2014 – Abril / Maio / Junho

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2014 – Abril / Maio / Junho
Revista Médica
ISSN 1677-194X
ANA COSTA
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Conselho Editorial Revista Médica
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para bibliotecas e faculdades das áreas de saúde cadastradas.
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Revista Médica Ana Costa / Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A.
v. 19, n. 2 (abril / maio / junho 2014). Santos: Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A.,
2014.
23 p. :il.
Periodicidade trimestral
ISSN 1677 194X
1.Ciências Médicas. 2. Medicina
CDD 610
CDU 616
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b) artigos de revisão - têm por objetivo resumir,
analisar, avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação
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e análise crítica da literatura levantada e não pode ser
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informações geralmente atuais sobre tema de interesse
para determinada especialidade, uma nova técnica ou
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distintas de um artigo de revisão, visto que não
apresentam análise crítica da literatura;
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situação médica especialmente rara, descrevendo
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estudado, com indicação de sexo e idade. Pode ser
realizado em humano ou animal.
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realizado;
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pesquisa;
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e instituição onde foi apresentada;
EXEMPLOS
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Livros
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originais os resumos devem ser estruturados
destacando: objetivos, métodos básicos adotados
(informando local, população e amostragem da
pesquisa), resultados e conclusões mais relevantes,
considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas
de continuidade do estudo. Para as demais categorias,
o formato dos resumos deve ser o narrativo, mas com
as mesmas informações.
Capítulo de Livros
Discussão: deve explorar adequada e objetivamente
os resultados, discutidos à luz de outras observações já
registradas na literatura.
A primeira página deverá conter:
b) nome completo de todos os autores;
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 67, abr / mai / jun 2014
Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome
alterations in human solid tumors. In: Vogelstein B,
Kinzler KW, editors. The genetic basis of human cancer.
New York: McGraw-Hill; 2002. p.93-113.
Dissertações e Teses
Silva LCB. Aspectos da fotoestimulação intermitente
em pacientes com epilepsia: Teófilo Otoni [dissertação]. Campinas: Pontifícia Universidade Católica de
Campinas; 2000.
Attenhofer Jost CH, Connolly HM, O'Leary PW, Warnes
CA, Tajik AJ, Seward JB. Left heart lesions in patients
with Ebstein anomaly. Mayo Clin Proc. 2005; 80(3):3618.
Trabalhos de Congressos, Simpósios, Encontros,
Seminários e outros
APRESENTAÇÃO DO MANUSCRITO
a) título do artigo (em português e em inglês);
Adolfi M. A terapia familiar. Lisboa: Editorial Veja; 1982.
Artigos de periódicos
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elaboradas de forma a serem auto-explicativas, e com
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Tabelas, quadros e figuras devem ser limitadas a 5 no
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PÁGINA DE TÍTULO
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com o Index Medicus.
ESTRUTURA DO TEXTO
Introdução: deve conter revisão da literatura
atualizada e pertinente ao tema, adequada à
apresentação do problema e que destaque sua
relevância. Não deve ser extensa, a não ser em
manuscritos submetidos como Artigo de Revisão.
Metodologia: deve conter descrição clara e sucinta,
acompanhada da correspondente citação bibliográfica,
dos seguintes itens:
·
procedimentos adotados;
Harnden P, Joffe JK, Jones WG, editors. Germ cell
tumours V. Proceedings of the 5th Gern Cell Tumour
Conference; 2001 Sep 13-15; Leeds, UK. New York:
Springer; 2002.
Material eletrônico
Periódicos eletrônicos, artigos
Sabbatini RME. A história da terapia por choque em
psiquiatria. Cérebro & Mente [periódico online] dez.
1997/fev. 1998 [Acesso em 12 ago. 2000]; (4).
Disponível em:
·
universo e amostra;
http://www.epub.org.br/cm/n04/historia/shock.htm
·
instrumentos de medida e, se aplicável, método de
validação,
Monografia em um meio eletrônico
·
tratamento estatístico.
Conclusão: apresentar as conclusões relevantes,
considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas
de continuidade do estudo. Se incluídas na seção
Discussão, não devem ser repetidas.
Agradecimentos: podem ser registrados agradecimentos, em parágrafo não superior a três linhas,
dirigidos a instituições ou indivíduos que prestaram
efetiva colaboração para o trabalho.
Referências: devem ser numeradas consecutivamente
na ordem em que foram mencionadas a primeira vez no
texto, baseadas no estilo Vancouver. A ordem de
citação no texto obedecerá esta numeração. Nas
referências com 2 até o limite de 6 autores, citam-se
todos os autores; acima de 6 autores, citam-se os 6
São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente.
Entendendo o meio ambiente [monografia online]. São
Paulo; 1999. [Acesso em: 8 mar. 1999]; v.1. Disponível
em: http://www.bdt.org.br/sma/entendendo/atual.htm
Anexos e/ou Apêndices: incluir apenas quando
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padronizada, restringindo-se apenas àquelas usadas
convencionalmente ou sancionadas pelo uso,
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título e no resumo.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 67, abr / mai / jun 2014
Artigo Original
Sintomatologia e do tratamento empregado em crianças com diagnóstico de Coqueluche.............................32
Symptoms and treatment employed in children diagnosed with whooping cough
André Horcajo Agostinetti e Paulo Sergio Ciola
Perfil de pacientes com câncer criticamente enfermos em UTI..........................................................................35
Profile of critically ill cancer patients in ICU
Natasha Crepo Nahon, Ana Paula de Carvalho Odoni Rocha, Rebeca Maria Lopes Grezos eSueli Monterroso Cruz
Epilepsia – o que sabe a população geral sobre esse tema?.................................................................................38
Epilepsy – what does the general population know about this subject?
Melissa Vieira Franco, André Knudsen Santana, Carina Verissimo Mendes e Yára Dadalti Fragoso
Artigo de Revisão
Lesões císticas do pâncreas...................................................................................................................................40
The cystic pancreatic lesions
Marco Antonio Buch Cunha, Lubia Bonini Daniel, Flavia Gerbi Azevedo, Renato Brassolotto Bello, Luciana Cleaver Aun,
Osmar Silvio Garcia de Oliveira, Carlos Kioshi Furuya Junior, Ricardo Sato Uemura, Katia Ferreira Guenaga,
Dayse Pereira da Silva Aparicio e Everson Luiz de Almeida Artifon
Carcinomatose meníngea......................................................................................................................................45
Meningeal Carcinomatosis
Sureya Maria de Almeida David Gibelli e Sueli Monterroso da Cruz
Relato de Caso
Seguimento e gravidez no pós-esvaziamento uterino devido à mola hidatiforme....................................48
Follow up and pregnancy after emptying of the uterus owing to hydatidiform mole
Daniel Machado e João Henrique Araújo Fernandes
Drusas da cabeça do nervo óptico e membrana epirretiniana.....................................................................51
Drusen of the optic nerve head and epiretinal membrane
Felipe Alves Utyama, Celso Afonso Gonçalves e Marcos Alonso Garcia
Tuberculose geniturinária................................................................................................................................54
Tuberculosis of the testis
Felipe Camargo Bestane, André Luiz Farinhas Tomé, Mohamad Dib Salah Ali e Fernando Lievana Mangolin
Síndrome de Steven Johnson pesadelo oftalmológico................................................................................56
Stevens Johnson Syndrome – ophthalmologic nightmare
Lucas Holdack, Luciana Garcia Iervolino, Celso Afonso Gonçalves, Marcos Alonso Garcia
e Érika Alessandra Galembeck Silvino Rodrigues
Morte materna por influenza H1N1..................................................................................................................60
Maternal death from H1N1 influenza in Santos - SP, in 2013
Marion Curado da Silva e Pia Ceraldi
A importância do diagnóstico precoce para o tratamento específico
da leucemia promielocítica aguda...................................................................................................................63
The importance of early diagnosis or specific treatment of acute promyelocytic leukemia
Suellen Nastri Castro e Letícia Medeiros
Abscesso cerebral em paciente portador de endocardite de valva protética.............................................65
Brain abscess in patients with prosthetic valve endocarditis
Amanda Evelyn Andrade Rocha e Rodolfo Leite Arantes
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 67, abr / mai / jun 2014
Sintomatologia e do tratamento empregado
em crianças com diagnóstico de Coqueluche
Symptoms and treatment employed in children diagnosed with whooping cough
1
André Horcajo Agostinetti
2
Paulo Sergio Ciola
RESUMO
Introdução: a coqueluche é uma infecção vigente como
importante problema de saúde pública, inclusive em países
com alta cobertura de imunização ativa. Devido à curta
duração da imunidade vacinal e a falta de reforços vacinais ou
naturais, a doença agora tem afetado adolescentes e adultos,
que contaminam recém-nascidos e crianças muito jovens para
serem vacinadas. Objetivo: avaliar a abordagem de crianças
com coqueluche. Métodos: estudo realizado revisando 13
prontuários de crianças até 12 anos internadas com
diagnóstico final de coqueluche e suas variantes. Foi analisada
sintomatologia antes da internação, estado vacinal dos
pacientes, tratamento empregado e evolução da doença.
Resultados: quanto à sintomatologia, notou-se prevalência de
100% de crianças com queixa de tosse e, como segunda
queixa (77%), obteve-se cianose pós-tosse, como
complicação da primeira queixa. Todos aqueles estudados
estavam com seu calendário vacinal em dia, porém a maioria
deles tinha esquema vacinal incompleto, devido à idade dos
alvos do estudo. Quanto ao tratamento empregado,
empregou-se macrolídeo em 92% dos casos e uso de
corticóide, de inalação com Beta-2-agonista e de Fisioterapia
respiratória acima de 69% das vezes.
ABSTRACT
Introduction: Whooping cough is an infection considered an
important public health problem, even in countries with active
immunization coverage. Due to the short duration of immunity
vaccine and lack of natural or vaccinal reinforcements, disease
now has affected adolescents and adults, infecting newborns
and children too young to be vaccinated. Objective: To
evaluate the management in children with whooping cough.
Methods: The study reviewed 13 cases of children under 12
years with a final diagnosis of Whooping cough and its variants.
The symptoms before admission, immunization status of
patients, treatment and follow disease progression were
evaluated. Results: The presenting symptom noticed a
prevalence of 100% of children with complaints of cough, and
as the second most common complaint, post-cough cyanosis
(77 %) as a complication of the first complaint. All patients had
their immunization updated, though most of them had
incomplete immunization due to the age of the targets of the
study.Regarding the treatment, macrolide were used in 92% of
cases, and corticosteroids, inhalation of beta-2-agonist and
respiratory physiotherapy above 69% of the time.
Key words: Bordetella pertussis. Whooping Cough. Cough.
Descritores: Bordetella pertussis. Coqueluche. Tosse
Coqueluchóide, Tosse.
Introdução
A coqueluche é uma infecção vigente como importante problema
de saúde pública, inclusive em países com alta cobertura de
imunização ativa1,2. É altamente contagiosa, principalmente para
recém-nascidos e idosos e acomete o trato respiratório. É causada
pelas bactérias Bordetella pertussis e B. parapertussis. Nos
últimos anos, a vacinação intensiva das crianças permitiu uma
redução importante de mortalidade e morbidade. Ainda assim, em
nível mundial ela é um dos principais agentes letais, estimando-se
300.000 mortes por ano por esta causa1-3.
Dessa forma, a generalização da vacinação conduziu a uma
mudança na transmissão da doença devido à curta duração da
imunidade vacinal e a falta de reforços vacinais ou naturais. A
doença afeta agora adolescentes e adultos que contaminam
recém-nascidos e crianças muito jovens para serem vacinadas5.
É importante saber quais são os principais sintomas que levam os
pacientes a internação, e como se comporta essa infecção após
intervenção médica hospitalar. Neste estudo, procurou-se entender
melhor os tipos de tratamento empregados em crianças com
suspeita de coqueluche, o conjunto de sinais e sintomas que
levaram seus acompanhantes a procurar o pronto atendimento e a
evolução da doença, uma vez iniciada a intervenção.
Métodos
Trata-se de estudo retrospectivo observacional de abordagem
qualitativa, com dados do Serviço de Pediatria do Hospital Ana
Costa no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2012.
Selecionaram-se pacientes internados, com idades entre zero e
onze anos, onze meses e vinte e nove dias, com diagnóstico de alta
hospitalar abrangendo os CIDs A370 até A379, ou seja, coqueluche
e todas as suas variantes.
Foi feita a revisão de dados dessas internações, avaliando
sintomatologia e sinais apresentados antes da internação e cada
tipo de tratamento empregado.
1) Estagiário de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa. Professor de Pediatria da Faculdade de Medicina da UNIMES.
Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
Correspondência: Rua Afonso Veridiano, 3, Ap. 803, Embaré, Santos/SP. E-mail [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 02/02/2014; publicado online em: 31/05/2014.
32
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 34, jan / fev / mar 2014
Quanto à sintomatologia apresentada pelos pacientes, foram
organizadas em seis categorias: febre, tosse, cianose, guincho,
perda de tônus e dispnéia. A febre foi considerada quando a mãe
descrevia a presença de temperatura axilar acima de 37,8ºC ou se
a criança tinha temperatura axilar medida pelo médico do PS ou da
internação aferida também acima desse referencial. A tosse foi
considerada quando era referida pela mãe ou quando avaliada
pelo médico da internação ou do PS como importante: um acesso
de prolongado, com complicações seguidas após este. Dispnéia
era considerada pela pesquisa quando referida no período de
intercrise, ou seja, fora dos períodos de tosse. Cianose, guincho e
perda de tônus foram três critérios que entraram na pesquisa como
conseqüências de crise de tosse importante e incapacitante.
Cianose e perda de tônus muscular ocorriam imediatamente após
um episódio prolongado de tosse e o guincho é a inspiração
forçada e de tom agudo que vem após esses quadros de tosse
prolongada e seguida, caracterizada por muitas pequenas
incursões respiratórias.
Quanto aos tipos de tratamento empregados durante a internação,
estes foram listados em seis tipos, sendo organizados a partir da
revisão dos prontuários e incluindo todas as condutas aplicadas:
fisioterapia respiratória, Corticoterapia (por via oral ou por via
intravenosa), uso de inalação (com Beta-2-Agonista), uso de
macrolídeo (Claritromicina), oxigenioterapia complementar
durante crises de tosse e uso de Ceftriaxona (Cefalosporina de 3ª
geração). Foram incluídos pacientes internados na enfermaria e
em UTI Pediátrica.
Quanto à situação vacinal das crianças estudadas, esta foi
certificada por meio revisão da carteira vacinal de todas.
Resultados
Foram estudados 13 casos de crianças internadas no serviço de
Pediatria do Hospital Ana Costa entre janeiro de 2011 e dezembro
de 2012. A idade dos pacientes variou entre um mês de idade e 26
meses, sendo que a média foi 5,1 meses e a moda dois meses. A
média de dias internado variou entre um e 11 dias de internação,
sendo a média 5,6 dias.
Quanto aos sinais e sintomas apresentados, seis queixas foram
motivo de preocupação dos acompanhantes dos pacientes na hora
de levá-los para avaliação hospitalar e posterior internação. São
elas: tosse, cianose pós-tosse, perda de tônus pós-tosse, guincho
típico coqueluchóide pós-tosse, febre e dispnéia nas intercrises.
No Gráfico 1, pode-se ver a prevalência de tosse como principal
queixa. Cem por cento das crianças estudadas apresentaram esse
sintoma. A segunda queixa mais comum referida na internação era
de cianose pós-tosse (77% das crianças), seguida de perda de
tônus pós-tosse (23% do total) e guincho clássico de tosse
coqueluchóide (15%). Febre só foi relatada por 1 paciente (7%),
assim como dispnéia.
Gráfico1 – Número de pacientes com sinais e sintomas respectivos.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 34, jan / fev / mar 2014
Quanto aos tratamentos aos quais os pacientes foram submetidos,
a revisão de dados mostrou 6 tipos diferentes, que foram aplicados
isoladamente ou de forma combinada. Nota-se prevalência de
tratamento dos quatro primeiros listados, como se pode ver no
gráfico abaixo – Gráfico 2.
Gráfico 2 – Número de pacientes submetidos aos respectivos tratamentos.
O tratamento empregado com mais prevalência foi o macrolídeo
(Claritromicina), usado em 12 dos 13 pacientes internados (92%).
Em seguida, o uso de corticóide (por via oral ou intravenosa) foi
aplicado em 11 dos 13 pacientes estudados (84%). Em terceiro
lugar na ordem de prevalência, com nove casos em 13, vieram uso
de inalação com Beta-2-agonista e fisioterapia respiratória (69%).
Uso de Oxigênio complementar durante crises de tosse e de
Ceftriaxona só foram aplicados em um paciente (7%).
O estudo da situação vacinal das crianças estudadas mostrou que
todas elas tinham vacinação em dia para a idade. Em busca de focar
a vacinação contra a B. pertussis, nesta análise se buscou os dados
da vacinação contra tríplice bacteriana, ou seja, DTP ou DTPa. De
acordo com a idade dos pacientes-alvo, notou-se que um paciente
(26 meses) tinha tomado três doses de vacina DTP e uma dose do
reforço. Dois pacientes (oito meses/13 meses) tinham tomado três
doses da vacina DTP. Sete pacientes (entre dois e três meses)
tinham esquema vacinal com uma dose de DTP. Três pacientes (um
mês) ainda não tinham sido vacinados com 1ª dose de DTP.
Discussão
Este estudo é uma revisão de sinais e sintomas de pacientes que
foram internados com diagnóstico de coqueluche, de seu histórico
vacinal e das respectivas condutas tomadas durante a internação,
para tratamento dessa doença.
Essa análise deve ser iniciada avaliando-se o método diagnóstico
utilizado para dar inicio à pesquisa. Foram aceitas crianças que
estiveram internadas no hospital privado de referência e que tinham
diagnóstico final de coqueluche e variantes, ou seja, CID-10 entre
A370 e A379. Não foi usado método de detecção de Bordetella por
meio de Swab ou sangue pois, em estudo feito para avaliar a
frequência de infecções respiratórias em crianças com suspeita de
coqueluche, notou-se que 44% das crianças tinham PCR para
Bordetella positivo e 35% tinham esse exame indeterminado.
Chegou-se à conclusão de que o teste sorológico não exclui a
possibilidade da doença e que a avaliação clínica ainda tem muita
soberania no diagnóstico4.
Quanto à situação vacinal dos pacientes deste estudo, todos
estavam com seu calendário vacinal em dia, contudo, a maioria
tinha esquema vacinal incompleto, no que diz respeito ao mínimo de
doses necessárias para se obter um fator protetor efetivo contra a B.
pertussis, que corresponde a um mínimo de três doses e um
reforço. É sabido o grande impacto da vacinação contra doenças
infecciosas e quantas mortes já foram evitadas em todo o mundo
33
por isso6. Assim, pode-se correlacionar a maior incidência de
internações pela doença em crianças com o esquema vacinal
incompleto, e devido à sua baixa idade.
Ainda que a sintomatologia em muitos pacientes recém-nascidos
ou lactentes seja de difícil detecção7, pôde-se reparar que aqueles
mais graves tiveram uma sintomatologia melhor definida,
acabando por ser internados. Em contrapartida, alguns autores
citam sinais mais freqüentes em recém-nascidos, como acessos
de tosse intensos seguidos de cianose, perda de tônus muscular
por baixa oxigenação cerebral, bradicardia e parada respiratória810
. Esses fatos podem ser comprovados neste estudo por meio dos
dois sintomas/sinais mais citados à internação, que foram tosse
intensa seguida de cianose e da idade média de internação, que é
de 5,1 meses. O questionamento que fica sem poder ser
respondido é de quantas crianças que foram atendidas no prontosocorro e acabaram ficando sem o diagnóstico de coqueluche, por
ter sintomatologia pouco rica, e por tampouco terem sido
submetidas à pesquisa da Bordetella em epitélio da retrofaringe.
A respeito do uso elevado de Macrolídeos, isso se deu pelo fato de
a amostra usada para o estudo ser somente de casos que tiveram
diagnóstico final de coqueluche ou alguma de suas variantes, ou
seja, a amostra é considerada viciada. É certo que seu uso deve
ser ponderado, como concluíram Ferronato et al., em seu estudo
sobre infecções respiratórias virais em crianças com suspeita
clínica de infecção por B. pertussis4. O tratamento foi realizado por
sete dias, na dose de 15 mg/kg/dia em duas tomadas.
