Livro Completo

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Livro Completo
Organizadores:
Maria Cristina Cacciamali
Rosana Ribeiro
Júnior Macambira
SÉCULO XXI:
TRANSFORMAÇÕES E
CONTINUIDADES NAS
RELAÇÕES DE TRABALHO
Fortaleza
Instituto de Desenvolvimento do Trabalho
Banco do Nordeste do Brasil
Universidade de São Paulo
2011
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SÉCULO XXI: TRANSFORMAÇÕES E
CONTINUIDADES NAS RELAÇÕES DE TRABALHO
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS AOS AUTORES
CONSELHO EDITORIAL:
Tania Bacelar de Araújo
Liana Maria da Frota Carleial
Tarcisio Patricio de Araujo
Pierre Salama
REVISÃO ORTOGRÁFICA
Maria Luísa Vaz Costa (Textos em Português)
Antônio Brandão de Macêdo (Textos em Espanhol)
NORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
Paula Pinheiro da Nóbrega
PROGRAMAÇÃO VISUAL E DIAGRAMAÇÃO
José Wendell de Oliveira Sá
CRIAÇÃO DA CAPA:
Ildembergue Leite.
S444s Século XXI: transformações e continuidades nas relações de trabalho /
organizadores, Maria Cristina Cacciamali, Rosana Ribeiro, Júnior
Macambira; autores, Clemente Ruiz Duran ... [et al.] – Fortaleza : Instituto
de Desenvolvimento do Trabalho, Banco do Nordeste do Brasil,
Universidade de São Paulo, 2011.
344 p.
ISBN: 978-85-7563-670-1
1. Relações de Trabalho. 2. Trabalho. I. Cacciamali, Maria Cristina. II.
Ribeiro, Rosana. III. Macambira, Júnior. IV. Título.
CDD: 331
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
5
RELAÇÕES DE TRABALHO: O ENFOQUE SISTÊMICO DE JOHN
T. DUNLOP
Carlos Henrique Horn, Fernando Coutinho Cotanda e Walter Arno Pichler 11
PARTE 1 - NEGOCIAÇÕES COLETIVAS E TRANSFORMAÇÕES NA
ORDEM ECONÔMICA MUNDIAL: SUBORDINAÇÃO OU PAPEL
ATIVO?
45
MÉXICO: TRANSFORMACIONES PRODUCTIVAS Y DESARROLLO
DE LAS NEGOCIACIONES COLECTIVAS DE 1980 A 2010
Clemente Ruiz Durán
47
TRÊS DÉCADAS DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA NO BRASIL:
CONTEXTOS, RESULTADOS E DESAFIOS
Regina Coeli Moreira Camargos e Rafael Soares Serrao
79
NEGOCIAÇÕES COLETIVAS EM NOVO POLO AUTOMOTIVO:
MMC E SIMECAT
Alexander Dias Siqueira e Rosana Ribeiro
99
PARTE 2 - RELAÇÕES DE TRABALHO: TRANSFORMAÇÕES E
PARTICULARIDADES NA AMÉRICA LATINA E NA EUROPA 125
PERSPECTIVAS DAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO BRASIL NO
COMEÇO DO SÉCULO 21
Marcio Pochmann
127
CAMBIOS INSTITUCIONALES Y MERCADO LABORAL:
PERÚ 1990 – 2009
Norberto E. García
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EL FUNCIONAMIENTO DEL MERCADO DE TRABAJO Y LA
SITUACIÓN SOCIAL EN ARGENTINA ENTRE 2004 Y 2009
Fernando Groisman
183
LA TRANSFORMACIÓN DE LAS RELACIONES LABORALES EN
ESPAÑA EN LA PERSPECTIVA EUROPEA
Santos M. Ruesga
205
PARTE 3 - SINDICATOS, GESTÃO E ORGANIZAÇÃO DO
TRABALHO NUM CONTEXTO DE LIBERALIZAÇÃO
237
REDES SINDICAIS EM EMPRESAS MULTINACIONAIS:
CONTORNOS DE UM SINDICALISMO COSMOPOLITA? A
EXPERIÊNCIA DO RAMO QUÍMICO
Leonardo Mello e Silva
239
HETEROGENEIDADE DO TRABALHO COMO CONTRAPONTO À
TESE DO INFOTAYLORISMO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Luís Fernando Santos Corrêa da Silva
267
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ORGANIZAÇÃO E PODER NO AMBIENTE DE TRABALHO
NUM CONTEXTO DE LIBERALIZAÇÃO
José Ricardo de Paula Xavier Vilela, Antonio Carvalho Neto e Mariana
de Oliveira Vilela
287
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NUM CONTEXTO
DE LIBERALIZAÇÃO
Valmiria Carolina Piccinini e Sidinei Rocha de Oliveira
309
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APRESENTAÇÃO
O livro Século XXI: Transformações e Continuidades nas Relações de Trabalho tem como principal objetivo revisitar a relação capital-trabalho no Brasil,
na América Latina e na Europa depois das reformas laborais postas em marcha
durante a onda liberal que varreu o mundo ocidental entre 1980 e o primeiro
lustro do século XX. O corolário será a análise das tendências sobre a situação de
emprego da força de trabalho.
As relações de trabalho compõem o quadro institucional formal e informal
de um país. As suas configuração e ações constituem-se em indicadores de primeira ordem para aferir o aprofundamento da democracia, o desenvolvimento
social e a consistência da cidadania construída socialmente. Relações de trabalho
que respeitam os pressupostos do desenvolvimento das atividades econômicas e
as necessidades objetivas e subjetivas de plena inserção social no trabalho e no
cotidiano são um dos eixos para o progresso econômico e social de um país. O
aumento da produtividade é essencial para o crescimento econômico, entretanto
sem intervenções públicas de qualidade, legislação trabalhista adequada e práticas
de negociação legítimas, não apenas o crescimento da produtividade poderá ser
comprometido como, sobretudo, a concentração da renda irá somar-se à concentração de poder político, traços inerentes à economia de mercado. Nesse contexto
podemos afirmar que relações de trabalho de caráter redistributivo são objetos de
conflitos sociais e de projetos políticos que combinam desenvolvimento econômico com progresso social.
A crise econômica dos países centrais ao final dos anos 60 e 70 do século
passado revelou o desgaste do pacto fordista e deu o primeiro impulso a um
processo de mudanças na política social e nas instituições trabalhistas que no lado
ocidental do planeta se prolonga até o presente. As sucessivas crises econômicas
mundiais, algumas originadas pelo setor produtivo, muitas pelo setor financeiro,
afetaram a concepção, a operação, a abrangência e o financiamento da política
social. Na esfera do trabalho as mudanças afetam o sistema público de seguridade
social, a legislação laboral, a expressão jurídica dos contratos, a atuação do movimento sindical e as negociações e conteúdos dos contratos coletivos. As mudanças buscaram ampliar a eficiência econômica e acelerar a renovação tecnológica.
A América Latina, ao longo do último vintênio do século XX, constituiu-se
palco de profundos e contínuos ajustamentos estruturais que transformaram a
socioeconomia política da região. Os condutores da política econômica desdobra-
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ram-se para superar o duplo desafio das mudanças de regime político, de um lado,
e da estagnação econômica, de outro. O ajustamento macroeconômico dos primeiros anos da década 1980 foi imposto pela denominada crise do endividamento
externo, enquanto na década de 1990 as reformas centraram-se na reorientação
da estrutura econômica pública e privada no sentido de torná-la mais competitiva e com maior interação com o mercado mundial. Acompanhar as mudanças
das tecnologias de informação, dos avanços científicos e da redivisão do poder
econômico e do trabalho no mercado global dos últimos trinta anos representou
um processo de aproximações sucessivas, sobretudo de acertos e de erros para os
governantes latino-americanos.
A regulação do mercado de trabalho originária dos anos 1930 e de inspiração europeia, na maioria dos países, não poderia permanecer incólume nesse
redesenho mundial. Todos os países da América Latina realizaram, em momentos
distintos, reformas laborais extensas e profundas, como a Argentina e o Peru, ou
de caráter pontual e descontínuo, porém não menos marcantes, como o Brasil e
o México. A tônica das alterações seguiu três eixos: menor e melhor qualidade
da regulação pública, diminuição dos custos do trabalho implicando redução de
proteção e direitos sociais e incentivos para aprofundar e ampliar as negociações
coletivas diretas.
O quadro das reformas da latino-américa, todavia, não apresenta apenas aspectos negativos para a construção de novas relações de trabalho ou a sua adaptação. A democratização dos regimes políticos da região, a constituição de partidos
políticos populares, a Constituição Federal de 1988 e a decorrente conformação
do poder político constituíram-se, no período, a âncora para realizar programas e
intervenções redistributivas e de inclusão social, e para rever a prática da relação
capital-trabalho. Assim, instituições formais e informais positivas sucederam-se,
a despeito do desenho draconiano da política macroeconômica que simultaneamente foi executada para criar um ambiente econômico favorável à recuperação
econômica conduzida pelo setor privado em combinação com o Estado. O crescimento econômico do mercado mundial, nos anos 2000, a superação no curto
prazo da crise econômica mundial de 2008 e a manutenção de governos progressistas confirmaram as possibilidades de criar e renovar instituições laborais que
confrontem a assimetria de poder econômico e político tanto no plano macrossocial quanto nos locais de trabalho.
O ano de 2008 correspondeu ao centenário da edição pioneira do Industrial
Relations System, de Dunlop, obra elaborada num contexto pós-Segunda Guerra Mundial. O objeto central do livro são as relações entre administradores de
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empresas, trabalhadores e agências governamentais que caracterizam as sociedades que atravessaram processos de industrialização. Nos anos 50 e 60 do século
passado foram elaboradas dezenas de publicações vinculadas à temática das relações de trabalho, sobretudo nos países de origem anglo-saxônica onde esse tema
dispõe de curso disciplinar próprio, embora interdisciplinar e com construção
epistemológica na intersecção entre teorias, ordem jurídica, ação política e gestão
administrativa.
No Brasil, ainda hoje vigora escassa produção científica, afinal temos uma
pequena quantidade de livros, teses e dissertações sobre a temática das relações de
trabalho. Entretanto, várias questões postas nesse eixo temático exigem uma reflexão mais intensa. À guisa de ilustração, análises sobre o poder de barganha dos
sindicatos dos trabalhadores em diferentes etapas de nossa história e as principais
transformações que envolvem esse processo de negociação, bem como o papel
de instituições como a Justiça do Trabalho são pouco discutidos pelos estudiosos.
Conforme apresentado anteriormente, as mudanças sociais da década de
1970, e no caso brasileiro, principalmente depois dos anos 1990, conduziram o
mundo a um novo cenário inteiramente distinto daquele que envolvera Dunlop.
As mudanças na economia mundial e o acirramento da concorrência intercapitalista conduziram as empresas que permaneceram ou ampliaram a sua parcela no
mercado mundial a difundir inovações tecnológicas e organizacionais e a criar,
recriar ou adaptar arranjos nas relações de trabalho com vistas a aumentar a produtividade e a criação de inovações de produtos e de processos. O que induz o
processo retroalimentador do avanço da competitividade tanto fundamenta as
alternativas de inserção na economia global quanto determina maior dinamismo
à economia interna.
Conflitos de interesses entre empregados e empregadores, padrões de controle, estruturas de poder e arranjos institucionais do uso da força trabalho e negociações coletivas encontram-se entre as questões centrais de estudo dessa área.
Os novos tempos mantêm os temas, mas alteram os objetos de estudo. Revisitar a
realidade com instrumentos formais e rigorosos, científicos, enfim, com conhecimento do passado e planejando o futuro delimitam as tendências que poderão reforçar ações políticas e intervenções públicas na construção do progresso social.
Este livro é composto de três partes e 11 capítulos, além de um capítulo de
abertura dedicado ao pesquisador americano John Dunlop, que é considerado
um dos teóricos pioneiros no campo das relações de trabalho. O propósito desta abertura realizada por Carlos Henrique Horn, Fernando Coutinho Cotanda
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e Walter Arno Pichler é apresentar uma reflexão acerca da importância de sua
obra intitulada Industrial Relations Systems. Os autores salientam a importância
e atualidade dessa obra para a constituição de uma teoria geral das relações do
trabalho e sua influência na agenda de pesquisa do período posterior à publicação. Este capítulo desenvolve, de forma clara e rigorosa, o arcabouço conceitual
e teórico formulado por Dunlop. Tal estrutura se revela crucial para a compreensão das principais questões envoltas nas relações de trabalho. Além disso, Carlos
Henrique Horn, Fernando Coutinho Cotanda e Walter Arno Pichler apontam os
prováveis determinantes da escassez de estudos no Brasil baseados no trabalho de
Dunlop, tais como a reduzida difusão do mecanismo de negociação coletiva entre
empresas e sindicatos e o grande número de estudos realizados em bases teóricas
avessas ao método proposto no livro Industrial Relations Systems.
A primeira parte ”Negociações Coletivas e Transformações na Ordem Econômica Mundial: subordinação ou papel ativo?” compreende três capítulos e interpreta, a partir de distintas perspectivas, os principais impasses e desafios das
negociações coletivas.
Clemente Ruiz Durán estuda as transformações que se verificaram no México, sobretudo na política econômica, no mercado de trabalho e no marco regulatório do trabalho no período de 1980 a 2010. Nesse contexto de modificações
nota-se elevada informalidade, perda salarial e deterioração das negociações coletivas.
No Brasil, Regina Coeli Moreira Camargo e Rafael Soares Serrao analisam
os avanços e recuos das negociações coletivas nas últimas décadas, bem como
os principais obstáculos ao desenvolvimento dessas negociações. Os autores realçam, especialmente, os debates acerca dos ganhos e perdas das negociações
coletivas nos anos 90.
Alexander Dias Siqueira e Rosana Ribeiro investigam as especificidades das
negociações coletivas em novo polo automotivo localizado em Catalão/GO. Os
autores ressaltam os avanços, impasses e limites dessas negociações realizadas em
espaço geográfico sem tradição sindical.
Por outro lado, na segunda parte, ”Relações de Trabalho: transformações e
particularidades na América Latina e na Europa” constam quatro capítulos que
têm o propósito de alimentar o debate sobre as principais mudanças verificadas
no campo das relações de trabalho no período recente no Brasil, Peru, Argentina
e Espanha.
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No caso brasileiro, Marcio Pochmann analisa a incorporação parcial e lenta dos trabalhadores nos direitos concedidos pela legislação trabalhista e social.
Além disso, sinaliza a necessidade de extensão desses direitos para aqueles que
trabalham no setor de serviços e pequenos empreendimentos, na medida em que
vários desses trabalhadores permanecem à margem da regulação.
Norberto E. García, por sua vez, realiza uma análise acurada da reforma
laboral implementada no Peru, a partir dos anos 90, bem como aponta seus principais resultados, tais como mercado de trabalho mais competitivo e flexível para
parcela razoável dos trabalhadores.
Focalizando a Argentina, Fernando Groisman interpreta as principais transformações no mercado de trabalho entre 2004 e 2009, bem como seus impactos
sobre os indicadores sociais. Observa-se uma expansão dos postos de trabalho
assalariados com proteção social, no entanto 25% da população residem em domicílios em que nenhum morador tem acesso ao trabalho regulamentado. De
acordo com o autor, é necessário, portanto, a implementação de políticas públicas
que busquem incorporar essa população nos marcos da seguridade social.
No que se refere à Espanha, Santos M. Ruesga discute as transformações
na oferta e demanda de trabalho, os salários e as principais mudanças no marco
regulatório. A partir dessas reflexões, o autor aponta os principais desafios para
o mercado de trabalho espanhol como a participação na oferta de trabalho das
mulheres e imigrantes, a tendência de queda dos salários e de promoção de uma
reforma laboral que eleve o nível de produtividade do trabalho.
Finalmente, a terceira parte, “Sindicatos, gestão e organização trabalho num
contexto de liberalização” contempla quatro capítulos que buscam refletir sobre
as transformações nas estratégias sindicais e gerenciais no período recente e também acerca dos alcances e limites das modificações na organização do trabalho.
Leonardo Mello e Silva investiga, de forma pioneira, os principais desafios
da rede de trabalhadores do ramo químico brasileiro. Vale mencionar que essa
instituição é recente e compreende um espaço em que os sindicatos atuam de
maneira concertada com Estados, empresas e organismos sociais diversos, introduzindo questões sociais e/ou trabalhistas.
Luís Fernando Santos Corrêa da Silva discute o uso do termo infotaylorismo
na organização do trabalho das empresas de call centers, que corresponde, na
verdade, ao taylorismo numa versão conectada à nova realidade tecnológica. O
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autor aponta que não há um modelo hegemônico de organização do trabalho nas
empresas de teleatendimento, visto que essas firmas apresentam padrões heterogêneos de organização do trabalho.
José Ricardo de Paula Xavier Vilela, Antonio Carvalho Neto e Mariana de
Oliveira Vilela refletem sobre o poder nas organizações e a importância da inclusão de uma abordagem nesses estudos que destaque a constituição de relações
autoritárias de poder entre indivíduos no Brasil. O estudo aponta a relevância das
questões relativas ao poder para a compreensão das estruturas organizacionais.
Valmiria Carolina Piccinini e Sidinei Rocha de Oliveira investigam os contornos assumidos pela gestão de recursos humanos no contexto de liberalização mundial, embora observem a influência das particularidades históricas de cada país.
Maria Cristina Cacciamali, Rosana Ribeiro e Júnior Macambira
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RELAÇÕES DE TRABALHO: O ENFOQUE SISTÊMICO DE JOHN T. DUNLOP
Carlos Henrique Horn1
Fernando Coutinho Cotanda2
Walter Arno Pichler 3
Introdução
O estudo das relações de trabalho segundo a tradição anglo-americana (industrial
relations) tem no enfoque sistêmico apresentado por John Thomas Dunlop, no livro
Industrial Relations Systems (IRS), de 1958, um de seus principais momentos de formulação conceitual e teórica. Há, com efeito, um consenso na literatura especializada
acerca da influência exercida pelo IRS, sendo essa obra considerada como a primeira
tentativa sistemática de elaboração de um arcabouço teórico no campo das relações
de trabalho. (MÜLLER-JENTSCH, 2004). Ainda que existam divergências sobre os
resultados da empreitada do autor, ou seja, do quão bem sucedido teria sido Dunlop
(1993) em sua busca de uma teoria geral das relações de trabalho, não resta dúvida
quanto às consequências do IRS na determinação de uma agenda de pesquisa e na
formulação científica do campo na segunda metade do século XX. Kaufman (2004,
p. 250, tradução dos autores), a despeito de sua visão crítica ao IRS, afirma em sua
magistral história do industrial relations que “[...] o livro é largamente visto como uma
das mais influentes peças acadêmicas já escritas no campo e vários a considerariam o
trabalho seminal de teoria das relações de trabalho”.
Este capítulo apresenta uma síntese analítica do IRS, sem, contudo, pretender exaurir as questões levantadas por sua publicação e que deram origem a uma
farta literatura. Além desta introdução, o capítulo possui sete seções. Na primeira,
procuramos delinear o contexto acadêmico de surgimento do Industrial Relations
Systems, associando-o à chamada era dourada do IR norte-americano e, em particular, a um amplo projeto de pesquisa denominado Estudo Interuniversitário
dos Problemas do Trabalho no Desenvolvimento Econômico. As seções 2 e 3
destinam-se à exposição dos conteúdos básicos do IRS. Nelas, delimitamos os
objetivos de Dunlop em sua obra e discorremos sobre o conceito e a estrutura de
um sistema de relações de trabalho. Na seção 4, aprofundamos a análise da estrutura, expondo os desdobramentos de Dunlop sobre cada um dos contextos do
1 Economista, Professor do Departamento de Ciências Econômicas e do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
2 Sociólogo, Professor do Departamento de Sociologia e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
3 Sociólogo e Economista, Pesquisador da Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser (FEE).
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sistema, ao passo em que o tema da formação de sistemas nacionais de relações
de trabalho é examinado na seção 5. A seção 6 destina-se a explorar as razões da
ausência da obra de Dunlop (1993) nos estudos sobre relações de trabalho no
Brasil. Por fim, na sétima seção, discutimos algumas lições do IRS que julgamos
relevantes e que permanecem válidas para o estudo das relações de trabalho.
O Contexto Acadêmico da Obra
O Industrial Relations Systems foi publicado no ápice de um período considerado como a era dourada do IR nos Estados Unidos, o qual, cronologicamente,
cobre o decênio entre os finais das décadas de 1940 e 1950. Dentre outros traços
salientes, essa época caracterizou-se por uma vasta produção científica sobre assuntos atinentes às relações de trabalho, envolvendo pesquisadores de diferentes
disciplinas e matizes teóricos. Conforme aponta Kaufman (1993, p. 92, tradução
dos autores), “como um resultado deste extenso envolvimento multidisciplinar, a
pesquisa em relações de trabalho ganhou fôlego até então desconhecido em seus
temas, perspectivas teóricas e métodos de pesquisa”.
Uma das iniciativas mais relevantes da pesquisa sobre relações de trabalho no
período, e que se estendeu por mais de duas décadas, foi o Estudo Interuniversitário dos Problemas do Trabalho no Desenvolvimento Econômico, um ambicioso
projeto coordenado por Clark Kerr (Universidade da Califórnia, Berkeley), John T.
Dunlop (Universidade de Harvard), Frederick Harbison (originalmente da Universidade de Chicago; posteriormente, da Universidade de Princeton), e Charles Myers
(MIT). Iniciado no ano de 1954, com algum trabalho preliminar em anos anteriores, o Estudo Interuniversitário fez parte do boom de análises comparativas das
relações de trabalho entre países que marcou os anos 1950. Esse projeto específico
atingiu, contudo, uma escala sem precedentes, tendo envolvido 78 pesquisadores e
coletado informações referentes a 35 países em seu primeiro quinquênio de atividade. Estes formaram um conjunto intencionalmente heterogêneo, cobrindo economias de mercado desenvolvidas (Alemanha, Japão, Estados Unidos, por exemplo),
economias de planejamento central (União Soviética) e economias em processo de
industrialização recente (Índia, Egito, Indonésia, Brasil).
O Estudo Interuniversitário deu origem a dezenas de publicações, entre as
quais se encontra o Industrial Relations Systems.4 Não obstante, o texto que provavelmente constitui sua marca registrada é Industrialism and Industrial Man, publicado em 1960, em uma co-autoria dos quatro coordenadores do projeto. O
4 A obra é arrolada na lista de publicações do Estudo Interuniversitário dos Problemas do Trabalho no Desenvolvimento Econômico, elaborada por Kerr et al. (1963).
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livro representa uma síntese das principais conclusões a que chegaram os autores
naquele momento do estudo. De acordo com Kaufman (2004, p. 256, tradução
dos autores), “representa a maior e mais extensa tentativa de teorização no campo das relações de trabalho nos Estados Unidos e, justificadamente, na história
global desse campo de estudos”. Nele, os autores partem da questão orientadora
geral do Estudo Universitário, a dos impactos da industrialização sobre a vida em
sociedade5 e, em particular, sobre as relações de trabalho; abordam as diferentes
trajetórias nacionais de industrialização associadas a diferentes tipos de elites industrializantes; e formulam sua predição sobre o futuro como uma resultante do
confronto entre fontes que conduzem à diversidade e fontes que pressionam por
uniformidade, sugerindo que a tendência básica dos países é a de evoluírem para
uma configuração que denominam industrialismo pluralista.6 Tal predição veio a
ser posteriormente referida, na literatura do industrial relations, como a tese da
convergência ao modo anglo-americano de relações de trabalho, tendo suscitado
controvérsias que se estendem aos dias de hoje. Uma das principais conclusões do
Industrialism and Industrial Man, notadamente a que se refere ao desenvolvimento de sistemas nacionais de relações de trabalho (SNRT) e ao papel das elites industrializantes, já havia sido antecipada por Dunlop (1993) no capítulo 7 do IRS.
Objetivo e Composição da Obra
O objetivo fundamental de Dunlop (1993, p. x, tradução dos autores, grifo dos
autores), no Industrial Relations Systems, é esclarecido já nas páginas iniciais do prefácio. Trata-se de apresentar “uma teoria geral de relações de trabalho; ele (o livro)
busca oferecer ferramentas de análise para interpretar e entender o mais amplo leque
de fatos e de práticas nas relações de trabalho.” As relações que são o objeto focal
da teoria configuram um complexo de interações entre administradores de empresas,
trabalhadores e agências governamentais que caracterizam as sociedades que atravessaram processos de industrialização. Em suma, essas relações compreendem a relação
de emprego assalariado enquanto seu núcleo é o conjunto de relações entre pessoas e
instituições que se forma em torno da relação básica de emprego.
5 A industrialização é “a grande transformação na longa história da humanidade neste planeta – mais básica, mais
rápida e mais universal do que qualquer outra transformação que jamais tenha ocorrido.” (KERR et al., 1963, p.
279, tradução dos autores). Há duas hipóteses – talvez fosse melhor chamá-las de pressupostos – que alimentam
o Estudo Universitário em seu nascedouro no pós-guerra: (i) os países, ou inúmeros países, inevitavelmente experimentarão um período de industrialização; (ii) como consequência, esses países vivenciarão os problemas típicos
da industrialização, sobretudo aqueles que se manifestam no âmbito da produção e das relações de trabalho.
6 Em 1975, os autores publicaram, no ensaio Industrialism and Industrial Man Reconsidered: Some Perspectives on
a Study over Two Decades of the Problems of Labor and Management in Economic Growth, uma atualização de
sua discussão central, mantendo algumas e modificando outras das principais conclusões apresentadas no Industrialism and Industrial Man de 1960. O ensaio é considerado o último documento do Estudo, então renomeado
Estudo Interuniversitário dos Recursos Humanos no Desenvolvimento Nacional. Ver Dunlop et al. (1975).
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Ao expor, ainda, o objetivo do IRS, Dunlop (1993, p. xi) acrescenta alguns esclarecimentos que revelam motivações e apontam aspectos capitais de sua construção teórica. Assim, o autor acreditava que a teoria pudesse ser útil para interpretar
a experiência das relações de trabalho: (i) em empresas e setores de atividade econômica, bem como para comparações entre eles; (ii) em países e para comparações
internacionais; e (iii) ao longo do tempo, no curso do desenvolvimento econômico.
E ao fazê-lo, deveria ter como tarefa central explicar por que determinadas normas
que governam a relação de emprego e as demais relações no mundo do trabalho
são estabelecidas em certos sistemas de relações de trabalho e como e por que as
normas mudam em face de pressões exercidas sobre o sistema.7
O conceito de sistema de relações de trabalho, a par de dar causa ao título da
obra8, ocupa o centro das atenções do autor ao longo do livro. O Industrial Relations
Systems é composto de nove capítulos.9 Os quatro primeiros destinam-se a esclarecer o
que é um sistema de relações de trabalho e qual é sua estrutura, com atenção principal
às relações de conformidade entre os contextos e as normas do sistema. Os capítulos
5 e 6 fornecem uma ilustração do poder analítico do conceito de sistema quando aplicado a relações de trabalho com normas determinadas no âmbito setorial. Os setores
de atividade que servem de exemplo são os da extração de carvão e construção civil.
Nos capítulos 7 e 8 o autor utiliza o conceito de sistema para tratar das relações de
trabalho no plano de uma nação e com base em um recorte longitudinal, visto que
sua preocupação é quanto aos fatores que incidem no desenvolvimento de sistemas
nacionais de relações de trabalho e ao modo como o desenvolvimento econômico
afeta a regulação da relação de emprego. O livro conclui com uma síntese, no capítulo
9, sob o título de “Teoria Geral das Relações de Trabalho”.
Sistema de Relações de Trabalho: Conceito e Estrutura
As relações de trabalho em um país ou em uma comunidade de trabalho são
percebidas por Dunlop como um sistema, isto é, como um todo compreensivo de
7 No comentário que escreveu à edição de 1993, Dunlop sustenta que o objeto de uma teoria das relações de trabalho deve ser a determinação de normas, mas também menciona as práticas das relações de trabalho: “[...] o foco
analítico deste campo [relações de trabalho] é o que desenvolvemos no Industrial Relations Systems: as regras e as
práticas do local de trabalho desenvolvem-se através da interação de gerentes, trabalhadores e suas organizações,
e agências governamentais em um contexto de tecnologia, mercados de trabalho e produto, e regulamentações
governamentais”. (DUNLOP, 1993, p. 8, tradução dos autores).
8 A tradução literal de industrial relations para o português, ou seja, relações industriais, leva à perda do seu significado mais preciso e que se refere ao estudo das relações de trabalho. Assim, em prol da clareza e da precisão, convém
abandonar a literalidade e seguir, por analogia, a orientação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que
indica utilizar a expressão relaciones laborales para a tradução do termo ao espanhol, passando, portanto, a usar a
expressão relações de trabalho como a melhor tradução de industrial relations para o português.
9 Nossa referência é a edição de 1993, da Harvard Business School, onde também aparece um comentário novo do
autor redigido especialmente para essa edição.
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elementos inter-relacionados. Esse sistema é composto de atores, contextos, ideologia
e normas. Os atores interagem sob a influência de determinados contextos – que
incluem a tecnologia, os mercados e a distribuição do poder na sociedade em geral – e
essa relação envolve, igualmente, uma ideologia, que, de acordo com o autor, contribui
para definir seus papéis, bem como para integrar o sistema. O produto de um sistema
de relações de trabalho constitui uma rede de normas que governam a relação de
emprego e as demais relações entre os agentes do mundo do trabalho.10 Mudanças no
ambiente, no relacionamento entre os atores ou nos entendimentos compartilhados
pelos mesmos podem afetar as normas do sistema ou até mesmo o sistema como um
todo. A Figura 1 ilustra a estrutura de um sistema de relações de trabalho.
Figura 1 - Estrutura de um Sistema de Relações de Trabalho
Fonte: Elaboração Própria dos Autores.
10 Wood et al. (1975, p. 295, tradução dos autores), em seu excelente ensaio interpretativo sobre o conceito de sistema
de relações de trabalho na obra de Dunlop, assinalam que “[...] a ‘teia de normas’ é vista como o produto do sistema
de relações de trabalho, o qual, por sua vez, é compreendido como um sistema de formulação de regras”. Elaboram,
ainda, em conformidade com o marco dunlopiano, uma distinção analítica entre o sistema que produz as normas
(isto é, o sistema de relações de trabalho) e o sistema que é regulado por tais normas (isto é, o sistema produtivo).
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Os atores de um sistema de relações de trabalho compreendem três tipos
de hierarquia ou organização: trabalhadores, administradores e agências governamentais ou privadas especializadas.
A hierarquia de trabalhadores é composta de organizações complementares ou rivais formalmente estabelecidas, tais como sindicatos, associações, clubes,
conselhos e organizações políticas, e formas pouco ou “não organizadas” em que
os trabalhadores podem tratar coletivamente de seus interesses. Dunlop recorda
que, em qualquer empreendimento produtivo permanente, os trabalhadores nunca estão inteiramente desorganizados. Quando um grupo de empregados trabalha
junto por um determinado tempo, algum tipo de organização informal tende a
surgir entre eles. Dentre as formas “pouco organizadas” ou “não organizadas”,
o autor menciona, a título de ilustração, os círculos de qualidade, as comissões de
prevenção de acidentes, os programas de participação de empregados, os grupos
comunitários e os grupos formados espontaneamente para lidar com problemas
específicos ou para reagir contra certos desenvolvimentos no local de trabalho.
A hierarquia de administradores, por sua vez, não corresponde necessariamente ao proprietário dos ativos de capital. Os administradores podem ser públicos ou privados, ou uma combinação de ambos, ou seja, essa hierarquia inclui um
leque variado de instituições. De acordo com o autor, em um dos extremos estão
os empregadores privados individuais e as estruturas empresariais familiares; no
outro, estão as grandes empresas multinacionais e as agências internacionais. A
exemplo do que ocorre com a hierarquia de trabalhadores, a definição sobre qual
hierarquia específica de administradores é relevante para o processo de formulação das normas depende, entre outros fatores, do nível ou escopo do sistema
de relações de trabalho – se empresa, setor, nação, ou algum outro, como nos
referiremos a seguir. Assim, a hierarquia que importa pode ser, entre outras, uma
empresa privada, uma corporação pública ou associação (ou sindicato) patronal.
Essencialmente, os atores relevantes dentro desse grupo são aquelas associações
ou agrupamentos de empresas com poder (ou autoridade explícita, ou de fato)
para participar no processo de tomada de decisões.
Finalmente, as agências especializadas incluem os organismos governamentais que desempenham um papel no sistema de relações de trabalho, aos quais
Dunlop confere maior atenção, bem como as agências especializadas criadas pelos outros dois atores. O autor afirma que, em algumas sociedades, essas agências
podem ter um papel tão amplo e decisivo que chega a anular o poder das hierarquias de administradores e de trabalhadores em todas as questões. Já em outras,
seu papel pode ser tão limitado que permite uma ampla liberdade de ação das ou-
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tras hierarquias. Essas organizações podem exercer as mais diversas funções, tais
como resolução de disputas, treinamento, estabelecimento de salários, cuidados
de saúde, provimento de pensões e aposentadorias, entre outras.
A interação dos atores ocorre sob a influência de três contextos relevantes, a
saber: tecnologia, mercados e distribuição do poder na sociedade em geral. Essas
condições ambientais são, de acordo com o autor, decisivas na moldagem das
normas estabelecidas em um sistema de relações de trabalho.
O contexto técnico diz respeito às características do local de trabalho e às
operações e às funções de trabalho. Segundo Dunlop, os locais de trabalho podem variar no tocante a diferentes aspectos: mobilidade, relação com a residência
dos trabalhadores, duração do trabalho e tamanho da força de trabalho. Já o tipo
de operação de trabalho refere-se ao conteúdo, ao ritmo e à jornada de trabalho.
Dunlop sustenta que os fatores tecnológicos afetam a forma de organização de
administradores e empregados, os problemas colocados para as administrações e
as características requeridas da força de trabalho. Os fatores tecnológicos colocam
diferentes problemas a administradores e empregados e, ao mesmo tempo, limitam o rol de soluções factíveis para esses problemas, resultando em que diferentes
ambientes tecnológicos determinam o aparecimento de normas distintas.
O contexto dos mercados compreende o mercado do produto, as limitações
orçamentárias com que se defrontam as empresas e o mercado de trabalho. O
mercado de produto pode variar conforme o caráter da concorrência (concorrência pura, oligopólio, monopólio) e o tipo de mercado (local, nacional, internacional; protegido ou exposto à concorrência). Já no caso de organizações produtivas
cujos meios financeiros dependem, no todo ou em parte relevante, de transferências de recursos tributários, sua capacidade de financiamento está vinculada menos
(ou não está vinculada) ao seu desempenho de mercado do que às suas limitações
orçamentárias. Esse tipo de contexto inclui, por fim, as características da força de
trabalho, tais como as étnicas, culturais, religiosas, nível de instrução e qualificação.
O contexto dos mercados incide decisivamente no grau de liberdade no estabelecimento das normas, sendo particularmente relevante para questões como as de
remuneração da força de trabalho, do timing de revisão das normas, da duração das
normas e do treinamento da mão-de-obra.
Finalmente, o contexto do poder se refere à distribuição do poder dos atores
na sociedade. Isso se reflete, de acordo com Dunlop, no seu prestígio, posição e
autoridade, afetando indiretamente a interação dos atores em um sistema ao contribuir para sua estruturação. O autor assinala que, de modo geral, a distribuição
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do poder é decisiva na definição do status dos atores, ou seja, suas funções e formas de interação, sendo particularmente importante na determinação da função
das agências governamentais especializadas. As funções e as formas de interação
prescritas podem ser impostas “de fora” pela sociedade (como é o caso da legislação em um sistema empresarial), ou ser criadas pelo próprio sistema de relações
de trabalho e, então, ser sancionadas ou reconhecidas pela comunidade.
O terceiro elemento constitutivo de um sistema de relações de trabalho, a
ideologia, refere-se ao conjunto de ideias e de crenças compartilhadas pelos atores. De acordo com o teórico Dunlop, a ideologia define o papel e o lugar de cada
ator, bem como as ideias que cada ator tem a respeito de seu lugar e do lugar
dos outros na sociedade. Ela tem a função de integrar o sistema de relações de
trabalho. Além disso, um sistema, para ser estável, requer congruência ou compatibilidade, em algum grau, entre as visões ou ideologias de cada ator.
O último elemento do sistema de relações de trabalho, a teia de normas
(web of rules), é o resultado da interação dos atores ou a variável dependente
do modelo. As normas abrangem uma ampla variedade de meios de expressão.
Podem aparecer como obrigações formalmente estabelecidas em regulamentos
e políticas da hierarquia de administradores, em regras de qualquer organização
de trabalhadores, na legislação do trabalho, em decretos ou em outros tipos de
decisão governamental, em decisões de tribunais, em decisões de agências especializadas criadas pelas hierarquias de administradores ou de trabalhadores, ou em
acordos estabelecidos através de negociação coletiva. Incluem, ainda, os costumes
e tradições da comunidade de trabalho.
Além das várias formas de expressão das normas, o autor igualmente as distingue, conforme o objeto de sua regulação, entre normas substantivas e normas
de procedimento. As primeiras incluem as normas que regulam as compensações
(remuneração) em todas as suas formas, os deveres e as performances esperadas
de trabalhadores e as normas que definem os direitos dos trabalhadores. As segundas incluem os procedimentos para o estabelecimento de normas e os procedimentos para decidir a sua aplicação a situações particulares.11
A autoridade dos atores e os procedimentos para estabelecer normas são
aspectos cruciais de um sistema de relações de trabalho. As normas de procedimento constituem um produto das políticas públicas, da história e das tradições
11 Goodman et al. (1975, p. 24, tradução dos autores), em sua detalhada elaboração sobre o conceito de normas na
teoria das relações de trabalho com base no IRS e em Flanders (1970), assinalam a natureza distinta dos dois tipos
de normas ao sintetizar que “normas substantivas definem os postos de trabalho, enquanto normas de procedimento regulam o processo de elaboração normativa”.
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de um país, sendo consideravelmente uniformes no espaço nacional e relativamente estáveis ao longo do tempo. Ainda de acordo com Dunlop, a relevância
das normas de procedimento é tal que se poderia distinguir um sistema de outro
através da identificação do modo pelo qual as relações de trabalho são reguladas
em uma dada realidade. Por exemplo, um sistema nacional em que a legislação
estatal tenha proeminência no marco normativo, enquanto uma função de menor
importância é cumprida pela negociação coletiva entre empresas e sindicatos, é
fundamentalmente diferente de um sistema em que a negociação coletiva exerce
um papel relevante, quer seja este principal, quer seja complementar, na regulação
da relação de emprego.
A definição do grau de importância ou da autoridade dos atores na regulação
das relações de trabalho está diretamente relacionada com a distribuição do seu
poder na sociedade, vale dizer, com aqueles aspectos que Dunlop (1993) julga
decisivos para a definição do status dos atores. E a autoridade é associada ao uso
legítimo do poder. Salamon (1998) esclarece que o conceito de poder é empregado em dois sentidos: o primeiro consiste na capacidade de alguém controlar os
outros, de dar ordens, de impor instruções ou regulamentos para outros; o segundo, na capacidade de influir na tomada de decisões de outros. Essa influência
pode se exercer através da capacidade de forçar mudanças nas decisões de outros,
ou na capacidade de gerar uma influência implícita que pode ser parte integral do
ambiente que é levado em conta por outros no processo de tomada de decisões.12
O conceito de sistema de relações de trabalho pode ser útil para analisar o processo de regulação das relações de trabalho em diferentes níveis. Assim, o escopo de
um sistema pode abranger uma sociedade nacional, quando estaríamos tratando de
um sistema nacional de relações de trabalho; pode, igualmente, referir-se às relações
de trabalho em um setor de atividade econômica ou em uma região; e, finalmente, o
sistema pode abranger um grupo econômico ou uma única empresa ou estabelecimento. Como assinala Dunlop (1993, p. 12, tradução dos autores),
O conceito de sistema é formulado para exprimir duas ideias:
o escopo ou contorno de um sistema pode variar conforme o
foco se direcione para uma nação, setores de uma economia,
ou unidades menores coerentes; e o sistema indica um forte
sentido de interdependência interna.
Uma hipótese de Dunlop (1993) é que, quanto menor o escopo do sistema,
maior o contexto e, por conseguinte, maior o peso do ambiente externo sobre
12 De acordo com Edwards (1995), o estabelecimento de normas no lugar de trabalho e na comunidade de trabalho
constitui um processo social complexo que depende do poder, do conhecimento e da organização dos atores.
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a ação dos atores. Assim, por exemplo, em sistemas de relações de trabalho no
âmbito de empresa ou grupo empresarial, os fatores ambientais dos mercados e
da legislação seriam decisivos na formulação das normas, ao passo que, quando o
sistema de relações de trabalho se confunde com o espaço nacional, os mercados
perdem relevância relativa como um elemento do contexto e a própria legislação
passa à condição de variável dependente13.
Contextos e Normas
Considerados os quatro elementos que compõem um sistema de relações de
trabalho, é na relação entre os contextos e a elaboração de normas que Dunlop
(1993) concentra a atenção quando procura detalhar sua teoria. As condições técnicas do local de trabalho e da comunidade laboral, juntamente com os mercados
e a distribuição de poder na sociedade, formam os contextos nos quais atuam, em
processo de influência recíproca, administradores, trabalhadores e organismos governamentais. Assim, em sua obra, após apresentada a estrutura de um SRT, o autor
dedica três capítulos às relações entre contextos e regulação, sendo um capítulo para
cada contexto específico. Nesta seção, mantemos a ordem da exposição de Dunlop
e sistematizamos as principais ideias do autor quanto à influência exercida pelos
contextos técnicos, dos mercados e do poder sobre a formulação de normas.
Tecnologia
O enquadramento teórico do sistema de relações de trabalho realizado por
Dunlop toma a tecnologia como uma dimensão indissociável das demais que
compõem os contextos do sistema. Mercados, poder e tecnologia estão mutuamente referidos e a tentativa de conhecer qualquer uma dessas dimensões do
contexto e seus impactos deve considerar a influência que uma exerce sobre a
outra. A separação possível dá-se no plano analítico, compreendendo que o recorte que separa uma dimensão singular das demais é, para Dunlop (1993), sempre
arbitrário. O contexto técnico é o objeto do capítulo 2 do IRS.
A análise que tem como foco os atores significativos de um SRT em sua
produção normativa pressupõe a incorporação das dimensões integrantes dos
contextos nos quais se desenrolam as interações entre os atores. A supressão dessas dimensões equivaleria a admitir, erroneamente, segundo Dunlop (1993), que
13 Podemos arguir, em conformidade com o IRS, que, nesse caso, a legislação pré-existente deveria ser considerada
um dos elementos de contexto de um sistema no qual os atores decidem sobre normas que se exprimem, entre
outras formas, através de nova legislação.
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as práticas dos atores ocorrem em um vazio.
O autor aponta algumas proposições gerais quanto ao contexto técnico:
a) É sempre singular em cada sistema de relações de trabalho e é
definido por muitas variáveis particulares;
b) É decisivo para a criação das normas por parte dos atores;
c) Importa, também, para definir a forma e o funcionamento das hierarquias e as interações entre os atores; e
d) É dinâmico; portanto, as mudanças ocorridas no plano tecnológico tendem a alterar o tecido normativo, a organização das hierarquias e o funcionamento do sistema de relações de trabalho.
Dunlop observa que as sociedades industriais produzem uma gama de atividades produtivas diferenciadas, ensejando vários contextos técnicos nos quais a
atividade laboral transcorre e se modela. O trabalho operatório, as hierarquias e as
normas nos locais de trabalho são alvo das possibilidades e dos constrangimentos
da conformação técnica de cada segmento produtivo, de cada local de trabalho.
Para o autor, no entanto, tomar, em primeiro lugar, o contexto técnico como
uma dimensão inescapável do sistema “não implica um determinismo rígido ou
uma forma de predestinação social [...]. O contexto técnico é só uma parte do
contexto global e interage de diferentes maneiras com os dois outros aspectos”.
(DUNLOP, 1993, p. 63, tradução dos autores).
A caracterização do contexto técnico é feita a partir de sete facetas. As quatro primeiras são relativas à caracterização dos trabalhadores e dos empresários
com respeito ao tipo de local de trabalho e as três últimas compreendem as operações ou funções que os atores executam.
Facetas Relativas ao Tipo de Local de Trabalho
I. Lugar de trabalho fixo ou variável: o local de trabalho, se fixo ou
variável, traz implicações diferenciadas para a conformação da organização do trabalho e as hierarquias e, por consequência, afeta as
normas do sistema de relações de trabalho.
II. Relação do lugar de trabalho com a residência: possuir ou não mo-
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radia própria, situar-se perto ou longe do local de trabalho, existir
residências disponíveis em quantidade suficiente, são fatores que
importam para as relações de trabalho. O contexto técnico pode
implicar, também, que a residência, pelo menos durante algum intervalo de tempo, seja móvel, a exemplo do que ocorre no setor
marítimo e em certos tipos de construção ou de trabalho agrícola.
Neste sentido, um conjunto de demandas diferenciadas é acionado,
tais como local para dormir provisoriamente, aluguéis, médicos,
transporte, pagamentos especiais.
III. Força de trabalho estável ou variável e operações de trabalho: o
contexto técnico também pode condicionar quanto à duração e
intensidade das operações de trabalho e à composição do grupo de
pessoas no trabalho. Assim, as operações de trabalho podem ser de
curta duração e sua frequência pode ser baixa ou alta. Ou, diferentemente, podem ser contínuas, mas com variações no volume de
trabalho, podendo dar lugar a um núcleo estável e a um segmento
flutuante de trabalhadores. Toda mudança na estabilidade ou na
variabilidade do local de trabalho dá lugar a novas normas e estruturas organizacionais.
IV. O tamanho do grupo de trabalho: as sociedades industriais comportam experiências tão variadas quanto o trabalho individual e
a agregação de milhares de trabalhadores em um único local de
trabalho. A maior ou menor formalização das normas, a estratificação das hierarquias dos atores, os problemas de comunicação
interna, as escalas salariais por ocupação, os processos internos
de tomada de decisão, a avaliação das tarefas, todos estes aspectos
são afetados pelo tamanho do grupo de trabalho. As obrigações e
o conhecimento gerencial requerido dos administradores também
variam conforme o tamanho da empresa.
Facetas Relativas às Operações ou Funções
Realizadas pelos Atores
V. O conteúdo da tarefa: esta faceta refere-se à natureza do trabalho
efetuado. O contexto técnico influencia o conteúdo operatório dos
trabalhos efetuados em cada local de trabalho e a distribuição de
cada tipo de trabalho. As normas nos locais de trabalho são forte-
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mente impactadas pelas mudanças no conteúdo das tarefas. Riscos
de acidentes, regras e equipamentos de segurança, velocidade de
funcionamento das operações e regramentos disciplinares, entre
outros aspectos, estão relacionados com o conteúdo das tarefas.
O conteúdo mais ou menos especializado das tarefas traz consequências, também, quanto aos aspectos formativos no sistema de
emprego. A tarefa é tão importante que o lugar estratégico que um
grupo de trabalhadores ou de administradores ocupa na empresa
ou na comunidade pode ser afetado por uma modificação de seu
conteúdo operatório.
VI. Relação com máquinas ou com clientes: os locais de trabalho podem comportar distintas operações de trabalho. Na indústria, um
trabalhador pode operar exclusivamente com ferramentas e essa
operação pode ser simples ou complexa. As operações podem, ainda, ser realizadas por meio de máquinas, transcorrendo, por exemplo, em uma esteira móvel nas quais os tempos e os movimentos
são determinados pela máquina. Já no setor de serviços, em lugar
dos equipamentos, o trabalho tem normalmente como foco de
atenção o cliente, como em um restaurante ou em uma loja. Todas
estas circunstâncias importam para a definição de distintas normas,
dos modos de relacionamento entre os atores e dos diferentes processos formativos.
VII. Os horários e os turnos do local de trabalho: o contexto técnico
pode influenciar o número de horas que o local de trabalho deve
operar. Produção em processos contínuos ou em processos discretos pode demandar, por exemplo, uma organização específica dos
turnos de trabalho. Por conta disso, as normas serão diferenciadas
quanto, por exemplo, à autoridade para mudar a escala horária ou
instituir novos turnos, aos critérios usados para decidir quanto à
alocação de trabalhadores e gerentes nos diferentes horários e às
taxas de remuneração extraordinária. Assim como todas as demais
facetas do contexto técnico, o número de horas de funcionamento
do local de trabalho também é um elemento dinâmico cuja variação conduz a mudanças nas normas.
Ao abordar o contexto técnico do lugar de trabalho, Dunlop (1993) procura dar relevo às implicações da tecnologia para a conformação das normas em
um determinado sistema de relações de trabalho. Além disso, o contexto técnico
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atua na organização das hierarquias dos atores, bem como no padrão de interação entre essas hierarquias. A maior ou menor proximidade entre os operários, a
maior ou menor homogeneidade técnica, a facilidade ou dificuldade em substituir
os operários, a existência ou não de processos produtivos com maior ou menor
vulnerabilidade estratégica afetam, também, as relações de poder no interior do
sistema. Em qualquer caso, as condições técnicas não determinam, isoladamente
dos demais contextos, o conjunto normativo, a organização das hierarquias e as
interações entre os atores.
Mercados
O segundo contexto de um sistema de relações de trabalho, enfocado por
Dunlop (1993) no capítulo 3 do IRS, é designado como o contexto dos mercados
ou das restrições orçamentárias14. Ele inclui o mercado do produto, o mercado
de trabalho, o mercado de insumos e os limites orçamentários. A definição de
quais são os mercados ou orçamentos específicos relevantes para a determinação
das normas depende, antes de tudo, do nível do sistema de relações de trabalho.
Além disso, há que se considerar, especialmente quando se trata de sistemas em
nível de planta ou de empresa, a propriedade do capital ou setor a que pertence
a unidade de produção, se público ou privado, pois, em geral, a competição em
mercados do produto é menos importante, ou absolutamente não o é, no caso de
unidades controladas ou de propriedade do Estado. Nessas unidades, particularmente quando seus produtos não são vendidos por um preço economicamente
significativo, o contexto relevante é o das restrições do orçamento público.
De modo similar ao contexto técnico, a operação dos mercados influencia a
determinação das normas não apenas de modo direto, nos processos decisórios,
mas ainda indiretamente ao afetar a organização interna dos atores e o modo como
estes se relacionam entre si. Em sua análise, Dunlop (1993) desenvolve essas associações, em primeiro lugar, ao considerar o mercado do produto e as restrições
orçamentárias, e, posteriormente, o mercado de trabalho. O mercado de insumos,
entretanto, não chega a merecer um comentário mais detalhado do autor.
A relação básica sugerida por Dunlop (1993) quanto ao mercado do produto é que o poder discricionário dos atores na determinação das normas em um
sistema de relações de trabalho depende do grau de controle que as unidades de
produção, individualmente ou em âmbito setorial, exercem sobre o preço e outros
aspectos da venda do produto. Portanto, a posição competitiva da unidade de
14 Daqui em diante, utilizaremos a expressão “contexto dos mercados” indistintamente, salvo quando for necessário
singularizar as restrições orçamentárias ou algum tipo de mercado em especial.
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produção é decisiva na fixação das normas. O paralelo desse aspecto de controle,
no caso de unidades do setor público, estaria no grau em que os atores conseguem
influenciar os processos orçamentários, de modo a abrandar as restrições que
pesam sobre seus sistemas singulares de relações de trabalho.
Dunlop (1993) não avança significativamente no desenvolvimento teórico
dos fatores que, ao determinarem a posição competitiva das unidades de produção, afetariam também a regulação da relação de emprego. Neste aspecto, ele
apenas menciona genericamente alguns determinantes da posição competitiva das
empresas segundo a ótica de estudos da organização industrial – número de concorrentes no mercado, liberdade de entrada, grau de homogeneidade do produto,
disponibilidade de produtos substitutos, fontes alternativas de oferta e grau de
essencialidade do produto. Mais ainda, uma importante lacuna no texto de Dunlop (1993) refere-se à falta de qualquer abordagem sobre a questão das estratégias
competitivas das empresas e o modo como influenciam as relações de trabalho.
Mais rico do que o desenvolvimento lógico é a série de ilustrações com
que o autor procura evidenciar a associação entre o controle de mercado ou de
orçamento e a definição de normas. À guisa de exemplo, algumas das proposições
expostas nessas ilustrações são as seguintes:
a) Diferenças crescentes e pronunciadas nas condições competitivas
das empresas tendem a enfraquecer os contornos prévios de igualdade salarial ou de uniformidade na mudança dos salários;
b) Os atores de um sistema podem buscar a fixação de políticas públicas que alterem as condições de competição no mercado de produto e, consequentemente, aumentem seu poder discricionário na
fixação de regras; e
c) Em sistemas de relações de trabalho vinculados a mercados instáveis, onde ocorrem variações substanciais nas condições econômicas em períodos curtos, os atores costumam firmar compromissos
por períodos também relativamente curtos.
Além de sua importância para a determinação das normas, o contexto do
mercado do produto age na própria configuração do sistema de relações de trabalho. Assim, “empresas que confrontam mercados do produto idênticos ou relacionados de modo muito próximo tendem a compor um mesmo sistema de
relações de trabalho ou seus sistemas são fortemente relacionados e interdepen-
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dentes”. (DUNLOP, 1993, p. 92, tradução dos autores). Nessas empresas, há uma
propensão à maior homogeneidade das normas aplicáveis à relação de emprego
do que entre empresas participantes de mercados distintos. Quando há um sistema de relações de trabalho em nível setorial, a adesão de uma empresa singular às
normas que prevalecem no sistema provê um padrão que reduz a ação arbitrária
da empresa, restringe seu poder discricionário e orienta as regras do local de trabalho com referência às de um grupo de outras empresas. As mudanças que ocorrem no mercado do produto podem, logicamente, alterar o escopo do sistema de
relações de trabalho e, no limite, desintegrar um sistema setorial pré-estabelecido.
Duas características-chave do contexto mercantil são (i) o grau de similaridade ou homogeneidade na posição de mercado e na estrutura de custo das
empresas que constituem o sistema e (ii) o tamanho das empresas. Quanto mais
similares a posição no mercado e os custos, tanto mais uniformes as normas e
mais centralizado o processo de sua fixação. Já a variedade nessas condições levará
a uma normatização menos uniforme e a processos decisórios descentralizados,
à exceção dos casos em que uma firma-líder ou a ação estatal impuserem extrema
centralização no processo de elaboração das normas. No setor público, a extrema
centralização é comum, com regulamentos que preveem normas para uma ampla
diversidade de locais de trabalho. No setor privado, contudo, normas uniformes
estabelecidas de modo formal em contextos de mercado diversificados padecem
de uma natureza genérica, o que deixa as previsões mais detalhadas para definição
em espaços descentralizados.
Quanto ao tamanho das empresas, Dunlop (1993) afirma que as empresas de
maior porte vivenciam uma necessidade maior de formalização das normas, uma
maior complexidade da rede de comunicação dentro das hierarquias de administradores e trabalhadores e uma necessidade de contratar pessoal especializado na
formulação e administração das normas. Há, nessas empresas, ainda, uma propensão a levar em conta questões de relações públicas na interação entre administração e trabalhadores, e é comum alguma participação mais direta do governo no
processo de elaboração normativa. Quando as grandes empresas possuem mais
de um estabelecimento, surgem problemas relacionados ao equilíbrio das condições de trabalho e à uniformidade das regras da empresa.
Outra questão levantada por Dunlop (1993) refere-se à relação entre o ritmo
de expansão do mercado do produto no longo prazo e os problemas enfrentados
pelas empresas, os quais exigiriam soluções específicas para as relações de trabalho.
No caso das empresas que experimentam expansão secular da demanda por seu
produto, é bastante provável haver uma expansão concomitante do emprego. Sur-
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gem, portanto, problemas relacionados, por exemplo, a recrutamento, contratação e
treinamento; ao desenvolvimento de padrões de trabalho e de normas disciplinares;
a regras de segurança para novas tecnologias; e à organização das hierarquias de trabalhadores e administradores. Já nas empresas com contração secular da demanda
pelo produto e, provavelmente, do emprego, os problemas envolvem a indenização
por despedida; os procedimentos no caso de fechamento de operações; a transferência de trabalhadores entre unidades de diferentes regiões; e planos de cooperação
entre sindicatos e a administração para conter o declínio.
As relações entre o mercado de trabalho e a teia de normas ocupam um
espaço de menor grandeza na exposição de Dunlop (1993). O autor propõe que
as normas são afetadas por características específicas da força de trabalho presente
e potencial, pelo grau de severidade do mercado de trabalho e pela razão entre
os custos do trabalho e o custo total. Dentre as características relevantes da força
de trabalho elenca-se seu grau de diferenciação pessoal quanto a etnia, idioma,
nacionalidade, raça e filiação religiosa e cultural; as características da área onde é
recrutada – por exemplo, o caso de trabalhadores agrícolas sem experiência industrial –; e as relações sociais e experiências das comunidades locais – por exemplo,
o grau de tensão e conflito na comunidade.
A par dos atributos pessoais e de outros aspectos atinentes a características
estruturais da oferta de trabalho, as condições de maior ou menor escassez dessa
oferta – e, portanto, de menor ou maior desemprego –, especialmente para as
habilidades e ocupações mais relevantes, também influenciam a formulação das
normas. Em geral, mercados com maior grau de severidade tendem a desenvolver
maior uniformidade normativa entre diferentes unidades de produção na mesma
região. E uma mudança nas condições de oferta e de demanda de trabalho afeta o
processo de formulação das normas, ainda que a transmissão não ocorra de modo
instantâneo, exigindo um período de maturação para também se manifestar em
mudança normativa.
Dunlop (1993) reserva para o final do capítulo uma discussão bastante interessante sobre a escolha do sistema de relações de trabalho de que fará parte uma
empresa ou unidade de produção. O contexto dos mercados joga um papel decisivo nessa escolha. Segundo Dunlop (1993), a preferência da administração normalmente recai sobre empresas ou locais de trabalho sujeitos a condições semelhantes de mercado de produto, ao passo que os representantes dos trabalhadores
preferem se associar a sistemas com semelhanças de mercado de trabalho e com
normas mais favoráveis. Não há uma maneira simples de resolver esse conflito de
preferências, sendo possível imaginar-se uma variedade de soluções de compro-
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misso, desde que nenhum dos atores se mostre altamente insatisfeito. No caso de
uma forte disjunção entre os contextos e o sistema de relações de trabalho, é de se
esperar que administradores e trabalhadores, conforme seus recursos específicos,
forcem uma mudança no sistema – por exemplo, os administradores podem liquidar a unidade de produção ou mudar o tipo de produto para compatibilizá-lo com
as condições de concorrência; os trabalhadores podem realizar operações-padrão.
Poder
Algumas normas – como é o caso dos direitos das organizações dos atores,
do direito de greve e lockout, da resolução de disputas, bem como das regras que
determinam a formação e as funções das comissões de fábrica ou dos delegados
sindicais – relacionam-se apenas remotamente com os contextos técnicos e de
mercado. Esses tipos de regras são derivados, segundo Dunlop (1993), do contexto do poder, entendido como sendo a cristalização de uma dada distribuição do
poder em uma sociedade. Ao analisá-lo, no capítulo 4 do IRS, o autor afirma que
esse elemento do ambiente afeta o status dos atores e os procedimentos para o
estabelecimento e a administração das normas em um sistema de relações de trabalho. Tal como já foi destacado anteriormente, uma dada distribuição de poder
na sociedade configura uma situação de status dos atores, que, por sua vez, afeta a
autoridade dos mesmos no estabelecimento e na administração das normas.
O status refere-se ao complexo de normas que define o inter-relacionamento
formal dos atores em um sistema. Mais precisamente, o status é definido como as funções prescritas para os atores e suas relações com os outros atores no mesmo sistema.
Essas funções e relações podem ser impostas pela comunidade – como é o caso da
legislação em um sistema nacional – ou podem se desenvolver dentro de um sistema
e, então, podem ser confirmadas por sanções ou reconhecimento da comunidade.
Diferentemente das regras derivadas dos contextos técnicos e de mercado,
as normas que definem o status do atores constituem traços consideravelmente
uniformes e estáveis ao longo do tempo dentro de um sistema nacional de relações de trabalho. Esse tipo de norma é a que apresenta maiores diferenças entre
os países; por essa razão, é utilizado tanto para caracterizar os sistemas nacionais
de relações de trabalho singulares quanto para compará-los entre si.
Dunlop identifica três situações quanto ao status dos atores: o status dos
empregados e suas organizações; o status das organizações de empregadores (ou
administradores); e o status das agências governamentais. O status dos trabalha-
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dores e suas organizações, em um sistema nacional, é descrito como uma rede
de inter-relações com a hierarquia de empregadores, as organizações de trabalhadores rivais ou potencialmente rivais e as agências governamentais, assim como
também se refere à organização interna da hierarquia. O autor afirma que o status
dos empregados em relação aos administradores apresenta um amplo leque de
situações. Em alguns sistemas qualquer forma de organização dos trabalhadores é proibida, enquanto em outros elas são permitidas ou toleradas. O leque de
situações inclui casos em que a permissão para o reconhecimento formal dessas
entidades de parte dos administradores depende de registro oficial, de certificação,
de aprovação ou de designação do governo. O reconhecimento formal pode ser
compulsório, em conformidade com os acordos estabelecidos nacionalmente,
com as decisões governamentais, ou com os regulamentos empresariais. O status
das organizações de trabalhadores é, igualmente, expresso nas funções prescritas
para sindicatos, conselhos de empresa ou para outros tipos de organização trabalhista. Em alguns países essas funções podem ser muito restritas, ao passo que em
outros elas podem contemplar um vasto conjunto de obrigações e responsabilidades. As relações entre uma organização de empregados e organizações rivais e o
modo de operar interno à organização podem ser deixados inteiramente à decisão
dos trabalhadores ou podem ser prescritos pelos governos. Finalmente, há casos
em que o governo tem poder de intervir, em grau variado, nos assuntos internos
das organizações de trabalhadores, de controlar suas finanças, de colocar limites à
sua formação, de dissolver as organizações existentes, ou de melhorar ou ampliar
sua situação e funções na sociedade.
O status das organizações de empregadores é definido como a rede de inter-relações com os trabalhadores e suas organizações (quando estas existem), com
as hierarquias de administradores rivais e com as agências governamentais. O status das organizações patronais em relação às de trabalhadores reflete-se na natureza da autoridade exercida pelos administradores sobre os trabalhadores nos locais
de trabalho. Aqui o foco recai sobre o caráter da determinação de normas pelos
administradores, e não sobre a filosofia ou ideologia administrativa. O espectro dos
SNRT inclui desde países em que há pouca ou nenhuma restrição à autoridade
patronal até aqueles em que sua autoridade é fortemente constrangida pelas organizações de trabalhadores, pelos governos e mesmo pelas associações patronais.
O status das organizações de empregadores varia de sistema para sistema.
Em alguns países essas entidades competem entre si pela autoridade de estabelecer acordos com trabalhadores, para representar os empregadores nos tribunais,
ou para ter assento em comitês ou comissões governamentais. As regulamentações governamentais tipicamente estabelecem se as associações de administrado-
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res têm direito exclusivo para fazer acordos com as organizações de trabalhadores
em um setor ou localidade, ou se elas estão sujeitas à competição aberta de outras.
Essas regulações também estabelecem as condições do registro dessas entidades
para fins de representação dos interesses dos empregadores em tribunais.
O status das associações de empregadores em relação ao governo se refere
ao grau de participação do governo na atividade produtiva. Nos diversos países há
uma combinação, em graus variados, do público e do privado. Em um extremo do
espectro estão os sistemas em que há uma larga predominância das empresas privadas, enquanto no outro estão as sociedades em que o setor público cobre quase
inteiramente a economia. Dunlop menciona diferentes situações em um mesmo
mercado do produto onde empresas públicas podem competir com empresas
privadas. Os empreendimentos podem ser organizados na forma de utilidades
públicas (public utilities) e podem estar sujeitos à regulamentação governamental quanto às principais decisões, inclusive as relacionadas com os trabalhadores.
Outro tipo são as empresas mistas, que combinam capital privado e estatal, as
quais estão sujeitas, em diferentes graus, ao comando governamental. A condição
das empresas – e, por conseguinte, dos administradores – em relação ao governo
afeta suas relações com os trabalhadores. Assim, quando os empregadores são
mais suscetíveis às pressões das autoridades governamentais abrem-se perspectivas para as organizações de trabalhadores influenciarem os administradores.
Finalmente, o status das agências governamentais diz respeito ao seu papel
na determinação de normas substantivas diretamente ou através da determinação
de normas para a interação entre empregadores e empregados. Isso inclui o direito de greve e de lockout, o acordo coletivo, a sentença normativa ou a regulação
substantiva do lugar de trabalho pelo governo, bem como sua extensão e os procedimentos para sua administração e aplicação a casos particulares. Os aspectos-chave considerados por Dunlop constituem a estabilidade e o grau de previsibilidade das normas, os quais se associam ao tipo de governo e à conjuntura. De
um lado, estão os governos democráticos ou constitucionais que seguem normas,
tradições ou práticas costumeiras. No lado oposto estão os regimes ditatoriais
nos quais as decisões podem ser arbitrárias e os dirigentes não são restringidos
por normas constitucionais. Outro aspecto que afeta a produção das normas são
os períodos de instabilidade política (como guerras), nos quais tende a crescer o
papel do governo nas relações de trabalho.
Quanto ao papel do governo no estabelecimento de normas de forma direta, os tipos de normas incluem as leis, as sentenças dos tribunais e as decisões
de agências administrativas, a permissão para o ajuste de alguns tipos de normas
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em acordos coletivos e a formulação de regras por empregados e empregadores
que exigem aprovação governamental prévia para serem colocadas em prática.
Já no que se refere aos procedimentos formais para a resolução das disputas de
interesse entre as partes, tal como no caso das normas substantivas, o regramento
pode ser semelhantemente estabelecido por lei, por sentenças dos tribunais, nos
acordos coletivos, ou, ainda, pode ser proposto pelas partes e submetido à aprovação governamental.
O autor assinala que alguns tipos de normas são estabelecidos centralmente
pelas autoridades governamentais – por exemplo, as pensões e as aposentadorias
–, enquanto outras, tais como as normas relativas a disciplina ou a transferências,
podem ser (ou exigem que sejam) fixadas em esferas menos centralizadas. O ponto essencial, não obstante, é que algumas normas necessitam ser determinadas
centralizadamente e, portanto, devem ser estabelecidas pelo governo. Quando
problemas especiais (more specialized problems) se tornam objeto de determinação centralizada, as regras são normalmente formuladas em termos gerais, ao
passo que o conteúdo específico é remetido a níveis inferiores do sistema nos quais
o governo desempenha um papel menos direto. A determinação centralizada das
normas inclui, entre outras questões, as relações formais entre as organizações de
empregados e de empregadores, os procedimentos para a resolução de disputas, a
seguridade social, a fiscalização do trabalho e o salário mínimo.
Desenvolvimento de Sistemas Nacionais
de Relações de Trabalho
Os quatro primeiros capítulos do IRS expõem os lineamentos básicos dos sistemas de relações de trabalho na obra de Dunlop (1993); neles, apresentam-se o conceito e a estrutura de um sistema e se discute a importância de cada um dos contextos para a definição da rede de normas. Os capítulos intermediários que lhes seguem
ilustram o poder explicativo da abordagem sistêmica a partir de dois casos setoriais
examinados sob um enfoque de estática comparativa. Esse enfoque, contudo, não encerra a exposição de Dunlop (1993). Conforme o próprio autor assinala, “perspectiva
histórica e uma apreciação da mudança ao longo do tempo são essenciais para a teoria
das relações de trabalho”. (DUNLOP, 1993, p. 227, tradução dos autores). Consequentemente, uma análise longitudinal é apresentada nos capítulos 7 e 8, a qual trata,
respectivamente, do desenvolvimento de sistemas nacionais de relações de trabalho
e das relações entre o desenvolvimento econômico e as normas do local de trabalho.
Nesta seção, procuramos destacar os aspectos-chave da contribuição dunlopiana ao
estudo dos sistemas nacionais de relações de trabalho.
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Dunlop (1993) inicia sua análise dos SNRT através do enunciado de duas
hipóteses centrais: (i) “as características principais de um sistema nacional de relações de trabalho parecem fixar-se em um estágio relativamente inicial do desenvolvimento industrial de um país”; e (ii) “os estágios iniciais do desenvolvimento
industrial são decisivos para a estruturação de um sistema nacional de relações
de trabalho, excetuando-se os casos de recomeços em virtude de revoluções políticas”. (DUNLOP, 1993, p. 227, tradução dos autores). A formação do SNRT
é afetada por fatores como a herança cultural específica do país, o estágio de seu
desenvolvimento econômico, o momento da história mundial contemporâneo da
formação do sistema, a sequência de mudanças políticas e sociais no país que
antecedem a formação do sistema, e as características e objetivos das elites que
lideram o processo de industrialização. Uma vez estabelecidas suas características
estruturais, um SNRT experimenta certa inércia em sua trajetória, a qual é acompanhada por mudanças de ordem marginal, enquanto as mudanças de sistema
dependem de rupturas políticas mais profundas.
Alguns fatores específicos no curso do desenvolvimento econômico parecem
incidir mais intensamente sobre a trajetória de um SNRT, isto porque “os atores
experimentam mudanças que afetam seu status e as relações dentro do sistema”.
(DUNLOP, 1993, p. 233, tradução dos autores). Uma lista de mudanças nas hierarquias de administradores e de trabalhadores e no governo que afetam diretamente as relações de trabalho inclui: alterações na rotatividade e no absenteísmo,
reconciliação com a condição de força de trabalho industrial e o desenvolvimento de um corpo comum de ideias (ideologia) entre os trabalhadores individuais;
maior proporção de técnicos e de trabalhadores especializados e de staff administrativo, gerencial e de nível superior na composição da força de trabalho, com requerimentos de treinamento mais intenso; organização de uma proporção maior
da força de trabalho, aumento dos recursos e profissionalização de líderes das
organizações de trabalhadores; tendência ao desenvolvimento de procedimentos
formais para reivindicações trabalhistas e uso da greve e da ameaça de greve por
meio de disciplina organizacional; surgimento de uma gerência profissional mais
sensível para construir organizações e lidar com os trabalhadores nas empresas;
fortalecimento do papel do governo, que se torna um importante empregador,
regulador e executor de políticas; e, por fim, tendência à expansão de uma rede de
normas detalhadas aplicáveis aos locais de trabalho.
A par dos fatores associados às condições técnicas e de mercados ao período da história mundial em que se deflagra a industrialização, à sequência dos
desenvolvimentos sociopolíticos e ao processo de desenvolvimento econômico
do país, Dunlop (1993, p. 234, tradução dos autores) assinala que “uma influência
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final decisiva na evolução de um sistema nacional de relações de trabalho é a estratégia ampla da elite que dirige o programa de industrialização do país”. Em uma
abordagem frequente nos anos 1950, o autor identifica três tipos ideais de elites –
elite dinástica-feudal, elite de classe média e elite revolucionária-intelectual – e os
associa a diferentes estratégias de industrialização.15 Em cada processo nacional
específico de industrialização há dez questões principais com que se confrontam
os arquitetos de um SNRT. Segundo Dunlop (1993, p. 235, tradução dos autores),
“um sistema nacional de relações de trabalho desenvolve-se conforme a elite dirigente da sociedade mais ampla se confronta com essas questões comuns e gradualmente formula um corpo de respostas mais ou menos consistentes na prática”.
Essas questões são as seguintes:
I. Qual deve ser a relação da gerência com os trabalhadores?
II. Qual deve ser a relação dos trabalhadores com a gerência?
III. Qual a função das organizações dos trabalhadores?
IV. Qual o grau de competição entre as organizações de trabalhadores
que deve ser permitido?
V. Qual será a estrutura do movimento dos trabalhadores?
VI. Como as organizações dos trabalhadores serão financiadas?
VII. Qual deve ser a fonte da liderança trabalhista?
VIII. Que atitude deve ser adotada em relação ao conflito trabalhista?
IX. Como as disputas serão resolvidas e quem deterá a balança de
poder?
X. Quais serão os campos de interesse dos especialistas universitários?
Dunlop (1993) conclui sua análise ao expor, ainda que de forma bastante
sintética, as respostas típicas de cada elite industrializante às dez questões principais. Assim, por exemplo, no que se refere à organização dos trabalhadores, a elite
dinástica-feudal admitiria funções sociais em nível de planta, porém com fraca
constrição sobre a gerência; a elite de classe média acomodaria um papel regula15 Esta análise é tratada com mais detalhes no Industrialism and Industrial Man. Ver, em especial, a síntese apresentada no capítulo X em Kerr et al. (1963).
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tório nos níveis local e de setor, com aceitação de independência política; e a elite
revolucionária-intelectual as veria como um instrumento do partido para educar e
liderar os trabalhadores, assim como para estimular a produção.
A Ausência de Dunlop no Brasil: Comentário Exploratório
O contraste entre a enorme influência exercida pelo Industrial Relations Systems nos estudos sobre as relações de trabalho em geral – particularmente nas comparações entre sistemas nacionais – e sua virtual ausência como referência explícita
de pesquisa na academia brasileira merece um comentário, ainda que meramente exploratório, sobre as possíveis razões dessa ausência. A hipótese que sugerimos é a de
que a limitada recepção de Dunlop no Brasil decorre de uma combinação entre dois
fatores. O primeiro deles diz respeito à existência, em nosso país, de uma base fática
consideravelmente diferente daquela em que vicejou o IRS, assim como diferente
do objeto primordial de estudos do IR norte-americano desde meados dos anos
1930 – a saber, a regulação conjunta da relação de emprego por meio de negociação
coletiva entre sindicatos e empresas. O segundo fator é o florescimento, nas escolas
de economia e sociologia brasileiras, de estudos sobre o trabalho ancorados em tradições intelectuais opostas e/ou desinteressadas (e, em alguns casos, refratárias ao
pensamento proveniente dos Estados Unidos) no método, no arcabouço conceitual
e nas soluções normativas para lidar com as relações de trabalho segundo o IR.
Não obstante a referência explícita irregular ao arcabouço dunlopiano na
pesquisa brasileira e a falta de uma edição nacional do IRS – o que imediatamente
contrasta com a expressiva presença editorial que a obra obteve em outros países,
inclusive os de língua espanhola –, a expressão “sistemas de relações de trabalho” foi amplamente acolhida no Brasil em período mais recente, e hoje é de uso
corrente em diferentes locus acadêmicos, profissionais e de representação de interesses que envolvem as relações de trabalho. Galvão (2002, p. 8-11), em sua nota
bastante crítica ao conceito de Dunlop (1993), bem assinala que a expressão veio
a se incorporar à literatura brasileira de fins dos anos 1990 através da economia
do trabalho e do direito, com extensões a outras áreas da academia e da prática
sindical.16 No entanto, a ampla acolhida da expressão “sistema de relações de
trabalho”, tributária da obra de Dunlop (1993), não se traduziu necessariamente
na recepção do enquadramento teórico por ele desenhado. O uso da terminologia sistêmica inscreve-se, majoritariamente, em uma perspectiva polissêmica que,
no mais das vezes, não traduz a complexidade dos significados empregados pelo
16 As menções anteriores ao conceito de sistema na literatura especializada brasileira (e sobre o Brasil) são esparsas,
podendo-se apontar os textos pioneiros de Mericle (1974); Rodrigues Netto (1983) e Pastore e Zylberstajn (1988).
Em nenhum deles, todavia, há referência explícita a Dunlop (1993).
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autor; apenas remete à existência de relações de interdependência e de interpenetração das variáveis que concorrem para a explicação dos fenômenos ligados à
relação de emprego.
A abordagem do IR para as relações de trabalho, dentro da qual se deve situar o texto de Dunlop, tem suas origens mais próximas nas obras de Sidney e Beatrice Webb, na Grã-Bretanha, e de John Rogers Commons, nos Estados Unidos.
Kaufman (2004), em sua mencionada história sobre esse campo de estudos, não
apenas situa nos Estados Unidos o espaço de nascimento do IR, num processo
que se desdobrou em múltiplas iniciativas acadêmicas e profissionais durante os
anos 1920, como também demonstra que, pelo menos até a década de 1960, a
difusão dessa tradição de pesquisa e de administração dos conflitos do trabalho
se circunscreveu, basicamente, a um espaço anglo-americano (Estados Unidos,
Reino Unido, Canadá, Nova Zelândia e Austrália). Com a criação da Associação
Internacional de Relações de Trabalho (International Industrial Relations Association), em 1966, o campo de estudos viria a expandir consideravelmente suas
fronteiras, encontrando adeptos em todos os continentes.
Se tomarmos, portanto, os anos 1960 como um momento em que seria
provável o ingresso da tradição do IR, em particular do IRS, no Brasil, é razoável supor que a obra de Dunlop não tenha merecido a devida atenção antes de
tudo porque poderia ser-lhe atribuída uma certa incapacidade de lidar com o caso
brasileiro. Nesse período, as bases do sistema brasileiro de relações de trabalho
encontravam-se assentadas e correspondiam ao regime instituído nos anos 1930,
notadamente um sistema marcado pelo forte intervencionismo estatal na regulação das relações trabalhistas em geral e na organização e na ação dos atores
sociais. As entidades sindicais patronais e, sobretudo, de trabalhadores, careciam
de liberdade para exercer plenamente sua função de representação de interesses
e, portanto, para negociar livremente os termos da relação de emprego.17 Esse
modelo contrastava fortemente com o modelo norte-americano pós-New Deal,
caracterizado na literatura como um sistema de regulação baseado na negociação
coletiva (collective bargaining-based industrial relations).
Assim, quem quer que tenha recebido uma notícia sobre o IRS na década de
1960, pode muito bem ter descartado sua utilidade para o estudo do caso brasileiro sob a premissa de que a obra abordaria exclusivamente os sistemas em que a
regulação conjunta e a hierarquia dos trabalhadores detenham alguma importân17 Mais recentemente, a partir de Noronha (1999, 2000), pesquisadores passaram a designar o modelo brasileiro
como “legislado”, enfatizando a forte primazia estatal na criação da norma. Já Pichler (2002, 2009) utiliza a expressão “modelo estatutário de barganha” para destacar que, a par da primazia estatal, a partir de fins da década
de 1970 ampliou-se, consideravelmente, a prática da negociação coletiva, alargando seu papel na regulação das
relações de trabalho.
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cia para a definição das normas – o que se põe em visível contraste com um sistema em que a função de regulação das relações de trabalho se exerce pelo Estado
por meio da lei, de uma justiça especializada e do controle sobre as organizações
patronais e de trabalhadores, fazendo com que as demandas dos empregados e
os conflitos trabalhistas em geral sejam encaminhados ao escrutínio de magistrados em vez de solucionados pelas partes por meio de processos negociados.
Tal leitura sobre o objeto do IRS, ainda que em nosso entender se equivoque ao
limitar sua abrangência a processos formalizados de negociação coletiva, estava
em conformidade com o fato de a academia norte-americana concentrar seus
estudos sobre as relações de trabalho justamente em temas sobre sindicatos e
negociação coletiva.
A identificação do IRS como sendo uma obra sobre sistemas de negociação
coletiva, por mais que nos pareça equivocada, encontrou guarida em um sem-número de pesquisadores das relações de trabalho. Kaufman (2004, p. 254, tradução
dos autores), por exemplo, escreve:
[...] embora, em princípio, a noção de um sistema de relações
de trabalho seja genérica e cubra todas as formas de relações
de emprego, na exposição de Dunlop a ideia é grandemente
contígua das formas coletivas e organizadas de relações de
trabalho (por exemplo, sistemas de relações entre gerentes e o
trabalho organizado).
No Brasil, uma expressão dessa identidade está na afirmação de Melo e Carvalho Neto (1998, p. 39) de que “o modelo dunlopiano baseia-se no instituto da
negociação coletiva”. Portanto, uma primeira explicação para o longo silêncio
sobre o IRS no Brasil está na virtual ausência, até o final dos anos 1970, de regulação das relações de trabalho conjuntamente por empresas e sindicatos mediante
negociação coletiva.
Esse primeiro fator explicativo remete, ademais, à cultura política brasileira
no que se refere ao modo de encarar o conflito trabalhista. No Brasil, atores
relevantes da cena trabalhista apresentam um longo histórico de dificuldades para
conviver com a pluralidade de interesses e o conflito inerente à relação de emprego. Há muito tempo o conflito é valorado negativamente, algo que deve ser
eliminado, expurgado, absorvido pelo Estado. A necessidade da permanente ação
direta do Estado sobre as relações de trabalho projeta-se como o fio condutor da
prática política hegemônica no Brasil. Na versão getulista, essa necessidade foi
sistematicamente reiterada, como ilustra o seguinte excerto de Getulio Vargas:
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A organização do trabalho, no sentido que se lhe deve dar,
num momento conturbado e de profundas transformações
sociais e econômicas como a atual, não pode realizar-se com
proveito para as classes patronais e benefícios para os operários, senão mediante inteligente, ponderada e sistemática coordenação para conciliar e garantir os seus mútuos interesses
[...] (HUMPHREY, 1982, p. 19).
O esquema dunlopiano parte da premissa da legitimidade da organização
e da ação dos atores na defesa dos seus interesses, não cabendo ao Estado um
papel de tutela absoluta. De modo consistente com essa visão, Dunlop (1993) e
seus companheiros da corrente institucionalista do trabalho posicionaram-se do
lado oposto ao dos economistas da Escola de Chicago, que professavam a necessidade de eliminar a interferência nociva dos sindicatos na regulação da relação
de emprego. Para os institucionalistas, a sociedade deve reconhecer os sindicatos
como representantes legítimos dos trabalhadores. Portanto, o IRS poderia ser entendido não apenas como texto destituído de poder explicativo do caso brasileiro
(dimensão teórica), mas também em completo desacordo com a prática política
predominante no País para a solução dos conflitos do trabalho (dimensão de
solução de problemas).
A hipótese sobre a percepção de limitada utilidade do IRS em sua dimensão
teórica reforça-se ao lembrarmos que, considerando os usos que Dunlop atribuía
à sua obra – comparações entre setores de atividade e empresas num dado sistema, comparações entre sistemas nacionais de relações de trabalho no curso do
desenvolvimento –, são exatamente os estudos sobre comparações internacionais
que mais vêm se utilizando do arcabouço dunlopiano. Tais comparações, salvo
muito recentemente, não atraíram a atenção da academia brasileira.
O Industrial Relations Systems não teria recebido guarida na pesquisa brasileira
não apenas em decorrência de sua suposta pouca utilidade para entender o País
ou para prover soluções aos conflitos do trabalho diante do legado autoritário
brasileiro, mas também porque importantes tradições teórico-metodológicas de
estudos do trabalho na economia e na sociologia, em larga medida dominantes
no Brasil dos anos 1960, não abrigavam os enfoques anglo-americanos do IR. No
caso da economia, as duas principais vertentes de ensino e pesquisa sobre o mercado de trabalho inspiravam-se em fonte concorrente da abordagem sistêmica do
IR – a economia neoclássica – ou aparentemente desinteressada nessa abordagem
– o estruturalismo-marxismo da Comissão Econômica para a América Latina e
o Caribe (CEPAL). Quanto à primeira, basta referir que um dos principais fundamentos na criação do campo de estudos das relações de trabalho nos Estados
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Unidos esteve justamente na oposição, teórica e normativa, à premissa tipicamente neoclássica de que o trabalho é uma mercadoria similar a qualquer outra. Já em
relação à tradição cepalina, não deixa de ser intrigante, dada a sua contiguidade,
que a literatura da economia institucionalista do trabalho norte-americana do tipo
IR não tenha recebido atenção igual à que receberam os teóricos dos mercados
segmentados de trabalho.
No campo da sociologia brasileira, cujos estudos sobre o trabalho haviam
iniciado algumas décadas antes da publicação do IRS, as razões para seu fechamento a essa obra talvez sejam ainda mais claras, remetendo a uma crítica aos seus
supostos conservadorismo e vínculo com o funcionalismo de Parsons (1951). É
sabido que Dunlop concentra seus argumentos sobre o funcionamento dos sistemas de relações de trabalho nos marcos de uma economia industrial capitalista.18
Isso, no entanto, está obviamente longe de nos fazer crer que o arcabouço conceitual e as descobertas analíticas decorrentes de suas pesquisas empíricas sejam
conservadores ou desprezíveis. Dunlop, ao acolher a ideia de conflito como algo
inerente ao funcionamento das sociedades industriais, posiciona-se fora do que
se poderia chamar de strong funcionalism, corrente hegemônica nas interpretações
sociológicas da época. Essa corrente postulava que a coesão ou ordem social se dá
como fruto de um consenso partilhado por todos, expurgando a ideia de conflito.
Ao contrário do funcionalismo, a ideia de conflito – que coexiste com as ideias
de cooperação e consenso – está presente no centro e opera como motivação do
enfoque analítico e das perspectivas normativas de Dunlop para as relações de
trabalho. E seu enfoque sistêmico sobre essas relações seguramente não é uma
aplicação da teoria de Parsons sobre o funcionamento da sociedade.19
Lições do Industrial Relations Systems
Transcorrido mais de meio século desde a edição pioneira do Industrial Relations Systems, mudanças na economia e na sociedade construíram um mundo
do trabalho que em muitos aspectos difere daquele no qual Dunlop escreveu
sua obra. Entre outras transformações representativas, as últimas décadas viram
surgir um sem-número de inovações tecnológicas e organizacionais aplicadas à
produção. Novos arranjos produtivos foram desenhados em todos os países industrializados e surgiram novas institucionalidades nas relações entre capital, trabalho e governo nos níveis micro, meso e macrorregulatórios.
18 Cabe lembrar, todavia, que o enfoque sistêmico propunha-se a explicar a criação de normas aplicáveis às relações
de trabalho independentemente do modo predominante de produção. Dunlop e seus parceiros do Estudo Interuniversitário examinaram diferentes tipos de economia, neles incluídos os de planejamento central.
19 A propósito das diferenças entre Parsons e o enfoque sistêmico de Dunlop (1993), ver Wood et al. (1975).
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No entanto, é preciso ter presente que aquelas transformações não alteraram, completamente, todas as dimensões do trabalho. O novo coexiste com o
velho; observam-se, também, continuidade, resiliência, inércia. A automação flexível, por exemplo, pode ter aplicação simultânea com os padrões organizacionais
tipicamente tayloristas. Sindicatos de trabalhadores e patronais podem resistir em
afastar-se da tutela estatal por força da cultura política presente em determinada
formação social. Se o mundo do trabalho mudou, mas não é absolutamente novo,
retomar o exame do IRS nos posiciona diante de questões como se nele ainda
existem elementos analíticos relevantes para entender o mundo do trabalho e que
elementos são esses.
A obra de Dunlop (1993) merece ser destacada, primeiramente, em virtude
da produção de uma reflexão sistemática e teórica sobre as relações de trabalho.
Muito antes desse autor, ao longo de toda a modernidade ocidental, os estudos
sobre o trabalho, seus atores e instituições estiveram presentes em vasta literatura.
Porém, no IRS, as relações de trabalho são enquadradas na condição de um objeto
de estudo particular – o sistema de relações de trabalho – com um corpo teórico
próprio. Ainda que o resultado final permaneça aberto às mais variadas disputas,
um mérito claro de Dunlop (1993) reside exatamente em sua insistência para com
a necessidade de formulação teórica num campo de estudos, o do industrial relations, até então caracterizado por um excesso de estudos descritivos. Como o autor aponta no prefácio, este era um campo em que “os fatos vêm ultrapassando as
ideias. Uma teoria integrativa tem ficado bem atrás da experiência em expansão”.
(DUNLOP, 1993, p. x, tradução dos autores). Dunlop (1993) lançou-se, então, em
busca de um arcabouço conceitual e teórico que permitisse interpretar esses fatos
e práticas das relações de trabalho.
Em sua busca de uma teoria geral, Dunlop (1993) amplia o escopo analítico
das relações de trabalho. Estas são enquadradas como o resultado de uma diversificada teia de relações e interações, em um entendimento que supera abordagens
que enfatizam dimensões particulares, como a técnica (Taylor) ou a psicossocial
(Elton Mayo). No Industrial Relations Systems, as relações de trabalho inserem-se em
um patamar de complexidade com múltiplos condicionantes e relações de interdependência. A empresa, conquanto seja o núcleo do sistema de produção e da
relação de emprego, não é tomada como o locus exclusivo e insulado das relações
de trabalho. As práticas das relações de trabalho, no arcabouço do IRS, sujeitam-se a imperativos de variada natureza, tais como técnicos, de mercado, ideológicos
e de distribuição de poder.
