Revista Univap 23jac.p65

Transcrição

Revista Univap 23jac.p65
REVISTA UNIVAP
Universidade do Vale do Paraíba
Universidade do Vale do Paraíba
Ficha Catalográfica
Revista UniVap - Ciência - Tecnologia - Humanismo. V.1, n.1 (1993)São José dos Campos: UniVap, 1993v. : il. ; 30cm
.
Semestral com suplemento.
ISSN 1517-3275
1 - Universidade do Vale do Paraíba
A REVISTA UniVap tem por objetivo divulgar conhecimentos, idéias e resultados, frutos de
trabalhos desenvolvidos na UNIVAP - Universidade do Vale do Paraíba, ou que tiveram
participação de seus professores, pesquisadores e técnicos e da comunidade científica.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores. A publicação total
ou parcial dos artigos desta revista é permitida, desde que seja feita referência completa à
fonte.
CORRESPONDÊNCIA
UNIVAP - Av. Shishima Hifumi, 2.911 - Urbanova
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acesso pela Avenida Shishima Hifumi, 2911 - Urbanova
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Jacareí - SP - CEP: 12300-000 - Tel.: (12) 3958-4000
Campus Aquarius:
Rua Dr. Tertuliano Delphim Junior, 181 - Jardim Aquarius
São José dos Campos - SP - CEP: 12246-080 - Tel.: (12) 3923-9090
Campus Platanus:
Campus Caçapava:
Avenida Frei Orestes Girardi, 3 - Bairro Fracalanza
Campos do Jordão - SP - CEP: 12460-000 - Tel.: (12) 3664-5388 / 3662-4667
Estrada Municipal Borda da Mata, 2020
Caçapava - SP - CEP: 12284-820 - Tel.: (12) 3655-4646
Supervisão Gráfica: Profa. Maria da Fátima Ramia Manfredini - Pró-Reitoria de Cultura e Divulgação - Univap / Revisão: Profa. Glória
Cardozo Bertti - (12) 3922-1168 / Editoração Eletrônica: Glaucia Fernanda Barbosa Gomes - Univap (12) 3947-1036 / Impressão: Jac Gráfica
e Editora - (12) 3928-1555 / Publicação: Univap/2006
Baptista Gargione Filho
Reitor
SUMÁRIO
Antonio de Souza Teixeira Júnior
Vice-Reitor e Pró-Reitor de Integração Universidade Sociedade
v. 13
Ana Maria C. B. Barsotti
Pró-Reitora de Assuntos Estudantis
PALAVRA DO REITOR. ..................................................................................... 5
Ailton Teixeira
Pró-Reitor de Administração e Finanças
EDITORIAL. .......................................................................................................... 7
Elizabeth Moraes Liberato
Pró-Reitora de Avaliação
A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E A
UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP) ............................... 9
Élcio Nogueira
Pró-Reitor de Graduação
Fabiola Imaculada de Oliveira
Pró-Reitora de Educação Continuada
Luiz Antônio Gargione
Pró-Reitor de Planejamento
n. 23
ago. 06
ISSN 1517-3275
PERSPECTIVAS VALORATIVAS NA PREDIÇÃO DO RENDIMENTO
ESCOLAR: UM ESTUDO A PARTIR DOS VALORES HUMANOS
Nilton Soares Formiga ........................................................................................ 1 3
Maria Cristina Goulart Pupio Silva
Pró-Reitora de Assuntos Jurídicos
A ESPECIALIZAÇÃO DE PROFESSORES A DISTÂNCIA: ANÁLISE
DE UMA EXPERIÊNCIA
Maria da Fátima Ramia Manfredini
Pró-Reitora de Cultura e Divulgação
Sonia Sirolli, Maria Tereza Dejuste de Paula .................................................... 2 1
João Luiz Teixeira Pinto
Diretor Geral do Campus Villa Branca - Jacareí
CIÊNCIA, FILOSOFIA E RELIGIÃO DIANTE DA QUESTÃO DA
ORIGEM DO UNIVERSO
Luiz Carlos Andrade de Aquino
Diretor da Faculdade de Direito do Vale do Paraíba
Mituo Uehara ...................................................................................................... 2 9
Francisco Pinto Barbosa
Diretor da Faculdade de Engenharia, Arquitetura e
Urbanismo
FUNÇÕES CARDÍACAS PARA DIFERENTES CONDIÇÕES DE
EXERCÍCIO FÍSICO
Frederico Lencioni Neto
Diretor da Faculdade de Educação
Mituo Uehara, Kumiko K. Sakane, Simone A. Bertolotti ............................. 4 2
Marcio Magini
Diretor da Faculdade de Ciência da Computação
CÉLULAS-TRONCO: REVISÃO SOBRE OS CONCEITOS BÁSICOS
Renato Amaro Zângaro
Diretor da Faculdade de Ciências da Saúde
Samuel Roberto Ximenes Costa
Diretor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas
Vera Maria Almeida Rodrigues Costa
Diretora da Faculdade de Comunicação e Artes
Marcos Tadeu Tavares Pacheco
Diretor do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento
Maria Valdelis Nunes Pereira
Diretora do Instituto Superior de Educação
COORDENAÇÃO GERAL
Antonio de Souza Teixeira Júnior
REVISÃO DE TEXTO
Glória Cardozo Bertti
DIGITAÇÃO E FORMATAÇÃO
Glaucia Fernanda Barbosa Gomes
CONSELHO EDITORIAL
Alexandro Oto Hanefeld
Amilton Maciel Monteiro
Antonio de Souza Teixeira Júnior
Antônio dos Santos Lopes
Cláudio Roland Sonnenburg
Élcio Nogueira
Elizabeth Moraes Liberato
Francisco José de Castro Pimentel
Francisco Pinto Barbosa
Frederico Lencioni Neto
Heitor Gurgulino de Souza
Jair Cândido de Melo
Luiz Carlos Scavarda do Carmo
Marcos Tadeu Tavares Pacheco
Maria da Fátima Ramia Manfredini
Maria Tereza Dejuste de Paula
Paulo Alexandre Monteiro de Figueiredo
Rosângela Taranger
Samuel Roberto Ximenes Costa
Vera Maria Almeida Rodrigues Costa
Karina Teixeira Naves, Newton Soares da Silva, Cristina Pacheco Soares .. 4 8
EFEITO DA IRRADIAÇÃO LASER DE BAIXA POTÊNCIA ARSIANETO
DE GÁLIO ALUMÍNIO (ASGAAL) DE 785NM SOBRE A
CICATRIZAÇÃO DE LESÃO MUSCULAR: ESTUDO EXPERIMENTAL
Getúlio A. de Freitas Filho, Maria de Fátima Rodrigues da Silva, Marcelo E.
Belleti, Evandro dos Reis Machado, Newton Soares da Silva ........................ 5 3
INFLAMAÇÃO PULMONAR INDUZIDA POR
LIPOPOLISSACARÍDEOS (LPS) E SUA CONTRIBUIÇÃO COMO
INSTRUMENTO DE PESQUISAS
Daniel de Souza Ramos, Newton Soares da Silva, Wellington Ribeiro ......... 6 1
A CRISE AMBIENTAL E A ECOTOXICOLOGIA: UMA FERRAMENTA
NA CONSERVAÇÃO DA DIVERSIDADE BIOLÓGICA
Isabel Cristina Fracasso Póvoa, Newton Soares da Silva, Maria Regina de
Aquino Silva ........................................................................................................ 6 5
O MEIO AMBIENTE E O AMBIENTE DA VIDA: A HISTÓRIA
ECOLÓGICA NO APERFEIÇOAMENTO E FORMAÇÃO DE
PROFESSORES EM PROJETOS INTERDISCIPLINARES
Celenrozi Zaroni dos Santos, Valéria Zanetti de Almeida .............................. 7 3
PLANEJAMENTO URBANO, CONTROLE SOCIAL E PRIVILÉGIOS
Luciane de Menezes Siqueira, Emmanuel Antonio dos Santos ...................... 8 4
O NOVO RURAL EM SÃO FRANCISCO XAVIER
Luciane de Menezes Siqueira, Ely Pimenta Guimarães .................................. 9 3
NORMAS GERAIS PARA A PUBLICAÇÃO DE TRABALHOS NA
REVISTA UNIVAP ........................................................................................... 101
PALAVRA DO REITOR
A nossa função, com a publicação desta Revista, é possibilitar o exercício de análise
de problemas, de alguma forma ligados ao ensino e à pesquisa, no âmbito do ensino
universitário, a nossos docentes e, em alguns casos, a discentes.
Os temas são livres, dentro das normas de proporcionar a comunicação de temas
ligados às atividades universitárias, estando abertas as possibilidades de contribuidores
externos apresentarem sua criatividade.
Dentro do trinômio Ensino – Pesquisa – Extensão, há muito o que abordar. E as
universidades, cada vez mais, alargam sua missão de atender aos anseios de sua comunidade
mais próxima, quer adequando seus cursos de modo a atender as demandas de profissionais
necessários, quer direcionando as pesquisas aplicadas para proporcionar melhor qualidade
de vida à população e, via extensão, praticar a inclusão social, indo até onde as carências são
maiores, mediante carretas-oficinas, com todo equipamento necessário.
Repete-se o adágio de ir à montanha, sem esperar que ela, não vindo até nós, tenhamos
a desculpa para o não atendimento da população distante.
E esta missão é cada vez mais amplificada, como agora, ao sermos instados a
proporcionar atendimento jurídico, não só como até agora, praticada no prédio da Faculdade
de Direito, mas indo às periferias pobres da cidade, aos bolsões de exclusão social, para
atender aos anseios de assistência jurídica da população mais desassistida.
Baptista Gargione Filho, Prof. Dr.
Reitor da Univap
EDITORIAL
Somos seres sociais. É sempre importante que nos reunamos, expressemos o que
sentimos, ajudemos os nossos semelhantes e sejamos por eles assistidos.
A comunicação escrita, proporcionada pela Revista Univap revela, muitas vezes,
aspectos insuspeitados de pessoas fisicamente tão próximas.
E, muitas vezes, somos obrigados a extrapolar o limite imposto às discussões de uma
Revista que se pretende baseada em princípios, leis e conceitos duramente conquistados na
áspera luta pelo melhor entendimento do universo constituído por matéria, espaço e tempo e
extrapolar para discussões filosóficas ou religiosas. Pode-se argumentar que todas estas
discussões são frutos de criaturas sujeitas às leis da natureza e que seus neurônios, no
fundo, obedecem a forças e energias e, portanto, as leis de Newton e de Maxwell estão presentes
e que o pensamento e as abstrações provêm sempre de algo concreto, formulando modelos
que têm a ver com a ciência.
Seja como for, o importante é que cada um seja livre para interpretar. E interpretar é a
forma mais clara de ultrapassar os limites do simples conhecimento e tentar penetrar em um
novo e prodigioso universo, o do entendimento.
Aos autores, portanto, dos artigos contidos neste número da Revista, os nossos
agradecimentos pelo esforço de externarem o que internalizaram, proporcionando a muitos
novas oportunidades de entender este mundo que pode ser maravilhoso, se entendido.
Antonio de Souza Teixeira Júnior, Prof. Dr.
Pró-Reitor de Integração Universidade - Sociedade
e Vice-reitor da UNIVAP
A FUNDAÇÃO VALEPARAIBANA DE ENSINO (FVE) E A
UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA (UNIVAP)
A Fundação Valeparaibana de Ensino (FVE), com sede à
Praça Cândido Dias Castejón, 116, Centro, na cidade de
São José dos Campos, Estado de São Paulo, inscrita no
Ministério da Fazenda sob o nº 60.191.244/0001-20, Inscrição Estadual 645.070.494-112, é uma instituição filantrópica e comunitária, que não possui sócios de qualquer natureza, com seus recursos destinados integralmente à educação, instituída por escritura pública de 24
de agosto de 1963, lavrada nas Notas do Cartório do 1º
Ofício da Comarca de São José dos Campos, às folhas
93 vº/96 vº, do livro 275.
A Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), mantida
pela FVE, tem como área de atuação prioritária o Distrito
Geoeducacional, DGE-31. Sua missão é a promoção da
educação para o desenvolvimento da Região do Vale do
Paraíba e Litoral Norte (DGE-31).
Até o presente, a UNIVAP possui os seguintes Campi:
a) Campus Centro, em São José dos Campos, situado à
Praça Cândido Dias Castejón, 116, e à Rua Paraibuna,
75.
b) Campus Urbanova, situado à Av. Shishima Hifumi, 2911.
c) Campus Urbanova/Jacareí, com acesso pela Av.
Shishima Hifumi, 2911.
d) Campus Aquarius, em São José dos Campos, situado
à Rua Dr. Tertuliano Delphim Júnior, 181.
e) Campus Villa Branca, localizado em Jacareí, na Estrada
Municipal do Limoeiro, 250.
f) Campus Platanus, localizado em Campos do Jordão,
na Av. Frei Orestes Girardi, 3.
g) Unidade Caçapava,na Estrada Municipal Borda da
Mata, 2020.
A Educação Superior, objetivo da UNIVAP, abrange os
cursos e programas a seguir descritos:
1) Graduação, abertos a candidatos que tenham concluído o ensino médio ou equivalente e que tenham
sido classificados em processo seletivo.
2) Pós-graduação, compreendendo programas de
Mestrado, Doutorado, Especialização e outros,
abertos a candidatos diplomados em cursos de graduação e que atendam aos requisitos da UNIVAP.
3) Extensão, abertos a candidatos que atendam aos
requisitos estabelecidos pela UNIVAP.
4) Educação a distância, com uso de novas tecnologias
de comunicação.
5) Formação tecnológica, com formação de tecnólogos
em nível de 3º grau.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
A FVE é também mantenedora, tendo em vista a educação integral dos futuros alunos da UNIVAP, de cursos de
Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e
ainda de Formação Profissional e Técnica.
A UNIVAP, em seu Projeto Institucional, centra-se:
1)
2)
3)
4)
numa função política, capaz de colocar a educação
como fator de inovação e mudanças na Região do
Vale do Paraíba e Litoral Norte - o DGE-31;
numa função ética, de forma que, ao desenvolver a
sua missão, observe e dissemine os valores positivos que dignificam o homem e a sua vida em sociedade;
numa proposta de transformação social, voltada
para a Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte;
no comprometimento da comunidade acadêmica com
o desenvolvimento sustentável do País e, em
especial, com a Região do Vale do Paraíba e Litoral
Norte, sua principal área de atuação.
A UNIVAP está em permanente interação com agentes
sociais e culturais que com ela se identificam. Como decorrência da demanda de seus cursos ou dos serviços
que presta, estabelece convênios com instituições
públicas e privadas, no Brasil e no Exterior. Estes
convênios resultam na cooperação técnica e científica,
na qualificação de seus recursos humanos e tecnológicos, na viabilização de estágios acadêmicos e na
prestação de serviços. A história da UNIVAP, enraizada
na trajetória da Região do Vale do Paraíba e Litoral Norte,
traz consigo a marca da participação comunitária, a partir
do compromisso que tem com a sociedade regional,
alicerçado na tradição, na busca da excelência acadêmica,
na qualidade de seu ensino, no diálogo com a comunidade
e no exercício da tríplice função constitucional de
assegurar a indissociabilidade da pesquisa institucional,
ensino e extensão.
Como atividades de extensão, destacam-se, na UNIVAP,
aquelas relativas à Comunidade Solidária, que têm por
objetivo mobilizar ações que contribuam para a alfabetização e melhoria da qualidade de vida de populações
carentes. Dentro deste Programa, foram realizadas
atividades nas áreas de Saúde, Higiene, Cidadania, Educação e Lazer, em Santa Bárbara (BA), Beruri (AM),
Teotônio Vilela (AL), Nova Olinda (CE), Coreaú (CE),
Carnaubal (CE), São Benedito (CE), Groaíras (CE), Atalaia
do Norte (AM), Pão de Açúcar (AL) e, no Vale do Paraíba,
nas cidades de Monteiro Lobato, São Bento do Sapucaí,
Paraibuna, São Francisco Xavier e São José dos Campos.
9
Todas as pesquisas institucionais da Universidade estão centradas em seu Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IP&D), o qual executa programas e projetos e
congrega pesquisadores de todas as áreas da UNIVAP,
envolvidos em atividades de pesquisa, desenvolvimento e extensão. Em seus oito núcleos de pesquisa, nas
áreas sócio-econômica, genômica, instrumentação
biomédica, espectroscopia biomolecular, estudos e desenvolvimentos educacionais, ciências ambientais e
tecnologias espaciais, computação avançada, biomédicas, atrai e dá condições de trabalho a pesquisadores
de grande experiência, do País e do exterior. Os alunos
têm condições de participar, com os professores, de
pesquisas, executando tarefas criativas, motivadoras, que
propiciam a formulação de modelos e de simulações,
trabalhando com equipamentos de primeira linha, e isto
faz a diferença entre a memorização e a compreensão.
Bolsas de estudo vêm sendo oferecidas a alunos e
pesquisadores, quer pela UNIVAP, quer por instituições
como CAPES, CNPq, FINEP e FAPESP.
O esforço da UNIVAP em construir, no Campus
Urbanova, uma Universidade com instalações especiais
para cada área de atuação, com atenção especial aos laboratórios, tem por objetivo um ensino de qualidade,
compatível com as exigências da sociedade atual.
A UNIVAP, para o ano letivo de 2006, fiel ao lema de que
“o saber amplia a visão do homem e torna o seu caminhar
mais seguro”, oferece à comunidade da Região do Vale
do Paraíba e Litoral Norte o seguinte Programa, de seus
diversos cursos, que vão desde a Educação Infantil à
Pós-Graduação, passando inclusive pelo Colégio Técnico Industrial e pela Faculdade da Terceira Idade.
CURSOS DE GRADUAÇÃO
-
Administração de Empresas e Negócios
Arquitetura e Urbanismo
Biomedicina
Ciência da Computação
Ciências Biológicas
Ciências Contábeis
Ciências Econômicas
Ciências Sociais
Direito
Educação Física
Enfermagem
Engenharia Aeroespacial
Engenharia Ambiental
Engenharia Biomédica
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia de Materiais
Engenharia Elétrica
-
Farmácia
Fisioterapia
Geografia
História
Jornalismo
Letras
Matemática
Normal Superior
Nutrição
Odontologia
Pedagogia
Publicidade e Propaganda
Rádio e TV
Secretariado Executivo
Serviço Social
Terapia Ocupacional
Turismo
CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO
- Doutorado
-
- Especialização - Lato-Sensu
Engenharia Biomédica
- Mestrado
-
10
Bioengenharia
Ciências Biológicas
Engenharia Biomédica
Planejamento Urbano e Regional
-
Administração e Planejamento da Educação
Computação Aplicada
Comunicação Empresarial
Dentística Restauradora
Direito Processual
Gestão Ambiental
Gestão Empresarial
Neurologia Funcional
Odontopediatria
Psicopedagogia
Saúde da Família
Terapia Familiar
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
São José dos Campos
Com cerca de 600.000 habitantes, São José dos Campos
é o município com maior população na sua região, sendo
que seu grande desenvolvimento começou realmente com
a construção da Rodovia Presidente Dutra e do Centro
Técnico Aeroespacial (CTA). Além disso, a localização
estratégica e privilegiada entre São Paulo e Rio de Janeiro e a topografia apropriada para a construção de grandes
indústrias possibilitaram que a cidade crescesse vertiginosamente na década de 70, passando a ser uma das
áreas mais dinâmicas do Estado e a terceira maior taxa de
crescimento da década de 80. De 1993 para cá, a cidade
passou por grandes transformações, alcançando avanços na área da saúde, desenvolvimento econômico, educação, criança e adolescente, saneamento básico e obras.
O comércio de São José dos Campos é bastante desenvolvido e vive um período de extensão, com vários centros de compras e grandes supermercados e Shopping
Centers. Com mais de 800 indústrias, 4.000 estabelecimentos comerciais e superando 7.000 prestadores de
serviço, o perfil industrial de São José dos Campos tem
dois lados distintos: o centralizado nas áreas aeroespacial
e aeronáutica, como a Embraer, e outro diversificado, com
indústrias, como a General Motors, Johnson & Johnson,
Petrobras, Rhodia, Monsanto, Kodak, Panasonic, Hitachi,
Bundy, Ericsson, Eaton e outras. É o quarto município
do Estado de São Paulo em arrecadação e ICMS, atrás
apenas da capital, Santo André e Campinas.
São José dos Campos possui, como resultado da atuação
de suas indústrias, dos estabelecimentos comerciais e
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
dos organismos que desenvolvem tecnologias de ponta,
mão-de-obra de altíssimo nível. Entre esses órgãos destacam-se o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE), o Centro Técnico Aeroespacial (CTA), com seus
Institutos: ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica,
IAE - Instituto de Atividades Espaciais, IFI - Instituto de
Fomento e Coordenação Industrial e o IEAv - Instituto
de Estudos Avançados.
Com uma vida cultural bastante intensa, o município conta
com uma Fundação Cultural e vários espaços culturais,
como o Museu Municipal, galerias de arte, centros de
exposição, casas de cultura, Teatro municipal, Cine-Teatro Benedito Alves da Silva, Cine-Teatro Santana e o
Teatro Univap Prof. Moacyr Benedicto de Souza,
cinemas, emissoras de rádio FM e AM, Central Regional
da TV Globo, jornais diários com circulação regional,
além dos da capital, e várias Bibliotecas Escolares,
Universitárias e de Pesquisa, como a da UNIVAP, a do
INPE e a do ITA.
A UNIVAP constitui, além do CTA e do INPE, o maior
centro de ensino e pesquisa do município. Da Pré-Escola
à Universidade, além de Cursos de Pós-Graduação e da
Terceira Idade, a UNIVAP mantém o IP&D - Instituto de
Pesquisa e Desenvolvimento, que garante a incorporação da pesquisa na comunidade acadêmica da UNIVAP,
permitindo a indissociabilidade entre o ensino e a pesquisa. A UNIVAP tem estado aberta à interação com empresas e instituições do município, notadamente as de
ensino e pesquisa, entre elas o INPE e o CTA-ITA, de
onde são provenientes o reitor, pró-reitores e vários professores.
11
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Perspectivas Valorativas na Predição do Rendimento
Escolar: um estudo a partir dos valores humanos
Nilton Soares Formiga *
Resumo: Os valores humanos têm sido um dos construtos mais estudados nas ciências humanas e
sociais. Na educação, tal tema vem tomando força a cada momento, seja por parte dos especialistas
ou por leigos, pois parte do pressuposto de que os valores são guias do comportamento humano,
sendo capazes de indicar a melhor conduta para viver em sociedade ou grupos. Foi observado que
a função psicossocial e o critério de orientação, salientado no modelo teórico dos valores humanos
básicos, foram capazes de predizer alguns indicadores do rendimento escolar (autoconceito do
estudante e horas dedicadas ao estudo). Assim, considerando tanto a estrutura teórica quanto a
aplicação dos valores aqui abordados, é possível que o rendimento escolar dos alunos apresentem
uma melhoria, bem como o desenvolvimento interpessoal entre os jovens frente ao êxito e qualificação escolar.
Palavras-chave: Rendimento acadêmico, valores humanos, predição de comportamento.
Abstract: Human values have been one of the most studied constructs in the human and social
sciences. In the area of education, this theme has been steadily gaining force, among both specialists
and non-specialists, since it presupposes that values are guides for human behavior and therefore
capable of indicating the best conduct for group and social life. It has been observed that psychosocial
function and the criterion of orientation, emphasized in the theoretical model of basic human
values, have been capable of predicting some indicators of school achievement (the student´s selfconcept and hours dedicated to study). Thus, while considering theoretical structure or the
application of the values studied here, it is possible that student´s scholastic achievement presents
an improvement as does also the interpersonal development among the young in relation to school
qualification and success.
Key words: Academic achievement, human values, behavior of prediction.
1. INTRODUÇÃO
Dos vários temas de pesquisa em que os valores
humanos têm sido estudados, a educação tem merecido
destaque, haja vista o seu insistente aparecimento na
mídia e as diversas discussões geradoras da qualificação do ensino e formação cultural entre os jovens. Nos
PCNs (1998) este construto é considerado um tema transversal, podendo-se inseri-lo sem nenhum problema tanto no plano pedagógico e prática de ensino quanto em
atividades extra-escolares propiciadas pela escola, apontando, assim, em direção da conjunção das díades bases
do êxito escolar: ensino-aprendizagem, professor-aluno
e escola-sociedade; não mais partindo de uma diretriz
linear e unilateral (INOUE; MIGLIORI; D´AMBRÓSIO,
1999), mas da sua multidisciplinariedade. Para isso, a pers* Mestre em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba.
E-mail: [email protected]
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
pectiva dos valores é capaz de orientar os comportamentos dos estudantes (FORMIGA; GOUVEIA; QUEIROGA;
LISLE JÚNIOR; CUNHA, 2001), principalmente, quando
relacionado aos construtos de orientação normativa, por
exemplo, a educação cooperativa (NIQUINI, 1999), na
qual o sujeito acontece nas relações e não no vazio e de
maneira individual e isolada.
Quanto aos valores humanos, muitos são os
enfoques apresentados sobre este tema, da sua função à
estrutura, considerando sua relatividade ou universalidade (GOUVEIA, 1998). No Brasil, educadores e pesquisadores que abordam e investem na implementação e
reflexão sobre esse construto têm enfatizado uma linha
filosófica; é possível encontrar, no trabalho de Aparecida
e Silva (1986), Inoue, Migliori e D’Ambrosio (1999) uma
busca na operacionalização dos valores, porém,
permeando dimensões filosóficas e abstratas quanto à
manipulação desse construto e sua aplicação à conduta
sócio-escolar. Desta forma, poucos estudos são encontrados no País que abordem valores e rendimento esco13
lar (INDEX PSI, 2003) empiricamente, seja na compreensão de relação ou predição de variáveis.
Vale destacar que numa recente pesquisa de tipo
correlacional, Formiga, Queiroga e Gouveia (2001) avaliaram a relação dos indicadores do rendimento escolar
(por exemplo, horas dedicadas ao estudo e autoconceito
do estudante) e os valores humanos, encontrando os
seguintes resultados: as funções psicossocais dos valores (normativa, suprapessoal e interacional, as quais caracterizam uma dimensão coletivista) se relacionaram diretamente com o autoconceito do estudante e as horas
dedicadas ao estudo; já as funções (existência, experimentação e realização, representando o individualismo)
apresentaram relações baixas, neutras e negativas. Com
isso, observou-se que os valores que visam a inter-relação, o grupo e o cumprimento das normas sociais demonstram uma maior probabilidade em concretizar alguns
indicadores do êxito escolar, bem como a formação cultural e humana. Porém, apesar de esses resultados permitirem uma compreensão explicativa entre essas variáveis,
neles existe apenas a relação de causa e efeito proposta
pelo cálculo de correlação de Pearson e não uma
previsibilidade funcional, a fim de avaliar um poder
preditivo entre as variáveis independentes e dependentes. Ao fazer referência à predição de variáveis, a partir
de indicadores psicométricos através do cálculo da análise de regressão, busca-se a elaboração de modelo teórico sobre o fenômeno estudado (BABBIE, 2001; BARBOSA, 1997).
Sendo assim, de modo geral os valores humanos
têm sido definidos como critérios que guiam o comportamento, desenvolvimento e manutenção das atitudes em
relação às pessoas, eventos etc. (TAMAYO, 1988). Tal
construto é destacado pelos teóricos como uma das dimensões de grande importância na predição do comportamento humano. Lima (1993) considera os valores como
uma dimensão explícita de preferências e até de avaliação cognitiva. Rokeach (1981) acredita que a formação
dos valores está sustentada em conteúdos cognitivos e
afetivos, podendo, assim, determinar o comportamento
do sujeito ou grupo. Já para Schwartz (1992; SCHWARTZ;
BILSKY, 1987; TAMAYO; SCHWARTZ, 1993) eles são
expressos através de tipos motivacionais, que, por sua
vez, são universais. Sabendo da diversidade de teorias
sobre os valores (GOUVEIA, 1998), pretende-se adotar
uma perspectiva alternativa, a qual parte da seguinte
definição: os Valores Humanos são como categorias de
orientação consideradas como desejáveis, baseados nas
necessidades humanas e nas pré-condições para
satisfazê-las, adotadas por atores sociais, podendo variar quanto à sua magnitude e aos elementos que a
definem (GOUVEIA, 1998, p. 293).
Para considerar tal definição, é necessário tomar
14
como referência a teoria das necessidades de Maslow
(1954 / 1970), as quais têm os seguintes fundamentos: (1)
as necessidades humanas são relativamente universais;
(2) são neutras ou positivas; (3) obedecem a uma hierarquia; (4) o homem caminha em direção à auto-realização;
e (5) a pessoa é um todo integrado e organizado. Em
função dessa teoria, identificaram-se 24 valores básicos,
que são terminais por natureza e expressam princípiosguia, sendo vistos como substantivos (ROHAN, 2000;
ROKEACH, 1973). Estes servem de categorias transcendentes que guiam as atitudes, as crenças e os comportamentos em situações específicas. Estes 24 valores dão
origem a um sistema de valor, apresentando três critérios
de orientação, que contemplam cada um duas funções
psicossociais, descritas a seguir:
Valores Pessoais. As pessoas que normalmente
assumem estes valores mantêm relações pessoais
contratuais, geralmente procurando obter vantagens / lucros. A pessoa prioriza seus próprios interesses e concede
benefícios sem ter em conta uma referência particular (papel ou estado). Para Rokeach (1973) estes valores são vistos como tendo um foco intrapessoal. Em Schwartz (1994)
tais valores atendem a interesses individuais. Considerando a sua função psicossocial, estes podem ser divididos em: (1) Valores de Experimentação: descobrir e apreciar estímulos novos, enfrentar situações arriscadas e procurar satisfação sexual são aspectos centrais destes valores (emoção, estimulação, prazer e sexo); e (2) Valores de
Realização: além da experimentação de novos estímulos,
faz parte do universo desejável dos seres o autocumprimento, o sentimento de ser importante e poderoso, ser
uma pessoa com identidade e espaço próprios
(autodireção, êxito, poder, prestígio e privacidade).
Valores Centrais. A expressão “valores centrais”
é usada para indicar o caráter central ou adjacente destes
valores; eles figuram entre e são compatíveis com os valores pessoais e sociais, estes tratados a seguir. Em termos
da tipologia de Schwartz (1990, 1994), tais valores servem
a interesses mistos (individuais e coletivos). Considerando a sua função psicossocial, os valores centrais podem
ser divididos em dois grupos: (1) Valores de Existência:
interessa garantir a própria existência orgânica (estabilidade pessoal, sobrevivência e saúde). A ênfase não está
na individualidade pessoal, mas na existência do indivíduo. Assim, valores de existência não são incompatíveis
com valores pessoais e sociais. Eles são importantes para
pessoas, principalmente em ambientes de escassez econômica, mas sem colocar em risco a harmonia social; e (2)
Valores Suprapessoais. Pessoas que assumem estes valores tentam atingir seus objetivos independentemente do
grupo ou condição social. Tais valores descrevem alguém
que é maduro, com preocupações menos materiais, não
sendo limitado a características descritivas ou específicas
para iniciar uma relação ou promover benefícios (beleza,
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
justiça social, maturidade e sabedoria). Estes valores
enfatizam a importância de todas as pessoas, não exclusivamente dos indivíduos que compõem o in-group. Portanto, são compatíveis com valores pessoais e sociais.
Embora Rokeach (1979) use a expressão valores supraindividuais, ele não se refere ao mesmo conteúdo aqui
abordado. Espera-se que os tipos motivacionais segurança e universalismo, propostos por Schwartz (1992),
correlacionem-se com as funções psicossociais existência e suprapessoal, respectivamente.
Valores Sociais. As pessoas que assumem estes
valores estão direcionadas para estarem com os outros.
No estudo de Rokeach (1973), correspondem a valores
de foco interpersonal, e em Schwartz (1994) estão incluídos entre os valores relacionados com os interesses coletivos. Tais valores são assumidos por indivíduos que
se comportam como alguém que gosta de ser considerado; que deseja ser aceito e integrado no in-group, ou
que pretende manter um nível essencial de harmonia entre atores sociais num contexto específico. Considerando sua função psicossocial, estes podem ser divididos
em: (1) Valores Normativos: enfatizam a vida social, a
estabilidade do grupo e o respeito para com os símbolos
e padrões culturais que prevaleceram durante anos. A
ordem é apreciada mais que tudo (obediência, ordem
social, religiosidade e tradição); e (2) Valores de
Interação: estes focalizam o destino comum e a complacência. Especificamente, a pessoa que os assume tem
interesse em ser amada e ter uma amizade verdadeira,
assim como tende a apreciar uma vida. Com isso, neste
trabalho pretende-se avaliar o poder predito das funções
psicossociais e os critérios de orientação valorativa frente
aos indicadores do rendimento escolar (horas dedicadas
ao estudo e autoconceito do estudante).
2. METODOLOGIA
Amostra
Participaram desta pesquisa 530 alunos distribuídos entre o ensino fundamental e médio, sendo a maioria
do sexo feminino (55%) e com uma média de idade de 15,21
anos. A amostra foi não-probabilística, podendo ser definida como intencional, pois foram consideradas as pessoas que, consultadas, dispuseram-se a colaborar, respondendo o questionário que era apresentado.
Instrumento
Os participantes responderam a um questionário
constando de duas partes: Questionário dos valores básicos e indicadors do rendimento escolar.
Para a caracterização Sócio-Demográfica, uma folha separada foi anexada ao instrumento prévio, onde
eram solicitadas informações de caráter sóciodemográfico (por exemplo, idade, sexo etc.).
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Questionário dos Valores Básicos – QVB. Uma
versão inicial foi proposta em Espanhol e Português,
compreendendo então 66 itens, três por cada um dos valores básicos que avaliava (GOUVEIA, 1998). Utilizou-se uma
versão modificada, cuja comprovação, a partir de uma análise fatorial confirmatória, apresentou parâmetros
psicométricos aceitáveis na população estudada, tendo
os seguintes indicadores de bondade de ajuste: χ2/gl =
3,02, GFI = 0,91, AGFI = 0,89 e RMSR = 0,07 (MAIA, 2000).
Formado por 24 itens-valores, com etiquetas que ajudam a
entender o seu conteúdo (por exemplo, Tradição– seguir
as normas sociais do seu país; respeitar as tradições da
sua sociedade; Êxito – obter o que se propõe; ser eficiente em tudo que faz; Justiça Social – lutar por menor diferença entre pobres e ricos; permitir que cada indivíduo
seja tratado como alguém valioso); para respondê-los, a
pessoa deveria avaliar o seu grau de importância como um
princípio-guia na sua vida e indicar sua resposta numa
escala de sete pontos, com extremos 1 = Nada Importante
a 7 = Muito Importante.No final precisava indicar o valor
menos e o mais importante de todos, os quais receberiam
pontuações 0 e 8, respectivamente.
Indicadores do rendimento escolar: foi composto
pelas seguintes questões: a) quntas horas dedicadas ao
estudo quando fora do colégio; o sujeito deveria indicar,
em um espaço pontilhado no final da pergunta, quantas
horas se dedica ao estudo quando não estava no colégio;
b) a sua autopercepção de como ele é como estudante.
Nesta, o sujeito deveria responder o quanto ele se considerava como estudante, adotando uma escala que variava
de 0 = Péssimo a 5 = Excelente.
Procedimento
Procurou-se definir um mesmo procedimento padrão o qual consistia em aplicar o questionário de valores básicos e os indicadores do rendimento escolar coletivamente em sala de aula. Um único pesquisador ficou
responsável pela coleta dos dados; após conseguir a
autorização da diretoria do colégio e, posteriormente, do
professor responsável pelas aulas, o pesquisador se apresentava como interessado em conhecer as opiniões e os
comportamentos das pessoas no dia a dia, solicitando a
colaboração voluntária dos estudantes no sentido de
responderem um questionário breve. Dizia-lhes que não
havia respostas certas ou erradas, e que respondessem
individualmente, como também assegurando o anonimato das suas respostas, que seriam tratadas em seu conjunto. Apesar de o questionário ser auto-aplicável, contando com as instruções necessárias para que possam
ser respondidos, o pesquisador esteve presente durante
toda a aplicação para retirar eventuais dúvidas ou realizar esclarecimentos que se fizessem indispensáveis. Um
tempo médio de 20 minutos foram suficientes para concluir essa atividade.
15
Tal estudo pretende contribuir com as perspectivas teóricas sobre valores e educação; isto não invalida
a reflexão filosófica e epistemológica desse fenômeno; o
que se buscou aqui foi propor um modelo teórico visando facilitar o trabalho de professores e pesquisadores na
área. Merece, também, ser destacado que esses resultados corroboram os estudos de Formiga et al. (2002), em
relação ao tipo de orientação cultural e rendimento escolar e de Niquini (1999; OVEJERO; MORAL; PASTOR,
2000), sobre interdependência social e aprendizagem cooperativa; esses autores defendem a importância de uma
dinâmica mais participativa e de cooperação, porém não
inibindo as dimensões individuais do sujeito educacional, limitando, assim, seu isolamento e egocentrismo intelectual aguçado, por exemplo, na busca de êxito e competição comparativa desenfreada.
O fato está em tornar capaz uma formação ética e
social entre rendimento escolar e jovem estudante; pois
a contribuição de alunos com melhor desempenho não
somente daria um desenvolvimento e maturidade da manutenção e instrumentalidade das relações sociais e percepção dos limites culturais e intelectuais entre eles, como
também contribuiria na auto-valorização deste ensinante
e no seu aperfeiçoamento de estudo e relações sociais.
Parece ser que essa condição dissolveria a imagem-estereótipo de que o inteligente e ‘gênio’ seria aquele sozinho, na primeira cadeira da sala e na frente do (a) professor (a), discutindo sobre tudo, ou isolado completamente, melancólico e sem contato grupal.
Mesmo visando uma perspectiva de educação
psicossocial, isso não permite a eliminação do indivíduo
do seu contexto, passando a cair mais uma vez no debate:
que vem primeiro, o indivíduo ou a sociedade, a educação
ou o aluno, a prova ou o êxito etc. Considerar uma educação que forme e seja formada é algo essencial para a dinâmica entre escola e sociedade, já que tais realidades não
acontecem no vácuo, mas, nas relações (CHARLOT, 2000;
NIQUINI, 1999; CAMINO, 1996) e complexidade da formação social e de comportamento político-educacional. No
contexto ensino-aprendizadem, tudo pode acontecer, o ser
conhecido, conhecer e reconstruir, podendo garantir que
no saber humano falta apenas uma orientação e esta poderia ser definida pelos valores humanos.
Apesar das dificuldades que a educação vem enfrentando, tanto na sua qualidade quanto no mau emprego
da quantidade especializada, uma das soluções para os problemas educacionais tão clássicos, considerando este estudo, estaria na aplicação dos valores humanos como intervenção para o rendimento escolar, bem como a extinção da
repetência e do analfabetismo cultural-científico, buscando, antes de tudo, uma formação ética e interdisciplinar
(DISKIN et al., 1998).
18
Os estudos sobre valores oferecem considerada
importância em relação ao rendimento escolar, uma vez
que foi possível observar o poder preditivo para as horas
dedicadas ao estudo e o autoconceito do estudante frente
aos critérios valorativos que prezam pela normatização,
disciplina e relações interpessoais. Definir qual o melhor
caminho na solução desse problema educacional permite
reflexões aprofundadas: desde políticas educacionais e
suas verbas, individualidade de cada aluno (inteligência,
motivação etc.) à instrumentalidade do ensino.
Por fim, a aplicação deste construto na área educacional contribuiria na formação de questões, além das
aqui tratadas, outras propostas pelos PCNs, bem como
conhecer tanto sua relação com o rendimento e outros
temas, quanto sua hierarquia visando a construção da
dinâmica do processo ensino-aprendizagem vivido na
escola (FORMIGA; QUEIROGA; GOUVEIA, 2001). Desta maneira, além de corroborar os resultados encontrados em outros estudos desenvolvidos por Formiga et al.
(op. cit; FORMIGA, 2002; FORMIGA, 2004), um estudo
posterior que se centra-se trata-se do confronto dos valores humanos para mudança de comportamento escolar
(CEIS, 1998; GRACIA, 1987; ROS et al., 1996) seria muito
significativo; pois, para esses autores, o objetivo nos
seus trabalhos consiste em incentivar a intervenção em
alguns valores, salientando os que, teoricamente, promovessem disciplina e afetassem, positivamente, o rendimento dos alunos, já que consideramos que todos temos valores, e que o problema estaria entre as prioridades valorativas que cada um de nós apresentamos; pois,
considerando o contexto, não somente se exige, como
também, é exigido que certos valores se mantenham. Paralelamente a este processo, busca-se melhorar as relações família-aluno-professor, fator que também é decisivo para manutenção e estabilidade atitudinal e
comportamental do estudante com base na sua formação
valorativa.
4. NOTAS
(1) A utilização desse método se deve à existência
de razões teóricas que possibilitam elaborar hipóteses
que contribuam na predição dos valores em relação ao
fenômeno questionado (os indicadores do rendimento
escolar).
