Protestos salvam floresta

Transcrição

Protestos salvam floresta
CANIVELLO.COM.BR
ITAR-TASS
Abecásia em cima
do muro
Depois de conflitos com
Geórgia, opinião dividida
Página 02
Reencontro com
Baryshnikov
URY KOZYREV
Trabalhadores
bem pagos, uni-vos
Os maiores salários para
estrangeiros estão aqui
Dançarino percorre cinco cidades brasileiras
Página 06
Página 08
Este suplemento foi produzido e publicado pela Rossiyskaya Gazeta (Rússia)
sem envolvimento de O Estado de S. Paulo
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO
Polêmica Até vocalista do U2 colaborou na mobilização que interrompeu obras no bosque de Khimki
NOTAS
Protestos salvam floresta
Irkutsk ganha 1ª fábrica
de biocombustível
Shows e manifestações
repercutiram na imprensa e
interromperam obra de
rodovia ligando Moscou a
São Petersburgo.
GALINA MASTEROVA
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Quem vai a Moscou e aterrissa no aeroporto Sheremetievo, a noroeste da cidade,
pode avistar uma enorme
faixa de mata que se torna
um oásis verdejante em meio
à aridez urbana. O terreno,
no entanto, é cortado por
uma fina cicatriz de oito quilômetros provocada pela derrubada de árvores. O desmatamento da região tem sido
foco de uma grande controvérsia.
Atualmente, mudas de replantio já estão substituindo as árvores abatidas e logo a cicatriz se tornará bem menor. Mas
a suspensão do projeto para
derrubar a floresta de Khimki, assim como as ações para
recuperar a mata, são resultado de uma intervenção poderosa e sem precedentes que
envolveu o presidente Dmitri
Medvedev e obteve o apoio de
diversas partes do mundo da opinião pública russa a
Bono Vox, vocalista da banda
irlandesa U2.
Poucos acreditavam que Medvedev pudesse intervir na obra,
mas sua decisão acabou trazendo novas esperanças de diálogo entre o governo e a so-
A holding estatal Russian Technologies
anunciou em setembro que planeja iniciar até meados de 2011 a construção
da primeira fábrica de biocombustível
do país. Segundo o diretor da companhia,
Serguei Chemezov, a unidade da cidade
de Irkutsk, no leste da Sibéria, vai produzir biobutanol a partir de aparas e outros derivados de madeira.
Em 2007, estimava-se em 800 milhões de
toneladas a biomassa de madeira para a
produção de energia. Dadas as imensas
reservas de combustíveis fósseis da Rússia, as alternativas verdes demoraram para
ganhar a atenção. Mas há dois anos o governo anunciou um programa para estabelecer e incrementar o setor de biocombustíveis. Trinta fábricas da indústria
madeireira devem receber patrocínio.
Business New Europe
Moscou entrega escritos
de Prestes ao Brasil
RIA NOVOSTI
ILYA VARLAMOV/PHOTOXPRESS
ciedade civil, inclusive
aos ativistas da oposição e aos
ambientalistas.
“É claro que foram os protestos em favor da floresta que
provocaram a decisão”, afirmou o presidente do Greenpeace na Rússia, Mikhail Kreindlin.
O projeto previa que a estra-
da partisse de São Petersburgo, maior cidade do noroeste
russo, por quase 700 km em
linha reta, quando faria um
âgulo agudo na altura do aeroporto Sheremetievo, a noroeste de Moscou, e cortaria
o bosque de Khimki por cerca
de 10 km até a capital.
A questão é que Khimki é
Manifestantes desaprovam as obras
sobre a floresta
considerada o coração do cinturão verde de Moscou, uma
das cidades mais poluídas do
continente europeu.
Além de existirem florestas de
pinheiros e abetos, há também
ali uma das poucas florestas
de carvalhos remanescentes
na Europa.
Depois de um verão em que
incêndios florestais balançaram o país, a natureza passou a ser tema de importância na Rússia. “Acho que
Medvedev ouviu o chamado
do povo”, ressaltou Evguenia
Chirikova, líder da campanha
para salvar Khimki.
CONTINUA NA PÁGINA 3
Carne País se tornou o maior exportador para a Rússia
Brasil domina
o mercado russo
Luis Carlos Prestes (Porto Alegre, 1898 Rio de Janeiro, 1990)
Manuscritos de Luiz Carlos Prestes arquivados em Moscou serão devolvidos ao Brasil no próximo dia 8 de outubro, no Palácio do Planalto. Na ocasião, o embaixador
da Rússia, Serguei Akopov, entregará os
documentos à família do líder comunista,
que viveu na capital russa de 1931 a 1934
e de 1970 a 1979, quando foi promulgada
a Lei da Anistia no Brasil.
“Meu pai faz parte da história deste país,
seu legado pertence ao povo brasileiro”,disse
sua filha, Mariana Prestes.
Os nove filhos de Maria Ribeiro com Prestes pedem que os escritos sejam remetidos ao Arquivo Público Nacional, enquanto Anita Leocádia, filha dele com Olga
Benário, acredita que o material deva ficar
sob o poder do Instituto Luiz Carlos Prestes, do qual é diretora.
Marina Darmaros
VLADISLAV KUZMICHEV
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
O recente embargo russo a
frigoríficos exportadores,
entre eles três brasileiros
(dois da JBS e um da Seara
Alimentos), não impediu que
o Brasil se tornasse em 2010
o líder absoluto nas exportações para a Federação
Russa de três tipos de
carne - de frango, bovina e
suína.
Os Estados Unidos foram
desbancados e não estão
nem entre os três maiores
exportadores de carne suína.
Além disso, os EUA caíram
para a terceira posição do
ranking da exportação de
carne de frango, sendo também ultrapassados pela Alemanha.
Ainda no final de setembro,
a Rússia iniciou o embargo
temporário sobre a importação de carne suína de dois
frigoríficos norte-america-
nos da companhia SmithField Packing.
O motivo alegado foi a descoberta de antibióticos do
grupo tetraciclina, proibido
pelas normas russas, entre
os produtos da empresa.
Mas junto à carne suína norte-americana também foi
suspendida temporariamente a importação do produto
de 12 empresas em seis países europeus e ainda antes
disso, de dois frigoríficos espanhóis e três argentinos.
CONTINUA NA PÁGINA 4
NESTA EDIÇÃO
BRIC
Dois séculos de negócios
História, quadro atual e perspectivas das relações entre
Brasil e Rússia
REUTERS/VOSTOCK-PHOTO
Embargo não impediu que
frigoríficos brasileiros
superassem os norteamericanos nos setores
bovino, suíno e de frango.
CONTINUA NA PÁGINA 5
Brasil supera os Estados Unidos na exportação de carne para a Rússia
EM FOCO
Internet Blogueiros mudam a agenda dos meios de comunicação tradicionais
Israelense que postou más
recordações de um hospital
no interior da Rússia virou
assunto nos jornais do país.
LUKE ALLNUTT
RFE/RL
Não dá mais para manter o
discurso, ainda recorrente, de
que os blogueiros estão sugando o cadáver do bom e
velho jornalismo tradicional.
Eis aqui um bom exemplo
russo de como um blogueiro
pode gerar assunto e virar
pauta para a imprensa.
O jornalistaVadim Isakov publicou no portal de notícias
GlobalVoices o comentário de
uma blogueira israelense de
ascendência russa que divul-
PHOTOXPRESS
Se o hospital é ruim,
publique no blog
Blogosfera russa está cada vez mais ativa
FORME SUA PRÓPRIA OPINIÃO
15 de novembro
Política, economia, cultura e comentários dos maiores
gou uma série de fotografias
revelando suas experiências
em um hospital da cidade de
Voronezh, cerca de 500 km ao
sul de Moscou. A moça não
chegou a se encantar com a
qualidade do tratamento.
O post não só provocou debate no próprio blog como
virou tema de reportagens em
um bom número de publicações tradicionais, que normalmente ignorariam temas de
tal procedência.
CONTINUA NA PÁGINA 2
RIA NOVOSTI
Blok, amor libertário
Paixão e mitos do pai da Era
de Prata no jubileu de 130
anos de nascimento do poeta
CONTINUA NA PÁGINA 8
SOBRE A RÚSSIA!
www.rbth.ru
experts da Rússia e do mundo
02
Política e Sociedade
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
Independência Dois anos após conflitos com a Geórgia, opinião abecasiana ainda está dividida
Os dois lados da influência
russa na dissidente Abecásia
Presença russa trouxe
dinheiro e empregos para a
Abecásia, mas habitantes se
preocupam com a perda da
soberania.
NÚMEROS
200
ANNA NEMTSOVA
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
mil habitantes é a população
aproximada da Abecásia
250
mil georgianos foram expulsos
da região na guerra de 1992-93
Presença de seguranças particulares da Rússia aumentou significativamente na região...
... e bases militares russas abrigam milhares de soldados
Críticas
Os interesses da Rússia na
Abecásia, entretanto, vão
muito além de balneários e
edifícios de apartamentos. A
companhia de petróleo Rosneft, uma importante estatal
russa, por exemplo, montou um escritório na capital
Sukhumi e anunciou o investimento de US$ 32 milhões
Propriedades em balneários turísticos estão na mira de empresários russos
em pesquisas geológicas ao
largo da costa do mar
tempo atrás, era conhecida
Negro.
Além de Moscou,
como um “conflito congela- Há temor de que a
“Nós nos sentimos seguros.
do”pós-soviético, ou seja, uma região, que busca se
governos de apenas Nós nos sentimos muito bem
região separatista que não separar da Geórgia,
na Abecásia”, afirmou o printrês outros países
faria mais parte da Geórgia,
cipal porta-voz da Rosneft,
reconheceram a
apesar das reivindicações, seja engolida pelo
VladimirVoevoda, ao comenindependência
mas também não seria inde- gigante vizinho
tar as atividades da compapendente. Era uma espécie de
nhia na região.
ministro Vladimir Putin pro- local de “Putin City”. Já Lu- Depois de a secretária de Esterritório no limbo.
Abandonados e sem manu- meteram canalizar bilhões de jkov, colocou US$ 70 milhões tado norte-americana Hillatenção, os telhados dos gra- dólares para dar apoio à in- em uma nova construção nos ry Clinton visitar a capital geciosos palácios do século 19 dependência local, impulsio- arredores de Gagra, que, ine- orgiana Tbilisi e afirmar que
do Príncipe Oldenburg eram nando a economia e fortale- vitavelmente, foi chamada de a Abecásia é um "território
castigados pela chuva e pela cendo a infraestrutura e o “Projeto Moscou”.
ocupado", houve quem defenAinda assim, nem todos os abe- desse as autoridades russas. O
neve. As brancas estátuas de poderio militar.
mármore e os lagos redondos Além disso, tanto Putin quan- casianos se deixam levar pelos proprietário da El Petroleum,
no jardim botânico ao longo to o recentemente demitido investimentos e vestígios dei- Serguei Klemantovich, sugeda orla marítima de Gagra prefeito de Moscou, Iuri Lu- xados pelos russos. A arquite- riu que Moscou simplesmene r a m d o m i n a d o s p e l o jkov, estão investindo em pro- ta Tamara Laksba, por exem- te ignore as críticas às intermusgo. Hoje, as autoridades jetos particulares na região. plo, é uma feroz defensora dos venções.
locais fazem de tudo para que O primeiro-ministro supervi- encantos provincianos de O próprio Klemantovich, que
os russos comprem e restau- siona a reconstrução do bal- Gagra e Pitsunda e teme que explora pedregulhos na Aberem os imóveis danificados, neário de Pitsunda, na costa a região venha a ser engolida cásia e exporta ferro-velho do
do mar Negro, famoso por pelo gigante vizinho.
antigos e modernos.
porto de Sukhumi para a Euseus pinheiros centenários e Segundo ela, nos dois últimos ropa, ignora os protestos da
Investimentos
pelos resorts que atraem mui- anos, a experiência foi Geórgia. Em 2009, ele teve um
O presidente russo Dmitri tos turistas na temporada de de “viver na linha de frente”. navio com 20 toneladas de
Medvedev, que recentemente verão. A influência é tanta que Ela se refere não ao combate carga confiscado por patruvisitou a região, e o primeiro- os habitantes apelidaram o aos georgianos, mas aos an- lhas marítimas georgianas,
ITAR-TASS
Líder abecasiano
busca segurança
e reconhecimento
O primeiro-ministro da
Abecásia defendeu o auxílio
militar e econômico de
Moscou e negou ocupação
pelo vizinho em entrevista à
Gazeta Russa.
mantendo suas bases militares. Mas quem achar que
isso é ocupação também deve
achar que muitos países europeus são ocupados pelos
Estados Unidos.
FRANCISCO MARTINEZ
Quais são as suas prioridades
hoje?
Segurança, é claro. Depois
disso, o reconhecimento internacional. Agora que a
Rússia garante nossa estabilidade, podemos nos concentrar no desenvolvimento
econômico e tentar atrair investimentos internacionais.
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
milhões de dólares foram
investidos pelo governo russo
na Abécasia durante 2010
siosos executivos russos que
planejam construir na costa
abecasiana prédios com alguns andares a mais do que
a lei permite.
“Quando cortarem o primeiro cedro centenário ou construírem acima dos três andares permitidos em Gagra, toda
a população sairá às ruas para
protestar”, afirma.
ENTREVISTA SERGUEI SHAMBA
As ruas da Abecásia estão
cheias de cartazes sobre os
200 anos de relações com a
Rússia. O senhor não acha que
isso confirma que a região está
ocupada por Moscou?
Isso não é verdade. O parlamento russo reconheceu
nossa independência. O exército russo pode permanecer
em nosso território para garantir a segurança, inclusive
100
URY KOZYREV(3)
Do mosteiro “Novi Afon” é
possível ver barcos militares
russos de patrulha de alta velocidade guardando a costa
do mar Negro da Abecásia. É
um sinal de que essa república autônoma na região do
Cáucaso, que sempre atraiu
o interesse de impérios, do romano ao soviético, ainda é território contestado.
