A cozinha coreana quer conquistar o mundo — vamos provar kimchi?

Transcrição

A cozinha coreana quer conquistar o mundo — vamos provar kimchi?
Especial gastronomia
Yzakaya-Umai
A cozinha coreana
quer conquistar
o mundo — vamos
provar kimchi?
Alho, gengibre, picante — a
cozinha coreana é feita à base
de sabores intensos. Por isso é
muito mais próxima do gosto
dos portugueses do que outras
cozinhas asiáticas, diz Anna Lins,
do Yzakaya-Umai, a “taberna
japonesa” onde se pode descobrir
kimchi, bolgoki ou bibimbap.
Alexandra Prado Coelho (texto) e
Bruno Simões Castanheira (fotos)
D
e repente, começa-se a ouvir falar em cozinha coreana por todo o lado. Há semanas, no
festival gastronómico MadridFusión, um grupo de rapazes e raparigas
irrompeu pela sala antes de uma das
conferências distribuindo amostras
de Jang Sauce, o molho feito à base
de soja fermentada e que, através
do Jang Project, a Sempio, empresa
alimentar coreana especialista em
fermentação, está a tentar introduzir na gastronomia internacional.
Sendo “o ingrediente principal da
cozinha coreana”, o jang tem três
formas básicas: o ganjang (molho
de soja coreano, feito a partir de feijão de soja fermentado), o doenjang
(pasta de feijão de soja, também fermentado), e gochujang (a mesma
pasta, mas com malagueta vermelha
e sal). O objectivo é mostrar que o
Jang pode “adaptar-se e integrar-se
em qualquer outra cultura culinária”. Para isso, a Sempio trabalhou
com a Foundation Alicia espanhola
para criar vários tipos de Jang, em
pasta ou em líquido, com maior ou
menor intensidade de sabor, e que
se adaptem aos diferentes alimentos, estudando o que funciona melhor com carne, com peixe, cereais,
produtos lácteos ou verduras.
É uma autêntica ofensiva diplomático-gastronómica aquela que
Seul está a lançar. A estratégia foi
estudada há algum tempo, posta em
prática, e começa agora a dar frutos.
Um dos pontos do plano coreano
é precisamente o desenvolvimento
de marcas internacionalmente reconhecidas, explica Tae Hee Lee num
artigo intitulado Developing Policy
Strategies for Korean Cuisine to Become a Tourist Attraction. Outro é
“simplificar e explicar” os menus de
forma a torná-los acessíveis para os
não-coreanos.
O casal Paulo Morais e Anna Lins
— criadores do restaurante asiático Umai e, mais recentemente, do
Yzakaya-Umai — não tem nada a
ver com a estratégia pensada pelo
Governo coreano, mas há bastante
tempo que se interessa pela cozinha
coreana, e hoje serve no menu do
Yzakaya alguns pratos coreanos.
Foi isso que nos levou a bater-lhes
à porta para tentar perceber o que
é, afinal, o sabor da Coreia.
Exótica e intensa
Anna Lins, que nos recebe no
Yzakaya, mostra-se surpreendida
com a ideia de que a cozinha coreana de repente se tornou moda. Só
recentemente começou a aperceberse, através dos clientes do restaurante, que existia um interesse crescente em torno dela. Mas acredita que,
22 | FUGAS | Público | Sábado 2 Março 2013
curiosamente, é uma cozinha com
sabores que, para os portugueses,
não são assim tão distantes — pelo
contrário.
“Quando estávamos na Penha
Longa [no Midori] havia muitas vezes grupos de coreanos que iam lá
comer”, recorda. “Achávamos estranho porque eles gostam muito
da comida picante, e a comida japonesa é um bocadinho o oposto,
é muito suave, muito equilibrada. A
coreana é forte, intensa. Os clientes
coreanos geralmente comiam tudo
com pickles e pediam sempre o que
havia de mais picante.”
Os dois interessaram-se pela cozinha coreana — Anna fez mesmo
um trabalho de fim de curso sobre
ela — e foram percebendo que, “ao
mesmo tempo que é exótica e diferente, é muito parecida com a nossa,
a mediterrânica, a nível de sabores
intensos”. Os coreanos “puxam
muito o alho e o gengibre, e usam
muito o feijão na base dos temperos”. Anna acha curiosa a utilização
do alho, tendo em conta o passado
budista do povo, e sabendo-se que
“os budistas descartam tudo o que
é estimulante, incluindo o gengibre,
o alho, a cebola”. Por outro lado,
lembra, “a medicina chinesa atribui
ao alho alguns efeitos medicinais, e
os coreanos ainda utilizam muito a
medicina chinesa misturada com a
alimentação normal”.
A introdução dos pratos coreanos no Yzakaya tem sido gradual.
Para já, constituem cerca de 10% da
ementa, mas é provável que em breve essa percentagem aumente, porque “têm tido uma aceitação muito
boa”. Vejamos então o que há. A secção chama-se “kankoku ryori” — é a
expressão japonesa para dizer “pratos coreanos”, mas como yzakaya
é o nome que se dá a uma taberna/
casa-de-petiscos japonesa, Anna e
Paulo acharam que fazia sentido
usar o termo que se usa no Japão
para a cozinha coreana.
Em primeiro lugar, surge aquele
que é provavelmente o petisco mais
emblemático da Coreia, o kimchi (1,5
euros a dose mais pequena, 2,5 a
maior), descrito como “pickles de
couve chinesa ao estilo coreano”.
Mas sobre o kimchi há muito a dizer, e daqui a pouco vamos seguir