O Anilhamento como ferramenta para o estudo de aves migratórias

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O Anilhamento como ferramenta para o estudo de aves migratórias
O Anilhamento como ferramenta
para o estudo de aves migratórias
Inês de Lima Serrano
ICMBIO-CEMAVE
Rua Alfredo de Medeiros 115, Edifício Farol da Barra, Apto 803, Espinheiro, Recife, Pernambuco, 52021-030 - Brasil
[email protected]
Este documento puede citarse como sigue:
Serrano, I. 2008. O anilhamento como ferramenta para o estudo de aves migratórias [en línea]. En de la Balze, V.M. y D.E. Blanco
(eds.): Primer taller para la Conservación de Aves Playeras Migratorias en Arroceras del Cono Sur. Wetlands International, Buenos
Aires, Argentina <http://lac.wetlands.org>
Introdução
O anilhamento surgiu na Dinamarca, no final do século
XIX em 1889, quando o professor Christian Mortensen,
utilizando anilhas de zinco com endereço e numeração
gravada, anilhou a primeira ave - Sturnus vulgaris
(Euring 2007). Em 1902 na América do Norte, há mais
de 100 anos atrás, Paul Bartsch, do Smithsonian
Institute, anilhando garças deu inicio ao uso da técnica
nos Estados Unidos (Tautin 2005). Ambos tinham em
comum, perguntas tais como: para onde vão as aves
quando desaparecem, quais seus deslocamentos,
migrações realizadas, quanto tempo vivem, quando se
tornam adultas para reprodução, entre outras questões.
Expandiu-se posteriormente na Alemanha (1903),
Hungria (1908), Grã-Bretanha (1909), Lugoslávia (1910)
e países escandinavos (entre 1911 e 1914).
Na América Latina, as primeiras iniciativas datam dos
anos 30, no Brasil e na década de 40 na Argentina
(Olrog 1948). Entretanto, como sistema nacional de
anilhamento unificado e funcionando de forma
sistemática, a atividade estabeleceu-se no Brasil a partir
de 1977, (CEMAVE 1994), com a criação pelo governo
brasileiro do CEMAVE (Centro Nacional de Pesquisa
para Conservação das Aves Silvestres). Brasil e
Argentina formam uma exceção entre os países latinoamericanos, ao utilizarem anilhas de seus próprios
sistemas nacionais. Na Argentina os trabalhos de
marcação de aves são coordenados pelo CENAA
(Centro Nacional de Anillado de Argentina), com maior
enfoque nos passeriformes. Os demais países utilizamse das anilhas fornecidas pelo centro norte-americano,
trabalhando sob a coordenação do Bird Banding
Laboratory/Patuxent Wildlife Research Center.
Como em seus primórdios, ainda hoje a base do
anilhamento é o sistema de marcação que permite a
identificação individual de aves. São usadas anilhas ou
anéis de ligas de diversos metais, de alumínio, outras
de aço. Na atualidade é uma ferramenta utilizada em
larga escala, na Europa e Estados Unidos. Ainda está
incipiente em boa parte da América do Sul e certamente
a criação do CEMAVE e do Sistema Nacional de
Anilhamento de Aves Silvestres, há 30 anos,
impulsionou seu uso no Brasil.
As aves migratórias de longo curso e, entre elas, os
Charadriiformes, constituem um dos grupos que mais
chamam a atenção do público em geral, pelas
espetaculares migrações realizadas anualmente.
Algumas espécies, como o trinta-réis ártico (Sterna
paradisaea), chegam a percorrer mais de 20.000 km
desde a Sibéria à Antártida. Em outras palavras,
anualmente são cerca de 40.000 km entre ida e volta
(Alerstam et al. 2003). Conectam hemisférios,
compartilham, utilizam recursos ambientais em distintos
habitats e consequentemente também sofrem diferentes
pressões antrópicas, ambientais e políticas. Por não
reconhecerem fronteiras políticas, as aves migratórias
são recursos naturais que requerem cooperação
internacional para sua efetiva conservação.
Esta palestra tem como objetivo apresentar, de forma
geral, o uso do anilhamento como ferramenta
importante não somente para estudos científicos, mas
também voltados ao monitoramento e conservação de
aves migratórias. nfase será dada às aves praieiras em
especial às espécies das famílias Charadriidae e
Scolopacidae.
