O COMÉRCIO AMOROSO EM SITES DE
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O COMÉRCIO AMOROSO EM SITES DE
O COMÉRCIO AMOROSO EM SITES DE RELACIONAMENTO Análise de conteúdo dos sites Badoo e Pof RESUMO Os sites de relacionamento se tornaram palco de encontros virtuais, diálogos eróticos e agendamento de encontros presenciais, com finalidades que variam desde o sexo sem compromisso em parcerias casuais aos relacionamentos estáveis. Este artigo é originário de uma análise de conteúdo, em interação netnográfica, em aplicativos do gênero. Palavras-chave: Internet; Mídias; Relação; Virtual; Real. ABSTRACT Social networking sites have become the scene of virtual meetings, erotic dialogue and scheduling face meetings, with purposes ranging from sex without commitment in casual partnerships to stable relationships. This article originates from a content analysis in netnographic interaction in the genre applications. Keywords: Internet; Media; Relationship; Virtual; Real. INTRODUÇÃO Este artigo aborda o caso do ‘comércio amoroso’ em sites de relacionamento. Partindo da observação de aplicativos e sites de relacionamento. Considerando o que diz Bauman, em ‘Amor Líquido’, sobre a superficialização dos laços humanos, presente nas interações mediadas pelas mídias sociais. Neste sentido, notamos “o crescimento das relações de afeto superficial (...) impulsionadas pelo libido sexual” (DORNELLES, 2003, p. 75). Relações constatadas nas mídias com finalidade de encontros amorosos. “Apesar dos relacionamentos serem, em sua maioria, superficiais, muitas pessoas acreditam que é possível encontrar o ‘par perfeito’” (DORNELLES, 2013, p.18) nas plataformas midiáticas. Conforme Bauman, “o namoro pela internet, ao contrário da incômoda negociação de compromissos mútuos, se ajusta perfeitamente (ou quase) aos novos padrões de escolha racional” (BAUMAN, 2004, p. 85). São exatamente estes padrões que despertam o interesse em entender tal fenômeno. Na obra ‘O Amor e a Mídia’, de Francisco Rüdiger, ensaia estudos sobre o site de relacionamentos ‘Par Perfeito’. Site que vem cedendo espaço aos aplicativos gratuitos como Tinder, Badoo, Pof, Hot or Not e mais. Como proposta inicial, buscamos analisar o caso e, principalmente, o conteúdo, de forma qualitativa em duas plataformas, de forma comparativa. Em um contexto de comercialização amorosa, em que os internautas expõem-se com produtos da mesma forma que descrevem o que buscam. Tornando, a escolha do par ideal, uma ação mercadológica racional calculada matematicamente. Bauman, quando refere-se aos relacionamentos como transações comerciais, no que diz respeito à investir no ‘par amoroso’, lembra que “na medida em que os relacionamentos são vistos como investimentos, como garantias de segurança e solução de seus problemas, eles parecem um jogo de cara ou coroa” (BAUMAN, 2004, p. 30). Neste contexto, os internautas, ao buscar os respetivos pares, investem em algo novo, desconhecido, parcialmente encoberto ao mesmo tempo em que algumas características se revelam apresentadas nas informações textuais e fotográficas dos perfis. Informações que compõe o objeto de estudo desta pesquisa. Em relação à superficialização dos laços humanos nas mídias sociais, Bauman salienta que “os usuários dos recursos de namoro on-line podem namorar com segurança, protegidos por saberem que sempre podem retornar para outra rodada de compras” (BAUMAN, 2004, p. 85). Neste ambiente de comercialização, cada um tenta valorizar-se da melhor forma possível. Expondo atributos e currículos; Sobrevalorizando a imagem em uma ação de marketing pessoal. RELEVÂNCIA DO ESTUDO A escolha do tema de pesquisa se deve ao crescimento do número de relações que se iniciam a partir de encontros virtuais em mídias sociais de relacionamento. Conforme pesquisa publicada, em junho de 2013, pela Proceedings of the National Academy of Sciences, um quarto dos relacionamentos, nos Estados Unidos, iniciam