18,7 menos). Raras, contudo, eram as secretarias que não participavam de
alguma estratégia pactuada de regionalização (0,6% mais x 2,2% menos), de forma que ambos
os grupos valorizavam a estratégia nas quais se encontravam inseridos, dado que consideravam
a existência de avanços em relação à situação anterior (89,7% mais x 76,9% menos).
Em 2006, as secretarias de saúde mais inovadoras participavam mais intensamente na
elaboração do Plano Diretor de Regionalização (77,5% mais x 38,8% menos), principalmente
por meio de negociação em CIBs regionais (54,8% mais x 22,2% menos).
Quanto aos motivos de não participação na elaboração do referido Plano Diretor, em
2006, os grupos mais e menos inovadores alegaram que o processo foi centralizado na Secretaria Estadual de Saúde (62,2% mais x 64,6% menos), excluindo a possibilidade da não elaboração (6,0% mais x 13,9% menos) ou da falta de interesse (0% mais x 5,0% menos).
Gráfico 177 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
características do processo de regionalização - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
447
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
O quadro a seguir sintetiza as principais características apresentadas, em 2006, pelas secretarias
municipais de saúde mais e menos inovadoras na dimensão gerencial.
Quadro 11 - Caracterização das gestões mais inovadoras na dimensão gerencial - 2006
Particularidades das secretarias de saúde mais inovadoras na dimensão gerencial
Diversificação e democratização dos mecanismos utilizados para captar as demandas da população, com
consequente aumento das respostas adotadas pelas gestões locais em razão das demandas recebidas;
Institucionalização de práticas para controle da qualidade dos serviços prestados;
Criação de órgão próprio para a gestão dos recursos humanos, oferta da política de educação permanente e pagamento de remuneração adicional atrelada ao desempenho dos profissionais;
Construção de redes gerenciais por meio da diversificação das fontes de apoio técnico e das parcerias
estabelecidas, englobando entidades setoriais, entidades intergovernamentais, instituições acadêmicas
e instituições da sociedade civil;
Valorização das estratégias institucionalizadas de regionalização.
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
5. 3 Dimensão assistencial
Nas gestões de saúde mais inovadoras, em comparação com as menos inovadoras, o acesso aos
serviços de média e alta complexidade, em 2006, ocorria por meio da central de marcação de consulta
(80,2% mais x 53,3% menos) e por intermédio da central de marcação de exames (66,7% mais x
38,3% menos). As gestões mais inovadoras também utilizavam com maior intensidade o encaminhamento das unidades básicas de saúde (61,1% mais x 43,3% menos). Contudo, não havia diferença
entre ambos os grupos quanto ao acesso aos serviços de média e alta complexidade mediante a demanda espontânea (21,7% mais x 23,9% menos).
448
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 178 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
formas de acesso aos serviços de média e alta complexidade - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Embora seja clara a preocupação das secretarias mais inovadoras em adotar mecanismos para
organizar a oferta de serviços de saúde, a avaliação sobre o acesso aos serviços de média e alta complexidade, em 2006, era semelhante, ou seja, os(as) gestores(as) das secretarias mais e menos inovadoras
julgaram ser o acesso insuficiente (49,0% mais x 56,4% menos) ou parcialmente suficiente (47,0%
mais x 38,7% menos).
Em 2006, a utilização de mecanismos para identificação de demanda reprimida pelas gestões
mais inovadoras era substancialmente maior do que nas gestões menos inovadoras, com destaque
para a demanda apresentada pelo conselho municipal de saúde (52,5% mais x 20,9% menos). Também eram mais comuns a pesquisa de opinião (35,5% mais x 11,4% menos), a ouvidoria (23,2%
mais x 3,0% menos) e a demanda de associações da sociedade civil (18,4% mais x 3,3% menos).
No entanto, o mecanismo mais utilizado por ambos os grupos, no entanto, era a fila nos serviços
(74,2% mais x 59,6% menos).
449
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 179 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
mecanismos utilizados para identificar a demanda reprimida - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 2006, as secretarias de saúde mais inovadoras dispunham de mais tipos de serviços que as
gestões menos inovadoras, embora, ambas as gestões apresentassem percentuais baixos: cartão do usuário (86,2% mais x 41,0% menos), central de marcação de consultas ou equivalentes (75,6% mais x
40,2% menos), equipe de saúde mental (53,1% mais x 14,7% menos), central de ambulância (50,3%
mais x 10,6% menos), cadastramento por base georeferenciada (42,6% mais x 5,5% menos) e central
de informações (38,1% mais x 4,4% menos).
Gráfico 180 – Distribuição das secretarias municipais de saúde mais e menos inovadoras por
tipo de recursos oferecidos à população - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
450
A lterações e P ersistências nos . . .
Este padrão é semelhante àquele verificado em 1996. Naquele ano, todos os serviços considerados
apresentaram significativa diferença entre mais e menos inovadores, sobretudo: cartão do usuário (66,7%
mais x 41,1% menos), central de marcação de consultas (60,5% mais x 34,4% menos), central de ambulância (65,2% mais x 30,1% menos), cadastramento por base georeferenciada (38,4% mais x 5,8%
menos), central de informações (35,8% mais x 8,1% menos), central de internações (36,4% mais x 11,1%
menos), acompanhamento domiciliar (69,9% mais x 28,8% menos), controle de endemias (70,6% mais x
40,4% menos) e desospitalização de saúde mental (43,4% mais x 4,7% menos).
Ao longo da década 1996-2006, contudo, é possível observar que aumentaram as diferenças entre
mais e menos inovadores na oferta dos serviços, principalmente em relação ao cartão do usuário e à central
de marcação de consultas, com impactos na organização e no planejamento da oferta dos serviços de saúde.
