Da Escravidão para a Liberdade

Transcrição

Da Escravidão para a Liberdade
Da Escravidão
para a Liberdade
Da Escravidão
para a Liberdade
F.T. Wright
1. edição: 3.000 exemplares
-1978 -
Excepto quando nao indicados, todos os textos
bíblicos foram tirados da Biblia, traduzida por
Joao Ferreira de Almeida, edição de 1957
PREFÁCIO
A presente obra baseia-se num estudo
bíblico que foi apresentado pela autor pela
primeira vez na Austrália, em 1965, e que
naquela ocasião foi gravado numa fita magnética.
Para aqueles ouvintes, um grupo ainda
bastante restrito, era este tema tão novo que,
apesar de um certo receio que uma transcrição não pudesse satisfazer um assunto tão
vivo como este, pediram que fosse publicado
por escrito.
Em virtude da grande necessidade de
poder transmitir esse importante tema aos
interessados de todo o mundo, foi então
publicada uma edição provisória, sob o título
»From Bondage to Deliverance«.
Essa primeira edição foi tão bem aceite,
que nos anos posteriores mais de dez mil
exemplares foram espalhados em todo o
mundo. E não somente isto, mas também foi
traduzida para o alemão, norueguês e zulu.
Depois da primeira edição se ter esgotado
e a procura ter continuado inalteradamente,
foi então elaborada a edição definitiva, sob o
título »From Bondage to Freedom«.
Essa edição é muito válida, visto ter como
base não somente a edição provisória, mas
também as experiências de muitos que provaram que a vitória sobre o pecado será
ganha por todos aqueles que fielmente seguem os princípios aqui apresentados.
Em todo o mundo há um grande número
de crentes que não se satisfazem com uma
mera teoria religiosa ou com argumentos
complicados, mas esperam que lhes seja entregue um guia prático de como podem alcançar o carácter perfeito de Jesus Cristo.
Com a presente obra, que pela primeira
vez é publicada na língua portuguesa, oferecemos aos crentes interessados um guia simples e prático.
Apesar do valor indiscutível deste guia
podem os leitores, em virtude de opiniões
particulares ou preconceitos existentes, ficar
privados das grandes bênçãos, destinadas a
cada um.
Pode, por exemplo, acontecer que pensam concordar com cada palavra escrita,
quando na realidade compreendem algo muito diferente. Queremos, portanto, encorajar
a todos a procurarem compreender o que
esta publicação realmente diz, e não o que
pensam que esteja a dizer.
Também há muitos que acham que a
entrega do velho homem do pecado exige
sacrifícios demasiado grandes. Quantos há,
hoje em dia, que estão realmente alarmados
com o caminho que o mundo leva e que
desejam uma inversão dessa direcção. Porém,
mesmo assim, não estão verdadeiramente
interessados no caminho que Deus indicou.
Oramos, no entanto, que, na leitura deste
volume, o estimado leitor seja um desses que
entrega tudo, para que possa obter essa
Pérola de grande apreço, e que se realize em
si, assim como em muitos outros, o que se
realizou no autor desta publicação.
OS EDITORES
Tradução do título original:
FROM BONDAGE TO FREEDOM
Edição revisada, Junho 1975
ÍNDICE
O PROBLEMA
7
A NATUREZA DO HOMEM
35
A SOLUÇÃO
43
LIBERTAÇÃO
53
O MEU TESTEMUNHO
65
NÃO DE CATIVEIRO
PARA CATIVEIRO
74
MANUTENÇÃO
77
VIGIAI
81
A LUTA É DO SENHOR
82
PALAVRAS FINAIS
84
O PROBLEMA
O presente estudo foi elaborado com o propósito de
mostrar aos atribulados do tempo actual a maneira
certa de como pode ser alcançada uma vida de vitória
sobre os pecados, que tão persistentemente marcam a
experiência diária da humanidade de hoje.
Não é um estudo que nos diz o que deveríamos ser,
pois a maioria das pessoas, com excepção daquelas que
se têm em conta de serem melhores do que realmente
são, não somente já sabem o que desejam, mas também
já estão lutando por esse objectivo. Mais ainda, em
virtude das diversas congregações cristãs terem uma
doutrina elevada, já aos seus membros é explicado, qual
a condição que deveriam ter, e não somente isto, mas
também a exigência da própria congregação para o
crente alcançar esse ideal, é também mais forte.
O problema comum de todos é: Como alcançarei eu,
o que segundo a minha mais profunda consciência
considero ser justo e sobre todas as coisas digno de ser
alcançado? Esta é a pergunta para a qual milhares de
pessoas estão procurando resposta certa.
Se o estimado leitor for uma dessas pessoas, então
este estudo é para si. Ele foi escrito não por alguém que
expôs simplesmente as suas teorias religiosas, mas que
acima de tudo procurou alcançar os ideais mais elevados duma vida cristã, achando finalmente o caminho
que o levou da escravidão da sua natureza ímpia para a
liberdade duma vida vitoriosa sobre o pecado. O tema
apresentado, além de ser segundo as Sagradas Escrituras, é tanto experimentado como provado. É ainda
um caminho que, uma vez apresentado a outras almas
em circunstâncias iguais, provou ser tão efectivo como o
foi para o autor desta publicação.
O mundo de hoje está envolvido em muitos problemas. Apesar dos homens procurarem intensamente
encontrar uma solução, não o conseguem por os
mesmos dia após dia se multiplicarem.
Quando os apóstolos Pedro e João estavam perante
os seus adversários judeus, declararam de Cristo o seguinte: »E em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre
os homens, pelo qual devamos ser salvos.« Act. 4:12
Não é por conseguinte o psiquiatra, o médico, nem
qualquer outro cientista ou sábio, que nos pode resolver
esses problemas. Somente na Palavra de Deus está
revelado tanto o poder salvador de Jesus Cristo, como
também a maneira como esse poder se pode tornar
nosso.
Na Santa Escritura temos o testemunho de alguém
que, através da própria experiência, conhecia o poder
salvador dessa Palavra. Foi Paulo que declarou: »Porque
não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o
poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê:
primeiro do judeu e também do grego.«
Havia uma razão pela qual ele não se envergonhou
de falar francamente no evangelho de Jesus Cristo:
»Pois é o poder de Deus.«
Pensemos em todas as características possíveis, das
quais Paulo podia ter falado, explicando o evangelho.
Podia tê-lo designado como teoria, como argumento ou
boas novas; porém, não se referiu a nenhuma dessas
definições. O evangelho »é o poder de Deus», proclamou. Era-lhe um poder, mas não um poder qualquer;
era-lhe »o poder de Deus«.
É essencial que logo no início deste estudo compreendamos o que é o evangelho realmente. Fazemos
bem em considerar a força e majestade desse poder. É o
poder de Deus pelo qual, através da Sua Palavra, foram
criados tanto os Céus como a terra.
O mesmo poder que através duma palavra dantes
criou os mundos, está no presente actuando no evangelho, pois diz a Palavra de Deus, »é o poder de Deus
para salvação«. Esse texto não especifica claramente do
que o evangelho nos salva. Mas existe ainda a necessidade de o especificar, estando tão claramente explicado
na Santa Escritura?
Quando o anjo do Senhor veio a José, marido de
Maria, mãe de Jesus, a fim de anunciar o nascimento
de Cristo, disse: »E dará à luz um filho e chamarás o seu
nome Jesus; porque ele salvará o seu povo dos seus
pecados.«
Para podermos compreender a Bíblia Sagrada, deve
ser comparado texto com texto. Verdades uma vez
declaradas não necessitam mais ser repetidas com as
mesmas palavras. Jesus é tanto o poder como o centro
do evangelho. Portanto se Jesus veio para salvar o Seu
povo dos seus pecados e se Paulo nos diz que o evangelho é o poder de Deus para a salvação, está claro que
se trata aqui da salvação do pecado.
Se um tal poder infinito, que não tem igual, está
disposto a salvar os seres humanos dos seus pecados,
como pode então haver uma desculpa para que o
pecado habite ainda em qualquer um de nós? Não há
desculpa alguma.
A maioria é indiferente no que diz respeito ao
problema do pecado, vivendo segundo o seu modo
preferido. O Senhor dá-lhes inteira liberdade para esco-
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lherem o que gostam. Porém, mesmo assim são culpados e colherão os resultados das suas erróneas acções.
Mas aqueles que lutam para que o seu carácter seja
segundo o molde divino, que têm as suas vidas cheias
de amor e alegria como resultado natural da sua experiência, podem saber que através de Jesus Cristo é-lhes
oferecido o poder de Deus, para os salvar dos seus
pecados. Portanto não necessitamos pecar. Podemos
viver uma vida de vitória perfeita sobre cada pecado, se
quisermos e se acreditarmos no poder salvador de
Deus. Apesar do evangelho ser para todos, não é o
evangelho o poder de Deus para todos, »pois é o poder
de Deus para salvação de todo aquele que crê: primeiro
do judeu, e também do grego.«
Somente para os crentes é o evangelho o poder de
Deus para a salvação do pecado. Para todos os outros é
uma simples teoria, uma história, uma doutrina ou algo
semelhante. No versículo seguinte continua o apóstolo
Paulo a mostrar-nos os resultados do poder do evangelho; »porque nele se descobre a justiça de Deus de fé
em fé, como está escrito: Mas o justo viverá da fé«.
Rom. 1:17
No evangelho está revelada a justiça de Deus. Meditemos um pouco sobre a palavra »revelada«. Indica que
a justiça de Deus é mostrada de modo a ser claramente
vista por todos aqueles que são observadores da cena.
Mas, onde está o evangelho de Cristo melhor revelado,
senão nas vidas daqueles que por Ele já foram transformados? Na vida do próprio Cristo, quando habitou
nesta terra, manifestou-se o evangelho como o poder de
Deus. Enquanto andou nesta terra, dia após dia salvou-O Deus do pecado, de modo que de fé em fé
revelou em Si a justiça de Deus. Portanto é Cristo o
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nosso grande exemplo para o que devemos ser; »porque
para isto sois chamados; pois também Cristo padeceu
por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as
suas pisadas.« 1.Pedro 2:21
Do mesmo modo como a justiça de Deus, através do
poder do evangelho, foi revelada dia após dia na vida de
Cristo, assim há-de ser revelada hoje, na vida dos Seus
seguidores.
Na vida de Jesus Cristo encontramos a revelação de
Deus, do que devemos ser. Ao olhar para essa vida, vê
nela cada professo filho de Deus o fluxo contínuo de
amor, perdão, graça, paciência e as demais virtudes
cristãs, de modo que deseja copiar esse ideal. Mas uma
vida de derrota e frustração leva ao pensamento de que
isto jamais possa ser possível. Desde o início deste
estudo, é importante compreender que o evangelho é o
poder salvador de Deus, que revelará na vida de cada
verdadeiro crente a justiça de Deus de fé em fé. Que
perspectiva tão maravilhosa de vitória pessoal através
do poder de Jesus Cristo, nosso Salvador.
Esse é o poder através do qual Jesus cumpre a Sua
promessa de expelir dum homem ímpio, corrupto, poluido, imperfeito, cheio de maldades e más suspeitas,
todos os frutos da carne, para o enriquecer de amor,
alegria, paz, delicadeza, humildade, paciência e todos
os demais frutos do Espírito. Este é o evangelho. Nada
a não ser isto, jamais pode ser o evangelho verdadeiro
de Jesus Cristo. Mas é esta a experiência dos que hoje
se dizem ser filhos professos de Deus?
Para encontrarmos a resposta, façamos a seguinte
experiência: Dirijamo-nos a um crente, que professa ser
filho de Deus, perguntando: »Diga-me francamente;
peca dia após dia?«
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Se a pessoa for realmente honesta, certamente responderá: »Sim, devo dizer que peco.« Segue então a
seguinte pergunta: «Quando comete um pecado, sentindo-se culpado, que faz?« Em resposta dirá: »Confesso-o,
peço ao Senhor que mo perdoe e ajude a não tornar a
cometê-lo.«
Seguimos com mais uma pergunta, avançando mais
um passo: »Depois de ter confessado o pecado, ter
pedido o perdão e a ajuda para não tornar a cometê-lo,
que pensa que irá acontecer? Pertence agora esse pecado ao passado ou existe ele ainda como anteriormente?
Com outras palavras: verifica que continua cometendo
esse pecado?«
Nesse momento um olhar de espanto aparece na
face daquele a quem perguntamos. »Porque me pergunta tal coisa?« Responde-nos. É claro que o mesmo
pecado ainda existe. Sou ainda um ser humano, e devo
para sempre lutar contra esse pecado. Repetidamente o
cometo e repetidamente devo confessá-lo.
Pode uma tal experiência ser chamada libertação do
pecado? A resposta deve ser, »não«. Essa é a experiência
de pecar e confessar, pecar e confessar, pecar e confessar.
Pensai nas vossas experiências do passado. Pensai no
pecado capital das vossa vida. Pensai como cometestes
o mesmo, como sentistes os remorsos, como procurastes
o Senhor para obterdes o perdão e a Sua ajuda, a fim
de vos guardar de o tornar a cometer novamente.
Pensai como o cometestes de novo e sempre de novo.
Não é verdade que a não ser que tenhais descoberto e
seguido o verdadeiro caminho da libertação, esse mesmo
pecado que era o vosso principal problema dez anos
atrás, ainda é o mesmo de hoje?
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Se com toda a franqueza podeis confirmar que era
assim, então destes o primeiro passo importante, para
que se realize em vós a libertação do pecado.
Não é a vontade de Deus que pequemos e todo
aquele que como crente conhece o evangelho como
poder de Deus para a salvação, não necessita pecar.
