Universidade Federal de São Carlos Centro de Ciências Biológicas
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Universidade Federal de São Carlos Centro de Ciências Biológicas e da Saúde Departamento de Fisioterapia Núcleo de Estudos em Neuropediatria e Motricidade X Curso de Especialização em Intervenção em Neuropediatria INTERVENÇÕES MUSICAIS: ASPECTOS DA EXPERIÊNCIA MUSICAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO DO BEBÊ - UMA REVISÃO DA LITERATURA David Martins de Almeida Maldonado Universidade Federal de São Carlos Centro de Ciências Biológicas e da Saúde Departamento de Fisioterapia Núcleo de Estudos em Neuropediatria e Motricidade X Curso de Especialização em Intervenção em Neuropediatria INTERVENÇÕES MUSICAIS: ASPECTOS DA EXPERIÊNCIA MUSICAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO DO BEBÊ - UMA REVISÃO DA LITERATURA Monografia apresentada ao X Curso de Especialização em Intervenção em Neuropediatria da Universidade Federal de São Carlos, requisito obrigatório para obtenção do título de Especialista. Aluno: David Martins de Almeida Maldonado Orientador: Profa. Ms. Elaine Leonezi Guimarães Co-orientador: Profa. Dra. Eloisa Tudella São Carlos – SP 2012 MEMBROS DA BANCA EXAMINADORA PARA DEFESA DA MONOGRAFIA DE DAVID MARTINS DE ALMEIDA MALDONADO, APRESENTADA AO X CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO DE INTERVENÇÃO EM NEUROPEDIATRIA, DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS, EM JUNHO DE 2012 BANCA EXAMINADORA: _____________________________________________ Profa. Ms. Elaine Leonezi Guimarães _______________________________________________ Profa. Dra. Eloisa Tudella _________________________________________________ Prof. Esp. Armando Fernandes Bugalho Filho SUMÁRIO RESUMO .......................................................................................................................... ii ABSTRACT..................................................................................................................... iii LISTA DE FIGURAS ...................................................................................................... iv LISTA DE TABELAS ...................................................................................................... v INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1 OBJETIVO ................................................................................................................... 3 METODOLOGIA ......................................................................................................... 4 Estratégias de busca .................................................................................................. 4 Critérios de Inclusão ................................................................................................. 4 Tipo de Estudo ...................................................................................................... 4 Extração dos dados ............................................................................................... 5 Critérios de Exclusão ............................................................................................ 5 RESULTADOS ............................................................................................................ 6 Estratégia e Busca ..................................................................................................... 6 Avaliação e Inclusão dos Estudos ............................................................................. 6 Características dos Estudos Incluídos ....................................................................... 6 DISCUSSÃO .................................................................................................................... 8 Capítulo 1. A MÚSICA ............................................................................................... 8 Percepção Musical .................................................................................................. 10 Consonância versus Dissonância ........................................................................ 13 Bebês e Música ....................................................................................................... 14 Especialização precoce à música ............................................................................ 17 Prática e formação musical ..................................................................................... 18 Elementos musicais................................................................................................. 20 Ritmo .................................................................................................................. 20 Melodia ............................................................................................................... 21 Harmonia ............................................................................................................ 22 Timbre ................................................................................................................. 23 Capítulo 2. EVIDÊNCIAS ACERCA DA UTILIZAÇÃO DA MÚSICA COM BEBÊS ........................................................................................................................ 25 Arquitetura Cerebral do Processamento da Música e Aprendizagem Musical....... 31 Fatores relacionados à Experiência Musical ........................................................... 34 Treinamento Musical .............................................................................................. 35 Motricidade e Ritmo ............................................................................................... 36 Emoção ................................................................................................................... 37 Capítulo 3. MUSICOTERAPIA ................................................................................. 38 Intervenções musicais ......................................................................................... 44 Música Ativa e Música Passiva .............................................................................. 48 CONCLUSÃO ................................................................................................................ 51 BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................ 52 ii RESUMO INTRODUÇÃO: A música é uma das atividades humanas mais complexas, pois engloba diversos sistemas funcionalmente conectados para o seu processamento. Ela é considerada como uma atividade inata do ser humano, pois compreende uma arquitetura neurológica especializada que evolui de acordo com o desenvolvimento. Ela também é culturalmente adquirida, pois alguns elementos musicais, como a dissonância ou a harmonia, somente são possíveis de serem processados, a partir da maturação do SNC e da experiência. Bebês, desde muito precocemente, podem desenvolver habilidades musicais, ou serem capacitados à percepção musical. Desta forma eles desenvolverão habilidades cognitivas, comunicativas, emotivas, sociais, motoras e bem estar. OBJETIVO: Investigar quais são os elementos da música que se apresentam inatos ao desenvolvimento e quais são os elementos que se desenvolvem a partir da experiência sonoro-musical, traçando um paralelo entre as pesquisas atuais em música com bebês, com a intervenção musicoterapêutica que visa desenvolver diversas habilidades globais do bebê. METODOLOGIA: Este estudo compreendeu uma revisão da literatura, através das bases de dados Web Of Knowledge e Medline, com os descritores: música ou musicoterapia, cérebro, desenvolvimento do cérebro e bebês, no qual buscaram-se artigos que compreendiam a música, o desenvolvimento do cérebro e bebês, a fim de agrupar dados necessários para evidenciar os efeitos da música no desenvolvimento do bebê. RESULTADOS: O estudo compreendeu 19 artigos relacionados à pesquisa experimental, 20 artigos de revisão e, ainda, 18 obras didático-pedagógicas sobre música, neurociências e musicoterapia. Os dados obtidos permitiram traçar um paralelo entre os estudos selecionados e a atual abordagem da musicoterapia. CONCLUSÃO: Pudemos comprovar que a experiência musical, no ser humano, é inata, assim como os diversos componentes que integram a música. Neste caso, o quão precocemente for realizada a intervenção, maior será a chance de obtenção de sucesso no desenvolvimento, e, a musicoterapia pode ser uma ferramenta muito ampla e valiosa para o trabalho com bebês. Palavras chave: música, musicoterapia, neuroplasticidade, intervenção precoce. iii ABSTRACT INTRODUCTION: Music is one of the most complex human activities, that involves many different systems functionally connected to the processing. It is considered an innate human activity, that includes a specialized neurological architecture which evolves according to the development. It is also culturally acquired, as some musical elements such as harmony or dissonance, is only possible to be processed from the mature CNS and experience. Babies, from very early, can develop musical skills, or be able to musical perception. Thus they develop cognitive skills, communicative, emotional, social, motor and wellness. OBJECTIVE: To investigate what are the elements of music that have innate development and what are the elements that develop from the experience and musical sound, drawing a parallel between the current research in music with babies, with the intervention that aims to develop musicoterapêutica several global skills baby. METHODS: This study included a literature review, through the databases Medline and Web Of Knowledge, with the following keywords: music or music therapy, brain, brain development and babies, which was searched for articles that included the music, the development brain and babies in order to gather data necessary to elucidate the effects of music on infant development. RESULTS: The study included 19 items related to experimental research, review articles and 20, still works 18-didactic teaching about music, neuroscience and music therapy. The data obtained allowed us to draw a parallel between the selected studies and the current approach to music therapy. CONCLUSION: We confirmed that the musical experience in humans, is innate, and the various components that make up the music. In this case, how early intervention is carried out, the greater the chance of achieving success in the development and therapy can be very wide and a valuable tool for working with babies. Keywords: music, music therapy, neuroplasticity, early intervention iv LISTA DE FIGURAS Figura 1. Fases procedimentais da musicoterapia...........................................................45 v LISTA DE TABELAS Tabela 1. Evidências da utilização da música com bebês...............................................26 1 INTRODUÇÃO Musicoterapia define-se pelo uso profissional da música e seus elementos como uma intervenção em ambientes médicos, educacionais e quotidianos com indivíduos, grupos, famílias ou comunidades, buscando otimizar a qualidade de vida e melhorar a saúde física, social, comunicativa, emocional, intelectual e bem estar em geral (WFMT, 2012). Em suma, a musicoterapia é o uso sistematizado da música, a fim de que, através de intervenções musicais, a pessoa possa ampliar as suas capacidades sociais, cognitivas, físicas, comportamentais, emocionais e musicais (AMTA, 2012). Por se tratar de um processo sistematizado, é necessário que o musicoterapeuta tenha conhecimento integral sobre o seu paciente, sobre os modelos, métodos ou técnicas de intervenção e principalmente sobre música (BRUSCIA, 2000), pois é através da intervenção musical e do envolvimento que o paciente tem com a música que a terapia ocorre. O conhecimento sobre o paciente envolve todo o âmbito pessoal físico, social, comunicativo, emocional intelectual e de bem estar, e pode se compreender como musicoterapia por toda a área abrangente que a música é capaz de transformar, ou seja, o desenvolvimento global da pessoa. A música é uma das atividades humanas mais complexas, pois engloba diversos sistemas, funcionalmente conectados, para o seu processamento. Ela pode ser considerada como uma atividade inata do ser humano, pois compreende uma rede neurológica especializada que evolui para que ela possa ser percebida, sentida ou executada (SAFFRAN, 2003; TRAINOR, 2008; TREHUB, 2003; ZATORRE, 2005). Entre as mais diversas habilidades que são desenvolvidas pela música, podemos dizer que ela exercita o cérebro (WEINBERGER, 1998). Isto somente é possível devido ao fato que o cérebro passa por um processo de desenvolvimento, ao qual podemos chamar de plasticidade cerebral, que pode ser compreendido pela capacidade que ele tem de organizar as suas estruturas, de modo que o indivíduo se torne mais especializado e mais funcional (LENT, 2010). Com o avanço da tecnologia e da pesquisa em música, pudemos ter evidências mais concretas sobre os efeitos da música no cérebro (através de exames de ressonância magnética funcional, magnetoencefalografia, eletroencefalografia) e as áreas corticais e estruturais que o cérebro recruta ao processar 2 a música. Zatorre (2005) acredita que a música provê informações necessárias para auxiliar a neurociência a compreender melhor o homem. De fato, se a música é uma atividade exclusivamente humana que envolve diversas habilidades perceptivas, cognitivas, sociais e da linguagem, ela é uma ferramenta de estudo que leva a uma melhor compreensão do homem. Neste caso, partimos de uma questão fundamental: a música é uma habilidade inata ou adquirida?; se é uma habilidade inata, como ela se desenvolve?; e, se é uma habilidade adquirida, em qual idade ela tem início? Estudos atuais mostram que os bebês têm uma alta sensibilidade para os sons, e são capazes de processar estímulos auditivos. Tal resposta indica que o bebê, na sua mais tenra idade (cerca de 1 ou 3 dias do puerpério) apresenta uma arquitetura neurológica funcional responsiva à percepção da música. Ainda, o bebê tende a apresentar uma resposta emocional, devido à distinção muito precoce que faz de um som consonante de outro dissonante (PERANI et al., 2010). Bebês com 4 meses de idade são capazes de distinguir o som de uma guitarra em contraste com o de uma marimba. Portanto, se a música é uma habilidade que pode englobar tanto as funções inatas, quanto os elementos adquiridos através da experiência sonora e musical, presentes desde o período pré-natal, onde o bebê está exposto a vários estímulos sonoros, ela pode ser desenvolvida e o bebê pode ser estimulado através de um processo de intervenção precoce. O presente estudo aborda a música através de uma perspectiva baseada em evidências, pelo qual se reuniram informações acerca do processamento da música e da experiência musical, que são particularmente inatas ao ser humano. 