Protestos salvam floresta
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Protestos salvam floresta
CANIVELLO.COM.BR ITAR-TASS Abecásia em cima do muro Depois de conflitos com Geórgia, opinião dividida Página 02 Reencontro com Baryshnikov URY KOZYREV Trabalhadores bem pagos, uni-vos Os maiores salários para estrangeiros estão aqui Dançarino percorre cinco cidades brasileiras Página 06 Página 08 Este suplemento foi produzido e publicado pela Rossiyskaya Gazeta (Rússia) sem envolvimento de O Estado de S. Paulo SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO Polêmica Até vocalista do U2 colaborou na mobilização que interrompeu obras no bosque de Khimki NOTAS Protestos salvam floresta Irkutsk ganha 1ª fábrica de biocombustível Shows e manifestações repercutiram na imprensa e interromperam obra de rodovia ligando Moscou a São Petersburgo. GALINA MASTEROVA ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Quem vai a Moscou e aterrissa no aeroporto Sheremetievo, a noroeste da cidade, pode avistar uma enorme faixa de mata que se torna um oásis verdejante em meio à aridez urbana. O terreno, no entanto, é cortado por uma fina cicatriz de oito quilômetros provocada pela derrubada de árvores. O desmatamento da região tem sido foco de uma grande controvérsia. Atualmente, mudas de replantio já estão substituindo as árvores abatidas e logo a cicatriz se tornará bem menor. Mas a suspensão do projeto para derrubar a floresta de Khimki, assim como as ações para recuperar a mata, são resultado de uma intervenção poderosa e sem precedentes que envolveu o presidente Dmitri Medvedev e obteve o apoio de diversas partes do mundo da opinião pública russa a Bono Vox, vocalista da banda irlandesa U2. Poucos acreditavam que Medvedev pudesse intervir na obra, mas sua decisão acabou trazendo novas esperanças de diálogo entre o governo e a so- A holding estatal Russian Technologies anunciou em setembro que planeja iniciar até meados de 2011 a construção da primeira fábrica de biocombustível do país. Segundo o diretor da companhia, Serguei Chemezov, a unidade da cidade de Irkutsk, no leste da Sibéria, vai produzir biobutanol a partir de aparas e outros derivados de madeira. Em 2007, estimava-se em 800 milhões de toneladas a biomassa de madeira para a produção de energia. Dadas as imensas reservas de combustíveis fósseis da Rússia, as alternativas verdes demoraram para ganhar a atenção. Mas há dois anos o governo anunciou um programa para estabelecer e incrementar o setor de biocombustíveis. Trinta fábricas da indústria madeireira devem receber patrocínio. Business New Europe Moscou entrega escritos de Prestes ao Brasil RIA NOVOSTI ILYA VARLAMOV/PHOTOXPRESS ciedade civil, inclusive aos ativistas da oposição e aos ambientalistas. “É claro que foram os protestos em favor da floresta que provocaram a decisão”, afirmou o presidente do Greenpeace na Rússia, Mikhail Kreindlin. O projeto previa que a estra- da partisse de São Petersburgo, maior cidade do noroeste russo, por quase 700 km em linha reta, quando faria um âgulo agudo na altura do aeroporto Sheremetievo, a noroeste de Moscou, e cortaria o bosque de Khimki por cerca de 10 km até a capital. A questão é que Khimki é Manifestantes desaprovam as obras sobre a floresta considerada o coração do cinturão verde de Moscou, uma das cidades mais poluídas do continente europeu. Além de existirem florestas de pinheiros e abetos, há também ali uma das poucas florestas de carvalhos remanescentes na Europa. Depois de um verão em que incêndios florestais balançaram o país, a natureza passou a ser tema de importância na Rússia. “Acho que Medvedev ouviu o chamado do povo”, ressaltou Evguenia Chirikova, líder da campanha para salvar Khimki. CONTINUA NA PÁGINA 3 Carne País se tornou o maior exportador para a Rússia Brasil domina o mercado russo Luis Carlos Prestes (Porto Alegre, 1898 Rio de Janeiro, 1990) Manuscritos de Luiz Carlos Prestes arquivados em Moscou serão devolvidos ao Brasil no próximo dia 8 de outubro, no Palácio do Planalto. Na ocasião, o embaixador da Rússia, Serguei Akopov, entregará os documentos à família do líder comunista, que viveu na capital russa de 1931 a 1934 e de 1970 a 1979, quando foi promulgada a Lei da Anistia no Brasil. “Meu pai faz parte da história deste país, seu legado pertence ao povo brasileiro”,disse sua filha, Mariana Prestes. Os nove filhos de Maria Ribeiro com Prestes pedem que os escritos sejam remetidos ao Arquivo Público Nacional, enquanto Anita Leocádia, filha dele com Olga Benário, acredita que o material deva ficar sob o poder do Instituto Luiz Carlos Prestes, do qual é diretora. Marina Darmaros VLADISLAV KUZMICHEV ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA O recente embargo russo a frigoríficos exportadores, entre eles três brasileiros (dois da JBS e um da Seara Alimentos), não impediu que o Brasil se tornasse em 2010 o líder absoluto nas exportações para a Federação Russa de três tipos de carne - de frango, bovina e suína. Os Estados Unidos foram desbancados e não estão nem entre os três maiores exportadores de carne suína. Além disso, os EUA caíram para a terceira posição do ranking da exportação de carne de frango, sendo também ultrapassados pela Alemanha. Ainda no final de setembro, a Rússia iniciou o embargo temporário sobre a importação de carne suína de dois frigoríficos norte-america- nos da companhia SmithField Packing. O motivo alegado foi a descoberta de antibióticos do grupo tetraciclina, proibido pelas normas russas, entre os produtos da empresa. Mas junto à carne suína norte-americana também foi suspendida temporariamente a importação do produto de 12 empresas em seis países europeus e ainda antes disso, de dois frigoríficos espanhóis e três argentinos. CONTINUA NA PÁGINA 4 NESTA EDIÇÃO BRIC Dois séculos de negócios História, quadro atual e perspectivas das relações entre Brasil e Rússia REUTERS/VOSTOCK-PHOTO Embargo não impediu que frigoríficos brasileiros superassem os norteamericanos nos setores bovino, suíno e de frango. CONTINUA NA PÁGINA 5 Brasil supera os Estados Unidos na exportação de carne para a Rússia EM FOCO Internet Blogueiros mudam a agenda dos meios de comunicação tradicionais Israelense que postou más recordações de um hospital no interior da Rússia virou assunto nos jornais do país. LUKE ALLNUTT RFE/RL Não dá mais para manter o discurso, ainda recorrente, de que os blogueiros estão sugando o cadáver do bom e velho jornalismo tradicional. Eis aqui um bom exemplo russo de como um blogueiro pode gerar assunto e virar pauta para a imprensa. O jornalistaVadim Isakov publicou no portal de notícias GlobalVoices o comentário de uma blogueira israelense de ascendência russa que divul- PHOTOXPRESS Se o hospital é ruim, publique no blog Blogosfera russa está cada vez mais ativa FORME SUA PRÓPRIA OPINIÃO 15 de novembro Política, economia, cultura e comentários dos maiores gou uma série de fotografias revelando suas experiências em um hospital da cidade de Voronezh, cerca de 500 km ao sul de Moscou. A moça não chegou a se encantar com a qualidade do tratamento. O post não só provocou debate no próprio blog como virou tema de reportagens em um bom número de publicações tradicionais, que normalmente ignorariam temas de tal procedência. CONTINUA NA PÁGINA 2 RIA NOVOSTI Blok, amor libertário Paixão e mitos do pai da Era de Prata no jubileu de 130 anos de nascimento do poeta CONTINUA NA PÁGINA 8 SOBRE A RÚSSIA! www.rbth.ru experts da Rússia e do mundo 02 Política e Sociedade SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 Independência Dois anos após conflitos com a Geórgia, opinião abecasiana ainda está dividida Os dois lados da influência russa na dissidente Abecásia Presença russa trouxe dinheiro e empregos para a Abecásia, mas habitantes se preocupam com a perda da soberania. NÚMEROS 200 ANNA NEMTSOVA ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA mil habitantes é a população aproximada da Abecásia 250 mil georgianos foram expulsos da região na guerra de 1992-93 Presença de seguranças particulares da Rússia aumentou significativamente na região... ... e bases militares russas abrigam milhares de soldados Críticas Os interesses da Rússia na Abecásia, entretanto, vão muito além de balneários e edifícios de apartamentos. A companhia de petróleo Rosneft, uma importante estatal russa, por exemplo, montou um escritório na capital Sukhumi e anunciou o investimento de US$ 32 milhões Propriedades em balneários turísticos estão na mira de empresários russos em pesquisas geológicas ao largo da costa do mar tempo atrás, era conhecida Negro. Além de Moscou, como um “conflito congela- Há temor de que a “Nós nos sentimos seguros. do”pós-soviético, ou seja, uma região, que busca se governos de apenas Nós nos sentimos muito bem região separatista que não separar da Geórgia, na Abecásia”, afirmou o printrês outros países faria mais parte da Geórgia, cipal porta-voz da Rosneft, reconheceram a apesar das reivindicações, seja engolida pelo VladimirVoevoda, ao comenindependência mas também não seria inde- gigante vizinho tar as atividades da compapendente. Era uma espécie de nhia na região. ministro Vladimir Putin pro- local de “Putin City”. Já Lu- Depois de a secretária de Esterritório no limbo. Abandonados e sem manu- meteram canalizar bilhões de jkov, colocou US$ 70 milhões tado norte-americana Hillatenção, os telhados dos gra- dólares para dar apoio à in- em uma nova construção nos ry Clinton visitar a capital geciosos palácios do século 19 dependência local, impulsio- arredores de Gagra, que, ine- orgiana Tbilisi e afirmar que do Príncipe Oldenburg eram nando a economia e fortale- vitavelmente, foi chamada de a Abecásia é um "território castigados pela chuva e pela cendo a infraestrutura e o “Projeto Moscou”. ocupado", houve quem defenAinda assim, nem todos os abe- desse as autoridades russas. O neve. As brancas estátuas de poderio militar. mármore e os lagos redondos Além disso, tanto Putin quan- casianos se deixam levar pelos proprietário da El Petroleum, no jardim botânico ao longo to o recentemente demitido investimentos e vestígios dei- Serguei Klemantovich, sugeda orla marítima de Gagra prefeito de Moscou, Iuri Lu- xados pelos russos. A arquite- riu que Moscou simplesmene r a m d o m i n a d o s p e l o jkov, estão investindo em pro- ta Tamara Laksba, por exem- te ignore as críticas às intermusgo. Hoje, as autoridades jetos particulares na região. plo, é uma feroz defensora dos venções. locais fazem de tudo para que O primeiro-ministro supervi- encantos provincianos de O próprio Klemantovich, que os russos comprem e restau- siona a reconstrução do bal- Gagra e Pitsunda e teme que explora pedregulhos na Aberem os imóveis danificados, neário de Pitsunda, na costa a região venha a ser engolida cásia e exporta ferro-velho do do mar Negro, famoso por pelo gigante vizinho. antigos e modernos. porto de Sukhumi para a Euseus pinheiros centenários e Segundo ela, nos dois últimos ropa, ignora os protestos da Investimentos pelos resorts que atraem mui- anos, a experiência foi Geórgia. Em 2009, ele teve um O presidente russo Dmitri tos turistas na temporada de de “viver na linha de frente”. navio com 20 toneladas de Medvedev, que recentemente verão. A influência é tanta que Ela se refere não ao combate carga confiscado por patruvisitou a região, e o primeiro- os habitantes apelidaram o aos georgianos, mas aos an- lhas marítimas georgianas, ITAR-TASS Líder abecasiano busca segurança e reconhecimento O primeiro-ministro da Abecásia defendeu o auxílio militar e econômico de Moscou e negou ocupação pelo vizinho em entrevista à Gazeta Russa. mantendo suas bases militares. Mas quem achar que isso é ocupação também deve achar que muitos países europeus são ocupados pelos Estados Unidos. FRANCISCO MARTINEZ Quais são as suas prioridades hoje? Segurança, é claro. Depois disso, o reconhecimento internacional. Agora que a Rússia garante nossa estabilidade, podemos nos concentrar no desenvolvimento econômico e tentar atrair investimentos internacionais. ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA milhões de dólares foram investidos pelo governo russo na Abécasia durante 2010 siosos executivos russos que planejam construir na costa abecasiana prédios com alguns andares a mais do que a lei permite. “Quando cortarem o primeiro cedro centenário ou construírem acima dos três andares permitidos em Gagra, toda a população sairá às ruas para protestar”, afirma. ENTREVISTA SERGUEI SHAMBA As ruas da Abecásia estão cheias de cartazes sobre os 200 anos de relações com a Rússia. O senhor não acha que isso confirma que a região está ocupada por Moscou? Isso não é verdade. O parlamento russo reconheceu nossa independência. O exército russo pode permanecer em nosso território para garantir a segurança, inclusive 100 URY KOZYREV(3) Do mosteiro “Novi Afon” é possível ver barcos militares russos de patrulha de alta velocidade guardando a costa do mar Negro da Abecásia. É um sinal de que essa república autônoma na região do Cáucaso, que sempre atraiu o interesse de impérios, do romano ao soviético, ainda é território contestado. Em 2008, depois da guerra entre a Rússia e a Geórgia, este enclave montanhoso, coberto de natureza subtropical selvagem e pontuado por praias paradisíacas, teve sua indepência reconhecida por Moscou. Desde então, pouco se importou com o fato de que apenas a Nicarágua, a Venezuela e um minúsculo ponto no Oceano Pacífico, a naçãoilha de Nauru, apoiaram a decisão. Sob a ótica europeia e n o rt e - a m e r i c a n a a re gião ainda é um território soberano georgiano. Foram necessários apenas dois anos para que a Rússia estabelecesse sua presença militar e comercial na Abecásia. E, até hoje, milhares de soldados e oficiais da Agência de Segurança Federal ainda ocupam as dependências recém-pintadas da base de Gudauta, um edifício de três andares localizado no litoral norte da região. Um moderno sistema de defesa aérea, com mísseis S-300, também funciona na base de Gali. Caminhões cor laranja com emblemas militares levantam poeira dia e noite enquanto transportam areia e cascalho para as instalações militares na fronteira com a Geórgia. “Nada de fotos ou a gente atira”, grita um militar parado diante de um trem carregado de tanques e veículos blindados nos arredores de Gudauta. A vigilância parece ameaçadora, mas para alguns abecásios o cenário de dominação é exatamente de que necessitam. É sinal de bondade e proteção russas.“Chamavam a gente de buraco negro. Agora, a gente é abraçado pelos maiores investidores russos e por figuras poderosas”, explicou o chefe da administração regional de Gagra, Astamur Ketsba. A região dissidente, que ocupa uma área de 8,6 mil km2, tornou-se isolada e decadente desde a rápida e sangrenta guerra contra as forças georgianas em 1993. Até pouco O senhor espera que outros países reconheçam a Abecásia em breve? Estamos trabalhando para isso em diversas regiões, principalmente na América Latina, no Oriente Médio e nos países da área do Pacífico. Além disso, estamos desenvolvendo boas relações com a União Europeia, mas com alguns desses a cooperação é mais difícil, pois são membros da OTAN, que é a favor da Geórgia e está sob grande influência dos Estados Unidos. Há diferenças entre a independência da Abecásia e a de Kosovo? A Abecásia tem mais direito à independência do que Kosovo. Ao contrário deles, NACIONALIDADE: ABECÁSIO com Tbilisi se resumem à busca de coexistência pacífica e à promoção das relações de boa vizinhança, além de mantermos negociações em Genebra. Mas nosso povo lembra bem de nossas fábricas e vidas destruídas. Nosso povo estava sendo assassinado e ninguém ligava para isso. Hoje estamos provando ao mundo que podemos nos desenvolver economicamente e de modo democrático. Realizamos eleições transparentes, o que foi testemunhado por muitos observadores internacionais. IDADE: 59 POSTO: PRIMEIRO-MINISTRO nós libertamos nosso território por conta própria. Em Kosovo foi tudo feito pela OTAN. Além disso, no último milênio nós fomos um Estado no Cáucaso, o mais poderoso da região. Kosovo, pelo contrário, sempre foi um território de trânsito reivindicado pela Sérvia e pela Albânia. O que está sendo proposto à Geórgia atualmente? Atualmente nossos contatos A maior parte dos investimentos estrangeiros na Abecásia tem origem russa… Os empresários russos são bem-vindos aqui. Aguardamos, porém, os investidores europeus, mas a falta de reconhecimento oficial nos prejudica. Os primeiros repres e n t a n t e s d o m e rc a d o internacional, entretanto, já estão chegando ao país. São companhias de turismo austríacas e turcas. Ancara é o nosso segundo maior parceiro comercial, depois de Moscou. Hoje 80% do nosso comércio é feito com a Rússia. mas voltou a exportar neste ano, confiante na proteção vinda da Rússia.“As bases militares russas vieram para ficar e oferecem segurança para nós”, ressaltou. “Em breve, a fronteira entre a Rússia e a Abecásia será tão insignificante quanto aquela entre a Rússia e a Bielo-Rússia”, afirmou o presidente da comissão para antigos Estados russos na Câmara dos Deputados, Konstantin Zatulin, em uma tentativa de mostrar aos investidores russos que eles podem se sentir confiantes em relação à parceria. Soberania No entanto, a insinuação de que o país está se tornando u m va s s a l o d a R ú s s i a deixa parte da população revoltada. O ministro da Defesa da Abecásia, general Mirab Kishmaria, faz questão de dizer que, junto com outros oficiais, derramou sangue para conquistar a independência do Estado.“Os deputados russos, por mais que tentem, nunca vão ver o dia em que a Abecásia eliminará seu exército independente”, afirmou. Kishmaria diz que aprecia todo o equipamento militar que recebeu da Rússia e a crescente presença de soldados russos na região, mas promete ampliar o exército abecásio. “Aqueles que querem desmilitarizar a Abecásia não estavam aqui durante a guerra, não sabem que o nosso povo é uma irmandade de guerreiros”, disse. A chegada de tantas tropas e seguranças russos e o corte de pessoal abecásio protegendo as fronteiras provocou certa tensão na região. O coronel Lavrenti Mikvabia, por exemplo, que há anos patrulha a fronteira de Gali com a Geórgia, afirma que os guardas de fronteira foram demitidos e substituídos por mil h a re s d e s o l d a d o s d o Serviço Federal de Segurança (FSB) da Rússia. Segundo o coronel, os oficiais estão ressentidos e alarmados porque ouviram dos russos que em breve já não haverá mais nenhum abecásio nessa função. “Eles estão cometendo um enorme e insensato erro ao retirar os militares abecásios de nossa própria fronteira”, criticou Mikvabia.“Com isso, os russos mostram que não têm nenhum respeito por nós. Esta é a minha terra, posso defender este lugar melhor do que qualquer soldado russo, se for preciso.” Em Tbilisi, as autoridades também estão descontentes e o presidente da Geórgia, Mikhail Saakashvili, mandou suas agências governamentais fazerem um levantamento das propriedades georgianas vendidas aos russos pelos abecásios. “Quero dar um aviso a alguns russos imprudentes: vocês estão comprando ilegalmente casas na Abecásia, em território georgiano ilegalmente ocupado”,declarou Saakashvili. O ministro para a reintegração étnica da Geórgia, Temur Iakobashvili, declarou à Gazeta Russa que 500 mil pessoas desalojadas pelo conflito de 1993 ainda vão reclamar suas propriedades na Abecásia um dia. “Putin, Lujkov e a Rosneft estão infringindo a lei georgiana ao trabalharem em território ocupado nosso”, afirmou Iakobashvili. Blogs viram arma útil para denunciar CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1 O tablóide popular Komsomolskaia Pravda, por exemplo, que normalmente se ocupa de reality shows da TV, escândalos de celebridades e esportes, publicou uma matéria detalhando as experiências da blogueira, o que provocou uma discussão ainda maior. Outra que ressaltou o novo papel dos blogs foi a jornalista Daisy Sindelar, que recentemente falou sobre o uso da blogosfera por ativistas rurais na hora de proporcionar socorro às vítimas dos incêndios na Rússia. Já Olga Serebrianaia, que cobre a blogosfera russa para o serviço russo da Rádio Free Europe/Rádio Liberty (RFE/ RL), deu destaque à plataforma LiveJournal, ao site pozhar. ru e aos blogs de Igor Cherski e Elizaveta Glinka, médica do Fair Help que mantém o blog Doctor Liza. Serebrianaia diz que a proliferação dessas ferramentas deu uma grande contribuição durante os incêndios de grandes proporções que atingiram a Rússia recentemente e ajudou a resgatar a unidade cívica que havia sido desgastada nas duas últimas décadas com o colapso soviético. Também é possível perceber que, cada vez mais, a oposição no país tem deixado de focar em figuras públicas ou partidos para abordar mais questões como protestos dos motoristas ou campanhas contra a corrupção policial. A blogosfera russa contribui colocando lenha na fogueira. O escoamento das notícias da internet para as mídias convencionais é muito significativo e mostra que os internautas continuam a se afastar de uma elite urbana "dona da verdade". A comunidade virtual do LiveJournal começou a preencher essa falha há muito tempo na Rússia. Agora a história está sendo escrita pelas mãos de cidadãos conectados. SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 Política e Economia 03 NOTAS NÚMEROS 73% É a proporção de habitantes da região de Khimki que são contra a derrubada da floresta para dar lugar a uma nova rodovia COMENTÁRIO Iuri Shevchuk ROQUEIRO '' A floresta de Khimki já se tornou um símbolo, uma metáfora. Ela já penetrou nas nossas almas. Ou ela floresce ou é destruída por completo. Se Khimki for derrubada não deixaremos nada para nossos netos, nada para nossos filhos. Apenas campos mortos” VASILY SHAPOSHNIKOV_KOMMERSANT Protestos salvam floresta No final de agosto, um protesto contra a rodovia foi realizado no centro de Moscou e contou até com um show acústico do roqueiro russo Iuri Shevchuk, da banda DDT. Diferentemente de outras grandes manifestações, a multidão ali reunida era composta não apenas pelos costumeiros ativistas da oposição, mas também por cidadãos interessados na causa. A audiência foi tanta que chegou a preocupar o governo do país. Antes de cantar, Shevchuk fez um discurso e destacou que a floresta de Khimki é um símbolo da região. “[Se Khimki for derrubada] não deixaremos nada para nossos netos, nada para nossos filhos, apenas campos mortos”, afirmou o roqueiro. Três dias depois, no primeiro concerto do U2 em Moscou, ele foi convidado para dividir o palco com a banda irlandesa e cantou Knockin' on Heaven's Door, de Bob Dylan, ao lado de Bono Vox. Na Rússia, o convite do U2 a Shevchuk foi interpretado como um claro gesto de apoio à campanha. No dia seguinte, Medvedev interrompeu a construção da estrada para “maiores discussões cívicas e técnicas”. O primeiro passo foi dado. As somas envolvidas na construção das pistas, no entanto, indicam que a vitória dos ambientalistas está longe de ser garantida.“Uma das possibilidades é que os protestos diminuam durante um mês ou dois e, então, depois de algumas discussões, o projeto original seja retomado”, diz Nikolai Petrov, analista político do Carnegie Center de Moscou. O passado confirma a teoria. Outros exemplos de casos em que ambientalistas se uniram em manifestações tiveram sucesso apenas inicial. Em 2008, uma fábrica de polpa de papel que poluía o lago Baikal foi fechada após protestos e reabriu neste ano. A destruição de casas construídas ilegalmente na região de dachas (casas de campo) de Rechnik também foi interrompida no começo do ano Trecho da discórdia após manifestações, mas tribunais locais acabam de dar permissão para que as demolições continuem.“Talvez eu esteja enganado, mas existe um receio de que a determinação tenha sido para apaziguar as tensões e de que daqui a algum tempo a construção prossiga”,disse Kreindlin, do Greenpeace. Já há sinais de que os defensores da estrada vão pegar pesado. Um dia após o anúncio de Medvedev, a administração de Khimki havia lançado uma petição em favor da construção. Segundo Evguenia Chirikova, líder do movimento de proteção à floresta, os funcionários das lojas e dos institutos ligados ao governo local receberam ordens de assinar e de recolher assinaturas. Em três dias, foram levantadas 20 mil assinaturas a favor da estrada, um número impossível de ser alcançado sem uma séria pressão da administração. O grande problema que surge é para onde levar a estrada, caso ela não passe pela flo- resta de Khimki.