Parecer Temático – Drenagem Urbana1

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Parecer Temático – Drenagem Urbana1
Parecer Temático – Drenagem Urbana 1
Consultor: José Paulo Soares de Azevedo
Colaboradores: Marcelo Gomes Miguez e Luiz Paulo Canedo de Magalhães
Sumário
Introdução ................................................................................................... 1
1 – DIAGNÓSTICO......................................................................................... 3
2 – PROGNÓSTICO ........................................................................................ 6
2.1 – Prognóstico Particular para a Bacia do Rio Acari ........................................ 7
3 – MEDIDAS RECOMENDÁVEIS .................................................................... 10
4 – PRIORIZAÇÃO ....................................................................................... 12
5 – CONCLUSÃO.......................................................................................... 12
Referências................................................................................................. 13
Introdução
As inundações em áreas urbanas consistem em um dos mais comuns, graves e onerosos problemas
com que as cidades precisam lidar. Observando os registros de perdas econômicas decorrentes de
inundações e outras catástrofes climáticas ao longo das últimas décadas, nota-se claramente uma
tendência de aumento dos prejuízos associados a estes fenômenos. Segundo estudos da Divisão de
Geociências da Munich Re America 2 , as perdas econômicas provocadas por catástrofes naturais nos
EUA, ao longo dos anos 50, foram de cerca de 30 bilhões de dólares, enquanto que no período entre
1990 e 1999 estas perdas superaram a marca de 210 bilhões de dólares (Grossi & Kunreuther,
2005).
As enchentes são fenômenos de origem natural e de alta relevância ambiental. No entanto, a
ocupação urbana interfere com este processo na medida em que provoca o seu agravamento e que
sua ocorrência passa a constituir um risco para a população, suas benfeitorias e atividades
econômicas presentes na região.
A origem das cheias está relacionada com as chuvas intensas. De forma simplificada, quando a
chuva atinge a superfície, uma parcela desta precipitação se infiltra no solo, enquanto que o
restante escoa sobre o terreno e em canais, fluindo em direção a áreas mais baixas e, em última
instância, ao mar. A urbanização impacta este processo através de diversas formas, conforme ilustra
a tabela 1.
1
2
Texto elaborado para o Instituto Pereira Passos, para subsidiar os debates do Seminário de Reação: Rio, próximos 100 anos.
Empresa membro do grupo Munich Re
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Tabela 1 – Impactos da Urbanização sobre as Inundações
Causas
remoção
Efeitos
da
vegetação
nativa
aumento do volume de escoamento superficial e
das vazões máximas; aumento da velocidade do
escoamento;
aumento
da
vulnerabilidade
do
terreno aos processos erosivos, propiciando o
assoreamento de canais e galerias
aumento
do
grau
impermeabilização
de
aumento do volume de escoamento superficial e
do
das vazões máximas, diminuição de retenções
terreno
superficiais
e
aumento
da
velocidade
de
escoamento superficial
implantação
de
rede
de
drenagem artificial
ocupação
de
aumento
significativo
da
velocidade
do
escoamento e dos picos de vazões de cheia
áreas
ribeirinhas
população exposta a inundações periódicas em
áreas
naturalmente
alagáveis,
ampliação
das
áreas alagáveis, com a incorporação de áreas
originalmente não sujeitas ao processo natural,
pela subtração de espaço nas várzeas
Lançamentos de Resíduos
degradação da qualidade de água; doenças de
Sólidos
veiculação hídrica; obstrução de bocas de lobo e
Sanitários
e
Esgotos
galerias; assoreamento de canais
Atualmente, uma nova preocupação quanto às inundações urbanas vem ganhando destaque,
a possibilidade de agravamento deste fenômeno em virtude de mudanças climáticas de escala
global. A causa destas mudanças está associada ao aumento da concentração de gases estufa,
principalmente de dióxido de carbono e metano, observado desde a revolução industrial e
extremamente intensificado ao longo do século XX. Este processo vem provocando o aumento da
temperatura média na superfície do planeta. Apesar de ainda haver muita incerteza quanto às
conseqüências do aquecimento global, existe um consenso entre os cientistas que haverá elevação
do nível do mar e que fenômenos extremos (tais como grandes tempestades e secas) tendem a
tornarem-se mais freqüentes, imprevisíveis e de magnitude mais severa.