(2) Este critério concebe um indivíduo maduro e
que atende tanto aos seus interesses individuais quanto
aos do coletivo, sem prejudicar excessivamente a ambos.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
A Especialização de Professores a Distância: análise de
uma experiência
Sonia Sirolli *
Maria Tereza Dejuste de Paula *
Resumo: A disponibilidade de novos recursos tecnológicos de informação e comunicação tem provocado o desenvolvimento de novas estratégias de ensino e de formação. A educação/aprendizagem à
distância tem sido utilizada desde a década de 30 no Brasil e na atualidade reveste-se de importância
para as questões educacionais, entre elas, a de formação dos professores. O presente estudo tem por
objetivo descrever, na perspectiva de duas participantes, um curso de especialização em Avaliação,
oferecido a distância, dirigido a professores universitários e realizado pela Universidade de Brasília
em parceria com a UNESCO. Os participantes do curso eram professores de instituições públicas e
privadas de ensino superior distribuídas geograficamente por todo o território nacional e com perfil
educacional que variou de graduação a doutorado. O curso foi realizado através de módulos com
estudos de casos e utilizou o correio e o contato telefônico como meio de alcance dos alunos e para o
envio de materiais impressos e vídeos. A avaliação e as orientações tutoriais foram feitas através de
encontros presenciais regionais. Os resultados mostraram que dos 868 alunos que iniciaram o curso,
a metade evadiu e 434 apresentaram a monografia final.
Palavras-chave: ensino a distância, formação de professores.
Abstract: The availability of new technologies of information and communication has been leading
to the development of new teaching and education strategies. In Brazil, the remote or distance
education has been used since the 1930s and today has acquired great relevance to education
questions, among them there is the teacher’s education. This study aims to describe, from the point
of view of two former students, one graduate course on Evaluation, planned and offered at distance
to university teachers by the Universidade de Brasília in partnership with UNESCO. This course
students were university teachers working at public and private universities dispersed by all the
country whose degrees varied from Bachelor to Doctorate. The course was developed through
modules based on case studies. The printed material and videos were distributed to the students by
mail. There were also telephonic contacts linking the students and the course staff. The learning
evaluation and tutorial orientation took place by means of regional and presential meetings. The
results showed that half of the 868 students enrolled in the course dropped out and 434 had the final
paper approved.
Key words: distance education, teacher education.
1. INTRODUÇÃO
A escola tem sido solicitada a mudar para atender
às novas necessidades da sociedade da informação. Requisitos como a educação ao longo da vida, a permanente formação profissional e a universalização das oportunidades de formação, entre outros, têm provocado a busca
de modalidades educacionais capazes de dar conta dessa nova realidade. A disponibilidade de novas tecnologias
de informação e de comunicação tem oferecido à educa-
*
ção recursos até então não existentes e que possibilitam
o desenvolvimento de novas estratégias capazes de atender a essas novas necessidades da tarefa educativa. A
educação a distância tem sido uma escolha para atender
às novas demandas do ensino e da formação.
Educar à distância não é um conceito novo. Para
Nunes (1993) esse tipo de ensino tem uma longa história
de experimentações, fracassos e sucessos, tendo sua
origem recente nas experiências de educação por correspondência iniciadas no final do século XVIII e com largo
desenvolvimento a partir de meados do século XIX .
Professora da UNIVAP.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
21
No Brasil, desde a década de 30, foram desenvolvidas experiências de ensino a distância com uso do
rádio e, alguns anos depois, ocorreram várias outras com
o uso da correspondência como meio para o ensino, tais
como a do Instituto Universal Brasileiro e a do Senac. No
final da década de 80 e durante a década de 90, houve
expansão da educação a distância no Brasil, principalmente com uso de fitas e vídeos (ALVES, 2004).
Não sendo um conceito novo, a definição de educação a distância tem passado por mudanças. Os termos,
educação a distância, ensino a distância e aprendizagem
a distância, têm sido usados como sinônimos em alguns
contextos, mas, para alguns especialistas, envolvem diferentes características e significados.
Para Moran (1994), por exemplo,
educação à distância é o processo de ensino-aprendizagem, mediado por
tecnologias, onde professores e alunos
estão separados espacial e/ou temporalmente . É ensino/aprendizagem onde professores e alunos não estão normalmente
juntos, fisicamente, mas podem estar
conectados, interligados por tecnologias,
principalmente as telemáticas, como a
Internet. Mas também podem ser utilizados o correio, o rádio, a televisão, o
vídeo, o CD-ROM, o telefone, o fax e
tecnologias semelhantes.
O termo ensino a distância é inadequado, para
Moran, já que enfatiza o papel do professor, enquanto o
termo educação a distância é mais apropriado, por ser
mais abrangente.
Outros, como Chaves (1999), argumentam que as
expressões educação a distância e aprendizagem a distância não são adequadas porque tanto a educação como
a aprendizagem ocorrem dentro do indivíduo e, portanto,
não podem ser realizadas à distância. Nesse caso, a expressão ensino a distância é mais adequada porque quem
está ensinando está espacialmente distante.
Preti (apud SILVA, 2002) prefere, no lugar de uma
definição de educação a distância, apontar suas características básicas: educadores e educandos se encontram
separados pelo tempo e/ou espaço, há canais
tecnológicos e humanos que individualizam a interação
e processos mediatizados, há uma estrutura complexa a
serviço dos educandos aliada a subsistemas integrados
de comunicação e tutoria, há ainda produção de materiais didáticos que buscam promover uma aprendizagem
independente, individualizada e flexível.
22
Rurato, Gouveia e Gouveia (2004) assinalam algumas características importantes da educação a distância,
tais como a abertura (diversidade e amplitude de oferta
de cursos com eliminação de barreiras e requisitos de
acesso, atendendo a uma população numerosa e dispersa com níveis e estilos de aprendizagem diferenciados);
a flexibilidade (de espaço e de tempo, de ritmos de aprendizagem e diferentes combinações de estudo/trabalho/
família); a eficácia (o aluno é motivado a se tornar sujeito
e responsável pela sua própria aprendizagem, a se avaliar, a aplicar o que aprende); a formação permanente
(aquisição de novos conhecimentos, interesses, atitudes e valores) e a economia (evita deslocamentos e
ausência total do trabalho).
Para Fonseca (1999), a educação a distância tem
base nas práticas pedagógicas avançadas do
construtivismo, atribuindo importância à autonomia e à
independência do aluno, aspectos que, na sociedade da
informação, têm grande relevo não só do ponto de vista
da cidadania como também do trabalho.
No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nº 9394, de 1996, no seu artigo 80, reconhece a importância de programas de ensino a distância, ao assinalar que
o Poder Público incentivará os esforços para que esses
programas se intensifiquem em todos os níveis e modalidades de ensino do Brasil.
Segundo Moran (2004), a educação a distância
no Brasil, em um primeiro momento, foi identificada com
o ensino por correspondência. Em um segundo momento, na década de 80, seu uso foi baseado em sistemas de
distribuição de informação por televisão e vídeo cassete, usados principalmente para telecursos
profissionalizantes e formadores de estudantes do ensino médio e fundamental. Foi a fase que, na visão de Fonseca (1999), pode ser caracterizada como analógica. No
final da década de 90, iniciou-se uma revolução com o
uso da Internet. Fonseca (1999) define essa fase como a
fase digital, caracterizada pelo uso de tecnologias de
educação bidirecionais.
Entre as várias experiências de educação a distância já realizadas e em realização, as de formação continuada de profissionais para as instituições de ensino
superior são importantes porque podem contribuir para
a qualidade do trabalho educativo dessas instituições.
É objetivo deste trabalho descrever uma experiência
recente de formação a distância em nível de especialização,
representada pelo curso oferecido pela Cátedra UNESCO/
Universidade de Brasília sobre avaliação educacional. O
estudo foi desenvolvido a partir da análise da experiência
das autoras, que foram alunas do curso e fizeram parte de
um grupo de 5 profissionais da mesma instituição de ensino
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
superior que concluíram o referido programa.
2. DESCRIÇÃO GERAL DO CURSO
Com o objetivo de atualizar profissionais docentes e técnico-administrativos de Instituições de Ensino
Superior brasileiro, foi oferecido, em 1997, pela Universidade de Brasília, através da Cátedra UNESCO de Educação a Distância, um curso de especialização em avaliação, na modalidade à distância, visando capacitar, em 24
meses, cerca de 800 professores e pessoal técnico-administrativo de instituições privadas e públicas do ensino
superior. A iniciativa foi uma parceria entre a Universidade de Brasília, o Ministério da Educação e do Desporto
(MEC), o Ministério da Ciência e Tecnologia, a Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP) e a
Associação Brasileira das Mantenedoras do Ensino Superior (ABM).
Participaram do curso, como docentes, especialistas de universidades brasileiras e de universidades estrangeiras como as de Michigan (E.U.A.) e Kassel (Alemanha).
O curso foi dado em seis módulos ou disciplinas,
totalizando trinta e dois créditos. Para completar o curso,
o aluno deveria ser aprovado nas disciplinas através de
avaliação presencial e elaborar uma monografia sob orientação de um dos professores da Cátedra.
As instituições de ensino superior escolheram
seus participantes do curso, tendo sido recomendado
que a seleção observasse nos escolhidos motivação, persistência e condições de trabalhar com autonomia e independência, características consideradas necessárias
para um bom desempenho no curso.
O tamanho da clientela atendida pelo curso caracterizou uma das vantagens do uso de educação a distância
que é o elevado número de pessoas que pode atender. Participaram do curso como alunos, docentes e funcionários
de instituições de ensino superior públicas e privadas, de
todas as regiões do país. O perfil de formação dessa clientela incluiu desde a graduação até o doutorado.
Os alunos do curso, que eram, como já mencionado, também docentes e funcionários das instituições de
ensino superior participantes, possuíam características
importantes a serem consideradas para o aprendizado,
tais como o tempo limitado disponível para estudo e horários variados de trabalho, dificultando deslocamento
em horários fixos. A flexibilidade e autonomia oferecida
pela estrutura do curso no que se referiu a horário de
estudos e de realização das atividades solicitadas atendeu às características dessa clientela adulta.
sários à formação de competências em avaliação na escola. Foram abordadas as seguintes temáticas organizadas em forma de disciplinas: Técnicas e Instrumentos de
Avaliação; Avaliação de Disciplina; Avaliação de Currículo e de Programas; Acompanhamento e Avaliação do
Aluno; Avaliação de Docentes e do Ensino e Avaliação
em Instituições de Ensino Superior.
3. RECURSOS PEDAGÓGICOS PARA O PROCESSO
DE ENSINO-APRENDIZAGEM
O curso em tela enquadra-se na modalidade a distância, pois, entre outras características, foi realizado com
a mediação de materiais escritos enviados pelo correio,
vídeos gravados e a realização de encontros presenciais
com os tutores. Foi também utilizado o contato telefônico
e o voice mail. O uso desses sistemas convencionais de
ensino a distância tem a vantagem de atingir clientelas que
não têm acesso a tecnologias eletrônicas mais avançadas,
como é o caso do computador e Internet. O curso foi
implementado a partir de 1997 e, seu desenvolvimento
ocorreu exatamente no momento anterior à expansão da
Internet no Brasil, que se intensificou a partir de 1998.
O curso iniciou-se com seminários presenciais
regionais que tiveram o propósito de apresentar o currículo e as estratégias de ensino a serem utilizadas. Os
seminários propiciaram aos participantes o conhecimento do grupo, o contato com a equipe organizadora do
curso e com as instruções relativas ao papel do aluno.
A estrutura do curso foi modular, sendo que o
aluno podia contar com textos, fitas de vídeo e ajuda do
tutor. Para cada módulo, o aluno recebia, para seu estudo
individual, o material escrito composto de um texto básico, um volume de mapas de informação do módulo, um
volume de leituras complementares e um vídeo.
Os textos básicos eram de autoria dos professores e produzidos especialmente para o curso. Cada texto
básico continha uma introdução em que eram apresentados os objetivos do módulo a que ele se referia, os objetivos do texto básico e os textos para leitura. Sua leitura
era obrigatória e havia, no final de cada capítulo, sugestões de leituras facultativas para o aprofundamento da
compreensão do assunto.
Os textos básicos continham também, ao final de
cada um dos seus capítulos, atividades que deviam ser
desenvolvidas pelos alunos. Tais atividades eram compostas de situações e problemas a serem resolvidos pelo
aluno através da leitura do material do módulo, da reflexão e da discussão com o tutor ou com outros alunos.
Incluíam também questões de múltipla escolha sobre o
conteúdo desenvolvido no módulo.
O programa do curso abrangeu conteúdos necesRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
23
Todas as atividades tinham um referencial de respostas no final do texto para a auto-avaliação do aluno. No
caso de algumas atividades de resposta aberta havia sugestões e para outras havia a recomendação de se consultar o tutor a respeito da resposta. Este último caso ocorreu,
por exemplo, no módulo 4, referente ao Acompanhamento e
Avaliação de Alunos, no qual foi solicitado ao aluno que
planejasse um programa de avaliação do discente. No caso
desta atividade, foi sugerido que tal plano fosse discutido
com os tutores do curso (HURTADO; SOUZA, 1997).
Em outros casos, as respostas às atividades solicitadas nos textos básicos deviam ser discutidas com os
colegas. Foi o caso do módulo 6, referente à Avaliação de
Instituições de Ensino Superior. Na atividade, solicitavase ao aluno que discutisse as implicações das funções
propostas por Cláudio de Moura Castro, para o ensino
superior, para a avaliação das instituições desse nível de
ensino (STARK; SOUZA; SOUZA, 1998). Neste caso,
havia claramente o objetivo de aprendizagem cooperativa e co-avaliação. No caso das autoras do presente trabalho houve discussão a respeito da atividade.
Os textos complementares apresentavam uma literatura relevante para a temática de cada módulo. Essa
literatura compunha-se de estudos e pesquisas nacionais e estrangeiras, traduzidos, que abordavam e
aprofundavam aspectos relacionados ao conteúdo do
módulo. Os textos complementares ofereciam também uma
bibliografia atualizada sobre os conteúdos desenvolvidos, o que possibilitava ao aluno buscá-la e ampliar o
seu conhecimento.
Como já mencionado, além dos textos básicos e
dos complementares, o aluno recebia também mapas de
informação. Os mapas de informação são unidades de apresentação de informação restritas a um assunto bem definido, contém todas as informações que interessam a quem
estude o referido assunto, sendo as informações organizadas em blocos. Cada bloco contém um aspecto específico com definição, exemplo, ilustração, procedimento etc.
Os textos têm as características de hipertexto e contêm
sistemas de organização e índices que permitem ao usuário encontrar com rapidez as informações relevantes (DICIONÁRIO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA, 2004).
Os mapas de informação foram enviados aos alunos em forma de fichas contendo informações sobre objetivos, conceitos, metodologias, procedimentos, esquemas
teóricos e operacionais, instrumental de coleta e outros
elementos teórico-práticos do processo de avaliação educacional, organizados em unidades e tendo em vista subsidiar a análise dos casos apresentados nos vídeos.
Cada mapa atendia, assim, a diferentes objetivos, apresentando definições, características, comentá24
rios e exemplos de conceitos, como, por exemplo, avaliação quantitativa e qualitativa, questionário, planejamento e plano de ensino e outros.
O uso dos mapas de informação não somente representou uma mediação entre o aluno e os objetivos a
serem alcançados, possibilitando a este a construção do
conhecimento a partir da resolução dos casos, como também uma inovação como estratégia de ensino.
Como também já mencionado, o aluno recebia também vídeos. Estes representaram uma modalidade de
material audiovisual cujo objetivo era desencadear o processo de aprendizagem do módulo através da análise de
casos apresentados. Cada caso descrevia uma situação
de avaliação e solicitava uma análise por parte do aluno
que, para ser realizada, demandava estudo dos mapas de
informação, do texto básico e dos complementares. Os
casos funcionavam, assim, como uma motivação para o
diálogo do aluno com o conteúdo do módulo, levando-o
a realizar uma aprendizagem significativa.
Cada vídeo apresentava a dramatização de 3 situações ou casos que incluíam problemas que deviam ser
objeto de reflexão e análise pelo aluno a partir do conteúdo do módulo a que se referiam. Para analisar os problemas do caso o aluno deveria recorrer aos mapas de informação, aos textos nele indicados e também aos textos
sugeridos pela própria análise do problema. Ele poderia
também realizar uma aprendizagem cooperativa com o
grupo de alunos parceiros do mesmo curso na sua instituição, caso que ocorreu com as autoras do presente
trabalho que se reuniam com os colegas para assistir e
debater os casos dos vídeos.
As situações dramatizadas nos vídeos eram semelhantes às da vida real e sempre aplicadas ao ensino superior, que era o objetivo de formação do curso. A análise de
cada caso possibilitava a aplicação de conceitos desenvolvidos em mais de um módulo. Os casos do vídeo constituíam também uma preparação para a avaliação presencial
pois, nesta, a partir de casos, o aluno devia relacionar e
aplicar os conceitos do módulo em avaliação.
Os vídeos e o material escrito se complementavam,
portanto, para a aprendizagem do aluno. Os vídeos gravados tiveram também um papel importante na interação entre
alunos e a coordenadora do curso pelo fato de que cada um
deles sempre iniciava por uma mensagem dela informando
sobre fatos relevantes do curso em desenvolvimento.
4. OS TUTORES
O papel do tutor foi o de ficar acessível ao aluno
para orientar, quando necessário, a compreensão dos
materiais dos módulos, o desenvolvimento das atividaRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
des propostas nos textos, a análise dos casos e a
monografia. Recorrer ao tutor era uma opção do aluno,
não havendo nenhum contato obrigatório. Entretanto,
os tutores convidavam os alunos para reuniões coletivas realizadas no centro mais próximo, como, por exemplo, na cidade de São Paulo para os alunos paulistas.
Nessas reuniões, dúvidas dos alunos eram superadas
através de discussões coletivas. Para cada região foram
indicados dois tutores para a orientação dos alunos.
A disponibilidade de tutores que podiam ser
acessados por telefone ou nos encontros presenciais
introduziu no curso o componente dialógico com o docente como parte do processo de construção dos conhecimentos pelos alunos.
5. AAVALIAÇÃO DAAPRENDIZAGEM DO ALUNO
A avaliação da aprendizagem do aluno, do ponto
de vista somativo, foi realizada através de provas
presenciais que ocorreram nos centros de cada Estado,
em intervalos bimestrais e com datas previamente
estabelecidas, invariavelmente aos sábados para atender às necessidades da clientela do curso que, como já
foi salientado, trabalhava.
A realização das provas efetivou-se de maneira
formal e individual em um período de duração de 4 horas.
Um fiscal designado pelos organizadores do curso acompanhava a realização das provas em cada sala.
As provas avaliavam a aprendizagem do aluno
através de questões centradas em casos semelhantes
aos dos vídeos. Os alunos deveriam analisar os casos,
apresentando argumentos relacionados ao módulo em
avaliação. As provas eram unificadas para todos os alunos do curso.
A correção era feita posteriormente pela equipe
de organizadores do curso e o relatório de resultados era
enviado pelo correio aos alunos após o período médio
de um mês.
c) Aplicação dos conhecimentos construídos ao
longo dos estudos no módulo – as respostas e suas
justificativas têm relação direta com o caso relatado e
explicitam conhecimentos a partir dos conteúdos dos
módulos estudados. Peso: 20%.
d) Riqueza de argumentação – as respostas e suas
justificativas têm relação direta com o caso relatado e
incluem idéias que traduzem uma perspectiva crítica e
variedade de pontos de vista. Peso: 20%.
e) Abrangência da argumentação – as respostas
às perguntas escolhidas pelo aluno têm relação direta
com o caso relatado e incluem tudo o que deveria ter sido
dito, nada importante sendo deixado fora. Peso: 20%.
f) Concisão- todo o registro de idéias foi feito com
um mínimo de termos, sem repetições ou redundâncias.
Peso: 5%.
O resultado da avaliação da prova a partir dos
critérios acima, para cada módulo, era dado em forma de
conceitos a partir de uma escala de 5 pontos. Os conceitos utilizados eram: superior, médio superior, médio, médio inferior e insuficiente.
O aluno somente podia passar para o estudo do
módulo seguinte se recebesse conceito no mínimo médio na prova do módulo em avaliação. Alunos que recebessem conceitos médio inferior ou insuficiente deveriam fazer uma prova de segunda chamada. Reprovação
na prova da segunda chamada redundaria em afastamento do aluno do curso.
Avaliações formativas ou de processo foram realizadas pelo próprio aluno através da análise do seu próprio desempenho nas atividades solicitadas no texto básico, através do confronto das suas respostas com as
sugeridas, e da auto-avaliação dos resultados do seu
desempenho nas provas de cada módulo a partir dos
relatórios recebidos.
6. ALGUNS RESULTADOS DO CURSO
Os critérios de correção das provas e seus pesos,
segundo os relatórios de desempenho enviados ao aluno, eram:
a)Coerência interna: a justificativa da prescrição
representa claramente uma visão crítica da descrição apresentada da situação. Peso 15%.
b) Coerência entre os vários aspectos da prescrição – na prescrição feita pelo aluno os vários aspectos
da avaliação (objetivo, metodologia e outros) têm relação adequada entre si. Peso: 20%.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Inscreveram-se no curso 868 alunos. Em termos
de evasão, antes do final da primeira disciplina, 19% (165)
abandonaram o curso. Do total de inscritos, 519 (59.7%)
chegaram até a última disciplina e 51,3% (446) concluíram
a monografia (PETERSON; SOUZA, 1999). Esses resultados indicam que aproximadamente a metade dos alunos desistiu do curso até a sua conclusão.
Como parte dos requisitos do curso, além da aprovação nos módulos, os alunos deviam apresentar uma
monografia com o desenvolvimento de um tema relacionado ao curso. Nessa etapa, segundo Peterson e Souza
25
(1999) 446 alunos apresentaram a monografia. Desses,
apenas 1% teve o trabalho reprovado.
Partindo-se do pressuposto de que é importante
a análise das áreas escolhidas pelos alunos para a realização das monografias (porque pode-se, através dela,
ilustrar as direções dos esforços dos alunos na aplicação dos conceitos desenvolvidos no curso e indicar prováveis melhorias ou aumento do conhecimento da reali-
dade das suas instituições de origem como decorrência
do curso), foi também desenvolvida neste trabalho uma
análise dos temas das monografias.
Dados apresentados na web (IESB, 2005) sobre
as monografias e seus temas foram analisados, mostrando um total de 434 títulos distribuídos em 8 áreas. As
áreas escolhidas pelos alunos que desenvolveram a
monografia são apresentadas na tabela abaixo.
Tabela 1 - Áreas das monografias apresentadas ao final do curso
Área da monografia
avaliação institucional
avaliação de currículos e de programas
avaliação de docentes e/ou ensino
acompanhamento e avaliação do aluno
avaliação de disciplinas
técnicas e instrumentos de avaliação
Avaliação de políticas públicas ou de políticas em educação
avaliação de egressos
Total
Nº de
Monografias
103
93
86
80
27
26
8
1
434
%
24,0
21,3
20.0
18,3
6,2
6,0
4,0
0,2
100,0
Fonte: IESB, 2005.
A Tabela 1 mostra que, aproximadamente, 83%
dos alunos concentraram suas escolhas em temáticas
ligadas à avaliação no nível da instituição, dos cursos,
dos docentes e dos alunos. As temáticas de avaliação
de disciplinas e de instrumentos de avaliação tiveram um
menor apelo para os alunos. Avaliação de políticas públicas e de egressos foram as menos escolhidas.
Os resultados das escolhas centradas na instituição, nos programas, nos docentes e nos alunos podem
ser explicados, em parte, pelo fato de a realização do curso de avaliação em análise ocorrer em um período em que
a universidade já era vista sob a ótica da avaliação e da
prestação de contas para a sociedade. Programas como
o Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), conduzido pelo Ministério da
Educação, já estavam em ação no país e sinalizavam para
as instituições a necessidade da universidade se submeter ao processo de avaliação externa e interna. Muitas já
estavam construindo e submetendo ao referido programa seus planos de avaliação institucional. Havia, portanto, necessidade de preparar recursos humanos para a
tarefa de avaliação institucional.
Muitas das escolhas de monografia deram-se como
decorrência de os alunos já estarem envolvidos em tarefas
referentes a algum tipo de avaliação. Muitos alunos já
faziam parte, nas suas instituições de origem, das Comissões Permanentes de Avaliação, responsáveis, na época,
pela avaliação nas Instituições de Ensino Superior
26
(PETERSON; SOUZA, 1999).
O depoimento abaixo transcrito, de uma aluna do
curso, ilustra como as temáticas desenvolvidas no curso
se aproximaram da vivência de alunos nas suas instituições de origem:
“...gostaria de registrar que a participação nesse Curso de Especialização em
Avaliação representou a possibilidade de
adquirir, sistematizar conhecimentos e,
utilizando esse instrumental teórico, refletir sobre um tema que faz parte do meu
cotidiano em termos profissionais. Os conhecimentos adquiridos abriram e ampliaram meu campo de visão, apontando,
para mim, novas perspectivas de análise
das questões de educação” (PETERSON;
SOUZA, 1999, p. 11).
7. CONCLUSÃO
Alguns pontos merecem ser destacados na experiência do curso em análise:
- A discussão, reflexão, problematização e abordagem científica das questões da avaliação no ensino
superior, tanto de aspectos institucionais como de aprendizagem, representou uma contribuição significativa para
a formação de docentes e funcionários, tendo em vista a
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
qualidade do processo educativo das instituições de
ensino superior.
- A abordagem utilizada no curso, com o uso da
análise de casos no processo de ensino, caracterizou
uma concepção construtivista de aprendizagem. Além
de ser uma inovação, a análise de casos favoreceu uma
aprendizagem do conteúdo como um meio para a resolução de problemas e não como um fim em si mesmo, tornando-a significativa para o aluno. Muitas vezes, o mero
uso de tecnologia não caracteriza um avanço no processo de ensino, pois pode estar a serviço de uma abordagem tradicional na qual o conteúdo é o centro e cabe ao
aluno apropriar-se dele através de memorização ou atividades repetitivas. No caso do curso em tela, houve a
preocupação com a compreensão do material através da
abordagem de estudo de casos. As avaliações também
foram realizadas através da análise de casos, o que sinalizava para o aluno a necessidade de compreensão e de
participação ativa no curso.
- A introdução de conceitos inovadores da área
de avaliação na educação, como, por exemplo, o de
portfólio como um instrumento de avaliação do aluno e
da escola, representou também uma contribuição para o
avanço do conhecimento dos alunos na área. O portfólio,
como instrumento de avaliação, era pouco conhecido
entre os docentes das instituições de ensino.
- O uso de materiais especialmente produzidos
para os objetivos do curso foi uma característica da preocupação com a qualidade do curso que não se limitou a
somente selecionar e reproduzir materiais já existentes.
Foi o caso dos mapas de informação, dos textos básicos
e dos vídeos. Os textos complementares foram reproduções de materiais já disponíveis, mas selecionados pela
sua alta importância para a complementação da aprendizagem dos alunos. Textos dispersos na literatura foram
convenientemente reunidos e oferecidos para os alunos.
- A vivência de um curso a distância, como o aqui
analisado, com uma abordagem que favoreceu uma aprendizagem significativa e fez uso dos recursos como uma
mediação para a construção do conhecimento do aluno e
não para a mera absorção de informações, representou
uma experiência positiva para alunos que, como as autoras do presente trabalho, pela primeira vez tiveram a
oportunidade de serem alunas de um curso a distância.
- No caso das autoras do presente trabalho já
havia em curso um esforço, na sua instituição de origem,
de levar avante um trabalho de avaliação da universidade e dentro dele, de avaliação do trabalho docente, o que
foi favorecido com a aprendizagem realizada no curso. O
curso favoreceu o desenvolvimento posterior da autoavaliação da instituição.
Alguns pontos na experiência do curso em análise poderiam ser melhorados no caso de sua extensão a
outros contextos:
- A auto-avaliação poderia ser utilizada com mais
ênfase para a autonomia da aprendizagem do aluno. Os
critérios das correções das provas, por exemplo, poderiam ter sido mais bem esclarecidos para os alunos. A análise dos relatórios das provas poderia ter sido um instrumento de melhor favorecimento da aprendizagem do aluno se acompanhada de uma cópia da prova. Por estar
distante no tempo, o aluno não se lembrava de tudo que
escrevera na prova ao receber o relatório com a sua avaliação.
- Os canais de comunicação e de feedback poderiam ter favorecido mais a aprendizagem dos alunos se
fossem mais rápidos. O contato com os tutores era apenas telefônico ou no dia da reunião presencial, o que não
atendia ao perfil dos que trabalhavam e não podiam comparecer às reuniões coletivas.
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
- O fato de grupos de pessoas da mesma instituição poderem estar no mesmo curso favoreceu a aprendizagem colaborativa. No caso da Instituição de Ensino
Superior de origem das autoras do presente estudo, havia um grupo de cinco pessoas no curso, o que possibilitou uma interação aluno-aluno em vários momentos,
quando então eram discutidos os casos e outras questões do curso. Considera-se esse um ponto positivo do
curso em análise, pois contrariou o que Azevedo (2000)
denominou como uma das maiores dificuldades do ensino a distância convencional, que é o isolamento do aluno que não pode contar com o apoio de um grupo de
pessoas que estão na mesma situação que ele e não pode,
assim, contar com as vantagens de uma aprendizagem
colaborativa.
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27
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Ciência, Filosofia e Religião Diante da Questão da Origem
do Universo
Mituo Uehara *
Resumo: Apresenta-se uma introdução ao estudo das questões filosóficas: 1. Por que o universo
existe? 2. Por que há ordem no universo? 3. Por que as leis da natureza podem ser expressas
matematicamente? Mostra-se a necessidade de buscar as respostas na filosofia e na religião.
Palavras-chave: Ciência, filosofia, religião, origem do universo.
Abstract: It is presented an introduction to the study of the philosophical questions: 1. Why does the
universe exist? 2. Why there is order in the universe? 3. Why the laws of nature can be expressed
mathematically? It is argued that the answers are given by philosophy and religion.
Key words: Science, philosophy, religion, origin of the universe.
1. INTRODUÇÃO
Werner Heisenberg, Prêmio Nobel de Física, narra
um fato ocorrido em 1927, durante o Congresso Solvay,
em que se discutiram questões epistemológicas relacionadas com as teorias quânticas. Certa noite, alguns jovens físicos, entre eles Werner Heisenberg e Wolfgang
Pauli, conversavam no saguão do hotel onde estavam
hospedados. Alguém comentou o fato de Einstein falar
freqüentemente de Deus, nas discussões sobre filosofia
da Física. Outro acrescentou que também Max Planck
não via nenhuma contradição entre ciência e religião. A
conversa girava em torno do tema religião e ciência, quando Paul Dirac juntou-se ao grupo. Inesperadamente, Dirac,
exaltado, disse que não entendia por que estavam falando sobre religião, e fez um discurso apaixonado em defesa do ateísmo, chegando a dizer que a religião era uma
espécie de ópio. Heisenberg apresentou objeções às idéias de Dirac. Enquanto a discussão prosseguia, perceberam que Wolfgang Pauli, que antes da chegada de Dirac,
havia opinado sobre o tema, permanecia calado, às vezes
mostrando uma fisionomia de desagrado, e às vezes com
um sorriso enigmático. Quando perguntaram o que ele
pensava, Pauli respondeu: “Ja, ja, unser Freund Dirac
hat eine Religion; und der Leitsatz dieser Religion
lautet: ‘Es gibt keine Gott, und Dirac ist sein Prophet’”
(Sim, sim, nosso amigo Dirac tem uma religião e o princípio guia dessa religião afirma: “Deus não existe e Dirac é
seu profeta”). Então todos riram, inclusive Dirac, e assim
terminou a conversa naquela noite, no saguão do hotel
(HEISENBERG, 1973).
* Professor da Univap.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
O fato narrado ilustra o perigo, quando se conversa sobre religião, de se deixar dominar por preconceitos e agir movido mais pelas paixões do que pela razão.
As pessoas envolvidas no fato narrado não eram nem de
longe pouco instruídas ou pouco inteligentes, pelo contrário, eram todos físicos brilhantes, sendo que os citados nominalmente, Heisenberg, Pauli, Dirac, Einstein e
Planck , receberam o Prêmio Nobel de Física. Naquela
época Dirac tinha vinte e cinco anos de idade. No decorrer dos anos sua atitude em relação à religião mudou,
como veremos na parte em que tratamos dos métodos da
Física Matemática na investigação das leis da natureza.
A atitude do jovem físico Dirac revela que ele se
deixou influenciar por filosofias anticristãs do século XIX,
século em que a má filosofia, baseada em falsos princípios, atacou a fé cristã em nome da razão (CORRIGAN,
1946; RUSSEL, 1991). Essas filosofias anticristãs estão
entre as principais causas do bolchevismo e do nazismo,
monstruosidades que marcaram o conturbado século XX.
No século XX ocorreu um fenômeno curioso, que
se acentuou nos últimos cinqüenta anos e, mais ainda,
nos últimos vinte e cinco anos: cientistas eminentes, principalmente físicos, começaram a falar de Deus em seus
escritos filosóficos (MARGENAU, 1992). Entre outras
razões, o fato está relacionado com o avanço impressionante da Ciência, especialmente da Física, no século XX.
Físicos eminentes manifestaram suas perplexidades diante do notável sucesso da Física Matemática. Eles perceberam claramente que a Ciência não era capaz de explicar as razões mais profundas de tal sucesso. Por exemplo, Eugene P. Wigner, Prêmio Nobel de Física, cunhado
de Dirac, escreveu um ensaio intitulado “The unreasonable
29
effectiveness of mathematics in the natural sciences” (A
incompreensível eficácia da Matemática nas Ciências Naturais) em que ele afirma que a enorme utilidade da Matemática nas Ciências Naturais é algo que toca o misterioso
e que não tem uma explicação racional (WIGNER, 1960).
Outros Físicos, entre eles Einstein e Dirac, também manifestaram a mesma perplexidade (DIRAC, 1939).
A Ciência não é capaz de responder muitas questões fundamentais a respeito do universo, como, por exemplo, as seguintes:
1.Por que existe algo e não o nada? Qual a origem
do universo?
2.Por que há ordem no universo e não o completo
caos? Por que há leis da natureza?
3.Por que as leis da natureza podem ser expressas
matematicamente?
4.Qual a origem da capacidade humana de descobrir leis da natureza?
A Filosofia e a Religião têm algo a dizer sobres
essas questões. Através da Filosofia pode-se chegar ao
conhecimento de certezas que se impõem por si ou podem ser deduzidas pela razão. Não é fácil definir o que é
o conhecimento, mas certamente no conceito de conhecimento está implícito o conceito de verdade, que é a
adequação da inteligência à realidade. Um conhecimento
para ser verdadeiro conhecimento deve ser adequado à
realidade (Santo Tomás de Aquino, 1999). Esta concepção de verdade é a única compatível com a Ciência, completamente inviável sem esse pressuposto. Como não
pode haver contradição entre duas verdades, o conhecimento científico não contradiz o verdadeiro conhecimento
filosófico, nem o verdadeiro conhecimento religioso.
Neste trabalho falamos, inicialmente, da Matemática, dando alguns exemplos de conceitos matemáticos, para
enfatizar a criatividade dos matemáticos e da liberdade
que há na criação dos conceitos matemáticos. Em seguida, damos exemplos de teorias físicas que mostram o sucesso notável da Física Matemática. Na seqüência, falamos das respostas que a Filosofia e a Religião podem dar
às quatro questões acima, não respondidas pela Ciência.
O objetivo não é apresentar uma discussão aprofundada
das questões tratadas, mas apenas despertar o interesse
por elas.
2. MATEMÁTICAE FÍSICA
Para ajudar a compreender a perplexidade dos
físicos teóricos, quanto à eficácia da Matemática na Física, vamos falar um pouco sobre o que é Matemática e o
30
que é Física Matemática.
A Matemática não trata apenas de como fazer cálculos, mas é muito mais do que isso, é uma linguagem de
inigualável concisão, riqueza e precisão. Wigner disse
que alguém definiu a Filosofia como o mau uso de uma
terminologia que foi inventada só para esse propósito.
No mesmo estilo, ele define a Matemática como a Ciência
das operações inteligentes com conceitos e regras inventadas só para esse propósito. A principal ênfase é na
invenção dos conceitos (WIGNER, 1960). Um grande matemático, Georg Cantor se não me engano, disse que
Matemática é liberdade. Liberdade de criação de conceitos e de operações matemáticas.
Como exemplo de um conceito criado pelos matemáticos citamos o número imaginário i = √ - 1 , a raiz
quadrada de menos 1. Não existe nenhum número real
que elevado ao quadrado dê como resultado um número
negativo. Os matemáticos criaram o conceito de número
complexo c = a + ib, em que a e b são números reais, e
formularam regras para fazer operações matemáticas com
números complexos. Por exemplo, a raiz quadrada de i é
√i = ± (1 + i)/√2. Observando a natureza, nada vemos
que sugira os números complexos inventados pelos matemáticos.
Outro exemplo da criatividade dos matemáticos é
o número e definido pelo matemático suiço Leonhard
Euler, um dos maiores matemáticos da história da Matemática e que viveu no século XVIII. Euler definiu a função exponencial ex como o limite de uma série infinita:
ex = limite da série (1+ x/n)n quando n tende para
o infinito.
Tomando x = 1 resulta
e = limite da série (1+ 1/n)n quando n tende para
o infinito,
sendo o número e o primeiro a ser definido como o limite
de uma série infinita.
O número e tem o valor e = 2,71828..., em que os
pontos indicam infinitos algarismos.
Derivada de uma função é outro conceito matemático de extrema importância tanto na Matemática pura
como na Física. A derivada da função exponencial dá
como resultado a própria função exponencial. É a única
função matemática cuja derivada é ela mesma, sendo,
portanto, uma função especialíssima. Apesar de ser uma
função especialíssima, surpreendentemente, muitos fenômenos físicos obedecem a uma lei exponencial, como,
por exemplo, a absorção de raios X por um meio material
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
como o corpo humano.
Um outro número importante na Matemática é o
número p, que aparece em muitas áreas da Matemática.
Por exemplo, na Geometria, onde aprendemos que a relação entre o comprimento L e o diâmetro D de uma circunferência é igual a L/D = π = 3,141592....
Os três números i, e e π satisfazem uma relação
matemática notável descoberta por Euler. A função
exponencial foi estendida por Euler para expoentes imaginários, o que o levou a descobrir a relação
eix = cosx + isenx.
Tomando x = π resulta
eiπ + 1 = 0,
que é certamente uma das mais belas fórmulas em toda a
Matemática. Podemos escrever o valor de e na forma
decimal apenas aproximadamente: e ≅ 2, 71828. Também π ≅ 3,141592. Porém, a fórmula acima é exata! Ela
relaciona as cinco constantes mais importantes da Matemática, que simbolizam os quatro grandes campos da
Matemática clássica: Aritmética, representada por 0 e 1;
Álgebra, por i; Geometria, por π; e Análise, por e. O matemático Eli Maor cita Edward Kasser e James Newman,
que narram um episódio no livro Mathematics and the
Imagination :
“To Benjamim Peirce, one of Harvard´s
leading mathematicians in the nineteenth
century, Euler´s formula eiπ = - 1 came as
something of a revelation. Having
discovered it one day, he turned to his
students and said: ‘Gentlemen, that is
surely true, it is absolutely paradoxical;
we cannot understand it, and we don´t
know what it means. But we have proved
it, and therefore we know it must be the
truth’ ” (Para Benjamim Peirce, um dos principais matemáticos de Harvard no século
dezenove, a fórmula de Euler eiπ = - 1 veio
como uma revelação. Tendo-a descoberto
certo dia, virou-se para seus alunos e disse: ‘Cavalheiros, isto é seguramente verdadeiro, é absolutamente paradoxal, nós
não podemos entendê-la, e não sabemos
o que ela significa. Mas, nós a demonstramos e, portanto, nós sabemos que ela deve
ser a verdade.’ ”) (MAOR, 1994).
Euler aplicou o conceito de números complexos
para funções transcendentais e obteve resultados inesperados. Ele mostrou que potências imaginárias de um
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
número imaginário pode ser real. Por exemplo, ele demonstrou que a expressão ii é igual a
ii = e-(π/2 + 2kπ), onde k = 0, ± 1, ±2, …
Para cada valor de k tem-se um resultado, de modo
que se têm infinitos valores, todos eles reais. Maor comenta admirado: “Num sentido muito literal, Euler fez o
imaginário tornar-se real!” (MAOR, 1994).
No século XIX a Matemática se enriqueceu com o
desenvolvimento de três grandes áreas: a teoria de funções de variável complexa, a Álgebra abstrata e a Geometria não-euclideana. Euler, por volta de 1750, foi o desbravador; Cauchy, Bolzano, Riemann, Weierstrass e muitos
outros, no século XIX, deram a essas áreas a importância
que hoje ela tem, não apenas para a Matemática, mas
também para a Física.
Comenta Wigner que se alguém perguntasse a um
matemático por que ele se interessa por números complexos, ele mencionaria, um pouco indignado com a pergunta, os numerosos e belos teoremas da teoria das funções
analíticas, que tiveram origem na introdução do conceito
de números complexos. Wigner cita um comentário de M.
Polanyi (Personal Knowledge, University of Chicago
Press, 1958) em que ele afirma que a Matemática não pode
ser definida sem mencionar sua característica mais óbvia:
o fato de que ela é interessante (WIGNER, 1960).
Procuramos mostrar com os exemplos acima, a
criatividade dos matemáticos na definição de novos conceitos e desenvolvimento de novas teorias matemáticas.
Na Matemática somos livres para definir um novo objeto
do modo como quisermos, desde que a definição não contradiga nenhuma das definições já aceitas ou resultados já
provados. A criatividade e o senso estético para reconhecer a beleza formal matemática desempenham papel importante na definição de novos objetos matemáticos. Georg
Cantor tinha razão, a Matemática é liberdade.
Não seria motivo de perplexidade se essa matemática, criada com tanta liberdade, tivesse utilidade na explicação de fenômenos naturais? Pois é exatamente o que
acontece na Física Matemática. Certamente para alguém
que não é matemático, comenta Wigner, os números complexos estão longe de serem naturais ou simples, e eles
não podem ser sugeridos por observações físicas. No entanto, a utilização dos números complexos é quase uma
necessidade na formulação das leis da teoria quântica em
que os estados dos sistemas físicos são vetores num espaço de Hilbert, um espaço complexo. Não apenas os números complexos, mas também as funções analíticas complexas desempenham um papel decisivo na formulação de
teorias quânticas. O sucesso da Física Matemática mostra
que a Matemática é a linguagem adequada para a formula31
ção das leis da Física (WIGNER, 1960).
