Experiências na Reserva Extrativista Chico Mendes, Acre
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Experiências na Reserva Extrativista Chico Mendes, Acre
MONITORAMENTO FLORESTAL COMUNITÁRIO Experiências na Reserva Extrativista Chico Mendes, Acre-Brasil 1 O Projeto Sinal Verde Agradecimentos Este projeto buscou incentivar a participação dos moradores da Reserva Extrativista Chico Mendes no monitoramento florestal. Isto foi realizado junto com as comunidades por meio de uma parceria entre: Os autores gostariam de agradecer primeiramente os membros da equipe de monitores comunitários da Reserva Extrativista Chico Mendes, e todas as famílias que participaram nas entrevistas. • O Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação dos Serviços Ambientais (IMC) do Governo do Estado do Acre, um dos principais instrumentos do Sistema de Incentivos por Serviços Ambientais; O desejo pelo conhecimento sempre foi mais forte que as dificuldades que encontramos ao longo do caminho. É impossível não citar o quanto aprendemos ao longo desse período. • O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), orgão federal que administra as unidades de conservação; • O Centro dos Trabalhadores da Amazônia (CTA), instituição não governamental, sem fins lucrativos, que trabalha como comunidades tradicionais na Reserva Extrativista Chico Mendes; • O Global Canopy Programme (GCP), sediado no Reino Unido, é um think tank voltado às florestais tropicais buscando acelerar a transição para uma economia mundial sem desmatamento. Agradecemos aos núcleos de base e associações concessionárias (Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Brasileia e Epitaciolândia – AMOPREBE; Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Xapuri – AMOPREX; Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Assis Brasil – AMOPREAB; Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Sena Madureira – AMOPRESEMA; Associação de Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Rio Branco e Capixaba – AMOPRECARB) e membros do Conselho Gestor da Reserva Extrativista Chico Mendes. Para saber mais sobre o trabalho do GCP com o monitoramento comunitário visite www.forestcompass.org ou escreva para [email protected] Citação Autor principal: David Sabogal Autores contribuintes: Stoney Nascimento, Luis Meneses Citação: Sabogal, D. et al. 2015. Monitoramento florestal comunitario: experiências na Reserva Extrativista Chico Mendes, Acre-Brasil. Global Canopy Programme. Gostariamos de agradecer os individuos do IMC, ICMBio, CTA e da Companhia de Desenvolvimento de Serviços Ambientais (CDSA) pelo acompanhamento e apoio durante o projeto, em especial, a Magaly Medeiros, Pavel Ježek, Maria José Albuquerque e Adelar Jesus de Alcantar. Gostariamos também agradecer o Jon Parsons e outros funcionairos e consultores do GCP pelo apoio na implementação do projeto. Por ultimo, agradecemos o imprescindível apoio financeiro da Agência Norueguesa de Cooperação para o Desenvolvimento (NORAD). Foto de capa: © iStock.com/luoman Parceiros: 2 Financiador: Índice Resumo executivo ................................................................................................................................................................. 4 Impacto & aprendizados ................................................................................................................................................................................................. 4 Resultados gerais ................................................................................................................................................................................................................ 5 1.Introdução ............................................................................................................................................................................ 6 1.1Conservação florestal e desenvolvimento sustentável no Estado do Acre, Brasil .................................................................... 6 1.2 Necessidades de monitoramento e participação . ...................................................................................................................................... 7 2.Monitoramento florestal comunitário na Reserva Extravista Chico Mendes ................ 8 2.1 Matriz de monitoramento .................................................................................................................................................................................... 8 2.2 Capacitação ............................................................................................................................................................................................................... 10 2.3 Uso da tecnologia .................................................................................................................................................................................................... 11 2.4 Amostragem .............................................................................................................................................................................................................. 11 3.Resultados & discussão ............................................................................................................................................ 14 3.1 Bem-estar social ..................................................................................................................................................................................................... 14 3.2 Desenvolvimento econômico ............................................................................................................................................................................. 16 3.3 Governança florestal ............................................................................................................................................................................................. 17 4.Impactos & próximos passos .............................................................................................................................. 20 4.1 Oportunidades . ....................................................................................................................................................................................................... 20 4.2 Desafios ....................................................................................................................................................................................................................... 20 4.3 Conclusão ................................................................................................................................................................................................................... 21 Acrônimos & abreviações ........................................................................................................................................... 22 Literatura ................................................................................................................................................................................. 