O objetivo deste parecer técnico é apresentar um diagnóstico das inundações urbanas no
Município do Rio de Janeiro, desenvolver um prognóstico baseado em cenários de elevação de nível
do mar de 40cm, 60cm e 1,40m, e apresentar uma relação de medidas recomendáveis, bem como
uma priorização das mesmas. Considerando a extensão da área do município e a complexidade de
análise dos problemas de drenagem urbana, para os quais não existe uma solução-padrão a ser
recomendada, torna-se necessária a análise caso a caso das causas de inundações e das medidas
estruturais e não estruturais recomendáveis para um dado sistema. Neste parecer, o trecho final da
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bacia do rio Acari foi selecionado para a realização de um estudo mais detalhado, visando avaliar os
impactos da elevação do nível do mar nas enchentes da região, de acordo com o enfoque proposto.
1 – DIAGNÓSTICO
A maior parte da ocupação urbana da cidade do Rio de Janeiro se concentra em planícies litorâneas
situadas entre o mar e a montanha. Esta configuração de relevo dá origem a uma enorme
quantidade de micro e pequenas bacias hidrográficas sujeitas a enchentes provocadas por chuvas
convectivas (mais comumente) e frontais, observando-se também uma forte influência de chuvas
orográficas nas áreas próximas a encostas.
Um fator que contribui substancialmente para a ocorrência de inundações é o crescimento
populacional, que tem como uma de suas conseqüências a expansão das áreas urbanas, provocando
um aumento do grau de impermeabilização da bacia em relação ao verificado no estágio de
ocupação natural. A população brasileira aumentou de pouco mais de 17 milhões de habitantes, em
1900, para quase 170 milhões de habitantes, no ano 2000, sendo constatado também uma
proporção cada vez maior da população urbana em relação à rural. Quanto à influência do aumento
do grau de impermeabilização, estudos como o de Leopold (1965) mostram que a vazão de pico de
cheia numa bacia urbanizada pode chegar a ser 6 vezes maior do que o pico desta mesma bacia em
condições naturais.
O processo de urbanização da cidade do Rio de Janeiro alterou de forma significativa a paisagem
original desta região. Com o passar do tempo, áreas alagadiças foram dessecadas, lagoas e áreas
das baías de Guanabara e Sepetiba foram aterradas, entre outras várias intervenções com o objetivo
de sanear e permitir a ocupação da região, além de dotá-la da infra-estrutura necessária para o seu
desenvolvimento. A figura 1 ilustra algumas das alterações ocorridas na região do centro da cidade e
imediações entre 1567 e 1906, podendo destacar como fato mais marcante o aterro do Saco de São
Diogo, dando origem ao Canal do Mangue.
Figura 1: Modificações da paisagem da região central da Cidade do Rio de Janeiro no período
entre os anos de 1567 e 1906 (adaptado de Escola de Engenharia, 1998).
O processo histórico de desenvolvimento da cidade pode ser identificado como o primeiro fator
agravante das cheias na região ao permitir a ocupação de áreas marginais aos cursos d’água e
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também daquelas situadas em cotas topográficas muito baixas. Com o passar do tempo, a ocupação
regular e irregular das planícies de inundação foi progressivamente se consolidando, aumentando
significativamente a população atingida periodicamente pelas enchentes e dificultando, inclusive, a
realização de ações de limpeza, dragagem e manutenção da calha e de obras de canalização. A
figura 2 mostra a intensa ocupação das margens do rio Acari.
