Greve no serviço público

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Greve no serviço público
Greve no serviço público
Perguntas e respostas sobre greve no serviço público:
1 - Os servidores públicos podem ou não fazer greve?
A Constituição Federal de 1988 ampliou os direitos sociais dos servidores públicos
civis, permitindo-lhes a livre associação sindical e o direito de greve.
Estipulou, entretanto, que o exercício do direito de greve deveria ser regulamentado
por lei complementar (redação alterada na EC 19/98 para lei específica).
2 - E essa lei nunca foi editada?
Nunca. Já no ano seguinte ao da promulgação da Constituição, adveio a Lei nº
7.783/89, que normatizou o direito de greve dos empregados da iniciativa privada. No
serviço público, as paralisações continuam à margem de regulação específica.
3 - Por que a Lei nº 7.783/89 não é utilizada também no serviço público?
Porque são espécies diferentes de relações jurídicas. A relação jurídico-laboral
existente entre o empregado e o empregador da iniciativa privada decorre do regime
trabalhista, regida pelo CONTRATO DE TRABALHO, e é subordinada à Consolidação das
Leis do Trabalho – CLT.
Já a relação jurídica da pessoa legalmente investida em cargo público – chamada de
servidor público pela Constituição de 1988 – com a Administração (direta, autarquias e
fundações públicas, Legislativo e Judiciário) não é contratual, mas institucional,
adesiva ou funcional.
Desse modo, se a Constituição fala em lei específica para os servidores públicos, o
administrador só poderá valer-se desse dispositivo, por força do Princípio da
Legalidade.
4 - E o que vem a ser o Princípio da Legalidade?
Segundo Alexandre de Moraes: "O tradicional princípio da legalidade, previsto no art.
5º, II, da Constituição Federal e anteriormente estudado, aplica-se normalmente na
Administração, porém de forma mais rigorosa e especial, pois o administrador público
somente poderá fazer o que estiver expressamente autorizado em lei e nas demais
espécies normativas, inexistindo, pois, incidência de sua vontade subjetiva, pois na
Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza, diferentemente
da esfera particular, onde será permitida a realização de tudo o que a lei não
proíba". (grifo nosso) In Direito Constitucional, 7ª ed. Ed. Atlas, 2000, São Paulo, pg.
279.
5 - E com base em quê os servidores públicos realizavam suas greves até
agora?
Na falta de regulamentação, geralmente as questões eram levadas ao Judiciário,
ficando à mercê da interpretação de cada tribunal.
Muitos juízes entendiam que o direito de greve do servidor era “norma de eficácia
contida”, isto é, não poderia ser exercido enquanto não fosse regulamentado por lei.
Esses juízes autorizavam o corte do ponto e aplicação de penalidades.
A corrente majoritária, no entanto, sempre defendeu que, por se tratar de direito
constitucional, o servidor não poderia ser impedido de exercê-lo por inércia do
legislador.
6 - O Judiciário, então, sempre considerou a greve legal?
Em termos. Com o tempo, foi sendo cristalizado o entendimento de que o servidor
não poderia ser punido por participar de greve. Ao mesmo tempo, no STJ foi sendo
firmada jurisprudência no sentido de que os dias não trabalhados poderiam ser
descontados, como pode ser constatado num dos últimos julgados sobre o assunto:
“O direito de greve, nos termos do art. 37, VII, da Constituição Federal, é assegurado
aos servidores públicos, porém não são ilegítimos os descontos efetuados em razão
dos dias não trabalhados“ (Precedentes).
Recurso desprovido.
RMS 20527 / SP. Ministro FELIX FISCHER. DJ 24.09.2007 p. 324
7 - E o que mudou em relação a isso?
Depois de quatro anos de debate, o STF finalmente encerrou o julgamento
Mandados de Injunção (MIs) 670, 708 e 712, impetrados, respectivamente,
Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindpol),
Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de João Pessoa (Sintem) e
Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do estado do Pará (Sinjep).
dos
pelo
pelo
pelo
Essas ações pediam providências contra a omissão do Presidente da República e do
Congresso Nacional em regulamentar o artigo 37, VII, da Constituição Federal, e
pediam que fosse assegurado o direito de greve para seus filiados, a despeito da
inércia legislativa.
