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MARCELLO CHAMUSCA
Os Processos Infocomunicacionais
e as Dinâmicas Territoriais e Sociais
na Cidade Contemporânea
Edições
VNI
UCSAL
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
OBRA DE LIVRE ACESSO E DISTRIBUIÇÃO PROMOVIDA POR:
Edições
UCSAL
VNI
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
PPROGRAMA DE
PÓS-GRADUAÇÃO EM
PLANEJAMENTO
TERRITORIAL E
DESENVOLVIMENTO
SOCIAL
Os Processos Infocomunicacionais e as Dinâmicas Territoriais e Sociais na
Cidade Contemporânea / Marcello Chamusca. -- Salvador, BA: Edições VNI /
UCSAL, 2011 [on-line].
Bibliografia.
ISBN 978-85-60936-07-6
1. Dinâmica Territorial, 2. Comunicação Móvel Pervasiva, 3. Conexão Ubíqua I.
Chamusca, Marcello II. UCSAL.
60936
CDD-600
ISBN: 978-85-60936-07-6
Dedico este livro a minha eterna companheira Marcia
Carvalhal. Sem a sua imprescindível colaboração,
certamente, ele não teria se concretizado. Na realidade, se
não fosse ela, eu não teria nem chegado a iniciar a minha
carreira acadêmica que culminou com a minha
dissertação de mestrado, que serviu de base para esse
livro. Márcia foi a responsável pela minha volta aos
estudos, depois de 12 anos. Quando pensamos em voltar
a estudar nos vimos diante de um grande problema, pois
eu não tinha concluído sequer o primeiro grau e ela já
possuía segundo grau completo. Para me incentivar,
Márcia entrou em sala de aula e fez comigo o supletivo
primeiro e segundo graus, mesmo já possuindo a
titulação. Certamente, essa não é uma atitude que se vê
todo dia. Por isso e por tudo que representa na minha
vida, dedico esta obra a essa grande companheira.
AGRADECIMENTOS
- Ao professor Peter José Schweizer, por ter acreditado no meu trabalho e ter me
apoiado dentro do programa de pós-graduação da Universidade Católica do
Salvador. Se não fosse ele, muito provavelmente, não teria nem ingressado no
curso;
- Agradeço à professora Maria Helena Flexor, pela aula de dedicação, respeito e
carinho, durante todo o período de orientação, lendo, comentando e discutindo,
cada vírgula por mim colocada no papel. A sua dedicação é realmente
emocionante e serve de exemplo para quem, como eu, pretende seguir carreira
acadêmica;
- Ao professor Sylvio Bandeira, uma das maiores autoridades da área de geografia
no Brasil, primeiro pelas indicações bibliográficas e por todo o apoio dado
durante todo o período do mestrado. Segundo pelo apoio incondicional e
imprescindível para a publicação desta obra, e, por último, pelo prefácio tão
significativo que escreveu para esse livro;
- Ao professor Cláudio Cardoso, uma das maiores autoridades da área de
comunicação do Brasil, pela honra concedida de participar da minha banca e por
toda a sua generosidade comigo, desde que nos conhecemos;
- Agradeço à toda a minha família: minha mãe Solange (uma grande mãe), meu
padrasto Everaldo, a minha irmã Paloma e ao meu cunhado Felipe, pela dedicação
às minhas coisas e pelo apoio incondicional em tudo o que faço, sempre;
- Agradeço à minha sogra Yvonne (in memorian), por ter sido uma grande
incentivadora do meu retorno aos estudos e por tudo que sempre me apoiou;
- Aos meus cunhados e concunhados: Eliete, Ivomar e Leida, Ana e Mário, pelo
apoio dado nessa etapa da minha vida, e em especial a Euvaldo pela participação
efetiva na indicação de conteúdos e apoio como geógrafo na elaboração de alguns
mapas utilizados na minha dissertação;
Aos professores e colegas do Mestrado em Planejamento Territorial e
Desenvolvimento Social, bem como a superintendente de pesquisa e pósgraduação da UCSAL Maria Julieta (Juju - como a chamamos carinhosamente)
pelo apoio dado à públicação desta obra;
- Agradeço à todas as 1.230 pessoas que responderam o meu questionário de
pesquisa e aos mais de 20 entrevistados, bem como a todos que ajudaram direta
ou indiretamente na concretização deste trabalho; e,
- Agradeço à Deus, por ter me concedido a força e a energia necessária para
vencer cada etapa desta importante jornada.
SUMÁRIO
PREFÁCIO, pág. 9
APRESENTAÇÃO, pág. 13
INTRODUÇÃO, pág. 15
O DIÁLOGO URBANO DAS MÍDIAS LOCATIVAS COM OS
DISPOSITIVOS MÓVEIS DIGITAIS, PROMOVIDO PELA CONEXÃO
UBÍQUA, pág. 28
Mídias locativas, pág. 29
Construindo um conceito de mídias locativas digitais a partir da concepção
coletiva, pág. 43
Dispositivos móveis digitais, pág. 50
Redes infocomunicacionais ubíquas, pág. 59
O diálogo urbano, pág. 65
A conexão ubíqua e o novo sentido do lugar, pág. 70
DINÂMICAS TERRITORIAL E SOCIAL: PROCESSOS
INFOCOMUNICACIONAIS NOS CIBERTERRITÓRIOS, pág. 74
O paradoxo da mobilidade e localidade, pág. 75
A formação dos ciberterritórios, pág. 77
A metamorfose dos ciberterritórios, pág. 80
Dinâmicas territoriais e sociais promovidas nos ciberterritórios, pág. 83
A percepção dos usuários brasileiros da Internet sobre a nova ambiência
tecnológica, pág. 97
A CIBERCIDADE DO SALVADOR: A MOBILIDADE E O ESPAÇO DA
CIDADE CONTEMPORÂNEA, pág. 130
Princípios que norteiam o contexto tecnológico da cibercidade
contemporânea, pág. 132
Cidade contemporânea: “desplugada” e “infiltrada”, pág. 134
A cultura hacker e o contexto da mobilidade, pág. 139
O cidadão contemporâneo e a demanda pela intervenção urbana, pág. 142
A centralidade da cibercidade do Salvador, pág. 152
Salvador: território premiado?, pág. 159
MAPEAMENTO DE ZONAS WI-FI NO TERRITÓRIO DA CIDADE DO
SALVADOR, pág. 168
Horizonte metodológico do mapeamento, pág. 169
Mapeamento, pág. 175
Análise final do mapeamento, pág. 180
CONCLUSÕES, pág. 187
REFERÊNCIAS, pág. 198
O AUTOR, pág. 209
PREFÁCIO
Prof. Dr. Sylvio Bandeira de Mello e Silva
Professor do Programa de Pós-graduação em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento
Social/UCSAL.
Pesquisador do CNPq.
Como coordenador do Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e
Desenvolvimento Social, da Universidade Católica do Salvador, e como membro
de sua banca examinadora, estou muito satisfeito com a publicação da dissertação
de mestrado de Marcello Chamusca em forma de livro. Esta satisfação seria a
mesma para a publicação de qualquer dissertação, mas no caso da dissertação de
Marcello Chamusca ela se reveste de uma característica bem especial: a da grande
originalidade de sua contribuição!
Um trabalho como o de Marcello Chamusca demonstra muito bem o acerto em
criar o Mestrado em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social, na
UCSAL, com uma visão interdisciplinar, o que permite que alunos de várias
origens profissionais tragam contribuições para a questão territorial ligada à
questão social. O corpo docente do programa é também originário de várias áreas
do conhecimento.
9
livro, a partir do ponto em que o usuário se encontra na rede em um determinado
momento. Portanto, o centro pode ser um agora e outro daqui a alguns segundos.
Assim, independente de estar ou não em um lugar central, o consumidor, como
destaca Marcello Chamusca, pode ter acesso às mesmas informações e até aos
mesmos bens físicos, a partir de sua inserção nos ambientes virtuais, que um
consumidor que está fisicamente na localidade central. É o princípio da
mobilidade dos centros, já destacado por Pierre Lévy no seu livro As tecnologias
da inteligência (1995).
O autor forma com sua esposa, Márcia Carvalhal, nossa ex-aluna e que também
publica sua dissertação, uma excelente dupla de pesquisadores. Dela, ele empresta
e discute o conceito inovador de ciberterritório, por permitir a observação da
formação de um novo território, na intersecção dos ambientes físicos e virtuais,
que formam a cibercidade, tema central do livro de Marcello Chamusca. E a
integração da cibernidade com a cidade real pode ser até dramática, como
demonstram os recentes acontecimentos em vários países árabes (a chamada
primavera árabe) e nas grandes cidades inglesas: as violentas manifestações foram
rapidamente organizadas e difundidas através das redes sociais da revolução
tecnológica.
Na conclusão, o autor apresenta uma definição atraente de Salvador, com base em
seus territórios cibernéticos, contrapondo-os aos territórios tradicionais. Nisto,
ele se inspira em Milton Santos que, em 1959, definiu Salvador de forma
brilhante, em sua obra O centro da cidade do Salvador. Com isto, quero ressaltar
10
Marcello Chamusca, vindo da área de Comunicação, buscou ao longo do seu
curso de mestrado fazer isto, inicialmente orientado pelo colega Prof. Dr. Peter
José Schweizer e depois, com o seu afastamento para o Equador, pela Profa. Dra.
Maria Helena Ochi Flexor, mas sempre em contato com todos os professores do
programa e com colegas de outras universidades.
O tema do seu livro é, como disse, bastante original já que procura analisar e
integrar três grandes conjuntos de idéias: (i) processos infocomunicacionais, (ii)
dinâmicas sócio-territoriais e (iii) cibercidades. Separadamente, há muitos
trabalhos sobre cada um desses aspectos, mas há poucos trabalhos que integrem
os três aspectos mencionados. Portanto, foi um desafio que o Marcello Chamusca
assumiu com coragem e determinação.
Os resultados são extremamente positivos, como pode ser verificado neste livro.
Como geógrafo e professor da disciplina Teoria sobre Território e
Desenvolvimento fiquei também satisfeito com a correta utilização do corpo
teórico, discutido em sala de aula, e sua integração com a temática por ele
escolhida. Destaco a utilização, dentre outros, das clássicas contribuições da teoria
locacional (Thünen, Weber e Christaller). Quanto ao último, autor da Teoria das
Localidades Centrais, Marcello Chamusca traz relevantes observações. As
localidades centrais efetivamente são, no território fisicamente tomado,
determinadas pelos princípios de mercado (o mais importante), de transporte e de
administração. No ciberterritório, o centro é virtual pois varia, segundo o autor do
11
que um estudo de caso, quando bem fundamentado e analisado, pode
perfeitamente propor generalizações no final do trabalho, contribuindo para o
debate conceitual e teórico.
A contribuição de Marcello Chamusca é, portanto, original e instigante.
Certamente, irá estimular novos e importantes trabalhos integrando territórios e
cibercidades.
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APRESENTAÇÃO
A obra é composta por quatro capítulos, além da introdução e das conclusões. O
primeiro capítulo trata do diálogo urbano das mídias locativas com os dispositivos
móveis digitais, diálogo possibilitado pelo advento da conexão ubíqua, generalizada,
característica das grandes cidades no momento contemporâneo. Para tanto, se
caracteriza os três principais componentes do diálogo: as mídias locativas, os
dispositivos móveis digitais e as multirredes que proporcionam a conexão ubíqua e o
novo sentido de lugar.
No segundo capítulo, trata-se especificamente de como o processo
infocomunicacional estabelecido pelo diálogo urbano, caracterizado no capítulo
anterior, pode influenciar as dinâmicas territorial e social nas cidades
contemporâneas. Atenta-se para o paradoxo da mobilidade e localidade, para a
formação dos ciberterritórios, as suas metamorfoses e como estes afetam o território.
É ainda neste segundo capítulo que se traz os resultados da pesquisa quantitativa,
realizada com 1.230 pessoas, através da Internet, observando a percepção dos
usuários brasileiros da Internet sobre a nova ambiência tecnológica digital.
No capítulo seguinte, se trata da mobilidade e do espaço da cidade contemporânea,
dos princípios que norteiam o seu contexto tecnológico e da noção de cidade
“desplugada” (LEMOS, 2004). Trata-se da cultura hacker no contexto da
comunicação em mobilidade, sobre as caraterísticas do cidadão contemporâneo e a
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sua demanda por intervenção urbana. Para finalizar o capítulo, analisa-se a
cibercidade do Salvador, a partir da sua centralidade e potencialidade para as
tecnologias digitais.
No quarto e último capítulo da obra encontra-se a sistematização dos resultados do
mapeamento de zonas Wi-Fi na cidade do Salvador, que tem como objetivo provar se
a noção de conexão ubíqua, generalizada, é algo que pode se constatar na prática e na
vivivência da cidade. A partir dos resultados obtidos no levantamento, buscam-se
generalizações teórico-conceituais que possam servir para pensar a cibercidade.
Boa leitura!
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INTRODUÇÃO
Edições
VNI
UCSAL
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
PPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PLANEJAMENTO TERRITORIAL E
DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Na atualidade, quase todo o espaço urbano das grandes cidades está coberto por
camadas digitais formadas por multirredes de acesso sem fio, como Wi-Fi, WiMax, Bluetooth, rede de telefonia móvel celular, dentre outras possibilidades. Esse
ambiente permite a formação dos fenômenos da conexão ubíqua e da
comunicação móvel pervasiva, conceitos que podem reconfigurar e até
ressignificar os espaços das cidades para os seus habitantes ou visitantes e que
serão discutidos nesta obra.
Assim como os conceitos já citados, muitos outros novos conceitos sobre a
ambiência tecnológica digital nas cibercidades emergem das discussões aqui
realizadas, sendo que vários deles ainda exigem um esforço de articulação, de
esclarecimento e em alguns casos de comprovação científica para sua aceitação no
âmbito acadêmico. Neste livro, buscar-se-á, de modo recorrente, a sistematização
criteriosa desses conceitos como forma de contribuição para a temática em
questão.
As análises realizadas se dão através da construção de cenários teórico-conceituais
que relacionam território físico e espaço virtual no contexto urbano e o seu
confrontamento com os resultados obtidos nas pesquisas empíricas delimitadas a
partir de duas dimensões: territorial e ciberterritorial. Na dimensão territorial, a
sua delimitação se deu em escala local, tomando a cidade do Salvador, capital do
Estado da Bahia, como ambiente de investigação. Na dimensão ciberterritorial, a
delimitação se deu em escalas local e nacional, utilizando tanto o espaço da cidade
do Salvador quanto a Internet para alcançar pessoas de todo o Brasil.
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A possibilidade de delimitação do ambiente de investigação em diferentes escalas
permitiu que se chegasse a respostas generalistas sobre o fenômeno do diálogo
urbano estabelecido entre as mídias locativas interativas e os dispositivos móveis
digitais, observando que este diálogo é proporcionado pela conexão ubíqua,
generalizada, que permite a comunicação móvel pervasiva, detectada hoje no que
aqui se convencionou chamar de ciberterritórios (CARVALHAL, 2008), que são,
em última análise, produto das relações sociais e dos conflitos espaço-temporais
dos territórios híbridos, característicos das cibercidades contemporâneas.
A temática aqui abordada, portanto, traz à luz a noção de ciberterritorialidade,
conceito ainda desconhecido pela maioria dos técnicos e administradores das
grandes cidades, ignorado nos planos de desenvolvimento urbano no Brasil, mas
que pode se constituir, em um primeiro momento, num diferencial de gestão
estratégica das cidades contemporâneas, e depois, em um segundo momento, num
modo inteligente de administrá-las com um alto nível de participação popular e,
ao mesmo tempo, mantendo um proporcional sistema de vigilância e controle dos
bens e patrimônios públicos, cumprindo assim duas funções precípuas da
administração pública: estimular a cidadania e garantir o bem-estar social.
Essa perspectiva contemporânea de territorialidade é assim estudada em suas
múltiplas implicações não apenas a partir de levantamento bibliográfico, mas,
sobretudo, dos resultados de pesquisas empíricas, que envolveram tanto métodos
de abordagem quantitativa quanto qualitativa, além de aplicações de instrumentos
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diversos nas suas também diversas dimensões, visando elaborações teóricopráticas sobre o fenômeno investigado que, por sua vez, está inserido em um
processo histórico que envolve, pelo menos, quatro décadas de transformações e
que será preciso ser aqui brevemente recuperado para um melhor entendimento
dos seus conceitos centrais.
Quando a microinformática surgiu, entre o final dos anos 1970 e o princípio dos
anos 1980, com ela apareceram os computadores pessoais, - os chamados PCs que, no primeiro momento, não passavam de máquinas de escrever mais
eficientes que as até então existentes, pois permitiam corrigir os erros de
digitação, antes da impressão do documento, e neles se possibilitava o uso de
calculadoras mais potentes e aperfeiçoadas que permitiam grandes cálculos com
precisão e rapidez.
Com a popularização da Internet, entre os anos 1980 e 1990, as pessoas
começaram a perceber então que aquela máquina não era apenas mais uma
ferramenta moderna que seria ultrapassada rapidamente pela evolução
tecnológica, mas se tratava de um novo meio de comunicação e informação que
transformaria a vida das pessoas em todo o planeta, à medida que criava novas
formas de comunicação e interação entre pessoas localizadas em diferentes
lugares do mundo, quebrando barreiras temporais e geográficas e permitindo que
novos padrões de fluxos informacionais pudessem se estabelecer, sobrepujando
antigos paradigmas.
18
Nessa fase, marcada pelo início da popularização da Internet, segundo Lemos
(2007a, p. 49), o PC ou computador pessoal, foi substituído pelo CC, computador
coletivo. “Aqui, a rede é o computador e o computador uma máquina de
conexão”. O autor afirmou, então, que a ideia, nessa fase, era que computadores
desconectados da rede estavam sendo subaproveitados, pois só tinham sentido
quando nela estavam inseridos.
Pode-se dizer que esta é a fase de “deslumbre”, em que discursos excessivamente
otimistas começavam a ter lugar, apontando a Internet como a solução para
muitos problemas do mundo. Foi, também, a fase em que os críticos mais
ferrenhos da Internet desenvolveram teses apocalípticas, em contraponto aos
discursos otimistas, construindo um ambiente de conhecimento tecnofóbico,
perdendo-se um pouco a noção de que os resultados, provenientes do advento da
Internet, transcendiam as questões meramente técnicas, ou tecnológicas, pois
podiam se tratar, também, de fenômenos sociológicos, econômicos,
antropológicos, dentre outras possibilidades e que, por isso mesmo, podiam
transformar significativamente os rumos da humanidade.
Esta primeira fase da Internet, posteriormente, ficou conhecida como a fase da
Web 1.0, em que muitas das possibilidades de comunicação e difusão de
informação multimídia, em tempo real e em grande escala, estavam apenas no
campo das potencialidades, pois esbarravam nas limitações técnicas para serem
estabelecidas na prática.
19
Somente no novo milênio, aproximadamente, entre 2004 e 2005, o novo contexto
tecnológico deu lugar ao surgimento da chamada Web 2.0, que tornou reais uma
série de atividades propiciadas pela Internet ainda em estado de pura
potencialidade. As conexões em banda larga trouxeram à tona possibilidades reais
de aplicações complexas de interfaces com bancos de dados e o estabelecimento
de diálogos multimídia - com texto, imagem e som , em tempo real, entre pessoas
de várias partes do mundo, através da rede.
Mas, a conexão em banda larga e todo o ambiente de interatividade, possibilitada
pela Web 2.0, ainda não foi suficiente para que as características centrais da fase
anterior, da Web 1.0, que dizem respeito à virtualização e à noção do ciberespaço
como algo distante da realidade, fossem superadas, pois não foi exatamente essa
possibilidade técnica que proporcionou a grande inversão do processo de
desterritorialização dos objetos, das pessoas, dos lugares, mas sim o advento da
mobilidade que permitiu a conexão em movimento, possibilitando às pessoas se
desvincularem de cabos e fios, saírem de suas casas e escritórios e voltarem a
utilizar o espaço público para a elaboração, emissão e recepção de informações.
A possibilidade de conectividade em movimento criou a necessidade de ambientes
públicos de conexão que interliguam objetos, que emitem informações dos
lugares, e pessoas que passem por esses lugares, recebam as informações e
dialoguem com os objetos através dos dispositivos móveis, estabelecendo o que
alguns autores chamam de novos sentidos dos lugares. Sobre isso, Lemos (2007a,
p. 18) afirmou que nesse novo cenário não é mais o usuário que se desloca até a
20
rede, “mas a rede passa a envolver os usuários e os objetos numa conexão
generalizada”.
Essa disseminação das tecnologias informacionais digitais vem gradativamente
transformando e reconfigurando os espaços públicos e privados, seja sob o ponto
de vista econômico ou sociocultural, à medida que promove a intersecção da
ambiência física com o ciberespaço, pela formação de camadas eletrônicas,
imperceptíveis ao olho humano, mas que influenciam direta ou indiretamente o
território, interferindo na relação construída das pessoas com os espaços,
produzindo e agenciando sentidos, muitas vezes promovendo uma releitura
significativa das suas experiências vivenciais com esses espaços.
O termo cyberspace, palavra em inglês para ciberespaço, foi utilizado pela
primeira vez por Gibson, em 1984, em um livro de ficção científica intitulado
Neuromancer (GIBSON, 2003), e definido como um espaço não físico ou
territorial, que se compõe de um conjunto de redes de computadores através das
quais todas as informações, sob as suas mais diversas formas, circulam. Pierre
Lévy (2002, p. 83) define ciberespaço como um novo meio de comunicação que
surgiu da interconexão mundial dos computadores e não compreende apenas a
infraestrutura da comunicação digital em todo o mundo, mas também o universo
de informações que ela abriga, assim como as pessoas que navegam e alimentam
esse universo. Em uma síntese conceitual básica pode-se conceber o ciberespaço
como o locus virtual, originado da junção de tecnologias diferenciadas de
21
telecomunicação e informática e que, em geral, são gerenciadas por
computadores.
À medida que vivenciam novas experiências, vinculadas aos conteúdos digitais
proporcionados pela possibilidade da conexão ubíqua - que permite, a todo e
qualquer cidadão, intervir no espaço urbano, agregando, aos equipamentos
públicos e privados da cidade, conteúdos próprios, bem como acessar os
conteúdos agregados por outras pessoas ou instituições -, os cidadãos inseridos no
contexto da comunicação móvel pervasiva vivenciada nas cibercidades na
atualidade podem ressignificar esses espaços de compartilhamento com seus
pares.
Para Lemos (2007a), o momento atual propõe uma nova compreensão da
ambiência tecnológica digital, visto que se vive uma nova fase, que pode ser
entendida através da metáfora do upload e do download, ambos os termos
correspondendo, respectivamente, às fases de desenvolvimento tecnológico
digital, anterior (upload) e atual (download), que se esboçam na
contemporaneidade. O mesmo autor (LEMOS, 2007a, p. 51) afirma que na fase
do upload, se referindo ao momento que está sendo superado na atualidade, o
ciberespaço era algo que estava “lá em cima”. Para se inserir ou acessar
informações do ciberespaço, as pessoas precisavam virtualizar as coisas, ou seja,
digitalizar e fazer o upload para aquele ambiente virtual, abstrato e intocável “lá
de cima”.
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Neste momento, quando se imaginava que tudo se desterritorializaria e que todas
as coisas necessariamente teriam que se virtualizar para serem inseridas nesta
nova realidade, previa-se o fim das cidades e das relações sociais na forma como
sempre se conheceu. Imaginava-se que, para se relacionar, as pessoas não iriam
mais às ruas, às praças públicas ou aos ambientes externos, pois não precisariam
mais sair das suas casas, visto que todas as suas necessidades poderiam ser
supridas através da Internet, que disponibilizaria tudo para todos, ao clique do
mouse. Assim, todos estariam em seus quartos, presos aos seus computadores,
conectados a fios e cabos, sem se exercitarem ou se relacionarem com o mundo
físico ao seu redor. Neste contexto, o corpo também começaria a perder força,
pois o que importava era a mente, aquilo que se pensava e que se dizia nos
ambientes virtuais. Seria também o fim das mídias físicas e de tudo aquilo que é
físico.
Os discursos, portanto, segundo Lemos (2009), apontavam para a aniquilação do
sentido de espaço, de lugar, chegando-se a falar no fim da geografia e do
urbanismo, pois o espaço físico não teria mais a importância antes obtida, uma
vez que não haveria mais a necessidade de estudá-lo e pensá-lo em profundidade.
Tinha-se também a percepção de que o mundo caminhava para a aniquilação das
relações sociais presenciais, pois se apostava na evidência e no
superdimensionamento do mundo “lá em cima”, apartado do mundo real.
Hoje, essa visão começa a ser repensada. O ciberespaço, como diria Russel
(1999), começou a “pingar” nas coisas. É o momento do ciberespaço “aqui em
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baixo”, fazendo parte da vida real. Os equipamentos passam a conter o
ciberespaço e a trazê-lo para o plano real. É a fase do download, em que as
informações são baixadas do ciberespaço para o sinal de trânsito, a placa de
outdoor, o painel do ponto de ônibus, o navegador GPS - Global positioning
system - dentro do carro, bem como para a geladeira, o micro-ondas, a banheira e
outros objetos que podem conter uma casa “inteligente”, etc. É o que Lemos
(2004, p. 28) chama de “Internet das coisas”. E para entender a “Internet das
coisas”, observa o autor, é preciso perceber que o ciberespaço “baixou e
encarnou” no mundo físico.
Nesta fase do download, o tipo predominante de acesso ao ciberespaço é o que
acontece em movimento, uma vez que o uso de um dispositivo móvel só faz
sentido se for realizado a partir de lugares diferentes e que não disponha de acesso
fixo, como em casa ou no escritório, por exemplo. “Alguém que está em casa não
precisa usar um laptop e uma rede sem fio para acessar Internet. Essas
tecnologias já são sintomas da saída do quarto” (LEMOS, 2009).
Nesta última frase, Lemos se refere ao que aqui se chamará de “mito do
enclausuramento”, que diz respeito à ideia que foi difundida sobre a sociedade
digital, quando se pensava que, por conta do novo contexto de facilidades
proporcionadas pela Internet, as pessoas ficariam enclausuradas nos seus quartos
e escritórios, presas aos seus computadores. Com o advento das mídias locativas,
das tecnologias móveis e da conexão ubíqua, esse mito cai de forma
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inquestionável, pois, para estar conectado e se comunicar na atualidade ninguém
precisa mais estar fixo em lugar nenhum.
Por outro lado, vale observar que os usos das redes sem fio no âmbito residencial
e empresarial crescem vertiginosamente, isso porque nos espaços fechados, o que
se busca muitas vezes não é a mobilidade que essa rede pode proporcionar, mas a
possibilidade da utilização de múltiplos dispositivos, sejam eles fixos ou móveis,
dispensando o uso de fios, que muitas vezes se tornam incômodos, sobretudo,
quando se trata de lugares pequenos, que dispõem de pouco espaço físico para a
circulação de pessoas e organização dos equipamentos.
Lemos (2009) também chama atenção para o fato de que “pela primeira vez se
tem uma conjunção de mobilidade física e mobilidade informacional, o que
possibilita produzir, consumir e distribuir informação em movimento”. O autor
complementa, observando que nesta nova fase do download, o lugar passa a se
configurar não só pelas suas características físicas, culturais, sociais etc., mas
também por bancos de dados que disparam informações a partir desse lugar e são
captados por dispositivos eletrônicos específicos.
Esta nova configuração da ambiência tecnológica que, por sua vez, reconfigura
também o espaço urbano, à medida que incorpora camadas eletrônicas ao espaço
físico, torna cada vez mais difícil o descolamento do ciberespaço da vida real,
uma vez que as informações do ciberespaço não estão mais apenas “lá em cima”,
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para serem acessadas “aqui de baixo”, mas estão também nos artefatos que são
utilizados pelas pessoas, em suas casas, escritórios ou mesmo nas ruas da cidade
em que vivem.
Nesse sentido, cai em completo desuso a noção desenvolvida inicialmente por
diversos autores de que o ciberespaço desterritorializaria tudo e que o mundo se
virtualizaria a ponto da geografia se tornar desnecessária, pois essa noção perde a
sua eficácia explicativa. Hoje se aposta na idéia de que tudo é locativo, pois está
sempre vinculado a um local, um espaço físico de referência, um território onde
as relações são construídas e vividas pelas pessoas. As mídias locativas surgem,
assim, como a grande tendência tecnológica no contexto das cibercidades.
Nesta nova perspectiva de apropriação e ressignificação do território por parte dos
cidadãos, objeto deste estudo, duas variáveis de análise se abrem. A primeira, diz
respeito à ressignificação dos espaços da cidade, pela vivência própria do espaço
territorial e das relações que se estabelecem nos âmbitos socioeconômico e
cultural da cidade, a partir do fenômeno da conexão generalizada e da
possibilidade de intervenção que o cidadão passa a ter nesses espaços.
Nesta dimensão, o que está em questão é a possibilidade de apropriação
individual do espaço da cidade para anotações digitais, que podem ser
compreendidas como registros inseridos nos espaços públicos ou privados, através
das mídias locativas digitais, lidos e interpretados por meio de dispositivos
móveis digitais. Aqui, o cidadão pode elaborar um referencial espacial
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próprio/adverso ao contexto tradicional que está posto, fincando as bases para o
estabelecimento de interações simbólicas e interpretações dos signos urbanos em
uma lógica própria. Ou seja, o cidadão pode interferir no espaço urbano,
ressignificando-o de modo personalizado, a partir da sua óptica individual,
apropriando-se do espaço público para uso privado e vice-versa.
A segunda variável de análise diz respeito à informação digital agregada à cidade,
por outras pessoas ou instituições. Neste caso, o que se destaca é o
confrontamento das visões e o diálogo urbano que se pode estabelecer neste
âmbito, visto que este confrontamento amplia significativamente a percepção
individual sobre um determinado espaço territorial, pois à percepção individual de
um cidadão poderá ser adicionada à percepção também individual de outro,
criando-se assim novas possibilidades de se perceber o espaço vivido. Neste caso,
a soma de percepções pode não apenas transformar a percepção individual de cada
um, mas também criar novas percepções a respeito do espaço na
contemporaneidade.