Figura 2 – Ocupação da planície de inundação ao longo do rio Acari.
Além da ocupação das áreas marginais aos cursos d’água, o processo de urbanização da
cidade do Rio de Janeiro também não foi capaz de prevenir a ocupação de suas encostas.
Atualmente, uma considerável área das encostas cariocas encontra-se ocupadas por favelas ou por
vegetação rasteira, em substituição à mata atlântica que ocupava a maior parte desta área no
passado. Com isso, a chuva que hoje cai sobre as favelas desce velozmente, como uma enxurrada,
acumulando-se nas áreas mais baixas da cidade, que passam a ser afetadas de forma mais intensa.
A construção de redes de drenagem pluvial, solução largamente e erroneamente adotada de
forma geral como solução para os problemas de drenagem, também contribui para o agravamento
das inundações das áreas mais baixas ao transferir os alagamentos de montante (rio acima) para
jusante (rio abaixo). As práticas mais atuais adotadas no controle de cheias tendem a tentar
retardar ou reduzir os escoamentos gerados na bacia através de medidas de armazenamento e
infiltração.
O acúmulo de resíduos sólidos no rio além do lançamento de esgotos sanitários sem
tratamento também contribui para o agravamento das cheias uma vez que provoca o assoreamento
das canalizações e a obstrução dos elementos hidráulicos que fazem parte do sistema de drenagem.
Além disso, estes fatores deterioram a qualidade da água do rio e podem provocar a contaminação
da população local com doenças de veiculação hídrica.
A presença de singularidades, tais como vigas e pilares de pontes, constituem um outro fator
agravante das cheias que ocorrem no Município do Rio de Janeiro. Em determinadas áreas, como,
por exemplo, na região da Praça Montese, em Marechal Hermes, constata-se a ocorrência de
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alagamentos de mais de 2m de lâmina d’água em virtude de uma travessia insuficiente do rio Tingui
por baixa da linha férrea, cujo muro de concreto funciona como um dique que faz com a água se
armazene na rua João Vicente e em outras ruas situadas próximas a esta. Outro exemplo é a ponte
da rua Luís Coutinho Cavalcanti que atua como um obstrução ao escoamento das cheias do rio
Sapopemba 3 , provocando o alagamento de áreas no seu entorno. A figura 3 ilustra os dois exemplos
citados anteriormente.
Figura 3 – Alagamento na região da Praça Montese e ponte da rua Luís Coutinho Cavalcanti.
A Secretaria Municipal de Obras, através da Subsecretaria de Águas Municipais 4 , tem feito
um monitoramento dos locais de ocorrência de enchentes na cidade do Rio de Janeiro. Analisando o
mapa com a materialização dos pontos de alagamento levantados, percebe-se que a maior parte dos
problemas concentra-se nas APs 3 e 4. Dentre as bacias hidrográficas da cidade, as bacias do Arroio
Fundo e do rio Acari são as que apresentam o maior número de ocorrências. Nota-se também a
predominância de pontos de alagamento em áreas situadas em cotas topográficas mais baixas. A
figura 4 mostra o mapa com os pontos levantados ao longo do verão de 2006/2007.
Figura 4 – Pontos de alagamento levantados ao longo do verão 2006/2007 (FONTE:
Subsecretaria da Águas Municipais).
3
4
Mais a frente este rio passa a ser denominado rio Acari
Rio Águas
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2 – PROGNÓSTICO
Os sistemas de drenagem urbana englobam dois subsistemas principais: a micro e a macrodrenagem. A microdrenagem é composta pelos pavimentos das ruas, sarjetas, bocas de lobo,
galerias de águas pluviais e canais de pequenas dimensões. Já a macrodrenagem, em geral, é
constituída por canais de maiores dimensões, que recebem as contribuições de microdrenagem e as
lançam no corpo receptor. Também fazem parte do sistema um conjunto complementar de
estruturas, entre as quais citam-se reservatórios de amortecimento, diques de proteção, estações de
bombeamento, entre outros. Todo este conjunto é projetado para trabalhar de forma integrada,
captando, conduzindo, eventualmente armazenando de forma temporária e descarregando os
escoamentos gerados em uma área urbana. Em última instância, o corpo d’água receptor é o mar.
