o multiculturalismo nas aulas de educação física em educação

Transcrição

o multiculturalismo nas aulas de educação física em educação
FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
NÚCLEO DE SAÚDE
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA
O MULTICULTURALISMO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA EM
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM ESTUDO DE CASO
MARIA SÍLVIA GALDINO DE MORAIS
Monografia de Especialização
PORTO VELHO
2008
ii
O MULTICULTURALISMO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA EM
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM ESTUDO DE CASO
MARIA SÍLVIA GALDINO DE MORAIS (Autora)
PROF. MS. CÉLIO JOSÉ BORGES (Orientador)
Trabalho de Conclusão do Curso
apresentado ao Departamento de
Educação Física do Núcleo de
Saúde da Universidade Federal de
Rondônia para obtenção do título
Lato-Sensu (Especialização) em
Ciência do Movimento Humano.
PORTO VELHO-RO
2008
iii
iv
“Dedico esta Monografia a todos
os professores que de fato
contribuirão para minha formação
acadêmica. Em especial à minha
família, meu orientador Prof. Ms.
Célio José Borges, que me
apoiaram, tiveram paciência e
acima de tudo acreditaram em
mim.”
v
“A agradeço a Deus pela
orientação Espiritual em todas as
coisas
que
faço,
pela
oportunidade de crescimento
profissional. Agradeço minha
profª e amiga Ms. Angeliete
Militão e meu orientador Célio
José Borges, pela confiança que
depositaram em mim, paciência e
atenção”.
vi
“Ensinar exige saber escutar.
Aceitar e respeitar a diferença
são uma dessas virtudes, sem o
que a escuta não se pode dar”.
Paulo Freire
vii
SUMÁRIO
LISTA DE GRÁFICOS...........................................................................................
ix
LISTA DE QUADROS...........................................................................................
x
RESUMO...............................................................................................................
xi
RESUMEN.............................................................................................................
xii
INTRODUÇÃO.......................................................................................................
13
1 CURRÍCULO E O MULTICULTURALISMO
16
2 EJA NO BRASIL: UM PRODUTO DA NECESSIDADE MULTICULTURAL
25
3 PROPOSTA CURRICULAR DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO
SEGUNDO SEGUIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL: ESPAÇOS PARA
O MULTICULTURALISMO..................................................................................
3.1 Organização Estrutural do PCNEJA...............................................................
31
3.2 Concepções que fundamentam o PCNEJA e suas relações com o
multiculturalismo...................................................................................................
31
31
3.3 Organização Curricular da EJA de Educação Física e sua concepção
multicultural............................................................................................................
35
3.3.1 Princípios Pedagógicos do PCNEJA de Educação Física...........................
35
3.3.2 Organização e Seleção dos Conteúdos na Educação Física da EJA..........
37
4 FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO FÍSICA PARA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS...............................................................
43
5. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS DA
47
PESQUISA............................................................................................................
5.1. Procedimentos Metodológicos........................................................................ 47
5.1.1 Caracterização da Pesquisa ........................................................................
47
5.1.2 População e amostra....................................................................................
47
5.1.3 Procedimentos para a seleção da amostra..................................................
47
5.1.4 Instrumento de Medida.................................................................................
48
5.2 Apresentação dos resultados e análises dos questionários aplicados aos
alunos....................................................................................................................
5.3 Apresentação dos dados e análise da observação das aulas de Educação
Física da EJA.........................................................................................................
48
57
viii
5.3.1 Metodologia de ensino utilizado nas aulas de Educação Física..................
57
5.3.2 Relação aluno-aluno (respeito às diversidades/princípios morais)..............
57
5.3.3 Relação professor-aluno (respeito às diversidades/princípios morais)........
60
5.3.4 Conteúdos Aplicados....................................................................................
61
5.3.5 Motivação dos alunos nas aulas...................................................................
62
5.4 Análise do Projeto Político Pedagógico da Escola Bela Vista e espaços do
multiculturalismo na EJA.......................................................................................
62
5.5 Apresentação dos relatos e análise da entrevista com o professor de
Educação Física....................................................................................................
65
5.5.1 Informação Profissional................................................................................
65
5.5.2 O Projeto Político Pedagógico e sua influencia na prática pedagógica
multicultural do professor de Educação Física......................................................
65
5.5.3 Conteúdos aplicados na Educação Física e a diversidade cultural na
concepção do professor........................................................................................
66
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
70
REFERÊNCIAS.....................................................................................................
72
APÊNDICES..........................................................................................................
74
ix
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 Idade dos alunos..........................................................................
49
GRÁFICO 2 Sexo.............................................................................................
49
GRÁFICO 3 Cor................................................................................................
50
GRÁFICO 4 Cidade de origem ........................................................................
50
GRÁFICO 5 Importância da Educação Física para EJA..................................
51
GRÁFICO 6 Conteúdos que gostaria na aula de Educação Física..................
51
GRÁFICO 7 Conteúdos significativos na aula de Educação Física.................
52
GRÁFICO 8 Conteúdos que não são importantes para o cotidiano.................
52
GRÁFICO 9 Diversidade cultural na sala ........................................................
53
GRÁFICO 10 As diversidades cultural dificultam a aula de Educação Física..
53
GRÁFICO 11 Preconceito e desvalorização nas aulas de Educação Física...
54
GRÁFICO 12 Respeito das diferenças entre os alunos nas aulas de
Educação Física...............................................................................................
54
GRÁFICO 13 Professor de Educação Física respeita as diversidades
culturais dos alunos..........................................................................................
55
GRÁFICO 14 Motivo que estuda na EJA..........................................................
56
x
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Movimentos na EJA...................................................................
26
QUADRO 2 Conteúdos Atitudinais: Conhecimento sobre o corpo;
esportes, jogos, lutas e ginásticas atividades rítmicas e expressivas...........
38
QUADRO 3 Conteúdos Conceituais e Procedimentais: Conhecimentos
sobre o corpo.................................................................................................
39
QUADRO 4 Conteúdos Conceituais e Procedimentais: Esportes, jogos,
lutas e ginásticas...........................................................................................
39
QUADRO 5 Conteúdos Conceituais e Procedimentais: Atividades rítmicas
e expressivas.................................................................................................
40
xi
MORAIS, Maria Silvia Galdino. Monografia (Especialização em Ciência do
Movimento Humano) Departamento de Educação Física do Núcleo de Saúde
da Universidade Federal de Rondônia. 2008, 80 páginas.
RESUMO
Esta pesquisa foi desenvolvida com o intuito de identificar as
características do multiculturalismo na prática pedagógica do profissional de
Ed. Física da EJA, relacionando e comparando com a perspectiva multicultural
indicada na PCNEJA. A pesquisa caracterizou-se como estudo de caso do tipo
qualitativa descritiva. A amostra foi constituída por 1(um) professor de
Educação Física da EJA, e 50 (cinqüenta) alunos (do 5ª ao 6ª série da EJA) da
Escola Municipal de Ensino Fundamental Bela Vista de Porto Velho
Rondônia.Realizada no período de 03 de novembro a 05 de Dezembro de
2008. Estudos sobre o Currículo Multicultural tem sido foco de análise e
discussão por diversos estudiosos de uma linha educacional crítica. Nestes
estudos é discutido as formas de valorizar e incorporar as identidades plurais
em políticas e práticas curriculares assim como refletir sobre os mecanismos
discriminatórios ou silenciadores da pluralidade cultural permeiam estas.
Precursores da EJA no Brasil, Paulo Freire e Gadott, apontam a necessidade
de um olhar mais atento para esta modalidade de ensino em relação ao
respeito às diversidades culturais, pois esta surge no país e se fortalece
decorrente dos problemas educacionais alimentados pela opressão econômica
e social, dos menos favorecidos, que compõe a dinâmica social vigente. Dentro
do contexto educacional vê-se a Educação Física como disciplina que está
inserida na modalidade de ensino EJA e que tem muita força na política
cultural, onde o esporte é subsídio importante para o desenvolvimento de
pessoas mais conscientes das concepções sociais positiva, e através da
cultura corporal o indivíduo pode se tornar conhecedor e crítico das suas
identidades culturais assim como na perpetuação das mesmas, e o lazer deve
ser entendido e praticado como direito de todo cidadão. Constatou-se, neste
estudo que os a PCNEJA apontam características que norteiam práticas
pedagógicas pautadas no multiculturalismo crítico já que esta está embasada
na pedagogia de Paulo Freire, mas, no entanto ao relacionar esta concepção
de ensino com a prática pedagógica do professor de Educação Física da
escola pesquisada, detectou-se que o método de ensino por ele utilizado não
está coerente com os princípios da PCNEJA, não possibilitando a formação de
indivíduos capazes de compreender, refletir, respeitar e criticar as diferenças
culturais defendidas pelo multiculturalismo crítico.
Palavras-chave: Multiculturalismo, Educação de Jovens e Adultos, Educação
Física.
xii
MORAIS, Maria Silvia Galdino. Monografía (Especialización en la ciencia del
movimiento humano) departamento de la educación física del núcleo de la salud de la
universidad federal de Rondônia. 2008, 80 páginas.
RESUMEN
Este intención del con del desarrollada del fue del investigación a identificar al
del pedagógico característico Ed de en el del profesional del multiculturalismo del
práctico del del de las lanas allí. Physics del EJA, relacionándose y que compara con
allí el EL indicado multicultural PCNEJA del en de la perspectiva. Allí fue del
investigación caracterizado como tipo del cualitativo del descriptivo del del de studio
del case. La muestra fue constituida por 1 (un) profesor de educación física del EJA, y
50 (cincuenta) pupilas (de 5ª a las series 6ª del EJA) de la escuela municipal de la
vista hermosa de la educación básica de Porto Velho Rondônia. Llevado con el
período del EL del en de 03 de los del noviembre unos 05 de diciembre de 2008. Allí el
educación de los jóvenes de los los que aparece y del EL el Brasil del en de Adultos
(EJA) decurrente de los strenghtens de y sí mismo de los problemas educativos de los
los, los de y retarda pasos los sociales de esa política de las lanas de este modalidad
si es desarrollan. Para la pieza del otra, del acuerdo del dado con INEP, la pupila de
los los numera el EL EJA del colocaron que aumentan cada adentro del año de los
vendas diversos de las lanas de los los de los etárias, alimentando el económica social
y del opresión allí, de menos haber favorecido, ese eficiente social del dinámica del
compone allí. Dentro del contexto educativo del del usted es las disciplinas vistas
físicas de las cuales allí del en del modalidad allí del educación EJA y del ése del tiene
del mucha del fuerza del en la política cultural de lana insertan allí, de donde está
subvenciona el EL deporta importante para el desarrollo del EL ensambla social
positivo del mal del de la gente del concienzuda de los los de los conceptos, y de los
pues del educación el puede individual del EL de la cultura corporal traviesa de lana al
experto que y crítica de los culturales tan de las identidades del sus bien como mismos
de los los del perpetuación del EL del en, ocio del hacer del EL de y si debe para
entender y a practicar ese derecha del EL allí todo el ciudadano. El pedagogía crítico
de lana del desarrollo del EL del consideran del multiculturalismo del del del en un de
las teorías del análisis de las lanas comprometió respecto del al las diversidades de
las lanas, aprendiendo del conocimiento significativo para la pupila, diálogo con del EL,
análisis del EL allí, realidad crítico de lana del reflexión del EL y social de donde si
pupila del inserta allí. Para bajo de tal manera, ensamblo el evidenció que el señala
característico sí mismo del un PCNEJA que el multiculturalismo crítico de los prácticos
de los pautadas del dirige del él del en del puesto pedagógico del EL que esto si el
pedagogía del EL del en del basa de Pablo Freire, pero, cuando del embargo del
pecado para relacionar este escuela de lana físico del educación del concepto del
práctica del con allí del del del educación de lana pedagógico de lana del profesor
buscó, fue detectó que el método del EL de educación para el le usado en él usted es
principios con del PCNEJA de los los del coherente que el tan bien como en el
formación posible de las liebres de los capaces de los individuos de los los a entender,
a reflejar, a y respetar allí para criticar las lanas usted distingue los culturales
defendidos por multiculturalismo crítico del EL.
Palabra: Multiculturalismo joven , educación del adult de e, comprobación del
educación.
xiii
1- INTRODUÇÃO
O
presente
estudo
objetivou
identificar
as
características
do
multiculturalismo na prática pedagógica do profissional de Ed. Física da EJA,
relacionando e comparando com a perspectiva multicultural indicada na
PCNEJA (Proposta Curricular Nacional para a Educação de Jovens e Adultos).
Estudos sobre o Currículo Multicultural tem sido foco de análise e
discussão por diversos estudiosos de uma linha educacional crítica, ganhando
força na esfera nacional a partir década de 80, através de Paulo Freire,
MacLaren, Gadott e Sacristán. Nestes estudos é discutido as formas de
valorizar e incorporar as identidades plurais em políticas e práticas curriculares
assim como refletir sobre os mecanismos discriminatórios ou silenciadores da
pluralidade cultural permeiam estas.
Autores já citados acima como Paulo Freire e Gadott apontam a
necessidade de um olhar mais atento para modalidade de ensino em relação
ao respeito às diversidades culturais, pois esta surge no Brasil e se fortalece
decorrente dos problemas educacionais alimentados pela opressão econômica
e social, dos menos favorecidos, que compõe a dinâmica social vigente.
Através de uma perspectiva multicultural lutam por uma educação popular mais
democrática, crítica, dialética onde os discentes possam ser tratados como
pessoas e não objetos.
Dentro do contexto educacional vê-se a Educação Física como disciplina
que faz parte da modalidade de ensino EJA, e que tem muita força dentro da
política sócio-cultural, onde o esporte é subsídio importante para o
desenvolvimento de pessoas mais conscientes das concepções sociais
positiva, e através da cultura corporal o indivíduo pode se tornar conhecedor e
crítico das suas identidades culturais assim como na perpetuação das mesmas,
e o lazer deve ser entendido e praticado como direito de todo cidadão. Mas
infelizmente ao longo do processo histórico estes subsídios da Educação Física
têm sido reduzida a mero subproduto da estrutura social vigente, “uma carta na
manga” como forma de manobras políticas.
Portanto, ressalta-se a crescente preocupação com os rumos políticos
culturais que a Educação Física tem se submetido disseminar através de suas
práticas educacionais na EJA.
xiv
Daólio apud Neira (2005) afirma que a linguagem corporal
resulta das interações sociais e da relação dos homens com o
ambiente; seu significado constrói-se em função de diferentes
necessidades, interesses e possibilidades corporais presentes
nas diferentes culturas, em diferentes épocas da história.
Assim, ao brincar, jogar, imitar e criar ritmos, as crianças
também se apropriam do repertório da cultura corporal na qual
estão inseridas. Depreendemos daí que, em um contexto
plural, a escola tem por dever favorecer um ambiente social
onde a criança se sinta estimulada e segura para manifestar
seu repertório cultural bem como travar contato com outros.
A linguagem é discutida por Paulo Freire como um símbolo de
libertação. Trazendo o fator linguagem para o campo da Educação Física ela
ganha força dentro da cultura corporal do movimento que é usada como um
meio importante de expressão, do diálogo, da proximidade, do afeto, das
capacidades intelectuais, partindo da concepção que o indivíduo lê o mundo a
partir da sua própria referencia.
Se não criarmos oportunidades de libertar este corpo oprimido, incapaz,
como a sociedade o moldou, o individuo terá maior dificuldade de se
desprender das amarras arraigadas no seu ser, que estão intimamente
relacionados, corpo e mente.
Para alcançar o objetivo principal do presente estudo, discutiu-se e
analisou-se o multiculturalismo na prática de Educação Física e Currículo EJA,
sobre os seguintes pontos: parâmetros utilizados pelo professor de Educação
Física para fazer a seleção de conteúdos; métodos de ensino utilizados nas
aulas de Educação Físicas e suas características multiculturais; diferenças
culturais dos alunos e o trato das mesmas nas relações sociais; a influencia
das possíveis diferenças nas aulas de Educação Física; aquisição de
conhecimentos referente aos princípios morais fomentados pela perspectiva
multicultural nas aulas de Educação Física; nível de significância dos
conteúdos, para os alunos, aprendidos nas aulas de Educação Física e seu
aproveitamento nas realidades social cotidiana.
A pesquisa caracterizou-se como estudo de caso com abordagem
qualitativa
descritiva.
A
população
deste
estudo
foi
composta
por
aproximadamente 180 alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Bela
Vista de Porto Velho/RO. Para a realização da pesquisa foi selecionada apenas
uma turma de cada série das turmas de EJA do ensino fundamental totalizando
xv
uma amostra de 50 alunos e o professor de Educação Física da EJA da
referida escola. Os instrumentos para a coleta de dados foram utilizados
questionário, aplicado aos alunos, entrevista gravada, aplicada ao professor, e
observação das aulas. A pesquisa foi realizada no período de 03 de novembro
a 05 de Dezembro de 2008.
Os principais autores estudados que subsidiou a interpretação e análise
dos resultados da pesquisa foram: Moreira (1999), Paulo Freire (1996) e
PCNEJA (2002).
Este estudo está estruturado em cinco tópicos. O tópico primeiro trata-se
dos objetivos do surgimento do currículo educacional e as diferentes
perspectivas multiculturais que influencia a organização do mesmo.