A Ceftriaxona foi usada em uma criança, que foi internada em UTI.
Foi introduzida no dia da entrada do paciente na unidade e retirada
no dia seguinte, após exclusão de infecção pneumônica
secundária.
Quanto aos dias de internação, estes ficaram em média 5,4 dias
internados. Assumindo-se que os pacientes tiveram sua doença
diagnosticada durante sua fase paroxística, devido à queixa de
tosse intensa com complicações, chegamos à discussão sobre a
eficácia da antibioticoterapia visando diminuir os sintomas
apresentados. É bem estabelecida a eficácia do tratamento com
macrolídeos na diminuição dos sintomas, quando estes são
iniciados na fase catarral11-13. Entretanto, ainda não existe
consenso se o início do antibiótico na fase paroxística diminui a
duração do período sintomático. Só existe a informação de que há
garantia de eliminação da bactéria dentro dos primeiros cinco dias
de terapia iniciada, o que coincide com o tempo médio de
internação dos pacientes estudados neste trabalho.
Não foi encontrada evidência científica de melhora do tratamento
34
com o uso de corticóides (VO ou EV) e inalação com Beta-2agonista. Nota-se a banalização de seu uso em pacientes com
qualquer queixa que envolva trato respiratório.
A fisioterapia respiratória também é questionada, sem evidência
prática de melhora. Esta inclusive muitas vezes acaba sendo
desestimulada, por poder levar a uma crise de tosse em uma
criança que estaria previamente fora de crise.
Sendo esta uma doença quem ainda tem um grande índice mundial
de letalidade e, devido ao fato de ser ainda muito subdiagnosticada,
um trabalho como este pode ajudar médicos em geral a levantar a
hipótese de coqueluche em pacientes que tenham queixas
características, como tosse persistente e, principalmente,
complicações da tosse.
Referências
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Dis. 2005;24:S10-8.
2. Aguas R, Goncalves G, Gomes M. Pertussis: increasing disease as a
consequence of reducing transmission. Lancet Infect Dis. 2006; 6:112-7.
3. Edwards K, Halasa N. Are pertussis fatalities in infants on the rise? What
can be done to prevent them? J Pediatr. 2003;143:552-3.
4. Ferronato AE, Gilio AE, Vieira SE. Respiratory viral infections in infants
with clinically suspected pertussis. J Pediatr (Rio de Janeiro). 2013; 89:23-5.
5. Guiso N. Why still whooping cough? Rev Prat. 2005; 55(12):1287-92.
6. Guiso N. Impact of vaccination on the infectious diseases epidemiology:
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Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 32 - 34, jan / fev / mar 2014
Perfil de pacientes com câncer
criticamente enfermos em UTI
Profile of critically ill cancer patients in ICU
Natasha Crepo Nahon1
2
Ana Paula de Carvalho Odoni Rocha
2
Rebeca Maria Lopes Grezos
3
Sueli Monterroso Cruz
RESUMO
Introdução: o suporte em UTI é, às vezes, necessário para o
alívio imediato dos sintomas e melhora a qualidade de vida dos
pacientes oncológicos, mesmo aqueles sem possibilidades de
cura. Objetivo: analisar o perfil dos pacientes oncológicos
admitidos na UTI do Hospital Ana Costa. Métodos: foram
analisadas retrospectivamente as internações contidas entre o
período de julho de 2012 a julho de 2013, no Hospital Ana
Costa. Os prontuários foram avaliados quanto à idade, sexo,
tipo de câncer, número de sítios metastáticos, motivo de
internação na unidade de terapia intensiva, dia internação em
enfermaria, dias de internação em UTI e óbito. Resultados: as
mulheres com diagnóstico de neoplasia foram admitidas em
maior número em relação aos homens (12 mulheres para 3
homens). A neoplasia mais incidente foi a de mama (8 casos).
Em dez casos os pacientes já apresentavam metástase e o
sítio mais frequente foi o ósseo. O diagnóstico que mais
motivou a internação em UTI foi insuficiência respiratória. O
desfecho óbito em UTI foi presente em nove casos dos 15 e a
permanência em UTI foi de no máximo nove dias, sendo que
cinco dos casos foi de apenas um dia.
ABSTRACT
Introduction: Support in the ICU is sometimes necessary for
the immediate relief of symptoms and improves quality of life of
oncological patients, even among those without possibility of
cure. Aim: To analyze the profile of cancer patients admitted to
the ICU of Hospital Ana Costa. Methods: Admissions from July
2012 to July 2013 at Hospital Ana Costa were analyzed. The
charts of these patients were evaluated regarding age, gender,
type of cancer, number of metastatic sites, reason for
hospitalization in the intensive care unit, day ward stay, days of
ICU stay and death. Results: Women diagnosed with cancer
were admitted in greater numbers compared to men (12 women
to 3 men). The most frequent cancer was breast (8 cases). In ten
cases the patients already had metastases and the most
frequent site was the bone. The diagnosis that most led to ICU
admission was respiratory insufficiency. The outcome death in
the ICU was present in nine of 15 cases and the permanency in
ICU was nine days in most cases, with five of the cases was only
one day.
Key words: Cancer. Intensive Care Unit. Admission.
Descritores: Câncer. Unidade de Terapia Intensiva.
Admissão.
Introdução
Atualmente se observa um aumento nos casos de câncer. Isso
deve-se à transição epidemiológica iniciada na década de 60 que
trouxe como principais causas de morte os casos de câncer e as
doenças do aparelho circulatório em detrimento das doenças
infecciosas1.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, há uma estimativa de
que, em 2030, podem-se esperar 27 milhões de casos incidentes,
17 milhões de mortes por câncer e 75 milhões de pessoas vivas,
anualmente, com câncer2.
Uma doença tão incidente resultou em um aumento da expectativa
de vida, explicada por três motivos: o avanço no tratamento de
tumores sólidos e hematológicos com desenvolvimento de
terapias mais potentes e específicas e avanço na prevenção da
disfunção de órgãos; o progresso na seleção dos pacientes com
indicação de unidade de terapia intensiva com uma admissão
precoce; e a capacidade de obter um diagnóstico em pacientes
com insuficiência respiratória aguda com melhor prognóstico3,4.
Apesar de novos avanços no tratamento, estes podem afetar
inúmeros órgãos, gerar maior predisposição a infecções, levando a
um maior risco de vida, ocupando mais leitos na UTI, prolongando
sofrimento e alocando recursos limitados para área4,6.
Além disso, para os pacientes que estão lúcidos, além da dor, estão
reservados o tubo, as sondas, os cateteres, a luz incidindo no olho,
o barulho dos alarmes, o vozerio dos profissionais, o frio, a nudez, a
solidão e o medo do tempo. Já tem sido vista a evidência de que a
ida para esses centros de pacientes com chance de cura ou de
controle do câncer tem taxas de mortalidade reduzida, incluindo
pacientes com sepse e submetidos à ventilação mecânica. O
suporte em UTI é, às vezes, necessário para o alívio imediato dos
sintomas e melhora a qualidade de vida, mesmo nos pacientes sem
possibilidades de cura5.
Outros estudos têm relatado altas taxas de mortalidade para
pacientes com câncer depois de uma longa permanência em UTI,
especialmente quando eles tinham leucopenia ou necessitaram de
ventilação mecânica e manejamento agressivo de tratar as
complicações com risco de vida nestes pacientes tem sido
1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP
2) Residente do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP
3) Chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Instituição: Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Tiradentes, 315 ap. 52 – 11700-290 Praia Grande/SP. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 26/01/2014; publicado online em: 31/05/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 35 - 37, abr / mai / jun 2014
35
questionada. Devido ao questionamento quanto a admitir ou não o
paciente oncológico em UTI, percebe-se que há a necessidade de
um levantamento e comparativamente tirar conclusões sobre qual
7
é a melhor opção para o paciente oncológico .
Métodos
Foram analisadas as internações contidas entre o período de julho
de 2012 a julho de 2013 no Serviço de Clínica Médica do Hospital
Ana Costa e, destes, selecionados os casos internados com o
Serviço de Oncologia, excluindo, portanto, casos de neoplasia
internados em outro serviço.
O material utilizado para o levantamento das internações foram os
cadernos de registros. A lista adquirida foi cruzada com a lista de
admissão na Unidade de Terapia Intensiva Geral, gerando um
montante quinze pacientes a serem analisados.
Os prontuários de tais pacientes foram avaliados quanto à idade,
sexo, tipo de câncer, número de sítios metastáticos, motivo de
internação na unidade de terapia intensiva, dia internação em
enfermaria, dias de internação em UTI e óbito.
Resultados
A análise dos pacientes admitidos no serviço de terapia intensiva
permitiu avaliar que as mulheres com diagnóstico de neoplasia
foram admitidas em maior número em relação aos homens (12
mulheres para três homens).
A neoplasia mais incidente foi a de mama, apresentando oito casos
na amostra. Em segundo lugar, esteve a neoplasia pulmonar.
Outras neoplasias também foram encontradas como: cólon e
próstata. Em dez casos os pacientes já apresentavam metástase,
sendo o sítio mais frequente relacionado com a metástase foi o
ósseo.
Dos quinze pacientes, quatro foram admitidos diretamente na UTI,
sem tempo de permanência na enfermaria do hospital.
O diagnóstico que mais motivou a internação em UTI foi
insuficiência respiratória, seguido de sepse e em outros casos pósoperatórios.
O desfecho óbito em UTI foi presente em nove casos dos quinze e
a permanência em UTI foi de no máximo nove dias, sendo que em
cinco dos casos foi de apenas um dia.
Discussão
O levantamento dos prontuários demonstrou uma maior
porcentagem de mulheres é admitida em UTI, assim como em um
dos estudos5, enquanto que em outro estudo foi apontado um
número maior de pacientes admitidos do sexo masculino7. Taccone
et al. também relatou que nos tumores sólidos os pacientes,
geralmente, eram mais velhos.
Com relação às metástases, foi encontrada uma incidência de
21,1% no momento da admissão em UTI7, enquanto que, em
nossa série, esta taxa foi de 66,6%.
As principais razões para a admissão na UTI foram: insuficiência
respiratória em 47,1% contra 60% no nosso , sepse em 17,6%
contra 33,3% e acompanhamento pós-operatório em 14,7% contra
33,3%5.
Em um trabalho com 19 mulheres criticamente enfermas com
câncer de mama ou ginecológico que foram admitidas na UTI
(cancer da mama n = 11, o câncer de ovário n = 4, o câncer do colo
do útero n = 3 e câncer endometrial n = 1) foi mostrado que, dos
pacientes, nove mulheres com câncer de mama e três pacientes
com câncer ginecológico já apresentavam doença metastática
63,2%. As principais razões para a admissão à UTI neste estudo
foram sepse 94,7%, insuficiência respiratória 36,8% e hipotensão
com necessidade de suporte vasoativo 26,3%.. Em todos os
6
casos, a causa da morte foi falência múltipla de órgãos .
Encontraram-se 35,3% de mortalidade dos pacientes durante o
período de internação na UTI, contrastando com 60% em nosso
36
serviço. Esses dados estão de acordo com a média de mortalidade
geral na UTI, semelhante a outros estudos recentemente
publicados, que mostraram mortalidade global UTI variando de 22 a
51%5.
Estudos atuais tentam encontrar uma explicação para a diferença
nas taxas de mortalidade. A necessidade de ventilação mecânica,
presença de infecção fúngica invasiva, o desenvolvimento de
falência de múltiplos órgãos e alta severidade da doença são
fatores prognósticos adicionais para a mortalidade entre os
pacientes com câncer. Tem sido proposto que a neutropenia é um
fator independente para mortalidade no câncer4.
A idade foi pouco relatada nos estudos. Em apenas um trabalho foi
mencionado que a idade foi fracamente relacionada com a
mortalidade8. Os casos admitidos na UTI do Hospital Ana Costa
tinham idade entre 41 e 82.
Ainda há muita dificuldade na admissão de pacientes com câncer
para UTI, porque a classificação do paciente em bom estado de
saúde e mal estado é complicada e subjetiva. Há a descrição em um
estudo de que 20% dos pacientes oncológicos não foram
admitidos por serem considerados "muito bem", morreram antes da
alta hospitalar (principalmente após a admissão na UTI atraso) e
25% dos pacientes não admitidos porque estavam muito doentes
acabaram sobrevivendo4.
O aumento do número de dias de sobrevivência pode ser apenas
um prolongamento do processo de morte ou só aumento efetivo na
sobrevivência com boa qualidade de vida. A maioria dos pacientes
sente dor, desconforto, ansiedade, distúrbios do sono, a fome ou
insatisfeito ou sede. Há relato de depressão e dispnéia. Dor
significativa e desconforto foram associados com os procedimentos
de UTI comuns. Incapacidade de se comunicar, dormir rompimento,
e limitações de visita foram particularmente estressante entre as
condições da UTI.4
Quando analisados pacientes oncológicos admitidos em UTI com
pacientes oncológicos não admitidos em UTI não há diferença em
termos estatísticos do tempo livre de doença no período de seis
anos 9.
Já quanto a sobrevida, os pacientes não internados na UTI
apresentam uma sobrevida melhor do que aqueles admitidos na
UTI (pacientes não-UTI: A sobrevida média, 19,6 meses e a
sobrevida aos 8 anos: 21%; pacientes da UTI: sobrevida média, 1,3
meses, a taxa de sobrevivência aos 8 anos: 9%, p <0,05).
Internação na UTI é um fator prognóstico adverso independente no
que diz respeito à sobrevivência9. O trabalho realizado no Hospital
Ana Costa não comparou os casos oncológicos admitidos com os
não-admitidos em UTI para verificar se a sobrevida foi maior
quando estes pacientes eram admitidos.
Os pacientes com câncer foram mais comumente admitidos por
motivos respiratórios, mas com menor frequência de doenças
neurológicas agudas e traumas7.
Nosso estudo tem algumas limitações, como a pequena amostra de
pacientes admitidos na UTI. Outro ponto negativo é comparar
diferentes tipos de cânceres em estádios diversos, o que acaba
tornando o estudo mais descritivo. Apesar dos avanços nas
técnicas de tratamento, ainda é limitado o número de pacientes
admitidos em UTI e o desfecho dos pacientes é incerto. A
mortalidade ainda é muito elevada e existe dificuldade em achar o
melhor momento. Então, há a necessidade de novos trabalhos para
quem sabe criar um protocolo no futuro sobre admissão de
pacientes oncológicos na UTI.
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Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 35 - 37, abr / mai / jun 2014
37
Epilepsia – o que sabe a população geral
sobre esse tema?
Epilepsy – what does the general population know about this subject?
1
Melissa Vieira Franco
1
André Knudsen Santana
Carina Verissimo Mendes1
Yára Dadalti Fragoso2
RESUMO
Objetivo: Identificar o grau de conhecimento da população
geral sobre epilepsia. Métodos: Entrevistas individuais com
questionário especificamente criado para o propósito deste
estudo. Resultados: Foram entrevistados 200 adultos (100H,
100M), idade média de 37 anos (20 a 60 anos), de vários níveis
socioeconômicos e diferentes graus de escolaridade. Deste
grupo, 184 (92%) diziam ter lido ou ouvido sobre epilepsia,
porém 88,5% deles referiam saber pouco ou nada sobre a
doença. Quarenta por cento do grupo conhecia pessoalmente
alguém que tinha epilepsia e 37,5% já tinha presenciado pelo
menos um caso de crise convulsiva. Vinte por cento dos
entrevistados não permitiriam que seus filhos se brincassem
com alguém com epilepsia e 23,5% não aprovariam que seus
filhos se casassem com alguém com epilepsia. De acordo com
6% dos entrevistados, epilepsia é contagiosa. Apenas um
quarto dos indivíduos sabia citar o nome de algum
anticonvulsivante, e 88,3% destes citou o fenobarbital
(geralmente pelo nome comercial Gardenal). Mais de 80% dos
entrevistados acredita que as pessoas com epilepsia sejam
discriminadas pela sociedade. Conclusão: O
desconhecimento, mitos e tabus sobre epilepsia ainda são
importantes na população.
ABSTRACT
Objective: To identify the degree of knowledge about epilepsy
in individuals of the general population. Methods: Individual
interviews using a questionnaire devised for this study.
Results: Two-hundred adults (100M, 100F) were interviewed.
Their average age was 37 years (20 to 60 years), and they had
different socioeconomic and educational backgrounds. From
this group, 184 (92%) said they had heard or read about
epilepsy, but 88.5% of them believed they knew very little or
nothing about the disease. Forty percent of the group personally
knew someone suffering from the disease and 37.5% of them
had seen at least one episode of seizure. Twenty percent of the
individuals would not allow their children to play with epileptic
children, and 23.5% would not approve the marriage of their
offspring to someone with epilepsy. According to 6% of the
individuals, epilepsy is a contagious disease. Only one quarter
of the individuals could name an anticonvulsant drug and 88.3%
of them cited phenobarbital (usually by the commercial name
Gardenal).Over 80% of the people interviewed believe that
people with epilepsy suffer discrimination by the society.
Conclusion:The lack of knowledge and the myths about
epilepsy still rate high in the population.
Introduction
Methods
Epilepsy is a neurological condition characterized by recurrent
seizures that can be manifested in different manners, according the
affected area of the brain. Beyond the high impact and the burden of
epilepsy, patients frequently face rejection from the society1. This
may result in psychological and psychiatric conditions, adding to
the negative impact of the disease. Tonic-clonic seizures with loss
of conscience are particularly dramatic and people may be
uncomfortable having patients with this type of epilepsy in their
personal and professional environment. Ignorance, fear and
mystification of the disease will invariably affect the patients, their
families and, ultimately, the successful treatment of epilepsy.
Epilepsy stigma may have different levels affecting the personal
and professional life of an individual with the disease. The social
and quality of life problems arising from a diagnosis of epilepsymay
represent even greater challenges than the disease itself2. Even
the mother of an epileptic child may find it difficult to live with this
diagnosis3, while teachers tend to underestimate the capability of
epileptic children4.
The objective of the present study was to assess the knowledge
about epilepsy in a Brazilian population of unaffected individuals.
The study was approved by the Ethics Committee of Universidade
Metropolitana de Santos under the registration number CAAE
04806212.2.0000.5509, .and all participants signed a written
consent to take part in the project. This was a transversal study
carried out with individual face-to-face interviews with 200
individuals aged between 20 and 60 years. These individuals were
residents of the city of Santos (Brazil) where literacy rates are
96.6%. The group was organized to include 100 men and 100
women and to cover a variety of socioeconomic and schooling
levels.
The questionnaire used in the interviewed was specifically created
with this purpose and all data were included in an excel file for
analysis. Except for the simplest mathematical calculations, the
results were analyzed and presented in a descriptive manner.
Results
The average age of the 100 men and 100 women participating in this
study was 37 years, and their economic level according to the
Brazilian classification was class A1 = 2%; A2 = 15,5%; B1= 19%; B2
1) Medical student at Universidade Metropolitana de Santos, Santos, SP, Brazil
2) Head of the Department of Neurology, Universidade Metropolitana de Santos, SP, Brazil.
Correspondence: YD Fragoso, Department of Neurology, Medical School, UNIMES
Rua da Constituição 374, CEP 11015-470, Santos SP, Brazil. E-mail: [email protected]
Conflicts of interest to declare: This study was carried out withour financial support from private or public institutions. The project is part of the Scientific Initiation Program at Universidade
Metropolitana de Santos, SP, Brazil.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 01/03/2014; publicado online em: 31/05/2014.
38
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 38 - 39, abr / mai / jun 2014
= 23%; C1 = 51%; C2 = 7.5%; and D = 7.5%. This classification is
based on the goods a family possesses and the present distribution
represents the typical Brazilian percentages of each economic
class5,6.
While 92%of the individuals reported having read or heard about
epilepsy, 88.5% of them referred to know little or nothing about the
disease. Forty percent of the group personally knew someone with
epilepsy, and 37.5% had already seen a patient having a seizure.
These individuals who witnessed a seizure reported the most
frequent signs as tongue biting (34.9%), loss of conscience
(30.1%), a state of mental confusion after the seizure (25.2%) and
loss of urine and/or feces (9.8%).
Only two thirds of the individuals interviewed knew that epilepsy
was not contagious (6% thought it was and 27% were not sure).
