Adubação com silício
Transcrição
Adubação com silício
Adubação com silício: uma alternativa no controle de doenças da cana-de-açúcar e do arroz Gaspar H. Korndörfer1 & Lawrence E. Datnoff2 1995. Adubação com silício: uma alternativa no controle de doenças da cana-de-açúcar e do arroz. Informações Agronômicas. Piracicaba. 70:1-5. Jun/1995. Resumo Certas plantas, como o arroz e a cana-de-açúcar, acumulam grandes quantidades de silício e geralmente produzem mais quando cultivados em solos que apresentam altos teores de silício solúvel. Nos solos minerais a silício é proveniente da intemperização dos minerais primários e particularmente dos minerais secundários como as argilas. No que se refere a nutrição das plantas o silício é um quebra cabeça. Normamente não é considerado entre .grupo de elementos essenciais ou funcionais para o crescimento das plantas As pesquisas visando o controle de doenças e o ataque de pragas em plantas cultivadas enfoca na maioria das vezes a resistência de cultivares e o uso de pesticidas. É preciso reconhecer que estes métodos possuim suas próprias fraquezas. O desenvolvimento de novas raças de patógenos pode quebrar a resistência genética das plantas. Por outro lado, os fungicidas se encontram sob intensa pressão nacional e internacional por causa das suspeitas de contaminação de águas sub-superficiais e perigos a saúde humana. A sílica (Si) aplicada como adubo ao solo vem sendo apontada como uma alternativa no manejo de doenças patogênicas e ataque de pragas com reflexos sobre a produtividade do arroz e da cana-de-açúcar em particular. Acredita-se que o silício proporcione maior resistência às paredes das células tornando-as menos vulneráveis às enzimas de degradação. Várias doenças foram avaliadas quantitativamente por um período de 3 anos, concluindo-se que o silício pode exercer um controle efetivo de algumas doenças com redução do impacto ambiental e aumento da produtividade. Silício Mesmo sabendo que o silício é um dos elementos mais abundantes na crosta terrestre e que a maioria dos solos contém consideráveis quantidades de silício, cultivos consecutivos podem reduzir o nível deste elememto até um ponto em que a adubação com silício seja necessária para obtenção de máximas produções. Solos muito intemperizados e altamente lixiviados, ácidos, com baixos teores de silício trocável e baixa relação de Si/sesquióxidos (relação=Ki), tendo sido apontados como sendo particularmente pobres em Silício disponível para as plantas (Brady, O silício (Si) geralmente não é considerado entre o grupo de elementos essenciais ou funcionais para o crescimento das plantas. No entanto, o crescimento e a produtividade de muitas gramíneas (arroz, cana-de-açúcar, sorgo, milheto, aveia, trigo, milho, grama kikuyu, grama bermuda, etc.) e algumas espécies não gramíneas (afafa, feijão, tomate, aface e repolho) tem mostrado aumentos de produtividade com o aumento da disponibilidade de Si para as plantas (Elawad & Green, 1979; Silva, 1973). 1 Dr., Professor Titular, Univerisdade Federal de Uberlândia, Caixa Postal 593, 38.400 Uberlândia, MG 2 Ph.D., Professor Assistente, University of Florida, Everglades Res. & Educ. Center, P.O. Box:8003 Belle Glade, Fl A 1992; Silva, 1973; Soils and Rice, 1978). Os Histosolos (solos orgânicos) também são considerados limitados quanto ao silício disponível (Snyder et al., 1986). O silicato de Ca, tem sido empregado como fonte de silício (disponível) para as plantas na maioria dos experimentos (Quadro 1). Entretanto, este material contém numerosos contaminantes tais como o Fe, P, etc. os quais podem trazer confundimento nos experimentos. A volastonita é um silicato livre de impurezas e por isso mesmo muito empregado em experimentação para evitar estes problemas. O material contendo silício deve ser aplicado na forma de pó (bem moído), porque o produto pouco moído (coarse) não tem tido sucesso. Além disto, o silicato não é considerado como fertilizante nas leis brasileiras e portanto não tem sua qualidade legalizada por lei. Os compradores devem estar seguros de que o produto possui granulometia inferior a 60 mesh antes de efetuar a compra. Segundo Datnoff, et al.