Quanto aos tipos de ações e programas de saúde, em 2006, sua oferta era sistematicamente maior
nas secretarias de saúde mais inovadoras. Em alguns casos, a presença das ações e programas era igualmente
elevada em ambos os grupos, mas sempre com vantagem para os mais inovadores, como a vigilância epidemiológica (100,0% mais x 90,4% menos), Programa Saúde da Família (99,2% mais x 88,9% menos), Programa Farmácia Básica (98,1% mais x 84,1% menos) e vigilância sanitária (97,5% mais x 89,9% menos).
Essas são ações basilares da política local de saúde ou programas financiados por repasse de verbas federais.
Na maioria dos casos, contudo, existiam elevadas discrepâncias entre a oferta dos mais e menos
inovadores, como a avaliação da mortalidade infantil e materna (98,7% mais x 55,2% menos), acompanhamento domiciliar (96,9% mais x 57,6% menos), Programa DST/AIDS (95,6% mais x 56,9% menos),
acompanhamento de gestantes e lactantes de risco (94,4% mais x 43,0% menos) e prevenção e atenção de
gravidez precoce (89,4% mais x 27,4% menos).
Gráfico 181 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por
tipo de ações e programas de saúde adotados - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
451
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Em 1996, observam-se relevantes diferenças entre mais e menos inovadores quanto a todas as
ações e programas considerados: vigilância epidemiológica (88,9% mais x 56,8% menos), vigilância
sanitária (88,2% mais x 52,7% menos), Programa Saúde da Família (41,6% mais x 16,1% menos),
controle de endemias (70,6% mais x 40,4% menos), acompanhamento domiciliar (60,9% mais x
28,8% menos), terapias alternativas (24,4% mais x 2,4% menos) e internação domiciliar (17,7% mais
x 3,7% menos).
Gráfico 182 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por
tipo de ações e programas de saúde adotados - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na década 1996-2006, verificou-se a expansão da oferta das ações e programas pelos mais inovadores e, principalmente, pelos menos inovadores, de forma que as diferenças entre os percentuais
dos mais e menos inovadores diminuíram ao longo da década, exceto para os programas de internação
domiciliar e terapias alternativas.
O quadro abaixo sintetiza as principais características apresentadas, em 2006, pelas secretarias
municipais de saúde mais inovadoras na dimensão assistencial em comparação com as secretarias
municipais menos inovadoras.
452
A lterações e P ersistências nos . . .
Quadro 11 - Caracterização das gestões mais inovadoras na dimensão assistencial -2006
Particularidades das secretarias de saúde mais inovadoras na dimensão assistencial
Organização da demanda e planejamento da oferta dos serviços de alta e média complexidade;
Racionalidade, funcionalidade e equidade na distribuição da oferta;
Diversidade na oferta de ações e serviços locais.
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
5. 4 Inovação e perfil do(a) gestor(a)
As diferenças entre as secretarias de saúde mais e menos inovadoras, em 2006, no que tange
ao perfil do(a) gestor(a), em geral, são menos acentuadas do que aquelas diferentes relativas à gestão
municipal de saúde em suas dimensões social, gerencial e assistencial.
O perfil socioeconômico dos(as) secretários(as) das gestões de saúde mais inovadoras na comparação com os menos inovadores, em 2006, difere em algum grau quanto à faixa salarial e à raça.
Os(as) secretários(as) das gestões menos inovadoras receberam, em 2006, salários inferiores, entre
R$1.001,00 e R$2.000,00 (42,8% mais x 59,8% menos), e obtiveram renda adicional na área pública
(20,3% mais x 30,1% menos), enquanto os mais inovadores auferiram renda adicional da área privada (30,0% mais x 15,3% menos). No entanto, o recebimento de rendas adicionais era incomum em
ambos os grupos, dado que mais de um terço não recebia ingressos adicionais (37,5% mais x 37,9%
menos).
Em 2006, nas gestões mais inovadoras era mais comum encontrar secretários(as) brancos(as)
(78,8% mais x 62,6% menos), ao passo que nas gestões menos inovadoras, comparativamente, os
pardos eram mais frequentes (20,0% mais x 32,9% menos). Este quadro reflete o acesso diferenciado
de brancos e pardos às secretarias de saúde com gestões mais dinâmicas.
Com menores diferenças, observa-se que nas secretarias menos inovadoras, em comparação às
mais inovadoras, eram mais comuns os(as) gestores(as) jovens, com até 30 anos (3,9% mais x 13,6%
menos), solteiros (12,2% mais x 22,7% menos), filhos de pais sem instrução escolar formal (2,8% x
10,6%) e com menos de 10 anos de residência no município em que atua como secretário (a) (17,4%
mais x 25,5% menos).
Não havia, em 2006, diferença significativa entre mais e menos inovadores no que tange às
variáveis sexo, município de origem e município de residência.
453
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 183 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras por perfil socioeconômico - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
O quadro desenhado para o perfil socioeconômico é idêntico àquele observado em 1996, quando os(as) secretários(as) das gestões de saúde mais inovadoras, em comparação aos menos inovadores,
receberam maiores salários, obtiveram renda adicional na iniciativa privada (28,7% mais x 18,2%
menos) e eram brancos (91,0% mais x 80,8% menos).
Vale ressaltar que, em 1996, a diferença entre o salário percebido pelos(as) gestores(as) mais
e menos inovadores(as) era mais discrepante que em 2006, nas faixas de até 1.000 reais (8,6% mais
x 31,8% menos), de 3.001 a 4.000 reais (15,8% mais x 3,4% menos) e mais de 4.001 reais (16,5%
mais x 2.4% menos).
454
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 184 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por perfil socioeconômico - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
A análise do perfil profissional, em 2006, revela diferença marcante do perfil apresentado
pelos(as) secretários(as) de saúde das gestões mais e menos inovadoras no que dizia respeito à realização de capacitação específica para exercício do cargo (80,9% mais x 58,5% menos).
