FT-0384 - Museu da Música Portuguesa

Transcrição

FT-0384 - Museu da Música Portuguesa
Museu da Música Portuguesa – Casa Verdades de Faria
Fundo Michel Giacometti – Dossier de Imprensa
Ficha de Transcrição nº 384
Cota: MG-DI-A-0384
Título: ‘OPUS ENSEMBLE’ É PROJECTO DE AMOR
Subtítulo:
Caixa:
Data: 12.02.88
Autor: Manuela Silva Reis, Bruno Peres (fotos)
Meio: CORREIO DA MANHÃ
Caracterização: Nacional / Lisboa
Localização no original:
Língua do documento: Português
Sumário/resumo:
Notas gerais:
Ilustrações: 3 fotos: “Anabela Chaves e Bruno Pizzamiglio são dois dos elementos do Opus Ensemble” /
“Opus
Ensemble: Anabela Chaves (viola); Bruno Pizzamiglio (oboé); Olga Prats (piano) e Alejandro Elrich-Oliva (contrabaixo)” / “No
opus Ensemble existe a vontade férrea de fazer o melhor”
Transcrição:
Opus Ensemble quanto tempo? – Já lhe perdi a conta, diz-nos Anabela Chaves, um dos elementos do opus Ensemble,
o quarteto de música da câmara que lançou vai para três meses o álbum “Cancioneiro Popular Português”.
Em Agosto de 80, Anabela Chaves, violoa de arco, ou , em termos mais correctos, violeta; Olga Prats, piano; Bruno
Pizzamiglio, oboé e Alejandro Erlich-Oliva, contrabaixo, decidiram partilhar o mesmo “amor” pela música de câmara e
formaram o Opus Ensemble que, por altura da Páscoa, verá editado mais um longa-duração, o volume três da sua carreira.
Este disco é especial, é um parêntesis porque é o “Cancioneiro Popular Português”, porque o que nós
fazemos é música clássica e o volume três é novamente música clássica, explicou Anabelas Chaves que há oito anos
divide a sua vida entre a Cidade-Luz e a capital portuguesa.
Com dois dos seus elementosa a viverem em Paris (Anabela Chaves e Bruno Pizzamiglio) e outros dois em Lisboa
(Olga Prats e Alejandro Erlich-Oliva), o Opus Ensemble é fruto de um grande amor e de uma série de sacrifícios que faz os
seus músicos andarem de um lado para o outro, swem férias, pois as horas livres são inteiramente ocupadas com a actividade
do conjunto.
A música clássica é um tema que daria matéria para muitas páginas pois sofre de um grave problema: a maior parte
da população portuguesa encara-a como a música das sextas-feiras santas, enfim, uma “chatice” que só os verdadeiros
melómanos aguentam.
De facto infelizmente assim é, mas a culpa, essa vem de baixo, precisamente no estágio onde deveria ser tratada de
uma forma não hermética e sim mais descomplexada . Estew, claro está, foi um dos temas que abordámos com Anabela
Chaves e Bruno Pizzamiglio, dois verdadeiros profissionais da múscia que, no seio do Opus Ensemble contrariam a ideia
preconcebida de que a música clássica é um tédio.
Segundo nos explicaram, a designação certa para o Opus Ensemble é um conjunto de música de câmara, música
clássica é claro! Sim, é música clássica, não gostamos de chamar séria. A música pode ser toda séria e também há
música clássica que não o é porque não é boa.
Conjuntos de música de câmara há poucos, mas não foi para suprir as faltas do país que surgiu o Opus
Ensemble, foi pela necessidade de apuramento de cada um como instrumentista.
Como é que vai a música de câmara em Portugal? A música de câmara neste país nunca estará ao nível que
devia estar enquanto não houver entidades que a subsidiem como coisa independente. Em Portugal não se pode
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viver de música de câmara. Nestas condições exige muitos sacrifícios. Quando se tem de estar oito horas no
Conservatório e seis horas na orquestra… Necessita de muito sacrifício porque a música de câmara não é tomada
com a seriedade que devia ter e o Opus Ensemble está nas mesmas circunstâncias que os outros grupos que
existem.
Uma missão por amor? Sem dúvida nenhuma, afirmou peremptoriamente Anabela Chaves corroborada por Bruni
Pizzamiglio que acrescenta ponto: Se temos um dia livre estamos reunidos de manhã até à noite.
Para Anabela Chaves, solista da Orquestra de Paris, é relativamente fácil arranjar tempo para vir a Portugal.
Felizmente tenho muitas facilidades porque temos uma quantidade de semanas possíveis de descanso. Permite
maleabilidade de tempo.
Opus Ensemble um “hobby”
Sendo o Opus Ensemble uma carreira paralela, poderá dizer-se que o agrupamento funciona em certa parte como um
“hobby”? Pelo prazer de fazer é realmente um “hobby”, mas é um trabalho intenso. Todo o trabalho que fazemos
juntos ajuda-nos nas nossas actividades.
Resumindo, a actividade dos músicos no que respeita à música de câmara é quase impossível,
do que advém o
pequeno número de agrupamentos do género em detrimento da própria música. Ao fim e ao cabo é um círculo vivioso que
não beneficia nem a música clássica nem o público e muito menos os próprios músicos que se vêem obrigados a protelar o
seu verdadeiro desejo.
Há seguramente pessoas que se pudessem deixar as orquestras para viverem da música, mas o pão de