Através da abordagem sistêmica, o IRS valoriza as relações de interdependên-
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cia dos atores das relações de trabalho, quer estes sejam vistos individualmente –
trabalhadores e empregadores –, quer sejam tomados de modo organizado – como
na formulação dunlopiana das hierarquias – ou institucional. Sem enfrentar, aqui, as
discussões gerais das ciências sociais em torno do enfoque sistêmico, cabe assinalar
que essa perspectiva relacional torna evidente, ainda, tanto a existência de conexões
e nexos entre diferentes dimensões das relações de trabalho quanto as estruturas
sociais subjacentes na conformação das normas que regulam essas relações.
No âmbito da dimensão metodológica, a obra de Dunlop sugere uma valorização da investigação empírica. Nisto reside uma diferença fundamental entre
ele e o sociólogo Talcott Parsons (1902-1979). Parsons preocupou-se menos com
a problematização de dimensões empíricas da realidade, direcionando sua energia
intelectual para a elaboração de uma intrincada teoria, marcadamente abstrata e
com pretensões totalizantes, sobre o funcionamento da sociedade. No IRS, porém, o sistema não possui uma existência acima dos atores concretos, dos mercados, da tecnologia, da ideologia e das relações de poder. Em suma, o sistema
de relações de trabalho não existe fora da história e dos contextos em que os
atores interagem. Dunlop desenvolveu um esforço de pesquisa empírica nas mais
diferentes realidades do trabalho, inclusive fora dos Estados Unidos, buscando
apreender o funcionamento de sistemas de relações de trabalho e a elaboração
das normas. A norma é vista como expressão de relações sociais históricas que
precisam ser apreendidas mediante sistemático trabalho de investigação empírica.
Ainda que não encontremos tal postulação de modo explícito no IRS, decorre, do modo como Dunlop define e elabora seu objeto de estudo, o enquadramento multidisciplinar do campo das relações de trabalho. Podemos dizer que
Dunlop, ao examinar diversas realidades empíricas, mostra que a formação da
norma e aquilo que ela procura estruturar nas relações entre os atores só são
compreendidos através do entendimento de singularidades culturais, econômicas,
religiosas e políticas próprias de cada formação social. E que o sucesso de tal empreendimento demanda o concurso de diversos campos de conhecimento.
Por fim, cabe ressaltar uma dimensão política central que decorre da obra de
Dunlop, ou seja, o reconhecimento de que as relações de trabalho abrigam interesses diferentes, o que é designado como perspectiva pluralista. Tal perspectiva
não raramente se mescla com elementos analíticos da obra do autor. Uma de suas
consequências principais é a noção de que as relações de trabalho podem expressar o consenso, mas também o conflito, algo a que normalmente se refere como
o motivo misto da cooperação e do conflito.20 Há, portanto, na obra de Dunlop
20 Dunlop (1993), portanto, distancia-se dos marxistas, que consideram irreconciliável a relação entre capital e trabalho; das correntes que não aceitam os sindicatos independentes como interlocutores legítimos dos trabalhadores
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um esforço para posicionar o conflito como algo inerente às relações de trabalho,
pois estas abrigam, em seu interior, interesses divergentes. Da mesma forma, o
pluralismo dunlopiano implica que os atores sejam efetivamente protagonistas na
resolução dos conflitos.21
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e veem em sua ação um entrave ao sucesso econômico das empresas; e das correntes interpretativas das relações
de trabalho que postulam ser a empresa uma comunidade de interesses comuns, cujos atores teriam objetivos
idênticos (unitarismo).
21 Em países de tradição voluntarista a afirmação sobre o protagonismo dos atores é normalmente tomada com
maior grau de aceitação do que em países onde a diferença dos interesses de empregadores e de empregados é
massivamente negada, sendo o conflito entre capital e trabalho entendido como um mal a ser remediado por meio
da ação do Estado, que tutela os atores.
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PARTE 1
NEGOCIAÇÕES COLETIVAS
E TRANSFORMAÇÕES
NA ORDEM ECONÔMICA
MUNDIAL: SUBORDINAÇÃO
OU PAPEL ATIVO?
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MÉXICO: TRANSFORMACIONES
PRODUCTIVAS Y DESARROLLO DE LAS
NEGOCIACIONES COLECTIVAS
DE 1980 A 2010
Clemente Ruiz Durán1
Rasgos Estilizados de la Crisis de la Deuda como Punto de
Partida de la Transformación Productiva
La crisis de la deuda externa, que tuvo lugar en la década de los años ochenta, marcó un nuevo rumbo para la economía mexicana. Hasta ese momento, el
país había logrado uno de los procesos de industrialización más exitosos entre
los países en desarrollo. Sin embargo, no había puesto metas a las empresas establecidas en el país para generar divisas, por lo que el mercado de divisas se
alimentaba de una pequeña base exportadora, fundamentada en el petróleo, y
de la deuda externa que contrataba el gobierno federal. A principios de los años
ochenta, alrededor del 85 por ciento de las divisas provenían de las exportaciones
petroleras y de la contratación de deuda, por lo que al desplomarse el precio del
petróleo en 1982, y al elevarse la tasa de interés de la deuda externa, México tuvo
que emprender el camino del cambio estructural, el cual se puede resumir en los
siguientes elementos:
a) Reestructurar la planta productiva de un modelo fundamentado en el
abastecimiento del mercado interno, a uno orientado hacia la exportación: el objetivo era que el mercado de divisas funcionara con base en las exportaciones y
la inversión extranjera, buscando sustituir al mecanismo de financiamiento de la
balanza de pagos basado en deuda externa. De esta manera, los ingresos por exportaciones tuvieron un gran crecimiento al pasar de 24 mil millones de dólares,
en 1980, a 343 mil millones de dólares en 2008. (ver Gráfico 1).
1 Profesor e investigador del Posgrado en Economía de la Universidad Nacional Autónoma de México
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Gráfico 1 – México: Expansión del Modelo Exportador 1980 a 2008
Fuente: Elaboración Propria con base en la Balanza de Pagos del Banco de México.
b) Reducir la dependencia de las divisas provenientes de las exportaciones
petroleras, para lo cual se promovió la ampliación de las capacidades manufactureras, bajo un esquema promotor de las exportaciones (ver Gráfico 2); asimismo,
se firmó un Tratado de Libre Comercio con Estados Unidos y Canadá (TLCAN).
Gráfico 2 – México: Cambio Estructural en la Composición de las
Exportaciones
Fuente: Elaboración Propria con base en la Balanza de Pagos del Banco de México.
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c) Reestructuración del Estado, pasando de un esquema promotor a un
sector público minimalista, reduciendo el número de empresas y organismos públicos, y contrayendo el papel de la Banca de Desarrollo. Ante la contracción
del papel del gobierno federal, las entidades federativas optaron por desarrollar
políticas estatales y locales de desarrollo, para alentar la expansión de capacidades
productivas en su territorio.
Gráfico 3 – México: del Estado Promotor al Estado Minimalista
Fuente: Elaboración Propria con base en Informes de Gobierno (Varios Años), Presidencia de la
República.
d) Surgimiento del modelo de competitividad basada en bajos costos salariales:
con el fin de abatir el proceso inflacionario desatado por la crisis de la deuda de los
años ochenta, se acordó un Pacto para Estabilidad y Crecimiento Económico entre
trabajadores, empresarios y gobierno, en el cual se acordó la revisión salarial basada
en la inflación esperada, sin compensar la caída sufrida por la inflación pasada; esto
ocasionó una caída del salario real de manera sistemática. El salario promedio manufacturero pasó de representar 26 por ciento del salario manufacturero, pagado en los
Estados Unidos en 1981, a 12 por ciento, en promedio, en la primera década del siglo
XXI. Esto se correspondió con un creciente flujo de inversión extranjera, que pasó de
3 mil millones de dólares en 1981 a un promedio de 22 mil millones de dólares entre
2000 y 2008, tal como se muestra en el Gráfico 4. De esta forma, el modelo de bajos
costos salariales se consolidó en México en los últimos treinta años, con la perspectiva
de mantener el flujo de inversión extranjera.
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Gráfico 4 – México – Incremento en los Flujos de IED en el Modelo de
Bajos Costos
Fuente: Elaboración Propria con base en la Balanza de Pagos del Banco de México.
e) Una estructura productiva con mayor peso de actividades de bajo valor
agregado. La falta de un esquema de planeación dio por resultado el debilitamiento de las actividades manufactureras, que de representar el 23 por ciento del PIB
en 1970, pasaron a representar el 18 por ciento en 2007; este debilitamiento redujo su capacidad de absorción de empleo, que fue sustituido por actividades de bajo
valor agregado, como es el caso de servicios personales y el comercio ambulante,
lo que resultó en el fortalecimiento del sector informal, en donde los trabajadores
no cuentan con cobertura de la seguridad social.
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Gráfico 5 – México: Cambio Estructural en la Producción
Fuente: Elaboración Propria con base en Dados del BIE e INEGI.
Los elementos anteriores configuraron un cambio estructural fundamentado
en una nueva relación con la economía global, en donde se marginó al mercado
interno y se privilegió un modelo exportador basado en bajos costos salariales, lo
que ha dado por resultado el debilitamiento del mercado laboral, especialmente
del sector formal de la economía, que ha sido sustituido por trabajos mal remunerados y sin condiciones mínimas de seguridad social.
La Introducción del Modelo de Bajos Costos y la
Negociación Colectiva
Una de las características fundamentales de la economía mexicana ha sido
su incapacidad para obtener un crecimiento económico que genere los suficientes
empleos de calidad que garanticen seguridad social y niveles de ingreso adecuados para los trabajadores. La población, a finales de 2009, era de 108 millones de
habitantes, de los cuáles 79 millones eran mayores a 14 años, 32 millones conformaban a la población económicamente no activa y 47 millones a la población
económicamente activa, de los cuáles 2.5 millones se encontraban en el desempleo abierto. En el siguiente diagrama se muestra la composición de la población
ocupada en 2009, observándose que el 73 por ciento de la población era subordinada (31 millones), y los trabajadores independientes alcanzaban el 27 por ciento,
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de los cuáles 4.4 por ciento eran empleadores y 22.6 por ciento eran trabajadores
por cuenta propia. Dentro del grupo de los subordinados se observa que casi 27
millones se encontraban en el régimen remunerado, con 14.6 millones con contrato escrito, y el resto sin contrato. Por otra parte, de los 31 millones de trabajadores subordinados el 54 por ciento tenía acceso a servicios de salud de calidad.
En este sentido, se puede deducir que el mercado laboral mexicano se encuentra
sumamente segmentado por el tipo de garantía en el trabajo y por el acceso a los
servicios de salud y pensiones establecidos en el país.
Diagrama 1 – Esquema de las Relaciones Institucionales del Mercado
Laboral (2009)
Fuente: Elaboración Propria con base en la Encuesta Nacional de Ocupación y Empleo.
En México las relaciones colectivas de trabajo se regulan con base en título
séptimo de la Ley Federal del Trabajo, en donde se especifica en el artículo 386 que el
“contrato colectivo de trabajo es el convenio celebrado entre uno o varios sindicatos
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de trabajadores y uno o varios patrones, o uno o varios sindicatos de patrones, con
objeto de establecer condiciones según las cuales debe prestarse el trabajo en una
o más empresas o establecimientos”2 . Por otra parte, la aplicación de las normas
de trabajo se establece en el título 11, en donde se especifica como competencia a
las autoridades federales o locales, a través de las Juntas de Conciliación o Arbitraje,
en donde se deberían de registrar las revisiones de los contratos. Sin embargo, la
legislación da la flexibilidad para que los contratos revisados no se registren ante la
autoridad competente, por lo que el proceso de registro es limitado. Considerando
lo anterior, la Secretaría de Trabajo y Previsión Social mantiene un sistema de información que permite dar un seguimiento a la contratación colectiva. De acuerdo
a este sistema, el número de revisiones salariales, efectuadas entre 1992 y 2009, se
elevó de 16 mil a 51 mil, y el número de trabajadores involucrados pasó de 1.6 millones a 2.7 millones, siendo una proporción mayor las revisiones presentadas ante las
Juntas Locales, aun cuando por relevancia del número de trabajadores involucrados
destaca la Jurisdicción Federal, lo que se explica por el hecho de que los convenios
sectoriales son de incumbencia federal. Si se analiza este registro de revisiones salariales con el número de trabajadores remunerados, se observa que los trabajadores
involucrados en las revisiones representaron tan sólo 7 por ciento del total, y 12 por
ciento de los trabajadores con contrato escrito.
2 Excepciones a este caso son los contratos de Petróleos Mexicanos, Comisión Federal de Electricidad y Universidad
Nacional Autónoma de México.
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Tabla 1 – Revisiones del Salario Contractual Registradas en las Juntas
Federales y Locales 1992 a 2009
Número de Revisiones Salariales
Período
Total
Tipo de Jurisdicción
Federal
Local
Trabajadores Involucrados
Total
Tipo de Jurisdicción
Federal
Local
1992
16.299
909
15.390
1.665.782
1.184.290
481.492
1993
21.709
3.617
18.092
1.978.450
1.485.705
492.745
1994
26.489
3.170
23.319
2.127.801
1.525.739
602.062
1995
31.691
3.633
28.058
2.208.438
1.491.367
717.071
1996
34.940
3.686
31.254
2.258.029
1.491.454
766.575
1997
34.220
4.074
30.146
2.213.345
1.495.224
718.121
1998
35.170
4.525
30.645
2.308.966
1.567.955
741.011
1999
38.747
4.671
34.076
2.496.999
1.572.173
924.826
2000
38.611
5.358
33.253
2.924.640
1.819.022
1.105.618
2001
37.946
5.679
32.267
2.788.994
1.732.219
1.056.775
2002
36.871
5.487
31.384
2.790.621
1.757.422
1.033.199
2003
37.232
5.337
31.895
2.785.103
1.763.486
1.021.617
2004
40.237
5.920
34.317
2.916.771
1.776.242
1.140.529
2005
44.483
5.957
38.526
2.919.132
1.783.259
1.135.873
2006
51.821
5.819
46.002
2.781.485
1.684.187
1.097.298
2007
55.413
6.251
49.162
3.031.357
1.858.111
1.173.246
2008
52.125
6.308
45.817
3.027.667
1.909.643
1.118.024
2009
51.254
6.645
44.609
2.754.266
1.824.255
930.011
Promedio
38.070
4.836
33.234
2.554.325
1.651.209
903.116
Fuente: Secretaría del Trabajo y Previsión Social.
Esta baja representatividad proviene del debilitamiento de la organización de
los trabajadores, que se ha dado en forma sistemática. El nivel de sindicalización
se ha reducido, lo que ha derivado del desaliento a promoverla. De acuerdo a la
Encuesta Nacional de Ocupación Y Empleo (ENOE) de 2009, el nivel de sindicalización fue de tan sólo 4,354,612 trabajadores, que significaba 10.1 por ciento
de la población ocupada. Si se analiza directamente a la industria manufacturera,
se observa que el mayor grado de sindicalización se da entre las empresas de gran
tamaño; por ejemplo, en 2004 el 70 por ciento de los establecimientos de gran tamaño contaban con un sindicato, mientras que esto era prácticamente inexistente
entre las microempresas, de acuerdo a la Encuesta Nacional de Empleo, Salarios,
Tecnología y Capacitación en el Sector Manufacturero de 2005.
El desaliento a afiliarse a sindicatos se ha derivado, entre otras cosas, de la baja
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efectividad en la negociación contractual. A este bajo nivel de sindicalización se ha
sumado una actitud pasiva de los sindicatos, lo cual se ha reflejado en incrementos
salariales sumamente bajos. Entre 1992 y 2008, los acuerdos contractuales firmados
lograron para todo el período un decremento acumulado del salario real de 1.3 por
ciento en términos reales, similar a lo que aconteció con el salario mínimo general,
que es acordado cada año con los representantes del movimiento obrero organizado,
los representantes empresariales y los del sector público. De esta forma, las revisiones
contractuales se ajustaron a lo que sucedía en la Comisión Nacional de Salarios Mínimos, que se tradujo en un mecanismo de control en materia salarial.
Tabla 2 – México: Efectos de las Revisiones Salariales Contractuales
Incremento Salarial Real
Período
Total
Tipo de Jurisdicción
Federal
Local
Salario Mínimo
1992
-1,7
-2,5
0,2
4,9
1993
-0,9
-1,1
-0,3
-1,6
1994
-0,9
-1,6
0,9
-0,0
1995
-15,0
-16,0
-12,9
-12,3
1996
-12,8
-10,7
-17,1
-8,3
1997
-2,1
-1,2
-4,0
-1,1
1998
1,5
1,7
1,0
0,5
1999
-0,4
-0,4
-0,4
-3,4
2000
2,8
2,5
3,3
0,5
2001
3,0
2,4
4,0
0,5
2002
1,5
0,8
2,6
0,7
2003
0,7
0,2
1,6
-0,1
2004
-0,1
-0,5
0,6
-0,4
2005
0,6
0,4
0,8
0,5
2006
0,7
0,4
1,2
0,4
2007
0,5
0,3
0,8
-0,1
2008
-0,3
-0,6
-0,0
-1,0
2009
-0,9
-0,9
-0,8
-0,7
Promedio
-1,3
-1,5
-1,0
-1,2
Fuente: Secretaría del Trabajo y Previsión Social.
El mecanismo de control se estableció en medio de la crisis de la deuda externa del
país en los años ochenta: durante el gobierno del Presidente Miguel de la Madrid se de-
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cidió no permitir que las empresas estatales demandaran incrementos que les permitiera
recuperar el poder adquisitivo de los salarios; por tanto, los trabajadores que optaran por
esta vía se les declararía no válida la huelga, con lo que perderían los ingresos en el lapso
que se mantuviera cerrada la empresa. El caso paradigmático de esta política fue aplicado
al Sindicato Único de los Trabajadores de la Industria Nuclear en 1983. Actualmente el
control sobre las empresas estatales se continúa ejerciendo; por ejemplo, en 2009 se aplicó esta política al Sindicato Mexicano de Electricistas, cerrando la empresa Luz y Fuerza
del Centro, liquidando a los trabajadores. Esta acción sistemática del sector público en
contra del movimiento obrero ha reducido el número de huelgas estalladas, que pasó de
230 en 1983 a 21 en 2008. Esto ha provocado que el derecho de huelga, como mecanismo para hacer valer los derechos de los trabajadores (título octavo de la Ley Federal del
Trabajo), haya quedado cuestionado.
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Tabla 3 – Huelgas Estalladas por Central Obrera
Integrantes del Congreso del Trabajo
Confederaciones Nacionales
Período
Total
1983
Sindicatos
Nacionales
Autónomos y
Asociaciones
Sindicales
Autónomas
Independientes
del Congreso
del Crabajo
No
especificada
11
55
1
Subtotal
CTM
CROC
CROM
Otras 1
230
174
111
23
7
22
1984
221
185
139
29
6
4
7
36
0
1985
125
90
64
12
6
3
5
35
0
1986
312
264
219
24
5
10
6
44
4
1987
174
150
123
10
5
2
10
23
1
1988
132
111
86
9
2
7
7
21
0
1989
118
94
71
9
5
5
4
23
1
1990
150
130
100
14
5
6
5
19
1
1991
136
114
87
8
7
5
7
22
0
1992
156
136
99
16
5
3
13
20
0
1993
155
144
98
22
12
5
7
11
0
1994
116
94
57
16
10
6
5
22
0
1995
96
83
50
13
6
11
3
13
0
1996
51
42
27
6
4
4
1
9
0
1997
39
34
22
5
1
5
1
5
0
1998
33
27
16
7
2
2
0
6
0
1999
32
25
16
2
5
2
0
7
0
2000
26
22
8
5
2
4
3
4
0
2001
35
30
12
9
6
2
1
5
0
2002
45
37
19
7
3
1
7
8
0
2003
44
39
16
8
4
7
4
5
0
2004
38
30
13
4
1
5
7
8
0
2005
50
42
22
5
5
4
6
8
0
2006
55
47
27
9
5
4
2
8
0
2007
28
21
14
3
0
1
3
7
0
2008
21
13
10
0
0
1
2
8
0
Fuente: Secretaría del Trabajo y Previsión Social y la J.F.C y A.
En el caso de México, la movilización obrera no ha sido homogénea, ya
que se ha concentrado en el centro del país y en algunas entidades federativas
del oriente, y ha estado presente en tan sólo una entidad del norte del país, tal
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como puede observarse en el Mapa 1. Esta situación deriva de la forma cómo el
movimiento obrero se ha organizado históricamente; además responde a la forma
cómo se realizó el primer proceso industrializador del país.
Mapa 1 – Trabajadores Involucrados en Revisiones Salariales en la
Jurisdicción Federal por Entidad Federativa
Fuente: Elaboración Propria del Autor con base en Datos de la Secretaría del Trabajo y Previsión Social.
Conviene señalar que, adicionalmente a la falta de efectividad en las negociaciones salariales, el movimiento obrero organizado ha permitido la flexibilización de los
contratos sectoriales, al no establecerlos en forma precisa. Pérez Pérez (2002) señala
que las nuevas formas de organización del trabajo y la existencia de sindicatos pasivos
son elementos fundamentales para la creación de flexibilidad laboral. También define
dos tipos de flexibilidad basados en la regionalización del país: máxima flexibilidad
y flexibilidad moderada. La máxima flexibilidad es característica de las empresas exportadoras del norte del país, en las que se dan políticas unilaterales, nuevas formas
de organización del trabajo, así como sindicatos pasivos. Asimismo, en esta región
existe una clase obrera con bajos índices de organización contractual y laboral, debido
a la reciente industrialización de la zona. Como resultado, se crea una política estatal
que atrae la inversión basada en bajos salarios y flexibilidad laboral. Por otra parte, la
flexibilidad moderada se da en la antigua industria reconvertida y en la paraestatal,
y tiene una base sindical pasiva e independiente. La política estatal en las regiones
de flexibilidad moderada es menos rígida que en el primer caso, como consecuencia
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de una clase obrera más experimentada y con mayores lazos a la sindicalización. La
industria automotriz, así como la banca, son ejemplos de este tipo de flexibilidad.
En la industria automotriz se aceptó con relativa facilidad la transformación en las
relaciones laborales a través del abaratamiento y el uso intensivo de la fuerza laboral,
acompañados de la reducción y la flexibilización en la negociación colectiva, así como
de la flexibilización del mercado y de la desindicalización. Por otra parte, mediante la
relación sindicato-patrón en la banca, no es posible llegar a acuerdos que permitan
hacer mejoras en la productividad. (PÉREZ PÉREZ, 2002). En este sentido, se puede
argumentar que el papel de los sindicatos es fundamental para la flexibilidad laboral, ya
que ésta requiere de pactos entre empresas y sindicatos, que fomenten la participación
activa de los trabajadores en la toma de decisiones y en la organización del trabajo. Sin
los acuerdos a los que empresarios y trabajadores puedan llegar, no será posible tener
un cambio en las condiciones y en la estructura del trabajo. De este modo, la flexibilidad laboral implica una reestructuración en la organización del trabajo y el capital. Los
cambios en la estructura laboral consisten en nuevas formas de contratación, cambios
en las modalidades de remuneraciones y sindicatos más abiertos a las negociaciones.
De esta manera, la flexibilidad laboral requiere, además de cambiar la organización
del trabajo, cambiar las relaciones dentro de los sindicatos, así como un cambio de las
relaciones entre centrales obreras y sindicatos. En el caso de los contratos colectivos
no suele haber especificaciones acerca de la organización del trabajo, ya que tienden a
concentrarse en asuntos como los salarios, las prestaciones y la duración de la jornada
laboral. Por otra parte, un aspecto negativo de este tipo de contratos en México es la
generalización en las negociaciones por parte de las centrales obreras, sin tomar en
cuenta las distintas ramas industriales, ni la relación entre los trabajadores y su ámbito
laboral. Actualmente, los sindicatos acatan lo estipulado por la central, sin poder negociar con las empresas, lo que limita el grado de flexibilidad del trabajo, aun cuando
algunos sindicatos no acatan a ninguna central, como es el caso del Sindicato de Telefonistas de la República Mexicana o el de Petróleos Mexicanos. En este sentido, si los
contratos se firmaran con base en las actividades de las empresas, sería posible tener
una mayor flexibilidad ajustada a las necesidades de cada rama.
Dentro del esquema de flexibilización se han sumado los esquemas de contratación laboral, lo que se conoce como el espacio de la flexibilidad numérica,
que consiste en incrementar la cuota de capital variable, movilizado en el proceso
de producción a través de cambios en la organización. Mediante la flexibilidad
numérica, la empresa es capaz de modificar el número de trabajadores en función
de las variaciones de la demanda externa de sus productos. De esta forma, la
variación en el personal ocupado por tipo de industria, así como el número de
trabajadores eventuales, indican el grado de flexibilidad numérica en una industria. En el caso mexicano, dentro de la industria manufacturera, es el ramo de los
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textiles y las prendas de vestir el que presenta la mayor flexibilidad numérica. En
contraste, la división de alimentos, bebidas y tabaco es la menos flexible. Los resultados presentados son un reflejo del tipo de demanda que los bienes de ambas
ramas tienen. Mientras que los alimentos son bienes con una demanda más rígida,
los textiles y la ropa presentan mayor elasticidad con respecto al ingreso. A lo
anterior se ha sumado el que las empresas hacen uso de la flexibilidad funcional
de los trabajadores, que consiste en el uso de un mismo trabajador en distintas
etapas del proceso productivo. Como consecuencia de la flexibilidad funcional, la
presencia del trabajador en la empresa se da en distintos turnos, horarios, departamentos y puestos. Así como la flexibilidad numérica se encuentra en función de
la demanda final de los productos de la empresa, la flexibilidad funcional depende
de los cambios tecnológicos. Los cambios en la jornada laboral y los cambios en
el número de personal correspondiente a cada puesto de la empresa son indicadores de la flexibilidad funcional. Las horas-hombre trabajadas, al mantenerse
constantes, muestran la poca flexibilidad funcional de la industria manufacturera.
Ante la falta de logros en materia salarial el movimiento obrero organizado
se ha centrado en la reducción de los riesgos de trabajo, que es una parte clave
de la legislación laboral en México (título noveno de la legislación). Para ello se
ha diseñado un esquema detallado de los mismos, y se han establecido en las
empresas las comisiones de higiene y seguridad, lo que ha servido para que entre
2000 y 2008 se haya reducido el número de defunciones por accidentes de trabajo
de 1,740 a 1,412 , y para que se hayan reducido las enfermedades de trabajo, aun
cuando los accidentes de trabajo y los accidentes en trayecto han aumentado.
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2000
356.725
91.807
5.557
1.740
1.299
431
10
Accidentes en trayecto
Enfermedades de trabajo
Defunciones
Accidentes de trabajo
Accidentes en trayecto
Enfermedades de trabajo
2001
3
354
1.145
1.502
5.520
84.078
324.150
413.748
12.224.231
Fuente: Instituto Mexicano del Seguro Social.
454.089
Accidentes de trabajo
12.418.761
Riesgos de Trabajo
Trabajadores expuestos
Concepto
4
308
1.049
1.361
4.511
80.325
302.970
387.806
12.112.405
2002
4
323
1.100
1.427
7.811
72.448
278.525
358.784
12.088.468
2003
8
287
1.069
1.364
7.418
70.906
282.469
360.793
12.348.259
2004
Tabla 4 – Trabajadores Expuestos, Riesgos de Trabajo y Defunciones
2005
3
255
1.109
1.367
7.292
70.353
295.594
373.239
12.735.856
2006
2
257
1.069
1.328
4.715
73.573
309.539
387.827
13.578.346
2007
3
227
1.049
1.279
2.691
86.167
361.244
450.102
14.424.178
2008
6
279
1.127
1.412
3.681
92.074
411.179
506.934
14.260.309
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La Caída de la Negociación Colectiva y el Empoderamiento
de las Relaciones Individuales de Trabajo
La flexibilización del mercado de trabajo ha dado por resultado el empoderamiento de las relaciones individuales de trabajo. Las normas de las relaciones
individuales de trabajo se encuentran contenidas en el Titulo Segundo de la Ley
Federal del Trabajo. En este caso se pueden señalar algunos elementos clave:
Artículo 20.- Se entiende por relación de trabajo, cualquiera
que sea el acto que le dé origen, la prestación de un trabajo
personal subordinado a una persona, mediante el pago de un
salario. Contrato individual de trabajo, cualquiera que sea su
forma o denominación, es aquél por virtud del cual una persona se obliga a prestar a otra un trabajo personal subordinado, mediante el pago de un salario. La prestación de un trabajo
a que se refiere el párrafo primero y el contrato celebrado producen los mismos efectos. (MÉXICO, 2010).
En los siguientes párrafos se precisan este tipo de relaciones en donde se han
realizado algunas modificaciones:
• Trabajo infantil (Artículo 22) Este concepto fue modificado ya
que la edad mínima para trabajar conforme a la versión original
era de doce años, en tanto que en la actual es de catorce; esto da
como resultado que de acuerdo a la ENOE del Segundo Trimestre
de 2008 se protege a 4,5 millones de menores, para que puedan
cumplir con su educación básica, que es de 9 años (6 de primaria
y 3 de secundaria). La intención de esta reforma fue redefinir el
trabajo infantil; sin embargo, hasta la fecha se estima que el trabajo
infantil es de 2,4 millones de niños, lo que muestra que aun cuando
la reforma legal se dio, no se han establecido mecanismos para la
observancia de la ley.
• Contrato por escrito (Artículo 24) Se establece la necesidad de estipular por escrito la relación laboral y la forma como ésta se cubrirá, para evitar abusos sobre el trabajador; sin embargo, la porción
de trabajadores que cuentan con un contrato escrito es de apenas
34 por ciento de la población ocupada.
• Estabilidad en el trabajo (Capítulo II del Título II) Este apartado es uno de los puntos más controversiales de la legislación
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laboral, ya que en principio, se establece en el artículo 35 que las
relaciones de trabajo pueden ser por obra o tiempo determinado
o por tiempo indeterminado, y que a falta de estipulaciones la relación será por tiempo indeterminado. No obstante, en la práctica
se observa que a los trabajadores se les contrata por tiempo determinado, cuando ésta debería ser la excepción, y que tales empresas, en sus nuevas contrataciones, celebran “contratos a prueba”
con sus trabajadores, dejándolos en un ámbito de incertidumbre
laboral. Tampoco es nada raro, en la actualidad, que las empresas
subcontratistas o agencias de colocación de personal (outsourcing)
eludan sus responsabilidades laborales violatorias del principio de
estabilidad en el empleo.
• Conviene señalar que el contrato a prueba no se encuentra validado en nuestra legislación – lo que incluye es por obra determinada,
por tiempo determinado y por tiempo indeterminado. Sin embargo, existe un debate al respecto en el que se señala que lo que no
está prohibido explícitamente está permitido. Bajo esta premisa,
algunos juristas han validado lo que es denominado “periodo de
prueba”, que da elementos para una contratación sin garantía de
percibir los beneficios de ley, y sobretodo cuestiona el principio de
estabilidad en el trabajo.
En lo referente a la subcontratación, la Ley Federal del Trabajo sí contempla,
dentro de su articulado, a la figura del intermediario, que “es la persona que contrata o interviene en la contratación de otra u otras, para que presten servicios a un
patrón”. (MÉXICO, 2010). Además, la norma laboral también establece el principio de la responsabilidad solidaria, mediante el cual las empresas clientes de las
agencias de colocación de personal también son responsables de las obligaciones
laborales frente a dichos trabajadores. Sin embargo, no todos los derechos de los
trabajadores se encuentran salvaguardados en esta forma de contratación, sobre
todo el referente a la estabilidad en sus empleos, ya que mueven a los trabajadores
de empresa en empresa, y muy a menudo se encuentran sujetos a la temporalidad
contractual continua; por tanto, en ningún caso tienen la seguridad de la permanencia. De acuerdo a las estadísticas de la Encuesta Nacional de Ocupación y
Empleo en 2009, de los 28,9 millones de trabajadores remunerados, 18,5 millones,
es decir, 62 por ciento tenían una permanencia en el trabajo por abajo de cinco
años. (véase Gráfico 6).
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Gráfico 6 – México: Antigüedad en el Trabajo de los Asalariados, 2009
Fuente: Elaboración Propria del Autor con base en la Encuesta Nacional de Ocupación y Empleo.
En la contratación individual han surgido nuevas formas de contratación
que no implican ningún tipo de relación laboral con la empresa, por ejemplo, en
las estaciones de servicio de la empresa Petróleos Mexicanos, a los trabajadores se
les da la oportunidad de laborar bajo el acuerdo que se conoce como derecho de
piso, que consiste en que los trabajadores puedan despachar la gasolina y prestar
cualquier otro tipo de servicio a los clientes que acuden a la estación, pero no
perciben ningún sueldo, obteniendo sus ingresos de las propinas obtenidas de los
clientes. Otra modalidad de la contratación individual es la surgida en la cadena
Wal-Mart de México, en la cual no se tiene empleados sino asociados, de tal manera que la relación de trabajo es diferente a la estipulada en la Ley. Por otra parte,
en la modalidad de honorarios asimilables se obtiene una contratación limitada,
ya que parte del sueldo o salario se paga de acuerdo a la legislación vigente con
todos los derechos de ley, pero la porción más importante de la percepción se
paga como honorarios, es decir, fuera de la relación laboral.
La relación de trabajo, mientras subsiste, atraviesa por una serie de vicisitudes relacionadas con el principio de la estabilidad en el empleo, que en ocasiones
son favorables o desfavorables para cualquiera de las partes que intervienen en
ella. La primera de ellas es la suspensión de las relaciones de trabajo de manera
temporal, cesando las obligaciones recíprocas, por un lado, de prestar el servicio
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el trabajador y, por el otro, de pagar el salario el patrón. El artículo 42 de la Ley
Federal del Trabajo establece siete causales de suspensión de la relación de trabajo,
entre las que se encuentran: la enfermedad del trabajador, el arresto, la prisión
preventiva seguida de sentencia absolutoria etc. Desaparecidas las causas temporales de suspensión se reanuda la relación laboral, respetándose, así, el principio
de la estabilidad en el empleo. En otras ocasiones se va más allá de la suspensión,
sobreviniendo un acontecimiento diferente, denominado terminación de las relaciones de trabajo, mismo que impide la continuación de la prestación del servicio.
Son causas de terminación de las relaciones de trabajo, de conformidad con el
artículo 53 de la Ley Federal del Trabajo, entre otras: el mutuo consentimiento,
la muerte del trabajador, la terminación de la obra, la incapacidad física o mental
del trabajador que haga imposible la prestación del servicio etc. En estos supuestos, aunque verdaderamente se acaba la relación de trabajo, ésta se da por causas
naturales no imputables a ninguna de las partes, por lo que el principio de la estabilidad en el empleo permanece a salvo.
La rescisión de la relación de trabajo, sin responsabilidad para el trabajador,
constituye otra vicisitud, por la que atraviesa dicha relación. En el artículo 51 de
nuestra legislación laboral se establecen nueve causas, por las que el trabajador puede separarse de su trabajo, sin ser su responsabilidad, lo que implica que el patrón
ha incurrido en el incumplimiento del contrato en contra del trabajador, por ser él
quien ha violentado el principio de la estabilidad en el trabajo. La falta de probidad
del patrón, reducir el salario del trabajador, no cubrir el salario en el lugar y fechas
convenidas etc., son algunas de las causales de esta ruptura. Esta separación del trabajador, sin ser el responsable, rompe dramáticamente el principio de la estabilidad
en el empleo. Sin embargo, quizá la menos deseada de las vicisitudes por las que
atraviesa la relación de trabajo la constituye el despido. Entiéndese por despido, al
acto unilateral en virtud del cual el patrón da por terminada la relación de trabajo, invocando una causa grave de incumplimiento que se imputa al trabajador. El despido
se da, en este caso, cuando es el propio trabajador quien cae en incumplimiento de
su contrato, incurriendo en alguna de las quince causales establecidas en el artículo
47 de la Ley Federal del Trabajo, sin responsabilidad para el patrón. La desobediencia del trabajador al patrón, tener más de tres faltas injustificadas en un período de
30 días, las faltas de probidad cometidas por el trabajador, concurrir en estado de
embriaguez a sus labores, entre otras, son las causales que le permiten al patrón
romper con el principio de estabilidad en el empleo.
Por otra parte, el empoderamiento de las relaciones de trabajo individuales ha llevado a un cambio en el lugar de desempeño de la actividad, tal como puede observarse
en el Cuadro 5, en donde se muestra la inestabilidad del lugar de trabajo.
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Tabla 5 – México: Redefiniendo el Lugar de Desempeño de la Actividad
2005
2006
2007
2008
2009
26.230.272
27.592.042
28.104.010
28.905.410
28.779.312
En domicilios particulares
3.692.782
3.809.031
3.999.996
4.043.648
4.102.509
De manera itinerante, circulando, o
sin limitarse a un solo espacio físico
1.519.694
1.510.935
1.486.786
1.505.103
1.598.279
Total de trabajadores
subordinados no agropecuarios
En puestos fijos o semifijos
152.264
161.085
166.360
187.596
192.572
En el lugar de la obra
384.191
461.750
585.990
575.525
566.639
17.460.672
18.386.810
18.772.819
19.404.839
19.102.725
En las instalaciones de otras
empresas o instituciones donde se
les envía
747.017
771.266
792.781
799.196
757.225
Lugares y/o condiciones no
especificadas
276.499
339.880
337.372
342.417
299.129
Trabajadores subordinados
remunerados en actividades
agropecuarias
1.997.153
2.151.285
1.961.906
2.047.086
2.160.234
33,4%
33,4%
33,2%
32,9%
33,6%
En establecimientos o instalaciones
controladas por la unidad económica
para la que trabaja
% de trabajadores fuera de
establecimientos
Fuente: Elaboración Propria con base en la Encuesta Nacional de Ocupación y Empleo.
Reformas a la Legislación Laboral
La posición gubernamental ha sido la de promover un esquema de trabajo en
donde se flexibilice la contratación individual, legalizando algunos de los mecanismos
que se han venido utilizando ilegalmente por las empresas, como lo son el contrato a
prueba, la reducción de requerimientos de capacitación, la flexibilización de la forma
cómo se lleva a cabo la negociación colectiva y la reducción de los mecanismos de
protección de los trabajadores para lograr la equidad, como es el derecho de huelga. A
continuación se describen sucintamente los elementos de la propuesta gubernamental
que se ha denominado Iniciativa de los Sectores, y que ha sido avalada por el Congreso
del Trabajo, que agrupa a los sindicatos afines al gobierno3:
Nuevas modalidades de contratos individuales de trabajo. Se establecerían nuevas modalidades de contratos individuales de trabajo, como serían los “contratos a prueba” o
3 Este resumen está basado en las palabras del Dr. Álvaro Castro Estrada, Subsecretario del Trabajo, Seguridad y
Previsión Social de la Secretaría del Trabajo y Previsión Social, en ocasión del Seminario “Panorama Laboral 20072008”. México, D. F., 21 de noviembre de 2007.
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“de capacitación inicial”. Asimismo, se regularían expresamente las relaciones de trabajo “por temporada”, que aunque
en la Ley vigente se infiere su existencia, con la reforma se hace
explícita su regulación. La relación de trabajo con período de
prueba se daría hasta por 30 días como regla general y por
180 días para puestos de dirección, gerenciales o para labores técnicas o profesionales especializadas, lo que amplía las
posibilidades de contratación. El contrato de “capacitación
inicial”, sería aquél mediante el cual el trabajador adquiriría
los conocimientos o habilidades necesarios para una actividad
determinada, percibiendo un salario acorde con la categoría
del puesto que desempeñe. Este tipo de contrato, tendría una
duración de hasta de tres meses –por regla general– y hasta
de seis meses cuando se trate de trabajadores para puestos de
dirección, gerenciales y demás personas que ejerzan funciones
de dirección o administración en la empresa o bien para labores técnicas o profesionales especializadas. Con este tipo de
contratos, se pretende romper el círculo vicioso de “no
tengo trabajo por no estar capacitado y no tengo capacitación porque no tengo trabajo.”
Distribución de la jornada de trabajo. Se contemplaría que
patrones y trabajadores puedan convenir la ampliación de
la jornada diaria de trabajo, así como un programa de
acumulación mensual de horas laborables o “banco de
horas”, a fin de permitir a los trabajadores el reposo acumulado de varios días a la semana, sin contravenir las exigencias del
artículo 123 constitucional, fracción XXVII, inciso a).
Simplificación de las obligaciones patronales en materia
de capacitación y adiestramiento. Se modificaría integralmente el capítulo relativo a la capacitación y el adiestramiento
de los trabajadores, denominándolo “De la Productividad,
Formación y Capacitación de los Trabajadores”. Se prevé que
sólo las empresas que tengan más de 20 trabajadores deben
integrar las comisiones mixtas de productividad, capacitación
y adiestramiento. Se suprimirían diversas obligaciones en esta
materia, entre las que destacan: Registrar ante la Secretaría del
Trabajo y Previsión Social los planes y programas de capacitación y adiestramiento de las empresas; el procedimiento de
autorización y registro ante la Secretaría del Trabajo y Previsión Social por parte de las instituciones o escuelas que deseen
impartir capacitación o adiestramiento; y el registro de constancias de habilidades laborales.
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Medidas para incrementar la productividad y la competitividad del país. Se suprimiría el “escalafón ciego” y de esta forma
se privilegiaría a la capacitación como el principal criterio para
el ascenso de los trabajadores a puestos vacantes o de nueva
creación, por sobre la antigüedad de los trabajadores. Se favorecería la “multihabilidad” como un factor que permitiría a
los trabajadores percibir ingresos mayores, es decir, se podrá
convenir que los trabajadores desempeñen labores o tareas
conexas o complementarias a su labor principal, siempre que
reciban el ajuste salarial correspondiente.
Registro sindical. La iniciativa contempla que el registro de los
sindicatos pueda cancelarse por no proporcionar informes a
las autoridades del trabajo, respecto a su actuación como sindicato, y por no informar cada seis meses de las altas y bajas
de sus miembros. La Junta de Conciliación y Arbitraje correspondiente tendría conocimiento sobre la cancelación de
registro de un sindicato, a solicitud de integrantes del propio
sindicato y de toda persona con interés jurídico.
Requisitos para la firma de un contrato colectivo de trabajo. Se contempla que cuando un sindicato vaya a celebrar
un contrato colectivo de trabajo, debe formular la solicitud por
escrito, la misma que contendrá la firma de los representantes
del sindicato y de los trabajadores que representa; y deberá
acompañar las constancias vigentes relativas a su inscripción
que hayan sido expedidas por la autoridad registradora. En caso
contrario, no se podrá hacer válido el contrato colectivo.
Fortalecer la justicia laboral. El principio de la conciliación
se incorporaría expresamente en el proceso laboral. Durante
todo el procedimiento y hasta antes de dictarse el laudo, las
Juntas intentarían que las partes resolvieran los conflictos mediante la conciliación. Para apoyar en estas tareas se incorporaría a los “funcionarios conciliadores” como parte del personal
jurídico de las Juntas. Se tiene previsto que el personal jurídico
de las Juntas de Conciliación y Arbitraje cuenten con título y
cédula de licenciado en derecho, que se hayan distinguido en
estudios de derecho del trabajo y gocen de buena reputación.
Desde luego, la “iniciativa de los sectores” contempló en sus
artículos transitorios que el personal jurídico de las Juntas de
Conciliación y Arbitraje que no cuente con el título y la cédula
profesional, tendría un término de cinco años para obtenerlo,
contado a partir de la vigencia de las reformas.
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En abril de 2010, la posición gubernamental se configuró dentro de la iniciativa
de Reforma Laboral, dada a conocer por la Secretaría de Trabajo y Previsión Social.
En dicha iniciativa se mantiene claramente la misma línea planteada anteriormente,
donde se maneja como eje principal la expansión del trabajo decente, incorporando
condiciones mínimas en las relaciones laborales, como lo son la dignidad humana,
la no discriminación, el acceso a la seguridad, el salario remunerador, la capacitación
y productividad, la seguridad e higiene, la libertad de asociación y autonomía, la democracia sindical, el derecho de huelga y la contratación colectiva . Asimismo, como
ya se mencionaba, se pretende flexibilizar el mercado laboral, incorporando nuevas
modalidades de contratación individual: periodos de prueba, capacitación inicial, y
trabajo de temporada. Por otra parte, se elimina el descuento obligatorio de las cuotas
sindicales, y se suprime la cláusula de exclusión por separación, para evitar que los
trabajadores sean despedidos por el hecho de renunciar a su sindicato. Para reforzar el
cumplimiento de la normatividad, se propone incrementar el monto de las sanciones
a los patrones que infrinjan la Ley Federal del Trabajo, pasando de un rango de 3 a 315
veces el salario mínimo, a uno de 50 a 5,000 veces el salario mínimo.
La Posición de los Sindicatos Independientes y de Algunos
Partidos Políticos
En contraposición al punto de vista gubernamental, se ha presentado una
propuesta alternativa, que centra su desarrollo en términos de fortalecer la negociación colectiva, eliminar la discrecionalidad, desaparecer la segmentación de la
legislación laboral entre trabajadores del servicio del Estado y del sector privado,
preservar el derecho de huelga, y actualizar la institucionalidad en organismos,
tales como el Registro Público de Asociaciones y Contratos Colectivos, y el Instituto para los Salarios Mínimos, Productividad y Reparto de Utilidades. Los puntos
fundamentales de su propuesta son4:
Preservar las garantías vigentes y garantizar la participación de los trabajadores en la firma de la negociación
colectiva, mediante una Asamblea en la que estén presentes
al menos una tercera parte de los trabajadores. Esta pretensión se canaliza por conducto del Registro Público Nacional de
Organizaciones Sindicales y Contratos Colectivos que es una
instancia neutral y profesional encabezada por personas de
reconocido prestigio, quienes reciben las constancias iniciales,
garantizando que se respete el derecho que pudiesen tener
4 Los puntos fundamentales de esta propuesta se obtuvieron de la Iniciativa de Decreto, por el que se reforman
diversas disposiciones de la Ley Federal del Trabajo, presentada por la Unión Nacional de Trabajadores y un conjunto de partidos representados en la Cámara de Diputados.
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otras organizaciones sindicales que pretendan también la firma
del Contrato Colectivo, desahogándose, en caso de controversia, una consulta entre los trabajadores a fin de determinar cuál
de ellas representa al mayor número de trabajadores. Estas
consultas realizadas en plazos reducidos y precisos culmina
con la notificación del emplazamiento a huelga. La intención de la propuesta busca evitar contratos de protección al
firmarse éstos al margen de la voluntad de los trabajadores,
el respeto de la voluntad mayoritaria o incluso, el deseo de
los trabajadores de no pertenecer a sindicato alguno, evitando
emplazamientos fantasmas que pongan en riesgo las fuentes
de trabajo; pero sobre todo, fortaleciendo la negociación colectiva legitima como instrumento fundamental de concertación entre patrones y trabajadores. En esta propuesta, ocupa
un lugar esencial el Registro Público mencionado, toda vez
que es fundamental que exista un organismo que resuelva las
controversias gremiales con neutralidad y rapidez a fin de garantizar que la negociación colectiva desde su inicio, lo cual
redundará en beneficio de trabajadores y patrones.
Preservar el Derecho de Huelga. La iniciativa busca garantizar un procedimiento de huelga con apoyo real de los
trabajadores, mediante la presentación del emplazamiento a
un juez laboral. Se mantiene el derecho de huelga en los términos vigentes con la garantía de que este derecho no podrá
ser motivo de chantaje a empresas o de actos de simulación,
como sucede en la práctica, en la que los patrones firman los
contratos colectivos sin conocimiento o apoyo de los trabajadores, simplemente porque compran a un líder que firma el
emplazamiento o el contrato sin conocimiento de sus destinatarios. La iniciativa garantiza un procedimiento eficaz para
que la titularidad de los contratos sea reconocida a quienes
cuentan con la mayoría, superando la práctica actual, tanto
por la tardanza de los juicios, como por la violencia de las
consultas, así como por la parcialidad evidente de las juntas
de conciliación y arbitraje, en las que los patrones y líderes
demandados suelen ser juez y parte.
Cancelación del Registro de los Sindicatos. En materia
de cancelación de registros, no se contemplan nuevas causales. Por el contrario, se respeta el derecho de asociación mediante un simple procedimiento de inscripción en el Registro
Público Nacional de Organizaciones Sindicales y Contratos
Colectivos, evitándose los controles vigentes orientados a
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condicionar la personalidad jurídica de los sindicatos. Sólo en
caso de controversia, se establece un procedimiento orientado
a consultar a los trabajadores, mediante el voto universal y secreto, bajo la supervisión del órgano neutral que es el Registro
Público Nacional.
Derecho a determinar el radio de acción de los sindicatos. Se establece en el artículo 470 de la Ley Federal de Trabajo, que los sindicatos tienen derecho a determinar libremente
su radio de acción, como lo ha recomendado la propia OIT,
siendo congruente con el derecho de libertad sindical que establece el artículo 123 constitucional.
Rescisión de la relación laboral. Esta iniciativa conserva las
reglas vigentes en materia de despido, agregando solamente la
causal de hostigamiento sexual. Es importante destacar que
el texto vigente ha sido producto del carácter protector de la
Ley Federal del Trabajo, por lo que modificarlo redundaría en
perjuicio de los trabajadores.
Fijación de la jornada laboral. Se conserva la regulación actual de la fijación de la jornada de trabajo, tomando en cuenta
que la ley actual otorga la suficiente flexibilidad para su distribución en diferentes días, a fin de facilitar el descanso a los trabajadores. Se adiciona dentro del artículo 65 de la Ley Federal
de Trabajo la posibilidad de intervención del juez laboral, a fin
de evitar que las jornadas laborales puedan generar quebranto
en la salud de los trabajadores.
Normas de trabajo. En esta iniciativa se propone un cambio
de redacción que perfeccione las definiciones, de modo que
puedan regularse debidamente la infinidad de simulaciones patronales que se dan en perjuicio de los trabajadores, a través
de las llamadas empresas de servicios o subcontratistas, que
han afectado sensiblemente la responsabilidad patronal.
Estabilidad en el empleo. Se conservan los principios vigentes en materia de estabilidad en el empleo, señalándose en
el artículo 38 de la Ley Federal de Trabajo, que el trabajo por
tiempo indeterminado puede ser continuo o discontinuo; el
trabajo por tiempo indeterminado discontinuo es aquél que
se desarrolla de manera permanente por temporadas en ciertos períodos del año. En estos casos, los trabajadores tendrán
los mismos derechos y obligaciones que los trabajadores por
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tiempo determinado de carácter continuo, en proporción al
tiempo trabajado
Como se puede observar, las propuestas no son complementarias, sino que
apuntan en direcciones diferentes. En un caso se pretende avanzar hacia un fortalecimiento de las relaciones individuales como un mecanismo de flexibilización;
en tanto, en el otro caso se pretende fortalecer las relaciones colectivas del trabajo.
Es un debate que se ha prolongado y que puede aún tomar un tiempo para llegar
a un acuerdo, siempre en la expectativa de que ninguna parte imponga su posición
por la vía de los hechos.
Una Perspectiva Hacia el Futuro
El mercado laboral mexicano ha estado moldeado por la baja creación de
empleos en la economía, los cuales son insuficientes para absorber la expansión
de la población económicamente activa, a través de trabajos decentes. Ante esta
situación de baja demanda de empleo, se ha precarizado el mercado laboral y se ha
potenciado la emigración hacia Estados Unidos. La baja creación de empleo está
asociada a dos factores fundamentales:
Bajo nivel de inversión en la economía, lo que ha provocado un lento
crecimiento del aparato productivo y, por ende, del empleo. Esta situación ha
prevalecido en los últimos veinte años, desde la aparición de la crisis de la deuda,
que rompió el esquema de generación de ganancias que alentaba al crecimiento de
la economía y no ha logrado ser sustituido por un esquema funcional que permita
impulsar un mayor crecimiento económico.
Débil marco institucional, que genera incertidumbre en el mercado laboral,
ya que no dota a los trabajadores ni a los patrones, de reglas que permitan asegurar
estabilidad en los ingresos de los trabajadores y flexibilizar la contratación por
parte de los trabajadores.
Estos dos elementos permiten elaborar una agenda de política laboral en
torno a la filosofía de la flexiguridad, ya que queda claro que sin mayor creación de
empleo no se puede reordenar el mercado de trabajo, y sin instituciones adecuadas puede ser que la flexibilización sea excesiva, perjudicando a los trabajadores.
Dentro de los elementos que podría contener una agenda, se encuentran los siguientes:
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Nueva políticas creadoras de empleo. Hasta el momento, la estructura
de las políticas públicas hacia el mercado laboral se pueden resumir en políticas de vinculación, capacitación, apoyo a emprendedores y subsidios marginales
para reducir el costo inicial del empleo. Sin embargo, éstas han sido a todas luces
insuficientes, lo que se ha traducido en una segmentación en donde el mercado
informal ocupa hoy el 30 por ciento de la población ocupada. Queda claro que el
problema de la creación de empleo no se resuelve en el propio mercado laboral,
ya que es consecuencia de lo que sucede en la economía en su conjunto, por lo
que se requiere de una alta demanda agregada, de un cierto nivel de integración
del mercado interno, de tecnologías que favorezcan el uso del capital humano y
de acuerdos institucionales en el mercado laboral que propicien la creación de
empleo. Desde esta perspectiva, los subsidios al empleo son irrelevantes si no
existe demanda agregada para que los empresarios inviertan y generen empleos.
En este sentido, las mejores políticas creadoras de empleo son aquellas que estimulan el crecimiento sostenido de las economías, tal como se ha mostrado en los
países emergentes de Asia, en donde la expansión de empleos es de las más altas
del mundo. Para sustentar estas políticas, los asiáticos han recurrido a políticas industriales que permitan la construcción de escenarios de crecimiento en plazos de
al menos dos décadas, lo cual ha creado certidumbre entre los empresarios para
invertir y crear empleos. La creación de empleos debe ser una tarea de Estado, es
decir, todo el aparato público debe estar enfocado a coordinar sus políticas para
promover la inversión y el empleo; para ello el sector público debe convertirse
en el gran coordinador del esfuerzo: utilizar su presupuesto para generar nuevos
empleos. El Estado es el agente con mayor capacidad para lograr este objetivo;
por ejemplo, en países industriales como Estados Unidos se alienta a las empresas
a desarrollar proyectos para el gobierno, induciendo a los pequeños empresarios
a convertirse en proveedores gubernamentales5, para lo que reservan alrededor de
300 mil millones de dólares para este propósito, a lo que se suma una serie de estímulos para la creación de nuevas empresas y para la operación de las ya existentes.
Rediseño de la Seguridad Social. En países con mercados laborales segmentados, debe pensarse en reconstruir la institucionalidad, ya que la informalidad
es consecuencia de la falta de cumplimiento de la ley; hacerla prevalecer requiere que
la misma sea coherente con el objetivo de crear un ambiente de seguridad para los
participantes en este mercado, por ello se requiere pensar en una modernización
del sistema de seguridad social a lo largo de la vida. En este sentido, una reforma
de la seguridad social debiera incluir la visión del ciclo de vida, compensaciones familiares desde la niñez, una línea de pobreza que determinara el nivel de
transferencias necesario para mantener un nivel de ingreso mínimo, un sistema
5 Federal Procurement Data System-Next Generation Federal Procurement, by State Summary Fiscal Year 2006.
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de seguros de riesgo de trabajo, de enfermedades, de maternidad, de invalidez;
apoyos para la vivienda, un seguro para el desempleo y un sistema de pensiones
de tipo ciudadano.
Fortalecimiento de la organización de los trabajadores. Un mercado
laboral disperso da como resultado pocos acuerdos para incrementar la productividad, por lo que es necesario promover una mayor sindicalización de los trabajadores.
Establecimiento de un Consejo Económico y Social como un mecanismo de aliento al diálogo entre los agentes. El Consejo permitiría, a través
del diálogo, establecer acuerdos que impulsaran una ruta definida de políticas sociales para resguardar los niveles de vida; éste podría restituir el mecanismo de
acuerdos entre grupos sociales que se habían establecido en torno a los Pactos
entre Sectores, que en su momento lograron estabilizar la economía. Hoy día, la
Secretaría de Desarrollo Social tiene un papel limitado ante la aplicación de esquemas focalizados, mientras que la Secretaría de Trabajo se ha enfocado a mantener
la calma social. La institucionalidad actual parece ya superada, por lo que es clara
la necesidad de contar con una más amplia, que sea capaz de definir dinámicamente los niveles de bienestar; el consejo podría ser la instancia encargada de reformar
todo el sistema de seguridad social.
Combinación de esquemas público-privados para establecer el piso
social básico. La tarea de modificación del mercado laboral requiere de un esfuerzo colectivo. No se puede pensar en pasar de la situación de no observancia de la
ley a un esquema en donde todo se cumpla simplemente por decreto, es necesario lograr alianzas y diseñar nuevos instrumentos acordes con los propósitos de
una nueva cultura del bienestar, en donde un componente básico requiere ser la
solidaridad social basada en acuerdos público-privados que garanticen niveles de
vida mínimos para todos. Un ejemplo puede ser la constitución de una pensión
ciudadana, complementada con fondos de pensiones personales que alentarían
a los ciudadanos al ahorro adicional, cuestión que no ha sido impulsada con el
sistema actual.
Fortalecimiento de las finanzas públicas para atender los problemas
del mercado laboral. En México, el papel rector del sector público ha quedado
relegado por la falta de recursos. Con ingresos por impuestos cercanos a tan
sólo 12 por ciento del Producto Interno Bruto, la capacidad de gestión social del
Estado queda como un buen propósito, pero en la práctica no le permite atender
plenamente a esta necesidad. La reforma fiscal aprobada en 2007 resulta a todas
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luces insuficiente para poner en marcha un proyecto de reestructuración institucional, limitándose a administrar a una sociedad segmentada y sin un perfil definido
de bienestar para el futuro.
Una nueva legislación acorde con una nueva institucionalidad. En la
perspectiva de una nueva institucionalidad, se requeriría adaptar la legislación vigente, de acuerdo a los principios de seguridad con flexibilidad, lo que conformaría al nuevo paradigma del desarrollo económico, político y social.
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TRÊS DÉCADAS DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA
NO BRASIL: CONTEXTOS, RESULTADOS E
DESAFIOS
Regina Coeli Moreira Camargos1
Rafael Soares Serrao2
As Negociações Coletivas no Período de 1978 a 1989
Entre 1978 e 1989 as negociações coletivas no Brasil gravitaram em torno das
sucessivas políticas salariais praticadas durante o regime militar e a Nova República.
Ao longo desse período o movimento sindical conseguiu driblar, nas mesas de negociação, com relativo sucesso, as rígidas regras impostas por essas políticas, ora obtendo
índices de reajustes superiores aos previstos em lei, ora reduzindo a periodicidade com
que os reajustes ocorriam. Sem dúvida, este foi o “caldo de cultura” que favoreceu a
consolidação de uma cultura negocial no seio do sindicalismo brasileiro3.
Entretanto, o movimento sindical não se limitou a tratar dessa questão nos
seus dissídios e negociações.
Estudos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) e de pesquisadores como o sociólogo Amaury de Souza e o
jurista Cid Sitrângulo, mostram que houve um adensamento temático dos acordos
e convenções coletivas.
Esses estudos revelam a presença de outras cláusulas de natureza salarial em
acordos e convenções pesquisados, entre elas a concessão de adicional de férias,
complementação de décimo terceiro salário e adicionais de turno, por tempo de
serviço e por assiduidade.
Em relação ao tema Condições de Trabalho, os estudos mostram a existência de várias cláusulas sobre estabilidade provisória para gestantes, acidentados
no exercício da atividade laboral e dirigentes sindicais, alimentação, assistência
médica e odontológica complementar e proteção e segurança no trabalho.
1 Economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) -, técnica do
Escritório Regional de Minas Gerais e doutora em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG). Email: [email protected].
2 Sociólogo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) -, técnico do setor de Pesquisas Sindicais, pesquisador do projeto Observatório das Metrópoles/Núcleo São Paulo do Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica (PUC)/SP, mestrando em Arquitetura e Urbanismo/ Habitat da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). Email: [email protected]
3 Para uma discussão detalhada acerca do enfrentamento, pelo movimento sindical, das políticas salariais durante o
regime militar, ver Oliveira (1985).
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Sobre o tema Normas de Trabalho, constam cláusulas relacionadas ao horário e à duração do trabalho, inclusive à redução da jornada. Surgem, também,
cláusulas relacionadas aos chamados Assuntos Sindicais, entre elas propaganda
sindical, criação de comissões paritárias de negociação e conciliação, regras para
eleição de delegados sindicais, livre acesso dos dirigentes sindicais nos locais de
trabalho, liberação do ponto para os dirigentes sindicais e obrigatoriedade de participação de empregados sindicalizados nas Comissões Internas de Prevenção de
Acidentes de Trabalho (CIPAS).
Os estudos em questão também mostram que desde o final de década de 70
começaram a surgir nos acordos e convenções cláusulas que previam a ampliação do prazo da licença-maternidade. Anos mais tarde, a Constituição de 1988
ampliou o prazo da licença maternidade de três para quatro meses, estendendo
esse benefício a todas as trabalhadoras. Outra cláusula que constava nos acordos
e convenções coletivas no final da década de 70 e que se tornou um direito para o
conjunto da classe trabalhadora na Constituição de 1988 foi o adicional de férias.
Esse processo de adensamento temático dos acordos e convenções coletivas
no período 1979-1989 está relacionado, primeiramente, à retomada do ativismo
sindical no País após os anos mais duros do regime militar e ao protagonismo
por ele assumido na luta pela redemocratização do País. Em segundo lugar, a
inclusão de novas conquistas trabalhistas nos instrumentos normativos pode ser
vista como resultado de uma estratégia que buscava ampliar o espaço de intervenção dos sindicatos na negociação coletiva, em face das restrições impostas pelas
políticas salariais.
Por fim, a transformação de conquistas negociadas em direitos coletivos é
parte do próprio processo de aperfeiçoamento do direito do trabalho.
Resultados das Negociações Coletivas na “Década Liberal”
A década de 90 representou a interrupção da trajetória virtuosa cumprida
pelo sindicalismo brasileiro e isso se deveu à conjugação de fatores de natureza
econômica e política, amplamente comentados na bibliografia especializada existente no País sobre o mundo do trabalho.
Um desses fatores – e, talvez, um dos mais importantes - foi a elevação
pronunciada e sistemática das taxas de desemprego e a queda na taxa de formalização do emprego. A Tabela 1 ilustra o comportamento, em termos absolu-
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tos, do desemprego e da informalidade em quatro diferentes anos (1985, 1989,
1996 e 1999) e mostra a variação anual média desses indicadores nos períodos
1985/1989, 1989/1996 e 1996/1999. Os dados são da Pesquisa de Emprego e
Desemprego da Região Metropolitana de São Paulo.
Tabela 1 - População Economicamente Ativa por Posição na Ocupação –
Região Metropolitana de São Paulo - 1985-1999 (Em Mil Pessoas)
Especificações
Anos
Variação anual média (em %)
1985
1989
1996
1999
85/89
89/96
Ocupados
5.711
6.553
7.116
7.251
3,5
1,2
96/99
0,6
- Assalariados formais (1)
3.529
4.115
3.672
3.546
3,9
-1,6
-1,2
- Informais (2)
3,0
1.331
1.619
2.220
2.429
5,0
4,6
- Demais
851
819
1.224
1.276
-0,9
5,9
1,4
- Desempregados
794
624
1.266
1.734
-5,8
10,6
11,1
Fontes: Elaboração do Escritório Regional do DIEESE em Minas Gerais Baseada nos Dados de
Convênio DIEESE e Fundação SEADE; Pesquisa de Emprego e Desemprego; Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE) e Censos Demográficos de 1980 e 1991.
Notas: (1) Assalariados do setor privado com carteira e do setor público (2) Assalariados do setor
privado sem carteira e autônomos Nota: Estimativas de 1985 e 1989 feitas por meio de interpolação
intercensitária.
A Tabela 1 mostra o crescimento simultâneo do desemprego e da informalidade na década de 90, embora se observe que esta última ampliava sua participação na ocupação total desde meados da década de 80.
A escalada do desemprego e o crescimento da informalidade solaparam
drasticamente o poder sindical, tendo efeitos prolongados sobre a capacidade de
mobilização dos trabalhadores e sobre a contratação coletiva.
As estratégias sindicais, de um modo geral, visaram deter as ofensivas empresariais contra os direitos trabalhistas, conter a queda do nível de emprego e a
precarização das condições de trabalho. Além do mais, os sindicatos enfrentaram
a fragmentação de suas bases ocasionada pela massiva adoção da terceirização
pelas empresas, como forma de redução de custos fixos.
Por outro lado, a privatização de grandes empresas nos setores de infraestrutura – siderurgia, telecomunicações e energia elétrica - teve impactos dramáticos
sobre o sindicalismo ligado às estatais, que foi umas das pontas de lança do ativismo sindical nos anos 80. Além das privatizações, houve intensa reestruturação de
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empresas estatais nos setores produtivos e financeiros, que teve desdobramentos
importantes sobre os trabalhadores e o movimento sindical.
É preciso destacar, também, que o Estado brasileiro assumiu uma postura
fortemente antitrabalhista e antissindical em toda a década de 90. No primeiro
mandato de Fernando Henrique Cardoso, a reforma trabalhista era uma das peças
centrais do programa de ajustamento macroeconômico, sendo vista como uma
das condições prévias para estimular a retomada da capacidade de investimento
da iniciativa privada no País.
A investida estatal contra os direitos trabalhistas endossou as ofensivas patronais que visavam à flexibilização ou retirada de conquistas adquiridas, reforçando, assim, a natureza defensiva das estratégias sindicais nas negociações coletivas.
Em relação aos resultados das negociações coletivas nos anos 90, cabe
dizer que não é tarefa fácil avaliá-los, pois são escassas as informações sistematizadas sobre este tema na bibliografia especializada existente sobre o mundo do
trabalho no período.
Existem, entretanto, dados elaborados pelo DIEESE para o triênio 19931996 que indicam as tendências das negociações coletivas que começavam, então,
a se delinear. (DIEESE, 1999). Há, também, um conjunto de informações acerca dos resultados das negociações coletivas realizadas por algumas categorias de
ponta do sindicalismo, entre 1992 e 1998, que constam de uma pesquisa feita pelo
sociólogo Antônio Carvalho Neto. (CARVALHO NETO, 2001).
O estudo do DIEESE traz os principais resultados obtidos nas negociações
coletivas realizadas por diversas categorias profissionais, no período compreendido
entre 1993 e 1996. Para tanto, a instituição analisou os documentos provenientes
das negociações coletivas realizadas por essas categorias e que constam no Sistema
de Acompanhamento de Contratações Coletivas (SACC) mantido pela instituição.
O estudo do DIEESE procurou identificar os aspectos das relações de trabalho
mais afetados pelos processos de reestruturação empresarial ocorridos no início dos
anos 90 e avaliar como eles estavam sendo tratados nas negociações coletivas.
O estudo captou as tendências iniciais dos processos de negociação coletiva
nos primeiros anos da década de 90, que se caracterizou por mudanças significativas no ambiente político e econômico do País. Os principais resultados apurados
pelo estudo do DIEESE foram:
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1. Verificou-se uma relativa estagnação no conteúdo dos convênios
coletivos firmados, embora isso não tenha levado a um retrocesso em relação ao patamar já conquistado, a despeito das adversidades enfrentadas pelo movimento sindical nas negociações.
2. Num grupo restrito de acordos e categorias observou-se a inclusão de cláusulas referentes a mudanças tecnológicas e organizacionais, à terceirização, à prevenção de acidentes de trabalho e de doenças profissionais e a fóruns de discussão e negociação no âmbito
das empresas. Essas cláusulas refletem as tentativas dos sindicatos
de interferirem nos processos de reestruturação das empresas.
3. Houve, também, um crescimento significativo do número de cláusulas referentes à participação nos lucros ou resultados, em virtude
do fim da política salarial, em 1995.
4. Algumas convenções coletivas incluíram cláusulas referentes a alterações no regime da jornada de trabalho, também conhecida como
Banco de Horas, cuja negociação, à semelhança da participação
nos lucros ou resultados, ocorre no âmbito das empresas. Segundo
o DIEESE, a jornada foi o aspecto do processo de trabalho
mais afetado pelas mudanças produtivas e organizacionais
ocorridas na década de 90.
5. Houve, também, aumento no número de cláusulas relacionadas
às demissões, visando assegurar compensações aos trabalhadores
demitidos. Um número muito restrito de instrumentos normativos
contemplou garantias à preservação do nível de emprego ou alguma forma de estabilidade temporária a trabalhadores em situações
específicas como vésperas de aposentadoria, retorno de licença
maternidade e retorno de afastamento pelo Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS).
6. Raramente foram encontradas cláusulas sobre organização dos
trabalhadores nos locais de trabalho ou referentes ao acesso dos
sindicatos às informações das empresas. Entretanto, observou-se
disseminação de cláusulas que previam formas de solução extrajudicial dos conflitos trabalhistas. Isso pode indicar, por um lado, que
o movimento sindical apostava em novas formas de solução dos
conflitos. Mas, por outro lado, pode ter sido consequência de um
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indesejável afastamento dos órgãos estatais de mediação e arbitragem trabalhista – Ministério e Justiça do Trabalho – em relação ao
movimento sindical, dado o contexto político da época.
7. O estudo argumenta, por fim, que dada a natureza dos temas que
passaram a ocupar a agenda sindical do período, tais como a PLR
e o Banco de Horas, a negociação coletiva por empresa assumiu
maior evidência, mas isso não implicou o seu predomínio sobre a
negociação por setor.
Com base nos resultados apurados pelo DIEESE para o triênio 1993-1996, é
possível dizer que nas negociações coletivas ocorridas na década de 90 tratou-se, ao
mesmo tempo, de preservar as conquistas obtidas nos anos 80 e de dar respostas
a problemas que emergiram no cenário econômico da chamada “década liberal”.
É preciso ressaltar que, em virtude das elevadas taxas de desemprego, havia
enormes dificuldades para a realização de greves. Sem o combustível das greves, os
processos de negociação coletiva perderam boa parte de sua força.
Finalmente, em relação ao estudo do DIEESE, cabe ressalvar que como
os resultados acima mencionados se referem a um curto período de tempo, eles
devem ser usados com a devida cautela.
O sociólogo Antônio Carvalho Neto oferece outra visão sobre como o movimento sindical enfrentou as adversidades da década de 90. Ele analisa as negociações coletivas realizadas por algumas categorias de ponta do sindicalismo,
durante o período compreendido entre 1992 e 1998, entre elas, os trabalhadores
em telecomunicações, os bancários dos setores privado e estatal, os químicos da
região do ABC e de São Paulo e os metalúrgicos do ABC, de São Paulo e de
Betim. (CARVALHO NETO, 2001). A pesquisa envolveu a análise dos acordos
e convenções coletivas de trabalho, firmados por essas categorias no período em
questão, além de entrevistas com dirigentes sindicais.
Como a pesquisa feita por Carvalho Neto (2001) compreendeu um período
de tempo mais longo, ela foi capaz de capturar com mais precisão as mudanças
ocorridas nos processos de negociação das categorias analisadas, dados os desafios
postos pelo ambiente político e econômico da década liberal. Além do mais, por
se tratar de categorias importantes do sindicalismo brasileiro, os resultados apurados pelo autor trazem boas surpresas. Entretanto, também ensejam reflexões
sobre as diferenças existentes no âmbito do sindicalismo brasileiro em relação ao
Livro.indb 84
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85
poder de contratação coletiva.
Carvalho Neto (2001) detectou, ao analisar os documentos resultantes das
negociações coletivas – acordos e convenções -, que à exceção dos bancários
do segmento estatal, todas as categorias analisadas haviam conseguido
manter o poder de compra dos salários entre 1992 e 1998, mesmo após o fim
da política salarial.
Em todos os setores analisados por Carvalho Neto (2001) a participação
nos lucros ou resultados se impôs como o principal tema da negociação coletiva
e, surpreendentemente, o autor constatou que a maioria dos sindicalistas entrevistados a consideravam uma oportunidade, e não um problema. Essa oportunidade
se relacionava à possibilidade de que a negociação sobre a participação nos lucros
ou resultados favorecesse a discussão de temas mais complexos, como organização nos locais de trabalho.
Em relação aos demais temas pesquisados, Carvalho Neto (2001) constatou que:
1. Não houve retrocesso em relação aos benefícios sociais concedidos aos trabalhadores, na forma de auxílios diversos (alimentação,
creche, educação etc.), mas também não houve ampliação dessas
conquistas.
2. A flexibilização da jornada de trabalho ocorreu por empresa e, na
percepção dos dirigentes sindicais entrevistados, a negociação sobre esse tema não representou, necessariamente, um retrocesso,
pois também propiciou o fortalecimento da ação sindical no interior das empresas.
3. Houve redução nos percentuais pagos a título de horas extras na
maioria dos acordos analisados, que previam majorações mais elevadas que as definidas em lei. O que se viu, na maioria dos casos, foi
a equiparação entre a lei e o contrato.
4. Houve algumas conquistas importantes para trabalhadores que
foram demitidos pouco tempo antes de sua aposentadoria (indenizações, pagamento do plano de saúde pela empresa até a aposentadoria etc) e para trabalhadores afastados por motivo de doença
profissional (complementação do auxílio-doença do INSS, pelas
empresas, concessão de auxílio alimentação durante o período de
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86
afastamento, entre outras).
5. Houve avanços importantes em cláusulas que tratam da prevenção de acidentes de trabalho, de doenças profissionais, do custeio
de tratamento de saúde para trabalhadores vítimas de Lesões por
Esforços Repetitivos (LER).
6. Houve avanços nas questões que tratam das relações entre empresas e sindicatos, com a criação de formas diretas de representação
de interesses nos locais de trabalho, como comissões e grupos de
trabalho. O autor explica esse fato em função da necessidade de
aproximar os sindicatos dos locais de trabalho no contexto dos
processos de reestruturação das empresas.
7. Por fim, o autor detectou nos acordos pesquisados um número significativo de cláusulas relacionadas a tentativas de intervenção dos
sindicatos nos processos de reestruturação das empresas, como
aquelas que tratam de limites à terceirização e de negociação prévia
sobre a introdução de inovações tecnológicas e gerenciais.
A conclusão do autor, em face desses resultados, é que “a década de 90 não
foi uma década perdida [para] as negociações coletivas”, em que pese o cenário
extremamente desfavorável aos trabalhadores. (CARVALHO NETO, 2001, p. 270).
Para o autor,
o sindicalismo de ponta no Brasil [...] não só deu sinais de que
está muito vivo, como foi além da dura luta de resistência para
não perder o que conquistou nos anos 80, chegando a garantir
alguns avanços significativos e mesmo certo poder de intervenção em uma realidade que lhe é ainda mais desfavorável
que a enfrentada pelo sindicalismo dos países mais desenvolvidos. (CARVALHO NETO, 2001, p. 271).
Os resultados das negociações coletivas na década de 90 apurados por Carvalho Neto, embora sejam positivamente surpreendentes, também sinalizam que
se ampliou a diferenciação do poder contratual no interior do movimento sindical, colocando, de um lado, os setores de ponta e, de outro, os setores com menor
poder de barganha.
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87
Essa diferenciação impôs à ação sindical uma lógica particularista, com consequências negativas sobre a solidariedade de classe e o papel da vanguarda social
do movimento sindical.
As Negociações Salariais após o Plano Real
Após quase 30 anos (1965-1994) de políticas salariais, os reajustes salariais
dos trabalhadores brasileiros, a partir de 1995, passaram a ser definidos exclusivamente pela livre negociação. Exceção foi mantida para o reajuste anual do salário
mínimo, que continuou a ser definido em lei.
Em 1º de julho de 1995 ocorreu o último reajuste automático de salários, que
pôs fim a um longo ciclo de indexação formal de salários e deu início a um novo
momento na história da negociação salarial no País.
Para o movimento sindical o começo dessa nova fase ocorreu sob circunstâncias muito desfavoráveis. A combinação entre as oscilações no crescimento
do Produto Interno Bruto (PIB), os altos índices de desemprego, o processo de
reestruturação produtiva e a negociação salarial sem regras pré-definidas influenciou os resultados das negociações salariais nos primeiros anos pós-Plano Real.
Além do mais, é preciso considerar que, a despeito do efetivo sucesso do
Plano Real em debelar a escalada dos preços, a “cultura inflacionária” marcou
profundamente as relações trabalhistas no País. Portanto, era de se esperar que
houvesse, nos primeiros anos pós o Plano Real, uma forte reação patronal diante
da tentativa dos sindicatos em manter o poder aquisitivo dos salários, no contexto
de um desempenho econômico modesto e instável.
A Tabela 2 mostra a distribuição dos reajustes obtidos pelas unidades de
negociação (acordos e convenções coletivas) acompanhadas pelo DIEESE entre
1996 e 1999, tendo com referência o INPC-IBGE.
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Tabela 2 - Distribuição dos Reajustes Salariais em Comparação com o
INPC-IBGE - Brasil – 1996 a 1999
Variação
1996
1997
1998
1999
nº
%
nº
%
nº
%
nº
%
Acima do INPC
120
51,9
184
39,1
141
43,5
111
35,1
Mais de 5% acima
15
6,5
17
3,6
8
2,5
1
0,3
De 4,01% a 5% acima
10
4,3
7
1,5
3
0,9
0
-
De 3,01% a 4% acima
13
5,6
16
3,4
3
0,9
6
1,9
De 2,01% a 3% acima
22
9,5
19
4,0
12
3,7
7
2,2
De 1,01% a 2% acima
33
14,3
43
9,1
23
7,1
21
6,6
De 0,01% a 1% acima
27
11,7
82
17,4
92
28,4
76
24,1
Igual ao INPC
9
3,9
73
15,5
64
19,8
46
14,6
De 0,01% a 1% abaixo
19
8,2
138
29,4
84
25,9
80
25,3
De 1,01% a 2% abaixo
35
15,2
37
7,9
18
5,6
31
9,8
De 2,01% a 3% abaixo
15
6,5
19
4,0
12
3,7
28
8,9
De 3,01% a 4% abaixo
8
3,5
6
1,3
3
0,9
15
4,7
De 4,01% a 5% abaixo
9
3,9
4
0,9
2
0,6
2
0,6
Mais de 5% abaixo
16
6,9
9
1,9
0
-
3
0,9
Abaixo do INPC
102
44,2
213
45,3
119
36,7
159
50,3
Total
231
100,0
470
100,0
324
100,0
316
100,0
Fontes: DIEESE – Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS).
A Tabela 2 mostra que 1999 foi o ano mais difícil para as negociações salariais no período em tela, pois 50% das unidades de negociação analisadas previram reajustes salariais abaixo da variação do INPC-IBGE.
O melhor ano da série para os reajustes salariais foi 1996, quando 51,9% das
unidades de negociação registraram ganhos reais. Não obstante esses momentos
extremos, todo o período foi marcado por um número expressivo de unidades de
negociação que registraram reajustes salariais abaixo do INPC-IBGE. Este dado
ilustra nitidamente as dificuldades enfrentadas pelas entidades sindicais em suas
negociações salariais nos primeiros anos que se seguiram ao Plano Real.
O segundo período a ser analisado compreende os anos de 2000 a 2003,
também marcado por fortes oscilações no desempenho da economia e por um
“repique” inflacionário em 2002 e 2003.
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89
No início da nova década havia indícios de recuperação da economia e do
mercado de trabalho que se refletiram nos resultados das negociações salariais,
como mostra a Tabela 3.
Tabela 3 - Distribuição dos Reajustes Salariais em Comparação com o
INPC-IBGE - Brasil – 2000 a 2003
Variação
2000
2001
2002
2003
nº
%
nº
%
nº
%
nº
%
190
51,5
214
43,2
124
25,8
103
18,8
6
1,6
7
1,4
0
-
3
0,5
De 4,01% a 5% acima
3
0,8
3
0,6
2
0,4
1
0,2
De 3,01% a 4% acima
19
5,1
3
0,6
2
0,4
1
0,2
De 2,01% a 3% acima
28
7,6
26
5,3
3
0,6
9
1,6
De 1,01% a 2% acima
46
12,5
47
9,5
12
2,5
14
2,6
De 0,01% a 1% acima
88
23,8
128
25,9
105
21,9
75
13,7
Igual ao INPC
56
15,2
97
19,6
133
27,7
126
23,0
De 0,01% a 1% abaixo
60
16,3
99
20,0
74
15,4
51
9,3
De 1,01% a 2% abaixo
30
8,1
51
10,3
64
13,3
63
11,5
De 2,01% a 3% abaixo
13
3,5
11
2,2
43
9,0
43
7,8
De 3,01% a 4% abaixo
5
1,4
8
1,6
15
3,1
35
6,4
De 4,01% a 5% abaixo
6
1,6
4
0,8
18
3,8
33
6,0
Mais de 5% abaixo
9
2,4
11
2,2
9
1,9
94
17,2
Acima do INPC
Mais de 5% acima
Abaixo do INPC
123
33,3
184
37,2
223
46,5
319
58,2
Total
369
100,0
495
100,0
480
100,0
548
100,0
Fontes: DIEESE – Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS).
Em 2000, o DIEESE registrou uma considerável melhoria nos ganhos salariais
em relação ao ano anterior, pois o percentual de negociações com reajustes acima do
INPC-IBGE passou de 35% para 52%. Porém, a recuperação econômica ocorrida
no primeiro ano da nova década foi abortada, entre outros fatores, pelo “apagão” no
setor hidrelétrico. Ademais, a partir de 2002, a inflação voltou, gradativamente, a atingir patamares elevados, em decorrência, inclusive, das incertezas e especulações que
caracterizaram o cenário político e econômico da sucessão do ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso e do primeiro ano do mandato do presidente Luis Inácio Lula da
Silva. Em 2003, o INPC-IBGE acumulado em algumas datas-bases superou a casa
dos 20%. A Tabela 3 ilustra o impacto sobre as negociações salariais de todo esse
movimento de idas e vindas no campo econômico.
Livro.indb 89
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90
Em 2002 e 2003 as entidades sindicais novamente enfrentaram dificuldades
para obter bons resultados em suas negociações salariais, sendo que, em 2003,
58% das unidades de negociação analisadas pelo DIEESE registraram reajustes
abaixo do INPC-IBGE.
Por fim, o último período relevante para a análise dos resultados das negociações salariais vai de 2004 a 2008.
Findo o primeiro ano do primeiro mandato do Presidente Lula, dissiparam-se as incertezas no meio empresarial em relação à condução da política macroeconômica que, no essencial, preservou um manejo mais conservador das políticas
monetária e fiscal, baseado na geração de superávits primários, no aumento das
reservas cambiais e no controle da inflação por meio da manutenção de taxas de
juros elevadas.
A partir de 2004, a economia começou a dar sinais de recuperação mais
consistentes, em face das boas condições da economia internacional, da gradativa
retomada do fomento estatal ao desenvolvimento econômico e da ampliação dos
programas públicos de geração e distribuição de renda, entre os quais a política
de recuperação do salário mínimo é uma das peças centrais. Ademais, o ambiente
político tornou-se mais favorável à interlocução entre o Estado e o movimento
sindical, sendo a política de reajuste do salário mínimo objeto de negociação entre
o governo e as centrais sindicais.
A melhoria no cenário político e econômico se refletiu nas negociações salariais, cujos resultados tiveram melhorias bastante expressivas, tal como mostra
a Tabela 4.
Livro.indb 90
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91
Tabela 4 - Distribuição dos Reajustes Salariais em Comparação com o
INPC-IBGE - Brasil – 2004 a 2008
Variação
2004
2005
2006
2007
2008
nº
%
nº
%
nº
%
nº
%
Acima do INPC
361
54,9
459
71,7
565
Mais de 5% acima
1
0,2
1
0,2
14
86,3
627
87,7
548
77,6
2,1
10
1,4
2
De 4,01% a 5% acima
23
3,5
3
0,5
17
0,3
2,6
8
1,1
5
0,7
De 3,01% a 4% acima
30
4,6
19
3,0
46
7,0
20
2,8
28
4,0
De 2,01% a 3% acima
54
8,2
52
8,1
130
19,8
93
13,0
65
9,2
De 1,01% a 2% acima
96
14,6
162
25,3
187
28,5
254
35,5
202
28,6
De 0,01% a 1% acima
157
23,9
222
34,7
171
26,1
242
33,8
246
34,8
Igual ao INPC
172
26,1
104
16,3
70
10,7
59
8,3
74
10,5
De 0,01% a 1% abaixo
69
10,5
58
9,1
20
3,1
26
3,6
73
10,3
De 1,01% a 2% abaixo
33
5,0
12
1,9
0
-
3
0,4
9
1,3
De 2,01% a 3% abaixo
14
2,1
2
0,3
0
-
0
-
1
0,1
De 3,01% a 4% abaixo
4
0,6
2
0,3
0
-
0
-
0
-
De 4,01% a 5% abaixo
1
0,2
2
0,3
0
-
0
-
O
-
Mais de 5% abaixo
4
0,6
1
0,2
0
-
0
-
1
0,1
Abaixo do INPC
125
19,0
77
12,0
20
3,1
29
4,1
84
11,9
Total
658
100,0
640
100,0
655
100,0
715
100,0
706
100,0
Fontes: DIEESE – Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS).
A partir de 2004, ampliou-se continuamente o percentual de unidades de
negociação que registraram reajustes salariais acima do INPC-IBGE acumulado
nas datas-base, embora, na maior parte do período analisado, os ganhos reais se
situem em patamares modestos – de 0,01% a 1% acima do INPC-IBGE.
Em 2005, 2006 e 2007, a ampla maioria das unidades de negociação registrou ganhos reais de salários e, mesmo em 2008, cujo último trimestre foi marcado pelo início de uma crise econômica internacional, os resultados das negociações salariais foram favoráveis aos trabalhadores.
O Gráfico 1 resume os resultados das negociações salariais no período 19962008, em relação ao INPC-IBGE.
Livro.indb 91
03/02/2011 11:34:07
92
Gráfico 1 - Distribuição dos Reajustes Salariais em Comparação com o
INPC-IBGE - Brasil – 1996 a 2008
Fonte: DIEESE.
Aqui cabe comentar, brevemente, a relação entre a política de valorização do
salário mínimo e os resultados das negociações dos pisos salariais das diversas categorias de trabalhadores. Tal relação, aparentemente, é ambígua, pois, no período
de 2004 a 2008, segundo dados do DIEESE, os valores dos pisos se aproximaram
cada vez mais do valor do salário mínimo. A Tabela 5 ilustra esta afirmação.
Livro.indb 92
03/02/2011 11:34:07
93
Tabela 5 - Distribuição dos Pisos Salariais por Faixas de Salário Mínimo
Vigente na Data-base - Brasil – 2004 a 2008
Ano e Pisos Salariais
Faixas de
salário
mínimo
2004
%
2005
%
acumul.
%
2006
%
acumul.
%
2007
%
acumul.
%
2008
%
acumul.
%
%
acumul.
1,00
0,9
0,9
1,1
1,1
2,7
2,7
3,4
3,4
5,8
5,8
1,01 a 1,25
23,5
24,4
25,3
26,3
48,0
50,7
52,9
56,3
50,4
56,2
1,26 a 1,50
21,6
46,0
23,7
50,0
21,9
72,6
20,9
77,2
21,0
77,1
1,51 a 1,75
16,7
62,7
19,1
69,1
9,3
81,9
10,4
87,6
13,1
90,2
1,76 a 2,00
15,4
78,1
11,4
80,6
6,6
88,5
4,2
91,8
4,6
94,9
2,01 a 2,25
10,2
88,3
5,6
86,2
2,4
90,9
2,5
94,3
2,2
97,1
2,26 a 2,50
2,5
90,7
4,5
90,7
2,9
93,8
1,1
95,4
0,6
97,8
2,51 a 2,75
3,4
94,1
3,2
93,9
1,8
95,6
0,9
96,3
1,0
98,7
2,76 a 3,00
0,6
94,8
0,8
94,7
0,9
96,5
1,4
97,7
0,0
98,7
Mais de 3,00
5,2
100,0
5,3
100,0
3,5
100,0
2,3
100,0
1,3
100,0
100,0
-
100,0
-
100,0
-
100,0
-
100,0
-
Total
Fonte: SAS-DIEESE.
Obs.: para cada unidade de negociação foi considerado apenas um piso salarial, que corresponde ao
menor valor fixado para o desempenho das atividades-fim das empresas.