Freeman Dyson, físico britânico que emigrou para
os Estados Unidos, diz que na Física Matemática buscase conhecer as leis da natureza seguindo o estilo e o
método rigorosos da Matemática pura. O objetivo dos
físicos matemáticos, afirma Dyson, “não é calcular os
fenômenos quantitativamente, e sim entendê-los qualitativamente. Eles trabalham com teoremas e demonstrações matemáticas, não com números e computadores. Seu objetivo é esclarecer com precisão matemática
o significado dos conceitos sobre os quais a teoria física é construída.” (DYSON, 1992).
Dyson cita uma palestra dada na universidade de
Miami, em Coral Gables, por Paul Adrien Maurice Dirac,
quando ele estava com setenta anos de idade e era o
último sobrevivente do grupo de jovens físicos que, de
1925 a 1928, criaram a teoria quântica. O título da palestra
era “Crenças básicas e pesquisa fundamental”. Falando sobre os métodos utilizados pelos físicos na investigação dos fenômenos da natureza, Dirac, a certa altura
da palestra afirma:
“O físico teórico também pode trabalhar
de outra forma, mais lenta e tranqüila,
capaz de conduzir a resultados mais profundos. Essa forma não depende muito de
trabalho experimental. Consiste em ter algumas crenças básicas e tentar
incorporá-las numa teoria. Por que alguém deve ter crenças básicas? Não sei
se posso explicar isso. Simplesmente sentimos que a natureza é construída de uma
determinada forma e nos agarramos a
essa idéia da mesma forma como nos agarramos a crenças religiosas. Sentimos que
as coisas simplesmente precisam estar
nessas linhas e precisamos imaginar uma
teoria matemática que incorpore a crença básica.” (DYSON, 1992).
De passagem observamos que a atitude de Dirac
em relação à religião mudou, pois ele se inclui entre as
pessoas que se agarram a crenças religiosas, tendo abandonado o ateísmo fanático que ele manifestara aos vinte
e cinco anos, na conversa com Heisenberg, Pauli e outros jovens físicos. Margenau inclui Dirac entre os físicos que falam de Deus em seus ensaios filosóficos
(MARGENAU, 1992).
Dirac fala da importância do critério estético na
formulação da teoria. Citemos suas palavras:
“Meu trabalho inicial foi muito influenciado pelas órbitas de Bohr, e tive a cren32
ça básica de que as órbitas de Bohr forneceriam a chave para a compreensão
dos eventos atômicos. Era uma crença
errada ... Descobri que minha crença básica estava errada e tive de passar para
uma linha de pensamento bem outra. Precisei buscar uma base mais geral para
meu trabalho, e a única base confiável
na qual pude pensar, a única base geral
o suficiente para evitar que eu voltasse a
cometer o mesmo erro era construir um
princípio de beleza matemática: dizer que
na verdade não sabemos o que são as
equações básicas da Física, mas que elas
têm de ter uma grande beleza matemática. Precisamos insistir nisso, e esse é o
único aspecto das equações no qual podemos confiar e insistir ... Como se pode
fazer da beleza um teste fundamental para
a correção de uma teoria física? Bem, é
bastante evidente que a beleza depende
efetivamente da cultura e da educação
para certos tipos de beleza: pintura, literatura, poesia e assim por diante ... Contudo, a beleza matemática é de um tipo
bem diferente. Talvez eu devesse dizer que
ela é de um tipo bem diferente e transcende esses fatores pessoais. É a mesma em
todos os países e em todos os períodos de
tempo ... Bem, essa é a essência do que eu
queria dizer. Na verdade é possível ter
uma opinião tão forte sobres essas coisas
que quando um resultado de experiência
não está de acordo com nossas crenças
provavelmente iremos prever que o resultado da experiência está errado e que os
pesquisadores experimentais irão corrigi-los em pouco tempo. Claro que não se
pode ser obstinado demais quanto a esses assunto, mas ainda assim é preciso
ousar.” (DYSON, 1992).
Agora passamos ao comentário de Dyson:
“Dirac era ousado. A confiança que ele
tinha em seu próprio instinto para a beleza matemática levou-o sucessivamente
a três descobertas fundamentais: primeiro, a formulação abstrata da Mecânica
Quântica; segundo, a descrição quântica
correta dos processo de radiação eletromagnética; e terceiro, a equação de Dirac
para o elétron. Em cada caso ele foi conduzido não meramente a uma nova lei
Física, mas a um novo estilo de descrição
matemática da natureza. E em cada caso
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
as experiências demonstraram que ele
estava certo, embora, como ele sugere na
conferência de Coral Gables, tenham surgido inicialmente alguns resultados experimentais contrários, que ele foi suficientemente ousado para ignorar.
A crença fundamental de Dirac, a de que
o critério básico para escolher uma teoria científica deva ser estético, demonstrou-se fantasticamente bem-sucedida em
suas mãos. A natureza concordou com seu
critério. E essa concordância entre as
noções de beleza da natureza e de Dirac
nos presenteia com um novo exemplo de
um velho enigma filosófico. Por que a
natureza deve se importar com nossas
opiniões sobre a beleza? Por que o elétron iria preferir uma bela equação a uma
equação feia? Por que o universo iria
dançar de acordo com a música de
Dirac? A essas perguntas misteriosas nem
os cientistas nem os filósofos sabem responder. Dirac, com seu estilo de descoberta, propôs essas questões de modo
mais preciso que os outros. Mais ainda
que Newton e Einstein, ele utilizou consciente e diretamente o critério da beleza
como meio de descobrir a verdade.”
(DYSON, 1992).
Albert Einstein, o maior físico do século XX, dedicou aproximadamente dez anos de sua vida na formulação de sua teoria da gravitação, mais comumente conhecida com o nome de Teoria da Relatividade Geral, motivado não por alguma necessidade observacional, mas por
razões de caráter filosófico e estético. Sua teoria é essencialmente uma teoria geométrica, riemanniana, do espaço-tempo quadridimensional. É uma teoria de extraordinária beleza matemática.
Uma teoria verdadeiramente científica não deve
se restringir a explicar fatos já observados, mas deve
fazer previsões teóricas de fenômenos ainda não observados. No caso da teoria de Einstein são citados, geralmente, as três verificações observacionais: 1. o desvio
de um raio luminoso ao passar próximo do Sol; 2. o avanço do periélio do Mercúrio; 3. o atraso do relógio num
campo potencial gravitacional. Os resultados
observacionais confirmaram as previsões teóricas de
Einstein nos três casos.
A explicação dada pela teoria de Einstein para o
desvio de um raio luminoso ao passar próximo de uma
grande massa tornou-se ferramenta de trabalho na Astronomia observacional. Por exemplo, a massa de uma
galáxia, que se interpõe entre um quasar distante e a
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Terra, pode ser estimada pelo grau de deformação da
imagem do quasar, pelo efeito de lente gravitacional resultante do desvio do raio luminoso ao passar próximo
da galáxia.
A verificação mais espetacular ainda estava por
vir. O conceito de ondas gravitacionais é um conceito
inteiramente novo introduzido pela Teoria da Relatividade Geral.Sir Roger Penrose, físico matemático inglês, professor da Universidade de Oxford, em seu livro “The
Large, the Small and the Human Mind” faz um relato da
verificação indireta da existência de ondas gravitacionais.
Em 1993, Hulse e Taylor ganharam o Prêmio Nobel pela
extraordinária série de observações, realizadas num período de vinte anos. Eles observaram o pulsar binário
conhecido como PSR 1913 + 16, que é constituído por
um par de estrelas de neutrons, cada uma com massa
aproximadamente igual à massa do Sol, concentrada num
volume de apenas alguns quilômetros de diâmetro. As
estrelas de neutrons orbitam em torno do centro de gravidade comum, em órbitas altamente elípticas. Uma delas
tem um campo magnético muito intenso e as partículas
que se movem nesse campo emitem uma radiação intensa que pode ser detectada na Terra. Segundo a teoria de
Einstein, os pulsares binários radiam energia na forma de
ondas gravitacionais. Essas ondas tiram energia do sistema numa taxa que pode ser calculada com grande precisão pela teoria de Einstein. A taxa de perda de energia
do sistema binário de estrelas de neutrons foi medida
com grande precisão no período de vinte anos. Os resultados mostram que a teoria de Einstein é correta com a
precisão de uma parte em 1014, o que faz da Teoria da
Relatividade Geral a teoria física de maior precisão
(PENROSE, 1997).
A teoria de Einstein tem sido utilizada para a elaboração de vários modelos de universo, sendo que o
modelo que melhor descreve os fatos observacionais é
um modelo de universo em expansão, que aponta para
uma situação no passado em que a temperatura era
altíssima e toda a matéria concentrava-se praticamente
num ponto, daí alguém ter falado num Big Bang inicial
que estaria na origem do universo. Steve Weinberg, físico matemático americano, Prêmio Nobel, em seu livro “The
First Three Minutes”(WEINBERG, 1977) descreve o universo em seu estágio inicial, na medida em que a Física
atual pode fazê-la. Ele mostra que a teoria de Einstein
leva à previsão de uma radiação eletromagnética de corpo negro distribuída de modo aproximadamente uniforme no universo. Essa radiação foi observada pelos
astrofísicos americanos Penzias e Wilson, em 1965. Utilizando a teoria de Einstein para interpretá-la, essa radiação nos conta algo do passado do universo, e o que ela
nos diz é que o Big Bang aconteceu há ~ 13,7 bilhões de
anos.
33
O astrofísico indiano, T. Padmanabhan, em seu
livro “After the First Three Minutes – The Story of Our
Universe” relata que medidas mais precisas foram realizadas, em 1992, com o satélite da NASA chamado COBE
(Cosmic Background Explorer), especificamente projetado para detectar desvios de temperatura na radiação cósmica de microonda. Os resultados mostraram variações
de temperatura, no campo de radiação, com a ordem de
grandeza esperada, mostrando conclusivamente que os
modelos teóricos a respeito da formação das galáxias e
outras estruturas no Universo estão basicamente corretas (PADMANABHAN, 1998).
em grande parte, a motivação e as condições para a
ciência desenvolver-se na cultura ocidental, como é agora
bem reconhecido. Historicamente, alguns cientistas encontraram inspiração e intuição para suas pesquisas
científicas nas suas crenças religiosas e insights espirituais. As perspectivas filosóficas da cultura ocidental
também exerceram e continuam a exercer forte influência no desenvolvimento do pensamento científico.”
(STOEGER, 2002).
A relação entre a Matemática e a Física é mais
profunda e misteriosa do que pode parecer numa análise
superficial. Einstein nos conta que em 1907 ele se perguntava como se poderia modificar a Teoria Newtoniana
da Gravitação de modo a torná-la compatível com o princípio de relatividade, quando então lhe ocorreu uma idéia
que ele considerou ser a idéia mais feliz de sua vida.
Entretanto, a formulação da teoria demorou quase dez
anos porque Einstein não conhecia a Matemática adequada para exprimir suas idéias. Ele precisava de uma
teoria matemática dos invariantes associados ao elemento diferencial de linha ds2 = gµνdxµdxν. Em 1912, seu amigo Marcel Grossman, matemático, disse-lhe que a teoria
matemática que ele procurava era a Geometria de
Riemann, criada por Bernhard Riemann, um dos maiores
matemáticos do século XIX. Somente depois da informação dada por Grossman é que Einstein começou a formular sua famosa teoria.
A Ciência não é capaz de responder a questão a
respeito da origem do universo porque os métodos científicos se aplicam a realidades materiais existentes e, conseqüentemente, não têm nada a dizer sobre a situação
hipotética da inexistência do universo. As equações da
Física não se aplicam ao nada.
Penrose comenta que o modo como Einstein desenvolveu sua teoria da gravitação e sua convincente
verificação experimental mostram que Einstein revelou
algo da estrutura matemática da natureza. O que Einstein
descobriu não foi algo de importância secundária na Física, mas a coisa mais fundamental que há na natureza,
a natureza do espaço e tempo (PENROSE, 1997).
O impressionante sucesso da Física Matemática,
exemplificado pelas teorias quânticas e pela Teoria da
Relatividade Geral, mostra que muita Física pode resultar
de um pouco de boa Filosofia, de senso estético, da teoria matemática adequada, e de um insight inspirado. Em
contrapartida, muitas conjecturas filosóficas foram inspiradas pelo sucesso da Física Matemática, o que mostra
que a boa Ciência e a boa filosofia não só são compatíveis, mas elas se beneficiam em suas mútuas interações.
Assim, também a boa Ciência pode se beneficiar da boa
Teologia (há boa e má teologia assim como há boa e má
Ciência) e vice-versa.
Sobre a interação entre Ciência, Religião e Filosofia, comenta o astrofísico e filósofo William Stoeger: “A
religião, a teologia e a espiritualidade proporcionaram,
34
3. CONHECIMENTO FILOSÓFICO E CONHECIMENTO RELIGIOSO
Gottfried Wilhelm Leibniz, matemático e filósofo
alemão, contemporâneo de Isaac Newton, formulou a
pergunta: “Por que existe alguma coisa e não o nada?”,
que é a pergunta que a Filosofia deve responder para
explicar a existência do universo.
Stoeger (1992) escrevendo sobre a origem do universo, chama a atenção para o significado do termo “criação”, que em Ciência é utilizado de modo não rigoroso.
Fala-se, por exemplo, em criação de partículas na interação
de outras partículas, ou por polarização do vácuo. Falase em proteínas criadas a partir de aminoácidos. Em todos os casos tratados pela Ciência, não há verdadeira
criação, mas sim transformação de matéria preexistente.
Filosoficamente, o significado do termo “criação”
é muito mais estreito e mais específico. O termo significa
creatio ex nihilo, criação a partir de absolutamente nada.
A criação com a qual estamos familiarizados na Ciência
não é creatio ex nihilo, mas sim transformação da matéria
previamente existente. Por exemplo, um fóton pode dar
origem a um elétron e a um pósitron num processo físico
chamado criação de um par elétron-pósitron. O elétron e o
pósitron não contêm em si a explicação de sua própria
existência. A existência deles depende de alguma outra
coisa, neste caso, do fóton que deu origem a eles, juntamente com toda a cadeia causal da qual depende o fóton.
Analisando a realidade material chega-se à conclusão de que nenhum ente físico explica a si mesmo ou
sua própria existência. Eles podem existir como podem
não existir, como vimos no exemplo do par elétronpósitron que não existia e passou a existir. Na interação
entre uma partícula e sua antipartícula, as duas partículas desaparecem dando origem à radiação eletromagnética. A busca pelas causas da existência de algo deve terRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
minar numa causa não causada. É forçoso admitir um ser
por si mesmo necessário, que não tem fora de si a causa
da sua necessidade, antes, sendo a causa da necessidade dos outros; e a tal ser todos chamam Deus. Aqui citamos Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, I q. 2 a.3:
“Ergo necesse est ponere aliquid quod est
per se necessarium, non habens causam
necessitatis aliunde, sed quod est causa
necessitatis aliis: quod omnes dicunt Deum.”
(SANTO TOMÁS DE AQUINO, 1934).
Convém observar que o nada não é o vácuo da
Física. O nada não existe, não contém nenhuma
potencialidade, nenhuma lei física, enquanto o vácuo
existe, é rico em potencialidades e está sujeito a leis físicas. Por exemplo, o vácuo tem propriedades elétricas e
magnéticas que determinam a velocidade da luz através
dele. Um par elétron-pósitron pode surgir da polarização
do vácuo.
É interessante notar que a creatio ex nihilo não
implica necessariamente ou exige um começo no tempo,
nem um começo do tempo. A hipótese de que o Universo
sempre existiu não elimina o problema de explicar sua
existência, pois o Universo não se explica por si mesmo.
Tal hipótese não pode ser comprovada cientificamente
nem provada filosoficamente. A revelação cristã fala de
um começo temporal. Mas, isso não é essencial, sob o
ponto de vista filosófico, como explica Santo Tomás de
Aquino na Summa Theologica I q. 46 a.2 (SANTO TOMÁS DE AQUINO, 1959). O problema da origem do Universo é o problema da explicação de sua existência, e não
um problema de uma origem temporal. A Ciência não é
capaz de explicar a transição da não-existência para a
existência.
O princípio da creatio ex nihilo é uma conclusão
filosófica, o resultado de uma análise filosófica da realidade como a conhecemos e não um princípio religioso
ou teológico. Ele não é incompatível com a Ciência, pois
deixa a Ciência inteiramente livre para investigar as leis
que regem os fenômenos naturais.
Perguntado sobre a existência de Deus, Laplace
teria respondido: “Je n´ai pas besoin de cette hypothèse”
(Eu não tenho necessidade desta hipótese). Sua resposta mostra que ele não entendeu a necessidade de se explicar a origem das leis da natureza.
Há vários caminhos para se demonstrar racionalmente a realidade de Deus. Recentemente, meu colega e
amigo Fernando de Mello Gomide, físico teórico e filósofo, publicou uma solução para o problema da prova
ontológica da realidade de Deus (GOMIDE, 1998).
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Gomide alertou-me quanto ao erro comum de aplicar o termo “existência” a Deus:
“O Pe. Cornélio Fabro, eminente tomista
italiano, mostra que a existência é a emergência do ente a partir de suas causas: é
pois idéia de extrinseceidade. Portanto
só às criaturas se aplica o termo existência: só elas existem porque são causadas.
Ora, Deus não é causado, por isso Deus
não existe, mas Deus É. Proposições como
“provas da existência de Deus”, “Deus
existe” são incorretas.” (GOMIDE, comunicação particular).
A Filosofia, além de demonstrar racionalmente a
realidade de Deus, demonstra também vários atributos
de Deus, como sua natureza puramente espiritual, sua
eternidade, sua inteligência infinita etc. Esta demonstração racional da realidade de Deus e de seus atributos é
conhecida como Teodicéia, termo criado por Leibniz.
Demonstrada racionalmente a realidade de Deus,
as origens da ordem do universo e das leis da natureza
podem ser atribuídas a Deus. Assim, a boa filosofia do
ser responde às perguntas sobre as origens do universo,
da ordem nele observada, das leis naturais, perguntas
que a Ciência não é capaz de responder. Grande parte da
Filosofia moderna nada contribui para esclarecer essas
questões, porque não é Filosofia do ser. Diz o Papa João
Paulo II que a Filosofia moderna concentrou sua atenção
sobre o homem e
“parece ter-se esquecido de que este (o
homem) é sempre chamado a voltar-se
também para uma realidade que o transcende. [...] A filosofia moderna, esquecendo-se de orientar a sua pesquisa para o
ser, concentrou a própria investigação no
conhecimento humano. Em vez de se apoiar sobre a capacidade que o homem tem
de conhecer a verdade, preferiu sublinhar
as suas limitações e condicionalismos.”
(JOÃO PAULO II, 2005).
Por outro lado, afirma o Papa que a Filosofia de
Santo Tomás de Aquino é verdadeiramente uma Filosofia do ser, e não do simples aparecer.
Gomide observa que a Filosofia do ser de Santo
Tomás de Aquino constitui uma inovação filosófica que
tornou possível a formulação precisa dos dados teológicos da Revelação. Em seu livro Diálogo entre a Filosofia e Ciência, ele diz:
35
“A obra-prima de Santo Tomás de
Aquino se encontra no seu pensamento
ontológico. No Doutor Angélico, a oposição metafísica Platão-Aristóteles é
transcendida mediante sua síntese da
doutrina do ato e da potência em
Aristóteles com a teoria platônica da participação, consubstanciada na sua distinção real entre o ente, o ser e a essência30-31. A distinção real entre o ente, o
ser e a essência é pensamento totalmente
novo na história da filosofia. A filosofia
do ser de Santo Tomás é um resultado superlativo da influência da Revelação sobre a razão natural do homem. Santo Tomás quando criança se tinha feito a pergunta: que é Deus? Sua filosofia do ser é
a resposta à pergunta e permite perfeitamente iluminar a definição que Moisés
recebeu de Javé: “Eu sou aquele que é”
(Ex III, 14). A filosofia de originalidade
cristã 32-33 encontrou em Santo Tomás um
de seus ápices. O menino Tomás formulando essa pergunta que o Espírito Santo lhe inspirou, deu início à maior inovação filosófica da história, tornando possível à inteligência cristã a mais perfeita
síntese dos dados teológicos da Revelação com a ordem especulativa
ontológica. Foi muito simbólica disso,
que, no Concílio de Trento, os Padres
Conciliares colocaram sobre o mesmo
altar a Sagrada Escritura, os Decretos
Pontifícios e a Suma Teológica do Doutor Angélico.” (GOMIDE, 1990).
A religião cristã incorpora a doutrina filosófica da
creatio ex nihilo, acrescentando-lhe a idéia da origem
temporal do Universo. Lemos no Gênesis: “No princípio Deus criou o céu e a terra”(Gn 1, 1). O céu e a terra
significam o Universo ordenado. No princípio significa
o início do tempo, isto é, o tempo foi criado simultaneamente com o Universo. O segundo livro dos Macabeus
faz referência explícita à criação ex nihilo, do nada: “Eu
te suplico, meu filho, contempla o céu e a terra e observa tudo o que neles existe. Reconhece que não foi de
coisas existentes que Deus os fez, e que também o gênero humano surgiu da mesma forma” (2MC 7, 28).
O prólogo do Evangelho de São João também fala
da criação do Universo: “No princípio era o Verbo e o
Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus. No princípio, ele estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele e
sem ele nada foi feito” (JO 1, 1-3).
que o sol fosse eterno. Ele respondeu: “eterno nò, ma
ben antico” (LEIBNIZ, 2004). A resposta dada por Galileo
veio da sua fé, não da Ciência, que naquela época nada
sabia sobre a teoria da formação e evolução estelar que
viria a ser formulada apenas no século XX.
Gomide, dentre as questões que ele analisa em
seus ensaios filosóficos sobre a relação entre Filosofia e
Ciência (GOMIDE, 1986; 1987; 1990; 1996; 1998; 2003),
trata também da questão do sucesso da Física Matemática. Ele mostra que a Filosofia do ser de Santo Tomás de
Aquino e os conceitos tomistas de intensidade de forma, magnitude transcendental e número transcendental
justificam perfeitamente a formalização matemática da
natureza. Neste trabalho eu me limitarei a citar alguns
trechos da Sagrada Escritura que se relacionam com o
assunto, acrescentando alguns comentários.
No livro da Sabedoria lemos: “Mas tudo
dispusestes com medida, número e peso” (Sb 11, 20),
que é a afirmação de que Deus criou o Universo sujeito a
leis que podem ser expressas matematicamente. Deus não
criou um Universo caótico mas ordenado, com medida,
número e peso. Depois de discutir o conceito de número,
segundo os conceitos tomistas, Gomide afirma:
“Assim, pois, o número surge idealmente
não só no terreno do ser-classe, mas também no domínio do ser e suas relações. Na
Física, a formalização matemática envolve
não só a de número de objetos, como número de átomos, número de partículas etc.,
mas também duas instâncias de
matematização que são as seguintes:
a) Atribuição de valores numéricos a qualidades atualizadas: as grandezas físicas
constantes e as funções dessas variáveis;
b) Equações diferenciais, que representam a formalização matemática no terreno
das relações, como, por exemplo, as
interações. A 2a. lei de Newton é um caso
particular.
As três ordens de matematização estão retratadas no Livro da Sabedoria e eis o significado daquele versículo considerado:
a) Medida: matematização de relação.
b) Número: matematização do ser-conjunto.
c) Peso: matematização da potência ativa, ou seja, qualidade.” (GOMIDE, 1986).
Alguém perguntou a Galileu Galilei se acreditava
36
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
A respeito dos números diz Santo Agostinho, em
seu livro O Livre Arbítrio (Livro II cap 8, 24):
“Por essas provas e muitas outras semelhantes, todos aqueles que raciocinam e
a quem Deus concedeu o espírito, mas
igualmente a quem a teimosia não envolveu nas trevas, são forçados a reconhecer que a lei e a verdade dos números
escapam ao domínio dos sentidos corporais, e que essas leis são invariáveis e
puras, oferecendo-se universalmente aos
olhos de todos aqueles que são capazes
de raciocínio”.
Santo Agostinho mostra que o conhecimento dos
números e de suas leis, puramente intelectual, certo, objetivo e indiscutível, é possuído por todo espírito realmente sadio. O que é percebido pelos sentidos corporais
está sujeito à corrupção e não sabemos por quanto tempo durará. Ao passo que os teoremas da Matemática,
que são percebidos só pela inteligência, são válidos não
apenas hoje, mas sempre, e são um patrimônio comum de
todos os que são capazes de raciocínio. Essas verdades
permanecem imutáveis em nossa mente mutável. São
constantes do espírito e evidenciam a realidade do conhecimento. Mais adiante ele diz que a sabedoria regula
pelos números a harmoniosa evolução do universo (Livre Arbítrio, Livro II, cap. 16, 42):
“Contempla o céu, a terra, o mar e todos
os seres neles contidos [...] Todos possuem beleza, porque têm seus números. Suprima-os e eles nada mais serão. Logo, de
onde vêm eles, a não ser daquele de onde
procede todo número?”
O Livro da Sabedoria diz: “pois a grandeza e a
beleza das criaturas fazem, por analogia, contemplar
seu Autor”. Lemos também na carta de São Paulo aos
Romanos:
“Porque o que se pode conhecer de Deus
é manifesto entre eles, pois Deus lho revelou. Sua realidade invisível - seu eterno
poder e sua divindade - tornou-se inteligível, desde a criação do mundo, através
das criaturas, de sorte que não têm desculpa.” (RM 1, 19-20).
João Paulo II comenta as palavras de São Paulo,
dizendo:
“Desenvolvendo com linguagem popular
uma argumentação filosófica, o Apóstolo
exprime uma verdade profunda: por meio
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
da criação, os ‘olhos da mente’ podem
chegar ao conhecimento de Deus. [...] raciocinando a partir dos sentidos, pode
chegar também à causa que está na origem de toda a realidade sensível. Em terminologia filosófica, podemos dizer que,
neste significativo texto Paulino, está afirmada a capacidade metafísica do homem.” (JOÃO PAULO II, 2005).
Heisenberg, falando sobre uso da Matemática na
Física diz:
“Antes de examinar se este método continua válido ou não para a ciência atual,
deveríamos perguntar-nos em que se fundamentava a confiança que guiou
Copérnico, Galileo e Kepler por esse novo
caminho. Fiel à tese de von Weizsäcker,
creio que se pode afirmar que esse fundamento era mais de índole teológica.
Galileo dizia que a natureza, o segundo
livro de Deus (o primeiro sendo a Bíblia),
estava escrita em letras matemáticas e que
se teria de aprender esse alfabeto para
poder lê-la. Kepler, em sua obra sobre a
harmonia do mundo, é ainda mais claro.
Ele diz: Deus criou o mundo segundo suas
idéias da criação. Estas idéias são as formas arquetípicas puras que Platão chamava idéias, e para o homem são inteligíveis na qualidade de relações matemáticas. E são compreensíveis porque o homem foi criado à semelhança espiritual
de Deus. A física é o reflexo das idéias
criativas de Deus; donde a física é um serviço divino.” (HEISENBERG, 1979).
A Ciência pressupõe a ordem do universo, mas
não explica sua origem. Como resposta racional para a
questão da origem das leis da natureza, Margenau, físico e
filósofo, diz que elas foram criadas por Deus
(MARGENAU, 1992).
Outra perplexidade dos físicos matemáticos é a
capacidade do homem de descobrir leis da natureza. A
religião tem a resposta para essa questão. Lemos no
Gênesis (GN 1, 26-28):
Deus disse: “Façamos o homem à nossa
imagem, como nossa semelhança, e que
eles dominem sobre os peixes do mar, as
aves do céu, os animais domésticos, todas as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra”.
37
Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele os criou, homem e mulher ele os criou.
Deus os abençoou e lhes disse: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e
submetei-a; dominai sobre os peixes do
mar, as aves do céu e todos os animais
que rastejam sobre a terra.”
Deus, ao criar o homem, dotou-o de inteligência,
que torna a criatura uma semelhança do Criador. Com a
inteligência, o homem deverá investigar as leis que regem os fenômenos da natureza, pois o conhecimento
dessas leis significa o cumprimento da ordem dada por
Deus, ao homem, de submeter a terra, o mar e o ar. Portanto, desde sua criação o homem deveria cumprir a tarefa
de buscar entender a natureza, de descobrir suas leis.
Sempre que Deus dá uma ordem, dá também os meios
para sua realização. Compete ao homem utilizar sabiamente os meios que Deus lhe concede.
4. INTERAÇÃO ENTRE CIÊNCIA, FILOSOFIA E RELIGIÃO
No diálogo entre Ciência e Religião, mediada pela
Filosofia, as três se enriquecem, conhecem melhor seus
próprios limites e até mesmo entendem melhor o objeto
do conhecimento que lhes é próprio. Estamos falando da
boa Ciência, da boa Religião e da boa Filosofia.
No século XIX, o Papa Leão XIII, na carta encíclica
Aeterni Patris, retomou e desenvolveu a doutrina do
Concílio Vaticano I sobre a relação entre fé e razão, mostrando como o pensamento filosófico é um contributo
fundamental para a fé e para a Teologia. O Papa João
Paulo II retomou o assunto na carta encíclica Fides et
Ratio, cujo capítulo VI trata da interação da Teologia
com a Filosofia. Ele diz (JOÃO PAULO II, 2005):
“Espera-se, pois, que teólogos e filósofos
se deixem guiar unicamente pela autoridade da verdade, para que seja elaborada uma Filosofia de harmonia com a palavra de Deus. Essa filosofia será o terreno de encontro entre as culturas e a fé
cristã, o espaço de entendimento entre fiéis e não fiéis. Ajudará os fiéis a convencerem-se mais intimamente de que a profundidade e a autenticidade da fé saem
favorecidas quando esta se une ao pensamento e não renuncia a ele.”
Em seguida, ele cita Santo Agostinho (De
praedestinatione Sanctorum 2, 5: PL 44, 963):
38
“Crer, nada mais é senão pensar consentindo [...]. Todo o que crê, pensa; crendo
pensa, e pensando crê [.... A fé se não for
pensada, nada é”.
Lembramos também que Santo Agostinho dizia
(RUBIO, 1995): “Crê para entender e entende para crer”.
In Joan. 29,6.
Quanto à Ciência, ela não leva ao ateísmo, cujas
causas estão menos na inteligência e mais na vontade.
Max Jammer, físico e filósofo, em seu livro “Einstein e a
Religião”, que discute a filosofia einsteiniana, ilustra,
com o exemplo de Einstein, a interação entre a Física e a
Religião, mediada pela Filosofia. Ele conta que, a alguém
que perguntou a Einstein se ele era um homem profundamente religioso, Einstein, calmamente e com toda a dignidade, respondeu:
“Sim, o senhor poderia dizer isso. Tente
penetrar, com seus recursos limitados, nos
segredos da natureza, e o senhor descobrirá que, por trás de todas as
concatenações discerníveis, resta algo
sutil, intangível e inexplicável. A veneração dessa força, que está além de tudo o
que podemos compreender, é minha religião. Nessa medida, sou realmente religioso.” (JAMMER, 2000).
O sentimento do mistério não desaparece com a
descoberta científica, mas esta revela um mistério ainda
mais profundo.
Em sentido inverso, a Teologia pode motivar e dar
condições para a pesquisa científica, como mostra estudos sobre a origem da Ciência na cristandade ocidental.
Jeffrey B. Russel fala do trabalho pioneiro de Pierre
Duhem, físico e grande estudioso da história da Ciência,
autor da monumental obra Système du Monde, em dez
volumes, publicados em Paris de 1913 a 1959. Duhem
mostra que a Igreja medieval apoiava e sustentava a Filosofia natural, tendo a Teologia cristã desempenhado um
papel fundamental para a formação do espírito científico,
espírito indagativo e racional, que busca os porquês dos
fenômenos naturais (RUSSEL, 1991). Ao trabalho de
Duhem seguiram-se outros, que acrescentaram mais dados históricos em favor de sua tese (STARK, 2005;
WOODS JR., 2005; LINDBERG, 1992).
Desde os primeiros tempos do cristianismo, a razão desempenhou um papel essencial no desenvolvimento da Teologia cristã, através do raciocínio dedutivo.
São conhecidos como Padres da Igreja autores cristãos
dos primeiros séculos, responsáveis pelo desenvolvimento racional da Teologia, do qual resultou a definição
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
de dogmas fundamentais do cristianismo.
Santo Agostinho, um dos Padres da Igreja,
enfatizava o papel da razão nas considerações das verdades da fé. Ele dizia que nós nem poderíamos crer se não
tivéssemos almas racionais (STARK, 2005). Santo Agostinho louvava o uso da razão não apenas em assuntos de
Teologia, mas também, de modo geral, se admirava com as
realizações da inteligência humana nas Artes, nas coisas
práticas, na Matemática etc., frutos de um “inexprimível
dom” de Deus, que dotou sua criatura de uma natureza
racional (SANTO AGOSTINHO, 2000). Em seu livro Sobre
a Potencialidade da Alma (De Quantitate Animae) ele se
refere à invenção da escrita, à música, à variedade de idiomas, à precisão da arte de calcular, “tudo produzido pela
humana potência de raciocínio e imaginação” (SANTO
AGOSTINHO, 1997). Ele teve grande influência sobre a
cristandade medieval, que assimilou seus ensinamentos a
respeito da capacidade da razão humana.
Em seu livro De Genesi ad Litteram (sobre o sentido literal do Gênesis), Santo Agostinho observa que a
Bíblia não contém nenhuma descrição clara da forma ou
do tamanho da Terra ou do Universo. Por isso, ele alerta
os cristãos para não se fazerem de tolos, citando textos
isolados das Escrituras como argumento contra os filósofos pagãos. Loucos são os que atribuem à Bíblia suas
próprias idiotices, fazendo com que os pagãos desprezem os cristãos e suas Escrituras. Como a Bíblia nada diz
a respeito da forma da Terra, ela é irrelevante para nossa
salvação, e é inútil discuti-la. Contudo, é assunto para a
investigação natural. Assim, continua Agostinho, precisamente porque a Bíblia não responde a questão, deveríamos ter a mente aberta à evidência apresentada pelos
filósofos. Ele estava refutando, particularmente, os cristãos que citavam salmos, trechos do profeta Isaías, do
livro de Jó, ou do profeta Amós, como argumentos contra a esfericidade da terra (RUSSEL, 1991). A religião trata
da fé e da moral, que interessam à nossa salvação. Em
assuntos puramente científicos, em que não entram nenhum aspecto da fé ou da moral, a Religião deixa para a
Ciência inteira liberdade de realizar suas investigações
dos fenômenos naturais.
A crença em Deus Criador, que criou o universo
ordenado, com uma estrutura racional, com leis naturais,
e a confiança na capacidade humana de descobrir essas
leis é que tornaram possível o nascimento da Ciência.
Alfred North Whitehead, matemático e lógico, co-autor
com Bertrand Russel do famoso Principia Mathematica,
afirmou que a Ciência nasceu na Europa em conseqüência da generalizada “fé na possibilidade da Ciência ...
originária da Teologia medieval”. Whitehead explica:
“A maior contribuição do medievalismo
para a formação do movimento científico
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
foi a inabalável crença de que ... havia
um segredo, um segredo que podia ser
desvelado. Como essa convicção foi tão
vividamente implantada na mente européia? ... Ele deve ter vindo da insistência
medieval na racionalidade de Deus, concebida como a energia pessoal de Iahweh
e com a racionalidade de um filósofo grego. Todos os detalhes estavam supervisionados: a busca na natureza somente
poderia resultar na reivindicação da fé
na racionalidade.” (STARK, 2005).
5. CONCLUSÃO
É próprio do espírito humano buscar a unidade
do conhecimento, englobando o conhecimento científico, o conhecimento filosófico e o conhecimento religioso num todo coerente e harmônico. O princípio unificador
é o conceito de Deus, transcendente, criador do Universo e da ordem nele observada.
O livro Cosmos, Bios, Theos, editado por Henry
Margenau e Roy Abraham Varghese, traz a opinião de mais
de sessenta eminentes cientistas (dentre os quais mais de
vinte ganhadores do Prêmio Nobel) a respeito de Ciência e
Religião. Citamos a seguir algumas dessas opiniões.
Arthur L. Schawlow, Prêmio Nobel de Física: Diante das maravilhas da vida e do universo, nós devemos perguntar por que e não apenas como. As únicas
respostas possíveis são religiosas. Eu sinto a necessidade de Deus no universo e na minha própria vida.
Wolfgang Smith, matemático, cujos estudos teóricos sobre a Aerodinâmica de campos de difusão proporcionaram a chave teórica para a solução do problema
da reentrada em vôos espaciais: Para mim pessoalmente, nada é mais evidente, mais certo do que a existência
de Deus.
Walter Thirring, professor de Física da Universidade de Viena: Eu penso que cientistas que dedicam
suas vidas a investigar a harmonia mundi não podem
deixar de ver nessa harmonia algum plano divino. Quanto às batalhas entre cientistas e teólogos elas acontecem devido à pretensão de alguns de seus representantes que acreditam entender mais do que realmente entendem. Deve-se ter humildade vis-à-vis aos grandes
mistérios do cosmos.
Charles Townes, Prêmio Nobel de Física: A questão da origem do Universo não pode ser respondida
pela ciência. Eu creio na existência de Deus.
Eugene P. Wigner, Prêmio Nobel de Física: O con39
ceito de Deus é maravilhoso – ele nos ajuda a tomar
decisões na direção correta. O problema da origem do
Universo é um mistério para a Ciência.
Werner Arber, biofísico, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina: Eu aceito o conceito de Deus sem tentar
defini-lo com precisão. Eu sei que o conceito de Deus
ajudou-me a controlar muitas questões na vida; ele me
guia em situações críticas, e eu o vejo confirmado em
muitos profundos insights, na beleza do funcionamento
do mundo vivo.
D. H. R. Barton, Prêmio Nobel de Química: Deus é
a Verdade. Não existe incompatibilidade entre Ciência
e Religião. Ambas buscam a verdade.
Steven L. Bernasek, professor de Química da Universidade de Princeton: Eu acredito na existência de Deus.
Sua existência é para mim aparente em tudo ao meu redor, especialmente em meu trabalho como cientista.
Sir John Eccles, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina: A consciência não é, de nenhum modo, um resultado de uma evolução darwiniana. Eu acho que ela é
uma criação divina. Eu acredito em Deus.
Ragnar Granit, Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina: Ciente das limitações da Ciência, eu tenho uma
atitude religiosa em relação ao desconhecido.
6. AGRADECIMENTO
Agradeço ao Prof. Fernando de Mello Gomide por
esclarecimentos a respeito de conceitos metafísicos da
Filosofia do ser de Santo Tomás de Aquino.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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40
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
41
Funções Cardíacas para Diferentes Condições de Exercício
Físico
Mituo Uehara *
Kumiko K. Sakane *
Simone A. Bertolotti **
Resumo: A avaliação clínica da capacidade de bombeamento do coração é mais bem realizada
com base na função cardíaca, que relaciona o volume de sangue bombeado pelo coração em cada
contração sistólica com o volume diastólico no final da fase diastólica e com outros parâmetros
hemodinâmicos. A realização de exercício físico causa alteração na função cardíaca. Neste trabalho utilizamos dados experimentais publicados na literatura para determinar, na aproximação
linear, funções cardíacas para diferentes níveis de exercício físico.
Palavras-chave: Funções cardíacas, exercício físico, contratilidade miocárdica.
Abstract: Clinical evaluation of the heart pumping capacity is better performed considering the
cardiac function curve, which relates the blood volume pumped by the heart at each systolic
contraction to the diastolic volume at the end of the diastolic phase and to other hemodynamic
parameters. Physical exercises change the cardiac function curve. In this paper, we used experimental data published in the literature to determine, in the linear approximation, cardiac function
curves for different intensity levels of physical exercises.
Key words: Cardiac function curve, exercising, myocardial contractility.
1. INTRODUÇÃO
Otto Frank (1895) observou em experimento com
coração de rã que quanto maior o volume de sangue
acumulado no ventrículo, no final de uma fase diastólica,
maior é o volume de sangue ejetado pelo ventrículo na
sístole seguinte. A mesma relação foi confirmada por
Ernest Starling e colaboradores (PATTERSON et al.,
1914), em experimentos com preparações coração-pulmão caninas. Essas observações podem ser expressas
matematicamente pela função S = S(vD), em que S é o
volume de ejeção (volume de sangue bombeado em cada
contração ventricular) e vD é o volume de sangue no
ventrículo no final de uma fase diastólica (fase em que o
ventrículo se enche de sangue). A função é conhecida
como relação de Frank-Starling (KATZ, 1977).
No caso do sistema cardiovascular intacto, i.e., in
vivo, é preciso considerar o fato de que o ventrículo bombeia o sangue para o sistema vascular que já contém
sangue à pressão não-nula (pressão arterial na aorta), o
que representa uma resistência a ser vencida pelo fluxo
sangüíneo. Matematicamente esse fato pode ser expres-
* Professor(a) da Univap.
** Graduada em Engenharia Biomédica pela Univap.
42
so escrevendo-se a relação S = S(vD; pa), que diz depender o volume de ejeção não apenas do volume diastólico
final vD, conhecido como pré-carga (preload), mas também da pressão arterial pa, que aqui representa a póscarga (afterload).
