Mowrey cara
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Mowrey cara
As Externalidades do Projeto Zona Franca de Manaus numa Perspectiva Normativa: uma proposta de investigação 1 Antônio José Botelho Manaus ancora sua economia num enclave industrial moderno, porque sua operacionalidade está estruturada em capital e tecnologia exógena. Tal fato caracteriza seus cidadãos como filhos bastardos da era eletroeletrônica. Neste sentido, as evidências de seu crescimento econômico representam um presente de grego, pois, no limite, o Projeto ZFM é um “cavalo de Tróia”. As evidências das marcas transnacionais instaladas no PIM, a determinarem a divisão internacional do trabalho, obstaculizam a criação e o desenvolvimento de amazonidades, além de constituir possíveis argumentos futuros visando possessões amazônicas a exemplo das bandeiras nacionais fincadas na Antártica. Esta dependência política, confirmando o atraso industrial e tecnológico, tem origem na formação socioeconômica do Brasil e se mantém com o marco regulatório do Projeto ZFM. 2 O que poderia ser investigado? O Projeto Zona Franca de Manaus [ZFM] opera um processo de transformação na cidade de Manaus mediante crescimento econômico estruturado na atração de investimentos. Tal crescimento também traz contribuições para as atividades econômicas do seu entorno regional. Todavia, ao longo do seu tempo de existência, seu marco regulatório não foi capaz de sustentar 1 Reflexão decorrente do Projeto de Pesquisa de mesmo título apresentado ao Programa de Pós-Graduação Sociedade e Cultura na Amazônia, do Instituto de Ciências Humanas e Letras, da Universidade Federal do Aamazonas [Ufam], que eliminou este autor, na qualidade de candidato, do processo de seleção realizado em novembro de 2009 para o Curso de Doutorado versão 2010 na Linha de Pesquisa 3: Processos Sociais, Ambientais e Relações de Poder, cujo conteúdo programático é constituído de: Formas de poder utilizadas ao longo dos processos que determinam a constituição dos diversos modos de protagonismos políticos e de resistência social, cultural e ambiental na Amazônia; Políticas públicas e trajetórias institucionais, problemas de ordem filosófica, sociológica, política e jurídica; História e funcionamento das instituições, as relações macro e micro-físicas do poder; Relações internacionais de direitos e garantias individuais e coletivas. Foram suprimidos os tópicos relativos à Metodologia e ao Cronograma. Os demais tópicos [Definição do objeto e seus objetivos; Justificativa; e Referencial Teórico] foram juntados numa seqüência lógica à reflexão mediante pequenos ajustes de inclusão e exclusão de parágrafos. Após formular requerimento de reconsideração da desqualificação, a Comissão de Seleção ratificou a nota 6,0 (seis) com parecer de que o projeto não preencheu os requisitos de adequação às linhas de pesquisa do programa e de que não encontra exequibilidade de orientação. Apesar de acatar a soberania da Comissão, este autor discordou frontalmente com o entendimento de não aprovação, cuja nota mínima para continuar no processo de seleção seria 7,0 (sete), encaminhando Carta Aberta ao programa. Ambas, Petição e Carta, estão atachadas no site www.argo.com.br/antoniojosebotelho . 2 Abstração contida no livro do autor Redesenhando o Projeto ZFM [2006]. Não fez parte do Projeto de Pesquisa abordado na nota de roda pé acima, tendo sido adotada nesta reflexão a título de intróito, por representar o cerne de uma perspectiva tecnonacionalista que a permeará. um processo complementar de criação de firmas que sinalizasse para uma equivalência de dinâmicas socioeconômicas. Pode-se identificar o processo relativo ao Projeto ZFM como de cathing up, 3 na forma de um enclave industrial moderno, que exige uma capacitação tecnológica tardia. Por hipótese verdadeira, deve-se estabelecer um ideário de desenvolvimento baseado em amazonidades de caráter restrito ao conceito concebido por Armando Dias Mendes [2001; pgs. 82-88], como vetores do que se poderia denominar de growing up. Os conceitos negritados foram desenvolvidos por este autor em Redesenhando o Projeto ZFM [2006; pg. 191 e nota de roda pé n° 154, respectivamente] e os sublinhados nas sínteses-reflexões intituladas Raciocinando por fora do pensamento único: evidências subjetivas de uma esquizofrenia histórica [2008; nota de roda pé n° 21] 4 5 e Tio Sam pelo Tio Sam: a fronteira tecnológica conquistada [uma busca por simetrias históricas em prol das amazonidades] [2008; nota de roda pé n° 69] 6. Tais conceituações estão reproduzidas a seguir: i. Economia de enclave industrial moderno: economia posta em um espaço (sub)periférico entendida como toda aquela que roda com capital e tecnologia exógenos, atraídos mediante vantagens competitivas estáticas (fundamentalmente incentivos fiscais), onde os lucros retornam aos donos do capital residentes em outras plagas e a tecnologia do chão de fábrica é inteiramente assimétrica com o chão da academia local, constituindo a passagem para uma economia auto-sustentada a construção de vantagens competitivas dinâmicas que oportunizarão não só a consolidação das firmas existentes mas, sobretudo, o desenvolvimento do empreendedorismo local a partir da emergência de empresas de base tecnológica, cujos produtos e processos estabeleçam sintonia com os insumos, os saberes e a cultura local (amazonidades para o caso dos locais do chão 3 Mais adiante, esse conceito será devidamente caracterizado com o exemplo da Coréia do Sul. Mas de plano, pode ser entendido como a busca da fronteira tecnológica pelos países em desenvolvimento, ou emergentes no jargão hodierno, significando a consecução do status de um país desenvolvido industrialmente falando a partir de firmas nacionais. Vale dizer, que esse desenvolvimento industrial está acoplado à conquista de conhecimento e de tecnologias aplicadas e correlatas vertidas a vários e distintos setores da economia. 4 Esta síntese-reflexão foi elaborada sobre o livro de Linsu Kim intitulado Da Imitação à Inovação: a dinâmica do aprendizado tecnológico da Coréia registrado nas Referências Bibliográficas desta reflexão. 5 Na verdade, o termo capacitação tecnológica tardia, conceituado adiante, já vinha sendo utilizado por este autor, como, por exemplo, na reflexão intitulada Inovação como fulcro de competitividade [2006]. Faltava-lhe, contudo, uma definição, efetivada em 2008. 6 Esta síntese-reflexão foi elaborada sobre o livro de David C. Mowery e Nathan Rosenberg intitulado Trajetórias da Inovação: a mudança tecnológica nos Estados Unidos da América no século XX registrado nas Referências Bibliográficas desta reflexão. 2 amazônico), enquanto estratégia de inserção positiva e inteligente no contexto da globalização contemporânea, assegurado o consumo local; ii. Capacitação tecnológica tardia: representa o esforço e resultado de aprendizado empreendido por local emergente e periférico em processo de “catching up” quando o conjunto de firmas que promove o crescimento econômico desse local é fundamentalmente de origem estrangeira e nacional. É o caso de Manaus cujo Pólo Industrial é constituído por multinacionais e empresas [nacionais] de capital não-local. Portanto, é a construção por parte do seu capital social [somatório de capital humano dos indivíduos e capital intelectual das instituições] de uma oferta tecnológica a uma demanda tecnológica [certamente sempre superior em função da fronteira tecnológica de alhures] que deriva de uma estrutura de produção resultante de políticas industriais e tecnológicas exógenas ao local periférico e emergente. Assim, nesse processo duplamente tardio [industrial e tecnológico] perde-se ou retarda-se a oportunidade da construção de um modelo de desenvolvimento que liberte politicamente e que promova a independência econômica desse local periférico e emergente [processo de growing up]; iii. Amazonidades: transformação de insumos e saberes da floresta amazônica em produtos (bens e serviços) e processos realizáveis ou realizados no mercado - sentido econômico resultante da aplicação de capital local (empreendedorismo) combinada com tecnologia limpa e endógena - sentido ideológico - condicionada por e ao mesmo tempo condicionando uma sustentabilidade sócio-ética-ambiental-ecológica - sentido civilizatório. O ideário, vertido à construção da liberdade política e independência econômica da Amazônia e imanente à lógica do