Os(as) secretários(as) das gestões mais inovadoras, em 2006, participaram com mais constância
de cursos de saúde pública (60,4% mais x 29,6% menos), planejamento (40,0% mais x 19,1% menos) e, em menor grau, legislação (30,3% mais x 12,2% menos) e orçamento (26,5% mais x 10,5%
menos). Esse dado é expressivo para demonstrar a importância da capacitação para a gestão em saúde.
455
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Gráfico 185 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por realização de capacitação específica para exercício do cargo - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
As demais variáveis vinculadas ao perfil profissional do(a) gestor(a) – profissão, experiência
anterior em saúde, experiência anterior como secretário de saúde, profissão anterior, experiência na
direção em órgão público e realização de atividades extra Secretaria de Saúde – não apresentaram
diferenças significativas entre as secretarias mais e menos inovadoras, inclusive quanto ao grau de instrução do(a) gestor(a), com leve diferença na pós- graduação (37,6% mais x 28,8% menos).
O panorama do perfil profissional em 1996 era muito semelhante ao de 2006, de forma que
a principal diferença entre os grupos mais e menos inovadores era a participação em capacitação específica para exercício do cargo (74,6% mais x 46,2% menos), entre os quais se destacavam planejamento (34,8% mais x 8,2% menos), recursos humanos (33,7% mais x 11,6% menos) e saúde pública
(47,7% mais x 25,7% menos).
456
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 186 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por realização de capacitação específica para exercício do cargo - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 1996, os(as) gestores(as) das secretarias apresentavam algum vínculo prévio à área de saúde,
principalmente o grupo dos mais inovadores. Os(as) secretários(as) de saúde eram médicos (41,6%
mais x 28,8% menos), possuía experiência prévia no setor (86,4% mais x 77,4% menos), inclusive
como ocupante de cargos diretivos na área de saúde (46,6% mais x 29,9% menos).
Na comparação da década 1996-2006, observa-se que se reduziu o vínculo dos(as) gestores(as)
com a área de saúde, sobretudo no caso das secretarias mais inovadoras, que, em 2006, pouco se diferenciavam das menos inovadoras em relação aos(as) gestores(as) serem médicos (12,3% mais x 7,1%
menos), já terem trabalhado no setor (68,9% mais x 70,7% menos), inclusive como ocupante de
cargo de direção na área da saúde (35,6% mais x 32,0% menos).
Quanto à trajetória política e vida pública, assim como a capacitação específica, a análise da
participação em entidades associativas revelou outra diferença marcante quanto aos (às) secretários(as)
de saúde das gestões mais e menos inovadoras (80,3% mais x 61,1% menos), sobretudo no que tange
à participação nas associações profissionais (35,9% mais x 16,8% menos), clubes sociais e desportivos
(28,7% mais x 10,7% menos), associações religiosas (32,6% mais x 19,5% menos) e clubes de serviços (19,0% mais x 6,1% menos). Logo, os(as) secretários(as) de saúde das gestões mais inovadoras
conferem alta importância à participação em associações para o exercício do cargo (45,0% x 25,8%).
A participação em entidades associativas pelos(as) gestores(as) das secretarias mais inovadoras
era maior desde 1996. Contudo, na comparação do período 1996-2006, verifica-se a diminuição na
participação nessas entidades, como clubes de serviços, quanto aos mais (36,6% em 1996 x 19,0%
em 2006) e menos inovadores (17,8% x 6,1%). Em outros casos, a redução foi maior no caso dos(as)
gestores(as) de secretarias mais inovadoras, de forma que se aproximam dos(as) gestores(as) das secre-
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tarias menos inovadoras em 2006, como em relação às associações profissionais, para mais (63,8% em
1996 x 35,9% em 2006) e menos inovadores (24,3% em 1996 x 16,8% em 2006), e em relação aos
sindicatos, para mais inovadores (35,8% em 1996 x 22,3% em 2006), pouco variando para os menos
inovadores (16,8% em 1996 x 16,7% em 2006).
Quanto à participação em eventos políticos em saúde, secretários(as) de saúde das gestões mais
e menos inovadoras diferenciavam-se, em 2006, pela participação em eventos como Encontro Regional dos Secretários de Saúde (91,2% mais x 59,0% menos), Conferência Estadual de Saúde (52,0%
mais x 38,3% menos) e Conferência Municipal de Saúde (73,4% mais x 65,6% menos).
Também se diferenciavam quanto à participação no CONASEMS (38,7% mais x 23,6% menos), na CIT (32,3% mais x 18,7% menos), no CONARES (23,3% mais x 11,5% menos) e na CIB
(67,3% mais x 57,0% menos) e CIB Regional (68% mais x 49,6% menos). Por outro lado, era mais
comum que os dirigentes de conselho municipal de saúde fossem gestores(as) de secretarias menos
inovadoras (45,2% mais x 56,7% menos).
Gráfico 187 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por participação política em saúde - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 1996, eram maiores as diferenças quanto à participação em eventos políticos na área da
saúde, como nas Conferências Estaduais (77,8% mais x 39,0% menos); Conferências Municipais
(91,0% mais x 54,8% menos); Encontro Nacional dos Secretários de Saúde (43,4% mais x 13,7%
menos); e Encontros Regionais dos Secretários de Saúde (92,5% mais x 62,7% menos).
458
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 188 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por participação política em saúde - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Na comparação da década 1996-2006, verifica-se que a diferença entre ambos os grupos
diminui por conta da redução da participação dos(as) secretários(as) de saúde das gestões mais
inovadoras na Conferência Estadual de Saúde (77,8% em 1996 x 52,0% em 2006) e na Conferência Municipal de Saúde (91,0% em 1996 x 73,4% em 2006), e pelo aumento da participação
das gestões menos inovadoras no Encontro Nacional de Secretários de Saúde (13,7% em 1996 x
44,2% em 2006). Destaca-se também a redução dos(as) secretários(as) das gestões menos inovadoras que nunca tinham participado em eventos políticos na área da saúde (13,4% em 1996 x 2,0%
em 2006). Chama atenção que a maior homogeneidade tenha sido atingida a custa da redução da
participação setorial dos mais inovadores, inclusive na Conferência Municipal de Saúde, por um
lado, e do aumento da participação dos menos inovadores, por outro lado.