cada dia tem de se ganhar em algum lado, afirmou Anabela Chaves.
O público, esse, parece não ser muito e restringe-se áqueles que mostram predilecção pela música clássica.
Acho que o público não é escasso. Nós como Opus Ensemble não nos podemos queixar que o público seja
escasso, mas é tão difícil falar nisso, porque tem outro tipo de implicações como a publicidade… que o público
existe acho que sim, disse-nos, ainda, Anabela que juntamente com Bruno Pizzamiglio é da opinião de que a maneira de
fazer música clássica é a desmistificação dela própria, é preciso que as pessoas estejam mais dentro dela.
Neste aspecto o Opus Ensemble parece ter conseguido essa mesma desmistificação e a prová-lo está o grande
número de gente jovem que assiste aos seus concertos e que, habitualmente, é dada como aquela que considera a música
clássica uma maçada.
Lembramos, por exemplo, o Festival de Sagres 1987 em que uma plateia maioritariamente jovem aplaudiu sem
reservas o trabalho do Opus Ensemble.
Se alguma coisa fizemos, ainda bem. Uma das coisas que fazemos é tentar, quando estamos em palco,
que não haja a barreira entre o senhor bem vestido e o menos bem vestido e – acrescenta Bruno – fazer música
séria com um sorriso. Esta última afirmação parece-nos a definição correcta para o trabalho deste quarteto.
Cancioneiro: temas populares portugueses
O “Cancioneiro Popular Português” versa sobre temas populares e foi instrumentado à maneira clássica porque é um
modo de chegar às camadas que de uma maneira geral não têm acesso à música clássica.
Se de facto existe público, o que realmente falta é a motivação. Quando se abre a rádio não se ouve m úsica
clássica, na rua o que se vê anunciado são são os grupos de “rock”… quando se vai para fora já não se ouve o
único canal que dá música clássica…
Mas tudo parece começar nas bases, nomeadamente nas escolas onde o ensino da disciplina de Música, antigamente
Canto Coral, parece ser leccionado da forma mais errada.
A este respeito dizia-nos Bruno Pizzamiglio: As classes de música na escola deviam começar por ouvir. E
acrescenta Anabela Chaves: Quando se fazem os exames de História da Música no Conservatório têm de se saber as
datas todas e dois meses depois já não se lembra nada…
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Falava-se que a motivação deve partir de baixo. O que é que custa levar um gravador por mais pequeno que
seja para uma aula e pôr os alunos a ouvir Brahms ou outro?… Mas nós continuamos a ser assaltados dia e noite,
pela outra música. Não é a incapacidade das pessoas que faz com que elas não gostem da música clássica.
Os profissionais têm de ser pagos
Para ajudar à criação do hábito que é também necessário para ouvir música clássica, o Opus Ensemble faz fincapé numa coisa que é respeitar o início do espectáculo, disse Bruno Pizzamiglio.
Hoje em dia, a música clássica vai mal, as orquestras vão mal, o que acontece é que há imensos grupos que se
formam e que ao fim de 6 meses, um ano, acabam porque não t~em estímulo.
O Opus Ensenble é bem pago? Nada é fácvil. Há concertos que podem ser feitos gratuitamente, mas em
concertos que são pagos há determinadas exigências. Para nós não há meio termo. Ou graciosamente ou bem
pagos, meio termo não. Nós somos profissionais e os profissionais têm que ser pagos. Se é pago é pago, explicou
Anabela Chaves e continua: Há músicos dispostos a venderem-se por tuta e meia e a prejudicar toda a classe.
Anabela Chaves é há oito anos solista da Orquestra de Paris, onde vive, porquê? Em Paris o nível musical e de
trabalho é muito melhor. As relações humanas dentro de uma orquestra também são melhores.
Bruno Pizzamiglio, que já esteve na Orquestra Gulbenkian, vive também em Paris, onde dá aulas particulares, é
maestro e assistente da Jovem Orquestra Nacional de Espanha e tem a seu cargo, no Opus Ensemble, o oboé.
Olga Prats vive entre nós. É apaixonada por Astor Piazzolla e professora no Conservatório e na Escola Superior de
Música. Há vinte anos que trabalha em conjunto com Anabela Chaves, com quem fazia inúmeros concertos a duo. Alejandro
Erlich-Oliva é primeiro-contrabaixo da Orquestra Gulbenkian.
Quanto ao próximo trabalho discográfico, o “Opus Ensemble Vol. 3”, já está feito e encerra quatro obras: “Nuevo
Tango Suite”, de Astor Piazolla; “Sonata” de Telmann e “Suite de danças” de Joly Braga Santos.
O “Cancioneiro Popular Português”, vendeu muito bem no Natal e continua a ser vendido. Muitos dos temas
deste álbum forma baseados na recolha de Jiacometti (sic) e Lopes Graça: que é, evidentemente, o mais importante que
se fez neste país no que se refere à recolha do folclore português, rematou Anabela Chaves.
Texto: Manuela Silva Reis
Fotos: Bruno Peres
Notas de transcrição:
Folha nº 122
Transcrição: João Rebocho Pinto
Data: 05.12.03

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