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1 O cinema como estratégia para discutir as políticas de inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais: uma análise do filme “Vermelho como o céu”1 Autores: Allan do Carmo Silva2 Gisele Ramos Duarte 3 Monique Santanna de Faria 4 Orientador: Márcia Denise Pletsch5 Introdução A educação pública no Brasil vive um verdadeiro drama: Professores desmotivados, baixos salários, escassez de recursos didáticos, estruturas que não atendem as especificidades educacionais. Neste contexto as políticas públicas apontam a obrigatoriedade de se incluir pessoas com necessidades educacionais especiais em escolas regulares de ensino. Este sistema que não atende sequer os alunos ditos “normais” enfrenta grandes dificuldades em promover uma inclusão de fato. A discussão da realidade vivida nas escolas brasileiras se faz importante entre professores, pais, direção, secretarias, e toda sociedade, visto que a falta de estrutura para acolher estes alunos acaba desqualificando todo o ensino. Diante deste quadro torna-se relevante a criação de espaços de discussão e reflexão acerca de propostas educacionais para inclusão. Assim um grupo de discentes do curso de Pedagogia do Instituto Multidisciplinar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, promove nos campus de Seropédica e de Nova Iguaçu uma oficina voltada para estudantes das diversas licenciaturas oferecidas pela instituição. Esta oficina fez parte do evento PRODOCÊNCIA - Programa de Consolidação das Licenciaturas - realizado no período de 09 a 13 de novembro de 2009. A proposta do grupo foi discutir as políticas de inclusão vigentes no país. Afinal, como se dá o processo de inclusão? Este processo realmente atende a criança com necessidades educacionais especiais? Os professores estão preparados para receber este novo público em salas de aula regulares? As equipes pedagógicas dispõem dos recursos necessários para atender a seu alunado? 1 Publicado em: PLETSCH, M. D, & RIZO, G. (ORGS.). Cultura e Formação: contribuições para a prática docente, Rio de Janeiro: EDUR, p. 76-81. 2010. 2 Discente do curso de Pedagogia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 3 Discente do curso de Pedagogia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 4 Discente do curso de Pedagogia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 5 Professora adjunta do Instituto Multidisciplinar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2 Desenvolvimento Diante dessas questões, o grupo propõe a oficina intitulada O cinema como estratégia para discutir as políticas de inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais: uma análise do filme “Vermelho como o céu”. O filme que desencadeia a discussão é do Diretor Cristiano Bortone (Itália 2006) e, passado na década de 1970 conta a história de Mirco, um menino de 10 anos de idade que após sofrer um acidente doméstico perde gradativamente sua visão. Rejeitado pela própria escola, Mirco é obrigado a freqüentar uma instituição destinada a crianças com deficiência visual em Gênova. Após dias de internato, o menino descobre um gravador e com a ajuda de seus amigos monta uma peça teatral sonora. Com o auxilio de seu professor, os meninos, apresentam a peça para os familiares dos alunos da instituição dando um exemplo de superação frente aos preconceitos da sociedade dos anos 70. A oficina segue então com a exibição do filme que serve como instrumento norteador para as discussões em grupo. Buscou-se nestas discussões alcançar os seguintes objetivos: Discutir as políticas de inclusão na atualidade; analisar o déficit na formação docente; perceber a possibilidade de exclusão na inclusão. As políticas de inclusão no Brasil partem de um discurso muito aceito na sociedade no sentido de acolher a todas as crianças no sistema regular de ensino. No entanto não leva em consideração o estado precário da educação pública. As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (Resolução 02/2001 do Conselho Nacional de Educação) trata do assunto da seguinte forma: Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. (BRASIL, 2001, p.39) Porém, temos muitos aspectos negativos nesta questão: A forma como esta inclusão tem se dado é preocupante, já que os jargões relativos a inclusão circulam livremente no meio educacional, jargões sem reflexão e sem uma ligação com a prática no cotidiano deste aluno e dos demais atores envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Pode-se dizer que virou moda defender a inclusão, mas poucos param pra pensar o quanto se deve investir e trabalhar para que a inclusão alcance os fins desejados. Esta inclusão deve fazer com que as pessoas com necessidades educacionais especiais realmente sejam e sintam-se incluídas numa escola 3 regular e na sociedade. A presença deste aluno numa classe regular não pode ser vista apenas como um local para a convivência com outras crianças, mas ter o direito de acessar os conteúdos socialmente valorizados para sua faixa etária. A formação do professor é precária no tocante a educação especial. Os cursos de licenciatura geralmente não oferecem sequer a disciplina de educação especial. Geralmente o docente entra em sala de aula despreparado para lidar com seu alunado. Fora isso, aqueles que já lecionam há anos, e que são impactados pela política de inclusão, dificilmente tem uma formação continuada capaz de prepará-los para o novo contexto de ter em sala de aula uma criança com necessidades educacionais especiais. O espaço da universidade deve favorecer a aproximação do docente com a realidade da inclusão. Padilha