Douglas Fischer_POA_IBGEN_7 de junho
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Douglas Fischer_POA_IBGEN_7 de junho
A COLABORAÇÃO PREMIADA COMO TÉCNICA DE INVESTIGAÇÃO Porto Alegre, 7 de junho de 2016 Douglas Fischer [email protected] CORRUPÇÃO NÃO É APENAS UM PROBLEMA DE DIREITO PENAL OU DA SEARA DA (IM)PROBIDADE É PROBLEMA ANTES DE QUALQUER COISA DE “EDUCAÇÃO” E “EVOLUÇÃO SOCIAL” Ações de “conscientização” Em escolas, inicialmente. Instituições universitárias (IBGEN !). Dos cidadãos (em geral). Veja-se a discussão recente sobre as “dez medidas” http://www.combateacorrupcao.mpf.mp. br/10-medidas (independentemente de concordância ou não das propostas) Debater Pequenos atos de corrupção “Gerson e sua lei” (pequenas vantagens) Podem levar a Grandes atos de corrupção (não esqueçamos a “sonegação”) Não se trata de um “problema do Brasil” – Corrupção é problema mundial. Mas Nossa “classificação”: 76ª, segundo a Transparência Internacional (7 posições piores que ano anterior) “A corrupção afeta os pobres desproporcionalmente desviando verbas para o desenvolvimento, comprometendo a habilidade governamental de prover serviços essenciais, alimentando a desigualdade e injustiça, e desencorajando investimentos e apoio externos”. (Kofi Annan, ex-Secretário-Geral das Nações Unidas, em seu discurso sobre a adoção da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção). ”El delito de cuello blanco puede incidir también de un modo más directo en la delincuencia común, creando más pobreza, más miseria y más desesperanza”. Reportando-se a Sutherland, consideram ainda que “los delitos de cuello blanco ocasionan más daños físicos y muertes que los delitos comunes, a pesar del carácter no violento de los primeros ”. SANCHÍS MIR, José Ricardo; GARRIDO GENOVÊS, Vicente. Delincuencia de ´Cuello Blanco´. Madrid: Instituto de Estudios de Policia, 1987, p. 73-78. O Direito PENAL é NECESSÁRIO! (Aliás, Ferrajoli sempre defendeu isso !) PREPARADOS PARA UMA PERGUNTA ? Quantos por cento dos condenados por corrupção que cumprem pena (alguma forma de “cumprimento”) ? Segundo site do Ministério da Justiça – “atualizado” (???) até junho de 2014 - , dentre 874.728 presos (fechado, semiaberto, aberto, provisórios e prisão domiciliar). (Apenas) 389 condenações por crimes contra a administração (peculato, concussão e corrupção): 0,045% um décimo de meio por cento!!! http://www.prisonstudies.org/highest-to-lowest/prisonpopulation-total?field_region_taxonomy_tid=All (acesso em 6.6.2016) AMPLITUDE DE ATUAÇÃO DO CRIME ORGANIZADO As formas de atuação de delinquentes em ‘organizações criminosas” são diversas e mediante a prática das mais variadas condutas: “tráfico de pessoas, tráfico de entorpecentes, roubo de cargas, assaltos a bancos ...” (tradicionais ...) Entretanto, mais atualmente há sem dúvida alguma um foco maior em crimes com lesividade também relevante (quiçá com efeitos difusos até maiores em determinados casos), como evasões fiscais, evasão de divisas, crimes financeiros, corrupção, lavagem de dinheiro, etc...” Obs: a Lei 13.260, de 17.3.2016 (terrorismo), previu a aplicação dos preceitos da Lei n. 12.850 (art. 16) e de competência federal (art. 11). Relembro palavras de LUIGI FERRAJOLI, para quem, mediante o uso do Direito Penal, “o Estado deve preocupar-se com as infrações cometidas pelos caballeros - corrupção, balanços falsos, valores em origem e ocultos, fraudes ou lavagem de dinheiro, ao contrário do que normalmente se faz em relação à propaganda da necessária punição exclusiva dos crimes que “ocorrem nas