A experiência político-eleitoral, em 2006, revela que são percentualmente pequenas as diferenças entre mais e menos inovadores. O quadro traçado para a experiência político-eleitoral é
semelhante àquele verificado em 1996. Os mais inovadores, em 2006, possuíam maior vínculo
partidário (64,5% mais x 58,6% menos), que era mais duradouro, considerando a faixa de 16 a
20 anos de filiação (11,4% mais x 1,4% menos). De fato, era maior o número de menos inovadores que já foi filiado a outro partido político (58,2% mais x 68,6% menos). Os mais inovadores
participaram com maior frequência de pleitos a cargos públicos (30,4% mais x 21,6% menos).
Nas eleições de 1988, contudo, os menos inovadores apresentaram maior número de candidaturas
(4,7% mais x 15,0% menos).
A distribuição de mais e menos inovadores entre os partidos políticos, número de eleitos
para cargos públicos e licenciados de cargos eletivos não apresenta diferenças substanciais. Em
2006, quanto à relação com o cargo de secretário, as maiores diferenças diziam respeito ao motivo
459
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
de designação para o cargo de secretário de saúde: capacidade de liderança (69,1% mais x 46,0%
menos), experiência administrativa (53,3% mais x 34,8% menos) e experiência técnica (45,0%
mais x 29,3% menos). Em menor grau, o motivo de aceitação do cargo também diferia mais e menos inovadores: melhorar currículo (53,2% mais x 40,7% menos), assumir desafios (81,5% mais x
70,3% menos) e adquirir força política (15,4% mais x 5,2% menos).
Gráfico 189 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por motivo de designação e aceitação do cargo - 2006
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Em 1996, as diferenças significativas eram a experiência técnica (41,9% mais x 25,3% menos)
como motivo para designação para o cargo e a vontade de assumir desafios (57,0% mais x 34,9% menos) e acumular experiência profissional (50,5% mais x 41,8% menos) como os motivos de aceitação
do cargo.
460
A lterações e P ersistências nos . . .
Gráfico 190 – Distribuição dos(as) gestores(as) de saúde das secretarias mais e menos inovadoras
por motivo de designação e aceitação do cargo - 1996
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
Por fim, quanto à percepção das realizações ou frustrações mais significativas, em 2006, as
diferenças mais significativas eram verificadas nas melhorias do atendimento ao usuário/humanização
(16,5% mais x 4,9% menos), como realização, e na falta de autonomia administrativa/financeira
(0,8% mais x 11,4% menos), como frustração.
Em 1996, as diferenças significativas na percepção dos(as) secretários(as) das gestões mais inovadoras eram quanto ao fortalecimento da descentralização (25,4% mais x 8,6% menos) e à introdução de melhorias gerenciais (20,4% mais x 9,2% menos) como suas realizações mais importantes.
O quadro abaixo sintetiza as principais características apresentadas, em 2006, pelos(as)
gestores(as) municipais de saúde das secretarias mais inovadoras em comparação com os(as) gestores(as)
das secretarias municipais menos inovadoras.
461
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Quadro 12 - Caracterização dos(as) secretários(as) de saúde das gestões mais inovadoras - 2006
Particularidades dos(as) secretários(as) de saúde das gestões mais inovadoras
Receberam maiores remunerações;
Realizaram capacitações específicas para exercer o cargo, principalmente cursos de saúde pública;
Mais participativos em entidades associativas, cuja experiência era valorizada no exercício do cargo;
Foram designados para o cargo em função de sua capacidade técnico-administrativa e de sua liderança.
Fonte: Relatório Técnico – Pesquisa Municipalização da Saúde (Peep, 2009).
6. Discussão
A comparação entre os resultados das duas edições da pesquisa permite afirmar que a inovação municipal convergiu para um padrão mais concentrado em níveis intermediários em 2006,
quando se comparam as curvas de inovação nas duas versões da pesquisa.
O formato das curvas de inovação, em 2006, apresenta uma configuração próxima de uma
distribuição normal, o que demonstra um amadurecimento do processo de descentralização, ao
reduzir as diferenças extremas. Na dimensão assistencial, nota-se com mais clareza essa tendência,
provável produto da implantação massificada dos programas federais nacionalmente padronizados.
Nesse sentido, as barreiras de expansão de certos nichos de oferta foram superadas, boa
parte em virtude da indução de incentivos financeiros. Também na dimensão social, houve a
convergência para concentração em torno do intervalo do escore situado entre 30 e 60%, com a
redução de ambos os intervalos adjacentes imediatos, indicando que, ao mesmo tempo em que
muitos municípios superaram barreiras já ultrapassadas pela maioria dos municípios, outros retrocederam. Parece haver um corte de barreira, que apresenta dificuldades significativas de superação, principalmente considerando a conjuntura política da década, caracterizada pela política
de estabilização econômica.
Na dimensão gerencial, não houve mudança no padrão de dispersão da inovação. Houve,
no entanto, alteração significativa na intensidade da inovação, uma vez que o intervalo de concentração, que era de mais de 20 a 50%, passou a ser de mais de 10 a 40%. Essa involução pode
ser explicada tanto pela redução dos recursos setoriais promovidos pela política macroeconômica
quanto pela insuficiência da reforma do Estado promovida no período. Também devem ser levadas
em conta as diferenças entre os dois instrumentos da pesquisa aplicados na década.
462
A lterações e P ersistências nos . . .
A hipótese de normalização das curvas de inovação confirmou-se, mostrando que a descentralização promoveu maior homogeneização da distribuição da inovação em saúde. Por outro lado,
como a intensidade da inovação não apresentou um padrão mais elevado, uma vez que são poucos os
municípios que vão além dos 60% dos pontos máximos estabelecidos, evidencia-se a existência clara
de barreiras estruturais à ampliação e difusão da inovação.
