Revista Univap 23jac.p65
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Revista Univap 23jac.p65
REVISTA UNIVAP Universidade do Vale do Paraíba Universidade do Vale do Paraíba Ficha Catalográfica Revista UniVap - Ciência - Tecnologia - Humanismo. V.1, n.1 (1993)São José dos Campos: UniVap, 1993v. : il. ; 30cm . Semestral com suplemento. ISSN 1517-3275 1 - Universidade do Vale do Paraíba A REVISTA UniVap tem por objetivo divulgar conhecimentos, idéias e resultados, frutos de trabalhos desenvolvidos na UNIVAP - Universidade do Vale do Paraíba, ou que tiveram participação de seus professores, pesquisadores e técnicos e da comunidade científica. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores. A publicação total ou parcial dos artigos desta revista é permitida, desde que seja feita referência completa à fonte. CORRESPONDÊNCIA UNIVAP - Av. Shishima Hifumi, 2.911 - Urbanova CEP: 12244-000 – São José dos Campos - SP - Brasil Tel.: (12) 3947-1036 / Fax: (12) 3947-1211 E-mail: [email protected] Universidade do Vale do Paraíba Av. Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova CEP: 12244-000 - São José dos Campos - SP Fone: (12) 3947-1000 - www.univap.br Campus Centro: Praça Cândido Dias Castejón, 116 - Centro São José dos Campos - SP - CEP: 12245-720 - Tel.: (12) 3928-9800 Rua Paraibuna, 75 - Centro São José dos Campos - SP - CEP: 12245-020 - Tel.: (12) 3928-9800 Campus Urbanova: Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova São José dos Campos - SP - CEP: 12244-000 - Tel.: (12) 3947-1000 Campus Urbanova/Jacareí: acesso pela Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova São José dos Campos - SP - CEP: 12244-000 - Tel.: (12) 3947-1000 Campus Villa Branca: Estrada Municipal do Limoeiro, 250 - Jd. Dora Jacareí - SP - CEP: 12300-000 - Tel.: (12) 3958-4000 Campus Aquarius: Rua Dr. Tertuliano Delphim Junior, 181 - Jardim Aquarius São José dos Campos - SP - CEP: 12246-080 - Tel.: (12) 3923-9090 Campus Platanus: Campus Caçapava: Avenida Frei Orestes Girardi, 3 - Bairro Fracalanza Campos do Jordão - SP - CEP: 12460-000 - Tel.: (12) 3664-5388 / 3662-4667 Estrada Municipal Borda da Mata, 2020 Caçapava - SP - CEP: 12284-820 - Tel.: (12) 3655-4646 Supervisão Gráfica: Profa. Maria da Fátima Ramia Manfredini - Pró-Reitoria de Cultura e Divulgação - Univap / Revisão: Profa. Glória Cardozo Bertti - (12) 3922-1168 / Editoração Eletrônica: Glaucia Fernanda Barbosa Gomes - Univap (12) 3947-1036 / Impressão: Jac Gráfica e Editora - (12) 3928-1555 / Publicação: Univap/2006 Baptista Gargione Filho Reitor SUMÁRIO Antonio de Souza Teixeira Júnior Vice-Reitor e Pró-Reitor de Integração Universidade Sociedade v. 13 Ana Maria C. B. Barsotti Pró-Reitora de Assuntos Estudantis PALAVRA DO REITOR. ..................................................................................... 5 Ailton Teixeira Pró-Reitor de Administração e Finanças EDITORIAL. .......................................................................................................... 7 Elizabeth Moraes Liberato Pró-Reitora de Avaliação A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E A UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP) ............................... 9 Élcio Nogueira Pró-Reitor de Graduação Fabiola Imaculada de Oliveira Pró-Reitora de Educação Continuada Luiz Antônio Gargione Pró-Reitor de Planejamento n. 23 ago. 06 ISSN 1517-3275 PERSPECTIVAS VALORATIVAS NA PREDIÇÃO DO RENDIMENTO ESCOLAR: UM ESTUDO A PARTIR DOS VALORES HUMANOS Nilton Soares Formiga ........................................................................................ 1 3 Maria Cristina Goulart Pupio Silva Pró-Reitora de Assuntos Jurídicos A ESPECIALIZAÇÃO DE PROFESSORES A DISTÂNCIA: ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA Maria da Fátima Ramia Manfredini Pró-Reitora de Cultura e Divulgação Sonia Sirolli, Maria Tereza Dejuste de Paula .................................................... 2 1 João Luiz Teixeira Pinto Diretor Geral do Campus Villa Branca - Jacareí CIÊNCIA, FILOSOFIA E RELIGIÃO DIANTE DA QUESTÃO DA ORIGEM DO UNIVERSO Luiz Carlos Andrade de Aquino Diretor da Faculdade de Direito do Vale do Paraíba Mituo Uehara ...................................................................................................... 2 9 Francisco Pinto Barbosa Diretor da Faculdade de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo FUNÇÕES CARDÍACAS PARA DIFERENTES CONDIÇÕES DE EXERCÍCIO FÍSICO Frederico Lencioni Neto Diretor da Faculdade de Educação Mituo Uehara, Kumiko K. Sakane, Simone A. Bertolotti ............................. 4 2 Marcio Magini Diretor da Faculdade de Ciência da Computação CÉLULAS-TRONCO: REVISÃO SOBRE OS CONCEITOS BÁSICOS Renato Amaro Zângaro Diretor da Faculdade de Ciências da Saúde Samuel Roberto Ximenes Costa Diretor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas Vera Maria Almeida Rodrigues Costa Diretora da Faculdade de Comunicação e Artes Marcos Tadeu Tavares Pacheco Diretor do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Maria Valdelis Nunes Pereira Diretora do Instituto Superior de Educação COORDENAÇÃO GERAL Antonio de Souza Teixeira Júnior REVISÃO DE TEXTO Glória Cardozo Bertti DIGITAÇÃO E FORMATAÇÃO Glaucia Fernanda Barbosa Gomes CONSELHO EDITORIAL Alexandro Oto Hanefeld Amilton Maciel Monteiro Antonio de Souza Teixeira Júnior Antônio dos Santos Lopes Cláudio Roland Sonnenburg Élcio Nogueira Elizabeth Moraes Liberato Francisco José de Castro Pimentel Francisco Pinto Barbosa Frederico Lencioni Neto Heitor Gurgulino de Souza Jair Cândido de Melo Luiz Carlos Scavarda do Carmo Marcos Tadeu Tavares Pacheco Maria da Fátima Ramia Manfredini Maria Tereza Dejuste de Paula Paulo Alexandre Monteiro de Figueiredo Rosângela Taranger Samuel Roberto Ximenes Costa Vera Maria Almeida Rodrigues Costa Karina Teixeira Naves, Newton Soares da Silva, Cristina Pacheco Soares .. 4 8 EFEITO DA IRRADIAÇÃO LASER DE BAIXA POTÊNCIA ARSIANETO DE GÁLIO ALUMÍNIO (ASGAAL) DE 785NM SOBRE A CICATRIZAÇÃO DE LESÃO MUSCULAR: ESTUDO EXPERIMENTAL Getúlio A. de Freitas Filho, Maria de Fátima Rodrigues da Silva, Marcelo E. Belleti, Evandro dos Reis Machado, Newton Soares da Silva ........................ 5 3 INFLAMAÇÃO PULMONAR INDUZIDA POR LIPOPOLISSACARÍDEOS (LPS) E SUA CONTRIBUIÇÃO COMO INSTRUMENTO DE PESQUISAS Daniel de Souza Ramos, Newton Soares da Silva, Wellington Ribeiro ......... 6 1 A CRISE AMBIENTAL E A ECOTOXICOLOGIA: UMA FERRAMENTA NA CONSERVAÇÃO DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA Isabel Cristina Fracasso Póvoa, Newton Soares da Silva, Maria Regina de Aquino Silva ........................................................................................................ 6 5 O MEIO AMBIENTE E O AMBIENTE DA VIDA: A HISTÓRIA ECOLÓGICA NO APERFEIÇOAMENTO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM PROJETOS INTERDISCIPLINARES Celenrozi Zaroni dos Santos, Valéria Zanetti de Almeida .............................. 7 3 PLANEJAMENTO URBANO, CONTROLE SOCIAL E PRIVILÉGIOS Luciane de Menezes Siqueira, Emmanuel Antonio dos Santos ...................... 8 4 O NOVO RURAL EM SÃO FRANCISCO XAVIER Luciane de Menezes Siqueira, Ely Pimenta Guimarães .................................. 9 3 NORMAS GERAIS PARA A PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS NA REVISTA UNIVAP ........................................................................................... 101 PALAVRA DO REITOR A nossa função, com a publicação desta Revista, é possibilitar o exercício de análise de problemas, de alguma forma ligados ao ensino e à pesquisa, no âmbito do ensino universitário, a nossos docentes e, em alguns casos, a discentes. Os temas são livres, dentro das normas de proporcionar a comunicação de temas ligados às atividades universitárias, estando abertas as possibilidades de contribuidores externos apresentarem sua criatividade. Dentro do trinômio Ensino – Pesquisa – Extensão, há muito o que abordar. E as universidades, cada vez mais, alargam sua missão de atender aos anseios de sua comunidade mais próxima, quer adequando seus cursos de modo a atender as demandas de profissionais necessários, quer direcionando as pesquisas aplicadas para proporcionar melhor qualidade de vida à população e, via extensão, praticar a inclusão social, indo até onde as carências são maiores, mediante carretas-oficinas, com todo equipamento necessário. Repete-se o adágio de ir à montanha, sem esperar que ela, não vindo até nós, tenhamos a desculpa para o não atendimento da população distante. E esta missão é cada vez mais amplificada, como agora, ao sermos instados a proporcionar atendimento jurídico, não só como até agora, praticada no prédio da Faculdade de Direito, mas indo às periferias pobres da cidade, aos bolsões de exclusão social, para atender aos anseios de assistência jurídica da população mais desassistida. Baptista Gargione Filho, Prof. Dr. Reitor da Univap EDITORIAL Somos seres sociais. É sempre importante que nos reunamos, expressemos o que sentimos, ajudemos os nossos semelhantes e sejamos por eles assistidos. A comunicação escrita, proporcionada pela Revista Univap revela, muitas vezes, aspectos insuspeitados de pessoas fisicamente tão próximas. E, muitas vezes, somos obrigados a extrapolar o limite imposto às discussões de uma Revista que se pretende baseada em princípios, leis e conceitos duramente conquistados na áspera luta pelo melhor entendimento do universo constituído por matéria, espaço e tempo e extrapolar para discussões filosóficas ou religiosas. Pode-se argumentar que todas estas discussões são frutos de criaturas sujeitas às leis da natureza e que seus neurônios, no fundo, obedecem a forças e energias e, portanto, as leis de Newton e de Maxwell estão presentes e que o pensamento e as abstrações provêm sempre de algo concreto, formulando modelos que têm a ver com a ciência. Seja como for, o importante é que cada um seja livre para interpretar. E interpretar é a forma mais clara de ultrapassar os limites do simples conhecimento e tentar penetrar em um novo e prodigioso universo, o do entendimento. Aos autores, portanto, dos artigos contidos neste número da Revista, os nossos agradecimentos pelo esforço de externarem o que internalizaram, proporcionando a muitos novas oportunidades de entender este mundo que pode ser maravilhoso, se entendido. Antonio de Souza Teixeira Júnior, Prof. Dr. Pró-Reitor de Integração Universidade - Sociedade e Vice-reitor da UNIVAP A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E A UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP) A Fundação Valeparaibana de Ensino (FVE), com sede à Praça Cândido Dias Castejón, 116, Centro, na cidade de São José dos Campos, Estado de São Paulo, inscrita no Ministério da Fazenda sob o nº 60.191.244/0001-20, Inscrição Estadual 645.070.494-112, é uma instituição filantrópica e comunitária, que não possui sócios de qualquer natureza, com seus recursos destinados integralmente à educação, instituída por escritura pública de 24 de agosto de 1963, lavrada nas Notas do Cartório do 1º Ofício da Comarca de São José dos Campos, às folhas 93 vº/96 vº, do livro 275. A Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), mantida pela FVE, tem como área de atuação prioritária o Distrito Geoeducacional, DGE-31. Sua missão é a promoção da educação para o desenvolvimento da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte (DGE-31). Até o presente, a UNIVAP possui os seguintes Campi: a) Campus Centro, em São José dos Campos, situado à Praça Cândido Dias Castejón, 116, e à Rua Paraibuna, 75. b) Campus Urbanova, situado à Av. Shishima Hifumi, 2911. c) Campus Urbanova/Jacareí, com acesso pela Av. Shishima Hifumi, 2911. d) Campus Aquarius, em São José dos Campos, situado à Rua Dr. Tertuliano Delphim Júnior, 181. e) Campus Villa Branca, localizado em Jacareí, na Estrada Municipal do Limoeiro, 250. f) Campus Platanus, localizado em Campos do Jordão, na Av. Frei Orestes Girardi, 3. g) Unidade Caçapava,na Estrada Municipal Borda da Mata, 2020. A Educação Superior, objetivo da UNIVAP, abrange os cursos e programas a seguir descritos: 1) Graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e que tenham sido classificados em processo seletivo. 2) Pós-graduação, compreendendo programas de Mestrado, Doutorado, Especialização e outros, abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam aos requisitos da UNIVAP. 3) Extensão, abertos a candidatos que atendam aos requisitos estabelecidos pela UNIVAP. 4) Educação a distância, com uso de novas tecnologias de comunicação. 5) Formação tecnológica, com formação de tecnólogos em nível de 3º grau. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 A FVE é também mantenedora, tendo em vista a educação integral dos futuros alunos da UNIVAP, de cursos de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e ainda de Formação Profissional e Técnica. A UNIVAP, em seu Projeto Institucional, centra-se: 1) 2) 3) 4) numa função política, capaz de colocar a educação como fator de inovação e mudanças na Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte - o DGE-31; numa função ética, de forma que, ao desenvolver a sua missão, observe e dissemine os valores positivos que dignificam o homem e a sua vida em sociedade; numa proposta de transformação social, voltada para a Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte; no comprometimento da comunidade acadêmica com o desenvolvimento sustentável do País e, em especial, com a Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte, sua principal área de atuação. A UNIVAP está em permanente interação com agentes sociais e culturais que com ela se identificam. Como decorrência da demanda de seus cursos ou dos serviços que presta, estabelece convênios com instituições públicas e privadas, no Brasil e no Exterior. Estes convênios resultam na cooperação técnica e científica, na qualificação de seus recursos humanos e tecnológicos, na viabilização de estágios acadêmicos e na prestação de serviços. A história da UNIVAP, enraizada na trajetória da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte, traz consigo a marca da participação comunitária, a partir do compromisso que tem com a sociedade regional, alicerçado na tradição, na busca da excelência acadêmica, na qualidade de seu ensino, no diálogo com a comunidade e no exercício da tríplice função constitucional de assegurar a indissociabilidade da pesquisa institucional, ensino e extensão. Como atividades de extensão, destacam-se, na UNIVAP, aquelas relativas à Comunidade Solidária, que têm por objetivo mobilizar ações que contribuam para a alfabetização e melhoria da qualidade de vida de populações carentes. Dentro deste Programa, foram realizadas atividades nas áreas de Saúde, Higiene, Cidadania, Educação e Lazer, em Santa Bárbara (BA), Beruri (AM), Teotônio Vilela (AL), Nova Olinda (CE), Coreaú (CE), Carnaubal (CE), São Benedito (CE), Groaíras (CE), Atalaia do Norte (AM), Pão de Açúcar (AL) e, no Vale do Paraíba, nas cidades de Monteiro Lobato, São Bento do Sapucaí, Paraibuna, São Francisco Xavier e São José dos Campos. 9 Todas as pesquisas institucionais da Universidade estão centradas em seu Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IP&D), o qual executa programas e projetos e congrega pesquisadores de todas as áreas da UNIVAP, envolvidos em atividades de pesquisa, desenvolvimento e extensão. Em seus oito núcleos de pesquisa, nas áreas sócio-econômica, genômica, instrumentação biomédica, espectroscopia biomolecular, estudos e desenvolvimentos educacionais, ciências ambientais e tecnologias espaciais, computação avançada, biomédicas, atrai e dá condições de trabalho a pesquisadores de grande experiência, do País e do exterior. Os alunos têm condições de participar, com os professores, de pesquisas, executando tarefas criativas, motivadoras, que propiciam a formulação de modelos e de simulações, trabalhando com equipamentos de primeira linha, e isto faz a diferença entre a memorização e a compreensão. Bolsas de estudo vêm sendo oferecidas a alunos e pesquisadores, quer pela UNIVAP, quer por instituições como CAPES, CNPq, FINEP e FAPESP. O esforço da UNIVAP em construir, no Campus Urbanova, uma Universidade com instalações especiais para cada área de atuação, com atenção especial aos laboratórios, tem por objetivo um ensino de qualidade, compatível com as exigências da sociedade atual. A UNIVAP, para o ano letivo de 2006, fiel ao lema de que “o saber amplia a visão do homem e torna o seu caminhar mais seguro”, oferece à comunidade da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte o seguinte Programa, de seus diversos cursos, que vão desde a Educação Infantil à Pós-Graduação, passando inclusive pelo Colégio Técnico Industrial e pela Faculdade da Terceira Idade. CURSOS DE GRADUAÇÃO - Administração de Empresas e Negócios Arquitetura e Urbanismo Biomedicina Ciência da Computação Ciências Biológicas Ciências Contábeis Ciências Econômicas Ciências Sociais Direito Educação Física Enfermagem Engenharia Aeroespacial Engenharia Ambiental Engenharia Biomédica Engenharia Civil Engenharia da Computação Engenharia de Materiais Engenharia Elétrica - Farmácia Fisioterapia Geografia História Jornalismo Letras Matemática Normal Superior Nutrição Odontologia Pedagogia Publicidade e Propaganda Rádio e TV Secretariado Executivo Serviço Social Terapia Ocupacional Turismo CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO - Doutorado - - Especialização - Lato-Sensu Engenharia Biomédica - Mestrado - 10 Bioengenharia Ciências Biológicas Engenharia Biomédica Planejamento Urbano e Regional - Administração e Planejamento da Educação Computação Aplicada Comunicação Empresarial Dentística Restauradora Direito Processual Gestão Ambiental Gestão Empresarial Neurologia Funcional Odontopediatria Psicopedagogia Saúde da Família Terapia Familiar Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 São José dos Campos Com cerca de 600.000 habitantes, São José dos Campos é o município com maior população na sua região, sendo que seu grande desenvolvimento começou realmente com a construção da Rodovia Presidente Dutra e do Centro Técnico Aeroespacial (CTA). Além disso, a localização estratégica e privilegiada entre São Paulo e Rio de Janeiro e a topografia apropriada para a construção de grandes indústrias possibilitaram que a cidade crescesse vertiginosamente na década de 70, passando a ser uma das áreas mais dinâmicas do Estado e a terceira maior taxa de crescimento da década de 80. De 1993 para cá, a cidade passou por grandes transformações, alcançando avanços na área da saúde, desenvolvimento econômico, educação, criança e adolescente, saneamento básico e obras. O comércio de São José dos Campos é bastante desenvolvido e vive um período de extensão, com vários centros de compras e grandes supermercados e Shopping Centers. Com mais de 800 indústrias, 4.000 estabelecimentos comerciais e superando 7.000 prestadores de serviço, o perfil industrial de São José dos Campos tem dois lados distintos: o centralizado nas áreas aeroespacial e aeronáutica, como a Embraer, e outro diversificado, com indústrias, como a General Motors, Johnson & Johnson, Petrobras, Rhodia, Monsanto, Kodak, Panasonic, Hitachi, Bundy, Ericsson, Eaton e outras. É o quarto município do Estado de São Paulo em arrecadação e ICMS, atrás apenas da capital, Santo André e Campinas. São José dos Campos possui, como resultado da atuação de suas indústrias, dos estabelecimentos comerciais e Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 dos organismos que desenvolvem tecnologias de ponta, mão-de-obra de altíssimo nível. Entre esses órgãos destacam-se o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), com seus Institutos: ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica, IAE - Instituto de Atividades Espaciais, IFI - Instituto de Fomento e Coordenação Industrial e o IEAv - Instituto de Estudos Avançados. Com uma vida cultural bastante intensa, o município conta com uma Fundação Cultural e vários espaços culturais, como o Museu Municipal, galerias de arte, centros de exposição, casas de cultura, Teatro municipal, Cine-Teatro Benedito Alves da Silva, Cine-Teatro Santana e o Teatro Univap Prof. Moacyr Benedicto de Souza, cinemas, emissoras de rádio FM e AM, Central Regional da TV Globo, jornais diários com circulação regional, além dos da capital, e várias Bibliotecas Escolares, Universitárias e de Pesquisa, como a da UNIVAP, a do INPE e a do ITA. A UNIVAP constitui, além do CTA e do INPE, o maior centro de ensino e pesquisa do município. Da Pré-Escola à Universidade, além de Cursos de Pós-Graduação e da Terceira Idade, a UNIVAP mantém o IP&D - Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento, que garante a incorporação da pesquisa na comunidade acadêmica da UNIVAP, permitindo a indissociabilidade entre o ensino e a pesquisa. A UNIVAP tem estado aberta à interação com empresas e instituições do município, notadamente as de ensino e pesquisa, entre elas o INPE e o CTA-ITA, de onde são provenientes o reitor, pró-reitores e vários professores. 11 12 Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Perspectivas Valorativas na Predição do Rendimento Escolar: um estudo a partir dos valores humanos Nilton Soares Formiga * Resumo: Os valores humanos têm sido um dos construtos mais estudados nas ciências humanas e sociais. Na educação, tal tema vem tomando força a cada momento, seja por parte dos especialistas ou por leigos, pois parte do pressuposto de que os valores são guias do comportamento humano, sendo capazes de indicar a melhor conduta para viver em sociedade ou grupos. Foi observado que a função psicossocial e o critério de orientação, salientado no modelo teórico dos valores humanos básicos, foram capazes de predizer alguns indicadores do rendimento escolar (autoconceito do estudante e horas dedicadas ao estudo). Assim, considerando tanto a estrutura teórica quanto a aplicação dos valores aqui abordados, é possível que o rendimento escolar dos alunos apresentem uma melhoria, bem como o desenvolvimento interpessoal entre os jovens frente ao êxito e qualificação escolar. Palavras-chave: Rendimento acadêmico, valores humanos, predição de comportamento. Abstract: Human values have been one of the most studied constructs in the human and social sciences. In the area of education, this theme has been steadily gaining force, among both specialists and non-specialists, since it presupposes that values are guides for human behavior and therefore capable of indicating the best conduct for group and social life. It has been observed that psychosocial function and the criterion of orientation, emphasized in the theoretical model of basic human values, have been capable of predicting some indicators of school achievement (the student´s selfconcept and hours dedicated to study). Thus, while considering theoretical structure or the application of the values studied here, it is possible that student´s scholastic achievement presents an improvement as does also the interpersonal development among the young in relation to school qualification and success. Key words: Academic achievement, human values, behavior of prediction. 1. INTRODUÇÃO Dos vários temas de pesquisa em que os valores humanos têm sido estudados, a educação tem merecido destaque, haja vista o seu insistente aparecimento na mídia e as diversas discussões geradoras da qualificação do ensino e formação cultural entre os jovens. Nos PCNs (1998) este construto é considerado um tema transversal, podendo-se inseri-lo sem nenhum problema tanto no plano pedagógico e prática de ensino quanto em atividades extra-escolares propiciadas pela escola, apontando, assim, em direção da conjunção das díades bases do êxito escolar: ensino-aprendizagem, professor-aluno e escola-sociedade; não mais partindo de uma diretriz linear e unilateral (INOUE; MIGLIORI; D´AMBRÓSIO, 1999), mas da sua multidisciplinariedade. Para isso, a pers* Mestre em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected] Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 pectiva dos valores é capaz de orientar os comportamentos dos estudantes (FORMIGA; GOUVEIA; QUEIROGA; LISLE JÚNIOR; CUNHA, 2001), principalmente, quando relacionado aos construtos de orientação normativa, por exemplo, a educação cooperativa (NIQUINI, 1999), na qual o sujeito acontece nas relações e não no vazio e de maneira individual e isolada. Quanto aos valores humanos, muitos são os enfoques apresentados sobre este tema, da sua função à estrutura, considerando sua relatividade ou universalidade (GOUVEIA, 1998). No Brasil, educadores e pesquisadores que abordam e investem na implementação e reflexão sobre esse construto têm enfatizado uma linha filosófica; é possível encontrar, no trabalho de Aparecida e Silva (1986), Inoue, Migliori e D’Ambrosio (1999) uma busca na operacionalização dos valores, porém, permeando dimensões filosóficas e abstratas quanto à manipulação desse construto e sua aplicação à conduta sócio-escolar. Desta forma, poucos estudos são encontrados no País que abordem valores e rendimento esco13 lar (INDEX PSI, 2003) empiricamente, seja na compreensão de relação ou predição de variáveis. Vale destacar que numa recente pesquisa de tipo correlacional, Formiga, Queiroga e Gouveia (2001) avaliaram a relação dos indicadores do rendimento escolar (por exemplo, horas dedicadas ao estudo e autoconceito do estudante) e os valores humanos, encontrando os seguintes resultados: as funções psicossocais dos valores (normativa, suprapessoal e interacional, as quais caracterizam uma dimensão coletivista) se relacionaram diretamente com o autoconceito do estudante e as horas dedicadas ao estudo; já as funções (existência, experimentação e realização, representando o individualismo) apresentaram relações baixas, neutras e negativas. Com isso, observou-se que os valores que visam a inter-relação, o grupo e o cumprimento das normas sociais demonstram uma maior probabilidade em concretizar alguns indicadores do êxito escolar, bem como a formação cultural e humana. Porém, apesar de esses resultados permitirem uma compreensão explicativa entre essas variáveis, neles existe apenas a relação de causa e efeito proposta pelo cálculo de correlação de Pearson e não uma previsibilidade funcional, a fim de avaliar um poder preditivo entre as variáveis independentes e dependentes. Ao fazer referência à predição de variáveis, a partir de indicadores psicométricos através do cálculo da análise de regressão, busca-se a elaboração de modelo teórico sobre o fenômeno estudado (BABBIE, 2001; BARBOSA, 1997). Sendo assim, de modo geral os valores humanos têm sido definidos como critérios que guiam o comportamento, desenvolvimento e manutenção das atitudes em relação às pessoas, eventos etc. (TAMAYO, 1988). Tal construto é destacado pelos teóricos como uma das dimensões de grande importância na predição do comportamento humano. Lima (1993) considera os valores como uma dimensão explícita de preferências e até de avaliação cognitiva. Rokeach (1981) acredita que a formação dos valores está sustentada em conteúdos cognitivos e afetivos, podendo, assim, determinar o comportamento do sujeito ou grupo. Já para Schwartz (1992; SCHWARTZ; BILSKY, 1987; TAMAYO; SCHWARTZ, 1993) eles são expressos através de tipos motivacionais, que, por sua vez, são universais. Sabendo da diversidade de teorias sobre os valores (GOUVEIA, 1998), pretende-se adotar uma perspectiva alternativa, a qual parte da seguinte definição: os Valores Humanos são como categorias de orientação consideradas como desejáveis, baseados nas necessidades humanas e nas pré-condições para satisfazê-las, adotadas por atores sociais, podendo variar quanto à sua magnitude e aos elementos que a definem (GOUVEIA, 1998, p. 293). Para considerar tal definição, é necessário tomar 14 como referência a teoria das necessidades de Maslow (1954 / 1970), as quais têm os seguintes fundamentos: (1) as necessidades humanas são relativamente universais; (2) são neutras ou positivas; (3) obedecem a uma hierarquia; (4) o homem caminha em direção à auto-realização; e (5) a pessoa é um todo integrado e organizado. Em função dessa teoria, identificaram-se 24 valores básicos, que são terminais por natureza e expressam princípiosguia, sendo vistos como substantivos (ROHAN, 2000; ROKEACH, 1973). Estes servem de categorias transcendentes que guiam as atitudes, as crenças e os comportamentos em situações específicas. Estes 24 valores dão origem a um sistema de valor, apresentando três critérios de orientação, que contemplam cada um duas funções psicossociais, descritas a seguir: Valores Pessoais. As pessoas que normalmente assumem estes valores mantêm relações pessoais contratuais, geralmente procurando obter vantagens / lucros. A pessoa prioriza seus próprios interesses e concede benefícios sem ter em conta uma referência particular (papel ou estado). Para Rokeach (1973) estes valores são vistos como tendo um foco intrapessoal. Em Schwartz (1994) tais valores atendem a interesses individuais. Considerando a sua função psicossocial, estes podem ser divididos em: (1) Valores de Experimentação: descobrir e apreciar estímulos novos, enfrentar situações arriscadas e procurar satisfação sexual são aspectos centrais destes valores (emoção, estimulação, prazer e sexo); e (2) Valores de Realização: além da experimentação de novos estímulos, faz parte do universo desejável dos seres o autocumprimento, o sentimento de ser importante e poderoso, ser uma pessoa com identidade e espaço próprios (autodireção, êxito, poder, prestígio e privacidade). Valores Centrais. A expressão “valores centrais” é usada para indicar o caráter central ou adjacente destes valores; eles figuram entre e são compatíveis com os valores pessoais e sociais, estes tratados a seguir. Em termos da tipologia de Schwartz (1990, 1994), tais valores servem a interesses mistos (individuais e coletivos). Considerando a sua função psicossocial, os valores centrais podem ser divididos em dois grupos: (1) Valores de Existência: interessa garantir a própria existência orgânica (estabilidade pessoal, sobrevivência e saúde). A ênfase não está na individualidade pessoal, mas na existência do indivíduo. Assim, valores de existência não são incompatíveis com valores pessoais e sociais. Eles são importantes para pessoas, principalmente em ambientes de escassez econômica, mas sem colocar em risco a harmonia social; e (2) Valores Suprapessoais. Pessoas que assumem estes valores tentam atingir seus objetivos independentemente do grupo ou condição social. Tais valores descrevem alguém que é maduro, com preocupações menos materiais, não sendo limitado a características descritivas ou específicas para iniciar uma relação ou promover benefícios (beleza, Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 justiça social, maturidade e sabedoria). Estes valores enfatizam a importância de todas as pessoas, não exclusivamente dos indivíduos que compõem o in-group. Portanto, são compatíveis com valores pessoais e sociais. Embora Rokeach (1979) use a expressão valores supraindividuais, ele não se refere ao mesmo conteúdo aqui abordado. Espera-se que os tipos motivacionais segurança e universalismo, propostos por Schwartz (1992), correlacionem-se com as funções psicossociais existência e suprapessoal, respectivamente. Valores Sociais. As pessoas que assumem estes valores estão direcionadas para estarem com os outros. No estudo de Rokeach (1973), correspondem a valores de foco interpersonal, e em Schwartz (1994) estão incluídos entre os valores relacionados com os interesses coletivos. Tais valores são assumidos por indivíduos que se comportam como alguém que gosta de ser considerado; que deseja ser aceito e integrado no in-group, ou que pretende manter um nível essencial de harmonia entre atores sociais num contexto específico. Considerando sua função psicossocial, estes podem ser divididos em: (1) Valores Normativos: enfatizam a vida social, a estabilidade do grupo e o respeito para com os símbolos e padrões culturais que prevaleceram durante anos. A ordem é apreciada mais que tudo (obediência, ordem social, religiosidade e tradição); e (2) Valores de Interação: estes focalizam o destino comum e a complacência. Especificamente, a pessoa que os assume tem interesse em ser amada e ter uma amizade verdadeira, assim como tende a apreciar uma vida. Com isso, neste trabalho pretende-se avaliar o poder predito das funções psicossociais e os critérios de orientação valorativa frente aos indicadores do rendimento escolar (horas dedicadas ao estudo e autoconceito do estudante). 2. METODOLOGIA Amostra Participaram desta pesquisa 530 alunos distribuídos entre o ensino fundamental e médio, sendo a maioria do sexo feminino (55%) e com uma média de idade de 15,21 anos. A amostra foi não-probabilística, podendo ser definida como intencional, pois foram consideradas as pessoas que, consultadas, dispuseram-se a colaborar, respondendo o questionário que era apresentado. Instrumento Os participantes responderam a um questionário constando de duas partes: Questionário dos valores básicos e indicadors do rendimento escolar. Para a caracterização Sócio-Demográfica, uma folha separada foi anexada ao instrumento prévio, onde eram solicitadas informações de caráter sóciodemográfico (por exemplo, idade, sexo etc.). Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Questionário dos Valores Básicos – QVB. Uma versão inicial foi proposta em Espanhol e Português, compreendendo então 66 itens, três por cada um dos valores básicos que avaliava (GOUVEIA, 1998). Utilizou-se uma versão modificada, cuja comprovação, a partir de uma análise fatorial confirmatória, apresentou parâmetros psicométricos aceitáveis na população estudada, tendo os seguintes indicadores de bondade de ajuste: χ2/gl = 3,02, GFI = 0,91, AGFI = 0,89 e RMSR = 0,07 (MAIA, 2000). Formado por 24 itens-valores, com etiquetas que ajudam a entender o seu conteúdo (por exemplo, Tradição– seguir as normas sociais do seu país; respeitar as tradições da sua sociedade; Êxito – obter o que se propõe; ser eficiente em tudo que faz; Justiça Social – lutar por menor diferença entre pobres e ricos; permitir que cada indivíduo seja tratado como alguém valioso); para respondê-los, a pessoa deveria avaliar o seu grau de importância como um princípio-guia na sua vida e indicar sua resposta numa escala de sete pontos, com extremos 1 = Nada Importante a 7 = Muito Importante.No final precisava indicar o valor menos e o mais importante de todos, os quais receberiam pontuações 0 e 8, respectivamente. Indicadores do rendimento escolar: foi composto pelas seguintes questões: a) quntas horas dedicadas ao estudo quando fora do colégio; o sujeito deveria indicar, em um espaço pontilhado no final da pergunta, quantas horas se dedica ao estudo quando não estava no colégio; b) a sua autopercepção de como ele é como estudante. Nesta, o sujeito deveria responder o quanto ele se considerava como estudante, adotando uma escala que variava de 0 = Péssimo a 5 = Excelente. Procedimento Procurou-se definir um mesmo procedimento padrão o qual consistia em aplicar o questionário de valores básicos e os indicadores do rendimento escolar coletivamente em sala de aula. Um único pesquisador ficou responsável pela coleta dos dados; após conseguir a autorização da diretoria do colégio e, posteriormente, do professor responsável pelas aulas, o pesquisador se apresentava como interessado em conhecer as opiniões e os comportamentos das pessoas no dia a dia, solicitando a colaboração voluntária dos estudantes no sentido de responderem um questionário breve. Dizia-lhes que não havia respostas certas ou erradas, e que respondessem individualmente, como também assegurando o anonimato das suas respostas, que seriam tratadas em seu conjunto. Apesar de o questionário ser auto-aplicável, contando com as instruções necessárias para que possam ser respondidos, o pesquisador esteve presente durante toda a aplicação para retirar eventuais dúvidas ou realizar esclarecimentos que se fizessem indispensáveis. Um tempo médio de 20 minutos foram suficientes para concluir essa atividade. 15 Tal estudo pretende contribuir com as perspectivas teóricas sobre valores e educação; isto não invalida a reflexão filosófica e epistemológica desse fenômeno; o que se buscou aqui foi propor um modelo teórico visando facilitar o trabalho de professores e pesquisadores na área. Merece, também, ser destacado que esses resultados corroboram os estudos de Formiga et al. (2002), em relação ao tipo de orientação cultural e rendimento escolar e de Niquini (1999; OVEJERO; MORAL; PASTOR, 2000), sobre interdependência social e aprendizagem cooperativa; esses autores defendem a importância de uma dinâmica mais participativa e de cooperação, porém não inibindo as dimensões individuais do sujeito educacional, limitando, assim, seu isolamento e egocentrismo intelectual aguçado, por exemplo, na busca de êxito e competição comparativa desenfreada. O fato está em tornar capaz uma formação ética e social entre rendimento escolar e jovem estudante; pois a contribuição de alunos com melhor desempenho não somente daria um desenvolvimento e maturidade da manutenção e instrumentalidade das relações sociais e percepção dos limites culturais e intelectuais entre eles, como também contribuiria na auto-valorização deste ensinante e no seu aperfeiçoamento de estudo e relações sociais. Parece ser que essa condição dissolveria a imagem-estereótipo de que o inteligente e ‘gênio’ seria aquele sozinho, na primeira cadeira da sala e na frente do (a) professor (a), discutindo sobre tudo, ou isolado completamente, melancólico e sem contato grupal. Mesmo visando uma perspectiva de educação psicossocial, isso não permite a eliminação do indivíduo do seu contexto, passando a cair mais uma vez no debate: que vem primeiro, o indivíduo ou a sociedade, a educação ou o aluno, a prova ou o êxito etc. Considerar uma educação que forme e seja formada é algo essencial para a dinâmica entre escola e sociedade, já que tais realidades não acontecem no vácuo, mas, nas relações (CHARLOT, 2000; NIQUINI, 1999; CAMINO, 1996) e complexidade da formação social e de comportamento político-educacional. No contexto ensino-aprendizadem, tudo pode acontecer, o ser conhecido, conhecer e reconstruir, podendo garantir que no saber humano falta apenas uma orientação e esta poderia ser definida pelos valores humanos. Apesar das dificuldades que a educação vem enfrentando, tanto na sua qualidade quanto no mau emprego da quantidade especializada, uma das soluções para os problemas educacionais tão clássicos, considerando este estudo, estaria na aplicação dos valores humanos como intervenção para o rendimento escolar, bem como a extinção da repetência e do analfabetismo cultural-científico, buscando, antes de tudo, uma formação ética e interdisciplinar (DISKIN et al., 1998). 18 Os estudos sobre valores oferecem considerada importância em relação ao rendimento escolar, uma vez que foi possível observar o poder preditivo para as horas dedicadas ao estudo e o autoconceito do estudante frente aos critérios valorativos que prezam pela normatização, disciplina e relações interpessoais. Definir qual o melhor caminho na solução desse problema educacional permite reflexões aprofundadas: desde políticas educacionais e suas verbas, individualidade de cada aluno (inteligência, motivação etc.) à instrumentalidade do ensino. Por fim, a aplicação deste construto na área educacional contribuiria na formação de questões, além das aqui tratadas, outras propostas pelos PCNs, bem como conhecer tanto sua relação com o rendimento e outros temas, quanto sua hierarquia visando a construção da dinâmica do processo ensino-aprendizagem vivido na escola (FORMIGA; QUEIROGA; GOUVEIA, 2001). Desta maneira, além de corroborar os resultados encontrados em outros estudos desenvolvidos por Formiga et al. (op. cit; FORMIGA, 2002; FORMIGA, 2004), um estudo posterior que se centra-se trata-se do confronto dos valores humanos para mudança de comportamento escolar (CEIS, 1998; GRACIA, 1987; ROS et al., 1996) seria muito significativo; pois, para esses autores, o objetivo nos seus trabalhos consiste em incentivar a intervenção em alguns valores, salientando os que, teoricamente, promovessem disciplina e afetassem, positivamente, o rendimento dos alunos, já que consideramos que todos temos valores, e que o problema estaria entre as prioridades valorativas que cada um de nós apresentamos; pois, considerando o contexto, não somente se exige, como também, é exigido que certos valores se mantenham. Paralelamente a este processo, busca-se melhorar as relações família-aluno-professor, fator que também é decisivo para manutenção e estabilidade atitudinal e comportamental do estudante com base na sua formação valorativa. 4. NOTAS (1) A utilização desse método se deve à existência de razões teóricas que possibilitam elaborar hipóteses que contribuam na predição dos valores em relação ao fenômeno questionado (os indicadores do rendimento escolar). (2) Este critério concebe um indivíduo maduro e que atende tanto aos seus interesses individuais quanto aos do coletivo, sem prejudicar excessivamente a ambos. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS APARECIDA, S.; SILVA, I. Valores em educação: o problema da compreensão e da operacionalização dos valores na prática educativa. Petrópolis: Vozes. 1986. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 BEM, D. J. Convicções, atitudes e assuntos humanos. São Paulo: EPU. 1973. CAMINO, L. (1996). Uma abordagem psicossociológica no estudo do comportamento político. Revista Psicologia e Sociedade, v. 1, n. 8, pp. 16-42. 1996. CEIS, V. Valores en niños, adolescente y jóvens. Exploração e educación en valores. Madrid: CEIS. 1998. DISKIN, L.; MARTINELLI, M.; MIGLIORI, R. F.; SANTO, R. C. E. 