ruas. (Ferrajoli, Luigi. Democracia y garantismo. Edición de Miguel Carbonell. Madrid: Editorial Trotta, 2008, p. 254) De fato, o Direito Penal NÃO IRÁ solucionar os problemas da corrupção. Mas o Direito Penal é NECESSÁRIO sobretudo como forma de estabilizar as relações e, sim, ser utilizado sobretudo na criminalidade envolvendo “corrupção grave” Insisto muito GARANTISMO “NEGATIVO” X GARANTISMO “POSITIVO” EQUILÍBRIO (Aristóteles) A prática reiterada e permanente de delitos de corrupção grave (e demais delitos econômicos) representa uma ameaça permanente à ordem pública. Tais condutas apresentam uma “periculosidade silenciosa, maligna, amorfa e subreptícia alarmante que merece [especialmente] por parte do Judiciário uma enérgica e corajosa tomada de atitude para coibir, quando chamada a atuar dentro do devido processo legal, a prática desses delitos causadores da falência da Nação”. (CIPRIANI, Mário Luís. A aplicação da pena privativa de liberdade aos white collar criminals. Revista Jurídica, Sapucaia do Sul/RS, v. 49, n. 289, p. 58). Não tenho dúvidas em afirmar: O DIREITO PENAL É FUNDAMENTAL PARA AUXILIAR NA DIMINUIÇÃO DA CORRUPÇÃO (prevenção geral) e NA EFETIVA (E DURA) PUNIÇÃO (prevenção especial) deste tipo de criminalidade. MAS: 1) não significa necessariamente “encarceramento” (apenas para situações extremamente graves) 2) o Direito Penal não é a panaceia para “solução” de todos os problemas (Aplicamos muito mal o Direito Penal como um todo) Falemos então um pouco da CORRUPÇÃO e da (necessidade) também da COLABORAÇÃO PREMIADA como uma “técnica de apuração de prova” I - COLABORAÇÃO PREMIADA E COMBATE À CORRUPÇÃO Respeito – sempre ! - pelo devido processo legal em procedimentos para investigação criminal. Grandes problemas apresentados inicialmente diante de delitos de corrupção e assemelhados (notadamente em “criminalidade organizada”): ↓ Dificuldades da apuração da prova: a) autoria b) materialidade Quando a colaboração premiada é insubstituível? “Em investigações de grandes organizações criminosas, como as que envolvem crimes de colarinho branco, corrupção governamental, tráfico de drogas e terrorismo. Em casos como esses, é impossível investigar a fundo sem o uso de criminosos como informantes” (Stephen S. Trott, juiz americano, especialista no assunto – Veja de 6.12.2015) Normalmente o que se tem é isso: PROCEDIMENTOS DA COLABORAÇÃO PREMIADA Todo cuidado é pouco ao se falar do tema de colaborações premiadas. Instituto muito recente e que precisa a devida valorização (deve-se evitar a banalização do instituto) Art. 3º (Lei 12.850/2013). Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros já previstos em lei, os seguintes meios de “obtenção da prova”: I - colaboração premiada (princípio da legalidade absolutamente atendido! - conformidade constitucional ampla) Não custa lembrar que, recentemente, o STF julgou o Habeas Corpus n. 127.483 (DJ de 4.2.2016), POR UNANIMIDADE, rejeitou tese da defesa que atacava a homologação do acordo de um colaborador. Assentou expressamente o STF: [...] 