Tipos de anilhas e outros marcadores
Grupo carismático, bem conhecido do ponto de vista
biológico, além de excelentes indicadores de qualidade
ambiental, as aves são ferramentas importantes para o
monitoramento e conhecimento de alterações
ambientais, respondendo rapidamente às drásticas
mudanças que ocorrem a nível global. Estimativas
populacionais recentes indicam nas diferentes rotas
migratórias entre 33% e 68% das populações estão em
declínio, comparado com 0% e 29% de incremento
(Stroud et al. 2006).
Vários são os tipos de anilhas utilizadas para marcar
diferentes espécies, dependendo do diâmetro e
estrutura do tarso ou tíbia. De modo geral, as anilhas
contem um código formado por letras e números, mais
um endereço para devolução no caso de encontro. O
uso da técnica permite a obtenção de informações dos
indivíduos marcados, ainda que os mesmos não sejam
novamente capturados, pela ampla participação
voluntária da população em geral.
1
Primer taller para la Conservación de Aves Playeras Migratorias en Arroceras del Cono Sur
Entre os materiais mais utilizados na confecção estão o
alumínio e o aço. Anilhas especiais e vários outros
marcadores adicionais podem ser usados para
identificar as aves à distância como anilhas plásticas
coloridas, bandeirolas, corantes como ácido pícrico, e
rádios-transmissores.
Os rádios, apesar dos avanços tecnológicos ainda
possuem alto custo para uso em larga escala. Também
a relação entre peso x tamanho do equipamento,
atualmente encontrados com menos de 10 g, tem
restringido o uso do mesmo na maioria das espécies de
aves praieiras. Apesar disto, já se usam plataformas de
transmissão de sinais para satélite (PTTs) em indivíduos
de Limosa lapponica e Numenius phaeopus, no Alasca,
para estudos de dispersão pós-reprodutiva (Gill et al.
2007), permitindo o monitoramento dos deslocamentos
realizados em tempo real dos indivíduos marcados.
Adicionalmente ao anilhamento, amostras de sangue
têm sido coletadas para extração de DNA em estudos
moleculares, visando determinar graus de parentescos
entre as populações migrantes, razão sexual,
classificação etária dos grupamentos; amostras de
penas para análise de isótopos estáveis para distinguir
populações migrantes ao longo das rotas de migração;
parasitas para estudos de imunidade e sua relação com
o estágio nutricional da espécie migrante.
Há vasta literatura sobre o assunto, entretanto cabe
aqui mencionar os trabalhos desenvolvidos por Morrison
et al. (2001), Myers et al. (1987), Piersma & Lindström
(2004).
Calidris canutus é a espécie cujas estratégias
migratórias dispõem de maior documentação, graças ao
esforço internacional cooperativo de marcação da
espécie, estabelecido a partir de 1997, no qual
participam Canadá, Estados Unidos, Brasil, Argentina e
Chile (Niles et al. 2007)
Entretanto, para espécies de maçaricos endêmicos para
o continente sul-americano, como Vanellus chilensis,
Oreopholus ruficollis, Charadrius modestus, Thinocorus
rumicivorus, entre outros, permanece como desafio
ampliar as informações sobre o tema. Pouco ainda se
conhece a cerca dos padrões de migração, áreas
preferenciais de invernada e tendências populacionais.
O mesmo para os migrantes neárticos, os quais ainda
são pouco conhecidos quanto a aspectos relacionados
às estratégias utilizadas tanto nas áreas de invernada,
como na migração de volta às áreas reprodutivas.
Revisão da metodologia estatística disponível para
estimar probabilidades de dispersão e movimentos pode
ser encontrada em Kendall & Nichols (2004), na qual os
autores exemplificam os métodos diretos (marcação
individual) e indiretos (baseados na detecção de
animais não marcados).
Aplicações
Biologia
Migrações
Essa foi a motivação principal para a criação do modelo
de marcação individual. Muitas espécies regularmente
movem-se entre longas distâncias desde suas áreas
reprodutivas até locais de estadia durante o período
menos favorável no local de reprodução. Entretanto,
estamos verificando que os problemas nos sítios de
invernada podem resultar em declínio das populações
reprodutivas. Informações detalhadas acerca de seus
movimentos anuais, assim como a variação de
parâmetros como mudas, massa corporal, classificação
etária das populações migrantes, são aspectos
prioritários para sua conservação.
Análises de dados de anilhamento e recuperações de
aves marcadas, através dos modelos populacionais
baseados nas taxas de captura-recaptura, seja em
redes ou outro método, seja pelo avistamento de
indivíduos marcados nos grupos avaliados, tem
contribuído de sobremaneira na ampliação do
conhecimento de rotas migratórias. A nível global, entre
os Charadriidae são reconhecidos 9 grandes sistemas
de migração (Kam et al. 2004). Na América do Norte,
incluindo migrantes inter-continentais, são conhecidos 4
grandes sistemas migratórios: Pacífico, Central,
Mississipi e Atlântico, tendo a maioria das espécies
migrantes áreas de invernada nas Américas
Central/Caribe e do Sul (Morrison 1984).