Há ainda outros fatores que podem alterar o volume de ejeção, como substâncias que alteram a
contratilidade do músculo cardíaco. Tais substâncias são
chamadas substâncias inotrópicas (KATZ, 1977;
MILNOR, 1990). A influência dessas substâncias poderia ser descrita matematicamente, escrevendo-se S =
S(vD; pa: i), em que i representaria o estado inotrópico
do músculo cardíaco. Chamaremos a função S = S(vD;
pa: i) de função cardíaca ou função ventricular, reservando o termo “relação de Frank-Starling” para a função
S = S(vD), que descreve a dependência do volume de
ejeção S apenas em relação ao volume diastólico final vD.
A realização de exercícios físicos impõe ao sistema cardiovascular uma sobrecarga decorrente de um aumento das necessidades metabólicas dos músculos que
exercem uma atividade mais intensa, ao mesmo tempo
que deve ser mantido o atendimento de outros órgãos. O
sistema responde a essas exigências por um aumento da
ventilação pulmonar, um aumento do débito cardíaco, em
aumento da pressão arterial e uma redistribuição do fluxo
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
de sangue, com um aumento do fluxo em direção aos
músculos mais ativos. O aumento do débito cardíaco pode
se conseguido com o aumento da pulsação cardíaca ou
aumento da contratilidade do músculo cardíaco, ou do
aumento de ambos os fatores. Esse aumento do débito
cardíaco significa portanto que as funções cardíacas são
alteradas pela realização de exercícios físicos.
A investigação da alteração da função cardíaca
em conseqüência da realização de exercícios físicos exige uma formulação matemática do problema, pois a função cardíaca depende de vários fatores, o que torna difícil seu estudo sem um modelamento matemático, enquanto que, matematicamente, ela pode ser mais bem estudada como uma função de várias variáveis. A importância
da análise matemática do problema da resposta cardiovascular a exercícios físicos está: 1. nas conclusões quantitativas e qualitativas que se podem inferir de dados experimentais; 2. nas sugestões para o planejamento de
experimentos.
Neste trabalho utilizamos dados experimentais de
Poliner et al. (1980) para determinar as funções cardíacas
correspondentes a diferentes níveis de exercícios físicos, e, através de uma análise matemática, discutimos a
questão da alteração da contratilidade miocárdica decorrente da realização de exercícios.
2. DADOS EXPERIMENTAIS DE POLINER ETAL. (1980)
Poliner et al. (1980) realizaram experimentos com
sete pessoas normais (seis homens e uma mulher), com
idade média de 26 anos, que se submeteram a exercícios
físicos de diferentes níveis de intensidade. Os exercícios
foram realizados nas posturas supina (deitada) e sentada, em bicicletas ergométricas. A Tabela 1 contém alguns
dados obtidos por aqueles autores.
Tabela 1 - Dados de Poliner et al. (1980)
Condição
Postura
EDV (ml)
ESV (ml)
S (ml)
HR (beats/min)
BP (mmHg)
CO (l/min)
Repouso
Sentada supina
85
107
32
34
55
76
89
71
125/84 125/76
4.8
5.4
Exercício 1
Sentada supina
113
123
28
31
85
92
124
100
161/86 152/81
10.4
9.1
Exercício 2
Sentada supina
117
137
24
32
92
105
165
133
190/89 169/91
15.1
13.8
Exercício máximo
Sentada supina
116
135
19
29
99
106
182
172
204/91 206/96
18.0
18.3
EDV é o volume diastólico final; ESV o volume sistólico final; S o volume de ejeção; HR a freqüência
cardíaca; BP as pressões sistólica e diastólica; CO é o débito cardíaco.
3. DETERMINAÇÃO DA FUNÇÃO CARDÍACA
3.1 Volume médio de sangue no ventrículo
Os dados acima não são suficientes para se determinar a função cardíaca completa S = S(vD; pa: i), mas
podemos determinar aproximadamente a dependência de
S com a vD supondo uma relação linear entre as duas
variáveis. Por razões teóricas é mais interessante escrever a função cardíaca na forma S = S(v), em que v designa o volume médio de sangue no ventrículo dado por
∫
v=
t +T
t
vi (t )dt
T
Segundo os dados experimentais de Little &
Downer (1990), a maior parte do aumento do volume de
sangue no ventrículo ocorre no primeiro terço da diástole.
Considerando ainda que a duração da diástole é aproximadamente o dobro da duração da sístole, o resultado da
integral na Equação (1) é aproximadamente
v≅
(2EDV + ESV )
3
(2),
sendo EDV (end diastolic volume) o volume diastólico
final e ESV (end sistolic volume) o volume sistólico final.
(1),
Utilizando a Equação (2) e os dados da Tabela 1,
obtemos os valores de v que estão na Tabela 2.
sendo vi(t) o volume de sangue no ventrículo no instante t e T o período cardíaco.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
43
3.2 Pressão arterial média
3.3 Relação entre o volume diastólico final (EDV)
e o volume sistólico final (ESV)
A pressão arterial média, num período cardíaco, é
dada por
pa
∫
=
t +T
t
p ai (t )dt
(3),
T
A razão EDV/ESV pode ser útil na busca de um
parâmetro que indique a contratilidade do miocárdio. Com
os dados da Tabela 1 obtemos os valores da razão EDV/
ESV que estão na Tabela 2. Indicamos por <EDV/ESV> a
média dos valores de EDV/ESV para as posturas sentada
e supina, correspondentes a cada condição de exercício
físico.
em que pai(t) é a pressão arterial no instante t.
Definamos o parâmetro u por
Para a condição de estado estacionário a Equação (3) dá aproximadamente o resultado
u=
pa ≅
2 pD + pS
3
〈 EDV / ESV〉
〈 EDV / ESV〉 0
(5),
(4),
sendo pD a pressão diastólica e pS a pressão sistólica.
A Equação (4) e os dados da Tabela 1 dão, para a
pressão arterial média pa, os resultados que estão na Tabela 2.
em que <EDV/ESV>0 é o valor da razão <EDV/ESV> correspondente ao repouso. O parâmetro u indica a intensidade relativa do nível de exercício, em relação à condição
de repouso.
Tabela 2 - Volume médio de sangue v; pressão arterial média pa; razão <EDV/ESV>; parâmetro u
Condição
Repouso
Exercício 1
Exercício 2
Postura
v (ml)
pa (mmHg)
EDV/ESV
<EDV/ESV>
u
Sentada/supina
67
83
98
92
2.7
3.1
2.9
1
Sentada/supina
85
92
136
128
4.0
4.0
4.0
1.4
Sentada/supina
86
102
156
143
4.9
4.3
4.6
1.6
Exercício
máximo
Sentada/supina
84
100
166
169
6.1
4.7
5.4
1.9
<EDV/ESV> é a média dos valores de EDV/ESV para as posturas sentada e supina, correspondentes
a cada condição de exercício físico; u = <EDV/ESV>/<EDV/ESV>0, sendo <EDV/ESV>0 o valor da razão
<EDV/ESV> correspondente ao repouso. O parâmetro u indica a intensidade relativa do nível de
exercício, em relação à condição de repouso.
3.4 Funções cardíacas
sendo a e b constantes a serem determinadas.
Suponhamos a relação linear
Dos valores de S que se encontram na Tabela 1 e
dos valores de v na Tabela 2, obtemos para a e b os
resultados que estão na Tabela 3.
S = a + bv
44
(6),
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Tabela 3 - Constantes a e b da função linear (6)
Vamos indicar por
S0 = a0 + b0v
conseqüência dos exercícios.
(7),
a função cardíaca correspondente à condição de repouso. Para uma condição de exercício escrevemos
S = a + bv = a0 + b0v + x + yv
(8),
Podemos determinar a relação entre ∆S e u na aproximação linear. Com os valores de x , da Tabelas 2, e com os
valores de u da Tabela 3, indicamos num gráfico cartesiano
os pontos experimentais (u;x), como mostra a Fig. 1. Na
aproximação linear, a relação entre x e u é dada por
x ≅ 100(u - 1)
(15).
em que x = a - a0 e y = b - b0 , sendo que os valores de
x e y estão na Tabela 3.
Com os resultados da Tabela 3, escrevemos para
as funções cardíacas
S0 = a0 + b0v = - 32ml + 1.3v
(9),
S1 = a1 + b1v = 1.0v
(10),
S2 = a2 + b2v = 23ml + 0.8v
(11),
Sm = am + bmv = 66ml + 0.4v
(12),
respectivamente, para as condições de repouso, nível 1 de
exercício, nível 2 de exercício e nível máximo de exercício.
Definir um índice de contratilidade é ainda um problema aberto. Muitos índices têm sido propostos, porém
nenhum é inteiramente satisfatório (Milnor, 1990). Como
uma tentativa de definir um índice que seja empiricamente
útil, consideremos a relação EDV/ESV (volume diastólico
final/volume sistólico final) que deve aumentar com o
aumento da capacidade de contração do miocárdio.
Condição
Repouso
Exercício 1
Exercício 2
a (ml)
0.0
23
− 32
.b
1.3
1.0
0.8
x (ml)
0.0
32
55
Fig. 1 - x em função de u. A reta representa a Equação (15).
y
0.0
− 0.3
− 0.5
Analogamente, indicamos num gráfico cartesiano
os pontos experimentais (u;y), como mostra a Fig. 2. Na
aproximação linear a relação entre y e u é dada por
y ≅ 0.9(1 - u)
(16).
Os resultados apresentados na Tabela 2 mostram
que o parâmetro u =<EDV/ESV>/<EDV/ESV>0 aumenta
com o aumento do nível de exercício.
Das Equações (7) e (8) obtemos
S = S0 + ∆S
(13),
em que
∆S = x + yv
(14),
representa a variação do volume de ejeção em
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Fig. 2 - y em função de u. A reta representa a Equação (16)
45
Exe
Das Equações (13) – (16) resulta
S = S0 + 100(u- 1) + 0.9(1 - u)v
(17).
A Equação (17) mostra que S = S0 quando u = 1.
Pela Tabela 2 temos a0 ≅ -32ml e b0 ≅ 1.3, de modo
que as Equações (7) e (17) dão
S = -32ml + 1.3v + 100(u - 1)ml + 0.9(1 u)v (18).
As funções cardíacas S0, S1, S2 e Sm, dadas, res-
pectivamente, pelas Equações (9)-(12), podem ser obtidas, aproximadamente, da Equação (18) tomando-se os
valores adequados de u.
A Fig. 3 mostra as funções cardíacas S = S(v; u),
para os diferentes níveis de exercício, como uma família de
curvas parametrizada em u. Segundo os dados da Tabela 2,
o volume médio de sangue, v, no coração, variou de 67ml a
102ml. Para esta faixa de valores de v, a Figura 3 mostra que
a reta que representa S0 , dada pela Equação (18), tomandose u = 1, situa-se abaixo das retas que representam as funções cardíacas em diferentes níveis de exercício.
Fig. 3 - Funções cardíacas parametrizadas em u.
4. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
A análise matemática do problema da resposta
cardiovascular a exercícios físicos mostrou a importância de se determinar a função cardíaca basal, correspondente à condição de repouso, pois é em relação a ela que
se pode analisar as variações causadas pela realização
de exercícios. Para uma determinação mais completa das
funções cardíacas são necessários mais dados experimentais do que os apresentados por Poliner et al. (1980).
Por exemplo, para se determinar a influência da pressão
arterial sistêmica sobre a função cardíaca, seria necessário fazer mais medidas correspondentes a cada nível de
exercício, com a inclusão de outros valores dos volumes
de sangue além daqueles apresentados para as posturas
supina e sentada. Tais medidas podem ser feitas utilizando-se camas de inclinação variável, que possibilitem variar a pré-carga (volume diastólico final).
O aumento do volume de ejeção com o aumento
do nível de exercício pode resultar do aumento da
contratilidade do músculo cardíaco e/ou diminuição da
resistência ao fluxo sangüíneo, de modo que o parâmetro
46
u pode incluir a influência dos dois fatores. Por essa
razão não identificamos u com o índice inotrópico i que
indica o estado de contratilidade do músculo cardíaco.
Com os dados de Poliner et al. (1980) não é possível
calcular a importância relativa de cada um dos dois fatores no aumento do volume de ejeção. Seria interessante
determinar a função cardíaca, na condição de repouso,
após a administração de uma substância inotrópica, e
comparar os resultados com as funções cardíacas para
diferentes níveis de exercício. Talvez a comparação das
funções cardíacas ajudasse na estimativa da importância
relativa de cada fator no aumento do volume de ejeção.
As Equações (14) - (12), assim como a Fig. 3, mostram que o aumento do volume de ejeção, ∆S, com o
aumento do nível de exercício depende do volume médio
de sangue no coração (pré-carga). Essa dependência
pode significar que a contratilidade miocárdica depende
da pré-carga, o que nos faz lembrar a afirmação de Milnor
(1990) de que talvez não seja possível definir um índice
de contratilidade miocárdica independente da pré-carga.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
47
Células-tronco: revisão sobre os conceitos básicos
Karina Teixeira Naves *
Newton Soares da Silva **
Cristina Pacheco Soares **
Resumo: Uma das mais fascinantes áreas da Biologia hoje é sem dúvida a que estuda as célulastronco. Este tipo celular é objetivo de grande interesse devido às suas propriedades biológicas e
seu importante potencial médico. No entanto, assim como muitos outros campos em expansão, a
pesquisa em células-tronco tem levantado questões do mesmo modo como tem gerado novas descobertas. Para que se inicie uma pesquisa com células-tronco, seja qual for seu objetivo, é necessário
haver uma compreensão dos fundamentos básicos conhecidos sobre o assunto. Com isto em mente,
esta revisão tem por objetivo fundamentar conceitos que envolvam os diferentes tipos conhecidos
de células-tronco, bem como suas propriedades principais, o que inclui os aspectos de origem,
produção, capacidade de auto-renovação e diferenciação com ênfase mais especificamente nas
células-tronco hematopoiéticas.
Palavras-chave: Célula-tronco, medula óssea, diferenciação.
Abstract: Undoubtedly one of the most fascinating areas of biology today is the one that studies
stem cells. This kind of cell has been object of great interest due to their biological properties and
its important medical potential. Nevertheless, as many others expansion areas, stem cell research
has arisen questions as well as generated new discoveries. Therefore it is important to have a
comprehension concerning the stem cells basic concepts before starting a research about this
theme. Considering that, this review aims to substantiate concepts involving known different kinds
of stem cells, their major properties, which include aspects of origin, production, self-renewal capacity
and differentiation. This review will focus more specifically on hematopoietic stem cells.
Key words: Stem cell, bone marrow, differentiation.
1. INTRODUÇÃO
As células-tronco são geralmente definidas como
células clonogênicas capazes de se auto-renovar e de se
diferenciar em diferentes tipos celulares (METCALF;
MOORE, 1971). São primariamente divididas em célulastronco embrionárias e células-tronco adultas. Ambos os
tipos são capazes de se auto-renovarem e de se diferenciarem (KAMMINGA; HAAN, 2006). Através do processo
de uma única divisão celular, uma célula-tronco pode dar
origem a uma nova célula-tronco como também a um progenitor mais diferenciado (HO, 2005). O papel normal de
uma célula-tronco no organismo animal é prover os diferentes tipos celulares que, durante o desenvolvimento,
irão formar os diversos tecidos e órgãos (MARTIN, 1980).
Além das propriedades de auto-renovação e de capacidade de diferenciação, há ainda outras propriedades que
estas células apresentam, como, por exemplo, a habilidade
de sofrer divisão celular assimétrica, exibir uma incrível
capacidade de auto-regeneração, existir em uma forma de
quiescência mitótica e, através de clonagem, regenerar
todos os diferentes tipos celulares que constituem o tecido em que estão (HALL; WATT, 1989; POTTEN;
LOEFFLER, 1990). A possibilidade de uma célula-tronco
hematopoeiética de um mamífero adulto ser capaz de se
transdiferenciar em tecidos diferentes daquele em que está
inserida deu origem ao conceito de plasticidade das células-tronco, o que tem causado grande euforia na comunidade científica em vista da possibilidade de essas células
poderem ser empregadas na prática de regeneração de tecidos e órgãos (ORLIC et al., 2003; WAGERS et al., 2002).
Nesta revisão, serão abordados temas para a compreensão deste campo. Será, portanto, mais focada no entendimento das células-tronco hematopoiéticas.
2. REVISÃO
2.1 O que são células-tronco e onde podem ser encontradas
* Mestranda em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006.
** Professor(a) da UNIVAP.
48
Há muito as células-tronco têm sido descritas como
células indiferenciadas com capacidade de se proliferar, se
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
auto-renovar, de gerar uma grande progênie diferenciada e
de regenerar tecidos (BLAU et al., 2001; SUDA et al., 2005).
Segundo Whittaker (2004), as células-tronco podem ser classificadas de acordo com seu potencial de
diferenciação. A este respeito podem ser:
a) Pluripotentes, as quais podem se diferenciar
para produzir células de qualquer tipo encontradas no
corpo humano;
2.2 Propriedades das células-tronco
Um grande número de propriedades, além da autorenovação, capacidade de regeneração de tecidos e do
potencial de diferenciação, é freqüentemente atribuído
às células-tronco. Estas propriedades incluem habilidade de se dividir de modo assimétrico e existir em uma
forma mitótica quiescente (HALL; WATT, 1989; POTTEN;
LOEFFLER, 1990).
Divisão simétrica versus divisão assimétrica
b) Multipotentes, as quais podem se diferenciar
em diversos (mas não todos) tipos celulares encontrados no corpo humano;
c) Unipotentes, as quais têm a capacidade de se
diferenciar somente em um tipo celular específico.
Entretanto, uma classificação mais completa das
células-tronco é dada por Chapman e colaboradores (1999):
Células-tronco Totipotentes: são as que têm a
capacidade de dar origem a um organismo inteiramente
funcional assim como originar todos os tipos celulares
do corpo. Segundo Rippon e Bishop (2004) as célulastronco totipotentes são de extrema importância para o
organismo, pois fornecem a matéria-prima para o desenvolvimento de tecidos e órgãos do embrião.
Células-tronco Pluripotentes: também chamadas
embriogênicas, são as capazes de dar origem a teoricamente todos os tipos celulares, mas não a um organismo
funcional;
Células-tronco Multipotentes: trata-se de células em um estágio mais avançado de diferenciação, isto
é, originam um número limitado de tecidos.
As células-tronco adultas são células
multipotentes indiferenciadas que residem em um tecido
adulto e que ainda mantêm a capacidade de se auto-renovar e de gerar células diferenciadas (XI et al., 2005).
Por residirem em um tecido adulto, estas células são também chamadas tecido-específicas e estão depositadas
em vários nichos ao longo do corpo, como, por exemplo,
na medula óssea, no cérebro, no fígado, na pele, como
parte do mecanismo de manutenção do tecido, crescimento e reparo (LAVKER;SUN, 2000; UCHIDA et al., 2000;
VESSEY; de la HALL, 2001; WAGERS et al., 2002).
Whittaker (2005) em seu trabalho descreveu que os
blastocistos de embriões são uma fonte de células-tronco pluripotentes, enquanto que o tecido fetal dá origem a
células-tronco pluripotentes e multipotentes. Outra fonte é o cordão umbilical, que origina células multipotentes.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Acredita-se que as células-tronco sofram uma divisão celular assimétrica determinada intrinsecamente, que
dá origem a uma filha (progenitor) diferenciada e a uma outra filha que ainda mantém as características de célula-tronco. Entretanto, mesmo que haja claros exemplos deste tipo
de divisão em Hirudo medicinalis, Drosophila
melanogaster e em Caenohabditis elegans, existem fortes
evidências de que, em mamíferos, a divisão ocorre de maneira simétrica. A divisão simétrica permite que o tamanho
do “pool” de células-tronco seja regulado por fatores que
controlam a quantidade de divisão com fins de diferenciação e de divisão para auto-renovação (MORRISON et al.,
1997; POTTEN; LOEFFLER, 1990).
Quiescência mitótica
Outra propriedade compartilhada por algumas, mas
nem todas, células-tronco é a de se dividir lentamente ou
de forma rara. Acredita-se que isto seja verdadeiro para
células-tronco da pele (LAVKER et al., 1993) e da medula
óssea (MORRISON; WEISSMAN, 1994). Porém, outros
tipos de células se dividem mais rapidamente. Portanto, de
modo geral, pode ser verdadeiro afirmar que células-tronco de tecidos adultos são mais propensas a um ciclo lento,
entretanto esta quiescência não é uma propriedade obrigatória das células-tronco (MORRISON et al., 1997).
2.3 Medula óssea e célula-tronco hematopoiética
A medula óssea é o tecido compreendido no centro
dos ossos longos do corpo. É o lugar onde novas células
sangüíneas são produzidas. A medula óssea contém dois
tipos de células-tronco: a hematopoiética e as células do
estroma (ou mesenquimais). As células-tronco
hematopoiéticas normalmente se diferenciam em células do
sangue, enquanto as células do estroma produzem células
de origem mesodérmica, como, por exemplo, osteócitos,
condrócitos, adipócitos e miócitos (MAGAKI et al., 2005).
Historicamente, as células-tronco hematopoiéticas
(HSC - hematopoietic stem cell) têm sido as células mais
extensivamente estudadas na biologia das células-tronco adultas. Isso se deve, em grande parte, à relativa facilidade de se isolar uma medula óssea (HÜTTMANN;
49
DÜHRSEN, 2003). Devido às suas propriedades biológicas e utilidade terapêutica, tem havido verdadeiros esforços para que seja feita a sua caracterização fenotípica
e a identificação dos mecanismos moleculares envolvidos no controle das suas funções (BALAZS et al., 2006).
A progênie resultante da divisão de HSCs pode se
auto-renovar, se diferenciar (gerando um progenitor mais
diferenciado), entrar no processo de morte celular programada ou se mobilizar pela corrente sanguínea (Fig. 1).
Plasticidade
Sendo uma célula adulta, a HSC tem a capacidade de
dar origem a um número não tão abrangente de células.
Sendo assim, a possibilidade de uma célula-tronco
hematopoeiética de um mamífero adulto ser capaz de se
transdiferenciar em tecidos diferentes daquele em que está
inserida deu origem ao conceito de plasticidade das célulastronco, o que tem causado grande euforia na comunidade
científica em vista da possibilidade de essas células poderem ser empregadas na prática de regeneração de tecidos e
órgãos (ORLIC et al., 2003; WAGES et al., 2002).
Como postulado, transdiferenciação ou plasticidade
das células-tronco diz respeito à conversão de uma célulatronco de determinado tecido em uma célula tronco de uma
linhagem inteiramente distinta. Este processo implica em uma
perda concomitante dos marcadores celulares específicos e
da função da célula original e aquisição de marcadores e
função do tipo celular transdiferenciado (KUCIA et al., 2005).
Regulação do número de células-tronco
hematopoiéticas
Fig. 1 - Modelo dos destinos alternativos das células-tronco
hematopoiéticas.
Fonte: WEISSMAN, 2000.
Células-tronco hematopoiéticas em outros tecidos e órgãos em mamíferos
As investigações dos últimos anos têm apoiado a
capacidade das células-tronco hematopoiéticas de se diferenciarem em outro tecidos tanto in vivo como in vitro
(COLINO, 2003). A Fig. 2 mostra um esquema deste conceito:
Em ratos jovens, a freqüência de HSCs em tecidos
hematopoiéticos é relativamente constante. Alguns modelos propuseram que as HSCs permanecem fora do ciclo celular durante muito tempo da vida do animal. Então,
uma ou poucas células hematopoiéticas de cada vez são
recrutadas para a hematopoiese e, quando elas atingem
o fim da sua vida reprodutiva, uma célula ou poucas células as repõem (WEISSMAN, 2000). Isso iria exigir um
mecanismo de regulação extremamente eficiente e um
mecanismo de “feedback” quase que mágico para controlar a entrada de apenas uma ou poucas células de
cada vez na hematopoiese. Contrário a esta hipótese,
experimentos subseqüentes mostraram que em ratos jovens cerca de 8 a 10% das HSCs entram, ao acaso, no
ciclo celular por dia e que, ao fim de 1 a 3 meses, todas as
células hematopoiéticas entraram no ciclo celular
(BRADFORD et al., 1997).
O número ou a freqüência de muitos tipos celulares é regulado, em parte, pela morte celular programada
(ou apoptose). As HSCs não são exceção. Estudos que
utilizavam HSCs transgênicas que superexpressavam a
proteína anti-apoptótica Bcl-2 mostraram que houve um
aumento gradual na quantidade de HSCs, o que sugere
que o número de HSCs é, em parte, regulado pela
apoptose (DOMEM et al., 2000).
50
Fig. 2 - Rota das células-tronco.
Fonte: BLAU; BRAZELTON; WEIMANN, 2001.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
A Fig. 2 ilustra as características das células-tronco adultas, que incluem plasticidade, diversidade de origem e multiplicidade de tecidos em que pode se diferenciar. As células-tronco são capazes de interagir com diversos tecidos partindo da corrente sanguínea (a “rodovia”) para gerar tipos celulares apropriados em resposta
a sinais do tecido em que se encontram ou de fatores de
crescimento, aqui ilustrados pelo “outdoors”. (Extraído
de BLAU et al., 2001).
Algumas células-tronco podem transitar pela circulação e ter acesso a outros órgãos do corpo. Célulastronco derivadas da medula óssea entram em diferentes
órgãos, alguns bem documentados experimentalmente
como o coração, o cérebro, o músculo esquelético ou o
fígado (BITTNER et al., 1999; BRAZELTON et al., 2000;
JACKSON et al., 1999; LAGASSE et al., 2000; MEZEY et
al., 2000). Sinais emitidos pelo tecido (“homing signals”)
podem ser resultantes de dano local, o que irá influenciar
a migração de células-tronco até sítios específicos
(BUTCHER, 1991). Fatores de crescimento induzem as
células-tronco a participarem da função do órgão com o
qual interagem. Portanto, o microambiente (o contato com
células vizinhas, com a matriz extracelular ou com o meio
local), assim como fatores de diferenciação, desempenha
um papel-chave na determinação das funções de uma
célula tronco. Sabe-se que dentro de órgãos como o cérebro, o fígado e o músculo esquelético, existem populações de células-tronco exclusivas para o reparo do tecido em que residem. Acredita-se que as células-tronco
possam entrar nestes tecidos para tanto contribuir com a
população já existente ali, como também para gerar células diferenciadas (BLAU et al., 2001).
3. CONCLUSÃO
Os avanços nas pesquisas com células-tronco têm
sido vistos por todo o mundo. Muitos esforços têm se
baseado na caracterização destes tipos celulares para
que sejam mais bem conhecidos e assim aplicados a fins
clínicos e terapêuticos. Ainda existem muitas questões a
serem respondidas e muitos estudos a serem realizados,
mas certamente este é um campo muito promissor que
ainda gerará muitos benefícios para a ciência médica.
4.AGRADECIMENTOS
Este trabalho contou com o apoio da CAPES –
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Efeito da Irradiação Laser de Baixa Potência Arsianeto de
Gálio Alumínio (ASGAAL) de 785nm sobre a Cicatrização
de Lesão Muscular: estudo experimental
Getúlio Antonio de Freitas Filho *
Maria de Fátima Rodrigues da Silva *
Marcelo Emílio Belleti **
Evandro dos Reis Machado **
Newton Soares da Silva ***
Resumo: Uma das intervenções fisioterapêuticas para lesões musculares é a irradiação laser de
baixa potência. Neste trabalho, foi utilizado o laser de baixa potência de 785nm e densidade de
energia de 4 J/cm2 com o objetivo de avaliar seus efeitos sobre o processo inflamatório e fibras
colágenas do músculo esquelético de ratos após trauma mecânico. Foram utilizados 48 ratos da
linhagem Wistar divididos aleatoriamente em três grupos: Grupo Controle Normal (GCN), Grupo
Controle Lesionado (GCL) e Grupo Lesionado e Tratado (GLT), todos contendo 16 animais, subdivididos em subgrupos de 8 animais para análises no oitavo e décimo quinto dias após a lesão.
Foram feitas lesões no músculo gastrocnêmio, por impacto de um pino de 320g solto sobre o
músculo a 21cm de altura. A terapia laser foi iniciada com uma aplicação duas horas após a lesão
e mais três aplicações em dias alternados. O grupo controle foi submetido a um tratamento semelhante com o aparelho laser desligado. Os músculos foram fixados em formol e processados em
parafina. Foram feitas colorações com hematoxilina-eosina, vermelho picrossírius e fast green. As
análises histomorfométrica indicaram que a terapia laser estimulou significativamente a deposição do colágeno nos músculos tratados em comparação aos músculos não tratados, tanto após oito
dias quanto quinze dias após a lesão. A comparação da quantidade de colágeno nos músculos
entre o oitavo e décimo quinto dias indicou também o aumento em sua produção na fase mais tardia
da lesão. A análise histológica mostrou que não houve alterações no processo inflamatório, quanto
ao número de fibroblastos, macrófagos e monócitos em relação aos grupos tratados e grupos
controles. Portanto, concluiu-se que doses de 4/cm2 de Al-Ga-As do laser de 785 nm não promoveram mudanças quanto ao número de células do processo inflamatório e neovascularização, mas
aumentaram a deposição de fibras colágenas entre as fibras musculares, sugerindo que a terapia
laser estimula a síntese de colágeno.
Palavras-chave: Lesão muscular, colágeno, laser 785 nm.
Abstract: One of the physical therapeutic interventions for the injured muscles is the low potency
laser irradiation. In this work, low potency laser of 785nm and energy density of 4 J/cm2 was used
to test its effects on the inflammatory process and collagen’s fibers of skeletal muscles of rats after
mechanical trauma. Forty-eight rats of Wistar lineage were used and randomly divided in three
groups: Normal Control Group (NCG), Injured Control Group (ICG) and Injured and Treated
Group (ITG), each one containing 16 animals, subdivided in 8 subgroups for analyses on the eighth
and fifteenth days after the injury. Injuries were made in the gastrocnemius muscle, by the impact of
a pin with 320g released on the muscle at 21 cm in height. The laser therapy application started 2
hours after the injury with three other applications in alternated days. The control group was
submitted to a similar treatment with the laser equipment turned off. The muscles were stuck in
* FESURV-Universidade de Rio Verde - GO.
** UFU - Universidade Federal de Uberlândia.
*** Professor da UNIVAP.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
53
formol and processed in paraffin. Colorations were done with hematoxilyn-eosin, picrosirius red
and fast green. The histomorphometric analysis indicates that the laser therapy stimulated
significantly the collagens deposition in the treated muscles in comparison with non-treated muscles
either after eight or fifteen days of the injury. The comparison of the collagen quantity in the muscles
between the eighth and fifteenth days indicated the increase in their production at the injury’s later
stage too. The histology analysis showed that there were not any alterations in the inflammatory
process, in the number of fibroblasts, macrophages and monocytes in relation to the treated groups
and control groups. Therefore, it was concluded that the 4J/cm2 of Al-Ga-As laser doses, didn’t
provoke changes in the numbers of cells in the inflammatory process and neovascularization, but
increased the collagen‘s fibers deposition between the muscles fibers, suggesting that the laser
therapy stimulates the collagen synthesis.
Key words: Muscle injure, collagen, laser 785 nm.
1. INTRODUÇÃO
A perspectiva para a utilização do laser de baixa
potência como forma terapêutica tem sido investigada
desde a década de 60. Estes estudos mostram que esta
forma de radiação pode estimular processos biológicos,
em especial os processos de reparo tecidual (MESTER;
KORENVI-BOTH; SPIRY; TISZA, 1975).
Dentre os tecidos biológicos o músculo é o mais
plástico, isto é, capaz de se remodelar frente a estímulos
como atividade física, condições de nutrição, inervação,
eletroestimulação, imobilização e alterações de condição
hormonais (ROSE; ROTHSTEIN, 1982). O músculo
esquelético é também um dos mais afetados por atividades
esportivas e traumas decorrentes de atividades de vida diária. A rápida recuperação deste tecido mantendo suas propriedades mecânicas e desempenho é importante para o
indivíduo lesionado em especial para atletas que necessitam de sua máxima eficiência durante as competições.
Estas lesões muitas vezes exigem longo tempo de
imobilização e uso de antiinflamatórios que podem provocar o aumento no número de fibras colágenas, bem
como alterações em sua orientação espacial e diminuição
da quantidade de fibras musculares. Estas alterações
contribuem para mudanças nas funções e propriedades
biomecânicas do músculo (TABARY et al., 1972;
WILLIAN; GOLDSPINK, 1984; YAMAMOTO et al.;
1996; JARVINEN et al., 2002; MEDRADO; PUGLIESE;
REIS; ANDRADE, 2003).
O principal constituinte do tecido muscular são
proteínas contráteis que por sua vez são envolvidas pelo
tecido conjuntivo constituído por colágeno e elastina,
as quais formam o endomísio, epimísio e perimísio. Estes
envoltórios do tecido muscular dão ao músculo elasticidade e flexibilidade, além de ligar o músculo aos ossos e
distribuir as forças da contração muscular. Após uma
injúria, o músculo passa por um processo de regeneração das fibras musculares danificadas e a produção de
54
um tecido conjuntivo de cicatrização. Este tecido
cicatricial em excesso pode ser uma barreira mecânica
para inibir a regeneração muscular (FISHER et al., 2000;
BODINER-FOWLER, 1994).
A terapia laser de baixa potência apresenta efeito
fotobiológico, estimulando a síntese de ATP, de colágeno,
proliferação celular dentre outros eventos celulares. Dessa forma, podem ocorrer efeitos analgésicos,
antiinflamatórios e reparadores. Porém, estes efeitos dependem de fatores como comprimento de onda do laser,
dose e tempo de aplicação (KARU; PYATIBRAT;
KALENDO, 1995; PEREIRA et al., 2002;
BOURGUIGNON-FILHO et al., 2005).
Estudos utilizando os lasers 904 e 632,8 nm sobre
regeneração do músculo esquelético mostraram que o laser
de 904nm não influenciou a regeneração muscular em músculo lesionado por miotoxina em camundongo (OLIVEIRA
et al., 1999). Por outro lado, o ensaio utilizando laser de
632,8 nm, com capacidade menor de penetração, nas mesmas condições, influenciou a regeneração de modo dose
dependente (AMARAL et al., 2001). Assim, é importante
determinar o efeito da terapia laser sob diferentes condições de aplicação em lesões musculares.
O presente trabalho avaliou o efeito da terapia
utilizando densidade de energia de 4 J/cm2 do laser AlGa-As de 785nm sobre células do processo inflamatório
e o colágeno do músculo gastrocnêmio de rato lesionado
por impacto.
2. METODOLOGIA
2.1. Animais
Neste trabalho foram aplicados os princípios éticos da experimentação animal de acordo com o COBEA
(Colégio Brasileiro de Experimentação Animal), tendo sido
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Univap,
protocolo n° L098/2005/CEP.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Foram utilizados 48 ratos (Rattus norvergicus),
machos da linhagem WISTAR, de mesma idade (70 dias),
sexo e massa corporal. Os ratos foram mantidos dentro
das condições ideais para sua espécie, ou seja, temperatura a 25°C, umidade 40% e luminosidade dia/noite de 12
horas e ventilação adequada e ração sólida e água ad
libitum enquanto durou o estudo.
• Pino de impacto: Tem por função fazer contato
com o local do animal a ser lesionado, com massa de 320
g. O pino foi posicionado sobre o músculo gastrocnêmio
do rato e solto, causando um impacto que provocou lesão muscular.
2.2. Grupos experimentais
Os animais foram divididos em três grupos, sendo
16 não lesionados, 16 lesionados não-tratados e 16
lesionados e tratados. Os grupos por sua vez foram subdivididos em dois subgrupos com 8 ratos. Cada subgrupo
foi sacrificado no 8º e 15º dias após o início do experimento.
2.3. Mecanismo de lesão
Os animais foram anestesiados com quetamina a
5% e xilasina a 2% na proporção de 1:4 em dose de 0,10 a
0,15 mL/100g de massa corporal, sendo feito em seguida
a tricotomia delimitando a área a ser contundida. Na região caudal da perna direita.
Optou-se por utilizar uma forma de produção de
lesão que se assemelhasse ao que ocorre na prática de
esportes, bem como em atividades de vida diária. Assim,
foi utilizado o aparelho promotor de lesa o qual possibilita a realização de lesões por meio de impacto (Fig. 1).
O equipamento promotor de trauma mecânico
(PTM) em sua estrutura geral é formado por uma base
fixa, um trilho fixo, um suporte móvel e um pino de impacto como descrito a seguir:
• Base fixa: Tem por finalidade a sustentação de
todo o aparelho, bem como servir de base para colocação dos animais em disposição previamente calculada
para que a lesão fosse implantada de conformidade com
o objetivo inicial;
• Trilho fixo: Parafusado na base fixa, tem por fim
servir de trilho por onde irá correr o suporte móvel. Trata-se de uma estrutura quadrangular, o que impede que
se altere a trajetória da haste e que esta atinja necessariamente o ponto determinado, funcionando assim como o
corredor por onde se deslocará a peça móvel;
• Suporte móvel: Em uma de suas extremidades
combina-se com o trilho fixo, onde realiza movimento de
deslocamento vertical, motivado pela ação da aceleração
gravitacional. Por outra extremidade liga-se ao pino de
impacto, possuindo a capacidade de ser regulada, mas
que no momento da indução da lesão permanece ajustada em altura previamente estabelecida;
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Fig. 1 - Equipamento promotor de trauma mecânico (PTM).
2.4. Terapia com Laser As-Ga-Al 785 nm
O equipamento utilizado foi o Laser Physiolux
Dual (Bioset Brasil) com freqüência de trabalho de 2000
Hertz e comprimento de onda de 785 nm – Arseneto de
Gálio e Alumínio – infravermelho, e LASER em emissão
contínua, com densidade de energia de 4J/cm2, potência
de pico de 70 mW, área do feixe de 0,08cm2 e regime de
emissão contínua.
A aplicação da radiação laser Al-Ga-As foi iniciada
no primeiro dia, duas horas após a lesão, pelo método
transcutâneo pontual em apenas um ponto, com dose de
4J/cm2. Os animais foram posicionados sobre uma plataforma, em decúbito ventral com hiperextensão do membro
inferior direito. A terapia laser foi realizada no 1º, 3º, 5º e 7º
dia após a lesão. A incidência da irradição foi realizada
diretamente sobre a pele da região lesionada, com o contato direto da caneta sobre esta região em ângulo de 90º. Os
animais controle também receberam o mesmo tipo de manipulação, porém com o equipamento laser desligado.
2.5. Análise histomorfométrica do colágeno
Ao final de cada fase experimental, os animais
foram sacrificados com dose excessiva de anestésico via
intraperitoneal. Em seguida, os músculos gastrocnêmios
foram retirados por meio de equipamentos cirúrgicos.
Os músculos foram fixados em formol 12% e colocados em parafina. Foram feitos cortes transversais de 9
mm e processados para coloração hematoxilina-eosina
(HE), vermelho picrossírius e fast green.
55
A coloração por vermelho picrossírius permite identificar fibras colágenas pela cor vermelha. A coloração do
colágeno foi executada usando uma modificação dos métodos combinados descritos por Sweat et al (1964) e Dolber
e Spach (1987). Inicialmente as lâminas foram imersas por
2 minutos em cubeta contendo solução de ácido vermelho
picrossírius, (sirius red e solução saturada de ácido pícrico)
por 90 minutos. As amostras foram enxaguadas por 2 minutos em solução 0,01 NHCl, seguido pelo enxágüe por 1
minuto em etanol 70%, etanol 100% e xilol.
A coloração por fast green evidencia as fibras
musculares em verde, permitindo o contraste com as fibras colágenas em vermelho para a realização da análise
morfométrica dos tecidos conjuntivos.
As imagens dos cortes histológicos foram obtidas em microscópio Olympus Triocular BX40 acoplado à
câmera Olympus-200, ligada a um computador PC através de placa digitalizadora Data Translation 3153 com
objetivas de 10X e 40X.
As quantificações morfométricas do colágeno
foram feitas a partir da binarização da imagem no programa HLimage. Neste, o colágeno em vermelho se torna
preto em contraste com a coloração verde do músculo,
que se torna branca. O programa calcula a área em preto,
resultando na porcentagem de colágeno.
2.6. Análise estatística
Todas as variáveis aferidas no estudo foram analisadas com o auxílio do programa SPSS 12.0 para
Windows. A expressão dos valores está demonstrada em
média aritmética e desvio-padrão, submetido ao teste
estatístico Wilcox ANOVA e t-Student. O nível de
significância estabelecido foi de 5 %(p<0,05).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Aspectos da lesão e do processo inflamatório
do músculo gastrocnêmio em recuperação
Ao exame in vivo, 24 horas após a lesão, foi observado aumento na espessura do músculo, caracterizando edema, movimento de retirada do membro à
palpação e hiperemia local. À luz da microscopia óptica
observou-se que o mecanismo de lesão utilizado neste
estudo promoveu separação das fibras musculares sem,
no entanto, apresentar características de injúria muscular como split fibres e núcleos centralizados (Fig. 2).
Fig. 2 - Corte transversal do músculo gastrocnêmio corado com HE, 24 horas após a lesão. Seta: fibra muscular;
seta pontilhada: fibroblasto; seta ondulada: células gigantes. Barra: A- 100 µm e B- 25 µm.
Oito dias após a lesão por impacto todos os músculos gastrocnêmios lesionados tanto do grupo irradiado quanto não-irradiado mostraram a presença de células do processo inflamatório como: células gigantes,
mononucleados (macrófagos, monócitos) e fibroblastos.
Foi observado também que a neovascularização ocorreu
em ambos os grupos, porém não há diferença estatisticamente significante entre a quantidade de células e de
vasos neoformados quando comparados os grupos tratados e não tratados.