No
segundo tópico é abordado o processo histórico da EJA e uma discussão sobre
as perspectivas educacionais que apontam para a necessidade de uma
pedagogia voltada para o multiculturalismo crítico para esta modalidade de
ensino. O terceiro tópico é feito apresentação uma análise da organização da
Proposta Curricular Nacional da Educação de Jovens e Adulto geral e
específico da Educação Física, com o intuito de verificar as perspectiva
educacionais que a norteia e identificando a posição multicultural em que esta
inserida. No tópico capítulo traz uma discussão sobre a realidade atual da
formação do profissional do educador da EJA e uma reflexão sobre os espaços
do multiculturalismo crítico no meio acadêmico. O quinto tópico apresenta-se
os procedimentos metodológicos da pesquisa e a apresentação, analisados e
discussão dos dados dos apresentados.
xvi
CURRÍCULO E O MULTICULTURALISMO
Segundo Moreira & Silva (2002) os primeiros estudos científicos que se
preocuparam com as questões curriculares na escola surgem no final do século
XIX, nos Estado Unidos. A preocupação era com processo de racionalização,
sistematização e controle da escola e do currículo, objetivando evitar que o
comportamento e o pensamento do aluno se desviassem de metas e padrões
pré-definidos pela classe dominante.
Nasce a partir de então a primeira preocupação com o multiculturalismo
na área do currículo escolar, este tipo de multiculturalismo é denominado por
Moreira & Silva (2002) de multiculturalismo conservador. Já que se preocupava
com o grande contingente de migrantes que chegavam ao país, aumentando o
número de indivíduos pobres e de cultura diferente, que ameaçavam a ordem
social, cultural e econômica defendida pela classe elitista que mantinha o poder
do país.
É importante relembrar que no Brasil desde a educação jesuítica a
organização escolar esteve submetida por esses interesses de controle.
Libâneo é um dos autores que discute este processo histórico nitidamente,
quando fala sobre as funções e ações dos atores da escola, no período
colonial, práticas que priorizavam submissão e controle pedagógico, sistema
que se perpetuou por um longo período de tempo e refletiu na organização do
conhecimento escolar até o final do século XIX.
Segundo os estudos de Moreira & Silva (2002) as teorias que nortearam
a organização curricular brasileira, sempre estiveram ligadas as influencias
pelos pensamentos dos estudiosos da educação dos Estados Unidos, assim
como suas reformas curriculares.
xvii
Entende-se desta forma que o currículo da educação no Brasil sempre
esteve à mercê das mudanças culturais, políticas e econômicas por qual se
passava os Estados Unidos assim como de outros países, o qual sempre
introduzia nos sistemas educacionais métodos advindos destes, tais fatores
esclarece o caos que a educação brasileira passou ao longo do seu processo
histórico de transformação e consolidação.
Saviani
em
seu
livro
Escola
e
Democracia
(1995)
esclarece
brilhantemente esse controle da classe elitista nas tendências educacionais e
organizações do conhecimento escolar ao longo do tempo no Brasil. Este autor
enquadra as primeiras tendências, que determinaram esta organização escolar,
como teorias não críticas no qual está inserido a escola nova e a tecnicista.
A tendência escolanovista preocupava-se com a elaboração de um
currículo que valorizasse os interesses do aluno onde a escola passa a ser a
forma de adaptação e ajuste dos indivíduos à sociedade. Na tecnicista a função
da escola passa a ser de formação de indivíduos eficientes, para o aumento da
produtividade social, associado diretamente ao rendimento e capacidades de
produção capitalista, em que fundamentou a construção científica de um
currículo que devolvesse os aspectos da personalidade adulta consideradas
“desejáveis”. Características de tais tendências influenciam a educação
brasileira até hoje.
A partir de 1973 nos Estados Unidos surgem movimentos de diversos
especialistas em currículo contrapondo as tendências curriculares dominantes
criticando seu caráter instrumental, apolítico e ateórico. “No caso específico do
currículo, a intenção central era identificar e ajudar a eliminar os aspectos que
contribuíram para restringir a liberdade dos indivíduos e dos diversos grupos
sociais” (Pinar & Gumet, apud Moreira & Silva 2002, pág. 15).
A partir deste período, correntes fundamentadas no neomarxismo e na
teoria crítica influenciaram as reformas curriculares nos Estados Unidos e
conseqüentemente no Brasil. No final dos anos setenta ampliam-se as
discussões a partir das tendências críticas, e teorias surgem ajudando a
compor o campo do currículo. Emerge-se então um novo olhar para o currículo:
“O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é uma relação de poder. O
currículo é trajetória, viagem, percurso. No currículo se forjam identidades”.
(SILVA apud NEIRA, 2005).
xviii
Teorias advindas do neomarxismo favorecem a análise e compreensão
do currículo enfatizando a questão social deste campo, chamadas de
Sociologia do Currículo, voltada para o exame das relações entre currículo e
estrutura social, currículo e cultura, currículo e poder, currículo e ideologia,
currículo e controle social.
Reitere-se a preocupação maior do novo enfoque: entender a
favor de quem o currículo trabalha e como fazê-lo trabalhar a
favor dos grupos e classes oprimidas. Para isso, discute-se o
que contribui, tanto no currículo formal como no currículo em
ação e no currículo oculto, para a reprodução de desigualdades
sociais (MOREIRA & SILVA 2002, pág. 15).
Considerando o questionamento sobre para quem o currículo trabalha
podemos fazer uma flexão do currículo como uma seleção da cultura como
discute Silva apud Carnen e Moreira (1999).
O currículo é o espaço em que se concentram e se desdobram
as lutas em torno dos diferentes significados sobre o social e
sobre o político. Por meio do currículo que diferentes grupos
sociais, especialmente os dominantes, expressam sua visão de
mundo, seu projeto social, sua “verdade”.
Entende-se, pois que se a organização dos conhecimentos ficarem a
mercê do domínio de uma classe social privilegiada, discriminações e
preconceitos permanecerão nas entrelinhas da estrutura educacional. Portanto
negar-se a produção de novos sentidos, novas identidades culturais, reação à
realidade social, as diferenças, ou seja, o multiculturalismo do currículo
educacional visando à afirmação de identidades culturais específicas.
Para Sacristán (1995, pág.106) o currículo multicultural vinculase com a pretensão de uma educação para a democracia e a
tolerância em um mundo que, pela influencia dos meios de
comunicação, tem, mais do que nunca, a consciência de ser
plural; onde os indivíduos, por exigências da economia política,
da ciência, da solidariedade e a manutenção da paz têm que se
relacionar com povos de tradições culturais muito diferentes.
Segundo Carnen e Moreira (1999), o profissional formado comprometido
com multiculturalismo procura permanentemente avaliar em que medida suas
xix
aulas introduzem e desenvolvem habilidades, conceitos e atitudes que sejam
úteis para os alunos viverem na sociedade multicultural contemporânea e bem
responderem a suas características e a seus problemas.
Segundo Freire apud Almeida e Silva (2005, p.156):
A multiculturalidade não se constitui na justaposição de culturas,
muito menos no poder exacerbado de uma sobre as outras, mas
na liberdade conquistada de mover-se cada cultura no respeito
uma da outra, correndo o risco livremente de ser diferente, sem
medo de ser diferente, de ser cada uma "para si", somente como
se faz possível crescerem juntas e não na experiência da tensão
permanente, provocada pelo todo poderosismo de uma sobre as
demais, proibidas de ser.
Gadotti um seguidor da filosofia de Paulo Freire continua a afirmar a
importância do respeito ás diversidades culturais através da prática pedagógica
multicultural na Educação de Jovens e Adultos:
(...)
Trata-se
de
incorporar
uma
abordagem
do
ensino/aprendizagem que se baseia em valores e crenças
democráticas e procura fortalecer o pluralismo cultural num
mundo cada vez mais interdependente. Por isso que a educação
de adultos deve ser sempre uma educação multicultural, uma
educação que desenvolve o conhecimento e a integração na
diversidade cultural. É uma educação para a compreensão
mútua, contra a exclusão por motivos de raça, sexo, cultura ou
outras formas de discriminação. A filosofia primeira na qual o
educador de jovens e adultos precisa ser formado, é a filosofia
do diálogo. (GADOTTI 2003, pág. 7)
As discussões do multiculturalismo nascem a partir das perspectivas
neomarxistas e críticas que procura ver, entender e resolver as problemáticas
da escola de fora para dentro e não de dentro para fora, como vinha
acontecendo
nas
perspectivas
de
ensino
tradicionais,
tecnicista
e
escolanovista. É preciso ver a escola que está inserida dentro de uma
comunidade o qual deve se adaptar e trabalhar em prol dela e não a
comunidade se adaptar aos anseios da escola imersos de concepções e
objetivos alheios.
Na discussão sobre multiculturalismo MacLaren apud Moreira (1999,
pág. 85) identifica quatro posições em relação à presença de distintos grupos
cultuais em uma mesma sociedade: multiculturalismo conservador, o
xx
multiculturalismo liberal, o multiculturalismo de esquerda e o multiculturalismo
crítico. Abaixo segue uma síntese de cada posição:
A primeira – o multiculturalismo conservador - pressupõe a inferioridade
e a incapacidade de outros grupos raciais, a elite cultural, busca construir uma
cultura comum, minimizando ou mesmo anulando os saberes, os dialetos, as
crenças, os costumes e os comportamentos de grupos subordinados e
garantindo a hegemonia do capital cultural da classe média.
A segunda posição – o multiculturalismo liberal – considera que todos,
independente de raça, cor ou etnias, apresentam a mesma capacidade
intelectual e, portanto, são capazes de competir e ascender na sociedade
capitalista. Os obstáculos injustos, que penalizam principalmente os grupos
dominados, são tidos como removíveis em reformas não traumáticas. Tais
aspectos colaboram para a aceitação, na sociedade, das normas e dos valores
dos grupos privilegiados, pois é disseminada a idéia, entre o “povo”, de não
almejar transformações sociais mais profundas.
A terceira posição – o multiculturalismo liberal de esquerda – aceita as
diferenças entre as raças e considera que a visão liberal de igualdade acaba
por negligenciar as importantes características que diferem uma raça de outra.
Minimizando o fato de que as identidades são produzidas histórica e
socialmente em meio a conflitos e lutas, supervalorizando a autenticidade de
culturas marginalizadas.
A quarta posição – o multiculturalismo crítico – enfatiza o papel da
linguagem e das representações na construção do significado e da identidade.
Representações de raça, classe e gênero como resultado de lutas sociais mais
amplas sobre signos e significados, o que associa à preocupação com o
discurso a tarefa de transformar as relações sociais, culturais e institucionais
nas quais o significado é gerado.
Com o intuito de comparar estas posições de multiculturalismo com as
abordagens pedagógicas da Educação Física, que norteou ao longo do
processo histórico suas práticas, pode-se identificar semelhanças nas
características
de
três
principais
abordagens:
Abordagem
Tecnicista,
Abordagem Crítico-Superadora e Abordagem da concepção de Aulas abertas,
conforme a classificação de Azevedo & Shigunov (2001).
xxi
Na primeira e terceira posição de multiculturalismo percebem-se
características da abordagem tecnicista, o qual nasce a Educação Física no
Brasil, objetivava-se através desta construir um projeto de homem disciplinado,
obediente, submisso, reproduzindo através do esporte e cultura corporal os
objetivos sociais da classe dominante. Esta abordagem tem como área base o
Pragmatismo Norte Americano.
Na segunda posição multicultural compara-se com a abordagem de
Aulas Abertas, esta considera a possibilidade de co-decisão no planejamento,
objetivos, conteúdos e formas de transmissão e comunicação no ensino.
Concebida, na expectativa de que essa nova visão fosse alterar a preparação
profissional criando outros sentidos de aulas para as crianças, no que se refere
ao jogo, movimento, esporte e prática docente.
Comparando esta abordagem com as tendências definidas por Saviani
(1995) assemelha-se com a Tendência Escolanovista, a qual o autor considera
que o importante não é o aprender a conhecer, como advogava a pedagogia
tradicional, mas o aprender a aprender. E a aplicação desta tendência na
escola pública gerou problemas negativos, pois provocaram o afrouxamento da
disciplina e a despreocupação com a transmissão de conhecimento,
rebaixando assim o nível de ensino das camadas populares.
E na quarta posição multicultural identifica-se fortemente características
da abordagem Crítico-Superadora.
Segundo Azevedo & Shigunov (2001, pág. 4) esta abordagem
embaza-se no discurso da justiça social no contexto da sua
prática. Busca levantar questões de poder, interesse e
contestação, faz uma leitura dos dados da realidade a luz da
crítica social dos conteúdos.
A E.F. é entendida como sendo uma disciplina que trata do jogo,
da ginástica, do esporte, da capoeira, da dança como sendo um
conhecimento da cultura corporal de movimento.
Busca
entender com profundidade o ensinar, onde não significa apenas
transferir ou repetir conhecimentos, mas criar as possibilidades
de sua produção crítica, sobre a assimilação destes
conhecimentos, valorizando a questão da contextualização dos
fatos e do resgate histórico.
Moreira (1999) enfatiza a importância do multiculturalismo crítico para
orientação das perspectivas de educacionais, pois este aponta a necessidade
de respeitar a pluralidade cultural e garantir a representação das identidades
xxii
culturais
em
discursos
e
práticas
curriculares,
negando
práticas
homogeneizadoras e etnocêntricos que silenciam a pluralidade e negam voz às
identidades culturais pautando-se em visões monoculturais e discriminatórias.
O multiculturalismo crítico rejeita ver a cultura como não conflitiva,
harmoniosa e consensual. Ao contrário, diversidade deve ser afirmada dentro
de uma crítica e de compromisso com a justiça social democrática e dialética. A
diferença é vista como um produto da história, da cultura, do poder e da
ideologia. MacLaren apud Barbosa aponta para a importância de espaços de
encorajamento para a multiplicidade de vozes em nossas salas de aula, como
também para a criação de uma pedagogia dialógica, na qual as pessoas vejam,
a si e aos outros, como sujeitos e não como objetos.
Para
Sacristán
(1995)
há
vários
problemas
pertinentes
ao
multiculturalismo e para cada caso há estratégias convenientes para estimulálos. Dentre os fatores que colaboram para cultura homogênea do currículo
escolar e o não respeito pela diferenças estão: a estrutura organizativa do
sistema educacional que sistematiza sem flexibilidade a progressão das séries,
organização dos conhecimentos fragmentados e desvinculados, separação de
alunos por níveis de aprendizagem ou conhecimento, comodismo dos
profissionais em trabalhar com apenas grupos homogêneos, homogeneidade
na seleção e sistematização dos conteúdos, escassa variedade de espaços,
estímulos e de recursos didáticos com variedades culturais.
Moreira (1999) em seu estudo sobre Multiculturalismo, Currículo e
Formação de Professores aponta princípios e estratégias comuns às práticas
que privilegie o multiculturalismo no processo de formação de professores.
Considera-se que alguns destes princípios os professores de Educação
de Jovens e Adultos devem levar em consideração na organização de
conteúdos e em suas práticas pedagógicas com o intuito de promover o
multiculturalismo nesta modalidade de ensino.
Dentre estes princípios destacam-se:
- Identificar e aceitar a existência dos problemas que permeiam
o multiculturalismo na escola como raça, poder, identidade,
significado, ética e trabalho;
- Prática que valorize a aprendizagem das habilidades
necessárias à promoção de um diálogo que favoreça uma
dinâmica de crítica e autocrítica. O professor deve entender e
ensinar que toda cultura precisa, no encontro com outras
xxiii
culturas, aceitar ser desestabilizada e contestada em alguns de
seus traços básicos;
- Saber lidar com os preconceitos e os esteriótipos do futuro
assim como promover uma educação que não fomente estes
fatores. Disponibilizando para os alunos a diversidade de
conteúdos e meios para que estes conheçam a diversidade
cultural do nosso país assim como identificá-las no meio em
que vivem;
- Valorização da aprendizagem moral desenvolvida por meio da
experiência;
- Estabelecer elos entre o conhecimento escolar, o
conhecimento e os significados que os estudantes trazem
consigo. (MOREIRA 1999 pág. 87-90.)
Santomé (1997, pág. 13) em seu estudo, sobre Políticas Educativas,
Multiculturalismo e Práticas Culturais Democráticas nas Salas de Aula, aponta
implicações,
numa
visão
multicultural,
necessárias
para
as
práticas
pedagógicas dos professores em sala de aula, tais como:
- Tudo o que se programe como tarefa escolar, como proposta
de trabalho curricular, tem de tornar visível suas conexões com
as experiências cotidianas e significativas para o coletivo
estudantil ao qual é oferecido. É necessário que se permita que
os problemas, preocupações, aspirações e interesses do
alunado sejam acolhidos.
- Toda proposta curricular tem de estar apoiada na cultura de
procedência do alunado. E quando falamos de cultura de
origem não é como conceito abstrato sem maior significado,
mas sim estamos nos referindo aos diferentes e dinâmicos
estilos de vida de sociedades e grupos humanos e às redes de
significados que as pessoas e grupos usam para construir seus
significados e comunicar-se entre si.