As cheias urbanas, por sua vez, estão diretamente associadas à falha destes subsistemas,
seja por erro de concepção, por falta de manutenção, por obsolecência, pelo crescimeto urbano
desordenado e, conforme avaliação mais recente, pela possibilidade de ocorrência de mudanças
climáticas, seja com o agravamento dos eventos de chuva intensa, seja com a restrição imposta
pela maré no exutório da bacia. Avaliando este contexto, percebe-se que o aumento do nível do mar
gera uma restrição ao escoamento fazendo o sistema de drenagem perder eficiência. O
agravamento da intensidade de eventos extremos, por sua vez, atuando em outra vertente do
problema, é uma possibilidade que traz uma conotação ainda mais crítica, uma vez que fará gerar
maior volume a ser escoado por um sistema com menor capacidade de descarga. Nessa situação,
em um quadro de enchentes urbanas já grave, os efeitos gerados podem aumentar fortemente as
manchas de alagamento, fazendo-as chegar a locais antes não alagáveis, aumentando lâminas de
alagamento e tempos de permanência, tornando a situação ainda mais dramática.
A seguir, é apresentado, especificamente, um prognóstico elaborado para a bacia do rio
Acari, localizada na zona norte do Município do Rio de Janeiro. Esta bacia foi selecionada por dispor
de uma base de modelagem computacional já desenvolvida, no âmbito de estudos específicos
contratados anteriormente pela Subsecretaria Águas Municipais.
2.1 – Prognóstico Particular para a Bacia do Rio Acari
A bacia do rio Acari possui uma área de drenagem de cerca de 107km², sendo composta por
diversos bairros densamente povoados do Município do Rio de Janeiro. Os principais afluentes do rio
Acari são, pela margem esquerda, o rio Calogi e, pela margem direita, os rios dos Cachorros I e II,
das Pedras, Tingui, dos Afonsos, Caldeireiro, Merinho e Caranguejo. Os rios Acari e Pavuna são os
formadores do rio São João de Meriti, que deságua na Baía de Guanabara. O rio Acari atravessa
diversas importantes vias de tráfego como, por exemplo, as avenidas Brasil e Automóvel Clube e a
rodovia Presidente Dutra. Os pontos mais críticos da bacia, em termos de inundações, estão
situados nos bairros de Jardim América, Acari, Parque Colúmbia, Coelho Neto, Barros Filho, e
Pavuna. Durante a ocorrência de grandes tempestades, observa-se uma área total de inundação de
mais de 3km2, com lâminas de alagamento variando entre 0,20m e 2,0m.
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Uma importante ferramenta no contexto da gestão de sistemas de drenagem e avaliação de
riscos de cheias é a modelação matemática. Modelos matemáticos são capazes de auxiliar na
confecção de projetos integrados de controle de enchentes, na avaliação do funcionamento sistêmico
de intervenções em arranjos complementares, na caracterização de níveis de alagamento, áreas de
influência e tempos de permanência de cheias, informações estas fundamentais para avaliação das
perdas provocadas pelos alagamentos. O prognóstico apresentado neste parecer foi elaborado a
partir de simulações feitas com modelos matemáticos, considerando cenários que representam a
situação atual e a elevação do nível do mar em 40cm, 60cm e 140cm.