22 3 Resumo executivo Sistemas de monitoramento florestal são componentes fundamentais para entender a eficácia e o impacto de iniciativas e investimentos em conservação e na redução de emissões de carbono por desmatamento e degradação florestal (REDD+) na Amazônia, assim como no desenvolvimento e implementação de salvaguardas socioambientais. Existem hoje diversas iniciativas e metodologias de monitoramento que surgem da tentativa de suprir as necessidades de entender as dinâmicas socioambientais das florestas tropicais. O protagonismo das populações da floresta no monitoramento, conhecido como monitoramento comunitário ou participativo, vem sendo incentivado mundialmente como uma ferramenta eficaz e de baixo custo para a coleta de informações e observações florestais relevantes para fortalecer a gestão e governança dos recursos florestais. O monitoramento comunitário é compreendido como um modelo importante para incorporar o conhecimento tradicional e gerar oportunidades de capacitação e apropriação das comunidades locais das estratégias de conservação florestal. No estado do Acre, foi assinado um acordo de cooperação técnica com o Governo do Estado do Acre, por meio do Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação dos Serviços Ambientais (IMC), para a implementação de um projeto piloto de monitoramento comunitário na Reserva Extrativista Chico Mendes (RECM). Entre 2014-2015 este projeto, chamado Sinal Verde, crio um sistema participativo de monitoramento in situ utilizando tecnologias digitais que atendesse às necessidades locais e externas de monitoramento. O projeto gerou dados sobre temas sociais, econômicos e ambientais, e fez uma avaliação independente dos impactos de programas e políticas públicas ambientais voltadas para a conservação e desenvolvimento dos meios de vida das comunidades extrativistas dentro da RECM. Com estas informações e acordos establecidos com diferentes atores (da comunidade, sociedade civil, e governo estadual e federal), a iniciativa buscou criar sinergias entre diferentes atores e escalas de governança para auxiliar a gestão compartilhada da RECM e orientar as políticas e estratégias dentro do Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA) do Estado do Acre, com foco específico nas salvaguardas socioambientais. O presente documento é o relatório final das experiências e impactos do projeto de monitoramento comunitário no âmbito da RECM. No Capítulo 1 buscamos contextualizar o monitoramento comunitário dentro da estrutura 4 política e atuais andamentos no estado do Acre, seguido por uma descrição da metodologia e implementação do projeto (Capítulo 2). Alguns dos resultados do projeto são apresentados e discutidos no Capítulo 3. Para concluir, no Capítulo 4, discutimos os desafios, oportunidades e próximos passos para o modelo de monitoramento comunitário dentro dos processos e andamentos em nível estadual, nacional e internacional. Impacto & aprendizados • A participação de atores comunitários em atividades periódicas e sistemáticas de monitoramento pode gerar fluxos importantes de informação para entender o impacto e efetividade de programas e incentivos socioeconômicos e garantir o comprimento de salvaguardas socioambientais; • S istemas de monitoramento comunitários podem gerar intercâmbios de informação, maior participação na tomada de decisões e um alinhamento de estratégias de gestão; • U m equilíbrio entre as necessidades e interesses dos atores locais e governamentais é fundamental para garantir a relevância da informação e a sustentabilidade do monitoramento ao longo prazo; • M esmo sendo uma fonte importante de informação, o monitoramento comunitário de certos temas como de vetores de desmatamento e uso da terra, por exemplo, se torna difícil e limitado quando estão presentes níveis baixos de coesão social e conflitos sobre os direitos de uso dos recursos florestais; • E ntre as vantagens do uso de tecnologias no monitoramento está à coleta de uma variedade de dados georeferenciados (ex. texto, áudio e fotografias) com maior precisão e rapidez para análise e compartilhamento. Porém existe uma dificuldade em se gerar resultados acessíveis e facilmente compreensíveis para as diferentes audiências. Resultados gerais do monitoramento na Reserva Extrativista Chico Mendes1 67% criam gado, 71% para corte e 29% para leite 80% afirmam conhecer as regras do Plano de Utilização da RECM O Cedro Rosa (Cedrela odorata), Jitó (Guarea trichilioides) e Amarelão (Aspidosperma vargasii) são as espécies madeireiras mais extraídas pelos moradores 75 colocações atualmente tem conflitos com vizinhos 172 registros de invasão, dos quais 41% para caça 21% cortam seringa (Hevea brasiliensis), a maioria no município de Xapuri 70% dizem valorizar mais à floresta em pé do que derrubada 10% afirmam criar peixes em açudes, 65% conhecem o programa de piscicultura, e 5% recebem algum beneficio do programa 84% acham que estão ocorrendo alterações climáticas; o aumento da temperatura é a mudança mais observada 89% responderam que não tem acesso à campanha de vacinação 77% dizem conhecer o Programa Bolsa Verde2, 16% participam 86% da escolas dentro da RECM carecem de serviços como transporte e 82% não tem acesso a energia 1 2 28% dizem ter comprado à colocação em que residem Em base à amostragem detalhada por tema na Tabela 3 na pagina 13. Todas a porcentagens são referentes as unidades familiares entrevistas, salvo o tema de educação. O Programa Bolsa Verde tem como objetivo incentivar a conservação dos ecossistemas. A bolsa é do valor de R$ 300,00 cada três meses. 5 1. Introdução 1.1 Conservação florestal e desenvolvimento sustentável no Estado do Acre, Brasil O estado do Acre conta com 86% de cobertura florestal original (Governo do Acre 2006; WWF 2013) e como parte de esforços estaduais para manter estas florestas em pé vem estabelecendo uma série de políticas e incentivos ambientais voltados à redução de emissões por desmatamento e degradação florestal (conhecido com REDD+3), à conservação florestal e ao desenvolvimento sustentável, como parte do Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA) – ver Box 1. Dentro do marco do SISA estão sendo criados mecanismos, em cumprimento a um conjunto de indicadores estabelecidos dentro do padrão de salvaguardas socioambientais REDD+ SES4, para controlar e monitorar os riscos e potencializar as oportunidades do sistema. Grande parte das florestas do Acre está distribuída em áreas protegidas, entre elas as Unidades de Conservação de Uso Sustentável (ver Figura 1), como as Reservas Extrativistas (RESEX). As RESEXs representam 16,5% do território do estado (totalizando 2.704.334 hectares) e são áreas estratégicas do sistema nacional e estadual de unidades de conservação (SNUC & SENUC), e de políticas federais e estaduais de contenção do desmatamento, da proteção da biodiversidade, na manutenção de serviços ambientais e no respeito à diversidade social e cultural. Apesar das RESEX proporem um modelo de gestão que afirma o princípio de compatibilizar a conservação da natureza com o aproveitamento sustentável dos recursos naturais, existe pouco entendimento sobre as dinâmicas de desenvolvimento rural florestal dentro destas unidades de conservação e sobre o alinhamento com os objetivos do REDD+ frente às mudanças nos meios de vida e padrões de uso da terra das populações aí residentes em resposta às pressões de mercado e à expansão agropecuária na região amazônica. Box 1. Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA), do Estado do Acre5,6 O Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA), criado pela Lei n° 2308, de 22 de outubro de 2010, é uma iniciativa pioneira que promove ações de conservação, recuperação e incremento de diversos serviços ambientais do estado, através de instrumentos de planejamento, regulação, monitoramento, controle e registro de emissões. O SISA apresenta vários programas que buscam a conservação do ativo florestal, melhoria da qualidade de vida com incremento da produtividade e de renda de atividades econômicas voltadas para a manutenção e valorização dos serviços ambientais. Entre estes, o programa de Incentivos aos Serviços Ambientais do Carbono Florestal - ISA Carbono, que está desenvolvendo um mecanismo de REDD+ em escala jurisdicional no estado com base na comercialização de créditos de carbono. Figura 1. Unidades de conservação de uso sustentável no estado do Acre Brasil Acre Brasil Reserva Extrativista Chico Mendes Peru 3 4 6 Bolivia REDD mais o manejo florestal sustentável, conservação, recuperação e aumento dos estoques de carbono. Os padrão REDD+ SES (“REDD+ Social & Environmental Standards”) foram elaborados e desenvolvidos de forma participativa pela facilitação da Aliança para o Clima, Comunidade e Biodiversidade (CCBA) e da CARE Internacional. 1.2 Necessidades de monitoramento e participação O fortalecimento de instrumentos de monitoramento florestal e a criação de sistemas de informação de salvaguardas é um componente fundamental para compreender a eficácia, efetividade e equidade de modelos de conservação como as RESEXs e de políticas e incentivos a investimentos ambientais que atuam nessas áreas, tais como o SISA. Ferramentas existentes de monitoramento, como a Unidade Central de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto (UCEGEO) do Acre que monitora a cobertura florestal e queimadas no estado, assim como e o sistema PRODES do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), estão gerando dados precisos sobre a cobertura florestal do Acre. Existe, porém, a necessidade de outras ferramentas de monitoramento para entender as dinâmicas locais do uso da terra e meios de vida, os estoques e fluxos de carbono, o impacto sobre a biodiversidade o contexto socioeconômico. Ferramentas que possam gerar informação de baixo para cima são essenciais para calibrar7 o entendimento sobre a efetividade e cumprimento de salvaguardas de estratégias REDD + e outras políticas ambientas na Amazônia. Box 2. O que é monitoramento comunitário? O monitoramento comunitário ou participativo é um modelo heterogênico que se define de maneira geral pela participação local ou comunitária. Porém, essa participação também varia em forma e intensidade. Em alguns casos as populações locais participam somente na coleta de dados e em outros modelos as comunidades participam em mais etapas: na definição de temas, na coleta e analise de dados, etc. Os níveis de participação têm sido um critério para categorizar e gerar uma tipologia dos diferentes modelos de monitoramento (Danielsen et al. 2009). Estes modelos participativos tem sido aplicados no monitoramento e para coleta de indicadores de uso de recursos naturais e bem-estar de comunidades florestais, buscando também incorporar conhecimentos tradicionais. Recentemente estão sendo integradas tecnologias digitais (como aparelhos celulares smartphone com capacidade GPS, e drones com câmaras/sensores) para aperfeiçoar a precisão e a rapidez da coleta e análise de dados dentro destes modelos. O uso de tecnologia no monitoramento serve como uma ferramenta para alinhar os dados gerados no nível local com outras metodologias e escalas de monitoramento. Para mais informações, veja: forestcompass.org O projeto de monitoramento florestal comunitário na Reserva Extrativista Chico Mendes demostra o potencial de modelos locais de monitoramento para gerar informações importantes para a gestão de recursos naturais dentro de areas protegidas, para a governança florestal e requerimentos de salvaguardas no estado do Acre. 5 6 7 8 © GCP Neste contexto, o monitoramento florestal comunitário ou participativo (ver Box 2) pode ser uma ferramenta eficaz8 e de baixo custo para a coleta de informações e observações florestais relevantes para gerar esse tipo de informação necessária para fortalecer a gestão e governança de recursos florestais de UCs. Este modelo pode também ser importante para gerar oportunidades de capacitação e apropriação local das comunidades florestais dentro estratégias conservação. Figura 2. Monitor comunitário da Guiana Inglesa Leitura adicional: WWF. 2013. O Sistema de Incentivos por Serviços Ambientais do Estado do Acre, Brasil: Lições para Políticas, Programas e Estratégias de REDD Jurisdicional. Rio Branco, Acre, Brasil. Disponível: http://d2ouvy59p0dg6k.cloudfront.net/downloads/acre_brazil_sisa_report___portuguese_10_13.pdf Leitura adicional: IMC, CARE BRASIL, IMAFLORA. 2013. Manual de monitoramento das salvaguardas socioambientais de REDD+ no SISA. Rio Branco, Acre, Brasil. Disponível: https:// www.imaflora.org/downloads/biblioteca/521b9f64930b5_Manual_Sisa_Final.pdf A precisão da UCEGEO é 0.5 ha. Os fragmentos dentro areas degradadas e desmatadas são menores e não são identificados o que pode inferir na soma geral do desmatamento – o monitoramento pode ser um verificador in loco do desmatamento e degradação (ver: Pratihast et al 2014). Resultados de Danielsen et al. 2013 mostram que as florestas podem ser monitoradas por comunidades com a mesma acurácia dos cientistas. 7 2. Monitoramento florestal comunitário na Reserva Extravista Chico Mendes A Reserva Extrativista Chico Mendes (RECM), criada pelo Decreto n° 99.144, de 12 de março de 1990, localizada na região sudeste do Estado do Acre, cobre uma área total de 970.550 ha que sobrepõe os municípios de Assis Brasil, Brasiléia, Xapuri, Capixaba, Rio Branco e Sena Madureira (ver FiguraS 1 & 8). A reserva é habitada por uma população dinâmica de aproximadamente 2.000 famílias9, em torno de 10 mil pessoas, que vivem da coleta de produtos florestais (como a castanha, seringa, caça, pesca) e da agricultura familiar. Porém, nos últimos anos, a pecuária e outras atividades predatórias, estão contribuindo para uma perda crescente da cobertura florestal10. Visando entender as dinâmicas locais e contribuir para o conhecimento detalhado sobre aspectos socioeconômicos e ambientais, foi estabelecido um projeto piloto de monitoramento com uma abordagem participativa e tecnológica. Os objetivos do projeto foram: (1)Criar capacidade técnica local para a coleta de dados e oportunidades de aprendizagem e conscientização comunitária; (2)Fortalecer e orientar a gestão compartilhada da RECM; (3)Informar o desenvolvimento é a implementação de políticas ambientais e salvaguardas ligadas ao marco do SISA do Acre; 2.1 Matriz de monitoramento O projeto inicio em novembro de 2013 