desenvolvimento sustentável; iv. Growing up: deve ser entendido como o processo de criação de uma trajetória tecnológica alternativa a partir do acaso amazônico [amazonidades = transformação de insumos e saberes da floresta em produtos e serviços realizados no marcado], estruturada no desenvolvimento sustentável, enquanto perspectiva de um novo marco civilizatório. Portanto, como contraponto ao processo de catching up resultante do determinismo econômico que a fronteira tecnológica determina aos países em desenvolvimento. É importante observar a inter-relação existente entre os conceitos, como problematização de uma investigação vertida às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Ou seja: 3 Como fazer com que a interdependência dos conceitos de economia de enclave industrial moderno, de capacitação tecnológica tardia, de amazonidades e de growing up constitua os componentes da visão de futuro desejado numa percepção de cenário normativo para o desenvolvimento de Manaus, e por extensão para outros locais da Amazônia? Por um lado, economia de enclave industrial condiciona sinergicamente de forma negativa a capacitação tecnológica tardia. Por outro lado, growing up é o campo de ação das amazonidades, libertando-as sinergicamente de forma positiva. É claro que a capacitação tecnológica tardia, derivada da economia de enclave industrial moderna, pode e deve ser tomada como suporte, como externalidade positiva, devendo, contudo, migrar predominantemente para o processo de growing up vertido às amazonidades. A idealização dos quatro conceitos foi possível observando a realidade industrial e tecnológica objetiva de Manaus em confronto com as evoluções histórias e reflexões teóricas dos Estados Unidos e Coréia do Sul, obtidas com as sínteses-reflexões acima destacadas, cujos temas são correlatos à emergência do Sistema Manaus de Inovação [SMI], de um processo de desenvolvimento industrial e tecnológico auto-sustentado e à lógica da sustentabilidade [desenvolvimento sustentável]. Adriana Sbicca e Victor Pelaez [2006; p. 419] oferecem o tom de alerta para uma investigação vertida à lógica das Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa quando informa que, pelo fato da aprendizagem vinculado aos sistemas de inovação ser predominantemente interativa e socialmente imersa, esta não pode ser compreendido sem o envolvimento de instituições e do contexto cultural. Portanto, asseguram que a estrutura de análise de um sistema de inovação é sistêmica e interdisciplinar, na medida em que considera a influência de fatores institucionais, sociais e políticos, além de econômicos. Finalizam esse raciocínio argüindo que a transposição pura e simples de modelos para outros países ou regiões é impraticável, na medida em que cada sistema apresenta características que só se revelam ao longo de um processo histórico de formação. Todavia, uma investigação pertinente às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa objetivaria verificar a validade das concepções deste autor considerando a formação histórica recente de Manaus frente ao conceito de tecnonacionalismo abordado por Richard Nelson [2006]. Esse conceito que será adiante explorado, claro, não é totalmente aceito do ponto de vista da lógica capitalista transnacional, apesar e considerando que os Sistemas Nacionais de Inovação estão progressivamente perdendo parte de suas identidades. 4 Neste contexto, poder-se-ia enunciar o seguinte objetivo geral para uma proposta de investigação vinculada às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa: Estimar as bases tecnonacionais necessárias para o Sistema Manaus de Inovação com vistas a um processo de growing up ajuizando suas condições ambientais atuais. Desse objetivo geral, derivariam três objetivos específicos associados àquele objetivo geral: i) Avaliar a cultura do empreendedorismo, a estrutura de crédito e a dinâmica de inovação de Manaus; ii) Ajustar os marcos regulatórios relativos às Políticas Industriais e Tecnológicas à criação e consolidação de firmas locais; e, iii) Delinear um alvo móvel constituído de firmas locais observando a dimensão patrimonial do capital e da tecnologia. Este autor entende que a interligação dos conceitos já desenvolvidos associados ao mapeamento de um alvo móvel que possa melhor subsidiar as políticas públicas de cunho tecnonacionalistas para a construção no longo prazo de um capitalismo amazônico, considerando as condições de contorno estabelecidas nas argumentações teóricas que se seguem, constituiria no caráter de originalidade de uma proposta de investigação vinculada às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Por que seria importante realizar a investigação? A importância de uma investigação vertida às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa estaria centrada na oportunidade histórica que a humanidade vivencia com o paradigma e utopia do desenvolvimento sustentável. Ou seja, considerando a Amazônia como um imenso território sob a égide de Estados nacionais, o ponto de inflexão iniciada com a superação da era dos hidrocarbonetos que sustentou o desenvolvimento industrial e tecnológico dos países centrais, confere aos amazônidas a possibilidade de construção de um processo de growing up a partir das amazonidades, enquanto trajetória tecnológica alternativa. 5 As externalidades do Projeto ZFM podem e devem servir como vereda normativa para essa construção. Uma investigação sobre os objetivos retro delineados poderão ou não sugerir as trilhas dessa trajetória tecnológica alternativa. Com qual marco teórico a investigação seria realizada? Helio Jaguaribe [2001; 2v.; pgs. 614/615] conclui argumentação no contexto do desenvolvimento da civilização planetária em curso, após estudar o nascimento, apogeu e declínio das grandes civilizações deste mundo, de que junto aos esforços desenvolvimentistas – e o Projeto ZFM tem essa característica – deve-se enfatizar dois importantes requisitos adicionais para se superar com êxito o subdesenvolvimento, ou a condição de país emergente – e Manaus pode ser considerado um local emergente. O primeiro, diz Jaguaribe, tem a ver com a necessidade de atribuir a mais alta prioridade ao desenvolvimento cultural e educacional, mais ainda do que ao desenvolvimento econômico. Continua o raciocínio afirmando que, se no curto prazo o desenvolvimento econômico provoca um aumento do excedente social que permite importantes investimentos públicos e sociais – e é certo que o Projeto ZFM tem gerado importantes externalidades -, além de acelerar a reprodução do capital, no longo prazo o desenvolvimento econômico não pode ser sustentado sem um desenvolvimento cultural apropriado, e sofrerá os efeitos debilitadores de uma conduta cultural deseducada e irracional. Com efeito, que a lógica do processo de growing up como campo de ação das amazonidades, ajustado com a cultura do empreendedorismo, a estrutura de crédito e a dinâmica da inovação – fulcro do primeiro objetivo - oferecerá, no longo prazo, a sustentabilidade pertinente ao sistema capitalista para o desenvolvimento de Manaus. Nesse sentido, busca-se inspiração em Rafael Clemente [2008; pg. 248], para resgatar toda a força de Josef Schumpeter, 7 que utilizou a expressão metafórica “destruição criativa” para sintetizar todo o potencial de evolução do capitalismo na imagem da destruição do velho pela criação do novo, trazendo à tona seu caráter endógeno, a necessidade de sua visão no tempo, junto com o papel central das inovações, da criação de crédito e do papel do empreendedor e das firmas para consubstanciar o ideário normativo de desenvolvimento estruturado em amazonidades. Portanto, deve-se ajustar toda e qualquer política que reproduza o desenvolvimentismo, abrindo espaço para o desenvolvimento 7 O economista que pensou, na primeira metade do século XX, a inovação capitalista como fenômeno econômico, que transitou, sem perder a importância intrínseca, especialmente em locais periféricos, do empreendedor para os laboratórios firmas – notadamente das grandes - e destas para o conjunto de agentes institucionais dos locais que influenciam o desempenho da inovação tecnológica, caracterizando a perspectiva neochumpeteriana dos Sistemas Locais de Inovação. 