Em 2008, depois da guerra
entre a Rússia e a Geórgia,
este enclave montanhoso, coberto de natureza subtropical selvagem e pontuado por
praias paradisíacas, teve sua
indepência reconhecida por
Moscou. Desde então, pouco
se importou com o fato de que
apenas a Nicarágua, a Venezuela e um minúsculo ponto
no Oceano Pacífico, a naçãoilha de Nauru, apoiaram a decisão. Sob a ótica europeia e
n o rt e - a m e r i c a n a a re gião ainda é um território soberano georgiano.
Foram necessários apenas
dois anos para que a Rússia
estabelecesse sua presença
militar e comercial na Abecásia. E, até hoje, milhares de
soldados e oficiais da Agência de Segurança Federal
ainda ocupam as dependências recém-pintadas da base
de Gudauta, um edifício de
três andares localizado no litoral norte da região. Um moderno sistema de defesa aérea,
com mísseis S-300, também
funciona na base de Gali. Caminhões cor laranja com emblemas militares levantam
poeira dia e noite enquanto
transportam areia e cascalho
para as instalações militares
na fronteira com a Geórgia.
“Nada de fotos ou a gente
atira”, grita um militar parado diante de um trem carregado de tanques e veículos
blindados nos arredores de
Gudauta.
A vigilância parece ameaçadora, mas para alguns abecásios o cenário de dominação é exatamente de que
necessitam. É sinal de bondade e proteção russas.“Chamavam a gente de buraco
negro. Agora, a gente é abraçado pelos maiores investidores russos e por figuras poderosas”, explicou o chefe da
administração regional de
Gagra, Astamur Ketsba.
A região dissidente, que ocupa
uma área de 8,6 mil km2, tornou-se isolada e decadente
desde a rápida e sangrenta
guerra contra as forças georgianas em 1993. Até pouco
O senhor espera que outros
países reconheçam a Abecásia em breve?
Estamos trabalhando para
isso em diversas regiões,
principalmente na América
Latina, no Oriente Médio e
nos países da área do Pacífico. Além disso, estamos desenvolvendo boas relações
com a União Europeia, mas
com alguns desses a cooperação é mais difícil, pois são
membros da OTAN, que é a
favor da Geórgia e está sob
grande influência dos Estados Unidos.
Há diferenças entre a independência da Abecásia e a de Kosovo?
A Abecásia tem mais direito à independência do que
Kosovo. Ao contrário deles,
NACIONALIDADE: ABECÁSIO
com Tbilisi se resumem à
busca de coexistência pacífica e à promoção das relações de boa vizinhança, além
de mantermos negociações
em Genebra. Mas nosso povo
lembra bem de nossas fábricas e vidas destruídas. Nosso
povo estava sendo assassinado e ninguém ligava para
isso. Hoje estamos provando
ao mundo que podemos nos
desenvolver economicamente e de modo democrático.
Realizamos eleições transparentes, o que foi testemunhado por muitos observadores internacionais.
IDADE: 59
POSTO: PRIMEIRO-MINISTRO
nós libertamos nosso território por conta própria. Em
Kosovo foi tudo feito pela
OTAN. Além disso, no último milênio nós fomos um
Estado no Cáucaso, o mais
poderoso da região. Kosovo,
pelo contrário, sempre foi um
território de trânsito reivindicado pela Sérvia e pela Albânia.
O que está sendo proposto à
Geórgia atualmente?
Atualmente nossos contatos
A maior parte dos investimentos estrangeiros na Abecásia
tem origem russa…
Os empresários russos são
bem-vindos aqui. Aguardamos, porém, os investidores
europeus, mas a falta de reconhecimento oficial nos prejudica. Os primeiros repres e n t a n t e s d o m e rc a d o
internacional, entretanto, já
estão chegando ao país. São
companhias de turismo austríacas e turcas. Ancara é o
nosso segundo maior parceiro comercial, depois de Moscou. Hoje 80% do nosso comércio é feito com a
Rússia.
mas voltou a exportar neste
ano, confiante na proteção
vinda da Rússia.“As bases militares russas vieram para ficar
e oferecem segurança para
nós”, ressaltou.
“Em breve, a fronteira entre
a Rússia e a Abecásia será tão
insignificante quanto aquela
entre a Rússia e a Bielo-Rússia”, afirmou o presidente da
comissão para antigos Estados russos na Câmara dos Deputados, Konstantin Zatulin,
em uma tentativa de mostrar
aos investidores russos que
eles podem se sentir confiantes em relação à parceria.
Soberania
No entanto, a insinuação de
que o país está se tornando
u m va s s a l o d a R ú s s i a
deixa parte da população revoltada.
O ministro da Defesa da Abecásia, general Mirab Kishmaria, faz questão de dizer que,
junto com outros oficiais, derramou sangue para conquistar a independência do Estado.“Os deputados russos, por
mais que tentem, nunca vão
ver o dia em que a Abecásia
eliminará seu exército independente”, afirmou.
Kishmaria diz que aprecia
todo o equipamento militar
que recebeu da Rússia e a
crescente presença de soldados russos na região, mas promete ampliar o exército abecásio. “Aqueles que querem
desmilitarizar a Abecásia não
estavam aqui durante a guerra, não sabem que o nosso
povo é uma irmandade de
guerreiros”, disse.
A chegada de tantas tropas e
seguranças russos e o corte
de pessoal abecásio protegendo as fronteiras provocou
certa tensão na região.
O coronel Lavrenti Mikvabia,
por exemplo, que há anos patrulha a fronteira de Gali com
a Geórgia, afirma que os guardas de fronteira foram demitidos e substituídos por mil h a re s d e s o l d a d o s d o
Serviço Federal de Segurança (FSB) da Rússia.
Segundo o coronel, os oficiais
estão ressentidos e alarmados porque ouviram dos russos que em breve já não haverá mais nenhum abecásio
nessa função.
“Eles estão cometendo um
enorme e insensato erro ao
retirar os militares abecásios
de nossa própria fronteira”,
criticou Mikvabia.“Com isso,
os russos mostram que não
têm nenhum respeito por nós.
Esta é a minha terra, posso
defender este lugar melhor do
que qualquer soldado russo,
se for preciso.”
Em Tbilisi, as autoridades
também estão descontentes e
o presidente da Geórgia, Mikhail Saakashvili, mandou
suas agências governamentais fazerem um levantamento das propriedades georgianas vendidas aos russos pelos
abecásios.
“Quero dar um aviso a alguns russos imprudentes:
vocês estão comprando ilegalmente casas na Abecásia,
em território georgiano ilegalmente ocupado”,declarou
Saakashvili.
O ministro para a reintegração étnica da Geórgia, Temur
Iakobashvili, declarou à Gazeta Russa que 500 mil pessoas desalojadas pelo conflito de 1993 ainda vão reclamar
suas propriedades na Abecásia um dia.
“Putin, Lujkov e a Rosneft
estão infringindo a lei georgiana ao trabalharem em território ocupado nosso”, afirmou Iakobashvili.
Blogs viram arma
útil para denunciar
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1
O tablóide popular Komsomolskaia Pravda, por exemplo, que
normalmente se ocupa de reality shows da TV, escândalos
de celebridades e esportes, publicou uma matéria detalhando as experiências da blogueira, o que provocou uma
discussão ainda maior.
Outra que ressaltou o novo
papel dos blogs foi a jornalista Daisy Sindelar, que recentemente falou sobre o uso da
blogosfera por ativistas rurais
na hora de proporcionar socorro às vítimas dos incêndios
na Rússia.
Já Olga Serebrianaia, que
cobre a blogosfera russa para
o serviço russo da Rádio Free
Europe/Rádio Liberty (RFE/
RL), deu destaque à plataforma LiveJournal, ao site pozhar.
ru e aos blogs de Igor Cherski
e Elizaveta Glinka, médica do
Fair Help que mantém o blog
Doctor Liza.
Serebrianaia diz que a proliferação dessas ferramentas deu
uma grande contribuição durante os incêndios de grandes
proporções que atingiram a
Rússia recentemente e ajudou
a resgatar a unidade cívica que
havia sido desgastada nas duas
últimas décadas com o colapso soviético.
Também é possível perceber
que, cada vez mais, a oposição
no país tem deixado de focar
em figuras públicas ou partidos para abordar mais questões como protestos dos motoristas ou campanhas contra
a corrupção policial. A blogosfera russa contribui colocando lenha na fogueira.
O escoamento das notícias da
internet para as mídias convencionais é muito significativo e mostra que os internautas continuam a se afastar de
uma elite urbana "dona da verdade".
A comunidade virtual do LiveJournal começou a preencher essa falha há muito tempo
na Rússia. Agora a história está
sendo escrita pelas mãos de
cidadãos conectados.
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
Política e Economia
03
NOTAS
NÚMEROS
73%
É a proporção de habitantes
da região de Khimki que são
contra a derrubada da floresta para dar lugar a uma nova
rodovia
COMENTÁRIO
Iuri Shevchuk
ROQUEIRO
''
A floresta de Khimki já
se tornou um símbolo,
uma metáfora. Ela já
penetrou nas nossas almas.
Ou ela floresce ou é destruída
por completo. Se Khimki for
derrubada não deixaremos
nada para nossos netos, nada
para nossos filhos. Apenas
campos mortos”
VASILY SHAPOSHNIKOV_KOMMERSANT
Protestos salvam floresta
No final de agosto, um protesto contra a rodovia foi realizado no centro de Moscou
e contou até com um show
acústico do roqueiro russo Iuri
Shevchuk, da banda DDT.
Diferentemente de outras
grandes manifestações, a
multidão ali reunida era
composta não apenas pelos
costumeiros ativistas da oposição, mas também por cidadãos interessados na causa. A
audiência foi tanta que chegou a preocupar o governo
do país.
Antes de cantar, Shevchuk
fez um discurso e destacou
que a floresta de Khimki é
um símbolo da região. “[Se
Khimki for derrubada] não
deixaremos nada para nossos netos, nada para nossos
filhos, apenas campos mortos”, afirmou o roqueiro.
Três dias depois, no primeiro concerto do U2 em Moscou, ele foi convidado para
dividir o palco com a banda
irlandesa e cantou Knockin'
on Heaven's Door, de Bob
Dylan, ao lado de Bono Vox.
Na Rússia, o convite do U2
a Shevchuk foi interpretado
como um claro gesto de apoio
à campanha.
No dia seguinte, Medvedev
interrompeu a construção da
estrada para “maiores discussões cívicas e técnicas”.
O primeiro passo foi dado.
As somas envolvidas na construção das pistas, no entanto, indicam que a vitória dos
ambientalistas está longe de
ser garantida.“Uma das possibilidades é que os protestos diminuam durante um
mês ou dois e, então, depois
de algumas discussões, o projeto original seja retomado”,
diz Nikolai Petrov, analista
político do Carnegie Center
de Moscou.
O passado confirma a teoria.
Outros exemplos de casos em
que ambientalistas se uniram
em manifestações tiveram sucesso apenas inicial. Em
2008, uma fábrica de polpa
de papel que poluía o lago
Baikal foi fechada após protestos e reabriu neste ano.
A destruição de casas construídas ilegalmente na região
de dachas (casas de campo)
de Rechnik também foi interrompida no começo do ano
Trecho da discórdia
após manifestações, mas tribunais locais acabam de dar
permissão para que as demolições continuem.“Talvez eu
esteja enganado, mas existe
um receio de que a determinação tenha sido para apaziguar as tensões e de que
daqui a algum tempo a construção prossiga”,disse Kreindlin, do Greenpeace.
Já há sinais de que os defensores da estrada vão pegar
pesado. Um dia após o anúncio de Medvedev, a administração de Khimki havia lançado uma petição em favor
da construção. Segundo Evguenia Chirikova, líder do
movimento de proteção à floresta, os funcionários das
lojas e dos institutos ligados
ao governo local receberam
ordens de assinar e de recolher assinaturas. Em três
dias, foram levantadas 20 mil
assinaturas a favor da estrada, um número impossível de
ser alcançado sem uma séria
pressão da administração.
O grande problema que surge
é para onde levar a estrada,
caso ela não passe pela flo-
resta de Khimki.“Atravessar
Khimki é ruim, porque haverá dano ecológico”,explica
o especialista em transportes Mikhail Blinkin, mas outros trajetos irão exigir deslocamento de moradores e
imensos pagamentos de indenização. “Não existe nenhuma decisão que possa
agradar a todos.”
Como na Amazônia, o dilema
entre progresso e devastação
De Manaus, jornalista traça
paralelo entre consequências
da Transamazônica para
população regional e
protestos de Khimki.
FELIPE MILANEZ
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Uma estrada conecta pontos
onde vivem pessoas que precisam de transporte e comunicação. É difícil imaginar que
obras de infraestrutura básicas como a ligação rodoviária Moscou – São Peterburgo
pudessem sofrer tanta oposição e protestos.
Mas não é a estrada em si, e
sim o que passa por ela e o
acesso que ela permite a recursos naturais, que geram as
críticas. Na Amazônia, a construção de uma estrada, ao
mesmo tempo em que abre
uma nova fronteira econômica, pode acelerar a destruição da floresta.
O Plano de Combate ao Desmatamento do Governo Federal, de 2009, atesta:“O desmatamento da Amazônia
correlaciona-se com o processo de ocupação em curso
desde a década de 70 e com
a abertura de longas rodovias
em meio à floresta, algumas
pavimentadas.” O desmatamento está, dessa forma, diretamente ligado às estradas.
Elas são a porta de entrada
da ocupação e, por consequência, da devastação.