“Atravessar Khimki é ruim, porque haverá dano ecológico”,explica o especialista em transportes Mikhail Blinkin, mas outros trajetos irão exigir deslocamento de moradores e imensos pagamentos de indenização. “Não existe nenhuma decisão que possa agradar a todos.” Como na Amazônia, o dilema entre progresso e devastação De Manaus, jornalista traça paralelo entre consequências da Transamazônica para população regional e protestos de Khimki. FELIPE MILANEZ ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Uma estrada conecta pontos onde vivem pessoas que precisam de transporte e comunicação. É difícil imaginar que obras de infraestrutura básicas como a ligação rodoviária Moscou – São Peterburgo pudessem sofrer tanta oposição e protestos. Mas não é a estrada em si, e sim o que passa por ela e o acesso que ela permite a recursos naturais, que geram as críticas. Na Amazônia, a construção de uma estrada, ao mesmo tempo em que abre uma nova fronteira econômica, pode acelerar a destruição da floresta. O Plano de Combate ao Desmatamento do Governo Federal, de 2009, atesta:“O desmatamento da Amazônia correlaciona-se com o processo de ocupação em curso desde a década de 70 e com a abertura de longas rodovias em meio à floresta, algumas pavimentadas.” O desmatamento está, dessa forma, diretamente ligado às estradas. Elas são a porta de entrada da ocupação e, por consequência, da devastação. O Imazon, instituto independente de pesquisa, já detectou por satélite milhares de quilômetros de estradas ilegais criadas a partir dos ramais centrais. Antes da construção das estradas, inicia-se um processo de grilagem e violência no campo. Segundo a antropóloga Mary Allegretti, existem basicamente dois modelos de construção de rodovias na Amazônia, e para ambos a BR-364, que liga Acre e São Paulo, serve como exemplo. “O primeiro é o asfaltamento do trecho ligando Cuiabá (MT) a Porto Velho (RO), que no início da década de 80 provocou altas taxas de desmatamento”, afirma. O outro modelo foi criado na metade da década de 80 para controlar o impacto da mesma estrada na conexão entre Rondônia e Acre. Allegretti afirma que esse“também teria provocado alto impacto, não tivesse sido objeto de pressão por parte dos movimentos sociais”. De qualquer forma, os dois modelos, construídos na transição da ditadura militar, foram marcados por destruição ambiental e violência. Assim como em Khimki, os mais recentes projetos para a Amazônia - como o asfaltamento da BR-319 ou a construção da Transoceâni- ca, rodovia que liga o Acre ao Oceano Pacífico - terão sua viabilidade discutida em uma sociedade com mais tecnologia e conhecimento frente à natureza. Isso pode acarretar uma destruição ainda maior – mas também uma nova dinâmica social e de pressões por preservação. Estradas trazem impacto ambiental, mas vêm acompanhadas de benefícios sociais e econômicos para as pessoas que vivem a seu redor. As consequências da extinção florestal, entretanto, podem ser desastrosas. A Academia de Ciências da Rússia receberá do governo federal recursos adicionais para destinar ao patrocínio de jovens cientistas. O anúncio foi feito pelo chefe da instituição, Iuri Osipov, durante assembleia da presidência da academia.“Decidiu-se que serão distribuídas mil bolsas para esses jovens cientistas”, disse ele. Além dos 600 milhões de rublos (cerca de R$ 30 milhões) em bolsas que não estavam previstos no orçamento, o acadêmico revelou que uma quantia equivalente a R$ 111 milhões será destinada à própria Academia e cerca de R$ 55 milhões serão reservados ao custeio de moradia dos bolsistas. Osipov interpretou a medida como“uma concreta mudança de postura”do governo em relação à Academia. ITAR-TASS Fauna de Sochi é relocada para Olimpíadas RIA NOVOSTI Já começou a transferência de animais como salamandras, rãs e lagartos que habitam a área onde estão sendo construídas as estruturas esportivas para as Olimpíadas de 2014 de Sochi, no sudoeste do país. A medida é parte do programa de compensação de danos ecológicos decorrentes das construções olímpicas. Segundo o vice-ministro do Meio Ambiente da Rússia, Igor Maidanov, o programa será concluído apenas em 2015.“Mas algumas espécies de anfíbios - salamandras e rãs, entre outros - e lagartos já estão sendo transferidos”, afirmou. Também serão replantados mais de 20 hectares de vegetação ameaçada de extinção. De acordo com Maidanov, sob o programa já foi realizado o replantio de 30% das espécies ameaçadas, removidas para construção das instalações olímpicas. As próprias companhias responsáveis pelas obras, Ferrovias Russas (RZhD) e Gazprom, teriam executado o trabalho, disse ele. Interfax.ru Tigre russo para as favelas brasileiras RUSSIAN LOOK CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1 Jovens cientistas ganham bolsa Estradas intensificam desmatamento, mas trazem benefícios Fiscalização Atendendo a pedidos presidenciais, governo afrouxa política de vistorias surpresa Pequenos empresários aliviados Desde que as medidas entraram em vigor, em maio deste ano, 97% das novas empresas não teriam tido problemas com fiscalização. PETER FRANCE THE ST. PETERSBURG TIMES O número de vistorias surpresa a negócios diminuiu significativamente desde que novas regras limitando a carga regulamentar sobre as empresas entraram em vigor, afirmou a ministra do Desenvolvimento Econômico da Rússia, Elvira Nabiullina. Os dados mais recentes, do primeiro trimestre de 2010, mostram que foram feitas apenas 405 mil inspeções em pequenos negócios, excluindo aquelas feitas pelas autoridades da receita federal e da polícia. Essa cifra caiu em relação ao terceiro e ao quarto trimestre de 2009 (que foram de 595 mil e 613 mil, respectivamente). Em maio de 2009, entraram em vigor mudanças para que a maioria das agências reguladoras estatais consigam permissão das promotorias locais antes de inspeções não-anunciadas. As novas regras vie- ram em resposta a um apelo do Presidente Dmitri Medvedev para que o governo parasse de “causar pesadelos” aos pequenos negociantes. Nabiullina afirmou que as medidas funcionaram e que apenas 54% do número total de inspeções a pequenos negócios teriam sido realizadas. “Essa cifra parece alta, mas os pequenos negócios representam 68% do número total de empresas, o que significa que a frequência das inspeções aos pequenos empresários diminuiu”, explicou a ministra. Apesar da menor pressão sobre as pequenas empresas, apenas 3,8% das inspeções realizadas precisariam receber autorização do Gabinete Geral da Promotoria. “Existem duas razões para isso. Em primeiro lugar, as regulamentações que exigem consentimento da promotoria foram emitidas para autoridades de certas agências, incluindo fiscais, alfândegárias, de orçamento, de transporte e antimonopólio. Em segundo, outras agências simplesmente não estão obedecendo à lei, infelizmente”, informou ela. Cerca de 80% das inspeções são hoje executados por apenas cinco corpos fiscais: o Ministério para Situações de Emergência, a Agência Federal de Proteção ao Consumidor, o Serviço Federal para Inspeção Ambiental, Tecnológica e Atômica, o Serviço Federal de Migração e o Serviço Federal de Trabalho e Emprego. O premiê Vladimir Putin pediu à ministra que apresentasse propostas para reduzir o número de agências excluídas das regras e criar um sistema de monitoramento que ITAR-TASS reduzisse o número de violações. Com as novas medidas, que afunilam o processo de abertura de firmas a 20 setores, 97% daqueles que começaram negócios dizem que não tiveram problema com a fiscalização, afirmou Nabiullina, citando um levantamento do grupo lobista de pequenas empresas Opora. “Então abrir um negócio aqui, podemos dizer, foi liberalizado num grau significativo?”, perguntou Putin.“Mas somente em 20 esferas de atividade”, replicou Nabiullina. O Batalhão de Operações Especiais (Bope) do Rio de Janeiro recebeu no dia 7 de setembro o modelo para testes do primeiro veículo blindado Gaz-2330 Tigre, importado da Rússia. O veículo está em produção desde 2005, possui blindagem de nível cinco e pode desenvolver velocidade de até 140 km por hora. O preço de uma unidade é de, aproximadamente, US$ 300 mil. Além disso, está sendo discutida a possibilidade de se instalar uma montadora do veículo no Brasil. Interfax [email protected] 04 Economia SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 Fertilizantes Fusão resulta na segunda maior produtora de potássio do ranking mundial Potássio rumo ao topo do mercado RIA-NOVOSTI Depois de adquirir a Uralkali e a Silvinit, deputado Suliman Kerimov se prepara para bater a produção da líder canadense PotashCorp. TIM GOSLING BUSINESS NEW EUROPE Outra gigantesca fonte de recursos naturais da Rússia se levanta para dominar seu mercado, e não se trata de vender petróleo ou gás. Em agosto, o oligarca e membro do parlamento russo Suliman Kerimov comprou o controle acionário da Uralkali e da Silvinit, duas das maiores mineradoras russas de potássio, principal ingrediente em fertilizantes agrícolas. A Rússia abriga o segundo maior depósito do mundo desse recurso natural e a união dessas companhias resultará no segundo maior produtor mundial, atrás apenas da canadense PotashCorp. A alta dos preços de cereais incitou uma frenética atividade de fusões e aquisições no setor de fertilizantes. Na última semana de agosto, a BHP Billinton, maior companhia mineradora do mundo, apostou bilhões na demanda crescente por commodities agrícolas dando um lance tentador de US$ 39 bilhões pela PotashCorp. O preço do potássio subiu a níveis astronômicos desde o boom provocado pelas commodities. O custo da tonela- da chegou a US$ 1 mil em 2008, até despencar para o nível atual de US$ 350 a US$ 375 por tonelada. Entretanto, espera-se que a alta nos preços seja significativa na medida em que as economias ao redor do mundo se recuperam, principalmente em importantes mercados emergentes como China e Índia. Além do mais, em consequência das temperaturas recordes desse verão na Rússia e dos subsequentes incêndios que destruíram um terço da colheita de grãos do país, os preços dos produtos agrícolas também estão subindo rapidamente, puxando consigo os preços do potássio. Apesar da crise de crédito internacional que assolou o mundo, especialistas preveem que praticamente nada mudou na dinâmica de suprimento de alimentos desde 2008, quando a escassez no abastecimento provocou uma drástica elevação nos preços. Conhecido como“o funcionário público mais rico da Rússia”,Kerimov chegou à Câmara dos Deputados (Duma) em 2007. O empresário é membro do partido dominante Rússia Unida e deputado pelo Daguestão. Kerimov chegou a ser repreendido recentemente por ser o mais ausente dentre os políticos russos, mas é mais conhecido por seus vastos investimentos em ouro, petróleo, imóveis e tecnologia Segundo alguns analistas, o deputado estaria construin- do seu império em nome do Kremlin. Ele estaria juntando bens em vários setores para formar uma série de“campeões nacionais”, que poderiam usar seu tamanho e força avassaladores para tirar vantagem nos mercados globais. Conforme sugere o banco de investimentos Troika Dialog, “Kerimov é um típico financista e suspeitamos que ele esteja encenando um drama de muitos atos com o intuito de monetizar seu investimento”. Ainda assim, a fusão faz sentido economicamente. gigante da diversificada mineração são pouco prováveis, enquanto um acordo com fabricantes de fertilizantes químicos como a Phosagro oferece poucos benefícios porque os métodos de produção são inteiramente diferentes. Em vez disso, Kerimov estaria tentando expandir o novo gigante através da fronteira com a Bielo-Rússia, que possui o terceiro maior depósito de potássio do mundo. No começo de agosto, o vicepremiê da Bielo-Rússia, Vladimir Semashko, desmentiu que o governo estivesse discutindo uma oferta de US$ Preços de fertilizantes devem subir, puxados pela retomada do boom de commodities Analistas veem dedo do Kremlin no negócio. Governo estaria interessado em criar gigantes Os efeitos da consolidação e a alta dos preços agrícolas já se fizeram sentir no setor dos fertilizantes depois que a Uralkali subiu os custos para pronta entrega em torno de 10% no início de setembro. Uma tentativa similar em fevereiro foi abortada pela reação agressiva dos compradores e pela indisciplina da parte da Silvinit. Enquanto o mercado observa a BHP cortejar a PotashCorp, também se indaga quais são as cartas da Rússia na jogada. Sugestões de que o novo campeão poderia se juntar à Norish Nickel para formar uma 7,5 bilhões de Kerimov para adquirir 51% da maior produtora de potássio do país, a Belaruskali. No entanto, apesar de informações sobre o interesse de chineses e indianos pela produtora bielo-russa, Semashko espera que o conglomerado russo emergente esteja entre os principais compradores da companhia. O premiê afirmou acreditar que o interesse de Kerimov nasceu de sua recente aquisição da Uralkali.