6 autônomo e minimamente adequado ao jogo capitalista a partir das forças, da inteligência, da energia, do tempo e dos recursos locais. Para Clemente, a compreensão de Schumpeter, de que a inovação na forma da destruição criativa é a força motriz não apenas do capitalismo, mas do progresso material em geral e que suas preocupações centrais – inovação, empreendedorismo e criação de crédito – tiveram papel central na forma como a moderna história dos negócios foi formada, fornece a base para um desenvolvimento autossustentado de longo prazo, na visão civilizatória hegemônica de Jaguaribe. Se isso é verdade, podemos acreditar que essa seja então a base para o ideário normativo de desenvolvimento estruturado em amazonidades. O segundo ponto destacado por Jaguaribe diz respeito na medida em que a abertura não regulamentada do mercado ao processo de globalização – num processo de investigação pertinentes às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa representada pela transnacionalização das firmas e por pressuposto respectivos sistemas de inovação – pode ser fatal para o tecido da nação, destruindo-o e deixando em seu lugar apenas um mercado internacionalizado. Não resta dúvida que Manaus pode ser interpretada nesse momento histórico de consolidação do modelo mental do Projeto ZFM ou como sitiada ou como invadida, considerando os planos do capital e dos pacotes tecnológicos forâneos aportados nas plantas industriais incentivadas. Como fator de geração de externalidades, tudo muito bem, mas o processo de industrialização e de desenvolvimento tecnológico, ambos tardios, não deve obstruir uma trajetória tecnológica alternativa. E esse papel cabe fundamentalmente ao Estado e ao seu capital social pertinente, cuja consciência deve verter para a busca de uma autonomia e independência adequada e apropriada ao jogo capitalista albergado pela democracia moderna. Esta responsabilidade é sugerida por Milton Santos [2004; pg.206] ao adotar a reflexão de Jean-Benoit Zimermann que diz que os sistemas nacionais produtivos devem fazer face à dualidade com as estruturas industriais transnacionais, que resultam do desenvolvimento pelas firmas internacionais de seus espaços industriais de atividade em escala mundial, gerando mais-valia global e tendendo a criar espaços homogêneos no seio dos quais se impõe progressivamente sistemas de normas, de produtos, de procedimentos e de organização industrial. Ora aqui se interpõe e muito bem, o Pólo Industrial de Manaus [PIM], lócus principal de reprodução do Projeto ZFM. Sua atuação como forma de expansão do capital internacional a gerar dependência tecnológica, além de estar rigorosamente demonstrado por Santos, com a 7 equação de hegemonia que superou o sistema colonial com o de Estados modernos tardia, foi também ilustrada com singular clareza por Eric Hobsbawm [1995; pg. 275], quando destacada que grandes fabricantes de produtos eletrônicos começaram a globalizar-se a partir de meados de 1960, sendo que algumas delas pararam nas extraterritorialidades caracterizadas como zonas francas e Manaus, no interior da floresta amazônica, como destaca aquele autor, foi uma das primeiras. Botelho [2006; pgs. 286/287] relata que Marilene Corrêa da Silva [2000; pgs. 32/33], escudada em Ernesto Renan Mello de Freitas Pinto e Noval Benayon de Mello, demonstra a junção ideológica do Projeto ZFM com a instituição Superintendência da Zona Franca de Manaus [Suframa] a partir de formulações diretoras da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial [Onudi] quanto a decisões técnicas, organizativas, espaciais e legislativas das zonas francas. Portanto, Botelho apreende que a natureza filosófica original desse motor unitário de ação desenvolvimentista não tem origem nacional, muito menos local, mas foi adotado pela sua intelectualidade governamental nacional e pela sua elite política e técnico-gerencial local. Nesse contexto a adoção das externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa exige uma postura de Estado associada a uma elite política e técnicogerencial suprapartidária e com conhecimento de causa. Os amazônidas precisam oferecer uma resposta sistemática utilizando-se, como numa disputa de judô, que usa o próprio corpo do adversário para superá-lo, das externalidades do Projeto ZFM para construir sua fronteira tecnológica sinérgica a uma trajetória vertida à lógica do desenvolvimento sustentável, alocando o chão amazônico como laboratório para essa experiência civilizatória modelar. Santos [2004; pg. 338] nos sugere que os lugares do Mundo devem adotar essa arte guerreira, respondendo à ordem global, que busca impor a todos os lugares uma única racionalidade, de acordo com os diversos modos de sua própria racionalidade. Esta necessidade nos remete à reflexão do segundo objetivo específico de uma investigação vertida à lógica das Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Por sua vez, o terceiro objetivo específico apresenta fulcro no conceito de um alvo móvel para o conjunto de firmas locais frente aos desafios da inovação tecnológica no contexto neochumpeteriano. Margarida Afonso Costa Baptista [2000; pgs. 166/167] sinalizando condicionalidades básicas de uma política industrial com base neoschumpeteriana, caracterizou o alvo móvel da política como a possibilidade da internacionalização de redes de aprendizado 8 vinculadas às dimensões de determinada estrutura industrial herdada. Esta percepção sugere a possibilidade do conjunto de firmas locais do SMI se apropriarem de forma progressiva do conhecimento gerado com a emergência desse próprio SMI na lógica da ação transnacioalizada das firmas implantadas no PIM. A política então - e aqui há um cruzamento sutil com o segundo objetivo específico – deverá traçar trilhas normativas para as firmas locais estruturadas sob a égide das amazonidades construírem um processo de growing up. Baptista argumenta que é a contraposição entre as características da estrutura herdada e o alvo móvel que permite especificar melhor os contornos de uma política industrial, que sendo assim, este autor infere que o capital intelectual de Manaus deveria cuidar de elaborar em conjunto com uma política tecnológica sinergicamente acoplada. Sutilmente também se pode admitir uma identificação do aprendizado oportunizado pela estrutura herdada na concepção de Baptista com o conceito de capacitação tecnológica tardia desenvolvida por Botelho. Estas sutilezas poderiam ser devidamente testadas ao longo de uma investigação no contexto das Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Esta dimensão representaria uma originalidade nas políticas industriais e tecnológicas amazonenses. Botelho [2005] realizou uma primeira aposta nesse sentido com caráter preliminar na síntese-reflexão intitulada Elementos de Política Industrial de Cunho Neochumpeteriano para uma Economia Estruturada em Quase-Firmas. Quase-firmas representando as empresas forâneas instaladas no PIM. A contribuição acadêmica de Baptista constituiu um referencial teórico, uma vez que trata a concepção de políticas industriais e tecnológicas abordando a dimensão patrimonial das firmas num contexto de sistemas locais de inovação. Já o objetivo geral traz um conceito – tecnonacionalismo – que consubstancia a lógica do processo de growing up já trabalhado conceitualmente por Botelho. Em verdade, há também uma interação entre a visibilidade de um alvo móvel elaborado e desenhado com o conceito de tecnolonacioalismo, e claro com o ideário de growing up estruturado nas amazonidades. Conforme registrado anteriormente, esse conceito foi adotado de Nelson [2005; pg. 428], no ensaio Sistemas Nacionais de Inovação: retrospecto de um estudo, que descreve uma comparação dos sistemas nacionais de 15 países, incluindo todos os principais grandes industrializados orientados para o mercado, vários pequenos países com altos níveis de renda e alguns países de industrialização recente. Nelson, então, assegura que existe claramente um novo espírito que pode ser chamado de tecnonacionalismo no ar, combinando uma forte crença de que as aptidões tecnológicas de firmas nacionais são uma fonte-chave para o desempenho 9 competitivo com a crença de que essas aptidões são em certo sentido de caráter nacional, e que podem ser construídas através de uma ação nacional. Ora, a lógica do processo de growing up estruturado nas amazonidades como ideário de desenvolvimento se insere nesse contexto dimensional. Porém, deveremos superar a sina do tecnicismo vinculado à epopéia desenvolvimentista brasileira do século XX, ancorada no fulcro da