A dinâmica da inovação, no campo da saúde, obedece a um padrão de inovação por adição. Isto
é, a incorporação de práticas inovadoras na gestão das secretarias municipais não significa o abandono
de artifícios conservadores, mesmo que haja certa incompatibilidade entre ambos. Tal padrão é explicitamente observado pelas diferentes dimensões, como é o caso da utilização de conselho municipal,
de pesquisas de opinião, mas também do atendimento no gabinete para a captação de demandas da
população. Outro exemplo é a demanda espontânea, dividindo a influência com o conselho municipal, na definição das prioridades em saúde.
A observação das mudanças ocorridas no transcurso de 1996-2006 revela que tanto as secretarias mais inovadoras quanto as menos inovadoras avançaram no que tange às inovações na gestão
da política de saúde, embora neste último caso os avanços tenham sido mais tímidos, de modo que
ambos os grupos distanciaram-se ao longo da década.
Assim, considerando que, além de apresentarem uma gestão mais dinâmica, as secretarias mais
inovadoras incorporaram práticas que podem acelerar ainda mais o processo, como a multiplicidade
de parcerias e de apoio técnico estabelecidos, pode-se prever uma tendência ao aumento das diferenças
entre as secretarias mais e menos inovadoras nas décadas vindouras.
463
DE M O C RA C IA E INO V AÇÃO NA G ESTÃO LO C AL DA SAÚDE
Referências
PROGRAMA DE ESTUDOS SOBRE A ESFERA PÚBLICA (PEEP/EBAPE/FGV). Pesquisa Municipalização da Saúde: inovação na gestão e democracia local no Brasil. Relatório Técnico. Rio de Janeiro, 2009.
464
Lista De Gráficos
Gráfico 1 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por sexo, segundo a região do país –
1996/2006. | 210
Gráfico 2 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por sexo, segundo o porte populacional
dos municípios – 1996/2006 | 211
Gráfico 3 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por raça, segundo a região do país –
1996/2006 | 212
Gráfico 4 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por raça, segundo o porte populacional
dos municípios – 1996/2006 | 213
Gráfico 5 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por faixa etária, segundo a região do país
– 1996/2006 | 214
Gráfico 6 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por faixa etária, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 216
Gráfico 7 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por Município de nascimento, segundo a
região do país – 1996/2006 | 217
Gráfico 8 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por Município de nascimento, segundo o
porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 218
Gráfico 9 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por maior grau de instrução do pai ou da
mãe, segundo a região do país – 1996/2006 | 219
Gráfico 10 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por maior grau de instrução do pai ou da
mãe, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 220
Gráfico 11 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por município de residência, segundo a
região do país – 1996/2006 | 221
Gráfico 12 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por município de residência, segundo o
porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 222
Gráfico 13 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por tempo de residência no município
em que atuam, segundo a região do país – 1996/2006 | 223
Gráfico 14 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por tempo de residência no município
em que atuam, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 224
Gráfico 15 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por faixa salarial, segundo a região do
país – 1996/2006 | 225
Gráfico 16 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por faixa salarial, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 226
Gráfico 17 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por fonte adicional de renda, segundo a
região do país – 1996/2006 | 227
465
Gráfico 18 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por fonte adicional de renda, segundo o
porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 228
Gráfico 19 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por grau de instrução, segundo a região
do país – 1996/2006 | 230
Gráfico 20 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por grau de instrução, segundo o porte
populacional dos municípios – 1996/2006 | 231
Gráfico 21 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por profissão, segundo a região do país
– 1996/2006 | 232
Gráfico 22 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por profissão, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 233
Gráfico 23 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por capacitação específica para exercer o
papel de dirigente, segundo a região do país – 1996/2006 | 234
Gráfico 24 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por capacitação específica para exercer o
papel de dirigente, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 236
Gráfico 25 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior na área de saúde,
segundo a região do país – 1996/2006 | 237
Gráfico 26 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior na área de saúde,
segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 238
Gráfico 27 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior em direção de
órgão público, segundo a região do país – 1996/2006 | 239
Gráfico 28 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior em direção de
órgão público, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 241
Gráfico 29 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior como Secretário(a)
de Saúde, segundo a região do país – 1996/2006 | 242
Gráfico 30 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior como Secretário(a)
de Saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 243
Gráfico 31 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por situação profissional anterior ao cargo
de Secretário(a) de Saúde, segundo a região do país –1996/2006 | 244
Gráfico 32 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por situação profissional anterior ao cargo
de Secretário(a) de Saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 245
Gráfico 33 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por realização de atividades extra-secretaria, segundo a região do país – 2006 | 246
Gráfico 34 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por realização de atividades extra-secretaria, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 247
Gráfico 35 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por filiação a algum partido político,
segundo a região do país – 1996/2006 | 248
Gráfico 36 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por filiação a algum partido político,
segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 249
466
Gráfico 37 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde filiados a algum partido político por
legenda partidária, segundo a região do país – 1996/2006 | 250
Gráfico 38 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde filiados a algum partido político por
legenda partidária, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 251
Gráfico 39 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde filiados a algum partido político por
tempo de filiação partidária, segundo a região do país – 2006 | 252
Gráfico 40 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde filiados a algum partido político por
tempo de filiação partidária, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 253
Gráfico 41 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde filiados a algum partido político por
filiação a algum outro partido, segundo a região do país – 2006 | 254
Gráfico 42 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde filiados a algum partido político por
filiação a algum outro partido, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 255
Gráfico 43 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por candidatura a cargo público, segundo
a região do país – 1996/2006 | 256
Gráfico 44 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por candidatura a cargo público, segundo
o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 257
Gráfico 45 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde já candidatos a cargo público por ano da