A modelagem desenvolvida para a caracterização do comportamento das cheias na região de
interesse foi elaborada considerando as seguintes particularidades:
•
o uso dos modelos MODCEL (Mascarenhas & Miguez, 2005), uma ferramenta robusta de
modelagem hidráulica-hidrológica utilizada para a análise do comportamento da bacia e de
intervenções de controle de cheias e que permite a elaboração de manchas de inundação
para toda a região modelada, e o Sistema HIDRO-FLU, um sistema que integra e automatiza
uma série de estudos hidrológicos aplicáveis a bacias de pequeno e médio porte;
•
o domínio da região modelada compreende o trecho situado entre a foz do rio São João de
Meriti na Baía de Guanabara e uma seção localizada 2km a montante da Estrada do
Camboatá. Ressalta-se que a modelação do rio São João do Meriti também é de suma
importância uma vez que o mesmo provoca efeito de remanso no rio Acari, afetando
significativamente os níveis de alagamento nesta bacia;
•
chuva com duração igual a 5 horas (equivalente ao tempo de concentração da bacia do rio
Acari), tempo de recorrência de 20 anos para as áreas da bacia do rio Acari e de 10 anos nas
áreas pertencentes às bacias dos rios Pavuna e São João de Meriti;
•
as áreas de drenagem das bacias do rio Acari e São João do Meriti situadas fora da região de
interesse foram modeladas hidrologicamente e os respectivos hidrogramas representados
através de condições de contorno; uma outra condição de contorno considerada foi a maré,
aplicada na célula que representa a Baía de Guanabara;
•
a condição de contorno de maré foi alterada de acordo com os cenários de elevação do nível
do mar considerados, através da soma de 40cm, 60cm e 140cm aos valores utilizados para a
simulação da condição atual (maré de sizígia).
Os resultados obtidos foram avaliados em termos de magnitude dos alagamentos máximos e da
extensão da área atingida. A tabela 2 mostra as lâminas de inundação observadas em 6 pontos
situados ao longo do trecho mais baixo da bacia do rio Acari para os cenários que representam a
situação observada atualmente e aqueles que consideram a elevação do nível do mar. A figura 5
mostra a localização destes pontos.
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Tabela 2 – Níveis de alagamento em diversos locais da bacia do rio Acari para os cenários
simulados
Localização
Situação
Atual
Cenário com Cenário com Cenário com
maré+0,40m maré+0,60m maré+1,40m
1) Jardim América - Rua Chambelland
0,59
0,70
0,75
1,03
2) Jardim América - Av. Ministro Arthur Costa
0,27
0,27
0,27
0,34
3) Parque Colúmbia (jusante) - Travessia com a rodovia Pres. Dutra
1,40
1,47
1,51
1,70
4) Parque Colúmbia (montante) - Rua Leão Coroado
1,70
1,73
1,74
1,80
5) Coelho Neto - Travessia com a Automóvel Clube
1,52
1,53
1,54
1,56
6) Barros Filho - junto à Caixa de Sedimentos
0,69
0,70
0,70
0,72
Figura 5 – Localização dos pontos de controle escolhidos para a análise dos resultados.
Uma outra forma de representação dos resultados obtidos na simulação dos cenários é através
de uma mancha de envoltória de alagamentos máximos, que representa os níveis máximos de
inundação observados em diversas áreas da bacia ao longo da passagem da cheia, não sendo,
portanto, um retrato instantâneo. A figura 6 ilustra a mancha de inundação para o cenário que
representa a situação atual.
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Figura 6 – Mancha de inundação correspondente ao cenário que representa a situação atual.
A figura 7 mostra a mancha de inundação para o cenário mais crítico, aquele que representa
uma elevação do nível do mar de 140cm. Nesta mancha, pode-se observar uma piora generalizada
dos níveis de alagamento, especialmente nas áreas mais próximas à foz do rio Acari.
Figura 7 – Mancha de inundação relativa ao cenário que contém elevação do nível do mar de 140cm.