Hoje em dia há diferenças visíveis nas crenças de
cada uma das diferentes congregações cristãs. Cada
uma reclama, em virtude de acreditar numa certa doutrina, pregar o caminho verdadeiro da salvação. O facto
real, porém, é que, não importando quão correcta uma
doutrina possa ser, se alguém não compreender e não
experimentar o poder salvador do evangelho, encontra-se tão perdido como se nunca tivesse acreditado na
libertação do pecado.
Alguém pode ter uma certa teoria de religião, uma
certa crença, pode visitar uma certa igreja, um certo
templo, pode pertencer a uma certa congregação Cristã,
mas tudo isso, não trará necessariamente a salvação. O
que importa é o que a religião efectua na pessoa. Se o
evangelho ao qual nos temos ligado for menos poderoso
do que o evangelho de Jesus Cristo, então o nosso
evangelho é somente uma imitação do real.
Somente aqueles que possuem uma vitória pessoal
sobre o pecado, que por si próprios sabem o que
significa ser salvo dos seus pecados, e que nas suas
vidas espirituais vêem um crescimento real, têm o
evangelho de Cristo e podem por conseguinte pregá-lo.
Ninguém pode pregar o que não conhece. Somente um
homem justo pode ser um professor de justiça.
Mas o que deve ser reconhecido neste ponto é que a
obra da salvação envolve a nossa colaboração intelectual.
Há uma obra que Deus faz e há outra que nós devemos
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fazer. Deus está sempre pronto a fazer a Sua parte. O
problema é que os homens não compreendem qual a
sua, impossibilitando assim a Deus de fazer a d'Ele.
Que temos uma certa parte a cumprir é-nos mostrado nas seguintes palavras de Cristo: »E conhecereis a
verdade, e a verdade vos libertará.« João 8:32
O verdadeiro propósito deste estudo é mostrar-nos a
verdade que nos libertará. Portanto, entremos directamente neste estudo, numa linguagem tão clara e simples
quanto possível.
A primeira pergunta que devemos fazer é: »O que é
pecado?« Para melhor compreensão seja dito que a
pergunta não é, »o que são pecados «, mas »o que é
pecado?« À pergunta anterior certamente responderíamos: »Assassínio, mentira, roubo, etc. Mas a resposta à
segunta pergunta é diferente. Não exageramos ao dizermos que, se não pudermos responder correctamente
a esta pergunta, não nos será possível encontrar o caminho da libertação do pecado, porque antes de podermos encontrar a solução, devemos compreender qual o
problema a ser resolvido.
Mesmo assim é comum pessoas pensarem, que
sabem responder a esta pergunta. Ao serem interrogadas, respondem imediatamente com as seguintes
palavras da Santa Escritura: »O pecado é a transgressão da lei.« l.João 3:4
Esta definição sobre o que é pecado, é segundo a
Escritura; por conseguinte, tem de ser correcta, desde
que compreendamos tudo o que o texto realmente diz.
A palavra »transgressão«, dá-nos a entender a ideia
duma acção. Portanto, a compreensão comum deste
versículo é que o pecado seja uma acção de fazer mal.
Devido a estas más acções a condição do malfeitor
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oportunidade para explicar-lhes o que é o pecado.
Disse: »E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertar á.« João 8:32
Esses homens mostraram a sua ignorância a respeito
dos princípios básicos do problema do pecado, dizendo:
»Somos descendentes de Abraão, e nunca servimos a
ninguém; como dizes tu: Sereis livres? Respondeu-lhes
Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que todo
aquele que comete pecado é servo do pecado.« João
8:33,34. Na resposta de Cristo temos a definição
completa sobre o que é pecado.
Aqui o pecado é identificado, não como uma acção,
mas como um senhor; porque se o pecador é servo do
pecado, então o pecado tem de ser o senhor do pecador.
Para ser tal senhor, tem o pecado que ser um poder,
porque ninguém pode reinar sem o devido poder; sobretudo quando os subjugados — os pecadores — não se
querem entregar livremente.
O pecado não é um senhor que recebe um serviço de
amor dos que lhe estão sujeitos, mas um que tem de ser
forçado. A palavra original em grego, da qual a palavra
»servo« é traduzida, era de facto a palavra normalmente
usada para um escravo, sendo essa portanto usada nas
traduções modernas.
A nossa definição sobre o pecado deve ser entendida
como segue: o pecado é um tirano que contra a nossa
vontade reina sobre nós, de modo que nos encontramos
na condição de escravidão. Para este problema, o perdão, no sentido em que esta palavra é normalmente
entendida, não é a solução. O que necessitamos é de
libertação. Em complemento à primeira definição simplificada com a definição acima descrita, obtemos este
gráfico:
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Este é o estado do homem do mundo, antes de
chegar ao conhecimento da lei de Deus. Ele não se
aflige em ser um pecador.
Mas finalmente vem o momento em que a lei entra
na sua vida e ele fica conhecedor das suas justas
exigências. Esse primeiro passo em direcção a Cristo —
o conhecimento da lei — pode chegar até ele através do
estudo da Santa Palavra, através dum pregador vivo ou
duma outra maneira. É importante saber que caso não
chegue ao conhecimento da lei, jamais encontrará a
Cristo como Salvador do pecado.
O conhecimento da lei de Deus leva a um outro
conhecimento, ou seja à convicção do seu estado interior.
Este é o segundo passo essencial para Cristo.
A convicção leva ao arrependimento, desde que não
seja abafada ou erguida uma resistência contra a obra
do Espírito Santo. Isto acontece porque não é agradável
de se ver como Deus nos vê. A tendência natural da
natureza humana é de rejeitar tais revelações como
sendo inoportunas. Um caso destes encontramos na
história de Felix e sua mulher Drusila, conforme está
descrito em Actos 24:24-27. »E alguns dias depois,
vindo Felix com sua mulher Drusila, que era judia,
mandou chamar a Paulo, e ouviu-o acerca da fé em
Cristo. E tratando ele da justiça, e da temperança, e do
juízo vindouro, Felix espavorido, respondeu: Por agora
vai-te, e em tendo oportunidade te chamarei. Esperando
ao mesmo tempo que Paulo lhe desse dinheiro, para
que o soltasse; pelo que também muitas vezes o
mandava chamar, e falava com ele. Mas passados dois
anos, Felix teve por sucessor a Porcio Festo; e, querendo comprazer aos judeus, deixou a Paulo preso.«
O facto de Felix ter ficado espavorido é uma evi-
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dência clara de que tinha a convicção profunda, e não
somente isto, mas o seu estado natural o teria levado ao
arrependimento, se não tivesse rejeitado essa revelação.
A sua falta foi mandar embora o apóstolo no tempo em
que mais necessitava do ministério dele. Queiramos ter
muito cuidado a fim de que, quando o Senhor nos
mostrar o nosso verdadeiro íntimo, reconheçamos não
somente o que somos, mas que também não rejeitemos
o testemunho fiel do espírito do verdadeiro arrependimento que o Senhor nos dará ao mesmo tempo.
Arrependimento significa não somente odiarmos o
pecado, mas desviarmo-nos dele. Não é somente odiar o
pecado por causa do que faz em nós. Judas e Balaão
odiaram ambos as consequências do pecado, mas não o
próprio pecado.
Assim como odiamos a sujidade por ser sujidade,
havemos de odiar o pecado por ser pecado. Assim
fazendo, significa que amaremos a justiça por ser justiça. Porém, isso não é natural ao ser humano. Não é
algo que possamos criar em nós próprios. Arrependimento é o dom de Deus. Este é o sentido da Escritura
que declara: »Deus com a sua dextra o elevou a Príncipe
e Salvador para dar a Israel o arrependimento e remissão dos pecados.» Actos 5:31
Arrependimento, uma vez recebido por Deus, como
resultado da actuação do Espírito Santo, será acompanhado da confissão dos pecados.
Estes são os primeiros quatro passos para Cristo:
conhecimento, convicção, arrependimento e confissão.
É verdade que muitos entraram em cada uma destas
experiências segundo a melhor maneira por eles conhecida, pensando que haviam cumprido todas as exigências necessárias para a libertação do pecado; porém,
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mesmo assim verificaram que não estavam de modo
algum libertos do mesmo. Certamente teriam esses
crentes ganho a libertação, se tivessem obtido essas
experiências, conforme a designação de Deus. O problema é que muitos não compreenderam o que cada uma
dessas experiências realmente significa. Chegaram de
facto a um arrependimento e confissão, mas falharam
em compreenderem que deve haver um arrependimento
e confissão mais profundo acerca do que somos e uma
confissão do mesmo.
Pensemos no momento comovente, quando pela
primeira vez nos chegou o conhecimento da verdade de
Deus. Que maravilhosa e firme aparecia a verdade de
um lado, mas que poder convincente e terrível mostrava
do outro lado. Vimos todo o passado da nossa vida,
cheio de egoísmo e pecado, e com arrependimento
profundo desejamos que todo esse mal termine para
sempre. Decidimos como os israelitas do passado, que
iremos obedecer a cada um dos mandamentos de Deus.
«Tudo o que o Senhor tem falado faremos e obedeceremos.« Ex. 24:7. Decidimos obedecer a todos os
mandamentos de Deus e após essa decisão verificamos
que de facto algum sucesso obtivemos no que diz
respeito a certas acções exteriores: grandes vitórias
foram ganhas, por exemplo, sobre as atracções do
mundo que anteriormente nos haviam atraído; mas o
que nos fez estranhar foi que a impaciência, o mau
génio e outros problemas íntimos permaneceram. Em
virtude disto chegamos à convicção profunda da permanência no pecado e que a nossa experiência seja
tentar e falhar, tentar e falhar, tentar e falhar. Confessamos os pecados e decidimos que a partir desse
momento seria diferente; mas verificámos que o não
era, surgindo sempre os mesmos problemas.
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Esta é justamente a imagem que o apóstolo Paulo
descreve em Romanos 7:15-24. »Porque o que faço não
o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que
aborreço isso faço. E, se faço o que nào quero, consinto
com a lei, que é boa. De maneira que agora já não sou
eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim.
Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não
habita bem algum: e com efeito o querer está em mim,
mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem
que quero, mas o mal que não quero esse faço. Ora, se
eu faço o que não quero, já não o faço eu, mas o pecado
que habita em mim. Acho então esta lei em mim; que,
quando quero fazer o bem, o mal está comigo. Porque,
segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus;
mas vejo nos meus membros outra lei, que batalha
contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo
da lei do pecado que está nos meus membros. Miserável
homem que eu sou! quem me livrará do corpo desta
morte?«
Paulo não podia ter descrito a nossa experiência do
passado, como filhos professos de Deus, melhor do que
fez nestes versículos. Quantas vezes li estas palavras aos
ouvintes, e me responderam, dizendo: »Esta é exactamente a minha experiência. Paulo, quando escreveu
estas palavras, escreveu a meu respeito.«
Após termos lido esta passagem, podemos ver que
Paulo tinha todos os primeiros passos para Cristo. As
suas repetidas confissões mostram claramente que conhecia tanto a lei como a própria condição perante ela.
No mesmo capítulo falou da lei nos seguintes termos:
»E assim a lei é santa, e o mandamento santo, justo e
bom.« Vers. 12. Disse mais ainda: «Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido
sob o pecado.« Vers. 14
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Como constatamos mais acima, este estudo é o
conhecimento da lei, acompanhado de um reconhecimento de nós próprios. Por isso é que Paulo, após ter
constatado que a lei é espiritual, confessa: »mas eu sou
carnal, vendido sob o pecado.«
Tais convicções são seguidas de arrependimento, a
não ser que sejam impedidas. Paulo teve sem dúvida o
arrependimento sincero, porque conforme o seu sincero
testemunho, odiava o pecado: »porque o que faço não o
aprovo.» Ainda mais; ele afastava-se do pecado tanto
quanto possível. Sem dúvida é este um arrependimento
verdadeiro, e não somente isto, esse arrependimento foi
acompanhado pela respectiva confissão, porque tudo
neste versículo é de facto uma confissão.
É então evidente que Paulo deu esses quatro passos
para Cristo: conhecimento, convicção, arrependimento
e confissão. É igualmente evidente que apesar disto não
alcançou a libertação do pecado. È muito importante
reconhecermos isto, porque existe o grande perigo de
pensarmos que por termos dado esses quatro passos a
nossa salvação já esteja assegurada. Esta passagem da
Santa Escritura mostra-nos claramente que é possível
alguém dar esses quatro passos e mesmo assim permanecer um escravo do pecado, estando portanto ainda
debaixo do poder daquele senhor do pecado, que nos
domina contra a nossa vontade. Esta é de facto a
experiência de pecar e arrepender-se, pecar e arrepender-se dos mesmos pecados ano após ano.
Quando uma pessoa chega ao conhecimento da
verdade de Deus, quando experimenta a convicção do
pecado, quando se arrepende dele e o confessa, acredita
ter encontrado a salvação, apesar de ainda ser um
escravo com a sua natureza antiga e pecaminosa. O
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testemunho de Paulo em Romanos sete é uma confirmação desse facto. Paulo foi sem dúvida um grande
homem de Deus. Compreendeu o evangelho e o plano
da salvação e estará no reino de Deus; porém, mesmo
assim testificou que era carnal, vendido sob o pecado.
Não fazia o que sabia que era justo, mas viu-se a si
próprio fazendo coisas que sabia serem pecado. Se essa
foi a experiência de Paulo naquele tempo, quando se
havia tornado um verdadeiro cristão, por conseguinte
com a esperança da salvação, então devemos esperar,
que também a nossa experiência cristã seja a mesma
descrita em Romanos sete. Com outras palavras, devemos acreditar que a experiência do homem de Romanos
sete, seja a experiência dum filho de Deus, verdadeiramente renascido.