A tendência mostrada na Tabela 5 é que ao passo em que diminui o percentual
de pisos salariais cujo valor ultrapassa três salários mínimos vigentes em cada data-base (de 5,2%, em 2004, para 1,3%, em 2008), amplia-se expressivamente o percentual de pisos na faixa de 1,01 a 1,25 salários mínimos (de 23,5% em 2004 para 50,4%
em 2008). Essa tendência pode ensejar a conclusão de que a política de valorização
do salário mínimo tem tido um efeito negativo sobre o reajuste dos pisos salariais.
De fato, essa tendência corrobora o fato de que os salários pagos no País são
muitos baixos e mostra que as entidades sindicais não conseguiram, no período
em tela, incorporar aos pisos os mesmos percentuais de reajuste aplicados ao
salário mínimo.
Mas isso não significa que a política de valorização do salário mínimo atue
em detrimento da negociação dos pisos salariais. Ao contrário, tal política tem
forçado as empresas a “correrem atrás” do reajuste do mínimo no momento em
que negociam o reajuste dos pisos salariais de seus empregados. Ou seja, o valor
nominal do salário mínimo é um parâmetro inescapável que passou a orientar as
decisões empresariais e as próprias estratégias sindicais.
Livro.indb 93
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94
Mais ainda, o percentual de reajuste anual do salário mínimo pode se tornar
uma referência, nas negociações coletivas, para a correção dos valores dos pisos,
de forma a se evitar que o valor nominal dos pisos se aproxime em demasia do
salário mínimo. Se isso ocorrer e mantida a atual política de ganhos reais para o
salário mínimo, é possível que, em médio prazo, ocorra uma melhoria nos valores
nominais dos pisos salariais. Isto é, uma vez que as empresas absorvam a política de recuperação do salário mínimo, num contexto de crescimento econômico,
pode ocorrer um gradativo descolamento entre este e o valor nominal dos pisos
de seus empregados. As consequências desse movimento são incontestáveis sobre
a ampliação da massa salarial da economia.
O balanço do período 2004 a 2008 indica que num contexto onde se conjugaram
a estabilidade econômica e a retomada do crescimento econômico e em que o Estado
promoveu políticas ativas de distribuição de renda, a reposição das perdas inflacionárias
se tornou o patamar mínimo para as negociações salariais. Ou seja, o conflito distributivo entre capital e trabalho, nesse contexto, se deslocou para outro campo onde o que
está em jogo é a apropriação dos ganhos de produtividade obtidos pelas empresas.
Negociação Coletiva: Restrições e Desafios
Nas três décadas que se seguiram ao final dos anos 70 a negociação coletiva consolidou-se como uma prática trabalhista corriqueira para a definição de
reajustes salariais e de outras questões relacionadas às condições de trabalho no
Brasil. Mais ainda, tornou-se uma das principais formas de ação sindical para a
defesa do poder de compra dos salários, para a conquista de novos direitos ou
aperfeiçoamento de direitos previstos em lei, particularmente nos momentos em
que existiram fortes restrições à realização de greves, dadas as adversidades do
ambiente econômico e político.
Não obstante os êxitos alcançados – não isentos de custos, obviamente -, a
prática da negociação coletiva se encontra restringida no País por uma série de
empecilhos legais.
De acordo com José Francisco Siqueira Neto, a negociação coletiva é uma
prática que depende, entre outros fatores, das condições em que atuam os agentes
negociadores. (SIQUEIRA NETO, 1994). Se há restrições à organização e à manifestação dos agentes, há, consequentemente, constrangimentos ao exercício da
negociação e limites aos seus resultados.
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Siqueira Neto considera o enquadramento sindical compulsório um dos
principais entraves ao desenvolvimento das negociações coletivas no Brasil, pois
ele limita fortemente a liberdade de organização sindical e impede que a negociação coletiva ocorra em diversos níveis e âmbitos – por ramo de atividade e setor
econômico, entre regiões e no interior de uma empresa, via organização nos locais de trabalho -, em consonância com as diferentes realidades vivenciadas pelas
diversas categorias de trabalhadores e com as mudanças ocorridas no mundo do
trabalho, nas últimas décadas.
Além disso, Siqueira Neto (1994) menciona outros limites legais à efetividade do potencial de solução de conflitos da negociação coletiva no País. Um
deles é a limitação do período de negociação a uma determinada época do ano, a
menos que se haja estabelecido uma cultura de negociação mais sistemática entre
as partes. Além do mais, o período definido em lei para a consumação de todo o
processo negocial pode ser insuficiente, conforme a complexidade das questões a
serem tratadas e as dificuldades encontradas pelas partes para chegarem ao acordo.
Outro limite é o fato de que os instrumentos normativos, findo o seu prazo de
vigência, podem ter seu efeito suspenso, anulando-se a validade de conquistas e direitos já previstos, a menos que haja o ajuizamento do dissídio coletivo. Como a Emenda
Constitucional nº 45 estabeleceu o princípio do comum acordo para instauração dos
dissídios, o impasse numa negociação constitui-se em fator de pressão sobre os sindicatos, que os obriga, muitas vezes, a celebrarem acordos insatisfatórios.
Outro obstáculo crucial ao desenvolvimento da negociação coletiva no Brasil é a existência de uma lei de greve conservadora e excessivamente formalista,
que dificulta o exercício do direito de greve pelos trabalhadores.
Um dos principais problemas identificados pelo autor na lei de greve brasileira é que ela “embute uma indisfarçada obsessão por transformar o exercício
regular de um direito em delito, [empregando] vários ardis para poder proferir
um julgamento sumário, transformando o direito de greve em exercício abusivo”.
(SIQUEIRA NETO, 1994, p. 250).
Por fim, as restrições ao pleno desenvolvimento da negociação coletiva
no Brasil advêm da não-ratificação, pelo Poder Legislativo, das principais convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) condizentes com um
sistema democrático de relações de trabalho. Entre elas se destaca a Convenção
158, que estabelece critérios para o término da relação de trabalho por iniciativa
do empregador, visando restringir a demissão imotivada.
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Outra questão que tem impactos importantes sobre a eficácia da negociação
coletiva como forma de solução dos conflitos trabalhistas é a terciarização, que
deslocou o eixo dos sistemas econômicos da indústria para os serviços.
A negociação coletiva é uma prática sindical relacionada ao crescimento da
classe trabalhadora inserida em grandes unidades industriais integradas. A grande
indústria moderna propiciou um ambiente favorável à organização dos trabalhadores em sindicatos relativamente homogêneos e espacialmente próximos uns
dos outros, favorecendo, dessa maneira, a ação coletiva e a constituição de vínculos identitários entre eles.
Esses elementos influenciam a eficácia dos processos de negociação coletiva,
pois propiciam a discussão de temas comuns a uma ampla parcela dos trabalhadores, a partir dos quais é possível estabelecer alguns parâmetros mínimos para a
realização do trabalho assalariado – salários, contrato de trabalho, jornada, processos produtivos, tecnologia e qualificação profissional, entre outros.
Inversamente, a predominância assumida pelo setor de serviços leva à intensa fragmentação dos trabalhadores segundo tipos de empresas e de contratos de
trabalho, de patamares salariais e demais condições de trabalho. Além do mais,
promove a dispersão geográfica das unidades produtivas.
Ademais, a mão-de-obra sindicalizada liberada do setor industrial não necessariamente se ressindicaliza ou, então, passa a se associar a sindicatos mais frágeis
e com menor tradição política. Mesmo no interior de sindicatos tradicionais do
setor de serviços ocorre um processo interno de desmembramento das categorias
que tem como consequência a pulverização dos processos de negociação coletiva
e a crescente diferenciação entre os convênios coletivos de trabalho celebrados.
Em face dessas mudanças, a negociação coletiva perdeu parte de seu poder
para fixar as condições gerais de exercício do trabalho assalariado.
É preciso considerar que apenas a superação das restrições legais ao exercício da negociação coletiva não garantirá a ampliação das conquistas trabalhistas,
dadas as profundas desigualdades existentes no País ao nível do mercado de trabalho e da organização sindical.
Não obstante, a superação das atuais restrições legais à negociação coletiva
pode criar certas condições institucionais que favoreçam a ampliação da capacidade contratual do conjunto do movimento sindical brasileiro.
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AGRADECIMENTOS
Os autores gostariam de registrar seus agradecimentos a Miguel Huertas e
Crystiane Peres, técnicos do DIEESE, por suas contribuições à discussão dos
resultados das negociações salariais no período 1996-2008.
REFERÊNCIAS
CARVALHO NETO, A. Relações de trabalho e negociação coletiva na
virada do milênio: estudo em quatro setores dinâmicos da economia brasileira.
Belo Horizonte: Vozes, 2001.
DIEESE. Balanço das negociações em 2003. São Paulo, 2004.
______. Balanço das negociações em 2004. São Paulo, 2005.
______. Balanço das negociações em 2005. São Paulo, 2006.
______. Balanço das negociações de reajustes salariais em 2006. São Paulo,
2007.
______. Balanço das negociações de reajustes salariais em 2007. São Paulo,
2008.
______. O comportamento das negociações coletivas nos anos 90: 19931996. São Paulo: Papirus, 1999. (Pesquisa DIEESE, n. 15).
______. Quadro das cláusulas introduzidas em negociações coletivas
(1970 – 1999). São Paulo, 2003.
OLIVEIRA, C. P. R. de. Política salarial no Brasil (1964-1984): idas e vindas
do corporativismo estatizante. 1985. 197 f. Dissertação (Mestrado em Ciência
Política) - Departamento de Ciência Política, Universidade Federal de Minas
Gerais, Belo Horizonte, 1985.
SIQUEIRA NETO, J. F. Contrato coletivo de trabalho: requisitos e condicionantes para sua implementação no Brasil. In: OLIVEIRA, C. A. et al. O mundo
do trabalho: crise e mudança no final do século. Campinas: Scritta, 1994.
SITRÂNGULO, C. J. Conteúdo dos dissídios coletivos de trabalho: 1947-
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98
1976. São Paulo: LTr, 1978.
SOUZA, A. de. A nova política salarial e as negociações coletivas de trabalho no Brasil, 1979-1982: um estudo exploratório. Rio de Janeiro: Instituto
Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, 1983. Mimeografado.
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NEGOCIAÇÕES COLETIVAS EM NOVO POLO
AUTOMOTIVO: MMC E SIMECAT
Alexander Dias Siqueira1
Rosana Ribeiro 2
Introdução
Este capítulo compreende um estudo de caso voltado à análise das negociações coletivas entre o Sindicato dos Metalúrgicos de Catalão (SIMECAT) e a
Mitsubishi Motors Corporation Automotores do Brasil S/A (MMC). Nele investigamos, por meio de alguns instrumentos coletivos, o modo como surgiu e se
desenvolveu o processo de negociação coletiva entre esta empresa e o sindicato
nascente, bem como os demais processos que se somaram à definição dos três
acordos coletivos celebrados entre 2005 e 2007.
A evidência empírica básica da pesquisa compõe-se de três acordos e suas
respectivas pautas de reivindicações, duas convenções e entrevistas. A análise da
base de dados é feita por meio do esquema de classificação de cláusulas segundo o
objeto temático desenvolvido por Horn (2003). Este esquema permite uma análise fiel do escopo temático dos instrumentos coletivos, seja ao longo do tempo,
seja entre diferentes unidades de negociação. Ainda com base em Horn (2003),
comparamos as cláusulas classificadas com a legislação estatal respectiva. Esta
comparação permitirá verificar se, e em que medida, os acordos do SIMECAT
com a MMC criaram regras adicionais à vasta legislação estatal que caracteriza o
sistema brasileiro de relações de emprego, além de indicar se os acordos estão, ou
não, sendo utilizados pelos empregadores para o ajuste de regras de seu interesse.
O capítulo é composto por seis seções. Na primeira seção apresentamos uma
breve história da chegada da empresa no município de Catalão e da constituição
da nova unidade de negociação. Na segunda seção apresentamos a evidência empírica básica da pesquisa e a metodologia de classificação de cláusulas coletivas sob
a ótica do escopo temático e da comparação com a legislação estatal. Na terceira,
apresentamos como se deu a dinâmica de formulação das pautas de negociações
e apontamos a importância das comparações nas relações de trabalho, isto é, o
uso de outros acordos mais maduros como referência. Por último, apresentamos
os resultados dos acordos no que tange ao escopo temático e à comparação com
a legislação.
1 Mestre pelo IE/UFU
2 Doutora pelo IE/UFRJ
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MMC e SIMECAT: Origens e Constituição
A partir da década de 90 do século XX consolidou-se no País a abertura comercial,
e simultaneamente a indústria nacional enfrentou graves problemas de competitividade
em relação aos padrões de produção internacionais. Nesse quadro temos o reaquecimento da demanda doméstica e a ampliação do percentual de veículos importados na
frota nacional. O resultado final foi um grave descompasso entre exportação e importação de veículos, num contexto de elevação do déficit da balança comercial. No intuito
de contornar o agravamento no setor externo o Governo criou o Regime Automotivo
Brasileiro por meio de Medida Provisória editada em dezembro de 19953. O principal
objetivo desse Regime foi vincular o volume de importações, a expansão da produção
local e o montante de exportações. Contudo, inexistia qualquer preocupação em estimular o repasse de tecnologia do exterior para o País. (BOTELHO, 2002).
Diante dessas transformações e estímulos surgiu um novo surto de investimentos na indústria automotiva nos anos 90, que foi desencadeado por influência
de fatores internos e externos como: a recuperação da demanda interna, a estabilidade de preços, a política de atração de novas montadoras, a consolidação do
Mercosul, a concorrência acirrada entre as montadoras locais e os novos rivais,
a instabilidade do oligopólio mundial e a estratégia de internacionalização das
montadoras globais. (RIBEIRO; CUNHA, 2007b).
Esse novo surto de investimento foi marcado por um processo de “desconcentração concentrada” na medida em que a indústria permaneceu concentrada
no Sudeste e no Sul, bem como no Paraná, em Minas Gerais, no Rio Grande do
Sul e no Rio de Janeiro. Todavia, a novidade do período foi a instalação da Ford
na Bahia, e da MMC no município de Catalão, em Goiás. (POSTHUMA, 2000).
A MMC contou com estímulos oferecidos pelo Regime Automotivo, mas também
com incentivos estaduais e municipais para sua instalação em Goiás. Dentre os estímulos
fiscais recebidos destacam-se o Fundo de Participação e Fomento à industrialização do
Estado de Goiás (FOMENTAR)4 e o Fundo Constitucional do Centro-Oeste (FCO)5.
3 A partir do Regime Automotivo, a alíquota de importação se elevou de 20% para 70%, além do que as montadoras
já instaladas poderiam importar com imposto aduaneiro de 30%, desde que, para cada veículo importado outro
fosse exportado. (CARDOSO, 2000).
4 Esse fundo foi criado em 1984 e concedia às indústrias instaladas em Goiás a isenção de 70% do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) por um prazo de 10, 7 ou 5 anos. Os financiamentos foram concedidos em parcelas iguais e fixas acrescidas de juros de 2,4% a.a, sem correção monetária.
5 Esse fundo, previsto na Constituição Federal de 1988, porém regulamentado em 1989, tem como objetivo o
desenvolvimento econômico e social do Centro-Oeste brasileiro por meio de programas de financiamento das atividades produtivas dos setores agropecuário, industrial, agroindustrial, mineral, infraestrutura, turismo, comércio e
serviços. A União disponibiliza 3% do produto da arrecadação do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer
Natureza e do Imposto sobre Produtos Industrializados.
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Esses incentivos também ajudaram na configuração do setor agroindustrial
no Estado de Goiás. O desenvolvimento desse setor, por sua vez, gerou condições para a criação de atrativos para outros investimentos, sobretudo pela formação de um mercado consumidor não desprezível. O município de Catalão, em
particular, tem na estrutura de seu Produto Interno Bruto uma grande contribuição do setor industrial, principalmente de empresas vinculadas aos segmentos
minero-metal-mecânico. Ou seja, o município se localiza numa região de fronteira mineral. (SILVA SÓ, 2004). Entretanto, a estrutura industrial desse município
tem pontos de convergência com o agronegócio, na medida em que os produtos
industriais dessa região têm forte interação com o mercado regional da fronteira
agropecuária fornecendo insumos, máquinas agrícolas e veículos. Vale mencionar,
ainda, que Catalão é rico em diversas jazidas minerais, porém inexistem recursos
minerais utilizados em larga escala pelo setor automobilístico. Noutras palavras,
a base de recursos minerais de Catalão não influenciou a decisão de instalação da
MMC no ano de 1998. (GUIMARÃES; RIBEIRO, 2006).
Dentre os fatores que são apontados para a instalação dessa montadora em
Catalão estão os incentivos fiscais federais, estadual e municipal; a ausência de
tradição sindical; o elevado nível de escolaridade dos jovens locais; a inserção do
município numa privilegiada malha rodo-ferroviária que facilita a movimentação
de componentes, peças e produtos; o elevado índice de venda de veículos 4 por
4 na região Centro-Oeste. Outro ponto importante se refere ao processo de produção da MMC, que não contempla os setores mais sofisticados de uma empresa
automotiva. Neste caso, a companhia não necessita de uma mão-de-obra qualificada e experiente que dificilmente seria encontrada em Catalão.
Por outro lado, a MMC é uma montadora brasileira de capital 100% nacional. Estruturada sob a forma de quotas, tem um contrato de produção e venda
dos veículos da marca Mitsubishi. A empresa nacional paga royalties à Mitsubishi
japonesa e adquire 40% das peças de plantas localizadas no exterior. A MMC tem
baixo índice de nacionalização e importa componentes e peças-chave na montagem de um veículo como motor, caixa de câmbio, estamparia, chassis, equipamentos eletrônicos etc. Somente os itens de menor valor agregado são adquiridos
no mercado nacional. Além disso, a baixa produção de componentes dos veículos
torna a MMC praticamente uma plataforma de montagem. Diante disso, não é
difícil compreender por que a empresa não enfrentou maiores dificuldades de instalação em Catalão, que conta com uma importante rede rodo-ferroviária que
facilita o transporte de peças e componentes importados e o deslocamento dos
veículos produzidos na fábrica. (RIBEIRO; CUNHA, 2007b).
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No ano de 2007, a MMC e as empresas contratadas geraram 1.752 empregos diretos, sendo que 600 postos de trabalhos são oriundos das contratantes.
No mais, o total de empregos indiretos atinge cerca de 5.000 postos de trabalho.
Ou seja, num município com cerca de 75.000 habitantes, o volume de empregos
gerados em função da instalação da MMC e seus impactos sobre os segmentos de
serviços e comércio não são desprezíveis para a realidade local.
Um dos motivos apontados para a instalação de manufaturas em locais sem
tradição manufatureira é a ausência de cultura sindical. Entretanto, no caso da MMC,
em janeiro de 2005, o Sindicato dos Metalúrgicos de Catalão (SIMECAT) foi criado,
e esse motivo começou a se erodir6. O elevado nível de escolaridade dos operários
da fábrica somado ao descontentamento e as poucas chances de mobilidade ocupacional existentes da fábrica contribuíram positivamente para a criação do sindicato.
Em dezembro de 2005, o SIMECAT contava com 710 associados e o número de trabalhadores na categoria girava em torno de 2.500 trabalhadores. Porém,
no ano de 2007, o número de filiações saltou para 1.112, sendo que 64% são
trabalhadores da MMC. O sindicato no estágio atual é filiado à Força Sindical e
conta com a assessoria técnica do Dieese em suas negociações coletivas. A partir
da criação desse sindicato se desenrolaram os primeiros acordos coletivos com a
MMC, que são objetos de investigação deste capítulo.
Dados e Metodologia
A evidência empírica básica da pesquisa compôs-se de três acordos coletivos
e suas respectivas pautas de reivindicações, uma convenção coletiva e de entrevistas
com os sindicalistas do SIMECAT, bem como com o técnico do Dieese que acompanha as negociações entre o Sindicato e a MMC. O critério de definição das pessoas
entrevistadas tomou como referência as sete pessoas que compõem a mesa de negociação dos acordos coletivos. As entrevistas orientaram-se por um conjunto de
questões relativas à relação sindicato-empresa, sindicato-trabalhador e empresa-trabalhadores, tendo como referência os processos de negociação coletiva e os acordos
coletivos. O roteiro de questões foi aplicado no mês de setembro de 2008, sendo
entrevistados o técnico do Dieese, o presidente e dois dirigentes do sindicato7.
A investigação centrou-se no estudo dos acordos coletivos celebrados en6 Para maiores detalhes sobre a criação do Sindicato, ver Ribeiro e Cunha (2007b).
7 Em que pese a insistência em entrevistar o lado patronal sobre as negociações coletivas na MMC, isso não foi
possível. Na melhor das respostas, um diretor afirmou que estas são informações estratégicas da empresa. Em
várias outras situações, nas quais foram procurados o Gerente de Recursos Humanos e o advogado da empresa
que acompanham as negociações, eles nunca estavam em condições de nos atender.
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tre a MMC e o SIMECAT, desde o primeiro instrumento coletivo, e das pautas
de reivindicações respectivas. Convém ressaltar que além da MMC, os acordos
contemplam as demais empresas parceiras no processo de produção dos veículos
da marca Mitsubishi, ou seja, a circunscrição da unidade de negociação abrange
também as empresas HPE componentes plásticos, RCM engenharia e Weldmatic.
A análise dos dados da amostra foi feita após a classificação das cláusulas
segundo o escopo temático. A metodologia de classificação de cláusulas baseia-se
em Horn (2003). Quatro níveis de agregação são reunidos no esquema de Horn
(2003, 2004). A Figura 1 busca fornecer a dimensão desses níveis.
Figura 1 - Níveis de Agregação do Esquema de Classificação de Cláusulas
segundo o Escopo Temático
Fonte: Elaboração Própria dos Autores.
O primeiro nível, que consiste da sua unidade básica, é o tópico temático da cláu-
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sula.8 O tópico temático é a unidade que caracteriza uma norma específica aplicável à
relação de emprego. Os tópicos com escopo temático semelhante são reunidos em grupos temáticos que compreendem o segundo nível de agregação do esquema.9 O grupo
temático caracteriza-se por um conjunto de normas confinantes, relativas ao conteúdo
dos tópicos temáticos constantes em cada grupo. O terceiro nível de agregação reúne os
grupos temáticos semelhantes em temas. Os temas compreendem normas de conteúdo
diverso, mas que dizem respeito a um aspecto específico da relação de emprego. O tema
intitulado ‘remuneração’, por exemplo, abrange todos os tópicos e grupos que se referem a este aspecto da relação de emprego. Por fim, no quarto nível de agregação, os temas
dividem-se em normas substantivas e normas de procedimento.
Como todas as variáveis são mensuradas em escala nominal, indicadores
para um determinado acordo baseiam-se, antes de tudo, numa contagem de frequência dos códigos em cada acordo, ou seja, o próprio esquema de classificação
oferece uma noção preliminar sobre o escopo temático dos acordos. Por exemplo: quanto mais tópicos temáticos o esquema possuir sobre remuneração, maior
deverá ser a frequência de cláusulas classificadas nesse tema.
No caso do primeiro nível de agregação da metodologia de classificação, que
se refere ao tópico temático da cláusula coletiva, se faz necessário um reordenamento do conteúdo dessas cláusulas. Esse procedimento é relevante, pois tomar
as cláusulas coletivas conforme sua redação e ordem originais pode acarretar sérios problemas metodológicos para a análise comparativa do conteúdo dos acordos ao longo do tempo e entre diferentes unidades de negociação
As cláusulas originais, de modo geral, não são comparáveis. É o que ocorre, por exemplo, quando o acordo A inclui uma cláusula que estipula regras sobre mais de um tópico temático específico, ao passo que estas mesmas regras (idênticos tópicos temáticos e conteúdo normativo) são arranjadas em mais de uma cláusula no acordo B. Essa situação poderia
acarretar um erro de interpretação quanto à extensão da cobertura temática dos acordos.
Não obstante ambos os acordos estipularem regras idênticas, poder-se-ia deduzir, com
base exclusivamente no número de cláusulas, que o acordo B abrange uma maior variedade de tópicos temáticos em virtude de possuir mais cláusulas. O procedimento analítico
correto, neste caso, consistiria em comparar o conteúdo de uma única cláusula no acordo A com o conteúdo de mais de uma cláusula no acordo B. (HORN, 2004).
Deste modo, o conteúdo dos acordos coletivos deve ser rearranjado, tanto
8 Por exemplo: as cláusulas que fixam uma percentagem de reajuste dos salários nominais vinculada ao aumento no
custo de vida são classificadas no tópico temático (010101), “reajuste salarial baseado no aumento do custo de vida”.
9 Por exemplo: todas as cláusulas sobre reajuste de salários nominais são reunidas no grupo temático “Reajuste dos
salários nominais” (grupo 0101), que compreende, dentre outros, os seguintes tópicos: reajuste salarial baseado no
aumento do custo de vida, salários mínimos e reajuste salarial do novo empregado.
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quanto possível, com o intuito de individualizar as regras segundo seu tópico
temático específico. Em particular, esse procedimento evita que normas sobre diferentes tópicos temáticos permaneçam mescladas em uma mesma cláusula. Segundo Horn (2003), no procedimento de classificação das cláusulas segundo o escopo temático, dois tipos de ajustamento são de particular interesse. Primeiro, se
a cláusula original consistir de um composto de normas sobre diferentes tópicos
temáticos, seu conteúdo deve ser separado em tantas normas individuais quantos
forem os tópicos temáticos. À guisa de ilustração, o acordo coletivo celebrado em
2005 entre o SIMECAT e a MMC trazia a seguinte cláusula:
Homologação de rescisão: As rescisões dos contratos de
trabalho, independente do tempo de serviço do empregado,
deverão ser homologadas na entidade sindical 01 (um) dia após
o término do aviso prévio trabalhado ou em até 10 (dez) dias
após a comunicação da dispensa no caso de aviso prévio indenizado. As empresas pagarão para a entidade sindical uma taxa
de homologação de: a) Para trabalhadores associados ao sindicato: R$ 10,00 (dez reais); b) Para trabalhadores não associados
ao sindicato: R$ 15,00 (quinze reais). (SIMECAT, 2005).
Após a classificação essa cláusula foi desdobrada em três tópicos temáticos.
A primeira parte foi classificada no código 050201, cujo tópico temático se refere
à “Assistência do sindicato” e no código 050202, que se refere à “Data limite para
pagamentos após rescisão do contrato de trabalho”. A segunda parte foi classificada no grupo 0903, que se refere às “Finanças do sindicato de empregados”,
em código que foi criado (090308). O tópico temático foi denominado “Taxas
de homologação de rescisão de contrato”. Neste caso, convém ressaltar que, ao
longo da classificação dos instrumentos coletivos que compõem a base de dados
deste artigo, algumas categorias foram acrescentadas ao esquema de classificação
de Horn (2003), ou seja, foram utilizados os códigos do esquema original, mas
também foram gerados novos códigos. Isso é natural que ocorra à medida que o
esquema de classificação é aplicado a novas bases de dados. Enfim, como é possível
perceber, após o rearranjo o conteúdo de cada norma passou a corresponder a
um tópico temático específico. Segundo, se o conteúdo de mais de uma cláusula
corresponder a um mesmo tópico temático ele deve ser combinado para resultar
em uma única cláusula. Por exemplo, o acordo coletivo celebrado em 2005 entre
o SIMECAT e a MMC trazia as seguintes cláusulas:
Auxílio Alimentação: Aos trabalhadores empregados nas empresas signatárias deste Acordo Coletivo de Trabalho, fica assegurado o Auxílio Alimentação no valor nominal de R$ 50,00
(cinqüenta reais) mensais, a partir de 30 de janeiro de 2006 [...]
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Despesas com Alimentação: Fica limitado a 3,5% (três vírgula cinco por cento) do salário nominal, a parte do trabalhador
no custeio de sua alimentação na empresa. (SIMECAT, 2005).
O critério de decisão foi de que estas cláusulas deveriam ser classificadas em
um único tópico temático (010502) referente a “Alimentação”. Entretanto, nada
impede que seja criado um novo código referente a despesas com alimentação
na empresa. Durante a classificação das cláusulas coletivas também é comum que
surjam alguns problemas de confiabilidade na mensuração quando a regra impõe
dúvidas sobre qual código deve ser utilizado.
Em suma, como consequência do reordenamento o número de cláusulas tal
como disposto originalmente no acordo poderá ser diferente do número de cláusulas após os ajustes, ainda que o conteúdo normativo do acordo seja exatamente
o mesmo antes e após seu reordenamento.
Após a classificação segundo o escopo temático, a cláusula classificada torna-se a unidade de investigação. Neste estudo, a expressão “cláusula” refere se às
normas dos instrumentos coletivos após o reordenamento de seu conteúdo. São
estas cláusulas que foram utilizadas na comparação com a legislação.
Tendo em vista a amplitude da legislação que regula as relações de trabalho no
Brasil, a análise, sob a ótica do escopo temático, por si só não permite concluir sobre
a capacidade regulatória das negociações coletivas sem que se comparem os resultados dos acordos coletivos com a legislação. A questão central consiste em verificar
se, e em que medida, as negociações coletivas de trabalho criaram regras adicionais
à vasta legislação estatal que caracteriza o sistema brasileiro de relações de trabalho.
Como regras adicionais devem-se considerar tanto as regras sobre aspectos das relações de trabalho que não são cobertos pela legislação estatal quanto as regras cujo
conteúdo difere das normas estatais que tratam do mesmo objeto.
Neste capítulo investigamos também em que medida os acordos coletivos de
trabalho na MMC geraram regras adicionais à legislação estatal no período entre
2005 e 2007. O foco da análise concentra-se no conteúdo das regras substantivas10
em comparação com a legislação estatal.
Desde logo registramos que foi levada em consideração toda a legislação
trabalhista (inclusive os Precedentes Normativos e as Súmulas do TST) e também
10
De acordo com Wood et al. (1975). Dunlop (1993) oferece uma definição descritiva de regras substantivas,
em normas que governam a relação de emprego e regras de procedimento em normas que administram as regras
substantivas. Flanders (1970) apresenta uma dicotomia similar e sugere que as regras de procedimento regulam, entre
outros aspectos, o comportamento das partes, incluindo a possibilidade de assistência a terceiros e o uso de árbitros.
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a legislação previdenciária em alguns casos. Neste sentido, são consideradas tanto
as normas emanadas dos poderes Executivo e Legislativo quanto as emanadas
do Poder Judiciário, neste caso aplicáveis apenas quando se recorre aos tribunais.
A referência à comparação foi a legislação vigente em agosto de 2008. Os acordos, entretanto, compreendem o período entre 2005 e 2007. Cabe ressaltar este
dado, pois não houve grandes modificações na legislação do trabalho durante esse
período, particularmente na legislação que contempla os tópicos presentes nos
acordos.
O fato é que mudanças na legislação podem, por exemplo, alterar o conjunto de regras adicionais de um determinado acordo. Imaginemos que um acordo
A no ano t-i traga uma cláusula que, comparada à legislação daquele ano, fosse
classificada como uma cláusula sem norma estatal comparável, beneficiando os empregados. Entretanto, no ano t há uma mudança na legislação e com isso há a
incorporação daquela regra existente no acordo A. A comparação daquele mesmo
acordo com a legislação no ano t levaria a dizer que a cláusula agora apenas reproduz a lei. Com isso, um mesmo acordo comparado em momentos diferentes com
as legislações vigentes poderia trazer resultados não uniformes. Por isso é preciso
deixar claro que a legislação utilizada na comparação refere-se às normas vigentes
em 2008. Apesar de se estabelecer um problema11, esta premissa não invalida
o estudo comparativo das cláusulas coletivas em relação à legislação estatal, ao
contrário, apenas justifica sua constante reavaliação. Além disso, ao se confrontar
o estudo do ano t com o estudo do ano t-i, podemos induzir algumas conclusões
sobre o papel da legislação na regulação do emprego. Por exemplo, se o acordo A
no ano t-i apresentou um maior número de cláusulas adicionais em relação ao que
se observou sobre esse mesmo acordo no ano t, deve haver fortes evidências de
que houve algum grau de relaxamento na legislação entre esses períodos.
De modo sintético, o esquema de comparação permite identificar se houve,
ou não, fortalecimento das negociações coletivas como método de regulação das
relações de emprego. De um lado, um número crescente de regras adicionais nos
acordos coletivos indica fortalecimento. Por outro, se o alargamento do escopo
temático das negociações for caracterizado por uma alta proporção de cláusulas
cujo conteúdo já se encontre na legislação, dificilmente poderemos sustentar uma
hipótese de fortalecimento das negociações coletivas. Nunca é demais ressaltar,
porém, que incorporar cláusulas que estejam na lei e assegurar seu cumprimento
11
O problema surge, por exemplo, se for confrontado o resultado da comparação de um acordo A com
a legislação do ano t com o resultado da comparação de um acordo B com a legislação do ano t-i. Por outro lado,
o confronto entre o resultado da comparação de um mesmo acordo com a legislação de anos distintos pode estabelecer um guia sobre o papel desempenhado pela legislação estatal na regulação da relação de emprego ao longo
do tempo. Neste caso um acordo fixo no tempo é o parâmetro para a análise.
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pode ser positivo quando se está em áreas onde as relações de trabalho ainda se
encontram em estágios iniciais. Imaginando um país de dimensões continentais
como o Brasil, marcado por intensas desigualdades regionais, é possível afirmar
que o cumprimento da lei, em algumas situações, representa um grande avanço.
Em síntese, a metodologia para a mensuração das cláusulas substantivas dos
acordos coletivos em comparação com a legislação inicia-se pela distinção entre
dois tipos primordiais de normas jurídicas: normas de conduta e normas de organização. De acordo com Horn (2003), as normas de conduta estabelecem os
direitos e obrigações dos agentes sociais, ao passo que as normas de organização
consistem em regras subsidiárias que auxiliam na formulação e na eficácia das
normas de conduta.
Existem três dimensões básicas para a análise do conteúdo das cláusulas
substantivas em comparação com a legislação estatal a serem consideradas ao
se projetarem categorias para a classificação de cláusulas. Horn (2003) formulou
essas três dimensões como questões, tal como segue abaixo. Em seguida, apresenta um quadro-resumo das dimensões da análise das cláusulas substantivas
em comparação com a legislação. Além disso, o Quadro 1 detalha a metodologia
que compõe o estudo comparativo entre as clausulas do acordo coletivo e a
legislação existente.
1. A cláusula substantiva do acordo coletivo estabelece uma norma
imperativa?
2. Qual das partes da relação de emprego se beneficia da cláusula
substantiva?
3. Qual a relação entre os vínculos lógicos que estabelecem direitos e
obrigações em uma cláusula de acordo coletivo e na norma estatal
relacionada?
Além disso, o Quadro 1 detalha a metodologia que compõe o estudo comparativo entre as clausulas do acordo coletivo e a legislação existente.
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DIMENSÃO
Norma
imperativa?
Beneficiário
da cláusula
Vínculos
lógicos
CARACTERIZAÇÃO
Sim
Cláusulas que fixam regras de cumprimento obrigatório
Não
Cláusulas que consistam de mera declaração de intenção
Empregado
Quando o direito ajustado na cláusula substantiva for
favorável ao empregado
Empregador
Quando o direito ajustado na cláusula substantiva for
favorável ao empregador
Cláusula sem
norma estatal
comparável
Cláusulas substantivas que convencionam regras cujo
objeto temático não é regulado na legislação estatal
Cláusula mais
ampla
Cláusulas substantivas que estipulam normas que, do
ponto de vista dos empregados, são mais favoráveis do
que as previstas na legislação estatal
Cláusula
operacional¹
Cláusulas substantivas relacionadas a normas estatais que
não são plenamente operacionais e que requerem um
complemento normativo para torná-las eficazes.
Cláusula que
reproduz a
norma estatal
Cláusulas substantivas 'igual a lei' presumem a existência
de regras estatais que focalizam o mesmo objeto temático
da cláusula coletiva. Estas cláusulas simplesmente
reproduzem a legislação estatal
Cláusula
disputável
Duas classes de regras compõem a categoria 'disputável'.
A primeira classe consiste de direitos dos empregadores
em conflito com direitos dos empregados já assegurados
na legislação. A segunda classe compreende direitos dos
empregados cujo conteúdo seja mais restrito do que o de
normas fixadas pela legislação estatal. Em ambos os casos,
as cláusulas 'disputáveis' produziriam uma redução no
conjunto de direitos dos empregados já garantidos em lei.
1 Durante a mensuração das cláusulas substantivas dos acordos coletivos, Horn (2003)
identificou três classes de norma estatal “não-operacional”, a saber: i) norma estatal que
proíbe determinada conduta, a não ser que esta conduta seja permitida em regra coletiva;
ii) norma estatal de enunciado impreciso. A imprecisão pode ocasionar disputas através do
ajuste de cláusulas que estipulem meios de aplicação da norma estatal; e iii) norma estatal
que explicita mais de uma alternativa de aplicação, em cujo caso os acordos coletivos podem
elucidar qual alternativa deverá, quer seja obrigando as partes a uma das alternativas, quer seja
fixando requisitos para o emprego de cada alternativa.
Quadro 1 - Dimensões da Análise das Cláusulas Substantivas em
Comparação com a Legislação
Fonte: Horn (2003).
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110
Os possíveis resultados das três questões formuladas anteriormente podem
ser combinados e originarem 11 categorias de classificação das cláusulas de acordos coletivos, tal como exposto no Quadro 2. Neste, apresentamos o esquema de
classificação das cláusulas coletivas em comparação com a legislação estatal.
Dimensões da análise
• Não há norma estatal que focalize o
mesmo objeto da cláusula
Categorias/ códigos
‘Sem norma estatal’,
beneficiando os
empregados
1
• Cláusula estipula direitos mais amplos
‘Mais ampla’
do que os da legislação estatal comparável
2
• Cláusula estipula regras que tornam
operacional a legislação estatal
comparável
‘Operacional’, beneficiando
os empregados
3
• Cláusula reproduz a legislação estatal
‘Igual à lei’, beneficiando os
empregados
4
• Não há norma estatal que focalize o
mesmo objeto da cláusula
‘Sem norma estatal’,
beneficiando os
empregadores
5
• Cláusula estipula regras que tornam
operacional a legislação estatal
comparável
‘Operacional’, beneficiando
os empregadores
6
• Cláusula reproduz a legislação estatal
‘Igual à lei’, beneficiando os
empregadores
7
• Cláusula estipula direitos de
empregadores em conflito com direitos
de empregados previstos na legislação
estatal
‘Disputável’ I
8
• Cláusula estipula direitos de
empregados menos favoráveis do que os
da legislação estatal
‘Disputável’ II
9
Cláusulas não-imperativas que beneficiam os empregados
Cláusulas não-imperativas
que beneficiam os
empregados
10
Cláusulas não-imperativas que beneficiam os empregadores
Cláusulas não-imperativas
que beneficiam os
empregadores
11
Cláusulas
imperativas que
beneficiam os
empregados
Cláusulas
imperativas que
beneficiam os
empregadores
Quadro 2 - Esquema de Classificação das Cláusulas Substantivas em
Comparação com a Legislação Estatal
Fonte: Horn (2003).
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As categorias 1 a 9 referem-se a cláusulas substantivas imperativas, enquanto as categorias 10 e 11 referem-se a cláusulas não-imperativas. (Quadro 2). As
categorias foram agrupadas de acordo com a parte que realmente se beneficia
da regra convencionada. As categorias 1 a 4 abrangem as cláusulas substantivas
imperativas que beneficiam os empregados, e as categorias 5 a 9, as cláusulas que
beneficiam os empregadores. Uma distinção similar é encontrada nas categorias
10 e 11. Segundo Horn (2003), em cada grupo de cláusulas imperativas as categorias foram definidas com base nos resultados possíveis para os vínculos lógicos
entre direitos (ou obrigações) nas cláusulas coletivas e direitos (ou obrigações) na
legislação estatal.
Principais Influências nas Negociações Coletivas do Novo
Polo Automotivo
Em toda sua trajetória de constituição o SIMECAT teve contribuições importantes da Força Sindical (FS) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores
nas Indústrias Metalúrgicas (CNTM). Tais contribuições são reconhecidas pelos
dirigentes sindicais, segundo os quais o apoio e participação da FS e da CNTM ao
longo das negociações coletivas com a MMC foram fundamentais à definição do
Acordo Coletivo de 2005.
Segundo o presidente do SIMECAT, o Acordo Coletivo de 2005 reproduziu muitas cláusulas presentes na Convenção do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de São Paulo (SITIMESP), que também é associado à Força
Sindical e à CNTM. Mais ainda, afirma que o grande objetivo do SIMECAT em
relação aos acordos coletivos firmados com a MMC seria torná-los cada vez
mais próximos dos direitos alcançados pelos metalúrgicos de São Paulo. Evidentemente, havia o reconhecimento de que isso seria um processo, dado que
na ocasião do primeiro acordo do SIMECAT, o Sindicato ousava seus primeiros
passos, enquanto o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo já possuía uma longa tradição em negociações. Isso pode ser percebido por meio da comparação
entre os instrumentos coletivos.
No que se refere à utilização da Convenção de São Paulo como um parâmetro (cláusulas copiadas literalmente e cláusulas semelhantes), o presidente
do SIMECAT chega afirmar que eles simplesmente tomaram essa convenção e
copiaram várias cláusulas para a pauta de reivindicações do SIMECAT. Note-se
um exemplo:
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112
Convenção SP – As empresas concederão, em caráter excepcional, na forma do art. 144, da CLT, um Abono especial,
desvinculado do salário, de 30% (trinta por cento), que será
pago nas datas abaixo e da seguinte forma [...]
Acordo SIMECAT – As empresas concederão aos seus empregados, em caráter especial e eventual, na forma do art. 144
da CLT, um Abono especial, totalmente desvinculado do salário, equivalente a 24% (vinte e quatro por cento) do salário
base vigente em 31 de outubro de 2005, em 02 (duas) parcelas,
na forma e condições a seguir [...]. (SITIMESP, 2004).
Desconsiderando-se a capacidade de barganha e as condições econômicas
existentes nos dois casos comparados, que sem dúvida se refletem nos percentuais do abono, além de algumas pequenas alterações na elaboração da frase, há
fortes evidências de que esta cláusula foi copiada da Convenção de São Paulo para
o Acordo de Catalão. Segundo o dirigente do SIMECAT, foi exatamente isso que
aconteceu neste caso. Esta confirmação permite afirmar, de forma mais acurada, a
existência de influência da Convenção sobre o Acordo. Segundo o presidente do
SIMECAT, a Convenção de São Paulo foi o grande parâmetro para a elaboração
do acordo de 2005. Pelo menos 11 tópicos temáticos contemplam cláusulas com
um elevado grau de semelhança, ou seja, aproximadamente 32,35% do acordo são
compostos por cláusulas que foram baseadas na Convenção de São Paulo.
Além disso, excetuando-se a cláusula sobre Comissão de Conciliação Prévia,
que foi proposta pelo próprio Presidente do SIMECAT, a maioria das cláusulas
restantes foi elaborada com base em orientações dos sindicalistas de São Paulo. Inclusive, a cláusula sobre PLR existente no Acordo do SIMECAT, sem cláusula comparável na Convenção de São Paulo, foi uma sugestão de um sindicalista paulista.
Portanto, esses elementos confirmam as informações fornecidas pela direção
sindical, que afirma a forte participação da Força Sindical no processo de barganha
e o uso da Convenção Coletiva dos Metalúrgicos de São Paulo como um parâmetro para a negociação do primeiro acordo do SIMECAT.
Interpretação dos Resultados dos Acordos Coletivos
Neste estudo, a amplitude do escopo temático nos acordos foi medida por
meio da frequência de cláusulas classificadas em cada tema. A principal constatação foi de que não houve maiores alterações no tamanho e no escopo temático
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dos acordos firmados entre 2005 e 2007, em que pesem algumas mudanças relevantes no conteúdo normativo desses acordos. (Tabela 1).
Tabela 1 – Frequência de Cláusulas por Temas nos Acordos do SIMECAT
Acordo
Remuneração
Duração
do
Trabalho
Férias e
Licenças
Remuneradas
Segurança no
emprego e Rescisão
do Contrato de
Trabalho
Cláusulas de
procedimento
Total
2005
18
1
2
5
8
34
2006
19
1
2
3
7
32
2007
19
1
2
3
7
32
Fonte: Acordos Coletivos de Trabalho do SIMECAT.
No tema “Remuneração”, os acordos de 2006 e 2007 trouxeram uma novidade, que foi o cartão de compras descontado em folha no valor de R$ 100,00
e R$ 200,00, respectivamente. Já no tema “Segurança no emprego e rescisão do
contrato de trabalho”, além das cláusulas constantes nos acordos de 2006 e 2007,
o acordo de 2005 contemplava duas cláusulas no grupo “procedimentos administrativos para rescisão do contrato”: uma no tópico “Assistência do Sindicato” e
outra no tópico “Data limite para pagamentos após rescisão do contrato de trabalho”. Estas foram as únicas modificações que ocorreram entre os acordos. No
restante, as regras acordadas mantiveram-se exatamente as mesmas, isto é, houve
uma cópia literal, com ajustamentos em alguns casos. Nos três acordos, a maioria
das cláusulas classificadas foi de cláusulas substantivas, aproximadamente 80% do
total, com maior frequência de cláusulas classificadas no tema remuneração, 53%
das cláusulas presentes no Acordo Coletivo de 2005, e 59% nos dois acordos
seguintes.
Os tópicos temáticos cobertos pelos acordos estudados incluem cláusulas
que se referem à remuneração, duração do trabalho, férias e licenças remuneradas,
segurança no emprego e rescisão do contrato de trabalho. (Quadro 3).
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Cláusulas substantivas
Remuneração
Reajuste dos salários nominais baseado no
aumento do custo de vida
Reajuste dos salários nominais de empregado
admitido após a última data-base de revisão
de dissídio (empregado novo)
Salários mínimos
Salário de admissão
Deduções em folha
Critério de cálculo da remuneração em casos
especiais
Compensações de jornada*
Taxa geral (horas extras)
Domingos, feriados, descanso semanal
Adicional noturno
Cláusulas de procedimento
Relações sindicais
Liberação de dirigente sindical
Contribuição de empregadores a sindicato de
empregados
Contribuição para custeio do sistema
confederativo
Taxas de homologação de rescisão de contrato*
Delegados sindicais
Procedimentos de negociação e de resolução
de conflitos
Cumprimento do instrumento coletivo
Procedimentos para criação de CCP
Normas complementares sobre o
instrumento coletivo
Período de vigência
Validade de disposições normativas de
instrumento anterior
Remuneração extraordinária
Alimentação
Transporte
Seguro de vida*
Creche
Complementação do auxílio-doença
PLR
Duração do trabalho
Redução ou supressão de jornada
Férias e Licenças remuneradas
Estudante
Requisição de documentos exigidos por lei
Segurança no emprego e Rescisão do
Contrato de Trabalho
Acidente e auxílio-doença
Empregado próximo da aposentadoria
Assistência do sindicato
Data-limite para pagamentos após rescisão
do contrato de trabalho
Normas especiais
* Tópicos acrescentados ao esquema original de classificação de cláusulas
Quadro 3 - Tópicos Temáticos Cobertos pelos Acordos entre o SIMECAT
e a MMC no Período de 2005 a 2007
Fonte: Elaboração Própria dos Autores.
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Considerando-se a média dos três acordos, a maioria das cláusulas, aproximadamente 78%, referia-se a normas que governam a relação de emprego, isto
é, normas substantivas, enquanto um percentual bem menor, em torno de 22%,
dizia respeito a normas de procedimento. As cláusulas substantivas envolveram
temas como remuneração, duração do trabalho, férias e licenças remuneradas,
segurança no emprego e rescisão do contrato de trabalho. Já as cláusulas de procedimento contemplaram temas como relações sindicais, procedimentos de negociação e de resolução de conflitos, além de normas complementares sobre o
instrumento coletivo.
A leitura dos acordos, sob a ótica do escopo temático, mostrou que a maioria
das cláusulas classificadas dizia respeito a cláusulas substantivas, particularmente
no tema remuneração. Além disso, verificamos que o número de tópicos temáticos
que caracterizou o primeiro instrumento coletivo manteve-se praticamente constante nos anos seguintes, indicando uma inércia das cláusulas acordadas.
Apesar de não haver mudanças no escopo temático dos acordos, houve algumas mudanças significativas no conteúdo normativo de algumas cláusulas acordadas, destacando-se, em primeiro lugar, o foco das negociações. Assim como em
2005, em 2006 e 2007 o foco foram as cláusulas relativas à remuneração. Foi o que
ocorreu com a cláusula sobre cesta básica. Em 2005, o valor acordado da cesta
foi de R$ 50,00. Em 2006 conseguiram uma cesta de R$ 60,00, e em 2007 houve
um ganho expressivo, com o valor da cesta atingindo R$ 100,00. Considerando-se
a inflação acumulada em outubro de 2006 e outubro de 2007, de 2,71% e 4,78%,
respectivamente, é razoável dizer que a magnitude do benefício ampliou-se, o que
não deixa de ser uma conquista muito importante.
De modo similar, o valor fixado para os pisos salariais sempre esteve acima
do salário mínimo oficial. O salário mínimo medido para os meses de outubro de
2005, 2006 e 2007 foram de R$ 300,00, R$ 350,00 e R$ 380,00. Já os valores acordados para os pisos na MMC nesses períodos foram de R$ 620,00, R$ 650 e R$
700,00. Portanto, bem superiores ao salário mínimo do período correspondente.
Os reajustes salariais de 2006 e 2007 mais do que superaram a inflação acumulada no período dos acordos, permitindo, desta forma, aumentos reais de salários. Esse ganho foi de 2,29% em 2006 e de 2,67% em 2007.
Também chamou a atenção nos acordos de 2006 e 2007 a extensão de alguns benefícios antes limitados à MMC e à HPE para a RCM e a Weldmatic. Na
primeira negociação coletiva, o SIMECAT enfrentou a resistência das empresas
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contratadas que desejavam que cada processo de negociação fosse estabelecido
empresa por empresa. Os dirigentes sindicais afirmam que essas empresas alegaram que não poderiam arcar com vários benefícios obtidos pelos trabalhadores
da MMC. De fato, o primeiro acordo trazia uma série de cláusulas discriminando
a regra de acordo com a empresa.
No acordo de 2006, contudo, já foi possível incorporar os benefícios de
pagamento de horas extras à Weldmatic, e no acordo de 2007 os trabalhadores da
RCM, apesar de não terem sido incluídos nos mesmos critérios de pagamento de
horas extras das demais empresas, tiveram um critério de pagamento mais amplo
do que o previsto na legislação estatal. O mesmo ocorreu no caso do adicional
noturno, que nos acordos de 2005 e 2006 era pago na forma da lei para a RCM e
a Weldmatic. Em 2007, a Weldmatic foi incorporada nos critérios de pagamento
da MMC e da HPE, e a RCM passou a estabelecer critérios mais amplos de pagamento em relação à legislação estatal.
Alguns pontos emblemáticos da reforma legal dos anos 1990 e que merecem
destaque neste estudo dizem respeito às normas de conteúdo flexível - Abono,
PLR e Comissão de Conciliação Prévia (CCP), presentes nos acordos de 2005,
2006 e 2007.
No caso do abono, alguns estudos (KREIN, 2002) destacam-no como uma
estratégia empresarial a ser utilizada com vistas a substituir a remuneração salarial.
De fato, o abono não é salário fixo, ou seja, ele pode vir a ser retirado ou ter seus
valores reduzidos com maior facilidade. Confirmando essa possibilidade, se no
acordo de 2005 o abono foi de 24% do salário, em 2006 esse percentual caiu para
13%, com certa recuperação em 2007, quando alcançou 20% do salário.
Algo semelhante ocorreu com a Participação nos Lucros e Resultados
(PLR). No acordo de 2006 houve uma pequena correção nos valores a serem
pagos, enquanto o valor negociado em 2007 não alcançou nem o valor pago no
acordo de 2005. Isso, entretanto, não foi visto de forma totalmente negativa pelos
trabalhadores, visto que a empresa reduziu as exigências para que o trabalhador
fizesse jus à gratificação.
Já a CCP, incorporada no Acordo de 2005, apesar de continuar existindo
formalmente nos acordos de 2006 e 2007, na prática nunca teve instaurada uma
comissão. Isso revela, senão uma despreocupação do sindicato nas questões concernentes aos conflitos de trabalho, pelo menos uma imprudência em não manter uma comissão preparada para solucionar potenciais conflitos do trabalho. O
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mesmo vale para a empresa que, segundo os sindicalistas, também não revelou
interesse em ativar a comissão.
Em suma, o escopo temático não se ampliou nos acordos estudados, porém
algumas conquistas são observadas, como a elevação no valor da cesta básica.
Uma possível explicação para esse congelamento do escopo temático se deve à
opção dos sindicalistas em estender as cláusulas relativas aos trabalhadores da
MMC para os operários das empresas contratadas. Os dirigentes sindicais foram
exitosos nessa tentativa e, atualmente, os trabalhadores da empresa contratante e
das contratadas têm várias cláusulas comuns no acordo coletivo
No que se refere às cláusulas classificadas nos acordos da MMC em comparação com a legislação estatal, a evidência analisada sugere que os acordos coletivos
desempenharam uma importante função regulatória, fazendo crescer o conjunto
de direitos dos empregados. Os dados demonstram, ainda, que esta não foi a
única função de interesse desempenhada pelos acordos coletivos, que, em alguma
medida, também foram utilizados pelos empregadores para o ajuste de regras de
seu interesse.
Cláusulas adicionais compreendem as cláusulas substantivas imperativas
classificadas em uma das seguintes categorias: ‘sem norma estatal’, beneficiando
os empregados; ‘mais ampla’; ‘sem norma estatal’, beneficiando os empregadores;
‘disputável’ I; e ‘disputável’ II. As cláusulas classificadas nas categorias ‘igual à lei’ e
as cláusulas não-imperativas são exemplos manifestos de cláusulas não-adicionais.
Já as cláusulas ‘operacionais’ formam um caso limítrofe. Segundo Horn (2003),
embora possam ser encontradas, em escopo e conteúdo na legislação estatal, as
normas inscritas neste tipo de cláusula não consistem de mera cópia da lei, mas
provêm de uma escolha entre alternativas de aplicação da legislação estatal.
No acordo de 2005, aproximadamente 74% das cláusulas coletivas compreendiam cláusulas adicionais. A maioria delas composta por cláusulas mais amplas
(35%) e por cláusulas sem norma estatal comparável, beneficiando empregados
(31%). Entretanto, os resultados mostram que o acordo também foi utilizado
pela MMC para o ajuste de regras de seu interesse, com 8% de cláusulas que
estipulavam direitos de empregados menos favoráveis do que os da legislação estatal, e 4% de cláusulas não-imperativas que beneficiavam a empresa. As cláusulas
não-adicionais envolveram aproximadamente 19% do acordo, sendo que deste
percentual 15% foram compostos de cláusulas que reproduziram a lei, beneficiando os empregados. Houve, ainda, em torno de 8% de cláusulas que estipularam
regras que tornaram operacional a legislação estatal comparável, beneficiando os
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empregados. Os acordos de 2006 e 2007 conservaram essas características, elevando, contudo, o percentual de cláusulas adicionais para 76%.
Importante de se observar é que, com o SIMECAT, houve uma ampliação
da regulação do emprego por meio da negociação coletiva, pois, ainda que o escopo temático da Convenção do SIMELGO tenha se apresentado mais amplo,
havia ali um conjunto significativo de cláusulas não-adicionais (51%), comparado
com o número de cláusulas adicionais ((45%). Além disso, 19% das cláusulas na
Convenção do SIMELGO traziam regras favoráveis ao empregador. Um quadro
comparativo com a percentagem de cláusulas, segundo as categorias, para os acordos do SIMECAT e a Convenção do SIMELGO segue abaixo:
Tabela 2 - Percentagem de Cláusulas, segundo as Categorias, nos
Acordos do SIMECAT e na Convenção do SIMELGO
CÓDIGO
CATEGORIAS
SIMECAT
SIMELGO
2005
2006
2007
2004
1
Sem norma estatal
31%
36%
36%
24%
2
Mais ampla
35%
32%
32%
7%
3
Operacional
8%
8%
8%
5%
4
Igual a lei
15%
16%
16%
39%
5
Sem norma estatal
0%
0%
0%
0%
6
Operacional
0%
0%
0%
10%
7
Igual a lei
0%
0%
0%
0%
8
Disputável I
0%
0%
0%
2%
9
Disputável II
8%
8%
8%
12%
10
Cláusulas não-imperativas que beneficiam empregados
0%
0%
0%
7%
11
Cláusulas não-imperativas que beneficiam empregadores
4%
4%
4%
5%
Fontes: Acordos Coletivos SIMECAT 2005, 2006 e 2007 e Convenção SIMELGO 2004.
Estes resultados confirmam a importância do SIMECAT no processo de negociação com a MMC. Com a instituição do sindicato houve um salto significativo
no número de regras adicionais acordadas e também se reduziu o espaço ao poder
discricionário do empregador. Ademais, mesmo quando se observa um elevado
percentual de cláusulas que apenas reproduzem a legislação, é preciso ter cautela
porque um modelo de relações de trabalho como o brasileiro, em que o poder
discricionário do empregador desafia a preponderância da lei, o instrumento de
negociação passa a ser um interlocutor importante no cumprimento da legislação.
Essa afirmação se torna ainda mais emblemática quando se considera o caso de
um greenfield, como Catalão, município que, quando abrigou uma montadora,
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encontrava-se ainda na “pré-história” das relações de emprego.
Entretanto, dois pontos chamam a atenção, ambos ligados ao cenário macroeconômico vigente à época da instalação da MMC em Catalão e da realização
do primeiro acordo entre essa empresa e o SIMECAT.
No primeiro caso, o que se deve destacar é que, mesmo em um cenário recessivo – marcado pelo processo de desconcentração industrial e pela reestruturação produtiva das empresas, visando reduzir custos, bem como pelas mudanças
na legislação do trabalho –, a MMC conseguiu ampliar a produção e o seu capital
utilizando-se de um modelo híbrido de produção, isto é, que emprega, ao mesmo
tempo, equipamentos modernos com outros tecnologicamente defasados, técnicas
gerenciais tayloristas e técnicas modernas. Isto foi possível pela forte vinculação dos
produtos oferecidos pela empresa com o agronegócio, em alta no período.
No segundo caso, destaca-se a recuperação do crescimento econômico e o
bom desempenho do setor automobilístico a partir de 2004. Em ambas as situações, a empresa encontrava-se em expansão da produção e do emprego. Significa
dizer que, considerando-se as limitações de oferta de trabalho em um município
do tamanho de Catalão, isso possibilitaria um maior poder de barganha aos trabalhadores, cujo desdobramento estaria no resultado das negociações.
Feitas estas ponderações, o que as vias factuais mostram é que, mesmo
diante de uma série de contratendências e do refluxo do movimento sindical no
País, os trabalhadores da MMC conseguiram articular a criação de um sindicato
dos metalúrgicos que representasse efetivamente a categoria local. Em que pesem
todas as consequências já apresentadas neste trabalho sobre a descentralização
das negociações, o fato é que, no caso dos metalúrgicos de Catalão, o acordo realizado diretamente com a empresa foi benéfico aos trabalhadores, pois possibilitou
a incorporação de um conjunto de regras adicionais à legislação estatal, ainda que
o escopo temático da negociação se apresentasse menos amplo.
Considerações Finais
O estudo desenvolvido neste capítulo se concentrou num greenfield do setor
automotivo. A escolha decorreu da importância que as negociações coletivas neste setor assumiram no Brasil, sobretudo, a partir da década de 80. Uma das novidades dos anos 90 foi a intensificação do deslocamento da indústria automotiva da
região metropolitana de São Paulo em direção aos estados da região Sul e Sudeste.
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A instalação de planta automotiva em Goiás e na Bahia representa uma novidade
ainda maior em termos da tradicional localização geográfica do setor automotivo.
No caso da MMC em Catalão/GO, os principais motivos apontados para sua
instalação estão relacionados às características da mão-de-obra local, sem cultura
sindical e com predisposição a baixos salários; ao elevado nível de escolaridade
dos trabalhadores; ao quantitativo de jovens com pouca experiência de trabalho, o
que favorece os baixos salários; à localização privilegiada de Catalão numa malha
rodo-ferroviária que facilita a movimentação de componentes, peças e produtos
da empresa; ao elevado índice de venda do produto 4 por 4 no Centro-Oeste, e às
políticas de incentivos fiscais dos governos estadual e municipal.
Transcorridos seis anos da instalação da empresa no município goiano, em
2004 a SIMECAT tornou-se o responsável pela representação dos trabalhadores
da MMC nas negociações coletivas, tendo-se firmado o primeiro acordo em 2005.
Este acordo, bem como os de 2006 e 2007, foram objeto de análise deste estudo.
Convém relembrar que desde sua implantação em 1998, a empresa foi ampliando sua planta produtiva, motivada pelo crescimento das vendas. Estas cresceram ao longo das negociações, puxando também o aumento do emprego na
fábrica. Em 2006, a montadora já era responsável por aproximadamente 50% das
receitas do município de Catalão e, mesmo no período mais crítico para o setor
automotivo, como foi 1998 e 1999, a MMC se expandiu. Neste caso, o ritmo
da empresa deveu-se ao seu mercado consumidor em expansão, particularmente
devido ao bom desempenho do agronegócio nesse período. Após 2004, entretanto, o cenário nacional foi favorável. Isso é importante porque essas condições
influenciam no resultado da barganha.
Em 2005, realizou-se a primeira barganha entre SIMECAT e MMC. O estudo revelou forte influência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo nessa
negociação. Essa influência pode ser apreendida por meio da comparação entre a
pauta de reivindicações do SIMECAT e a Convenção Coletiva dos Metalúrgicos
de São Paulo, bem como nas entrevistas realizadas junto aos sindicalistas. Nas
negociações realizadas nos anos seguintes o sindicato ganhou maior autonomia
na elaboração de sua pauta de reivindicações que se concentrou, sobretudo, em
questões locais como: remuneração e extensão de direitos antes limitados à MMC
às empresas subcontratadas (HPE, RCM e WELDMATIC).
No que se refere à leitura dos acordos sob a ótica do escopo temático, a
maioria das cláusulas classificadas dizia respeito a cláusulas substantivas, particular-
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mente no tema remuneração. Verificou-se, ainda, que o número de tópicos temáticos que caracterizaram o primeiro instrumento coletivo manteve-se praticamente
constante nos anos seguintes, indicando uma inércia das cláusulas acordadas. Não
obstante, houve algumas mudanças significativas no conteúdo normativo de algumas cláusulas acordadas (como por exemplo: cesta básica, pisos salariais, extensão
de benefícios antes restritos à MMC às subcontratadas etc.). Isto, segundo os
sindicalistas, foi coerente com a nova postura do Sindicato (maior autonomia) e
com a luta para a manutenção de direitos já conquistados em acordos anteriores.
Portanto, em que pese a manutenção das cláusulas, houve variações no conteúdo normativo. Essas variações traduzem ganhos que a leitura do escopo temático não permite evidenciar. Daí a importância de se comparar as cláusulas
classificadas nos acordos com a legislação estatal.
No acordo celebrado entre o SIMECAT e a MMC em 2005, aproximadamente 74% das cláusulas coletivas compreendiam cláusulas adicionais, a maioria
delas composta por cláusulas mais amplas (35%) e por cláusulas sem norma estatal comparável, beneficiando empregados (31%). Entretanto, os resultados também mostram que o acordo foi utilizado pela MMC para o ajuste de regras de
seu interesse, com 8% de cláusulas que estipulavam direitos de empregados menos favoráveis do que os da legislação estatal, e 4% de cláusulas não-imperativas
que beneficiavam a empresa. As cláusulas não-adicionais envolveram aproximadamente 19% do acordo, sendo que, deste percentual 15% foram compostos
de cláusulas que reproduziram a lei, beneficiando os empregados. Houve, ainda,
em torno de 8% de cláusulas que estipularam regras que tornaram operacional a
legislação estatal comparável, beneficiando os empregados. Os acordos de 2006 e
2007 conservaram essas características, elevando, ainda, o percentual de cláusulas
adicionais para 76%.
Estes resultados confirmaram a importância do SIMECAT no processo de
negociação com a MMC. Com a instituição do sindicato, houve um salto significativo no número de regras adicionais acordadas e também se reduziu o espaço
ao poder discricionário do empregador. Ademais, mesmo quando se observam
cláusulas que apenas reproduzem a legislação, é preciso ter cautela, pois, num
modelo de relações de trabalho como o brasileiro, em que o poder discricionário
do empregador desafia a preponderância da lei, o instrumento de negociação passa
a ser um interlocutor importante no cumprimento da legislação. Essa afirmação se
torna ainda mais emblemática quando se considera o caso de um greenfield, como
Catalão, ainda na “pré-história” das relações de emprego quando abrigou uma
montadora na cidade.
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Enfim, mesmo diante de uma série de contratendências e do refluxo do movimento sindical no País, os trabalhadores da MMC conseguiram articular a criação de um sindicato dos metalúrgicos que representasse efetivamente a categoria
local. Em que pesem todas as consequências já apresentadas neste estudo sobre a
descentralização das negociações, o fato é que, no caso dos metalúrgicos de Catalão, o acordo realizado diretamente com a empresa foi benéfico aos trabalhadores,
pois possibilitou a incorporação de um conjunto de regras adicionais à legislação
estatal, ainda que o escopo temático da negociação se apresentasse menos amplo.
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PARTE 2
RELAÇÕES DE TRABALHO:
TRANSFORMAÇÕES E
PARTICULARIDADES NA
AMÉRICA LATINA E NA
EUROPA
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PERSPECTIVAS DAS RELAÇÕES DE TRABALHO NO
BRASIL NO COMEÇO DO SÉCULO 21
Marcio Pochmann1
O tema das relações de trabalho parece voltar ao centro do debate sobre
políticas regulatórias após a grande noite de predomínio do pensamento neoliberal. O forçado Consenso de Washington apontava para um mundo superior, com
plena desregulamentação do trabalho.
A grande crise do capital globalizado, em 2008, indicou os limites das políticas neoliberais, bem como a regressão imposta ao mundo do trabalho pelo
avanço da concentração econômica pelas grandes corporações transnacionais. O
movimento desencadeado pelas nações para a defesa da produção do emprego
diante do agravamento da recessão internacional abre a nova perspectiva para a
regulação das relações de trabalho.
É neste contexto que o presente estudo pretende contribuir no debate a respeito de inovações no padrão de regulação das relações de trabalho no Brasil. Para
isso, aponta, inicialmente, breve descrição das principais especificidades de regulação das relações de trabalho e, na sequência, rápida descrição sobre as tentativas
recentes de reformação do padrão regulatório do trabalho no País.
A última parte, antes das considerações finais, trata do novo emprego assalariado formal e da ocupação nos pequenos empreendimentos que terminam por
reposicionar o trabalho no Brasil emergente por nova regulação social e trabalhista. Deve-se destacar que as informações estatísticas utilizadas foram compatibilizadas e sistematizadas a partir da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios
do Instituto Brasileiro de Geografia de Estatística e da Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego.
Especificidades das Relações de Trabalho e Gradualismo
Regulador
De maneira geral, as relações de trabalho nos países que conformam a periferia do capitalismo mundial não registram idêntica trajetória de avanços conforme
1 Professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit)
da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
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observada em alguns poucos países desenvolvidos. Por conta disso, as relações de
trabalho no Brasil apresentam especificidades que não devem ser menosprezadas
no âmbito da reprodução das principais características do subdesenvolvimento
(disparidade na produtividade setorial e regional e parcela significativa da população prisioneira de condições precárias de vida e trabalho)2.
Três são as principais especificidades que marcam a evolução das relações
de trabalho no Brasil3. A primeira resulta tanto da longa transição da sociedade
agrária como da rápida e incompleta passagem pela sociedade urbano-industrial.
Enquanto o primitivismo da sociedade agrária durou 430 anos (1500-1930), a sociedade urbano-industrial predominou por menos de sessenta anos (1930-1980).
Na sociedade agrária brasileira houve a convivência do anacronismo no uso do
trabalho forçado com condições de vida extremamente precárias, limitadas pela prevalência de produtividade nacional praticamente estagnada por longo período. Jornadas de trabalho longas e expectativa da média de vida da população trabalhadora
inferior a quarenta anos impuseram a conformação de uma sociedade de extremos
entre a elite aristocrática e a massa restante miserável da população.
Na sociedade urbano-industrial as transformações no mundo do trabalho
foram intensas, porém desacompanhadas das reformas civilizatórias do capitalismo contemporâneo, ou seja, das reformas agrárias, tributárias e sociais. Em virtude disso, o salto nos ganhos de produtividade terminou sendo apropriado por
parcela ínfima da população, sobretudo a elite branca proprietária e a que emergia
do acesso – ainda que limitado – ao sistema educacional portador de passaporte
para as melhores oportunidades de trabalho e vida.
A segunda especificidade nas relações de trabalho do Brasil deriva do predomínio de regimes políticos não democráticos, geralmente conduzidos pelo conservadorismo autoritário, avesso a avanços sociais e trabalhistas rápidos e imediatos. Exemplos disso podem ser constatados na própria experiência nacional de
regulação lenta e tardia das relações de trabalho, a começar pela longa transição
do trabalho escravo. O Brasil foi um dos poucos países com passado escravista
que ao alçar a condição de independência nacional (1822) não interrompeu o
trabalho forçado. Os 66 anos de independência nacional convividos com a escravidão (1822 - 1888) se deram no contexto de negociações graduais e pontuais
em torno do lento e administrado abandono sem rupturas da escravidão. Inicialmente, em 1850, com o fim do tráfico negreiro (Lei Eusébio de Queirós), poste
2 Sobre a problemática do subdesenvolvimento, ver: Furtado (1980); Arrighi (1997); Robinson (1981) e Amin (1976).
3 Para maiores detalhes a respeito da perspectiva do trabalho no desenvolvimento brasileiro ver: Pochmann (2010).
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riormente sucedido da introdução de legislação esparsa de contenção do uso de
mão-de-obra escrava (leis do ventre livre, em 1871, e dos sexagenários, em 1885).
Na sequência, a demora em 55 anos para a implantação de um código de
trabalho específico ao emprego assalariado no Brasil (1888-1943). A Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT), que representou muito mais do que a racionalização
de um conjunto de mais de cinco mil leis em vigência no início da década de
1940, se deu durante a vigência de regime autoritário (Estado Novo, 1937-1945)
e atingiu menos de 15% dos trabalhadores brasileiros. Destaca-se que a CLT de
1943 voltou-se somente aos empregados assalariados urbanos, enquanto até 1960
o Brasil foi majoritariamente dependente do trabalho agropecuário. O ingresso
dos empregados rurais na CLT se deu a partir da década de 1960, com gradual
e limitada cobertura dos direitos sociais e trabalhistas, também conduzido pelo
regime autoritário (ditadura militar, 1964-1985).
Somente com a Constituição Federal de 1988 os trabalhadores rurais terminaram sendo plenamente incorporados ao sistema de proteção social e trabalhista
vigente no Brasil. Noutras palavras, o trabalho livre no Brasil demorou exatamente um século (1888-1988) para ser efetivamente aplicado nas relações de trabalho
assalariadas. Para os empregados rurais, em especial, isso somente se completou
quando passaram a representar uma parcela ínfima do conjunto das classes trabalhadoras.
Por fim, a terceira especificidade nas relações de trabalho no Brasil decorre da
singularidade da conformação das classes trabalhadoras durante o ciclo de industrialização nacional (1930-1980). O movimento migratório campo-cidade não foi
geralmente espontâneo e acompanhado de certa mobilidade social, ao contrário
da experiência europeia de regressão social representada pelo movimento de expulsão do trabalho no meio rural e pela transição da condição de servo para a de
operário nos séculos 18 e 19.
Diante de condições extremamente precárias no campo brasileiro, a transferência para as cidades representou a possibilidade de ter oportunidades de vida e
trabalho inexistentes no meio rural. Mas o enorme fluxo migratório para as cidades concentrado no tempo e sem planejamento governamental implicou caos urbano, com favelização das moradias, configuração de um gigantesco excedente de
mão-de-obra metropolitana desempregada e subocupada e, ainda, a transposição
da pobreza rural para o meio urbano convivendo com sinais exteriores crescentes
de riqueza concentrada em pequenos circuitos sociais.
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Dificuldades Recentes no Avanço Regulatório
do Mercado de Trabalho
Desde antes do esgotamento do ciclo de industrialização nacional, a partir
da década de 1980, o Brasil já apontava para a passagem para a sociedade pós-industrial, com avanço dos postos de trabalho crescentemente influenciados pelo
setor terciário da economia. Isso, evidentemente, não indica a perda de importância dos setores industriais e agropecuários na geração de riqueza, mas apenas
indica o vetor de onde provém a maior parte das ocupações que podem ser em
maior e melhor qualidade dependendo do ritmo de expansão econômica e do
perfil da produção (agrária, industrial ou financeira).
Três décadas após a identificação da crescente importância ocupacional do
setor terciário na economia nacional, observa-se alguma semelhança com a trajetória de regulação do passado: lentidão e legislação pontual e gradual. Durante a
vigência recente do regime democrático que acompanha o Brasil na passagem do
século 20 para o 21, assistiu-se a três momentos políticos voltados às mudanças
no padrão de regulação das relações de trabalho.
O primeiro ocorreu na segunda metade da década de 1980, com a Assembleia Nacional Constituinte, responsável fundamentalmente pelo aperfeiçoamento do código de trabalho (CLT) aos empregados já incorporados e a inclusão
de adicionais de trabalhadores historicamente excluídos. Acordos conservadores
realizados entre parcela da representação de trabalhadores e do empresariado impediram consagrar na Constituição de 1988 a regulação das relações de trabalho
contemporâneas com o avanço do trabalho pós-industrial.
O segundo momento político se deu na primeira metade da década de
1990, quando o pensamento neoliberal predominou. O Fórum Nacional do
Trabalho de formato tripartite e paritário durante o breve governo do presidente Itamar (1993-1994) não conseguiu convergir para uma proposta nova
de regulação das relações de trabalho. O fracasso deste Fórum foi sucedido
durante a segunda metade da década de 1990, por diversas modalidades de
desregulamentação e rebaixamento do patamar das relações de trabalho no
Brasil.
O terceiro momento político, também de formato tripartite e paritário, ocorreu na primeira metade de 2000, logo no início do primeiro mandato do governo
do presidente Lula. No contexto pós-neoliberal não houve convergência necessária entre as partes representadas no Fórum do Trabalho para que houvesse
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mudanças no padrão regulatório das relações de trabalho, tão-somente para interromper o movimento maior de desregulamentação e precarização das condições
de trabalho.
Na recente marcha de expansão significativa do emprego formal terminaram
sendo implementadas algumas políticas para os pequenos negócios (lei geral da
micro e pequena empresa e do empreendedor individual). A despeito disso, o
Brasil segue à margem de regulação nas relações de trabalho adequada à nova fase
de dinamismo do trabalho no setor terciário (terceirização e demais formas de
exercício do trabalho imaterial)4.
Reposicionamento do Trabalho nas duas Últimas Décadas
Entre 1988 e 2008, o Brasil gerou 28,4 milhões de novos postos de trabalho. Deste total, 15,8 milhões foram empregos assalariados com carteira assinada
(55,6% do total), o que permitiu fazer com que a taxa de formalização no total da
ocupação crescesse 12,2%, passando de 40,2%, em 1988, para 45,1%, em 2008,
segundo a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD), publicada
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Não obstante o desempenho econômico desfavorável ao longo do período
(alta inflação, baixo dinamismo econômico e desemprego expressivo), o Brasil
evitou o aprofundamento do grau de desestruturação do seu mercado de trabalho, sobretudo a partir do ano 2000. A recente e crescente expansão dos empregos formais tem refletido a retomada contínua do crescimento econômico pelo
mercado interno, especialmente pela recuperação dos investimentos.
Mesmo assim, o perfil do emprego gerado nos últimos anos apresenta características distintas daquele que predominou durante o ciclo de industrialização
nacional (1933-1980). Sobre isso, aliás, a primeira parte trata de descrever os principais aspectos do saldo dos empregos gerados entre 1988 e 2008.
Na sequência, procura-se analisar brevemente a evolução dos postos de trabalho informais durante o mesmo período de tempo que atingiu a 12,6 milhões de
novas ocupações. Tendo em vista algumas especificidades identificadas, percebe-se como se mantém a dinâmica ocupacional ainda à margem das atuais políticas
de regulação social e trabalhista.
4 Mais informações podem ser encontradas em: Pochmann (2009a); Pochmann (2009b) e Pochmann e (2008).
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O Avanço do Novo Emprego Assalariado Formal
A expansão do emprego formal não ocorreu de forma homogênea em todo
o território nacional. A região Sudeste, que respondia por 57,3% do total da ocupação formal do país em 1988, gerou apenas 43,3% dos quase 16 milhões de
novos empregos. Por isso, o Sudeste passou a representar 51,7% do emprego
formal em 2008.
Em compensação, as demais regiões geográficas aumentaram as suas participações relativas no total do emprego formal entre 1988 e 2008, conforme o
Gráfico 1. Enquanto a região Nordeste respondeu por 20,3% de todos os novos
postos de trabalho com carteira assinada, a região Sul contribuiu com 17,6%, o
Centro-Oeste com 11,2%, e o Norte com 7,9%. Se considerada também a massa
de rendimento das novas ocupações formais, percebe-se que o emprego que mais
cresceu nas grandes regiões não foi o de maior remuneração. Na região Nordeste,
por exemplo, registrou aumento relativo de 11,4% no total da ocupação, enquanto
a massa de rendimentos cresceu 1,5% no total do País.
Gráfico 1 - Brasil – Evolução na Composição do Total do Emprego Formal
por Grande Região Geográfica em 1988 e 2008 (em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Já na região Norte, o aumento de 47,2% na sua participação relativa no total
do emprego formal em 47,2% foi acompanhado do crescimento de 58,1% no
rendimento total. Na região Centro-Oeste, o peso relativo no total do emprego
aumentou 34,4% e na massa de rendimentos o crescimento foi de 47,1%, seguido
da região Sul com elevações de 1,2% na participação relativa do emprego formal,
e de 10,6% na massa de rendimentos.
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Gráfico 2 - Brasil – Evolução na Composição da Renda Total do Emprego
Formal por Grande Região Geográfica em 1988 e 2008 (em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
A região Sudeste, contudo, reduziu a sua participação relativa tanto no total
do emprego formal em 9,8% como na massa de rendimentos em 10,6%. Ou seja,
maior perda relativa na massa de rendimentos do que nos empregos formais, o
que indica que grande parte dos 6,8 milhões de novos postos de trabalho gerados
na região Sudeste entre 1988 e 2008 não conseguiu reproduzir idêntico padrão de
remuneração vigente até a década de 1980.
Gráfico 3 - Brasil – Saldo no Total de Emprego Formal Gerado por Setor
de Atividade Econômica entre 1988 e 2008 (em Milhão)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
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Duas razões podem ajudar a entender a evolução diferenciada das ocupações
e das remunerações dos empregados no mercado de trabalho formal durante as
duas últimas duas décadas. De um lado, o dinamismo gerador de emprego formal
fortemente concentrado no setor terciário, que terminou sendo responsável por
90,5% do total do emprego gerado entre 1988 e 2008. O comércio respondeu por
27,2% e os serviços por 63,3% dos 15,8 milhões dos novos postos de trabalho
com carteira assinada gerados em duas décadas. O setor primário e secundário da
economia criou poucos postos de trabalho formais, 0,7 milhão na agropecuária
e 0,8 milhão na indústria de transformação e construção civil no mesmo período
de tempo. Parte das ocupações criadas no setor de serviços parece ter tido alguma
relação com a terceirização dos empregos formais, sobretudo pela reestruturação
industrial ocorrida durante as duas últimas décadas, seja com o deslocamento
geográfico de empresas (guerra fiscal), a internacionalização de capital e as fusões e
aquisições. Desta forma, percebe-se que a remuneração percebida pelos empregados formais tendeu a ser, em média, inferior à paga pelo segmento de manufatura.
Gráfico 4 - Brasil – Saldo do Emprego Formal Gerado por Tamanho de
Estabelecimento entre 1988 e 2008 (em Milhão)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
De outro lado, percebe-se a força da geração dos empregos formais centrada
nos empreendimentos de menor tamanho em termos de trabalhadores ocupados.
Os empreendimentos com menos de 50 empregados com carteira assinada foram
responsáveis pela abertura de 51,3% do total dos postos de trabalho entre 1988
e 2008, enquanto as empresas com 500 ou mais trabalhadores contribuíram com
27,8% do total de 15,8 milhões de novas vagas.
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Gráfico 5 - Brasil – Composição do Total do Emprego Formal por
Tamanho de Estabelecimento segundo Região Geográfica em 1988 e 2008
(em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Com isso, as empresas com até 49 empregados aumentaram a participação relativa no total da ocupação em 34,3%, passando de 27,7%, em 1988, para
37,2%, em 2008. As empresas na faixa de 50 e 499 empregados reduziram em
25% a participação relativa no mesmo período de tempo (de 31,6% para 27,3%),
assim como os grandes empregadores (500 e mais empregados) com queda de
12,8% na ocupação formal total (de 40,7% para 35,5%).
Gráfico 6 - Brasil – Participação dos Empregados com Carteira Assinada
em Estabelecimentos com até 49 Trabalhadores no Total do Emprego
Formal por Grande Região Geográfica em 1988 e 2008 (em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
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A região Nordeste foi a que mais aumento no emprego formal apresentou entre
as empresas com até 49 empregados, com crescimento de 48,6% entre 1988 e 2008 (de
20,8% para 30,9%). Em posição oposta, a região Sudeste foi a que cresceu menos o
emprego formal relativamente nas empresas com menos de 50 empregados (31,2%).
Gráfico 7 - Brasil – Participação dos Empregados com Carteira Assinada
em Estabelecimentos de 50 até 499 Trabalhadores no Total do Emprego
Formal por Grande Região Geográfica em 1988 e 2008 (em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
No segmento ocupacional de 50 a 499 empregados, observa-se que entre 1988
e 2008, a região Nordeste foi a que registrou menor redução relativa do emprego
formal no total dos postos gerados (-10,2%). A região Norte foi, em compensação,
a que maior queda relativa apresentou no mesmo período de tempo (-25,2%).
Gráfico 8 - Brasil – Participação dos Empregados com Carteira Assinada
em Estabelecimentos com 500 e mais Trabalhadores no Total do
Emprego Formal por Grande Região Geográfica em 1988 e 2008 (em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS),
Publicada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
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Por fim, constata-se também que nas empresas com 500 ou mais empregados, a região Norte foi a única que elevou a participação relativa no total da
ocupação formal gerada entre 1988 e 2008. As demais regiões geográficas do País
reduziram a participação relativa no saldo do emprego formal, sendo a região
Sudeste com menor queda (14,2%) e o Centro-Oeste com a maior redução (20%)
no mesmo período de tempo.
Dinamismo das Ocupações à Margem da Legislação
Social e Trabalhista
As ocupações que se encontram à margem da legislação social e trabalhista
constituem um segmento heterogêneo de postos de trabalho. Em conformidade
com a classificação das ocupações disponível, o conjunto de postos de trabalho
não regulamentados conforma-se com empregados assalariados despossuídos de
contratação formal de trabalho, os empregadores e os trabalhadores por conta
própria sem contribuição à previdência social.
Esse segmento heterogêneo de ocupações pode ser ainda dividido por tamanho do empreendimento. O primeiro, até 10 postos de trabalho, e o segundo
com 11 ou mais ocupações. Ao se desconsiderar do total dos 92,4 milhões de
ocupados no Brasil em 2008, os postos de trabalho não expostos diretamente à
dinâmica privada de contratação e demissão (21,8 milhões de vagas), como no
caso dos funcionários públicos (6,4 milhões), dos trabalhadores domésticos (6,6
milhões) e dos ocupados não remunerados e envolvidos em atividades próprias
de produção, consumo e construção não agrícola (8,8 milhões), chega-se ao universo de 70,6 milhões de ocupações (76,4% do total da ocupação nacional). No
âmbito das ocupações submetidas mais diretamente à dinâmica do setor privado,
encontram-se os empregados (47,8 milhões), os empregadores (4,1 milhões) e os
trabalhadores por conta própria (18,7 milhões).
Neste segmento de trabalhadores ocupados no setor privado, identificam-se
38,4 milhões de ocupados pertencentes a empreendimentos com até 10 ocupações,
o que equivale a 54,4% de todos os postos de trabalho, e a 57,2% do total da massa
de rendimento. Do total dos postos de trabalho em empreendimentos com menos
de 11 ocupações, somente 29,4% possuíam algum grau de proteção estabelecido
pela atual legislação social e trabalhista. No caso dos ocupados por conta própria,
só 16,7% possuíam alguma proteção social e trabalhista, enquanto 40,8% dos empregados assalariados estavam registrados por contrato de trabalho formal. Entre os
empregadores eram 55,8% com contribuição à previdência social em 2008.
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No segmento de pequenos empreendimentos (de até 10 postos de trabalho),
as ocupações se dividiam em 18,7 milhões de trabalhadores por conta própria
(48,7%), em 16,5 milhões de empregados assalariados (43%) e em 3,2 milhões de
empregadores (8,3%). Enquanto os empregados em pequenos negócios representavam 27,1% do total de trabalhadores assalariados do País, os empregadores
respondiam por 78% do total de empresários e os postos de trabalho por conta
eram todos constituídos por pequenos negócios.
Em 2008, o rendimento médio mensal do conjunto dos ocupados nos pequenos empreendimentos foi de 902 reais, sendo de R$ 633,03 para os empregados assalariados, de R$ 2.607,00 para empregadores e de R$ 807,34 para os
trabalhadores por conta própria. O total da massa de rendimentos do segmento
ocupacional de pequenos empreendimentos era composto por 26,1% da renda
dos empregadores, por 27,3% dos salários dos empregados e por 46,6% das remunerações dos trabalhadores em conta própria.
Do conjunto dos postos de trabalho do segmento econômico com até 10 ocupações no Brasil, observa-se que 22,7% (8,7 milhões de pessoas) encontravam-se
na condição de pobreza absoluta (rendimento de até meio salário mínimo mensal).
Dos pobres ocupados em pequenos empreendimentos, 62,4% estavam ocupados
por conta própria, 36% eram empregados e 1,6% eram empregadores. No caso da
ocupação por conta própria, a taxa de pobreza absoluta era de 24%, enquanto entre
os empregados era de 17,4% e, ainda, entre empregadores de 3,5%.
Gráfico 9 - Brasil – Distribuição do Total da Ocupação e da Massa de
Rendimentos dos Empreendimentos Privados com até 10 Postos de
Trabalho por Grandes Regiões Geográficas (em %) entre 1988 e 2008
Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do IPEA; PNAD/IBGE e RAIS/MTE.
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Com relação à distribuição do total das ocupações e massa de rendimento dos
empreendimentos com até dez ocupados por grandes regiões geográficas brasileiras,
percebe-se a importância relativa do Sudeste, que respondeu por quase 40% do total
dos postos de trabalho e quase 46% da massa de rendimento. Na sequência aparece
a região Nordeste, a região Sul, a região Centro-Oeste e a região Norte.
Em relação à jornada de trabalho, observa-se que, em 2008, 15,4 milhões de
ocupados em empreendimentos com até 10 ocupações (40,3% do total) possuíam
jornadas de trabalho superior a 44 horas semanais. No caso dos trabalhadores por
conta própria, são 38,5% com jornada de trabalho acima de 44 horas semanais,
enquanto entre os empregadores havia 59,4% com atividades laborais superiores
a 44 horas semanais e entre os empregados assalariados 38,1% com tempo de
trabalho superior ao tempo legal de trabalho.
No quesito etário, percebe-se que 57,6% dos ocupados em pequenos empreendimentos encontravam-se na faixa etária de 25 a 49 anos de idade, com
18,7% com até 24 anos de idade e 23,7% com 50 anos ou mais de idade. Entre os
trabalhadores por conta própria, 57,1% tinham entre 25 e 49 anos, 34,1% com 50
anos e mais de idade e 8,8% até 24 anos de idade, enquanto para os empregadores
67,7% estavam na faixa etária de 25 a 49 anos, 28,3% com 50 anos ou mais de
idade e 4% com até 24 anos de idade. Nos empregados, 53,7% tinham entre 25 e
49 anos de idade e 36,6% com até 24 anos de idade e, ainda, 9,7% com 50 anos
ou mais de idade.
Considerando-se a escolaridade, constata-se que somente 10,8% dos ocupados em empreendimentos com até 10 ocupados encontravam-se na faixa de
escolaridade compatível com o ensino superior (completo ou incompleto). Os
demais trabalhadores ocupados possuíam escolaridade do ensino fundamental
(48,2%) e do ensino médio (41%). No caso dos empregados, 34,8% tinham apenas o ensino fundamental, 35,7% o ensino médio, e 29,5% o ensino superior,
enquanto os empregadores se dividiam entre 51,9% com ensino superior, 31,2%
com ensino médio, e 16,9% com ensino fundamental. Já os trabalhadores por
conta própria tinham 32,4% com o ensino fundamental, 35,2% o ensino médio e
32,4% o ensino superior.