Only 40% of those interviewed knew that epilepsy itself did not
affect the mental ability of a person, but 14% considered that
medications might induce serious mental compromise. Only one
quarter of the people interviewed could name an anticonvulsant
drug, and 88.3% of them cited phenobarbital as the only drug they
ever heard about.
Regarding their views on epileptic children, 20% of those
interviewed would not allow their own children to play with
epileptics, and 17% were not sure whether they would let such
friendship flourish. In addition, 23.5% of all individuals interviewed
in the present study would not allow their offspring to marry
someone with epilepsy, while 28% were not sure whether they
would permit such relationship to occur.
While 85.5% of individuals agreed that the society discriminates
epileptic people, they did not see themselves doing so.
Discussion
Epilepsy is a frequent neurological disease, affecting millions of
people worldwide. A recent survey in the USA estimated that 1.0%
of their adult population suffered from epilepsy but this number rose
to 1.9% if only people with lower annual income were
considered7.Patients with epilepsy live daily with the enacted or
perceived stigma based on myths, misconceptions and
misunderstandings that have persisted for thousands of years8.
The image of epilepsy in Brazil is often associated with criminal
behavior and violence, dating as long ago as the theories of Cesare
Lombroso (1835-1909) and still perpetuated by media headlines9.
An interesting aspect observed in those who witness a seizure is
the “we see what we expect to see” phenomenon, previously
pointed out by other studies10. In Brazil, the tongue-biting idea
related to seizures is very well known and, in fact, when asked
about the seizure they had witnessed, people most frequently
mentioned tongue-biting as the main aspect of the convulsion. In
London, due to the excessive foaming through the mouth portrayed
by films and television, this was frequently reported among people
interviewed about seizures10.
Although most papers dealing with the myths and taboos related to
epilepsy are from developing countries11-14, also in the USA and
Europe the misconceptions are frequent among the general
population10,15. Perhaps the most striking feature of the present
study was the fact that participants agreed that there was prejudice
against epileptic patients, but many of them would not allow their
children to play with or to marry to an individual with epilepsy.
Similar rejection rates were observed in Greece16.
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Conclusion
The misconception and lack of knowledge regarding epilepsy was
high in this study. Specific educational programs should be put into
practice in an attempt to decrease the psychosocial burden of
epileptic patients.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 38 - 39, abr / mai / jun 2014
39
Lesões císticas do pâncreas
The cystic pancreatic lesions
1
Marco Antonio Buch Cunha
1
Lubia Bonini Daniel
Flavia Gerbi Azevedo2
Renato Brassolotto Bello2
Luciana Cleaver Aun2
2
Osmar Silvio Garcia de Oliveira
2
Carlos Kioshi Furuya Junior
2
Ricardo Sato Uemura
Katia Ferreira Guenaga2
Dayse Pereira da Silva Aparicio2
Everson Luiz de Almeida Artifon3
RESUMO
As lesões císticas do pâncreas são peculiares em relação ao
diagnóstico e tratamento, devendo ser lembradas como
diagnóstico diferencial nos pacientes com quadro de dor
abdominal e lombar, perda de peso, empachamento pósprandial, icterícia, pancreatite e massas abdominais palpáveis.
Podem ser divididas em pseudocistos, cistos não-neoplásicos
e cistos neoplásicos (cistoadenoma seroso, cistoadenoma
mucinoso e neoplasia mucinosa papilar intraductal).
Geralmente são diagnosticadas incidentalmente em exames
de imagem abdominal por queixas inespecíficas, podendo ser
melhor estudadas através da ecoendoscopia
(endossonografia), a qual pode diferenciar lesões benignas de
malignas. Este é um método diagnóstico que possui maior
sensibilidade em lesões císticas menores que 2,0 cm de
diâmetro, permitindo ainda a punção aspirativa com agulha
fina do conteúdo líquido cístico, onde a análise pode auxiliar no
diagnóstico diferencial das lesões císticas. A análise do
conteúdo líquido dos cistos pancreáticos pode ser realizada
por meio de sua citologia e bioquímica (amilase, lipase e dos
marcadores tumorais CEA e CA19-9). De acordo com os
resultados laboratoriais, as hipóteses diagnósticas podem ser
feitas com boa sensibilidade e especificidade. Portanto, lesões
císticas pancreáticas são afecções com alta possibilidade de
cura na ocasião do diagnóstico precoce, podendo oferecer-se
tratamento precoce e efetivo.
ABSTRACT
Cystic lesions of the pancreas are peculiar regarding the
diagnosis and treatment and should be remembered as a
differential diagnosis in patients with abdominal pain and lower
back, weight loss, postprandial bloating, jaundice, pancreatitis
and palpable abdominal masses. They can be divided in
pseudocysts, cysts non- neoplastic and neoplastic cysts
(serous cystadenoma, mucinous cystadenoma and intraductal
papillary mucinous neoplasm). They are usually found
incidentally on abdominal imaging by nonspecific complaints
and can be better studied by echoendoscopy
(endosonography), which can differentiate benign from
malignant lesions. This is a diagnostic method that has greater
sensitivity in cystic lesions smaller than 2.0cm in diameter, while
still allowing fine-needle aspiration of the cystic fluid content
where analysis can aid in the differential diagnosis of cystic
lesions. The analysis of the liquid contents of pancreatic cysts
can be performed through its cytology and biochemical
(amylasis, lipasis and tumor markers CEA and CA19 -9).
According to the laboratory results diagnostic hypotheses can
be made with good sensitivity and specificity. Therefore,
pancreatic cystic lesions are diseases with high possibility of
cure at the time of early diagnosis and can offer up early and
effective treatment.
Key words: Pancreas. Neoplasms. Endosonography.
Pancreatic Cyst. Pancreatic Pseudocyst.
Descritores: Pâncreas. Neoplasias. Endossonografia. Cisto
Pancreático. Pseudocisto Pancreático.
Introdução
Lesões císticas pancreáticas podem ser encontradas durante a
avaliação de pacientes com dor abdominal e pancreatite, porém,
estão cada vez mais sendo diagnosticadas incidentalmente em
exames de imagem abdominal por causas inespecíficas1.
Essas lesões podem ser divididas em pseudocistos, cistos nãoneoplásicos e cistos neoplásicos, que incluem cistoadenoma
seroso, cistoadenoma mucinoso e neoplasia mucinosa papilar
intraductal. Sabe-se ainda que outros tumores pancreáticos
também podem conter espaços císticos ou regiões de
degeneração cística, como neoplasia sólida pseudopapilar, tumor
endócrino cístico e até adenocarcinoma ductal2.
Uma avaliação adequada é importante, pois cistos nãoneoplásicos requerem tratamento apenas quando sintomáticos,
enquanto algumas das neoplasias císticas têm um potencial
maligno significante e devem ser ressecadas.
Diagnóstico
Os sinais e sintomas mais comuns são dor abdominal, perda de
peso, dor lombar, icterícia, pancreatite, massa abdominal palpável
e empachamento pós-prandial3.
Devido ao seu aspecto radiológico, as neoplasias císticas
pancreáticas podem ser erroneamente classificadas como
pseudocistos3-5. Entretanto, apesar de sua semelhança, elas são
diferenciadas por meio de suas características clínicas, achados
ecoendoscópicos, citológicos e da análise do conteúdo líquido em
seu interior (Tabela 1).
1- Residente do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2- Médico Assistente do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3- Chefe do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: Av. Mal. Floriano Peixoto, 227, Apto 82, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 30/11/2013; publicado online em: 31/05/2014.
40
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014
Tabela 1: Carac terístic as das lesões císticas pancreática s.
Qua dro clínico
Achados e coendoscópicos
Líquido
Citologia
Potenc ia l
maligno
P se udocisto
Históric o de pancreatite
Anecóic o, parede espe ssa,
Fino,
N eutrófilos,
grave ou moderada
raras se ptações, linfonodos
amarronzado
macrófagos, histiócitos;
regionais infla matórios pode m
c oloração nega tiva pa ra
ser vistos
IPMN
N enhum
muc ina
Históric o de pancreatite,
Ducto pancreático princ ipal
Viscoso, claro
dor abdominal ou ac hado
dila tado ou ductos secundários;
muc inosas com atipia
inc idental
pode se r um cisto septado;
variá vel; coloração
pode ter um componente sólido
Células colunares
Sim
A análise do conteúdo líquido dos cistos fornece informações
importantes a respeito de sua etiologia. Os exames mais realizados
são a citologia, a dosagem bioquímica de amilase e dos
marcadores tumorais antígeno carcinoembrionário (CEA) e CA 199. Dependendo desses resultados, a orientação para uma hipótese
diagnóstica da lesão cística pode ser feita com boa sensibilidade e
especificidade (Tabela 2)8.
positiva para m ucina
Cistoadenoma
Geralmente um ac hado
M acrocístico, septado;
mucinoso
inc idental, ma s pode
ca lc ificações periféricas,
Viscoso, claro
muc inosas com atipia
causa r dor abdominal e
componentes sólidos e
Células colunares
variá vel; coloração
massa pa lpável
linfonodos re gionais qua ndo
Sim
positiva para m ucina
malignos
Cistoadenoma
Geralmente um ac hado
M icroc ístico c om padrão “fa vo
Fino, claro ou
E pitélio c uboide com
seroso
inc idental, ma s pode
de mel”; raramente possui
se rossanguinole
c oloração positiva para
causa r dor abdominal e
componente macrocístic o;
nto
glicogênio
massa pa lpável
ca lc ificação c entra l
Neoplasia endócrina
Pode ter cara cterísticas
Cisto unilocular oc upa qua se
Fino, claro
Células monomórficas
cística
clínic as de neoplasia
toda a ne opla sia
Q uase nulo
Sim
de tumor e ndócrino;
endócrina sólida
c oloração positiva para
pancreática
c romogranina e
Tipos de lesões císticas:
sinaptofisina
Neoplasia sólida
Geralmente um ac hado
Sanguinolento e
Células monomórficas
pseudopapilar
inc idental; raramente
Compone ntes sólidos e císticos
com debris
c om núcleo
causa desconforto
necróticos
a rredondado;
abdomina l
Sim
e osinofílico; coloração
positiva para vimentina
ea
-1-antitr ipsina
Adenocarc inoma
Icte rícia indolor, dor
M assa sólida primariame nte
Sanguinolento
Pode ser observado
ductal com
abdomina l/lombar ou
com espaç os císticos
com ou sem
a denocarcinoma
degeneraç ão c ístic a
rarame nte com pancreatite
debris
maligno, mas vá rios
Já presente
gra us de atipia pode m
e star presentes
Fonte: Jacobson BC, Baron TH, Adler DG et al. AS GE guideline: The role of endoscopy in the diagnosis and the
management of cystic lesions and inflammatory fluid collections of the pancreas. Ga strointest Endosc.
2005;61(3):363-70.
Dentre os exames de imagem, a tomografia computadorizada com
cortes finos é a forma mais utilizada no diagnóstico de lesões
císticas, podendo fornecer informações sobre a localização no
parênquima pancreático, relação com vasos e influenciar a
estratégia terapêutica. A ressonância nuclear magnética pode ser
uma alternativa para melhor avaliação da anatomia ductal,
também sendo uma opção nos casos de alergia ao contraste
iodado.
Na figura 1, propomos um algoritmo de investigação e conduta na
abordagem das lesões císticas pancreáticas (adaptado de
Figueiras et al.)6.
a) Pseudocisto pancreático
Os pseudocistos são um tipo de coleção líquida que resulta da
inflamação e necrose pancreática, como complicações de
pancreatite crônica, aguda, ou trauma pancreático. Compreendem
cerca de 15% a 30% de todas as lesões císticas pancreáticas e
cerca de metade dos cistos pancreáticos em pacientes com
histórico de pancreatite9,10. Em um paciente com histórico de
pancreatite aguda, uma lesão cística somente deve ser
diagnosticada como pseudocisto se houver um exame de imagem
prévio demonstrando sua ausência.
A ausência de um epitélio interno é o que distingue o pseudocisto de
uma lesão cística verdadeira, pois sua parede é formada por um
tecido fibroso e de granulação originados de um processo
inflamatório. Podem ser únicos ou múltiplos e a maioria dos
pseudocistos possui comunicação com o sistema ductal
pancreático, contendo altos níveis de amilase e lipase.
De acordo com a classificação revisada de Atlanta de 199211:
· Pseudocisto pancreático: coleção bem definida, encapsulada,
com líquido homogêneo e componente sólido;
· Walled-off necrosis: coleção bem definida, encapsulada, com
líquido heterogêneo e presença de componente sólido necrótico.
A maior parte dos pseudocistos tem resolução espontânea,
contudo, podem ocorrer complicações agudas como infecção,
rotura e sangramento e complicações crônicas como obstrução
biliar, trombose de veia esplênica ou porta e dificuldade no
esvaziamento gástrico. Nesses casos, o tratamento de drenagem
cirúrgica, percutânea ou endoscópica está indicado – Figura 2.
Figura 1: Abordagem das lesões císticas pancreáticas - adaptado de
Figueiras et al.6.
A ecoendoscopia é um método diagnóstico que possui maior
sensibilidade em lesões císticas menores que 2cm de diâmetro e
ainda permite a punção aspirativa com agulha fina do conteúdo
líquido cístico, onde a análise pode ajudar no diagnóstico
diferencial das lesões císticas7.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014
Figura 2: Tomografia de abdome evidenciando volumoso pseudocisto
pancreático situado no mesogástrio, com paredes espessas e contato com
a parede gástrica. À ecoendoscopia setorial percebe-se volumoso
pseudocisto com conteúdo anecóico, medindo 12,1 cm X 6,6 cm. A
drenagem ecoguiada falhou devido à parede espessa do pseudocisto com
impossibilidade de dilatação do trajeto. Paciente foi submetido à
cistogastrostomia cirúrgica.
b) Cistos pancreáticos não-neoplásicos
Os cistos pancreáticos não-neoplásicos são raros e geralmente
assintomáticos, não necessitando de tratamento específico. Na
maioria das vezes, são diagnosticados depois de uma ressecção
41
devido à suspeita de tratar-se de uma neoplasia cística pancreática
no pré-operatório. Eles incluem cistos verdadeiros, cistos de
retenção, cistos mucinosos não-neoplásicos e cistos linfoepiteliais.
c) Neoplasias císticas pancreáticas
A identificação de neoplasias císticas pancreáticas é importante,
pois algumas possuem potencial maligno e têm indicação cirúrgica.
Seus quatro subtipos são:
· Neoplasia cística serosa;
· Neoplasia cística mucinosa;
· Neoplasia mucinosa papilar intraductal
· Neoplasia sólida pseudopapilar.
Neoplasia cística serosa
A maioria das neoplasias císticas serosas são cistoadenomas, que
são neoplasias benignas formadas por células cuboidais ricas em
glicogênio originadas de células centroacinares do pâncreas
exócrino. Localizam-se predominantemente no corpo e cauda
pancreáticos e são mais diagnosticadas em mulheres acima de 60
anos12-14.
À ecoendoscopia, podemos caracterizar as lesões em suas
variações morfológicas: microcística, macrocística e mista. A
variação mais frequente é a microcística, que consiste em uma
lesão hipoecóica, heterogênea, com vários cistos anecóicos
separados por septos finos e regulares, determinando um aspecto
em “favo de mel” – Figura 3. Esses septos podem coalescer,
formando uma cicatriz central, que quando calcificada, denota um
sinal patognomônico nos exames de imagem. A variação
macrocística é composta por um ou mais cistos acima de 20mm,
dificultando sua diferenciação com as lesões mucinosas. O padrão
misto, com cistos de tamanho macrocístico.
Uma vez que sua degeneração maligna é extremamente rara, o
tratamento só é necessário quando há presença de sintomas ou
quando ocorre um crescimento rápido da lesão. Na maioria dos
casos, está indicado um acompanhamento clínico e através de
exames de imagem (avaliar tamanho e conteúdo da lesão).
Figura 3 – Lesões císticas na cabeça (A) e colo (B) do pâncreas
caracterizada por vários pequenos cistos agrupados e traves
hiperecogênicas no centro (cicatriz estrelar). O aspecto ecoendoscópico é
sugestivo de cistoadenoma seroso.
Neoplasia cística mucinosa
As neoplasias císticas mucinosas ocorrem quase que
exclusivamente em mulheres e são mais comumente
diagnosticadas acima dos 40 anos de idade. Possuem um grau de
atipia celular variável e secretam mucina, semelhantemente às
neoplasias mucinosas papilares intraductais15,16. Entretanto, em
contraste com estas últimas, não se comunicam com os ductos
pancreáticos e apresentam tecido estromal semelhante ao
ovariano que tipicamente tem origem do corpo ou cauda
pancreáticos16,17.
À ecoendoscopia, podemos caracterizá-la mais frequentemente
como uma lesão macrocística, que pode ser multiloculada ou
microcística, que é mais rara. Suas paredes são geralmente finas e
bem definidas em relação ao parênquima pancreático. Evidências
de nodularidade mural, calcificação na parede (aspecto em casca
42
de ovo) e obstrução ductal são indicativos de malignidade da lesão
– Figura 4.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou seu aspecto
patológico em adenoma (cistoadenoma mucinoso), borderline e
maligno (cistoadenocarcinoma mucinoso)9. Devido ao seu
potencial maligno, estando o paciente em condições clínicas
favoráveis, a ressecção cirúrgica é recomendada.
Figura 4 – Ecoendoscopia setorial demonstrando imagem cística de 47mm
X 34mm, em corpo pancreático, com traves e conteúdo espesso interno,
compatível com neoplasia mucinosa (cistoadenoma mucinoso).
Neoplasia mucinosa papilar intraductal (IPMN)
As neoplasias mucinosas papilares intraductais são lesões
produtoras de mucina originadas do sistema pancreático ductal que
exibem graus de atipia celular variável e causam dilatação dos
ductos pancreáticos18. Têm um pico de incidência acima dos 50
anos de idade e igual distribuição entre os sexos.
De forma semelhante às neoplasias mucinosas, podem ser
classificadas de acordo com o grau de atipia em adenoma,
borderline ou carcinoma mucinoso papilar intraductal. Localizamse principalmente na cabeça do pâncreas, sendo comum a
presença de doença multifocal9 – Figura 5.
Figura 5 – Tomografia evidenciando dilatação uniforme do ducto
pancreático a partir da cabeça do órgão onde se verifica lesão cística
multiseptada. À ecoendoscopia, verifica-se dilatação do ducto pancreático
e, na cabeça do pâncreas, lesão macrocística com septos finos, não
comunicante ao ducto de Wirsung. A imagem endoscópica demonstra
papila pátula com drenagem de material mucoide. A ecopunção demonstrou
tratar-se de IPMN.
Em relação ao acometimento do sistema ductal, o IPMN pode
acometer o ducto pancreático principal, os secundários ou ambos.
Sabe-se que o acometimento dos ductos secundários evolui com
menos frequência para um carcinoma invasivo, o que é importante
para a definição de conduta.
O último consenso internacional, em 2012 19 , indica as
características para o tratamento cirúrgico dos IPMN de ductos
secundários, com seu manejo clínico dependendo do grau de
acometimento do ducto pancreático principal ou secundário, da
presença de componente sólido, da ocorrência de calcificações e
do tamanho do cisto – Figura 6.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014
pancreática, com ou sem esfincterotomia, pode ser adequada se a
coleção tiver comunicação com o ducto pancreático principal31,32.
Uma vantagem da abordagem transpapilar, quando comparada à
transmural, é a prevenção de hemorragia ou perfuração que podem
ocorrer com esta última. A desvantagem seria que uma prótese
pancreática pode induzir a uma cicatrização e fibrose do ducto
pancreático principal, alterando sua anatomia em pacientes cujo
ducto pancreático é normal e, ainda, dificultando a adequada
drenagem de coleções maiores33,34.
Figura 6 – Abordagem do IPNM de ducto secundário.
Fonte19: Tanaka M, Fernández-del Castillo C, Adsay V, et al. International
consensus guidelines 2012 for the management of IPMN and MCN of the
pancreas. Pancreatology 2012;12(3):183-97.
Neoplasia sólida pseudopapilar
As neoplasias sólidas pseudopapilares pancreáticas são raras e
ocorrem geralmente em mulheres jovens com menos de 35 anos
de idade. Estão localizadas mais comumente no corpo e cauda
pancreáticos, e podem conter ambos os componentes, sólido e
cístico, além de áreas de calcificação20,21.