Após 15 dias de lesão, observa-se ainda a presença de células relacionadas ao processo inflamatório e
neovascularização, tanto no grupo de animais lesionados
quanto no grupo de animais lesionados e tratados, po56
rém, sem diferença estatística entre os grupos.
A comparação entre os grupos tratados oito e
quinze dias após a lesão também não mostrou diferença
estatística significativa entre número de células inflamatórias e neovascularização, sugerindo que a terapia laser
não influenciou a evolução do processo inflamatório.
A terapia laser é um dos recursos utilizados em tratamentos fisioterapêuticos aplicados desde a superfície do
organismo como em casos de cicatrização da pele, ao tratamento de lesões em tecidos profundos, como o osso
(BOURGUIGNON-FILHO et al., 2005). Neste trabalho foi
utilizada a terapia laser de baixa potência no comprimento
de onda de 785nm. Esta escolha baseou-se em estudos reaRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
lizados por Karu (2003), os quais mostram que os comprimentos de onda com maior potencial para penetração capazes de atravessar o tecido epitelial estão entre 750 a 800 nm
estando, portanto, o comprimento de 785nm, dentro da faixa
indicada como capaz de atingir a camada muscular.
A literatura traz que a aplicação da radiação laser
durante a fase aguda diminui o processo inflamatório
(STAINKI et al., 1998; SCHINDL et al., 2000); baseado
nestas informações foi decidido iniciar o protocolo de
aplicação logo após a lesão, seguida de três aplicações
em dias alternados.
Neste trabalho foi observado que não houve alterações no número de células relacionadas ao processo
inflamatório. Vários trabalhos utilizando o laser As-Ga
tanto em lesão muscular por miotoxina quanto em cultura
de células também demonstram o mesmo efeito (BOUMA
et al.., 1996; OLIVEIRA et al., 1999).
Vários trabalhos sugerem a eficácia da terapia laser
de baixa potência e baixa intensidade de energia para
promover a diminuição do processo inflamatório como a
diminuição do edema. Porém, poucos trabalhos foram
realizados a fim de verificar o efeito da terapia laser sobre
a migração de células para locais de inflamação.
3.2. Análise histomorfométrica do colágeno no
músculo lesionado
No oitavo dia após a lesão, observou-se que o
grupo irradiado apresentou as fibras colágenas distribuídas entre as fibras musculares (Fig. 3). A quantificação
do colágeno mostrou que ela é maior no grupo irradiado,
sugerindo que a terapia laser estimulou sua produção
(p = 0,000) (Fig. 4).
Após quinze dias da lesão, observou-se ainda a
maior quantidade de colágeno no grupo irradiado com
diferença estatisticamente significante (p=0,001) (Fig. 4).
A comparação da quantidade de colágeno entre o
oitavo e décimo quinto dias nos grupos irradiados mostrou também maior quantidade de colágeno no décimo
quinto dia (p= 0,003) sugerindo que o estímulo à produção de colágeno continuou (Fig. 4).
Fig. 3 - Análise histológica do tecido muscular com 8 das após lesão: A – grupo lesionado não-tratado (GCL); B –
grupo controle lesionado e tratado (GLT); C – grupo controle normal (GCN). Análise histológica do tecido
muscular com 15 dias após lesão: D – Grupo lesionado e tratado (GLT); E – grupo controle lesionado não-tratado
(GCL); F – grupo lesionado e tratado (GCN). Picrosirius e fastgreen (barra = 100 µm).
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
57
Fig. 4 - Gráfico da porcentagem de colágeno do músculo gastrocnêmio lesionado após a irradiação de 4J/cm2 de laser
785 nm. GCN – grupo controle normal, GCL – grupo controle lesionado, GLT - grupo lesionado e tratado (8 e 15 dias).
O músculo é também constituído por tecido conjuntivo, o qual é composto principalmente de fibras
colágenas, produzidas por fibroblastos que formam estruturas que envolvem o tecido muscular, sendo importantes
para distribuir forças geradas pelas fibras musculares e na
fixação dos músculos aos ossos. Após uma lesão, o
colágeno pode atuar no processo de cicatrização com o
aumento de sua produção. Esta cicatrização por sua vez
pode ser desvantajosa quando contribui para diminuir a
capacidade funcional do tecido. Dessa forma, é importante compreender o efeito da terapia laser sobre o colágeno
que envolve o tecido muscular. A terapia laser é um método muito usado dentro dos mais variados protocolos empregados, e o que se tem visto é que a terapia laser, apesar
de muito estudada, ainda gera controvérsias e dúvidas
sobre seu efeito na cicatrização do tecido muscular.
De acordo com Letho et al. (1985), a produção de
colágeno em músculo lesionado inicia-se dois dias após
a lesão e é mais intensa entre os 5º e 21º dias e diminui
logo após. No presente estudo observou-se que no 8º e
15º dia ainda havia produção de colágeno. Como não foi
observada a proliferação de fibroblastos sugere-se que a
irradiação laser estimulou a síntese de colágeno.
A utilização de terapia laser 904 nm na dose de 4 J/
cm2 promoveu a deposição de colágeno em tendões de ratos submetidos à tenotomia do tendão calcâneo tanto na
fase inicial quanto tardia da lesão (TAVARES et al., 2005).
Estudos realizados por Reddy et al. (1998) mostram que a terapia laser estimula a produção de colágeno
em tendão lesionado por cirurgia. Análises bioquímicas
58
revelaram que a quantidade de ligações cruzadas entre
as fibras colágenas do grupo tratado era semelhante ao
grupo controle indicando que a terapia laser atua de maneira a acelerar a renovação do colágeno.
Quando uma terapia laser é aplicada podem-se
obter efeitos tanto estimulatórios quanto inibitórios sobre a proliferação celular ou ativação de seu metabolismo. A lei de Arndt-Schultz indica que existem densidades
que não alteram a resposta biológica, doses que estimulam e doses que inibem a resposta (SOMMER et al., 2001).
Estudos in vitro utilizando laser de 904 nm mostraram
que a irradiação de 3 a 4 J/cm2 promove o aumento do
número de fibroblastos e que a dose de 5 J/cm2 não
surtiu efeitos sobre o crescimento celular (PEREIRA et
al., 2002). Já Schindl et al. (2000) encontraram que em
cultura de fibroblastos doses acima de 10 J/cm2 inibem a
produção de colágeno. A dose de 4 J/cm² escolhida neste estudo foi utilizada na expectativa de abordar sua eficiência no rearranjo do colágeno e eficácia quanto ao
parâmetro biomodulador sobre fibras colágenas.
Skinmer et al. (1996) encontraram que a radiação
laser de 904 nm em cultura de fibroblastos aumentou a
síntese de colágeno e não alterou o número de células,
resultado também demonstrado em nosso experimento
com o laser de 785nm. Eles encontraram também que a
síntese de colágeno foi maior quando foram feitas aplicações por mais de quatro dias. Pogrel et al. (1997), ao
utilizarem radiação laser de 830 nm, com diferentes doses
e tempos de aplicação, em cultura de fibroblastos, encontraram que não houve estímulo à proliferação, migração e adesão de fibroblastos. Outros trabalhos, utilizanRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
do o mesmo comprimento de onda, mostraram que este
atua sobre o processo de cicatrização acelerando suas
fases, abreviando a fase de exudação e acelerando a fase
de reparação, e, ainda, diminuindo o edema, melhorando
o tecido de granulação nas lesões, estimulando a proliferação de fibroblastos e miofibrosblastos e, deste modo,
aumentando a deposição organizada de colágeno, além
de estimular a formação de retículo endoplasmático, de
mitocôndrias e de miofibrilas (MEDRADO et al., 2003;
PUGLIESE et al., 2003).
Outro trabalho utilizando comprimentos de onda
de 635 nm e 780 nm, próximos ao utilizado neste trabalho,
mostrou não haver efeito sobre o crescimento do colágeno.
E ainda o laser a 3-4 J/cm² tem intenso efeito sobre o
crescimento do colágeno (PEREIRA et al., 2002).
A recuperação muscular pode ocorrer também pelo
reparo do tecido muscular por meio do preenchimento da
área de lesão por células miogênicas, as quais irão recuperar a fibra lesionada ou pela formação de nova fibra
muscular a partir de células mio-precursoras (ROTH;
ORUN, 1985). Neste trabalho não foram observadas alterações no tamanho da fibra, na posição do núcleo que
pudessem indicar a regeneração muscular tanto no grupo tratado quanto no controle. Oliveira et al. (1999), em
seus estudos sobre o efeito do laser AsGa (904 nm) com
doses de 3 e 10 J/cm 2 na regeneração de músculo
esquelético lesionado com miotoxina, observaram também que ambas as doses não promoviam efeitos sobre o
processo de regeneração muscular.
Amaral et al., (2001) avaliaram o efeito do laser
HeNe com comprimento de onda de 632,8 nm e potência
de 2,6 mW, com doses 2.6, 8,4 e 25 J/cm2 aplicados durante cinco dias consecutivos, sobre a pele do músculo
tibial anterior lesionado, e constataram que somente a
dose de 2.6 J/cm2 proporcionou aumento da fibra muscular e densidade mitocondrial.
A organização do colágeno no músculo sadio ou
lesionado é de suma importância para a funcionalidade
muscular, podendo o excesso aliado à desorganização
causar barreiras mecânicas que inibem a função e/ou regeneração muscular. No campo da fisioterapia, a reabilitação com sucesso depende do retorno da funcionalidade do músculo acometido; vários protocolos de tratamentos são empregados com o objetivo de promover
uma restauração tecidual rápida, mas sem alteração nas
atividades normais.
Este trabalho permite concluir que a aplicação de
4J/cm2 da irradiação laser de 785 nm pode promover a
síntese de colágeno. Porém, este efeito pode não ser favorável à funcionalidade do músculo por ser um tecido
de cicatrização.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
4.AGRADECIMENTOS
Agradecemos à Empresa Bioset Indústria de
Tecnologia Eletrônica Ltda à cessão da caneta 785nm de
As-Ga-Al, à Universidade Federal de Uberlândia pela disponibilidade para utilização do Biotério e Laboratório de
Bioquímica (LABIBI) e Laboratório de Morfologia.
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Inflamação Pulmonar Induzida por Lipopolissacarídeos
(LPS) e sua Contribuição como Instrumento de Pesquisas
Daniel de Souza Ramos *
Newton Soares da Silva **
Wellington Ribeiro **
Resumo: O sistema imunológico é responsável pela defesa do organismo contra infecções. Por
muito tempo o homem vem buscando formas de reproduzir os quadros dessas doenças, com o objetivo de desenvolver tratamentos eficazes e seguros. Os lipopolissacarídeos (LPS) têm sido uma
ferramenta muito importante para o conhecimento da ação tóxica das bactérias gram-negativas e
para o entendimento de como o sistema imune combate tais invasores. Faz-se aqui uma breve
revisão sobre as pesquisas, quais as novas descobertas e quais os novos caminhos que estão sendo
traçados nessa área de estudos.
Palavras-chave: Inflamação pulmonar, LPS.
Abstract: The immune system is responsible for the defense of the organism against infections. For a
long time man has been searching forms to reproduce the pictures of these illnesses, with the
objective to develop efficient and safe treatments. The lipopolysaccharide (LPS) has been a very
important tool for the knowledge of the toxic action of the gram-negative bacteria and for the
understanding of how the immune system combats such invaders. This paper does a brief review
about the researches, the new discoveries, and the ways being traced in this area.
Key words: Lung inflammation, LPS.
1. INTRODUÇÃO
O organismo humano está em constante
suscetibilidade a infecções por microorganismos e bactérias, que, dependendo de seu componente de toxicidade,
podem vir a causar quadros infecciosos letais. Contudo, o
processo de evolução da espécie nos qualificou com a
capacidade imunológica, que pode se apresentar na forma
adquirida, o que nos torna capazes de criar defesas fisiológicas contra as agressões, e na forma inata, que envolve
processos gerais, como a fagocitose (BRODER et al., 1994;
COLVIN et al., 1994; GRANSTEIN, 1994).
Com as constantes alterações climáticas, alimentares e de hábitos de vida, é cada vez maior a incidência de
novas doenças ligadas ao sistema respiratório (SR) (ABBEY
et al., 1993; BOBAK, 2000; BRAGA et al., 1999;
COMMITTEE OF THE ENVIRONMENTAL AND
OCCUPATIONAL HEALTH, 1996; DOMINICI et al., 2002).
Posto isto, as pneumonias permanecem em um patamar de
destaque, alardeando o mundo com ocorrências mais precoces e letais entre as populações. Segundo a Organização
* Mestrando em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006.
** Professor da UNIVAP.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Mundial de Saúde, as doenças respiratórias agudas (DRA)
em crianças não somente ocorrem, com maior freqüência,
como também são mais letais.(BERMAN et al.,1990; SHANN,
1986; MCINTOSH, 2002; HEMMING, 1994).
Em 1985 pela primeira vez, a Chlamydia
pneumoniae foi reconhecida como agente etiológico de
infecção respiratória no ser humano (SAIKKU et al., 1985).
Atualmente é identificada como um agente de pneumonia atípica e infecção respiratória alta (GRAYSTON et al.,
1986; GRAYSTON et al., 1990; GRAYSTON, 1994), estimando-se que 5 a 15% de todos os casos de pneumonia
se associem a Chlamydia pneumoniae (PRINCIPI et al.,
2001; KUO et al., 1995).O único sorotipo identificado até
a data denomina-se TWAR (SAIKKU et al., 1985;
GRAYSTON et al., 1986), A Chlamydia pneumoniae é
uma bactéria intracelular obrigatória, com um ciclo de
vida bifásico, uma forma extracelular infecciosa e uma
forma intracelular metabolicamente ativa. Dois a três dias
depois da invasão ocorre infecção de novas células hospedeiras. A bactéria multiplica-se nos macrófagos
alveolares, células do músculo-liso e células endoteliais,
induzindo alterações nos cílios do epitélio pulmonar
(KAUPPINEN; SAIKKU, 1995). A Chlamydia
pneumoniae transmite-se pelo trato respiratório, ocorrendo primariamente em crianças dos cinco aos quinze
61
anos de idade, as reincidências de infecções são freqüentes, mas estima-se que 50% dos adultos tenham
anticorpos para este agente (GRAYSTON et al., 1990;
NIKI; KISHIMOTO, 1996; BLASI et al., 1998).
Embora nosso sistema imunológico produza
anticorpos e a medicina conte, hoje, com uma gama variada de vacinas para o combate a infecções, existem bactérias que liberam substâncias, como os lipopolissacarídeos
(LPS), que são os componentes tóxicos das bactérias gramnegativas (BA, 1998), cujo grau de toxicidade em um quadro avançado da infecção acarreta um processo inflamatório degenerativo danoso ao tecido, conhecido como
síndrome da disfunção múltipla dos órgãos (MDOS)
(BEAL; CERRA, 1994), pois, na tentativa de conter a inflamação, nosso organismo lança mão de suas células de
defesa como macrófagos e neutrófilos que se deslocam
até o local onde o agente invasor está agredindo o organismo. Estes, por sua vez, liberam uma variada quantidade
de sinalizadores que desencadeiam novas cascatas, ativando outros mecanismos de defesa e citocinas, como o
fator de necrose tumoral (TNF), a interleucina-1 (IL-1) e
interleucina-6 (IL-6) que trabalham degradando o agente
invasor (CAVAILLON et al., 1990). Vários estudos relataram associações da imunidade inata a variações nos genes
que codificam proteínas especificas, como as TLRs, TNFa, CD14, e proteína crescente bactericidal/permeabilidade
(COHEN, 2002; ARCAROLI et al., 2005). Hoje, a Medicina
tem procurado soluções eficazes e que tragam menos conseqüências posteriores ao organismo afetado. Algumas
linhas de pesquisas têm encontrado substâncias que, além
de possuírem funções bem definidas no organismo, podem contribuir para o desenvolvimento de novos tratamentos. Um bom exemplo são as lipoproteínas dos HDL
(EMANCIPATOR et al., 1992).
A partir do contexto exposto buscaremos definir
um panorama dos métodos mais utilizados e das descobertas que surgem nas variadas linhas de pesquisas afins.
Essa revisão apenas objetiva demonstrar o papel dos métodos que reproduzem quadros infecciosos, utilizando
como ferramenta lipopolissacarídeos. E com isso, de uma
maneira geral, demonstrar como estão sendo traçados os
caminhos, para que, quem sabe num futuro próximo, o
organismo humano não esteja desprovido de defesa contra as inflamações e, por outro lado, deixar um horizonte de
opções de linhas de estudo para que novos pesquisadores possam vir a dar suas contribuições, para o desenvolvimento de novas vacinas e tratamentos contra invasões
bacterianas e para a compreensão da capacidade de adaptação dos mecanismos de defesa do organismo humano.
ram reproduzir as condições infecciosas da ação dos LPSs
em camundongos (BERMAN et al., 1990; SHANN, 1986;
MCINTOSH, 2002; HEMMING, 1994; TATE; REPINE,
1983; WEILAND et al., 1986; WOTHERN et al., 1987;
NEWMAN, 1985 ). Esse processo se dá a partir da administração intraperitonial ou através da instilação nasal
dos LPSs (TATE; REPINE, 1983; WEILAND et al., 1986;
WOTHERN et al., 1987; NEWMAN, 1985 ). Podemos
facilmente através desse modelo dosar o grau de toxicidade
desejado e determinar um estudo dirigido a uma infecção
aguda ou crônica.
Durante os quadros inflamatórios percebe-se que
a resposta imune inata possui um leque de opções para
proteger o organismo do agente invasor, contudo não
podemos esquecer que alguns dos mecanismos de defesa
utilizados podem reverter suas função de proteção, tornando-se desencadeadores de ferimentos que comprometem o tecido afetado. Estudos recentes buscam encontrar
respostas para a ação de vários reguladores do processo
inflamatório. Os Nrf2 e a família dos receptores TLR parecem ter um papel importante na organização da defesa
imunológica inata (BEUTLER et al., 2003; MEDZHITOV;
JANEWAY JR, 2000). O receptor TLR4 é capaz de detectar
vários LPSs diferentes (CHOW et al., 1999), mas muitos
artigos apresentam diferentes resultados com relação aos
papéis desse receptor (CHAPES et al., 2001; CHEN et al.,
2004; FAURE et al., 2004; HART et al., 2003; LETTINGA
et al., 2002; MANN et al., 2004; SCHURR et al., 2005;
SING et al., 2003). Higgins e outros descreveram uma
aplicabilidade diferente para TLR4 durante a infecção com
parapertussis do B. Em seu modelo, o TLR4 parece ser
mais importante para desenvolver a imunidade adaptável,
atuando nas respostas reguladoras (HIGGINS et al., 2003).
Vários modelos caracterizam-se pelo aumento da
permeabilidade vascular, acúmulo e ativação de neutrófilos
e macrófagos, levando-os a liberarem inúmeras citocinas,
enzimas proteolíticas, espécies reativas de oxigênio e nitrogênio e metabólitos do ácido araquidônico (GOODMAN
et al., 1996; ROSSEAU et al., 2000; FREVERT et al., 1995;
KOPYDLOWSKI et al., 1999). Inúmeros desses produtos
atuam como sinalizadores para as células que constituem
as vias aéreas (músculo liso e células epiteliais principalmente) e o parênquima pulmonar (pneumócitos tipo II),
levando-as a liberarem citocinas e fatores de crescimento,
contribuindo para a perpetuação da inflamação, o que cronicamente leva a um remodelamento das vias aéreas e
parênquima pulmonar, causando alterações estruturais
funcionais dos pulmões (NAGASE; WOESSNER, 1999;
MURPHY; DOCHERTY, 1992).
3. CONCLUSÕES
2. DISCUSSÃO
Sendo as inflamações pulmonares motivo de grande parte das mortes registradas, muitos estudos procu62
Diante do volume de experimentos que fazem uso
dos lipopolissacarídeos conclui-se que sua utilização já
é consolidada no meio científico.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Nota-se que as células do sistema imunológico
exercem funções variadas e determinadas pelo fator infeccioso.
Estudos recentes têm encontrado novas citocinas
e receptores, deixando claro que ainda não estão totalmente definidos os mecanismos específicos de ação do
sistema imune.
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
A Crise Ambiental e a Ecotoxicologia: uma ferramenta na
conservação da diversidade biológica
Isabel Cristina Fracasso Póvoa *
Newton Soares da Silva **
Maria Regina de Aquino Silva **
Resumo: É relevante destacar a utilização dos recursos naturais como fonte de energia durante a
Revolução Industrial o que levou a crise ambiental. Para combater as pragas agrícolas, foram
introduzidos, no início do século XX, os pesticidas, os quais abrangem os inseticidas, os herbicidas
e os fungicidas, denominados xenobióticos. Outra classe de contaminantes são os metais pesados,
os quais são conseqüência da produção comercial. O ciclo antropogênico global resultou na
presença de metais pesados e os efeitos de acumulação ao longo da cadeia trófica podem ser
observados tanto em ambientes terrestres como aquáticos, afetando a biodiversidade. O Brasil é
considerado o país da megadiversidade, com 15 a 20% do número total de espécies do planeta;
conta com a mais diversa flora do mundo, número superior a 55 mil espécies descritas. Diante da
necessidade de preservação surgiram movimentos que deram origem ao conceito de desenvolvimento sustentável, como o Clube de Roma, em 1968, 1ª Conferência Sobre o Meio Ambiente, em
Estocolmo, 1972, e o relatório de Brundtland proposto pela ‘Comissão Mundial do Desenvolvimento e Meio Ambiente’, e, mais recente, em março de 2006, a COP8, “Oitava Conferência das
Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica”, realizada no Brasil. E como ferramenta para
a preservação da biodiversidade surge a ecotoxicologia, a qual desenvolve pesquisas que focalizam degradação ambiental, saúde pública e preservação de recursos naturais. A ecotoxicologia
realiza a importante tarefa da avaliação do risco ambiental, sendo os estudos ecotoxicológicos
fundamentais para a sociedade desenvolver planos de recuperação de ecossistemas degradados e
conservação da biodiversidade.
Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável, organoclorados, metais pesados, ecotoxicologia.
Abstract: It is relevant to highlight the natural resources utilization as source of energy during the
Industrial Revolution, which led to an environmental crisis. Pesticides, such as insecticides,
herbicides and fungicides, denominated xenobiotics were introduced in the beginning of the 20th
century to combat agricultural plagues. Another pollutant class is the heavy metals, which are
consequence of the commercial scale production. The anthropogenic global cycle resulted in the
presence of heavy metals and the accumulating effects through the trophic chain can be observed
either in the terrestrial or in the aquatic environment affecting biodiversity. Brazil is considered one
of the countries with great diversity. The country holds 15 to 20% of the total number of species of
the planet and has the largest diversified flora of the world, a number higher than 55 thousand
described species. Due to the need for preservation, movements were created with the concept of
sustainable development for example the Club of Rome, in 1968, The 1st Stockholm Conference on
Environment, in 1972, the Brundtland report proposed by the ‘World Commission for Development
and Environment and more recently, in March 2006, the COP8 “Eighth Conference of the Parties in
the Biological Diversity Convention”, held in Brazil. Ecotoxicology emerges in this scenery as a
tool for the preservation of the biodiversity, and develops research that focus on the environmental
degradation, public health and natural resources preservation. Ecotoxicology performs the important
task of evaluating the environmental risk, where ecotoxicolgy studies are fundamental for the
society to develop plans to recover degraded ecosystems and the conservation of the biodiversity.
Key words: Sustainable development, organochlorines, heavy metals, ecotoxicology.
* Mestranda em Ciências Biológicas - UNIVAP, 2006.
** Professor(a) da UNIVAP.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
65
1. INTRODUÇÃO
Desde os primórdios da humanidade, a natureza,
a grande fonte de inspiração dos filósofos gregos, era
referência fundamental para existência humana e o homem era visto como parte integrante desse conjunto de
fenômenos. Todavia, na Idade Média, o homem começou a se afastar da natureza e, com o advento do cristianismo, a forma de ver a natureza passou a refletir interesses das classes dominantes, sendo pensada e interpretada através das Sagradas Escrituras.
Nos séculos XV e XVI o Renascimento trouxe a
reformulação da idéia sobre a natureza “divina” e o rompimento entre a ordem divina e ordem humana. Estas
novas linhas de pensamento, segundo Rocha (2005), levaram a um carácter antropocêntrico de domínio da natureza e o anseio de controlá-la.
Já no século XVII a tese de Galileu Galilei (1564 –
1642) derruba a visão clássica do mundo - o Geocêntrismo,
adotada pelo cristianismo na perspectiva de São Tomás
de Aquino (1224 – 1274) e então a ciência revela o carácter
obscuro da natureza utilizando a experimentação e a matemática. Assim, a ciência no século XVIII estabeleceu a
razão como essência e idealizou a natureza como um
recurso infinito a ser explorado e juntamente a descobertas e desenvolvimentos tecnológicos culminou a Revolução Industrial, que, durante sua primeira fase, levou ao
aparecimento das classes rurais e urbanas, implementou
um sistema baseado no capital e trabalho assalariado, o
capitalismo (ROCHA, 2005).
É importante destacar a importância dos recursos
naturais como fonte de energia nesse novo sistema. Na
primeira fase da revolução industrial – de 1780 a 1860,
revolução do carvão e do ferro – levou a mecanização da
indústria e da agricultura. Na segunda fase de revolução
industrial – de 1860 a 1914, revolução do aço e da eletricidade – surgiram os primeiros automóveis na Alemanha
e Estados Unidos, e novas e revolucionárias formas de
organização de negócios foram implementadas, em decorrência da acumulação de capital, tais como: formações de cartéis e fusões empresariais.
À medida que os países se industrializavam
incrementava-se a produção de alimentos e a melhora
nas condições sócio-econômicas e sanitárias e conseqüentemente a redução da taxa bruta de mortalidade e
conseqüente aumento da taxa de crescimento
populacional.
A partir desse novo contexto sócio-econômico, o
meio ambiente começou a receber de forma crescente os
resíduos industriais e domésticos, impactando-o e conseqüentemente os recursos naturais. Estes novos pa66
drões de geração de resíduos surgiram em quantidades
maiores que a capacidade de absorção da natureza, dando origem a problemas ambientais, como carência de recursos e perda da biodiversidade.
Mediante toda a problemática ambiental, surgem
as grandes reuniões ambientais a partir da década de 60
e grandes tratados visando a proteção do meio ambiente. Dentro de todo esse debate, o meio científico vem
buscando conhecimentos para sustentar as previsões
desastrosas do descuido com o meio ambiente e trilhando caminhos para seu uso sustentável, preservando a
biodiversidade do nosso planeta.
A ecotoxicologia surge nesse momento como
grande ferramenta para validar estudos, pelos quais os
decisores podem se basear nessa grande tarefa da preservação.
2. BIODIVERSIDADE
“Diversidade biológica” significa a variabilidade
de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos
e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de
ecossistemas. (Artigo 2 da Convenção sobre Diversidade Biológica)
Ninguém conhece, ainda, o número total de espécies existentes na Terra, todavia, aproximadamente,
1.500.000 espécies de plantas e animais em todo mundo
foram descritas. Alguns especialistas estimaram que a
contagem final possa atingir entre 10 e 30 milhões, porém
estudos realizados recentemente em florestas tropicais
sugerem que pode haver 30 milhões de espécies apenas
de insetos (WILSON, 1997).
A atividade antrópica vem ocasinando constante
impacto em populações de espécies e uma quantidade
significativa está sendo sistematicamente destruída. Presentemente especialistas têm voltado sua maior atenção
às florestas tropicais, porque embora cubram apenas 7%
da superfície terrestre, elas contêm mais da metade das
espécies da biota mundial e estão sendo destruídas e
exploradas de maneira agressiva muito rapidamente. Atualmente, menos de 5% das florestas estão protegidas em
forma de parques e reservas e estão vulneráveis a pressões políticas e econômicas. De acordo com Wilson
(1997), persistindo os atuais níveis de remoção das florestas, dentro de um século haverá perda de 12% de 704
espécies de aves na bacia amazônica, e de 15% de 92000
espécies de plantas nas Américas Central e do Sul.
É importante salientar que a biodiversidade é a
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
fonte mais importante de recursos naturais na Terra, dependem dela a agricultura, a medicina e a indústria, sendo sua conservação dependente da amplitude de cada
espécie, de procriação múltipla que apresentam complexos padrões de variabilidade genética. Desta maneira,
mesmo que uma espécie em perigo seja salva da extinção,
dependendo do número de indivíduos, ela provavelmente terá perdido muito da sua diversidade genética.
O Brasil é considerado o país da megadiversidade,
com 15 a 20% do número total de espécies do planeta;
conta com a mais diversa flora do mundo, número superior
a 55 mil espécies descritas. A Amazônia, a Mata Atlântica
e o Cerrado são exemplos de ecossistemas mais ricos do
planeta e estão localizados em delimitacões brasileiras.
Levando em consideração estas informações temos muito clara a importância do Brasil nesse atual conceito de recursos naturais e riqueza genética, assim como
o valor de se estabelecerem diretrizes políticas e educacionais para sua conservação.
3. CONTAMINANTES NO ECOSSISTEMA
composto organoclorado que foi sintetizado inicialmente em 1800 na Alemanha. Estas podem apresentar diversas substituições possíveis em relação à quantidade de
átomos de cloro, as quais variam de 1 a 10 átomos, podendo ser obtidos até 209 estruturas diferentes denominadas congêneres.
A produção industrial das PCBs iniciou em 1920,
mas somente depois de mais de 40 anos, em 1966, foi
reconhecido como contaminante ambiental . Em 1970 teve
seu auge na produção com 50.000 toneladas, sendo a
indústria eletro-eletrônica a maior consumidora (PENTEADO e VAZ, 2001). As PCBs foram muito difundida devido principalmente as suas propriedades físico-químicas,
como são a alta constante dielétrica e a elevada estabilidade térmica. Segundo Penteado e Vaz (2001), devido a
esse grande emprego, o acúmulo mundial dessa substância foi aproximadamente de 1.200.000 toneladas, e deste
total cerca de 60% foi utilizado em transformadores e
capacitores, 15% para fluídos de transferência de calor e
25% como aditivos na formulação de plastificantes, tintas, adesivos e pesticidas. Cerca de 40% ou 300.000 toneladas entrou no ambiente e grande parte do restante
está em uso em equipamentos eletro-eletrônicos antigos.
3.1 Organoclorados
Os denominados xenobióticos (inseticidas,
herbicidas e fungicidas), compostos orgânicos estranhos,
são continuamente descartados no ambiente por comunidades urbanas e industriais. No século passado, muitos milhares de substâncias orgânicas, como bifenilas
policloradas (PCBs), praguicidas organoclorados,
dibenzofuranos policlorados e dibenzo-p-dioxinas foram
produzidos e uma considerável parcela liberada no meio
ambiente.
Em 1940, Paul Müeller observou que o DDT
(diclorodifeniltricloroetano) era um potente inseticida e seu
uso rapidamente se implementou. Durante a Segunda Guerra Mundial, na Itália, o DDT em pó foi pulverizado na pele
da população para prevenir epidemias de tifo transmitida
por vetores. Müeller recebeu prêmio nobel de medicina
em 1948, pelas milhões de vidas salvas pelo DDT.
O poder residual do DDT, considerado como qualidade positiva, começou a ser encarado como sério inconveniente. Tardiamente se constatou que resíduos
haviam contaminado praticamente todos ecossistemas,
e, na década de 60, se intensificaram pesquisas relativas
ao assunto e começou-se a implantar medidas legais
restringindo o seu uso. Apesar da restrição, o problema
da contaminação tem se agravado e adquirido proporções dramáticas, atualmente pode-se encontrar DDT nas
regiões polares (D’AMATO et al.,2002).
No Brasil as restrições foram implementadas em
1981; até então o produto era importado principalmente
dos Estados Unidos e Alemanha. No entanto, permite-se
que equipamentos já instalados continuem em funcionamento até sua substituição integral.
O BHC (hexaclorobenzeno) é outro exemplo de
organoclorado, que consiste de uma mistura de uma série de isômeros em diferentes porcentagens e dentre estes o mais conhecido é o isômero ã (Lindano) com propriedades inseticidas.
A legislação brasileira proibiu seu uso em 1985,
ficando restrito às campanhas de saúde pública, mas infelizmente existem áreas muito contaminadas, como no
Município de Duque de Caxias, RJ, onde existia uma fábrica de BHC que foi abandonada em 1965 juntamente
com parte de sua produção, cerca de 300 a 400 toneladas
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2003).
Outros contaminantes a destacar são as dioxinas
e furanos, os quais são duas classes de compostos aromáticos tricíclicos, que possuem propriedades físicas e
químicas semelhantes. São formados como subproduto
não intencional de vários processos envolvendo o cloro, produção de diversos produtos químicos (pesticidas),
branqueamento de papel e celulose, incineração de resíduos, incêndios, incineração de lixo urbano e hospitalar,
incineração de resíduos industriais, veículos automotores
e outros (ASSUNÇÃO; PESQUERO,1999).
As PCBs (bifenilas policloradas) são um tipo de
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67
A seqüência de reações para a formação de furanos
e dioxinas ainda não é bem conhecida, mas sim suas fontes,
que são os PCBs e os processos de combustão respectivamente. Estudos em cobaias, como coelhos, macacos e gado,
demonstraram que o sistema imune e reprodutivo é atingido
por estas substâncias. A meia-vida da dioxina em seres humanos tem sido estimada em 5 a 11 anos, sabe-se, porém,
que aumenta com a idade, provavelmente devido ao aumento de tecido adiposo e à diminuição do metabolismo
basal (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2003).
do não possui definição única, variando de acordo com
o ramo da ciência que o aborda, entretanto podemos definir que são elementos com a massa atômica maior que a
do cálcio.
Muitos pontos em relação às dioxinas e furanos
ainda não estão completamente entendidos, por exemplo
as tranformações que sofrem na atmosfera na fase vapor
e os efeitos sinergéticos dessas substâncias no meio
ambiente (ASSUNÇÃO; PESQUERO, 1999).
O ciclo antropogênico global implementou a presença de metais pesados, e considerando também os processos
da biofera, podemos citar estudos recentes, que descreveram
a presença de altas concentrações de mercúrio nos Pirineos
Franceses, região montanhosa que teoricamente não possui
fontes de contaminação (BLAIS et al., 2005).
Em relação à atmosfera sabemos que a volatização
de material organoclorado pode chegar até mesmo em áreas
remotas, como o continente Antártico e Ártico, e pode
estar distribuídos entre fase gasosa e material particulado.
Esta distribuição é influenciada principalmente pela temperatura e pressão (PENTEADO; VAZ, 2001).
Com relação a seres humanos, pode-se ressaltar
que a persistência ambiental desses compostos pode trazer vários efeitos, dentre estes o caso de mulheres em
período de lactação que podem mobilizar resíduos de
organoclorados presentes em depósitos corporais (gordura), sendo oferecidos aos bebês; contaminantes que
podem estar incorporados na alimentação (MELLO-DASILVA; FRUCHTENGARTEN, 2005). Recentes estudos
feitos em salsichas (BOGUSZ et al., 2004) e queijos (SANTOS et al., 2006) detetaram a presença de organoclorados,
que, apesar de atenderem os limites máximos permitidos
pela legislação, chamam a atenção, alertando sobre a necessidade de continuar estudos e rever a legislação, levando em conta o poder cancerígeno dessas substâncias.
Durante uma reunião do Programa das Nações
Unidas para o Ambiente, em maio de 2001, em Estocolmo,
representantes de 90 países, incluindo o Brasil, assinaram a Convenção sobre Poluentes Orgânicos Persistentes, que visa proibir a produção e o uso de 12 substâncias tóxicas, atendendo a um apelo da comunidade internacional (NASS; FRANCISCO, 2002).
A emissão de metais pesados no ambiente é conseqüência da produção comercial específica, mas por
outro lado há emissões não intencionais decorrentes da
queima do carvão, do petróleo, acúmulo de lodos e entulhos, e produção de cimento e vidro.
Os efeitos de acumulação ao longo da cadeia trófica
podem ser observados tanto em ambientes terrestres como
aquáticos. Outro aspecto importante a ser considerado é a
interação entre diversos metais e não metais, que podem
resultar numa potencialização ou diminuição dos seus efeitos deletérios, além da interação com substâncias húmicas,
que acabam complexando alguns metais.
A seguir apresentam-se alguns metais pesados:
x Cádmio (Cd) – É uma descoberta relativamente
recente, foi descrito em 1817. Não possui função biológica e é altamente tóxico a plantas e animais; os níveis
naturais de Cd encontrados normalmente não causam
toxicidade aguda.
É utilizado em galvanoplastia, fabricação de ligas,
baterias de Ni-Cd, tubos de TV, pigmentos, esmaltes e tinturas têxteis, fotografia, lasers, entre outros. Na agricultura, a fonte de contaminação são os fertilizantes fosfatados,
os quais interferem no pH do solo, aumentando sua disponibilidade (PIERANGELI et al.,2004) e conseqüentemente a concentração do metal nos produtos agrícolas.
Os metais pesados talvez sejam os agentes tóxicos mais conhecidos pelo homem; há aproximadamente
2000 anos a.C. grandes quantidades de chumbo eram
obtidas como subproduto da fusão da prata, dando início à sua utilização.
x Cobre (Cu) – Considerado um dos elementos
essenciais mais importantes para as plantas e animais.
Os usos principais são na produção de fios e de suas
ligas, bronze e latão. As minas para extração de cobre
produzem um grande impacto ambiental, disponibilizando
outros metais pesados como manganês e arsênico, os
quais possuem potencial carcinogênico (BIDONE et al.,
2001). Estudos recentes com peixes demonstram que seu
acúmulo nas brânquias leva a alterações na atividade de
proteínas responsáveis por trocas iônicas e em alterações em fatores bioquímicos modificando o funcionamento deste organismo (MONTEIRO et al., 2005).
Embora amplamente utilizado, o termo metal pesa-
x Chumbo (Pb) – O liberado no ambiente possui
3.2 Metais Pesados
68
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
maior tempo de residência comparado com a maioria dos
poluentes; tende a se acumular nos solos e sedimentos.
O chumbo pode se encontrar em dois estados de oxidação, Pb (II) e Pb (IV), que são estáveis, mas no ambiente
o elemento predominante é o chumbo bivalente.
cimento”, publicado em 1972 e posteriormente apresentado na 1ª Conferência Sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo, também em 1972, a qual foi organizada diante de
uma série de denúncias referentes ao uso indiscriminado
dos recursos naturais.
x Cromo (Cr) – Pode ser introduzido no ambiente
através de deposições de origem industrial, como
curtumes e siderurgia. Na natureza, o cromo ocorre tanto
na forma trivalente como na forma hexavalente. Por ser
mais solúvel , o cromo hexavalente apresenta maior
toxicidade do que na forma trivalente. Diversos estudos
evidenciam seus efeitos tóxicos em organismos e plantas. Na soja, sua ação reduz absorção de nutrientes e
fixação de nitrogênio por bactérias aderidas a suas raízes.
(CASTILHOS et al., 2001)
Em 1973 surge o conceito de ecodesenvolvimento,
o qual considerava potencialidades locais, a diversidade
de situações e diferentes caminhos para o desenvolvimento de base sustentada, entretanto necessariamente
atrelado a políticas de redistribuição de renda e de avaliação dos impactos das políticas de países desenvolvidos nos países em desenvolvimento (SACHS, 1986).
Mercúrio (Hg) – O emprego de compostos
mercuriais durante décadas na agricultura e seu uso para
fins industriais resultaram no aumento significativo da
contaminação ambiental. Grande parte desse mercúrio
entra no ambiente como Hg (II) ou elemental Hg (0); a
partir desse estado pode ser metilado por caminhos
bióticos e abióticos, formando metilmercúrio, a qual é
sua forma mais tóxica e acumulativa.
4. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Sabemos que os processos ecológicos sustentam a função dos ecosssistemas e que os aspectos mais
importantes são o direcionamento da energia e reciclagem
contínua de materiais.
Quando os processos naturais são rompidos, os
ecossistemas podem não ser mais capazes de se manterem
a si próprios. Sendo assim, manter uma biosfera sustentável requer que conservemos os processos ecológicos;
contudo, o que ocorreu no último século foi uma vasta
interferência nesses sistemas onde, segundo Ricklefs
(2003), as habilidades tecnológicas avançaram muito rapidamente para que a natureza se mantivesse em equilíbrio.
Esses níveis de degradação começaram a causar
impactos negativos significantes, comprometendo processos industriais pela escassez de recursos naturais e a saúde
humana devido à contaminação do solo, do ar e da água.
A partir desses eventos surgiram movimentos que
deram origem ao conceito de desenvolvimento sustentável. Em 1968 surge uma organização informal, o Clube
de Roma, formado por cientistas, educadores, economistas, humanistas, industriais e funcionários públicos de
dez países, o qual tinha em mente obter uma visão mais
clara dos limites do sistema mundial e seu comportamento a longo prazo. O primeiro documento que formalizou
estas discussões foi então o estudo dos “Limites do CresRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
O termo desenvolvimento sustentável foi usado
pela primeira vez em 1987 quando a ONU publica o relatório de Brundtland, proposto pela ‘Comissão Mundial do
Desenvolvimento e Meio Ambiente’. Essa comissão foi
formada em 1984, tendo como coordenadora a primeiraministra da Noruega, Gro Halem Brundtland. A comissão
definiu em seu relatório final o conceito de desenvolvimento sustentável: “Atender às necessidades da geração presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras de atenderem suas próprias necessidades.”
Mediante as primeiras discussões ambientais e a
clara necessidade de se atrelar economia, política, sociedade e meio ambiente, seguiram-se várias conferências
mundiais. Entre elas destaca-se a ECO 92, no Rio de Janeiro, tendo como principal resultado a Agenda 21 que
propõe que os diversos países do mundo tomem medidas para garantir a sustentabilidade das atividades humanas. Trata de transformações culturais e de valores,
estimulando a adoção de padrões de consumo e produção, visando a proteção do meio ambiente e ainda propõe soluções e estima custos de investimento.