candidatura, segundo a região do país – 2006 | 258
Gráfico 46 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde já candidatos a cargo público por ano da
candidatura, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 259
Gráfico 47 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior como político
eleito, segundo a região do país – 1996/2006 | 260
Gráfico 48 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por experiência anterior como político
eleito, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 261
Gráfico 49 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por licenciatura atual de algum cargo
político, segundo a região do país – 2006 | 262
Gráfico 50 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por licenciatura atual de algum cargo
político, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 263
Gráfico 51 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por participação em entidades associativas, segundo a região do país – 1996/2006 | 265
Gráfico 52 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por participação em entidades associativas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 266
Gráfico 53 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por grau de importância atribuída à experiência de participar em associações, segundo a região do país – 2006 | 267
Gráfico 54 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por grau de importância atribuída à experiência de participar em associações, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 268
Gráfico 55 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por participação em eventos políticos da
área de saúde, segundo a região do país – 1996/2006 | 269
467
Gráfico 56 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por participação em eventos políticos da
área de saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 271
Gráfico 57 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por participação nos espaços de pactuação intergestores e instituições representativas, segundo a região do país –2006 | 272
Gráfico 58 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por participação nos espaços de pactuação intergestores e instituições representativas, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 273
Gráfico 59 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por tempo de ocupação no cargo, segundo a região do país – 1996/2006 | 274
Gráfico 60 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por tempo de ocupação no cargo, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 275
Gráfico 61 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde em decorrência ou não de candidatura
do(a) Secretário(a) anterior, segundo a região do país – 1996/2006 | 276
Gráfico 62 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde em decorrência ou não de candidatura
do(a) Secretário(a) anterior, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 277
Gráfico 63 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por motivo de designação ao cargo, segundo a região do país – 1996/2006 | 278
Gráfico 64 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por motivo de designação ao cargo, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 279
Gráfico 65 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por motivos na sua decisão de ocupar o
cargo, segundo a região do país – 1996/2006 | 280
Gráfico 66 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por motivos na sua decisão de ocupar o
cargo, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 281
Gráfico 67 – Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por suas expectativas profissionais após o
término da gestão, segundo a região do país – 1996/2006 | 282
Gráfico 68 – Distribuição dos Secretários(as) Municipais de Saúde por suas expectativas profissionais após o
término da gestão, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 283
Gráfico 69 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por influência dos atores sociais na elaboração do
orçamento, segundo a região do país – 1996/2006 | 298
Gráfico 70 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por influência dos atores sociais na elaboração do
orçamento, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 299
Gráfico 71 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores sociais na execução dos gastos em saúde, segundo a região do país – 2006 | 300
Gráfico 72 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores sociais na execução dos gastos em saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 301
Gráfico 73 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos procedimentos adotados para a definição de prioridades em saúde, segundo a região do país – 1996/2006 | 302
Gráfico 74 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos procedimentos adotados para a definição de prioridades em saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 303
468
Gráfico 75 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores para a definição
de prioridades em saúde, segundo a região do país – 2006 | 304
Gráfico 76 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de influência dos atores para a definição
de prioridades em saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 305
Gráfico 77 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por sede própria, segundo a região do país – 2006 | 306
Gráfico 78 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por presidência do Secretário(a) de Saúde, segundo a região do país – 2006 | 306
Gráfico 79 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por eleição para a presidência, segundo a região
do país – 2006 | 307
Gráfico 80 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por divulgação das resoluções, segundo a região
do país – 2006 | 307
Gráfico 81- Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por forma de divulgação das resoluções, segundo
a região do país – 2006 | 308
Gráfico 82 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por existência de canal efetivo de troca de informações entre a Secretaria e o Conselho de Saúde, segundo a região do país – 2006 | 309
Gráfico 83 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde pelo canal efetivo de troca de informações entre
a Secretaria e o Conselho de Saúde, segundo a região do país – 2006 | 310
Gráfico 84 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por sede própria, segundo o porte populacional
dos municípios – 2006 | 311
Gráfico 85 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por presidência do Secretário(a) de Saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 311
Gráfico 86 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por eleição para a presidência, segundo o porte
populacional dos municípios – 2006 | 312
Gráfico 87 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por divulgação das resoluções, segundo o porte
populacional dos municípios – 2006 | 312
Gráfico 88 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por forma de divulgação das resoluções, segundo
o porte populacional dos municípios – 2006 | 313
Gráfico 89 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde por existência de canal efetivo de troca de informações entre a Secretaria e o Conselho de Saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 314
Gráfico 90 - Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde pelo canal efetivo de troca de informações entre
a Secretaria e o Conselho de Saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 315
Gráfico 91 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por instituições a quem presta contas, segundo a
região do país – 1996/2006 | 316
Gráfico 92 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por instituições a quem presta contas, segundo o
porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 317
Gráfico 93 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos utilizados para prestação de
contas, segundo a região do país – 1996/2006 | 318
Gráfico 94 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos utilizados para prestação de
contas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 318
469
Gráfico 95 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por informações oferecidas à população, segundo
a região do país – 1996/2006 | 320
Gráfico 96 - Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por informações oferecidas à população, segundo
o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 321