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O DIÁLOGO URBANO DAS MÍDIAS LOCATIVAS
COM OS DISPOSITIVOS MÓVEIS DIGITAIS,
PROMOVIDO PELA CONEXÃO UBÍQUA
Edições
VNI
UCSAL
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
PPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PLANEJAMENTO TERRITORIAL E
DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Antes de tratar especificamente do diálogo urbano que as mídias locativas
estabelecem com os dispositivos móveis digitais, no espaço da cidade, através das
redes ubíquas, buscou-se estabelecer conceitualmente os três componentes que
envolvem a questão: as mídias locativas, os dispositivos móveis digitais e as redes
ubíquas, para que se possa compreender o complexo contexto de transformação e
inovação que este tema possui nos estudos sobre territorialidade e
desenvolvimento das cidades contemporâneas.
Mídias locativas
Ao discutir e conceituar este primeiro componente propõe-se uma nova
classificação, para dar conta dos objetivos propostos nesta obra e possibilitar o
entendimento das reflexões aqui colocadas.
Segundo Lemos (2007a, p. 1),
[...] mídia locativa é um conjunto de tecnologias e processos infocomunicacionais cujo conteúdo informacional vincula-se a um lugar
específico. Locativo é uma categoria gramatical que exprime lugar,
como 'em', 'ao lado de', indicando a localização final ou o momento de
uma ação.
Este conceito permite o entendimento claro de que mídia locativa é tudo aquilo
29
que agrega conteúdo informativo ou comunicativo a um determinado local.
Portanto, uma placa de outdoor, um totem de sinalização, o monitor de um
elevador, ainda que sejam mídias analógicas, que apresentam informações
estáticas, são locativas. Assim, quando se fala em mídias locativas digitais, além
de dispositivos informacionais, cujo conteúdo da informação está diretamente
ligado a um lugar, estas se caracterizam “por emissão de informação digital a
partir de lugares/objetos” (LEMOS, 2007a, p. 1).
Ribeiro (2009) observa que as mídias locativas, por serem experiências novas e
pouco exploradas, ainda estão sujeitas a reflexões mais aprofundadas. Por outro
lado, para o autor, a ambiência tecnológica digital possui como característica
central mudanças muito rápidas. Essas duas questões levam ao enfrentamento de
dois problemas: o primeiro está na necessidade de se analisar o novo fenômeno
das mídias locativas com um referencial teórico-metodológico escasso e não
específico que se tem disponível, que pode não ajudar a dar conta da sua
complexidade, pois é um fenômeno que traz muitas nuances, ainda não pensadas e
trabalhadas teoricamente, sobretudo metodologicamente, pelos autores da área.
Já o segundo problema, que diz respeito às mudanças muito rápidas que ocorrem
no ambiente tecnológico digital, está, para Ribeiro (2009), na dificuldade de
mapeamento dos componentes dessa ambiência, visto que se trata de uma
estrutura que possui um caráter dinâmico por excelência, movida por rápida
evolução tecnológica.
30
Essa dificuldade de mapeamento, apontada por Ribeiro (2009), de fato pôde ser
percebida nos levantamentos realizados na pesquisa para esta obra, que buscou
identificar e mapear, a partir de amostras de espaços territoriais dentro da cidade,
as zonas de acesso Wi-Fi, públicas e privadas, abertas ou de acesso livre, e
fechadas ou acessíveis por meio de senhas, para se caracterizar a amplitude de
utilização dessas tecnologias na cidade do Salvador na atualidade e, com isso,
poder chegar a conclusões que permitam teorizar a respeito do fenômeno, a partir
de componentes, que se pressupõem universais e generalizados, para se pensar as
cidades contemporâneas.
As mídias locativas digitais, apesar de serem um fenômeno relativamente novo, já
possuem algumas classificações. McCullough (2004) as classifica a partir dos
lugares de interação: trabalho, casa, cidade, estrada, observando suas
características segundo as diferenças estabelecidas na relação espacial e social das
pessoas com os ambientes de interação, uma vez que nos processos de interações
simbólicas, segundo Blumer (1969), as pessoas são influenciadas pelo ambiente
em que se encontram e pela sua interação com os objetos, as ideias, etc. Já Lemos
(2007a) classifica as mídias locativas digitais a partir de suas funções:
a) realidade aumentada Permite que informações sobre uma determinada
localidade sejam visualizadas em um dispositivo móvel, “aumentando” a
informação. Esse tipo de hiperlinkagem chama-se mobile augmented reality
applications (LEMOS, 2008, p. 3). Por exemplo: com um programa
específico instalado em um celular, a pessoa pode, ao apontar para uma rua,
31
visualizar links que a possam levar a websites de lojas, museus, órgãos
públicos ou qualquer tipo de organização que esteja cadastrada e mapeada
pelo sistema;
b) mapeamento e monitoramento Funções locativas aplicadas a formas de
mapeamento (mapping) e de monitoramento do movimento (tracing) do
espaço urbano através de dispositivos móveis (LEMOS, 2008, p. 4);
c) geotags Agregam informação digital em mapas. Podem ser acessadas por
dispositivos móveis ou não. Ex.: googlemaps;
d) anotação urbana Possibilita formas de apropriação do espaço urbano, a
partir de escritas eletrônicas. Permite anotações eletrônicas utilizando
celulares, palms, etiquetas RFID ou redes Bluetooth para indexar
mensagens, - SMS, vídeo, foto -, a lugares (LEMOS, 2008, p. 7).
Neste estudo, se trabalhará com conceitos mais amplos e classificar-se-ão as
mídias locativas de uma forma abrangente, e não apenas as digitais, quanto o seu
tipo e uso, a partir do nível de interação que cada uma delas proporciona entre as
pessoas e os conteúdos das mensagens por elas vinculadas. Considerando essa
visão mais ampla, pode-se classificar as mídias locativas em:
a) analógica impressa - é constituída pelos outdoor, busdoor, placas de
identificação das empresas, sinalizações de trânsito, banner (Fig. 1) pontos
de ônibus, placas do sistema nacional de trânsito, estacionamentos, etc. ,
dentre outras mídias não eletrônicas, que são apenas pintadas ou “plotadas”
com imagens e textos estáticos. O nível de interação do usuário com esse
32
tipo de mídia é apenas o de leitura ou observação do que está impresso num
nível zero de interação;
Fig. 1 - Exemplo de mídia locativa analógica impressa: banner impresso afixado
em uma loja de departamentos.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
33
b) analógica eletroeletrônica - nessa categoria estão contidos os outdoors
eletrônicos, os semáforos, o monitor de TV com DVD digital versatile disc
acoplado, uma vitrine de uma loja que possua algum movimento usando meio
eletrônico, letreiros eletrônicos (Figs. 2, 3 e 4), letreiro elétrico de identificação de
empresas (Fig. 5), dentre outros dispositivos que utilizem algum tipo de energia bateria ou energia elétrica -, e que não sejam programados por computador. Esse
tipo de mídia locativa proporciona interações mecânicas do usuário com o
equipamento, ligando e desligando, mudando de canal ou de ritmo etc. É
classificado como nível 1 (um) de interação;
Fig. 2 Exemplo de mídia locativa
analógica eletroeletrônica:
letreiro eletrônico em um ônibus mensagem 1.
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009.
Fig. 3 Exemplo de mídia locativa
analógica eletroeletrônica:
letreiro eletrônico em um ônibus mensagem 2.
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009.
34
Fig.5 Exemplo de mídia locativa analógica eletroeletrônica: letreiro elétrico da loja McDonalds.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
c) digital off-line - são aquelas mídias locativas que são mediadas por computador,
mas desconectadas do ciberespaço. Por exemplo: os painéis digitais de
publicidade, os monitores de circuito interno de TV, os telões digitais de LED
light emitting diode (Fig. 7) e TVs de plasma ou LCD liquid crystal display (Fig.
6) nas lojas e magazines, dentre outras mídias que utilizam a informática, sem o
uso da rede para a dinâmica das informações. Neste tipo de mídia, como a
informação é dinâmica e pode ser diversificada, visto é uma informação mediada
por computador e, portanto, passível de programação, o usuário já pode, em alguns
casos, participar do conteúdo, tanto selecionando o que quer ter acesso, quanto
interagindo com o conteúdo transmitido, como é o caso dos circuitos internos de
TV. Este então é o nível 2 (dois) de interação;
35
Fig. 6 Exemplo de mídia locativa digital off-line:
TV de plasma passando uma apresentação promocional
do produto a venda em uma loja de departamento.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
Fig. 7 Exemplo de mídia locativa digital off-line:
LED veiculando publicidade
em um shopping de Salvador.
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009.
36
d) digital on-line não dialógica são aquelas que apesar de estarem conectadas ao
ciberespaço e obterem conteúdos dinâmicos, não dialogam com os dispositivos
móveis e, portanto, não permitem intervenção direta do usuário no local que está
sendo por ele compartilhado. Por exemplo: os painéis de notícias de aeroportos,
shoppings centers e de elevadores de prédios comerciais (Fig. 8). Neste tipo de
mídia, a intervenção do cidadão no conteúdo, embora remota, já começa a ser
possível, pois ela veicula conteúdos do ciberespaço. Para acontecer a intervenção
direta do cidadão no conteúdo veiculado, entretanto, o usuário tem que inserir
conteúdo no ciberespaço “lá de cima”, ou seja, enviando conteúdo para a Internet,
podendo passar pelos filtros dos veículos on-line. Esse seria o terceiro nível de
interação, pois proporciona a possibilidade de intervenção nos conteúdos
veiculados, mesmo que ainda de forma pouco interativa;
Fig. 8 Exemplo de mídia locativa digital on-line
não dialógica: monitor transmitindo notícias
do Portal Terra em elevador de prédio comercial
de Salvador em tempo real
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009.
37
e) digital on-line dialógica são aquelas mídias que estão conectadas ao
ciberespaço e permitem o diálogo com os dispositivos móveis digitais e,
consequentemente, permitem a dinamicidade dos espaços públicos, bem como o
aumento do nivel de complexidade do conjunto de sistemas das cidades
contemporâneas, resultando em grandes transformações do espaço urbano, na
medida em que proporcionam o diálogo e a intervenção das pessoas no âmbito da
cidade. Estas são as mídias digitais que permitem anotações urbanas, realidade
aumentada ou ampliada, geolocalização, etc. Estas mídias permitem que o usuário
dialogue diretamente com elas, de forma localizada. Apesar das informações, que
nelas estão contidas, estarem no ciberespaço, se encontram disponíveis para
intervenção direta no próprio objeto ou local em que estão sendo veiculadas. São,
portanto, as mídias locativas que permitem o maior nível de interação e, portanto,
a que é classificada como nível 4 (quatro) de interação.
Fig. 9 Exemplo de mídia locativa digital
on-line dialógica: Etiqueta RFID.
Fig. 10 Exemplo de mídia locativa digital
on-line dialógica: Leitor RFID
38
A tecnologia RFID - radio-frequency identification ou, em português,
Identificação por Rádio Frequência, mostrada nas Figs. 9 e 10, possibilita o
diálogo digital entre etiquetas, - que ficam nos objetos, nas roupas, nos produtos,
etc. , que podem ser identificadas na Fig.9, e sensores, - que estão fixos em
determinados lugares , que podem ser identificados na Fig.10. As suas aplicações
mais conhecidas são:
a) na segurança são colocadas etiquetas nas embalagens dos produtos para que
ninguém saia da loja sem pagar por eles. Ao tentar sair da loja, ainda com a
etiqueta, ela é detectada por um sensor que emite sinais sonoros ou mensagens
para alertar os seguranças especialmente contratados pela empresa para
impedir a saída dos produtos sem pagamento. Pode ser utilizada também para
emitir informações para o sistema de injeção eletrônica de um carro que não
tenha sido ligado com a sua chave ou que tenha tido o alarme acionado a
distância pelo dono, por exemplo;
b) no comércio as etiquetas são colocadas dentro das embalagens dos
produtos, para que o cliente os leve diretamente ao caixa, onde são
identificados por sensores incluíndo os preços e a conta, restando apenas ao
comprador efetuar o pagamento;
c) na localização de pessoas e objetos pessoas ou objetos, com uma etiqueta
RFID, podem facilmente ser encontrados no ambiente de uma empresa. Esse
tipo de etiquetagem, para a localização de pessoas e objetos, tem sido muito
utilizado nos hospitais para se encontrar membros da equipe e/ou
39
equipamentos necessários para a realização de procedimentos de emergência.
Bares e casas noturnas também têm utilizado essa tecnologia para identificar
seus clientes VIPs Very important person, quando chegam ao ambiente, para
poder oferecer-lhes o tratamento adequado. As companhias aéreas também
usam as etiquetas RFID para reduzir a possibilidade de perda das bagagens;
d) na catalogação de objetos pode ser usada para o controle de livros de
bibliotecas, para organizar coleções de CDs Compact disk - ou DVDs - Digital
versatile disk, visto que as etiquetas podem guardar muitas informações sobre
o objeto, o que pode ajudar numa busca muito mais eficiente de um livro, uma
música ou um filme, por exemplo. Além disso, pode ajudar na organização de
entrada e saída de livros de uma biblioteca ou na localização do livro nas
prateleiras.
e) na prestação de serviços públicos ou privados um grupo de pessoas
identificado com etiquetas podem ter acesso a serviços sem intervenções de
terceiros, enfrentamento de obstaculos, obediência à burocracia, basta que
tenha o direito adquirido desse uso antecipadamente. Por exemplo: uma pessoa
que possui passe livre em transporte público, ao passar pela catraca é
identificada e liberada automaticamente a ulrapassa-la. O mesmo pode
acontecer para dar acesso a lugares privativos a determinados grupos, como
museus, teatros, etc.
f) na inteligência urbana é o caso de sensores que podem identificar em um
cruzamento a rua, que tem um número maior de carros, e adequar o tempo do
semáforo à demanda de veículos por rua, tornando o trânsito mais fluente. Da
mesma forma, um carro com a documentação irregular pode ser identificado
40
pelo sensor RFID afixado em um semáforo. Esse sensor manda a informação
para o posto policial mais próximo. Quando o veículo passar pelo posto é
parado e autuado.
Fig. 11 Exemplo de mídia locativa digital on-line dialógica: etiqueta QR Code.
Fonte: Gerada por Marcello Chamusca, em ago, 2009.
O termo QR Code vem da contração de Quick response code, que em
português significa resposta rápida. A etiqueta (vide Fig. 11) possui uma
grande possibilidade de armazenamento de informações e pode ser utilizada de
formas muito diversas, desde anotações urbanas livres até fins comerciais, em
substituição aos códigos de barras tradicionais.
41
A opção por esse tipo de classificação deu-se por se perceber que ela permitiria a
compreensão de que as mídias locativas sempre povoaram as cidades desde o
século XIX, e que evoluíram dentro do contexto analógico de forma considerável.
Desde então até o final do século XX não deixou de progredir e, agora, no
contexto digital, têm evoluído de modo ainda mais significativo, pois
transcenderam a esfera do sentido da visão. Hoje se apresentam de várias
maneiras, dentre elas, de modo invisível aos olhos humanos e perceptíveis apenas
para quem dialoga com elas no espaço da cidade, através de dispositivos móveis
digitais.
Vale observar que todos os tipos de mídias locativas, identificados nesta
classificação estão sendo utilizados nas cibercidades, convivendo
harmoniosamente, dividindo os seus espaços públicos e privados
democraticamente, sem que nenhum deles se sobrepuje ao outro, apesar de se
poder constatar, em alguns casos, um certo desequilíbrio numérico na sua
distribuição por esses espaços.
Segundo Lemos (2004, p. 124),
[...] estamos vendo se desenvolver uma relação estreita entre mídias com
funções massivas (as 'clássica' como o impresso, o rádio e a TV), e as
mídias digitais com novas funções que chamaremos aqui de 'pósmassivas' (Internet, e suas diversas ferramentas como blogs, wikis,
podcasts, redes P2P, softwares sociais, e os telefones celulares com
múltiplas funções).
42
É importante salientar que a classificação aqui proposta foi realizada para se dar a
amplitude necessária ao desenvolvimento da análise do último tipo apontado, as
mídias locativas digitais on-line dialógicas, que esse trabalho se propõe a discutir
em maior profundidade, mas sem deixar de destacar que ela se encontra em um
contexto histórico que envolve antecedentes significativos de serem pensados e
que, supõe-se, influenciaram na sua evolução, no formato e nas características que
apresentam hoje.
E, uma das características mais importantes a ser lembrada, quando se trata de
uma mídia locativa digital on-line dialógica, a que possui o maior nível de
interação, é que esta precisa dos dispositivos móveis digitais para estabelecer o
processo comunicativo responsável pelas dinâmicas territorial e social que aqui
serão exploradas. Antes de caracterizar as tecnologias móveis digitais, entretanto,
para complementar de forma ampla o entendimento sobre mídias locativas
digitais, buscar-se-á a construção de um conceito largo e abrangente desse
primeiro componente, através de uma concepção coletiva delas, conforme segue.
Construindo um conceito de mídias locativas digitais a partir da concepção
coletiva
Numa sondagem realizada, através de questionário on-line, disponibilizado na
Internet, com 1.230 pessoas de todo o Brasil, se solicitou aos respondentes que
dissessem o que entendiam por mídias locativas digitais, com o objetivo de criar
43
uma noção conceitual ampliada, a partir do que Levy (1995) chamou de
inteligência coletiva.
O perfil da amostra sondada teve a seguinte característica: a maior parte dos
respondentes, cerca de 55%, são residentes em Salvador e sua Região
Metropolitana. O nível de escolaridade variada, mas com predominância de
pessoas com nível superior, completo ou em conclusão, conforme pode ser
verificado no Gráfico 1.
Gráfico 1 Nível de escolaridade
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009
O formulário on-line ficou disponível 24h por dia durante 30 dias. O endereço do
formulário foi divulgado para grupos diversos, alcançados através de redes sociais
44
criadas em sites como Orkut, Facebook, Twitter, dentre outros. Além disso,
o endereço do formulário foi divulgado por e-mail para a lista de notícias
Orgulho de Ser RP, que enviou uma mensagem com a convocação do
professor Marcello Chamusca autor desta obra e da pesquisa para
responder o questionário, a cerca de nove mil pessoas. Essa distribuição
resultou em 1.230 questionários respondidos.
O questionário continha treze perguntas fechadas e quatro abertas, sendo
que três delas relacionadas a complementação de questões fechadas e
apenas uma de livre manifestação (vide Anexo 1). As questões visavam
perceber, entre as pessoas, na atualidade, o nível de conhecimento,
familiaridade e uso efetivo das tecnologias de funções pós-massivas e dos
conceitos pertinentes.
É preciso salientar que a amostra é constituída por 100% de usuários da
Internet, visto que o formulário foi disponibilizado on-line e, portanto, não
mede o nível de difusão dessas tecnologias no âmbito geral, mas entre
usuários da rede no Brasil que, conforme dados estatísticos do Ibope
Nielsen Online (2009), no Brasil, são de aproximadamente 65 milhões de
pessoas, que representam cerca de 62% dos mais de 104.6 milhões de
pessoas economicamente ativas no País (DIEESE, 2009).
Neste momento, se aborda apenas a questão aberta pelo questionário sobre
o entendimento das mídias locativas digitais pelos participantes. Esta não
45
foi uma questão de preenchimento obrigatório e foi respondida por apenas 62
pessoas, que representam um percentual pequeno da população sondada (cerca de
5%).
Houve respostas bastante satisfatórias sobre o entendimento conceitual do que são
mídias locativas digitais. As respostas consideradas válidas foram subdivididas
em três grandes grupos: definições precisas, definições tangenciais e definições
adicionais. Foram consideradas definições precisas aquelas que estão de acordo
com a literatura já estabelecida da área, tangenciais aquelas que se aproximam da
essência conceitual, ainda que de forma incompleta ou imprecisa. Já no grupo das
definições adicionais foram inseridas aquelas que acrescentam algum elemento ao
que já estava posto, servindo para ampliar a noção estabelecida de mídias
locativas digitais.
As definições semelhantes dadas por esses participantes foram agrupadas e/ou
compiladas em uma só definição.
Definições precisas:
a) tecnologias que permitem emitir e receber (trocar) informações
associadas a um determinado local;
b) processo/dispositivo infocomunicacional, vinculado a um local, que
dispara informações para serem captadas pelos dispositivos móveis que
passam por essa localidade;
46
c) nova tecnologia para troca de informações localizadas através de
dispositivos móveis;
d) são mídias digitais de formatos variados e que fazem parte de uma nova
forma de comunicação, possibilitando a emissão de conteúdo partindo de
lugares para pessoas que ali transitam;
e) conjunto de dispositivos situados em ambientes específicos passíveis de
trocas informacionais através da comunicação móvel;
f) dispositivos digitais estacionários com capacidade de comunicar-se em
tempo real com outros equipamentos que passem pelo local;
g) aquela mídia que agrega conteúdo informacional digital a um determinada
localidade;
h) um conjunto de tecnologias e técnicas de comunicação do qual o conteúdo
informativo vincula-se a um lugar específico. Trata-se de processos de
emissão e recepção de informações, a partir de um determinado local,
distribuídos através de dispositivos móveis sem fio;
i) mídias digitais que têm por característica principal a troca de informações
específicas com um dispositivo móvel em uma determinada localidade e
j) tecnologia digital utilizada para difusão de informação a partir de um
determinado local.
Definições tangenciais:
a) Espaços destinados a divulgação publicitária, que estejam ligados a uma
determinada localidade;
47
b) meio de comunicação interativo, o qual permite uma troca de
informações entre um emissor e receptor em tempo real;
c) possibilita a troca de informações e estabelecimento de comunicação
através de dispositivos móveis digitais com lugares/objetos;
d) um conjunto de tecnologias de informações que está intimamente ligado
a uma localidade/comunidade, onde a trocas de informações se dá através
destes meios tecnológicos;
e) dispositivos móveis que fornecem funcionalidades baseadas em locações
geográficas;
f) tecnologias vinculadas a uma localidade específica, que transmitem
diversos tipos de conteúdos, para variados fins;
g) permitem acesso a informações por meio digital em qualquer local;
h) permite o acesso a Internet de qualquer lugar;
i) são mídias vinculadas a uma determinada localidade;
j) permitem a troca de informações direcionadas de uma determinada
localidade a um dispositivo móvel, através da tecnologia digital;
k) são procedimentos tecnológicos que surgem no contexto das redes
móveis, para o desenvolvimento de experiências com imagem, som e/ou
acesso a informações na contemporaneidade, facilitando a vida da
sociedade global;
l) permitem compartilhamento de informações com equipamentos móveis
capazes de armazenar, processar e transmitir dados digitalizados ;
m)um conjunto de tecnologias informáticas e processos de comunicação
direcionados e associados a uma localidade especifica;
48
N)uma nova tecnologia a favor da comunicação, que serve para a
distribuição de informações partindo de uma determinada localidade;
o) um meio de comunicação digital utilizado localmente;
p) mídia digital vinculada a um local.
Definições adicionais:
a) tecnologias utilizadas para comunicação em tempo real, vinculadas ao
local/espaço demandado pelo usuário;
b) algum tipo de mecanismo - software e hardware -, que permita
comunicação onde ele estiver disponível;
c) é utilizada para transmissão de conteúdo digital de uma localidade, de
forma não-massiva, mas individualizada;
d) recursos de mídia digital que, embora numa base local, conectam este
lugar ao espaço global, com características de fluidez e simultaneidade;
e) um recurso de mídia digital que pode ser disponibilizada em locais
estratégicos para acesso móvel; e,
f) tudo que envolve a Internet e que possibilita a locomoção fácil e rápida.
A partir das diversas definições aqui expostas, que emergiram da questão aberta
do questionário aplicado, pode-se criar um conceito bastante amplo de mídias
locativas digitais. Algumas definições não foram trazidas para a construção do
conceito coletivo pretendido, porque confundem mídias locativas com
dispositivos móveis digitais ou com aplicativos de geoprocessamento.
49
A confusão com os dispositivos móveis, não aconteceu por acaso, visto que há, de
fato, uma profunda relação entre esses dois componentes, pois, as funções pósmassivas provenientes das mídias locativas digitais se encontram exatamente no
diálogo que essas estabelecem com os dispositivos móveis digitais no espaço da
cidade que, por sua vez, só é possível por causa da infraestrutura, formada pelo
ambiente de acesso generalizado, proporcionado pelas multi-redes sem fio,
disponíveis na atualidade: Wi-Fi, Wi-Max, Bluetooth, telefonia celular, dentre
outras.
Dispositivos móveis digitais
Os dispositivos móveis digitais, na prática, se traduzem nos telefones celulares,
smartphones, laptops, palmtops, GPS, dentre outros dispositivos que permitem
acesso a informação, em mobilidade, e sem a necessidade de cabos e fios de
qualquer natureza. Mas, conforme observa Lemos (2004, p. 131),
Dentre as tecnologias móveis, o telefone celular tem sido o dispositivo
maior da convergência tecnológica e da possibilidade de exercício
efetivo dessa 'rebelião' política, mas também de constituição de relações
sociais por contato imediato, seja através de voz, SMS, fotos ou vídeos.
Lemos (2007a) propõe, inclusive, uma nova nomenclatura para os celulares, visto
que estes já não são apenas telefones celulares, mas verdadeiros exemplares da
50
convergência das mídias e das funções pós-massivas. O autor (LEMOS, 2007a, p.
56) propõe que esses dispositivos passem a se chamar de DHMCM, sigla para
dispositivo híbrido móvel de conexão multirrede, pois, através dele, textos podem
ser elaborados, assim como se ouve músicas, assiste vídeos, acessa a Internet,
envia mensagens, faz ligações telefônicas, sempre em movimento e a partir de
diversas redes, como Bluetooth, Wi-Fi, rede de telefonia celular, etiquetas de
radiofrequência, dentre outras possibilidades.
É preciso chamar a atenção para o fato de que os celulares nem sempre tiveram
essas características e há bem pouco tempo não se imaginava que estes aparelhos
seriam nem mesmo aparentados ao que Lemos (2007a, p. 56) chama hoje de
DHMCH. O telefone celular causou um enorme impacto há 36 anos, quando foi
utilizado pela primeira vez, em abril de 1973 nos Estados Unidos (FONTOURA,
2003). O aparelho usado na época pesava mais de um quilo, media 25 cm de
comprimento e a bateria se esgotava em cerca de 20 minutos de uso, em modo de
converssação. Só começou a ser comercializado, dez anos depois, em 1983,
quando a Motorola lançou o modelo DynaTAC 8000X. O alto preço inicial, cerca
de quatro mil dólares, não impediu o grande sucesso do lançamento
(MOTOROLA, 2004).
Percebendo o quão promissor era o setor de telefonia móvel, as empresas
investiram nele maciçamente, buscando avanços tecnológicos que permitissem o
barateamento e a consequente popularização do produto. Hoje, as empresas do
51
setor abastecem o mercado internacional com aparelhos para todos os orçamentos
e segmentos de mercado. Segundo o jornal A Tarde On-line (2004), “o telefone
celular, como resultado deste processo, passou a ser algo mais acessível,
independentemente da classe social ou região geográfica das pessoas, e ao mesmo
tempo incorporou funções que extrapolam a simples transmissão de voz”.
Os serviços agregados ao aparelho telefônico básico vão do envio de mensagens
escritas até à recepção da programação de emissoras de TV. Existem aparelhos
equipados com câmeras fotográficas e filmadoras digitais, sensores de etiquetas
de radiofrequência, acesso à Internet e até a incorporação de sistemas de
localização, com o uso de receptores GPS, que possibilitam identificar o
posicionamento geográfico de uma pessoa, via satélite.
O celular chegou ao Brasil em 1990. Segundo dados da Agência Nacional de
Telecomunicações (ANATEL), no primeiro ano havia no País apenas 667
aparelhos celulares. No ano seguinte, esse número passou para 6,7 mil aparelhos,
mostrando um crescimento de mais de 1.000% (mil por cento). Em 1992, chegou
à marca de 30 mil aparelhos, mais 450% de crescimento em relação ao ano
anterior, alcançando quase 162 milhões de aparelhos em junho de 2009, o que
representa mais de 1.300.000 (um milhão e trezentos mil) pontos percentuais de
crescimento, desde a sua chegada em 1990. Nenhuma outra indústria cresceu
tanto quanto essa, no mesmo período (ANATEL, 2009).
52
É importante lembrar que até o ano de 1997 o serviço de telefonia no Brasil era
estatizado. A privatização acelerou o processo de crescimento do setor, sobretudo
o da telefonia móvel, permitindo o surgimento de um mercado com níveis de
competitividade muito elevados. Como qualquer indústria que desponta, e já
cresce de forma tão significativa, a telefonia celular teve que enfrentar alguns
percalços, próprios da falta de conhecimento da sociedade, diante de uma
tecnologia nova que se difundiu muito rapidamente. Como existe a noção de que
toda tecnologia tem necessariamente seu efeito colateral maligno, especulou-se
muito, e durante muito tempo, sobre quais seriam os efeitos do telefone celular
sobre o homem.
Buscou-se vincular o uso do celular a questões de saúde, como câncer, surdez,
problemas cardíacos, dentre outros. Entretanto, desses danos à saúde,
supostamente decorrentes do uso excessivo do celular ou da exposição às ondas
emitidas pelas antenas de telefonia, poucos são procedentes, segundo estudos
encomendados pelas operadoras e agências reguladoras do setor em todo o mundo
(A TARDE on-line, 2004).
Segundo o jornal A Tarde On-line (2004),
De acordo com o MMF - Mobile Manufacturers Forum [Fórum de
Fabricantes de Aparelhos Móveis] -, entidade que financia pesquisas
sobre o tema em todo o mundo, a resposta é 'absolutamente nada'.
Segundo o fórum, cerca de 350 estudos sobre as conseqüências do uso do
53
celular estão sendo desenvolvidas em diversos países e até agora os
resultados obtidos não indicam perigo algum à saúde humana. 'O que
existe são muitas especulações e mitos urbanos criados a partir de
suposições teóricas, mas na prática nada foi identificado', garantiu
Aderbal Bonturi Pereira, diretor do MMF para a América Latina,
ressaltando que a energia emitida pelos celulares é muito baixa, não
causando impacto ao corpo humano. Bonturi Pereira destacou ainda que
todas as pesquisas financiadas pelo MMF seguem as regras da
Organização Mundial da Saúde (OMS).
O jornalista Siqueira (2003, p. 33), um dos principais especialistas em
telecomunicações do Brasil, concorda que, até hoje, não há conclusão científica
sobre os males causados pela utilização do celular.