3 OBJETIVO O objetivo deste estudo foi investigar quais são os elementos da música que se apresentam inatos ao desenvolvimento e quais são os elementos que se desenvolvem a partir da experiência sonoro-musical, traçando um paralelo entre as pesquisas atuais em música com bebês, com a intervenção musicoterapêutica que visa desenvolver diversas habilidades globais do indivíduo, neste caso o bebê. 4 METODOLOGIA Estratégias de busca Foram utilizadas as bases científicas Medline e Web Of Science, na língua inglesa, com os descritores ("music" or "music therapy"); ("brain" or "brain development") e ("infant"), no período de janeiro a maio de 2012, sem restrições quanto ao ano de publicação. Critérios de Inclusão Foram selecionados os artigos que satisfizeram os seguintes critérios de inclusão: artigos que evidenciavam os efeitos da experiência musical em neonatos até 12 meses de idade; evidências acerca do sistema auditivo, preceptor da experiência musical; e artigos de revisão bibliográfica que mencionavam a experiência musical aplicada à bebês. Além desses foram, consultados obras didático-pedagógicas sobre o tema Musicoterapia para complementar a discussão acerca da prática terapêutica. Tipo de Estudo Através de um levantamento da literatura, buscaram-se artigos que compreendiam a música, o desenvolvimento do cérebro e dos bebês, a fim de agrupar dados necessários para evidenciar os efeitos da música no desenvolvimento do bebê. Participantes Foram incluídos apenas estudos com participantes na faixa etária de neonatos até 12 meses de idade. 5 Extração dos dados A partir dos estudos e obras selecionadas, reunimos as informações pertinentes ao tema, para então, traçarmos um paralelo com a intervenção precoce em musicoterapia. Critérios de Exclusão Os critérios de exclusão adotados foram: estudos com crianças acima de 12 meses de idade; pré-termos; pesquisas com animais; estudos relacionados a patologias como: Autismo, Síndrome de Williams, Encefalite, Síndrome de Rett, Epilepsia, Depressão, Atraso de Linguagem; estudos não relacionados à música como mecanismo de plasticidade cerebral ou investigação acerca da experiência musical; estudos psicanalíticos da música e patentes de produtos comercializáveis relacionados à música. 6 RESULTADOS Estratégia e Busca A pesquisa bibliográfica incluiu artigos de 1982 a 2012. A busca eletrônica resultou em 96 artigos publicados na língua inglesa. Avaliação e Inclusão dos Estudos O estudo compreendeu 19 artigos relacionados à pesquisa experimental, 20 artigos de revisão e, ainda, 18 obras didático-pedagógicas sobre música, neurociências e musicoterapia. Os dados obtidos permitiram traçar um paralelo entre os estudos selecionados e a atual abordagem da musicoterapia. Características dos Estudos Incluídos Avaliamos 19 artigos que evidenciam artefatos preciosos acerca da experiência musical com bebês, e, propusemos a discussão de 5 categorias que se referem à música: Arquitetura Cerebral do Processamento da Música e Aprendizagem Musical, incluindo artigos relacionados à estrutura de processamento auditivo em relação à música e mecanismos de aprendizagem, subjacentes à experiência musical, ou seja, processamentos cerebrais específicos que resultam na percepção e processamento da experiência musical, que sem eles não é possível perceber os elementos distintos da música; Fatores relacionados à Experiência Musical, que relacionam estudos referentes à reorganização cerebral (plasticidade cerebral) e respostas hemodinâmicas à música, envolvendo estruturas além do lobo temporal e que pode ser moldado pelo ambiente e pela experiência musical; Treinamento Musical, contendo artigos que evidenciam habilidades cognitivas, sociais, emocionais e musicais através do treinamento precoce e da experiência musical; Motricidade e Ritmo, que reúne informações da experiência musical no âmbito psicomotor comparado ao ritmo musical, e, por fim Emoção, que enfatiza as estruturas que envolvem a percepção afetiva da música e seu resultado no comportamento afetivo. 7 Dentre os artigos incluídos no presente estudo, 9 foram desenvolvidos no Canadá, 3 na Hungria, 1 na China, 1 na Finlândia, 1 na França, 1 na Holanda, 1 na Inglaterra, 1 na Itália e 1 no Japão. A tabela 1 mostra dados relativos aos artigos selecionados quanto aos aspectos metodológicos, resultados e local de desenvolvimento dos estudos incluídos. 20 artigos de revisão escritos na língua inglesa, resultantes da pesquisa eletrônica, foram incluídos para embasar o estudo acerca da utilização da música com bebês, como mecanismo de neuroplasticidade e desenvolvimento global infantil. 18 obras didático-pedagógicas foram consultadas, 9 na língua portuguesa e 9 na língua inglesa buscando subsidiar a contextualização da intervenção precoce através da música com bebês e a musicoterapia. 8 DISCUSSÃO Baseado nos resultados da pesquisa realizada, o estudo realizado foi dividido em 3 capítulos, que seguem, onde serão discutidas as evidências encontradas a partir da relação passiva ou ativa de bebês com a música, ou seja, através da percepção musical ou da execução musical. O primeiro capítulo contextualiza a música, a percepção musical, a relação da consonância e dissonância com a percepção musical, bebês e música e a especialização precoce à música, prática e formação musical e elementos musicais: ritmo, melodia, harmonia, qualidade do som, timbre. O segundo capítulo discute as evidências da experiência musical com bebês, segundo as habilidades inatas ou adquiriras. No terceiro capítulo será discutida a musicoterapia como prática terapêutica de intervenção precoce, abordando o processo terapêutico, as intervenções musicais e duas formas de experiências musicais - a música ativa e passiva. Capítulo 1. A MÚSICA Com o atual avanço das pesquisas neurológicas temos uma melhor compreensão sobre os aspectos da música no homem. De fato, a música provê diversas informações que têm ajudado a neurociência a compreendê-lo melhor. Winkler et al. (2009) afirma que a música está presente em todas as culturas humanas, e é considerada como uma atividade inata do ser humano, pois todo bebê já nasce com uma estrutura sensível à percepção e ao processamento de elementos musicais. De acordo com o crescimento e desenvolvimento do bebê, e com as experiências vividas, os mecanismos de percepção e processamento gradualmente evoluem com a criança (TRAINOR, 2008; TREHUB, 2003; ZATORRE, 2005). A música pode ser considerada, assim como a fala, um dos sistemas universais, mais complexos adquirido pelos seres humanos no início da vida (SAFFRAN, 2003), pois, da aprendizagem motora à emoção a música pode suscitar mecanismos de processamento tão amplos que recrutam diversos mecanismos neurológicos e sistemas físicos específicos. 9 A música provoca alterações psicológicas, do humor e também fisiológicas, o ritmo cardíaco acelera ou desacelera; a respiração também reage. Podemos sentir aflição, dor e outras sensações através da música. Para aquele que ouve atentamente uma peça musical, ela pode ser o melhor ansiolítico (ZATORRE, 2005). A música mobiliza, gera prazer, envolve sistemas sensoriais, perceptivos, cognitivos, motor, aprendizagem e memória. Entre muitos outros benefícios, podemos dizer que a música facilita a aquisição de linguagem, velocidade na leitura, desenvolvimento intelectual global, promove atitudes positivas, aumenta a criatividade e promove o desenvolvimento social, ajustamento, personalidade e autoestima (WEINBERGER, 1998). Isto se deve ao fato que, durante a experiência musical (seja ela ativa ou passiva), uma extensa parte, senão todo o córtex é ativado, recrutando as diversas conexões neurológicas, em ambos os hemisférios, induzindo a neuroplasticidade e a apoptose (a formação de novas redes mais específicas em detrimento de outras menos especializadas (LENT, 2010; TRAINOR, 2008). A música lida com diversos sistemas. É concebida por nossos cérebros, interpretada através de nossos corpos, percebida através dos nossos órgãos sensoriais e novamente interpretada pelos nossos cérebros (TRAINOR, 2008). Evidências a partir de imagens cerebrais (através de fMRI1) mostram que, durante a execução musical, praticamente todo o córtex é ativado (WEINBERGER, 1998). Por lidar com tantos fatores: perceptivo, cognitivo, emocional, social, físico, entre outros, podemos classificar a música como sendo uma atividade multimodal. Ela participa ativamente no nosso desenvolvimento. Weinberger (1998) afirma que a música exercita o cérebro, pois desenvolve habilidades amplas que modificam a estrutura cerebral: os sistemas sensoriais e perceptivos, cognitivo, motor e motivacional. De fato, a música fornece uma ferramenta para estudar numerosos aspectos da neurociência - a aprendizagem motora, a cognição, a percepção, a emoção - e não é difícil de afirmar que ela pode render informações valiosas sobre o funcionamento do cérebro. A chave para eventuais questões vêm a partir de uma compreensão mais sistemática dos diferentes componentes cognitivos envolvidos e os circuitos específicos neurais associados com eles (ZATORRE, 2005). 1 fMRI - Functional magnetic resonance imaging. Em português ressonância magnética funcional. 10 Durante a infância, diversos bilhões de neurônios se comunicam, formando um sistema complexo resultando na criação de milhares de redes neurais. Isto se deve à própria característica genética, no desenvolvimento de redes neuronais específicas e conexões sinápticas, que proliferam e sofrem uma poda para formar conexões mais eficientes para o processamento do som (LENT, 2010). A experiência também afeta as conexões formadas. Bebês podem perceber estruturas musicais complexas, e caso não ocorra um treinamento frequente, induzido pela experiência, podem perder tal habilidade (TRAINOR, 2008). Compreender a música é compreender o próprio homem, e um pouco do seu funcionamento neurológico. Algumas funções cognitivas relacionadas à música, quanto a relação de intervalo e tonalidade, por exemplo, dependem da segmentação dos elementos musicais e da ordem em que cada evento ocorre no desenvolvimento humano (ZATORRE, 2005). Isto caracteriza os eventos próprios da natureza humana e os estimulados através da experiência musical. Percepção Musical Evidências a partir da ativação de determinadas áreas do cérebro sugerem que uma região particular do hemisfério direito é especializada para representar informações musicais. Entretanto, isto não significa que apenas um hemisfério processa a informação musical. O fato do cérebro ter se especializado muito precocemente à percepção da música atrai a atenção (ZATORRE, 2005). A percepção da música lida com diversas áreas corticais trabalhando conjuntamente e independentemente que resultam no processamento sonoro-musical. Estudos da fisiologia cortical, realizados por fMRI, nos permitem vincular aspectos funcionais emocionais do cérebro para a música. A partir desses estudos foram descobertas uma vasta rede de conectividade, cortical e subcortical, envolvendo ambos os hemisférios, compreendendo estruturas complexas (LAWS, 2010). Estruturas superiores nas regiões ventromediais e dorsolaterais do córtex préfrontal também estão envolvidas na percepção musical; bem como o sistema límbico, córtex temporoparietal direito, lobo temporal - córtex auditivo primário e secundário, lobo frontal, parietal e occipital (HE; TRAINOR, 2009; HOMAE et al., 2012; 11 NIEMINEN et al., 2011; SAKATANI et al., 1999; SCHMIDT; TRAINOR; SANTESSO, 2003; TRAINOR; LEE; BOSNYAK, 2011). Além disso, indivíduos com processamento musical pobre mostram deficiência no volume de matéria branca nas regiões frontais inferiores (HYDE et al., 2006 apud TRAINOR et al., 2011) e redução nos tratos de substância branca entre áreas superiores temporais e inferiores frontais (LOUI et al., 2009 apud TRAINOR et al., 2011). O processamento do tom (altura) e padrões temporais são essenciais para a apreciação da música. Especificamente, bebês reconhecem mudanças de padrões melódicos na tonalidade e no tempo (TREHUB, 2003). A percepção da emoção também é um passo para a percepção musical (NIEMINEN et al., 2011). Bebês são sensíveis a mudanças melódicas no contexto sequencial e no grupo temporal, que engloba métrica, tempo, duração e timbre (TREHUB, 2003). Entretanto, bebês de 12 meses de idade não reconhecem contrastes musicais que não são significativos na sua cultura nativa (WERKER; LALONDE, 1988; HANNON; TREHUB, 2005 apud FUJIOKA; MOURAD; TRAINOR, 2011). Desta forma, sabe-se que para que o bebê possa compreender tais padrões musicais, é necessário que desenvolvam redes neurais de ordem superior no processamento da informação sensorial, a partir do segundo semestre de vida. Há envolvimento de áreas frontais, que ampliam gradativamente a sua especialização no decurso do desenvolvimento, bem como do córtex auditivo no lobo temporal primário, nas redes neurais que processam o evento auditivo (FUJIOKA; MOURAD; TRAINOR, 2011). O lobo frontal está envolvido no planejamento de ações e movimento, assim como no pensamento abstrato. A região pré-frontal do lobo está relacionada a estratégias e planejamento de ações motoras. As suas funções incluem o pensamento abstrato e criativo, a fluência do pensamento e da linguagem, respostas afetivas e capacidade para ligações emocionais, julgamento social, vontade e determinação para ação e atenção seletiva. O córtex auditivo primário está situado no giro temporal transverso superior (área de Broadman 41), que é responsável pelo reconhecimento individual dos sons em relação à intensidade, à frequência e à localização da fonte emissora. Os sons são analisados isoladamente e armazenados no córtex temporal com a memorização de tons e sequência temporal (LENT, 2010). 12 Uma característica preditiva para a percepção musical é a própria experiência musical. Sabe-se que o envolvimento com a música está relacionado com a memória de trabalho e faz com que o ouvinte reconheça e armazene os dados dos sons que prevalecem no ambiente (STIX, 2011). A respeito da discriminação dos sons, as crianças, por exemplo, apresentam esta habilidade frente ao contexto melódico - elas são capazes de distinguir entre grave e agudo. Nos adultos, por exemplo, tais fatores se devem às predisposições pessoais experimentadas anteriormente, mas são muito mais especializadas. Se uma criança é apresentada a um estímulo determinadas vezes, uma mudança será causada nela, e posteriormente haverá reconhecimento ao estímulo, pois a informação musical é retida na memória (STEWART; WALSH, 2005). Entretanto, não é necessário que a criança, ou o bebê, se depare com diversos estímulos sonoros para desenvolver tais habilidades. Esta predisposição para o processamento dos intervalos, da melodia e do ritmo (que compreendem a música) parece ter raízes biológicas muito bem estruturadas no nosso sistema auditivo naturalmente desenvolvido. É possível que, na ausência de prolongada exposição à música, os processamentos neurais ocorram; e, neste caso, mesmo em uma idade muito precoce, quando o intervalo, a melodia, ou regularidades rítmicas são apresentados (TREHUB, 2006 apud NIEMINEN et al., 2011). Quanto a discriminação do tom (altura), tal fator pode ser melhor compreendido por casos de pessoas que possuem ouvido absoluto2. Para Deutsch e Henthorn (2004), o potencial para adquirir "ouvido absoluto" está universalmente presente ao nascimento e permite a criança associar campos tonais com rótulos verbais durante o período crítico da aquisição da linguagem. Saffran e Griepentrog (2001), observaram que bebês aos 8 meses de idade foram capazes de realizar um aprendizado perceptual na tarefa, isto fornece forte evidência de que a capacidade de adquirir ouvido absoluto está realmente presente na infância (DEUTSCH; HENTHORN, 2004). Entretanto, parece ser mais eficiente a aquisição de um "ouvido relativo", e de acordo com o próprio desenvolvimento neural, o sistema auditivo que processa os intervalos sonoros do tom são a base para a 2 Ouvido absoluto é uma rara dotação musical no qual a pessoa possui a capacidade de nomear ou produzir uma nota de um tom em particular, na ausência de uma nota de referência. Acredita-se que a prevalência seja estimada de menos de 1 em 10.000 na população em geral (DEUTSCH; HENTHORN, 2004). 