na web. A mesma tendência pode ser observada no Brasil, uma vez que somos os maiores usuários de redes sociais virtuais do mundo, em horas por internauta. Conforme com Bauman, sobre as ‘relações virtuais’ Ao contrário dos relacionamentos antiquados (para não falar daqueles com ‘compromisso’, muito menos dos compromissos de longo prazo), elas parecem feitas sob medida para o líquido cenário da vida moderna, em que se espera e se deseja que as ‘possibilidades românticas’ (e não apenas românticas) surjam e desapareçam numa velocidade crescente e em volume cada vez maior, aniquilando-se mutuamente e tentando impor aos gritos a promessa de ‘ser a mais satisfatória e a mais completa’” (BAUMAN, 2004, p. 12) É certo que apenas uma parte das relações virtuais evolui ao encontro físico. Boa parte delas permanece apenas na condição de interação mediada. O fato principal é que os sites de relacionamento vêm se tornando uma forma de mercado aberto onde pretendentes divulgam a si mesmos como produtos, da mesma forma que definem as características do perfil do internauta de seus respectivos interesses. OS SITES DE RELACIONAMENTO A partir da interação virtual, os relacionamentos virtuais tendem a se tornar presenciais em alguns cliques. O fenômeno é observado desde a década de noventa com os Webchats. Evoluindo, com o tempo, através das mídias sociais. Como exemplo de espaços que visam colocar em contato, através da web, pessoas interessadas em interação virtual ou encontro real, assim como o Badoo e Pof, podemos citar sites como Par Perfeito, Sex Log e Adult Friend Finder. Sendo que o primeiro visa à construção de relacionamentos amorosos e os dois últimos visam prioritariamente o encontro sexual. Enquanto os demais têm múltiplas formas de interesse. Neste contexto, Pof e Badoo são sites múltiplos. Nestas plataformas se encontram usuários interessados em namoro, amizade ou encontro casual. Preferências que são descritas no perfil dos internautas. A vantagem do Badoo e do Pof, em relação ao Par Perfeito, é a de que, além de ser mais recente e ter uma versão para dispositivos móveis, com função de mídia locativa (no estilo Tinder), a maioria dos recursos são gratuitos aos usuários comuns. O Badoo, além de ter sua versão direcionada ao público usuário de smartphones e Tablets, possui uma versão disponível em formato de aplicativo no Facebook. Tendo também a possibilidade de ter as contas vinculadas ao aplicativo ‘Hot or not’. Neste contexto, esta pesquisa é atual e extremamente importante para que possamos entender como as relações humanas via internet vêm se configurando. Tendo uma noção de como ocorre a evolução das relações virtuais, com fins de encontro real, em um futuro já iniciado em nosso tempo. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A metodologia aplicada consiste em um método hibrido com elementos de observação participativa, netnografia, estudo caso e análise de conteúdo. Analisados, como casos múltiplos e únicos (quando abordadas, as redes, de forma isolada). As subunidades acrescentam, conforme Yin, “oportunidades significativas para a análise extensiva, favorecendo os insights ao caso único” Conforme Bardin, é necessária uma “razão por que se analisa, e explicita-la de modo que se possa saber como analisar” (BARDIN, 2011, p. 133). Desta forma, a partir da definição dos porquês da pesquisa é que conseguimos estabelecer uma base determinante do estudo. Apesar da importância da definição de metodologias, de acordo com Silva, “A pesquisa exige uma boa dosagem de paixão e razão” (SILVA, 2010, p. 92). O que justifica a escolha do objeto de estudo deste projeto de tese. Uma vez que o pesquisador possui vivência prática em tais redes de relacionamento, configurando-se como um apaixonado hard user de tais tecnologias, desde a virada do milênio. RECORTE DO OBJETO PESQUISA Nas redes Badoo.com e Pof.com, o que nos interessa como recorte do objeto de pesquisa, neste ambiente