Por enquanto, a conclusão dos especialistas é a de que, por não serem
ionizantes, as radiações eletromagnéticas dos celulares não devem
produzir danos relevantes à saúde, ficando muito abaixo dos efeitos
comprovados dos cinescópios de nossos televisores domésticos.
O mesmo autor (SIQUEIRA, 2003, p. 34) diz ainda que,
[...] existem mais fantasmas do que perigos reais no uso do celular.
Exatamente como acontecia, por volta de 1840, diante do alerta de
alguns médicos naturistas norte-americanos sobre os perigos que corriam
os passageiros de trens. Segundo ensinavam aqueles doutores, seria um
grave risco à saúde deslocar-se a mais de 40 quilômetros por hora porque
esse é o limite de velocidade jamais alcançado pelos atletas nas corridas.
54
'Logo, concluíam, é antinatural viajar a velocidades superiores a esse
limite'.
Mesmo diante de tantas evidências de que o celular não apresenta graves riscos à
saúde humana, a mídia nacional transformou, de forma sensacionalista, uma lenda
urbana em lei. Durante muito tempo foi noticiado o provável “perigo de
explosão” que o uso de celular em postos de gasolina poderia conter. As matérias
veiculadas na grande mídia TV, jornais, revistas explicavam que as ondas
eletromagnéticas recebidas pelo dispositivo celular poderiam produzir faíscas,
causando uma possível explosão dos tanques de combustíveis. Depois que essas
matérias foram veiculadas, “a Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou e a
Prefeitura paulista sancionou, em 2002, a Lei 13.440, que proíbe o uso de
telefones celulares em postos de combustíveis” (A TARDE on line, 2004).
Fernandes (1998, p. 201), em sua dissertação de mestrado sobre mitos midiáticos,
lembra que:
É compreensível, que a fim de entender os processos de criação
simbólica já que esses nem sempre são conscientes e racionais o
homem contemporâneo faça uso de significantes que lhes são, a um só
tempo, próximos e distantes, modificando-lhes o significado.
No caso específico, certamente houve uma exploração midiática, com o apelo ao
desconhecido, influenciando um processo de criação simbólica que mitificou o
55
perigo de uso do celular, dando-lhe uma dimensão além do normal. Num posto de
gasolina, carros ligam e desligam seus motores a todo o momento. As velas e a
bateria de um carro produzem fagulhas em grande quantidade. Este fato,
entretanto, nunca motivou nenhuma Lei que tivesse como objetivo exigir que os
veículos saiam do perímetro do posto de abastecimento desligados, para que as
faíscas provocadas pelo mesmo não causem acidentes. Mas a presunção de que
um aparelho celular possa provocar uma explosão ainda persiste. O medo
continua a ser alimentado, a partir da ignorância da maioria das pessoas sobre o
assunto.
O celular hoje, conforme observa Lemos (2004), é uma espécie de “teletudo”, que
desempenha muitas funções e tornou-se o maior símbolo de convergência da
sociedade digital. Mas também é responsável por modificações significativas nas
relações sociais, e não somente pela mera possiibilidade de mobilidade, que já
faria uma grande diferença na intercomunicação e nas relações sociais de um
modo geral, mas devido a outras questões relativas as relações humanas que a
mobilidade traz consigo.
A psicóloga Cocentino (A TARDE on-line, 2004) chama a atenção para uma
dessas questões, ao afirmar que quando alguém adquire um aparelho celular sela
uma espécie de “pacto” com as pessoas que a rodeiam, pois assume com elas que,
a partir de então, poderá ser localizada a qualquer momento e em qualquer lugar
que esteja. Esse pode ser um bom objeto de reflexão para o que representam as
56
mudanças que o advento da telefonia móvel celular vem promovendo no
comportamento humano.
A grande maioria das pessoas reconhece que deixa o celular ligado durante 24
horas por dia, por questões sociais ou pessoais. Esse novo hábito pode ocasionar
um também novo tipo de problema: estar disponível a qualquer hora, o dia todo, e
ter os seus movimentos controlados. Como o celular é um telefone pessoal, as
pessoas não se sentem nem um pouco constrangidas em ligar a qualquer hora do
dia ou da noite, o que segundo A Tarde On-line (2004),
[...] viabilizou um processo de perseguição social, determinando que
quando uma pessoa não atende a uma ligação está quebrando uma regra do
bom comportamento, sendo malvista por aqueles que utilizam telefone
celular. 'Isto acaba gerando angústias e neuroses, com a pessoa se sentido
um verdadeiro escravo do celular', diagnosticou Cocentino.
A possibilidade da mobilidade, segundo Cocentino (A TARDE on-line, 2004),
também permite aos usuários do celular a banalização da mentira, pois o celular
ajuda uma pessoa a entrar em contato com outra, mas não, necessariamente, a
localizá-la geograficamente. Quando uma pessoa atende a um telefone fixo, a
outra pessoa que está do outro lado da linha sabe, exatamente, qual a sua
localização geográfica, mas quando atende ao celular, que permite ao usuário
mobilidade no espaço da cidade, não se pode precisar a sua localização. A pessoa
pode estar em qualquer lugar do planeta e dizer que está a poucos metros de
57
distância ou vice-versa, sem que o outro possa desconfiar ou mesmo se assegurar
a respeito da informação. Isso faz com que as pessoas, que se encontrem em
dificuldades ou em lugares que não gostariam de ser localizadas, exercitem a
prática da mentira. Para Cocentino (A TARDE on-line, 2004), o grande problema
é que “o ser humano aprendeu a lidar com a culpa de não dizer a verdade,
banalizando a mentira em meio ao ritmo da vida nas cidades contemporâneas”.
Ou seja, as pessoas instituíram a mentira como algo banal e admitem mentir,
corriqueiramente, por conveniência.
Se, de um lado, o celular trouxe algumas desvantagens e pontos negativos para as
relações sociais, por outro, também pode ter trazido grandes avanços e benefícios.
A comunicação em movimento é uma delas, visto que a possibilidade de
mobilidade dá uma nova dinâmica à vida das pessoas, das organizações e das
cidades, que começam a explorar suas possibilidades espaciais de maneiras
diferentes, muito mais flexíveis e livres.
O celular está atingindo um nível tão alto de convergência que começa a
extrapolar as funções comunicacionais e sendo utilizado, inclusive, para efetuar
pagamentos em estabelecimentos comerciais, em substituição ao dinheiro ou ao
cartão de crédito.
É certo que o advento das mídias locativas, e da conexão sem fio generalizada,
amplia ainda mais as possibilidades de obtenção de avanços e benefícios através
do uso contínuo do celular, visto que este tem sido, conforme já visto aqui, o
58
dispositivo “escolhido” para a convergência das mídias e das funções que Lemos
(2009) chama de pós-massivas, o que o coloca, na atualidade, na vanguarda dos
dispositivos móveis digitais. Em verdade, o celular é hoje um dos símbolos da
infocomunicação ubíqua, onipresente e sem fronteiras, proposto pelas tecnologias
móveis digitais como a nova revolução para a intercomunicação humana.
Redes infocomunicacionais ubíquas
Para se entender as redes infocomunicacionais ubíquas é necessário se tratar do
conceito de ciberterritório que, por sua vez, exige o entendimento prévio do que se
entende por território. Neste sentido, buscar-se, inicialmente, fazer uma breve
abordagem conceitual sobre a noção de territorialidade e, em seguida, de
ciberterritorialidade, para poder se avançar na questão específica das redes
ubíquas.
O termo território, quase sempre remete à noção de delimitação do espaço físico
na terra. A própria etimologia da palavra deixa claro que é algo diretamente
relacionado a terra. Vem do latim territorium, que significa pedaço de terra
apropriado (ALBAGLI, 2004, p. 26). Não bastasse a raiz da palavra estar
vinculada à terra, muitos autores da área também o conceituam com base nesta
mesma noção. Ratzel (1990), por exemplo, define território como uma
determinada porção da superfície terrestre apropriada por um grupo humano. A
59
visão brasileira, de Santos e Silveira (2008, p. 20), não é muito diferente, pois
estes definem território como “a extensão apropriada e usada, que interessa ser
pensada, dentre outras possibilidades, como sinônimo de espaço geográfico”.
Carvalhal (2008, p. 3) também constatou essa afirmação quando observou que a
territorialidade
[...] vem sendo abordada pelas perspectivas espaciais, regionais,
relacionadas ao lugar, à cidade, ao campo ou à nação, mas, conforme já
pontuado, sempre vinculada ao espaço físico e à terra, ainda que essas
abordagens se dêem em diferentes escalas, sejam elas local, regional,
nacional, supra-nacional ou global.
Mas, a dinâmica territorial do mundo contemporâneo expressa complexidade e
permite articulações que envolvem questões de ordem simbólica, que
transcendem a esfera do físico e permitem conceitos e visões diferenciados sobre
o território. Alguns autores, como Raffestin (1993) e Silva e Silva (2006), já sob
uma perspectiva mais recente de território, apontam possibilidades de conceitos
que contemplam um nível maior de complexidade e abrangência do território.
Raffestin (1993), por exemplo, afirmou que o território não se reduz a sua
dimensão material ou concreta, mas se constitui num campo de forças, onde se
dão as relações sociais. Já Silva e Silva (2006) entenderam que o território agrega
as relações humanas em seus diversos aspectos e escalas e, por isso mesmo,
envolve um nível de complexidade muito grande.
60
É nessa complexidade dos processos contemporâneos que o conceito de
ciberterritório (CARVALHAL, 2008) é bem-vindo, pois alarga as discussões sobre
a noção de territorialidade e permite abordagens mais significativas do contexto
atual, em que muitos velhos paradigmas foram quebrados e outros se mantêm
fragilizados, sob permanentes questionamentos dos analistas da ambiência
tecnológica.
Para Carvalhal (2008, p. 5), o ciberterritório:
[...] diz respeito à formação de um determinado território na intersecção
do espaço físico e o espaço cibernético, proporcionado por uma rede
física de dispositivos digitais, que dão acesso a um ambiente virtual, em
que as relações humanas se estabelecem. Um ambiente intangível onde
as pessoas e instituições produzem cultura e disseminam informação e
conhecimento, a partir de uma grande rede social que se forma, conforme
observa Castells (1999), em escala global, mas com possibilidade de
participação e inserção em todas as escalas.
É importante observar que o conceito de Carvalhal (2008) não se opõe ao conceito
tradicional de território, apenas cria uma nova perspectiva quando observa a
formação de um novo território, o ciberterritório, na intersecção dos ambientes
físicos e virtuais, que formam a cibercidade.
Outros autores de diversas áreas, também têm construído conceitos semelhantes,
ao definirem esse ambiente híbrido, estabelecido na intersecção do espaço físico e
61
as “camadas eletrônicas” que as tecnologias digitais criam na cidade e que dão
base para as mídias locativas estabelecerem o diálogo comunicativo com os
dispositivos móveis digitais, o que está promovendo mudanças nas relações dos
habitantes das cidades com o seu espaço físico de referência.
Além de conceituar ciberterritório, aqui, buscar-se-á entender o que muda na
relação da população com a cidade, quando há a possibilidade de receber e emitir
informação enquanto se está em movimento, através desses territórios híbridos,
visto que a percepção de quem se comunica em movimento não deve ser a mesma
de quem está em um local fixo. Isso porque, a mobilidade cria uma relação
espaço-temporal subjetiva, diferente de quem está preso a uma localidade, que
não pode perceber a relação tempo-espaço da mesma forma.
Dadas essas noções básicas conceituais de território e ciberterritório, cabe
salientar que as redes infocomunicacionais ubíquas são as multirredes de acesso
sem fio, como as redes Wi-Fi, Wi-Max, Bluetooth, redes de telefonia celular,
dentre outras possibilidades que hoje são onipresentes e permitem ao usuário o
acesso generalizado, de qualquer lugar, sendo responsáveis pela formação do que
aqui se chamará de camadas eletrônicas, ambientes de acesso múltiplos que se
misturam, formando um emaranhado de “bolhas” informacionais invisíveis
(BESLAY e HAKALA, 2005) ou um território informacional formado por uma
nuvem de acesso generalizado (LEMOS, 2007b) ou, ainda um ciberterritório que
se compreende na intersecção do espaço físico e das camadas virtuais criadas
pelas redes de acesso (CARVALHAL, 2008).
62
Os territórios informacionais, que Lemos (2009), baseado em Foucault, entende
como heterotopias da ciberurbe, a alma virtual das cibercidades, se configura,
“cada vez mais, por práticas sociais que emergem da mobilidade informacional
digital” (LEMOS, 2007a, p. 131) e que Carvalhal (2008), ao sistematizar um novo
conceito de território, referido anteriormente, se baseia nas relações sociais
estabelecidas na intersecção do espaço físico com o ciberespaço, chamou de
ciberterritórios, é o produto do ambiente de acesso ubíquo que permite o diálogo
entre os dispositivos móveis e as mídias locativas digitais de quarto nível, aqui
chamadas de mídias locativas digitais on-line dialógicas. É importante chamar a
atenção de que, para Carvalhal (2008), o conceito de ciberterritório está
diretamente ligado à relação indissociável do homem com os espaços territoriais,
conforme já observava Haesbaert (2003), pois só é possível acessar o ciberespaço
a partir de um espaço físico.
Uma vez que é estabelecido na intersecção do espaço físico e virtual, ou seja, no
contexto dos ciberterritórios, o diálogo contemporâneo das mídias locativas
digitais on-line dialógicas com os dispositivos móveis digitais parece propiciar
aos cidadãos as condições favoráveis ao aparecimento de novas práticas
experienciais e novas leituras dos espaços urbanos. Tais experiências são
refletidas em seus corpos e em suas ações no espaço físico de convivência, bem
como nas relações sociais cotidianas.
Nesse sentido, revela-se um singular processo de apropriação e (re)apropriação
dos espaços públicos por parte do cidadão comum que, de forma não usual, se
63
descobre possuidor de ferramentas e dispositivos que potencializam o seu
processo de inscrição, de escrita pessoal e coletiva nas estruturas constitutivas das
cidades, o que pode influenciar de forma considerável nas dinâmicas territorial e
social das cibercidades.
Ao fazer a sua intervenção no espaço público, o cidadão pode ressignificá-lo,
tanto para ele próprio quanto, em certa medida, também para o coletivo,
provocando modificações de várias ordens no processo de vivência dele e do seu
coletivo no espaço da cidade, influenciando, inclusive, na distribuição das pessoas
nesse espaço, podendo mudar as coordenadas estatísticas com relação à densidade
e a concentração de pessoas nos espaços públicos e privados da cidade, quando a
intervenção, de alguma forma, envolve a concentração ou desconcentração de
pessoas em um determinado espaço físico.
Exemplo: um cidadão realiza uma anotação urbana que convoca seus pares para
uma manifestação pública em um espaço que não costuma concentrar um grande
número de pessoas. Ou convoca as pessoas a uma manifestação de boicote a um
determinado serviço, que costuma concentrar um número muito grande de pessoas
num determinado lugar. No primeiro caso, há uma concentração de pessoas em
um espaço que normalmente isso não acontece. No último, ao contrário do
primeiro caso, há uma desconcentração de pessoas em um espaço que costuma
manter alta densidade.
64
Todo esse contexto de transformações não seria possível sem a noção de
ubiquidade das tecnologias digitais na cibercidade, pois, é ela quem torna possível
o diálogo urbano que será discutido a seguir. O problema é que o ambiente,
formado pelas redes informacionais ubíquas, são invisíveis aos olhos humanos,
porque são camadas eletrônicas que cobrem virtualmente o espaço físico da
cidade. O uso generalizado do celular entre os habitantes da cidade e a sua
presença maciça na paisagem urbana, entretanto, dão, de forma visível, a
verdadeira dimensão da onipresença ubíqua das redes infocomunicacionais na
atualidade.
O diálogo urbano
A grande revolução proposta pelas tecnologias digitais de funções pós-massivas,
está exatamente na possibilidade do diálogo urbano que os dispositivos móveis
podem estabelecer com as mídias locativas digitais on-line dialógicas e,
consequentemente, com os equipamentos públicos ou privados que compõem a
cibercidade, através de intervenções e anotações urbanas que todo cidadão pode
hoje realizar nos monumentos, praças, avenidas ou qualquer outra área da cidade,
modificando sua relação com o espaço e, muitas vezes, ressignificando os seus
territórios de convivência e de relações socioculturais.
Cabe, igualmente, observar que o processo infocomunicacional estabelecido por
65
esse diálogo se dá a partir de uma determinada localidade que, por sua vez, pode
interferir nas relações estabelecidas entre a população e o espaço da cidade, uma
vez que potencializa a socialização das informações contidas no espaço territorial
e permite a qualquer cidadão, portador desses dispositivos móveis digitais, uma
apropriação diferenciada do espaço público para uso privado e vice-versa.Ao
possibilitarem o diálogo das pessoas com o espaço urbano, através dos seus
dispositivos móveis digitais, as mídias locativas digitais on-line dialógicas podem
ser utilizadas em favor, tanto da comunicação, quanto da inserção dos indivíduos
no âmbito da interação e da sociabilidade nas cidades contemporâneas, visto que,
nesta instância, a interação pode acontecer por meio do acesso a partir de espaços
públicos das cidades, o que, por sua vez, é permitido pela emissão de informações
digitais vindas de lugares/objetos e processadas por dispositivos móveis digitais,
como GPS, celulares, palms e laptops, através de redes Wi-Fi, Bluetooth ou RFID
(LEMOS, 2004).
Neste processo infocomunicacional, a informação reage ao contexto, pois ela é
dinâmica e depende do que está acontecendo naquele momento. Por exemplo:
uma etiqueta de radiofrequência capta a aproximação de uma pessoa na via
pública destinada a veículos, a etiqueta então transmite a informação, indicando
ao semáforo que ele deve interromper o trânsito de carros, permitindo a travessia
do pedestre em segurança. Essa possibilidade torna os equipamentos públicos
inteligentes e os fazem se comportarem de modo adequado às necessidades
humanas. Essas as novas possibilidades instituídas pelas mídias locativas digitais
on-line dialógicas neutralizam o discurso de que as tecnologias substituiriam o
66
homem ou o dominariam, pois, nesse contexto, o que ganha força é a simbiose
entre homem e os equipamentos, para o seu bem-estar e qualidade de vida.
Neste exemplo, a partir de uma informação local, a respeito de um fato que estava
ocorrendo naquele exato momento, um equipamento público de segurança pôde
reagir automaticamente para garantir a segurança do cidadão, sem nenhuma ação
direta do ser humano no processo e mesmo sem nenhuma intervenção visível na
infraestrutura física do espaço público. A partir desse exemplo, pode-se verificar
que as mídias locativas digitais podem disponibilizar informações localizadas
para os mais diversos fins, sejam eles:
a) comerciais através de anúncios de produtos ou serviços em promoção. Ao
entrar em um shopping center, uma loja, onde se costuma comprar, pode
enviar informações via Bluetooth para o seu celular com informações sobre
produtos ou serviços disponíveis do seu interesse; avisos de vencimento de
faturas e pagamentos, através de torpedos no celular, notificando o débito
referente ao mês em curso, dentre outras possibilidades;
b) sociais fornecendo informações sobre acessibilidades, locais, como, por
exemplo, onde encontrar serviços públicos gratuitos etc.;
c) políticos informando sobre manifestações políticas, partidárias ou não;
como, por exemplo, ações “verdes” de intervenção urbana, por parte de
ativistas ambientalistas;
d) educacionais informações coletivas enviadadas por escola/faculdade, via
67
celular, comunicando o horário de aulas, temática da aula, ausência de
professor, devolução de livro à biblioteca, além de questões de cunho
pedagógico-educacionais emitidos pelos equipamentos, etc.;
e) turísticas informações históricas sobre monumentos, praças e objetos de
arte, pontos turísticos, de um modo geral, que podem enriquecer a visita do
turista, com informações históricas a partir de depoimentos em vídeo, fotos
antigas, textos que exaltem a sua importância, etc.
f) policiais relacionados com as questões de vigilância, controle e
monitoramento, através de transmissões on-line, via stream, de imagens
captadas por câmeras digitais instaladas em lugares específicos; uso de
transmissor GPS em veículos e/ou pessoas, para monitoramento do seu
posicionamento no espaço da cidade, etc.
Ao tratar deste último item, relacionado à questão do controle e vigilância, vale
retomar um aspecto sobre o qual Lemos (2009) chama a atenção, quando diz que
a grande ameaça da nova ambiência tecnológica digital é que, como ela dá às
pessoas uma sensação de liberdade muito grande, permitindo-lhes a livre
expressão e até a intervenção nos espaços públicos e privados, as pessoas passam
a fornecer informações pessoais e “privadas”, alimentando, diariamente, grandes
bancos de dados em todo o mundo.
A cada passo que se dá na cidade, a cada anotação urbana que se realiza, a cada
compra que se faz com um cartão bancário ou de crédito, a cada ligação via
68
celular, ou a cada zona Wi-Fi que se acessa, em lugares públicos/privados, ou
mesmo na Internet, a cada perfil que se cria no Orkut, no Twitter, no My space,
etc., a cada e-mail que se envia ou se recebe, a cada página que se “navega”,
grandes bancos de dados são alimentados. O fato é que essas informações podem
ser cruzadas para uso posterior, de maneira questionável, sem que ninguém saiba.
Não se trata de uma teoria conspiratória do autor, mas de uma constatação de que
algo maior pode estar por trás de uma lógica excessivamente “libertária”, que
favorece a liberdade, para além de qualquer padrão já visto na história da
humanidade, e de participação efetiva das pessoas comuns. A questão que emerge
dessa discussão é: por que o Estado, controlador por natureza, e o capital,
manipulador por natureza, permitem, e até incentivam, o fortalecimento de um
ambiente que potencializa, cada vez mais, a participação autônoma e uma suposta
emancipação das pessoas comuns nos processos sociopolíticos e culturais da
humanidade?
Este estudo não se propõe a responder tal questão, visto que ela se afasta dos seus
objetivos centrais, mas traz a questão à tona, porque se entendeu que algo dessa
relevância não pode deixar de ser trazido à luz, para que se discuta mais
profundamente, sobretudo no âmbito acadêmico, onde se busca maior
profundidade, através de investigações específicas e abordagens fundamentadas
na sustentação de argumentos contra e a favor de teses ou hipóteses apresentadas.
69
A conexão ubíqua e o novo sentido do lugar
Neste “admirável mundo novo”, profetizado por Aldous Huxley, numa obra de
ficção em 1932 (HUXLEY, 2007), hoje, caracterizado pela “Internet das coisas”
(LEMOS, 2009), o local passa a ser fundamental, pois a informação agora parte
dos lugares, das coisas que estão localizadas em determinados territórios, e não
mais apenas da Internet “lá de cima”. Vale lembrar que o ciberespaço “lá de cima”
não deixa de existir para dar lugar ao “daqui debaixo”. O que de fato acontece é
uma reconfiguração que permite as duas possibilidades e não mais apenas a
possibilidade do acesso às informações “lá em cima”.
Essa possibilidade de união do local com o informacional permite um novo
sentido aos lugares porque possibilita a relação lugar a lugar, ou seja, pessoas que
estão vivenciando e interagindo com os espaços diferenciados nos mais diversos
lugares do mundo, significando-os e ressignificando-os, permanentemente, a
partir dos processos simbólicos nos quais se inserem ao estabelecerem suas
relações com esses espaços, agora, com essa nova configuração de espaço hibrido
de convivência podem também permitir a troca e a vivência, ainda que de formas
específicas e limitadas, do espaço do outro.
Neste sentido, os lugares podem ser reconfigurados, porque eles passam a assumir
a função de conduzir os fluxos comunicacionais não apenas localizados, mas
também em interface com outras escalas, inclusive, global e, com isso, passam a
ser percebidos de forma diferente, o que pode resultar em uma espécie de
70
ressignificação do lugar por aqueles que nele se relacionam ou se interrelacionam
a partir de lugares diferentes, em tempo real. Exemplo: uma pessoa que estava no
Haiti durante o terremoto que aconteceu no início do ano 2010 pôde compartilhar
as sensações com quem estava em qualuqer outro lugar do mundo, não apenas
pelo que podia falar para as pessoas, mas podendo inseri-las no ambiente de
destruição, ne medida em que podia enviar em tempo real fotos, filmes e outros
registros, permitindo a difusão da sensação de desconforto local em escala global.
Mas é possível também pensar nas transformações que o lugar passa em escala
local. Por exemplo: se em um ponto de ônibus existir um painel digital, que possa
indicar exatamente onde se encontra o ônibus que uma pessoa pretende pegar, a
depender do tempo que o ônibus poderá demorar a chegar, a pessoa fará um uso
do espaço público, e de seu tempo, de maneiras diferentes. Se faltarem dois
minutos para o ônibus passar, a atitude do usuário do transporte será uma, se
faltarem 20 minutos, poderá será outra. Na primeira hipótese, a pessoa
permanecerá no ponto, uma vez que o transporte, segundo o painel, está bem
próximo. Já, na segunda, ela terá opção de se ocupar em fazer alguma coisa, como
uma pequena compra ou tomar um café, sorvete ou refrigerante, por exemplo.
Este exemplo ilustra muito bem como uma informação emitida a partir de um
determinado local pode promover uma dinâmica territorial e social significativa,
visto que a informação serve como subsídio para a tomada de decisões diversas e
para que as pessoas se comportem também de forma diferenciada, apropriando-se
71
do espaço da cidade de modo específico, a depender da informação que lhe é
fornecida.
O exemplo do ponto de ônibus com o painel indicativo digital mostra aplicações
práticas do diálogo entre as mídias locativas - que mostram a informação - e
dispositivos de captação - que recebem a informação - é sui generis. Neste caso, o
dispositivo de captação é fixo: o painel digital no ponto de ônibus. E o local, que
passa a informação para sua captação, está em movimento, que é o próprio ônibus.
Esse modelo, em que a informação parte de um local, cujo informante está em
movimento, e cuja informação é captada por um dispositivo fixo é pouco comum.
O que mais se encontra é exatamente o contrário: a mídia locativa é fixa em uma
determinada localidade e dali “dispara” informações para serem captadas por
dispositivos móveis que passam por aquele local.
Entretanto, o paradoxo da localidade e mobilidade, aqui trabalhado, permanece
intacto mesmo neste exemplo, uma vez que as condições de emissor e receptor
primários da informação são invertidas, mas não se descaracterizam, pois mantêm
a estrutura do diálogo entre algo que está em movimento e algo que está fixo, não
apenas localizado, mas vinculado a um determinado espaço físico e territorial.
A essência do que se busca está no fato da percepção de que o diálogo urbano,
proporcionado por esse “novo” ambiente tecnológico digital contemporâneo, é o
núcleo do processo infocomunicacional responsável por significativas
transformações ocorridas nas dinâmicas territoriais e sociais das cidades. Nelas, os
72
cidadãos comuns passam a ter um nível de participação e autonomia cada vez
maior e utilizam o “empoderamento”, oferecido pela nova lógica, em favor de um
coletivo mais crítico e consciente dos seus direitos, ainda que muitas vezes boa
parte desse coletivo ainda esteja de fora do diálogo urbano aqui discutido.
73
DINÂMICAS TERRITORIAL E SOCIAL:
PROCESSOS INFOCOMUNICACIONAIS
NOS CIBERTERRITÓRIOS
Edições
VNI
UCSAL
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
PPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PLANEJAMENTO TERRITORIAL E
DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Para explicar o fenômeno dos processos infocomunicacionais, provenientes do
diálogo das mídias locativas com os dispositivos móveis digitais, foi preciso
identificar e caracterizar, como se viu, as três principais variáveis de análise,
relativas aos três componentes da ambiência tecnológica necessária à emersão do
fenômeno: as mídias vinculadas aos locais - mídias locativas -, os dispositivos
móveis digitais que, conforme foi visto, dialogam com essas mídias através da
captação de informações delas advindas, e, finalmente, as redes de acesso
generalizado, sem fio, ubíquas, que podem ser concretizadas através das
tecnologias Wi-Fi, Bluetooth, RFID, telefonia móvel, dentre outras possibilidades,
e que permitem o diálogo entre as mídias locativas digitais on-line dialógicas e os
dispositivos móveis.
Agora, para explicar como esse diálogo tem influenciado nas dinâmicas
territoriais e sociais das cibercidades, inicialmente se abordará o mais importante
paradoxo que envolve a temática: mobilidade versus localidade.
O paradoxo da mobilidade e localidade
A ambiência das mídias locativas possui duas dimensões distintas: a dos sistemas
baseados em localização os softwares , e o das tecnologias baseadas em
localização os hardwares. A primeira está relacionada com os serviços que
disponibilizam informações, a partir de lugares e objetos. Por exemplo: um jornal
com uma etiqueta QR Code que o remete a um conteúdo na rede. Já a segunda,
75
está relaciona aos equipamentos, ou seja, aos dispositivos, redes e sensores - que
geralmente são agregados aos objetos - que captam as informações.
Por outro lado, as funções pós-massivas das mídias locativas somente emergem
da junção dessas duas dimensões que, ao estabelecerem o diálogo com os
dispositivos digitais, que se encontram engendrados na malha urbana, sustentam o
paradoxo contemporâneo de mobilidade e localidade, o qual, por sua vez, tem
proporcionado as transformações em curso nas relações entre as pessoas e os
espaços, públicos e privados das cibercidades, promovendo acentuadas dinâmicas
no contexto urbano.
O diálogo dos dispositivos móveis com as mídias locativas, através dos
ciberterritórios estabelecidos pelas redes ubíquas, institui esse instigante paradoxo
no contexto das cidades, uma vez que alia em um só momento a localização
relacionada com um lugar, um espaço físico fixo, através da mídia locativa e a
mobilidade relativa ao movimento, proporcionado pelos dispositivos móveis
digitais. É dessa relação paradoxal que surge o processo comunicativo que
promove as dinâmicas territorial e social na cibercidade, tema central deste
estudo.
O paradoxo da mobilidade e localidade é compreendido como possível e também
como essencial para que essas tecnologias se difundam e transformem
significativamente a cidade na atualidade, visto que, se por um lado, as mídias
locativas digitais estão diretamente relacionadas a determinados locais e emitem
76
informações digitais a partir deles, para que
essas informações sejam recebidas,
decodificadas e circulem entre as pessoas, é
preciso que haja um dispositivo móvel que,
ao passar por aquele local, possa
estabelecer um diálogo com a mídia
locativa digital, resultando em um processo
comunicativo interativo e de múltiplas
possibilidades.
