O maior espetáculo do mundo

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O maior espetáculo do mundo
ANGOLA
Censo 2014
NEGÓCIOS
Compras africanas na Europa
Nº 86 - junho 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15
COPA DO BRASIL 2014
O maior
espetáculo
do mundo
A incógnita
dos brasileiros
e do planeta está
nas manifestações
de protestos
que não param
desde 2013
África21– junho 2014
1
2
junho 2014 –
África21
Super Ordenado BAI
CONDIÇÕES
AINDA
MELHORES
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60 M
O Banco de todos os momentos.
Por que não remodelar a sua casa? Ou comprar uma mobília nova? Ou até mesmo iniciar os estudos? São até 5 milhões
de kwanzas e 60 meses para pagar. Super Ordenado BAI. O dinheiro que precisa, agora.
Angola • Cabo Verde • Portugal • África do Sul
África21– junho 2014
3
sumário
Censo em Angola
Copa do Mundo
No último censo efetuado em 1970,
Angola tinha 5,6 milhões de habitantes.
Em 16 de maio de 2014, mais de 60 mil
recenseadores partiram para o terreno
de jipe, helicóptero e de barco para
descobrirem quantas pessoas residem
atualmente no país e em que condições.
Tomás Tim-Tim
20
A poucos dias do Mundial de Futebol no Brasil as manifestações de rua não
param, sobretudo em São Paulo e Rio de Janeiro. Em 5 de outubro há eleições
gerais. O desempenho da seleção canarinha vai influenciar a reeleição de Dilma
Rousseff.
30
Teixeira Cândido
Compras africanas na Europa
África do Sul
69
58
Grupos privados africanos compram fábricas na Europa para
adquirirem vantagens competitivas, com os empresários a
diversificar a economia e a criar empregos.
Nicole Guardiola
Jacob Zuma foi eleito para um segundo mandato, e o ANC
venceu com 62%, insuficientes para a maioria qualificada
no Parlamento, obrigando a negociar os grandes projetos
com a oposição.
Gaye Davis
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4
junho 2014 –
África21
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aos leitores
Quase a entrar em campo
Faltam duas semanas para que a
bola comece a rolar no Arena de
São Paulo.
Com ou sem manifestações
furiosas contra o despesismo do
Entrevista
Mundial de Futebol, o certo é que nas
Mayra Andrade
nove cidades brasileiras onde se
Nova sonoridade
disputam os jogos tudo já está pronto
Gláucia Nogueira
[email protected]
para a grande festa colorida, com
muito samba, animação, convívios e cerveja fora do estádio.
33ANGOLA Caminhos da diplomacia
Mas falta ainda saber se as bilionárias obras dos estádios,
Miguel Correia
vias de acesso, comunicações, aeroportos, estarão concluídas a
34ANGOLA Traçar o mapa dos minerais
tempo. Infraestruturas imprescindíveis para os Jogos Olímpicos
João Belisario
de 2016, no Rio de Janeiro.
36ANGOLA Lula da Silva e luta contra a fome
A esperança é remetida para o jeitinho brasileiro de que vai
João Belisario
tudo correr bem. Diga-se de passagem que o famoso «padrão
38CRÓNICA DA TERRA Fernando Pacheco
europeu» invocado pelos dirigentes na maior prova futebolística,
42CABO VERDE Desenvolvimento estratégico
entre os quais o inefável Joseph Blatter, e também Pelé, nem
Natacha Mosso
sempre foi imaculado na Europa e na América Latina. Nas
46guiné-bissau Retorno progressivo à democracia
vésperas do Mundial de 2010 na África do Sul, primeiro e
Almami Júlio Cuiaté
único que aconteceu no continente, as descrenças também
52SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE Recursos não petrolíferos
foram muitas, mas os responsáveis sul-africanos foram depois
Juvenal Rodrigues
elogiados pelo êxito alcançado.
54ÁFRICA Ingerência ou ajuda militar
No Brasil resta saber se as escaramuças quase diárias entre
Nicole Guardiola
polícias e favelados estarão suspensas, garantindo a segurança
61BRASIL Violência no Rio
dos brasileiros e turistas de todo o mundo nas nove capitais dos
Carlos Castilho
estados que vão receber a Copa.
64AMÉRICA LATINA Uruguai recebe Guantánamo
Caso tudo corra bem, sobretudo se a seleção canarinha
Manrique S. Gaudin
alcançar a sexta vitória do campeonato da FIFA, os protestos
66ÁFRICA-EUA Obama volta-se para África
de rua serão abafados pela euforia.
Itamar Souza
E seis semanas após a final no carioca Maracanã, os
74ECONOMIA Associação de consumidores CPLP
brasileiros vão a votos e Dilma Rousseff acreditará que tem a
João Carlos
reeleição assegurada.
81LÍNGUA PORTUGUESA Promoção e dificuldades orçamentais
As seleções candidatas a erguer a Taça Jules Rimet são as
João Carlos
habituais. Brasil, Argentina, Espanha e Alemanha. Para Felipe
83MOÇAMBIQUE A batida do rap
Scolari será ouro sobre azul ganhar o segundo mundial.
João Vaz de Almada
Há, no entanto, grandes dúvidas sobre a performance com
que chegarão três «astros» do Desporto Rei. Hoje, Neymar,
Messi e Cristiano Ronaldo ainda não recuperaram totalmente
29 Pepetela
11 Antena21
das lesões que os atormentam.
45 Germano de Almeida
19 Gente
Para nós, simples mortais sem passaporte para a Copa,
51 Odete Costa Semedo
76 Insumos
temos lugar marcado diante da televisão. Consolemo-nos.
96 João Melo
88 Cults
Estamos juntos com milhares de milhões de aficionados do
92 Livro do Mês
94 Ver, Ouvir Ler
planeta.
Carlos Pinto Santos
Ilustração da capa: Cristina Sampaio
6
Rubricas
Crónicas
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Entrevista a Mayra Andrade, cantora
“Eu sei que a minha força, lá fora,
é ser cabo-verdiana”
Jovem musa da world music aferra-se à liberdade de ser mais pop,
porque antes de ser «cantora cabo-verdiana», é simplesmente cantora
Gláucia Nogueira
África21 Com quatro discos em sete anos, em que
ponto acha que chegou na sua carreira?
MAYRA ANDRADE Com o último disco, Lovely
dificult, acho que «meti a quarta», é um momento de
viragem, nunca de rutura, para uma direção em que
tenho ainda de ir mais fundo. É o começo de novas
experimentações. Criei um precedente para poder ir
ainda mais longe, tendo de alguma forma preparado
o meu público para isso. Não que tenha ficado por
meias medidas, neste disco fui até onde queria ir, não
tenho ideia do que vai ser o próximo, mas na minha
carreira estou certamente a começar uma fase nova.
Com uma aposta mais pop, os públicos a atingir expandem-se? Sobretudo em que países?
Com cada disco a gente vai alargando o seu público,
e com este há a adesão de um público menos world
music, menos de entendedores da música tradicional,
que acabou por aderir à minha música um pouco por
causa desses sinais, digamos, mais contemporâneos.
Eu acabo de passar 12 anos da minha vida em França. Nunca tinha vivido 12 anos num mesmo lugar.
Não havia como não materializar essa minha vivência
europeia num disco. Lovely dificult foi um espaço
para isso.
Procura ser uma cantora, tout court, e não «cantora
cabo-verdiana»? É essa etiqueta que quer evitar?
Sim, a afirmação da minha cabo-verdianidade é uma
coisa que está no meu ADN, emociono-me com
Cabo Verde das formas mais imprevisíveis, mas ao
mesmo tempo tenho uma afirmação muito forte da
minha liberdade de criação. Desde o início quis
mostrar que ia fazer um percurso um pouco à beira
do tradicional. Tradicional com jazz, com influências
brasileiras, com influências africanas, com o que fosse
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África21
chegando a mim e que eu fosse assimilando, gostando e que eu quisesse traduzir na minha música. Então, sim, antes de «cantora cabo-verdiana», uma
cantora. Comecei a cantar quanto tinha três ou quatro anos, na altura pedi um violão à minha mãe.
E nessa época, eu não sabia o que era ser «cantora
cabo-verdiana», eu só queria cantar. Eu sei que a minha força, lá fora, é ser cabo-verdiana, e para mim
tanto melhor, mas o que me torna única é a minha
vivência. Acho que a minha música é um reflexo
muito fiel do meu percurso de vida, as viagens que
fiz, as oportunidades que tive. Mas o facto de eu ser
cabo-verdiana também me torna única lá fora, como
a qualquer outro cabo-verdiano. Mas se eu não me
afastar, não explorar outras coisas, vou apagar-me.
Não suporto o tédio; se eu estiver em piloto automático, afasto-me da música. Costumo dizer que a música é como alguém da minha família, que foi crescendo comigo. Então, tenho um respeito muito
grande pelo facto de poder cantar.
Essa individualidade bem vincada, por que sempre se
pautou, tem um preço? Em Cabo Verde, sobretudo,
onde há um certo conservadorismo ou pendor para o
tradicional?
Tem um preço que é não ser popular, ou não ser
entendido no momento em que estou a propor esse
som novo. Tenho a impressão que há um delay entre
o momento em que lanço uma proposta e o momento em que essa proposta é completamente entendida
ou assimilada. Temos um conservadorismo, um
protecionismo muito forte em relação à música tradicional, mas em relação a mim, penso que já há um
certo hábito. A viragem foi tão forte neste disco que
as reações foram muito mais positivas do que eu esperava. Enquanto se está numa meia-água, há sempre
SANDRO CAMPARDO/LUSA
Em Cabo
Verde há um
conservadorismo,
um protecionismo
muito forte em
relação à música
tradicional
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aquelas opiniões, não é bem tradicional, falta aquele
sal, aquela pimenta, aquela malagueta cabo-verdiana.
Quando se dá alguma coisa mais moderna, mais pop,
parece que há um alívio, como se as pessoas dissessem, ok, já não estamos no tradicional, então podemos aceitar isso como uma coisa diferente. É um
bocado difícil de explicar. Mas ao mesmo tempo, há
no público pessoas que me seguem e abraçam por
onde eu for e que têm essa abertura natural, enquanto outras vêm falar do meu primeiro disco, dizendo
que é muito bom, quando se calhar na altura achavam que faltava alguma coisa. Em Cabo Verde há
uma certa atração por dar ao público aquilo que se
pensa que ele quer pelo risco de não se ser totalmente
aclamado.
Em que medida a editora influencia?
Depende muito de cada artista. Quando não se sabe
o que se quer fazer, eles costumam ter umas fórmulas
predefinidas. Mas quando se mostra o que se quer,
normalmente opinam mas de uma forma muito
mais distante. Neste disco eu pedi que me acompanhassem mais, ter propostas de produtores e músicos
que eu não conhecia, porque era um mundo no qual
eu ainda não tinha estado. Então deram apoio nesse
sentido, mas sou muito independente no trabalho
que faço. Tive reuniões na Sony em que o diretor
artístico da Columbia dizia, este disco pode ser uma
coisa meio Sade, meio Norah Jones, meio não sei
quê, e em determinado momento explodi, dizendo
que não queria ouvir isso, não, que não sou nem uma
nem a outra. O risco é ser uma projeção dum fantas-
A música
é como alguém
da minha
família, que
foi crescendo
comigo
É preciso lutar
para que no
final as pessoas
tenham na
mão um disco
que nós
reivindicamos,
que podemos
assumir
Mayra Andrade
SANDRO CAMPARDO/LUSA
Em 2001, aos 16 anos, deu início a uma
carreira cujo ponto de partida foi uma medalha de ouro nos IV Jogos da Francofonia, no
Canadá, vencendo cerca de 1900 concorrentes de vários países. Como parte do
prémio era uma formação artístico-profissional em França, em 2002 transfere-se para
Paris, onde vive desde então. Os prémios,
esses, continuaram a chegar, bem como
convites para participações em trabalhos de outros artistas e duetos, entre os
quais com Charles Aznavour.
Ao longo da sua infância, a cantora viveu em diferentes países (Senegal,
Angola, Alemanha), devido ao facto de o padrasto ser diplomata. Esse percurso deu-lhe à-vontade para cantar em várias línguas e influências musicais
diversas, em que a brasileira é reivindicada de forma especial.
A sua discografia começa em 2006 já numa grande editora, a Sony Music,
pela qual gravou Navega (2006), Stória Stória (2009), Studio 105 (2010) e Lovely dificult (2013). O mais recente traz uma linguagem mais pop que a distância
um pouco do segmento world music em que se inseria, aposta que a cantora
reivindica como reflexo da sua liberdade, sem medo de não agradar.
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ma, duma fantasia, de algo que querem reproduzir
devido ao sucesso que aquilo teve. Depois dessa minha reação, foi ótimo. O que aconteceu é que eu estava dentro da etiqueta Sony Jazz, que foi fechada, e
passei para a Columbia, que tem artistas muito mais
pop, internacionais. E é onde essas fórmulas existem
muito mais que no jazz e no clássico. Houve toda
uma reestruturação e mudei de equipa, comecei a
trabalhar com pessoas que me viam chegar do outro
selo e diziam, pronto, agora vamos fazer de ti tal coisa. Então tive de reagir, mas isso acabou por gerar
uma relação muito boa, acaba-se por obter o respeito
das pessoas, mesmo quando tens de brigar um pouco. É preciso lutar para que no final as pessoas tenham na mão um disco que nós reivindicamos, que
podemos assumir. Mas, ao mesmo tempo, essas pessoas têm algo a trazer-nos em termos de desafios e
novas propostas.
Esteve em Cabo Verde a participar nas comemorações dos 80 anos de Pedro Pires. Tendo nascido dez
anos após a independência, que imagem tem dessa
geração que lutou pela independência?
No espetáculo na Assembleia Nacional, eu tentei
agradecer a Pedro Pires e caiu em cima de mim um
tijolo de emoção, duas vezes em três músicas… São
coisas que eu não verbalizo mas que sinto. A minha
gratidão por essa geração é muito concreta, palpável.
Sempre me interessei em saber como era Cabo Verde
antes, o porquê dessa luta, o que o meu pai viveu, o
que os meus avós viveram. O meu pai foi o mais jovem combatente na luta pela independência. Às vezes
até soa estranho, lá fora, esse sentido de patriotismo.
Se um francês falar da França como nós falamos de
Cabo Verde até é mal visto. Mas, enfim, é um sentimento de gratidão.
Em que difere deles a sua geração, que por vezes é
vista como uma geração mimada, sem causas, que
não lida bem com as frustrações. Há causas para
lutar?
Parece-me que para eles estava tudo mais claro, a direita, a esquerda… Faltava tanto que era muito mais
fácil toda a gente olhar para a mesma direção, daí esse
sentimento de grupo, de união, de unidade, de sacrifício comum para todos. Essa geração mimada sofre
muito de não ter isso.
Não há causas?
Há. Haverá sempre, mas naquele tempo era a sobrevivência, era a independência, a luta, agora temos o
essencial. Torna-se mais difícil pôr o mesmo entusiasmo, a mesma dedicação, o mesmo sentido de sacrifício no que fazemos.
LANÇAMENTO
O maior complexo multiuso de Angola
vai ganhar mais uma etapa.
Quem acreditar vai ganhar.
5
etapa
2 torres
Salas de 249,63 m 2 a 1022,77 m 2
Mall com loja de conveniência, café, banco e restaurante
4 opções de plantas
Localizado em Talatona
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África21
de dólares é quanto rende,
segundo a OIT,
o trabalho forçado no mundo
“
Há certamente cumplicidades (com a
Boko Haram) entre uma parte da população,
por adesão ou intimidação ou as duas coisas
ao mesmo tempo
Banco Mundial apoia Angola em mil milhões de dólares
O Banco Mundial (BM) vai apoiar o Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, com mil milhões de dólares a serem investidos nas áreas da educação, saúde e agricultura. O anúncio foi
feito em Luanda, no final de maio, por Gregor Binkert, diretor das operações para Angola do BM.
«O Banco Mundial decidiu, através do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento, apoiar Angola por ser um país africano com um ritmo de crescimento considerável nos
últimos anos», explicou o gestor, que participou em Luanda no workshop «Financiamento às
infraestruturas, à agricultura e agropecuária», coorganizado pela Agência Nacional para o Investimento Privado (ANIP) e Banco Mundial. «Queremos, nos próximos meses, analisar e ver
quais serão as prioridades e mecanismos em que vamos disponibilizar os recursos do Banco
Mundial e usar o dinheiro como garantias que podem alavancar mais financiamento ao setor
privado», explicou.
Binkert considerou que apoiar a implementação do Plano Nacional de Desenvolvimento é
fundamental para a melhoria da qualidade de vida da população. O gestor considerou fundamental apoiar Angola na implementação do Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017
porque o país precisa de mais infraestruturas para melhorar a qualidade de vida das suas
populações.
PIERRE BUYOYA, ex-Presidente do Burundi,
coordenador da missão da Comissão da UA
para a luta contra o terrorismo no Sahel
PAULO MULAZA/JORNAL DE ANGOLA
Antena21
150 mil milhões
Gregor Binkert, diretor das operações
para Angola do Banco Mundial
Angola prevê aumento de 30%
dos inscritos na Segurança Social
O Sistema de Segurança Social de Angola regista 1.169.112
trabalhadores, prevendo-se que este número aumente 30%
até 2017. Os dados constam de um relatório apresentado em
maio por Manuel Moreira, coordenador executivo do Plano de
Sustentabilidade e Gestão da Segurança Social, durante uma
mesa redonda promovida por uma comissão da Assembleia
Nacional (AN). O encontro, que juntou parceiros sociais, líderes sindicais, de associações empresariais e ONG, teve como
objetivo recolher contributos que fomentem uma melhor fiscalização, enquadramento e proteção dos trabalhadores.
Segundo o documento apresentado por Manuel Moreira,
entre 2002 e 2013, registou-se a inscrição anual média de
aproximadamente 80 mil contribuintes, enquanto até 2002, a
média anual era inferir a 10 mil. O sistema registava no ano
passado 87.762 pensionistas, com uma média de idades de
67 anos. As pensões por velhice atingiram em 2012 o valor
médio de 40 mil kwanzas (400 dólares), quando em 2007 tinham metade desse valor.
Joana Lina, primeira vice-presidente da AN, lembrou
como a proteção social evoluiu e se alargou em Angola
desde 1975; o estabelecimento da licença de maternidade
para todas as mulheres trabalhadoras, subsídio por morte e
funeral e generalização do abono de família em 1978; e a
institucionalização, em 1990, do Sistema Nacional de Segurança Social, assente nos princípios da universalidade,
igualdade, eficácia e solidariedade.
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11
1800 milhões
de dólares é o prejuízo estimado
de quatro meses de greve
nas minas de platina sul-africanas
“
Nem Kadhafi no auge da repressão
se atreveu a bombardear-nos com aviões
como fez Haftar
AHMED AL-JAZAOUI, porta-voz
da coligação revolucionária de Bengasi, Líbia
O novo primeiro-ministro maliano, Moussa Mara, quis visitar o Norte do
Mali para afirmar a restauração da autoridade do Estado sobre todo o
território, mas a sua ida a Kidal, «capital» autoproclamada dos independentistas tuaregues do MNLA (Movimento Nacional de Libertação do
Azawad), saldou-se em (mais uma) humilhante derrota do exército maliano. Depois de pôr em fuga o primeiro-ministro e a sua comitiva e de assassinar dezenas de altos funcionários, os rebeldes tomaram conta da cidade
e lançaram uma ofensiva sobre várias outras localidades. Segundo o
Governo de Bamako, os mesmos grupos armados jihadistas – AQMI,
Ansardine, MUJAO – que tinham ocupado a região em 2012 estão de
novo a combater ao lado do MNLA, o que este desmente.
A França adiou a retirada dos efetivos da «Operação Serval», e
mandou reforços para Gao, prevendo uma eventual progressão dos rebeldes para Sul. A ONU apela a um cessar-fogo e a «negociações inclusivas» mas Ibrahim Boubacar Keita, Presidente do Mali, diz que os crimes
de Kidal não podem ficar impunes e que o MNLA perdeu legitimidade
como interlocutor, ao desrespeitar a integridade territorial do país.
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África21
DR
Mali de novo em pé de guerra
Em França, a Frente Nacional, de extrema-direita, venceu as
europeias com 25% dos votos, e o Partido Socialista (no poder) foi
relegado para o terceiro lugar com 14%
Eletrochoque eleitoral
para a União Europeia
Sismo, tsunami, rejeição, a imprensa europeia rivaliza em
clichés catastrofistas para descrever os resultados das eleições ao Parlamento de Estrasburgo. Mas as vitórias dos
«soberanistas» no Reino Unido, na Dinamarca e sobretudo
em França não devem servir para deturpar o sentido do escrutínio de 25 de maio. Este revelou uma profunda desconfiança em relação à forma como as instituições europeias e
os governos lidam com a crise económica e social no Velho
Continente. O sinal mais visível é a elevada abstenção (58%
para toda a UE) – mais forte na «nova Europa» (87% na Eslováquia e 77% na Polónia) – que nos países fundadores.
Mas os 380 milhões de eleitores europeus também não
acreditam na mera alternância entre conservadores e socialistas para mudar o rumo das políticas europeias.
Portugal é disso um exemplo. À «derrota histórica» da coligação PSD-CDS correspondeu uma «vitória pífia» do PS que
ficou menos de 4% de votos acima do adversário principal.
Uma abstenção recorde de 66% deu a vantagem aos partidos
«antissistema»: o PCP – que registou o melhor resultado percentual desde 1989 – e o Partido da Terra, cuja lista liderada
pelo ex-bastonário da Ordem dos Advogados Marinho e Pinto,
ficou em quarto lugar com mais de 7% dos votos.
Contudo os «partidos europeístas» continuam maioritários
em Portugal – onde PS, PSD e CDS reuniram 59% dos votos
– e também na União. Com 523 deputados em 751 (212 do
PPE, 186 PSE, 70 liberais e 55 verdes), os atuais dirigentes
europeus não têm nada a temer dos cerca de 130 «eurofóbicos» mas estes já mostraram que o seu objetivo é a conquista
do poder nos respetivos países. Por isso, minimizar o que
aconteceu em 25 de maio pode revelar-se suicidário por parte
dos democratas europeus confrontados com a subida dos nacionalismos populistas, xenófobos e até neonazis.
1000 milhões
de pessoas ainda subsistirão com menos
de 1,25 dólares/dia em 2015,
ano do final dos Objetivos
de Desenvolvimento do Milénio
A sombra de Nasser
sobre as eleições egípcias
DR
Mais de 94% dos 318.033 eleitores egípcios da diáspora,
que votaram entre 15 e 19 de maio, deram o seu voto ao
marechal (reformado) Abdel Fattah al-Sissi, contribuindo
para uma antevisão do tsunami eleitoral esperado a 26 e 27
de maio. O homem que colheu os louros do derrube do
Presidente Morsi e do regime dos Irmãos Muçulmanos não
fez campanha eleitoral, limitando-se a afirmar que a segurança e o relançamento da economia – que promete pôr em
ordem no prazo de dois anos – serão as suas prioridades.
Se a maioria dos egípcios não pede outra coisa, os
meios empresariais e financeiros internacionais preocupam-se com os recursos que Sissi – que se apresenta
como o novo Gamal Abdel Nasser, o carismático presidente socialista que governou o Egipto de 1956 a 1970 – entende utilizar para atingir as suas metas. São preocupantes
as suas declarações a favor do reforço do papel do Estado
«na planificação, organização e realização» dos projetos
económicos e a intenção de pôr o setor privado a contribuir
(voluntariamente) de modo a constituir um fundo de 10 mil
milhões de dólares para estabilizar os preços e financiar
investimentos públicos.
Por acaso ou talvez não, o único adversário de al-Sissi
nesta eleição foi Hamdeen al-Sabbahi, líder do partido
nasserista de esquerda al-Karama, que chegou em terceiro
lugar nas eleições de 2012. Al-Sabbahi, que calcorreou o
Egipto de lés-a-lés durante a campanha, partilha muitas das
ideias de Sissi, incluído o ódio visceral contra os Irmãos
Muçulmanos, mas acusa os militares de quererem instaurar um regime autoritário. No fundo a rivalidade política
entre os dois candidatos resume-se a interpretações diferentes do legado de Nasser.
Marechal al-Sissi
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13
“
80.000 milhões
Vamos levar a guerra para dentro do
Quénia
Os Presidentes Xi Jinping e Vladimir Putin
Parceria energética Rússia-China
Em visita oficial a Xangai – a primeira desde a chegada
ao poder do novo Presidente chinês Xi Jinping – Vladimir Putin assinou um acordo qualificado de «histórico»
em matéria de energia, petróleo mas sobretudo gás.
A crise da Ucrânia e o desejo de Moscovo em reduzir a sua dependência económica das exportações de
gás para a Europa ajudaram a desbloquear as negociações com o gigante russo Gazprom para o fornecimento de gás da Sibéria para a China, que se arrastavam desde 2004. O acordo terá uma duração de 30
anos e prevê a exportação para a China de cerca de 38
mil milhões de metros cúbicos de gás natural, negócio
avaliado em mais de 400 mil milhões de dólares. Para
o efeito será construído um novo gasoduto que deverá
estar plenamente operacional em 2018.
A China já é atualmente o principal parceiro comercial da Rússia, numa relação comercial que gera um
fluxo anual de 90 mil milhões de dólares. A aproximação entre Moscovo e Pequim, para a qual contribuirá
este acordo energético, pretende duplicar nos próximos dez anos os fluxos comerciais entre os dois
países.
14
junho 2014 –
África21
FUAD MOHAMED, chefe militar
dos Shebab no sul da Somália
Terramoto eleitoral na Índia
A anunciada vitória do Bahratiya Janata Party (BJP) nas eleições legislativas de abril-maio na Índia ultrapassou todas as previsões e a maioria
esmagadora de que vai dispor no Parlamento de Deli faz do novo primeiro-ministro Narendra Modi o líder mais poderoso deste país, de 1200 milhões de habitantes, desde os tempos áureos da dinastia Nehru-Gandhi.
À cabeça do estado de Gujarat há mais de uma década, Modi prometeu aplicar em todo o país as receitas ultraliberais que estão na origem da
rápida industrialização e aparente prosperidade deste estado do noroeste
da Índia. Obteve o apoio dos grandes grupos económicos e da classe
média urbana, mas a sua personalidade e autoritarismo – criticados
mesmo no seio do BJP – suscitam sérios receios. Com efeito, o rótulo de
«nacionalista» utilizado no Ocidente não é correto. A Índia é um mosaico
de povos, culturas e religiões e foi o Partido do Congresso fundado por
Nehru que encarnou durante mais de meio século o nacionalismo indiano,
laico e pluricultural. O BJP é um partido religioso (hindu) e Modi, se pretende governar para todos os indianos, não deixa de considerar o hinduísmo,
maioritário, como um traço fundamental da identidade nacional que deve
ser respeitado pelos praticantes das outras religiões.
Desgastado pelo poder, o arrefecimento da economia e os escândalos, o partido do Congresso que registou o seu pior resultado desde a independência, com pouco mais de 50 deputados eleitos num total de 543,
diz que chegou a hora de uma profunda reflexão sobre as causas deste
revés histórico. Sónia Gandhi, ainda líder do partido, alertou para a necessidade de sensibilizar a população para a defesa da laicidade e dos programas sociais de luta sob pena de agravar as tensões sectárias e de fazer perigar a unidade nacional.
DR
DR
de dólares é o total previsto
dos investimentos diretos estrangeiros
em África em 2014
Narendra Modi, novo primeiro-ministro indiano
“
53 milhões
Na Nigéria, os Estados Unidos são
os únicos a ajudar a encontrar as jovens
raptadas pela Boko Haram. Os outros países
não foram convidados nem se ofereceram»
de turistas visitaram África em 2012,
as receitas têm aumentado
6% a 10% ao ano desde 2000
JOHN KERRY, chefe da diplomacia dos EUA
O general (reformado) Khalifa Haftar, que lançou a «Operação Dignidade» para libertar Bengasi – e a Líbia – das milícias islamistas radicais, está em vias de realizar a sua aposta. Depois de obter o apoio
da mais poderosa milícia do oeste (Zintan), das Forças Especiais e
dos três chefes do estado-maior do exército nacional, Haftar exige a
demissão do Parlamento e do Governo interino e a formação de um
conselho presidencial civil para organizar as eleições legislativas,
marcadas antecipadamente para 25 de junho.
Totalmente isolado, o poder político acabou por aceitar que o
Congresso Geral Nacional (Parlamento provisório dominado pelos
islamistas) entre de férias depois de aprovar o orçamento para 2014,
mas não se sabe ao certo quem manda em Trípoli, se o novo primeiro-ministro Ahmed Mittig, que ainda não formou governo, se o seu
antecessor Abdalá al-Theni, cujo ministro da cultura Habib Lamine
apoia publicamente a iniciativa do general Haftar.
As intenções deste não são claras e os seus biógrafos não as
esclarecem: enquanto uns destacam que serviu sob Khadafi durante a
DR
Um discípulo de Sissi novo homem forte da Líbia?
Khalifa Haftar
guerra do Chade, outros fazem notar que esteve exilado nos EUA
durante 20 anos e só regressou à Líbia para participar ao derrube do
anterior regime. Uns dizem-no «agente da CIA», outros «discípulo
do egípcio al-Sissi». Seja como for, toda a gente parece estar farta do
caos líbio. Argélia, Egipto e Tunísia fecharam as fronteiras e reforçam os
controlos; árabes e europeus retiram o pessoal diplomático e civil; o
primeiro-ministro italiano apela à comunidade internacional para intervir
no sentido de repor a ordem na Líbia e acabar com o fluxo de migrantes
que atravessam o Mediterrâneo.
África21– junho 2014
15
DR
de espectadores em todo o mundo
assistiram à final da Liga dos Campeões
no estádio da luz.
General Prayuth chan-Ocha
Golpe de Estado
na Tailândia
As forças armadas e de segurança da
Tailândia tomaram o poder em 22 de
maio para pôr termo à crise política que
se arrastava há sete meses.
O general Prayuth Chan-ocha anunciou
a suspensão da Constituição, a instauração do recolher obrigatório das 22 às
5 horas, e mandou prender os representantes das duas fações em luta e a
ex-primeira-ministra eleita em 2011, ao
mesmo tempo que apelava aos funcionários públicos e restante população a
continuarem as suas atividades.
O golpe foi unanimemente condenado no Ocidente, mas na Tailândia
não se observou grandes reações
populares. Este próspero país asiático detém o recorde mundial dos golpes militares: 19 desde 1932 e mais
dez a vinte tentativas. Os militares
que governaram o país de 1947 a
1973 são acima de tudo leais ao rei
Bumibhol, que festejará em junho os
seus 68 anos de reinado e é atualmente o Chefe de Estado mais antigo
do mundo.