Por setor de atividade econômica, nota-se que o segmento dos pequenos
negócios registrou maior concentração ocupacional no ramo do Comércio, Alojamento e Alimentação, com 40,2% do total dos postos de trabalho, seguido da
Educação, Saúde e demais serviços coletivos (16,5%), da Indústria (14,8%), da
Construção Civil (14,7%), Transporte e Comunicação (6,5%) e outras atividades
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(7,3%). Para os empregados, o setor do Comércio, Alojamento e Alimentação absorve 43,6% das ocupações, seguido da Indústria (14,2%), da Educação, da Saúde
e dos demais serviços coletivos (12,4%) e Construção Civil (11,8%), enquanto
para os empregadores também o ramo do Comércio, Alojamento e Alimentação
responde pela maior parte das vagas (48,7%), acompanhado da Indústria (14%),
da Educação, da Saúde e dos demais serviços coletivos (11,8%) e Construção Civil (10%). Para as ocupações por conta própria, Comércio, Alojamento e Alimentação concentram 35,1% do total dos postos de trabalho, seguidos da Educação,
da Saúde e dos demais serviços coletivos (21,3%), da Construção Civil (18,6%),
Indústria (15,5%), Transporte e Comunicação (8,5%) e Outros Serviços (1%).
Gráfico 10 - Brasil – Saldo dos Postos de Trabalho Gerados por
Empreendimentos de até 10 Ocupados ou mais entre 1988 e 2008 (em
Milhão)
Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do IPEA; PNAD/IBGE e RAIS/MTE.
Na comparação do ano de 2008 com o de 1988, constata-se a geração líquida
de 12,6 milhões à margem da legislação social e trabalhista. Quase 80% dessas novas ocupações geradas informalmente ocorreram em empreendimentos com até
10 ocupações. Nas 10 milhões de novas oportunidades de trabalho sem proteção
social e trabalhista criadas em empreendimentos de até 10 ocupações entre 1988 e
2008, 49,1% eram de emprego assalariado (4,9 milhões de ocupações), 38,4% por
conta própria (3,8 milhões de ocupações) e 12,5% com empregador (1,2 milhão
de ocupações).
Nos empreendimentos de até 10 ocupações, a taxa de desproteção social é
muito mais intensa que nos empreendimentos com 11 ou mais postos de trabalho.
Menos de 15% dos empregadores com 11 ou mais ocupados não contribuíam
com a previdência social em 2008, enquanto 1/5 dos trabalhadores não possuía
registro contratual.
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No caso dos empreendimentos com até 10 ocupações, a taxa de desproteção
atingiu quase 45% dos empregadores e 60% dos empregados. Para os que trabalham por conta própria a desproteção ultrapassou 80% do total.
Em virtude das significativas transformações por que passam os pequenos
negócios, fruto das alterações no quadro geral da economia e da sociedade brasileira, urge recompor o conjunto de políticas públicas específicas para esse segmento do mercado de trabalho. De um lado, devido à herança do quadro econômico e
social desfavorável dos anos oitenta e noventa, responsável pela ampliação do papel dos pequenos negócios no abrigo do excedente da força de trabalho na forma
de atividades laborais voltadas a diferentes estratégias de sobrevivência (produção,
vendedores ambulantes, prestadores de serviços de qualquer natureza, inclusive
ilegais). O resultado foi o menor desemprego aberto no País, embora ocorresse
o rebaixamento do nível de rendimento geral dos ocupados e a precarização dos
postos de trabalho.
De outro lado, devido ao movimento geral de reestruturação das grandes
empresas privadas (reengenharia, terceirização, entre outros), bem como a reformulação do papel do Estado (descentralização de responsabilidades, privatização,
terceirização, entre outros), houve a expansão dos pequenos negócios, nem sempre associada à baixa remuneração e precariedade dos postos de trabalho. Ou seja,
a oportunidade de novos negócios de mais alta tecnologia e produtividade em
baixa escala de produção e prestação de serviços em conformidade com melhores
remunerações e condições de trabalho.
Gráfico 11 - Brasil – Taxa de Desproteção Social e Trabalhista nos Postos
de Trabalho em Empreendimentos do Setor Privado com até 10 ou mais
Ocupações em 2008 (em %)
Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do IPEA; PNAD/IBGE e RAIS/MTE.
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Assim, a profusão do segmento dos pequenos negócios tornou-se ainda
mais heterogênea, conforme se procurou apresentar sinteticamente. Mesmo com
expansão média anual do Produto Interno Bruto de apenas 2,6% nas duas últimas décadas, a ocupação não agrícola aumentou 2,4% ao ano, em média. No
segmento de pequenos negócios do setor privado não agrícola, o crescimento
médio anual da ocupação foi de 4,1%. A se manter a mesma taxa de expansão
média anual da ocupação em empreendimentos privados não agrícolas com até 10
trabalhadores, verificada entre 1989 e 2008 (4,2%), o Brasil deverá gerar, até 2020,
19,3milhões de novos postos de trabalho. Deste total, 55% (10,7 milhões) deverão
ser de responsabilidade dos pequenos negócios (até 10 trabalhadores).
Cabe destacar, contudo, que o forte ritmo na geração de novos postos de
trabalho nos pequenos negócios ocorreu diferenciadamente em termos de proteção social e trabalhista. Para cada grupo de dez postos de trabalho abertos pelos
pequenos negócios, somente quatro foram protegidos pela legislação trabalhista
em vigor entre os anos de 1989 e 2008. Por isso, a presença de ocupações precárias e de baixa remuneração continua a ser um dos problemas estruturais que
atingem os pequenos negócios no Brasil. Em se mantendo a mesma taxa media
anual de formalização nos postos de trabalho nos empreendimentos com até 10
ocupações (5,3%), o Brasil poderá deter, em 2020, 61,1% do total das vagas ainda
sem proteção social e trabalhista.
Em síntese, há possibilidade de geração de cerca de 19,3 milhões de novas
ocupações no setor não agrícola até 2020, sendo mais da metade de responsabilidade dos empreendimentos até 10 ocupados. Desse universo, somente 5,7 milhões poderão ter alguma forma de proteção social e trabalhista. Diante disso,
o Brasil precisa rever o papel do conjunto das políticas públicas voltadas aos
empreendimentos com até 10 ocupados. A reordenação das políticas macroeconômicas e sociais capaz de atender à plenitude das especificidades dos pequenos
empreendimentos constitui o desafio inadiável em termos de escala e orientação
de ações coordenadas no campo tributário, creditício, comercial, tecnológico e
assistência técnica, previdência social, formação e qualificação de mão-de-obra e
relações de trabalho.
Considerações Finais
Conforme foi possível acompanhar nas páginas anteriores, o Brasil apresenta uma trajetória de especificidades importantes na regulação das relações de
trabalho. A ausência histórica de rupturas e reformas abruptas indica para o pre-
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domínio do caráter conciliador e postergador de mudanças profundas no padrão
de regulação das relações de trabalho ao longo do tempo.
Isso pode ser observado no movimento regulatório do trabalho na passagem
da sociedade agrária e escravista para a sociedade urbano-industrial e salarial, cuja
transição para o trabalho livre demorou quase sete décadas desde a Independência nacional (1822-1888) e, a partir disso, um século (1988-1988) para incorporar
plenamente os empregados rurais no código do trabalho assalariados (CLT). Neste sentido, constata-se nos dias de hoje também a presença de traços semelhantes
frente ao avanço das relações de trabalho pós-industrial que seguem sem a regulação adequada, quando não inexistente.
Se consideradas as duas últimas décadas, nota-se que parte significativa da
expansão da ocupação encontrou-se associada diretamente à dinâmica do setor
terciário e ao comportamento dos pequenos empreendimentos no Brasil. Quase
4/5 dos postos trabalho gerados pertencem ao setor terciário da economia, bem
como duas a cada grupo de três ocupações abertas no segmento privado não agrícola foram provenientes dos empreendimentos com até 10 trabalhadores.
Frente a isso se constata que parcela significativa das ocupações dos pequenos negócios ocorreu à margem da legislação social e trabalhista. Ademais, os
postos de trabalho abertos incorporaram pessoas de maior escolaridade, porém
acompanhados da redução do rendimento médio real. Diante da elevada heterogeneidade do segmento dos pequenos empreendimentos, que reúnem desde atividades associadas à estratégia de sobrevivência a ocupações modernas e vinculadas
ao comportamento das grandes empresas nacionais e internacionais, percebe-se
o quanto cabe ao País reavaliar o conjunto de ações regulatórias às relações de
trabalho no setor terciário e nos pequenos empreendimentos.
Os avanços realizados até o momento, como a legislação para micro e pequenas empresas e empreendedor individual são importantes, seguindo a tradição
histórica de regulação pontual e gradual dos novos fenômenos. Se projetado no
tempo o potencial de expansão das novas ocupações no setor terciário e no âmbito dos pequenos negócios no Brasil, conclui-se que há urgência e muito a ser feito,
pois do contrário, a marca específica do conservadorismo e do atraso nas relações
de trabalho poderá se manter inalterada.
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REFERÊNCIAS
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1976.
ARRIGHI, G. A ilusão do desenvolvimento. Petrópolis: Vozes, 1997.
FURTADO, C. O mito do desenvolvimento econômico. São Paulo: Paz e
Terra, 1980.
POCHMANN, M. Desenvolvimento e perspectivas novas para o Brasil. São
Paulo: Cortez, 2010.
______. Força de trabalho e tecnologia no Brasil. Rio de Janeiro: Revan,
2009a.
______. Qual desenvolvimento?. São Paulo: Publisher, 2009b.
______. A superterceirização do trabalho. São Paulo: LTr, 2008.
ROBINSON, J. Desenvolvimento e subdesenvolvimento. Rio de Janeiro:
Zahar, 1981.
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CAMBIOS INSTITUCIONALES Y MERCADO LABORAL:
PERÚ 1990 – 2009
Norberto E. García1
Introducción
El propósito de este trabajo es verificar los principales cambios institucionales registrados en el mercado laboral peruano y establecer hasta que punto los mismos han
influido en el comportamiento de dichos mercados. Para ese propósito, la sección II
sintetiza la evolución económica de Perú en 1990-2009. La sección III releva, muy brevemente, los principales cambios institucionales de derecho y de hecho que afectaron
el funcionamiento de los mercados laborales en el período 1990-2009. La sección IV
sintetiza la incidencia de esos cambios en el comportamiento de los mercados laborales
peruanos en 1990-2009, con atención a la profunda segmentación que los caracteriza. La
sección V plantea las principales conclusiones. Es importante señalar que, dado que no
se dispone de series anuales con información completa para los mercados laborales para
todo el período analizado, se descansa en hipótesis no testeadas econométricamente.
La evolución Económica de Perú en 1990-2009
El período 1980-1990
Entre 1950 y 1980, la economía peruana creció a un ritmo de 5.2 por ciento anual. Perú se encuentra en ese período entre los países con mayor crecimiento de la PEA
en América Latina. La PEA total creció en ese período a una tasa de 2.1 por ciento,
mientras que la PEA urbana, revelando la presión de las migraciones rural-urbanas,
lo hizo a un ritmo de 3.8 por ciento. El empleo formal urbano creció en ese período
por encima de la tasa previa, a un ritmo de 4.2 por ciento anual. A pesar de ello, el
escaso tamaño de los segmentos modernos urbanos relativizan ese dinamismo: el
empleo formal, incluyendo más de 16 por ciento de empleo público representaba en
1950 un 35 por ciento del empleo total, y el empleo informal urbano un 24 por ciento.
El desempleo abierto urbano se hallaba en 8 por ciento. El empleo agrícola creció
mucho más lentamente, a un ritmo de 0.7 por ciento anual. El sector agrícola absorbía
en 1980 el 42 por ciento de la PEA total, con 32 por ciento inserto en agricultura
tradicional y 10 por ciento en la agricultura comercial moderna2.
1 Economista, Universidad Nacional, Argentina; Master, Universidad de Chile, Ph.D. Cand. University of Cambridge (aprobé los exámenes pero no presenté la tésis).
2 Todas las cifras mencionadas provienen de PREALC (1981). La base estadística son Censos de Población, Censos
Económicos y Encuestas de Hogares.
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Es importante destacar la fuerte heterogeneidad productiva que caracteriza
a la economía. El rasgo estilizado es el predominio de muy elevadas diferencias
de productividad entre segmentos. (PINTO, 1965). La economía peruana de ese
período es muy escasamente diversificada y con un rol predominante de la producción de commodities. La escasa diversificación de la producción impedía la difusión de los aumentos de productividad hacia todas las actividades de la economía.
Los segmentos de muy baja y muy alta productividad absorbían una proporción
importante de la población activa, reflejándose así en las condiciones de vida, distribución del ingreso y pobreza. Esas diferencias de productividad podían alcanzar un ratio de 25 a uno, si se comparaba la productividad en sectores la industria
fabril con la de los minifundistas en la sierra peruana. Ese ratio era aún mucho
mayor, si se comparaba la productividad en la Minería – actividad muy intensiva
en capital – con la de los minifundistas en la sierra peruana.
La heterogeneidad productiva reflejaba diferencias de accesos a recursos en
general – capital, educación, calificación, capacidad de gestión etc. Por consiguiente, esas diferencias en acceso a recursos explicaban también la segmentación del
mercado laboral. En la medida que existía esa fuerte diferencia de acceso a recursos, el mercado laboral de las actividades de más baja productividad no podía
integrarse plenamente al mercado laboral de las actividades con pleno acceso a
recursos y de mayor productividad.
Una consecuencia de la heterogeneidad productiva es que no existía un
mercado laboral homogéneo y único. Así, por ejemplo, un desastre natural que
afectara significativamente el ingreso laboral del segmento del campesinado minifundista ubicado en la sierra rural, no afectaba significativamente la tasa de salarios
de entrada en las actividades de mayor productividad en los grandes centros urbanos. Recíprocamente, un aumento del desempleo abierto urbano no afectaba el
crecimiento del ingreso del campesinado minifundista de la sierra peruana. Esto
no significa que existieran compartimientos estancos, si no que el impacto de cualquier cambio o shock era mediatizado por este tipo de segmentación.
Recordemos que en ese período se trataba de una economía cerrada, en la
que el crecimiento dependía esencialmente del comportamiento de los segmentos
modernos de la economía. Era también una economía con fuerte intervención del
Estado, con una elevada cantidad de empresas públicas productoras de bienes y
servicios y regulaciones y políticas públicas que incidían en la formación de precios
y salarios – incluyendo el tipo de cambio. Hacia principios de los años 1980, las
divisas eran generadas esencialmente por las exportaciones de la minería metálica, la
pesca y la producción de harina de pescado. La tributación era también sensible a lo
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generado por estas actividades. Por consiguiente, lo producido por estas actividades
y los precios de estos commodities en mercados externos, incidían tanto sobre la
restricción de divisas como sobre la restricción fiscal. Esto explica porqué el crecimiento de Perú era muy sensible a la producción y precios de dichos commodities.
En los años 1980 Perú sufre tres shocks de alta intensidad: la crisis de la
deuda externa, el fenómeno del Niño y las consecuencias sobre decisiones de
inversión y crecimiento del conflicto generado por la Administración García.
Perú había acumulado un considerable stock de deuda externa, por lo que
con la crisis de la deuda externa de 1982-83, es uno de los países más afectados.
El shock generado por la fuerte alza en la tasa de interés de los EEUU en 1982 y
las políticas de ajuste interno, reducen significativamente el ritmo de crecimiento
durante varios años y la tasa de inflación permanece a niveles elevados.
A esto se le agrega a mediados de los años 1980 el impacto negativo del fenómeno del Niño, particularmente serio en comparación con otros períodos, que
provoca inundaciones y sequías que dañan la producción agropecuaria, afectan la
infraestructura y el transporte de bienes. Esto agudiza la desaceleración del crecimiento y añade presiones a la tasa de inflación.
El tercer shock proviene del conflicto generado por una Administración que
intenta sustraer a la economía del ajuste impuesto por el repago de la deuda externa,
implementar una redistribución de ingresos, intervenir el mercado cambiario y escalar el enfrentamiento con el sector privado hasta amenazar con estatizar los grandes
bancos. Este conflicto afecta decisivamente las decisiones de inversión privada y el
crecimiento y reduce la tributación, con lo que el Gobierno hace uso de la emisión
para mantener un gasto público creciente. El resultado es la aparición de múltiples
mercados negros y una tasa de inflación creciendo a tal velocidad, que a fines de los
años 1980 y primeros meses de los años 1990 Perú se encuentra ya en una franca
hiperinflación que roza el 2000 por ciento anual, con los salarios reales contraídos al
menor nivel registrado en su historia estadísticamente registrada.
Los tres shocks previos afectan el funcionamiento de la economía y el crecimiento económico. Con ello, afectan la capacidad de creación de empleos en
actividades de mayor productividad. Pero la PEA mantiene la inercia de su muy
elevado crecimiento. El resultado es un espectacular crecimiento de la informalidad – que hacia fines de los años 80 supera el 51 por ciento – y en menor medida
del empleo agrícola tradicional de muy baja productividad.3
3 En este trabajo, todas las cifras de informalidad corresponden a estimaciones oficiales del Programa de Estadísticas
y Estudios Laborales del Ministerio de Trabajo y Promoción del Empleo.
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El rasgo que caracteriza a la economía peruana, tanto en 1950-80 como en
1980-90, es el predominio de la producción de commodities y la muy débil diversificación de la inversión y producción. Este rasgo es importante para explicar las
altas diferencias de productividad, porque sin una diversificación significativa de la
producción es por definición mucho más difícil que se difundan los aumentos de
productividad hacia todas las actividades económicas.
El Período 1990-2000
A principios de los años 90, una nueva administración política pone en marcha simultáneamente un programa de shock para detener la hiperinflación, y un
programa de reformas estructurales, orientadas a abrir la economía y eliminar
la intervención del Estado en la misma. El programa de shock es exitoso, pero
afecta el empleo y no logra situar el tipo de cambio real a un nivel competitivo. La
informalidad vuelve entonces a crecer por estos shocks.
El programa de reformas estructurales es muy drástico: abre simultáneamente la cuenta comercial externa y la cuenta de capitales de la balanza de pagos,
privatiza en pocos años la casi totalidad de empresas públicas, y desregula o reduce significativamente la regulación en casi todos los mercados – incluyendo el
mercado laboral.
Inicialmente estos dos gigantescos shocks internos afectan la actividad económica, pero en poco tiempo, las expectativas generadas por operar en un contexto de libre mercado después de muchos decenios de regulación estatal, impulsan
las decisiones de inversión privada, y la economía peruana retoma un crecimiento
elevado en 1993-97.
En 1998-99 Perú sufre el rebote de las crisis del sudeste de Asia que afecta
decisivamente el ingreso de capitales de corto plazo, una de las fuentes de financiamiento del sistema bancario. El Banco Central de la Reserva no logra amortiguar
el impacto y por el contrario, adopta desafortunadamente medidas que conducen
a la interrupción de la cadena de pagos en el sector privado. Esto genera en muy
poco tiempo una recesión muy seria, que afecta a Perú en 1998-2000. Esta recesión genera más informalidad que desempleo. El empleo informal crece hasta
representar en el 2000 un 55.0 por ciento de la PEA.
Un rasgo decisivo del comportamiento a largo plazo de la economía peruana es el muy lento crecimiento de la productividad total. Como se desprende
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del Tabla 1, el crecimiento acumulado de la productividad total en 1970-2000 es
o negativo o cercano a cero, dependiendo de las estimaciones. En ambos casos,
refleja una pérdida de competitividad significativa, respecto a los países con los
cuales Perú compite, cuya productividad crecía anualmente a tasas significativas en
esos tres decenios.
Tabla 1 - Crecimiento de la Productividad Total 1950-2000
(Variación anual promedio en %)
Beltrán y
Vega
Seminario Centeno
(1998)
(1989)
Vega
Centeno
(1997)
Vallejos y
Valdivia
(1999)
Calvo y
Bonilla
(1998)
1.5
1.1
2.7
...
2.0
1.3
1.7
...
PERÍODO
IPE
1950-60
1.5 P(1)P
1.0
1960-69
1.4 P(2)P
2.5
1970-80
-0.8 P
0.3
1.1
-0.8
-0.6
...
1981-90
-3.9
-3.6
0.3 P(4)P
-2.4
-4.0 P(5)P
...
1991-2000
1.0
3.4 P(6)P
...
-0.4 P(7)P
1.8 P(8)P
1.8 P(9)P
(3)P
(1) 1951-60; (2) 1961-70; (3) 1971-80; (4) 1981-88; (5) 1980-90; (6) 1991-95; (7) 199196; (8) 1991-98; (9) 1993-96
Fuente: Datos del IPE 2001.
Esto es de gran importancia para entender la magnitud del shock que supuso
abrir la economía sin un tipo de cambio competitivo y con una productividad
total muy rezagada, respecto a los países competidores. Ambas cosas señalan que
la competitividad de Perú era muy débil durante los primeros años de la apertura
– razón
por la cual el crecimiento de la inversión privada en 1991-97 se orientó en
buena parte hacia no transables, excepto la Minería y otros sectores productores
de commodities. Esa muy débil competitividad presionó también al Gobierno a
adoptar medidas inmediatas y sin costos fiscales para mejorar la competitividad de
las empresas, y el principal candidato era la desregulación del mercado laboral.
Hacia el 2000, la economía seguía estando muy débilmente diversificada y los
commodities representaban un 69 por ciento de las exportaciones, una alta proporción de la tributación, y cumplían por lo tanto un rol decisivo para la dinámica
del gasto y crecimiento económico. Casi diez años después de la apertura económica, la economía peruana seguía caracterizada por una muy débil diversificación,
altas diferencias de productividad y segmentación de mercados.
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El Período 2001-2009
El período 2001-09 se caracteriza por un significativo esfuerzo de penetración
y diversificación de mercados externos. Tanto la Administración Toledo como la
Administración García impulsan políticas macroeconómicas estables, dan claras
señales de priorizar el esfuerzo exportador y logran acuerdos de libre comercio
con diversos países. Impulsadas en parte por la bonanza en mercados externos y
en parte por el esfuerzo para promoverlas, las exportaciones a precios constantes
crecen en 2001-08 a un ritmo de 8 por ciento anual (26 por ciento anual en dólares corrientes); en particular, las exportaciones no tradicionales se diversifican y
crecen a una tasa aún más elevada. Hacia el 2008, las exportaciones totales ascendían a 31.5 miles de millones de dólares y las no tradicionales representaban un
24.5 por ciento de ese total, debido a la fuerte alza de precio de los metales que
aumenta el valor de las tradicionales (véase Tabla 2 adjunto). Las exportaciones se
habían elevado desde el 11 por ciento del PIB en 1990 y 13 por ciento en el 2000,
hasta casi 25 por ciento del PIB en el 2008.
El dinamismo de las exportaciones se transmite a las restantes variables del
gasto, lo que impulsa el crecimiento del PIB a un ritmo de casi 7 por ciento anual
entre el 2002 y el 2008. En el 2008, Perú alcanza la tasa record de 9.9 por ciento
de crecimiento anual. La recesión global interrumpe este notable impulso de crecimiento, ya que provoca una contracción de las exportaciones del orden de 20
por ciento, más intensa en las no tradicionales, y hace que el país crezca sólo 1.4
por ciento en el 2009.
El Gráfico 1 adjunto señala con nitidez como, considerando incluso el índice
de volumen físico del PIB, limpio de efecto precio, se visualiza una notable aceleración de su crecimiento a partir del 2002, que se detiene bruscamente por la
recesión global en el 2009. Un hecho importante es que el acelerado crecimiento
del 2001-08 incluye un significativo aumento de la productividad total, a un ritmo
de aproximadamente 2.6 por ciento anual. (GARCÍA, 2008). Esto no es sólo
reflejo del crecimiento de las exportaciones no tradicionales, si no del aumento
de la inversión privada e innovaciones asociadas, y de una mayor diversificación de
la producción que permite difundir los aumentos de productividad. Con esto, en
las tres últimas décadas, sólo en 1993-97 y en 2001-08 se registra un crecimiento
significativo de la productividad total. La ausencia de un crecimiento sostenido
de la productividad total es en parte no despreciable explicada por la ausencia de
políticas deliberadas y potentes, que estimulen la adopción de innovaciones, la
capacitación laboral y la calidad de la educación.
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Tabla 2 - Exportaciones en Miles de Millones de Dólares 1990-2008
Total
% XNT
% PIB
1990
3.279.8
31.1
11.0
2000
6.954.9
31.0
13.0
2002
7.713.9
30.4
13.6
2008
31.529.4
24.5
24.7
Fuente: Banco Central dela Reserva de Perú. Series Estadísticas. Disponibles en: <www.bcrp.gob.pe>.
Gráfico 1 - Perú: Índice del Volumen Físico del PIB 1991-2009
Fuente: INEI. Cuentas Nacionales. Disponibles en: <www1.inei.gob.pe>.
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Los Principales Cambios Institucionales en el Mercado
Laboral
Los principales cambios institucionales en el mercado laboral pueden agruparse en: i) la reforma laboral de principios de los años 1990; ii) el nuevo régimen
laboral agrario del año 2000; iii) la nueva ley laboral para Micro y Pequeña Empresa (MYPE) del 2003; iv) la segunda reforma de la ley de MYPE del 2008; v)
los cambios a las disposiciones del salario mínimo y vi) el fortalecimiento de la
inspección del trabajo. Jaramillo (2004) señala, acertadamente, que la tendencia en
materia de reforma laboral es una constatada en numerosos países de América y
Europa – Perú no es un caso aislado.
La Reforma de Principios de los Años 1990
La reforma laboral de inicios de los 1990’s es un proceso que se inicia en
1991 y se despliega en varios años hasta culminar, con las últimas medidas, en
1995. Los principales cambios que introduce son los siguientes:
i). En el terreno colectivo, se modificaron las normas correspondientes a la
constitución de representaciones de trabajadores, los procedimientos de negociación y el derecho a huelga. Entre las normas más importantes en ese sentido, se
puede mencionar que se impuso un límite mínimo en el número de trabajadores
necesarios para constituir un sindicato: 20 trabajadores para sindicato de empresa
y la mitad de los trabajadores para sindicato de actividad. Asimismo, se eliminaron los beneficios de protección frente al despido (fuero sindical), a los dirigentes
sindicales. Finalmente, se anuló la negociación laboral a nivel de rama y solo se
permitió la negociación por empresa u obra4/. Finalmente, se ampliaron las causas de cese colectivo (despidos masivos mayores al 10% de personal de la planta,
sin pago de indemnización alguna), incorporándose una modalidad asociada a
“causas económicas.”
ii).Por otro lado, en el plano de los derechos individuales, se produjeron
importantes cambios en los mecanismos de despido y de contratación de trabajadores. Los más importantes de estos cambios se muestran en el cuadro 3 siguiente y se comentan a continuación. Uno de los principales cambios, siguiendo la
experiencia española, es la introducción de variadas modalidades de contratación
temporal o de corto plazo. Aparecen así nuevas formas de contratación, con la
finalidad de flexibilizar la relación
4 El caso mas notorio en este proceso fue el los trabajadores de construcción civil, cuyas obras en general no duran
mas de seis meses, con lo cual, las posibilidades de organizarse y negociar se redujeron.
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Cuadro 1 – Síntesis de la Reforma Laboral: Derechos Individuales
de los Trabajadores
Fuente: Chacaltana y García (2004)
laboral. Para ello, una de las primeras acciones a ser tomadas fue flexibilizar
las condiciones y requisitos exigidos para la contratación temporal de mano de
obra, proceso que hasta entonces era bastante dificultoso. Así, a las ya existentes
modalidades de contratación de naturaleza temporal o accidental, se añadió la
posibilidad de contratar por obra o servicio (contratos específicos, intermitentes
o de temporada), y esto podía hacerse “cuando así lo requieran las necesidades del
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154
mercado o mayor producción de la empresa”5. Asimismo, la duración máxima del
uso de estos contratos temporales paso de 2 años a 5 años por trabajador aunque
cuando se trata de contratos por obra o servicio específico, no hay plazo límite.
iii). En cuanto a los procedimientos de despido, probablemente el hecho
mas importante fue la eliminación de la estabilidad laboral absoluta, derecho
que incluso había adquirido rango constitucional en 1979. La estabilidad laboral
absoluta implicaba que era nulo el despido arbitrario de manera que el despido
sólo procedía cuando existían “causas justas” demostrables judicialmente por el
empleador. Las razones de “causas justas” de despido eran taxativas, su número
reducido, y sólo se aplicaban en casos extremos, como por ejemplo, faltas graves
derivadas de la conducta del trabajador6. Con la reforma, se creó la figura del
despido arbitrario, es decir, se eliminó la nulidad del despido injustificado y consecuentemente la estabilidad laboral absoluta. Esta fue reemplazada por el derecho
a la estabilidad laboral relativa, definida como una protección contra el despido
arbitrario equivalente a una indemnización de una y media remuneración ordinaria mensual por cada año completo de servicios, sujeta a un tope de doce remuneraciones mensuales en total. Simultáneamente, se amplió el abanico de “causas
justas” de despido incorporándose algunas asociadas a problemas de conducta y
a la incapacidad productiva del trabajador.
iv). Se ampliaron las posibilidades de capacitación laboral juvenil, que por
no tener carácter laboral, no obligan al pago de beneficios sociales, aún cuando
mantienen la obligación de asegurar una cobertura de salud al joven participante.
Antes de la reforma, los contratos de capacitación para el trabajo sólo existían a
través de la forma de prácticas preprofesionales, mecanismo aplicable sólo para
estudiantes de educación superior. Con la reforma se estableció que las prácticas
preprofesionales no sólo se aplicaran para estudiantes sino también para egresados de educación superior. Al mismo tiempo para quienes no tuvieran educación
superior, se crearon los Convenios de Formación Laboral Juvenil (CFLJ) aplicable
a jóvenes entre 16 y 25 años y, para los jóvenes con formación técnica, se crearon
los Contratos de Aprendizaje (CA)7.
5 En relación a los costos asociados a la contratación temporal, en la actualidad los trabajadores de este régimen
tienen los mismos derechos y beneficios que los trabajadores con contrato indeterminado (permanentes). La única
diferencia radica en que, en caso de rompimiento arbitrario del contrato, el empleador está obligado a otorgar al
trabajador temporal una indemnización equivalente a una y media remuneración por cada mes dejado de trabajar
de acuerdo a su contrato.
6 Se exceptuaban de este beneficio a ciertos trabajadores como por ejemplo, a los que ocupaban puestos de confianza
y a aquellos que tenían menos de tres meses de antigüedad en el empleo, a los cuales se les consideraba en periodo
de prueba y cuyo número no podía exceder el 10% del total de trabajadores permanentes de la empresa
7 Cabe señalar que simultáneamente a la creación de estos mecanismos, se establecieron limitaciones a su uso: la
duración máxima de los CFLJ y los CA es de 36 meses y es obligatoria su inscripción en un registro especial del
MTPS, luego del pago de una tasa mínima.
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v). Se ampliaron las posibilidades de subcontratación laboral. En primer
lugar, se modificaron las normas de subcontratación a través de terceros (intermediación). Antes sólo se permitía la participación de trabajadores pagados por
terceros en una empresa, “cuando los servicios eran actividades complementarias, como mantenimiento, limpieza, vigilancia, seguridad, eventos temporales y
otros análogos”. Con la reforma laboral (DL. 728), se crearon las cooperativas
de trabajo y fomento del empleo y las empresas de servicios especiales (llamadas
services en Perú) y la innovación consistió en que los trabajadores provenientes
de estos “services” o cooperativas, podían prestar no solo servicios complementarios sino también servicios esenciales temporales. El argumento es que este mecanismo permite que las empresas usuarias “concentren sus recursos en aquellas
actividades que por su especialización les generen mayores beneficios”. En segundo lugar, actualmente, se puede subcontratar directamente - no solo a través de
mecanismos de comisión o destajo que ya existían- sin también a través del uso de
los denominados contratos de locación de servicios utilizando el Registro Único
de Contribuyentes (RUC). Aunque esta no es una modalidad laboral propiamente
dicha – sino civil y por tanto no permitida para incorporar trabajadores - ha sido
una de las modalidades mas utilizadas por las empresas en los últimos 10 años.
vi). Estos cambios determinaron una reducción importante en la capacidad
de los trabajadores para organizarse y negociar de manera colectiva sus salarios y
condiciones de trabajo.
vii). Mas importante aún, todo esto ocurrió en el contexto de un claro debilitamiento de la Autoridad Administrativa del Trabajo – el Ministerio de Trabajo
– cuyo presupuesto y personal se redujo a menos de la cuarta parte en unos pocos
años. En particular, sufrió una reducción cuantitativa y cualitativa la inspección
del trabajo, con consecuencias notables de aumento del incumplimiento de las
normas laborales. Una hipótesis a considerar es que dado que el Gobierno publicitó esta reforma señalando las ventajas de la desregulación, una consecuencia no
planeada fue el aumento del incumplimiento de las nuevas normas, hecho viable
por la significativa reducción de la inspección laboral y la idea explicitada por el
Gobierno de que las pequeñas empresas eran importantes para el empleo aun
cuando no cumplieran con las normas laborales.
viii). La reforma fijó la Compensación por Tiempo de Servicio (CTS) en 30
días por año, equivalentes a 8.33 por ciento del salario anual. La CTS es un aporte
que efectúa la empresa para constituir un fondo individual capitalizable al que
puede acceder el trabajador en caso de despido. No obstante, a través de varias
leyes, el objetivo de la CTS fue desnaturalizado al permitirse retiros de parciales
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de estos fondos para la adquisición de vivienda, para bienes durables y para situaciones de enfermedad o accidentes.
La reforma laboral iniciada en 1991 y desplegada en 1991-05, logra una flexibilización laboral significativa y reduce abruptamente la capacidad de negociación
sindical. Estos hechos se manifiestan en la reducción de los costos laborales no
salariales y en la mayor capacidad de manejo del personal por parte de las empresas pero afectan las relaciones laborales y también, decisivamente, la formación
de salarios. Después de la reforma laboral los salarios reales crecen en 1995-2008
muy lentamente en Perú, significativamente por debajo de la productividad.
El Régimen Laboral Agrario del 2000
La ley No 27360 del 2000 estableció un régimen de promoción al sector
agrario, incluyendo las actividades agroindustriales que se desarrollen fuera de
Lima y Callao (excluyendo ciertas agroindustrias que usan determinados insumos). Además de establecer incentivos tributarios y de otra índole, introdujo un
régimen laboral agrario, vigente hasta Diciembre del 2010.
El régimen laboral agrario contempló originalmente (2000) que los trabajadores
tienen derecho a percibir una remuneración diaria no menor a s/ 16.- o mensual no menor a s/ 480.-, siempre que laboren más de 4 horas diarias. Dentro de esta remuneración
se incluye la Compensación por Tiempo de Servicio o CTS (aporte de las empresas para
cuando el trabajador quede cesante) y las Gratificaciones de Julio y Diciembre (15 días y
15 días) por lo que se trata de un salario integrado. Considerando este hecho, su nivel en
la práctica fue fijado por debajo de la remuneración mínima vital general.
Dado que la CTS y las gratificaciones equivalen, sumadas, a 25 por ciento del
salario base8, implícitamente esta Ley descansaba en un salario base de s/ 384. - La
ley dispuso que esos s/16 diarios o s/480 mensuales, se actualizarán en la misma
proporción que el reajuste del mínimo.
Adicionalmente, el trabajador agrario tiene derecho a un seguro de salud
en base a un aporte del empleador de 4%, a 15 días de vacaciones por año y a
una indemnización por despido arbitrario de 15 días por año con un tope de 180
remuneraciones diarias – o las fracciones correspondientes. El monto de salario
agrario de s/16.- diarios o s/ 480.- mensuales, fue reajustado en el 2003 en 12.2
% de acuerdo al reajuste del mínimo, lo que lo elevó a s/ 539.- mensuales. Fue
8 Las gratificaciones equivalen a 16.7 % del salario y la CTS a 8.3 por ciento. La suma es entonces 25%.
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reajustado nuevamente en el 2005 en 8.7 %, lo que volvió a elevarlo a aproximadamente s/ 585.- Estos 585.- soles se descomponen en: i) Salario base: s/ 468. - ;
ii) CTS y dos Gratificaciones anuales: s/ 117.El salario base en el régimen agrícola era en el 2007 de s/ 468.- comparado
con el mínimo de s/ 500.- del régimen general. Esto implica que el mínimo general de s/ 500.- era un 6.8 por ciento más elevado que el salario base del salario
integral agrícola. A fines del 2007 con vigencia a partir de principios del 2008, la
remuneración mínima general fue reajustada en 10 por ciento, a s/ 550.- Consecuentemente, el salario base del régimen agrícola fue reajustado a s/ 514.8, cifra
en la que permanece hasta la actualidad.
La Reforma Laboral para la MYPE de la Ley 28015 del 2003
Hacia el 2000, la importancia de la Micro y Pequeña Empresa (MYPE) para
la generación de empleo era evidente. Generaba aproximadamente un 19 por
ciento del empleo total del país. También era relevante lograr su formalización, ya
que una proporción muy alta de la micro y pequeña empresa era desde un punto
de vista tributario y laboral informal. Cobra así fuerza la idea de establecer un
régimen especial de promoción para las MYPE, que abarcara diferente facetas
importantes para su desarrollo – acceso a capacitación e innovaciones, acceso
a compras estatales, régimen tributario, régimen laboral especial etc. EL Ministerio de Trabajo y Promoción Social elabora y presenta un proyecto de ley, que
es notablemente modificado por el Ministerio de Economía y Fomento y otros
Ministerios, hasta reducirlo en lo esencial a un cambio en el régimen laboral y
tributario. La ley es promulgada en el 2003. Se esperaba que con estos incentivos
se incrementara significativamente la formalización de MYPE informales.
En lo relativo a las normas laborales, la ley establece un régimen laboral excepcional para las MYPE. Entre los cambios respecto al régimen laboral general,
sobresalen los siguientes:
i) La nueva ley define como microempresa a aquellas con 1 a 10 trabajadores
y con ventas anuales máximas de 150 Unidades Impositivas Tributarias (UIT).
Define como pequeña empresa a aquellas con 1 a 50 trabajadores y con ventas
anuales de entre 150 y 850 UIT.
ii) Para estas empresas, dispone un régimen laboral especial por un plazo de
diez años.
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iii) La remuneración no debería ser inferior al mínimo legal, la jornada normal de ocho horas, el horario de trabajo debía respetarse, el sobre tiempo era
legislado de manera similar al régimen general y lo mismo el descanso semanal y
feriados.
iv) Se reducían las vacaciones a 15 días por año y fracción adicional por año
de servicio con un tope.
v) Para el caso del despido injustificado se admitía una indemnización de 15
remuneraciones diarias, más un adicional creciente con el número de años de
servicio con un tope de 180 remuneraciones diarias.
vi) El seguro de salud no era obligatorio y tampoco el pago de pensiones.
vii) Las MYPE quedaban exentas de cotizar para fines de capacitación al
SENATI en el caso de la industria y al SENSICO en el caso de la construcción.
viii) Los trabajadores de las MYPE quedaban exentos de participar en las
utilidades de las empresas dispuestas por ley en Perú.
ix) El aporte a la CTS se establece en 30 días por año, aproximadamente un
8.33 por ciento del salario anual, a ser depositado semestralmente por las empresas en la cuenta del trabajador.
x) La ley establecía un registro en el Ministerio de Trabajo, en el que las
MYPE debían inscribirse, para gozar de las ventajas laborales y tributarias de la
nueva ley.
xi) Se trasladaron todas las funciones y el organigrama de promoción de las
MYPE al Ministerio de Trabajo.
xii) A raíz de ese traslado, el nuevo nombre fue Ministerio de Trabajo y Promoción del Empleo (MTPE), con un Vice Ministerio de Promoción del Empleo,
del cual dependían todas las unidades y entidades de promoción de las MYPE.
La segunda Reforma Laboral para la MYPE del 2008
Las reformas previstas por la ley 28015 generaron con el tiempo cierta
desazón en dos grupos diferenciados. En el sector público, se tomó conciencia de que el número de MYPE inscriptas en el registro de la ley 28015 era
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pequeño en relación a los cientos de miles de unidades MYPE del país. En
los medios empresariales, se señalaba que una de las razones que explicaba su
escasa acogida, era el carácter temporal del régimen especial – vencido el cual
se regresaba a la legislación general del trabajo. En el 2007, dentro del propio
MTPE se analizaba nuevamente la necesidad de una política de promoción
que apuntara a elevar la productividad y competitividad del segmento MYPE,
y reducir su mortalidad. En ese año, sólo un tercio de las MYPE alcanzaban a
cumplir los tres años de vida, con una tasa de mortalidad mucho mayor a la de
las empresas grandes y pequeñas. Se revitalizó la idea de un enfoque integral,
que abarcara políticas de promoción en diferentes planos, incluyendo acceso a financiamiento, nuevas normas tributarias simplificadas, simplificación de
trámites y registros contables, acceso a innovaciones y capacitación, estimulo
a la formación de clusters y a la subcontratación, apoyo para el acceso a la
seguridad en salud y pensiones, normas laborales más afinadas que diferenciaran las microempresas de subsistencia familiar de aquellas con potencial
competitivo, etc.
El Congreso había aprobado facultades delegadas especiales al Poder
Ejecutivo para la aprobación de leyes exentas de ser específicamente debatidas
en el Congreso que reflejaban temas necesarios para la aprobación del TLC
con EEUU. La causa invocada fue el apuro para cumplir con el plazo previsto
en numerosos temas esenciales para la firma del TLC. Dentro de los temas
incorporados a las facultades delegadas, se incluyó el nuevo proyecto de promoción de MYPE.
El nuevo proyecto sufrió un trámite bastante accidentado, ya que una vez
propuesto por el MTPE, en el Consejo de Ministros enfrento la oposición y
propuestas de enmiendas o modificaciones de varios Ministerios importantes.
De hecho, hubo una confrontación institucional que provocó una modificación significativa a este proyecto – dejando de lado muchos de los aspectos
promocionales y enfatizando, al igual que lo sucedido en el 2003, la reducción
de costos laborales, esta vez por una vía inesperada. La confrontación llegó
a un terreno más serio que en el 2003, ya que en el Congreso se planteó y
aprobó una ley que trasladaba todas las funciones y organigrama vinculados
a las MYPE, desde el MTPE al Ministerio de la Producción. Como esto se
efectuó sin consulta alguna al MTPE, el proceso culminó con la renuncia del
Ministro de Trabajo. Después de este accidentado curso, el nuevo proyecto de
ley, aprobado en el 2009, incluía temas no previstos en el proyecto original del
MTPE y no incluía la mayoría de los temas de promoción y acceso a recursos
para las MYPE.
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En lo laboral, el nuevo proyecto aprobado comprendía lo siguiente:
i) La definición de MYPE fue ampliada radicalmente. Se definía como
microempresa a las unidades de hasta 20 trabajadores y se amplió también
el monto de ventas contenido en la ley 28015. Similarmente, se definía como
pequeña empresa a las unidades de 1 a 100 trabajadores y el monto de ventas máximo se elevó desde 850 a 1700 UIT anuales. Esta última cifra era
equivalente en el 2008 a aproximadamente 2.15 millones de dólares anuales,
lo que para la economía peruana implica un nivel de ventas de una empresa
mediana o grande. Consiguientemente, por esta vía, se ampliaba el acceso al
régimen especial de MYPE a empresas que en la práctica no eran MYPE sino
empresas medianas. De hecho, al establecer estos nuevos límites, las empresas
con más de 100 ocupados que quedaban sujetas al régimen laboral general,
representaban menos del 5 por ciento del empleo del país. Todo el resto estaba cubierto por el régimen especial MYPE y por el régimen especial agrario
y agroindustrial.
ii) El régimen laboral MYPE fue establecido como permanente, a diferencia
del régimen anterior que era temporal. Esto fue una consecuencia de la idea que
al ser temporal, no incentivaba la inscripción en ese régimen. Se agregó al carácter
definitivo del régimen, un plazo de cinco años a cada empresa para inscribirse en
el régimen permanente.
iii) La jornada laboral, horario y sobre tiempo quedaban igual al régimen
especial del 2003, con la excepción de que no se aplicaba sobre tasa alguna por
trabajo nocturno.
iv) Se mantenían las normas de vacaciones e indemnización por despido sin
causa justificada y la exención a participar en las utilidades de las empresas contempladas ya en el régimen especial del 2003.
v) El aporte por CTS es eliminado para las microempresas (1 a 20 trabajadores) y reducido a la mitad (15 días por año o aproximadamente 4.16 por ciento del
salario anual) para las empresas definidas como pequeñas (1 a 100 trabajadores).
vi) A diferencia del régimen del 2003, se establece un aporte para el seguro
de salud, una parte del cual era efectuado por el Estado; y el remanente, de un
costo muy bajo,
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Tabla 3 - Perú. Monto y Composición de los Costos no Laborales. 2002-08
(En porcientos)
2002
Gratificaciones anuales
Vacaciones
Cesantía (1)
Salud
Pensiones
Accidentes laborales (2)
Subsidio Familiar (3)
Capacitación laboral
Solidaridad
Total
A cargo del trabajador
A cargo del empleador
16.7
8.3
8.3
9.0
11.1
1.3
5.5
0.8
2.0
63.0
11.1
51.9
Post Reforma MYPE
2008
16.7
4.2
…….
3.1 (4)
11.1
…….
5.5
…….
40.6
11.1
29.5
Fuente: García (2005) y Estimaciones Efectuadas para Este Trabajo.
Notas:
(1) Aporte para la CTS
(2) Promedio de aportes a aseguradoras
(3) Corresponde al 10 % adicional sobre el salario mínimo para los trabajadores con cargas
familiares. La cifra del cuadro se calculó en base al promedio de remuneraciones asalariados, y el
número de asalariados con al menos un hijo menor de 18 años.
(4) Estimado en base a un aporte de 30 soles por empleador y un salario medio vigente en el tramo
de pequeña y mediana empresa hasta 100 ocupados.
por el beneficiario – microempresario, familiares o trabajadores. También se dispuso la
obligatoriedad del aporte a pensiones. El cofinanciamiento del seguro de salud era particularmente atractivo para empresarios y trabajadores del segmento MYPE que en la
práctica no imponían al sistema de seguros de salud. Fue posible incluirlo en este proyecto porque en forma coetánea, en el Gobierno se estaban aprobando varias iniciativas en
la dirección de establecer un seguro de salud universal en Perú para todos los habitantes.
vii) Se habilitó un registro para la inscripción simplificada de las MYPE para
acceder a los beneficios de la nueva ley, que de hecho operaba como primer paso
hacia la formalización.
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viii) Se trasladaron todas las funciones, responsabilidades y organigrama de
promoción y supervisión de las MYPE al Ministerio de la Producción.
La Tabla 3 estima el descenso de costos laborales no salariales generado por
la reforma del 2008 del régimen especial para MYPE. Como se desprende de
dicho Cuadro, el descenso en los costos laborales no salariales a cargo del empleador es significativo: desde un 51.9 por ciento a un 29.5 por ciento post reforma.
Conviene recordar que si bien el régimen es llamado para la micro y pequeña
empresa, el cambio de definición de tamaño, ampliando el tipo de empresa considerada legalmente como MYPE, deja afuera a sólo a 2 por ciento de las empresas
(las grandes) y 6 por ciento del empleo.
Como se desprende de lo expuesto, los cuatro cambios más importantes del
nuevo régimen laboral especial fueron: a) la notable ampliación en la definición
de tamaño de MYPE, que permitía en los hechos a la mediana empresa acceder
a este régimen especial con menores costos laborales; b) el carácter permanente
del régimen especial en reemplazo de la temporalidad; c) la reducción del aporte
de las empresas por la CTS y d) el acceso a bajo costo al seguro de salud para los
empresarios, sus familiares y los trabajadores, con un aporte estatal para reducir el
monto mensual de cotización del beneficiario. Esto último fue en la práctica uno
de los grandes atractivos del nuevo régimen. Una prueba de ello es que a partir de
su aprobación el número de MYPE inscritas en el registro del régimen especial,
creció rápidamente.
En la práctica, la aprobación de este nuevo régimen especial antes de firmar el
TLC con EEUU, benefició principalmente a empresas pequeñas y medianas ya que
les proveyó de una legislación laboral menos exigente y de menores costos, para
mejorar su competitividad poco antes de aprobarse legalmente dicho tratado9.
Los Cambios en el Régimen del Salario Mínimo
El régimen de salario mínimo sufrió grandes alteraciones de hecho, provenientes de tres grandes factores. El primero, hasta el 2007, el criterio de reajuste
del mínimo nominal y el período de vigencia, dependía en los hechos de decisiones político – administrativas, y por lo tanto variaban a lo largo del tiempo. El
segundo, las aceleraciones y desaceleraciones inflacionarias sumadas a la discre9 Por las razones expuestas, varios analistas consideran la reforma aprobada del régimen especial MYPE del 2008,
como una reforma laboral “encubierta” en la que el “anzuelo” es el acceso subsidiado a la seguridad en salud,
necesaria para la competitividad de empresas pequeñas y medianas ante la inminente firma del TLC con EEUU. (A
diferencia de la reforma inicialmente proyectada en el MTPE que era una estrategia de promoción).
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cionalidad en materia de reajustes nominales, condujo a una pronunciada caída del
mínimo real particularmente intensa durante la hiperinflación de fines de 1989 y
comienzos de 1990. De allí en adelante se verifica una lenta y errática recuperación,
sin que nunca alcanzara a retomar los niveles reales alcanzados en 1980. El tercer
factor fue el cambio legal en la cobertura de efectiva del salario mínimo que sufrió
modificaciones importantes.
Respecto a los cambios de cobertura, recordemos que el salario mínimo legal
general no rige para las actividades exportadoras no tradicionales, que se manejan
con un mínimo más bajo. En el 2000 se dispuso que para el sector agropecuario
y agroindustrial un régimen diferente de salario base inferior al mínimo al que se
le agregaba un 8.3 por ciento de aporte por la CTS y las gratificaciones de Julio
y Diciembre (15 días y 15 días), lo que representa un costo adicional de 16.7 por
ciento del salario base.
En el año 2000, el Gobierno provisional que sucede al Presidente Fujimori,
aprueba la reinstalación del Consejo Nacional del Trabajo, como entidad tripartita en
la cual tiene lugar del diálogo social a nivel macro. Entre las funciones otorgadas a ese
Consejo, se encuentra el análisis, discusión y aprobación de un salario mínimo vital.
No obstante, es recién en el 2007 que se logra aprobar, por primera vez en
Perú, un criterio o regla de reajuste y un plazo de vigencia, de modo de establecer un mecanismo institucional libre de interferencias político-institucionales. La
regla de reajuste está dada por la tasa esperada de inflación subyacente10/ para los
dos años siguientes, más el crecimiento de la productividad total registrado en los
dos años anteriores a la fijación. El plazo de vigencia se establece en dos años. La
tasa de inflación subyacente esperada es la proyectada oficialmente por el Banco
Central de la Reserva. Se mantiene un adicional de 10 por ciento del mínimo, para
los trabajadores con cargas familiares.
El mecanismo de reajuste, al descansar en la tasa de inflación subyacente
esperada para los siguientes dos años, contemplaba una cláusula de salvaguardia,
usual cuando se utiliza la inflación esperada a dos años plazo. Esa cláusula de salvaguardia, llamada cláusula gatillo, establecía que cuando la inflación subyacente
efectiva superaba significativamente la inflación subyacente esperada, el Consejo
podía aprobar automáticamente un reajuste suplementario por la diferencia, sin
esperar al vencimiento del plazo de vigencia de dos años.
Eso fue lo que ocurrió en el 2008, año en que se verificaron bruscas alzas en
10
La inflación subyacente es calculada por el BCRP como aquella libre de una parte significativa de la
volatilidad en los precios de alimentos y combustibles. Es por lo tanto una proxy de la tendencia de mediano plazo.
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el precio de alimentos – maíz y trigo importado, y otros alimentos – y combustibles, que provocaron una súbita aceleración de precios al consumidor cercana a 7
por ciento anual, muy por encima de la meta de 2 por ciento anual del BCRP. Las
Centrales Sindicales solicitaron la aplicación de la cláusula gatillo en Setiembre del
2008. En ese mismo mes, el Ministerio de Economía anunció públicamente que
la economía peruana no tendría problemas con la recesión internacional que estaba ya avanzando, y que cabría esperar una desaceleración del crecimiento desde
el casi 10 por ciento anual estimado para el 2008 a un 7 por ciento para el 2009.
Pero los empresarios, que contaban con información efectiva de lo que estaba
sucediendo en el exterior y de la brusca caída o anulación de pedidos de compra
por exportaciones, previeron un panorama mucho más adverso y se negaron a
aprobar el reajuste de la cláusula gatillo. El Gobierno se plegó a la posición empresarial a pesar de sus declaraciones de que la recesión global no afectaría a Perú.
Se produjo entonces un forcejeo que, complicado por los temas que emergieron
con la recesión global, terminó con el retiro de las Centrales Sindicales del Consejo y el virtual cese de actividades del Consejo todo el 2009 y lo que va del 2010. En
consecuencia, no sólo se dejó de lado la cláusula gatillo, si no también el reajuste
bianual que debía ser debatido a fines del 2009 para entrar en vigencia a principios del 2010. El Gobierno fue en el 2010 más explícito: declaró que no debía
reajustarse el salario mínimo en circunstancias que el país estaba recién saliendo
de una desaceleración del crecimiento. Con esto el propio Gobierno destruyó el
mecanismo de reajuste del salario mínimo creado por él mismo a fines del 2007, y
lo hizo a pesar de que Perú no sufrió en el 2009 una contracción del PIB – sólo
una abrupta desaceleración de su alto crecimiento previo.
Conviene agregar que en la práctica, la evasión del salario mínimo es elevada – en el 2006 aproximadamente un 32 por ciento de los asalariados se encontraba por debajo del mismo. Esto se explica esencialmente por el hecho de que
el salario mínimo es muy elevado para el muy bajo nivel de la productividad en
el segmento de la microempresa (menos de 10 ocupados), que da empleo a la
mayor parte de los asalariados. Este hecho es particularmente difundido entre
las microempresas de fuera de Lima Metropolitana, que son las que registran
menores niveles de productividad.
El Fortalecimiento de la Fiscalización Laboral
La capacidad de aplicar la ley es tan importante como su aprobación. En la
práctica, sobre todo a partir de la reforma laboral iniciada en 1991, se había ido
generando un clima de permitir el no cumplimiento de la legislación. Este clima
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se intensificó cuando en la práctica, la capacidad de fiscalización y control del Ministerio de Trabajo fue desmontada drásticamente en 1991-94, al rebajarse su presupuesto y recortarse su personal – entre ellos el cuerpo de inspectores laborales
que fue reducido en 80 por ciento.
Durante las negociaciones (2005-07) del tratado de libre comercio (TLC) con
EEUU, el primer tratado de comercio negociado por Perú, surgió el tema de las
normas laborales. El tratado, a solicitud del Gobierno de los EEUU, establecía nítidamente dos principios: i) el respeto a los derechos humanos en el campo del derecho laboral, establecidos en lo que es conocido como las normas fundamentales del
trabajo de OIT; ii) el cumplimiento de la legislación laboral nacional en cada país. En
la práctica, esto suponía un grado mayor de enforcement al vigente en Perú, donde
la aplicación y cumplimiento de la legislación laboral nacional era sumamente laxo.
Dado que tanto funcionarios del Gobierno, como representantes de las organizaciones de trabajadores y empresarios de EEUU viajaron a Perú frecuentemente para constatar el cumplimiento de las leyes laborales nacionales, la negociación del TLC condujo a la necesidad de fortalecer la inspección del trabajo. En
un período relativamente corto de tiempo el número de inspectores laborales se
elevó en más de 500 por ciento a más de 500 funcionarios.
A ello se le agregó una capacitación especial relativamente intensa, y campañas de información preventiva por los medios de difusión para alertar a las empresas de la nueva estrategia de fiscalización del cumplimiento de la legislación laboral. Simultáneamente, la Superintendencia Nacional de Tributación (SUNAT),
que posee una capacidad de fiscalización más potente que el MTPE, incluyó en sus
sistemas de verificación el cumplimiento de las leyes laborales.
En el 2008 se habilitó desde el MTPE el sistema de planilla laboral electrónica, en la que deben estar registrados los trabajadores de cada empresa. La combinación de todas estas acciones condujo a resultados más positivos en materia
de cumplimiento, aún cuando es todavía muy temprano para evaluar resultados
definitivos. Hacia el 2008, estaban registradas en planillas electrónicas alrededor de
142 mil empresa, el grueso de ellas micro y pequeñas empresas.
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El Impacto de los Cambios Institucionales
Período 1990-2000
Son muy escasos los estudios que han intentado evaluar el impacto cuantitativo del proceso de reformas, sobre todo porque este proceso se extiende en el
tiempo, como fue expuesto, desde 1991 hasta 2008. Esto hace muy difícil aislar su
incidencia de las causadas por otras múltiples variables en la evolución del mercado laboral. Un dato adicional, es que las encuestas de hogares para medir empleo
se amplían a nivel urbano total y nacional recién en 1996. Esto explica porqué el
análisis efectuado para los años 90 descansa en las cifras de empleo e ingresos
laborales de Lima Metropolitana – que por otra parte representaba una porción
muy elevada del empleo nacional urbano.
Sin duda, la intensidad y profundidad de la reforma laboral que se desplegó
entre 1991 y 1995 tuvo como principales consecuencias flexibilizar el mercado
laboral y reducir los costos laborales. Como veremos, tuvo también otras repercusiones, algunas de ellas no deseadas.
Respecto al empleo, como se observa en el Gráfico 2, el mismo sigue ajustadamente antes y después de las reformas de 1991-95 el comportamiento del PIB,
lo que está indicando que las reformas no afectaron significativamente en forma
directa esa correlación. En 1990-92, tanto el PIB como el empleo permanecen
prácticamente estancados como consecuencia del impacto del programa de shock
para detener la hiperinflación. En 1993-97, el PIB ser recupera y crece significativamente a una tasa de 7 por ciento anual y el empleo lo sigue de cerca creciendo
a un ritmo de 5.4 por ciento anual. En 1997-99 la economía sufre el rebote de la
crisis asiática y un serio daño al financiamiento de las empresas, lo que provoca
una recesión, manifestada en un estancamiento del PIB mientras el empleo sigue
creciendo pero explicado por el aumento de la informalidad, que se eleva notablemente de 48 a 54 por ciento entre 1997 y 1999.
Es importante retener un rasgo estilizado de los mercados laborales segmentados de Perú. Frente a shocks negativos o positivos, estos no se manifiestan
mucho sobre la tasa de desempleo, y en cambio el ajuste tiene lugar vía cambios
en la proporción de
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Grafico 2 – Lima: Evolución del PBI, el Empleo, y el Ingreso
Laboral: 1990-1999 (1990=100)
Fuente: Encuesta de Hogares MTPE-INEI (ENAHO).
empleo informal, en el ingreso laboral informal y en los salarios reales. Así, en
el período que se viene analizando, el shock registrado en 1990-92 no eleva la
tasa de desempleo, pero si aumenta la informalidad y genera una seria caída de
salarios reales.
Respecto a estos últimos, observando el Gráfico 2, se constata como el ingreso laboral medio cae sostenidamente en términos reales hasta 1993, y de allí
en adelante se recupera pero más lentamente que el empleo. Es probable que este
comportamiento haya estado influido por la reforma de 1991-95 que, como veremos, debilitó la formación de salarios. Cabe tener en cuenta que con la hiperinflación de 1989-90. El salario mínimo se había reducido a menos de 20 por ciento de
su valor real en 1980, hecho que sin duda afectó también la formación de salarios.
Los efectos de la reforma laboral se manifestaron no tanto en el empleo
agregado, si no en su composición, y en otras variables que afectan la calidad del
empleo, las relaciones laborales y la formación de salarios.
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Observando el Cuadro 5 adjunto, se concluye que uno de los efectos más
significativos de la reforma laboral es el cambio de composición del empleo por tipo
de contrato laboral. Entre 1991 y el 2000, la proporción de asalariados con contrato
laboral estable e indefinido, cae abruptamente de 41 por ciento a 21.3 por ciento.
A la inversa, los asalariados con contrato no estable (que incluye todas las formas
de contratación temporal o eventual) se elevan desde 25.8 por ciento del total de
asalariados en 1991 a casi 32 por ciento en el 2000. Pero el cambio más importante
tiene lugar en los asalariados sin contrato laboral o “en negro”: la proporción de los
mismos crece rápidamente desde 33.2 a casi 47 por ciento del total de asalariados.
Este último indicador, que refleja el aumento del empleo “en negro”, está manifestando un efecto no buscado de la reforma laboral de 1991-95. En la medida que se
introducen legalmente múltiples contratos de menor duración y costos, se abandona
la tarea de fiscalización del Ministerio de Trabajo expuesta en una sección previa, y
se legitima por parte del Gobierno la idea de que la estabilidad laboral es dañina; la
consecuencia es un fuerte crecimiento del personal asalariado no sujeto a contratos laborales – un aumento de la informalidad legal laboral en actividades formales – y desprotegida entonces de normas salariales, condiciones de trabajo y de seguridad social.
También es importante notar que hacia el 2000 la mayor proporción de los
asalariados sin contrato se ubica en el tramo de empresas de menos de 10 ocupados y de 10 a 49 ocupados – micro y pequeña empresa. A la inversa, la mayor
proporción de contratos no estables se concentra en las empresas de mayor tamaño pequeñas, medianas y sobre todas las grandes – 100 y más ocupados. Por
consiguiente, el debilitamiento de las normas laborales y de la fiscalización, indujeron dos tipos de respuestas en el mercado laboral formal en Perú. Por una parte,
facilitaron a las micro y pequeñas empresas elevar la evasión laboral, lo que explica
el alza de la proporción de sin contrato en estos tamaños de empresas. Por la otra,
la habilitación de múltiples contratos no estables, dio lugar al reemplazo de personal estable por este nuevo tipo de contratos en el estrato de empresas medianas y
sobre todo grandes. Estos dos grandes cambios afectaron las relaciones laborales
y, sin duda, la formación de salarios en los diversos estratos de empresas – reflejada en la mayor lentitud de la recuperación del ingreso laboral real en 1993-99
La Tabla 4 siguiente nos informa de otros cambios que tienen lugar, como consecuencia de las variaciones en la actividad económica y del efecto de la reforma laboral
de 1991. El primero de ellos, explicado por la aceleración y posterior contracción del
crecimiento económico, es el lento descenso de la proporción de empleo informal en
1990-97, y un abrupto aumento en 1997-99, de tal magnitud que hacia fines de los 1990’s
la proporción de informalidad era superior a la de 1990 y llegaba a 54 por ciento.
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Tabla 4 - Asalariados Privados según Modalidad Contractual y Tamaño
de Establecimiento. 1991-2000. (En porcientos)
Lima 1991
Lima 2000
Perú Urbano
(2000)
Con Contrato Estable
- 41.0
24.8
21.3
-Con Contrato No Estable
25.8
29.8
31.9
-Sin Contrato (1)
33.2
45.4
46.8
- Total
100.0
100.0
100.0
Estable
No Estable
Sin Contrato (1)
1. <10 ocupados
24.4
19.3
72.6
2. 10 a 49 ocupados
18.3
27.2
20.1
3. 50 a 99 ocupados
9.5
11.4
2.6
4. 100 y más ocupados
47.8
42.1
4.6
Total
100.0
100.0
100.0
Tamaño/Contratos (2000)
Fuente: Chacaltana y García (2004) en base a INEI, MTPS; ENAHO, 3er trimestre de cada año.
(1) Sin Contrato: definidos como aquellos asalariados privados que la ENAHO identifica como sin
contrato y que simultáneamente, no registran cotización a la seguridad social.
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Tabla 5 - Indicadores Seleccionados Mercado Laboral
1991
1993
1995
1997
1999
Informal
52.4
51.1
49.6
47.5
54.0
Formal
47.6
48.9
50.4
52.5
46.0
Asalariado Privado
42.3
44.3
44.7
43.6
52.5
Asalariado Público
11.9
10.0
9.2
6.8
9.1
Independiente
31.7
29.4
30.6
33.0
30.8
Resto
14.1
16.2
15.5
16.7
7.6
Estable/contrato indefinido
41.0
33.5
28.3
25.5
24.8
Comisionistas,destajo, honorarios
8.6
9.8
11.3
11.4
11.0
Tipo de Empleo (%)
Tipo de Contrato (%)
Services y cooperativas
7.1
2.7
5.4
3.8
3.0
Practicantes,Formación Laboral
0.2
0.3
0.5
1.3
0.8
Período de prueba
0.0
6.7
1.2
0.8
0.2
Eventual/plazo
9.9
12.2
15.6
16.0
14.8
Sin Contrato
33.2
34.8
37.7
41.2
45.4
Duración del empleo (meses)
69.1
52.0
48.0
42.0
46.6
Afiliación a Sindicatos (%)
36.4
28.1
19.3
5.5
7.7
Fuente: Chacaltana y García (2004) en base a Encuestas de Hogares, MTPE-INEI.
El fuerte incremento de la informalidad tuvo que ver con la recesión de fines
de los años 90, y con el hecho de que el mercado laboral peruano tiene un umbral
determinado por el elevado crecimiento de la PEA Urbana.
Así, en esa fecha el crecimiento de la PEA Urbana se hallaba entorno a 3.2
por ciento. Dada una elasticidad empleo producto que se movía entorno 0.75,
esto significaba que la economía debía crecer por encima de un umbral de 4.6 por
ciento anual para absorber el crecimiento de la PEA. Si se contraía el crecimiento
muy por debajo de ese umbral, se elevaba abruptamente la proporción de informalidad. El umbral fue descendiendo a medida que la tasa de crecimiento de la
PEA Urbana se fue desacelerando, pero se mantuvo por encima del 4 por ciento
anual hasta el 2009.
El segundo ajuste detectado en la Tabla 5 es el descenso en la duración del
empleo. La misma cae de 69 meses en 1991 a 46.6 meses en 2000. Esto es también
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un indicador del aumento de inestabilidad en el empleo y apunta hacia una mayor
rotación laboral y mayor número de episodios de salida de empleos del sector
moderno y entrada a empleos informales. Esto fue acompañado con un aumento
en el número de horas trabajadas. Hacia el 2000, 43 por ciento de los asalariados
trabajaban más de 48 horas semanales – particularmente en el sector de microempresa. Este fenómeno se extiende hasta la actualidad.
El tercer cambio significativo, es la enorme caída en la tasa de afiliación sindical: la misma decrece de 36.4 por ciento en 1991 a 7.7 por ciento en el 2000,
reflejando como la reforma deteriora notablemente la capacidad de negociación
sindical. Este hecho también influyó en la formación de salarios.
El cuarto cambio es la caída en la participación del empleo público – aunque
el Cuadro registra sólo lo acaecido en el Gobierno Central. Si se computa la privatización de empresas públicas, la caída es mucho mayor.
El quinto fenómeno registrado en la Tabla 5 es la significativa estabilidad de la
proporción de trabajadores independientes, la mayoría de ellos de bajos ingresos.
Como se observa en ese cuadro, esa proporción se mantiene en la década de los
años 1990 en torno a 31 por ciento. Este es también un rasgo estilizado del comportamiento de los mercados laborales en Perú: la alta proporción de trabajadores
independientes no asalariados que permanece a un nivel significativo a lo largo el
tiempo – con o sin reformas.
En síntesis, el mercado laboral formal se hizo más flexible y competitivo.
Pero la composición del empleo cambió fuertemente en los años 90, hacia una
mayor informalidad, hacia una mayor proporción de ocupados con contratos de
corta duración o sin contrato, hacia una menor protección social y hacia un contexto más negativo en materia de relaciones laborales y negociación sindical.
Respecto al crecimiento de la productividad total, las estimaciones a nivel
macro del mismo señalan, como cabría esperar, que la misma crece significativamente en 1993-97 durante el sub período de alto crecimiento – y cae abruptamente a partir de la recesión 1998-99.
Chacaltana y García (2004) agregan una información relevante. El fuerte
incremento en el uso de contratos de corta duración y de personal sin contrato,
posee una repercusión sobre el crecimiento de la productividad al interior de
las empresas. A medida que la planta de personal de una empresa ocupa más
contratados de corta duración, se torna menos posible invertir masivamente en
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capacitación. La razón es bien simple. Las empresas tienden a capacitar al personal estable que va a permanecer en la empresa. En la medida que se incrementa
mucho el personal no estable, se reducen proporcionalmente las posibilidades de
capacitación. Esto tiene una lógica económica.
Si una proporción muy alta del empleo de la empresa se encuentra con contratos
de corta duración, la tasa de rentabilidad de la inversión en capacitación debería ser
desmesuradamente elevada a corto plazo para justificar la capacitación de personal no
estable. Como en Perú la tasa de rentabilidad a corto plazo de la capacitación no es desmesuradamente elevada, el fuerte cambio de composición hacia contratos laborales no
estables contribuyó a afectar el crecimiento potencial de la productividad a nivel micro-económico. Cuando se afecta el crecimiento potencial de la productividad a nivel microeconómico, después de un cierto rezago – que puede implicar varios años – esto tenderá
a incidir en el crecimiento efectivo de la productividad total a nivel macroeconómico.
El testeo de la hipótesis previa vía series de tiempo es imposible por la ausencia
de información. Pero es factible una aproximación. Así Chacaltana y García (2004),
en base a una regresión de datos de empresas de un panel cross-section, usando datos anuales de Encuestas a Empresas del Ministerio de Industria efectuadas 1997-98,
estiman una elasticidad productividad/capacitación a nivel micro de 0.089 y un efecto
negativo significativo sobre la productividad de la rotación laboral explicada por el
gran uso de contratos no estables. Esto estaría sugiriendo que si se duplicara el gasto
anual en capacitación por empresa, se haría viable un aumento de 8.9 por ciento en la
productividad. Esta cifra se ubica en el tramo superior del rango de estimaciones similares efectuadas para otros países, lo que estaría confirmando que a fines de los años
1990, el débil gasto en capacitación de las empresas era una restricción significativa
para el aumento de la productividad a nivel microeconómico, y que no era ajeno a este
problema la gran proporción de contratos inestables.
El Período 2000- 2009
Los efectos de la recesión 1998-99 se extienden hasta el 2000. A partir de ese
año se inicia una recuperación orientada por la política macro-económica, y del
2002 en adelante, por un notable esfuerzo de aumento y diversificación de las exportaciones, aprovechando la bonanza de mercados externos. Dos Administraciones políticas sucesivas, desarrollan una variedad de esfuerzos, políticas y acuerdos
de comercio y transmiten al sector privado la prioridad otorgada a la penetración
de mercados externos. Las expectativas empresariales respecto a la viabilidad de
un crecimiento orientado por exportaciones se desarrollan velozmente. El impul-
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so exportador se difunde y abarca no sólo a los commodities mineros exportados
tradicionalmente por Peru, si no que se extiende a productos agrícolas, agroindustriales e industriales, cuyas exportaciones crecen muy velozmente en 2002-2008
– como ya se expusiera en una sección previa. Este impulso exportador incide
paulatinamente sobre otras variables de gasto y se alcanza así el período de más
alta aceleración del crecimiento económico de la historia peruana: aproximadamente un 7 por ciento anual entre el 2002 y el 2008, con una aceleración que eleva
la tasa de crecimiento desde el 4 al 10 por ciento anual entre el 2001 y el 2008.
Gráfico 3 - PIB, Empleo Formal, Empleo Total y Remuneraciones 2001-08
Fuente: INEI/MTPE.
Serie 1: PIB
Serie 2: Empleo Formal en empresas de 10 ocupados y más
Serie 3: Empleo Total Nacional
Serie 4: Promedio de Remuneraciones Reales en empresas de 10 y más.
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Este impulso es interrumpido abruptamente en el 2009 por la crisis mundial.
El Gráfico 3 resume el crecimiento del PIB, del Empleo Formal, del Empleo Total
y del promedio de las Remuneraciones Reales en 2001-08.
La notable dinámica del crecimiento se manifestó en una aceleración significativa de la creación de empleos. En particular, el empleo formal en empresas
de 10 ocupados y más, crece fuertemente a un ritmo de casi 5 por ciento anual,
por encima del crecimiento del empleo total que crece a una tasa de aproximadamente 3.0 por ciento anual, lo que impulsó una significativa reducción del
empleo informal.
La productividad total también se eleva con la aceleración del crecimiento
económico, alcanzando un crecimiento de entre 2 y 2.6 por ciento anual en 200208. (GARCÍA, 2008).
A pesar del aumento del empleo y de la productividad, los salarios reales
siguen un curso diferente. El crecimiento es muy poco significativo. El promedio de remuneraciones (ejecutivos, empleados y obreros) en empresas de más
de 10 ocupados crece a un ritmo de 0.8 por ciento anual entre 2001 y 2008.
El salario real obreros crece en el mismo período a un ritmo ligeramente más
elevado, 1.4 por ciento. El salario mínimo se recupera en términos reales en
2002-08 pero aún así su valor sigue siendo menos de un tercio del registrado
en 1980. Las diferenciales de ingresos por tamaño de empresa (véase Tabla
6 siguiente) seguían siendo en el 2006 muy elevadas, y más elevadas aún en
relación al ingreso medio de los trabajadores independientes de menos calificación e ingreso.
Usando información de planillas electrónicas del Ministerio de Trabajo que
abarcaban en el 2008 aproximadamente 155 mil empresas del país, puede concluirse que la proporción de contratos estables de plazo indefinido se recuperó
ligeramente respecto al año 2000. En el año 2008 dicho indicador llegaba al 46
por ciento del total de asalariados contratados en comparación con el 40 por
ciento verificado en el 2000 si se deja de lado los asalariados sin contrato - por definición las empresas registradas en las planillas electrónicas no reportan el empleo
sin contrato laboral o “en negro” mientras en la Tabla 4 anterior el empleo “en
negro” está incluido en el cálculo.
La incidencia del régimen laboral agrario y agroindustrial establecido en el
2000, facilitó sin duda la contratación de trabajadores a bajo costo en los sectores
agrícola y agroindustrial de exportación. La evidencia disponible señala el rápido
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crecimiento del empleo en las regiones de la costa, fuera de Lima Metropolitana,
donde cobraba impulso la dinámica exportadora. El crecimiento del empleo en
estas regiones tuvo lugar a un ritmo aún más elevado que en Lima Metropolitana.
No obstante, al igual que en el resto del país, las remuneraciones reales no crecieron al mismo ritmo.
Tabla 6 - Perú: Ingreso Mensual Promedio según Segmento Laboral, 2006
P/ (En Nuevos Soles)
Segmento laboral
Ingreso laboral promedio 1/
Independientes no calificados
387.6
hasta S/.400 mensuales
156.9
Más de S/.400 mensuales
818.0
Microempresa 2/
561.4
De 2 a 4 trabajadores
528.2
De 5 a 9 trabajadores
742.0
Pequeña empresa
792.4
10 a 19 trabajadores
725.6
20 a 34 trabajadores
802.3
35 a 49 trabajadores
1100.0
Mediana Empresa
1270.7
50 a 79 trabajadores
1309.4
80 a 149 trabajadores
1327.1
150 a 199 trabajadores
1013.6
Gran Empresa
1701.7
200 a 299 trabajadores
1642.4
300 y más trabajadores
2166.1
Fuente: INEI - Encuesta Nacional de Hogares, IV trimestre 2006. Elaboración: MTPE - Programa
de Estadísticas y Estudios Laborales (PEEL).
Notas técnicas:
P/ Cifras preliminares
1/. No se considera a los trabajadores familiares no remunerados (TFNR)
2/. La microempresa incluye a los independientes que utilizan trabajadores familiares no
remunerados (TFNR) y también a los T.F.N.R. que laboran en microempresas.
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Tabla 7 - Composición del Empleo en 2006. (En porcientos)
Número de
Trabajadores
1/
Número de
Trabajadores
(%)
Número de
asalariados
2/
Número
empresas
3/
Sector público
1,075,102
7.5
1,075,102
-
Micro empresa
2,772,202
19.3
2,050,772
805,693
92.8
De 2 a 5
trabajadores
2,150,736
15.0
1,530,436
716,912
82.6
De 6 a 9
trabajadores
621,467
4.3
520,336
88,781
10.2
1,073,180
7.5
1,037,728
57,210
6.6
De 10 a 19
trabajadores
539,776
3.8
507,906
41,521
4.8
De 20 a 49
trabajadores
533,405
3.7
529,822
15,688
1.8
Mediana y grande
4/.
1,347,040
9.4
1,347,040
5,024
0.6
De 50 y más
trabajadores
1,347,040
9.4
1,347,040
5,024
0.6
Independientes
sin TFNR
2,592,643
18.1
-
Independientes
con TFNR
2,431,910
17.0
-
T.F.N.R.
2,500,490
17.4
-
549,660
3.8
-
14,342,226
100.0
867,926
Composición
Pequeña empresa
Trabajador del
hogar
TOTAL
Número
empresas
(%)
100
Fuente: INEI - ENAHO Continua, IV Trimestre 2006. Resultados Preliminar.
Notas técnicas:
1/ Incluye a los empleadores.
2/ Incluye a empleados y obreros
3/ Se obtuvo dividiendo la PEA ocupada entre el punto medio de cada intervalo.
4/ MTPE. Oficina de Estadística e Informática. Hoja de Resumen de Planilla 2006
P
El impacto de la ley 28015 del 2003 con el régimen especial a la micro y
pequeña empresa, no parece haber sido muy significativo, a juzgar por el bajo
número de MYPE inscriptas en el registro correspondiente del MTPE – aproximadamente 17.000 hasta el 2007 sobre un universo superior a 860 mil de MYPE.
No puede evaluarse plenamente la incidencia de la segunda reforma al régimen
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especial MYPE, desarrollada en el 2008 y aprobada en el 2009, por el muy escaso
tiempo transcurrido. Pero es posible señalar que las MYPE registradas en el régimen especial crecieron a 80 mil a principios del 2010 y que esa segunda reforma
colocó en posición bastante más competitiva a empresas pequeñas y medianas
que debían enfrentar el TLC con EEUU.
Un punto a destacar es que en 2000-08 se registran significativas mejoras en
protección social. La cobertura de los regímenes de acceso a salud se eleva desde
un 35 por ciento en el 2000 a 43 por ciento en el 2008 y es decisión de Gobierno
seguir priorizando el aumento de esa cobertura. En Pensiones, el avance es más
lento: desde un 27 por ciento en el 2000 a un 32 por ciento en el 2008.
No obstante, después de 7 años de rápido crecimiento, casi un 30 por ciento
de la PEA seguía en el sector rural, el grueso de ella ocupada en labores de minifundio de muy baja productividad. Las diferencias de productividad y de oportunidades entre los ocupados en el minifundio rural en la Sierra o en la Amazonía
y los insertos en la industria, comercio o servicios en áreas urbanas desarrolladas,
seguían tan elevadas como dos decenios atrás, antes de la apertura económica.
La Tabla 7 explica porqué a pesar de las muy altas tasas de crecimiento del
empleo total y formal, la composición del empleo en Perú siguió exhibiendo un
grado elevado de precariedad. La muy baja dimensión inicial de los segmentos de
mayor productividad – el empleo vinculado a la pequeña, mediana y gran empresa
– explica porqué a pesar de las muy elevadas tasas de absorción en estos estratos
en el 2002-08, la composición del empleo seguía estando esencialmente caracterizada por el predominio del empleo de baja productividad: el empleo independiente de bajos ingresos, los trabajadores familiares no remunerados y el empleo
en microempresas rural y urbanas.
Así, como se desprende de la Tabla 8, el empleo de trabajadores independientes y los trabajadores familiares no remunerados, más el trabajo doméstico,
representaban en el 2006 el 56 por ciento del empleo total. El empleo en microempresas, con 92.8 por ciento de los establecimientos del país, constituía el 19.3
por ciento del empleo total. Mientras que la pequeña, mediana y gran empresa,
generaban sólo el 16.9 por ciento del empleo total – con el 6.2 por ciento de los
establecimientos.
Por consiguiente, pese a los indudables y significativos avances registrados
por el alto crecimiento del período 2001-08, el mercado laboral peruano seguía
caracterizado por grandes diferencias de productividad entre el sector de la pe-
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queña, mediana y gran empresa, de mayor productividad relativa, y el registrado
en el vasto contingente laboral inserto en las microempresas rural urbanas u ocupados como trabajadores independientes, familiares sin remuneración o trabajadores domésticos.
En el 2009, el crecimiento del empleo total y sobre todo el del empleo formal se desacelera bruscamente, como consecuencia de la contracción de la tasa
de crecimiento económico desde el 10 por ciento en 2008 a 1.4 por ciento en el
2009. Esto es provocado por una enorme caída de las exportaciones, del orden de
20 por ciento, que afecta en mayor medida a las no tradicionales, y por el cambio
de expectativas empresariales causado por la crisis global. Como en otras oportunidades, el desempleo abierto no se incrementa significativamente – si lo hace el
empleo informal.
Conclusiones
Es útil comenzar la reflexión sobre la incidencia de las reformas legales y
de hecho, con un dato de la realidad. Como se señalara previamente, un 56 por
ciento del empleo del país está explicado por trabajadores independientes rurales
y urbanos, trabajadores familiares, muchos de los cuales laboran con trabajadores
independientes, trabajadores domésticos y ocupados en microempresas de menos
de 10 ocupados. Por consiguiente, los cambios en la legislación laboral no inciden
directamente sobre este vasto contingente de la población ocupada, excepto para
el 10 por ciento de las microempresas (> de 10 ocupados) que están registradas en
el MTPE. De hecho entonces, los cambios institucionales no afectan directamente a todo el empleo si no a una proporción significativamente menor del empleo
del país – aproximadamente a un 39 por ciento del empleo total, si se sustrae lo
expuesto y el empleo público.
La profunda reforma a la legislación laboral de 1991-95, en conjunto con
el abandono de la función de fiscalización por parte de el MTPE, la aprobación
del régimen laboral agrario y agroindustrial, y el régimen laboral especial para
MYPE, tuvieron una significativa incidencia en los mercados laborales formales.
Por un lado contribuyeron a flexibilizarlos significativamente y a reducir los costos
no laborales. Por el otro, debilitaron significativamente las relaciones laborales y
la formación de salarios. A partir de estas reformas, las remuneraciones reales
crecen muy lentamente en Peru, por debajo del crecimiento de la productividad.
Las tendencias descriptas en el párrafo previo, contribuyeron a mejorar la
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competitividad de las empresas peruanas en un período histórico en que enfrentaban el desafío de integrarse a mercados mundiales. Pero es útil recordar que no se
desarrollaron con una intensidad similar otras políticas para fortalecer la competitividad del país, como la capacitación y adopción de innovaciones en la empresa,
el desarrollo de la infraestructura productiva – que registra un considerable atraso
en Perú – y otras orientadas a elevar la productividad. Es recién en 2003-2008 que
se verifica un esfuerzo significativo y sistemático para mejorar la infraestructura
productiva, y se establecen pequeños fondos para acceder a innovaciones de cobertura muy limitada. La capacitación laboral, sigue siendo un tema de entidades
privadas y no existe un sistema de incentivos a la capacitación en la empresa. Esto
es particularmente grave en un país que se caracteriza por una débil calidad de la
educación primaria y secundaria.
El problema que se genera cuando las mejoras de competitividad descansan
sólo en medidas que afectan el mercado laboral, emerge del hecho que la competitividad es un concepto relativo y dinámico. Si, por ejemplo, en China, EEUU,
Taiwan y Corea del Sur - países que compiten con Perú en diversos mercados
internos y externos de Perú – el crecimiento de la productividad alcanza tasas del
orden de 2 a 4 por ciento anual durante períodos prolongados, esto implica una
presión equivalente hacia el descenso de los costos totales por unidad producida,
que son los relevantes para fines de competitividad.
Una estrategia para enfrentar ese descenso en costos totales por unidad de
los competidores, que descanse sólo en reducir costos laborales y flexibilizar crecientemente el mercado laboral, se ve compelida – como sucedió en Perú – a
aplicar sucesivas reformas y reducciones en costos laborales para enfrentar el aumento de la competitividad externa. Claramente, esta estrategia de competitividad
no es viable a mediano plazo porque no es factible ni deseable reducir periódicamente las condiciones de vida y de trabajo de los trabajadores afectados. Es decir,
a la inversa de la estrategia basada en el crecimiento de la productividad, se agota
apenas se pone en práctica.
Por consiguiente, la principal lección del enfoque de competitividad adoptado por Perú, es que el mismo no es sostenible en el tiempo. Es imprescindible
desarrollar en su reemplazo, una estrategia de competitividad orientada a diversificar la producción y promover y difundir aumentos de productividad significativos.
(GARCÍA, 2004).
Esto se visualiza mejor en la siguiente expresión:
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180
CLU = CLH / PT
(1)
CLH = Costo Laboral Total/ Horas Trabajadas
(2)
PT = Producto/ Horas trabajadas
(3)
Por definición, el Costo Laboral por Unidad Producida (CLU) relevante para
fines de competitividad, es igual al costo laboral por unidad de trabajo (CLH) dividido por la Productividad (PT). La estrategia adoptada en Perú descansó en reducir el
numerador, pero la manera en que lo hizo – múltiples contratos de corta duración
más aumento del personal sin contrato – inhibió el aumento del gasto en capacitación de las empresas – afectando negativamente el crecimiento del denominador.
Más importante aún: al enfatizar durante decenios el tema de reducción de
costos laborales, sacó del foco de atención de las empresas el aumento persistente de la productividad como fuente de la competitividad. El aumento de la
productividad comienza aparecer en 2002-08 no como objetivo explícito de las
políticas públicas si no como un resultado de la bonanza en mercados externos
que estimula a las empresas a desarrollar un esfuerzo exportador y con ello, empieza a obligarlas a ajustar tipificación de productos, calidad y productividad a los
requerimientos de mercados externos.
Al descansar principalmente en la flexibilidad del mercado laboral y reducción de los costos laborales para fines de competitividad, la estrategia adoptada
tuvo que provocar ajustes de alta intensidad para obtener resultados significativos.
Estos ajustes de alta intensidad, deterioraron y precarizaron significativamente los
mercados laborales formales de Perú y afectaron decisivamente, hasta la actualidad, la formación de salarios. Un resultado no buscado de esta estrategia, fue que
las Centrales Sindicales del país desarrollaron plataformas de fuerte oposición a
la integración en la globalización, exactamente porque la estrategia de competitividad descansaba en el debilitamiento de la capacidad de negociación sindical y la
precarización de los mercados de trabajo formales.
Por otra parte, también es cierto que el empleo crece rápidamente en 200208 y que varios de los signos de deterioro y precarización comienzan a revertirse
en ese período. Las reformas laborales facilitaron a las empresas su inserción en el
impulso exportador registrado en 2002-08, aunque una de las causas del mismo se
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halle en el extraordinario dinamismo de los mercados mundiales en ese período.
En este plano, el factor decisivo no es el abaratamiento de la mano de obra respecto al capital, si no la incidencia de las reformas laborales sobre las expectativas
y decisiones empresariales, que hace que se sientan más confiados para aumentar el
empleo sabiendo que el costo es bajo y que en cualquier momento pueden prescindir de una fracción del mismo pagando una indemnización accesible.
Lo expuesto sugiere que hacia el futuro, si Perú desea seguir compitiendo en
mercados internacionales y en su mercado interno, se verá crecientemente forzado a desarrollar una estrategia de competitividad diferente a la implementada
en 1990-2008. Que haga mucho más énfasis en la diversificación de productos, en
el aumento de la productividad y en las mejoras de calidad, lo que conduce a la
organización de clusters o consorcios, redes y cadenas productivas orientadas a
competir – y a una política de tipo de cambio real competitivo.
Los futuros Gobiernos tendrán que desarrollar enfoques pedagógicos al respecto, para que el grueso de los empresarios internalicen el aumento de la productividad y la mejora de la calidad como las principales fuentes de la competitividad
y dejen de concentrar su atención en la reducción de costos laborales y flexibilidad
del mercado laboral. El aumento de la productividad requerirá de una menor proporción de contratos inestables y sobre todo en negro y un mejoramiento de las
relaciones laborales lo que implica que hacia el futuro, un aumento de la flexibilidad
dependerá de lo pactado en el marco de la negociación – aunque será necesario
mantener una vía expedita para el despido. Es decir, los futuros Gobiernos deberán
reemplazar el mensaje central hacia los empresarios, que fue colocado en la cabeza de los mismos por los gobiernos pasados. Claro está, esto también implica un
cambio de filosofía respecto a la estrategia de crecimiento: pasar de la fe plena en
la libertad de los mercados, a un enfoque que combine el comportamiento de los
mercados con una intervención selectiva del Estado vía políticas públicas. Aunque
hay muchos indicios de que esto se ha ido ya captando en importantes sectores de
opinión, no está todavía claro que los futuros Gobiernos puedan articular fácilmente este nuevo enfoque estratégico, por la inercia generada por el modelo vigente.