O Imazon, instituto independente de pesquisa, já detectou por satélite milhares de
quilômetros de estradas ilegais criadas a partir dos ramais centrais. Antes da construção das estradas, inicia-se
um processo de grilagem e
violência no campo.
Segundo a antropóloga Mary
Allegretti, existem basicamente dois modelos de construção de rodovias na Amazônia, e para ambos a BR-364,
que liga Acre e São Paulo,
serve como exemplo. “O primeiro é o asfaltamento do trecho ligando Cuiabá (MT) a
Porto Velho (RO), que no início da década de 80 provocou
altas taxas de desmatamento”, afirma.
O outro modelo foi criado na
metade da década de 80 para
controlar o impacto da mesma
estrada na conexão entre
Rondônia e Acre. Allegretti
afirma que esse“também teria
provocado alto impacto, não
tivesse sido objeto de pressão
por parte dos movimentos sociais”.
De qualquer forma, os dois
modelos, construídos na transição da ditadura militar,
foram marcados por destruição ambiental e violência.
Assim como em Khimki, os
mais recentes projetos para
a Amazônia - como o asfaltamento da BR-319 ou a
construção da Transoceâni-
ca, rodovia que liga o Acre
ao Oceano Pacífico - terão
sua viabilidade discutida em
uma sociedade com mais tecnologia e conhecimento frente à natureza. Isso pode acarretar uma destruição ainda
maior – mas também uma
nova dinâmica social e de
pressões por preservação.
Estradas trazem impacto ambiental, mas vêm acompanhadas de benefícios sociais e
econômicos para as pessoas
que vivem a seu redor. As consequências da extinção florestal, entretanto, podem ser desastrosas.
A Academia de Ciências da
Rússia receberá do governo
federal recursos adicionais
para destinar ao patrocínio
de jovens cientistas. O anúncio foi feito pelo chefe da
instituição, Iuri Osipov, durante assembleia da presidência da academia.“Decidiu-se que serão distribuídas
mil bolsas para esses jovens
cientistas”, disse ele.
Além dos 600 milhões de rublos (cerca de R$ 30 milhões)
em bolsas que não estavam
previstos no orçamento, o
acadêmico revelou que uma
quantia equivalente a R$ 111
milhões será destinada à
própria Academia e cerca de
R$ 55 milhões serão reservados ao custeio de moradia dos bolsistas.
Osipov interpretou a medida como“uma concreta mudança de postura”do governo em relação à Academia.
ITAR-TASS
Fauna de Sochi
é relocada para
Olimpíadas
RIA NOVOSTI
Já começou a transferência
de animais como salamandras, rãs e lagartos que habitam a área onde estão
sendo construídas as estruturas esportivas para as
Olimpíadas de 2014 de
Sochi, no sudoeste do país.
A medida é parte do programa de compensação de
danos ecológicos decorrentes das construções olímpicas. Segundo o vice-ministro do Meio Ambiente da
Rússia, Igor Maidanov, o programa será concluído apenas em 2015.“Mas algumas
espécies de anfíbios - salamandras e rãs, entre outros
- e lagartos já estão sendo
transferidos”, afirmou.
Também serão replantados
mais de 20 hectares de vegetação ameaçada de extinção. De acordo com Maidanov, sob o programa já foi
realizado o replantio de 30%
das espécies ameaçadas, removidas para construção das
instalações olímpicas.
As próprias companhias responsáveis pelas obras, Ferrovias Russas (RZhD) e Gazprom, teriam executado o
trabalho, disse ele.
Interfax.ru
Tigre russo
para as favelas
brasileiras
RUSSIAN LOOK
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1
Jovens
cientistas
ganham bolsa
Estradas intensificam desmatamento, mas trazem benefícios
Fiscalização Atendendo a pedidos presidenciais, governo afrouxa política de vistorias surpresa
Pequenos empresários aliviados
Desde que as medidas
entraram em vigor, em maio
deste ano, 97% das novas
empresas não teriam tido
problemas com fiscalização.
PETER FRANCE
THE ST. PETERSBURG TIMES
O número de vistorias surpresa a negócios diminuiu significativamente desde que
novas regras limitando a
carga regulamentar sobre as
empresas entraram em vigor,
afirmou a ministra do Desenvolvimento Econômico da
Rússia, Elvira Nabiullina.
Os dados mais recentes, do
primeiro trimestre de 2010,
mostram que foram feitas
apenas 405 mil inspeções em
pequenos negócios, excluindo aquelas feitas pelas autoridades da receita federal e
da polícia. Essa cifra caiu em
relação ao terceiro e ao quarto trimestre de 2009 (que
foram de 595 mil e 613 mil,
respectivamente).
Em maio de 2009, entraram
em vigor mudanças para que
a maioria das agências reguladoras estatais consigam permissão das promotorias locais
antes de inspeções não-anunciadas. As novas regras vie-
ram em resposta a um apelo
do Presidente Dmitri Medvedev para que o governo parasse de “causar pesadelos”
aos pequenos negociantes.
Nabiullina afirmou que as medidas funcionaram e que apenas 54% do número total de
inspeções a pequenos negócios
teriam sido realizadas. “Essa
cifra parece alta, mas os pequenos negócios representam
68% do número total de empresas, o que significa que a
frequência das inspeções aos
pequenos empresários diminuiu”, explicou a ministra.
Apesar da menor pressão
sobre as pequenas empresas,
apenas 3,8% das inspeções
realizadas precisariam receber autorização do Gabinete
Geral da Promotoria.
“Existem duas razões para
isso. Em primeiro lugar, as regulamentações que exigem
consentimento da promotoria foram emitidas para autoridades de certas agências,
incluindo fiscais, alfândegárias, de orçamento, de transporte e antimonopólio. Em segundo, outras agências
simplesmente não estão obedecendo à lei, infelizmente”,
informou ela.
Cerca de 80% das inspeções
são hoje executados por apenas cinco corpos fiscais: o Ministério para Situações de
Emergência, a Agência Federal de Proteção ao Consumidor, o Serviço Federal para
Inspeção Ambiental, Tecnológica e Atômica, o Serviço
Federal de Migração e o Serviço Federal de Trabalho e
Emprego.
O premiê Vladimir Putin
pediu à ministra que apresentasse propostas para reduzir
o número de agências excluídas das regras e criar um sistema de monitoramento que
ITAR-TASS
reduzisse o número de violações.
Com as novas medidas, que
afunilam o processo de abertura de firmas a 20 setores,
97% daqueles que começaram negócios dizem que não
tiveram problema com a fiscalização, afirmou Nabiullina, citando um levantamento
do grupo lobista de pequenas
empresas Opora.
“Então abrir um negócio aqui,
podemos dizer, foi liberalizado num grau significativo?”,
perguntou Putin.“Mas somente em 20 esferas de atividade”, replicou Nabiullina.
O Batalhão de Operações
Especiais (Bope) do Rio de
Janeiro recebeu no dia 7 de
setembro o modelo para testes do primeiro veículo blindado Gaz-2330 Tigre, importado da Rússia. O veículo
está em produção desde
2005, possui blindagem de
nível cinco e pode desenvolver velocidade de até 140 km
por hora. O preço de uma
unidade é de, aproximadamente, US$ 300 mil.
Além disso, está sendo discutida a possibilidade de se
instalar uma montadora do
veículo no Brasil.
Interfax
[email protected]
04
Economia
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
Fertilizantes Fusão resulta na segunda maior produtora de potássio do ranking mundial
Potássio rumo ao
topo do mercado
RIA-NOVOSTI
Depois de adquirir a Uralkali
e a Silvinit, deputado
Suliman Kerimov se prepara
para bater a produção da
líder canadense PotashCorp.
TIM GOSLING
BUSINESS NEW EUROPE
Outra gigantesca fonte de recursos naturais da Rússia se
levanta para dominar seu
mercado, e não se trata de
vender petróleo ou gás.
Em agosto, o oligarca e membro do parlamento russo Suliman Kerimov comprou o
controle acionário da Uralkali e da Silvinit, duas das maiores mineradoras russas de potássio, principal ingrediente
em fertilizantes agrícolas.
A Rússia abriga o segundo
maior depósito do mundo
desse recurso natural e a
união dessas companhias resultará no segundo maior produtor mundial, atrás apenas
da canadense PotashCorp.
A alta dos preços de cereais
incitou uma frenética atividade de fusões e aquisições
no setor de fertilizantes. Na
última semana de agosto, a
BHP Billinton, maior companhia mineradora do mundo,
apostou bilhões na demanda
crescente por commodities
agrícolas dando um lance tentador de US$ 39 bilhões pela
PotashCorp.
O preço do potássio subiu a
níveis astronômicos desde o
boom provocado pelas commodities. O custo da tonela-
da chegou a US$ 1 mil em
2008, até despencar para o
nível atual de US$ 350 a US$
375 por tonelada. Entretanto, espera-se que a alta nos
preços seja significativa na
medida em que as economias
ao redor do mundo se recuperam, principalmente em
importantes mercados emergentes como China e Índia.
Além do mais, em consequência das temperaturas recordes
desse verão na Rússia e dos
subsequentes incêndios que
destruíram um terço da colheita de grãos do país, os preços
dos produtos agrícolas também estão subindo rapidamente, puxando consigo os preços
do potássio.
Apesar da crise de crédito internacional que assolou o
mundo, especialistas preveem que praticamente nada
mudou na dinâmica de suprimento de alimentos desde
2008, quando a escassez no
abastecimento provocou uma
drástica elevação nos preços.
Conhecido como“o funcionário público mais rico da Rússia”,Kerimov chegou à Câmara dos Deputados (Duma) em
2007. O empresário é membro
do partido dominante Rússia
Unida e deputado pelo Daguestão.
Kerimov chegou a ser repreendido recentemente por ser
o mais ausente dentre os políticos russos, mas é mais conhecido por seus vastos investimentos em ouro, petróleo,
imóveis e tecnologia
Segundo alguns analistas, o
deputado estaria construin-
do seu império em nome do
Kremlin. Ele estaria juntando bens em vários setores para
formar uma série de“campeões nacionais”, que poderiam
usar seu tamanho e força
avassaladores para tirar vantagem nos mercados globais.
Conforme sugere o banco de
investimentos Troika Dialog,
“Kerimov é um típico financista e suspeitamos que ele
esteja encenando um drama
de muitos atos com o intuito
de monetizar seu investimento”.
Ainda assim, a fusão faz sentido economicamente.
gigante da diversificada mineração são pouco prováveis,
enquanto um acordo com fabricantes de fertilizantes químicos como a Phosagro oferece poucos benefícios porque
os métodos de produção são
inteiramente diferentes.
Em vez disso, Kerimov estaria tentando expandir o novo
gigante através da fronteira
com a Bielo-Rússia, que possui o terceiro maior depósito
de potássio do mundo.
No começo de agosto, o vicepremiê da Bielo-Rússia, Vladimir Semashko, desmentiu
que o governo estivesse discutindo uma oferta de US$
Preços de
fertilizantes devem
subir, puxados pela
retomada do boom
de commodities
Analistas veem
dedo do Kremlin no
negócio. Governo
estaria interessado
em criar gigantes
Os efeitos da consolidação e
a alta dos preços agrícolas já
se fizeram sentir no setor dos
fertilizantes depois que a
Uralkali subiu os custos para
pronta entrega em torno de
10% no início de setembro.
Uma tentativa similar em fevereiro foi abortada pela reação agressiva dos compradores e pela indisciplina da
parte da Silvinit.
Enquanto o mercado observa a BHP cortejar a PotashCorp, também se indaga
quais são as cartas da Rússia
na jogada.
Sugestões de que o novo campeão poderia se juntar à Norish Nickel para formar uma
7,5 bilhões de Kerimov para
adquirir 51% da maior produtora de potássio do país, a
Belaruskali.
No entanto, apesar de informações sobre o interesse de
chineses e indianos pela produtora bielo-russa, Semashko
espera que o conglomerado
russo emergente esteja entre
os principais compradores da
companhia.
O premiê afirmou acreditar
que o interesse de Kerimov
nasceu de sua recente aquisição da Uralkali.“Espero que
depois [que assuma o controle] da Silvinit, a Belaruskali
venha a seguir,” disse Semashko.
timos anos demonstraram que
os mercados financeiros
podem ser igualmente desestabilizadores. Por isso, as reformas enfocam os mesmos
objetivos de diversificar a economia além dos recursos energéticos e criar um setor financeiro capaz de intermediar a
poupança russa para companhias russas. A taxação excessiva do setor petrolífero e
a baixa taxação do resto da
economia é uma resposta. Um
novo gerenciamento visando
a reformas nas concessoras
de empréstimos Sberbank e
VTB é outra. O programa de
modernização do presidente
Dmitri Medvedev é uma terceira resposta.
Dada a volatilidade dos mercados globais, o programa de
reforma vai ser uma dura tarefa, mas é crítico que ele seja
executado durante o próximo boom do país. Se a Rússia saiu da crise de 2008, isso
foi devido às ações tomadas
pela OPEP, pelo Fed, pelo governo chinês e pelo ministro
das Finanças, Alexei Kudrin,
nessa ordem de importância.
Mas caso essa combinação
deixe de se materializar na
próxima crise, as consequências poderão ser muito piores. Num país com um sistema político tão inflexível
como a Rússia, grandes crises econômicas podem ter
efeitos imprevisíveis.
Panorama Crescimento econômico russo depende de motivos que fogem ao controle do Estado
Um país à mercê dos humores
internacionais
Dependente do preço do
petróleo e do custo
internacional do capital, a
Rússia é o país que mais
sofre com grandes guinadas
econômicas.
ROLAND NASH
ESTRATEGISTA-CHEFE DO
RENAISSANCE CAPITAL
Tanto entre os admiradores
como entre os críticos da Rússia existe o mito de que o país
tem controle sobre seu destino econômico. Não tem.