consultando diversos atores comunitários, governamentais e da sociedade civil atuando ou interessados na RECM. Uma matriz de monitoramento foi elaborada em oficinas com a participação de representantes das comunidades, principalmente o conselho gestor da RECM, órgãos do governo estadual e federal, e sociedade civil11, buscando entender os temas e indicadores de prioridade e equilibrar as necessidades e interesses locais e externos em monitoramento. A matriz final é composta por três áreas temáticas (e os indicadores correspondentes): (1) Desenvolvimento econômico; (2) Bem-estar comunitário; (3) Governança florestal. A partir destra estruturação, as perguntas metodológicas foram definidas pela equipe técnica em conjunto com os monitores comunitários do projeto, buscando entender como um modelo de monitoramento comunitário poderia ser viável para gerar a informação necessária, e para orientar e contextualizar as perguntas que suplementariam os indicadores. © David Sabogal (4)Desenvolver boas práticas no uso de ferramentas tecnológicas em modelos de monitoramento florestal comunitário. Figura 3. Monitora comunitária do Projeto Sinal Verde 9 10 11 8 O censo SEMA/ICMBio que registrou 1766 unidades familiares na RECM em 2009. Cerca de 11% de área desmatada (ICMbio): http://d3nehc6yl9qzo4.cloudfront.net/downloads/guia_resex_chicomendes.pdf Atores do governo estadual (IMC, SEMA, CDSA), atores do governo federal (ICMbio, UFAC), sociedade civil organizada (Centro dos Trabalhadores da Amazônia). Tabela 1. Matriz de monitoramento comunitário do projeto Sinal Verde Governança florestal Bem estar comunitário Desenvolvimento econômico Tema 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 Produção extrativista florestal 12 Indicador Relevância Quantidade e frequência de extração (anual & mensal); espécies em uso; comercialização e preço pago; tipo e escala de operação; existência de plano de manejo; acesso a subsídios e politicas relacionadas à produção. Meios de vida13 Produção agrícola Frequência de abertura de roçados; tipo de cobertura vegetal e área utilizada; tipos de cultivo; comercialização; métodos e insumos agrícolas. Produção pecuária16 Tipo e número de criação; comercialização; produtos derivados; acesso a serviços/políticas públicas. Acesso a serviços públicos Conhecimento; percepção sobre serviço; número de participantes/beneficiários. Uso e qualidade da educação Localização e número de escolas; média de alunos e gênero; meio de transporte utilizado; tipos de serviços e infraestrutura existentes nas escolas. Atendimento á saúde Percepção sobre incidência de doenças; localização e números de postos de saúde; frequência de visitas/uso dos postos; gastos por família com saúde. Uso e qualidade da agua Frequência e número de famílias tratando água de consumo; modos de acesso à água; número e tipo de atividades realizadas com água; armazenamento e tratamento de água. Trafegabilidade das vias de acesso Localização, número e tipo de obstáculos/problemas. Efetividade e participação na gestão Participação na estrutura coletiva de gestão comunitária18; conhecimento e perspectivas sobre os instrumentos de gestão da RESEX19. Ocupação do território Frequência, ocorrência, tipo23 e localização de invasão e conflitos territoriais; período de permanência na RECM e emigração; aquisição de colocações; conhecimento dos limites da colocação. Percepção e conhecimento local Conhecimento e compreensão de temas ambientais; percepções de mudanças climáticas e valorização florestal. Impacto de políticas públicas24 Conhecimento, acesso/participação e percepção do impacto da política ou programa. 15 Direitos de uso14 Vetores de desmatamento e degradação florestal Geração de benefícios17 Direitos sociais básicos Repartição de benefícios20 Consentimento livre prévio e informado (FPIC)21 Boa governança e participação22 Borracha (CVP; latex liquido; FDL), castanha (processada), açaí, peixe e caça tradicional e comercial; carvão vegetal; madeira. Principio 3, critério 3.1 do checklist do manual de monitoramento de salvaguardas socio-ambientais do SISA. Principio 1, critério 1.1 do checklist. Roçados brancos & permanente (frutíferas e palmeiras). Gado, pequenos animais, piscicultura. Principio 2, critério 2.1 do checklist. Conselho Deliberativo, Associações, Núcleos de Base, Adjunto. Plano Desenvolvimento Comunitário - PDC, Plano de Manejo - PM, Plano de Utilização - PU. Principio 2, critério 2.1 do checklist. Principio 1, critério 1.3 do checklist. Principio 4, critério 4.1, 4.2, 4.3; principio 6. Para caça, retirada de castanha e madeira, pesca, pasto e roçado. Programas incluem: Pequenos Animais; Florestas Plantadas; Piscicultura; Subsidio da Borracha; PGPM; PNAE; PAA; Bolsas; Credito Habitação; Energia (Luz para todos, e solar). 9 Município Total de habitantes (famílias26) Monitores comunitários27 Xapuri 2825 (626) 12 Brasileia & Epitaciolândia 3008 (664) 13 Assis Brasil 1411 (275) 6 Sena Madureira 324 (54) 3 Capixaba & Rio Branco 652 (147) 6 © GCP Cada monitor participou de 11 oficinas de treinamento (sobre metodologias de levantamento25, uso de celulares e formulários eletrônicos, técnicas de entrevista e comunicação), para a elaboração de perguntas, verificação e relatoria dos resultados para as comunidades. Tabela 2. Alocação dos monitores por município da RECM Figuras 4, 5 & 6. Treinamento e definição das áreas de atuação dos monitores comunitários 25 26 27 10 A abordagem (método, perguntas) é adaptada ao contexto local com a participação dos moradores da reserva. Considerando o censo SEMA/ICMBio 2009 que registrou 1766 unidades familiares (UF) na RECM. O numero final de monitores capacitados foram 36. © GCP Uma equipe de 40 monitores comunitários (30 homens e 10 mulheres) com faixa etária de 18 a 38 anos, residentes da RECM foram inicialmente selecionados para participar por meio de uma convocatória e processos de entrevistas por parte das associações com os instituições parceiras do projeto. Estes receberam uma bolsa de incentivo no valor mensal de R$ 300,00 (equivalentes a 10 dias trabalhados em tarefas de monitoramento) em áreas de atuação previamente acordadas. A alocação dos monitores dentro da RECM foi realizada por critério demográfico (Tabela 2). Uma equipe de gestão capacitada (com integrantes das organizações parceiras) realizou oficinas de capacitação e visitas mensais, criou os formulários eletrônicos de levantamento, e realizou a análise e parte da relatoria de dados para as lideranças comunitárias e outros atores. © GCP 2.2 Capacitação 2.3 Uso da tecnologia28 Para a coleta de dados foram utlizados aparelhos celulares smartphone (Samsung Galaxy X cover 229) e questionários digitais usando um aplicativo de livre acesso e de interface amigável da Google chamado Open Data Kit (ODK)30. Este aplicativo permite utilizar a função de texto, câmera, gravação de áudio e GPS do aparelho celular. A criação dos formulários foi feita com Microsoft Excel e depois transferida a uma plataforma local e online chamada Smap31, que foi utilizada para gestão destes formulários. Figura 7. Sistema monitoramento e uso de tecnologias do projeto Sinal Verde 1. 