Finalmente, cualquiera sea la estrategia de competitividad que se adopte, es
imprescindible integrar al crecimiento a los segmentos más rezagados de los mercados laborales peruanos: la población ocupada en minifundios de muy baja productividad en la Sierra y en la Amazonía. El enfoque explícito de políticas públicas
en 1990-2008, ha sido enfocar el problema como un tema de políticas y programas
sociales – nutrición, salud materno-infantil, agua potable, obras sanitarias, salud
adulta, educación etc. – de lucha contra la pobreza, y dejar que el ajuste de los mer-
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cados vaya paulatinamente integrando económicamente estos vastos segmentos a la
sociedad. Pero los esfuerzos desplegados por ONG’s privadas, demostraron en los
últimos cinco años que con un conjunto de innovaciones tecnológicas muy simples
y de muy bajo costo – riego por goteo, semillas para nuevos cultivos, carpas transparentes para conservar calor, capacitación del campesino en nuevas técnicas, crianza
de conejos y aves, capacitación en ventas a mercados cercanos, etc. – es factible
cuadruplicar el rendimiento de la superficie cultivada en predios pequeños de entre
1000 y 2000 metros cuadrados y con ello, cuadruplicar el ingreso familiar. Alrededor
de 40 mil familias campesinas minifundistas han logrado estos avances, sin apoyo
del Estado, con esta estrategia de prestar atención al aumento de la productividad en
el minifundio – y no sólo descansar en programas y políticas sociales. Esto es una
evidencia que el enfoque de políticas sociales asistenciales, debe ser complementado por programas de desarrollo de la productividad y de los rendimientos con
innovaciones muy simples, que en definitiva son el principal vehículo para otorgar la
ciudadanía a estos segmentos marginados.
REFERÊNCIAS
CHACALTANA, J.; GARCÍA, N. Estabilidad laboral, capacitación y productividad. In: ______. Políticas de empleo en Perú. Lima: CIES, 2004. Tomo I y II.
GARCÍA, N. Incentivos al aumento de la productividad: capacitación y adopción de innovaciones en la empresa. [S.l.]: Consejo Nacional del Trabajo, 2008.
______. Mercado laboral y competitividad: Perú 1990-2004. Santiago: CEPAL, 2005. (Serie Macroeconomía del Desarrollo, n. 41).
______. Productividad, competitividad y empleo: un enfoque estratégico. In:
______. Políticas de empleo en Perú. Lima: CIES, 2004. Tomos I y II.
JARAMILLO, M. La regulación del mercado laboral en Perú. Lima: GRADE, 2004.
PINTO, A. Concentración del progreso técnico y de sus frutos en el desarrollo latinoamericano. Ciudad de México: FCE, 1965. (El Trimestre Económico, n. 125).
PREALC. Dinámica del subempleo en América Latina. Santiago, 1981.
(Estudios de la CEPAL, n. 10).
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EL FUNCIONAMIENTO DEL MERCADO DE
TRABAJO Y LA SITUACIÓN SOCIAL EN ARGENTINA ENTRE 2004 Y 2009
Fernando Groisman1
Introducción
Es inevitable referirse al mercado de trabajo a la hora de brindar un panorama
acerca de la situación social en Argentina en los últimos años. La sostenida recuperación del empleo y la mejora en los ingresos laborales justifican este abordaje. Una
forma directa de hacerlo es examinando la evolución de los indicadores laborales que
sintetizan el funcionamiento de este mercado. Asimismo, la investigación se enriquece
cuando se introduce como unidad de análisis a los hogares. Desde esta perspectiva es
posible examinar el derrotero que ha seguido la participación de las personas en la actividad económica, atendiendo a la posición que ocupan en la estructura familiar y/o
en razón de su aporte a los presupuestos familiares, entre otras dimensiones de análisis
posible. En este documento se recurrió a esta perspectiva de análisis, que goza aun de
menor difusión relativa.2 Su utilización permitió obtener información relevante, respecto del tipo de vinculación que establecieron los hogares con el mercado de trabajo.
Las características del proceso de recuperación económica, luego de la crisis
de 2001, hacen que el análisis propuesto sea oportuno. En efecto, durante esos
años la expansión del empleo y el aumento de los salarios contribuyeron a sostener el crecimiento de la economía, y prácticamente constituyeron los mecanismos
principales para el logro de mejoras en las condiciones de vida. Por otra parte, el
cambio en las normas laborales parece haber incidido también en la mejora de la
calidad del empleo. La sanción de un nuevo régimen laboral en 2004 – Ley 25877
– retomó gran parte de los principios de protección al trabajo derogados por las
sucesivas reformas en la Ley de Contrato de Trabajo.3
1 Investigador del Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas de Argentina (CONICET) y de la
Universidad de Buenos Aires (UBA)
2 Entre otros ver Arriagada (2007) y OIT (2009).
3 Las relaciones laborales en Argentina se rigen por la Ley de Contrato de Trabajo Nro. 20744 de 1974. Esa norma
presume que todos los contratos son en principio celebrados por tiempo indeterminado y fija la obligación de
registrar la relación laboral. El empleo público, el trabajo agrario y el empleo doméstico cuentan con regulaciones
específicas al igual que otros sectores de actividad como el de la construcción. Al margen de esas particularidades,
la norma constituye la referencia legal para el conjunto de las relaciones laborales en el país. Durante las últimas
dos décadas se instrumentaron numerosas modificaciones con el propósito de alterar las cargas sociales, el carácter
de indeterminación del plazo y/o las incumbencias y alcances de la negociación colectiva, entre otros aspectos
sustantivos. Entre las más sobresalientes, cabe mencionar: ley 24013 de 1991; ley 24465 de 1995; ley 25013 de 1998;
ley 25250 de 2000 y ley 25877 de 2004. Para una revisión de las normas laborales puede consultarse Goldín (2008).
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La fuente de información utilizada en este documento es la Encuesta Permanente de Hogares (EPH)– que releva el Instituto Nacional de Estadísticas y Censos
(INDEC). La EPH se realiza en las principales ciudades del país, abarcando a alrededor del 70% del total de la población urbana. Desde 2003 la encuesta recoge la
información en forma continua, produciendo estimaciones trimestrales para algunas
variables y semestrales para otras. En este documento se ha recurrido a las bases de
microdatos correspondientes a los primeros trimestres de los años 2004, 2005, 2006,
2007, 2008 y 2009. Se excluyó del análisis al período 2002-2003 que conforma la etapa
de salida o “rebote”, respecto del piso que representó la crisis de 2001 en Argentina.4
Ello permite focalizar la atención en los cambios acaecidos en la sociedad argentina,
una vez alcanzado cierto umbral de crecimiento. El documento brinda así un panorama sucinto de la situación social y sus cambios en el período 2004-2009.
La investigación reveló que la expansión de los puestos de trabajo registrados en la seguridad social –los empleos de mejor calidad– fue de una magnitud
muy relevante y alcanzó a sectores sociales tradicionalmente postergados. Entre
2004 y 2009 la proporción de la población urbana, la cual residía en hogares que
dependían esencialmente del trabajo de sus miembros, pero en los que ninguno
de ellos se desempeñaba en un puesto de trabajo asalariado registrado, se redujo
del 36% al 26%. No obstante, los resultados obtenidos ponen de relieve también
la presencia de segmentación en la estructura social argentina, que requieren la
instrumentación de políticas para su corrección.
El documento se encuentra organizado en cinco secciones. En la siguiente se describe el funcionamiento del mercado de trabajo durante el período, mientras que en la
tercera sección se discute la dependencia de los hogares, respecto del mercado de trabajo. En la cuarta sección se ensaya una caracterización de la situación social argentina,
a partir de una tipología de hogares que toma en consideración las fuentes de ingresos
y la inserción ocupacional de sus integrantes. Por último, se presentan las conclusiones.
El Funcionamiento del Mercado de Trabajo en el
Quinquenio 2004-2009
Entre el primer trimestre de 2004 y el mismo período del año 2007 la oferta laboral
mostró un comportamiento creciente en el tiempo, pasando de una tasa de variación
anual de 0,68% entre 2004 y 2005 a una de 2,72% entre 2006 y 2007. Este indicador
4 El Producto Interno Bruto (PIB) en el primer trimestre de 2004 se encontraba levemente por debajo del valor que
exhibió a comienzos de 2001, previo a la abrupta caída posterior. Para un análisis de las características macroeconómicas del período puede consultarse Cetrángolo; Heymann y Ramos (2007).
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se contrajo – y se redujo en valores absolutos – durante el año siguiente y volvió a
incrementarse hacia el 2009. Globalmente, el aumento de la oferta de trabajo durante
el trienio 2004-2007 fue inferior a la creación de empleo, lo cual explicó la progresiva
reducción de la tasa de desocupación. Entre 2007 y 2008 el aumento del empleo se desaceleró, aunque ello no condujo a un aumento de la desocupación por el mencionado
encogimiento en la cantidad de activos que más que compensó la disminución en la creación de puestos de trabajo. Hacia el primer trimestre de 2009, el empleo volvió a expandirse y similar comportamiento mostró la oferta laboral. Ver cuadro 1. Este panorama
laboral fue consistente con la evolución del Producto Interno Bruto (PIB), que creció a
tasas del 8-9% entre 2004 y 2007, para luego seguir una trayectoria algo más modesta.5
Tabla 1 – Indicadores Seleccionados del Mercado de Trabajo.
Grupos de población
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Activos
100
100,7
102,6
105,5
104,8
Trim 1 2009
107,5
Ocupados
100
102,3
106,2
111,1
112,1
114,9
Asalariados (excluye planes)
100
105,8
112,8
120,9
125,3
128,0
Registrados
100
105,0
116,5
127,7
139,3
144,1
No registrados
100
106,8
107,9
112,1
106,7
106,8
No asalariados
100
99,9
100,5
104,6
101,1
105,8
Planes de empleo
100
74,1
57,9
32,0
14,7
10,2
Industria
100
111,6
111,4
114,6
117,7
119,6
Construcción
100
99,9
113,3
130,3
125,1
133,3
Servicio doméstico
100
111,3
119,0
124,7
124,9
126,5
Comercio
100
99,7
102,0
109,5
109,3
110,5
Transporte
100
107,2
108,5
114,0
116,6
121,8
Servicios sociales
100
102,5
105,4
106,0
106,0
106,9
Sector público
100
94,2
101,4
98,2
101,3
107,1
Servicios modernos
100
106,3
108,5
118,0
117,1
125,5
Bajo
100
106,5
106,8
115,1
113,6
115,7
Alto
100
105,2
117,9
125,8
135,0
138,3
Jefe
100
106,5
109,3
116,2
117,6
120,0
Conyuge
100
105,5
113,6
121,2
130,9
134,6
Resto de miembros
100
104,8
118,0
128,4
133,9
136,7
No registrado
100
114,1
104,4
111,0
100,4
98,6
Registrado
100
103,8
107,5
113,8
112,1
114,4
No registrado
100
105,0
104,4
112,5
109,5
104,6
Registrado
100
104,5
114,9
122,1
134,3
141,6
Total de ocupados Rama de actividad
Asalariados (excluye beneficiarios
de planes de empleo) Nivel educativo
Posición en el hogar
Posición en el hogar y nivel educativo
Jefe de baja educación
Jefe de alta educación
Sigue
5 Producto en alguna medida la crisis económica internacional. Para ver los efectos sobre el mercado de trabajo
puede consultarse ILO (2009).
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186
Tabla 1 – Indicadores Seleccionados del Mercado de Trabajo.
Grupos de población
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Trim 1 2009
No registrado
100
Registrado
100
107,6
98,6
118,3
123,8
101,3
97,9
105,9
157,8
189,7
176,9
No registrado
Registrado
100
106,9
100
100,9
134,2
119,6
134,0
116,0
114,9
125,8
137,4
148,2
No registrado
100
Registrado
100
101,0
105,7
114,3
107,8
113,2
98,8
118,6
134,5
162,0
165,7
No registrado
Registrado
100
104,6
116,3
116,1
109,9
109,6
100
110,9
131,2
150,1
169,2
171,4
No registrado
11,3%
12,2%
10,5%
10,4%
9,1%
8,7%
Registrado
13,4%
13,2%
12,8%
12,6%
12,0%
12,0%
Cónyuge de baja educación
Cónyuge de alta educación
Resto de miembros de baja educación
Resto de miembros de alta educación
Distribución de asalariados
Jefe de baja educación
Jefe de alta educación
No registrado
5,8%
5,8%
5,4%
5,4%
5,1%
4,8%
Registrado
18,8%
18,6%
19,1%
19,0%
20,2%
20,8%
No registrado
5,8%
5,9%
5,0%
4,8%
4,5%
4,8%
Registrado
2,1%
2,3%
2,3%
2,7%
3,1%
2,9%
No registrado
2,6%
2,6%
3,1%
2,6%
2,8%
2,4%
Registrado
9,3%
8,9%
9,5%
9,7%
10,2%
10,8%
No registrado
9,7%
9,3%
9,1%
9,2%
8,3%
8,6%
Registrado
3,3%
3,1%
3,5%
3,7%
4,3%
4,3%
Cónyuge de baja educación
Cónyuge de alta educación
Resto de miembros de baja educación
Resto de miembros de alta educación
No registrado
7,9%
7,8%
8,2%
7,6%
6,9%
6,8%
Registrado
9,9%
10,4%
11,5%
12,3%
13,4%
13,3%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Total
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
100,0%
Finalizacióm
La evolución sectorial del empleo revela el importante dinamismo que tuvieron
la construcción y el servicio doméstico, ramas en las que la presencia de trabajadores
con bajo nivel educativo es muy elevada. En 2007 el volumen de ocupados en la primera de esas ramas fue 30% superior al vigente en 2004, mientras que en la segunda
este valor trepó al 24,7%. Los sectores de la industria manufacturera, transporte y
comunicaciones y los servicios modernos también mostraron un crecimiento significativo. Razonablemente, la disminución en la creación de puestos de trabajo que se
constató entre 2007 y 2008 se reflejó en las ramas que habían mostrado una fuerte
expansión en los años previos, como construcción y servicio doméstico, a las que se
agregaron comercio y servicios sociales (educación y salud). (Ver Tabla 1).
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187
Globalmente, en el quinquenio bajo análisis, la expansión del empleo respondió mayoritariamente a la creación de puestos de trabajo asalariados. Entre
puntas del período los asalariados se habían expandido un 28%, mientras que
aquellos que estaban ocupados en puestos no asalariados lo habían hecho un
5,8%. En la creación de los puestos de trabajo asalariados, prevalecieron aquellos
registrados en la seguridad social (son los que se encuentran declarados por las
empresas y por lo tanto quienes los ocupan gozan de la protección de las normas
laborales, muestran mayor estabilidad6 y además suelen obtener salarios superiores). Puede apreciarse que entre 2004 y 2009 estos trabajadores se incrementaron
el 44,1%, mientras que los no registrados lo hicieron el 6,8%. Se desprende de
ello que las condiciones laborales mejoraron en forma sustantiva. Cabe acentuar
que la cantidad de asalariados no registrados se incrementó sólo hasta el 2007 –
acumulando un incremento del 12% respecto de 2004– para luego disminuir en
valores absolutos al año siguiente y mantenerse en el mismo nivel hacia el 2009.
La desaceleración en la creación del empleo a expensas de los puestos de trabajo
no registrados se combinó con el aumento de la tasa de registración, fenómeno
interesante de señalar, ya que ha sido frecuente en la historia económica de Argentina que la tasa de registración caiga en los contextos de incertidumbre económica. Finalmente, debe señalarse que, a lo largo de ese período, se produjo una
progresiva reducción de los ocupados en planes de empleo. En el primer trimestre
de 2009 sólo persistían en esa condición un 10% de los beneficiarios existentes en
el primer trimestre de 2004.
Dado el gran dinamismo que exhibió el empleo asalariado registrado, resulta
apropiado analizar si se constataron diferencias en el acceso a esos puestos de
trabajo, por parte de ciertos grupos de la población. Ello va a permitir contar con
algunos indicios acerca de la influencia que ha tenido la etapa expansiva sobre la
estructura social. Como es usual, un primer corte consiste en distinguir a los individuos según el nivel educativo. Se conformaron dos grupos: aquellos con bajo
nivel educativo –que no finalizaron la escolarización secundaria– y los que completaron ese nivel. Se verifica que los individuos con alta educación, que ocupaban
puestos asalariados, incrementaron su volumen en un 38% entre 2004 y 2009,
mientras que los de menor nivel educativo lo hicieron sólo en 15,7% (valor que
en realidad ya se había alcanzado en 2007, cuando llegó al 15,1%). (Ver Tabla 1).
En otras palabras, las probabilidades de acceder a un puesto asalariado para
aquellos con bajo nivel educativo fueron relativamente menores.
6 Ver Groisman (2010a).
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188
Al recurrir a la posición de las personas en el hogar, también se hallaron diferencias. Entre extremos del período, las categorías que concentraron las mayores
ganancias de empleo fueron los cónyuges no jefes, con un 34,6%, y el resto de
los miembros del hogar (compuesto mayoritariamente por hijos) con el 36,7%.
Por su parte, los jefes de hogar lograron un incremento de 20% entre puntas. Si
bien estos últimos suelen exhibir tasas de empleo elevadas, su menor expansión
no puede atribuirse a ello. Interesa enfatizar, además, que entre los jefes fueron los
que tenían alto nivel educativo, quienes lograron un acceso mayor a los puestos de
trabajo registrados. Entre sus cónyuges la registración fue algo más intensa para
los de menor nivel educativo, mientras que entre los restantes miembros la situación fue similar a la observada para los jefes. La explicación de esas diferencias
puede hallarse en la inserción económica, según la rama de actividad. En efecto,
alrededor de un 40% de los jefes de baja educación, se encontraban empleados en
la construcción, el servicio doméstico (básicamente las jefas mujeres) y el comercio, mientras que este porcentaje se reducía a menos de la mitad para los jefes con
mayor nivel educativo. Similar comportamiento se constató para los miembros
que no son jefes ni cónyuges, aunque con alguna diferencia en su intensidad. Justamente, debe tenerse en cuenta que en estos sectores económicos la incidencia
del empleo registrado es muy baja. (Ver tabla 2 y tabla 3).
Tabla 2 – Tasas de Registración en el Empleo Asalariado seguún
Posición en el Hogar y Nivel Educativo y Rama de Actividad. Excluye
Beneficiarios de Planes de Empleo.
Posición en el hogar y nivel educativo
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Trim 1 2009
Jefe de baja educación
54,3%
51,9%
55,0%
54,9%
57,0%
57,9%
Jefe de alta educación
76,3%
76,2%
78,0%
77,7%
79,8%
81,3%
Cónyuge de baja educación
26,4%
28,3%
31,0%
35,8%
41,0%
37,4%
Cónyuge de alta educación
78,1%
77,1%
75,4%
79,0%
78,6%
82,0%
Resto de miembros de baja educación
25,5%
25,1%
27,7%
28,7%
34,0%
33,4%
Resto de miembros de alta educación
55,6%
57,1%
58,5%
61,8%
65,8%
66,2%
Industria
66,6%
64,5%
65,7%
67,7%
71,1%
72,0%
Construcción
23,8%
21,1%
25,4%
32,1%
35,8%
40,5%
Servicio doméstico
6,4%
4,9%
6,6%
9,5%
12,6%
12,7%
Comercio
48,2%
49,0%
51,7%
53,5%
55,2%
54,6%
Transporte
50,0%
51,6%
56,4%
60,9%
62,5%
60,4%
Servicios sociales
67,1%
66,4%
69,1%
67,8%
71,6%
74,0%
Sector público
90,0%
91,4%
90,5%
91,6%
92,9%
92,7%
Servicios modernos
64,0%
65,3%
70,9%
70,1%
73,5%
73,7%
Rama de actividad
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC .
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Tabla 3 – Distribución del Empleo Sectorial según Posición en el Hogar y
Nivel Educativo
Posición en el hogar y nivel educativo
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Trim 1 2009
Industria
21,4%
20,9%
20,3%
20,4%
20,3%
18,7%
Construcción
10,2%
11,2%
13,1%
14,5%
12,2%
12,5%
Servicio doméstico
12,3%
12,6%
14,0%
13,3%
14,0%
13,9%
Comercio
18,5%
17,3%
16,1%
16,6%
16,9%
18,2%
Transporte
11,3%
12,6%
10,9%
12,0%
11,8%
12,4%
Servicios sociales
9,1%
8,5%
8,8%
8,5%
8,6%
8,4%
Sector público
11,5%
10,2%
10,8%
9,1%
10,6%
11,1%
Jefe de baja educación
Servicios modernos
5,8%
6,8%
6,0%
5,6%
5,5%
4,9%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Industria
17,8%
16,6%
16,3%
14,5%
15,9%
16,5%
Construcción
2,9%
2,2%
1,8%
3,4%
3,3%
4,4%
Servicio doméstico
2,5%
3,2%
3,8%
3,1%
3,2%
2,7%
Comercio
15,4%
15,6%
16,0%
15,3%
16,6%
15,2%
Jefe de alta educación
Transporte
7,9%
8,1%
7,5%
8,1%
7,2%
6,9%
Servicios sociales
12,7%
12,9%
14,0%
12,9%
13,7%
13,8%
Sector público
27,5%
27,8%
29,2%
29,1%
27,9%
27,8%
Servicios modernos
13,3%
13,7%
11,5%
13,6%
12,2%
12,8%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Industria
9,4%
12,2%
11,6%
11,9%
10,6%
14,8%
Construcción
3,9%
3,8%
5,6%
4,9%
7,5%
7,2%
Servicio doméstico
42,7%
47,0%
43,8%
44,9%
40,8%
40,1%
Comercio
14,7%
11,7%
14,6%
13,9%
15,4%
13,9%
Transporte
3,1%
2,4%
3,0%
3,2%
3,4%
3,5%
Servicios sociales
10,5%
10,2%
8,3%
8,3%
9,0%
8,0%
Sector público
11,7%
9,3%
9,2%
9,0%
9,6%
8,3%
Cónyuge de baja educación
Servicios modernos
3,9%
3,5%
3,7%
4,0%
3,7%
4,2%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Industria
8,0%
8,7%
7,4%
7,5%
7,8%
8,3%
Construcción
0,9%
0,7%
1,2%
1,0%
1,3%
1,8%
Servicio doméstico
4,9%
5,7%
5,0%
6,2%
5,5%
4,7%
Comercio
13,2%
15,2%
14,3%
13,3%
14,7%
11,7%
Cónyuge de alta educación
Transporte
2,2%
2,5%
2,6%
3,3%
2,7%
2,9%
Servicios sociales
22,7%
20,3%
22,3%
20,6%
19,9%
20,7%
Sector público
36,9%
37,3%
35,6%
37,0%
37,6%
40,8%
Servicios modernos
11,2%
9,6%
11,5%
11,1%
10,4%
9,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Industria
17,8%
21,9%
21,9%
19,5%
19,3%
18,8%
Construcción
14,4%
13,5%
15,5%
17,8%
15,4%
16,2%
Servicio doméstico
14,0%
11,5%
13,2%
13,2%
13,2%
13,9%
Comercio
27,7%
29,6%
26,2%
29,0%
28,6%
26,5%
Transporte
8,0%
7,9%
7,9%
6,9%
7,7%
7,0%
Resto de miembros de baja educación
Sigue
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190
Tabla 3 – Distribución del Empleo Sectorial según Posición en el Hogar y
Nivel Educativo
Posición en el hogar y nivel educativo
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Servicios sociales
5,7%
5,1%
5,9%
5,2%
6,7%
6,8%
Sector público
4,5%
4,5%
3,6%
3,3%
3,5%
4,8%
Servicios modernos
Trim 1 2009
8,0%
6,0%
5,9%
5,2%
5,7%
6,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Industria
14,2%
16,4%
15,0%
16,1%
14,6%
14,5%
Construcción
4,6%
3,0%
3,8%
4,3%
3,9%
4,0%
Servicio doméstico
4,7%
4,1%
4,7%
4,5%
4,4%
5,0%
Comercio
27,1%
26,4%
26,4%
26,4%
27,1%
25,7%
Resto de miembros de alta educación
Transporte
6,9%
7,7%
7,3%
6,2%
6,7%
7,0%
Servicios sociales
15,3%
14,1%
13,9%
13,4%
13,4%
13,2%
Sector público
16,2%
15,7%
16,6%
15,6%
16,1%
17,3%
Servicios modernos
11,1%
12,6%
12,4%
13,6%
13,7%
13,3%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Finalizacióm
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
La descomposición de la variación de la tasa de registración arroja que de los
6,4 p.p. en que se incrementó (descontando los efectos de estructura), prácticamente
3 puntos fueron aportados por los miembros que no eran jefes ni cónyuges (de los
cuales 1,9 p.p. correspondieron a los de mayor educación y 1 p.p. a los de baja educación). El aporte de cónyuges fue de 1,4p.p. (0,9 p.p. para los de baja educación y 0,5 p.p.
para los de alto nivel educativo) y finalmente 2,1 p.p. aportaron los jefes de hogar (0,9
p.p. los que tenían baja educación y 1,2 p.p. los de mayor nivel educativo). Ver Tabla
4. Ello pone de relieve la importancia de los trabajadores que no son jefes de hogar
en la mejora global de los indicadores de calidad del empleo. La menor contribución
relativa de los jefes, y entre éstos de los de menor nivel educativo, aun cuando son los
que proveen los mayores ingresos de los hogares, requiere mayor investigación.
Tabla 4 – Descomposición de la Tasa de Tegistración en el Empleo
Asalariado
Tasa de empleo registrado (excluye
beneficiarios de planes de empleo)
Dif. Anual (p.p.)
Dif. Entre extremos
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Trim 1 2009
58,6%
56,4%
58,7%
60,0%
63,2%
64,0%
-0,4%
2,3%
1,3%
3,2%
0,8%
7,2%
Descomposición de la diferencia en la
tasa de registración entre 2004 y 2009
Efecto estructura educ. y posición en el hogar
0,6%
Efectos tasas específicas por grupos
Jefe de baja educación
0,9%
Sigue
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03/02/2011 11:34:19
191
Tabla 4 – Descomposición de la Tasa de Registración en el Empleo
Asalariado
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Trim 1 2009
Cónyuge de baja educación
0,9%
Cónyuge de alta educación
0,5%
Resto de miembros de baja educación
1,0%
Resto de miembros de alta educación
1,9%
Total efectos tasas específicas por grupos
6,4%
Residuo
0,1%
Finalizacióm
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
Dado ese comportamiento diferencial en el acceso al empleo, según posición
en el hogar de los individuos, procede adentrarse en la exploración de los vínculos
que exhiben las familias con el mercado de trabajo.
La Dependencia del Mercado de Trabajo: un Análisis a nivel
de Los Hogares
Es posible cuantificar el grado de dependencia de los hogares, respecto de los ingresos laborales obtenidos por la inserción ocupacional de sus
miembros. En el Cuadro 5 se aprecia que alrededor de 8 de cada 10 hogares
obtuvieron ingresos monetarios, como resultado de actividad laboral de alguno de sus integrantes. La proporción de aquellos hogares que dependían
exclusivamente del mercado de trabajo fue de 58,6% en 2004 y se redujo al
52,6% en 2009, mientras que la proporción de hogares que sólo accedieron
a ingresos no laborales (básicamente jubilaciones o pensiones) se mantuvo
estable. Ambos comportamientos advierten acerca de la expansión en la
cobertura del sistema previsional. La estratificación de los hogares según
el nivel educativo alcanzado por los jefes de hogar permite concluir que el
cambio en el agregado obedeció fundamentalmente a lo acontecido en el
segmento de menores recursos. (Ver Tabla 5).
Livro.indb 191
03/02/2011 11:34:20
192
Tabla 5 – Hogares y Fuentes de Ingresos según Nivel Educativo del Jefe
de Hogar
Distribución de los hogares
Trim 1 2004
Trim 1 2007
Trim 1 2009
Solo perciben ingresos no laborales
18,9%
17,6%
17,6%
Solo perciben ingresos laborales
58,6%
54,8%
52,6%
Perciben ambos tipos de ingresos
22,5%
27,6%
29,8%
Total
100,0%
100,0%
100,0%
Solo perciben ingresos no laborales
21,7%
21,1%
21,0%
Solo perciben ingresos laborales
55,6%
47,9%
43,6%
Perciben ambos tipos de ingresos
22,7%
31,1%
35,5%
Total
100,0%
100,0%
100,0%
Solo perciben ingresos no laborales
17,0%
15,4%
16,1%
Solo perciben ingresos laborales
61,2%
60,8%
60,8%
Perciben ambos tipos de ingresos
21,8%
23,8%
23,2%
Total
100,0%
99,9%
100,0%
Total de hogares
Jefe de nivel educativo bajo
Jefe de nivel educativo medio
Jefe de nivel educativo alto
Solo perciben ingresos no laborales
11,7%
9,4%
10,0%
Solo perciben ingresos laborales
65,2%
68,4%
66,1%
Perciben ambos tipos de ingresos
23,2%
22,3%
24,0%
Total
100,1%
100,0%
100,0%
Participación de ingresos laborales
79,8%
80,7%
81,3%
Participación de ingresos no laborales
20,2%
19,3%
18,7%
Total
100,0%
100,0%
100,0%
Participación de ingresos laborales
75,4%
75,9%
76,3%
Participación de ingresos no laborales
24,6%
24,1%
23,7%
Total
100,0%
100,0%
100,0%
Participación de ingresos laborales
80,0%
81,6%
83,2%
Participación de ingresos no laborales
20,0%
18,4%
16,8%
Total
100,0%
100,0%
100,0%
Participación de ingresos laborales
85,9%
87,0%
86,4%
Participación de ingresos no laborales
14,1%
13,0%
13,6%
Total
100,0%
100,0%
100,0%
Composición del ingreso total familiar
Jefe de nivel educativo bajo
Jefe de nivel educativo medio
Jefe de nivel educativo alto
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
Cabe destacar que, aun cuando se produjo un incremento en los hogares
que combinaron ingresos laborales y no laborales, la composición de los ingresos monetarios del hogar se mantuvo estable. En efecto, puede constatarse que
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193
prácticamente no se redujo la participación del ingreso laboral – de alrededor
del 80 % – en el presupuesto de los hogares. Ese porcentaje es creciente con el
nivel educativo del jefe, expresando la mayor incidencia de las jubilaciones en los
ingresos de los hogares de escasos recursos. Esos valores confirman la centralidad
del mercado de trabajo, para entender el nivel de bienestar al que pueden aspirar
los hogares en Argentina.
En el Tabla 6a puede considerarse que dos terceras partes del ingreso no laboral
provenían de jubilaciones. Ese porcentaje no sufrió modificaciones en el quinquenio
que va del 2004 al 2009. Entre los ingresos laborales del hogar, se puede verificar
también la leve incidencia que ejerció el ingreso aportado por segundas ocupaciones.
Tabla 6 – Composición del Ingreso Laboral y no Laboral de los Hogares
según Nivel Educativo del Jefe de Hogar
Ingreso laboral y no laboral
Trim 1 2004
Trim 1 2007
Trim 1 2009
Ingreso de ocupaciones principales
93,9%
93,2%
93,8%
Ingreso laboral de segundas ocupaciones
6,1%
6,8%
6,2%
100,0%
100,0%
100,0%
Total de hogares
Total ingreso laboral
Ingreso de jubilaciones
65,3%
62,6%
65,8%
Resto de ingreso no laboral
34,7%
37,4%
34,2%
Total ingreso no laboral
100,0%
100,0%
100,0%
Ingreso de ocupaciones principales
94,5%
94,9%
95,3%
Ingreso laboral de segundas ocupaciones
5,5%
5,1%
4,7%
100,0%
100,0%
100,0%
Jefe de nivel educativo bajo
Total ingreso laboral
Ingreso de jubilaciones
72,8%
69,2%
71,7%
Resto de ingreso no laboral
27,2%
30,8%
28,3%
Total ingreso no laboral
100,0%
100,0%
100,0%
Ingreso de ocupaciones principales
95,8%
94,6%
94,9%
Ingreso laboral de segundas ocupaciones
4,2%
5,4%
5,1%
100,0%
100,0%
100,0%
Jefe de nivel educativo medio
Total ingreso laboral
Ingreso de jubilaciones
53,4%
56,3%
56,7%
Resto de ingreso no laboral
46,6%
43,7%
43,3%
Total ingreso no laboral
100,0%
100,0%
100,0%
90,7%
Jefe de nivel educativo alto
Ingreso de ocupaciones principales
91,2%
89,5%
Ingreso laboral de segundas ocupaciones
8,8%
10,5%
9,3%
100,0%
100,0%
100,0%
Total ingreso laboral
Ingreso de jubilaciones
64,1%
54,4%
63,9%
Resto de ingreso no laboral
35,9%
45,6%
36,1%
Total ingreso no laboral
100,0%
100,0%
100,0%
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
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194
Considerando la posición en el hogar, el aporte de la ocupación principal
del jefe de hogar es ampliamente mayoritario, siendo superior a la sumatoria de
las contribuciones de los restantes miembros del hogar. (Ver Tabla 8). Aun así, y
en sintonía con la evolución del empleo, comentada en la sección precedente, su
participación decreció 5,5 p.p. (del 59,9% al 54,4%), a expensas del incremento,
relativo a las contribuciones realizadas por los restantes miembros, especialmente
por los miembros no cónyuges. La reducción relativa de la participación de los
ingresos aportados por los jefes se produjo en forma generalizada en todos los
estratos de hogares. Se recordará que la evolución del empleo tendió a favorecer a
los miembros no jefes, y entre esos a los de mayor educación en las ocupaciones
registradas. En el análisis según el nivel educativo del jefe de hogar, se aprecian
algunas diferencias que deben ser enfatizadas.
Tabla 7 – Composición del Ingreso Laboral de los Hogares Procedente de
las Ocupaciones Principales de sus Miembros según Nivel Educativo del
Jefe de Hogar
Ingreso laboral de las ocupaciones principales
Trim 1 2004
Trim 1 2007
Trim 1 2009
Total de hogares
Ingreso laboral de jefes no registrados
9,3%
8,4%
6,7%
Ingreso laboral de jefes registrados
36,7%
35,0%
35,4%
Ingreso laboral de jefes cuentapropias
11,0%
9,8%
9,4%
Ingreso laboral de jefes patrones
6,7%
7,7%
6,4%
Ingreso laboral de cónyuges no registrados
3,7%
2,5%
2,5%
Ingreso laboral de cónyuges registrados
10,6%
11,3%
12,7%
Ingreso laboral de cónyuges cuentapropias
2,9%
2,8%
2,9%
Ingreso laboral de cónyuges patrones
1,4%
1,5%
1,7%
Ingreso laboral de resto de miembros no registrados
5,8%
5,8%
5,6%
Ingreso laboral de resto de miembros registrados
9,4%
12,2%
13,5%
Ingreso laboral de resto de miembros cuentapropias
2,2%
2,1%
2,3%
Ingreso laboral de resto de miembros patrones
0,3%
0,9%
0,7%
100,0%
100,0%
100,0%
Ingreso laboral de jefes no registrados
13,3%
11,5%
8,7%
Ingreso laboral de jefes registrados
26,6%
27,5%
26,9%
Ingreso laboral de jefes cuentapropias
12,8%
10,5%
9,9%
Ingreso laboral de jefes patrones
3,8%
4,5%
3,7%
Ingreso laboral de cónyuges no registrados
5,0%
3,4%
3,8%
Ingreso laboral de cónyuges registrados
6,4%
7,4%
8,9%
Ingreso laboral de cónyuges cuentapropias
2,9%
2,4%
2,6%
Ingreso laboral de cónyuges patrones
0,5%
0,8%
1,0%
Ingreso laboral de resto de miembros no registrados
10,5%
9,8%
10,3%
Ingreso laboral de resto de miembros registrados
14,8%
17,7%
20,2%
Total
Jefe de nivel educativo bajo
Ingreso laboral de resto de miembros cuentapropias
3,1%
3,5%
3,2%
Ingreso laboral de resto de miembros patrones
0,3%
1,2%
0,7%
Sigue
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195
Tabla 7 – Composición del Ingreso Laboral de los Hogares Procedente de
las Ocupaciones Principales de sus Miembros según Nivel Educativo del
Jefe de Hogar
Ingreso laboral de las ocupaciones principales
Ingreso laboral de ocupaciones principales
Trim 1 2004
Trim 1 2007
Trim 1 2009
100,0%
100,0%
100,0%
Jefe de nivel educativo medio
Ingreso laboral de jefes no registrados
7,8%
6,9%
6,0%
Ingreso laboral de jefes registrados
39,1%
37,0%
39,8%
Ingreso laboral de jefes cuentapropias
11,0%
9,3%
8,4%
Ingreso laboral de jefes patrones
8,2%
9,4%
7,8%
Ingreso laboral de cónyuges no registrados
3,5%
2,1%
2,0%
Ingreso laboral de cónyuges registrados
12,7%
13,4%
14,9%
Ingreso laboral de cónyuges cuentapropias
2,8%
2,9%
3,1%
Ingreso laboral de cónyuges patrones
1,6%
1,4%
1,7%
Ingreso laboral de resto de miembros no registrados
3,9%
4,2%
3,1%
Ingreso laboral de resto de miembros registrados
7,1%
11,6%
10,4%
Ingreso laboral de resto de miembros cuentapropias
2,0%
1,4%
1,5%
Ingreso laboral de resto de miembros patrones
0,3%
0,7%
1,0%
100,0%
100,0%
100,0%
Ingreso laboral de ocupaciones principales
Jefe de nivel educativo alto
Ingreso laboral de jefes no registrados
5,5%
6,0%
4,6%
Ingreso laboral de jefes registrados
47,6%
42,9%
41,9%
Ingreso laboral de jefes cuentapropias
8,8%
9,6%
9,7%
Ingreso laboral de jefes patrones
9,2%
10,4%
8,4%
Ingreso laboral de cónyuges no registrados
1,9%
1,9%
1,4%
Ingreso laboral de cónyuges registrados
14,0%
14,2%
15,3%
Ingreso laboral de cónyuges cuentapropias
2,9%
3,4%
3,1%
Ingreso laboral de cónyuges patrones
2,6%
2,5%
2,9%
Ingreso laboral de resto de miembros no registrados
1,6%
2,1%
2,0%
Ingreso laboral de resto de miembros registrados
4,5%
5,2%
7,9%
Ingreso laboral de resto de miembros cuentapropias
1,2%
1,1%
2,2%
Ingreso laboral de resto de miembros patrones
0,3%
0,7%
0,4%
100,0%
100,0%
100,0%
Ingreso laboral de ocupaciones principales
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
Finalizacióm
Puede observarse que, mientras que en los hogares del estrato bajo los ingresos aportados por el jefe de hogar oscilaron alrededor del 50%, en los hogares
con jefes de mayor nivel educativo esa incidencia estuvo alrededor del 60%. La
segunda característica a remarcar es la baja contribución de los miembros cónyuges en los hogares con jefe de baja educación. Efectivamente, su aporte fue de
alrededor del 15% del ingreso laboral total del hogar, contra un 20% en el caso de
los hogares con jefes de mayor nivel educativo.
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196
Según el tipo de inserción ocupacional, la principal fuente de provisión de
ingresos laborales para el conjunto de los hogares fueron los puestos de trabajo
registrados. Esa incidencia que fue del 56,6% en 2004 trepó al 61,7% en 2009, lo
cual es consistente con el aumento de la tasa de registración. Ese aumento relativo
se produjo a expensas de la contribución proveniente de las posiciones asalariadas
precarias, que redujeron su incidencia en 4,1 p.p. (del 18,8% al 14,7%). Interesa
destacar que ese aumento se produjo en los tres estratos de hogares, pero fue
más intenso para los hogares del estrato inferior. Ello obedeció al aumento de la
participación relativa de los miembros no jefes. Precisamente, en la combinación
de los aportes, según posición del hogar e inserción ocupacional, se confirma que
los jefes disminuyeron su contribución en todas las categorías de ocupación, y
quienes concentraron esas ganancias fueron los restantes miembros en posiciones
registradas: 4 p.p. para los hijos y 2 p.p. para los miembros cónyuges.
Aun cuando los hogares del estrato inferior se vieron beneficiados por el acceso a
puestos registrados, debe señalarse que la brecha, que todavía en 2009 separaban a los
hogares de menores recursos del resto, es elevada. En estos últimos hogares, la contribución de los trabajadores registrados fue 9 puntos inferior a la que mostraron los hogares
con jefes de nivel educativo alto y medio, y el aporte proveniente de posiciones no registradas fue el doble del que exhibieron los hogares con jefe de nivel educativo medio, y
estuvo cerca de triplicar el que mostraron los hogares del estrato superior.
Es útil complementar este análisis con la identificación de las fuentes de las
que dependen los hogares. En efecto, ello aportará información sobre el grado en
que los hogares pueden apropiarse de diferentes fuentes de ingreso. En el cuadro
7 se presenta esta información y allí se aprecia que entre el 75% (en 2004) y el 73%
(en 2009) de los hogares obtuvieron sus ingresos de una sola fuente (de ocupaciones registradas, no registradas, por cuenta propia o empleadores). Este resultado
refleja que las posibilidades que tienen los hogares para elaborar estrategias que
les permitan combinar el tipo de ocupación, a la que logran acceder sus miembros, son limitadas. La situación en 2009 indica que el 41% de los hogares recibía
ingresos exclusivamente de posiciones registradas, un 16% sólo de posiciones no
registradas, 12% de ocupaciones por cuenta propia y 3% en calidad de patrones
o empleadores. Ver cuadro 7. Es de resaltar la notable caída de los hogares que
dependían sólo de los ingresos provenientes de ocupaciones no registradas: éstos
se redujeron en 8 p.p. Las familias que dependían exclusivamente de ingresos por
ocupaciones por cuenta propia cayeron en cerca de 2 p.p., mientras que crecieron
en 7 p.p. las que obtuvieron sus ingresos de ocupaciones registradas en la seguridad social. No hubo cambios de relevancia en la distribución de los hogares,
según combinación de fuentes. Si bien en los tres grupos de hogares aumentó la
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197
proporción de hogares que dependían exclusivamente de ingresos provenientes
de puestos registrados, el aumento fue mayor para los que tenían jefes con bajo
nivel educativo. No obstante, todavía en 2009 sólo un tercio de estos hogares se
encontraba en esa situación, contra prácticamente el 50% en los hogares con jefe
de nivel medio y 53,8% en los hogares con jefe de alto nivel educativo.
Tabla 8 – Distribución de los Hogares según Inserción Ocupacional de
sus Miembros (en %)
Inserción ocupacional
Trim 1 2004
Trim 1 2007
Trim 1 2009
Total de hogares
No registrados
24,4
19,5
16,2
Cuentapropias
14,1
12,7
12,3
Patrones
2,5
2,8
3,3
Registrados
34,3
37,4
41,3
Total una única fuente
75,3
72,3
73,0
No registrados y cuentapropias
6,0
4,9
4,2
No registrados y registrados
9,1
11,3
10,8
No registrados y patrones
1,0
1,3
0,9
Registrados y patrones
1,0
1,4
1,5
Registrados y cuentapropias
5,4
6,5
6,7
Patrones y cuentapropias
0,6
0,4
0,4
Total dos fuentes diferentes
23,1
25,9
24,5
Patrones, cuentapropias y registrados
0,0
0,1
0,1
Patrones, cuentapropias y no registrados
0,1
0,2
0,2
Registrados, cuentapropias y no registrados
1,2
1,2
1,6
Registrados, patrones y no registrados
0,2
0,3
0,2
Total tres fuentes diferentes
1,5
1,8
2,1
Registrados, patrones, no registrados y cuentapropias
0,0
0,0
0,0
Total
100
100
100
Jefe de nivel educativo bajo
No registrados
32,4
26,6
22,8
Cuentapropias
14,8
14,3
13,7
Patrones
1,4
1,7
1,8
Registrados
25,5
28,9
31,9
Total una única fuente
74,1
71,5
70,3
No registrados y cuentapropias
8,1
6,5
6,1
No registrados y registrados
9,8
13,0
12,7
No registrados y patrones
0,7
1,3
1,1
Registrados y patrones
0,3
0,5
0,8
Registrados y cuentapropias
4,9
5,2
5,4
Patrones y cuentapropias
0,3
0,2
0,2
Total dos fuentes diferentes
24,2
26,7
26,4
Patrones, cuentapropias y registrados
0,0
0,0
0,1
Patrones, cuentapropias y no registrados
0,1
0,1
0,3
Registrados, cuentapropias y no registrados
1,4
1,4
2,2
Registrados, patrones y no registrados
0,3
0,2
0,3
Total tres fuentes diferentes
1,8
1,8
2,9
Sigue
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198
Tabla 8 – Distribución de los Hogares según Inserción Ocupacional de
sus Miembros (en %)
Inserción ocupacional
Trim 1 2004
Trim 1 2007
Registrados, patrones, no registrados y cuentapropias
0,0
0,0
Trim 1 2009
0,0
Total
100
100
100
Jefe de nivel educativo medio
No registrados
17,1
13,4
12,0
Cuentapropias
13,9
11,4
10,2
Patrones
3,2
3,7
4,4
Registrados
42,7
44,3
49,0
Total una única fuente
76,8
72,9
75,5
No registrados y cuentapropias
3,7
3,7
2,6
No registrados y registrados
8,9
10,0
9,4
No registrados y patrones
1,3
1,4
0,9
Registrados y patrones
1,7
2,1
1,7
Registrados y cuentapropias
5,6
7,4
7,8
Patrones y cuentapropias
0,8
0,6
0,4
Total dos fuentes diferentes
22,1
25,2
22,9
Patrones, cuentapropias y registrados
0,0
0,2
0,0
Patrones, cuentapropias y no registrados
0,1
0,1
0,1
Registrados, cuentapropias y no registrados
1,0
1,2
1,0
Registrados, patrones y no registrados
0,1
0,4
0,2
Total tres fuentes diferentes
1,2
1,9
1,4
Registrados, patrones, no registrados y cuentapropias
0,0
0,0
0,0
Total
100
100
100
Jefe de nivel educativo alto
No registrados
8,9
8,1
5,1
Cuentapropias
12,0
10,0
11,8
Patrones
5,3
4,3
5,5
Registrados
51,0
51,5
53,8
Total una única fuente
77,2
74,0
76,2
No registrados y cuentapropias
2,4
2,3
1,5
No registrados y registrados
6,9
8,7
7,8
No registrados y patrones
1,4
1,0
0,4
Registrados y patrones
2,4
2,9
3,1
Registrados y cuentapropias
7,1
8,6
8,4
Patrones y cuentapropias
1,2
1,0
0,9
Total dos fuentes diferentes
21,4
24,4
22,2
Patrones, cuentapropias y registrados
0,0
0,4
0,1
Patrones, cuentapropias y no registrados
0,0
0,4
0,2
Registrados, cuentapropias y no registrados
1,2
0,5
0,8
Registrados, patrones y no registrados
0,2
0,3
0,0
Total tres fuentes diferentes
1,3
1,6
1,1
Registrados, patrones, no registrados y cuentapropias
0,1
0,1
0,1
Total
100
100
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
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100
Finalizacióm
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199
El Análisis de la Situación Social en Argentina
Con base en los resultados discutidos con anterioridad, se procedió a clasificar a la población en diferentes grupos, atendiendo a tres dimensiones que contribuyen a calificar el grado de dependencia de los hogares respecto del mercado
de trabajo:
a. la participación de los ingresos laborales en el total de los ingresos
monetarios del hogar;
b. la categoría de inserción ocupacional del jefe de hogar;
c. la presencia de otros miembros del hogar ocupados en puestos de
trabajo registrados.
Con el propósito de ponderar el estado de subordinación al mercado de
trabajo, se decidió excluir como variable de estratificación al nivel educativo. Las
tendencias reseñadas en las secciones previas brindan sentido a los criterios utilizados para esta clasificación. Así, se recordará que el ingreso laboral resultó ser
el componente principal del ingreso monetario de los hogares, al que a su vez
contribuye mayoritariamente el jefe de hogar. Asimismo, se discutió que en el
período analizado aumentó globalmente la registración de los puestos de trabajo,
exhibiendo mayor intensidad entre los miembros no jefes. La utilización de estos
criterios permitirá ofrecer un panorama sucinto de la situación social y sus cambios en el período 2004-2009.
Se conformaron nueve grupos que, aun cuando no responden en forma
lineal a una escala jerárquica, reflejan diferentes grados de inclusión/exclusión
social. (Ver Tabla 8). Los primeros cuatro grupos concentran a aquellos hogares
que exhibirían una elevada vulnerabilidad social. Efectivamente, en los primeros
dos grupos se encuentran aquellas familias en las que el empleo de sus miembros
es la única fuente de ingresos (grupo 1) o la mayoritaria – mayor al 50% de los
ingresos del hogar – (grupo 2); en ambos casos, el jefe de hogar no está ocupado
en un puesto de trabajo registrado – ni tampoco es empleador y además no hay
en esas familias otros miembros en puestos de trabajo registrados. Ambos conjuntos concentraban al 36% de la población en 2004, cifra que se redujo al 26%
en 2009. Esa sensible disminución se produjo enteramente por lo acontecido en
el primero de los grupos (aquellos que sólo disponen de ingresos laborales), que
redujo su peso relativo en alrededor de 12 p.p., mientras que el segundo grupo lo
Livro.indb 199
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200
incrementó en 2 p.p. Este último comportamiento es consistente con el aumento
de las jubilaciones entre los sectores de menores recursos.
Tabla 9 – Distribución de la Población según Tipología de Hogares.
Grupos
Definición
Trim 1 2004
Trim 1 2005
Trim 1 2006
Trim 1 2007
Trim 1 2008
Trim 1 2009
1
Depende exclusivamente del
mercado de trabajo, jefe no
es patrón ni asalariado registrado y no hay miembros
registrados en el hogar.
26,8%
25,2%
21,4%
17,4%
15,5%
14,7%
2
No depende exclusivamente del mercado de
trabajo, jefe no es patrón ni
asalariado registrado y no
hay miembros registrados
en el hogar.
9,2%
9,7%
11,7%
11,6%
11,4%
11,4%
3
No hay miembros ocupados
en los hogares
10,8%
10,2%
10,2%
9,8%
9,7%
9,9%
4
Depende en forma secundaria del mercado de trabajo
6,3%
7,1%
6,0%
6,8%
6,3%
6,0%
5
El jefe de hogar es un
asalariado registrado y no
hay otros miembros en esa
condición
21,3%
21,7%
21,7%
22,4%
22,9%
22,2%
6
El jefe es asalariado no registrado o no está ocupado
y hay otros miembros en
el hogar como asalariados
registrados
8,3%
8,9%
9,4%
11,0%
11,8%
12,5%
7
El jefe es cuentapropia con
otros miembros en el hogar
como asalariados registrados
3,9%
3,5%
4,0%
4,3%
4,3%
4,8%
8
El jefe es asalariado registrado y hay otros miembros
asalariados registrados
9,4%
9,8%
11,5%
12,0%
13,3%
14,0%
9
El jefe es empleador
3,9%
3,9%
4,1%
4,7%
4,9%
4,6%
Total
100%
100%
100%
100%
100%
100%
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
Los grupos 3 y 4 comprenden a aquellos individuos residentes en hogares,
en los que los ingresos monetarios que prevalecen son no laborales que, se recordará, se componen fundamentalmente de jubilaciones y pensiones. Esos grupos
mantuvieron prácticamente sin cambios su participación en torno al 16% en forma conjunta. El grupo 5 aglutina a aquellos integrantes de hogares en los que es el
jefe el único que cuenta con una ocupación registrada en la seguridad social. Este
conjunto de hogares comprende a poco más del 20% del total de la población y
exhibió entre extremos un leve incremento de alrededor de 1 p.p. El grupo 6,
a diferencia del anterior, cuenta con otros miembros registrados pero impone la
condición que el jefe no esté ocupado o lo esté pero en un puesto no registrado.
La participación relativa de este segmento se incrementó en 4,2 p.p., pasando del
Livro.indb 200
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201
8,3% en 2004 al 12,5% en 2009. Ello refleja el fuerte impacto de la registración de
puestos ocupados por miembros no jefes. El grupo 7 se define en forma similar
al grupo 6, pero imponiendo la condición de que el jefe revista en una ocupación
por cuenta propia. Nótese que en este caso el incremento es inferior a 1 p.p.,
entre extremos del período. El grupo 8 reúne a todos aquellos hogares cuyo jefe
ocupa un puesto de trabajo registrado y además cuentan con otro integrante que
también desempeña en un puesto de trabajo de similar condición. Este segmento,
que en 2004 agrupaba al 9,4% de la población, incrementó su incidencia al 14%.
Finalmente el grupo 9 concentra a aquellos hogares cuyo jefe es patrón o empleador. Este estrato mantuvo una participación que varió del 3,9% al 4,6%.
Una manera de aproximarse a una validación de la clasificación propuesta
es a través de la comparación entre los grupos confeccionados de una serie de
atributos sociodemográficos asociados a situaciones de vulnerabilidad social. (Ver
Tabla 10).
Tabla 10 – Características Seleccionadas de los Grupos de Hogares
Confeccionados. Trim 1 de 2009
Grupos
brecha de
ingreso
per cápita
relativo al
promedio
tamaño
del
hogar
cantidad de
jubilados/
pensionados
% de
hogares
con
jefatura
femenina
% de
hogares
con jefes de
bajo nivel
educativo
tasa de
empleo
niños
menores
de 10
años
%de
empleo
industrial
% de
empleo en la
construcción
% de
empleo en
servicio
doméstico
% de
empleo
en
comercio
29,9%
1
0,67
3,3
0,0
28,5%
59,4%
56,5%
0,62
12,2%
15,5%
13,5%
2
0,68
4,1
0,2
40,7%
73,3%
48,0%
0,78
10,0%
18,0%
13,9%
32,9%
3
0,84
1,8
0,8
54,1%
62,9%
na
0,12
na
na
na
na
4
0,95
3,1
0,4
50,8%
63,1%
41,9%
0,38
12,2%
8,5%
17,6%
24,8%
5
1,15
3,3
0,0
25,8%
39,8%
52,4%
0,66
18,7%
6,0%
6,6%
18,7%
6
0,93
4,1
0,4
47,5%
65,3%
53,3%
0,50
16,2%
7,0%
7,4%
21,8%
7
1,08
4,1
0,0
14,2%
50,4%
71,8%
0,51
13,5%
10,8%
5,1%
24,7%
8
1,42
3,8
0,0
16,9%
31,0%
70,9%
0,55
14,9%
4,1%
1,8%
15,9%
9
1,65
3,4
0,0
13,6%
33,2%
66,7%
0,47
18,9%
8,8%
2,1%
32,0%
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos de EPH-INDEC.
Se destaca la fuerte correspondencia entre el ordenamiento de los grupos
sociales construidos y el ingreso per cápita familiar. En efecto, se aprecia que
los grupos 1 y 2 muestran un valor inferior al ingreso promedio –en torno al
67-68%–, los grupos 3 y 4 se ubican también por debajo del promedio aunque la
distancia respecto de esa referencia es algo menor mientras que los grupos 5, 6 y
7 están en torno al valor promedio. Claramente los grupos 8 y 9 exhiben marcas
que superan holgadamente el valor promedio. Ello confirma la oportuna creación,
desde fines de 2009, de un subsistema no contributivo denominado “Asignaci-
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202
ón Universal por Hijo para Protección Social”. Este programa consiste en una
transferencia de ingresos destinada a aquellos niños, niñas y adolescentes que no
tengan otra asignación familiar prevista por la ley y pertenezcan a grupos familiares que se encuentren desocupados o se desempeñen en la economía informal (es
decir que no estén registrados en la seguridad social).
La tipología de hogares también refleja la fuerte asociación con el nivel educativo del jefe de hogar: en los grupos 1 y 2 el 59% y 73%, respectivamente, son
hogares cuyos jefes que no finalizaron el nivel de educación medio mientras que
en el extremo opuesto – en los grupos 8 y 9 – estos porcentajes fueron de 31% y
33% respectivamente. Asimismo, despunta el hecho de que la jefatura femenina
exhibió una incidencia mayor en los agrupamientos inferiores, especialmente en el
grupo 2, donde trepó al 41%, mientras que en los grupos 8 y 9 éstos porcentajes
fueron del 17% 14% respectivamente. No sorprende tampoco que este indicador
sea elevado en los grupos 3 y 4, ya que se trata de hogares compuestos por población jubilada o pensionada en los que la mayor expectativa de vida de las mujeres
es consistente con la prevalencia de la jefatura femenina (obsérvese el menor tamaño relativo de esos hogares). Las tasas de empleo en los hogares de los grupos
1 y 2 son inferiores a las de los grupos superiores y ello es reflejo combinado, tanto de las menores oportunidades de empleo para este grupo como de una desigual
exposición a las restricciones que enfrentan sus miembros, para incorporarse a la
oferta laboral. Préstese atención en relación a ese último punto, que la presencia
de niños menores de 10 años es más numerosa en los hogares de los grupos 1 y
2. Finalmente, en términos de la inserción sectorial que logran los miembros de
estos hogares se aprecia el importante peso de construcción y servicio doméstico
para los hogares de los grupos 1 y 2, que se ubica en torno del 30% respecto de
porcentajes del orden del 6% y 11%, para los grupos 8 y 9 respectivamente.
Comentarios Finales
La clasificación de la población según su pertenencia a diferentes tipos de
hogares permite identificar algunos elementos relevantes a la hora de evaluar los
cambios en la situación social argentina entre 2004 y 2009. Entre ellos se destaca
el fuerte impacto que tuvo la creación de puestos de trabajo que cumplen con
los estándares legales. Puede estimarse que, si se atiende al aumento de la participación relativa de los grupos 6, 7 y 8, alrededor de un 10% de la población total
se benefició de la expansión de los puestos de trabajo registrados en la seguridad
social. En segundo lugar corresponde resaltar el positivo impacto de políticas que
contribuyeron a mejorar los ingresos de los hogares de menores recursos, por
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203
ejemplo a través de la ampliación del número de beneficiarios del sistema previsional. Téngase en cuenta que al menos un 2,2% de la población – considerando sólo
el aumento de la participación relativa del grupo 2 – se vio favorecida.
No obstante, al cabo de estos cinco años de expansión económica, persiste un
déficit de integración social. En 2009 un cuarto de la población urbana de Argentina
residía en hogares en los que ningún miembro se desempeñaba en un puesto de
trabajo registrado en la seguridad social. Asimismo, el hecho de que la mayoría de
los hogares obtenga sus ingresos monetarios de una única fuente laboral es reflejo
de segmentación en la distribución de oportunidades en la sociedad argentina.
Este cuadro de situación impone la necesidad de instrumentar políticas específicas tendientes a mejorar el panorama social. Entre éstas ocupan un lugar
destacado aquellas tendientes a reducir los índices de empleo no registrado en
sectores, en los que se insertan los trabajadores de menor nivel educativo: el servicio doméstico, la construcción y el comercio minorista. Asimismo, la baja tasa
de actividad en los hogares más pobres sugiere la necesidad de instrumentar mecanismos, que faciliten la incorporación plena de los miembros adultos de esos
hogares al mercado de trabajo. En este sentido son relevantes tanto la mejora en
las condiciones de la oferta laboral – por ejemplo vía capacitación laboral – y la
provisión de centros de cuidado infantil así como las políticas de estímulo a la instalación de unidades económicas productivas en zonas segregadas espacialmente.7
Finalmente, cabe resaltar que, en la transición, las políticas de transferencia de
ingresos han mostrado ser mecanismos idóneos para sostener los niveles de bienestar de aquellos hogares privados de empleos de buena calidad.
REFERÊNCIAS
ARRIAGADA, I. (Ed.). Familias y políticas públicas en América Latina:
una historia de desencuentros. Santiago de Chile: CEPAL, 2007. (Serie Libros de
la CEPAL, 96).
CETRÁNGOLO, O. D.; HEYMANN, Y. A.; RAMOS. Macroeconomía en recuperación: la Argentina post- crisis. In: KOSACOFF, B. (Ed.). Crisis, recuperación y nuevos dilemas: la economía argentina. Buenos Aires: CEPAL, 2007.
GOLDÍN, A. Normas laborales y mercados de trabajo argentino: seguridad y flexibilidad. Santiago de Chile: CEPAL, 2008. (Serie Macroeconomía del
desarrollo, 74).
7 Acerca de la segregación residencial véase Groisman (2010b).
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204
GROISMAN, F. Inestabilidad de ingresos y desigualdad durante la reciente fase de recuperación económica en Argentina. Buenos Aires: ASET,
2010a. (Estudios del Trabajo, 36).
______. La persistencia de la segregación residencial socioeconómica en Argentina. Estudios Demográficos y Urbanos, v. 25, n. 2, p. 74, Ciudad de México,
2010b.
ILO. World of work report 2009: the global jobs crisis and beyond. Geneva,
2009.
OIT. Trabajo y familia: hacia nuevas formas de conciliación con corresponsabilidad social. Santiago, 2009.
Livro.indb 204
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LA TRANSFORMACIÓN DE LAS RELACIONES
LABORALES EN ESPAÑA EN LA PERSPECTIVA
EUROPEA
Santos M. Ruesga1
Introducción
Llevamos ya más de treinta años de procesos de reforma política e institucional, particularmente en lo que a regulación del mercado laboral se refiere, que es el
más in-tenso que ha vivido España en su historia contemporánea. En concreto,
con el Real De-creto Ley 17/1977 de 4 de marzo sobre Relaciones de Trabajo, se
iniciaba el desmontaje del entramado que había construido la Dictadura del General Franco en sus cuarenta años largos de historia y se abría camino a un nuevo
marco de relaciones laborales basado en los modelos democráticos de la Europa
comunitaria. Este decreto, promulgado con anterioridad a las primeras elecciones
democráticas celebradas en el país, en junio del mismo año, inicia la marcha hacia
la constitución de un sistema libre de relaciones labora-les, al reconocer la libre
constitución y actuación de organizaciones sindicales y patronales y el derecho de
ambas a promover conflictos colectivos en defensa de sus respectivos intereses.
A partir de aquí el mercado de trabajo español ha experimentado una profunda transformación, tanto en su vertiente cuantitativa como en su estructura interna de
funcio-namiento, al compás del cambio institucional que ha vivido el país, pero también
de su desarrollo económico, con las correspondientes fluctuaciones cíclicas. Estas transforma-ciones, desde el punto de vista del desarrollo económico del país, no son un tema
baladí. En todas las economías, independientemente de su nivel de desarrollo, el trabajo
es la fuente fundamental de generación de valor añadido en los procesos productivos.
Por eso, las rentas del trabajo constituyen la parte fundamental del Producto Interior
Bruto (PIB), al tiempo que la prestación laboral es la fuente fundamental de recursos
para la mayor parte de la población del país y para todos ellos. Por tal cúmulo de razones
cabe señalar que la dinámica del mercado laboral es una pieza singular en el proceso de
desarrollo socioe-conómico nacional.
Se pretende analizar de forma descriptiva en este trabajo la trayectoria de
transfor-mación que ha experimentado este mercado laboral, su estructura y dinámica, siguiendo un esquema en el que se considerarán los cambios habidos en
sus componentes funda-mentales: oferta y demanda laborales y salarios y los desequilibrios que en su interacción se generan, deteniéndose también en el marco
1 Doutor em Ciências Econômicas pela Universidad Autónoma de Madrid
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206
institucional que regula estas relaciones de trabajo y aproximándose al efecto de
dicho sistema de relaciones laborales en el ámbito macroeconómico.
Una Secuencia Temporal Cambiante
La historia laboral, tanto en su vertiente estrictamente de mercado como en
el plano institucional, ha trazado un recorrido cambiante en estos últimos treinta
años, al compás del ciclo económico nacional-internacional, pero también con
profundas transformaciones en la dimensión político institucional. En grandes
líneas y atendiendo a la dinámica de ambos elementos, la del propio mercado
laboral y la institucional, se podrían identificar seis etapas en este período de tres
décadas:
1. Entre 1977 y 1985 existe largo período de ajuste en el plano económico y laboral así como de definición y asentamiento del marco de
relaciones labo-rales, siguiendo el modelo europeo en un contexto
de concertación social muy intensa.
2. Entre 1986 y 1991 se produce una fuerte expansión económica y
de empleo, con intensificación de la temporalidad en relación con
las políticas activas de mercado de trabajo, implantadas en el período anterior, todo ello en un contexto de crisis en el proceso de
concertación social previo.
3. De 1992 a 1996 se produce un período de fuerte impulso reformista, modifi-cando aspectos institucionales básicos, modificando la
legislación laboral y reorientando las políticas activas de mercado
de trabajo en un contexto económico de intensa recesión hasta
1995 y en ausencia de diálogo social efectivo.
4. Entre 1997 y 2004 se produce un cambio en la orientación política
del go-bierno elegido en las urnas que abrirá camino a un período
de reformas la-borales, de signo diverso, inicialmente con apoyo en
el diálogo social que se irá diluyendo y enmarcando en una dinámica económica expansiva. Con una singularidad en la dinámica del
mercado laboral, que es la incorporación de una oferta creciente
de trabajo inmigrante que alcanzará al final de pe-riodo cerca del 10
por ciento de la población ocupada.
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207
5. De 2005 hasta la actualidad, se retoma el impulso reformador en el
mercado laboral, apoyado en una amplia y continuada participación de los interlocuto-res sociales, en un contexto económico-laboral fuertemente expansivo, que sigue apoyándose en la expansión
de la oferta de mano de obra inmigrante.
6. 2008 significa la quiebra completa del funcionamiento alcista del
mercado de trabajo. La crisis económica se materializa en la destrucción de más de dos millones de empleos netos y la tasa de desempleo pasa de estar en el entorno de la media europea a rondar
el veinte por ciento.
Siguiendo este sintético esquema temporal de la evolución de la dinámica
laboral de España, vamos a analizar la misma y los hechos principales acaecidos
en el período.
Treinta Años en la Dinámica del Mercado Laboral Español
El mercado laboral español siempre ha adolecido de una muy baja tasa de actividad. Tal situación se mantuvo, incluso empeoró, hasta bien entrados los años
ochenta del pasado siglo; desde entonces se ha producido un cambio paulatino e
intenso que ha su-puesto un aumento de casi diez millones de personas en el volumen de la población activa, contando desde 1977 a 2009, es decir un crecimiento
de de casi un sesenta por ciento en un período de treinta años. En este contexto, la
estructura del mercado laboral español, en sus especificidades, responde, en primer
lugar, a las características demográficas del país y a su evolución más reciente, pero
también a diversas singularidades económicas y socioculturales que explican la
dinámica del mercado en los últimos años.
En otro lugar, Ruesga (2005, p. 108-109) he señalado que
desde mediados de los setenta del pasado siglo comienza a
estancarse la dinámica de fuerte crecimiento demográfico que
se había producido en las décadas anteriores. Desde el punto
de vista del mercado laboral, tal estancamiento no se observará de forma clara hasta pasada otra década, bien entrados
los años ochenta.
Y en ese contexto, dos acontecimientos políticos son fundamentales para entender las transformaciones que sufre el
Livro.indb 207
03/02/2011 11:34:22
208
mercado de trabajo español: la reinstauración del régi-men
democrático a partir de 1977 y posteriormente el ingreso de
España a la Unión Eu-ropea (UE).
Veamos cómo evoluciona la dinámica del mercado laboral, analizando sus
compo-nentes – oferta y demanda. La base de la oferta de trabajo de un país
dado está determi-nada, en primera instancia, por su población y su estructura
de edades, de lo que deriva el potencial de mano de obra disponible para trabajar. Estadísticamente hablando, la oferta de trabajo se identifica con la población
activa. Su dinámica está condicionada, en primera instancia, por el saldo neto del
crecimiento vegetativo más el resultado de los flujos migratorios (inmigración
menos emigración).
Años
Población
mayor de 16
años
Población
activa
Tasa de
actividad
Población
ocupada
Tasa de
ocupación
Población
desempleada
Tasa de paro
Tasa de
dependencia*
Tabla 1 - Evolución del Mercado Laboral Español
1977
25.724,55
13.283,48
51,64
12.594,40
48,96
689,10
5,19
30,09
1985
28.582,38
14.009,13
49,01
11.004,03
38,50
3.005,08
21,35
33,04
1990
30.429,73
15.465,40
50,82
12.954,93
42,57
2.510,48
16,23
34,40
1994
31.556,45
16.087,73
50,98
12.207,63
38,69
3.880,08
24,11
35,51
2007
37.662,88
22.189,90
58,92
20.356,00
54,05
1.833,90
8,26
32,91
2009
38.431,58
23.037,48
59,94
18.887,97
49,15
4.149,50
18,01
32,67
Fuente: Elaboración Propia del Autor sobre Datos EPA (INE).
*Tasa de dependencia = (mayores de 65 años) / (población activa) x100
La oferta efectiva de trabajo está delimitada por múltiples factores socioeconómi-cos, culturales e institucionales que contribuyen a explicar la existencia
de diferentes tasas de actividad para países distintos e incluso para cada territorio
regional dentro de un mismo país o para colectivos poblacionales diversos. Entre
tales factores que inciden en la definición de la tasa de actividad se pueden señalar
desde las normas que regulan las diferentes formas de acceso a la situación de
inactividad percibiendo una prestación social –jubilación u otras formas– o hábitos y costumbres que marcan pautas de comportamiento para grupos poblacionales específicos, hasta diferentes instituciones económicas (instrumentos fiscales,
subsidio de desempleo etcétera), que también contribuyen a definir la actitud de
las personas en su acceso al mercado laboral. Este tipo de variables influyen no
solo en la disponibilidad absoluta de la población ante el trabajo remunerado sino
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209
tam-bién en el número de horas de trabajo que cada individuo está dispuesto a
ofrecer a cam-bio de una remuneración dada.
Las tendencias demográficas en España en los últimos años señalan una conver-gencia acelerada hacia las pautas europeas de bajo crecimiento vegetativo. La
tasa de crecimiento vegetativo (tasa de natalidad menos tasa de mortandad) ya
era similar a la media comunitaria a principios de los años noventa del siglo XX,
cuando tan sólo quince años antes la superaba en más de seis puntos porcentuales. Y es que la natalidad en España ha experimentado un acusado descenso al
compás de la incorporación de la mu-jer al mercado laboral. La ausencia de instrumentos de apoyo a la natalidad ha redundado en un elevado coste demográfico
en el país, como contrapartida a la incorporación de la mujer española al mercado
laboral, que va convergiendo hacia estándares europeos. Tan sólo a partir de la
intensificación de entrada de población inmigrante, a partir de la segunda mitad de
la década de los años noventa del siglo XX y sobre todo en la primera década del
siglo siguiente, el crecimiento de la población española se ha animado, pudiendo
recuperar ritmos por encima de la media de los países comunitarios. Esto ha significado que la población, en términos absolutos, vuelva a crecer cuando ya parecía
que se había in-troducido en una senda regresiva.
En relación con la evolución de la oferta de trabajo en España, la primera
nota a destacar es que la tasa de actividad de la población ha sido tradicionalmente
muy baja con relación a los parámetros de la UE. El principal factor explicativo
está relacionado con el reducido nivel de actividad laboral (para el mercado) de las
mujeres españolas. La tasa de actividad femenina, en cualquier contexto espacial,
va descendiendo de forma intensa al compás de la industrialización y urbanización; en el caso español en los años sesenta y setenta del siglo XX. En España,
también es preciso considerar la influencia de un entorno cultural, de raíces profundamente católicas, que facilitó la salida de la mano de obra femenina desde
la actividad en el mundo rural a las labores domésticas en la urbe, eso sí, en un
contexto de escasez de demanda laboral, lo que también contribuyo a impulsar la
emigración al exterior de una parte de la población potencialmente activa femenina. No será hasta ya bien entrada la década de los ochenta, cuando la población
femenina inicie un proceso de vuelta al mercado, que en las condiciones sociales
del país, contribuirá a acelerar el descenso de las tasas de natalidad y a la regresión
del volumen de población. En los últimos años hasta 2007, con dos décadas de
crecimiento económico casi ininte-rrumpido, se ha producido una intensa reorientación de las tendencias en el mercado la-boral. Ello está redundando en un
notable crecimiento de la oferta de trabajo, que acerca su estructura a las pautas
habituales de los europeos.
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210
Tabla 2 - Características de la Oferta de Trabajo (Población Activa)
% sobre
el total
Valor
absoluto
% sobre
el total
Valor
absoluto
% sobre
el total
Valor
absoluto
% sobre
el total
2009
Valor
absoluto
2007
% sobre
el total
1994
Valor
absoluto
1990
% sobre
el total
1985
Valor
absoluto
1977
Características
Total
13.283
100,0
14.009
100,0
15.465
100,0
16.088
100,0
22.190
100,0
23.037
100,0
Varones
9.528
71,7
9.770
69,7
10.088
65,2
10.061
62,5
12.802
57,7
12.938
56,2
Mujeres
3.755
28,3
4.239
30,3
5.377
34,8
6.027
37,5
9.387
42,3
10.099
43,8
16-24
años
2.823
21,3
2.890
20,6
3.025
19,6
2.769
17,2
2.434
11,0
2.223
9,7
25-54
años
8.418
63,4
9.222
65,8
10.570
68,3
11.649
72,4
17.350
78,2
18.173
78,9
55 años o
más
2.042
15,4
1.898
13,5
1.871
12,1
1.669
10,4
2.406
10,8
2.641
11,5
Fuente: Elaboración Propia del Autor sobre EPA (INE).
Como resultado del proceso demográfico descrito, la población activa española en-vejece de forma intensa; y ni tan siquiera el flujo de inmigración registrado a partir de 1995 parece alterar, de forma significativa, tal tendencia. Este
rasgo de la oferta de trabajo, no muy diferente a lo que está ocurriendo en el resto
de los países de la UE, introduce problemas graves de disponibilidad de mano de
obra, al tiempo que genera fuertes incer-tidumbres sobre el sistema protección
social, particularmente sobre el futuro de las pen-siones (públicas y privadas), en
tanto que la esperanza de vida de los españoles se alarga de modo continuo, con
niveles absolutos de los más elevados en el contexto mundial.
Otro rasgo significativo de la estructura de la oferta laboral hace referencia al
acor-tamiento que se viene produciendo desde hace lustros del período de vida
activa de los españoles. Se retrasa la edad de entrada al mercado laboral, por imperativos legales (alargamiento de la escolarización obligatoria hasta los dieciséis
años) o sociales (fuerte expansión de la demanda de servicios educativos). Y por
el lado opuesto, se reduce pau-latinamente la edad de retiro de la actividad laboral,
a través de mecanismos diversos de jubilación anticipada (voluntaria o a través de
programas de reconversión empresarial). Eso significa una menor oferta potencial
de trabajo y un saldo decreciente en la relación activos/pasivos del sistema de
Seguridad Social. Parece, no obstante que en los años más recientes, se podría
estar frenando esa tendencia. Posiblemente comienzan a hacer efecto los esfuerzos realizados en aras de alargar la vida laboral, en coherencia con las políticas
establecidas en la Estrategia de Lisboa2.
2 Al amparo de dicha estrategia, establecida en 2000 y revisada, en la cuantificación y ordenación de sus objetivos en
el año 2005, se establecía alcanzar una tasa de empleo para los mayores de cincuenta y cinco años, por encima del
cincuenta por ciento, como media para el conjunto de los países de la UE en el año 2010.
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A destacar también, sobre todo a partir de los años noventa, el aumento relativo de la oferta de trabajo femenino, muy acusado en términos relativos, debido
a los intensos cambios socioculturales que ha experimentado el país en las tres
últimas décadas, que han contribuido a dinamizar la incorporación de las mujeres
en el mercado de laboral. Esto significa también un cambio intenso en la estructura
del mercado laboral y la expansión de nuevas actividades productivas auspiciadas
por tal fenómeno de la feminización de la oferta laboral. En el resto de la UE también se está registrando un proceso de feminización en sus respectivos mercados
laborales, pero no con tanta intensidad como en el caso español.
Por último, conviene señalar cómo en la última década se ha producido un
cambio significativo en la estructura demográfica a causa de la fuerte presencia que
han adquirido entre la población los trabajadores extranjeros. Se ha pasado de una
cifra relativa del 1,3 por ciento de extranjeros en la ocupación a otra superior al
diez por ciento, un fenómeno sin parangón entre los países de la UE aunque no
represente la cifra relativa de trabaja-dores foráneos más elevada de este espacio.
A éstos habría que añadir la cifra no bien estimada de extranjeros en situación irregular que trabajan, que supone un volumen de mano de obra mal contabilizada,
por razones obvias de ocultación, en los mecanismos habituales de estimación de
estimación de estas variables
A efectos de comparaciones internacionales3, la demanda de trabajo se mide
por el número de personas que realizan algún tipo de trabajo remunerado, con
una hora o más de trabajo semanal. Este valor representa el stock de demanda de
trabajo en un momento del tiempo y para un lugar dado. La demanda laboral está
determinada, cuantitativamente hablando, por la cantidad de bienes y servicios
que se producen en un período concreto, en un espacio concreto; pon la intensidad laboral de los sistemas productivos4 – la cantidad de trabajo utilizado por
unidad de producto generado, en relación con otros factores de producción–; y
con el tipo de jornada laboral realizada. Estos tres factores determinan la cantidad
de empleo que las empresas ponen a disposición de la oferta laboral.
De forma gráfica se puede observar lo que ha ocurrido con la demanda de
trabajo en España, analizando la evolución de la tasa de empleo en las últimas
décadas. Dicha tasa viene dibujando una senda de crecimiento sostenido desde
1994, en consonancia con el ciclo económico expansivo, con tasas de crecimiento
3 Según los estándares establecidos por las sucesivas Conferencias Estadísticas de la Oficina Internacional del Trabajo, asumidos por la oficina estadística de la Unión Europea (Eurostat).
4 Obviamente, tal intensidad está en relación con los precios relativos de los factores productivos y con la tecnología
disponible, en un contexto dado. Ambos factores, demanda de bienes y servicios e intensidad laboral definen el
número de puestos de trabajos que las empresas crean.
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del PIB superiores de forma continua a la media registrada por el conjunto de
la UE. Ese aumento notable sufre una quiebra a partir de 2007 con la aparición
de la virulenta crisis económica y su plasmación radical en el empleo. A pesar de
esta evolución, subsisten diferencias importantes en cuanto al nivel de empleo en
relación con las principales economías de la UE y del resto de los países desarrollados. La tasa de empleo se sitúa en España casi cinco puntos por-centuales por
debajo de la media europea, una diferencia que se ha venido reduciendo de forma
intensa en las últimas dos décadas pero que aún sigue siendo singular.
Tales diferencias en cuanto al nivel de la tasa de empleo con respecto a la UE
vie-nen explicadas fundamentalmente por el comportamiento de la tasa de empleo
femenino. Aunque se ha reducido, el diferencial entre las tasas de empleo masculina
y femenina en España sigue siendo de los más elevados de Europa, situándose en la
actualidad en más de diez puntos porcentuales. La tasa de empleo masculino se sitúa
un punto porcentual por debajo de la media europea y, sin embargo, la femenina
aún se mantiene más de ocho puntos porcentuales por debajo de la respectiva media
comunitaria. El crecimiento del empleo experimentado por España en los últimos
años no oculta las diferencias aún importantes que nos separan de los estándares
medios de la UE. La tasa de empleo media se encuentra aún lejos de la meta establecida para el año 2010 por la Agenda de Lisboa: un setenta por ciento.
Tabla 3 - Distribución Sectorial del PIB y del Empleo (% sobre Total)
Empleo (puestos de trabajo equivalentes
a tiempo completo)
VAB
Años
1977
1985
1990
1994
2007
2009
1977
1985
1990
1994
2007
2009
Agrario
6,3
6,0
4,9
3,5
2,7
2,4
20,4
16,4
11,0
8,8
4,5
4,5
Energía
5,3
6,0
5,6
6,1
2,6
2,5
27,6
1,4
1,1
1,0
0,7
0,7
Industria
26,3
25,2
21,9
19,0
14,7
12,6
22,0
21,5
19,9
15,1
14,3
10,3
Construcción
8,3
6,9
9,7
8,5
11,8
10,7
10,1
7,0
9,4
8,5
13,8
Servicios
53,8
55,9
57,8
62,9
68,1
71,7
41,8
53,2
57,0
61,8
65,9
70,3
De mercado
43,5
43,2
43,9
48,1
53,4
55,5
..
36,3
38,5
41,5
47,8
50,2
De no mercado
10,3
12,7
13,8
14,7
14,7
16,2
16,8
18,5
20,3
18,1
20,0
..
Fuente: Elaboración Propia del Autor sobre Datos Contabilidad Nacional Trimestral (INE).
Los problemas del mercado laboral español en cuanto a generación de empleo
no son sólo de orden cuantitativo sino también, de modo creciente, en algunos
aspectos y en los últimos años, de carácter cualitativo. Nuestro sistema laboral se
caracteriza por la existencia de una profunda dualidad en el tratamiento de la oferta
laboral por parte de la demanda, según género y edad, entre otras líneas de segmen-
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tación del mercado. Como se ha señalado, las mujeres padecen aún una sistemática
discriminación laboral que se manifiesta tanto en el acceso al mercado como en
menores niveles salariales. Las mujeres se integran en menor cuantía en el mercado
laboral en las edades más tempranas y comienza a declinar su presencia mucho antes (entre los veinticinco y los treinta años) que los hombres (a partir de los cuarenta
y cinco años). La edad también introduce una brecha de segmentación importante
en el mercado de trabajo español. Jóvenes y mayores muestran una intensidad de
inserción relativa en el mercado laboral mucho menor que la población adulta, poniendo de manifiesto la presencia de rechazo (discriminación) en el contexto de los
mercados regulados que articulan nuestro sistema de relaciones laborales.
El crecimiento del empleo de las últimas décadas se ha sustentado fundamental-mente en la creación de puestos de trabajo de baja calificación, que se
han ido ocupando en una buena proporción por mano de obra inmigrante, con
efectos negativos en la diná-mica de crecimiento de la productividad del trabajo
y en la productividad total de los facto-res en el conjunto del tejido productivo
español. Pero tal fenómeno no se puede entender como la causa, sino más bien
al contrario, como el resultado de la evolución de un sistema productivo que está
generando mucho empleo, en detrimento de la productividad del sistema5.
Y es que, en lo que se refiere a la demanda laboral, se ha producido un profundo
cambio sectorial, a expensas de lo que ha ocurrido en el tejido productivo español, también a partir de los años sesenta y de forma muy intensa en la última década del pasado
siglo. Desde el punto de vista de la demanda de trabajo, pasa de ser una economía básicamente agraria hasta prácticamente mediados de los años sesenta a una economía ya
altamente terciarizada en la primera mitad de los años noventa, es decir, en veinticinco
años la economía española describe unas fases de transición o cambio sectorial que en
las economías desarrolladas habían requerido de un período de tiempo más dilatado.
El cambio es mucho más intenso en términos de mano de obra ocupada que de valor
añadi-do a causa de la intensa capitalización que experimenta el sector agrario.
La terciarización del empleo ha introducido, además, cambios sustanciales
en la elasticidad producto-empleo, es decir, en la dinámica de creación de empleo,
y transfor-maciones notables en la práctica de las relaciones laborales en tanto
que ha afectado desde la estructura empresarial vigente en las economías industriales o agrarias hasta los comportamientos sociolaborales de los asalariados. El
mercado de trabajo terciarizado, o cuaternarizado, demanda también soluciones
5 Sobre la evolución del sistema productivo español con referencia a la dinámica productiva se puede consultar el
trabajo dirigido por el profesor Francisco Pérez del Instituto Valenciano de Investigaciones Económicas. (PÉREZ,
2006).
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reguladoras distintas a las vigentes en otras estructuras laborales6. En ese sentido,
el cambio sectorial experimentado, hacia la cons-trucción y ciertos subsectores de
servicios, ha favorecido la creación de empleo, dado que tales sectores son los más
intensivos en la utilización del factor trabajo.
La evolución del empleo está fuertemente relacionada con la marcha de la actividad económica. En este sentido, el primer elemento a considerar en el orden económico hace referencia a la marcha del ciclo económico. Su dinámica está relacionada,
de un lado, con la propia senda de la economía mundial y las respuestas a los procesos
críticos de la misma –políticas de estabilización y contracción monetaria etcétera– y, de
otro, secuen-cialmente más intenso, con la presencia desde 1986 de España en la hoy
denominada UE y los avatares económico-institucionales de ese espacio de integración. La integración de España en la UE constituye el otro hito singular en estos primeros estadios del proceso de transformación económica y laboral, en tanto que significa
la consolidación de la apertura comercial de la economía española hacia este espacio
de integración. El efecto inmediato de la integración se deja notar en la balanza de pagos, particularmente la industrial, que experimenta un deterioro importante, poniendo
de manifiesto las carencias de competitividad del tejido productivo español. Sin duda,
tal impacto ponía de relieve ya entonces, la necesidad de proceder a modificar las
pautas de comportamiento del sector empresarial español, al tiempo que acumulaba
más demandas para la reforma del funcio-namiento del mercado laboral. En buena
medida, el impacto de la integración europea conducirá a la reforma laboral de 1994.
Y al margen de la tendencia cíclica general de la demanda de trabajo, las tasas de
empleo masculino y femenino han seguido una tendencia diferente en las últimas décadas; en el primer caso se observa un comportamiento procíclico, es decir la tasa tiende
a aumentar en las fases expansivas de la economía y a reducirse en las fases depresivas,
siendo más acusado este carácter en el caso español que en el del conjunto de la UE a
causa de la intensa temporalidad que caracteriza al empleo en España. La tasa de empleo
femenino, por el contrario, viene mostrando una tendencia creciente, en los últimos
treinta años, más intensa en el mercado laboral español que en el europeo, en su conjunto, con tan sólo ligeros retrocesos en las fases contractivas del ciclo económico.
Por otro lado, la dinámica de generación de empleo está también relacionada
con los cambios que se producen en la relación capital-trabajo en el tejido productivo. El efecto de incorporación de nuevas tecnologías al tejido productivo es
doble: por un lado permite acelerar el proceso de crecimiento de la productividad
global del sistema, facilitando la ganancia de competitividad interna y externa a
las empresas y, por otro y en sentido contrario, lleva consigo una disminución de
la demanda unitaria de trabajo. En términos de empleo, el resultado neto depende
6 Sobre los cambios que induce el paso a la “cuaternarización” véase Laan y Ruesga (1997).
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de ambos flujos: aumento de la demanda agregada al ganar en competitividad y
descenso de la demanda unitaria al aumentar la productividad de los factores, en
particular del trabajo, lo que llevaría a un descenso en la elasticidad empleo-producto. En última instancia, el crecimiento económico en España se está apoyando
en la creación de empleo de baja cualificación o, lo que es lo mismo, la expan-sión
productiva no es debida al crecimiento de la productividad impulsada por un más
rápido ascenso e incorporación de I+D+i. Ello no redunda positivamente en la
competitivi-dad de las empresas españolas, tanto en el exterior como en el interior
y, a medio plazo, cuestiona incluso el crecimiento futuro de la economía.
Tabla 4 - Distribución de la Población Ocupada (% sobre Total)
1990
1994
2007
2009
99,7
99,6
86,3
86,1
0,3
0,4
13,7
13,9
Trabajadores por cuenta propia
25,6
25,7
17,6
16,9
Empleador
3,8
4,6
5,5
5,7
Empresario sin asalariados o trabajador independiente
15,8
16,0
10,6
10,2
Miembro de cooperativa
0,8
1,0
0,4
0,2
Por nacionalidad
Españoles
Extranjeros
Por situación profesional
Ayuda familiar
5,3
4,1
1,1
0,9
Asalariados
74,1
74,0
82,3
83,0
Sector público
16,8
17,7
14.3
16,2
Sector privado
57,3
56,3
68,0
66,8
0,2
0,3
0,0
0,1
7,4
8,1
7,4
8,0
2 Técnicos y profesionales científicos e intelectuales
9,3
10,0
12,4
13,7
3 Técnicos y profesionales de apoyo
15,2
6,6
11,9
12,3
10,9
9,3
9,3
Otra situación
Por tipología de ocupaciones
1 Dirección de las empresas y de la administración pública
4 Empleados de tipo administrativo
5 Trabajadores de servicios de restauración, personales, protección y vendedor
de comercio
20,0
13,9
15,4
17,0
6 Trabajadores cualificados en agricultura y pesca
11,1
6,8
2,5
2,5
7 Artesanos y trabajadores cualificados de industrias manufactureras, construcción
y minería, excepto operadores
25,4
18,2
16,5
13,9
8 Operadores de instalaciones y maquinaria: montadores
5,2
11,0
9,2
8,5
9 Trabajadores no cualificados
6,1
14,2
15,0
14,2
0 Fuerzas armadas
0,4
0,3
0,4
0,6
Fuente: Elaboración Propia del Autor con base en EPA (INE).