Drenagem de coleções líquidas pancreáticas - tratamento
endoscópico
O tratamento endoscópico para drenagem de coleções líquidas
pancreáticas é aceito como uma opção menos invasiva que a
drenagem cirúrgica ou percutânea.
Apesar de existirem terapêuticas ecoguiadas de ablação para
neoplasias císticas com injeção de etanol ou outros agentes
ablativos, seu uso está restrito a casos selecionados e não devem
ser utilizadas rotineiramente na prática clínica22-25.
Indicações
As indicações para drenagem endoscópica estão, principalmente,
relacionadas aos sintomas do paciente, sendo os principais: dor
abdominal, retardamento no esvaziamento gástrico, saciedade
precoce, perda de peso e icterícia. A infecção cística e o aumento
de seu tamanho também são indicativos de tratamento.
A maturação da parede cística das coleções líquidas pancreáticas,
onde o aspecto é bem definido, está relacionada ao tempo do
episódio de pancreatite – maior que quatro semanas. Este aspecto
as torna tecnicamente favoráveis à drenagem endoscópica.
Em outro aspecto, somente o tamanho do pseudocisto não é uma
indicação para a sua drenagem, porém sabe-se que quando
atingem dimensões maiores que 6cm eles tendem a ser
sintomáticos.
Dessa forma, podemos resumir as indicações em:
· Sinais e sintomas clínicos;
· Tamanho maior que 6cm;
· Tempo acima de quatro semanas.
b) Técnica transmural
Essa técnica é obtida por meio da colocação de uma ou mais
próteses através da parede gástrica ou duodenal.
Uma avaliação ecoendoscópica antes da drenagem pode ser feita
para reduzir as chances de complicações, definindo a melhor
topografia para a punção e drenagem da coleção30,35-38. A
inviabilidade na realização de uma ecoendoscopia não significa a
suspensão do procedimento, exceto nos casos em que não haja um
abaulamento endoscopicamente visível, a presença de vasos
interpostos ou uma falha prévia na tentativa de drenagem. Nesses
casos, o local de punção deve ser o ponto máximo de compressão
extrínseca causada pela coleção.
A punção da coleção é realizada com uma agulha de grande calibre
ou um estilete com eletrocautério29. Após a passagem de um fio guia
na cavidade, é realizada uma dilatação balonada do trajeto seguida
da colocação de uma ou mais próteses, geralmente plásticas tipo
duplo pigtail, para obter-se a drenagem.
Recentemente, o uso de próteses metálicas auto-expansíveis temse tornado uma alternativa às próteses plásticas, com a vantagem
de formarem uma fístula de maior diâmetro, reduzindo o risco de
obstrução precoce e, ainda, permitindo um acesso endoscópico
para exploração da cavidade39-44. Essa técnica vem sendo utilizada
com boa frequência em nosso serviço, onde foram obtidos
resultados satisfatórios na resolução tanto de pseudocistos, como
em walled-off necrosis, nos quais são necessárias novas
abordagens e sessões de lavagens internas da coleção.
Complicações
Recomenda-se que a drenagem endoscópica de uma coleção
pancreática seja realizada somente com a disponibilidade de
radioscopia e suporte clínico adequado em caso de complicações45,
as quais podem ocorrer durante o procedimento ou a partir da
drenagem inadequada do conteúdo das coleções
Infecção é a principal complicação, e deve-se à obstrução das
próteses, quando o conteúdo é espesso ou está associado à
presença de restos necróticos. Outras complicações incluem
sangramento, perfuração, pancreatite, broncoaspiração do
conteúdo da coleção, migração da prótese, lesão ao ducto
pancreático e complicações relacionadas à sedação.
Resultados
O resultado após uma tentativa de drenagem endoscópica
depende do tipo de coleção e da experiência do endoscopista45,46.
De uma forma geral, o sucesso da drenagem endoscópica dos
pseudocistos é obtido em 82% a 89% dos casos, com taxas de
complicações que variam de 5% a 16%; e as de recorrência entre
4% a 18%47-49.
A experiência com drenagem endoscópica de walled-off necrosis é
ainda limitada, mas em dois estudos apresentou resolução nãocirúrgica bem sucedida em 31 dos 43 pacientes incluídos (72%)45,48.
Em um estudo de Park et al50 a drenagem transmural de abscessos
pancreáticos através da colocação de próteses obteve uma
resolução em 91% (10) dos casos, ocorrendo sangramento autolimitado em apenas um (11%).
Técnica
A abordagem endoscópica para drenagem de um pseudocisto
pode ser transpapilar, transmural ou uma combinação das duas 2630
. A decisão de qual método a ser utilizado deve ser baseada na
relação anatômica da coleção com o estômago e duodeno, com a
presença de comunicação ductal e no seu tamanho.
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A drenagem transpapilar por meio da colocação de uma prótese
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Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 40 - 44, abr / mai / jun 2014
Carcinomatose meníngea
Meningeal Carcinomatosis
Sureya Maria de Almeida David Gibelli1
2
Sueli Monterroso da Cruz
RESUMO
ABSTRACT
A carcinomatose meníngea é uma condição rara (5-8%) que
pode ocorrer nos tumores sólidos e hematológicos. Os
tumores mais frequentemente associados a ela são, em ordem
decrescente: mama, pulmão, melanoma, leucemias e
linfomas. Existem diversas formas de disseminação tumoral
para atingir o líquor, disseminação hematogênica, linfática,
extensão direta, dentre outras. As manifestações clínicas são
as mais variadas, desde paralisia de pares cranianos, cefaleia,
convulsões a coma. Normalmente, o diagnóstico é feito por
meio da coleta do líquor, porém, este pode ser negativo em
10% dos casos. Sem tratamento, a sobrevida mediana é de
cerca de um mês e meio. O tratamento é paliativo e sempre que
possível deve-se indicar a quimioterapia intratecal.
The meningeal carcinomatosis is a rare condition (5-8%) that
can occur in solid and hematological tumors. The tumors that
are most associated with it are decreasing order: breast, lung,
melanoma, leukemias and lymphomas. There are several
forms of tumor dissemination to reach the cerebrospinal fluid,
as hematogenous, lymphatic spread, direct extension, among
others. The clinical manifestations can be paralysis of cranial
nerves, headache, convulsions, and coma. Usually the
diagnosis is made by collecting the cerebrospinal fluid,
however, it can be negative in 10% of all. Without treatment,
median survival is about a month and a half. The best modality is
intrathecal chemotherapy, should be indicated whenever it is
possible.
Descritores: Carcinomatose Meningea; Câncer de Mama.
Key words: Meningeal Carcinomatosis. Breast Cancer.
Introdução
A carcinomatose meníngea, descrita inicialmente em 18701, pode
ser identificada em 4-15% dos pacientes com neoplasia2. Alguns
autores referem que essa taxa varia em uma faixa mais estreita, 5 a
8%3 daqueles pacientes portadores de tumores sólidos (mais
frequentes), leucemias e linfomas. Tumores cerebrais primários
apresentam essa condição em uma frequência bem menor.
Inicialmente, a carcinomatose meningea era uma condição rara,
porém, atualmente, representa uma incidência considerável3.
Os tumores primários mais relacionados são: mama, pulmão e
melanoma. Na neoplasia de mama, o acometimento das
leptomeninges pode alcançar 2-5% dos casos4. Há uma estimativa
que cerca de 30-60% dos pacientes com diagnóstico de
carcinomatose meníngea é portador de neoplasia de mama5.
No tumor de mama, a incidência é maior no subtipo lobular (58%)
em relação ao ductal (33%)4. Em se tratando da neoplasia de
pulmão, o tipo histológico mais relacionado é o adenocarcinoma6.
Fisiopatologia
As células tumorais atingem as meninges por diversas vias:
disseminação hematogênica, linfática, extensão direta por
depósitos contíguos; e por meio da migração centrípeta a partir de
tumores sistêmicos ao longo dos espaços perineurais e
perivasculares7. Uma vez dentro do espaço subaracnoide, as
células neoplásicas são transportadas pelo líquor, resultando em
comprometimento disseminado e multifocal do neuroeixo3.
A infiltração tumoral acomete principalmente a base do crânio,
mais especificamente nas cisternas basilares e na superfície
dorsal da medula espinhal, em particular na cauda equina. A
obstrução do fluxo do líquor por nódulos tumorais depositados ao
nível do quarto ventrículo pode resultar em hidrocefalia. Essas
formações nodulares podem interferir negativamente na ação de
quimioterapia intratecal, pois os agentes quimioterápicos
administrados por essa via penetram milímetros nos tecidos
adjacentes 1.
Quadro clínico
As manifestações clínicas da carcinomatose leptomeníngea
consistem em sinais e sintomas relacionados a três áreas da
função neurológica: os hemisférios cerebrais; os nervos cranianos;
e a medula espinhal e raízes associadas3,5.
Cerca de 40% dos pacientes que desenvolvem essa complicação
existe o acometimento de nervos cranianos, evoluindo com as
manifestações mais frequentes: diplopia, redução da acuidade
visual, redução do paladar e paralisia facial8. Hidrocefalia, cefaleia,
vômitos e alterações do nível de consciência pode ocorrer em
cerca de 70% dos casos9.
1) Residente de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil
2) Chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10° andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil.
E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 03/03/2014; publicado online em: 31/05/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 45 - 47, abr / mai / jun 2014
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Outros sinais incluem confusão, demência, convulsões e
hemiparesias. Cerca de metade dos pacientes desenvolve
acometimento das raízes espinhais, apresentando alteração de
reflexos tendinosos profundos, alteração da sensibilidade,
disfunção vesical e retal9.
Ponto importante que deve ser sempre lembrado é a precocidade
do diagnóstico. O atraso está diretamente relacionado a pior
prognostico1.
Diagnóstico
O exame do líquor representa o exame laboratorial padrão ouro
para o diagnóstico da carcinomatose meníngea. A citologia
oncótica é negativa em cerca de 10% dos casos, percentagem que
representa os falsos-negativos. Portanto, uma citologia oncótica
negativa, não exclui o diagnóstico9. As anormalidades observadas
na análise bioquímica do líquor são: aumento de proteína (76%),
redução da glicorraquia (32%), aumento da contagem celular a
custa de linfócitos provável de origem reacional (56%)6. Essas
alterações são sugestivas, porém, não são diagnósticas7. Já a
presença de células neoplásicas estabelece o diagnóstico,
contudo, nem sempre são identificadas em uma única amostra. A
natureza do tumor não pode ser estabelecida por meio do exame
citológico3. Embora o diagnóstico possa ser estabelecido em 80%
dos pacientes por meio de uma segunda punção, o benefício é
limitado com a realização de um número maior de procedimentos.
Se o paciente apresenta sinais e sintomas cranianos, uma amostra
obtida por punção ventricular, geralmente apresenta uma
positividade maior que o líquor colhido via lombar, bem como na
presença de sinais e sintomas espinhais, a amostra obtida por
punção lombar é frequentemente positiva.
A ressonância magnética (RM) contrastada com gadolíneo
representa a técnica de escolha para avaliar pacientes com
suspeita de metástases leptomeníngeas. Esse exame é capaz de
detectar cerca de 60 a 70% dos casos de carcinomatose
meningea, devendo ser realizada sempre que aventada a
suspeita10.
A RM é mais sensível que a tomografia computadorizada
contrastada, pois qualquer irritação das leptomeninges resultará
em um aumento de sinal7. A imagem observada na RM
corresponde a hipercaptação do contraste, focal ou generalizada,
nos nervos cranianos, cisternas, no epêndima, na superfície do
cérebro e na medula espinhal. Podem-se também observar
redução no volume do parênquima cerebral, hidrocefalia e nódulos
subaracnóides.
A taxa de falso-negativos na RNM pode alcançar 30% 6. Portanto, o
diagnóstico de Carcinomatose Meningea pode ser dado se
citologia do líquor positiva para células neoplásicas ou se quadro
clínico compatível com acometimento multifocal neurológico e
exames de imagem sugestivos, mesmo com citologia oncótica
negativa8. O bloqueio do fluxo liquórico representa um sinal de mau
prognóstico e constitui uma indicação formal para o tratamento
focal com radioterapia3.
Prognóstico
Estima-se que a sobrevida mediana de pacientes portadores que
evoluem com carcinomatose meningea não tratada é de quatro a
seis semanas7,8. A disfunção cerebral progressiva é a responsável
pelo grave desfecho dessa condição. A intenção do tratamento é
melhorar ou estabilizar a condição neurológica, bem como
aumentar a sobrevida. Geralmente, a evolução é desfavorável em
pacientes que apresentam comprometimento do estado geral,
várias alterações neurológicas fixas, doença maciça no sistema
nervoso central, encefalopatia carcinomatosa e anormalidades no
fluxo observadas na ventriculografia.
Pacientes com doença metastática sistêmica que já não
apresentaram boa responsta aos tratamentos quimioterápicos
sistêmicos, dificilmente apresentarão um benefício da terapêutica
46
intratecal. O tratamento precoce, antes do aparecimento de déficits
neurólógicos fixos, é crítico para impedir a progressão da doença7.
Tratamento
O tratamento tem caráter paliativo na tentativa de evitar a
progressão, bem como estabilizar os sintomas neurológicos.
A avaliação da eficácia do tratamento da CM é complicada pela
ausência de uma conduta padrão 8 pela dificuldade na
demonstração de uma resposta diante dos métodos de diagnóstico
pouco sensíveis e pelo fato de a mortalidade estar frequentemente
associada à progressão da doença sistêmica3.
A radioterapia tem papel importante na paliação dos sintomas
neurológicos. Porém quando realizada radiação de todo o
neuroeixo, está associada a uma alta morbidade e a
mielossupressão importante, portanto não deve ser indicada3. A
radioterapia deve atingir a dose de 30Gy (10-12 frações) se forem
evidenciados pontos de obstrução ao fluxo e lesões visualizadas
pelos exames de imagem8.
A quimioterapia intratecal é o tratamento de escolha nos casos de
carcinomatose meningea, apresenta inúmeras limitações. Uma
delas é a baixa penetração nos nódulos tumorais. Se houver uma
obstrução ao fluxo liquórico, há um aumento da toxicidade bem
como falha terapêutica8. Ddemonstrou-se que o Metotrexate,
quando administrado via intraventricular, possui distribuição mais
uniforme, quando comparada com a infusão via lombar12. Nesta, a
chance de administração no espaço subdural ou epidural é muito
grande, reduzindo a concentração liquórica.
A via intraventricular representa o sistema ideal na maioria dos
casos por ser mais simples e confortável para o paciente e mais
seguro do que a realização de punções lombares repetidas.
Existem dois tipos básicos de reservatório: o Rickham Style, que
consiste em um reservatório plano colocado sobre o orifício de
trepanação e o reservatório de Ommaya, com a superfície em
forma de cúpula, mais fácil de ser palpado. O cateter é posicionado
no corno anterior do ventrículo lateral ou próximo do forâmen de
Monro através de uma punção ventricular. É fundamental que a
ponta do cateter e os orifícios laterais estejam posicionados
completamente dentro do ventrículo para evitar a instilação da
droga no parênquima cerebral7.
Existem três agentes que são utilizados rotineiramente na
quimioterapia intratecal, são eles: metotrexato, citarabina
(incluindo a preparação liposomal) e a trietilenotiofosforamida
(tiotepa). Não existe diferença de resposta entre os diversos
agentes, e a frequência de sua utilização é variável. Os níveis
liquóricos do preparado lipossomal da citarabina podem
permanecer por mais de dez dias e a sua utilização pode parecer
mais vantajosa. Alguns estudos, entretanto, descrevem uma
frequência maior de meningite química associada àquele agente9.
Infecções liquóricas ocorrem em cerca de 10% dos pacientes e
resultam em cefaleia, febre e alterações do nível de consciência. O
agente mais frequentemente identificado é o Staphylococcus
epidermidis. Alguns autores recomendam a retirada imediata do
reservatório e o tratamento da infecção com antibióticos sistêmicos.
A meningite química pode ser tratada com corticosteroides e
repouso. O uso combinado de quimioterapia e radioterapia pode
resultar em leucoencefalopatia tardia, frequentemente sintomática.
Alguns estudos argumentam que a quimioterapia intratecal não
contribui significativamente para o controle da doença meníngea
quando comparada ao tratamento sistêmico. Embora, o tratamento
intratecal permanece como a terapia padrão para esses pacientes.
A avaliação de resposta, como mencionada é limitada por uma
análise citológica de difícil avaliação. Dos sintomas neurológicos
associados à CM, a dor responde de uma forma mais consistente
ao tratamento utilizado.2
O Metrotexate não é metabolizado pelo sistema nervoso central,
alcançando a corrente sanguínea pelo coróide, podendo provocar
neutropenia e mucosite em alguns pacientes. A suplementação do
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 45 - 47, abr / mai / jun 2014
ácido fólico pode amenizar essas complicações8. O MTX
normalmente é administrado na dose de 12mg duas vezes por
semana em um total de oito semanas, posteriormente dose mensal
de manutenção9.
Uma complicação que pode haver algumas horas após a infusão
do quimioterápico é a meningite asséptica, podendo ocorrer em
cerca de 30% dos casos. Normalmente, cursa com quadro clínico
de febre, cefaleia, confusão mental, náuseas, vômitos e
meningismo. Mesmo com uso de ácido fólico, cerca de 8% dos
pacientes desenvolvem toxicidade6.
Considerações finais
O tratamento agressivo deve ser reservado para pacientes com
uma estimativa de sobrevida superior a três meses e um estado
geral preservado. O tratamento de suporte deve ser oferecido para
todos os pacientes e inclui a utilização de anticonvulsivantes,
analgésicos e ansiolíticos, quando necessários. Corticosteroides
possuem eficácia limitada no controle de sintomas determinados
pela CM7. Trata-se de uma complicação extremamente grave,
com sobrevida curta, diretamente proporcional ao tempo
entre e diagnóstico e o início do tratamento.
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Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 45 - 47, abr / mai / jun 2014
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Seguimento e gravidez no pós-esvaziamento
uterino devido à mola hidatiforme
Follow up and pregnancy after emptying of the uterus owing to hydatidiform mole
Daniel Machado1
João Henrique Araújo Fernandes2
RESUMO
Relato de caso: descreve-se a gravidez molar em uma
adolescente, na qual o acompanhamento da remissão
espontânea foi prejudicado por uma nova gestação. Verificouse um aumento nos níveis de â-hCG sérico. Nesse momento, a
atividade persistente do tecido trofoblástico possibilitou o
diagnóstico e, por causa disso, a indicação de quimioterapia foi
discutida. No entanto, por meio de exames complementares,
foi descoberto um aborto durante o seguimento. Assim, depois
de outro esvaziamento uterino, os valores séricos de â-hCG
diminuíram e permaneceram negativos durante os outros
controles. Desse modo, fica evidente que a gravidez torna
difícil a interpretação e a conduta no seguimento da mola
hidatiforme.
Descritores: Doença Trofoblástica Gestacional.
Quimioterapia. Gravidez Molar. Gravidez na Adolescência.
Introdução
A mola hidatiforme (MH) constitui uma modalidade da doença
trofoblástica gestacional (DTG). Essa condição origina-se pela
degeneração do tecido trofoblástico, no início da gravidez. Em um
estudo da Escola Paulista de Medicina, a frequência de MH foi de
1:215 gravidezes1,2. Apesar de haver dificuldade, em alguns casos,
para diferenciar a DTG de abortamento retido ou incompleto, a
ultrassonografia superou os demais métodos não invasivos para o
diagnóstico da mola3. O tratamento da MH consiste, em
esvaziamento uterino e seguimento com exames
complementares, principalmente, para diagnosticar precocemente
o risco de malignização da doença, o qual varia de 15 a 33%4,5,
sendo, neste caso, empregada a quimioterapia6. A elevação do
nível sérico da gonadotrofina coriônica humana (hCG) é um
parâmetro para esse diagnóstico. Assim, a gravidez, durante o
seguimento da doença, causa confusão na evolução e na conduta
da MH4.