- As situações escolares devem facilitar a análise e a
compreensão de modo de funcionamento das estruturas
sociais que caracterizam e condicionam a vida dos cidadãos e
cidadãs.
- Estimular e favorecer uma maior atenção aos produtos
culturais de cada sociedade, prestando atenção a suas
condições e processos de construção e à forma como são
percebidos e valorados, tanto dentro da própria comunidade
quanto por outras sociedades.
Neste estudo, o autor acima citado, enfatiza a necessidade de uma
educação que respeite as diversidades culturais principalmente no em relação
aos grupos menos favorecidos, oportunizando uma educação democrática para
a formação de cidadãos com consciência crítica que lhe permita analisar,
xxiv
valorizar e participar de tudo o que acontece e tem a ver com seu entorno
sociocultural e político.
Para efetivação desta perspectiva educacional Santomé (1997, 18-19)
recomenda desenvolver através da prática pedagógica os seguintes princípios
nos alunos:
- Incorporar uma perspectiva global. Assumir a análise dos
contextos socioculturais nos quais se desenvolve sua vida,
assim como daqueles das questões e situações que submetam
a estudo; atender às dimensões culturais, econômicas,
políticas, religiosas, militares, ecológicas, de gênero, étnicas,
territoriais etc. (ante uma educação mais tradicional em que a
descontextualização é uma das peculiaridades da maior parte
de tudo que se aprende.)
- Incorporar a perspectiva histórica, as controvérsias e
variações que ocorreram até o momento sobre o fenômeno
objeto de estudo; a que se deveram, a quem beneficiavam etc.
Incidir, portanto, na provisoriedade do conhecimento.
- Compreender todas as questões que são objeto de estudo e
investigação levando em consideração dimensões de justiça e
eqüidade. Converter o trabalho escolar em algo que permita
pôr em prática e ajudar a compreensão das implicações de
diferentes posições éticas e morais.
- Partir da valorização da experiência e do conhecimento do
próprio alunado. Facilitar a confrontação de suas convicções e
pontos de vistas pessoais com os de outras pessoas.
- Promover a discussão a respeito de diferentes alternativas
para resolver problemas e conflitos, assim como dos efeitos
colaterais de cada uma das opções.
- Empregar estratégias de ensino e aprendizagem flexíveis e
participativas. Aprender num âmbito organizativo flexível,
participativo e democrático, no qual se preste especial atenção
à integração de estudantes de diferentes grupos étnicos e
níveis culturais, de distintas capacidades e níveis de
desenvolvimento, no qual as tarefas escolares sejam levadas a
cabo em grupos cooperativos de trabalho.
Neste contexto pode-se afirmar que resolver ou tentar solucionar a
questão do multiculturalismo do currículo escolar não é algo fácil de resolver,
até por que quando envolve cultura no processo de reformulação do sistema
educacional se fala em mexer com interesses e ordens de quem detêm o poder
das decisões presentes nas entrelinhas da estrutura educacional do país.
Mas Sacristián (1995) cita com propriedade as estratégias necessárias
para a reforma do currículo para viabilizar a sustentação de uma proposta
baseada
na
perspectiva
multicultural
democrática.
Dentre
os
pontos
xxv
fundamentais estão à formação de professores, o planejamento dos currículos,
o desenvolvimento de materiais apropriados, a análise e a revisão crítica das
práticas vigentes, a partir de avaliações de experiências ou da realidade mais
ampla, da pesquisa-ação com professores, assim como o trabalho em conexão
entre a escola e o meio social.
Para
o
currículo
educacional
oferecer
uma
organização
de
conhecimentos pautados no respeito ao multiculturalismo Lawton apud
Sacristián (1995) afirma ser necessário primeiro fazer uma análise cultural que
deve seguir uma série de parâmetros descritivos que são: invariantes culturais
(diferenciações internas da cultura ou do contraste com outras); descrever suas
características; ordenar as informações levantadas e decidir experiências a ser
tomadas de acordo com as necessidades dos alunos.
Tais ações apontam para necessidade da formação de um professor
pesquisador, intelectual transformador capaz de buscar práticas pedagógicas
voltadas
para
uma
formação
multicultural
crítica
favorecendo
o
desenvolvimento de um pensamento mais investigativo e comprometido com
uma educação emancipadora.
EJA NO BRASIL: UM PRODUTO DA NECESSIDADE MULTICULTURAL
A Educação de Jovens e adultos está presente no Brasil desde o
período colonial, quando os religiosos exerciam uma ação educativa
missionária com os adultos, era impostos aos nativos da terra o conhecimento
de uma cultura e educação de um outro país, com objetivos de submissão e
extorsão. Porém durante muito tempo nenhum registro oficial foi formalizado
sobre o direito do jovem e adulto a educação.
xxvi
Em meados do século XVIII o Brasil começa a participar de conferências
mundiais sobre a Educação e compromete-se a desenvolver responsabilidades
e metas para a educação básica de Jovens e Adultos.
A partir daí movimentos civis se empenham na luta contra o
analfabetismo defendendo a necessidade e direitos pela educação de jovens e
adultos, mas o governo resistia, pois para este era assumir a própria falha da
educação básica e também não era de interesse da mão-de-obra capitalista a
formação destes indivíduos.
Era mais interessante para o governo manter a “ignorância” facilitando a
manipulação do povo. O governo só muda de estratégias com a pressão
trazida pelo início da industrialização que impõe a necessidade de formação de
mão-de-obra aliada à importância da manutenção da ordem social nas cidades.
Estes fatores contribuíram para o país assumir o direito de todos ao
Ensino Fundamental independente da idade na Constituição de 1988. Apesar
do avanço muitos projetos educacionais na modalidade EJA nem saíram do
papel e outros não tiveram êxito devido o não comprometimento do governo.
Segue abaixo quadro um, com os principais períodos da EJA na história
e seus respectivos movimentos ou nome criados pelo governo para suprir seus
objetivos políticos. Este foi construído a partir das informações contidas nas
literaturas que contém o processo histórico da EJA.
QUADRO 1- Movimentos na EJA
PERÍODO
Constituição Brasileira de 1824
formalizou a garantia de “instrução
primária e gratuita para todos os
cidadãos”.
Governo Militar 1967
Nova República 1985
Comissão Nacional de Alfabetização
MOVIMENTO
“uma chaga social”
Movimento Brasileiro de
Alfabetização (Mobral)
Plano Nacional de
Alfabetização e
Cidadania (PNAC)
Educação Básica de
OBJETIVO
Manutenção de ordens e formar
mão-de-obra devido ao surto da
urbanização no início da indústria
nacional
“Democratizar a educação no
ensino fundamental” – objetivos
políticos populista
Elaborar diretrizes para a
xxvii
1990
Jovens e Adultos
formulação de políticas de
alfabetização.
Wanderley apud Gadotti e Romão (2005, pág. 36-37) distingue três
“orientações” da educação popular no Brasil que podem ser encontradas em
outros países da América Latina:
1ª a educação popular com a orientação de integração,
uma educação instrumental, entendida como popularização da
educação oficial sob a hegemonia das classes dominantes, com
o objetivo de consolidar o capitalismo dependente, integrando
principalmente o campesinato.
2ª educação popular com a orientação nacionaldesenvolvimentista visando à implantação de um capitalismo
autônomo, nacional e popular. Seria uma versão brasileira da
“educação funcional” (UNESCO). Pretendia-se distribuir os
benefícios do progresso social do modelo capitalista
dependente.
3ª a educação popular com a orientação de libertação
com o objetivo de estimular as potencialidades do povo através
da conscientização, da capacitação e de ampla participação
social.
A
partir
dessa
orientação,
certos
grupos
problematizaram, criticaram a ordem capitalista e começaram a
exigir mudanças estruturais profundas.
Diante do exposto entende-se que a EJA não só no Brasil assim como
na América Latina sempre foi alvo de manobras políticas, hora com o intuito de
manter a ordem social hora para atender a necessidade de mão-de-obra
qualificada, acatando assim os anseios da ordem capitalista.
Durante todo este processo histórico a regulamentação da EJA no Brasil
sempre esteve impulsionada pelos movimentos externos, como conferencias
internacionais sobre educação, que como conseqüência disso surgia os
movimentos nacionais. Através destes processos a EJA foi sendo incorporada
na LDBEN, mas poucas políticas públicas foram de fato efetivadas em
decorrência destes avanços.
De acordo com a PCNEJA (2002, pág. 16) somente com a LDBEN nº.
5.692/71 “o ensino supletivo ganha capítulo próprio, estabelecendo que ele se
destinasse a suprir a escolarização regular para adolescentes e adultos que
não tinham seguido ou concluído na idade própria”. A partir deste período se
afirmava a necessidade de adequar o ensino ao “tipo especial de aluno que se
destina”, resultando daí uma grande flexibilidade curricular.
xxviii
Os primeiros estudos que impulsionaram a educação de jovens e
adultos foram conduzidos por Paulo Freire. O pedagogo desenvolveu
metodologias destinadas especificamente para esta clientela. O fundamento
destas metodologias orientava-se pelos paradigmas da educação popular. A
perspectiva
de
educação
popular
já
apontava
possibilidades
do
multiculturalismo já que a mesma era organizada a partir de trabalhos que
levavam em conta a realidade dos alunos, defendia o interesse do “povo”, o
excluído e marginalizado, ou seja, a democratização da educação.
É certo afirmar que a Educação de Jovens e adultos já surge de uma
situação marginalizada e ganha força à medida que tendências sociais na
educação evoluem.
A partir de então muito se tem refletido, pesquisado e escrito sobre
metodologias pedagógicas para esta modalidade de ensino com o intuito de
aperfeiçoar as práticas educativas e diminuir a marginalização da educação
para esta clientela.
Gadotti, também foi um precursor de estudos na área da Educação de
Jovens e Adultos, este aponta a necessidade de um currículo adaptado à
realidade e especificidade desta clientela defendendo que:
A qualidade em educação de jovens e de adultos deve ser
medida pelo atendimento às suas necessidades educacionais e
culturais. Não se trata de “repassar” para eles um saber já
cristalizado e elitista. Trata-se de construir junto com eles um
novo saber, realmente libertador e significativo para o projeto de
vida de cada um dos educandos-educadores, para viverem no
mundo de hoje (GADOTTI 2007, p. 8).
Portanto pode-se afirmar que tanto Paulo Freire como Gadotti, enfatizam
a necessidade da organização de conhecimento advindos da cultura da própria
clientela que se pretende trabalhar. Estas perspectivas defendem que os
conhecimentos repassados precisam antes de tudo ser significativo para os
alunos, desenvolvendo habilidades, conceitos e atitudes que sejam úteis para
estes. Tais características levantadas identificam-se com um currículo numa
perspectiva multicultural.
No multiculturalismo quando se propõem a discutir, organizar ou
selecionar conteúdos para serem aplicados em qualquer modalidade e/ou
disciplina educacional é indispensável à reflexão dos objetivos dos mesmos.
xxix
Estes objetivos não devem se limitar apenas ao desenvolvimento
cognitivo ou biológico, mas social e cultural. Quando se determina o que, e
como os alunos devem aprender faz-se necessário ainda uma reflexão mais
aprofundada levando em consideração tanto o aspecto pedagógico como
político.
A natureza/essência da educação é sociopolítica na medida em
que pode, ou não auxiliar os indivíduos a adquirirem consciência
de seu lugar na humanização e democratização da sociedade, o
que expressa a intensa ligação existente, a teoria histórica, entre
saber e política. (BORGES pág. 108, 2006)
A autora ainda acredita que a relação educação-sociedade é uma
relação de mão dupla, ou seja, a escola é influenciada pela sociedade em que
se insere, porém, dialeticamente, pode também influenciar nesta sociedade.
Portanto enfatiza-se mais uma vez a necessidade de que os conteúdos sejam
organizados de acordo com, interesses e realidade em que o aluno está
inserido propiciando melhor adequação e prática consciente da cidadania.
A escola tem um espaço pedagógico no qual possibilite a organização
destes saberes, respeitando multiculturalismo existente na mesma. Este
espaço é o Projeto Político Pedagógico, onde através deste a equipe escolar
encontrará subsídios necessários para levantar informações, analisar, refletir,
congregar, e organizar os conteúdos adequados para o grupo que se propõe a
trabalhar. Através deste trabalho o aluno pode ser visto com um “ser da
sociedade” na qual a escola está inserida e não um ser com fins próprios o qual
se insere na escola.
No mínimo, estes educadores precisam respeitar as condições
culturais do jovem e do adulto analfabeto. Eles precisam fazer o
diagnóstico histórico-econômico do grupo ou comunidade onde
irão trabalhar e estabelecer um canal de comunicação entre o
saber técnico (erudito) e o saber popular. (GADOTTI & ROMÃO
2005)
Na construção do Projeto Político Pedagógico a Educação de Jovens e
Adultos os profissionais que trabalham com este segmento precisam ter um
olhar mais cuidadoso quanto à diversidade cultural desta clientela, pois esta
modalidade de ensino reuni alunos com faixa etária muito diferente o que traz
xxx
junto costumes, pensamentos, pretensões e modos distintos entre jovens e
adultos.
Assim os conteúdos e métodos devem ser organizados e aplicados de
modo a atender essas diferenças. A necessidade do respeito dessas
diferenças fundamentou a construção das Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação de Jovens e Adultos, legalizada pela resolução CNE/CEB nº.
1/2000, estas diretrizes são obrigatórias para a estruturação dos componentes
curriculares
de
Ensino Fundamental e Médio da modalidade.
Segundo PCNEJA (2002) as diretrizes destacam que a EJA, como
modalidade da educação básica, deve considerar o perfil dos alunos e sua
faixa etária ao propor um modelo pedagógico, de modo a assegurar a
diferença - identificação e reconhecimento da alteridade própria e inseparável
dos jovens e dos adultos em seu processo formativo, da valorização do mérito
de cada um e do desenvolvimento de seus conhecimentos e valores.
Apoiado em documentos da 5ª Conferencia Internacional sobre
Educação de Jovens e Adultos de 1997 em Hanburgo, no volume 1 da
Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos Segundo
Seguimento do Ensino Fundamental, é enfatizado que a EJA deve seguir
novas princípios e orientações e para o foco desta discussão destacamos:
elaborar e implementar currículos flexíveis, diversificados e participativos, que
sejam também definidos a partir das necessidades e dos interesses do grupo,
de modo a levar em consideração sua realidade sociocultural, científica e
tecnológica e reconhecer seu saber assim como respeitar aos conhecimentos
construídos pelos jovens e adultos em sua vida cotidiana.
Para que as diferenças culturais sejam respeitadas e a organização dos
conhecimentos seja significativa para os alunos faz-se necessário que no
Projeto Político Pedagógico seja levantado o perfil geral dos alunos da EJA
assim como dos professores que atuam nesta modalidade para que se possa
tornar possível uma formação mais adequada e construir um currículo baseado
em princípios multiculturais.
Para contribuir com o enfoque sobre a necessidade de desenvolver um
Projeto Político Pedagógico que respeite o espaço da EJA no meio escolar a
Proposta Curricular da Educação de Jovens e Adultos do Segundo Seguimento
xxxi
do Ensino Fundamental, aponta aspectos importantes a serem considerados
em sua construção.
Dentre estes aspectos destaca-se o primeiro o qual enfatiza a
importância de se conhecer esta clientela. Afirma que deve-se repensar o papel
e a função da educação escolar, seu foco, sua finalidade e seus valores: isso
significa considerar características, anseios, necessidades e motivações dos
alunos, da comunidade local e da sociedade em que ela se insere. A escola
tem de encontrar formas variadas de mobilização e de organização dos alunos
e da comunidade, integrando os diversos espaços educacionais que existem
na sociedade e, sobretudo, ajudando a criar um ambiente que leve à
participação do leque de opções e ao reforço das atitudes criativas do cidadão.
No tópico a seguir será analisada, de forma mais detalhada, a Proposta
Curricular da Educação de Jovens e Adultos do Segundo Seguimento do
Ensino Fundamental de Educação Física, com o intuito de verificar possíveis
espaços de multiculturalismo.
xxxii
PROPOSTA CURRICULAR DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DO
SEGUNDO SEGUIMENTO DO ENSINO FUNDAMENTAL: ESPAÇOS PARA
O MULTICULTURALISMO
3.1 Organização Estrutural do PCNEJA
A elaboração da Proposta Curricular da Educação de Jovens e Adultos
do Segundo Seguimento do Ensino Fundamental foi publicada em 2002. Sua
construção contou com a participação de educadores que atuam na Educação
de Jovens e Adultos, nas escolas jurisdicionadas às secretarias de educação
estaduais e municipais e em outras instituições. Esta Proposta Curricular é
orientada pelas proposições da LDBEN nº.9.394/96 e das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, do Conselho
Nacional de Educação.
Em suas considerações o Ministro da Educação Paulo Renato Souza, à
época, esta proposta parte do princípio de que a construção de uma educação
básica para jovens e adultos – voltada para a cidadania – deve esta
comprometer-se com a qualidade, ministrado por professores capazes de
incorporar ao seu trabalho os avanços das pesquisas nas diferentes áreas do
conhecimento e de estar atentos às dinâmicas sociais e suas implicações no
âmbito escolar.