Desde 1973, os militares que tomaram o poder fizeram-no para criar
as condições para a resolução das
crises, devolvendo-o a seguir aos civis. Desta vez, porém, as coisas podem ser mais complicadas porque o
soberano, garante da estabilidade,
tem 87 anos, está doente e o príncipe
herdeiro não é popular como o pai,
venerado pela maioria da população.
16
junho 2014 –
África21
“
Os jogadores estavam mortos
na segunda parte
JORGE JESUS, treinador do Benfica,
no final da Taça de Portugal
Visita de Joseph Kabila a Paris
Um mês depois do Presidente angolano José Eduardo dos Santos foi a vez de Joseph Kabila, Presidente da República Democrática do Congo (RDC) ser recebido na capital francesa
para falar da estabilidade na África Central e na República Centro-Africana (RCA).
Ao contrário do chefe da diplomacia americana John Kerry que, de passagem por
Kinshasa, se tinha permitido opor-se publicamente a uma eventual recandidatura de
Kabila à Presidência em 2017, as autoridades francesas evitaram cuidadosamente toda
a ingerência nos assuntos internos da RDC. Agradecem o contributo da RDC à força
africana de paz na RCA (o maior, de 850 homens) e pedem mais, com a perspetiva de
virem a integrar a força da ONU em formação.
Kabila, entretanto, tem outras dores de cabeça, como o regresso de milhares de
nacionais expulsos da vizinha República do Congo. Desde abril são mais de 100.000 os
que atravessaram o rio e se amontoam em campos improvisados nos arredores de
Kinshasa, em condições precárias. Os «retornados» queixam-se de maus tratos, violações e roubos por parte da polícia de Brazzaville e de incitação à violência das populações. Há mais de 600.000 naturais da RDC a residirem no país vizinho, muitos deles há
gerações e de forma legal. Em nome do princípio de reciprocidade, Kinshasa restabeleceu os vistos para os cidadãos do Congo Brazzaville que se desloquem para a RDC.
DR
4000 milhões
Sudão do Sul entre o pau e a cenoura
O acordo assinado a 9 de maio sob pressão internacional não acabou com os combates
entre os partidários do Presidente Salva Kiir e do seu ex-vice-presidente Riek Machar
em curso desde dezembro de 2013. Há mais de quatro milhões de pessoas em risco de
vida por causa dos combates e da fome, e as ONG alertam para o perigo de catástrofe
humanitária agora que as chuvas tornam intransitáveis as (poucas) estradas do país.
Foram detetados casos de cólera em Juba, a capital. Segundo os analistas, só um
acordo de partilha do poder entre os dois rivais poderá resolver a situação e é duvidoso
que isso se consiga pela via das eleições antecipadas previstas no acordo. Os «padrinhos» do mais jovem Estado africano, com os Estados Unidos à cabeça, recorrem alternadamente às ameaças de sanções e às ofertas de ajuda para tentar travar o descalabro.
Enquanto a ONU estabeleceu uma lista negra dos alegados responsáveis pela violação do
cessar-fogo, uma conferência de doadores pôs a 20 de maio mais 600 milhões de dólares
sobre a mesa das autoridades de Juba para combater a pobreza e desenvolver as infraestruturas. O Uganda, que enviou tropas para apoiar as de Salva Kiir, reclama a criação
«urgente» de uma força africana de interposição para o Sudão do Sul.
“
Gente
O uso da violação como arma de guerra
é um dos mais horrendos e selvagens crimes
contra civis
ANGELINA JOLIE, atriz
Luta contra o terrorismo
divide a União Africana
DR
A África do Sul prepara-se para relançar o debate
sobre a criação de uma força africana de reação
rápida, capaz de intervir a todo o momento e em
qualquer ponto do continente africano para prevenir
conflitos armados ou evitar o seu alastramento.
A discussão não é nova, mas ganhou atualidade com o agravamento da situação no Sudão do
Sul, República Centro-Africana, Quénia e sobretudo na Nigéria. O facto do «grupo dos 5», também
chamado de «protocolo de Nouakchott» – criado
em 2013 pela Comissão da União Africana na sequência da crise do Mali – e a própria UA – não
terem sido convidados para participar na cimeira
de Paris de 17 de maio, em que participaram a
Nigéria, Chade, Níger, Camarões, os Estados
Unidos e a União Europeia, levou Pretória a ir a
Abuja «pedir contas» ao Presidente nigeriano
Goodluck Jonathan. «A luta contra o terrorismo em
África diz respeito aos africanos», diz o ex-Presidente do Burundi, Pierre Buyoya, presidente do
«Grupo dos 5».
Quer os Camarões quer o Níger, que não têm
as melhores relações com a Nigéria, mostram
pouco entusiasmo para alinhar na «guerra total»
contra a Boko Haram sob a batuta dos serviços
secretos nigerianos e ocidentais, e têm procurado
fazer face às rebeliões e ameaças terroristas com
os seus próprios meios sem abdicar da defesa da
sua soberania. Um diplomata francês justificou o
não ter sido feito convite à UA pelo facto da organização pan-africana não ter forças armadas e de
segurança. A União Europeia também não as tem.
Daphne Mashile-Nkosi A sul-africana, presidente da
Kalagadi Manganese, é a única mulher do mundo a dirigir uma empresa mineira e recebeu na Suíça o prémio de CEO do ano atribuído pelo African CEO Forum.
«A indústria mineira não tem sido um caminho fácil,
especialmente para uma mulher negra, mas com perseverança consegui superar os muitos obstáculos que
foram colocados no meu caminho», afirmou no discurso de
agradecimento. Acrescentou ainda que a atribuição do prémio significa que «uma
mulher africana pode deixar a sua marca na indústria mineira dominada por homens». Amir Ben Yahmed, presidente do African CEO Forum, afirmou que
Mashile-Nkosi era a «candidata ideal» ao prémio pelo seu papel como gestora e
também pelo passado de empreendedora. «Ela lançou em 1999 a Eyesizwe
Coal, que hoje é conhecida como o gigante mineiro Exxaro», lembrou. A Kalagadi
Manganese, que emprega 3000 pessoas e processa anualmente três milhões de
toneladas de manganês, tem desempenhado um papel de destaque no desenvolvimento da província de Northern Cape.
Helena Costa Aos 36 anos, esta portuguesa tornou-se a
primeira mulher do mundo a treinar uma equipa de futebol profissional masculina: o Clermont Foot 63, que
joga na 2.ª divisão da Liga francesa. Antes de se tornar
conhecida no estrangeiro, Helena Costa treinou equipas jovens do Benfica, as femininas Sociedade União
1.º de Dezembro e Odivelas Futebol Clube, a equipa
masculina da Sociedade Recreativa e Desportiva Cheleirense. Depois mudou-se para o Médio Oriente. Foi selecionadora nacional feminina de futebol no Qatar – onde montou toda a estrutura do
futebol feminino no país – e no Irão. Colaborou igualmente com o Celtic de
Glasgow, como «olheira». Licenciada em Ciências do Desporto, fez Mestrado em
Análise de Jogo, foi a melhor classificada no primeiro curso de treinadores que
fez na Associação de Futebol de Lisboa, entre 120 candidatos; fez depois os
cursos de treinadores UEFA nível 2 e nível 3 pela Federação Portuguesa de
Futebol. O Clermont Foot 63 terminou a época a meio da tabela e espera que a
experiência de Helena Costa o possa levar à primeira divisão da Liga francesa.
Muhammad Sa’ad Abubakar Sultão de Sokoto, Muhammad Sa’ad Abubakar apelou aos muçulmanos para se
unirem contra o terrorismo e, em particular, contra a
seita Boko Haram. Nascido em 1956, Abubakar, que
foi brigadeiro no exército nigeriano até à morte do irmão, subiu ao trono em 2006. Seguidor da doutrina
malequita como a maioria dos islamitas africanos, o
sultão de Sokoto não é apenas o chefe espiritual dos 70
milhões de muçulmanos nigerianos. Como herdeiro de uma
dinastia fundada no século XVIII, e que reinou sobre um dos maiores impérios
pré-coloniais de África, a sua autoridade é reconhecida pelos líderes tradicionais
da maioria dos estados do norte da Nigéria e dos países vizinhos. Considerado
uma das 500 personalidades muçulmanas mais influentes no mundo, o sultão
convidou o Governo nigeriano a preferir o diálogo à repressão, e a pôr termo à
violência e discriminações étnico-religiosas.
África21– junho 2014
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Copa do Mundo 2014
Quando futebol
Em vinte Campeonatos do Mundo de Futebol, o Brasil apenas falhou um.
Cinco vezes campeão, o anfitrião da Copa
vai tentar o hexacampeonato com a seleção
canarinha comandada por Luiz Felipe Scolari, que deu aos brasileiros a quinta e última
vitória em 2002, disputada na Coreia e Japão.
Nas nove capitais dos estados, vão a jogo 32
seleções, cinco das quais são africanas.
Brasil, Espanha, Alemanha e Argentina
são as favoritas, a que se podem juntar as de
18
junho 2014 –
África21
CAMPEONATO DO MUNDO DE FUTEBOL 2014
e política se misturam
segunda linha, lideradas pela Holanda, Portugal e Itália. A esperança dos africanos recai na
seleção Gana, devido ao seu desempenho nos
mundiais de 2006 e 2010.
A dez dias do jogo inaugural em São Paulo,
espera-se que os fabulosos Lionel Messi, Neymar e Cristiano Ronaldo recuperem a cem por
cento das suas prolongadas lesões. Como se
viu na final da Liga dos Campeões Europeus, o
CR-7 (o atual melhor do mundo) que passou à
margem do jogo, precisou de um penalti para
marcar um golo.
Não restam grandes dúvidas de que a
Copa do Brasil será acompanhada por aguer-
ridas manifestações de rua a protestar contra
o dinheiro mal gasto, em detrimento de investimentos na saúde, educação, justiça e na
luta contra a pobreza.
Dois meses depois (5 de outubro) da final
no Rio de Janeiro, há eleições gerais no Brasil.
E aqui o campeonato «vira» para a política.
Se o escrete canarinho vencer o Mundial, Dilma Rousseff poderá ter a reeleição garantida.
Os seus rivais que almejam a hospedagem
do Palácio do Planalto ficam enfraquecidos ou
semiderrotados e o Partido dos Trabalhadores
de Lula da Silva e Dilma Rousseff pode assegurar mais quatro anos no poder.
Teixeira Cândido
Estádio
Mané Garrincha,
em Brasília
África21– junho 2014
19
Copa do Mundo 2014
Os brasileiros voltam a ver o mundial de futebol em casa, depois
de em 1950 terem acolhido essa competição com a vitória do Uruguai.
Nesta vigésima edição participam 32 seleções, o dobro das 16
que participaram na IV edição do Mundial, organizada pelo Brasil.
Mundial 2014
Entre a festa e as manifestações
E
ntre as 32 equipas apuradas para a fase
final do Mundial do Brasil, cinco são
africanas. Ou seja, pela primeira vez os
africanos vão estar presentes num país que ajudaram a erguer. Em 1950, nenhum país africano
participou, pois a maioria começava então a libertar-se do jugo colonial.
Estiveram presentes apenas sete seleções da
Europa, continente que acabava de sair da Segunda Guerra Mundial, sete americanas e duas
asiáticas, Turquia e a Índia. O Brasil foi o único
país de expressão portuguesa que jogou este
mundial.
Em 1950, a competição foi disputada em seis
cidades, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Curitiba e Porto Alegre. Na XX
edição será no dobro das cidades, e igual número
de estádios. No primeiro mundial realizado no
Brasil a FIFA não tinha os padrões de exigência
de hoje cujo caderno de encargos é estimado em
450 folhas.
A FIFA preocupa-se hoje não só com os relvados de qualidade, balneários, cabines de imprensa, como fazia nessa época, mas também
exige que os países anfitriões proporcionem aos
adeptos de futebol segurança, hotéis confortáveis
e transportes.
Sobre os estádios, como se sabe, falou-se muito e foram levantadas dúvidas em torno da sua
conclusão a tempo de serem testados. O certo é
que o Brasil não cumpriu os prazos exigidos pela
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junho 2014 –
África21
FIFA, assim como não o fez em 1950, mesmo
tendo sido dado um ano a mais do que o previsto,
em virtude da Segunda Guerra Mundial.
A segurança dos adeptos, que não são apenas
brasileiros nem de países participantes no mundial, mas de quase todo mundo, é a principal
preocupação do governo de Dilma Rousseff,
cujas atenções estão repartidas entre a sua reeleição e o Mundial.
De qualquer modo, é obrigada como anfitriã
e depois da lição da África do Sul, em 2010, a
fazer melhor ou pelo menos o mesmo. Ou não
fossem as duas nações membros dos BRICS.
Organizar um Mundial hoje não tem a mesma importância do que em 1950, quando 200
mil brasileiros viram a sua canarinha perder no
Estádio Maracanã frente ao Uruguai por 2-1. No
presente, significa capacidade económica e desenvolvimento infraestrutural, aliás dois dos
principais requisitos constantes nos cadernos de
exigências da FIFA.
O Mundial, em particular este do Brasil, está
a ser um palco trabalhado pelos políticos e candidatos à presidência, assim como cidadãos que
querem explorar ao máximo a presença dos media de quase todo mundo.
Messi, Neymar e Ronaldo
procuram consagração no Brasil
Lionel Messi, Neymar e Cristiano Ronaldo têm
o azar de nascer em países que já viram brilhar
Brasil não
cumpriu
os prazos
exigidos pela
FIFA, assim
como não o fez
em 1950
TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL
dr
Cristiano Ronaldo
jogadores como Maradona, Pelé, Ronaldo Nazário, Gaúcho ou ainda Eusébio e Luís Figo.
Pelé, como se sabe, conquistou três mundiais,
com a camisola da seleção brasileira, Nazário levantou duas taças do mundo com a canarinha,
títulos conquistados em 1994 e 2002, além da
presença na final de 1998, em França.
Gaúcho conquistou o Mundial de 2002 e esteve igualmente na final perdida diante da França.
Maradona conquistou com a Argentina o Mundial de 1986 e esteve na final em 1990, na Itália.
Eusébio, falecido em dezembro de 2013, foi o
responsável pelo terceiro lugar conquistado por
Portugal em 1966, no Mundial disputado em Inglaterra. Figo, embora não tivesse conquistado
qualquer título a nível de seniores, tem no curriculum dois mundiais de sub-20 e foi o primeiro
português a conquistar a Bola de Ouro. Ou seja,
não se pode falar da seleção das Quinas, colocando-o de parte.
Lionel Messi já conquistou com a sua equipa
todos os títulos na Europa. Tal como Cristiano
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21
dr
Copa do Mundo 2014
Lionel Messi
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África21
de futebol, eles poderão ser recordados como
grandes mas nunca com a dimensão de Maradona, Pelé ou Eusébio.
Esse é o peso que os três jogadores mais mediáticos do futebol mundial carregam para o
Brasil. Cristiano Ronaldo tem 28 anos, e no
próximo mundial, em 2018, terá 32 anos. Ou
seja, poucas hipóteses terá de conquistar essa cobiçada competição.
Lionel Messi terá 26, uma idade que lhe permite sonhar ainda com a conquista dessa prova
na Rússia, em 2018. Assim como Neymar. Aliás,
o craque brasileiro pode contar com mais dois
mundiais. Tem 21 anos de idade.
Se não forem
campeões,
Messi, Neymar
e Ronaldo
poderão ser
recordados
como grandes
mas nunca
como
Maradona,
Pelé ou
Eusébio
dr
Ronaldo. Neymar fê-lo na América do Sul, com
o Santos FC. E tem a oportunidade de brilhar
agora com a camisola do Barcelona.
No entanto, Messi, Cristiano Ronaldo e
Neymar não têm qualquer grande feito com a
camisola das respetivas seleções. Messi conquistou Jogos Olímpicos, sub-20, porém falta-lhe
um título mundial (de sénior). Neymar conquistou a Taça das Confederações em 2013. Cristiano Ronaldo não ganhou ainda nada além de ir à
final do Euro em 2004.
O Mundial do Brasil afigura-se como uma
oportunidade para esses craques inscreverem os
respetivos nomes na história mundial, em particular nesta competição, o maior palco do futebol
mundial.
Lionel Messi e Neymar estão melhor servidos. Têm «assistentes» de luxo, como Kun Aguero, Tevez, Di Maria, Pastore e outros. Neymar
tem Óscar, Hulk, William, Ramires e Fred.
Cristiano Ronaldo tem mais dificuldades em
encontrar os seus assistentes. Nani seria um deles,
se estivesse no seu momento de forma. No entanto, está longe daquele extremo que carregou o
Manchester United em 2012.
Por força dessa escassez, Portugal não integra
a lista das principais equipas candidatas ao título.
Se acontecer, ou seja, se Portugal conquistar o
Mundial do Brasil, Cristiano Ronaldo fica definitivamente consagrado na história do futebol
mundial como um dos maiores.
De outro modo, se as seleções integradas por
estes três jogadores não vencerem um Mundial
Neymar
Brasil, Espanha, Alemanha e Argentina (a ordem pouco importa)
são os principais candidatos ao título do Mundial, que volta a ser disputado
na terra do samba, 64 anos depois
O
Os candidatos ao título
palmarés do Brasil é em si um
argumento para sustentar esta
afirmação. Tem 19 participações em fases finais do Mundial, em 20
provas disputadas. Cinco vezes campeão,
mais do que qualquer outro país, e é «simplesmente» o anfitrião.
Por todo o canto da Europa, continente com os melhores campeonatos,
deambulam craques brasileiros. Ou seja,
a seleção canarinha tem todos os requisitos para conquistar o hexacampeonato.
Nada melhor do que escolher o mítico
treinador Luiz Felipe Scolari para materializar esse sonho.
Em 2002, na Coreia e Japão, quando
Scolari conquistou o seu primeiro título,
e o quinto para o Brasil, contava com
jogadores de outro nível como Ronaldo
Nazário e Rivaldo, apenas esses.
Hoje, o rosto de maior referência
no Brasil é o avançado do Barcelona,
Neymar. Tem à sua volta outros jogadores
que o podem ajudar a levar a nação
amarela e verde para o título. Thiago Silva,
Óscar, Ramires, David Luiz, Fred e outros
já mostraram que podem ganhar a qualquer um.
A conquista da Copa das Confederações, prelúdio do Mundial, é disso uma
prova. O Brasil enfrenta a melhor Espanha
de todos os tempos, seleção que domina o
futebol europeu desde 2008. A roja conquistou os dois últimos europeus, 2008 e
2012, e o Mundial na África do Sul, o primeiro no seu historial.
Talvez seja a principal candidata ao
título, pela qualidade de jogadores que
reúne hoje. A Espanha é um Barcelona
perfeito. Ou seja, uma seleção completa,
da defesa ao ataque. Iniesta, do Barcelona, David Silva do Manchester City ou
Javier Martinez do Bayern de Munique
são jogadores que qualquer seleção gostaria de ter.
Del Bosque, treinador que comanda a
Espanha, convenceu o brasileiro Diego
Costa a jogar pela roja, elevando as opções
no ataque. Era desnecessário, pois possui
outros da mesma qualidade como Fernando Llorente da Juventus, Negredo do
Manchester City, Torres do Chelsea ou
ainda o veterano David Villa, do Atlético
de Madrid.
Espanha apresenta-se como das seleções mais completas neste Mundial. Tem
recursos em todos os setores, como o Brasil
tinha há anos.
A Alemanha tenta quebrar o jejum de
24 anos. Os alemães são uma imagem do
Bayern de Munique, tal como Espanha o é
em relação ao Barcelona. É sobre a base do
Bayern que Joachim Löw constrói a seleção
alemã.
A Argentina é, à semelhança de Espanha, uma equipa de muitos recursos. Da
defesa ao ataque, a equipa alviceleste tem
como responder às necessidades da competição. É escusado afirmar que Lionel Messi é
a principal referência. Sê-lo-ia em qualquer
seleção do mundo. Além de Messi, a Argen-
Brasil enfrenta a melhor
Espanha de todos os tempos,
seleção que domina
o futebol europeu desde 2008
Em 2010 a Espanha
venceu o Campeonato
do Mundo
na África do Sul
África21– junho 2014
23
Copa do Mundo 2014
tina tem Aguero, Tevez, Higuain, Di Maria, Pastor e Lavezzi, entre outros craques.
É no entanto uma equipa menos equilibrada se comparada a Espanha. Tem uma
defesa envelhecida com Demichelis e Pablo
Zabaleta, ambos do Manchester City, e Javier Mascherano do Barcelona. À equipa da
Argentina, conduzida por Alejandro Sabella, falta igualmente um conjunto, a exemplo da Espanha e da Alemanha. A Argentina persegue o terceiro título, tendo
conquistado o seu último em 1986, no
México, com Diego Maradona a comandar
a orquestra.
Luís Felipe Scolari
O trio do segundo escalão
A Holanda, Portugal e Itália lideram a lista
das equipas com potencial de discutirem o
título. A laranja mecânica foi a finalista
vencida do Mundial de 2010 e a squadra
azzurra não precisa de estrelas para chegar
ao título. Vive do coletivo e nem sempre
tem um futebol vistoso. Ainda assim, por
força da sua história é uma seleção a levar
em consideração.
Vicente Del Bosque
Alemanha tenta quebrar
o jejum de 24 anos
e a Argentina tem como
responder às necessidades
da competição
Portugal é outras das seleções que reclama um estatuto nesta prova do Brasil. Tem
o melhor jogador do mundo, mas é uma
equipa desprovida ou com carências enormes no ataque. Não tem um avançado da
qualidade de Mario Balotelli: ou Van Persie, comparando apenas com as outras
equipas colocadas no segundo escalão.
Cristiano Ronaldo é assim a maior esperança da seleção das Quinas, que chegaram às
meias-finais no Mundial da África do Sul.
Ronaldo sabe que precisa de brilhar
mais do que tem feito no Real Madrid,
porque este é o palco dos melhores, além de
que Portugal nunca conquistou um Mundial, situação que acaba por reduzir a importância das seleções e dos jogadores no
concerto das nações futebolísticas.
Joachim Löw
Alejandro Sabella
24
junho 2014 –
África21
Gana,
a esperança
africana
África volta a ter cinco
representantes no Mundial
do Brasil, depois dos seis
que participaram na África
do Sul em 2010. Os Bafana
Bafana, seleção sul-africana,
são os grandes ausentes.
O
s embaixadores de África no
Mundial 2014 são a Costa do
Marfim, Camarões, Nigéria,
Gana e a Argélia. Os mesmos que estiveram no Mundial de 2010. E mais uma
vez, a esperança dos africanos está depositada nos ombros do Gana, por conta
das suas prestações nas últimas duas
participações.
O Gana estreou-se em fases finais no
Mundial da Alemanha, em 2006, na
companhia de Angola, Costa do Marfim,
Tunísia e Togo, e foi a única a ultrapassar
a primeira fase, tendo sido eliminada nos
oitavos-de-final pelo Brasil. Na segunda
participação, em 2010, o Gana assumiu
mais uma vez as despesas de dignificar o
continente africano. Chegou aos quartos-de-final, e só por manifesto azar não
fez história.
Seria a primeira vez que uma equipa
africana chegaria às meias-finais, depois de
em três ocasiões experimentarem os quartos-de-final. Os Camarões abriram o caminho no Mundial da Itália, em 1990.
Quatro anos mais tarde, a Nigéria seguiu-lhe os passos, nos Estados Unidos. E depois o Senegal em 2002.
O Gana foi precisamente a quarta
equipa a alcançar os quartos-de-final, em
A seleção do Gana volta a ser a grande esperança de África
2010. O desafio que se coloca a estas seleções presentes no Mundial do Brasil é
ultrapassar esta barreira.
A esperança dos adeptos africanos recai
sobre o Gana e a Costa do Marfim. Mais na
primeira seleção do que na segunda. Apesar
dos Elefantes (costa-marfinenses) reunirem
melhor qualidade individual, com nomes
como Yaya Touré, médio do Manchester
City, considerado por muitos como o melhor do mundo na sua posição, e Didier
Drogba, o veterano avançado do Galatasaray da Turquia, falta-lhes um conjunto sólido, tal como possui o Gana. Essa diferença
tem sido determinante, sem colocar de
parte os adversários com os quais se cruzam.
Sempre tiveram o azar de defrontar os colossos mundiais.
Em 2006, jogaram ao lado da Argentina, da Holanda e da Sérvia. Perderam os
dois jogos pelo mesmo resultado de 2-1, e
ganharam à Sérvia por 3-2. Na edição seguinte, em África, a Costa do Marfim
voltou a ter no caminho grandes como o
Brasil e Portugal, além da Coreia do Norte. Perdeu com o Brasil, empatou com
Portugal e venceu com naturalidade a
Coreia do Norte. Fez um ponto a mais do
que na edição anterior, mas voltou a não
passar da fase de grupos.
A descrença é extensiva às seleções dos
Camarões e da Nigéria, outras que reúnem estrelas de nível mundial, porém sem
conjunto. Os Leões Indomáveis perderam
o espírito coletivo que os caracterizava.
O individualismo sobrepõe-se à união, e
como consequência deixou de ser a principal referência nas fases finais do Mundial.
Acresce o facto de existirem problemas
organizativos na sua federação, que levaram inclusive Samuel Eto’o a renunciar à
seleção. Reconsiderou a decisão, porém, os
Camarões já não apresentam a mesma
equipa disciplinada e coesa.
A Nigéria é uma seleção caracterizada
pela confusão permanente, situação que
sempre relegou a sua qualidade para o segundo plano, com a exceção de 1994. No
entanto, advinha-se uma nova fase, comandada por Stephen Keshi, curiosamente capitão das Super Águias em 1994, e agora selecionador nacional.
O primeiro resultado desse trabalho foi
o título africano conquistado na África do
Sul, em 2013. Keshi está a privilegiar uma
nova geração de jogadores, comprometidos
com o sucesso coletivo, em detrimento do
individual. Para este trabalho conta com alguns veteranos, como o médio do Chelsea
de Inglaterra, Obi Mikel.
É uma equipa em construção e por
conta disso as esperanças nas Super Águias
são ténues. A Argélia está igualmente numa
fase de reconstrução, e não tendo jogadores
de nível mundial, as suas possibilidades de
brilhar são menores. Sofiane Feghouli,
avançado do Valência, é a principal referência de uma seleção que congrega 60% de
jogadores nascidos em França.
Craques africanos
que podem fazer a diferença
Yaya Touré, 30 anos, três vezes melhor jogador africano, é a grande referência da Costa
do Marfim e do futebol africano. Sem dúvida, as suas exibições no Manchester City de
Inglaterra, clube para o qual se transferiu em
2010 por 30 milhões de dólares, constituem
um chamariz. Touré conquistou tudo na
Europa, ao serviço do Barcelona de Espanha
(Liga Espanhola, Supertaça, Liga dos Clubes
Campeões e Campeonato do Mundo de
Clubes) e com o Manchester City falta-lhe
apenas ganhar a Liga dos Clubes Campeões.
Ganhou tudo em Inglaterra, porém, em
África falta-lhe um CAN e ao nível dos
Mundiais, nunca foi além da primeira fase.
O Mundial do Brasil representa a sua
terceira participação numa fase final e todos esperam que o craque do Manchester
África21– junho 2014
25
Copa do Mundo 2014
PERFIL DAS SELEÇÕES AFRICANAS
Argélia
Sofiane Feghouli
3 participações (1982, 86 e 2010)
9 jogos
5 derrotas
2 vitórias
2 empates
Principal jogador: Sofiane Feghouli (avançado do
Valência de Espanha)
Camarões
Samuel Eto’o
6 participações (1982, 90, 94, 98, 2002 e 2010)
20 jogos
9 derrotas
4 vitórias
7 empates
Principal jogador: Samuel Eto’o (avançado do
Chelsea da Inglaterra)
Costa do Marfim
Yaya Touré
2 participações (2006 e 2010)
6 jogos
3 derrotas
2 vitórias
1 empate
Principal jogador: Yaya Touré (médio do Manchester City)
Nigéria
4 participações (1994, 1998, 2002 e 2010)
14 jogos
8 derrotas
4 vitórias
2 empates
Principal jogador: Victor Moses (avançado do
Liverpool)
Victor Moses
Gana
Asamoah Gyan
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junho 2014 –
2 participações (2006 e 2010)
9 jogos
3 derrotas
4 vitórias
2 empates
Principal jogador: Asamoah Gyan (médio da
Juventus)
África21
O desafio das seleções
africanas é ultrapassar
a barreira
dos quartos-de-final
City possa levar a sua equipa a um melhor
resultado do que a fase de grupos, conseguida nas duas anteriores edições. Yaya
Touré conta com a experiência do avançado veterano Didier Drogba, do Galatasary
da Turquia, e do médio ofensivo Gervinho, do Roma da Itália. Esta é a última
oportunidade para essa geração de craques
brilhar numa fase final do Mundial.
Asamoah, médio da Juventus de Turim, titular absoluto, afigura-se como o
motor do Gana, equipa que assenta o seu
futebol mais no coletivo do que no individual. Para essa tarefa conta com o irreverente Prince-Boateng, médio do Schalke
04 da Alemanha, e ainda o veterano Asamoah Gyan, melhor marcador da equipa
nos mundiais com cinco golos, em nove
partidas.
John Obi Mikel comanda a geração de
jovens, que fazem hoje as Super Águias.
O médio foi pouco utilizado na equipa de
José Mourinho, Chelsea de Inglaterra,
contudo tem ritmo para tentar fazer melhor
do que no Mundial da África do Sul, em
que a Nigéria não passou da primeira fase.
Para o acompanhar nessa empreitada, Obi
Mikel tem o avançado do Liverpool Victor
Moses, determinante na conquista do
CAN 2013. Não utilizado com regularidade na equipa de Brendan Rodgers é porém
um ativo na seleção de Stephen Keshi.
Samuel Eto’o notabilizou-se ao serviço
do Barcelona, com o qual conquistou
tudo na Europa, mas tem uma dívida
enorme para com a sua equipa. O Mundial do Brasil afigura-se como a única
oportunidade (por força da sua idade, 34
anos), de brilhar à dimensão de Roger
Milla no Mundial da Itália.
Milla não tem os mesmos títulos individuais de Samuel Eto’o, mas o seu nome
tem maior notoriedade no futebol camaronês por conta dos seus feitos nos leões
indomáveis. Eto’o tenta chegar próximo
do que fez o seu compatriota. O avançado
do Chelsea tem desse modo a sua única
oportunidade para brilhar.