Na última década, e até há
mais tempo, a economia russa
tem sido impelida principalmente por dois fatores: o
preço dos recursos naturais
e o custo do capital, ambos
fora de seu domínio. Nesse
sentido, o cartel do petróleo
OPEP, o governo chinês e o
Fed (banco central norte-americano) têm tanta influência
sobre a Rússia quanto o Kremlin ou os oligarcas.
Claro que a maioria dos países é influenciada de um
modo ou de outro pelo preço
do petróleo e pelo custo internacional do capital. Mas a
Rússia depende de ambos.
O país é o maior produtor e
exportador mundial de recursos naturais. No ranking de
recursos energéticos não-renováveis (petróleo, gás e carvão), a Rússia exporta 50%
mais do que o segundo lugar,
a Arábia Saudita. Mas, ao
contrário de outros produtores importantes, a Rússia não
pode depender exclusivamente de sua produção. Apesar
da contribuição que trazem
para a economia, os hidrocarbonetos são responsáveis por
menos de 2% dos empregos
da população ativa.
A Rússia também está sob o
jugo do custo global do capital. Quando sua conta de capital foi aberta, em 2006, pressupunha-se que os mercados
internacionais estariam em
melhor posição para alocar
capital no país do que o anêmico mercado financeiro doméstico. Mas, com a crise de
2008, a combinação de setor
bancário frágil, mercado financeiro subdesenvolvido e
conta de capital aberta tornaram a Rússia vulnerável às
alterações de humor bipolares dos mercados financeiros
globais.
A exposição singular a duas
variáveis que estão fora de seu
controle e são sujeitas à volatilidade faz da Rússia o
exemplo acabado de economia do“sobe e desce”.Através
de uma taxa de câmbio controlada, os mercados e a economia da Rússia importam
diretamente a volatilidade dos
mercados globais de bens de
consumo e capital. Quando as
coisas vão bem, poucos países parecem em melhor situação. Quando o sentimento
internacional muda, a economia e os mercados russos entram em colapso.
A boa e a má notícia
A boa notícia é que o panorama a curto prazo é ideal
para a Rússia. Os desafios estruturais com que se defrontam Estados Unidos, Europa e Japão lhes deixam pouca
escolha a não ser manter as
taxas de juros virtualmente
em zero no futuro. Da mesma
forma, por motivos totalmen-
te diferentes, a OPEP e o governo chinês parecem determinados a manter elevado o
preço do petróleo. Um pessimismo a curto prazo pode
refrear os preços do petróleo neste ano, mas a perspectiva a médio prazo para
preços de bens de consumo
parece tão sólida quanto em
2007, quando o preço do petróleo subiu a quase US$ 150
o barril.
Não há motivo pelo qual a
Rússia não possa voltar ao
crescimento econômico anual
de 5% a 7% que teve durante grande parte da década
passada, ou pelo qual os mercados imobiliários não devessem figurar de novo entre os
de melhor desempenho global. Devido à crise de 2008,
o país desacelerou, reestruturou-se e está em boa posição para embarcar numa nova
onda de crescimento.
Mas, como no passado, qualquer novo crescimento econômico ou financeiro não será
totalmente graças aos ganhos
de produtividade na Rússia.
Na verdade, quanto mais a
Rússia subir no próximo ciclo,
maior deverá ser a queda da
próxima vez em que houver
um desconforto internacional
nos mercados.
O governo há muito tempo
tem noção de sua vulnerabilidade em relação aos preços
de bens de consumo e os úl-
Relação entre o preço do petróleo e o PIB da Rússia
(US$ por barril)
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1
Em alguns desses produtos,
além dos antibióticos, foram
detectados micro-organismos
anaeróbicos, bactérias E. coli,
listeria e salmonela.
Apesar do medicamento tetraciclina não apresentar perigo imediato, sua ingestão
regular pode ter efeitos não
desejados em humanos. Um
deles é a diminuição dos efeitos de remédios antibióticos
em pessoas submetidas ao
consumo. Na Rússia, epidemias de resfriados e de gripe
comum ocorrem uma ou duas
vezes por ano, e os órgãos sanitários não querem correr
riscos por conta dos lucros
dos pecuaristas dos Estados
Unidos.
Não é a primeira vez que os
serviços sanitários embargam
produtos norte-americanos.
Segundo especialistas russos,
41 frigoríficos foram incluídos
na lista de exportadores aptos
a fornecer carne suína para a
Rússia, sob a garantia oficial
do governo de Washington. No
entanto, já foram impostos
embargos temporários a 26
deles. O quadro da carne bovina norte-americana não está
melhor. Dos 32 frigoríficos certificados na Rússia, 21 estão
sob regime de controle intensificado devido à descoberta
de antibióticos ou contaminação por bactérias.
Mas epidemias animais são
alarmantes na própria produção russa. Segundo Anna
Evangeleeva, analista do site
MeatInfo.ru, entre janeiro e
fevereiro o país registrou 54
casos de peste suína africana, nove de peste suína clássica, um de gripe aviária e
um de febre aftosa. Isso pode
retardar os planos da Rússia
de desenvolver a produção
doméstica, mesmo depois de
um grande salto produtivo
dos fazendeiros locais, que
têm contado com subsídios
do Estado.
Até pouco tempo, a participação da carne de frango nacional no consumo era inferior a 40%. A quantidade de
REUTERS/VOSTOCK-PHOTO
Brasil ultrapassa
EUA na exportação
de carne à Rússia
Com aumento da produção, Rússia importa cada vez menos
frango importado dos EUA
era tanta que o produto foi
apelidado como “pernas de
Bush”,em homenagem a Bush
pai, sob cuja gestão começaram as exportações da ave
para a Rússia.
Nos últimos anos, entretanto, a produção russa recebeu
grandes investimentos estatais e privados. Graças a isso,
a produção nacional passou
a ocupar de 70% a 75% do
consumo.
Já o aumento de produção de
carne suína não se tornou tão
relevante, ainda que tenha
sido notável nos últimos anos.
Nos sete primeiros meses de
2010, a produção subiu 28,7%,
se comparada com o mesmo
período de 2009.
Por enquanto, somente a população de gado bovino e a
produção de carne estão diminuindo. Segundo Anna
Evangeleeva, a produção
entre janeiro e julho deste
ano diminuiu 3%, se comparada com o mesmo período
do ano passado. Mas a analista também destaca que a
carne de frango ocupa 75%
do total de consumo na Rús-
sia, a suína 20%, e a bovina
somente 4%.
Segundo Evangeleeva,“desde
o início da realização do projeto nacional de produção de
carne, a avicultura é o segmento que se desenvolve de
modo mais dinâmico. E ainda
que isso também seja influência dos embargos, os volumes de importação estão
diminuindo”.
A especialista não exclui a
possibilidade, no caso do
crescimento contínuo da produção nacional, de a Rússia
se transformar de importadora em exportadora nos
próximos anos. Segundo ela,
o volume de produção nos
oito meses de 2010 somou 1,5
milhão de toneladas, e a importação nos sete primeiros
meses foi de apenas 133 mil
toneladas, 2,8 vezes menor
do que nos primeiros sete
meses de 2009.
Dos outros frigoríficos que
tiveram sua carne impedida
de entrar na Rússia a partir
de 28 de setembro, três eram
espanhois, três holandeses,
quatro alemães, um francês
e um polonês.
BRIC
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
Relações bilaterais Iniciada em 1812, parceria entre Brasil e Rússia agora engloba produtos de alta tecnologia
Dois séculos de negócios
História, quadro atual e
perspectivas do
desenvolvimento das relações
comerciais e econômicas
entre Rússia e Brasil.
NÚMEROS
3,4
SERGUEI BALDIN
REPRESENTANTE COMERCIAL
DA FEDERAÇÃO DA RÚSSIA NO BRASIL
bilhões de dólares
Foi o nível alcançado pela
balança comercial Brasil-Rússia
entre janeiro e julho de 2010
95
porcento
É a contribuição dos produtos
agrícolas brasileiros no total
das exportações para a Rússia
em 2009
ALAMY/PHOTAS
O comércio entre a Rússia e o
Brasil começou em 1812, quando atracaram pela primeira
vez na Rússia os navios de um
próspero empreendedor português, vindos do outro lado
do oceano. Em 1814 chegaram
ao Brasil os primeiros navios
mercantes russos. O início das
relações diplomáticas entre
nossos países, em 3 de outubro de 1828, inaugurou o intercâmbio comercial e econômico da Rússia não só com o
Brasil, mas com todos os Estados da América Latina.
No século 20, as relações comerciais permanentes entre
a União Soviética e o Brasil
desenvolveram-se de modo
mais ativo após a assinatura,
em 1959, do primeiro acordo
comercial e de pagamentos.
A participação da União Soviética na balança do comércio internacional brasileiro
somou, naquela época, 3%. O
Brasil, por outro lado, tornouse um dos maiores parceiros
da URSS entre os países em
desenvolvimento.
Hoje, o Brasil é o maior parceiro comercial da Rússia na
América Latina. A crise financeira e econômica internacional provocou a queda da produção industrial nos dois
países, inclusive da produção
voltada à exportação. Os volumes de crédito minguaram
e, em consequência, foram re-
Comércio entre os dois países já inclui produtos para os setores de energia e militar
duzidos os negócios entre os
parceiros.
Segundo a estatística da Receita Federal brasileira, os indicadores do comércio do
Brasil com a Rússia em 2009
reduziram-se em 46% e chegaram a US$ 4,3 bilhões, contra os US$ 8 bilhões de 2008.
A exportação da Rússia para
o Brasil em 2009 foi de US$
1,4 bilhão, e a importação figurou em US$ 2,9 bilhões
(uma queda de 57% e 39%
respectivamente).
Em 2009 foram exportados
para o Brasil fertilizantes,
matéria-prima para fertilizantes, carvão, derivados de
petróleo, enxofre granulado
e derivados de borracha natural. Pela primeira vez nos
últimos anos, notou-se o incremento de vendas de produtos de alta tecnologia, dentre os quais helicópteros e
peças repositoras para esses,
assim como turbinas e geradores para as hidrelétricas em
construção no país.
Já do lado brasileiro, os produtos agrícolas foram respon-
sáveis por grande parte das
exportações para a Rússia em
2009 - 95% do total. Os produtos mais exportados foram
carne bovina (33,2% do total
exportado), açúcar (30,3%),
carne suína (19,8%), carne de
frango (4,3%), tabaco (4%) e
café (3,4%).
Em 2010, a balança comercial Brasil-Rússia somou US$
3,4 bilhões entre janeiro e
julho. As exportações brasileiras para a Rússia foram de
US$ 2,4 bilhões, ou seja, cresceram 41% se comparadas ao
mesmo período de 2009. As
importações brasileiras da
Rússia somaram US$ 1 bilhão (crescimento de 94%).
A meta da Rússia agora é inserir no mercado brasileiro
produtos de alto valor agregado e tecnologia, principalmente os relacionados às
áreas de energia hidrelétrica,
petróleo e gás, mineração, exploração pacífica do espaço
e da energia atômica, aviação, medicina e telecomunicações.
As companhias russas se interessam principalmente por
tecnologias brasileiras de pecuária e avicultura para organizar cadeias produtivas.
Também há necessidade de
equipamentos tecnológicos
para uso nos complexos pecuários e para o processamento de produtos de carne, bem
Depois de ouvir piadas sobre
a fragilidade de sua
economia, a Rússia agora
apresenta indicadores
superiores entre emergentes.
BEN ARIS
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Há apenas um ano, logo depois de uma crise econômica
global que atingiu a Rússia
em cheio, analistas pediam a
cabeça do“R”do Bric (o bloco
de gigantes em crescimento
composto por Brasil, Rússia,
Índia, China). Agora que a
economia se recuperou, alguns estão se perguntando se
a Rússia não seria o melhor
componente do grupo.
Um relatório divulgado em
agosto pelo banco de investimentos russo Troika Dialog
coloca o país do leste europeu como melhor aposta que
a China ou a Índia. Segundo
o autor do documento, Kingsmill Bond, as fraquezas da
Rússia são mais destacadas
que suas vantagens. E a vantagem mais óbvia é que o país
está repleto de todo recurso
mineral imaginável – e não
apenas petróleo e gás.
“O mercado emergente deve
ter um crescimento superior
ao da Europa e dos Estados
Unidos. Como a Rússia é o
principal depósito de matérias-primas do mundo, essa
transformação não será possível sem ela”, diz Bond.
Além disso, a maior parte dos
investidores internacionais
foca na China, que tem uma
população de 1,3 bilhão de
pessoas e transforma qualquer
produto vendido em centenas
de milhões de unidades comercializadas. Nesse sentido, é um
investimento na quantidade e
não na qualidade.
sia, ajustada ao poder de compra, é de cerca de US$ 19 mil,
sendo que a economia ainda
está em transição para o capitalismo e quase todo bem
de consumo tem uma alta demanda. No Brasil, esse indicador é de US$ 10,5 mil, na
China, de US$ 6,5 mil e na
Índia, de US$ 3,3 mil.
Bond ressalta ainda que 68%
da população russa é considerada de classe média, o que
representa aproximadamente 100 milhões de pessoas,
contra 31% no Brasil (75 mi-
Renda per capita dos países do Bric
Mercado é lucro
A Rússia tem uma população
de 142 milhões de habitantes
e representa um mercado
muito menor que o chinês. No
entanto, o poder de compra
do povo russo é duas vezes
maior do que o desses asiáticos e cinco vezes maior que
o dos indianos.
A renda per capita da Rús-
NOTAS
NEGÓCIOS
Moscou inicia a
venda de yuan
na Bolsa
como a implementação de
redes de churrascarias na
Rússia.
Órgãos estatais e companhias
privadas russas e brasileiras
estão elaborando diversos
projetos de infraestrutura
energética e de transporte, de
nanotecnologia e de pesquisa e uso de recursos naturais.
