Leia a íntegra do artigo do ex-deputado e professor Hélio Duque.

Transcrição

Leia a íntegra do artigo do ex-deputado e professor Hélio Duque.
Os Barões ladrões e o Brasil
Hélio Duque
Nos Estados Unidos até 1865, final da guerra da secessão, a
aristocracia escravagista do sul tinha nos chamados Barões sulistas,
produtores de algodão e tabaco, os seus principais agentes econômicos. Nas
décadas seguintes seriam substituídos pelos novos barões da indústria e das
finanças. Formaram-se grandes grupos de monopolizadores, destacando-se
Rockefeller, Morgan, Vanderbilt, Gould e Hill, Harriman, Carnegie e outros.
Petróleo, estradas de ferro, siderurgia, sistema bancário, operavam como
monopólio daquelas famílias. A sociedade norte americana entendia que o
amealhar de riqueza, com o beneplácito e subsídio estatal, ofendia o espírito
igualitário e democrático fundamento da sua origem histórica trazida pelos
peregrinos do Mayflower. Sabotagens, coação, dumping eram praticas normais
desses grandes conglomerados familiares. Odiados pelo país inteiro, refletido
na literatura e nos jornais, eram chamados de “Barões ladrões”.
Eleito em 1901, presidente da República, Theodor Roosevelt, iria
transformar radicalmente essa realidade. Ganharia o apelido de “Trust Buster”,
espancador de trustes. Sabendo que o poder legislativo era controlado pelos
“barões”, estimulou jornalistas e escritores combativos a denunciar os ricaços e
suas negociatas, como uma ameaça à sociedade americana. A jornalista Ida
Tarbell, em 1904, publicava “The History of the Standard Oil Co.”, denunciando
os truques e ativa corrupção da empresa de John Rockfeller, que refinava 84%
do petróleo nos EUA. Roosevelt entrou com processo na justiça federal contra
a Standard Oil, acusando-a de monopolizadora. Ao final a organização foi
obrigada a dividir-se em 39 novas empresas. No setor de siderurgia, a United
Steel Co., monopolizadora das forjas de aço e nas estradas de ferro 74% eram
controladas por apenas seis grupos, a mão mesada de Theodor Roosevelt foi
fundamental para limitar o excesso de poder econômico desses conglomerados
familiares. A opinião pública, alimentada por revistas, jornais e notáveis
jornalistas foram os seus grandes aliados, ao denunciarem o Império da
corrupção que se formava. O Presidente Theodor Roosevelt, que estimulava
aquelas publicações, dizia ser a imprensa “os muckrakers”, que significa
“removedores de esterco”.
No Brasil contemporâneo, a imprensa vem cumprindo importante
papel histórico no desmascaramento de ilicitudes e “mal feitos” gerados pelo
governo e grupos privados de variáveis gradações. A corrupção triunfante
passou a frequentar o cotidiano dos brasileiros, graças ao trabalho dos jornais
e revistas investigativos. A cada semana o rol de malversação dos recursos
públicos e escândalos ganham nova dinâmica, com fatos escabrosos invadindo
a administração pública com personagens de velhos e novos carnavais da
corrupção. Perplexa, a sociedade queda-se na quase desesperança. Aponta o
desejo em 63% de querer mudanças, mas os atores políticos demonstram
timidez e não encaixam formulações objetivas nas propostas de transformação
mudancista apontada pelos brasileiros.
Recentemente o espetáculo doloroso que vem envolvendo a
Petrobrás na sua criminosa mutilação é exemplo acabado. Nos últimos anos, a
maior empresa brasileira foi esquartejada, aparelhada pela incompetência,
gerando um ciclo de “mal feitos” inédito na sua história. Não é de agora, mas
dos últimos dozes anos, quando foi transformada em palanque populista e
apêndice da política econômica. Não fosse a imprensa buscar a operação dos
desvios e negociatas e tudo continuaria como dantes no quartel de abrantes.
Exemplo: quando Lula da Silva assumiu a presidência, em 1º de janeiro de
2003, uma ação da Petrobrás era cotada a R$ 46,56. Para voltar a esse valor
teria de ter uma correção de 223%. Os acionistas minoritários, donos de 48%
do seu capital, tiveram as suas finanças confiscadas pela incompetência do
governo brasileiro. E mais: hoje a cada 30 dias, a empresa perde mais de US$
1 bilhão com importação de derivados.
A rigor, nos EUA, do início do século 20, o presidente Theodor
Roosevelt, teve na imprensa o grande aliado para remover esterco, no Brasil é
o próprio governo é o principal “alimentador dos estercos.”
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade
Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de
vários livros sobre a economia brasileira.