Fig. 12 Do território...
A formação dos ciberterritórios
As imagens abaixo ilustram a formação de
uma “camada digital” proporcionada por
uma zona de conexão sem fio agregada ao
espaço físico da cidade. O ciberterritório
seria o produto social e territorial da
intersecção do espaço físico e essa camada,
formada pela rede sem fio abaixo
representada por uma bolha amarela que,
ao permitir conexão aos seus cidadãos, em
movimento, possibilita usos e apropriações
diferenciados desse espaço.
Fig. 13 ...ao ciberterritório
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009.
Manipulação gráfica na Fig.13
realizada pelo autor.
77
Essa camada, na prática, favorece o aparecimento de uma série de novas expressões
das pessoas que ali transitam e convivem, mudando a sua relação com o espaço, não
apenas do ponto de vista físico, mas também simbólico, na medida em que podem
usar dispositivos digitais para funções diversas nesses espaços.
Nas Figs. 14 e 15, a seguir, têm-se a representação simbólica de como as redes sem fio
podem estar gradativamente transformando a cidade em uma cibercidade, na medida
em que agregam camadas digitais, que formam uma espécie de nuvem de conexão
generalizada.
Fig. 14 Da cidade...
Fig. 15 ... a cibercidade.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
Manipulação gráfica na Fig. 15 realizada pelo autor
78
As bolhas vermelhas e amarelas representadas na Fig. 15 simbolizam basicamente
as zonas Wi-Fi, pois se aí fossem representar também as zonas Bluetooth e redes
de telefonia celular, só para citar mais dois tipos de redes representativas,
certamente, a figura teria tantas camadas sobrepostas que ficaria difícil até se
identificar o lugar da cidade que estão localizadas.
Vale ressaltar que a representação através das bolhas é apenas uma forma de
ilustrar, simbolicamente, através de um recurso visual, as camadas eletrônicas que
o território passa a agregar com as zonas de conexões criadas pelas multirredes
sem fio que dão acesso ao ciberespaço. É de suma importância, portanto,
esclarecer que a representação através das bolhas não tem a pretensão de ser
precisa e nem representar fielmente a realidade, mas tão somente criar uma base
visual, que simbolize as zonas de conexões Wi-Fi, para o entendimento do leitor
sobre o fenômeno das redes ubíquas, discutido nesta obra.
Essas camadas digitais são altamente variáveis, uma vez que se trata de redes que
podem ser móveis, como o caso das Bluetooth, que podem ser geradas a partir dos
próprios dispositivos móveis e acompanha-los aonde quer que estejam. Podem ser
sazonais, ou seja, ativadas e desativadas em períodos e horários diferentes, como é
o caso das redes Wi-Fi, mas podem também ter alguma estabilidade maior como é
o caso das redes de telefonia móvel.
79
Essa variabilidade das camadas digitais sobre a cidade que, em última análise, são
as responsáveis pela formação dos ciberterritórios, uma vez que esses surgem
como produto da intersecção desses dois ambientes físico e virtual cria uma
dinâmica territorial e social ainda maior do que se possa prever quando se
imaginam camadas fixas. Isso acontece, pois, as formas e usos do espaço e os
modos de se relacionar e de se apropriar do ambiente da cidade passam a ser ainda
mais variados e flexíveis, uma vez que, além de se basearem no paradoxo da
mobilidade e localidade, no diálogo das mídias locativas com os dispositivos
móveis e, na noção de conexão ubíqua, ainda podem variar de acordo com a
metamorfose característica dos ciberterritórios.
A metamorfose dos ciberterritórios
Uma das premissas que deve ser utilizada para se analisar os territórios híbridos
físico/virtual , aqui chamados de ciberterritórios (CARVALHAL, 2008), ou de
territórios informacionais (LEMOS, 2007a), é a de que esses territórios estão em
metamorfose permanente, provocando uma dinâmica jamais imaginada
anteriormente.
Um ciberterritório, assim como qualquer outro território, não é algo estanque, mas
está em constante movimento. No caso específico do ciberterritório, este se
80
encontra em permanente estado de transformação e sujeito a profundas mudanças
na relação espaço-temporal.
A metamorfose dos ciberterritórios se dá por diversos motivos, dois dos quais são
passíveis de comentários mais intelegíveis. Antes disso, entretanto, é preciso
ressaltar que os ciberterritórios, conforme já visto anteriormente, são formados
pela criação de camadas eletrônicas no espaço físico e que essas camadas
eletrônicas são fruto das múltiplas redes virtuais existentes, como Wi-Fi,
Bluetooth, redes de telefonia celular, dentre outras, que permitem a conexão
ubíqua, generalizada, onipresente, que envolve o usuário em uma “nuvem” de
acessos em todos os lugares da cidade pelos quais circula, permitindo-lhe o uso
do território físico de maneiras flexíveis e diferenciadas.
Algumas dessas redes, como Wi-Fi e Bluetooth, por exemplo, podem não ficar
ativas durante todo o tempo. É o caso das redes fechadas - residenciais ou
empresariais - que se encontram em um determinado bairro ou local da cidade.
Quando um usuário está em sua residência, com o computador e roteador ligados,
a rede está ativa. Quando esse mesmo usuário sai ou viaja, computador e roteador
são desligados e sua rede automaticamente é desativada. O mesmo pode acontecer
com uma rede empresarial. Uma rede Wi-Fi de um supermercado, por exemplo,
muito provavelmente só estará ativa nas horas em que o estabelecimento estiver
em funcionamento e será desativada com o término do expediente.
Ao serem ativadas e/ou desativadas, essas redes modificam o ciberterritório e o
81
reconfiguram, tanto do ponto de vista do espaço infocomunicacional, quanto do
espaço físico, uma vez que essa reconfiguração do espaço infocomunicacional
pode ressignificar o espaço físico para o usuário que aí convive e circula. Esta
seria então a primeira categoria de motivos pela qual o ciberterritório vive em
constante estado de metamorfose e que, devido o seu caráter transitório, se
denominará metamorfose inconstante.
A segunda categoria está relacionada às mudanças de locais, de usuários e
instituições, no espaço da cidade. Uma empresa pode estar instalada em um
determinado bairro da cidade, mas pode mudar-se para outro. Deslocando seus
equipamentos, movem as redes sem fio para outro lugar, o que proporcionará uma
mudança do ciberterritório, tanto na localidade da qual saiu quanto na que está
recém-ocupando para somar novas redes à configuração anterior deste último.
Enquanto na categoria anterior, as mudanças eram apenas espaço-temporais e não
tinham o caráter de permanência ou, pelo menos, de constância na reconfiguração
dos espaços físicos e virtuais, nesta outra categoria, a mutação da rede é de caráter
mais constante ou mesmo permanente, pois não se trata apenas de ativar e
desativar uma rede, em horas e dias diferentes da semana, de acordo com a
conveniência de uso dos serviços proporcionados por elas, mas de alteração de
endereço do estabelecimento residencial ou empresarial , que tende a ser
determinada por intervalos de mudanças muito maiores e, em alguns casos, de
permanência por longos períodos. Por causa disso, esta segunda categoria será
aqui identificada como metamorfose constante.
82
Esse processo permanente de metamorfose dos ciberterritórios pode influenciar
significativamente nas dinâmicas territoriais e sociais de uma cibercidade na
atualidade, uma vez que, como já visto anteriormente, os espaços dessas cidades
são constantemente reconfigurados e até ressignificados por seus
habitantes/usuários, a partir das experiências que vivenciam ao estabelecerem
vínculos com outras pessoas e lugares da cidade, nas suas relações sociais, sejam
elas de cunho político, econômico, afetivo ou de qualquer outra natureza.
Dinâmicas territoriais e sociais promovidas nos ciberterritórios
Falar em território informacional ou ciberterritório, mesmo quando se está
utilizando conceitos já sistematizados por outros autores, exige um esforço
reflexivo bastante acentuado, visto que o termo território sempre remeteu as
pessoas à noção de delimitação de espaço físico e apropriação da terra.
Mas, conforme foi visto, a complexidade dos processos no mundo atual começam
a possibilitar outras formas de abordagem do território. Sobre isso, Carvalhal
(2008, p. 4) observa que:
[...] na medida em que as relações sociais começam a se submeter a
ambientes virtuais, formados por um contingente de informações em um
locus desassociado do espaço geográfico e físico, imagina-se que a noção
de territorialidade, antes só pensada com relação ao material, também
83
pode ser submetida a esses ambientes virtuais, uma vez que está
relacionada a um espaço fidedigno de construção de cultura e de
estabelecimento de relações humanas.
Em função disso, a mesma autora (2008, p. 4) então questiona:
[...] se o território pode ser pensado enquanto espaços apropriados por
atores sociais para o estabelecimento das suas relações, poderia o
ciberespaço também ser pensado como um espaço que abriga essas
relações e, portanto, dar base ao conceito de ciberterritorialidade, não
como algo que está em oposição, mas como um conceito complementar
ao de territorialidade?
E, foi partindo desse questionamento que a autora esboçou o conceito de
ciberterritório utilizado recorrentemente neste trabalho. Muito antes de Carvalhal,
Haesbaert (2002, p. 132) construiu a noção de território-rede que, apesar de não
ser tão específico quanto à hibridez dos territórios físicos e os possíveis territórios
virtuais, estava relacionada ao espaço em que a rede física se localiza e que
possibilita às redes sociais se concretizarem, o que, segundo ele, fortalece o
conceito de território. Essa noção foi defendida também por Souza (1995) e Veltz
(1996).
Mas, ao se tratar das dinâmicas territoriais e sociais possíveis nos espaços
híbridos dos ciberterritórios não se pode deixar de observar que a noção de
mobilidade tem sido a temática central desta nova sociedade, que adere, cada vez
84
mais a ela, ajustando paulatinamente suas características. O número crescente de
celulares por habitante é uma prova concreta dessa aderência que, por sua vez,
transforma significativamente a dinâmica da cidade, uma vez que, quando um
cidadão se comunica em mobilidade, a sua percepção de tempo e espaço é
subjetivada, conforme Licoppe e Heutin (2002), pois ele não consegue sequer
definir o local preciso de onde está falando.
Em mobilidade, durante o processo comunicacional, emissores e receptores
podem estar se distanciando ou se aproximando uns dos outros e,
consequentemente, tornando mais complexa a dinâmica do processo
comunicativo. A comunicação, antes impedida de se estabelecer enquanto se
estava em deslocamento, dirigindo-se de um lugar para o outro, agora acontece de
maneira fluida, sem nenhum impedimento ou razão que possam ser atribuídos ao
fato de se estar em mobilidade.
Se antes uma pessoa podia dizer para outra que não se comunicou porque passou
o dia todo viajando para outro estado ou país, por exemplo, hoje, isso não
acontece, pois o fato de se estar em deslocamento ou em mobilidade em nada
pode atrapalhar as possibilidades existentes de comunicação, no sentido mais
amplo, envolvendo aqui não só recepção e emissão de informações, que são
potencializadas pela conexão ubíqua, que por sua vez, são possibilitadas pelas
redes sem fio existentes nas cibercidades, como as redes Wi-Fi, Bluetooth, rede
de telefonia celular, dentre outras , bem como pela produção e a distribuição de
85
conteúdos próprios, elaborados através de dispositivos digitais criados para essa
finalidade.
É importante refletir se a possibilidade de conectar-se, através das zonas Wi-Fi
e/ou outras redes sem fio, em todas as partes das cidades, trouxe à população
outras vivências do espaço urbano, proporcionando significativas mudanças em
sua relação com o território, visto que os ambientes informacionais, criados para o
estabelecimento do diálogo entre os dispositivos móveis e as mídias locativas
digitais no espaço da cidade, não são visíveis aos olhos humanos.
Apesar de acontecerem a partir de ambientes invisíveis aos olhos humanos, as
transformações que as tecnologias informacionais digitais têm trazido para as
cidades são notórias. Pode-se identificá-las, não apenas nos agrupamentos de
pessoas em torno das zonas Wi-Fi, sobretudo naqueles locais em que a conexão é
aberta e gratuita para acesso público, mas também nas trocas de SMS - short
message service, entre as pessoas que estão ocupando espaços da cidade, nas
praças, nas paradas de ônibus ou em mobilidade, durante o deslocamento entre um
lugar e outro; nas conexões em redes Bluetooth que, dentre outras formas de
aplicação, são muito utilizadas pelas empresas em suas propagandas e ações
promocionais nos espaços públicos e nas etiquetas RFID, que agregam conteúdo,
os mais diversos, aos locais através de anotações urbanas e da realidade
aumentada. Além disso, as experiências em geoprocessamento e em mapeamento
dos espaços urbanos, para fins de controle e vigilância, bem como de contravigilância e de defesa da invasão da privacidade, são formas de inserção dessas
86
tecnologias no âmbito das cidades, que devem ganhar interesse e importância
cada vez maior no planejamento territorial para o desenvolvimento urbano.
Diante das possibilidades, propiciadas pela mobilidade da conexão sem fio, em
banda larga, a relação do cidadão com o espaço urbano pode ser amplamente
ressiginificada, visto que a sua percepção muda significativamente, como foi
visto, quando se pode consumir, produzir e distribuir informações enquanto se
está em movimento. Essa perspectiva torna as relações sociais mais ativas,
enquanto as pessoas se deslocam no espaço público, o que torna ainda mais
complexa a dinâmica territorial e a análise sobre desenvolvimento nas grandes
cidades.
As dinâmicas territoriais e sociais também são promovidas pela possibilidade da
realização de ações interativas de comunicação a partir de um determinado lugar,
sejam através de equipamentos públicos, como praças, cabines telefônicas, etc.;
através de instituições públicas ou privadas como hospitais, escolas, etc., sejam
em espaços privados como shoppings, centros comerciais, stands de vendas, bares
e restaurantes, para os portadores de dispositivos móveis digitais, como GPS,
notebooks, palms, smartphones e celulares, de uma forma geral.
As ações de comunicação, por sua vez, podem contemplar todos os tipos de
conteúdo, desde atitudes ativistas ambientais até divulgação de promoções, peças
de campanhas publicitárias etc., sempre de forma criativa e limpa, do ponto de
vista da poluição sonora e visual, visto que as ações de comunicação, realizadas
87
através das mídias locativas digitais, geralmente são visíveis apenas para quem
participa delas, o que as enquadra entre as ações com usos e práticas
comunicacionais mais adequados para o momento atual.
Com base nesta constatação de que os territórios informacionais são invisíveis ao
olho humano e na tentativa de tornar isso algo mais próximo das pessoas, um
espanhol das Astúrias, inventou um telescópio que permite visualizar no espaço
da cidade as zonas Wi-Fi com colorações diferentes para zonas abertas e fechadas
(LEMOS, 2009). As ilustrações utilizadas nesta obra inspiram-se nesta idéia de
representação das zonas Wi-Fi abertas e fechadas por meio de cores diferenciadas.
Independente de constatação visual, essas novas possibilidades de exploração do
espaço físico da cidade podem estar alterando, tanto as relações práticas quanto as
psicológicas, que ocupam o imaginário individual e coletivo dos habitantes das
cidades e que, por sua vez, terminam por criar novos traçados no espaço público.
Em uma cibercidade - correspondente a territórios de grandes meios urbanos -, há
muito pouca possibilidade de se encontrar um local que não esteja inserido no
contexto da territorialidade informacional ou da ciberterritorialidade. Isto porque,
quando o local não possui nenhuma zona Wi-Fi ou Bluetooth, muito
provavelmente está coberto pela rede de telefonia celular. Este, por sua vez,
permite a conexão e o diálogo entre dispositivos móveis e mídias locativas
digitais e, portanto, a conexão ubíqua, com a qual a cibercidade se articula e
88
proporciona aos seus usuários/cidadãos o acesso a uma série de serviços baseados
nas tecnologias digitais que, muitas vezes, flexibilizam o uso dos espaços
urbanos, através de algumas possibilidades, tais como:
a) Acesso nômade à Internet subverte a noção de que, para estar conectado ao
ciberespaço é preciso estar preso a fios e, consequentemente, a espaços
físicos específicos, como residências, escritórios, lan houses etc. O acesso
nômade à Internet tira o usuário, como o adolescente, por exemplo, de um
espaço físico fixo e o leva para as praças; tira o trabalhador do escritório e o
leva para os shoppings; tira o cidadão de casa e o leva para a rua, espaços de
convivência e relações sociais amplas. O acesso nômade, portanto, aniquila
o discurso de que as tecnologias digitais foram adotadas para virtualizar
tudo e tornar as relações sociais superficiais e efêmeras;
b) conectividade permanente com os telefones celulares as comunicações
antes não permitidas, quando as pessoas estavam em movimento ou em
lugares remotos, onde não se tinha disponível linhas de telefone fixo, hoje,
não só são permitidas, como muitas vezes potencializadas, visto que, os
celulares, na atualidade, são dispositivos completos, que possuem múltiplas
mídias e funções massivas e pós-massivas;
c) objetos que passam informações aos dispositivos essa função pós-massiva
das mídias locativas digitais também acaba com o discurso de que tudo se
desterritorializaria a ponto fazer a geografia desaparecer paulatinamente,
pois os espaços físicos e os lugares perderiam, cada vez mais, sua
importância. Com essa possibilidade de diálogo com diferentes locais,
89
promovido pelas tecnologias informacionais digitais, o lugar ganha força,
pois passa a ser locativo, visto que as informações agora partem dos lugares
e dos objetos que estão nele contidos e não mais de um mundo virtual
desterritorializado e desmaterializado, sem vínculo com um espaço físico;
d) etiquetas de radiofreqüência, como RFID, que permitem o tracking de
objetos possibilita o monitoramento dos ambientes e moldam a informação
de acordo com a necessidade percebida naquele momento, ou seja,
permitem que objetos e/ou equipamentos realizem ações personalizadas, a
partir da leitura do ambiente e de uma necessidade específica;
e) equipamentos com Bluetooth que criam pequenas redes de
compartilhamento tornam possível se compartilhar músicas e vídeos, bem
como outros tipos de arquivos, gratuitamente, no ônibus, na estação de
metrô, na praça de alimentação do shopping, na escola ou faculdade. Essas
são algumas possibilidades criadas pelas redes Bluetooth no campo
individual. Já no âmbito empresarial, essas redes podem servir para repassar
informações publicitárias, informações utilitárias, como forma de
estabelecer relacionamentos com clientes ou usuários, dentre muitas outras
possibilidades. Essa possibilidade pode mudar, tanto o comportamento do
consumidor, estimulando-o a comprar um produto ou serviço, quanto
conscientizar um cidadão, através de uma convocação para ações de
mobilização política ou social, por exemplo.
Até agora se fez recorrentes referências ao ambiente infocomunicacional dos
ciberterritórios ser invisível aos olhos humanos, visto que essa característica é
90
muito importante para a sua análise. Por outro lado, no entanto, não se comentou
que há uma questão, que envolve essas tecnologias, e que é passível de
observação visual por parte dos seus analistas. Se o ambiente de acesso, e as
próprias mídias locativas, podem ser invisíveis, os equipamentos ou dispositivos
móveis fazem, cada vez mais, parte da paisagem urbana. É cada vez mais comum
ver pessoas usando laptops, palmtops, smartphones, celulares etc. em lugares
públicos.
O uso desses dispositivos é essencialmente privado, apesar de estar sendo
utilizado a partir do espaço público, o que provoca discussões sobre a
possibilidade de se criar uma cultura de privatização do espaço público, à medida
em que ele é apropriado para o uso privado. Muito mais do que a mera utilização
do espaço público para fins privados, o que se discute, neste trabalho, é a
apropriação do referido espaço, pois, nesta relação de uso das tecnologias digitais
no espaço da cidade, há a possibilidade do cidadão nele intervir, realizando
anotações, “aumentando” a realidade, apropriando-se do espaço de forma
personalizada, de uma maneira possível, anteriormente, apenas daquilo que fosse
de sua propriedade.
Se, de um lado, o cidadão passou a ter autonomia para intervir no espaço público,
reconfigurando-o e ressignificando-o de modo personalizado, ele também está
sendo atingido, conforme Lemos (2009) fez notar, pois, está abrindo mão de parte
da sua privacidade, deixando rastros pela cidade. Os habitantes das grandes
cidades, que também são usuário dessa tecnologia, podem ser rastreados,
91
monitorados e permitirem a recuperação de seu perfil, com riqueza de detalhes,
quer de caráter pessoal, econômico, social, cultural e em muitos outros aspectos.
É nesse sentido que Deleuze e Guattari (1986) observaram que as sociedades
contemporâneas estão sujeitas a processos de territorialização e
desterritorialização constantes e que os espaços urbanos, segundo Mitchell (2003),
Horan (2000) e Meyrowitz (2004), se reconfiguram permanentemente. As
dinâmicas territoriais e sociais, promovidas pela nova ambiência tecnológica
digital são criadoras de uma nova sociedade, com características ainda não
totalmente desveladas, que carecem de muitas reflexões da comunidade científica
que se propõe a estudá-las.
Percebe-se isso de forma contundente, quando se entra em contato com a
“sociologia da mobilidade” (URRY, 2000, 2003) que levanta muitas questões,
ainda sem respostas e se tenta sintetizar a noção de “computação ubíqua”, de
Weiser (Weiser, 1991, p. 1). Esse autor, desde 1991, já profetizava que os
computadores tinham a tendência a subverter o antigo paradigma homem versus
máquina e levar em consideração o ambiente humano natural, pois aos poucos se
dissolveriam, observando assim que “as tecnologias mais profundas são aquelas
que desaparecem. Elas se entrelaçam ao tecido da vida cotidiana até se tornarem
indistinguíveis”.
Hoje, quase vinte anos depois, a noção de “computação ubíqua”, se traduz, na
92
prática, em conexão ubíqua, da qual este estudo trata de forma recorrente, que
permite às pessoas o uso de dispositivos digitais - o que Weiser chamou de
computador - de forma generalizada em toda a extensão territorial das
cibercidades. É quase a volta da cultura nômade, ou como diria Meyrowitz (2004,
p. 25), os habitantes das cidades contemporâneas são “nômades globais na savana
digital”.
A noção de territorialidade informacional (LEMOS, 2007a) aqui empregada,
apesar de toda a sua relevância no contexto atual, é um conceito ainda
subestimado, ou mesmo desconhecido, pela maioria dos técnicos e
administradores públicos, o que, via de regra, ocasiona uma desconsideração de
aspectos e variáveis importantes na compreensão do modelo de cidades baseadas
nas tecnologias digitais.
Nota-se que este movimento crescente de transformação e ressignificação dos
espaços das cidades, por este não seguir uma linha tradicional de planejamento,
oriunda de uma visão tecnocrática de projeção urbanística, parece gerar nos
gestores públicos uma certa perplexidade, haja vista que os mecanismos habituais
de regência da dinâmica social das cidades também parecem não ser suficientes
ou adequados diante do quadro que, gradativamente, vai se configurando.
Assim, se antes as bases para o planejamento e o desenvolvimento urbanos
excluíam, na maioria das vezes, o olhar do cidadão comum, hoje, com a
93
ampliação das possibilidades reais de intervenção, de registro de trajetórias deste
cidadão no contexto e na dinâmica das cidades, mais cuidados e domínios de
saberes específicos são exigidos para a consecução de ações mais efetivas,
revelando a necessidade premente de se considerar tais expressões comuns como
coadjuvantes do planejamento urbano.
Os gestores do poder público precisam ter em mente que graças ao advento das
tecnologias informacionais digitais, os cidadãos comuns podem fornecer
informações a um local específico, delineando novas formas e criando novas
funções para os equipamentos públicos existentes no espaço urbano. Na prática,
isso quer dizer que os gestores do poder público precisam se dar conta de que os
espaços públicos necessitam de adaptações às novas demandas sociais
estabelecidas pela relação cidade-cidadão, que as tecnologias informacionais
digitais têm potencializado. As transformações que vêm acontecendo, em grande
medida, estão se dando através de um processo natural de adaptação nãoplanejada e não-ordenada da apropriação pelos cidadãos dos espaços públicos
para o uso dessas tecnologias.
Sobre isso, Lemos (2007a, p. 123) observa que:
O desafio é criar maneiras efetivas de comunicação e de reapropriação
do espaço físico, reaquecer o espaço público, favorecer a apropriação
social das novas tecnologias de comunicação e informação e fortalecer a
democracia contemporânea.
94
Percebendo essa tendência, observada por Lemos (2007a), e se apropriando desse
conhecimento, os gestores das cidades contemporâneas têm a possibilidade de
promover o desenvolvimento socioeconômico, planejando o uso dessas
tecnologias nos espaços públicos. Essas tecnologias têm sido recorrentemente
escolhidas pela indústria da comunicação e da informação, como os principais
dispositivos de convergência das mídias contemporâneas, bem como utilizadas
com grandes méritos para soluções urbanas voltadas para questões de alta
relevância e impacto social como:
a) na segurança câmeras digitais instaladas em espaços públicos; GPS em
carros e caminhões;
b) no transporte GPS e câmeras digitais instaladas nos ônibus;
c) na saúde exames e procedimentos feitos com aparelhos de precisão digital;
d) na educação uso de computadores e outros dispositivos digitais no âmbito
escolar e de forma mais significativa no ensino à distância.
Essas tecnologias pós-massivas possuem um grande poder de difusão de
conteúdos informacionais, em tempo real e em escala planetária, e possibilitam a
divulgação de acontecimentos e fatos ocorridos no âmbito privado para o público
e vice-versa, graças a um conjunto de características que congregam, ao mesmo
tempo, mobilidade e conectividade, sem perder a relação com o local, a mais
importante referência para o cidadão nas suas relações com a cidade.
Assim, percebe-se que os formatos de gestão pública mais sensíveis ao conjunto
95
de demandas e circunstâncias estabelecidas pela nova relação cidade-cidadãos,
seriam, em tese, mais eficazes, uma vez que promoveriam possibilidades efetivas
de respostas coletivas, convergentes e em sintonia com a expectativa da maioria
dos habitantes, através de um processo de reavaliação contínua dos modelos
operacionais de ação, alargando consequentemente a visão sobre o campo de
práticas sociais emergentes ou derivadas de tal configuração.
A gestão pública, portanto, diante de tal constatação, pode estabelecer
formalmente um ambiente propício para que a população informalmente se
permita participar da construção do seu espaço de convivência social, por meio da
expressão proporcionada pelas tecnologias digitais de função pós-massiva. Isso
porque, segundo Lemos (2007a, p. 125), estas tecnologias “insistem em processos
de conversação, de interações, de comunicação...”, mas também permitem e
potencializam novas formas de controle e vigilância na intersecção dos espaços
territoriais físicos e informacionais. Essas características, de certa forma, podem
garantir a atuação do Estado na sua função reguladora, sem necessariamente
coibir a dimensão democrática potencializada pelas tecnologias digitais no
processo de desenvolvimento das cidades contemporâneas.
Se, por um lado, as mídias locativas proporcionam ao cidadão, tanto a
possibilidade de escrita, quanto a de releitura do espaço urbano, como forma de
apropriação e ressignificação das cidades, através de funções infocomunicacionais
diversas, como realidade aumentada móvel, tracing/mapping, geotags e anotações
urbanas, por outro, também podem ter fins institucionais, comerciais ou mesmo
96
de regulação por parte do Estado, uma vez que “são utilizadas para agregar
conteúdo digital a uma localidade, servindo para funções de monitoramento,
vigilância, mapeamento, geoprocessamento (GIS), localização...” (LEMOS,
2007a, p. 2).
A função reguladora do Estado e as características libertárias das mídias pósmassivas, ainda que se contraponham, terão que conviver em um ambiente em
que as contraposições podem ser exacerbadas, mas também constantemente
monitoradas e ressignificadas. Se, conforme Lemos (2007a, p. 12), “o andar na
ciberurbe está associado às mídias locativas como apropriações do espaço
urbano”, certamente, a cibercidade não pode deixar de ser administrada e pensada
cada vez mais estrategicamente pelo poder público, senão pelas potencialidades
que tais mídias trazem para os seus gestores, pelo “empoderamento” que
proporciona aos cidadãos comuns.
A percepção desse “empoderamento” por parte das pessoas que utilizam as
tecnologias digitais, e têm todo o instrumental para se apropriar dos seus
potenciais, pode ser constatada nos resultados da pesquisa quantitativa realizada,
conforme segue.
A percepção dos usuários brasileiros da Internet sobre a nova ambiência
tecnológica digital
97
Para tentar mensurar a difusão das tecnologias informacionais digitais,
relacionadas com o paradoxo da mobilidade e localização, que propõe o diálogo
urbano em discussão, a pesquisa realizada pela Internet com usuários de todo o
Brasil, cujo perfil da amostra foi capítulo anterior, utilizou-se as respostas dadas à
questão aberta relativa ao conceito coletivo de mídia locativa digital, quando se
procurou investigar o conhecimento e o uso, por parte dos “internautas” sobre as
suas funções pós-massivas, que vêm impondo transformações significativas aos
espaços de convivência e às relações sociais estabelecidas no âmbito das cidades.
Foram ao todo 1.230 questionários respondidos. O perfil da amostra é formado
por usuários da Internet, e o questionário foi aplicado através de formulário online, disponibilizado em um endereço Web, divulgado nas redes sociais, listas de
discussões e na lista de notícias Orgulho de Ser RP, que possui cerca de 9 mil
membros.
Gráfico 2 Pessoas que possuem
dispositivos móveis com acesso a Internet
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
98
Das 1.230 pessoas que responderam ao questionário, 963, que correspondem a
78% do universo pesquisado, afirmaram possuir algum dispositivo móvel digital
que lhes dava acesso à Internet, contra apenas 267, ou 22%, que ainda não
possuíam nenhum, conforme o Gráfico 2.
É importante observar que esse é um ambiente em que a realidade pode mudar de
forma muito rápida e que neste momento o percentual de pessoas, que possuem
um dispositivo com acesso a Internet no Brasil, já pode ser muito maior que em
setembro de 2009, quando esta pesquisa foi realizada.