Também desenvolvem mecanismos de pagamento com as
próprias moedas nacionais,
além de parcerias técnicas e
militares e cooperação no âmbito do BRIC.
Os projetos de pequenos e médios negócios entre os países
ainda não tiveram um desenvolvimento digno de nota.
Mesmo assim, grandes companhias e instituições financeiras russas, como Power
Machines, Gazprom, Rostekhnologii, Agência Federal Espacial (Roskosmos) e Banco
do Desenvolvimento e de Economia Externa (Vnesheconombank), atuam ativamente e com sucesso em território
brasileiro. A companhia brasileira de aviação Embraer,
por outro lado, demonstra interesse em estabelecer parcerias com empresas de aviação
da Rússia.Novas perspectivas
de parcerias entre Rússia e
Brasil se iniciam com o projeto de exportação de blindados russos GAZ-2330 Tigre,
da companhia Russkie Machini (RM Corporation). Recentemente, o Rio de Janeiro
recebeu um modelo do veículo para testes e, se tiverem
sucesso, os Tigres russos
podem invadir o mercado brasileiro, abrindo caminho para
mais uma série de produtos
competitivos.
SXC.HU
A Bolsa de Valores de Moscou (Micex) planeja começar a venda do yuan chinês
até o final deste ano. A informação foi dada à Gazeta
Russa pelo representante oficial da bolsa, Nikita Bekasov. Segundo ele, mais de 30
bancos russos já se interessaram pela nova possibilidade, especialmente organizações de crédito da Sibéria
e do extremo oriente russo,
regiões de fronteira com a
China.
“O surgimento dessa nova
modalidade na Bolsa de Valores ampliará as possibilidades de uso das nossas moedas nacionais pelos bancos
e empresas”, afirmou. Neste
ano, o volume de comércio
entre a Rússia e a China
pode ficar entre US$ 50 bilhões e US$ 60 bilhões.
Nos cinco primeiros meses
a balança comercial entre
Rússia e Índia cresceu 35%.
Em comparação com o
mesmo período do ano passado, somou US$ 3,41 bilhões. A balança comercial
Rússia-Brasil cresceu 49%
no primeiro semestre e atingiu US$ 3 bilhões.
Vladislav Kuzmichev
Cooperação
energética com
Brasil em foco
Ranking Para analistas, fraquezas do país são mais divulgadas que vantagens
Rússia sai da crise como
a melhor opção do Bric
05
lhões), 13% na China (160 milhões) e menos de 3% na Índia
(30 milhões).
A desigualdade social da população também explica a
grande diferença no crescimento entre a China e a Índia,
de 8% a 10%. A Rússia, que
apresenta índice entre 4% e
6%, já possui uma sociedade
industrial sofisticada e de população instruída, enquanto
os outros dois países entraram agora nesse caminho.
Na Rússia, o número de carros para cada mil pessoas é
cinco vezes maior do que na
China, por exemplo. Sendo
que o tempo de vida médio
de um veículo russo é de 11,5
anos, contra 8,5 anos na Europa Ocidental, isso significa
que os russos terão que substituir seus carros antes dos
europeus, acelerando ainda
mais o crescimento do setor
automotivo.
“A Rússia tem um potencial
imenso na propriedade de
carros per capita à medida
em que a renda disponível
cresce”, diz o estrategista da
Renaissance Capital, Tom
Mundy.
A Rússia em primeiro
As ações russas também atraem cada vez mais investimentos, já que a bolsa do país é
a mais barata dos principais
mercados do mundo.
A relação entre o preço das
ações e o lucro por ação das
companhias em mercados desenvolvidos, índice que mostra o quanto o investidor está
pagando pelo lucro de uma
companhia, está tipicamente
pouco além da dezena, mas
as empresas russas estão negociando bem abaixo, numa
proporção de sete vezes.
Quanto menor este número,
mais vantajosa é uma ação, e
as da Índia, do Brasil e da
China se situam bem acima,
em proporções de 21, 15 e 14
vezes, respectivamente.
“Quando falo com investidores em Londres, sempre recomendo que invistam na Rússia primeiro”,afirma o diretor
da companhia de financiamento ING Eurasia, Danny
Corrigan. “A Rússia teve um
monte de problemas terríveis,
mas a economia está aberta
a investidores estrangeiros,
enquanto as barreiras a negócios na China comunista
são muito altas e os indianos
simplesmente excluem os estrangeiros de muitos setores.”
Já Bond, da Troika, diz que a
Rússia se compara favoravelmente com outros Bric “em
dados mensuráveis como a facilidade para fazer negócios,
o tamanho do mercado, a
transparência, a infraestrutura, saúde, crime, retorno de
lucros, cessão de dividendos
e o coeficiente de Gini”.
Uma das principais prioridades na cooperação bilateral com a Rússia, o mercado brasileiro de energia
foi destaque da exposição
Rio Oil & Gas 2010.
"A infraestrutura de combustível-energia tem um significado estratégico para
qualquer Estado. E, naturalmente, os países tentam
mantê-la um tanto fechada,
abrindo-a apenas nas esferas em que encontram algumas dificuldades e não
podem agir independentemente”, disse, na ocasião, o
vice-diretor do Departamento de Política Pública e
Eficiência de Energia da
Rússia, Stanislav Dorzhinkevich.
No Brasil, ressaltou Dorzhinkevich, esse processo
aconteceria no setor de petróleo e gás.
RIA Novosti
Brasil é o Bric
que mais gasta
em TI
PHOTOXPRESS
Ações Depois da crise de 2008, empresas sediadas na Rússia levaram seus negócios para pregões de outros países
Bolsa de Nova York
busca retomar
negócios russos
Previsão de lucro em ofertas
públicas iniciais de ações
emergentes está forçando a
bolsa de Nova York a ampliar
seus horizontes.
MIKHAIL VOLKOV
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Companhias russas já levantaram bilhões de dólares em
ofertas públicas iniciais de
ações (IPOs, na sigla em inglês) no mercado de câmbio.
Mas desde que a companhia
de aço Mechel entrou em flutuação na bolsa de NovaYork
(NYSE), em 2004, a maioria
delas passou a negociar em
Londres ou, mais recentemente, em Hong Kong. Agora, com
as IPOs russos valendo bilhões de dólares e aguardando apenas que as condições
do mercado melhorem, a bolsa
de Nova York está buscando
agarrar uma fatia do bolo.
“Ninguém esperava que a Rússia se desenvolvesse tão rapidamente após a crise de 1998
para se tornar um país do
BRIC, que agora lidera o crescimento global”, diz Ronald
Kent, vice-presidente executivo da NYSE-Euronext, resultado da fusão da bolsa de
Nova York com a líder europeia no setor de câmbio. Kent,
que já trabalhou com a bolsa
de valores de Xangai e é res-
ponsável pelos negócios russos, afirma que “a China e a
Rússia possuem, ambas, sistemas financeiros domésticos
menores do que necessitam
suas economias e o principal
perigo é que possam acelerar
demais.”
Em abril de 2008, o presidente russo Dmitri Medvedev estabeleceu a meta de transformar Moscou num centro
financeiro internacional e lançou um pacote de reformas
para incrementar os mercados de capital domésticos. O
processo foi interrompido
quando o colapso do banco
de investimentos Lehman
Brothers provocou uma queda
no mercado russo de ações
naquele ano, mas o Kremlin
manteve-se firme e continuou
a aprovar novas leis, como a
proibição do tráfico de informação privilegiada, em agosto de 2010.
Nova York perdeu muito de
sua atração depois da introdução, em 2002, do Ato Sarbanes-Oxley, que estabeleceu
onerosas exigências de cadastramento para companhias
que quisessem tomar parte na
bolsa. Mas depois da fusão da
Demanda reprimida
de IPOs russos
adiados por conta da
crise pode chegar a
US$ 60 bilhões
NYSE com a Euronext, a
bolsa investiu mais de US$
500 milhões na construção de
um sistema integrado que
permite aos negociadores
comprarem e venderem ações
de quaisquer cidades do
mundo cobertas pela instituição – como Paris, Madri, Londres e Nova York.
As companhias russas estão
encarando com interesse a
NYSE-Euronext. Sua participação também evitaria a
principal queixa contra a
Bolsa de Valores de Londres
(LSE) – a de serem tratados
como cidadãos de segunda
classe. A participação da LSE
está dividida em dois níveis:
o das companhias registradas
no Reino Unido e do resto do
mundo. Já que o mercado doméstico de ações e fundos de
pensões não podem investir
no segundo nível, o montante de capital é limitado.
A Rússia só viu quatro IPOs
desde que a crise começou,
no final de 2008, e apenas uma
delas, o RusAl, teve participação no mercado internacional. Mas analistas calculam
que a demanda reprimida de
IPOs forçadas a esperar em
função da crise poderia subir
até US$ 60 bilhões.
Os gastos do usuário final
de Tecnologia da Informação (TI) no Brasil vão superar US$ 101,3 bilhões em
2010, o equivalente a 9,6%
do Produto Interno Bruto
(PIB) real, segundo a companhia de análise e pesquisas tecnológicas Gartner,
Inc. Essa proporção entre TI
e PIB está acima da média
de 6,1% dos Bric (Brasil,
Rússia, Índia e China). Hoje
o Brasil gasta mais do que
o dobro da Rússia em TI e
supera em 33% os gastos da
Índia no setor.
Segundo o vice-presidente
e chefe global de pesquisas
da Gartner, Peter Sondergaard, isso acontece porque no
Brasil a TI se propaga em
todo tipo de organização, enquanto“em outros países do
Bric, como a Índia, esses gastos se concentram em serviços de TI e, na China, em
grandes projetos de TI do governo central.”
Gartner/India
Infoline News Service
06
Trabalho
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
Renda Pesquisa revela que salário de mais de 36% dos trabalhadores estrangeiros altamente qualificados na Rússia é superior a R$ 36 mil
Exilados mais bem pagos do mundo
Profissionais de alto nível
são bem remunerados
porque atraem investimentos
estrangeiros e trazem
inovações para o país.
RACHEL MORARJEE
ANNA ARTEMEVA
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Estrangeiros se encontram em happy hour no John Donn Pub, em Moscou, conhecido por reunir os “expats” da cidade
Quem ganha os melhores salários
Exemplo brasileiro
O fisioterapeuta brasileiro
Túlio Menezes, do time de
futebol CSKA, é um deles.
Ele conta que começou atendendo o jogador de futebol
Daniel Carvalho, no Sport
Club Internacional, em janeiro de 2007. Na época, Carvalho jogava pelo time russo
e veio se tratar no Brasil.
Quando retornou a Moscou,
decidiu levar o fisioterapeu-
FONTE: BANCO HSBC
Lei Novas medidas facilitam importação de cérebros
Kremlin abre as
portas ao trabalho
de estrangeiros
TIM GOSLING
KIRILL TULIN_KOMMERSANT
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
A política de imigração russa
para operários altamente especializados é hoje uma das
mais tolerantes do mundo. O
recrutamento de cientistas e
altos executivos, principalmente da Europa, está longe
de representar uma abertura
despretensiosa. Pelo contrário, é um investimento do
Kremlin para acelerar a modernização da economia.
Em maio deste ano, o presidente Dmitri Medvedev deu o
grito de "modernização ou
morte". Uma nova legislação
foi aprovada para facilitar a
imigração de trabalhadores altamente especializados, com
experiência e talento, capazes
de ajudá-lo no novo projeto.
E, com a importação de administradores e especialistas
pelas empresas multinacionais, mais investimentos estrangeiros serão atraídos para
a Rússia.
Dentro do país, no entanto,
existe uma necessidade crescente de gerentes experientes, que ajudem a aumentar
a eficiência, a produtividade
e a inovação, principalmente
agora que o governo de Medvedev se prepara para colocar em prática o "Vale do Silício Russo", um projeto
avaliado em US$ 2 bilhões e
que já começa a ser construído em Skolkovo, nos arredores de Moscou.
Enquanto o desenvolvimento da indústria de alta tecnologia no país tem estampado
Estrangeiro toca acordeão, instumento tradicional na música
local, em frente a faixa onde se lê, em cirílico, “estilo russo”
as manchetes de todos os jornais, o mercado para reputados cientistas russos torna-se
cada vez menos atrativo.
Segundo relatório da IBM publicado no mês passado, as instituições de pesquisa científica do país estão entre as
melhores do mundo, mas as
escolas de administração ainda
estão abaixo do nível do mercado. Pela pesquisa, 59% das
empresas apontam a mão-deobra como obstáculo significativo ao desenvolvimento.
Gerentes estrangeiros podem
ser a solução, já que possuem
formação de qualidade e do-
minam as técnicas ocidentais
para a alta tecnologia que
serão usadas no projeto de
modernização, acredita Lilit
Geovorgian, da consultoria
IHS Global Insight.
O especialista em migração
da PricewaterhouseCoopers,
Guenadi Odarich, defende
que esses profissionais também podem se transformar
em modelos para os funcionários russos, o que ajudaria
a moldar as futuras gerações
tanto em talento quanto em
novas atitudes.
Segundo ele, o apetite por tais
candidatos é grande, mas o
ta junto. “O clube então me
pediu para trabalhar com o
goleiro Igor Akinfeev, que
tinha feito uma cirurgia de
cruzado também”, lembra
Menezes.
Depois disso, ele montou um
projeto de melhorias para o
departamento médico do
clube, logo aprovado, e foi
contratado como funcionário da casa. “Hoje, em Moscou, o único clube que tem
uma estrutura médica boa
além do CSKA é o Spartak,
que também tem um fisioterapeuta brasileiro”, afirma.
No entanto, qualquer oportunidade de gerenciamento
júnior ou intermediário em
empresas russas foi eliminada. Segundo executivos moscovitas, agora os estrangeiros só são contratados se
souberem como viver na Rússia, falar a língua e se não
apresentarem grandes custos de transferência.