de interação, é, principalmente, a informação contida em dois tópicos dos perfis de usuários. O primeiro resume-se à forma, conteúdo e linguagem, das informações dissertativas sobre o internauta. Somadas ao conteúdo fotográfico dos perfis. O segundo tópico refere-se às informações dissertativas sobre o par ideal buscado pelo usuário. No site Badoo.com, a seção em que os usuários descrevem a si mesmos, é intitulada ‘Sobre mim’. Somada da seção complementar ‘Mais informações’. Enquanto, a seção em que os internautas descrevem as características do par ideal, intitula-se ‘Busco’. No site Pof.com as seções têm nomes semelhantes. E o mecanismo funciona da mesma forma. A seção em que o usuário disserta sobre si mesmo, aparece da forma ‘Sobre (nome do usuário)’. Enquanto a seção em que os internautas costumam descrever o que buscam, chama-se ‘Interesses’. A questão principal da pesquisa é fazer o cruzamento dos dados do perfil com as fotos. Ou, dos dados do perfil dos usuários com o perfil dos internautas que são buscados na rede. Esta segunda alternativa pressupõe uma avaliação de afinidades. Na primeira situação, analisamos a questão da verossimilhança das informações quando comparadas ao que é constatado nas fotos. Por exemplo: Uma internauta diz, em seu perfil, que não consome álcool, ao mesmo tempo em que aparece bebendo nas fotos. Inicialmente, constatamos que as internautas buscam, com frequência, algo ‘diferente’ do seu padrão. Há internautas ‘gordinhas’ buscando, conforme seus respectivos perfis, pares ‘em forma’. Mulheres que fumam, buscando internautas ‘livres do tabagismo’. Mulheres que bebem, buscando internautas ‘atletas’. Mulheres com filhos buscando homens sozinhos. Mulheres jovens ou maduras, buscando internautas mais maduros ou mais novos que suas respectivas faixas etárias. Estas diferenças podem ser verificadas na comparação das informações do perfil das internautas, assim como das fotos, com a seção em que descrevem o ‘par ideal’. A comparação das informações dos internautas em seus respectivos perfis, com os dados que descrevem o que buscam, a fim de constatar a importância das afinidades, possibilita tais considerações. A PESQUISA A pesquisa propôs-se a analisar, de forma qualitativa, as informações das seções anteriormente citadas. Cruzando as informações pessoais dos usuários com os interesses. Sendo que nesta seção, o foco principal são as informações sobre o ‘par ideal’. Enquanto a tendência, na internet, é reunir pessoas com afinidades e interesses comuns, a hipótese, confirmada e defendida, é a de que há casos em que o usuário busca o seu oposto. Analisamos os perfis de usuários em um período de trinta dias, em abril de 2015, nas plataformas escolhidas. Observando as plataformas, confirmamos, através dos perfis de usuários, que há uma tendência em buscar algo acima do perfil compartilhado. Por exemplo, usuários com grau de instrução de ensino fundamental, priorizando contato com usuários de nível superior; Usuários que preenchem, em seus respectivos perfis, serem fumantes, buscando pares não-fumantes; Usuários que descrevem-se como ‘em busca de trabalho’ preferirem pares com status profissional estável; Internautas que descrevem-se como boêmios buscarem pares que preferem ‘programações caseiras’; Etc. Apesar de observar a busca por opostos, as afinidades continuam sendo prioridades nas possibilidades de relacionamento. O mesmo grau de instrução; Ser nãofumante; Ser independente financeiro; A faixa estaria; O status de relacionamento; O interesse em amizade, flerte ou namoro; Etc. O cruzamento das informações contidas nas seções permite comprovar a hipótese. Mesmo quando predominam as relações entre afins, há aqueles que buscam pares com características diferenciadas de seu perfil pessoal. Desta forma, conseguiremos perceber a dimensão importância das afinidades, e (também) a inexistência delas, na construção de algumas relações. O COMÉRCIO DE