orientação básica para a elaboração do artigo

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orientação básica para a elaboração do artigo
IV Reunião Equatorial de Antropologia e XIII Reunião de Antropólogos do Norte e
Nordeste. 04 a 07 de agosto de 2013, Fortaleza-CE.
Grupo de Trabalho: 15. Grupo de Trabalho: Emoções, Religiosidades e lazeres. Morte
e Luto nas Linhas do Além: As cartas psicografadas em Teresina. Patrícia Carvalho
Moreira e Francisca Verônica Cavalcante, Universidade Federal do Piauí-UFPI,
[email protected]; [email protected]
2
MORTE E LUTO NAS LINHAS DO ALÉM: AS CARTAS PSICOGRAFADAS EM
TERESINA
Patrícia Carvalho Moreira1
Francisca Verônica Cavalcante2
RESUMO
Este artigo tem por objetivo apresenta parte de minha dissertação desenvolvida no PPGAArq/UFPI que
problematizou o significado de cartas psicografadas para a vivência do processo do luto, segundo
enlutados, médiuns e presidentes dos centros espíritas pesquisados. Teve por objetivo compreender o
significado de cartas psicografadas para a vivência do processo de luto, em Centros Espíritas de Teresina.
E conhecer o significado de morte e do luto para médiuns psicógrafos e buscadores enlutados, antes e
depois de receberem as mensagens psicografadas; analisar a influência da experiência da sessão
mediúnica psicografia para a vivência do processo de luto. A metodologia desta pesquisa foi constituída por
um campo etnográfico formado por participantes de três centros espíritas médiuns. Com o método
antropológico da observação participante utilizei os seguintes procedimentos: registro em diário de campo,
aplicação de questionário e entrevista semi-estruturada, com captação de imagens, gravação de áudio e
escaneamento das cartas psicografadas. A morte tem sido parte integral da existência humana desde
épocas antigas o homem parece ter refletir sobre sua finitude. A consciência de que tudo que é vivo irá
morrer é vista por diversos pesquisadores como uma característica universal da humanidade e, por esta
razão, é um assunto que traz preocupação para alguns seres humanos que se debruçam sobre a
experiência do luto ou da morte e do morrer. O referencial teórico é constituído por autores que discutem
morte, luto, emoções e religiosidade e as cinco obras espíritas de Allan Kardec. O estudo concebe que
parece ser no Kardecismo que a emoção da experiência do luto (enlutados) ou da comunicação com quem
morreu (médiuns), que o sofrimento encontra um “espaço” e um “tempo” para ser vivido publicamente e
socialmente de forma diferenciada.
Abstract
This article presents part of my dissertation developed in PPGAArq / UFPI that problematized the meaning of
automatic writing letters to the experience of the grieving process, according mourners, mediums and
spiritual centers of presidents surveyed. Aimed to understand the meaning of automatic writing letters to
experience the grieving process in Spiritualist Centers of Teresina. And to know the meaning of death and
mourning for writing mediums and seekers mourners before and after receiving the messages
psychographic; analyze the influence of experience psychographic mediumship session to experience the
grieving process. The methodology of this research was composed by an ethnographic field formed by three
participating centers spiritualist mediums. With the anthropological method of participant observation used
the following: Journaling field, questionnaire and semi-structured interview, with image capture, audio
recording and scanning of letters psychographic. Death has been an integral part of human existence since
ancient times man seems to reflect on his finitude. The awareness that everything is alive will die is seen by
many researchers as a universal characteristic of humanity and, therefore, is a matter that brings concern for
some humans who focus on the experience of bereavement or death and die. The theoretical framework
consists of authors who discuss death, grief, emotions and religiosity and five works spiritualist Allan Kardec.
The study sees what appears to be the Kardecism the thrill of the experience of grief (mourning) or
communication with those who died (mediums), that suffering is a "space" and "time" to be lived publicly and
socially differently.
PALAVRAS-CHAVE: Cartas Psicografadas. Luto. Kardecismo.
1. PESQUISANDO CARTAS PSICOGRAFADAS NO KARDECISMO
O campo religioso brasileiro é marcado por diversidades de expressões e
manifestações de religiosidades, que contemplam desde elementos das religiões
1
Mestre em Antropologia e Arqueologia-PPGAArq-UFPI. E-mail: patrí[email protected].
Antropóloga. Profa. Dra. do curso de Ciências Sociais do Departamento de Ciências Sociais - UFPI. Orientadora e Profa. no
Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Arqueologia - PPGAArq - UFPI [email protected].
2
3
indígena, católica, afrobrasileira, protestante, judaica, kardecista, aos chamados novos
movimentos religiosos, como as práticas novaeristas3.
A religiosidade e a espiritualidade parecem constituir marca identitária brasileira,
de acordo com os dados do Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística-IBGE, no ano 2000 observava-se um número crescente de igrejas cristãs no
Brasil. Em 2010 os dados do Censo reafirmam que continua acirrada a disputa entre
cristãos em nosso país. E mesmo aqueles que se dizem sem religião, são muitos dentre
eles que cultivam forte espiritualidade, bebendo em várias destas tradições.