“Não acredito na contratação de expatriados na Rússia. Antes a gente dependia
de estrangeiros para entender melhor os detalhes de
uma área, quer no setor de
corretagem ou no de restaurantes, hoje não”, afirma o
empreendedor Bernard Sucher, um dos fundadores da
cadeia de restaurantes Starlight Diners e do banco de
melhor de tudo é que o terreno já está preparado: “As
coisas parecem estar correndo bem. As autoridades estão
de esforçando muito para garantir que a burocracia entenda esse novo processo.”
Produção Recursos humanos influem mais que tecnologia
Benefícios
Imigração de profissionais
qualificados tende a atrair
investimentos externos. Essa
é a aposta do governo para
reciclar o mercado.
nados em inglês para falarem
com banqueiros nos Estados
Unidos e no Reino Unido, diz
Nikita Prokofiev, sócio da empresa de recrutamento Odgers
Berndtson.
Hoje, os advogados bilíngues
fazem diferença, mas a demanda mesmo é por profissionais russos com experiência internacional, observa.
Mas conforme os mercados
de capital forem retomando
forças, a necessidade de advogados treinados no estrangeiro tende a crescer de novo.
Então, Moscou pode ser mais
uma vez um local atrativo. O
percurso para o topo da carreira profissional é muito mais
curto na capital russa que em
outros países.
“Conheço vários advogados
que me disseram: em meu país
eu seria só mais um dentre
cem candidatos, mas aqui eu
sou um astro”, diz Prokofiev.
Outra área em que profissionais estrangeiros podem exigir bons salários e obter vantagens atraentes é a de
gerenciamento de projetos no
setor de softwares.
A Rússia tem uma abundância de programadores de software altamente treinados,
mas faltam gerentes de projetos e negócios com mais de
dez anos de experiência.
“Um russo nessa área pode
escolher à vontade onde quer
trabalhar”,afirma a presidente da EDventure Holdings Esther Dyson.
Mas para que os estrangeiros
tenham realmente espaço na
Rússia, afirma Igor Klimov,
da Acuris, é preciso que as
companhias do país invistam
e se expandam no exterior.
Até agora Moscou não deu
espaço para profissionais que
estejam dispostos a arriscar
e deixar de lado os atrativos
oferecidos por Londres, Nova
York e até mesmo São
Paulo.
Para encorajar a vinda desses profissionais, o governo
russo criou programas de incentivo à imigração de pessoal qualificado, que seguem
o modelo usado por Reino
Unido, Canadá e Austrália.
Pela nova lei, os empregados
qualificados e suas famílias
recebem um visto de três anos,
o que torna o processo de imigração um dos mais fáceis do
mundo. Para os empregadores, a vantagem é a atual isenção da cota anual do Serviço
Federal de Migração.
Para os trabalhadores estrangeiros que não se qualificam
como altamente especializados, as empresas interessadas
têm só o mês de janeiro para
requerer permissão ao governo para empregá-los, sem nenhum recurso para revisão
durante o resto do ano.
Caçadores de talentos como
Nikita Prokofiev, da agência
Odgers Berndtson, afirmam
que o plano de instigar as companhias a trazerem os profissionais mais valiosos está funcionando. E, ao mesmo tempo,
o mercado evoluiu e também
está em um momento de contratar cada vez mais funcionários locais.
"Agora muitas companhias
preferem contratar russos”,explica ele.“Há 15 anos, o funcionário especializado que se
buscava era uma pessoa bilíngue com um domínio básico de finanças, mas agora
as empresas só querem empregados seniores com qualidades muito específicas.”
Isso acontece não apenas devido ao forte desejo de empregar pessoal que conheça a cultura do comércio local, mas
também à própria definição do
empregado altamente qualificado, que recebe até 2 milhões
de rublos por ano (cerca de R$
9,5 mil por mês). Enquanto os
salários no mercado interno
ainda estão se recuperando da
crise econômica, os trabalhadores qualificados e experientes de fora esperam por uma
premiação para se transferirem.
Mercado atrativo
Além disso, as firmas russas
que buscam ser respeitadas
nos mercados internacionais
têm nas contratações de estrangeiros um motivo especial: assegurar aos investidores que a empresa não está
manchada pela corrupção que
assola o país.
Até 2008, companhias que
quisessem levantar dinheiro
com um pacote de novas ações
ou com um acordo acionário
precisavam de advogados trei-
O grande desafio
da produtividade
Empresas russas investem
em tecnologia para aumentar
o nível de produção, mas
problema pode estar na
mão-de-obra ineficiente.
BEN ARIS
BUSINESS NEW EUROPE
Se tudo sair como o governo
planeja, os bancos russos, de
preferência instalados em reluzentes arranha-céus, vão
ser o coração dos mercados
financeiros globais, e o país
se tornará o maior mercado
consumidor da Europa, com
cerca de 60% da população
na classe média.
Fantasia? Sim e não. É provável que a Rússia não concretize todas essas previsões ambiciosas do governo de Dmitri
Medvedev, mas certamente
tem potencial de ir mais longe
do que muitos podem pensar. Essa é uma declaração ousada, ainda mais no atual cenário de pós-crise, mas o país
acaba de estabelecer um novo
ciclo de aumento da produtividade, o que leva o governo
a apostar em uma década de
forte crescimento. O momento é propício. Os fluxos de investimento e o crédito bancário se mantêm restritos e
aumentar a produtividade significa imensos lucros a baixo
custo.
Ganhos produtivos
Durante a expansão de 2008,
pouca atenção foi dada à produtividade. A maioria das
companhias estava focada
apenas em se ampliar o mais
rápido possível e as altas margens de lucro do jovem mercado tornavam o quesito da
eficiência irrelevante. A produtividade na Rússia então
se limitou a apenas 16% daquela da União Europeia.
Agora, a possibilidade de ganhos com pequenas melhoras
no gerenciamento é realmente muito grande. “Se apenas
NIKOLAY TSYGANOV_KOMMERSANT
Houve um tempo em que jovens inteligentes que chegassem a Moscou falando um
russo razoável podiam escolher o emprego que quisessem. Há 15 anos, a economia
local crescia mais rápido que
as dos países ocidentais e estrangeiros que poderiam
estar servindo café ou tirando xerox em uma firma de
seu país de origem eram colocados, de uma hora para
outra, para administrar
grandes empresas.
Atualmente, a coisa mudou.
As empresas na Rússia, locais ou estrangeiras, contratam cada vez mais gerentes
russos para administrarem
seus negócios e só recrutam
expatriados quando eles são
profissionais altamente especializados. E, nesses casos,
paga-se muito bem para garantir a vinda - e a contribuição - do forasteiro.
Um levantamento recente divulgado pelo banco HSBC
revelou que os estrangeiros
que vivem na Rússia são os
mais ricos do mundo, sendo
que 36% deles ganham mais
de US$ 250 mil ao ano (cerca
de R$ 36 mil por mês).
investimentos Troika Dialog.
À medida que os consumidores russos se tornaram mais
sofisticados, os caçadores de
talentos passaram a buscar
pessoal qualificado dentro do
país. Começou a aparecer um
número cada vez maior de gerentes russos que já haviam
trabalhado no exterior ou que
serviram companhias estrangeiras operando na Rússia.
O diretor da empresa de recrutamento Acuris, Igor Klimov, explica que é muito mais
fácil para um russo adquirir
a confiança de empregados e
empresas estrangeiras.
“Ainda são necessários estrangeiros no setor de investimentos, mas na economia real a
gente quase não recebe pedidos para selecionar gerentes
de outras nacionalidades”,
diz. Sucher afirma ainda que
a procura por russos que tenham vivido no exterior é
grande porque eles, além de
entenderem as exigências do
mercado internacional, são
bons para negociar segundo a
cultura de negócios do país.
Por outro lado, é preciso pagar
um alto preço para atrair esses
russos de volta e, mesmo
assim, eles não são suficientes para atender à demanda.
Com isso, abre-se espaço para
estrangeiros em áreas-chaves
do mercado.
Melhoras no gerenciamento podem aumentar PIB em 150%
Operário russo leva
quatro dias para
fazer um carro que
no Ocidente faz-se
em poucas horas
10% da população ativa trabalhasse no nível médio de
eficiência que vemos nos Estados Unidos, a produção da
economia russa cresceria
140% e o Produto Interno
Bruto, 150%”,afirma Alexander Idrisov, sócio do grupo europeu de análise de mercado
Strategy Partners.
Nesta fase de orçamento
curto, as companhias viram
que um operário russo pode
custar uma fração do que
custa um ocidental. No entanto, essa economia é desperdiçada quando se percebe
que eles levam quatro dias
para fazer um carro, enquanto a maioria das fábricas ocidentais pode dar conta do serviço em poucas horas.
Saindo do buraco
A longo prazo, a única maneira de a Rússia manter o
crescimento estável é melhorando sua produtividade.
A maioria das pessoas pres-
supõe que a baixa eficiência
no país é fruto exclusivo de
fábricas obsoletas, mas Idrisov defende que culpar a tecnologia antiquada é um“mito”
e que o principal problema é
simplesmente o mau gerenciamento.
Segundo dados de um relatório recentemente divulgado pela consultoria global de
empreendimentos McKinsey,
a administração ineficiente
responde por 80% da diferença entre as produtividades da
Rússia e dos EUA.
A pesquisa revela ainda que
alguns setores da economia
russa já estão no mesmo nível
que empresas internacionais,
principalmente no setor do
aço. As áreas de construção,
sistema bancário e eletricidade, embora estejam em níveis
mais baixos que os norteamericanos, também se destacam por serem mais produtivos do que outros setores
da economia.
Diante desses dados, fica claro
que somente quando o gerenciamento russo enfrentar
essas questões é que a tecnologia, a menina dos olhos do
presidente Medvedev, poderá
começar a desempenhar seu
papel.
Opinião
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
07
QUALIDADE ANTES DE QUANTIDADE
Artem
Zagorodnov
GAZETA RUSSA
A
lguns observadores
da Rússia não se
cansam de repetir
que o país enfrenta
uma “crise demográfica”. Recentemente, a divisão russa
da emissora de rádio BBC advertiu em tom agourento que
“a Rússia está morrendo rapidamente”. O autor chegou
afirmar que a população decrescente vai debilitar a posição internacional e até alterar as fronteiras do país.
Com a previsão do censo dos
Estados Unidos de que a população mundial atingirá
entre 8,5 bilhões e 10 bilhões
em meados do século e um
suprimento cada vez menor
de recursos naturais, eu diria
que países com menos, e não
mais, bocas a alimentar, petróleo para consumir e água
potável para beber estarão
numa posição privilegiada.
A Rússia seguramente tem
abundância de recursos: vasto
território, água potável (detém
20% do suprimento mundial
só no lago Baikal), florestas
intermináveis, próspero mercado agrícola, petróleo e gás,
população instruída e armamento nuclear para se defender. Poderia, portanto, ser um
dos países mais bem equipados para enfrentar futuras crises ambientais.
Mas – insistirão os críticos –
a questão não é o número de
residentes, e sim a força de
trabalho decrescente, que impedirá o crescimento econômico nas próximas décadas.
Declínio demográfico
russo é apontado
como desvantagem,
mas pode ser
positivo diante da
escassez de recursos
naturais e de uma
força de trabalho
qualificada
É aí que a recente política do
governo, que parece ter sucumbido à histeria que cerca
o tema, gera motivos de preocupação.
Quando era ainda vice-premiê, o atual presidente Dmitri Medvedev apoiou a aprovação de uma série de
medidas para reverter tendências demográficas negativas: multas de trânsito mais
severas para reduzir o índice de mortalidade nas rodo-
vias, uma batalha contra o
consumo de álcool e maiores
investimentos nos programas
de saúde.
Como resultado, em 2009 a
população russa cresceu pela
primeira vez e, depois de cerca
de dois anos do lançamento
do projeto, a expectativa de
vida masculina aumentou, segundo a Agência Estatal de
Estatística da Rússia.
Desde então, o Estado também vem distribuindo pre-
miações de aproximadamente US$ 12 mil para mães que
têm mais de um filho. Eu
diria, porém, que, além de
pagar os cidadãos para que
tenham mais filhos, o governo deveria dedicar-se à melhoria da produtividade. Esse
indicador permanece criticamente baixo, equivalendo a
apenas 16% daquele da União
Europeia, segundo a empresa Capital Partners.
Entre as propostas que o go-
verno deveria seguir para desenvolver de modo considerável a economia russa, o
padrão de vida e a influência
global estão:
• Fazer contato com a Diáspora no exterior: poucos russos no exterior estão dispostos a mandar seus filhos – os
quais geralmente têm o talento crítico, a experiência
prática e o entusiasmo gerencial de que a Rússia carece
desesperadamente – sequer
para visitar, menos ainda
morar num país onde podem
ser apanhados de surpresa na
rua e jogados no exército. Isso
os deixa com a escolha de
abrir mão da cidadania russa
ou evitar totalmente o país.
O Estado deveria emendar a
legislação sobre o recrutamento militar e a residência
para atrair cidadãos talentosos de dupla cidadania.
• Encorajar operários estrangeiros altamente especializados, principalmente gerentes,
a viverem e trabalharem no
país. Qualquer expatriado
que more em Moscou pode
relatar histórias de terror
quanto à obtenção de residência e uma permissão legal
de trabalho. Embora o Estado recentemente tenha feito
esforços no sentido de facilitar as regras de concessão
de visto para trabalhadores
altamente qualificados, muito
mais pode ser feito. Um relatório de 2009 da revista de
negócios McKinsey Quarterly afirma que 80% do abismo de produtividade da Rússia em relação aos Estados
Unidos deve-se simplesmente ao mau gerenciamento.