SI Simultaneamente, analisamos, de forma qualitativa, a forma como os usuários ‘vendem-se’ (se apresentam e falam sobre si mesmos) nas seções dissertativas do perfil. Análise que pôde ser estendida, ou direcionada de acordo com a proposta do orientador, à análise do conteúdo das conversações, comentários, fotos ou vídeos publicados no perfil. Notamos a utilização dos sites como ‘vitrines’ onde são expostos ‘produtos’. No caso, os ‘próprios usuários’. Interpretando as seções ‘Busco’ e ‘Interesses’ como uma forma de ‘encomenda’ do par ideal aos moldes de uma ‘agência matrimonial’. A visão do amor como ‘mercadoria’ é uma forma de perceber como as pessoas constituem os relacionamentos na sociedade midiatizada. Comercializando-se a partir do marketing pessoal e ‘adquirindo’ o par ideal dentro de um hall de alternativas. CONSIDERAÇÕES DA ANÁLISE A presença em massa de jovens nos sites de relacionamento, somada à superficialização das relações afetivas, tem, por consequência, um outro fenômeno. Conforme Rüdiger, “a facilidade de acesso e a multiplicidade de contatos por meio dela viabilizadas ampliam nossas margens de escolha e comparação” (RUDIGER, 2013, p.194). Desta forma, o usuário destas plataformas interativas se torna mais exigente na hora de definir o perfil de seus respectivos interesses. Do mesmo modo, valoriza as informações pessoais que o sobrepõem sobre a concorrência. Tornando superficiais, as relações amorosas, sexuais e afetivas. Este é um fenômeno pós-moderno, o qual presenciamos, e participamos, efetivamente cada vez que construímos relações mediadas, quando tais relações evoluem a ponto de se tornarem reais. Tivemos a oportunidade de testemunhar a evolução da ‘emancipação feminina’. Conforme Rüdiger, "Os movimentos de emancipação política da mulher convergiram com sua interpelação como consumidora e o aparecimento de novos modelos para seu assujeitamento à ordem societária” ( RÜDIGER, 2008, p. 60). Neste contexto, constatamos a afirmação da mulher através das descrições nos perfis. Da mesma forma que, na afirmação subjetiva dos selfies e outras fotografias compartilhadas. Algumas mulheres tendem a apresentar-se como ‘bons partidos’; Moças educadas, reservadas, que preferem o primeiro contato em lugares públicos. Relatam que buscam algo a mais que o sexo casual. Esclarecendo que preferem relações estáveis. Ao contrário das internautas que esclarecem, desde a primeira interação, que desejam apenas ‘curtir o momento’. Aproveitando para mostrar o corpo semi-nú em fotos sensuais. Expondo o interesse em algo ‘livre de compromisso’. Este segundo modelo, revela a transformação dos valores sociais da sociedade patriarcal em tempos de feminismo. Em resumo, “a internet tornou-se uma grande vitrine onde cada um mostra o que tem de melhor e adquire o que considera mais conveniente” (DORNELLES, 2013, p. 35). Neste ambiente, emergem os sites de relacionamento. 8 – Referências Bibliográficas BAUMAN, Zygmunt. Amor Líquido – Sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Editora, 2003 BARDIN, Laurence – Análise de Conteúdo – Câmara Brasileira do Livro – São Paulo, 2011 DORNELLES, Juliano Paz. Virtual e Real. Rio de Janeiro. CBJE, 2013. PRIMO, Alex. Interação mediada por computador: Comunicação, Cibercultura, Cognição. Porto Alegre: Editora Sulina, 2008 RECUERO, Raquel. Redes Sociais na internet. Porto Alegre: Editora Sulina, 2009 RÜDIGER, Francisco. O Amor e a Mídia – Problemas de legitimação do romantismo tardio. Porto Alegre. Edi PUCRS, 2013 RÜDIGER, Francisco. As teorias da Cibercultura – Perspectivas, questões e autores. Porto Alegre. Editora Sulina. 2011. SANTAELLA, Lucia. A ecologia pluralista da comunicação – Conectividade, mobilidade, ubiquidade. São Paulo. Editora Paulus, 2010. SILVA, Juremir Machado. Como fazer textos acadêmicos. Porto Alegre. Editora Meridional, 2010. YIN, Roberto K. Estudo de Caso – Planejamento e Métodos. Porto Alegre. Editora Bookman, 2009.