(1992), quanto mais fino o material (silicato), maior foi a absorção do silício pela folha e menor a severidade da bruzone e da mancha parda no arroz irrigado. O silício é absorvido pela planta como ácido monosilícico, Si(OH)4 (Jones & Handreck, 1967). O mecanismo de resistência a doenças é conferido ao Silício pela associação deste com constituintes da parede celular, tornando-as menos acessíveis as enzimas de degradação. A aplicação de silicatos finamente moído ao solo é prática comercial no Havaí e em outras partes do mundo por causa dos aumentos de produtividade. O efeito positivo dos silicatos são normalmente associados ao aumento na disponibilidade do Si-solúvel, ao efeito do pH e também dos micronutrientes que estes produtos podem conter. O silício pode atuar ainda na redução do Fe e Mn tóxicos para as plantas. Quadro 1. Teores de Si-total e solúvel de alguns produtos Material Fonte Silicato (forno elétrico) Silicato (céu aberto) Calcário moído Calcário dolomítico Rocha fosfatada Fosfato coloidal Fuller Fonte: adaptado de Bair (1966) Alabama Alabama Kendrick Lebanon Florida Dunnellon Georgia Si-total % 18,2 6,88 0,22 0,38 3,64 10,83 35,07 Si-solúvel % 3,96 1,72 0,0164 0,0234 0,0230 0,0220 0,0234 sendo de alto potencial de degradação ambiental, particularmente, do solo e da água, além das suspeitas de serem cancerígenos. Estas questões de natureza ambiental já levaram ao cancelamento de vários fungicidas no mercado americano (Raid & Datnoff, 1990). Além disto, os fungicidas são considerados produtos de alta tecnologia e que por isso acrescentam elevados custos ao produtor que Arroz As doenças do arroz são usualmente manejadas pelo uso de cultivares resistentes ou fungicidas. Entretanto, esta resistência adquirida pode também ser facilmente quebrada. Por outro lado, o uso dos fungicidas vem sendo questionado por grupos ambientalistas nacionais e internacionais como B Cana-de-açúcar em muitos casos não possuem condições financeiras para adquirí-lo. Produtos mais sustentáveis e menos poluentes estão sendo buscados. A adubação com silício tem demonstrado eficiência no controle ou redução da incidência de várias doenças importantes do arroz. Uma aplicação de Silício antes do plantio pode eliminar ou reduzir o número de aplicações com fungicidas durante o ciclo da cultura. Uma boa coheita de arroz chega a extrair 1,5 t de SiO 2 /ha (Malavota, 1978). Numerosos pesquisadores (Aleshin et al, 1987; Datnoff et al, 1991; Elawad and Green, 1979; Kim and Lee, 1982; Lee et al., 1981; Nanda and Gangopadhyay, 1984; Ohata et al, 1972; Osuna-Canizales et al., 1991; Ou, 1985; Takahashi, 1967; Volk et al., 1958; Yamauchi and Winslow, 1987) tem mostrado que a sílica reduz a severidade de várias doenças de importância econômica tais como a bruzone, mancha parda, escaldadura, entre outras. Estas doenças tendem a diminuir com o aumento da concentração de silício no tecido foliar (Datnoff et al., 1991; Osuna-Canizales et al., 1991). Estudos mais recentes conduzidos em solos orgânicos (Histosols) na região dos Everglades na Flórida, tem mostrado que a adubação com silicatos é bastante efetiva em reduzir a intensidade da "mancha parda" causada por B. oryzae e da bruzone causada por P. grisea (Datnoff et al., 1990b; Datnoff et al., 1991). Nestes trabalhos os autores concluem que a bruzone foi reduzida em média de 17 a 31% e a mancha parda de 15 a 32% comparado com a testemunha. Mesmo sabendo que as funções do silício na cana-de-açúcar ainda não foram completamente esclarecidas, é certo, que o elemento desempenha um papel importante na produtividade da cana-de-açúcar (Preez, 