Gráfico 97 - Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por oposição à gestão, segundo a região
do país – 1996/2006 | 322
Gráfico 98 - Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por oposição à gestão, segundo o porte
populacional dos municípios – 1996/2006 | 323
Gráfico 99 - Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por forças sociais de apoio à gestão, segundo a região do país – 1996/2006 | 324
Gráfico 100 - Distribuição dos(as) Secretários(as) Municipais de Saúde por forças sociais de apoio à gestão,
segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 325
Gráfico 101 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por gestão de recursos humanos, segundo a
região do país – 2006 | 345
Gráfico 102 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por gestão de recursos humanos, segundo o
porte populacional dos municípios – 2006 | 346
Gráfico 103 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por política de capacitação, segundo a região
do país – 2006 | 347
Gráfico 104 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por política de capacitação, segundo o porte
populacional dos municípios – 2006 | 348
Gráfico 105 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por forma de contratação, segundo a região do
país – 2006 | 349
Gráfico 106 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por forma de contratação, segundo o porte
populacional dos municípios – 2006 | 350
Gráfico 107 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipos de pagamentos adicionais para profissionais, segundo a região do país – 2006 | 351
Gráfico 108 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipos de pagamentos adicionais para profissionais, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 352
Gráfico 109 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos de compras e contratações,
segundo a região do país – 2006 | 353
Gráfico 110 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos de compras e contratações,
segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 354
Gráfico 111 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por forma de terceirização de serviços, segundo
a região do país – 2006 | 355
Gráfico 112 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por forma de terceirização de serviços, segundo
o porte populacional dos municípios – 2006 | 356
Gráfico 113 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos de controle de qualidade,
segundo a região do país – 2006 | 357
470
Gráfico 114 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos de controle de qualidade,
segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 358
Gráfico 115 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por participação em estratégia pactuada de
regionalização de serviço, segundo a região do país – 2006 | 359
Gráfico 116 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por participação em estratégia pactuada de
regionalização de serviço, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 360
Gráfico 117 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por percepção quanto à estratégia pactuada de
regionalização de serviço, segundo a região do país – 2006 | 361
Gráfico 118 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por percepção quanto à estratégia pactuada de
regionalização de serviço, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 362
Gráfico 119 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por participação do município da elaboração
do Plano Diretor de Regionalização, segundo a região do país – 2006 | 363
Gráfico 120 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por participação do município da elaboração do
Plano Diretor de Regionalização, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 364
Gráfico 121 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por motivo de não participação em alguma
estratégia pactuada de regionalização, segundo a região do país – 2006 | 365
Gráfico 122 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por motivo de não participação em alguma
estratégia pactuada de regionalização, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 366
Gráfico 123 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por elaboração do Plano Diretor de Regionalização, segundo a região do país – 2006 | 367
Gráfico 124 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por elaboração do Plano Diretor de Regionalização, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 368
Gráfico 125 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por instrumentos utilizados para captação de
demandas da população, segundo a região do país – 1996/2006 | 369
Gráfico 126 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por instrumentos utilizados para captação de
demandas da população, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 370
Gráfico 127 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por medidas adotadas em resposta às demandas
recebidas, segundo a região do país – 1996/2006 | 371
Gráfico 128 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por medidas adotadas em resposta às demandas
recebidas, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 372
Gráfico 129 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por origem do apoio técnico recebido, segundo
a região do país – 1996/2006 | 373
Gráfico 130 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por origem do apoio técnico recebido, segundo
o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 374
Gráfico 131 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por modalidades de parceria, segundo a região
do país – 1996/2006 | 375
Gráfico 132 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por modalidades de parceria, segundo o porte
populacional dos municípios – 1996/2006 | 376
471
Gráfico 133 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por formas de acesso a serviços de média e alta
complexidade, segundo a região do país – 2006 | 391
Gráfico 134 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por forma de acesso a serviços de média e alta
complexidade, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 392
Gráfico 135 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de suficiência da oferta de ações e
serviços de média e alta complexidade, segundo a região do país – 2006 | 393
Gráfico 136 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por grau de suficiência da oferta de ações e
serviços de média e alta complexidade, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 394
Gráfico 137 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos de identificação de demanda
reprimida, segundo a região do país – 2006 | 395
Gráfico 138 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por mecanismos de identificação de demanda
reprimida, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 396
Gráfico 139 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de recurso para a organização da atenção à saúde, segundo a região do país – 1996/2006 | 397
Gráfico 140 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de recurso de organização da atenção
à saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 398
Gráfico 141 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo a região do país – 1996/2006 | 399
Gráfico 142 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 400
Gráfico 143 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo a região do país – 2006 | 401
Gráfico 144 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 402
Gráfico 145 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo a região do país – 2006 | 403
Gráfico 146 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 404
Gráfico 147 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo a região do país – 2006 | 405
Gráfico 148 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por tipo de ações e programas de atenção à
saúde, segundo o porte populacional dos municípios – 2006 | 406
Gráfico 149 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por decil de inovação, segundo dimensões da
inovação – 2006 | 417
Gráfico 150 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde por decil de inovação, segundo dimensões da
inovação – 1996 | 418
Gráfico 151 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde menos inovadoras por decil de inovação, segundo dimensões da inovação – 2006 | 420
472