2
O anilhamento tem também contribuído no
conhecimento de parâmetros morfológicos. Mudas de
penas, um fato crucial para a sobrevivência anual das
aves, são relativamente bem conhecidos para espécies
no Hemisfério Norte (Prater et al. 1977). Entretanto, nos
sítios de invernada, nos quais estas espécies
dispendem pelo menos 1/4 de seu ciclo anual, poucos
são ainda os trabalhos sobre o tema na América do Sul.
Apesar disto, atividades sistemáticas de anilhamento
destas espécies na costa brasileira tem revelado
aspectos importantes em algumas espécies como
Calidris pusilla, Calidris alba, Arenaria interpres, Calidiris
canutus, tais como observado em Azevedo-Júnior
(1993), Antas & Nascimento (1996) e Nascimento
(1998).
O mesmo é verdade para outros parâmetros como
massa corporal, estimativas de capacidade de vôo ou
classificação etária (Morrison 1984, Hicklin 1987,
Harrington et al. 1986, Baker et al. 2004, González
2007).
Sexagem molecular, partindo de uma coleção de
referência de amostras de sangue coletadas durante o
anilhamento, podem identificar com precisão e baixo
custo a razão sexual das populações ao longo das rotas
migratórias, não somente graus de parentesco (Baker et
al. 1999).
Primer taller para la Conservación de Aves Playeras Migratorias en Arroceras del Cono Sur
Monitoramento
Estudos relacionados a variação espacial e temporal
das populações de aves é uma importante ferramenta
na adoção de medidas eficazes de conservação, além
de um alerta a cerca das tendências populacionais da
biodiversidade, seja em escala local, regional ou mesmo
internacional. Taxas reprodutivas, de sobrevivência de
juvenis, adultos, recrutamento, podem ser monitoradas
utilizando o anilhamento. Programas de monitoramento
de longo prazo tem revelado declínios populacionais a
nível global. (Sandercock 2003). Entre estes os
maçaricos migrantes neárticos estão Howe et al. (1989)
e Morrison et al. (2001).
Embora contagens ou estimativas em geral sejam
fontes importantes de informação sobre as tendências
populacionais, isoladamente são ineficientes para
determinar mecanismos, processos e/ou causas das
flutuações populacionais detectadas.
O monitoramento à longo prazo utilizando também o
anilhamento, pode gerar robustas bases de dados, com
a acumulação de informações consistentes ao longo do
tempo. Como exemplos destas iniciativas, podemos
citar o CES (Constant Effort Site) e o MAPS (Monitoring
Avian Productivity and Survival).
O primeiro surgiu no Reino Unido e Irlanda em 1983, e
atualmente é organizado em 16 países na Europa, com
600 áreas e 100.000 aves capturadas anualmente.
Produz índices de sucesso reprodutivo para mais de 30
espécies na Europa. As análises geradas tem
demonstrado que o clima quente na primavera afeta
negativamente a reprodução de um grande número de
espécies, entre as quais aves praieiras migrantes
(Euring 2007).
O segundo, foi criado pelo Institute for Bird Population,
nos Estados Unidos, para avaliar e monitorar dinâmica
de populações de pelo menos 120 espécies de aves
terrestres, visando prover informações críticas para
conservação e manejo. Utilizam esforço constante de
captura com redes e anilhamento, em inúmeras
estações no continente norte-americano (MAPS 2007).
Como exemplo, o verificado recentemente com a
espécie Calidris canutus rufa. Reduções na oferta
alimentar da espécie na Baia de Delaware, último e
importante ponto de parada para repouso e alimentação
antes de alcançar as áreas reprodutivas no Ártico. Ali,
esse maçarico alimenta-se preferencialmente de ovos
do caranguejo ferradura, cujas populações reduziram-se
drasticamente devido à sua sobre-pesca (Niles et al.
2007). Segundo as predições (Morrison et al. 2004),
caso permaneça a tendência de declínio esta
subespécie deve desaparecer até 2010.
Parâmetros demográficos - sobrevivência
Estimar parâmetros demográficos nem sempre é uma
tarefa fácil, pelo fato de que indivíduos marcados nem
sempre são observados posteriormente à marcação.
Neste sentido, métodos estatísticos foram
desenvolvidos para tentar resolver este problema.