argumenta que muitas vezes o preparo dado ao profissional docente é superficial afimando que a formação dos professores, tanto a inicial quanto em serviço, porque os cursos, as palestras, as oficinas, os projetos municipais, estaduais ou federais que se apresentam como meios para melhorar as condições da população e afirmam que tudo é ‘pelo social’ não têm sido analisados com a profundidade necessária e tem sido formados educadores com ‘consciência ingênua’ – como disse Paulo Freire. (PADILHA, 2009) Segue-se um processo de exclusão dentro da inclusão. Os alunos com necessidades educacionais especiais deixam de ter o apoio necessário ao aprendizado. Uma vez que falta ao professor a formação necessária para lidar com este aluno, e também faltam as condições físicas de sala aula, nada resta senão relegar ao aluno especial o lugar segregado dos demais. A política pública sobre o tema rege na Resolução CNE/CEB Nº 2 de 2001 que “os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos” (BRASIL, 2001). No entanto estas condições não são asseguradas e ocorre na prática uma transferência de responsabilidades do Estado para a unidade escolar que, tendo suas limitações, passa o problema para que o professor resolve em sala de aula. Esta sala geralmente continua com um número excessivo de alunos, escassez de material didático e agora recebe um aluno com necessidades especiais em seu meio. Toda esta discussão deve ser fomentada visto que o número de crianças com necessidades educacionais especiais incluídas no ensino regular tem crescido gradativamente a cada ano. E certamente os futuros professores terão em suas classes crianças passando pelo processo de inclusão. 4 Desde 2003, com a implementação do Programa Federal Educação Inclusiva: direito à diversidade em diferentes municípios do país, o número de alunos com necessidades educacionais especiais matriculados em classes comuns da rede regular tem aumentado ano após ano, chegando a crescer 640% entre os anos de 1998 e 2006, conforme mostra o gráfico abaixo. Gráfico 1 – Evolução das matriculas em escolas regulares/classes comuns (inclusão) de 1998 a 2006: 800.000 700.624 700.000 640.317 566.753 600.000 504.039 500.000 400.000 448.601 337.326 374.699 311.354 300.000 382.215 300.520 404.743 323.399 337.897 358.896 378.074 375.488 325.136 262.243 293.403 195.370 200.000 100.000 371.383 145.141 43.923 63.345 81.695 81.344 2000 2001 110.704 0 1998 1999 2002 2003 2004 2005 2006 Matrículas em Escolas Regulares/ Classes Comuns Matrículas em Escolas Especializadas e Classes Especiais Total de matrículas Este gradativo aumento de matrículas de crianças com necessidades educacionais especiais nas classes regulares de ensino requer tanto uma melhor estrutura física das escolas quanto o preparo dos profissionais que lidam com estes alunos. Infelizmente é notório que as estruturas ainda são precárias e que a formação dos profissionais ainda deixa a desejar, tanto na graduação quanto na formação continuada desses sujeitos 5 Conclusão A discussão com os grupos que participaram das oficinas mostra o quanto o tema ainda surpreende. Com a exibição do filme, muitos se mostram impactados, revelando o quanto o tema é pouco discutido, principalmente no meio acadêmico. Alguns utilizam suas experiências familiares para tratar com as pessoas com necessidades especiais, muitos dizem que tal discussão não tem sido presente em seus cursos de graduação. Espaços de debate sobre esta temática mostram-se relevantes e poderiam ser mais freqüentes na formação continuada dos profissionais de educação. Para tanto as políticas públicas não podem se restringir a obrigatoriedade da inclusão, mas também precisam vislumbrar a necessidade de se formar os profissionais tanto durante a graduação quanto na formação continuada, onde este possa se atualizar quanto as questões relativas a educação especial. Neste sentido o incentivo a pesquisa e a projetos de extensão que abordem a temática são de grande valia. São justamente nesses espaços de discussão que se percebe mais claramente as necessidades dos profissionais de educação e também a melhor forma de se incluir o aluno com alguma necessidade especial. Também se possibilita uma visão crítica quanto as legislação vigente de modo a se buscar junto ao poder público melhores condições de trabalho nas escolas. Oficinas como esta que vivenciamos ajudam a promover o debate que deve se estender a toda sociedade, visto a importância da temática neste momento que a inclusão ainda é algo novo no país. O filme Vermelho como o Céu deixa o exemplo de um tempo em que a criança com necessidade educacional especial era pouco notada, e até mesmo segregada socialmente. O importante para nós que vivemos um tempo diferente, em que a palavra de ordem é a inclusão, é que não fechemos os olhos diante deste processo, mas que estejamos atentos as necessidades de todos os que de uma forma ou de outra podem contribuir para que esta inclusão seja algo real e proveitoso para toda a sociedade. 6 Referências Bibliográficas BRASIL. Resolução CNE/CEB Nº 2, de 11 de setembro de 2001. Estabelece as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Diário Oficial da União. Brasília, 14 de set. 2001. Seção 1E, p.39-40, 2001. GLAT, R. Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: 7 letras, 2007. PADILHA, A.M. “Ensino Inclusivo”: uma Expressão Incorreta. Londrina: ABPEE, 2009. p. 5-19. VERMELHO COMO O CÉU (Rosso come il Cielo). 2006. Itália. Direção: Cristiano Bortone. Elenco: Luca Capriotti, Paolo Sassaneli, Francesca Maturanza. Gênero: Drama. Duração: 96 minutos. Baseado na história real de Mirco Mencacci.