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El otro componente de la demanda de trabajo lo constituye la jornada de
laboral. La jornada de trabajo para los asalariados está regulada doblemente en
España, no así para otras categorías ocupacionales, de no asalariados. De un lado,
el Estatuto de los Traba-jadores establece los límites máximos de la jornada ordinaria de trabajo para los trabaja-dores por cuenta ajena (cuarenta horas semanales), desde 1983; asimismo, regula el número máximo de horas extraordinarias
a realizar (ochenta horas a lo largo del año) y, por último, establece los períodos
mínimos de descanso. De otro lado, la negociación colectiva establece la jornada
que se ha de realizar en cada ámbito concreto de negocia-ción, respetando, obviamente, los máximos y mínimos establecidos en el Estatuto de los Trabajadores.
No obstante, los datos estadísticos señalan que la jornada efectiva de trabajo
en España se sitúa entre las más altas de los países de la UE. Si bien la jornada
media muestra niveles inferiores al límite máximo establecido para los asalariados
en el Estatuto de los Trabajadores, considerando tan solo los asalariados tiempo completo, los datos superan ese mínimo legal7. Las estadísticas sobre jornada
efectivamente trabajada que facilita la Encuesta de Población Activa muestran que
algunos colectivos realizan jornadas muy largas con respecto a la jornada establecida como máxima. De manera destacada ocurre entre los trabajadores por cuenta
propia, particularmente empleadores y autó-nomos. Pero también son frecuentes
entre los asalariados las largas jornadas, habiéndose extendido en el sector privado
la práctica de horas extras sin remuneración.
Una de las características más singulares del mercado laboral español, por el
lado de la demanda, por sus efectos sobre su propia estructura y sobre otras variables socioe-conómicas, hace referencia a los cambios habidos en el nivel relativo
de estabilidad en el empleo. En la actualidad, mientras dos terceras partes de la
población ocupada gozan de una elevada estabilidad en el empleo, el otro tercio
está sometido a un importante grado de rotación derivado de las condiciones
flexibles de acceso al mismo, que se han ido ex-pandiendo en las últimas décadas.
Ello ha configurado una intensa dualidad en el mercado, marcando dos segmentos
claramente diferenciados en cuanto a las características de los empleos en cada
uno de los segmentos: el de empleo estable y el de empleo más flexible.
7 Las razones de este hecho están, por tanto, relacionadas con la fuerte expansión del trabajo temporal (que acapara
las necesidades de flexibilidad productiva de las empresas españolas); la propia regulación de trabajo a tiempo
parcial en España (modificada en varias ocasiones con el objetivo de potenciar el uso de esta modalidad contractual
entre los asalariados) y los diferenciales de renta de las familias con respecto a otros países europeos (la renta
disponible es más baja y por ello se requiere el concurso del salario a tiempo completo de dos o más miembros de
la familia, a diferencia la situación en otros países comunitarios). (RUESGA BENITO, 2007).
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Tabla 5 - Empleos Flexibles en la UE (%) sobre Total Ocupación
Empleo a
Empleo temporal
Trabajo autónomo
tiempo parcial
España
UE-15
España
UE-15
España
UE-15
1987
15,6
..
5,6
..
18,8
1990
29,9
..
4,8
…
16,7
1995
35,0
11,5
7,2
15,6
16,2
9,0
2000
32,4
13,6
8,0
17,5
12,2
8,2
2005
32,1
14,4
12,2
19,7
11,2
9,4
2008
29,3
14,4
11,8
20,4
10,7
9,1
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos EPA y Eurostat.
En este marco analítico conviene hacer referencia a cómo la flexibilidad
laboral en España ha venido impulsada de forma intensa, aunque de forma
asimétrica, por la refor-ma del nuevo marco institucional desarrollado desde
1980 en adelante8. Las formas de flexibilidad desarrolladas en España desde los primeros años de la transición democrática, tras la primera reforma
laboral (1983-84), (RUESGA; VALDÉS DAL RÉ; ZUFIAUR NARVAIZA,
2005) se han concentrado en la flexibilidad cuantitativa externa, y, particular-mente en la contratación, es decir en el inicio de la relación laboral, lo
que ha sido consi-derado como un proceso de flexibilización asimétrico con
consecuencias desestabilizado-ras para el funcionamiento del mercado laboral (dualizando el mercado de los asalariados, con impactos negativos sobre
la productividad del trabajo, etcétera). En efecto, a partir de la reforma del
Estatuto de los Trabajadores, promulgada en 1983, por la que se introducen
incentivos a la contratación temporal, la cifra de empleos temporales sobre
el total de asa-lariados creció espectacularmente, convirtiéndose tal camino
en el mecanismo fundamen-tal de flexibilidad cuantitativa del mercado laboral español. Posteriores reformas de la regulación del mercado han tratado o bien de abrir el ámbito de la flexibilidad cuantitativa externa a otras
partes de la relación laboral (despidos colectivos, por ejemplo), o bien incentivar la contratación por tiempo indefinido, o bien impulsar la flexibilidad cuantitativa interna, actuando sobre la jornada (contratación a tiempo
parcial, ordenación irregular de la jornada etcétera), o bien promover otras
formas de flexibilidad (salarial o funcional). Y ya sea por lo limitado de tales reformas e incentivos o porque, como apuntan algunos trabajos recientes, se ha instalado en el mercado laboral español una especie de “cultura
8 Para un análisis “in extenso” de la reforma laboral en España, desde diversos ángulos analíticos se puede consultar
Ruesga; Valdés dal Ré y Zufiaur Narvaiza (2005).
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la temporalidad”9 que resulta sumamente difícil de erradicar, el resultado es
que la contratación temporal en España sigue afectando a un tercio de los
asalariados españo-les10.
Como resultado de toda esta dinámica de transformaciones en el mercado laboral
español se ha ido perfilando en el mismo un alto nivel de dualidad que diferencia entre
los ocupados con empleo estable, con mayor o menor grado de protección legal (mercado primario), y un amplio segmento de ocupados con formas más flexibles (mercado
secun-dario) sujeto a los vaivenes de la demanda específica de cada mercado particular.
En este segundo mercado se desenvuelven desde los asalariados temporales a los trabajadores a tiempo parcial, pasando por los autónomos insertos en sucesivas cadenas
de subcontratación y, en el último eslabón, los trabajadores irregulares (“sin papeles”,
“ilega-les”, “ocultos”, “piratas”, etcétera). En la perspectiva comparada, el mercado laboral espa-ñol supera en más de diez puntos porcentuales en importancia relativa (respecto al total del empleo) en estas formas de flexibilidad a la media del mercado europeo.
En el caso de la población asalariada tal proceso de flexibilización ha conducido a una
situación en la que soportan una elevada y creciente rotación de la mano de obra. Cerca
de la tercera parte de la población asalariada ocupada permanece menos de dos años
en el mismo empleo, lo que contrasta de forma notable con la situación existente a este
respecto hace tres décadas. Este modo de flexibilización de la relación laboral a través
de la temporalidad contractual puede estar teniendo efectos perversos en el terreno de
la acumulación de capital humano en las empresas, en suma, en su dinámica de productividad laboral y total.
Tabla 6 - Distribución de la Población Ocupada Asalariada según el
Tiempo de Permanencia en el Empleo Actual (% sobre Total) 2006
Tiempo de permanencia
Porcentaje sobre el total
Menos de 3 meses
6,4
De 3 a 5 meses
4,6
De 6 a 11 meses
6,6
De 1 a 2 años
10,9
De 2 a 3 años
8,5
De 3 a 6 años
17,2
6 años o más
45,9
Fuente: Elaboración Propia sobre Datos EPA.
9 Véase Toharia (2005).
10 Tras el acuerdo suscrito en 1997 entre los interlocutores sociales, para la Estabilidad en el Empleo, se produjo una cierta
inflexión a la baja de las cifras de temporalidad en el mercado laboral español. Sin embargo, tal efecto duró pocos años, pues
a partir de 2002 se produce un nuevo ascenso de la tasa de temporalidad hasta llegara a un treinta y cinco por ciento de los
ocupados asalariados. Cabe atribuir este ascenso al comportamiento de la contratación en las administraciones y organismos
públicos donde se ha experimentado un crecimiento intenso de la temporalidad frente a un ligero descenso en el sector privado.
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219
Los mercados laborales mantienen niveles de desequilibrio en su funcionamiento, entre oferta y demanda, observables en diferentes planos analíticos: a) cuantitativo,
que hace referencia al exceso de oferta sobre la demanda, situación habitual en los
mercados, con mayor o menor intensidad; b) espacial, relativo a los comportamientos diferenciados de los mercados laborales según áreas geográficas y c) ocupacional,
que expresa dife-rencias entre oferta y demanda por tipos de ocupaciones, que es, en
definitiva el ámbito donde se articulan y definen los mercados de trabajo. Pueden, sin
duda, identificarse otros planos analíticos, pero éstos son los fundamentales a efectos
de entender la dinámica y resultados de los mercados de trabajo nacionales11.
Tal es el caso del comportamiento del mercado de trabajo español, que
muestra una reducción sustancial del nivel estadístico del desempleo a partir de
1994, habiendo disminuido desde entonces la tasa de paro en quince puntos porcentuales. Durante dos décadas la tasa de paro en España se situó en la cabecera
de los países occidentales, mostrando un profundo desequilibrio en el mercado de
trabajo nacional. Pero todo lo ga-nado se perdió casi en su totalidad en el breve
periodo que va desde 2007 a 2009, donde se pasó de tasas de desempleo por debajo de los dos dígitos a acercarse peligrosamente al veinte por ciento.
El desempleo es un fenómeno heterogéneo que afecta de manera diferente
a distin-tos colectivos y territorios. En el caso español, el desempleo afecta en
mayor medida a mujeres, jóvenes y trabajadores con menor nivel de cualificación
y, actualmente, a los trabajadores inmigrantes, mostrando de forma muy gráfica las
líneas de segmentación del mercado laboral español. Más allá de los desequilibrios
cuantitativos de los mercados laborales, se observan otros tipos de “patologías”
en su funcionamiento, con importantes implicaciones tanto para su propia dinámica, más o menos armónica, como para el desa-rrollo con estabilidad del propio
orden socioeconómico. Una de tales patologías hace refe-rencia a las importantes
diferencias espaciales, que se observan tanto en la estructura como en la dinámica
del mercado de trabajo.
11 Durante los años ochenta del pasado siglo una abundante literatura económica se concentró en la estimación de
la tasa natural de paro en los países desarrollados; particularmente, en el caso europeo esta tasa parecía adaptarse a
una realidad donde la tasa estimada de paro se mantenía durante un largo periodo en cifras muy elevadas. Se analizaron múltiples factores para explicar el porqué de una tasa de equilibrio de paro elevada y con tendencia ascendente; en general las explicaciones giraron en torno a la presencia de diferentes instituciones que conferían mayor
rigidez al funcionamiento del mercado de trabajo (sindicatos, normas laborales, subsidio de desempleo, etcétera);
en suma, ponían el énfasis en factores por el lado de la oferta. (GREEN, 2001). Cuando a partir de mediados de
los noventas la tasa de paro inicio una senda descendente, el debate se centró en determinar cuáles eran las causas
de la volubilidad de dicha tasa y de su posible variación a la baja, ofreciéndose múltiples interpretaciones; ello ha
llevado a que “se haya puesto en cuestión la utilidad de la NAIRU como concepto” (GREEN, 2001) para explicar
la causalidad del desempleo y su dinámica.
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220
En el contexto español se puede comprobar cómo las diferencias regionales
en cuanto a la utilización del recurso trabajo disponible no han sufrido alteraciones
significati-vas en estas dos últimas décadas; no habiendo cambiado de forma significativa las posi-ciones relativas, al menos en lo que hace a las posiciones de cabecera
y postreras. Así, tradicionalmente, las tasas de empleo más reducidas se sitúan en
Andalucía, Extremadura y Asturias, mientras que las más elevadas las registran Baleares, Madrid, Cataluña, Navarra y La Rioja. Tales diferenciales se observan también,
con tendencias semejantes, al analizar algunas de las características de la demanda
de trabajo, como el nivel de flexi-bilidad del empleo, registrándose niveles superiores
en las regiones con mayores des-equilibrios laborales y menor tasa de empleo. En
el orden interpretativo de tales diferencias en el comportamiento de los mercados
laborales espaciales, las variaciones en cuanto a la estructura sectorial del producto tiene escaso poder interpretativo; habría que acudir al análisis de las diferentes
capacidades productivas del conjunto de los tejidos regionales, en definitiva a los
factores que afectan a la dinámica de la productividad del trabajo, para obtener una
explicación más relevante de tales diferencias12.
La importancia del trabajo en una economía no es debida tan solo a la cuantía del mismo disponible y utilizado sino que también y, de modo destacado, depende de sus cualidades desde la perspectiva del sistema productivo. Así pues la
cualificación del tra-bajo se puede observar desde una doble perspectiva: de un
lado, en las características de la oferta y, de otro, en el contenido cualitativo de
la demanda laboral, de los puestos de trabajo. Las diferencias entre una y otra
definen los desajustes ocupacionales que pueden existir en un mercado de trabajo,
desequilibrio que puede contribuir a explicar, al menos en parte, la persistencia de
elevadas tasas de desempleo, si tal desequilibrio crece con el tiempo.
Una forma de aproximarse a las características de la oferta en materia de
cualifica-ción consiste en medir el nivel educativo de la población, asumiendo que
el nivel formativo reglado alcanzado por la población activa es una variable proxy
de la cualificación de la mano de obra. Bajo esta perspectiva, lo que se observa en
el caso español es un fuerte crecimiento del nivel cualitativo de la oferta laboral
(al menos en lo que a educación formal se refiere). Así, en el período 1987-1996, la
población activa (oferta) con estudios universitarios aumento en casi cinco puntos
porcentuales, en tanto que la ocupación (de-manda) lo hizo en casi seis, estableciéndose un desajuste al final del periodo de 1,3 puntos porcentuales. Al final del
periodo, la oferta y la demanda de trabajo con estudios superiores se situaba,
respectivamente, en un 32,1 y un 35,4 por ciento de los totales respectivos, con
un desfases entre ambas inferior al punto porcentual. A pesar de las diferentes
12 Véase Informe de la Comisión de Expertos para el Diálogo Social (2005).
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221
categorías utilizadas por la EPA para los dos periodos considerados, parece que el
desajuste, medido en estos términos, habría disminuido ligeramente en la última
década. En todo caso estos datos lo que ponen de manifiesto es una ralentización
en el avance de la cualificación de la demanda de trabajo, cuestión que se ponía
de manifiesto más arriba, al analizar las características de la demanda de trabajo.
Con otros formas de medición las conclusiones, podrían ser semejantes a las aquí
expresadas13.
Tabla 7 - Oferta y Demanda de Trabajo por Nivel Educativo
% de Personas con Estudios Universitarios y Otros Superiores sobre Total
1987
1996
2007
2009
Demanda de trabajo (población activa)
10,6
15,6
31,8
32,1
Oferta de trabajo (población ocupada)
11,0
16,9
32,9
35,4
Fuente: Elaboración Propia del Autor sobre Datos EPA (INE).
Retribuciones y los Costes Salariales
Como se ha dicho, el coste del trabajo es una de las partidas más significativas de los costes de producción de la mayoría de las empresas, al tiempo que constituye la fuente fundamental de ingresos para la mayor parte de la población. Por
ello, desde la pers-pectiva empresarial, una gestión eficiente tratará de minimizar
el coste del trabajo utilizado para cada unidad producida (coste laboral unitario,
CLU), mientras que en la óptica del trabajador, su objetivo será obtener el máximo posible de renta total en términos reales (compensación real por empleado,
CRE). Los primeros, los empresarios, habrán de con-templar por tanto, el total
de costes que implica para la empresa la utilización de cada unidad de trabajo en
relación con su rendimiento; en el segundo, los trabajadores, su refe-rencia estará
en el total de ingresos obtenidos por cada unidad de trabajo con relación a la
evolución de los precios al consumo.
13 Véase Consejo Económico y Social (2005).
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Tabla 8 - Tasa Anual Acumulada de Incremento en el Periodo 1995-2009 (en %)
Remuneración real por empleado
Unión Europea-15
España
9,1
-0,9
Costes laborales unitarios reales
Unión Europea-15
España
-2,0
-6,4
Fuente: Elaboración Propia del Autor sobre Datos Eurostat.
Las diferencias entre las dinámicas respectivas de estas dos variables, compensa-ción real por asalariado y coste laboral unitario, se explican por la productividad del factor trabajo. Esto permite entender la singularidad que se produce en el caso español con
res-pecto la situación media de los países de la UE-15. En España, tanto la remuneración
real por empleado como los costes laborales unitarios han descendido en la última década, en tanto que en el conjunto de la UE-15, las remuneraciones han crecido en este
período y los CLU han disminuido ligeramente en términos reales. Dada la vinculación
de la dinámica salarial con la marcha de la productividad aparente del factor trabajo,
observable y contrastable en el caso español,14 el estancamiento de ésta explicaría la depreciación salarial registrada en ese lapso temporal. En suma, el avance de los empleos
temporales y de baja cualificación arrastra consigo una caída de los salarios reales medios
y un avance relativo de la posición competitiva de las empresas españolas vía costes, que,
sin embargo, no ha de ser suficiente para competir internacionalmente en los mercados
de bienes y servicios intensivos en el uso del factor trabajo.
Otro aspecto relevante a señalar, referido a la evolución salarial, hace referencia
a las diferencias que se registran en entre diferentes categorías de trabajadores, en función de diferentes líneas de segmentación que operan en los mercados laborales. Una
primera se refiere a las diferencias salariales en razón del género. Recientes estadísticas
señalan que el salario medio de los varones en 2004 era un 15,7 por ciento mayor
que el de las mujeres. Y el segundo aspecto singular en este terreno se refiere a las
diferencias salaria-les en razón de la cualificación. Sabido es que la cualificación es un
factor determinante de la remuneración salarial, en tanto que una mayor cualificación
reflejaría un mayor po-tencial productivo por parte del trabajador que la posee.
14 Véase Ruesga y Silva Bichara (2006).
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Las instituciones laborales
El marco regulatorio de las relaciones laborales se asienta en un modelo de
tipo eu-ropeo continental, apoyado sobre una sólida base normativa, construida a
partir de 1977, sobre la base de un proceso robusto y continuo –con altibajos– de
diálogo social. El mo-delo se asienta, por tanto, sobre tres pilares básicos:
a) Una extensa regulación normativa que abarca prácticamente todos
los ámbitos de la relación laboral. No obstante, a medida que el
modelo ha ido desarrollán-dose, con reformas de la normativa de
por medio, han ido aumentando los ámbitos laborales cuya regulación se traslada desde la normativa (regulación legal) hacia la negociación colectiva (regulación convenida), siguiendo pautas habituales en los países centroeuropeos. De esta forma el mecanismo de
la negociación colectiva (de alcance inicialmente microeconómico)
ha ido ganan-do relevancia en el caso español, como modulador
incluso de la propia regula-ción de las relaciones laborales en general, dado el carácter de eficacia gene-ralizada que los convenios
colectivos tienen en la legislación española y las crecientes atribuciones conferidas a este instrumento en las sucesivas reformas laborales habidas, hasta alcanzar la propia praxis del diálogo social.
b) El diálogo social, desarrollado de forma intensa y extensa, desde inicios de la transición política en 1977. A través de sucesivos
pactos sociales de diferente alcance y contenido, los interlocutores
sociales (organizaciones empresariales y sindicatos) han tenido una
presencia decisoria en las sucesivas reformas de la legislación laboral (aunque no en todas las ocasiones), en el diseño e incluso en
la aplicación de las políticas económicas de alcance más general y,
con incidencia más o menos explícita en el tejido de las relaciones
laborales.
c) Las políticas de mercado laboral, tanto activas como pasivas.
La política económica desarrollada a lo largo de este periodo en España acentúa
también los requerimientos de una reforma laboral que contribuya a la generación de
empleo, dado que, salvo en los años más recientes, aquella –la política económica–
tuvo un efecto contractivo sobre la actividad productiva, a la búsqueda del equilibrio
macroeconómico. No obstante, la entrada en el euro y la estabilidad macroeconómica
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subsiguiente han derivado en una larga época de bajos tipos de interés que han contribuido de forma singular al dinamismo económico de los últimos diez años.15
En consecuencia, el mercado laboral español ha estado sometido los últimos
treinta años a un proceso continuado de cambios y, al tiempo, de reformas en
su regulación legal. Este proceso constituye una realidad que ha ido trasladando
impulsos de muy distinto signo al sistema económico y que, en sus grandes coordenadas, ha seguido pautas simi-lares a las desarrolladas en los diversos procesos
de reforma del marco de relaciones laborales que han tenido lugar en la mayoría
de los países europeos. En el caso español, se podrían distinguir tres fases en el
proceso de reforma laboral llevado a cabo en las tres últimas décadas:
1ª FASE: Consolidación democrática (1977-1982)
2ª FASE: Ajuste y reforma (1982-91)
3ª FASE: Reformas consecutivas:
1º PERIODO: 1992-96
2º PERÍODO: 1997-2004
3º PERIODO: 2004- actualidad
Si hubiera que sintetizar estos procesos de reforma, cabría señalar que han estado
caracterizados por una búsqueda permanente de mayor flexibilidad en las relaciones la-borales, aunque tales intentos de flexibilización se han traducido en cambios en la regula-ción de muy distinto tipo en los diferentes países europeos. En general, el objetivo de
estos procesos de reforma de las relaciones laborales ha estado centrado en la búsqueda
de un sistema productivo con una mayor capacidad de adaptación a los rápidos cambios
que se producen en las cantidades y cualidades de la demanda de bienes y servicios, a
instancias, en buena medida, del acelerado proceso de cambio técnico. Esa volatilidad de
la demanda ha introducido en las empresas una mayor exigencia de flexibilidad que se ha
trasladado, casi de forma inmediata, al sistema de relaciones laborales. La inestabilidad de
la demanda a la que se enfrentan las empresas, exige de ellas una capacidad productiva
cambiante en términos de cantidad y de cualidad, exigencia que las diversas estrategias
empresariales han ido convirtiendo en plantillas variables en su cantidad y sujetas a un
proceso continuo de cualificación y recalificación.
15 Un análisis más detallado de la incidencia de la política económica sobre el proceso de reforma laboral se puede
encontrar en Segura (2004).
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En una primera etapa legislativa, se desarrollan las normas de carácter democrático en el campo de las relaciones laborales, acorde con los principios establecidos en la
Constitución Española de 1978, al tiempo que se va derogando la normativa vigente du-rante el régimen autoritario anterior. Esta legislación se materializa en 1980, con la pro-mulgación del Estatuto de los Trabajadores. Tal norma, junto con las posteriores Básica
de Empleo (1981) y Orgánica de Libertad Sindical (1986), constituye el tronco básico de
la legislación laboral española, que se irá completando con otros instrumentos jurídicos.
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Norma
Fecha
R.D.L. /1977
4/03/1977
Modificaciones introducidas.
Relaciones de Trabajo
Ley 8/1980
10/03/1980
Estatuto de los Trabajadores
Ley 14/1983
29/06/1983
Reducción de la jornada laboral máxima
Ley 32/1984
2/08/1984
Flexibilización de la contratación temporal; fomento de la
contratación temporal con subvenciones
Ley 10/94
19/05/1994
Medidas urgentes de fomento de la ocupación.
Ley 11/94
19/05/1994
Flexibilidad de la relaciones laborales individuales (entrada,
interna y de salida) y potenciación de la negociación colectiva
y mejora de sus contenidos.
Ley 14/94
1/06/94
Supresión del monopolio del INEM en materia de
contratación y creación de Empresas de Trabajo Temporal
(ETT´s)
Ley 31/1995
8/11/195
Ley de prevención de riesgos laborales
Ley 63/1997
26/12/1997
Medidas para el fomento de la contratación indefinida
(procede del Acuerdo sobre Estabilidad en el Empleo)
R.D.L. 15/1998
27/11/1998
Nueva regulación del contrato a tiempo parcial (Acuerdo
sobre el Trabajo a Tiempo Parcial)
Ley 12/2001
9/07/2001
Medidas urgentes contra las excesivas tasas de temporalidad
y modificación de la regulación de la contratación a tiempo
parcial
R.D.L. 5/2002
24/05/2002
Reforma protección por desempleo (denominado
“decretazo”)
Ley 32/2002
5/07/2002
Igualdad de género
R.D.L. 45/2002
12/12/2002
Medidas Urgentes para la reforma del sistema de protección
por desempleo y mejora de la ocupabilidad.
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R.D.L 5/2006
9/06/2006
Reforma mercado laboral (procede del Acuerdo para la
mejora del Crecimiento y el Empleo). Incluye medidas para la
promoción de la contratación indefinida, mejorar la utilización
de la contratación temporal, las prestaciones del Fondo de
Garantía Salarial y la transparencia en la subcontratación de
obras y servicios, la protección por desempleo de colectivos
específicos y su delimitación respecto de la cesión ilegal de
trabajadores
Cuadro 1 - Principales Reformas de la Legislación Laboral
Fuente: Elaboración Propia del Autor a partir de Sala Franco (2005).
La secuencia temporal de las sucesivas reformas –cambios legislativos–
muestra, no obstante, objetivos instrumentales cambiantes en el tiempo. Si bien
el objetivo final de todo el proceso de reforma es la búsqueda de mayores tasas de
creación de empleo, los objetivos instrumentales son diversos. Existen diferencias
importantes en este terreno entre los diferentes hitos legislativos que conforman la reforma laboral en España a lo largo del periodo analizado. La primera
modificación del Estatuto de los Trabajadores, en 1984, tiene un solo objetivo
instrumental definido: la instauración de un régimen de flexibilidad contractual
que promueva la creación de empleo. Se legisla el contrato temporal de fomento
de empleo, subvencionándose la contratación por tiempo definido y suprimiendo,
prácticamente, la causalidad a la que venía estando sujeta la realización de contratos temporales. El efecto de esta reforma hacia una flexibilidad parcial y sesgada
(en el con-trato) fue una espectacular expansión de los contratos temporales que
alcanzan en un corto espacio de tiempo los niveles más elevados de toda la Europa comunitaria, con dife-rencias acusadas.
La segunda reforma legislativa, en 1994, tratará de reaccionar contra los “excesos” generados en materia de contratación temporal, que había introducido una fuerte
dualidad en el mercado laboral entre contratados fijos y temporales. Se da por acabado
el meca-nismo de subvención a los contratos temporales – reinstalando el principio de
causalidad en la contratación temporal – y, en segundo lugar, se propician reformas
laborales que tratan de dotar de mayor flexibilidad al marco regulatorio en otros ámbitos
de la relación laboral: flexibilidad durante la prestación –flexibilidad funcional o geográfica– y al final de la misma – despido –. No obstante, esa reforma introduce también otros
elementos de flexibilidad en la contratación, no contemplados hasta entonces (empresas
de trabajo temporal, de cesión de trabajo y agencias privadas de colocación) que incidirán sobre las características de la temporalidad (mayor rotación de las plantillas).
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El tercer episodio de reforma laboral, en 1997, en este caso pactada con los
interlo-cutores sociales, incide aún más contra los excesos de la temporalidad,
instaurando –a través del Pacto para la Estabilidad en el Empleo– una nueva
figura contractual subven-cionada para promover la contratación por tiempo indefinido.16 En la cuarta reforma labo-ral de calado profundo, llevada a cabo en
2001-2002, promulgada tras el fracaso de intento de concertación social, se centró
en “la lucha contra lo que denomino en su Exposición de Motivos excesiva temporalidad existente”17. La reforma contiene como elemento esencial una nueva
regulación del contrato a tiempo parcial, que flexibiliza su uso, y completa con
el denominado “decretazo”, en el cual se modifica el sistema de protección por
desempleo, dificultando las condiciones de acceso al mismo.
La última reforma de calado llevada a cabo, hasta la fecha, es la que se recoge
en el Real Decreto Ley (RDL) 5/2006. Es el fruto del proceso de concertación social iniciado en julio de 2004 que incorpora un abanico amplio de acuerdos sobre
reformas en el mercado laboral, que van desde pactos sobre formación profesional hasta la modificación de los incentivos a la contratación indefinida, pasando
cambios importantes en la fijación del Salario Mínimo Garantizado. (CONSEJO
ECONÓMICO Y SOCIAL, 2006). En la vertiente estricta del marco regulatorio
de las relaciones laborales, la reforma se concreta en el acuerdo de 9 mayo de
2006, reflejado en el RDL citado, en el que se recogen tres tipos de medidas,
básicamente: 1) sobre fomento de la contratación indefinida, 2) sobre y 3) sobre
mejora de los mecanismos de inspección del trabajo. Es en esta perspectiva temporal en la que se puede introducir la idea de proceso de ida y vuelta, en la medida
en que los objetivos instrumentales originales, flexibilidad en la contratación, se
rechazan en el periodo más reciente, alterándose la orientación de las modificaciones legislativas hacia una mayor estabilidad en el empleo, acompañándose de
mayor flexibilidad en otros ámbi-tos de la relación de trabajo.
En síntesis, se podría afirmar que las reformas laborales habidas han estado
guiadas por un criterio de corte cuantitativista, por el lado del empleo, considerando como prioridad absoluta el incremento del volumen de trabajo contratado (de
personas ocupa-das) y no tanto la calidad del mismo. En segundo lugar, entrando
en el detalle de los con-tenidos, se ha hecho un especial hincapié en aumentar
la flexibilidad externa de la relación laboral (los mecanismos regulatorios de la
entrada y la salida de la actividad) en de-trimento de la flexibilidad interna, en el
16 El contrato de fomento del empleo estable se subvenciona a través de la reducción en el monto de indemnización
por despido para los trabajadores acogidos a esta nueva figura contractual; de hecho supone en la práctica el intercambio de algo más de estabilidad por algo más de flexibilidad en el despido.
17 Sala Franco (2005, p. 266). Y, el profesor Sala Franco continúa afirmando que “Sin embargo, las medidas adoptadas
en esta línea fueron claramente insuficientes, tratándose de reformas de deta-lle”.
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ámbito de la empresa. Incluso durante un lapsus largo de tiempo las denominadas
políticas activas del mercado de trabajo han estado actuando, en parte, al servicio
de este enfoque, subvencionando, por ejemplo, la contra-tación por tiempo definido. Bien es verdad que a partir de 1994 se ha intentado frenar el avance de la
temporalidad, con no demasiado éxito, en aras, sobre todo, de eliminar los efectos
de segmentación generados en el mercado laboral y las sinergias perversas sobre
la dinámica de la productividad del trabajo.
En un segundo nivel, la flexibilidad externa se ha reforzado de forma singular tras la vigencia de la Ley 45/2002, que autoriza a la empresa a llevar a cabo un
a modo de despido-express, reconociendo la improcedencia del cese y poniendo
a disposición del trabajador la indemnización legislada para esta categoría de despido (45 días por año de antigüedad, con máximo de 42 meses de percepción).
Con este cambio legislativo se introduce la posibilidad del despido “acausal”, en
definitiva el despido libre con indemni-zación.
Esta línea de reformas ha arribado en una nueva situación regulatoria, radical-mente distinta de la existente en los albores del régimen democrático, allá por 1978,
de modo tal que no sería hoy muy ajustado a la realidad seguir afirmando que el sistema
español de relaciones laborales sigue siendo muy rígido, altamente protector del empleo.
Las dificultades de las empresas para ajustar sus plantillas a la coyuntura de la demanda, se
han reducido de forma notable, de modo tal que contamos con un acelerado incremen-to del número de despidos en los últimos años, incluso en una fase de crecimiento
económico18. A pesar de lo que siguen señalando los informes de la OCDE sobre la rigi-dez en el empleo, en el caso español, la situación dista bastante de lo que parecen poner
de manifiesto –en términos comparativos- los indicadores que elabora esta institución19.
18 Véase a este respecto lo que señalan Malo y Toharia (2007, p. 8-9). En Comisión de Expertos para el Diálogo Social
(2005, p. 136): se apunta también como “el número de despidos ha crecido de forma notable en los últimos años”.
19 Los indicadores que elabora este organismo son de carácter nominalista, apoyándose en la letra de las respectivas
le-gislaciones en materia de contratación, despido u otros elementos que inciden en el grado de flexibilidad de las
relacionales laborales; además, se definen con una interpretación altamente subjetiva, sobre la aportación de cada
ítem considerado al grado de rigidez de las relacionales laborales. La práctica efectiva en cada caso concreto, que
podría indicar de modo más real las dificultades de las empresas para adecuarse a la evolución de sus demandas, no
se contemplan. Otros índices elaborados con la misma finalidad cambian bastante esta percepción de máximo grado
de rigidez laboral (particularmente en lo que a ajuste de plantillas se refiere). Y, en cualquier caso, la propia OCDE ha
calificado la posición española como intermedia en el ranking de protección del empleo fijo. (OCDE, 2004, p. 72). O
más tarde ha reconocido de forma explícita: “en 1994 la OCDE presentó el informe Jobs Study, analizando las causas
del alto desempleo en Europa. Este estudio identificaba como inapropiadas las regulaciones laborales y la legislación
como factores determinantes del alto desempleo. La OCDE recomendó la desregulación y la liberalización de las
instituciones laborales como remedio. Sin embargo, nuevas investigaciones empíricas han explorado la influencia
de las instituciones laborales sobre el desempleo y han confirmado solo parcialmente las recomendaciones del Jobs
Study. En una reevaluación, la OCDE ahora concluye que diferentes combinaciones de instituciones puede impulsar
un buen comportamiento del mercado de trabajo. Como en los países es-candinavos, Austria es un país con fuertes
instituciones laborales y un bajo nivel de desempleo.” (STIGLBAUER, 2006, p. 58). Otros informes abundan en esta
perspectiva; véase a este respecto, por ejemplo, UGT (2010) e Gaelle y Scarpetta (2004).
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El resultado de esta línea de desarrollo de las reformas laborales habidas es que
se han intensificado (o ha contribuido a exacerbar) las características de un modelo
pro-ductivo de baja productividad. Dicho de otro modo, se ha optado por una estrategia de competencia en costes laborales absolutos, tratando de reducir el coste por
hora, y no, como debiera entenderse desde una perspectiva del desarrollo a medio/
largo plazo, de costes laborales unitarios, es decir impulsando su reducción a través del
incremento de la productividad. La escasa intensidad inversora en investigación, desarrollo tecnológico e innovación (I+D+i) por parte de las empresas españolas muestra sus preferencias por los ajustes de costes nominales, más que por la estrategia de
control de los costes unitarios. El deterioro creciente de la competitividad internacional de la economía española es una consecuencia de tal comportamiento empresarial.
Denominación
del Pacto Social
Año
Tipo y contenido del acuerdo
Entidades que
suscriben el acuerdo
Unión General de
Trabajadores (UGT) y
Confederación Española
de Organizaciones
Empresariales (CEOE)
Acuerdo Básico
Interconfederal
1978
Definición del marco de
relaciones laborales democrático,
que influirá en los contenidos
laborales de la CE-78.
Acuerdo Marco
Interconfederal
1980
Acuerdo salarial
Comisiones Obreras
(CCOO), UGT y CEOE
Acuerdo Básico
para el Empleo
1981
Acuerdo salarial
CCOO y CEOE
Acuerdo
Interconfederal
1982
Acuerdo salarial
CCOO y CEOE
Acuerdo
Económico y
Social
1985
Acuerdo salarial
CCOO, UGT y CEOE
Acuerdo para la
Estabilidad en el
Empleo
1997
Medidas para impulsar la
estabilidad en el empleo
CCOO, UGT y CEOE
Acuerdo para
la solución
extrajudicial de
conflictos laborales
1998
Establecimiento de mecanismos
de arbitraje para la solución de
conflictos laborales al margen de
los tribunales
CCOO; UGT y CEOE
Establecen acuerdos salariales
para el año en curso
CCOO, UGT y CEOE
Acuerdo
Nacional para
la Negociación
Colectiva
2000-2008
Acuerdo para
la mejora del
Crecimiento y el
empleo
2006
CCOO, UGT, CEOE y
Gobierno
Sigue
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Acuerdo para
el Empleo y la
Negociación
Colectiva
2010
Establecen acuerdos salarias para
un periodo de tres años
CCOO, UGT y CEOE
Cuadro 2 - Principales Acuerdos Sociales Suscritos en España
Fuente: Elaboración Propia del Autor.
El método desarrollado en España, al igual que en la mayoría de los países de
la UE-15, para ir modificando el marco regulador de las relaciones laborales, ha consistido en la práctica del dialogo social, entendido como un procedimiento de debate
y puesta en común entre empresarios y sindicatos, con la presencia, en ocasiones,
del gobierno ac-tuando como juez y parte. Instrumento que ha sido y es fundamental, no sólo para la mo-dificación del marco de regulación de las relaciones laborales,
sino también para la propia estabilidad del sistema político y económico, aspecto este
último puesto de manifiesto en las duras condiciones políticas y económicas de la
transición española (1976-86).20 Incluso en los momentos en los que la concertación
está ausente, se erige en la protagonista del momento, precisamente por su ausencia.21
Fue un papel, el de la concertación social, singular en términos de estabilidad política
y social, que fue preciso para afianzar una dinámica de crecimiento continuado de la
formación bruta de capital, vía atracción de in-versiones externas o vía estimulo al
ahorro interno. Adicionalmente, desde la perspectiva del ajuste del mercado de trabajo
y de la subsiguiente política económica de equilibrio aplicada, la concertación social
introduce moderación salarial de manera más o menos sistemática y asume, al menos
implícitamente y en parte, el contenido de las diferentes reformas estructurales, que
también habrán de redundar en moderación relativa de los costes laborales.
20 Buena parte del proceso de transformación de las normas laborales ha sido concertado entre empresarios y trabajadores con los distintos gobiernos que en ese período hay en España. Connotación que afecta a la regulación, a
los cambios en la regulación y a la política de rentas que condiciona el desarrollo de la política social o del Estado
del Bienestar y que tiene como consecuencia el logro de un elevado nivel estabilidad social y política, factor indispensable para la propia transición política.
21 Como ocurre en la reforma de 1994, promulgada sin el beneplácito sindical, que dio lugar, posteriormente, a una
huelga general. Durante los 10 años de transición laboral, difícilmente podría explicarse el relativo clima de paz
social reinante –aparte del episodio de intento de Golpe de Estado de febrero de 1981– sin acudir a la concertación
social que impulsó las primeras fases de la reforma laboral y apoyó, en buena medida, la política económica de
ajuste. Téngase en cuenta que estas primeras etapas de la reforma laboral, en paralelo a la transición a la democracia, se llevaron a cabo en un contexto de fuerte desequilibrio en el mercado de trabajo, con tasas de desempleo que
alcanzaron en 1985 casi un veinticuatro por ciento.
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DIALOGO SOCIAL EN ESPAÑA
1ª FASE: Moderación salarial y construcción del Estado de Bienestar (1977-88)
2ª FASE: Ruptura del diálogo social (1988-1996)
3ª FASE: Diálogo social con reparos (1997-2004)
4ª FASE: Reconstrucción del diálogo social integral (2004- 2008)
5ª FASE: Ruptura del diálogo social (2009)
Cuadro 3 – Diálogo Social en España
Fuente: Elaboración Propria del Autor.
Así pues, la concertación social ha definido, por un lado, las pautas fundamentales de la regulación del mercado laboral y sus sucesivas reformas – con excepciones de des-acuerdo de los interlocutores con el gobierno, que han acabado
en reformas no pactadas – y por otro, ha marcado la pauta de la moderación sa
larial característica esencial del comportamiento de los mercados laborales en las
últimas tres décadas. Los diferentes acuerdos alcanzados con dimensión nacional
han participado de estas dos dimensiones reguladora y salarial. En un segundo
plano, se ha de hacer también mención a la concer-tación social institucionalizada
que se materializa en el continuo proceso de diálogo entre los interlocutores sociales que se lleva a cabo o bien, con carácter general, en el Consejo Económico
y Social o bien, con carácter más específico, según funciones o territorio, en diferentes organismos de las Administraciones publicas en cuyos consejos están presentes los interlocutores sociales (Consejo del INEM, de la Seguridad Social...) o
en los Consejos Económicos y Sociales de la Comunidades Autónomas. Las diferencias en los resultados que derivan de distintos tipos de negociación colectiva se
pueden apreciar en el incremento salarial resultante de los convenios negociados
en el ámbito empresarial y aquellos otros que lo son en un ámbito superior (en
un sector económico, para una pro-vincia, una comunidad autónoma e incluso en
todo el estado). En aquellos se observa como el crecimiento salarial pactado en
los convenios de empresa suele ser ligeramente inferior a los registrados en los
convenios de ámbito superior.
Una cuestión adicional que muestra la experiencia pasada relativa a los instru-mentos de la reforma laboral: se ha podido comprobar que la eficacia en su
aplicación ha sido siempre más elevada en los episodios de reforma logrados
a través del diálogo social y con acuerdos entre los interlocutores sociales, que
cuando los cambios se han llevado a cabo a través de decisiones unilaterales de
los gobiernos de turno. (RUESGA, 2005).
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El tercer elemento importante que incide en este proceso de cambio en las
relacio-nes laborales es la política laboral.22 En dos planos diferenciados: uno,
primero, de cambio normativo para introducir modificaciones importantes en la
relación laboral y otro, se-gundo, de implementación y desarrollo de las políticas
laborales activas. Es decir, inter-venciones arbitrarias desde el ámbito de lo público para modificar ciertos aspectos de la dinámica laboral, bien desde el lado de la
demanda incentivando la generación de empleo o bien, desde el lado de la oferta,
fundamentalmente con la cualificación de la mano de obra, es decir, mejorando el
capital humano. Desde el punto de vista de las modificaciones estructurales de las
relaciones laborales, la línea de actuación no es muy distinta a la que se promueve
en el resto de los países europeos, aunque sí con matices diferenciales importantes. El punto de arranque es la puesta en práctica de las políticas de oferta que se
generalizan no solo en el ámbito europeo, sino también en otras áreas y países.
No obstante, la ausencia de una política propia por parte de la UE, no ha de
signi-ficar la inexistencia de una política laboral comunitaria.23 En éste como en
otros muchos ámbitos de la política comunitaria, prima el principio de subsidiariedad y el diseño, la eje-cución y la financiación de las acciones políticas corren a
cargo de las administraciones nacionales y regionales hasta, incluso, de las locales.
La acción política comunitaria implica el diseño de estrategias comunes (mediante
la definición de objetivos y el diseño de líneas de acción), la coordinación de las
actuaciones nacionales y el seguimiento de su aplicación y la evaluación de los resultados alcanzados. La sensibilidad comunitaria en el terreno de la política laboral
es relativamente reciente y se retrotrae al inicio de la década pasada. La política
de estabilidad monetaria, en previsión de la creación de la Unión Monetaria, con
los desafíos que lleva consigo en materia de empleo y, sobre todo, los altos niveles
de desempleo, cosechados desde la década de los años setenta en la generalidad
de los países europeos, requerían una respuesta política coordinada en el propio
ámbito europeo.
El debate condujo a la incorporación del empleo como un nuevo capítulo
del Tra-tado (Título VIII), en Ámsterdam (1997), donde se identifica como una
cuestión de interés común, invitando a los Estados miembros a desarrollar una
estrategia coordinada para el empleo, en el ámbito europeo. Se reconoce el carácter estructural del paro en el Tratado de Maastricht y, a partir de aquí, se entiende
como necesaria la realización de actuaciones públicas para revertir la situación,
mediante estrategias de estabilidad macroeconómica, y políticas expresas contra el
22 Una revisión de este proceso se puede consultar en Ruesga (2002). Y uno de los primeros balances sobre este
tema se encuentra en Fina Sanglas (1999).
23 Atendiendo a los datos presupuestarios, las políticas de mercado de trabajo, tanto activas como pasivas, son de
carácter estrictamente nacional. Salvo el gasto que la Unión dedica al Fondo Social Europeo y a algunos programas
comunitarios específicos, no se encuentran otras partidas del presupuesto comunitario orientadas a modificar las
condiciones de desequilibrio de los mercados laborales. Extractado de: Ruesga; Pérez Ortiz y Silva Bichara (2005).
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desempleo. Es en la Cumbre de Luxemburgo, a finales de 1997, cuando se adopta
la Estrategia Europea de Empleo. El objetivo fundamental se planteaba avances
decisivos en el plazo de cinco años, que se cumplieron en el pasado 2002, especialmente en lo que se refiere al desempleo de larga duración y al desempleo de
los jóvenes. En esta Cumbre se establece una Estrategia Europea de Empleo, en
la que se definen los cuatro principios de actuación básicos que habrán de orientar
su acción en el futuro:
1. Empleabilidad: necesidad de introducir mejoras en la capacidad
de inserción pro-fesional, con el fin de llenar el vacío técnico; prevenir el desempleo de larga dura-ción y favorecer la inclusión de los
grupos más desfavorecidos. Sustitución de polí-ticas pasivas por
activas.
2. Desarrollo del espíritu de empresa: estimular el empleo autónomo, reduciendo la burocracia y señalando nuevas fuentes de empleo (desarrollar el potencial de acti-vidad del sector servicios)
3. Adaptabilidad: fomentar la capacidad de adaptación de los trabajadores y de las empresas a los cambios en el mercado laboral
(modernizar la organización del trabajo, contando con los interlocutores sociales).
4. Igualdad de oportunidades: facilitar la entrada de más mujeres
en el mercado de trabajo y la igualdad de trato en dicho mercado, y
conciliación de la vida laboral con la familiar.
Con posterioridad, en la Cumbre de Lisboa, 2000, y reuniones ulteriores de
Jefes de Estado se han ido estableciendo un conjunto de objetivos para el decenio
que se ini-ciaba, acompañados de una redefinición de la Estrategia Europea para
el Empleo, in-sertándola en un marco más general de crecimiento y estabilidad
económicos.
Algunas Reflexiones sobre el Futuro del Mercado Laboral
Español
De la lectura de las páginas anteriores, se puede extraer una secuencia sintética de la evolución y de la situación actual de mercado de trabajo español. A
partir de ahí, des-arrollando un esfuerzo sintético, es factible esbozar algunas de
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las líneas futuras de desarrollo del mercado y apuntar los retos que en el marco
institucional aún están pen-dientes, en aras de alcanzar un mejor equilibrio interno en el propio mercado de trabajo y de dotarle de mayores cotas de eficiencia en
su contribución al desarrollo económico ge-neral.
La oferta tiene aún, en el plano cuantitativo, varías incógnitas a despejar. De
un lado, la aún baja tasa de actividad femenina, que, de seguir las pautas de acercamiento a los estándares europeos aportará en los próximos años un contingente
nutrido de mano de obra para integrar en el mercado laboral. En esta misma línea
cabe esperar un aumento también de la tasa de empleo de la población activa
mayor de cincuenta años, frenándose las salidas del mercado hacia la inactividad
a edades tempranas. Y, por último, nos queda la incógnita de lo qué ocurrirá con
el flujo de población inmigrante, tan activo en la última década. Aunque parece
haberse frenado, al menos en términos relativos, el contingente anual de población que inmigra, no quiere ello decir que el flujo desaparezca de facto: al menos
seguirá alimentándose de procesos de reagrupamiento familiar y, también de nuevas entradas, en tanto siga en expansión el actual modelo productivo sectorial, de
demanda de mano obra no cualificada, de difícil concertación con la oferta nativa.
En el terreno salarial, mientras la creación de empleo se concentre en los
puestos de trabajo poco cualificados, el nivel salarial medio puede seguir una senda descendente, así como la participación de las rentas del trabajo en el PIB. Sólo
la mejora en la cualifica-ción puede trasladar impulsos positivos al nivel salarial
medio. No obstante, hay espacio para que desde el ámbito de la concertación social se promueva el crecimiento salarial (decretando mayores mínimos o pactando
niveles superiores en los suelos de los conve-nios) lo que podría constituir, manejado adecuadamente, un estimulo a la innovación y cualificación de los puestos de
trabajo, en suma a la búsqueda de mayores cotas de pro-ductividad.
La reforma laboral sigue abierta y, sobre todo, tiene que seguir abordando
los desequilibrios que aún persisten, en particular la dualización en la que está
inmerso el mercado de trabajo español. La agenda de la reforma laboral aún tiene
entre sus manos temas de singular trascendencia, que van desde la reducción de
la temporalidad (más allá de los logros obtenidos tras las modificaciones legales
introducidas con el último acuerdo social) hasta la siempre postergada reforma
de la regulación de la negociación colectiva, en aras de alcanzar mayores cotas de
productividad y de retribuciones salariales, y tra-tando de ordenar de manera más
eficiente las relaciones laborales internas, en la pers-pectiva de ambos interlocutores sociales.
Y, en el entreacto, a medida que la demanda de trabajo vaya transformando
sus cualidades a instancia de un mayor esfuerzo en I+D+i, los interlocutores
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sociales y la polí-tica laboral han de incrementar los recursos invertidos en una
mayor cualificación profe-sional de la mano de obra, la nativa y la importada recientemente y aún por llegar, así como en mejorar la eficiencia de las actuaciones,
públicas y privadas, a ello encaminadas.
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PARTE 3
SINDICATOS, GESTÃO
E ORGANIZAÇÃO
DO TRABALHO NUM
CONTEXTO DE
LIBERALIZAÇÃO
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REDES SINDICAIS EM EMPRESAS
MULTINACIONAIS: CONTORNOS DE UM
SINDICALISMO COSMOPOLITA? A EXPERIÊNCIA
DO RAMO QUÍMICO1
Leonardo Mello e Silva2
Introdução
Uma das vertentes do debate sobre o sindicalismo ou a crise do sindicalismo
(Leôncio Martins Rodrigues) reside nas possibilidades de o movimento sindical
cumprir um papel próximo a um movimento social (Michael Burawoy), ao invés
de concentrar-se em seus assuntos internos e virar uma espécie de gerente das
negociações coletivas. Neste último caso, o foco e o investimento do trabalho sindical se voltam para os interesses clássicos do emprego e dos direitos trabalhistas
adquiridos e consagrados no marco regulatório formal (leis, estatutos, costumes
etc.). A empresa ou a organização passa a ser o principal locus de atuação do
sindicato e também parâmetro contra o qual ele mede as suas realizações, suas
vitórias e derrotas.
O fenômeno de constituição de redes de trabalhadores em empresas multinacionais – incluindo nesse grupo empresas brasileiras que se internacionalizam e
se tornam multinacionais quando se instalam em outros países – parece estar próximo desse segundo perfil, embora seja uma resposta à globalização e se autorrepresente como uma superação do sindicalismo tradicional, ainda muito apegado a
um ponto de vista local e incapaz de enxergar as conexões econômicas e técnicas
que estão para além da empresa (ou da fábrica). (MUNCK, 2000; WATERMAN,
2005; WATERMAN; WILLS, 2001). Resta saber se tal sindicalismo cosmopolita
consegue fugir, de fato, de uma lógica administrativa e gerencial, recuperando
sua vertente valorativa como ator coletivo a propor alternativas solidárias de organização produtiva e social, ou se acaba capturado pela pauta de uma reforma
empresarial empurrada por atores sociais externos ao mundo do trabalho.
Como em todas as principais economias do mundo, o sindicalismo no Brasil
se vê corroído pela desafetação de suas bases, talvez mais moral do que quantitativa. Porém, essas circunstâncias não levaram forçosamente ao imobilismo ou
1 Trabalho anteriormente apresentado no 33.° Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), em Caxambu, outubro de 2009.
2 Doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH)-USP.
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à insistência em um discurso politizado e doutrinário, completamente avesso às
possibilidades de atuação dentro da ordem.
Ao contrário, os últimos anos têm assistido a um notável esforço do movimento sindical em acompanhar as políticas públicas e influir, sempre que o assunto
se refira direta ou indiretamente ao emprego, salário ou renda, na direção que essas
políticas venham a tomar. Com a administração Lula (de 2002 até o presente), tal
tendência se viu reforçada. Dentre as várias formas de intervenção nessa esfera,
pode-se mencionar a participação no Sistema Público de Emprego, em particular os
programas de qualificação profissional, subordinados ao referido sistema. No âmbito da relação privada entre empregados e patrões, o exemplo é a participação em
redes de trabalhadores de empresas multinacionais. A seu modo, ambas as iniciativas terminam por interferir – direta ou indiretamente – nas estratégias de gestão das
empresas. A hipótese aqui sustentada é de que, diante de tais iniciativas, as políticas
de recursos humanos se veem frente a balizas que podem dificultar ou favorecer a
adoção de um modelo global de Gerência de Recursos Humanos3.
Neste texto, será a experiência das redes o alvo da análise.
Obtenção de Dados
Para a confecção deste trabalho foram utilizadas basicamente duas fontes de
informação: entrevistas e participação direta em reuniões das redes. Foram feitas
entrevistas com representantes de Recursos Humanos (RH) de duas grandes empresas da área químico-farmacêutica, ambas de capital alemão e com expressiva
presença nesse segmento em nível mundial. Elas serão identificadas como Empresa A e Empresa B. Também foram realizadas entrevistas com sindicalistas do
setor e com um pesquisador de uma Organização Não-Governamental (ONG).
Foram acompanhados dois encontros das redes, um de cada empresa, ambos em
São Paulo, transcorridos entre abril e junho de 2009.
O Pano de Fundo das Redes de Trabalhadores de Empresas
Multinacionais: A Responsabilidade Social
As redes de trabalhadores organizadas em nível internacional (regional por
ora; global na intenção) são parte de um repertório que inclui outras iniciativas
onde os sindicatos buscam estar presentes e atuar de maneira concertada com
3 A sigla em inglês é International Human Ressource Management (IHRM), sem correspondência em português.
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Estados, empresas e organismos sociais diversos, inserindo uma “cunha” social
ou trabalhista nas instituições que, de uma forma ou de outra, tentam fazer face à
globalização. Essas instituições são, preferencialmente, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Organização Mundial do Comércio (OMC), a Organização das Nações Unidas (ONU) e as federações sindicais internacionais (ou, como
alguns designam, “sindicatos globais”). O discurso que permeia tais instituições
é o da responsabilidade social corporativa, ele próprio um elemento derivado de
uma preocupação maior com a responsabilidade social ou ética no comércio e na
economia de maneira mais ampla.
Não se sabe ao certo qual é o impacto preciso que o chamado mercado ético
ou de produtos éticos4 tem hoje em dia vis-à-vis ao comércio normal. Estatísticas
mencionam que esse tipo de comércio já cobre de 1% a 4% do comércio global.
(WICK, 2003). Seja como for, é certo que ele se expande e invade inadvertidamente o mundo do trabalho por conta, entre outras coisas, da sua associação com
o tema da responsabilidade social das empresas. A responsabilidade social corporativa é parte de um contexto mais largo que engloba a responsabilidade social
e do comércio, onde a busca por um tratamento preferencial para os produtos
éticos é pedra de toque.
Várias iniciativas podem ser declinadas como estando dentro do espírito da responsabilidade social corporativa ou empresarial. A seguir, listam-se algumas delas.
I) Consumo Ético e Comércio Equitativo: a ideia subjacente é de que o
comércio justo ajuda a melhorar a renda e os benefícios sociais das populações
mais pobres que se dedicam à produção desses bens, sobretudo na agricultura.
As organizações e as empresas que promovem o comércio justo tinham, inicialmente, como alvo preferencial essas populações. Contudo, ao longo do tempo,
foram incluídas também as atividades industriais, uma vez que era incontornável
a importância desse setor para o desenvolvimento dos países da periferia ou do
Terceiro Mundo.
Por outro lado, as famílias do Primeiro Mundo orientariam suas preferências
de consumo para empresas que trabalham com produtos oriundos do fair trade.
Essa orientação seria, sobretudo, por razões de consciência, não por razões econômicas. As razões incluem o respeito aos direitos humanos no trabalho, a intolerância com relação ao trabalho infantil, ao trabalho escravo, a não discriminação
a imigrantes (ao contrário, favorecendo ativamente, em alguns casos, o aproveitamento de imigrantes em sua força de trabalho), o uso de fontes alternativas
4 Isto é, itens produzidos de maneira ética (para uma melhor compreensão do que comporta praticamente este
termo, ver parágrafo adiante).
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de energia não agressivas ao meio ambiente, o emprego de produtos e matériasprimas não poluentes, a preocupação com a sustentabilidade etc.
II) A cláusula social da OMC: a regulamentação do comércio mundial é vista
por uns como ingerência indevida ao livre comércio, enquanto que, para outros,
ela poderia trazer sanções comerciais aos países que têm dificuldade de competir.
Aqui reside um problema complicado, pois cláusulas sociais para o comércio podem significar protecionismo dos países mais ricos contra os países em vias de desenvolvimento. A mesma cautela aparece no momento de definir a forma de ação
adequada contra os países que não adotam o direito à livre negociação (prevista
pela OIT): embora a favor da inclusão da cláusula, alguns se mostram contrários a
boicotes a esses países. Argumentam eles que uma coisa é favorecer o surgimento
de mecanismos de representação dos trabalhadores onde estes não existam; outra
muito diferente é criar esses mecanismos, o que já seria uma ingerência indevida
da empresa. Por outro lado, em países com tradição corporativista-populista, a
liberdade de associação sempre foi vista com desconfiança, dada a identificação
com uma possível estratégia de criar sindicatos paralelos que dividam e fragmentem o movimento sindical.
Outros ainda chamam a atenção para o fato de que a OMC não seria o fórum mais adequado para veicular cláusulas trabalhistas, uma vez que sua atuação
está associada justamente à globalização neoliberal, fonte das mazelas dos trabalhadores no mundo. (O’BRIEN, 2000).
A Confederação Internacional de Organizações Sindicais Livres (CIOLS)
é a favor de uma cláusula social no âmbito da OMC, mas essa posição é – ou
pelo menos era – polêmica. Os críticos chamam a atenção para a vista grossa
da OMC em relação aos tratados bilaterais de comércio e ao estabelecimento de
zonas francas nos países do Terceiro Mundo, iniciativas que não levam em conta
os standards mínimos de condições de trabalho tais como previstos, por exemplo,
pela OIT (ver abaixo).
III) Códigos de Conduta: são instrumentos, no âmbito da empresa, que asseguram normas mínimas de uso do trabalho, evitando as suas formas mais opressoras e eticamente condenáveis. Estas últimas podem ser entendidas por: discriminação ou assédio; trabalho infantil ou forçado; ambiente insalubre ou perigoso;
desrespeito à jornada de trabalho; desrespeito às leis de maneira geral; recusa ao
direito de reunião e associação; perseguição e controle dos empregados; ausência
de capacitação e de promoção; trabalho informal; não informação; inexistência
de aviso prévio, entre outras que poderiam entrar nesse rol. A título de contra-
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ponto, pode ser identificado aí o conjunto de reivindicações que conformavam
as bandeiras democráticas do momento de retomada do sindicalismo brasileiro,
trinta anos atrás.
Os códigos de conduta podem ser fruto de uma iniciativa da própria empresa interessada, de organismos internacionais, de associações ou de organizações
representativas dos próprios interessados (ONG’s e sindicatos). Quando é iniciativa da própria empresa, isto é, voluntário, o código de conduta não contempla
necessariamente (ou, melhor dizendo, obrigatoriamente), a presença e participação sindicais. Aliás, uma das sérias objeções endereçadas aos códigos de conduta
voluntários é o fato de apresentar-se algumas vezes como substituto do sindicato
ou de outro órgão de representação de classe, na medida em que os acordos e
contratos coletivos seriam, neste caso, considerados impertinentes, porquanto a
empresa já teria o seu próprio código de práticas do trabalho.
Quanto aos organismos internacionais, os mais importantes códigos de conduta são aqueles saídos da ONU - Pacto Global, de 1999; Desafios do Milênio;
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - Linhas
Diretivas da OCDE para Empresas Multinacionais, de 1999 e 2000; OIT - Declaração sobre os Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho, de 1998; CIOSL
- Código Básico de Prática Trabalhista, de 1997, entre outros. Seu alvo preferencial são os setores mais frágeis em termos de organização sindical; aqueles cuja
presença de representantes dos trabalhadores é inexistente ou combatida pelo
patronato. Entram nessa definição os setores têxteis de confecção e de calçados,
onde a presença de mão-de-obra ainda é significativa, além de concentrada principalmente nos países do Terceiro Mundo. Prestam-se, sobremaneira, à subcontratação, pela possibilidade de sublocar partes da produção para oficinas pequenas e
às vezes até domésticas. Em suma, setores de mão-de-obra intensiva, cuja cadeia
produtiva é fortemente internacionalizada, imperando na maioria dos sítios um
trabalho de baixa qualidade (informalidade, baixa ou nenhuma regulação em termos de duração, intensidade, saúde e segurança, trabalho infantil etc.).
IV) Acordos-Marco: são aqueles que são assinados entre empresas multinacionais e as federações globais de sindicatos, organizadas por ramos de atividade,
e que buscam extrair um código de conduta social para a empresa e seus fornecedores, onde quer que ela se localize (matriz, filiais ou subsidiárias). Em outras
palavras, buscam a constituição de um acordo-marco global para a empresa em
questão. Pressupõem uma relativa presença sindical capaz de forçar à montagem,
efetivação e acompanhamento dos acordos (diferente, portanto, dos códigos de
conduta descritos acima, onde a participação sindical não é condição necessária).
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Qual o Significado da Responsabilidade Social para a
Empresa?
Pode-se dizer que o maior temor, para a estratégia de negócios de uma grande
empresa global, é ter seu nome associado a uma prática injusta, ecologicamente
danosa ou socialmente irresponsável. A marca conta porque a guerra midiática é
utilizada como arma competitiva, além de prover argumentos para a consciência
crítica da opinião pública. Neste sentido, qualquer um dos enquadramentos éticos
– Comércio Equitativo, Cláusula Social da OMC, Códigos de Conduta ou AcordoMarco – é importante para a empresa. O peso de cada um daqueles instrumentos,
contudo, varia de acordo com o ramo de atividade, o porte, a origem do capital e o
histórico das relações de trabalho. Eles constituem, antes de tudo, uma referência
posta por atores sociais originalmente estranhos à empresa, com relação à qual ela
não pode mais tergiversar, sob pena de abalar sua imagem corporativa (quando uma
grande empresa emite um código de conduta de maneira unilateral, portanto, isso
pode estar indicando não uma escolha voluntária, mas uma exigência da situação).
Um indicador geralmente utilizado no sentido de medir o aprofundamento
do conteúdo democrático dos acordos e sua efetividade prática é verificar o grau
de independência das auditorias e de seu monitoramento: quanto mais distantes
da própria empresa, maior a possibilidade de isenção. No entanto, nem sempre
é fácil discernir o quanto as empresas de auditora formalmente independentes
estão de fato desvinculadas dos interesses das grandes corporações, pois estes
podem se esconder de diversas maneiras, dado o poder de pressão que exercem
no mercado. Ademais, é preciso especificar detalhadamente em que consistem
tais auditorias, pois elas devem contemplar um acompanhamento rigoroso não
apenas da empresa, mas também de suas subcontratantes, e não limitar-se a umas
poucas inspeções, com intervalos bem dilatados no tempo entre uma e outra.
Assim, uma constatação teoricamente relevante que esses movimentos recentes permitem adiantar é que uma determinada modalidade de questão social,
que ecoa fora dos muros da fábrica, tem demonstrado algum poder de pressão
sobre as políticas internas da empresa. De algum modo, essa nova arena – a do
embate ético – recupera alguma margem de manobra para uma intervenção política saída dos atores coletivos tradicionais do mundo do trabalho.
Porém, nem tudo são flores no caminho da responsabilidade social. Este
não é um tema isento de conflitos. Há um conjunto de objeções, políticas e de
concepção, que a fórmula esboçada acima – com tudo o que a ela ficou associado
– enfrentou no passado e que, de algum modo, transfere-se para o presente.
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Os Problemas no Caminho
O primeiro dilema real que as campanhas do comércio ético e da responsabilidade social devem enfrentar diz respeito a um argumento da divisão internacional do trabalho: bater nas multinacionais e suas fornecedoras atuando no Terceiro
Mundo pode significar supressão de postos de trabalho – formal ou informal,
mas de toda forma melhores do que os oferecidos pelas empresas locais – e, por
isso, colocar os trabalhadores contra as ONG’s e os sindicatos. Esse tipo de dilema esteve muito presente no início dos movimentos de resistência internacional à
globalização, no âmbito sindical.
Havia ainda o receio, no rescaldo das polarizações saídas do ambiente da Guerra
Fria, de que o ataque às organizações nacionais pudesse fazer parte de um jogo de
influências políticas no tabuleiro do equilíbrio de poder das organizações mundiais
de sindicatos. O próprio desenvolvimento do processo de integração das economias
encarregou-se de dirimir tal receio, e a desconfiança em relação às ONGs aos poucos
também foi se transformando de uma atitude de desconfiança inicial até uma postura,
que prevalece atualmente, de franca colaboração. (JAKOBSEN, 1998).
É preciso lembrar que durante o período de repressão à organização sindical
em alguns países do sudeste asiático, as ONG’s funcionaram efetivamente como
equivalentes funcionais do sindicato, com papel de organização e mobilização entre
os trabalhadores. (WEBSTER; LAMBERT, 2005). Esse lado ativo e partisan das
ONGs relativiza a queixa de que eventualmente a sua atuação nas relações de trabalho pode ser uma forma velada de buscar substituir os sindicatos. Pode-se perceber
que esse tipo de queixa vem caminhando pouco a pouco para o descrédito5.
De todas as fontes potenciais de conflitos elencadas acima – a competição
por empregos baratos, a competição organizacional entre estruturas sindicais e o
papel das ONGs -, certamente o argumento da divisão internacional do trabalho
é o que se mostra mais sensível e persistente.
As objeções de cunho mais prático não questionam doutrinariamente a responsabilidade social, o comércio ético ou os códigos de conduta das empresas.
Eles fustigam o alcance real dessas iniciativas e o grau de comprometimento delas
com os seus parceiros do lado trabalhista. Nesse caso, as posturas críticas substituem uma posição de recusa total por uma espécie de ceticismo ativo, isto é,
optaram por acompanhar à risca a implementação e difusão das normas sociais
ao longo da cadeia produtiva.
5 Entre outras razões, pelo fato de que algumas das novas ONGs são formadas ou incluem egressos do próprio
movimento sindical.
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As Fontes de Regulamentação e os Interesses em Jogo:
Empresas e Sindicatos no Brasil
São dois os principais conjuntos de normas internacionais sobre os direitos
do trabalho: as convenções da OIT e as Diretrizes da OCDE. Nas primeiras, os
signatários são os países, não as empresas. As convenções não têm força legal; são
antes sugestões que podem ou não ser acolhidas pelos governos. Para que sejam
incorporadas no arcabouço regulatório local é preciso que sejam aprovadas pelo
Congresso Nacional. Elas são apreciadas separadamente e tratam de temas tais
como o trabalho infantil ou forçado; a liberdade sindical; as formas de discriminação no trabalho em suas diversas variantes; saúde e segurança, entre outras.
A Convenção 87, que trata da liberdade sindical, nunca foi aprovada, pois é incompatível com a unicidade da representação, que ainda vigora formalmente. O
problema maior, quanto a esse tema, reside no interior do próprio lado sindical,
pois as principais centrais têm visões divergentes sobre o assunto. Com respeito
às convenções que foram aprovadas, contudo, a força constrangedora se faz presente e pode ser invocada pela parte prejudicada.
Já no caso da OCDE, onde o Brasil não é membro, mas tem o estatuto de
convidado (juntamente com outros países da América Latina), as empresas de
origem dos países-membros aqui instaladas devem ter as suas dez diretrizes dos
direitos dos trabalhadores acompanhadas e verificadas internamente. A responsabilidade por essa tarefa é delegada a um “ponto de contato nacional”, cuja indicação é feita pelo Ministério de Fazenda. As denúncias de violação das diretrizes são
recebidas por essa espécie de “antena” da OCDE, estando credenciadas a fazê-las
as federações de ramo de atividade e as centrais sindicais do País, chamadas Federações de Segundo Grau. O Ponto de Contato Nacional não é um órgão com
poder de sanção, mas apenas administrativo. Tanto as convenções da OIT como
as Diretrizes da OCDE, como se pode perceber, pressupõem uma forte formalização e densidade da representação coletiva do trabalho – centrais e federações
sindicais são os interlocutores escolhidos. Com essa exigência, a convergência
organizacional entre as centrais (principalmente a CUT e a Força Sindical) passa
a ser uma decorrência natural6, uma vez que é o próprio processo de negociação
em nível internacional que solicita uma voz mais ou menos unificada (veja-se o
problema da Convenção 87 da OIT) pelo lado trabalhista.
Os acordos-marco assinados por grandes empresas com as federações globais de ramo de atividade não parecem ser uma realidade que tenha se estendi
6 Uma visão de dentro que aborda indiretamente essa questão pode ser encontrada nas entrevistas de Geraldino dos
Santos (Força Sindical) e Carlos Alberto Grana (CUT) em Estanque et al. (2005).
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do para as suas subsidiárias no Brasil. Um receio pode estar na possibilidade de
propalar o padrão de relações com os empregados que vigoram na matriz para
as subsidiárias no Sul. Por outro lado, o argumento formal aventado por essas
últimas é de que o movimento sindical no Brasil é muito fragmentado e carece de
unidade de representação, sendo, portanto, um obstáculo para o estabelecimento
de acordos com alto poder de incidência entre as partes: as empresas podem estar
localizadas em municípios cuja base sindical não se filia a uma federação que, por
seu turno, esteja vinculada a uma central que possua uma política de apoio e de
estímulo a esse tipo de iniciativa, por exemplo. O próprio desenho institucional
do lado trabalhista dificultaria o acordo-marco.
Seja como for, as filiais ou subsidiárias das grandes empresas internacionais
têm à disposição um trunfo estratégico, que é o de poder manipular, segundo
a conveniência, duas estruturas organizacionais – a nacional e a internacional:
invoca-se o padrão corporativo (o anátema de burocrática e vetusta para a estrutura sindical, no que se refere à negociação, também deve ser adicionado aqui)
para minar a viabilidade do padrão internacional de parceria e de responsabilidade
social; alternativamente, essa mesma estrutura mantém comodamente à distância
o padrão europeu de relações do trabalho, benéfico para os trabalhadores do Sul7.
Do ponto de vista dos sindicatos, tanto do Norte quanto do Sul, há, por
seu turno, bases objetivas de convergência. Os sindicatos dos países desenvolvidos têm interesse em que salários e condições de trabalho não funcionem como
atrativo para a deslocalização da produção das matrizes para áreas do globo desprotegidas, onde o poder trabalhista é fraco ou nulo. Já os sindicatos dos países
periféricos têm interesse na extensão do padrão europeu de relações de trabalho
e emprego para a região, por intermédio de acordos internacionais com empresas
que sejam feitos tendo por base um patamar por cima.
Mas, no caso do Brasil, essa aparente convergência esbarra em problemas
estruturais, devidos à própria organização, conforme já se fez menção acima.
Quando uma empresa metalúrgica alemã com implantação em todos os estados
brasileiros adquiriu uma antiga planta de fabricação de elevadores, no Rio de Janeiro, seus ex-trabalhadores não foram aproveitados, o que gerou uma mobilização e, depois, uma organização que acabou induzindo à formação de uma rede
nacional da empresa, evoluindo, em seguida, para uma rede internacional. Uma
das maiores dificuldades foi justamente administrar os pertencimentos coletivos,
pois cada uma (a atual e a antiga empresa que foi incorporada) era ligada a um
sindicato diferente, com um contrato de trabalho diferente.
7 “Sul” aqui é entendido não na sua acepção geográfica, mas em sua acepção econômica na divisão internacional do
trabalho: países do Sul = periferia; países do Norte = centro do capitalismo.
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Às dificuldades devidas à organização sindical, devem-se adicionar as variações de orientação política no interior das centrais. Dentro da Central Única dos Trabalhadores (CUT) há correntes controlando sindicatos que veem na
negociação com empresas uma modalidade condenável de colaboração, porque
coloca a entidade exercendo um papel que não é o dela. Fato recente transcorrido
com o Sindicato de Metalúrgicos de Campinas demonstra o quanto essa fonte de
tensão pode abortar a tentativa de um acordo: depois de a direção internacional
da empresa (autopeças, capital alemão, partidária da responsabilidade social) ter
evoluído para a proposição de instauração de um fórum que incluísse os seus
empregados, a fim de discutir questões internas, a ideia não foi avante por causa
da recusa do sindicato em negociar com a direção da empresa.
Em suma, para que haja um acordo-marco, as condições a serem preenchidas deveriam ser as seguintes: em primeiro lugar, é imprescindível que o sindicato
tenha recursos de poder que sejam reconhecidos pela outra parte, isto é, é preciso
que seja fortemente representativo. Nas palavras de um dos entrevistados, o interlocutor só negocia com quem tiver algo para negociar. Em segundo lugar, pelo
lado dos empresários, é preciso que haja disposição para levar a cabo um contrato
internacional. Finalmente, é preciso que as empresas gozem de estabilidade nos
países em que estão implantadas como subsidiárias.
As Normas Sociais Internacionais e o Trabalho
Qual é o grau de interferência que os acordos-marco acabariam tendo na vida
produtiva das empresas, isto é, em seu processo de trabalho? Para responder a essa
pergunta é preciso considerar dois níveis distintos: o primeiro é o das políticas ou
estratégias de gestão seguidas por essas empresas; o segundo é saber em que medida
tais políticas são 1) convergentes com as normas sociais ou protocolos contidos nos
acordos; 2) relativamente convergentes com eles; 3) incompatíveis com eles.
Como as chamadas Boas Práticas de Produção (Good Manufacturing Practices)
em geral contêm uma série de sugestões que estão também previstas nas normas
sociais encontradas em acordos-marco, em códigos de conduta e nas resoluções dos
organismos internacionais, é de se supor que não deveria haver muita turbulência
entre as primeiras e as segundas. As grandes empresas multinacionais, em geral,
incorporam os padrões gerenciais das boas práticas, fazendo deles parte de sua
política interna de recursos humanos. Resta saber se essa política é internacional,
deslocando-se também para as suas subsidiárias no Sul. Neste último caso, poderíamos falar de um isomorfismo matriz-subsidiária quanto às relações de trabalho.
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Por outro lado, é lícito conjecturar que se há uma boa governança corporativa,
ela deve integrar a observância da regulamentação oriunda das instituições internacionais, inclusive quanto a sua política interna no relacionamento com os empregados. Essa situação é idealmente diferente entre as pequenas e médias empresas de
capital nacional, pouco ou nada internacionalizadas, pois a possibilidade de haver
uma afinidade eletiva entre as normas sociais e as políticas internas de gestão do
pessoal são menores aí: não havendo uma política definida de recursos humanos
do tipo boas práticas, não há por que cobrar uma coerência com as normas sociais
porventura seguidas por elas. Estas últimas tendem a afetá-las quando aquelas empresas se veem diante da contingência de operar como fornecedoras das grandes.
As redes de trabalhadores de empresas multinacionais são instâncias criadas
por iniciativa bipartite (empresas e trabalhadores) e têm uma relação muito próxima com os acordos-marco: quando tais acordos não existem, o intuito é trabalhar
para o seu estabelecimento; quando eles já existem, a preocupação é mantê-los e
estendê-los.
É interessante ver as redes de trabalhadores como uma espécie de meio
caminho até o acordo-marco.
A pergunta de como os acordos-marco podem afetar a política interna das
empresas pode ser respondida em dois âmbitos diferentes, ainda que complementares: 1) o da política de gestão (ou recursos humanos), como já se referiu acima,
e 2) o das relações de emprego.
Com respeito às relações de emprego, entra em cena a questão do possível
conflito entre a regulação normativa local (no caso, nacional) e a regulação internacional, conforme já referido. Onde as relações de emprego teriam mais chance
de apresentar grandes divergências entre o ideal (contido nas cláusulas sociais dos
documentos da OIT e da OCDE) e o praticado, seria justamente entre as pequenas e médias, não nas grandes, onde a representação por local de trabalho, as condições de saúde e segurança, os benefícios e outros são mais facilmente seguidos.
Com relação às subcontratadas, o raio de incidência dos acordos é inversamente
proporcional à sua aproximação do polo da grande empresa: quanto mais próxima da grande empresa, maiores as chances de seu sistema de relações de trabalho
ser afetado, enfraquecendo-se à medida que se aproxima dos elos externos da
cadeia, onde justamente o poder de constrangimento dos acordos se dilui.
Tecnicamente, a relação entre cliente e fornecedor é uma relação entre dois
entes privados diferentes, ou seja, entre empresas diferentes. Uma regra que inci-
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disse nessa relação estaria estendendo seu âmbito de aplicação para além da organização e estaria considerando, por tabela, uma acepção estendida desta última.
Esse é um passo significativo para uma cultura empresarial (como a brasileira),
com grande dificuldade de colocar os assuntos das relações industriais em um
plano coletivo. Na entrevista com o representante da Empresa A, por exemplo,
ficou explícita a incompatibilidade entre a empresa e o sindicato empresarial que
a representa na negociação coletiva - o CEAG-10, grupo das empresas do ramo
químico na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP): “A Empresa A delega ao CEAG-10 [a negociação com os sindicatos de trabalhadores], mas
a Empresa A não se senta à mesa de negociação com o CEAG-10”.
É importante o envolvimento dos sindicatos nos acordos, pois eles são a
maior garantia de que as boas práticas de produção sejam efetivamente aplicadas
e, sobretudo, de que sejam estendidas ao longo da cadeia produtiva. Os sindicatos
têm o papel histórico de acolchoar certas práticas oportunistas e deletérias, tanto
no âmbito interno (organização) quanto no âmbito intraorganizações, atuando
como um agente civilizatório, por assim dizer, enquanto as preocupações mais
urgentes das empresas dizem respeito à economia de custos, ao crescimento dos
lucros e à redução das incertezas.
Contudo, problemas de coordenação entre subsidiárias e matrizes, e entre
clientes e fornecedores (qualidade, prazos, escala etc.), poderiam ser mais facilmente equacionados na presença de uma prática contínua de negociação. Os
acordos-marco poderiam acabar funcionando nessa direção, adicionando um elemento de confiabilidade nas relações interempresas, da mesma forma que já o faz
na relação entre capital e trabalho. Os sindicatos poderiam ajudar a administrar
os problemas nas cadeias produtivas, limpando o terreno, por exemplo, quando
se tratar de vigiar o emprego das boas práticas. Por hipótese, se eventualmente o
setor de compras não verifica de maneira previdente a origem de certos produtos
dos fornecedores e suas condições de produção, ONGs ou sindicatos, desde que
comprometidos no acordo, poderiam funcionar como sinalizadores de práticas
condenáveis de uso do trabalho na cadeia produtiva. Os atores sociais, nesses
casos, fariam o trabalho que funcionalmente estaria atribuído ao setor de compras
da empresa.
Outra visão enfatiza, ao contrário, a responsabilidade das empresas
numa esfera que é precipuamente dela – as relações econômicas com subsidiárias e fornecedoras – e onde o sindicato não deveria interferir além da
exigência de aplicação das regras gerais da OIT (consideradas mais protetoras para o trabalho).
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No que concerne propriamente às relações de trabalho, o interesse reside
em medir o grau de influência das normas sociais saídas de acordos-marco – ou,
a rigor, de qualquer outro instrumento regulatório – nas políticas de recursos
humanos das empresas. Vendo na perspectiva da subsidiária – como é o caso
deste estudo exploratório – a pergunta atualiza uma antiga questão, muito debatida quando a temática dos transplantes dos modelos de produção estava em
plena voga, que é o da transferência dos métodos de gestão de produção e do
trabalho da matriz para a filial no terceiro mundo. Com a difusão dos programas
de qualidade total e, mais recentemente, as políticas de recursos humanos de alta
performance – e que no Brasil têm sido traduzidos pela sua variante de boas práticas de produção – como políticas corporativas em tese globalmente integradas,
haveria que desagregar como que a primeira onda da segunda. A primeira seria
aquela onde os problemas estariam concentrados nas questões de convergência,
adaptação ou hibridação, grau de centralização, inovação ou divergência de padrões de gerência global da matriz quando transferidos para a subsidiária, ou seja,
problemas internos à organização. A segunda onda seria aquela onde as questões
bastante similares surgem da necessidade de adequação (onde não há) das normas
sociais internacionais à política de recursos humanos, sendo que, neste último
caso, o vetor da mudança é externo à organização.
Nas abordagens com responsáveis de RH nas duas empresas da amostra
há um esforço em marcar a compatibilidade da orientação oriunda da responsabilidade social com as políticas já adotadas pelas subsidiárias no Brasil,
embora não se faça menção explícita a nenhum instrumento de gestão em
particular. Em todo o caso, é lícito adiantar a hipótese de que os acordos-marco aprofundam as mudanças de tipo mais sistêmico nas empresas, prevendo
a participação da força de trabalho, a representação sindical, a melhoria do
ambiente de trabalho e também o grau de envolvimento (commitment) dos
empregados, além de orientar-se para programas assistenciais no bairro (caso
da Empresa B, tanto na planta de São Paulo quanto no Rio de Janeiro). Com
respeito à inovação propriamente dita, intervém outro componente, próprio
do setor: o ramo químico-farmacêutico é dominado por grandes grupos multinacionais, e o estímulo ao desenvolvimento interno do produto é muito
baixo, uma vez que boa parte das matérias-primas é importada. Mas é possível
observar uma preocupação com a capacitação mínima do pessoal operário
(Empresa B) quando da incorporação do novo plano de cargos e salários,
matéria de acirrada discussão no momento da pesquisa de campo, uma vez
que ele visa elevar o patamar de qualificação em diversos âmbitos (escolaridade, experiência, disciplina, cursos etc.), relacionando-o a uma nova grade de
postos de trabalho.
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Até aqui mencionou-se a relação da responsabilidade social com as “boas
práticas”, e destas últimas com a rede de fornecedores. Mas a relação entre responsabilidade social e a organização do trabalho ainda permanece um tanto vaga:
afinal, no que exatamente a aplicação das normas sociais propostas pelos organismos internacionais interfere no dia-a-dia do trabalho? Pode-se tentar responder
a esta pergunta da seguinte maneira: o elo está no aprofundamento da produção
enxuta (lean production) em sua versão high road. Se, como afirmam alguns autores da literatura gerencial - para uma visão geral, veja-se Appelbaum et al. (2000) é
possível desagregar um high road de um low road na trajetória de implantação dos
sistemas de produção baseados nas ideias gerais da produção enxuta, então fica
nítida a correlação entre essas ideias e certas proposições contidas nas Normas
Sociais, que são reapropriadas pelas empresas.
As evidências vêm das indicações contidas nos códigos de conduta ou nas
tratativas entre empresa e rede de trabalhadores (a fonte são as próprias publicações dessas redes) que permitem verificar, em seu conjuno, o reforço do ideal da
empresa como um ente mais que econômico, ou seja, como um ente social que
promove integração e adesão aos seus valores. Sobre o que versam esses códigos
ou essas tratativas? Entre os muitos aspectos que eles cobrem, convém deter-se
em alguns princípios gerais desses códigos. Eles enfatizam o desacordo com respeito a determinadas posturas oportunistas, consideradas como não desejáveis e
como objeto de sanção: tais posturas variam desde a concorrência desleal (portanto, um tópico que está na esfera do mercado de produtos), até o comportamento
de desconsideração para com a sociedade (o que pode ser entendido de diversas
maneiras e ser aplicado a diversas interpretações), passando pela condenação do
segredo e da ocultação de posturas que atentam contra os interesses da empresa
ou que ponham em dúvida a dedicação do empregado a ela. Enfim, em seu conjunto, tais normas reforçam os vínculos não apenas contratuais dos empregados,
mas também de comprometimento com a empresa, isto é, de filiação a ela. No
conjunto, essas indicações podem ser lidas como partes de um discurso que transfere a questão social para um assunto privado.
Não sendo uma decorrência direta das normas sociais do tipo “Dez Diretrizes dos Direitos dos Trabalhadores da OCDE” nem da “Declaração sobre os
Direitos e Princípios Fundamentais no Trabalho da OIT”, do “Pacto Global” ou
“Desafios do Milênio”, da ONU, a invocação fácil a essas normas para legitimar
o discurso de integração empregado-empresa, contudo, é o que permite inferir
uma adequação entre ambos, reforçando nessa medida uma determinada postura
no chão de fábrica.
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A prova de que os sindicatos não estão à vontade e pressentem as dificuldades relacionadas com a aceitação das normas sociais como forma de capturar
o seu consentimento pode ser encontrada na advertência de que, sempre que
possível, o movimento sindical deve preferir a legislação à autorregulação. Em
outras palavras, os sindicatos devem sempre preferir acordos que comprometam
os governos e as instâncias estatais, ao invés do voluntariado. (OBSERVATÓRIO
SOCIAL, 2004). Isso é o reconhecimento do perigo de acordos do tipo “Códigos
de Conduta” resvalarem de uma regulação pública para uma regulação privada,
isto é, confinada ao âmbito da empresa. Mas a advertência limita-se aos aspectos
formais do acordo e não entra na realidade da organização e da gestão dos recursos humanos, que permanecem um campo em disputa. Tudo se passa como se o
bem-vindo reconhecimento da organização por local de trabalho8, reivindicação
histórica do movimento sindical cutista e ainda uma bandeira pertinente, fosse suficiente para garantir a independência dos papéis de trabalhador e de colaborador
como duas identidades distintas ou duas culturas de classe9. As Boas Práticas de
Produção, assim como as orientações do Recursos Humanos de Alta Performance ou Gestão Internacional de Recursos Humanos, ao contrário, caminham no
sentido de fundir as duas identidades.
As Empresas do Ramo Químico no Contexto da
Responsabilidade Social
O ramo químico-farmacêutico é muito concentrado, quase integralmente
formado por gigantes de negócios globais, grande parte de origem europeia. No
Brasil, suas subsidiárias são grandes empresas, às quais está associada uma posição pró-ativa em termos de responsabilidade social quando comparada com a de
outros ramos de atividade. Não costuma haver grandes problemas internos em
termos de relações de trabalho, de condições de saúde e segurança, ou de queixas
quanto à discriminação10. Ao contrário, elas parecem querer se colocar na vanguarda da nova preocupação ética. A Bayer, por exemplo, foi uma das primeiras
empresas no Brasil a explicitar um compromisso de conduta empresarial, ou seja,
a fazer um pronunciamento público que responde a algumas das preocupações
da agenda da responsabilidade social. Isso pode ser atribuído, em alguma medida,
8 Todos os documentos sindicais fazem menção a esse reconhecimento como sendo um dos grandes avanços de
iniciativas tais como a das redes de trabalhadores e a da busca por acordos-marco globais. Sendo uma realidade
consolidada há muito tempo nos contratos coletivos dos sindicatos europeus, a ideia é de que a organização por
local de trabalho seria transferida quando esses acordos fossem ratificados pelos parceiros no Sul.
9 Uma excelente demonstração da existência social de duas culturas de classe associadas a gerações de trabalhadores
está em Beaud e Pialoux (1999).
10 Os problemas estão concentrados na cadeia produtiva.
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à cultura empresarial nos países de origem e também ao peso do movimento
sindical ali.
Um dos pontos positivos da constituição das redes é que ela ajuda a consolidar
a ideia de discutir os problemas internos das empresas de um ponto de vista menos
oficialista, onde o sindicato tradicionalmente tem pouca penetração. As reuniões da
rede são realizadas dentro da empresa, dela participando, pelos estatutos, as comissões de fábricas (no caso de existirem11), dirigentes dos sindicatos e trabalhadores
eleitos ou escolhidos especialmente para esse fim. Sindicalistas da CUT buscam
inserir uma cláusula em que os dirigentes do sindicato devem ser necessariamente
funcionários da empresa, com isso evitando um distanciamento entre base e cúpula.
O que unifica o discurso tanto de sindicalistas quanto de empresários, no caso
das redes de trabalhadores, é o conceito de diálogo social. Ambos reivindicam a fidelidade aos princípios da responsabilidade social em sentido amplo e ao código de
conduta – quando este existe – em sentido estrito. Este último prevê a participação
de empregados e a constituição de canais de comunicação internos para possibilitar
um bom ambiente de trabalho. Há iniciativas práticas nessa direção, como um esforço em direção ao entendimento de que o diálogo social não é mera fachada: a AkzoICI (antiga Akzo-Nobel), por exemplo, instituiu um concurso interno de projetos
em que são selecionados seis projetos mundiais. No caso de ter seu projeto escolhido, o funcionário é premiado e o projeto financiado. Isso reforça a credibilidade do
programa de diálogo, além de indicar que ele pode ser sustentável a longo prazo12.