13 percepção de melodias (STEFANICS et al., 2009). O ouvido relativo é essencial para o processamento das melodias. Vimos que algumas características estão presentes logo no nascimento da criança, outras se desenvolvem a partir da experiência com o mundo. Sabemos que os primeiros meses de vida de um bebê são dotados de um desenvolvimento muito amplo e progressivo; entretanto, pouco se sabe como ocorre o desenvolvimento musical nos primeiros meses de vida. Sabemos que a extensão da percepção e das capacidades cognitivas são inatas, e em certas medidas, elas são moldadas pelo ambiente (STEWART; WALSH, 2005). Consonância versus Dissonância Existem diversas especulações que, adultos, predominantemente, têm preferências musicais consonantes ao invés de dissonantes (PERANI et al., 2010). Consonante define-se a partir de uma coincidência dos harmônicos ou dos seus parciais de uma nota ou tom. Neste caso, a consonância não é apenas vista como o intervalo entre duas notas, mas sim a qualidade do som das próprias notas3 que resulta na qualidade do som (timbre) (CHEDYAK, 1986). Bebês também são sensíveis à consonância e dissonância de padrões musicais. Eles categorizam intervalos com base na consonância e dissonância e retém informações precisas de padrões com intervalos consonantes (TREHUB, 2003). Empiricamente podemos pensar que uma forte hipótese para a preferência de consonâncias contra dissonâncias, se deve ao fato da exposição as músicas específicas da cultura. Entretanto, sabe-se que a preferência de consonâncias está muito mais ligada à habilidade auditiva (TREHUB, 2003). A habilidade auditiva conforme o passar dos anos vai se refinando e diferenciando-se devido à percepção dos sons musicais (STEFANICS et al., 2009). O padrão de ativação observado na literatura atual reflete uma sensibilidade do cérebro do recém-nascido para sons dissonantes, e assim como evidenciado em outros estudos, bebês têm preferências por sons mais consonantes. A percepção de estímulos 3 Intervalos consonantes dividem-se em dois grupos: perfeitos e imperfeitos. São consonâncias perfeitas: uníssonos e oitavas; e quartas e quintas justas. São consonâncias imperfeitas: terças maiores e sextas menores; e terças menores e sextas maiores (CHEDYAK, 1986). 14 consonantes e dissonantes é uma função da propriedade física do estímulo auditivo e indica que o bebê, logo após o nascimento, apresenta sensibilidade e respostas neurais emocionais (sistema límbico) quanto às alterações nos níveis de consonância e dissonância (PERANI et al., 2010). Bebês também apresentam uma estética rudimentar para a música consonante. Por exemplo, bebês prestam mais atenção enquanto escutam Minuetos de Mozart em versões alteradas ao invés da versão original, no qual os intervalos dissonantes substituem diversos intervalos consonantes (TREHUB, 2003). Entretanto, o fato de bebês terem preferências por sons consonantes, não quer dizer que eles processam a música como os adultos. Bebês demonstram preferência para tons de ao redor de um tom central até à idade de 6 meses (T4, 4º, 5º e 8ª). Aos 11 meses, grande parte da escala musical já é compreendida (T, 3º, 4º, 5º, 6º e 8ª) 5. Conclui-se que a produção de tons durante o segundo semestre de vida foi influenciada pela preferência de tons pertencentes à série harmônica presente na música tonal (COHEN, 2000). "Vários estudos utilizando o procedimento de procura da fonte têm descoberto que bebês com até 3 meses, como adultos, preferem intervalos consoante ao invés de dissonantes. Recentemente, processos cerebrais de música consonante em neonatais, investigados com imageamento por ressonância magnética funcional (fMRI), têm mostrado que diferenças da música dissonante, podem ser devido à estrutura e as características do ouvido interno e do nervo auditivo. Esta preferência pela consonância tem sido colocada como um importante subjacente à emoção em música. Em suma, o processamento sensorial de propriedades musicais básicas, no nível do tronco cerebral e córtex auditivo, juntamente com a preferência central ou preferência sensorial para algumas dessas propriedades, ocorre em bebês muito jovens, permitindo assim o desenvolvimento posterior de uma resposta estética mais sofisticada às propriedades musicais mais complexas" (NIEMINEN et al., 2011, p. 1140). Bebês e Música Bebês são inerentemente musicais. Tal afirmação está baseada na sensibilidade 4 T é a tônica ou fundamental do acorde ou escala musical, é a primeira nota, ao qual se originará o sistema musical (CHEDYAK, 1986). 5 O 3º e 6º grau de uma escala musical é considerado como consonante imperfeito. As consonâncias podem ser usadas livremente sem necessidade de alguma preparação e podem ocorrer nos tempos fracos ou fortes (CHEDYAK, 1986). 15 das características essenciais do som e da música6 (TREHUB, 2003). Antes do nascimento, o feto percebe a informação auditiva nas semanas finais da gestação e as características desta entrada podem ser reconhecidas após o nascimento (PERANI et al., 2010). A experiência de uma determinada frequência sonora, ou estímulo musical, modifica a resposta cortical auditiva em humanos, e desta forma, o cérebro está sujeito a alterações susceptíveis de plasticidade através do curso do seu desenvolvimento. Exposições à música, ou a um timbre específico durante a infância, aumentam a sua representação cortical, que resulta em um processamento mais preciso posteriormente (TRAINOR et al., 2011). A circuitaria musical dos bebês é surpreendentemente sofisticada. Bebês podem ser considerados minimúsicos: eles são capazes de distinguir diferentes escalas e acordes, são capazes de ter preferências por sons consonantes ao invés de dissonantes (ZATORRE, 2005). Com apenas 2 meses de idade, o bebê prefere tais sequencias. Aos 4 meses de idade, eles ouvem e se comportam contentemente diante de melodias folclóricas. Também se contorcem e agitam-se ao ouvir as mesmas melodias em versões dissonantes (TREHUB, 2003). Bebês podem reconhecer tons ou melodias tocadas para eles ao longo de períodos de dias ou semanas e são sensíveis às regularidades dos sons. O sistema nervoso dos bebês parece estar equipado com a capacidade de categorizar os diferentes sons musicais que atingem os seus ouvidos com o objetivo de construir uma gramática ou um sistema de regras (ZATORRE, 2005). Eles também podem demonstrar sensibilidade às características temporais de sequências musicais (COHEN, 2000). Aos 6 meses de idade, bebês são capazes de combinar a representação de seu tom (emitido) com uma representação de um tom produzido externamente. Neste caso, o comportamento de vocalização, ao longo do desenvolvimento musical de alguns bebês tem sido estudado por diversos cientistas (COHEN, 2000). As surpreendentes habilidades musicais dos bebês levantam uma série de questões relativas à arquitetura dos sistemas neurofuncionais subjacentes. Uma questão fundamental nesse sentido diz respeito à arquitetura funcional do córtex auditivo. 6 As propriedades do som são: duração, intensidade, altura e timbre. São características essenciais da música: ritmo, melodia e harmonia (BRUSCIA, 2000). 16 Recentes estudos neurofisiológicos demonstram fluxos de processamento independentes para localização e identificação de som, que é realizado por sistemas neurais funcionalmente independentes. Bebês estão equipados com esse sistema refinado desde o nascimento (FAIENZA; COSSU, 2003). Algumas habilidades são desenvolvidas durante o período gestacional. Os mecanismos básicos neurais, localizados no tronco cerebral são um exemplo disso. O córtex auditivo, aliado a este mecanismo é responsável por representar fontes múltiplas de sons ativos, e apresentam-se funcionais ao nascimento. (WINKLER et al., 2003 apud NIEMINEN et al., 2011). Assim, os bebês são capazes de perceber aspectos relevantes da música e dos sons. Além disso, a sua discriminação de diferenças temporais e tonais, bem como a sua percepção de classes equivalentes parece ser semelhante aos ouvintes mais experientes (TREHUB, 2003 apud NIEMINEN et al., 2011). Eles são sensíveis às propriedades musicais, como melodia, intervalos, padrões rítmicos e alguns aspectos da harmonia (TREHUB, 2006; TREHUB et al., 1997 apud NIEMINEN et al., 2011). Entre as idades de 7 e 9 meses, os bebês podem categorizar os sons de alguns instrumentos musicais. Estudos de discriminação melódica com bebês de 9 a 11 meses de idade também revelaram a capacidade de distinguir uma diferença na frequência de um semitom (COHEN, 2000). A sensibilidade rítmica e tonal surge dentro do primeiro ano de vida. Alterações no processamento destas propriedades musicais ocorrem durante toda a infância e vão se especializando de acordo com o desenvolvimento e a experiência, sem que haja uma formação musical específica (NIEMINEN et al., 2011). Um número de conclusões muito claras nos ajudam a entender como o cérebro é esculpido pela experiência musical. Estas mudanças estão diretamente relacionadas com a idade em que o estímulo é induzido. A modificação mais ampla para o cérebro ocorre muito precocemente, ao passo que, se desenvolvido mais tardiamente, os efeitos ocorrem, mas se mostram muito menores (ZATORRE, 2005). Estudos relataram a capacidade de lactentes para reter um conjunto de tons compreendendo uma sequência. Neste caso, a repetição é um fator consistente na indução da tonalidade que estabelece uma representação estável. O armazenamento de eventos auditivos repetidos é necessário para a indução da tonalidade; e, no caso da 17 tonalidade, o que é armazenado é o conjunto de tons apresentados na música (COHEN, 2000). Quanto ao desenvolvimento da linguagem, bebês detectam mudanças no tom em uma sequência de quatro notas quando as sílabas são redundantes, mas não identificam a sequência idêntica (tonal) quando as sílabas são variadas. Bebês são mais aptos a detectar uma mudança na sílaba em uma sequência cantada ao invés da sílaba idêntica em uma sequência falada (LEBEDEVA; KUHL, 2010), portanto, eles se demonstram aptos a compreender e reter a região tonal (graves ou agudos) e a direção tonal (ascendente ou descendente). Especialização precoce à música Experiências sonoro-musicais são fenômenos robustos que se desenvolvem precocemente (desde o período de gestação) e amadurecem rapidamente durante as fases iniciais do desenvolvimento (FUJIOKA et al., 2011). Uma região cerebral essencial para o processamento musical, amplamente envolvida à percepção, é o lobo temporal. A ativação de regiões primárias, secundárias e superiores no lobo temporal, na porção direita do hemisfério do recém-nascido, indicam que o cérebro responde à informação musical; em especial o córtex auditivo primário direito que está envolvido na análise tonal e integração, ou seja, na decodificação da região tonal (grave ou agudo), direção tonal (ascendente ou descendente) e seu timbre; pré-requisito para o processamento da música (PERANI et al., 2010). Quanto ao desenvolvimento do sistema auditivo, sabemos que: "O sistema auditivo humano começa a desenvolver no útero (KISILEVSKY e LOW, 1998) e desempenha um papel fundamental na aquisição de conhecimentos linguísticos e musicais na infância. Bebês de seis meses podem discriminar contrastes fonéticos (WERKER e LALONDE, 1988), detectar diferenças de padrões rítmicos (HANNON e TREHUB, 2005) e reconhecer uma melodia executada em diferentes tons musicais (PLANTINGA e TRAINOR, 2005) (FUJIOKA et al., 2011, p. 521)". As demais áreas do hemisfério direito do córtex auditivo, fora da zona primária, são especializadas no processamento de frequências, na codificação e reconhecimento de melodias e na junção auditivo-motora. Portanto, a maturação das redes oscilatórias 18 que integram os componentes relacionados ao processamento do som e consequentemente a música, ocorrem logo aos 4 meses de idade, e que, tais redes reorganizam-se de tal forma que as funções específicas são transferidas para redes de ordem superiores por cerca dos 12 meses de idade - quando está ocorrendo a aprendizagem perceptual auditiva de sons específicos da cultura. Isto sugere uma ponte de funções auditivas e cognitivas, como acesso à memória de longo prazo que provavelmente está acompanhada pelo desenvolvimento de mecanismos oscilatórios neurais hierárquicos (FUJIOKA et al., 2011). Sugerimos que a maturação dos distintos componentes que processam a música ocorrem em paralelo, e que funções sensoriais específicas ligadas às redes tálamo corticais são transferidas para redes desenvolvidas de ordem superior, gradativamente até que mecanismos nervosos oscilatórios hierárquicos são alcançados por todo o cérebro (FUJIOKA et al., 2011; PERANI et al., 2010). Quanto às atividades no interior das estruturas límbicas, sugere-se que recémnascidos envolvem recursos neurais no processamento emocional em resposta aos estímulos musicais, porém não há evidências observadas no cérebro do recém-nascido exposto à informação musical que evoluem para isto ou está exclusivamente envolvida no processamento da música (PERANI et al., 2010). Desta forma, o processamento musical desenvolve-se a partir de uma rede espacial e funcional distinta de componentes, tornando-se cada vez mais complexa e específica, transferindo-se para redes de ordem superiores durante o primeiro ano de vida do bebê (FUJIOKA et al., 2011). Prática e formação musical Sabe-se que a formação musical está presente precocemente na infância. A formação musical atua como tônico cerebral, porém uma série de perguntas permanecem sem respostas sobre quais tipos de prática melhoram as funções globais da pessoa (STIX, 2011). Evidências têm mostrado que a prática de um instrumento musical melhora a atenção a memória de trabalho e o autocontrole (STIX, 2011). Bebês diminuíram suas angústias quando confrontados com novos estímulos após a participação tanto em aulas 19 de música ativa, quanto passivas. Seus comportamentos foram moldados pela vivência e experiência musical. Em outras palavras, a música preparou-os para enfrentamento de novas atividades, fazendo com que eles não sofressem pela ansiedade de novas situações (GERRY, D.; UNRAU; TRAINOR, 2012). Stix (2011) defende uma formação musical intensiva a partir da infância precoce. O autor acredita que a música promove competências, além de apenas uma habilidade para tocar um instrumento. A concentração do músico sobre a acústica do som ajuda com a compreensão da linguagem e promove as habilidades cognitivas: atenção, memória de trabalho e autorregulação. O fundamento para tal pedagogia de formação pessoal está na diferença entre músicos e não músicos. Músicos percebem os sons mais claramente do que os não músicos, têm habilidades motoras mais precisas, bem como a sua acuidade visual, porque praticar um instrumento treina o cérebro inteiro (STIX, 2011). Esta característica se deve ao fato da atividade elétrica auditiva na cóclea enviar informações para o tronco cerebral, antes de enviar para o córtex ou retornar para a cóclea. Os potenciais evocados auditivos correspondem à atividade elétrica que ocorre no sistema auditivo, desde a cóclea, nervo coclear, tronco encefálico e córtex, em resposta a uma estimulação auditiva (NASCIMENTO, 2009). Este processo atua sobre diversos planos e capacita ao músico desenvolver habilidades globais, além daquelas especialmente auditivas. É inegável que a música que nos afeta, pode ter um efeito no nosso comportamento (LECANUET, 1996 apud MCPHERSON et al, 2006). Lactentes, desde a mais precoce idade respondem à música e aos mais variados níveis musicais, como: mudanças na melodia, tons, ritmos, tempo. Tais capacidades, conforme o desenvolvimento natural da criança e o treino, se especializam de tal forma, que processam estímulos cada vez mais complexos7 (COHEN, 2000). Sabe-se que o objetivo de um treino musical é capacitar as pessoas para perceber e produzir formas mais elaboradas e complexas. Um programa ideal para a formação musical deve conter uma ampla variedade de formas musicais, incluindo formas métricas (ritmo) (GERRY, D. W.; FAUX; TRAINOR, 2010). Outra justificativa sobre a formação musical é a sensibilidade à estrutura harmônica. Para tal percepção, o sistema 7 Como por exemplo a percepção da dissonância que dá base para a compreensão da harmonia, que se inicia por volta de 5 anos de idade. 