Atualmente, existem softwares especificamente
desenvolvidos para estimar dados á partir da capturarecaptura de indivíduos, ou recuperações de aves
encontradas mortas. Entre estes, o MARK, para estimar
sobrevivência à partir de animais marcados (White &
Burham 1999), POPAN (Population Analysis Software
Group), para estimar tamanho da população e
recrutamento utilizando modelo de Jolly-Seber, e
SURPH (Survival Under Proportional Hazards).
Revisão a cerca de métodos quantitativos utilizando
captura-recaptura para estimar taxas de sobrevivência
de aves aquáticas pode ser encontrada em Sandercock
(2003).
Outro exemplo é o estabelecimento da taxa estacional
de residência e sobrevivência de Calidris pusilla em
Porto Rico, parâmetros necessários para compreender
melhor a ecologia em sítios não reprodutivos, bem
como o valor funcional de habitats salinos para a
espécie (Rice et al. 2007)
Estudos realizados por Gonzalez (2007) com Calidirs
canutus, ao longo de suas migrações entre o Ártico e a
Patagônia utilizam o anilhamento tradicional acoplado a
anilhas coloridas e bandeirolas. Pela combinação de
cores e sua localização na pata da ave criam-se com
códigos individuais ou de coorte. As recuperações são
feitas através da captura com redes, avistamentos e
aves encontradas mortas. O objetivo principal é
investigar causas da declinação da espécie. Utiliza-se
dos modelos conforme o programa MARK, bem como
taxas de retorno e proporções de sexos capturados ou
avistados, antes e depois da queda populacional
detectada na espécie, os resultados mostraram que os
machos tiveram uma taxa de sobrevivência menor que
as fêmeas, entre outros fatores afetando esta espécie.
Evolução e determinantes
Padrões de migrações tem constantemente evoluído na
história do planeta. Alguns, porém, surgiram há poucos
milhares de anos, desde a última era glacial.
Aparentemente, para algumas espécies há grande
flexibilidade evolucionária, permitindo o aparecimento e
desaparecimento das migrações, com transições
evolucionárias de espécies residentes para migratórias
ou vice versa no espaço de algumas gerações.
Alterações na extensão e padrões de migração
parecem ocorrer sem importantes contrastes
filogenéticos (Alerstam et al. 2003). Segundo estes
autores, diversos fatores afetam a evolução e ecologia
das migrações de longa distância, tais como
sazonalidade, habitats, competição, barreiras,
orientação e navegação, parasitas e imunologia, etc.
Vários exemplos são apresentados nos mais variados
táxons, e novas técnicas (como o uso de rádiotelemetria) podem prover novas informações que
permitam reavaliação das teorias de migração,
locomoção e navegação.
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Primer taller para la Conservación de Aves Playeras Migratorias en Arroceras del Cono Sur
Alterações climáticas
Piersma & Lindström (2004) argumentam que o
conhecimento dos fatores que dirigem as variações nas
tendências populacionais, fenótipo e comportamento de
aves migratórias como entre os maçaricos, pode
permitir que estas espécies sejam utilizadas como
sentinelas integrativas de alterações ambientais em
escala global. Baseando-se no período da migração,
status de plumagens e massa corporal, a alteração dos
mesmos para os maçaricos podem indicar o quanto os
sistemas ecológicos e climáticos estão intactos ou
estáveis em escala hemisférica, ou o quanto podem
estar alterados.
De modo geral observa-se que a perda de habitats, pelo
uso da terra em agricultura, e alterações climáticas,
constitui-se como a mais imediata ameaça às
populações de maçaricos. Nos EUA, a perda de
ambientes aquáticos na região central das grandes
pradarias gira em torno de 90%. Há uma redução no
número de habitas e tamanho dos ambientes aquáticos
como efeito do aquecimento global. Por exemplo, o
projeto do USGS que explora os impactos das
alterações climáticas globais na migração de Calidris
melanotos, em três pontos de parada da espécie nos
Estados Unidos e sítios reprodutivos no Alasca. Entre
os resultados, se alterações climáticas resultam em
anos mais secos, o sucesso reprodutivo pode ser
altamente impactado (Farmer & Wiens 1999).
Revisão sobre o tema pode ser encontrada em Butler &
Taylor (2005).
Alterações de paisagens
Uso do anilhamento e rádio-telemetria em maçaricos
tem sido uma ferramenta também aplicada em estudos
onde a agricultura é praticada em larga escala, como
observado nos trabalhos de Farmer & Parent (1997) e
Taft & Haig (2007).
Os primeiros autores utilizaram as técnicas para estudar
os efeitos na alteração de paisagens, afetando a
movimentação de espécies como Calidris melanotos, na
região das pradarias americanas.