Relato de caso
Paciente de 16 anos, nuligesta, chegou ao serviço, com queixa de
sangramento vaginal. A data da última menstruação era
desconhecida. Relatou uso de condom nas relações sexuais,
menarca aos 12 anos e primeira relação sexual aos 14 anos de
idade. Ao exame, apresentou bom estado geral, com temperatura
ABSTRACT
Case report: It is reported a case of molar pregnancy in an
adolescent, in whom the follow up of the spontaneous remission
was hampered by another pregnancy. It was found some rise in
the serum determinations of â-hCG. At that time, the persistent
activity of the trophoblastic tissue made the diagnosis possible.
Thus, the indication of chemotherapy was discussed. However,
by means of auxiliary exams, an abortion was discovered
during the follow up. Thus, after another uterine evacuation, the
values of serum â-hCG decreased and remained negatives
during the other controls. So, it is evidenced that pregnancy can
make difficult the interpretation and conduct in the follow up of
the hydatidiform mole.
Key words: Gestational Trophoblastic Disease.
Chemotherapy. Molar Pregnancy. Pregnancy in Adolescence.
corporal de 36,5ºC e pressão arterial de 100 x 60 mmHg, durante a
palpação e toque vaginal negou dor e não foram evidenciadas
massas ou visceromegalias. Entretanto, havia sangramento pelo
orifício externo do colo uterino, em pouca quantidade. Conduta:
pedido de â-hCG sérico qualitativo. Resultado do exame: positivo.
O exame ultrassonográfico transvaginal evidenciou útero
anteversofletido, com morfologia preservada, endométrio
centrado, espessado e heterogêneo com 26 mm de espessura e
discreta imagem sacular de oito mm, sem caracterização de eco
embrionário, mas, sugerindo estado gravídico. O controle, após 15
dias, mostrou um â-hCG sérico quantitativo de 303.690 mUl/ ml e
um exame de ultrassonografia com alterações inespecíficas que
poderiam estar relacionadas com moléstia trofoblástica, pois
apresentou múltiplas formações císticas com aspecto “em cacho
de uva” no endométrio, medindo cerca de 5,7cm. O embrião não foi
individualizado e o volume uterino era de 165ml. Foi realizado
esvaziamento uterino por meio de curetagem e o material foi
enviado para exame histopatológico, o qual apontou vilosidades
coriônicas dilatadas, revestidas por citotrofoblasto hiperplásico
com discreta atipia, apoiada em estroma de tecido conjuntivo
frouxo, dando diagnóstico de mola hidatiforme. No seguimento, a
mensuração do â-hCG sérico foi decrescente durante seis
semanas, chegando a 2mUl/ ml, porém, com aumento do valor na
sétima semana, atingindo 433 mUl/ ml, embora com o útero
mantendo as dimensões normais com 80,5 cc, mas a ecotextura
miometrial era finamente heterogênea e o eco endometrial
espessado, ecogênico, com 10 mm de espessura. Com isso,
1) Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/ SP.
2) Chefe do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/ SP.
Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/ SP, Brasil.
Correspondência: Daniel Machado, Rua Pedro Américo, 60 – 10º andar, 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 30/05/2013; aceito para publicação em: 30/11/2013; publicado online em: 31/05/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
48
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014
houve suspeita da persistência de tecido trofoblástico em
atividade, com atenção especial para o risco de malignização da
doença trofoblástica gestacional. A adolescente, orientada a
utilizar rigorosamente contraceptivo hormonal oral e não manter
relação sexual, afirmava o uso regular da pílula e negava relação
sexual após a curetagem uterina. Na oitava semana, o valor do âhCG chegou em 8918 mUl/ ml e o risco de tumor trofoblástico
gestacional tornou iminente o encaminhamento da paciente para a
equipe de oncologia, a fim de avaliação e provável início de
quimioterapia. Todavia, ao ser informada sobre o tratamento a ser
proposto e sobre os efeitos adversos dos quimioterápicos,
contradizendo as informações primárias, relatou, além de relação
sexual recente, o uso inadequado do anticoncepcional hormonal
oral. Assim, com essas informações, um eco endometrial
heterogêneo, uma imagem cística regular de 8,8cm e volume
uterino de 73ml, a hipótese diagnóstica de nova gravidez seguida
de abortamento foi sedimentada e optou-se por nova curetagem
uterina, após radiografia simples de tórax com transparência
normal do parênquima pulmonar. O exame histopatológico
confirmou a gravidez, mostrando restos ovulares e placentários.
Depois disso, o método contraceptivo foi modificado para de uso
injetável, com supervisão mais rigorosa da mãe da paciente.
Então, os próximos exames de â-hCG sérico foram decrescentes,
até serem considerados negativos e permaneceram abaixo de
2mUl/ml por cinco medidas consecutivas.
Discussão
Mola hidatiforme
No momento da implantação do óvulo fecundado no endométrio,
após o estádio de mórula, o blastocisto possui uma camada
externa chamada de trofoblasto, que é dividido em citotrofoblasto
(camada interna do trofoblásto), sinciciotrofoblasto (camada
externa que reveste as vilosidades coriônicas da placenta) e
trofoblasto (camada intermediária). A partir do trofoblásto é
formado o cório, que se ramifica e torna-se vascularizado, a fim de
complementar a formação da placenta. Essas ramificações são
chamadas de vilosidades coriônicas7.
A MH é uma massa policística em que as vilosidades coriônicas
sofreram degeneração cística. É uma complicação relativamente
infrequente da gravidez, mas com potencial evolução para formas
que necessitam de tratamento sistêmico e podem ser
ameaçadoras da vida. São reconhecidos dois tipos de MH:
completa (MHC) e parcial ou incompleta (MHP)1. Nas MHC, feto,
cordão e membranas sempre estarão ausentes; as vilosidades de
primeiro trimestre medem entre 1 e 8mm de diâmetro e as de
segundo trimestre entre 1,5 e 20mm. Assim, as vilosidades não
aparecerão normais, mostrarão proliferação generalizada e
pronunciada do trofoblasto e maior frequência de atipias dos
núcleos celulares3.
Em relação ao cariótipo, os genes da MHC são de origem paterna
por dissomia uniparental, sendo 90% 46,XX e 10% 46, XY, já a
MHP apresenta triploidia ou tetraploidia3.
Para cálculo da frequência da MH, a Escola Paulista de Medicina
estabeleceu como base 13.986 gravidezes, contando com partos,
abortos e gravidezes ectópicas, somando, no período do estudo,
65 casos de mola hidatiforme. Desse modo, a frequência da mola
hidatiforme ficou estabelecida em 1:215, valor comparável aos
países asiáticos e africanos1,2.
A gravidade da DTG encontra-se na evolução para neoplasia
trofoblástica estacional (NTG), também chamada de tumor
trofoblástico gestacional (TTG), que diz respeito à forma maligna
da DTG, caracterizada pela persistência de tecido trofoblástico
ativo na parede uterina ou em outros órgãos e tecidos4. No Brasil, a
incidência de TTG nos casos de mola hidatiforme varia de 15 a
33%5.
A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO)
estabeleceu os seguintes critérios para o diagnóstico de NTG:
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014
platô da hCG sérica em três semanas de seguimento ou mais;
ascensão de mais de 10% do valor da hCG, em duas semanas de
seguimento ou mais; persistência da hCG sérica detectável por seis
meses ou mais, após o esvaziamento uterino e diagnóstico
histológico de corionarcinoma4.
O diagnóstico precoce é fundamental para evitar complicações
como pré-eclâmpsia, hipertireoidismo, anemia, hiperêmise e
síndrome do desconforto respiratório (SDR)8. Assim, o diagnóstico
pode ser investigado, inicialmente, na vigência de sangramento,
através do ultrassom e da dosagem sérica do â-hCG8. Os níveis de
â-hCG estarão muito elevados e quase a metade das pacientes têm
níveis superiores a 100.000 mUI/ ml1. A ultrassonografia superou
todos os métodos não invasivos para o diagnóstico, apesar de
haver confusão entre mola e aborto retido. Por isso, alguns casos
de mola são diagnosticados após o exame histopatológico em
material de curetagem uterina, indicada, primeiramente, para um
abortamento retido. Por outro lado, muitos casos de mola completa
exibem imagens típicas, apresentando grande quantidade de
material ecogênico, contendo múltiplas vesículas anecóicas
difusas no útero3.
O tratamento da mola consiste em esvaziamento uterino, no
entanto, os seguintes exames devem se pedidos antes do
procedimento: hemograma completo, grupo sanguíneo e fator Rh,
determinação do nível de hCG e raio-X de tórax3.
Os principais desafios para tratamento de pacientes com MH
abrangem o diagnóstico precoce, antes de 10 a 12 semanas de
gravidez, o esvaziamento uterino imediato, o controle das
complicações clínicas, o seguimento pós-molar regular com
dosagem sérica de â-hCG e contracepção eficiente no período de
seguimento8.
Em um estudo com adolescentes, com alto risco para malignidade,
foi empregado actinomicina D (o mesmo que dactinomicina) para
um grupo, sendo a frequência de neoplasias 6,9%, já no grupo
controle a frequência foi de 29%1. O tratamento quimioterápico,
primeiramente, consiste em actinomicina-D ou metotrexato6.
Os efeitos adversos da actinomicina D são náusea, vômito,
ulceração da mucosa, mielossupressão dose-limitante e
manifestações dermatológicas. Já com o uso de metrotrexato, fica
o paciente passível, principalmente, a mielossupressão e a
mucosite9.
A maioria das mulheres com doença trofoblástica gestacional pode
ser curada e manter o seu futuro reprodutivo, dependendo do
diagnóstico, tratamento e seguimento5. Entretanto, a experiência
de todos os serviços especializados mostra dificuldade para manter
a aderência das pacientes a um seguimento1, contudo, o controle
personalizado com motivação continuada, assim como
anticoncepção gratuita, reduz o percentual de abandono do
controle da doença10.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o
seguimento pós-molar ideal deve ser feito com dosagem seriada de
â-hCG a cada duas semanas, até que os níveis se normalizem, e a
cada mês, no primeiro ano5. Além disso, é importante a adesão da
paciente ao tratamento contraceptivo, de preferência, oral ou
injetável1.
A curetagem diagnóstica durante o seguimento deve ser criteriosa,
pois a segunda curetagem é contraindicada se houver metástase,
elevação persistente dos níveis de â-hCG ou coriocarcinoma1.
Gravidez e adolescência
A atividade sexual na adolescência vem-se iniciando cada vez mais
precocemente, com consequências indesejáveis. Sabe-se que as
adolescentes engravidam mais a cada dia e em idades cada vez
menores. Além disso, a sociedade tem aceitado melhor o sexo
antes do casamento e a própria gravidez na adolescência.
Portanto, tabus, inibições e estigmas estão diminuindo e a atividade
sexual e a gravidez aumentando11.
Um dos fatores que colaboram com a gravidez precoce é a
utilização de métodos contraceptivos de modo ineficaz na
49
adolescência. Isso está relacionado aos fatores psicológicos,
inerentes a esta fase da vida, pois a adolescente nega a
possibilidade de engravidar. Como também ela não assume
perante a família a sua sexualidade, dessa forma, a posse de um
contraceptivo seria a prova formal de vida sexual ativa e a
adolescente deixa de utilizar um anticoncepcional por não o ter no
momento da relação11,12.
Um fator biológico também colabora com o aumento da baixa idade
na gravidez, a idade em que ocorre a menarca tem se adiantado
em torno de quatro meses por década, assim, a adolescente está
cada vez mais tempo exposta a gravidez. Noventa e cinco por
cento da menarca encontram-se nos limites de 11,0 a 15,0 anos de
idade11. Do mesmo modo, ocorre com a questão demográfica, pois
a gravidez na adolescência também tem aumentado devido ao
crescimento da população de adolescentes em nossa sociedade13.
Considerações finais
A gravidez, no seguimento da MHC, eleva os níveis séricos da âhCG e pode levar a paciente ao tratamento quimioterápico. No
caso em questão, a adolescente seria exposta,
desnecessariamente, às reações adversas de drogas utilizadas na
prevenção da NTG. Então, devemos permanecer atentos para o
comportamento das adolescentes, pois o descaso com o uso de
contraceptivo e a prática sexual inconsequente e banalizada pode
gerar gravidez e alterar a conduta em um caso de remissão
espontânea de uma mola hidatiforme.
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50
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014
Drusas da cabeça do nervo óptico
e membrana epirretiniana
Drusen of the optic nerve head and epiretinal membrane
Felipe Alves Utyama
Celso Afonso Gonçalves
Marcos Alonso Garcia
RESUMO
Introdução: as drusas da cabeça do nervo óptico (drusas de
papila), frequentemente referidas como pseudopapiledema,
são uma condição hereditária autossômica dominante
irregular de penetrância incompleta. São bilaterais em 70%
dos casos, porém assimétricos e mais frequentemente em
brancos. A membrana epirretiniana (MER) faz parte das
anormalidades de interface vítreo retiniana, consiste em
membrana fibrocelular e avascular que prolifera sobre
superfície interna da retina, produzindo vários graus de
disfunção macular. Relato de caso: Paciente do sexo
masculino, caucasiano, 62 anos, acompanhado pela Clínica
de Oftalmologia UNILASER, em Santos/SP, apresentou as
duas condições simultaneamente, porém, assimétricas em
ambos os olhos. Em função da boa acuidade visual do paciente
(20/20 parcial com a melhor correção) em ambos os olhos,
optou-se por conduta expectante com avaliação periódica do
paciente.
ABSTRACT
Introduction: Drusen of the optic nerve head (optic disc
drusen), often referred to as pseudopapilledema, is a hereditary
condition irregular autosomal dominant with incomplete
penetrance. They are bilateral in 70% of cases and more often
in caucasians. The epiretinal membrane (ERM) is part of
abnormalities vitreoretinal interface and consists of fibrocellular
membranes and avascular proliferating on the inner surface of
the retina, producing varying degrees of macular dysfunction.
Case report: A Caucasian 62 year-old male patient, previously
followed up at Optometry Clinic UNILASER, in Santos,
presented both conditions simultaneously, however,
asymmetric in both eyes. Due to the good visual acuity
presented by the patient (20/20 partial with the best correction)
in both eyes. We opted for expectant management with periodic
follow up.
Key words: Druze of the Optic Nerve. Epiretinal Membrane.
Abnormalities of the Vitreoretinal Interface.
Descritores: Drusa de Nervo Óptico. Membrana Epirretiniana.
Anormalidades da Interface Vitreorretiniana.
Introdução
As drusas de disco óptico constituem uma alteração na cabeça do
nervo óptico de origem familiar autossômica dominante que
acomete igualmente homens e mulheres. É mais encontrada em
caucasianos e não tem relação com condições patológicas do olho.
1
A forma bilateral é encontrada na maioria dos casos (70%) , sendo
normalmente assintomáticos, porém, podem levar à perda do
campo visual (mais frequentemente na forma de defeitos
arqueados) ou, em raros casos, da acuidade visual central. Estão
confinadas anteriormente à lâmina cribrosa e são compostos de
material proteináceo que se tornam calcificados com o avançar da
idade. Sua patofisiologia está relacionada com o fluxo
axoplasmático diminuído, com consequente formação de
excrescências calcificadas. Tais depósitos podem ser
considerados pequenos tumores que se desenvolvem na cabeça
do nervo óptico, podendo causar uma protuberância (daí o termo
pseudopapiledema). Os depósitos calcificados podem, então,
comprometer as camadas de fibras nervosas e suprimento
vascular, levando a defeitos do campo visual e hemorragias
variadas da cabeça do disco óptico.
O diagnóstico é feito por meio do exame clínico da cabeça do nervo
óptico, além de estudos de imagem. Se as drusas da cabeça do
nervo óptico são superficiais, isso pode ajudar no diagnóstico
durante o exame de fundo de olho dilatado. O disco óptico toma
1
uma aparência granulosa-irregular (lumpy-bumby) . Exames
complementares de grande auxílio são a angiografia com
fluoresceína e a ecografia modo B, onde é possível identificar uma
2
alta refletividade diferentemente do verdadeiro papiledema .
Raramente são encontradas alterações vasculares como microhemorragias em chama de vela, neuropatia óptica não arterítica,
oclusão da veia central da retina e formação de membranas
2
neovasculares ao redor do nervo óptico .
Não há tratamento disponível para essas drusas. Laserterapia tem
sido usada para conter a neovascularização ao redor da cabeça do
nervo óptico. O prognóstico é geralmente bom e os pacientes
3
devem ser apenas observados .
Numerosos termos têm sido usados para descrever membrana
) Residente de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Médico Oftalmologista, Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3) Médico Oftalmologista, Preceptor de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10 andar – 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 05/01/2014; publicado online em: 31/05/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 48 - 50, abr / mai / jun 2014
51
epiretiniana, incluindo: pucker macular, membrana epimacular,
maculopatia em celofane e fibrose macular epirretiniana. O tipo
mais comum é a maculopatia em celofane branda (em cinco anos,
incidência de 3,8%). A incidência de sua formação é mais elevada
em pacientes portadores de membranas epirretiniana no olho
oposto (em cinco anos, incidência de 13,5%)4. A membrana
epirretiniana é um tecido fibrovascular localizado sobre a superfície
interna da retina, semitransparente que prolifera na superfície da
camada limitante interna desta.
A forma mais comum de apresentação é a idiopática, todavia, pode
estar secundariamente presente em doenças vasculares da retina,
condições inflamatórias, trauma, após cirurgias oculares, tumores
intraoculares, e descolamentos ou rupturas de retina. Outros
fatores de risco incluem a idade, descolamento de vítreo posterior e
história de membrana no outro olho. A patogênese das membranas
epirretinianas não é completamente entendida. Aparentemente, a
patogênese da forma idiopática pode ser diferente da que ocorre
após o aparecimento do descolamento de retina. O
desenvolvimento de descolamento do vítreo posterior parece ser
essencial para o desenvolvimento de membranas idiopáticas5. A
maioria dos pacientes com membranas epirretinianas idiopáticas
está acima dos 50 anos de idade; entretanto, crianças e adultos
6,7
jovens ocasionalmente são afetados . A idade média do
4
diagnóstico é de 65 anos . Sua prevalência diagnosticada por meio
8-10
de retinografia em estudos varia de 4 a 11% . São bilaterais em
6,8,11
20-30% dos casos .
Células gliais e pigmentares da retina são os maiores
componentes. Não há medidas preventivas em sua forma
idiopática. O diagnóstico é baseado na história clínica e no exame
biomicroscópico do fundo do olho e, em alguns casos, a
angiografia com fluoresceína juntamente com a tomografia de
coerência óptica é útil no acompanhamento de sua evolução. A
cirurgia da membrana epirretiniana é a mais comum cirurgia vítreo
retiniana realizada segundo centros especializados e convênios de
12
saúde , que envolve o peeling de membrana com vitrectomia via
pars plana.
Relato e caso
Paciente 62 anos, masculino, hipertenso, procedente de Santos foi
encaminhado à clínica oftalmológica UNILASER para
procedimento de facoemulsificação e implante de lente intraocular
devido catarata senil em ambos os olhos (realizado o procedimento
em olho direito em agosto de 2008 e olho esquerdo em junho de
2013). Foi submetido a tal cirurgia sem intercorrência, com
instilação correta dos colírios pré e pós-operatórios, segundo o
protocolo da clínica. Em setembro de 2013, procurou novamente o
serviço, queixando-se de baixa de acuidade visual em olho
esquerdo, referindo “visão de fantasma” e sem dor ocular. Ao
exame de biomicroscopia externa na lâmpada de fenda, não havia
alterações. A acuidade visual também era normal (20/20 parcial em
ambos os olhos com a melhor correção). Procedendo ao exame de
biomicroscopia do fundo de olho notou-se área de palidez da
cabeça do nervo óptico. Após a identificação dessa alteração
solicitamos retinografia e angiofluoresceinografia para elucidação
diagnóstica – Figura 1. Após os resultados dos exames,
estabeleceu-se o diagnóstico de drusas de nervo óptico associado
à membrana epirretiniana branda. O paciente encontra-se em
seguimento. Optou-se por conduta conservadora, sendo o mesmo
reavaliado a cada seis meses para averiguar possível piora da
acuidade visual e progressão da condição, onde condutas mais
invasivas poderão ser tomadas.