Programas desse tipo não são, evidentemente, novos no panorama dos recursos humanos no Brasil. Eles sempre existiram, e com mais ênfase no período
de redemocratização, a fim de disputar a atenção do trabalhador no momento em
que o movimento sindical se mostrava ativo e capaz de cativar a audiência para a
necessidade de liberdade de organização, expressão e reivindicação. Eram conhecidos então como políticas participativas. Agora, essas políticas não são reativas;
elas estão integradas em um arcabouço mais coerente, que unifica as iniciativas
dentro da fábrica (como mais democracia e possibilidade de expressão do “peão”)
com iniciativas fora da fábrica, na comunidade e na sociedade civil, tanto local
quanto supranacional. Tudo coberto pelo manto do discurso da ética, tendo a
responsabilidade social como conversor prático desse discurso.
Uma unidade da Empresa B, localizada na periferia do Rio de Janeiro, financia uma fábrica de vassouras para a comunidade local; essa mesma unidade
provê um “sopão” no mesmo local, além de manter um programa especial fo11 Nas empresas alemãs as comissões são parte do organograma da própria empresa. Existe há muito tempo na Bayer.
12 Este exemplo foi extraído da publicação CNQ-CUT de Stifung (2008).
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cado para o pessoal que manipula produtos agrotóxicos. A unidade do mesmo
grupo, em São Paulo, mantém uma linha de apoio a iniciativas voluntárias de seus
empregados, desde que voltadas para melhoramento da qualidade de vida tanto
dos funcionários quanto da população moradora da comunidade (bairro) onde a
fábrica está instalada. Uma dessas iniciativas foi o projeto de construção de uma
quadra de futebol no bairro. A Empresa B deu suporte ao projeto, desde que a
quadra pudesse ser utilizada por todos os seus empregados. O autor, morador da
área, líder comunitário e funcionário da empresa, era também dirigente do sindicato dos químicos. Esse tipo de atividade filantrópica não é apenas cosmético ou
complementar, nem vive somente das chances de renúncia fiscal que podem estar
associadas a ela. Mais do que isso, parece ser uma atividade que, nas palavras do
discurso da responsabilidade social, agrega valor, isto é, figura na contabilidade
simbólica como um ganho de credibilidade (o que reforça a marca) e de imagem
(já que a empresa é identificada como ambiental ou socialmente responsável), o
que pode ter implicações econômicas sérias, sobretudo por default.
O Sindicato das Indústrias do Setor Farmacêutico (Sindusfarma) possui uma
cartilha sobre responsabilidade social e ética, a qual é hoje uma norma adotada
por todas as filiadas. Essa cartilha elenca as condutas internas e externas que a
empresa deve seguir. As externas referem-se à postura de responsabilidade social
e promoção do voluntariado, já mencionadas. As internas regulam a vida social
intramuros e funcionam como guias de orientação para as políticas de RH, porém
não no sentido do relacionamento com a força de trabalho – aliás, não há nenhuma menção de como deve ser organizado o trabalho no processo de produção.
Trata-se de diretivas gerais e de princípios, tais como o combate ao nepotismo interno, a instituição de ouvidorias, a instituição de conselhos de ética (onde os sindicalistas pressionam para a participação de empregados nele), a denúncia de discriminação racial, de gênero, de opção sexual ou de comportamento13, de trabalho
não decente (trabalho escravo, precário, superexplorado etc.), ao longo da cadeia
de fornecedores, preocupação com a saúde e a segurança, entre outros. Nenhuma
palavra sobre o ritmo de trabalho, a intensificação, o stress derivado da carga de
cobrança pela performance ou qualquer outro tópico que tradicionalmente se
considerava como condições de trabalho. Além disso, as famosas pesquisas de
clima levadas a efeito pelo RH antecipam, para a direção, as insatisfações que
antes iam parar na comissão de fábrica ou em qualquer grupo de representação
13 Matéria da revista Exame, “As 100 melhores empresas”, relata o caso de um trabalhador da Novartis que usava
brinco e que, graças à política afirmativa da empresa, deixou de se sentir discriminado. Num sentido mais profundo, o que essas experiências de ação afirmativa mostram é que o filtro moral representado pela comunidade (de
moradia ou mesmo do local de trabalho) é confrontado pela política de direitos humanos no trabalho. O trabalhador não se sente mais constrangido pelo grupo e, dentro da empresa, ele é uma pessoa livre – mas livre também de
grupos de referência imediatos e como que automáticos.
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dos empregados, diluindo o seu potencial reivindicativo e esvaziando o próprio
papel da organização autônoma dos empregados. O sindicato só fica advertido de
que as condições de trabalho constituem um problema real no momento em que
os trabalhadores são demitidos e acorrem ao departamento jurídico para fazer a
homologação, quando então as queixas são levantadas. Caso contrário, é como
se esse tipo de problema tivesse saído do raio de visibilidade. Situação análoga
ocorre com as Lesões por Esforços Repetitivos (LER).
Enfim, no dizer de um sindicalista, o código de conduta “é abrangente, não
entra nos detalhes”. Sua esperança é de que os direitos humanos no trabalho sejam
uma espécie de janela de oportunidade, um conjunto geral de noções cujo sentido
pode ser disputado, nada impedindo, a princípio, que aquelas antigas denúncias
do movimento fossem retomadas sob uma nova bandeira. Mesmo que isso signifique conviver em uma mesma rede ou numa reunião em um comitê com representantes dos funcionários, com pessoal de escritório para quem o chamamento
recíproco de colaborador é tão natural quanto seria exótico o correspondente de
companheiro. Mas as raízes dessa mudança cultural são mais profundas.
Ao lado dos deslocamentos no discurso é preciso também adicionar um
dado de base: o setor químico vem passando por profunda reestruturação há
mais de década e meia14. Fusões, aquisições, fechamento de fábricas, relocalizações, mudança do padrão tecnológico, focalização e subcontratação (outsourcing)
e uma persistente queda nos postos de trabalho do setor devem ser considerados
como elementos que ajudam a compreender o apelo ético dos códigos de conduta, já que uma boa parte de seus empregados está localizada em escritórios
(ao menos em São Paulo, onde está a base de representação do sindicato dos
químicos) e não faz parte do núcleo duro do operariado industrial. A título de
ilustração, a Novartis hoje conta com 900 empregados no escritório e apenas 250
na produção, em São Paulo. Rigorosamente falando, são apenas três as empresas
químicas remanescentes na base municipal com contingente propriamente operário: a Companhia Paulista de Cartuchos (CPC), a Nitroquímica e a Braskem.
Bayer, Whitehall e outras estão paulatinamente retirando a sua área produtiva
da capital. Nesse contexto, a linguagem do colaborador substituindo a do companheiro parece não trazer surpresas. Na verdade, além do deslocamento para
o interior, outro dado de base do ramo é a sua segmentação: às multinacionais,
todas grandes empresas (onde as redes estão implantadas), opõem-se as médias
e pequenas, estas sim, com contingente menor de serviço e maior de produção,
14 Uma boa apresentação do setor e que permite vislumbrar o momento de passagem de uma “velha” categoria para
uma “nova” categoria está em Fontes (2002).
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a maioria de capital nacional e distribuída por vários subsetores: plástico, cosméticos, higiene e limpeza, e outros. Nessas empresas não se fala em códigos de
conduta, muito menos em redes de trabalhadores. Mesmo a subcontratação das
pequenas e médias pelas grandes – um caso muito comum era a de embalagens
plásticas para a indústria farmacêutica – parece hoje estar revertendo em direção
à implantação de seções antes terceirizadas dentro da grande empresa (caso de
embalagens).
As Redes de Trabalhadores no Ramo Químico
As redes de trabalhadores de empresas multinacionais começaram a se constituir no Brasil ainda na década de 1990. Elas começaram como uma organização
de plantas de uma mesma empresa no território nacional e em seguida se espalharam, em alguns casos, para o continente. Quando se trata de uma empresa de
capital internacional, o mais importante é conseguir o engajamento dos trabalhadores da matriz na rede, pois é lá que se tomam as decisões corporativas que
afetam o funcionamento das filiais ao redor do mundo. As dificuldades, contudo,
de organização dizem respeito a como as redes são montadas. A base é o sindicato
da categoria que representa os trabalhadores da empresa, no caso o Sindicato dos
Químicos. Mas, no Brasil, dependendo da central sindical à qual estejam filiados
os sindicatos de outras localidades, a dinâmica e até mesmo a constituição das
redes pode ficar comprometida por causa de disputas políticas entre as centrais
com diferentes visões sobre a participação, sobre o que negociar, as prioridades a
constarem da pauta etc.
Redes de empresas multinacionais também existem em outros países. Neste
sentido, um dos objetivos das redes nacionais é a aproximação com elas (caso da
Rede da Dow Chemical no Brasil e nos EUA), eventualmente criando uma rede
global de empresa ou juntando-se a ela, no caso de esta já existir.
As redes com alcance internacional geralmente contam com o suporte de
centrais e sindicatos dos países de origem dessas empresas. Já aquelas que, conquanto empresas multinacionais, permanecem em âmbito nacional, contam com
o apoio – quando existe – apenas das entidades locais. Como o trânsito entre
sindicato e central é – no caso, por exemplo, da CUT, que representa os principais
sindicatos do ramo químico – muito fluido, os apoios de um e outro, no fundo
se contrabalançam, com o primeiro cedendo algum suporte material e o segundo
complementando, ou vice-versa.
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As experiências pioneiras de redes sindicais no ramo químico são da Basf
e da Bayer. A primeira completou, no ano de 2009, dez anos de existência, e é
também a mais estratégica, pois encontra-se organizada em nível continental, com
representantes das fábricas localizadas na Argentina, Chile e Peru, além do Brasil.
As avaliações em geral concordam em identificar um comportamento diferenciado: enquanto as empresas alemãs e europeias em geral15 são mais acostumadas a
empreender conversações no chão de fábrica, as norte-americanas apresentam
uma tolerância menor. Os sindicalistas têm consciência de que o modelo alemão16 está sob ataque hoje por causa dos supostos custos elevados relacionados
à proteção social e ao arcabouço regulatório naquele país. Por isso, as redes, tal
como eles a concebem, correm o risco de perder muito do seu apelo e interesse,
o que faz com que busquem alianças com o movimento sindical daquele país, e
particularmente com as redes mundiais daquelas empresas. Outro problema diz
respeito à diversidade de setores de atividade que estão representados em um
mesmo grupo. Isso ocorre com a holandesa Unilever, que no Brasil possui fábricas de alimentos, material de limpeza e cosméticos, e química. Atualmente a rede
se encontra parada ali.
Do ponto de vista das reivindicações históricas do sindicalismo do ramo
químico, é instrutivo observar a aceitação da decomposição dos seus vários subsetores em unidades autônomas de negociação (farmacêutica, plásticos, cosméticos,
agroquímicos, fertilizantes, petroquímica etc.). Neste sentido, existe uma regressão em relação a algumas iniciativas tomadas há cerca de quinze anos que incluíam
a compreensão de que o sindicato deveria mais e mais abranger, como base de
sua representação, todos os setores que formassem a cadeia produtiva do ramo. A
justificativa era de que, assim procedendo, seria possível mostrar as interrelações
técnicas e econômicas entre aqueles setores, subsidiando, desta forma, uma pauta
onde os mais tradicionais e atrasados fossem vinculados, enquanto clientes, aos
mais modernos e sofisticados (exemplo: o polipropileno numa ponta e os plásticos na outra). Um sindicalismo baseado no ramo, e não na categoria profissional,
era a justificativa para investir em negociações amplas. Era igualmente a justificativa para absorver sindicatos afins, como o sindicato dos plásticos, que se fundiu
ao sindicato dos químicos em 1994, por exemplo. (FONTES, 2002). Numa visão
alternativa, a fusão teria sido um mero artifício de sobrevivência, tendo em vista a
crise de sustentação dos sindicatos diante do desemprego e dos custos de manutenção da máquina; em suma, um rearranjo institucional obedecendo a uma lógica
15 O Comitê Europeu de Empresa, com representantes da empresa e dos trabalhadores, é uma figura inexistente no
Brasil e uma referência para o movimento sindical.
16 Modelos nacionais de emprego e trabalho tais como o alemão são considerados inadequados para a nova economia. Eles são excessivamente rígidos na proteção do emprego e na contratação coletiva. (JÜRGENS; KRZYWDZINSKI; TEIPEN, 2006).
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de racionalização gerencial. Vistos da ótica de hoje, esses argumentos parecem
ganhar um sentido mais plausível do que no passado recente. Eles se juntam, por
outro lado, com argumentos atuais que enfatizam a complexidade das realidades
dos diferentes setores: os acordos coletivos do ramo, em São Paulo, estão caminhando para negociações em separado (químicos e farmacêuticos, desde o início
dos anos 2000, têm datas-base diferentes), assim como as redes de trabalhadores
caminham para um contrato coletivo nacional de empresa, em nome da possibilidade de neles desenvolver uma “reflexão sobre temas mais complexos.” (STIFUNG, 2008, p. 17). Se a diversidade de realidades do mundo do trabalho exige
resposta descentralizada dos sindicatos, a tensão reside exatamente nos limites a
serem traçados entre aquela diversidade percebida e a exigência de flexibilidade
oriunda do ambiente econômico onde as empresas estão inseridas.
Outro aspecto importante a notar é que, muitas vezes, dado o bloqueio de
um bom canal de comunicação entre empregados e patrões, a constituição da rede
de empresa acaba funcionando muito mais como um elemento de distensão das
relações de trabalho, fazendo as vezes da negociação coletiva quando esta última
é ausente ou frágil (Dow Química). As reivindicações das redes incorporam, assim, muito das reivindicações constantes das bandeiras históricas do sindicalismo
cutista, tais como a OLT e reuniões periódicas entre empregados e gerência, ou
de cunho mais tradicional, como a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
(CIPA). Muitas delas, contudo, incorporam também temas de uma nova agenda,
tais como o assédio moral e a diversidade no local de trabalho, entendida aí a
inclusão de deficientes físicos e de mulheres (Novartis).
A seguir, serão elencados os casos de redes sindicais em duas das principais
empresas do setor.
1) Empresa A
Teve início em 1999. É considerada a referência brasileira em diálogo social
ou responsabilidade social corporativa. Não existe ainda, neste momento, uma
rede mundial de trabalhadores da empresa, estando ela limitada por enquanto
ao continente latino-americano e organizada na forma de uma coordenação. A
empresa está representada pela diretoria de recursos humanos para a América
do Sul e mais um gerente de recursos humanos, enquanto que pela coordenação
comparecem dois trabalhadores eleitos de dois países da América do Sul. Em
âmbito nacional existe o Comitê da Intersindical Nacional dos Trabalhadores da
Empresa A. Pela estrutura sindical ainda vigente, os sindicatos não são obrigados
a se filiar às centrais sindicais, fazendo-o por escolha através de assembleias com
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a categoria. Assim, o Comitê da Intersindical da Empresa A pode acolher sindicatos de várias orientações, ligados ou não às centrais sindicais.
O principal resultado oferecido pela rede até aqui foi a disseminação de
comissões de fábrica em unidades onde não havia. Essas comissões são previstas
não apenas na produção (chão de fábrica), mas também nos escritórios.
Um documento acordado entre as partes estabelece que as decisões saídas
do diálogo social devem ter validade indeterminada e somente podem ser modificadas por consenso entre as partes, como se fossem de fato matéria de negociação
coletiva direta. Outro traço que reforça o seu caráter constrangedor é a preocupação com a formalização das decisões e debates levados a efeito ali: os diálogos
são transplantados para atas, lavradas pelos representantes17.
Do ponto de vista da normatização das relações de trabalho, o ponto alto
seria a criação de um Acordo-Marco Global. Dos outros tópicos que são negociados nos encontros da rede, além daqueles tradicionalmente associados ao “trabalho decente”, é importante iluminar dois deles, que estão associados à negociação
coletiva em sentido mais estrito: o combate à terceirização (ou subcontratação do
trabalho), entendida como uma forma de precarização, e a participação nos lucros
e resultados.
Para o RH da Empresa A, salários são assunto que não deve constar da
pauta das redes – nesse ponto demonstrando uma enfática coincidência com
a Empresa B -, porém a Participação nos Lucros e Resultados (PLR), sim.
Os primeiros devem ser discutidos no âmbito das convenções coletivas de
categoria, enquanto que a PLR, ao contrário, caberia dentro de um código
de conduta. Como a PLR envolve metas que não podem ser generalizadas
para todas as empresas, tal compreensão sugere que esse adicional da remuneração vem sendo incorporado como instrumento de gestão de recursos
humanos, e, por essa via, pode entrar como componente agregado do diálogo social da empresa.
17 A preocupação com a formalização deve ser entendida no seu contexto nacional. O sistema de relações de
trabalho sempre foi muito legalista no Brasil. É da cultura corporativa entre empresários e sindicalistas que, à
menor discordância na perseguição de um acordo entre as partes, o recurso à Justiça do Trabalho seja o artifício
mais corriqueiro e o mais à mão dentre outras fórmulas possíveis de conciliação disponíveis. Daí a importância
da formalização de um acordo que tem como garantia não o poder coercivo do Estado, mas a palavra dos próprios atores coletivos. A literatura brasileira de relações de trabalho chamou a essa tendência, verificada a partir
de meados dos anos 1990, de nova contratualidade. (PAOLI, 1994; VÉRAS, 2007). O avanço do neoliberalismo,
contudo, terminou por neutralizá-la e renovou o apelo ao legalismo como anteparo de proteção mais imediato
para o mundo do trabalho.
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Acordos de redução da jornada de trabalho também podem ser objeto de
negociação entre a direção geral do grupo e sindicatos dos mais variados locais
no mundo, levando mais uma vez a um impulso importante de normatização,
embora se circunscreva à empresa, e não ao ramo de atividade. Aqui se toca em
um ponto sensível do significado e alcance dos acordos coletivos. Os sindicalistas
(sobretudo os da CUT) entendem que o reconhecimento da legitimidade dos
acordos de empresa não compromete a compreensão de um sistema coletivo
democrático de relações de trabalho, e não significa, portanto, a subscrição da
agenda flexibilizante que valoriza a descentralização e a fragmentação. Na visão
deles, o acordo de nível micro não pode ser derrogatório dos acordos macro (de
ramo de atividade ou interprofissional) e, por conseguinte, não corre o risco de
abalar direitos previstos em âmbitos inclusivos de negociação. Mas os críticos não
estão muito convencidos dessas boas intenções, na medida em que cada passo no
sentido de negociar medidas pontuais e específicas na verdade pode ser um passo
na direção de negociar direitos.
De todo o modo, haveria que desagregar entre as matérias que seriam objeto
de um acordo global da empresa: enquanto a possibilidade de modificar determinadas disposições da legislação local não é bem vista, a implantação de princípios
gerais contidos na política de recursos humanos utilizada na matriz pode ser interessante para os sindicalistas do Sul, pois preveem cláusulas mais avançadas do
que o padrão encontrado nas firmas brasileiras.
2) Empresa B
A rede teve início em 2004 e a periodicidade dos encontros é anual. Também é um exemplo de diálogo social. Até o momento não se espalhou para além
das fronteiras nacionais, embora seja parte de sua estratégia no curto prazo. Este
seria um primeiro passo antes de se pensar na possibilidade de um acordo-marco.
Comparativamente, a Empresa A estaria mais perto desse alvo do que a Empresa
B, pois ali a organização da rede, além de ser mais longeva, alcança uma maior
abrangência territorial.
O principal resultado líquido que ela apresenta é a melhoria do canal de
comunicação entre o sindicato e a empresa. Mas há também resultados mais concretos a serem elencados: a elaboração de um código de conduta para contratação
de terceiros; a revisão do plano de cargos e salários, o qual era motivo de queixa
pelos trabalhadores por causa de distorções que acarretavam; e o tratamento do
plano de saúde dos aposentados. Problemas internos de uma determinada unidade – caso dos problemas relativos à eleição da comissão de fábrica no Rio de
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Janeiro – acabam encontrando uma resolução no âmbito da rede, e não da relação
entre empregados e representantes da direção daquela unidade do grupo em particular. Embora a rede tenha atuação apenas nacional, tal fato deve ser colocado
em perspectiva: primeiro, a Empresa B sempre foi considerada uma empresa com
a qual os sindicatos do ramo químico não têm um relacionamento fácil (isso varia
segundo a orientação política do sindicato em cada localidade onde a empresa
se situa); em segundo lugar, o grupo tem, nos últimos tempos, incorporado empresas com culturas diferentes (a mais recente aquisição foi uma empresa farmacêutica, também de capital alemão, situada na zona sul da cidade de São Paulo),
com histórico de recusa ao reconhecimento da influência sindical. Por isso, os
passos dados até aqui têm um significado próprio de avanço, e a rede, neste caso,
contribui mais para distender as relações de trabalho com a empresa, as quais se
encontravam emperradas no âmbito da negociação coletiva, do que propriamente
para dar passos mais ousados.
Esses passos incluiriam, por exemplo, os direitos humanos no trabalho e a
responsabilidade social corporativa, temas presentes como política do grupo na
matriz. As comissões de fábrica são uma realidade estatutária da Empresa B e anteriores à penetração sindical nelas. A comissão de fábrica alemã é atuante na rede,
e isso contribui para dar um ar de respeitabilidade e aumentar a legitimidade de
sua atuação diante dos executivos responsáveis pelo diálogo, pelo lado da empresa. Hoje, o representante da comissão de fábrica no Brasil é membro automático
da rede. Essa foi uma decisão tomada em 2008.
Diferentemente da Empresa A, a Participação nos Lucros e Resultados (PLR)
não entra na pauta temática das reuniões, pois é considerada juntamente com tópicos tais como: plano de saúde para aposentados, plano de cargos salários e a própria
questão salarial, um assunto “superado” pela nova agenda do diálogo social.
A manutenção de um intercâmbio de informações permanente entre os trabalhadores da empresa no Brasil e na Alemanha é outro propósito da rede. O seu reforço e
formalização também fazem parte da pauta, o que inclui a confecção de um estatuto e de
um código de conduta com regimento interno próprio, reconhecidos pelos dois lados.
O avanço, nas redes, das reivindicações de participação, transparência, negociação permanente, assim como a adoção de temas como direitos humanos
no trabalho e inclusão social, indicam o grau de penetração do vocabulário do
sindicato-cidadão no mundo sindical. (VÉRAS, 2007). Mas, além desse lado, digamos, doutrinário e abstrato, há elementos na reivindicação sindical que, se concretizados, apontam para a inserção de fato de um elemento estranho à política
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privada e unilateral das firmas, até aqui concebidas como únicas responsáveis por
decisões internas: tal é o caso do plano de cargos e salários, em geral concebido
como assunto que compete exclusivamente à área interna de recursos humanos
(Bayer, Braskem), ou a proposta de uma PLR negociada nacionalmente (Braskem,
Dupont, Dow Química, Quattor), assim como um plano salarial unificado (caso
da Braskem) ou, ainda, a participação no conselho de administração da empresa
(Braskem).
3) Outras redes
Empresa brasileira originária do setor petroquímico, a Empresa C está em
processo de internacionalização e de reestruturação local, com anúncio de fechamento de unidades no Brasil, o que causa apreensão e mina o ambiente interno.
Para fazer face a esses problemas, a rede preocupou-se em criar um boletim nacional que circulasse entre os trabalhadores das diversas unidades do grupo (uma
política de comunicação, segundo os sindicalistas). A extensão internacional da
rede não é ainda um levantamento de informações. A prioridade é a estruturação
propriamente da rede, com mecanismos de sustentação financeira que lhe permitam autonomia. Por enquanto, são os sindicatos os responsáveis por bancar as
redes e, por isso, sua viabilidade organizacional depende da compreensão mais
ou menos benevolente deles, o que envolve orientações políticas e prioridades
estratégicas de suas diretorias, entre outros fatores.
Tal como nas redes das outras empresas, problemas internos são o principal
alvo da rede de trabalhadores da Empresa C: melhoria das condições de trabalho,
qualidade de vida de seus empregados, má vontade com a representação sindical
na fábrica, PLR nacional, aposentadoria especial (por causa do enquadramento da
categoria), saúde e segurança no trabalho.
Já a Empresa D, de origem norte-americana, é uma das gigantes do ramo
químico no mundo e possui oito unidades no Brasil. A criação da rede teve um
impulso de fora para dentro, pois foram os sindicatos americanos que sugeriram
aos seus colegas brasileiros a sua formação. Tal como no caso da Empresa C, a
rede luta para se estabelecer autonomamente e com isso possibilitar um funcionamento regular, por exemplo, com encontros entre representantes das várias unidades. De novo, quesitos ligados a saúde e segurança são elencados como os mais
urgentes, além da necessidade de comunicação entre os trabalhadores das diversas
plantas. A recusa da empresa tem sido vista como um traço de cultura gerencial
nacional (as firmas americanas não aceitam o diálogo social), daí ser considerado
já um avanço o estabelecimento de uma coordenação nacional de trabalhadores
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da empresa para discutir unificadamente com os representantes do grupo no Brasil. A tentativa de limitar toda a negociação em esfera local, descentralizada, pode
ser uma característica das relações industriais norte-americanas.
Outras redes de empresas acusam as fricções mais comuns: problemas de
comunicação (criação de boletins), de estruturação (financiamento) e postura
antissindical (perseguição aos líderes sindicais) despontam na lista. A pauta dos
encontros das redes inclui o combate à terceirização; defesa da saúde e do meio
ambiente; PLR; instituição de um código de conduta; uniformização de procedimentos de negociação e de benefícios (quando adicionais noturnos variam entre
as unidades); planos de previdência da empresa; instituição de comissões de trabalhadores nas fábricas; diálogo com as matrizes e trocas de experiências com trabalhadores de unidades no exterior. Pode-se perceber que muitos itens são típicos
de negociação coletiva da categoria. Outras queixas mais específicas recaem na
inconstância da representação da empresa nos encontros do diálogo social com a
frequente mudança dos interlocutores; não reconhecimento por parte da matriz
do grupo; pulverização da representação trabalhista, quando a empresa tem participação em ramos de atividade além do químico (o que pode acarretar não apenas
mudança de competência de confederação, mas por vezes de central – isso aconteceu no caso de um grupo econômico que tem fábricas não apenas no complexo
químico, mas também no setor de alimentação e bebidas: a rede é também clivada
pelo setor ou ramo de atividade em que a empresa está localizada na organização
das relações industriais do País). Em um caso a designação “rede” foi substituída
por “comitê” – comitê de trabalhadores – mas o significado era o mesmo.
De um modo geral, o grande desafio dos sindicalistas é angariar adeptos à
ideia das redes entre as suas próprias hostes. Como pode parecer uma iniciativa
muito distante do dia-a-dia do trabalhador, abstrata até, os dirigentes devem se
esforçar para mostrar as conexões entre uma pauta geral de reivindicações que
engloba as unidades no Brasil e no exterior, e as demandas locais, específicas de
cada planta, convencendo desse modo as bases a se engajarem na luta pela sua
implementação. Pode-se concluir com a observação de que a experiência da organização de redes no ramo químico ainda é bastante incipiente e heterogênea (a
qual se estende a unidades de um mesmo grupo em território nacional), além de
reproduzir alguns elementos típicos da pauta clássica da negociação coletiva. Por
sua vez, os sindicatos enxergaram aí uma oportunidade, seja para atualizar velhas
dívidas das relações industriais (déficit de participação nas decisões das firmas e
inexistência de organização por local de trabalho, por exemplo), seja para tentar
inserir seu próprio ponto de vista em uma globalização que os privava cada vez
mais de relevância econômica e política.
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HETEROGENEIDADE DO TRABALHO COMO
CONTRAPONTO À TESE DO INFOTAYLORISMO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Luís Fernando Santos Corrêa da Silva1
Introdução
No Brasil, os call centers se tornaram um dos grandes mercados empresariais
durante a última década. A ampliação do acesso aos serviços de telecomunicações, consequencia da privatização do sistema Telebras, levou as empresas a optar
por formas alternativas ao atendimento presencial, de modo a reduzir custos operacionais com infraestrutura e locomoção de pessoal.
Diversos serviços antes prestados através do atendimento face a face passaram a ser centralizados em call centers ligados a variados segmentos de mercados.
Como exemplos de serviços prestados por call centers podem-se citar: serviços de
suporte técnico, fidelização de clientes, pesquisas de mercado, processamento de
solicitações, cobranças, venda de produtos ou serviços, atendimentos a clientes
de serviços de telecomunicações, serviços bancários e de operadoras de cartões
de crédito, entre outros.
O surgimento desse mercado empresarial deu origem a um novo cenário de
trabalho, que passou a assumir destacada importância empregatícia nos últimos
anos. Segundo expectativa da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), o
Brasil deve alcançar, no ano de 2010, a marca de um milhão de empregos diretos
em call centers. Devido ao elevado índice de formalização das contratações, a força de trabalho empregada em call centers passaria a representar aproximadamente
2% do emprego formal brasileiro2.
Antes de sua consolidação, no Brasil, o mercado de call centers já despertava
o interesse dos estudiosos do trabalho pelo mundo. Na Europa, por exemplo,
os call centers se tornaram objeto de investigações que discutiam a introdução dos
1 Sociólogo, professor assistente da Universidade Federal da Fronteira Sul (Campus Erechim/RS) e doutorando do
Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É também colaborador do grupo de pesquisas Trabalho na Sociedade Contemporânea/UFRGS – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Disponível em: <http://www.ufrgs.br/ppgsocio>.
2 Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, o Brasil possuía, no ano de 2008, um contingente de aproximadamente 39,4 milhões de trabalhadores formais.
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princípios tayloristas na organização do processo de trabalho. Segundo autores
como Kerst e Holtgrewe (2001), a aplicabilidade do taylorismo nos call centers é
limitada, visto que a necessidade por qualidade na comunicação com o cliente demanda trabalhadores com capacidades cognitivas elevadas, assim como maiores
níveis de flexibilidade na organização do trabalho, vis-à-vis às linhas de montagem
tayloristas.
Recentemente, estudo realizado por Hualde e Micheli (2009) sobre o mercado de trabalho mexicano em setores de tecnologia de informação concluiu que
os call centers expressam, contraditoriamente, por um lado, demanda por interação
complexa e força de trabalho qualificada e, por outro, pressão por redução dos
custos operacionais, devido à competição interempresarial. Segundo Hualde e
Micheli (2009), este quadro condiciona o desenvolvimento de estratégias diferenciadas para enfrentar a concorrência interna ao segmento de atuação da empresa.
Face ao exposto, observa-se que o teleatendimento e os call centers se constituíram em um desafio teórico para os estudiosos do trabalho. As características
intrínsecas a esse cenário de emprego, como, por exemplo, o uso intensivo de
tecnologias informacionais para a execução das tarefas, a realização de trabalho
fragmentado e, em alguns casos, repetitivo, além do controle eletrônico a que
os teleoperadores são submetidos, levaram estudiosos brasileiros do trabalho a
relacionar as formas de organização do trabalho encontradas nessas empresas ao
taylorismo, agora numa versão revigorada e interconectada à realidade tecnológica
atual. O conceito de infotaylorismo expressaria o taylorismo renovado, no qual os
call centers seriam a principal referência empírica. (VENCO, 1999; OLIVEIRA,
2004; BRAGA, 2007).
Entretanto, considera-se que a defesa da tese do infotaylorismo sustentada
por esses estudiosos apresenta limites teóricos importantes, seja devido à tentativa de resgatar um conceito utilizado como paradigma explicativo da sociedade
industrial, agora adaptado ao contexto da sociedade da informação, seja devido à
possibilidade de generalização para todo o mercado de trabalho dos call centers
dos achados dos estudos de caso que dão suporte à tese.
Neste sentido, o propósito deste artigo é discutir os limites da tese do infotaylorismo aplicado à organização do trabalho em call centers, utilizando, como
contraponto, respostas teóricas alicerçadas nas noções de heterogeneidade do trabalho e “emprego trampolim”. Tais noções serão apresentadas mais adiante no
texto, visto que, num primeiro momento, considera-se necessário situar a tese do
infotaylorismo no debate contemporâneo da Sociologia do Trabalho brasileira.
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Organização do Trabalho em Call Centers e a Tese do
Infotaylorismo
No Brasil, a maioria dos estudos realizados sobre a organização do processo
de trabalho em call centers se insere no âmbito da tese da precarização generalizada
do trabalho. Os estudos sobre precarização do trabalho no Brasil tiveram início
em meados da década de 1990, investigando principalmente o processo de reestruturação produtiva industrial e as privatizações do período. O esgotamento
desses processos, ao menos em termos da possibilidade de agregar novidades
empíricas aos achados das pesquisas já existentes, levou os estudiosos do trabalho
a testar a tese da precarização do trabalho nos novos cenários de emprego, sobretudo no setor de tecnologia da informação.
Cabe destacar que a tese da precarização generalizada do trabalho não é uma
novidade, tendo sido desenvolvida, em outros termos, na década de 1970, por
Harry Braverman. Apoiado na teoria marxista, o autor argumenta, em seu livro
“Trabalho e Capital Monopolista”, que o desenvolvimento do capitalismo acarretaria a degradação do trabalho. Para Braverman (1974), a degradação do trabalho
observada na indústria, em virtude da aplicação do taylorismo como forma de
organização da produção, estaria se difundindo no setor de serviços, visto que o
mesmo também seria passível de divisão entre concepção e execução, rotinização
das tarefas e intenso controle dos trabalhadores.
Apoiados na tese bravermaniana de degradação do trabalho no capitalismo,
bem como na tese que lhe é herdeira, a da precarização generalizada do trabalho,
os estudiosos do trabalho, no Brasil, passaram a tomar os call centers como a linha
de montagem taylorista da sociedade da informação, assumindo uma leitura estrutural e generalizada das formas possíveis de organização do trabalho nessas empresas. A partir de então, um novo conceito passou a ser utilizado para designar a
forma de organização do trabalho nos cenários de emprego do setor de serviços
intensivos na utilização de tecnologias informacionais: o infotaylorismo.
No âmbito dos estudos do trabalho, a primeira investigação brasileira sobre o
mercado de call centers foi realizada por Selma Venco, no final da década de 1990. O
estudo da autora desenvolve o argumento de que a organização do trabalho, em um
call center de uma instituição financeira, seria caracterizada pelos mesmos princípios
tayloristas observados na indústria. Aspectos observados por Venco nas atividades de
teleatendimento, como a divisão entre execução e concepção, controle dos tempos e
movimentos e a seleção científica dos trabalhadores, estariam de acordo com os princípios tayloristas de organização do trabalho. (VENCO, 1999).
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Segundo Venco (1999), o taylorismo nos call centers seria possibilitado pelo
alto grau de informatização do processo de trabalho, viabilizando o aumento da
produtividade e o controle eletrônico do trabalho executado. Nos call centers, os
sistemas de software seriam os instrumentos que conformam a organização do
trabalho. O software:
[...] distribui as chamadas telefônicas aos operadores há mais
tempo ociosos, orienta sobre procedimentos, mensura o tempo de duração das ligações, emite relatórios de produtividade,
registra o tempo de permanência e de interrupções nos postos de atendimento e, sobretudo, grava todos os atendimentos
efetuados. (VENCO, 1999, p. 69).
Venco (1999) argumenta que os sistemas de software registram todas as atividades realizadas no posto de trabalho, intensificando o ritmo do trabalho realizado e tornando possível o controle dos trabalhadores. Venco (1999) também
destaca que o software possibilita avaliar o desempenho dos trabalhadores através
de variáveis quantitativas. Por seu turno, os scripts padronizados de atendimento
seriam utilizados para uniformizar as falas dos operadores, fornecendo orientações acerca das rotinas de trabalho. Segundo a autora, o scritp padronizado
tornaria o trabalho rotineiro e repetitivo, tendo em vista que as possibilidades de
originalidade e de autonomia de fala no contato com o cliente seriam limitadas
por essa ferramenta.
Também assumindo a tese da precarização generalizada do trabalho e o
conceito de infotaylorismo, a pesquisadora Sirlei Oliveira realizou, em meados
da década de 2000, estudo sobre as relações de trabalho na cadeia produtiva da
telefonia fixa do Estado de São Paulo. Segundo Oliveira (2004), os call centers
apresentam relações de trabalho baseadas na busca por uma produtividade precisa, articulada a uma racionalização crescente do trabalho. Na mesma linha de
Venco (1999), nesse estudo Oliveira (2004) argumenta que os trabalhadores em
call centers estão submetidos a intenso controle do trabalho realizado: seriam determinados o ritmo, as cadências e os procedimentos, não deixando espaço para
uma possível autonomia dos teleoperadores. Em relação à atividade do teleoperador, Oliveira (2004, p. 268) destaca que:
É um ofício que se exerce a partir de restrições quase que
absolutas no que diz respeito à gestão do tempo e à intensificação do trabalho. O atendente submete-se a “fiscalização
eletrônica” desde a movimentação no PA até o registro da
quantidade de atendimentos realizados que é impresso não
por ele, mas pela máquina.
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Conforme ressalta Oliveira (2004, p. 271), na empresa investigada a qualidade nos serviços prestados e a humanização do trabalho estariam colocadas em
segundo plano, visto que a aliança entre a empresa de telefonia fixa contratante
dos serviços e a empresa de call centers seguiu a “lógica que interessa às grandes empresas”, visto que aumentou as possibilidades de redução de pessoal e de
controle de custos através da racionalização extrema do trabalho e aplicação de
princípios tayloristas.
Ainda no âmbito dos estudos que sustentam a tese do infotaylorismo, artigo
publicado por Ruy Braga classifica os call centers como a face negativa do trabalho informacional. Segundo Braga (2007, p. 363), a organização do trabalho nos
call centers seria condicionada por “pressão do fluxo informacional”, provocando
a rotinização da comunicação e subordinação a um script de atendimento pré-definido.
Para Braga (2007), as formas de organização do trabalho encontradas nos
call centers seriam evidências da possibilidade de adaptação do taylorismo ao trabalho intelectual. Segundo Braga (2007, p. 364):
Em última instância, trata-se de um tipo de trabalho que testemunha como nenhum outro a taylorização do trabalho intelectual e do campo das relações de serviço: uma comunicação
instrumental sob a coação do fluxo informacional e prisioneira do script tendente a transformar o teleoperador em um
autômato inquieto.
Braga (2007) sustenta que a aplicação do taylorismo nos call centers teria como
objetivo a intensificação do ritmo do trabalho através da instrumentalização da
comunicação, visando à redução de custos operacionais.
Recentemente, o lançamento do livro “Infoproletários”, organizado por Ricardo Antunes e Ruy Braga, retomou o debate sobre a introdução do taylorismo
nas empresas de call centers. O livro reúne artigos de pesquisadores marxistas
que analisam o emprego em call centers sob diversos aspectos, como as formas de
organização do trabalho, a construção de identidades coletivas, a nova divisão sexual do trabalho, entre outros. O ponto de convergência entre esses autores seria
a possibilidade de constituição de um novo proletariado, diferente do predominante nas sociedades industriais. Segundo Antunes e Braga (2009), o proletariado,
ator coletivo emancipador da teoria marxista, na atualidade passaria a emergir de
um novo lócus, como resultado das contradições capitalistas relativas à sociedade
da informação.
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Considera-se que os estudiosos brasileiros do trabalho em call centers desenvolveram uma abordagem que generaliza os achados de estudos de caso e que não
problematiza as diferenças inerentes aos segmentos que compõem o mercado.
Este entendimento, totalizante em seus fundamentos, obscurece a possibilidade
de compreensão de diferenças que supostamente possam ser encontradas no âmbito da pesquisa empírica sobre os call centers.
Cabe destacar que a escolha de uma abordagem generalizante para analisar o
mercado de call centers não é aleatória. Os estudos que sustentam conceitualmente
o infotaylorismo derivam de abordagens teórico-metodológicas fundamentadas
no marxismo e visam a reforçar a tese da degradação do trabalho no capitalismo.
No Brasil, como referido anteriormente, esta tese está articulada com a perspectiva teórica que sustenta a precarização generalizada do trabalho. É necessário,
num primeiro momento, estabelecer um diálogo crítico que evidencie seus limites.
A utilização do termo “precarização”, que significa piora processual das
condições de trabalho ao longo do tempo, mostra-se conceitualmente inadequada
neste caso, visto que os call centers são um novo cenário de emprego e, por conta
disso, a ação do tempo como elemento de sustentação de uma pretensa piora das
condições de trabalho não parece razoável. Inclusive, muitos dos trabalhadores
de call centers vivenciam sua primeira experiência no mercado de trabalho, não
havendo um passado laboral em suas trajetórias.
Por outro lado, caso o conceito de “precarização” seja entendido como degradação das condições estruturais do mercado de trabalho brasileiro nos últimos
anos, cabe indagar sobre o passado do emprego no País e a qual modelo nãoprecário o mesmo se refere, bem como se o emprego não-precário, em algum
momento, foi o modelo típico de inserção na estrutura ocupacional. O emprego
industrial, sabidamente mais estável, nunca representou mais que a quarta parte
do mercado de trabalho brasileiro (POCHMANN, 2001) e, como indicam dados
governamentais, o mercado de trabalho brasileiro sempre conviveu com elevados
índices de informalidade. Assim, no Brasil, o emprego formal estável sempre foi
para poucos. Neste caso, a inadequação do conceito de “precarização”, para a
análise do objeto a que se propõe, ultrapassa a dimensão meramente semântica.
Sobre o taylorismo, pode-se afirmar que, no Brasil, foi adotado como modelo de organização do processo de trabalho, mas, diferentemente dos países da
Europa central, esteve distante de se constituir como paradigma explicativo da era
industrial. Neste sentido, as questões que se impõem saber são: qual passado do
mercado de trabalho brasileiro é utilizado como referência empírica para sustentar
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a tese da precarização generalizada de trabalho nos anos recentes? Qual o poder
heurístico do (info)taylorismo, paradigma explicativo da sociedade industrial, para
analisar o emprego na sociedade da informação e em novos cenários de emprego
como os call centers? Estas são questões que se impõem àqueles que sustentam as
teses da precarização generalizada do trabalho e do infotaylorismo, mas que ainda
não fazem parte da agenda dos estudiosos vinculados a tais perspectivas analíticas.
Novos Rumos: A Sociologia da Heterogeneidade do Trabalho
e o Conceito de “Emprego Trampolim” como Contraponto
ao Infotaylorismo
A resposta teórica que proponho à tese da precarização generalizada do
trabalho combina as dimensões macro e micro que compõem a dinâmica das
relações de trabalho. No âmbito da pesquisa sociológica, chamo-a de “Sociologia
da heterogeneidade do trabalho”. Ela está fundamentada na necessidade de contemplar nos modelos de análise, por um lado, aspectos estruturais do mercado
de trabalho (dimensão macro) e, por outro, as estratégias empregatícias que os
atores sociais desenvolvem no decorrer de suas trajetórias ocupacionais (dimensão micro).
Portanto, a Sociologia da heterogeneidade do trabalho é uma tentativa de
conciliar polos tradicionalmente opostos na pesquisa sociológica: a) condicionamento estrutural e b) ação voluntária dos agentes sociais. Neste contexto, cabe à
pesquisa sociológica averiguar qual o peso dessas duas dimensões nas situações
concretas que se propõe investigar.
Contudo, convém ressaltar que o termo “Sociologia da heterogeneidade do
trabalho” foi utilizado pela primeira vez por Bruno Lautier, em artigo publicado na Revista Latino-Americana de Estudios del Trabajo, do ano de 1999, para
sustentar a importância da realização de pesquisas que contemplem os aspectos
microssociológicos inerentes às relações de trabalho. Entende-se, assim como
Lautier, que uma eventual “Sociologia da heterogeneidade do trabalho” deve
contemplar tais aspectos relativos à microssociologia, mas que também não deve
abandonar a análise macrossociológica, pois esta última possibilita a investigação
dos processos de mudança na estrutura ocupacional das sociedades que estão
relacionados a eventos de maior abrangência e amplitude. Portanto, a heterogeneidade seria compreendida como uma categoria de análise que ultrapassaria as
clivagens macro e micro, podendo ser utilizada seja no desvendamento de padrões relativos ao mercado de trabalho como um todo (em nível global, nacional,
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setorial etc.) e seus processos de mudança e/ou conservação, como suas dualidades e incongruências, seja na interpretação de aspectos relativos à subjetividade
do trabalhador ou sua trajetória ocupacional.
Caberia esclarecer que adotar a ideia de heterogeneidade como categoria de análise
não implica aderir ao determinismo tecnológico como argumento. A heterogeneidade não é produto do desenvolvimento tecnológico, mas sim da complexificação das
sociedades contemporâneas. Considera-se que o desenvolvimento tecnológico não se
configura como processo autônomo, mas permeado por interesses e questões políticas
que estabelecem a mediação entre seus fins e as formas concretas de sua apropriação.
No caso do objeto empírico aqui analisado, os call centers, também é importante ressaltar que a tecnologia não está sendo considerada como o motor de
uma possível heterogeneidade do trabalho no âmbito micro. A articulação entre
as tecnologias informacionais e as diversas variáveis de natureza organizacional,
que derivam da tomada de posição em termos de gestão do negócio, parecem
estabelecer a mediação entre níveis mais ou menos elevados de heterogeneidade,
na organização do processo de trabalho.
Os resultados de estudos por mim realizados em call centers ligados a segmentos de mercado como provedor de serviços de Internet, distribuidora de energia
elétrica, empresas de telecomunicações, empresas de cartões de crédito e de cobrança, sugerem que as formas de organização do trabalho nas empresas de teleatendimento estão distantes da possibilidade de generalização. Nos call centers
investigados, o taylorismo está longe de ser o modelo hegemônico de organização
do trabalho, visto que os mesmos apresentam padrões heterogêneos de organização do trabalho conjugando tarefas com conteúdo complexo e simplificado,
ritmo e repetitividade do trabalho variáveis segundo o tipo de atividade, aspectos
que em alguns casos apresentam-se como a realidade de diversas atividades relacionadas ao teleatendimento. (SILVA, 2004, 2006).
No estudo realizado no ano de 2004 constatou-se que não é possível afirmar
que o taylorismo seja a forma predominante de organização do trabalho em um
call center que prestava serviços a um provedor de Internet e a uma empresa de
telecomunicações. No caso de um tipo específico de operação, o teleatendimento
receptivo3, haveria uma orientação para pressupostos de flexibilidade, visto que
o trabalho realizado é orientado pela demanda de serviços. A maior ou menor
procura por alguns tipos de serviços determina, em última instância, a quantidade
de teleoperadores relacionados a uma atividade, ao ritmo, às pausas e à repetitivi3 No teleatendimento receptivo é o cliente que demanda certo tipo de produto ou serviço quem toma a iniciativa do
contato telefônico.
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dade do trabalho. Já no telemarketing ativo4, normalmente relacionado à venda de
produtos e serviços, há maior espaço para a padronização da fala do teleoperador,
além de ser possível maior intensificação do ritmo do trabalho. (SILVA, 2004).
No mesmo estudo constatou-se que atributos pessoais que possuem forte
vinculação com os processos de socialização individual, tais como fatores comportamentais, habilidades comunicacionais, mas também qualificação técnica e formal,
seriam impreteríveis, tanto para a admissão quanto para o desempenho da atividade
de teleoperador, aspecto que contraria a lógica do taylorismo, que não demandaria
perfis sócio-ocupacionais possuidores de tais atributos.5 (SILVA, 2004).
Passados dois anos da realização da investigação anteriormente citada, em
estudo realizado em call centers que atuam em três diferentes segmentos de mercado, constatou-se que as empresas adotam variadas estratégias de flexibilidade
laboral no processo de organização do trabalho. Tais estratégias eram orientadas
ora pela qualidade dos serviços prestados aos clientes, ora pela redução de custos
operacionais. O estudo foi realizado em três empresas prestadoras de serviços de
call center situadas na Região Metropolitana de Porto Alegre-RS, atuando nos seguintes segmentos de mercado: a) distribuidora de energia elétrica; b) recuperação
de crédito e help desk; c) cartões de crédito. (SILVA, 2006).
Os achados de pesquisa indicaram que o call center que prestava serviços para uma distribuidora de energia elétrica adotava estratégia de flexibilidade laboral que seguia a lógica
da qualidade do atendimento prestado ao cliente. Aspectos como o tipo de subcontratação
estabelecida, em regime de terceirização parcial, que requer maior envolvimento da empresa contratante na prestação do serviço, bem como a presença de agência de regulamentação no setor6 em que o call center encontra-se inserido, condicionavam a adoção de tal lógica
e influenciavam positivamente as condições de trabalho. Observou-se também que o call
center não utilizava script padronizado de atendimento, apresentava menor quantidade de
ligações atendidas por um teleoperador e tempos médios de ligação mais longos, bem
como apresentou, entre as três empresas investigadas, o maior tempo médio de emprego
entre os entrevistados.
4 No telemarketing ativo é o teleoperador que toma a iniciativa do contato telefônico, dando início à conversação.
5 O “trabalhador bovino”, de Frederick Taylor, é o exemplo clássico do perfil sócio-ocupacional possuidor de pouca
ou nenhuma qualificação e seria predominante nas linhas de montagem tayloristas.
6 A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) avalia periodicamente a qualidade dos serviços prestados pelo
call center, através do cumprimento dos indicadores estabelecidos por uma resolução normativa de 2004. Tal
medida visa a padronizar os serviços de teleatendimento prestados pelas concessionárias ou permissionárias encarregadas da distribuição de energia elétrica, estabelecendo: disponibilidade para atendimento nas 24 horas do dia,
sete dias por semanas; obrigatoriedade de gravação em meio magnético de uma amostra diária dos atendimentos
para fins de monitoramento e fiscalização da qualidade do atendimento prestado; índices máximos de abandonos
e de chamadas ocupadas calculados a partir de fórmula estabelecida pela ANEEL; atendimento em, no máximo,
dois sinais sonoros e tempo máximo em espera para atendimento de, no máximo, 30 segundos.
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Já o call center que prestava serviços de recuperação de crédito e help desk,
adotava a estratégia que seguia a lógica da redução dos custos laborais para as atividades que necessitam de menor especialização. Operações relacionadas à prestação de informações, pesquisa e qualificação de serviços de menor complexidade
e de maior repetitividade, eram desempenhadas por teleoperadores contratados
como estagiários, sem vínculo por Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), predominantemente jovens, possuidores de menor escolaridade e em primeira inserção no mercado de trabalho, enquanto que a operação relacionada à recuperação
de crédito, de maior complexidade e que possibilitava maiores margens de ação e
negociação ao teleoperador, era desempenhada por empregados possuidores de
contratos de trabalho por tempo indeterminado, com maior escolaridade e remuneração mais elevada. O caso deste call center é emblemático e demonstra que a
heterogeneidade nas condições de trabalho não está presente apenas no mercado
de call centers como um todo, mas também no interior de uma mesma empresa.
Em relação ao call center que prestava serviços para empresas de cartões
de crédito, foi possível afirmar que a estratégia de flexibilidade laboral adotada
efetiva-se a partir de polivalência dos teleoperadores no interior de uma mesma
empresa-cliente. Ou seja, o teleoperador era contratado para prestar serviços a somente uma empresa-cliente, mas estava apto a realizar atendimentos de variadas
naturezas, como venda de cartões de crédito para titulares e dependentes, seguro
em caso de perda do cartão, entre outros. Portanto, a estratégia de flexibilidade
laboral utilizada seria mais restrita comparativamente aos outros dois call centers
estudados. O call center apresentou o menor tempo médio de emprego entre os teleoperadores entrevistados, bem como maior intensificação do ritmo de trabalho
e repetitividade das tarefas devido ao tipo de atividade desempenhada, relacionada ao telemarketing ativo.
Neste mesmo estudo buscou-se identificar o sentido que os teleoperadores
atribuíam às tarefas que desempenhavam. Através de uma pergunta de múltipla
escolha aplicada por questionário, solicitou-se que os teleoperadores indicassem a
palavra que melhor definiria o trabalho que realizavam.
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Gráfico 1 - Entre as Palavras Abaixo, Qual Melhor
Define seu Trabalho?
Fonte: Silva (2006).
Distribuidora de energia elétrica: n = 51; Recuperação de crédito e help desk: n
= 53; Cartões de crédito: n = 108
O call center que prestava serviços para empresas de cartões de crédito apresentou o maior índice de teleoperadores que consideravam seu trabalho criativo/
intelectual (47%). É possível supor que a necessidade de vender o produto torne
necessária a criatividade nos diálogos com o cliente. Já o maior percentual de teleoperadores que consideram seu trabalho técnico/complexo foi observado no call
center especializado em recuperação de crédito e help desk (26%). A prestação
de suporte técnico, que é a atividade-fim do help desk, justificaria o índice mais
elevado entre as três empresas analisadas. Nos três call centers analisados, os percentuais de teleoperadores que definem seu trabalho como rotineiro/repetitivo
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variou entre 26% e 37% dos entrevistados, sendo o maior percentual observado
no call center da empresa de distribuição de energia elétrica (37%).
O estudo concluiu que as estratégias de flexibilidade laboral presentes nas
empresas investigadas configuram-se a partir de variadas condições de emprego
e formas de organização do trabalho. Observou-se, também, que as relações de
trabalho são condicionadas tanto por questões estruturais do mercado de trabalho quanto pelo perfil das empresas, no que se refere às peculiaridades do gerenciamento da força de trabalho. (SILVA, 2006). Por seu turno, a percepção dos
trabalhadores sobre o trabalho que realizam se configurou num paradoxo, visto
que no call center da empresa distribuidora de energia elétrica, que apresentou
os melhores indicadores nas condições de emprego e formas mais participativas
de organização do trabalho, foi encontrado o maior percentual de teleoperadores
que consideram seu trabalho rotineiro/repetitivo.
Concluída a pesquisa que tratava das estratégias de flexibilidade laboral adotada nos três call centers da Região Metropolitana de Porto Alegre, restava investigar os motivos que levavam os teleoperadores com melhores condições de
trabalho e emprego a considerar seu trabalho mais rotineiro e repetitivo, comparativamente aos teleoperadores das outras duas empresas. Como o questionário
padronizado aplicado na pesquisa contemplava dados relativos à satisfação com
o emprego, buscou-se estabelecer relação entre o perfil sócio-ocupacional dos
trabalhadores e sua percepção sobre aspectos de satisfação com o emprego, mais
especificamente com relação a: 1) oportunidade de aprender; 2) atividade interessante; 3) oportunidades de promoção e; 4) reconhecimento dos méritos. Neste
sentido, buscou-se, através da realização de análise de regressão linear, determinar
em que medida as variáveis relativas ao perfil sócio-ocupacional dos teleoperadores, como sexo, idade, escolaridade, faixa de rendimentos, tempo de emprego, tipo
de atividade realizada e complexidade do atendimento, se relacionam à satisfação
com o emprego.
No estudo, o grau de satisfação com o emprego foi definido como percepção subjetiva do empregado em relação à sua ocupação. Entre diversas possibilidades de tentar apreender a satisfação com o emprego, foram selecionados
quatro indicadores: trabalho interessante, oportunidade de aprender, reconhecimento dos méritos e oportunidade de promoção. A escolha dos quatro indicadores sustentou-se nos objetivos do estudo, que visava avaliar a influência do perfil
sócio-ocupacional do empregado no seu grau de satisfação.
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Gráfico 2 - Grau de Satisfação dos Empregados - Trabalho
Interessante
Fonte: Silva e Mocelin (2009).
A satisfação relacionada à possibilidade de realização de trabalho interessante apresentou índices relativamente elevados. Somente 26 teleoperadores se
disseram insatisfeitos com esse quesito. Em contrapartida, constataram-se índices
semelhantes entre entrevistados que disseram estar razoavelmente satisfeitos ou
satisfeitos com esse aspecto, reunindo o total de 182 entrevistados.
O indicador relativo à satisfação com a oportunidade de aprender foi o que
apresentou maior percentual de entrevistados, bem como o menor percentual de
insatisfação. Neste sentido, acredita-se que as frequentes mudanças tecnológicas e
de conteúdo do trabalho realizado, em muitos casos de natureza técnica, colaborem para os elevados índices de satisfação encontrados.
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Gráfico 3 - Grau de Satisfação dos Empregados - Oportunidade de
Aprender
Fonte: Silva e Mocelin (2009).
Em relação à satisfação com o reconhecimento dos méritos, foi possível constatar índice de insatisfação mais elevado vis-à-vis aos aspectos anteriores. Constatou-se
também que, quanto maior o tempo de emprego, maior a insatisfação com relação ao
reconhecimento dos méritos. Isto se explica na medida em que, passado algum tempo,
o teleoperador percebe limitada a possibilidade de carreira na empresa, pois não foi
promovido ao cargo hierarquicamente superior, o de supervisor.
Gráfico 4 - Grau de Satisfação dos Empregados - Reconhecimento
dos Méritos
Fonte: Silva e Mocelin (2009).
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Gráfico 5 - Grau de Satisfação dos Empregados - Oportunidade de
Promoção
Fonte: Silva e Mocelin (2009).
Aspecto semelhante ao anterior, a satisfação em relação à oportunidade de
promoção foi a variável que apresentou níveis mais reduzidos de satisfação. Somente 45 dos 207 entrevistados se disseram satisfeitos com as oportunidades de
promoção. Por sua vez, o indicador “razoavelmente satisfeito” reuniu 95 entrevistados, e os insatisfeitos somaram 67. Assim como no caso da variável anterior
(reconhecimento dos méritos), quanto maior o tempo de emprego maior a insatisfação com a oportunidade de promoção.
Paralelamente à análise descritiva dos indicadores, o estudo se propôs realizar regressão múltipla linear, estabelecendo relação entre o perfil sócio-ocupacional dos entrevistados e seu grau de satisfação com o emprego. Com o intuito
de tornar mais homogênea a variável dependente do estudo, as quatro variáveis
relativas à satisfação com o emprego foram agrupadas em uma única variável,
através de recurso à análise fatorial. As variáveis independentes, oriundas dos
indicadores relativos ao perfil sócio-ocupacional dos entrevistados (sexo, idade,
escolaridade, faixa de rendimentos, tempo de emprego, tipo de atividade realizada
e complexidade do atendimento) foram relacionadas à satisfação com o emprego,
esta a variável dependente do estudo. O R² obtido com o modelo foi de 0,200.
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Tabela 1 - Resumo da Regressão
Modelo
R
R quadrado
R quadrado
corrigido
Erro típ. da
estimacão
1
,448(a)
,200
,167
,90417969
Fonte: Tabulação de Dados.
Em relação à significância, constataram-se melhores índices nas seguintes
variáveis independentes: tempo de emprego (,000); faixa de rendimentos (,098);
escolaridade (,132); e tipo de atendimento (,182).
O modelo de regressão demonstrou que a variável que condiciona de modo
mais significativo a satisfação com o emprego é o tempo de emprego, que possui
uma relação inversa com a satisfação, ou seja, quanto maior o tempo de emprego,
menor a satisfação com o emprego. A regressão demonstra que para cada unidade
de tempo de emprego (meses) a satisfação com o emprego diminui 0,434.
Tabela 2 – Coeficientes Obtidos na Regressão
Modelo
1
Constante
Coeficientes não
estandarizados
Coeficientes
estandarizados
t
Sig.
B
Erro típ.
Beta
B
Erro
típ.
-,711
,478
-,452
,636
Sexo
,191
,166
,082
1,153
,250
Idade
,004
,013
,023
,323
,747
-,109 -1,512
,132
Escolaridade
-,100
,066
Tipo de
atividade
,246
,184
Tempo de
emprego
-,042
,007
Complexidade
do atendimento
,194
,193
,080
1,005
,316
Faixa de
rendimento
,131
,079
,125
1,663
,098
,108
1,341
,182
-,434 -5,618
,000
Fonte: Silva e Mocelin (2009).
Os resultados obtidos na pesquisa apontaram que o tempo de emprego é o
principal indicador explicativo da (in)satisfação com o emprego. Neste sentido,
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quanto maior o tempo de permanência no emprego, maior a insatisfação com o
mesmo, motivando o desligamento voluntário do trabalhador, sobretudo quando
ele se qualifica ou encontra emprego melhor. O estudo constatou que os call centers tendem a se caracterizar, de fato, como ocupação ou emprego de passagem,
ou seja, um emprego temporário para suprir uma situação que o próprio empregado considera como transitória.
Assim, a recurso metodológico à Sociologia da heterogeneidade do trabalho permitiu o desenvolvimento do conceito de “emprego trampolim”, definido
como postos de trabalho temporariamente ocupados pelos trabalhadores, mas
que não são atrativos profissionalmente, sendo descartados quando o trabalhador
encontra uma melhor oportunidade ou conclui seus estudos, sua formação técnica
ou graduação. O ambiente favorável para a emergência do “emprego trampolim”
congrega duas dimensões fundamentais: por um lado, exige um trabalhador jovem, escolarizado, qualificado, criativo e, por outro, oferece salários relativamente
baixos, comparativamente aos requisitos de qualificação exigidos, poucas possibilidades de ascensão hierárquica, ritmo de trabalho intenso em alguns tipos de
teleatendimento (sobretudo relacionados ao telemarketing ativo), flexibilidade em
horários e preocupações com ergonomia. Condições estruturais do mercado de
trabalho influenciam o aumento da taxa de rotatividade nas empresas, bem como
a falta de identificação dos trabalhadores com a atividade que desempenham e
com a sua categoria profissional. Tais condições influenciam a reelaboração dos
sentidos do estar empregado e do estar desempregado, uma vez que o foco das
estratégias que definem o “emprego trampolim” não estaria fundado na obtenção
da estabilidade, e sim na superação transitória e individual das condições materiais
e simbólicas dos atores sociais envolvidos.
Considerações Finais
A problematização proposta neste artigo é, antes de tudo, conceitual, e o que
está em jogo é o poder heurístico do conceito de taylorismo, agora unido ao prefixo “info”, no intuito de analisar um mercado de trabalho situado na base da estrutura ocupacional da sociedade da informação. Desde o surgimento da Sociologia
como disciplina científica, os sociólogos têm reafirmado a importância do rigor
conceitual para o desvendamento da realidade social. Na Sociologia do Trabalho
contemporânea isso não é diferente. Mais do que uma tentativa de explicação de
um aspecto constituinte da vida social, discute-se o sentido da interpretação sociológica sobre o trabalho, suporte social estruturante das sociedades modernas.
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A abordagem generalizante do trabalho em call centers que se difundiu no
Brasil durante a última década, sustentada na tese da precarização generalizada do
trabalho, parece ter alcançado seu limite. Como contraponto, uma abordagem que
assuma a heterogeneidade do trabalho como pressuposto nos modelos de análise
permite que se articulem aspectos relativos às condições estruturais do mercado
de trabalho e às estratégias empregatícias dos trabalhadores. Nesta proposta, as
regularidades que por ventura sejam identificadas surgem no próprio processo
de desvendamento da realidade, e não da tentativa de readequação conceitual do
taylorismo.
O recurso à heterogeneidade permite o desenvolvimento de novos conceitos, que surgiriam não só das regularidades, mas também das singularidades,
seja de um segmento do mercado de trabalho, seja de uma ocupação específica,
bem como incorporando a percepção dos trabalhadores. Estariam em evidência
a possibilidade de produzir conhecimento sobre novas formas de uso e gestão
do trabalho, novas estratégias de dominação social, bem como o sentido que os
trabalhadores atribuem ao trabalho que realizam.
Em relação aos call centers, passados mais de dez anos da privatização do
monopólio estatal das telecomunicações no Brasil e da consequente expansão dos
serviços, pode-se afirmar que a atividade de teleatendimento se consolidou como
principal referência empírica na análise do processo de trabalho informacional.
Por aliar, de um lado, trabalhadores razoavelmente instruídos quando comparados aos níveis gerais do mercado de trabalho, e, de outro, baixos índices de
profissionalização, pode-se afirmar que o emprego em call centers se constitui num
paradoxo. O perfil sócio-ocupacional dos teleoperadores não segue o padrão das
atividades em que os trabalhadores estão coletivamente mais organizados, como
nas empresas de setores tradicionais, nem mesmo segue o padrão do mercado de
trabalho em geral, visto que apresenta especificidades vinculadas à natureza do
trabalho executado em call centers e às aspirações dos trabalhadores.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, R.; BRAGA, R. (Org.). Infoproletários: a degradação real do
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BRAGA, R. Crônicas de autômato: o infotaylorismo como contratempo. In:
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ORGANIZAÇÃO E PODER NO AMBIENTE
DE TRABALHO NUM CONTEXTO DE
LIBERALIZAÇÃO1
José Ricardo de Paula Xavier Vilela2
Antonio Carvalho Neto3
Mariana de Oliveira Vilela4
Introdução
Vivemos num contexto de liberalização crescente desde o rompimento
dos acordos de Bretton Woods, no início dos anos 1970, com a crise do sistema fordista de regulação e da proposta social-democrata de um capitalismo
mais inclusivo e menos excludente. Os partidos de origem social-democrata
que chegaram ao poder nos países centrais, depois de amargarem sucessivas
derrotas tiveram de se adaptar à nova lógica liberal de menos Estado e mais
mercado. Em alguns países a lógica liberal vigorou com mais força, em outros
com menos força, mas, ainda assim, sempre suplantou a reação social-democrata nestes quase quarenta anos. A própria social-democracia liberalizou seu
discurso, por assim dizer.
Mesmo com a aguda crise de 2008, causada pelos desvarios especulativos de
um mercado financeiro excessivamente desregulado, não há sinais significativos
de que esse rumo liberal na economia e na política seja modificado. No Brasil a
situação não é muito diferente, grosso modo, ainda que nos governos Lula tenha
havido maior intervenção do Estado na execução de políticas públicas de distribuição de renda, como o Programa Bolsa Família e o aumento do salário mínimo
acima da inflação.
Neste quadro de continuada liberalização, a organização, aqui entendida como a grande empresa capitalista, vem ganhando força cada vez maior
como lócus de poder. O que pretendemos neste estudo é discutir o poder nas
1 Agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) pelo apoio ao Núcleo
de Estudos em Recursos Humanos e Relações de Trabalho (NERHURT) do Programa de Pós-Graduação em
Administração (PPGA) da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), de onde se originou
este capítulo.
2 Mestre em Administração e Doutorando pelo PPGA da PUC Minas, pesquisador do NERHURT.
3 Doutor em administração, Coordenador do PPGA da PUC Minas; Coordenador da Divisão Gestão de Pessoas
e Relações de Trabalho (GPRT) da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração
(ANPAD); coordenador do NERHURT.
4 Mestranda em Administração pelo PPGA da PUC Minas, pesquisadora do NERHURT.
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organizações a partir de uma visão que busca integrar o espaço macro das relações de
trabalho (industrial relations na literatura internacional), sujeito aos determinantes socioeconômicos e políticos discutidos acima, ao espaço micro, de dentro da
empresa, consubstanciado na gestão de recursos humanos.
Pretendemos, aqui, dar um enfoque diferente e até certo ponto provocativo
à discussão sobre poder nas organizações, normalmente tratado a partir do equilíbrio (ou não) de poder entre os atores sociais coletivos. Partindo do ponto de
vista do indivíduo (que vai certamente refletir no coletivo), cientes do autoritarismo escravocrata que herdamos no Brasil, utilizaremos resultados de uma pesquisa
onde foi aplicada a escala de autoritarismo de Theodor Adorno nos dirigentes de
níveis tático e estratégico de cooperativas e de empresas em Minas Gerais para
discutir o poder nas organizações.
Qualquer tema que tenha como parte de seu conteúdo as relações de poder
é complexo e extenso, em função dos diversos enfoques que a ele podem estar
ligados e que são determinados pela origem (histórica, cultural, econômica e
social) de quem o aborda. Não se pode deixar de considerar os enfoques produzidos em contextos diferentes, ainda que pelas mesmas razões tenhamos de
realizar escolhas.
Para contextualizar a discussão, uma abordagem compreensiva das relações de poder em organizações no Brasil deve considerar os autores que se
dedicaram a analisar a sociedade brasileira na qual estão inseridas as organizações. Entre eles destacamos Roberto da Matta (1990, 1991, 1997), Raimundo
Faoro (2001), Marilena Chauí (1986), Sérgio Buarque de Hollanda e Darcy
Ribeiro, além de clássicos como Euclides da Cunha. O que se constata numa
revisão desse tipo é que as organizações estão inseridas em uma sociedade
“mestiça, múltipla, de ethos aristocrático, com marcas mais profundas deixadas pela escravidão do que nos demais países das Américas. Essa associação
predispõe ao autoritarismo, à síndrome de distanciamento com relação ao
poder.” (BERTERO, 2007, p. 36).
Pesquisas realizadas nas grandes organizações brasileiras, ao abordarem as
relações interpessoais, têm observado, tanto nas empresas quanto nas instituições
políticas do País, comportamentos caracterizados pelo distanciamento do poder,
personalismo e estilos pouco participativos de gestão (BARROS, 2004; BERTERO, 2007; HOFSTEDE, 1983) com extensão às organizações das características
observadas nas relações sociais no País.
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Um estudo das relações de poder nas organizações deve incluir uma abordagem sobre relações autoritárias entre indivíduos no Brasil. Para essa discussão
é realizada uma pequena revisão do referencial teórico que a sustenta. Assim,
neste capítulo estudaremos o poder nas relações entre indivíduos, em geral e no
trabalho, a partir de autores que pesquisaram o tema no plano internacional e no
Brasil. Para situar a discussão no ambiente de trabalho será feita, também, uma
breve revisão que buscará contextualizar a evolução na compreensão das relações
de trabalho e do campo da gestão dos recursos humanos.
Trata-se, aqui, de abordagem que vai ao encontro de importante corrente teórica de relações de trabalho que tem buscado analisar essas relações em conjunto
com a gestão de recursos humanos, integrando a visão macro e micro. (KATZ;
KOCHAN; WEBER, 1985; KOCHAN, 2000; KAUFMAN, 2002).
Por fim, chamamos a atenção para o fato de que, para conduzir as discussões relativas às relações de poder, optamos por contextualizá-las, considerando
as diferenças na estrutura organizacional e procurando não desconsiderar, como
variável relevante, o comportamento autoritário dos indivíduos.
Referencial Teórico
Primeiramente, procuraremos recuperar o desenvolvimento do papel das
pessoas nas empresas, utilizando para isso os estudos realizados sobre o desenvolvimento da gestão de recursos humanos, de um lado, e o das relações de trabalho, de outro, até o momento atual. Para facilitar a compreensão do quadro atual
utilizaremos uma tipologia de gestão de recursos humanos que ajude a identificar
as tensões existentes em cada modelo descrito para as organizações.
Como a tensão em um relacionamento põe em evidência, para a sua resolução, as relações de poder, será feita, a seguir, uma abordagem sobre o tema do
poder na literatura, inicialmente envolvendo as organizações em geral, e, depois,
um breve apanhado das discussões envolvendo o poder no Brasil e nas organizações brasileiras.
Devido à extensão do tema e à limitação de espaço neste capítulo, a abordagem deverá ser necessariamente sucinta, ficando como sugestão, para o leitor
interessado em se aprofundar na matéria, referenciar-se à bibliografia citada.
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A Origens da Gestão de Recursos Humanos e das Relações
de Trabalho
Como veremos mais à frente neste texto, a maioria dos autores que conduziram as discussões sobre o poder nas organizações – pelo menos, os do mainstream das discussões, situada no campo funcionalista – teve como foco prioritário a
estrutura. O indivíduo, ainda que considerado – uma vez que é ele quem exerce ou
sofre os efeitos do poder – ficou relegado a um segundo plano nessa discussão. É
uma tendência que pode ser identificada já no modo como os indivíduos foram
considerados na evolução histórica do seu papel nas organizações.
Kaufmann (2002) faz uma abrangente revisão das origens do campo acadêmico de estudos na área de gestão de recursos humanos. Toda a literatura
sobre temas que basicamente são hoje objeto da gestão de recursos humanos,
num primeiro período – até os primeiros anos da décasda 1920 – foi escrita por
economistas, em revistas de Economia. Foi também nessas revistas que o autor
identificou muitas referências a cursos sobre administração de pessoal, que eram
ministrados por economistas, com temas basicamente na área que seria hoje considerada como relacionada à gestão de recursos humanos.
O foco principal de preocupação dos economistas eram os problemas do
trabalho – alto turnover, baixos salários, gerenciamento arbitrário e autoritário,
jornada de trabalho excessivamente longa. A despeito disso, muitas das soluções
propostas para os problemas do trabalho, identificados pelos economistas, vieram de outras áreas como Sociologia, Ciências Políticas e Administração – já que
o trabalho era, desde então, considerado temática multidisciplinar. As soluções
envolviam atores diferentes: empregadores, na forma de práticas mais eficazes de
gerenciamento de pessoal; trabalhadores, na forma de sindicalização; e comunidade, que deveria proteger os seus trabalhadores através de leis trabalhistas.
Paralelamente, o sucesso dos testes de aptidão aplicados pelo Exército norteamericano para o recrutamento de trabalhadores na Primeira Guerra Mundial também traz para a discussão os psicólogos industriais. O foco destes últimos estava
na realização dos testes psicológicos, com o que chamaram a atenção dos homens
de negócio e dos consultores – cuja preocupação estava voltada para a técnica e a
implementação de práticas mais eficientes de gestão de recursos humanos.
Na década de 1920, o termo mais utilizado para falar de todas essas áreas
era Relações Industriais ou Industrial Relations (RI), compreendido como envolvendo as relações de negociação coletiva, dentre as quais se incluem as relações
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sindicais e as relações diretas do trabalhador com o empregador. O que se percebe
é o termo RI envolvendo atividades multidisciplinares que podem ser subdivididas em dois grandes eixos: o primeiro, que diz respeito ao gerenciamento da força
de trabalho dentro da organização, e o segundo, relacionado à atividade sindical.
A partir das experiências de Elton Mayo, nos EUA, da década de 1930, sobre a relação entre melhores condições de trabalho e aumento da produtividade,
começa-se a perceber uma separação entre os temas tratados pelos economistas
do trabalho e a gestão de recursos humanos. Essa separação está representada nas
décadas de 1940 e 1950 pelo human relations movement, e atinge o seu apogeu na
década de 1970. Existem, ainda, duas outras razões que justificam essa separação:
(1) a preocupação maior na economia neoclássica com o mercado, e menor com
a ação das pessoas; e (2) a especialização e a funcionalização da administração de
negócios, exigindo a especialização de pessoas no conhecimento específico para
o atendimento às necessidades identificadas nessa área.
Após a Segunda Guerra Mundial, começa-se a perceber o início do interesse de PhDs em Sociologia e Psicologia pela área de negócios. Mas, enquanto as
discussões sociológicas progrediam, era possível constatar três fatores que dificultavam o progresso da Psicologia nesse campo: (1) o fato de que ela veio de uma
área evidentemente fora da área de negócios; (2) o fato de que a preocupação dos
psicólogos em geral com a área de psicologia industrial naquele momento era pequena; e (3) que os estudos em Psicologia estavam ligados a uma área considerada
periférica para os assuntos de negócios.
Na década de 1970, a crise econômica mundial motivou os estudiosos a
pesquisarem as diferenças na forma de gestão de recursos humanos em países
como o Japão. Surgiu, então, o enfoque sobre a cultura organizacional, que parte
do pressuposto de que cada organização, cada empresa desenvolve uma cultura
própria. Surgiram também autores que tratam da relação entre essa cultura organizacional e a cultura nacional do país onde as organizações foram geradas ou do
país que as hospeda. O trabalho de Hofstede (1983) neste sentido é emblemático.
Já nos dias atuais, Kochan (2000) estuda as RI nos países mais desenvolvidos
da Europa e nos Estados Unidos. Kochan (2000) identifica mudanças importantes que estão ocorrendo, fundamentadas principalmente no papel exercido pelo
conhecimento, pela informação e pelo próprio capital humano. Essas mudanças
tendem a modificar o papel e o poder dos sindicatos, desviando o poder de sindicatos mais centralizados para representantes dos trabalhadores de cada empresa
– principalmente no caso de empresas maiores. Também para o empregador as
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novas formas de estruturação dos negócios – como redes e parcerias estratégicas
– têm diminuído o poder de um setor da economia de forma mais centralizada,
derivando novamente para o gestor individual.
Para Kochan (2000), a discussão atual sobre as RI deveria incluir outros
atores que estão se mostrando relevantes no cenário do trabalho: as mulheres, os
trabalhadores mais jovens, os ambientalistas, os estudantes e muitos outros movimentos sociais, como os de consumidores – ao contrário de se considerar somente os atores sociais coletivos tradicionais, os trabalhadores e os empregadores.
Esses estudos permitem que se trace um paralelo entre o que foi desenvolvido para as RI e o conhecimento das relações de poder nas organizações –
evoluindo de uma visão toda voltada para a estrutura para aquela que considera
o indivíduo como o ator mais importante da investigação. A estrutura nunca foi
abandonada como um dado relevante nesses estudos, mas sua importância tem
sido relativizada, dependendo da linha teórica seguida pelo autor, como será visto.
Para que esta discussão fique ainda mais clara, traçaremos, a seguir, a relação
entre a estrutura das organizações e os modelos atuais de gestão de recursos humanos, com suas tensões, como foi proposto por Nizet e Pichoult (2007). Esse é o
modelo que parece mais adequado para os objetivos propostos para este capítulo.
Tipologia dos Modelos Atuais de Gestão de Recursos
Humanos (GRH) e suas Tensões
Nizet e Pichoult (2007) estabelecem uma relação entre a configuração da
organização baseando-se nas clássicas cinco configurações propostas por Mintzberg (1995) e as diferentes formas utilizadas pelas organizações para lidar com o
seu subsistema social. O resultado é uma tipologia também com cinco modelos,
sumarizada como segue:
(a) Modelo arbitrário: é o modelo mais encontrado em organizações familiares (ou que possuem poucos donos), principalmente nas fases iniciais de sua
existência, mas que pode se estender por um longo período de seu crescimento
enquanto o poder estiver ligado a uma liderança de caráter carismático – como
essa terminologia é compreendida na definição weberiana. (WEBER, 1974). Possui práticas de Gestão de Recursos Humanos (GRH) que são definidas pelo dirigente da empresa, sem referência a qualquer critério pré-estabelecido, uma vez
que o poder é exercido sem limites por um líder carismático;
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(b) Modelo objetivizador: as práticas se relacionam a critérios formalizados
e impessoais, onde a padronização de procedimentos ou resultados é definida em
convenções coletivas e aplicada indistintamente a todos os que compõem a organização. É o modelo preferencialmente encontrado em organizações burocráticas
– também da forma como a burocracia foi definida por Weber (1974);
(c) Modelo individualizador: as práticas são definidas por negociações interpessoais, sendo específicas para cada indivíduo – geralmente pessoas bem qualificadas – que as definem junto ao seu superior na escala hierárquica. É o modelo
que se espera encontrar em uma adhocracia – da forma como esta foi definida
por Mintzberg (1995);
(d) Modelo convencionalista: também envolve profissionais bem qualificados, que definem coletivamente regras e procedimentos válidos para todos, e
aos quais se submetem livremente. É o modelo que se espera encontrar em uma
configuração profissional onde as normas são definidas em debates, nos quais
se permite o contraditório, visando à coexistência de especialistas que possuem
autonomia operacional – como acontece, por exemplo, em universidades e em
hospitais; e
(d) Modelo valorativo: supõe que os valores que mobilizam os trabalhadores
da organização seriam mais legítimos ou importantes que práticas de GRH, afastando qualquer tentativa de implantação dessas práticas. É o mais encontrado em
uma configuração “missionária” – como esta foi definida também por Mintzberg
(1995).
Poderemos supor que essas relações não sejam estanques e que, na prática
do dia-a-dia das organizações algumas descontinuidades entre as configurações
e o modelo de GRH sejam percebidas. Isso pode ocorrer em função de muitas
variações como, por exemplo, a presença de programas de modernização de práticas de GRH, que não atingem a configuração da organização ou, ao contrário,
de mudanças estruturais que são implantadas sem se abandonar práticas já estabelecidas de GRH. Entretanto, para efeitos práticos e didáticos, essa tipologia dos
cinco modelos continua sendo útil.
Como é possível encontrar em todo dado da realidade, em cada um desses modelos poderemos identificar tensões entre os indivíduos envolvidos no
processo, tensões estas que são geradas a partir de suas próprias características.
Nizet e Pichoult (2007) identificam em cada modelo um elemento que é nuclear
para a tensão. A partir da compreensão da tensão é possível fazer uma pequena
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discussão sobre como os indivíduos envolvidos mobilizam elementos presentes
no contexto para legitimar sua posição, permitindo estabelecer a relação do poder
dentro das organizações com os modelos de gestão de recursos humanos. O conjunto final pode ser sumarizado da seguinte forma:
(a) No modelo arbitrário: a tensão está entre a sujeição e a delegação. Aqui,
temos a dependência – ou subordinação – do trabalhador ao dirigente empresarial, em tensão com a necessidade de implementar formas de participação e de
delegação. A “confiança” é o elemento que está no centro dessa tensão: de um
lado, o dirigente confia em alguns – aos quais tende a delegar poderes – e não confia em outros; por outro lado, subordinados procurarão “merecer” a confiança do
líder buscando estabelecer com este relações de lealdade –, como foi identificado
nas pesquisas de Barros (2004). Esse elemento central pode determinar o nível
de confiança do gerente, aumentando a autonomia dos trabalhadores, ou a necessidade de adesão a um líder. Por isso mesmo, a sucessão do líder é o momento
crucial no qual essa tensão pode ser evidenciada colocando em xeque a própria
sobrevivência da organização;
(b) No modelo objetivador: a tensão está entre a transparência (própria de
uma estrutura impessoal) e a reapropriação do trabalho pelo trabalhador – melhor
evidenciada pela resistência do trabalhador à racionalização do seu trabalho. Essa
resistência pode ser identificada tanto em manobras individuais – que, no caso,
podem ser anuladas pela estrutura – como em manobras coletivas que, consideradas mais estratégicas, visam a negociar as condições de trabalho. Essas últimas, se
fracassadas num primeiro momento podem ser logo apropriadas pelo sindicato
em ações coletivas mais organizadas. O elemento central que estaria em jogo aqui
seria a neutralidade – elemento próprio de uma estrutura burocrática. A neutralidade como questão central pode tanto determinar a preocupação com racionalização e transparência, de um lado, como com o estabelecimento de mecanismos
de defesa contra as intervenções da administração, de outro;
(c) No modelo individualizador: a tensão estaria na autonomia controlada
– melhor expressa na relação salarial do trabalhador. O caso mais típico para a
exemplificação são as empresas de tecnologia da informação, onde pode não haver pressão relacionada à autorização formal para folgas ou ausências eventuais.
Em contrapartida, há certa pressão para que os trabalhadores executem atividades
que excedam as suas horas de trabalho – por exemplo, ajudando membros da
equipe em atividades que devem ser executadas fora do turno normal ou em finais
de semana – ou a reduzir o número de dias de férias efetivamente gozadas. O
elemento central nas relações aqui seria a responsabilização do indivíduo com sua
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tarefa. A flexibilidade no horário, que se relaciona com a responsabilização, tanto
pode tender para o aumento da autonomia do trabalhador como para o aumento
do controle sobre seu trabalho e para a extensão de sua jornada de trabalho;
(d) No modelo convencionalista: a tensão está entre a autoridade individual e
a coletiva – e o elemento central para a compreensão das relações seria a questão
do domínio. A dúvida – relacionada à questão do domínio – estaria no estabelecimento do limite entre práticas que são fruto de acordo e as que dependem da interferência de uma autoridade. Nizet e Pichoult (2007) propõem que nesse grupo
(que é um tanto heterogêneo), profissionais cuja atividade envolve procedimentos
formais (como juristas e contadores) tenderão a formalizar mais suas práticas do
que profissionais como médicos e psicólogos que, pelas características de sua atividade, tendem a resistir às formalizações. No que se refere à gestão dos recursos
humanos, a questão do domínio tanto pode derivar para um mínimo de convencionalismo que garanta uma maior autonomia aos profissionais quanto para uma
tendência a minimizar as lacunas nas normas e na legislação, determinando um
esforço voltado para a estruturação de normas de conduta – como ocorre com
os códigos de ética;
(e) No modelo valorativo: a tensão está entre a unidade e a diversidade – e
o elemento central para a discussão é a questão da legitimidade. Questões como
promoção, remuneração etc., não são consideradas como legítimas, pois o que
importa para esses indivíduos são os valores que mobilizam os membros da organização. O desafio estaria em conciliar um objetivo comum com o compromisso,
que é voluntário, dos indivíduos. Essa conciliação pode gerar desequilíbrios que
podem comprometer ou o projeto coletivo ou os compromissos individuais. A
questão central, estando na legitimidade do projeto, vai tencionar a discussão entre a priorização do desenvolvimento pessoal e das relações sociais, ou a priorização dos objetivos envolvidos na missão da organização.
Essa tensão, associada com as modalidades observadas para o tratamento de
todos os conflitos, nos remete para o próximo item, que se refere ao estudo das
relações de poder dentro das organizações.
O Poder nas Organizações
Da mesma forma como ocorre no estudo da teoria das organizações, o estudo das relações de poder entre os indivíduos nessas mesmas organizações também admite diversos enfoques.
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O enfoque dominante no campo da administração é o sistêmico funcionalista, que tem em Talcott Parsons (1967, 1951) um de seus representantes mais
importantes. Este autor diferencia quatro formas de exercício do poder: a persuasão, a ativação de compromissos, o incentivo e a coerção. Sem nos determos em
discussão mais detalhada, podemos sumarizar sua abordagem dizendo que, para
ele, o que produz o poder é a mobilização, por quem exerce o poder, do consentimento daquele sobre quem o poder é exercido. (FARIA, 2003).
Outro enfoque muito utilizado e que orientou boa parte da discussão até
meados do século XX, é o weberiano. Resgatando a sua abordagem sobre a burocracia, nesse enfoque é a posição ocupada por um indivíduo numa relação social
a fonte de seu poder. Os conceitos mais importantes que são utilizados para a
compreensão desse enfoque são os que envolvem a dominação, a obediência e a
disciplina. (WEBER, 1974).
Também vem de Weber a visão que deriva o poder do conhecimento das
operações. Esse conhecimento confere, a quem o detém, a capacidade de controlar não os meios (como é o caso do capitalista), mas os métodos de produção
– relacionando-o com as identidades ocupacionais que estão na base da vida subjetiva das organizações, conferindo a quem o detém algum nível de criatividade,
de discernimento e os meios para o uso do poder. (HARDY; CLEGG, 1996).
Uma consequência do enfoque weberiano (baseado na natureza hierárquica
do poder), que foi apropriado por autores de orientação funcionalista, é que, derivado da estrutura organizacional, a autoridade, no exercício do poder, o transforma em um poder que é tomado como “legítimo”. Seu contraponto é o poder
que é exercido fora das estruturas hierárquicas de autoridade, onde a dicotomia
existente entre poder e autoridade está na origem do surgimento de outro tipo de
poder que, por estar situado fora dessa estrutura será considerado como “ilegítimo”. Muitas discussões envolvendo política nas organizações têm como fundamento essa visão. (MINTZBERG, 1983; PETTIGREW, 1973).
Essa dicotomia entre poder e autoridade em torno da legitimidade também
está na base das discussões sobre o poder nas organizações, que envolve as contingências e a dependência de recursos. Nessas discussões, são vários os fatores
identificados com a origem real do poder – ainda que este não seja visto como
legítimo. Entre eles, encontram-se o controle da incerteza (CROZIER, 1981); o
controle da informação (PETTIGREW, 1973); a especialização técnica, a credibilidade, a posição e o prestígio do indivíduo na estrutura (PETTIGREW, 1973); o
acesso e a facilidade para contatos com membros do alto escalão, o controle do
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dinheiro, além dos mecanismos de recompensas e sanções. (FRENCH; RAVEN,
1975). Essa forma de exercício de poder seria a mais comumente observada entre
membros de escalões inferiores na estrutura hierárquica, de acordo com essa linha
de autores – daí, numa posição que se pode considerar como ideológica, cujo
poder é descrito como ilegítimo.
Mas as relações de poder também podem ser abordadas a partir do efeito
que o poder exerce sobre o indivíduo nas organizações, e não somente a partir do
agente que o exerce. Desde visões pragmáticas, como as desenvolvidas pela Escola
de Relações Humanas – cujos representantes mais importantes foram Elton Mayo e
Chester Barnard, nos Estados Unidos, até as análises atuais – o comportamento do
indivíduo e sua relação com o meio é que têm sido objeto desses estudos.