Entre outros exemplos, emVillamette Valey, Oregon,
Estados Unidos, importante área de invernada para
espécies como Calidris alpina e Charadrius vociferus,
também é utilizada para agricultura. Estudos têm
demonstrado a sobreposição de áreas utilizadas para
agricultura e o forrageamento destas espécies, bem
como a importância da manutenção de habitats íntegros
para a conservação (Taft & Haig 2007)
anilhamento. Nas aves, é um método que enfoca
principalmente as penas de vôo (primárias). Sua
utilização baseia-se em duas premissas básicas:
primeiro nos valores isotópicos de diferentes elementos
químicos variam espacialmente devido a processos
naturais ou de origem humana. Segundo, um indivíduo
ao alimentar-se, assimila e reflete em seus tecidos a
composição isotópica do sítio no qual se alimenta
(Dowdall et al. 2006, Atkinson et al. 2006).
Estudo de caso foi feito com Calidiris canutus rufa
(Atkinson et al. 2006) passando pela Baía Delaware, na
costa leste americana, em maio, vindos de áreas de
invernada no sul do continente sul-americano
(Patagônia e Brasil). Análises na composição de
isótopos estáveis revelaram que aproximadamente 55%
das aves capturadas em Delaware vem do sul do
continente, 22,5% do Brasil e 12,5% dos sul dos
Estados Unidos (Flórida), com 10% de origem
desconhecida.
Transmissão de doenças
As aves migratórias podem ser vetores na transmissão
de doenças, como a Febre do Nilo Ocidental ou a
Influenza Aviária, entre outras. O uso do anilhamento
como ferramenta para apoiar esses estudos é antigo e
tem se incrementado nos últimos anos na Europa e
Estados Unidos (Euring 2007).
Na América do Sul, particularmente no Brasil, esse
monitoramento tem acontecido desde a década de
1960, liderado pelo Instituto Adolfo Lutz de São Paulo e
pelo Instituto Evandro Chagas, de Belém. A partir de
2002, através da implementação de um acordointerministerial entre os Ministérios da Saúde, da
Agricultura e do Meio Ambiente, anilhadores
credenciados pelo Sistema Nacional de Anilhamento
tem trabalhado cooperativamente a cada ano. Há a
coleta de amostras de sangue das aves, após o
anilhamento, em vários pontos no país, expandindo e
tornando o monitoramento mais efetivo em cobertura
geográfica (Araújo 2003, 2004).
Conservação
Nessa área são inúmeras iniciativas que tem utilizado
os resultados advindos do anilhamento e marcação de
aves migratórias, como:
A elaboração do Plano Nacional de Conservação de
Aves Migratórias nos Estados Unidos (U.S. Fish &
Wildlife Service 2001).
Conectividade migratória
A criação de áreas protegidas no Brasil, como o Parque
Nacional da Lagoa do Peixe, em 1986, baseada nas
atividades desenvolvidas pelo CEMAVE (IBAMA 1999).
Marcadores como o uso e a composição de isótopos
estáveis em tecidos animais podem determinar a origem
geográfica de indivíduos ao longo das rotas migratórias
e essa técnica também tem sido acoplada ao
No Brasil, as atividades de anilhamento realizadas pelo
CEMAVE contribuiram à inclusão da Área de Proteção
Ambiental das Reentrâncias Maranhenses e do Parque
Nacional da Lagoa do Peixe em 1991, à Western
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Primer taller para la Conservación de Aves Playeras Migratorias en Arroceras del Cono Sur
Hemispheric Shorebird Reserve Network (WHSRN
2007) e posterior inclusão das mesmas à Convenção de
Ramsar, quando o Brasil aderiu a esse tratado em
1993.
Conclusões
O anilhamento de aves é uma ferramenta importante,
aplicada num amplo espectro de estudos, possibilitando
a baixo custo e curto/médio prazo, a obtenção de
informações importantes relativas à dispersão,
migração, comportamento, estrutura social, taxas de
sobrevivência, sucesso reprodutivo, tendências
populacionais, alterações climáticas, vetores
transmissores de doenças.
Pode prover informações vitais no conhecimento de
padrões e processos demográficos, ecológicos e
migratórios, bem como ao monitoramento e
conservação ambiental.
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Agradecimentos
Sinceros agradecimentos à Wetlands International, em
especial a Daniel Blanco por convidar-me para esta
palestra e também à Victoria de la Balze; à Jaime
Collazo, pela valiosa bibliografia de apoio cedida sobre
o tema.
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