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O presente estudo tem por objetivo descrever, na perspectiva de duas participantes, um curso de especialização em Avaliação, oferecido a distância, dirigido a professores universitários e realizado pela Universidade de Brasília em parceria com a UNESCO. Os participantes do curso eram professores de instituições públicas e privadas de ensino superior distribuídas geograficamente por todo o território nacional e com perfil educacional que variou de graduação a doutorado. O curso foi realizado através de módulos com estudos de casos e utilizou o correio e o contato telefônico como meio de alcance dos alunos e para o envio de materiais impressos e vídeos. A avaliação e as orientações tutoriais foram feitas através de encontros presenciais regionais. Os resultados mostraram que dos 868 alunos que iniciaram o curso, a metade evadiu e 434 apresentaram a monografia final. Palavras-chave: ensino a distância, formação de professores. Abstract: The availability of new technologies of information and communication has been leading to the development of new teaching and education strategies. In Brazil, the remote or distance education has been used since the 1930s and today has acquired great relevance to education questions, among them there is the teacher’s education. This study aims to describe, from the point of view of two former students, one graduate course on Evaluation, planned and offered at distance to university teachers by the Universidade de Brasília in partnership with UNESCO. This course students were university teachers working at public and private universities dispersed by all the country whose degrees varied from Bachelor to Doctorate. The course was developed through modules based on case studies. The printed material and videos were distributed to the students by mail. There were also telephonic contacts linking the students and the course staff. The learning evaluation and tutorial orientation took place by means of regional and presential meetings. The results showed that half of the 868 students enrolled in the course dropped out and 434 had the final paper approved. Key words: distance education, teacher education. 1. INTRODUÇÃO A escola tem sido solicitada a mudar para atender às novas necessidades da sociedade da informação. Requisitos como a educação ao longo da vida, a permanente formação profissional e a universalização das oportunidades de formação, entre outros, têm provocado a busca de modalidades educacionais capazes de dar conta dessa nova realidade. A disponibilidade de novas tecnologias de informação e de comunicação tem oferecido à educa- * ção recursos até então não existentes e que possibilitam o desenvolvimento de novas estratégias capazes de atender a essas novas necessidades da tarefa educativa. A educação a distância tem sido uma escolha para atender às novas demandas do ensino e da formação. Educar à distância não é um conceito novo. Para Nunes (1993) esse tipo de ensino tem uma longa história de experimentações, fracassos e sucessos, tendo sua origem recente nas experiências de educação por correspondência iniciadas no final do século XVIII e com largo desenvolvimento a partir de meados do século XIX . Professora da UNIVAP. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 21 No Brasil, desde a década de 30, foram desenvolvidas experiências de ensino a distância com uso do rádio e, alguns anos depois, ocorreram várias outras com o uso da correspondência como meio para o ensino, tais como a do Instituto Universal Brasileiro e a do Senac. No final da década de 80 e durante a década de 90, houve expansão da educação a distância no Brasil, principalmente com uso de fitas e vídeos (ALVES, 2004). Não sendo um conceito novo, a definição de educação a distância tem passado por mudanças. Os termos, educação a distância, ensino a distância e aprendizagem a distância, têm sido usados como sinônimos em alguns contextos, mas, para alguns especialistas, envolvem diferentes características e significados. Para Moran (1994), por exemplo, educação à distância é o processo de ensino-aprendizagem, mediado por tecnologias, onde professores e alunos estão separados espacial e/ou temporalmente . É ensino/aprendizagem onde professores e alunos não estão normalmente juntos, fisicamente, mas podem estar conectados, interligados por tecnologias, principalmente as telemáticas, como a Internet. Mas também podem ser utilizados o correio, o rádio, a televisão, o vídeo, o CD-ROM, o telefone, o fax e tecnologias semelhantes. O termo ensino a distância é inadequado, para Moran, já que enfatiza o papel do professor, enquanto o termo educação a distância é mais apropriado, por ser mais abrangente. Outros, como Chaves (1999), argumentam que as expressões educação a distância e aprendizagem a distância não são adequadas porque tanto a educação como a aprendizagem ocorrem dentro do indivíduo e, portanto, não podem ser realizadas à distância. Nesse caso, a expressão ensino a distância é mais adequada porque quem está ensinando está espacialmente distante. Preti (apud SILVA, 2002) prefere, no lugar de uma definição de educação a distância, apontar suas características básicas: educadores e educandos se encontram separados pelo tempo e/ou espaço, há canais tecnológicos e humanos que individualizam a interação e processos mediatizados, há uma estrutura complexa a serviço dos educandos aliada a subsistemas integrados de comunicação e tutoria, há ainda produção de materiais didáticos que buscam promover uma aprendizagem independente, individualizada e flexível. 22 Rurato, Gouveia e Gouveia (2004) assinalam algumas características importantes da educação a distância, tais como a abertura (diversidade e amplitude de oferta de cursos com eliminação de barreiras e requisitos de acesso, atendendo a uma população numerosa e dispersa com níveis e estilos de aprendizagem diferenciados); a flexibilidade (de espaço e de tempo, de ritmos de aprendizagem e diferentes combinações de estudo/trabalho/ família); a eficácia (o aluno é motivado a se tornar sujeito e responsável pela sua própria aprendizagem, a se avaliar, a aplicar o que aprende); a formação permanente (aquisição de novos conhecimentos, interesses, atitudes e valores) e a economia (evita deslocamentos e ausência total do trabalho). Para Fonseca (1999), a educação a distância tem base nas práticas pedagógicas avançadas do construtivismo, atribuindo importância à autonomia e à independência do aluno, aspectos que, na sociedade da informação, têm grande relevo não só do ponto de vista da cidadania como também do trabalho. No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº 9394, de 1996, no seu artigo 80, reconhece a importância de programas de ensino a distância, ao assinalar que o Poder Público incentivará os esforços para que esses programas se intensifiquem em todos os níveis e modalidades de ensino do Brasil. Segundo Moran (2004), a educação a distância no Brasil, em um primeiro momento, foi identificada com o ensino por correspondência. Em um segundo momento, na década de 80, seu uso foi baseado em sistemas de distribuição de informação por televisão e vídeo cassete, usados principalmente para telecursos profissionalizantes e formadores de estudantes do ensino médio e fundamental. Foi a fase que, na visão de Fonseca (1999), pode ser caracterizada como analógica. No final da década de 90, iniciou-se uma revolução com o uso da Internet. Fonseca (1999) define essa fase como a fase digital, caracterizada pelo uso de tecnologias de educação bidirecionais. Entre as várias experiências de educação a distância já realizadas e em realização, as de formação continuada de profissionais para as instituições de ensino superior são importantes porque podem contribuir para a qualidade do trabalho educativo dessas instituições. É objetivo deste trabalho descrever uma experiência recente de formação a distância em nível de especialização, representada pelo curso oferecido pela Cátedra UNESCO/ Universidade de Brasília sobre avaliação educacional. O estudo foi desenvolvido a partir da análise da experiência das autoras, que foram alunas do curso e fizeram parte de um grupo de 5 profissionais da mesma instituição de ensino Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 superior que concluíram o referido programa. 2. DESCRIÇÃO GERAL DO CURSO Com o objetivo de atualizar profissionais docentes e técnico-administrativos de Instituições de Ensino Superior brasileiro, foi oferecido, em 1997, pela Universidade de Brasília, através da Cátedra UNESCO de Educação a Distância, um curso de especialização em avaliação, na modalidade à distância, visando capacitar, em 24 meses, cerca de 800 professores e pessoal técnico-administrativo de instituições privadas e públicas do ensino superior. A iniciativa foi uma parceria entre a Universidade de Brasília, o Ministério da Educação e do Desporto (MEC), o Ministério da Ciência e Tecnologia, a Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP) e a Associação Brasileira das Mantenedoras do Ensino Superior (ABM). Participaram do curso, como docentes, especialistas de universidades brasileiras e de universidades estrangeiras como as de Michigan (E.U.A.) e Kassel (Alemanha). O curso foi dado em seis módulos ou disciplinas, totalizando trinta e dois créditos. Para completar o curso, o aluno deveria ser aprovado nas disciplinas através de avaliação presencial e elaborar uma monografia sob orientação de um dos professores da Cátedra. As instituições de ensino superior escolheram seus participantes do curso, tendo sido recomendado que a seleção observasse nos escolhidos motivação, persistência e condições de trabalhar com autonomia e independência, características consideradas necessárias para um bom desempenho no curso. O tamanho da clientela atendida pelo curso caracterizou uma das vantagens do uso de educação a distância que é o elevado número de pessoas que pode atender. Participaram do curso como alunos, docentes e funcionários de instituições de ensino superior públicas e privadas, de todas as regiões do país. O perfil de formação dessa clientela incluiu desde a graduação até o doutorado. Os alunos do curso, que eram, como já mencionado, também docentes e funcionários das instituições de ensino superior participantes, possuíam características importantes a serem consideradas para o aprendizado, tais como o tempo limitado disponível para estudo e horários variados de trabalho, dificultando deslocamento em horários fixos. A flexibilidade e autonomia oferecida pela estrutura do curso no que se referiu a horário de estudos e de realização das atividades solicitadas atendeu às características dessa clientela adulta. sários à formação de competências em avaliação na escola. Foram abordadas as seguintes temáticas organizadas em forma de disciplinas: Técnicas e Instrumentos de Avaliação; Avaliação de Disciplina; Avaliação de Currículo e de Programas; Acompanhamento e Avaliação do Aluno; Avaliação de Docentes e do Ensino e Avaliação em Instituições de Ensino Superior. 3. RECURSOS PEDAGÓGICOS PARA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM O curso em tela enquadra-se na modalidade a distância, pois, entre outras características, foi realizado com a mediação de materiais escritos enviados pelo correio, vídeos gravados e a realização de encontros presenciais com os tutores. Foi também utilizado o contato telefônico e o voice mail. O uso desses sistemas convencionais de ensino a distância tem a vantagem de atingir clientelas que não têm acesso a tecnologias eletrônicas mais avançadas, como é o caso do computador e Internet. O curso foi implementado a partir de 1997 e, seu desenvolvimento ocorreu exatamente no momento anterior à expansão da Internet no Brasil, que se intensificou a partir de 1998. O curso iniciou-se com seminários presenciais regionais que tiveram o propósito de apresentar o currículo e as estratégias de ensino a serem utilizadas. Os seminários propiciaram aos participantes o conhecimento do grupo, o contato com a equipe organizadora do curso e com as instruções relativas ao papel do aluno. A estrutura do curso foi modular, sendo que o aluno podia contar com textos, fitas de vídeo e ajuda do tutor. Para cada módulo, o aluno recebia, para seu estudo individual, o material escrito composto de um texto básico, um volume de mapas de informação do módulo, um volume de leituras complementares e um vídeo. Os textos básicos eram de autoria dos professores e produzidos especialmente para o curso. Cada texto básico continha uma introdução em que eram apresentados os objetivos do módulo a que ele se referia, os objetivos do texto básico e os textos para leitura. Sua leitura era obrigatória e havia, no final de cada capítulo, sugestões de leituras facultativas para o aprofundamento da compreensão do assunto. Os textos básicos continham também, ao final de cada um dos seus capítulos, atividades que deviam ser desenvolvidas pelos alunos. Tais atividades eram compostas de situações e problemas a serem resolvidos pelo aluno através da leitura do material do módulo, da reflexão e da discussão com o tutor ou com outros alunos. Incluíam também questões de múltipla escolha sobre o conteúdo desenvolvido no módulo. O programa do curso abrangeu conteúdos necesRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 23 Todas as atividades tinham um referencial de respostas no final do texto para a auto-avaliação do aluno. No caso de algumas atividades de resposta aberta havia sugestões e para outras havia a recomendação de se consultar o tutor a respeito da resposta. Este último caso ocorreu, por exemplo, no módulo 4, referente ao Acompanhamento e Avaliação de Alunos, no qual foi solicitado ao aluno que planejasse um programa de avaliação do discente. No caso desta atividade, foi sugerido que tal plano fosse discutido com os tutores do curso (HURTADO; SOUZA, 1997). Em outros casos, as respostas às atividades solicitadas nos textos básicos deviam ser discutidas com os colegas. Foi o caso do módulo 6, referente à Avaliação de Instituições de Ensino Superior. Na atividade, solicitavase ao aluno que discutisse as implicações das funções propostas por Cláudio de Moura Castro, para o ensino superior, para a avaliação das instituições desse nível de ensino (STARK; SOUZA; SOUZA, 1998). Neste caso, havia claramente o objetivo de aprendizagem cooperativa e co-avaliação. No caso das autoras do presente trabalho houve discussão a respeito da atividade. Os textos complementares apresentavam uma literatura relevante para a temática de cada módulo. Essa literatura compunha-se de estudos e pesquisas nacionais e estrangeiras, traduzidos, que abordavam e aprofundavam aspectos relacionados ao conteúdo do módulo. Os textos complementares ofereciam também uma bibliografia atualizada sobre os conteúdos desenvolvidos, o que possibilitava ao aluno buscá-la e ampliar o seu conhecimento. Como já mencionado, além dos textos básicos e dos complementares, o aluno recebia também mapas de informação. Os mapas de informação são unidades de apresentação de informação restritas a um assunto bem definido, contém todas as informações que interessam a quem estude o referido assunto, sendo as informações organizadas em blocos. Cada bloco contém um aspecto específico com definição, exemplo, ilustração, procedimento etc. Os textos têm as características de hipertexto e contêm sistemas de organização e índices que permitem ao usuário encontrar com rapidez as informações relevantes (DICIONÁRIO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, 2004). Os mapas de informação foram enviados aos alunos em forma de fichas contendo informações sobre objetivos, conceitos, metodologias, procedimentos, esquemas teóricos e operacionais, instrumental de coleta e outros elementos teórico-práticos do processo de avaliação educacional, organizados em unidades e tendo em vista subsidiar a análise dos casos apresentados nos vídeos. Cada mapa atendia, assim, a diferentes objetivos, apresentando definições, características, comentá24 rios e exemplos de conceitos, como, por exemplo, avaliação quantitativa e qualitativa, questionário, planejamento e plano de ensino e outros. O uso dos mapas de informação não somente representou uma mediação entre o aluno e os objetivos a serem alcançados, possibilitando a este a construção do conhecimento a partir da resolução dos casos, como também uma inovação como estratégia de ensino. Como também já mencionado, o aluno recebia também vídeos. Estes representaram uma modalidade de material audiovisual cujo objetivo era desencadear o processo de aprendizagem do módulo através da análise de casos apresentados. Cada caso descrevia uma situação de avaliação e solicitava uma análise por parte do aluno que, para ser realizada, demandava estudo dos mapas de informação, do texto básico e dos complementares. Os casos funcionavam, assim, como uma motivação para o diálogo do aluno com o conteúdo do módulo, levando-o a realizar uma aprendizagem significativa. Cada vídeo apresentava a dramatização de 3 situações ou casos que incluíam problemas que deviam ser objeto de reflexão e análise pelo aluno a partir do conteúdo do módulo a que se referiam. Para analisar os problemas do caso o aluno deveria recorrer aos mapas de informação, aos textos nele indicados e também aos textos sugeridos pela própria análise do problema. Ele poderia também realizar uma aprendizagem cooperativa com o grupo de alunos parceiros do mesmo curso na sua instituição, caso que ocorreu com as autoras do presente trabalho que se reuniam com os colegas para assistir e debater os casos dos vídeos. As situações dramatizadas nos vídeos eram semelhantes às da vida real e sempre aplicadas ao ensino superior, que era o objetivo de formação do curso. A análise de cada caso possibilitava a aplicação de conceitos desenvolvidos em mais de um módulo. Os casos do vídeo constituíam também uma preparação para a avaliação presencial pois, nesta, a partir de casos, o aluno devia relacionar e aplicar os conceitos do módulo em avaliação. Os vídeos e o material escrito se complementavam, portanto, para a aprendizagem do aluno. Os vídeos gravados tiveram também um papel importante na interação entre alunos e a coordenadora do curso pelo fato de que cada um deles sempre iniciava por uma mensagem dela informando sobre fatos relevantes do curso em desenvolvimento. 4. OS TUTORES O papel do tutor foi o de ficar acessível ao aluno para orientar, quando necessário, a compreensão dos materiais dos módulos, o desenvolvimento das atividaRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 des propostas nos textos, a análise dos casos e a monografia. Recorrer ao tutor era uma opção do aluno, não havendo nenhum contato obrigatório. Entretanto, os tutores convidavam os alunos para reuniões coletivas realizadas no centro mais próximo, como, por exemplo, na cidade de São Paulo para os alunos paulistas. Nessas reuniões, dúvidas dos alunos eram superadas através de discussões coletivas. Para cada região foram indicados dois tutores para a orientação dos alunos. A disponibilidade de tutores que podiam ser acessados por telefone ou nos encontros presenciais introduziu no curso o componente dialógico com o docente como parte do processo de construção dos conhecimentos pelos alunos. 5. AAVALIAÇÃO DAAPRENDIZAGEM DO ALUNO A avaliação da aprendizagem do aluno, do ponto de vista somativo, foi realizada através de provas presenciais que ocorreram nos centros de cada Estado, em intervalos bimestrais e com datas previamente estabelecidas, invariavelmente aos sábados para atender às necessidades da clientela do curso que, como já foi salientado, trabalhava. A realização das provas efetivou-se de maneira formal e individual em um período de duração de 4 horas. Um fiscal designado pelos organizadores do curso acompanhava a realização das provas em cada sala. As provas avaliavam a aprendizagem do aluno através de questões centradas em casos semelhantes aos dos vídeos. Os alunos deveriam analisar os casos, apresentando argumentos relacionados ao módulo em avaliação. As provas eram unificadas para todos os alunos do curso. A correção era feita posteriormente pela equipe de organizadores do curso e o relatório de resultados era enviado pelo correio aos alunos após o período médio de um mês. c) Aplicação dos conhecimentos construídos ao longo dos estudos no módulo – as respostas e suas justificativas têm relação direta com o caso relatado e explicitam conhecimentos a partir dos conteúdos dos módulos estudados. Peso: 20%. d) Riqueza de argumentação – as respostas e suas justificativas têm relação direta com o caso relatado e incluem idéias que traduzem uma perspectiva crítica e variedade de pontos de vista. Peso: 20%. e) Abrangência da argumentação – as respostas às perguntas escolhidas pelo aluno têm relação direta com o caso relatado e incluem tudo o que deveria ter sido dito, nada importante sendo deixado fora. Peso: 20%. f) Concisão- todo o registro de idéias foi feito com um mínimo de termos, sem repetições ou redundâncias. Peso: 5%. O resultado da avaliação da prova a partir dos critérios acima, para cada módulo, era dado em forma de conceitos a partir de uma escala de 5 pontos. Os conceitos utilizados eram: superior, médio superior, médio, médio inferior e insuficiente. O aluno somente podia passar para o estudo do módulo seguinte se recebesse conceito no mínimo médio na prova do módulo em avaliação. Alunos que recebessem conceitos médio inferior ou insuficiente deveriam fazer uma prova de segunda chamada. Reprovação na prova da segunda chamada redundaria em afastamento do aluno do curso. Avaliações formativas ou de processo foram realizadas pelo próprio aluno através da análise do seu próprio desempenho nas atividades solicitadas no texto básico, através do confronto das suas respostas com as sugeridas, e da auto-avaliação dos resultados do seu desempenho nas provas de cada módulo a partir dos relatórios recebidos. 6. ALGUNS RESULTADOS DO CURSO Os critérios de correção das provas e seus pesos, segundo os relatórios de desempenho enviados ao aluno, eram: a)Coerência interna: a justificativa da prescrição representa claramente uma visão crítica da descrição apresentada da situação. Peso 15%. b) Coerência entre os vários aspectos da prescrição – na prescrição feita pelo aluno os vários aspectos da avaliação (objetivo, metodologia e outros) têm relação adequada entre si. Peso: 20%. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Inscreveram-se no curso 868 alunos. Em termos de evasão, antes do final da primeira disciplina, 19% (165) abandonaram o curso. Do total de inscritos, 519 (59.7%) chegaram até a última disciplina e 51,3% (446) concluíram a monografia (PETERSON; SOUZA, 1999). Esses resultados indicam que aproximadamente a metade dos alunos desistiu do curso até a sua conclusão. Como parte dos requisitos do curso, além da aprovação nos módulos, os alunos deviam apresentar uma monografia com o desenvolvimento de um tema relacionado ao curso. Nessa etapa, segundo Peterson e Souza 25 (1999) 446 alunos apresentaram a monografia. Desses, apenas 1% teve o trabalho reprovado. Partindo-se do pressuposto de que é importante a análise das áreas escolhidas pelos alunos para a realização das monografias (porque pode-se, através dela, ilustrar as direções dos esforços dos alunos na aplicação dos conceitos desenvolvidos no curso e indicar prováveis melhorias ou aumento do conhecimento da reali- dade das suas instituições de origem como decorrência do curso), foi também desenvolvida neste trabalho uma análise dos temas das monografias. Dados apresentados na web (IESB, 2005) sobre as monografias e seus temas foram analisados, mostrando um total de 434 títulos distribuídos em 8 áreas. As áreas escolhidas pelos alunos que desenvolveram a monografia são apresentadas na tabela abaixo. Tabela 1 - Áreas das monografias apresentadas ao final do curso Área da monografia avaliação institucional avaliação de currículos e de programas avaliação de docentes e/ou ensino acompanhamento e avaliação do aluno avaliação de disciplinas técnicas e instrumentos de avaliação Avaliação de políticas públicas ou de políticas em educação avaliação de egressos Total Nº de Monografias 103 93 86 80 27 26 8 1 434 % 24,0 21,3 20.0 18,3 6,2 6,0 4,0 0,2 100,0 Fonte: IESB, 2005. A Tabela 1 mostra que, aproximadamente, 83% dos alunos concentraram suas escolhas em temáticas ligadas à avaliação no nível da instituição, dos cursos, dos docentes e dos alunos. As temáticas de avaliação de disciplinas e de instrumentos de avaliação tiveram um menor apelo para os alunos. Avaliação de políticas públicas e de egressos foram as menos escolhidas. Os resultados das escolhas centradas na instituição, nos programas, nos docentes e nos alunos podem ser explicados, em parte, pelo fato de a realização do curso de avaliação em análise ocorrer em um período em que a universidade já era vista sob a ótica da avaliação e da prestação de contas para a sociedade. Programas como o Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), conduzido pelo Ministério da Educação, já estavam em ação no país e sinalizavam para as instituições a necessidade da universidade se submeter ao processo de avaliação externa e interna. Muitas já estavam construindo e submetendo ao referido programa seus planos de avaliação institucional. Havia, portanto, necessidade de preparar recursos humanos para a tarefa de avaliação institucional. Muitas das escolhas de monografia deram-se como decorrência de os alunos já estarem envolvidos em tarefas referentes a algum tipo de avaliação. Muitos alunos já faziam parte, nas suas instituições de origem, das Comissões Permanentes de Avaliação, responsáveis, na época, pela avaliação nas Instituições de Ensino Superior 26 (PETERSON; SOUZA, 1999). O depoimento abaixo transcrito, de uma aluna do curso, ilustra como as temáticas desenvolvidas no curso se aproximaram da vivência de alunos nas suas instituições de origem: “...gostaria de registrar que a participação nesse Curso de Especialização em Avaliação representou a possibilidade de adquirir, sistematizar conhecimentos e, utilizando esse instrumental teórico, refletir sobre um tema que faz parte do meu cotidiano em termos profissionais. Os conhecimentos adquiridos abriram e ampliaram meu campo de visão, apontando, para mim, novas perspectivas de análise das questões de educação” (PETERSON; SOUZA, 1999, p. 11). 7. CONCLUSÃO Alguns pontos merecem ser destacados na experiência do curso em análise: - A discussão, reflexão, problematização e abordagem científica das questões da avaliação no ensino superior, tanto de aspectos institucionais como de aprendizagem, representou uma contribuição significativa para a formação de docentes e funcionários, tendo em vista a Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 qualidade do processo educativo das instituições de ensino superior. - A abordagem utilizada no curso, com o uso da análise de casos no processo de ensino, caracterizou uma concepção construtivista de aprendizagem. Além de ser uma inovação, a análise de casos favoreceu uma aprendizagem do conteúdo como um meio para a resolução de problemas e não como um fim em si mesmo, tornando-a significativa para o aluno. Muitas vezes, o mero uso de tecnologia não caracteriza um avanço no processo de ensino, pois pode estar a serviço de uma abordagem tradicional na qual o conteúdo é o centro e cabe ao aluno apropriar-se dele através de memorização ou atividades repetitivas. No caso do curso em tela, houve a preocupação com a compreensão do material através da abordagem de estudo de casos. As avaliações também foram realizadas através da análise de casos, o que sinalizava para o aluno a necessidade de compreensão e de participação ativa no curso. - A introdução de conceitos inovadores da área de avaliação na educação, como, por exemplo, o de portfólio como um instrumento de avaliação do aluno e da escola, representou também uma contribuição para o avanço do conhecimento dos alunos na área. O portfólio, como instrumento de avaliação, era pouco conhecido entre os docentes das instituições de ensino. - O uso de materiais especialmente produzidos para os objetivos do curso foi uma característica da preocupação com a qualidade do curso que não se limitou a somente selecionar e reproduzir materiais já existentes. Foi o caso dos mapas de informação, dos textos básicos e dos vídeos. Os textos complementares foram reproduções de materiais já disponíveis, mas selecionados pela sua alta importância para a complementação da aprendizagem dos alunos. Textos dispersos na literatura foram convenientemente reunidos e oferecidos para os alunos. - A vivência de um curso a distância, como o aqui analisado, com uma abordagem que favoreceu uma aprendizagem significativa e fez uso dos recursos como uma mediação para a construção do conhecimento do aluno e não para a mera absorção de informações, representou uma experiência positiva para alunos que, como as autoras do presente trabalho, pela primeira vez tiveram a oportunidade de serem alunas de um curso a distância. - No caso das autoras do presente trabalho já havia em curso um esforço, na sua instituição de origem, de levar avante um trabalho de avaliação da universidade e dentro dele, de avaliação do trabalho docente, o que foi favorecido com a aprendizagem realizada no curso. O curso favoreceu o desenvolvimento posterior da autoavaliação da instituição. Alguns pontos na experiência do curso em análise poderiam ser melhorados no caso de sua extensão a outros contextos: - A auto-avaliação poderia ser utilizada com mais ênfase para a autonomia da aprendizagem do aluno. Os critérios das correções das provas, por exemplo, poderiam ter sido mais bem esclarecidos para os alunos. A análise dos relatórios das provas poderia ter sido um instrumento de melhor favorecimento da aprendizagem do aluno se acompanhada de uma cópia da prova. Por estar distante no tempo, o aluno não se lembrava de tudo que escrevera na prova ao receber o relatório com a sua avaliação. - Os canais de comunicação e de feedback poderiam ter favorecido mais a aprendizagem dos alunos se fossem mais rápidos. O contato com os tutores era apenas telefônico ou no dia da reunião presencial, o que não atendia ao perfil dos que trabalhavam e não podiam comparecer às reuniões coletivas. 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS - O fato de grupos de pessoas da mesma instituição poderem estar no mesmo curso favoreceu a aprendizagem colaborativa. No caso da Instituição de Ensino Superior de origem das autoras do presente estudo, havia um grupo de cinco pessoas no curso, o que possibilitou uma interação aluno-aluno em vários momentos, quando então eram discutidos os casos e outras questões do curso. Considera-se esse um ponto positivo do curso em análise, pois contrariou o que Azevedo (2000) denominou como uma das maiores dificuldades do ensino a distância convencional, que é o isolamento do aluno que não pode contar com o apoio de um grupo de pessoas que estão na mesma situação que ele e não pode, assim, contar com as vantagens de uma aprendizagem colaborativa. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 ALVES, J. R. M. Educação a distância e as novas tecnologias de informação e aprendizagem. Disponível em: <http://www.engenheiro2001.org.br/programas/ 980201a1.htm>. Acesso em: 23 set. 2004. 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Abstract: It is presented an introduction to the study of the philosophical questions: 1. Why does the universe exist? 2. Why there is order in the universe? 3. Why the laws of nature can be expressed mathematically? It is argued that the answers are given by philosophy and religion. Key words: Science, philosophy, religion, origin of the universe. 1. INTRODUÇÃO Werner Heisenberg, Prêmio Nobel de Física, narra um fato ocorrido em 1927, durante o Congresso Solvay, em que se discutiram questões epistemológicas relacionadas com as teorias quânticas. Certa noite, alguns jovens físicos, entre eles Werner Heisenberg e Wolfgang Pauli, conversavam no saguão do hotel onde estavam hospedados. Alguém comentou o fato de Einstein falar freqüentemente de Deus, nas discussões sobre filosofia da Física. Outro acrescentou que também Max Planck não via nenhuma contradição entre ciência e religião. A conversa girava em torno do tema religião e ciência, quando Paul Dirac juntou-se ao grupo. Inesperadamente, Dirac, exaltado, disse que não entendia por que estavam falando sobre religião, e fez um discurso apaixonado em defesa do ateísmo, chegando a dizer que a religião era uma espécie de ópio. Heisenberg apresentou objeções às idéias de Dirac. Enquanto a discussão prosseguia, perceberam que Wolfgang Pauli, que antes da chegada de Dirac, havia opinado sobre o tema, permanecia calado, às vezes mostrando uma fisionomia de desagrado, e às vezes com um sorriso enigmático. Quando perguntaram o que ele pensava, Pauli respondeu: “Ja, ja, unser Freund Dirac hat eine Religion; und der Leitsatz dieser Religion lautet: ‘Es gibt keine Gott, und Dirac ist sein Prophet’” (Sim, sim, nosso amigo Dirac tem uma religião e o princípio guia dessa religião afirma: “Deus não existe e Dirac é seu profeta”). Então todos riram, inclusive Dirac, e assim terminou a conversa naquela noite, no saguão do hotel (HEISENBERG, 1973). * Professor da Univap. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 O fato narrado ilustra o perigo, quando se conversa sobre religião, de se deixar dominar por preconceitos e agir movido mais pelas paixões do que pela razão. As pessoas envolvidas no fato narrado não eram nem de longe pouco instruídas ou pouco inteligentes, pelo contrário, eram todos físicos brilhantes, sendo que os citados nominalmente, Heisenberg, Pauli, Dirac, Einstein e Planck , receberam o Prêmio Nobel de Física. Naquela época Dirac tinha vinte e cinco anos de idade. No decorrer dos anos sua atitude em relação à religião mudou, como veremos na parte em que tratamos dos métodos da Física Matemática na investigação das leis da natureza. A atitude do jovem físico Dirac revela que ele se deixou influenciar por filosofias anticristãs do século XIX, século em que a má filosofia, baseada em falsos princípios, atacou a fé cristã em nome da razão (CORRIGAN, 1946; RUSSEL, 1991). Essas filosofias anticristãs estão entre as principais causas do bolchevismo e do nazismo, monstruosidades que marcaram o conturbado século XX. No século XX ocorreu um fenômeno curioso, que se acentuou nos últimos cinqüenta anos e, mais ainda, nos últimos vinte e cinco anos: cientistas eminentes, principalmente físicos, começaram a falar de Deus em seus escritos filosóficos (MARGENAU, 1992). Entre outras razões, o fato está relacionado com o avanço impressionante da Ciência, especialmente da Física, no século XX. Físicos eminentes manifestaram suas perplexidades diante do notável sucesso da Física Matemática. Eles perceberam claramente que a Ciência não era capaz de explicar as razões mais profundas de tal sucesso. Por exemplo, Eugene P. Wigner, Prêmio Nobel de Física, cunhado de Dirac, escreveu um ensaio intitulado “The unreasonable 29 effectiveness of mathematics in the natural sciences” (A incompreensível eficácia da Matemática nas Ciências Naturais) em que ele afirma que a enorme utilidade da Matemática nas Ciências Naturais é algo que toca o misterioso e que não tem uma explicação racional (WIGNER, 1960). Outros Físicos, entre eles Einstein e Dirac, também manifestaram a mesma perplexidade (DIRAC, 1939). A Ciência não é capaz de responder muitas questões fundamentais a respeito do universo, como, por exemplo, as seguintes: 1.Por que existe algo e não o nada? Qual a origem do universo? 2.Por que há ordem no universo e não o completo caos? Por que há leis da natureza? 3.Por que as leis da natureza podem ser expressas matematicamente? 4.Qual a origem da capacidade humana de descobrir leis da natureza? A Filosofia e a Religião têm algo a dizer sobres essas questões. Através da Filosofia pode-se chegar ao conhecimento de certezas que se impõem por si ou podem ser deduzidas pela razão. Não é fácil definir o que é o conhecimento, mas certamente no conceito de conhecimento está implícito o conceito de verdade, que é a adequação da inteligência à realidade. Um conhecimento para ser verdadeiro conhecimento deve ser adequado à realidade (Santo Tomás de Aquino, 1999). Esta concepção de verdade é a única compatível com a Ciência, completamente inviável sem esse pressuposto. Como não pode haver contradição entre duas verdades, o conhecimento científico não contradiz o verdadeiro conhecimento filosófico, nem o verdadeiro conhecimento religioso. Neste trabalho falamos, inicialmente, da Matemática, dando alguns exemplos de conceitos matemáticos, para enfatizar a criatividade dos matemáticos e da liberdade que há na criação dos conceitos matemáticos. Em seguida, damos exemplos de teorias físicas que mostram o sucesso notável da Física Matemática. Na seqüência, falamos das respostas que a Filosofia e a Religião podem dar às quatro questões acima, não respondidas pela Ciência. O objetivo não é apresentar uma discussão aprofundada das questões tratadas, mas apenas despertar o interesse por elas. 2. MATEMÁTICAE FÍSICA Para ajudar a compreender a perplexidade dos físicos teóricos, quanto à eficácia da Matemática na Física, vamos falar um pouco sobre o que é Matemática e o 30 que é Física Matemática. A Matemática não trata apenas de como fazer cálculos, mas é muito mais do que isso, é uma linguagem de inigualável concisão, riqueza e precisão. Wigner disse que alguém definiu a Filosofia como o mau uso de uma terminologia que foi inventada só para esse propósito. No mesmo estilo, ele define a Matemática como a Ciência das operações inteligentes com conceitos e regras inventadas só para esse propósito. A principal ênfase é na invenção dos conceitos (WIGNER, 1960). Um grande matemático, Georg Cantor se não me engano, disse que Matemática é liberdade. Liberdade de criação de conceitos e de operações matemáticas. Como exemplo de um conceito criado pelos matemáticos citamos o número imaginário i = √ - 1 , a raiz quadrada de menos 1. Não existe nenhum número real que elevado ao quadrado dê como resultado um número negativo. Os matemáticos criaram o conceito de número complexo c = a + ib, em que a e b são números reais, e formularam regras para fazer operações matemáticas com números complexos. Por exemplo, a raiz quadrada de i é √i = ± (1 + i)/√2. Observando a natureza, nada vemos que sugira os números complexos inventados pelos matemáticos. Outro exemplo da criatividade dos matemáticos é o número e definido pelo matemático suiço Leonhard Euler, um dos maiores matemáticos da história da Matemática e que viveu no século XVIII. Euler definiu a função exponencial ex como o limite de uma série infinita: ex = limite da série (1+ x/n)n quando n tende para o infinito. Tomando x = 1 resulta e = limite da série (1+ 1/n)n quando n tende para o infinito, sendo o número e o primeiro a ser definido como o limite de uma série infinita. O número e tem o valor e = 2,71828..., em que os pontos indicam infinitos algarismos. Derivada de uma função é outro conceito matemático de extrema importância tanto na Matemática pura como na Física. A derivada da função exponencial dá como resultado a própria função exponencial. É a única função matemática cuja derivada é ela mesma, sendo, portanto, uma função especialíssima. Apesar de ser uma função especialíssima, surpreendentemente, muitos fenômenos físicos obedecem a uma lei exponencial, como, por exemplo, a absorção de raios X por um meio material Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 como o corpo humano. Um outro número importante na Matemática é o número p, que aparece em muitas áreas da Matemática. Por exemplo, na Geometria, onde aprendemos que a relação entre o comprimento L e o diâmetro D de uma circunferência é igual a L/D = π = 3,141592.... Os três números i, e e π satisfazem uma relação matemática notável descoberta por Euler. A função exponencial foi estendida por Euler para expoentes imaginários, o que o levou a descobrir a relação eix = cosx + isenx. Tomando x = π resulta eiπ + 1 = 0, que é certamente uma das mais belas fórmulas em toda a Matemática. Podemos escrever o valor de e na forma decimal apenas aproximadamente: e ≅ 2, 71828. Também π ≅ 3,141592. Porém, a fórmula acima é exata! Ela relaciona as cinco constantes mais importantes da Matemática, que simbolizam os quatro grandes campos da Matemática clássica: Aritmética, representada por 0 e 1; Álgebra, por i; Geometria, por π; e Análise, por e. O matemático Eli Maor cita Edward Kasser e James Newman, que narram um episódio no livro Mathematics and the Imagination : “To Benjamim Peirce, one of Harvard´s leading mathematicians in the nineteenth century, Euler´s formula eiπ = - 1 came as something of a revelation. Having discovered it one day, he turned to his students and said: ‘Gentlemen, that is surely true, it is absolutely paradoxical; we cannot understand it, and we don´t know what it means. But we have proved it, and therefore we know it must be the truth’ ” (Para Benjamim Peirce, um dos principais matemáticos de Harvard no século dezenove, a fórmula de Euler eiπ = - 1 veio como uma revelação. Tendo-a descoberto certo dia, virou-se para seus alunos e disse: ‘Cavalheiros, isto é seguramente verdadeiro, é absolutamente paradoxal, nós não podemos entendê-la, e não sabemos o que ela significa. Mas, nós a demonstramos e, portanto, nós sabemos que ela deve ser a verdade.’ ”) (MAOR, 1994). Euler aplicou o conceito de números complexos para funções transcendentais e obteve resultados inesperados. Ele mostrou que potências imaginárias de um Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 número imaginário pode ser real. Por exemplo, ele demonstrou que a expressão ii é igual a ii = e-(π/2 + 2kπ), onde k = 0, ± 1, ±2, … Para cada valor de k tem-se um resultado, de modo que se têm infinitos valores, todos eles reais. Maor comenta admirado: “Num sentido muito literal, Euler fez o imaginário tornar-se real!” (MAOR, 1994). No século XIX a Matemática se enriqueceu com o desenvolvimento de três grandes áreas: a teoria de funções de variável complexa, a Álgebra abstrata e a Geometria não-euclideana. Euler, por volta de 1750, foi o desbravador; Cauchy, Bolzano, Riemann, Weierstrass e muitos outros, no século XIX, deram a essas áreas a importância que hoje ela tem, não apenas para a Matemática, mas também para a Física. Comenta Wigner que se alguém perguntasse a um matemático por que ele se interessa por números complexos, ele mencionaria, um pouco indignado com a pergunta, os numerosos e belos teoremas da teoria das funções analíticas, que tiveram origem na introdução do conceito de números complexos. Wigner cita um comentário de M. Polanyi (Personal Knowledge, University of Chicago Press, 1958) em que ele afirma que a Matemática não pode ser definida sem mencionar sua característica mais óbvia: o fato de que ela é interessante (WIGNER, 1960). Procuramos mostrar com os exemplos acima, a criatividade dos matemáticos na definição de novos conceitos e desenvolvimento de novas teorias matemáticas. Na Matemática somos livres para definir um novo objeto do modo como quisermos, desde que a definição não contradiga nenhuma das definições já aceitas ou resultados já provados. A criatividade e o senso estético para reconhecer a beleza formal matemática desempenham papel importante na definição de novos objetos matemáticos. Georg Cantor tinha razão, a Matemática é liberdade. Não seria motivo de perplexidade se essa matemática, criada com tanta liberdade, tivesse utilidade na explicação de fenômenos naturais? Pois é exatamente o que acontece na Física Matemática. Certamente para alguém que não é matemático, comenta Wigner, os números complexos estão longe de serem naturais ou simples, e eles não podem ser sugeridos por observações físicas. No entanto, a utilização dos números complexos é quase uma necessidade na formulação das leis da teoria quântica em que os estados dos sistemas físicos são vetores num espaço de Hilbert, um espaço complexo. Não apenas os números complexos, mas também as funções analíticas complexas desempenham um papel decisivo na formulação de teorias quânticas. O sucesso da Física Matemática mostra que a Matemática é a linguagem adequada para a formula31 ção das leis da Física (WIGNER, 1960). Freeman Dyson, físico britânico que emigrou para os Estados Unidos, diz que na Física Matemática buscase conhecer as leis da natureza seguindo o estilo e o método rigorosos da Matemática pura. O objetivo dos físicos matemáticos, afirma Dyson, “não é calcular os fenômenos quantitativamente, e sim entendê-los qualitativamente. Eles trabalham com teoremas e demonstrações matemáticas, não com números e computadores. Seu objetivo é esclarecer com precisão matemática o significado dos conceitos sobre os quais a teoria física é construída.” (DYSON, 1992). Dyson cita uma palestra dada na universidade de Miami, em Coral Gables, por Paul Adrien Maurice Dirac, quando ele estava com setenta anos de idade e era o último sobrevivente do grupo de jovens físicos que, de 1925 a 1928, criaram a teoria quântica. O título da palestra era “Crenças básicas e pesquisa fundamental”. Falando sobre os métodos utilizados pelos físicos na investigação dos fenômenos da natureza, Dirac, a certa altura da palestra afirma: “O físico teórico também pode trabalhar de outra forma, mais lenta e tranqüila, capaz de conduzir a resultados mais profundos. Essa forma não depende muito de trabalho experimental. Consiste em ter algumas crenças básicas e tentar incorporá-las numa teoria. Por que alguém deve ter crenças básicas? Não sei se posso explicar isso. Simplesmente sentimos que a natureza é construída de uma determinada forma e nos agarramos a essa idéia da mesma forma como nos agarramos a crenças religiosas. Sentimos que as coisas simplesmente precisam estar nessas linhas e precisamos imaginar uma teoria matemática que incorpore a crença básica.” (DYSON, 1992). De passagem observamos que a atitude de Dirac em relação à religião mudou, pois ele se inclui entre as pessoas que se agarram a crenças religiosas, tendo abandonado o ateísmo fanático que ele manifestara aos vinte e cinco anos, na conversa com Heisenberg, Pauli e outros jovens físicos. Margenau inclui Dirac entre os físicos que falam de Deus em seus ensaios filosóficos (MARGENAU, 1992). Dirac fala da importância do critério estético na formulação da teoria. Citemos suas palavras: “Meu trabalho inicial foi muito influenciado pelas órbitas de Bohr, e tive a cren32 ça básica de que as órbitas de Bohr forneceriam a chave para a compreensão dos eventos atômicos. Era uma crença errada ... Descobri que minha crença básica estava errada e tive de passar para uma linha de pensamento bem outra. Precisei buscar uma base mais geral para meu trabalho, e a única base confiável na qual pude pensar, a única base geral o suficiente para evitar que eu voltasse a cometer o mesmo erro era construir um princípio de beleza matemática: dizer que na verdade não sabemos o que são as equações básicas da Física, mas que elas têm de ter uma grande beleza matemática. Precisamos insistir nisso, e esse é o único aspecto das equações no qual podemos confiar e insistir ... Como se pode fazer da beleza um teste fundamental para a correção de uma teoria física? Bem, é bastante evidente que a beleza depende efetivamente da cultura e da educação para certos tipos de beleza: pintura, literatura, poesia e assim por diante ... Contudo, a beleza matemática é de um tipo bem diferente. Talvez eu devesse dizer que ela é de um tipo bem diferente e transcende esses fatores pessoais. É a mesma em todos os países e em todos os períodos de tempo ... Bem, essa é a essência do que eu queria dizer. Na verdade é possível ter uma opinião tão forte sobres essas coisas que quando um resultado de experiência não está de acordo com nossas crenças provavelmente iremos prever que o resultado da experiência está errado e que os pesquisadores experimentais irão corrigi-los em pouco tempo. Claro que não se pode ser obstinado demais quanto a esses assunto, mas ainda assim é preciso ousar.” (DYSON, 1992). Agora passamos ao comentário de Dyson: “Dirac era ousado. A confiança que ele tinha em seu próprio instinto para a beleza matemática levou-o sucessivamente a três descobertas fundamentais: primeiro, a formulação abstrata da Mecânica Quântica; segundo, a descrição quântica correta dos processo de radiação eletromagnética; e terceiro, a equação de Dirac para o elétron. Em cada caso ele foi conduzido não meramente a uma nova lei Física, mas a um novo estilo de descrição matemática da natureza. E em cada caso Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 as experiências demonstraram que ele estava certo, embora, como ele sugere na conferência de Coral Gables, tenham surgido inicialmente alguns resultados experimentais contrários, que ele foi suficientemente ousado para ignorar. A crença fundamental de Dirac, a de que o critério básico para escolher uma teoria científica deva ser estético, demonstrou-se fantasticamente bem-sucedida em suas mãos. A natureza concordou com seu critério. E essa concordância entre as noções de beleza da natureza e de Dirac nos presenteia com um novo exemplo de um velho enigma filosófico. Por que a natureza deve se importar com nossas opiniões sobre a beleza? Por que o elétron iria preferir uma bela equação a uma equação feia? Por que o universo iria dançar de acordo com a música de Dirac? A essas perguntas misteriosas nem os cientistas nem os filósofos sabem responder. Dirac, com seu estilo de descoberta, propôs essas questões de modo mais preciso que os outros. Mais ainda que Newton e Einstein, ele utilizou consciente e diretamente o critério da beleza como meio de descobrir a verdade.” (DYSON, 1992). Albert Einstein, o maior físico do século XX, dedicou aproximadamente dez anos de sua vida na formulação de sua teoria da gravitação, mais comumente conhecida com o nome de Teoria da Relatividade Geral, motivado não por alguma necessidade observacional, mas por razões de caráter filosófico e estético. Sua teoria é essencialmente uma teoria geométrica, riemanniana, do espaço-tempo quadridimensional. É uma teoria de extraordinária beleza matemática. Uma teoria verdadeiramente científica não deve se restringir a explicar fatos já observados, mas deve fazer previsões teóricas de fenômenos ainda não observados. No caso da teoria de Einstein são citados, geralmente, as três verificações observacionais: 1. o desvio de um raio luminoso ao passar próximo do Sol; 2. o avanço do periélio do Mercúrio; 3. o atraso do relógio num campo potencial gravitacional. Os resultados observacionais confirmaram as previsões teóricas de Einstein nos três casos. A explicação dada pela teoria de Einstein para o desvio de um raio luminoso ao passar próximo de uma grande massa tornou-se ferramenta de trabalho na Astronomia observacional. Por exemplo, a massa de uma galáxia, que se interpõe entre um quasar distante e a Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Terra, pode ser estimada pelo grau de deformação da imagem do quasar, pelo efeito de lente gravitacional resultante do desvio do raio luminoso ao passar próximo da galáxia. A verificação mais espetacular ainda estava por vir. O conceito de ondas gravitacionais é um conceito inteiramente novo introduzido pela Teoria da Relatividade Geral.Sir Roger Penrose, físico matemático inglês, professor da Universidade de Oxford, em seu livro “The Large, the Small and the Human Mind” faz um relato da verificação indireta da existência de ondas gravitacionais. Em 1993, Hulse e Taylor ganharam o Prêmio Nobel pela extraordinária série de observações, realizadas num período de vinte anos. Eles observaram o pulsar binário conhecido como PSR 1913 + 16, que é constituído por um par de estrelas de neutrons, cada uma com massa aproximadamente igual à massa do Sol, concentrada num volume de apenas alguns quilômetros de diâmetro. As estrelas de neutrons orbitam em torno do centro de gravidade comum, em órbitas altamente elípticas. Uma delas tem um campo magnético muito intenso e as partículas que se movem nesse campo emitem uma radiação intensa que pode ser detectada na Terra. Segundo a teoria de Einstein, os pulsares binários radiam energia na forma de ondas gravitacionais. Essas ondas tiram energia do sistema numa taxa que pode ser calculada com grande precisão pela teoria de Einstein. A taxa de perda de energia do sistema binário de estrelas de neutrons foi medida com grande precisão no período de vinte anos. Os resultados mostram que a teoria de Einstein é correta com a precisão de uma parte em 1014, o que faz da Teoria da Relatividade Geral a teoria física de maior precisão (PENROSE, 1997). A teoria de Einstein tem sido utilizada para a elaboração de vários modelos de universo, sendo que o modelo que melhor descreve os fatos observacionais é um modelo de universo em expansão, que aponta para uma situação no passado em que a temperatura era altíssima e toda a matéria concentrava-se praticamente num ponto, daí alguém ter falado num Big Bang inicial que estaria na origem do universo. Steve Weinberg, físico matemático americano, Prêmio Nobel, em seu livro “The First Three Minutes”(WEINBERG, 1977) descreve o universo em seu estágio inicial, na medida em que a Física atual pode fazê-la. Ele mostra que a teoria de Einstein leva à previsão de uma radiação eletromagnética de corpo negro distribuída de modo aproximadamente uniforme no universo. Essa radiação foi observada pelos astrofísicos americanos Penzias e Wilson, em 1965. Utilizando a teoria de Einstein para interpretá-la, essa radiação nos conta algo do passado do universo, e o que ela nos diz é que o Big Bang aconteceu há ~ 13,7 bilhões de anos. 33 O astrofísico indiano, T. Padmanabhan, em seu livro “After the First Three Minutes – The Story of Our Universe” relata que medidas mais precisas foram realizadas, em 1992, com o satélite da NASA chamado COBE (Cosmic Background Explorer), especificamente projetado para detectar desvios de temperatura na radiação cósmica de microonda. Os resultados mostraram variações de temperatura, no campo de radiação, com a ordem de grandeza esperada, mostrando conclusivamente que os modelos teóricos a respeito da formação das galáxias e outras estruturas no Universo estão basicamente corretas (PADMANABHAN, 1998). em grande parte, a motivação e as condições para a ciência desenvolver-se na cultura ocidental, como é agora bem reconhecido. Historicamente, alguns cientistas encontraram inspiração e intuição para suas pesquisas científicas nas suas crenças religiosas e insights espirituais. As perspectivas filosóficas da cultura ocidental também exerceram e continuam a exercer forte influência no desenvolvimento do pensamento científico.” (STOEGER, 2002). A relação entre a Matemática e a Física é mais profunda e misteriosa do que pode parecer numa análise superficial. Einstein nos conta que em 1907 ele se perguntava como se poderia modificar a Teoria Newtoniana da Gravitação de modo a torná-la compatível com o princípio de relatividade, quando então lhe ocorreu uma idéia que ele considerou ser a idéia mais feliz de sua vida. Entretanto, a formulação da teoria demorou quase dez anos porque Einstein não conhecia a Matemática adequada para exprimir suas idéias. Ele precisava de uma teoria matemática dos invariantes associados ao elemento diferencial de linha ds2 = gµνdxµdxν. Em 1912, seu amigo Marcel Grossman, matemático, disse-lhe que a teoria matemática que ele procurava era a Geometria de Riemann, criada por Bernhard Riemann, um dos maiores matemáticos do século XIX. Somente depois da informação dada por Grossman é que Einstein começou a formular sua famosa teoria. A Ciência não é capaz de responder a questão a respeito da origem do universo porque os métodos científicos se aplicam a realidades materiais existentes e, conseqüentemente, não têm nada a dizer sobre a situação hipotética da inexistência do universo. As equações da Física não se aplicam ao nada. Penrose comenta que o modo como Einstein desenvolveu sua teoria da gravitação e sua convincente verificação experimental mostram que Einstein revelou algo da estrutura matemática da natureza. O que Einstein descobriu não foi algo de importância secundária na Física, mas a coisa mais fundamental que há na natureza, a natureza do espaço e tempo (PENROSE, 1997). O impressionante sucesso da Física Matemática, exemplificado pelas teorias quânticas e pela Teoria da Relatividade Geral, mostra que muita Física pode resultar de um pouco de boa Filosofia, de senso estético, da teoria matemática adequada, e de um insight inspirado. Em contrapartida, muitas conjecturas filosóficas foram inspiradas pelo sucesso da Física Matemática, o que mostra que a boa Ciência e a boa filosofia não só são compatíveis, mas elas se beneficiam em suas mútuas interações. Assim, também a boa Ciência pode se beneficiar da boa Teologia (há boa e má teologia assim como há boa e má Ciência) e vice-versa. Sobre a interação entre Ciência, Religião e Filosofia, comenta o astrofísico e filósofo William Stoeger: “A religião, a teologia e a espiritualidade proporcionaram, 34 3. CONHECIMENTO FILOSÓFICO E CONHECIMENTO RELIGIOSO Gottfried Wilhelm Leibniz, matemático e filósofo alemão, contemporâneo de Isaac Newton, formulou a pergunta: “Por que existe alguma coisa e não o nada?”, que é a pergunta que a Filosofia deve responder para explicar a existência do universo. Stoeger (1992) escrevendo sobre a origem do universo, chama a atenção para o significado do termo “criação”, que em Ciência é utilizado de modo não rigoroso. Fala-se, por exemplo, em criação de partículas na interação de outras partículas, ou por polarização do vácuo. Falase em proteínas criadas a partir de aminoácidos. Em todos os casos tratados pela Ciência, não há verdadeira criação, mas sim transformação de matéria preexistente. Filosoficamente, o significado do termo “criação” é muito mais estreito e mais específico. O termo significa creatio ex nihilo, criação a partir de absolutamente nada. A criação com a qual estamos familiarizados na Ciência não é creatio ex nihilo, mas sim transformação da matéria previamente existente. Por exemplo, um fóton pode dar origem a um elétron e a um pósitron num processo físico chamado criação de um par elétron-pósitron. O elétron e o pósitron não contêm em si a explicação de sua própria existência. A existência deles depende de alguma outra coisa, neste caso, do fóton que deu origem a eles, juntamente com toda a cadeia causal da qual depende o fóton. Analisando a realidade material chega-se à conclusão de que nenhum ente físico explica a si mesmo ou sua própria existência. Eles podem existir como podem não existir, como vimos no exemplo do par elétronpósitron que não existia e passou a existir. Na interação entre uma partícula e sua antipartícula, as duas partículas desaparecem dando origem à radiação eletromagnética. A busca pelas causas da existência de algo deve terRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 minar numa causa não causada. É forçoso admitir um ser por si mesmo necessário, que não tem fora de si a causa da sua necessidade, antes, sendo a causa da necessidade dos outros; e a tal ser todos chamam Deus. Aqui citamos Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, I q. 2 a.3: “Ergo necesse est ponere aliquid quod est per se necessarium, non habens causam necessitatis aliunde, sed quod est causa necessitatis aliis: quod omnes dicunt Deum.” (SANTO TOMÁS DE AQUINO, 1934). Convém observar que o nada não é o vácuo da Física. O nada não existe, não contém nenhuma potencialidade, nenhuma lei física, enquanto o vácuo existe, é rico em potencialidades e está sujeito a leis físicas. Por exemplo, o vácuo tem propriedades elétricas e magnéticas que determinam a velocidade da luz através dele. Um par elétron-pósitron pode surgir da polarização do vácuo. É interessante notar que a creatio ex nihilo não implica necessariamente ou exige um começo no tempo, nem um começo do tempo. A hipótese de que o Universo sempre existiu não elimina o problema de explicar sua existência, pois o Universo não se explica por si mesmo. Tal hipótese não pode ser comprovada cientificamente nem provada filosoficamente. A revelação cristã fala de um começo temporal. Mas, isso não é essencial, sob o ponto de vista filosófico, como explica Santo Tomás de Aquino na Summa Theologica I q. 46 a.2 (SANTO TOMÁS DE AQUINO, 1959). O problema da origem do Universo é o problema da explicação de sua existência, e não um problema de uma origem temporal. A Ciência não é capaz de explicar a transição da não-existência para a existência. O princípio da creatio ex nihilo é uma conclusão filosófica, o resultado de uma análise filosófica da realidade como a conhecemos e não um princípio religioso ou teológico. Ele não é incompatível com a Ciência, pois deixa a Ciência inteiramente livre para investigar as leis que regem os fenômenos naturais. Perguntado sobre a existência de Deus, Laplace teria respondido: “Je n´ai pas besoin de cette hypothèse” (Eu não tenho necessidade desta hipótese). Sua resposta mostra que ele não entendeu a necessidade de se explicar a origem das leis da natureza. Há vários caminhos para se demonstrar racionalmente a realidade de Deus. Recentemente, meu colega e amigo Fernando de Mello Gomide, físico teórico e filósofo, publicou uma solução para o problema da prova ontológica da realidade de Deus (GOMIDE, 1998). Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Gomide alertou-me quanto ao erro comum de aplicar o termo “existência” a Deus: “O Pe. Cornélio Fabro, eminente tomista italiano, mostra que a existência é a emergência do ente a partir de suas causas: é pois idéia de extrinseceidade. Portanto só às criaturas se aplica o termo existência: só elas existem porque são causadas. Ora, Deus não é causado, por isso Deus não existe, mas Deus É. Proposições como “provas da existência de Deus”, “Deus existe” são incorretas.” (GOMIDE, comunicação particular). A Filosofia, além de demonstrar racionalmente a realidade de Deus, demonstra também vários atributos de Deus, como sua natureza puramente espiritual, sua eternidade, sua inteligência infinita etc. Esta demonstração racional da realidade de Deus e de seus atributos é conhecida como Teodicéia, termo criado por Leibniz. Demonstrada racionalmente a realidade de Deus, as origens da ordem do universo e das leis da natureza podem ser atribuídas a Deus. Assim, a boa filosofia do ser responde às perguntas sobre as origens do universo, da ordem nele observada, das leis naturais, perguntas que a Ciência não é capaz de responder. Grande parte da Filosofia moderna nada contribui para esclarecer essas questões, porque não é Filosofia do ser. Diz o Papa João Paulo II que a Filosofia moderna concentrou sua atenção sobre o homem e “parece ter-se esquecido de que este (o homem) é sempre chamado a voltar-se também para uma realidade que o transcende. [...] A filosofia moderna, esquecendo-se de orientar a sua pesquisa para o ser, concentrou a própria investigação no conhecimento humano. Em vez de se apoiar sobre a capacidade que o homem tem de conhecer a verdade, preferiu sublinhar as suas limitações e condicionalismos.” (JOÃO PAULO II, 2005). Por outro lado, afirma o Papa que a Filosofia de Santo Tomás de Aquino é verdadeiramente uma Filosofia do ser, e não do simples aparecer. Gomide observa que a Filosofia do ser de Santo Tomás de Aquino constitui uma inovação filosófica que tornou possível a formulação precisa dos dados teológicos da Revelação. Em seu livro Diálogo entre a Filosofia e Ciência, ele diz: 35 “A obra-prima de Santo Tomás de Aquino se encontra no seu pensamento ontológico. No Doutor Angélico, a oposição metafísica Platão-Aristóteles é transcendida mediante sua síntese da doutrina do ato e da potência em Aristóteles com a teoria platônica da participação, consubstanciada na sua distinção real entre o ente, o ser e a essência30-31. A distinção real entre o ente, o ser e a essência é pensamento totalmente novo na história da filosofia. A filosofia do ser de Santo Tomás é um resultado superlativo da influência da Revelação sobre a razão natural do homem. Santo Tomás quando criança se tinha feito a pergunta: que é Deus? Sua filosofia do ser é a resposta à pergunta e permite perfeitamente iluminar a definição que Moisés recebeu de Javé: “Eu sou aquele que é” (Ex III, 14). A filosofia de originalidade cristã 32-33 encontrou em Santo Tomás um de seus ápices. O menino Tomás formulando essa pergunta que o Espírito Santo lhe inspirou, deu início à maior inovação filosófica da história, tornando possível à inteligência cristã a mais perfeita síntese dos dados teológicos da Revelação com a ordem especulativa ontológica. Foi muito simbólica disso, que, no Concílio de Trento, os Padres Conciliares colocaram sobre o mesmo altar a Sagrada Escritura, os Decretos Pontifícios e a Suma Teológica do Doutor Angélico.” (GOMIDE, 1990). A religião cristã incorpora a doutrina filosófica da creatio ex nihilo, acrescentando-lhe a idéia da origem temporal do Universo. Lemos no Gênesis: “No princípio Deus criou o céu e a terra”(Gn 1, 1). O céu e a terra significam o Universo ordenado. No princípio significa o início do tempo, isto é, o tempo foi criado simultaneamente com o Universo. O segundo livro dos Macabeus faz referência explícita à criação ex nihilo, do nada: “Eu te suplico, meu filho, contempla o céu e a terra e observa tudo o que neles existe. Reconhece que não foi de coisas existentes que Deus os fez, e que também o gênero humano surgiu da mesma forma” (2MC 7, 28). O prólogo do Evangelho de São João também fala da criação do Universo: “No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princípio, ele estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele e sem ele nada foi feito” (JO 1, 1-3). que o sol fosse eterno. Ele respondeu: “eterno nò, ma ben antico” (LEIBNIZ, 2004). A resposta dada por Galileo veio da sua fé, não da Ciência, que naquela época nada sabia sobre a teoria da formação e evolução estelar que viria a ser formulada apenas no século XX. Gomide, dentre as questões que ele analisa em seus ensaios filosóficos sobre a relação entre Filosofia e Ciência (GOMIDE, 1986; 1987; 1990; 1996; 1998; 2003), trata também da questão do sucesso da Física Matemática. Ele mostra que a Filosofia do ser de Santo Tomás de Aquino e os conceitos tomistas de intensidade de forma, magnitude transcendental e número transcendental justificam perfeitamente a formalização matemática da natureza. Neste trabalho eu me limitarei a citar alguns trechos da Sagrada Escritura que se relacionam com o assunto, acrescentando alguns comentários. No livro da Sabedoria lemos: “Mas tudo dispusestes com medida, número e peso” (Sb 11, 20), que é a afirmação de que Deus criou o Universo sujeito a leis que podem ser expressas matematicamente. Deus não criou um Universo caótico mas ordenado, com medida, número e peso. Depois de discutir o conceito de número, segundo os conceitos tomistas, Gomide afirma: “Assim, pois, o número surge idealmente não só no terreno do ser-classe, mas também no domínio do ser e suas relações. Na Física, a formalização matemática envolve não só a de número de objetos, como número de átomos, número de partículas etc., mas também duas instâncias de matematização que são as seguintes: a) Atribuição de valores numéricos a qualidades atualizadas: as grandezas físicas constantes e as funções dessas variáveis; b) Equações diferenciais, que representam a formalização matemática no terreno das relações, como, por exemplo, as interações. A 2a. lei de Newton é um caso particular. As três ordens de matematização estão retratadas no Livro da Sabedoria e eis o significado daquele versículo considerado: a) Medida: matematização de relação. b) Número: matematização do ser-conjunto. c) Peso: matematização da potência ativa, ou seja, qualidade.” (GOMIDE, 1986). Alguém perguntou a Galileu Galilei se acreditava 36 Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 A respeito dos números diz Santo Agostinho, em seu livro O Livre Arbítrio (Livro II cap 8, 24): “Por essas provas e muitas outras semelhantes, todos aqueles que raciocinam e a quem Deus concedeu o espírito, mas igualmente a quem a teimosia não envolveu nas trevas, são forçados a reconhecer que a lei e a verdade dos números escapam ao domínio dos sentidos corporais, e que essas leis são invariáveis e puras, oferecendo-se universalmente aos olhos de todos aqueles que são capazes de raciocínio”. Santo Agostinho mostra que o conhecimento dos números e de suas leis, puramente intelectual, certo, objetivo e indiscutível, é possuído por todo espírito realmente sadio. O que é percebido pelos sentidos corporais está sujeito à corrupção e não sabemos por quanto tempo durará. Ao passo que os teoremas da Matemática, que são percebidos só pela inteligência, são válidos não apenas hoje, mas sempre, e são um patrimônio comum de todos os que são capazes de raciocínio. Essas verdades permanecem imutáveis em nossa mente mutável. São constantes do espírito e evidenciam a realidade do conhecimento. Mais adiante ele diz que a sabedoria regula pelos números a harmoniosa evolução do universo (Livre Arbítrio, Livro II, cap. 16, 42): “Contempla o céu, a terra, o mar e todos os seres neles contidos [...] Todos possuem beleza, porque têm seus números. Suprima-os e eles nada mais serão. Logo, de onde vêm eles, a não ser daquele de onde procede todo número?” O Livro da Sabedoria diz: “pois a grandeza e a beleza das criaturas fazem, por analogia, contemplar seu Autor”. Lemos também na carta de São Paulo aos Romanos: “Porque o que se pode conhecer de Deus é manifesto entre eles, pois Deus lho revelou. Sua realidade invisível - seu eterno poder e sua divindade - tornou-se inteligível, desde a criação do mundo, através das criaturas, de sorte que não têm desculpa.” (RM 1, 19-20). João Paulo II comenta as palavras de São Paulo, dizendo: “Desenvolvendo com linguagem popular uma argumentação filosófica, o Apóstolo exprime uma verdade profunda: por meio Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 da criação, os ‘olhos da mente’ podem chegar ao conhecimento de Deus. [...] raciocinando a partir dos sentidos, pode chegar também à causa que está na origem de toda a realidade sensível. Em terminologia filosófica, podemos dizer que, neste significativo texto Paulino, está afirmada a capacidade metafísica do homem.” (JOÃO PAULO II, 2005). Heisenberg, falando sobre uso da Matemática na Física diz: “Antes de examinar se este método continua válido ou não para a ciência atual, deveríamos perguntar-nos em que se fundamentava a confiança que guiou Copérnico, Galileo e Kepler por esse novo caminho. Fiel à tese de von Weizsäcker, creio que se pode afirmar que esse fundamento era mais de índole teológica. Galileo dizia que a natureza, o segundo livro de Deus (o primeiro sendo a Bíblia), estava escrita em letras matemáticas e que se teria de aprender esse alfabeto para poder lê-la. Kepler, em sua obra sobre a harmonia do mundo, é ainda mais claro. Ele diz: Deus criou o mundo segundo suas idéias da criação. Estas idéias são as formas arquetípicas puras que Platão chamava idéias, e para o homem são inteligíveis na qualidade de relações matemáticas. E são compreensíveis porque o homem foi criado à semelhança espiritual de Deus. A física é o reflexo das idéias criativas de Deus; donde a física é um serviço divino.” (HEISENBERG, 1979). A Ciência pressupõe a ordem do universo, mas não explica sua origem. Como resposta racional para a questão da origem das leis da natureza, Margenau, físico e filósofo, diz que elas foram criadas por Deus (MARGENAU, 1992). Outra perplexidade dos físicos matemáticos é a capacidade do homem de descobrir leis da natureza. A religião tem a resposta para essa questão. Lemos no Gênesis (GN 1, 26-28): Deus disse: “Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança, e que eles dominem sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra”. 37 Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele os criou, homem e mulher ele os criou. Deus os abençoou e lhes disse: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a; dominai sobre os peixes do mar, as aves do céu e todos os animais que rastejam sobre a terra.” Deus, ao criar o homem, dotou-o de inteligência, que torna a criatura uma semelhança do Criador. Com a inteligência, o homem deverá investigar as leis que regem os fenômenos da natureza, pois o conhecimento dessas leis significa o cumprimento da ordem dada por Deus, ao homem, de submeter a terra, o mar e o ar. Portanto, desde sua criação o homem deveria cumprir a tarefa de buscar entender a natureza, de descobrir suas leis. Sempre que Deus dá uma ordem, dá também os meios para sua realização. Compete ao homem utilizar sabiamente os meios que Deus lhe concede. 4. INTERAÇÃO ENTRE CIÊNCIA, FILOSOFIA E RELIGIÃO No diálogo entre Ciência e Religião, mediada pela Filosofia, as três se enriquecem, conhecem melhor seus próprios limites e até mesmo entendem melhor o objeto do conhecimento que lhes é próprio. Estamos falando da boa Ciência, da boa Religião e da boa Filosofia. No século XIX, o Papa Leão XIII, na carta encíclica Aeterni Patris, retomou e desenvolveu a doutrina do Concílio Vaticano I sobre a relação entre fé e razão, mostrando como o pensamento filosófico é um contributo fundamental para a fé e para a Teologia. O Papa João Paulo II retomou o assunto na carta encíclica Fides et Ratio, cujo capítulo VI trata da interação da Teologia com a Filosofia. Ele diz (JOÃO PAULO II, 2005): “Espera-se, pois, que teólogos e filósofos se deixem guiar unicamente pela autoridade da verdade, para que seja elaborada uma Filosofia de harmonia com a palavra de Deus. Essa filosofia será o terreno de encontro entre as culturas e a fé cristã, o espaço de entendimento entre fiéis e não fiéis. Ajudará os fiéis a convencerem-se mais intimamente de que a profundidade e a autenticidade da fé saem favorecidas quando esta se une ao pensamento e não renuncia a ele.” Em seguida, ele cita Santo Agostinho (De praedestinatione Sanctorum 2, 5: PL 44, 963): 38 “Crer, nada mais é senão pensar consentindo [...]. Todo o que crê, pensa; crendo pensa, e pensando crê [.... A fé se não for pensada, nada é”. Lembramos também que Santo Agostinho dizia (RUBIO, 1995): “Crê para entender e entende para crer”. In Joan. 29,6. Quanto à Ciência, ela não leva ao ateísmo, cujas causas estão menos na inteligência e mais na vontade. Max Jammer, físico e filósofo, em seu livro “Einstein e a Religião”, que discute a filosofia einsteiniana, ilustra, com o exemplo de Einstein, a interação entre a Física e a Religião, mediada pela Filosofia. Ele conta que, a alguém que perguntou a Einstein se ele era um homem profundamente religioso, Einstein, calmamente e com toda a dignidade, respondeu: “Sim, o senhor poderia dizer isso. Tente penetrar, com seus recursos limitados, nos segredos da natureza, e o senhor descobrirá que, por trás de todas as concatenações discerníveis, resta algo sutil, intangível e inexplicável. A veneração dessa força, que está além de tudo o que podemos compreender, é minha religião. Nessa medida, sou realmente religioso.” (JAMMER, 2000). O sentimento do mistério não desaparece com a descoberta científica, mas esta revela um mistério ainda mais profundo. Em sentido inverso, a Teologia pode motivar e dar condições para a pesquisa científica, como mostra estudos sobre a origem da Ciência na cristandade ocidental. Jeffrey B. Russel fala do trabalho pioneiro de Pierre Duhem, físico e grande estudioso da história da Ciência, autor da monumental obra Système du Monde, em dez volumes, publicados em Paris de 1913 a 1959. Duhem mostra que a Igreja medieval apoiava e sustentava a Filosofia natural, tendo a Teologia cristã desempenhado um papel fundamental para a formação do espírito científico, espírito indagativo e racional, que busca os porquês dos fenômenos naturais (RUSSEL, 1991). Ao trabalho de Duhem seguiram-se outros, que acrescentaram mais dados históricos em favor de sua tese (STARK, 2005; WOODS JR., 2005; LINDBERG, 1992). Desde os primeiros tempos do cristianismo, a razão desempenhou um papel essencial no desenvolvimento da Teologia cristã, através do raciocínio dedutivo. São conhecidos como Padres da Igreja autores cristãos dos primeiros séculos, responsáveis pelo desenvolvimento racional da Teologia, do qual resultou a definição Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 de dogmas fundamentais do cristianismo. Santo Agostinho, um dos Padres da Igreja, enfatizava o papel da razão nas considerações das verdades da fé. Ele dizia que nós nem poderíamos crer se não tivéssemos almas racionais (STARK, 2005). Santo Agostinho louvava o uso da razão não apenas em assuntos de Teologia, mas também, de modo geral, se admirava com as realizações da inteligência humana nas Artes, nas coisas práticas, na Matemática etc., frutos de um “inexprimível dom” de Deus, que dotou sua criatura de uma natureza racional (SANTO AGOSTINHO, 2000). Em seu livro Sobre a Potencialidade da Alma (De Quantitate Animae) ele se refere à invenção da escrita, à música, à variedade de idiomas, à precisão da arte de calcular, “tudo produzido pela humana potência de raciocínio e imaginação” (SANTO AGOSTINHO, 1997). Ele teve grande influência sobre a cristandade medieval, que assimilou seus ensinamentos a respeito da capacidade da razão humana. Em seu livro De Genesi ad Litteram (sobre o sentido literal do Gênesis), Santo Agostinho observa que a Bíblia não contém nenhuma descrição clara da forma ou do tamanho da Terra ou do Universo. Por isso, ele alerta os cristãos para não se fazerem de tolos, citando textos isolados das Escrituras como argumento contra os filósofos pagãos. Loucos são os que atribuem à Bíblia suas próprias idiotices, fazendo com que os pagãos desprezem os cristãos e suas Escrituras. Como a Bíblia nada diz a respeito da forma da Terra, ela é irrelevante para nossa salvação, e é inútil discuti-la. Contudo, é assunto para a investigação natural. Assim, continua Agostinho, precisamente porque a Bíblia não responde a questão, deveríamos ter a mente aberta à evidência apresentada pelos filósofos. Ele estava refutando, particularmente, os cristãos que citavam salmos, trechos do profeta Isaías, do livro de Jó, ou do profeta Amós, como argumentos contra a esfericidade da terra (RUSSEL, 1991). A religião trata da fé e da moral, que interessam à nossa salvação. Em assuntos puramente científicos, em que não entram nenhum aspecto da fé ou da moral, a Religião deixa para a Ciência inteira liberdade de realizar suas investigações dos fenômenos naturais. A crença em Deus Criador, que criou o universo ordenado, com uma estrutura racional, com leis naturais, e a confiança na capacidade humana de descobrir essas leis é que tornaram possível o nascimento da Ciência. Alfred North Whitehead, matemático e lógico, co-autor com Bertrand Russel do famoso Principia Mathematica, afirmou que a Ciência nasceu na Europa em conseqüência da generalizada “fé na possibilidade da Ciência ... originária da Teologia medieval”. Whitehead explica: “A maior contribuição do medievalismo para a formação do movimento científico Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 foi a inabalável crença de que ... havia um segredo, um segredo que podia ser desvelado. Como essa convicção foi tão vividamente implantada na mente européia? ... Ele deve ter vindo da insistência medieval na racionalidade de Deus, concebida como a energia pessoal de Iahweh e com a racionalidade de um filósofo grego. Todos os detalhes estavam supervisionados: a busca na natureza somente poderia resultar na reivindicação da fé na racionalidade.” (STARK, 2005). 5. CONCLUSÃO É próprio do espírito humano buscar a unidade do conhecimento, englobando o conhecimento científico, o conhecimento filosófico e o conhecimento religioso num todo coerente e harmônico. O princípio unificador é o conceito de Deus, transcendente, criador do Universo e da ordem nele observada. O livro Cosmos, Bios, Theos, editado por Henry Margenau e Roy Abraham Varghese, traz a opinião de mais de sessenta eminentes cientistas (dentre os quais mais de vinte ganhadores do Prêmio Nobel) a respeito de Ciência e Religião. Citamos a seguir algumas dessas opiniões. Arthur L. Schawlow, Prêmio Nobel de Física: Diante das maravilhas da vida e do universo, nós devemos perguntar por que e não apenas como. As únicas respostas possíveis são religiosas. Eu sinto a necessidade de Deus no universo e na minha própria vida. Wolfgang Smith, matemático, cujos estudos teóricos sobre a Aerodinâmica de campos de difusão proporcionaram a chave teórica para a solução do problema da reentrada em vôos espaciais: Para mim pessoalmente, nada é mais evidente, mais certo do que a existência de Deus. Walter Thirring, professor de Física da Universidade de Viena: Eu penso que cientistas que dedicam suas vidas a investigar a harmonia mundi não podem deixar de ver nessa harmonia algum plano divino. Quanto às batalhas entre cientistas e teólogos elas acontecem devido à pretensão de alguns de seus representantes que acreditam entender mais do que realmente entendem. Deve-se ter humildade vis-à-vis aos grandes mistérios do cosmos. Charles Townes, Prêmio Nobel de Física: A questão da origem do Universo não pode ser respondida pela ciência. Eu creio na existência de Deus. Eugene P. Wigner, Prêmio Nobel de Física: O con39 ceito de Deus é maravilhoso – ele nos ajuda a tomar decisões na direção correta. O problema da origem do Universo é um mistério para a Ciência. Werner Arber, biofísico, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina: Eu aceito o conceito de Deus sem tentar defini-lo com precisão. Eu sei que o conceito de Deus ajudou-me a controlar muitas questões na vida; ele me guia em situações críticas, e eu o vejo confirmado em muitos profundos insights, na beleza do funcionamento do mundo vivo. D. H. R. Barton, Prêmio Nobel de Química: Deus é a Verdade. Não existe incompatibilidade entre Ciência e Religião. Ambas buscam a verdade. Steven L. Bernasek, professor de Química da Universidade de Princeton: Eu acredito na existência de Deus. Sua existência é para mim aparente em tudo ao meu redor, especialmente em meu trabalho como cientista. Sir John Eccles, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina: A consciência não é, de nenhum modo, um resultado de uma evolução darwiniana. Eu acho que ela é uma criação divina. Eu acredito em Deus. Ragnar Granit, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina: Ciente das limitações da Ciência, eu tenho uma atitude religiosa em relação ao desconhecido. 6. AGRADECIMENTO Agradeço ao Prof. Fernando de Mello Gomide por esclarecimentos a respeito de conceitos metafísicos da Filosofia do ser de Santo Tomás de Aquino. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS A BÍBLIA de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 1987. CORRIGAN, R. A Igreja e o Século Dezenove. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1946. DIRAC, A.M. P. The relation between mathematics and physics. Proceedings of the Royal Society (Edinburgh) 59, pp. 122-129. 1939. DYSON, F. De Eros a Gaia. São Paulo: Best Seller, 1992. pp. 196; 346-348. GOMIDE, F. M. A Bíblia e a Matematização da Realidade. [s.n.] 1986. pp. 145-166. [Presença Filosófica, Vol. XII]. _______. Filosofia do Conhecimento Científico. Curitiba: Albert Einstein, 1987. 40 _______. Diálogo entre a Filosofia e Ciência. Presença. Rio de Janeiro: [s.ed.], 1990. p. 35. _______. 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Bertolotti ** Resumo: A avaliação clínica da capacidade de bombeamento do coração é mais bem realizada com base na função cardíaca, que relaciona o volume de sangue bombeado pelo coração em cada contração sistólica com o volume diastólico no final da fase diastólica e com outros parâmetros hemodinâmicos. A realização de exercício físico causa alteração na função cardíaca. Neste trabalho utilizamos dados experimentais publicados na literatura para determinar, na aproximação linear, funções cardíacas para diferentes níveis de exercício físico. Palavras-chave: Funções cardíacas, exercício físico, contratilidade miocárdica. Abstract: Clinical evaluation of the heart pumping capacity is better performed considering the cardiac function curve, which relates the blood volume pumped by the heart at each systolic contraction to the diastolic volume at the end of the diastolic phase and to other hemodynamic parameters. Physical exercises change the cardiac function curve. In this paper, we used experimental data published in the literature to determine, in the linear approximation, cardiac function curves for different intensity levels of physical exercises. Key words: Cardiac function curve, exercising, myocardial contractility. 1. INTRODUÇÃO Otto Frank (1895) observou em experimento com coração de rã que quanto maior o volume de sangue acumulado no ventrículo, no final de uma fase diastólica, maior é o volume de sangue ejetado pelo ventrículo na sístole seguinte. A mesma relação foi confirmada por Ernest Starling e colaboradores (PATTERSON et al., 1914), em experimentos com preparações coração-pulmão caninas. Essas observações podem ser expressas matematicamente pela função S = S(vD), em que S é o volume de ejeção (volume de sangue bombeado em cada contração ventricular) e vD é o volume de sangue no ventrículo no final de uma fase diastólica (fase em que o ventrículo se enche de sangue). A função é conhecida como relação de Frank-Starling (KATZ, 1977). No caso do sistema cardiovascular intacto, i.e., in vivo, é preciso considerar o fato de que o ventrículo bombeia o sangue para o sistema vascular que já contém sangue à pressão não-nula (pressão arterial na aorta), o que representa uma resistência a ser vencida pelo fluxo sangüíneo. Matematicamente esse fato pode ser expres- * Professor(a) da Univap. ** Graduada em Engenharia Biomédica pela Univap. 