política industrial de substituição de importações, 8reverberada no Projeto ZFM, para dar início, verdadeiramente, à saga amazônica vertida às amazonidades. Na realidade Nelson [2005; pg. 461] no tópico O que ficou dos Sistemas Nacionais de Inovação? daquele ensaio lança questionamentos em função da progressiva estratégia transnacional das firmas. Contudo, tal perspectiva não nega a necessidade de se criar em Manaus e na Amazônia um desenvolvimento endógeno, minimamente autônomo e interdependente. O mote da criação de um capitalismo amazônico está centrado no fato de que a Amazônia representa um dos três maiores capitais naturais do planeta Terra sob a égide de Estados nacionais, o qual alberga povos emergentes que precisam jogar o jogo democrático-capitalista em condições equânimes visando conquistar o bem-estar de sua gente de forma livre e independente, conforme já sugerido. O próprio Nelson ao argumentar sobre o que restará dos sistemas nacionais [basicamente, sistemas de educação, de pesquisas universitárias e de laboratórios públicos e outras infraestruturas públicas nacionais, como legislação, instituições financeiras, políticas fiscais e de comércio internacional jogando com as firmas transnacionais], coloca que, por certo, as pessoas e os governos terão que se acostumar a lidar com firmas transnacionais cujas matrizes estão no exterior. Aduz, contudo, que até agora nenhum país grande, que tenha conquistado o status de país industrializado e conquistado ou se aproximado da fronteira tecnológica, parece ter absorvido pacificamente este tipo de problema. Portanto, a substituição ou a inexistência de firmas nacionais, genuinamente nacionais, é um problema! O pior é que o Brasil se enquadra no conjunto de países em que as firmas residentes são consideradas nacionais, uma posição absolutamente subalterna. 9 No que concerne a Manaus e à Amazônia, pelo que representa no contexto do desenvolvimento sustentável quanto a oportunidades políticas e econômicas, isso é um problemão! 8 Uma perspectiva ampliada dessa trajetória de formação da estrutura de produção brasileira pode ser obtida em A Dinâmica do Aprendizado Tecnológico no Período de Substituição das Importações e as Recentes Mudanças Estruturais no Setor Industrial da Argentina, do Brasil e do México de Jorge Katz contido no livro Tecnologia, Aprendizado e Inovação, organizado por Linsu Kim e Richard Nelson, registrado nas Referências Bibliográficas desta reflexão. 9 A reflexão deste autor intitulada Ameaças e Oportunidades do Processo de Inovação [2005] denuncia esse equívoco! 10 A prosa é simples. No longo prazo, os Estados tornam-se frágeis frente às metamorfoses dos sistemas econômicos. Tomemos a experiência histórica da superação dos Estados aristocráticos para os modernos, quando a nobreza cedeu espaço para os burgueses e pequeno-burgueses. Portanto, nesta era da civilização planetária, que está em construção, a próxima grande transformação gerará cidadãos de primeira e de segunda categoria. Os países que tiverem suas próprias firmas e seu próprio conhecimento acumulado restarão no primeiro plano do foto histórica. Em caso contrário, os países que não as tiverem, albergarão cidadãos de segunda categoria. Um movimento tecnonacionalista na base do Projeto ZFM corresponderia uma resposta políticaestratégica ao denominador comum universal que Santos [2004; pgs. 191/192] titulou para caracterizar o novo sistema técnico surgido com a morte dos impérios vis a vis o surgimento de numerosos Estados nacionais. Os mercados eram nacionais e as diferenças eram compensadas pelas vantagens comerciais. A concorrência entre os países não tinha como base a tecnologia, mas a política comercial. A partir da segunda metade do século XX, surge o trunfo das técnicas baseadas na informação que revolucionam a economia e a política, que Santos chamou de capitalismo tecnológico. Adotar políticas públicas com fulcro explícito em amazonidades com ideário de desenvolvimento consubstanciado por um SMI tecnonacionalista é a indicação para a resolução da problematização da proposta de investigação ora exposta nesta reflexão. E não há tempo a perder. Guajarino [2006; pg. 138] ao estudar o processo de aprendizagem do PIM a partir da perspectiva da cooperação entre seus atores econômicos, apesar de constatar avanços importantes junto à lógica de clusters, registra que a Câmara de Comércio e Indústria Nipo-Brasileira do Estado do Amazonas adota o idioma japonês nos contatos que conformam a cooperação e o aprendizado, claro limitando uma maior participação de agentes locais do SMI. Esse é um grande indicador da dependência tecnológica associada ao processo de industrialização de Manaus albergado pelo Projeto ZFM. É como se tivéssemos firmas de capital e tecnologia amazônicas atuam transnacionalmente como líderes em outros países e criando, concernentemente, processos de aprendizagem e cooperação que dispensassem atores locais. Nesse sentido, todos os sistemas de educação, de pesquisas universitárias e de laboratórios públicos de Manaus e outras infraestruturas públicas locais, como legislação, instituições financeiras, políticas fiscais e de comércio internacional devem estar a serviço do processo de growing up de construção de um capitalismo amazônico. 11 Como então construir um capitalismo amazônico? Essa é, em outras palavras, a grande problematização de uma proposta de investigação pertinente às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Este autor entende que se deveriam aprofundar estudos sobre uma abordagem evolucionária da teoria do desenvolvimento que Nelson e Winter [2005; pg. 344] entendem como sendo um processo de desequilíbrio que envolve uma combinação de firmas que empregam diferentes safras de tecnologia. Portanto, sob uma perspectiva evolucionária, o crescimento econômico em qualquer economia, quer seja em país desenvolvido ou em desenvolvimento, é fruto de diversas combinações tecnológicas, que se modificam ao longo do tempo. Segundo Nelson e Winter, nos países mais desenvolvidos, as novas tecnologias passam a participar das combinações na medida em que as invenções acontecem. Nos países menos desenvolvidos, as novas tecnologias passam a participar das combinações na medida em que as tecnologias dos países desenvolvidos passam a ser adotadas. Neste contexto, em qualquer tempo, as diferenças entre países podem ser explicadas pelas diferenças das combinações de tecnologias utilizadas, assim pelas proporções de fatores. É claro e óbvio que os pacotes tecnológicos das plantas industriais sediadas no PIM representam, em regra, as invenções realizadas no mercado global pelos países desenvolvidos ou industrializados como base própria de conhecimento para acesso à fronteira tecnológica. Botelho [2004 e 2006; pgs. 147/148 e 244/245, respectivamente], refletindo sobre essa realidade que chama de determinismo econômico orientado pelo processo de cathing up, propõe exatamente as bases do que passou a conceituar de processo de growing up, que no caso do SMI pode albergar um capitalismo amazônico. As simbologias adiante [Figura 1] expressam essa abordagem. Portanto, este autor crê que Manaus pode reverter sua estratégia de crescimento econômico estruturado na atração de investimentos albergado pelo Projeto ZFM, estabelecendo uma estratégia equilibrada e lúcida de criação e consolidação de firmas com capital e tecnologia locais. Vale dizer, passaríamos a adotar as três vertentes [criação, atração e consolidação de empresas] com vigor, com a mesma energia. Essa possibilidade é tanto maior na perspectiva de uma trajetória tecnológica alternativa, a partir do acaso amazônico, tomando o Projeto ZFM como meio. Essa foi a ideia fundamental deste autor defendida na brochura de título imanente 12 [Botelho, 2004]. Isto é, contrariamente ao que defendeu Linsu Kim [2005; pgs. 141-143] 10 de que o processo de catching up dos países em desenvolvimento deve ter um sentido inverso ao conquistado pelos países desenvolvidos, locais emergentes como Manaus pode e deve construir sua própria trajetória tecnológica a partir da criação, da geração de tecnologias. Trajetória Tecnológica dos Países Desenvolvidos [Fonte: Combustíveis Fósseis] Momento Atual (fato) Século XIX Produto Projeto Processo Trajetória Tecnológica dos Países em Desenvolvidos (Industrialização & Capacitação Tecnológica Tardia) [Fonte: Combustíveis Fósseis] Momento Atual (desafio) Projeto Produto Século XX Processo Trajetória Tecnológica Alternativa: acaso amazônico [Fonte: Biomassa combinada com Desenvolvimento Sustentável] Momento Atual (desafio) Projeto Século XXI Produto Processo Figura 1: Trajetórias Tecnológicas dos Países Desenvolvidos e em Desenvolvimento [cathing up] versus o acaso amazônico [Criação do Autor]. Considera-se, para tanto, que Manaus já dispõe de ciência e tecnologia suficiente para transformar insumos e saberes da floresta em bens e serviços realizáveis no mercado em permanente processo de inovação. É pensar alto e grande; é adotar a política do “é possível” adotada na Coréia do Sul, que Kim relatou com proficiência. Mas para tanto alguns ajustes precisam ser feitos para superar a supremacia da lógica da atração de investimentos, ajustando a natureza do Projeto ZFM e, sobretudo, as legislações estaduais e municipais correlatas. Deve-se, ademais, ajustar o capital social de Manaus à lógica do empreendedorismo e do crédito, juntamente com a inovação tecnológica, como vetores de progresso. É, portanto, absolutamente necessário adotar a perspectiva tecnonacionalista para conduzir o desenvolvimento industrial e tecnológico de Manaus a partir da organização política vigente no Planeta Terra. 