Em 1997 foi realizado o Rio + 5, evento que tinha
como objetivo fazer um balanço dos cinco anos decorrentes do Rio 92, infelizmente se evidenciou que pouco
havia sido feito de fato para colocar em prática as resoluções da última conferência pela maioria dos países participantes, entre eles o Brasil.
Posteriormente foi realizada em Johannesburgo a
Rio + 10, em 2002, na qual foram detalhados objetivos
dentro dos princípios já conhecidos. Destaca-se pela
primeira vez os problemas associados à globalização, pois
os benefícios e os custos a ela associados estão distribuídos desigualmente com o risco de a pobreza gerar
desconfiança nos sistemas democráticos, o que poderia
provocar o surgimento de sistemas ditatoriais.
Um aspecto relevante é que a democratização de
todos estes debates envolve a contraposição de interesses de diferentes países e de distintas camadas da soci69
edade, sendo interessante salientar que o estudos levam
a um plano político mundial, talvez impraticável, a ser
desenvolvido pela ONU.
químicas (xenobióticos) de origem antrópica e como agem
sobre os ecossistemas, sua biota e suas inter-relações
(AZEVEDO; CHASIN, 2003).
O Brasil, que efetivamente participou das conferências mundiais, agora é sede para várias discussões,
as quais abordam as definições sobre desenvolvimento
sustentável descrito pelos orgãos da ONU com certa desaprovação. Segundo Diegues (1992): “ se baseiam na
necessidade de se atingir o grau de desenvolvimento
atingido pelas sociedades industrializadas e está cada
vez mais claro que o estilo de desenvolvimento dessas
sociedades, baseado num concurso exorbitante de energia, artificialmente barata e intensiva em recursos naturais (...) é igualmente insustentável a médio e longo
prazo.”
A ecotoxicologia desenvolve pesquisas que focalizam degradação ambiental, saúde pública e preservação de recursos naturais; o meio científico tem buscado
progressivamente maior conhecimento de sistemas naturais, dos seus constituíntes, mecanismos de funcionamento e comportamento diante de inúmeros
contaminanates, oferecendo recursos para estabelecer
estratégias de proteção e gestão ambiental
Mais recentemente, em março de 2006, foi realizada no Brasil a COP8, “Oitava Conferência das Partes da
Convenção sobre Diversidade Biológica”, sendo o órgão supremo decisório no âmbito da Convenção sobre
Diversidade Biológica (CDB).
Um dos resultados dos debates, que duraram duas
semanas, foi a definição de uma data limite, até 2010, para
a criação de regras internacionais para repartição dos
lucros oriundos dos recursos genéticos e de conhecimento de populações tradicionais, tema muito polêmico
já que implica que os países ricos paguem pelo que já
estão usufruindo.
A CDB parte do pressuposto de que a
biodiversidade deve ser uma preocupação comum da
humanidade, entretanto se observa que existe uma certa
cautela nos tratados sobre meio ambiente em relação ao
fato de países do primeiro mundo assumirem sua parcela
de responsabilidade no subdesenvolvimento de alguns
países mais pobres, os que foram outrora explorados para
atender suas necessidades, permitindo que assumissem
o status atual de primeiro mundo.
Já no Brasil estão sendo trilhados caminhos para
o conhecimento da sua biodiversidade com a elaboração
de inventários, quando será possível atingir os objetivos da CDB, tarefa a qual é de grande urgência, tendo em
vista a velocidade da degração do nosso ambiente.
5. ECOTOXICOLOGIA
Como ferramenta para a preservação da
biodiversidade surge a ecotoxicologia. Em 1969, o professor francês René Truhaut institui o termo
Ecotoxicologia, do grego oîkos (domicílio, habitat, meio
ambiente: ecologia) e a palavra toxicologia (ciência dos
agentes tóxicos, dos venenos ), para definir a ciência que
trata dos efeitos deletérios promovidos por substâncias
70
A expressão da ecotoxicidade de uma substância
química depende das características da exposição e de
seu comportamento nos sistemas biológicos. Além das
propriedades físico-químicas das substâncias, deve-se
considerar a magnitude, a duração, as vias de introdução
e a suscetibilidade dos organismos, estando esta última
diretamente interligada aos processos toxicocinéticos e
toxicodinâmicos.
Dentro da ecotoxicologia, tanto o ecossitema aquático quanto os sedimentos são os compartimentos de
destaque nas análises ambientais. Os ecossistemas aquáticos são possivelmente os sistemas naturais que mais
receberam a descarga das atividades antrópicas nas últimas décadas, e os sedimentos têm papel importante tanto na acumulação como na liberação de substâncias tóxicas para o meio aquático.
A deposição de sedimentos depende de uma série
de fatores ambientais que influenciam a composição química dos sedimentos, com reflexo no teor de nutrientes e,
conseqüentemente, na biota, levando em conta que há
intensas trocas entre sedimentos e coluna d’água. Os compostos indicadores de contaminação ambiental encontrados no sedimento podem ser orgânicos, como inseticidas
e herbicidas, ou inorgânicos, como metais pesados.
Estudos recentes na bacia do Médio Tietê Superior resaltam a importância da relação água-sedimento na
contaminação do meio, levando em consideração, não
somente as substâncias dissolvidas, mas a presença de
contaminantes biodisponíveis no sedimento, uma vez que
este pode representar o verdadeiro potencial tóxico do
sistema (ESPÍNDOLA et al.,2000). Outros significativos
estudos que têm como protagonista o sedimento poderão classificar ambientes de acordo com seu nível de contaminação e biodisponibilidade de metais pesados, como
o mercúrio, metal nocivo que sofre biomagnificação dentro da cadeia trófica (SIQUEIRA et al., 2005), e ainda
como indicadores de atividades antrópicas irresponsáveis, como exemplo a detecção de mercúrio na região
amazônica do Brasil (MASCARENHAS et al., 2004), por
ação do garimpo.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Para o monitoramento e avaliação de impactos
ambientais em ecossistema aquáticos são realizadas medições de alterações nas variavéis físicas e químicas, juntamente com variáveis microbiológicas, os coliformes
totais e fecais. São ferramentas de indiscutível valor na
classificação e enquadramento de rios e córregos em classes de qualidade de água, mas que fornecem parâmetros
momentâneos de uma situação que é dinâmica
(WHITFIELD, 2001), além disso o monitoramento físico
e químico não é muito eficiente na determinação de alterações nas comunidades biológicas.
verdadeiro lugar dentro dos sistemas naturais, pois fazemos parte deles e do seu funcionamento. Historicamente, avaliações de impacto ambiental têm se concentrado
nos efeitos na saúde humana, entretanto podem causar
riscos severos às demais comunidades biológicas.
Atualmente, um dos desafios da ecotoxicologia é
determinar organismos representativos do ecossistema
como indicadores de contaminação. Os bioindicadores
são definidos como organismos ou comunidades que
respondem à poluição ambiental, alterando suas funções
vitais ou acumulando toxinas, eventos que modificam a
dinâmica das populações.
AZEVEDO, F. A.; CHASIN, A. A. M. As bases
toxicológicas da ecotoxicologia. São Carlos: Rima, 2003.
No entanto, as populações em um sistema natural
refletem a integridade ecológica total dos ecossistemas,
integrando efeitos dos diferentes agentes impactantes,
em que cada tipo de organismo apresenta seu limite de
tolerância a contaminantes, sendo a perda de espécies
sensíveis e crescimento da população tolerante uma indicação de contaminação.
Principais organismos comumente utilizados na
avaliação de contaminação em ecossistemas aquáticos
são os macroinvertebrados bentônicos, peixes e comunidade perifítica (GOURLART; CALLISTO,2003); a utilização de macrovertebrados bentônicos em estudo de
impacto ambiental ainda é incipiente no Brasil, entretanto é amplamente utilizado em outros países da Europa e
nos Estados Unidos.
A ecotoxicologia realiza uma importante tarefa, a
avaliação do risco ambiental, o qual é uma união entre a
ciência do ambiente e a administração do risco, esta deve
prover suficiente informação para decisões que venham
a proporcionar a proteção do meio ambiente.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento sustentável pode ser
ententido como melhoria das condições de existência dos
povos, com a utilização consciente de recursos naturais.
Sendo assim, o monitoramento ambiental, a diminuição
de descarga de xenobióticos no ambiente e os estudos
ecotoxicológicos funcionam como uma ferramenta fundamental da sociedade para desenvolver planos de recuperação de ecossistemas degradados e a conservação
da biodiversidade.
Deve-se em primeiro lugar refletir sobre nosso
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
7. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
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72
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
O Meio Ambiente e o Ambiente da Vida: a história
ecológica no aperfeiçoamento e formação de professores
em projetos interdisciplinares
Celenrozi Zaroni dos Santos *
Valéria Zanetti de Almeida **
Resumo: A interdisciplinaridade na escola tem motivado novas propostas de ensino e de currículo,
baseada na inter-relação entre os diversos ramos do conhecimento. Os novos parâmetros curriculares
incluem o assunto meio ambiente como forma de expressar conceitos e valores fundamentais à
democracia e à cidadania. Esse tema, assim como Ética, Saúde, Pluralidade cultural e Orientação
sexual, corresponde a questões importantes e urgentes para a sociedade brasileira de hoje, presentes sob várias formas na vida cotidiana. Através do estudo do meio ambiente, o aluno consegue
compreender as noções básicas sobre o tema, perceber relações que condicionam a vida para
posicionar-se de forma crítica diante do mundo, dominar métodos de manejo e conservação
ambiental. Lançando mão da micro e macrorrelações, propõe-se discutir a história ecológica,
relatando a ação do homem no meio ambiente a partir dos primeiros habitantes da América, da
colonização européia e dos períodos econômicos do Brasil – cana-de-açúcar, extração de ouro,
café, chegando aos principais produtos agrícolas da atualidade. Este é um trabalho que deverá
caber, especialmente, aos educadores que querem fazer a diferença na educação do Brasil. O tema
foi trabalhado com 83 professores da rede pública e com 46 alunos de graduação de Ciências
Biológicas e Matemática.
Palavras-chave: Educação, história, meio ambiente.
Abstract: Interdisciplinarity at school has motivated new conceptions of teaching and curriculum
based on the interrelation among several fields of knowledge. The new curriculum parameters
include environment subject to express fundamental concepts and values to democracy and
citizenship. This theme, as well as ethics, health, cultural plurality and sexual orientation, corresponds
to important and urgent questions to the contemporary Brazilian society which are present in daily
life under various forms. Studying the environment, the student understands its basic notions, perceive
life relations so as to position himself before the world in a critical way, master managing methods
and environmental conservation. Considering the micro and macro relations, it is proposed to
discuss the ecology history, describing the anthropic action on the environment from the America’s
first inhabitants, through European colonization and over the Brazilian economic cycles – sugar
cane, gold exploration, coffee, getting to the main modern agricultural products. This paper is
suitable especially for teachers who want to make a difference on educational fields in Brazil. The
theme was discussed with 83 teachers from public schools and 46 undergraduate students from
Biology and Mathematic courses.
Key words: Education, history, environment.
1. INTRODUÇÃO
O Brasil, além de ser um dos maiores países do
mundo em extensão, possui inúmeros recursos naturais
*
Mestranda em Planejamento Urbano e Regional PLUR, UNIVAP, 2006.
** Professora da UNIVAP.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
de fundamental importância para todo o planeta. Suas
florestas tropicais, seu pantanal, seu cerrado, seus mangues e suas restingas representam importantes
ecossistemas. Possui uma grande parte da água doce
disponível para o consumo humano e é detentor de uma
das maiores biodiversidades do mundo.
Como forma de entender a natureza e a forma como
o homem se apropria dela, é preciso compreender a evo73
lução do pensamento humano. O trabalho tem por objetivo expor a necessidade de estudarmos a história
ambiental do Brasil, buscando compreender a origem e a
evolução de algumas dinâmicas predatórias que vêm marcando a economia brasileira desde os seus primórdios.
Conhecê-las em profundidade é importante para termos
esperança de transformá-las.
A história ecológica é uma abordagem nova de
conteúdo sugerida pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). São ainda tímidas as investidas dos professores das diferentes áreas com o tema em sala de aula. A
atuação como docente no Programa de Capacitação de
Professores da rede Estadual deu-nos possibilidade de
relacionar o tema Meio Ambiente com as outras áreas do
conhecimento, elaborando um projeto interdisciplinar. A
proposta foi trabalhada com os professores de História,
Geografia, Matemática e Biologia na “Teia do Saber” da
Rede Pública do Estado de São Paulo e com os alunos da
graduação dos cursos de Ciências Biológicas, Geografia, História e Matemática na Faculdade de Educação da
Universidade do Vale do Paraíba.
O projeto tentou dar ao professor uma base histórica para conscientizar os alunos dos problemas ambientais
e dicas para trabalhar o tema nas escolas de ensino fundamental e médio, de forma interdisciplinar. Visando a
transversalidade, pretendia-se romper com a idéia que o
estudo do Meio ambiente deveria ser responsabilidade
única e exclusiva do professor de Ciências ou Biologia.
Segundo Caldeira (2001), existem poucos trabalhos no campo da Educação Matemática discutindo questões de ordem educacional prática ou teórica, em que se
envolvam trabalhos quantificando fenômenos relacionados ao meio ambiente e que sirva como um referencial
para a formação do professor da área.
O professor, importante agente da transformação
social, conhecendo os problemas ambientais de forma
histórica e atual, contribuirá, sobremaneira, para as pequenas ações, a partir da própria escola, do bairro e até,
quem sabe, num plano mais abrangente e eficaz, o pensar
globa/agir local proposto na Agenda 21.
2. MEIO AMBIENTE E A TRANSVERSALIDADE DO
TEMA
A interdisciplinaridade refere-se a uma nova concepção de ensino e de currículo baseada na
interdependência entre os diversos ramos do conhecimento. A proposta interdisciplinar busca um novo
paradigma, mais dinâmico e compatível com o avanço
acelerado da Ciência e da Tecnologia.
Segundo Andrade (2005), essa proposta, definida
74
como construtivista, vem ao encontro da necessidade
de reformulação curricular nas escolas. De acordo com a
teoria construtivista, o ser humano nasce com potencial
para aprender. E este potencial - esta capacidade - só se
desenvolverá na interação com o mundo, na experimentação com o objeto de conhecimento, na reflexão sobre a
ação. A aprendizagem conforme metodologia
construtivista, se organiza, se estrutura num processo
dialético de interlocução.
Andrade (2005)ainda afirma que a qualidade da
educação, grande preocupação atual dos administradores escolares, será alcançada via gestão participativa,
criação de trabalho de equipe (parceria, cooperação) e
adaptação para currículo interdisciplinar, mecanismos que
superam o modelo individualista, fragmentado e
centralizador de administração e de produção do saber.
Um dos caminhos à operacionalização do currículo
interdisciplinar é, pois, a administração e metodologia
participativas.
Uma prática escolar interdisciplinar tem algumas
características que podem ser apontadas como fundamentais para uma transformação curricular e que exigem
mudanças de atitude, procedimento e postura por parte
dos educadores. Os Parâmetros Curriculares Educacionais preconizam que a nova ação pedagógica deverá,
segundo Andrade (2005):
- perceber-se interdisciplinar, sentir-se “parte do
universo e um universo à parte” (resgatar sua própria
inteireza, sua unidade);
- historicizar e contextualizar os conteúdos (resgatar a memória dos acontecimentos, interessando-se por
suas origens, causas, conseqüências e significações;
aprender a ler jornal e a discutir as notícias);
- valorizar o trabalho em parceria, em equipe
interdisciplinar, integrada (tanto o corpo docente como o
corpo discente), estabelecendo pontos de contato entre
as diversas disciplinas e atividades do currículo;
- desenvolver atitude de busca, de pesquisa, de
transformação, construção, investigação e descoberta;
- definir uma base teórica única como eixo norteador
de todo o trabalho escolar, seja ideológica (que tipo de homem queremos formar?), psicopedagógica (que teoria de
aprendizagem fundamenta o projeto escolar?), ou relacional
(como são as relações interpessoais, a questão do poder, da
autonomia e da centralização decisória na escola?);
- resgatar o sentido do humano, o mais profundo e
significativo eixo da interdisciplinaridade, perguntandose a todo momento: - “o que há de profundamente humaRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
no neste novo conteúdo?” ou - “em que este conteúdo
contribui para que os alunos se tornem mais humanos?”.
- trabalhar com a pedagogia de projetos, que elimina a artificialidade da escola, aproximando-a da vida
real e estimula a iniciativa, a criatividade, a cooperação e
a co-responsabilidade.
Desenvolver projetos interdisciplinares na escola é, seguramente, a melhor maneira de garantir a
integração de conteúdos pretendida pelas novas propostas curriculares. Um projeto surge de uma situação,
de uma necessidade sentida pela própria turma e consta
de um conjunto de tarefas planejadas e empreendidas
espontaneamente pelo grupo, em torno de um objetivo
comum (ANDRADE, 2005).
Para Jolibert (1994), “a pedagogia de projetos permite viver numa escola alicerçada no real, aberta a múltiplas relações com o exterior: nela a criança trabalha “pra
valer” e dispõe dos meios para afirmar-se como agente
de seus aprendizados, produzindo algo que tem sentido
e unidade.” Realiza-se, assim, a proposta da
interdisciplinaridade de buscar o sentido e a unidade do
conhecimento e do ser.
A transversalidade do tema meio ambiente, segundo os Parâmetros em Ação (2001), tem dois significados.
De um lado, deve ser algo externo ao universo escolar,
com um recorte próprio, sem se circunscrever a uma área
específica de saber, contribuindo assim com abordagens
novas de conteúdos – como, por exemplo, uma visão mais
complexa do meio ambiente. Ao mesmo tempo, deve estar
presente nos conteúdos das disciplinas e nos procedimentos e atitudes do convívio escolar. A idéia-chave dos
temas transversais é re-significar o que se ensina, aproximando da realidade. Essa constatação é fundamental para
integrar a questão ambiental no universo escolar.
Os modelos e a linguagem da Matemática, por
exemplo, auxiliam a compreender a realidade em seus diversos aspectos, assim como boa parte das formas do
meio ambiente e de seu funcionamento. Seus instrumentos permitem que sejam revelados e identificados padrões
e dinâmicas universais, conhecimentos essenciais para
orientar nossas intervenções no meio ambiente. Podem
ser desenvolvidos pelos alunos trabalhos matemáticos
sobre a dinâmica das florestas e das águas, a multiplicação e desaparição de espécies e da biodiversidade, as
formas da natureza, e trabalhos analisando a expansão
urbana e as áreas desmatadas (PCN EM AÇÃO, 2001).
Segundo Caldeira (2001), quantificar os fenômenos ambientais deixa a Matemática aquém daquilo que
ela deve ser, mas aprender Matemática usando como
“pano de fundo as questões ambientais faz muito mais
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do que fornecer aos estudantes instrumentos e ferramentas para a compreensão do fenômeno. Aprender a
usar a Matemática no seu cotidiano faz com que o estudante perceba, entre outras coisas, seu verdadeiro papel
como cidadão e transformador social”.
A história ecológica aparece como ferramenta importante do professor para a qualificação, não só dos
fenômenos da natureza, mas também da natureza do homem frente aos problemas ambientais enfrentados hoje,
no ambiente da escola ou fora dela.
3. HISTÓRIA ECOLÓGICA GLOBAL
Antes de conhecer a história ecológica do Brasil
e os fatos que foram marcantes para o meio ambiente
desde a colonização, temos de conhecer um pouco da
história ecológica global e o espaço geográfico das sociedades indígenas que ocuparam o território da América
no período pré-colombiano e que já interagiam com a
natureza no Brasil.
A rica biodiversidade da ecologia tropical do Brasil e suas paisagens foram alteradas muito mais recentemente e muito menos do que as dos biomas do “velho
mundo”. Nesse sentido, o território brasileiro é mais “rústico”, mais “selvagem”, exibindo marcas humanas muito
mais leves. Ou seja, ele ainda está por sofrer intervenções humanas de profundidade e duração comparáveis
às que ocorreram no “velho mundo”, visto que o Brasil é
considerado um país em desenvolvimento, onde o processo de urbanização e do consumo de matérias primas
estão em franco crescimento (DRUMMOND, 2002).
A ocupação do território brasileiro se deu sob os
regimes de comunidades de caçadores-coletores nômades ou de pequenas aldeias semipermanentes de
policultores tropicais. Isso contrasta com o regime de
civilizações complexas (com agricultura intensiva, animais domesticados, divisão social do trabalho, classes
sociais especializadas, cidades permanentes, estado centralizado, religiões organizadas etc.). Embora no continente americano existissem também civilizações assemelhadas a essas sediados nos territórios atuais do México
e do Peru ou em partes da Amazônia, esse regime não
predominou no conjunto do território brasileiro.
Uma boa parte dos povos remanescentes de caçadores-coletores e policultores que praticam ou ainda
são influenciados pelos estilos de vida “tradicionais”,
de baixo impacto sobre o mundo natural, vivem ou viveram no Brasil. Não se trata da natureza brasileira ser
“intocada”, mas sim de ela ser “tocada” há menos tempo,
e de forma mais “leve” (DRUMMOND, 2002).
Segundo Drummond (2002), a ocupação do terri75
tório do Brasil começou com migrantes vindos da Ásia e
da Oceania há cerca de 12 mil anos (trabalhos mais recentes data a ocupação do território nacional em torno de 16
mil anos) e encontraram um continente vasto, ecologicamente diversificado e cujos processos biológicos vinham
evoluindo sem intervenção humana. A natureza, antes
desse período, estava longe de ser estática. Havia
interação entre as plantas e animais. Ecossistemas e paisagens mudaram ao sabor de mudanças climáticas, extinguiram-se algumas espécies e surgiram novas”.
Os primeiros habitantes da América eram descendentes dos caçadores-coletores. Após um certo período,
começaram a ser formadas as primeiras aldeias agrícolas.
Na América do Norte, elas evoluíram a estados agrícolas.
Como exemplo, podemos citar a civilização Maia na
Guatemala. No Brasil, os indígenas formaram várias aldeias agrícolas e assim viveram até a chegada dos portugueses (DRUMMOND, 2002).
Estamos, portanto, em um outro momento histórico. Momento em que o pensamento moderno, com base
na observação das conseqüências históricas da devastação ambiental, nos dá o direito de questionar milênios
de cultura humana dominante e afirmar, subversivamente que tomar as florestas como uma sombra a ser destruída
é o caminho do colapso. O caminho da sobrevivência, ao
contrário, deve ser o de considerar as florestas como
nossas vizinhas e supridoras. Em outras palavras, ao invés de vê-las como uma franja de escuridão ao nosso
redor, aprender a reconhecê-las como nosso colchão
benéfico e imprescindível de inspiração, sustento e garantia de vida (PÁDUA, 2005).
4. HISTÓRIA ECOLÓGICA DO BRASIL E OS 500
ANOS DE DESTRUIÇÃO
A descrição do Brasil feita por Pero Vaz de Caminha, em 1500, comprova uma paisagem diferenciada daquela da conquista da terra. Os 500 anos da história do
Brasil foram marcados pela destruição. No campo
ambiental, a área desmatada dos três maiores biomas,
Amazônia, Mata Atlântica e Cerrado, soma, no total, 2,7
milhões de km2, ou seja, 31,7% do território nacional e 62
vezes a superfície do Estado do Rio. Imagine a bandeira
brasileira sem um terço de seu verde (PÁDUA, 2004).
A convivência com a Mata Atlântica, sem dúvida,
marcou a formação da economia e da sociedade coloniais
desde os seus primeiros momentos. No começo do século
XVI, quando os europeus chegaram pela primeira vez ao
nosso território, o tamanho da massa verde que cobria o
litoral do nordeste ao sul do país, podendo penetrar de
cem a quinhentos quilômetros no interior, devia estar em
torno de 130 milhões de hectares (PÁDUA, 2004).
76
A agricultura é um dos principais responsáveis
pelo desmatamento. O problema está na forma que se
exerce a agricultura. Os mitos da época da colonização
ainda persistem. São eles: “Nessa terra, em se plantando
tudo dá”, “a natureza é inesgotável, e não é preciso adaptar tecnologia à natureza” (PÁDUA, 2004).
Segundo Feijão Teixeira (2001), o processo de
ocupação territorial e a incorporação de novas áreas ao
processo produtivo agrícola no Brasil, ao longo dos anos,
foram feitos sem preocupação ambiental. A expansão da
fronteira agrícola caracterizou-se pela redução da
biodiversidade e por outros impactos sobre os recursos
ambientais, principalmente sobre o solo e a água.
Os períodos econômicos do Brasil Colônia são exemplos da exploração predatória dos recursos naturais. Grandes extensões de Mata Atlântica foram destruídas para
abrir espaço para os canaviais. Calcula-se que, para cada
quilo de açúcar produzido no Brasil, queimou-se cerca de
15 quilos de lenha. A atividade econômica do século XVIII
foi dominada pela mineração do ouro e dos diamantes, de
forma também predatória. Encostas foram desmatadas, rios
foram dragados e seus cursos desviados. Pelo menos 100
toneladas de mercúrio foram utilizadas na extração do ouro
em Minas Gerais (PÁDUA, 2005).
Para Pádua (2004), a idéia de que a Mata Atlântica
era vista como um estorvo vinha da imagem difundida
em 1711 pelo jesuíta André João Antonil, em Cultura e
opulência do Brasil por suas drogas e minas. Na obra
de Antonil, a floresta surge de forma indireta como um
grande obstáculo: “feita a escolha da melhor terra para a
cana, roça-se, queima-se, limpa-se, tirando-lhe tudo o que
podia servir de obstáculo”. Segundo Dean (1996) a lavoura, vista pelos nativos como complemento de uma
dieta alimentar, significava, para os jesuítas, “a identificação com o cristianismo” pois eliminava a floresta e, em
conjunto, qualquer vestígio cultural da política dos pajés e feiticeiros.
De todos os produtos coloniais, isto é, aqueles plantados para render um excelente exportável para a metrópole
– o mais valioso e viável era a cana-de-açúcar. Cultivada há
séculos na Índia e plantada em todo o Mediterrâneo, foi um
importante produto de exportação dos portugueses para os
mercados do norte da Europa (DEAN, 1996).
Em suas colônias dos Açores e Madeira, Portugal
já possuía uma pequena produção de açúcar, embora lucrativa que, no entanto, não atendia mais um mercado consumidor em franco crescimento. As condições propícias
para efetivar o plantio na terra dos brasis possibilitaram a
exploração sistemática do solo, dando início à monocultura
em larga escala. Embora a cana tivesse de ser adubada na
Madeira e Açores e São Tomé, isso era desnecessário no
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Brasil, onde, em certos lugares, a cana podia ser cortada
ano após ano sem replantio (ASSUNÇÃO, 2000).
Josué de Castro (apud DEAN, 1996) em Geografia
da Fome, traça o retrato violento da cana-de-açúcar: “Já
afirmou alguém, com muita razão, que o cultivo da canade-açúcar se processa em regime de autofagia: a cana devorando tudo em torno de si, engolindo terras e mais terras, dissolvendo o húmus do solo, aniquilando as pequenas culturas indefesas e o próprio capital humano, do qual
a sua cultura tira toda a vida”. A conservação dos recursos naturais iria mostrar-se irrelevante em uma sociedade
na qual a conservação da vida humana era irrelevante.
O ouro e o diamante brasileiros, no século XVIII,
foram as mais importantes riquezas do novo mundo colonial. De 1700 a 1800, 1 milhão de quilos de ouro foram
oficialmente registrados a caminho da Metrópole e talvez outro milhão tenha escapado ao fisco real. Cerca de
2,4 milhões de quilates de diamantes foram extraídos.
Segundo registros oficiais, uma quantia adicional desconhecida e incalculável foi contrabandeada (DEAN, 1996).
O efeito desse tipo de mineração foi o de substituir a floresta por terras com pântanos esburacados. O
botânico francês Auguste de Saint-Hilaire, quando atravessou a estrada ao norte de Ouro Preto, na segunda
década do século XIX, relatava que “por todos os lados,
tínhamos sob os olhos os vestígios aflitivos das lavagens, vastas extensões de terra revolvida e montes de
cascalho.” (DEAN, 1996).
O desnudamento das encostas provocou erosão de
camadas de terra, gerando gigantescos sulcos chamados
voçorocas, assoreamento de leitos de riachos e enchentes
que ainda ocorrem na região de forma generalizada que parecem características naturais da paisagem (DEAN, 1996).
O volume total de ouro obtido durante o século
XVIII teria revirado 4 mil km2 da região de Mata Atlântica.
Isso sugere a destruição de cerca de 20% da faixa aurífera
que se estendia por 450 quilômetros entre Diamantina e
Lavras. O crescimento da floresta secundária nas áreas
de garimpo e de queimada tendia a enfraquecer.
Segundo Dean (1996), a modificação e a remoção
exploratória, hidráulica e manual da superfície dos solos
das florestas sugerem que o empreendimento minerador
do século XVIII exigiu muito mais da Mata Atlântica que
os primeiros dois séculos de lavoura de subsistência com
as plantações de trigo e cana-de-açúcar. A degradação
de grande parte do solo das áreas derrubadas estava
ocorrendo a tal ponto que a vegetação que renascia carecia de muitas das espécies que teriam reconstituído, na
ausência de interferência humana.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Surgiram críticas à agricultura de corte e queima,
técnicas fáceis e baratas de avançar na agricultura; tais
técnicas são utilizadas até hoje. Rodrigo de Souza
Coutinho, ministro da Marinha e do Ultramar, entre 1796
e 1801, compartilhou a tese de que era preciso evitar a
devastação das florestas brasileiras. Neste período, Sousa
Coutinho teve a iniciativa de enviar cartas régias para os
governadores de algumas capitanias brasileiras estabelecendo normas para o uso das florestas litorâneas. O
alvo principal das cartas, assinadas pela rainha, era “a
indiscreta e desordenada ambição dos habitantes que,
com pretexto das suas lavouras, têm assolado e destruído
preciosas matas a ferro e fogo” (PÁDUA, 2004).
A partir de então, todas as matas e árvores localizados ao longo da costa marítima, ou nas margens dos
rios navegáveis que desembocassem no mar, eram propriedade exclusiva da Coroa.
Segundo Pádua (2002), a história da defesa da
Mata Atlântica no Brasil colônia não terminou neste episódio. Outras vozes tentaram defender nossas matas como
a de Baltasar da Silva Lisboa e José Bonifácio que chegou a propor um modelo de desenvolvimento sustentável moderno até para os dias de hoje, com base na reforma agrária, beneficiando os índios e os negros libertos.
José Bonifácio com uma mirada visionária de historiador
ambiental percebeu claramente que a decadência
civilizatória do antigamente poderoso Oriente Médio não
podia ser divorciada da degradação de suas condições
ambientais. Afirmou, em um texto de 1815 que: “todos os
que conhecem por estudo a grande influência dos bosques e arvoredos na economia geral da natureza sabem
que os países que perderam suas matas estão quase de
todo estéreis e sem gente. Assim sucedeu à Síria, Fenícia,
Palestina, Chipre, e outras terras, e vai sucedendo ao
nosso Portugal”. A destruição florestal ameaçava transformar o nosso território, segundo Bonifácio, em algo
semelhante aos “páramos e desertos áridos da Líbia”
(PÁDUA, 2004).
Depois da emancipação política em 7 de setembro
de 1822, nossa situação econômica parecia complicada
pela dívida externa. Foi-se o ouro...Muitas vilas
mineradoras entraram em decadência, e seus moradores
voltaram à floresta para reassumir a lavoura da derrubada e queimada. Nas primeiras décadas do império, surge
uma nova cultura que se tornaria a base da economia
exportadora do Rio de Janeiro – o café, até então desprezado pelos funcionários da coroa, mas que já agradava
aos paladares dos europeus.
Tal como o século XVIII havia sido, para o Brasil,
o século do ouro, o século XIX seria o século do café.
Para a Mata Atlântica, entretanto, a introdução dessa
planta exótica significaria uma ameaça mais intensa que
77
qualquer outro evento dos trezentos anos anteriores. Em
contrapartida, a erva foi a salvação da aristocracia colonial e da corte imperial que cambaleava. (DEAN, 1996).
O café foi inicialmente plantado no litoral do Rio de
Janeiro. No entanto, os ventos salinos acabaram empurrando as plantações de café para o planalto um pouco
mais fresco e depois para o Vale do Paraíba. O cultivo do
café exige solos que não sejam encharcados nem secos;
dessa forma, o plantio deveria ser feito em encostas íngremes. Àquela época, acreditava-se que o café deveria ser
plantado em solo coberto por floresta “virgem”. As antigas zonas cafeeiras não eram replantadas e novas faixas
de floresta primária eram então constantemente limpas para
manter a produção. O café avançou pelas terras altas, de
geração em geração, nada deixando em seu rastro além de
montanhas desnudadas (DEAN, 1996).
Lacerda Werneck, um dos maiores plantadores de
café do Rio de Janeiro, criou um manual dos agricultores
apresentando reflexões sobre a prática dos fazendeiros
mais representativos. Nesse manual, aconselhava-se
observar as encostas dos montes na primavera, quando
muitas árvores da floresta estão em flor. Onde se visse o
Jacarandatã e outras dezesseis espécies determinadas
(encontradas somente na floresta primária), a terra era de
boa qualidade (DEAN, 1996).
Novamente o fogo foi usado como forma de limpar
o terreno para o plantio do café. Os incêndios de muitas
clareiras elevavam imensas nuvens cinzentas de fumaça.
Dean (1996) comenta que o Vale do Paraíba deve ter parecido infernal ao final das estações secas, com centenas de
fogos espalhados por todos os lados. Segundo o autor, a
fumaça era tanta que uma nuvem amarela pairava sobre a
província durante esses meses, obscurecendo o sol de dia
e apagando as estrela à noite. Muitas espécies podem ter
virado cinzas antes mesmo de serem estudadas e sua importância reconhecida (DEAN, 1996).
Auguste de Saint-Hilaire, que viajou pelas partes
centrais e meridionais do Brasil, achava que a zona ocidental do Vale do Paraíba abrigava a vegetação mais
diversificada que ele vira em todas as suas viagens pela
Mata Atlântica. Esses primeiros investigadores não dispunham do tempo nem de recursos para um completo
estudo das formas de vida que habitavam a Mata nas
regiões destruídas pelo desmatamento. Quase todos se
mantiveram nas mesmas trilhas de mulas; na maioria, evitavam florestas altas.
Entre os botânicos, o brasileiro Francisco Freire Alemão, em ocasião da destruição da floresta, corria de uma
derrubada a outra, para examinar as gigantes abatidas. Infelizmente, segundo consta, mal dava conta de estudar todas
as árvores, quanto mais epífitas e parasitas (DEAN, 1996).
78
No início do século XX, o comércio de café entrou
em crise e muitos fazendeiros abandonaram as plantações,
deixando o Vale do Paraíba empobrecido juntamente com
sua vegetação natural. Um século depois da introdução do
café, Augusto Ruschi, o grande naturalista e ambientalista
do Espírito Santo, lamentava o resultado do cultivo
depredatório: “jamais restabeleceremos o clima e as condições bióticas do solo que possuíamos” (DEAN, 1996).
Reclamava o biólogo que, ainda que fosse do café
“que a vida de nossa gente depende; dele depende um
bom ou mau governo”. Ruschi chamava as características da sociedade pós-colonial como intruso indesejável.
A atrasada forma de tratar a terra, assim como a produção
monocultora, visando lucro imediato, e a ineficiência administrativa do governo brasileiro deram fundamentos
para que Ruschi comentasse que “o feito está consumado e nenhum traço da floresta restou sobre os morros
secos e amarelados do Vale do Paraíba” (DEAN, 1996).
A queimada da floresta para produção cafeeira foi
a principal causa, mas não a única, do desflorestamento
no século XIX. É sabido que o comércio do café induziu
o crescimento demográfico, a urbanização, a industrialização e a implantação de ferrovias.
A política de crescimento industrial no período da
ditadura foi questionada na primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento,
realizada em Estocolmo em 1972. José Sarney contra-argumentava dizendo: “que venha a poluição, desde que as
fábricas venham com ela”.Um representante do governo
na conferência apresentou uma desculpa populista e dissimulada para o problema ambiental. Para ele, “a pior forma
de poluição é a pobreza”, como se um ambiente preservado e saudável fosse sinal de pobreza (DEAN, 1996).
As riquezas do meio ambiente não são vistas
como um produto de crescimento. Na colonização, a floresta era vista como um obstáculo. Hoje, depois de quinhentos anos, a visão dos políticos e agricultores poderosos não mudou muito. Tem-se a idéia de que as florestas são improdutivas, têm baixo valor e pouco contribuem para o desenvolvimento do País.
Estudos recentes mostram que a expansão agrícola e a agropecuária não trazem crescimento econômico às
populações mais pobres como se acreditava. O mito de
que políticas ambientais impedem ou prejudicam o crescimento econômico é um equívoco. Estudos mostram que
as ações que protejam o meio ambiente tendem a melhorar
a qualidade de vida da população (YOUNG, 2004).
Na exploração do novo mundo, a principal vítima,
além dos seus primitivos habitantes, foi a Mata Atlântica. Do período colonial até hoje, a área perdeu 93% de
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
suas florestas que originalmente cobriam 1,3 milhões de
km2 ao longo do litoral. Em áreas como as florestas de
araucária no Sul do País, há apenas 2% da cobertura
original. O Cerrado perdeu 50% ou um milhão de km2, de
sua cobertura original, desde o início de sua ocupação
na década de 1950 (DEAN, 1996).
A Amazônia, nos últimos 25 anos, teve 15% da floresta ou 551.000 km2 destruídos. Com as matas, foram embora também os animais que nelas habitavam. A árvore que foi
o símbolo do País e que lhe deu o nome, o Pau-brasil, é uma
espécie em via de extinção, e, quinhentos anos depois, só é
encontrada em jardins botânicos (PÁDUA, 2005).
Para cada hectare que se pretendia abrir para a
lavoura, de cinco a dez eram destruídos pelo fogo descontrolado. Já no século XX, começaram a ser destruídos
o Cerrado e a Amazônia. O Cerrado, como aconteceu com
a Mata Atlântica, está sendo visto como um embaraço
que deve ser superado. A expansão da fronteira agrícola,
destinada à produção de grãos para a exportação, vem
dizimando este bioma (SUERTEGARAY, 2004).
Segundo Nobre (2004), dos anos 1950 para cá o
mercúrio continua sendo usado nos garimpos. A fronteira agrícola continua em expansão. Existem 30 mil focos
de queimadas por mês no País durante a época da seca e
os desmatamentos nas encostas ainda provocam erosão
e enchentes. As queimadas contribuem em muito para o
aumento do efeito estufa causado pela emissão de gases, principalmente o CO2, produzidos pela queima de
combustíveis fósseis.
Segundo Suertegaray (2004), estudos indicam
que, na Amazônia, a soja e a pecuária induzem as queimadas e o desmatamento, que marca o início de uma desastrosa transformação ambiental. Inclui-se, entre outros
efeitos, processos de exposição do solo, da lavagem superficial com perda de solo, do assoreamento dos rios e,
ainda, dos processos de arenização que podem fazer da
Amazônia um grande deserto.
A expansão do agronegócio (atividade agrícola
em que a produção destina-se basicamente ao mercado
externo), que até os anos 80 concentravam-se nos Estados do Sul, agora se expande às regiões centro-oeste,
oeste da Bahia, sul do Maranhão e Piauí. O cerrado, que
permaneceu por longos anos área de “reserva” para a
expansão agrícola, devido à infertilidade do solo e à escassez de água, pelos efeitos da tecnologia, se tornou
um obstáculo superado (YOUNG; STEFFEN, 2005).
Vários são os problemas ambientais indicados
como associados ao agronegócio. Entre eles:
desmatamentos, perda da biodiversidade, erosão hídrica
(ravinas e voçorocas), formação de areais, assoreamento
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
dos cursos d’água, contaminação do lençol freático,
salinização, perda e envenenamento do solo, esgotamento
potencial dos recursos hídricos (comprometimento dos
mananciais). O elevado investimento degrada, não só o
ambiente, mas também expropria a população de seu
hábitat tradicional, destruindo seus ritos, cultura, representações e formas de produção aliadas à conservação
(SUERTEGARAY, 2004).
A destruição continuou, as lições não foram aprendidas e chegamos, ao século XX, novamente vitimando
as comunidades indígenas com moto-serras e tratores.
Dos 3,5 milhões de índíos que existiam nessas terras resta apenas o equivalente à metade da população de um
bairro como Copacabana. Os Pataxós, que viram Cabral
chegar com suas caravelas em Porto Seguro, há quinhentos anos, até hoje apanham da polícia do homem branco
e arriscam ser queimados vivos quando protestam por
suas terras (PÁDUA, 2005).
Poucos produtores conhecem ou dão valor ao
conhecimento do ambiente específico em que atuam. Isto
já ocorria no século XVI quando os colonizadores não
conheciam a biodiversidade brasileira e introduziram espécies nativas da Europa, menosprezando o conhecimento dos índios Tupi. Segundo Dean (1996), a destruição
de florestas tropicais é irreversível no âmbito de qualquer escala temporal humana. Quando a floresta tropical
é destruída, a perda em danos de diversidade, complexidade e originalidade não é apenas maior que a de outro
ecossistema: é incalculável. É uma tragédia cujas proporções ultrapassam a compreensão ou concepções humanas. As intervenções humanas quase nunca realizam as
expectativas, os resultado são campos empobrecidos,
pastos magros, cidades sem água, homens e animais sem
casa nem comida.