A Proposta Curricular da Educação de Jovens e Adultos do Segundo
Seguimento do Ensino Fundamental está publicada em 3 volumes. Volume 1
um livro de introdução que trata de algumas características específicas da EJA
e construção de uma proposta curricular para EJA. O volume 2 trata das
especificidades das matérias de Língua Estrangeira, Língua Portuguesa,
Geografia e História e o volume 3 reune as disciplinas de Educação Física,
Matemática, Ciências e Artes.
3.2 Concepções que fundamentam o PCNEJA e suas relações com
o multiculturalismo
Esta proposta foi organizada baseada na perspectiva educacional
defendida por Paulo Freire e teorias socioconstrutivistas.
xxxiii
As propostas de Paulo Freire se focalizam nas relações entre
aluno e professor, e entre aluno e conhecimento, salientando a
importância do respeito à experiência e à identidade cultural dos
alunos e aos “saberes construídos pelos seus fazeres”.
(PCNEJA 2002, pág. 97)
Nesta perspectiva, o processo educativo não se caracteriza pelo
recebimento, por parte dos alunos, de conhecimentos prontos e acabados, mas
pela reflexão sobre os conhecimentos que circulam e que estão em constante
transformação; professores e alunos são produtores de cultura; todos
aprendem
e
todos
ensinam,
são
sujeitos
da
educação
e
estão
permanentemente em processo de aprendizagem.
Paulo Freire ver dentro da EJA a necessidade de uma pedagogia
voltada para a educação como prática da liberdade. “Liberdade e crítica que
não pode se limitar às relações do grupo, mas que necessariamente se
apresentam na tomada de consciência que este realiza de sua situação social.”
(PAULO FREIRE 1996, pág. 16)
Um aspecto de grande destaque na obra de Paulo Freire é a afirmação
da educação com caráter emancipatório, libertador, problematizador da
realidade, no sentido oposto ao de uma educação para a submissão, mas uma
educação para a decisão, para a responsabilidade social e política.
Na concepção Socioconstrutivista é enfatizado que o conhecimento não
é algo situado fora do indivíduo, a ser adquirido por meio da cópia do real,
tampouco algo que o indivíduo constrói independente da realidade exterior, dos
demais indivíduos e de suas próprias capacidades pessoais. É, antes de tudo,
uma construção histórica e social, na qual interferem fatores de ordem
antropológica, cultural e psicológica, entre outros (PCNEJA 2002, 100).
Segundo Azevedo & Shigunov (2001, pág. 3) nesta abordagem:
A intenção é a construção do conhecimento a partir da
interação do sujeito com o mundo, respeitar o universo cultural
do aluno, explorando as diversas possibilidades educativas de
atividades lúdicas espontâneas, propondo tarefas cada vez
mais complexas e desafiadoras com vistas à construção do
conhecimento. Além de valorizar as experiências, a cultura
dos alunos, a proposta construtivista tem o mérito de propor
alternativas aos métodos diretivos, alicerçados na prática da
E.F.
xxxiv
Esta concepção de ensino segue as idéias fundamentadas por Wallon e
Vygotsky que priorizam no processo de ensino e aprendizagem o
conhecimento prévio dos alunos. Nesta o conhecimento, é visto através de um
complexo processo de construção, modificação e reorganização, utilizadas
pelos alunos para internalizar e interpretar os novos conteúdos. O que o aluno
pode aprender em determinado momento da escolaridade depende das
possibilidades delineadas pelas formas de pensamento de que dispõe, dos
conhecimentos que já construiu anteriormente, das informações e do ensino
que recebe.
Por mais que o professor, os companheiros de classe e
os materiais didáticos possam e devam contribuir para que a
aprendizagem se realize, nada pode substituir a atuação do
próprio aluno na tarefa de construir significados sobre os
conteúdos da aprendizagem. É ele quem vai modificar,
enriquecer e, portanto, construir novos e mais potentes
instrumentos de ação e interpretação. Nessa perspectiva,
valorizava-se a técnica de ensino, os manuais de aplicação.
(PCNEJA 2003, pág. 100)
Observa-se a preocupação das duas tendências em trabalhar a
construção do conhecimento partindo da realidade em que o aluno está
inserido, priorizam práticas voltadas diálogo, levando à reflexão a dimensão
histórica do sujeito sem abrir mão da importância dos conteúdos para a
ampliação dos conhecimentos do docente. No entanto as características do
multiculturalismo cultural estão presentes e contextualizadas na pedagogia de
Paulo Freire, o qual construiu toda uma perspectiva educativa especificamente
para EJA o qual vislumbrou a possível “libertação” dos indivíduos que fazem
parte desta modalidade de ensino.
De acordo com PCNEJA (2002) Paulo Freire ressalta que “a educação
pode contribuir para que as pessoas se acomodem ao mundo em que vivem ou
se envolvam na transformação dele”; assim, a educação será conservadora ou
transformadora da realidade.
Para Freire (1996) quando o professor não tem clareza sobre a quem
está servindo ou opta pela neutralidade, está mesmo que inconscientemente
optando por um dos lados, neste caso, pela conservação. Ao optar por uma
educação transformadora, ela deve ser essencialmente problematizadora,
pressupondo criatividade e reflexão sobre a realidade, de modo a assumir o
xxxv
compromisso com sua mudança. Numa visão dialética, “a educação para a
libertação se constitui como ato de saber, um ato de conhecer e um método de
transformar a realidade que se procura conhecer”. Para passar da consciência
ingênua à consciência crítica, é necessário o aluno parar de apenas escutar e
obedecer e rejeitar a “hospedagem do opressor dentro de si”, que faz com que
se considere ignorante e incapaz. As características desta pedagogia
convergem com as do multiculturalismo Crítico.
MCLaren apud Moreira (1999) considera o Multiculturalismo Crítico
como o ideal, pois vê as diferenças como produto da história, da cultura, do
poder
e da ideologia. Esta fornece subsídios necessários para uma
intervenção comprometida com a democracia e justiça social nas relações de
poder que constrói em diferenças.
As análises acima das correntes teóricas que norteiam a PCNEJA
(Proposta Curricular da Ed. de Jovens e Adultos) foram discutidas de acordo
com fragmentos do texto da Parte II do livro 1 que trata da Construção de uma
Proposta Curricular para EJA.
Nesta parte contém um subitem que trata só das concepções
norteadoras de uma proposta curricular que fala das lições de Paulo Freire e o
Construtivismo. Além disso, levanta também a Concepção do Saber. A
PCNEJA defende a construção do saber como a união entre saber popular e
científico, com o objetivo de propiciar a cada aluno a possibilidade de
desenvolver capacidades, como a de estabelecer conexões entre diferentes
contextos de significação, de transferir relações de um feixe de conhecimento a
outro, de desenvolver novos significados, promover de fato uma aprendizagem
significativa.
Rejeita a idéia de que o conhecimento pode ser visto como um bem
passível de ser transmitido de um indivíduo para o outro e ser acumulado.
Abole também a concepção de que o conhecimento pode ser
representado por uma cadeia de elos, encadeados uns após os outros, de
forma hierarquizada, em que cada um constitui um pré-requisito para o
seguinte,
ignorando
suas
relações
com
conhecimentos
anteriormente
estudados ou trazidos pelos alunos de sua vivência.
Aliada com esta concepção de conhecimento a PCNEJA apóia a
importância da interdisciplinaridade na organização das disciplinas e seus
xxxvi
conhecimentos, que é notório ressaltarmos o comprometimento desta
metodologia com a questão criticidade.
Segundo PCNEJA a interdisciplinaridade visa a recuperação da unidade
humana por meio da passagem da subjetividade para a intersubjetividade,
recupera a idéia primeira de cultura (formação do homem total), o papel da
escola (formação do homem inserido em sua realidade) e o papel do homem
(agente das mudanças no mundo).
Por intersubjetividade compreende-se a ultrapassagem de um estágio
subjetivo, em que as limitações são camufladas, a um estágio compreensivo,
em que se passa a aceitar e incorporar as experiências dos outros, a ver na
experiência do outro a complementação de sua própria.
Pode-se afirmar que a concepção de conhecimento da PCNEJA, pois
não trata o mesmo como um objeto manipulável e transmissível, mas levam em
consideração experiências vividas em torno do conhecimento e são
construídos de forma coerente, significativa e crítica.
Na PCNEJA para Seleção de Conteúdos são levados em consideração
a relevância social e desenvolvimento intelectual do aluno procurando envolver
explicações, formas de raciocínio, linguagens, valores, sentimentos, interesses
e condutas.
Nesta proposta, os conteúdos estão dimensionados não só em
conceitos, mas também em procedimentos e atitudes, apresentados em blocos
de conteúdo ou em eixos temáticos, de acordo com as áreas. Recomenda
também que os conteúdos tratados em cada sala de aula passem por
adaptações e alterações, de acordo com as capacidades e as características
sociais, culturais e econômicas particulares da localidade.
Assim, a seleção proposta nas distintas áreas curriculares deve servir
como uma referência suficientemente aberta, para técnicos e professores
analisarem, refletirem e tomarem decisões, adequando-a às necessidades de
aprendizagem de seus alunos.
Identifica-se nesta teoria a preocupação com as invariantes culturais e
importância do desenvolvimento integral do indivíduo capacitando-o com uma
série de conhecimentos, habilidades e valores que lhes permitam entender e
contribuir para com a sociedade e a cultura na qual vivem.
xxxvii
3.3 Organização Curricular da EJA de Educação Física e sua concepção
multicultural
Analisaremos como estas concepções que norteiam a organização
curricular da EJA estão estruturadas na PCNEJA específica da disciplina de
Ed. Física do Segundo Seguimento.
3.3.1 Princípios Pedagógicos do PCNEJA de Educação Física
Baseado nas concepções de Paulo Freire e do Construtivismo, as quais
norteiam a estrutura do PCNEJA, os princípios pedagógicos do PCNEJA Ed.
Física parte de quatro aspectos fundamentais: o princípio da inclusão, o da
diversidade, as categorias de conteúdos e os temas transversais.
Quanto à prática inclusiva deve: apoiar, estimular, incentivar, valorizar,
promover
e
acolher
o
estudante.
Valorizar
todos
os
alunos
–
independentemente de etnia, sexo, língua, classe social, religião ou nível de
habilidade esta – deve ser a primeira estratégia do professor. Através de
estratégias esclarecimento destes valores, práticas corporais proporcionando a
vivencia das mesmas e discussão. A inclusão da Educação Física na educação
de jovens e adultos representa a possibilidade de acesso, a cultura corporal de
movimento. O acesso a esse universo de informações, vivências e valores é
compreendido aqui como um direito do cidadão, na perspectiva da construção
e usufruto de instrumentos para promover a saúde, utilizar criativamente o
tempo de lazer e de expressão de afetos e sentimentos, em diversos contextos
de convivência.
No princípio da diversidade, a prática pedagógica deve-se dar através
de aprendizagem significativa, entendida aqui como a aproximação entre os
alunos e o conhecimento construído pela cultura corporal de movimento ao
longo do tempo.
Para a seleção dos conteúdos de Ed. Física mantém o princípio das
dimensões (categorias de conteúdos) Procedimental e Conceituais onde
afirma que o ensino na Ed. Física deve ultrapassar o conhecimento de esporte,
ginástica, dança, jogos, atividades rítmicas e expressivas e o conhecimento
sobre o próprio corpo, em seus fundamentos, técnicas e organização;
Atitudinais que aborda a necessidade
de incluir também os valores
subjacentes dos conteúdos, ou seja, quais atitudes os alunos devem ter nas e
xxxviii
para as atividades corporais e o Procedimental que busca garantir o direito do
aluno de saber por que está realizando este ou aquele movimento, isto é, quais
conceitos estão ligados àqueles procedimentos.
A respeito dos temas transversais supõe um relacionamento das
atividades da Educação Física com os grandes problemas da sociedade
brasileira, sem, no entanto, que se perca de vista o seu papel de integrar o
cidadão na esfera da cultura corporal de movimento.
PCNEJA de Ed. Física chama a atenção dos docentes, para que não
atentem somente para os conteúdos conceituais, mas que levem em
consideração também o desenvolvimento moral do indivíduo. A respeito deste
aspecto afirma-se que o desenvolvimento moral está intimamente relacionado
à afetividade e à racionalidade, e nas aulas de Educação Física ocorrem
situações que permitem uma intensa mobilização afetiva e interação social.
Tal cenário apresenta-se como ambiente ideal para explicitação,
discussão, reflexão e aplicação de atitudes e valores considerados éticos ou
antiéticos para si e para os outros. Além da intervenção no momento oportuno,
cabe ao professor de Educação Física a construção de formas operacionais e
contextos pedagógicos para que valores relacionados ao princípio da dignidade
humana e construção de autonomia moral sejam exercidos, cultivados e
discutidos no decorrer das práticas escolares.
Os alunos poderiam ter experiência de: respeitar e ser respeitado;
realizar ações conjuntas; dialogar efetivamente com colegas e professores;
prestar e receber solidariedade; ter acesso a conhecimentos que alimentem a
compreensão e a cooperação; analisar criticamente situações concretas dentro
e fora da escola.
Portanto é quase indiscutível a presença de características do que
estimulem práticas que respeitem as diversidades culturais dos alunos, nos
princípios pedagógicos que norteiam a PCNEJA de Ed. Física. E isto se
confirma também no tópico que trata de como ensinar, onde são sugeridas
estratégias que prioriza a cooperação de construção e descoberta entre
professor e aluno na organização dos conteúdos de acordo com os princípios
relacionados acima. É enfatizada ainda a importância de o professor
oportunizar espaços de reflexão e síntese da atualidade para o aprendizado,
promovendo uma visão organizada do processo como uma possibilidade real
xxxix
através de experiências socioculturais construídas. Essa organização do
professor pode ser complementada mediante a ação dos alunos, que se
tornam co-responsáveis pelo ensino e aprendizagem dos colegas.
3.3.2 Organização e Seleção dos Conteúdos na Educação Física da
EJA
A PCNEJA considera que a distribuição e o desenvolvimento dos
conteúdos devem estar relacionados ao projeto educativo de cada escola e à
especificidade de cada grupo. A característica do trabalho deve contemplar os
vários níveis de competência desenvolvidos, para que todos os alunos sejam
incluídos e as diferenças individuais resultem em oportunidades de troca e
enriquecimento
do
trabalho.
Dentro
dessa
perspectiva,
o
grau
de
aprofundamento estará submetido às dinâmicas dos grupos.
Identifica-se como fator característico das perspectivas multiculturais
críticos esta preocupação da construção do projeto político pedagógico
sugerido pela Proposta Curricular da Educação de Jovens e Adultos,
enfatizando que a equipe escolar, na construção do mesmo, deve ter em vista
uma aprendizagem significativa criando condições para que os alunos possam
manifestar preocupações, problemas, interesses, conhecimentos prévios,
motivações – e, assim, levá-los em conta no processo de articulação entre
definição de objetivos e seleção de conteúdos.
Os conteúdos na PCNEJA de Educação Física estão organizados em
blocos como os da educação regular. Constituem-se em três blocos:
conhecimentos sobre o corpo; esportes, jogos, lutas, ginásticas; atividades
rítmicas e expressivas. É ressaltado ainda na PCNEJA que estes blocos de
conhecimentos não devem representar estruturas rígidas para serem seguidas
de modo específico, mas sim um recorte possível a ser abordado no contexto
escolar.
Descreve-se abaixo os conteúdos atitudinais dos blocos que se
considerou relacionado com a perspectiva multicultural crítica.
Quadro 2 - Conteúdos Atitudinais: Conhecimento sobre o corpo;
esportes, jogos, lutas e ginásticas atividades rítmicas e expressivas
• Valorização do estilo pessoal de cada um.
xl
• Predisposição à cooperação e solidariedade (ajudar o outro, dar segurança,
contribuir com um ambiente favorável ao trabalho etc.).
• Predisposição ao diálogo (favorecer a troca de conhecimento, não omitir
informações úteis ao desenvolvimento do outro, valorizar o diálogo na
resolução de conflitos, respeitar a opinião alheia).
• Valorização da cultura popular, nacional e internacional.
• Predisposição para a busca do conhecimento, da diversidade de padrões, da
atitude crítica em relação a padrões impostos, do reconhecimento a outros
padrões pertinentes a diferentes contextos.
• Respeito a si e ao outro (limites corporais próprios, desempenho, interesse,
biótipo, gênero, classe social, habilidade, erro etc.).
• Valorização do desempenho esportivo de um modo geral, sem ufanismo ou
regionalismo.
• Predisposição para experimentar situações novas ou que envolvam novas
aprendizagens.
• Aceitação da disputa como um elemento da competição e não como uma
atitude de rivalidade ante os demais.
• Valorização do próprio desempenho em situações competitivas desvinculadas
do resultado.
• Reconhecimento do desempenho do outro como subsídio para a própria
evolução e parte do processo de aprendizagem (diálogo de competências).
• Disposição para adaptar regras, materiais e espaços visando a inclusão do
outro (jogos, ginásticas, esportes etc.).
• Valorização da cultura corporal de movimento como: parte do patrimônio
cultural da comunidade, do grupo social e da nação; instrumento de expressão
de afetos, sentimentos e emoções; possibilidade de obter satisfação e prazer;
linguagem e forma de comunicação e interação social.