2. Elaboração participativa das perguntas do formulário Criação e gestão dos formulários eletrônicos (Excel & Smap) O upload e download de dados dos celulares para o computador foram feitos usando uma conexão wifi local. A visualização e processamento inicial dos dados foram feitos usando Smap que também permite fazer downloads dos resultados em formatos diferentes como planilhas e shape files para uma análise e visualização aprofundada usando Excel, ArcGIS e Google Maps Engine. 3. 4. Transferência de formulários dos aparelhos usando wifi (Tp link) Coleta de dados off-line (ODK) Copias dos dados foram armazenadas em um hard drive local e na nuvem (Dropbox), com acesso múltiplo baseado no Smap instalado no computador, e acessíveis online. O uso de tecnologias digitais tem um grande potencial em atividades de monitoramento local e mais abrangentes. Entre as vantagens, está a coleta de uma variedade de dados georeferenciados (ex. texto, áudio e fotográfico) instantâneos e com maior precisão (redução no número de erros no cadastro). Outro atributo importante do monitoramento comunitário baseado em tecnologias digitais é a rapidez com que estas informações podem ser compartilhadas e analisadas, mantendo a relevância e aplicabilidade das informações. 5. 6. Recebimento de dados dos aparelhos usando wifi (Tp link) Processamento e análise de resultados (Excel, Smap, ArcGIS, Google Maps Engine) 2.4 Amostragem De março 2014 à fevereiro 2015 foram visitados 56 seringais, alcançando uma média de 25% do total de família que residem na RECM. Por volta de 6.169 formulários foram preenchidos neste período, por meio de observações, entrevistas estruturadas e georeferenciadas nas unidades familiares dentro da RECM. 28 29 30 31 7. 8. Armazenamento na nuvem (Dropbox) Compartilhamento e relatoria de resultados A metodologia foi adaptada de experiências na Guiana Inglesa: http://forestcompass.org/how/resources/case-study-report-community-based-monitoring-systems-redd-guyana O aparelho deve ser robusto, ser resistente a água e possuir memória extensa para coleta de dados. www.opendatakit.org http://www.smap.com.au/ 11 Figura 8. Mapa da abrangência do monitoramento comunitário na RECM Legenda: Colocação/famílias entrevistadas PSV Tabela 3. Período e amostragem do monitoramento Período de coleta Fonte N° formulários (% UF32) Suficiência amostral Impacto de políticas públicas Entrevistas 931 (53%) 3% Ocupação do território Entrevistas 931 (53%) 3% Trafegabilidade das vias de acesso Observações 637 n/a Conhecimento de temas ambientais Entrevistas 326 (18%) 5% Observações; Entrevistas 8933; 719 3% Uso e qualidade da agua Entrevistas 699 (40%) 3% Produção extrativista florestal Entrevistas 722 (41%) 3% Efetividade da gestão florestal Entrevistas 660 (37%) 5% Produção agropecuária Entrevistas 539 (31%) 4% Avaliação do projeto Entrevistas 389 (22%) 5% Temas de monitoramento 2014 J F M A M J J 2015 A S O Educação e saúde 32 33 12 Considerando o censo SEMA/ICMBio 2009 que registrou 1766 unidades familiares (UF) na RECM. Visitas e entrevistas nos centros educacionais da RECM. N D J F Tabela 4. Cronograma de implementação do projeto Participação34 Baixa Media Atividade Duração Comentários Alta • Elaboração e revisão participativa da matriz de monitoramento. Seleção dos monitores feita pelas associações de moradores35 em função da capacidade e perfil36. Formação dos monitores por meio de 11 oficinas de treinamento sobre temas, métodos de entrevistas e uso de tecnologias e logística do monitoramento. Comunicação com a comunidade para divulgar o projeto, discutir prioridades de monitoramento e explicar próximos passos. Coleta de dados usando formulários ODK e aparelhos celulares, e transferência de dados usando Smap. Nov. 2013 – Jan. 2014; Set. 2014 Dez. 2013 – Jan. 2014 Relatoria de resultados realizadas em 20 diferentes encontros. Compartilhamento de dados para diferentes partes interessadas. 34 35 36 • Entender os limites do monitoramento feito com metodologias participativas (ex. desmatamento), e revisar a matriz de acordo com estas limitações. • eleção deve ser feita pelos órgãos comunitários com base S no perfil definido junto ás instituições parceiras. • ma avaliação antes e depois da seleção dever ser feita U para entender a disponibilidade e comprometimento do candidato (a). • iagnósticos periódicos de capacidades são importantes D para o nivelamento de conhecimento e habilidades entre os monitores e para desenhar o processo de capacitação. • troca de aprendizados entre os monitores é fundamental A assim como a disponibilidade de material de leitura nos mesmos aparelhos celulares. • disseminação de informação é fundamental para obter A apoio local e evitar qualquer desentendimento ou conflito. • olhetos informativos assim como monitores capacitados e F informados sobre as perguntas e respostas são essenciais. • participação comunitária é indispensável na elaboração e A definição das perguntas e abordagem do monitoramento. • georeferenciamento dos dados é importante para O entender a distribuição espacial do monitoramento e desempenho dos monitores. • necessário entender a compatibilidade dos resultados É para permitir o cruzamento com dados existentes. • rocessamento e análise requerem tempo e precisam ser P verificados por atores comunitários. • s necessidades de informação são diferentes nos diversos A níveis de gestão – o governo federal e estadual, ONGs, e comunidades – demandando diferentes formatos de relatoria (ex. reuniões, oficinas participativas, posters, videos, etc). • articipação comunitária na relatoria para garantir P relevância e aprovação local. • importante que sejam estabelecidos acordos entre É comunidades e partes interessadas, de forma que os dados coletados não causem impactos negativos e garantam o domínio da comunidade sobre os dados coletados. Mar. 2014 – Dez. 2014 Mar. 2014 – Fev. 2015 Mar. 2014 – Dez. 2014 (Mensal) Análise e visualização de dados por meio do Smap, Excel & ArcGIS. Set. 2014 – Nov. 2014; Fev. 2015 – Abr. 2015 uscar um equilíbrio entre as necessidades, interesses B e prioridades locais e externas de monitoramento para manter relevância e alinhar os resultados às iniciativas existentes e relevantes em diferentes escalas. Participação dos membros da comunidade (lideranças, monitores, etc.) nas diferentes atividades realizadas. AMOPRESENA, AMOPRECARB, AMOPREX, AMOPREB e AMOPREAB. Escolaridade, disposição física, conhecimento local, liderança, e caráter de voluntariedade, disponibilidade de tempo, etc. 13 3. Resultados & discussão O projeto tem produzido uma série de relatórios (disponíveis como anexos e no site www.forestcompass.org) com base nas temáticas da matriz de monitoramento (Tabela 1). Estes foram distribuídos às partes interessadas em diversas escalas de governança e discutidos em reuniões participativas ao longo do projeto. Os resultados apresentados abaixo servem para ressaltar a relevância do monitoramento comunitário para suprir as necessidades de informação que existem dentro e fora da RECM, tanto por comunitários como governamentais. 