Nos cinco anos, após a morte do médium mineiro, Francisco Cândido Xavier, em
2002, houve um perceptível aumento no Brasil e no exterior, na produção de filmes,
desenhos animados, músicas, minisséries, novelas que direta ou indiretamente fazem
alusão ao espiritismo. Observei crescentes publicações de revistas (espíritas e
espiritualista) e documentários sobre personalidades espíritas, assim como um grande
número de livros, supostamente psicografados4, além de sites, blogs, vídeos,
comunidades virtuais, liga de pesquisadores espíritas, associações espíritas, programas
de TVs, entrevistas, reportagens, pesquisas acadêmicas, publicação de teses,
dissertações, artigos e eventos científicos sobre o espiritismo.
O meu problema de pesquisa objetivou, deste modo, compreender qual
significado de cartas psicografadas para a vivência do processo de luto de enlutados que
buscam estes serviços e para os médiuns que psicografam as mensagens e presidentes
dos espaços pesquisados? O objetivo geral é compreender o significado das cartas
psicografadas para a vivência do processo de luto em três Centros Espíritas de Teresina:
Sociedade Espírita Casa de Oração e Caridade ‘Luz de Nazaré’, Sociedade Espírita ‘João
Nunes Maia’; Lar Espírita Casa do Samaritano. Através deles busquei apreender o
significado de morte e do luto para os médiuns psicógrafos e para enlutados, antes e
depois de receberem as mensagens psicografadas e analisar o significado da experiência
da sessão pública de cartas psicografadas para a vivência do processo de luto.
O referêncial teórico desta pesquisa é constituído de um levantamento sobre
estudos antropológicos que lidam com a religião, morte, o morrer e o luto, sob as lentes
da antropologia e do Espiritismo. São os seguintes autores: Durkheim (1996, 1989),
Geertz, (2001, 2003, 2004, 2008), Camargo (1961), Cavalcanti (2004, 2012), Le Goff
(1995), Douglas (1970), Turner (2004), Van Gennep, (1977, 2011), Ariès, (1977, 1990),
Thomas, (1983), Peirano (2003), Elias (2001), Ziegler (1977), Morin (1988), Rodrigues
3
Cavalcante (2009) define a Nova Era como um movimento que nasceu nos Estados Unidos nos anos 60 e que se difundiu por vários
países, particularmente no Brasil, nas décadas 70 e 80. Tendo como característica marcante a busca do autoconhecimento, da
experiência mística e da preservação da natureza por parte do seu fruidor.
4
Segundo Kardec (1996), psicografia é a escrita dos espíritos através da mão de um médium, e este é o meio, instrumento, ponto de
acesso ou intermediário entre os Espíritos e os homens.
4
(1983), Koury (2001, 2003, 2010), Freyre (1974, 1988), DaMatta (1987, 2010), Parkes,
(1998, 2003, 2009), de Allan Kardec, as cinco obras da codificação Espírita.
Essa pesquisa foi realizada de março de 2011 até janeiro de 2013,
desenvolvendo-se uma produção etnográfica como uma “descrição densa” (GEERTZ,
2008, p. 07) sobre o espiritismo kardecista, enfocando a morte, o luto e a religiosidade
nos três espaços espíritas mencionados.
Considerei importante vivenciar o cotidiano espírita através de observações à
eventos espíritas, palestras com outros temas Kardecistas sobre a mediunidade, sobre a
morte, sobre o dia de finados, sobre o desencarne e psicografia, em diferentes centros
espíritas. Mergulhei no cotidiano dos participantes dos espaços espíritas, e pude
compreender aquilo que Malinowski (1978) denominou de “os imponderáveis da vida
real”, participando não só da sessão de cartas psicografadas, mas do atendimento
espiritual, da terapêutica Espírita, das diversas atividades que os três espaços
pesquisados oferecem.
Essas atividades, além do caderno de campo, em linhas gerais, foram parte
importante para eu entender um espiritismo, “abrasileirado” (Stoll, 1999, 2003) em seus
bastidores e quem sabe alcançar o objetivo que tanto me inquieta, a vivência dos serviços
de psicografia para o processo de luto. Neste sentido apresento nas páginas seguintes
um esboço dessa pesquisa.
2. ESBOÇO DO PERFIL DOS INFORMANTES PESQUISADOS
Foram realizadas entrevista com dez médiuns, sendo três médiuns psicógrafos e
com dez médium não psicógrafo e três presidentes de centros espíritas, afirmam
pertencer a religião espírita kardecista, com faixa etária No intervalo entre 28 a 58 de
idade. A maioria é solteira e pertence ao sexo masculino, de cor parda. A maioria
apresenta escolaridade de nível superior completo, a minoria ensino médio completo.
Porém, dois especialistas e dois mestres.