• Respeito a diferenças e características relacionadas ao gênero presentes nas
práticas da área.
Fonte: PCNEJA 2002, pág. 214
Abaixo destaca-se os conteúdos conceituais e procedimentais de cada bloco:
Quadro 3 – Conteúdos Conceituais e Procedimentais: Conhecimentos
sobre o corpo
xli
• Identificação das capacidades físicas básicas.
• Compreensão dos aspectos relacionados à boa postura.
• Compreensão das relações entre as capacidades físicas e as práticas da
cultura corporal de movimento.
• Compreensão das técnicas de desenvolvimento e manutenção das
capacidades físicas básicas.
• Vivência de diferentes formas de desenvolvimento das capacidades físicas
básicas.
• Identificação das funções orgânicas relacionadas às atividades motoras.
• Vivências corporais que ampliem a percepção do corpo sensível e do corpo
emotivo.
• Conhecimento dos efeitos que a atividade física exerce sobre o organismo e a
saúde.
Fonte: PCNEJA 2002, pág. 215
Quadro 4 - Conteúdos Conceituais e Procedimentais: Esportes, jogos,
lutas e ginásticas.
• Compreensão dos aspectos histórico-sociais relacionados aos jogos, às lutas,
aos esportes e às ginásticas.
• Participação em jogos, lutas e esportes, dentro do contexto escolar, de forma
recreativa e competitiva.
• Vivência de jogos cooperativos.
• Desenvolvimento das capacidades físicas e habilidades motoras, por meio
das práticas da cultura corporal de movimento.
• Compreensão e vivência dos aspectos relacionados à repetição e à qualidade
do movimento na aprendizagem do gesto esportivo.
• Aquisição e aperfeiçoamento de habilidades específicas a jogos, esportes,
lutas e ginásticas.
• Compreensão e vivência dos aspectos técnicos e táticos do esporte no
contexto escolar.
• Desenvolvimento da capacidade de adaptar espaços e materiais na criação
de jogos.
• Desenvolvimento da capacidade de adaptar espaços e materiais para realizar
esportes simultâneos, envolvendo diferentes objetivos de aprendizagem.
xlii
• Vivência de esportes individuais e coletivos dentro de contextos participativos
e competitivos.
• Vivência de variados papéis assumidos no contexto esportivo (goleiro, defesa,
atacante, técnico, torcedor, juiz).
• Participação na organização de campeonatos, gincanas, excursões e
acampamentos dentro do contexto escolar.
• Compreensão das diferentes técnicas de ginásticas relacionadas com
diferentes contextos histórico-culturais e seus objetivos específicos.
• Compreensão e vivência dos aspectos de quantidade e qualidade
relacionados aos movimentos da ginástica.
Fonte: PCNEJA 2002, pág. 215-216
Quadro 5 - Conteúdos Conceituais e Procedimentais: Atividades rítmicas
e expressivas
• Compreensão dos aspectos histórico-sociais das danças.
• Percepção do ritmo pessoal e do grupo.
• Desenvolvimento da noção de espaço e tempo vinculada ao estímulo musical
e ao silêncio com relação a si mesmo e ao outro.
• Exploração de gestos e códigos de outros movimentos corporais não
abordados nos outros blocos.
• Compreensão do processo expressivo, partindo do código individual para o
coletivo (mímicas individuais, representações de cenas do cotidiano em grupo,
danças individuais, pequenos desenhos coreográficos em grupo).
• Percepção dos limites corporais na vivência dos movimentos rítmicos e
expressivos.
• Predisposição a superar seus próprios limites nas vivências rítmicas e
expressivas.
• Vivências das danças da cultura popular regional, compreendendo seus
contextos de manifestação (carnaval, escola de samba e seus integrantes,
frevo, capoeira, bumba-meu-boi etc.).
• Reconhecimento e apropriação dos princípios básicos para construção de
desenhos coreográficos simples.
• Vivência da aplicação dos princípios básicos na construção de desenhos
coreográficos.
xliii
• Vivência das manifestações das danças urbanas mais emergentes e
compreensão do seu contexto originário.
• Vivência das danças populares regionais nacionais e internacionais e
compreensão do contexto sociocultural onde se desenvolvem.
Fonte: PCNEJA 2002, pág. 216
Entende-se que a forma com que os conteúdos estão descritos e
organizados, sem aprofundar ou fazer um maior detalhamento e organização
por série, tem um fator positivo, pois assim os professores têm a autonomia de
selecionar os conteúdos e suas expressividades de acordo com a necessidade
e realidade em que está inserido. No entanto, cabe ao professor não usar as
dificuldades da estrutura da escola pública e se limitar ao espaço e material
disponível na escola para a organiza os conteúdos e objetivos de ensino.
Assim como não deve também abrir mão dos conteúdos transformando seu
plano de curso em mero discurso ideológico.
Considera-se de uma forma geral que o PCNEJA, o qual está baseado
na perspectiva Freiriano, aponta sim características importantes no respeito às
diversidades culturais dos alunos subsidiando uma prática multicultural crítica.
Esta perspectiva de ensino está relacionada com a abordagem críticosuperadora dentro da Educação Física o qual considera as questões de poder,
interesse,
esforço
e
contestação,
como
princípios
importantes
na
contextualização dos conteúdos da disciplina. Os adeptos a esta abordagem
propõem que se considere a relevância social dos conteúdos, sua
contemporaneidade e sua adequação às características sócio-cognitivas dos
alunos.
Portanto, para fundamentar melhor suas aulas com características
multiculturais crítico o professor deve apoiar–se na PCNEJA desde o volume 1,
pois é neste que é feito uma especificação melhor quanto as perspectivas de
Paulo Freire, o qual também defende a pedagogia politizadora, a superação da
opressão de classes, e a contextualização das relações sócio-culturais.
É importante ressaltar que o papel do PCN é apenas de norteador das
práticas pedagógicas, e que a intencionalidade críticas e politizadoras aos
conteúdos não podem se limitar a influencia deste documento. Um fator maior
que influencia ou caracteriza a prática pedagógica de qualquer professor é sua
xliv
formação acadêmica e seu nível de comprometimento ético com a profissão e
sociedade no qual está inserido.
FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE EDUCAÇÃO FÍSICA PARA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Conforme visto no processo histórico da EJA no Brasil este seguimento
educacional sempre foi tratado como projetos assistencialistas em que suas
conquistas sempre foram conseguidas através das lutas travadas por
educadores vinculados com as filosofias críticas.
xlv
O governo sempre tratou esta clientela como um símbolo dos resultados
negativos educacionais do país. Logo, a formação de profissionais preparados
para atender esta modalidade de ensino nunca foi considerada pelo governo.
As grades curriculares de cursos de licenciatura foram evoluindo de
acordo com as mudanças de governo no país e seus objetivos. A história
educacional nacional por longo período de tempo esteve voltada para a
formação técnica e mão de obra qualificada, só a partir da década de 80 os
objetivos neomarxistas ganham força e influencia as mudanças no currículo do
magistério. Portanto as concepções que defendem a diversidade cultural no
âmbito educacional que contribuem para a formação de professores
preparados
para
atender
a
demanda
multicultural
provocada
pelo
multiculturalismo ainda é recente no Brasil.
Como uma área educacional a Educação Física passa por todas estas
influencias, mas com um pouco de retardo maior, pois esta disciplina é
introduzida na escola visando principalmente os aspectos higienista e
performance atlética. Tais objetivos contribuíram com que a atenção dos
estudos e pesquisas, desta área, fomentasse a formação dos professores que
priorizasse o esporte utilizando método tecnicista.
Estes fatores influenciaram para a demora pelo qual a Educação Física
levou para incluir na sua grade curricular o currículo mínimo dos cursos
superiores de licenciatura, a resolução de nº. 298/62. Dentre as disciplinas a
serem acrescentadas estavam a Psicologia da Educação: adolescência,
aprendizagem; Didática; Elementos de Administração Escolar e a Prática de
Ensino sob forma de estágio supervisionado. Tal abordagem demorou muito
para ser introduzida no curso (em torno de 6 anos após a implantação da
resolução), assim como demorou a serem assimiladas e aplicadas de forma
coerente em sua prática, ou seja, por um bom tempo estas não passavam
apenas dos discursos dos formadores acadêmicos.
Outro fator principal, que influenciou a discussão dos aspectos políticos
e sociais da educação na Educação Física, foi à saída dos militares do poder
fato este que propiciou maior liberdade sobre os discursos das teorias críticas
da educação. Emergem neste período críticas pedagógicas ao tecnicismo e a
adoção da concepção das “ciências da educação”.
xlvi
Questiona-se a partir de então o papel e dimensão política da Educação
Física escolar gerando grandes mudanças surgindo novos estudos, debates,
protestos. A partir de então o que era um processo formativo de caráter técnico
passa a apresentar novos modelos e teorias de conhecimentos que
fundamentassem/direcionassem a formação dos profissionais, com a (re)
definição de sua identidade sócio-profissional no universo das práticas.
Apesar das inúmeras barreiras aos poucos as mudanças foram se
consolidando sob a perspectiva de uma pedagogia crítica-social, mas como
estudos e a própria história comprova que as bases atuais dos modelos de
formação ainda apresentam currículos com necessidades de reformulação.
As disciplinas da área de didática em sua grande maioria são aplicadas
de forma desvinculada da fisiologia e demais disciplinas, trazendo consigo uma
série de dificuldades na prática de ensino dos professores da Educação Física,
que em sua maioria são conseqüência de uma formação inicial deficiente,
como cita Oliveira.
Krusg apud Oliveira et al. (2001, p. 26) enfatiza em uma de suas
pesquisas a situação dos currículos da Educação Física nas universidades:
(...) desarticulado, desvinculada da realidade social
concreta, privilegiando a formação desportiva e o
desenvolvimento de habilidades motoras. Os currículos são
organizados procurando atender os interesses do corpo
docente e operacionalizados em disciplinas isoladas com
conteúdos isolados.
Estes currículos mostram sua deficiência quando também deixam de
contemplar as questões políticas e sociais que permeiam a escola. Se estes
fossem
levados
em
consideração
os
profissionais
teriam
um
maior
conhecimento e sairiam da formação inicial aptos para interferir de forma
consciente e assumindo suas responsabilidades políticas e sociais da
educação.
Moreira aponta características necessárias para formar docentes
conscientes das suas responsabilidades com a prática pedagógica voltada para
o multiculturalismo crítico.
xlvii
(...) uma proposta de formação docente multicultural deva
implicar não o desenvolvimento de uma aceitação irrestrita de
diferentes manifestações culturais, mas, sim, a aprendizagem
das habilidades necessárias à promoção de um diálogo que
favoreça uma dinâmica de crítica e autocrítica. O
reconhecimento de que qualquer cultura é incompleta e
apresenta pontos fracos constitui condição sine qua non para u
diálogo intercultural. (SANTOS apud Moreira 1999 pág. 87).
Entende-se que este diálogo intercultural praticado no campo de
formação, a partir do que já foi discutido sobre multiculturalismo, não se limita
as paredes acadêmicas, mas o futuro profissional da educação deve ter um
olhar mais dialético para o processo de ensino aprendizagem. De forma a
perceber o aluno, jovem ou adulto, está inserido num mundo multicultural, onde
a cultura, a razão, o afeto e a vida em sociedade, pode conduzi-lo na
percepção do mundo consciente ou inconsciente. E o aluno, acadêmico, só
conseguirá conhecer, refletir e relacionar o conhecimento científico com os
saberes práticos através da vivência, experimentação e reconstrução da sua
própria práxis pedagógica.
Sempre se reconheceu o valor da apropriação dos saberes
profissionais através da experiência.
Aprende-se com as
práticas do trabalho, interagindo com os outros, enfrentando
situações, resolvendo problemas, refletindo as dificuldades e os
êxitos, avaliando e reajustando as formas de ver e de proceder.
(CAVACO apud GENTIL 2008, p.8).
Portanto enfatiza-se a importância do curso de formação de professores
de Educação Física manter uma grade curricular coesa em que os
conhecimentos discutidos no meio acadêmico sejam vivenciados desde o
princípio do curso através de estágios onde os futuros professores possam
exercer práxis.
Outro fator preocupante que tem contribuído de forma negativa na
atuação do profissional de Educação Física no ensino noturno é o dilema da
sua facultatividade da disciplina no ensino da modalidade na EJA.
Na LDBEN 9394/96 parágrafo terceiro, do artigo 26 a Educação Física
contemplava a EJA da seguinte forma: "A educação física, integrada à proposta
pedagógica da escola é componente curricular da Educação Básica, ajustandose às faixas etárias e as condições da população escolar, sendo facultativa nos
xlviii
cursos noturnos". Como disciplina facultativa, o Conselho Nacional de
Educação aconselhava que caberia aos alunos participarem ou não das aulas
de Educação Física e também a escola o direito de oferecerem ou não a
disciplina para este turno de ensino.
Em dezembro de 2003, o presidente da república e o congresso nacional
sanciona e decreta a lei n. 10.793, alterando a redação do artigo 26 da lei
anterior para a seguinte: "A educação Física, integrada à proposta pedagógica
da escola, é componente curricular obrigatório da educação básica, sendo sua
prática facultativa ao aluno:
I.
que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a seis
horas;
II.
maior de trinta anos de idade;
III.
que estiver prestando serviço militar inicial ou que, em
situação similar, estiver obrigado à prática da educação
física;
IV.
amparado pelo Decreto-Lei no 1.044, de 21 de outubro de
1969;
V.
(Vetado)
VI.
que tenha prole".
Portanto, percebe-se que a diferença desta lei para a antiga está apenas
na reserva de mercado criada para o profissional de Educação Física que
agora retorna ao ensino noturno, mas que não modifica muito o quadro quando
o que está em questão é a participação dos alunos nas aulas de Educação
Física; pois, a grande maioria dos alunos são trabalhadores com carga horária
igual ou superior às seis horas, o que permite que sejam dispensados das
aulas.
Consideram-se todos estes fatores como um grande entrave que
dificultam perceber a Educação Física como um meio de consolidação de
práticas multicultural crítico por meio do desenvolvimento da cultura corporal.
Visto que até os órgãos educacionais ainda tratam a disciplina como um mero
subsídio de promoção à aptidão física, em que o aluno adulto é incapaz de
praticá-las devido às impossibilidades físicas, visão discriminatória que se
xlix
disseminam não só pelas escolas, mas que indiretamente influencia as
concepções de formação docente proporcionando a omissão da EJA nas
grades curriculares.
APRESENTAÇÃO, ANÁLISE DOS DADOS E RESULTADOS DA
PESQUISA.
5.1 Procedimentos Metodológicos
5.1.1 Caracterização da Pesquisa
Esta pesquisa caracteriza-se como estudo de caso do tipo descritivo
com abordagem qualitativa.
O estudo de caso consiste em uma investigação detalhada de
uma ou mais organizações, ou grupos dentro de uma
organização, com vistas a prover uma análise do contexto e
dos processos envolvidos no fenômeno em estudo. O
fenômeno não está isolado de seu contexto (como nas
pesquisas de laboratório), já que o interesse do pesquisador é
justamente essa relação entre o fenômeno e seu contexto. A
abordagem de estudo de caso não é um método propriamente
dito, mas uma estratégia de pesquisa. (HARTLEY apud DIAS
2000, pág. 1).
Esta estratégia de pesquisa facilitará para que o autor deste estudo
obtenha com mais êxito os objetivos e seu real propósito, discutir, conhecer e
relacionar com a prática pedagógica da escola estuda as possibilidades do
multiculturalismo na EJA, de forma a contribuir para a ampliação do seu
conhecimento do foco proposto nesta pesquisa.
5.1. 2 População e amostra
A população deste estudo foi composta por aproximadamente 180 alunos
da EJA do sexo masculino e feminino, regularmente matriculados na escola E.
E. F. Bela Vista de Porto Velho / RO. Para a realização da pesquisa foi
selecionada apenas uma turma de cada série (6º, 7º, 8º e 9º ano), já que havia
apenas 1 (um) professor de Educação Física
A amostra foi constituída de 50 alunos do sexo feminino e masculino, faixa
etária de 15 á 50 anos e do professor da EJA da escola referida.
l
5.1.3 Procedimentos para a seleção da amostra
Inicialmente realizou-se uma visita à direção da escola, onde foi explicado
o objetivo e relevância do estudo. Em seguida, oficializou-se a pesquisa
através de uma solicitação para a realização do trabalho, tendo sido acordado
com a direção da escola um termo de consentimento da coleta de dados.
Posteriormente foi feito contato com o professor de Educação Física que
auxiliou na seleção da amostra, os quais foram escolhidos diversidade de faixa
etária.
A partir de então, de forma intencional foi dado inicio a coleta de dados.
5.1.4 Instrumento de Medida
Para atingir os objetivos com êxito foi usado para coleta de dados
questionários de perguntas abertas e fechadas, entrevistas e observação.
Será viável o uso destas técnicas, pois o número de escolas
pesquisadas será pequeno, 1 (uma) escolas estadual e a amostra contará com
a participação de apenas 1(um) professor e 4 turmas (5ª á 8ª série) para o qual
este profissional dá aula.