Figura 1 – Retinografia e angiofluoresceinografia de olho direito e esquerdo
52
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 51 - 53, abr / mai / jun 2014
Discussão
O presente caso apresenta simultaneamente e de forma bilateral a
formação de membrana epirretiniana com drusas da cabeça do
nervo óptico. Não foram encontrados artigos relacionando essas
duas alterações de pólo posterior. O paciente não apresentava
antecedentes de cirurgias vítreo-retinianas, inflamação, cicatriz
corioretiniana ou vasculopatia peripapilares que poderiam justificar
de maneira secundária a formação de membranas epiretinianas.
Apesar da causa idiopática da membrana epirretiniana ser a mais
comum5, foi questionado se a presença de drusas da cabeça do
nervo óptico poderia ser a causa primária do seu encontro.
O principal problema relacionado com a formação de membrana
na região macular é que, devido à sua propriedade contráctil, pode
haver tração na superfície da retina, causando mudanças na
morfologia neuroretiniana13 e, consequentemente, distúrbios
visuais. Os sintomas estão diretamente relacionados com a
espessura da membrana e com a severidade da distorção14, sendo
que, no presente caso, foi observado ser de grau leve ao exame de
polo posterior segundo a classificação de Gass proposta em
198715, sendo: grau leve = membrana isolada; grau moderado =
membrana com dobras; grau avançado = membrana com dobras e
contração da limitante interna (pucker macular). Vitrectomia via
pars plana com peeling da membrana limitante interna é o
tratamento padrão para a remoção da membrana epiretiniana.
Apesar da remoção da membrana ser questionada por algum
tempo, a maioria dos autores acredita ser benéfico para melhora
dos sintomas e sua recorrências. Essa técnica remove células
gliais, hialócitos e fibroblasto sobre limitante interna, causa bem
conhecida de proliferação celular e recorrência de formação de
membrana. Futuros relatos de casos com a presença de drusas de
papila e membrana macular poderão estabelecer alguma relação
entre essas duas patologias.
Com relação ao tratamento adotado, optou-se apenas pelo
acompanhamento (tratamento conservador) devido à boa
acuidade visual apresentada pelo paciente. Normalmente,
membranas epiretinianas brandas produzem sintomas mínimos.
Em tais casos, não é necessária nenhuma intervenção.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 51 - 53, abr / mai / jun 2014
O quadro fundoscópico ilustrado por esse paciente nos faz
questionar a relação entre essas duas doenças. Abre-se um espaço
para que novos casos parecidos sejam relatados e estudos são
necessários para se tentar estabelecer ligação entre essas duas
condições, que aparentemente não parecem existir.
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53
Tuberculose geniturinária
Tuberculosis of the testis
1
Felipe Camargo Bestane
2
André Luiz Farinhas Tomé
1
Mohamad Dib Salah Ali
1
Fernando Lievana Mangolin
RESUMO
Introdução: A tuberculose geniturinária corresponde ha 0,5%
dos casos extrapulmonares e 1,5% nos com tuberculose
pulmonar. Por ser uma forma rara de apresentação e ter como
diagnóstico diferencial doença neoplásica característica de
adultos jovens, torna-se importante relatar este caso. Relato
de caso: Paciente masculino, de 31 anos, deu entrada no
pronto-socorro com quadro de insuficiência respiratória devido
a derrame pleural extenso associado a nódulo sólido testicular.
Por tratar-se de adulto jovem, sem antecedentes e com
exames laboratoriais negativos para tuberculose, foi aventada
hipótese de neoplasia testicular metastática. A orquiectomia
confirmou o diagnóstico de tuberculose pela presença de
necrose caseosa.
ABSTRACT
Introduction: The genitourinary tuberculosis corresponds to
0.5% of extrapulmonary cases and 1.5% of those with
pulmonary tuberculosis. Being a rare form of presentation and
having neoplastic disease characteristic of young adults as
differential diagnosis, it is important to report this case. Case
report: A 31 year-old man was admitted to the ED with
respiratory failure due to extensive pleural effusion associated
with testicular solid nodule. For being a young adult with no
history and negative laboratory tests for tuberculosis, was
suggested hypothesis of metastatic testicular cancer.
Orchiectomy confirmed diagnosis of tuberculosis by the
presence of caseous necrosis.
Key words: Tuberculosis. Genitourinary. Testicles.
Descritores: Tuberculose. Genitourinária. Testicular.
Introdução
A tuberculose constitui um problema de saúde pública em todo o
mundo, principalmente nos países em desenvolvimento. Mesmo
com protocolo de tratamento bem definido, mantem-se como a
principal causa de morte por doença infectocontagiosa1. O Brasil é
o 22o país com maior incidência da doença, sendo esta de 48/100
mil habitantes2.
A tuberculose pulmonar é a infecção inicial e de manifestação mais
comum, correspondendo a 70 % dos casos3. O acometimento
extrapulmonar é mais frequente em pacientes com imunodeficiência, principalmente portadores de síndrome da imunodeficiência
adquirida (AIDS)4-6.
A tuberculose genitourinária (TBGU) é a forma mais frequente de
doença extrapulmonar, atingindo 15 a 20% dos pacientes infectados2. Foi primeiramente descrita por Porter, em 19847. O patógeno
M. tuberculosis é responsável pela maioria dos casos, sendo rara
TBGU por outra espécie de Mycobacterium8.
O acometimento do trato geniturinário dá-se quase que exclusivamente por disseminação hematogênica de infecção pulmonar. Das
manifestações genitais, a orquiepididimite refratária ao tratamento
clínico é a mais frequente, podendo ocorrer abscesso com
fistulização. Nódulo sólido mimetizando neoplasia também tem
sido descrito. Tem início na cauda do epidídimo e atingir o testículo
por contiguidade. Quando causa de infertilidade, esta em sua
maioria é obstrutiva2,9.
A pluralidade de sintomas e manifestações clínicas oriundas da
TBGU dificulta, muitas vezes retardando o diagnóstico. Muitos
pacientes acabam por apresentarem alterações e sequelas
irreversíveis, as quais o tratamento cirúrgico se impõe10.
Relato de caso
Homem de 31 anos, com quadro de dispnéia progressiva associada à tosse seca e emagrecimento, sem febre, havia 1 mês, ao
exame físico, encontrava-se caquético e dispneico, com murmúrio
vesicular abolido à direita, além de testículo esquerdo aumentado
de volume, de consistência endurecida e indolor. Os exames
laboratoriais demonstraram leucocitose moderada e alteração da
função renal, além de importante leucocitúria e hematúria, com
urocultura negativa. A radiografia simples de tórax mostrou
velamento do hemitórax direito. Foi realizada drenagem torácica e
biópsia pleural, a qual revelou processo inflamatório crônico
inespecífico. Os exames de PPD e a bacterioscopia para BAAR da
secreção pulmonar foram positivas para M. tuberculosis. A ultrasonografia evidenciou aumento do volume do testículo esquerdo,
com padrão heterogêneo e fluxo sanguíneo ao Doppler – Figura 1.
A tomograrfia computadorizada de tórax e abdome revelou
infiltrado pulmonar com destruição do parênquima à direita, além
de espessamento de todo o sistema coletor urinário, bexiga,
próstata e vesícula seminal esquerda – Figuras 2, 3 e 4. Optou-se
pela realização de orquiectomia esquerda. O resultado do exame
anatomopatológico foi compatível com tuberculose testicular,
confirmado pela presença de focos de necrose caseosa compro-
1) Residente de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Assistente do Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua José Caballero, 60 ap. 109 – 11055-300 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 15/03/2014; publicado online em: 31/05/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
54
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 54 - 55, abr / mai / jun 2014
metendo o testículo e o epidídimo, com sinais de infiltração do
cordão. Iniciou-se tratamento com isoniazida 400 mg/dia, rifampicina 600 mg/dia e pirazinamida 2g/dia por quatro meses e isoniazida
e rifampicina por mais quatro meses.
Discussão
O M. tuberculosis infecta um terço da população mundial, mas
apenas 5 a 10% dos pacientes apresentarão alguma forma de
doença ativa. Contudo, a tuberculose ainda mata três milhões de
pacientes por ano10. Houve grande aumento no número de casos,
principalmente na África, pela disseminação da AIDS. O risco de
um paciente com HIV desenvolver tuberculose é de 10% ao ano,
enquanto de um indivíduo sadio é de 10% durante toda a vida.
A tuberculose geniturinária corresponde a 0,5% dos casos
extrapulmonares e 1,5% nos com tuberculose pulmonar. Ao longo
dos anos, houve queda dos números de pacientes acometidos12.
O mecanismo de acometimento testicular é controverso, sendo a
disseminação possível através da via hematogênica, retrouretral,
linfática e por contiguidade, porém, a via hematogênica é a mais
frequentemente responsável pelo acometimento13.
Os homens com tuberculose testicular, por vezes, mimetizam o
quadro de neoplasia testicular, sendo difícil a exclusão de malignidade, como demonstrado no caso acima, em que o paciente se
apresentou com massa testicular, endurecida, indolor e derrame
pleural, aventando assim a hipótese de doença neoplásica
testicular metastática12.
O tratamento é clinico com quimioterapia por seis a nove meses e o
tratamento testicular cirúrgico esta indicado quando a resposta ao
tratamento clínico não é satisfatória e/ou há suspeita de malignidade13.
As complicações como infertilidade de causa obstrutiva, abscesso
e fístula também apresentam indicação cirurgica11. A epididimectomia, quando realizada, melhora a eficácia dos quimioterápicos à
doença testicular.
A TBGU deve ser sempre suspeitada em pacientes com história de
contato ou infecção prévia, moradores de regiões com alta
incidência e em casos de doença recorrente, mesmo após
tratamento de primeira linha.
Apesar dos avanços na medicina e na vigilância epidemiológica, a
tuberculose ainda se mantém como um problema de saúde
pública, embora haja protocolo de tratamento definido. O acometimento extra-pulmonar é frequente, porém, a gama de sintomas
inespecíficos e o conhecimento insuficiente da TBGU por parte de
profissionais e pacientes, leva ao diagnóstico tardio. A política de
saúde urbana, visando a diminuição dos casos de tuberculose,
deve iniciar o tratamento precoce desses pacientes para que haja
menor disseminação e menor tempo para desenvolver tuberculose
extrapulmonar.
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Figura 2 – Tomografia de tórax com cavitação e fibrose do parênquima
pulmonar.
55
Síndrome de Steven Johnson
pesadelo oftalmológico
Stevens Johnson Syndrome – ophthalmologic nightmare
1
Lucas Holdack
1
Luciana Garcia Iervolino
2
Celso Afonso Gonçalves
Marcos Alonso Garcia3
Érika Alessandra Galembeck Silvino Rodrigues4
RESUMO
Introdução: A Síndrome de Stevens-Johnson, também
chamada de eritema multiforme maior, faz parte de um
conjunto de alterações de pele e mucosas desencadeada por
reação de hipersensibilidade tipo 3 após uso de determinadas
drogas ou contato com micro-organismo. O quadro clínico é
acompanhado por comprometimento sistêmico com febre,
vômitos, cefaleia e prostração e pode durar até seis semanas.
Pode ainda se apresentar sob a forma de necrólise epidérmica
tóxica (NET). Não há tratamento específico na fase aguda.
Recomenda- se higiene palpebral, lubrificantes,
corticosteróide e antibioticoterapia profilática. Para quadros
crônicos, medidas como lubrificação ocular e epilação podem
ajudar. Correção cirúrgica das pálpebras é importante para
diminuir a evaporação lacrimal. Transplante de membrana
amniótica pode minimizar o dano ao segmento externo.
Contudo, o prognóstico, principalmente nos casos com olho
seco severo, continua reservado. Relato de caso: Paciente do
sexo feminino, 63 anos, aposentada, parda, natural e
procedente de Guarujá, procurou o Serviço de Oftalmologia do
Hospital Ana Costa apresentando dor, irritação ocular e baixa
acuidade visual progressiva em ambos os olhos há dois
meses, após alta hospitalar devido a síndrome Stevens
Johnson. Apesar de simbléfaro bilateral, o olho direito
apresenta-se pior, com deficiência lacrimal muito importante e
com lesão com infiltrado perilesional nesse olho. Apesar de
prontamente iniciada terapia com lagrimas artificiais sem
conservantes, antibiótico e corticoide tópicos, o olho direito
evoluiu de maneira não satisfatória, necessitando de
transplante de córnea e posteriormente evisceração devido
perfuração com endoftalmite. O olho esquerdo apresentou- se
maneira menos agressiva até o 8º mês de seguimento quando
apresentou, a despeito de grande arsenal terapêutico,
afinamento e posterior lesão perfurante pequena, que foi
prontamente tamponada e agora segue em acompanhamento
ambulatorial.
ABSTRACT
Introduction: Stevens-Johnson syndrome , also called
erythema multiforme major, part of a set of changes to skin and
mucous membranes1 triggered by type 3 hypersensitivity
reaction after use of certain drugs or contact with
microorganism . The clinical picture is followed by systemic
involvement with fever, vomiting, headache and prostration and
can last up to six weeks. It may present in the form of toxic
epidermal necrolysis (TEN). There is no specific treatment in
the acute phase. It is recommended eyelid hygiene, lubricant,
prophylactic corticosteroid and antibiotic. For chronic cases,
measures such as ocular lubrication and epilation may help.
Surgical correction of eyelid is important, in order to reduce tear
evaporation. Recent studies show that amniotic membrane
transplantation for ocular surface can minimize the damage to
the outer segment. However, the prognosis , especially in cases
with severe dry eye, remains reserved. Case report: A female
patient, 63 years old, retired, mulatto, born and living in Guarujá,
sought the Ophthalmology Service at Hospital Ana Costa
presenting pain, eye irritation and progressive visual
impairment in both eyes for two months after hospital discharge
due to Stevens Johnson syndrome. Despite bilateral
symblepharon, the right eye had become worse with very
relevant tear deficiency and eye lesion with perilesional
infiltration. Even though therapy with artificial tears without
preservatives, antibiotics and topical corticosteroids was
promptly initiated, the eye remained unsatisfactorily, requiring
corneal transplantation and subsequently eviscerated caused
by drilling followed by endophthalmitis. The left eye was way
less aggressive until the 8th month follow-up, when presented,
despite aggressive therapy, thinning and subsequent small
perforating injury, which was readily buffered and now
continues under follow up.
Key words: Stevens-Johnson Syndrome. Ocular
Complications.
Descritores: Síndrome de Stevens-Johnson. Complicações
Oculares.
1) Residente de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Médico Oftalmologista, Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3) Médico Oftalmologista, Preceptor de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
4) Médico Oftalmologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 10º andar 11075-905 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 30/10/2013; aceito para publicação em: 25/02/2014; publicado online em: 31/05/2014.
56
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 56 - 59, abr / mai / jun 2014
Introdução
A síndrome de Stevens-Johnson, também chamada de eritema
multiforme maior, faz parte de um conjunto de alterações de pele e
mucosas1 desencadeada por reação de hipersensibilidade tipo 3
após uso de determinadas drogas (por exemplo, as sulfonamidas,
anti-inflamatórios, penicilina,barbitúricos, alopurinol e vacinas) ou
contato com micro-organismo (Mycoplasma pneumoniae, vírus
como Herpes simplex, entre outros). O quadro clínico é acompanhado por comprometimento sistêmico com febre, vômitos,
cefaleia e prostração e pode durar até seis semanas. Pode ainda
se apresentar sob a forma de necrólise epidérmica tóxica (NET) ou
síndrome de Lyell, entidade rara caracterizada por necrose
extensa da epiderme2. Envolvimento da superfície ocular é muito
comum e pode causar cegueira em muitos casos. Estruturas
oculares estão envolvidas em 67% a 81% dos pacientes3,4. Casos
moderados apresentam-se com conjuntivite e defeitos epiteliais
localizados em conjunctiva, com os pacientes experimentando
desconforto ocular leve. A maior parte dos casos severos tem
inflamação extensa e difusa da mucosa, pseudomembrana e
conjuntivite membranosa, com descamação epitelial com dor
severa e fotofobia5. À medida que as ulcerações da mucosa
melhoram, podem cicatrizar, levando à adesão, chamada simbléfaro, entre conjuntiva tarsal e conjuntiva bulbar5. Pode haver
encurtamento dos fórnices conjuntivais6. A intensa resposta
inflamatória da conjuntiva leva à destruição de células caliciformes,
diminuindo a produção de mucina e desestabilizando o filme
lacrimal3. Pode também haver diminuição da produção aquosa da
lagrima, devido dano às glândulas lacrimais acessórias e dutos da
glândula lacrimal principal.a superfície conjuntival é reposta por
epitélio cicatricial e tecido cicatricial subjacente5, com metaplasia
escamosa6. Tudo isso resulta em extremo ressecamento podendo
promover opacificação corneana e deformidades palpebrais5. Olho
seco severo é a complicação ocular mais comum em longo prazo e
pode ser encontrada em 46% dos pacientes4. Triquiase é a
segunda mais comum, atingindo 16%4. Opacificação corneana
diminui significativamente a acuidade visual e ainda pode haver
defeitos epiteliais recorrentes, haze inflamatório e neovascularização. Deficiencia de stem cell no limbo pode acontecer em casos
graves6.
Não há um tratamento específico na fase aguda. Recomenda-se
higiene palpebral, lubrificantes, corticosteróide e antibioticoterapia
profilática tópica. Corticosteróide e imunossupressão sistêmicos
são controversos. Para os quadros crônicos, medidas adjuvantes,
como lubrificação ocular e epilação de cílios podem ajudar7.
Correção cirúrgica das alterações palpebrais é importante, assim
como tarsorrafia para diminuir a evaporação lacrimal. Estudos
recentes demonstram que transplante de membrana amniótica
para a superfície ocular durante a primeira semana da doença
pode minimizar o dano ao segmento externo ocular8–14. Contudo, o
prognóstico, principalmente nos casos com olho seco severo,
continua reservado.
não foi removida. Iniciou-se terapia antibiótica e antiinflamatória
tópicas, além de uso de lágrimas artificiais sem conservantes. Na 4ª
semana de tratamento optou-se pela tarsorrafia em OD, para tentar
amenizar a falta de lubrificação. Porém, nas consultas subsequentes apresentou piora do quadro corneano, com infecção e afinamento em porção central do OD (Figura 2), mesmo na vigência de
terapia antibiótica tópica. No início do 3º mês, apresentou descemetocele importante nesse olho, que recebeu então transplante
corneano na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, iniciando
acompanhamento ambulatorial conjunto. Como complicação
imediata, apresentou elevação da pressão intraocular devido
ângulo fechado em porção nasal, que foi controlada com mediação
oral e tópica. Todavia, as condições adversas de lubrificação e
constante inflamação acabaram por levar à falência do transplante,
com consequente perfuração e infecção. O olho direito foi eviscerado no 4º mês de seguimento. O olho esquerdo, no entanto, seguia
dentro dos padrões de normalidade esperados para o quadro, até
que no 8º mês de seguimento apresentou edema corneano e
ceratite importante, com pressão intraocular elevada e infiltrado
corneano perilesional com afinamento de 1/3 da espessura
corneana – Figura 3. Após uso de medicações via oral e tópica, teve
a pressão intra ocular controlada e iniciou seguimento diário para
lesão corneana. Ao final de cinco dias apresentou perfuração , que
foi prontamente recoberta com ceracrilato – Figura 4. Paciente
segue em acompanhamento quinzenal em ambulatório e mantem
uso de lagrima artificial sem conservantes, soro autólogo, corticoide
tópico e antibioticoprofilaxia.
Figura 1 – Aspecto inicial à biomicroscopia.
Relato de caso
Paciente do sexo feminino, 63 anos, dona de casa, parda, natural e
procedente de Guarujá, procurou o Serviço de Oftalmologia do
Hospital Ana Costa queixando-se de dor, irritação ocular e baixa
acuidade visual progressiva em ambos os olhos havia dois meses,
após alta hospitalar devido quadro de Síndrome de Steven
Johnson em decorrência de uso de medicamento contendo sulfa.
Ao exame oftalmológico, apresentava acuidade visual de 20/200
em olho direito (OD) e 20/100 em olho esquerdo (OE). À biomicroscopia, apresentava simbléfaro de grau 3b (até 50% de área tarsal
encurtada) em ambos os olhos, hiperemia conjuntival 3+/4+ em
ambos os olhos e ceratite em porção central, sem infiltrado
perilesional; a motilidade extrínseca estava preservada em ambos
os olhos – Figura 1. Devido à intensa fibrose, a área com simbléfaro
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 56 - 59, abr / mai / jun 2014
Figura 2 – Afinamento em porção central da córnea.