Os presidentes dos espaços kardecistas, são adultos jovens, dois do sexo
masculino e um do sexo feminino. Com idades entre 43 a 58 anos de idade. Dois tem
curso superior e um ensino médio completo. Todos os sujeitos dessa pesquisa trabalham
e foram os fundadores dos espaços.
Os dezesseis buscadores de cartas psicografadas – enlutados, têm como faixa
etária o intervalo de 28 a 71 anos. A maioria composta por solteiros e a minoria por
casado ou união estável, e minoria pertencente ao sexo feminino. A maioria afirmou ter
nível superior completo como nível de escolaridade o, enquanto que a minoria ensino
fundamental incompleto. Os buscadores de cartas psicografadas – enlutados, na maioria,
5
se autodefinem pertencentes ao catolicismo, a minoria é composta de: umbandista,
evangélico e novaeristas.
3. CARTAS PSICOGRAFADAS: Quem as envia e o que elas revelam?
Centro
Espírita
‘Luz de
Nazaré’
Grupo:
Resgate e
Amor
‘João Nunes
Maia’
Grupo: ‘Maria
de Nazaré’
Casa do
Samaritano
Grupo:
‘Enxugando
Lágrimas’
Francisco
Cândido
Xavier
Carta
Escrita
por
caneta
em
papel
A4
Escrita
por
caneta
em
papel
A4
Digitada
s em
noteboo
k
Impress
a em
papel
A4
Escrita
com
caneta
em
papel
A4
CARTAS PSICOGRAFADAS
Quem as
Buscadores
envia:
O que revelam: Características Gerais
Comunicantes
- Não assinada pelo espírito, mas identificada por
Adultos, maioria
nome completo ou outros dados do comunicante;
Ente querido ou
do sexo feminino.
- Consolam seus familiares;
mentores
Católicos,
- Comunicam saudade,
espirituais do
umbandistas e
- Falam sobre a nova vida;
espaço
espíritas de
- Perdem perdão ou perdoam;
kardecista
Teresina
- Pedem para aumentar a fé e continuar sua vida
na terra
Adultos, maioria
- Não assinada pelo comunicante, mas
do sexo feminino.
identificada com o grau de parentesco do
Prevalência de
Ente querido ou
comunicante;
católicos,
amigo espiritual
- Comunicam saudade,
espíritas,
da família ou do
- Mensagem de otimismo, consolo e esperança;
espiritualista
buscador, ou do
- Rememoram fatos vividos em família;
cristãos de
morto
- Pedem perdão;
Teresina e
- Mensagem recado para outros familiares
Maranhão.
- Não assinada pelo comunicante, mas
identificada com o grau de parentesco do
buscador;
- Quando o serviço era realizado com escrita no
Mulheres e
papel a caneta, a maioria das cartas eram
homens, de todas
Ente queridos
assinadas ou identificadas pelo nome completo do
as fases do
ou
comunicante;
desenvolvimento
amigo espiritual - Comunicam saudade,
humano.
da família, do
- Consolam seus familiares;
Sem religião e
buscador,
- Informam como estão, o que realizam no além;
todas as religiões
do morto ou do - Perdem perdão e fazem pedidos;
do
espaço
- Descrevem sobre a vida após a morte;
Piauí, Maranhão e
kardecista
- Relatam o momento de sua morte;
Ceará.
- Rememoram fatos vividos em família;
- Comparam a vida na terra e a vida do outro
mundo;
- Notícias de como estão emocionalmente;
- Revelam conteúdos familiares
- Todas assinadas pelo espírito, identificada por
Mulheres e
nome completo, endereço, datas, e outros dados;
homens, de todas
Ente queridos
- Comunicam saudade,
as fases do
ou
- Consolam seus familiares;
desenvolvimento
amigo espiritual - Explicam como é a vida no outro mundo;
humano.
da família, do
- Perdem perdão e fazem pedidos;
Sem religião e de
buscador,
- Descrevem sobre a vida após a morte;
todas as religiões
do morto ou do - Relatam o momento de sua morte;
do
espaço
- Rememoram fatos vividos em família;
Brasil e de outros
kardecista
- Comparam a vida na terra e a vida do outro
países.
mundo;
- Revelam conteúdos familiares
Com este quadro, pode-se verificar que os três espaços pesquisados possuem
dinâmica de atendimento, terapêutica e sessão de psicografia diferente. Cada espaço
6
possui suas características particulares. Destaco que no item quatro desse quando, faço
um breve comparação com as sessões de cartas psicografadas por Chico Xavier. Porque
quando pensei este estudo, supus que em Teresina seriam atividades exatamente iguais,
as que assisti, em cena de filme ou documentário sobre o trabalho mediúnico de
psicografia. Para minha surpresa os espaços kardecistas locais oferecem o serviço
mediúnico de psicografia, mais tímido se comparado ao trabalho do Mineiro Chico Xavier.