No senso comum é natural se pensar que o acesso às tecnologias digitais está
diretamente ligado ao nível de escolaridade que no Brasil também está
diretamente ligada ao nível econômico das pessoas. Esse, entretanto, não foi um
componente marcante nas respostas ao questionamento sobre o acesso aos
dispositivos móveis digitais. Em todos os níveis de escolaridade, o acesso é
generalizado, conforme se pode observar no quadro comparativo abaixo, não
obstante o nível superior completo tenha alcançado o maior índice de acesso,
atingindo mais de 75% entre as respostas positivas.
99
Das 963 pessoas que retornaram as indagações afirmando possuir algum
dispositivo móvel digital, que dá acesso à Internet, conforme podia se prever, o
celular é o mais difundido e está na liderança com 736 respostas, ou 45% do total
de pessoas consultadas. O segundo dispositivo mais popular é o laptop, com 534
respostas positivas, ou 32%, conforme o Gráfico 3. Essa pergunta possibilitou
múltiplas escolhas.
Gráfico 3 Tipos de dispositivos
móveis utilizados para acesso a Internet
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
Esse resultado confirma o que a literatura aponta a respeito do celular como o
dispositivo de maior convergência de funções e mídias pós-massivas. Confirmam
também as hipóteses de pesquisa desta obra que indicam que nas cibercidades o
uso do celular é generalizado e que esse dispositivo dá base para as novas
dinâmicas territoriais e sociais na atualidade.
100
A prática de compartilhamento de arquivo, passíveis de mobilidade, através da
tecnologia Bluetooth, também foi avaliada. Esta prática é apontada neste trabalho
como uma das tecnologias que provocam transformações no uso do espaço urbano e
na forma que as pessoas têm se apropriado da cidade para as suas vivências.
As pesquisas on-line apontam para um nível alto de utilização da tecnologia
Bluetooth, 964 pessoas, ou 78% dos entrevistados, afirmam utilizar a tecnologia
para compartilhamento de arquivos multimídia no espaço da cidade, sendo que
deste percentual 25%, que corresponde a 302 pessoas, responderam que usam o
Bluetooth frequentemente, 23%, que somam 284 pessoas, usam a mesma
tecnologia de vez em quando ou moderadamente e, 378 pessoas, que representam
30% do universo de pessoas sondadas, usam pouco ou raramente. Esse resultado
confirma a hipótese de que as redes ubíquas vêm promovendo uma intensa
dinâmica nos ciberterritórios ou territórios informacionais presentes no espaço das
cibercidades. Apenas 20 dos 1.230 ”internautas” que participaram da enquête
disseram não conhecer a tecnologia Bluetooth, o que representa apenas 2% das
pessoas que responderam à pesquisa.
Gráfico 4 Uso da tecnologia Bluetooth
para o compartilhamento de arquivos
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
101
O nível de escolaridade, ao contrário do que aconteceu com os dispositivos
móveis de acesso a Internet, que não influenciou, nem positiva nem
negativamente nos resultados do seu uso, o compartilhamento de arquivos através
da tecnologia Bluetooth é maior entre os usuários de níveis mais baixos de
escolaridade, apesar do uso entre aqueles de nível superior completo, incluindo
especialização, que predominam na faixa etária entre 25 e 35 anos, também
atingirem níveis bastante altos, conforme Tabela comparativa abaixo:
Tabela 2 Comparação do uso do Bluetooth entre os níveis de escolaridade.
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
102
Quando se trata do uso das redes Wi-Fi para o diálogo das mídias locativas e
dispositivos móveis digitais, constata-se que essa tecnologia está bem mais
difundida do que se costuma imaginar no senso comum. A maioria significativa,
836 pessoas, que representam o percentual de 68% das pessoas consultadas, de
acordo com o Gráfico 5, utilizam as redes Wi-Fi para acessar a Internet quando
está em movimento pela cidade.
Gráfico 5 Uso da tecnologia Wi-Fi, para acesso à Internet, nos espaços da cidade
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
Das 1.230 pessoas, que responderam o questionário, 350 delas, que representam
mais de um quarto do universo sondado, ou seja, 28,5%, conforme pode ser
constatado no Gráfico 6, já percebem espontaneamente a noção de ubiquidade das
redes na atualidade e afirmam procurar sempre redes Wi-Fi ao se deslocarem pela
103
cidade, sabendo ser muito provável encontrar uma rede aberta disponível para
acesso, sobretudo, nos lugares da cidade que possuem concentrações
consideráveis de pessoas e instituições.
Gráfico 6 Lugares de onde costuma acessar redes Wi-Fi
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009
Possibilitando-se às pessoas estar conectadas, a partir de qualquer lugar, as redes
sem fio, como as redes Wi-Fi, podem acentuar significativamente as dinâmicas
territorial e social, na medida em que promovem o que aqui se convencionou
chamar de diálogo urbano, que acontece entre as mídias locativas de quarto nível,
classificadas como mídias locativas digitais on-line dialógicas, e os dispositivos
móveis digitais. Esse diálogo midiático urbano, muitas vezes, modifica o traçado
104
que as pessoas realizam nos espaços públicos e privados da cidade, podendo,
inclusive, influenciar nos pontos de concentração, ou dispersão de pessoas em
determinados lugares, transformando as relações das pessoas com os lugares pela
ausência ou presença de uma rede de acesso nesses lugares.
Gráfico 7 Nível de importância atribuída a um lugar que possui uma rede Wi-Fi
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009
Mais da metade dos usuários questionados, afirmou que é essencial ou importante
um lugar possuir uma rede Wi-Fi. Foram 623 pessoas, que representam mais de
50% do universo de 1.230 participantes da pesquisa, uma parcela significativa e
decisiva para a constatação de que as dinâmicas territoriais e sociais estão sendo
profundamente alteradas pelo ambiente tecnológico, uma vez que o
comportamento da população, dentro do espaço da cidade, também tem sido
105
alterado a partir do uso das tecnologias móveis digitais e do seu diálogo com as
mídias locativas.
Também corrobora com a noção de importância da tecnologia Wi-Fi, constatada
acima, os resultados de outras duas questões. A primeira é a que diz respeito à
difusão da tecnologia no âmbito da cidade e a sua consequente assimilação pela
população. Neste caso, 826 pessoas, que representam um percentual de 67% do
universo de pessoas que responderam a pesquisa, afirmaram que conheciam
algum lugar da cidade que possui uma zona Wi-Fi, contra 404 pessoas, ou 33%,
que não conhecia, conforme se constata no Gráfico 8.
Gráfico 8 Totais de pessoas que conhecem lugares que possuem redes Wi-Fi na cidade
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
106
A segunda questão, que confirma a noção de importância que a tecnologia Wi-Fi
ganha no contexto da cidade, em que as pessoas buscam conexão permanente,
mesmo quando estão em movimento, é a questão que diz respeito à decisão por ir
a um lugar por este possuir uma rede Wi-Fi. Os resultados da pesquisa indicam
que ter ou não uma rede de acesso disponível nos dias atuais pode representar,
muitas vezes, a presença de algumas pessoas em determinados lugares, uma vez
que um número cada vez maior de usuários prioriza freqüentar espaços que
possuem acesso Wi-Fi, ou outras formas de acesso sem fio, que lhes permita estar
conectados enquanto realizam outras atividades, sejam elas relacionadas ao
trabalho ou ao entretenimento.
Gráfico 9 Opção por ocupar um espaço devido à presença de rede Wi-Fi
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
107
179 pessoas, que representam cerca de 15% dos que responderam às questões de
pesquisa, conforme se pode contatar no Gráfico 9, afirmaram que podem deixar
de ir a algum lugar, caso esse lugar não possua uma rede de acesso Wi-Fi
disponível que permitam conexão. Esse número representa uma marca muito
importante para se pensar a cibercidade, pois, mesmo sendo apenas 15% do
universo de usuários pesquisados, já pode constituir um forte indício de que as
pessoas começam a se comportar e a ocupar os espaços da cidade a partir das
referências tecnológicas do ambiente, optando por um lugar simplesmente porque
este vai lhe permitir conexão e comunicação permanente com a sua rede social de
relacionamento.
Tabela 3 Comparativa do nível de importância do acesso Wi-Fi
com a opção por ir ou não a um lugar por causa desta tecnologia.
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
Ao se comparar as respostas que dão importância a um lugar que possui rede Wi108
Fi com as respostas vinculadas a decisão de ir ou não a um lugar por este possuir
uma rede Wi-Fi, se percebe que metade dos usuários que apontaram ser
indispensável o acesso Wi-Fi nos lugares que frequentam, afirmam que deixariam
de ir a esses lugares se não dispuserem da tecnologia. E dentre os que atribuíram
status de muito importante ao Wi-Fi, quase 25%, também deixaria de ir a um lugar
que não oferece o serviço, conforme pode se observar Tabela 3.
A cidade, na sua complexa dinâmica, que a leva a adaptações e readaptações
constantes, já está se configurando segundo as necessidades de comunicação em
mobilidade requerida pelos cidadãos contemporâneos. A tecnologia Wi-Fi já está
bastante difundida e é muito difícil encontrar um local que não seja coberto por
uma rede Wi-Fi nas grandes cidades nos dias atuais. A difusão das tecnologias de
acesso sem fio não chegou apenas para o sistema Wi-Fi, mas também para o
Bluetooth e outras tecnologias que possibilitam a comunicação em mobilidade e o
compartilhamento de informações entre pessoas e objetos no espaço da cidade,
como, por exemplo, as redes de telefonia móvel celular.
Em uma comparação direta entre as tecnologias Bluetooth e Wi-Fi, no espaço da
cidade, verifica-se que o nível das suas utilizações são proporcionais, ou seja,
quem usa Wi-Fi tende a usar o Bluetooth também. Na pesquisa realizada, dos
1.230 “internautas” participantes, 302, cerca de 25%, disseram utilizar o Bluetooth
frequentemente. Destes 302, 243, ou aproximadamente 80% destes, também
responderam que costumam utilizar o acesso Wi-Fi. Outras 284 pessoas, que
representam 23% do universo de participantes da pesquisa, responderam que
109
utilizam o Bluetooth moderadamente. Destes, 172, ou quase 60% dos 284,
também afirmaram que utilizam o acesso Wi-Fi. E dos 378 usuários que
responderam que utilizam pouco ou raramente o Bluetooth, 263, que representam
mais de 70% desses 378, também utilizam o Wi-Fi para acessar a Internet quando
está em movimento no espaço da cidade (vide Tabela 4).
Tabela 4 Comparação de uso entre tecnologia Wi-Fi e Bluetooth
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
O uso proporcional das duas tecnologias pode ser um indicativo de que elas são de
ampla difusão entre os usuários sondados e, por isso mesmo, são utilizadas pela
maioria dos participantes da pesquisa, apesar do maior índice de concentração do
Bluetooth estar no uso raro da tecnologia pelos seus usuários, conforme se pode
verificar no Gráfico 4, que aponta o uso raro do Bluetooth com 30%, contra 25%
do uso frequente e 23% do uso moderado.
110
Alem das tecnologias Wi-Fi e Bluetooth, buscaram-se informações sobre o uso da
tecnologia GPS, para conhecer o estado de sua difusão no universo pesquisado.
Notaram-se diferenças em relação às outras tecnologias tratadas até o agora.
Apenas uma minoria de 29 pessoas, ou seja, 2% do público sondado, afirma não
conhecer a tecnologia. A maioria, composta por 1.201 pessoas, ou 98%, diz
conhecer a tecnologia.
Destas 1.201 pessoas que afirmam conhecer a tecnologia, um universo de 1054
pessoas, que corresponde a cerca de 86% do total dos que conhecem a tecnologia,
afirmam que não a usa ou a utilizam raramente. Apenas 69 pessoas, ou cerca de
6% dos participantes da pesquisa, afirmaram utilizar frequentemente e 78 pessoas,
outros 6%, utilizar moderadamente o GPS para se localizar dentro do espaço da
cidade, conforme pode se constatar no Gráfico 10, apresentado a seguir:
Gráfico 10 Uso da tecnologia GPS para localização no espaço da cidade
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
111
Esse resultado aponta para uma difusão ínfima da tecnologia GPS no cotidiano dos
habitantes das cidades brasileiras. O GPS, em suas diversas aplicações, tem
potencial para promover grandes transformações no âmbito da cidade, influenciando
fortemente na sua dinâmica, ajudando as pessoas e instituições a facilitarem algumas
tarefas que se tornaram muito complexas, dado o crescimento e o desenvolvimento
desordenados experimentados pelas cidades nos últimos anos. É uma das
tecnologias que serve de base para o desenvolvimento da realidade aumentada no
ambiente dos dispositivos móveis.
Comparando com o uso do Bluetooth, por exemplo, o uso diminuto do GPS se
evidencia. Enquanto 20,3% dos usuários nunca recorreram à tecnologia Bluetooth,
quase 75% também nunca utilizaram o GPS. Com esse resultado, ao contrário do
que acontece quando o Bluetooth é comparado ao uso do Wi-Fi, chega-se à
constatação de falta de proporcionalidade e direcionamento no uso das duas
tecnologias por parte da população pesquisada.
Ao inverter a relação quanto ao maior uso, entretanto, dos 78% dos usuários que
responderam ao questionário que afirmam utilizar o Bluetooth, seja de forma
freqüente, moderada ou raramente, apenas 34% utilizam também o GPS, sendo que a
grande maioria dos que utilizam esta última tecnologia indica um uso raro, conforme
pode ser visto na Tabela 5.
112
Tabela 5 Comparação do uso da tecnologia GPS com o uso do Bluetooth
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
Se comparado com o uso da tecnologia Wi-Fi, o baixo uso do GPS também é
evidenciado. Dos 836 “internautas”, ou 68%, que afirmaram utilizar o acesso WiFi para suas conexões em movimento, em torno de 47%, também utilizam o GPS.
Deste último percentual, 31% usa o GPS raramente, 9% moderadamente e apenas
cerca de 7% usa a tecnologia com frequência.
Se se comparar o não-uso das tecnologias pelos participantes da pesquisa,
encontra-se também uma diferença considerável, que acentua ainda mais a noção
de pouca difusão do GPS entre os usuários da Internet. Das 394 pessoas, ou 32%
do total de participantes, que responderam que não utilizam ou não conhecem a
113
tecnologia Wi-Fi, a maioria absoluta, cerca de 30%, também não utiliza o GPS, o
que termina por estabelecer um padrão de perfil de usuário pouco envolvido com
essas tecnologias. O contrário não se aplica, uma vez que das 762 pessoas, ou
62% dos participantes da pesquisa, que afirmam não utilizar ou não conhecer a
tecnologia GPS, apenas 340, aproximadamente 28%, também não utilizam o WiFi como meio de acesso em mobilidade, conforme se pode notar na Tabela 6, que
faz um comparativo do uso das duas tecnologias.
Tabela 6 Comparação de uso da tecnologia GPS com o Wi-Fi
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
Outra tecnologia sondada foi a QR Code, que ainda é desconhecida pela maioria
absoluta dos que responderam a pesquisa, apesar de ser uma tecnologia já bastante
difundida no ambiente empresarial.
114
Tem sido recorrentemente utilizada em substituição ao antigo código de barras,
devido a sua grande capacidade de armazenamento de informações. Apenas 236
pessoas, que representam 19% do universo sondado afirmam conhecer a
tecnologia, contra 994, ou 81%, que nunca ouviu referências a ela.
No conjunto, todas as tecnologias sondadas e apresentadas até aqui, obtiveram
índices baixíssimos de desconhecimento por parte do público pesquisado. A única
que fugiu a regra foi a etiqueta QR Code. O Bluetooth teve 1,6% de
desconhecimento, o Wi-Fi 0,8% e mesmo o GPS, que apresentou um baixo
percentual de utilização, teve apenas 2,4% de desconhecimento, contra 81% de
desconhecimento sobre o QR Code.
Gráfico 11 Grau de conhecimento
sobre a tecnologia QR Code
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
115
Esta tecnologia se operacionaliza a partir de etiquetas presas a objetos, peças,
produtos diversos e lugares que ficam vinculados a um conteúdo multimídia
disponível na rede, como uma espécie de link off-line. Como já existem muitos
veículos de informação de massa, como jornais diários e revistas, que utilizam
esse recurso como forma de agregar mais conteúdo a uma determinada notícia que
é limitada pelo espaço físico da mídia analógica impressa, a etiqueta que é
utilizada para esse fim é reconhecida por algumas pessoas que, quando sondadas
sobre isso, dizem recordar de tê-la visto em algum lugar. Isso foi confirmado pelo
resultado da questão que verificou o reconhecimento da etiqueta QR Code,
conforme pode se verificar no Gráfico 12, a seguir.
Gráfico 12 Nível de reconhecimento da etiqueta QR Code
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
116
O percentual de pessoas que afirmaram já ter visto a etiqueta QR Code em alguma
ocasião é consideravelmente maior do que aquelas que dizem conhecer a
tecnologia. Enquanto o percentual dos que dizem conhecer a tecnologia QR Code
é de 19% (Vide Gráfico 11), o percentual de pessoas que reconhecem a etiqueta
sobe para 36%, o que mostra que, apesar de pouco conhecida, a tecnologia vem se
difundindo e pode crescer nos próximos anos, sobretudo, pelo seu potencial
interativo e de agregação de informações adicionais a objetos e lugares.
O QR Code é uma das tecnologias que permite o diálogo urbano acontecer na sua
plenitude, ou seja, na última escala da interatividade proposta por Lemos (1997).
Possibilita o diálogo bidirecional do cidadão com o seu ambiente de convivência
na cidade. É uma tecnologia que ao fazer a completa interface do território físico
com o ciberterritório, permite ao seu usuário a relação, não apenas de
contemplação dos espaços da cidade, mas de intervenção, tanto na leitura como na
interpretação e na inscrição da sua percepção sobre os equipamentos públicos e
sobre os espaços vividos por eles na cidade, sejam eles públicos ou privados.
Como forma de verificar se dentre aqueles que afirmaram conhecer o QR Code
estão também os usuários do Bluetooth e do Wi-Fi, buscou-se o confrontamento
dessas informações. Na tabela comparativa do uso do Bluetooth com o
reconhecimento da tecnologia QR Code pôde-se constatar quem mesmo aqueles
que afirmam utilizar frequentemente a tecnologia Bluetooth, em sua maioria, não
conhece o QR Code. Ou seja, dos 964 “internautas” que utilizam frequentemente,
117
moderadamente ou raramente o Bluetooth para compartilhamento de arquivos,
que representam 78% do universo de usuários pesquisado, apenas 360, cerca de
29%, conhecem a tecnologia QR Code, observando que a situação não muda se
forem analisados os critérios de uso frequente, moderado ou raro,
individualmente, pois o baixo conhecimento da tecnologia QR Code é
identificado em todos os casos, conforme pode se verificar na Tabela 7, a seguir.
Tabela 7 Comparativa do uso da tecnologia Bluetooth com o conhecimento da tecnologia QR Code.
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
O mesmo acontece se a comparação for realizada com a tecnologia Wi-Fi,
conforme se pode verificar na Tabela 8, apresentada a seguir. Contudo, nota-se
118
que uma parcela significativa dos usuários que conhecem a tecnologia QR Code,
aproximadamente 69%, é formada por aqueles que utilizam o acesso Wi-Fi.
Tabela 8 Comparação do uso do acesso Wi-Fi com o conhecimento da tecnologia QR Code
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
Também se fez uma sondagem, entre os participantes da pesquisa sobre a
realidade aumentada. Em primeira instância se buscou averiguar se o termo era
familiar, depois, para aqueles que declararam já ter noticias a respeito, se
perguntou se usava o recurso. E, por último, para aqueles que declararam já ter
utilizado o recurso, perguntou-se qual o software utilizado e para que finalidade.
Na primeira questão 26% das pessoas sondadas, ou seja, 317 pessoas,
responderam que já tinham “ouvido falar” em realidade aumentada, contra 913
que ainda não haviam tomado conhecimento, conforme pode se verificar no
Gráfico 13.
119
Na segunda questão, se verificou
o nível de ineditismo possui a
temática deste trabalho. Nenhum
participante afirmou usar
frequentemente o recurso. 20
pessoas, que representam 1,6%
do universo de sondagem,
responderam que usam
moderadamente e apenas 40
pessoas, 3,2%, afirmaram que
usam raramente. Ver Gráfico 14.
Gráfico 13 Familiaridade com o termo realidade aumentada
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
Gráfico 14 Uso do recurso da realidade aumentada
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
120
Esses números, apesar de serem muito baixos, ainda podem não corresponder à
realidade que, por sua vez, pode ser de um nível de utilização ainda menor do
recurso, isto porque, quando na terceira questão sobre realidade aumentada se
solicitou às 60 pessoas que responderam na questão anterior que usavam o
recurso ainda que moderadamente ou raramente a indicação do software que
utilizava e para que ele servia, nenhum dos 60 questionados, que se identificou
como usuário do recurso, indicou nenhum software de realidade aumentada que
utilizava e muito menos qual seria sua utilidade. Ou seja, na prática, nenhum
deles utilizava efetivamente o recurso. Alguns dos investigados indicaram
softwares, mas não se tratavam de ferramentas de realidade aumentada.
Em função disso, resolveu-se caracterizar brevemente e apontar algumas
aplicações práticas de realidade aumentada, para se compreender como estas
podem se incorporar ao ambiente dialógico, criado pelas mídias locativas e
dispositivos móveis digitais, na promoção do diálogo urbano que, por sua vez,
influencia significativamente na dinâmica territorial e social das cibercidades.
A realidade aumentada se propõe a acrescentar informações digitais ao espaço
físico. Trata de criar “cidades invisíveis”, na justaposição de informações digitais
ao espaço da cidade visível, tornando perceptível, através dos dispositivos
móveis, o que é invisível a olho nu. A ideia é proporcionar um acréscimo de
informações ao usuário a respeito dos lugares por onde ele passa e pessoas que ele
conhece ao se movimentar pela cidade. Em entrevista ao Portal do Estadão
121
(CABRAL; DIAS, 2009), Lemos explicou que a realidade aumentada busca
enriquecer o ambiente com informações adicionais, "como se colasse post-its nos
lugares".
Fig.16 Imagem do aplicativo Augmented ID reconhece o rosto da pessoa e mostra seu perfil em redes sociais.
O aplicativo visto na Fig.16, o Augmented ID, ajuda ao usuário a identificar
pessoas através dos seus perfis em redes sociais que, cada vez são mais
necessários e com o maior número de informações sobre os indivíduos. Esse
aplicativo, portanto, "aumenta" a identidade de uma pessoa, quando reconhece o
seu rosto, busca maiores informações na rede sobre ela, e as disponibiliza ao seu
usuário. A matéria do Estadão (CABRAL; DIAS, 2009) mostra ainda que uma
122
grande variedade de programas como esse começa a ser divulgado e a se
popularizar em todo o mundo.
Um outro exemplo é o Wikitude AR Travel. Trata-se de um sistema baseado em
GPS, na câmera e na bússola digitais para ampliar a realidade ou mais
precisamente, obter a realidade aumentada, na medida em que mostra informações
sobre pontos comerciais e turísticos da cidade, na tela do celular, ao apontar o
aparelho para o lugar desejado.
A realidade aumentada aplicada para a inteligência urbana pode ser um grande
diferencial para uma cidade, pois favorece a oferta de serviços inestimáveis ao
cidadão na apropriação do seu território. Com a realidade aumentada, os usuários
não se perderão mais na cidade, pois basta apontar o celular para o local em que
se encontra para saber tudo sobre ele, como a taxa de criminalidade,
características socioeconômicas da população, pontos comerciais, estrutura de
transporte público, dentre muitas outras possibilidades.
Figs. 17 e 18 Imagens da tela de um
aplicativo que utiliza o sistema
Mobile augmented reality applications (MARA)
123
O aplicativo verificado nas Figs. 17 e 18 é um exemplo prático exato do que se fez
referência acima a respeito da realidade aumentada, sendo utilizada para a
inteligência urbana. Esse aplicativo, que usa o sistema Mobile augmented reality
applications - MARA -, amplia a informação sobre o lugar, com o simples gesto
de se apontar o celular para ele. Com ele o usuário pode encontrar bares,
restaurantes, hotéis, lojas, etc. apenas apontando o celular para a rua ou a praça
por onde se passa.
Além de identificar o estabelecimento, conforme pode se verificar nas telas das
Figs. 17 e 18, ao “clicar” no local identificado pelo sistema, visto que esse se torna
um hiperlink, o usuário pode ainda acessar informações sobre pormenores
disponibilizados pela empresa, como tabela de preços, menu do dia, promoções da
casa, etc. Os aplicativos de realidade aumentada, que possibilitam a agregação de
conteúdo aos lugares, ampliando, a partir de informações adicionais, a realidade
do cidadão no espaço da cidade, são exemplos de como as dinâmicas territorial e
social estão sendo influenciadas por essa nova ambiência tecnológica digital.
Também são exemplos disso, as etiquetas QR Code, que permitem adicionar
conteúdo digital aos objetos, criando uma espécie de hiperlink do espaço físico
com o ciberespaço e, os aplicativos de geolocalização, que potencializam
profundas transformações na apropriação dos territórios por parte dos cidadãos, na
medida em que lhes permitem tomadas de decisões mais adequadas as suas
necessidades e desejos, porque possibilitam a visualização das distâncias a serem
124
percorridas entre dois ou mais lugares, além da localização quase precisa de
localidades, empresas e instituições, bem como a relação tempo de deslocamentoespaço da cidade, em diferentes perspectivas: distância percorrida de carro
particular, de ônibus ou caminhando.
Todos esses exemplos são, em última análise, fruto do diálogo urbano, fenômeno
que faz parte do contexto no qual se encontram as mídias locativas digitais online dialógicas, os dispositivos móveis digitais e a conexão ubíqua, proporcionada
pelas multirredes sem fio, que tornam o espaço da cidade um espaço passível de
acesso generalizado, que envolve as pessoas que nele estão, de tal modo que a
conectividade passa a ser algo natural, permanente e contínuo, permitindo ao
cidadão um ambiente de acesso constante a informação e com amplas
possibilidades de comunicação em nível planetário.
Uma das questões abertas do questionário de pesquisa disponibilizado aos
usuários, solicitava que citassem lugares que costumam acessar a rede na cidade.
Os lugares mais citados, de forma genérica, foram as escolas de ensino básico e
segundo grau, universidades, bibliotecas, praias, shoppings, stands empresariais,
cafeterias, bares, restaurantes, terminais rodoviários, aeroportos, estações de
metrô, hotéis, clubes, mercados públicos, TVs, rádios, jornais, escritório,
agências, lojas e concessionárias.
A partir desta questão aberta surgiu uma informação muito pertinente às
discussões sobre o tema. Um dos participantes da pesquisa informou que o
125
município de Campo Bom foi um dos pioneiros em disponibilizar Internet sem fio
gratuita para toda a população, indicando uma reportagem, exibida no Jornal da
TV Record, no dia 7 de outubro de 2009. Foi realizada uma investigação na
Internet para comprovar a veracidade do fato. Um outro entrevistado comentou
que, em Belo Horizonte, a Prefeitura Municipal tem um projeto chamado BH
Digital, que mantém hotspots gratuitos em diversas localidades da cidade como
no Parque Municipal, nas proximidades do prédio da administração, Rodoviária,
Praça da Liberdade, Praça Rui Barbosa e parte da Praça da Estação, além de
prédios públicos como o saguão da Prefeitura.
Ao pesquisar sobre o tema, descobriram-se algumas outras ações semelhantes em
várias partes do Brasil. Trata-se de redes sem fio de acesso ilimitado, em tempo
integral, com sinal 24 horas, implementados pelas prefeituras municipais, que
permitem aos moradores de toda a cidade conectar-se à Internet, em alta
velocidade, gratuitamente. Em alguns municípios os projetos são limitados a
alguns pontos da cidade e outros de forma ampla, generalizada, incorporando
completamente a noção de rede ubíqua aqui discutida.
Descobriu-se então que além de Campo Bom e Belo Horizonte existem projetos
semelhantes nas seguintes cidades do Brasil:
a) Brasília (DF) beneficia cerca de 1 milhão de pessoas;
b) Curitiba (PA) funciona como em Belo Horizonte, apenas em alguns pontos
da cidade;
126
c) Parnaíba (PI) beneficia cerca de 140 mil habitantes, em toda a cidade;
d) Pitangueiras (PR) leva o benefício a cerca 2.8 mil pessoas;
e) Ribeirão Pires (SP) funciona em alguns pontos da cidade;
f) Santa Fé (PR) funciona em alguns pontos da cidade;
g) São Simão (GO) funciona em alguns pontos da cidade;
h) Sapiranga (RS) funciona em toda cidade;
Projeto Baixada Digital beneficia cerca de 1.5 milhões de pessoas nas
cidades abaixo:
i) Duque de Caxias (RJ)
j) São João de Meriti (RJ)
k) Belford Roxo (RJ)
l) Mesquita (RJ)
m)Nova Iguaçu (RJ)
n) Nilópolis (RJ)
Toda essa movimentação das cidades brasileiras, que estão buscando propiciar
aos seus cidadãos a conexão ubíqua e a possibilidade de mantê-los conectados em
tempo integral e em todos os lugares, é motivada por um projeto do Governo
Federal chamado Cidades Digitais, que atende inicialmente 20 cidades brasileiras
e que, em setembro de 2009, em audiência pública realizada na cidade de Brasília
ampliou o benefício a 160 cidades, que devem ser contempladas com acesso
generalizado até 2010, tornando-se cidades digitais (GUIA CIDADES DIGITAIS,
2009).
127
Essa noção de cidade digital ganhou força nos últimos anos e inspirou a
criação de um guia na Internet exclusivamente dedicado ao tema, o Guia
Cidades Digitais (2009). Neste guia existem muitas informações
pertinentes, dentre as quais uma que sistematiza os benefícios que uma
cidade tem quando se torna uma cidade digital, em diversos aspectos.
Sob o ponto de vista do Governo Federal, os benefícios estariam
relacionados com a modernização da administração pública, que pode
integrar todas as instituições de administrações diretas e indiretas, bem
como as estruturas tributárias e financeiras, proporcionando melhoria da
fiscalização, bem como o acesso imediato às informações e serviços aos
cidadãos (GUIA CIDADES DIGITAIS, 2009).
Para o cidadão, o benefício mais claro é o acesso gratuito à Internet, para
produção e difusão de conhecimento, mas também para o entretenimento.