C
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África21– junho 2014
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junho 2014 –
África21
A crónica de Pepetela
J
Encontros em terceiro grau
uro que evito ao máximo discussões e debates
públicos, nos quais recuso sempre participar,
porque os considero inúteis. E também evito confrontar as crenças das pessoas, cada um que acredite
no que lhe der mais jeito, já passei a fase de tentar
convencer alguém. Azar o meu quando alguém aproveita o facto de se sentar ao meu lado
num qualquer avião, e me conhecer há
muitos anos, para chamar a atenção que
tenho sido corrosivo ou sarcástico demais em relação ao poder, qualquer que
ele seja, em livros ou entrevistas.
Sem eu querer, lá tive de me defender
mais uma vez desse tipo de acusações.
Disse ao meu conhecido de décadas, colega antigo em assentos governamentais, que não sou eu o sarcástico, ele
anda mesmo distraído. De facto, o sarcástico é o poder que anda a gozar connosco há muito
tempo. Ele não gostou, não podia, faz parte, mas
quem pisa o rabo do cão deve se preparar para a mordidela. A discussão pegou algum fogo, mas como encolhi os ombros e disse que não tinha tempo a perder
com essas discussões não conduzindo a nada, ele ficou
zangado e perguntou se eu achava que ele afinal andava a perder o seu rico tempo de vida.
Tive de explicar, depende do que se entende por
perder tempo. Não tenho dúvida que ele gasta muitas
calorias sentado em reuniões e congressos, na maior
parte do tempo a meditar sobre mares e ventos longínquos da mesa das discussões, porque já sabe o que
cada um vai dizer. Mesmo o discurso que vai ler, o
será pela primeira vez, pois um assessor qualquer lho
apresentou já todo bonitinho, só que não tem uma
frase original, todas copiadas dos discursos feitos durante trinta anos, mudando uma vírgula aqui ou uma
palavra ali, na célebre técnica do copy-paste tão usada
pelos nossos estudantes para fazer trabalhos escolares.
Não sei quem copiou quem, mas acredito que os
primeiros foram os estudantes, tendo os assessores
aprendido com eles. E fico feliz por saber que terá ao
menos sido um assessor angolano a fazer os copy-paste, pois muitas instituições nacionais pagam bué
de kumbú a estrangeiros mal letrados para o fazerem.
Nessas reuniões dos nossos muatas, eles sofrem os
inconvenientes de estarem em mesas cheias de folhos
onde seja difícil equilibrar um papel, ainda menos um
copo. Que sofrem a ter de beber água, quando estão
habituados a outras bebidas mais energéticas. Que
têm de disfarçar os bocejos e alguns se rendem a uma
soneca, à frente de toda a gente. Que uns tantos só
não foram apanhados pela televisão a ressonar, porque a censura corta o som e só se vê o
camarada dormindo no seu assento, o
que pode parecer uma profunda meditação sobre o que outros dizem. Aceito,
é duro ser muata, uma vida de sacrifício, sempre a lutar contra o sono.
Mas sacrifício e esforço não significam trabalho. Trabalhar é outra coisa
para além de consumir o seu tempo de
vida em atividades inúteis.
Pedi-lhe hipocritamente desculpa,
mas lamentava o seu sofrimento em
benefício do povo. Eu ao menos aproveito para dormir, se tenho sono.
E acabou a conversa. Como dois desconhecidos,
continuámos a viagem. Só brindámos ao jantar, bom
trabalho a ambos. Eu não ia em serviço, portanto estava tranquilo. Ele, que se conformava em mais uma
delegação oficial defendendo os interesses do país,
suspirou no brinde, o que não o impediu de pedir
mais umas bebidas para se inspirar nas difíceis negociações que iria encetar. Na despedida, só lhe perguntei, já tens os discursos preparados? Ele foi modesto,
vou reler tudo, fizeste-me pensar.
E eu, já de maldade, animei-o, faz isso mesmo
mas não exageres, pensar cansa, e pagam-vos pouco
para tanto sacrifício.
Ele não gostou, não podia,
faz parte, mas quem pisa
o rabo do cão deve se preparar
para a mordidela
África21– junho 2014
29
censo 2014
Um ponto de viragem
na história de Angola
Quantos são, quem são e como vivem. Foi este o mote para
a megaoperação Censo 2014, promovida pelo Executivo
angolano. Uma iniciativa histórica, dado que foi o primeiro
recenseamento geral da população e da habitação desde a
independência.
Tomás Tim-Tim
A
última contagem da população
foi realizada há mais de 40 anos,
e os dados agora recolhidos vão
permitir ao Governo planear de melhor
forma o futuro do país. Depois de quatro
anos de preparação, maio de 2013 marcou o primeiro passo deste processo, com
a realização de um censo-piloto em 100
aldeias e bairros pertencentes a doze municípios de sete das dezoito províncias de
Angola. Esta operação estatística, cujos
resultados não chegaram a ser divulgados, serviu apenas como teste para identificar e corrigir problemas detetados.
Com uma preparação minuciosa, no
Censo 2014 foi feito de tudo para não
haver pontas soltas durante todo o processo. Era 00h00 do dia 16 de maio
quando os mais de 60 mil recenseadores
foram para o terreno de jipe, helicóptero e até de barco. Todos os meios foram
mobilizados para que ninguém ficasse
de fora da contagem. Suportada na totalidade pelo Governo angolano, a operação abrangeu 45 mil secções censitárias
e teve um orçamento de 20 mil milhões
de kwanzas (perto de 200 milhões de
dólares).
O país contou com o apoio técnico e
a experiência dos institutos nacionais de
30
junho 2014 –
África21
estatística de Moçambique, Cabo Verde
e Brasil, além do Fundo das Nações
Unidas para a População. Contudo, para
ajudar na operação foram convidados,
também, observadores de Portugal, Brasil e Moçambique.
Seriedade e compromisso era, acima
de tudo, o que as autoridades angolanas
pediam, para que tudo corresse da melhor forma. Da parte do Executivo tudo
foi feito para que nada falhasse, e foram
mobilizados 105 mil pessoas e 556 viaturas para apoio do momento censitário
e outras 184 para a Polícia Nacional.
A última contagem
foi realizada em 1970,
e apurou 5,6 milhões
de habitantes
Grande parte do investimento foi direcionado para a publicidade, com 16 toneladas de material publicitário e muita
mobilização.
Através de um vasto questionário
sobre habitação e agregado familiar, os
técnicos de campo obtiveram informações, por exemplo, sobre o tipo de habi-
tação, iluminação, fonte de água, meio
sanitário, que a população utiliza.
Os dados recolhidos vão ajudar no planeamento e distribuição de recursos,
além de propiciarem o desenvolvimento
estatístico, como base informativa para a
melhoria do nível de vida da população
angolana.
Tudo começou com os sem-abrigo
Após o arranque da operação, que começou com as pessoas que vivem na rua, era
visível a adesão da sociedade ao longo das
18 províncias de Angola, que via no Censo
uma porta de saída para um futuro melhor. Ainda nem um dia tinha passado, e o
Presidente da República apelava a todos os
residentes do país para que colaborassem
no processo de recenseamento.
Numa mensagem à nação, em direto
para todas as televisões, José Eduardo
dos Santos frisava que todo o processo
MIQUEIAS MACHANGONGO/JORNAL DE ANGOLA
«é um trabalho importante e muito necessário para que o Governo possa tomar medidas para melhorar a organização do comércio, dos transportes, da
agricultura, da saúde, da educação, da
distribuição de água e de energia e criar,
assim, melhores condições de vida para
todos os cidadãos».
Horas depois, a população fez questão de passar a mensagem que estava do
lado do Presidente e mostrava total disponibilidade para colaborar. Da parte
dos recenseadores o esforço foi máximo
para conseguir chegar ao maior número
de pessoas, no menor tempo possível.
Tirando casos pontuais, como de uma
seita religiosa no Cuando Cubango, que
estava a impedir a população da província de se recensear, e alguns cidadãos na
província do Cacuaco que se recusavam a
dar as informações solicitadas, ao fim de
cinco dias, data em que foi escrita esta
peça, tudo corria dentro da normalidade.
Na ausência de dados oficiais sobre o
número exato de pessoas recenseadas, as
autoridades afirmavam que o recenseamento «corria conforme o esperado e que
a data de 31 de maio iria ser cumprida».
A 16 de maio mais
de 60 mil recenseadores
foram para o terreno de jipe,
helicóptero e de barco
Identificadas como zonas de difícil
acesso, as províncias do Cuando Cubango, Cunene, Zaire e Moxico contaram
com o apoio de aviões e helicópteros
para fazer chegar os meios necessários
para se proceder ao recenseamento da
população. A operação teve, ainda, um
novo impulso quando o governo pro-
vincial de Luanda decretou tolerância de
ponto até ao final da operação Censo
2014 para os funcionários públicos, naquela que é considerada a província
mais populosa de Angola.
«Não temos zonas inatingíveis e o
mau tempo também não é problema».
Esta era a mensagem passada pelas autoridades que reforçavam a ideia que
sempre que necessário os aviões e os helicópteros entravam em ação. Os recenseadores mostravam-se satisfeitos com a
receção feita pela população, destacando
«a adesão em massa e o bom trabalho de
preparação efetuado junto de cada
província».
De todo o bom trabalho realizado
até à data, houve apenas um destaque
pela negativa. A morte de um dos recenseadores por um incidente. Fernando
Manuel, 27 anos, morreu na sequência
de uma queda de um galho de uma árvore sobre a cabeça, enquanto recolhia
dados de uma família na localidade de
Makila.
Contagens anteriores
A contagem não é inédita. A última foi
feita no período colonial, em 1970, e
apurou 5,6 milhões de habitantes contra
os poucos mais de 3,7 milhões recenseados na anterior operação, realizada em
1940.
A Guerra Civil impediu a realização
de operações deste tipo e as tentativas
efetuadas pelas autoridades entre 1983 e
1987 não foram consideradas, por não
terem abrangido todo o território nacional nem obedecido aos princípios e recomendações internacionais para este
tipo de contagem, estabelecidos pelas
Nações Unidas.
Relativamente aos resultados do recenseamento da população e habitação,
as estimativas apontam para cerca de 21
milhões de pessoas, valor estimado por
organizações internacionais.
O processo de contagem oficial de
habitantes de Angola termina a 31 de
maio e os resultados podem ser apresentados num prazo de 18 meses, embora o
Governo admita que em três ou quatro
meses possam estar já disponíveis dados
preliminares.
África21– junho 2014
31
angola
in
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junho 2014 –
África21
ROGÉRIO TUTI/JORNAL DE ANGOLA
A aposta
angola
da diplomacia angolana
Os últimos meses têm assistido a um crescendo
da diplomacia angolana. Com a candidatura
do país a membro não permanente
do Conselho de Segurança das Nações Unidas
como pano de fundo e a atual presidência
da Conferência Internacional sobre a Região
dos Grandes Lagos na mesa de trabalho, Angola
desdobra-se em encontros internacionais.
Miguel Correia
A
ngola tem registado uma intensa atividade diplomática,
refletindo uma estratégia de afirmação internacional.
Depois de uma visita de Estado de José Eduardo dos
Santos nos últimos dias de abril a França, onde se encontrou com
François Hollande, a etapa seguinte foi o Vaticano, onde o Presidente foi recebido pelo Papa Francisco. Já em Luanda, Eduardo dos
Santos recebeu o secretário de Estado norte-americano, John Kerry,
e uma semana depois o primeiro-ministro da China, Li Keqiang.
Em cerca de um mês, Angola cruzou algumas das mais fortes diplomacias mundiais, a que se juntaram neste final de maio dirigentes
de Cuba, República Centro-Africana, Coreia do Norte, Moçambique, Azerbaijão ou Zâmbia. No outono, após mais algumas visitas
oficiais, será David Cameron a acolher Eduardo dos Santos em
Londres.
«Uma das mais fortes diplomacias do continente africano». As
palavras são de Markus Korprobst, professor de diplomacia internacional da Academia Austríaca, e procuram definir a política externa
de Luanda. Na opinião de Korprobst, tal resulta «de muito trabalho
e do rápido processo de desenvolvimento que o país vem
registando».
A visita a Paris de Eduardo dos Santos e comitiva de seis ministros comprovou a aposta de Angola na esfera internacional, nomeadamente em assuntos relacionadas com a África Central, questão
atualmente relevante, já que tem a presidência da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL). Presidência que, até agora, tem mesmo merecido elogios generalizados da
comunidade internacional.
A visita a Paris de José Eduardo dos Santos demonstrou a aposta de
Luanda na sua afirmação internacional
Ao aterrar em Paris, o Presidente angolano procurava ultrapassar as vicissitudes que o caso «Angolagate» provocou nos últimos
anos das relações entre os dois países, com reflexos no relacionamento político, mas também económico. Conseguiu. Mas se a visita abriu portas a um relançamento das relações comerciais, a verdade é que também permitiu um desejado relançamento da
cooperação na área diplomática, demonstrando o peso que a França
já dispensa a Angola na sua estratégia para África.
Mais peso internacional
Dias depois da visita presidencial a Paris, Luanda foi uma das quatro escalas do recente périplo africano da atenta diplomacia norte-americana, liderada pelo secretário de Estado John Kerry (ver artigo
de Itamar Souza nesta edição). Ao deixar Luanda, a mensagem ficou:
os Estados Unidos procuram em Angola um parceiro estratégico na
região.
O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, foi o seguinte na
agenda angolana. A assinatura de dois acordos, um para a supressão
de vistos, e outro no domínio financeiro, dominaram a visita. Mas
as declarações no final à comunicação social de Li Keqiang também, quando reforçou o papel importante de Angola na estabilização do leste da República Democrática do Congo e na manutenção
da paz na região dos Grandes Lagos, salientando depois publicamente aquilo que Luanda desejava ouvir: a China vai apoiar Angola
na sua candidatura a membro não permanente do Conselho de
Segurança das Nações Unidas para o biénio 2015/2016.
Com África a conquistar espaço nas agendas das maiores economias mundiais, Angola reforçou a sua estratégia de afirmação
internacional. Escrevia Alex Vines, diretor do departamento de
África do Instituto Real de Relações Internacionais (Chatham
House), a propósito da visita de Eduardo dos Santos a França:
«A importância que Paris deu à melhoria das relações franco-angolanas não tem só a ver com o crescimento do comércio bilateral mas
também com o reconhecimento de que, quando se trata da África
Central, Angola é cada vez mais um Estado-chave na região para a
paz e a segurança».
África21– junho 2014
33
MOTA AMBRÓSIO/JORNAL DE ANGOLA
As companhias
selecionadas são obrigadas
a contratar recursos
humanos angolanos
e capacitá-los em todas
as fases do projeto
Edeltrudes Costa e Francisco Queirós batizam o avião que fará o levantamento dos recursos minerais
O mapa do tesouro
angola
Governo de Angola anuncia o início do mapeamento detalhado
dos recursos minerais do seu território
João Belisario
D
esde o início do século passado, sabe-se que o território angolano é muito rico em recursos
minerais. No entanto, desde a independência, além do petróleo e dos diamantes, por
causa da guerra que se estendeu pelo país
durante tantos anos e da falta de conhecimento preciso sobre as reservas existentes,
poucos foram de facto os minerais explorados em escala industrial.
Mas esta situação deve mudar rapidamente. Em meados de maio, o Governo
anunciou o início do levantamento detalhado de todos os recursos minerais existentes no seu subsolo, enquadrado no seu Plano Nacional de Geologia (PLANAGEO).
O voo inaugural do monomotor equipado
com os instrumentos necessários para realizar este levantamento foi o momento escolhido pelo Executivo para tornar público
este projeto.
Antes do voo, um técnico do Ministério de Geologia e Minas, o próprio minis-
34
junho 2014 –
África21
tro e o embaixador da China, país que fornecerá a tecnologia para a execução da
tarefa, detalharam aos meios de comunicação social e a uma plateia constituída por
ministros, secretários de Estado, comandantes militares, empresários e diplomatas,
em que consiste este trabalho, por quem
será realizado e de que forma. A CITIC Constrution (China), a Impulso (Brasil), a
Costa Negócios (Portugal) e a Satec (Espanha), empresas selecionadas em concurso
público, irão trabalhar usando todas os
mesmos métodos aerogeofísicos (magnetometria, gamaespectometria, eletromagnético e gravimetria) para identificar com precisão as ocorrências minerais.
As empresas vão trabalhar respetivamente em três áreas: noroeste, sudoeste e
sul, leste e nordeste, divididas em 22 blocos,
abarcando a totalidade das 18 províncias
angolanas. O trabalho, que está previsto
para ser concluído até 2017, começará pelo
Noroeste com a CITIC. O investimento
avaliado em cerca de 400 milhões de dólares será utilizado para a realização dos levantamentos e para a construção, apetrechamento técnico e gestão do Instituto
Geológico (IGEO) e do seu laboratório, a
ser construído em Luanda e nas províncias
da Huíla e Lunda Sul. As companhias selecionadas também estarão obrigadas a contratar recursos humanos angolanos e a capacitá-los em todas as fases do projeto.
Edeltrudes Costa, ministro de Estado e
Chefe da Casa Civil, ao falar na ocasião representando o Presidente da República,
realçou o papel estratégico fundamental do
PLANAGEO considerando-o como «um
dos maiores projetos estruturantes de Angola de todos os tempos». Visto como «o
abrir de uma nova era» para o país, o mapeamento minucioso das riquezas minerais
deverá permitir o planeamento da exploração sustentável desses recursos para as próximas décadas, contribuindo assim substancialmente para a diversificação da
economia e desenvolvimento angolano.
O otimismo demonstrado pelos membros do Executivo é plenamente justificado,
sobretudo quando tomamos conhecimento que parte deste tesouro enterrado no
subsolo angolano após a sua extração não
será apenas exportado em estado bruto,
mas também deverá ser transformado no
próprio país, agregando valor à matéria
prima, gerando mais empregos e tornando-se assim numa importante alavanca
para a sua industrialização.
Uma empresa que deixa marca
O que transportamos?
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35
angola e brasil
SANTOS PEDRO/JORNAL DE ANGOLA
A visita realizada a Angola no início de maio
pelo ex-Presidente brasileiro, organizada pelo
Instituto Lula em parceria com a Fundação
Eduardo dos Santos (FESA), para debater a
experiência do Brasil e de Angola no combate
à fome e à pobreza, teve grande repercussão
junto à sociedade angolana
João Belisario Luanda
Anão fome
pode esperar
D
urante os três dias que esteve em Angola, Lula da
Silva encontrou-se com o Presidente da República, visitou projetos de agricultura familiar e apoiados por empresas brasileiras, conversou com trabalhadores, cortou cana, conduziu
máquinas agrícolas, pousou para fotos com governadores e crianças, deu entrevistas aos meios de comunicação social e reuniu-se
com empresários e membros da comunidade brasileira.
Mas foi a sua participação no seminário «Experiências do
Combate à Fome e à Pobreza em Angola e no Brasil», organizado
pelo Instituto Lula e a Fundação José Eduardo dos Santos, que
causou mais impacto e ainda ecoa tanto nas redes sociais como
nos meios de comunicação sociais angolanos, alguns dos quais
transmitiram o seu discurso integralmente.
Ministros, secretários de Estado, membros dos partidos políticos, juristas, deputados, professores, diplomatas, empresários
dos dois países, militares de alta patente, estudantes, jornalistas e
outras centenas de pessoas, ouviram com atenção a intervenção
do ex-Presidente brasileiro, ovacionando-o entusiasticamente por
diversas vezes.
Lula discursou após a exposição da ministra do Comércio, Rosa
Pacavira, sobre as propostas atuais e ações e de combate à fome e à
pobreza realizadas pelo Governo angolano nos últimos quatro anos,
e do relato mais técnico sobre o Bolsa Família e os programas sociais
brasileiros feito pela ex-ministra do Desenvolvimento Social do seu
governo, Márcia Lopes. Lula falou durante 50 minutos com a
franqueza que o caracteriza, sobre o que o motivou, como começou
«Os governantes devem tornar o combate
contra a fome e a pobreza uma prioridade»,
diz Lula da Silva
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junho 2014 –
África21
Lula da Silva visita um projeto habitacional no Kilamba Kiaxi, com o coordenador
do programa de realojamento da província de Luanda, Bento Soito
e orientou a política de combate à fome e à pobreza extrema, enfrentando os mais diversos preconceitos, durante os seus oito anos
de Governo e que resultaram na retirada da miséria de mais de 36
milhões de brasileiros.
O discurso do ex-Presidente brasileiro pode ser ouvido na íntegra no site do Instituto Lula, mas, em síntese, podemos resumir
tudo o que disse num único pensamento: a fome não pode esperar.
Quem tem fome não pode esperar. Tudo o mais na vida pode esperar, mas a fome não. E para conseguir resultados nessa luta, insistiu
Lula, os governantes devem dar prioridade ao combate contra a
fome e a pobreza.
Ao lembrar que no ano passado Lula fizera um discurso semelhante no Centro Internacional de Conferências Joaquim Chissano, um diplomata moçambicano disse-nos que a dissertação do
ex-presidente reacendera o debate sobre a melhor estratégia para a
redução e eliminação da pobreza em Moçambique. Alguns formadores de opinião não acreditam nessa possibilidade em Angola.
Outros, no entanto, consideram que, no devido tempo, isso acabará também por ocorrer e que a experiência do ex-Presidente brasileiro e a cooperação com o Instituto Lula venham auxiliar a dinamizar as políticas sociais do governo angolano para que o país possa
eliminar a fome e a pobreza o mais rapidamente possível.
Apesar das estatísticas disponíveis não serem totalmente confiáveis, algumas estimativas indicam que cerca de 30% da população
angolana vive em situação de extrema pobreza e para atingir os objetivos de desenvolvimento do milênio, estabelecidos pela ONU, reduzindo a fome e a pobreza em metade até 2015, o governo angolano terá que fazer um grande esforço para resolver muitos problemas
e mobilizar mais recursos. Angola também está à frente de um grupo
de países da OUA que, com apoio da FAO e do Instituto Lula, se
comprometeram a eliminar a fome e a pobreza até 2025.
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África21– junho 2014
37
crónica da terra
Caminhos perigosos
O debate político entre os diferentes partidos angolanos, e em particular entre
o MPLA e a UNITA, tem, regra geral, baixo nível em termos qualitativos,
principalmente na Assembleia Nacional.
Fernando Pacheco
P
or deficiente preparação, a maioria dos
deputados não domina os dossiês, principalmente os de natureza económica. Isto pode explicar
porque os temas dominantes sejam, do lado da
UNITA as contundentes críticas ao desempenho
do Executivo no que respeita à solução de problemas fundamentais da população, nomeadamente
os sociais, mas o partido do Galo Negro vem cometendo o erro de não separar o período em que a
guerra pode, em teoria, explicar tudo, daquele em
que, já em paz, e com grande disponibilidade de
recursos, não se verificam melhorias significativas
em termos de qualidade de vida, agravam-se problemas como o desemprego e o êxodo rural e não se
vislumbram soluções para a corrupção e para o
crescimento da desigualdade. Pode explicar também porque o MPLA se mantém arreigado às acusações à UNITA sobre a sua responsabilidade na
destruição do país durante o período da guerra.
Esta mediocridade revela que ambos os partidos
não entendem que a sociedade angolana mudou
muito desde o início do século e não são capazes de
encontrar respostas aos novos problemas, principalmente os dos jovens. O MPLA, tenho dito já, não
quer, ou não pode, fazer uma análise dos resultados
das eleições de 2012 e procura soluções com fugas
para a frente. Se é verdade que têm registado nos últimos tempos alguns progressos no campo financeiro
e diplomático – explicados em grande medida, como
se deveria saber, porque o preço do petróleo se mantém em alta – a economia e a vida dos cidadãos continuam fortemente penalizadas. Os programas lança-
Fernando Pacheco é o
coordenador do OPSA
38
junho 2014 –
MPLA e UNITA não entendem
que a sociedade angolana mudou
muito desde o início do século e
não são capazes de encontrar
respostas aos novos problemas
África21
dos pelo Executivo para reanimar a economia
continuam a marcar passo – e as primeiras consequências são a manutenção da dependência do petróleo e a aflitiva situação do desemprego, uma espécie
de bomba que pode detonar a qualquer momento.
A UNITA, por sua vez, não sabe aproveitar esta situação, nem sequer fazendo recurso a algumas excelentes análises que felizmente têm aparecido na comunicação social, e que poderiam elevar o nível do
debate político. Tampouco os outros partidos.
A polémica sobre Cuíto Canavale
Daí que não seja estranha a polémica recente sobre
a batalha do Cuíto Canavale. Numa altura em que
temos tantos problemas económicos e sociais por
resolver, canalizar as atenções para um facto que
teve a importância que teve no passado, mas que
não contribui em nada para a solução de tais problemas, só posso deduzir que se trata de uma manobra
de diversão da parte do Executivo. Que teve da
parte dos membros da UNITA a resposta que esta
julgou conveniente, e que, julgo, tem o direito de o
fazer. Não se pode pensar que o facto de terem sido
derrotados em 2002 obriga os antigos generais das
FALA a aceitarem uma narrativa – para usar um
termo em voga – que acham não ser a verdadeira.
Sou de opinião que a história de factos recentes – refiro-me ao período posterior a 1961 – só
terá credibilidade quando for feita por historiadores independentes ou com capacidade para resistirem a pressões de natureza política. Sobre o Cuíto
Canavale haverá inúmeras versões, pois mesmo do
lado de cada uma das quatro partes diretamente
envolvidas – Governo angolano, UNITA, Cuba e
África do Sul – existirão sempre pontos de vista
diferentes. Por exemplo, o léxico sobre o Triângulo do Tumpo só agora começou a ser usado, e o
papel de certos protagonistas foi até há pouco
tempo desconhecido do grande público. Outros
factos estarão seguramente por revelar.
ROGÉRIO TUTI/JORNAL DE ANGOLA
Monumento à Batalha do Cuíto Canavale, no Cuando Cubango
Tudo isto, é minha convicção, resulta do modo
como a questão da reconciliação nacional foi tratada depois de 2002. Foi muito correto o facto de se
terem poupado as vidas dos líderes da UNITA e
permitido que esta organização não fosse ilegalizada, mas tem sido muito pouco correta a condição,
digamos de sujeição, a que se submeteu o partido,
cujo papel na vida política angolana está sempre limitado: uma crítica mais forte ao Executivo ou ao
MPLA custa-lhe geralmente um coro de acusações
sobre as responsabilidades exclusivas na destruição
do país – o que, como se sabe, não é verdadeiro – e,
mais grave, sobre supostas intenções de regresso à
guerra, sem que provas sejam apresentadas.
O 40.º aniversário da revolução do 25 de Abril,
que tanto teve a ver connosco, proporcionou-me
uma comparação sobre a evolução de Portugal e
Angola desde essa época. Acho que o modo como os
militares portugueses trataram os vencidos na época,
O modo como os militares
portugueses trataram os vencidos
na época foi um belíssimo
exemplo de tolerância política
apesar dos crimes cometidos durante o fascismo, resistiram às pressões para ilegalizar o Partido Comunista e devolveram o poder aos civis, foi um belíssimo
exemplo de tolerância política, que pode ser considerado como o primeiro exemplo de comportamento
mandeliano, que haveria de surpreender o mundo 20
anos depois.
Muitos dos simpatizantes da causa do 25 de
Abril acham que os acontecimentos posteriores,
protagonizados pelas lideranças dos chamados partidos do arco do poder em Portugal, desvirtuaram
os ideais da revolução. Tenho uma opinião um
pouco diferente. A maior conquista de Abril foi a
democracia, que permitiu uma transformação radical da sociedade portuguesa, hoje muito melhor do
que a de há 40 anos. Os partidos que governam têm
sido eleitos democraticamente e os seus opositores
não têm sido capazes para, em ambiente democrático, fazer valer as suas razões. Não sou ingénuo, por
isso sei que contra eles, os partidos que se reveem
em Abril, têm jogado o facto de o mundo ser hoje
dominado por um modelo político e económico
que nada tem a ver com princípios de solidariedade,
equidade e justiça social que eram as bandeiras desse
Abril e é muito responsável pelo que de mau tem
acontecido. Mas sei também que tais partidos têm o
seu espaço na comunicação social, incluindo a pública, e isso é de um valor inestimável, que só poderia ser valorizado se um dia, por qualquer razão, lhes
fosse retirado.
Em Angola, infelizmente, não podemos dizer o
mesmo. O domínio da comunicação social pública,
que é aquela que tem impacto, pelo partido no poder, sem margem de hipótese para os oposicionistas,
não é uma coisa boa e pode transformar-se em algo
muito perigoso para a paz. No caso do Cuíto Canavale, por exemplo, porque não um debate aberto
entre todas as partes intervenientes? Não seria um
bom sinal para a reconciliação, condição necessária
para uma Angola em paz?
África21– junho 2014
39
Transacções
em Moeda
Estrangeira
1 Posso
efectuar pagamentos em moeda estrangeira para bens ou
serviços adquiridos no país?
Não. Os pagamentos devidos pela aquisição de bens ou serviços em Angola
devem ser sempre efectuados em Kwanzas, a única moeda com curso legal e
poder liberatório ilimitado no país.
Repare que é obrigatória a emissão de facturas em moeda nacional, excepto
quando se trate da transmissão de bens e serviços exportados, caso em que
as facturas podem ser emitidas na moeda da negociação.
2 Existe uma taxa de câmbio máxima a praticar pelos bancos comerciais
e casas de câmbio na venda de Moeda Estrangeira?
Questões Frequentes
Na venda de divisas (moeda escritural), a taxa de câmbio aplicada pelos bancos
comerciais, incluindo comissões, mas excluindo impostos, não pode exceder a taxa
de câmbio de venda publicada diariamente pelo BNA acrescida de 3%.
Na venda de notas, a taxa de câmbio é livremente estabelecida pelos
bancos comerciais e casas de câmbio, pelo que deve procurar efectuar a sua
compra na instituição que oferecer a melhor taxa.
Os bancos comerciais e as casas de câmbio devem ter as taxas de câmbio
expostas em local visível. As taxa de referência do mercado podem ser
consultadas através do site www.bna.ao.
3É
possível efectuar depósitos e levantamentos em contas
denominadas em moeda estrangeira, nos bancos comerciais?
Sim. Os residentes cambiais podem efectuar depósitos e levantamentos de
numerário nas suas contas denominadas em moeda estrangeira. No entanto, os
bancos comerciais podem criar contas para depósitos e/ou levantamentos e outras
que aceitam unicamente transacções escriturais (não admitem numerário).
Consulte o seu banco sobre as regras específicas de movimentação de contas
denominadas em moeda estrangeira. Ainda assim, note que a legislação sobre
o combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo exige
a justificação de depósitos e levantamentos em numerário sempre que o valor
em causa, qualquer que seja a moeda, exceda o equivalente a USD 15.000.