“Espero que depois [que assuma o controle] da Silvinit, a Belaruskali venha a seguir,” disse Semashko. timos anos demonstraram que os mercados financeiros podem ser igualmente desestabilizadores. Por isso, as reformas enfocam os mesmos objetivos de diversificar a economia além dos recursos energéticos e criar um setor financeiro capaz de intermediar a poupança russa para companhias russas. A taxação excessiva do setor petrolífero e a baixa taxação do resto da economia é uma resposta. Um novo gerenciamento visando a reformas nas concessoras de empréstimos Sberbank e VTB é outra. O programa de modernização do presidente Dmitri Medvedev é uma terceira resposta. Dada a volatilidade dos mercados globais, o programa de reforma vai ser uma dura tarefa, mas é crítico que ele seja executado durante o próximo boom do país. Se a Rússia saiu da crise de 2008, isso foi devido às ações tomadas pela OPEP, pelo Fed, pelo governo chinês e pelo ministro das Finanças, Alexei Kudrin, nessa ordem de importância. Mas caso essa combinação deixe de se materializar na próxima crise, as consequências poderão ser muito piores. Num país com um sistema político tão inflexível como a Rússia, grandes crises econômicas podem ter efeitos imprevisíveis. Panorama Crescimento econômico russo depende de motivos que fogem ao controle do Estado Um país à mercê dos humores internacionais Dependente do preço do petróleo e do custo internacional do capital, a Rússia é o país que mais sofre com grandes guinadas econômicas. ROLAND NASH ESTRATEGISTA-CHEFE DO RENAISSANCE CAPITAL Tanto entre os admiradores como entre os críticos da Rússia existe o mito de que o país tem controle sobre seu destino econômico. Não tem. Na última década, e até há mais tempo, a economia russa tem sido impelida principalmente por dois fatores: o preço dos recursos naturais e o custo do capital, ambos fora de seu domínio. Nesse sentido, o cartel do petróleo OPEP, o governo chinês e o Fed (banco central norte-americano) têm tanta influência sobre a Rússia quanto o Kremlin ou os oligarcas. Claro que a maioria dos países é influenciada de um modo ou de outro pelo preço do petróleo e pelo custo internacional do capital. Mas a Rússia depende de ambos. O país é o maior produtor e exportador mundial de recursos naturais. No ranking de recursos energéticos não-renováveis (petróleo, gás e carvão), a Rússia exporta 50% mais do que o segundo lugar, a Arábia Saudita. Mas, ao contrário de outros produtores importantes, a Rússia não pode depender exclusivamente de sua produção. Apesar da contribuição que trazem para a economia, os hidrocarbonetos são responsáveis por menos de 2% dos empregos da população ativa. A Rússia também está sob o jugo do custo global do capital. Quando sua conta de capital foi aberta, em 2006, pressupunha-se que os mercados internacionais estariam em melhor posição para alocar capital no país do que o anêmico mercado financeiro doméstico. Mas, com a crise de 2008, a combinação de setor bancário frágil, mercado financeiro subdesenvolvido e conta de capital aberta tornaram a Rússia vulnerável às alterações de humor bipolares dos mercados financeiros globais. A exposição singular a duas variáveis que estão fora de seu controle e são sujeitas à volatilidade faz da Rússia o exemplo acabado de economia do“sobe e desce”.Através de uma taxa de câmbio controlada, os mercados e a economia da Rússia importam diretamente a volatilidade dos mercados globais de bens de consumo e capital. Quando as coisas vão bem, poucos países parecem em melhor situação. Quando o sentimento internacional muda, a economia e os mercados russos entram em colapso. A boa e a má notícia A boa notícia é que o panorama a curto prazo é ideal para a Rússia. Os desafios estruturais com que se defrontam Estados Unidos, Europa e Japão lhes deixam pouca escolha a não ser manter as taxas de juros virtualmente em zero no futuro. Da mesma forma, por motivos totalmen- te diferentes, a OPEP e o governo chinês parecem determinados a manter elevado o preço do petróleo. Um pessimismo a curto prazo pode refrear os preços do petróleo neste ano, mas a perspectiva a médio prazo para preços de bens de consumo parece tão sólida quanto em 2007, quando o preço do petróleo subiu a quase US$ 150 o barril. Não há motivo pelo qual a Rússia não possa voltar ao crescimento econômico anual de 5% a 7% que teve durante grande parte da década passada, ou pelo qual os mercados imobiliários não devessem figurar de novo entre os de melhor desempenho global. Devido à crise de 2008, o país desacelerou, reestruturou-se e está em boa posição para embarcar numa nova onda de crescimento. Mas, como no passado, qualquer novo crescimento econômico ou financeiro não será totalmente graças aos ganhos de produtividade na Rússia. Na verdade, quanto mais a Rússia subir no próximo ciclo, maior deverá ser a queda da próxima vez em que houver um desconforto internacional nos mercados. O governo há muito tempo tem noção de sua vulnerabilidade em relação aos preços de bens de consumo e os úl- Relação entre o preço do petróleo e o PIB da Rússia (US$ por barril) CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1 Em alguns desses produtos, além dos antibióticos, foram detectados micro-organismos anaeróbicos, bactérias E. coli, listeria e salmonela. Apesar do medicamento tetraciclina não apresentar perigo imediato, sua ingestão regular pode ter efeitos não desejados em humanos. Um deles é a diminuição dos efeitos de remédios antibióticos em pessoas submetidas ao consumo. Na Rússia, epidemias de resfriados e de gripe comum ocorrem uma ou duas vezes por ano, e os órgãos sanitários não querem correr riscos por conta dos lucros dos pecuaristas dos Estados Unidos. Não é a primeira vez que os serviços sanitários embargam produtos norte-americanos. Segundo especialistas russos, 41 frigoríficos foram incluídos na lista de exportadores aptos a fornecer carne suína para a Rússia, sob a garantia oficial do governo de Washington. No entanto, já foram impostos embargos temporários a 26 deles. O quadro da carne bovina norte-americana não está melhor. Dos 32 frigoríficos certificados na Rússia, 21 estão sob regime de controle intensificado devido à descoberta de antibióticos ou contaminação por bactérias. Mas epidemias animais são alarmantes na própria produção russa. Segundo Anna Evangeleeva, analista do site MeatInfo.ru, entre janeiro e fevereiro o país registrou 54 casos de peste suína africana, nove de peste suína clássica, um de gripe aviária e um de febre aftosa. Isso pode retardar os planos da Rússia de desenvolver a produção doméstica, mesmo depois de um grande salto produtivo dos fazendeiros locais, que têm contado com subsídios do Estado. Até pouco tempo, a participação da carne de frango nacional no consumo era inferior a 40%. A quantidade de REUTERS/VOSTOCK-PHOTO Brasil ultrapassa EUA na exportação de carne à Rússia Com aumento da produção, Rússia importa cada vez menos frango importado dos EUA era tanta que o produto foi apelidado como “pernas de Bush”,em homenagem a Bush pai, sob cuja gestão começaram as exportações da ave para a Rússia. Nos últimos anos, entretanto, a produção russa recebeu grandes investimentos estatais e privados. Graças a isso, a produção nacional passou a ocupar de 70% a 75% do consumo. Já o aumento de produção de carne suína não se tornou tão relevante, ainda que tenha sido notável nos últimos anos. Nos sete primeiros meses de 2010, a produção subiu 28,7%, se comparada com o mesmo período de 2009. Por enquanto, somente a população de gado bovino e a produção de carne estão diminuindo. Segundo Anna Evangeleeva, a produção entre janeiro e julho deste ano diminuiu 3%, se comparada com o mesmo período do ano passado. Mas a analista também destaca que a carne de frango ocupa 75% do total de consumo na Rús- sia, a suína 20%, e a bovina somente 4%. Segundo Evangeleeva,“desde o início da realização do projeto nacional de produção de carne, a avicultura é o segmento que se desenvolve de modo mais dinâmico. E ainda que isso também seja influência dos embargos, os volumes de importação estão diminuindo”. A especialista não exclui a possibilidade, no caso do crescimento contínuo da produção nacional, de a Rússia se transformar de importadora em exportadora nos próximos anos. Segundo ela, o volume de produção nos oito meses de 2010 somou 1,5 milhão de toneladas, e a importação nos sete primeiros meses foi de apenas 133 mil toneladas, 2,8 vezes menor do que nos primeiros sete meses de 2009. Dos outros frigoríficos que tiveram sua carne impedida de entrar na Rússia a partir de 28 de setembro, três eram espanhois, três holandeses, quatro alemães, um francês e um polonês. BRIC SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 Relações bilaterais Iniciada em 1812, parceria entre Brasil e Rússia agora engloba produtos de alta tecnologia Dois séculos de negócios História, quadro atual e perspectivas do desenvolvimento das relações comerciais e econômicas entre Rússia e Brasil. NÚMEROS 3,4 SERGUEI BALDIN REPRESENTANTE COMERCIAL DA FEDERAÇÃO DA RÚSSIA NO BRASIL bilhões de dólares Foi o nível alcançado pela balança comercial Brasil-Rússia entre janeiro e julho de 2010 95 porcento É a contribuição dos produtos agrícolas brasileiros no total das exportações para a Rússia em 2009 ALAMY/PHOTAS O comércio entre a Rússia e o Brasil começou em 1812, quando atracaram pela primeira vez na Rússia os navios de um próspero empreendedor português, vindos do outro lado do oceano. Em 1814 chegaram ao Brasil os primeiros navios mercantes russos. O início das relações diplomáticas entre nossos países, em 3 de outubro de 1828, inaugurou o intercâmbio comercial e econômico da Rússia não só com o Brasil, mas com todos os Estados da América Latina. No século 20, as relações comerciais permanentes entre a União Soviética e o Brasil desenvolveram-se de modo mais ativo após a assinatura, em 1959, do primeiro acordo comercial e de pagamentos. A participação da União Soviética na balança do comércio internacional brasileiro somou, naquela época, 3%. O Brasil, por outro lado, tornouse um dos maiores parceiros da URSS entre os países em desenvolvimento. Hoje, o Brasil é o maior parceiro comercial da Rússia na América Latina. A crise financeira e econômica internacional provocou a queda da produção industrial nos dois países, inclusive da produção voltada à exportação. Os volumes de crédito minguaram e, em consequência, foram re- Comércio entre os dois países já inclui produtos para os setores de energia e militar duzidos os negócios entre os parceiros. Segundo a estatística da Receita Federal brasileira, os indicadores do comércio do Brasil com a Rússia em 2009 reduziram-se em 46% e chegaram a US$ 4,3 bilhões, contra os US$ 8 bilhões de 2008. A exportação da Rússia para o Brasil em 2009 foi de US$ 1,4 bilhão, e a importação figurou em US$ 2,9 bilhões (uma queda de 57% e 39% respectivamente). Em 2009 foram exportados para o Brasil fertilizantes, matéria-prima para fertilizantes, carvão, derivados de petróleo, enxofre granulado e derivados de borracha natural. Pela primeira vez nos últimos anos, notou-se o incremento de vendas de produtos de alta tecnologia, dentre os quais helicópteros e peças repositoras para esses, assim como turbinas e geradores para as hidrelétricas em construção no país. Já do lado brasileiro, os produtos agrícolas foram respon- sáveis por grande parte das exportações para a Rússia em 2009 - 95% do total. Os produtos mais exportados foram carne bovina (33,2% do total exportado), açúcar (30,3%), carne suína (19,8%), carne de frango (4,3%), tabaco (4%) e café (3,4%). Em 2010, a balança comercial Brasil-Rússia somou US$ 3,4 bilhões entre janeiro e julho. As exportações brasileiras para a Rússia foram de US$ 2,4 bilhões, ou seja, cresceram 41% se comparadas ao mesmo período de 2009. As importações brasileiras da Rússia somaram US$ 1 bilhão (crescimento de 94%). A meta da Rússia agora é inserir no mercado brasileiro produtos de alto valor agregado e tecnologia, principalmente os relacionados às áreas de energia hidrelétrica, petróleo e gás, mineração, exploração pacífica do espaço e da energia atômica, aviação, medicina e telecomunicações. As companhias russas se interessam principalmente por tecnologias brasileiras de pecuária e avicultura para organizar cadeias produtivas. Também há necessidade de equipamentos tecnológicos para uso nos complexos pecuários e para o processamento de produtos de carne, bem Depois de ouvir piadas sobre a fragilidade de sua economia, a Rússia agora apresenta indicadores superiores entre emergentes. BEN ARIS ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Há apenas um ano, logo depois de uma crise econômica global que atingiu a Rússia em cheio, analistas pediam a cabeça do“R”do Bric (o bloco de gigantes em crescimento composto por Brasil, Rússia, Índia, China). Agora que a economia se recuperou, alguns estão se perguntando se a Rússia não seria o melhor componente do grupo. Um relatório divulgado em agosto pelo banco de investimentos russo Troika Dialog coloca o país do leste europeu como melhor aposta que a China ou a Índia. Segundo o autor do documento, Kingsmill Bond, as fraquezas da Rússia são mais destacadas que suas vantagens. E a vantagem mais óbvia é que o país está repleto de todo recurso mineral imaginável – e não apenas petróleo e gás. “O mercado emergente deve ter um crescimento superior ao da Europa e dos Estados Unidos. Como a Rússia é o principal depósito de matérias-primas do mundo, essa transformação não será possível sem ela”, diz Bond. Além disso, a maior parte dos investidores internacionais foca na China, que tem uma população de 1,3 bilhão de pessoas e transforma qualquer produto vendido em centenas de milhões de unidades comercializadas. Nesse sentido, é um investimento na quantidade e não na qualidade. sia, ajustada ao poder de compra, é de cerca de US$ 19 mil, sendo que a economia ainda está em transição para o capitalismo e quase todo bem de consumo tem uma alta demanda. No Brasil, esse indicador é de US$ 10,5 mil, na China, de US$ 6,5 mil e na Índia, de US$ 3,3 mil. Bond ressalta ainda que 68% da população russa é considerada de classe média, o que representa aproximadamente 100 milhões de pessoas, contra 31% no Brasil (75 mi- Renda per capita dos países do Bric Mercado é lucro A Rússia tem uma população de 142 milhões de habitantes e representa um mercado muito menor que o chinês. No entanto, o poder de compra do povo russo é duas vezes maior do que o desses asiáticos e cinco vezes maior que o dos indianos. A renda per capita da Rús- NOTAS NEGÓCIOS Moscou inicia a venda de yuan na Bolsa como a implementação de redes de churrascarias na Rússia. Órgãos estatais e companhias privadas russas e brasileiras estão elaborando diversos projetos de infraestrutura energética e de transporte, de nanotecnologia e de pesquisa e uso de recursos naturais. Também desenvolvem mecanismos de pagamento com as próprias moedas nacionais, além de parcerias técnicas e militares e cooperação no âmbito do BRIC. Os projetos de pequenos e médios negócios entre os países ainda não tiveram um desenvolvimento digno de nota. Mesmo assim, grandes companhias e instituições financeiras russas, como Power Machines, Gazprom, Rostekhnologii, Agência Federal Espacial (Roskosmos) e Banco do Desenvolvimento e de Economia Externa (Vnesheconombank), atuam ativamente e com sucesso em território brasileiro. A companhia brasileira de aviação Embraer, por outro lado, demonstra interesse em estabelecer parcerias com empresas de aviação da Rússia.Novas perspectivas de parcerias entre Rússia e Brasil se iniciam com o projeto de exportação de blindados russos GAZ-2330 Tigre, da companhia Russkie Machini (RM Corporation). Recentemente, o Rio de Janeiro recebeu um modelo do veículo para testes e, se tiverem sucesso, os Tigres russos podem invadir o mercado brasileiro, abrindo caminho para mais uma série de produtos competitivos. SXC.HU A Bolsa de Valores de Moscou (Micex) planeja começar a venda do yuan chinês até o final deste ano. A informação foi dada à Gazeta Russa pelo representante oficial da bolsa, Nikita Bekasov. Segundo ele, mais de 30 bancos russos já se interessaram pela nova possibilidade, especialmente organizações de crédito da Sibéria e do extremo oriente russo, regiões de fronteira com a China. “O surgimento dessa nova modalidade na Bolsa de Valores ampliará as possibilidades de uso das nossas moedas nacionais pelos bancos e empresas”, afirmou. Neste ano, o volume de comércio entre a Rússia e a China pode ficar entre US$ 50 bilhões e US$ 60 bilhões. Nos cinco primeiros meses a balança comercial entre Rússia e Índia cresceu 35%. Em comparação com o mesmo período do ano passado, somou US$ 3,41 bilhões. A balança comercial Rússia-Brasil cresceu 49% no primeiro semestre e atingiu US$ 3 bilhões. Vladislav Kuzmichev Cooperação energética com Brasil em foco Ranking Para analistas, fraquezas do país são mais divulgadas que vantagens Rússia sai da crise como a melhor opção do Bric 05 lhões), 13% na China (160 milhões) e menos de 3% na Índia (30 milhões). A desigualdade social da população também explica a grande diferença no crescimento entre a China e a Índia, de 8% a 10%. A Rússia, que apresenta índice entre 4% e 6%, já possui uma sociedade industrial sofisticada e de população instruída, enquanto os outros dois países entraram agora nesse caminho. Na Rússia, o número de carros para cada mil pessoas é cinco vezes maior do que na China, por exemplo. Sendo que o tempo de vida médio de um veículo russo é de 11,5 anos, contra 8,5 anos na Europa Ocidental, isso significa que os russos terão que substituir seus carros antes dos europeus, acelerando ainda mais o crescimento do setor automotivo. “A Rússia tem um potencial imenso na propriedade de carros per capita à medida em que a renda disponível cresce”, diz o estrategista da Renaissance Capital, Tom Mundy. A Rússia em primeiro As ações russas também atraem cada vez mais investimentos, já que a bolsa do país é a mais barata dos principais mercados do mundo. A relação entre o preço das ações e o lucro por ação das companhias em mercados desenvolvidos, índice que mostra o quanto o investidor está pagando pelo lucro de uma companhia, está tipicamente pouco além da dezena, mas as empresas russas estão negociando bem abaixo, numa proporção de sete vezes. Quanto menor este número, mais vantajosa é uma ação, e as da Índia, do Brasil e da China se situam bem acima, em proporções de 21, 15 e 14 vezes, respectivamente. “Quando falo com investidores em Londres, sempre recomendo que invistam na Rússia primeiro”,afirma o diretor da companhia de financiamento ING Eurasia, Danny Corrigan. “A Rússia teve um monte de problemas terríveis, mas a economia está aberta a investidores estrangeiros, enquanto as barreiras a negócios na China comunista são muito altas e os indianos simplesmente excluem os estrangeiros de muitos setores.” Já Bond, da Troika, diz que a Rússia se compara favoravelmente com outros Bric “em dados mensuráveis como a facilidade para fazer negócios, o tamanho do mercado, a transparência, a infraestrutura, saúde, crime, retorno de lucros, cessão de dividendos e o coeficiente de Gini”. Uma das principais prioridades na cooperação bilateral com a Rússia, o mercado brasileiro de energia foi destaque da exposição Rio Oil & Gas 2010. "A infraestrutura de combustível-energia tem um significado estratégico para qualquer Estado. E, naturalmente, os países tentam mantê-la um tanto fechada, abrindo-a apenas nas esferas em que encontram algumas dificuldades e não podem agir independentemente”, disse, na ocasião, o vice-diretor do Departamento de Política Pública e Eficiência de Energia da Rússia, Stanislav Dorzhinkevich. No Brasil, ressaltou Dorzhinkevich, esse processo aconteceria no setor de petróleo e gás. RIA Novosti Brasil é o Bric que mais gasta em TI PHOTOXPRESS Ações Depois da crise de 2008, empresas sediadas na Rússia levaram seus negócios para pregões de outros países Bolsa de Nova York busca retomar negócios russos Previsão de lucro em ofertas públicas iniciais de ações emergentes está forçando a bolsa de Nova York a ampliar seus horizontes. MIKHAIL VOLKOV ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Companhias russas já levantaram bilhões de dólares em ofertas públicas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) no mercado de câmbio. Mas desde que a companhia de aço Mechel entrou em flutuação na bolsa de NovaYork (NYSE), em 2004, a maioria delas passou a negociar em Londres ou, mais recentemente, em Hong Kong. Agora, com as IPOs russos valendo bilhões de dólares e aguardando apenas que as condições do mercado melhorem, a bolsa de Nova York está buscando agarrar uma fatia do bolo. “Ninguém esperava que a Rússia se desenvolvesse tão rapidamente após a crise de 1998 para se tornar um país do BRIC, que agora lidera o crescimento global”, diz Ronald Kent, vice-presidente executivo da NYSE-Euronext, resultado da fusão da bolsa de Nova York com a líder europeia no setor de câmbio. Kent, que já trabalhou com a bolsa de valores de Xangai e é res- ponsável pelos negócios russos, afirma que “a China e a Rússia possuem, ambas, sistemas financeiros domésticos menores do que necessitam suas economias e o principal perigo é que possam acelerar demais.” Em abril de 2008, o presidente russo Dmitri Medvedev estabeleceu a meta de transformar Moscou num centro financeiro internacional e lançou um pacote de reformas para incrementar os mercados de capital domésticos. O processo foi interrompido quando o colapso do banco de investimentos Lehman Brothers provocou uma queda no mercado russo de ações naquele ano, mas o Kremlin manteve-se firme e continuou a aprovar novas leis, como a proibição do tráfico de informação privilegiada, em agosto de 2010. Nova York perdeu muito de sua atração depois da introdução, em 2002, do Ato Sarbanes-Oxley, que estabeleceu onerosas exigências de cadastramento para companhias que quisessem tomar parte na bolsa. Mas depois da fusão da Demanda reprimida de IPOs russos adiados por conta da crise pode chegar a US$ 60 bilhões NYSE com a Euronext, a bolsa investiu mais de US$ 500 milhões na construção de um sistema integrado que permite aos negociadores comprarem e venderem ações de quaisquer cidades do mundo cobertas pela instituição – como Paris, Madri, Londres e Nova York. As companhias russas estão encarando com interesse a NYSE-Euronext. Sua participação também evitaria a principal queixa contra a Bolsa de Valores de Londres (LSE) – a de serem tratados como cidadãos de segunda classe. A participação da LSE está dividida em dois níveis: o das companhias registradas no Reino Unido e do resto do mundo. Já que o mercado doméstico de ações e fundos de pensões não podem investir no segundo nível, o montante de capital é limitado. A Rússia só viu quatro IPOs desde que a crise começou, no final de 2008, e apenas uma delas, o RusAl, teve participação no mercado internacional. Mas analistas calculam que a demanda reprimida de IPOs forçadas a esperar em função da crise poderia subir até US$ 60 bilhões. Os gastos do usuário final de Tecnologia da Informação (TI) no Brasil vão superar US$ 101,3 bilhões em 2010, o equivalente a 9,6% do Produto Interno Bruto (PIB) real, segundo a companhia de análise e pesquisas tecnológicas Gartner, Inc. Essa proporção entre TI e PIB está acima da média de 6,1% dos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China). Hoje o Brasil gasta mais do que o dobro da Rússia em TI e supera em 33% os gastos da Índia no setor. Segundo o vice-presidente e chefe global de pesquisas da Gartner, Peter Sondergaard, isso acontece porque no Brasil a TI se propaga em todo tipo de organização, enquanto“em outros países do Bric, como a Índia, esses gastos se concentram em serviços de TI e, na China, em grandes projetos de TI do governo central.” Gartner/India Infoline News Service 06 Trabalho SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 Renda Pesquisa revela que salário de mais de 36% dos trabalhadores estrangeiros altamente qualificados na Rússia é superior a R$ 36 mil Exilados mais bem pagos do mundo Profissionais de alto nível são bem remunerados porque atraem investimentos estrangeiros e trazem inovações para o país. RACHEL MORARJEE ANNA ARTEMEVA ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Estrangeiros se encontram em happy hour no John Donn Pub, em Moscou, conhecido por reunir os “expats” da cidade Quem ganha os melhores salários Exemplo brasileiro O fisioterapeuta brasileiro Túlio Menezes, do time de futebol CSKA, é um deles. Ele conta que começou atendendo o jogador de futebol Daniel Carvalho, no Sport Club Internacional, em janeiro de 2007. Na época, Carvalho jogava pelo time russo e veio se tratar no Brasil. Quando retornou a Moscou, decidiu levar o fisioterapeu- FONTE: BANCO HSBC Lei Novas medidas facilitam importação de cérebros Kremlin abre as portas ao trabalho de estrangeiros TIM GOSLING KIRILL TULIN_KOMMERSANT ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA A política de imigração russa para operários altamente especializados é hoje uma das mais tolerantes do mundo. O recrutamento de cientistas e altos executivos, principalmente da Europa, está longe de representar uma abertura despretensiosa. Pelo contrário, é um investimento do Kremlin para acelerar a modernização da economia. Em maio deste ano, o presidente Dmitri Medvedev deu o grito de "modernização ou morte". Uma nova legislação foi aprovada para facilitar a imigração de trabalhadores altamente especializados, com experiência e talento, capazes de ajudá-lo no novo projeto. E, com a importação de administradores e especialistas pelas empresas multinacionais, mais investimentos estrangeiros serão atraídos para a Rússia. Dentro do país, no entanto, existe uma necessidade crescente de gerentes experientes, que ajudem a aumentar a eficiência, a produtividade e a inovação, principalmente agora que o governo de Medvedev se prepara para colocar em prática o "Vale do Silício Russo", um projeto avaliado em US$ 2 bilhões e que já começa a ser construído em Skolkovo, nos arredores de Moscou. Enquanto o desenvolvimento da indústria de alta tecnologia no país tem estampado Estrangeiro toca acordeão, instumento tradicional na música local, em frente a faixa onde se lê, em cirílico, “estilo russo” as manchetes de todos os jornais, o mercado para reputados cientistas russos torna-se cada vez menos atrativo. Segundo relatório da IBM publicado no mês passado, as instituições de pesquisa científica do país estão entre as melhores do mundo, mas as escolas de administração ainda estão abaixo do nível do mercado. Pela pesquisa, 59% das empresas apontam a mão-deobra como obstáculo significativo ao desenvolvimento. Gerentes estrangeiros podem ser a solução, já que possuem formação de qualidade e do- minam as técnicas ocidentais para a alta tecnologia que serão usadas no projeto de modernização, acredita Lilit Geovorgian, da consultoria IHS Global Insight. O especialista em migração da PricewaterhouseCoopers, Guenadi Odarich, defende que esses profissionais também podem se transformar em modelos para os funcionários