Para a educação, o Guia Cidades Digitais (2009) aponta como benefícios a
“integração das escolas a outras instituições de pesquisa e ensino;
laboratórios de informática; acesso a acervos de livros e documentos
históricos; capacitação dos professores”. Para a área da saúde os benefícios
apontados são a “gestão integrada dos centros de assistência à saúde;
interligação com serviços de emergência como o Corpo de Bombeiros e a
Defesa Civil; uso de novas tecnologias, tais como videoconferência e
telemedicina”.
128
Duas outras áreas ainda beneficiadas pelo conceito de cidade digital são: a
segurança e a economia. Na segurança, os benefícios estariam vinculados à
“interligação via computadores de órgãos como as polícias Civil e Militar e o
Corpo de Bombeiros; instalação de câmeras de vigilância via Internet em pontos
mais vulneráveis da cidade”, dentre outras possibilidades. Já a área econômica
teria os seus benefícios vinculados ao “acesso à Internet sem fio para pequenos
empresários; comunicação mais barata com entidades de classe ou empresários de
outra cidade/região através da Internet ou da telefonia VoIP; incentivo ao turismo”
(GUIA CIDADES DIGITAIS, 2009).
É importante observar que as transformações e alterações nas dinâmicas sociais e
territoriais, promovidas pelas tecnologias digitais nas cidades estão acontecendo,
natural e espontaneamente, mesmo nas cidades que não possuem projetos
governamentais de popularização das redes Wi-Fi, como as apontadas acima. A
cidade do Salvador é uma delas. Não possui nenhum projeto governamental
planejado e mesmo assim possui uma ampla difusão da tecnologia Wi-Fi no seu
âmbito urbano.
129
A CIBERCIDADE DO SALVADOR:
A MOBILIDADE E O ESPAÇO DA
CIDADE CONTEMPORÂNEA
Edições
VNI
UCSAL
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
PPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PLANEJAMENTO TERRITORIAL E
DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Quando se fala em mobilidade na cidade pode-se estar falando de muitas
possibilidades como no sistema de transporte locomovendo pessoas e cargas para
diferentes pontos da cidade ; comunicação interligando informações e pessoas a
partir das redes telemáticas ; ou fluxos financeiros a partir do sistema monetário,
em que moedas de diversos tipos e formas circulam no âmbito da cidade, apenas
para citar três possibilidades. Apesar das diferenças que pode haver entre todas
essas possibilidades, entretanto, há pelo menos um ponto de convergência: estão
todas relacionadas com a noção de redes que, por sua vez, podem ser de diversos
tipos e características: biológicas, sociais, tecnológicas, dentre outras.
No caso presente, apenas um tipo de rede interessa ao contexto das discussões,
que são as redes telemáticas, por formarem uma base para os fluxos
informacionais, que se configuram e se difundem no tecido urbano das complexas
cidades contemporâneas. Lemos (2007a, p. 122) já observava que as redes
telemáticas “passam a integrar, e mesmo a 'comandar' (cibernética), as diversas
redes que constituem o espaço urbano e as diversas formas de vínculo social que
daí emergem”.
Essa hegemonia das redes telemáticas, entretanto, não diminui a importância das
outras redes, visto que são elas que promovem a sua dinâmica, na medida em que
estabelecem a rede telemática como elemento predominante da sociedade atual.
Pelo menos é assim que entendia Castells (1999), quando concebeu a noção da
“sociedade em redes”, em que considerava a sociedade atual como a sociedade da
131
informação, do conhecimento, graças à possibilidade que esta tem de instituir
grandes fluxos informacionais multidirecionados.
Os grandes fluxos informacionais, potencializados pelas redes telemáticas, por si
só já criam condições para a noção de mobilidade na cidade ser significativamente
ampliada, visto que, segundo Lemos (2007a), a cidade se constitui,
historicamente, como lugar de mobilidade e fixação. Mas, certamente, só com a
chegada do conceito de computação ubíqua (WEISER, 1991), a noção de
mobilidade atingiu a sua plenitude, conforme se pôde observar no contexto
histórico realizado na introdução deste trabalho.
Princípios que norteiam o contexto tecnológico da cibercidade
contemporânea
As cibercidades formam-se em um contexto tecnológico, que pode ser pensado a
partir de uma cronologia que atinge a atualidade. Para tentar entender esse
cenário, Lemos (2009) sistematizou os três princípios básicos da cibercultura em
emissão, conexão e reconfiguração. O primeiro, de acordo com o autor, está
relacionado aos blogs, podcasts e sites de relacionamentos, como o Orkut e o
Twitter, dentre outras possibilidades. São as ferramentas que permitem a qualquer
pessoa produzir informação com muito pouco recurso e sem pedir autorização a
nenhum editor de veículo de comunicação, concessão ao Estado ou mesmo apoio
a nenhum grande financiador.
132
Para Lemos (2009), as revoluções que acontecem hoje, bem como as tensões
relacionadas a direitos autorais e quebra de diversos paradigmas, vêm da
liberação do polo de emissão, que permitiu o que se pode chamar de emissão
generalizada. Qualquer pessoa na atualidade pode produzir informação e emitir,
através da rede livremente, independente do seu conteúdo, tenha este cunho
político, cultural, social, seja engajado ou trate simplesmente de entretenimento.
O segundo princípio é o da conexão. A emissão generalizada, constatada
anteriormente, para Lemos (2009), só faz sentido porque é feita em conexão com
outras pessoas. O autor observou que, se antes o diário pessoal e o álbum de fotos
de uma pessoa ficavam guardados na gaveta, hoje são vetores comunicacionais,
pois são utilizados como forma de se comunicar com outras pessoas que também
estão conectadas na mesma rede ou em redes próximas. A força hoje está em
compartilhar e não em reter a informação.
O terceiro e último princípio da cibercultura, sistematizado por Lemos (2009), é o
da reconfiguração. Para o autor, as dimensões políticas, culturais e sociais desse
processo intercomunicacional, em que a humanidade está inserida, são enormes,
pois cada vez que uma pessoa pode falar livremente o que pensa e se conectar a
outras sem restrições, ela reconfigura a sua vida política, cultural e social, bem
como também pode influenciar significativamente a das outras pessoas. “Não é à
toa que os governos totalitários tentam impedir a emissão e conexão livres, visto
que estes não querem nenhuma reconfiguração”, observou Lemos (2009).
133
Portanto, falar em cibercultura nos dias atuais não se trata mais de falar apenas da
cultura feita para e na Internet, mas da cultura contemporânea de um modo geral,
visto que as tecnologias digitais vêm gradativamente hibridizando conceitos e
derrubando muitos paradigmas que apontavam para essa delimitação. Não é em
vão que a característica cultural mais marcante da cibercidade é a cultura da
mobilidade que, conforme Meyrowitz (2004), deixa a organização social da
cidade mais fluida, com papéis menos rígidos e lugares sociais intercambiáveis,
que se aproximam muito da forma social dos primeiros agrupamentos humanos.
Instituiu-se o paradoxo da mobilidade e localidade, como se viu, que fundamenta
e torna possível a noção de “cidade desplugada”, trazida por Lemos, uma vez que
é da emissão de informações localizadas, partindo de vários pontos da cidade, que
se criam as camadas virtuais no espaço físico que, por sua vez, promovem a
conexão ubíqua, que envolve o usuário em todos os lugares por onde ele circula e
lhe dá possibilidade de acesso aonde quer que ele se encontre, através da criação
de zonas Wi-Fi, Bluetooth, redes de telefonia celular, dentre outras, desde que ele
seja portador de um dispositivo móvel digital, com modem de acesso sem fio,
para que possa completar a partir dele o processo comunicativo.
Cidade contemporânea: “desplugada” e “infiltrada”
Para Lemos (2007a, p.123), o ambiente de acesso generalizado, promovido pela
computação ubíqua, permite às metrópoles se tornarem “cidades desplugadas”,
134
que envolvem o usuário em pleno movimento e interligam máquinas, pessoas e
equipamentos urbanos, através dos territórios informacionais. Na cidade
“desplugada”, “o usuário não vai mais ao ponto da rede. A rede é ubíqua,
envolvendo o usuário em um ambiente de acesso” (LEMOS, 2004, p. 29). “Ao
invés de trazer o usuário para a rede, pela primeira vez a rede está sendo levada ao
usuário” (TOWNSEND, 2003, apud LEMOS, 2004, p. 29).
É fato que as organizações e as pessoas que habitam as grandes cidades usam cada
vez mais essas tecnologias para se relacionarem. Segundo Castells (2006), dois
terços da população do planeta podem se comunicar graças aos telefones
celulares, inclusive em lugares onde não há energia elétrica nem linhas de telefone
fixo. Esta constatação de Castells (2006) levou em consideração que quase toda a
comunicação à distância que se estabelece nos dias atuais no âmbito das cidades,
se dá por meio das tecnologias informacionais digitais que estão cada dia mais
presentes nos espaços urbanos, alterando as relações, reconfigurando os espaços e
até ressignificando-os para os seus habitantes.
Se, de um lado, como se viu, os celulares estão cada vez mais populares e
representam de modo muito significativo a comunicação à distância entre os
habitantes das cidades contemporâneas, por outro, “várias cidades do mundo estão
oferecendo acesso Wi-Fi aos seus cidadãos, constituindo uma verdadeira cidade
desplugada” (LEMOS, 2004, p. 29).
No Brasil, em todas as metrópoles e grandes cidades, já é possível se
135
compreender, na prática, a noção de conexão ubíqua, pois se considera o espaço
da cidade como um ambiente de conexão latente, em que qualquer porção do
espaço está potencialmente apta a ser um ponto de acesso ao ciberespaço. A cada
dia se torna mais difícil encontrar um ponto no espaço físico da cidade, em que
exista concentração humana, que não esteja coberto por uma zona Wi-Fi ou outros
tipos de redes, conforme se mostrará adiante.
Provavelmente, devido a esse grande poder de propagação e popularização que
alguns autores chegaram a apontar as “conexões Wi-Fi como soluções para os
países em desenvolvimento” (Press, 2003, p. 62). Lemos (2004) observou a
existência de um movimento que visava à construção de redes sem fio em
diversos pontos das cidades, com espírito anarquista, cooperativo e distributivo do
sistema Linux, do Napster e outros sistemas abertos e de distribuição ponto a
ponto.
[...] os defensores do free wireless estão conclamando todos aqueles que
possuem uma conexão de alta velocidade (cabo, DSL, T1) a
'emprestarem', gratuitamente, sua largura de banda para o público. O
compartilhamento de informação, 'a informação quer ser livre', lema da
contracultura digital, é enriquecido agora pelo compartilhamento de
largura de banda, buscando democratizar o acesso ao ciberespaço
(LEMOS, 2004, p. 30-31).
A primeira impressão é de que o acesso Wi-Fi parece constituir uma importante
ferramenta de “inclusão digital” e de acesso de pessoas de baixa renda aos
recursos tecnológicos disponíveis. O acesso Wi-Fi pode se destacar como uma das
136
melhores ferramentas entre todas as opções oferecidas para esse fim, pois
permite, com a instalação de uma infraestrutura pública simples, o acesso
generalizado a todos os cidadãos, sem discriminação, e o melhor ainda, possibilita
o acesso através de um dispositivo de uso quase generalizado, pois quase a
totalidade dos cidadãos residentes nas grandes cidades possui, independentemente
de sua classe social, um celular.
Tratar de “inclusão digital” e de acesso da população de baixa renda a recursos
tecnológicos nas cidades através do sistema Wi-Fi, entretanto, implica em
observar que, conforme afirmavam Middleton e Crow (2008, p. 421), o acesso
para esse fim deve ser “developed with de public interest in mind/or to serve a
public need, public wireless networks are distinct from for-profit wireless
offerings”. Mas, ainda que isso não venha a se concretizar, ou mesmo que não
seja uma solução viável para diminuir as desigualdades sociais ou incluir as
pessoas que ainda estão de fora deste “admirável mundo novo” (HUXLEY, 2007),
“o que importa é colocar em pauta a democratização do acesso pelo espírito de
compartilhamento que fez da Internet um fenômeno social” (LEMOS, 2004, p.
32).
Independentemente da possibilidade de democratização do acesso, graças às
tecnologias móveis digitais, segundo Ito (2003, p.44), “a cidade não é mais um
espaço urbano anônimo”, uma vez que essas tecnologias possibilitam a difusão
das experiências vivenciais individuais que o cidadão tem nessa cidade e a
transforma em um espaço de experiências muito mais coletivas. Assim, o mesmo
137
autor (ITO, 2003) observou que o diálogo multimídia, que envolve textos,
imagens e sons e é estabelecido pelas pessoas que vivenciam a cidade, transforma
momentos, que seriam de experiência individual dos espaços urbanos, em algo
compartilhado.
É por isso que se pensa que “o papel das tecnologias da informação no ambiente
urbano mostra-se de modo mais forte [...] onde e quando a contiguidade espacial
e temporal não revela a causa, o efeito nem a circunstância das ações e reações
que desencadeiam” (DUARTE; FREY, 2008, p. 170). Mas, a contiguidade
espacial e temporal, por outro lado, pode refletir significados antes não
percebidos ou descobertos na vivência do espaço urbano pelas pessoas e no uso
desses mesmos espaços pelas instituições. Esse contexto permite se formar o
conceito de cidade infiltrada, que diz respeito ao que Duarte e Frey (2008)
observaram quando falavam que a cidade vai além dos pontos de acesso
identificados, onde acontece a concentração do que eles chamaram de
“conectados”. A cidade também pode ser pensada através de conexões latentes,
que podem estar ou surgir de algum ponto, de algum local.
Qualquer cidadão pode, ao se mover pela cidade, detectar essas redes e utilizá-las
para conexões pontuais e ter acesso a informações que necessita naquele
momento. Essa infiltração informacional é uma das modalidades de exploração
do espaço da cidade, que possibilita a menor rastreabilidade possível, porque, à
medida que detecta redes diversas e realiza conexões, também diversas, dificulta
138
a identificação do usuário, mesmo quando se realiza o cruzamento de
informações por meio de sistemas integrados a grandes bancos de dados.
Esta infiltração informacional, realizada através de acesso a pontos latentes de
conexão e não através de pontos de grande concentração de “conectados”,
assemelha-se à contracultura hacker que, apesar de muito difundida pelo seu
apelo negativo, possui um importante papel no desenvolvimento tecnológico
mundial e na ambiência relacionada com a liberdade de expressão hoje cultuada
no ciberespaço pelos seus usuários.
A cultura hacker e o contexto da mobilidade
Os hackers são tratados no senso comum como bandidos virtuais. Isso porque a
mídia tradicional divulga a ação hacker apenas quando ela é considerada
criminosa. A cultura hacker, entretanto, é um dos pilares da filosofia da Internet
livre, sem barreiras e censuras. Além disso, é, de certo modo, responsável pelo
desenvolvimento tecnológico digital, visto que a indústria da informática os
hardwares e os softwares evolui a partir da ação hacker, mostrando as
inconsistências, instabilidades e vulnerabilidades dos sistemas e equipamentos.
Estima-se que a cultura hacker tenha contribuído significativamente para a
evolução do conceito de mobilidade, até o estado atual, visto que pela
necessidade natural que os hackers possuem de se deslocar no espaço físico e
139
acessar a rede de lugares diferentes a cada momento, para fugirem da vigilância e
da ação policial, adaptaram os dispositivos à mobilidade de que inexoravelmente
precisavam.
Especula-se que à medida que a indústria foi miniaturizando os dispositivos e os
hackers de todo o mundo foram aderindo a esses novos dispositivos
miniaturizados, visto que eles se adaptavam à mobilidade requerida para a prática
hacker, eles foram se difundindo, gerando demanda de mercado e se
popularizando. Hoje os dispositivos móveis se adequam não apenas às demandas
hackers, mas às de toda a sociedade.
Assim, é importante pontuar que, ainda se tratando da mobilidade, além de
atuarem no campo da evolução das tecnologias de hardware, fortalecendo e
adaptando os equipamentos miniaturizados à mobilidade, os hackers também têm
dado muitas contribuições à evolução dos sistemas ou softwares, que permitem a
comunicação em mobilidade possível, visto que, muito antes do celular utilizar
sistemas digitais e disponibilizar acesso à Internet aos seus usuários, os hackers
de todo o mundo já usavam o sistema de telefonia móvel analógica, para adaptar
dispositivos diversos a celulares e conseguir acesso em movimento.
Além disso, sabe-se que as práticas hackers, para a democratização das redes WiFi no espaço urbano, por exemplo, são muitas. Duas delas chamam a atenção: o
warchalking, que consiste em colocar antenas, feitas em casa para ampliar o raio
de ação de uma rede Wi-Fi, com o objetivo de compartilhar com um número
140
maior de pessoas o acesso à rede e de forma gratuita. Essa modalidade de ação
hacker, na prática, amplia o território informacional (LEMOS, 2007a), o
ciberterritório (CARVALHAL, 2008) ou ainda as bolhas informacionais
(BESLAY e HAKALA, 2005), democratizando o acesso e, consequentemente, a
informação.
A outra prática é a do wardriving, que também consiste no uso de antenas
artesanais, não para ampliar uma zona Wi-Fi, como no warchalking, mas para
localizar pontos de acesso público na rua e divulgar, para outras pessoas que
estejam onde o acesso é livre. Essas práticas só são consideradas hackers porque
os provedores de acesso proíbem, em contrato, a disponibilização da sua rede WiFi para o público, pois tratam o compartilhamento da conexão como sublocação
do serviço a terceiros (THOMPSON, 2001 apud LEMOS, 2004, p. 32).
Não se busca criar apologia acerca das práticas hackers, sobretudo as criminosas,
mesmo porque os bandidos virtuais já não são chamados de hackers há algum
tempo. Estes são os crackers, que buscam, com as suas ações, não a manutenção
da Internet como um ambiente livre da dominação absoluta dos grandes
conglomerados econômicos internacionais, mas com fins ilícitos de
enriquecimentos pessoais, como um criminoso qualquer.
Por outro lado, se desenvolve um discurso relevante na cultura hacker que pode
criar um ambiente muito saudável, se adaptado para o ambiente dos usuários
comuns: a noção de apropriação da rede para a transformação da sua realidade,
141
através da intervenção nos espaços públicos e privados, para a ressignificação
desses espaços de convivência ou, como diriam Santos e Silveira (2001), dos
“espaços construídos”, a partir do seu “território em uso”.
Por outro lado, não se pode deixar de registrar todos os transtornos que os
crackers, os “hackers” criminosos, causam no cotidiano das pessoas e instituições
contemporâneas. Além da disseminação de vírus computacionais destrutivos, os
crackers costumam invadir sistemas de instituições financeiras para desviar
dinheiro, além disso, roubam senhas de usuários da rede para realização de
transferências de valores ou compras indevidas em lojas de comércio eletônico,
dentre outras modalidades de crimes “virtuais” com implicações reais difundidos
pela mídia de massa nos últimos anos.
O cidadão contemporâneo e a demanda pela intervenção urbana
Ribeiro, Chamusca e Carvalhal (2006, p.115) afirmaram que, no mundo atual,
“queiramos ou não, somos impelidos a vivenciar uma dinâmica regida pela
participação, pelo contato, pela interferência”. De fato, há um apelo constante pela
participação, direta ou indireta, das pessoas em tudo que se faz na atualidade. Esse
ambiente de participação, apesar de estar relacionado com as tecnologias digitais,
as transcende, pois acabou por se tornar um componente da lógica social no
contexto contemporâneo.
142
É comum nos últimos anos ver os programas de TV, de rádio, jornais e revistas
impressos e outros meios de comunicação de massa, que nunca tiveram na
participação a sua tônica principal, e nem mesmo periférica, agora buscar a
participação das pessoas no seu conteúdo. Não se sabe precisar, entretanto, se os
meios de comunicação de massa estão buscando essa participação para se adequar
ao âmbito das novas mídias, que são baseados neste componente, ou se há por trás
dessa lógica uma questão apenas mercadológica voltada para as novas gerações.
Por outro lado, seja porque os profissionais de mídia vêm fomentando a
participação, seja porque o “novo consumidor” da informação tem requerido a sua
participação nos espaços midiáticos, conforme sugere Ribeiro, Chamusca e
Carvalhal , o fato é que as pessoas estão assimilando essa lógica e buscando a
participação em todas as esferas sociais, inclusive no espaço urbano.
Fig. 19 Foto de um totem do Banco do Brasil,
contendo uma anotação de um cliente
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009
Fig. 20 Foto de uma anotação anônima urbana,
afixada em uma árvore, no bairro do Rio Vermelho.
Fonte: foto de Marcello Chamusca,
Salvador/BA, ago, 2009
143
As Figs. 19 e 20, por exemplo, mostram anotações urbanas analógicas, realizadas
por esse tipo de cidadão alvo de discussão, que não aceita mais ser mero
consumidor da informação, mas busca interagir, explicitar a sua opinião e, acima
de tudo, verificar se a sua participação tem efeito prático no seu contexto. Na Fig.
19, o totem do Banco do Brasil serviu de mídia dialógica, para a participação do
cidadão, mesmo se tratando do que se classificou como uma mídia locativa de
nível zero de interação, uma mídia locativa analógica impressa que, em tese, não
proporciona ao indivíduo qualquer possibilidade de interação ou diálogo. O
cidadão, entretanto, se apropriou da mídia para subverter essa lógica e impor a sua
necessidade de se expressar.
Já a anotação urbana vista na Fig. 20, trata-se de uma manifestação espontânea de
um cidadão que, dentro dessa nova lógica de participação, e de apropriação dos
espaços públicos para uso privado e vice-versa, ressignificou o seu espaço de
convivência, a partir de uma anotação sobre o seu tema de interesse e através do
meio de que disponibilizava, no espaço e tempo por ele apropriados.
Pelas leis em vigor no País, tanto a primeira quanto a segunda manifestação são
consideradas ilegais. A primeira porque se trata de depreciação do patrimônio
privado e do uso ilegal desse espaço para manifestação particular, mesmo que a
intenção do cliente tenha sido apenas de expressar a sua opinião a respeito do
serviço oferecido por aquela instituição. O totem não foi exposto pelo banco para
servir de diálogo com o consumidor, e, portanto, não podia ser utilizado para tal,
tendo sido depreciado, ou estragado, com os acréscimos nele feitos. O segundo, é
144
igualmente ilegal, porque também pode ser interpretado como depredação do
patrimônio público, além de infringir a proibição feita pela autoridade municipal
de se afixar qualquer material nos lugares públicos, sem devida autorização.
A nova ambiência tecnológica, pautada na mobilidade e conectividade criada
pelas redes ubíquas, que permitem o diálogo urbano das mídias locativas de
quarto nível, classificadas como mídias locativas digitais on-line dialógicas, com
os dispositivos móveis digitais no espaço da cidade, vem não apenas
potencializar, mas tornar viável a execução legal desse tipo de demanda,
oferecendo ao cidadão participativo a possibilidade de intervenção efetiva no seu
espaço de convivência dentro da cidade, através de diversas formas de anotações
através do uso dos seus dispositivos móveis que se convencionou chamar
ciberterritórios.
Pode-se, por exemplo, inserir impressões a respeito dos lugares em um mapa
eletrônico da cidade, disponibilizando-o na rede para que outras pessoas possam
ver ou utilizar. Essas impressões poderão ser lidas e vistas por muitas pessoas que
estão ou pretendem ir a esses lugares e, por sua vez, contribuir para formar sua
própria opinião, visto que poderá possibilitar vivências diferenciadas da cidade e
dos espaços urbanos, pois, com isso, passa-se a contar com a percepção, formada
pela soma das percepções individuais e coletivas do espaço público, e não apenas
pela sua percepção isolada no momento em que está vivenciando o lugar.
Para Lemos (2007a, p. 132-133),
145
[...] as práticas de anotação das mídias locativas são muito próximas
daquilo que os surrealistas, dadaístas e situacionistas buscavam pela
deriva e pela ocupação de espaços das cidades nas décadas de 1950 e
1960 [...] Essas práticas, como as atuais com celulares, laptops, GPS ou
etiquetas RFID, buscam criar formas de apropriação dos espaços das
cidades, cada vez mais impessoal, frio e racionalizado.
Também é possível se realizar uma anotação urbana através da tecnologia QR
Code, que vincula etiquetas impressas a conteúdos multimídia dos mais diversos
tipos, agregando àquele local ou equipamento público da cidade informações
digitais como textos, fotos, filmes, arquivos de áudio, páginas da Web, etc.,
utilizando o aumento da realidade vivenciada.
A noção de realidade aumentada, quando combinada com as noções de
mobilidade e conectividade, no contexto da cibercidade, “trata-se não apenas de
escrita dos espaços por anotações e ou de reforçar laços sociais, mas de ampliar a
leitura do espaço urbano através da superposição de camadas informacionais aos
lugares do espaço público” (LEMOS, 2007a, p. 134). Isso reforça a idéia central
deste trabalho a respeito da influência que o diálogo urbano, promovido pelas
redes ubíquas, das mídias locativas com os dispositivos móveis digitais, têm nas
dinâmicas territoriais e sociais das cibercidades.
146
As funções pós-massivas das tecnologias informacionais digitais, e a sua
aplicação prática nos espaços das cidades podem ir além de anotações urbanas
para sua ressignificação, na medida em que permitem que a sociabilidade e a
interação entre as pessoas nos espaços públicos sejam ampliadas. Apesar dessa
afirmação ir de encontro à percepção do senso comum de que as tecnologias
digitais afastam as pessoas, umas das outras, e as deixam enclausuradas nos seus
ambientes domésticos e escritórios, onde se encontram seus computadores elas, de
fato, podem ser utilizadas como um instrumento de sociabilidade, e possibilitar o
uso e a apropriação dos espaços públicos das cibercidades pelos usuários.
Elas possibilitam, por exemplo, que uma pessoa informe a sua presença num
determinado local para toda a sua rede de contatos on-line, a partir de emissão de
informações digitais do seu dispositivo móvel, ou celular, que, conectado, pode
enviar a todos a sua localização exata no mapa, se estiver configurado para isso.
Essa informação pode ser prestada de forma espontânea, com o próprio usuário
enviando-a para a rede, ou de maneira automática, em que um dispositivo
programado para isso dispara a informação para um sistema que, por sua vez,
esteja interligando o usuário a sua rede de contatos e que, ao mesmo tempo,
mapeie os lugares da cidade, identificando a sua localização e a dos seus contatos
virtuais, informando para alguém da lista de contatos, que estiver próximo àquele
local, bem como mostram a possibilidade de encontro pessoal ou virtual.
147
Nesse caso, os espaços físico e virtual se imbricam para favorecer as relações
sociais, alterando e tornando complexas as dinâmicas territoriais e sociais nos
espaços das cidades, na medida em que modificam a forma de apropriação dos
espaços físicos e territoriais pelo cidadão, e, ao mesmo tempo, promovem a
interação entre pessoas no espaço urbano, significando ou ressignificando esses
espaços, sejam eles públicos ou privados.
Lemos (2007a, p. 233-134) fez notar que, ao potencializar as interações sociais
nos espaços das cidades, tornando consideravelmente complexa a dinâmica urbana
através da potencialização de situações como as discutidas acima. Dessa forma, as
tecnologias informacionais digitais permitem que:
[...] pessoas que só se conhecem online possam, caso estejam no mesmo
lugar por acaso, se identificarem [...] Assim, se você estiver em um bar e
um amigo virtual (que você não sabe quem é fisicamente) estiver por
perto, os telefones celulares se reconhecerão um ao outro e vocês
poderão se encontrar pessoalmente, em real life.
Cabe então uma reflexão sobre a proposta de Santos e Silveira (2001), que dizia
respeito ao conceito de território em uso, utilizado pelos autores para designar a
imbricação entre os dispositivos, ou artefatos, e as técnicas ou tecnologias, que
transformam os espaços através das relações políticas, econômicas e, sobretudo,
das relações sociais, que conferem direção e sentido a essas transformações.
148
Possibilidades de anotações autônomas no espaço urbano por seus cidadãos, que
podem o ressignificar a partir da sua apropriação para fins privados, bem como
das possibilidades da promoção de aproximações e ampliação das interações
sociais nos espaços das cidades, potencializando a transformação de “laços
fracos” em “laços fortes” (GRANOVETTER, 1983), dentre muitas outras que as
tecnologias informacionais digitais possibilitam e permitem o entendimento de
que, conforme observaram Santos e Silveira (2001), as mudanças ficam
registradas nas diferentes escalas conforme o território é apropriado e construído,
visto que estas transcendem o contexto local, onde a vivência se dá, e podem
implicar em transformações em todas as escalas, inclusive, global.
É importante observar que os cidadãos contemporâneos não têm fronteiras,
vivem, segundo Friedman (2005), num “mundo plano”, em que, conforme Santos
e Silveira (2001), a informação e o conhecimento têm um papel essencial na
reorganização produtiva do território e nas suas especializações. E, por isso
mesmo, está imbricado em uma complexa rede de relações que potencializa a
disseminação de informações da escala local para as demais escalas, através da
arquitetura de participação e colaboração que permitem não só o consumo e a
produção da informação, mas também a sua distribuição em escala planetária e
em tempo real.
Quando Santos e Silveira (2001) criticam as pretensões totalizadoras da
sociologia e da economia, que segundo eles, tendem a desconhecer a importância
149
do “espaço construído” e superestimar as “relações”, como se nelas estivesse
contida a totalidade da realidade social, observa-se a possibilidade de abertura de
uma nova perspectiva para se discutir as cibercidades: a espacialidade territorial
híbrida promovida pelas tecnologias informacionais digitais, quando formam as
camadas eletrônicas que permitem a conexão ubíqua e envolvem o cidadão em um
ambiente pleno em conexão com o ciberespaço, a partir de qualquer lugar,
inclusive, quando este se encontra deslocando-se pela malha urbana.
Para Lemos (2007a, p. 128), quando isso acontece,
As cibercidades contemporâneas tornam-se “máquinas de comunicar” a
partir de novas formas de apropriação do espaço urbano escrever e ler o
espaço de forma eletrônica por funções 'locativas' (mapping,
geolocalização, smart mobs, anotações urbanas, wireless games),
trazendo novas dimensões do uso e da criação de sentido nos espaços
urbanos.
Santos e Silveira (2001) utilizam três conceitos estruturantes, para análise da
realidade urbana brasileira, o meio natural, os sucessivos meios técnicos e o
advento do meio técnico-científico-informacional, observando que neste último se
encontra o que se vem denominando ciberterritórios, ou seja, o “espaço
construído” pelas vivências das pessoas no ambiente de intersecção do espaço
físico com o ciberespaço, através do uso das redes ubíquas, dos dispositivos
móveis e das mídias locativas digitais.
