Título: O ENCONTRO Tarde fria e chuvosa, Roberto Laz

Transcrição

Título: O ENCONTRO Tarde fria e chuvosa, Roberto Laz
Título: O ENCONTRO
Autora: ELAINE LÚCIA SOUZA BOFF
Tarde fria e chuvosa, Roberto Laz, em seu escritório,
lia atentamente o bilhete que lhe foi entregue pela polícia.
Fechou os olhos e trouxe de volta as lembranças do
passado.
O mês de março, o ano? Não importava muito, mas
naquela manhã de segunda, o celular tocou, fazendo um
barulho infernal. Roberto, tirou o lençol do corpo, apalpou o
telefone e ao atendê-lo respondeu com a voz baixa e
bocejando:
- Alô! O que foi Arnaldo... Você quer conversar?
Quando? – Era o amigo que queria marcar um encontro.
Ao desligar o telefone, Roberto fechou os olhos e voltou a
dormir, mas o seu sono foi interrompido novamente pela
tímida luz que invadia o quarto através da pequena fresta
da janela.
Impaciente, pulou da cama, abaixou a cabeça e saiu à
procura dos chinelos. A porta se abriu, era a avó avisando
que o café estava pronto.
Após o café, saiu para mais um dia de trabalho.
Roberto desce a avenida, ainda pensando no telefonema, e
com pressa de chegar, para seu desagrado viu se
aproximando Arnaldo:
-Ô, cara! Acenou o colega.
Roberto voltou-se e deu com Arnaldo.
-Tô com problema!
-É mesmo? Roberto ficou inquieto, tentando se
esquivar do colega, preocupado com o tempo, olhando os
pulsos, desconcertado.
-Olha... Precisamos conversar, cara! Insistiu Arnaldo.
Roberto olhou para os lados, viu as pessoas andando
apressadamente e foi se afastando do amigo, impaciente,
olhando para o relógio:
-Está vendo o trânsito? Os carros buzinando, eu não
posso ficar aqui parado conversando com você, o tempo
urge, meu amigo! Meu celular tá tocando. Quem sabe uma
outra hora, heim?
Naquele momento Roberto desligou o celular
impaciente e saiu apressado. Era um dia de sol, muito
quente, o rosto parecia desmanchar de tanto suor, as
buzinas dos carros o incomodavam muito. Às vezes,
quando se aproximava de uma loja, via o reflexo de
Arnaldo na vitrine, mas quando dava por si o amigo
desaparecia. Que perseguição!
Ao chegar no escritório o telefone tocou. Do outro lado
da linha alguém tomou bastante o seu tempo.
-Eu já disse para você que não posso fazer nada! –
Desligou o aparelho nervoso e tentou se concentrar junto à
papelada que estava à sua frente.
O grande contador tinha muitos compromissos,
trabalhava para várias empresas da cidade, fazia balanços,
controles de caixa, cálculos trabalhistas, Imposto de
Renda, enfim, tudo que se relacionava à contabilidade de
uma empresa. Roberto era um solteirão com seus 34 anos
de idade, moreno, estatura mediana, morava com a sua
querida avó materna, já que seus pais faleceram num
acidente de carro ainda quando era apenas uma criança.
Final de tarde e Roberto nem se deu conta, olhou para
o relógio, e pediu à secretária para agendar um horário
com um de seus sócios. Se possível ainda naquela mesma
noite, jantar de negócios, assim sendo, talvez pudesse
colocar em dia algumas pendências do escritório. A
secretária, após várias ligações, não conseguiu encontrar o
sócio e a reunião foi adiada.
Desanimado, Roberto liberou a secretária e foi-se
embora.
Ao sair do prédio viu caído no chão um pequeno
brinco que o fez lembrar de sua amada naquele instante de
céu crepuscular. O celular tocou e num impulso pressionou
o botão:
-Meu amor, onde você está?