O que se pode apontar como semelhante ou aproximado, em relação a características
dos remetentes, é que nas cartas recebidas por Francisco Candido Xavier, quem mais
envia são os parentes dos buscadores, em sua maioria, porém assim como as sessões
de psicografia de Teresina também são recebidas mensagens espirituais de amigo
espiritual da família, do buscador, do morto ou do espaço kardecista em nome do
desencarnado.
Ao se perguntar, quem procura por cartas psicografadas no grupo “Enxugando
Lágrimas”? o psicógrafo Jobrane, responde:
“As psicografias de cartas e mensagens de parentes e amigos desencarnados
são destinadas aqueles que necessitam de conforto espiritual, sejam enlutados
ou quem simplesmente deseja notícias do mundo de lá. São jovens adultos,
idosos, esposas, filhos, esposos, netos e até crianças buscando notícias
daqueles que morreram apenas na carne. A saudade fala mais alto que seu
credo religioso. Aqui vêem pessoas de todas as religiões e até o que não tem
religião. As pessoas querem saber com seus amores estão se encontram
outros parentes falecidos. Elas precisam diminuir suas angústias, medos e
saudade. A possibilidade de comunicação, bondade Divina, conforta nos
momentos de desespero. Uma carta psicografada é a luz que ilumina um
coração aprisionado pela dor da saudade.”5
A médium Gardênia relata que contém nas cartas psicografadas, disse:
“a maioria das cartas são de consolação das pessoas que estão sofrendo. Os
espíritos querem ansiosamente estabelecer contato com seus amores, informar
que a vida continua e os vivos por sua vez querem notícia de como estão, o
que sentem o que fazem com que estão. As mães, grande maioria, sempre
querem saber isso, choram por notícias”.6
Apresento resumo do discurso do médium psicógrafo, Jobrane, antes da leitura
de cartas recebidas no LECS.
Em 10 de março de 2012, em uma de minhas idas a campo, quando as
psicografias finalizaram-se o médium afirmou que “o tempo passa rápido”, que eles nem
percebem as praticamente 03 horas de sessão de psicografia e que as mensagens em
slide ajudam a passar o tempo. Ele fala da diferença evolutiva entre seres vivos e os
mortos, que acontece porque a Terra abriga espíritos de todos os níveis evolutivos. Diz
5
6
Médium Jobrane psicógrafo. Entrevista concedida à pesquisadora no LESC, em 03|05|2012.
Médium Gardênia. Entrevista concedida à pesquisadora em 23/03/2012. no LECS.
7
que este mundo é passageiro, e assim como a passagem das pessoas em nossa vida
também pode ser rápida, daí a importância de viver momentos, dizer que ama e perdoar
enquanto estamos vivos. E que as separações por morte são temporárias. Depois, ele
falou que o morto pode esta ao nosso lado e não sabemos, eles vêm nos visitar
constantemente. “Quando alguém morre o que parte de nossa presença é somente o
corpo de carne de seu ente querido não há garantias, pois pode ser espiritual, da casa ou
outro espírito amigo”7.
As cartas da sessão mediúnica pública do LESC, dia 24 de março de 2012
falaram de como os mortos estão no além túmulo, o que fazem, como se sentem, que
também há uma saudade do lado de lá. Os comunicantes pedem perdão, perdoam,
deixam recado para outros parentes, rememoram fatos da vida em família. Consolam,
animam e incentivam seus entes a continuar na jornada dessa vida. Os textos das cartas
querem oferecer consolo, dar esperança e ânimo para os que sofrem pela ausência por
morte de um ser amado. Falam que a morte é só do corpo de carne, que não estão
sofrendo mais, e que a separação é momentânea, que a vida continua e que é bem
melhor que nossa vida aqui na terra.
Guarnieri (2001) conclui que uma carta psicografa “é a redescoberta do sentido
para a vida perante a morte e o luto.” (GUARNIERI, 2001, p. 14). Para a maioria dos
meus sujeitos, médiuns e buscadores de cartas psicografadas – enlutados também.
Enquanto Koury (2003) nomeou a mudança cotidiana em relação ao trabalho de luto, de
“busca de uma nova vida” o que Parkes (1998) denomina de “reposiciona-se em sua
vida”, ou seja, alocar o morto, em sua vida, de tal forma que sua ausência não ‘paralise’ e
comprometa sua vida. Também Worden (1998) chama o fim do luto de “reposicionar em
termos emocionais a pessoa que faleceu e continuar a vida” e por fim o que Bowlby
(2004) chama de “Reorganização”, que é reavalia da situação de perda, a redefinição do
“eu” perante a vida; consequentemente reconhecendo a necessidade de mudança,
retorno as atividades que realizava antes da perda do ser amado.
Gennep (2010) destaca que via o luto antes somente como tabu e práticas
negativas que delimitavam o período de isolamento. E chega a conclusão de que é “um
estado de margem para os sobreviventes, no qual entram mediante ritos de separação e
do qual saem por ritos de reintegração na sociedade geral (ritos de suspensão do luto)”
7
Jobrane, médium. Entrevista concedida à pesquisadora no LECS em 03/05/2012.