10 Este livro foi objeto da síntese-reflexão intitulada Raciocinando por fora do pensamento único: evidências subjetivas de uma esquizofrenia histórica que gerou o conceito growing up, conforme já registrado nesta reflexão. 13 Ou seja, na perspectiva deste autor, a industrialização dos países desenvolvidos se deu do produto para o processo, a dos ainda em desenvolvimento se dá do processo para o produto, que converge para os argumentos de Kim. O viés quanto aos argumentos de Kim, é que, hoje, apesar do entendimento comum de que os países em desenvolvimento podem se aproximar da finalização de suas plataformas industrializadas, este autor entende que os países desenvolvidos afastam-se do produto para a lógica dos projetos, isto é, hoje o maior valor agregado está na terceirização de produção de marcas mundiais, estabelecidas os mercados emergentes, para a geração de novas inovações tecnológicas incrementais, determinando maiores obstáculos para a conquista da fronteira tecnológica por parte dos países emergentes. Kim, que acredita na possibilidade dos países em processo de catching up tornarem-se desenvolvidos, corroborou, contudo, para o entendimento deste autor argumentando as exigências quanto à propriedade intelectual, que perpassa pela resistência óbvia em conceder licenças de tecnologia por parte dos detentores de patentes. Portanto, a produção de um determinismo econômico, que os países em processo de catching up não conseguem se livrar é permanente. Assim, o acaso amazônico tem a oportunidade de romper com esse determinismo. Deve-se, destarte, construir uma fronteira tecnológica própria vertida às amazonidades. Segundo Kim, somente o Japão conquistou a condição de país desenvolvido, atingindo, portanto a fronteira tecnológica derivada do desenvolvimento industrial e tecnológico estruturado nos combustíveis fósseis, o que, se não valida, leva-nos a refletir sobre a real oportunidade de o acaso amazônico oferecer veredas normativas para uma trajetória tecnológica alternativa. Kim sinalizou quatro aspectos do processo de catching up da Coréia do Sul que podem ser imitados mediante redução sociológica no processo de growing up de Manaus: i) o estabelecimento de uma liderança transformadora, com uma orientação e uma forte determinação para promover mudanças. A Coréia do Sul teve uma forte liderança governamental. Manaus deve construir uma liderança para conduzir a bons termos e emergência do seu sistema de inovação; ii) a emulação das políticas industrias e tecnológicas orientadas para a criação e consolidação de firmas locais. A Coréia do Sul adotou a política industrial como demanda e a política tecnológica como oferta do processo de aprendizado tecnológico das empresas coreanas – negritado propositalmente. Manaus, nesse sentido, deve ratificar uma cultura empreendedora de cunho capitalista; iii) a expansão dos sistemas educacionais vertidos às amazonidades. A Coréia do Sul preparou-se educacionalmente de forma antecipada para a 14 consequente industrialização. Manaus, nesse sentido, precisa verter seu capital social à lógica das amazonidades; e, iv) a construção de crises para acelerar o processo de aprendizado tecnológico. A Coréia do Sul provou ser uma experiência útil. Manaus resiste em aprender com as sucessivas prorrogações do prazo de vigência do Projeto e com a perda de tempo, dinheiro, inteligência e energia frente os descompassos das vantagens comparativas estruturadas em incentivos fiscais. É bom ressaltar que o paradigma que escuda a ideologia defendida por este autor tem como pressupostos vinculantes, o sistema capitalista e suas derivações, os quais seguem albergados pelos Estados nacionais e seus respectivos contratos sociais. Portanto, representam vetores relacionais de poder político e econômico. Vale dizer que a organização social deste Planeta Terra, neste início do terceiro milênio da era Cristã, continua, com vigor redobrado, estruturado na acumulação de capital e na apropriação do conhecimento, individual e coletivamente categorizando a hegemonia do jogo político. Assim, nesse jogo, prevalece a propriedade de firmas e tecnologias, isto é, quem não as possui torna-se cidadãos de segunda categoria política, conforme já sugerido. Pode-se perceber com clareza, e com convicção por parte deste autor ratificada ao final de duas décadas de estudo e reflexão, a dualidade de dois caminhos possíveis para o desenvolvimento de Manaus. Adotar o Projeto ZFM como um fim em si mesmo representa a trilha exploratória. Ao contrário, como um meio, representa a vereda normativa. Alguns poderão arguir: e o caminho do meio? Bem, a história julgará! Mas antes deveremos superar a cultura do assistencialismo que impera no chão amazônico adotando a cultura do risco econômico como vetor de progresso. Nesse embalo capitalista, construir indicadores que expressem o avanço da dimensão patrimonial das firmas com capital [e tecnologia] endógena, atuando na construção de uma fronteira tecnológica pertinente às amazonidades. Por exemplo, adotando o conceito de Produto Manauara Bruto [PMB], o qual ao longo deste século XXI deverá ser confrontado com a evolução do atual PIB, de tal sorte que o resultado da fração PMB PIB , 11 Fórmula [1] 11 Esta fórmula é a síntese de um indicador maior idealizado na reflexão Desenvolvimento Libertário: uma fórmula política para Manaus deste autor, registrada nas Referências Bibliográficas desta reflexão. Tal indicador tem no seu numerador o conceito de amazonidades e no seu denominador o conceito de economia de enclave industrial moderno. 15 resulte muito maior no início do século XXII, mas muito maior mesmo, do que a unidade. Este seria o principal indicador de sucesso representado pela adoção da vereda normativa. Nesse jogo os tempos dos vários agentes devem ser ajustados. O principal deles é o tempo político conflitante entre os governos e o do Estado. O segundo, mas não menos importante, é o tempo dos pesquisadores frente às oportunidades do mercado. No acaso amazônico, os governos devem trabalhar de forma suprapartidária em prol do processo de growing up e os cientistas devem focar pesquisas com considerações de uso econômico imediato em prol das amazonidades. Portanto, a estrutura de avaliação proposta para Manaus serve também para a Amazônia como um todo! Nelson e Winter [2005; pgs. 503-560], 12 na reta final de suas conclusões, argumentam que é evidente que uma visão evolucionária do que está acontecendo no mundo das firmas influencia fortemente a maneira de se ver a questão do que deveria estar acontecendo. Para Nelson e Winter, uma teoria normativa consistente com uma abordagem evolucionária da economia positiva será quase com certeza complexa e confusa. É improvável que se seja capaz de provar vários teoremas normativos amplos do tipo dos que agora estão contidos nos tratados avançados e nos textos elementares. Isso, no entanto, não deve ser causa de desânimo. Adoto os argumentos de Nelson e Winter para exatamente introduzir as perspectivas das amazonidades no campo das possibilidades do processo de growing up. Claro que essa introdução não é trivial, e dependente muito dos aspectos sutis das