• Desenvolver a assistência
social de modo que os mais
de 730 mil órfãos russos possam tornar-se membros produtivos da sociedade na vida
adulta. O site Iorphan.org
informou que apenas 10%
dos órfãos da Rússia se tornam cidadãos íntegros, enquanto a maioria descamba
para as drogas, a violência
e o suicídio. À parte a óbvia
necessidade humana de evitar essa tragédia, um melhor
planejamento familiar e políticas de adoção poderiam
salvar esse segmento da sociedade.
• Desenvolver programas
para integrar portadores de
deficiência à sociedade. A
economia da“inovação”pregada por Medvedev não se
baseia em fábricas ou no
campo. Muitos trabalhos de
pesquisa e desenvolvimento
podem ser desempenhados
em casa, pela internet, e garantir uma conexão de internet grátis de alta velocidade
para incapacitados físicos nas
principais cidades russas e
provê-los de cursos universitários online são coisas que
podem ser feitas já. Novas
redes de transporte e edifícios também podem ser construídos levando em conta a
acessibilidade.
O esforço por modernização
de Medvedev é a melhor oportunidade para finalmente
mudar a discussão da demografia russa – de quantidade
para qualidade.
Artem Zagorodnov é editor
executivo de Russia Beyond
The Headlines.
O MENOS DESIGUAL DOS BRIC
Ben Aris
BUSINESS NEW
EUROPE
A
imagem convencional feita da Rússia é
a de um país com
uns poucos barões
do petróleo super-ricos e mais
de uma centena de milhões
de pobres. No entanto, apesar de o país contar mais bilionários, em dólares, do que
qualquer outro BRIC – o bloco
econômico dos gigantes Brasil, Rússia, Índia, China - a
renda do país é também mais
equitativamente distribuída
do que nos Estados Unidos,
por exemplo.
O coeficiente de Gini, medida que avalia o nível de desigualdade na distribuição de
renda num país, calcula também o conceito de riqueza. Se
o comunismo tivesse funcionado, por exemplo, então todo
o mundo ganharia igual, o que
resultaria num coeficiente de
Gini zero. Já numa socieda-
de perfeitamente desigual, em
que uma única pessoa tem
todo o dinheiro, o coeficiente
de Gini seria 100.
Na Rússia, os ricos certamente ficaram muito mais ricos
nos últimos 10 anos e sua bem
relacionada elite abriga algumas das pessoas mais abastadas da Terra. No entanto, o
boom econômico desta década, iniciado durante o mandato de presidente de Vladimir Putin (e auxiliado pela
alta do petróleo), fez os pobres enriquecerem ainda mais
rapidamente. Em dólares, o
PIB da Rússia cresceu cerca
de 7,5 vezes na última década, subindo de cerca de US$
200 bilhões para US$ 1,5 trilhão. Ao mesmo tempo, a
média dos salários aumentou
14 vezes em relação ao mesmo
período, de US$ 50 para US$
700 mensais. Liam Halligan,
economista da empresa de gerenciamento de capital especializada no mercado russo
Prosperity Capital Manage-
CARTAS AO EDITOR DA GAZETA RUSSA
Faltam futebol,
hotéis e
estradas
Meus parabéns!
Gostei e muito das reportagens. Parabéns!
Gostaria que nas próximas
reportagens tivéssemos algo
sobre futebol, hotéis e estradas.
Parabéns mesmo.
Li na íntegra todo o contéudo da Gazeta Russa e aprendi mais sobre o maior país do
mundo - a Federação Russa.
Por favor, receba os meus sinceros cumprimentos pelo excelente trabalho, ao divulgar
em português informações
precisas e atuais sobre a situação social, econômica e
ambiental da Rússia.
Arnaldo Salles
Paulo Galvão Júnior
LEITOR DA GAZETA RUSSA
ECONOMISTA
ENVIEM CARTAS PARA A REDAÇÃO DA GAZETA RUSSA EM MOSCOU:
[email protected]
EXPEDIENTE DA GAZETA RUSSA
ESTE SUPLEMENTO É PRODUZIDO E PUBLICADO PELA ROSSIYSKAYA GAZETA SEM
QUALQUER ENVOLVIMENTO EDITORIAL DO JORNAL O ESTADO DE S. PAULO
WWW.RBTH.RU E-MAIL: [email protected] TEL.: +7 (495) 775 3114 FAX: +7 (495) 775 3114
DIRETOR GERAL: ALEXANDER GORBENKO EDITOR CHEFE: VLADISLAV FRONIN
ENDEREÇO DA SEDE: AV. PRAVDY, 24, BLOCO 4, ANDAR 12, MOSCOU, RÚSSIA - 125993
EDITOR E PUBLISHER: EVGUENI ABOV; EDITOR ASSISTENTE: DMITRI GOLUB;
SUBEDITOR: MARINA DARMAROS; EDITOR NO BRASIL: FELIPE GIL;
GRÁFICO PRINCIPAL: ANDREI SHIMARSKI; EDITORES DE FOTO: ANDREI ZAITSEV,
NIKOLAI KOROLEV, DARIA KOZYREVA; CHEFE DA SEÇÃO DE PRÉ-IMPRESSÃO:
MILLA DOMOGATSKAIA; PAGINADORES: IRINA PAVLOVA; ILIA OVCHARENKO
PARA A PUBLICAÇÃO DE MATERIAIS PUBLICITÁRIOS NO SUPLEMENTO, CONTATE JULIA
GOLIKOVA, DIRETORA DA SEÇÃO PUBLICITÁRIA, [email protected]
© COPYRIGHT 2010 – ZAO ROSSIYSKAYA GAZETA. TODOS OS DIREITOS RESERVADOS.
É EXPRESSAMENTE PROIBIDA A PRODUÇÃO DE QUAISQUER CÓPIAS, REDISTRIBUIÇÃO
OU RETRANSMISSÃO DE QUALQUER PARTE DO CONTEÚDO DESTA PUBLICAÇÃO SEM
UMA PRÉVIA AUTORIZAÇÃO ESCRITA DA ROSSIYSKAYA GAZETA.
PARA OBTER A AUTORIZAÇÃO DE CÓPIA OU REIMPRESSÃO DE QUALQUER ARTIGO OU
FOTO, FAVOR APRESENTAR SOLICITAÇÃO ENTRANDO EM CONTATO
PELO TELEFONE +7 (495) 775 3114 OU E-MAIL [email protected].
ment, afirma que “dessa maneira, a proporção do PIB potencializada pela força de
trabalho cresceu muito. Alguns russos hoje conhecidos
ficaram muito ricos não com
o trabalho, mas com o capital. No entanto, não tiraram
esse capital de outras pessoas, mas do Estado”.
O coeficiente de Gini da Rússia subiu de 39,9 em 2001 para
42,3 em 2008 – um aumento
menor que o dos EUA e abaixo de qualquer outro país do
BRIC (46,9 da China, 53,5 da
Índia e 57 do Brasil, segundo
a CIA).
em tijolos e argamassa. Mas
com o volume de empréstimos sob hipoteca dobrando
todo mês desde o começo do
semestre, essa riqueza está se
tornando rapidamente acessível a um número crescente
de russos.
O efeito desse rápido cresci-
A revolução imobiliária
mento na riqueza das massas
tem sido dramático. Se o
mesmo crescimento ocorresse no país de Barak Obama,
a renda per capita dos Estados Unidos subiria dos atuais US$ 40 mil, segundo a
CIA, para US$ 560 mil nos
próximos oito anos. Qualquer
presidente que promovesse
esse tipo de aumento de ri-
Um dos motivos pelos quais
a Rússia tem se saído tão bem
no coeficiente de Gini é que
todo cidadão do país ganhou
um apartamento depois do
colapso da União Soviética.
O problema é que até recentemente ninguém podia usar
o capital representado por
essa posse, literalmente preso
Na última década,
renda dos russos
mais pobres cresceu
mais rápido que a
dos ricos
queza não só seria reeleito,
como canonizado. Essa imensa transformação criou uma
crescente classe média na
Rússia quase da noite para o
dia.
Quando Putin lançou seu
plano de reforma a longo
prazo, preconizou que 60% da
população ingressaria na classe média até 2020. Mas, segundo um relatório divulgado pelo principal banco de
investimento russo, o Troika
Dialog, a Rússia já estaria lá
no início do segundo semestre deste ano. O Troika afirma
que a classe média (definida
pela renda per capita de mais
de US$ 6 mil anuais) já representa 68% da população,
contra 31% no Brasil, 13% na
China e 3% na Índia. Qualquer que seja a definição de
classe média escolhida, ainda
está claro que a distribuição
de riqueza russa é muito mais
equitativa do que em qualquer
outro dos BRIC, e por uma
grande diferença.
Sinais de inquietação
Liberada da necessidade de
simplesmente sobreviver, a
classe média emergente tipicamente se torna mais política, uma vez que tem muito
a perder com um mau governo. A população russa tem suportado silenciosamente as
A classe média
emergente se torna
mais política, já que
passa a ter muito a
perder
dores da transição pela maior
parte dos últimos 19 anos, mas
desde o ano passado começou a vir à tona uma variedade de protestos.
Manifestantes do movimento
Estratégia 31 se reúnem no
trigésimo primeiro dia de todo
mês de 31 dias contra a recusa do Estado em permitir
livres demonstrações de pro-
testo, garantidas pelo artigo
31 da Constituição. O movimento dos direitos dos gays
ganha força e o Kremlin foi
várias vezes constrangido e
levado a agir pela pressão dos
protestos na blogosfera da
Rússia. O mais significante
desses exemplos foi a ordem
do presidente russo, Dmitri
Medvedev, para que a construção de uma rodovia cortando a floresta de Khimki
fosse interrompida, depois de
uma série de protestos públicos.
Tanto Putin como Medvedev
estão falando agora da necessidade de promover a sociedade civil. Com o aumento de
sua experiência capitalista, o
Kremlin agora tenta um jogo
delicado: equilibrar o relaxamento do controle centralizado enquanto monitora a
opinião popular.
Ben Aris é editor-chefe
do jornal Business New
Europe.
IMPORTANDO CÉREBROS
Igor Fediukin
ESPECIAL PARA
GAZETA RUSSA
H
á cerca de dois anos,
nossa instituição, a
Nova Escola de Economia, contratou um
estrangeiro como professor
efetivo pela primeira vez.
Acadêmicos russos educados
no exterior são extremamente raros nas universidades do
país e poucas instituições
podem se gabar de ter um
estrangeiro na folha de pagamento. Depois de selado o
acordo, porém, tivemos um
pequeno problema: descobrir
como trazer nosso novo colega para o país.
A Rússia é praticamente o
único dos países que preza
pela pesquisa a não possuir
uma categoria de vistos“acadêmicos”. Além do mais, até
este ano só havia uma única
categoria de vistos para todos
os pretendentes a trabalhar
no país. Uma companhia que
desejasse, por exemplo, um
advogado estrangeiro treinado em Harvard, tinha que enfrentar as mesmas compli-
cações burocráticas para
trazer centenas de operários
de construção. Como consequência, profissionais altamente especializados muitas
vezes obtinham vistos de apenas três meses para poderem
trabalhar no país e eram forçados a viajar a um país vizinho no final do período
para pedir uma nova permissão de entrada na Rússia.
As complicadas e restritivas
regras para obtenção de visto
tornam mais difícil atrair
para o país os melhores talentos do mundo, e isso tem
sido um grande obstáculo
para qualquer tipo de intercâmbio acadêmico há muito
tempo. A resistência em
afrouxar essas regras também é enorme. Uma grande
parte do funcionalismo russo,
especialmente a ligada às forças armadas, naturalmente
encara tal abertura como um
convite para que se mandem
mais espiões para a Rússia.
Outros, incluindo aqueles
considerados bastante liberais, são contra qualquer relaxamento unilateral dos regulamentos de vistos, o que
Leis de imigração
não facilitam
a entrada de
acadêmicos na
Rússia
poderia ser visto como concessão e sinal de fraqueza.
No entanto, prevalece a ideia
de que a capacidade russa
em atrair profissionais estrangeiros altamente qualificados é necessária se o país
quiser se modernizar – e a
seriedade do problema parece ter sido finalmente reconhecida pelo governo.
Emendas inclusas nas leis de
imigração no primeiro semestre oferecem privilégios aos
profissionais estrangeiros
chamados“altamente qualificados”(que também são altamente pagos, diga-se).
Esses novos regulamentos de
vistos entraram em vigor há
poucos meses, mas, curiosamente, não se aplicam a pesquisadores e professores, que
não se encaixam na defini-
ção de “profissionais altamente qualificados” da nova
lei, já que não recebem pelo
menos dois milhões de rublos (cerca de R$ 110 mil)
anuais.
Novas medidas em discussão
voltadas às universidades e
aos pesquisadores devem resolver alguns dos problemas
mais urgentes. Entre elas,
estão propostas para incluir
professores na categoria de
“profissionais altamente qualificados”; criar uma opção
para a emissão de“vistos acadêmicos” em não menos que
três dias; permitir que pesquisadores estrangeiros se
desloquem livremente pelo
país; permitir que seus esposos trabalhem sem a necessidade de requisição de uma
permissão de trabalho à
parte. Embora essas emendas possam parecer menos
revolucionárias, caso sejam
introduzidas ajudarão a
atrair mais profissionais altamente qualificados para a
Rússia e tornarão muito mais
fácil a vida daqueles que já
estão trabalhando no país.
Entretanto, muito mais pre-
cisa ser feito. As regras e os
regulamentos de visto ainda
estão atravancados por todo
tipo de exigências ridículas
ou supérfluas. Para atrair um
acadêmico do exterior com
diploma de doutorado, por
exemplo, ele teria de traduzir sua dissertação na totalidade e submetê-la a uma
nova defesa de tese.