42 so escrevendo-se a relação S = S(vD; pa), que diz depender o volume de ejeção não apenas do volume diastólico final vD, conhecido como pré-carga (preload), mas também da pressão arterial pa, que aqui representa a póscarga (afterload). Há ainda outros fatores que podem alterar o volume de ejeção, como substâncias que alteram a contratilidade do músculo cardíaco. Tais substâncias são chamadas substâncias inotrópicas (KATZ, 1977; MILNOR, 1990). A influência dessas substâncias poderia ser descrita matematicamente, escrevendo-se S = S(vD; pa: i), em que i representaria o estado inotrópico do músculo cardíaco. Chamaremos a função S = S(vD; pa: i) de função cardíaca ou função ventricular, reservando o termo “relação de Frank-Starling” para a função S = S(vD), que descreve a dependência do volume de ejeção S apenas em relação ao volume diastólico final vD. A realização de exercícios físicos impõe ao sistema cardiovascular uma sobrecarga decorrente de um aumento das necessidades metabólicas dos músculos que exercem uma atividade mais intensa, ao mesmo tempo que deve ser mantido o atendimento de outros órgãos. O sistema responde a essas exigências por um aumento da ventilação pulmonar, um aumento do débito cardíaco, em aumento da pressão arterial e uma redistribuição do fluxo Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 de sangue, com um aumento do fluxo em direção aos músculos mais ativos. O aumento do débito cardíaco pode se conseguido com o aumento da pulsação cardíaca ou aumento da contratilidade do músculo cardíaco, ou do aumento de ambos os fatores. Esse aumento do débito cardíaco significa portanto que as funções cardíacas são alteradas pela realização de exercícios físicos. A investigação da alteração da função cardíaca em conseqüência da realização de exercícios físicos exige uma formulação matemática do problema, pois a função cardíaca depende de vários fatores, o que torna difícil seu estudo sem um modelamento matemático, enquanto que, matematicamente, ela pode ser mais bem estudada como uma função de várias variáveis. A importância da análise matemática do problema da resposta cardiovascular a exercícios físicos está: 1. nas conclusões quantitativas e qualitativas que se podem inferir de dados experimentais; 2. nas sugestões para o planejamento de experimentos. Neste trabalho utilizamos dados experimentais de Poliner et al. (1980) para determinar as funções cardíacas correspondentes a diferentes níveis de exercícios físicos, e, através de uma análise matemática, discutimos a questão da alteração da contratilidade miocárdica decorrente da realização de exercícios. 2. DADOS EXPERIMENTAIS DE POLINER ETAL. (1980) Poliner et al. (1980) realizaram experimentos com sete pessoas normais (seis homens e uma mulher), com idade média de 26 anos, que se submeteram a exercícios físicos de diferentes níveis de intensidade. Os exercícios foram realizados nas posturas supina (deitada) e sentada, em bicicletas ergométricas. A Tabela 1 contém alguns dados obtidos por aqueles autores. Tabela 1 - Dados de Poliner et al. (1980) Condição Postura EDV (ml) ESV (ml) S (ml) HR (beats/min) BP (mmHg) CO (l/min) Repouso Sentada supina 85 107 32 34 55 76 89 71 125/84 125/76 4.8 5.4 Exercício 1 Sentada supina 113 123 28 31 85 92 124 100 161/86 152/81 10.4 9.1 Exercício 2 Sentada supina 117 137 24 32 92 105 165 133 190/89 169/91 15.1 13.8 Exercício máximo Sentada supina 116 135 19 29 99 106 182 172 204/91 206/96 18.0 18.3 EDV é o volume diastólico final; ESV o volume sistólico final; S o volume de ejeção; HR a freqüência cardíaca; BP as pressões sistólica e diastólica; CO é o débito cardíaco. 3. DETERMINAÇÃO DA FUNÇÃO CARDÍACA 3.1 Volume médio de sangue no ventrículo Os dados acima não são suficientes para se determinar a função cardíaca completa S = S(vD; pa: i), mas podemos determinar aproximadamente a dependência de S com a vD supondo uma relação linear entre as duas variáveis. Por razões teóricas é mais interessante escrever a função cardíaca na forma S = S(v), em que v designa o volume médio de sangue no ventrículo dado por ∫ v= t +T t vi (t )dt T Segundo os dados experimentais de Little & Downer (1990), a maior parte do aumento do volume de sangue no ventrículo ocorre no primeiro terço da diástole. Considerando ainda que a duração da diástole é aproximadamente o dobro da duração da sístole, o resultado da integral na Equação (1) é aproximadamente v≅ (2EDV + ESV ) 3 (2), sendo EDV (end diastolic volume) o volume diastólico final e ESV (end sistolic volume) o volume sistólico final. (1), Utilizando a Equação (2) e os dados da Tabela 1, obtemos os valores de v que estão na Tabela 2. sendo vi(t) o volume de sangue no ventrículo no instante t e T o período cardíaco. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 43 3.2 Pressão arterial média 3.3 Relação entre o volume diastólico final (EDV) e o volume sistólico final (ESV) A pressão arterial média, num período cardíaco, é dada por pa ∫ = t +T t p ai (t )dt (3), T A razão EDV/ESV pode ser útil na busca de um parâmetro que indique a contratilidade do miocárdio. Com os dados da Tabela 1 obtemos os valores da razão EDV/ ESV que estão na Tabela 2. Indicamos por <EDV/ESV> a média dos valores de EDV/ESV para as posturas sentada e supina, correspondentes a cada condição de exercício físico. em que pai(t) é a pressão arterial no instante t. Definamos o parâmetro u por Para a condição de estado estacionário a Equação (3) dá aproximadamente o resultado u= pa ≅ 2 pD + pS 3 〈 EDV / ESV〉 〈 EDV / ESV〉 0 (5), (4), sendo pD a pressão diastólica e pS a pressão sistólica. A Equação (4) e os dados da Tabela 1 dão, para a pressão arterial média pa, os resultados que estão na Tabela 2. em que <EDV/ESV>0 é o valor da razão <EDV/ESV> correspondente ao repouso. O parâmetro u indica a intensidade relativa do nível de exercício, em relação à condição de repouso. Tabela 2 - Volume médio de sangue v; pressão arterial média pa; razão <EDV/ESV>; parâmetro u Condição Repouso Exercício 1 Exercício 2 Postura v (ml) pa (mmHg) EDV/ESV <EDV/ESV> u Sentada/supina 67 83 98 92 2.7 3.1 2.9 1 Sentada/supina 85 92 136 128 4.0 4.0 4.0 1.4 Sentada/supina 86 102 156 143 4.9 4.3 4.6 1.6 Exercício máximo Sentada/supina 84 100 166 169 6.1 4.7 5.4 1.9 <EDV/ESV> é a média dos valores de EDV/ESV para as posturas sentada e supina, correspondentes a cada condição de exercício físico; u = <EDV/ESV>/<EDV/ESV>0, sendo <EDV/ESV>0 o valor da razão <EDV/ESV> correspondente ao repouso. O parâmetro u indica a intensidade relativa do nível de exercício, em relação à condição de repouso. 3.4 Funções cardíacas sendo a e b constantes a serem determinadas. Suponhamos a relação linear Dos valores de S que se encontram na Tabela 1 e dos valores de v na Tabela 2, obtemos para a e b os resultados que estão na Tabela 3. S = a + bv 44 (6), Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Tabela 3 - Constantes a e b da função linear (6) Vamos indicar por S0 = a0 + b0v conseqüência dos exercícios. (7), a função cardíaca correspondente à condição de repouso. Para uma condição de exercício escrevemos S = a + bv = a0 + b0v + x + yv (8), Podemos determinar a relação entre ∆S e u na aproximação linear. Com os valores de x , da Tabelas 2, e com os valores de u da Tabela 3, indicamos num gráfico cartesiano os pontos experimentais (u;x), como mostra a Fig. 1. Na aproximação linear, a relação entre x e u é dada por x ≅ 100(u - 1) (15). em que x = a - a0 e y = b - b0 , sendo que os valores de x e y estão na Tabela 3. Com os resultados da Tabela 3, escrevemos para as funções cardíacas S0 = a0 + b0v = - 32ml + 1.3v (9), S1 = a1 + b1v = 1.0v (10), S2 = a2 + b2v = 23ml + 0.8v (11), Sm = am + bmv = 66ml + 0.4v (12), respectivamente, para as condições de repouso, nível 1 de exercício, nível 2 de exercício e nível máximo de exercício. Definir um índice de contratilidade é ainda um problema aberto. Muitos índices têm sido propostos, porém nenhum é inteiramente satisfatório (Milnor, 1990). Como uma tentativa de definir um índice que seja empiricamente útil, consideremos a relação EDV/ESV (volume diastólico final/volume sistólico final) que deve aumentar com o aumento da capacidade de contração do miocárdio. Condição Repouso Exercício 1 Exercício 2 a (ml) 0.0 23 − 32 .b 1.3 1.0 0.8 x (ml) 0.0 32 55 Fig. 1 - x em função de u. A reta representa a Equação (15). y 0.0 − 0.3 − 0.5 Analogamente, indicamos num gráfico cartesiano os pontos experimentais (u;y), como mostra a Fig. 2. Na aproximação linear a relação entre y e u é dada por y ≅ 0.9(1 - u) (16). Os resultados apresentados na Tabela 2 mostram que o parâmetro u =<EDV/ESV>/<EDV/ESV>0 aumenta com o aumento do nível de exercício. Das Equações (7) e (8) obtemos S = S0 + ∆S (13), em que ∆S = x + yv (14), representa a variação do volume de ejeção em Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Fig. 2 - y em função de u. A reta representa a Equação (16) 45 Exe Das Equações (13) – (16) resulta S = S0 + 100(u- 1) + 0.9(1 - u)v (17). A Equação (17) mostra que S = S0 quando u = 1. Pela Tabela 2 temos a0 ≅ -32ml e b0 ≅ 1.3, de modo que as Equações (7) e (17) dão S = -32ml + 1.3v + 100(u - 1)ml + 0.9(1 u)v (18). As funções cardíacas S0, S1, S2 e Sm, dadas, res- pectivamente, pelas Equações (9)-(12), podem ser obtidas, aproximadamente, da Equação (18) tomando-se os valores adequados de u. A Fig. 3 mostra as funções cardíacas S = S(v; u), para os diferentes níveis de exercício, como uma família de curvas parametrizada em u. Segundo os dados da Tabela 2, o volume médio de sangue, v, no coração, variou de 67ml a 102ml. Para esta faixa de valores de v, a Figura 3 mostra que a reta que representa S0 , dada pela Equação (18), tomandose u = 1, situa-se abaixo das retas que representam as funções cardíacas em diferentes níveis de exercício. Fig. 3 - Funções cardíacas parametrizadas em u. 4. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO A análise matemática do problema da resposta cardiovascular a exercícios físicos mostrou a importância de se determinar a função cardíaca basal, correspondente à condição de repouso, pois é em relação a ela que se pode analisar as variações causadas pela realização de exercícios. Para uma determinação mais completa das funções cardíacas são necessários mais dados experimentais do que os apresentados por Poliner et al. (1980). Por exemplo, para se determinar a influência da pressão arterial sistêmica sobre a função cardíaca, seria necessário fazer mais medidas correspondentes a cada nível de exercício, com a inclusão de outros valores dos volumes de sangue além daqueles apresentados para as posturas supina e sentada. Tais medidas podem ser feitas utilizando-se camas de inclinação variável, que possibilitem variar a pré-carga (volume diastólico final). O aumento do volume de ejeção com o aumento do nível de exercício pode resultar do aumento da contratilidade do músculo cardíaco e/ou diminuição da resistência ao fluxo sangüíneo, de modo que o parâmetro 46 u pode incluir a influência dos dois fatores. Por essa razão não identificamos u com o índice inotrópico i que indica o estado de contratilidade do músculo cardíaco. Com os dados de Poliner et al. (1980) não é possível calcular a importância relativa de cada um dos dois fatores no aumento do volume de ejeção. Seria interessante determinar a função cardíaca, na condição de repouso, após a administração de uma substância inotrópica, e comparar os resultados com as funções cardíacas para diferentes níveis de exercício. Talvez a comparação das funções cardíacas ajudasse na estimativa da importância relativa de cada fator no aumento do volume de ejeção. As Equações (14) - (12), assim como a Fig. 3, mostram que o aumento do volume de ejeção, ∆S, com o aumento do nível de exercício depende do volume médio de sangue no coração (pré-carga). Essa dependência pode significar que a contratilidade miocárdica depende da pré-carga, o que nos faz lembrar a afirmação de Milnor (1990) de que talvez não seja possível definir um índice de contratilidade miocárdica independente da pré-carga. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS POLINER, L. R.; DEHMER, G. J.; LEWIS, S. 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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 47 Células-tronco: revisão sobre os conceitos básicos Karina Teixeira Naves * Newton Soares da Silva ** Cristina Pacheco Soares ** Resumo: Uma das mais fascinantes áreas da Biologia hoje é sem dúvida a que estuda as célulastronco. Este tipo celular é objetivo de grande interesse devido às suas propriedades biológicas e seu importante potencial médico. No entanto, assim como muitos outros campos em expansão, a pesquisa em células-tronco tem levantado questões do mesmo modo como tem gerado novas descobertas. Para que se inicie uma pesquisa com células-tronco, seja qual for seu objetivo, é necessário haver uma compreensão dos fundamentos básicos conhecidos sobre o assunto. Com isto em mente, esta revisão tem por objetivo fundamentar conceitos que envolvam os diferentes tipos conhecidos de células-tronco, bem como suas propriedades principais, o que inclui os aspectos de origem, produção, capacidade de auto-renovação e diferenciação com ênfase mais especificamente nas células-tronco hematopoiéticas. Palavras-chave: Célula-tronco, medula óssea, diferenciação. Abstract: Undoubtedly one of the most fascinating areas of biology today is the one that studies stem cells. This kind of cell has been object of great interest due to their biological properties and its important medical potential. Nevertheless, as many others expansion areas, stem cell research has arisen questions as well as generated new discoveries. Therefore it is important to have a comprehension concerning the stem cells basic concepts before starting a research about this theme. Considering that, this review aims to substantiate concepts involving known different kinds of stem cells, their major properties, which include aspects of origin, production, self-renewal capacity and differentiation. This review will focus more specifically on hematopoietic stem cells. Key words: Stem cell, bone marrow, differentiation. 1. INTRODUÇÃO As células-tronco são geralmente definidas como células clonogênicas capazes de se auto-renovar e de se diferenciar em diferentes tipos celulares (METCALF; MOORE, 1971). São primariamente divididas em célulastronco embrionárias e células-tronco adultas. Ambos os tipos são capazes de se auto-renovarem e de se diferenciarem (KAMMINGA; HAAN, 2006). Através do processo de uma única divisão celular, uma célula-tronco pode dar origem a uma nova célula-tronco como também a um progenitor mais diferenciado (HO, 2005). O papel normal de uma célula-tronco no organismo animal é prover os diferentes tipos celulares que, durante o desenvolvimento, irão formar os diversos tecidos e órgãos (MARTIN, 1980). Além das propriedades de auto-renovação e de capacidade de diferenciação, há ainda outras propriedades que estas células apresentam, como, por exemplo, a habilidade de sofrer divisão celular assimétrica, exibir uma incrível capacidade de auto-regeneração, existir em uma forma de quiescência mitótica e, através de clonagem, regenerar todos os diferentes tipos celulares que constituem o tecido em que estão (HALL; WATT, 1989; POTTEN; LOEFFLER, 1990). A possibilidade de uma célula-tronco hematopoeiética de um mamífero adulto ser capaz de se transdiferenciar em tecidos diferentes daquele em que está inserida deu origem ao conceito de plasticidade das células-tronco, o que tem causado grande euforia na comunidade científica em vista da possibilidade de essas células poderem ser empregadas na prática de regeneração de tecidos e órgãos (ORLIC et al., 2003; WAGERS et al., 2002). Nesta revisão, serão abordados temas para a compreensão deste campo. Será, portanto, mais focada no entendimento das células-tronco hematopoiéticas. 2. REVISÃO 2.1 O que são células-tronco e onde podem ser encontradas * Mestranda em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006. ** Professor(a) da UNIVAP. 48 Há muito as células-tronco têm sido descritas como células indiferenciadas com capacidade de se proliferar, se Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 auto-renovar, de gerar uma grande progênie diferenciada e de regenerar tecidos (BLAU et al., 2001; SUDA et al., 2005). Segundo Whittaker (2004), as células-tronco podem ser classificadas de acordo com seu potencial de diferenciação. A este respeito podem ser: a) Pluripotentes, as quais podem se diferenciar para produzir células de qualquer tipo encontradas no corpo humano; 2.2 Propriedades das células-tronco Um grande número de propriedades, além da autorenovação, capacidade de regeneração de tecidos e do potencial de diferenciação, é freqüentemente atribuído às células-tronco. Estas propriedades incluem habilidade de se dividir de modo assimétrico e existir em uma forma mitótica quiescente (HALL; WATT, 1989; POTTEN; LOEFFLER, 1990). Divisão simétrica versus divisão assimétrica b) Multipotentes, as quais podem se diferenciar em diversos (mas não todos) tipos celulares encontrados no corpo humano; c) Unipotentes, as quais têm a capacidade de se diferenciar somente em um tipo celular específico. Entretanto, uma classificação mais completa das células-tronco é dada por Chapman e colaboradores (1999): Células-tronco Totipotentes: são as que têm a capacidade de dar origem a um organismo inteiramente funcional assim como originar todos os tipos celulares do corpo. Segundo Rippon e Bishop (2004) as célulastronco totipotentes são de extrema importância para o organismo, pois fornecem a matéria-prima para o desenvolvimento de tecidos e órgãos do embrião. Células-tronco Pluripotentes: também chamadas embriogênicas, são as capazes de dar origem a teoricamente todos os tipos celulares, mas não a um organismo funcional; Células-tronco Multipotentes: trata-se de células em um estágio mais avançado de diferenciação, isto é, originam um número limitado de tecidos. As células-tronco adultas são células multipotentes indiferenciadas que residem em um tecido adulto e que ainda mantêm a capacidade de se auto-renovar e de gerar células diferenciadas (XI et al., 2005). Por residirem em um tecido adulto, estas células são também chamadas tecido-específicas e estão depositadas em vários nichos ao longo do corpo, como, por exemplo, na medula óssea, no cérebro, no fígado, na pele, como parte do mecanismo de manutenção do tecido, crescimento e reparo (LAVKER;SUN, 2000; UCHIDA et al., 2000; VESSEY; de la HALL, 2001; WAGERS et al., 2002). Whittaker (2005) em seu trabalho descreveu que os blastocistos de embriões são uma fonte de células-tronco pluripotentes, enquanto que o tecido fetal dá origem a células-tronco pluripotentes e multipotentes. Outra fonte é o cordão umbilical, que origina células multipotentes. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Acredita-se que as células-tronco sofram uma divisão celular assimétrica determinada intrinsecamente, que dá origem a uma filha (progenitor) diferenciada e a uma outra filha que ainda mantém as características de célula-tronco. Entretanto, mesmo que haja claros exemplos deste tipo de divisão em Hirudo medicinalis, Drosophila melanogaster e em Caenohabditis elegans, existem fortes evidências de que, em mamíferos, a divisão ocorre de maneira simétrica. A divisão simétrica permite que o tamanho do “pool” de células-tronco seja regulado por fatores que controlam a quantidade de divisão com fins de diferenciação e de divisão para auto-renovação (MORRISON et al., 1997; POTTEN; LOEFFLER, 1990). Quiescência mitótica Outra propriedade compartilhada por algumas, mas nem todas, células-tronco é a de se dividir lentamente ou de forma rara. Acredita-se que isto seja verdadeiro para células-tronco da pele (LAVKER et al., 1993) e da medula óssea (MORRISON; WEISSMAN, 1994). Porém, outros tipos de células se dividem mais rapidamente. Portanto, de modo geral, pode ser verdadeiro afirmar que células-tronco de tecidos adultos são mais propensas a um ciclo lento, entretanto esta quiescência não é uma propriedade obrigatória das células-tronco (MORRISON et al., 1997). 2.3 Medula óssea e célula-tronco hematopoiética A medula óssea é o tecido compreendido no centro dos ossos longos do corpo. É o lugar onde novas células sangüíneas são produzidas. A medula óssea contém dois tipos de células-tronco: a hematopoiética e as células do estroma (ou mesenquimais). As células-tronco hematopoiéticas normalmente se diferenciam em células do sangue, enquanto as células do estroma produzem células de origem mesodérmica, como, por exemplo, osteócitos, condrócitos, adipócitos e miócitos (MAGAKI et al., 2005). Historicamente, as células-tronco hematopoiéticas (HSC - hematopoietic stem cell) têm sido as células mais extensivamente estudadas na biologia das células-tronco adultas. Isso se deve, em grande parte, à relativa facilidade de se isolar uma medula óssea (HÜTTMANN; 49 DÜHRSEN, 2003). Devido às suas propriedades biológicas e utilidade terapêutica, tem havido verdadeiros esforços para que seja feita a sua caracterização fenotípica e a identificação dos mecanismos moleculares envolvidos no controle das suas funções (BALAZS et al., 2006). A progênie resultante da divisão de HSCs pode se auto-renovar, se diferenciar (gerando um progenitor mais diferenciado), entrar no processo de morte celular programada ou se mobilizar pela corrente sanguínea (Fig. 1). Plasticidade Sendo uma célula adulta, a HSC tem a capacidade de dar origem a um número não tão abrangente de células. Sendo assim, a possibilidade de uma célula-tronco hematopoeiética de um mamífero adulto ser capaz de se transdiferenciar em tecidos diferentes daquele em que está inserida deu origem ao conceito de plasticidade das célulastronco, o que tem causado grande euforia na comunidade científica em vista da possibilidade de essas células poderem ser empregadas na prática de regeneração de tecidos e órgãos (ORLIC et al., 2003; WAGES et al., 2002). Como postulado, transdiferenciação ou plasticidade das células-tronco diz respeito à conversão de uma célulatronco de determinado tecido em uma célula tronco de uma linhagem inteiramente distinta. Este processo implica em uma perda concomitante dos marcadores celulares específicos e da função da célula original e aquisição de marcadores e função do tipo celular transdiferenciado (KUCIA et al., 2005). Regulação do número de células-tronco hematopoiéticas Fig. 1 - Modelo dos destinos alternativos das células-tronco hematopoiéticas. Fonte: WEISSMAN, 2000. Células-tronco hematopoiéticas em outros tecidos e órgãos em mamíferos As investigações dos últimos anos têm apoiado a capacidade das células-tronco hematopoiéticas de se diferenciarem em outro tecidos tanto in vivo como in vitro (COLINO, 2003). A Fig. 2 mostra um esquema deste conceito: Em ratos jovens, a freqüência de HSCs em tecidos hematopoiéticos é relativamente constante. Alguns modelos propuseram que as HSCs permanecem fora do ciclo celular durante muito tempo da vida do animal. Então, uma ou poucas células hematopoiéticas de cada vez são recrutadas para a hematopoiese e, quando elas atingem o fim da sua vida reprodutiva, uma célula ou poucas células as repõem (WEISSMAN, 2000). Isso iria exigir um mecanismo de regulação extremamente eficiente e um mecanismo de “feedback” quase que mágico para controlar a entrada de apenas uma ou poucas células de cada vez na hematopoiese. Contrário a esta hipótese, experimentos subseqüentes mostraram que em ratos jovens cerca de 8 a 10% das HSCs entram, ao acaso, no ciclo celular por dia e que, ao fim de 1 a 3 meses, todas as células hematopoiéticas entraram no ciclo celular (BRADFORD et al., 1997). O número ou a freqüência de muitos tipos celulares é regulado, em parte, pela morte celular programada (ou apoptose). As HSCs não são exceção. Estudos que utilizavam HSCs transgênicas que superexpressavam a proteína anti-apoptótica Bcl-2 mostraram que houve um aumento gradual na quantidade de HSCs, o que sugere que o número de HSCs é, em parte, regulado pela apoptose (DOMEM et al., 2000). 50 Fig. 2 - Rota das células-tronco. Fonte: BLAU; BRAZELTON; WEIMANN, 2001. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 A Fig. 2 ilustra as características das células-tronco adultas, que incluem plasticidade, diversidade de origem e multiplicidade de tecidos em que pode se diferenciar. As células-tronco são capazes de interagir com diversos tecidos partindo da corrente sanguínea (a “rodovia”) para gerar tipos celulares apropriados em resposta a sinais do tecido em que se encontram ou de fatores de crescimento, aqui ilustrados pelo “outdoors”. (Extraído de BLAU et al., 2001). Algumas células-tronco podem transitar pela circulação e ter acesso a outros órgãos do corpo. Célulastronco derivadas da medula óssea entram em diferentes órgãos, alguns bem documentados experimentalmente como o coração, o cérebro, o músculo esquelético ou o fígado (BITTNER et al., 1999; BRAZELTON et al., 2000; JACKSON et al., 1999; LAGASSE et al., 2000; MEZEY et al., 2000). Sinais emitidos pelo tecido (“homing signals”) podem ser resultantes de dano local, o que irá influenciar a migração de células-tronco até sítios específicos (BUTCHER, 1991). Fatores de crescimento induzem as células-tronco a participarem da função do órgão com o qual interagem. Portanto, o microambiente (o contato com células vizinhas, com a matriz extracelular ou com o meio local), assim como fatores de diferenciação, desempenha um papel-chave na determinação das funções de uma célula tronco. Sabe-se que dentro de órgãos como o cérebro, o fígado e o músculo esquelético, existem populações de células-tronco exclusivas para o reparo do tecido em que residem. Acredita-se que as células-tronco possam entrar nestes tecidos para tanto contribuir com a população já existente ali, como também para gerar células diferenciadas (BLAU et al., 2001). 3. CONCLUSÃO Os avanços nas pesquisas com células-tronco têm sido vistos por todo o mundo. Muitos esforços têm se baseado na caracterização destes tipos celulares para que sejam mais bem conhecidos e assim aplicados a fins clínicos e terapêuticos. Ainda existem muitas questões a serem respondidas e muitos estudos a serem realizados, mas certamente este é um campo muito promissor que ainda gerará muitos benefícios para a ciência médica. 4.AGRADECIMENTOS Este trabalho contou com o apoio da CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALAZS, A. B.; FABIAN, A. J.; ESMON, C. T.; MULLIGAN, R. C. Endothelial protein C receptor (CD201) explicity identifies hematopoietic stem cells in Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 murine bone marrow. Hematop, v. 7, pp. 2317-2321, 2006. BITTNER, R. E.; SCHOFER, C.; WEIPOLTSHAMMER, K.; IVANOVA, S.; HAUSER, E.; FREILINGER, M.; HOGER, H.; ELBE-BURGER, A.; WACHTLER, F. Recruitment of bone marrow-derived cells from skeletal and cardiac muscle in adult dystrophic mdx mice. Anat. Embryol, v. 199, pp. 391-396, 1999. BLAU, H. M.; BRAZELTON, T. R.; WEIMANN, J. M. The Evolving Concepts of a Stem Cell: Entity or Function? Cell, v. 105, pp. 829-841, 2001. 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Foram utilizados 48 ratos da linhagem Wistar divididos aleatoriamente em três grupos: Grupo Controle Normal (GCN), Grupo Controle Lesionado (GCL) e Grupo Lesionado e Tratado (GLT), todos contendo 16 animais, subdivididos em subgrupos de 8 animais para análises no oitavo e décimo quinto dias após a lesão. Foram feitas lesões no músculo gastrocnêmio, por impacto de um pino de 320g solto sobre o músculo a 21cm de altura. A terapia laser foi iniciada com uma aplicação duas horas após a lesão e mais três aplicações em dias alternados. O grupo controle foi submetido a um tratamento semelhante com o aparelho laser desligado. Os músculos foram fixados em formol e processados em parafina. Foram feitas colorações com hematoxilina-eosina, vermelho picrossírius e fast green. As análises histomorfométrica indicaram que a terapia laser estimulou significativamente a deposição do colágeno nos músculos tratados em comparação aos músculos não tratados, tanto após oito dias quanto quinze dias após a lesão. A comparação da quantidade de colágeno nos músculos entre o oitavo e décimo quinto dias indicou também o aumento em sua produção na fase mais tardia da lesão. A análise histológica mostrou que não houve alterações no processo inflamatório, quanto ao número de fibroblastos, macrófagos e monócitos em relação aos grupos tratados e grupos controles. Portanto, concluiu-se que doses de 4/cm2 de Al-Ga-As do laser de 785 nm não promoveram mudanças quanto ao número de células do processo inflamatório e neovascularização, mas aumentaram a deposição de fibras colágenas entre as fibras musculares, sugerindo que a terapia laser estimula a síntese de colágeno. Palavras-chave: Lesão muscular, colágeno, laser 785 nm. Abstract: One of the physical therapeutic interventions for the injured muscles is the low potency laser irradiation. In this work, low potency laser of 785nm and energy density of 4 J/cm2 was used to test its effects on the inflammatory process and collagen’s fibers of skeletal muscles of rats after mechanical trauma. Forty-eight rats of Wistar lineage were used and randomly divided in three groups: Normal Control Group (NCG), Injured Control Group (ICG) and Injured and Treated Group (ITG), each one containing 16 animals, subdivided in 8 subgroups for analyses on the eighth and fifteenth days after the injury. Injuries were made in the gastrocnemius muscle, by the impact of a pin with 320g released on the muscle at 21 cm in height. The laser therapy application started 2 hours after the injury with three other applications in alternated days. The control group was submitted to a similar treatment with the laser equipment turned off. The muscles were stuck in * FESURV-Universidade de Rio Verde - GO. ** UFU - Universidade Federal de Uberlândia. *** Professor da UNIVAP. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 53 formol and processed in paraffin. Colorations were done with hematoxilyn-eosin, picrosirius red and fast green. The histomorphometric analysis indicates that the laser therapy stimulated significantly the collagens deposition in the treated muscles in comparison with non-treated muscles either after eight or fifteen days of the injury. The comparison of the collagen quantity in the muscles between the eighth and fifteenth days indicated the increase in their production at the injury’s later stage too. The histology analysis showed that there were not any alterations in the inflammatory process, in the number of fibroblasts, macrophages and monocytes in relation to the treated groups and control groups. Therefore, it was concluded that the 4J/cm2 of Al-Ga-As laser doses, didn’t provoke changes in the numbers of cells in the inflammatory process and neovascularization, but increased the collagen‘s fibers deposition between the muscles fibers, suggesting that the laser therapy stimulates the collagen synthesis. Key words: Muscle injure, collagen, laser 785 nm. 1. INTRODUÇÃO A perspectiva para a utilização do laser de baixa potência como forma terapêutica tem sido investigada desde a década de 60. Estes estudos mostram que esta forma de radiação pode estimular processos biológicos, em especial os processos de reparo tecidual (MESTER; KORENVI-BOTH; SPIRY; TISZA, 1975). Dentre os tecidos biológicos o músculo é o mais plástico, isto é, capaz de se remodelar frente a estímulos como atividade física, condições de nutrição, inervação, eletroestimulação, imobilização e alterações de condição hormonais (ROSE; ROTHSTEIN, 1982). O músculo esquelético é também um dos mais afetados por atividades esportivas e traumas decorrentes de atividades de vida diária. A rápida recuperação deste tecido mantendo suas propriedades mecânicas e desempenho é importante para o indivíduo lesionado em especial para atletas que necessitam de sua máxima eficiência durante as competições. Estas lesões muitas vezes exigem longo tempo de imobilização e uso de antiinflamatórios que podem provocar o aumento no número de fibras colágenas, bem como alterações em sua orientação espacial e diminuição da quantidade de fibras musculares. Estas alterações contribuem para mudanças nas funções e propriedades biomecânicas do músculo (TABARY et al., 1972; WILLIAN; GOLDSPINK, 1984; YAMAMOTO et al.; 1996; JARVINEN et al., 2002; MEDRADO; PUGLIESE; REIS; ANDRADE, 2003). O principal constituinte do tecido muscular são proteínas contráteis que por sua vez são envolvidas pelo tecido conjuntivo constituído por colágeno e elastina, as quais formam o endomísio, epimísio e perimísio. Estes envoltórios do tecido muscular dão ao músculo elasticidade e flexibilidade, além de ligar o músculo aos ossos e distribuir as forças da contração muscular. Após uma injúria, o músculo passa por um processo de regeneração das fibras musculares danificadas e a produção de 54 um tecido conjuntivo de cicatrização. Este tecido cicatricial em excesso pode ser uma barreira mecânica para inibir a regeneração muscular (FISHER et al., 2000; BODINER-FOWLER, 1994). A terapia laser de baixa potência apresenta efeito fotobiológico, estimulando a síntese de ATP, de colágeno, proliferação celular dentre outros eventos celulares. Dessa forma, podem ocorrer efeitos analgésicos, antiinflamatórios e reparadores. Porém, estes efeitos dependem de fatores como comprimento de onda do laser, dose e tempo de aplicação (KARU; PYATIBRAT; KALENDO, 1995; PEREIRA et al., 2002; BOURGUIGNON-FILHO et al., 2005). Estudos utilizando os lasers 904 e 632,8 nm sobre regeneração do músculo esquelético mostraram que o laser de 904nm não influenciou a regeneração muscular em músculo lesionado por miotoxina em camundongo (OLIVEIRA et al., 1999). Por outro lado, o ensaio utilizando laser de 632,8 nm, com capacidade menor de penetração, nas mesmas condições, influenciou a regeneração de modo dose dependente (AMARAL et al., 2001). Assim, é importante determinar o efeito da terapia laser sob diferentes condições de aplicação em lesões musculares. O presente trabalho avaliou o efeito da terapia utilizando densidade de energia de 4 J/cm2 do laser AlGa-As de 785nm sobre células do processo inflamatório e o colágeno do músculo gastrocnêmio de rato lesionado por impacto. 2. METODOLOGIA 2.1. Animais Neste trabalho foram aplicados os princípios éticos da experimentação animal de acordo com o COBEA (Colégio Brasileiro de Experimentação Animal), tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Univap, protocolo n° L098/2005/CEP. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Foram utilizados 48 ratos (Rattus norvergicus), machos da linhagem WISTAR, de mesma idade (70 dias), sexo e massa corporal. Os ratos foram mantidos dentro das condições ideais para sua espécie, ou seja, temperatura a 25°C, umidade 40% e luminosidade dia/noite de 12 horas e ventilação adequada e ração sólida e água ad libitum enquanto durou o estudo. • Pino de impacto: Tem por função fazer contato com o local do animal a ser lesionado, com massa de 320 g. O pino foi posicionado sobre o músculo gastrocnêmio do rato e solto, causando um impacto que provocou lesão muscular. 2.2. Grupos experimentais Os animais foram divididos em três grupos, sendo 16 não lesionados, 16 lesionados não-tratados e 16 lesionados e tratados. Os grupos por sua vez foram subdivididos em dois subgrupos com 8 ratos. Cada subgrupo foi sacrificado no 8º e 15º dias após o início do experimento. 2.3. Mecanismo de lesão Os animais foram anestesiados com quetamina a 5% e xilasina a 2% na proporção de 1:4 em dose de 0,10 a 0,15 mL/100g de massa corporal, sendo feito em seguida a tricotomia delimitando a área a ser contundida. Na região caudal da perna direita. Optou-se por utilizar uma forma de produção de lesão que se assemelhasse ao que ocorre na prática de esportes, bem como em atividades de vida diária. Assim, foi utilizado o aparelho promotor de lesa o qual possibilita a realização de lesões por meio de impacto (Fig. 1). O equipamento promotor de trauma mecânico (PTM) em sua estrutura geral é formado por uma base fixa, um trilho fixo, um suporte móvel e um pino de impacto como descrito a seguir: • Base fixa: Tem por finalidade a sustentação de todo o aparelho, bem como servir de base para colocação dos animais em disposição previamente calculada para que a lesão fosse implantada de conformidade com o objetivo inicial; • Trilho fixo: Parafusado na base fixa, tem por fim servir de trilho por onde irá correr o suporte móvel. Trata-se de uma estrutura quadrangular, o que impede que se altere a trajetória da haste e que esta atinja necessariamente o ponto determinado, funcionando assim como o corredor por onde se deslocará a peça móvel; • Suporte móvel: Em uma de suas extremidades combina-se com o trilho fixo, onde realiza movimento de deslocamento vertical, motivado pela ação da aceleração gravitacional. Por outra extremidade liga-se ao pino de impacto, possuindo a capacidade de ser regulada, mas que no momento da indução da lesão permanece ajustada em altura previamente estabelecida; Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Fig. 1 - Equipamento promotor de trauma mecânico (PTM). 2.4. Terapia com Laser As-Ga-Al 785 nm O equipamento utilizado foi o Laser Physiolux Dual (Bioset Brasil) com freqüência de trabalho de 2000 Hertz e comprimento de onda de 785 nm – Arseneto de Gálio e Alumínio – infravermelho, e LASER em emissão contínua, com densidade de energia de 4J/cm2, potência de pico de 70 mW, área do feixe de 0,08cm2 e regime de emissão contínua. A aplicação da radiação laser Al-Ga-As foi iniciada no primeiro dia, duas horas após a lesão, pelo método transcutâneo pontual em apenas um ponto, com dose de 4J/cm2. Os animais foram posicionados sobre uma plataforma, em decúbito ventral com hiperextensão do membro inferior direito. A terapia laser foi realizada no 1º, 3º, 5º e 7º dia após a lesão. A incidência da irradição foi realizada diretamente sobre a pele da região lesionada, com o contato direto da caneta sobre esta região em ângulo de 90º. Os animais controle também receberam o mesmo tipo de manipulação, porém com o equipamento laser desligado. 2.5. Análise histomorfométrica do colágeno Ao final de cada fase experimental, os animais foram sacrificados com dose excessiva de anestésico via intraperitoneal. Em seguida, os músculos gastrocnêmios foram retirados por meio de equipamentos cirúrgicos. Os músculos foram fixados em formol 12% e colocados em parafina. Foram feitos cortes transversais de 9 mm e processados para coloração hematoxilina-eosina (HE), vermelho picrossírius e fast green. 55 A coloração por vermelho picrossírius permite identificar fibras colágenas pela cor vermelha. A coloração do colágeno foi executada usando uma modificação dos métodos combinados descritos por Sweat et al (1964) e Dolber e Spach (1987). Inicialmente as lâminas foram imersas por 2 minutos em cubeta contendo solução de ácido vermelho picrossírius, (sirius red e solução saturada de ácido pícrico) por 90 minutos. As amostras foram enxaguadas por 2 minutos em solução 0,01 NHCl, seguido pelo enxágüe por 1 minuto em etanol 70%, etanol 100% e xilol. A coloração por fast green evidencia as fibras musculares em verde, permitindo o contraste com as fibras colágenas em vermelho para a realização da análise morfométrica dos tecidos conjuntivos. As imagens dos cortes histológicos foram obtidas em microscópio Olympus Triocular BX40 acoplado à câmera Olympus-200, ligada a um computador PC através de placa digitalizadora Data Translation 3153 com objetivas de 10X e 40X. As quantificações morfométricas do colágeno foram feitas a partir da binarização da imagem no programa HLimage. Neste, o colágeno em vermelho se torna preto em contraste com a coloração verde do músculo, que se torna branca. O programa calcula a área em preto, resultando na porcentagem de colágeno. 2.6. Análise estatística Todas as variáveis aferidas no estudo foram analisadas com o auxílio do programa SPSS 12.0 para Windows. A expressão dos valores está demonstrada em média aritmética e desvio-padrão, submetido ao teste estatístico Wilcox ANOVA e t-Student. O nível de significância estabelecido foi de 5 %(p<0,05). 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1. Aspectos da lesão e do processo inflamatório do músculo gastrocnêmio em recuperação Ao exame in vivo, 24 horas após a lesão, foi observado aumento na espessura do músculo, caracterizando edema, movimento de retirada do membro à palpação e hiperemia local. À luz da microscopia óptica observou-se que o mecanismo de lesão utilizado neste estudo promoveu separação das fibras musculares sem, no entanto, apresentar características de injúria muscular como split fibres e núcleos centralizados (Fig. 2). Fig. 2 - Corte transversal do músculo gastrocnêmio corado com HE, 24 horas após a lesão. Seta: fibra muscular; seta pontilhada: fibroblasto; seta ondulada: células gigantes. Barra: A- 100 µm e B- 25 µm. Oito dias após a lesão por impacto todos os músculos gastrocnêmios lesionados tanto do grupo irradiado quanto não-irradiado mostraram a presença de células do processo inflamatório como: células gigantes, mononucleados (macrófagos, monócitos) e fibroblastos. Foi observado também que a neovascularização ocorreu em ambos os grupos, porém não há diferença estatisticamente significante entre a quantidade de células e de vasos neoformados quando comparados os grupos tratados e não tratados. Após 15 dias de lesão, observa-se ainda a presença de células relacionadas ao processo inflamatório e neovascularização, tanto no grupo de animais lesionados quanto no grupo de animais lesionados e tratados, po56 rém, sem diferença estatística entre os grupos. A comparação entre os grupos tratados oito e quinze dias após a lesão também não mostrou diferença estatística significativa entre número de células inflamatórias e neovascularização, sugerindo que a terapia laser não influenciou a evolução do processo inflamatório. A terapia laser é um dos recursos utilizados em tratamentos fisioterapêuticos aplicados desde a superfície do organismo como em casos de cicatrização da pele, ao tratamento de lesões em tecidos profundos, como o osso (BOURGUIGNON-FILHO et al., 2005). Neste trabalho foi utilizada a terapia laser de baixa potência no comprimento de onda de 785nm. Esta escolha baseou-se em estudos reaRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 lizados por Karu (2003), os quais mostram que os comprimentos de onda com maior potencial para penetração capazes de atravessar o tecido epitelial estão entre 750 a 800 nm estando, portanto, o comprimento de 785nm, dentro da faixa indicada como capaz de atingir a camada muscular. A literatura traz que a aplicação da radiação laser durante a fase aguda diminui o processo inflamatório (STAINKI et al., 1998; SCHINDL et al., 2000); baseado nestas informações foi decidido iniciar o protocolo de aplicação logo após a lesão, seguida de três aplicações em dias alternados. Neste trabalho foi observado que não houve alterações no número de células relacionadas ao processo inflamatório. Vários trabalhos utilizando o laser As-Ga tanto em lesão muscular por miotoxina quanto em cultura de células também demonstram o mesmo efeito (BOUMA et al.., 1996; OLIVEIRA et al., 1999). Vários trabalhos sugerem a eficácia da terapia laser de baixa potência e baixa intensidade de energia para promover a diminuição do processo inflamatório como a diminuição do edema. Porém, poucos trabalhos foram realizados a fim de verificar o efeito da terapia laser sobre a migração de células para locais de inflamação. 