oportunidades. Aqueles autores entendem que os economistas têm comentado temas de política microeconômica durante centenas de anos, mas que foi apenas recentemente que esses comentários passaram a basear-se nos teoremas puros da economia contemporânea do bem-estar. E que, além disso, uma boa parte do argumento contemporâneo a favor da pesada confiança nos mercados e na concorrência repousa não sobre o formalismo da teoria contemporânea, mas sobre a visão evolucionária implícita do que está ocorrendo e sobre as alternativas organizacionais. E ainda que comparados aos argumentos normativos da ortodoxia contemporânea, os argumentos de Schumpeter pecam 12 Este autor adota Nelson e Winter, e já antes o conceito de tecnonacionalismo de Nelson, para escudar esta reflexão consciente de que a tese da teoria evolucionária da mudança econômica que defendem, está, na realidade, associadas às condições objetivas de países que conquistaram a fronteira tecnológica ou que a trilham a passos largos para superar seus gaps tecnológicos em relação àquela fronteira, além de representar um campo do conhecimento extremamente complexo, envolvendo toda a história dos tratados econômicos. Todavia, por outro lado, seus argumentos devidamente ajustados nos pareceram extremamente propício para a finalidade de uma proposta de investigação pertinente às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Portanto, amparam as pretensões do nosso conceito de growing up vis a vis amazonidades como ideário de desenvolvimento. 16 por falta de rigor, mas talvez sejam mais convincentes. Nelson e Winter entendem, ademais, que existe uma sutileza na análise que permite que o leitor contemporâneo veja as limitações do empreendimento competitivo bem como sua força, e, portanto, comece a apreciar as variedades de formas organizacionais e as sutilezas da interdependência que caracterizam e ecologia institucional real da sociedade moderna. É exatamente nesse vácuo que pode surgir um campo de oportunidades para um novo marco civilizatório inspirado pelas amazonidades, adotando a emergência do SMI como plataforma de vôo. Mas como moldar a comunidade política num processo consciente para a mudança institucional? Nelson e Winter nos informam que uma teoria evolucionária vê a estrutura institucional em desenvolvimento. Vale dizer que a perspectiva evolucionária deve estar aberta a discussão, a qual, por sua vez, deve focar de forma adequada os problemas relativos a como lidar e se ajustar à mudança. Portanto, para aqueles autores o deslocamento da perspectiva é importante. Esse deslocamento envolve o abandono da meta normativa tradicional. No caso da presente reflexão vertida às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa representa exatamente tomar o Projeto ZFM como um fim me si mesmo, adotando suas evidências positivas com caráter exploratório. No caso ainda do fulcro desta reflexão, a idéia não é negá-lo, mas superá-lo num horizonte de 100 anos! Ora, nesse sentido, qual é o problema relativo e fundamental da Manaus? É a falta de firmas locais se apropriando de forma marcante dos benefícios que o Projeto ZFM oferece para a reprodução do capital! Qual é representatividade do capital estrangeiro [internacional e nãolocal] no faturamento do Pólo Industrial de Manaus [PIM]? Deixo a busca da percentagem para os leitores, mas é visível que o capital estrangeiro instalado no PIM representa a maior parte do seu faturamento. Portanto, a meta normativa tradicional do Projeto ZFM é a atração de investimentos. Assim, Manaus deve elaborar uma meta complementar para a criação de investimentos pautada nos princípios capitalistas da acumulação de capital e na apropriação do conhecimento. É simples, mas ao mesmo tempo complexo como este autor tem dito em suas reflexões já publicadas, pois envolve aspectos culturais. Mas essa política de longo prazo deve ser empreendida. 17 Para tanto, Nelson e Winter argumentam que na perspectiva evolucionária, o fenômeno ao qual se aplica a etiqueta externalidades, que o PIM tem gerado em Manaus e na área de abrangência do Projeto ZFM, parece ser menos sensível à categorização definitiva, e estar mais intimamente relacionado a contextos históricos e institucionais particulares. Em grande medida, os problemas das externalidades e de suas oportunidades que dominam as discussões políticas, às quais os pesquisadores acadêmicos, segundo Nelson e Winter, direcionam tardiamente a atenção, são aspectos da mudança econômica. Por sua vez, os processos de mudança estão continuamente suscitando novas externalidades que precisam ser tratadas de uma maneira ou de outra. Assim, num processo em que o avanço técnico está ocorrendo e a estrutura institucional está evoluindo em resposta a padrões móveis de demanda e oferta, novas interações extra-mercado que não estão adequadamente contidas nas leis e políticas prevalecentes certamente aparecerão, e as velhas podem desaparecer. Essa é a perspectiva da vereda normativa frente à trilha exploratória. Para Nelson e Winter, com o que este autor concorda, uma parte central do problema econômico da sociedade moderna é a necessidade de continuamente desenhar e redesenhar as linhas divisórias entre a visão exploratória e a mudança normativa. Para Nelson e Winter, o mundo visto pela teoria evolucionária difere de um mundo ortodoxo não apenas porque as coisas estão sempre mudando de modos que não poderiam ser plenamente previstos, e pelo fato de sempre ser preciso fazer ajustes para acomodar ou para explorar essas mudanças. Ele difere, também, pelo fato desses ajustes e acomodações, quer sejam eles privados quer sejam públicos, não levarem, em geral, a resultados previstos de forma precisa. Para o bem e para o mal, a vida econômica é uma aventura. No caso particular das amazonidades, ela deve ser vivida em toda sua plenitude. Não podemos e não devemos deixar de explorar integralmente as externalidades e as mudanças que o PIM tem determinado em Manaus, muito especialmente no que concerne à emergência do SMI. Relembro para ratificar a linha demarcatória da ideologia de uma proposta de investigação vertida às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa, o conceito de Nelson, denominado de tecnonacionalismo presente no que se poderia chamar de Sistema Supramundial de Inovação, 13 que combina uma forte crença de que as aptidões tecnológicas de firmas nacionais são uma fonte-chave para o desempenho competitivo com a crença de que 13 A idéia dessa dimensão da inovação pode ser obtida no ensaio “Globalização e Glocalização: problemas para países em desenvolvimento e implicações para políticas supranacionais, nacionais e subnacionais” contido no livro Conhecimento, Sistemas de Inovação e Desenvolvimento [2005] registrado nas Referências Bibliográficas desta reflexão. 18 essas aptidões são em certo sentido de caráter nacional, e que podem ser construídas através de uma ação nacional. Ora, conforme já sugerido a lógica do em prol das amazonidades como ideário de desenvolvimento se insere nesse contexto dimensional. Porém, deveremos superar, conforme também já sugerido, a sina do tecnicismo vinculado à epopéia desenvolvimentista brasileira do século XX, ancorada no fulcro da política industrial de substituição de importações, reverberada no Projeto ZFM, para dar início, verdadeiramente, à saga amazônica vertida às amazonidades. 