1970). O silício aparece na cana-de-açúcar em altas concentrações, podendo variar desde 0,14% em folhas jovens até 6,7% nos colmos e folhas velhas. No Havaí, as folhas contendo menos de 0,5% de Silício são frequentemente afetadas por um sintoma denominado "freckling". A causa deste sintoma é ainda bastante controvertida, porém a maioria dos pesquisadores atribuem à falta de Si e a desequilíbrios nutricionais. O aparecimento da ferrugem na cana-de-açúcar (Puccinia melanocephala) pode estar relacionado com o referido sintoma. O sintoma é mais severo nas folhas mais velhas e a área foto-sintética é normalmente fortemente atingida. De acordo com (Fox & Silva, 1978), a aplicação de 6 t/ha de silicato ao solo o sintoma desaparece. Os solos tropicais são de um modo geral altamente inteperizados onde os minerais primários contendo silício já não existem mais. Estes solos apresentam em alguns casos teores menores do que 2ppm no extrato saturado. Segundo Bair (1966), os solos carentes em silício resultam na disseminação rápida do mosaico, atrasa a maturação e baixa a quantidade de sólidos solúveis no caldo da cana. Mas é na produção de colmos o principal efeito do silício na cana-de-açúcar. Segundo Kidder & Gascho (1977) os aumentos de produtividade variam entre 10 e 35%. As chances de aparecer efeitos sobre os teores (concentração) de açúcar são menores. Tabela 2. Efeitos na produção de cana-de-açúcar e açúcar por hectare da aplicação de 20 t/ha de silicato em 2 locais da região dos Everglades/Florida. Local Corte Produção cana Produção açúcar Sem-Si Com-Si Sem-Si Com-Si ----------------------------------- t/ha --------------------------------A 1º 100,1 129,0 13,4 15,7 2º 109,6 126,6 12,9 14,6 3º 83,1 100,5 10,6 13,4 B 1º 94,6 123,0 11,6 15,3 2º 89,0 118,5 10,5 14,4 3º 51,9 72,0 5,8 8,7 Fonte: Adaptado de Anderson et al (1987). C A Tabela 2 mostra parte dos resultados obtidos por Anderson et al (1987) com a aplicação de 20 t/ha de silicato aplicado imediatamente antes do plantio da cana. Segundo Preez (1970), o aumento da produtividade da cana-de-açúcar dos tratamentos contendo silício (Metasilicato de Cálcio/CaSiO 3 ) foram associados ao aumento de silício na planta, enquanto que no caso do carbonato de cálcio os aumentos de produtividade foram acompanhados de um redução do silício na planta. Isto é, os tratamenos contendo silício provaram ser superiores ao carbonato de cálcio em todos os 3 tipos de solo testado (Tabela 3). Tabela 3. Solo Efeito de silicatos sobre a produção de biomassa de cana-de-açúcar em 3 solos ácidos. Tratamento Dose t/ha A Testemunha 0 A Metasilicato 4,5 A Metasilicato 9,0 A Metasilicato 18 A CaCO3 4,5 A CaCO3 9 A CaCO3 18 B Testemunha 0 B Metasilicato 4,5 B Metasilicato 9,0 B Metasilicato 18 B CaCO3 4,5 B CaCO3 9 B CaCO3 18 C Testemunha 0 C Metasilicato 4,5 C Metasilicato 9,0 C Metasilicato 18 C CaCO3 4,5 C CaCO3 9 C CaCO3 18 Fonte: Adaptado de Preez (1970). Mat. Seca g 19,7 22,0 23,2 23,3 20,6 21,1 19,1 13,6 17,3 18,5 18,4 15,8 15,9 16,3 11,4 13,4 14,4 14,5 13,4 13,6 11,5 pH H2 O 4,67 5,00 5,27 5,63 5,13 5,43 5,82 4,49 5,00 5,10 5,45 4,87 5,13 5,62 4,63 5,58 6,25 7,17 5,85 6,72 7,27 BIBLIOGRAFIA Mn ppm 360 270 166 69 307 197 67 338 230 128 57 183 117 67 428 93 59 46 90 85 67 Mn:Si relação 0,079 0,038 0,019 0,006 0,075 0,059 0,022 0,061 0,024 0,013 0,004 0,037 0,033 0,019 0,116 0,012 0,004 0,003 0,028 0,026 0,023 Bair, R.A. 1966. Leaf Silicon in Sugarcane, Field Corn and St. Augustinegrass grown on some Florida Soils. Soil and Crop Science Society of Florida Proceedings, 26:63-70. Brady, N. C. 1992. The nature and properties of soil. 10th . Edition Macmillan Publishing Co., N.Y. 179-200. Datnoff, L. E., Raid, R. N., Snyder, G. H., and Jones, D. B. 1991. Effect of calcium silicate on bruzone and mancha parda intensities and yields of rice. Plant Dis. 75:729-732. Aleshin, N. E., Avakyan, E. R., Dyakunchak, S. A., Aleshkin, E. P., Baryshok, V. P., and Voronkov, M. G. 1987. Role of silicon in resistance of rice to bruzone. Doklady Akademii Nauk SSSR. 291(2):217-219. Anderson, D.L.; D.B. Jones & G.H. Snyder. 