Para ilustrar melhor este ponto, permitam-me contar urna experiência que uma vez tive. Recebi um dia
um convite para falar sobre o caminho da libertação a
um homem que tinha uma posição elevada na sua
igreja. Ainda mais: ele era um lider duma instituição
religiosa e era conhecedor da doutrina da sua igreja e
certamente cumpria a lei no que diz respeito às exigências exteriores. Por anos pregara ao seu povo. Porém,
quando lhes li as palavras de Romanos sete, disse-me:
»Isto é a descrição certa da minha experiência, desde
que me entreguei ao Senhor. Eu nasci com mau génio e
ainda tenho esse mesmo problema. Perco o controle
sobre mim mesmo. Sinto a convicção do pecado. Confesso-o e decido que nunca mais o farei. Depois, porém,
vem novamente o poder da tentação e perco-o outra vez
e sempre de novo uma e outra vez. Posso realmente
sentir como Paulo em Romanos sete.«
Este senhor foi tão franco e sincero como o foi
24
Paulo. Sem querermos ser juizes é-nos lícito perguntar
se um homem destes se levantará na ressurreição dos
justos, ou se estará eternamente perdido? Antes de
tentarmos responder a esta pergunta devemos compreender qual a experiência demonstrada em Romanos
sete. Aqui é-nos apresentado um homem, que conhece a
lei de Deus e a guarda tanto quanto possível. Nos seus
deveres religiosos é fiel semana após semana. Ocupa
um lugar elevado na igreja, paga os seus dízimos e
ofertas. É activo nos projectos missionários para o
desenvolvimento do evangelho. É altamente respeitado
pelos membros da igreja, mas mesmo assim confessa
que ainda é um escravo da sua própria natureza interior
e que não pode cumprir as coisas que segundo sabe
perfeitamente deveria cumprir.
Este é o homem de Romanos sete. Não é o pecador
voluntário do mundo, que pouco se importa das coisas
do Senhor e da eternidade. Sabemos que o homem do
mundo, enquanto permanecer neste estado, não participará da ressurreição. Mas como é a situação do homem
de Romanos sete? Esta é a pergunta principal.
Aparte do forte argumento da vida de Paulo, há
dois faclores que influenciarão fortemente a nossa atenção, porque parecem indicar que aqui se trata da experiência dum verdadeiro filho de Deus. Em primeiro
lugar há o testemunho que a nossa própria vida. durante
todo o tempo em que pertencemos à igreja, tem sido
conforme o que está escrito em Romanos sete. Gostamos
de pensar em todos os sacrifícios que para a verdade
fizemos e estamos relutantes em admitir que tudo isto
para nada tenha servido, pois se não recebermos a vida
eterna, certamente que tudo terá sido em vão.
Pensamos também em todos aqueles que morreram
25
e que, como sabemos, estavam sob a experiência de
Romanos sete. Se chegamos ao ponto de acreditarmos
que o homem de Romanos sete não é um filho de Deus,
temos então receio de nunca mais os vermos. Tenho
visto pessoas que somente por essa razão se prenderam
à fé de que o homem de Romanos sete é um verdadeiro
filho de Deus. Não obstante, a sua recusa em acreditar
nesse facto não muda a situação nem por um pouco.
A pergunta se a experiência de Romanos sete é a de
um verdadeiro filho de Deus ou não, está com toda a
importância perante nós.
Sempre quando se pergunta isto, há três grupos com
respostas distintas. Há poucos que dizem sem hesitar
que certamente participarão na ressureição dos justos.
A seguir há aqueles que não têm uma posição definida,
e finalmente há os que dizem que esse homem, caso
morra nesse estado, não terá a vida eterna.
É evidente que há uma certa ignorância sobre o
tema, se a experiência de Romanos sete é a daqueles
que serão salvos ou não. É muito importante que essa
questão seja bem clara para todos os que procuram a
vida eterna. Existe uma razão para isso. Considerem a
situação perigosa daquele que sabe que está na experiência descrita em Romanos sete e que ao mesmo
tempo acredita que essa seja uma experiência cristã
verdadeira, enquanto, como sabemos, não é. Uma tal
pessoa ficará contente com o que é e nada mais
procurará. Somente aqueles que procuram, encontrarão. Por isso, o que não procurar, jamais encontrará.
Quando no grande dia do juízo descobrir que se tinha
apoiado sobre uma esperança errada, a sua perda será
terrível. Nada há de mais terrível do que viver e pensar
que tudo está bem, enquanto descobrir demasiado
tarde que tinha seguido uma doutrina falsa.
26
É muito importante que as interpretações e opiniões
humanas não tenham lugar na determinação desta
resposta e que a Palavra de Deus seja a única autoridade. Nela, e somente nela, é o lugar onde a resposta certa
pode ser encontrada.
O homem de Romanos sete está sem dúvida na
escravidão. Ele sabe o que deveria fazer, mas vê que lhe
é impossível fazê-lo. De modo algum é um pecador
voluntário, mas involuntário. O que importa é que ele é
um pecador, que está servindo ao pecado e está por isso
ao serviço de Satanás.
Se está servindo a Satanás, então não pode servir a
Deus, porque »ninguém pode servir a dois senhores;
porque ou há-de odiar um e amar outro, ou se dedicará
a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a
Mammon.« Mat. 6:24
Se não está servindo a Deus, como pode ter a salvação? Outra vez a resposta é que não pode. Por conseguinte, é claro que o homem de Romanos sete não tem
a salvação.
Mas isto é somente um testemunho a respeito da
questão, que o homem de Romanos sete não tem a
salvação. Pode ser convincente, porém, não é suficiente,
porque a regra bíblica é que »pela boca de duas ou três
testemunhas toda a palavra seja confirmada.« Por
conseguinte, devemos continuar a procurar mais testemunhos bíblicos a este respeito.
Nos versículos finais de Romanos sete o apóstolo
Paulo chega ao fim da sua descrição sobre a experiência
de estar na escravidão do poder do pecado. No desespero, no qual a experiência o deixou, exclama: »Miserável homem que eu sou! quem me livrará do corpo desta
morte?«
28
E.J. Waggoner, no seu livro, «Christ and His Righteousness«, pág. 86 e 87, pergunta: »É a verdadeira experiência cristã um corpo de morte tào terrível que a alma
é constrangida a clamar por libertação? — Não, certamente que não. Liberta Cristo duma verdadeira experiência cristã? Não, de facto não. Então a servidão do
pecado, da qual o apóstolo se queixa no sétimo capítulo
de Romanos, não é a experiência dum filho de Deus,
mas dum servo do pecado. Cristo veio para libertar o
homem deste cativeiro. Ele não veio para nos libertar de
lutas durante esta vida, mas para impedir de sermos
vencidos e para nos dar a possibilidade de sermos fortes
no Senhor e no poder da Sua Omnipotência, a fim de
podermos agradecer ao Pai. > q u e nos libertou do poder
da escravidão e nos transformou para o reino do Seu
Filho Amado«, através de cujo sangue temos a salvação.«
O argumento empregado por E.J. Waggoner é que
Cristo nunca liberta duma verdadeira experiência cristã.
Mas em Romanos sete está Paulo pedindo para ser
liberto da sua experiência. O facto dele fazer isto, na
luz da verdade que Cristo nunca liberta duma verdadeira
experiência crista, é uma prova positiva que essa experiência não é a de um verdadeiro filho de Deus. Este é o
segundo testemunho.
Voltemos então a nossa atenção para o terceiro
testemunho. Quando Paulo clamou pela libertação,
sabia que em Deus não há somente salvação, mas que o
evangelho é o poder de Deus para salvar dos pecados. À
pergunta, »quem me livrará?«, podia ele responder:
«Dou graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor.«
Rom. 7:25.
Depois, de repente, muda toda a situação. Ele interrompe somente para somar a experiência de Romanos
29
sete: »Assim que eu mesmo com o entendimento sirvo à
lei de Deus, mas com a carne à lei do pecado.« Esta é a
experiência certa do homem de Romanos sete. Ele sabe
o que é justo e com a sua mente decide que quer servir
a Deus. Ele acredita nas verdades de Deus, quer ser leal
ao Senhor e entregar-se ao Seu serviço, mas as actividades reais da sua vida, apesar de saber que estão
erradas, são devotadas ao serviço do pecado.
Depois de ter resumido essa experiência, descreve
Paulo aquela experiência que o levou à libertação do
pecado. »Portanto agora nenhuma condenação há para
os que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a
carne, mas segundo o espírito. Porque a lei do espírito
de vida, em Cristo Jesus, me livrou da lei do pecado e
da morte.« Rom. 8:1,2.
Nos versículos restantes do capítulo fala ele da liberdade, vitória e filiação com Deus, terminando com o
testemunho triunfante: »Mas em todas estas coisas
somos mais que vencedores, por aquele que nos amou.
Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida,
nem os anjos, nem os principados, nem as potestades,
nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a
profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá
separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus
nosso Senhor.« Rom. 8:37-39
É impossível ler Romanos sete e depois Romanos
oito, sem ver que são de facto duas experiências distintas. Romanos sete é a experiência dum escravo que
contra a sua vontade é constrangido a fazer as obras do
pecado, enquanto o capítulo seguinte relata a história
de uma pessoa liberta do poder do pecado, que faz o
que sabe ser justo e o que deseja fazer. Ambos não
podem ser a descrição de uma experiência cristã. Uma
30
ou a outra pode ser, mas não ambas. Enquanto pode
ter havido alguma dificuldade em ver que a experiência
de Romanos sete não é a experiência de um filho de
Deus, não deveria tal dificuldade existir no que diz
respeito a Romanos oito. É de facto bem claro que a
experiência descrita nesse capítulo é a de um verdadeiro
cristão. Em Romanos oito, »nenhuma condenação há«
(vers. 1); ele é livre »da lei do pecado e da morte«
(vers. 2); a justiça da lei está sendo cumprida nele, e ele
não anda »segundo a carne, mas segundo o espírito«
(vers. 4); ele é um filho de Deus (vers. 14-16), portanto
um herdeiro de Deus e coherdeiro de Cristo (vers. 17); e
ele é mais do que vencedor »por Aquele que nos amou«
(vers. 37)
Esta é uma verdadeira experiência cristã. Ninguém
deveria ter a mínima dificuldade em o ver. Mas que
diferente é esta experiência da que está descrita em
Romanos sete. Por conseguinte, se Romanos oito é a
descrição de uma experiência cristã, Romanos sete deve
ser a descrição de algo diferente. Não pode ser a experiência de um cristão.
Mas estas ainda não são todas as provas para apoiar
estes factos. No final de Romanos sete pede Paulo para
ser liberto, e quando a grande mudança veio, agradeceu
ao Senhor. Então o seu testemunho imediato foi: »Portanto agora nenhuma condenação há para os que estão
em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas
segundo o espírito.« Rom. 8:1
É conveniente dar ênfase ao significado de duas
palavras neste texto. Elas são: »portanto« e »agora«. A
primeira é uma palavra muito comum na construção
das frases de Paulo. Repetidamente apresenta ele certos
factos, para depois tirar conclusões. Como ele tira a
31
conclusão, inicia a frase com a palavra »portanto«. O
que diz de facto, é o seguinte: Por causa destes factos
que já foram citados, devem seguir as seguintes evidências.
Neste caso particular descreveu ele a experiência de
estar na servidão ao poder do pecado, e o seu clamor
para a libertação do mesmo. Como conseguiu alcançar
a sua finalidade, segue o que de outro modo não podia
ser. «Portanto agora nenhuma condenação há.« A palavra »agora« dá ênfase à palavra »portanto«, porque indica que houve uma mudança. Tudo era assim e assim,
mas agora mudou. Para que todos compreendam a
razão pela qual agora nenhuma condenação há, é citado
que »a lei do espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou
da lei do pecado da morte.«
Em Romanos sete, deu ele um testemunho diferente.
Lá, com certeza, não estava livre da lei do pecado e da
morte. Agora está, e por estar, nenhuma condenação
há. Admite-se, portanto, que se não estava livre da lei
do pecado e da morte, estava então sob a condenação.
Há uma palavra que significa o mesmo que menhuma condenação« e essa palavra é »justificação«.
Temos visto que, onde há liberdade da lei do pecado
e da morte, como em Romanos oito, depois de ter sido
liberto da servidão de Romanos sete, nenhuma condenação há. Isto significa que há justificação. Igualmente
se pode dizer que em Romanos sete há condenação, o
que significa que não há justificação. Isto mostra então
que o homem de Romanos sete não tem justificação
nem perdão. Se ele não os tem, como pode ter então a
possibilidade de participar na ressurreição dos justos?
Queira o leitor considerar cuidadosamente o que
isto significa no que diz respeito à sua própria experiên-
32
cia. Caso seja um dos que neste momento deve testificar, que Romanos sete é uma descrição perfeita do seu
estado espiritual, pode então saber que não terá salvação do pecado, e se morrer neste instante, não participará na ressureição dos justos.
Quando alguém que por muito tempo é um fiel
membro duma igreja, sendo activo nos seus trabalhos
missionários, suportando liberalmente os seus programas, sendo fiel na sua crença e tendo uma boa reputação
entre os vizinhos, descobre que não tem salvação, está
no perigo de cair em grande desespero. Mas é essencial
que este conhecimento doloroso venha, a fim de que
seja compreendido quais os passos decisivos que devem
ser dados na procura do que o Senhor nos tem
preparado.
Há duas reacções possíveis ao chegar-se a essa
realização.
A tendência da natureza humana é rejeitar o que
está contra os hábitos estabelecidos e enraizados na
vida. Depois de ter permanecido por tanto tempo numa
segurança, tanto confortável como enganadora dum
bem estar, há um forte desejo de não enfrentar a
realidade descoberta.
Não queremos crer que isto seja a verdade. Portanto
existe o perigo real de nos voltarmos para o que nos é
mais aceitável e agradável.
Caso caíamos nessa tentação, veremos que uma
dúzia de argumentos nos parecem estar em contradição
com a Palavra de Deus. Diremos com ansiedade: »Porquê? Certamente que sou um cristão! Vejam somente o
que deixei para seguir a Cristo; os meus conhecimentos
profundos das Escrituras, o tempo empregado nos
estudos e orações, o lugar de responsabilidade que
ocupo na igreja. . . e. . . e. . .« .