4 A partir da conta em Kwanzas é possível ter um cartão com aceitação
internacional (Visa, Mastercard, etc) para pagamentos e levantamentos
no exterior do país?
Sim. Os cartões com aceitação internacional, quer sejam de débito, crédito ou
pré-pagos, podem ser emitidos somente a partir de contas denominadas em
moeda nacional.
Os pagamentos e levantamentos no exterior do país são sempre efectuados
na moeda legal desses países, sendo os valores convertidos para Kwanzas
quando lançados nas contas dos clientes.
Na utilização de qualquer cartão de pagamento no exterior do país deve-se
ter em conta os limites estabelecidos no Aviso n.º13/13, de 6 de Agosto, sobre
as operações de invisíveis correntes (e referidos infra no ponto 6).
5
Que meios de pagamento posso utilizar para despesas no exterior do
país? Existe algum limite de valor?
5.1
Para viagens ao exterior do país podem ser utilizados os seguintes meios de
pagamento:
(i) transferência de valores para a conta do passageiro no exterior do país.
No caso de menores de 18 anos, a transferência deve ser efectuada para a
conta dos respectivos progenitores ou representantes legais;
(ii) cartão de crédito, cartão de débito ou pré-pago, cheque nominativo não
endossável ou outros instrumentos de pagamento internacional de natureza
análoga, emitidos em nome do passageiro.
40
junho 2014 –
África21
(iii) Numerário em moeda nacional e em moeda estrangeira.
Os limites dos valores que podem ser utilizados nas deslocações ao exterior do
país são anuais e aplicam-se como se segue:
Kz 25.000.000,00 por passageiro, por ano civil;
Kz 6.000.000,00 por passageiro menor de 18 anos, por ano civil.
No caso de numerário, pode-se sair com moeda nacional até Kz 50.000. Tratandose de moeda estrangeira, pode-se transportar à saída os seguintes montantes:
Maiores de 18 anos – Até USD 15.000 por passageiro, por viagem;
Menores de 18 anos – Até USD 5.000 por passageiro, por viagem.
Recomenda-se que ao viajar para o exterior do país, se leve um cartão de
pagamento de marca internacional (Visa, Mastercard, etc), que é sempre mais
seguro. Deve-se transportar apenas o numerário que for absolutamente
necessário e informe-se também sobre os limites de entrada aplicáveis nos
países de destino.
5.2
5.3
As despesas relacionadas com fins educacionais, científicos, culturais e
tratamento de saúde, não estão sujeitas a limites se os pagamentos forem
efectuados por transferência bancária directa a favor dos estabelecimentos de
saúde ou de ensino.
As despesas relacionadas com apoio familiar, contribuições a entidades
de classe e outras transferências de carácter privado, podem ser pagas
por transferência bancária. Nestes casos, o limite cumulativo está fixado em Kz
12.000.000,00 por cada ano civil.
De notar que:
(i) estes limites aplicam-se unicamente a pessoas singulares residentes cambiais e
destinam-se à cobertura de gastos próprios e de seus familiares directos;
(ii) o limite para gastos efectuados fora do país nas deslocações é único para todas
as viagens efectuadas num ano civil, incluindo as de carácter pessoal e as viagens
em serviço por conta da sua entidade patronal;
(iii) os bancos comerciais devem disponibilizar os valores em moeda estrangeira
(a) para cada viagem, consoante a capacidade financeira fundamentada de
cada passageiro, seu cliente, e mediante a apresentação de documentação
justificativa (b) nos casos referidos no ponto 5.2, mediante apresentação de
documentação justificativa e (c) nos casos referidos no ponto 5.3, consoante a
capacidade financeira fundamentada do ordenador, seu cliente, e mediante a
apresentação de documentação justificativa;
(iv) Os bancos comerciais registam essas operações no Sistema Integrado de Operações
Cambiais (SINOC), permitindo controlar a utilização dos limites.
Para mais informação, consultar os Avisos n.º 13/13, de 6 de Agosto, n.º 1/12, de
27 de Janeiro e o n.º 28/12, de 1 de Novembro.
6
Podem os bancos comerciais usar as contas em moeda estrangeira dos seus
clientes para liquidação de pagamentos ao exterior?
Sim. Tratando-se de contas à ordem em moeda estrangeira, o saldo disponível
deve ser utilizado preferencialmente para a realização de pagamentos ao
exterior. Deve-se certificar com o seu banco comercial sobre as regras de
abertura e movimentação de contas.
7
• podem ser efectuadas apenas por pessoas singulares nacionais,
ou estrangeiras possuidoras de cartão de residência emitido pelas
autoridades competentes;
• estão sujeitas ao limite mensal de Kz 500.000 e anual de Kz 2.000.000,
por ordenante.
As remessas provenientes do exterior, independentemente do Pais e da moeda de
origem, são sempre disponibilizadas ao beneficiário final em Kwanzas.
Para mais informação, consultar o Aviso n.º 06/13, de 01 de Abril.
8 Sendo cidadão não residente cambial, como posso enviar para o exterior
os meus rendimentos?
As pessoas singulares não residentes cambiais podem, cumpridas que estejam
as suas obrigações fiscais, transferir para o exterior do país os rendimentos
legalmente auferidos, que venham a ser depositados nas suas contas bancárias
pelas entidades com as quais tenham celebrado contractos de trabalho ou de
prestação de serviços.
As referidas transferências podem ser efectuadas durante a permanência ou
no final da estadia em território angolano.
Para mais informação, consultar o Aviso n.º 13/13, de 6 de Agosto.
9 Aonde devo dirigir-me para comprar ou vender moeda estrangeira?
Deve dirigir-se sempre a um banco ou a uma casa de câmbios, que são as únicas
entidades permitidas pelo BNA para exercer o comércio de câmbios e onde não
corre o risco de receber notas falsas ou de se sujeitar a práticas especulativas.
As empresas podem apenas vender ou comprar moeda estrangeira nos bancos
comerciais.
Importa ainda esclarecer que somente os bancos comerciais estão autorizados
a vender divisas. As casas de câmbio podem apenas vender notas aos seus
clientes.
As agências de viagem e unidades hoteleiras, devidamente autorizadas pelo
BNA, podem comprar moeda estrangeira aos seus clientes ou hóspedes, mas
não estão autorizadas a vender.
10 Porque existem limites cambiais?
As divisas são recursos que o país obtém das exportações, da venda de
património ao exterior ou da contratação de empréstimos externos. Esses
recursos permitem-nos adquirir ao exterior os bens e serviços que o país não
dispõe ou que ainda não produz.
Por isso, os limites cambiais são medidas de protecção macroeconómica que
visam apoiar a estabilidade, o crescimento e o emprego, pelo que vão sendo
ajustadas em função das circunstâncias de desenvolvimento do país.
Para mais informações, consulte o seu banco comercial, a página electrónica
do BNA www.bna.ao ou o portal do consumidor
www.consumidorbancario.bna.ao
Posso enviar fundos para o exterior sem ter uma conta bancária? Em que
moeda posso fazer estas operações?
Sim. Pode enviar fundos para o exterior sem ter uma conta bancária, para um
beneficiário no exterior que também não tenha conta bancária, através dos
bancos comerciais e sociedades financeiras autorizadas que prestam serviços de
remessas de valores.
As remessas para o exterior:
• são sempre ordenadas em Kwanzas;
África21– junho 2014
41
NICOLAS THIBAUT/AFP
cabo verde
A pesca contribui entre 7% a 10% para o PIB de Cabo Verde
Novos setores estratégicos
para o desenvolvimento
Atrair investimentos, dinamizar a economia, tornando-a
competitiva e moderna, capaz de gerar emprego
e reduzir os índices de desigualdade e pobreza são
os objetivos prioritários do Governo de Cabo Verde
Natacha Mosso Praia
O
Executivo cabo-verdiano
reconhece que a base económica
do país continua a ser reduzida,
pelo que há necessidade de se diversificar os
setores e clusters selecionados como parte da
agenda de transformação do arquipélago.
Tudo isso para criar novas oportunidades e
edificar uma economia de base alargada e
competitiva. Para tal, vem implementando
medidas e investindo recursos na construção
de infraestruturas modernas, e a adotar reformas que visam facilitar os negócios, expandir
a formação profissional e universitária e
atrair novos investimentos e parcerias.
Considerado pelo primeiro-ministro
como «um importante pilar de transforma-
42
junho 2014 –
África21
ção do país», o agronegócio é um dos setores que vem conhecendo uma grande dinâmica, com investimentos significativos para
transformá-lo num setor atrativo, de onde
emerja uma verdadeira indústria ligada à
agricultura e pecuária nas ilhas.
Sendo a escassez de água um dos principais obstáculos à concretização dessa ambição, o Governo, nos últimos anos, tem
apostado significativamente num programa de mobilização de águas, do qual se
destaca a construção de barragens nas ilhas
de forte tradição agrícola, que irá permitir
captar milhões de metros cúbicos de água
necessária para aumentar as áreas irrigadas.
A par disso, um trabalho de investigação
vem sendo feito, liderado pelo Instituto
Nacional de Investigação e Desenvolvimento Agrário, tendendo a introduzir novas espécies vegetais e animais, mais resistentes e de melhor qualidade.
Outro investimento que se conjuga
para alavancar o agronegócio tem sido no
domínio da transformação de alimentos.
Varias iniciativas de apoio à produção,
transformação e comercialização dos produtos agrícolas têm sido postas em prática,
em parceria com as ONG e associações de
base comunitária. Pôr em funcionamento
centros de transformação agroalimentar,
apoiar a criação e o desenvolvimento de
pequenas unidades de transformação, formar pessoas nas áreas de transformação e
gestão são algumas das ações definidas e
materializadas pelo Governo.
Para os próximos tempos, o Executivo
pretende criar uma empresa de logística,
para unificar o mercado emergente do
agronegócio. Trata-se, de acordo com a
ministra do Desenvolvimento Rural, Eva
Ortet, de uma empresa que permitirá unificar o mercado, organizar e fazer com que os
agricultores vejam a agricultura como uma
espécie de contrato com os investidores.
O fator TIC
Para o Governo de Cabo Verde, as Tecnologias de Informação e Comunicação
res) na fase inicial, contribuindo de forma
determinante para a atração de investimento estrangeiro.
Criar um Fundo de apoio ao investimento destinado às micro e pequenas empresas e criar um regime especial para estas
empresas são outras medidas em curso.
que vêm respondendo positivamente, capacitando o país nesse domínio. Para já, e
como apoio da FAO, o Executivo definiu
um quadro estratégico de desenvolvimento da aquacultura no país, que identifica os
caminhos para um desenvolvimento durável da aquacultura, permitindo assim alcançar os objetivos preconizados, colocando em relevo os aspetos relativos à
durabilidade económica, financeira, social
e ambiental. De referir que, em 2011, o
contributo do setor das pescas para o Produto Interno Bruto de Cabo Verde foi estimado entre 7% e 10%.
Investir no mar, em terra e no ar
Dadas as suas potencialidades na criação de
milhares de empregos diretos e indiretos e
de serviços associados, o mar foi também
eleito como setor estratégico para o desenvolvimento socioeconómico do país.
Ao nível das pescas, pela sua importância na geração de divisas através da exportação do pescado com algum valor comercial,
o Governo tem investido na construção de
infraestruturas portuárias de apoio à pesca,
mas também no aumento da frota pesqueira e na introdução de novas artes de pesca.
A visão para o setor
do agronegócio está
nas microempresas e
cooperativas que assegurem
a produção agrícola
NICOLAS THIBAUT/AFP
(TIC) constituem uma oportunidade para
o desenvolvimento económico-social sustentável do país. Por isso tem apostado no
desenvolvimento do setor, através da promoção de um cluster TIC cujos benefícios,
de acordo com o Executivo, passam pelo
aumento do conhecimento, alargamento
do mercado, economias de escala, novas
ideias, negócios e serviços especializados.
Os investimentos feitos atestam esta
importância atribuída, sendo um dos mais
expressivos o parque tecnológico recentemente construído com um empréstimo do
Banco Africano de Desenvolvimento, no
valor de 32 milhões de euros (cerca de 44
milhões de dólares). Considerado um projeto estruturante para a afirmação do país
na área das TIC, o mesmo comporta um
Centro de Dados, um Centro de Negócios,
um Centro de Incubação de Empresas e
um Centro de Treino e Qualificação, e
Cabo Verde estuda a introdução de novas espécies animais e vegetais para dinamizar o agronegócio
servirá o tecido empresarial uma vez que irá
acolher programas de incubação para start-ups e ações de formação e certificação de
quadros em TIC.
O Governo acredita que o parque possa
vir a ter um importante impacto na economia regional e nacional, criando 1500 novos empregos e receitas na ordem dos
45 milhões de euros (62 milhões de dóla-
Governo quer criar um
cluster aeronáutico com
epicentro na ilha do Sal
Além disso, surgiram algumas empresas
privadas nacionais, ou de nacionais associados a estrangeiros, cuja atividade se relaciona com a captura, a transformação e a comercialização de pescado.
Ainda neste âmbito, e no quadro do
processo de criação de alternativas sustentáveis para o setor e valorização dos produtos das pescas, o desenvolvimento da
aquacultura aparece como uma necessidade e um desafio para Cabo Verde. Tendo
em conta este desiderato, o Governo procura estabelecer parcerias internacionais
Ainda emergente, o aeronegócio é outra área onde o Governo vê oportunidades
para dinamizar a economia. Em fevereiro, a
ministra cabo-verdiana das Infraestruturas e
Economia Marítima, Sara Lopes, anunciou
que será criado o cluster aeronáutico com
epicentro na ilha do Sal, onde se situa o
Aeroporto Internacional Amílcar Cabral
que reúne, de acordo com a governante,
todas as condições para estimular negócios,
atrair investimentos e provocar o crescimento económico em torno do setor.
Embora esteja em bom ritmo, a ministra acredita que será dentro de três anos que
estará finalizado o conjunto de medidas incentivadoras e facilitadoras do ambiente de
negócios, estando nesse momento a procurar parceiros económicos e investidores em
países como a China, Singapura e Japão.
Por ora, diz a ministra que vão sendo identificadas oportunidades de negócios ligadas
à aviação civil e transportes aéreos, adiantando que existem já alguns interesses
identificados.
A aviação recreativa e a formação são
áreas a serem exploradas, de acordo com
Sara Lopes, destacando a cultura aeronáutica bastante acentuada em Cabo
Verde, a capacidade nacional, reconhecida no exterior, bem como a certificação
das instituições quer a nível regional quer
internacional.
África21– junho 2014
43
É possível encontrar infinitas maneiras
de se definir a Paz. Esta é apenas uma delas.
A Paz é a nossa maior riqueza.
Está nos pequenos momentos das nossas
vidas e nas grandes realizações do nosso país.
É o que nos une e o que garante que
sejamos um Povo cada vez mais forte no
presente e no futuro.
44
junho 2014 –
África21
Ministério da Comunicação Social
A crónica de Germano de Almeida
Q
As cunhas ao bando dos oito
desenvolvimento da comunidade lusófona, o que deve
uem diria que ao longínquo japão pudesse
ser mesmo verdade em termos económicos (pelo mealguma vez interessar sequer conhecer quem é,
nos já há muitos quadros cabo-verdianos trabalhando
quanto mais querer saber o que faz ou pode fazer a
nesse país), já o Presidente da República manifesta dúCPLP? Pois bem, esse mesmo Japão aparece agora mevidas, invoca um caderno de encargos que terá sido
tendo cunha junto de Portugal para que este convença
submetido à GE para cumprimento, relembra os direios demais membros a aceitar a nação dos crisântemos no
tos humanos, questiona a pena de morte ainda em uso
seu seio, ainda que como simples observador das suas
naquele país...
ímpares e, para nós outros, desconhecidas
E, no entanto, até há bem pouco
virtudes. É claro que as más-línguas vão
tempo tudo parecia favoravelmente enquerer lançar desdouro sobre a nobre
caminhado, para não dizer resolvido, já
bisbilhotice nipónica, resumi-la a simples
com Mr. Obiang praticamente com as
busca de oportunidades de negócio. Mas
mãos nas torneiras do seu petróleo
nós outros, gente de boa-fé, acreditamos
prontas a serem abertas na nossa diretratar-se de legítima curiosidade de um
ção. Mesmo no que concerne à pena de
povo que muito estima as coisas matemorte, ele, nobre e magnanimamente
riais, é verdade, mas sempre colocou
decidiu suspender a sua aplicação. Até
a grandeza Espiritual acima de toda a
quando? Não disse e ninguém sabe!
mesquinhice.
[email protected]
E nestas condições, há o risco de estar
Mas há riscos. Porque a continuar
suspensa apenas a execução, as pessoas poderem continesse ritmo de procura, qualquer dia a CPLP está em
nuar a ser condenadas, mas depois separadas e guardafranca competição com a União Europeia, os países do
das em lugar secreto e seguro, longe dos bisbilhoteiros
mundo em fila à sua porta, de mãos estendidas pedinda comunicação social. E mal passe a cimeira de Díli,
do a graça, se não de entrar, pelo menos de poder esMr. Obiang manda encher um campo de futebol com
preitar de perto as maravilhas que as suas iniciais pareos seus condenados, pede a importação dos que estão
cem prometer.
no corredor da morte do Japão (sim, o Japão tem pena
De todo o modo, com a chegada do Japão serão
de morte!) e seremos todos convidados a assistir à apomais dois os forasteiros a querer entrar no bando dos
teose da sua coroação como membro da CPLP.
oito. Mas certamente que isso não causará escândalo,
sobretudo se à atual CPLP se acrescentar «&C.ª Ltda».
Isso porque o Japão encontra aguardando um outro já
impaciente país, a Guiné Equatorial, que diante de
tantas delongas e hesitações em ver-lhe franqueada a
porta, qualquer dia será bem capaz de enviar uma rajada
de petróleo destinada a afogar os recalcitrantes e desse
modo fazer esquecer os pequenos obstáculos até agora
chamados a impedir a sua triunfal entrada no seio da
Comunidade.
Ainda que seja verdade que a situação da Guiné
Equatorial voltou a ficar algo confusa. A princípio era
apenas Portugal que torcia o nariz à sua pretensão, mas
agora o próprio Cabo Verde, ou pelo menos uma parte
do poder em Cabo Verde, parece hesitar, o que coloca
o país como que pousado sobre um muro vacilante,
sem a segurança de um sim certo ou um não claro.
É que enquanto o primeiro-ministro apoia com entusiasmo a eventual entrada da Guiné Equatorial na
CPLP, dizendo tratar-se de um grande passo para o
A continuar nesse ritmo de procura,
qualquer dia a CPLP está em franca
competição com a União Europeia
África21– junho 2014
45
O desafio
MUSSA BALDE/LUSA
guiné-bissau
da normalização
Com a entrada em funções, este mês, das autoridades
eleitas, espera-se que seja definitivamente ultrapassado o
ciclo das transições políticas e comece o retorno progressivo
à democracia e à ordem constitucional
Almami Júlio Cuiaté Bissau
A
eleição do Presidente da República, o elo que faltava para
completar o retorno à ordem
legal, foi concluída a 18 de maio, à segunda volta, com a vitória do economista
e empresário José Mário Vaz (61 anos), o
popular ministro das Finanças do Governo deposto há dois anos.
Antigo presidente da Câmara da capital e apoiado pelo PAIGC, partido que
em abril tinha obtido a maioria absoluta
nas legislativas, Vaz ganhou por folgados
61% ao seu adversário, o independente
Nuno Gomes Nabiam, candidato dos
militares golpistas e do regime por eles
instalado em 2012.
Apesar das pressões sobre a Comissão
Nacional de Eleições, o órgão da administração eleitoral, para adiar a publicação
dos resultados definitivos, e não obstante
as perseguições, ameaças e agressões físicas
contra os dirigentes e ativistas do PAIGC,
em particular nas regiões de Bafatá e
Gabu, importante viveiro eleitoral no
Leste do território, os eleitores não vacilaram nas urnas, e tal como na primeira
volta, a 13 de abril, votaram em massa em
‘Jomav’, como também é chamado o
novo Chefe de Estado guineense, o quinto
escolhido em eleições multipartidárias.
As intimidações tinham por finalidade condicionar a vontade popular ou, em
caso contrário, impor contrapartidas em
46
junho 2014 –
África21
benefício da cúpula militar e seus aliados
políticos, que receiam um futuro sem o
poder e as regalias de que vinham desfrutando ilegalmente. Esse era igualmente o
objetivo das reuniões promovidas no Palácio Presidencial após a segunda volta do
escrutínio, embora as tentativas de acautelar os interesses dos tenores da transição
fossem camufladas com supostas iniciativas de reconciliação nacional. A última
manobra nesse sentido foi a recusa de reconhecer os resultados por parte do candidato derrotado, esquema insustentável
e sem sucesso.
Soube-se, mais tarde, através de uma
inconfidência do Chefe de Governo de
Cabo Verde, que Nuno Nabiam teria exigido o posto de 1.º vice-primeiro-ministro
encarregado da reforma do setor da Defesa
e Segurança e dos Recursos Naturais, em
troca da aceitação dos resultados eleitorais.
A reforma da área da Defesa, nomeadamente a renovação das chefias castrenses
que ela implica, é um autêntico pesadelo
para os militares golpistas, alguns dos
Se o Governo fizer
a reforma da Defesa,
Antonio Injai deverá
ser afastado pelo
Presidente da República
quais têm graves contas a ajustar com a
justiça nacional e internacional.
Entendimento PAIGC/PRS
para governar sem sobressaltos
Consciente da necessidade de acalmar os
militares, a fim de instaurar a estabilidade
indispensável às difíceis reformas da governação que se perfilam, o PAIGC, o
partido governamental, logo que foram
conhecidos os resultados definitivos das
presidenciais, retomou os discretos contactos que já tinha desde 2013 com o
PRS, a principal força da oposição e próxima dos militares.
O objetivo destes encontros era chegar a um entendimento político e estabelecer parcerias. As negociações culminaram na assinatura de um comunicado
conjunto, pelos líderes das duas formações, respetivamente Domingos Simões
Pereira, novo primeiro-ministro, e Alberto Nbunhe Nambeia, na presença das
máximas autoridades da transição, in-
tirar para a aldeia paterna, uma remota
localidade do setor de Bissorá, no centro-norte do país. Qualquer que seja o seu
destino, a presença de António Injai nos
quartéis será sempre um fator de instabilidade para o regime democrático, além
do embaraço de tê-lo como interlocutor
em qualquer parceria externa para o financiamento da reforma da Defesa e Segurança. Agora, as atenções em Bissau
estão viradas para o Parlamento. A posse
dos novos deputados e a eleição do presidente da Assembleia Nacional Popular, a
segunda figura do Estado, deverá ocorrer
no final da primeira semana de junho.
Depois será a vez da investidura do Chefe
de Estado, que por sua vez deverá nomear
e dar posse ao primeiro-ministro e ao seu
Governo.
O general António Injai celebra a vitória presidencial de José Mário Vaz
cluindo o homem-forte militar, general
António Injai. Além da observância do
princípio do «perdão a favor da reconciliação» e da concessão da amnistia, anteriormente já rejeitada pelo Parlamento
cessante, um dos compromissos assumidos no documento é o de assegurar às
forças de Defesa e Segurança um tratamento de «respeito e dignidade», mormente no quadro da implementação do
programa de reforma do setor. Outra
garantia expressa no comunicado é de
«não perseguição, nem ameaças», para
tranquilizar a classe política e todos os
atores sociais guineenses.
Retiro na aldeia paterna?
Na véspera deste entendimento, o Estado-Maior das Forças Armadas divulgara
uma nota oficial, exortando a população
a permanecer tranquila, e na qual reafirma a sua submissão ao poder político.
Algumas horas antes, à saída de um encontro que reuniu os dirigentes cessan-
tes e as novas autoridades eleitas, sob os
olhares dos representantes das Nações
Unidas e da União Africana e de milhares de pessoas que vitoriavam o Presidente eleito, o chefe das Forças Armadas, general Injai, segurou no braço de
José Mário Vaz e ergueu-o, dando a entender que entre ambos estava tudo
numa boa.
Contudo, o futuro de Injai ainda é
uma incógnita. Se o próximo Governo
levar avante a reforma da Defesa, como
tudo indica, o controverso oficial deverá
ser afastado pelo Presidente da República. Correm rumores de que o próprio
militar já manifestou a intenção de se re-
Ramos-Horta considera que
a comunidade internacional
tem o dever de acudir o
país fornecendo os meios
para um apoio de urgência
Visita do primeiro-ministro de Timor
A Guiné-Bissau não tem tempo a perder,
porque a economia está quase estagnada
e a situação social é explosiva. Vários setores sensíveis, como a saúde e a educação, estavam em greve. Os funcionários
públicos, com cerca de cinco meses de
salários em atraso, suspenderam a paralisação em sinal de boa vontade para com
o novo regime. E como os cofres do Tesouro público estão vazios, só resta o recurso à ajuda externa.
Para José Ramos-Horta, o representante da ONU na Guiné, a comunidade
internacional tem o dever de acudir o país,
fornecendo os meios para um apoio de
urgência de pelo menos seis meses. E tal
como na preparação das eleições, o diplomata timorense parece estar em sintonia
com as autoridades de Díli. Com efeito,
depois de terem financiado o recenseamento e as eleições gerais guineenses, os
governantes timorenses parecem decididos a tomar a dianteira na nova etapa que
se abre e a oferecer os seus serviços. O primeiro-ministro Xanana Gusmão vai ser o
primeiro Chefe de Governo estrangeiro a
deslocar-se a Bissau, entre 6 e 10 de junho, para conhecer o rumo que a nova
equipa dirigente pretende dar ao país e o
que pretende fazer em matéria da cooperação bilateral.
África21– junho 2014
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África21
África21– junho 2014
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África21
A crónica de Odete Costa Semedo
E
O voto e a bicicleta do menino
m tempo de eleições, há inquietações, bancarPor mais incrível que pareça, no meio desta azáfama
rotas, buscas. Em causa está o poder! Porém,
alguém ousou furar o esquema das atenções eleitoralescas,
quem está na aldeia mais remota do país, quando vê
trazendo para a cena bissauense um livro: África/Brasil:
chegar a caravana de carros do último grito carregada
diálogos possíveis… A apresentação teve a sala cheia, entre
de víveres e eteceteras, não imagina o imbróglio que
académicos, diplomatas, familiares e amigos.
envolve o caminho percorrido para ali se fazer chegar
Artemisa Monteiro traz um assunto que tem a ver
tudo aquilo: compadrios, associações amistosas, emcom o público guineense, a relação África/Brasil.
presas kasisas 1, todos entram em cena
A autora questiona a imagem duma África reinventada por negras e negros brasipara aplicações na bolsa de valores polítileiros. Aborda a questão dos movimentos
ca, esperando os resultados para cobrar
negros em Piaui, as suas lutas, conquistas
os despréstimos.
e o peso da discriminação que essa camaÀs portas da segunda volta das presida sofre na sociedade brasileira.
denciais, à medida que o dia do escrutíDois olhares se cruzam sobre essa relanio se aproxima, a insegurança dos mais
ção, por um lado o olhar da estrangeira
inseguros transforma-se em violência e
que chega ao Brasil esperando encontrar
tudo é feito na calada da noite, como
um país multicultural e plurirracial, com o
manda o figurino.
[email protected]
povo vivendo na sua harmonia e a deceção
A ostentação de carros pelos partida autora ao conhecer o país real, pois Artemisa acompados, candidatos e apoiantes é impressionante; biciclenhou a trajetória de luta das mulheres militantes do
tas, motos, baldes, chaleiras, arroz são adquiridos para
movimento negro piauense; por outro lado, o olhar do
seduzir o eleitorado, pois julgam-no vulnerável e fácil
negro brasileiro sobre o continente africano, numa visão
de intrujar. Grande engano! Nas tabancas, o povo entra
idealizada da mãe África em que o continente é visto
no jogo, recebe o que lhe oferecem e remete tudo às
como uma grande Nação, diferente da imagem estereomãos de Deus. Deus já escolheu, nós é que ainda não
tipada de uma África de doenças, de guerras e de fome.
sabemos! Dizem sabiamente os mais velhos aos caçadoMas o que tem este livro a ver com as eleições?
res de votos, que saem das tabancas pensando cada um
No livro, descortina-se como a autora se sentiu inser o eleito de Deus. E acreditem, minha gente, essa
terpelada e desafiada por inquietações relacionadas aos
caça aos votos está a dar que falar e vem provocando
sentidos de África e pelo universo simbólico das reprechacotas e anedotas.
sentações do continente africano. Foi confrontada com
Há dias, contaram-me que um menino chegou a
a imagem de uma África positiva, ainda que representacasa a correr, gritando pela mãe, perguntando quando
da pelo corpo, por roupas coloridas e adornos, porém,
seria a terceira volta. A mãe, sem entender, questionou
uma África de luta pela sua afirmação.
o filho, ao que este explicou: o pai foi receber a motoriNeste pedaço do Continente, as eleições interpelam
zada lá no bantabá onde tem comício! A mãe lembra-se
o País, os atores sociais e intimam o Povo para os desade que na primeira volta o pai ganhou uma bicicleta?
fios das ciências e do saber, do trabalho e da disciplina.
Então, agora a bicicleta vai ser minha. Havendo terceiOs dardos estão lançados!
ra volta, pode ser que o pai ganhe um carro. E tomara
que seja daqueles carros com quintalzinho que dá para
carregar frutas e lenha.
Como esta, há tantas outras anedotas reinventadas,
algumas mostrando, como diz o artista Zé Manel, que
o povo não é burro. A boca cala-se, mas os olhos veem!
E muitos vão tirando proveito do que puderem para
dar o seu voto a quem quiserem.
1
Espírito mau e nojento que vagueia de noite.
Bicicletas, motos, baldes,
chaleiras, arroz são adquiridas
para seduzir o eleitorado, pois
julgam-no vulnerável e fácil
de intrujar. Grande engano!
África21– junho 2014
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são tomé e príncipe
Seminário sobre recursos não petrolíferos em São Tomé
Zona de Desenvolvimento Conjunto
Recursos pesqueiros rentáveis
A Autoridade Conjunta procura sensibilizar operadores e
investidores no setor pesqueiro para oportunidades de negócio
na Zona de Desenvolvimento Conjunto entre Nigéria e São
Tomé e Príncipe. Os interessados poderão beneficiar de
incentivos na concessão de licenças. Contudo, há que garantir
a segurança na sub-região.