3.2. Análise histomorfométrica do colágeno no músculo lesionado No oitavo dia após a lesão, observou-se que o grupo irradiado apresentou as fibras colágenas distribuídas entre as fibras musculares (Fig. 3). A quantificação do colágeno mostrou que ela é maior no grupo irradiado, sugerindo que a terapia laser estimulou sua produção (p = 0,000) (Fig. 4). Após quinze dias da lesão, observou-se ainda a maior quantidade de colágeno no grupo irradiado com diferença estatisticamente significante (p=0,001) (Fig. 4). A comparação da quantidade de colágeno entre o oitavo e décimo quinto dias nos grupos irradiados mostrou também maior quantidade de colágeno no décimo quinto dia (p= 0,003) sugerindo que o estímulo à produção de colágeno continuou (Fig. 4). Fig. 3 - Análise histológica do tecido muscular com 8 das após lesão: A – grupo lesionado não-tratado (GCL); B – grupo controle lesionado e tratado (GLT); C – grupo controle normal (GCN). Análise histológica do tecido muscular com 15 dias após lesão: D – Grupo lesionado e tratado (GLT); E – grupo controle lesionado não-tratado (GCL); F – grupo lesionado e tratado (GCN). Picrosirius e fastgreen (barra = 100 µm). Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 57 Fig. 4 - Gráfico da porcentagem de colágeno do músculo gastrocnêmio lesionado após a irradiação de 4J/cm2 de laser 785 nm. GCN – grupo controle normal, GCL – grupo controle lesionado, GLT - grupo lesionado e tratado (8 e 15 dias). O músculo é também constituído por tecido conjuntivo, o qual é composto principalmente de fibras colágenas, produzidas por fibroblastos que formam estruturas que envolvem o tecido muscular, sendo importantes para distribuir forças geradas pelas fibras musculares e na fixação dos músculos aos ossos. Após uma lesão, o colágeno pode atuar no processo de cicatrização com o aumento de sua produção. Esta cicatrização por sua vez pode ser desvantajosa quando contribui para diminuir a capacidade funcional do tecido. Dessa forma, é importante compreender o efeito da terapia laser sobre o colágeno que envolve o tecido muscular. A terapia laser é um método muito usado dentro dos mais variados protocolos empregados, e o que se tem visto é que a terapia laser, apesar de muito estudada, ainda gera controvérsias e dúvidas sobre seu efeito na cicatrização do tecido muscular. De acordo com Letho et al. (1985), a produção de colágeno em músculo lesionado inicia-se dois dias após a lesão e é mais intensa entre os 5º e 21º dias e diminui logo após. No presente estudo observou-se que no 8º e 15º dia ainda havia produção de colágeno. Como não foi observada a proliferação de fibroblastos sugere-se que a irradiação laser estimulou a síntese de colágeno. A utilização de terapia laser 904 nm na dose de 4 J/ cm2 promoveu a deposição de colágeno em tendões de ratos submetidos à tenotomia do tendão calcâneo tanto na fase inicial quanto tardia da lesão (TAVARES et al., 2005). Estudos realizados por Reddy et al. (1998) mostram que a terapia laser estimula a produção de colágeno em tendão lesionado por cirurgia. Análises bioquímicas 58 revelaram que a quantidade de ligações cruzadas entre as fibras colágenas do grupo tratado era semelhante ao grupo controle indicando que a terapia laser atua de maneira a acelerar a renovação do colágeno. Quando uma terapia laser é aplicada podem-se obter efeitos tanto estimulatórios quanto inibitórios sobre a proliferação celular ou ativação de seu metabolismo. A lei de Arndt-Schultz indica que existem densidades que não alteram a resposta biológica, doses que estimulam e doses que inibem a resposta (SOMMER et al., 2001). Estudos in vitro utilizando laser de 904 nm mostraram que a irradiação de 3 a 4 J/cm2 promove o aumento do número de fibroblastos e que a dose de 5 J/cm2 não surtiu efeitos sobre o crescimento celular (PEREIRA et al., 2002). Já Schindl et al. (2000) encontraram que em cultura de fibroblastos doses acima de 10 J/cm2 inibem a produção de colágeno. A dose de 4 J/cm² escolhida neste estudo foi utilizada na expectativa de abordar sua eficiência no rearranjo do colágeno e eficácia quanto ao parâmetro biomodulador sobre fibras colágenas. Skinmer et al. (1996) encontraram que a radiação laser de 904 nm em cultura de fibroblastos aumentou a síntese de colágeno e não alterou o número de células, resultado também demonstrado em nosso experimento com o laser de 785nm. Eles encontraram também que a síntese de colágeno foi maior quando foram feitas aplicações por mais de quatro dias. Pogrel et al. (1997), ao utilizarem radiação laser de 830 nm, com diferentes doses e tempos de aplicação, em cultura de fibroblastos, encontraram que não houve estímulo à proliferação, migração e adesão de fibroblastos. Outros trabalhos, utilizanRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 do o mesmo comprimento de onda, mostraram que este atua sobre o processo de cicatrização acelerando suas fases, abreviando a fase de exudação e acelerando a fase de reparação, e, ainda, diminuindo o edema, melhorando o tecido de granulação nas lesões, estimulando a proliferação de fibroblastos e miofibrosblastos e, deste modo, aumentando a deposição organizada de colágeno, além de estimular a formação de retículo endoplasmático, de mitocôndrias e de miofibrilas (MEDRADO et al., 2003; PUGLIESE et al., 2003). Outro trabalho utilizando comprimentos de onda de 635 nm e 780 nm, próximos ao utilizado neste trabalho, mostrou não haver efeito sobre o crescimento do colágeno. E ainda o laser a 3-4 J/cm² tem intenso efeito sobre o crescimento do colágeno (PEREIRA et al., 2002). A recuperação muscular pode ocorrer também pelo reparo do tecido muscular por meio do preenchimento da área de lesão por células miogênicas, as quais irão recuperar a fibra lesionada ou pela formação de nova fibra muscular a partir de células mio-precursoras (ROTH; ORUN, 1985). Neste trabalho não foram observadas alterações no tamanho da fibra, na posição do núcleo que pudessem indicar a regeneração muscular tanto no grupo tratado quanto no controle. Oliveira et al. (1999), em seus estudos sobre o efeito do laser AsGa (904 nm) com doses de 3 e 10 J/cm 2 na regeneração de músculo esquelético lesionado com miotoxina, observaram também que ambas as doses não promoviam efeitos sobre o processo de regeneração muscular. Amaral et al., (2001) avaliaram o efeito do laser HeNe com comprimento de onda de 632,8 nm e potência de 2,6 mW, com doses 2.6, 8,4 e 25 J/cm2 aplicados durante cinco dias consecutivos, sobre a pele do músculo tibial anterior lesionado, e constataram que somente a dose de 2.6 J/cm2 proporcionou aumento da fibra muscular e densidade mitocondrial. A organização do colágeno no músculo sadio ou lesionado é de suma importância para a funcionalidade muscular, podendo o excesso aliado à desorganização causar barreiras mecânicas que inibem a função e/ou regeneração muscular. No campo da fisioterapia, a reabilitação com sucesso depende do retorno da funcionalidade do músculo acometido; vários protocolos de tratamentos são empregados com o objetivo de promover uma restauração tecidual rápida, mas sem alteração nas atividades normais. Este trabalho permite concluir que a aplicação de 4J/cm2 da irradiação laser de 785 nm pode promover a síntese de colágeno. Porém, este efeito pode não ser favorável à funcionalidade do músculo por ser um tecido de cicatrização. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 4.AGRADECIMENTOS Agradecemos à Empresa Bioset Indústria de Tecnologia Eletrônica Ltda à cessão da caneta 785nm de As-Ga-Al, à Universidade Federal de Uberlândia pela disponibilidade para utilização do Biotério e Laboratório de Bioquímica (LABIBI) e Laboratório de Morfologia. 5. REFERÊNCIAS AMARAL, A. C.; PARIZOTTO, N. A.; SALVINI, T .F. Dose-dependency of Low-energy HeNe laser effect in regeneration of Skeletal muscle in mice. Lasers Med Sci. v. 16, pp. 44-51, 2001. BODINER-FOWLER, S. Skeletal muscle regeneration after injury: an overview. Journal of Voice. v. 8, pp. 53-62, 1994. BOUMA, M. G.; BUURMAN, W. A.; VAN DEN WILDENBERG, F. A. Low energy laser irradiation fails to modulate the inflammatory function of human monocytes and endothelial cells. Lasers Surg. Med. v. 19, pp. 207215, 1996. BOURGUIGNON-FILHO, A. M.; FEITOSA, A. C. R.; BELTRÃO, G. 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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Inflamação Pulmonar Induzida por Lipopolissacarídeos (LPS) e sua Contribuição como Instrumento de Pesquisas Daniel de Souza Ramos * Newton Soares da Silva ** Wellington Ribeiro ** Resumo: O sistema imunológico é responsável pela defesa do organismo contra infecções. Por muito tempo o homem vem buscando formas de reproduzir os quadros dessas doenças, com o objetivo de desenvolver tratamentos eficazes e seguros. Os lipopolissacarídeos (LPS) têm sido uma ferramenta muito importante para o conhecimento da ação tóxica das bactérias gram-negativas e para o entendimento de como o sistema imune combate tais invasores. Faz-se aqui uma breve revisão sobre as pesquisas, quais as novas descobertas e quais os novos caminhos que estão sendo traçados nessa área de estudos. Palavras-chave: Inflamação pulmonar, LPS. Abstract: The immune system is responsible for the defense of the organism against infections. For a long time man has been searching forms to reproduce the pictures of these illnesses, with the objective to develop efficient and safe treatments. The lipopolysaccharide (LPS) has been a very important tool for the knowledge of the toxic action of the gram-negative bacteria and for the understanding of how the immune system combats such invaders. This paper does a brief review about the researches, the new discoveries, and the ways being traced in this area. Key words: Lung inflammation, LPS. 1. INTRODUÇÃO O organismo humano está em constante suscetibilidade a infecções por microorganismos e bactérias, que, dependendo de seu componente de toxicidade, podem vir a causar quadros infecciosos letais. Contudo, o processo de evolução da espécie nos qualificou com a capacidade imunológica, que pode se apresentar na forma adquirida, o que nos torna capazes de criar defesas fisiológicas contra as agressões, e na forma inata, que envolve processos gerais, como a fagocitose (BRODER et al., 1994; COLVIN et al., 1994; GRANSTEIN, 1994). Com as constantes alterações climáticas, alimentares e de hábitos de vida, é cada vez maior a incidência de novas doenças ligadas ao sistema respiratório (SR) (ABBEY et al., 1993; BOBAK, 2000; BRAGA et al., 1999; COMMITTEE OF THE ENVIRONMENTAL AND OCCUPATIONAL HEALTH, 1996; DOMINICI et al., 2002). Posto isto, as pneumonias permanecem em um patamar de destaque, alardeando o mundo com ocorrências mais precoces e letais entre as populações. Segundo a Organização * Mestrando em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006. ** Professor da UNIVAP. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Mundial de Saúde, as doenças respiratórias agudas (DRA) em crianças não somente ocorrem, com maior freqüência, como também são mais letais.(BERMAN et al.,1990; SHANN, 1986; MCINTOSH, 2002; HEMMING, 1994). Em 1985 pela primeira vez, a Chlamydia pneumoniae foi reconhecida como agente etiológico de infecção respiratória no ser humano (SAIKKU et al., 1985). Atualmente é identificada como um agente de pneumonia atípica e infecção respiratória alta (GRAYSTON et al., 1986; GRAYSTON et al., 1990; GRAYSTON, 1994), estimando-se que 5 a 15% de todos os casos de pneumonia se associem a Chlamydia pneumoniae (PRINCIPI et al., 2001; KUO et al., 1995).O único sorotipo identificado até a data denomina-se TWAR (SAIKKU et al., 1985; GRAYSTON et al., 1986), A Chlamydia pneumoniae é uma bactéria intracelular obrigatória, com um ciclo de vida bifásico, uma forma extracelular infecciosa e uma forma intracelular metabolicamente ativa. Dois a três dias depois da invasão ocorre infecção de novas células hospedeiras. A bactéria multiplica-se nos macrófagos alveolares, células do músculo-liso e células endoteliais, induzindo alterações nos cílios do epitélio pulmonar (KAUPPINEN; SAIKKU, 1995). A Chlamydia pneumoniae transmite-se pelo trato respiratório, ocorrendo primariamente em crianças dos cinco aos quinze 61 anos de idade, as reincidências de infecções são freqüentes, mas estima-se que 50% dos adultos tenham anticorpos para este agente (GRAYSTON et al., 1990; NIKI; KISHIMOTO, 1996; BLASI et al., 1998). Embora nosso sistema imunológico produza anticorpos e a medicina conte, hoje, com uma gama variada de vacinas para o combate a infecções, existem bactérias que liberam substâncias, como os lipopolissacarídeos (LPS), que são os componentes tóxicos das bactérias gramnegativas (BA, 1998), cujo grau de toxicidade em um quadro avançado da infecção acarreta um processo inflamatório degenerativo danoso ao tecido, conhecido como síndrome da disfunção múltipla dos órgãos (MDOS) (BEAL; CERRA, 1994), pois, na tentativa de conter a inflamação, nosso organismo lança mão de suas células de defesa como macrófagos e neutrófilos que se deslocam até o local onde o agente invasor está agredindo o organismo. Estes, por sua vez, liberam uma variada quantidade de sinalizadores que desencadeiam novas cascatas, ativando outros mecanismos de defesa e citocinas, como o fator de necrose tumoral (TNF), a interleucina-1 (IL-1) e interleucina-6 (IL-6) que trabalham degradando o agente invasor (CAVAILLON et al., 1990). Vários estudos relataram associações da imunidade inata a variações nos genes que codificam proteínas especificas, como as TLRs, TNFa, CD14, e proteína crescente bactericidal/permeabilidade (COHEN, 2002; ARCAROLI et al., 2005). Hoje, a Medicina tem procurado soluções eficazes e que tragam menos conseqüências posteriores ao organismo afetado. Algumas linhas de pesquisas têm encontrado substâncias que, além de possuírem funções bem definidas no organismo, podem contribuir para o desenvolvimento de novos tratamentos. Um bom exemplo são as lipoproteínas dos HDL (EMANCIPATOR et al., 1992). A partir do contexto exposto buscaremos definir um panorama dos métodos mais utilizados e das descobertas que surgem nas variadas linhas de pesquisas afins. Essa revisão apenas objetiva demonstrar o papel dos métodos que reproduzem quadros infecciosos, utilizando como ferramenta lipopolissacarídeos. E com isso, de uma maneira geral, demonstrar como estão sendo traçados os caminhos, para que, quem sabe num futuro próximo, o organismo humano não esteja desprovido de defesa contra as inflamações e, por outro lado, deixar um horizonte de opções de linhas de estudo para que novos pesquisadores possam vir a dar suas contribuições, para o desenvolvimento de novas vacinas e tratamentos contra invasões bacterianas e para a compreensão da capacidade de adaptação dos mecanismos de defesa do organismo humano. ram reproduzir as condições infecciosas da ação dos LPSs em camundongos (BERMAN et al., 1990; SHANN, 1986; MCINTOSH, 2002; HEMMING, 1994; TATE; REPINE, 1983; WEILAND et al., 1986; WOTHERN et al., 1987; NEWMAN, 1985 ). Esse processo se dá a partir da administração intraperitonial ou através da instilação nasal dos LPSs (TATE; REPINE, 1983; WEILAND et al., 1986; WOTHERN et al., 1987; NEWMAN, 1985 ). Podemos facilmente através desse modelo dosar o grau de toxicidade desejado e determinar um estudo dirigido a uma infecção aguda ou crônica. Durante os quadros inflamatórios percebe-se que a resposta imune inata possui um leque de opções para proteger o organismo do agente invasor, contudo não podemos esquecer que alguns dos mecanismos de defesa utilizados podem reverter suas função de proteção, tornando-se desencadeadores de ferimentos que comprometem o tecido afetado. Estudos recentes buscam encontrar respostas para a ação de vários reguladores do processo inflamatório. Os Nrf2 e a família dos receptores TLR parecem ter um papel importante na organização da defesa imunológica inata (BEUTLER et al., 2003; MEDZHITOV; JANEWAY JR, 2000). O receptor TLR4 é capaz de detectar vários LPSs diferentes (CHOW et al., 1999), mas muitos artigos apresentam diferentes resultados com relação aos papéis desse receptor (CHAPES et al., 2001; CHEN et al., 2004; FAURE et al., 2004; HART et al., 2003; LETTINGA et al., 2002; MANN et al., 2004; SCHURR et al., 2005; SING et al., 2003). Higgins e outros descreveram uma aplicabilidade diferente para TLR4 durante a infecção com parapertussis do B. Em seu modelo, o TLR4 parece ser mais importante para desenvolver a imunidade adaptável, atuando nas respostas reguladoras (HIGGINS et al., 2003). Vários modelos caracterizam-se pelo aumento da permeabilidade vascular, acúmulo e ativação de neutrófilos e macrófagos, levando-os a liberarem inúmeras citocinas, enzimas proteolíticas, espécies reativas de oxigênio e nitrogênio e metabólitos do ácido araquidônico (GOODMAN et al., 1996; ROSSEAU et al., 2000; FREVERT et al., 1995; KOPYDLOWSKI et al., 1999). Inúmeros desses produtos atuam como sinalizadores para as células que constituem as vias aéreas (músculo liso e células epiteliais principalmente) e o parênquima pulmonar (pneumócitos tipo II), levando-as a liberarem citocinas e fatores de crescimento, contribuindo para a perpetuação da inflamação, o que cronicamente leva a um remodelamento das vias aéreas e parênquima pulmonar, causando alterações estruturais funcionais dos pulmões (NAGASE; WOESSNER, 1999; MURPHY; DOCHERTY, 1992). 3. CONCLUSÕES 2. DISCUSSÃO Sendo as inflamações pulmonares motivo de grande parte das mortes registradas, muitos estudos procu62 Diante do volume de experimentos que fazem uso dos lipopolissacarídeos conclui-se que sua utilização já é consolidada no meio científico. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Nota-se que as células do sistema imunológico exercem funções variadas e determinadas pelo fator infeccioso. Estudos recentes têm encontrado novas citocinas e receptores, deixando claro que ainda não estão totalmente definidos os mecanismos específicos de ação do sistema imune. CHAPES, S. K. et al. MHCII, Tlr4 and Nramp1 genes control host pulmonary resistance against the opportunistic bacterium Pasteurella pneumotropica. J. Leukoc. Biol., n. 69, pp. 381-386. 2001. CHEN, W. et al. Toll-like receptor 4 (TLR4) does not confer a resistance advantage on mice against low-dose aerosol infection with virulent type A Francisella tularensis. Microb. Pathog., n. 37, pp. 185-191. 2004. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABBEY, D. E. et al. Long-term ambient concentrations of total suspended particulates, ozone, and sulfur dioxide and respiratory symptoms in a nonsmoking population. Arch Environ Health, v. 48, n. 1, pp. 33-46.1993. ARCAROLI, J.; FESSLER, M. B.; ABRAHAM, E. Genetic polymorphisms and sepsis. Shock. n. 24, pp. 300-312. 2005. BA, D. N. (Ed.). 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O Brasil é considerado o país da megadiversidade, com 15 a 20% do número total de espécies do planeta; conta com a mais diversa flora do mundo, número superior a 55 mil espécies descritas. Diante da necessidade de preservação surgiram movimentos que deram origem ao conceito de desenvolvimento sustentável, como o Clube de Roma, em 1968, 1ª Conferência Sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo, 1972, e o relatório de Brundtland proposto pela ‘Comissão Mundial do Desenvolvimento e Meio Ambiente’, e, mais recente, em março de 2006, a COP8, “Oitava Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica”, realizada no Brasil. E como ferramenta para a preservação da biodiversidade surge a ecotoxicologia, a qual desenvolve pesquisas que focalizam degradação ambiental, saúde pública e preservação de recursos naturais. A ecotoxicologia realiza a importante tarefa da avaliação do risco ambiental, sendo os estudos ecotoxicológicos fundamentais para a sociedade desenvolver planos de recuperação de ecossistemas degradados e conservação da biodiversidade. Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável, organoclorados, metais pesados, ecotoxicologia. Abstract: It is relevant to highlight the natural resources utilization as source of energy during the Industrial Revolution, which led to an environmental crisis. Pesticides, such as insecticides, herbicides and fungicides, denominated xenobiotics were introduced in the beginning of the 20th century to combat agricultural plagues. Another pollutant class is the heavy metals, which are consequence of the commercial scale production. The anthropogenic global cycle resulted in the presence of heavy metals and the accumulating effects through the trophic chain can be observed either in the terrestrial or in the aquatic environment affecting biodiversity. Brazil is considered one of the countries with great diversity. The country holds 15 to 20% of the total number of species of the planet and has the largest diversified flora of the world, a number higher than 55 thousand described species. Due to the need for preservation, movements were created with the concept of sustainable development for example the Club of Rome, in 1968, The 1st Stockholm Conference on Environment, in 1972, the Brundtland report proposed by the ‘World Commission for Development and Environment and more recently, in March 2006, the COP8 “Eighth Conference of the Parties in the Biological Diversity Convention”, held in Brazil. Ecotoxicology emerges in this scenery as a tool for the preservation of the biodiversity, and develops research that focus on the environmental degradation, public health and natural resources preservation. Ecotoxicology performs the important task of evaluating the environmental risk, where ecotoxicolgy studies are fundamental for the society to develop plans to recover degraded ecosystems and the conservation of the biodiversity. Key words: Sustainable development, organochlorines, heavy metals, ecotoxicology. * Mestranda em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006. ** Professor(a) da UNIVAP. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 65 1. INTRODUÇÃO Desde os primórdios da humanidade, a natureza, a grande fonte de inspiração dos filósofos gregos, era referência fundamental para existência humana e o homem era visto como parte integrante desse conjunto de fenômenos. Todavia, na Idade Média, o homem começou a se afastar da natureza e, com o advento do cristianismo, a forma de ver a natureza passou a refletir interesses das classes dominantes, sendo pensada e interpretada através das Sagradas Escrituras. Nos séculos XV e XVI o Renascimento trouxe a reformulação da idéia sobre a natureza “divina” e o rompimento entre a ordem divina e ordem humana. Estas novas linhas de pensamento, segundo Rocha (2005), levaram a um carácter antropocêntrico de domínio da natureza e o anseio de controlá-la. Já no século XVII a tese de Galileu Galilei (1564 – 1642) derruba a visão clássica do mundo - o Geocêntrismo, adotada pelo cristianismo na perspectiva de São Tomás de Aquino (1224 – 1274) e então a ciência revela o carácter obscuro da natureza utilizando a experimentação e a matemática. Assim, a ciência no século XVIII estabeleceu a razão como essência e idealizou a natureza como um recurso infinito a ser explorado e juntamente a descobertas e desenvolvimentos tecnológicos culminou a Revolução Industrial, que, durante sua primeira fase, levou ao aparecimento das classes rurais e urbanas, implementou um sistema baseado no capital e trabalho assalariado, o capitalismo (ROCHA, 2005). É importante destacar a importância dos recursos naturais como fonte de energia nesse novo sistema. Na primeira fase da revolução industrial – de 1780 a 1860, revolução do carvão e do ferro – levou a mecanização da indústria e da agricultura. Na segunda fase de revolução industrial – de 1860 a 1914, revolução do aço e da eletricidade – surgiram os primeiros automóveis na Alemanha e Estados Unidos, e novas e revolucionárias formas de organização de negócios foram implementadas, em decorrência da acumulação de capital, tais como: formações de cartéis e fusões empresariais. À medida que os países se industrializavam incrementava-se a produção de alimentos e a melhora nas condições sócio-econômicas e sanitárias e conseqüentemente a redução da taxa bruta de mortalidade e conseqüente aumento da taxa de crescimento populacional. A partir desse novo contexto sócio-econômico, o meio ambiente começou a receber de forma crescente os resíduos industriais e domésticos, impactando-o e conseqüentemente os recursos naturais. Estes novos pa66 drões de geração de resíduos surgiram em quantidades maiores que a capacidade de absorção da natureza, dando origem a problemas ambientais, como carência de recursos e perda da biodiversidade. Mediante toda a problemática ambiental, surgem as grandes reuniões ambientais a partir da década de 60 e grandes tratados visando a proteção do meio ambiente. Dentro de todo esse debate, o meio científico vem buscando conhecimentos para sustentar as previsões desastrosas do descuido com o meio ambiente e trilhando caminhos para seu uso sustentável, preservando a biodiversidade do nosso planeta. A ecotoxicologia surge nesse momento como grande ferramenta para validar estudos, pelos quais os decisores podem se basear nessa grande tarefa da preservação. 2. BIODIVERSIDADE “Diversidade biológica” significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas. (Artigo 2 da Convenção sobre Diversidade Biológica) Ninguém conhece, ainda, o número total de espécies existentes na Terra, todavia, aproximadamente, 1.500.000 espécies de plantas e animais em todo mundo foram descritas. Alguns especialistas estimaram que a contagem final possa atingir entre 10 e 30 milhões, porém estudos realizados recentemente em florestas tropicais sugerem que pode haver 30 milhões de espécies apenas de insetos (WILSON, 1997). A atividade antrópica vem ocasinando constante impacto em populações de espécies e uma quantidade significativa está sendo sistematicamente destruída. Presentemente especialistas têm voltado sua maior atenção às florestas tropicais, porque embora cubram apenas 7% da superfície terrestre, elas contêm mais da metade das espécies da biota mundial e estão sendo destruídas e exploradas de maneira agressiva muito rapidamente. Atualmente, menos de 5% das florestas estão protegidas em forma de parques e reservas e estão vulneráveis a pressões políticas e econômicas. De acordo com Wilson (1997), persistindo os atuais níveis de remoção das florestas, dentro de um século haverá perda de 12% de 704 espécies de aves na bacia amazônica, e de 15% de 92000 espécies de plantas nas Américas Central e do Sul. É importante salientar que a biodiversidade é a Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 fonte mais importante de recursos naturais na Terra, dependem dela a agricultura, a medicina e a indústria, sendo sua conservação dependente da amplitude de cada espécie, de procriação múltipla que apresentam complexos padrões de variabilidade genética. Desta maneira, mesmo que uma espécie em perigo seja salva da extinção, dependendo do número de indivíduos, ela provavelmente terá perdido muito da sua diversidade genética. O Brasil é considerado o país da megadiversidade, com 15 a 20% do número total de espécies do planeta; conta com a mais diversa flora do mundo, número superior a 55 mil espécies descritas. A Amazônia, a Mata Atlântica e o Cerrado são exemplos de ecossistemas mais ricos do planeta e estão localizados em delimitacões brasileiras. Levando em consideração estas informações temos muito clara a importância do Brasil nesse atual conceito de recursos naturais e riqueza genética, assim como o valor de se estabelecerem diretrizes políticas e educacionais para sua conservação. 3. CONTAMINANTES NO ECOSSISTEMA composto organoclorado que foi sintetizado inicialmente em 1800 na Alemanha. Estas podem apresentar diversas substituições possíveis em relação à quantidade de átomos de cloro, as quais variam de 1 a 10 átomos, podendo ser obtidos até 209 estruturas diferentes denominadas congêneres. A produção industrial das PCBs iniciou em 1920, mas somente depois de mais de 40 anos, em 1966, foi reconhecido como contaminante ambiental . Em 1970 teve seu auge na produção com 50.000 toneladas, sendo a indústria eletro-eletrônica a maior consumidora (PENTEADO e VAZ, 2001). As PCBs foram muito difundida devido principalmente as suas propriedades físico-químicas, como são a alta constante dielétrica e a elevada estabilidade térmica. Segundo Penteado e Vaz (2001), devido a esse grande emprego, o acúmulo mundial dessa substância foi aproximadamente de 1.200.000 toneladas, e deste total cerca de 60% foi utilizado em transformadores e capacitores, 15% para fluídos de transferência de calor e 25% como aditivos na formulação de plastificantes, tintas, adesivos e pesticidas. Cerca de 40% ou 300.000 toneladas entrou no ambiente e grande parte do restante está em uso em equipamentos eletro-eletrônicos antigos. 3.1 Organoclorados Os denominados xenobióticos (inseticidas, herbicidas e fungicidas), compostos orgânicos estranhos, são continuamente descartados no ambiente por comunidades urbanas e industriais. No século passado, muitos milhares de substâncias orgânicas, como bifenilas policloradas (PCBs), praguicidas organoclorados, dibenzofuranos policlorados e dibenzo-p-dioxinas foram produzidos e uma considerável parcela liberada no meio ambiente. Em 1940, Paul Müeller observou que o DDT (diclorodifeniltricloroetano) era um potente inseticida e seu uso rapidamente se implementou. Durante a Segunda Guerra Mundial, na Itália, o DDT em pó foi pulverizado na pele da população para prevenir epidemias de tifo transmitida por vetores. Müeller recebeu prêmio nobel de medicina em 1948, pelas milhões de vidas salvas pelo DDT. O poder residual do DDT, considerado como qualidade positiva, começou a ser encarado como sério inconveniente. Tardiamente se constatou que resíduos haviam contaminado praticamente todos ecossistemas, e, na década de 60, se intensificaram pesquisas relativas ao assunto e começou-se a implantar medidas legais restringindo o seu uso. Apesar da restrição, o problema da contaminação tem se agravado e adquirido proporções dramáticas, atualmente pode-se encontrar DDT nas regiões polares (D’AMATO et al.,2002). No Brasil as restrições foram implementadas em 1981; até então o produto era importado principalmente dos Estados Unidos e Alemanha. No entanto, permite-se que equipamentos já instalados continuem em funcionamento até sua substituição integral. O BHC (hexaclorobenzeno) é outro exemplo de organoclorado, que consiste de uma mistura de uma série de isômeros em diferentes porcentagens e dentre estes o mais conhecido é o isômero ã (Lindano) com propriedades inseticidas. A legislação brasileira proibiu seu uso em 1985, ficando restrito às campanhas de saúde pública, mas infelizmente existem áreas muito contaminadas, como no Município de Duque de Caxias, RJ, onde existia uma fábrica de BHC que foi abandonada em 1965 juntamente com parte de sua produção, cerca de 300 a 400 toneladas (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2003). Outros contaminantes a destacar são as dioxinas e furanos, os quais são duas classes de compostos aromáticos tricíclicos, que possuem propriedades físicas e químicas semelhantes. São formados como subproduto não intencional de vários processos envolvendo o cloro, produção de diversos produtos químicos (pesticidas), branqueamento de papel e celulose, incineração de resíduos, incêndios, incineração de lixo urbano e hospitalar, incineração de resíduos industriais, veículos automotores e outros (ASSUNÇÃO; PESQUERO,1999). As PCBs (bifenilas policloradas) são um tipo de Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 67 A seqüência de reações para a formação de furanos e dioxinas ainda não é bem conhecida, mas sim suas fontes, que são os PCBs e os processos de combustão respectivamente. Estudos em cobaias, como coelhos, macacos e gado, demonstraram que o sistema imune e reprodutivo é atingido por estas substâncias. A meia-vida da dioxina em seres humanos tem sido estimada em 5 a 11 anos, sabe-se, porém, que aumenta com a idade, provavelmente devido ao aumento de tecido adiposo e à diminuição do metabolismo basal (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2003). do não possui definição única, variando de acordo com o ramo da ciência que o aborda, entretanto podemos definir que são elementos com a massa atômica maior que a do cálcio. Muitos pontos em relação às dioxinas e furanos ainda não estão completamente entendidos, por exemplo as tranformações que sofrem na atmosfera na fase vapor e os efeitos sinergéticos dessas substâncias no meio ambiente (ASSUNÇÃO; PESQUERO, 1999). O ciclo antropogênico global implementou a presença de metais pesados, e considerando também os processos da biofera, podemos citar estudos recentes, que descreveram a presença de altas concentrações de mercúrio nos Pirineos Franceses, região montanhosa que teoricamente não possui fontes de contaminação (BLAIS et al., 2005). Em relação à atmosfera sabemos que a volatização de material organoclorado pode chegar até mesmo em áreas remotas, como o continente Antártico e Ártico, e pode estar distribuídos entre fase gasosa e material particulado. Esta distribuição é influenciada principalmente pela temperatura e pressão (PENTEADO; VAZ, 2001). Com relação a seres humanos, pode-se ressaltar que a persistência ambiental desses compostos pode trazer vários efeitos, dentre estes o caso de mulheres em período de lactação que podem mobilizar resíduos de organoclorados presentes em depósitos corporais (gordura), sendo oferecidos aos bebês; contaminantes que podem estar incorporados na alimentação (MELLO-DASILVA; FRUCHTENGARTEN, 2005). Recentes estudos feitos em salsichas (BOGUSZ et al., 2004) e queijos (SANTOS et al., 2006) detetaram a presença de organoclorados, que, apesar de atenderem os limites máximos permitidos pela legislação, chamam a atenção, alertando sobre a necessidade de continuar estudos e rever a legislação, levando em conta o poder cancerígeno dessas substâncias. Durante uma reunião do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, em maio de 2001, em Estocolmo, representantes de 90 países, incluindo o Brasil, assinaram a Convenção sobre Poluentes Orgânicos Persistentes, que visa proibir a produção e o uso de 12 substâncias tóxicas, atendendo a um apelo da comunidade internacional (NASS; FRANCISCO, 2002). A emissão de metais pesados no ambiente é conseqüência da produção comercial específica, mas por outro lado há emissões não intencionais decorrentes da queima do carvão, do petróleo, acúmulo de lodos e entulhos, e produção de cimento e vidro. Os efeitos de acumulação ao longo da cadeia trófica podem ser observados tanto em ambientes terrestres como aquáticos. Outro aspecto importante a ser considerado é a interação entre diversos metais e não metais, que podem resultar numa potencialização ou diminuição dos seus efeitos deletérios, além da interação com substâncias húmicas, que acabam complexando alguns metais. A seguir apresentam-se alguns metais pesados: x Cádmio (Cd) – É uma descoberta relativamente recente, foi descrito em 1817. Não possui função biológica e é altamente tóxico a plantas e animais; os níveis naturais de Cd encontrados normalmente não causam toxicidade aguda. É utilizado em galvanoplastia, fabricação de ligas, baterias de Ni-Cd, tubos de TV, pigmentos, esmaltes e tinturas têxteis, fotografia, lasers, entre outros. Na agricultura, a fonte de contaminação são os fertilizantes fosfatados, os quais interferem no pH do solo, aumentando sua disponibilidade (PIERANGELI et al.,2004) e conseqüentemente a concentração do metal nos produtos agrícolas. Os metais pesados talvez sejam os agentes tóxicos mais conhecidos pelo homem; há aproximadamente 2000 anos a.C. grandes quantidades de chumbo eram obtidas como subproduto da fusão da prata, dando início à sua utilização. x Cobre (Cu) – Considerado um dos elementos essenciais mais importantes para as plantas e animais. Os usos principais são na produção de fios e de suas ligas, bronze e latão. As minas para extração de cobre produzem um grande impacto ambiental, disponibilizando outros metais pesados como manganês e arsênico, os quais possuem potencial carcinogênico (BIDONE et al., 2001). Estudos recentes com peixes demonstram que seu acúmulo nas brânquias leva a alterações na atividade de proteínas responsáveis por trocas iônicas e em alterações em fatores bioquímicos modificando o funcionamento deste organismo (MONTEIRO et al., 2005). Embora amplamente utilizado, o termo metal pesa- x Chumbo (Pb) – O liberado no ambiente possui 3.2 Metais Pesados 68 Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 maior tempo de residência comparado com a maioria dos poluentes; tende a se acumular nos solos e sedimentos. O chumbo pode se encontrar em dois estados de oxidação, Pb (II) e Pb (IV), que são estáveis, mas no ambiente o elemento predominante é o chumbo bivalente. cimento”, publicado em 1972 e posteriormente apresentado na 1ª Conferência Sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo, também em 1972, a qual foi organizada diante de uma série de denúncias referentes ao uso indiscriminado dos recursos naturais. x Cromo (Cr) – Pode ser introduzido no ambiente através de deposições de origem industrial, como curtumes e siderurgia. Na natureza, o cromo ocorre tanto na forma trivalente como na forma hexavalente. Por ser mais solúvel , o cromo hexavalente apresenta maior toxicidade do que na forma trivalente. Diversos estudos evidenciam seus efeitos tóxicos em organismos e plantas. Na soja, sua ação reduz absorção de nutrientes e fixação de nitrogênio por bactérias aderidas a suas raízes. (CASTILHOS et al., 2001) Em 1973 surge o conceito de ecodesenvolvimento, o qual considerava potencialidades locais, a diversidade de situações e diferentes caminhos para o desenvolvimento de base sustentada, entretanto necessariamente atrelado a políticas de redistribuição de renda e de avaliação dos impactos das políticas de países desenvolvidos nos países em desenvolvimento (SACHS, 1986). Mercúrio (Hg) – O emprego de compostos mercuriais durante décadas na agricultura e seu uso para fins industriais resultaram no aumento significativo da contaminação ambiental. Grande parte desse mercúrio entra no ambiente como Hg (II) ou elemental Hg (0); a partir desse estado pode ser metilado por caminhos bióticos e abióticos, formando metilmercúrio, a qual é sua forma mais tóxica e acumulativa. 4. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Sabemos que os processos ecológicos sustentam a função dos ecosssistemas e que os aspectos mais importantes são o direcionamento da energia e reciclagem contínua de materiais. Quando os processos naturais são rompidos, os ecossistemas podem não ser mais capazes de se manterem a si próprios. Sendo assim, manter uma biosfera sustentável requer que conservemos os processos ecológicos; contudo, o que ocorreu no último século foi uma vasta interferência nesses sistemas onde, segundo Ricklefs (2003), as habilidades tecnológicas avançaram muito rapidamente para que a natureza se mantivesse em equilíbrio. Esses níveis de degradação começaram a causar impactos negativos significantes, comprometendo processos industriais pela escassez de recursos naturais e a saúde humana devido à contaminação do solo, do ar e da água. A partir desses eventos surgiram movimentos que deram origem ao conceito de desenvolvimento sustentável. Em 1968 surge uma organização informal, o Clube de Roma, formado por cientistas, educadores, economistas, humanistas, industriais e funcionários públicos de dez países, o qual tinha em mente obter uma visão mais clara dos limites do sistema mundial e seu comportamento a longo prazo. O primeiro documento que formalizou estas discussões foi então o estudo dos “Limites do CresRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 O termo desenvolvimento sustentável foi usado pela primeira vez em 1987 quando a ONU publica o relatório de Brundtland, proposto pela ‘Comissão Mundial do Desenvolvimento e Meio Ambiente’. Essa comissão foi formada em 1984, tendo como coordenadora a primeiraministra da Noruega, Gro Halem Brundtland. A comissão definiu em seu relatório final o conceito de desenvolvimento sustentável: “Atender às necessidades da geração presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras de atenderem suas próprias necessidades.” Mediante as primeiras discussões ambientais e a clara necessidade de se atrelar economia, política, sociedade e meio ambiente, seguiram-se várias conferências mundiais. Entre elas destaca-se a ECO 92, no Rio de Janeiro, tendo como principal resultado a Agenda 21 que propõe que os diversos países do mundo tomem medidas para garantir a sustentabilidade das atividades humanas. Trata de transformações culturais e de valores, estimulando a adoção de padrões de consumo e produção, visando a proteção do meio ambiente e ainda propõe soluções e estima custos de investimento. Em 1997 foi realizado o Rio + 5, evento que tinha como objetivo fazer um balanço dos cinco anos decorrentes do Rio 92, infelizmente se evidenciou que pouco havia sido feito de fato para colocar em prática as resoluções da última conferência pela maioria dos países participantes, entre eles o Brasil. Posteriormente foi realizada em Johannesburgo a Rio + 10, em 2002, na qual foram detalhados objetivos dentro dos princípios já conhecidos. Destaca-se pela primeira vez os problemas associados à globalização, pois os benefícios e os custos a ela associados estão distribuídos desigualmente com o risco de a pobreza gerar desconfiança nos sistemas democráticos, o que poderia provocar o surgimento de sistemas ditatoriais. Um aspecto relevante é que a democratização de todos estes debates envolve a contraposição de interesses de diferentes países e de distintas camadas da soci69 edade, sendo interessante salientar que o estudos levam a um plano político mundial, talvez impraticável, a ser desenvolvido pela ONU. químicas (xenobióticos) de origem antrópica e como agem sobre os ecossistemas, sua biota e suas inter-relações (AZEVEDO; CHASIN, 2003). O Brasil, que efetivamente participou das conferências mundiais, agora é sede para várias discussões, as quais abordam as definições sobre desenvolvimento sustentável descrito pelos orgãos da ONU com certa desaprovação. Segundo Diegues (1992): “ se baseiam na necessidade de se atingir o grau de desenvolvimento atingido pelas sociedades industrializadas e está cada vez mais claro que o estilo de desenvolvimento dessas sociedades, baseado num concurso exorbitante de energia, artificialmente barata e intensiva em recursos naturais (...) é igualmente insustentável a médio e longo prazo.” A ecotoxicologia desenvolve pesquisas que focalizam degradação ambiental, saúde pública e preservação de recursos naturais; o meio científico tem buscado progressivamente maior conhecimento de sistemas naturais, dos seus constituíntes, mecanismos de funcionamento e comportamento diante de inúmeros contaminanates, oferecendo recursos para estabelecer estratégias de proteção e gestão ambiental Mais recentemente, em março de 2006, foi realizada no Brasil a COP8, “Oitava Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica”, sendo o órgão supremo decisório no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB). Um dos resultados dos debates, que duraram duas semanas, foi a definição de uma data limite, até 2010, para a criação de regras internacionais para repartição dos lucros oriundos dos recursos genéticos e de conhecimento de populações tradicionais, tema muito polêmico já que implica que os países ricos paguem pelo que já estão usufruindo. A CDB parte do pressuposto de que a biodiversidade deve ser uma preocupação comum da humanidade, entretanto se observa que existe uma certa cautela nos tratados sobre meio ambiente em relação ao fato de países do primeiro mundo assumirem sua parcela de responsabilidade no subdesenvolvimento de alguns países mais pobres, os que foram outrora explorados para atender suas necessidades, permitindo que assumissem o status atual de primeiro mundo. Já no Brasil estão sendo trilhados caminhos para o conhecimento da sua biodiversidade com a elaboração de inventários, quando será possível atingir os objetivos da CDB, tarefa a qual é de grande urgência, tendo em vista a velocidade da degração do nosso ambiente. 