Sem esperar muito a resposta falou ansioso:
-Vamos nos encontrar naquele restaurante de
sempre? Lá a gente pode ficar mais à vontade.
Ao desligar o celular Roberto não se conteve e
esboçou um sorriso de satisfação. É claro, ia se encontrar
com ela, pois já fazia um bom tempo que não a via. Era
uma noite que prometia muito, já que a reunião de
negócios não teria mais. Só o amigo que o chateava
bastante, mas isso ele resolvia depois.
O restaurante ficava numa rua pouco movimentada,
era pequeno, discreto mas bem frequentado. As luzes
deixavam o ambiente mais aconchegante e o garçom era
bem simpático, já conhecido. Roberto aguardava sua
princesa com ansiedade, não parava de olhar o relógio,
parecia uma criança à espera de um presente. De repente
uma mulher aproximou-se dele, era ela, como sempre a
mulher mais bonita do restaurante, vistosa, radiante, Vera
tinha seus 23 anos de idade, jovem, com belos e longos
cabelos vermelhos, pele bem clara, olhos esverdeados,
mas desta vez parecia que lhe faltava algo: o brilho nos
seus olhos ao ver seu amado.
A noite estava se prolongando muito, passava das
dez, saíram do restaurante e se despediram. Ao chegar em
casa a luz da sala ainda estava acesa, Roberto viu a avó
cochilando no sofá e foi direto para o quarto, mal tirou a
sua roupa e a avó bateu na porta:
-Roberto, aquele seu amigo, ligou duas vezes, pediu
para você ligar assim que chegasse em casa. Seu celular
está sem bateria? Boa noite querido!
A idosa saiu, voltou para sala e continuou lendo o livro
dormindo ali mesmo.
O cansaço chegava, Roberto pegou o telefone e ligou
para Arnaldo, depois de alguns conselhos, marcou um
encontro com o amigo e desligou o aparelho. Caiu na
cama. O sono veio como uma dádiva de Deus.
Terça-feira. Era um dia como qualquer outro onde a
agitação da cidade não tinha fim. O encontro foi num bar
próximo ao aeroporto, já que Arnaldo teria que viajar
novamente a serviço.
A verdade foi exposta por Roberto de forma bem clara
e objetiva:
-Cara, tenho que lhe contar uma coisa... É... que...
bem... eu e sua mulher... nós... estamos juntos!
Arnaldo foi ficando vermelho, inquieto. Tentando
levantar-se da cadeira, mas foi impedido pelo amigo.
-Calma! Deixa eu contar tudo, cara! –Tentando
tranquilizar o amigo, -A gente se conheceu num curso da
Universidade, nos identificávamos muito, tudo era novidade
para nós, eu estava ansioso para conhecer mais sobre
aquela mulher já resolvida. Quando soube que era sua
esposa, tentei me afastar, mas não adiantava, ela me
ligava nas noites que você estava fora. Ficava sozinha em
casa, parecia abandonada, precisando de alguém. E esse
alguém era...
Naquele instante Arnaldo não se conteve, avançou no
amigo, desferindo-lhe um violento soco na face, Roberto
caiu da cadeira e ficou imóvel, os clientes do bar correram
em direção a Arnaldo e o seguraram. Arnaldo continuou
fazendo ameaças e gesticulando furiosamente. Os dois
foram expulsos do recinto, cada um em direções opostas.
Aquela terça-feira foi marcante na vida de Roberto que
nuca mais falou com o amigo. Sua amada separou-se do
marido e o seu relacionamento com Roberto foi se
esfriando com o tempo, já não se encontravam mais como
antes. Após quatro anos. Sentado na cadeira de seu
escritório, Roberto recebeu a notícia trágica da morte do
seu velho amigo. Foi encontrado morto num parque da
cidade, aos 32 anos com um tiro na cabeça, no bolso do
seu paletó havia um bilhete redigido para o seu melhor
amigo.