14 Nelson e Winter argumentam, ainda, que as leis, as políticas e as organizações públicas são uma parte importante do ambiente que molda as atividades do setor privado. Eles asseguram que embora seja útil para certos fins pensar nas leis, políticas e organizações públicas como partes da paisagem, estas, assim como as atividades do setor privado, passam por uma evolução contínua. Em longo prazo, o resultado acumulado das ações e reações privadas e públicas representa uma modificação gradual da estrutura básica da sociedade. É nesse molde que se insere o alvo móvel tratado no terceiro combinado com o segundo objetivo específico de uma proposta de investigação vertida às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa. Ou seja, a institucionalidade manauara-amazonense precisa construir um marco regulatório que eleve as firmas de dimensão patrimonial local para uma categoria de um conjunto emergente a caminho da fronteira tecnológica. Uma fronteira a ser construída a partir de uma trajetória tecnológica alternativa. Exatamente vertida às amazonidades como ideário de desenvolvimento. Como o foco do trabalho de Nelson e Winter é o curto prazo, ajustado está temporalmente ao de caso de Manaus e da Amazônia, pois que é no aqui e agora que se deve atuar para se processar as mudanças de longo prazo. Vale dizer superar o Projeto ZFM pelo modelo das amazonidades, superação expressa pela função matemática retro-apresentada. Assim, continuando com as argumentações de Nelson e Winter, deve-se observar que as políticas públicas evoluem em parte como respostas às mudanças nas demandas e nas oportunidades percebidas das estruturas de mercado, ou de outras alterações identificáveis nas condições objetivas. As políticas públicas podem refletir não as mudanças nas condições objetivas, mas as alterações de valores, ou de compreensão. Nesse ponto se encaixa a vereda normativa à qual este autor se apega, isto é, sua 14 A reflexão deste autor intitulada Ameaças e Oportunidades do Processo de Inovação [2005] demonstra o cerne que compromete a lógica do tecnonacionalismo adotado nesta reflexão, na medida em que nosso próprio contrato social tergiversa nessa questão fundamental que combina ciência política e economia política. 19 adoção pela comunidade de políticas depende da alteração de valores quanto às novas oportunidades de desenvolvimento que as externalidades do Projeto ZFM confere para Manaus e sua área de impacto. Exige, igualmente, a compreensão quanto à natureza frente à economia política e ciência política que uma inflexão do marco regulatório da atração de investimentos poderá proporcionar em termos de independência política e liberdade econômica. Mas, infelizmente o que prevalece é o medo de perder o Projeto ZFM, quando na realidade devemos metamorfoseá-lo em prol das amazonidades como ideário de desenvolvimento. Portanto, representa uma questão de valor. Mas este autor está consciente que só a mudança ao longo do tempo no poder relativo de diferentes interesses e grupos dentro da sociedade é que trará mudanças na política em seu contexto. As instituições e os procedimentos particulares para fazer, e para modificar, as políticas determinam a maneira pela qual as várias forças sociais e políticas são traduzidas em novas ideias políticas. Algumas vezes, o instrumental institucional para fazer política parece ter uma vida própria. Esse é o grande obstáculo para a metamorfose idealizada. O ideário do Projeto ZFM como um fim em si mesmo ganha vida própria. Tudo sugere e todos acreditam que estamos no caminho certo. Apesar de igualmente estarmos conscientes, acompanhando Nelson e Winter, de que a elaboração de políticas envolve tanto a luta quanto a barganha entre diferentes interesses e uma tentativa de identificar um interesse público, devemos trabalhar por uma mudança política qualitativa no sentido da idealização de uma trajetória tecnológica alternativa embasada em amazonidades. Uma mudança política que expresse a possibilidade de se estabelecer um marco regulatório que idealize um cenário para um futuro desenvolvimento evolucionário. É possível e certamente necessário que o capital social de Manaus e amazônico estejam imbuídos de um grande ato de fé. Fé na conquista de uma fronteira tecnológica estruturada em amazonidades como ideário de desenvolvimento. Nelson e Winter oferecem as seguintes sugestões para a busca dessa oportunidade: i) devemos aumentar a compreensão do problema, isto é, ampliar a visão das condições objetivas para a construção de uma mudança qualitativa; ii) esse entendimento deve influenciar o discurso e a barganha da comunidade de políticas, isto é, não se pode criar um interesse público a partir de um conjunto de interesses privados divergentes; iii) a ação atual de conter flexibilidade em termos de escolha mantida em aberto para amanhã, informando sobre as trajetórias alternativas 20 correlatas; iv) como a elaboração de políticas é vista como um processo contínuo, as estruturas organizacionais e institucionais devem aprender a aprender e a se ajustar às mudanças; v) que tal como as análises do funcionamento da economia de mercado tendem a abstrair a economia privada das políticas e das instituições públicas, também as análises destas não reconhecem que seus efeitos são determinados por atores privados e não-governamentais. Portanto, para Nelson e Winter uma análise política séria em qualquer dessas áreas requer uma detalhada compreensão das instituições, dos mecanismos, dos interesses e dos valores em jogo. Na percepção deste autor, dever-se-á desmobilizar as trincheiras do status quo, do conformismo que impera com a percepção de que crescimento de Manaus e da Amazônia sem conhecimento próprio aplicado economicamente no mercado [tecnonacionalismo] seja possível de conferir condições autosustentadas de progresso social futuro. Não oferece condições auto-sustentadas, muito menos sustentabilidade. Essa é a lógica do objetivo geral de uma proposta de investigação associada às Externalidades do Projeto ZFM numa Perspectiva Normativa quando se aposta num desenvolvimento tecnológico positivo em prol das amazonidades como ideário de desenvolvimento. Essa mudança política que promoverá qualitativamente o avanço do nosso marco regulatório com marca tecnonacionalista deverá explorar elementos de políticas industriais e tecnológicas de forma sinérgica e sinergizadora. Tal estratégia deverá transitar dos aspectos de concessão de incentivos fiscais e indução de Pesquisa e Desenvolvimento [P&D], focando uma forma integrada e integradora dos atributos fundamentais do sistema capitalista, isto é, empreendedorismo, inovação tecnológica e crédito, perpassando pelo poder de compra dos governos locais [de Manaus e dos locais amazônicos] e comércio exterior. Esse é o mote do Conselho Político de Gestão Econômica e Gestão Tecnológica proposto na síntese-reflexão O Quadrante de Pasteur: em busca de um modelo de desenvolvimento tecnológico afirmativo para as amazonidades [Botelho; 2009]. 15 Todavia, da mesma forma que Nelson e Winter, este autor está majoritariamente preocupado com a mudança tecnológica na produção. Na realidade, essa preocupação é tanto maior porque a mudança tecnológica pertinente exige um complemento para se formar genuinamente o tecnonacionalismo, isto é, precisamos formar definitivamente a cultura do risco como conteúdo de progresso econômico lastreado com capital endógeno. Ou seja, precisamos em Manaus e na 15 Esta síntese-reflexão foi elaborada sobre o livro de Donald E. Stokes intitulado O Quadrante de Pasteur: a ciência básica e a inovação tecnológica registrado nas Referências Bibliográficas desta reflexão. 21 Amazônia afinar uma mudança política refinando com duas outras mudanças: uma tecnológica e a outra econômica. Não é trivial. O desenvolvimento sustentável traz uma grande janela de oportunidade para Manaus e para a Amazônia. Na medida em que os produtos e serviços deixarão paulatinamente de serem fabricados com base em insumos derivados do petróleo, dos hidrocarbonetos, passarão a serem elaborados com base em insumos natural-renováveis. Por isso, de novo, uma trajetória tecnológica alternativa deverá estar sustentada pela cultura do empreendedorismo e pela criação de crédito, tanto para investimentos econômicos quanto tecnológicos. Quanto ao interesse majoritário, acompanhando Nelson e Winter, devemos obter um pano de fundo sobre o papel adequado e fecundo que o apoio governamental ativo pode desempenhar em relação às atividades no setor produtivo pertinente a um alvo móvel, isto é, considerando a dimensão patrimonial das firmas. Como se sabe, argumentam Nelson e Winter, a P&D é uma atividade separada da produção. Trata-se de uma atividade extremamente incerta. Ou seja, o resultado de um projeto de P&D pode incluir uma tecnologia pronta para ser posta em prática, ou nada que possa ser encontrado ou inventado. Em qualquer caso, o resultado do projeto inclui também um conhecimento revisado sobre alternativas tecnológicas. Em particular, um projeto de P&D bem-sucedido revela que projetos similares, mas não idênticos, podem gerar tecnologias similares, mas não idênticas. Um projeto malsucedido fornece informação geral sobre a localização das lacunas. Consequentemente, se a topografia da inovação for suficientemente regular, o avanço técnico será cumulativo. E isto poderá ser também verdade para a construção de trajetória tecnológica alternativa com base nas amazonidades. Certamente, mantida