russos, o que ajudaria a moldar as futuras gerações tanto em talento quanto em novas atitudes. Segundo ele, o apetite por tais candidatos é grande, mas o ta junto. “O clube então me pediu para trabalhar com o goleiro Igor Akinfeev, que tinha feito uma cirurgia de cruzado também”, lembra Menezes. Depois disso, ele montou um projeto de melhorias para o departamento médico do clube, logo aprovado, e foi contratado como funcionário da casa. “Hoje, em Moscou, o único clube que tem uma estrutura médica boa além do CSKA é o Spartak, que também tem um fisioterapeuta brasileiro”, afirma. No entanto, qualquer oportunidade de gerenciamento júnior ou intermediário em empresas russas foi eliminada. Segundo executivos moscovitas, agora os estrangeiros só são contratados se souberem como viver na Rússia, falar a língua e se não apresentarem grandes custos de transferência. “Não acredito na contratação de expatriados na Rússia. Antes a gente dependia de estrangeiros para entender melhor os detalhes de uma área, quer no setor de corretagem ou no de restaurantes, hoje não”, afirma o empreendedor Bernard Sucher, um dos fundadores da cadeia de restaurantes Starlight Diners e do banco de melhor de tudo é que o terreno já está preparado: “As coisas parecem estar correndo bem. As autoridades estão de esforçando muito para garantir que a burocracia entenda esse novo processo.” Produção Recursos humanos influem mais que tecnologia Benefícios Imigração de profissionais qualificados tende a atrair investimentos externos. Essa é a aposta do governo para reciclar o mercado. nados em inglês para falarem com banqueiros nos Estados Unidos e no Reino Unido, diz Nikita Prokofiev, sócio da empresa de recrutamento Odgers Berndtson. Hoje, os advogados bilíngues fazem diferença, mas a demanda mesmo é por profissionais russos com experiência internacional, observa. Mas conforme os mercados de capital forem retomando forças, a necessidade de advogados treinados no estrangeiro tende a crescer de novo. Então, Moscou pode ser mais uma vez um local atrativo. O percurso para o topo da carreira profissional é muito mais curto na capital russa que em outros países. “Conheço vários advogados que me disseram: em meu país eu seria só mais um dentre cem candidatos, mas aqui eu sou um astro”, diz Prokofiev. Outra área em que profissionais estrangeiros podem exigir bons salários e obter vantagens atraentes é a de gerenciamento de projetos no setor de softwares. A Rússia tem uma abundância de programadores de software altamente treinados, mas faltam gerentes de projetos e negócios com mais de dez anos de experiência. “Um russo nessa área pode escolher à vontade onde quer trabalhar”,afirma a presidente da EDventure Holdings Esther Dyson. Mas para que os estrangeiros tenham realmente espaço na Rússia, afirma Igor Klimov, da Acuris, é preciso que as companhias do país invistam e se expandam no exterior. Até agora Moscou não deu espaço para profissionais que estejam dispostos a arriscar e deixar de lado os atrativos oferecidos por Londres, Nova York e até mesmo São Paulo. Para encorajar a vinda desses profissionais, o governo russo criou programas de incentivo à imigração de pessoal qualificado, que seguem o modelo usado por Reino Unido, Canadá e Austrália. Pela nova lei, os empregados qualificados e suas famílias recebem um visto de três anos, o que torna o processo de imigração um dos mais fáceis do mundo. Para os empregadores, a vantagem é a atual isenção da cota anual do Serviço Federal de Migração. Para os trabalhadores estrangeiros que não se qualificam como altamente especializados, as empresas interessadas têm só o mês de janeiro para requerer permissão ao governo para empregá-los, sem nenhum recurso para revisão durante o resto do ano. Caçadores de talentos como Nikita Prokofiev, da agência Odgers Berndtson, afirmam que o plano de instigar as companhias a trazerem os profissionais mais valiosos está funcionando. E, ao mesmo tempo, o mercado evoluiu e também está em um momento de contratar cada vez mais funcionários locais. "Agora muitas companhias preferem contratar russos”,explica ele.“Há 15 anos, o funcionário especializado que se buscava era uma pessoa bilíngue com um domínio básico de finanças, mas agora as empresas só querem empregados seniores com qualidades muito específicas.” Isso acontece não apenas devido ao forte desejo de empregar pessoal que conheça a cultura do comércio local, mas também à própria definição do empregado altamente qualificado, que recebe até 2 milhões de rublos por ano (cerca de R$ 9,5 mil por mês). Enquanto os salários no mercado interno ainda estão se recuperando da crise econômica, os trabalhadores qualificados e experientes de fora esperam por uma premiação para se transferirem. Mercado atrativo Além disso, as firmas russas que buscam ser respeitadas nos mercados internacionais têm nas contratações de estrangeiros um motivo especial: assegurar aos investidores que a empresa não está manchada pela corrupção que assola o país. Até 2008, companhias que quisessem levantar dinheiro com um pacote de novas ações ou com um acordo acionário precisavam de advogados trei- O grande desafio da produtividade Empresas russas investem em tecnologia para aumentar o nível de produção, mas problema pode estar na mão-de-obra ineficiente. BEN ARIS BUSINESS NEW EUROPE Se tudo sair como o governo planeja, os bancos russos, de preferência instalados em reluzentes arranha-céus, vão ser o coração dos mercados financeiros globais, e o país se tornará o maior mercado consumidor da Europa, com cerca de 60% da população na classe média. Fantasia? Sim e não. É provável que a Rússia não concretize todas essas previsões ambiciosas do governo de Dmitri Medvedev, mas certamente tem potencial de ir mais longe do que muitos podem pensar. Essa é uma declaração ousada, ainda mais no atual cenário de pós-crise, mas o país acaba de estabelecer um novo ciclo de aumento da produtividade, o que leva o governo a apostar em uma década de forte crescimento. O momento é propício. Os fluxos de investimento e o crédito bancário se mantêm restritos e aumentar a produtividade significa imensos lucros a baixo custo. Ganhos produtivos Durante a expansão de 2008, pouca atenção foi dada à produtividade. A maioria das companhias estava focada apenas em se ampliar o mais rápido possível e as altas margens de lucro do jovem mercado tornavam o quesito da eficiência irrelevante. A produtividade na Rússia então se limitou a apenas 16% daquela da União Europeia. Agora, a possibilidade de ganhos com pequenas melhoras no gerenciamento é realmente muito grande. “Se apenas NIKOLAY TSYGANOV_KOMMERSANT Houve um tempo em que jovens inteligentes que chegassem a Moscou falando um russo razoável podiam escolher o emprego que quisessem. Há 15 anos, a economia local crescia mais rápido que as dos países ocidentais e estrangeiros que poderiam estar servindo café ou tirando xerox em uma firma de seu país de origem eram colocados, de uma hora para outra, para administrar grandes empresas. Atualmente, a coisa mudou. As empresas na Rússia, locais ou estrangeiras, contratam cada vez mais gerentes russos para administrarem seus negócios e só recrutam expatriados quando eles são profissionais altamente especializados. E, nesses casos, paga-se muito bem para garantir a vinda - e a contribuição - do forasteiro. Um levantamento recente divulgado pelo banco HSBC revelou que os estrangeiros que vivem na Rússia são os mais ricos do mundo, sendo que 36% deles ganham mais de US$ 250 mil ao ano (cerca de R$ 36 mil por mês). investimentos Troika Dialog. À medida que os consumidores russos se tornaram mais sofisticados, os caçadores de talentos passaram a buscar pessoal qualificado dentro do país. Começou a aparecer um número cada vez maior de gerentes russos que já haviam trabalhado no exterior ou que serviram companhias estrangeiras operando na Rússia. O diretor da empresa de recrutamento Acuris, Igor Klimov, explica que é muito mais fácil para um russo adquirir a confiança de empregados e empresas estrangeiras. “Ainda são necessários estrangeiros no setor de investimentos, mas na economia real a gente quase não recebe pedidos para selecionar gerentes de outras nacionalidades”, diz. Sucher afirma ainda que a procura por russos que tenham vivido no exterior é grande porque eles, além de entenderem as exigências do mercado internacional, são bons para negociar segundo a cultura de negócios do país. Por outro lado, é preciso pagar um alto preço para atrair esses russos de volta e, mesmo assim, eles não são suficientes para atender à demanda. Com isso, abre-se espaço para estrangeiros em áreas-chaves do mercado. Melhoras no gerenciamento podem aumentar PIB em 150% Operário russo leva quatro dias para fazer um carro que no Ocidente faz-se em poucas horas 10% da população ativa trabalhasse no nível médio de eficiência que vemos nos Estados Unidos, a produção da economia russa cresceria 140% e o Produto Interno Bruto, 150%”,afirma Alexander Idrisov, sócio do grupo europeu de análise de mercado Strategy Partners. Nesta fase de orçamento curto, as companhias viram que um operário russo pode custar uma fração do que custa um ocidental. No entanto, essa economia é desperdiçada quando se percebe que eles levam quatro dias para fazer um carro, enquanto a maioria das fábricas ocidentais pode dar conta do serviço em poucas horas. Saindo do buraco A longo prazo, a única maneira de a Rússia manter o crescimento estável é melhorando sua produtividade. A maioria das pessoas pres- supõe que a baixa eficiência no país é fruto exclusivo de fábricas obsoletas, mas Idrisov defende que culpar a tecnologia antiquada é um“mito” e que o principal problema é simplesmente o mau gerenciamento. Segundo dados de um relatório recentemente divulgado pela consultoria global de empreendimentos McKinsey, a administração ineficiente responde por 80% da diferença entre as produtividades da Rússia e dos EUA. A pesquisa revela ainda que alguns setores da economia russa já estão no mesmo nível que empresas internacionais, principalmente no setor do aço. As áreas de construção, sistema bancário e eletricidade, embora estejam em níveis mais baixos que os norteamericanos, também se destacam por serem mais produtivos do que outros setores da economia. Diante desses dados, fica claro que somente quando o gerenciamento russo enfrentar essas questões é que a tecnologia, a menina dos olhos do presidente Medvedev, poderá começar a desempenhar seu papel. Opinião SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 07 QUALIDADE ANTES DE QUANTIDADE Artem Zagorodnov GAZETA RUSSA A lguns observadores da Rússia não se cansam de repetir que o país enfrenta uma “crise demográfica”. Recentemente, a divisão russa da emissora de rádio BBC advertiu em tom agourento que “a Rússia está morrendo rapidamente”. O autor chegou afirmar que a população decrescente vai debilitar a posição internacional e até alterar as fronteiras do país. Com a previsão do censo dos Estados Unidos de que a população mundial atingirá entre 8,5 bilhões e 10 bilhões em meados do século e um suprimento cada vez menor de recursos naturais, eu diria que países com menos, e não mais, bocas a alimentar, petróleo para consumir e água potável para beber estarão numa posição privilegiada. A Rússia seguramente tem abundância de recursos: vasto território, água potável (detém 20% do suprimento mundial só no lago Baikal), florestas intermináveis, próspero mercado agrícola, petróleo e gás, população instruída e armamento nuclear para se defender. Poderia, portanto, ser um dos países mais bem equipados para enfrentar futuras crises ambientais. Mas – insistirão os críticos – a questão não é o número de residentes, e sim a força de trabalho decrescente, que impedirá o crescimento econômico nas próximas décadas. Declínio demográfico russo é apontado como desvantagem, mas pode ser positivo diante da escassez de recursos naturais e de uma força de trabalho qualificada É aí que a recente política do governo, que parece ter sucumbido à histeria que cerca o tema, gera motivos de preocupação. Quando era ainda vice-premiê, o atual presidente Dmitri Medvedev apoiou a aprovação de uma série de medidas para reverter tendências demográficas negativas: multas de trânsito mais severas para reduzir o índice de mortalidade nas rodo- vias, uma batalha contra o consumo de álcool e maiores investimentos nos programas de saúde. Como resultado, em 2009 a população russa cresceu pela primeira vez e, depois de cerca de dois anos do lançamento do projeto, a expectativa de vida masculina aumentou, segundo a Agência Estatal de Estatística da Rússia. Desde então, o Estado também vem distribuindo pre- miações de aproximadamente US$ 12 mil para mães que têm mais de um filho. Eu diria, porém, que, além de pagar os cidadãos para que tenham mais filhos, o governo deveria dedicar-se à melhoria da produtividade. Esse indicador permanece