Quais as ações que podemos adotar para reverter
essa situação? Com certeza, investimentos na agricultura familiar, novas tecnologias para uso da água e investimentos que ajudem as populações ribeirinhas e que vivem nas florestas. Yong e Steffen (2005) citam políticas
no Amazonas que aumentaram a renda da população
compatíveis com a sobrevivência da floresta, valorizando financeiramente o uso sustentável da floresta. Isso
incluiu o licenciamento de planos de manejo florestal de
pequena escala e incentivos à extração de produtos nãomadeireiros, como borracha, óleo de andiroba, copaíba e
outras essências, mel, açaí, enfim, uma enorme diversidade de produtos que a floresta proporciona.
Aumentando a renda média dos produtos florestais fica bem mais fácil conter o processo de conversão
para atividades alternativas. Por outro lado, foi feito um
esforço de regularização fundiária, para impedir o
desmatamento como “produtor” de direitos de proprie79
dade. Junto com outras políticas que encaram que preservação florestal não se faz apenas com coerção, com
essas ações a área desmatada caiu de 1.734 km2 para
1.054km2. (YONG; STEFFEN, 2005).
através da Faculdade de Educação, assumiu a responsabilidade de oferecer, no ano de 2004, conforme contrato,
os cursos solicitados pelas Diretorias de Ensino dos municípios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté.
O conhecimento das leis ambientais é um elemento indispensável para a avaliação de diagnósticos
ambientais. Conforme ressaltam os PCNs de Meio Ambiente, “a compreensão da organização administrativa do
poder público (ministérios, secretarias, diretorias, departamentos) também auxilia os alunos a se posicionarem
como cidadãos participativos. Afinal, apesar de o Brasil
possuir um dos mais elaborados sistemas de leis de preservação ambiental, nossa realidade é extremamente problemática, pois essas leis não são cumpridas, pelo desconhecimento da população, por descaso ou por diversos outros fatores” (PCN EM AÇÃO, 2000)
O presente trabalho surgiu da necessidade de oferecer aos professores que atuam na rede pública estadual um curso que contemple os conteúdos específicos da
área de atuação com aplicação de temas interdisciplinares
como, por exemplo, o tema transversal meio ambiente.
5. METODOLOGIA
A necessidade de ampliar os estudos na área
ambiental nas escolas levou-nos a elaborar a presente
proposta. Ressalta-se a importância de trabalharmos as
questões ambientais durante a formação do docente,
assim como nos cursos de aperfeiçoamento.
O tema Meio Ambiente foi trabalhado com 83 professores da rede pública inscritos no programa de formação continuada do Estado de São Paulo oferecido pela
Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP) nos municípios de Jacareí, São José dos Campos e Taubaté.
A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo,
visando à capacitação de professores do ciclo II do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, que atuam em sala de
aula nas escolas estaduais jurisdicionadas à Diretoria de
Ensino criou, no ano de 2003, o Programa de Formação
Continuada de Professores denominado Teia do Saber.
Segundo o Projeto Básico do Programa de Formação Continuada “Teia do Saber” (2004), esse programa
tem como objetivo oferecer à população uma escola pública de qualidade, favorecendo o acesso à cultura, à
arte, à ciência, ao mundo do trabalho, educando para o
convívio social e solidário, para o comportamento ético,
para o desenvolvimento do sentido da justiça, o aprimoramento pessoal e a valorização da vida. O êxito desse
empreendimento requer o preparo intelectual, emocional
e afetivo dos profissionais nele envolvidos. Por essa razão, prioriza-se, entre suas ações, a formação dos educadores que atuam nas escolas.
O projeto da Secretaria de Educação prevê a participação de instituições de ensino superior contratadas
para realização de cursos de capacitação e aprimoramento dos professores da rede pública estadual. A UNIVAP,
80
Por determinação da Secretaria da Educação, no
final de cada encontro (1) seria realizada uma avaliação
através de um questionário. Este material serviu de base
para compor os resultados deste estudo, uma vez que a
opinião dos professores/alunos sobre o tema foi de suma
importância para a nossa fundamentação. Após a aplicação da presente proposta no curso Teia do Saber, o projeto da História Ecológica, além dos cursos de História e
Geografia, foi aplicado também para os cursos de Graduação: Licenciaturas em História, Geografia, Matemática e
Ciências Biológicas, o que foi realizado no ano de 2005.
Em forma de explanação, realização de atividades
em sala de aula e prática de campo, buscou-se
instrumentalizar os professores para a sua prática pedagógica. Uma das estratégias utilizadas foi, através da
análise da paisagem, fazer com que os docentes percebessem a ação antrópica no ambiente, relacionando os
fatos históricos aos impactos das plantações de café no
Vale do Paraíba.
Ao término da aula, os professores responderam
um questionário de avaliação relativo à sua aprendizagem e à viabilização do tema em sala de aula.
A aplicação do tema no curso de graduação de
Matemática e Ciências Biológicas da UNIVAP se deu
sob a forma de palestra dentro das disciplinas Seminários de Matemática e prática de Formação de Professores.
O questionamento sobre a aplicação do conhecimento
da História Ecológica nos projetos de meio ambiente foram respondidos pelos alunos através do questionário
investigativo.
6. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os resultados obtidos através da aplicação de
questionários (Tabelas 1 a 3) revelaram a importância dos
conhecimentos históricos para reflexão de atitudes. O
presente trabalho sugeriu uma abordagem interdisciplinar
das questões ambientais, reforçando a importância do
meio ambiente com os fatos históricos na tentativa de
proporcionar ao educador conhecimentos e habilidades
necessárias para trabalhar com projetos de Educação
Ambiental nas escolas.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Um aluno, além de considerar importante os conhecimentos históricos no estudo da ecologia e diagnóstico dos problemas ambientais, ressaltou que o tema
serve como parâmetro para mudança de atitudes. Um
outro destacou a importância do conhecimento histórico
na interpretação da realidade. A maioria dos alunos responderam que a História Ecológica é uma ferramenta importante nos projetos de meio ambiente nas escolas.
Araújo (2002) realizou um trabalho investigativo
também com questionários aplicados a professores da
rede pública de PortoVelho–RO. Como resultado, obteve
várias respostas de como a educação ambiental é vista
pelos professores. O resultado foi relatado com as seguintes afirmações dos alunos-professores: “o professor de Ciências e Geografia é que deve tratar o assunto.
Afinal, eles estudam isso na faculdade”; “sei que tenho
responsabilidade para com o meio ambiente, as drogas, o
sexo entre meus alunos, mas não me sinto preparado
para lidar com nenhum desses pontos. Não tive nada
disso na minha formação”.
A ressonância desses discursos na escola levounos à elaboração da presente proposta, como forma de
ressaltar a importância de trabalhar as questões
ambientais já na formação do docente na graduação e
também nos cursos de aperfeiçoamento dos professores
da rede pública como foi comprovado através do trabalho de Araújo (2002).
Professores ressaltaram não terem sido preparados na graduação para lidar com os temas transversais.
A História Ecológica é uma ferramenta importante na formação do educador. Preparado, o docente poderá abordar o assunto com mais propriedade nas salas de aulas
contribuindo significativamente nos projetos da escola,
independentemente de sua área de formação.
todo esse conhecimento para conscientização de uma geração que não conta mais com vastas matas, rios que parecem
não ter fim e solos em que “se plantando tudo dá”.
Infelizmente, o brasileiro tem um rico vocabulário
para exprimir sua opinião sobre o assunto: “pois é”, “não
tem jeito não”, “tá cada vez pior”, “o povo aqui é assim
mesmo”, “a culpa é do governo”, “deixa pra lá”, “não
adianta” “o problema não é meu”, são algumas das expressões mais ouvidas. O resultado dessa mentalidade
foi a destruição. Não devemos simplesmente lamentar a
destruição, mas aprender com o passado e fazer diferente, adotando medidas preventivas e salvando o que ainda pode ser salvo. Cabe ao educador mudar essa mentalidade, colocando em suas aulas a importância da preservação do meio ambiente e da biodiversidade, seja ele
professor de Biologia, História, Geografia, Matemática.
Somente desta forma é que a sustentabilidade deixa
de ser um plano que consta somente no papel, e passa a
ser um instinto, dentro de cada um. Uma condição que
deve preponderar na educação é a capacidade de produzir conhecimento para que seus povos possam promover seu desenvolvimento humano de forma racional e
sustentável. Este é um trabalho que deverá caber, especialmente, aos educadores que querem fazer a diferença
na educação do Brasil.
8. NOTA
(1) As aulas realizam-se aos sábados, nos campi
da instituição, com uma carga horária total de 80 horas.
9. BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, R. C. Interdisciplinaridade - Um novo
paradigma curricular. Disponível em http://
www.suigeneris.pro.br/edvariedade_interdisciplin1.htm.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A História Ecológica é uma ferramenta importante
para conscientização dos problemas ambientais enfrentados na atualidade. Diante dos fatos históricos, tentamos aprender com os erros. Segundo Leonardo Boff
(2003), apesar de sermos reféns de um modelo civilizatório
depredador e consumista, surge a urgência da
espiritualidade que nos leva a cuidar da vida em todas as
suas formas porque vivemos nelas excelência e valor e
tudo que existe merece viver.
Quando se fala em preservação dos recursos naturais, toda forma de conhecimento deve ser considerada,
seja através da Filosofia, da História, da Ecologia e da
espiritualidade. Há várias formas de abordagem das questões ambientais e a histórica é apenas uma delas que foi
ressaltada neste trabalho. O educador deve se apropriar de
82
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
83
Planejamento Urbano, Controle Social e Privilégios
Luciane de Menezes Siqueira *
Emmanuel Antonio dos Santos **
Resumo: O planejamento urbano no Brasil tem tradição de utilizar-se de modelos já desenvolvidos em
países europeus. Visando conhecer estes modelos de planejamento, o presente estudo faz uma abordagem teórica e identifica como estes foram, e são, utilizados no país. A abordagem teórica abrange um
período histórico que vai do final do século XIX ao início do século XXI.
Palavras-chave: Capitalismo, planejamento urbano, Estado, controle social.
Abstract: Urban planning models already developed by some European countries are traditionally
adopted in Brazil. With the objective of knowing these urban planning models, this paper studies the
theoretical approach about the urban planning models and identifies how they were and are being
used in Brazil. The theoretical approach covers the period from the beginning of the 19th century up
to the 21st century.
Key words: Capitalism, urban planning, State, social control.
1. INTRODUÇÃO
Ao final do século XIX o Brasil já é uma República, não conta mais com mão-de-obra escrava, as terras já
haviam sido reforçadas como propriedade privada, através da Lei de Terras, e as primeiras atividades industriais, como base econômica, começam a se desenvolver
nas cidades. O país apresentava, portanto, condições
propícias para inserir-se no modo capitalista de acumulação, e para tanto passa a desenvolver planos urbanísticos como forma de tornar as cidades atraentes ao capital
internacional e mostrar ao mundo sua nova condição, ou
seja, a condição de modernidade.
consolidar durante todo o século XX no Brasil: a modernização excludente, ou seja, o investimento nas áreas
que constituem o cenário da cidade hegemônica ou oficial, com a conseqüente segregação e diferenciação acentuada na ocupação do solo e na distribuição dos equipamentos urbanos.
Com base nesses pressupostos este artigo pretende caracterizar os modelos de planejamento urbano
desenvolvidos na Europa e nos Estados Unidos, e indicar como foram utilizados no Brasil.
2. A ORIGEM DO PLANEJAMENTO URBANO
Para tanto, o Estado brasileiro, e sua elite dirigente,
passam a utilizar-se de planos urbanos, seguindo os modelos já desenvolvidos em países europeus e nos Estados
Unidos, modelos estes “distantes da nossa realidade”,
(MARICATO, 2000). Estes modelos de planos urbanos
serviam aos interesses da elite dirigente e escamoteavam
os conflitos sociais, que se refletiam sobre o espaço urbano, derivados da mudança do modo de vida que passou a
ocorrer nas cidades desde o final do século XIX.
O planejamento urbano, de modo formal, tem origem na Europa do século XIX, quando as cidades, além
de serem sede do aparato produtivo - da indústria - passaram a ser sede do alojamento da mão-de-obra. As cidades não tinham infra-estrutura que permitisse alojar adequadamente o contingente populacional que migrava às
cidades, levando conseqüentemente a um adensamento
dessa população em cortiços nas áreas centrais das cidades.
Segundo Maricato (1997, p. 30), este urbanismo
que se inaugurava no país seria o urbanismo que iria se
As péssimas condições físicas das cidades, associadas às péssimas condições de vida dos trabalhadores urbanos - que já se organizavam em sindicatos e
reinvidicavam melhores condições de vida e trabalho passaram a ser foco de ação planejadora do Estado inglês, quando teve fim o regime liberal, no final da primeira
metade do século XIX.
*
Mestranda em Planejamento Urbano e Regional PLUR, UNIVAP, 2006.
** Professor da UNIVAP.
84
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
As cidades que se industrializavam tinham de se
adequar à nova ordem capitalista vigente e passam a se
utilizar do urbanismo – “que pertence de fato e direito,
essencialmente, ao saber arquitetônico” (SOUSA, 2004)
- como forma de organizar e ordenar as cidades.
tes, além dos demais posteriores, foram seguidos por
vários países no mundo, incluindo aí o Brasil.
Cidade saneada, remodelada, significava reprodução saudável das forças de produção, conseqüentemente significaria maior produtividade. Cidade saneada
significaria manutenção e reprodução do capital. As cidades tinham de se tornar eficientes ao capital e adequar-se a este.
Segundo Campos Filho (1992) a primeira linha de
urbanismo, pós-Revolução Industrial, foi o urbanismo
sanitarista. Este tinha por preocupação básica as condições dos bairros e habitações, visando a melhoria das
condições sanitárias do ambiente urbano. Encarava os
problemas urbanos com racionalidade e julgava que
melhorias técnicas no ambiente construído resolveriam
os problemas sociais - como se estes fossem somente
uma questão de formatação espacial.
As intervenções urbanas foram sendo realizadas,
objetivando que as cidades passassem a ter eficiência,
tornando-se mais propícias à ordem capitalista, dando
por embico as primeiras formas de planejamento urbano.
Conforme Souza (2004, p. 158) as intervenções
urbanísticas estavam mais preocupadas com a funcionalidade, a estética e a “ordem” que com a justiça social
(ou, fantasiosamente imaginando que uma remodelação
espacial trará, por si só, “harmonia social”), não obstante
ela conter uma óbvia e essencial dimensão espacial.
A ação planejadora sobre as cidades em deterioração, e implicitamente sobre a sociedade, visava, sobretudo, torná-las aptas ao desenvolvimento capitalista,
adaptando-as a este em cada uma de suas etapas de transformação a partir de então.
A ação planejadora passou a ser objeto de obtenção de controle no, e sobre, o espaço urbano, visando a
manutenção, e conseqüente domínio, do status quo das
forças capitalistas. Controle sobre a cidade, sobre seu
ordenamento, significa, implicitamente, ter controle sobre a sociedade que nela vive. Sociedade controlada,
manipulada, facilitada fica a dominação.
Desde o final do século XIX até o século presente,
várias linhas de pensamento se juntam a linhas de ação,
formando, portanto, um modelo, para melhor tentar adaptar as cidades às transformações ocorridas com o sistema
capitalista. Todos os modelos propostos são aqui considerados como planejamento urbano, mesmo aqueles que
exarcebavam a preocupação com o urbanismo, julgando
que a resolução dos “problemas urbanos” estaria vinculada a uma melhoria das formas espaciais urbanas.
É bom deixar claro que se sabe que no presente
momento histórico, o “planejamento urbano inclui o Urbanismo (ou desenho urbano); o último é um subconjunto
do primeiro” (SOUZA, 2004, p. 56). Mas até o começo
dos anos 1940, o urbanismo foi considerado como planejamento urbano, por isso se torna importante fazer considerações sobre seus modelos, especialmente porque esRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
3. MODELOS DE PLANEJAMENTO URBANO
EUROPEUS
A questão do saneamento deu origem à legislação urbanística que estabelecia normas para a ocupação
urbana, visando evitar adensamentos populacionais em
determinadas áreas. De acordo com Campos Filho (1992,
p.6) “Estas normas se constituíram, aos poucos, em códigos de regulamentos urbanísticos quanto às edificações
e ao uso, à ocupação e ao parcelamento do solo para fins
urbanos e as políticas de transporte correspondentes.
Esses equivalem aos atuais códigos de zoneamento”.
Cullingworth, citado por Souza (2004, pp.251-252),
argumenta que o espírito que acompanha o zoneamento
desde seus primórdios, como os propósitos de promover
a saúde e o bem-estar geral, prevenir o superadensamento
etc, omite aquele que é, de longe, o mais importante: a
exclusão de pessoas ou usos indesejáveis, e por via de
conseqüência a preservação do status quo.
Verifica-se que o zoneamento passa a ser utilizado
como instrumento regulamentador da segregação sócioespacial que é desejada por uma elite dominante objetivando
manter seu controle no e sobre o espaço urbano.
Em seguida, e muitas vezes simultâneamente ao
urbanismo sanitarista, começou a surgir o urbanismo
estético viário, que tem em Paris o seu maior expoente, o
barão Haussmann e a Ètoile (estrela) de avenidas, tendo
ao centro o Arco do Triunfo, sua maior expressão (CAMPOS FILHO, 1992).
Souza & Soares (2000) informam que a reforma
urbano-sanitária promovida por Hausmann implicou a
demolição da parte antiga da cidade devastando quarteirões então superpovoados, igrejas e antigas construções, abrindo sobre os escombros grandes avenidas, que
integravam um novo traçado viário para a cidade.
Segundo Spósito (1999) muitas construções antigas foram derrubadas em nome do melhor aproveitamento dos espaços e da uniformidade da arquitetura.As
85
áreas residenciais ricas afastaram-se do centro à procura
de ares mais limpos. Em nome do melhor aproveitamento
do espaço, mas, no fundo, objetivando maiores lucros
foram planejados imensos bairros operários, marcados
por alta densidade e uniformidade.
O urbanismo de Haussmann, como considerado
por Campos Filho (1999), usa a monumentalidade como
expressão da força da classe burguesa dominante, retratada numa preocupação da ordenação do espaço urbano.
Este modelo de ordenação do espaço urbano,
como proposto por Haussmann, acabou transformandose em modelo de intervenção urbanística em vários países que se inseriam no modo capitalista industrial de
produção e que precisavam adequar-se à nova estrutura
econômica vigente.
O urbanismo sanitarista e o urbanismo estéticoviário prepararam a base para a adaptação da sociedade
ao sistema produtivo industrial, levando as cidades a
uma modernização subseqüente. Mas, conforme cita
Souza (2004, p.125), o urbanismo modernista terá o ápice
do apriorismo do planejamento urbano com as proposições de Le Corbusier.
Conforme cita Campos Filho (1999), Le Corbusier
propunha uma arquitetura e urbanismo dos grandes centros urbanos e do industrialismo, em que procurava combinar áreas verdes e edificações verticais, visando uma
alta densidade urbana, redutora dos custos de urbanização, pela menor extensão de infra-estrutura e equipamentos urbanos. Comparava a cidade a uma máquina de morar. A cidade deveria funcionar como um instrumento,
como uma máquina, deveria ter eficiência.
A estética corbusiana caracterizava-se pelo
despojamento e pelo primado da função, e diferentemente da cidade pós-liberal, que privilegiava as funções produtivas, entre elas as terciárias, privilegiará as funções
urbanas na seguinte ordem: habitar, trabalhar, cultivar o
corpo e o espírito, circular (BENÉVOLO, 1999, p. 630).
As idéias de zoneamento, ou de diferentes usos
do solo, surgidas na Alemanha do século XIX, ganharam
força com as proposições de Le Corbusier. Segundo Souza
(2004, p.253), “as idéias de Le Corbusier preconizavam
que os diferentes usos da terra, sobretudo as diversas
funções básicas do viver urbano, produzir, circular, morar e recrear-se, deveriam ser objeto de uma separação
rígida”. Estas idéias encontram seu ponto culminante em
1933, na quarta edição dos Congressos Internacionais
de Arquitetura Moderna - CIAM-, do qual derivou a Carta de Atenas.
Conforme Bologna (2000), a Carta de Atenas foi
86
um manifesto, gerado pelos urbanistas presentes no
CIAM de 1933, o qual indicava um modelo de cidade,
analisando as necessidades humanas universais, no quadro das quatro grandes funções propostas por Le
Corbusier. A separação funcional era a chave mestra do
“ordenamento” da cidade e de sua modernização.
Esta proposta de plano de cidade será adotada
em vários países, como França, Japão, Estados Unidos e
África do Norte. No Brasil, nos anos 1950, Lúcio Costa e
Oscar Niemeyer idealizam Brasília.
Percebe-se, que o zoneamento urbano foi o instrumental encontrado e utilizado para tornar as cidades,
e implicitamente a sociedade, eficientes e domesticadas.
Segundo Bridley et al. (apud SOUZA, 2004), o
grande boom populacional verificado no pós-guerra e a
nova fase em que se encontra o capitalismo, no caso em
sua fase monopolista em um período político de Guerra
Fria, induzem o Estado a um maior controle sobre o território e suas cidades, e implicitamente sobre a sociedade.
Neste contexto, grandes sistemas de planejamento começaram a se estabelecer e o Estado passa a fazer uso de
seus poderes de controle e disciplinamento da expansão
urbana e de uso da terra. É o período do planejamento
regulatório.
Castellls (apud SPÓSITO, 1998, p. 67) afirma que
o “capitalismo precisa de uma concentração do poder
político, e cria condições para a formação de uma
tecnocracia, apoiada na competência dos especialistas,
que em nível das cidades produz uma planificação urbana sem particularismos através de programas nacionais”.
Nos anos 1960, o planejamento físico territorial
começa a sofrer algumas intervenções derivado da nova
maneira de enxergar as cidades, apoiadas na evolução da
metodologia adotada pela teoria geral dos sistemas, desenvolvida para fins militares durante a Segunda Guerra
Mundial.
Segundo Souza (2004) o que na prática aconteceu
é que o planejamento urbano começou a absorver elementos do enfoque sistêmico, tendo o seu vocabulário e
o seu instrumental enriquecidos e sofisticados sem que
a essência fosse muito modificada.[...]. A racionalidade
instrumental se volta exclusivamente para a adequação
dos meios a fins preestabelecidos, permanecendo estes
últimos inquestionáveis.
Todo o aparato regulatório que foi absorvido pelo
planejamento urbano encontrou respaldo nas proposições do modelo keynesianista/fordista. Este perdura do
início do século XX até a década de 1970, quando a crise
mundial do petróleo, associada ao avanço da tecnologia,
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implicará desemprego e transporá uma nova adequação
mundial ao sistema capitalista, levando conseqüentemente ao enfraquecimento dos Estados nacionais. O enfraquecimento dos Estados nacionais implicará o retorno
do liberalismo em nova formatação: o neoliberalismo.
O neoliberalismo e o avanço da tecnologia implicarão, a partir dos anos 1980, uma globalização da economia e esta levará o capital a ser volátil em razão de sua
busca incessante por mercados consumidores. O capital
volátil implicará uma competição, ou em uma guerra, entre os lugares na intenção de atraí-lo. A partir de então os
lugares, ou melhor, as cidades, têm de se adaptar à nova
ordem e passam a se utilizar de modelos e estratégias
empresariais para planejar a nova forma de organizar, e
ordenar, a cidade, ou, entenda-se, a nova maneira de
direcionar investimentos públicos para atender às demandas do capital.
Segundo Compans (1999, p. 108) a competição
entre as cidades refletirá a competição das empresas, que
na busca por incrementos de produtividade procuram se
situar naquelas localidades que mais oferecem condições
para tanto.
Para Souza (2004, p. 30) o planejamento baseado
em estratégias empresariais rompe com o espírito
regulatório dos anos 70, “na medida em que deixa de
tentar domesticar ou disciplinar o capital para, pelo contrário, melhor se ajustarem aos seus interesses, inclusive
imediatos”.
O mais conhecido, e divulgado, modelo de planejamento estratégico é o da cidade de Barcelona -Espanha,
mas a utilização de técnicas empresariais para gerir as
cidades em crise encontra sua origem na Baltimore - USA
- dos anos 1960.
O Plano Estratégico de Barcelona propõe obras
de revitalização urbana, valorizando alguns locais, bem
como valorizará a imagem de novos monumentos, como
forma de mostrar ao mundo sua nova inserção na pósmodernidade, fazendo uso, para tanto, do city marketing.
Para Vainer (2000, p. 77), o planejamento estratégico
traz consigo “um discurso que se estrutura sobre a articulação de três analogias constitutivas: a cidade é uma mercadoria; a cidade é uma empresa; a cidade é uma pátria”.
Para Compans (1999, p. 108),
“A lógica simbiótica da cidade-empresa é
ambivalente à da cidade-mercadoria, que
deve promover sua imagem no exterior com
vistas a exercer atração de investidores, e
ao mesmo tempo facilitar suas ‘exportações
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
de bens, serviços e profissionais. Ambas
atribuem aos governos locais uma espécie
de papel de capitalista coletivo, na medida
em que’ a mercado tecnia da cidade, vender a cidade, converteu-se, portanto, em
uma das funções básicas dos governos
locais e em um dos principais campos de
negociação público-privada”. (BORJA;
FORN, 1996, p. 33)
A estratégia utilizada para legitimar a cidade-empresa, e manipular a grande massa trabalhadora para aceitar a nova condição da cidade, encontra respaldo na crise econômica.
Conforme argumenta Vainer (2000), a sensação de
crise induz a população ao consenso da urgência de respostas urbanas para uma reativação econômica, e do
emprego, nas cidades. Este consenso se transforma em
um consistente e durável patriotismo de cidade, que será,
ao mesmo tempo, resultado e condição do sucesso do
planejamento estratégico.
Este patriotismo será ainda mais exacerbado, e
manipulado, quando os governos locais começam a utilizar a estratégia de realização de obras monumentais.
Estas serão utilizadas como uma marca da cidade que
identifica seus usuários e lhes proporciona amor cívico
Ressalve-se que estas obras, aí incluindo obras de
arte em espaços públicos e prédios de arquitetura arrojada, com perfil de pós-modernidade, localizam-se em áreas
pré-selecionadas, em áreas nobres da cidade. Mas, a demanda insolvável da população não se importará com esses investimentos, em áreas nobres, porque enxergam que
estes lhes garantirão o retorno do emprego, sendo assim,
consentem na gentrificação. Mais uma vez a população é
manipulada segundo os interesses capitais.
Percebe-se que a busca de consensos é uma técnica de obtenção de controle social.
O que se verifica é que, de acordo com as
especificidades apresentadas pelo desenvolvimento do
capitalismo, particularmente em se falando no período
compreendido entre meados do século XIX e começo do
século XXI, várias atividades de planejamento urbano,
contendo propostas urbanísticas, vêm sendo criadas
como forma de “organizar” as cidades e torná-las atraente ao capital e sua reprodução.
4. O PLANEJAMENTO URBANO NO BRASIL
No Brasil, somente a partir dos anos de 1870, com
o início de uma sociedade urbano-industrial favorecida
pela atividade cafeeira, começará a haver uma preocupa87
ção em tornar as cidades “atraentes” ao capital internacional. Para que isso ocorresse, o país, e sua elite agrária
dirigente, passa a utilizar-se de planos urbanos - entendidos como atividades de planejamento urbano que incorporam discurso e ação concreta do Estado sobre o
urbano - seguindo os modelos já desenvolvidos em países europeus e nos Estados Unidos.
Quando, já na década de 1870, as cidades brasileiras começaram a expressar um desconforto ambiental,
com proliferação de cortiços e doenças, devido ao êxodo
em sua direção, começa a haver uma preocupação da
elite agrária, que nas cidades tinham residências, quanto
à salubridade e quanto ao seu afastamento desta população desprovida.
Sousa & Soares (2002, p. 21) relatam que no Rio de
Janeiro a situação apresentava-se caótica, “a imagem de
cidade doente consolidava-se, tornando necessário um
projeto de reforma urbana. As casas insalubres, as ruas
estreitas, a sujeira e a pobreza envergonhavam as autoridades diante da presença de visitantes estrangeiros, comprometendo e afugentando interesses comerciais”.
Em 1875 o Rio de Janeiro, representado por sua
elite dirigente, na Comissão de Melhoramentos da Cidade do Rio de Janeiro, criada em 1874, apresentará o primeiro documento com propostas de melhoramentos para
a cidade, o Plano de Melhoramentos, conhecido também
como o “Plano de Engenheiros”, o qual credita Villaça
(1999, p. 193), ser o marco referencial do nascimento do
planejamento urbano no Brasil, porque pela primeira vez
se utilizará os conceitos de “plano” e “global” associados ao espaço urbano.
Mas, somente após a Proclamação da República
as propostas de melhoramento ganharão vulto.
Conforme cita Nestor Goulart (apud SOUSA; SOARES, 2002, p. 25), as primeiras administrações republicanas tiveram como um de seus objetivos fundamentais a
modernização das principais cidades, sobretudo da capital federal, para estabelecer o contraste com os feitos da
monarquia, cujo vínculo principal era com a escravidão.
Os planos de renovação urbana se inspiraram na
reforma de Paris, executada pelo prefeito Haussmann no
período de 1853-1870. A renovação das cidades se deu
nas áreas centrais e em novos bairros destinados ao uso
das classes dominantes e às faixas de renda média. Os
centros passaram por reformas amplas e programas de
renovação.
Villaça (1999), considera que o ápice dos planos de
embelezamento no país, e de sua efetivação, e que foi modelo para as demais capitais do país, está no plano de reformas
88
para a cidade do Rio de Janeiro, elaborado por Pereira Passos, governador nomeado do Rio de Janeiro em 1903.
Oliveira Reis (apud VILLAÇA, 1999), chega a argumentar que foi impressionante a coincidência, para não
dizer a exatidão, entre a obra efetivamente executada e o
plano elaborado por Pereira Passos. Mas, como alerta
Villaça (1999) “isso nunca mais viria a acontecer”, mesmo
que os Planos Agache, para o Rio de Janeiro, em 1926, e
de Prestes Maia, em 1945, para São Paulo, tivessem sido
razoavelmente cumpridos. Estes dois últimos, pela novidade de seus conteúdos, marcaram uma nova etapa na
história do planejamento urbano no Brasil, e foram modelo de planejamento para as demais cidades do país, no
período que perdura entre o final dos anos 1920, quando
ocorreu a grande crise mundial e o país começou a se
industrializar, até o início dos anos 1950.
Os Planos Agache e Prestes Maia, apesar de serem planos globalizantes, deram ênfase à circulação e
privilegiaram de investimentos as áreas centrais. Entretanto, a ênfase dada à circulação indica que esses planos
serviam aos interesses relativos ao início da sociedade
urbano-industrial, verificado no período de 1930 a 1950,
em que a cidade da produção tinha que ser eficiente, por
isso especial atenção ao aspecto da circulação em detrimento aos problemas urbanos que se avolumavam. Conforme Villaça (apud MARICATO, 1999, p. 125) “o plano
discurso cumpre um papel ideológico e ajuda a encobrir
o motor que comanda os investimentos urbanos”.
De acordo com Bologna (2000), a partir da década
de 1950, intensificou-se, nos países latino-americanos,
em particular no Brasil, a intervenção do Estado na definição da política econômica e em outros setores. Foi então que passaram a atuar a Comissão Mista Brasil - EUA
(1951-1953) e o Grupo Misto BNDE/CEPAL (1953-1955).
Esses grupos pretendiam implantar no Brasil um processo de industrialização, como forma de alcançar a independência econômica do país.
A referida autora, identifica que no Brasil essa foi
a época da ideologia desenvolvimentista que caracterizou o governo do Presidente Juscelino Kubitscheck
(1955-1960). Durante este período, o Estado passou a
adotar o planejamento econômico como única forma capaz de possibilitar a superação do atraso da economia e
da miséria da população.
Como cita Maricato (1997, p. 37) o desenvolvimento dos anos 1950 que sustentou o processo de acumulação no Brasil, teve por base a indústria de bens duráveis (automóveis, máquinas, eletrodomésticos) que
combinava tecnologia importada, e avançada para os
padrões brasileiros, com baixos salários.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Foi nos anos 1950, que “o encarecimento do preço da força de trabalho e da produção de certas mercadorias nos países centrais, induziram esses países a um
movimento de industrialização no sentido da periferia”
(OLIVEIRA 1982, p. 48), e que o processo de industrialização nacional passou a ter significativo e crescente controle do capital internacional.
Neste contexto as atividades de planejamento urbano passaram a atender às exigências do capitalismo
internacional em expansão, que intensificava a busca por
vantagens geográficas na instalação de suas unidades
de produção, e tem início os superplanos de caráter urbano e regional.
Através do Plano de Metas, no governo de Juscelino Kubitscheck, entre os anos 1955 e 1960, e dos
PNDs (Planos Nacionais de Desenvolvimento) nos governos militares, que ocorreram entre os anos 1964 a 1980,
são lançadas as bases para a introdução dessa industrialização, ou do capitalismo monopolista, através da intensificação de uma rede de transportes rodoviários e de
comunicações, objetivando uma maior integração
territorial, visando a formação de um mercado de consumo que pudesse dar sustentação ao desenvolvimento
das forças produtivas capitalistas internacionais no país.
No governo de Kubitscheck, a construção de
Brasília no planalto central, um velho sonho desde o Im-
pério, teve um destaque primordial na nova aparência do
país (BECKER, 1998, p. 86).
Considerada como “metassíntese do Plano de
Metas” (BOLOGNA, 2000, p. 24), a construção de Brasília,
baseada nas proposições de Le Corbusier e nas referências da Carta de Atenas teve, de acordo com Becker (1998,
p. 86), um significado simbólico de que o país estaria se
desenvolvendo. O desenho da cidade se confunde com
o de uma nova sociedade: racional, ordenada e eficiente.
Mas como se sabe, o ideal de cidade justa, infelizmente, não foi alcançado.
Conforme relata Maricato (1997, p. 39), “o ideário
modernista, a utopia construída pelos arquitetos de organizar a cidade separando as diferentes funções, passou a
ser incorporado ao urbanismo brasileiro por intermédio de
leis de zoneamento e planos diretores, consolidando nas
décadas seguintes um conjunto de idéias fora do lugar”.
Em seu projeto de modernização, o Brasil cresceu
economicamente, mas fez aprofundar as disparidades
sociais nas cidades que se industrializavam. Em decorrência da migração campo-cidade, é provocada uma crescente urbanização nas cidades que se industrializavam.
Na Tabela 1 pode ser verificado o crescimento da urbanização no país neste período.
POPULAÇÃO URBANA
Tabela 1 - População urbana POPULAÇÃO
e rural - 1960-1996
RURAL
1960
31.303.034
1970
52.084.984
1980
80.436.409
38.767.423
41.054.053
38.566.297
Fonte: Censos demográficos de 1960 a 1991 e contagem da população de 1996.
A partir dos anos 1950, o país se torna predominantemente urbano. A crescente urbanização levou a
conurbação entre as cidades, dando origem a grandes
metrópoles e grandes problemas, especialmente os de
habitação e infra-estrutura.
Como a industrialização brasileira é caracterizada
por baixos salários, o acesso à habitação fica restrito às
faixas de maior renda, e as faixas menos providas acabam
se direcionando as áreas periféricas das cidades, muitas
vezes com deficiência de infra-estrutura, ou então ocupam o solo ilegalmente.
Conforme cita Bologna (2000, p. 24), “o Estado
não havia formulado uma política urbana consistente e
abrangente à altura do acelerado processo brasileiro de
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
urbanização”.
Há de ser lembrado, como referenciado por Oliveira (1982, p. 50), que “quando as indústrias começaram a se
instalar no país, trouxeram dentro de si uma complexa divisão social do trabalho, onde se destacava a enorme
gravitação do trabalho improdutivo, de gerentes e executivos, o que deu origem a grande classe média do Brasil”.
Por representarem os interesses do capitalismo
monopolista no país, o Estado, voltado ao aspecto do
urbano enquanto localização, passou a “atender demandas da classe média, dando por contraste o desatendimento
da forma mais absurda possível das demandas das classes mais baixas na estrutura de classes da sociedade, das
demandas do operariado, das demandas das classes po89
pulares em geral” (OLIVEIRA, 1982, p.51).
Quando a população brasileira começa a se contrapor a esse sistema perverso de exclusão, ou contrapor-se à “modernidade da pobreza”, como diz Becker
(1999, p. 169), e ter apoio do então Presidente da República, João Goulart, acontece o golpe militar.
Ao capturar o poder político, que implicitamente
recapturava os interesses do capitalismo, já que o momento é de Guerra Fria, as forças armadas introduzem no
planejamento, não só sua burocracia de base técnica,
que requer planos para sobreviver, mas também o seu
estilo autoritário-tecnocrata. O Estado Nacional se utilizará do planejamento regulatório.
Bologna (2000, p. 24), cita que do ponto de vista
do planejamento urbano, o ano de 1964 marca o momento a partir do qual se inicia uma política voltada para a
questão urbana, e que o Estado abre duas frentes de
planejamento relacionadas com a cidade:
“Uma, aquela do Banco Nacional da Habitação (BNH), e outra, a do Serviço Federal
de Habitação e Urbanismo (SERFAU), em
que um dos objetivos seria estabelecer critérios, de âmbito nacional, para a execução dos programas habitacionais. No caso
do BNH, os seus objetivos proclamados,
de voltar-se para a chamada habitação de
interesse social, logo se mostraram comprometidos em função da especulação imobiliária e do capital financeiro (baixa
lucratividade em função do crescente preço da terra urbana). O SERFAU esgotouse precocemente na elaboração, ou no financiamento a particulares, de Planos Preliminares de Desenvolvimento Local Integrado, com os quais as Prefeituras se capacitavam aos financiamentos governamentais para a construção de conjuntos
habitacionais”
(SANTOS
apud
BOLOGNA, 2000, p. 24).
Nos anos em que resistiu o regime militar “uma
quantidade inédita de Planos Diretores foi elaborada no
período. [...] Álibi ou convicção positivista, o planejamento foi tomado como solução para o caos urbano e o
crescimento descontrolado. Essas idéias dissimulavam
os conflitos e os reais motores desse caos” (MARICATO,
1999, p. 139).
Há de ser referido que neste período foram elaborados Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND), que, em
termos de planejamento regional, priorizaram investimentos
maciços em redes de integração espacial, estradas, aeropor90
tos, portos e telecomunicações. Desta forma o país continuava a perseguir os ideais de integração nacional e conseqüentemente beneficiava a circulação do capital.
Mas, todo o aparato desenvolvimentista, empreendido desde os anos 1955, teve como base de recursos
empréstimos internacionais e estes levaram, nos anos 1970,
com a crise do petróleo e o esgotamento do sistema financeiro dos países centrais, a uma fragilização do Estado
nacional, o que gerou uma situação de crise interna. Esta
última associada ao avanço da globalização, que provocou uma reestruturação econômica mundial, levou a uma
fuga de capitais do país, conseqüentemente levando a
uma situação de desindustrialização e desemprego. O desemprego acentuou a desigualdade refletida sobre o espaço urbano, sendo que cada vez tornava-se mais difícil à
grande massa trabalhadora fazer parte da cidade legal.
Em resposta à situação de crise econômica, de um
Estado interventor e regulador, aliado à dificuldade da
elite nacional se sobrepor às reinvidicações populares
por reformas urbanas, vem a tona no país, nos anos 1990,
via eleição direta, o Estado neoliberal. Este último transporá para os estados e municípios a necessidade de serem competitivos, o que implicará em autonomia destes
quanto às suas políticas de desenvolvimento local. Neste contexto tem início a fase, que ainda perdura, de um
planejamento urbano baseado em técnicas empresariais
que apoiam-se, sobretudo nas proposições do Plano de
Barcelona.
Há de ser considerado que a mudança no Estado
nacional, conforme apontado por Maricato (2001), foi
resultado das diretrizes propostas pelo Consenso de
Washington que preconizava uma agenda inquestionável
para dirigir os destinos dos países emergentes e apresentava como princípio norteador à soberania absoluta
do mercado, interna e externa dos países, acompanhado
dos corolários de diminuição do Estado e de erosão do
conceito de nação. Desta maneira, para a referida autora,
os planos estratégicos combinaram bem com as diretrizes do Consenso de Washington.
A cidade do Rio de Janeiro tem o mais conhecido
exemplo de planejamento estratégico no país, e contou
para sua elaboração com um grupo de consultores
catalães. Mas, como cita Compans,
“O Plano Estratégico da Cidade do Rio de
Janeiro provocou a inversão privilegiada
de recursos públicos no atendimento das
exigências do setor privado. As propostas
consideradas prioritárias foram aquelas relacionadas diretamente aos objetivos estratégicos de melhoria da infra-estrutura
urbana (acessibilidade, transporte e teleRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
comunicações), de criação de áreas empresariais e de atratividade de atividades econômicas, em detrimento daquelas que tratavam do emprego, da qualidade de vida, e
democratização da Administração Pública”.
Estas observações vão ao encontro às observações de Maricato (2000) quando esta considera que as
estratégias de desenvolvimento local utilizadas no planejamento estratégico aumentam as disparidades, a segregação espacial, ao passo que privilegiam algumas
áreas em detrimento a outras.
Mais uma vez percebe-se que o planejamento urbano, no Brasil, apresenta um discurso, que é neste período amplamente divulgado pelo marketing, e dissimula a
direção tomada pelos investimentos públicos. Não se
observa uma proposição de plano urbano que vise a reprodução saudável da grande massa trabalhadora do país.