Juvenal Rodrigues SÃO TOMÉ
T
rês fatores principais são
apontados como razões para se
investir na área partilhada pelos
dois países. O primeiro é que está provada a existência de recursos pesqueiros na
Zona de Desenvolvimento Conjunto
(ZDC) e os estudos indicam que são
economicamente exploráveis. Por outro
lado, qualquer empresa que obtiver uma
licença para pescar nesta zona poderá
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junho 2014 –
África21
conseguir uma segunda autorização,
ampliando a dimensão da área de atividade. A Autoridade Conjunta promete
interceder junto das autoridades dos
dois países para que seja concedida essa
permissão. Em terceiro lugar, existem
em São Tomé e Príncipe infraestruturas
no domínio das pescas que podem ser
exploradas segundo o conceito de parceria público-privada.
Os responsáveis da Autoridade Conjunta pediram a colaboração do Governo
norueguês, através do Instituto de Pesquisas
Marítimas e da Organização Mundial da
Alimentação. Dois estudos de investigação
científica realizados em 2011 e 2012 na referida zona são animadores. Os seus resultados foram apresentados no workshop sobre
«Policiamento, Segurança e Desenvolvimento dos Recursos na Zona de Desenvolvimento Conjunto», que decorreu de 5 a 8
de maio na capital santomense.
A exploração do potencial de recursos
haliêuticos existentes, nomeadamente
atum, poderá contribuir para a criação de
riqueza e fonte de emprego para os povos
de ambos os países. As informações disponíveis indicam que a região do Golfo
da Guiné, em geral, e a Zona de Desenvolvimento Conjunto, em particular, é
bastante próspera em recursos biológicos
Nigéria e São Tomé
e Príncipe têm na ZDC
um vasto campo
de potencialidades para
explorar e desenvolver
e minerais. Nigéria e São Tomé e Príncipe têm aí um vasto campo de potencialidades para explorar e desenvolver.
Garantir a segurança
Contudo, há um obstáculo: a pirataria.
O fenómeno que se tem alastrado no
Golfo da Guiné «ameaça seriamente o
futuro de paz, prosperidade e segurança,
exigindo de todos nós firmeza e determinação no combate que devemos travar contra esse flagelo», declarou o
primeiro-ministro.
Para Gabriel Costa, «é essencial o
papel da comunidade internacional,
sendo cada vez mais premente a necessidade de se agilizar e tornar mais eficaz
esse combate».
São vários os desafios a serem ultrapassados para facilitar o investimento
com vista à exploração de recursos não
petrolíferos, entre os quais se destaca:
criar um ambiente propício ao desenvolvimento de petróleo e gás e outros recursos naturais na ZDC; acabar com
assaltos à mão armada, tráfego de pessoas e mercadorias ilícitas, pesca ilegal
não regulada e não declarada, abastecimento ilícito de petróleo, descarga de
resíduos tóxicos, poluição resultante da
exploração de petróleo e gás.
«A exploração dos recursos existentes na ZDC só será possível quando os
investidores tiverem a garantia de que as
embarcações que operam na zona não
correm o risco de serem atacadas, o que
suscita, desde logo, o problema crucial
de policiamento e segurança da zona»,
sublinhou o chefe do Governo.
A estratégia tem várias valências. Por
exemplo, o Conselho Ministerial Conjunto na sua reunião de março, realizada
em Abuja, deliberou que o Conselho de
Administração da Autoridade Conjunta
deve propor um acordo de segurança
temporário que deverá evoluir para uma
cooperação militar bilateral. O objetivo,
segundo o presidente do Conselho de
Administração, Luís dos Prazeres, é «proporcionar segurança aos investidores e
seus equipamentos que se comprometerem a desenvolver atividades na Zona».
Por sua vez, São Tomé e Príncipe
tem beneficiado da cooperação de outros parceiros na vigilância e combate
aos ilícitos marítimos, como Reino
Unido, Estados Unidos, União Europeia, França, Brasil e Portugal. Porém,
na perspetiva de Gabriel Costa «torna-se
necessário o estabelecimento de um
quadro regional para lidar, com eficiência, com as questões económicas e am-
Os noruegueses defendem
uma gestão inteligente
que permita a exploração
dos recursos sem pôr
em causa o ecossistema
BENEFÍCIOS DA ZONA CONJUNTA
A cooperação entre São Tomé e Príncipe e a Nigéria na Zona de Desenvolvimento
Conjunta é boa. Segundo o presidente do Conselho de Administração da Autoridade
Conjunta, os dois países já obtiveram «muitos benefícios», nomeadamente na área
social. Por exemplo, em São Tomé e Príncipe fez-se um investimento superior a três
milhões de dólares em projetos sociais. A nível de concessão de bolsas de estudo foi
mais de um milhão de dólares. Cerca de 900 alunos foram beneficiados, como informou Luís dos Prazeres. «Além disso, quando fizemos o primeiro e o segundo leilão,
em 2003 e 2004, o país encaixou 80 milhões de dólares aproximadamente. Mas falta
o principal: entrarmos na fase de produção que trará recursos mais avultados para o
país», acrescentou.
bientais estabelecidas no âmbito do
Tratado, sendo certo que a Comissão do
Golfo da Guiné é uma instituição regional capaz de contribuir para o efeito».
A presença de membros nigerianos
do Conselho Ministerial Conjunto e
empresários do país vizinho no workshop
deita uma vez mais por terra a notícia
veiculada em março pela WorldStage
Newsonline, segundo a qual as autoridades nigerianas estariam «frustradas» com
o alegado fracasso da exploração petrolífera na ZDC e que consideravam a possibilidade de abandonar o Tratado.
A Autoridade Conjunta já tinha desmentido formalmente essa informação.
Acusou o órgão de ter deturpado as declarações do ministro nigeriano dos Negócios
Estrangeiros, Nuruddeen Mohammed,
perante a comissão parlamentar de Cooperação e Integração em África. «Nestes 12
anos falámos muito de petróleo e gás, mas
decidimos que desta vez era fundamental
abordarmos os recursos não petrolíferos.
Aliás, o Tratado fala não só de hidrocarbonetos, mas também de recursos não petrolíferos, como a pesca», declarou a África21
o presidente do Conselho de Administração da JDA, Luís dos Prazeres.
Durante dois dias, uma dezena de
oradores falou sobre «Potencialidades dos
recursos não petrolíferos e oportunidades
para o seu desenvolvimento», «Segurança
na Zona de Desenvolvimento Conjunto
para os recursos naturais», «Sensibilização
sobre a problemática marítima regional
nos aspetos de partilha de informação e de
criação de capacidades e a situação prevalecente no golfo da Guiné e seu impacto
na ZDC», entre outros assuntos.
Os representantes da Noruega, país
que explora petróleo e tem uma importante atividade pesqueira, partilharam a sua
experiência. Defendem que uma gestão
inteligente permite a exploração dos dois
recursos sem pôr em causa o ecossistema.
O propósito da Autoridade Conjunta é iniciar antes do final deste ano atividades de exploração de recursos pesqueiros já identificados em grande
escala, que permitirão gerar receitas para
os dois Estados e os investidores.
África21– junho 2014
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áfrica
O sequestro de duas centenas de jovens nigerianas suscitou uma emoção
mundial e o Ocidente mobilizou equipas de «especialistas» para as resgatar.
Mais uma vez está em debate a alegada incapacidade dos africanos para
combater o terrorismo e garantir a segurança do continente.
Nicole Guardiola
Luta contra o terrorismo islâmico
H
Assistência
ou ingerência?
á muito que não se via tanta agitação
político-mediática em torno de um
drama africano. Acusado de «incompetência» e de «insensibilidade» face ao drama
das «crianças» ameaçadas de «escravatura sexual»,
o Presidente nigeriano acabou por pedir ajuda
internacional para as localizar. Estados Unidos,
França, Reino Unido e China responderam positivamente. Mas a iniciativa de Goodluck Jonathan não é unanimemente aprovada na Nigéria e
nos países vizinhos. Depois da cimeira organizada em dezembro passado em Paris, sobre segurança em África, a «minicimeira» de 17 de maio,
que reuniu na capital francesa os Presidentes do
Chade, Camarões, Níger e Nigéria, suscita sérias
interrogações sobre o sentido da «guerra total»
declarada contra a Boko Haram.
Campanha mediática sob suspeita
Basta folhear a imprensa nigeriana para verificar
que a campanha em curso no Ocidente e nas redes sociais sob o lema «BringBackOurGirls» parece exagerada vista de África.
Os raptos de crianças de ambos os sexos não
são infelizmente uma novidade. Todos os grupos
armados os têm praticado em África e não só.
Joseph Kony e o seu Exército de Resistência do
Senhor são acusados pelo Tribunal Penal Internacional do rapto de 60 a 80 mil crianças no
Uganda desde 1986.
Na Nigéria, os ataques atribuídos nos últimos meses à Boko Haram contra estabelecimentos escolares, e que causaram a morte de centenas
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África21
de miúdos queimados vivos no incêndio dos seus
dormitórios, nunca suscitaram tanta emoção.
É verdade que Abubakar Shekau, o chefe
sanguinário e analfabeto que tomou a liderança
da Boko Haram desde o assassínio do fundador
da seita em 2009, tem sido o principal artesão da
sua própria diabolização. No vídeo divulgado a 5
de maio para reivindicar o rapto das raparigas de
Chibok parece sair diretamente de um conto popular de terror para representar o papel do «feroz
islamita», entre gargalhadas e ameaças. A tal ponto
que as mais altas autoridades religiosas muçulmanas tiveram que reagir e afirmar que Shekau
é um louco criminoso que nada tem a ver com o
Islão.
Afirmar que a Boko Haram é uma criação
dos serviços secretos nigerianos e/ou da CIA,
para fomentar a islamofobia e a repressão contra
os muçulmanos é uma tese de sucesso nas redes
sociais. Não é a única das «teorias da conspiração» em circulação. No sul, entre os cristãos e os
Ibo do Delta do Níger, a etnia do Presidente
Goodluck Jonathan, e nos meios políticos de
Abuja fala-se da alegada «cumplicidade» das autoridades políticas do Norte e de altas patentes
do exército nigeriano (maioritariamente nortistas
e muçulmanas) com a Boko Haram para impedir
Jonathan de se candidatar às eleições presidenciais de fevereiro de 2015.
O futuro incerto de Goodluck Jonathan
Em todo o caso, a atitude titubeante de Jonathan
desde o início da crise fez passar a mensagem de
AFP/BOKO HARAM
Imagem do vídeo divulgado pela Boko Haram. Na bandeira pode ler-se «Não há outro deus senão Alá»
um Chefe de Estado fraco e impotente face às
pressões dos seus «conselheiros» nacionais e
estrangeiros.
Entretanto, a prioridade dada às buscas das
raparigas provoca reações de pânico entre as populações, que se sentem desprotegidas, e atritos
entre os militares nigerianos e os seus «conselheiros» ocidentais.
Na sequência do ataque de 5 de maio contra
a cidade fronteiriça de Gamburu Ngala, que fez
cerca de 300 vítimas, e de uma emboscada em
que pereceram 12 dos seus camaradas, soldados
amotinados teriam disparado contra o carro do
general Ahmadu Mohammed, comandante da
região militar de Maiduguri.
Abuja acusa a imprensa e a oposição de veicularem boatos, mas todos os analistas admitem
que o desfecho do caso das raparigas de Chibok
será decisivo para o futuro político do Presidente
Jonathan, cada vez mais isolado e impopular no
seu próprio Partido Democrático Popular
(PDP), e acusado de incompetência pelo ex-Presidente Olusegun Obasanjo.
Na cimeira de 17 de maio, François Hollande fez questão de garantir que não se trata de
enviar tropas francesas ou da ONU para a Nigéria. Mas os exemplos do Mali e da República
Centro-Africana (RCA) inquietam as opiniões
públicas da África Ocidental e Central.
Militares africanos e (in)segurança no continente
Com umas forças armadas de mais de 130.000
homens, relativamente bem armadas e equipadas, a Nigéria é uma potência militar regional.
Devia ser capaz de garantir a sua própria segurança e a estabilidade da região. Mas contra a Boko
Haram ou contra os rebeldes do Delta do Níger,
os militares nigerianos somam reveses e são sistematicamente acusados de corrupção e violações
dos direitos humanos.
Aliás, durante décadas, o Ocidente afirmou
que os golpes e regimes militares eram um dos
Potência
militar regional,
a Nigéria
é incapaz
de garantir
a sua própria
segurança
África21– junho 2014
55
maiores problemas de África. Saudou efusivamente a «restauração da democracia» na Nigéria
e no Mali, que foi obra de dois generais ex-golpistas, Olusegun Obasanjo e Ibrahim Toumani
Touré. Ambos foram citados como exemplos de
sujeição do poder militar ao poder civil, mesmo
quando as oposições internas denunciavam
a corrupção por detrás destas «conversões» à
democracia.
A desconfiança permanece e quando, depois
do 11 de Setembro, a ameaça terrorista passou a
suplantar a democracia e os direitos humanos nas
preocupações do Ocidente, americanos e europeus ofereceram os seus serviços aos governos
africanos para reforçar as suas capacidades de
defesa e segurança, sem abdicar do controlo sobre os meios mais sofisticados e sobre os militares
africanos formados para participarem nas operações «antiterroristas».
Não cabe aqui detalhar estes programas mas
as consequências estão à vista. Segundo a imprensa norte-americana, o dispositivo americano
antiterrorista em África realizou mais de 500
ações em 2012. A França, por sua vez, interveio
diretamente em 2013, com a bênção da comunidade internacional, no Mali e na RCA para «evitar catástrofes iminentes».
As intervenções foram militarmente bem-sucedidas. Os grupos armados jihadistas foram expulsos do norte do Mali e o país dispõe de novas
instituições democraticamente eleitas. A insegurança e os massacres continuam na RCA, mas a
chegada anunciada de 12.000 capacetes azuis da
ONU permite a Paris iniciar a retirada das suas
tropas.
Ajuda ou recolonização?
É a altura propícia para a França proceder à reorganização do seu dispositivo militar em África.
Única potência a dispor de bases militares permanentes no continente, a França quer deixar de intervir diretamente e copiar o modelo norte-americano, centrado em «vigilância», controlo aéreo
(drones) e formação de forças especiais africanas
selecionadas e doutrinadas.
Em que medida a campanha para salvar as
Reabertura do estádio do Maracanã,
raparigas
de Chibok
contribuir para reforonde
decorrerá
a final da pode
Copa 2014
56
junho 2014 –
África21
MUSTAFA SEVGI/ANADOLU AGENCY
Americanos e europeus querem
manter o controlo sobre os meios
e os militares africanos envolvidos
na luta contra o terrorismo
Os Presidentes Mahamadou Issoufou (Níger), François Hollande (França) e Goodluck
Jonathan (Nigéria), na minicimeira sobre segurança em Paris
çar a segurança em África? A jornalista e ativista
nigeriana Jumoke Balogun duvida das intenções
da campanha político-mediática e dos apelos à
guerra total contra a Boko Haram. Num artigo
de opinião publicado em Londres e Paris, Jumoke agradece a compaixão dos internautas mas
avisa que «quando fazem pressão sobre as potências ocidentais e particularmente o Governo dos
EUA para que intervenham nos assuntos africanos (…) estão a tornar-se protagonistas e cúmplices de uma agenda de expansão militar em África. E isto é mau».
Muitos malianos estão a chegar à mesma
conclusão. Bastou a visita do primeiro-ministro
Moussa Mara a Kidal para desencadear a ira dos
separatistas tuaregues que estiveram na origem da
crise de 2012, e os confrontos causaram dezenas
de mortos. O PM, que teve de ser evacuado pelas
forças da MINUSMA, interrogou os responsáveis militares estrangeiros presentes no Mali sobre «quem manda em Kidal» e ordenou o envio
de 1500 soldados malianos para a cidade. É uma
«declaração de guerra», apoiada pelo presidente
Ibrahim Boubacar Keita numa comunicação ao
país. Regresso à estaca zero?
Em 2012
os EUA
realizaram mais
de 500 ações
em África, e
a França em
2013 interveio
diretamente
em dois países
África21– junho 2014
57
áfrica do sul
O Presidente sul-africano Jacob Zuma, eleito para um
segundo mandato, com uma vitória por 62% do Congresso
Nacional Africano (ANC) nas eleições de maio, vai apresentar
o plano de ação quinquenal do Governo, quando fizer o seu
discurso sobre o Estado da Nação este mês
Gaye Davis Joanesburgo
Apesar de vitória nas eleições
ANC sem motivos
de regozijo
O
rival mais próximo do ex-movimento de libertação, que conta
102 anos de idade, foi a Aliança
Democrática (AD), ao obter 22% dos
votos nestas eleições, que decorreram de
forma pacífica em geral, e foram consideradas livres e justas pelos observadores.
Zuma dedicou o sucesso do resultado
– que se seguiu às comemorações do 20.º
aniversário da democracia na África do Sul
– à memória do primeiro Presidente democrático do país, Nelson Mandela, que
morreu em dezembro.
Discursando após o anúncio final da
contagem dos votos, Zuma descreveu o resultado como uma «vitória esmagadora»
para o seu partido, dizendo que esta «reafirma que o ANC como a única verdadeira
esperança para a maioria do nosso povo».
No entanto, a maioria de dois terços
ambicionada pelo partido ficou-se pelo
caminho, e uma análise mais minuciosa aos
resultados revela uma perda aproximada de
4% dos votos, em termos nacionais, desde
as eleições de 2009, e um padrão semelhante de declínio em cinco das nove províncias do país. A perda mais acentuada
58
junho 2014 –
África21
registou-se em Gauteng, a província mais
rica e populosa da África do Sul, onde o
ANC foi sacrificado em cerca de 10%
(mais de 300.000 votos), mantendo-se no
poder com 53%.
Alguns dentro do ANC atribuem o
fraco desempenho nesta província a divisões internas e a fações, enquanto outros
sustentam que os escândalos associados à
liderança de Zuma foram, pelo menos,
parcialmente responsáveis. De uma maneira ou de outra, essa quebra funcionou
como um alerta para o partido.
Os resultados indicam também que o
ANC está a tornar-se cada vez mais dependente dos eleitores do meio rural, do que da
classe média urbana. Se esta tendência não
se inverter, o ANC poderá vir a perder o
controlo das principais cidades a favor da
Aliança Democrática ou de uma coligação.
Eleições Municipais em 2016
O palco já está montado para uma luta
renhida nas eleições municipais em 2016.
A Aliança Democrática, que governa na
província do Cabo Ocidental, é a favorita
à vitória em Joanesburgo e Pretória, o que
A maioria de dois terços
ambicionada pelo ANC ficou
pelo caminho, com uma
perda de 4% dos votos
serviria como um trampolim para o poder
nacional em 2019.
O analista político Richard Calland
diz que embora a votação eleitoral tenha
constituído «um excelente resultado»
para o ANC, este deve precaver-se contra
a complacência. «O partido do Governo
devia ser aconselhado a analisar os resultados em profundidade, porque o feito
não é tão convincente quanto parece»,
afirmou.
Calland diz ser «notório» que os votos
do ANC caíram mais de 200.000 face a
2009, apesar de existirem dois milhões de
novos eleitores. «Em termos de participação
global, 32,5 milhões de pessoas podiam
votar, das quais 25,3 milhões estavam recenseadas e 18,5 milhões votaram efetivamente – uma participação de 73%, que é
internacionalmente elevada, mas constituiu
O Plano de Desenvolvimento Nacional, o quadro de crescimento e desenvolvimento do país a 30 anos focado no reforço
da economia e no combate às desigualdades, deverá servir de base aos planos do
Governo para os próximos cinco anos,
com Zuma a dizer que a maioria obtida
pelo ANC concedeu «luz verde» para se
avançar.
Mas há quem veja a confiança no plano
como despropositada. Frans Cronje, executivo-chefe do Instituto de Relações Raciais,
diz que desde a sua aprovação, o Governo
tem vindo a avançar com leis e políticas que
enfraquecem os direitos de propriedade,
reduzem a autonomia do setor privado,
ameaçam os negócios com «penalidades
draconianas» por não cumprimento e des-
Jacob Zuma eleito para um segundo e último mandato
5% menos do que em 2009. Isto representa
56,6% dos potenciais eleitores, o que significa que o ANC ganhou a eleição nacional
com os votos de pouco mais de 35% de
todas as pessoas que podiam votar».
Por outro lado, a Aliança Democrática
ganhou mais de um milhão de votos face ao
resultado de 16,7% obtido em 2009.
Calland refere que a diferença entre o ANC
e a AD diminuiu «drasticamente», de 61%
em 1994 para 40% nestas eleições. E acrescenta que enquanto o partido da oposição
pode ter hipóteses de vencer em Joanesburgo ou Pretória, daqui a dois anos, seria necessário mais uns «impensáveis» 20% para
garantir o poder a nível nacional.
O rápido crescimento da AD, de partido que representava principalmente os
interesses dos brancos a uma formação
que oferece uma maior abrangência, tem
causado tensões internas, decorrentes dos
seus esforços para manter a sua base de
apoio de sempre e em simultâneo conquistar os eleitores negros.
O ANC perdeu 15 lugares na Assembleia Nacional (de 400 deputados), tendo
ficado com 249 assentos parlamentares,
seguido da Aliança Democrática com 89.
O populista Combatentes pela Liberdade
Económica, partido estreante conduzido
pelo líder expulso da Juventude do ANC,
Julius Malema, conseguiu obter um milhão de votos com a sua campanha apoiada na intenção de expropriação de terras
sem indemnização e na nacionalização da
indústria, que lhe garantiu 25 lugares.
Outro potencial desafio político para
o ANC está no lançamento de um partido
dos trabalhadores, atualmente em discussão no sindicato dos trabalhadores metalúrgicos, o NUMSA. O sindicato rompeu
com a Cosatu e retirou o seu apoio eleitoral ao ANC, após a destituição de Zwelinzima Vavi de líder da Cosatu.
Para Zuma, cujo poder está limitado a
dois mandatos pela Constituição sul-africana, as prioridades concentram-se no
avanço do programa de construção de infraestruturas, avaliado em um bilião de
rands (cerca de 96 mil milhões dólares) de
forma a concretizar os projetos de estradas,
ferrovias, centrais de energia, gasodutos e
outros, destinados a olear a economia do
país e a criar empregos.
O partido de Mandela
e de Zuma torna-se cada
vez mais dependente
dos eleitores do meio rural
troem a confiança dos investidores. «Estas
políticas vão desde regras para mais igualdade no emprego e empoderamento económico dos negros a legislação com impacto
sobre a terra, agricultura, mineração, petróleo, indústria financeira e investidores em
geral».
Cronje entende que isto se opõe aos
objetivos de crescimento e emprego do
Plano de Desenvolvimento Nacional, o
qual ele sente que falha por não recomendar «mudanças políticas ousadas
capazes de colocar o país no caminho da
prosperidade».
Restaurar a confiança dos investidores
está no topo da agenda do Governo, diz o
secretário-geral do ANC Gwede Mantashe. Esse sentimento foi afetado, em particular, por uma greve prolongada no setor
de platina, que se tornou na disputa mais
longa na história da África do Sul. Mas,
para isso, é necessária uma reviravolta nos
atuais baixos níveis de confiança entre o
governo, o trabalho e as empresas – e cada
vez mais – o eleitorado.
Tradução de Teresa Souto
África21– junho 2014
59
FEIRAS JUNHO - JULHO 2014
60
FIL - Feira Internacional de Luanda | Estrada de Catete | Km 12 | CP. 6127 Luanda - Angola
INSCRIÇÕES E INFORMAÇÕES: Tel:. +244 926 405 978 / 70 / 923 676 731
(*) Agradecemos reconrmação - As Feiras e as datas poderão sofrer alteração
junho 2014 – África21
www.fil-angola.co.ao |
facebook.com/filangola
TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL
brasil
Quase 1,5 milhão
de pessoas vivem
nas 736 favelas
cariocas, ou seja,
quase 23%
da população total
da cidade
Rio de Janeiro
A guerra das favelas
numa cidade dividida
Governo decreta um virtual estado de guerra nas mais populosas favelas
do Rio de Janeiro para tentar conter confrontos quase diários entre
policiais e narcotraficantes pelo controle de áreas estratégicas da cidade.
Carlos Castilho Florianópolis
O
Rio de Janeiro não é considerada pelas estatísticas oficiais a cidade mais
violenta do Brasil, mas para quem lê
jornais e assiste aos noticiários na TV, a sensação
é a de que vive numa capital tão conflagrada
quanto Damasco, Kiev ou Bagdade. Isto faz com
que a «cidade maravilhosa» enfrente um duplo
desafio: de estatísticas e de balas.
Segundo o relatório Mapa da Violência 2013,
produzido com base em dados de 2010 e 2011, o
Rio de Janeiro ocupa o 23.º lugar entre as capitais
brasileiras no número de homicídios por 100 mil
habitantes (23,1 por 100 mil), índice que em
2011 foi 58,4% menor do que em 2001. Em valores absolutos, o mesmo relatório afirma que o número de homicídios na cidade caiu 55,2%.
Mas dados mais recentes, divulgados no início de maio pelo Instituto de Segurança Pública,
um órgão do governo do Rio de Janeiro, indicam
que a situação além de não ser tão tranquila
África21– junho 2014
61
Ocupação pelas forças de segurança do complexo de favelas Maré
Se a tendência
for mantida,
o número de
assassinatos
até dezembro
pode bater
o recorde
histórico de
3738 vítimas em
2002
62
junho 2014 –
como aponta o Mapa da Violência, revela uma
assustadora tendência de crescimento, com 1459
homicídios cometidos na cidade apenas nos três
primeiros meses de 2014, quase o mesmo total
registrado para todo o ano de 2011. Caso a tendência seja mantida, o número de assassinatos até
dezembro deve bater o recorde histórico de 3738
vítimas em 2002.
Escaramuças quase diárias
O temor de que os índices de violência disparem
durante a Copa do Mundo levou o governo do
Rio de Janeiro a decretar um virtual estado de
guerra ao cancelar todas as licenças e férias de
policiais tanto civis como militares, pedir o apoio
do Exército e da Marinha para patrulhar favelas e
deixar de sobreaviso a Polícia Federal e a Força
Nacional para eventuais emergências.
Tudo isto porque desde o início de abril, a
«cidade maravilhosa» assiste a escaramuças quase
diárias entre policiais e narcotraficantes em áreas
África21
como o chamado Complexo do Alemão, onde
vivem mais de 100 mil pessoas distribuídas em
13 favelas, e o Complexo da Maré, integrado por
16 favelas e 130 mil moradores. Ambas estão situadas na rota de acesso ao aeroporto internacional do Rio de Janeiro.
O Alemão e a Maré são os fronts mais violentos
da batalha em torno das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) criadas pelo governo do Rio de
Janeiro como parte de uma estratégia destinada a
ocupar militarmente as principais favelas da cidade, controladas por narcotraficantes e milícias.
Trinta e sete UPPS foram instaladas em favelas
cariocas desde 2008 quando o projeto foi lançado
com um enorme aparato publicitário, em meio ao
ufanismo de governantes que prometeram instalar
serviços básicos de saúde, educação, segurança e
saneamento nas regiões ocupadas.
Quase seis anos depois de iniciada a implantação das UPP no Rio de Janeiro, os resultados
são pouco convincentes como reconhece o soció-
TÂNIA RÊGO/AGÊNCIA BRASIL
Copa do
Mundo levou
o governo do
Rio de Janeiro
a decretar um
virtual estado
de guerra ao
cancelar todas
as licenças
e férias de
policiais tanto
civis como
militares
logo Michel Misse, coordenador do Núcleo de
Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana (Necvu) da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), em entrevista à Agência Pública.
O professor admite que a iniciativa é boa mas
lamenta que os resultados tenham sido escassos
«por causa dos policiais».
A atuação dos policiais nas UPP tornou-se o
estopim de uma verdadeira «guerra» com o narcotráfico depois que soldados e suboficiais foram acusados pelo desaparecimento de um trabalhador na
favela da Rocinha, uma das quatro maiores do Rio
e situada na zona sul, a região mais rica da cidade.
O caso deu publicidade à ação truculenta da polícia
nas regiões supostamente pacificadas. Ainda segundo dados do Instituto de Segurança Pública, 6034
pessoas desapareceram em favelas cariocas entre
novembro de 2012 e outubro de 2013.
O «desaparecimento», considerado nas favelas
como um sinônimo de assassinato, é o recurso
preferido por policiais das UPP para tirar de circulação pessoas suspeitas de pertencer ou colaborar
com o narcotráfico. Mas o mesmo método é usado
também pelo crime organizado, em especial pelas
milícias que eliminam traficantes e suspeitos de
colaboração com a polícia. Este tipo de ação à
margem da lei gerou duas consequências letais: a
intensificação do chamado «efeito colateral», jargão técnico para identificar civis mortos durante
choques entre policiais e delinquentes; e a tendência cada vez mais forte entre os agentes da lei, de
atirar primeiro e perguntar depois.
Policiais militares e policiais civis
Policiais à beira de um ataque de nervos foram os
responsáveis por um tiroteio dentro de uma delegacia na periferia de São Paulo, onde agentes,
acreditando que estavam sendo atacados por bandidos, acabaram matando um médico e ferindo
vários civis que aguardavam atendimento. A tensão entre os policiais militares e policiais civis
chegou a tal ponto que o jornalista Luciano Martins, do Observatório da Imprensa, sugeriu uma
«pacificação» da polícia carioca.
Depois de um recuo inicial em 2012 e 2013
quando o governo acelerou a implantação das
UPP no Rio, os narcotraficantes e as milícias retomaram a iniciativa em 2014 usando a violência da
polícia como estratégia de propaganda para conquistar o apoio dos moradores de favelas e reduzir
a credibilidade no projeto de ocupação militar de
áreas controladas pelo crime organizado.
Nas áreas de influência
do narcotráfico
há um conjunto
de instituições informais
que garantem a justiça,
ordem, segurança e serviços
A guerra informal entre o sistema de segurança pública e o crime organizado colocou quase
metade dos 6,5 milhões de cariocas dentro de
territórios onde é difícil distinguir os limites entre o poder do Estado e a influência do narcotráfico e/ou milícia. São bairros inteiros situados na
vizinhança de favelas cujos moradores, ricos e
pobres, não sabem se estão sob proteção do governo ou das organizações criminosas.
Nas áreas de influência do narcotráfico há um
conjunto de instituições informais que garantem a
justiça, ordem, segurança e serviços como distribuição de gás doméstico, transporte, energia elétrica,
televisão a cabo e, em alguns casos, até internet via
cabo. Tudo à margem da lei. Divergências entre
moradores e pequenos furtos são resolvidos pelo
chefe do narcotráfico local em bases sumárias.