33
Não há erro mais fatal que possa ser cometido, a
não ser este. Houve pessoas no passado que perderam a
vida eterna, por não terem tido a coragem de neste
ponto enfrentar a verdade. O resultado foi que o Espírito de Deus não pôde fazer mais por eles e as impressões
feitas se dissiparam.
A outra reacção que é muito frequente, é a do desespero fatal. Pela nossa honestidade reconhecemos na
Palavra de Deus que a experiência em que nos encontramos não é salvação. O sentimento de estarmos perdidos, porém, sobrevem-nos e então sentimos que
estamos eternamente separados de Deus.
Chegarmos até este ponto é um passo muito positivo
para nós. Ter sido levado a tal experiência é a obra do
Espírito Santo. O Espírito sabe que nos é essencial, que
a nossa verdadeira condição nos seja revelada. É da
maior importância que o brilho duma segurança falsa
seja destruído para que o Espírito de Deus possa fazer
em nós a obra indicada. Lamentavelmente há muitos
que vivem na condição de Laodicéia, como está descrito
em Apocalipse: »Eles não sabem que são desgraçados, e
miseráveis e pobres, e cegos, e nus.« Apoc. 3:14-22
Isto, porém, deve ser reconhecido, porque se o não
for, permanecerá a alma na sonolência de uma segurança errónea, até que seja demasiado tarde.
Portanto, alegremo-nos e sejamos felizes, quando
alcançamos este ponto, de vermos que estamos perdidos, desesperada e eternamente perdidos. Alegremo-nos,
porque há um caminho de libertação do poder do pecado. Não necessitamos de permanecer na experiência de
Romanos sete, onde estão vencidos e frustrados os nossos
desejos sinceros de servirmos ao Deus vivo. Mais ainda,
esse caminho de libertação não é um segredo. Não era a
34
intenção deste estudo levar-vos ao ponto do desespero,
sem continuarmos esclarecendo o caminho da libertação. Rogamos que continuem o estudo deste tema, até
que a fé abrace o poder de Deus, a fim de que sejam
curados.
Tendo então estabelecido que o homem de Romanos
sete não é certamente um cristão, devemos compreender
qual a razão, pois apesar de saber a lei e de desejar
guardá-la, não é capaz de o fazer. Essa compreensão é
uma parte importante da solução do problema.
A NATUREZA DO HOMEM
Somente quando tivermos o conhecimento certo da
natureza do homem, podemos compreender o problema
do pecado. É verdade que o homem em si é muito
complexo e que nele há uma relação íntima entre todas
as partes. Deve, porém, ser compreendido e considerado
por nós, que apesar disto existe ao mesmo tempo uma
distinção clara entre certas partes importantes.
A primeira parte que queremos considerar é o nosso
intelecto. Nele, através dos vários sentidos, como a vista,
o ouvido, o olfacto, o tacto e o paladar, recebemos certas informações. Por este intermédio nos são transmitidas as mensagens de Deus, a fim de sabermos o que
necessitamos para a nossa salvação e que o Senhor
pretende fazer por nós.
Mas o intelecto não aceita tudo que lhe é oferecido.
Sabemos por experiência própria que certas coisas são
aceites, enquanto que outras são rejeitadas. Serão até
rejeitadas verdades que mais necessitamos, caso o
intelecto já se tenha habituado a acreditar na mentira,
ou por a aceitação da verdade ser demasiadamente
inconveniente ou dispendiosa.
Para reagirmos correctamente tem que o intelecto
entrar em acção e tirar conclusões certas. Essas conclusões exigem depois que tomemos decisões, as quais por
sua vez resultam em acções correspondentes. Isto é o
estabelecimento do nosso querer.
No que diz respeito ao nosso corpo deve esse obedecer e cumprir as decisões tomadas pelo intelecto. Para o
propósito do presente estudo no entanto é suficiente
compreendermos que o corpo é um instrumento designa-
36
do para cumprir os propósitos do intelecto. Será no
estudo sobre a obra da reforma, onde veremos que o
corpo também é capaz de exercer pressões sobre o
intelecto, sobretudo quando se trata de satisfazer as
suas necessidades de gratificação ou preservação própria.
Que o corpo humano é um instrumento é-nos mostrado nas seguintes palavras: »Nem tão pouco apresenteis os vossos membros ao pecado por instrumentos de
iniquidade; mas apresentai-vos a Deus, como vivos dentre os mortos, e os vossos membros a Deus, como instrumentos de justiça.« Rom. 6:13
Não deveria ser difícil compreendermos que o corpo
deve ser o servo do intelecto. Pensemos numa ilustração
simples: Como resultado de informações e decisões
resultantes, desejamos viajar do lugar presente para
outro. As informações colhidas dizem-nos que para
viajarmos devemos ir à estação de caminho de ferro. O
intelecto não pode ir lá sozinho, mas pode influenciar
os membros do corpo a nos transportar até lá. O corpo
portanto obedece às directrizes do intelecto.
Muitos outros exemplos podiam ser citados. Poderíamos contar muitas coisas semelhantes da vida diária.
Mas, ao contrário de tudo isto, no caso do homem de
Romanos sete, o corpo não obedece ao que o intelecto
deseja fazer. Lemos a declaração clara no versículo
quinze: «Porque o que faço não aprovo; pois o que
quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço.«
Todas as acções são realizadas através do corpo
físico. Mas o que no caso presente (Romanos sete) é
feito, não é o desejado; e o que o intelecto deseja fazer,
o corpo não faz, antes faz o que odeia fazer. É evidente
que é no intelecto onde o ódio contra isso existe, que ele
37
se recusa. Aqui temos um caso claro duma situação em
que o intelecto sabe o que deveria ser feito, deseja fazêlo, manda instruções aos membros do corpo para actuarem, mas para sua surpresa verifica que o corpo age
contrariamente às indicações recebidas.
Não deve haver dificuldade em compreendermos o
exemplo acima citado, porque estou certo que todos nós
já temos passado por semelhante experiência. Caso concluamos que estamos ainda na experiência de Romanos
sete, então sabemos o que isto significa: Temos por
exemplo resolvido nunca mais falarmos palavras apressadas e ofensivas. Somos realmente sinceros nas nossas
intenções. Tomamos essa decisão e por algum tempo
tudo corre bem; mas chega o dia em que a língua, esse
instrumento insubordinado, exprime palavras injuriosas,
palavras de recriminação amarga contra o nosso semelhante.
Sem dúvida, o homem de Romanos sete sabe o que
é certo. Conhece a lei de Deus e tem prazer nas grandes
verdades da Palavra de Deus. »O querer está em mim,
mas não consigo realizar o bem.« Rom. 7:18
A questão a ser enfrentada é a seguinte: Qual a
razão que na situação como está descrito em Romanos
sete. não obedece o corpo às directrizes do intelecto?
Quando essa razão for reconhecida e compreendida,
então será dado um passo decisivo para solucionar o
problema.
A experiência de Romanos sete não é positiva. Deus
não criou um homem, cujo corpo esteja em rebelião
com o intelecto. Deus deu ao homem o corpo para que
cumpra os desejos do intelecto e obedeça à sua vontade.
Mas apesar de não estar isto relatado em Romanos sete,
está descrito em Romanos oito. Ali vemos o crente
38
chegar ao ponto de fazer com o instrumento, o que no
seu intelecto sabe estar certo.
Neste ponto a maioria das pessoas conclui que o
problema é que a sua carne é demasiadamente fraca
para conseguir que o corpo esteja sujeito ao intelecto.
Pensam que deveriam exercer somente mais força de
vontade, a fim de que o corpo seja sujeito ao intelecto.
Mas estão enganados, porque não importa quanto
esforço seja exercido, pois rapidamente será reconhecido
que é impossível vencer o problema desta maneira. A
solução deste problema não se encontra na actuação da
força de vontade ou numa determinação mais forte. Ela
encontra-se num outro campo da natureza humana, que
ainda não foi mencionado neste estudo.
Cada ser humano tem um intelecto e um corpo.
Além disto tem algo mais que tem uma relação muito
significativa na vida de cada um. A identificação assim
como o isolamento deste algo é fácil, e muitos há que
negam por isso a sua existência como sendo uma
entidade separada. Trata-se da natureza carnal do
homem. É comum os homens identificarem a natureza
carnal e humana como sendo uma só. Esse é o erro
principal que lhes impede de encontrarem a libertação
da escravidão do pecado.
Por ser a identificação e o isolamento deste algo da
nossa vida tão importante para termos sucesso na busca
da vitória sobre o pecado, ser-lhe-á dedicado uma
pequena parte deste estudo, a fim de mostrar a sua
existência e de a separar da natureza humana e física.
No capítulo sete da epístola aos Romanos referiu-se
Paulo com grande certeza e clareza às três partes:
»Porque, segundo o homem interior, tenho prazer na lei
de Deus; mas vejo nos meus membros outra lei, que
39
batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende
debaixo da lei do pecado que está nos meus membros.«
Rom. 7:22,23
Consideremos estes versículos com cuidado. Paulo
testifica aqui que, segundo o homem interior, tem
prazer na lei de Deus. Este prazer, como temos visto
mais acima, pode haver somente no intelecto. Na continuação, porém, confessa Paulo: »Mas vejo nos meus
membros outra lei, que batalha contra a lei do meu
entendimento, e me prende debaixo da lei do pecado
que está nos meus membros.« Rom. 7:23. Enquanto o
intelecto tem prazer na lei de Deus, encontra-se aqui
nos membros outra lei, que batalha contra o entendimento. O resultado é ser levado à sujeição dessa lei de
pecado que está nos seus membros.
Deve-se considerar que a lei do pecado não é propriamente a carne, mas algo que reside nessa carne. Já
no versículo dezassete afirma Paulo que, »agora já não
sou eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim.«
Rom. 7:17. Aqui o pensamento de »residir« é expresso
pelas palavras «habita em mim«.
Essa lei »do pecado« nos membros não é a natureza
humana em carne e sangue duma pessoa. É algo diferente que reside nessa carne e que a domina, até contra
a vontade e o entendimento educado e inteligente. O
mesmo está declarado na Santa Escritura, em Ez. 36:26.
O que Paulo chama em Romanos a »lei do pecado«
é aqui chamado »coração de pedra«. Em Romanos sete
é mostrado como algo que mora na carne, enquanto a
promessa aqui é que será expulso da carne. Quando a
»lei do pecado« é tirada da carne, esta ainda permanece
no mesmo lugar. Não é a carne que é tirada. Isto mostra claramente que há de facto três partes no corpo. São
40
elas: O entendimento, a carne e a lei do pecado, ou seja
o coraçáo de pedra que mora na carne e a domina
conforme as suas intenções e contra a vontade do
entendimento.
Romanos 8:7 refere-se com as seguintes palavras a
essa mesma entidade, ou seja à inclinação da carne:
«Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra
Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade
o pode ser.«
Este texto é uma das provas mais fortes de que no
corpo há de facto uma terceira entidade. Consideremos
portanto cuidadosamente o que está dito neste versículo.
Diz que conquanto é possível à carne pecaminosa e
caída do homem ser um instrumento de justiça, por
estar sujeita à lei de Deus, é impossível à inclinação da
carne de o fazer.
A inclinação carnal não é somente inimizade contra
a lei de Deus. Ela própria é inimizade. A sua própria
natureza, o que ela é em si própria, é inimizade contra
Deus. Se fosse uma simples inimizade, poderia reconciliar-se com Deus; mas como é ela própria inimizade,
então nunca se poderá reconciliar com Deus, nunca
pode estar sujeita à Sua lei. Mas a carne pode ser controlada. De facto em Rom. 6:13, exorta Paulo aos
convertidos a entregarem »os seus membros« a Deus,
como instrumento de justiça.
Como temos visto temos uma natureza, um poder,
que está em inimizade com Deus, não o podendo servir,
e temos um outro poder, a carne que o pode. Portanto,
não podem ser a mesma coisa. Devem ser duas coisas
distintas, porque uma não pode ocupar uma posição em
que é impossível servir à lei, enquanto que ao mesmo
tempo se entrega como instrumento de serviço à lei.
41
A inclinação carnal, a lei do pecado, o coração de
pedra é o poder do pecado que domina na vida do
homem contra a vontade do entendimento. Não quero
dizer com isto que a carne é senhor sobre o entendimento; mas que a carne está sujeita a esse outro poder,
de modo que se encontra forçado a obedecer, enquanto
esse pecado nela permanece.
Paulo resume todo o problema nos últimos versículos de Romanos sete, dizendo: »Assim que eu mesmo
com o entendimento sirvo à lei de Deus, mas com a
carne à lei do pecado.« Aqui é evidente que há dois
senhores a trabalhar na vida do homem de Romanos
sete. Um é o grande Senhor de toda a verdade ao qual o
entendimento devota o seu serviço; o outro é a lei do
pecado à qual a carne está sujeita. Portanto como o
entendimento e a carne estão ao serviço de dois poderes
distintos, não pode a carne fazer o que o entendimento
deseja. Está sujeita a um outro senhor que está em
inimizade mortal contra a lei de Deus.
Agora chegamos ao ponto principal do problema.
Verificamos que o que fazemos é somente o fruto do
que somos. A este respeito diz-nos Jesus: »Porque não
há boa árvore que dê mau fruto, nem má árvore que dê
bom fruto. Porque cada árvore se conhece pelo seu
próprio fruto; pois não se colhem figos dos espinheiros,
nem se vindimam uvas dos abrolhos. O homem bom do
bom tesouro do seu coração tira o bem, e o homem mau
do mau tesouro do seu coração tira o mal, porque da
abundância do seu coração fala a boca.« Lucas 6:43-45
Aqui refere-se Cristo a uma lei da natureza que
nunca foi violada e à qual até uma criança é familiar. É
um princípio inalterável, que se quisermos ter bons
frutos devemos antes de tudo ter uma boa árvore. Após
42
se ter referido ao principio revelado na natureza, declara
o Salvador que assim como é na natureza o é no mundo
espiritual.