1987. Response of a rice-sugarcane rotation to calcium silicate slag on Everglades Histosols. Agron. J. 79:531535. D Datnoff, L. E., Raid, R. N., Snyder, G. H., and Jones, D. B. 1990b. Evaluation of calcium silicate slag and nitrogen on mancha parda, neck rot, and sheath blight development on rice, 1989. Biological and cultural tests for control of plant desease. Vol 5:65. Elawad, S. H., and Green Jr., V. E. 1979. Silicon and the rice plant environment: a review of recent research. Revista IL RISO 28:235-253. Elliott, C. L., Snyder, G. H.. 1991. Autoclaveinduced digestion for the colorimetric determination of silicon in rice straw. J. Agric. Food Chem. 39:1118-1119. Fox, R.L. & Silva, J.A. Symptoms of plant malnutrition: silicon, and agronomically essential nutrient for sugarcane. In: Illustrated concepts in tropical agriculture. College of tropical Agriculture and Human resources University of Hawaii. No. 8, 1978. Jones, L. H. P., and Handreck, K. A. 1967. Silica in soils, plants, and animals. Adv. Agron. 19: 107-149. Kidder, G. & Gascho, G.J. Silicate slag recommended for specified conditions in Florida sugarcane. Agronomy Facts, Florida Cooperative Extension Service, University of Florida, n.65, 1977. Kim, C.K., and Lee, S.C. 1982. Reduction of the incidence of rice neck bruzone by integrated soil improvement practice. Korean J. Plant Prot. 21:15:10 Malavolta, E.. 1978. Nutrição e adubação do arroz irrigado. São Paulo. Ultrafértil. 64p. Nanda, H. P., and Gangopadhyay, S. 1984. Role of silicated cells in rice leaf on mancha parda disease incidence by Bipolaris oryzae. Int. J. Tropical Diseases 2: 89-98. Ohata, K., Kubo, C., and Kitani, K. 1972. Relationship between susceptibility of rice plants to Helminthosporium blight and physiological changes in plants. Bull. Shikoku Agric. Exp. Stn. 25:15-19. Okuda, A. and Takahashi, E. 1964. The role of silicon. In: The mineral nutrition of the rice plant. Proc. Symp. Inter. Rice Res. Inst., Feb., John Hopkins Press, Baltimore, MD, p. 123-146 Osuna-Canizalez, F. J., de Datta, S. K., Bonman, J. M. 1991. Nitrogen form and silicon nutrition effects on resistance to bruzone disease of rice. Plant and Soil . 135:223-231. Ou, S.H. 1985. Rice diseases. 2nd ed., Commonw. Mycol. Inst., Kew, Surrey, England. 380p. Preez, P. 1970. The effect of silica on cane growth. The South African Sugar Technologists's Association. Proceedings. p.183-188, Junho. Raid, R.N. and Datnoff, L.E. 1990. Loss of the EDBC fungicides: Impact on control of downy mildew of lettuce. Plant Dis. 74:829-831. Rossman, A. Y., Howard, R. J., and Valent, B. 1990. Pyricularia grisea, the correct name for the rice bruzone disease fungus. Mycologia 82(4):509-512. Silva, J. A. 1973. Plant, mineral nutrition. Yearbook of Science and technology. McGraw-Hill Book Co., Inc. Snyder, G. H., Jones, D. B. & Gascho, G. J. 1986. Silicon fertilization of rice on Everglades Histosols. Soil Sci. Soc. Am. J. 50:1259-1263. Soils and Rice. 1978. International Rice Research Institute. Los Banos, Phillippines. 825p. Takahashi, Y. 1967. Nutritional studies in the development of Helminthosporium leaf spot. In: Rice Diseases And Their Control By Growing Resistant Varieties And Other Measures. Proceedings of a Symposium on Tropical Agriculture Researches. September. Agriculture, Forestry and Fisheries Research Council. p. 157-170. Volk, R. J., Kahn, R. P., and Weintraub, R. L. 1958. Silicon content of the rice plant as a factor influencing its resistance infection by the bruzone fungus Piricularia oryzae. Phytopathology. 48:121-178. Yamauchi, M., and Winslow, M. D. 1987. Silica reduces disease on upland rice in a high rainfall area. IRRI. 12:622-23. E