5. ECOTOXICOLOGIA Como ferramenta para a preservação da biodiversidade surge a ecotoxicologia. Em 1969, o professor francês René Truhaut institui o termo Ecotoxicologia, do grego oîkos (domicílio, habitat, meio ambiente: ecologia) e a palavra toxicologia (ciência dos agentes tóxicos, dos venenos ), para definir a ciência que trata dos efeitos deletérios promovidos por substâncias 70 A expressão da ecotoxicidade de uma substância química depende das características da exposição e de seu comportamento nos sistemas biológicos. Além das propriedades físico-químicas das substâncias, deve-se considerar a magnitude, a duração, as vias de introdução e a suscetibilidade dos organismos, estando esta última diretamente interligada aos processos toxicocinéticos e toxicodinâmicos. Dentro da ecotoxicologia, tanto o ecossitema aquático quanto os sedimentos são os compartimentos de destaque nas análises ambientais. Os ecossistemas aquáticos são possivelmente os sistemas naturais que mais receberam a descarga das atividades antrópicas nas últimas décadas, e os sedimentos têm papel importante tanto na acumulação como na liberação de substâncias tóxicas para o meio aquático. A deposição de sedimentos depende de uma série de fatores ambientais que influenciam a composição química dos sedimentos, com reflexo no teor de nutrientes e, conseqüentemente, na biota, levando em conta que há intensas trocas entre sedimentos e coluna d’água. Os compostos indicadores de contaminação ambiental encontrados no sedimento podem ser orgânicos, como inseticidas e herbicidas, ou inorgânicos, como metais pesados. Estudos recentes na bacia do Médio Tietê Superior resaltam a importância da relação água-sedimento na contaminação do meio, levando em consideração, não somente as substâncias dissolvidas, mas a presença de contaminantes biodisponíveis no sedimento, uma vez que este pode representar o verdadeiro potencial tóxico do sistema (ESPÍNDOLA et al.,2000). Outros significativos estudos que têm como protagonista o sedimento poderão classificar ambientes de acordo com seu nível de contaminação e biodisponibilidade de metais pesados, como o mercúrio, metal nocivo que sofre biomagnificação dentro da cadeia trófica (SIQUEIRA et al., 2005), e ainda como indicadores de atividades antrópicas irresponsáveis, como exemplo a detecção de mercúrio na região amazônica do Brasil (MASCARENHAS et al., 2004), por ação do garimpo. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Para o monitoramento e avaliação de impactos ambientais em ecossistema aquáticos são realizadas medições de alterações nas variavéis físicas e químicas, juntamente com variáveis microbiológicas, os coliformes totais e fecais. São ferramentas de indiscutível valor na classificação e enquadramento de rios e córregos em classes de qualidade de água, mas que fornecem parâmetros momentâneos de uma situação que é dinâmica (WHITFIELD, 2001), além disso o monitoramento físico e químico não é muito eficiente na determinação de alterações nas comunidades biológicas. verdadeiro lugar dentro dos sistemas naturais, pois fazemos parte deles e do seu funcionamento. Historicamente, avaliações de impacto ambiental têm se concentrado nos efeitos na saúde humana, entretanto podem causar riscos severos às demais comunidades biológicas. Atualmente, um dos desafios da ecotoxicologia é determinar organismos representativos do ecossistema como indicadores de contaminação. Os bioindicadores são definidos como organismos ou comunidades que respondem à poluição ambiental, alterando suas funções vitais ou acumulando toxinas, eventos que modificam a dinâmica das populações. AZEVEDO, F. A.; CHASIN, A. A. M. As bases toxicológicas da ecotoxicologia. São Carlos: Rima, 2003. No entanto, as populações em um sistema natural refletem a integridade ecológica total dos ecossistemas, integrando efeitos dos diferentes agentes impactantes, em que cada tipo de organismo apresenta seu limite de tolerância a contaminantes, sendo a perda de espécies sensíveis e crescimento da população tolerante uma indicação de contaminação. Principais organismos comumente utilizados na avaliação de contaminação em ecossistemas aquáticos são os macroinvertebrados bentônicos, peixes e comunidade perifítica (GOURLART; CALLISTO,2003); a utilização de macrovertebrados bentônicos em estudo de impacto ambiental ainda é incipiente no Brasil, entretanto é amplamente utilizado em outros países da Europa e nos Estados Unidos. A ecotoxicologia realiza uma importante tarefa, a avaliação do risco ambiental, o qual é uma união entre a ciência do ambiente e a administração do risco, esta deve prover suficiente informação para decisões que venham a proporcionar a proteção do meio ambiente. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolvimento sustentável pode ser ententido como melhoria das condições de existência dos povos, com a utilização consciente de recursos naturais. Sendo assim, o monitoramento ambiental, a diminuição de descarga de xenobióticos no ambiente e os estudos ecotoxicológicos funcionam como uma ferramenta fundamental da sociedade para desenvolver planos de recuperação de ecossistemas degradados e a conservação da biodiversidade. Deve-se em primeiro lugar refletir sobre nosso Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 7. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ASSUNÇÃO, J. V. de; PESQUERO, C. R. Dioxinas e furanos: origens e riscos. Rev. Saúde Pública, v. 33, n. 5, pp.523-530, out. 1999. BIDONE, E. D. et al. Environmental risk increase due to heavy metal contamination caused by a copper mining activity in Southern Brazil. An. Acad. Bras. Ciênc., v. 73, n. 2, pp. 277-286, jun. 2001. BLAIS, J. M. et al. Mercury, polybrominated diphenyl ether, organochlorine pesticide, and polychlorinated biphenyl concentrations in fish from lakes along an elevation transect in the French Pyrénées. Ecotoxicology and Environmental Safety, v. 63, pp. 91-99. jan. 2006. 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Acesso em: 3 jun. 2006. 72 Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 O Meio Ambiente e o Ambiente da Vida: a história ecológica no aperfeiçoamento e formação de professores em projetos interdisciplinares Celenrozi Zaroni dos Santos * Valéria Zanetti de Almeida ** Resumo: A interdisciplinaridade na escola tem motivado novas propostas de ensino e de currículo, baseada na inter-relação entre os diversos ramos do conhecimento. Os novos parâmetros curriculares incluem o assunto meio ambiente como forma de expressar conceitos e valores fundamentais à democracia e à cidadania. Esse tema, assim como Ética, Saúde, Pluralidade cultural e Orientação sexual, corresponde a questões importantes e urgentes para a sociedade brasileira de hoje, presentes sob várias formas na vida cotidiana. Através do estudo do meio ambiente, o aluno consegue compreender as noções básicas sobre o tema, perceber relações que condicionam a vida para posicionar-se de forma crítica diante do mundo, dominar métodos de manejo e conservação ambiental. Lançando mão da micro e macrorrelações, propõe-se discutir a história ecológica, relatando a ação do homem no meio ambiente a partir dos primeiros habitantes da América, da colonização européia e dos períodos econômicos do Brasil – cana-de-açúcar, extração de ouro, café, chegando aos principais produtos agrícolas da atualidade. Este é um trabalho que deverá caber, especialmente, aos educadores que querem fazer a diferença na educação do Brasil. O tema foi trabalhado com 83 professores da rede pública e com 46 alunos de graduação de Ciências Biológicas e Matemática. Palavras-chave: Educação, história, meio ambiente. Abstract: Interdisciplinarity at school has motivated new conceptions of teaching and curriculum based on the interrelation among several fields of knowledge. The new curriculum parameters include environment subject to express fundamental concepts and values to democracy and citizenship. This theme, as well as ethics, health, cultural plurality and sexual orientation, corresponds to important and urgent questions to the contemporary Brazilian society which are present in daily life under various forms. Studying the environment, the student understands its basic notions, perceive life relations so as to position himself before the world in a critical way, master managing methods and environmental conservation. Considering the micro and macro relations, it is proposed to discuss the ecology history, describing the anthropic action on the environment from the America’s first inhabitants, through European colonization and over the Brazilian economic cycles – sugar cane, gold exploration, coffee, getting to the main modern agricultural products. This paper is suitable especially for teachers who want to make a difference on educational fields in Brazil. The theme was discussed with 83 teachers from public schools and 46 undergraduate students from Biology and Mathematic courses. Key words: Education, history, environment. 1. INTRODUÇÃO O Brasil, além de ser um dos maiores países do mundo em extensão, possui inúmeros recursos naturais * Mestranda em Planejamento Urbano e Regional PLUR, UNIVAP, 2006. ** Professora da UNIVAP. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 de fundamental importância para todo o planeta. Suas florestas tropicais, seu pantanal, seu cerrado, seus mangues e suas restingas representam importantes ecossistemas. Possui uma grande parte da água doce disponível para o consumo humano e é detentor de uma das maiores biodiversidades do mundo. Como forma de entender a natureza e a forma como o homem se apropria dela, é preciso compreender a evo73 lução do pensamento humano. O trabalho tem por objetivo expor a necessidade de estudarmos a história ambiental do Brasil, buscando compreender a origem e a evolução de algumas dinâmicas predatórias que vêm marcando a economia brasileira desde os seus primórdios. Conhecê-las em profundidade é importante para termos esperança de transformá-las. A história ecológica é uma abordagem nova de conteúdo sugerida pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). São ainda tímidas as investidas dos professores das diferentes áreas com o tema em sala de aula. A atuação como docente no Programa de Capacitação de Professores da rede Estadual deu-nos possibilidade de relacionar o tema Meio Ambiente com as outras áreas do conhecimento, elaborando um projeto interdisciplinar. A proposta foi trabalhada com os professores de História, Geografia, Matemática e Biologia na “Teia do Saber” da Rede Pública do Estado de São Paulo e com os alunos da graduação dos cursos de Ciências Biológicas, Geografia, História e Matemática na Faculdade de Educação da Universidade do Vale do Paraíba. O projeto tentou dar ao professor uma base histórica para conscientizar os alunos dos problemas ambientais e dicas para trabalhar o tema nas escolas de ensino fundamental e médio, de forma interdisciplinar. Visando a transversalidade, pretendia-se romper com a idéia que o estudo do Meio ambiente deveria ser responsabilidade única e exclusiva do professor de Ciências ou Biologia. Segundo Caldeira (2001), existem poucos trabalhos no campo da Educação Matemática discutindo questões de ordem educacional prática ou teórica, em que se envolvam trabalhos quantificando fenômenos relacionados ao meio ambiente e que sirva como um referencial para a formação do professor da área. O professor, importante agente da transformação social, conhecendo os problemas ambientais de forma histórica e atual, contribuirá, sobremaneira, para as pequenas ações, a partir da própria escola, do bairro e até, quem sabe, num plano mais abrangente e eficaz, o pensar globa/agir local proposto na Agenda 21. 2. MEIO AMBIENTE E A TRANSVERSALIDADE DO TEMA A interdisciplinaridade refere-se a uma nova concepção de ensino e de currículo baseada na interdependência entre os diversos ramos do conhecimento. A proposta interdisciplinar busca um novo paradigma, mais dinâmico e compatível com o avanço acelerado da Ciência e da Tecnologia. Segundo Andrade (2005), essa proposta, definida 74 como construtivista, vem ao encontro da necessidade de reformulação curricular nas escolas. De acordo com a teoria construtivista, o ser humano nasce com potencial para aprender. E este potencial - esta capacidade - só se desenvolverá na interação com o mundo, na experimentação com o objeto de conhecimento, na reflexão sobre a ação. A aprendizagem conforme metodologia construtivista, se organiza, se estrutura num processo dialético de interlocução. Andrade (2005)ainda afirma que a qualidade da educação, grande preocupação atual dos administradores escolares, será alcançada via gestão participativa, criação de trabalho de equipe (parceria, cooperação) e adaptação para currículo interdisciplinar, mecanismos que superam o modelo individualista, fragmentado e centralizador de administração e de produção do saber. Um dos caminhos à operacionalização do currículo interdisciplinar é, pois, a administração e metodologia participativas. Uma prática escolar interdisciplinar tem algumas características que podem ser apontadas como fundamentais para uma transformação curricular e que exigem mudanças de atitude, procedimento e postura por parte dos educadores. Os Parâmetros Curriculares Educacionais preconizam que a nova ação pedagógica deverá, segundo Andrade (2005): - perceber-se interdisciplinar, sentir-se “parte do universo e um universo à parte” (resgatar sua própria inteireza, sua unidade); - historicizar e contextualizar os conteúdos (resgatar a memória dos acontecimentos, interessando-se por suas origens, causas, conseqüências e significações; aprender a ler jornal e a discutir as notícias); - valorizar o trabalho em parceria, em equipe interdisciplinar, integrada (tanto o corpo docente como o corpo discente), estabelecendo pontos de contato entre as diversas disciplinas e atividades do currículo; - desenvolver atitude de busca, de pesquisa, de transformação, construção, investigação e descoberta; - definir uma base teórica única como eixo norteador de todo o trabalho escolar, seja ideológica (que tipo de homem queremos formar?), psicopedagógica (que teoria de aprendizagem fundamenta o projeto escolar?), ou relacional (como são as relações interpessoais, a questão do poder, da autonomia e da centralização decisória na escola?); - resgatar o sentido do humano, o mais profundo e significativo eixo da interdisciplinaridade, perguntandose a todo momento: - “o que há de profundamente humaRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 no neste novo conteúdo?” ou - “em que este conteúdo contribui para que os alunos se tornem mais humanos?”. - trabalhar com a pedagogia de projetos, que elimina a artificialidade da escola, aproximando-a da vida real e estimula a iniciativa, a criatividade, a cooperação e a co-responsabilidade. Desenvolver projetos interdisciplinares na escola é, seguramente, a melhor maneira de garantir a integração de conteúdos pretendida pelas novas propostas curriculares. Um projeto surge de uma situação, de uma necessidade sentida pela própria turma e consta de um conjunto de tarefas planejadas e empreendidas espontaneamente pelo grupo, em torno de um objetivo comum (ANDRADE, 2005). Para Jolibert (1994), “a pedagogia de projetos permite viver numa escola alicerçada no real, aberta a múltiplas relações com o exterior: nela a criança trabalha “pra valer” e dispõe dos meios para afirmar-se como agente de seus aprendizados, produzindo algo que tem sentido e unidade.” Realiza-se, assim, a proposta da interdisciplinaridade de buscar o sentido e a unidade do conhecimento e do ser. A transversalidade do tema meio ambiente, segundo os Parâmetros em Ação (2001), tem dois significados. De um lado, deve ser algo externo ao universo escolar, com um recorte próprio, sem se circunscrever a uma área específica de saber, contribuindo assim com abordagens novas de conteúdos – como, por exemplo, uma visão mais complexa do meio ambiente. Ao mesmo tempo, deve estar presente nos conteúdos das disciplinas e nos procedimentos e atitudes do convívio escolar. A idéia-chave dos temas transversais é re-significar o que se ensina, aproximando da realidade. Essa constatação é fundamental para integrar a questão ambiental no universo escolar. Os modelos e a linguagem da Matemática, por exemplo, auxiliam a compreender a realidade em seus diversos aspectos, assim como boa parte das formas do meio ambiente e de seu funcionamento. Seus instrumentos permitem que sejam revelados e identificados padrões e dinâmicas universais, conhecimentos essenciais para orientar nossas intervenções no meio ambiente. Podem ser desenvolvidos pelos alunos trabalhos matemáticos sobre a dinâmica das florestas e das águas, a multiplicação e desaparição de espécies e da biodiversidade, as formas da natureza, e trabalhos analisando a expansão urbana e as áreas desmatadas (PCN EM AÇÃO, 2001). Segundo Caldeira (2001), quantificar os fenômenos ambientais deixa a Matemática aquém daquilo que ela deve ser, mas aprender Matemática usando como “pano de fundo as questões ambientais faz muito mais Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 do que fornecer aos estudantes instrumentos e ferramentas para a compreensão do fenômeno. Aprender a usar a Matemática no seu cotidiano faz com que o estudante perceba, entre outras coisas, seu verdadeiro papel como cidadão e transformador social”. A história ecológica aparece como ferramenta importante do professor para a qualificação, não só dos fenômenos da natureza, mas também da natureza do homem frente aos problemas ambientais enfrentados hoje, no ambiente da escola ou fora dela. 3. HISTÓRIA ECOLÓGICA GLOBAL Antes de conhecer a história ecológica do Brasil e os fatos que foram marcantes para o meio ambiente desde a colonização, temos de conhecer um pouco da história ecológica global e o espaço geográfico das sociedades indígenas que ocuparam o território da América no período pré-colombiano e que já interagiam com a natureza no Brasil. A rica biodiversidade da ecologia tropical do Brasil e suas paisagens foram alteradas muito mais recentemente e muito menos do que as dos biomas do “velho mundo”. Nesse sentido, o território brasileiro é mais “rústico”, mais “selvagem”, exibindo marcas humanas muito mais leves. Ou seja, ele ainda está por sofrer intervenções humanas de profundidade e duração comparáveis às que ocorreram no “velho mundo”, visto que o Brasil é considerado um país em desenvolvimento, onde o processo de urbanização e do consumo de matérias primas estão em franco crescimento (DRUMMOND, 2002). A ocupação do território brasileiro se deu sob os regimes de comunidades de caçadores-coletores nômades ou de pequenas aldeias semipermanentes de policultores tropicais. Isso contrasta com o regime de civilizações complexas (com agricultura intensiva, animais domesticados, divisão social do trabalho, classes sociais especializadas, cidades permanentes, estado centralizado, religiões organizadas etc.). Embora no continente americano existissem também civilizações assemelhadas a essas sediados nos territórios atuais do México e do Peru ou em partes da Amazônia, esse regime não predominou no conjunto do território brasileiro. Uma boa parte dos povos remanescentes de caçadores-coletores e policultores que praticam ou ainda são influenciados pelos estilos de vida “tradicionais”, de baixo impacto sobre o mundo natural, vivem ou viveram no Brasil. Não se trata da natureza brasileira ser “intocada”, mas sim de ela ser “tocada” há menos tempo, e de forma mais “leve” (DRUMMOND, 2002). Segundo Drummond (2002), a ocupação do terri75 tório do Brasil começou com migrantes vindos da Ásia e da Oceania há cerca de 12 mil anos (trabalhos mais recentes data a ocupação do território nacional em torno de 16 mil anos) e encontraram um continente vasto, ecologicamente diversificado e cujos processos biológicos vinham evoluindo sem intervenção humana. A natureza, antes desse período, estava longe de ser estática. Havia interação entre as plantas e animais. Ecossistemas e paisagens mudaram ao sabor de mudanças climáticas, extinguiram-se algumas espécies e surgiram novas”. Os primeiros habitantes da América eram descendentes dos caçadores-coletores. Após um certo período, começaram a ser formadas as primeiras aldeias agrícolas. Na América do Norte, elas evoluíram a estados agrícolas. Como exemplo, podemos citar a civilização Maia na Guatemala. No Brasil, os indígenas formaram várias aldeias agrícolas e assim viveram até a chegada dos portugueses (DRUMMOND, 2002). Estamos, portanto, em um outro momento histórico. Momento em que o pensamento moderno, com base na observação das conseqüências históricas da devastação ambiental, nos dá o direito de questionar milênios de cultura humana dominante e afirmar, subversivamente que tomar as florestas como uma sombra a ser destruída é o caminho do colapso. O caminho da sobrevivência, ao contrário, deve ser o de considerar as florestas como nossas vizinhas e supridoras. Em outras palavras, ao invés de vê-las como uma franja de escuridão ao nosso redor, aprender a reconhecê-las como nosso colchão benéfico e imprescindível de inspiração, sustento e garantia de vida (PÁDUA, 2005). 4. HISTÓRIA ECOLÓGICA DO BRASIL E OS 500 ANOS DE DESTRUIÇÃO A descrição do Brasil feita por Pero Vaz de Caminha, em 1500, comprova uma paisagem diferenciada daquela da conquista da terra. Os 500 anos da história do Brasil foram marcados pela destruição. No campo ambiental, a área desmatada dos três maiores biomas, Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado, soma, no total, 2,7 milhões de km2, ou seja, 31,7% do território nacional e 62 vezes a superfície do Estado do Rio. Imagine a bandeira brasileira sem um terço de seu verde (PÁDUA, 2004). A convivência com a Mata Atlântica, sem dúvida, marcou a formação da economia e da sociedade coloniais desde os seus primeiros momentos. No começo do século XVI, quando os europeus chegaram pela primeira vez ao nosso território, o tamanho da massa verde que cobria o litoral do nordeste ao sul do país, podendo penetrar de cem a quinhentos quilômetros no interior, devia estar em torno de 130 milhões de hectares (PÁDUA, 2004). 76 A agricultura é um dos principais responsáveis pelo desmatamento. O problema está na forma que se exerce a agricultura. Os mitos da época da colonização ainda persistem. São eles: “Nessa terra, em se plantando tudo dá”, “a natureza é inesgotável, e não é preciso adaptar tecnologia à natureza” (PÁDUA, 2004). Segundo Feijão Teixeira (2001), o processo de ocupação territorial e a incorporação de novas áreas ao processo produtivo agrícola no Brasil, ao longo dos anos, foram feitos sem preocupação ambiental. A expansão da fronteira agrícola caracterizou-se pela redução da biodiversidade e por outros impactos sobre os recursos ambientais, principalmente sobre o solo e a água. Os períodos econômicos do Brasil Colônia são exemplos da exploração predatória dos recursos naturais. Grandes extensões de Mata Atlântica foram destruídas para abrir espaço para os canaviais. Calcula-se que, para cada quilo de açúcar produzido no Brasil, queimou-se cerca de 15 quilos de lenha. A atividade econômica do século XVIII foi dominada pela mineração do ouro e dos diamantes, de forma também predatória. Encostas foram desmatadas, rios foram dragados e seus cursos desviados. Pelo menos 100 toneladas de mercúrio foram utilizadas na extração do ouro em Minas Gerais (PÁDUA, 2005). Para Pádua (2004), a idéia de que a Mata Atlântica era vista como um estorvo vinha da imagem difundida em 1711 pelo jesuíta André João Antonil, em Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas. Na obra de Antonil, a floresta surge de forma indireta como um grande obstáculo: “feita a escolha da melhor terra para a cana, roça-se, queima-se, limpa-se, tirando-lhe tudo o que podia servir de obstáculo”. Segundo Dean (1996) a lavoura, vista pelos nativos como complemento de uma dieta alimentar, significava, para os jesuítas, “a identificação com o cristianismo” pois eliminava a floresta e, em conjunto, qualquer vestígio cultural da política dos pajés e feiticeiros. De todos os produtos coloniais, isto é, aqueles plantados para render um excelente exportável para a metrópole – o mais valioso e viável era a cana-de-açúcar. Cultivada há séculos na Índia e plantada em todo o Mediterrâneo, foi um importante produto de exportação dos portugueses para os mercados do norte da Europa (DEAN, 1996). Em suas colônias dos Açores e Madeira, Portugal já possuía uma pequena produção de açúcar, embora lucrativa que, no entanto, não atendia mais um mercado consumidor em franco crescimento. As condições propícias para efetivar o plantio na terra dos brasis possibilitaram a exploração sistemática do solo, dando início à monocultura em larga escala. Embora a cana tivesse de ser adubada na Madeira e Açores e São Tomé, isso era desnecessário no Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Brasil, onde, em certos lugares, a cana podia ser cortada ano após ano sem replantio (ASSUNÇÃO, 2000). Josué de Castro (apud DEAN, 1996) em Geografia da Fome, traça o retrato violento da cana-de-açúcar: “Já afirmou alguém, com muita razão, que o cultivo da canade-açúcar se processa em regime de autofagia: a cana devorando tudo em torno de si, engolindo terras e mais terras, dissolvendo o húmus do solo, aniquilando as pequenas culturas indefesas e o próprio capital humano, do qual a sua cultura tira toda a vida”. A conservação dos recursos naturais iria mostrar-se irrelevante em uma sociedade na qual a conservação da vida humana era irrelevante. O ouro e o diamante brasileiros, no século XVIII, foram as mais importantes riquezas do novo mundo colonial. De 1700 a 1800, 1 milhão de quilos de ouro foram oficialmente registrados a caminho da Metrópole e talvez outro milhão tenha escapado ao fisco real. Cerca de 2,4 milhões de quilates de diamantes foram extraídos. Segundo registros oficiais, uma quantia adicional desconhecida e incalculável foi contrabandeada (DEAN, 1996). O efeito desse tipo de mineração foi o de substituir a floresta por terras com pântanos esburacados. O botânico francês Auguste de Saint-Hilaire, quando atravessou a estrada ao norte de Ouro Preto, na segunda década do século XIX, relatava que “por todos os lados, tínhamos sob os olhos os vestígios aflitivos das lavagens, vastas extensões de terra revolvida e montes de cascalho.” (DEAN, 1996). O desnudamento das encostas provocou erosão de camadas de terra, gerando gigantescos sulcos chamados voçorocas, assoreamento de leitos de riachos e enchentes que ainda ocorrem na região de forma generalizada que parecem características naturais da paisagem (DEAN, 1996). O volume total de ouro obtido durante o século XVIII teria revirado 4 mil km2 da região de Mata Atlântica. Isso sugere a destruição de cerca de 20% da faixa aurífera que se estendia por 450 quilômetros entre Diamantina e Lavras. O crescimento da floresta secundária nas áreas de garimpo e de queimada tendia a enfraquecer. Segundo Dean (1996), a modificação e a remoção exploratória, hidráulica e manual da superfície dos solos das florestas sugerem que o empreendimento minerador do século XVIII exigiu muito mais da Mata Atlântica que os primeiros dois séculos de lavoura de subsistência com as plantações de trigo e cana-de-açúcar. A degradação de grande parte do solo das áreas derrubadas estava ocorrendo a tal ponto que a vegetação que renascia carecia de muitas das espécies que teriam reconstituído, na ausência de interferência humana. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Surgiram críticas à agricultura de corte e queima, técnicas fáceis e baratas de avançar na agricultura; tais técnicas são utilizadas até hoje. Rodrigo de Souza Coutinho, ministro da Marinha e do Ultramar, entre 1796 e 1801, compartilhou a tese de que era preciso evitar a devastação das florestas brasileiras. Neste período, Sousa Coutinho teve a iniciativa de enviar cartas régias para os governadores de algumas capitanias brasileiras estabelecendo normas para o uso das florestas litorâneas. O alvo principal das cartas, assinadas pela rainha, era “a indiscreta e desordenada ambição dos habitantes que, com pretexto das suas lavouras, têm assolado e destruído preciosas matas a ferro e fogo” (PÁDUA, 2004). A partir de então, todas as matas e árvores localizados ao longo da costa marítima, ou nas margens dos rios navegáveis que desembocassem no mar, eram propriedade exclusiva da Coroa. Segundo Pádua (2002), a história da defesa da Mata Atlântica no Brasil colônia não terminou neste episódio. Outras vozes tentaram defender nossas matas como a de Baltasar da Silva Lisboa e José Bonifácio que chegou a propor um modelo de desenvolvimento sustentável moderno até para os dias de hoje, com base na reforma agrária, beneficiando os índios e os negros libertos. José Bonifácio com uma mirada visionária de historiador ambiental percebeu claramente que a decadência civilizatória do antigamente poderoso Oriente Médio não podia ser divorciada da degradação de suas condições ambientais. Afirmou, em um texto de 1815 que: “todos os que conhecem por estudo a grande influência dos bosques e arvoredos na economia geral da natureza sabem que os países que perderam suas matas estão quase de todo estéreis e sem gente. Assim sucedeu à Síria, Fenícia, Palestina, Chipre, e outras terras, e vai sucedendo ao nosso Portugal”. A destruição florestal ameaçava transformar o nosso território, segundo Bonifácio, em algo semelhante aos “páramos e desertos áridos da Líbia” (PÁDUA, 2004). Depois da emancipação política em 7 de setembro de 1822, nossa situação econômica parecia complicada pela dívida externa. Foi-se o ouro...Muitas vilas mineradoras entraram em decadência, e seus moradores voltaram à floresta para reassumir a lavoura da derrubada e queimada. Nas primeiras décadas do império, surge uma nova cultura que se tornaria a base da economia exportadora do Rio de Janeiro – o café, até então desprezado pelos funcionários da coroa, mas que já agradava aos paladares dos europeus. Tal como o século XVIII havia sido, para o Brasil, o século do ouro, o século XIX seria o século do café. Para a Mata Atlântica, entretanto, a introdução dessa planta exótica significaria uma ameaça mais intensa que 77 qualquer outro evento dos trezentos anos anteriores. Em contrapartida, a erva foi a salvação da aristocracia colonial e da corte imperial que cambaleava. (DEAN, 1996). O café foi inicialmente plantado no litoral do Rio de Janeiro. No entanto, os ventos salinos acabaram empurrando as plantações de café para o planalto um pouco mais fresco e depois para o Vale do Paraíba. O cultivo do café exige solos que não sejam encharcados nem secos; dessa forma, o plantio deveria ser feito em encostas íngremes. Àquela época, acreditava-se que o café deveria ser plantado em solo coberto por floresta “virgem”. As antigas zonas cafeeiras não eram replantadas e novas faixas de floresta primária eram então constantemente limpas para manter a produção. O café avançou pelas terras altas, de geração em geração, nada deixando em seu rastro além de montanhas desnudadas (DEAN, 1996). Lacerda Werneck, um dos maiores plantadores de café do Rio de Janeiro, criou um manual dos agricultores apresentando reflexões sobre a prática dos fazendeiros mais representativos. Nesse manual, aconselhava-se observar as encostas dos montes na primavera, quando muitas árvores da floresta estão em flor. Onde se visse o Jacarandatã e outras dezesseis espécies determinadas (encontradas somente na floresta primária), a terra era de boa qualidade (DEAN, 1996). Novamente o fogo foi usado como forma de limpar o terreno para o plantio do café. Os incêndios de muitas clareiras elevavam imensas nuvens cinzentas de fumaça. Dean (1996) comenta que o Vale do Paraíba deve ter parecido infernal ao final das estações secas, com centenas de fogos espalhados por todos os lados. Segundo o autor, a fumaça era tanta que uma nuvem amarela pairava sobre a província durante esses meses, obscurecendo o sol de dia e apagando as estrela à noite. Muitas espécies podem ter virado cinzas antes mesmo de serem estudadas e sua importância reconhecida (DEAN, 1996). Auguste de Saint-Hilaire, que viajou pelas partes centrais e meridionais do Brasil, achava que a zona ocidental do Vale do Paraíba abrigava a vegetação mais diversificada que ele vira em todas as suas viagens pela Mata Atlântica. Esses primeiros investigadores não dispunham do tempo nem de recursos para um completo estudo das formas de vida que habitavam a Mata nas regiões destruídas pelo desmatamento. Quase todos se mantiveram nas mesmas trilhas de mulas; na maioria, evitavam florestas altas. Entre os botânicos, o brasileiro Francisco Freire Alemão, em ocasião da destruição da floresta, corria de uma derrubada a outra, para examinar as gigantes abatidas. Infelizmente, segundo consta, mal dava conta de estudar todas as árvores, quanto mais epífitas e parasitas (DEAN, 1996). 78 No início do século XX, o comércio de café entrou em crise e muitos fazendeiros abandonaram as plantações, deixando o Vale do Paraíba empobrecido juntamente com sua vegetação natural. Um século depois da introdução do café, Augusto Ruschi, o grande naturalista e ambientalista do Espírito Santo, lamentava o resultado do cultivo depredatório: “jamais restabeleceremos o clima e as condições bióticas do solo que possuíamos” (DEAN, 1996). Reclamava o biólogo que, ainda que fosse do café “que a vida de nossa gente depende; dele depende um bom ou mau governo”. Ruschi chamava as características da sociedade pós-colonial como intruso indesejável. A atrasada forma de tratar a terra, assim como a produção monocultora, visando lucro imediato, e a ineficiência administrativa do governo brasileiro deram fundamentos para que Ruschi comentasse que “o feito está consumado e nenhum traço da floresta restou sobre os morros secos e amarelados do Vale do Paraíba” (DEAN, 1996). A queimada da floresta para produção cafeeira foi a principal causa, mas não a única, do desflorestamento no século XIX. É sabido que o comércio do café induziu o crescimento demográfico, a urbanização, a industrialização e a implantação de ferrovias. A política de crescimento industrial no período da ditadura foi questionada na primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em Estocolmo em 1972. José Sarney contra-argumentava dizendo: “que venha a poluição, desde que as fábricas venham com ela”.Um representante do governo na conferência apresentou uma desculpa populista e dissimulada para o problema ambiental. Para ele, “a pior forma de poluição é a pobreza”, como se um ambiente preservado e saudável fosse sinal de pobreza (DEAN, 1996). As riquezas do meio ambiente não são vistas como um produto de crescimento. Na colonização, a floresta era vista como um obstáculo. Hoje, depois de quinhentos anos, a visão dos políticos e agricultores poderosos não mudou muito. Tem-se a idéia de que as florestas são improdutivas, têm baixo valor e pouco contribuem para o desenvolvimento do País. Estudos recentes mostram que a expansão agrícola e a agropecuária não trazem crescimento econômico às populações mais pobres como se acreditava. O mito de que políticas ambientais impedem ou prejudicam o crescimento econômico é um equívoco. Estudos mostram que as ações que protejam o meio ambiente tendem a melhorar a qualidade de vida da população (YOUNG, 2004). Na exploração do novo mundo, a principal vítima, além dos seus primitivos habitantes, foi a Mata Atlântica. Do período colonial até hoje, a área perdeu 93% de Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 suas florestas que originalmente cobriam 1,3 milhões de km2 ao longo do litoral. Em áreas como as florestas de araucária no Sul do País, há apenas 2% da cobertura original. O Cerrado perdeu 50% ou um milhão de km2, de sua cobertura original, desde o início de sua ocupação na década de 1950 (DEAN, 1996). A Amazônia, nos últimos 25 anos, teve 15% da floresta ou 551.000 km2 destruídos. Com as matas, foram embora também os animais que nelas habitavam. A árvore que foi o símbolo do País e que lhe deu o nome, o Pau-brasil, é uma espécie em via de extinção, e, quinhentos anos depois, só é encontrada em jardins botânicos (PÁDUA, 2005). Para cada hectare que se pretendia abrir para a lavoura, de cinco a dez eram destruídos pelo fogo descontrolado. Já no século XX, começaram a ser destruídos o Cerrado e a Amazônia. O Cerrado, como aconteceu com a Mata Atlântica, está sendo visto como um embaraço que deve ser superado. A expansão da fronteira agrícola, destinada à produção de grãos para a exportação, vem dizimando este bioma (SUERTEGARAY, 2004). Segundo Nobre (2004), dos anos 1950 para cá o mercúrio continua sendo usado nos garimpos. A fronteira agrícola continua em expansão. Existem 30 mil focos de queimadas por mês no País durante a época da seca e os desmatamentos nas encostas ainda provocam erosão e enchentes. As queimadas contribuem em muito para o aumento do efeito estufa causado pela emissão de gases, principalmente o CO2, produzidos pela queima de combustíveis fósseis. Segundo Suertegaray (2004), estudos indicam que, na Amazônia, a soja e a pecuária induzem as queimadas e o desmatamento, que marca o início de uma desastrosa transformação ambiental. Inclui-se, entre outros efeitos, processos de exposição do solo, da lavagem superficial com perda de solo, do assoreamento dos rios e, ainda, dos processos de arenização que podem fazer da Amazônia um grande deserto. A expansão do agronegócio (atividade agrícola em que a produção destina-se basicamente ao mercado externo), que até os anos 80 concentravam-se nos Estados do Sul, agora se expande às regiões centro-oeste, oeste da Bahia, sul do Maranhão e Piauí. O cerrado, que permaneceu por longos anos área de “reserva” para a expansão agrícola, devido à infertilidade do solo e à escassez de água, pelos efeitos da tecnologia, se tornou um obstáculo superado (YOUNG; STEFFEN, 2005). Vários são os problemas ambientais indicados como associados ao agronegócio. Entre eles: desmatamentos, perda da biodiversidade, erosão hídrica (ravinas e voçorocas), formação de areais, assoreamento Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 dos cursos d’água, contaminação do lençol freático, salinização, perda e envenenamento do solo, esgotamento potencial dos recursos hídricos (comprometimento dos mananciais). O elevado investimento degrada, não só o ambiente, mas também expropria a população de seu hábitat tradicional, destruindo seus ritos, cultura, representações e formas de produção aliadas à conservação (SUERTEGARAY, 2004). A destruição continuou, as lições não foram aprendidas e chegamos, ao século XX, novamente vitimando as comunidades indígenas com moto-serras e tratores. Dos 3,5 milhões de índíos que existiam nessas terras resta apenas o equivalente à metade da população de um bairro como Copacabana. Os Pataxós, que viram Cabral chegar com suas caravelas em Porto Seguro, há quinhentos anos, até hoje apanham da polícia do homem branco e arriscam ser queimados vivos quando protestam por suas terras (PÁDUA, 2005). Poucos produtores conhecem ou dão valor ao conhecimento do ambiente específico em que atuam. Isto já ocorria no século XVI quando os colonizadores não conheciam a biodiversidade brasileira e introduziram espécies nativas da Europa, menosprezando o conhecimento dos índios Tupi. Segundo Dean (1996), a destruição de florestas tropicais é irreversível no âmbito de qualquer escala temporal humana. Quando a floresta tropical é destruída, a perda em danos de diversidade, complexidade e originalidade não é apenas maior que a de outro ecossistema: é incalculável. É uma tragédia cujas proporções ultrapassam a compreensão ou concepções humanas. As intervenções humanas quase nunca realizam as expectativas, os resultado são campos empobrecidos, pastos magros, cidades sem água, homens e animais sem casa nem comida. Quais as ações que podemos adotar para reverter essa situação? Com certeza, investimentos na agricultura familiar, novas tecnologias para uso da água e investimentos que ajudem as populações ribeirinhas e que vivem nas florestas. Yong e Steffen (2005) citam políticas no Amazonas que aumentaram a renda da população compatíveis com a sobrevivência da floresta, valorizando financeiramente o uso sustentável da floresta. Isso incluiu o licenciamento de planos de manejo florestal de pequena escala e incentivos à extração de produtos nãomadeireiros, como borracha, óleo de andiroba, copaíba e outras essências, mel, açaí, enfim, uma enorme diversidade de produtos que a floresta proporciona. Aumentando a renda média dos produtos florestais fica bem mais fácil conter o processo de conversão para atividades alternativas. Por outro lado, foi feito um esforço de regularização fundiária, para impedir o desmatamento como “produtor” de direitos de proprie79 dade. Junto com outras políticas que encaram que preservação florestal não se faz apenas com coerção, com essas ações a área desmatada caiu de 1.734 km2 para 1.054km2. (YONG; STEFFEN, 2005). através da Faculdade de Educação, assumiu a responsabilidade de oferecer, no ano de 2004, conforme contrato, os cursos solicitados pelas Diretorias de Ensino dos municípios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté. O conhecimento das leis ambientais é um elemento indispensável para a avaliação de diagnósticos ambientais. Conforme ressaltam os PCNs de Meio Ambiente, “a compreensão da organização administrativa do poder público (ministérios, secretarias, diretorias, departamentos) também auxilia os alunos a se posicionarem como cidadãos participativos. Afinal, apesar de o Brasil possuir um dos mais elaborados sistemas de leis de preservação ambiental, nossa realidade é extremamente problemática, pois essas leis não são cumpridas, pelo desconhecimento da população, por descaso ou por diversos outros fatores” (PCN EM AÇÃO, 2000) O presente trabalho surgiu da necessidade de oferecer aos professores que atuam na rede pública estadual um curso que contemple os conteúdos específicos da área de atuação com aplicação de temas interdisciplinares como, por exemplo, o tema transversal meio ambiente. 