8
(GENNEP, 2010, p. 129). Para esse autor, o tempo desse luto será proporcional ao grau
de parentesco com o morto, variando segundo o vínculo social com o morto, situação
social.
Para Parkes (1998) luto8 é uma reação normal ou natural frente a uma perda
significativa. Assume comportamentos esperados, “normal”, como: tristeza, raiva, choro,
isolamento, ambivalência e estado depressivo, dentre outros, essas são algumas das
manifestações normais de luto.
Worden (1998) entende que o luto9 possui fases a serem superadas, esse é o
trabalho do processo de luto. E a primeira tarefa10 é reconhecer a perda como realidade, e
para isso é necessário, antes, que essas emoções e sentimentos sejam expressos.
Luto “é um processo normal e esperado de elaboração de qualquer perda e é
importante para a saúde mental, na medida em que proporciona reconstrução de recursos
e adaptação às mudanças” (CASELLATO, 2005, p. 20). Está, enlutado segundo Soares e
Mauton (2007), é um estado emocional de estar e até como sentir algo ser rasgado dentro
de si. É um processo doloroso, mas normal, que todo ser humano vai passar.
Orquídea, revela que a sessão mediúnica pública de psicografia expressa tristeza
e ao mesmo tempo significa quietude, ela diz: “Achei um lugar muito triste, ao mesmo
tempo cheio de paz e esperança. No geral foi positivo”. Essa significação, percepção,
esse sentido atribuído ao momento da sessão de psicografia, parece contribuir para a
expressão de emoções de um enlutado. Lá é permitido emocionar-se, falar de morte, do
morto, do morrer e estar enlutado não é vergonhoso, e nem um ato solitário.
Pergunto a enlutada Azaléia, a sua impressão e suas críticas em relação à
sessão de cartas psicografadas, ela afirma que achou muito fácil, na primeira sessão, já
receber uma carta sobre seu filho. “Receber uma carta psicografada foi surpresa. Não
esperava por isso”, diz Azaléia.
Sobre seu acolhimento no centro que buscou carta psicografada, ela responde
que: “Tomei conhecimento de várias mães que perderam filhos na mesma época que eu,
em torno de 2004, que estiveram lá e receberam cartas, não sei se deles ou se sobre
eles, mais parecendo uma tentativa de amenizar a dor dessas mães, foi o que estranhei”
conta a enlutada Azaléia. Afirma ainda ter sido recebida muito cordialmente. Sentiu-se à
vontade e curiosa ao mesmo tempo, mas não soube precisar o papel desse centro
espírita para a sociedade. Ainda assim, esporadicamente assiste a palestras e recebe
8
Neste estudo utilizo a categoria luto para a manifestação pública de comportamentos físicos, emocionais,
comportamentais e sociais a partir de uma perda significativa e a definição de luto segundo Colin M. Parkes (1998).
9
Luto é um processo, e não um estado emocional, porque existem fases e tarefas, uma dependente da outra, a serem
cumpridas ou realizadas para que um luto seja tido como normal.
10
Elaborar a dor da perda e ajustar-se a um ambiente onde está faltando à pessoa que morreu; reposicionar-se em
termos emocionais a pessoa que morreu e continuar a sua vida; investir em novas relações e novos projetos de vida.
9
passes na Federação Espírita Piauiense. Mas não buscou mais cartas psicografadas,
segundo ela porque não se sente merecedora de tal graça.
Alguns enlutados, não acreditam que receberão notícias do além, e quando
acontece, definem que foi uma surpresa. A maioria dos buscadores de cartas
psicografadas – enlutados, dessa pesquisa afirmaram que desejavam muito receber
mensagem espiritual, mas achavam que não receberiam. Foi assim, comigo também.
Solicitei cartas, anonimamente sem revelar a pesquisa aos organizadores da sessão de
psicografia ao solicitar a ficha. Tinha certeza que minha ficha não seria escolhida, mas foi,
fiquei surpresa e sem conseguir compreender minhas emoções.
Buscadores ENLUTADOS – SOBRE A VIVÊNCIA DO RECEBIMENTO DA CARTA
A importância da sessão pública mediúnica de
Buscado
Número Centro
psicografia para quem busca mensagem espiritual para
r
a vivência do luto
Luz de
01
Lótus
“Consolo aos corações partidos e esperança de contato”
Nazaré
Luz de
02
Gardênia “Significa muito, como escola, hospital e amparo”
Nazaré
“Contribuir para a ascensão do mundo, para uma
sociedade mais evoluída e com menos dor”
João
“Deve-se ter grande cuidado, é em não alimentar a
03
Nunes Rosa Flor obsessão de encarnados para desencarnados. Além do
Maia
desgaste do médium em receber grande quantidade de
cartas, por conta da energia dos mortos.”
“Tem um papel social, conforto e esclarecimento espiritual”.