20 auditivo requer familiarizar-se com diversas estruturas musicais consonantes e dissonantes (TRAINOR, 2008). Desta forma, é possível treinar bebês numa fase muito precoce no seu desenvolvimento para a formação musical (GERRY, D. et al., 2012; GERRY, D. W. et al., 2010). Elementos musicais A música envolve dois amplos aspectos; estrutura temporal (ritmo) e estrutura espectral (altura8). Ambos são multidimensionais e envolvem diversos padrões de complexidade (TRAINOR, 2005). Ainda, a música é formada por três elementos distintos: ritmo, melodia e harmonia (CHEDYAK, 1986). Tal predisposição para processamento do ritmo, melodia e harmonia parece ter raízes biológicas no nosso sistema auditivo, ao qual está em constante e natural desenvolvimento (NIEMINEN et al., 2011). Uma sensibilidade para alguns ritmos específicos, bem como melodias começam a emergir ao final do primeiro ano de vida, onde a criança é capaz de reconhecer avidamente tais componentes e reagir diante deles através do seu comportamento (TRAINOR, 2012). Entretanto, evidências têm mostrado que mesmo em idades precoces (no 2º ou 3º dia puerperal, em bebês com idade gestacional entre 37 e 40 semanas) o bebê é capaz de processar intervalos tonais (STEFANICS et al., 2009). Em contrapartida, a harmonia só começa a ser claramente interpretada depois do 5º ano de vida da criança (TRAINOR, 2008). Ritmo O ritmo talvez seja um dos preceptores acerca da percepção da experiência musical, devido à sua importância no sistema musical. O ritmo prediz o andamento da música, bem como agrupa os eventos sonoros e os segmenta dentro de uma categorização hierárquica (TRAINOR, 2005). Baseado nisso, Zatorre (2005) afirma que toda mãe é capaz de provar que seu bebê reage ao tom e ao ritmo da sua voz. 8 Aqui também pode ser compreendido como tom ou melodia. 21 Os bebês exibem um intenso interesse pela música, como evidenciado por vários experimentos (TREHUB, 2003). Especialmente, os bebês demonstram preferências por gostos musicais ou por intervalos agradáveis (consonantes) a partir do seu comportamento motor. Por exemplo, quando a criança começa a balançar, a movimentar-se positivamente, a interagir com a música, ela participa de um processo fundamental que seguirá ao longo da vida. A interação entre o som e o movimento desenvolve-se cedo9 e apresenta-se fundamental para o desenvolvimento da música ao longo da vida. Tem sido desde há muito tempo conhecido, que os bebês são atraídos para a música e sensíveis ao seu conteúdo emocional (PHILLIPS-SILVER; TRAINOR, 2005). Uma hipótese para esta preferência é a estética e o envolvimento emocional às qualidades consonantes da música (NIEMINEN et al., 2011; TRAINOR, 2005; TREHUB, 2003). A música sempre está associada com a atividade motora. "A experiência da música envolve a percepção, sequências intencionais e organização motora como causa da informação auditiva temporal síncrona" (MOLNAR-SZAKACS;OVERY, 2006 apud NIEMINEN et al., 2011, p. 1140). Bebês, crianças e adultos se comportam ativamente à música e são capazes de sincronizar os seus movimentos com a música (NIEMINEN et al., 2011). Uma hipótese para isto deve-se ao fato do ritmo musical poder ter sua origem na atividade motora que controla a locomoção, respiração e a frequência cardíaca. Esta experiência motora e auditiva precoce cria representações que fazem parte de uma extensa cadeia de conexões no cérebro. Embora a música induza à batida, o movimento envolve conexões cerebrais multissensoriais entre as áreas motoras e auditivas. Portanto, a qualidade do nosso movimento esta condicionada à forma com que nós interpretamos o ritmo, e neste caso, a música (TRAINOR, 2008). Melodia A trajetória desenvolvimental à aquisição da estrutura musical da melodia está intimamente ligada às preferências musicais acerca da consonância. A sensibilidade à escala musical se desenvolve nos primeiros anos de vida. Entretanto, a melodia caminha 9 No estudo de Phillips-Silver e Trainor (2005) bebês de 7 meses de idade foram treinados a seguir um padrão rítmico. 22 quase que simultaneamente com a harmonia, devido ao fato de uma melodia tonal estar acompanhada à um número delimitado de acordes (TRAINOR, 2005). Para a percepção da melodia, também é necessário integrar áreas de processamento que decodificam a altura, intensidade e o timbre, localizadas no córtex temporal, associadas às áreas que processam prazer e memória (COHEN, 2000; PHILLIPS-SILVER; TRAINOR, 2005) A percepção da melodia também está ligada à fatores culturais específicos que resultam em intervalos consonantes e dissonantes (TREHUB, 2003). Harmonia Estrutura harmônicas10 dominam a música ocidental. A percepção da harmonia parece desenvolver-se mais tardiamente com relação à percepção de outros elementos musicais (COSTA-GIOMI, 2003). Sem uma específica formação musical a sensibilidade à harmonia surge em crianças só depois de cerca de 5 anos de idade (TRAINOR, 2008). Em contrapartida, acredita-se que as crianças não distinguem claramente a harmonia até por volta dos 6 anos de idade. Esta afirmativa baseia-se na preferência infantil, entre 2e 7 meses de idade, de as crianças terem sensibilidade clara por consonâncias ao invés de dissonâncias acompanhadas a uma melodia (COSTAGIOMI, 2003). Estruturas harmônicas dependem de aprendizagem. Em contraste com consonância sensorial e dissonância, há mais flexibilidade na forma como eles são percebidos (TRAINOR, 2008). A harmonia não depende da percepção e sim da compreensão, portanto ela requer um amplo processamento cognitivo. Evidências para a percepção dos centros tonais estáveis (função dominante do acorde, no grau I) 11 não emergem até à idade de 5 ou 6 anos. Por volta dos 7 ou 8 anos de idade a criança apresenta sensibilidade para os intervalos da escala musical (COHEN, 2000). Aos 8 anos, uma criança consegue distinguir cadências conclusivas ou inconclusivas, e têm No estudo de Phillips-Silver e Trainor (2005) bebês de 7 meses de idade foram treinados a seguir um padrão rítmico. úsica (TRAINOR, 2008). 11 A função dominante no grau I (estável) compreende ao acorde principal da escala musical, cuja nota é fundamental. Denomina-se estável por ter um sentido conclusivo e não suspensivo. (CHEDYAK, 1986). 23 uma ideia vaga da função dominante do acorde. Aos 10 anos de idade, a criança é capaz de abordar mais analiticamente a percepção de cadências tonais e a função tônica dos acordes dominantes (COSTA-GIOMI, 2003). A flexibilidade do nosso sistema auditivo e sua dependência da aprendizagem nos permite perceber diferentes estruturas musicais. Uma característica positiva à isto é a criação de gostos musicais que mudam de acordo com a familiaridade e experiência musical (TRAINOR, 2008). Crianças mais velhas têm os pré-requisitos necessários para a inferência de sons mais complexos, pois o acúmulo de informações acústicas, nos sistemas de memória, tem base para suportar tais tarefas. O desempenho infantil é muitas vezes inferior, quando comparado a indivíduos mais velhos em diversas funções. Esta diferença pode ser devido à imaturidade dos sistemas de memória dos bebês (COHEN, 2000). Dado o curso de desenvolvimento da plasticidade neural, com relação a música, o modelo de plasticidade postulado pela aquisição da gramática musical no desenvolvimento da memória de longo prazo, oferece um atalho para a indução da tonalidade (diferenciação da altura - grave e agudo, sentido - ascendente ou descendente), que é um passo fundamental para a interpretação da harmonia e depende da quantidade, do tipo de música e qual foi a relação do bebê com a música ao qual ela foi exposta no primeiro ano de vida (COHEN, 2000). Timbre O timbre evoca uma atividade elétrica encefálica na região do córtex auditivo secundário. Trainor et al. (2011) comprova esta afirmativa devido ao fato que, durante uma audição musical, o instrumento de conhecimento e domínio do músico, é reconhecido e compreendido com maior facilidade com relação à outros instrumentos e sons. Estudos através de um MEG12 mediram respostas musicais em crianças durante o período de um ano e acharam respostas positivas (potencial evocado através do MEG) associadas a memória e a processos atencionais. Estas respostas estão associadas à iniciação musical e ao processo neurológico que evidencia o reconhecimento do timbre e da música, em comparação às crianças que não treinaram música (TRAINOR et al., 12 Magnetoencefalógrafo. 24 2011). Isto sugere um efeito causal para o reconhecimento do timbre a partir de um treinamento musical ou das experiências musicais. Estudos demonstraram que uma resposta negativa surge normalmente entre 2 e 4 meses de idade (HE et al., 2007 apud TRAINOR et al., 2011), mas uma resposta positiva apresenta-se a partir do 6º mês (TEW et al., 2009 apud TRAINOR et al., 2011). O estudo de Trainor et al. (2011) verificou, se a exposição de timbre musical em lactentes de 4 meses conduz alterações plásticas na resposta do cérebro a esses timbres. O autor comenta que: "Quando gravações de EEG são analisadas na frequência dominante, músicos também mostram maiores respostas gama para tons musicais em comparação aos não músicos (SHAHIN et al. 2008; TRAINOR et al. 2009). Embora estes estudos não podem definitivamente indicar se as diferenças são causadas pela experiência musical, estudos mostrando avançado processamento para tons no timbre do instrumento do músico sugerem que a experiência desempenha um papel importante" (PANTEV et al. 2001; SHAHIN et al. 2003; SHAHIN et al. 2008)" (TRAINOR et al., 2011,p. 194). Ainda afirma que: "Embora simples repetida exposição a um estímulo podem ser suficiente para induzir mudanças plásticas nas respostas de P2 (SHEEHAN et al., 2005). Experiência acústica também modifica as propriedades de 40Hz auditivo estado estacionário resposta (GANDER et al. 2010) que localiza ao córtex auditivo primário" (TRAINOR et al., 2011,p. 194). Trainor et al. (2011) sugere que a exposição, na infância, para tons de um timbre particular ajusta a nitidez e amplia a percepção para tons daquele timbre. Foi demonstrado que uma exposição curta (inferior a 3 horas) para um timbre particular em meio à grande variedade de sons que os bebês são expostos, resulta em uma mudança plástica na resposta ao timbre não ouvido previamente. O autor também apresenta uma hipótese para esta representação tímbrica; a influência ambiental e cultural para determinados timbres, como a da guitarra, por exemplo. O fato de estar presente na cultura ocidental, influencia a percepção para a exposição deste timbre. Neste caso, mudanças plásticas ocorreram após a exposição passiva (audição musical) quanto às melodias de um timbre particular. No caso, não houve uma formação ativa ou processo atencional. Quanto à forma passiva de experimentar música, conclui-se que quando uma rede neural está em um estado relativamente desorganizado, como no cérebro do bebê, a exposição passiva é mais eficaz, ao invés da experiência ativa. De acordo com Trainor 25 et al. (2011), o fato da rede se especializar para entradas sonoro-musicais, podem ser conferidos à uma exposição relativamente pequena aos tons de timbres particulares, que resultam em alterações plásticas para as representações gerais do timbre em bebês com 4 meses de idade e evoluem rapidamente para respostas comportamentais. Capítulo 2. EVIDÊNCIAS ACERCA DA UTILIZAÇÃO DA MÚSICA COM BEBÊS Considerando a influência da música na fisiologia cerebral, bem como, nos mecanismos de neuroplasticidade cerebral, conforme abordado no capítulo anterior, podemos considerar a música uma poderosa ferramenta de avaliação e intervenção. Segundo Haden et al. (2009), é possível predizer algumas deficiências em idades muito precoces. Para abordar as evidências científicas acerca da experiência musical com bebês foram selecionados e analisados 19 artigos que evidenciam artefatos preciosos. Na a Tabela 1 apresentamos uma síntese dos artigos, agrupados conforme proposto pelos autores, os quais foram discutidos considerando as 5 categorias que se referem à música: Arquitetura Cerebral do Processamento da Música e Aprendizagem Musical; Fatores relacionados à Experiência Musical; Treinamento Musical; Motricidade e Ritmo; Emoção. Tabela 1. Evidências da utilização da música com bebês. Materiais e Métodos Participantes Resultados Local de Desenv. do Estudo G1 com 3 meses e G2 com 6 meses Ativações nas regiões bilaterais temporais em ambas as idades foram notadas em todos os estímulos sonoros. A ativação dependente do estímulo foi observada na região temporoparietal de ambas as idades. Os resultados indicam que o cérebro do bebê é capaz de responder às diversas variações de tom (altura). Sugere-se que a região temporoparietal direita aumenta a sensibilidade às sequências auditivas. Japão 6 meses Os resultados indicaram uma aceleração na aquisição musical dos bebês, devido a utilização de uma técnica pedagógica apropriada. Além disso, a experiência musical interativa parece facilitar o desenvolvimento cognitivo sob a forma de utilização de gestos comunicativos pré linguísticos e linguístico, devido à interação com os pais e a socialização. A música favoreceu a expressão, o canto, aumentou a motivação dos pais e estimulou os bebês. Fica claro que um forte agente para o resultado é a interação social positiva entre os pais e bebês Canadá 6 meses Bebês percebem alterações em 8%, 6% e 4% na desafinação do tom, sem diferença significativa entre eles. Alterações de 2% e 1% demonstram desempenho pior no reconhecimento, quando comparadas às variações mais amplas. Os resultados indicam que os bebês são sensíveis às violações da estrutura harmônica, e sugere que eles separem dois objetos sonoros simultaneamente. Canadá Autor Tipo de Estudo Técnica Utilizada Espectroscopia de Infravermelho (NIRS) Homae et al., 2012 Experimental Gerry et al., 2012 Mensuração da sensibilidade à escala ocidental; Mensuração do desenvolvimen Experimental to socioemocional ; Mensuração do desenvolvimen to do início da comunicação Folland e Butler, 2012 Experimental Observacional Desenho Tipo de Estímulo / Método Transversal Escala cromática, contendo 25 tons de C3 a C5, com duração de 50ms (cada tom), dividido em 3 conjuntos de estímulos. 