3.1 Bem-estar comunitário Com base nas necessidades locais identificadas na elaboração da matriz, o projeto avaliou o fornecimento de serviços básicos na RECM como água, saúde e educação37, quanto ao uso, acesso e percepções de qualidade destes serviços, assim como a trafegabilidade das vias que estão relacionadas com o acesso a estes serviços. É evidente que a qualidade de vida das comunidades florestais na RECM está ligada ao fornecimento e acesso a serviços básicos, servindo assim como importantes indicadores sobre o bem-estar para informar estrategias que buscam gerar benefícios socias. Dentro da política de salvaguardas socioambientais do SISA 38, a contribução ao bem-estar das populações florestais tradicionais é um importante criterio dos programas que buscam melhorar meios de vida e para o sucesso de sistemas de REDD+. Box de resultados 1. Uso e qualidade da água na RECM As principais fontes de abastecimento de água na RECM são cacimbas e igarapés. O armazenamento da água é feito em sua maior parte em baldes e em caixas de água. 58% dos moradores utilizam a água para a criação de pequenos animais, 27% usam água na agricultura, 14% para criação de 20 40 60 80 gado e 1% 0para a piscicultura. Entre as 719 famílias entrevistadas, existe uma porcentagem significativa (39%) que não realiza nenhum tipo de tratamento na água para consumo. Aqueles que afirmam tratar o fazem com uso de cloro/água sanitária. Embora seja difícil definir a correlação entre doenças relacionadas à agua e a falta de tratamento de água, os resultados visíveis no gráfico abaixo apontam a um problema de doenças ligadas a descuidos sanitários e consumo de água não tratada. % Entrevistados Figura 9. Relação entre tratamento de água e ocorrência de diarréia na RECM 100 100 80 80 % Que trata agua para consumo 60 60 % Afirma a diarreia como problema de saúde 40 40 20 20 Assis Brasil Epitaciolandia Brasileia Rio Branco Capixaba 42% 62% 36% 61% 77% 56% 33% 28% 82% 27% Outro resultado interessante e importante é que 66% dos entrevistados não consideram a água como fator relacionado a problemas de saúde, o que indica uma falta de conhecimento sobre os riscos. Estes resultados dão um entendimento adicional sobre o bem-estar das populações dentro da reserva. Informações 37 38 14 Sena Madureira Xapuri como estas podem orientar ações de programas de saúde, na conscientização sobre o tratamento de água, para que os moradores sejam informados dos riscos de consumir água não tratada e que seja feita a capacitação em boas práticas do uso de água: coleta, armazenamento, tratamento. A distribuição de cloro também poderia trazer resultados positivos. http://www.ipsamazonia.org.br/metodologia O princípio 3 do manual de monitoramento de salvaguardas socioambientais diz que o SISA e seus programas devem melhorar e assegurar os meio de vida em longo prazo e bem-estar dos povos indígenas e populações locais com atenção especial para mulheres vulneráveis. IMC 2013. 15 © Neil Palmer (CIFOR) 3.2 Desenvolvimento econômico A política ambiental do estado do Acre está direcionada para o desenvolvimento sustentável com base num modelo econômico “verde” alinhado com mecanismos de REDD+, que tem como estratégia impulsionar as cadeias produtivas extrativistas existentes em áreas como a RECM, a fim de aliviar as pressões sobre a floresta associadas a modelos de desenvolvimento econômicos predatórios, como a pecuária extensiva e as limitações de mercado (ex. escoamento, preço justo). Como parte destes esforços é necessário gerar informações para entender o desempenho econômico e a sustentabilidade da produção florestal extrativista, assim como o acesso e a participação da população local nas políticas voltadas para a produção comparadas aos sistemas convencionais de exploração. Depoimentos comunitários “ Em pé (a floresta), porque é mais frio e eu vivo dela, eu não sou fazendeiro, eu sou seringueiro e castanheiro, então eu vivo dela ” Você acha que a floresta vale mais em pé ou no chão/ derrubada ? “ “ Porque com ela (floresta) no chão a gente planta as coisas pra se alimentar, a macaxeira, faz a farinha, planta o arroz, onde a gente cria galinha, a bananeira que a gente vende, e com a mata em pé ninguém vai comer a folha Com o objetivo de suprir estas necessidades, o projeto tem gerado uma fotografia atual da produção florestal baseado na coleta de dados qualitativos (ex. depoimentos comunitários) e quantitativos por meio de entrevistas com unidades familiares dentro da RECM. ” Box de resultados 2. Produção florestal extrativista na RECM Os principais produtos florestais extraídos na RECM são a castanha e seringa. Das 738 famílias entrevistadas cerca de 60% (461 famílias – ver mapa abaixo) quebra castanha, e o munícipio de Xapuri apresenta maior ocorrência. A quantidade média extraída por família é por volta de 172 latas por safra com um valor médio de R$ 29,50 por lata de castanha. Vale a pena destacar que os preços pagos são muito diferenciados (entre R$ 16,50 - R$ 43,25/lata) dependendo do município sendo que a venda é feita na maioria para marreteiros39 e por tanto existem rendas muito diferentes na reserva. Figura 10. Familias que quebram castanha na RECM em 2014 Legenda: Quebram castanha 39 16 O marreteiro (atravessador) é uma figura emblemática que percorre as colocações comprando a produção de castanha por preço inferior ao de mercado. Box de resultados 2. Produção florestal extrativista na RECM Foram identificadas 166 famílias que atualmente cortam seringa na RECM (22% dos 73840). Os municípios de Assis Brasil e Xapuri apresentam maior numero de famílias que cortam seringa. Das 166 famílias que cortam seringa a maioria (73%) produz látex (borracha seca), 19% cernambi virgem prensado (CVP) e o restante (8%) produz folha de defumação líquida (FDL). Para entender a produção da seringa na RECM o projeto também procurou compreender o impacto de ações governamentais, especialmente os atuais subsídios para a cadeia da borracha criados pela Lei Chico Mendes41. Com base em uma amostra de 931 entrevistas, 34% (ou 319 famílias) afirmam conhecer a política de subvenção da borracha (Subsidio da Borracha – SB) e 168 famílias (53%) recebem ou receberam o beneficio em 2014. O gráfico42 abaixo mostra a distribuição e o acesso diferenciado por município. Os resultados apresentados aqui mostram a fragilidade do extrativismo, e a necessidade de se ter um melhor entendimento sobre como está sendo feita a repartição de benefícios dos programas atuais que buscam incentivar a geração de renda em base a produção florestal. Figura 11. Relação entre famílias que cortam seringa e acessam o Subsídio da Borracha (SB) por municipio da RECM 52% Xapuri Sena Madureira 44% 0% 3% % Famílias que atualmente cortam seringa Rio Branco/ Capixaba 18% 20% % Famílias que acessam ou acessaram o Subsidio da Borracha 14% 18% Brasileia/Epita 77% Assis Brasil 24% 0% 20% 0 40% 20 40 Depoimentos comunitários Quais são os conflitos que existem com colocações 100 vizinhas? 