João
04
Nunes
Acássia
“Consolar as pessoas”
Maia
Casa
“Não tenho como dizer, nem palavras e nem descrever a
do
Flor de
existência de um lugar em que as pessoas podem chorar e
05
Samari
Liz
dizer que esta doendo muito, que somos entendidos e
tano
cuidados”
Casa
do
“Um lugar grado que pode ajudar as pessoas a entender a
06
Bromélia
Samari
vida”
tano
Casa
do
07
Petúnia
“Ajudar as pessoas espiritualmente”
Samari
tano
Casa
do
Tulipa
08
“Não sei informar”
Samari
Negra
tano
“Uma escola da vida para quem busca e recebe ajuda e
Casa
que pode saber de comunicações com desencarnados.
do
09
Desde que ela venha num contexto seguro e confiável. Que
Samari Orquídea
haja seriedade no trabalho e a finalidade de divulgação da
tano
Doutrina Consoladora e não apenas a busca do fenômeno”
Casa
do
10
Laranjeira “Saber de notícias de nossos entes querido e nos consolar”
Samari
tano
11
Casa
Jasmim
“Ser o intercambio entre o céu e a terra para ajudar a
do
diminuir a dor da saudade e do medo de não saber como
Samari
estão”
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tano
Casa
do
Samari
tano
Casa
do
Samari
tano
Casa
do
Samari
tano
Casa
do
Samari
tano
Casa
do
Samari
tano
Girassol
“Ter notícia de pessoas queridas, é tudo e observar que
outras pessoas também perdem seus afetos faz agente se
sentir mais aliviado, quando a carta é lida as pessoas
choram conosco”
Sol
“Permitir que as pessoas emocionem-se com suas as
histórias, permitir quem esta sofrendo a morte de pessoas
querida seja amparado. No meu caso, significou muito.
Lírio
“Não sei”
Azaléia
“A vivência de felicidade pela emoção de quem identificou
ser realmente de seu ente querido pode ajudar a sofrer
menos”
Violeta
“Para quem acredita é um mega lugar para buscar
esperança, consolo e meio para se ativar a resiliência e
ressignifica o luto.”
Neste resumo sobre a importância da sessão pública mediúnica de psicografia
para quem busca mensagem espiritual para a vivência do luto, no quadro vinte e três, a
minoria formada por dois enlutados, (vide quadro vinte e um, número oito e número
quatorze) afirmaram que não sabem qual a importância da sessão de psicografia para
pessoas em sofrimento pela morte de entes queridos. Enquanto a maioria declarou que a
sessão é um momento de consolo oferecido pelo espiritismo a quem busca cartas
espirituais.
Importante observar que a definição de consolo conferida pelos enlutados aos
espaços kardecistas, como também pelos presidentes desses espaços e pelos médiuns
kardecista está ancorado na crença de que o espiritismo é o consolador prometido.
Buscadores ENLUTADOS
Númer
o
Centro
Buscado
r
01
Luz de
Nazaré
Lótus
02
Luz de
Nazaré
03
João
Nunes
Maia
João
Nunes
Maia
Acássia
04
05
Casa do
Samaritan
o
Flor de
Liz
06
Casa do
Bromélia
Gardênia
Rosa Flor
Significado da Carta Psicografada para Processo de Luto
“Sim, imagine uma dor que não tem fim e aí a própria pessoas
diz que estava bem, que nos ama e ainda estaremos juntos. É
um refrigério em sua alma”
“eu não conseguia vê que eu estava sofrendo muito, mesmo
acreditando em vida após a morte, eu não assumia que estava
difícil de aceitar a partida do vô, mas depois da mensagem eu
pude perceber como eu estava, sofrendo. A carta foi uma
fonte, um bálsamo”
“Foi uma comunicação importante, as informações que
continham na carta só mamãe sabia. Foi uma alegria saber
que ele continua em alguma lugar, assim sentimos que vamos
nos encontrar ainda e viver nosso amor.
“Um pouco, assim por que é tão difícil aceitar”
“Fez acreditar mais ainda na vida espiritual. Todas as vezes
que fico triste e com saudade de meu filho leio a carta. Choro,
choro até não doer tanto. Ando com ela na bolsa, se estou na
fila do banco e demoro, leio e fico sonhando com ele,
lembrando dos bons momentos juntos”
“Ajudou demais e também o meu pânico, aquele medo de
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Samaritan
o
Casa do
Samaritan
o
Casa do
Samaritan
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Casa do
Samaritan
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Casa do
Samaritan
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Casa do
Samaritan
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Casa do
Samaritan
o
Casa do
Samaritan
o
Casa do
Samaritan
o
morrer, amenizou”
Petúnia
Tulipa
Negra
Orquídea
Laranjeira
“Renovou minhas esperança diante da vida, fazendo eu ter
animo para continuar vivendo até chegar a minha vez”
“Não ajudou não”
“Creio que ajudou a diminuir a dor pela culpa de ter matado
minha mãe, mas as dores continuam, só que suaves e cheias
de esperança”
“É um consolo saber que podemos ir lá e sair mais forte e com
esperança mesmo quem não recebe cartas só o fato de vê a
comoção de quem recebe, já traz uma sensação de paz”.