O que se percebe é que o planejamento estratégico vem
sendo utilizado como técnica de controle social,
objetivando a manutenção do status quo capitalista.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No transcorrer deste artigo pôde ser percebido
que, tanto para a Europa e Estados Unidos, quanto para
o Brasil, o planejamento urbano está vinculado à ordem
econômica vigente e é instrumental de uso fundamental
para o grande capital e suas forças hegemônicas poderem se reproduzir e manter seu controle sobre a sociedade que no e sobre o espaço vive.
Como visto, o Brasil tem uma herança de fazer uso
de modelos de planejamento urbano importados. Estes
modelos, como indicado por Maricato (2000), sempre foram “distantes de nossa realidade” mas sempre serviram
aos interesses de nossa elite dirigente.
Segundo Villaça (1999) diferentemente da Europa
e dos Estados Unidos onde o planejamento urbano
corresponde, em parte, às ações concretas do Estado, no
Brasil o planejamento urbano é usado como uma fachada
ideológica, não legitimando a ação concreta do Estado,
mas, ao contrário, procura ocultá-la.
Esta afirmação pode ser observada neste texto
quando se verifica que as obras realizadas através de
planos urbanos privilegiam algumas áreas em detrimento
a outras. As áreas privilegiadas são aquelas ocupadas e
destinadas à população solvente e que possibilitam a
circulação e reprodução saudável do capital. Já nas
áreas ocupadas por população insolvente os investimentos são mínimos porque mínimos também serão os custos de sua reprodução.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
Para tentar reverter esse quadro, que implica segregação sócio-espacial, considera-se que o grande desafio a ser enfrentado pelas próximas gestões urbanas é
o de tornar equânime, através do planejamento urbano, a
distribuição das vantagens dos investimentos públicos
que possibilitem a reprodução satisfatória de “toda” a
força de trabalho do país.
Em relação a esse desafio, alguns municípios brasileiros, especialmente de gestão de esquerda, dentre os quais
pode-se citar Porto Alegre (RS), Belém (PA) e Santo André
(SP), vêm, desde o início dos anos 1990, avançando nesta
questão, pondo em prática o planejamento participativo
como meio de democratizar o governo municipal.
Um dos instrumentos, dentre outros, posto em
prática neste tipo de planejamento é o orçamento
participativo o qual se resume em um processo de elaboração da proposta orçamentária municipal com deliberação da comunidade, propiciando controle e poder de decisão da sociedade sobre os gastos públicos.
Ao verificar a aplicação do orçamento participativo
em Belém, Martins (2001) cita que no primeiro ano (1997)
houve predomínio de ações locais e vitais e já no terceiro
ano houve uma ampliação dos horizontes à medida que
as emergências iam sendo atendidas. A autora constatou
que as necessidades foram passando a expressar, não só
demandas hoje necessárias, mas desejos para o futuro.
Constata-se, portanto, que existe possibilidade
para tornar equânime a distribuição dos investimentos
públicos para a reprodução satisfatória de toda a forca
de trabalho, resta, entretanto que o Estado, em todos os
níveis, desprenda-se das amarras de seu clientelismo.
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92
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
O Novo Rural em São Francisco Xavier
Luciane de Menezes Siqueira *
Ely Pimenta Guimarães *
Resumo: Trata-se de um estudo que objetiva identificar quais as determinantes que têm induzido
novos usos não agropecuários do solo em São Francisco Xavier, Distrito do município de São José
dos Campos - SP. Estes novos usos têm sido responsáveis pela manutenção da população local, bem
como pelo retorno de outras que do local migraram em face à crise da pecuária leiteira na década
de 1980.
Palavras-chave: Rural, meio de vida, investimentos, legislação, APAs.
Abstract: This study aims to identify the causes that have been inducing new land uses other than
non-agricultural and cattle raising in São Francisco Xavier, District in São José dos Campos – SP.
These new land uses have contributed to keep the local population and to the return of those who
had migrated due to the milk cattle raising crises in the 1980’s.
Key words: Rural, living way, investments, legislation, APAs.
1. INTRODUÇÃO
O meio rural brasileiro, hoje, já não apresenta as
mesmas características de espaço isolado e autônomo
que prevaleceu até a década de 1920, quando o país tinha sua economia baseada na agroexportação.
A expansão do meio técnico, nas décadas seguintes, em direção às áreas rurais passou a mostrar cada vez
mais tênue a dicotomia entre urbano e rural. O meio rural
vem deixando de ser sinônimo de um espaço tipicamente
agropecuário.
Entretanto, a expansão do meio técnico contemporâneo acirrou a competitividade entre grandes produtores latifundiários e pequenos produtores. Dentre estes
últimos, alguns ainda resistentes, tiveram de encontrar
alternativas para se manter no campo em face da agressiva concorrência.
Com a ampliação e difusão do pensamento ecológico e com as novas necessidades de lazer do homem
urbano moderno vem à tona o resgate da cultura rural
que acaba por induzir e propiciar novos usos não exclusivamente agropecuários no meio rural.
Graziano da Silva (1996, p. 60) cita que entre esses
novos usos encontram-se atividades voltadas ao turis-
*
Mestranda em Planejamento Urbano e Regional PLUR, UNIVAP, 2006.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
mo, a expansão do número chácaras de lazer, pousadas,
pesque-pague, restaurantes, bem como novas atividades produtivas, como a criação de abelhas, aves, plantas
ornamentais e flores, que acabam por se tornar novos
nichos de mercado. Desta maneira, o autor verifica que
as atividades agropecuárias tradicionais já não conseguem explicar por si só a dinâmica do emprego e da população no rural do Estado de São Paulo.
Conforme dados expostos pelo referido autor
(1997, p. 51), no Brasil, a proporção de trabalhadores rurais em atividades não-agrícolas passou, entre 1992 e
1995, de 20,8% para 22,8%. Em São Paulo, o percentual
de trabalhadores rurais ocupados em atividades não-agrícolas era, em 1992, de 35,5%, passando para 44,2% em
1995. Verifica-se, portanto, que vem ocorrendo um aumento no número de pessoas ocupadas no meio rural em
atividades não-agrícolas.
Veiga (apud MIRANDA, 2005) cita que a
dinamização econômica de diversas regiões rurais está
sendo determinada pela captação de rendas urbanas, e,
entende-se em Carneiro (apud MIRANDA, 2005), que
essa captação de renda urbana está relacionada com os
novos usos rurais, que tendem a substituir, em grau de
interesse e rendimento a unidade de produção agrícola
que ali antes funcionava.
A partir de observações empíricas, percebe-se que
o distrito de São Francisco Xavier, localizado na área
rural do município de São José dos Campos, vem passando por alterações semelhantes às que os autores aci-
93
ma citados se referiram, ou seja, o meio rural do distrito já
não mais se caracteriza somente por uso agropecuário.
Com base nesses pressupostos este trabalho procurara identificar as determinantes que induziram aos
novos usos não-agrícolas e pecuários em São Francisco
Xavier, bem como suas conseqüências.
2. CARACTERIZAÇÃO DO DISTRITO DE SÃO FRANCISCO XAVIER
São Francisco Xavier é um dos distritos do município de São José dos Campos. Oficialmente, o município
é constituído por três distritos: São José dos Campos
(sede), Eugênio de Melo e São Francisco Xavier (Fig. 1).
Fig. 1 - Mapa do Município de São José dos Campos e
divisas distritais.
Fonte: São José em dados - 2004.
No município de São José dos Campos, o distrito
sede, São José dos Campos, e o distrito de Eugênio de
Melo desenvolvem atividades econômicas voltadas à
industrialização, onde há a caracterização de um parque
aeronáutico e aeroespacial. Entretanto, o distrito de São
Francisco Xavier, afastado cerca de 60km da sede municipal, com sua localização na Serra da Mantiqueira, compondo um relevo harmonioso de montanhas e vales, possui características rurais e tem sua economia baseada na
94
pecuária leiteira e produção de derivados de leite, seguida do plantio de culturas temporárias para subsistência,
feijão, milho e mandioca, e a criação de animais domésticos (PMSJC, 2004). O setor de serviços ligado ao turismo
também está em crescimento, com a implantação de pousadas e produção de artesanato, o que vem caracterizando um novo meio e modo de vida rural.
Conforme o Censo Demográfico de 2002 o distrito
de São Francisco Xavier tem uma população total de 2867
habitantes, sendo 64% (1831) deste total de população
rural e 36% de população urbana (1036). Segundo informações do administrador do distrito, Antônio Fernandes
da Silva, o número total de habitantes chega a ter um acréscimo de 1200 pessoas se for considerado que a cidade é
local de segunda residência para um número significativo
de paulistanos e joseenses que têm, no distrito, chácaras
de lazer e pousadas. Aos finais de semana e feriados acrescenta-se uma média de 2000 pessoas visitando o distrito
para atividades de lazer e descanso.
Através de estimativa da Associação de Turismo
Sustentável - ATUS - verificou-se que o distrito possui
trinta e cinco (35) propriedades com pousadas que desenvolvem atividades de turismo rural, que vêm se constituindo, junto à atividade agropecuária, a base econômica do distrito. Destas 35 pousadas, 20 são registradas no
CNPJ; três (3) propriedades onde se desenvolve atividade de piscicultura, sendo que uma delas desenvolve atividade de pesque-pague que é responsável por um número considerável de visitantes ao distrito nos finais de
semana; uma (1) propriedade desenvolve ranário; seis
(6) desenvolvem atividade de apicultura; quatro (4) desenvolvem o cultivo de shitake (cogumelo). Em relação à
produção de shitake, duas das quatro propriedades que
o cultivam, a Fazenda Guirra e a Fazenda Essência, além
de destinarem parte de sua produção para o Estado de
São Paulo, exportam para os Estados Unidos e Europa.
As outras duas produtoras de shitake direcionam sua
produção para o mercado de consumo da Grande São
Paulo e de São José dos Campos. Aliás, toda a produção
de peixes, rãs, mel e queijo é destinada ao mercado de
consumo de São Paulo e São José dos Campos.
A atividade industrial tem característica de
complementação de renda, em que a produção está voltada
quase na totalidade a atividades artesanais, com grande
parte das atividades voltadas à informalidade, totalizando
19 empresas, segundo o Cadastro Industrial de São José
dos Campos. Dentre essas atividades cita-se: aparelhamento de madeiras, produção de lingüiça, produção de violas,
móveis rústicos, geléias, manteigas, queijos, pães, cachaça.
No distrito há um total de dez (10) lojas; um banco; uma Unidade Básica de Saúde, a qual responde pela
assistência médica e odontológica local; uma escola
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
municipal, uma escola estadual e 12 restaurantes.
A população economicamente ativa é de cerca de
45%, segundo informações da subprefeitura. Deste total
percentual 21,9% se dedicam à agropecuária, 12,2% ao
comércio, 20% à prestação de serviços, 7,3% à construção
civil e 2,4% ao setor de transportes, e há predominância de
trabalhadores empregados no Poder Público Municipal,
que conta com cerca de 29,3%, sendo a maioria constituída por mão-de-obra não-especializada. A mesma fonte relata que a explicação para parte da grande parcela de população que não trabalha, 55%, está no fato de haver, no
distrito, um grande número de habitantes em idade escolar, perfazendo um total de 791 pessoas, segundo levantamento dos dados censitários de 2000.
Observa-se através destes últimos dados que a
economia do distrito está voltada às atividades de
agropecuária e turismo. Mas, conforme relata a ATUS, as
atividades ligadas ao turismo e à diversificação das atividades agropecuárias ganharam maior expressividade,
como fonte de renda local, a partir dos anos 1990, quando o distrito passa a ser amparado por lei municipal como
área de preservação ambiental, sendo uma série de normalizações e diretrizes destinadas ao distrito numa tentativa de preservar as áreas de nascentes, fauna e vegetação atlântica remanescente, além de promover o desenvolvimento sustentável para a população local, visando
mantê-la na área rural do município
Conforme relatos da PMSJC (1985) - Prefeitura
Municipal de São José dos Campos, o distrito de São
Francisco Xavier, inicialmente era ocupado por propriedades rurais relacionadas às práticas agropecuárias, especialmente voltadas à produção leiteira. Nos anos 1980,
o baixo preço, pago pelo mercado ao produto, leva a
atividade à estagnação, e o homem do campo com seus
recursos reduzidos não vê alternativa para se manter. A
opção encontrada se volta para o arrendamento de parte
da propriedade, bem como o parcelamento e venda para
terceiros. Os proprietários vão se desfazendo de parte de
suas propriedades até que o remanescente mal dá para a
criação e plantio caseiro. Desfizerem-se do gado porque
já não há pasto suficiente. O parcelamento das propriedades incentiva o surgimento de chácaras de lazer para
turistas de fim de semana.
Outro fato observado em São Francisco Xavier se
refere ao fato de que, quando os novos proprietários
rurais compraram terras com a finalidade de montar chácaras de veraneio, montando hortas, pomares e pequenas criações, empregaram os ex-proprietários ou os filhos destes.
Entre os novos proprietários rurais, há fazendeiros, empreendedores, que encontraram condições climáRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
ticas para desenvolver na região novos negócios, como
é o caso de criação de animais de raça e do turismo. Os
benefícios que se seguiram foram relativos, pois à medida que as novas atividades geraram condições para que
o antigo proprietário se fixasse na região pelo trabalho
assalariado, promoveu rompimento com seus laços da
terra. O antigo trabalhador rural estava expulso de suas
antigas tradições em suas terras, quando plantava para a
própria subsistência. O fato de estar empregado não significava que sua condição econômica tivesse melhorado. Significava apenas uma transformação no seu modo
de vida (PMSJC, 1985).
Observa-se então que grande parte dos antigos proprietários rurais perde o domínio da terra e neste momento
passa a ser empregado dos novos donos das terras.
Muitos dos ex-proprietários rurais relutam em desatar os laços com a terra, tentando permanecer próximo
em outros trabalhos e/ou atividades, empregando-se
como caseiros e pedreiros na construção civil. Outros
fabricam doces, queijos e comercializam como meio de
subsistência. É uma tentativa de reforçar a identidade, de
pertencer a um lugar, como uma âncora de segurança. Ir
de encontro à modernidade sem perder sua origem.
(PMSJC, 1985).
Percebe-se que o antigo proprietário rural perde
suas características, seu referencial. O pequeno agricultor/pecuarista perde suas perspectivas de trabalho agrário. E a partir desse momento fica estabelecida uma nova
atividade econômica no distrito: o turismo.
Em diagnóstico realizado em uma proposta de Plano Diretor para o distrito de São Francisco Xavier, elaborado pela Secretaria de Planejamento e Informática da
Prefeitura Municipal de São José dos Campos, no ano de
1985, há referências de que a paisagem pouco a pouco se
transforma, ocorrendo transformação local, com invasão
de construções que exprimem o conceito e as necessidades do homem urbano. Esse processo violenta o sistema
simples e primitivo do homem do campo, cortando suas
raízes mais profundas, de trabalhador rural, impondo uma
nova condição de vida que é irreversível.
Alternativas deveriam ser tomadas para que não
ocorresse esse impacto sócio-econômico, evitando com
isso o êxodo de parte da população, bem como a degradação ambiental do distrito, visto que inúmeras chácaras
e atividades de reflorestamento estavam expandindo-se
para as áreas de remanescentes. “O processo de degradação que passou a ocorrer em inúmeros locais do distrito, justificou a criação da APAs pelos órgãos públicos
através da regulamentação e ampliação de mecanismos
de conservação do patrimônio natural”, segundo indica
Martin et al. (apud MEDEIROS, 2005).
95
3. AS APAS DE SÃO FRANCISCO XAVIER E O FOMENTO DAPREFEITURAMUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
DOS CAMPOS PARA ESTÍMULO DAS NOVAS ATIVIDADES RURAIS
De acordo com Moreli e Fantin (2001) a criação de
APAs - Área de Proteção Ambiental - pela União, Estados, ou Municípios, encontram respaldo na Política Nacional do Meio Ambiente, de 1981, que editou a Lei 6.902
(de 27/4/1981), em que foram criadas as Estações Ecológicas (áreas representativas de ecossistemas brasileiros,
sendo que 90% delas deveriam permanecer intocadas e
10% poderiam sofrer alterações para fins científicos) e as
Áreas de Proteção Ambiental, onde poderiam permanecer as propriedades privadas, mas o poder público poderia limitar as atividades econômicas para fins de proteção
ambiental.
A criação de uma APA objetiva proteger e assegurar a sustentabilidade do uso de recursos naturais com
destaque especial para a biodiversidade (conjunto de
espécies e ecossistemas de uma região), através da disciplina do processo de ocupação do solo.
Em 1982, conforme Decreto Federal nº 87.561/82,
de 13 de setembro de 1982, é criada a APA da Bacia
Hidrográfica do Paraíba do Sul com área total de 37,88
Km, incidente no município de São José dos Campos.
Em São José dos Campos, conforme indicam Moreli
e Fantin (2001), a legislação referente aos aspectos
ambientais teve início na década de 1970, juntamente com
a consolidação do parque industrial do município. Com o
advento da Constituição de 1988 que dedicou um capítulo
especial para o meio ambiente, o legislador municipal sentiu a necessidade de criar instrumentos legais para a proteção do meio ambiente, consolidando a legislação ambiental
atual do município de São José dos Campos.
Seguindo as tendências das Constituições Federal e do Estado de São Paulo, a Lei Orgânica do município
de São José dos Campos, de 5 de abril de 1990, reservou
um capítulo específico para tratar das questões referentes ao meio ambiente.
No TÍTULO VI, Capítulo I, Do Meio Ambiente, o
Artigo 241 define que os rios Paraíba do Sul, Buquira e do
Peixe, a Reserva Florestal Augusto Ruschi (Fazenda Boa
Vista), a área ocupada pelo antigo Sanatório Vicentina Aranha, o Banhado e o Distrito de São Francisco Xavier são
espaços territoriais especialmente protegidos e sua utilização far-se-á na forma da lei, dentro de condições que
assegurem a preservação do meio ambiente (PMSJC, 2005).
Em 1992, a Lei Municipal nº 4.212/92 declara área de
proteção ambiental - APA, o trecho da Serra da Mantiqueira
96
no município (próximo a São Francisco Xavier).
Em 4 de abril de 1995 a Lei complementar 165/95
dispõe sobre a política territorial e urbana do município
de São José dos Campos e institui o Plano Diretor de
Desenvolvimento Integrado, o qual, entre outras disposições, define as características e o perímetro das Áreas
de Proteção Ambiental, perfazendo um total de quatro,
sendo uma delas, a APA IV, criada dentro do perímetro
urbano. As APAs I e II estão inseridas no Distrito de São
Francisco Xavier (PMSJC, 2004).
Conforme relatam Monteiro e Silva (2001), a APA
I, Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira, é
caracterizada pelos maciços remanescentes do Complexo da Mata Atlântica e pela nascente do Rio do Peixe e
compreende a margem esquerda do rio citado; a APA II
compreende a margem direita do Rio do Peixe e é caracterizada por inúmeros recursos hídricos da Bacia do Rio do
Peixe.
Na referida lei, ainda se observa - na seção II, Das
Diretrizes Específicas de Desenvolvimento Econômico
Rural - na Subseção I, Artigo 7°, nos Incisos VII, X, XI,
XII e XIV, respectivamente - disposições sobre:
- estimular o potencial econômico das áreas protegidas “APAS”, através do desenvolvimento de atividades turísticas, manifestações de cultura local, e do
manejo sustentado dos recursos naturais existentes;
- apoiar os Conselhos distritais de São Francisco
Xavier e Eugênio de Melo;
- dotar a administração Distrital de São Francisco
Xavier de corpo técnico adequado ao desenvolvimento
e a orientação de programas e projetos da Administração
Municipal junto à comunidade;
- fomentar e apoiar iniciativas privadas para a dotação de infra-estrutura turística, tais como: meios de hospedagem e atividades comerciais;
- criar uma central turística equipada com banco
de dados referentes aos eventos e outros potenciais de
estruturação do setor, objetivando a sua divulgação e
dos serviços oferecidos.
Em 1997, a Lei complementar 165/97, de 15 de Dezembro dispõe sobre uso e ocupação do solo no município e estabelece, em seu Capítulo VI, Artigo 134, incisos
1° e 2°, o tipo de uso permitido para as APAs, e dispõe,
respectivamente que:
- na Área de Proteção Ambiental da Serra da
Mantiqueira (APA I) são permitidos os usos destinados
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
ao ecoturismo e atividades florestais com espécies nativas, admitindo-se as atividades agrícola e pecuária mediante a adoção de métodos e técnicas conservacionistas
do solo e das águas, serviços de hospedagem e o uso
agroindustrial;
- na Área de Proteção Ambiental do Rio do Peixe
(APA II), são permitidos os usos agrícolas, florestais,
pecuários e o ecoturismo mediante a prática de métodos
e técnicas conservacionistas do solo e das águas, serviços de hospedagem e o uso agroindustrial.
Em 8 de novembro de 2002, foi aprovada a lei estadual n° 11262, criando a APA São Francisco Xavier, que
ainda está em processo de regulamentação. O perímetro
desta APA corresponde ao perímetro da APA Municipal
da Serra da Mantiqueira. Conforme dispõe a referida lei,
em seu artigo 2°, a implantação desta APA será coordenada pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA
- em colaboração com os órgãos da administração Direta,
Indireta e Fundacional do Estado, vinculados à preservação do meio ambiente. Dispõe ainda que o Estado, por
meio de seus órgãos competentes, fica autorizado a firmar
convênios ou contratos públicos, com órgãos e poderes
municipais ou com entidades da comunidade local necessários para a implantação da APA. Para que esta APA seja
regulamentada, é necessário que se estabeleça seu Plano
de Manejo, mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece
o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso
da área e o manejo dos recursos naturais. Na Fig. 2 pode
ser observada a localização das APAs do distrito de São
Francisco Xavier, lembrando que a APA estadual coincide
com a APA municipal da Serra da Mantiqueira.
Fig. 2 - APAs de São Francisco Xavier.
Fonte: Medeiros, 2005.
Como o distrito passa a ser considerado uma APA,
e, como em uma APA podem se desenvolver atividades
econômicas sustentáveis, a PMSJC passa a direcionar
investimentos públicos, bem como incentiva os investimentos privados, visando alternativas que possam manter o homem no meio rural, evitando assim o êxodo rural.
Um adendo: por ser uma APA, as atividades ecoRevista UniVap, v.13, n.23, 2006
nômicas e a implantação de qualquer tipo de construção
devem passar por regularizações junto aos órgãos competentes, Polícia Florestal, DEPRN- Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais, Secretaria de Planejamento Urbano da PMSJC. Entretanto, conforme relatos da Secretaria de Planejamento Urbano (2005), observa-se que há resistência de alguns proprietários rurais
em seguir as determinações devidas quanto ao uso do
97
solo, sendo que estas vão contra seus interesses de uso
e rentabilidade. Este é um conflito que vem demonstrando que o “coronelismo” ainda é vigente na estrutura do
meio rural, mesmo considerando novas formas de uso.
uma cooperativa de laticínios local, bem como proposta
para uma cooperativa de apicultores e uma cooperativa
de artesanato que contaria, esta última, específicamente,
com o trabalho das mulheres de SFX.
Seguindo as determinações propostas na lei 165/
95, a Prefeitura Municipal de São José dos Campos vem
investindo no distrito junto aos representantes da sociedade civil local - Associação do Turismo Sustentável, Clube dos Tropeiros e Violeiros, Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de SJC, Instituto Muriqui (ONG), Paróquia de SFX,
Sociedade de Amigos de SFX, Grupo de Mulheres de SFX,
Grupo de voluntários da Bacia do rio do Peixe - desenvolvendo cursos de capacitação para a população local, com
atividades voltadas ao comércio, turismo e agropecuária,
contando, com parcerias, entre outras, junto ao SEBRAE e
SESI. A capacitação da comunidade local objetiva diversificar o trabalho da mão-de-obra local, incentivar a atividade turística e elevar a faixa salarial média local que, segundo dados do Censo (2000), é de R$300,00.
As atividades voltadas ao turismo também vêm
recebendo incentivos da PMSJC que criou, em 1997, o
COMTUR - Conselho Municipal de Turismo de São José
dos Campos, como parte do Programa Nacional de
Municipalização do Turismo, da Embratur.
Os investimentos privados das pousadas rurais também têm sido um motivador para a manutenção da população
local no campo, as quais se tornaram fontes de emprego.
A PMSJC vem estimulando, junto a parcerias privadas, uma diversificação de eventos no distrito, além
das festas tradicionais de origem religiosa, como forma
de manter o giro dos turistas no distrito e manter aquecida
a sua economia, estimulando, conseqüentemente, a manutenção da população local.
É importante ressaltar que as organizações da
sociedade civil estão em constante vigilância aos acontecimentos locais e visam representar os interesses dos
diferentes segmentos da sociedade, o que muitas vezes
gera conflitos quando se buscam consensos para determinadas realizações em SFX.
De acordo com informações da ATUS e da Administração Distrital, vem sendo observado o retorno de
moradores locais que haviam migrado para outras cidades, bem como vem ocorrendo, em direção ao distrito, uma
migração de população de áreas diversas do país e até
mesmo de estrangeiros, visando investimentos em pousaPara estimular a manutenção do homem no cam- das, restaurantes, spas, em função do novo modo de uso
POPULAÇÃO
Período
1950
1960
Distrito 1970
po, vem sendo desenvolvido o estudo da formação de da terra no local. Este fato pode ser observado na Tabela 1.
Ano
Urbana 503
Rural
250 Total 358
URBANA
3.744 6623.023 122 2.365
RURAL 1980
540
3.994 e1.230
TOTALdas
2000
981
Tabela 1 - Crescimento populacional
áreas urbana
rural3.381 339 2.868
85%
177%
65%
Crescimento relativo
Fonte: IBGE 2002. Adaptado de Medeiros, 2005.
Observa-se que durante quatro décadas, de 1950
a 1980, a população rural do município, moradora do distrito de São Francisco Xavier, apresentou um crescimento populacional negativo. A partir de 1990 este quadro
passa a se alterar, chegando a 2000 com um número
populacional equivalente ao de 1970. Este fato está associado ao incremento das novas atividades rurais que
possibilitaram a recolocação do antigo morador rural.
Na Tabela 2 pode ser observado o crescimento do
número de moradias na área urbana e na área rural, em que se
pode inferir que as atividades de lazer estão direcionadas ao
meio rural local, sendo que houve um acréscimo considerável
no número total de moradias de segunda residência.
Tabela 2 - Tabela de distribuição dos domicílios por situação e tipo de uso
Fonte: Ruschman, 2004.
98
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
1980
Domicílios199
oc
Total
722 Urbana
99
1.768
1.70
563
89
2.490
2.69
815
288
44,7% 223%
Visando divulgar permanentemente as atividades
voltadas ao turismo, a ATUS se uniu ao COMTUR e a
Eventos SJC (setor da PMSJC que lida com a divulgação
de eventos do município).
Visando estimular as atividades turísticas, a
PMSJC empreendeu obras de revitalização no distrito de
São Francisco Xavier, estabelecendo, portanto, um planejamento estratégico que visa à manutenção, e ampliação, da economia local.
Finalizando: observa-se que os investimentos no
distrito visam à manutenção, e ampliação, da economia
local, bem como mostra o novo modo de vida da população rural, atrelado ao novo uso da terra, sendo que se
estabeleceram novas opções de emprego, fonte de renda, já que a propriedade da terra passou por significativas mudanças que alteraram as suas características naturais, as características da posse e, conseqüentemente,
as características do trabalho rural.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
São Francisco Xavier é distrito de um município
cuja vocação principal, na atualidade, está voltada às
atividades aeronáuticas e aeroespaciais. Entretanto, sua
distância da sede municipal, aliada às condições físicas,
pode ter sido um dos fatores que o manteve com características distintas do restante do município.
Até o início dos anos 1980 prevaleceram, no distrito, atividades agropecuárias, indicando uma dicotomia
entre a área urbana do município, dotada de meios técnicos, e a área rural, vista sob muitos aspectos de forma
negativa porque não era dotada dos meios técnicos urbanos. Esse caráter negativo, conforme aponta Graziano
da Silva (apud MIRANDA, 2005), está associado à área
rural desde o século XVII, quando o urbano passou a ser
identificado com o novo, com o progresso capitalista
das fábricas; e o rural - ou a classe dos proprietários
rurais, com o velho, ou seja, a velha ordem social vigente, e com o atraso, no sentido de que procuravam impedir
o progresso das forças sociais.
Conforme Otavio Valentim Balsadi (apud
MIRANDA, 2005), um dos pontos fundamentais relacionados com as profundas transformações pelas quais vem
passando o meio rural, está relacionado à clara e forte
tendência de queda das ocupações agrícolas. Em São
Francisco Xavier, as transformações que se observam
no meio rural são decorrentes da nova forma de apropriação do uso do solo, especialmente em atividades voltadas ao turismo, desde que a produção pecuária leiteira
declinou em virtude de uma instável política leiteira, associada a inexpressivo plantel de animais e falta de orientação técnica. O antigo produtor rural passa a dispor de
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
suas propriedades, parcelando-as e propiciando sua ocupação por chácaras de recreio para turistas paulistas.
Estes últimos, implicitamente, foram aos poucos
descaracterizando o modo de vida rural local, bem como
o uso do solo.
A PMSJC já havia observado, desde os anos 1980,
a introdução de novos valores urbanos na comunidade
local, o que aumentava o grau de exigência quanto aos
serviços urbanos e criava novas necessidades à medida
que os novos habitantes interagiam com a comunidade e
demonstrava o crescimento das atividades não
agropecuárias no meio rural local. Observa-se, em São
Francisco Xavier, uma crescente urbanização do meio
rural com moradias de alto padrão, turismo rural, lazer.
Observam-se também novas atividades no meio rural com dedicação à criação de abelhas, peixes, produção de
flores e plantas ornamentais, atividades de recreação,
pesque-pague, restaurantes, spas- todas dotadas de valor comercial considerável.
Verifica-se, no distrito de São Francisco Xavier, o
mesmo fato já constatado por Veiga (apud MIRANDA,
2005), em estudos sobre o novo rural paulista de que a
“dinamização econômica de diversas regiões rurais está
sendo muito mais pela captação de rendas urbanas, sendo que há uma procura crescente de formas de lazer associadas ao meio rural, intensificado pela divulgação do
pensamento ecológico” que se tornou praxe a partir dos
anos 80.
Entretanto, a expansão do número de propriedades voltadas ao turismo e veraneio provocaram degradação ambiental, sendo que avançaram para áreas de remanescentes. Estas alterações do meio físico justificaram,
como se refere Martin (apud MIRANDA, 2005), a criação
das APAs pelos órgãos públicos, através da regulamentação e ampliação de mecanismos de conservação do
patrimônio natural. A partir da regulamentação das APAs,
o uso do solo passou a ser sistematizado e fiscalizado.
As atividades turísticas, consideradas como a nova vocação do distrito, passaram a ser orientadas como um
novo meio de vida para a população local. A subprefeitura
do município investe em cursos de capacitação voltados
às atividades ligadas ao turismo, como forma de evitar o
êxodo e de ampliar a renda média local.
A exemplo de fato observado por Carneiro (apud
MIRANDA, 2005) para outras áreas do interior do Estado de São Paulo, as atividades voltadas ao turismo em
São Francisco Xavier vêm propiciando oportunidade de
trabalho para o conjunto da mão-de-obra familiar, contribuindo para o aumento de sua renda e para uma visível
melhoria das condições de parte da população rural que,
ao ter garantida uma renda fixa e razoavelmente estável
em sua própria localidade de origem, abandona o projeto
99
de migração em busca de emprego e salário na cidade.
Finalizando, observa-se que o meio rural de São
Francisco Xavier já não é mais caracterizado somente
como um meio agropecuário, pois se tornou um novo
meio rural, sendo que incorporou valores e usos urbanos no desenvolvimento de pluriatividades rurais, que
vêm estimulando a permanência da população local.
5. BIBILIOGRAFIA
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Paraíba, São José dos Campos, 2005.
100
MONTEIRO, P. P; SILVA, R. A. Caracterização do turismo
rural como subsídio ao desenvolvimento econômico
sustentável do bairro de Santa Bárbara - São Francisco
Xavier. 2001. Trabalho de Graduação (Graduação em
Geografia). Faculdade de Educação. Universidade do Vale
do Paraíba, São José dos Campos, 2001.
MORELLI, A. F.; FANTIN, M. Espacialização
Cartográfica da Legislação Ambiental no Município de
São José dos Campos - SP, através do uso integrado das
técnicas de Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento
e GPS. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CADASTRO
TÉCNICO MULTIFINALITÁRIO DA FSC Anais...
Florianópolis, SC: COBRAC, 2000.
PMSJC. São José em Dados. São José dos Campos, SP:
PMSJC, 2004.
PMSJC. Plano Diretor de São José dos Campos, São
José dos Campos, SP: PMSJC, 1994.
PMSJC. Plano Diretor de São Francisco Xavier, 1ª fase.
São José dos Campos, SP: PMSJC, 1985.
PMSJC. Legislação de parcelamento, uso e ocupação do
solo de São José dos Campos. São José dos Campos, SP:
PMSJC, 1997.
RUSCHMANN, D. M. Plano de desenvolvimento integrado
do turismo sustentável - São Francisco Xavier. diagnóstico
e proposições. São Paulo: SENAC, 2004.
SEMA- Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São
Paulo. Área de Proteção Ambiental - São Francisco
Xavier. [s.l.: s.ed.] 2005.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
NORMAS GERAIS PARA A PUBLICAÇÃO
DE TRABALHOS NA REVISTA UNIVAP
A Revista UniVap é uma publicação de divulgação
científica da Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP),
que procura cumprir com a sua tríplice missão de ensino,
pesquisa e extensão. Assim, a pesquisa na UNIVAP
tem, dentre suas funções, a de formar elites intelectuais,
sem as quais não há progresso. Esta publicação
incentiva as pesquisas e procura o envolvimento de seus
professores e alunos em pesquisas e cogitações de
interesse social, educacional, científico ou tecnológico.
Aceita artigos originais, não publicados anteriormente,
de seus docentes, discentes, bem como de autores da
comunidade científica nacional e internacional. Publica
artigos, notas científicas, relatos de pesquisa, estudos
teóricos, relatos de experiência profissional, revisões de
literatura, resenhas, nas diversas áreas do conhecimento
científico, sempre a critério de sua Comissão Editorial e
de acordo com o formato dos artigos aqui publicados.
Solicita-se o cumprimento das instruções a seguir para
o preparo dos trabalhos.
1. Os originais devem ser apresentados em papel branco
de boa qualidade, no formato A4 (21,0cm x 29,7cm) e
encaminhados completos, definitivamente revistos, com
no máximo 15 páginas, digitados em espaço 1,5 entre as
linhas, com duas colunas. Recomenda-se o uso de
caracteres Times New Roman, tamanho 12, em 2 vias,
acompanhado de suporte eletrônico disquete ou CDROM em Word e, se possível, enviar a cópia para o email [email protected]. Somente em casos muito especiais
serão aceitos trabalhos com mais de 15 páginas. Os
títulos das seções devem ser em maiúsculas, numerados
seqüencialmente, destacados com negrito. Não se
recomenda subdivisões excessivas dos títulos das
Seções.
2. Língua. Os artigos devem ser escritos,
preferencialmente, em Português, aceitando-se também
textos em Inglês e Espanhol. No caso do uso das línguas
Portuguesa e Espanhola, devem ser anexado um resumo
em Português (ou Espanhol) e em Inglês (Abstract).
3. Os trabalhos devem obedecer à seguinte ordem:
informações referentes às instituições a que pertence(m)
e às qualificações, títulos, cargos ou outros atributos.
- Resumo. Com no máximo 250 palavras, o resumo deve
apresentar o que foi feito e estudado, seu objetivo, como
foi feito (metodologia), apresentando os resultados,
conclusões ou reflexões sobre o tema, de modo que o
leitor possa avaliar o conteúdo do texto. NBR6028.
- Abstract. Versão do resumo para a língua Inglesa.
Caso o trabalho seja escrito em Inglês, o Abstract deve
ser traduzido para o Português (Resumo).
- Palavras-chave (Key words). Apresentar de duas a
cinco palavras-chave sobre o tema.
- Texto. Corpo do artigo estruturado em introdução,
desenvolvimento e conclusão. No caso de divisão de
seções, sua ordenação deve seguir o sistema de
numeração progressiva (NBr6024), com subtítulos de
caráter informativo.
- Citações dentro do texto. As citações com mais de 3
linhas devem ser destacadas com recuo da margem
esquerda 4 cm, com letra menor que a do texto utilizado
e sem aspas.
Ex.:
Na criança, bons hábitos posturais são
importantes para evitar sobrecargas
anormais em ossos em crescimento e
alterações adaptativas em músculos e
tecido mole. (KISNER; COLBY, 1998).
Nas citações são utilizadas sobrenome e data,
apresentadas em maiúsculas dentro do parênteses e
em minúsculas fora do parênteses.
Ex.: 1. Segundo Spector (2003), “A discussão dos
resultados é a parte mais livre da tese, onde o autor
tem maior latitude para demonstrar o seu domínio do
tema e o valor do estudo.”
Ex.: 2. A discussão dos resultados é a parte mais livre
da tese, onde o autor tem maior latitude para
demonstrar o seu domínio do tema e o valor do estudo
(SPECTOR, 2003).
- Título (e subtítulo, se houver). Deve estar de acordo
com o conteúdo do trabalho, conforme os artigos aqui
apresentados.
- Referências Bibliográficas: devem ser apresentadas
no final do trabalho, em ordem alfabética de sobrenome
do(s) autor(es), como nos seguintes exemplos:
- Autor(es). Logo abaixo do título, apresentar nome(s)
do(s) autor(es) por extenso, sem abreviaturas. Com
asterisco, colocado logo após o nome completo do autor
ou autores, remeter a uma nota de rodapé relativa às
a) Livro: SOBRENOME, Nome. Título da obra. Local
de publicação: Editora, data. Exemplo: PÉCORA,
Alcir. Problemas de redação. 4.ed. São Paulo: Martins
Fontes, 1992.
Revista UniVap, v.13, n.23, 2006
101
b) Capítulo de livro: SOBRENOME, Nome. Título do
capítulo. In: SOBRENOME, Nome (org.). Título do
livro. Local de publicação: Editora, data. Página
inicial-final. Exemplo: LACOSTE, Yves. Liquidar a
geografia... liquidar a idéia nacional? In: VESENTIN,
José William (org.). Geografia e ensino: textos críticos.
Campinas: Papirus, 1989. p.31-82.
c) Artigo de periódico: SOBRENOME, Nome. Título
do artigo. Título do periódico, local de publicação,
volume do periódico, número do fascículo, página
inicial-página final, mês(es). Ano. Exemplo:
ALMEIDA JÚNIOR, M. A economia brasileira.
Revista Brasileira de Economia, São Paulo, v. 11, n.
1, p. 26-28, jan./fev. 1995.
d) Dissertações, Teses e Trabalhos Acadêmicos:
SOBRENOME, Nome. Título da dissertação (ou tese).
Local. Número de páginas (Categoria, grau e área de
concentração). Instituição em que foi defendida. data.
Exemplo: BRAZ, A. L. Efeito da luz na faixa espectral
do visível em adultos sadios. 2002. 1 disco laser.
Dissertação (Mestrado em Bioengenharia) - Instituto
de Pesquisa e Desenvolvimento, Universidade do
Vale do Paraíba, São José dos Campos, 2002.
e) Outros casos: Consultar as Normas da ABNT para
Referências Bibliográficas (NBR6023). Ou acessar o
site: http://www.univap.br/cultura/abnt.htm
4. As figuras (desenhos, gráficos, ilustrações, fotos) e
tabelas devem apresentar boa qualidade e serem
acompanhados de legendas breves e claras. Indicar no
verso das ilustrações, escritos a lápis, o sentido da figura,
o nome do autor e o título abreviado do trabalho. As
figuras devem ser numeradas seqüencialmente com
números arábicos e iniciadas pelo termo Fig., devendo
ficar na parte inferior da figura. Exemplo: Fig. 4 - Gráfico
de controle de custo. (fonte 10). As tabelas também
devem ser numeradas seqüencialmente, com números
arábicos, e colocadas na parte superior da tabela.
Exemplo: Tabela 5 - Cronograma da Pesquisa. As figuras
e tabelas devem ser impressas juntamente com o original
e quando geradas no computador deverão estar gravadas
no mesmo arquivo do texto original. Fotografias,
desenho artístico, mapas etc., devem ser de boa
qualidade e em preto e branco.
102
5. O encaminhamento do original para publicação deve
ser feito acompanhado do disquete ou CD-ROM e com a
indicação do software e versão usada.
6. O Corpo Editorial avaliará sobre a conveniência ou
não da publicação do trabalho enviado, bem como
poderá indicar correções ou sugerir modificações. A
cada edição, o Corpo Editorial selecionará, dentre os
trabalhos considerados favoráveis para publicação,
aqueles que serão publicados imediatamente. Os não
selecionados serão novamente apreciados na ocasião
das edições seguintes.
7. Os conteúdos e os pontos de vista expressos nos textos
são de responsabilidade de seus autores e não
apresentam necessariamente as posições do Corpo
Editorial da Revista UniVap.
8. Originais. A Revista não devolverá os originais dos
trabalhos e remeterá, gratuitamente, a seus autores, três
exemplares do número em que forem publicados.
9. O Corpo Editorial se reserva o direito de introduzir
alterações nos originais, com o objetivo de manter a
homogeneidade e a qualidade da publicação,
respeitando, porém, o estilo e a opinião dos autores.
10. Endereços. Deverá ser enviado o endereço completo
de um dos autores para correspondência. Os trabalhos
deverão ser enviados para:
UNIVERSIDADE DO VALE DO PARAÍBA - UNIVAP
PRÓ-REITORIA DE INTEGRAÇÃO UNIVERSIDADE/
SOCIEDADE
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Revista UniVap, v.13, n.23, 2006

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