6. Por se tratar de negócio jurídico personalíssimo, o acordo de colaboração premiada não pode ser impugnado por coautores ou partícipes do colaborador na organização criminosa e nas infrações penais por ela praticadas, ainda que venham a ser expressamente nominados no respectivo instrumento no “relato da colaboração e seus possíveis resultados” (art. 6º, I, da Lei nº 12.850/13). Reafirmado novamente: […] 5, Eventual desconstituição de acordo de colaboração premiada tem âmbito de eficacia restrito as partes que o firmaram, não beneficiando e nem prejudicando terceiros (HC 127483, Relator(a) […] . Até mesmo em caso de revogação do acordo, o material probatório colhido em decorrência dele pode ainda assim ser utilizado em face de terceiros, razão pela qual não ostentam eles, em principio, interesse jurídico em pleitear sua desconstituição, sem prejuízo, obviamente, de formular, no momento próprio, as contestações que entenderem cabíveis quanto ao seu conteúdo.” (Inquérito 3983, Plenário, unânime, DJ 12.5.2016) Invalidade “ética” ? Nenhuma ! A opção é do colaborador (voluntariedade), como sempre valeu no caso de confissão e indicação da participação de terceiros. Passos básicos e cuidados fundamentais 1. Recomenda-se conduta “passiva” (a voluntariedade recomenda a nãotomada de atitude do MP/Polícia para tentar “oferecer” a delação: a iniciativa deve ser do interessado) 2. Não utilizar jamais (embora muito assim se diga equivocadamente) a “prisão cautelar” como forma de “pressionar” a realização da colaboração. “GOEBBELS”: Cuidado com frases repetidas que não condizem com a realidade ! 3. Início após a manifestação voluntária: Assinatura do “termo de confidencialidade” 4. Discussão e realização de “anexos” em que precisam ser ditos, mesmo que genericamente, as pretensões a serem “reveladas” pelo colaborador. 5. Discussão das “condições” e concomitante análise da “importância” da colaboração: eficiência e segurança A regra legal é clara: Art. 4º Lei 12.850. O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituíla por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha UM ou MAIS dos seguintes resultados: I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. § 1º Em qualquer caso, a concessão do benefício levará em conta a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso e a EFICÁCIA da colaboração. Fatores a serem considerados (para análise de benefícios): X – tempo (da investigação) Y - “volume” e importância de provas Vetor: (resultado da negociação entre “provas” e “benefícios”) 6. Assinatura do acordo e posterior homologação. TUDO GRAVADO EM VÍDEO (reforça a demonstração da voluntariedade e maximiza ampla defesa) – a lei fala tanto quanto possível 7. Análise da “constitucionalidade” e da “legalidade”. Análise da voluntariedade. HOMOLOGAÇÃO. Até hoje 52 acordos de colaboração (homologados judicialmente): a) 25,00 % colaboradores estavam presos (13 acordos); b) 75,00 % soltos (39 acordos); Os seis principais colaboradores: 1) 4 estavam presos (até março de 2016) e, agora, 3 continuam presos (o que foi solto em dezembro ficou 1 ano preso – detração) – um deles ficará mais dois anos preso; 2) um estava solto e continua solto (no Brasil) 3) um estava no exterior e veio voluntariamente ao Brasil antes mesmo da investigação apurar sua conduta. E qual a razão para os 9 (dos 13) que estavam presos terem sido soltos? Simples: as penas acordadas (AO FINAL DO ACORDO, NÃO ANTES) ou não impunham regime fechado ou então já tinham tempo de preventiva para ser “abatido” da pena final. Portanto, como regra, só afirma que as prisões preventivas são meios de “pressionar”: a) quem não conhece procedimento de colaboração; b) quem está desinformado; c) quem tem posição contrária à colaboração e quer desvirtuar o instituto sem divulgar os dados corretos. Respeitosamente, vejo como TOTAL ABSURDO algumas propostas no sentido de alteração da legislação para que a colaboração premiada seja realizada com o colaborador sempre em liberdade. Inversão total de valores. Se houver eventual excesso (e pode haver), há