57
Figura 3 – Afinamento corneano em OE.
Figura 4 – Aspecto de perfuração em OE após uso de ceracrilato.
Discussão
Os objetivos do manejo oftalmológico em pacientes com SJS são a
prevenção da infecção, o controle da inflamação e impedir adesões
conjuntivais. O tratamento efetivo requer uma abordagem
multidisciplinar e um encaminhamento precoce a um centro de
referência para queimaduras para reduzir os riscos de infecção e
mortalidade significativamente15. A interrupção dos possíveis
medicamentos causadores do quadro e o início dos cuidados de
suporte são os pilares do tratamento. Devido ao fato de a inflamação dos olhos poder evoluir rapidamente nos primeiros dias da
doença, é importante que as avaliações diárias sejam realizadas
até que seja evidente que nenhum agravamento do quadro ocorra.
O envolvimento agudo dos olhos pode variar de uma leve conjuntivite à descamação de toda a mucosa da superfície dos olhos e das
pálpebras.
A presença de cicatrizes na conjuntiva tarsal tem sido associada a
uma morbidade de longo prazo, relacionada também ao ato de
piscar, que acaba por causar lesões corneanas em decorrência do
atrito causado16.
Corticóides sistêmicos, plasmaférese, ciclosporina sistêmica, e
58
imunoglobulinas intravenosas têm recebido atenção como
possíveis meios de tratamento, mas tiveram resultados variáveis ?
e
permanecem controversos, sem que ainda apresentem diferença
significativa na mortalidade17-21.
Em relação ao tratamento da fase aguda ocular, que visa diminuir
os efeitos em longo prazo da doença, estudos recentes demosntaram benefício no uso de corticoterapia tópica intensa, diminuindo o
dano à superfície ocular de maneira segura10,22. Tal medida pode
facilitar o desenvolvimento de infecção local, e por isso a visita do
especialista deve ser diária para que seja iniciada terapia antibiótica
em caso de necessidade.
Outra alternativa que vem apresentando bons resultados é o uso de
transplante de membrana amniótica(5,8-10,12,14,23-26), devido propriedades antiinflamatórias e por diminuir chance de cicatrização.
Contudo, os maiores índices de beneficio estão associados ao
transplante realizado entre sete e 10 dias do início do quadro11,13
No presente estudo, observa-se má condução do quadro em sua
fase aguda, uma vez que na unidade de tratamento em que foi
recebida não foram disponibilizadas avaliações ou medidas
oftalmológicas básicas, o que resultou em evolução para a fase
crônica caótica e dramática. Após admissão no Serviço de
Oftalmologia do Hospital Ana Costa, a paciente iniciou medidas
terapêuticas para fase crônica, que compreendem lubrificação
abundante com colírios sem conservantes, bem como uso de
corticoesteróides e antibióticos tópicos para amenizar os quadros
infeccioso e inflamatório que se apresentavam .
Apesar do uso de soro autólogo e da tarsorrafia realizada como
tentativa de terapia agressiva para o olho extremamente seco, a
paciente ainda manifestava sintomatologia importante de dor,
sensação de corpo estranho e fotofobia, assim como observado em
outros relatos6,27. O uso de membrana amniótica não foi realizado
conforme baseado na literatura supracitada devido o tempo
decorrido entre a apresentação dos sintomas e o primeiro exame
oftalmológico realizado, de maneira que a paciente não poderia
mais ser beneficiada pelo procedimento
Devido a complicações relacionadas ao filme lacrimal adquiridas
com a doença, o transplante de córnea não foi bem sucedido,
apresentando ulcerações recorrentes e endoftalmite, sendo
necessária evisceração.
Apesar do número crescente de opções de tratamentos possíveis
para o manejo da SJS tanto na fase aguda quanto na crônica, essa
entidade permanece sendo extremamente desafiadora e, muitas
vezes, a despeito de cuidado intensivo julgado adequado, proporcionam apenas alívio parcial dos sintomas e são suscetíveis a falhas.
O transplante precoce de membrana amniótica precoce parece
prevenir ou aliviar a maior parte dos sintomas que se sobrepõe no
seguimento desses pacientes, evitando ou ao menos amenizando
a fase crônica, o que evidencia a necessidade de acompanhamento
oftalmológico dentro da multidisciplinariedade que implica a doença
desde a admissão no hospital.
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59
Morte materna por influenza H1N1
Maternal death from H1N1 influenza in Santos - SP, in 2013
Marion Curado da Silva1
Pia Ceraldi²
RESUMO
ABSTRACT
Objetivo: Relatar um caso de morte materna por influenza
H1N1 ocorrido no serviço de Ginecologia e Obstetrícia do
Hospital Ana Costa, em Santos. Relato do caso: Relatamos o
caso de uma paciente de 19 anos, gestante de 27 semanas
com queixa de mialgia e febre havia cinco dias. Os exames de
imagem sugeriam uma broncopneumonia, porém, foi
confirmado diagnóstico de influenza H1N1 com posterior morte
da mesma. Comentários: Este relato ressaltou a importância
da vacinação nas gestantes, como também do diagnóstico e
tratamento precoces na tentativa de diminuir a mortalidade
materna e fetal por esta doença.
Objective: To report a case of maternal death from H1N1
influenza occurred in the Department of Gynecology and
Obstetrics of Hospital Ana Costa, Santos. Case report: We
report the case of a 19 year-old patient, on 27 weeks pregnant
complaining of myalgia and fever for 5 days. The imaging scan
suggested pneumonia, however, the diagnosis of H1N1
influenza was confirmed and she dead due to the disease.
Comments: This report emphasized the importance of
vaccination in pregnant women, as well as the early diagnosis
and treatment in an attempt to reduce maternal and fetal
mortality from this disease.
Descritores: Gestação. Influenza. Influenza H1N1. Influenza
Pandêmica. Morte Materna.
Key words: Pregnancy. Influenza. H1N1 Influenza. Pandemic
Influenza. Maternal Death.
Introdução
Em abril de 2009, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recebeu
informes de infecções de um novo vírus da influenza A (H1N1) no
México e nos Estados Unidos. Rapidamente, o vírus se propagou
para diversos países da Europa, Américas e Extremo Oriente. Em 6
de maio daquele ano, o Ministério da Saúde do Brasil (MS) recebeu
testes para confirmação diagnóstica de influenza A, o que permitiu
que, em 7 de maio, fossem confirmados os primeiros casos dentre
as amostras de suspeitos1. Nessa época, os testes laboratoriais
para diagnóstico do vírus ainda eram limitados, tornando imprescindível a atenção na interpretação de resultados em pacientes
com suspeita da gripe. Segundo a OMS, mais de 214 países
relataram casos confirmados de influenza A durante a epidemia,
chegando a mais de 18.449 óbitos².
No Brasil, a disseminação foi confirmada oficialmente em 16 de
julho de 2009. Em 21 de agosto de 2009, o Brasil tinha 34.506
casos de doença respiratória aguda grave. Destes, 5.457 casos
foram confirmados laboratorialmente como sendo secundários à
infecção pela influenza A pandêmica, porém, o número total de
casos foi provavelmente bem maior, pois com a evolução da
epidemia, houve uma orientação por parte do Ministério da Saúde
de só testar casos graves³.
A literatura atual, a partir da última pandemia e de surtos anteriores
de H1N1, tem demonstrado que as gestantes no segundo e terceiro
trimestres de gravidez são quatro vezes mais suscetíveis a
hospitalizações do que a população geral e têm uma taxa significa-
tivamente maior de mortalidade. Além disso, oito – 16% de todas as
mortes por infecção por H1N1 aconteceram entre gestantes,
embora este grupo represente apenas 1% da população geral. No
Brasil, do total de 1.632 óbitos registrados até o dia 28 de novembro
de 2009, 156 eram gestantes (9,56%)¹.
Na última epidemia da doença, a estratégia de enfrentamento foi
baseada em medidas de contenção – identificação precoce,
tratamento e isolamento de casos e seguimento de seus contatos
próximos. No cenário atual, essa estratégia perde importância e
efetividade – fenômeno esperado na transmissão de agentes
infecciosos, particularmente com as características dos vírus
influenza – requerendo medidas mais integradas de monitoramento da situação epidemiológica de priorização da assistência aos
casos graves ou com potencial de complicação¹.
O presente relato de caso aborda os aspectos fisiopatológicos,
diagnósticos, terapêuticos e profiláticos da infecção pelo novo vírus
A H1N1 durante a gestação, objetivando avaliar a importância do
tratamento antiviral em gestantes infectadas e as indicações de
interrupção da gestação nessas pacientes.
Relato de caso
Paciente de 19 anos, primigesta, gestante de 27 semanas e 2 dias,
sem comorbidades prévias, procurou atendimento de urgência no
dia 14 de abril de 2013 com queixa de febre e mialgia havia cinco
dias e dor torácica à direita havia um dia. Ao exame físico, encontra-
1) Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Médica ginecologista e obstetra do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 20/11/2013; aceito para publicação em: 12/02/2014; publicado online em: 31/05/2014.
60
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 60 - 62, abr / mai / jun 2014
va-se em bom estado geral e comn ausculta pulmonar com com
roncos e sibilos difusos bilateralmente. O exame obstétrico inicial
mostrava movimentação fetal presente e batimentos cardíacos
fetais (BCF) de 147 bpm. Foram realizados Hemograma: Hb = 10,7
; Ht = 32,7 ; leucócitos = 16.400 (com 20 bastonetes) e plaquetas =
261.000. Urina I sem alterações e Raio X de tórax mostrando
hipotransparência pulmonar bilateralmente e obliteração dos seios
costo-frênicos. Ultrassom (USG) obstétrico: feto único, BCF = 151
bpm, líquido amniótico = 15,3, peso fetal = 1045 g; gestação de 27
semanas e 6 dias. Com base nesses resultados, foi orientada
internação, na vigência de Amoxacilina 1,5g por dia, inalação com
Fenoterol e Ipratrópio e Acetilcisteína. No dia seguinte, foram
suspensas Amoxacilina e Acetilcisteína, introduzidos Cefriaxone e
Hidrocortisona 300mg por dia. O ecocardiograma materno
evidenciou apenas taquicardia. No mesmo dia, houve piora do
quadro respiratório associado à acidose metabólica, sendo
encaminhada à UTI, onde foi realizado acesso central (intracath) e
iniciado Meropenem 2g por dia e Vancomicina 2g por dia. Dia 16 de
abril foi realizado novo Raio X de tórax com sinais de derrame
pleural bilateral, sendo realizada toracocentese em hemitórax
direito com saída de aproximadamente 300ml de líquido serosanguinolento e introduzido Oseltamivir 75mg duas vezes ao dia. A
pesquisa de H1N1 resultou positiva. Por apresentar piora progressiva do padrão respiratório, sem tolerar CPAP, foi realizada
intubação orotraqueal no dia 17 de abril, com presença de grande
quantidade de fluido sero-hemático, em vias aéreas inferiores e
aumentada a dose de Oseltamivir. Entre os dias 18 e 20 de abril
foram introduzidos Furosemida e Noripurum e realizado ciclo de
Betametasona para maturação pulmonar fetal. Devido a alterações
no exame físico neurológico, como ausência de reflexos óculocefálico, córneo-palpebral e escala de Glasgow = 3, foi realizada
tomografia de crânio dia 20 de abril mostrando isquemia parietal
direita com transformação hemorrágica e edema difuso. Dia 21 de
abril, foram retiradas as drogas vasoativas e mantido o suporte
clínico. No dia seguinte, a avaliação neurológica mostrou sinais
clínicos de morte encefálica. O USG Doppler transcraniano
mostrou fluxo nas artérias oftálmicas e cerebral média esquerda.
Feito também USG obstétrico com líquido amniótico = zero, peso
fetal = 950 g e gestação de 25 semanas. De acordo com o resultado
do USG obstétrico, optou-se pela resolução da gestação por via
alta. No intraoperatório, foi feita histerotomia segmento-corporal e
observada placenta calcificada. O recém-nascido, do sexo
masculino, pesou 945 g e apresentou APGAR 04/06/08 respectivamente. Nos primeiros três dias pós-parto a conduta foi mantida,
ocorrendo depois parada cardíaca em assistolia e constatado o
óbito da paciente. A causa da morte foi hipertensão intracraniana
devido a um acidente vascular cerebral, causado por sepse pelo
vírus influenza H1N1. O recém-nascido permaneceu internado na
UTI neonatal do próprio serviço, recebendo alta hospitalar em
setembro de 2013.
Discussão
A pandemia por influenza A 2009 foi a primeira do século 21. Houve
grande número de casos, que se disseminaram rapidamente e
acometeram principalmente indivíduos jovens, como sugeriram
diversas coortes publicadas. Devido a isso, embora a letalidade da
doença pareça ter sido baixa, houve uma grande quantidade de
pacientes admitidos na UTI, o que gerou uma série de estudos
relatando a apresentação clínica e a evolução destes pacientes3.
Os sintomas dos pacientes infectados pelo novo vírus influenza
são basicamente os mesmos de uma gripe sazonal, incluindo
tosse, febre de até 41°C, mialgia, astenia, hiporexia, odinofagia e
cefaléia, também podendo aparecer sintomas gastrointestinais
como náuseas, vômitos e/ou diarréia. O curso clínico da doença é
variável de acordo com o indivíduo em questão, sendo que,
normalmente, na ausência de fatores de risco, o quadro é autolimitado1.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 60 - 62, abr / mai / jun 2014
Existem grupos de maior risco que incluem gestantes, crianças com
menos de dois anos, idosos, pacientes com imunossupressão
(câncer, AIDS, uso de medicamentos imunossupressores,
transplantados) e indivíduos com doenças crônicas (pneumopatias, cardiopatias, doenças hematológicas, renais e obesidade
mórbida) ².
As gestantes devem ser incluídas em um grupo de risco elevado
para desenvolver complicações devido à série de alterações
fisiológicas do organismo materno durante a gravidez.
Primeiramente, seu sistema imunológico encontra-se deprimido
em consequência da alteração de suas respostas humorais e
celulares pelos antígenos específicos fetais. Embora essa
mudança fisiológica seja necessária para facilitar a tolerância
materna aos antígenos de origem paterna, também torna a
gestante mais suscetível aos patógenos intracelulares, tais como
vírus¹.
Além de alterações imunológicas, as gestantes sofrem algumas
adaptações fisiológicas, apresentando alterações mecânicas e
hormonais, o que leva a modificações no sistema cardiovascular e
pulmonar, com aumento da frequência cardíaca, volume sanguíneo, consumo de oxigênio e redução da capacidade pulmonar. De
modo geral, perante todas essas alterações e adaptações, as
infecções virais manifestam-se de forma mais grave quando
adquiridas durante a gestação, especialmente na segunda metade
da gravidez, tornando a gestante mais propensa a complicações,
que tendem a acontecer mais no segundo e terceiro trimestres².
Pouco se sabe sobre os efeitos diretos do vírus da gripe sobre o
feto, mas acredita-se que a viremia seja infrequente e, assim, a
transmissão vertical parece ser rara¹. Já as principais complicações
maternas são síndrome do desconforto respiratório do adulto,
embolia pulmonar, edema agudo de pulmão, pneumonia bacteriana, insuficiência renal e morte².
A coleta de exame para diagnóstico etiológico deve ser priorizada
nas gestantes e puérperas internadas, seguindo-se os critérios de
suspeição de doença respiratória aguda grave4. O teste laboratorial
recomendado pela OMS para a detecção qualitativa do vírus da
influenza. A é a reação em cadeia da polimerase em tempo real
(rRT-PCR). As amostras clínicas que devem ser coletadas para a
realização do teste são swabs combinados de nasofaringe e
orofaringe, preferencialmente até o terceiro dia após o início dos
sintomas. Recentemente, o Centers for Disease Control and
Prevention (CDC) emitiu um consultivo de saúde alertando sobre a
baixa sensibilidade dos testes rápidos e afirmando que as decisões
clínicas sobre o tratamento não devem ser guiadas ou postergadas
com base no resultado desses testes¹.
Recomenda-se o tratamento com inibidores da neuraminidase,
como Oseltamivir 75mg por via oral, duas vezes ao dia por cinco
dias associado a adoção oportuna de todas as medidas de suporte
clínico, de todas as gestantes e puérperas com sídrome gripal,
preferencialmente até 48 horas após o início da febre4. De forma
geral, o tratamento está indicado para todos os pacientes hospitalizados com infecção suspeita ou confirmada e pacientes de risco
para complicação, conforme avaliação clínica¹.
O tratamento tardio da terapia antiviral foi associada com doença
mais grave e morte, como mostrado anteriormente, tanto para a
gripe sazonal quanto para a influenza A, enquanto que o início do
tratamento precoce tem sido associado com a redução da gravidade da doença, a duração dos sintomas, a mortalidade e incidência
de complicações secundárias, hospitalizações e a necessidade de
antibióticos5.
Efeitos indiretos da influenza, particularmente, hipertermia materna
no primeiro trimestre, estão relacionados com defeitos do tubo
neural, anomalias e defeitos cardíacos congênitos. A febre durante
o parto pode causar convulsões neonatais, encefalopatia, paralisia
cerebral e até morte neonatal. Sendo assim, o tratamento com
paracetamol é o mais recomendado6.
Com relação à interrupção da gestação, em gestantes com menos
de 32 semanas, a melhor indicação é a manutenção da gravidez; já
naquelas com 34 semanas ou mais, haverá melhora funcional após
61
o parto, principalmente nas pacientes com sintomas respiratórios
moderados a graves. Quanto à via de parto, deve-se levar em
conta que o parto vaginal exige maior demanda de oxigênio tanto
para mãe quanto para o feto. Em pacientes instáveis, a via de parto
mais adequada é a cesariana¹.
Os medicamentos antivirais apresentam de 70% a 90% de
efetividade na prevenção da influenza, entretanto, a quimioprofilaxia indiscriminada não é recomendável, pois pode promover o
aparecimento de resistência viral. Para que ela seja efetiva, o
antiviral deve ser administrado durante a potencial exposição à
pessoa com influenza e continuar por mais sete dias após a última
exposição conhecida7.
É imprescindível que as gestantes recebam as orientações
corretas acerca da vacina contra a Influenza A durante o pré-natal,
no sentido de disseminar tais informações entre essa população8.
Torna-se essencial o desenvolvimento de estratégias de comunicação entre o profissional de saúde e as gestantes para o estabelecimento de relação de confiança e estudos das representações
acerca das campanhas de vacinação, em especial, envolvendo a
influenza A. Até o momento, nenhum estudo demonstrou a
ocorrência de complicações maternas ou fetais decorrentes da
vacinação.
evolução de pacientes com infecção por Influenza A (H1N1) que necessitaram de terapia intensiva durante a pandemia de 2009. Rev Bras Ter Int.
2010; 22(4):333-8.
4.
Manual de Recomendações para grávidas, puérperas e recém-nascidos
da Secretaria de Estado da Saúde do Estado de São Paulo; 2009.
5.
Siston AM, Rasmussen SA, Honein MA, Fry AM, Seib K, Callaghan WM,
Louie J, Doyle TJ, Crockett M, Lynfield R, Moore Z, Wiedeman C, Anand M,
Tabony L, Nielsen CF, Waller K, Page S, Thompson JM, Avery C, Springs
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H1N1 Influenza in Pregnancy Working Group. Pandemic 2009 influenza
A(H1N1) virus illness among pregnant women in the United States. JAMA.
2010;303(15):1517-25.
6.
Weber C, Correa G, Haberland M, Martini RR, Beck SE, Lara GM. Risco
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7.
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8.
Pereira BFB, Martins MAS, Barbosa TLA, Silva CSO, Gomes LMX.
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no período gestacional. Scientia Med. 2012;22(1):53-8.