80 60 40 20 40 41 “ …O cara vem com o cachorro para caçar, eles comem (os animais do mato), a gente fica sem, e ainda espanta os outros! ” 60% % Famílias 60 80% 100% 80 3.3 Governança florestal A RECM busca unir a conservação ambiental com o desenvolvimento e para isso são necessárias medidas e estruturas que viabilizem este objetivo. A participação na governança, o conhecimento local acerca das ferramentas e normas de gestão e a valorização das instituições e dos agentes gestores da UC, são indicadores importantes para entender a efetividade deste modelo. Além disso, dados sobre a coesão social, por exemplo, a ocorrência de conflitos relacionados ao uso da terra pode auxiliar na gestão e governança do território em áreas protegidas como as RESEX e, também podem informar processos em outras escalas de atuação e governança em nível jurisdicional. Em comparação, no censo de 2009, 801 famílias (45%) cortavam seringa de um total de 1766 unidades familiares. Preços atuais (2014): FDL R$ 7,5/quilo, CVP: R$ 1,5/quilo, Latex R$ 3,6/quilo; Preço do subsídio: FDL R$ 3,5/quilo, CVP: R$ 1,4/quilo, Latex R$ 4,4/quilo. 17 18 © Diego Lourenço Gurgel Box de resultados 3. Governança e gestão na RECM Na RECM as principais ferramentas de gestão são os planos de manejo e utilização da RESEX e Plano de Desenvolvimento Comunitário (PDC) que funcionam juntamente com uma estrutura de gestão compartilhada (por meio do conselho gestor43) para direcionar, de forma participativa, a tomada de decisão e a validação dos instrumentos de gestão e o uso dos recursos naturais. Por tanto o projeto buscou gerar um entendimento aprofundizado sobre o desempenho desses mecanismos de gestão quanto à participação, conhecimento, perspectivas e acompanhamento das regras e normas estabelecidas nos planos de gestão, e também como são valorizados estas instituições e agentes gestores da UC. Figura 12. Estrutura e effectividade da gestão da RECM e os resultados encontrados pelo projeto 44 Ferramentas de gestão 63% conhece o PdM, 21% dos que conhecem acha que funciona 41% (226 entrevistados) afirmam saber da existência do PdU; destes, 80% conhece as regras; 77% concordam com as regras e 64% acredita que são cumpridas 30% afirmam saber da existência do PDCs; dos que conhecem e tem PDC (51%), 74% dizem ter participado da elaboração do plano Plano de Manejo Plano de Utilização Resultados do projeto mostram que metade (54%) dos entrevistados mora na RECM desde, ou antes, da sua criação em 1990. Dos 539 moradores entrevistados dentro da RECM, 35% já mudaram de colocação pelo menos uma vez, e 26% dos entrevistados dizem ter comprado à colocação em que residem. Foram também identificadas 75 colocações que atualmente têm conflitos sobre limites com as colocações vizinhas, e 172 registros de invasão, dos quais 41% foram para caça como indica o gráfico (Figura 13). 42 43 44 ICMBio 55% acha que o ICMBio cumpre seu papel na UC Plano de Desenvolvimento Comunitário (PDC) Outros fatores importantes que podem ter um impacto na gestão da RECM são as dinâmicas de ocupação, em termos de assentamentos e dispersão demográfica, e conflitos sobre o uso da terra. 67% se sente representado pelo Conselho Deliberativo Conselho Gestor Associações de moradores 62% não estão ligados a uma associação Comunidades, núcleos de base, adjuntos 49% participa no NdB, e 47% acha importante Famílias e moradores 47% participa no adjunto, 84% acha importante Figura 13. Tipos de invasão que ocorrem na RECM Retirada de madeira 8% Retirada de castanha 23% 40 Roçado 10% 20 0 Pesca 13% Caça 41% Pastagem 5% A rotatividade de famílias dentro da RECM, e a compra de colocações, tanto como a presença de conflitos, traz prejuízos para a execução dos planos de manejo e de utilização. É preciso conscientização das famílias que estão sendo assentadas para que todos os usuários da UC estejam nivelados quanto ao conhecimento das regras. 0 10 80 60 40 20 Gráfico referente a dados de dois formulários diferentes. O Conselho Deliberativo da Resex Chico Mendes foi criado pela Portaria IBAMA n° 28, de 22 de maio de 2003, publicada no Diário Oficial da União – edição n° 98 – em 23 de maio de 2003, com a finalidade de contribuir com ações voltadas à sua efetiva implantação, implementação do Plano de Manejo e ao cumprimento dos seus objetivos de criação. Porcentagens em base a um total de 551 entrevistas. 19 4. Impactos & próximos passos 4.1 Oportunidades © GCP Experiências na RECM, demostram o potencial de modelos de monitoramento florestal comunitários como ferramenta para gerar importantes fluxos de informação, tanto para as populações locais como para agentes externos. Ao nivel local, esta informação pode possibilitar tomadas decisões informadas sobre o uso e gestão dos recursos naturais e melhoria dos meios de vida dentro de áreas dinâmicas e de difícil acesso como a RECM. Em nível jurisdicional também serve como modelo para avaliar de forma independente o impacto e efetividade de instrumentos de governança. A retroalimentação ou feedback do monitoramento poder ser usado para desenvolver e melhorar os impactos de políticas ambientais como REDD+ em programas como o SISA, para garantir o cumprimento de salvaguardas socioambientais como o REDD+ SES. Promovendo assim a transparência e responsabilidade destas iniciativas e contribuindo para uma governança e repartição de benefícios mais equitativa. Figura 14. Equipe de monitores capacitados da RECM O monitoramento comunitário torna-se um modelo que pode catalisar outros benefícios como uma maior participação em atividades conservação e criar intercâmbios entre atores em diversas escalas de governança. A capacitação de agentes comunitários na coleta de dados periódicos e sistemáticos tem criado uma nova categoria funcional de mão-de-obra especializada, o monitor comunitário, que tem um potencial importante dentro de um sistema abrangente de monitoramento florestal, replicável em outras regiões e UCs. Monitores comunitários têm o acesso, o conhecimento tradicional e a credibilidade para realizar a coletas de dados, que muitos atores externos 45 20 carecem. Estes atores também podem ser pontos focais para disseminação e troca de informações, e na intermediação do diálogo entre diferentes níveis e atores. Tal diálogo é necessário para estabelecer uma ligação e promover a sensibilização entre diferentes escalas de atores e interesses (comunidades florestais, governo estadual e governo federal) para a implementação de políticas como REDD+. 4.2 Desafios Apesar dos benefícios e oportunidades que vêm se demonstrando, ainda existem desafios na integração, valorização e uso de dados provenientes de iniciativas locais de monitoramento por parte de sistemas e instituições em outras escalas. O monitoramento deve gerar resultados que possam ser utilizados nos processos de tomada de decisão nos diversos níveis de governança. O empodeiramento das comunidades e da informação é fundamental, mas ele continua sendo um desafio por existirem barreiras na geração de resultados acessíveis e facilmente compreensíveis por membros da comunidade, assim como falta de valorização e capacidade institucional ao nível de base. As atividades de monitoramento com base comunitária também se tornam mais difíceis e limitadas (quanto ao acesso á informação), quando estão presentes níveis baixos de coesão social e conflitos sobre os direitos de uso dos recursos florestais. Relações históricas com órgãos do governo na RECM por exemplo, geram desafios na coleta de dados. O monitoramento de vetores de desmatamento e uso da terra é frequentemente relacionado com fiscalização e multas por