As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para a
análise e interpretação das informações (seus significados ditos, interditos e
contradições).
As perguntas da entrevista com o professor, os questionários aplicados
aos alunos assim como a observação contaram com um roteiro de análise de
acordo com o que foi proposto investigar de uma forma coerente o que permitiu
a análise e interpretação mais ampla dos resultados. Disponibilizando através
desta a ligação de todos os resultados obtidos, comparados para destacar
pontos comuns e portos de discordância consolidando de forma coesa os
resultados.
Acredita-se que este estudo ampliou o conhecimento do pesquisador e
contribuiu para a formação de sua prática pedagógica de maneira mais
reflexiva e crítica. Este estudo contribuiu para analisar as problemáticas que
dificultam a prática de ensino do professor de Educação Física e respeito às
diversidades culturais presentes na EJA, assim como atentar para a
importância de uma prática voltada para o multiculturalismo crítico o qual dá
li
subsídios para as problemáticas sociais econômicas e políticas nos quais está
envolvida esta clientela. Acredita-se que o pesquisar/ou envolvidos no estudo
poderão trabalhar no sentido de dar sua contribuição no processo de mudança
da realidade que aflige e influencia a prática dos profissionais da sua área.
5.2 Apresentação dos resultados e análises dos questionários
aplicados aos alunos.
Os dados coletados através de questionários foram agrupados de
acordo com a semelhança das respostas, os resultados seguem apresentados
através de porcentagem e descritos em gráficos. Foram respondidos ao todo
50 questionários distribuídos entre as 5ª, 6ª, 7ª e 8ª séries.
Com o intuito de facilitar uma melhor análise, leitura e discussão dos
resultados optou-se por agrupar os gráficos que possuem relação na
interpretação dos dados.
Ressalta-se desde já que os dados das questões 9 e 10, do questionário
aplicado aos alunos, não forma tabulados já que todos os alunos afirmaram
que o professor não aplica qualquer tipo de trabalho.
Gráfico 1
Gráfico 2
lii
Idade dos Alunos
15-19 anos
8%
18%
20-30 anos
38%
31-40 anos
36%
41-50 anos
Sexo
46%
54%
Feminino
Masculino
Como podemos observar nos gráficos 1 e 2 as características de idade e
sexo estão bem divididas, um campo rico para se desenvolver uma prática
pedagógica que priorize o diálogo, troca de saberes e valores culturais. Visto
que alunos na faixa etária de 15-19 anos estão passando por ápice de
mudanças e
conflito
no
seu
desenvolvimento
de
uma forma
geral
(adolescência), se encontram mais críticos, mas agressivos, mais criativos,
com muita energia e disposição. Por outro lado os alunos de 20 e 30 anos
estão na fase adulta, mas seguros e maduros, com mais responsabilidades,
conhecedores das experiências sociais, o que pode estar contribuindo para
troca de conhecimentos e mediando relações de menos conflitos negativos,
uma vez que conhecem e convivem com a mesma realidade social que os
alunos mais novos estão passando.
As trocas de conhecimentos tantos das habilidades esportivas e de
culturas corporais como os conhecimentos cognitivos (científicos, políticos,
sociais, afetivos) proporcionado pelas diferenças de idade e sexo, podem ser
usados como conector da mediação dos conhecimentos oferecidos pelo
professor com os conhecimentos trazidos pelos alunos.
No entanto de acordo com as observações não é bem isso o que está
acontecendo. O método didático utilizado pelo professor não valoriza as
liii
diversidades percebidas nos dados, abrindo mão das diferenças como
incremento para suas aulas. Ao contrário disso os alunos por si só reproduzem
relações de preconceito entre os sexos, e distanciamento entre alunos mais
novos e mais velhos em que as relações imperam isolamentos, apatia e
menosprezo de si e do outro, conforme estará descrito mais a frente com os
outros dados da pesquisa.
Gráfico 3
Gráfico 4
Cor
13%
20%
67%
Pardo
Amarelo
Negro
Cidade de origem
Porto Velho
8%
4%
Outras cidades da
Região Norte
88%
Considera-se
que
Cidades da Região
Nordeste
há
uma
semelhança
nos
resultados,
certa
homogeneidade, na característica cor dos alunos quanto do local de origem. A
cor dos alunos é bem característica da população da cidade de Porto Velho,
onde a maior parte dos alunos é de origem, portanto pode-se afirmar que tais
fatores pode não ser um estímulo de conflitos negativos em decorrência das
diversidades entre os alunos. A depreciação ou qualquer tipo de preconceito,
em relação à cor ou origem, não foram identificados nas relações dos alunos
durante as aulas de Educação Física.
No entanto, estes fatores não devem contribuir para que o professor
abra mão, de utilizar suas aulas e conteúdos, as diversidades da cultura
corporal assim como suas características políticas e sociais, também
liv
proporcionar as relações de respeito e apreço as diversidades de cor ou raça
existente em nosso país. Ao contrário a diversidade de conhecimento cultural é
defendida com afinco na PCNEJA, mas de acordo com os dados da
observação o professor não utiliza métodos didáticos que contemplem a
aplicação de conteúdos referente à diversidade de cultura corporal. Conforme
analisado nos pressupostos teóricos estes conteúdos são muito importantes
para o conhecimento e afirmação das identidades culturais assim como a
reflexão e criticidade da mesma.
Gráfico 5
Gráfico 6
Importância da Educação Física para EJA
Conteúdos que gostaria na aula de
Educação Física
25%
24%
18%
26%
15%
2% 13%
15%
4%
8%
44%
6%
Melhoria da Saúde
Exerc. Físicos: alongamento, treinamento de força,
caminhada
Todos os conteúdos da disciplina
Oportuniza prática esportiva
Futsal
Proporciona: lazer, motivação e interação
Desenvolvimento físico
Brincadeiras
Desenvolvimento cognitivo
Não é importante
Vôlei
Importante como as outras disciplinas
Na leitura dos gráficos acima podemos verificar que os alunos da EJA
estão cientes da importância da Educação Física para seu desenvolvimento.
Esta afirmativa pode ser constatada na coerência dos resultados dos gráficos 5
e 6. No gráfico 5, 24% dos alunos definiram que a disciplina é importante para
a promoção da saúde e no gráfico 6, 44% destes optam pela prática de
exercícios importantes para a promoção da saúde nas aulas. E 26% dos alunos
gostariam que tivesse todos os conteúdos da Educação Física.
Estes resultados contrapõem a fala do professor na entrevista quando
afirma que o futsal é o esporte que os alunos mais gostam, é importante
refletirmos que se os alunos anseiam por outros conteúdos da Educação Física
mais só querem jogar futsal, será que eles preferem jogar futsal por que não
são oferecidas para os mesmos outras opções de conteúdos?
Esses fatores apontam para que o professor de Educação Física reflita
sua prática pedagógica com o intuito de verificar o nível de conhecimento
lv
passado para os alunos, já que a PCNEJA enfatiza a necessidade de ampliar o
conhecimento dos alunos através da diversidade de conhecimentos.
Na discussão sobre o multiculturalismo crítico, no referencial teórico,
verifica a necessidade da ampliação dos conhecimentos destes alunos, pois
sem os mesmos os alunos não terão capacidade de transcender à condição
vigente, não se pode refletir, criticar ou mudar algo se não for oferecido
subsídios pra isso.
Para contextualizar esta afirmativa, nos adiantamos e relacionamos com
a fala do professor na entrevista quando diz que “os alunos fazem algumas
críticas sobre o esporte mais sem conhecimento aprofundado”. Portanto
percebe-se a ciência do professor quanto a necessidade dos alunos em
aumentar seu conhecimento dos conteúdos da disciplina, mas não proporciona
meios para isso na sua prática de ensino.
Podemos afirmar também através dos dados do gráfico 5 os conteúdos
oferecidos para os alunos não contemplam seus anseios, já que de acordo com
o relatos dos alunos e observação durante todo ano letivo o professor aplica
sempre os mesmos conteúdos vôlei, futsal e jogos de mesa, de igual modo
para todas as séries.
Gráfico 7
Gráfico 8
Conteúdos significativos nas
aulas de Educação Física
Conteúdos que não são importantes
para o cotidiano
42%
4%
22%
10%
49%
12%
51%
Sim
Não
8% 2%
Futebol e Volêi
Torneio
Volêi
Futsal
Dama e Xadrez
Conteúdos Teóricos
Todos são importantes
Obs: As justificativas dos alunos quanto à significância dos conteúdos para o dia-a-dia
são: Sim - Aprendo noção de saúde, pratico esporte, tenho lazer e interação; Não não aprendo nada, o professor só da futsal e vôlei.
Os dados do gráfico 7 contradizem os dados dos gráficos 5 e 6 conforme
discutidos a cima, pois 51% dos alunos firmam que os conteúdos aplicados na
lvi
Educação Física são significativos para o cotidiano, sendo que mais de 70%
destes anseiam por outros conteúdos da Educação Física, também
relacionados com a saúde. E no gráfico 8 mais de 50% dos alunos (reunindo as
valores do conteúdos que não são importante para o cotidiano) afirmam que
todos os conteúdos aplicados pelo professor não ser importante para o dia-adia.
Durante a aplicação do questionário, e alguma conversas com alunos
durante a observação, percebe-se na fala dos alunos certa complacência para
com a relação professor-aluno, onde o aluno gosta do professor, pois não
obriga ou impõe nada durante a aula e o professor se sente acomodado com a
situação na aplicação das aulas, através do método aula livres.
Portanto acredita-se que estes fatores podem estar relacionados com os
resultados, do gráfico 7, onde 51% dos alunos afirmam ser os conteúdos
aplicados pelo professor ser significativos para o aprendizado da prática de
esporte, conhecimento de noção de saúde. Também é possível afirmar este
fato, por que algumas das justificativas dizem não ser significativos os
conteúdos por que o professor só dar vôlei e futsal. Afirma-se esta hipótese
devido à constatação nas observações que estes conteúdos não são aplicados
sistematicamente, mais como um meio de lazer e recreação.
Enfatiza-se mais uma vez que o método utilizado para estas classes do
EJA não contemplam os princípios defendidos pela PCNEJA assim como
pedagogia de Paulo Freire, que enfatiza a necessidade de trabalharmos com
os conteúdos a partir significativos aos alunos. É certo afirmar que a não
adoção a esta prática contribui para a desmotivação dos alunos não só pela
disciplina, mas também pela educação como um todo estimulando os altos
números de desistências na EJA.
Gráfico 9
Gráfico 10
lvii
Diversidade Cultural na sala
Sexo
12%
44%
22%
Religião
Idade
22%
Não tem diversidade
significativa
As Diversidades Cultural dificultam a
aula de Educação Física
30%
70%
Sim
Não
Observação: As justificativas que afirmam que as diferenças atrapalham a
aula foram: só joga quem sabe, os alunos mais velhos não têm espaço na Educação
Física, cansaço físico, idade avançada (aluno acima de 40 anos diz que Educação
Física é bom só pra jovens).
De acordo com gráfico 9 na opinião de
44% dos alunos não há
diversidade cultural na sala de aula, acredita-se que esta resposta pode não
estar relacionada com o que de fato estamos discutindo, já que os alunos não
entendem com profundidade a relevância da diversidade cultural e também
quando se trata de diversidade cultural abre-se uma amplitude de
possibilidade. No entanto é importante considerar a percepção destes quanto
às diferenças em relação à idade, pois podemos supor, ou entender nas
entrelinhas desta resposta, que se há percepção da diversidade fatores
positivos ou negativos quanto à relação pessoal podem fazer com que esta
seja percebida.
Até por que esta questão das dificuldades de práticas
pedagógicas que atendam as diferenças de idade na EJA são focos de
discussão no mundo acadêmico.
Confirma-se
a
subjetividade
com
que
esses
gráficos
sejam
interpretados, quando atentamos para leitura do gráfico 10, onde 70% dos
alunos afirmam que as diversidades culturais não dificultam as aulas de
Educação Física, pois como foi constatado na observação há sim problemas
relacionados à participação de mulheres nas aulas, assim como o pouca
lviii
participação de adultos nas mesmas. Portanto volta-se a questionar a
existência de complacência nas interações professor-aluno quanto à aplicação
da disciplina.
Não é possível encontrar nenhuma característica do multiculturalismo
crítico nesta prática, pois há ausência de percepção das diferenças em que
qualquer grupo apresenta, assim com a falta de criticidade quanto realidade ou
posição em que vivem (submissão e conformismo pelos conteúdos oferecidos
pelo professor) indicam o baixo nível de anseios de mudanças, de reação,
libertação da obscuridade de conhecimento, percebidos na fala, ações e
respostas dos alunos.
Gráfico 11
Gráfico 12
Preconceito e Desvalorização
10%
Respeito das diferenças entre os
alunos nas aulas de Educação
Física
50%
50%
90%
Sim
Sim
Não
Não
Obs. (Gráfico 11) Todos os alunos que responderam que sofreram algum tipo de
desvalorização ou preconceito afirmam que foi provocado por outros alunos.
Encontra-se mais uma vez uma contradição nas respostas dos alunos.
No gráfico 11, 90% dos alunos afirmam não ter sofrido nenhum tipo de
preconceito ou desvalorização, mas no gráfico 12, 50% afirmam que não há
respeito às diferenças entre os alunos. Subtende-se mais uma vez que a falta
de conhecimento sobre os diversos tipos de preconceito ou desvalorização,
que podem estar interdito nas brincadeiras verbais ou não, nas falas e trato uns
com os outros durante um jogo, podem ter influenciado nas respostas dos
alunos.
Afirma-se tal hipótese quando relacionamos estes dados com as
observações das aulas de Educação Física, no qual foram identificadas várias
situações de agressividade, desrespeito e preconceito entre os alunos durante
a realização dos jogos.
lix
Portanto, enfatiza-se mais uma vez a necessidade de reflexação do
professor sobre que tipo de interações e concepções está sendo proporcionado
na aplicação destas aulas. Fazemos este questionamento, pois segundo o PPP
da escola a comunidade em que a escola está inserida permeiam violências,
furtos, drogas e outros problemas sociais os quais a escola é responsável pela
ampliação das capacidades humanas com o intuito de formar indivíduos autocríticos capazes de colaborar com a democracia social e sustentação de uma
sociedade mais justa.
Gráfico 13
Professor de Educação Física respeita as
difirenças culturais dos alunos
20%
Sim
Não
80%
Obs: As justificativas dos alunos quanto o respeito do professor pelas
diferenças culturais:
Sim: trata todos iguais, não obriga os mais velhos a fazer Educação Física,
todos os alunos podem participar, não destrata ninguém.
Não: Não conversa com todo mundo igual, dar mais atenção para as mulheres,
só joga quem sabe.
Mais uma vez é conveniente afirmar que a pergunta proposta para os
alunos tem sido tratada de uma forma diferente do foco de discussão, pois os
alunos os dados dos gráficos divergem com os dados coletados na entrevista.
80% dos alunos afirmam que o professor respeita as diferenças, acredita-se
que muitos alunos referiram suas resposta quanto ao trato relacional que o
professor tem com os mesmo, já que na entre as justificativas os alunos afirma
que o professor não destrata ninguém e nem obriga a participação nas aulas.
De fato durante as observações foi constatado que o professor trata os alunos
sem qualquer agressão ou depreciação, é calmo e paciente, assim como tem
uma boa amizade com os alunos.
No entanto, quanto ao método utilizado na aplicação das aulas não é
conveniente afirmarmos isto, pois como as aulas são livres, sendo os jogos e
lx
esportes utilizados como recreação e lazer, conseqüentemente só a
participação dos alunos com mais habilidades e mesmo assim se torna de fato
desmotivante à participação dos alunos mais adultos que além de não ter mais
tanta habilidade com alguns jogos também estão cansados de ter trabalhado
durante o dia.
Gráfico 14
Motivo que estuda na EJA
Não teve oportunidade quando
criança
32%
Não aproveitou na idade certa
11%
Objetiva conseguir melhor
emprego
33%
8%
16%
Reprovação
Desistência
Como esta pergunta foi aberta deu margem há mais de uma
interpretação, alguns responderam suas pretensões em estudar na EJA outros
descreveram os motivos que contribuíram para que eles estejam estudando na
EJA.
Considera-se relevante analisarmos o que contribuiu para que estes
alunos estejam estudando na EJA. Conforme podemos observar 33% dos
alunos afirmam ter sido por causa da reprovação e 32% por desistência, tais
fatores nos fazem refletir sobre a situação atual da educação não só do estado
mais também do nosso país.
O que percebe-se é que os problemas sociais continuam a interferir na
melhoria da educação regular e o Estado apesar do “esforço” não estão de fato
conseguindo resolver tais problemas, com isso as escolas mantêm-se omissa
aos seus verdadeiros objetivos, onde os profissionais capacitados preferem
utilizar práticas cômodas, que apenas reproduzem os objetivos da classe
elitista, fomentando o desenvolvimento de adultos mais sujeitos a opressão
ideológicas da sociedade vigente. Tais fatores colaboram para que a cada ano
mais jovem desistam das da educação regular ou se matriculem na EJA devido
inúmeras reprovação e fracassos. O que contribui ainda mais para a decadente
lxi
situação desta modalidade de ensino é a simples redução dos conteúdos sem
vínculos significativos para esta clientela desenvolvidos através de práticas
descompromissadas com a aplicação de conhecimentos políticos culturais.