criticamente baixo, equivalendo a apenas 16% daquele da União Europeia, segundo a empresa Capital Partners. Entre as propostas que o go- verno deveria seguir para desenvolver de modo considerável a economia russa, o padrão de vida e a influência global estão: • Fazer contato com a Diáspora no exterior: poucos russos no exterior estão dispostos a mandar seus filhos – os quais geralmente têm o talento crítico, a experiência prática e o entusiasmo gerencial de que a Rússia carece desesperadamente – sequer para visitar, menos ainda morar num país onde podem ser apanhados de surpresa na rua e jogados no exército. Isso os deixa com a escolha de abrir mão da cidadania russa ou evitar totalmente o país. O Estado deveria emendar a legislação sobre o recrutamento militar e a residência para atrair cidadãos talentosos de dupla cidadania. • Encorajar operários estrangeiros altamente especializados, principalmente gerentes, a viverem e trabalharem no país. Qualquer expatriado que more em Moscou pode relatar histórias de terror quanto à obtenção de residência e uma permissão legal de trabalho. Embora o Estado recentemente tenha feito esforços no sentido de facilitar as regras de concessão de visto para trabalhadores altamente qualificados, muito mais pode ser feito. Um relatório de 2009 da revista de negócios McKinsey Quarterly afirma que 80% do abismo de produtividade da Rússia em relação aos Estados Unidos deve-se simplesmente ao mau gerenciamento. • Desenvolver a assistência social de modo que os mais de 730 mil órfãos russos possam tornar-se membros produtivos da sociedade na vida adulta. O site Iorphan.org informou que apenas 10% dos órfãos da Rússia se tornam cidadãos íntegros, enquanto a maioria descamba para as drogas, a violência e o suicídio. À parte a óbvia necessidade humana de evitar essa tragédia, um melhor planejamento familiar e políticas de adoção poderiam salvar esse segmento da sociedade. • Desenvolver programas para integrar portadores de deficiência à sociedade. A economia da“inovação”pregada por Medvedev não se baseia em fábricas ou no campo. Muitos trabalhos de pesquisa e desenvolvimento podem ser desempenhados em casa, pela internet, e garantir uma conexão de internet grátis de alta velocidade para incapacitados físicos nas principais cidades russas e provê-los de cursos universitários online são coisas que podem ser feitas já. Novas redes de transporte e edifícios também podem ser construídos levando em conta a acessibilidade. O esforço por modernização de Medvedev é a melhor oportunidade para finalmente mudar a discussão da demografia russa – de quantidade para qualidade. Artem Zagorodnov é editor executivo de Russia Beyond The Headlines. O MENOS DESIGUAL DOS BRIC Ben Aris BUSINESS NEW EUROPE A imagem convencional feita da Rússia é a de um país com uns poucos barões do petróleo super-ricos e mais de uma centena de milhões de pobres. No entanto, apesar de o país contar mais bilionários, em dólares, do que qualquer outro BRIC – o bloco econômico dos gigantes Brasil, Rússia, Índia, China - a renda do país é também mais equitativamente distribuída do que nos Estados Unidos, por exemplo. O coeficiente de Gini, medida que avalia o nível de desigualdade na distribuição de renda num país, calcula também o conceito de riqueza. Se o comunismo tivesse funcionado, por exemplo, então todo o mundo ganharia igual, o que resultaria num coeficiente de Gini zero. Já numa socieda- de perfeitamente desigual, em que uma única pessoa tem todo o dinheiro, o coeficiente de Gini seria 100. Na Rússia, os ricos certamente ficaram muito mais ricos nos últimos 10 anos e sua bem relacionada elite abriga algumas das pessoas mais abastadas da Terra. No entanto, o boom econômico desta década, iniciado durante o mandato de presidente de Vladimir Putin (e auxiliado pela alta do petróleo), fez os pobres enriquecerem ainda mais rapidamente. Em dólares, o PIB da Rússia cresceu cerca de 7,5 vezes na última década, subindo de cerca de US$ 200 bilhões para US$ 1,5 trilhão. Ao mesmo tempo, a média dos salários aumentou 14 vezes em relação ao mesmo período, de US$ 50 para US$ 700 mensais. Liam Halligan, economista da empresa de gerenciamento de capital especializada no mercado russo Prosperity Capital Manage- CARTAS AO EDITOR DA GAZETA RUSSA Faltam futebol, hotéis e estradas Meus parabéns! Gostei e muito das reportagens. Parabéns! Gostaria que nas próximas reportagens tivéssemos algo sobre futebol, hotéis e estradas. Parabéns mesmo. Li na íntegra todo o contéudo da Gazeta Russa e aprendi mais sobre o maior país do mundo - a Federação Russa. Por favor, receba os meus sinceros cumprimentos pelo excelente trabalho, ao divulgar em português informações precisas e atuais sobre a situação social, econômica e ambiental da Rússia. Arnaldo Salles Paulo Galvão Júnior LEITOR DA GAZETA RUSSA ECONOMISTA ENVIEM CARTAS PARA A REDAÇÃO DA GAZETA RUSSA EM MOSCOU: [email protected] EXPEDIENTE DA GAZETA RUSSA ESTE SUPLEMENTO É PRODUZIDO E PUBLICADO PELA ROSSIYSKAYA GAZETA SEM QUALQUER ENVOLVIMENTO EDITORIAL DO JORNAL O ESTADO DE S. PAULO WWW.RBTH.RU E-MAIL: [email protected] TEL.: +7 (495) 775 3114 FAX: +7 (495) 775 3114 DIRETOR GERAL: ALEXANDER GORBENKO EDITOR CHEFE: VLADISLAV FRONIN ENDEREÇO DA SEDE: AV. PRAVDY, 24, BLOCO 4, ANDAR 12, MOSCOU, RÚSSIA - 125993 EDITOR E PUBLISHER: EVGUENI ABOV; EDITOR ASSISTENTE: DMITRI GOLUB; SUBEDITOR: MARINA DARMAROS; EDITOR NO BRASIL: FELIPE GIL; GRÁFICO PRINCIPAL: ANDREI SHIMARSKI; EDITORES DE FOTO: ANDREI ZAITSEV, NIKOLAI KOROLEV, DARIA KOZYREVA; CHEFE DA SEÇÃO DE PRÉ-IMPRESSÃO: MILLA DOMOGATSKAIA; PAGINADORES: IRINA PAVLOVA; ILIA OVCHARENKO PARA A PUBLICAÇÃO DE MATERIAIS PUBLICITÁRIOS NO SUPLEMENTO, CONTATE JULIA GOLIKOVA, DIRETORA DA SEÇÃO PUBLICITÁRIA, [email protected] © COPYRIGHT 2010 – ZAO ROSSIYSKAYA GAZETA. TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. É EXPRESSAMENTE PROIBIDA A PRODUÇÃO DE QUAISQUER CÓPIAS, REDISTRIBUIÇÃO OU RETRANSMISSÃO DE QUALQUER PARTE DO CONTEÚDO DESTA PUBLICAÇÃO SEM UMA PRÉVIA AUTORIZAÇÃO ESCRITA DA ROSSIYSKAYA GAZETA. PARA OBTER A AUTORIZAÇÃO DE CÓPIA OU REIMPRESSÃO DE QUALQUER ARTIGO OU FOTO, FAVOR APRESENTAR SOLICITAÇÃO ENTRANDO EM CONTATO PELO TELEFONE +7 (495) 775 3114 OU E-MAIL [email protected]. ment, afirma que “dessa maneira, a proporção do PIB potencializada pela força de trabalho cresceu muito. Alguns russos hoje conhecidos ficaram muito ricos não com o trabalho, mas com o capital. No entanto, não tiraram esse capital de outras pessoas, mas do Estado”. O coeficiente de Gini da Rússia subiu de 39,9 em 2001 para 42,3 em 2008 – um aumento menor que o dos EUA e abaixo de qualquer outro país do BRIC (46,9 da China, 53,5 da Índia e 57 do Brasil, segundo a CIA). em tijolos e argamassa. Mas com o volume de empréstimos sob hipoteca dobrando todo mês desde o começo do semestre, essa riqueza está se tornando rapidamente acessível a um número crescente de russos. O efeito desse rápido cresci- A revolução imobiliária mento na riqueza das massas tem sido dramático. Se o mesmo crescimento ocorresse no país de Barak Obama, a renda per capita dos Estados Unidos subiria dos atuais US$ 40 mil, segundo a CIA, para US$ 560 mil nos próximos oito anos. Qualquer presidente que promovesse esse tipo de aumento de ri- Um dos motivos pelos quais a Rússia tem se saído tão bem no coeficiente de Gini é que todo cidadão do país ganhou um apartamento depois do colapso da União Soviética. O problema é que até recentemente ninguém podia usar o capital representado por essa posse, literalmente preso Na última década, renda dos russos mais pobres cresceu mais rápido que a dos ricos queza não só seria reeleito, como canonizado. Essa imensa transformação criou uma crescente classe média na Rússia quase da noite para o dia. Quando Putin lançou seu plano de reforma a longo prazo, preconizou que 60% da população ingressaria na classe média até 2020. Mas, segundo um relatório divulgado pelo principal banco de investimento russo, o Troika Dialog, a Rússia já estaria lá no início do segundo semestre deste ano. O Troika afirma que a classe média (definida pela renda per capita de mais de US$ 6 mil anuais) já representa 68% da população, contra 31% no Brasil, 13% na China e 3% na Índia. Qualquer que seja a definição de classe média escolhida, ainda está claro que a distribuição de riqueza russa é muito mais equitativa do que em qualquer outro dos BRIC, e por uma grande diferença. Sinais de inquietação Liberada da necessidade de simplesmente sobreviver, a classe média emergente tipicamente se torna mais política, uma vez que tem muito a perder com um mau governo. A população russa tem suportado silenciosamente as A classe média emergente se torna mais política, já que passa a ter muito a perder dores da transição pela maior parte dos últimos 19 anos, mas desde o ano passado começou a vir à tona uma variedade de protestos. Manifestantes do movimento Estratégia 31 se reúnem no trigésimo primeiro dia de todo mês de 31 dias contra a recusa do Estado em permitir livres demonstrações de pro- testo, garantidas pelo artigo 31 da Constituição. O movimento dos direitos dos gays ganha força e o Kremlin foi várias vezes constrangido e levado a agir pela pressão dos protestos na blogosfera da Rússia. O mais significante desses exemplos foi a ordem do presidente russo, Dmitri Medvedev, para que a construção de uma rodovia cortando a floresta de Khimki fosse interrompida, depois de uma série de protestos públicos. Tanto Putin como Medvedev estão falando agora da necessidade de promover a sociedade civil. Com o aumento de sua experiência capitalista, o Kremlin agora tenta um jogo delicado: equilibrar o relaxamento do controle centralizado enquanto monitora a opinião popular. Ben Aris é editor-chefe do jornal Business New Europe. IMPORTANDO CÉREBROS Igor Fediukin ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA H á cerca de dois anos, nossa instituição, a Nova Escola de Economia, contratou um estrangeiro como professor efetivo pela primeira vez. Acadêmicos russos educados no exterior são extremamente raros nas universidades do país e poucas instituições podem se gabar de ter um estrangeiro na folha de pagamento. Depois de selado o acordo, porém, tivemos um pequeno problema: descobrir como trazer nosso novo colega para o país. A Rússia é praticamente o único dos países que preza pela pesquisa a não possuir uma categoria de vistos“acadêmicos”. Além do mais, até este ano só havia uma única categoria de vistos para todos os pretendentes a trabalhar no país. Uma companhia que desejasse, por exemplo, um advogado estrangeiro treinado em Harvard, tinha que enfrentar as mesmas compli- cações burocráticas para trazer centenas de operários de construção. Como consequência, profissionais altamente especializados muitas vezes obtinham vistos de apenas três meses para poderem trabalhar no país e eram forçados a viajar a um país vizinho no final do período para pedir uma nova permissão de entrada na Rússia. As complicadas e restritivas regras para obtenção de visto tornam mais difícil atrair para o país os melhores talentos do mundo, e isso tem sido um grande obstáculo para qualquer tipo de intercâmbio acadêmico há muito tempo. A resistência em afrouxar essas regras também é enorme. Uma grande parte do funcionalismo russo, especialmente a ligada às forças armadas, naturalmente encara tal abertura como um convite para que se mandem mais espiões para a Rússia. Outros, incluindo aqueles considerados bastante liberais, são contra qualquer relaxamento unilateral dos regulamentos de vistos, o que Leis de imigração não facilitam a entrada de acadêmicos na Rússia poderia ser visto como concessão e sinal de fraqueza. No entanto, prevalece a ideia de que a capacidade russa em atrair profissionais estrangeiros altamente qualificados é necessária se o país quiser se modernizar – e a seriedade do problema parece ter sido finalmente reconhecida pelo governo. Emendas inclusas nas leis de imigração no primeiro semestre oferecem privilégios aos profissionais estrangeiros chamados“altamente qualificados”(que também são altamente pagos, diga-se). Esses novos regulamentos de vistos entraram em vigor há poucos meses, mas, curiosamente, não se aplicam a pesquisadores e professores, que não se encaixam na defini- ção de “profissionais altamente qualificados” da nova lei, já que não recebem pelo menos dois milhões de rublos (cerca de R$ 110 mil) anuais. Novas medidas em discussão voltadas às universidades e aos pesquisadores devem resolver alguns dos problemas mais urgentes. Entre elas, estão propostas para incluir professores na categoria de “profissionais altamente qualificados”; criar uma opção para a emissão de“vistos acadêmicos” em não menos que três dias; permitir que pesquisadores estrangeiros se desloquem livremente pelo país; permitir que seus esposos trabalhem sem a necessidade de requisição de uma permissão de trabalho à parte. Embora essas emendas possam parecer menos revolucionárias, caso sejam introduzidas ajudarão a atrair mais profissionais altamente qualificados para a Rússia e tornarão muito mais fácil a vida daqueles que já estão trabalhando no país. Entretanto, muito mais pre- cisa ser feito. As regras e os regulamentos de visto ainda estão atravancados por todo tipo de exigências ridículas ou supérfluas. Para atrair um acadêmico do exterior com diploma de doutorado, por exemplo, ele teria de traduzir sua dissertação na totalidade e submetê-la a uma nova defesa de tese. Finalmente, existe a questão da implementação do novo regulamento e de fazer com que os consulados russos, conhecidos por suas maneiras pouco amistosas, modifiquem sua atitude em relação aos requerentes de vistos. Isso exigiria mudar toda a mentalidade do serviço consular russo, o que levaria um longo tempo. Ainda assim, o mero fato de que o presidente Medvedev afirmou no ano passado que“nós precisamos deles” (isto é, de profissionais qualificados do estrangeiro), e não o oposto, oferece algum terreno para otimismo. Igor Fediukin é diretor de Estudos de Política na Nova Escola de Economia. 