Por isso se quisermos ter uma nova vida, cheia de
boas obras, devemos em primeiro lugar ser bons. Mas
ninguém pode ser bom, enquanto tem a inclinação
carnal, o coração de pedra. Ter essa natureza ímpia e
esse poder em nós, significa que somos ímpios e como
tal podemos ter só obras más e nào boas.
Não é o entendimento o problema, porque este está
convertido ao serviço de Deus e às verdades da Palavra
de Deus. Não é também a natureza humana, porque
esta está sujeita a um outro poder, o poder do pecado,
que reside nos membros e os controla mesmo contra a
sua vontade.
Isto no entanto não quer dizer que o entendimento e
a carne não possam ser um problema. Podem; mas não
são o problema daquele que vive na experiência de
Romanos sete. Também a sua carne não é o problema,
porque está sujeita a um outro poder, de modo que até
que seja liberta desse poder, não pode escapar do
domínio do pecado e fazer o que o entendimento indica
ser justo.
A lei do pecado nos membros é então o verdadeiro
problema. É a raiz, a causa principal, a fonte original
da nossa calamidade. Em virtude de ser este o problema, é óbvio que deve a solução ser procurada aqui. É
portanto neste ponto, que devemos resolver o problema.
A SOLUÇÃO
Agora, depois de termos conseguido isolar o problema, a nossa pergunta é: »Como pode ele ser resolvido
para sempre?«
Desde já deve ser compreendido que não adianta
tentarmos forçar a inclinação carnal a servir à lei de
Deus, porque como sabemos é impossível. Devemo-nos
somente lembrar das palavras de Jesus, quando deu a
ilustração do espinheiro. Nenhum esforço resultará em
termos bons frutos dum coração impio. Consideremos o
espinheiro. Ele, pela própria natureza não dá maçãs.
Caso alguém encontre no seu jardim um espinheiro,
sabe que nenhum cuidado de irrigação ou fertilização
pode fazer produzir dele uma única maçã. É completamente impossível.
Que cada pessoa que procura a vitória sobre o pecado, tenha a certeza que nenhum esforço, nenhum estudo intensivo da Palavra de Deus, nenhum cargo dentro
da igreja, nenhuma actividade missionária, nenhuma
oração sincera, nem a doação liberal de ofertas, levará a
inclinação da carne a produzir os frutos do Espírito.
Este não é o caminho, porque »a inclinação da carne é
inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus,
nem, em verdade o pode ser.« Rom. 8:7. Assim isto é
tão verdade como é verdade o espinheiro não estar
sujeito à lei de produzir maçãs, nem em verdade pode
estar.
Por isso cada pessoa, que, enquanto tem a inclinação
carnal, tentar guardar a lei de Deus, está tentando uma
impossibilidade absoluta. Somente depois dessa inclinação carnal ter sido tratada, de modo a que o seu poder
44
tenha sido fragmentado, pode uma pessoa começar a
guardar a lei de Deus. O machado deve ser colocado na
raiz da árvore. Não há outra possibilidade
Aqueles que no mundo de hoje pensam que a solução do problema é de eliminarem a lei, verào, se reflectirem um pouco só, que não pode ser.
Um homem ignorante pensou uma vez resolver o
problema do calor, quebrando o termómetro; mas
quando o inutilizou, o problema continuou a existir da
mesma maneira. Em vez de resolver o problema, perdeu
ele a possibilidade de saber a temperatura certa do
ambiente. Assim do mesmo modo se a lei fosse abolida,
o pecado em si permaneceria na mesma situação. Continuaria a existir, ficando o homem privado do padrão
exacto, pelo qual saberia o que é o pecado.
Na primeira parte de Romanos sete está essa verdade expressa no exemplo do casamento. Aqui está
claramente mostrado que não é preciso mudar a lei. Ela
é perfeita e não tem necessidade de ser modificada.
Quem precisa de ser realmente modificado é o homem,
porque é nele que se encontra o problema. »Não sabeis
vós. (pois que falo aos que sabem a lei), que a lei tem
domínio sobre o homem por todo o tempo que vive?
Porque a mulher que está sujeita ao marido, enquanto
ele viver, está-lhe ligada pela lei; mas, morto o marido,
está livre da lei do marido. De sorte que, vivendo o
marido, será chamada adúltera, se for doutro marido;
mas, morto o marido, livre está da lei, e assim não será
adúltera, se for doutro marido.» Rom. 7:1-3
Com a lei do casamento estamos todos familiarizados. Enquanto a mulher estiver legalmente casada com
seu marido, a lei a condenará como adúltera se fizer
qualquer tentativa de casar com outro homem. Mas,
45
caso o marido morra, então a mesma lei que antes a
condenava, agora a liberta. Houve uma mudança, mas
não na lei. Foi na mulher. Ela que anteriormente era
casada agora é como se fosse solteira.
Assim é no reino espiritual. Paulo não tratou aqui
da questão específica do casamento, mas antes usou a
lei do casamento como exemplo, a fim de explicar o
casamento espiritual com Cristo. »Assim meus irmãos,
também vós estais mortos para a lei, pelo corpo de
Cristo, para que sejais doutro, daquele que ressuscitou
dentre os mortos a fim de que dêmos fruto para Deus.«
Rom. 7:4
Neste versículo não existe a mais pequena tentativa
para mudar a lei; mas mesmo assim há a referência
clara a uma mudança a ser feita, ou seja no homem.
Ele deve morrer para que ela possa casar com outro, ou
seja com Cristo, porque Ele é o Tal ressuscitado da
morte.
Todo o propósito da obra de Cristo é salvar do
pecado, como está escrito: »E dará à luz um filho e
chamarás o seu nome Jesus; porque ele salvará o seu
povo dos seus pecados.« Mat. 1:21
Ser salvo do pecado significa ser salvo da transgressão da lei, porque o pecado é a transgressão da lei,
como está escrito: »O pecado é a transgressão da lei.«
l.João 3:4 (tradução de João Ferreira de Almeida, edição revista e actualizada no Brasil). Transgredir a lei é
desobediência. Portanto, ser salvo de transgredir é ser
salvo para a obediência.
Está então revelado que nenhum esforço de vontade,
nem a abolição da lei, são a solução do problema.
Tendo nós visto qual é a solução, voltemos para
saber em que consiste ela: É a libertação da natureza
46
antiga e a sua completa substituição, pela nova natureza.
Nada é na Sagrada Escritura mais claramente ensinado
do que isto. Consideremos os versículos seguintes, como
mais um testemunho. »E lhes darei um mesmo coração,
e um espírito novo porei dentro deles; e tirarei da sua
carne o coração de pedra, e lhes darei um coração de
carne; para que andem nos meus estatutos, e guardem
os meus juízos, e os executem; e eles serão o meu povo,
e eu serei o seu Deus.« Ez. 11:19.20
Numa linguagem bem clara, afirma o Senhor que
tirará o coração de pedra antigo e pecaminoso da nossa
carne, dando-nos um novo em seu lugar. Ele não diz
que nos dará um novo coração além do velho. Esta não é
a mensagem dos versículos. Reparem atentamente, porque está dito que o velho será tirado da sua carne e um
novo espírito e um novo coração tomarão o lugar do
antigo.
Tudo isto é feito com um propósito, ou seja para
alcançar certos resultados »para (com o intuito ou o
propósito) que andem nos meus estatutos e guardem os
meus juízos, e os executem; e eles serão o meu povo, e
eu serei o seu Deus.«
No nosso estudo sobre Romanos sete temos claramente visto que a razão pelo qual o servo intencionado
de Deus não podia fazer o que desejava, era porque
ainda tinha a inclinação antiga da carne que o dominava como um senhor. Reconhecemos portanto, que a
presença deste poder é o problema real deste homem, e
que o Senhor é conhecedor de que a única solução é
remover o ofensor, ou seja o coração de pedra e substitui-lo por um novo coração.
Tornando ao exemplo do espinheiro, encontramos a
mesma resposta. O espinheiro está no jardim, verde e
47
florescendo, mas sem utilidade. Ele impede o caminho,
ocupa bom terreno e rasga os vestidos daqueles que por
ali passam. O jardineiro, apesar de desejar que ele dê
bons frutos como maçãs ou laranjas, vê nele somente
um estorvo. O que na realidade tem é um espinheiro,
portanto sabe que a única solução é arrancá-lo e substitui-lo por uma árvore boa. Tendo feito isto, terá no
devido tempo os bons frutos desejados.
Assim o homem de Romanos sete deseja ter as boas
obras da lei, na forma dos frutos do Espírito, que são:
amor alegria, paz, etc. . . Mas a sua natureza ímpia é a
fonte da desobediência, ódio, vaidade, inveja, etc. . . O
problema e a solução são idênticos ao do jardineiro
que tinha o espinheiro. Essa natureza ímpia deve ser
arrancada do corpo humano e ser substituída pela
natureza nascida do Alto. Só assim pode ele ser um
filho de Deus e só assim podem ser produzidos os bons
frutos do Espírito.
Esta verdade é muitas vezes afirmada na Santa
Escritura, de modo que ninguém deve ter mais dúvida,
no que diz respeito ao caminho da libertação do poder
do pecado. «Porque a lei do espírito de vida, em Cristo
Jesus, me livrou da lei do pecado e da morte. Porquanto
o que era impossível à lei, visto que estava enferma pela
carne. Deus, enviando o seu Filho em semelhança da
carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na
carne; para que a justiça da lei se cumprisse em nós,
que não andamos segundo a carne, mas segundo o
espírito.» Rom. 8:2-4
Deus enviou o Seu Filho a este mundo, para condenar o pecado na carne. Uma distinção importante deve
ser reconhecida. As acções do pecado podem ser chamadas pecados da carne, enquanto que o poder interior
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do coração de pedra ou da inclinação carnal, é o pecado
na carne. Devemos observar que Jesus não veio para
fazer uma obra superficial, condenando somente os
pecados da carne. Ele veio para condenar o pecado que
está na carne e que como tal é a raiz do problema e a
causa de derrotas contínuas.
Deus enviou o Seu Filho a este mundo, para condenar o pecado na carne. Uma distinção importante deve
ser reconhecida. As acções do pecado podem ser chamadas pecados da carne, enquanto que o poder interior
do coração de pedra ou da inclinação carnal, é o pecado
na carne. Devemos observar que Jesus não veio para
fazer uma obra superficial, condenando somente os
pecados da carne. Ele veio para condenar o pecado que
está na carne e que como tal é a raiz do problema e a
causa de derrotas contínuas.
Porque veio Ele condenar o pecado na carne? »Para
que a justiça da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o espírito.« Rom. 8:4
A mensagem é sempre a mesma. O velho é condenado, é extirpado e afastado, de modo que um certo
objectivo possa ser cumprido; para que possamos, através de Jesus Cristo, nosso Senhor, viver a vida de justiça
de Deus.
Para que condenou Jesus o pecado na carne? Para
ser subjugado e controlado? Para o exilar com uma
declaração de não aprovação? Não. Condenou-o à
morte; à morte que se tornou efectiva, através da Sua
morte e ressurreição.
Em parte alguma está a verdade mais claramente
afirmada do que em Rom. 6:1-6; »Que diremos pois?
Permaneceremos no pecado, para que a graça abunde?
De modo nenhum. Nós que estamos mortos para o
49
pecado, como viveremos ainda nele? Ou não sabeis que
todos quantos fomos batizados em Jesus Cristo fomos
batizados na sua morte? De sorte que fomos sepultados
com ele pelo batismo na morte; para que como Cristo
ressuscitou dos mortos, pela glória do Pai, assim andemos nós tembém em novidade de vida. Porque, se fomos
plantados juntamente com ele na semelhança da sua
morte, também seremos na da sua ressurreição; Sabendo isto, que o nosso homem velho foi com ele crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito, para
que não sirvamos mais ao pecado.«
O versículo seis é o climax do argumento contido
neste trecho. Enquanto os versículos anteriores nos
dizem que aqueles que estão em Cristo Jesus, que portanto são os verdadeiros filhos de Deus, morreram e
ressuscitaram, assim como Ele morreu e ressuscitou,
diz-nos este versículo o que foi que morreu.
Antes de dirigirmos a nossa atenção para o que deve
morrer, deixem-nos ver o poder da mensagem nos versículos precendentes. Em resumo é, que somente aqueles
que morreram podem viver. É uma outra maneira de
dizer que o velho deve perecer, antes que o novo possa
vir. A morte sempre tira o velho; a ressurreição traz
algo de novo.
É no versículo cinco onde essa verdade está expressa
em termos mais firmes. »Porque, se fomos plantados
juntamente como ele na semelhança da sua morte,
também o seremos na da sua ressurreição.«
E muito importante compreendermos que, a não ser
que essa condição seja cumprida, o resto não pode
seguir, porque somente aqueles que morreram com
Cristo, podem viver com Ele. Isto significa que somente
quando o velho for tirado, pode o novo entrar. O espi-
50
nheiro deve ser arrancado antes que a macieira possa
ser plantada. Eles não crescem e nem podem crescer no
mesmo lugar. O que quer dizer Paulo nestes versículos?
Está ele exprimindo uma retórica sem valor especial, ou
são essas palavras reais, sobre experiências reais?
Quando ele afirma que devemos morrer com Cristo, o
que quer ele dizer? Devemos nós realmente morrer,
ou fala ele somente duma mudança de filosofia.