os devidos meios de prevenção e repressão. Questionamentos sobre “colaborações” incompletas”. Em princípio, nenhum problema. Há a devida “proteção do acordo”: dependendo do caso, pode haver novo ajuste. Se “rescindido” o acordo de colaboração, as provas produzidas valem. Mas há se diferenciar: Colaborações incompletas x Mentira Sobre colaborações “incompletas”: “Essa situação que você descreveu não é incomum. Eu já tive casos de pessoas que esconderam informações preciosas por temer sua vida e mais tarde decidiram revelá-las. O que fizemos foi o de sempre: investigamos as informações. Como se mostraram verdadeiras, foram aceitas, ainda que contradissessem o depoimento original. O essencial para a Justiça é a verdade.” (Stephen S. Trott, juiz americano, especialista no assunto – Veja de 6.12.2015) (Eventuais) divergências de depoimentos e versões de colaboradores Em princípio, nenhum problema também. Atentar para ver se, efetivamente, “há mentira(s)”. Meras divergências são naturais. Veja-se: A mentira tende levar à rescisão do acordo de colaboração 18 de maio de 2016: sentença do Juiz Federal Sérgio Fernando Moro RESCINDIU (primeira vez) judicialmente acordo pela mentira de um colaborador Fernando Antônio de Moura e aplicou a pena de 16 anos e 2 meses de reclusão. Há pedidos de rescisão de outros dois acordos. O colaborador (que era “lobista”) negou peremptoriamente que José Dirceu tivesse sido responsável pela indicação de Renato Duque para o cargo de diretor de Serviços da Petrobras e que JD orientou o colaborador deixar o país. Como viu que as provas eram em sentido contrário, mudou completamente sua versão Decisão “o colaborador que mente, além de comprometer seu acordo, coloca em risco a integridade da Justiça e a segurança de terceiros que podem ser incriminados indevidamente”. Maximização da boa-fé, que é fundamental nos acordos. “Adaptadas” ao caso: prevenção especial e “prevenção geral positiva” II - ALGUNS DADOS RELEVANTES QUANTO À LAVAJATO Mais informações: www.lavajato.mpf.mp.br 1. REPATRIAÇÕES EFETIVADAS: Aproximadamente R$ 659 milhões já “repatriados” mediante cláusulas de acordos de colaboração (previsão expressa da lei) + USD 54 milhões semana passada (SBM) Total = R$ 864.000.000,00 2. “SUPOSTOS ABUSOS” DE PRISÕES: 2.1. 78 preventivas (5 do STF). 2.2. 87 temporárias (algumas temporárias convertidas em preventivas) Pergunta: São números altos ? Resposta: para a dimensão do caso NÃO! 3. PEDIDOS DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL: 108 (94 ativos – para 30 países - e 17 passivos) (“novos rumos” para o Direito Penal e criminalidade com efeitos transnacionais) 4. AÇÕES PENAIS: 52 (1 no STF – 9 denúncias com 32 acusados pendente de recebimento – além de 47 inquéritos) 19 ações com sentença penal 94 pessoas já condenadas Penas já impostas cumulativamente: + de 1140 anos (algumas delas “suspensas”) 5. RÉUS: 245 PESSOAS (incluindo prerrogativa de foro) 6. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: 6 ações 7. RÉUS EM IMPROBIDADE: 33 pessoas físicas e 16 pessoas jurídicas 8. PEDIDOS NAS AÇÕES DE IMPROBIDADE: pagamento de R$ 11,7 BILHÕES de reais (com multas R$ 37,6 BILHÕES) 9. PAGAMENTO DE PROPINAS EM APURAÇÃO: R$ 6,4 BILHÕES DE REAIS. 10. VALORES (JÁ) DEVOLVIDOS POR ACORDOS: R$ 2,9 BILHÃO DE REAIS (entre bens e valores bloqueados, apreendidos e repatriações) www.lavajato.mpf.mp.br “Os maiores crimes de hoje implicam muito mais manchas de tinta que de sangue” (Thomas Lynch) MUITO OBRIGADO [email protected]
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