Para um favelado que vive na base da subsistência econômica mínima, este tipo de proteção
é, em geral, considerada mais eficiente do que os
serviços oferecidos pelo Estado. Daí a dificuldade
da polícia do Rio de Janeiro de conquistar «corações e mentes» nas favelas sob controle do narcotráfico. A propaganda oficial insiste que o projeto
das UPP é pacificar as favelas e acabar com o
poder paralelo do crime organizado por meio de
uma ocupação militar, o que na prática quotidiana é um símbolo de guerra.
Para os segmentos de classe média e alta que
residem em bairros na periferia de favelas as consequências vão além de uma convivência com a pobreza e os «efeitos colaterais» na guerra entre polícia
e delinquentes. Quem contrata uma empregada
doméstica que mora na favela pode colocar sua família na esfera da ação do crime organizado. Isto
pode até trazer algum benefício como proteção
contra roubos ou sequestros, mas pode ter consequências trágicas. A luta pelo poder entre narcotraficantes é sempre decidida a bala e quem for considerado amigo do perdedor, passa a ser inimigo do
novo chefe. É a incerteza transformada em item do
quotidiano do Rio de Janeiro.
África21– junho 2014
63
guantánamo
O Uruguai e outros países sul-americanos, a confirmar, vão receber no seu território presos
que os Estados Unidos mantêm em condições inumanas na prisão de Guantánamo, em solo
cubano. São cidadãos do mundo islâmico a quem a Casa Branca tentou, sem êxito nem base
de sustentação, vincular aos atentados de 11 de setembro de 2001.
BRENDAN SMIALOWSKI/APF
Manrique S. Gaudin Buenos Aires
José Mujica foi recebido na Casa Branca em maio
As portas abertas
da América Latina
A
notícia foi conhecida a 20
de março, mas a ideia estava a
ser gerada há 23 meses, quando
os Presidentes José Mujica e Barack
Obama se encontraram em Cartagena
das Índias, Colômbia, e o uruguaio disse que sim, por razões estritamente hu-
64
junho 2014 –
África21
manitárias, estava disposto a aceder ao
pedido do norte-americano.
Tratava-se, e trata-se, de receber no pequeno país sul-americano um grupo de
prisioneiros que os Estados Unidos mantêm há quase 13 anos – em condições desumanas e violadoras de todos os acordos e
tratados internacionais – na prisão da base
naval de Guantánamo, no extremo sudeste
da ilha de Cuba.
Nem Mujica nem Obama nem nenhum outro Presidente o disse, mas o
exemplo que pode vir a ser seguido pelo
Brasil, Colômbia e Chile. Assim, antes do
final do ano, cerca de um terço dos 120
detidos que a grande potência mantém
nesse pedaço de território cubano ocupado
pelo Pentágono desde 1903, verão como se
abrem as portas da América do Sul para os
receber, para que voltem a viver em liberdade sem grades, correntes e humilhações.
«Aqui não há truques, como dizem os
opositores de visões curtas, é solidariedade pura para com mais de 100 indivíduos
que estão presos há 13 anos e que nunca
tiveram um tratamento digno, nunca viram um juiz nem um inspetor», explicou
Mujica.
Segundo uma reconstituição jornalística, naquela reunião entre Mujica e Obama
em abril de 2012 na cidade colombiana
também teriam participado os Presidentes
Juan Manuel Santos (Colômbia), Dilma
Rousseff (Brasil) e o então Chefe de Estado
do Chile, Sebastián Piñera. Meses depois
chegaram a Montevideu, capital uruguaia,
emissários da Casa Branca que descreveram
o perfil dos detidos com possibilidades de
serem transferidos. Apresentaram-nos então como fez a embaixadora dos Estados
Unidos, Julissa Reynoso, em 15 de abril
último, quando numa conferência de imprensa realizada em Montevideu, tratou de
combater a virulenta reação da direita local,
preocupada em abortar o gesto humanitário, e disse tratarem-se de «seres pacíficos
que não geraram nenhum conflito». A diplomata surpreendeu ainda mais quando
É solidariedade pura para
com mais de 100 indivíduos
presos há 13 anos, que
nunca tiveram um tratamento
digno, disse Mujica
completou a sua descrição: «Estas pessoas
não são de alto risco nem para os Estados
Unidos nem para vós». Mas quando questionada sobre qual a razão para continuarem presos sob condições extremas, Reynoso calou-se.
Já em 2013 o Uruguai enviou uma
missão a Guantánamo para conversar in
loco com quem poderia ser seu hóspede.
Os enviados souberam nessa ocasião que
cerca de 40 presos estavam a aprender castelhano, sinal de que, efetivamente, haveria
outros países latino-americanos dispostos a
abrir-lhes as portas. Para todos os que possam viajar até ao Uruguai, o país compromete-se a garantir assistência psicológica,
emitir documentos de identidade, oferecer
medidas de segurança necessárias a preservar a sua identidade física e a garantir-lhes o
livre exercício dos seus direitos, como a
qualquer outro refugiado.
Além do ministro dos Negócios Estrangeiros, Luis Almagro, Mujica encarregou também de trabalhar nos preparativos
para a receção os ministros Eleuterio Fernández Huidobro (Defesa) e Eduardo Bonomi (Administração Interna), dois ex-guerrilheiros tupamaros que, como ele,
estiveram presos durante a ditadura.
Protestos da oposição
As leis nacionais e os tratados internacionais
estabelecem que os pedidos de asilo devem
ser tratados de forma pessoal. Como neste
caso se trata de um acordo Governo a Governo, que não está contemplado dentro
dos termos das normas, dá margem à oposição para reclamar a ilegalidade da chegada
dos refugiados. «Tudo o que possa ser feito
para ajudar estas vítimas é válido, assim se
lhe dê o formato legal de asilo ou de ajuda
humanitária», respondeu aos protestos da
direita o jurista Óscar López Goldaracena,
que entende que dar amparo aos prisioneiros de Guantánamo é quase uma obrigação
em termos de ética, solidariedade e direitos
humanos. «Não se pode ignorar que estas
pessoas estão privadas ilegalmente da sua
liberdade, nas mãos da potência mais poderosa da terra, que viola o artigo 14 do Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos,
que consagra o direito de qualquer pessoa a
ter um julgamento justo e um tratamento
digno», disse López Goldaracena.
Embora a decisão transmitida por
Mujica a Obama seja estritamente humanitária, e também política, e o Presidente
uruguaio se tenha encarregue de o dizer e
repetir, as críticas imediatas dos partidos da
oposição estão a obrigar o Governo a transformar o tema num assunto jurídico. Segundo o Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados, no Uruguai vivem 203 refugiados – sul-americanos,
cubanos, chineses e africanos –, mas ninguém fala da sua existência. Hoje o grande
objetivo da direita é o de frustrar o acordo
humanitário dos Presidentes para ferir a
autoridade de Mujica, com a consequência
de romper a tradição uruguaia de ser uma
terra de asilo para os perseguidos de todos
os quadrantes políticos e de qualquer parte
do mundo.
Os que se opõem a que o Uruguai seja
um refúgio não sabem, porque ninguém
sabe, quem serão os prisioneiros que pode-
O objetivo da direita
é frustrar o acordo
humanitário, rompendo
com a tradição uruguaia
de ser uma terra de asilo
rão chegar ao país, nem sequer escutaram a
embaixadora Reynoso quando os tranquilizou, dizendo-lhes que não são perigosos
nem para os Estados Unidos, que os mantêm em cativeiro, nas piores das condições.
O líder do Partido Blanco, Luis Alberto
Lacalle Pou, perguntou «o que ganha o
Uruguai trazendo estes sujeitos com antecedentes de fanatismo religioso». O seu homólogo do Partido Colorado, Pedro Bordaberry, tomou idêntico caminho e disse
que «o país transformar-se-á numa prisão
dos Estados Unidos que nos custará muito
dinheiro». Já em tom francamente desrespeitoso da autoridade presidencial, o ex-mandatário deste partido, Jorge Batlle,
afirmou «que esta palhaçada não é mais do
que um teatrinho que se faz com o único
propósito de somar pontos a uma candidatura de Mujica ao Prémio Nobel da Paz».
Mujica respondeu a todos, de forma
breve, mas energética: «Quem pensa assim, miseravelmente, nunca esteve nem
meia hora num calabouço por ter lutado
pela liberdade. A causa é válida se conseguir tirar-se do encarceramento seres humanos que passaram 13 anos em condições incríveis, vergonhosas para os seus
verdugos». O Presidente uruguaio sabe
muito bem do que fala: ele, juntamente
com outros oito guerrilheiros, esteve detido durante 13 anos em condições de isolamento total e sem ver a luz do sol.
Tradução de Teresa Souto
África21– junho 2014
65
eua – áfrica
FRANCISCO BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA
Obama vira
a bússola
para África
A um mês de acolher
em Washington líderes
africanos para a esperada
cimeira entre África
e os EUA, o Presidente
Barack Obama pôs o seu
secretário de Estado
em campo
Itamar Souza Nova Iorque
A
escolha do itinerário de John
Kerry que o levou à Etiópia, Sudão do Sul, República Democrática do Congo e Angola, não foi acidental.
Com a sua agenda diplomática marcada
por grandes contrariedades no Irão, Síria,
Médio Oriente, Ucrânia e por arrastamento no relacionamento com a Rússia, ele tinha particularmente em Adis Abeba, sede
da União Africana, e em Luanda, dois
dossiês nos quais o empenhamento americano pode ser uma referência.
A estratégia americana para África
assenta essencialmente no fortalecimento
de instituições democráticas, reforço da
paz, segurança e estabilidade, desenvolvimento económico e criação de oportunidades de negócios para companhias
norte-americanas.
Em Adis Abeba, cidade escolhida para
acolher as negociações de paz entre o Presidente do Sudão do Sul, Salva Kiir, e o seu
ex-Vice-Presidente Riek Marchar, John
Kerry deixou um «recado» a ambos, refor-
66
junho 2014 –
África21
Angola foi a última paragem nesta viagem a África de John Kerry
çado por um apelo durante uma escala em
Juba. A mensagem incluiu a possibilidade
dos Estados Unidos virem a impor sanções
aos líderes locais, se o conflito que dura há
cerca de seis meses não terminar. O chefe
da diplomacia de Washington manifestou-se apreensivo com os efeitos do conflito,
traduzido em milhares de mortos e mais de
um milhão de deslocados. A continuar, isto
pode representar um verdadeiro desafio à
comunidade internacional no que diz respeito a genocídio.
Dez dias depois de John Kerry ter deixado Juba, Salva Kiir e Riek Machar assinaram um cessar-fogo. Mas a assinatura do
acordo ficou de imediato fragilizada pelo
facto do primeiro ter acusado o segundo de
com a guerra estar a contribuir para a fome
generalizada que assola aquele país. Em
maio, em Oslo, uma conferência de doadores para o Sudão do Sul estimou em 1,8 mil
milhões de dólares o montante necessário
para assistir até janeiro 1,5 milhões de deslocados. De acordo com a ONU, a manter-
-se o status quo, em dezembro um em cada
dois cidadãos do Sudão do Sul poderá ficar
na condição de deslocado, morrer à fome
ou por doença. A conferência recolheu
pouco mais de metade dos fundos solicitados pelo que funcionários da ONU estão
de novo em campanha.
Em Kinshasa, numa escala curta, o
chefe da diplomacia norte-americana foi
breve. Fez o apanhado da situação e pediu
ao Presidente congolês Joseph Kabila para
que respeite a Constituição e não volte a
concorrer em 2016, ano em que deve abandonar o poder voluntariamente.
Escala em Angola
Luanda, última escala do périplo de John
Kerry, foi eventualmente a parte mais auspiciosa de toda a digressão. Kerry reconheceu o empenho do Presidente José Eduardo
dos Santos na estabilização da região dos
Grandes Lagos, traduzida nos esforços para
a estabilização da RDC e da República
Centro-Africana. Esta região – o Egito na
geopolítica americana faz parte do Médio
Oriente – é eventualmente aquela em que
os EUA parecem mais empenhados. Há
dois anos despacharam um pequeno contingente militar para ajudar a capturar
Joseph Kony, líder do Exército de Resistência do Senhor, porém parecem mais empenhados em relação ao que se passa aqui,
tendo designado Russel Feingold, antigo
senador como enviado especial. Antes de
acompanhar Kerry a Luanda, Feingold tinha estado em Angola em duas ocasiões.
Primeiro em janeiro, por altura da reunião
da Conferência Internacional dos Grandes
Lagos, e depois em março, em companhia
da subsecretária de Estado para os Assuntos
Africanos, Linda Thomas-Greenfield.
A visita de Kerry a Luanda, além de
marcada por elogios às diligências diplomáticas de Angola, registou o facto de que ao
contrário do que é norma em delegações
oficiais norte-americanas quando visitam
este país, apesar de vários lobbies em Luanda
e em Washington, ele não se encontrou
com nenhum membro da oposição. Kerry,
entretanto, recebeu na residência do embaixador quatro representantes da sociedade
civil, num exercício que do ponto de vista
diplomático não tem a mesma relevância
do que se tivesse tido lugar na embaixada.
Em Luanda, John Kerry
reconheceu o empenho
de José Eduardo dos Santos
na estabilização da região
dos Grandes Lagos
A passagem por Luanda parece ter
criado condições favoráveis à participação
do Presidente angolano na cimeira de
agosto em Washington. À semelhança de
outros países africanos, Angola também
apresentou algumas reticências relativa-
mente ao formato divulgado por funcionários do Departamento de Estado, o
qual na sua opinião pode transformar-se
num encontro de cavalheiros ao invés de
uma reunião de trabalho com a substância que os EUA querem dar à sua política
africana.
É voz corrente em Washington que
o Presidente Barack Obama fará uma
terceira visita a África antes do termo do
seu mandato em 2016. Em julho de
2009, Obama esteve no Gana e em julho
do ano passado visitou sucessivamente a
Tanzânia, África do Sul e Senegal. Não
é claro se, a acontecer, a visita venha a
incluir o Quénia, terra natal do seu pai,
mas há um consenso segundo o qual
antes de deixar a Casa Branca, alguns
países da África Subsariana começam a
sentir os benefícios do programa de eletrificação da África Subsariana, lançado
por ele, o qual promete servir sobretudo
zonas rurais.
Doença Cardiovascular
Abordagem integrada no Hospital CUF Infante Santo
Ao longo dos últimos 20 anos a mortalidade associada à
doença Cardiovascular (DCV) tem vindo a reduzir-se, devido
essencialmente a uma maior implementação das estratégias
de prevenção primária, modificação do estilo de vida, melhoria crescente no diagnóstico e tratamento na doença crónica e à própria abordagem do doente com evento agudo.
Para o diagnóstico de doença coronária, a associação da
clínica aos fatores de risco é um elemento essencial. Muitas
vezes, no entanto, é necessário recorrer a exames complementares de diagnóstico mais elaborados para confirmar a
suspeita. A possibilidade de ter acesso às diferentes modalidades diagnósticas num só centro torna a prática clínica
mais racional e facilitada.
No Hospital CUF Infante Santo (HCIS), a disponibilidade
para recorrer no imediato à imagiologia avançada permite
dar um salto qualitativo na abordagem do doente. É o caso
de técnicas como a angio TC e a ressonância magnética (RM),
onde dispomos de equipamentos de topo de gama. Estes dois
métodos vieram complementar outros já mais tradicionalmente usados, como a ecocardiografia, a prova de esforço e
a cintigrafia miocárdica.
Nos doentes com eventos agudos como o enfarte do
miocárdio (EAM), a angina instável (AI), arritmias paroxísticas (fibrilhação auricular) ou insuficiência cardíaca descompensada, o serviço de urgência conta com apoio cardiológico
durante 24 horas, através de um grupo especialista multi-
disciplinar e diferenciado, o que permite um apoio atempado
de qualidade às situações mais instáveis, com recurso quando necessário à Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente
(UCIP).
Para o tratamento adequado do EAM e AI, existe uma
equipa de intervenção experiente, sempre disponível para
atuar o mais precocemente. Para o efeito, o HCIS dispõe de
um equipamento moderno de angiografia, material em constante renovação e pessoal técnico e de enfermagem totalmente qualificados e com experiência para este tipo de procedimentos.
Nos casos mais complexos podemos ainda recorrer à cirurgia cardíaca, que está englobada no Centro do Coração.
Este núcleo compreende diversos profissionais de saúde que
fazem atividade clínica no Hospital, com consultas, exames
complementares e intervenções terapêuticas múltiplas – angioplastias coronárias, ablações de arritmia, dispositivos de
encerramento interauricular, pacemakers, desfibrilhadores.
Ao longo dos últimos anos, a oferta diferenciada passou a
ser um dos objetivos do grupo e do próprio Hospital. Deste
modo, desenvolveram-se consultas de prevenção CV, medicina desportiva e arritmologia, centralizadas em questões
mais específicas dentro da área da Medicina cardiovascular.
O espírito de grupo da equipa cardiovascular e sua multidisciplinaridade permite uma abordagem integrada do doente cardíaco ou de risco CV elevado.
África21– junho 2014
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junho 2014 –
África21
FAROUK BATICHE/AFP
economia
Empresários magrebinos
compram fábricas
no sul da Europa
Issad Rebrab, magnata argelino, acaba de comprar o fabricante hispano-francês de eletrodomésticos, a Fagor-Brandt
Industrializar para diversificar a economia e criar empregos está
na ordem do dia em toda a África. Mas enquanto os governos
africanos rivalizam entre si para atrair investimentos estrangeiros,
alguns grupos privados africanos tomam o caminho inverso
e compram fábricas na Europa para adquirirem vantagens
competitivas e desenvolver as suas próprias manufaturas.
Nicole Guardiola
A
proveitando a crise que grassa a
norte do Mediterrâneo, levando
inúmeras pequenas e médias
empresas (PME) à falência, um número
crescente de empresários magrebinos está a
dar o salto, implantando-se em França, Espanha, Portugal e Bélgica. O movimento,
ainda incipiente, promete acelerar e os governos europeus agradecem e convidam
investidores do resto do continente a participar no esforço de reindustrialização do
Velho Continente.
A palavra «co-localização» substitui a de
«deslocalização». Na recente visita a Paris
do Presidente José Eduardo dos Santos, fa-
lou-se de «investimentos cruzados» e de
transferência de tecnologia, mas o público,
mal habituado, pensou tratar-se sobretudo
de investimentos financeiros e de tomadas
de participações nos bancos e grandes grupos europeus.
Fábricas europeias a preço de saldos
Com a crise, abriram os saldos», comenta
Badreddine Ouali, diretor-executivo da
empresa tunisina Vermeg, que tomou o
controlo da belga Business Solutions Builders (BSB) cotada na Bolsa de Bruxelas e
com um volume de negócios duas vezes
maior.
O argelino Issad Rebrab, dono da Cevital, é ainda mais brutal. «É possível hoje ir às
compras na Europa e adquirir fábricas inteiras ao preço da uva mijona», diz o magnata que, depois de comprar em 2012 a
Oxxo, líder europeu da produção de móveis em PVC, acaba de deitar mão ao fabricante hispano-francês de eletrodomésticos,
a Fagor-Brandt, n.º 1 dos mercados francês
e espanhol, e a cerca de 25 marcas prestigiadas que este detinha (Vedette, Sauter e
Dietrich, entre outras).
Contra a promessa de manter em atividade as empresas do grupo em França e
de salvar dois terços dos 1200 empregos, o
Governo francês ofereceu à Cevital um
empréstimo de 47,5 milhões de euros
(cerca de 65 milhões de dólares) do Fundo
de Desenvolvimento Económico e Social.
A ideia de Rebrab é de aproveitar as marcas para comercializar produtos fabricados
a menor custo na Argélia, enquanto as fábricas europeias e o centro de investigação
e inovação serão virados para as produções
topo de gama. Como já está a fazer com a
criação em Bordj Bou Arreridj (Argélia),
de uma gigantesca fábrica de janelas, aproÁfrica21– junho 2014
69
É possível adquirir fábricas
inteiras na Europa ao preço
da uva mijona, diz um
empresário argelino
dr
veitando a tecnologia da Oxxo (e três vezes
maior que a casa-mãe) e o vidro plano, de
que Cevital era já o primeiro produtor
magrebino.
Os mesmos cálculos parecem inspirar
a JET Alu, empresa familiar marroquina
de serralharia, que comprou em 2013
duas PME francesas, a Leblanc (por
110.000 euros/151.000 dólares) e a Silver
Constructions, ambas em falência técnica
apesar de terem registado uma faturação
superior a 10 milhões de euros (13,7 milhões dólares) em 2012.
O caso mais emblemático é o dos Laboratoires Salem, PME farmacêutica argelina
especializada na produção de genéricos que
A tendência não é nova: já em 1993 o
tunisino COFICAB tinha montado uma
fábrica de cabos elétricos para automóveis na Guarda, em Portugal, antes de
abrir outra em 2005 na Alemanha e de
transferir as suas atividades de investigação e desenvolvimento para esse país, mas
é evidente que a crise e os problemas de
liquidez que enfrentam as PME europeias estimula o apetite das PME magrebinas, que aproveitam geralmente estas
«alianças de prestígio» para expandir as
suas atividades na África Subsariana.
«As empresas do Norte têm problemas de competitividade, mas uma empresa que trabalha exclusivamente no
sul tem dificuldades em compreender o
mercado europeu», diz Badreddine Ouali, atual presidente da BSB.
Comprar uma empresa na Europa é
também a possibilidade de passar do estatuto de subcontratada ao de fornecedor
direto das grandes multinacionais, como
A argelina Laboratoires Salem comprou as instalações da Bristol-Myers Squibb em França por um euro
comprou por um euro simbólico (um dólar
e 30 cêntimos), e sem dívidas as instalações
e equipamentos da filial da multinacional
Bristol-Myers Squibb (BMS), n.º 10 mundial, em Meymac, no centro da França. Há
anos que a empresa argelina procurava um
parceiro estrangeiro para desenvolver a sua
produção na Argélia, mas os candidatos estavam mais interessados em vender os seus
próprios produtos do que em transferir
tecnologia e conhecimentos. A BMS, por
sua vez, escolheu a PME argelina porque
não era um concorrente direto. Com os
equipamentos e o pessoal da fábrica de
Meymac, os laboratórios argelinos lançaram-se na produção e comercialização de
medicamentos cujas patentes caíram no
domínio público, «redescobrindo» as receitas pelos seus próprios meios.
70
junho 2014 –
África21
reconhece Amine Ben Ayed, presidente
da tunisina Misfat: «Com a compra da
Solaufil adquirimos também a marca
Mecafilter, o que nos permite vender diretamente os nossos filtros de ar a uma
dezena de construtores de automóveis, o
que era impossível com uma marca tunisina. Hoje exportamos para 80 países».
O prestígio, a tecnologia, as marcas,
os circuitos comerciais e o acesso ao gran-
Comprar uma empresa na
Europa é a possibilidade
de passar do estatuto
de subcontratada ao de
fornecedor direto das
grandes multinacionais
de mercado europeu não são as únicas
razões que levam empresários privados
africanos, já donos de empresas locais, a
comprar fábricas europeias. Há também
uma «revolução cultural» a fazer em termos de formação, nomeadamente ao nível dos quadros intermédios.
Gestores africanos sem complexos
Os gestores, formados nas melhores universidades e escolas de gestão dos EUA e
da Europa, não têm complexos em relação aos homólogos europeus e dispõem
sobre estes da vantagem de conhecer os
mercados e os meandros das burocracias
nacionais. Para os quadros intermédios, a
situação é mais complicada, a formação é
inexistente ou deficiente, e o recurso a
pessoal expatriado oneroso.
A possibilidade, para quadros magrebinos ou oriundos da diáspora de estagiarem em empresas estrangeiras propriedade de compatriotas é uma oportunidade
de adquirir, além dos conhecimentos
técnicos, a autoconfiança e a experiência
que dificilmente conseguiriam de outra
forma.
A mobilidade, a capacidade de se
adaptarem e de aprenderem com as boas
práticas são outras qualidades indispensáveis aos quadros das PME africanas para
que estas possam ultrapassar os limites,
frequentemente exíguos, dos mercados
nacionais e iniciar uma verdadeira internacionalização, a começar pelos vizinhos
africanos.
Obviamente, estas compras de fábricas são vistas de soslaio pelos sindicatos e
uma parte da opinião pública europeia,
com os radicais, de esquerda e direita, a
falarem de «negócios obscuros», dinheiro
sujo e «colonização ao contrário». Mas os
dirigentes políticos estão mais confiantes
na possibilidade de uma verdadeira parceria estratégica. O ministro da economia
e do desenvolvimento produtivo francês,
Arnaud Montebourg, dizia já em 2010:
«quando vejo a Total a fechar refinarias
em França, sonho vê-las a serem retomadas por petrolíferas magrebinas». Ainda
não aconteceu, mas Montebourg, encarregue de travar a desindustrialização da
França e despedimentos massivos, não
fecha nenhuma porta.
AUDI
BMW
3 A 8 JUNHO 2014
CHEVROLET
DAIHATSU
BAíA DE LUANDA
ISUZU
FORD
HINO
HYUNDAI
IVECO
JAGUAR
JMC
KIA
LAND ROVER
MAHINDRA
MERCEDES
MITSUBISHI
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África21– junho 2014
71
72
junho 2014 –
África21
publirreportagem
Tektónica cresce em número de visitantes
Um vasto programa de conferências, seminários e workshops
dominaram a 16.ª Tektónica, que
decorreu em Lisboa entre 6 e 10
de maio, numa edição que registou um aumento de visitantes,
tanto profissionais, como particulares.
A
16.ª edição da TEKTÓNICA - Feira Internacional de Construção
e Obras Públicas, realizada na
FIL, em Lisboa, entre 6 e 10 de maio, voltou a mobilizar um elevado número de
expositores e visitantes, que registaram
mesmo um aumento de 4% em relação a
2013.
Organizada pela Fundação AIP,
através da AIP - Feiras Congressos e
Eventos, sob o lema “Construção, Pilar do Desenvolvimento da Economia
Mundial”, a edição de 2014 contou com
mais de meia centena de profissionais
estrangeiros vindos de vários países,
com a organização a conseguir, através
do programa Hosted Buyers, trazer
compradores oriundos da Arábia Saudita, Argélia, Brasil, Canadá, Colômbia,
Espanha, EUA, Emirados Árabes Unidos,
Líbano e Rússia.
Segundo Jorge Oliveira, responsável
da Tektónica e diretor da Área de Feiras
da FIL, «estes indicadores são reflexo
dos sinais de revitalização que o setor
tem começado a demonstrar, quer por
via das exportações de serviços e produtos, mas também impulsionado pelo
aumento dos projetos de reabilitação e
obras de remodelação». Na sua opinião,
«ao longo de 16 edições, a TEKTÓNICA
tem acompanhado as tendências do
setor, nomeadamente apoiando cada
vez mais as empresas nos seus esforços de internacionalização, levando-as
a novos mercados e trazendo a Portugal
A edição deste ano contou com a presença de mais de meia centena de profissionais estrangeiros
investidores, mas também promovendo
o que de melhor se faz e inova em Portugal, exibindo na feira as empresas de
referência e os projetos e produtos mais
emblemáticos».
A lusofonia na construção
A organização apostou este ano na dinamização de sessões empresariais
focadas na internacionalização, o que
permitiu aos empresários interessados
em expandir os seus negócios para novos mercados conhecer oportunidades
de trabalho em diversos países, mas
também estabelecer os primeiros contactos. Neste âmbito destacaram-se as
duas sessões Arab Market Overview,
que contaram nas duas conferências
(uma relativa ao Koweit e outra ao Qatar) com cerca de 200 participantes,
bem como o workshop «Oportunidades
de Negócio e Investimento na Polónia»,
com 60 participantes.
A 2.ª edição do Fórum «Construção,
Imobiliário e Segurança na Lusofonia»
foi a conferência em destaque no programa deste ano da TEKTÓNICA. Organizada pela Fundação AIP, em parceria
com a CPCI - Confederação Portuguesa
da Construção e do Imobiliário, o evento
juntou entidades oficiais e empresários
dos mercados lusófonos, e teve como
objetivo explorar oportunidades de investimento e a promoção de sinergias
entre empresas portuguesas e sociedades dos mercados de Angola, Brasil,
Cabo-Verde e Moçambique. Bastante
participada, contou com cerca de 100
profissionais e empresários do setor.
As Academias TEKTÓNICA registaram nesta edição um grande interesse
por parte dos profissionais do setor
da Construção, que aproveitaram a
oportunidade para enriquecer os seus
conhecimentos através das ações de
formação realizadas na feira. Com um
programa de dez áreas de qualificação,
as sessões registaram a participação
de cerca de 300 profissionais ao longo
dos dias do evento.
Para os particulares, o BrickoGarden
foi o espaço que captou mais visitantes,
ao apresentar todo o tipo de soluções
e produtos para manutenção, remodelação e decoração de áreas interiores e
exteriores das habitações. O «faça você
mesmo» tem captado cada vez mais entusiastas, e na TEKTÓNICA a tendência
resultou num aumento do público não
profissional, que procurou na feira novos conceitos e soluções para os seus
trabalhos de bricolage e jardinagem.
África21– junho 2014
73
economia
Foi constituída em Lisboa a Organização
Internacional das Associações de Consumidores
de Língua Portuguesa (CONSUMARE).
O objetivo das associações é melhorar a
qualidade de produtos e serviços oferecidos
às populações dos respetivos países.
João Carlos
CONSUMARE
em defesa
dos consumidores
A
presidência da assembleia-geral da Consumare
fica a cargo da Federação Angolana e Associações de
Consumidores (FAAC), cabendo a Moçambique presidir ao Conselho Fiscal, por intermédio da PROCONSUMERS. A
direção da organização, presidida pela Associação de Defesa do
Consumidor de Portugal (DECO), terá por incumbência zelar
pelo cumprimento dos objetivos claramente definidos: promover,
desenvolver, fomentar e apoiar a defesa dos direitos dos consumidores. Dias depois da constituição da CONSUMARE a 7 de maio
último, o corpo diretivo, que integra a ADECO (Cabo Verde) e a
PROTESTE (Brasil), reuniu-se em Lisboa para discutir, entre outros pontos, propostas para o plano de ação.
Jorge Morgado, secretário-geral da DECO, disse à África21
que a organização tem a missão de estreitar os laços de cooperação
entre as diferentes associações de consumidores dos países, territórios e regiões administrativas de língua portuguesa, incluindo Macau. A ideia é que o intercâmbio que já existia passe a ser mais organizado e com mais capacidade técnica para se afirmar.