O que faz difícil aos crentes acreditarem que é uma
morte real, é não distinguirem entre a carne pecaminosa
e a inclinação carnal pecaminosa, a qual também é
chamada o coração de pedra, o velho homem e o mestre
do pecado. Por as pessoas pensarem que a natureza
pecaminosa seja a carne, julgam que é só uma morte
retórica, porque como sabem a pessoa não morre segundo a carne e o sangue. Imaginam ser algo meramente reconhecido ou atribuído à pessoa, mas que
realmente se manifestou na vida de Cristo.
É inteiramente verdade que a pessoa que passa pela
experiência de Romanos sete, tornando-se um verdadeiro e ressuscitado filho de Deus, não morre fisicamente. Ele tem, como homem convertido, a mesma
carne e o mesmo sangue como dantes. Nisto não há
nem morte nem mudança. Carne pecaminosa é mortal.
Desta ninguém será liberto antes do grande dia da ressurreição, quando Cristo descer para chamar o Seu
povo para o Seu lar celeste.
Mas ele morre, porque se não o fizesse, não podia
estar com Cristo. O que morre então? A resposta encontra-se no versículo seis: »Sabendo isto, que o nosso
homem velho foi com ele crucificado, para que o corpo
do pecado seja desfeito, para que não sirvamos mais ao
pecado.« Aqui há algo chamado «nosso homem velho«.
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O que significa esta expressão? Quem, ou o que é o
nosso homem velho? Para termos a certeza que temos a
compreensão certa, seguimos o versículo. Diz, que o
homem velho foi crucificado, »para que o corpo do
pecado seja desfeito, para que não sirvamos mais ao
pecado.« Paulo podia ter escrito como segue: »Sabendo
isto, que o nosso homem velho foi com ele crucificado
para que o homem velho seja descoberto.« Mas em vez
de aqui usar o termo »homem velho« usa ele um outro
nome »o corpo do pecado«. Agora temos a certeza que
o »homem velho« e »corpo do pecado« são uma e única
coisa.
Em Romanos 7:24, esse »homem velho« é chamado
»o corpo desta morte«, sendo esta uma outra maneira
de exprimir o que no mesmo capítulo mais acima é chamado a »lei do pecado«. Du estudo já dado nesta publicação, sabemos portanto que »o homem velho«, o »corpo
do pecado«, o »corpo da morte« e a »lei do pecado«,
todos eles se referem à terceira parte do corpo humano,
ou seja à inclinação carnal, que »não está sujeita à lei
de Deus, nem em verdade o pode estar.«
É isto que é crucificado na vida daqueles que passam do estado não convertido para o convertido. É isto
que deve ser arrancado pela morte, de modo que uma
nova vida possa ressuscitar no lugar da velha.
Que não haja uma interpretação errada sobre o facto
que isto tenha de ser uma morte real. Crucificação não
é exílio, não é prisão perpétua, não é algo controlado.
Crucificação é uma espécie de morte. Portanto se Paulo
diz que o homem velho é crucificado, diz ele com outras
palavras que é morto. Para ter a certeza e não haja
qualquer dúvida, diz ele que o homem velho é crucificado para que o corpo do pecado possa ser destruído.
52
Quando algo é destruído, deixa de existir. Não existe
mais.
Nos textos e exemplos mencionados temos visto que
toda essa obra é cumprida para um certo propósito. É
para que a pessoa passe da desobediência para a obediência; da lamentação de que não pode fazer o que
deseja para a justiça da lei, cumprida na sua vida.
Portanto, o homem velho é crucificado, o corpo do
pecado é destruído, »para que não sirvamos mais ao
pecado.«
A natureza é uma ilustração maravilhosa da verdade
bíblica. A verdade deste versículo será melhor compreendida se substituirmos o espinheiro pelo homem velho
e se depois lermos o versículo como se dissesse respeito
ao jardineiro que dum espinheiro deseja ter bons frutos.
Ele o arranca e o substitui pela macieira, dizendo: »Sabendo que a árvore velha tem de ser arrancada pelas
raízes para que o espinheiro seja destruído, para que já
não produza mais espigas.« Ninguém terá a menor
dificuldade em ver que esse princípio opera realmente
na natureza. O mesmo princípio devemos ver também
no mundo espiritual.
Compreendendo a obra da natureza, não teremos
dificuldade em compreendermos a obra da purificação
da alma, como sendo preliminar à vitória do problema
do pecado.
LIBERTAÇÃO
Uma grande parte do estudo presente tem sido
devotado ao problema do pecado. Temos reconhecido
que fazemos o que fazemos, não por causa da nossa
vontade fraca, mas por causa do que somos. Enquanto
tivermos em nós a lei do pecado e da morte, teremos
um poder mau dentro de nós que controla a carne
humana e a usa de acordo com a vontade do senhor do
pecado, sem respeitar o conhecimento, os desejos ou até
a consciência.
Portanto, para sermos libertos deste poder, devemos
arrancá-lo de nós, para que seja implantada uma nova
vida em seu lugar. Não há outra possibilidade de entrar
na experiência do renascimento. Somente desta maneira
podemos passar do cativeiro de Romanos sete para a
liberdade de Romanos oito.
Esse conhecimento é de importância vital para
aquele que procura a libertação do pecado.
Não me esqueço do dia em que dei este estudo a
uma certa família. Eu tinha acabado de explicar o
problema, quando resolvemos fazer uma pequena
pausa. Disse então a senhora: »Sabe, faz somente algumas semanas que ouvimos um sermão muito semelhante
a este.« »Exactamente«, confirmou o marido. »O prega»dor explicou o problema tal e qual como o senhor. Ouvi
atentamente, porque desejava compreender o problema
e conhecer a solução. Sabia que estava em Romanos
sete e desejava a libertação dele; mas quando terminou
de expor o problema, o pastor sentou-se. Na minha
ansiedade de saber a solução que ele ainda não tinha
dado, levantei-me dizendo: > Pastor, o senhor deu-nos o
54
problema; por favor agora dê-nos a solução. Diga-nos
como seremos libertos desse poder. <
Em dado momento o pastor levantou-se novamente
dizendo com voz entristecida: >Tenho muita pena; não
vos posso responder, porque ainda não encontrei a
solução para mim próprio.< Fiquei desapontado e sem
mais nada poder dizer, sentei-me na minha cadeira.«
Durante alguns momentos pensava o esposo nessa
experiência. Depois voltou-se para mim dizendo: »E o
senhor, também nos traz o problema, deixando-nos sem
a solução?«
Com alegria disse-lhes então, que tínhamos interrompido somente um instante, mas que a solução seria
dada em termos bem claros. Assim também nesta
publicação o leitor não ficará somente conhecedor do
problema, mas a solução ser-lhe-á explicada em termos
compreensíveis e claros.
O evangelho é a solução. É o poder de Deus para
salvar do pecado.
Alguém, porém, pergunta: Então se o evangelho é o
poder de Deus, dado para nos libertar do pecado,
porque não fui eu já liberto? A resposta é, que o evangelho não é o poder de Deus para a salvação de cada
um.
Lemos cuidadosamente Romanos 1:16. Paulo não
disse: »Porque não me envergonho do evangelho de
Cristo, pois é o poder de Deus para salvação de cada
um.« É verdade que Paulo, com excepção da última,
usou estas palavras. No entanto, o que ele realmente
disse, foi que o evangelho é o poder de Deus para salvação de »todo aquele que crê«. Nisto há uma grande
diferença. O evangelho para o incrédulo pode ter muitas
palavras bonitas, mas somente para o crente é o poder
de Deus para salvação do pecado.
55
O apóstolo João exprimiu a mesma verdade dizendo:
»e esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé.«
l.João 5:4
Se alguém perguntar a professos filhos de Deus se
têm fé, receberá da maioria a resposta, que sim. A
resposta até um certo ponto está certa, porque a pessoa
tem fé na Bíblia como sendo a Palavra de Deus, tem fé
em Deus como sendo um Ser Supremo, tem fé que o
pecado receberá a sua punição justa e que só em Jesus
pode haver salvação. Mas alguém pode ter fé em todas
estas coisas e mesmo assim não ter fé no evangelho,
como sendo o poder vivo do Deus vivo, que o salva do
pecado. Não é demais que se diga, que cada um que
ainda está na experiência de Romanos sete não tem a fé
que é a vitória que vence o mundo. Fé não somente traz
a vitória, f é é a vitória. Portanto se temos a fé da qual
Paulo e João falam, então não estamos na experiência
de Romanos sete, mas na de Romanos oito.
É desta fé da qual Jesus falou quando disse: «Quando porém vier o Filho do homem, porventura achará fé
na terra?« Lucas 18:8. A fé que traz a libertação do
cativeiro do pecado, não é aquela que mais frequentemente encontramos no mundo de hoje. Como Jesus
sabia que seria assim, fez essa pergunta.
Como sem esta fé a vitória não é possível, deve ser
esclarecido como a mesma deve ser exercida. Voltemo-nos para o régulo que, vindo de Cafarnaum, veio ter
com Jesus para lhe rogar que curasse o seu filho. «Segunda vez foi Jesus a Cana da Galileia, onde da água
fizera vinho. E havia ali um oficial do rei, cujo filho
estava doente em Cafarnaum. Tendo ouvido dizer que
Jesus viera da Judeia para a Galileia, foi ter com ele e
lhe rogou que descesse para curar o seu filho, que estava
56
à morte. Então Jesus lhe disse: Se porventura não virdes
sinais e prodígios, de modo nenhum crereis. Rogou-lhe
o oficial: Senhor, desce, antes que meu filho morra. Vai,
disse-lhe Jesus; teu filho vive. O homem creu na palavra
de Jesus, e partiu. Já ele descia, quando os seus servos
lhe vieram ao encontro, anunciando-lhe que o seu filho
vivia. Então indagou deles a que hora o seu filho se
sentira melhor. Informaram: Ontem à hora sétima, a
febre o deixou. Com isto reconheceu o pai ser aquela
precisamente a hora em que Jesus lhe dissera: Teu filho
vive; e creu ele e toda a sua casa. Foi este o segundo
sinal que Jesus fez depois de vir da Judeia para a Galileia.« João 4:46-54
O que esse homem procurou para o seu filho que
estava tão doente e que poucas horas de vida tinha, foi
uma cura física. Os médicos já não tinham esperança,
visto ià tudo terem feito para o salvar.
Enquanto esta história se refere à fé, no que diz
respeito à cura física, tem ela ensinos directos no que
diz respeito à cura da enfermidade espiritual. O propósito real de Cristo nas curas físicas foi tanto mostrar
o Seu poder divino, como ensinar a maneira de recebermos a libertação das enfermidades espirituais. Se vemos
Cristo somente como alguém que tinha poder de curar
a lepra, a paralisia ou coisas semelhantes, não compreendemos a Sua mensagem no ministério de curar. A
enfermidade na Palavra de Deus é um símbolo do
pecado. Lemos em Isaias l :4-6.
Comparemos, portanto, o que já estudámos sobre o
problema do pecado com o problema da enfermidade.
O enfermo deseja fazer certos movimentos; mas a enfermidade é um poder que reside na sua carne e manda
nele, de maneira que não pode fazer o que gostaria de
57
fazer. Somente quando a enfermidade for debelada,
pode ele ter a esperança de movimentar-se segundo os
seus desejos. Não há quadro mais perfeito do que este
da enfermidade, que nos pode ilustrar melhor a tríplice
natureza do problema do pecado.
O régulo viajara de Cafarnaum para Canà, a fim de
procurar a ajuda de Cristo. Ele procurava a solução
dum problema físico, que de certo modo é idêntico ao
do pecado. Assim como ele necessitava que a enfermidade fosse retirada do corpo do seu filho, precisamos
nós que o senhor do pecado seja retirado dos nossos
corpos.
Ele sem dúvida foi ter com a única pessoa capaz de
o ajudar, ou seja Jesus Cristo. Ele pediu o que desejava
à pessoa certa. Mas Jesus recusou-se descer a sua casa
a fim de satisfazer o pedido. Essa rejeição não foi por o
régulo não ter achado graça aos olhos de Deus. Não,
mas a maneira como apresentou o seu pedido impossibilitou a Jesus de curar o seu Filho.
Quantas vezes estamos ajoelhados em oração, pedindo perdão para um pecado, suplicando ao Senhor de
nos dar a vitória sobre este pecado, e mesmo assim
verificamos que o pecado ainda existe em nós, como se
não tivéssemos pedido perdão. Ficamos perturbados e
perplexos, incapazes de compreender a razão do Senhor
não atender a nossa oração.
Também este homem teria seguido seu caminho e
teria encontrado seu filho morto, se não tivesse reconhecido que tinha apresentado o seu pedido a Cristo
duma maneira errada e se finalmente não tivesse pedido
segundo a verdadeira ciência da oração. Foi quando
começou a ter fé que a sua petição foi ouvida e respondida.
58
Jesus não deixou este homem na ignorância, no que
diz respeito à sua falta de fé. Disse-lhe: »Se não virdes
sinais e prodígios, não crereis.« O Senhor numa linguagem clara quis dizer que, apesar da sua apresentação
como crente, ainda não possuía a fé verdadeira.
Não devemos ignorar que este homem sabia da sua
grande necessidade. Sabia que poder algum deste mundo podia curar o seu filho. Também nós temos uma
nacessidade. Também nós sabemos que nenhum poder
deste mundo nos pode salvar dos nossos pecados. Este
homem foi ter com Jesus, para apresentar a sua petição.
Também nós devemos ir ter com Jesus, para sermos
salvos dos nossos pecados. Este homem orou a Cristo,
porque a apresentação dum pedido é uma oração.
Cristo, porém, disse-lhe claramente que apesar de
tudo o considerava um incrédulo. Cristo nada podia
fazer por ele. Isto significa que se, depois de fazermos
tudo quanto devemos fazer para alcançarmos a vitória
sobre os nossos pecados, verificamos que ainda nos
encontramos na experiência de Romanos sete, também
nós somos incrédulos. Se somos incrédulos, necessitamos
de compreender a fé que actua pelo amor e que purifica
a alma.