1. Ascendendo e descendendo as escalas por 24 semitons. 2. Ascendendo e descendendo as escalas por 12 semitons. Ascendendo e descendendo as escalas por 4 semitons. As diferenças entre os conjuntos estão na ordem dos tons apresentados Longitudinal 6 meses de aulas Fazer musical ativo/interação musical projetado para desenvolver as habilidades musicais por meio da participação e observação (bebês e pais). Foi construído um repertório de canções de ninar, canções de ação e cantigas de roda. Utilização do CD em casa para repetir as músicas e rimas diariamente. Transversal 1. Tom com altura de 240Hz, contendo seis harmônicos iniciais (240, 480, 720, 960, 1200 e 1440Hz) e duração de 500ms. 2. Tom desafinado foi alterado o 3º harmônico (720Hz), em percentil superior de 1%, 2%, 4%, 6% ou 8%. N 46 (G1 = 22 e G2 = 24) 34 (20 música ativa e 14 música passiva) 24 Idade 26 Trainor et al., 2011 Fujioka et al., 2011 Blasi et al., 2011 Perani et al., 2010 Experimental EEG (124 eletrodos) EEG (Lobos: Frontal, Temporal, Central e Experimental Occipital clusters com 22 - 30 eletrodos cada) Experimental Experimental fMRI fMRI Longitudinal Transversal Exposição à timbres de guitarra (G1) e marimba (G2). 2 notas no piano repetidas aleatoriamente (uma 80% e outra 20% repetida) Transversal 4 categorias de estímulos auditivos: vocalizações não verbais (emocionalmente neutra, emocionalmente positiva e emocionalmente negativa), e sons ambientais familiares a idade da criança. Transversal 3 conjuntos de estímulos. 1. Música tonal (maior e menor) "ocidental", duração de 21seg em 124bpm. 2. Manipulação de 1 semitom (acima ou abaixo) da música 1 , no final das cadências. 3. Voz principal foi aumentada em 1 semitom 25 (13 no G1 e 12 no G2) 25 (G1 = 12 e G2 = 13) 21 18 4 meses Exposição relativamente pequena à sons particulares de um timbre modificam o sistema perceptivo e a representação geral para este timbre. Isto indica plasticidade em bebês com até 4 meses de idade, e que eles são capazes de reconhecer o som da guitarra em contraste com o da marimba. Canadá G1 com 4 meses e G2 com 12 meses Os achados sugerem que uma atividade neural auditiva específica, envolve maior velocidade e alcance nas redes neurais, na idade de 12 meses, quando a memória a longo prazo para a representação musical está formada. A maturação dos distintos componentes rítmicos ocorre em paralelo, e que redes oscilatórias reorganizam-se de tal forma, que as funções específicas são transferidas para as recém desenvolvidas redes de ordem superiores (aos 12 meses), quando ocorre a aprendizagem perceptual auditiva. Canadá 3a7 meses Observou-se ativações no giro medial temporal, giro lingual direito, giro medial frontal, putâmen direito e giro fusiforme direito. Vocalizações neutras provocaram maior ativação do que o estímulo não vocal no medial anterior direito, giro superior temporal e no giro medial frontal. Em contraste, o estímulo não vocal provocou maior ativação no giro esquerdo superior temporal. Não foram detectadas diferenças entre vocalizações positivas e neutras, entretanto, vocalizações negativas (tristes) mostraram grande ativação na ínsula e giro reto. Inglaterra 3 dias Música evocou ativações predominantes do hemisfério direito, no córtex auditivo primário e superior. As músicas alteradas provocaram diminuição no córtex auditivo direito e ativações no córtex frontal inferior esquerdo e sistema límbico foram vistas. Itália 27 Kotilahti et al., 2010 Dehaene-Lambertz et al., 2010 Winkler et al., 2009 Stefanics et al., 2009 Espectroscopia de Experimental Infravermelho (NIRS) Transversal Transversal 5 peças faladas (gravadas previamente) extraídas de "Chapeuzinho Vermelho" e estímulos musicais extraídos de um concerto para piano de Mozart. 3 estímulos - música, voz materna e voz estranha 13 7 1 a 4 dias O estudo apresentou assimetrias no processamento da audição da fala e da música, no hemisfério esquerdo (HE) e hemisfério direito (HD). Não houve evidência a respeito de uma lateralização específica para a audição da fala e da música. Entretanto, foi evidenciado que os bebês foram mais reativos à fala ao invés da música, e a área do HE predominou ao HD, com relação à ativação. Sugere-se que uma típica lateralização ao HE inicia-se na infância, porém não apresenta-se inteiramente desenvolvida. Finlândia 2,5 meses Verificou-se uma assimetria já presente nas áreas temporais posteriores dos lactentes: há vantagem do hemisfério esquerdo para a fala em relação à música ao nível do lobo temporal. As regiões posteriores temporais são sensíveis ao ambiente auditivo. Além disso, ao ouvir a voz da mãe, a ativação foi observada em várias áreas, incluindo áreas envolvidas no processamento emocional (amígdala, córtex órbito-frontal), mas também, fundamentalmente, em grande medida do lobo temporal na porção esquerda posterior, o que sugere que a voz da mãe desempenha um papel especial na formação precoce das áreas de linguagem. França Experimental fMRI Experimental EEG (C3,Cz, C4 -sistema 10-20) Transversal 5 blocos de padrões rítmicos (bumbo, chimbau e caixa de bateria) 14 2 a 3 dias Experimental EEG (F3, Fz, F4, C3, Cz e C4, de acordo com o sistema 10-20) Transversal Par de tons sinusoidais com 50ms de duração em frequência descendente. 21 2 a 3 dias Bebês detectam omissões ocasionais de padrões rítmicos. É possível que neonatos construam uma representação detalhada do ritmo. Isto permite não somente identificar a batida, mas criar uma ordem hierárquica na representação do ritmo. O sistema auditivo do neonato assemelha-se às capacidades do adulto, representando os intervalos musicais à partir de um intervalo constante, independentemente da variação da frequência. Isto significa que a maior parte do processamento auditivo básico e de nível superior é funcional ao nascimento. Esta habilidade permite ao neonato compreender o ambiente acústico normalmente variável. Hungria Hungria 28 Honing et al., 2009 He et al., 2009 He; Trainor, 2009 Haden et al., 2009 Experimental EEG (C3, C4 e Cz) Experimental EEG (124 eletrodos em bebês) Experimental Experimental EEG (124 eletrodos em bebês e 128 eletrodos em adultos) EEG (F3, F4, C3, Cz e C4, de acordo com o sistema 1020) A capacidade de detectar o ritmo em sequências sonoras rítmicas é funcional ao nascimento. A detecção de toda a estrutura somente é possível após completar todo o ciclo rítmico, até a completa representação do padrão rítmico no cérebro. Esta representação não é importante apenas para compreender o ritmo, mas para construir uma representação hierarquicamente ordenada do ritmo (indução ao ritmo) Holanda Transversal 6 blocos de padrões rítmicos (bumbo, chimbau e caixa de bateria) 14 Recémnascidos (não especifica do) Transversal Notas no piano de C5 a F#5 tocadas no sentido ascendente. Desvio padrão consistiu nas mesmas notas tocadas descendentemente. As notas tiveram 400ms de duração e 50ms de intervalo entre elas. 29 (G1 = 16; G2 = 13) G1 com 2 meses e G2 com 4 meses Sugere-se que mudanças não frequentes na ordem da sequência dos tons eliciam uma resposta MMN em bebês com 4 meses de idade. Com bebês de 2 meses de idade esta resposta não foi observada. Canadá Transversal Em cada tom foi adicionado 10 ondas sinusoidais que seguiram as frequências múltiplas da frequência fundamental (a partir dos 15 primeiros harmônicos), onde a intensidade foi reduzida por 4dB/oitava. O primeiro tom foi utilizado como padrão e continha a frequência fundamental. Os componentes do segundo tom no estímulo desviante foram criados de modo a formar uma fundamental ausente. G1 com 3 meses, G2 com 4 meses, G3 com 7 meses e G4 com 20 anos de idade Evidenciou uma representação cortical para o tom na ausência da sua fundamental, que aparenta emergir após os 3 meses e anterior aos 4 meses de idade, indicando integração dos componentes da frequência harmônica na percepção do tom aos 4 meses de idade. Entre 3 e 4 meses de idade há uma mudança importante na forma como o tom é representado no córtex, de modo que, através do 4º mês, componentes que estão em relações harmônicas unem-se à uma percepção única, cujo tom corresponde à fundamental, estando ela presente ou não no estímulo. Canadá 2 a 3 dias Observou-se a existência de um processamento avançado relacionado à altura (tom) em recém nascidos e sugere que a representação do tom é um recurso que existe desde o nascimento. O processamento do tom é um pré-requisito necessário para o desenvolvimento da fala normal, incluindo a percepção da prosódia e conteúdos emocionais, identificação da fonte sonora e percepção musical. Hungria Transversal Sequências compostas com 2 sons instrumentais de alturas (tons) diferentes. C#3 e F3. Os sons foram tocados no timbre French Horn. 69 (G1 = 29, G2 = 15, G3 = 15 e G4 = 10) 12 29 Gerry et al., 2009 Phillips-Silver e Trainor, 2005 Experimental Experimental Observacional e Comparativo com o estudo de PhillipsSilver e Trainor, 2005 EEG EEG (F3, F4, P3, P4, Cz sistema 10-20) Schmidt et al., 2003 Experimental Sakatani et al., 1999 Espectroscopia de Experimental Infravermelho (NIRS) Longitudinal Transversal Transversal Transversal Idêntico ao estímulo utilizado por Phillips-Silver e Trainor, 2005 Ritmo ambíguo (sem acentuação do tempo forte) 3 estímulos musicais: Barber - Adágio (reflete tristeza); Prokofiev - Peter and the Wolf (reflete medo) e Vivaldi Spring (segundo movimento) (reflete alegria). Estimulação auditiva - peça popular de piano, através de um par de fones de ouvido. 8 Não mencionad o 167 (G1 =33, G2 = 42, G3 = 52 e G4 = 40) 28 7,4 meses Sugere-se que, se o objetivo do treinamento musical é capacitar as pessoas para serem capazes de produzir e apreciar formas mais complexas, um programa musical ideal de formação para lactentes devem incluir uma variedade de formas métricas Canadá 7 meses Foi evidenciado que há uma forte conexão entre o movimento do corpo e o processamento auditivo do ritmo (quando ambas as fontes são experimentadas simultaneamente). O efeito observado envolve o sistema vestibular e provavelmente os sistemas proprioceptivos. A experiência do movimento do corpo desempenha um papel importante na percepção musical do ritmo. Canadá G1 com 3 meses, G2 com 6 meses, G3 com 9 meses e G4 com 12 meses Lactentes com 3 e 6 meses de idade não demonstraram diferenças no lobos frontais e parietais, enquanto outras crianças (9 e 12 meses) apresentaram maior ativação elétrica no lobo frontal e parietal. Este desenvolvimento também refere-se à maturação do lobo frontal. Os resultados sugerem que existe uma alteração clara no desenvolvimento, no efeito da música sobre a atividade cerebral que regula a emoção, no primeiro ano de vida. Importantes mudanças no desenvolvimento que ocorrem em níveis centrais e autônomos que podem estar subjacentes a processos de regulação da emoção, no primeiro ano de vida pós-natal deve-se à música que, neste caso, tem uma forte influencia na regulação da emoção e acalma o neonato. Canadá 3 dias Sugere-se que o desenvolvimento do cérebro (incluindo as disfunções cerebrais) pode ter mecanismos semelhantes de oxigenação e metabolismo energético durante a ativação neuronal. China N, número de participantes; G, grupo; EEG, eletroencefalografia; fMRI, ressonância magnética funcional; MMN, mismatch negativity - é uma resposta relacionada ao evento (ERP) que o cérebro emite frente ao estímulo que ele ainda não reconheceu. 30 31 Arquitetura Cerebral do Processamento da Música e Aprendizagem Musical Para perceber alguns elementos da música (tom, melodia e harmonia) são necessários o recrutamento de sistemas neurais através de uma rede espacial e funcionalmente distinta. Entretanto, grande porção da identificação dos elementos sonoros estão localizados na porção direita do lobo temporal. Esta assimetria para a percepção da música está presente desde o nascimento, e deve-se ao fato do córtex primário auditivo (no hemisfério direito) estar envolvido com a análise do tom e integração (altura, direção e timbre). Tais ativações se estendem ao giro de Heschl em direção ao plano polar, bem como para o plano temporal e ao lobo inferior parietal. As áreas do giro temporal superior e plano polar estão envolvidas com o aumento da complexidade melódica, e áreas hemisféricas do córtex auditivo direito, ao processamento de padrões de altura (tom) no reconhecimento de melodias, e na transformação auditivo-motora (PERANI et al., 2010). Homae et al. (2012) observaram que o cérebro do bebê de 3 e 6 meses apresentaram diferenciação e lateralização funcional nas áreas auditivas, sendo capaz de responder a mais que um simples tom da informação sonora. Desta forma, o mecanismo de percepção e processamento do estímulo auditivo aumenta a sensibilidade para sequências sonoras fazendo com que todo o sistema processe a informação auditivo/sonora. As áreas ativadas no hemisfério esquerdo compreendem uma tendência à resolução temporal (como na análise do discurso), e ao hemisfério direito compete uma melhor resolução às frequências tonais. Estas diferenças funcionais correspondem à achados anatômicos no volume do processamento cortical direito e esquerdo do córtex auditivo (PERANI et al., 2010). A lateralização de funções deve-se ao fato do cérebro codificar os estímulos perceptivos em padrões de processamento. Automaticamente, o cérebro recruta tais padrões frente ao estímulo auditivo com base na informação obtida anteriormente. Extrair tais padrões é essencial para a compreensão do objeto sonoro. Se sucessivos estímulos auditivo não são conhecidos, ao deparar com uma informação nova, uma resposta negativa é vista, ao qual chamamos de Mismatch Negativity (MMN) (HE; HOTSON; TRAINOR, 2009), onde o cérebro recruta rapidamente informações