Jasmim
“foi tudo, um oásis, fonte de ternura, esperança e consolo”
Girassol
Sol
Lírio
Casa do
Samaritan
o
Azaléia
Casa do
Samaritan
o
Violeta
“Foi um maravilhoso presente de Deus. Contribuiu demais, só
o fato de ela dizer que voltaria e relembrar de momentos que
só nós duas vivemos foi divino”
“As descrições de algo que somente eu e a minha esposa
sabíamos, foi incrível!”
“Não, para mim nada. Achei a carta muito genérica, o que me
faz duvidar da autenticidade da carta. Não representou nada,
nem para mim e nem para minha família. Minha mãe disse, e
eu concordo, que se quisermos vê de um ângulo que é o meu
irmão, pode ser, mas por outros, pode não ser”
“Não vi diferença alguma. Creio que as explicações sobre
tópicos do evangelho segundo o espiritismo enquanto um
senhor (médium) recebia cartas psicografadas, o consolo que
o médium explica o espiritismo com Jesus, as mensagem ditas
e lidas e os livros que li e participar dos passes me ajudaram
mais”
“Em nada alterou”
Segundo os buscadores de cartas psicografadas – enlutados, do total de
dezesseis, a maioria afirmou que a carta psicografada recebida ressignificou seu
processo de luto. Enquanto a minoria, quatro dos enlutados, segundo quadro dezessete,
afirmaram que não houve qualquer mudança significativa em relação ao seu luto.
Bromélia, enlutada pela morte de seu pai, afirma como a carta psicografada que
recebeu do mesmo, contribuiu não somente em seu processo de luto, mas em sua visão
de morte, consequentemente reduziu seu medo de morrer.
Para DaMatta (1987) a sociedade brasileira apresenta diversas maneiras de se
relacionar com a morte e os mortos, um característica marcante de nosso povo é a de
que:
“No Brasil, fala-se muito mais dos mortos do que da morte. E isso implica uma
estranha contradição, porque falar dos mortos já é uma forma sutil e disfarçada
de negar a morte, fazendo prolongar a memória do morto e dando àquela
pessoa que foi viva uma forma de realidade.” (DAMATTA, 1987, p. 153).
12
Pode-se afirmar a partir de Morin (1988) que antropologicamente, todas as
gerações, nas mais diversas sociedades, em todos os tempos da história da humanidade,
o homem parece ter desenvolvido o seu lidar com a morte, o seu fim.
A morte, universalmente, parece ser parte da humanidade desde que esta
experiênciou a morte de um ente querido, do “outro”. Ela se deu conta da irreversibilidade
do morrer, a partir da consciência de um fim, citada por diversos pensadores como
Thomas (1983), Ariès (1977, 1990), Morin (1988), Ziegler (1977), Rodrigues (1983) dentre
outros, como universal e como problemática, porque a ideia de finitude humana
desequilibra e abala a íntima relação do homem com a vida.
Rodrigues (1983) realiza um estudo antropológico e histórico dos processos de
formação da visão social de morte, entendida a partir da visão de morte como produto do
processo de industrialização, progresso e o consumo.
Nos estudos sobre morte e luto com Ziegler (1977), Elias (2001), Reis (1991),
Koury (2001, 2003, 2005, 2010), DaMatta (1984, 1987, 2010), Kovacs (1992), Torres
(1983) e Franco (2005, 2010) dentre outros pesquisadores, fazem crê que estudos sobre
a morte e o morrer estiveram em discussão acadêmicas, no Brasil mais a partir da década
de 60.
Ziegler (1977) chama de lembrete histórico e antropológico: a consciência que
cedo ou tarde não mais existiremos. Esse autor aponta a descoberta, como um marco da
humanidade, “uma importante conquista” (ZIEGLER, 1977, p. 130). Neste mesmo sentido,
Rodrigues (2009) define essa certeza, como uma “marca da humanidade” (RODRIGUES,
2009, p. 19), a consciência de que todo ser vivo morrerá um dia. “A consciência da morte
é a condição mesma da vida da consciência” (THOMAS, 1983 p. 24). Diz-se que somos
os únicos a pensar sobre a morte e o morrer, e com essa consciência, o homem tem
construído, historicamente o seu imaginário, um campo simbólico repleto de elementos
que dão sentido ao fenômeno o fim da vida.
As concepções sobre outro mundo, de um criador parece apaziguar, em certo
sentido, a ameaça de fim da existência humana. Um imaginário com sua geografia de um
além (Le Goff, 1995), como extensão para o além da vida na Terra. Prometida por
sistemas religiosos salvacionistas como lugar de bem-aventuranças, gozos e felicidade
plena, eternas, se houve esforço no bem. Porém, se não houve trabalho de edificação, há
sanções e culpa desse humano que não buscou ou trabalhou por sua salvação. As
palavras da enlutada Lótus11 pode atestar a influência da religiosidade ou da
espiritualidade no conceito de morte: “Um momento de desespero. É muito pior quando
11
Enlutada Lótus. Entrevista concedida à pesquisadora em 28/10/2011. Na SEJNM.