Uma outra informação que pode ser deduzida a partir da análise dos resultados obtidos é a
extensão do rio Acari afetada em cada um dos cenários simulados. Em termos gerais, os cenários de
elevação do nível do mar de 40cm e 60cm apresentaram resultados bem similares, provocando
efeitos de agravamento das inundações em seções distantes até 9,3km da foz do rio São João de
Meriti na Baía de Guanabara. Já o cenário de elevação de 140cm mostrou piora dos níveis de
inundações em seções distantes até 11,3km da foz do rio São João. A figura 8 ilustra os resultados
obtidos.
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Figura 8 – Limite dos trechos dos rios Acari e São João de Meriti que apresentaram pioras dos
níveis de inundação para cada um dos cenários considerados.
Rio São João de Meriti
Rio Acari
Imediações da comunidade Parque Acari - local mais a montante (a 9,3km
da foz na Baía de Guanabara) que apresentou piora das cheias para os
cenários de elevação do nível do mar de 40cm e 60cm
Barros Filho - local mais a montante (a 11,3km da foz na Baía de Guanabara) que apresentou piora
das cheias para os cenários de elevação do nível do mar de 140cm
3 – MEDIDAS RECOMENDÁVEIS
A compreensão da maneira como a urbanização interfere nas cheias é muito importante para que o
planejamento e o controle de enchentes urbanas sejam feitos de forma adequada. De modo geral, pode-se
dizer que o controle de cheias urbanas passa pela adoção de medidas estruturais, que modificam a
paisagem da bacia, introduzindo intervenções dentro e fora da rede de drenagem, para minoração do
problema, e de medidas não estruturais, associadas às ações de educação ambiental, planejamento e
medidas diversas que permitem uma convivência mais harmônica com o fenômeno das enchentes. A
combinação de medidas estruturais e não estruturais, em um contexto de planejamento integrado com o
crescimento urbano, bem como a própria utilização de estruturas da paisagem urbana com funções
hidráulicas, permite uma composição capaz de equacionar o problema de enchentes de forma harmônica e
sustentável. Essa concepção, que é relativamente recente, vem sendo considerada como mais adequada
para tratamento do problema de cheias urbanas, por considerar o problema de uma forma sistêmica e
propor atuações que, dentro do possível, procuram minimizar os impactos da urbanização.
Essa tendência, ainda que não motivada pelo painel pintado pelas possíveis mudanças climáticas,
vem ao encontro deste tema, com possibilidades de atuação eficaz, em contraposição à abordagem
tradicional do problema de cheias urbanas, que passava, basicamente, pela proposição de canalizações.
Nesta ótica, atacava-se a conseqüência do problema, ou seja, buscava-se ajustar a condutância
de rios e canais às vazões produzidas pela bacia urbana. Considerando a elevação do nível médio dos
mares, porém, a tentativa de aumento da capacidade de escoamento da calha não reverte, de fato, em
capacidade de descarga do sistema. Assim, considera-se, neste contexto, mais importante tratar a
problemática de produção dos escoamentos, com atuações distribuídas sobre a paisagem urbana, de
forma a reduzir e retardar picos de cheia, permitir a recarga do lençol freático e buscar restaurar as
condições aproximadas do escoamento natural. Essa nova abordagem passa pelo conceito de
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urbanização sustentável, como medida básica e preventiva. A não ampliação da cheia deve ser uma
premissa no desenvolvimento de novas áreas e na recuperação de áreas degradadas. Medidas como
reservatórios de amortecimento (junto aos pés de encostas, controlando grandes áreas de cabeceira,
distribuídos na paisagem urbana e integrados a praças, parques e áreas de lazer, ou mesmo ao nível dos
loteamentos, onde podem ser utilizados como controle na entrada do sistema de drenagem), bem como
ações de reflorestamento, utilização de pavimentos permeáveis e medidas diversas que privilegiem a
infiltração, podem ser importantes ferramentas para minimizar o problema de cheias, reduzindo o pico
de vazões que precisa passar pelo sistema de drenagem. Essas medidas, adequadamente projetadas de
forma integrada, poderiam ser capazes de trabalhar preventivamente, modificando a distribuição
espacial e temporal dos escoamentos, para fazer frente aos novos desafios.