essenciais do experimento auditivo, separando os elementos e codificando- 32 os através de um mecanismo inato de aprendizagem. As respostas MMN mudam rapidamente com a experiência e envolvem diversas áreas corticais, sendo consideradas como eventos robustos, pois envolve o cerebelo, o núcleo coclear, que é caracterizado como uma automatização que ocorre em intervalos curtos de tempo (milissegundos). Esta automatização envolve ciclos dos gânglios basais, tálamo corticais (incluindo o córtex motor suplementar) e envolve a atenção (TRAINOR, 2012). Outro mecanismo cerebral na arquitetura do processamento da música são as predições. O processamento preditivo ocorre em muitas áreas do cérebro em escalas e tempo diferentes. Tal processamento é muito importante para o desenvolvimento, pois envolve expectativa para altura, duração, timbre, sequências melódicas e rítmicas. Alguns tipos de informação preditiva estão muito presentes na infância, desde uma idade muito precoce. Trainor (2012) afirma que ao final do primeiro ano de vida, a criança já está especializada para a estrutura rítmica e tonal da musica no seu ambiente cultural, devido ao processamento preditivo. Sabemos que os eventos auditivos são divididos em informações segmentadas e codificados em regiões distintas do cérebro. Conforme descrito anteriormente, o cérebro, diante um estímulo novo, emite uma resposta negativa (MMN) e recruta regiões especializadas para o processamento e codificação da informação adquirida. Neste caso, a capacidade para segmentar eventos auditivos simultâneos é essencial para o desenvolvimento auditivo infantil e para a percepção da música. Diante um evento auditivo complexo como a música, precisamos separar as notas, compreender as alturas (tons), acordes, direção melódica (ascendente ou descendente), timbre, entre outros elementos. Bebês com 6 meses de idade são capazes de perceber violações muito sutis na estrutura harmônica de um timbre, por exemplo (FOLLAND et al., 2012). Este artefato se deve à arquitetura cerebral do recém-nascido, que evolui conforme a experiência e ao mecanismo de aprendizagem eliciado por respostas MMN. Perceber a estrutura harmônica do timbre é tão importante e essencial quanto à percepção do tom (altura); ambos presentes na fala e na música. Para a identificação de um objeto e da paisagem sonora, através do qual são derivadas as representações para cada objeto no ambiente, uma representação cortical para o tom é essencial para a compreensão deste. A forma complexa da onda sonora possui diversos harmônicos que derivam a partir de um tom fundamental e multiplicam-se por números inteiros. Na 33 ausência da fundamental do tom, o som ainda é percebido, devido à segmentação da onda complexa e pela codificação que o processamento cortical realiza a partir dos harmônicos que se derivam. He e Trainor (2009) comentam que entre 3 e 4 meses de idade, há uma mudança importante na forma como o tom é representado no córtex, de modo que, através do 4º mês, componentes que estão em relações harmônicas unem-se à uma percepção única, cujo tom corresponde à fundamental, estando ela presente ou não no estímulo. Desta forma, há uma representação cortical para o tom na ausência da sua fundamental, que aparenta emergir após os 3 meses e anterior aos 4 meses de idade, indicando integração dos componentes da frequência harmônica na percepção do tom. Haden et al. (2009) comprova a afirmação de He e Trainor (2009) em seu estudo e comenta que a capacidade de separar tons de outras características sonoras, tais como o timbre, é um importante pré-requisito da percepção auditiva subjacente a aquisição da fala e cognição musical. O sistema auditivo extrai o tom da informação sonora independente da sua fonte. Haden sugere que a percepção do tom é um mecanismo inato, e o processamento do tom é um pré-requisito necessário para o desenvolvimento da fala normal, incluindo a percepção da prosódia e conteúdos emocionais, identificação da fonte sonora e percepção musical. O autor ainda comenta que em futuras pesquisas, métodos de avaliação para déficits auditivos podem ter como base o teste de discriminação do tom, em idades muito precoces. Desta forma, podemos abranger a discussão de Haden também para deficiências ou atrasos na linguagem falada, alterações na prosódia e conteúdos emocionais na linguagem falada, que podem também estar presentes na discriminação auditiva da música, em especial, no processamento da informação auditiva do som. A arquitetura cerebral do neonato, ainda, assemelha-se à do adulto quanto a compreensão de diferentes alturas. A partir de um intervalo musical constante, o bebê é capaz de representar intervalos musicais, independentemente da variação da frequência. Isto significa que a capacidade auditiva do bebê é capaz de processar diferentes intervalos de altura (tom). Stefanics et al. (2009) afirma que esta habilidade permite ao neonato compreender o ambiente acústico normalmente variável. Por último, um grande mecanismo que permite ao cérebro aprender, que é subjacente à experiência musical, é a formação de memória a longo prazo. Vimos que, ao depararmos com eventos sonoros, um processamento preditivo ocorre diante a 34 experiência sonoro-musical e que através de uma codificação específica, o som é segmentado em partes identificáveis, e quando incompatíveis, uma resposta MMN é gerada. Diante tal situação, o processamento musical desenvolve-se através de uma rede espacial e funcional distinta, que, conforme a experiência, torna-se cada vez mais complexa. Fujioka et al. (2011) sugere que as funções auditivas e cognitivas, bem como o acesso à memória de longo prazo, estão acompanhadas pelo desenvolvimento de mecanismos oscilatórios neurais hierárquicos, e que isto ocorre na infância, tão logo aos 4 meses de idade. Fatores relacionados à Experiência Musical A experiência musical modifica o sistema perceptivo e a representação para um determinado som (TRAINOR et al., 2011). Isto quer dizer que novas conexões cerebrais são formadas, e que um mecanismo de plasticidade cerebral é induzido pela experiência com a música e com eventos auditivos. Para Trainor, uma pequena exposição a um som de uma guitarra ou de marimba pode alterar a representação para este timbre, e que este efeito generaliza para a música expressa por este instrumento. Tons jamais experimentados anteriormente não eliciarão respostas MMN para este timbre, e isto se deve à representação cortical dicotomizada entre o timbre (instrumento) e o tom (altura). Por recrutar uma vasta circuitaria neurológica, o estímulo auditivo aumenta os níveis de hemoglobina na região do lobo frontal, pois a experiência musical, assim como o treinamento, capacitam uma gama de funções atencionais e executivas que resultam na especialização à música. A plasticidade é afetada por vários processos anatômicos, tais como a proliferação e poda sináptica, mielinização e neurofilamento e níveis de neurotransmissores, cada um dos quais tem a sua própria trajetória de desenvolvimento. Para Sakatani (1999) o desenvolvimento do cérebro (funcional ou não) pode ter mecanismos semelhantes de oxigenação e de metabolismo energético durante a ativação neuronal, e o estímulo auditivo aumenta os níveis de hemoglobina nos recém-nascidos. Vimos que durante a exposição à música novas conexões são formadas, e a representação para timbres (instrumentos) musicais independem à forma musical. 35 Porém a maturação do sistema auditivo depende de outros fatores além de uma simples exposição musical. Kotilahti et al. (2010) afirma que a lateralização das funções auditivas iniciam-se na infância, porém não encontram ainda desenvolvidas. Treinamento Musical A estrutura musical é complexa e consiste em elementos organizados como altura e estrutura temporal, seguindo regras gramaticais próprias. Adultos treinados e não treinados musicalmente utilizam, igualmente, redes perceptivas e cognitivas para processar a música. Durante o desenvolvimento torna-se cada vez mais especializada a codificação da estrutura musical. Os aspectos da estrutura, tal como a consonância e a dissonância são encontrados no início do desenvolvimento, em conjunto com a exposição temporal a sons estruturados. Esta sensibilidade define-se como a base fundamental para a aprendizagem de escalas e harmonia, que compõe a base para o sistema musical cultural específico. Da mesma forma, a percepção precoce para as estruturas rítmicas surgem através de redes entre o movimento e áreas auditivas do sistema nervoso, relacionando experiência multissensoriais com som e movimento. A formação musical treina uma gama de funções atencionais e executivas no qual resulta na generalização ou especialização à música. Hannon e Trainor (2007) afirmam que a compreender a totalidade da música depende de três instâncias - desenvolvimento universal precoce, aculturação e treinamento formal. O desenvolvimento universal precoce consiste em padrões universais que estão associados à experiência musical, que podem ser inatos ou desenvolvidos muito precocemente no lactente. São eles: consonância, regularidade temporal e interações multissensoriais. Experiência musical passiva - crianças podem aculturar um sistema musical que é dotado de escalas, harmonia, tonalidade e métrica (ritmo); isto quer dizer que através da experiência com os elementos musicais, a criança desenvolve a percepção e o processamento para tais elementos. Através de uma experiência musical ativa, ou treino, outros mecanismos são desenvolvidos, como performance, leitura musical, conhecimento explícito, atenção e função executiva - estes elementos necessitam de funções cognitivas superiores e treino. A aculturação musical depende de uma prática pedagógica apropriada (GERRY, D. et al., 2012). Ao treinarmos bebês para responder positivamente à musica, ou seja, 36 participar ativamente e interagir socialmente, aceleramos diversos aspectos cognitivos da aprendizagem. Gerry afirma que a experiência musical interativa parece facilitar o desenvolvimento cognitivo sob a forma de utilização de gestos comunicativos pré linguísticos e linguístico, devido à interação com os pais e a socialização. Este estudo contribui a um questionamento sobre qual a melhor idade para induzir a criança ao treino da música - o mais precocemente possível - e quais outros fatores devem estar envolvidos - a interação, motivação, o canto (dos pais), a qualidade da música e a repetição. Claramente a motivação e interação entre os pais e os bebês são fatores fundamentais para o desenvolvimento e a aprendizagem da criança. Desta forma, o treinamento musical é tão importante quanto a própria experiência musical passiva, pois amplia as capacidades perceptivas da criança, socializa, amplia a interação com o grupo e beneficia diversos aspectos cognitivos e da aprendizagem. Outro ponto a ser destacado é a quantidade de repetições ao qual Gerry et al. (2012) afirma ser o ponto chave para uma prática pedagógica de treinamento musical. Motricidade e Ritmo O ritmo é considerado uma estrutura importante na percepção e experiência da música. Ao ouvirmos a música, induzimo-nos à batida rítmica que mobiliza preferencialmente nossa habilidade motora. Honning et al. (2009) verificaram se esta capacidade é inata ou induzida. O resultado de sua pesquisa mostrou que a capacidade de detectar o ritmo é funcional ao nascimento, ou seja, apresenta-se inata ao desenvolvimento. Entretanto, construir um ritmo ordenado exige uma representação hierárquica de todo o ciclo. A codificação do ciclo rítmico é influenciada pelos movimentos corporais ao qual envolve uma estimulação vestibular. O sistema vestibular é composto por um conjunto de órgãos do ouvido interno que correspondem à manutenção do equilíbrio. Neste sistema estão presentes algumas estruturas essenciais13 ao ortostatismo, ao qual 13 Formado por três canais semicirculares que se juntam numa região central chamado o vestíbulo, que apresenta ainda duas excrescências chamadas sáculo e utrículo. Ao vestíbulo encontra-se igualmente ligada a cóclea que é a sede do sentido da audição. O conjunto destas duas estruturas chama-se labirinto (PHILLIPS-SILVER; TRAINOR, 2005). 37 encontra um sistema de tubos membranosos, cheios de líquido, cujo movimento estimula as células ciliadas que enviam impulsos nervosos ao cérebro, ou diretamente aos centros que controlam o movimento dos olhos ou dos músculos (PHILLIPSSILVER; TRAINOR, 2005). Gerry et al. (2010) acredita que um treinamento musical capacita o lactente a executar formas mais complexas, acelerando, desta forma, a capacidade motora e a aprendizagem sobre o ritmo. Emoção A regulação da emoção é um processo complexo que envolve maturação, aprendizagem e interação. A capacidade das crianças para negociar com sucesso um complexo mundo social é altamente dependente da regulação da emoção. Áreas do córtex pré-frontal estão envolvidas na inibição de respostas motoras particulares, bem como na solução de problema e como no comportamento afetivo (SCHMIDT et al., 2003). A música apresenta ser um estímulo ideal para compreender as respostas emocionais. Devido ao recrutamento de diversas áreas cerebrais, bem como áreas límbicas e do lobo frontal, a música sensibiliza respostas afetivas em bebês de 9 meses de idade (SCHMIDT et al., 2003). Entretanto, bebês com 3 dias de idade correspondem à música ativando áreas límbicas que processam respostas emocionais à música. Os sinais foram observados em resposta a uma música tonal e consonante, na porção direita do complexo amígdala-hipocampo, e durante a percepção de uma música atonal e dissonante na porção esquerda hipocampal e no córtex entorrinal esquerdo (e possivelmente incluindo a amígdala). A ativação das estruturas límbicas em bebês, em resposta ao estímulo musical, sugerem que eles realizam respostas emocionais à música (PERANI et al., 2010). Quando o bebê começa a balançar, a movimentar-se positivamente e a interagir com a música, ele participa de um processo fundamental que seguirá ao longo da vida. A interação entre o som e o movimento desenvolve-se precocemente (PHILLIPSSILVER; TRAINOR, 2005), e isto ocorre devido ao processamento cognitivo e às associações de diversas áreas do córtex e do sistema límbico. A experiência musical 38 pode suscitar diversas respostas, principalmente com relação à afetividade e a emoção (SCHMIDT et al., 2003), entretanto, o que podemos concluir é a maneira com que a música pode sensibilizar jovens bebês a participarem ativamente da experiência musical, através da resposta afetiva que eles têm a partir dela e o prazer que é extraído desta relação através de um mecanismo interno de motivação. Capítulo 3. MUSICOTERAPIA A música desde a antiguidade é utilizada, dentre suas tantas aplicações14, como uma ferramenta terapêutica. Desde então, ela passa por um processo criativo e artístico, que tem o objetivo de afetar e mobilizar o ser humano a alguma determinada finalidade, passando por processos cognitivos específicos do homem que a interpreta através de uma cadeia de processamento cerebral (FOLLAND et al., 2012; WIGRAN; PEDERSEN; BONDE, 2002). Música envolve não apenas escutar, mas também tocar e criar (pensar), onde as diferenças individuais são muito mais evidentes. Embora quase todas as pessoas possam ter um sistema neural que permita perceber, pensar, sentir a música ou até mesmo reproduzir padrões musicais através do canto, nem todas as pessoas reagem à música, ou a fazem da mesma maneira. Isto é possível devido ao fato que a música envolve estruturas particulares que estão ligadas à processos de atenção, memória, aprendizagem, motivação e emoção. Embora todas as pessoas possuam estruturas de processamento da música essencialmente idênticas, na sua grande parte, a maneira com que cada um vivencia a música é especialmente diferente (ZATORRE, 2005). Todas estas questões são abordadas por um musicoterapeuta em um contexto clínico que leva em conta diversos fatores que estão relacionados ao som e a organização humana que levaram à criação ou à percepção. O musicoterapeuta deve estar apto a conhecer a pessoa integralmente, a partir da sua vivência com a música, ou, mesmo que ela ainda não tenha uma experiência significativa, como no caso de bebês, é importante que o musicoterapeuta conheça o ambiente sonoro musical ao qual a criança foi concebida (BENENZON, 1988; 14 BRUSCIA, 2000). Isto nos leva à um maior Em geral, as aplicações da música envolvem rituais, vinculados à religião, expressões artísticas, cerimônias e a própria terapia. 