5.3 Apresentação dos dados e análise da observação das aulas de
Educação Física da EJA
5.3.1 Metodologia de ensino utilizado nas aulas de Educação Física
Em todas as séries o professor aplica as mesmas estratégias, distribui a
bola (de vôlei ou futebol de acordo com o desejo dos alunos), arma a mesa de
ping-pong, organiza os tabuleiros de dama e xadrez, nestas prevalece o lazer e
recreação.
O método utilizado pelo professor apresenta algumas características da
abordagem de aulas livres, no entanto é possível verificar que nenhuma aula é
planejada para atender qualquer dos objetivos que sejam, pois não está
presente nenhum tipo de mediação de conhecimento. Apenas o professor
disponibiliza os materiais e os alunos escolhem o que quer usar.
Esta prática nos remete relaciona-la as ações do capitalismo vigente em
nossa sociedade, o qual nos “oferece” “tudo”, os que detêm o poder quer, e o
“povo” apenas aceita sem nenhum tipo de contestação devido à comodidade,
ou sem outra opção, dos produtos que nos são “impostos”.
As relações fomentadas por esta prática de ensino é o posto que Paulo
Freire propõe, pedagogia em que se apóia a PCNEJA, uma educação
libertadora, crítica, consciente que não pode se limitar às relações do grupo
mas que necessariamente se apresentam na tomada de consciência, no
sentido oposto ao de uma educação para a submissão, mas uma educação
para a decisão, para a responsabilidade social e política.
5.3.2 Relação aluno-aluno (respeito às diversidades/princípios
morais)
Como as aulas são aplicadas através de métodos livres as interações
dos alunos variavam de acordo com a turma.
Nas salas em que havia alunos que saiam bem no futebol ou no vôlei só
aquele grupo jogava, durante toda a aula o jogo tornava-se uma disputa
lxii
acirrada. A interação entre eles era sempre de depreciação uns aos outros, se
tratavam por palavras de baixo galão como “pega otário”, “zé ruela”, “respeita
safado”, todas estas palavras eram citadas quando os alunos ganhavam uma
certa jogada, zombando uns dos outros. Essas falas sempre eram num tom de
superioridade para mostrar que era o melhor, mas através de “brincadeiras”.
Nestes jogos os próprios alunos combinam as regras e arbitram o jogo
sem a interação do professor, e a maior parte dos alunos era sempre do sexo
masculino. Só jogavam as meninas que sabiam muito bem.
Na arquibancada enquanto assistia uma destas aulas, conversei com
uma aluna de idade adulta, perguntei se ela também gostava de jogar vôlei, ela
disse: “Gosto, mas não sei jogar direito e tenho medo de levar bolada, só joga
os alunos que sabem”.
“Tem vontade de aprender mais o professor não
ensina”. Neste momento o professor ia passando próximo e ela perguntou para
ele se ele a ensinaria, ele afirmou que ia conseguir outra bola para ensiná-la ao
lado da quadra enquanto os meninos jogavam.
Nas turmas em que os alunos não tinham tanta habilidade com vôlei ou
tinha pouco homem para fazer a partida de futebol, as brincadeiras era de vôlei
em rodinha, ou jogo de futsal sem disputa séria. Nestas a participação de
mulheres eram quase iguais as dos homens, mas sempre surgia uma piadinha
dos meninos para as meninas, desvalorizando-as nas habilidades.
Para ter a oportunidade de jogar as mulheres (jovens e adultas) corria a
frente dos meninos, se posicionavam na beira da quadra, tiravam as sandálias
e já gritavam “vou jogar!”, durante todo o jogo para não ficar de fora tinham que
se impor, “peitavam os homens”, sempre tinham que se sair melhor para não
se colocadas para fora do jogo.
Uma turma em que a maioria dos alunos era jovem, durante a
brincadeira de futsal, foi o momento em que observei uma cena de maior
descaso com as diferenças culturais. Nesta turma tem tinha um aluno com
problema de dicção (fanho), os alunos o chamam de Gago, ao chegar na
quadra este pede para participar e outros disseram:
- Que, Gago, sai fora tu é muito ruim!
E as meninas (mais popular da sala que também estavam jogando afirmam
emperrando o “Gago”):
- Sai, não vem perturbar a gente não!
lxiii
Tudo que o aluno “Gago” falava eles o imitavam como se tivessem
também com problema de dicção (fanho) e riam dele. O aluno fica meio sem
graça e vai sentar.
Depois os alunos, vêem que estava faltando um integrante, chamaram
ele (Gago) de volta para jogar.
Durante toda a brincadeira o aluno “Gago” tenta jogar o melhor, gosta de
participar, parece que precisa ser o melhor para estar entre “Os Melhores”.
O aluno “Gago” tenta tirar umas brincadeiras com uma das meninas, e
ela sempre o menospreza, bate nele, ignora, procura sempre mostrar com
ênfase para os colegas que não quer nada com ele, não quer aproximação. Ao
tratá-lo assim ri e olha para as colegas.
O “Gago” procura não falar ou se comunicar muito durante o jogo, pois
sempre que fala alguma coisa os alunos o imitam. Num certo momento duas
meninas (populares da sala) combinam e derrubam o “Gago”, depois riem dele.
No final do jogo este aluno se dirige até mim e pergunta o que eu to
anotando, e vai logo explicando, sem que eu falasse nada, “as meninas não me
derrubaram foi eu que caí sozinho meu sapato é liso, já sou maior de idade,
sou casado e só estava brincando com as meninas”.
Expliquei pra ele que estava fazendo uma pesquisa na escola sobre as
aulas de Educação Física. Começamos a conversar e ele falou um pouco da
sua vida.
Falou sobre sua infância, foi abandonado pela mãe, sofria com o
preconceito da madrasta e apanhava muito do pai. Falou que trabalhava, de
seus planos pensava num futuro melhor para ele e esposa. Durante suas falas
sempre enfatizava sobre sua honestidade, que não era bandido, nem usava
drogas.
Pedi que ele preenchesse um questionário para mim, mas ele disse que
sua letra era muito feia e que não ia responder, então pedi que ele
respondesse as perguntas e eu escreveria.
Na pergunta sobre se já tinha sofrido algum tipo de preconceito, primeiro
ele disse que não, depois ficou vermelho botou a mão na cabeça e disse que
sim sem querer assumir.
Durante a brincadeira de futsal que relatei acima, sobre o desrespeito
com um aluno com distúrbio de dicção, o professor fez apenas um comentário,
lxiv
quando os alunos se recusavam em deixar o “Gago” participar, falou com a voz
mansa: “Deixa ele jogar!”
Diante do relato exposto percebe-se que o método utilizado pelo
professor não possibilita a mediação do estímulo ao respeito às diversidades
culturais. Nestas aulas vê-se presente o espaço que contribui para as relações
submissão e superioridade, corroboram para a afirmação dos fracassos e
medos, onde os jovens e adultos (oprimidos, cheios de não saber de nada),
trazem consigo para este meio escolar. Percebe-se na fala dos alunos adultos
que assim como a escola a Educação Física é um espaço alheio onde estão de
favor. Afirma-se isto numa das falas dos alunos quando responde que a
“Educação Física é bom para os jovens”.
Apesar de no gráfico 12 ter mostrado em porcentagem que 50% dos
alunos afirmam a existência de falta de respeito às diversidades entre os
mesmos nas aulas de Educação Física as observações “falam mais alto”.
Embora as competências sociais no indivíduo já estejam sendo formadas a
partir dos seis anos de idade e os profissionais de Educação Física têm muita
responsabilidade
na
educação
das
mesmas,
identificamos
aqui
as
competências sociais como princípios e valores que precisam ser discutidos e
repensados de uma forma crítica. O aluno precisa perceber que muitas de suas
ações são estimuladas pelas influencias sociopolíticas (capitalismo) que
objetivam “amara-los” de forma a minimizar suas autonomias morais.
Portanto, considera-se que as aulas de Educação Física não
possibilitam a aplicação dos princípios pedagógicos (diversidade cultural,
inclusão e transversalidade trabalhados pelos conteúdos atitudinais) que
norteiam a PCNEJA, assim como não contribui para as necessidades
sociopolíticas identificadas na comunidade pelo PPP da escola.
Tal cenário, de ampla diversidades, apresenta-se como ambiente ideal
para explicitação, discussão, reflexão e aplicação de atitudes e valores
considerados éticos ou antiéticos para si e para os outros. Além da intervenção
no momento oportuno, cabe ao professor de Educação Física a construção de
formas operacionais e contextos pedagógicos para que valores relacionados ao
princípio da dignidade humana e construção de autonomia moral sejam
exercidos, cultivados e discutidos no decorrer das práticas escolares.
lxv
5.3.3 Relação professor-aluno (respeito às diversidades/princípios
morais)
O professor sempre se omitia nas interações, só intervia em último caso.
Sempre usava a voz em som baixo e nunca se alterava com os alunos. Os
alunos o respeitavam, mas quase sempre a opinião que prevalecia era dos
alunos. Sua interação era mais freqüente com as mulheres.
5.3.4 Conteúdos Aplicados
Como as aulas era livre, ou recreativa, sempre os alunos jogavam vôlei,
futebol, xadrez, dama e ping-pong. E de acordo com as respostas dos alunos
na questão 9 do questionário o professor não passa nenhum tipo de trabalho,
ou seja, as aulas se resumem apenas os jogos recreativos.
De acordo com o próprio professor na entrevista os alunos são avaliados
apenas pela presença.
Durante a observação foi constatada a preocupação dos alunos em
responder a chamada feita pelo professor, assim que alguns alunos
respondiam iam embora ou voltavam para a sala de aula.
Dentro desta situação podemos identificar a displicência com os dois
elementos fundamentais na Educação de Jovens e Adultos na Educação
Física, o conteúdo e avaliação.
No referencial teórico foi fomentado por diversos autores a importância
de trabalharmos os conhecimentos significativos através de diálogo e
criticidade para que a prática pedagógica possa contemplar o multiculturalismo
crítico. Em nenhum momento foi afirmado no referencial teórico, tanto das
citações dos autores que abordam o multiculturalismo quanto à prática
pedagógica de Paulo Freire e do Sócio-construtivismo os quais a PCNEJA está
embasada, a não importância sobre os conhecimentos. Ao contrário sem
conhecimento é impossível à reflexão, a crítica, a libertação/superação das
ideologias impostas.
A PCNEJA ainda enfatiza o cuidado que o professor deve ter em
selecionar os conteúdos para a EJA, pois sua relação com o conhecimento é
muito distinta daquela de crianças e adolescentes que cursam o Ensino
Fundamental.
lxvi
O jovem e o adulto são cidadãos mais conscientes acerca da
falta de alguns conhecimentos das diferentes disciplinas; ao
mesmo tempo, são sujeitos que já põem em ação
conhecimentos construídos ao longo da vida, inclusive a serviço
da tarefa profissional. (PCNEJA 2002, 118)
Como já foi mostrado no gráfico 5 e 6 os alunos sabem da importância
da Educação Física na escola é tanto que almejam por conteúdos de acordo
com suas necessidades, atividade física e saúde. Portanto, pode-se afirmar
que os não estão sendo aplicados conteúdos de acordo com as necessidades
dos alunos, assim como a forma com que os conteúdos são trabalhados não
propiciam nenhum acréscimo de conhecimento impossibilitando-os de refletir,
analisar, dialogar e criticar suas ações na sociedade.
5.3.5 Motivação dos alunos nas aulas
A participação dos alunos nas atividades era de acordo com as
habilidades, os que sabiam e gostavam de jogar sempre jogavam com
entusiasmo. Nas turmas que tinha alunos mais jovens ou alunos de mais idade
que não tinham tanta habilidade com as brincadeiras, estas não eram tão
duradouras, começavam a jogar e logo depois paravam (alguns alunos já não
respeitavam as regras e começavam a bagunçar).
5.4 Análise do Projeto Político Pedagógico da Escola Bela Vista e
espaços do multiculturalismo na EJA
Com o intuito de investigar se os objetivos e metas da escola atentam
para o respeito das diversidades culturais através do Projeto (Projeto Político
Pedagógico), analisou-se através de leitura o referido documento da escola
relacionando-o com as concepções de multiculturalismo e diversidade cultural
discutidas no presente trabalho.
Destacam-se abaixo alguns tópicos do PPP que foi considerado
significativo para tal análise, para que posteriormente faça-se uma relação com
as práticas pedagógicas do professor de Educação Física e as possibilidades
multiculturais.
Ao analisar o PPP da Escola observa-se bem claro a descrição da
realidade da clientela, estas informações são muito importantes tanto para o
lxvii
professor de Educação Física como os de outras disciplinas, pois estas
possibilitarão que o professor conheça melhor os alunos com que está
trabalhando assim como suas necessidades educativas e elabore um
planejamento que possa respeitar as diversidades culturais possibilitando
também práticas que contemple o multiculturalismo crítico.
No tópico Contextualização Socioeconômica e Cultural diz: “No ensino
noturno e vespertino, há incidências de grande distorção de idade-série,
reprovação, evasão e desinteresse dos alunos pelos estudos e dos pais pelos
filhos que apresentam problemas na escola”. No próximo parágrafo é afirmado
que os profissionais da escola têm o desafio de buscar cada vez mais a
melhoria da prática pedagógica assim como melhorar as relações humanas,
dentro e fora da escola, com o intuito de difundir valores morais como respeito,
solidariedade, igualdade, cidadania e criatividade.
Esclarece-se, portanto que o Projeto Político Pedagógico é um
instrumento clarificador da ação educativa da escola e fundamental na
coerência e organização da prática pedagógica docente, pois é através dele
que é refletida a realidade da escola e do aluno em que o professor terá
subsídios para construir, refletir, avaliar, ressignificar e consolidar sua ação. A
Educação Física enquanto componente curricular da Educação básica deve
assumir sua responsabilidade de atuar e contribuir para a elaboração e
viabilização do Projeto Político Pedagógico da escola para que possa elaborar
suas práticas em consonância com a realidade e necessidade sociais, políticas
e culturais da comunidade em que atua.
No tópico Concepção da Escola percebe-se a preocupação com a
formação de cidadãos críticos, uma das características do multiculturalismo
crítico.
Escola que queremos:
Escola – Idealizamos uma escola aberta, um centro cultural
onde não apenas repassamos os conteúdos e saberes
historicamente acumulados, mas discutiremos questões
políticas, conhecimentos gerais, manifestações culturais,
cidadania e outros assuntos que permitam o diálogo e o
desenvolvimento da crítica. Deve ser uma escola uma ofereça
que ofereça qualidade de ensino e serviços prestados,
adequada às necessidades do aluno, a partir de sua realidade.
Currículo – muito além de um rol de conteúdos básicos para
cada série e disciplina, deve ser flexível, constantemente
avaliada revista e enriquecida com conhecimentos que
lxviii
favoreçam o desenvolvimento cognitivo e social dos nossos
alunos.
Aluno – Ativo, participativo, crítico, consciente de seu papel na
escola e na sociedade e da importância de sua participação no
processo de construção de seu saber.
Professor – Como mediador do processo de conhecimento do
aluno, deve ter competência técnica, dinamismo, manejo das
relações interpessoais e conflito, domínio de conteúdos e
metodologias de ensino, flexibilidade e boa disposição.
Para alcançar tais concepções a escola traça como Missão “Garantir o
acesso e permanência dos alunos na escola, oferecer uma educação de
qualidade, conscientizando-os sobre o exercício da cidadania e tornando-o
capaz de agir na transformação da sociedade”.
Priorizando as seguintes necessidades:
Melhorar o processo de ensino e aprendizagem dos alunos,
incrementando a avaliação e a utilização de recursos
pedagógicos. Realizar reuniões pedagógicas para troca de
experiências, planejamento e prática docente. Fomentar
metodologias participativas das aulas, com maior envolvimento
dos alunos e de sua família, promover eventos da integração
com a comunidade interna e externa.
É ressaltado também no documento que a proposta é constituída por
ementas, que estão embasadas na Matriz Curricular do Ensino Fundamental e
nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
Diante do exposto pode-se afirmar que o PPP da escola aponta
preocupações com as diferenças culturais, pois investigaram a realidade e
necessidades da comunidade no qual está inserida, assim como idealiza uma
escola que contemple o respeito às diversidades culturais apontando metas
que incentiva práticas docentes com características do multiculturalismo crítico,
quando diz que os docentes procuram difundir através de suas práticas valores
morais,
respeito,
solidariedade,
igualdade
através
de
metodologias
participativas capazes de formar cidadãos críticos capazes de agir na
transformação da sociedade.
Como foi citado no referencial teórico o currículo, que deve ser
construído de acordo com o PPP da escola, deve ser um espaço que propicie
lutas em torno dos diferentes significados sobre o social e político, tais
processos subsidiam a construção do processo de ensino aprendizagem
baseado nos princípios multicultural crítico. E conforme as informações
declaradas no PPP da escola estudada evidenciam-se a urgente necessidade
lxix
de práticas pedagógicas embasadas no multiculturalismo crítico, um trabalho
que só pode ser desenvolvido com o trabalho em equipe através de uma
1
Gestão Participativa comprometida com o desenvolvimento socioeconômico,
político e cultural da comunidade escolar.