Gráfico 152 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde menos inovadoras por decil de inovação, segundo dimensões da inovação – 1996 | 421
Gráfico 153 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais inovadoras por decil de inovação, segundo
dimensões da inovação – 2006 | 422
Gráfico 154 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais inovadoras por decil de inovação, segundo
dimensões da inovação – 1996 | 423
Gráfico 155 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por região geográfica
– 1996/2006 | 425
Gráfico 156 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por porte populacional dos municípios – 1996/2006 | 428
Gráfico 157 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por influência no
estabelecimento das prioridades em saúde – 2006 | 430
Gráfico 158 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por influência na
elaboração do orçamento e na execução dos gastos saúde – 2006 | 431
Gráfico 159 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por mecanismo utilizado para a prestação de contas – 2006 | 432
Gráfico 160 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por instituições a que
a Secretaria de Saúde presta contas – 2006 | 433
Gráfico 161 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por instituições a que
a Secretaria de Saúde presta contas – 1996 | 433
Gráfico 162 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por tipo de informação oferecida à população – 2006 | 434
Gráfico 163 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por tipo de informação oferecida à população – 1996 | 435
Gráfico 164 – Distribuição dos Conselhos Municipais de Saúde vinculados às Secretarias mais e menos inovadoras por características de funcionamento – 2006 | 436
Gráfico 165 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por forças sociais de
apoio à gestão – 2006 | 436
Gráfico 166 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por forças sociais de
apoio à gestão – 1996 | 437
Gráfico 167 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por mecanismos utilizados para captação de demandas da população – 2006 | 439
Gráfico 168 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por mecanismos utilizados para captação de demandas da população – 1996 | 440
Gráfico 169 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por medidas adotadas
em resposta às demandas recebidas – 2006 | 441
Gráfico 170 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por medidas adotadas
em resposta às demandas recebidas – 1996 | 441
Gráfico 171 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por características de
compras e serviços – 2006 | 442
473
Gráfico 172 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por características da
gestão de pessoas – 2006 | 443
Gráfico 173 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por apoio técnico
recebido – 2006 | 444
Gráfico 174 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por apoio técnico
recebido – 1996 | 445
Gráfico 175 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por modalidade de
parceria – 2006 | 446
Gráfico 176 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por modalidade de
parceria – 1996 | 446
Gráfico 177 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por características do
processo de regionalização – 2006 | 447
Gráfico 178 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por formas de acesso
aos serviços de média e alta complexidade – 2006 | 449
Gráfico 179 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por mecanismos utilizados para identificar a demanda reprimida – 2006 | 450
Gráfico 180 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por tipo de recursos
oferecidos à população – 2006 | 450
Gráfico 181 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por tipo de ações e
programas de saúde adotados – 2006 | 451
Gráfico 182 – Distribuição das Secretarias Municipais de Saúde mais e menos inovadoras por tipo de ações e
programas de saúde adotados – 1996 | 452
Gráfico 183 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por perfil socioeconômico – 2006 | 454
Gráfico 184 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por perfil socioeconômico – 1996 | 455
Gráfico 185 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por realização de
capacitação específica para exercício do cargo – 2006 | 456
Gráfico 186 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por realização de
capacitação específica para exercício do cargo – 1996 | 457
Gráfico 187 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por participação
política em saúde – 2006 | 458
Gráfico 188 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por participação
política em saúde – 1996 | 459
Gráfico 189 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por motivo de designação e aceitação do cargo – 2006 | 460
Gráfico 190 – Distribuição dos Gestores de Saúde das Secretarias mais e menos inovadoras por motivo de designação e aceitação do cargo – 1996 | 461
474
Lista de Tabelas
Tabela 1 - Evolução do número de municípios habilitados, segundo Norma Operacional – 1991-2001 | 113
Tabela 2 - Total de municípios, municípios respondentes e percentuais de resposta por unidade da federação –
1996 | 130
Tabela 3 - Distribuição dos questionários respondidos por porte populacional – 1996 | 132
Tabela 4 - Total de municípios, municípios respondentes e percentuais de resposta por unidade da federação –
2006 | 133
Tabela 5 - Distribuição dos questionários respondidos por porte populacional – 2006 | 135
Tabela 6 - Limites de confiança para as estimativas segundo o plano amostral adotado na simulação, que
utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal, adotando um nível de significância
de 5% | 137
Tabela 7 - Total de municípios, municípios respondentes e percentuais de resposta por unidade da federação
- 2006 | 175
Tabela 8 - Parâmetros populacionais e estimativas obtidas, segundo o plano amostral adotado na simulação que
utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal | 176
Tabela 9 - Coeficientes de variação (%) estimados, segundo o plano amostral adotado na simulação, que utiliza
estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal | 178
Tabela 10 - Limites de confiança para as estimativas, segundo o plano amostral adotado na simulação, que
utiliza estratificação por grandes regiões, tipo de gestão e porte municipal, adotando um nível de significância de 5% | 180
Tabela 11 - Intervalos de maior concentração de escores por decis nas dimensões social, gerencial e assistencial | 424
475
Lista de Quadros
Quadro 1 - Three models of public administration | 40
Quadro 2 - Objectives, rationales and controversies of health decentralization | 55
Quadro 3 - Disposição das questões do gestor por categoria, atributo e variável | 127
Quadro 4 - Disposição das questões da gestão por categoria, atributo e variável | 128
Quadro 5 - Variáveis do questionário básico (Gestão) e do suplemento (Assistência Social) selecionados para a
análise amostral da pesquisa | 173
Quadro 6 - Variáveis do Banco de dados do Sistema Único de Saúde, selecionadas para a análise amostral da
pesquisa | 174
Quadro 7 - Variáveis das Finanças do Brasil - Dados Contábeis dos Municípios - selecionadas para a análise
amostral da pesquisa | 174
Quadro 8 - Dimensões, Variáveis, Fontes, Indicadores e Estrutura de Pontuação do Índice de Inovação | 185
Quadro 9 - Categorias, atributos e variáveis de análise do perfil dos(as) secretários(as) municipais de saúde | 207
Quadro 10 - Caracterização das gestões mais inovadoras na dimensão social – 2006 | 438
Quadro 11 - Caracterização das gestões mais inovadoras na dimensão gerencial – 2006 | 448
Quadro 12 - Caracterização das gestões mais inovadoras na dimensão assistencial – 2006 | 453
Quadro 13 - Caracterização dos(as) secretários(as) de saúde das gestões mais inovadoras – 2006 | 462
476
Lista de Figuras
Figura 1 - Adopter Categorization on the Basis of Innovativeness (ROGERS, 2003, p.281) | 69
Figura 2 - Independent variables related to organizational innovativeness. (ROGERS, 2003, p. 411) | 70
Figura 3 - Estrutura Conceitual da Pesquisa Municipalização da Saúde | 125
477
Formato: 21 x 26 cm
Tipologia: Agaramond
Papéis: 0ff-set 90g/m2 (miolo) e Cartão Supremo 250g/m2 (capa)
CTP, impressão e acabamento: Imos Gráfica e Editora Ltda.
Rio de Janeiro, maio de 2014.
CEBES
Av. Brasil, 4036, sala 802
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