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Nassar AP, Mocelin AO, Nunes ALB, Brauer L. Apresentação clínica e
62
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 60 - 62, abr / mai / jun 2014
A importância do diagnóstico precoce
para o tratamento específico
da leucemia promielocítica aguda
The importance of early diagnosis
or specific treatment of acute promyelocytic leukemia
Suellen Nastri Castro1
Letícia Medeiros2
RESUMO
ABSTRACT
Introdução: a leucemia promielocitica aguda é uma doença
peculiar, responsável por 10 a 15% das leucemias mieloides
agudas. Aproximadamente 95% dos casos apresenta
translocação balanceada entre os cromossomos 15 e 17
envolvendo rearranjo dos genes PLM e RARa. Cabe ressaltar
a importância dos novos tratamentos, como ATRA e sua
associação com quimioterapia, como visto anteriormente
dobra a taxa de cura, eleva as taxas de remissão a 80 a 90%
dos casos e as taxas de sobrevida em longo prazo se tornam
superiores a 75% em relação à quimioterapia isolada. Relato
de caso: apresentamos um caso de uma paciente com quadro
inespecífico de pancitopenia, prontamente suspeitado de
leucemia aguda. Foi introduzido ATRA (acido transretinoico),
antes mesmo de iniciar investigação especifica de qual tipo de
leucemia estávamos lidando, conduta essa que exige
experiência do profissional e conhecimento do comportamento
da doença e que melhora o prognostico principalmente da
leucemia mieloide aguda do tipo promielocitica.
Descritores: Leucemia Promielocitica Aguda. Ácido
Transretinoico.
Introduction: The acute promyelocytic leukemia is a peculiar
disease, accounting for 10-15% of acute myeloid leukemias.
Approximately 95% of the cases present balanced
translocation between chromosomes 15:17 rearrangement
involving genes and PLM RARa. We highlight the importance of
new treatments, such as ATRA and its association with
chemotherapy, as seen earlier doubles the cure rate increases
remission rates of 80 to 90% of cases and rates of long-term
survival becomes greater than 75% compared to chemotherapy
alone. Case report: We present a case of a patient with
nonspecific box pancytopenia, promptly suspected acute
leukemia. ATRA (all-trans retinoic acid) was introduced even
before starting research specifies which type of leukemia were
dealing, conduct that requires professional experience and
knowledge of the behavior of the disease, which mainly
improves the prognosis of acute myeloid leukemia
promyelocytic type.
Key words: Acute Promyelocytic Leukemia. Trans Retinoic
Acid.
Introdução
Leucemia mielóide aguda (LMA) é uma doença clonal maligna que
se caracteriza pela proliferação anormal de células progenitoras da
linhagem mielóide, ocasionando produção insuficiente de células
sanguíneas maduras normais. Desse modo, a infiltração da
medula por essas células é frequentemente acompanhada de
pancitopenia. O mecanismo que faz com que a célula perca o
controle da proliferação celular, ocasionando clone leucêmico,
parece estar relacionado com a ativação de proto oncogênese
mutação em genes supressores que regulam o ciclo celular1. O
pleomorfismo da LMA, assim como uma possível diferença no
comportamento biológico, motivou o estabelecimento de uma
classificação. Em 1975, pela primeira vez, o grupo cooperativo
Franco Americano Britânico (FAB) propôs a classificação em seis
diferentes subtipos, baseado estritamente em aspectos morfológicos e citoquímicos. Em 1985, essa classificação foi revisada
originando a atual, onde foram acrescentados dois novos subtipos1
– Tabela 1.
1) Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Médica Assistente de Hematologia Clínica do Hospital Ana Costa
Instituição: Serviço de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Av. Bernardino de Campos, 586 ap 11, Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 11/03/2014; publicado online em: 31/05/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 63 - 64 abr / mai / jun 2014
63
Como visto acima, a leucemia promielócitica aguda (M3) se
caracteriza por apresentar promielócitos anormais. Nesse tipo de
leucemia, os pacientes costumam apresentar quadro clinico e
laboratorial compatível com coagulação intravascular disseminada
(CIVD), situação essa grave que necessita rápido diagnóstico e
intervenção. Após o advento do ácido transretinoico (ATRA), a LMA
M3 passou a apresentar boa resposta a esse quadro de coagulopatia grave, tornando-se o subtipo com melhor prognóstico e chance
de cura.
Caso clínico
Paciente feminina, de 20 anos, veio encaminhada do PS Guarujá,
devido a quadro de febre diária, não aferida, associada a mal-estar
inespecífico, fraqueza, inapetência e dor no corpo havia aproximadamente um mês. Referiu que, nesse período, procurou o PS do
Guarujá diversas vezes e, durante as avaliações, foi diagnosticada
infecção do trato urinário e gripe. Apesar do tratamento adequado,
mantinha os mesmos sintomas. Ao exame físico, apresentava-se
descorada, desidratada e febril. O hemograma de entrada
apresentava pancitopenia, principalmente anemia e plaquetopenia. Suspeitou-se de leucemia mielóide aguda e, de imediato,
introduziu-se vesanoid. Após, foram solicitados exames laboratoriais complementares, mielograma com imunofenotipagem e
citogenética, onde se fechou o diagnóstico de leucemia mielóide
aguda do tipo M3 – promielocítica aguda. Iniciou-se, associado ao
Vesanoide, quimioterapia com Antraciclina e Citarabina. A paciente
evolui com melhora do quadro, sem complicações, seguindo em
acompanhamento ambulatorial.
Discussão
A leucemia promielocítica aguda é caracterizada pela proliferação
anormal de células progenitoras de linhagem mielóide. Os
promielocitos anormais têm núcleo excêntrico, abundantes
granulações e múltiplos bastonetes de Auer no citoplasma, que
caracterizam esse tipo de leucemia. Ela corresponde a 10 a 15%
das leucemias mieloides agudas e, de acordo com a classificação
de FAB (Franco-Americana-Britânico), é caracterizada pela sua
apresentação celular e características citoquímicas como M3,
onde, em cerca de 90% dos casos, há translocação t15; 17 q22;
q212. Em 1991, descobriu-se que essa translocação cromossômica causava a fusão do gene do receptor do ácido transretinoico alfa
(RARa) ao chamado gene de leucemia promielocítica no cromossomo 15, produzindo uma proteína de fusão, PML RARa (que pode
ser confirmada por meio da detecção por método de FISH, reação
de cadeia de Polimerase -RTPCR ou citogenetica convencional).
64
Portanto, esses dados sugeriam que a perda da função normal do
gene deveria ser a causa do desenvolvimento da leucemia
promielocitica aguda2.
A LPA, diferentemente dos outros subtipos de LMA, ocorre com
maior freqüência em adultos jovens e tem incidência praticamente
estável entre os 20 e 59 anos de idade. Não há predomínio de
nenhum dos sexos e não está associada à síndrome mielodisplásica prévia. Apresenta maior incidência em países de colonização
latina e algumas regiões da Espanha. Porém, a real incidência da
LPA não é conhecida e a maioria dos estudos baseia-se em
registros hospitalares3.
A leucemia promielocítica aguda é uma emergência hematológica
que, na maior parte dos casos, apresenta-se clinicamente por
pancitopenia, podendo estar presente no início do diagnóstico uma
grave coagulopatia. Assim, requer confirmação diagnóstica
imediata e medidas terapêuticas precisas. A introdução do acido
transretinóico na terapia da LPA dobra a taxa de cura em relação à
quimioterapia isolada e as taxas de remissão em 80 a 90% dos
casos. As taxas de sobrevida em longo prazo superior a 75% foram
alcançados com a combinação de ATRA e quimioterapia contendo
antraciclina. Ainda assim, em média, 10% dos pacientes morrem na
fase inicial da doença e 20 a 30% recidivam4.
O tratamento da LPA sofreu importantes modificações nos últimos
20 anos e difere dos esquemas utilizados para as demais LMAs. O
maior impacto no tratamento da LPA foi, sem dúvida, a demonstração de que o ácido all-trans-retinóico (ATRA), em doses farmacológicas, permite a progressão da diferenciação celular. Desta forma,
o clone leucêmico progride na maturação mielóide, tornando-se
susceptível aos mecanis-mos de morte celular. O tratamento com
ATRA deve ser iniciado imediatamente diante da suspeita morfológica3.
Referências
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mielóide aguda. Rev Ass Méd Bras. 2000;46(1):57-62.
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Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 63 - 64 abr / mai / jun 2014
Abscesso cerebral em paciente portador
de endocardite de valva protética
Brain abscess in patients with prosthetic valve endocarditis
Amanda Evelyn Andrade Rocha¹
Rodolfo Leite Arantes²
RESUMO
Introdução: A endocardite infecciosa (EI) é uma infecção
microbiana de uma valva cardíaca ou do endocárdio mural. A
disponibilidade de agentes antimicrobianos potentes, dotados
de capacidade bactericida e o progresso da tecnologia
cirúrgica promoveram uma redução na morbidade e na
mortalidade relacionadas à endocardite. Todavia, a EI
representa uma doença em evolução. Para ser capaz de
diagnosticá-la prontamente e tratá-la de modo eficaz, devemse compreender suas novas e sutis apresentações, os
problemas especiais envolvidos quando do acometimento de
uma prótese valvar, complicações extracardíacas, a
abordagem antibiótica moderna e o papel desempenhado pela
cirurgia no tratamento desta condição. Relato de caso:
Apresentamos o caso clinico de um paciente de 52 anos,
portador de endocardite de prótese valvar mitral, evoluindo
com presença de múltiplos abscessos cerebrais. Optou-se
pela realização de drenagem cirúrgica do abscesso e,
posteriormente, nova troca de prótese valvar.
ABSTRACT
Introduction: Infective endocarditis (IE) is an infection of a
heart valve or mural endocardium. The accessibility of potent
antimicrobial agents, endowed with bactericidal capacity and
progress in surgical technology promoted a reduction in
morbidity and mortality related to endocarditis. However, IE is a
disease in evolution. In order to be able to directly diagnose it
and treat it effectively, the clinician must understand their new
and subtle manifestation, the special problems with the
involvement of a prosthetic valve, extracardiac complications,
antibiotic modern approaches and the role of surgery in treating
this condition. Case report: We present the clinical case of a
patient of 52 years old, with prosthetic mitral valve endocarditis,
developing the presence of multiple brain abscesses. It was
decided to carry out the surgical drainage of the abscess and
subsequent surgery for replacement of the valve prosthesis.
Key words: Infective Endocarditis. Valve Prosthesis. Cerebral
Abscess.
Descritores: Endocardite Infecciosa. Prótese Valvar.
Introdução
A endocardite infecciosa é uma infecção microbiana de uma das
valvas cardíacas ou do endocárdio mural causada por agentes
infecciosos. A lesão primária é uma vegetação, que consiste em um
trombo de plaquetas e fibrina infectado, localizado dentro do
coração1. A infecção valvar nativa (EVN) consiste em uma infecção
de valvas cardíacas naturais normais ou anormais. A endocardite
de valva protética (EVP) envolve valvas artificiais implantadas.
A incidência geral da endocardite infecciosa varia de 1,7 a 6,2
casos:100.000 indivíduos/ano2. Embora a incidência geral tenha
permanecido relativamente estável nas últimas cinco décadas,
houve variação da frequência relativa da doença em determinados
subgrupos particulares, assim como de muitos aspectos distintos
de sua epidemiologia. A média da idade dos pacientes que sofrem
de endocardite aumentou para 57,9 anos3.
Entre as principais condições predisponentes, a doença cardíaca
reumática crônica tornou-se relativamente incomum nos países
desenvolvidos, enquanto as doenças valvares degenerativas
ganharam importância. Os casos de endocardite associada ao uso
abusivo de fármacos por via parenteral e à presença de valvas
cardíacas protéticas tornaram-se mais comuns, assim como a
endocardite infecciosa nosocomial. Também está havendo
aumento da frequência das infecções com envolvimento de
dispositivos intravasculares implantados, referidas como
endocardites infecciosas associadas a dispositivos cardíacos
(EIADC), diferentes do envolvimento valvar4.
O risco de endocardite protética valvar é de 1 a 5% no primeiro ano
1) Médica Residente de Clinica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Médico Cardiologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Cardiologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60, Santos/SP, Brasil. E-mail:
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em 05/03/2014; publicado online em: 31/05/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 65 - 67 abr / mai / jun 2014
65
após o implante e depois diminui para cerca de 1% por ano. É
semelhante entre válvulas mecânicas e prótese biológica e
comparável entre as válvulas nas posições aórtica e mitral5. EPV
ocorrendo nos primeiros 12 meses após a cirurgia é mais
freqüentemente causada por estafilococos coagulase-negativo ou
S. aureus6, enquanto EPV de início tardio tem microbiologia
semelhante ao ENV7.
Os pacientes com EI aguda geralmente descrevem o início abrupto
de febre e calafrios e pode apresentar sintomas de embolia. A
história deve incluir inquérito específico sobre os fatores de risco
conhecidos para o EI, incluindo procedimentos invasivos, uso de
drogas injetáveis, doença cardíaca estrutural, e endocardite
prévia. A apresentação clínica da EI subaguda é variável,
caracterizada por sintomas constitucionais de longa data1.
Complicações podem ser comuns em pacientes com EI.
Complicações cardíacas foram as mais comuns, mas as taxas de
mortalidade foram maiores para complicações neurológicas e
sépticas. Por isso, a insuficiência cardíaca foi substituída por
complicações neurológicas e sépticas como as principais causas
de morte em pacientes com endocardite infecciosa. As
complicações neurológicas podem surgir por meio dos seguintes
mecanismos, frequentemente associadas no mesmo paciente:
oclusão das artérias cerebrais por embolia derivados de vegetação
endocárdica, hemorragia cerebral, infecção das meninges,
abscesso cerebral e aneurismas micóticos. Encefalopatia
relacionada à sepse, definida por estado confusional agudo ou
delírio, com flutuação de vigilância também pode contribuir para
manifestações neurológicas da EI, especialmente em pacientes
com infecção pelo S. aureus8.
Relato de caso
Paciente de 52 anos, caucasiano, masculino, portador de
insuficiência mitral, submetido à cirurgia para troca de valva mitral
por prótese biológica em abril de 2013. Procurou atendimento
médico em nosso serviço em 16 de julho 2013 apresentando
episódios de febre alta e dor torácica recorrente havia dois dias. Ao
exame, apresentava-se em regular estado geral, corado,
desidratado+/4+, anictérico, acianótico, febril (39°C), com pressão
arterial de 110 x 70 mmHg, frequência cardíaca 120bpm e
saturação de O2 de 98% em ar ambiente. O ecocardiograma
evidenciou função ventricular diminuída de grau importante,
hipocinesia difusa, prótese biológica mitral com gradiente médio de
2,5mmHg e presença de imagem ecogênica mitral na haste da
prótese sugestiva de vegetação. A terapia com Vancomicina,
Rifampicina e Meropenem foi iniciada e o paciente foi internado no
nosso serviço. No segundo dia de internação, evoluiu com quadro
de confusão mental e hemiplegia direita, sendo então transferido
para UTI cardiológica. Foi submetido a uma tomografia
computadorizada de crânio e, posteriormente, ressonância
magnética, evidenciando presença de diversas lesões isquêmicas
cortiço-subcortical occipital esquerdo, cortiço-subcortical parietal
bilateral, subcortical fronto-temporo-parietal esquerda e presença
de formação com sinal heterogêneo na região frontal esquerda
com compressão de sulcos cerebrais ipsilateral – Figura 1. A
equipe da neurocirurgia optou por intervenção cirúrgica com
realização de drenagem do abscesso cerebral sem intercorrência.
Evoluiu com melhora do quadro clinico, consciente e orientado,
afebril, com persistência de hemiparesia direita. A hemocultura
evidenciou presença de Staphylococcus aureus. Recebeu alta
hospitalar em 3 de setembro, em uso de Vancomicina, orientado
acompanhamento com equipe para programação de cirurgia
eletiva para nova troca de prótese valvar em dois meses.
Apresentou novos quadros de febre e, após 10 dias, foi novamente
internado para realização de nova troca de valva mitral biológica,
sem intercorrêncis. Evolui de forma satisfatória, assintomático e
com melhora parcial do déficit motor à direita. Recebeu alta
hospitalar em 21 de outubro, mantendo uso de Vancomicina e em
acompanhamento com serviço de home care.
66
Figura1 – Ressonância magnética de crânio, evidenciando abscessos
cerebrais.
Discussão
O Staphylococcus aureus é a causa principal de EI aguda. A
incidência de S. aureus vem aumentando nas últimas décadas,
tornando-se o organismo predominante na maioria dos relatórios. O
aumento do uso de cateteres endovenosos e próteses implantadas
levaram a taxas mais elevadas de estafilococos associados à
bacteremia, colocando mais pacientes em risco para o EI9. Está
associada a maiores taxas de embolia e de mortalidade em
comparação com a EI causada por outros organismos10.
O abscesso cerebral é uma complicação rara da EI subaguda,
porém, é menos rara na forma aguda. É detectável por meio de
tomografia computadorizada com infusão de contraste ou
ressonância magnética. Esses abscessos são geralmente
pequenos, com menos de 1,5cm de diâmetro e, frequentemente,
são múltiplos. A terapêutica antimicrobiana intensiva, com um
agente antimicrobiano capaz de atravessar a barreira
hematoencefálica, representa um tratamento eficaz. É rara a
ocorrência de um grande abscesso cerebral, exigindo a drenagem
cirúrgica11.
Determinadas subpopulações de pacientes com EI experimentam
uma elevada taxa de mortalidade, apesar da terapêutica com
agentes antimicrobianos potentes. Essas subpopulações
englobam aqueles pacientes cuja EI é causada por um
microrganismo virulento ou resistente à antibioticoterapia e aqueles
pacientes cuja EI produz complicações cardíacas ou
extracardíacas significativas.
A endocardite em próteses valvulares é complicação pouco
frequente, porém, muito grave. A intervenção cirúrgica é
frequentemente necessária, contudo, há controvérsia em relação
ao melhor momento para indicação. Não há consenso, na literatura,
em relação aos fatores que provocariam a endocardite após o
implante da prótese. Nos casos em que a doença desenvolve-se
precocemente após a cirurgia, a contaminação pré ou intraoperatória da prótese é o fator mais aceito, principalmente quando o
agente etiológico é estafilococo12.
A ausência de ensaios clínicos randomizados na literatura de
terapia cirúrgica versus terapia médica isolada no tratamento de EI,
as diretrizes atuais para o tratamento cirúrgico da IE são baseadas
principalmente em dados observacionais, que são propensos a
vícios, como confusão por indicação e sobrevivência e viés de
seleção de tratamento13.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 2, p. 65 - 67 abr / mai / jun 2014
O tratamento cirúrgico para endocardite protética valvar é
frequentemente indicado, e é realizada em cerca de metade de
todos os casos de EPV14. Esses pacientes devem ser
cuidadosamente considerados para cirurgia, embora pacientes de
baixo risco com EPV podem ser geridos de forma adequada com a
terapia médica sozinho. Características que sugerem menor risco
incluem ausência de insuficiência cardíaca, abscesso ou
deiscência da válvula, e aqueles cuja EI é causada por organismos
menos virulentos, como estreptococos viridans15.
Baseados em dados da literatura, podemos concluir que as
condições clínicas pré-operatórias influem decisivamente no
resultado cirúrgico, não devendo, portanto, ser postergada a
indicação da operação quando o tratamento clínico não está
produzindo resultados satisfatórios. A cirurgia de urgência tem
resultados menos favoráveis, devido às condições mais críticas
dos doentes. Endocardites mais precoces são mais graves e a
manipulação de focos infecciosos em pacientes com prótese
valvular deve ser cuidadosa e precedida de antibioticoterapia. Nos
pacientes sobreviventes à operação, a evolução em longo prazo
apresenta melhora significativa da classe funcional12.
A sobrevida geral para os pacientes com endocardite infecciosa é
de cerca de 75 a 80%. Essa taxa de sobrevida é um pouco melhor
que aquela vigente na década de 1950, mas ainda precisa
melhorar16. A perspectiva depende em grande parte da rapidez com
que o diagnóstico é estabelecido e a terapia é iniciada, bem como
da natureza do organismos infeccioso, da existência de
comorbidades e do desenvolvimento de complicações cardíacas e
neurológicas17. Embora os resultados sejam piores nos casos de
EPV em fase inicial, as taxas de sobrevida para os pacientes em
fase tardia parecem ser similares às taxas de sobrevida dos
pacientes com infecção de valva nativa18. Com a incorporação de
uma intervenção cirúrgica mais precoce no tratamento dos
pacientes com endocardite, a insuficiência cardíaca passou ter
menor destaque como causa mortalidade. No entanto, as
complicações significativas envolvendo o SNC e a infecção
descontrolada, sobretudo a formação de abscesso, continuam
associadas a uma maior mortalidade19.
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Sua saúde em boas mãos