150
Os autores (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 101) apresentam o conceito de meio
técnico-científico-informacional como “a cara geográfica da globalização”, uma
vez observado que os acréscimos da ciência, tecnologia e informação ao território
são, ao mesmo tempo, produto e condição para o desenvolvimento do trabalho
material e intelectual.
Assim, entende-se que pensar em ciberterritórios, como forma de compreender a
realidade das cidades contemporâneas, implica no estabelecimento do conceito de
meio técnico-científico-informacional, como uma aplicação lógica para a análise
do ambiente informacional, promovida pelas tecnologias digitais no espaço das
cidades, na medida em que, segundo Lemos, (2007a, p. 134) os territórios
informacionais ou o que neste trabalho se convencionou chamar de
ciberterritórios,
[...] permitem criar sentido por anotações do espaço público, por leituras
de “realidades aumentadas” e colocar pessoas em contato 'permanente',
no meio do ambiente anônimo das grandes cidades, tentando criar, na
'superfície', uma membrana, uma zona de contato e 'acesso' e criar,
recriar e fortalecer as redes de sociabilidade e a apropriação do urbano.
Nesta nova ambiência, portanto, as demandas por intervenções nos espaços
urbanos são viabilizadas pelo que Santos e Silveira (2001) conceituaram como
meio técnico-científico-informacional, pois é exatamente neste campo em que se
encontram os capitais intelectual e simbólico, nos quais os territórios
151
informacionais se imbricam com os territórios físicos e em que circulam as
informações e o conhecimento produzidos atualmente pela humanidade, onde se
dão as possibilidades de interações também simbólicas entre as pessoas e os
equipamentos nos espaços da cidade.
A centralidade da cibercidade do Salvador
O IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística realizou em 2008 uma
pesquisa que visou à compreensão das regiões que mostram as áreas de influência
das cidades da rede urbana brasileira. Foram levantadas informações sobre 4.625
municípios e esses dados foram comparados com estudos feitos em 1972, 1987 e
2000. O estudo classificou as cidades em cinco níveis e, para cada nível, dois ou
três subníveis. No primeiro nível, o das metrópoles, estão 12 redes urbanas,
compostas pelos principais centros urbanos do País. Este primeiro nível da gestão
territorial é subdividido em três sub-níveis:
a) grande metrópole nacional;
b) metrópole nacional e,
c) metrópole.
No primeiro sub-nível grande metrópole nacional está a cidade de São Paulo, o
maior conjunto urbano do País, com quase 20 milhões de habitantes. No segundo
sub-nível metrópole nacional estão as cidades do Rio de Janeiro, que possui
152
quase 12 milhões de habitantes, e Brasília, com mais de 3 milhões de habitantes.
Salvador se encontra no terceiro sub-nível metrópole , juntamente com Manaus,
Belém, Fortaleza, Recife, Belo Horizonte, Curitiba, Goiânia e Porto Alegre.
Os outros quatro níveis de classificação das redes urbanas e das cidades
brasileiras, nesse estudo do IBGE (2008), são: capital regional, centro subregional, centro de zona e centro local. As capitais regionais são 70 centros que
também se relacionam com o estrato superior da rede urbana, têm capacidade de
gestão territorial semelhante à das metrópoles, e possuem entre 250 mil e 1
milhão de habitantes. O nível do centro sub-regional é formado por 169 centros,
com atividades de gestão menos complexas. Já o centro de zona possui 556
cidades de menor porte, que não possuem muitas relações e exercem funções de
gestão elementares. O último nível, o centro local, agrega as cidades cuja atuação
não extrapola os limites do próprio município (IBGE, 2008).
A rede urbana, de influência liderada pela cidade do Salvador, contempla seis
capitais regionais, 16 centros sub-regionais, 41 centros de zona e um total de 486
municípios. É composta por uma população de quase 16,5 milhões de pessoas, em
uma área de quase 600 mil quilômetros quadrados. A rede de influência, liderada
pela cidade do Salvador, representa quase 5% do PIB nacional, ocupando a sétima
posição entre as 12 redes urbanas comandadas pelas metrópoles brasileiras. Além
disso, abriga quase 9% da população do País. A metrópole soteropolitana
concentra 22,4% da população e 44% do PIB de toda a rede que lidera, com um
153
PIB per capita de R$ 12,6 mil, enquanto a média das outras cidades que
compõem a rede é de apenas R$ 4,6 mil (IBGE, 2008).
Na distribuição das sedes de grandes empresas, segundo dados divulgados pela
Editora Abril, em sua coluna Valor Econômico, em 2005, Salvador ocupava a
sexta posição nacional e a primeira entre as cidades nordestinas, com um total de
32 sedes de grandes empresas instaladas em seu território. É também sede de uma
das 50 maiores instituições financeiras do País (IBGE, 2008).
No Censo de Educação Superior, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais (INEP), em 2004, Salvador obteve a sexta colocação
entre as cidades brasileiras que mais matricularam no ensino de graduação,
atingindo cerca de 107 mil matrículas. Passados cinco anos, esse número está
num patamar muito maior, visto que, nos últimos anos inúmeros novos cursos
Tabela 9 Distâncias médias dos centros de destino por quilômentros
Fonte: IBGE, Região de influência das cidades, 2007.
154
foram criados e as universidades públicas, estaduais e federais, ampliaram
significativamente o número de vagas oferecidas.
Em relação às distâncias médias percorridas pelos habitantes das cidades
brasileiras para terem acesso aos equipamentos e serviços, Salvador mantém-se
acima da média nacional em praticamente todos os itens analisados pelo IBGE,
conforme a Tabela 9.
As relações das redes de cidades, que o estudo do IBGE (2008) realizou,
determinava a influência direta e indireta dos grandes centros urbanos na
dinâmica territorial brasileira. Esta noção de que a localização influencia
significativamente no desenvolvimento econômico e social das populações já vem
sendo esboçada desde o século XIX, quando Thunen sistematizou, em 1826, a
Teoria de Localização da Produção Agrícola (apud SCHUMPETER, 1982), que
dizia que o mercado se organizava em torno dos locais onde se concentrava a
produção e vice-versa. Weber, em 1909, também tangenciou a questão da
influência da localização, quando desenvolveu a Teoria de Localização Industrial
(apud DIAS, 2003).
Mas apenas Christaller (1966), em sua Teoria das Localidades Centrais, elaborou
um argumento que procurava a correspondência dos serviços e instituições
urbanas com as teorias de Thunen e Weber. Christaller (1966) se baseou na ideia
de que os fatores fundamentais do sistema de localidades centrais eram a
155
hierarquia gerada pelo mercado, que o tráfego e a circulação afetavam os custos, a
depender do nível de demanda, e que a estrutura administrativa das organizações
estavam voltadas para as oportunidades de mercado.
O IBGE (2008) ao realizar este estudo que mostrou a nova dinâmica da rede
urbana brasileira e apontou os 12 maiores centros urbanos brasileiros como os
principais líderes das redes de relações das cidades, traçando as suas regiões de
influências que, de certa forma, corroborava a teoria de Christaller (1933), visto
que atribuia às localidades centrais a gestão territorial do País. Trazendo esse
contexto para a cidade do Salvador, considerada no estudo do IBGE (2008) como
uma das principais metrópoles do País, por possuir uma grande importância no
cenário nacional, tanto do ponto de vista da dimensão populacional e territorial,
quanto pelo grande número de relacionamentos que mantém com outras cidades
da sua rede de influência regional, é possível aplicar a teoria de Christaller (1933),
considerando as devidas proporções.
Há uma série de eventos históricos, que envolvem questões de mercado, que
podem ter influenciado na centralidade da cidade do Salvador. A descoberta do
primeiro poço de petróleo do país em 1939, por exemplo, pode ser considerado
um desses. Toda uma cadeia produtiva se forma por conta de um evento dessa
natureza. A força do capital fortalece o mercado que, por sua vez, ampliam as
redes de influência e atraem pessoas interessadas em se beneficiar das suas
oportunidades. Daí então surge necessidades de recursos materiais e intelectuais,
de produtos e serviços, de comunicação, de lazer e entretenimento...
156
No novo contexto tecnológico as noções de centralidade desenvolvidas por
Thunen, Weber e Christaller, entretanto, apesar de muito coerentes e robustas,
podem ser relativisadas. Levy (1995), quando sistematiza os seis princípios
fundamentais da hipertextualidade, ele destaca o princípio da “mobilidade dos
centros”, em que trata da noção de centralidade na nova ambiência tecnológica
digital.
Para o autor, no âmbito do ciberespaço, a centralidade está sugeita a novas
reflexões, uma vez que este possui uma estrutura sem centro ou, no mínimo, onde
é constantemente recentrado. No ciberespaço, o centro é virtual e não pode ser
localizado em nenhum ponto exato, mas pode momentaneamente, ser demarcado
em qualquer um dos muitos pontos possíveis existentes na rede. O centro no
ciberespaço é sempre o local virtual em que a pessoa se encontra naquele
momento. E o centro não é o mesmo para todos os usuários, mas algo individual.
Tomando como base a ideia de que as cibercidades propiciam os chamados
ciberterritórios, como produto da contrução social e das vivências das pessoas
neste ambiente hibrido formado pelo território físico e virtual informacional que
se forma no momento atual, a noção de centralidade terá que ser repensada, uma
vez que em se tratando de um ambiente hibrido físico e virtual há, pelo menos,
dois centros, em questão:
a) o centro do ponto de vista do território físico - determinado,
predominantemente, conforme Christaller (1966), pela conjuntura de
157
mercado, e, por isso mesmo, passível de ser definido;
b)
o centro virtual do ciberespaço - indeterminado, pois varia a partir do
ponto em que o usuário se encontra na rede naquele exato momento. Isso
que dizer que o seu centro pode ser um agora, outro daqui a há alguns
segundos e outro completamente diferente daqui há alguns minutos, além
de ser diferente para cada usuário, pois é instituído a partir da sua
navegação pela rede.
Neste sentido, graças a hibridez dos ciberterritórios, que proporciona o que Levy
(1995) chamou de princípio da mobilidade dos centros, a teoria da centralidade
(CHRISTALLER, 1966), que atribui ao mercado o principal fator centralizador,
apesar de válida no seu contexto, passa a ser relativisada, pois agora, o cidadão,
independente de estar ou não em um local central, do ponto de vista do espaço
físico, ele pode ter acesso as mesmas informações e até aos mesmos bens físicos, a
partir do acesso aos ambientes virtuais, de alguém que está no local físico central.
Antes do advento das tecnologias digitais, uma cidade do interior, por ser uma
localidade periférica, não se beneficiava das facilidades mercadológicas que a
localidade central possuía, uma vez que a logística para fazer um produto chegar a
uma localidade periférica é mais complexa e isso gera um custo compatível com a
complexidade logística do processo. Por outro lado, a tradicional lei de oferta e
demanda, leva os comerciantes dos locais periféricos a se aproveitarem do fato de
as pessoas não terem opção de compra para vender com margens de lucros acima
da média.
158
No novo contexto tecnológico digital, um morador de uma cidade do interior
pode, através do acesso ao ciberespaço, passar a comprar produtos através dos
grandes portais da Internet, por preços significativamente mais acessíveis do que
compraria no comércio da sua cidade, subvertendo a antiga lógica que beneficiava
apenas a localidade central, se utilizando do princípio da mobilidade dos centros,
trazida à luz por Levy (1995).
A Teoria das Localidades Centrais para o contexto em que Christaller viveu foi de
fato muito válida, mas agora que o mundo é globalizado, os territórios
hibridizados e as possibilidades de comunicação e circulação de informações
ilimitadas, os centros urbanos nacionais podem não ser mais suficientes para
justificar a noção de centralidade pretendida na sua teoria. Por outro lado, as
localidades que se inserem de forma mais abrangente no contexto das novas
mídias e disponhem de infraestrutura para a sua disseminação na malha urbana,
podem se tornar um território premiado.
Salvador: território premiado?
Para pensar o contexto contemporâneo é preciso, necessariamente, se pensar a
indústria de tecnologia digital como motor de desenvolvimento, observando,
entretanto, que não é qualquer indústria que pode proporcionar o avanço, por
exemplo, do Vale do Silício. Neste caso, tratava-se de uma indústria que possuía
um mercado de demanda de consumo crescente e acelerada. Para se ter uma ideia,
159
em um País como o Brasil, que ainda possui um alto nível de desigualdade social,
segundo Weinberg e Brasil (2003), vende-se um computador a cada três segundos.
Isso significa a venda de quase 49 mil computadores por dia, ou
aproximadamente, 1,5 milhões de computadores por mês.É importante observar
que um computador possui componentes de hardware, que estão relacionados
com a parte física, com o equipamento em si, e os componentes de software, que
são os programas que permitem o funcionamento do equipamento. Isso significa
dizer que com o computador é necessário se adquirir também os programas que o
fazem funcionar. Neste sentido, ao produzir e vender cerca de 1,5 milhões de
computadores por mês, o Brasil cria uma demanda por software muito grande,
visto que cada computador funciona com cerca de vinte a trinta programas, que
vão de simples editores de texto a sofisticados analisadores geográficos, que se
interligam a satélites e mapeiam cada milímetro do planeta, com dados espaciais,
bi ou tridimensionais, com um excelente nível de precisão.
As duas indústrias em questão, de hardware e software, estão interligadas e fazem
parte da indústria de tecnologias digitais que, quando concentrada maciçamente
em um determinado território, pode transformá-lo em um “território premiado”,
pois este desfrutará de um legado valioso que, certamente, pode se constituir na
base da produção e do comércio mundial nas próximas décadas. É importante
observar que os “territórios premiados” estão quase sempre diretamente
relacionados aos grandes centros econômicos e localizados em cidades que
possuem fortes redes de influência.
160
Recentemente o jornal A Tarde (2007), o jornal diário de maior circulação do
Estado da Bahia, publicou uma matéria que levantava a questão: Salvador pode se
autodenominar uma cibercidade? Essa questão era levantada não exatamente por
falta de inserção da cidade na ambiência tecnológica digital que lhe possibilitasse
esse status, mas pelos profundos problemas sociais ainda encontrados na cidade.
A matéria apontava, na época, a existência de uma zona Wi-Fi na praça de
alimentação do Shopping Barra, observando que as mesas que antes eram
ocupadas, na sua grande maioria, por pessoas que buscavam os restaurantes e
lanchonetes para se alimentar, começava a receber um número cada vez maior de
outras pessoas interessadas em um atrativo, diverso dos fast-foods: a Internet. A
matéria refletia, de forma superficial, o tema que se está aprofundando, sobre os
lugares e os espaços da cidade que estão sendo ressignificados pelos seus
habitantes a partir do uso das tecnologias digitais pós-massiva.
Nesta mesma matéria, Lemos (A TARDE, 2007) é citado como fonte para
observar que “podem-se chamar de ciber (do grego kubernetes: cibernética,
cultura pilotada pela tecnologia) as cidades que oferecem a seus habitantes as
condições para o aproveitamento da tecnologia da informação”.
Com base nesta afirmação de Lemos (A TARDE, 2007), Salvador então poderia
ser considerada uma cibercidade, visto que a cidade proporciona aos seus
habitantes uma estrutura bastante organizada de acesso às tecnologias digitais e,
161
consequentemente, aos ambientes cibernéticos. Segundo o próprio Lemos (A
TARDE, 2007), “Salvador é ciber, mas a seu ritmo. Não dá pra (sic) comparar
com São Paulo, muito menos com as grandes cidades dos Estados Unidos e do
Oriente”.
Salvador, entretanto, é uma cidade dos extremos. Em relação às mídias locativas e
às tecnologias digitais, por exemplo, é uma cidade que lidera o ranking nacional,
tanto das mídias locativas classificadas como de nível zero, ou seja, as menos
interativas de todas, que são as mídias locativas analógicas impressas, quanto das
tecnologias móveis digitais, o principal signo da convergência digital e da
cibercidade.
Em relação à mídia locativa analógica impressa, que se encontra no nível zero de
interação, segundo estatística da Central do Outdoor, realizada em 2008, Salvador
possuía 1.307 placas, em 613 lugares diferentes da cidade. Para se ter uma noção
do que isso representa, em termos proporcionais, comparada à maior metrópole
nacional, São Paulo, nessa mesma época, possuía apenas 160 placas em 80 locais
diferentes. Mesmo a cidade do Rio de Janeiro, a segunda maior do Brasil, que
também possui um número bastante elevado de placas e localidades com
outdoors, este não alcança a quantidade de Salvador. A cidade do Rio de Janeiro
possuía, nessa época, 1.200 placas, em 542 localidades (CENTRAL DO
OUTDOOR, 2008).
Mas, como já observado, essa característica não implica em dizer que Salvador é
162
uma cidade analógica, pois, paralelamente a isso, possui a maior teledensidade do
País, superando São Paulo e Brasília em número de telefones celulares por
habitante. No ranking da ANATEL (2009), Salvador aparece em primeiro lugar,
com o “índice de 131,13%, o que significa 1,31 celular por habitante, seguido por
Brasília, com 128,01%, e São Paulo, com 112,59%”. Entendendo que o celular é
o maior símbolo da convergência digital e que entre os dispositivos móveis
digitais é o que mais se liga ao processo de transformação das cibercidades,
Salvador pode então ser considerada a mais ciber das cibercidades brasileiras.
A seguir, apresentam-se alguns espaços de Salvador com representações
simbólicas das camadas invisíveis, formadas pelas redes ubíquas, que permitem a
formação dos ciberterritórios. Para ilustrar de forma significativa como essas
zonas de conexão invisíveis se apresentam no território, se utilizou duas cores,
representando redes fechadas, que necessitam de senha para acesso, e, redes
abertas, livres para acesso generalizado. O tamanho e a altura da bolha
representam as zonas formadas por equipamentos mais e menos potentes, pois
quanto maior a potencia do roteador que gera a rede, maior também a área de
conexão que se cria..
Em todos os espaços aqui ilustrados, as pessoas estão se conectando, em
movimento, ou portando dispositivos que permitem a comunicação em
mobilidade, e utilizando ao mesmo tempo o espaço da cidade para trabalhar, se
divertir...
163
Fig. 19 Do Farol da Barra ...
Fig. 20 ... ao Ciberfarol da Barra.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
Manipulação gráfica na Fig.20 realizada pelo autor.
Fig. 21 Do Pelourinho ...
Fig. 22 ... ao Ciberpelourinho.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
Manipulação gráfica na Fig.22 realizada pelo autor.
164
Fig. 23 Do Elevador Lacerda ...
Fig. 24 ... ao Ciberelevador Lacerda.
Fonte: foto de Marcello Chamusca, Salvador/BA, ago, 2009.
Manipulação gráfica na Fig.24 realizada pelo autor.
165
Com essas ilustrações, busca-se de modo simbólico dar visibilidade as camadas
eletrônicas invisíveis sobrepostas no espaço territorial da cidade do Salvador, que
formam uma espécie de nuvem de acesso ao ciberespaço e que, por sua vez,
proporciona a conexão ubíqua, generalizada, encontrada na maioria absoluta dos
espaços das cidades contemporâneas.
Trata-se de mera representação simbólica, para que se possa vislumbrar, a partir
de recursos visuais, como se formam os territórios híbridos, que surgem da
intersecção dos espaços físicos que são visíveis aos olhos humanos - e virtuais
invisíveis os olhos humanos , mas que dão base para a formação dos denominados
ciberterritórios. Provavelmente, estas ilustrações podem ser reproduzidas em
várias cidades do mundo, pois, estima-se que a presença dessas tecnologias seja
generalizada, sobretudo, nas grandes cidades.
É muito importante observar que as ilustrações acima não têm a pretensão de
representar a realidade fielmente, pois não se trata de um mapeamento dos
espaços invisíveis ocupados pelas zonas de acesso Wi-Fi, Bluethoot, etc., mas tão
somente de uma representação gráfica de como as camadas eletrônicas
proporcionadas pelas multirredes de acesso sem fio, que hoje cobrem todo o
território físico habitado das grandes cidades, poderiam ser vistas com um recurso
especial de realidade aumentada para essa finalidade, facilitando o entendimento
sobre o fenômeno do diálogo urbano protagonizado pelas mídias pós-massivas,
objeto dessa obra.
166
Mas, para o estabelecimento de uma base científica que permitisse classificar
Salvador como uma cibercidade, sem muitos questionamentos, foi-se além da
representação simbólica apresentada pelas ilustrações acima dos pontos turísticos
da cidade e das citações de outros autores sobre o tema. A partir da pesquisa de
campo, em cerca de 40 localidades de Salvador, se mapeou as zonas Wi-Fi
existentes.
A tecnologia escolhida para o mapeamento foi a rede sem fio Wi-Fi, uma vez que
ela representa bem a noção da conexão ubíqua aqui pleiteada, pois são parte
determinante na nuvem de acesso generalizado que cobre a cibercidade do
Salvador e também formam camadas invisíveis no seu território, conforme
representadas nas imagens acima, proporcionando às pessoas que convivem e se
relacionam nesses espaços, a possibilidade de conexão enquanto estão em
movimento e, consequentemente, de usos diferenciados, tanto dos espaços
públicos quanto dos espaços privados, permitindo não apenas a potencialidade de
reconfiguração natural desses espaços, mas também a sua ressignificação.
167
MAPEAMENTO DE ZONAS WI-FI NO
TERRITÓRIO DA CIDADE DO SALVADOR
Edições
VNI
UCSAL
UNIVERSIDADE
CATÓLICA DO
SALVADOR
PPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
PLANEJAMENTO TERRITORIAL E
DESENVOLVIMENTO SOCIAL
Com o objetivo de dimensionar o uso da tecnologia Wi-Fi no espaço da
cibercidade do Salvador e, de forma prática, verificar se de fato as cidades estão
cobertas por camadas eletrônicas, que possibilitam a formação de ciberterritórios,
conforme se afirmou em várias passagens desta obra, buscou-se, a partir do uso
prático de dispositivos móveis digitais no espaço público, a identificação dessas
zonas Wi-Fi em alguns pontos da cidade, escolhidos previamente para serem
mapeados.
Horizonte metodológico do mapeamento
Optou-se pela obtenção de amostras de todas as regiões da cidade para que,
mesmo sem ter mapeado a totalidade do território, os resultados pudessem ser
generalizados e tomados como a realidade de toda a cidade. Foram feitos onze
roteiros, utilizando um telefone celular com acesso a Internet, modelo i-Phone 3G
e/ou um netbook equipado com modem wireless, dispositivos móveis digitais
acessíveis, sem nenhum recurso tecnológico adicional, mas que permitem
perfeitamente o reconhecimento de redes Wi-Fi e apresentam nomes e
possibilidades de conexão a essas redes, quando as detectam.
Os roteiros escolhidos contemplam 45 localidades de Salvador, distribuídos em
toda a extensão territorial da cidade. Para a escolha dessas localidades tomaramse como critérios a sua densidade demográfica, além da tradição e popularidade,
priorizando-se os bairros com densidade alta, sem deixar de verificar os bairros
169
tradicionais e populares de menor densidade, conforme as faixas populacionais
por km² (ATLAS RM SALVADOR, 2006):
a) de 223,0 a 6.102,0 8 localidades: Placaford, Piatã, Amaralina, Campo
Grande, Carmo, Comércio, Calçada e Boa Viagem;
b) de 6.102,1 a 10.387,0 7 localidades: Barra, Matatu, Federação,
Aquidabã, Baixa dos Sapateiros, Pelourinho e Lobato;
c) de 10.387,1 a 13.999,0 10 localidades: Armação, Rio Vermelho, Ondina,
Brotas, Garibaldi, Sete Portas, Barbalho, Curuzu, Cajazeiras V e X;
d) de 13.999,1 a 24.546,0 7 localidades: Itapuã, Pituba, Pero Vaz, Paripe,
Sete de Abril, São Marcos e Cajazeiras IV; e,
e) de 24.546,1 a 58.406,0 13 localidades: Vasco da Gama, Lapinha,
Liberdade, Bonfim, Ribeira, Mont Serrat, Caminho de Areira, Uruguai,
Plataforma, Itacaranha, Escada, Periperi e Coutos.
170
Mapa 1 Mapa da densidade demográfica da cidade do Salvador.
Fonte: gerado através do ATLAS RM SALVADOR (2006).
171
Considerou-se, também, o critério de classe social predominante, a partir da
aplicação do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (ATLAS RM
SALVADOR, 2006). Este último quesito foi incluído com a intenção de verificar
se existem padrões diferentes, no uso da tecnologia Wi-Fi, nos territórios que
possuem predominância de habitantes de classes sociais diferentes para, com isso,
se chegar a conclusões significativas a respeito de algumas hipóteses que
sustentavam a pesquisa executada para a elaboração desse trabalho, como a noção
de redes ubíquas, conexão generalizada, comunicação móvel pervasiva e a
formação de ciberterritórios no contexto das cidades contemporâneas.
Como critério de análise do uso das tecnologias Wi-Fi na cidade do Salvador,
considerou-se a presença e a quantidade de redes por espaço e localidade para se
medir a densidade de camadas digitais no espaço da cidade, a partir da seguinte
classificação:
Tabela 10 Classificação das faixas de densidade de camadas digitais no espaço da cidade
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
172
O mapeamento realizado não pretendeu apontar com precisão a identificação da
presença e nem da quantidade de redes nos locais mapeados, primeiramente
porque o mapeamento foi resultado de simulação feita por um cidadão comum,
com equipamentos simples, circulando pela cidade. Em segundo lugar, porque
também se quer registrar a metamorfose dos ciberterritórios, uma vez que a
estrutura identificada em um determinado local no dia e no horário do
mapeamento pode não condizer com a estrutura desse mesmo local em hora e dia
diferentes, pois as redes podem ser agregadas e desagregadas a todo instante,
alterando a densidade observada naquele local em tempos diversos.
A precisão no mapeamento, entretanto, não é a constatação primordial para esta
pesquisa, visto que o que se deseja provar é que os cidadãos dos centros urbanos
realmente vivem envolvidos em “nuvens” de conexão que permitem o uso do
espaço público para acesso permanente ao ciberespaço, o que pode confirmar a
formação dos ciberterritórios (CARVALHAL, 2008), como produto dos “espaços
construídos”, nos “territórios usados” (SANTOS, 2005), a partir da formação de
ambientes híbridos, formados pelo físico e o virtual.
Neste sentido, a grande maioria das zonas Wi-Fi identificadas neste mapeamento,
não se tem precisão de onde se origina, pois o levantamento consistiu em verificar
o nome, o tipo aberta ou fechada e a quantidade de redes sem fio baseadas na
tecnologia Wi-Fi que estavam disponíveis no momento da verificação. Essas
informações foram tidas como sufucientes para a consecução do objetivo do
173
levantamento, que é o de provar que a cidade do Salvador, assim como qualquer
outra grande cidade do mundo na atualidade, tem o seu território físico quase
totalmente coberto por camadas digitais que, por sua vez, permitem a conexão
ubíqua e generalizada.
Algumas redes foram passíveis de identificação precisa. Nestes casos se procedeu
com registros fotográficos, não só para ilustrar, mas também para representar as
outras redes identificadas sem precisão.
Os dados sistematizados no mapeamento foram os seguintes:
a) nome da localidade e/ou bairro;
b) quantidade de zonas Wi-Fi fechadas e abertas;
c) classificação da densidade de camadas digitais;
d) imagem de satélite da localidade;
e) redes específicas identificadas através de registro fotográfico, quando
houver.
No final do mapeamento são realizadas análises generalizantes dos aspectos
globais do levantamento, sobretudo, a respeito do seu objetivo principal, que
envolve a possibilidade de comunicação e de interação com os ambientes, que se
tem na atualidade, enquanto se está em movimento pela cidade.
174
Mapeamento
Notou-se que durante o mapeamento alguns nomes de redes se repetem. A
princípio, essa repetição pode acontecer por, pelo menos, três motivos distintos:
a) a “bolha” formada pela rede possui grande dimensão, graças a potência do
equipamento utilizado para “rotear” a conexão. Esse caso só pode acontecer
quando as localidades são próximas. Aqui, está se falando de uma mesma
rede que é possível ser acessada a partir de locais diferentes;
b) a empresa de informática contratada para configurar a rede utiliza o nome da
própria empresa para identifica-la. Neste caso é possível identificar redes
em bairros e regiões diferentes da cidade com o mesmo nome. Aqui, apesar
de ter o mesmo nome, são redes distintas;
c) pessoas ou instituições homônimas nominalizam as redes com nomes iguais.
Neste caso pode acontecer das redes serem tanto de localidades próximas
quanto distantes. Aqui as redes também são distintas, apesar de possuírem o
mesmo nome.
Muitas redes com o nome “Default” foram encontradas ao longo do mapeamento.
Neste sentido, torna-se relevante observar que o termo é utilizado no ambiente
tecnológico como sinônimo de “padrão”. Ex.: quando um computador vem de
fábrica com o sistema Windows, está na configuração “Default” ou “Padrão”. Se
o usuário quiser pode ir adaptando a configuração às suas necessidades. Neste
caso estará tirando a configuração do “Default” e personalizando-a.
175
No caso específico das redes Wi-Fi, o título Default quer dizer que ao instalar o
roteador que possibilita a rede existir utilizou-se a configuração padrão, sem
nenhuma alteração personalizada para o usuário.
O bairro da Pituba foi mapeado apenas por celular. Foi o único bairro que não
contou com o netbook, que tem um modem de maior potência e que, por isso
mesmo, identifica com maior facilidade as redes sem fio disponíveis. Mesmo
assim, a Pituba foi o bairro onde se conseguiu identificar o maior número de redes
com precisão. Isso se deve ao fato dos nomes das redes serem mais compatíveis
com os nomes das instituições que as utilizam.
Há algumas redes Wi-Fi cobrem uma área significativa e podem ser notadas em
várias ruas das adjacências. Tomando como base as simulações gráficas, que
representam as zonas de conexão sem fio através de uma bolha semitransparente,
como se viu anteriormente, para ilustrar pontos turísticos de Salvador, a
representação dessas redes supracitadas exigiriam uma ilustração de uma bolha de
grande circunferência.