08 Em Foco SUPLEMENTO COMERCIAL GAZETA RUSSA WWW.RBTH.RU SEGUNDA-FEIRA, 4 DE OUTUBRO DE 2010 RECEITA Dança moderna Espetáculo Três Solos e Um Dueto percorre cinco cidades O grande legado do conde Stroganov Baryshnikov reencontra os palcos brasileiros FABRICIO YURI VITORINO AP ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Bailarino também divulga seu trabalho como fotógrafo com a exposição "Dominican Moves" leiros ele já conhece bem, esta é a quinta vez que ele passa por aqui. Mas além das cinco cidades brasileiras que visita, o bailarino se apresenta pela primeira vez na Argentina e no Peru. Uma viagem dessa natureza, para profissionais com a idade mais avançada, requer ITAR-TASS Quando o Brasil e Mikhail Baryshnikov se reencontrarem em São Paulo, no próximo dia 19 de outubro, ambos vão perceber que pouca coisa mudou desde os últimos passos dados por aqui, em 2007. Aos 62 anos, a lenda viva da dança continua com o mesmo vigor de garoto, esbanja maturidade e emociona com seus movimentos precisos, firmes e delicados. A novidade fica por conta da apresentação de dança moderna em parceria especial com a espanhola Ana Laguna, de 54 anos, no espetáculo Três Solos e Um Dueto, que tem coreografias dos renomados mestres Mats Ek, Benjamin Millepied e Alexei Ratmansky. A turnê vai ser a maior que Baryshnikov já fez pela América Latina. Os palcos brasi- Montagem e negociação da apresentação levaram dois anos ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA cuidados especiais. Baryshnikov e Laguna viajam com uma equipe de profissionais para tentar minimizar o desgaste de voos, compromissos, ensaios e doze apresentações em menos de um mês. Para a apresentação no Rio de Janeiro, no entanto, não houve nenhum pedido exótico de estrela, apenas a possibilidade de ensaiar muitas horas por dia nas vésperas das apresentações. Para o bailarino que nasceu na Letônia e foi acolhido pelos Estados Unidos, onde brilhou nos palcos, no cinema e na TV, o nome inspira grandiosidade, mas o que chama mesmo a atenção é a simplicidade. Segundo Maria Rita Stumpf, produtora da turnê, Baryshnikov só fez dois pedidos: o de não ser tratado como celebridade, mas sim como bailarino, e o de que seus espetáculos tenham preços, se não ‘populares’, pelo menos acessíveis a todos os públicos. Com isso, os lugares mais baratos estão sendo vendidos a R$50. Stumpf ressalta ainda que, apesar de o bailarino já ter vindo muitas vezes ao Brasil, cada aparição dele é única e o espetáculo ao lado de Ana Laguna é mais especial ainda, pois pode ser a última chance de vê-lo em ação por aqui. "Ele não quer mais ficar fazendo turnê o ano todo, todos os anos. Mas desta vez incluiu a América do Sul em função da apreciação que ele tem pelo nosso país", diz a produtora. BENGT WANSELIUS Acompanhado da espanhola Ana Laguna, o dançarino de 62 anos se apresenta a preços acessíveis e ainda promove master classes. Irakli Iosebashvili Misha faz apresentação ao lado da espanhola Ana Laguna De acordo com ela, a montagem do espetáculo e a negociação para a vinda da dupla ao Brasil levaram dois anos. Além de encantar o público, Misha (apelido em russo derivado de seu nome, Mikhail) também pretende lapidar novos bailarinos, ajudar a formá-los e a criar espaços para a dança no Brasil. Uma equipe vinda do centro de referência que mantém em Nova York, o Baryshnikov Arts Center (www.bacnyc.org), vai dar "master classes" nas cidades onde fizer apresentações. Entre 15 e 20 sortudos bailarinos com boa qualificação serão selecionados para um treinamento inesquecível com algumas das maiores lendas da dança de toda a história. Em sua nova passagem pela América Latina, o bailarino também pretende divulgar seu ainda pouco conhecido trabalho como fotógrafo. Ele traz "Dominican Moves" (algo como movimentos dominicanos), seu portfólio de fotos feitas na ilha caribenha, onde ele tem uma casa de veraneio. A exposição, que já passou por lugares como o Museu Pushkin, em Moscou, o Metropolitan Opera House, em NovaYork, e o Kennedy Center, em Washington, retrata movimentos de dançarinos do país da América Central, em uma surpreendente fusão de ritmos. E estar em nosso país, mesmo após todas essas visitas, não deixa de ser um encanto para Baryshnikov, conta Stumpf. "Ele gosta muito daqui, tem fascínio pelo Rio de Janeiro. Poder vir ao Brasil e trabalhar aqui parece sempre ser um privilégio para Misha", explica. Para nós, certamente, também é. Literatura Poesia de Aleksandr Blok refletiu sua difícil relação com a namorada, Liubov Dimitrievna A vida privada de um poeta apaixonado Cento e trinta anos depois do nascimento do autor russo, correspondente revela paixão e mitos do pai da Era de Prata da literatura russa. controu uma capela deserta dentro da Catedral de Cazã, onde eles podiam se esconder para longas sessões de beijos apaixonados. Talvez o poeta se torturasse por pensar ser o único atacado pelos pensamentos sórdidos e carregasse um sentimento de culpa pelo desejo sexual que tinha por aquela que havia elevado a tão alto pedestal. Na virada para o século 20, a psiquiatria freudiana ainda era desconhecida. Blok desenvolveu uma esquizofrenia aguda. CRAIG NELSON RIA NOVOSTI ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA Comecei a ler Aleksandr Blok no início do meu divórcio e talvez isso tenha ajudado em meu fascínio pelo escritor. Considerava-o uma espécie de companheiro da desgraça amorosa. Em meus momentos mais tristes e sombrios, eu lia as juras idealizadas do período mais romântico e abstrato da vida de Blok e, então, fechava o livro, apagava a luz e chorava sem parar. A vida adulta e a poesia de Reprodução do retrato de Aleksandr Blok por P. Borisov Blok refletem sua difícil e complexa relação com a noirá-la incessante e obedienteva-namorada, Liubov Dimi- Após o casamento, mente, como um escravo. Era trievna, e sua relação com a Block vive triângulo o pronome indefinido, um alprópria instituição do casaguém, uma sombra, um vulto amoroso diante de mento. Enquanto a cortejava, indistinto na neblina, mais o escritor transformou Liu- novo pretendente de sentida do que vista. Era o bov em sua musa inspirado- Liubov que ele chamava de névoa ra, o que resultou em um ciclo azul-celeste ou luz brilhande poemas de oito mil versos te. Na verdade, Liubov era sobre "A Bela Senhora". Ela mesmo a inspiração de seu era para Blok“a Vênus russa”, amor adolescente e um ser imbuída de“castidade impashumano real, cheio de vigor sível e tristeza além de toda e promessa juvenil. O namomedida”. E ele poderia espero foi platônico até que ela en- Era de Prata Outra fase que marcou o escritor foi quando o casamento com Liubov, que demorou um ano para acontecer, foi desafiado por um pretendente, Andrei Beli. Block permitiu que Liubov retribuísse o afeto do novo candidato e instalouse um triângulo amoroso. Por fim, Beli não levou Liubov embora, como havia prometido. Ela voltou para Blok e a partir desse reencontro estabeleceu-se um novo padrão de relação. Tensa, aberta para cortesias de outros, com separação, reencontro e reconciliação. Com isso, Blok tornou-se o líder incontestável do simbolismo durante a Era de Prata da literatura russa. Pouco a pouco, o tema de seus poemas deslocou-se da Bela Senhora idealizada para o realismo urbano, mas a forma permaneceu complexa, de maneira que o ritmo e a métrica jâmbica, o som de certas consoantes e o uso da repetição e da aliteração criavam no ouvinte uma sensação letárgica e eufórica. Embora essas qualidades técnicas se percam na tradução para outras línguas, podemos considerar que a construção de tais estruturas, especialmente aquelas com símbolos embutidos, como os criados por Edgar Allan Poe, é uma arte da qual Blok foi o mestre supremo, mesmo ao mudar seus temas para a cidade. Blok também abraçou a revolução quando ela chegou. Nessa época, produziu seu mais famoso poema, "Os Doze", enquanto se separava de sua própria classe da pequena nobreza, tendo previsto durante anos que tudo seria varrido para longe. Depois disso, Blok ficou enfermo e tentou fugir do verão infestado pelo tifo em São Petersburgo para o ar puro do campo da Finlândia. Seu pedido de autorização para viajar foi inicialmente negado. Alguns dizem que os atrasos foram planejados, o que faria dele o primeiro intelectual a ser assassinado e martirizado pela nova ordem. A origem do prato predileto de um incontável número de brasileiros, o estrogonofe, é cercada de polêmica e mistério. Dizem até que ele foi inventado por um mineiro. Mas a maioria das fontes, embora não todas, concorda que o “biefstroganov” – assim mesmo, com “a” – foi um dos poucos pratos russos a cruzar a fronteira cultural e a ser servido no mundo inteiro. Sim, o estrogonofe, como o nome já dá a entender, veio da Rússia, onde costuma ser preparado de forma um pouco diferente que no Brasil: no lugar do creme de leite, o povo do leste europeu usa coalhada azeda, também conhecida como smetana. Reza a lenda que um certo conde Alexander Grigorievich Stroganov viveu no século 19 e deixou como legado um grande número de realizações. Último da linhagem, morreu aos 96 anos, depois de ter fundado bancos e universidades, ter se tornado governador-geral da região de Novorossisk e despontado como sujeito notavelmente vigoroso. Stroganov era também adepto da arte do bem viver, especialmente quando se tratava de receber convidados. Dizem que ordenava a seus empregados que alimentassem qualquer um que pusesse o pé em seu território. E, diante da necessidade de preparar um prato rapidamente, encomendou a façanha a seus chefs. E assim foi inventado o estroganofe. Depois da queda da Rússia imperial, os emigrantes foram responsáveis por espalhar o prato por todos os cantos do mundo. O estroganofe se tornou especialmente popular na China, o destino preferido dos russos que fugiram do regime comunista. Outra versão chegou aos Estados Unidos, e o prato também foi apreciado na Austrália, em Portugal e, como a gente já sabe, no Brasil. Eis a receita russa para que brasileiros experimentem a versão clássica do estroganofe: Ingredientes : verem douradas, acrescente a carne, o sal e a pimenta 5. Cozinhe a carne em fogo alto durante 5 a 6 minutos, mexendo de vez em quando 6. Abaixe o fogo, cubra a panela e deixe em fogo baixo por 5 a 7 minutos 7. Aumente o fogo novamente, acrescente a farinha, mexa e cozinhe por mais 2 a 3 minutos 8. Acrescente a coalhada, mexa e deixe ferver 9. Junte o molho de tomate, abaixe o fogo, cubra a panela e deixe em fogo baixo por 2 a 3 minutos, até ficar pronto Sirva sobre macarrão ou arroz ou com batatas fritas como acompanhamento. GETTY IMAGES_FOTOBANK • 500 gramas de filé • 2 cebolas • 3/4 de xícara de coalhada • 1 colher de sopa de farinha • 2 colheres de sopa de molho de tomate • sal, pimenta (a gosto) Modo de preparo : 1. Lave a carne, coloque-a sobre uma tábua de cozinha e bata com um amaciante de carne 2. Quando a carne estiver tenra, corte-a em tiras 3. Pique a cebola em pedacinhos, coloque numa panela e refogue no óleo por 2 a 3 minutos 4. Quando as cebolas esti- PHOTOXPRESS Calendário cultural Calendário empresarial TRÊS SOLOS E UM DUETO 6º CONFERÊNCIA DE INVESTIMENTOS HOTELEIROS DA RÚSSIA E CEI 19 E 20 DE OUTUBRO, 21H, TEATRO ALFA, SÃO PAULO Baryshnikov e Ana Laguna brilham em um programa de quatro peças. O primeiro é Valse-Fantasie, seguido da versão de Ana Laguna para Solo for Two, Baryshnikov com Years Later e, no encerramento, os dois artistas voltam juntos ao palco na coreografia Place. › www.ingressorapido.com.br DE 25 A 27 DE OUTUBRO, RENAISSANCE MOSCOW MONARCH CENTRE HOTEL, MOSCOU A conferência anual reúne diretores e executivos seniores do mundo inteiro que têm negócios no setor hoteleiro na Rússia e em outros países da Comunidade dos Estados Independentes (CEI). › www.russia-cisconference.com