«Sentimos que esta colaboração nos fará crescer a todos»,
afirmou Morgado, reconhecendo que as associações partem de
realidades diferentes no que toca à defesa dos consumidores em
cada um dos respetivos países. Apesar disso, é possível partilhar
esforços, informações, meios técnicos, assim como iniciativas
Fomentar iniciativas conjuntas
que possam exigir melhor comportamento
às empresas, instituições e serviços
74
junho 2014 –
África21
conjuntas, para que possam exigir melhor comportamento às
empresas, instituições e serviços.
O secretário-geral da DECO lembra que existem várias empresas portuguesas que vendem em todos os países de língua portuguesa mas com comportamentos diferenciados. «Se nós conseguirmos,
com esta cooperação, fazer uma exigência de qualidade a essas empresas isso será bom para a defesa dos interesses dos consumidores e
para a qualidade de vida em todos os nossos países», assegurou.
Fragilidades penalizam os cidadãos
Com cerca de 20 milhões de consumidores, Angola reconhece
quanto ainda tem de fazer para preservar os direitos dos consumidores muitas vezes violados de forma desleal, apesar das medidas que
impõe a legislação. Esta é uma das inquietações de Domingos da
Conceição, secretário-geral da Federação Angolana de Associações
de Consumidores (FAAC). No entanto, sublinhou o facto de que
cerca de 95% dos conflitos têm sido resolvidos amigavelmente.
Moçambique e Cabo Verde têm alguma experiência neste
domínio, mas ainda estão confrontados com a necessidade de regulamentação da legislação já existente. Para países como a Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, com debilidades muito mais
profundas, o nascimento da CONSUMARE é visto como um
fator de impulso. João Tavares, da Associação São-tomense de
Defesa do Consumidor (ASDECO), disse que vai levar as experiências recolhidas em Lisboa e apresentá-las à comissão que está a
trabalhar no projeto de lei sobre defesa do consumidor. Por outro
lado, leva conhecimento para pressionar o poder político com o
objetivo de fazer com que a legislação, apresentada há cinco anos,
seja aprovada o mais breve possível.
Na Guiné-Bissau, onde os constrangimentos também são
enormes, é difícil falar de uma efetiva defesa dos direitos do consumidor. Mais de 69% dos guineenses vivem em situação de pobreza,
33% dos quais em pobreza extrema, segundo o representante da
Associação do Consumidor de Bens e Serviços (ACOBES), criada
em 1992. Apesar das fraquezas, o país tem potencial e recursos.
A ACOBES reconhece que os desafios a enfrentar pela defesa dos
direitos dos consumidores ainda são enormes.
África21– junho 2014
75
Delta Cafés e Refriango
estabelecem parceria estratégica
DR
O Grupo Delta Cafés, líder do setor do café em Portugal,
e a Refriango, empresa de produção, comercialização e
distribuição de bebidas, uma referência do continente
africano, estabeleceram uma parceria estratégica que torna
a Delta no distribuidor oficial dos produtos da Refriango
em Portugal. Com a assinatura deste acordo, a Delta Cafés
irá iniciar a distribuição, em junho, da marca Blue, líder
no seu segmento em Angola, em todos os canais do mercado português através do lançamento, numa fase inicial,
de quatro sabores distintos: laranja, ananás, maracujá e
guaraná.
«Esta é uma parceria de sucesso», disse Rui Miguel
Nabeiro, administrador do Grupo Delta Cafés. «Duas
empresas, de dois países diferentes, unem esforços e valências para continuar a oferecer a clientes e consumidores
soluções de qualidade e diferenciadoras. A Refriango garante produtos de elevadíssima qualidade, com inúmeras
distinções a nível internacional, tem uma ampla gama de
produtos que permite ser uma alternativa aos players existentes no mercado português e dispõe já de créditos firmados no desenvolvimento de estratégias de marketing. Estão reunidos todos os ‘ingredientes’ para esta parceria ser
bem-sucedida», sublinhou.
Por seu lado, Carlos Santos, CEO da Refriango, afirmou: «A internacionalização das nossas marcas é absolutamente estratégica para a Refriango, e em particular para o
mercado português. A força de distribuição do Grupo
Nabeiro bem como o conhecimento do mercado português, associados à qualidade dos produtos da Refriango e
a um marketing que se ajuste ao mercado local serão as
chaves de sucesso desta parceria».
JOÃO GOMES/JORNAL DE ANGOLA
insumos
Obras no aproveitamento hidroelétrico de Laúca
Angola quer apostar
em energias renováveis
Até 2025, Angola pretende quadruplicar a produção de energia, e
fazê-lo sobretudo através de fontes renováveis, segundo anunciou o
ministro da Energia e Águas, João Baptista Borges, em Oslo, após
um encontro com o ministro norueguês dos Petróleos, Tord Lien.
O responsável disse que o objetivo do país é atingir os 9 mil
MW até daqui a uma década, o que equivale a metade do potencial
do país inventariado ainda durante o período colonial, que apontava para uma capacidade de produção energética em Angola de 18
mil MW. «Desenvolveremos, em particular, a capacidade energética do Médio Kwanza, com um potencial de cerca de 7 mil MW.
Neste momento estamos a construir o aproveitamento hidroelétrico de Laúca, o qual, uma vez concluído, acrescentará 2,6 mil MW
ao sistema elétrico nacional». Baptista Borges afirmou que até 2017
será iniciada a construção do empreendimento Caculo Cabaça,
com capacidade de geração de 2,1 mil MW; no Soyo nascerá uma
central de ciclo combinado, com capacidade de produção de 750
MW. Estão também em curso outras obras como a reabilitação e
modernização da 1.ª Central de Cambambe, o alteamento da barragem de Cambambe e a construção da 2.ª Central de Cambambe
– depois de concluídos os trabalhos, este projeto terá uma capacidade instalada capaz de produzir 960 MW.
Menos custos para criar empresas
Rui Nabeiro, da Delta Cafés, e Carlos Santos da Refriango
76
junho 2014 –
África21
Estima-se que os custos para constituir uma sociedade comercial
em Angola diminuam 96% com a nova lei sobre a Redução dos
Encargos Legais Aplicáveis à Constituição de Sociedades Comerciais, aprovada por unanimidade na Assembleia Nacional em
maio. A lei prevê uma tarifa única de 10 mil kwanzas (100 dólares) para a constituição de sociedades por quotas, em «comandita
simples e em nome coletivo», e uma taxa de 40 mil kwanzas (400
dólares) para sociedades anónimas e em «comandita por ações».
Pretende-se, desta forma, «reduzir os custos associados ao processo de criação de novas sociedades comerciais, por se entender que
tais custos provocam constrangimentos à iniciativa privada», de
acordo com o Relatório/Parecer Conjunto da 1.ª e 5.ª Comissões
da Assembleia Nacional.
Durante cinco dias Benguela vibrou com a IV edição da Feira
Internacional de Benguela (FIB). Inaugurada a 14 de maio, pelo
governador da província, Isaac dos Anjos, acompanhado pelo
ministro da Agricultura, Afonso Pedro Canga, a feira levou
àquela província mais de 272 empresas de Angola, Portugal e
Itália. «A FIB é hoje uma plataforma de referência no estabelecimento de contactos e na criação de uma rede de negócios ao
serviço do desenvolvimento das empresas da região, de Angola e
especialmente de Benguela, por via da atração de empresas para
o evento», referiu o presidente da Eventos Arena, Bruno Albernaz, promotora da iniciativa.
Durante o certame, que contabilizou cerca de 43 mil visitantes,
algumas empresas notabilizaram-se e foram valorizadas com uma
distinção no jantar de encerramento. A Sonangol arrebatou o prémio de Melhor Participação da IV edição da FIB, enquanto a sociedade de cervejas de Angola (Soba) Catumbela, Coca-Cola, Banco
Keve, Zap e a empresa Mundi Máquinas foram premiadas, respetivamente, nas categorias de Melhor Participação de Empresa Nacional, Melhor Banca e Serviços Financeiros, Melhor Participação e
Serviços e Melhor Participação de Máquinas e Equipamentos.
O evento, que decorreu no Estádio Nacional de Ombaka,
atribuiu o prémio de Melhor Participação Internacional à
DR
FIB 2014 impulsiona desenvolvimento do sul de Angola
Inauguração da FIB 2014 pelo governador Isaac dos Anjos
Fundação AIP de Portugal. A Rádio Benguela recebeu uma
menção honrosa de Melhor Cobertura de Imprensa ao passo
que o Porto do Lobito foi agraciado com a distinção de Melhor Participação Institucional. O prémio de Melhor Participação de Construção Civil coube à construtora Odebrecht.
África21– junho 2014
77
insumos
Crescimento económico de África
acelera em 2014
A boa saúde da economia africana atrai um número crescente de investidores estrangeiros. Segundo o relatório anual do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), publicado a 19 de maio, o crescimento foi de 5% na
África Subsariana e deverá atingir os 5,8% em 2015. As previsões são ainda
mais positivas se não for contabilizada a África do Sul que já foi a «locomotiva» económica do subcontinente: 6,1 % em 2014 e 6,8 % em 2015.
O relatório observa acentuadas diferenças entre as regiões e os países
com diferentes níveis de desenvolvimento. Globalmente a África Oriental e Ocidental têm melhores resultados que a África Austral e do Norte,
e os países menos desenvolvidos progridem mais rapidamente que os
mais desenvolvidos. As exportações de matérias-primas – nomeadamente
hidrocarbonetos, ferro e fosfatos – continuam a conduzir as economias
menos desenvolvidas, mas já não são o único fator. Na Nigéria, que
acaba de suplantar a África do Sul como primeira economia do continente, o setor petrolífero representa ainda 37% das exportações e 20% das
receitas do Estado, mas são a agricultura e os serviços que mais contribuem para o crescimento do PIB.
Segundo o BAD esta diversificação é um fator positivo que pode
permitir um verdadeiro desenvolvimento económico e social apesar do
atraso na industrialização (que representa apenas 10% do PIB do continente). O motor principal do crescimento africano é o consumo, dinamizado pelo aumento do poder de compra provocado pela subida dos
salários e das remessas dos emigrantes e a redução rápida e sustentada da
inflação que passou de 9% em 2013 para 6,7% à escala do continente.
Nova SBE com formação de excelência
em Angola
A Nova SBE - School of Business & Economics está a expandir a sua
atividade em Angola. A aposta é na formação de quadros de excelência
para empresas com ambição de crescimento. Em junho, arrancam mais
três ações de formação destinadas a capacitar executivos, sob a tutela da
Angola Business School, polo da Nova SBE em Luanda. Entre os dias
4 e 10, decorrem na capital angolana um workshop para quadros de
excelência, a pós-graduação em gestão aplicada e o programa de liderança para executivos. A 26 de maio teve lugar a formação para jovens
licenciados angolanos, no âmbito do Programa Avançado de Gestão.
«Estamos no caminho certo», considera Nadim Habib, CEO da Formação de Executivos da Nova SBE, que, no dia 3 participou na Conferência da IDC (Internacional Data Corporation), empresa líder
mundial na área de market intelligence, serviços de consultoria e organização de eventos para os mercados das tecnologias de informação, telecomunicações e eletrónica de
Consumo. Habib foi orador
no primeiro painel sobre a
importância da visão estratégica no crescimento profissional em Angola.
78
junho 2014 –
África21
COREIA DO NORTE O país asiático quer investir
em Angola, nomeadamente na área das telecomunicações. O vice-ministro do Comércio norte-coreano,
Ri Myong San, esteve em Angola em maio e encontrou-se com o secretário de Estado angolano para
as Tecnologias de Informação, Pedro Sebastião
Teta, a quem apresentou propostas de investimento
nas áreas de tele-educação e telemedicina. «A delegação norte-coreana tomou conhecimento da nossa
realidade e vamos criar uma plataforma de base
para os peritos explorarem melhor as vias de colaboração, que poderão culminar numa visita à Coreia
do Norte», afirmou Sebastião Teta.
AGRICULTURA Angola explora apenas cinco milhões de hectares dos 35 que possui aptos a ser
cultivados. Os números são do secretário de Estado da Agricultura, José Amaro Tati. Para o desenvolvimento do setor, considera o governante, é
necessário captar investimentos, recuperar e
construir infraestruturas e «fazer um esforço considerável na área de investigação e inovação para
acelerar o processo de modernização do setor».
CARVÃO A brasileira Vale anunciou em maio um
prejuízo de 44 milhões de dólares no primeiro trimestre de 2014 em Moçambique e avisou que só
fará mais investimentos no país com menos custos
na operação. Na apresentação dos resultados,
Pedro Gutemberg, novo responsável da Vale Moçambique, apelou a todos os intervenientes na cadeia de produção de carvão no país para aumentarem a eficiência e diminuirem os gastos. «Se isso
não for feito, este resultado que estamos a apresentar hoje não vai ser mudado e dificilmente teremos novos investimentos», alertou, apelando ao
Governo de Maputo para uma redução temporária
de impostos.
VISTA POWER A Mota-Engil Angola e a Visabeira
Global criaram em parceria uma nova empresa, a
Vista Power, com valências nas áreas de energia,
transportes e distribuição elétrica em Angola. Sedeada no Huambo, a nova empresa conta com um
investimento de três milhões de dólares, estando
prevista a criação de 155 postos de trabalho.
TURQUIA Istambul, a capital turca, passa a estar
ligada a Luanda através de voos semanais regulares realizados pela Turkish Airlines a partir de junho. O Instituto Nacional de Aviação Civil (INAVIC)
de Angola autorizou o início destes voos, estando
previstas duas frequências semanais. O voo inaugural Istambul-Luanda realiza-se a 11 de junho.
África21– junho 2014
79
press release
n Case Construction
já em Angola
A Case Construction Equipment, presente
em 170 países através de 11.500 concessionárias e distribuidoras, tem agora uma representação oficial em Angola. A parceria com a
Riccardo Balma, diretor de Marketing para a CNH
Industrial Construction Equipment em África
Tracto-Lena, importador oficial para o país,
foi celebrada em maio, com a apresentação
da gama completa do equipamento Case
(retroescavadora 580T, escavadoras de rastos CX210B e CX290B, Bulldozers e Niveladoras, e Pá Carregadora 921F). «Angola é
um dos mercados mais promissores em toda
a África para o setor da construção», disse
Randhir Haripersad, diretor comercial da
Case Construction para a África subequatorial. Abílio Justo, diretor da Tracto-Lena, reforçou que a empresa, com a experiência
obtida ao longo dos anos, «espera em conjunto com a CNH estar preparada para prestar um bom serviço aos clientes e superar os
desafios».
n MicroStrategy - nova gestão
para Portugal, Moçambique
e Angola
A MicroStrategy, líder mundial em plataformas de software empresarial, anunciou o reforço da sua estrutura de gestão com a nomeação de Vítor Rodrigues para o cargo de
Country Leader para Portugal, Moçambique
e Angola. «Estou muito entusiasmado com
este novo desafio,
tendo em conta a
capacidade de inovação da MicroStrategy e a qualidade
das suas soluções,
principalmente nas
áreas de analytics, Vítor Rodrigues
80
junho 2014 –
África21
Big Data e mobile. A empresa opera numa
área com enorme potencial de crescimento e
que atravessa um ótimo momentum», destaca Vítor Rodrigues. O gestor tem mais de 18
anos de experiência no mercado das Tecnologias de Informação e ao longo da sua carreira ocupou cargos de gestão em empresas
líderes como a Oracle, Meta4 e TAP. A MicroStrategy está em Portugal com presença
direta desde 2001 e começou a trabalhar o
mercado angolano em 2003 e o moçambicano em 2007.
n Novo Toyota Corolla
para o mercado angolano
A Toyota de Angola apresentou no final de
maio em Luanda a última versão do modelo
Corolla. Trata-se da 11.ª geração do modelo
mais vendido em todo mundo pela construtora japonesa (mais de 40 milhões de veículos
comercializados). O novo Corolla «cresceu»,
no exterior e no interior, apresentando uma
bagageira com 470 litros de capacidade. As
linhas fluidas conferem-lhe beleza e juventude, a nova grelha dá agressividade e classe
ao modelo que pretende atrair os mais jovens. O motor é de 1800cc com 140 cavalos
de potência e caixa automática de sete velocidades. «O modelo mantém a tradição da
Toyota de comercializar veículos adaptados
ao mercado angolano. Ele é um pouco mais
alto, além doutras especificações que têm a
ver com a climatização e temperaturas de
funcionamento», disse Manuel Menezes, diretor da Toyota de Angola.
n CONGRESSO CARDS & PAYMENTS
EM LUANDA
O iiR Angola organiza em Luanda a 5.ª
Edição do Congresso Cards & Payments,
ponto de encontro anual entre os Key
Players do mercado de cartões, meios de
pagamento, tecnologias, telecomunicações
e retalho, entre os dias 8 e 10 de julho próximo, com o patrocínio da Petrotec e Siga
Payments da Sinfic. Os avanços tecnológicos fazem deste um setor em contínuo
crescimento e com inúmeras oportunidades
de negócio, pelo que a realização deste
evento consiste numa oportunidade única
de networking para os profissionais da indústria. Está prevista a presença de diversos especialistas no Congresso, que integra
também dois seminários técnicos.
n Smartphones topo de gama LG
- Atualização do sistema knock
code™
O Knock Code™ (sistema de desbloqueio
através de toques no ecrã) será uma característica-chave nos smartphones da LG este
ano, incluindo G Pro 2, G2 mini, Série III F e L.
Desde abril, a LG Electronics (LG) disponibiliza o inovador sistema Knock Code™ para
smartphones mais antigos. A conclusão de
um estudo, que mostra que a maioria dos
utilizadores desbloqueia e acede ao telemóvel entre 100 a 150 vezes por dia, inspirou a
LG em aumentar ainda mais a capacidade
de segurança e funcionalidade do seu sistema KnockOn, patenteado em 2008. O KnockOn foi a base perfeita para desenvolver o
Knock Code™, sistema único pela sua capacidade de aceder e desbloquear o telemóvel
através de um único passo.
língua portuguesa
As responsabilidades do Instituto Internacional de Língua
Portuguesa, para cumprir o Plano de Ação de Brasília,
estão condicionadas a um magro orçamento anual. Mas
o diretor executivo, Müller de Oliveira, não cruza os
braços. O IILP lança no mês de julho, em Timor-Leste,
alguns projetos em resposta aos desafios de promoção
e difusão da língua comum falada por mais de 250
milhões de pessoas.
João Carlos
Gilvan Müller de Oliveira, diretor executivo do IILP
Fracos recursos financeiros
não travam objetivos do IILP
S
edeado em Cabo Verde e criado como instrumento de dinamização da cooperação linguística, o IILP padece de dificuldades financeiras, dependendo essencialmente da contribuição diferenciada dos Estados-membros, feita de acordo com a a
capacidade de cada um. O diretor executivo, Gilvan Müller de
Oliveira, tem um orçamento anual de 250 mil euros (cerca de 343
mil dólares) para responder às oito tarefas inscritas nos objetivos de
defesa, promoção e difusão da língua portuguesa, segundo as orientações do Plano de Ação de Brasília (2010).
O brasileiro confessa que é um magro orçamento, que gere de
acordo com as possibilidades, mas sem lamentações. É possível
também recorrer a outros canais de financiamento, como os fundos
ACP (África, Caraíbas e Pacífico), ao abrigo da parceria com a
União Europeia, dada a localização do IILP em Cabo Verde.
Na IX reunião do Conselho Científico, realizada em maio na
cidade da Praia, foram analisados o Relatório e Contas de 2013, o
plano de atividades para 2014, e a proposta de orçamento para
2015. Müller de Oliveira revelou à África21 ter proposto à CPLP,
em Lisboa, no sentido de se cumprir um dos itens do seu regimento, a abertura de escritórios regionais no Brasil ou em Portugal, que
permitiriam ao Instituto captar financiamentos nestes países. Referiu-se em concreto ao exemplo do Brasil, onde existem muitas
fundações e instituições que poderiam ajudar a minimizar o problema e dar suporte financeiro adequado aos projetos.
Na sua atual gestão, as estruturas do IILP (comissões nacionais,
Conselho Científico e direção executiva) cumpriram grande parte
das tarefas previstas no Plano de Brasília, o que leva Oliveira a subli-
IILP lança em julho o Vocabulário
Ortográfico Comum da Língua Portuguesa
nhar a utilidade do Instituto, criado em 1989, para a internacionalização da língua portuguesa. Uma das ações é o lançamento
oficial na cimeira da CPLP em Díli (Timor-Leste), em julho, do
VOC - Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa,
criado para dar resposta a algumas dúvidas sobre a aplicação das
bases do Acordo Ortográfico de 1990. Esta foi outra das matérias
analisadas no Conselho Científico do IILP. A plataforma online
(www.ppple.org) conta já com 300 mil vocábulos, com origem nos
vocabulários nacionais integrados do Brasil, Moçambique, Portugal
e Timor-Leste. Em julho, o VOC já deverá contar com o vocabulário nacional de São Tomé e Príncipe.
Outro projeto apontado por Müller de Oliveira é um portal do
professor de Português – língua não materna, uma plataforma digital com ferramentas didáticas interativas, como a WIKI, destinadas
a docentes em todo o mundo. O portal está organizado na base de
um princípio novo, com o contributo de equipas em cinco dos
países já integradas no projeto, permitindo captar experiências de
professores de português em qualquer parte do mundo.
A metodologia mereceu o consenso alcançado em reuniões
técnicas internacionais, o que, segundo o diretor do IILP, propõe
um português policêntrico com uma gestão internacionalizada, em
pleno século XXI. O projeto potencia os oito países membros como
gestores, produtores e financiadores, e também como participantes
plenos na difusão e promoção de uma língua que é de todos.
Na segunda quinzena de fevereiro, uma missão do ILLP esteve em Timor-Leste para trabalhar com o Instituto Nacional de
Formação de Docentes e Profissionais da Educação (INFORDEPE)
e o Instituto de Linguística timorense para a formação de docentes nacionais. Isto permitiu integrar Timor-Leste nos projetos
lançados pelo IILP, dispondo assim de uma base lexical própria
como parte do VOC.
África21– junho 2014
81
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rap moçambicano
Dizem que as coisas não estão bem no país, por isso o rap, estilo musical de intervenção
social e contestatário por natureza, «está a bater» com força em Moçambique. Matéria para
as letras parece não faltar. África21 falou com três protagonistas deste estilo que nasceu nos
guetos suburbanos pobres dos Estados Unidos.
João Vaz de Almada Texto e fotos
A
‘Está a bater’
zagaia nasceu Edson da Luz
e nada levaria a pensar que aquele
menino, nascido na pacata vila da
Namaacha, a 6 de maio de 1984, viria a
tornar-se, no final da última década, o ícone da música de intervenção/contestação
em Moçambique.
«Comecei por ouvir, influenciado por
um primo, cassetes dos Wu-Tang Clan,
Nass, Snoop Dogg. Depois entrei no rap
de língua portuguesa com Gabriel o Pensador, os Black Company e, mais tarde, Boss
AC», refere o músico.
As letras fascinavam-no muito mais do
que a batida. «Sempre gostei de poesia».
Ainda muito novo tomou contacto com a
literatura de Craveirinha e de outros autores de resistência contra o colonialismo
como Albino Magaia. Azagaia rebusca na
memória a primeira letra que escreveu no já
longínquo ano de 1994, logo a seguir às
primeiras eleições multipartidárias que o
país conheceu. «Chamava-se ‘Já pariu o
ventre democrático’». Falava de democracia, de dependência externa, dos problemas
que não conseguimos resolver.
S Gee, nome por que é conhecido no
mundo do rap Sérgio Magaia, fez a sua entrada neste estilo igualmente pelos norte-americanos. «Foi uma entrada mimicada.
Imitávamos o estilo dos artistas americanos,
na roupa, na forma de falar, nos trejeitos.
Eu, na altura, não sabia nada de inglês mas
imitava-os bem».
Quando ouviu Rappers Unity, Broxen
Clan e Family G, os primeiros grupos moçambicanos de rap, S Gee exclamou:
Azagaia
Azagaia cravava o dedo
em várias feridas,
voltando-as a abrir quando
o poder já as havia dado
como cicatrizadas
África21– junho 2014
83
dza, começou a identificar-se com o mundo do hip hop. «O hip hop não discrimina.
Aliás nasceu mesmo contra a discriminação. Aqui não há raças, não há sexos. Sei
que é um universo masculino, nasceu dos
homens, mas a engenharia também, o
exército também. Temos de adaptar o
mundo para todos».
Foi pelas letras que Azagaia começou a
ser persona non grata aos olhos do poder,
sobretudo a partir de 2007, quando surgiu
o single, integrado no álbum Babalaze –
ressaca em changane – que acabou por sair
para o mercado seis meses depois. «As
Mentiras da Verdade» saiu em maio e teve
um grande impacto. «Por causa daquela
música retirei algumas que faziam parte do
Babalaze e gravei outras como ‘A verdade’,
‘As mentiras’, ‘A marcha’, ‘Ciclo da Censura’, ‘Eu não paro’, que não existiam no
projeto inicial do álbum». Azagaia cravava o
dedo em várias feridas, voltando a abri-las
quando o poder já as havia dado como cicatrizadas. Falava na hipótese de Samora
Machel ter sido assassinado num conluio
em que o Governo não estava isento de
responsabilidades, («e se eu dissesse que Samora foi assassinado por gente do Governo
que ainda hoje finge que procura o culpado»); falava da responsabilidade dos graúdos nas mortes de Carlos Cardoso e de Siba-Siba Macuácua, ambos assassinados
quando investigavam o desfalque no extinto Banco Austral; enfrentava a polícia e a
sua teia de corrupção («afinal quem é o polícia e quem é o ladrão»); e no fim simulava
o seu próprio assassinato às mãos da mesma
polícia bruta, cruel e corrupta.
Iveth
Iveth, por ser mulher, sabe
que é uma exceção no
mundo do rap moçambicano
«Uaau! Os manos estão mesmo a fazer
música!» Pouco depois formou, com mais
três elementos, os Ghost of Underground.
«Procurámos um nome assustador e este foi
o que soou melhor». O grupo realizou
muitos espectáculos nas escolas, mas a distância entre residências acabou por separá-los. «Vivíamos muito longe uns dos outros». S Gee ficou só com Dingzwayu.
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África21
Juntos formam os Xitiku ni Mbawula, expressão changane que em português, numa
tradução literal, significa fogueira.
Uma mulher no mundo do rap
Iveth, por ser mulher, sabe que é uma excepção no mundo do rap moçambicano.
«Somos muito poucas. É uma cultura
completamente dominada pelos homens»,
refere, abrindo os enormes olhos que entram sobrolho adentro. Na adolescência,
influenciada pelo irmão mais velho, «viciado nos Wu-Tang Clan, Fugitives e Black
Company», Iveth, que nasceu Ivete Mafun-
Venenosa azagaia contra a corrupção
«A minha vida deu uma volta de 180 graus»,
refere Azagaia. «Passei a ser conhecido».
O menino tímido da Namaacha era agora
uma venenosa azagaia lançada contra a
corrupção, contra as arbitrariedades do poder, contra os intocáveis. E tinha seguidores
por todo o lado.
Azagaia escreveu a letra «As Mentiras
da Verdade» numa noite. «Eram temas
que estavam na minha cabeça, coisas que
fui ouvindo em conversas de forma que foi
só colocar no papel tudo aquilo que me
estava a inquietar, toda aquela teoria de
conspiração que havia na minha cabeça.
Sempre tive uma certa paixão por Samora
Machel e ele aparece como a pessoa que
segura toda a história desta música. Depois
de ler muita coisa pensei: o Samora, devido
ao que ele representava na altura, só pode
ter sido assassinado num complot que envolve gente do governo, do regime do apartheid
e, provavelmente, uma potência ocidental».
A letra «Povo no poder» levou-o à Procuradoria. «Escrevi-a depois da revolta dos
chapas de 5 de fevereiro de 2008. Fui acusado de ‘incitamento à violência’. Quando
cheguei lá fizeram-me uma série de perguntas mas depois deixaram-me sair. Azagaia
acabaria por inseri-la na música «A minha
geração» (Azagaia na Procuradoria/o puto
vai-se arrepender), uma geração, segundo
ele, «enteada do poder». A força de Azagaia
vai crescendo e com ela a legião de seguidoS Gee
res. Os seus espectáculos enchem e entusiasmam uma juventude que se revê nas
suas letras. Num deles chega a pôr os filhos
da nomenclatura a gritar: Corruptos, fora!
Ladrões, fora! Assassinos, fora! No dia seguinte, um jornal titula com graça: Na noite
em que os filhos chamaram nomes aos pais!
Azagaia recorda o episódio com um riso,
misto de satisfação e provocação.
Apesar de tudo, Azagaia gaba-se de
nunca ter sido ameaçado. «Diretamente,
nunca fui, mas já recebi muitas sugestões
para não me juntar ao partido X ou Y».
As letras dos Xitiku ni Mbawula – cantam exclusivamente em ronga e chopi – são
bem menos polémicas. «Procuramos temas
mais perenes», esclarece S Gee. Em «Wansati» – mulher em ronga –, o tema preferido
de S Gee, fala-se da mulher do ponto de
vista positivo, da mulher exemplar, que
consegue passar valores aos filhos. «É cantada em ronga para melhor chegar às mamanas do sul. Apresentamos a crítica de maneira diferente porque aquele combate mais
direto é feito por outros».
Iveth, em termos de acutilância de letras, situa-se no meio dos dois. «Lancei
‘Nhandayeyo’ – socorro em changana.
Nela falava da greve dos médicos, do sofrimento do povo, e dizia ‘este ano há eleições e acho que vai dar berro’». Iveth, tal
como Azagaia, também nunca foi ameaçada, mas aconselharam-na a manter-se distante desta ou daquela pessoa. «Já sofri
pressões do poder, propostas de vários
partidos. Tenho o meu partido mas prefiro ficar distante porque o povo moçambicano não escuta a música de cantores da
«Imitávamos o estilo dos
artistas americanos, na
roupa, na forma de falar, nos
trejeitos», diz S Gee
Frelimo, da Renamo ou do MDM. Escuta
música de cantores moçambicanos». Iveth
elege «Amiga» como a sua música mais
bem conseguida. «É uma aula de Direito,
mas também uma história de sociedade,
um grito de desespero». «Amiga» conta a
história de uma mulher que sofre violência
doméstica. «Baseei-me em vários casos
reais. São várias histórias numa só».
E será que se pode falar num rap moçambicano? Há já uma linha que o distingue dos outros? Para Azagaia «está-se a criar
mas ainda domina a influência americana.
Gostava de ser um dos criadores». S Gee
sugere a criação de qualquer coisa que pode
ter uma base americana mas preenchida
com elementos locais. «Um dos projetos
que tenho é lançar o álbum A Kaya – a casa.