No bairro da Pituba constatou-se a existência de uma desproporção entre redes
fechadas e abertas, predominando as redes fechadas. Acredita-se que essa
predominância se deve ao fato de haver no local um grande número de pessoas
que utilizam a tecnologia Wi-Fi com muita frequência. Isso faz com que as
pessoas busquem configurar as suas redes com segurança, para que usuários não
176
autorizados utilizem suas redes e com isso percam largura de banda na conexão
ou haja interferência em seus acessos. Além disso, na região da Pituba nota-se
uma predominância absoluta de redes empresariais, que atuam na perspectiva do
negócio, sem nenhum interesse em compartilhamento de acesso e nem mesmo
permitir acesso aos seus clientes de forma gratuita. Deste universo, excetuam-se
algumas empresas de serviços, como hotéis, restaurantes, lanchonetes, dentre
outras, que utilizam o acesso sem fio de forma estratégica, para atrair o cliente
para o seu ambiente de serviço.
Em algumas localidades nota-se que não há preocupação em fechar o acesso. A
impressão inicial que se tem é que esse acesso é liberado porque os usuáriosproprietários das redes desses locais acreditam que as pessoas, que por ali
circulam, não estejam aptos a utilizar a rede sem fio para acessar a Internet,
apesar da constatação já apontada, de que o uso das tecnologias digitais não está
diretamente vinculado aos níveis social, econômico e muito menos educacional
dos usuários.
A Estação Aquidabã foi a primeira localidade mapeada em que foram encontradas
mais redes públicas abertas do que privadas ou fechadas. As características do
local apontam para a sustentação da mesma hipótese da despreocupação com a
restrição de acesso a transeuntes.
O levantamento realizado no bairro da Liberdade leva à confirmação de que o uso
177
das tecnologias móveis digitais independem da classe social e poder aquisitivo do
cidadão. A Liberdade é um dos bairros de Salvador que concentra um grande
contingente de pessoas carentes e surpreendentemente todas as localidades
mapeadas do bairro possuem alta densidade digital, com concentração de mais de
20 redes por localidade, o que posiciona o bairro da Liberdade como um dos que
mais concentra camadas digitais que cobrem o espaço físico da cidade e dão aos
cidadãos acesso aos ciberterritórios.
O trecho entre a Estrada da Liberdade e o largo da Soledade possui uma
característica bem específica e diferenciada dos demais trechos levantados, que é
a equivalência numérica entre as redes abertas e as fechadas, além da
predominância da alta densidade digital em todas as localidades.
O trecho que compreende o bairro do Barbalho, verificaram-se diferenças
significativas em relação ao bairro vizinho da Liberdade. Enquanto na Liberdade
a faixa de densidade digital é sempre alta, no Barbalho permanece
predominantemente média, com apenas algumas localidades pontuais mostrando
alta densidade. Outra diferença significativa entre os dois bairros vizinhos referese às redes abertas e fechadas. Enquanto na Liberdade há um equilíbrio entre os
dois tipos de redes, no Barbalho, assim como em outros bairros como Pituba e
Brotas, por exemplo, a concentração de redes fechadas, que exigem senha de
acesso, é muito maior.
178
Uma localidade chamou bastante atenção e se destacou nas análises do
mapeamento: o início da Via Regional, em que há uma comunidade altamente
carente, com construções residenciais com pouca ou nenhuma infraestrutura, com
uma população que, até pouco tempo, sobrevivia do lixo que era jogado num
aterro sanitário que ficava próximo dessa localidade. Como o local não domicilia
empresas, a não ser pequenos armazéns e bares, previa-se a completa ausência de
redes Wi-Fi, uma vez que, em tese, tratava-se de uma população sem nenhuma
proximidade com o ambiente tecnológico digital, sobretudo, das tecnologias
móveis digitais. Ao contrário disso, encontrou-se uma localidade com média
densidade de camadas digitais, ou seja, uma concentração muito significativa para
as características do ambiente.
Nessa região também se identificou um número maior de redes abertas do que
fechadas. Nesse caso, inclusive, o número de redes abertas superara em dobro o
número das fechadas.
Vale observar que devido à metamorfose dos ciberterritórios, os quatro pontos
cegos encontrados no dia do mapeamento, realizado de 23 de julho a 2 de agosto
de 2009, poderiam não ter sido identificados novamente no dia seguinte ou
simplesmente num horário diferente do mesmo dia, visto que uma rede pode ser
acionada naquela localidade e mudar a sua configuração a qualquer momento. Os
pontos cegos geralmente são encontrados em lugares em que há pouco ou nenhum
movimento de pessoas.
179
Análise dos resultados do mapeamento das redes Wi-Fi no território da
cidade do Salvador
Foram mapeados ao todo 105 espaços de 45 localidades da cidade do Salvador.
Dos 105 espaços verificados, 65 possuem alta densidade digital, ou seja, possuem
uma grande concentração de “bolhas” zonas Wi-Fi que permitem conexão aos
usuários traseuntes. 26 espaços possuem média densidade e 14 espaços baixa
densidade, conforme se pode conferir na Tabela 11, nas próximas três páginas.
180
181
182
Tabela 11 Resumo do levantamento realizado
Fonte: Tabela elaborada pelo autor, 2009.
183
Esses resultados permitem afirmar que a concentração de “bolhas” informacionais
na cidade do Salvador é alta, e estas formam, de fato, uma “nuvem” de conexão
que acompanha as pessoas em praticamente todos os espaços da cidade, uma vez
que se constatou que os espaços de alta densidade digital somam mais da metade
do universo observado, tendo em segunda colocação os espaços de densidade
média e por último os espaços de baixa densidade.
Com base no levantamento, realizado na cidade do Salvador, que não é uma das
mais desenvolvidas do País, seja economica ou tecnologicamente, é possível,
portanto, se generalizar e afirmar que as redes Wi-Fi estão se popularizando em
todo o mundo, sobretudo nas grandes cidades, em um nível muito superior ao que
se pode identificar comumente.
Em Salvador mesmo sem nenhum projeto do poder público que envolva a
popularização do acesso Wi-Fi, disponibilizando-o em praças, parques, ônibus ou
em outras localidades centrais, e tendo como base que seriam essas
disponibilidades que possibilitariam o acesso ubíquo , conforme se pode conferir
nos dados do mapeamento, é muito difícil se encontrar um local que não esteja
coberto por uma zona Wi-Fi, fechada, com acesso através de senha, ou aberta para
acesso generalizado.
Foram encontradas 1.681 redes, sendo que a proporção de redes fechadas e
184
abertas é a seguinte: 1.288 redes fechadas, que representam 77% das redes
encontradas, contra 393 redes abertas ou 23%, conforme pode se verificar no
gráfico abaixo.
Gráfico 15 Redes Wi-Fi fechadas e abertas
Fonte: Gráfico gerado pelo autor, 2009.
Conforme se enfatizou, foram encontrados quatro pontos cegos em todo o
mapeamento. Apesar disso, pode-se afirmar que esses espaços da cidade não estão
descobertos de camadas digitais, provenientes de outras redes sem fio, que
possibilitam a formação dos ciberterritórios. No caso específico dos pontos cegos
Wi-Fi encontrados no levantamento realizado, todos eles estão cobertos pelas
185
redes de telefonia celular, o que garante o ambiente de conexão generalizada, que
envolve os habitantes da cidade, onde quer que eles se encontrem, permitindo-os
se comunicarem, produzirem, consumirem e distribuirem informações em
movimento.
Os locais onde se encontrou os pontos cegos são locais em que a ocupação
humana é ínfima, ou seja, a relação deles com o espaço é de pouca construção de
sentidos, uma vez que a circulação de pessoas praticamente não acontece. Com
exceção de um dos pontos, o localizado no bairro do Lobato, que ocorreu em um
local de alta concentração de moradias.
É importante observar que este ponto cego pode ter aparecido no dia e na hora em
que foi realizado o mapeamento, mas que, devido a característica da metamorfose
dos ciberterritórios, pode não se configurar como um lugar sem cobertura Wi-Fi
definitiva, mas apenas que se encontrava naquele exato momento do
levantamento, sem cobertura.
No geral, a densidade de redes oscila pouco de um bairro para outro, mesmo
quando são bairros com características econômicas diferenciadas, como é o caso
da Pituba e do Vale da Muriçoca, o que não permite afirmar que o uso é mais
frequente ou mais concentrado em bairros de maior poder aquisitivo. Em alguns
casos, como o citado acima, no exemplo do Vale da Muriçoca e Pituba, a
186
realidade é exatamente contrária. Observou-se uma maior densidade de redes no
Vale da Muriçoca bairro proletário que em várias localidades da Pituba bairro de
classe média.
Analisando os nomes que identificam as redes, percebe-se que muitos usuários
utilizam esse recurso como forma de comunicação, mandando mensagens sobre
quem são ou o que desejam. Muitos utilizam o recurso do humor, denominando a
rede com piadas e outras formas do gênero. Outros detectaram no sistema de
nominação da rede uma forma de realizar negócios. Muitas redes são nominadas
com números de telefones, endereços de e-mail ou de sites da Internet, para que o
usuário que detectar a rede, e esteja precisando usá-la, possa entrar em contato e
pagar pelo acesso.
Para dar a dimensão do levantamento realizado, elaborou-se um mapa (vide Mapa 2)
no qual se pode vizualizar, nas localidades mapeadas, as redes Wi-Fi fechadas e
abertas, identificadas através de cores diferenciadas. Esse mapa mostra que o número
de redes fechadas ainda é predominante, conforme se pôde constatar também no
Gráfico 15, apesar de já existir uma quantidade significativa de resdes abertas no
espaço da cidade, mesmo não havendo nenhum projeto governamental ou privado de
acesso generalizado gratuito para a população que tenha sido detectado por esse
estudo.
187
MAPA IDENTIFICAÇÃO DE REDES WI-FI
EM 45 LOCALIDADES DE SALVADOR
LOCALIDADES
39
38
37
36
35
34
42
31
30 29
28
33
27 32
232417
26 22 16
25 21
20 18
11
19
15
9
40
45
44
43
41
2
10
4
38º21’ W
13
14
5
6
7
LEGENDA
Redes Wi-Fi fechadas
12
8
1
3
13.1 Km
13º S
Redes Wi-Fi abertas
Pontos cegos
1 - Itapuã
2 - Placafor
3 - Piatã
4 - Armação
5 - Pituba
6 - Amaralina
7 - Rio Vermelho
8 - Ondina
9 - Barra
10 - Brotas
11 - Matatu
12 - Vasco da Gama
13 - Federação
14 - Garibaldi
15 - Campo Grande
16 - Sete Portas
17 - Aquidabã
18 - Baixa dos Sapateiros
19 - Pelourinho
20 - Carmo
21 - Barbalho
22 - Lapinha
23 - Liberdade
24 - Curuzu, Pero Vaz
25 - Comércio
26 - Calçada
27 - Caminho de Areia
28 - Ribeira
29 - Bonfim
30 - Boa Viagem
31 - Monte Serrat
32 - Uruguai
33 - Lobato
34 - Plataforma
35 - Itacaranha
36 - Escada
37 - Periperi
38 - Coutos
39 - Paripe
188
CONCLUSÕES
A principal e mais contundente constatação, depois das análises realizadas, a partir
da confrontação dos resultados da pesquisa quantitativa, com 1.230 usuários da
Internet, e da pesquisa qualitativa que envolveu observação, realização de
entrevistas semi-estruturadas e uma revisão bibliográfica prévia sobre territórios e
tecnologias digitais pós-massivas, é a de que o advento das mídias pós-massivas
vem tornando as cidades cada vez mais complexas, sobretudo, no momento mais
recente, quando se identifica a possibilidade de mobilidade comunicacional nos
seus espaços públicos e privados.
O processo infocomunicacional, objeto central deste estudo, dá base a essa
constatação, na medida em que envolve o diálogo das mídias locativas com os
dispositivos móveis digitais no espaço da cidade, somente possível graças às
tecnologias de conexão sem fio, que ao se espalharem pela malha urbana,
proporcionam um ambiente generalizado de conexão, que acompanha o cidadão
em todos os lugares, validando a noção de comunicação móvel pervasiva, na
medida em que forma uma espécie de “nuvem” de conexão que cobre todo o
espaço territorial da cidade, o que neste estudo se convencionou a chamar de
conexão ubíqua.
Por outro lado, os resultados, obtidos com o extenso levantamento da presença de
redes Wi-Fi, realizado em 45 localidades e 105 espaços da cidade do Salvador
189
potencializam novas formas de se pensar o território, na medida em que revelam a
sua hibridez e as múltiplas possibilidades de apropriação que esses territórios
híbridos pelas pessoas, instituições e Estado.
Ao se provar, através do levantamento de zonas de conexão Wi-Fi existentes no
espaço público da cidade do Salvador, que as camadas eletrônicas provenientes
destas redes formam, de fato, uma “nuvem” de conexão que envolve o cidadão
que permanece ou transita em toda a sua extensão territorial e, com isso,
constatar-se não só o ambiente de conexão ubíqua, mas também a comunicação
móvel pervasiva no espaço da cidade, se permitiu um avanço significativo nas
discussões sobre o tema, pois as possibilidades de teorização agora se baseiam em
dados de pesquisa empírica, tirando o tema do patamar que antes se encontrava no
campo apenas hipotético e especulativo.
Surgem dessa discussão, já como aprofundamento sobre as consequências do
fenômeno do diálogo urbano aqui investigado, muitos conceitos importantes,
dentre os quais se pode destacar o de ciberterritórios, como produtos da vivência
dos cidadãos nos territórios híbridos, físico e virtual , proporcionada pelo uso das
tecnologias digitais pós-massivas no espaço da cidade.
A noção de ciberterritórios amplia as análises sobre territorialidade, na medida em
que insere a dimensão geografica nas discussões sobre o ciberespaço, pois percebe
que do novo contexto tecnológico digital das cidades contemporâneas surge uma
também nova noção de lugar, que subverte a ideia amplamente difundida de que
190
com o advento do ciberespaço os espaços físicos perderiam importância e que o
mundo entraria em um processo de desterritorialização sem precedentes. As
mídias locativas, os dispositivos móveis digitais e as multirredes sem fio
desconstroem completamente essa idéia e põem as discussões das tecnologias
digitais em um outro patamar, pois mostram que, através do diálogo que se
mantêm no espaço urbano, a dimensão virtual não está descolada da dimensão
física, pois o ciberespaço é ocupado pelas pessoas que, por sua vez, estão
indissociavelmente vinculadas ao espaço físico.
Ao interferir na relação construída, das pessoas com os espaços, as experiências
vividas nos ciberterritórios podem ressignificar ou, no mínimo, reconfigurar o
lugar para essas pessoas e ainda das instituições, uma vez que, ao vivenciar
experiências vinculadas a conteúdos digitais diretamente relacionados ao
processo de intervenção pessoal no espaço urbano, elas tendem a mudar a sua
concepção sobre os espaços de compartilhamento ideal com seus pares e com o
próprio espaço físico usado da cidade para esse compartilhamento.
É importante salientar que esta obra não propõe a ideia de que a cidade
contemporânea esteja se transformando simplesmente porque está sendo invadida
por equipamentos digitais, mas porque novos paradigmas estão emergindo da
atual ambiência tecnológica, bem como de outros paradigmas que têm sido
relativizados, ou tido sua validade questionada, sobretudo, os que dizem respeito
às relações tempo-espaço, real-virtual, homem-máquina, dentre muitos outros
191
modelos que se entendia como definitivos para a análise da sociedade, há bem
pouco tempo.
As sete conclusões genéricas que podem ser consideradas o cerne deste estudo,
portanto, são as seguintes:
a)No contexto tecnológico das ciberdades contemporâneas, o lugar baseado
no espaço físico , ao contrário do que se difunde no senso comum, e até em
alguns espaços acadêmicos, ganha uma força cada vez maior, pois as
relações sociais mediadas por dispositivos móveis e as mídias locativas
digitais, se estabelecem a partir deles: dos lugares. As informações digitais,
das quais os cidadãos necessitam no seu dia-a-dia, nesta nova fase das
tecnologias digitais, partem dos lugares, pois o ciberespaço que antes só se
concebia “lá em cima”, e “descolado” do mundo real e do espaço físico,
agora pode se encontrar nos equipamentos públicos ou objetos que
compõem a paisagem “aqui em baixo”, interferindo diretamente nas
relações das pessoas com o espaço territorial vivido e construido;
b) essa conjuntura destroi completamente a ideia que se difundiu, até o final do
século passado, de que as tecnologias digitais e a Internet
desterritorializariam tudo e que as ferramentas analógicas iriam
gradativamente desaparecer na medida em que se virtualizariam para serem
inseridas na nova realidade. As previsões do fim das cidades, das relações
sociais e de muitas outras coisas, que se julgavam tão verdadeiras na época,
foram completamente descaracterizadas. Com a noção de conexão ubíqua
192
no espaço da cidade comprovada e o diálogo urbano dos dispositivos móveis
com as mídias locativas garantido, que garantem as pessoas se
comunicarem, interagirem umas com as outras e com instituições,
consumirem, produzirem e distribuirem informações enquanto estão em
movimento, as análises geográficas dos aspectos territoriais voltam a tomar
corpo e a se estabelecer como foco para o entendimento do complexo
processo infocomunicacional que o conjunto tecnológico atual disponibiliza
para comunicação no seio da sociedade;
c) a possibilidade de conexão em movimento que, por sua vez, possibilita a
mobilidade física e informacional de forma conjunta, cria novas perspectivas
para os cidadãos que não precisam mais estar presos a lugares para poder
acessar a Internet e realizar tarefas pessoais ou profissionais. Isso faz com
que o território não se configure mais apenas pelas suas características
físicas, mas também pelas informacionais, que advêm de bancos de dados
que emitem informações, que são captadas por dispositivos eletrônicos
específicos, que completam o processo infocomunicacional estabelecido. É
neste momento que a cidade começa se tornar uma cibercidade, uma vez que
os territórios agora ganham camadas eletrônicas que possibilitam, como
produto das relações sociais por meio do uso das tecnologias digitais, a
formação dos ciberterritórios;
d) há nesse ambiente a possibilidade de reconfiguração do espaço urbano, à
medida que este incorpora as camadas eletrônicas, advindas das redes de
conexão sem fio que se cria e se hibridiza com o espaço físico da cidade,
tornando-o cada vez mais difícil o descolamento e identificação do que é
193
físico e do que é virtual, do que vem do ciberespaço e do que vem da vida
real, pois o ciberespaço não está mais apenas “lá em cima”, para ser
acessado “aqui de baixo”, mas está nos objetos utilizados pelas pessoas em
suas residências, escritórios ou mesmo nas ruas da cidade;
e) nas cibercidades, com o advento das mídias locativas, dos dispositivos
móveis e das redes ubíquas, que proporcionam conexão generalizada e
envolve o usuário em todos os lugares em que ele circula, a partir da
formação de uma espécie de nuvem de conexão, se defende a idéia de que
tudo é locativo, pois está sempre vinculado a um local, a um espaço físico de
referência, a um território onde as relações são construídas e vividas pelas
pessoas. Se mesmo antes, quando se pensava no processo de
desterritorialização total, o lugar já possuía importância, visto a condição
indissociável do homem de um espaço físico de referência, hoje, que o
ciberespaço está contido nas “coisas”, nos objetos e equipamentos que
ocupam os espaços da cidade, o lugar agora passa a ser um dos principais
focos de atenção dos estudos sobre a sociedade contemporânea, pois, nessa
visão, não há nada que não se possa pensar do ponto de vista da localização;
f) muito mais importante que a possibilidade de dialogar no espaço físico, as
mídias locativas possibilitam ao cidadão a interação com o espaço da cidade,
permitindo, inclusive, aos usuários, intervir no seu espaço físico, anexando
conteúdo digital aos lugares. Com isso, permitem novas perspectivas de
apropriação e ressignificação dos espaços territoriais, na medida em que
potencializam a apropriação individual do espaço da cidade para anotações
194
digitais. Estas anotações, por sua vez, podem conter referenciais próprios a
respeito do espaço, que podem ser construidos por meio de interações
simbólicas e interpretações dos signos urbanos, a partir de uma lógica
também própria, ou seja, as mídias pós-massivas permitem aos usuários
interferência no espaço urbano, ressignificando-o de modo personalizado, a
partir da sua óptica individual ou por componentes de grupos de redes;
g) a análise das dinâmicas territorial e social, promovidas pelo diálogo das
mídias locativas com os dispositivos móveis digitais no espaço da
cibercidade, leva à real possibilidade de que estas podem reconfigurar e até
ressignificar esses espaços para os seus cidadãos. Alterações nas dinâmicas
social e territorial podem levar a implicações que venham modificar
comportamentos, lugares, relações sociais e o uso que as pessoas fazem do
espaço da cidade, muitas vezes reconfigurando as localidades não apenas
pela transformação nos padrões de densidade e concentração de pessoas no
âmbito da cidade, mas também pela forma subjetiva de vê-las, mudando o
seu significado tanto para o indivíduo quanto para o coletivo.
Diante dessas sete constatações centrais e generalizadoras é importante situar a
cidade do Salvador - que subsidiou as análises da pesquisa qualitativa e serviu de
delimitação territorial para o levantamento das zonas Wi-Fi - no contexto da
investigação realizada, notando que ela possui características contraditórias, que a
permite ser classificada, ao mesmo tempo, como uma autêntica metrópole do
século XXI, envolvida em uma dinâmica territorial e social fundantes das grandes
cidades contemporâneas, mas também como um exemplo de cidade tradicional,
195
que ainda possui vínculos profundos com o passado e reconhece nesse passado a
sua importância no contexto em que se encontra.
Se antes podia ser dividida entre a cidade que se encontrava em cima como sendo
esta a representação do velho e do tradicional, e a cidade que se encontrava em
baixo como sendo a cidade que descortinava o novo e abria as suas perspectivas
para a modernidade, conforme Santos o fez em 1959, na sua consagrada obra “O
centro da cidade do Salvador”, hoje, do ponto de vista tecnológico um dos
principais critérios que determinam o desenvolvimento de uma cidade na
atualidade percebe-se uma espécie de homogeinização dos processos urbanos,
não só em cima e em baixo, bem como em todas as suas novas adaptações
perimetrais, adquiridas a partir do seu crescimento ordenado ou desordenado em
diversas direções. Sem mencionar o fato de que a concepção de cidade baixa e
alta não dá mais conta do verdadeiro dimensionamento que a cidade tomou na
atualidade.
A contraposição vista na atualidade diz respeito à outra relação que não mais a da
cidade antiga alta e moderna baixa , pois a percepção que se tem hoje de
Salvador é de uma cidade multifacetada, com multiplos centros, determinados
pela distribuição dos recursos tecnológicos e do acesso a esses recursos, o que
aqui se chamou de territórios premiados. Hoje, a cidade de Salvador pode ser
pensada pelo processo infocomunicacional proveniente do diálogo urbano aqui
discutido, pois este impõe às grandes metrópoles um novo ritmo, que envolve
novas dinâmicas, que as situam no contexto das cibercidades.
196
Salvador, conforme constatado, não possui nenhum grande projeto governamental
que a coloque entre as principais cibercidades brasileiras, mas se insere neste
contexto de forma autônoma, através da sua população que, ao seguir o padrão
cosmopolita das populações dos grandes centros urbanos em todo o mundo,
assimila as novidades tecnológicas de forma contundente. Neste sentido, não
possui uma grande rede pública de conexão, mas é toda coberta por pequenas
redes comerciais e residenciais, abertas ou fechadas, que garantem as
características centrais das cibercidades: a conexão ubíqua e a comunicação móvel
pervasiva, em toda a sua extenção territorial.
Ao se criar a simbologia dos ciberlugares da cidade, buscando interrelacionar os
espaços turísticos com a conexão ubíqua e a comunicação pervasiva no espaço da
cidade, como na representação do ciberpelourinho, do ciberfarol da Barra, do
ciberelevador Lacerda, do cibermercado Modelo, dentre outros lugares
representados pelas “bolhas informacionais” das redes sem fio, espalhadas por
toda a cidade, se estabeleceu a possibilidade de entender a cidade pela perspectiva
tecnológica, incluindo-a no contexto das cibercidades. Esta representação
simbólica, emprestada de Beslay e Hakala (2005), serviu tão somente para
reforçar o seu posicionamento dentro desse contexto, visto que já assim se
estabelecia por ter alcançado a maior teledensidade do País em 2009, ou seja, por
possuir o maior número de celulares digitais, - símbolo principal do novo contexto
tecnológico -, por número de habitantes.
197
O exemplo de Salvador, portanto, permite afirmar que as novas dinâmicas
territoriais e sociais, provenientes da também nova ambiência tecnológica digital,
provocam, de fato, profundas transformações nas relações entre as pessoas, as
instituições e os espaços no âmbito urbano, o que, por sua vez, tem permitido a
ressignificação dos lugares vivenciados, pela intervenção do cidadão usuário no,
para e com o espaço.
Permite, inclusive, a constatação de que a nova ambiência tecnológica
potencializa a socialização das informações, que estão contidas no espaço
territorial urbano, possibilitando a todo e qualquer cidadão a apropriação desse
espaço público para uso privado e vice-versa. Também permite a subversão do
“mito do enclausuramento”, que dá conta de que as tecnologias digitais retraem
em algum grau, direta ou indiretamente, as relações sociais, na medida em que
fazem com que os indivíduos se restrinjam a um espaço físico limitado e deixem
de utilizar os espaços públicos das cidades. O novo ambiente tecnológico,
analisado neste estudo, remete a possibilidades diferenciadas do uso e apropriação
do território para o estabelecimento de relações mediadas pelas tecnologias
informacionais digitais. O espaço da cidade é agora um lugar para se conectar e se
comunicar com o mundo, através dos seus dispositivos móveis.
Adiciona-se o conceito de ciberterritório ao tradicional conceito de território, mas
sem alterar a noção de que é nele que as experiências humanas são concebidas, as
relações de todas as formas e tipos são construídas e permanecem em eterno
198
conflito. Ao território têm sido somadas camadas digitais, que possibilitam a
transformação das relações das pessoas e instituições com os seus espaços de
vivências, na medida em que o território passa a se constituir não só do espaço
físico apropriado, mas também está impregnado de conteúdo digital disponível
para usos diferenciados nos seus espaços de referência.
As dinâmicas territoriais e sociais, promovidas pelo processo infocomunicacional
proveniente da conexão ubíqua no espaço da cibercidade, portanto, são o produto
de uma sociedade que vem se transformando pelo paradigma central das relações
humanas, que dizem respeito à ideia de que o território é a base de tudo e o lugar
é a relação mais forte entre o homem e o mundo. As tecnologias digitais não vêm
para mudar, mas para reforçar essa ideia.
199
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208
O AUTOR
Marcello Chamusca
@mchamusca
Mestre em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social; pós-graduado em
Educação Superior e Novas Tecnologias; bacharel em Comunicação
Social/Habilitação em Relações Públicas; pesquisador da área de cibercultura
vinculado ao CNPq, desde 2006.
Coordenador do curso de pós-graduação Gestão Estratégica em Relações Públicas
da Faculdade Batista Brasileira (FBB); professor dos seguintes cursos de pósgraduação: * MBA em Marketing Digital, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), *
Comunicação e Marketing Estratégico, da Faculdade Juvêncio Terra (FJT), *
Comunicação Organizacional da Faculdade 2 de Julho (F2J), * Marketing Digital,
da Unijorge, * Gestão Estratégica em Relações Públicas, da Faculdade Batista
Brasileira (FBB), * Marketing Digital, da Faculdade Adventista da Bahia (FAB),
209
* Gestão Estratégica em Comunicação Digital, da Solaris Cursos. Além disso, é
professor do curso de Administração de Empresas da Faculdade Batista
Brasileira.
Atualmente é secretário geral da Associação Latino-americana de Relações
Públicas (ALARP-Brasil), membro do Conselho de Relações Públicas do Centro
Interamericano de Comunicação (CIC) e membro associado da Sociedade
Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (INTERCOM) e da
Associação Brasileira de Pesquisadores da Comunicação Organizacional e
Relações Públicas (ABRAPCORP).
Conferencista internacional com mais de 70 conferências e palestras realizadas
em 9 países da Europa e América Latina.
É diretor geral do Portal RP-Bahia; editor do Guia de Relações Públicas na
Internet, da revista digital RP em Revista, do boletim Orgulho de Ser RP, do
jornal digital Plantão RP-Online, da Rádio RP-Online e da RP TV, além de
colunista do Portal Nós da Comunicação e da Revista PQN.
Atua como CEO da VNI Comunicação Estratégica e Digital e como consultor de
Comunicação Social e Relações Públicas, com trabalhos realizados/em
andamento na Secretaria de Turismo do Estado da Bahia (SETUR-BA),
Odebrecht S/A, Coelba/Neoenergia, Global S/A, Instituto Procardíaco, Apae
Salvador, dentre outras.
210
É organizador dos e-books Relações Públicas Digitais (2010) e Comunicação e
Marketing Digitais (2011); autor dos livros Relações Públicas do Brasil (2007) e
Processos Infocomunicacionais e Dinâmicas Territoriais na Cidade
Contemporânea (2011); autor de cerca de 60 artigos publicados em livros e
periódicos científicos da área de comunicação e educação, além de diversos
artigos apresentados/publicados em anais de eventos nacionais e internacionais,
no Brasil e no exterior.
Vencedor do Prêmio Iniciacom 2005 na categoria Comunicação Institucional e
Relações Públicas. Recebeu a distinção Mérito Acadêmico, da Asociación
Latinoamericana de Relaciones Públicas (ALARP-Argentina), em 2009; Mérito
Profissional, do Instituto Superior de Relaciones Públicas y Cerimonial de La
Plata, em 2010. Também recebeu, da mesma instituição, pelo Portal RP-Bahia,
portal que dirige desde 2003, o prêmio de “Melhor Portal de Relações Públicas
do Brasil”, em 2010. Foi por cinco vezes professor de comunicação
homenageado da turma, em duas instituições distintas (UNIFACS e Isaac
Newton).
Foi coordenador dos cursos de Relações Públicas (2007/2009) e Publicidade e
Propaganda (2009) da Faculdade Isaac Newton; professor da Universidade
Salvador - UNIFACS (2007/2009); professor do Instituto Federal da Bahia
(2009/2011); coordenador geral da campanha nacional de valorização da
profissão de relações públicas (2006/2007) e membro das comissões
organizadora e científica da Cúpula Iberoamericana de Comunicadores
(2006/2007).
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