Como se aproximou este homem de Jesus? As palavras de Cristo o mostram claramente. »Se não virdes
sinais e prodígios, não crereis.« Este homem com outras
palavras veio ter com Jesus para apresentar a sua petição, esperando que Jesus a cumprisse incondicionalmente. Pensava que, se Jesus a cumprisse, acreditaria
n'Ele, como seu Salvador pessoal.
Este, porém, não é nem nunca pode ser o caminho
da fé que salva do pecado. Se todos nós examinássemos
com a maior sinceridade a maneira como nas nossas
60
orações apresentamos a Deus as nossas petições, veríamos que são tão erradas como a do régulo. Temos por
exemplo pedido ao Senhor que nos abençoe; mas em
seguida vamos embora, esperando ver as bênçãos derramadas sobre nós, em vez de acreditarmos que já as
temos recebido.
É desnecessário dizer que, se o Senhor nos desse as
bênçãos solicitadas desta maneira, ficaríamos surpreendidos em ver o seu cumprimento.
Para o régulo tinha chegado a hora da verdade.
Também para nós deve ela vir, a fim de experimentarmos ã fé salvadora. Quando o Senhor nos repreende,
vem o Espírito de Deus, Aquele que convence do pecado,
para nos revelar os defeitos de carácter. Foi assim que
as palavras de Cristo, sob o ministério do Espírito Santo,
revelaram a esse homem a sua incredulidade. Quando
ele ouviu o que o Senhor disse, certamente aceitou a
repreensão, porque a resposta do nosso Salvador à
petição seguinte, foi muito diferente da primeira.
O régulo insistiu com o Senhor dizendo: »Senhor
desce, antes que meu filho morra.« Havia uma diferença
na petição. É possível que não a possamos discernir,
mas através da resposta divina, vemos claramente que a
havia.
A primeira petição teve como resposta só uma repreensão triste, ao passo que a segunda lhe trouxe libertação. Qual a diferença? A diferença está, em que o
homem se tornou crente. Sabemos isto porque a
Palavra de Deus o diz: »E o homem creu na palavra que
Jesus lhe disse, e foi-se.« João 4:50
Caná não era muito distante de Cafarnaum. Devem
ter sido cerca de vinte e cinco quilómetros. Cristo falou
ao régulo na sétima hora, ou seja cerca da uma hora da
61
tarde, de maneira que nessa mesma tarde podia o
régulo ter ido para casa. Mas mesmo assim não foi para
ver com os seus próprios olhos que seu filho de facto
tinha sido curado.
Ele sabia que o filho estava bem. Quando no dia
seguinte chegou a casa, contaram-lhe os servos somente
o que a fé, um dia antes, lhe tinha contado. Sem dúvida
ficaram eles surpreendidos ao verem que seu amo, a
respeito da notícia, não se tinha surpreendido.
Comparemos agora as diferentes petições do régulo
a Cristo. É ao mesmo tempo a comparação do crente
com o incrédulo.
Na resposta da segunda petição reconheceu ele algo
do poder que está em Jesus Cristo. A sua fé abraçou
esse poder, no qual viu a resposta às suas necessidades.
Pediu então para que seu filho fosse curado, aceitando
ao mesmo tempo esse dom pela fé, sabendo que já era
seu. Em seguida foi tranquilamente ao seu caminho,
sabendo que a bênção da qual já era possuidor, seria
revelada no momento em que mais dela precisasse.
Nisto é-nos comunicada a fórmula de sucesso da fé
verdadeira.
Em primeiro lugar devemos ter um conhecimento
certo do problema a enfrentar. Quantas vezes no passado fomos ter com Deus, pedindo perdão pelo que
temos feito, sem termos reconhecido o verdadeiro problema e sem termos pedido a remoção desta lei do
pecado que está em nós. Tem havido uma deficiência
séria na compreensão daquilo com que realmente lutamos, deficiência essa que deve ser vencida, antes que
possamos orar inteligentemente e com sucesso.
Em segundo lugar devemos conhecer e aceitar as
promessas de Deus, como sendo o poder de Deus. Para
62
reconhecermos isto, devem elas ser lidas e estudadas até
que sejam absorvidas pela nossa mente e que façam
parte integrante de nós mesmos.
Mas quantas vezes estive perante um grupo de
professos cristãos e quando lhes pedi que me citassem
algumas das grandes promessas bíblicas da vitória
sobre o pecado, não me sabiam responder. Para aqueles
que desejam ter e manter uma vitória pessoal sobre o
pecado, devem essas promessas ser uma parte importante da sua vida. Devem estar sempre prontos para as
pronunciar, quando o inimigo os ataca ou se lhes quer
sugerir alguma dúvida a respeito do poder salvador de
Deus.
Não é a intenção dar aqui uma lista de todas as
promessas bíblicas, antes deveria cada um procurar as
mesmas por si próprio. Serão indicados somente alguns
exemplos, para aqueles que gostariam de iniciar um
estudo mais amplo e profundo.
«Porque o pecado não terá domínio sobre vós.«
Rom. 6:14. Lemos estas palavras até que vejamos que
nos são uma promessa pessoal e que Deus não permitirá
que o pecado tenho domínio sobre nós. »Nao veio sobre
vós tentação, senão humana; mas fiel é Deus, que vos
não deixará tentar acima do que podeis, antes com a
tentação dará também o escape, para que a possais
suportar.« l.Cor. 10:13. Assim como um pai não permite
que o seu filho tenha de enfrentar perigos excessivos
para a sua tenra idade, assim o Senhor nunca permitirá
que nos sobrevenha uma tentação demasiado forte, a
qual não possamos suportar. Para cada tentação que se
nos apresenta, tem Ele provido um caminho de libertação, de modo que não haja desculpa alguma para
qualquer pecado. «Posso todas as coisas naquele que
me fortalece.» Fil. 4:13
63
Poderíamos citar mais exemplos, mas é melhor que
cada um procure as promessas para si próprio. A seguir
só mais algumas referências: Mat. 1:21; João 8:36;
l.Cor. 15:34-57; 2.Cor. 2:14; Gál. 3:14-21; Fil. 1:6;
l.Tes. 4:3-5.23.24; 1.Pedro 1:5; 2.Pedro 1:4; Judas 24.
Os Salmos 23 e 46 contêm promessas particularmente
boas, no que diz respeito ao poder da libertação. Tenhamos também interesse especial para as promessas de
Ez. 11:19.20; 36:26.
O grande objectivo de conhecer estas promessas é
chegarmos a uma fé que purifica a alma. Quanto mais
as lermos e estudarmos, mais elas nos ajudarão na
formação de uma fé viva, até chegarmos ao ponto em
que aceitamos o poder que nos pode trazer a libertação
tão desejada.
Fé não é algo que pela própria natureza é nosso.
Não é algo que podemos gerar em nós. »E assim, a fé
vem pela pregação e a pregação pela palavra de Cristo.«
Rom. 10:17 (tradução de João Ferreira de Almeida,
(edição revistae actualizada no Brasil).
Quando tiver chegado o tempo em que a fé realmente acredita nas promessas de Deus e as aceita, é
chegada então a hora de dar o terceiro passo. Devemos
ir ter com Cristo, pedindo pelas bênçãos. Não façamos
a antiga oração, que tantas vezes falhou em nos trazer a
libertação. No passado o molde da oração era: »Senhor,
eu pequei, rogo-Te que me perdoes este pecado e me
ajudes a nunca mais o tornar a cometer.«
Essa oração não trouxe vitória alguma no passado e
não trará nenhuma no futuro. Como a petição do régulo
deve a nossa oração ser apresentada de outra maneira.
Em vez do acima citado, devemos agora orar: »Senhor,
cheguei ao ponto de reconhecer que o problema verda-
64
deiro se encontra nesta natureza pecaminosa que está
em mim. É o »poder do pecado«, a »lei do pecado e da
morte«, o »corpo da morte«, a »inclinação carnal« e o
»coração de pedra«. Enquanto isto estiver em mim e
enquanto o meu corpo estiver sujeito ao controle daquele poder, sou como a árvore má que produz somente
frutos maus. Senhor, prometeste tirar o coração de
pedra, para dar-me um completamente novo. Acredito
que vais fazer isto e por isso dou-Te o meu coração
velho. Toma-o de mim, não o quero mais e coloca no
seu lugar um novo coração. Faz com que eu possa
participar da Tua própria natureza divina. Pela fé
aceito esta bênção e por ela Te agradeço, em nome do
nosso querido Salvador Jesus Cristo. Ámen.«
Caso tenhamos alcançado a fé viva, não esperaremos
até vermos a realização das bênçãos, para sabermos que
de facto as temos. Saberemos que estamos libertos, que
o pecado não tem mais domínio sobre nós e que finalmente nos temos tornado um verdadeiro filho de Deus.
Resistamos, portanto, às tendências da natureza humana que, em vez de acreditar, deseja ver. Tão pouco
esperemos ver algo, que nos indique que estamos
transformados. Acreditemos porque a Palavra de Deus
o diz, e em breve veremos a realização dos factos.
O régulo, para ter fé e portanto a certeza de que o
seu filho estava vivo, não necessitou ir vê-lo. A Palavra
de Deus através de Cristo foi-lhe suficiente. Fé na
Palavra de Deus não se baseia em ver ou sentir. Aliás o
ver e sentir é algo que facilmente pode mudar dia após
dia.
Por conseguinte, se queremos ter a certeza da nossa
relação para com Deus, nunca nos devemos orientar
pelos nossos sentimentos, mas sim segundo a Palavra de
Deus.
O MEU TESTEMUNHO
O apóstolo João afirma: »O que vimos e ouvimos,
isso vos anunciamos, para que também tenhais comunhão connosco.« l.João 1:3
Aqueles que têm uma experiência própria são os
que da melhor maneira podem dar um testemunho
verdadeiro. Podem falar do que experimentaram e não
do que aprenderam. Para que outros conheçam a actuação positiva do caminho exposto neste estudo, gostaria
de relatar como o evangelho actuou na minha vida. Há
muitos crentes em todo o mundo, que ouviram o mesmo
estudo, aplicaram a mesma sistemática e que através da
mensagem presente, podem juntamente comigo confirmar a libertação do pecado.
No ano de 1953 tornei-me professor num seminário.
No ano seguinte fui escolhido para oficial da igreja à
qual pertencia. Eu amava a igreja e me absorvi nas suas
actividades. Entendia e amava a doutrina, de modo que
pregava a mensagem com seriedade e entusiasmo. Pensava ser salvo e regozijava-me dia após dia na esperança
da vida eterna.
Apesar de ter tido uma boa reputação e ter vivido
uma »boa vida«, tinha no meu interior problemas que
não conseguia vencer. Eu era professor na secção de
marcenaria e todos os alunos que nas outras disciplinas
não venciam, eram transferidos para a minha classe.
Alguns desses rapazes resistiram a tal ponto aos estudos
diários que nas aulas haviam lutas contínuas, entre os
meus esforços de ensinar e a sua resistência em estudar.
Fui finalmente levado a tal ponto, que a minha ira
se voltou contra eles. Havia ocasiões em que podia ter
66
batido suas cabeças contra a parede. Mas algo me
impedia de o fazer: tinha de guardar uma boa reputação e não quis que a directoria tivesse algo a criticar-me. Abafei a minha ira, para que exteriormente
ninguém se apercebesse do meu estado interior e crítico.
Um gerador de vapor com as válvulas fechadas,
quando aquecido, certamente suporta durante algum
tempo a pressão crescente, e quando deixamos de o
aquecer a pressão baixa, sem que tenha ocorrido a
explosão. Se no entanto o aquecermos sem parar, virá o
momento em que explodirá. Quanto mais aquecido,
tanto maior será a explosão.
Assim era comigo. As lutas durante a semana de
serviço aqueciam dia após dia a minha ira. Fechei todas
as minhas saídas, para que a ira não pudesse escapar.
Ela, porém, existia e a sua revelação era somente uma
questão de tempo. Quanto mais aguentei, tanto pior foi
a explosão quando chegou. Esse momento chegava normalmente nos fins de semana, quando me encontrava
em casa. Então minha mulher e meus filhos, sem culpa
alguma tornaram-se o recipiente da ira que pelas
atitudes dos outros, se acumularam em mim.
Quando a pressão me deixava, sentia-me culpado e
cheio de remorsos. Fui então ter com o Senhor, pedindo
o Seu perdão, prometendo que nunca mais o faria.
O que aconteceu, porém, foi a repetição do passado.
Novamente provocou a atitude dos alunos a minha ira e
novamente fechei todas as minhas saídas. Novamente
havia a pressão crescente com a consequente explosão e
novamente havia o arrependimento e o pedido de
perdão. Isto se repetia semana após semana. Minha
vida era pecar e arrepender, pecar e arrepender, pecar e
arrepender. Isto sem dúvida era a experiência de
67
Romanos sete. Eu não a compreendia, de modo que a
epístola aos Romanos, parecia-me a mais difícil de todas
da Bíblia. Procurava uma resposta, ouvia outros pregadores para saber o que diziam sobre o assunto; mas em
toda a parte era aparente, que até os homens na liderança da igreja se encontravam na mesma situação.
Finalmente comecei a construir uma filosofia, na
qual considerava a minha experiência como a dos salvos.
Raciocinava que era um homem honesto e sério, que
fazia o melhor que podia, pensando que no grande dia
do juízo final, o Salvador certamente diria: »Este homem apesar de na terra ter vivido uma vida de pecado,
fazia o melhor que podia. Portanto vou perdoar-lhe e
dar-lhe um lugar no reino celeste.«
Mais tarde encontrei um jovem que de si mesmo
dizia que tinha sido liberto do pecado e que gostaria de
falar comigo a este respeito. No início parecia-me a sua
conversação uma língua estrangeira, porque estava
falando duma experiência e duma vida que até àquela
data me era completamente desconhecida.