O agravamento do problema, porém, poderia levar à necessidade de implantação de medidas mais
drásticas, eventualmente se chegando à proposição de polders, para a proteção das áreas urbanizadas.
Esta solução, de caráter corretivo, combinaria a utilização de diques, controlando a saída da rede de
drenagem para o mar através de comportas, gerando a necessidade de grandes áreas de armazenamento
temporário de vazões e agravando o risco de acidentes, pela possibilidade de ruptura de uma destas
estruturas.
Dentre as medidas não estruturais, por sua vez, recomenda-se, como ação importante na
minimização dos impactos advindos de uma cheia, a adoção de um sistema de alerta e um plano de
contingência, no caso de eventos excepcionais. Planos de contingência deveriam ser gerados, também,
no caso da necessidade de implantação de medidas extremas, como os polders citados anteriormente,
para atender a situações de falha estrutural ou acidentes. Destaca-se, contudo, neste leque de ações
não estruturais, a necessidade de confecção de um plano diretor de drenagem urbana, considerando
cenários futuros que abarquem o problema das mudanças climáticas, permitindo preparar a cidade para
este problema e buscando soluções que visem harmonizar a interação com o meio ambiente de forma a
racionalizar a ação do homem sobre a bacia urbana.
4 – PRIORIZAÇÃO
Mais recentemente, uma nova filosofia de proteção contra enchentes vem evoluindo, tratando da
gestão do risco de cheias em um contexto mais geral, que considera as enchentes como uma das
várias fontes de risco na sociedade humana. Neste contexto, o risco de cheia relaciona-se com o
dano esperado, causado por uma enchente, para um dado período de tempo. A estratégia do
gerenciamento do risco de cheia deve passar por considerações mais abrangentes, como parte do
trabalho integrado de gerenciamento de Recursos Hídricos. Assim sendo, deve-se considerar todos
os custos e benefícios envolvidos, avaliar o potencial de redução de risco, quanto este risco pode ser
reduzido e a que custo, comparar as relações de custo x benefício obtidas com outras possíveis
atuações, em vários campos da sociedade, priorizando e ordenando investimentos, especialmente
aqueles do setor público.
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5 – CONCLUSÃO
O painel construído mostra, nitidamente, que as possíveis mudanças climáticas aqui supostas,
simuladas como um aumento do nível médio dos mares, é capaz de agravar significativamente o
problema de cheias urbanas. Os sistemas de drenagem são dependentes de sua capacidade de
descarga que, por sua vez, fica comprometida pela ação de restrição exercida pelo mar, nas
condições de sobrelevação de seu nível médio. O conceito de projeto de drenagem vem mudando,
no sentido de se procurar manter padrões de comportamento da bacia similares àqueles
encontrados previamente à urbanização. Esta tendência é positiva, quando se olha o problema pela
ótica das mudanças climáticas. Ações de sustentabilidade da urbanização, em que as cidades,
tomadas como habitat do ser humano, se inserem no meio ambiente de forma não agressiva,
apontam um caminho a ser seguido por planejadores, técnicos multidisciplinares e gestores.
Referências:
Escola de Engenharia – Proposta COPPETEC PP/6637A à Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.
Estudos e Projetos de Obras Civis e Prontas Atuações de Controle Sistêmico das Enchentes na Bacia
Hidrográfica do Canal do Mangue. Rio de Janeiro, 1998.
Grossi, P. & Kunreuther, H. Catastrophe Modeling: A New Approach to Managing Risk. Springer. New
York, USA. 2005.
Leopold, L. B. Hydrology for Urban Land Planning. Geological Survey, USA., circular 554. 1965.
MASCARENHAS, F.C.B.; MIGUEZ, M.G. “Mathematical Modelling of Rural and Urban Floods: a
hydraulic approach”. In: Flood Risk Simulation. WIT PRESS, Gateshead. 2005.
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