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não se tem uma espiritualidade, é muito difícil. Mas sabemos que é a continuidade da vida
em outra vida” afirma aparentemente aliviada.
Novos comportamentos, nos dizeres de Ariès, sempre modificados com o passar
dos [milhares] de anos. A representação do fim dos tempos, com o Juízo Final,
deslocando o momento da morte em um momento onde se desenvolve, seu julgamento
(Ariès, 1977). Observa-se a partir deste período histórico o surgimento das imagens
macabras, de caveiras, do “cadáver decomposto” de novo trazem os primeiros sinais, o
fracasso humano diante da morte (Elias, 2001), (Le Goff, 1995). A enlutada Azaléia,
confirma a crença Cristã de lugares espirituais quando diz: “morrer é ir para o céu,
purgatório ou inferno, dependendo de nossos atos na terra, pelo menos foi o que me
ensinavam no catecismo”
Pode-se constatar os buscadores de cartas psicografados, em sua maioria,
definiram as seguintes emoções, expressas em sessões de cartas psicografadas: choro,
alegria, saudade, ansiedade, alegria, esperança.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir observação participante tentei realizar o percurso que os buscadores de
cartas psicografadas realizavam, ou a busca de comunicação de mensagens espirituais
de entes queridos mortos os quais denomino de Ritual da Saudade.
Meus informantes são cidadãos Teresinenses, adultos com idades entre 28 a 71
anos de idade. Foram trinta e dois informantes no total, vinte e três do sexo feminino e
nove do sexo masculino. Trinta e um afirmaram se heterossexual e um ser homossexual.
Dezesseis dentre eles são, buscadores de cartas psicografadas - enlutados, três médiuns
responsáveis pela psicografia e três presidentes de centros espíritas e dez médiuns não
responsáveis pelas cartas psicografadas. Formam um grupo majoritário de pessoas que
se autodeclaram de cor parda, enquanto uma minoria se autodeclara de cor preta e
branca.
Quanto ao pertencimento religioso os médiuns todos são espíritas, ao passo que
os buscadores de cartas psicografadas – enlutados, pertencem a uma diversidade
religiosa contemplando as seguintes religiões: uma maioria de catolicismo, e os demais
subdivididos em religiões evangélicas especialmente neopentecostais, umbandistas e
uma minoria que se autodeclara sem religião, porém com forte afeito a espiritualidade
novaerista. O período de morte dos entes queridos desses buscadores compreendido
entre os anos de 1973 a 2012.
Consolo, conforto, alívio foram os sentimentos mais citados e experimentados
pelos buscadores de cartas, desse estudo. Observei que a carta psicografada, o conteúdo
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da notícia, da mensagem parecem não serem o suficiente para o enlutado e seu luto, mas
o espaço, os conceitos teóricos e terapêutica kardecistas, somando-se a vivência da
sessão mediúnica pública de psicografia. O espetáculo da leitura, parece ser o ponto
‘chave’ pela descrição de emoções, como: paz, segurança, bem-estar, acolhimento,
união, amor que pode simbolizar um pertencimento ao coletivo. Contribuem para os
buscadores seguir um novo caminho, o redirecionamento de sua vida, mesmo com a
saudade dilacerante.
Os centros espíritas pesquisados parecem ser o lugar onde os buscadores tem
suas emoções valorizadas, permitidas de serem expressas. Assim, os kardecistas vivem
na anti-estrutura, e à medida que seus rituais negam a morte. Os buscadores e médiuns
vivem as margens da estrutura dominante porque acreditam na comunicação com os
mortos, na continuidade da vida. A mensagem é a ambiguidade, a transição, em que o
morto está vivo, uma ambivalência. O luto é o drama social, a busca por cartas é a ação
social, é a ação simbólica. A morte é a metáfora, e quando se recebe a carta psicografada
vive-se uma communitas. Já a carta é o símbolo de que a vida continua.
Novas pesquisas ou mesmo ampliar este estudo, tenho por sugestão a pomada
do ‘Vovô Pedro’, a pictografia, a influência da terapêutica espírita, o tratamento espiritual,
o momento da sessão mediúnica pública de psicografia para o processo de luto, a
influência da música no trabalho de luto são outras formas para se compreender o
processo de luto a luz do Kardecismo.
Poder-se-ia pesquisar os buscadores enlutados que não tenham recebido
mensagens espirituais, ou o significado de uma carta psicografada enviada pelo ente
querido morto ou por um amigo espiritual, em nome desse morto. Ou um estudo de caso,
ou a história de vida, por exemplo, dos buscadores Girassol e Sol, Flor de Liz. Ou ainda a
influência de cartas psicografadas para um grupo familiar, como recentemente o caso
Fernanda Lages, sua família publicou, em dezembro de 2012 na imprensa local a
mensagem espiritual endereça aos familiares.
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