O STF reconheceu a mora legislativa e determinou fosse aplicada, no que cabível e de
modo transitório, a Lei Geral da iniciativa privada - Lei nº 7.783/89. Em suma,
regulamentou provisoriamente o exercício do direito de greve do servidor.
8 - Por que outros sindicatos não entraram antes com o Mandado de
Injunção?
O Mandado de Injunção, previsto no art. 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal, tem
a finalidade de resguardar direitos e liberdades constitucionais cujo exercício venha a
ser tolhido ou inviabilizado em virtude de ausência injustificada de regulamentação.
Esse instrumento quase não era utilizado por não apresentar resultados práticos: o
STF simplesmente reconhecia a omissão do Legislativo, mas nada fazia, sob a alegação
de que estaria ferindo o princípio da separação de poderes, pois não lhe compete
legislar.
Desse modo, a decisão do STF nos MIs representa um avanço, sem dúvida, mas ainda
não é o ideal, tendo em vista as peculiaridades do serviço público.
9 - Como ficou a decisão do STF em relação ao pagamento dos dias não
trabalhados?
O ministro Lewandowski inspirou-se na redação proposta no art. 9º do Projeto de Lei
nº 4.497/01, da deputada Rita Camata (PMDB-ES), para determinar que os dias de
greve serão computados como de efetivo exercício para todos os efeitos, inclusive
remuneratórios, desde que atendidas as exigências da Lei nº 7.783/89, e acaso, após
o encerramento da greve, sejam repostas as horas não trabalhadas, conforme
cronograma estabelecido pela Administração, com a participação da entidade
representativa dos servidores.
No entanto, o relator do PL 4497/01 (com previsão de votação na Câmara nos
próximos dias), deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), apresentou substitutivo que
altera o projeto e incorpora sugestões de outras sete propostas que tramitam
apensadas (5662/01, 6032/02, 6141/02, 6668/02, 6775/02, 1950/03 e 981/07). O
texto apresentado por Marquezelli descarta o pagamento dos dias parados.
O deputado Tarcísio Zimmermann (PT-RS) apresentou voto em separado ao PL
4497/01, propondo que se considerem os dias de greve como falta justificada, e a
flexibilização do percentual de servidores que deve garantir a prestação dos serviços
que não podem ser interrompidos, entre outros pontos.
10 - Quais os procedimentos a serem adotados para deflagração da greve, de
acordo com a decisão do STF?
São os seguintes, de acordo com as modificações efetuadas na Lei 7.783/89:
1) estabelecer tentativas prévias de atendimento voluntário, pela União Federal,
das pautas de reivindicações (artigo 3º modificado pelo STF);
2) documentar o mais amplamente possível (ofícios de remessa e respostas às
reivindicações; reportagens sobre visitas às autoridades; notícias de jornal
sobre as mobilizações anteriores, acordos não cumpridos pelo Poder Público
etc.) (artigo 3º modificado pelo STF);
3) convocar assembléia-geral da categoria (não apenas dos associados) mediante
a observância dos critérios definidos no Estatuto do Sindicato e com divulgação
do Edital com antecedência razoável (72 horas, como sugestão) em jornal de
grande circulação (artigo 4° modificado pelo STF);
4) em assembléia, votar a pauta de reivindicações e deliberar sobre a paralisação
parcial de serviços (artigo 4° modificado pelo STF);
5) comunicar a decisão da assembléia: a) ao tomador dos serviços e b) aos
usuários do serviço (mediante edital publicado em jornal de grande circulação),
com antecedência mínima de 72 (setenta e duas horas) (artigo 3°, § único
modificado pelo STF);
6) durante a greve, buscar sempre que possível a negociação para o atendimento
das reivindicações, documentando-a ao máximo;
7) manter equipe de servidores para assegurar a continuidade da prestação dos
serviços, buscando a definição do que sejam “serviços indispensáveis ao
atendimento das necessidades da comunidade” ou “serviços cuja paralisação
resulte em prejuízo irreparável” (artigos 9° e 14 modificados pelo STF);
8) manter até o final da greve um “Ponto Paralelo”, para registro pelos servidores
grevistas, o qual poderá ser instrumento útil para discutir eventual desconto
dos dias parados.
Em
março de 2008
Assessoria Jurídica do SINAL/NACIONAL.