Começámos a denominar por ‘A kaya rap’
(o rap de casa)». Iveth acha que ainda há
um longo caminho a percorrer. «A minha
luta é tornar o rap mais nosso. Não vamos
fugir à globalização mas podemos integrar
instrumentos nossos como timbilas, congas, batuques. É isso que estou a fazer. No
último show juntei Tufo dos macuas ao rap.
Foi uma fusão incrível!».
África21– junho 2014
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86
junho 2014 –
África21
ANGOLA
Censo 2014
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NEGÓCIOS
Compras africanas na Europa
A Nova Movimento – empresa angolana proprietária da África21 – montou
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Assim, as assinaturas serão recolhidas, conforme os casos, em três centros:
Luanda, Lisboa e Rio de Janeiro. Com exceção dos assinantes de Angola e Brasil, todos os demais receberão o seu exemplar pelo correio a partir de Lisboa.
Como os custos de envio também são variáveis, conforme as re­giões,
o preço das assinaturas é igualmente regionalizado.
Eis, a seguir, um quadro explicativo, com a tabela de preços
das assinaturas e com os detalhes acerca dos centros onde os pagamentos
deverão ser feitos, conforme os endereços dos assinantes.
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dos brasileiros
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de protestos
que não param
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SEMESTRAL
ANUAL
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KZ 6.000
KZ 10.000 Keve
Brasil
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R$ 200
Portugal
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€ 35
União Europeia
€ 30
€ 55
Resto do mundo USD 60
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87
cults
Retratos
T
da mulher angolana
rinta e quatro cubos iluminados com fotografias, legendas e dados sobre a mulher angolana atual integraram a exposição «Mulher Angolana - Ao Encontro do Desenvolvimento Sustentável?», apresentada no mês de maio em Lisboa, no Camões – Instituto da
Cooperação e da Língua. Segundo a organização, para esta mostra foram retratadas «médicas,
donas de casas, ministras, professoras e até vendedoras ambulantes», de forma a construir um
«testemunho fiel sobre a realidade da mulher em Angola e em África».
A exposição visa retratar o papel da mulher angolana no desenvolvimento sustentável das
sociedades e é organizada pela Embaixada de Angola em Portugal e o Banco Espírito Santo
Angola (BESA), em parceria com a World Press Photo (WPPH), com o objetivo de promover e divulgar a cultura de Angola e o talento dos fotógrafos angolanos em Lisboa.
Os trabalhos apresentados nesta coletiva resultam de um workshop realizado pelo BESA e a
WPPH, em 2010, para o qual foram selecionados os fotógrafos angolanos Armando Carmo,
Osvaldo Paulo, Carlos Araújo, Jaime Sebastião, Anacleto Próspero, Pedro Paulo e Waldney
Oliveira. A reconhecida qualidade dos trabalhos finais destes fotógrafos levou à criação desta
mostra, que esteve já em São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Salvador da Baía, onde integrou
o Primeiro Encontro das Culturas Negras do Brasil, e terminou a sua itinerância no Brasil com
uma mostra no Centro de Cultura da Câmara dos Deputados em Brasília.
Poemas e contos
S
de angolanos e brasileiros
essenta e quatro autores angolanos e brasileiros integram o livro
Raízes – Laços do Brasil com Angola, apresentado em maio na
União dos Escritores Angolanos (UEA), em Luanda. Resultado de
uma iniciativa do Clube Nacional de Poetas e Trovadores e da Associação Internacional de Escritores e Artistas (Literarte), que a edita,
a obra passa por temas como a discriminação racial, preconceitos e
influência da cultura angolana e da brasileira entre si.
«Do ponto de vista histórico, muitos angolanos saíram de Angola para o Brasil. Por outro lado, os brasileiros foram os primeiros a
reconhecer a independência de Angola», referiu o Carlos Pedro, um
dos escritores angolanos que participam no livro, juntamente com
Nguimba Ngola, Ângelo dos Reis («poeta dos pés descalços»), Denise Kangandala, Avô Ngola, Otília Adriano, Lara Hotalala, Martinho
Bangula, Soraia Mendes e Zé Ndunguilo, entre outros.
Raízes – Laços do Brasil com Angola junta escritores novos e consagrados dos dois países, como forma de fortalecer o relacionamento
cultural e de amizade e sublinhar o problema da discriminação vivida
em todo o mundo. «Nós como escritores devemos elaborar a mensagem para auxiliar a sociedade a refletir que, independentemente de
sermos diferentes, somos todos humanos», afirmou Carlos Pedro.
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África21
Roça Língua,
homenagem à língua portuguesa
A
A Geração da Utopia
Q
em Luanda?
uando as condições forem propícias, A Geração da Utopia será exibida em Luanda. É o que deseja Guilherme
Mendonça, encenador da peça inspirada no romance homónimo de Pepetela.
Sete atores (portugueses, são-tomenses e angolanos) interpretam o papel de 16 personagens. Em cerca de duas horas e meia,
constroem em palco momentos marcantes da história de Angola,
segundo a adaptação feita pelo encenador luso-moçambicano à
obra do escritor angolano.
A peça, estreada e exibida em maio no Teatro A Barraca,
em Lisboa – uma produção da Associação Griot – constitui
um retrato de quatro décadas do período que decorre desde
a luta armada até às eleições multipartidárias, realçando o
envolvimento dos nacionalistas angolanos na luta pela independência de Angola. A história envolve quatro personagens
– Sara (Susana Sá), Aníbal (Ângelo Torres), Vítor Ramos
(René Vidal) e Malongo (Matamba Joaquim) – que representam interesses e pessoas possíveis entre a juventude que se
envolveu assumidamente na organização dos movimentos de
libertação.
Anselmo Ralph
HERBERTO SMITH/GRIOT
presentado no final de maio em Lisboa, Roça Língua é uma coletânea de contos
de diversos autores lusófonos. O projeto para este livro nasceu em São Tomé e
Príncipe em 2011, durante uma Residência de Escrita Criativa, que reuniu no país
escritores de países de língua oficial portuguesa. Comissariado pelo escritor angolano
José Eduardo Agualusa e pela portuguesa Marta Lança, o objetivo dessa iniciativa da
associação santomense Roça Mundo, foi o de viver e perceber as antigas roças coloniais e a sua influência na cultura local, bem como desenvolver um conjunto de atividades culturais no contexto de São Tomé e dirigidas à juventude, como oficinas de
escrita criativa, jornalismo cultural e artes performativas.
Roça Língua junta contos de Albertino Bragança e Olinda Beja (São Tomé e
Príncipe), Celina Pereira e Filinto Elísio (Cabo Verde), Alberto S. Santos, Cláudia Clemente, Ricardo Alves, Paulo Ramalho, João Ferreira Oliveira, José Fialho
Gouveia e Marta Lança (Portugal), Daniel Galera e Tatiana Salem Levy (Brasil),
José Eduardo Agualusa (Angola), Ungulani Ba Ka Khosa (Moçambique) e Waldir Araújo (Guiné-Bissau). Para Alberto S. Santos, o livro é uma homenagem à
língua portuguesa e à cultura em português e «evoca essa ligação identitária e
cultural, para o bem e para o mal, que fomos tendo ao longo destes últimos 500
anos» entre os diferentes países lusófonos.
O ator Ângelo Torres em A Geração da Utopia
Guilherme Mendonça usa as personagens para retratar a
quebra dos idealismos, o surgimento de grupos com interesses
de poder dentro dos movimentos independentistas, assim
como as divisões no seu seio na própria luta armada, ou ainda
o aparecimento do tribalismo. O encenador procura respeitar
a visão de Pepetela, da leitura que fez da obra. «Foi um processo muito florescente», argumenta, em alusão ao conteúdo de
A Geração da Utopia, romance que faz a biografia da geração
que conduziu Angola à independência e dos muitos rumos
que ela tomou depois.
Além de Angola, o encenador acredita que será possível, como
deseja, ver a peça noutros palcos internacionais, entre os quais no
Mindelac (Festival de Teatro do Mindelo, em Cabo Verde).
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África Mostra-se 2014
A
edição deste ano do «África Mostra-se – Mostra de Cinema e Cultura
Africana» decorreu de 23 de maio a 1 de junho, em Lisboa, e tal como tem
feito desde 2010, quis mostrar na capital portuguesa «várias culturas africanas
com o intuito de incentivar uma reflexão sobre as imagens construídas em torno
deste continente e o modo como este é percecionado».
No programa de cinema, foram apresentados os filmes Of good report, do
sul-africano Jhamil Quebeka, Sodiq do britânico Adeyemi Michael, bem como
diversas curtas-metragens de jovens cineastas africanos, na sequência de uma
parceria estabelecida com o Film Africa, festival de cinema realizado em Londres.
«África Mostra-se» apresentou ainda trabalhos cinematográficos realizados em
países africanos de expressão francesa, em resultado de uma parceria com o Institut Français du Portugal. No que respeita à música, os palcos desta festa da diversidade cultural abriram-se à participação do músico e compositor guineense
Tony Osvaldo, Congo Stars Vibrations, irmãos Makossa, dj’s Frohlocker, Julinho da Concertina e Toni Tavares, entre outros. Tal como em edições anteriores, foram organizados diversos workshops.
Como afirma a organização no site, «é importante para nós enaltecer a diversidade estética e cultural de África, evitando a tendência, ainda generalizada, para
se uniformizar as manifestações culturais daqui oriundas».
Paulina Chiziane
dr
continua a escrever
A
escritora moçambicana não abandonou o romance. Por
razões de saúde, decidiu fazer uma pausa. Paulina Chiziane revelou à África21 que optou por trabalhar em projetos
de intervenção social, admitindo que possa retomar a escrita
de romances no próximo ano.
Zeferino Coelho, da editora Leya/Caminho, que tem publicado as suas obras, confirmou que ela tem em preparação
um novo livro, mas não especificou em concreto a categoria.
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junho 2014 –
África21
Em maio, depois de ter participado no II Encontro Internacional Pelos Mares da Língua Portuguesa, que decorreu entre
os dias 21 e 23 em Aveiro (Norte de Portugal), a autora foi
figura central numa conversa na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa com alunos, professores e leitores.
No dia 23, o «momento de conversa», promovido em
parceria com a editorial Caminho, desenvolveu-se em torno
da obra da escritora, com moderação de Inocência Mata e
Maria João Coutinho. Natural de Gaza, Paulina Chiziane revelou ser dona de uma linguagem simples, clara e objetiva,
mas sempre crítica em relação a vários temas, entre os quais a
poligamia, que alimentaram o diálogo de cerca de duas horas,
seguido de uma sessão de autógrafos.
A participação de professores e alunos de várias nacionalidades confirmou o interesse que a sua obra conquistou também no meio académico. Um leitor assíduo considerou-a a
melhor escritora de língua portuguesa, pela sua sintaxe e objetividade, sustentadas essencialmente por histórias da oralidade
africana. São histórias, segundo ela, que passam de pais para
filhos. «Nós somos filhos da tradição», argumentou, em defesa
da linguagem oral.
África21– junho 2014
91
livro do mês
O Ocaso dos Pirilampos de Adriano Mixinge
Um romance fulgurante
A publicação em Portugal
do último livro deste escritor
angolano, que no ano passado
foi o vencedor de um
dos mais prestigiados galardões
do panorama cultural angolano,
o Prémio Literário Sagrada
Esperança, faz parte de um
esforço de internacionalização
da literatura angolana,
e especialmente do autor
Rodrigues Vaz
F
oi de modo entusiasmado que o seu editor o anunciou com a maior pompa e circunstância: «Há um novo romance a irromper na cena literária angolana. E há novos
romancistas, uma geração independente, com
uma sofisticação e um universalismo que lhes
confere personalidade própria. Adriano Mixinge,
recentíssimo vencedor em Luanda do Prémio Literário Sagrada Esperança, é o primeiro desses
novos romancistas a ser editado em Portugal, com
um romance fulgurante, O Ocaso dos Pirilampos.»
O editor, Manuel S. Fonseca, que viveu muitos
anos em Luanda, continuando ligado a Angola por
laços de vária índole, salienta que se trata de um
romance de um forte e pungente simbolismo, é um
grito, umas vezes revoltado, outras de uma ironia a
roçar o sarcasmo, sobre o Poder Absoluto e a desumanização. Também se pode e é certeiro alegar que,
como disse Amélia da Lomba, representante do júri
que premiou em Luanda este romance, «O Ocaso
dos Pirilampos abarca preocupações quotidianas de
qualquer cidadão comum, como a destruição do
ambiente, a falta de exercício pleno da cidadania, a
desumanização, a sobreposição do lado material ao
espiritual, num apelo à consciência coletiva».
92
junho 2014 –
África21
Segundo o próprio autor, «O Ocaso dos Pirilampos é resultado de um trabalho aturado de
quatro anos: a escrita e reescrita de três formatos
de textos mais ou menos acabados, com diferentes perspetivas que, inicialmente, tiveram até
mesmo títulos diferentes: fui depurando criteriosamente aqueles textos que tinha intitulado de
O Batuqueiro e Os Finórios, que decidi subdividir
em O Ocaso dos Pirilampos e um novo romance,
sem título definitivo, em que estou a trabalhar.
Temos presenciado no mundo e em Angola, a
emersão de uma nova sociedade, fruto das transformações que a globalização e as novas tecnolo-
gias provocam e os localismos condicionam e ou
adaptam. O mundo vê-se a braços com uma
mistura de decadência com regeneração criativa,
com o esvaziamento dos poderes absolutos e a
irrupção dos micropoderes da cidadania, de tensões entre interesses individuais e as responsabilidades coletivas, e foi isso que quis evocar».
Quando ainda estava no seu começo, sob o
título Os Finórios, há mais ou menos quatro anos,
Jacques dos Santos, da Associação Chá de Caxinde, pediu-me uma opinião sobre o original, e
acho que vale a pena transcrever as considerações
que apresentei na altura, pela sua assertividade:
«Tendo optado por assuntos pouco dados a
ficção literária, e muito raramente utilizados, o autor consegue, no entanto, bom nível de discorrimento da imaginação, na sequência temática e de
trama do que escolheu, através de uma escrita fluente, mesmo com um mínimo de diálogos. A linguagem crua, nomeadamente o emprego de termos
eróticos explícitos, se bem que chocantes para uma
camada de público, acaba por se entender no contexto da novela – eu insisto que é uma novela, porque toda a sua feitura está estruturada como tal; um
romance exige outro fôlego. Aparentemente banal,
devido aos temas utilizados, trata-se, no entanto, de
um projeto nitidamente ambicioso, que quase
consegue meter ‘o Rossio na Betesga’, isto é, quase
consegue representar Angola no seu todo e especialmente a sociedade angolana, com todas as suas
idiossincrasias, em 64 páginas a um espaço corpo
12 Times Roman. E mais: o autor conseguiu fazer
uma obra de carácter universal, o que na literatura
angolana só alguns dos grandes nomes já conhecidos é que são capazes de alcançar.»
Veja-se como Adriano Mixinge começa, de
maneira alegórica, polémica, fálica, este livro,
com um discurso na primeira pessoa do protagonista, segundo o autor, um ser fantástico e surrealista inspirado no «Uakodilô Môxi», expressão
Kimbundu que se refere à capacidade que as
pessoas têm de crescer por dentro: «Ouvi um
barulho estranho, persistente, ora abafado ora
agudo. Deu-me vontade de urinar. O que urinei
encheu-me de maravilha: começaram a sair
aviões e mais aviões da minha uretra, enquanto
todo o meu corpo cavernoso, a minha glande e o
meu prepúcio pareciam estalar».
Após várias revisões e modificações, as qualidades que eu lhe havia apontado ampliaram-se nitidamente e, na maior parte das vezes, mais se sublimaram, o que é lógico e era de esperar. Utilizando
ADRIANO MIXINGE
Nasceu em Luanda em 1968. Aos 11 anos viajou para Cuba, tendo passado toda a sua adolescência na Ilha da Juventude. Historiador e
Crítico de Arte. Licenciado, em 1993, pela Universidade de Havana (Cuba). Foi investigador
no Museu Nacional de Antropologia, em Luanda, editor cultural do Jornal de Angola e comissário na I Bienal de Arte de Joanesburgo
(1995). Desde 2003, é membro da Associação
Internacional de Críticos de Arte (AICA). Autor
do romance Tanda (Edições Chá de Caxinde, 2006), e do livro de ensaios Made
in Angola: arte contemporânea, artistas e debates (Editions L´Harmattan, Paris,
2009). Em 2002 foi nomeado Conselheiro Cultural da Embaixada de Angola em
França, onde, em novembro de 2008 organizou o Projeto Angola, mon amour,
no Museu do Quai Branly, e esteve na origem da exposição Angola, Figuras de
Poder (Museu Dapper, Paris, 2011). Atualmente é Conselheiro Cultural na Embaixada da República de Angola em Madrid.
uma linguagem que não tem medo das chamadas
palavras escabrosas, ditas, por muitos, obscenas, e
recorrendo muitas vezes a cenas que, noutros
contextos poderiam ser consideradas escatológicas,
o autor acaba por construir uma metáfora gigante,
dir-se-ia épica, em que há que ter atenção a todos
os símbolos e a todas as ações, pois todos estes
elementos fazem parte do todo que é uma reflexão
sobre o nosso quotidiano e todos os desafios que se
nos deparam constantemente na vida atual.
Efetivamente, pode dizer-se que O Ocaso dos
Pirilampos é um romance angolano com uma dimensão universal, porque nele estão focadas todas
as angústias do homem contemporâneo, especialmente quando recorre a poemas que vai introduzindo na prosa corrida, à maneira do contraponto feito
pelo coro na tragédia grega. «E se o tango fosse um
ardor/ os nossos dedos em torpor/ não haveria partituras/ nem esboços na foz da percussão/ se ele
fosse uma voz/ poderíamos ouvi-lo à capela/ mesmo
que soasse tórrida/ num capo de arroz/ e se o semba
fosse uma flor/ os jardins baloiçariam com o ventre/
Haveria um cântico por amar».
Saliente-se, igualmente, as excelentes ilustrações que enriquecem o volume, da autoria da esposa do autor, Rosa Cubillo.
Romance
angolano
com dimensão
universal,
porque foca
todas
as angústias
do homem
contemporâneo,
especialmente
quando introduz
poemas
na prosa corrida
O Ocaso dos Pirilampos
Adriano Mixinge
Rosa Cubillo, ilustrações
Guerra e Paz, Lisboa, 2014
África21– junho 2014
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O Reino das Casuarinas
Texto Editores, Lisboa, maio 2014
José Luís Mendonça
São sete angolanos vítimas da síndrome da amnésia autoadquirida, provocada por traumas que viveram durante a guerra
em Angola. Durante o internamento, o grupo tomou a opção
de se evadir, para fundar um Estado na Floresta da Ilha de
Luanda, denominado «Reino das Casuarinas». É então que o
narrador, de seu nome Nkuko, mutilado de guerra e impotente
devido a uma agressão que sofreu na infância, vai largando nas
páginas do livro a história de cada personagem, identificando as
causas do estado de perturbação de cada um deles. Stravinski,
um gato que ele trouxe da ex-Alemanha Democrática quando
terminou os estudos como bolseiro, dá-lhe uma bem-vinda
ajuda. O livro discorre sobre a história recente de Angola, e
cruza episódios marcantes, da Guerra Colonial à independência
e à posterior Guerra Civil. Um livro que fala sobre idealismo
e utopia, mas que no fim acaba com um assassinato mesmo
antes das primeiras
eleições. José Luís
Mendonça nasceu em
1955, no Golungo
Alto, e é jornalista,
escritor e poeta. A Chuva
Novembrina (Prémio
Esperança em 1981),
Gíria de Cacimbo (1987)
e Respirar as mãos na
Perra (Prémio Sonangol
1988) são algumas das
suas obras poéticas.
94
junho 2014 –
África21
No ano em que se assinala
um século sobre o início da
Primeira Guerra Mundial, são
muitas as obras a encher os
escaparates das livrarias.
São várias as abordagens e
diversos os temas escolhidos,
embora predominem as
visões gerais do conflito.
Peter Englund partiu para algo
diferente: a experiência de
homens e mulheres comuns
oriundos de várias partes
do mundo, explorando os
aspetos quotidianos da guerra,
não só a tragédia e o horror,
mas também o absurdo, a
monotonia e até a beleza. São
muitas as histórias; histórias de
vida, histórias simples. Há um
jovem na infantaria do exército
britânico que pondera emigrar
até a guerra lhe ter oferecido
«a sua grande promessa de
mudança». Há um funcionário
francês de meia-idade,
socialista e escritor, cuja «fé
simplesmente ruiu» com o
início da guerra. Há ainda
uma menina alemã que se
entusiasma com as notícias
das vitórias do exército, o que
para ela significa que com as
suas colegas de sala poderão
gritar na escola. Um livro
de sentimentos, sensações,
desejos. De emoções em
tempos de guerra.
A beleza e a dor da guerra –
História Íntima da Primeira
Guerra Mundial
Peter Englund
Bertrand Editora, Lisboa,
maio 2014
Um livro em que se fala da CIA,
da sua forma de organização,
mas também de casos concretos
da sua atuação. Esta é mesmo
a característica que o distingue
de muitos outros já editados, e
que abordam a agência norteamericana. Nas suas páginas,
as operações sucedem-se.
Operação 5412 - Objetivo:
eliminar o primeiro-ministro da
República do Congo, Patrice
Lumumba. Motivo? Ser um
«marxista perigoso». Projeto
MKULTRA - Objetivo: fabricar
drogas alucinogénias capazes
de controlar a mente e a vontade
dos seres humanos. Caso
NOSENKO - Objetivo: revelar
a verdadeira identidade do exagente do KGB Yuri Nosenko.
Como? Injetando-lhe LSD e
fechando-o numa cela onde
nunca se apagam as luzes;
deixando-o sem comer durante
dias e obrigando-o a beber a
própria urina. Projeto Programa
PHOENIX - Objetivo: identificar
e destruir o aparelho comunista
no Vietname do Sul. Como?
Matando, torturando, violando
e executando prisioneiros
de guerra. Um dia, Dwight
Eisenhower, Presidente dos
Estados Unidos entre 1953 e
1961, afirmou: «Na CIA fazemse coisas que é melhor não
tentar explicar». Autor de vários
ensaios, Eric Frattini acaba por
nos contar o que já sabíamos.
CIA – Joias de Família
Eric Frattini
Bertrand, Lisboa, março 2014
Sangue bom, de João
Afonso, junta na música e
nas palavras Angola, Portugal
e Moçambique. O músico
português partiu para um
desafio que se transformou
numa autêntica viagem, em
que de África se chega a
Goa através das letras de
Mia Couto e José Eduardo
Agualusa. Mas um disco que
não é fácil, é certo. Não se
parte com facilidade pelas
suas melodias, tal a densidade
em que nos transporta.
O próprio João Afonso
confessa: «Há poemas
introspetivos, filosóficos,
como Sementes ou A dor
e o Tempo». Com arranjos
de Vitor Milhanas, o disco
é composto por 14 temas,
de «amizade, fraternidade
e contos sobre o paradigma
perdido da infância… um
domínio de afetos humanos
musicais entre Portugal,
Moçambique e Angola»,
segundo João Afonso.
Sim, estão lá todos estes
sentimentos e ao escutálo chegam-nos muitas
sensações diferentes. Mas
chega-nos, sobretudo,
excelente música, numa
boa voz; e palavras que não
param de nos aconchegar, de
nos fazer viajar. Na canção
que dá título ao álbum, pode
escutar-se pela mão de Mia
Couto: «cada homem é uma
raça». Cativante álbum, este.
Sangue bom
João Afonso
É o sexto álbum da banda,
desta feita gravado fora
de casa. Depois de alguns
sustos, e de o vocalista
Abdallah Ag Lamida ter
sido inclusivamente preso
em 2012, acusado por um
grupo islamista de produzir
música proibida, o grupo
fez as malas, deixou o Mali
e partiu para os Estados
Unidos. Assentaram arraiais
na Califórnia, talvez motivados
pela paisagem, e lançaram
Emmaar. Algum sentimento de
revolta, ou um inconformismo
que lhes impregna a música,
levou-os a mais um álbum
forte, carregado de guitarras.
Contaram aliás com algumas
colaborações, como a de Josh
Klinghoffer (Red Hot Chili
Peppers). O seu som está lá
todo e facilmente nos recorda
outros registos anteriores.
Talvez por isso, não haja
nada que nos surpreenda,
mas muito que nos agrade:
estamos perante uns
Tinariwen em grande forma.
Não inovaram, mas também
não estragaram aquilo a que
já nos têm habituado.
Emmaar
Tinariwen
A National Geographic há
anos que realiza excelentes
documentários sobre a vida
animal, nomeadamente em
África. Foi mesmo pioneira em
algumas abordagens, inclusive
na aplicação de novas
técnicas de filmagem. Mas
o progressivo interesse pela
história, as novas descobertas
das últimas décadas, o
crescente envolvimento de
universidades e das suas
equipas nos trabalhos de
exploração/investigação e as
novas possibilidades na área
da divulgação, permitidas
pelo digital, abriram portas à
produção de documentários
sobre temáticas mais
abrangentes. É o caso deste,
que se debruça sobre o
chamado Grande Zimbabwe,
que floresceu no século XII,
e que caiu abruptamente
no esquecimento no século
XIV. Ao longo de quase uma
hora viajamos no tempo,
pelo trabalho do geólogo
alemão Carl Mauch ou pelas
descobertas de Gertrude
Caron-Thompson, que
colocaram em causa teorias
anteriores. Afinal, o que
aconteceu à grande civilização
que surgiu e floresceu no
coração do sul de África?
Tesouros Perdidos - O
Reino Esquecido do Grande
Zimbabwe
Realização: National
Geographic
Género: Documentário
Valeu, da autoria de Asdrúbal
Rebelo, é um documentário
que recupera as histórias de
dez sobreviventes da luta de
libertação de Angola. Parte
integral de um projeto que foi
exibido em maio na Televisão
Pública de Angola (TPA), a
síntese-documental retrata a
vida dos antigos combatentes
Domingos Venâncio, Joaquim
Lopes, José Sebastião, Anania
Malaquias, António Neto,
Cristóvão José, Francisco
Malebo, Maria Martins e
Neves Damião. Através destas
personagens da segunda
guerra de libertação, cheganos uma história de Angola no
período pós-independência.
«Temos que mostrar o que é
feito deles, dos filhos e seus
netos. O objetivo é dar a ver
um povo de uma nação jovem
que luta pela sua afirmação no
mundo», diz o realizador. Com
algumas imagens inéditas,
os espectadores poderão ver
a coragem de crianças que
perderam a infância e hoje são
homens casados e com filhos.
Domingos Venâncio, um dos
visados, afirma: «é uma honra
poder participar neste filme,
porque coisa igual não podia
acontecer. Há muito que se
aguardava um documentário do
género para dar a conhecer os
feitos de muitos que deram a sua
vida pela libertação deste país
que hoje vive em paz».
Valeu
Realizador: Asdrúbal Rebelo
Género: Documentário
África21– junho 2014
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Última página
Os «criticistas»
[email protected]
João Melo
S
sem crítica, não há boa governação. Mais do que
um slogan, esta frase deve constituir uma atitude consciente e permanente, quer dos governos quer dos cidadãos, em todo e qualquer país do mundo.
Assim, os governos, em vez de recearem a crítica, devem
estimulá-la, enquanto os cidadãos não devem hesitar em
utilizá-la, sempre que discordarem de qualquer medida, ato
ou decisão dos governos. Resta dizer que, em democracia, a
crítica deve ser sempre exercida dentro dos marcos da lei (a
democracia é o primado da lei, disse alguém).
Embora consagrado constitucional e legalmente, o direito à crítica, em Angola, sofre de duas perversões gritantes,
que contribuem para enfraquecê-lo. A seguir, abordarei essas
duas perversões de maneira breve e sucinta.
A primeira é a dificuldade de muitos governantes em
aceitar a crítica. Daí à formulação de teorias da conspiração
difíceis de comprovar, assim como à tendência para rotular,
de maneira generalizada, os autores de eventuais críticas
(«inimigos da paz» é o epíteto que «está na moda»), vai apenas um pequeno passo.
Para evitar equívocos, esclareço: não sou ingénuo, pelo que
admito perfeitamente que existem indivíduos e organizações,
dentro e fora do país, interessados em desestabilizar Angola.
Mas considerar que todos aqueles que criticam a governação são
«inimigos» é um exagero evidente, que não partilho.
O segundo problema que contribui para enfraquecer o
direito à crítica, entre nós, é a tendência de algumas personalidades e entidades para o criticismo absoluto e obsessivo. Na
verdade, trata-se do mesmo vício, embora de sinal contrário,
daqueles que consideram toda e qualquer crítica como um ato
«inimigo».
Todos os partidos da oposição angolana enfermam desse
vício, o que não contribui para o seu eventual posicionamento como alternativas consistentes ao atual partido no
poder. Afirmar que o papel da oposição é criticar o governo
não chega a ser uma tautologia: é um argumento simplista e
primário. As críticas que se julgam bastar a si próprias, como
pescadinhas de rabo na boca, são inúteis e improdutivas.
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África21
O problema é mais preocupante quando se trata dos
críticos considerados (ou proclamados) apartidários. Como,
em todo o mundo, os partidos estão em baixa, muitos deles
arvoram-se de uma pretensa superioridade moral que uma
análise mais acurada, entretanto, desmonta fragorosamente.
Com efeito, a maioria não passa de obsessivos e contumazes
«criticistas» (uso esta expressão para não confundi-los com os
críticos e, igualmente, para não desvalorizar estes últimos).
O que neles me incomoda em particular é a sua tendência
para o sectarismo e a demagogia. Na verdade, embora se proclamem apartidários, concentram o foco das suas críticas unicamente no partido no poder, desmentindo, assim, o seu «apartidarismo» e a sua «independência». Não é de estranhar, portanto,
a sua complacência com as práticas da oposição, considerando
«legítima», inclusive, a discussão, por parte desta última, de
factos históricos cuja natureza está à vista de toda a gente.
Salvaguardadas as devidas proporções, impõe-se uma
pergunta, a título de exemplo: terá alguém, hoje, legitimidade para, em nome da democracia, da reconciliação ou seja lá
do que for, discutir a natureza da escravatura, da Inquisição,
do Holocausto, do estalinismo, dos crimes dos Khmers
Vermelhos ou do apartheid, para determinar se se tratou de
factos positivos ou negativos?
Os «criticistas» não resistem também à tentação da demagogia. Acontece que governar não é uma brincadeira, sobretudo quando se trata de um país que tinha chegado ao fundo do
poço e que está a ser reconstruído praticamente a partir do
zero. Para fazê-lo, são precisas ações firmes e nem sempre populares. O tema merece uma crónica exclusiva.
Anticríticos e «criticistas»
descredibilizam o direito à crítica