autoridades causando resistência e desconfiança por parte dos membros da comunidade no fornecimento de informações e relização de atividades. Existem também desafios logísticos na coleta de dados e disseminação de informação em áreas de remotas como a RECM. O tamanho da reserva (quase 1 milhão de hectares) e dispersão demográfica das unidades familiares dentro da RECM dificultam o monitoramento. Estas realidades aumentam os custos de transporte, o tempo necessário para realizar a coleta de dados os quais impactam a disponibilidade e a capacidade de a retenção dos monitores45. Vale salientar que os resultados obtidos pelo projeto devem ser entendidos como uma fotografia da situação atual na RECM por ser uma amostra da população total da reserva O incentivo para participar no projeto é marginal (R$ 300,00/mês), por tanto o custo de oportunidade é maior em comparação a outras fontes de renda dentro da RESEX e região. durante um período de tempo. Também é importante mencionar que perguntas sensíveis relacionadas à extração de madeira e caça, por exemplo, podem gerar resultados incompletos pela natureza das perguntas e pela desconfiança dos extrativistas já que existem planos e regulações quanto ao uso destes recursos florestais dentro da reserva. Por ser uma experiência piloto no Acre e de curto prazo, será necessário refinar a metodologia para que ela se torne facilmente replicável e duradoura, tomando em conta os desafios e aprendizados apresentados. 4.3 Conclusão Resultados desse projeto piloto e de outras iniciativas no mundo mostram o potencial do monitoramento florestal comunitario (veja: www.forestcompass.org para mais informação). Porém será necessário avançar e alinhar metodologias e ferramentas de monitoramento existentes, e incentivar a criação de mecanismos financeiros e mandatos institucionais que possibilitem a longevidade e a incorporação destes modelos em sistemas holísticos de monitoramento e estratégias de conservação florestais. Existem esforços atuais pelo Governo do Estado do Acre, por meio do IMC, para ampliar esta iniciativa piloto dentro do sistema SISA, procurando entender o funcionamento deste modelo dentro de um estructura governamental para REDD+. © Marina Londres Existe uma necessidade de informação sobre o estado das florestas e povos, sobre os estoques e fluxos de carbono, a biodiversidade, e os impactos de esforços de conservação. A disponibilidade destas informações será fundamental para atingir, entre outros objetivos, uma eficiente e efetiva governança florestal para regimes de REDD+ no Acre e ao nível nacional no Brasil46. Esta experiência de monitoramento comunitário no Acre tem buscado demonstrar o potencial deste modelo para gerar dados locais sobre indicadores de desempenho, participação social, geração e repartição de benefícios, que são importantes para a gestão de áreas protegidas e para informar o desenho e implementação de REDD+ e suas salvaguardas (REDD+ SES) no Acre. Figura 15. Morador tradicional da Reserva Extrativista Chico Mendes 46 A implementação de sistemas de informação de salvaguardas é uma obrigação nacional dentro dos acordos Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCCC, em inglês), decisão 1/CP.16. 21 Acrônimos & abreviações Literatura AMOPREABAssociação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Assis Brasil Danielsen, F., T. Adrian, S. Brofeldt, M. van Noordwijk, M. K. Poulsen, S. Rahayu, E. Rutishauser, I. Theilade, A. Widayati, N. The An, T. Nguyen Bang, A. Budiman, M. Enghoff, A. E. Jensen, Y. Kurniawan, Q. Li, Z. Mingxu, D. Schmidt-Vogt, S. Prixa, V. Thoumtone, Z. Warta, and N. Burgess. 2013. Community monitoring for REDD+: international promises and field realities. Ecology and Society 18(3): 41. http://dx.doi.org/10.5751/ES-05464180341 AMOPREBEAssociação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Brasiléia e Epitaciolândia AMOPRECARBAssociação de Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Rio Branco e Capixaba AMOPRESEMAAssociação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Sena Madureira AMOPREX Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Chico Mendes em Xapuri CDSA Companhia de Desenvolvimento de Serviços Ambientais CTA Centro dos Trabalhadores da Amazônia FPIC Consentimento livre, prévio e informado GCP Global Canopy Programme ICMBioInstituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade IMC Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação de Serviços Ambientais INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ISA Carbono Incentivos a Serviços Ambientais do Carbono NORAD Agência Norueguesa de Cooperação para o Desenvolvimento ODK Open Data Kit PDC Plano de Desenvolvimento Comunitário PRODESProjeto de Estimativa do Desflorestamento da Amazônia PSV Projeto Sinal Verde RECM Reserva Extrativista Chico Mendes REDD+Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação e Manejo Florestal Sustentável, Conservação, Recuperação e Aumento dos Estoques de Carbono REDD+ SES REDD+ Social & Environmental Standards RESEX Reservas Extrativistas SISA Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservação UC Unidades de Conservação UCEGEOUnidade Central de Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto 22 Danielsen, F. N. D. Burgess, M. Enghoff. Quadro 15.3 Do nível mundial ao nível local no MRV de REDD+: Ligar abordagens comunitárias e governamentais. Analise de REDD+: Desafios e escolhas. A. Angelsen, M. Brockhaus, W. D. Suderlin, L. V. Verchot. 2013. CIFOR, Bogor, Indonesia. http://www.cifor.org/publications/ pdf_files/Books/BAngelsen130415P.pdf Governo do Acre. 2006. Programa Estadual de Zoneamento Ecológico Econômico, Fase II: Documento Síntese – Escala 1:250.000. Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA), Rio Branco. IMC, CARE BRASIL, IMAFLORA. 2013. Manual de monitoramento das salvaguardas socioambientais de REDD+ no SISA. Rio Branco, Acre, Brasil. https://www.imaflora.org/downloads/ biblioteca/521b9f64930b5_Manual_Sisa_Final.pdf Ministerio do Meio Ambiente - ICMBio, Plano de Utilização da Reserva Extrativista Chico Mendes. Portaria Nº 60, de 28 de agosto de 2008 – ICMBio. Ministerio do Meio Ambiente ICMBio, Plano de Manejo da Reserva Extrativista Chico Mendes - 2006. Pratihast, Arun Kumar, Ben DeVries, Valerio Avitabile, Sytze de Bruin, Lammert Kooistra, Mesfin Tekle and Martin Herold. 2014. Combining Satellite Data and Community-Based Observations for Forest Monitoring. Forests, 5, 2464-2489; doi:10.3390/f5102464. Saraiva Rando, A., M. Nogueira de Azevedo. 2015. Controle social no sistema estadual de incentivos a serviços ambientais do acre: relato da experiência de implantação e funcionamento do comitê local de padrões redes. Santa Cruz do Sul, v. 20, nº 1, p. 108 – 128, jan./abr. Disponivel. https://online.unisc.br/seer/index.php/redes/ article/viewFile/4685/pdf_20 SEMA. 2010. Diagnóstico Socioeconômico e Cadastro da Reserva Extrativista Chico Mendes. Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Acre – SEMA. WWF. 2013. O Sistema de Incentivos por Serviços Ambientais do Estado do Acre, Brasil: Lições para Políticas, Programas e Estratégias de REDD Jurisdicional. 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