Finalmente, existe a questão
da implementação do novo
regulamento e de fazer com
que os consulados russos, conhecidos por suas maneiras
pouco amistosas, modifiquem
sua atitude em relação aos
requerentes de vistos. Isso
exigiria mudar toda a mentalidade do serviço consular
russo, o que levaria um longo
tempo. Ainda assim, o mero
fato de que o presidente Medvedev afirmou no ano passado que“nós precisamos deles”
(isto é, de profissionais qualificados do estrangeiro), e
não o oposto, oferece algum
terreno para otimismo.
Igor Fediukin é diretor de
Estudos de Política na Nova
Escola de Economia.
08
Em Foco
SUPLEMENTO COMERCIAL
GAZETA RUSSA
WWW.RBTH.RU
SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010
RECEITA
Dança moderna Espetáculo Três Solos e Um Dueto percorre cinco cidades
O grande legado do
conde Stroganov
Baryshnikov
reencontra os
palcos brasileiros
FABRICIO YURI VITORINO
AP
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Bailarino também
divulga seu trabalho
como fotógrafo
com a exposição
"Dominican Moves"
leiros ele já conhece bem, esta
é a quinta vez que ele passa
por aqui. Mas além das cinco
cidades brasileiras que visita,
o bailarino se apresenta pela
primeira vez na Argentina e
no Peru.
Uma viagem dessa natureza,
para profissionais com a
idade mais avançada, requer
ITAR-TASS
Quando o Brasil e Mikhail Baryshnikov se reencontrarem
em São Paulo, no próximo dia
19 de outubro, ambos vão perceber que pouca coisa mudou
desde os últimos passos dados
por aqui, em 2007. Aos 62 anos,
a lenda viva da dança continua com o mesmo vigor de
garoto, esbanja maturidade e
emociona com seus movimentos precisos, firmes e delicados. A novidade fica por conta
da apresentação de dança moderna em parceria especial
com a espanhola Ana Laguna, de 54 anos, no espetáculo
Três Solos e Um Dueto, que
tem coreografias dos renomados mestres Mats Ek, Benjamin Millepied e Alexei Ratmansky.
A turnê vai ser a maior que
Baryshnikov já fez pela América Latina. Os palcos brasi-
Montagem e negociação da apresentação levaram dois anos
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
cuidados especiais. Baryshnikov e Laguna viajam com uma equipe de
profissionais para tentar minimizar o
desgaste de voos,
compromissos,
ensaios e doze
apresentações em menos
de um mês. Para a apresentação no Rio de Janeiro, no entanto, não houve nenhum pedido exótico de
estrela, apenas a possibilidade de ensaiar muitas horas
por dia nas vésperas das
apresentações. Para o bailarino que nasceu na Letônia
e foi acolhido pelos Estados
Unidos, onde brilhou nos palcos, no cinema e na TV, o
nome inspira grandiosidade,
mas o que chama mesmo a
atenção é a simplicidade.
Segundo Maria Rita Stumpf,
produtora da turnê, Baryshnikov só fez dois pedidos: o
de não ser tratado como celebridade, mas sim como bailarino, e o de que seus espetáculos tenham preços, se não
‘populares’, pelo menos acessíveis a todos os públicos. Com
isso, os lugares mais baratos
estão sendo vendidos a
R$50.
Stumpf ressalta ainda que,
apesar de o bailarino já ter
vindo muitas vezes ao Brasil, cada aparição dele é única
e o espetáculo ao lado de Ana
Laguna é mais especial ainda,
pois pode ser a última chance de vê-lo em ação por
aqui. "Ele não quer mais ficar
fazendo turnê o ano todo,
todos os anos. Mas desta vez
incluiu a América do Sul em
função da apreciação que ele
tem pelo nosso país", diz a
produtora.
BENGT WANSELIUS
Acompanhado da espanhola
Ana Laguna, o dançarino de
62 anos se apresenta a
preços acessíveis e ainda
promove master classes.
Irakli
Iosebashvili
Misha faz apresentação ao lado da espanhola Ana Laguna
De acordo com ela, a montagem do espetáculo e a negociação para a vinda da dupla
ao Brasil levaram dois
anos.
Além de encantar o público,
Misha (apelido em russo derivado de seu nome, Mikhail)
também pretende lapidar
novos bailarinos, ajudar a formá-los e a criar espaços para
a dança no Brasil. Uma equipe vinda do centro de referência que mantém em Nova
York, o Baryshnikov Arts
Center (www.bacnyc.org), vai
dar "master classes" nas cidades onde fizer apresentações. Entre 15 e 20 sortudos
bailarinos com boa qualificação serão selecionados para
um treinamento inesquecível
com algumas das maiores lendas da dança de toda a história.
Em sua nova passagem pela
América Latina, o bailarino
também pretende divulgar
seu ainda pouco conhecido
trabalho como fotógrafo. Ele
traz "Dominican Moves" (algo
como movimentos dominicanos), seu portfólio de fotos
feitas na ilha caribenha, onde
ele tem uma casa de veraneio. A exposição, que já passou por lugares como o Museu
Pushkin, em Moscou, o Metropolitan Opera House, em
NovaYork, e o Kennedy Center, em Washington, retrata
movimentos de dançarinos
do país da América Central,
em uma surpreendente fusão
de ritmos.
E estar em nosso país, mesmo
após todas essas visitas, não
deixa de ser um encanto para
Baryshnikov, conta Stumpf.
"Ele gosta muito daqui, tem
fascínio pelo Rio de Janeiro. Poder vir ao Brasil e trabalhar aqui parece sempre
ser um privilégio para Misha",
explica. Para nós, certamente, também é.
Literatura Poesia de Aleksandr Blok refletiu sua difícil relação com a namorada, Liubov Dimitrievna
A vida privada de um
poeta apaixonado
Cento e trinta anos depois
do nascimento do autor
russo, correspondente revela
paixão e mitos do pai da Era
de Prata da literatura russa.
controu uma capela deserta
dentro da Catedral de Cazã,
onde eles podiam se esconder
para longas sessões de beijos
apaixonados.
Talvez o poeta se torturasse
por pensar ser o único atacado pelos pensamentos sórdidos e carregasse um sentimento de culpa pelo desejo
sexual que tinha por aquela
que havia elevado a tão alto
pedestal. Na virada para o século 20, a psiquiatria freudiana ainda era desconhecida. Blok desenvolveu uma
esquizofrenia aguda.
CRAIG NELSON
RIA NOVOSTI
ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA
Comecei a ler Aleksandr Blok
no início do meu divórcio e
talvez isso tenha ajudado em
meu fascínio pelo escritor.
Considerava-o uma espécie
de companheiro da desgraça
amorosa. Em meus momentos mais tristes e sombrios,
eu lia as juras idealizadas do
período mais romântico e abstrato da vida de Blok e, então,
fechava o livro, apagava a luz
e chorava sem parar.
A vida adulta e a poesia de Reprodução do retrato de Aleksandr Blok por P. Borisov
Blok refletem sua difícil e
complexa relação com a noirá-la incessante e obedienteva-namorada, Liubov Dimi- Após o casamento,
mente, como um escravo. Era
trievna, e sua relação com a Block vive triângulo
o pronome indefinido, um alprópria instituição do casaguém, uma sombra, um vulto
amoroso diante de
mento. Enquanto a cortejava,
indistinto na neblina, mais
o escritor transformou Liu- novo pretendente de sentida do que vista. Era o
bov em sua musa inspirado- Liubov
que ele chamava de névoa
ra, o que resultou em um ciclo
azul-celeste ou luz brilhande poemas de oito mil versos
te. Na verdade, Liubov era
sobre "A Bela Senhora". Ela
mesmo a inspiração de seu
era para Blok“a Vênus russa”,
amor adolescente e um ser
imbuída de“castidade impashumano real, cheio de vigor
sível e tristeza além de toda
e promessa juvenil. O namomedida”. E ele poderia espero foi platônico até que ela en-
Era de Prata
Outra fase que marcou o escritor foi quando o casamento com Liubov, que demorou
um ano para acontecer, foi desafiado por um pretendente,
Andrei Beli. Block permitiu
que Liubov retribuísse o afeto
do novo candidato e instalouse um triângulo amoroso. Por
fim, Beli não levou Liubov
embora, como havia prometido. Ela voltou para Blok e
a partir desse reencontro estabeleceu-se um novo padrão
de relação. Tensa, aberta para
cortesias de outros, com separação, reencontro e reconciliação.
Com isso, Blok tornou-se o
líder incontestável do simbolismo durante a Era de Prata
da literatura russa. Pouco a
pouco, o tema de seus poemas deslocou-se da Bela Senhora idealizada para o realismo urbano, mas a forma
permaneceu complexa, de
maneira que o ritmo e a métrica jâmbica, o som de certas consoantes e o uso da repetição e da aliteração
criavam no ouvinte uma sensação letárgica e eufórica.
Embora essas qualidades técnicas se percam na tradução
para outras línguas, podemos
considerar que a construção
de tais estruturas, especialmente aquelas com símbolos
embutidos, como os criados
por Edgar Allan Poe, é uma
arte da qual Blok foi o mestre supremo, mesmo ao mudar
seus temas para a cidade.
Blok também abraçou a revolução quando ela chegou.
Nessa época, produziu seu
mais famoso poema, "Os
Doze", enquanto se separava
de sua própria classe da pequena nobreza, tendo previsto durante anos que tudo seria
varrido para longe.
Depois disso, Blok ficou enfermo e tentou fugir do verão
infestado pelo tifo em São Petersburgo para o ar puro do
campo da Finlândia. Seu pedido de autorização para viajar foi inicialmente negado.
Alguns dizem que os atrasos
foram planejados, o que faria
dele o primeiro intelectual a
ser assassinado e martirizado pela nova ordem.
A origem do prato predileto de um incontável número
de brasileiros, o estrogonofe, é cercada de polêmica e
mistério. Dizem até que ele
foi inventado por um mineiro. Mas a maioria das fontes, embora não todas, concorda que o “biefstroganov”
– assim mesmo, com “a” –
foi um dos poucos pratos
russos a cruzar a fronteira
cultural e a ser servido no
mundo inteiro. Sim, o estrogonofe, como o nome já dá
a entender, veio da Rússia,
onde costuma ser preparado de forma um pouco diferente que no Brasil: no lugar
do creme de leite, o povo do
leste europeu usa coalhada
azeda, também conhecida
como smetana.
Reza a lenda que um certo
conde Alexander Grigorievich Stroganov viveu no século 19 e deixou como legado
um grande número de realizações. Último da linhagem,
morreu aos 96 anos, depois
de ter fundado bancos e universidades, ter se tornado
governador-geral da região
de Novorossisk e despontado
como sujeito notavelmente vigoroso.
Stroganov era também adepto
da arte do bem viver, especialmente quando se tratava de
receber convidados. Dizem que
ordenava a seus empregados
que alimentassem qualquer um
que pusesse o pé em seu território. E, diante da necessidade
de preparar um prato rapidamente, encomendou a façanha
a seus chefs. E assim foi inventado o estroganofe.
Depois da queda da Rússia
imperial, os emigrantes foram
responsáveis por espalhar o
prato por todos os cantos do
mundo. O estroganofe se tornou especialmente popular
na China, o destino preferido
dos russos que fugiram do regime comunista. Outra versão
chegou aos Estados Unidos,
e o prato também foi apreciado na Austrália, em Portugal e, como a gente já sabe,
no Brasil.
Eis a receita russa para que
brasileiros experimentem a
versão clássica do estroganofe:
Ingredientes :
verem douradas, acrescente a
carne, o sal e a pimenta
5. Cozinhe a carne em fogo alto durante 5 a 6 minutos, mexendo de vez em quando
6. Abaixe o fogo, cubra a panela e deixe em fogo baixo por 5
a 7 minutos
7. Aumente o fogo novamente, acrescente a farinha, mexa e
cozinhe por mais 2 a 3 minutos
8. Acrescente a coalhada, mexa
e deixe ferver
9. Junte o molho de tomate,
abaixe o fogo, cubra a panela e
deixe em fogo baixo por 2 a 3
minutos, até ficar pronto
Sirva sobre macarrão ou arroz ou com batatas fritas como
acompanhamento.
GETTY IMAGES_FOTOBANK
• 500 gramas de filé
• 2 cebolas
• 3/4 de xícara de coalhada
• 1 colher de sopa de farinha
• 2 colheres de sopa de molho de tomate
• sal, pimenta (a gosto)
Modo de preparo :
1. Lave a carne, coloque-a sobre uma tábua de cozinha e
bata com um amaciante de
carne
2. Quando a carne estiver
tenra, corte-a em tiras
3. Pique a cebola em pedacinhos, coloque numa panela e refogue no óleo por 2 a
3 minutos
4. Quando as cebolas esti-
PHOTOXPRESS
Calendário
cultural
Calendário
empresarial
TRÊS SOLOS E UM DUETO
6º CONFERÊNCIA
DE INVESTIMENTOS
HOTELEIROS DA RÚSSIA E
CEI
19 E 20 DE OUTUBRO, 21H, TEATRO
ALFA, SÃO PAULO
Baryshnikov e Ana Laguna
brilham em um programa
de quatro peças. O
primeiro é Valse-Fantasie,
seguido da versão de Ana
Laguna para Solo for Two,
Baryshnikov com Years
Later e, no encerramento,
os dois artistas voltam
juntos ao palco na
coreografia Place.
› www.ingressorapido.com.br
DE 25 A 27 DE OUTUBRO,
RENAISSANCE MOSCOW MONARCH
CENTRE HOTEL, MOSCOU
A conferência anual reúne
diretores e executivos seniores
do mundo inteiro que têm
negócios no setor hoteleiro
na Rússia e em outros países
da Comunidade dos Estados
Independentes (CEI).
› www.russia-cisconference.com

Documentos relacionados