5. METODOLOGIA A necessidade de ampliar os estudos na área ambiental nas escolas levou-nos a elaborar a presente proposta. Ressalta-se a importância de trabalharmos as questões ambientais durante a formação do docente, assim como nos cursos de aperfeiçoamento. O tema Meio Ambiente foi trabalhado com 83 professores da rede pública inscritos no programa de formação continuada do Estado de São Paulo oferecido pela Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP) nos municípios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté. A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, visando à capacitação de professores do ciclo II do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, que atuam em sala de aula nas escolas estaduais jurisdicionadas à Diretoria de Ensino criou, no ano de 2003, o Programa de Formação Continuada de Professores denominado Teia do Saber. Segundo o Projeto Básico do Programa de Formação Continuada “Teia do Saber” (2004), esse programa tem como objetivo oferecer à população uma escola pública de qualidade, favorecendo o acesso à cultura, à arte, à ciência, ao mundo do trabalho, educando para o convívio social e solidário, para o comportamento ético, para o desenvolvimento do sentido da justiça, o aprimoramento pessoal e a valorização da vida. O êxito desse empreendimento requer o preparo intelectual, emocional e afetivo dos profissionais nele envolvidos. Por essa razão, prioriza-se, entre suas ações, a formação dos educadores que atuam nas escolas. O projeto da Secretaria de Educação prevê a participação de instituições de ensino superior contratadas para realização de cursos de capacitação e aprimoramento dos professores da rede pública estadual. A UNIVAP, 80 Por determinação da Secretaria da Educação, no final de cada encontro (1) seria realizada uma avaliação através de um questionário. Este material serviu de base para compor os resultados deste estudo, uma vez que a opinião dos professores/alunos sobre o tema foi de suma importância para a nossa fundamentação. Após a aplicação da presente proposta no curso Teia do Saber, o projeto da História Ecológica, além dos cursos de História e Geografia, foi aplicado também para os cursos de Graduação: Licenciaturas em História, Geografia, Matemática e Ciências Biológicas, o que foi realizado no ano de 2005. Em forma de explanação, realização de atividades em sala de aula e prática de campo, buscou-se instrumentalizar os professores para a sua prática pedagógica. Uma das estratégias utilizadas foi, através da análise da paisagem, fazer com que os docentes percebessem a ação antrópica no ambiente, relacionando os fatos históricos aos impactos das plantações de café no Vale do Paraíba. Ao término da aula, os professores responderam um questionário de avaliação relativo à sua aprendizagem e à viabilização do tema em sala de aula. A aplicação do tema no curso de graduação de Matemática e Ciências Biológicas da UNIVAP se deu sob a forma de palestra dentro das disciplinas Seminários de Matemática e prática de Formação de Professores. O questionamento sobre a aplicação do conhecimento da História Ecológica nos projetos de meio ambiente foram respondidos pelos alunos através do questionário investigativo. 6. RESULTADOS E DISCUSSÕES Os resultados obtidos através da aplicação de questionários (Tabelas 1 a 3) revelaram a importância dos conhecimentos históricos para reflexão de atitudes. O presente trabalho sugeriu uma abordagem interdisciplinar das questões ambientais, reforçando a importância do meio ambiente com os fatos históricos na tentativa de proporcionar ao educador conhecimentos e habilidades necessárias para trabalhar com projetos de Educação Ambiental nas escolas. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Um aluno, além de considerar importante os conhecimentos históricos no estudo da ecologia e diagnóstico dos problemas ambientais, ressaltou que o tema serve como parâmetro para mudança de atitudes. Um outro destacou a importância do conhecimento histórico na interpretação da realidade. A maioria dos alunos responderam que a História Ecológica é uma ferramenta importante nos projetos de meio ambiente nas escolas. Araújo (2002) realizou um trabalho investigativo também com questionários aplicados a professores da rede pública de PortoVelho–RO. Como resultado, obteve várias respostas de como a educação ambiental é vista pelos professores. O resultado foi relatado com as seguintes afirmações dos alunos-professores: “o professor de Ciências e Geografia é que deve tratar o assunto. Afinal, eles estudam isso na faculdade”; “sei que tenho responsabilidade para com o meio ambiente, as drogas, o sexo entre meus alunos, mas não me sinto preparado para lidar com nenhum desses pontos. Não tive nada disso na minha formação”. A ressonância desses discursos na escola levounos à elaboração da presente proposta, como forma de ressaltar a importância de trabalhar as questões ambientais já na formação do docente na graduação e também nos cursos de aperfeiçoamento dos professores da rede pública como foi comprovado através do trabalho de Araújo (2002). Professores ressaltaram não terem sido preparados na graduação para lidar com os temas transversais. A História Ecológica é uma ferramenta importante na formação do educador. Preparado, o docente poderá abordar o assunto com mais propriedade nas salas de aulas contribuindo significativamente nos projetos da escola, independentemente de sua área de formação. todo esse conhecimento para conscientização de uma geração que não conta mais com vastas matas, rios que parecem não ter fim e solos em que “se plantando tudo dá”. Infelizmente, o brasileiro tem um rico vocabulário para exprimir sua opinião sobre o assunto: “pois é”, “não tem jeito não”, “tá cada vez pior”, “o povo aqui é assim mesmo”, “a culpa é do governo”, “deixa pra lá”, “não adianta” “o problema não é meu”, são algumas das expressões mais ouvidas. O resultado dessa mentalidade foi a destruição. Não devemos simplesmente lamentar a destruição, mas aprender com o passado e fazer diferente, adotando medidas preventivas e salvando o que ainda pode ser salvo. Cabe ao educador mudar essa mentalidade, colocando em suas aulas a importância da preservação do meio ambiente e da biodiversidade, seja ele professor de Biologia, História, Geografia, Matemática. Somente desta forma é que a sustentabilidade deixa de ser um plano que consta somente no papel, e passa a ser um instinto, dentro de cada um. Uma condição que deve preponderar na educação é a capacidade de produzir conhecimento para que seus povos possam promover seu desenvolvimento humano de forma racional e sustentável. Este é um trabalho que deverá caber, especialmente, aos educadores que querem fazer a diferença na educação do Brasil. 8. NOTA (1) As aulas realizam-se aos sábados, nos campi da instituição, com uma carga horária total de 80 horas. 9. BIBLIOGRAFIA ANDRADE, R. C. Interdisciplinaridade - Um novo paradigma curricular. Disponível em http:// www.suigeneris.pro.br/edvariedade_interdisciplin1.htm. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS A História Ecológica é uma ferramenta importante para conscientização dos problemas ambientais enfrentados na atualidade. Diante dos fatos históricos, tentamos aprender com os erros. Segundo Leonardo Boff (2003), apesar de sermos reféns de um modelo civilizatório depredador e consumista, surge a urgência da espiritualidade que nos leva a cuidar da vida em todas as suas formas porque vivemos nelas excelência e valor e tudo que existe merece viver. Quando se fala em preservação dos recursos naturais, toda forma de conhecimento deve ser considerada, seja através da Filosofia, da História, da Ecologia e da espiritualidade. Há várias formas de abordagem das questões ambientais e a histórica é apenas uma delas que foi ressaltada neste trabalho. O educador deve se apropriar de 82 ARAÚJO, M. L.F. Meio Ambiente e Prática Pedagógica. Disponível em: www.unir.br/primeira/artigo126.html. 2002. ASSUNÇÃO, P. de. 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Disponível em: <http://www.oeco.com.br. 2005>. PARÂMETROS EM AÇÃO, meio ambiente na escola: Guia de atividades em sala de aula./Secretaria de Educação Fundamental . Brasília: MEC; SEF, 2001. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 83 Planejamento Urbano, Controle Social e Privilégios Luciane de Menezes Siqueira * Emmanuel Antonio dos Santos ** Resumo: O planejamento urbano no Brasil tem tradição de utilizar-se de modelos já desenvolvidos em países europeus. Visando conhecer estes modelos de planejamento, o presente estudo faz uma abordagem teórica e identifica como estes foram, e são, utilizados no país. A abordagem teórica abrange um período histórico que vai do final do século XIX ao início do século XXI. Palavras-chave: Capitalismo, planejamento urbano, Estado, controle social. Abstract: Urban planning models already developed by some European countries are traditionally adopted in Brazil. With the objective of knowing these urban planning models, this paper studies the theoretical approach about the urban planning models and identifies how they were and are being used in Brazil. The theoretical approach covers the period from the beginning of the 19th century up to the 21st century. Key words: Capitalism, urban planning, State, social control. 1. INTRODUÇÃO Ao final do século XIX o Brasil já é uma República, não conta mais com mão-de-obra escrava, as terras já haviam sido reforçadas como propriedade privada, através da Lei de Terras, e as primeiras atividades industriais, como base econômica, começam a se desenvolver nas cidades. O país apresentava, portanto, condições propícias para inserir-se no modo capitalista de acumulação, e para tanto passa a desenvolver planos urbanísticos como forma de tornar as cidades atraentes ao capital internacional e mostrar ao mundo sua nova condição, ou seja, a condição de modernidade. consolidar durante todo o século XX no Brasil: a modernização excludente, ou seja, o investimento nas áreas que constituem o cenário da cidade hegemônica ou oficial, com a conseqüente segregação e diferenciação acentuada na ocupação do solo e na distribuição dos equipamentos urbanos. Com base nesses pressupostos este artigo pretende caracterizar os modelos de planejamento urbano desenvolvidos na Europa e nos Estados Unidos, e indicar como foram utilizados no Brasil. 2. A ORIGEM DO PLANEJAMENTO URBANO Para tanto, o Estado brasileiro, e sua elite dirigente, passam a utilizar-se de planos urbanos, seguindo os modelos já desenvolvidos em países europeus e nos Estados Unidos, modelos estes “distantes da nossa realidade”, (MARICATO, 2000). Estes modelos de planos urbanos serviam aos interesses da elite dirigente e escamoteavam os conflitos sociais, que se refletiam sobre o espaço urbano, derivados da mudança do modo de vida que passou a ocorrer nas cidades desde o final do século XIX. O planejamento urbano, de modo formal, tem origem na Europa do século XIX, quando as cidades, além de serem sede do aparato produtivo - da indústria - passaram a ser sede do alojamento da mão-de-obra. As cidades não tinham infra-estrutura que permitisse alojar adequadamente o contingente populacional que migrava às cidades, levando conseqüentemente a um adensamento dessa população em cortiços nas áreas centrais das cidades. Segundo Maricato (1997, p. 30), este urbanismo que se inaugurava no país seria o urbanismo que iria se As péssimas condições físicas das cidades, associadas às péssimas condições de vida dos trabalhadores urbanos - que já se organizavam em sindicatos e reinvidicavam melhores condições de vida e trabalho passaram a ser foco de ação planejadora do Estado inglês, quando teve fim o regime liberal, no final da primeira metade do século XIX. * Mestranda em Planejamento Urbano e Regional PLUR, UNIVAP, 2006. ** Professor da UNIVAP. 84 Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 As cidades que se industrializavam tinham de se adequar à nova ordem capitalista vigente e passam a se utilizar do urbanismo – “que pertence de fato e direito, essencialmente, ao saber arquitetônico” (SOUSA, 2004) - como forma de organizar e ordenar as cidades. tes, além dos demais posteriores, foram seguidos por vários países no mundo, incluindo aí o Brasil. Cidade saneada, remodelada, significava reprodução saudável das forças de produção, conseqüentemente significaria maior produtividade. Cidade saneada significaria manutenção e reprodução do capital. As cidades tinham de se tornar eficientes ao capital e adequar-se a este. Segundo Campos Filho (1992) a primeira linha de urbanismo, pós-Revolução Industrial, foi o urbanismo sanitarista. Este tinha por preocupação básica as condições dos bairros e habitações, visando a melhoria das condições sanitárias do ambiente urbano. Encarava os problemas urbanos com racionalidade e julgava que melhorias técnicas no ambiente construído resolveriam os problemas sociais - como se estes fossem somente uma questão de formatação espacial. As intervenções urbanas foram sendo realizadas, objetivando que as cidades passassem a ter eficiência, tornando-se mais propícias à ordem capitalista, dando por embico as primeiras formas de planejamento urbano. Conforme Souza (2004, p. 158) as intervenções urbanísticas estavam mais preocupadas com a funcionalidade, a estética e a “ordem” que com a justiça social (ou, fantasiosamente imaginando que uma remodelação espacial trará, por si só, “harmonia social”), não obstante ela conter uma óbvia e essencial dimensão espacial. A ação planejadora sobre as cidades em deterioração, e implicitamente sobre a sociedade, visava, sobretudo, torná-las aptas ao desenvolvimento capitalista, adaptando-as a este em cada uma de suas etapas de transformação a partir de então. A ação planejadora passou a ser objeto de obtenção de controle no, e sobre, o espaço urbano, visando a manutenção, e conseqüente domínio, do status quo das forças capitalistas. Controle sobre a cidade, sobre seu ordenamento, significa, implicitamente, ter controle sobre a sociedade que nela vive. Sociedade controlada, manipulada, facilitada fica a dominação. Desde o final do século XIX até o século presente, várias linhas de pensamento se juntam a linhas de ação, formando, portanto, um modelo, para melhor tentar adaptar as cidades às transformações ocorridas com o sistema capitalista. Todos os modelos propostos são aqui considerados como planejamento urbano, mesmo aqueles que exarcebavam a preocupação com o urbanismo, julgando que a resolução dos “problemas urbanos” estaria vinculada a uma melhoria das formas espaciais urbanas. É bom deixar claro que se sabe que no presente momento histórico, o “planejamento urbano inclui o Urbanismo (ou desenho urbano); o último é um subconjunto do primeiro” (SOUZA, 2004, p. 56). Mas até o começo dos anos 1940, o urbanismo foi considerado como planejamento urbano, por isso se torna importante fazer considerações sobre seus modelos, especialmente porque esRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 3. MODELOS DE PLANEJAMENTO URBANO EUROPEUS A questão do saneamento deu origem à legislação urbanística que estabelecia normas para a ocupação urbana, visando evitar adensamentos populacionais em determinadas áreas. De acordo com Campos Filho (1992, p.6) “Estas normas se constituíram, aos poucos, em códigos de regulamentos urbanísticos quanto às edificações e ao uso, à ocupação e ao parcelamento do solo para fins urbanos e as políticas de transporte correspondentes. Esses equivalem aos atuais códigos de zoneamento”. Cullingworth, citado por Souza (2004, pp.251-252), argumenta que o espírito que acompanha o zoneamento desde seus primórdios, como os propósitos de promover a saúde e o bem-estar geral, prevenir o superadensamento etc, omite aquele que é, de longe, o mais importante: a exclusão de pessoas ou usos indesejáveis, e por via de conseqüência a preservação do status quo. Verifica-se que o zoneamento passa a ser utilizado como instrumento regulamentador da segregação sócioespacial que é desejada por uma elite dominante objetivando manter seu controle no e sobre o espaço urbano. Em seguida, e muitas vezes simultâneamente ao urbanismo sanitarista, começou a surgir o urbanismo estético viário, que tem em Paris o seu maior expoente, o barão Haussmann e a Ètoile (estrela) de avenidas, tendo ao centro o Arco do Triunfo, sua maior expressão (CAMPOS FILHO, 1992). Souza & Soares (2000) informam que a reforma urbano-sanitária promovida por Hausmann implicou a demolição da parte antiga da cidade devastando quarteirões então superpovoados, igrejas e antigas construções, abrindo sobre os escombros grandes avenidas, que integravam um novo traçado viário para a cidade. Segundo Spósito (1999) muitas construções antigas foram derrubadas em nome do melhor aproveitamento dos espaços e da uniformidade da arquitetura.As 85 áreas residenciais ricas afastaram-se do centro à procura de ares mais limpos. Em nome do melhor aproveitamento do espaço, mas, no fundo, objetivando maiores lucros foram planejados imensos bairros operários, marcados por alta densidade e uniformidade. O urbanismo de Haussmann, como considerado por Campos Filho (1999), usa a monumentalidade como expressão da força da classe burguesa dominante, retratada numa preocupação da ordenação do espaço urbano. Este modelo de ordenação do espaço urbano, como proposto por Haussmann, acabou transformandose em modelo de intervenção urbanística em vários países que se inseriam no modo capitalista industrial de produção e que precisavam adequar-se à nova estrutura econômica vigente. O urbanismo sanitarista e o urbanismo estéticoviário prepararam a base para a adaptação da sociedade ao sistema produtivo industrial, levando as cidades a uma modernização subseqüente. Mas, conforme cita Souza (2004, p.125), o urbanismo modernista terá o ápice do apriorismo do planejamento urbano com as proposições de Le Corbusier. Conforme cita Campos Filho (1999), Le Corbusier propunha uma arquitetura e urbanismo dos grandes centros urbanos e do industrialismo, em que procurava combinar áreas verdes e edificações verticais, visando uma alta densidade urbana, redutora dos custos de urbanização, pela menor extensão de infra-estrutura e equipamentos urbanos. Comparava a cidade a uma máquina de morar. A cidade deveria funcionar como um instrumento, como uma máquina, deveria ter eficiência. A estética corbusiana caracterizava-se pelo despojamento e pelo primado da função, e diferentemente da cidade pós-liberal, que privilegiava as funções produtivas, entre elas as terciárias, privilegiará as funções urbanas na seguinte ordem: habitar, trabalhar, cultivar o corpo e o espírito, circular (BENÉVOLO, 1999, p. 630). As idéias de zoneamento, ou de diferentes usos do solo, surgidas na Alemanha do século XIX, ganharam força com as proposições de Le Corbusier. Segundo Souza (2004, p.253), “as idéias de Le Corbusier preconizavam que os diferentes usos da terra, sobretudo as diversas funções básicas do viver urbano, produzir, circular, morar e recrear-se, deveriam ser objeto de uma separação rígida”. Estas idéias encontram seu ponto culminante em 1933, na quarta edição dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna - CIAM-, do qual derivou a Carta de Atenas. Conforme Bologna (2000), a Carta de Atenas foi 86 um manifesto, gerado pelos urbanistas presentes no CIAM de 1933, o qual indicava um modelo de cidade, analisando as necessidades humanas universais, no quadro das quatro grandes funções propostas por Le Corbusier. A separação funcional era a chave mestra do “ordenamento” da cidade e de sua modernização. Esta proposta de plano de cidade será adotada em vários países, como França, Japão, Estados Unidos e África do Norte. No Brasil, nos anos 1950, Lúcio Costa e Oscar Niemeyer idealizam Brasília. Percebe-se, que o zoneamento urbano foi o instrumental encontrado e utilizado para tornar as cidades, e implicitamente a sociedade, eficientes e domesticadas. Segundo Bridley et al. (apud SOUZA, 2004), o grande boom populacional verificado no pós-guerra e a nova fase em que se encontra o capitalismo, no caso em sua fase monopolista em um período político de Guerra Fria, induzem o Estado a um maior controle sobre o território e suas cidades, e implicitamente sobre a sociedade. Neste contexto, grandes sistemas de planejamento começaram a se estabelecer e o Estado passa a fazer uso de seus poderes de controle e disciplinamento da expansão urbana e de uso da terra. É o período do planejamento regulatório. Castellls (apud SPÓSITO, 1998, p. 67) afirma que o “capitalismo precisa de uma concentração do poder político, e cria condições para a formação de uma tecnocracia, apoiada na competência dos especialistas, que em nível das cidades produz uma planificação urbana sem particularismos através de programas nacionais”. Nos anos 1960, o planejamento físico territorial começa a sofrer algumas intervenções derivado da nova maneira de enxergar as cidades, apoiadas na evolução da metodologia adotada pela teoria geral dos sistemas, desenvolvida para fins militares durante a Segunda Guerra Mundial. Segundo Souza (2004) o que na prática aconteceu é que o planejamento urbano começou a absorver elementos do enfoque sistêmico, tendo o seu vocabulário e o seu instrumental enriquecidos e sofisticados sem que a essência fosse muito modificada.[...]. A racionalidade instrumental se volta exclusivamente para a adequação dos meios a fins preestabelecidos, permanecendo estes últimos inquestionáveis. Todo o aparato regulatório que foi absorvido pelo planejamento urbano encontrou respaldo nas proposições do modelo keynesianista/fordista. Este perdura do início do século XX até a década de 1970, quando a crise mundial do petróleo, associada ao avanço da tecnologia, Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 implicará desemprego e transporá uma nova adequação mundial ao sistema capitalista, levando conseqüentemente ao enfraquecimento dos Estados nacionais. O enfraquecimento dos Estados nacionais implicará o retorno do liberalismo em nova formatação: o neoliberalismo. O neoliberalismo e o avanço da tecnologia implicarão, a partir dos anos 1980, uma globalização da economia e esta levará o capital a ser volátil em razão de sua busca incessante por mercados consumidores. O capital volátil implicará uma competição, ou em uma guerra, entre os lugares na intenção de atraí-lo. A partir de então os lugares, ou melhor, as cidades, têm de se adaptar à nova ordem e passam a se utilizar de modelos e estratégias empresariais para planejar a nova forma de organizar, e ordenar, a cidade, ou, entenda-se, a nova maneira de direcionar investimentos públicos para atender às demandas do capital. Segundo Compans (1999, p. 108) a competição entre as cidades refletirá a competição das empresas, que na busca por incrementos de produtividade procuram se situar naquelas localidades que mais oferecem condições para tanto. Para Souza (2004, p. 30) o planejamento baseado em estratégias empresariais rompe com o espírito regulatório dos anos 70, “na medida em que deixa de tentar domesticar ou disciplinar o capital para, pelo contrário, melhor se ajustarem aos seus interesses, inclusive imediatos”. O mais conhecido, e divulgado, modelo de planejamento estratégico é o da cidade de Barcelona -Espanha, mas a utilização de técnicas empresariais para gerir as cidades em crise encontra sua origem na Baltimore - USA - dos anos 1960. O Plano Estratégico de Barcelona propõe obras de revitalização urbana, valorizando alguns locais, bem como valorizará a imagem de novos monumentos, como forma de mostrar ao mundo sua nova inserção na pósmodernidade, fazendo uso, para tanto, do city marketing. Para Vainer (2000, p. 77), o planejamento estratégico traz consigo “um discurso que se estrutura sobre a articulação de três analogias constitutivas: a cidade é uma mercadoria; a cidade é uma empresa; a cidade é uma pátria”. Para Compans (1999, p. 108), “A lógica simbiótica da cidade-empresa é ambivalente à da cidade-mercadoria, que deve promover sua imagem no exterior com vistas a exercer atração de investidores, e ao mesmo tempo facilitar suas ‘exportações Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 de bens, serviços e profissionais. Ambas atribuem aos governos locais uma espécie de papel de capitalista coletivo, na medida em que’ a mercado tecnia da cidade, vender a cidade, converteu-se, portanto, em uma das funções básicas dos governos locais e em um dos principais campos de negociação público-privada”. (BORJA; FORN, 1996, p. 33) A estratégia utilizada para legitimar a cidade-empresa, e manipular a grande massa trabalhadora para aceitar a nova condição da cidade, encontra respaldo na crise econômica. Conforme argumenta Vainer (2000), a sensação de crise induz a população ao consenso da urgência de respostas urbanas para uma reativação econômica, e do emprego, nas cidades. Este consenso se transforma em um consistente e durável patriotismo de cidade, que será, ao mesmo tempo, resultado e condição do sucesso do planejamento estratégico. Este patriotismo será ainda mais exacerbado, e manipulado, quando os governos locais começam a utilizar a estratégia de realização de obras monumentais. Estas serão utilizadas como uma marca da cidade que identifica seus usuários e lhes proporciona amor cívico Ressalve-se que estas obras, aí incluindo obras de arte em espaços públicos e prédios de arquitetura arrojada, com perfil de pós-modernidade, localizam-se em áreas pré-selecionadas, em áreas nobres da cidade. Mas, a demanda insolvável da população não se importará com esses investimentos, em áreas nobres, porque enxergam que estes lhes garantirão o retorno do emprego, sendo assim, consentem na gentrificação. Mais uma vez a população é manipulada segundo os interesses capitais. Percebe-se que a busca de consensos é uma técnica de obtenção de controle social. O que se verifica é que, de acordo com as especificidades apresentadas pelo desenvolvimento do capitalismo, particularmente em se falando no período compreendido entre meados do século XIX e começo do século XXI, várias atividades de planejamento urbano, contendo propostas urbanísticas, vêm sendo criadas como forma de “organizar” as cidades e torná-las atraente ao capital e sua reprodução. 4. O PLANEJAMENTO URBANO NO BRASIL No Brasil, somente a partir dos anos de 1870, com o início de uma sociedade urbano-industrial favorecida pela atividade cafeeira, começará a haver uma preocupa87 ção em tornar as cidades “atraentes” ao capital internacional. Para que isso ocorresse, o país, e sua elite agrária dirigente, passa a utilizar-se de planos urbanos - entendidos como atividades de planejamento urbano que incorporam discurso e ação concreta do Estado sobre o urbano - seguindo os modelos já desenvolvidos em países europeus e nos Estados Unidos. Quando, já na década de 1870, as cidades brasileiras começaram a expressar um desconforto ambiental, com proliferação de cortiços e doenças, devido ao êxodo em sua direção, começa a haver uma preocupação da elite agrária, que nas cidades tinham residências, quanto à salubridade e quanto ao seu afastamento desta população desprovida. Sousa & Soares (2002, p. 21) relatam que no Rio de Janeiro a situação apresentava-se caótica, “a imagem de cidade doente consolidava-se, tornando necessário um projeto de reforma urbana. As casas insalubres, as ruas estreitas, a sujeira e a pobreza envergonhavam as autoridades diante da presença de visitantes estrangeiros, comprometendo e afugentando interesses comerciais”. Em 1875 o Rio de Janeiro, representado por sua elite dirigente, na Comissão de Melhoramentos da Cidade do Rio de Janeiro, criada em 1874, apresentará o primeiro documento com propostas de melhoramentos para a cidade, o Plano de Melhoramentos, conhecido também como o “Plano de Engenheiros”, o qual credita Villaça (1999, p. 193), ser o marco referencial do nascimento do planejamento urbano no Brasil, porque pela primeira vez se utilizará os conceitos de “plano” e “global” associados ao espaço urbano. Mas, somente após a Proclamação da República as propostas de melhoramento ganharão vulto. Conforme cita Nestor Goulart (apud SOUSA; SOARES, 2002, p. 25), as primeiras administrações republicanas tiveram como um de seus objetivos fundamentais a modernização das principais cidades, sobretudo da capital federal, para estabelecer o contraste com os feitos da monarquia, cujo vínculo principal era com a escravidão. Os planos de renovação urbana se inspiraram na reforma de Paris, executada pelo prefeito Haussmann no período de 1853-1870. A renovação das cidades se deu nas áreas centrais e em novos bairros destinados ao uso das classes dominantes e às faixas de renda média. Os centros passaram por reformas amplas e programas de renovação. Villaça (1999), considera que o ápice dos planos de embelezamento no país, e de sua efetivação, e que foi modelo para as demais capitais do país, está no plano de reformas 88 para a cidade do Rio de Janeiro, elaborado por Pereira Passos, governador nomeado do Rio de Janeiro em 1903. Oliveira Reis (apud VILLAÇA, 1999), chega a argumentar que foi impressionante a coincidência, para não dizer a exatidão, entre a obra efetivamente executada e o plano elaborado por Pereira Passos. Mas, como alerta Villaça (1999) “isso nunca mais viria a acontecer”, mesmo que os Planos Agache, para o Rio de Janeiro, em 1926, e de Prestes Maia, em 1945, para São Paulo, tivessem sido razoavelmente cumpridos. Estes dois últimos, pela novidade de seus conteúdos, marcaram uma nova etapa na história do planejamento urbano no Brasil, e foram modelo de planejamento para as demais cidades do país, no período que perdura entre o final dos anos 1920, quando ocorreu a grande crise mundial e o país começou a se industrializar, até o início dos anos 1950. Os Planos Agache e Prestes Maia, apesar de serem planos globalizantes, deram ênfase à circulação e privilegiaram de investimentos as áreas centrais. Entretanto, a ênfase dada à circulação indica que esses planos serviam aos interesses relativos ao início da sociedade urbano-industrial, verificado no período de 1930 a 1950, em que a cidade da produção tinha que ser eficiente, por isso especial atenção ao aspecto da circulação em detrimento aos problemas urbanos que se avolumavam. Conforme Villaça (apud MARICATO, 1999, p. 125) “o plano discurso cumpre um papel ideológico e ajuda a encobrir o motor que comanda os investimentos urbanos”. De acordo com Bologna (2000), a partir da década de 1950, intensificou-se, nos países latino-americanos, em particular no Brasil, a intervenção do Estado na definição da política econômica e em outros setores. Foi então que passaram a atuar a Comissão Mista Brasil - EUA (1951-1953) e o Grupo Misto BNDE/CEPAL (1953-1955). Esses grupos pretendiam implantar no Brasil um processo de industrialização, como forma de alcançar a independência econômica do país. A referida autora, identifica que no Brasil essa foi a época da ideologia desenvolvimentista que caracterizou o governo do Presidente Juscelino Kubitscheck (1955-1960). Durante este período, o Estado passou a adotar o planejamento econômico como única forma capaz de possibilitar a superação do atraso da economia e da miséria da população. Como cita Maricato (1997, p. 37) o desenvolvimento dos anos 1950 que sustentou o processo de acumulação no Brasil, teve por base a indústria de bens duráveis (automóveis, máquinas, eletrodomésticos) que combinava tecnologia importada, e avançada para os padrões brasileiros, com baixos salários. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Foi nos anos 1950, que “o encarecimento do preço da força de trabalho e da produção de certas mercadorias nos países centrais, induziram esses países a um movimento de industrialização no sentido da periferia” (OLIVEIRA 1982, p. 48), e que o processo de industrialização nacional passou a ter significativo e crescente controle do capital internacional. Neste contexto as atividades de planejamento urbano passaram a atender às exigências do capitalismo internacional em expansão, que intensificava a busca por vantagens geográficas na instalação de suas unidades de produção, e tem início os superplanos de caráter urbano e regional. Através do Plano de Metas, no governo de Juscelino Kubitscheck, entre os anos 1955 e 1960, e dos PNDs (Planos Nacionais de Desenvolvimento) nos governos militares, que ocorreram entre os anos 1964 a 1980, são lançadas as bases para a introdução dessa industrialização, ou do capitalismo monopolista, através da intensificação de uma rede de transportes rodoviários e de comunicações, objetivando uma maior integração territorial, visando a formação de um mercado de consumo que pudesse dar sustentação ao desenvolvimento das forças produtivas capitalistas internacionais no país. No governo de Kubitscheck, a construção de Brasília no planalto central, um velho sonho desde o Im- pério, teve um destaque primordial na nova aparência do país (BECKER, 1998, p. 86). Considerada como “metassíntese do Plano de Metas” (BOLOGNA, 2000, p. 24), a construção de Brasília, baseada nas proposições de Le Corbusier e nas referências da Carta de Atenas teve, de acordo com Becker (1998, p. 86), um significado simbólico de que o país estaria se desenvolvendo. O desenho da cidade se confunde com o de uma nova sociedade: racional, ordenada e eficiente. Mas como se sabe, o ideal de cidade justa, infelizmente, não foi alcançado. Conforme relata Maricato (1997, p. 39), “o ideário modernista, a utopia construída pelos arquitetos de organizar a cidade separando as diferentes funções, passou a ser incorporado ao urbanismo brasileiro por intermédio de leis de zoneamento e planos diretores, consolidando nas décadas seguintes um conjunto de idéias fora do lugar”. Em seu projeto de modernização, o Brasil cresceu economicamente, mas fez aprofundar as disparidades sociais nas cidades que se industrializavam. Em decorrência da migração campo-cidade, é provocada uma crescente urbanização nas cidades que se industrializavam. Na Tabela 1 pode ser verificado o crescimento da urbanização no país neste período. POPULAÇÃO URBANA Tabela 1 - População urbana POPULAÇÃO e rural - 1960-1996 RURAL 1960 31.303.034 1970 52.084.984 1980 80.436.409 38.767.423 41.054.053 38.566.297 Fonte: Censos demográficos de 1960 a 1991 e contagem da população de 1996. A partir dos anos 1950, o país se torna predominantemente urbano. A crescente urbanização levou a conurbação entre as cidades, dando origem a grandes metrópoles e grandes problemas, especialmente os de habitação e infra-estrutura. Como a industrialização brasileira é caracterizada por baixos salários, o acesso à habitação fica restrito às faixas de maior renda, e as faixas menos providas acabam se direcionando as áreas periféricas das cidades, muitas vezes com deficiência de infra-estrutura, ou então ocupam o solo ilegalmente. Conforme cita Bologna (2000, p. 24), “o Estado não havia formulado uma política urbana consistente e abrangente à altura do acelerado processo brasileiro de Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 urbanização”. Há de ser lembrado, como referenciado por Oliveira (1982, p. 50), que “quando as indústrias começaram a se instalar no país, trouxeram dentro de si uma complexa divisão social do trabalho, onde se destacava a enorme gravitação do trabalho improdutivo, de gerentes e executivos, o que deu origem a grande classe média do Brasil”. Por representarem os interesses do capitalismo monopolista no país, o Estado, voltado ao aspecto do urbano enquanto localização, passou a “atender demandas da classe média, dando por contraste o desatendimento da forma mais absurda possível das demandas das classes mais baixas na estrutura de classes da sociedade, das demandas do operariado, das demandas das classes po89 pulares em geral” (OLIVEIRA, 1982, p.51). Quando a população brasileira começa a se contrapor a esse sistema perverso de exclusão, ou contrapor-se à “modernidade da pobreza”, como diz Becker (1999, p. 169), e ter apoio do então Presidente da República, João Goulart, acontece o golpe militar. Ao capturar o poder político, que implicitamente recapturava os interesses do capitalismo, já que o momento é de Guerra Fria, as forças armadas introduzem no planejamento, não só sua burocracia de base técnica, que requer planos para sobreviver, mas também o seu estilo autoritário-tecnocrata. O Estado Nacional se utilizará do planejamento regulatório. Bologna (2000, p. 24), cita que do ponto de vista do planejamento urbano, o ano de 1964 marca o momento a partir do qual se inicia uma política voltada para a questão urbana, e que o Estado abre duas frentes de planejamento relacionadas com a cidade: “Uma, aquela do Banco Nacional da Habitação (BNH), e outra, a do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFAU), em que um dos objetivos seria estabelecer critérios, de âmbito nacional, para a execução dos programas habitacionais. No caso do BNH, os seus objetivos proclamados, de voltar-se para a chamada habitação de interesse social, logo se mostraram comprometidos em função da especulação imobiliária e do capital financeiro (baixa lucratividade em função do crescente preço da terra urbana). O SERFAU esgotouse precocemente na elaboração, ou no financiamento a particulares, de Planos Preliminares de Desenvolvimento Local Integrado, com os quais as Prefeituras se capacitavam aos financiamentos governamentais para a construção de conjuntos habitacionais” (SANTOS apud BOLOGNA, 2000, p. 24). Nos anos em que resistiu o regime militar “uma quantidade inédita de Planos Diretores foi elaborada no período. [...] Álibi ou convicção positivista, o planejamento foi tomado como solução para o caos urbano e o crescimento descontrolado. Essas idéias dissimulavam os conflitos e os reais motores desse caos” (MARICATO, 1999, p. 139). Há de ser referido que neste período foram elaborados Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND), que, em termos de planejamento regional, priorizaram investimentos maciços em redes de integração espacial, estradas, aeropor90 tos, portos e telecomunicações. Desta forma o país continuava a perseguir os ideais de integração nacional e conseqüentemente beneficiava a circulação do capital. Mas, todo o aparato desenvolvimentista, empreendido desde os anos 1955, teve como base de recursos empréstimos internacionais e estes levaram, nos anos 1970, com a crise do petróleo e o esgotamento do sistema financeiro dos países centrais, a uma fragilização do Estado nacional, o que gerou uma situação de crise interna. Esta última associada ao avanço da globalização, que provocou uma reestruturação econômica mundial, levou a uma fuga de capitais do país, conseqüentemente levando a uma situação de desindustrialização e desemprego. O desemprego acentuou a desigualdade refletida sobre o espaço urbano, sendo que cada vez tornava-se mais difícil à grande massa trabalhadora fazer parte da cidade legal. Em resposta à situação de crise econômica, de um Estado interventor e regulador, aliado à dificuldade da elite nacional se sobrepor às reinvidicações populares por reformas urbanas, vem a tona no país, nos anos 1990, via eleição direta, o Estado neoliberal. Este último transporá para os estados e municípios a necessidade de serem competitivos, o que implicará em autonomia destes quanto às suas políticas de desenvolvimento local. Neste contexto tem início a fase, que ainda perdura, de um planejamento urbano baseado em técnicas empresariais que apoiam-se, sobretudo nas proposições do Plano de Barcelona. Há de ser considerado que a mudança no Estado nacional, conforme apontado por Maricato (2001), foi resultado das diretrizes propostas pelo Consenso de Washington que preconizava uma agenda inquestionável para dirigir os destinos dos países emergentes e apresentava como princípio norteador à soberania absoluta do mercado, interna e externa dos países, acompanhado dos corolários de diminuição do Estado e de erosão do conceito de nação. Desta maneira, para a referida autora, os planos estratégicos combinaram bem com as diretrizes do Consenso de Washington. A cidade do Rio de Janeiro tem o mais conhecido exemplo de planejamento estratégico no país, e contou para sua elaboração com um grupo de consultores catalães. Mas, como cita Compans, “O Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro provocou a inversão privilegiada de recursos públicos no atendimento das exigências do setor privado. As propostas consideradas prioritárias foram aquelas relacionadas diretamente aos objetivos estratégicos de melhoria da infra-estrutura urbana (acessibilidade, transporte e teleRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 comunicações), de criação de áreas empresariais e de atratividade de atividades econômicas, em detrimento daquelas que tratavam do emprego, da qualidade de vida, e democratização da Administração Pública”. Estas observações vão ao encontro às observações de Maricato (2000) quando esta considera que as estratégias de desenvolvimento local utilizadas no planejamento estratégico aumentam as disparidades, a segregação espacial, ao passo que privilegiam algumas áreas em detrimento a outras. Mais uma vez percebe-se que o planejamento urbano, no Brasil, apresenta um discurso, que é neste período amplamente divulgado pelo marketing, e dissimula a direção tomada pelos investimentos públicos. Não se observa uma proposição de plano urbano que vise a reprodução saudável da grande massa trabalhadora do país. O que se percebe é que o planejamento estratégico vem sendo utilizado como técnica de controle social, objetivando a manutenção do status quo capitalista. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS No transcorrer deste artigo pôde ser percebido que, tanto para a Europa e Estados Unidos, quanto para o Brasil, o planejamento urbano está vinculado à ordem econômica vigente e é instrumental de uso fundamental para o grande capital e suas forças hegemônicas poderem se reproduzir e manter seu controle sobre a sociedade que no e sobre o espaço vive. Como visto, o Brasil tem uma herança de fazer uso de modelos de planejamento urbano importados. Estes modelos, como indicado por Maricato (2000), sempre foram “distantes de nossa realidade” mas sempre serviram aos interesses de nossa elite dirigente. Segundo Villaça (1999) diferentemente da Europa e dos Estados Unidos onde o planejamento urbano corresponde, em parte, às ações concretas do Estado, no Brasil o planejamento urbano é usado como uma fachada ideológica, não legitimando a ação concreta do Estado, mas, ao contrário, procura ocultá-la. Esta afirmação pode ser observada neste texto quando se verifica que as obras realizadas através de planos urbanos privilegiam algumas áreas em detrimento a outras. As áreas privilegiadas são aquelas ocupadas e destinadas à população solvente e que possibilitam a circulação e reprodução saudável do capital. Já nas áreas ocupadas por população insolvente os investimentos são mínimos porque mínimos também serão os custos de sua reprodução. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 Para tentar reverter esse quadro, que implica segregação sócio-espacial, considera-se que o grande desafio a ser enfrentado pelas próximas gestões urbanas é o de tornar equânime, através do planejamento urbano, a distribuição das vantagens dos investimentos públicos que possibilitem a reprodução satisfatória de “toda” a força de trabalho do país. Em relação a esse desafio, alguns municípios brasileiros, especialmente de gestão de esquerda, dentre os quais pode-se citar Porto Alegre (RS), Belém (PA) e Santo André (SP), vêm, desde o início dos anos 1990, avançando nesta questão, pondo em prática o planejamento participativo como meio de democratizar o governo municipal. Um dos instrumentos, dentre outros, posto em prática neste tipo de planejamento é o orçamento participativo o qual se resume em um processo de elaboração da proposta orçamentária municipal com deliberação da comunidade, propiciando controle e poder de decisão da sociedade sobre os gastos públicos. Ao verificar a aplicação do orçamento participativo em Belém, Martins (2001) cita que no primeiro ano (1997) houve predomínio de ações locais e vitais e já no terceiro ano houve uma ampliação dos horizontes à medida que as emergências iam sendo atendidas. A autora constatou que as necessidades foram passando a expressar, não só demandas hoje necessárias, mas desejos para o futuro. Constata-se, portanto, que existe possibilidade para tornar equânime a distribuição dos investimentos públicos para a reprodução satisfatória de toda a forca de trabalho, resta, entretanto que o Estado, em todos os níveis, desprenda-se das amarras de seu clientelismo. 6. 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Key words: Rural, living way, investments, legislation, APAs. 1. INTRODUÇÃO O meio rural brasileiro, hoje, já não apresenta as mesmas características de espaço isolado e autônomo que prevaleceu até a década de 1920, quando o país tinha sua economia baseada na agroexportação. A expansão do meio técnico, nas décadas seguintes, em direção às áreas rurais passou a mostrar cada vez mais tênue a dicotomia entre urbano e rural. O meio rural vem deixando de ser sinônimo de um espaço tipicamente agropecuário. Entretanto, a expansão do meio técnico contemporâneo acirrou a competitividade entre grandes produtores latifundiários e pequenos produtores. Dentre estes últimos, alguns ainda resistentes, tiveram de encontrar alternativas para se manter no campo em face da agressiva concorrência. Com a ampliação e difusão do pensamento ecológico e com as novas necessidades de lazer do homem urbano moderno vem à tona o resgate da cultura rural que acaba por induzir e propiciar novos usos não exclusivamente agropecuários no meio rural. Graziano da Silva (1996, p. 60) cita que entre esses novos usos encontram-se atividades voltadas ao turis- * Mestranda em Planejamento Urbano e Regional PLUR, UNIVAP, 2006. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 mo, a expansão do número chácaras de lazer, pousadas, pesque-pague, restaurantes, bem como novas atividades produtivas, como a criação de abelhas, aves, plantas ornamentais e flores, que acabam por se tornar novos nichos de mercado. Desta maneira, o autor verifica que as atividades agropecuárias tradicionais já não conseguem explicar por si só a dinâmica do emprego e da população no rural do Estado de São Paulo. Conforme dados expostos pelo referido autor (1997, p. 51), no Brasil, a proporção de trabalhadores rurais em atividades não-agrícolas passou, entre 1992 e 1995, de 20,8% para 22,8%. Em São Paulo, o percentual de trabalhadores rurais ocupados em atividades não-agrícolas era, em 1992, de 35,5%, passando para 44,2% em 1995. Verifica-se, portanto, que vem ocorrendo um aumento no número de pessoas ocupadas no meio rural em atividades não-agrícolas. Veiga (apud MIRANDA, 2005) cita que a dinamização econômica de diversas regiões rurais está sendo determinada pela captação de rendas urbanas, e, entende-se em Carneiro (apud MIRANDA, 2005), que essa captação de renda urbana está relacionada com os novos usos rurais, que tendem a substituir, em grau de interesse e rendimento a unidade de produção agrícola que ali antes funcionava. A partir de observações empíricas, percebe-se que o distrito de São Francisco Xavier, localizado na área rural do município de São José dos Campos, vem passando por alterações semelhantes às que os autores aci- 93 ma citados se referiram, ou seja, o meio rural do distrito já não mais se caracteriza somente por uso agropecuário. Com base nesses pressupostos este trabalho procurara identificar as determinantes que induziram aos novos usos não-agrícolas e pecuários em São Francisco Xavier, bem como suas conseqüências. 2. CARACTERIZAÇÃO DO DISTRITO DE SÃO FRANCISCO XAVIER São Francisco Xavier é um dos distritos do município de São José dos Campos. Oficialmente, o município é constituído por três distritos: São José dos Campos (sede), Eugênio de Melo e São Francisco Xavier (Fig. 1). Fig. 1 - Mapa do Município de São José dos Campos e divisas distritais. Fonte: São José em dados - 2004. No município de São José dos Campos, o distrito sede, São José dos Campos, e o distrito de Eugênio de Melo desenvolvem atividades econômicas voltadas à industrialização, onde há a caracterização de um parque aeronáutico e aeroespacial. Entretanto, o distrito de São Francisco Xavier, afastado cerca de 60km da sede municipal, com sua localização na Serra da Mantiqueira, compondo um relevo harmonioso de montanhas e vales, possui características rurais e tem sua economia baseada na 94 pecuária leiteira e produção de derivados de leite, seguida do plantio de culturas temporárias para subsistência, feijão, milho e mandioca, e a criação de animais domésticos (PMSJC, 2004). O setor de serviços ligado ao turismo também está em crescimento, com a implantação de pousadas e produção de artesanato, o que vem caracterizando um novo meio e modo de vida rural. Conforme o Censo Demográfico de 2002 o distrito de São Francisco Xavier tem uma população total de 2867 habitantes, sendo 64% (1831) deste total de população rural e 36% de população urbana (1036). Segundo informações do administrador do distrito, Antônio Fernandes da Silva, o número total de habitantes chega a ter um acréscimo de 1200 pessoas se for considerado que a cidade é local de segunda residência para um número significativo de paulistanos e joseenses que têm, no distrito, chácaras de lazer e pousadas. Aos finais de semana e feriados acrescenta-se uma média de 2000 pessoas visitando o distrito para atividades de lazer e descanso. Através de estimativa da Associação de Turismo Sustentável - ATUS - verificou-se que o distrito possui trinta e cinco (35) propriedades com pousadas que desenvolvem atividades de turismo rural, que vêm se constituindo, junto à atividade agropecuária, a base econômica do distrito. Destas 35 pousadas, 20 são registradas no CNPJ; três (3) propriedades onde se desenvolve atividade de piscicultura, sendo que uma delas desenvolve atividade de pesque-pague que é responsável por um número considerável de visitantes ao distrito nos finais de semana; uma (1) propriedade desenvolve ranário; seis (6) desenvolvem atividade de apicultura; quatro (4) desenvolvem o cultivo de shitake (cogumelo). Em relação à produção de shitake, duas das quatro propriedades que o cultivam, a Fazenda Guirra e a Fazenda Essência, além de destinarem parte de sua produção para o Estado de São Paulo, exportam para os Estados Unidos e Europa. As outras duas produtoras de shitake direcionam sua produção para o mercado de consumo da Grande São Paulo e de São José dos Campos. Aliás, toda a produção de peixes, rãs, mel e queijo é destinada ao mercado de consumo de São Paulo e São José dos Campos. A atividade industrial tem característica de complementação de renda, em que a produção está voltada quase na totalidade a atividades artesanais, com grande parte das atividades voltadas à informalidade, totalizando 19 empresas, segundo o Cadastro Industrial de São José dos Campos. Dentre essas atividades cita-se: aparelhamento de madeiras, produção de lingüiça, produção de violas, móveis rústicos, geléias, manteigas, queijos, pães, cachaça. No distrito há um total de dez (10) lojas; um banco; uma Unidade Básica de Saúde, a qual responde pela assistência médica e odontológica local; uma escola Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 municipal, uma escola estadual e 12 restaurantes. A população economicamente ativa é de cerca de 45%, segundo informações da subprefeitura. Deste total percentual 21,9% se dedicam à agropecuária, 12,2% ao comércio, 20% à prestação de serviços, 7,3% à construção civil e 2,4% ao setor de transportes, e há predominância de trabalhadores empregados no Poder Público Municipal, que conta com cerca de 29,3%, sendo a maioria constituída por mão-de-obra não-especializada. A mesma fonte relata que a explicação para parte da grande parcela de população que não trabalha, 55%, está no fato de haver, no distrito, um grande número de habitantes em idade escolar, perfazendo um total de 791 pessoas, segundo levantamento dos dados censitários de 2000. Observa-se através destes últimos dados que a economia do distrito está voltada às atividades de agropecuária e turismo. Mas, conforme relata a ATUS, as atividades ligadas ao turismo e à diversificação das atividades agropecuárias ganharam maior expressividade, como fonte de renda local, a partir dos anos 1990, quando o distrito passa a ser amparado por lei municipal como área de preservação ambiental, sendo uma série de normalizações e diretrizes destinadas ao distrito numa tentativa de preservar as áreas de nascentes, fauna e vegetação atlântica remanescente, além de promover o desenvolvimento sustentável para a população local, visando mantê-la na área rural do município Conforme relatos da PMSJC (1985) - Prefeitura Municipal de São José dos Campos, o distrito de São Francisco Xavier, inicialmente era ocupado por propriedades rurais relacionadas às práticas agropecuárias, especialmente voltadas à produção leiteira. Nos anos 1980, o baixo preço, pago pelo mercado ao produto, leva a atividade à estagnação, e o homem do campo com seus recursos reduzidos não vê alternativa para se manter. A opção encontrada se volta para o arrendamento de parte da propriedade, bem como o parcelamento e venda para terceiros. Os proprietários vão se desfazendo de parte de suas propriedades até que o remanescente mal dá para a criação e plantio caseiro. Desfizerem-se do gado porque já não há pasto suficiente. O parcelamento das propriedades incentiva o surgimento de chácaras de lazer para turistas de fim de semana. Outro fato observado em São Francisco Xavier se refere ao fato de que, quando os novos proprietários rurais compraram terras com a finalidade de montar chácaras de veraneio, montando hortas, pomares e pequenas criações, empregaram os ex-proprietários ou os filhos destes. Entre os novos proprietários rurais, há fazendeiros, empreendedores, que encontraram condições climáRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 ticas para desenvolver na região novos negócios, como é o caso de criação de animais de raça e do turismo. Os benefícios que se seguiram foram relativos, pois à medida que as novas atividades geraram condições para que o antigo proprietário se fixasse na região pelo trabalho assalariado, promoveu rompimento com seus laços da terra. O antigo trabalhador rural estava expulso de suas antigas tradições em suas terras, quando plantava para a própria subsistência. O fato de estar empregado não significava que sua condição econômica tivesse melhorado. Significava apenas uma transformação no seu modo de vida (PMSJC, 1985). Observa-se então que grande parte dos antigos proprietários rurais perde o domínio da terra e neste momento passa a ser empregado dos novos donos das terras. Muitos dos ex-proprietários rurais relutam em desatar os laços com a terra, tentando permanecer próximo em outros trabalhos e/ou atividades, empregando-se como caseiros e pedreiros na construção civil. Outros fabricam doces, queijos e comercializam como meio de subsistência. É uma tentativa de reforçar a identidade, de pertencer a um lugar, como uma âncora de segurança. Ir de encontro à modernidade sem perder sua origem. (PMSJC, 1985). Percebe-se que o antigo proprietário rural perde suas características, seu referencial. O pequeno agricultor/pecuarista perde suas perspectivas de trabalho agrário. E a partir desse momento fica estabelecida uma nova atividade econômica no distrito: o turismo. Em diagnóstico realizado em uma proposta de Plano Diretor para o distrito de São Francisco Xavier, elaborado pela Secretaria de Planejamento e Informática da Prefeitura Municipal de São José dos Campos, no ano de 1985, há referências de que a paisagem pouco a pouco se transforma, ocorrendo transformação local, com invasão de construções que exprimem o conceito e as necessidades do homem urbano. Esse processo violenta o sistema simples e primitivo do homem do campo, cortando suas raízes mais profundas, de trabalhador rural, impondo uma nova condição de vida que é irreversível. Alternativas deveriam ser tomadas para que não ocorresse esse impacto sócio-econômico, evitando com isso o êxodo de parte da população, bem como a degradação ambiental do distrito, visto que inúmeras chácaras e atividades de reflorestamento estavam expandindo-se para as áreas de remanescentes. “O processo de degradação que passou a ocorrer em inúmeros locais do distrito, justificou a criação da APAs pelos órgãos públicos através da regulamentação e ampliação de mecanismos de conservação do patrimônio natural”, segundo indica Martin et al. (apud MEDEIROS, 2005). 95 3. AS APAS DE SÃO FRANCISCO XAVIER E O FOMENTO DAPREFEITURAMUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS PARA ESTÍMULO DAS NOVAS ATIVIDADES RURAIS De acordo com Moreli e Fantin (2001) a criação de APAs - Área de Proteção Ambiental - pela União, Estados, ou Municípios, encontram respaldo na Política Nacional do Meio Ambiente, de 1981, que editou a Lei 6.902 (de 27/4/1981), em que foram criadas as Estações Ecológicas (áreas representativas de ecossistemas brasileiros, sendo que 90% delas deveriam permanecer intocadas e 10% poderiam sofrer alterações para fins científicos) e as Áreas de Proteção Ambiental, onde poderiam permanecer as propriedades privadas, mas o poder público poderia limitar as atividades econômicas para fins de proteção ambiental. A criação de uma APA objetiva proteger e assegurar a sustentabilidade do uso de recursos naturais com destaque especial para a biodiversidade (conjunto de espécies e ecossistemas de uma região), através da disciplina do processo de ocupação do solo. Em 1982, conforme Decreto Federal nº 87.561/82, de 13 de setembro de 1982, é criada a APA da Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul com área total de 37,88 Km, incidente no município de São José dos Campos. Em São José dos Campos, conforme indicam Moreli e Fantin (2001), a legislação referente aos aspectos ambientais teve início na década de 1970, juntamente com a consolidação do parque industrial do município. Com o advento da Constituição de 1988 que dedicou um capítulo especial para o meio ambiente, o legislador municipal sentiu a necessidade de criar instrumentos legais para a proteção do meio ambiente, consolidando a legislação ambiental atual do município de São José dos Campos. Seguindo as tendências das Constituições Federal e do Estado de São Paulo, a Lei Orgânica do município de São José dos Campos, de 5 de abril de 1990, reservou um capítulo específico para tratar das questões referentes ao meio ambiente. No TÍTULO VI, Capítulo I, Do Meio Ambiente, o Artigo 241 define que os rios Paraíba do Sul, Buquira e do Peixe, a Reserva Florestal Augusto Ruschi (Fazenda Boa Vista), a área ocupada pelo antigo Sanatório Vicentina Aranha, o Banhado e o Distrito de São Francisco Xavier são espaços territoriais especialmente protegidos e sua utilização far-se-á na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente (PMSJC, 2005). Em 1992, a Lei Municipal nº 4.212/92 declara área de proteção ambiental - APA, o trecho da Serra da Mantiqueira 96 no município (próximo a São Francisco Xavier). Em 4 de abril de 1995 a Lei complementar 165/95 dispõe sobre a política territorial e urbana do município de São José dos Campos e institui o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado, o qual, entre outras disposições, define as características e o perímetro das Áreas de Proteção Ambiental, perfazendo um total de quatro, sendo uma delas, a APA IV, criada dentro do perímetro urbano. As APAs I e II estão inseridas no Distrito de São Francisco Xavier (PMSJC, 2004). Conforme relatam Monteiro e Silva (2001), a APA I, Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira, é caracterizada pelos maciços remanescentes do Complexo da Mata Atlântica e pela nascente do Rio do Peixe e compreende a margem esquerda do rio citado; a APA II compreende a margem direita do Rio do Peixe e é caracterizada por inúmeros recursos hídricos da Bacia do Rio do Peixe. Na referida lei, ainda se observa - na seção II, Das Diretrizes Específicas de Desenvolvimento Econômico Rural - na Subseção I, Artigo 7°, nos Incisos VII, X, XI, XII e XIV, respectivamente - disposições sobre: - estimular o potencial econômico das áreas protegidas “APAS”, através do desenvolvimento de atividades turísticas, manifestações de cultura local, e do manejo sustentado dos recursos naturais existentes; - apoiar os Conselhos distritais de São Francisco Xavier e Eugênio de Melo; - dotar a administração Distrital de São Francisco Xavier de corpo técnico adequado ao desenvolvimento e a orientação de programas e projetos da Administração Municipal junto à comunidade; - fomentar e apoiar iniciativas privadas para a dotação de infra-estrutura turística, tais como: meios de hospedagem e atividades comerciais; - criar uma central turística equipada com banco de dados referentes aos eventos e outros potenciais de estruturação do setor, objetivando a sua divulgação e dos serviços oferecidos. Em 1997, a Lei complementar 165/97, de 15 de Dezembro dispõe sobre uso e ocupação do solo no município e estabelece, em seu Capítulo VI, Artigo 134, incisos 1° e 2°, o tipo de uso permitido para as APAs, e dispõe, respectivamente que: - na Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira (APA I) são permitidos os usos destinados Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 ao ecoturismo e atividades florestais com espécies nativas, admitindo-se as atividades agrícola e pecuária mediante a adoção de métodos e técnicas conservacionistas do solo e das águas, serviços de hospedagem e o uso agroindustrial; - na Área de Proteção Ambiental do Rio do Peixe (APA II), são permitidos os usos agrícolas, florestais, pecuários e o ecoturismo mediante a prática de métodos e técnicas conservacionistas do solo e das águas, serviços de hospedagem e o uso agroindustrial. Em 8 de novembro de 2002, foi aprovada a lei estadual n° 11262, criando a APA São Francisco Xavier, que ainda está em processo de regulamentação. O perímetro desta APA corresponde ao perímetro da APA Municipal da Serra da Mantiqueira. Conforme dispõe a referida lei, em seu artigo 2°, a implantação desta APA será coordenada pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA - em colaboração com os órgãos da administração Direta, Indireta e Fundacional do Estado, vinculados à preservação do meio ambiente. Dispõe ainda que o Estado, por meio de seus órgãos competentes, fica autorizado a firmar convênios ou contratos públicos, com órgãos e poderes municipais ou com entidades da comunidade local necessários para a implantação da APA. Para que esta APA seja regulamentada, é necessário que se estabeleça seu Plano de Manejo, mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais. Na Fig. 2 pode ser observada a localização das APAs do distrito de São Francisco Xavier, lembrando que a APA estadual coincide com a APA municipal da Serra da Mantiqueira. Fig. 2 - APAs de São Francisco Xavier. Fonte: Medeiros, 2005. Como o distrito passa a ser considerado uma APA, e, como em uma APA podem se desenvolver atividades econômicas sustentáveis, a PMSJC passa a direcionar investimentos públicos, bem como incentiva os investimentos privados, visando alternativas que possam manter o homem no meio rural, evitando assim o êxodo rural. Um adendo: por ser uma APA, as atividades ecoRevista UniVap, v.13, n.23, 2006 nômicas e a implantação de qualquer tipo de construção devem passar por regularizações junto aos órgãos competentes, Polícia Florestal, DEPRN- Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais, Secretaria de Planejamento Urbano da PMSJC. Entretanto, conforme relatos da Secretaria de Planejamento Urbano (2005), observa-se que há resistência de alguns proprietários rurais em seguir as determinações devidas quanto ao uso do 97 solo, sendo que estas vão contra seus interesses de uso e rentabilidade. Este é um conflito que vem demonstrando que o “coronelismo” ainda é vigente na estrutura do meio rural, mesmo considerando novas formas de uso. uma cooperativa de laticínios local, bem como proposta para uma cooperativa de apicultores e uma cooperativa de artesanato que contaria, esta última, específicamente, com o trabalho das mulheres de SFX. Seguindo as determinações propostas na lei 165/ 95, a Prefeitura Municipal de São José dos Campos vem investindo no distrito junto aos representantes da sociedade civil local - Associação do Turismo Sustentável, Clube dos Tropeiros e Violeiros, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de SJC, Instituto Muriqui (ONG), Paróquia de SFX, Sociedade de Amigos de SFX, Grupo de Mulheres de SFX, Grupo de voluntários da Bacia do rio do Peixe - desenvolvendo cursos de capacitação para a população local, com atividades voltadas ao comércio, turismo e agropecuária, contando, com parcerias, entre outras, junto ao SEBRAE e SESI. A capacitação da comunidade local objetiva diversificar o trabalho da mão-de-obra local, incentivar a atividade turística e elevar a faixa salarial média local que, segundo dados do Censo (2000), é de R$300,00. As atividades voltadas ao turismo também vêm recebendo incentivos da PMSJC que criou, em 1997, o COMTUR - Conselho Municipal de Turismo de São José dos Campos, como parte do Programa Nacional de Municipalização do Turismo, da Embratur. Os investimentos privados das pousadas rurais também têm sido um motivador para a manutenção da população local no campo, as quais se tornaram fontes de emprego. A PMSJC vem estimulando, junto a parcerias privadas, uma diversificação de eventos no distrito, além das festas tradicionais de origem religiosa, como forma de manter o giro dos turistas no distrito e manter aquecida a sua economia, estimulando, conseqüentemente, a manutenção da população local. É importante ressaltar que as organizações da sociedade civil estão em constante vigilância aos acontecimentos locais e visam representar os interesses dos diferentes segmentos da sociedade, o que muitas vezes gera conflitos quando se buscam consensos para determinadas realizações em SFX. De acordo com informações da ATUS e da Administração Distrital, vem sendo observado o retorno de moradores locais que haviam migrado para outras cidades, bem como vem ocorrendo, em direção ao distrito, uma migração de população de áreas diversas do país e até mesmo de estrangeiros, visando investimentos em pousaPara estimular a manutenção do homem no cam- das, restaurantes, spas, em função do novo modo de uso POPULAÇÃO Período 1950 1960 Distrito 1970 po, vem sendo desenvolvido o estudo da formação de da terra no local. Este fato pode ser observado na Tabela 1. Ano Urbana 503 Rural 250 Total 358 URBANA 3.744 6623.023 122 2.365 RURAL 1980 540 3.994 e1.230 TOTALdas 2000 981 Tabela 1 - Crescimento populacional áreas urbana rural3.381 339 2.868 85% 177% 65% Crescimento relativo Fonte: IBGE 2002. Adaptado de Medeiros, 2005. Observa-se que durante quatro décadas, de 1950 a 1980, a população rural do município, moradora do distrito de São Francisco Xavier, apresentou um crescimento populacional negativo. A partir de 1990 este quadro passa a se alterar, chegando a 2000 com um número populacional equivalente ao de 1970. Este fato está associado ao incremento das novas atividades rurais que possibilitaram a recolocação do antigo morador rural. Na Tabela 2 pode ser observado o crescimento do número de moradias na área urbana e na área rural, em que se pode inferir que as atividades de lazer estão direcionadas ao meio rural local, sendo que houve um acréscimo considerável no número total de moradias de segunda residência. Tabela 2 - Tabela de distribuição dos domicílios por situação e tipo de uso Fonte: Ruschman, 2004. 98 Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 1980 Domicílios199 oc Total 722 Urbana 99 1.768 1.70 563 89 2.490 2.69 815 288 44,7% 223% Visando divulgar permanentemente as atividades voltadas ao turismo, a ATUS se uniu ao COMTUR e a Eventos SJC (setor da PMSJC que lida com a divulgação de eventos do município). Visando estimular as atividades turísticas, a PMSJC empreendeu obras de revitalização no distrito de São Francisco Xavier, estabelecendo, portanto, um planejamento estratégico que visa à manutenção, e ampliação, da economia local. Finalizando: observa-se que os investimentos no distrito visam à manutenção, e ampliação, da economia local, bem como mostra o novo modo de vida da população rural, atrelado ao novo uso da terra, sendo que se estabeleceram novas opções de emprego, fonte de renda, já que a propriedade da terra passou por significativas mudanças que alteraram as suas características naturais, as características da posse e, conseqüentemente, as características do trabalho rural. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS São Francisco Xavier é distrito de um município cuja vocação principal, na atualidade, está voltada às atividades aeronáuticas e aeroespaciais. Entretanto, sua distância da sede municipal, aliada às condições físicas, pode ter sido um dos fatores que o manteve com características distintas do restante do município. Até o início dos anos 1980 prevaleceram, no distrito, atividades agropecuárias, indicando uma dicotomia entre a área urbana do município, dotada de meios técnicos, e a área rural, vista sob muitos aspectos de forma negativa porque não era dotada dos meios técnicos urbanos. Esse caráter negativo, conforme aponta Graziano da Silva (apud MIRANDA, 2005), está associado à área rural desde o século XVII, quando o urbano passou a ser identificado com o novo, com o progresso capitalista das fábricas; e o rural - ou a classe dos proprietários rurais, com o velho, ou seja, a velha ordem social vigente, e com o atraso, no sentido de que procuravam impedir o progresso das forças sociais. Conforme Otavio Valentim Balsadi (apud MIRANDA, 2005), um dos pontos fundamentais relacionados com as profundas transformações pelas quais vem passando o meio rural, está relacionado à clara e forte tendência de queda das ocupações agrícolas. Em São Francisco Xavier, as transformações que se observam no meio rural são decorrentes da nova forma de apropriação do uso do solo, especialmente em atividades voltadas ao turismo, desde que a produção pecuária leiteira declinou em virtude de uma instável política leiteira, associada a inexpressivo plantel de animais e falta de orientação técnica. O antigo produtor rural passa a dispor de Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 suas propriedades, parcelando-as e propiciando sua ocupação por chácaras de recreio para turistas paulistas. Estes últimos, implicitamente, foram aos poucos descaracterizando o modo de vida rural local, bem como o uso do solo. A PMSJC já havia observado, desde os anos 1980, a introdução de novos valores urbanos na comunidade local, o que aumentava o grau de exigência quanto aos serviços urbanos e criava novas necessidades à medida que os novos habitantes interagiam com a comunidade e demonstrava o crescimento das atividades não agropecuárias no meio rural local. Observa-se, em São Francisco Xavier, uma crescente urbanização do meio rural com moradias de alto padrão, turismo rural, lazer. Observam-se também novas atividades no meio rural com dedicação à criação de abelhas, peixes, produção de flores e plantas ornamentais, atividades de recreação, pesque-pague, restaurantes, spas- todas dotadas de valor comercial considerável. Verifica-se, no distrito de São Francisco Xavier, o mesmo fato já constatado por Veiga (apud MIRANDA, 2005), em estudos sobre o novo rural paulista de que a “dinamização econômica de diversas regiões rurais está sendo muito mais pela captação de rendas urbanas, sendo que há uma procura crescente de formas de lazer associadas ao meio rural, intensificado pela divulgação do pensamento ecológico” que se tornou praxe a partir dos anos 80. Entretanto, a expansão do número de propriedades voltadas ao turismo e veraneio provocaram degradação ambiental, sendo que avançaram para áreas de remanescentes. Estas alterações do meio físico justificaram, como se refere Martin (apud MIRANDA, 2005), a criação das APAs pelos órgãos públicos, através da regulamentação e ampliação de mecanismos de conservação do patrimônio natural. A partir da regulamentação das APAs, o uso do solo passou a ser sistematizado e fiscalizado. As atividades turísticas, consideradas como a nova vocação do distrito, passaram a ser orientadas como um novo meio de vida para a população local. A subprefeitura do município investe em cursos de capacitação voltados às atividades ligadas ao turismo, como forma de evitar o êxodo e de ampliar a renda média local. A exemplo de fato observado por Carneiro (apud MIRANDA, 2005) para outras áreas do interior do Estado de São Paulo, as atividades voltadas ao turismo em São Francisco Xavier vêm propiciando oportunidade de trabalho para o conjunto da mão-de-obra familiar, contribuindo para o aumento de sua renda e para uma visível melhoria das condições de parte da população rural que, ao ter garantida uma renda fixa e razoavelmente estável em sua própria localidade de origem, abandona o projeto 99 de migração em busca de emprego e salário na cidade. Finalizando, observa-se que o meio rural de São Francisco Xavier já não é mais caracterizado somente como um meio agropecuário, pois se tornou um novo meio rural, sendo que incorporou valores e usos urbanos no desenvolvimento de pluriatividades rurais, que vêm estimulando a permanência da população local. 5. BIBILIOGRAFIA IBGE - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2000. SILVA, J. G. da.; BALSADI, O. V.; BOLLIGER, F. P.; BORIN, M. R.; PARO, M. R. O rural paulista: muito além do agrícola e do agrário. São Paulo em perspectiva. São Paulo: Fundação Seade, abr./jun. de 1996. pp. 60-72. SILVA, J. G. da.; BALSADI, O; DEL GROSSI, M. E. O emprego rural e a mercantilização do espaço agrário. São Paulo em perspectiva: São Paulo: Fundação Seade, abr./ jun. 1997. pp. 50-64. MIRANDA, Z. A. I. Diferenciações entre rural e urbano. 2005. 1 disco laser. Dissertação (Mestrado em Planejamento Urbano e Regional) – Instituo de Pesquisa e Desenvolvimento, Universidade do Vale do Paraíba, São José dos Campos, 2006. MEDEIROS, J. S. Desenvolvimento Urbano e meio-ambiente no distrito de São Francisco Xavier - subsídios ao ordenamento territorial. 2005. 1 disco laser. Dissertação (Mestrado em Planejamento Urbano e Regional) – Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento, Universidade do Vale do Paraíba, São José dos Campos, 2005. 100 MONTEIRO, P. P; SILVA, R. A. Caracterização do turismo rural como subsídio ao desenvolvimento econômico sustentável do bairro de Santa Bárbara - São Francisco Xavier. 2001. Trabalho de Graduação (Graduação em Geografia). Faculdade de Educação. Universidade do Vale do Paraíba, São José dos Campos, 2001. MORELLI, A. F.; FANTIN, M. Espacialização Cartográfica da Legislação Ambiental no Município de São José dos Campos - SP, através do uso integrado das técnicas de Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento e GPS. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CADASTRO TÉCNICO MULTIFINALITÁRIO DA FSC Anais... Florianópolis, SC: COBRAC, 2000. PMSJC. São José em Dados. São José dos Campos, SP: PMSJC, 2004. PMSJC. Plano Diretor de São José dos Campos, São José dos Campos, SP: PMSJC, 1994. PMSJC. Plano Diretor de São Francisco Xavier, 1ª fase. São José dos Campos, SP: PMSJC, 1985. PMSJC. Legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo de São José dos Campos. São José dos Campos, SP: PMSJC, 1997. RUSCHMANN, D. M. Plano de desenvolvimento integrado do turismo sustentável - São Francisco Xavier. diagnóstico e proposições. São Paulo: SENAC, 2004. SEMA- Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo. Área de Proteção Ambiental - São Francisco Xavier. [s.l.: s.ed.] 2005. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 NORMAS GERAIS PARA A PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS NA REVISTA UNIVAP A Revista UniVap é uma publicação de divulgação científica da Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), que procura cumprir com a sua tríplice missão de ensino, pesquisa e extensão. Assim, a pesquisa na UNIVAP tem, dentre suas funções, a de formar elites intelectuais, sem as quais não há progresso. Esta publicação incentiva as pesquisas e procura o envolvimento de seus professores e alunos em pesquisas e cogitações de interesse social, educacional, científico ou tecnológico. Aceita artigos originais, não publicados anteriormente, de seus docentes, discentes, bem como de autores da comunidade científica nacional e internacional. Publica artigos, notas científicas, relatos de pesquisa, estudos teóricos, relatos de experiência profissional, revisões de literatura, resenhas, nas diversas áreas do conhecimento científico, sempre a critério de sua Comissão Editorial e de acordo com o formato dos artigos aqui publicados. Solicita-se o cumprimento das instruções a seguir para o preparo dos trabalhos. 1. Os originais devem ser apresentados em papel branco de boa qualidade, no formato A4 (21,0cm x 29,7cm) e encaminhados completos, definitivamente revistos, com no máximo 15 páginas, digitados em espaço 1,5 entre as linhas, com duas colunas. Recomenda-se o uso de caracteres Times New Roman, tamanho 12, em 2 vias, acompanhado de suporte eletrônico disquete ou CDROM em Word e, se possível, enviar a cópia para o email [email protected]. Somente em casos muito especiais serão aceitos trabalhos com mais de 15 páginas. Os títulos das seções devem ser em maiúsculas, numerados seqüencialmente, destacados com negrito. Não se recomenda subdivisões excessivas dos títulos das Seções. 2. Língua. Os artigos devem ser escritos, preferencialmente, em Português, aceitando-se também textos em Inglês e Espanhol. No caso do uso das línguas Portuguesa e Espanhola, devem ser anexado um resumo em Português (ou Espanhol) e em Inglês (Abstract). 3. Os trabalhos devem obedecer à seguinte ordem: informações referentes às instituições a que pertence(m) e às qualificações, títulos, cargos ou outros atributos. - Resumo. Com no máximo 250 palavras, o resumo deve apresentar o que foi feito e estudado, seu objetivo, como foi feito (metodologia), apresentando os resultados, conclusões ou reflexões sobre o tema, de modo que o leitor possa avaliar o conteúdo do texto. NBR6028. - Abstract. Versão do resumo para a língua Inglesa. Caso o trabalho seja escrito em Inglês, o Abstract deve ser traduzido para o Português (Resumo). - Palavras-chave (Key words). Apresentar de duas a cinco palavras-chave sobre o tema. - Texto. Corpo do artigo estruturado em introdução, desenvolvimento e conclusão. No caso de divisão de seções, sua ordenação deve seguir o sistema de numeração progressiva (NBr6024), com subtítulos de caráter informativo. - Citações dentro do texto. As citações com mais de 3 linhas devem ser destacadas com recuo da margem esquerda 4 cm, com letra menor que a do texto utilizado e sem aspas. Ex.: Na criança, bons hábitos posturais são importantes para evitar sobrecargas anormais em ossos em crescimento e alterações adaptativas em músculos e tecido mole. (KISNER; COLBY, 1998). Nas citações são utilizadas sobrenome e data, apresentadas em maiúsculas dentro do parênteses e em minúsculas fora do parênteses. Ex.: 1. Segundo Spector (2003), “A discussão dos resultados é a parte mais livre da tese, onde o autor tem maior latitude para demonstrar o seu domínio do tema e o valor do estudo.” Ex.: 2. A discussão dos resultados é a parte mais livre da tese, onde o autor tem maior latitude para demonstrar o seu domínio do tema e o valor do estudo (SPECTOR, 2003). - Título (e subtítulo, se houver). Deve estar de acordo com o conteúdo do trabalho, conforme os artigos aqui apresentados. - Referências Bibliográficas: devem ser apresentadas no final do trabalho, em ordem alfabética de sobrenome do(s) autor(es), como nos seguintes exemplos: - Autor(es). Logo abaixo do título, apresentar nome(s) do(s) autor(es) por extenso, sem abreviaturas. Com asterisco, colocado logo após o nome completo do autor ou autores, remeter a uma nota de rodapé relativa às a) Livro: SOBRENOME, Nome. Título da obra. Local de publicação: Editora, data. Exemplo: PÉCORA, Alcir. Problemas de redação. 4.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1992. Revista UniVap, v.13, n.23, 2006 101 b) Capítulo de livro: SOBRENOME, Nome. Título do capítulo. In: SOBRENOME, Nome (org.). Título do livro. Local de publicação: Editora, data. Página inicial-final. Exemplo: LACOSTE, Yves. Liquidar a geografia... liquidar a idéia nacional? In: VESENTIN, José William (org.). Geografia e ensino: textos críticos. Campinas: Papirus, 1989. p.31-82. c) Artigo de periódico: SOBRENOME, Nome. Título do artigo. Título do periódico, local de publicação, volume do periódico, número do fascículo, página inicial-página final, mês(es). Ano. Exemplo: ALMEIDA JÚNIOR, M. A economia brasileira. Revista Brasileira de Economia, São Paulo, v. 11, n. 1, p. 26-28, jan./fev. 1995. d) Dissertações, Teses e Trabalhos Acadêmicos: SOBRENOME, Nome. Título da dissertação (ou tese). Local. Número de páginas (Categoria, grau e área de concentração). Instituição em que foi defendida. data. Exemplo: BRAZ, A. L. Efeito da luz na faixa espectral do visível em adultos sadios. 2002. 1 disco laser. Dissertação (Mestrado em Bioengenharia) - Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento, Universidade do Vale do Paraíba, São José dos Campos, 2002. e) Outros casos: Consultar as Normas da ABNT para Referências Bibliográficas (NBR6023). Ou acessar o site: http://www.univap.br/cultura/abnt.htm 4. As figuras (desenhos, gráficos, ilustrações, fotos) e tabelas devem apresentar boa qualidade e serem acompanhados de legendas breves e claras. Indicar no verso das ilustrações, escritos a lápis, o sentido da figura, o nome do autor e o título abreviado do trabalho. As figuras devem ser numeradas seqüencialmente com números arábicos e iniciadas pelo termo Fig., devendo ficar na parte inferior da figura. Exemplo: Fig. 4 - Gráfico de controle de custo. (fonte 10). As tabelas também devem ser numeradas seqüencialmente, com números arábicos, e colocadas na parte superior da tabela. Exemplo: Tabela 5 - Cronograma da Pesquisa. As figuras e tabelas devem ser impressas juntamente com o original e quando geradas no computador deverão estar gravadas no mesmo arquivo do texto original. Fotografias, desenho artístico, mapas etc., devem ser de boa qualidade e em preto e branco. 102 5. O encaminhamento do original para publicação deve ser feito acompanhado do disquete ou CD-ROM e com a indicação do software e versão usada. 6. O Corpo Editorial avaliará sobre a conveniência ou não da publicação do trabalho enviado, bem como poderá indicar correções ou sugerir modificações. A cada edição, o Corpo Editorial selecionará, dentre os trabalhos considerados favoráveis para publicação, aqueles que serão publicados imediatamente. Os não selecionados serão novamente apreciados na ocasião das edições seguintes. 7. Os conteúdos e os pontos de vista expressos nos textos são de responsabilidade de seus autores e não apresentam necessariamente as posições do Corpo Editorial da Revista UniVap. 8. Originais. A Revista não devolverá os originais dos trabalhos e remeterá, gratuitamente, a seus autores, três exemplares do número em que forem publicados. 9. O Corpo Editorial se reserva o direito de introduzir alterações nos originais, com o objetivo de manter a homogeneidade e a qualidade da publicação, respeitando, porém, o estilo e a opinião dos autores. 10. Endereços. Deverá ser enviado o endereço completo de um dos autores para correspondência. Os trabalhos deverão ser enviados para: UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA - UNIVAP PRÓ-REITORIA DE INTEGRAÇÃO UNIVERSIDADE/ SOCIEDADE Conselho Editorial da Revista UniVap Av. Shishima Hifumi, 2.911 - Bairro Urbanova São José dos Campos - SP 12244-000 Telefone: (12) 3947.1036 Fax: (12) 3947.1211 E-mail: [email protected] Revista UniVap, v.13, n.23, 2006