De maior importância nessa linha, pela produção acadêmica existente, são as
correntes chamadas comportamentais. Dentre diversas, Faria (2003) destaca duas
que estão entre as mais importantes, mas que partem de fundamentos opostos:
uma primeira, derivada da psicologia behaviorista, que é representada por autores
como Dahl (1957, 1963) e French e Raven (1975); e a outra baseada nos estudos
de Vygotsky (1991), relacionada com o discurso e, portanto, com as relações entre
os indivíduos.
Mais recentemente, também enquadrados na linha comportamental, mas na
ótica das consequências sobre quem o poder é exercido, estão incluídos os trabalhos
de Foucault sobre o poder disciplinar, que tem sido cada vez mais utilizado nos
estudos organizacionais. Alcapadini e Silva (2001) têm uma pesquisa realizada que
utiliza os fundamentos foucaultianos sobre o poder disciplinar, onde observa que,
conforme Foucault apontou, o regime de poder disciplinar
transforma um poder que era claro e localizável em um poder
que atinge toda a sociedade sem ser percebido. Com a disseminação da disciplina na empresa, percebemos que o foco do
poder desaparece. (ALCAPADINI; SILVA, 2001, p. 13).
Na mesma linha, se encontram os trabalhos de autores como Pagès et al.
(2006), que abordam o poder que as organizações exercem sobre o indivíduo.
Uma discussão mais extensa desse grupo de autores, apesar de interessante, não
será realizada, pois foge ao escopo deste capítulo.
Exercendo um papel ainda mais fundamental para os debates ocorridos durante todo o século XX, encontra-se o modelo construído a partir de Marx, para
quem o poder é derivado da propriedade ou do controle dos meios de produção.
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As análises das relações de poder nesse modelo estão baseadas na dominação
econômica e na subordinação que ocorre dentro das relações de produção. E
a ênfase para o campo dos estudos organizacionais recai no papel da mudança
como resultado final do processo social. A produção literária nesse campo é muito extensa, mas pode ser subdividida em dois grandes grupos, dentro da linha de
nossa discussão – que procura tencionar o papel do indivíduo e o da estrutura –
utilizando os paradigmas sociológicos de Burrel e Morgan (1979) para a análise
das organizações:
(a) o radical estruturalista enfatiza as relações estruturais do mundo social
como o foco para a análise. A mudança é parte da ênfase nesse grupo, mas a visão
comum dos teóricos dessa linha é a de que a sociedade contemporânea é caracterizada por conflitos que estão na origem das mudanças, as quais só ocorrerão
por intermédio de crises econômicas e políticas. Além dos teóricos que estiveram
na origem das revoluções socialistas da primeira metade do século XX, outros
nomes recentes que se associam a esse paradigma são os de Althusser, Poulantzas
e Dahrendorf, apenas para citar alguns. O outro paradigma é:
(b) o radical humanista, cujas análises partem do homem e de sua subjetividade, também enfatiza a mudança, interessando-se pelos modos de dominação
do homem, pela privação imposta aos indivíduos, e pela potencialidade existente
no indivíduo para sua emancipação. Autores como Lukács e Gramsci, e aqueles
autores ligados à que é conhecida como a “Escola de Frankfurt”, são os que melhor representam essa linha de abordagem – sendo estes últimos importantes em
nossa discussão por estarem na base das pesquisas que produziram a Escala “F”
de Theodor Adorno, que deu origem à escala utilizada para a pesquisa de autoritarismo, que será posteriormente discutida.
Com isso, temos aqui um apanhado geral de como se conduziram as discussões sobre o poder nas organizações na literatura internacional. Mas essas
discussões não passaram despercebidas por autores brasileiros que lidaram com o
tema. Assim, é preciso rever, ainda que também sumariamente, como o tema foi
abordado em nosso meio.
O Poder nas Organizações no Brasil
O poder na abordagem das relações entre indivíduos no campo da administração no Brasil tem sido secundário, realizado mais comumente com a finalidade
pragmática de utilizá-lo como instrumento de gestão. Na tentativa de compreen-
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der aspectos como o autoritarismo, o distanciamento do poder, o personalismo e
a baixa ocorrência de estilos mais participativos em nossas empresas, percebe-se
uma tendência para a utilização de trabalhos de acadêmicos que se dedicaram a
analisar a formação cultural de nossa sociedade. (BERTERO, 2007).
Antropólogos, sociólogos e filósofos que buscaram compreender as relações sociais no Brasil têm caracterizado a sociedade brasileira como autoritária.
(CHAUÍ, 1986; DAMATTA, 1991, 1997). Esse autoritarismo se expressa, entre
outras coisas, pela criação da figura social do “senhor-cidadão”, que tem na cidadania um privilégio de sua classe ou uma concessão da classe dominante às
demais. Diferenças e assimetrias sociais são transformadas em desigualdades, evidenciadas em relações hierárquicas de mando e obediência. Os indivíduos em
nossa sociedade se distribuem em superiores e inferiores, ainda que essa posição
possa mudar de uma relação para outra, e as relações entre eles ocorrem na forma
de dependência, tutela, concessão e favor. O paternalismo e o clientelismo são
considerados naturais, e são tomados como qualidades positivas do “caráter nacional”. As leis são armas usadas para manter privilégios, e não instrumentos para
definição de direitos e deveres. São consideradas inúteis, passíveis de ser violadas,
e não de serem contestadas ou transformadas, sendo que a violação é violentamente reprimida nas classes populares e permanece impune para os “indivíduos
superiores.” (CHAUÍ, 1986).
Essa divisão dentro da nossa sociedade foi extensamente abordada por DaMatta
(1997), que evidencia “a casa e a rua” como duas categorias sociológicas fundamentais para a compreensão da sociedade brasileira, diferenciando a pessoa (da casa) do
indivíduo (da rua). O discurso do dominador é mais da “rua”, carregado de componentes legais e de formalismos burocráticos, enquanto o dos subordinados é mais
da “casa”, fundado na amizade e no compadrio e vazado de conotações morais. A
separação autoritária das duas posições sociais fica evidente no “rito” do “Você sabe
com quem você está falando?.” (DAMATTA, 1990).
Fazendo a transposição
do autoritarismo da sociedade para o estudo das organizações, Faria (1985) faz a escolha de colocá-lo no centro da teoria geral da Administração, elaborando-o dentro
de seus diferentes enfoques. De acordo com esse autor, uma teoria aplicável sobre o
poder acabaria por ser também uma teoria das organizações, na qual o autoritarismo
envolveria relações não apenas econômicas, mas políticas e sociais.
Nessa linha, alguns autores são já clássicos nos estudos sobre poder e organizações no Brasil, entre os quais podemos citar os trabalhos de Motta (1990) e
Tragtenberg (1971, 1980), que devem ser pesquisados por quem se interessar em
se aprofundar no tema.
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Mais recentemente, Barros (2004), estudando os sistemas de ação cultural nas
organizações brasileiras, identifica que a herança autoritária do patriarcado rural,
estendida às relações organizacionais, se manifesta nas formas de mandonismo,
protecionismo e dependência – características de atitudes paternalistas. De acordo
com seus estudos, os brasileiros funcionam orientados pela autoridade externa, e o
liderado se habituou, desde as relações familiares, com uma estrutura hierarquizada
de poder. A consequência disso é a transferência de responsabilidade para a liderança. Os líderes, por sua vez, interpretam essa postura como falta de segurança para
assumir responsabilidades, o que determina o aumento de controle sobre as ações
dos subordinados, fechando um círculo vicioso. O resultado é que existe uma forte
tendência à concentração de poder nas empresas brasileiras, que é exercido de forma autoritária, mesmo que disfarçado em comportamentos inclusivos.
O ethos autoritário é, então, considerado como central na determinação das
relações que serão estabelecidas nas organizações no Brasil. Se considerarmos que
o comportamento autoritário envolve características ligadas à personalidade, para
se obter um estudo compreensivo dessa expressão nos relacionamentos é preciso
identificar, nos indivíduos, características que possam propiciar o estabelecimento
de relações autoritárias.
Nessa linha, realizamos pesquisa para investigar aspectos da personalidade que estão ligados ao comportamento autoritário, envolvendo os mais altos
níveis de direção de empresas e cooperativas do Estado de Minas Gerais. (VILELA, 2008). Uma das finalidades da pesquisa foi avaliar se as organizações que
escolhem democraticamente seus dirigentes, como as cooperativas, tenderiam a
escolher pessoas que possuíssem características de personalidade que tivessem o
potencial de facilitar o estabelecimento de relações menos autoritárias.
A pesquisa revelou que o nível de autoritarismo do grupo de dirigentes de
cooperativas, na população estudada, é maior do que o observado entre os dirigentes de empresas. E, ainda, que o nível de autoritarismo dos gerentes – que é semelhante quando se compara gerentes de empresa e de cooperativa –, é maior que
o nível de autoritarismo dos diretores de empresa. Os trabalhadores não foram
objeto de investigação nesse primeiro momento, mas é possível se questionar se,
a partir da teoria, não se poderiam esperar resultados semelhantes (esta pesquisa
está sendo conduzida no momento por um dos autores deste capítulo, do mesmo
grupo de pesquisa).
Esse resultado está em desacordo com o que, a partir das informações anteriores e do senso comum, se esperaria encontrar – ou seja, que numa sociedade
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de ethos autoritário esse aspecto das relações deveria estar expresso na estrutura
hierárquica. Isso reforça a necessidade de se compreender o indivíduo que está na
estrutura, e não apenas a estrutura.
Pensamos ser adequado no momento fazer um breve histórico sobre a Escala F de Adorno, que utilizamos na referida pesquisa, para que se possa compreender o tipo de informação que foi obtida.
Breve Histórico da “Escola de Frankfurt” e
da Escala “F” de Adorno
No final da década de 1920, foi criado na Alemanha o Instituto de Pesquisa
Social - Institut für Socialforschung (ISF), vinculado à Universidade de Frankfurt. O
objetivo inicial era gerar conhecimento e compreensão sobre a vida social, em sua
totalidade, sendo, por isso, desde o seu início, intensas as tentativas de integração
do pensamento de Freud com o de Marx. Um dos motivos para essa aproximação
foi compreender por que, durante a grande depressão dos anos 1930 – contrariando as previsões da teoria de Marx – a classe operária pensou e agiu contra os
seus próprios interesses. Nesse contexto, a psicanálise é chamada para ajudar na
explicação da ação, considerada irracional, da classe operária no apoio ao nazismo. (ROUANET, 1989).
Nessa linha de investigação, em 1936, Horkheimer (que foi o segundo e mais
influente diretor do ISF) publicou, a partir de uma pesquisa empírica realizada
em associação com Erik Fromm (à época também membro do ISF), os Estudos
sobre Autoridade e Família, uma reflexão teórica que se constituiu em uma das
bases para outro estudo, de maior sofisticação metodológica e consequência teórica, que foi A Personalidade Autoritária.
O contexto desse último trabalho é a década de 1940, já numa fase em que,
com o pleno emprego nos Estados Unidos e com a sociedade da abundância no
pós-guerra imediato, se percebia a assimilação operária ao capitalismo. A pergunta que motivava a investigação dos frankfurtianos nesse momento era: “como
era possível que a maioria da população nos países industrializados do mundo
pensasse e agisse num sentido favorável ao sistema que a oprime?”. Adorno e
Horkheimer procuravam saber o porquê da livre escolha dos homens pelos seus
próprios opressores, e o porquê de a vítima se tornar perseguidora de si mesma.
Para eles, Marx teria confundido dominação com exploração, sendo a dominação
um fenômeno anterior, mais complexo e mais difícil de ser resolvido, pois, se a
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exploração econômica pode ter um fim, o desejo de comandar e o de servir permanecem. (ROUANET, 1989).
Para a produção de A Personalidade Autoritária Adorno se uniu, ao final da
década de 1940, a psicólogos pesquisadores da Universidade de Berkerley, para
um estudo empírico guiado pela hipótese de que as convicções sociais, políticas
e econômicas do indivíduo formam um padrão coerente, que é a expressão de
traços das camadas profundas da sua personalidade. A finalidade inicial do estudo
era responder as seguintes perguntas: (1) Se existe um indivíduo potencialmente
fascista, como ele é? (2) O que acontece para que pensamentos antidemocráticos
se desenvolvam? (3) Quais são as forças constituintes dentro da pessoa? (4) Se
essa pessoa existe, quão comum é sua existência em nossa sociedade? E, (5) se ela
existe, quais foram os determinantes para o seu surgimento e qual será o curso de
seu desenvolvimento?. (ADORNO et al., 1982).
Com a finalidade de adaptação à realidade brasileira, a escala original
de Adorno sofreu algumas alterações e o resultado foi denominado “Escala
AUT®” (estatisticamente validada). Nas pesquisas realizadas em todo o mundo
com base na escala “F” são consideradas escala original de Adorno aquelas que
contenham no mínimo 12 itens da escala original (CARONE, 1995), como é o
caso da escala AUT.
Vilela (2008) a aplicou a 75 dirigentes e 158 gerentes de cooperativas, a 140
dirigentes e 650 gerentes de empresas privadas do Estado de Minas Gerais. Foram
selecionadas empresas nas quais os dirigentes foram escolhidos para o cargo, eliminando, assim, os dirigentes que são donos das empresas ou que as herdaram, na
tentativa de equiparar, sob esse aspecto, os dois grupos de dirigentes. O resultado
mostrou que na casuística selecionada, usando a Escala “F” de Adorno adaptada,
os dirigentes de sociedades cooperativas demonstraram personalidade que se expressava com características mais autoritárias do que a de dirigentes das empresas
privadas. E que os gerentes, apesar de semelhantes nos dois grupos, possuíam
características mais autoritárias do que os diretores de empresas.
Uma discussão mais ampliada da escala foge ao escopo deste capítulo. No
entanto, não se deve deixar de assinalar que sua aplicação só tem sentido – e
deverá ser interpretada – dentro do referencial teórico da teoria crítica. Sem este
cuidado, o que ela evidencia pode estar sujeito a confusões conceituais ou a usos
ideológicos – como aconteceu com muitos dos pesquisadores que a utilizaram
fora de contexto, desde que os seus resultados foram publicados na década de
1950. (CROCHIK, 1995, 2001; CARONE, 1995).
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Considerações Finais
Do que foi visto até aqui, pode-se dizer que os estudos sobre as relações de
poder nas organizações, na forma como existem hoje, têm consequências não
apenas de ordem teórica, mas podem orientar discussões que terão consequências
práticas, como, por exemplo, duas contidas no tema que tem interessado ao nosso
grupo de pesquisa: uma relacionada à gestão da mudança organizacional; a outra,
relacionada à compreensão das relações entre diversos atores organizacionais com
a finalidade de repensar modelos de governança para determinadas organizações.
Com relação ao primeiro item – o da mudança organizacional – é importante
salientar que a não compreensão do relacionamento entre a estrutura e o modelo
de gestão dos recursos humanos pode ser um fator importante para o insucesso
de programas de mudança. Esses programas têm sido estabelecidos a partir de
modelos genéricos, acompanhando os modismos próprios da área de administração, veiculados de forma também genérica por “gurus” e consultores que buscam
a aplicação de “fórmulas” gerais que pensam poder servir para qualquer organização, ou por gestores ansiosos por aplicarem as novidades aprendidas nos MBAs
de preparação de administradores, com visão mais pragmática e superficial.
O outro aspecto – que se relaciona com os modelos de governança – também tem interessado ao nosso grupo de pesquisa. Autores como Jackson e Carter
(1995) propõem uma reflexão baseada em Foucault que pode ser usada como
ponte para a discussão sobre a governança como forma de poder. Pode-se sumarizar a discussão, em termos bem gerais, da seguinte forma: a governança corporativa, como aplicada atualmente nas organizações é, a partir de Foucault, o
governo das pessoas, não o governo pelas pessoas, ou para as pessoas. (JACKSON; CARTER, 1995). Se existem informações cuja revelação é determinada
pela legislação, pode-se dizer que todas as demais dependem de escolha. Para se
conhecer bem uma organização, a pergunta relevante então deveria ser: quem tem
o poder de escolher o que revelar, e quais são as bases dessa escolha? A partir daí,
identificar quais as consequências dessa escolha e quais seriam as consequências
caso a escolha recaísse sobre outros aspectos. Esse exercício pode nos mostrar
como as “boas práticas” de governança corporativa se relacionam diretamente
com as relações de poder nas organizações.
Outra forma de se obter melhores insights sobre as relações de poder na governança pode ser o estudo do comportamento das estruturas de governança em
organizações onde o componente político é mais claramente parte da estrutura
– como ocorre nas organizações onde a associação é de pessoas, e não de capital.
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Nessas organizações (cooperativas, sindicatos, organizações não-governamentais
e partidos políticos), existe processo político eletivo para os cargos de conselheiro
e diretor, deixando claras as manobras políticas e as disputas de poder dentro do
processo. Mas, para que o paralelismo possa ser útil como insight para os estudos nas empresas, seria importante que a organização de associação de pessoas
a ser estudada tivesse objetivo econômico. Daí a escolha por estudar o tema em
cooperativas. O leitor interessado em aprofundar essa discussão pode buscar em
Turnbull (1995) alguns dos fundamentos mais interessantes.
Podemos, então, concluir com a observação de que mudam as estruturas,
mudam as relações que as pessoas estabelecem entre si e com as estruturas, mas
as questões relativas ao poder continuam centrais tanto para a compreensão do
que são essas estruturas quanto para qualquer projeto que pretenda interferir no
processo de mudança para as pessoas – ou para as estruturas.
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ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NUM CONTEXTO DE LIBERALIZAÇÃO
Valmiria Carolina Piccinini1
Sidinei Rocha de Oliveira2
Introdução
Para se manterem no mercado os gestores e proprietários buscam formas de
aumentar capacidades e competências de suas empresas. Hoje, a concorrência adquire uma proporção global, independentemente do nível de internacionalização
de cada setor. Tal nível de competição impacta diretamente nas formas de gestão
e organização do trabalho no interior das organizações.
Os modelos de gestão se modificam e adquirem novas roupagens em diferentes contextos para ligar os objetivos individuais dos trabalhadores aos da
organização, tarefa permanente da área de recursos humanos, que passa a ser
compartilhada por todos em função gerencial. As relações de poder no interior
das organizações se redistribuem em moldes mais sutis e se tem dificuldade de
identificar como se concretizam. Embora se fale do surgimento de novos modelos e de mudanças cada vez mais rápidas, muitas vezes há a simples reprodução
de modelos já existentes.
Rondeau (1999) observa que as organizações se subordinam a diferentes
forças ambientais (econômicas, políticas, sociais, tecnológicas) que as levam a
reagir introduzindo novas formas de gestão e organização do trabalho. Estão
diretamente relacionadas às forças políticas que interagem neste cenário de desregulamentação dos mercados, de diminuição das estruturas de controle, antes
inerentes ao Estado, que levam à reorganização e ao comprometimento das atividades em numerosos setores industriais com a formação de alianças estratégicas,
fusões, aquisições, redes interorganizacionais; novas parcerias; reestruturações;
organizações virtuais, dentre outras. Em consequência são questionadas políticas,
estratégias e procedimentos.
1 Doutora em Economia do Trabalho e da Produção pela Université Pierre Mendes France – Grenoble – França.
Professora do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (EA/UFRGS).
2 Doutor em Administração pelo Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (EA/UFRGS) e pelo Institut d’Administration des Entreprises
(IAE) da Université Pierre Mendes France – Grenoble – França.
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A organização do trabalho3 está ligada à estrutura de poder e de controle organizacional, ao conteúdo (por meio do desenho de tarefas e definição de
postos) e às relações estabelecidas com as condições físicas do trabalho, as quais
apresentam fronteiras difíceis de precisar. A organização do trabalho apresenta
uma diversidade de elementos (tecnologia, força de trabalho, hierarquias etc.), que
irão compor todas as estruturas e relações de trabalho nas organizações. (GUIMARÃES, 1995).
Ferreira (2002) observa que a evolução dos modelos de organização do
trabalho e a natureza das tecnologias4 envolvidas estão estreitamente ligadas ao
contexto das sociedades industriais onde surgem. Para o autor, os conceitos de
organização do trabalho e novas tecnologias devem ser estudados considerando a
sua historicidade, comparando os modelos sempre com aqueles que o precedem,
pois as tecnologias e a organização do trabalho são fatores interdependentes e
intrínsecos a uma realidade que não pode ser desconsiderada.
Assim, para melhor entender as mudanças que ocorreram na organização do
trabalho no Brasil parece importante retornar ao processo de gestão do trabalho
decorrente da história de sua formação e resultado de influências no seu modo de
gestão, sobretudo do modelo americano que foi o orientador da gestão e das escolas
de gestão brasileiras. Assim, faremos um breve retrospecto das mudanças correntes
na organização do trabalho no contexto neoliberal, e finalizaremos com um exemplo de adoção numa empresa instalada no Brasil do modelo Toyota - que em grande parte tem inspirado as empresas de setores mais avançados, como é o caso do
setor metal mecânico - e de como se dão as relações de poder nestas organizações.
As Políticas de Recursos Humanos no Brasil
O desenvolvimento dos modelos gerenciais é marcado por traços históricos
e sociais do país ou região em que as organizações estão inseridas. Assim, para
melhor compreender as políticas utilizadas pelas organizações, torna-se relevante
conhecer o contexto histórico. Aqui buscamos detalhar alguns momentos importantes do desenvolvimento nacional e suas implicações para as práticas de gestão.
3 Entende-se por organização do trabalho “o conjunto de aspectos técnicos e sociais que intervêm na produção
de determinado objeto, bem como a divisão do trabalho entre as pessoas, e entre estas e as máquinas [...] Ela é
resultado de um conjunto de regras e normas, fruto de uma construção social, histórica e, portanto modificável
que determina como se deve executar a produção ou o trabalho em determinada organização [...] dentro desta
perspectiva é uma construção social, histórica, modificável e mutável.” (NOVICK, 2000, p. 126).
4 Ferreira (2002) entende como novas tecnologias não só as máquinas, ferramentas, materiais e energias empregados
nos diferentes processos, mas também a energia, a informação e o conhecimento desenvolvido pelo homem ao
longo de suas experiências.
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Com a Abolição da Escravatura (1888) e a Proclamação da República (1889),
o País ingressa em um novo período político. A formação de uma nova estrutura de
Estado exige alterações nas antigas estruturas da sociedade e das organizações existentes. Centraremos nossa análise a partir desse período, embora para analisarmos
certos traços culturais algumas vezes tenhamos de voltar no tempo para resgatar
elementos que os constituíram. Para um rápido retrospecto da história da gestão no
Brasil é necessário retroceder ao final do século XIX e início do século XX.
No período de 1888-1929, a economia mantém seu caráter agrícola na maior
parte do País, com a população concentrada no meio rural, embora já se iniciem os
ciclos migratórios. Surgem as primeiras obras de infraestrutura necessárias para o crescimento industrial. A organização do trabalho ainda apresenta traços do período anterior, marcado pelo escravismo. (TONELI; LACOMBE; CALDAS, 2002). Os antigos
escravos, agora homens livres não dispunham de recursos que permitissem seu acesso
aos bens necessários para a sobrevivência senão pela venda do seu trabalho, na qual
não possuíam espaço para qualquer negociação, tendo de aceitar a compensação que
o proprietário estivesse disposto a pagar a permanência do autoritarismo e, por vezes,
da violência como forma predominante de relação de trabalho.
De modo diferente ao que ocorre no restante do País, em São Paulo e no Rio
de Janeiro o impulso para a industrialização é maior, expandindo-se rapidamente
e consolidando a posição da burguesia empresarial brasileira, principalmente nos
setores têxtil, vestuário, produtos alimentícios e oficinas de manutenção. Na região
de São Paulo, os imigrantes europeus, e no Rio de Janeiro migrantes da zona rural e
do Sul foram importantes para a formação da mão-de-obra operária. A intervenção
do Estado é restrita, tanto em termos de ingerência nas atividades produtivas como
na regulamentação das relações capital-trabalho. Ao redor das incipientes fábricas
vão-se criando vilas operárias que, se por um lado contribuíram para a formação
da identidade operária, por outro facilitaram o controle das empresas sobre as suas
vidas. (FLEURY; FISCHER, 1992). As políticas de gestão assumem situações variadas de acordo com as características específicas da atividade. Em pequenas e médias
empresas predomina o trabalho semiartesanal, gestão marcada pela pessoalidade e
pouco distanciamento hierárquico e de qualificação entre patrões e empregados. No
setor têxtil, com maior mecanização e arranjos organizacionais com mais empregados, a imposição coercitiva do trabalho, exercida em diversos níveis hierárquicos, intermedeia relações predatórias entre capital e trabalho. Na área de ferrovias a gestão
era mais paternalista e com concessões e benefícios aos empregados.
A preocupação com a administração nasce ligada à esfera pública e até o final
da década de 1920 confunde-se com a ciência jurídica. A administração restringe-
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se à elaboração de leis e regulamentos e à estruturação dos recursos necessários
para seu cumprimento. Esta concepção vai se alterar nos anos seguintes com o
surgimento dos primeiros estudos de gestão no cenário mundial, principalmente
na Inglaterra e nos Estados Unidos, quando se passa a considerar que as decisões jurídicas não são sempre a melhor resposta para problemas administrativos.
(KEINERT; LAPORTA, 1994). É praticamente inexistente a preocupação com a
gestão de recursos humanos.
O legalismo presente na administração brasileira decorre do período de
colonização portuguesa, que já carregava séculos de legislação romana. Embora
tenha deixado o caráter legalista, a administração pública ainda apresenta fortes
marcas deste período, que se mantém principalmente devido a traços culturais
como o “jeitinho”, que possibilita que as regras sejam burladas sem que sejam
questionadas ou alteradas. (FLEURY; FISCHER, 1992).
O período entre 1930-1945 é marcado pela crise do café, decorrente da
depressão de 1929, pela Revolução de 1930 e pela aceleração do processo de
industrialização. Deve ser destacado que a indústria nacional se desenvolve em
um modelo que se diferencia significativamente do tipo de mercado industrial
ocidental em função do ampliado papel do Estado na Economia que foi vista
como necessária para conseguir rápido desenvolvimento econômico por meio da
industrialização a fim de substituir a necessidade de importações.
No início do período de 1930-1937, a crise do café leva à migração massiva
de trabalhadores do campo para as cidades em busca de oportunidades nos setores de serviços e indústria. Nas indústrias ocorre alguma estruturação das funções
de recursos humanos (recrutamento e seleção) reproduzindo as relações da economia agrícola, paternalista e escravocrata, com péssimas condições de trabalho,
baixa remuneração e treinamento praticamente inexistente.
A intervenção do Estado nas áreas política, social e econômica marca a fase
seguinte. É criado o Ministério do Trabalho Indústria e Comércio e instituídas
regulações sobre as condições de trabalho, organização sindical e previdência social. A criação de uma área específica para a justiça do trabalho é exemplo da
formalização do papel do Estado no cenário das relações de trabalho. (FLEURY;
FISCHER, 1992).
Com a reorganização e expansão do Estado surge uma demanda por habilidades de gestão que, somada ao crescimento da área de administração no cenário
mundial, contribuiu para o fortalecimento desta no Brasil. A administração públi-
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ca ingressa em um período de racionalização, por influência das obras de Taylor,
Fayol e Gulick. É exemplo da importação de elementos da administração científica a criação do Instituto de Organização Racional do Trabalho (IDORT), fundado em 1931, e do Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP),
em 1938. O DASP, baseado na racionalização e no treinamento técnico, serviria
como braço administrativo do governo por meio da profissionalização do serviço
público, da implantação de um sistema de ingresso por competição e promoção
por mérito. A incorporação dos conceitos prescritivos da Escola Clássica marca a
tentativa de organização da administração do serviço público no período. (KEINERT; LAPORTA, 1994).
Com a industrialização há importantes mudanças na gestão de recursos humanos, embora com papel bastante limitado e burocrático. Nesse período são
criados os departamentos de pessoal com a separação e centralização das atividades de recrutamento, seleção, remuneração e demissão. Ressalte-se que o surgimento do departamento ainda está ligado à necessidade de atender as exigências
legais que começavam a surgir pela legalização da administração do trabalho, e
não pela valorização destas atividades por parte das empresas. (TONELI; LACOMBE; CALDAS, 2002). O Estado passa a intervir em todas as instâncias da
vida política, econômica e social do País e, a partir de 1937, com o regime de Vargas, formaliza-se seu papel como elemento onipresente das relações do trabalho.
Organiza-se a Justiça do Trabalho e, em 1943, é promulgada a Consolidação das
Leis Trabalhistas (CLT), transformando em lei uma série de direitos do trabalhador, dando maior força para a legislação trabalhista. (FLEURY; FISCHER, 1992).
A marca do surgimento das funções de recursos humanos de caráter legalista,
secundário e com pouca influência na melhora da gestão de pessoas nas organizações está presente em muitas organizações até os dias atuais.
O desenvolvimento da industrialização brasileira no período entre guerras
impulsiona transformações importantes nas condições de organização de trabalho. (TONELLI; LACOMBE; CALDAS, 2003). O modelo taylorista passa a ser
introduzido nas indústrias brasileiras, que buscam a separação entre planejamento
e execução das tarefas e o aumento da produtividade com a especialização do
trabalho. A forma de atuação requerida pelo modelo taylorista é nova e faz com
que o corpo apareça como principal ponto de impacto dos prejuízos do trabalho,
levando ao esgotamento físico não apenas os trabalhadores braçais, mas o conjunto dos operários da produção de massa. (DEJOURS, 1987).
Um dos pontos críticos do taylorismo é a separação entre trabalho intelectual e manual. Em muitos casos a nova organização do trabalho acaba por limitar e,
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por vezes, eliminar a atividade mental dos operários. Além disso, a especialização
do trabalhador reduz seu escopo de ação levando a intensa repetição das tarefas,
o que resulta em problemas osteomusculares.
Como uma forma de responder ao crescente número de problemas de saúde
pela repetição das tarefas, no fim da guerra, em 1945, são instalados os primeiros
laboratórios de ergonomia, formados por fisiólogos, psicólogos e engenheiros interessados em adaptar o trabalho ao homem. As primeiras pesquisas revelam a incompatibilidade de máquinas, ferramentas e sistemas à relação homem-máquina.
Na década seguinte, intensificam-se as pesquisas sobre a ergonomia do trabalho,
tendo como finalidade principal a melhor adaptação de máquinas e utensílios às
atividades do homem. (GUIMARÃES, 1995).
Com o fim da Segunda Guerra encerra-se, também, o Estado Novo e começa o processo de redemocratização. O Estado passa a investir na formação dos
parques industriais do País via investimentos nos setores de base como mineração, petrolífero, geração e distribuição de energia elétrica, siderurgia e química, e
também na formação profissional com a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e do Serviço Nacional do Comércio (SENAC).
Os grandes empreendimentos industriais incorporam muitos trabalhadores
não qualificados vindos do campo. Com a entrada de multinacionais são implantados modelos de gestão de recursos humanos mais organizados e formalizados
que os existentes até então. (FLEURY; FISCHER, 1992).
Nos anos 1950, durante a vigência do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, ocorreu um vigoroso impulso para a implementação do modelo fordista de
organização e gestão do trabalho. Este processo, baseado na abertura ao investimento estrangeiro direto e em investimentos públicos em infraestrutura, desenvolveu-se principalmente nas indústrias voltadas à produção de bens de consumo
duráveis, tendo à frente as indústrias ligadas ao complexo automotivo. Foram as
montadoras e as indústrias de autopeças, instaladas principalmente na região do
ABC paulista, que implementaram de forma vigorosa o modo fordista de produção de mercadorias, dando início, assim, a um novo modelo de organização
produtiva no País. (ALVES, 2000).
No final dos anos 1950 e nos anos 1960 são instaladas indústrias multinacionais, principalmente nos ramos automobilístico e químico, atraídas por isenções
de incentivos à instalação e mão-de-obra barata e demanda reprimida do mercado
interno. (FLEURY; FISCHER, 1992). O movimento sindical ganha maior liber-
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dade, embora permaneça dependente do Ministério do Trabalho para funcionar.
Em alguns setores nos quais o segmento industrial já estava consolidado os sindicatos assumiram as lutas da categoria por melhores condições de trabalho, salários
e benefícios. No entanto, esse processo ficou em grande parte restrito à Região
Metropolitana de São Paulo, na qual a indústria automobilística é o setor-chave
que dinamiza a economia, e a alguns segmentos do setor de serviços, como foi o
caso dos bancários.
Nesse período, a área de administração começa a se formar como campo de
conhecimento, cresce a produção teórica, caracterizada pela tradução de textos
e importação de conceitos para ajudar a delinear os contornos do campo. (KEINERT; LAPORTA, 1994). Ao voltar seu olhar prioritariamente para a produção
estrangeira, os estudiosos da área de administração deixam de considerar aspectos da cultura nacional e estrutura social brasileira, reproduzindo o mesmo erro
criticado por autores nacionais em outros campos científicos, como a Sociologia.
(GUERREIRO - RAMOS, 1996). A importação e reprodução de conceitos estrangeiros podem ter contribuído para a formação do campo da administração no
Brasil, no entanto a permanência dessa prática afirma o caráter “estrangeirístico”
da produção científica e gestão nacional.
Este modelo passa a ser utilizado em nível mundial a partir da década de
1950, mas só vai direcionar os estudos no Brasil na década de 1980. Nesse momento os pesquisadores da organização do trabalho buscam romper as barreiras
que limitam o campo de pesquisa sobre o assunto, partindo para a compreensão
dos estudos internacionais realizados e adotando os procedimentos sugeridos
para tratamento interdisciplinar dos modelos de organização do trabalho existentes no País. (FLEURY; VARGAS, 1983).
Na gestão das organizações, para acompanhar as transformações do ambiente e conseguir maior colaboração das pessoas, são introduzidas modificações
na organização do trabalho, o que influencia a estruturação dos cargos. Além de
ser responsável pela execução do trabalho, é exigido do trabalhador que desenvolva habilidades para o planejamento da tarefa, coordenação do trabalho dentro do
fluxo da produção e resolução dos problemas encontrados. Somam-se a isso as
formas mais flexíveis de organizar trabalho e produção entre os grandes processos de reestruturação dos anos 1980, que acabam por formar estruturas organizacionais reduzidas e planas, eliminando inúmeros postos de trabalho. (TONELLI;
LACOMBE; CALDAS, 2003).
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Os estudos sobre ergonomia ampliam-se e o ergonomista passa a participar do processo de geração de projetos de sistemas, de estações de trabalho, de
equipamentos, de tarefas, de organização do trabalho, do ambiente físico e espacial onde ele é realizado. As tecnologias da informação trazem novos desafios à
ergonomia e à evolução tecnológica, ao promover mudanças na organização do
trabalho, ampliando a preocupação da área para as qualidades individuais e as
capacidades psíquicas dos trabalhadores. (GUIMARÃES, 1995).
A partir dos anos 1990, os fatores econômicos e políticos, bem como as mudanças nas práticas de gestão em outros países levam os empresários e gestores
brasileiros a buscarem estabelecer uma ligação maior do trabalhador com a empresa, vinculando-os ao seu negócio, objetivos e metas. Com a busca de um maior
comprometimento dos funcionários, as organizações forçam os indivíduos a se dedicarem integralmente a elas. As estratégias de controle sobre o trabalho e o disciplinamento social tomam conta de outras dimensões da vida cotidiana – urbanismo,
lazer, educação e saúde, entre outras. Não apenas o tempo de trabalho, mas também
o próprio tempo livre dos trabalhadores passa a ser controlado pelas organizações.
Ao mediar as relações entre capital e trabalho nas empresas as políticas de
Recursos Humanos (RH) desempenham um papel relevante no processo de construção da identidade da organização. Os dogmas, os mitos e as crenças da organização estão presentes nas políticas e práticas de gestão de pessoal e medeiam
a relação entre indivíduo e organização. Ao analisarmos as políticas implícitas e
explicitas de RH, observando suas consistências e inconsistências, é possível interpretar os padrões culturais da organização e os traços gerais da cultura regional
que ali estão expressos.
Na próxima sessão abordaremos como a internacionalização dos mercados
e as novas formas de contratos de trabalho têm se refletido nas relações de trabalho no Brasil.
A Liberalização da Economia e as Forças
que Regem o Trabalho
No final do século XX e início do século XXI, as Novas Tecnologias de
Informação e Comunicação (NTICS) contribuíram para tornar a organização do
trabalho mais mutável. As transformações decorrentes da evolução das tecnologias influenciaram profundamente a forma de organizar e gerir o trabalho pela
reengenharia dos processos, teletrabalho, just-in-time etc.
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São importantes também as transformações sociais como a liberalização da
economia, a diversificação da mão-de-obra; a contestação das estruturas de autoridade
e que levam a uma modificação profunda do contrato social entre a organização e os
trabalhadores: demissões em massa; precarização do emprego (temporário, contratual, partilhado…); polivalência funcional. As consequências sobre a organização do
trabalho recaem em novas formas de mobilização: práticas de habilitação (empowerment); práticas de apropriação (grupos autônomos); de participação nos lucros e nos
resultados, de envolvimento e comprometimento dos trabalhadores com as metas da
organização e a remuneração variável, como as medidas de incentivos ao grupo, remuneração de acordo com as competências, entre outros. (RONDEAU, 1999).
Para Rondeau essas forças se concretizam também em quatro grandes tendências
em termos de gestão e resultados. A primeira, observada no início dos anos 1980, é a
orientação para o cliente questionando os modos de análise da eficiência organizacional
e pelo reconhecimento do cliente do que deve ser atendido quando das decisões organizacionais, como a qualidade total e a engenharia simultânea. As práticas de organização
do trabalho restringem-se aos indicadores de desempenho (individual/grupal).
A segunda é a orientação para o processo, que apresenta um impacto maior
especialmente sobre a emergência das Novas Formas de Organização do Trabalho (NFOT). A reconcepção do trabalho é centrada na reengenharia de processos, na contabilidade por atividade e no Kaizen.
A terceira tendência é o estabelecimento de padrões de desempenho em
consequência da mundialização das economias e leva as organizações a adotarem
práticas que produzam resultados vantajosos utilizando modelos de comparação
de práticas de trabalho: padrões de classe mundial (como as normas ISO), melhores práticas (best practices). Essa orientação se traduz em uma sistematização da
avaliação: medidas de gestão; auditorias de gestão; benchmarking.
A orientação para o feedback decorre da constatação de que a organização pode
ser concebida como uma “organização que aprende”. Representa um esforço organizacional para recolher, de forma sistemática, informações sobre seu próprio funcionamento e sobre o ambiente onde a organização se insere. Assim, a experiência da organização é a principal fonte de aprendizagem. O modelo de gestão é o da organização de
aprendizagem (learning organization), melhoria contínua e vigilância organizacional. São
adotados: grupos de solução de problemas, círculos de qualidade, Aprendizagem através
de Resolução de Problemas (APP) e avaliação de desempenho 360º5.
5 Modelo de avaliação de desempenho onde todos os envolvidos (gestores, pares, subordinados etc.) participam do
processo.
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Essas tendências de gestão demonstram que a organização não pode mais
ser considerada como uma máquina eficiente, tampouco gerir na era do saber
significa deter o controle total sobre a informação, uma vez que o ambiente é
cada vez mais incerto e complexo. Os problemas de gestão que deverão ser enfrentados estão ligados mais à escolha da informação pertinente que a seu acesso.
Segundo Rondeau (1999), o sucesso das organizações corresponde à sua massa
crítica, seus recursos, especialidades e práticas que lhes conferem estabilidade e
impacto e, ao mesmo tempo, à flexibilidade que ela é capaz de ter para ajustar
constantemente a utilização de seus recursos segundo as necessidades do ambiente. Neste caso, a busca de flexibilidade se choca com a necessidade de continuidade para mobilizar as pessoas que fazem parte da organização, já que nesse modelo
flexibilizado as pessoas não conseguem criar vínculos, pois são constantemente
substituídas ou partem para outras experiências mais vantajosas. Configura-se,
assim, um dos dilemas das organizações: como adequar a força de trabalho às oscilações da demanda e lançar mão de diferentes contratos de trabalho e ao mesmo
tempo comprometer os funcionários com seu negócio.
Estas considerações apresentadas acima podem ajudar a entender a forma
pela qual a gestão, o poder e o controle se instauraram nas organizações, permitindo analisar as transformações/adaptações que as organizações brasileiras fizeram
neste novo século e como os trabalhadores se adaptaram às mesmas, pressionados pela necessidade de manter empregos. O papel do sindicato não será discutido aqui, uma vez que outros artigos abordarão essa organização que também
reflete as mudanças que foram ocorrendo no contexto internacional e brasileiro.
A Globalização dos Mercados e o Desenvolvimento de
Modelos de Produção
A globalização, vista como uma necessidade de redistribuição e reestruturação da produção para a sobrevivência das organizações que alcançaram seu limite
dentro do modelo fordista, é consequência das mudanças que vieram ocorrendo
nas últimas décadas do século XX. Todo esse processo de mudanças busca justificar os novos empreendimentos do capital em nome da competitividade e da
concorrência que alteraram o conjunto de aspectos técnicos e sociais da organização do trabalho, afetando também a divisão do trabalho entre as pessoas, e destas
com as máquinas. Isso se reflete, como destaca Novick (2000), em uma alteração
no conjunto de regras e normas, fruto de uma construção social e histórica, alterando a forma de execução da produção ou a forma do trabalho em determinada
organização. (PICCININI; OLTRAMARI; ROCHA-DE-OLIVEIRA, 2007).
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Ao contrário do observado nos países desenvolvidos, o fordismo foi implementado no Brasil de forma parcial. A rede de proteção social que se expressava
pelo Estado de bem-estar social restringiu-se ao operariado do ABC paulista, tendo por consequência um processo parcial de integração dos cidadãos ao mercado
de trabalho e de consumo, levando à exclusão social um contingente significativo
da sociedade brasileira. (SINGER, 1999; FARIA; KREMER, 2004).
Cabe destacar que a tecnologia – aqui vista como um dos aspectos técnicos que tornaram possíveis os novos empreendimentos do capital – permitiu
e continua possibilitando a obtenção de maiores ganhos em eficiência e custos,
capacidade de resposta às variações da procura de produtividade, de qualidade e
de inovação. A grande empresa do padrão fordista (voltada para a produção em
série de produtos estandardizados, num contexto organizacional hierarquizado e
rígido), cede lugar (ou convive com) às empresas enxutas, orientadas para uma
produção diversificada e flexível, fortemente apoiada na tecnologia microeletrônica. (KOVÁCS, 2001). Em consequência, não há a predominância de um único
modelo produtivo, como já destacado, entre outros, por Kovács e Castillo (1999)
e Castells (2002).
Essa mudança pode ser vista mais claramente na organização do trabalho,
que vem se tornando flexibilizada, de modo a garantir a variação quantitativa e
qualitativa do produto, a fim de adaptá-lo à instabilidade da demanda dos mercados. As diferentes tendências de modelos de produção e organização do trabalho
interagem entre si, influenciam-se e se reorganizam originando novos modelos.
Neste sentido, o sistema de produção flexível permite às grandes organizações ganhos em produtividade via terceirização, já que as pequenas empresas têm maior
flexibilidade ampliando as suas possibilidades de sobrevivência no mercado global, mas com forte influência e poder das grandes empresas em rede. Elas concentram poder pelo controle das iniciativas de inovação e espaço nos mercados.
Piccinini; Oltramari e Rocha-de-Oliveira (2007) destacam que a centralização do
controle permanece e, em alguns casos se amplia, por meio da divisão internacional do trabalho. Os ganhos em produtividade são alcançados por meio da redução
de custos da empresa central que se desverticaliza, o que pode implicar distintas
condições de trabalho para os empregados das empresas subordinadas.
Esses novos arranjos são dinâmicos e se desenvolvem nos mais diversos
contextos culturais e institucionais. Porém, a forma como ocorrem e as suas implicações para os trabalhadores se fazem de forma distinta conforme a região
ou país. Um dos fatores que marcam o caráter das relações que se formam nas
redes é o espaço social, com destaque para as relações de trabalho e atuação go-
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vernamental que atingem diretamente a forma de gestão da empresa e a forma
de organização do processo de trabalho. (PICCININI; OLTRAMARI; ROCHADE-OLIVEIRA, 2007). Assim, em cada região, em função de aspectos locais e de
sua relação com outros países e regiões, são estabelecidas diferentes estratégias de
atuação no mercado e de gestão da mão-de-obra.
Quando se fala sobre as formas assumidas pela organização do trabalho no momento presente, costuma-se destacar as montadoras de automóveis que no século XX
lideraram as mudanças na organização da produção. No entanto, é importante destacar que cada modelo (fordismo, toyotismo, volvismo) está ligado ao contexto social e
cultural em que se desenvolve, mesmo que as empresa utilizem modelos “híbridos”
de organização do trabalho. Vamos nos deter um pouco mais sobre o Sistema Toyota,
pois é tido como uma das formas mais eficazes de organizar o trabalho apresentandose como um contraponto ao modelo fordista. (WOMACK; JONES; ROOS, 1992).
O termo Sistema Toyota de Produção foi cunhado no final da década de
1980, a partir de uma pesquisa do Massachusetts Insitute of Technology (MIT),
a qual deu origem ao livro “A máquina que mudou o mundo”, que mostrou um
grande entusiasmo de seus autores quanto ao novo modelo de produção, acompanhado também de um deslumbramento mundial.
Apesar da ideia de que haveria uma ruptura entre o modelo taylorista/fordista e a produção enxuta, o surgimento do Lean Manufacturing (Lean) teria sido, na
verdade, uma adaptação do fordismo à economia japonesa pós-guerra. Na época,
executivos da Toyota visitaram fábricas automobilísticas da Ford e perceberam
que não seria viável implantar um sistema de produção em massa no Japão, pois
o mercado estava reduzido e havia escassez de capital – impossibilitando altos investimentos em modernas tecnologias ocidentais – já existiam muitos fabricantes
com marcas consolidadas no mercado mundial e a Toyota estava à beira da falência. Esta ameaça levou a empresa a anunciar o enxugamento do quadro funcional,
gerando revolta entre os trabalhadores, porém o governo japonês havia endurecido as leis trabalhistas, dificultando a dispensa de empregados. Nas negociações a
companhia e os trabalhadores fizeram um acordo que incluía demissão voluntária
de um quarto dos funcionários, renúncia do presidente, emprego vitalício para
os remanescentes, bônus e salários crescentes de acordo com o tempo de empresa, entre outros benefícios. (DENNIS, 2002). Assim, funcionários e empresa
acordaram um tipo diferente de contrato, baseado em cooperação, flexibilidade e
benefícios mútuos. Segundo Dennis (2002), os trabalhadores passaram a ser um
custo fixo, por isso a empresa deveria usufruir da sua capacidade, estimulando seu
desenvolvimento e aproveitando seus conhecimentos e experiência.
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Nessa conjuntura complexa e com uma comunidade de trabalhadores dispostos a se envolverem com a empresa, a Toyota desenvolveu seu modelo de
produção, com dois pilares de sustentação: melhoria contínua e respeito pelas
pessoas. A melhoria contínua corresponde à abordagem básica nos negócios, responsável por criar uma atmosfera de aprendizagem permanente e um ambiente
que adota as mudanças, sendo este possível apenas onde há respeito pelas pessoas. Este modelo não diz respeito apenas às conhecidas ferramentas de gestão da
produção, como just-in-time, kanban e kaizen, mas engloba todas as dimensões
da organização e requer uma transformação cultural profunda e abrangente. (LIKER, 2005).
Algumas características da produção enxuta são marcantes, como, por exemplo, a redução das perdas. Quatro elementos definem a base do modelo Lean:
filosofia de longo prazo; processo; desenvolvimento do pessoal e fornecedores;
e solução contínua de problemas básicos. A filosofia de longo prazo é baseada
na ideia de gerar valor para o cliente, a sociedade e a economia sem preocupação
excessiva com retorno financeiro de curto prazo. O processo certo produz os resultados certos: as ferramentas mais famosas do modelo – fluxo unitário de peças,
sistemas puxados, nivelamento da carga de trabalho, controle visual, entre outras,
aprimoram o processo produtivo a fim de reduzir as perdas e buscando sempre a
qualidade. O desenvolvimento do pessoal e parceiros é o centro do modelo, pois
é o envolvimento das pessoas que permitirá à empresa ter melhoria contínua e
qualidade. Já a solução contínua de problemas básicos consiste em buscar a raiz
dos problemas para não repeti-los no futuro e, então, fazer com que a empresa se
torne uma organização de qualidade, apta a se reinventar e se adaptar ao ambiente
em que está inserida.
Apesar da ênfase dada às pessoas no modelo, tem-se questionado se este seria mesmo benéfico aos trabalhadores, proporcionando responsabilidade, aprendizagem, envolvimento, reconhecimento, encorajamento e autonomia. Kovács
(1999) considera a produção enxuta como um “taylorismo interiorizado”, com
excesso de trabalho, eliminação de movimentos e práticas inúteis, processos padronizados e destruição dos aspectos informais. Além disso, sugere que o Lean
seria uma racionalização autogerida, podendo ser uma autoexploração através da
sobrecarga de trabalho e horas extras, degradação das condições de trabalho, ritmo intensificado e pressão. Ainda há a questão das formas flexíveis de emprego,
como terceirizados e temporários, muito presentes nas empresas que seguem o
modelo. Como se sabe nessas modalidades de emprego há fragmentação das relações homogêneas de trabalho, dos lugares de execução do trabalho e das formas
de controle do trabalho. (CERDEIRA, 2000).
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Boyer e Freyssinet (2001) criticam a proposta da existência de um “modelo
japonês” e apresentam outros modelos produtivos desenvolvidos em diferentes
sociedades e mesmo na japonesa, sobretudo durante o século XX. Constataram
que a diversidade de condições macroeconômicas e sociais em que as empresas atuam e que as leva a definir diferentes estratégias particulares põe em causa
a existência de um único modelo, o one best way. Contestam, também, que a
indústria de automóveis tenha se desenvolvido em três fases, uma artesanal dirigida para uma clientela restrita, e que teria entrado em crise justamente por isso,
levando à produção em massa que permitiu a uma grande parcela da população
ter acesso a esse bem de consumo, e a lean production, que teria sido a resposta
adequada à crise e a uma nova época. Observam que quando a Toyota sofreu
uma grande crise, em 1990, teve de implantar mudanças no seu modelo de produção, assim como o modelo implantado pela Ford foi de difícil aplicação fora
dos Estados Unidos; o sucesso de outras montadoras sugere que um modelo tem
suas limitações dependendo das condições macroeconômicas e sociais em que
se desenvolvem. São situações que se reproduzem e permitem ser chamadas de
modelos de produção em que as montadoras adotam diferentes estratégias tanto
de volume quanto de qualidade, de inovação ou de flexibilidade.
Enfim, conforme Novick (2000), fica claro que a organização do trabalho,
além dos aspectos técnicos e sociais que intervêm na produção de determinado
objeto, bem como a divisão do trabalho entre as pessoas e entre estas e as máquinas, é resultado de um conjunto de regras e normas, fruto de uma construção social, histórica e, portanto, modificável, que leva a mudanças na produção
ou no trabalho.
Embora o modelo de especialização flexível da Toyota não seja o dominante em todas as empresas – que apresentam modelos híbridos de produção
conforme destacado por Boyer e Freissinet (2001) – este se apresenta como o
mais almejado pelas organizações. O toyotismo é visto como sinônimo de produzir melhor, com melhor qualidade, menor custo e um grande envolvimento
dos trabalhadores considerados fundamentais no processo. Para exemplificar,
apresentaremos um estudo realizado numa empresa transnacional do setor metal-mecânico de autopeças que busca se manter líder no seu segmento de mercado e que é fornecedora de juntas homocinéticas para grandes montadoras
instaladas no Brasil e no exterior.
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Heterogeneização da Organização do Trabalho: Modelo
Japonês em Planta Brasileira
Em 2008, o Grupo Interdisciplinar de Estudos da Inovação e do Trabalho (GINEIT) do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da Escola de
Administração (EA) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) realizou um levantamento abrangendo todas as empresas do setor metal-mecânico do Rio
Grande do Sul. Este estudo foi desenvolvido com o apoio do Sindicato das Indústrias
Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico e Eletrônico do Estado do Rio Grande
do Sul (SINMETAL) e teve retorno de 51% (46) das empresas cadastradas. Em 2001
já havia sido realizado este mesmo estudo e, posteriormente, os resultados comparados com os de 2008. Visava saber se e como as empresas implantavam políticas de
flexibilização do trabalho e comparar com a de outro estudo feito pelo grupo. Os
resultados desse levantamento foram apresentados em outros fóruns. Nessa segunda
etapa havia uma questão para indicar o interesse das empresas em participar de um
estudo aprofundado ao qual a Sulpeças6 se dispôs. A empresa desejava saber se e
como os operadores estavam se adaptando ao modelo Lean implantado na fábrica
dois anos antes. O Grupo de pesquisa desejava, também, conhecer em profundidade
a aplicação do modelo e as estratégias de flexibilização adotadas pela empresa. Como
as negociações levaram algum tempo, o período de campo coincidiu com o momento
crítico dos primeiros meses da crise mundial ocorrida no final de 2008, quando a
multinacional estava sentindo profundamente os seus efeitos, sobretudo no exterior.
A Sulpeças atua em 31 países e emprega mais de 40 mil pessoas, sendo líder
mundial em componentes e sistemas de transmissão e na produção de semieixos
homocinéticos, entre outros. Possui duas plantas no Rio Grande do Sul, uma em
Porto Alegre e outra na Região Metropolitana. Foi fundada em 1947, com capital
nacional, porém ao longo dos anos foi se associando a grupos estrangeiros. Em
2000, uma empresa inglesa assumiu 100% do controle acionário, realizou investimento em tecnologia de última geração, desenvolvimento de novos produtos e
expansão do mercado. No total, as duas plantas contam com 1.500 funcionários,
sendo 900 na produção. Apesar de gozar de certa autonomia para tomar decisões,
presta conta dos resultados para os Estados Unidos, que coordena as empresas
das Américas, e em última instância para a matriz inglesa. Nos últimos anos passou por reestruturações no seu processo e na sua organização produtiva, adotando estratégias de flexibilização como terceirização, trabalho multifuncional ou
polivalente e contrato de trabalho por tempo determinado, horas extras e estágios.
A diferenciação dos tipos de contrato apareceu como uma tendência nas diversas
empresas que responderam à primeira parte da pesquisa.
6 Nome fictício pelo qual a organização vai ser referenciada a seguir.
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Para aprofundar o conhecimento das práticas de gestão e flexibilização do
trabalho nessa organização foram realizadas entrevistas semiestruturadas com 20
operadores, sete gestores e um médico do trabalho. As entrevistas com os operadores ocorreram em dezembro de 2008 e janeiro de 2009, época de grande
instabilidade no setor automobilístico e, por conseguinte, nas fornecedoras de peças para este setor. Naquele momento a empresa havia dado férias coletivas para
parte de seus funcionários, operando em apenas um turno, quando normalmente
opera em três, o que pode ter influenciado nas respostas dos entrevistados. O grupo dos gestores compreendia: dois chefes de departamento; um coordenador de
recursos humanos; um analista de recursos humanos; um gerente de melhorias; e
um gerente de manufatura. Estas entrevistas foram realizadas ao longo dos meses
de março e abril de 2009.
As entrevistas com os operadores seguiram um roteiro elaborado com questões abertas, com duas ou três alternativas, e questões para numeração por ordem
de importância. Dos 20 entrevistados, 12 aceitaram que a entrevista fosse gravada
e a duração média dessas foi de 34 minutos. As entrevistas com os gestores e o
médico do trabalho foram baseadas em roteiros abertos, compostos por tópicos
iniciais que foram complementados ao longo das entrevistas. Também foi questionada a trajetória profissional dos sujeitos entrevistados. A média de duração
dessas entrevistas foi de 60 minutos.
Os operadores atuavam em diversos setores da fábrica, como abastecedor de
célula, operador de máquinas, montagem, inspeção final etc. A média de tempo
de empresa é de 6,4 anos, sendo que muitos foram estagiários ou temporários
antes de serem efetivados. A maioria dos entrevistados era jovem (cinco com até
24 anos e 12 de 25 a 39 anos, dois deles idade acima de 40 anos). Mesmo os mais
jovens já tinham um tempo considerável de casa, nove estavam na empresa há
mais de cinco anos, o que pode indicar que a Sulpeças mantém os funcionários e
obedece ao princípio do modelo Lean de formar o pessoal internamente para que
aprendam e sigam sua cultura desde cedo. A empresa utiliza os diferentes tipos de
contrato de trabalho, sobretudo contrato por tempo determinado como período
de teste para a efetivação dos trabalhadores que de fato incorporam os princípios
estabelecidos pelo modelo adotado.
A maioria dos trabalhadores é constituída de técnicos de nível médio, sendo
mais comum a formação em mecânica. Alguns estão cursando, ou estudaram
depois de entrar na empresa; sete têm o ensino médio completo; quatro fazem
curso superior (engenharia, administração, informática), enquanto um relatou ter
entrado há muito tempo com ensino fundamental e concluído o ensino médio
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por meio de programa de subvenção da organização e por exigência da mesma. A necessidade de qualificação tende a aumentar, visto que alguns anos atrás
funcionários eram admitidos com ensino fundamental, e hoje é necessário ter
curso técnico. É possível que a exigência por mais qualificação seja consequência,
também, da implementação da produção enxuta, pois exige pessoas capacitadas
e aptas a resolver problemas rapidamente. No entanto, um dos entrevistados que
está fazendo curso superior observou que o seu trabalho poderia ser realizado
por alguém com curso fundamental somente. A contratação de pessoal mais escolarizado, mesmo para postos que exigem pouca qualificação, pode ser devido
à grande oferta de mão-de-obra e uma forma de afunilar os candidatos ao posto.
Por outro lado, a organização deverá lidar com pessoal mais escolarizado e qualificado que pode ser mais contestador e apresentar mais reivindicações.
Os gestores de produção salientaram que a empresa busca ter apenas pessoas com curso de nível médio, ofertando esta formação para quem não a possui – a
busca pela excelência é característica fundamental do Lean. Também pensando
em qualificação, abordaram a importância dos cursos técnicos, principalmente os
de mecânica, eletrônica e computação. Um dos gestores lembrou que para conseguirem um bom técnico de eletrônica, hoje essencial para a empresa, oferecem
vagas de estágio para estudantes da área7. Além disso, consideram qualificados
todos os seus trabalhadores, seja por terem feito cursos, seja pela experiência.
Traçando-se um paralelo entre a opinião dos gestores e o modelo de produção
enxuta, percebe-se o constante aumento de exigência por qualificação – antes
era possível ser admitido apenas com o ensino fundamental, hoje é exigido um
curso técnico – mesmo que a atividade que vá desempenhar não exija este nível
de conhecimento.
O posicionamento da empresa em proporcionar excelência para seus trabalhadores, e ainda o pressuposto de que eles precisam ser mais qualificados por terem mais responsabilidades no andamento da produção pode ser encarado como
sobrecarga de exigência física e até mesmo psicológica. A ampliação da qualificação é uma tendência geral no mercado brasileiro, e no caso em estudo a formação
permanente pode ser um requisito para a manutenção e crescimento na empresa.
Foi abordada também pelos gestores a importância do relacionamento interpessoal, pois os operadores devem trabalhar juntos, interagindo, comunicando-se
– para o Lean, essa característica é básica para resolver problemas urgentes e ter
um ambiente de trabalho propício à melhoria contínua e a excelência das pessoas.
7 Uma escola do SENAI funciona anexa ao prédio da fábrica. Os estudantes estagiam na empresa e muitos são
aproveitados. Podem começar como temporários e posteriormente serem efetivados.
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(LIKER, 2005). Além disso, um dos gestores afirmou que de nada adianta ter
um bom conhecimento técnico se o comportamento não for adequado, inclusive
“uma pessoa é contratada por sua formação e habilidades técnicas, mas ela permanece no emprego por seu lado comportamental” (Chefe de departamento).
Valorizam os trabalhadores proativos, dinâmicos e flexíveis por se adaptarem
às mais variadas situações que surgem dentro da fábrica. Infere-se, assim, que a
empresa segue as premissas da produção enxuta de que o trabalhador deve ser
versátil, flexível e polivalente, e que em uma perspectiva enxuta existe uma “racionalização autogerida”, que pode ser uma “auto-exploração”, já que o trabalhador
deve estar sempre pronto a trabalhar em ritmo intenso, resolver problemas e fazer
sugestões. (KÓVACS, 1999).
Os operadores consideram satisfatório e suficiente o treinamento oferecido,
bem como o aprimoramento da segurança nas atividades e esclarecimento dos
procedimentos, possibilitando que melhorem continuamente seu trabalho. Também um deles afirmou que os cursos servem tanto para atuar na empresa como
na “vida lá fora”, como, por exemplo, os cursos de competência interpessoal. Esta
ideia está de acordo com os preceitos do Lean, de contínuo desenvolvimento do
pessoal da organização, seja como funcionário, seja como pessoa.
Um dos gestores (chefe de departamento), ao comentar sobre os programas
motivacionais, disse que a maior dificuldade é a transmissão dos objetivos do
modelo Lean aos terceirizados, que não têm as mesmas perspectivas de salários,
progressão etc., que os efetivos, além de considerar um grande desafio para o qual
não encontrou resposta ou solução. A gestão de múltiplos contratos de trabalho
tem sido um dos grandes desafios para a organização, pois é bastante diversa a
vinculação dos trabalhadores que não dispõem de um contrato formal com a
organização. A fragilidade do vínculo e as mudanças constantes fazem com que
fiquem focados apenas na execução das tarefas sem se envolverem com os objetivos gerais e a cultura da organização.
Segundo o coordenador de recursos humanos, o rodízio de funcionários é
positivo. Mesmo quando os temporários não são efetivados (o percentual de efetivação é em torno de 40%), aqueles que saem, levam consigo uma grande experiência, podendo atuar em outras áreas e se relacionar com várias pessoas, vários
perfis de equipe (neste caso refere-se somente àqueles com contrato temporário).
Considera que o programa de estágios deve ser melhorado, pois a empresa tem
um número muito grande de estagiários e não está conseguindo acompanhá-los
adequadamente nas áreas em que atuam. Então, para dar maior apoio e fazer uma
avaliação mais individualizada estão pensando em reduzir o número de estagiários.
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Um ponto de divergência entre os trabalhadores entrevistados refere-se à
adaptação ao modelo – alguns os teriam incorporado muito rapidamente, enquanto outros afirmaram que tiveram dificuldades – mas todos disseram ter se
adaptado por terem trabalhado anteriormente em indústrias, ou pela força de
vontade, por já terem trabalhado em grupo, por trabalharem em uma área manual
que não exige muitos conhecimentos, pelo apoio do pessoal experiente ou pela
união do grupo de trabalho.
Outro aspecto de discordância refere-se ao ritmo de trabalho. Embora 17
operadores tenham classificado o ritmo como intenso, três deles consideram
“tranquilo”. É interessante que estes que consideram o trabalho tranquilo operam mais de três máquinas e um deles afirma que às vezes pode se enganar na
execução das atividades. Somente quatro ressaltaram que o trabalho é repetitivo e
um que o trabalho que realiza não precisaria de curso técnico. Entre aqueles que
indicaram que o ritmo de trabalho é intenso, há os que ressaltem um lado positivo, “pela adrenalina”, por não sentir o tempo passar ou gostar de correr e buscar
metas. Outros consideram que o ritmo se intensificou nos últimos anos tanto no
volume quanto na otimização da produção, reduzindo o número de pessoas por
célula e, assim, aumentando as tarefas para cada um.
As metas de produção são específicas para cada célula e controladas hora a
hora, bem como tendem a aumentar ao longo dos anos. Um dos operadores afirmou que alguns anos atrás, a meta diária era de 12 mil peças, ao passo que agora é
de 20 mil, sem aumento do número de trabalhadores (o que foi confirmado pelo
gerente de produção). Afirmam que as metas de produção são atingidas quase
sempre nos setores em que trabalham e, para isso, precisam contornar problemas,
como: algum operador da célula faltar ao trabalho; problema nas máquinas; ou
falta de material. Muitos consideram difícil atingir as metas, por isso não podem
parar, o ritmo é “alucinante” e qualquer parada ou falha precisa ser justificada.
Quanto a este assunto, ainda há alguns comentários de que “o tempo é muito
enxuto, qualquer falha leva tempo, que geralmente não dá pra recuperar”; “caso
não corra, não dá”.
Comparando as informações levantadas pelos trabalhadores com a teoria da
produção enxuta, é possível destacar que são estabelecidas metas que devem ser
sempre superadas; os trabalhadores têm autonomia para parar a produção para
resolver problemas; detêm certo poder sobre o processo produtivo, pois a empresa depende deles para reduzir estoque, identificar problemas e solucioná-los;
porém, não permitem a eliminação da sobrecarga de trabalho, como é proposto
no Lean, já que os operadores têm que “correr” para alcançar as metas. Além
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disso, deve-se considerar que a instabilidade do mercado automotivo nos últimos
anos e o excedente de mão-de-obra característico do mercado de trabalho brasileiro fazem com que as pessoas busquem se adaptar pelo risco de perderem o
emprego. No caso da Sulpeças, o salário acima da média e o status da empresa na
região tornam-se elementos adicionais no empenho dos trabalhadores para manterem seus empregos, configurando-se, assim, uma relação em que o poder está
centrado na organização, enquanto os trabalhadores buscam se adaptar às novas
demandas decorrentes das alterações no ambiente externo.
Um dos operadores estava saindo para trabalhar em outra empresa, onde,
segundo ele, se sente menos os efeitos das crises. Foi dos mais críticos, sobretudo
quanto aos critérios de promoção, alegando que nunca se sabe porque alguém foi
promovido ou recebeu aumento. Que os critérios não são claros. Este é um dos
maiores motivos de insatisfação já detectado pelos gestores de Recurso a Humanos da empresa.
Muitos entrevistados disseram que a empresa estimula que ofereçam sugestões, inclusive com retorno financeiro, e que grande parte das ideias são testadas
e implementadas. Certos operadores falaram sobre o evento kaizen, realizado
pouco tempo antes das entrevistas, permitindo diminuir o número de etapas de
um processo produtivo de 11 para oito. Entre as principais sugestões que apresentaram quando incentivados a isso estão: a) a redução do ritmo de trabalho e
da quantidade de máquinas que operam; b) diferença de ritmo entre células de
trabalho que requer adaptação constante; c) aumento da produção reduziu alguns
espaços dificultando o fluxo; d) maquinário muito antigo, muita variação de medição, supervisão confusa e que deveriam procurar melhorar a comunicação entre
os colegas.
Outro questionamento feito aos operadores foi sobre o que consideravam
mais satisfatório no seu trabalho. Os mais citados foram a remuneração e os benefícios e, ainda, em ordem decrescente: o reconhecimento do trabalho pela empresa, a aprendizagem, o relacionamento com os colegas e a estabilidade. Deste
modo, afere-se que os elementos mais satisfatórios para os entrevistados estão
entre aqueles cuja responsabilidade é da gestão da empresa.
Por outro lado, questionou-se sobre causas de insatisfação no trabalho, o
que trouxe algumas respostas interessantes. Dos 20 entrevistados, dois disseram
nunca terem ficado insatisfeitos e não terem do que se queixar. Os demais apresentaram como causas de insatisfação, por ordem decrescente: a) aprendizagem
ou oportunidade de crescimento; b) remuneração; c) reconhecimento; d) relacio-
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namento com chefias; e) estabilidade; talvez esta última tenha sido mais citada
devido ao cenário de crise na época das entrevistas. Dois aspectos que chamaram
atenção foram a reclamação pelo fato de a empresa não oferecer transporte próprio para buscar e levar os funcionários8 e o favorecimento pessoal ou pessoalidade. Quanto a esse último item – favorecimento pessoal – houve concordância por
parte de gestores que reconheciam esta insatisfação.
No que se refere ao salário e à forma de atribuição, a maioria disse saber os
critérios para o aumento de salário, uma vez que há um sistema de promoções.
Entre os critérios citados destacam-se: trabalhar bem; saber fazer mais operações
dentro da célula; envolvimento; dedicação; aprender rápido; escolaridade; assiduidade; competências técnicas e comportamentais; tempo de empresa e experiência.
No entanto, estes nem sempre são respeitados. Foi muito destacado que alguns
funcionários seriam favorecidos pela direção nos momentos de promoção sem
que fossem claros os critérios utilizados. A pessoalidade é um traço marcante da
cultura brasileira (CAVEDON, 2008) que se reflete nas relações de trabalho; se
por um lado a pessoalidade aproxima as pessoas contribuindo para a formação de
um ambiente informal, por outro torna a gestão menos objetiva, como é ressaltado pelos entrevistados que destacam a falta de critérios objetivos para promoções.
O teto salarial foi lembrado em diversas entrevistas, com observações de
que pode desmotivar, pois atualmente em cerca de dois anos chegam muito rápido ao teto e depois não existem mais possibilidades de promoção na categoria
de operador. Alguns operadores disseram desconhecer a política de aumento de
salários, enquanto outros afirmaram que não há critérios específicos, os quais poderiam ser pela qualificação ou por competências. Além disso, foram feitos alguns
comentários a respeito do aumento espontâneo; o chefe escolhe os melhores trabalhadores e concede aumento e isso é visto como injusto por alguns, já que os
critérios não são suficientemente claros.
O assunto teto salarial também foi abordado junto aos gestores e, assim
como na opinião dos operadores, não há um consenso se ele frustraria o trabalhador ou não, pois o teto é o máximo que se recebe em determinada função.
Além do salário, a empresa oferece plano de saúde, ginástica laboral e auxílio
para formação. O plano de saúde é administrado por uma empresa terceirizada,
que cobre consultas, hospitais e laboratórios. A ginástica laboral está vinculada ao
Plano de Participação nos Resultados (PPR), pois é valorizada a participação do
8 A fábrica é situada dentro do perímetro urbano de Porto Alegre, mas a maioria dos operários mora em cidades da
Grande Porto Alegre.
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funcionário e há uma parcela de reconhecimento financeiro dentro dessa participação. Para o programa de auxílio à educação, definem como critério o vínculo
com o negócio e da área de formação.
Quanto à complexidade e tempo para realizar as atividades, três deles disseram não ter dificuldades. Para os demais as dificuldades mais citadas foram:
atividades repetitivas; falta de autonomia; senso de importância do seu trabalho
para a empresa; e relacionamento com chefias.
Um dos entrevistados citou que teve problemas no ombro devido às atividades repetitivas. O médico do trabalho especializado em doenças osteomusculares
foi enfático no sentido de que a maioria dos operadores tem esse tipo de problema e vários se submeteram a cirurgias, mas que há uma cultura na organização de
que os problemas de saúde só são reconhecidos quando aparece sangue e estas
são doenças silenciosas e pouco admitidas. Ele está fazendo uma campanha para
que os gestores reconheçam a importância do problema.
Quanto à supervisão do trabalho, as considerações dos operadores foram contraditórias, já que alguns afirmaram que o líder só aparecia quando era chamado, enquanto outros disseram que a chefia estava sempre por perto. Ainda houve relatos
sobre o diário de bordo onde são especificados os problemas da produção e as quantidades produzidas, inspecionado pelo técnico de manufatura, pelo supervisor ou pelo
analista de qualidade. A diferença nas respostas evidencia que o nível de controle/
autonomia varia de acordo com o setor, ou com o perfil do supervisor responsável.
A autonomia dos trabalhadores é um requisito do Lean, com a intenção de
resolver rapidamente os problemas que surgem durante o processo produtivo,
através do senso de urgência dos trabalhadores, afinal uma parada pode interromper outras operações, gerando uma crise. (LIKER, 2005). No entanto, essa
noção de urgência pode ser uma pressão psicológica sobre os trabalhadores, já
que o andamento da produção passa a ser de responsabilidade deles. Se a empresa
produzir menos do que deveria, o operador pode se sentir responsável. O trabalho em equipe também é uma forma de controle sobre o trabalho, apesar de sutil,
pois o indivíduo quer se sentir incluído e valorizado, e as falhas seriam ruins para
sua imagem perante o grupo. Assim, talvez a produção enxuta permita autonomia porque o próprio grupo é capaz de exercer controle sobre os seus membros,
mesmo que eles não percebam – por isso dispensável a presença do supervisor.
Além disso, se numa célula é produzida uma peça defeituosa, essa mesma
peça fica exposta em local bem visível no chão e é fácil a identificação de onde
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ela vem, pois o espaço reproduz o ordenamento das células na fábrica. Se muitas
peças estiverem em exposição significa que várias células apresentam problema de
qualidade e o grupo todo fica exposto.
No que se refere às dificuldades no trabalho dos gestores, destaca-se a necessidade de saberem lidar com funcionários que fazem muitas críticas ao trabalho e
à própria empresa, o que acaba influenciando os colegas e, às vezes, atrapalhando
a rotina do grupo. A solução encontrada por um dos entrevistados é conversar com os “críticos”, mostrando-lhes a repercussão que tal atitude pode ter na
equipe. Então, surge uma demanda por habilidades interpessoais, de liderança
dos gestores, já que é preciso estimular o grupo e mantê-lo homogêneo, além de
propiciar um ambiente de trabalho que não desmotive os funcionários. Segundo
um dos gestores, além da formação em engenharia, é fundamental desenvolver
conhecimentos de gestão de pessoas, pois apenas o foco em resultados e produtividade não basta. Neste ponto, o modelo Lean preconiza pessoas trabalhando
juntas, com respeito mútuo e confiança entre funcionários e empresa, comunicando-se e, principalmente, resolvendo problemas (LIKER, 2005), o que exigiria
cooperação e dedicação ao trabalho, ou seja, mão-de-obra comprometida com a
organização. Em contrapartida, Kóvacs (1999) afirma que o trabalho em equipe,
tão valorizado na produção enxuta, é apenas mais uma forma de controle social,
visto que os próprios colegas podem exercer pressão sobre o indivíduo e até
mesmo excluí-lo do grupo.
Tal necessidade também reflete o atual estágio das políticas de recursos humanos, onde a gestão de pessoas deixa de ser um departamento específico e passa
a ser incorporado por todos aqueles que têm algum nível de gestão na organização. A habilidade para liderar e estimular os trabalhadores torna-se um requisito fundamental para os gestores. Ainda sobre habilidades humanas dos gestores
entrevistados, destacou-se que a parte prazerosa do trabalho é programar algum
processo e ver a equipe realizando de forma eficiente e eficaz, às vezes, inclusive,
enfrentando obstáculos como a exiguidade de tempo. Isso deixa o grupo satisfeito e traz motivação aos operadores, além de reforçar o senso de equipe, tão
estimado na produção enxuta. (LIKER, 2005).
Dentre as conhecidas ferramentas do Lean, está o 5S (classificar, organizar,
limpar, padronizar e disciplinar) como meio de manter o ambiente laboral em ordem e facilitar o andamento da produção. Na empresa o 5S é visto como elemento que proporciona limpeza e organização do espaço de trabalho, permitindo que
o operador exerça suas atividades de forma saudável, segura e econômica. Com o
local organizado se mantém a higiene, se revela e facilita a visualização de pontos
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de insegurança e, assim, a empresa economiza recursos que seriam gastos com
acidentes de trabalho. Segundo um dos gestores entrevistados, o mais difícil do 5S
é a disciplina, por requerer administração comprometida, treinamento adequado e
uma cultura que perpetue essa disciplina.
A razão de os teóricos da produção enxuta dar tanta atenção à excelência
nas pessoas e à criatividade dos funcionários pode ser resumida nesta fala de um
dos entrevistados:
Então tem vários tipos de reuniões onde o principal item
de colaboração é o operador, porque hoje não existe assim,
como tu falou, o engenheiro pode ter conhecimento, o líder
pode ter um nível x de conhecimento, o gerente também pode
ter um nível de conhecimento, agora quem vive mesmo a operação é o operador, essa é a preciosidade, a jóia maior. (Chefe
de Departamento).
Certamente, quem executa o trabalho, quem fabrica os produtos que serão
vendidos e trarão resultados para a organização é o operador, aquele que cuida
das máquinas, abastece as células, percebe os problemas do maquinário e conhece
suas responsabilidades e tarefas, sendo capaz de propor melhorias e inovações
para o processo de que participa. A empresa depende dos operadores para reduzir
estoque, identificar problemas e solucioná-los. (LIKER, 2005).
Também falando de funcionários do chão de fábrica, abordou-se a questão
da liderança das equipes de trabalho que são escolhidos pela direção. O gerente
de fábrica ressaltou:
[...] a questão de ser um líder, de tu teres uma liderança, é uma
questão cada vez mais complicada, porque simplesmente o
líder hoje não é aquele que sabe mais, só porque tu, naquela célula tu é o cara que operou todas as máquinas, conhece
como operador de máquinas, não quer dizer que seja um ótimo líder. Muitas vezes, a gente ainda elege em função disso,
simplesmente porque o fulano conhece todas as máquinas,
ele vai ser o líder de 5 pessoas, muitas vezes tu tira aquela
pessoa dali pra ser o cabeça dos 5, e ele bota toda célula a
perder, ele não tem algo mais, que é ser um disciplinador, ser
um exemplo, ser um coach, que é o cara que agrupa a equipe,
que consegue levar a equipe pros seus exemplos e pra sua
doutrina, é muito difícil isso, então muitas vezes até a própria
equipe derruba o cara, é um negócio complicado, ser um líder,
escolher um líder.
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[...] aí, às vezes a equipe fala e o gerente percebe quem é o líder
nato, ou se já tem um líder eleito pela equipe, e aí sim, aí tu
pinça aquele cara, trabalha ele, pra ver se ele tem uns adendos
a mais na área de liderança, uma coisa é tu tá ali no meio, todo
mundo te aceitar como tu sendo o cara que fala mais, o cara
que fala com todo mundo, principalmente porque o cara tem
o peito aberto, tá sempre na frente de tudo, mas aí tu tira ele
daquela função, coloca ele na liderança, muitas vezes ele não
gosta, aí ele ó... então tu tem que observar, então muitas vezes
a equipe elege, mas além da equipe eleger, tu também tem
que como gerente, ter a percepção de realmente identificar
se o cara realmente tem perfil pra ser o líder de toda equipe,
às vezes não é.
O modelo Lean está sendo implantado também nas áreas administrativas – o
Lean Office – e todas as gerências estudam o modelo Lean para discutir e esclarecer as dúvidas sobre o modelo que foi adotado em toda a fábrica. Grande parte
da tecnologia data da época do desenvolvimento eletroeletrônico e eletromecânica que eles desenvolveram no Brasil. Ainda, o conceito de célula sempre existiu,
porém vem mudando ao longo do tempo, seja com o conceito Toyota, seja com
o Lean, que segue o conceito da automação. 100% do grupo adotam o conceito
do Lean. O modelo Toyota de produção sempre esteve na empresa antes de 2000,
e vem se remodelando ao longo dos tempos. No final da montagem, ou no final
da célula de inspeção do produto contratam mão-de-obra terceirizada responsável
pela medição de 100% de todos os produtos que saem por um período de três
ou seis meses. Esse processo denomina-se safety launch, que é traduzido como
“financiamento seguro”.
Na área de RH a matriz define os grandes desafios para os próximos cinco
anos, e com esses objetivos globais a diretoria brasileira faz o desdobramento
local para a América do Sul. Depois são definidos os objetivos diários. Cada equipe define com o seu gestor os objetivos da sua área, fazendo o desdobramento
individual. Todos sabem qual o seu papel na sua área, que é feita anualmente, mas
na realidade é um processo de avaliação de desempenho. O processo de avaliação
de desempenho se inicia no começo do ano, quando se definem os objetivos individuais para cada funcionário para o período.
A empresa tem uma formatação de trabalho em equipes multidisciplinares. Com a inclusão do Lean nas práticas fazem uma reunião diária. Cada dia
um representante do RH participa da reunião de toda a engenharia de produção,
quando fica sabendo como está a manufatura, e apresenta as necessidades da área
de recursos humanos, mostrando como podem ajudar no negócio e na produção.
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Embora a fábrica tenha certa autonomia, segue sempre as orientações da
matriz, que são passadas em reunião semanal com o diretor-presidente , assim
como todos os outros diretores de região. Nessa reunião são avaliados os resultados da semana e o progresso do negócio.
A área de gestão de pessoas procura associar o modelo Lean à gestão por
competências, ou seja, a partir da análise das competências que a pessoa tem hoje
e de seu desempenho avaliam as condições de aspirações de carreira, formação
escolar e competências complementares (idiomas, informática etc.), que possam
contribuir para o desenvolvimento da carreira. É oferecida ao pessoal administrativo a possibilidade de desenvolvimento, no qual anualmente e pelo menos
em três etapas formais a pessoa avalia os seus objetivos profissionais, as suas
competências, tanto da parte comportamental quanto das competências técnicas
e aspirações de carreira e o seu plano de desenvolvimento. Segundo a entrevistada
da área, essas quatro etapas, se bem conduzidas, asseguram ao trabalhador a possibilidade de identificar as suas oportunidades na empresa e o que está faltando
para se tornar elegível.
A área de recursos humanos busca administrar todos os processos relacionados à comunicação, remuneração, treinamento e desenvolvimento. Segue a tendência de que para trabalhar num sistema integrado as pessoas devem sair dos
limites da situação de lidar com processos e procurar entender a dinâmica dos
processos interligados e como eles se comunicam entre si. Ao pensar em processos as pessoas podem desenvolver competências que reforçam sua atuação
nas atividades que desempenham, bem como colaborar para fortalecer a cadeia
de ligações e construir uma atuação mais completa. Como a organização está
estudando e desenvolvendo um modelo Lean para a administração, pretendem
que a fábrica inteira fique integrada dentro desse modelo de produção e de gestão.
A cultura do Lean é muito difundida entre os operadores e gestores, no
entanto apresentam-se contradições e o método de gerenciamento muitas vezes
pode ser considerado híbrido, isto é, há também resquícios do modelo taylorista/
fordista. A cultura e a prática em função do Lean são muito fortes, e o retorno
tende a ser positivo para a organização. As gerências pretendem que a cultura
Lean seja uma marca da organização. No entanto, embora o modelo esteja cada
vez mais difundido entre os trabalhadores, alguns aspectos da cultura nacional,
como o personalismo e a tendência ao paternalismo, também marcam as relações
de trabalho na organização e, sobretudo, a dificuldade de compatibilizar diferentes vínculos de trabalho com comprometimento e identificação com a organização por parte dos que mantêm vínculos flexíveis. Além disso, a existência de
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múltiplos contratos e as exigências de habilidade em gestão de pessoas aos gestores da manufatura mostra aspectos da atual tendência de gerenciamento. Assim,
evidencia-se que, por mais que a empresa se empenhe na aplicação de um modelo
de organização do trabalho “fechado”, este é influenciado por aspectos sociais,
culturais e conjunturais que a organização apresenta.
Considerações Finais
Num retrospecto dos modelos de gestão constata-se que eles se modificam
e adquirem novas roupagens, mas muitas vezes dentro de uma mesma lógica e
objetivo principal, que é de ligar os interesses individuais dos trabalhadores aos
da organização, tarefa permanente da área de recursos humanos, que passa a ser
compartilhada por todos em função gerencial. Ao longo das diferentes etapas
do desenvolvimento das práticas de Recursos Humanos as relações de poder se
redistribuem em moldes mais sutis, sendo difícil identificar como se concretizam.
Assim, temas como o comprometimento e a autogestão tornam-se importantes
como formas de reforçar o vínculo do trabalhador com a organização.
Rondeau (1999) lembra que embora se fale do surgimento de novos modelos e de mudanças cada vez mais rápidas, muitas vezes há a simples reprodução
de padrões já existentes que correspondem aos interesses das organizações e
que se subordinam a diferentes forças ambientais (econômicas, políticas, sociais,
tecnológicas) que as levam a reagir introduzindo novas formas de gestão e organização do trabalho diretamente relacionadas às forças políticas que interagem
neste cenário de desregulamentação dos mercados, de diminuição das estruturas
de controle antes inerentes ao Estado. Essas novas formas levam à reorganização e comprometimento das atividades em numerosos setores industriais com a
formação de alianças estratégicas, fusões, aquisições, redes interorganizacionais;
novas parcerias; reestruturações; organizações virtuais, dentre outras.
A organização do trabalho de cada período é resultado de um conjunto de
regras e normas, produto de uma construção social e histórica. Desta forma,
pode ser modificada de acordo com a forma de estruturação e o porte de cada
organização, ligando-se estrutura de poder e de controle organizacional ao conteúdo e às condições físicas do trabalho.
A organização do trabalho apresenta uma diversidade de elementos (tecnologia, força de trabalho, hierarquias etc.), que irão compor todas as estruturas e
relações de trabalho nas organizações. Para solucionar os problemas que passam
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a enfrentar, os gestores buscam novas formas de organização do trabalho que
respondam às transformações pelas quais passa uma sociedade onde os interesses
econômicos, políticos e as mudanças tecnológicas influenciam cada vez mais as
relações de trabalho e de poder nas organizações.
Para podermos entender as mudanças que ocorreram na organização do trabalho no Brasil foram retornados o processo histórico de gestão do trabalho e as
consequências dessa formação, sobretudo pela herança escravista e também pela
influência do colonizador português. No início do processo desenvolvimentista o
modelo de gestão estabelecido no País foi fortemente influenciado pela corrente
americana que estruturou e orientou também a formação dos cursos de formação
em administração no País. Além disso, outro traço marcante da gestão no Brasil
é a participação do Estado, tanto no estímulo às organizações e ao próprio desenvolvimento do País como na legislação sindical em que o controle do Estado
ficou evidente em vários períodos.
Como o discurso predominante na área de produção industrial é de implantação do modelo de “produção enxuta”, lean production, lean manufacturing,
trouxemos o exemplo de uma empresa em que foi realizada uma pesquisa para
verificar como repercutiu a implantação do modelo, há cerca de dois anos, e os
possíveis problemas já apontados por críticos do modelo. O modelo Toyota existia na empresa desde 2000, mas o lean production foi implantado há dois anos
e foram observados reflexos desse processo, sobretudo no ritmo intenso, nas
doenças osteo-musculares, apesar de não ter sido possível saber se houve reflexos
na saúde mental dos operadores e demais funcionários.
As entrevistas foram realizadas em meio à crise econômica mundial do final
de 2008 e início de 2009, e que se refletiu na empresa. Embora a economia brasileira não tenha sofrido muito (se comparada à de outros países), essa empresa,
por ser a filial de uma multinacional e por atuar diretamente ligada ao setor automotivo – um dos mais atingidos – teve um impacto bem maior no seu cotidiano
do trabalho. O impacto da crise esteve presente na fala de quase todos os trabalhadores que apontavam receio e incerteza quanto ao futuro das atividades e a manutenção de seus empregos9. Este fato chama atenção para o mosaico de relações
que se constroem na economia mundializada quando as relações de poder das
redes organizacionais não seguem mais fronteiras geográficas e os impactos da
economia de outro país podem afetar fortemente as empresas situadas no Brasil.
9 O fato de estarem empregados num período conturbado pode ter contribuído para que minimizassem as críticas
ao sistema Lean e se empenhassem em alcançar as metas implantadas pela organização.
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Constatou-se que todos, em todos os níveis da organização, haviam incorporado o modelo Lean e demonstravam conhecer os seus princípios e as suas
ferramentas. A maioria dos operadores e funcionários era bastante jovem, e sabese que quem inicia dentro dessa lógica tem mais facilidade em se adaptar até pelo
fato de ter uma maior escolaridade, mas mesmo estes, como os funcionários mais
antigos, criticavam, sobretudo, o ritmo do trabalho, embora aceitassem a necessidade de alcançar as metas para serem produtivos e úteis à organização.
Como dentro desse modelo a figura dos terceirizados está presente em quase
todos os setores da fábrica, o chefe de departamento tinha dificuldade em “passar” a mensagem da organização, uma vez que eles não desfrutavam do mesmo
estatuto e dos mesmos benefícios dos efetivos. No entanto, a maioria inicia como
contratado temporário e depois pode ser efetivada. Como a empresa oferece remuneração e benefícios aos que se destacam no setor e que são reconhecidos pelos funcionários, a queixa maior se refere ao sistema de promoções e de aumento
de salários, considerado injusto e/ou difícil de reconhecer as razões de alguns receberem promoções. Outra queixa é o fato de a empresa não oferecer transporte
aos trabalhadores quando muitos moram na Região Metropolitana.
Observou-se que, mesmo que a empresa desfrute de uma tecnologia muito
avançada, ainda persistem em paralelo tecnologias mais antigas e algumas formas
de trabalho tayloristas, inclusive a gerência pretende uniformizar as tarefas elaborando manuais de trabalho para que o Lean seja considerado pela organização
como o ideal de produção.
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