39 conhecimento sobre a pessoa e, talvez induza perguntas: por que determinadas crianças têm preferências por certos instrumentos e outros não?; como se relacionam as crianças que não possuem em seu contexto familiar, ou que não foram estimuladas musicalmente, com a música?; como estas crianças experimentam música?; o quão a experiência musical pode ajudar o desenvolvimento? Tais questionamentos são imprescindíveis ao cotidiano de um musicoterapeuta, que aplica a música com efeitos de ampliar a qualidade de vida, em todas as suas instâncias, a fim de que a pessoa, ou paciente, transforme a sua condição atual e se beneficie através do uso da música. De acordo com a Associação Americana de Musicoterapia (AMTA, 2012), musicoterapia é o uso clínico, baseado em evidências, das intervenções musicais para atingir objetivos individuais dentro de uma relação terapêutica aplicada por um profissional credenciado que concluiu uma formação musicoterapêutica. Portanto, a musicoterapia enquadra-se como profissão da área da saúde, no qual a música é utilizada para tratar necessidades físicas, emocionais, cognitivas e sociais dos indivíduos. Após avaliar necessidades de cada pessoa, o musicoterapeuta fornece o tratamento indicado, incluindo criar, cantar, dançar, e/ou ouvir música, dividindo assim a atividade musical em dois âmbitos: ativa ou passiva (AMTA, 2012; MRÁZOVÁ; CELEC, 2010). "Musicoterapia define-se pelo uso profissional da música e seus elementos como uma intervenção em ambientes médicos, educacionais e quotidianos com indivíduos, grupos, famílias ou comunidades, buscando otimizar a qualidade de vida e melhorar a saúde física, social, comunicativa, emocional, intelectual e bem estar em geral" (WFMT, 201215). O termo “musicoterapia” abarca tanto as intervenções musicais baseadas em evidências clínicas aplicadas por um musicoterapeuta devidamente habilitado, quanto a pesquisa sobre os efeitos da música no homem. Relatos sobre a utilização da música com efeitos profiláticos são conhecidos e documentados através da evolução histórica da utilização da música (BUNT, 1994; COSTA, 1989). Através do envolvimento musical no contexto terapêutico, habilidades dos clientes são desenvolvidas e reforçadas, no âmbito pessoal - social, físico, emocional e cognitivo. A música estimula diversas áreas pessoais e a engaja através diferentes 15 Disponível em: < http://www.musictherapyworld.net/WFMT/President_presents..._files/President %20presents...5-2011.pdf >. Acesso em: 01 de março de 2012 40 maneiras - através do canto, da expressão musical através do instrumento, da elaboração de uma composição, de uma recriação musical, de uma paródia, através de uma peça teatral, ou mesmo através do silêncio (uma qualidade imprescindível da música) (BRUSCIA, 2000). Como resultado ela facilita o desenvolvimento global; relaxa e acalma; motiva e estimula; ajuda a pessoa a gerenciar a dor e as diversas situações emocionais; encoraja a socialização, autoexpressão a comunicação; facilita o desenvolvimento motor; estimula a cognição e a linguagem; motiva (AMTA, 2012; SCHELLENBERG, 2004). Apesar da musicoterapia ser uma prática terapêutica que nasceu há muitos anos (e talvez sempre esteve presente às culturas como esta forma), ela engloba-se em um campo relativamente novo das terapias e da própria medicina. Data-se de cerca de 70 anos o seu nascimento formal16 (BUNT, 1994). Entretanto, ainda muito se discute acerca da prática terapêutica e sobre os mecanismos de ação da musicoterapia. Mrázová (2010) em seu artigo “Revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados usando musicoterapia para crianças”, menciona a musicoterapia com a necessidade de engajar-se em uma prática baseada em evidências que necessita de uma maior investigação sobre os mecanismos de ação da sua prática terapêutica. Entretanto, com o avanço de técnicas de imageamento cerebral, evidências têm se consolidado no campo da música e da musicoterapia e trazem diversas respostas para os questionamentos, que antes eram percebidos empiricamente e que faziam parte do cotidiano da musicoterapia. Tais respostas têm se demonstrado bastante confiáveis e concretas. Hoje sabemos que bebês sadios são inatos musicalmente, ou seja, eles possuem a capacidade de processar música, mesmo sem tê-la vivenciado. Também sabemos que a música nutre o cérebro, e cria novas conexões, especializando o nosso cérebro à experiência musical (STIX, 2011; TRAINOR, 2008; ZATORRE, 2005). Por fim, sabemos que a quantidade de ensaios randomizados em musicoterapia são escassos, e que, ainda há necessidade de sistematização dos métodos de intervenção para evidenciar os caminhos do trabalho (MRÁZOVÁ; CELEC, 2010), porém, acreditamos que um passo inicial para tais feitos seja fundamentar a prática profissional 16 Até então a música utilizada como forma terapêutica era baseada em afirmações empíricas. Em 1944 nasceu o primeiro curso de formação de musicoterapia, pela Universidade Estadual de Michigan, Estados Unidos. 41 em uma base sólida, esgotando a possibilidade de compreensão da relação homemmúsica; e neste campo, ainda há muito o que esclarecer. O Processo Musicoterapêutico A musicoterapia é um processo sistemático de intervenção no qual o terapeuta ajuda a pessoa a promover a sua saúde, utilizando experiências musicais e as relações que se desenvolvem durante o uso destas experiências, como forças dinâmicas de mudança (BRUSCIA, 2000). Através do processo musicoterapêutico, terapeuta e cliente encontram um ponto em comum na música, onde o terapeuta torna-se um agente facilitador do processo musical-terapêutico, ou seja, quais aspectos da experiência musical, ou da música, beneficiarão a pessoa a fim de que objetivos sejam atingidos. A musicoterapia torna-se então um processo sistemático de intervenção em que o terapeuta ajuda o cliente a promover a saúde utilizando experiências musicais e as relações que se desenvolvem a partir delas. Por se definir como um processo sistemático de intervenção, o musicoterapeuta requer um conhecimento mínimo necessário do seu paciente, e deve estar engajado em uma estrutura organizada e regulada, onde serão avaliados diversos aspectos da pessoa (físicos, emocionais, sociais, comunicativos, entre outros), pertinentes ao trabalho terapêutico (BRUSCIA, 2000; RUUD, 1990). "Vimos a musicoterapia ser utilizada na reabilitação de acidente vascular cerebral, tratamento da depressão e estresse e hipertensão. É possível alterar o estado hormonal, o processamento da memória, aprendizagem, e uma coisa chamada raciocínio espaço-tempo; também se mostra eficaz no autismo" (LAWS, 2010, p. 458). Com relação à intervenção, um exemplo de musicoterapia que podemos comentar é a aplicação do trabalho com neonatos: gravações foram produzidas à partir dos sons uterinos, incluindo o som da placenta e o fluxo sanguíneo na pulsação do cordão umbilical. Isto foi utilizado com bebês recém nascidos propensos a longos períodos de choro, com a finalidade de acalmá-los (WIGRAN et al., 2002). Isto somente é possível pelo fato da música atuar juntamente nos centros de prazer, atenção e motivação da pessoa (PHILLIPS-SILVER; TRAINOR, 2005; SCHMIDT et al., 2003; WEINBERGER, 1998). A musicoterapia tem se demonstrado uma ferramenta 42 ampla e eficaz no tratamento de diversas doenças devido à aceitação e engajamento do paciente com a experiência musical. Trehub (2003) afirma que a música é altamente eficiente na regulação ou otimização do humor em diversas idades. Compreende-se então que a musicoterapia é um processo através do qual o terapeuta ajuda o paciente a melhorar, manter ou restaurar um estado de bem estar, onde, através da relação com a música e das experiências musicais, as mudanças ocorrem (BRUSCIA, 1987). Por ser uma prática baseada em objetivos focados no cliente ou grupo, é necessário que o musicoterapeuta siga planos criteriosos de avaliação e intervenção (RUUD, 1990). O musicoterapeuta deve utilizar uma sequência de procedimentos clínicos específicos para evocar respostas satisfatórias do cliente, conduzindo assim o tratamento por uma abordagem mais homogênea e sistemática (MRÁZOVÁ; CELEC, 2010). Tais respostas compreendem objetivos pré-definidos ao tratamento e podem corresponder tanto em musicais, quanto não musicais. Entende-se por materiais não musicais, todos aqueles que originam da prática terapêutica e que não estão relacionados diretamente à experiência sonoro-musical e podem vir à ser ideias inspiradoras ao contexto clínico (por exemplo - uma palma, um sorriso, um balbucio, um gesto, entre outros) (BRUSCIA, 2000). A música utilizada na sessão de musicoterapia pode partir tanto do musicoterapeuta quanto do seu paciente. Musicoterapeuta e paciente interagem diretamente, e neste caso, o terapeuta deverá facilitar a expressão musical do seu paciente visando recrutar e desenvolver todas as áreas necessárias. O terapeuta, diante o cenário musical, coloca todas as suas impressões objetivas e subjetivas a respeito do paciente, modelando a atividade musical. Valores estéticos musicais também são colocados em evidência, como consonâncias e dissonâncias devidamente aplicados, fazendo com que o paciente participe ativamente da sessão (QUEIROZ, 2003). Para isto, o musicoterapeuta deve seguir um plano criterioso de sessões regulares, advinda de um planejamento previamente estabelecido, que deve ser constantemente avaliados de acordo com o trabalho realizado diante da ação e reação das crianças. Neste caso é essencial que o musicoterapeuta tenha uma boa formação, pois, os procedimentos específicos aplicados por ele, serão influenciados pela sua especialização ou fundamentação teórica (RUUD, 1990). A formação do musicoterapeuta segue normas ditadas pela Federação Mundial de Musicoterapia, por 43 associações ou conselhos nacionais de musicoterapia, abordando também os padrões musicais e culturais (WFMT, 2012). O plano de atendimento da musicoterapia, por valer-se de um processo sistemático de intervenção, segue propósitos. Em geral os propósitos são obtidos em dados de anamnese, ou após algumas sessões de avaliação (BENENZON, 1988). É necessário que o terapeuta conheça o paciente a fim de formular objetivos específicos para o trabalho em conjunto onde, embora uma das partes se demonstre comprometida (através de uma debilidade física, emocional, social, cognitiva, etc.), o musicoterapeuta conduzirá sua intervenção clínica de acordo com os graus de funcionalidades e potencialidades do cliente. Este processo sistemático, também se vale de alguns recursos terapêuticos aplicados pelo musicoterapeuta, como avaliação diagnóstica, tratamento e avaliação. É sempre necessário estar ciente dos limites, das potencialidades e funcionalidades neurológicas, onde, caso haja comprometimento neurológico, é preciso trilhar caminhos para ajudar a compensar os danos e aperfeiçoar as respostas, sempre dentro dos limites impostos da enfermidade (BRUSCIA, 2000; BUNT, 1994; COSTA, 1989). O processo musicoterapêutico, segundo Bruscia (2000), deve seguir três etapas: a) Avaliação Diagnóstica: onde o terapeuta reúne informações basais sobre o funcionamento do paciente no início da terapia. Esta avaliação engloba desde dados musicais até dados clínicos do paciente, como aspectos físicos, emocionais, psicológicos e sociais. b) Tratamento: é a parte do processo terapêutico onde o musicoterapeuta engaja o paciente em diversas experiências musicais, empregando métodos e técnicas específicas que induzem mudanças. Por exemplo: se o objetivo é estimular a fala, o musicoterapeuta deverá fornecer estímulos musicais que estimulem a fala através do canto, de balbucios, sons onomatopaicos, entre outros. Se o objetivo é desenvolver a coordenação motora, o tratamento deverá utilizar recursos materiais (como instrumentos de diversos tamanhos e formas que estimulem a preensão e a coordenação, como chocalhos, sinos, baquetas, etc.) que propiciem isto. O musicoterapeuta, neste caso, deverá fornecer estímulos que favoreçam a movimentação espontânea, utilizando técnicas de improvisação musical, por exemplo. Desta forma, o tratamento tem suporte em objetivos gerais e específicos, de acordo com a necessidade de cada cliente. Está também embasado em evidências reveladas pelo cliente durante a 44 atividade musical. c) Avaliação: define-se pela etapa onde o terapeuta avalia o efeito da intervenção sobre o seu paciente. A intervenção musicoterapêutica deve seguir estes propósitos sistemáticos e metodológicos a fim de que haja reprodutibilidade das ações terapêuticas, principalmente com fins de estudo. Por ser uma área muito abrangente, na musicoterapia há grande variabilidade de métodos, modelos e técnicas de intervenção, especialmente com a clientela pediátrica (MRÁZOVÁ; CELEC, 2010). Os resultados com bebês de risco, em UTI's neonatais que adotaram um acompanhamento da musicoterapia para o tratamento, tiveram boas respostas quanto ao curso do bebê na UTI. Dentre os cuidados englobaram redução de ruídos e sessões de musicoterapia, com músicas durante o tratamento (ANCORA, 2010). Mrázová e Celec (2010) analisaram 28 ensaios controlados randômicos em musicoterapia entre os anos de 1998 e 2009. As sessões variaram de uma única sessão até 30 sessões. As condições de tratamento foram diversas, como: depressão, imunização, bebê pré-termo, autismo, fibrose cística, queimaduras, deficiência visual, TDAH, agressividade, dificuldade socioeconômica, cirurgias ambulatoriais, transtornos de leitura, alergia, punções, pacientes de traumatologia, transtornos do desenvolvimento e acupuntura. 