essa linha estratégica de atuação, algo profundamente profícuo e salutar acontecerá num horizonte de 100 anos. É o que prazo que propusemos para a configuração da função matemática, idealizada acima como indicador de sucesso da vereda normativa. Continuando acompanhando os argumentos de Nelson e Winter, devemos ter a percepção de que o resultado de uma rodada de projetos de P&D, que inclui alguns sucessos e alguns fracassos, define um conjunto de vizinhanças semelhantes e melhores do que as tecnologias previamente desenvolvidas. Também é importante ter explícito sobre onde reside a informação relevante para a tomada de decisões sobre P&D no setor produtivo. Neste particular, e no que concerne à perspectiva das amazonidades, é fundamental uma análise crítica do esforço institucional que o SMI está realizando em termos de investimentos em P&D para que essas vizinhanças sejam 22 visíveis. Essa perspectiva deve migrar para uma lógica de plataformas tecnológicas, conforme sugerido na síntese-reflexão O Quadrante de Pasteur: em busca de um modelo de desenvolvimento tecnológico afirmativo para as amazonidades [Botelho; 2009], sempre adotando a dimensão patrimonial das firmas. Uma nuance lógica da mudança política que se deve construir é que todo o recurso decorrente da concessão de incentivos fiscais para o capital estrangeiro esteja à disposição da construção de uma trajetória tecnológica endógena. Para Nelson e Winter, em geral a tomada de decisões sobre P&D reside nas organizações que estão comprometidas com a produção e a comercialização. Aqui se insere claramente, mais uma vez, a necessidade de elaboramos políticas públicas com foco na dimensão patrimonial das firmas considerando o jogo do tecnonaciolismo que Nelson nos avisa estar ocorrendo no mundo globalizado. Pois que, estas organizações são as que conhecem as forças e as fraquezas das tecnologias vigentes e as metas e as oportunidades para o aprimoramento. Aqui junto à perspectiva e códigos do princípio das plataformas tecnológicas, o setor produtivo que delas participam busca resolver os gargalos tecnológicos em parceria cooperativa com a academia e o governo. Nelson e Winter advertem que a transferência dessa massa de informações para as organizações de P&D que estão desassociadas das de produção e comercialização gasta tempo e é cara. Com o processo acumulativo de conhecimento e produção [de amazonidades], esse processo oportunizaria a busca por negócios através das brechas tecnológicas, as chamadas “janelas de oportunidades”. Assim, numa economia que se apóia nas empresas privadas com fins lucrativos para o fornecimento de bens e serviços, é inevitável que grande parte da tomada de decisões sobre P&D seja descentralizada nas empresas privadas, em que os retornos de P&D são internalizados por meio de segredo, da proteção das patentes ou do domínio do mercado. Portanto, sob a perspectiva do jogo capitalista, na concepção deste autor, não há sentido um processo de industrialização sem o foco na dimensão patrimonial e menos ainda um processo de inovação tecnológica pertinente, pois que o mesmo não traz benefícios palpáveis para o progresso social baseado no risco econômico. Esse alerta está contido na síntese-reflexão O Quadrante de Pasteur: em busca de um modelo de desenvolvimento tecnológico afirmativo para as amazonidades [Botelho; 2009], pois o SMI, apesar de estar emergindo com os investimentos em P&D por força do Projeto ZFM, ainda não geraram, como regra, patentes e royalties para retroalimentá-lo. Na realidade, Manaus trabalha gerando capacitação tecnológica tardia para atender as demandas do PIM, o que em tese é um contra-senso, pois os pacotes tecnológicos que 23 desembargam em Manaus estão operacionalmente resolvidos e ofertar soluções operacionais não resolve a necessidade de se construir uma trajetória alternativa com base nas amazonidades como ideário de desenvolvimento, mas reproduz a dependência tecnológica. Nelson e Winter nos lembram que uma característica da concorrência schumpeteriana é que os lucros que são a recompensa pela inovação bem-sucedida proporcionam tanto a motivação como os fundos de financiamento para o crescimento da firma. Mais uma vez e sempre este autor volta a alertar: quais são nossas empresas, aquelas que podem ser definidas como de capital local, que atuam no PIM? Por sua vez, este autor infere que uma característica neoschumpeteriana é o estabelecimento de vínculos e relacionamentos parceiros estratégico-cooperativo entre as firmas de um dado sistema de inovação. Mais uma vez e sempre, até que se observe a questão da dimensão patrimonial das firmas, cabe a pergunta: quais os interesses e as motivações reais das firmas estrangeiras convergirem para um processo de growing up [tecnonacionalismo amazônico] se elas por si só já representam um processo de cathing up [tecnonacionalismo vinculados aos seus países de origem]? Se por um lado estamos numa situação desconfortável, por outro, Nelson e Winter, nos advertem, e é o que este autor tenta colocar, que, na verdade, a sociedade tem uma escolha entre as áreas de pesquisa que deverá definir como pesquisa básica e as áreas que ela deverá considerar como aplicadas a serem dirigidas por critérios próximos aos dos valores da organização que utiliza tecnologias particulares. No caso do SMI, dever-se-ia observar a tecnologia do conjunto de firmas de capital local para adotá-lo como um alvo móvel. Nelson e Winter nos advertem que a lição da história é que a primeira abordagem, vinculada à pesquisa básica, tem grandes compensações de longo prazo, especialmente quando a compreensão científica ilumina as opções tecnológicas e suas conexões com valores econômicos. Portanto, tanto no caso do SMI quanto dos demais locais amazônicos, representa sentença de morte a inobservância da produção científica sem que esteja em prol das amazonidades como ideário de desenvolvimento. Nelson e Winter nos alertam que, muito embora, não haja teoremas da mão invisível a ordenar ou induzir a solução ótima para os casos da dualidade pesquisas básicas e aplicadas, sugere que para a maior parte das atividades de P&D que mantêm o avanço da tecnologia produtiva, grande parcela da informação relevante está localizada nas empresas produtoras, e a tomada de boas decisões em P&D envolve considerar diretamente os benefícios e os custos econômicos. Para 24 este autor, adotar o Projeto ZFM como um fim em si mesmo parece colocar Manaus permanentemente numa posição de cheque-mate quanto à sua independência econômica e liberdade política. Ou até mesmo em cheque, considerando uma perspectiva menos pessimista, considerando as possibilidades da trilha exploratória. Mais ainda assim, só a vereda normativa sugere a condição objetiva indispensável para jogar o jogo capitalista, qual seja a observância da construção de um conjunto de firmas locais com capital próprio e tecnologia vertida às amazonidades como ideário de desenvolvimento. Repita-se, permanentemente, o mantra abaixo, utilizado na abstração defendida por este autor no I Workshop sobre Inovação do Amazonas, realizado em 22 e 23 de setembro de 2009, enquanto perdurar o sistema capitalista e a necessidade de independência econômica e liberdade política para os 25 milhões de amazônidas! Um mantra quântico-trântrico para transformar a mente amazônica: EMPREENDEDORISMO EMPREENDEDORISMO EMPREENDEDORISMO INOVAÇÃO INOVAÇÃO INOVAÇÃO CRÉDITO CRÉDITO CRÉDITO OH SENHOR ESTADO OH SENHOR MERCADO OH SENHORA SOCIEDADE OH SENHORA CULTURA PERMITAM QUE O CHÃO AMAZÔNICO INCORPORE TAIS FUNÇÕES DO SISTEMA CAPITALISTA VISANDO UMA ACUMULAÇÃO PRIMITIVA DO CAPITAL PERMITAM QUE O CHÃO AMAZÔNICO CONSTRUA UM CAPITALISMO AMAZÔNICO PERMITAM QUE A ACUMULAÇÃO DO SEU CAPITAL, A EVOLUÇÃO DA SUA TECNOLOGIA E A SUA ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO ESTEJA A SERVIÇO DAS AMAZONIDADES PERMITAM QUE ESSAS AMAZONIDADES ESTEJAM A SERVIÇO DO EMPREENDEDORISMO DA INOVAÇÃO E DO CRÉDITO NUM FLUXO E REFLUXO PERMITAM QUE POSSAMOS DURANTE ESSE SÉCULO XXI INDUZIR CONSUMO DE AMAZONIDADES CRIAR MERCADO PARA AS AMAZONIDADES FORMAR UMA CULTURA BASEADA EM AMAZONIDADES TRANSFORMANDO INSUMOS E SABERES DA FLORESTA EM AMAZONIDADES REALIZADAS NO MERCADO OPORTUNIZANDO LIBERDADE POLÍTICA E INDEPENDÊNCIA ECONÔMICA PARA O HOMEM AMAZÔNICO Referência Bibliográfica ARAÚJO FILHO, Guajarino de. 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