5.5. Apresentação dos relatos e análise da entrevista com o professor de
Educação Física
As perguntas do roteiro de entrevista foram agrupadas de acordo
com o tópico de discussão, e as principais respostas do professor foram
transcritas para melhor análise e discussão dos resultados.
5.5.1 Informação Profissional
Ano de Formação: 1992
Tempo de Serviço na EJA: 4 anos
Instituição
de formação: UNIR
5.5.2 O Projeto Político Pedagógico e sua influencia na prática
pedagógica multicultural do professor de Educação Física
Segundo o professor o Projeto Político Pedagógico da escola não
influencia nas suas aulas, pois não participou de sua elaboração, assim como
não faz Plano de Curso. Para elaborar suas aulas leva em consideração
apenas a disponibilidade de material na escola. Não faz planejamento de
ensino, mas apenas roteiro de conteúdos. Afirma ainda que não tem condições
de trabalhar de acordo com as orientações do PPP devido as dificuldades de
estruturas da escola como falta de portão na quadra e material desportivo.
Observa-se até o momento a falta de conhecimento das orientações do
PPP e sua influencia na elaboração do seu plano de ensino. Sabe-se que o
PPP é o documento de identidade da escola. Neste contém a contextualização
socioeconômica e cultural da escola, está descriminado quem são estes alunos
da EJA, quais os principais problemas da comunidade escolar, principais
objetivos pedagógicos e metas traçadas para alcançar estes objetivos. É
1
(...) Gestão educacional corresponde ao processo de gerir a dinâmica do sistema de ensino como um
todo e de coordenação das escolas em específico, afinado com as diretrizes e políticas educacionais
públicas, para a implementação das políticas educacionais e projeto político da escola. Compromissado
com os princípios da democracia e com métodos que organizem e criem condições para um ambiente
educacional autônomo (soluções próprias, no âmbito de suas competências) de participação e
compartilhamento (tomada conjunta de informações) e transparência (demonstração pública de seus
processos e resultados) (Lück 2006, p.35-36).
lxx
através destas informações que o professor poderá fazer o plano de ensino de
forma a atender as necessidades reais da comunidade que está atendendo.
Conforme analisado no parágrafo anterior o PPP da escola tem
claramente as informações necessárias que possam subsidiar o professor na
elaboração do seu plano de ensino, ainda pautado numa prática que respeite
as diferenças culturais e privilegie o multiculturalismo crítico.
De acordo com os resultados apontados pelos questionários aplicados
aos alunos aponta-se a necessidade da viabilização de planejamentos pautado
no PPP no sentido de buscar as mediações significativas entre o conhecimento
a ser desenvolvido e a realidade do aluno, pois observa-se que o professor usa
metodologias que propicia na participação das aulas apenas os alunos com
mais habilidades (alunos mais novos) e os alunos mais adultos (menos
habilidosos) encontram-se desmotivados a participar das aulas, não há espaço
de aprendizagem para estes.
Esta metodologia também não possibilita uma pedagogia que favoreça a
reflexão, a criticidade, diálogo dinâmico e construtivo, não há mediação do
saber e respeito às diferenças.
O planejamento docente fundamentado no PPP é essencial para
subsidiar as práticas pedagógicas que contemplem uma perspectiva dialética e
multicultural crítica. Este deve levar em conta o aluno real e considerar a
totalidade do seu desenvolvimento (psicomotor, sócio-afetivo e cognitivo),
experiências anteriores (história pessoal).
5.5.3 Conteúdos aplicados na Educação Física e a diversidade
cultural na concepção do professor
Foi perguntado o que o professor leva em consideração na elaboração
dos objetivos e conteúdos o professor diz que “Tem que levar em consideração
a heterogeneidade da turma (faixa etária), pois independentes das séries tem
alunos, adolescentes, jovens, adultos e alguns já anciães, portanto eu tenho
que levar algum conhecimento teórico, algum conhecimento prático. Deixar
experimentar o que nós temos”. E cita o que faz em sua aula para respeitar
esta diversidade, disponibiliza diversos materiais como bola de futsal, dama,
baralho, xadrez, ping-pong e vôlei.
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Observa-se na fala do professor a fuga da responsabilidade de levar em
consideração na elaboração das aulas o respeito as diversidade, ele fala “tem
que levar em consideração” e não “eu levo em consideração”, para não admitir
que não elabore suas aulas com o intuito de respeitar a diversidade da idade
dos alunos, mas que ele sabe da importância do determinado dever. Tenta
justiçar-se em sua fala que o método utilizado, aula livre, respeita às diferenças
de idade, e que atende as necessidades das turmas com os materiais citados
por ele.
Em outra pergunta semelhante indagou-se o seguinte: como organiza os
conteúdos diante das diferenças de idade e diversidade cultural? O mesmo
afirma que não leva em consideração a diversidade cultural para elaborar suas
aulas, devido às dificuldades de estrutura da escola, como portão da quadra
aberto e falta de materiais esportivos adequados. Elabora suas aulas de acordo
com os materiais disponíveis, quando não tem dá um jeito e arruma, já chegou
até trazer alguns materiais seus.
Quando foi perguntado se percebia uma considerável diversidade
cultural nas turmas da EJA encontram, percebe-se que o professor percebe as
diferenças de uma forma mais comum sem relacionar com as questões sóciopolíticas que permeiam a educação. Não cita a idade como diversidade
cultural, na sua visão as diferenças está nas pessoas que vem de estados ou
regiões diferentes, que tem suas preferências de ritmo e músicas diferentes, de
acordo com sua fala estas diferenças foi identificado por ele quando introduziu
no ano passado a dança em seus conteúdos.
Esta metodologia utilizada pelo professor não contempla com o que é
sugerido no PCNEJA, o qual deixa claro a importância da aplicação diversidade
de conteúdos de formar a contemplar o aprendizado conceitual, procedimental,
e atitudinal, assim como a interação e construção do saber, defendido pela
perspectiva construtivista. A prática utilizada não atenta para atender as
necessidades dos alunos, quanto à significância dos conteúdos para a vida dos
alunos e o desenvolvimento do senso crítico das situações concretas dentro e
fora da escola.
Fortalecemos estas justificativas através da resposta do professor
quando perguntamos de que forma professor tem colaborado em suas aulas
com o intuito de formar cidadãos mais críticos e conscientes quantos suas
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relações sociais, o professor responde que “nunca tinha pensado nisso e que a
partir deste momento pode começar a pensar sobre o desenvolvimento da
criticidade dos alunos através dos seus conteúdos”. Explica que os alunos
fazem comentários aleatórios e sem conhecimento do algumas questões do
desporto com um olhar crítico. Afirma que a partir de agora pode passar mais
conhecimentos mais aprofundado sobre o desporto e isso poderá contribuir
para que os alunos fiquem com uma crítica mais apurada.
Percebe-se na fala do professor a admissão da não aplicação de
conteúdos sobre os esportes aos alunos assim como não colabora para a
formação de discentes mais conscientes e críticos quanto aos conhecimentos
da Educação Física.
Foi perguntado ao professor se os conteúdos por ele aplicados têm sido
significativos/relevantes para dia-a-dia do aluno, o professor diz: “Sim, pra mim
o significativo é que eles cumpram regras, diminuam as agressividades,
diminuam os desrespeitos um pelo outro, que saibam perder, que são
desenvolvidos principalmente no futsal, conteúdo que os alunos mais gostam”.
Percebe-se nas respostas do professor o conhecimento da realidade e
necessidades dos alunos quanto os aspectos sociais, assim como o nível de
conhecimento dos conteúdos da disciplina, no entanto, o professor prefere
afirmar que o método utilizado por ele, aula livre, podem contemplar todas as
questões levantadas a respeito da significância dos conteúdos, criticidade e
respeito às diversidades.
O professor afirma respeitar as diversidades dos alunos “Quando se
depara com os alunos com mais de 30 anos e que já o deixa em condições de
desfrutar da dispensa a aula prática, não questiona a ausência do mesmo nas
aulas, assim acontece no caso de alunos adventistas, não exige sua
participação nas sextas e não o trata diferente por isso. Assim como os alunos
que não querem participar das atividades oferecidas ele pede para que o aluno
experiente e se não gostar não forço o aluno, desta forma acredito que respeito
à diversidade dos alunos”.
O professor percebe a diversidade cultural como uma simples “liberdade
e direito de escolha que o aluno tem religião, maneira como vai agir, é o direito
de cada um ser como é, por isso ser respeitado, por isso não ser descriminado.
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Acredita que “com o avanço da globalização o respeito às diferenças tem
aumentado”.
Com as colocações do professor podemos concluir que sua concepção,
sobre diversidade cultural assim como o trato da mesma dentro da sua prática
pedagógica,
aponta
características
que
se
enquadra
dentro
do
multiculturalismo liberal. O professor reconhece a diferença entre os alunos e
as aceita como natural, ignorando as relações, os confrontos e desrespeito
pelas diferenças dos educandos uns com os outros. Ignora a importância de
trabalhar essas competências sociais, mal desenvolvidas, dentro de seus
conteúdos, e deixa os alunos reproduzirem ações de depreciação, submissão e
opressão disseminada pelo pragmatismo capitalista.
Percebe-se também que na concepção do professor qualquer ato de
liberdade de expressão é visto como democracia e respeito às diversidades
culturais, e que qualquer discussão que se faça com os alunos desenvolve-se
os aspectos da criticidade, conteúdos atitudinais fomentado na PCNEJA.
Esta visão social contraria a perspectiva em que a PCNEJA defende,
baseado no método Freiriano, que luta por um ensino de EJA em que a prática
pedagógica perceba que alunos e professores são sujeitos da educação,
produtores da cultura, através de uma educação com caráter emancipatório,
libertador, problematizador da realidade, no sentido oposto ao de uma
educação para a submissão.
É notório ver também a omissão do professor nas responsabilidades
quando o ato pedagógico, os quais contribuem para o não desenvolvimento
dos adultos e adolescentes nas suas competências cognitivas, sociais e morais
relacionados aos conteúdos das aulas de Educação Física. De acordo com as
citações de Paulo Freire no referencial teórico “quando o professor não tem
clareza sobre a quem está servindo ou opta pela neutralidade, está mesmo que
inconscientemente optando por um dos lados, neste caso, pela conservação”.
Portanto abre mão de uma educação problematizadora, que estimula a
criatividade e reflexão sobre a realidade, de modo a assumir o compromisso
com transformação social, como está projetada nas propostas do PPP da
escola em que atua.
Verifica-se, nas aulas de Educação Física da escola estudada, a
carência de práticas de “encorajamento para a multiplicidade de vozes,
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pedagogia dialogal, que pessoas vejam a si e os outros como sujeitos e não
como objeto” (MacLaren apud Moreira 1999, pág. 88).
Acredita-se que a ausência de ética e respeito mútuo pode estar sendo
influenciado
pela
não
mediação
das relações
e
também
pela
não
sistematização dos conteúdos de acordo com as aspirações dos alunos, pois
foi observado a desmotivação de muitos alunos nas aulas, tanto jovens como
adultos, assim como espaços de tempos ociosos que contribuem para
interações negativas.
Sem a promoção do conhecimento não há possibilidades para a
educação dialética e multicultural crítica, pois o indivíduo só pode ser libertado,
da opressão, através da aquisição do conhecimento, só podemos transformar o
que é vigente quando conseguimos entender, refletir e repensar a realidade,
passando consciência ingênua à consciência crítica, “é necessário o aluno
parar de apenas escutar e obedecer e rejeitar a hospedagem do opressor
dentro de si, que faz com que se considere ignorante e incapaz” (Paulo Freire
apud PCNEJA, 2002)
Considerando que está descrito do PPP que o documento estava
composto ementas embasadas nos Parâmetros Curriculares Nacionais, e
conforme analisado neste estudo a Proposta Curricular da EJA, que está
norteadas por perspectivas educacionais críticas, aponta-se a necessidade de
averiguar quais e como estão sendo desenvolvidas as ações pedagógicas pela
coordenação e administração escolar com o intuito de efetivar os objetivos e
propostas descritas no PPP da escola, já que as práticas do professor de
Educação Física não condizem com os mesmos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estudar, discutir e analisar os aspectos multiculturais nos Parâmetros no
Currículo e práticas pedagógicas da Educação Física da EJA, foi antes de tudo
uma realização profissional, já que durante todo o percurso de formação da
graduação e especialização as questões políticas e sociais da área sempre foi
para mim, pesquisadora e profissional da Educação Física, um anseio e prazer.
Portanto, o presente estudo traz um sentimento de satisfação e completude em
ter encontrado, no estudo sobre o multiculturalismo, um dos princípios
fundamentais para construção e consolidação da minha própria prática
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pedagógica. Visto que sempre é angustiante, cada vez que parto para pesquisa
de campo, se deparar com práticas pedagógicas que negligenciam os
problemas políticas, sociais e culturais presentes nas instituições de ensino do
nosso país.
Nesta pesquisa não foi diferente, conforme os dados coletados e
analisados foram possíveis constatar que o método utilizado nas aulas de
Educação Física, na escola pesquisada, não está contribuindo de forma
positiva para a formação de jovens e adultos providos de uma educação
multicultural crítica. As práticas utilizadas não mediam a formação de discentes
auto-críticos, que se identifique como sujeitos da história vigente, capazes de
identificar, compreender, respeitar as diferenças culturais e almejar transcender
qualquer imposição ideológica que favoreça a opressão.
Identifica-se na prática pedagógica docente a incoerência dos objetivos
e perspectivas traçadas pela Proposta Curricular Nacional da EJA, de acordo
com que sugere os conteúdos (atitudinais, procedimentais e conceituais) que
conforme constatados, apontam subsídios necessário para uma prática da
Educação Física embasadas no multiculturalismo crítico.
A não seriação destes conteúdos, propostos na PCNEJA, é vista como
forma de respeitar o tempo, o ritmo e as experiências, oportunizando diferentes
ofertas, dentro da modalidade EJA, na perspectiva de atender às várias
realidades de vida dos educandos possibilitando desta forma a autonomia da
comunidade escolar. Desta forma o projeto político-pedagógico de cada escola
pode ser construído tendo como parâmetros as reais necessidades apontadas
de acordo com o diagnóstico sócio-político e econômico, considerando as
diversidades dos sujeitos envolvidos no processo educativo.
A PCNEJA está embasada pela pedagogia de Paulo Freie, o precursor
das
políticas
educacionais
voltadas
para
a
libertação
da
opressão,
característica dada pelo autor os educando da EJA sempre foi enquadrado no
meio educacional. Tal pedagogia aponta meios para a promoção de uma
prática pedagógica mais democrática, em que os conhecimentos aplicados aos
alunos atentam aos seus anseios e necessidades políticas, sociais e culturais
viabilizando a problematização da realidade social.
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Por meio desta perspectiva o profissional de Educação Física encontrará
subsídios para fundamentar suas aulas de forma com os alunos sejam capazes
de conhecer e compreender a própria cultura corporal, suas necessidades e
limitações bio-psicosocial, assim como ter uma visão mais crítica da
“percepção de corpo” produzido e imposto pelos anseios capitalistas da
sociedade contemporânea, sendo capaz de identificar, compreender e conviver
com as diferenças.
Portanto, percebe-se um emaranhado de controvérsias nas falas e
ações dos alunos e professor, assim como a prática do mesmo com a PCNEJA
e os objetivos, metas e estratégias do Projeto Político Pedagógico, que busca a
democratização e uma educação consciente no processo de ensino
aprendizagem.
No entanto, é incorreto apontar o docente da disciplina como único
responsável para a situação vigente, nosso olhar não deve se limitar como as
concepções de ensino conservadoras, que ver a solução dos problemas sociais
de dentro da escola para fora. Mas devemos analisar esta situação como um
todo, indagar, refletir e pesquisar o que a administração e coordenação desta
escola têm feito para contribuir para a melhoria da prática pedagógica deste e
dos demais profissionais que atuam na EJA, de forma a viabilizar as ações
propostas no PPP e a PCNEJA, já que de acordo com o documento da escola
afirma está composto por ementas embasadas na Matriz e Parâmetros
Curriculares Nacionais.
Assim como investigar em que perspectivas multiculturais os cursos de
formação de Educação Física, o qual este e a maioria dos docentes deste
município são formados, estão consolidando as práticas pedagógicas dos
profissionais que de lá saem habilitados para atuar em qualquer modalidade de
ensino.
Pesquisar e analisar também as Políticas de Ações Educacionais
promovidas pelo governo com o intuito de instruir os professores da EJA a usar
e colocar em prática as Propostas Curriculares da Educação de Jovens e
adultos.
Ressalta-se a necessidade de que os profissionais da Educação Física
atentem para a aplicação de conteúdos que contemplem todos os objetivos
capazes de formar indivíduos mais críticos e conscientes, um ser provido de
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corpo, cultura e cidadania que incorpore o multiculturalismo crítico em suas
ações cotidianas. E não permitir a Educação Física se perpetuação da forma
com que vem sendo usada no meio educacional ao longo do processo
histórico, como subproduto dos objetivos e manobras políticas do poder
capitalista.

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