82% dos estudos analisados apresentaram provas dos benefícios da musicoterapia. Nos processos musicoterapêuticos descritos, vale ressaltar a importância de uma boa documentação e dos procedimentos utilizados para esclarecer os resultados obtidos. Um completo e extenso relatório das sessões e das intervenções nas publicações, permite-nos compreender melhor a eficiência da musicoterapia, e, desta forma, direcionar melhor o trabalho, replicar os estudos e aplicá-los na prática clínica. Intervenções musicais Intervir consiste em conduzir alguém à um estado ou situação no qual há necessidade de melhora. No caso da musicoterapia, a intervenção está baseada na relação que a pessoa tem com a música e qual o potencial evocado a partir desta relação (BRUSCIA, 1987; NORDOFF; ROBBINS; ROBBINS, 1998). Neste caso, a música irá atuar como um guia facilitador do processo que fornecerá elementos que irão desenvolver alguma área necessária. Pode-se compreender como intervenção musical a 45 metodologia utilizada pelo terapeuta para extrair respostas objetivas quanto ao desenvolvimento do paciente (BRUSCIA, 2000). As intervenções musicais estão intimamente relacionadas à pessoa, levando em consideração as suas necessidades e seus potenciais. Aplicada à educação especial, o musicoterapeuta toma as necessidades como o foco primário e a função da música é atuar como um meio que satisfaça as necessidades. Portanto, a aquisição da habilidade de expressar-se musicalmente está vinculada ao processo musicoterapêutico e é um requisito para a criança desenvolver-se e corresponder à terapia. A música será o meio pelo qual a terapia ocorrerá (WIGRAN et al., 2002). A habilidade de expressar-se musicalmente refere-se à qualquer comportamento suscitado através da relação terapêutica com a música, ou seja, a qualidade expressiva - por meio de ações - que resultaram da música e a influenciou17 (BRUSCIA, 1987). Para que a intervenção musical ocorra, é necessário que musicoterapeuta conheça o seu paciente musicalmente, pois ele utilizará diversos caminhos e recursos musicais para intervir e facilitar a relação do bebê com a música. A musicoterapia, então, será considerada como uma abordagem centrada nas necessidades da pessoa (BRUSCIA, 2000). O procedimento que o musicoterapeuta utilizará para conhecer a pessoa musicalmente envolverá três etapas conforme o esquema abaixo. Figura 1. Fases procedimentais da musicoterapia (BRUSCIA, 1987, p. 45). 17 Esta afirmação está vinculada à improvisação e ao processo criativo de musicoterapia que será discutido logo a seguir. 46 Conforme a figura 1, o objetivo principal é "conhecer o indivíduo musicalmente" e neste caso, o musicoterapeuta deverá suscitar caminhos musicais que venham de encontro com o paciente a fim de que se estabeleça um canal de comunicação entre ambos. Os estágios que sucedem o objetivo principal: evocar respostas musicais e desenvolver níveis musicais, fazem parte do processo bem como da intervenção musical (BRUSCIA, 1987). Outro aspecto da intervenção está relacionado ao tempo em que ela será iniciada e se instalará como ferramenta de favorecer o desenvolvimento. Ela deve ser iniciada o quão precoce possível a fim de ampliar as capacidades físicas e mentais dos bebês. Os critérios para incluir as crianças em tais programas são baseados nos diagnósticos de atraso no desenvolvimento e nas condições das crianças, bem como na presença de fatores de risco (FORMIGA; PEDRAZZANI; TUDELLA, 2010). No primeiro ano de vida, o bebê depara com o surgimento e o desenvolvimento de diversas capacidades e habilidades (FORMIGA et al., 2010; ZATORRE, 2005), e no caso de atrasos do desenvolvimento, ou quaisquer outras especificidades que necessitam de um acompanhamento profissional, podemos mencionar que: “A intervenção precoce visa capacitar a criança, por meio do apoio fornecido aos pais e/ou cuidadores, a estabelecer uma trajetória de desenvolvimento mais saudável e com mais qualidade. Ela se refere ao conjunto de atividades que têm como objetivo estimular as capacidades das crianças o mais cedo possível, apoiar as famílias e fornecer um monitoramento ativo destas aquisições. É considerada essencial para prevenir danos ou agravos ao desenvolvimento de crianças cujas famílias não podem garantir por si só, estimulação adequada durante a primeira infância” (FORMIGA et al., 2010, p. 131). As intervenções musicais encorajam a flexibilidade do paciente, no que diz respeito à experiência, ao fazer musical. Este mecanismo de autodescoberta possibilita a pessoa projetar-se além das suas limitações, participando de uma experiência musical constante, seja ela ativa ou passiva (ALDRIDGE; ALDRIDGE, 2008). Outro fator essencial à intervenção musical está vinculado à metodologia procedimental ao qual o processo será conduzido. A metodologia guiará as intervenções musicais, conduzidas pelo musicoterapeuta, e poderão guiar-se através de diferentes níveis musicais de expressão, ou seja, quaisquer comportamentos, do paciente, que são originados através da relação com a música. Na Fig. 1, pudemos verificar que o objetivo "conhecer o indivíduo musicalmente" tende a "desenvolver níveis musicais". Isto quer 47 dizer que o objetivo final desta intervenção é fazer com que o paciente se expresse musicalmente tendendo a desenvolver-se através da música (BRUSCIA, 1987). Através de um processo musicoterapêutico criativo, ou seja, utilizando diversos recursos musicais (ativos ou passivos) que tendem à improvisação musical (baseada no contexto sonoro-musical e nas necessidades da pessoa), buscam-se desenvolver estágios de exploração, experimentação e novos padrões de comportamento, que incluem afetividade, motricidade, linguagem, cognição, entre outros. Esta metodologia resulta no desenvolvimento global da pessoa (BRUSCIA, 1987). O processo criativo diz respeito à estágios de identificação, exploração, experimentação e seleção de novas alternativas para lidar com o self18. Desta maneira, o cliente é engajado em um processo onde pode se expressar livremente. É o primeiro meio de motivação que resulta em efeitos no crescimento pessoal do cliente (BRUSCIA, 1987). Quanto ao uso criativo e improvisativo da música, o autor comenta: "O musicoterapeuta buscará a essência da música como terapia para encontrar, na sua criação improvisacional, uma linguagem de comunicação entre ele e a criança. As palavras desta linguagem são componentes da música e seu conteúdo expressivo é realizado através da sua experimentação. Na situação clínica ele tende a ser o centro da sucessão musical; seus dedos desenham no instrumento as suas impressões da criança: expressões faciais, olhares, postura, comportamento, condição - tudo é expressado na música. A flexibilidade da sua execução busca, fora de um contato direto com a criança, respostas emocionais que compreendem a base musical para a interatividade. Esta execução - sua duração, seus ritmos e pausas - cuidadosamente segue, conduz e acompanha as atividades da criança." (BRUSCIA, 1987, p. 24) Portanto, através da intervenção musical, o musicoterapeuta buscará, por meio das improvisações, ou até mesmo da música passiva, desenvolver níveis pessoais, sejam eles musicais ou relacionados ao desenvolvimento da pessoa. Objetivos musicais dizem respeito à qualidade da execução, e são tão importantes quando quaisquer outros objetivos traçados (BRUSCIA, 2000; BUNT, 1994). Os ritmos musicais, a pulsação, o timbre, bem como a intenção, a qualidade19 e o comportamento podem ser considerados como níveis de expressão musical (BRUSCIA, 2000), e, neste caso estão ligados intimamente à experiência musical que resulta no desenvolvimento da criança. Desta forma, a música se torna caminho de experiências, de intercomunicações que são base para as crianças, que sumariamente sentem-se livres para expressar-se. Do mesmo 18 19 Qualidade de pessoa relacionada à sua personalidade. No sentido da execução. 48 modo, a música tem a capacidade de fortalecer vínculos que são a base fundamental para o desenvolvimento humano. A extensão do que a música alcança se torna musicoterapia (BRUSCIA, 1987). Música Ativa e Música Passiva Grande parte da intervenção musicoterapêutica ocorre diretamente através da estimulação musical ou da forma com que o terapeuta e o cliente experimentam a música. A música é universal e qualquer pessoa pode experimentá-la. Seus elementos fundamentais, como melodia ritmo e harmonia atraem e mobilizam cada um de nós. A atividade musical motiva as crianças com determinadas incapacidades físicas a utilizar os membros, ou a voz com expressividade. As estruturas rítmico-melódicas dão suporte às atividades e induzem ordem e controle, promovendo o movimento (NORDOFF et al., 1998). Acerca da experiência musical, ou seja, a forma com que o terapeuta e cliente relacionam-se com a música, Bruscia (2000) cita quatro formas distintas de experimentar a música. São elas a audição, improvisação, a recriação e composição. Estas experiências compreendem o meio pelo qual o terapeuta conduz a sessão e o processo com o seu cliente, ou seja, de forma ativa ou passiva. A respeito do processo terapêutico, existem dois meios pelo qual a sessão é dividida – Música na terapia e música como terapia. Essa divisão inicial indica o caminho que o terapeuta conduzirá seu processo e a forma com que o paciente atingirá os objetivos. Na música como terapia, a música exerce uma influência direta sobre a pessoa e sua saúde. Ela serve como um agente primário na mudança terapêutica. Através desta perspectiva o principal objetivo do terapeuta é ajudar o cliente a engajarse ou relacionar-se com a música, servindo como um guia facilitador da experiência musical. A música na terapia é utilizada para intensificar os efeitos de uma relação terapêutica, sejam através de verbalização, sensações, dança ou quaisquer outros meios que a música ouvida possa implementar. Basicamente essa divisão pode ser classificada como ativa e passiva, ou seja, a maneira com que o paciente faz ou recebe a música (BRUSCIA, 2000). “Uma batida no tambor não é somente bater no tambor [ ... ] é música!” alega NORDOFF et al. (1998, p. 40). A criança ao tocar o instrumento junto com a música 49 improvisada do terapeuta, está fazendo música. Diversos sistemas estão envolvidos no processo do fazer musical; como informações visuais, auditivas, motoras e proprioceptivas. A música requer uma rede neurológica ampla e especializada para ser processada e executada (PHILLIPS-SILVER; TRAINOR, 2005; WEINBERGER, 1998). Outro componente trabalhado a partir da relação com a música é a motivação, que vem sendo amplamente estudado no homem devido aos seus efeitos (GERRY, D. et al., 2012; PHILLIPS-SILVER; TRAINOR, 2005; SCHMIDT et al., 2003). A música lida com diversas áreas do córtex; tem acesso às áreas límbicas, que controlam nossos impulsos, motivações e emoções, ao sistema de percepções que unificam várias sensações exteroceptivas e proprioceptivas, às regiões frontais, temporais, occipitais e parietais. Por fim, a intervenção musicoterapêutica aplicada à bebês, por exemplo, deve facilitar um ambiente rico para o seu desenvolvimento, fornecendo mecanismos que favoreçam a exploração de objetos ou instrumentos musicais, o alcance, a expressão e a comunicação, a experimentação sonora através do fazer musical e das mais variadas formas, sonoridades e intensidades. Devemos levar em conta que o bebê desde pequeno demonstra preferências sonoro-musicais (HOMAE et al., 2012; MCPHERSON, 2006; TRAINOR et al., 2011; WINKLER et al., 2009). Tais preferências consistem em: timbres de baixa e alta frequência (graves e agudos); consonâncias ao invés de dissonâncias; intervalos com poucos saltos harmônicos; ritmos marcantes (SCHNECK; BERGER, 2006). Em suma, a intervenção precoce em musicoterapia deve seguir alguns critérios estabelecidos anteriormente, como: basear a intervenção nas necessidades e potencialidades do paciente; fornecer mecanismos musicais visando facilitar a comunicação, a expressão musical; fornecer estruturas rítmico-melódicas que darão suporte às atividades que induzem ordem e controle, promovendo o movimento; manter um estado de bem estar, motivação, prazer e atenção na atividade musical; reforçar habilidades no âmbito pessoal, social, físico e emocional. A experiência musical, seja ela ativa e passiva molda o comportamento e prepara o indivíduo para realizar novas atividades e experimentar novas situações, pois os bebês se comportam ativamente à música. Formiga et al. (2010) comenta que as intervenções que utilizam vários caminhos para alcançar o desenvolvimento da criança produzem efeitos maiores no seu 50 desenvolvimento. Acreditamos que a música é uma ferramenta que fornece diversos elementos que, através da intervenção musicoterapêutica, favorecerão o desenvolvimento motor, cognitivo, social, da linguagem e de autocuidados da criança. Neste caso a intervenção musicoterapêutica deve fornecer um ambiente rico para o desenvolvimento do bebê, fornecendo mecanismos que favoreçam a exploração de objetos ou instrumentos musicais, o alcance, a expressão e a comunicação, a experimentação sonora através do fazer musical e das mais variadas formas, sonoridades e intensidades. Sempre levando em conta as preferências sonoro-musicais que favorecerão o desenvolvimento do bebê. 51 CONCLUSÃO Diante das evidências acerca do processamento musical em bebês e da utilização da música com fins desenvolvimentistas, acreditamos que um crescente interesse pela utilização da música no favorecimento de diversas especialidades , crescerá substancialmente nos próximos anos, em especial na pediatria. Isto já é evidente com o substancial aumento da pesquisa neurológica e com os artefatos tecnológicos que dão suporte. Pudemos comprovar que no ser humano é inata a experiência musical, e os diversos componentes que integram a música. Também vimos que diversos mecanismos estão presentes ao nascimento, outros são modelados a partir da experiência, outros ainda amadurecerão mais tardiamente, estabelecendo conexões cerebrais e ampliando as já existentes. O quão precoce possível for realizada a intervenção, maior será a chance de obtenção de sucesso no desenvolvimento e a musicoterapia pode ser uma ferramenta muito ampla e valiosa para o trabalho com bebês. Esperamos que o presente estudo possa contribuir para a prática clínica e também para futuras pesquisas em musicoterapia. (BLASI et al., 2011; DEHAENE-LAMBERTZ et al., 2010; HADEN et al., 2009; HOMAE et al., 2012) (STEFANICS et al., 2009) (FUJIOKA et al., 2011) (TRAINOR et al., 2011) (KOTILAHTI et al., 2010) (SAKATANI et al., 1999) (TRAINOR et al., 2011) (HANNON; TRAINOR, 2007) (HONING et al., 2009) (GERRY, D. W. et al., 2010) (SCHMIDT et al., 2003) (HOMAE et al., 2012; SCHNECK; BERGER, 2006; (FORMIGA et al., 2010) TRAINOR et al., 2011; MCPHERSON, 2006; WINKLER et al., 2009) 52 BIBLIOGRAFIA ALDRIDGE, G.; ALDRIDGE, D. Melody in Music Therapy: A Therapeutic Narrative Analysis. Philadelphia, USA: Jessica Kingsley Publishers, 2008. AMTA, A. M. T. A. What is music therapy? , 2012. 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