De repente voltou-se para mim e duma maneira
directa perguntou-me: »Sabe o que significa obter dia
após dia a vitória sobre cada pecado conhecido?«
Quando ouvi isto ri-me e com ar incrédulo disse:
«Faz dez anos que procuro essa experiência. Certamente
não haverá ninguém que tenha orado mais sinceramente
ou que tenha tentado com mais zelo, do que eu, para a
obter. Até à presente data, porém, ainda não encontrei
pessoa alguma que tenha obtido essa experiência. É
claro, que dia a dia tento fazer o melhor, mas também
dia a dia devo pedir perdão a Deus pelos pecados cometidos. Mas, mesmo assim, acredito que Deus me perdoa
e que no dia da ressurreição aceitará as minhas obras
como as melhores possíveis. Certamente serei salvo.
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Nunca na minha vida me hei-de esquecer da sua
resposta; não em palavras, mas sim no olhar. Sua
expressão dizia-me: »Irmão, tu precisas de ajuda e a
necessitas com urgência.«
Esta mensagem não expressa por palavras impressionou-me tão profundamente que, quando me perguntou se me podia visitar a fim de me dar um estudo
bíblico sobre este tema, concordei sem hesitar.
Nunca ouvi um estudo mais estranho do que este.
Sempre que este jovem lia um texto bíblico, tentava
comentá-lo com uma explicação mais ampla. Mas
parecia-me que lhe tinham fugido as palavras, de modo
que para vencer a situação continuava sempre com o
versículo seguinte. O estudo continuava, mas nós não
faziamos outra coisa senão lermos versículo após versículo. Fielmente anotei todos estes versículos.
No fim apresentei alguns argumentos contra a sua
mensagem, e depois foi-se embora. Estou certo de que
ele saiu muito desanimado, convicto que eu era um
desgraçado que rejeitaria a mensagem da libertação do
pecado. Depois disto passaram-se vários dias. Não via
nada de definido, tudo me parecia confuso, mas o poder
dos versículos trabalhava em mim. Lembrei-me então
do cego que começou a ver. »E levantando ele os olhos,
disse: Vejo homens; pois os vejo como árvores que
andam.« Marcos 8:24. Depois de quatro dias, numa
quarta feira à tarde, chegando a minha casa no intervalo
das aulas escolares, aproveitei o tempo para estudar a
lista dos versículos anotados. Um por um, comecei a
lê-los novamente. »Porque o pecado não terá domínio
sobre vós«, »e graças a Deus que sempre nos faz triunfar
em Cristo«. »Ora àquele que é poderoso para vos guardar
de tropeçar«. Rom. 6:14; 2.Cor. 2:14; Judas 24
69
Quando li texto por texto, tentei compreender os seus
verdadeiros sentidos. Com a ajuda do Espírito Santo,
que sempre está presente para iluminar a Palavra da
Verdade, tinha eu lido mais ou menos um terço dos
textos, quando me veio uma convicção profunda. Até
àquele momento tinha acreditado que nunca poderia
viver sem pecado. Com outras palavras, acreditava que
Satanás era mais forte do que Cristo, e que o pecado
era mais forte do que a justiça. De repente, porém,
sobreveio-me a implicação terrível desta crença. Compreendi que enquanto acreditasse nisto, não pararia de
pecar. No momento em que compreendi isto, reconheci
que a minha vida não era um testemunho do poder de
Deus, mas de Satanás.
O Espírito de Deus começou a trabalhar em mim;
comecei a ver que tudo em que tinha confiado, o meu
conhecimento, o meu zelo, a minha posição, o amor
pela verdade conforme a tinha compreendido, de repente
tudo se tinha tornado inválido. Tudo isto agora nada
mais me significava, nem me era mais uma segurança.
Vi-me, como Deus me viu — desesperado, perdido,
eternamente condenado. Apoderaram-se de mim trevas
dum desespero terrível e o tremendo medo de não
participar na ressurreição dos justos. Nunca na minha
vida tinha passado por um momento mais angustioso
do que esse.
O Senhor deu-me — não sei como — a honestidade
de aceitar tudo isto como a pura verdade. Não argumentei que era professor do colégio, pregador, homem
bem familiarizado com as Escrituras, de boa reputação
e zelo incansável pela causa da verdade. Agradeço por
isto ao Senhor e peço ao mesmo tempo ao leitor que,
quando o seu momento da verdade chegar a aceite tal
70
como ela é; porque se argumentar contra o Espírito
Santo, certamente fechará a porta para qualquer outra
obra da graça futura em seu favor. Isto evidentemente
trará consequências graves para a eternidade.
O Senhor nunca fere, mas cura. No mesmo momento
em que me reconheci como pecador perdido e desesperado, mostrou-me o Senhor as promessas, que antes
nunca tinha visto. Elas, a partir desse momento, foram-me como se fossem só para mim em particular. Quando
abracei o poder da Palavra viva, fé viva encheu todo o
meu ser. Então caí sobre os meus joelhos e pela primeira
vez em toda a minha vida orei uma oração nova.
«Senhor eu vejo agora que o problema não é o que
fiz, mas o que sou. Esta vida ímpia em mim é a raiz de
todo o problema, é como uma doença, o senhor do meu
corpo, de modo que não consigo fazer o que desejo,
apesar de saber o que deveria fazer. Aqui está esta vida
antiga, toma-a e dá-me no lugar da antiga a Tua nova
vida. Senhor, sei que aceitas a minha oferta e agradeço-Te em nome do nosso querido Salvador Jesus Cristo.
Ámen.«
Levantei-me então com a a inteira convicção de que
fui renascido. Não era um sentimento, não sentia nada
de diferente. Era uma convicção, o testemunho da fé,
baseada na Palavra de Deus. Era a mesma convicção
que levou o régulo a voltar tranquilamente para casa;
porque sabia que o seu filho estava curado. Ele nem se
tinha apressado, pois tinha a firme certeza dessa cura
miraculosa. Do mesmo modo também eu sabia da
minha libertação e soube dela nesse mesmo momento.
A realização visual ou exterior certamente virá posteriormente, assim como veio para o régulo.
Naqueles dias tinhamos um carro antigo, um Ford,
71
modelo A. Minha mulher costumava ir com ele à cidade.
Mas nem sempre conseguia voltar para casa. Muitas
vezes recebia eu telefonemas dela, dizendo-me que tinha
problemas com o carro e que eu tinha de ajudar. Era-me
sempre muito inconveniente deixar o meu serviço, e
antes do dia da minha libertação ficava muito irritado
sobre este problema. Nessas ocasiões sempre tinha
para minha mulher palavras impacientes e portanto
inconvenientes. Mas sempre quando esses incidentes
terminavam, ficava muito triste, por causa do meu
comportamento. Confessei então o meu pecado, determinando nunca mais o tornar a cometer.
Sempre quando essas chamadas de emergência
vieram, lembrava-me que tinha prometido ser paciente
e amável. No início tudo corria bem; mas durante o
arranjo havia sempre certos incidentes — uma vez
fugiu-me a chave de fendas da mão e feriu-me — de
modo que a ira tomava posse de mim. Poucos minutos
após havia a habitual torrente de palavras irritadas.
Depois de ter acalmado, pensava sempre a mesma coisa:
»Não adianta, não há outra hipótese, tem que ser assim
mesmo.« Sem falar guiava o carro para casa, vencido e
incapaz de me compreender a mim próprio. Apesar
desses arrependimentos, amontoaram-se os problemas
até ao ponto de quase desfazer-se o nosso lar.
Depois do dia da minha libertação, não senti nada
de diferente em mim. É verdade que também não estava
mais sob aquela pressão habitual. O fogo no gerador
tinha cessado e eu vivia feliz, dia após dia. Depois veio
outra tarde, uma sexta feira, em que minha mulher saiu
de carro e em que veio a habitual chamada, por o
carro mais uma vez, a cerca de quatro quilómetros da
nossa casa, se ter avariado.
72
Fui então o mais rapidamente possível ter com
minha mulher, para reparar o carro. Quando vi que
não conseguia repará-lo, pedi a minha mulher que fosse
para casa, no carro de um vizinho que na ocasião
passou. Finalmente mandei rebocar o carro. Fui para
casa e jantámos. A seguir fomos a um culto na escola, e
terminado esse fomos para casa e deitámo-nos.
Como estava muito cansado, não reparei que minha
mulher permanecia deitada ao meu lado, sem falar,
como se estivesse pensando nalguma coisa. Eu estava
quase a dormir, quando ela de repente me perguntou:
»O que aconteceu contigo?«
Eu não tinha a mínima ideia ao que ela se estava a
referir, de modo que pedi uma explicação mais precisa.
Mas ela somente respondeu: »Algo aconteceu contigo,
que eu gostaria de saber.« Como não entendi ao que ela
se queria referir, pedi mais uma vez uma explicação
mais clara. Então disse-me ela: »Esta tarde estava eu à
tua espera junto do carro. Esperava ouvir as tuas
acusações habituais. Mas chegaste, e em vez disto,
pediste-me para ir para casa. Eu estava feliz por ir
embora, mas convicta que quando chegasses a casa,
ouviria algo a respeito do que se passara. Mas chegaste
a casa e nada disseste. Pensei que depois do jantar a
tua ira habitual se voltasse contra mim; mas mais uma
vez continuaste teu caminho pacífico. Tirei finalmente a
conclusão de que te tinhas controlado. Mesmo assim
pensei que após o culto, ao chegarmos a casa tocarias
no assunto; mas até este momento nada disseste. Algo
aconteceu contigo, que eu gostaria de saber.«
De repente apercebi-me da grande mudança operada em mim. Compreendi que, conquanto dantes procedia como a pessoa que antes tinha sido, naquele mo-
73
mento procedi como a pessoa que naquele momento
era. Enquanto antigamente, nas mesmas circunstâncias
fiquei impaciente e irritado, agora mantinha a paz e a
paciência. O facto desta realização sobreveio-me de tal
forma que estava incapaz de dar uma resposta à minha
mulher. No meu íntimo lembrei-me do texto. »Foi o
Senhor que fez isto, e é coisa maravilhosa aos nossos
olhos.» Salmo 118:23
Estimado leitor, quando chegar ao ponto de reconhecer esta maravilhosa transformação interna, quando
reconhecer que sob as pressões da vida diária há uma
reacção completamente nova, compreenderá como me
senti naquele momento. Digo somente que foi maravilhoso.
Desde então passaram-se muitos anos. Foram anos
em que o poder da verdade foi provado no campo da
batalha da vida. Sinto muito não poder testificar de
nunca mais ter pecado nesse tempo, mas posso regozijar-me no testemunho precioso que a mensagem ainda
actua exactamente como naquele dia. Se pequei a culpa
foi sempre minha, por ter falhado na minha fé, por me
ter desleixado em manter a minha conexão íntima com
o poder de Deus. A razão de facto nunca se encontrava
na verdade de Deus.
Mas desde aqueles dias de derrota, a vida tem sido
muito diferente. Naquele tempo, ano após ano, havia
uma repetição contínua das mesmas lutas contra os
mesmos pecados, sem jamais poder sair desse círculo de
pecar e confessar, pecar e confessar. Agora passou
definitivamente. Novos conhecimentos juntaram-se, novas vitórias foram ganhas. É-me agora uma satisfação
ler a epístola aos Romanos, porque entendo o que Paulo
está dizendo e já não me é um mistério.
76
mos somente aprofundar a situação do homem de
Romanos sete e a do homem de Romanos oito. Satanás
aproxima-se com as suas tentações ao homem de
Romanos sete, chamando a sua atenção aos desejos e
fraquezas da carne. O homem no seu íntimo sabe que
essa chamada leva ao pecado. Ele toma a decisão firme
de não fazer o que é injusto e manda ao corpo as instruções adequadas de como deve reagir nesse caso.
Mas a inclinação carnal é o senhor verdadeiro do
homem, que domina a cena e que torna inválida a vontade do homem. Os desejos da carne não são mantidos
sob controle, antes se revelam em pecado aberto. Claro
está que nesta situação a inclinação carnal mantém a
superioridade.
No caso do homem de Romanos oito, a situação é
diferente. A tentação aproxima-se aqui à mesma carne.
Também aqui a mente é chamada a tomar uma certa
decisão. Caso a mente tome a decisão definida de não
se entregar à tentação e caso essa decisão seja tomada
com a fé absoluta que o poder de Deus nele e o poder
de Deus do Alto se unirão para pôr em prática essa
decisão, então as forças servirão a vontade. A carne será
mantida sob controle perfeito e o pecado será renunciado.
Não se pode dar demasiada ênfase, que é a fé que
dá a vitória. O centro de controle de facto foi removido
da inclinação carnal para a vontade; mas essa vontade
pode somente actuar na fé, que o Senhor irá realizar a
decisão tomada. Essa fé envolve a confiança de que o
poder de Deus é suficiente e que nos virá ajudar. Todo
aquele que é renascido e que pensa estar suficientemente
forte para resistir ao poder do pecado, cairá certamente
na tentação. »O justo viverá da fé.« Rom. 1:17
MANUTENÇÃO
Segue então que há uma real necessidade de manter
viva a experiência que foi obtida. »O justo viverá da fé«.
Mas a fé pode cessar. Portanto, é necessário que ela não
só seja mantida, mas revelada e fortificada. Fé é algo
vivo e as coisas vivas quando deixam de crescer, morrem.
Por isso devemos alimentar-nos diariamente da Palavra
de Deus. A Bíblia chama à experiência da libertação
do antigo senhor do pecado »renascimento«. É por essa
razão que um novo cristão pode ser chamado »bebé«.
Um bebé que há pouco começou a percorrer a passagem
longa da vida, precisa de ser continuamente alimentado
a fim de que possa crescer, até à maturidade completa
de homem ou mulher. »Desejai afectuosamente, como
meninos novamente nascidos, o leite racional, não falsificado, para que por ele vades crescendo.« 1.Pedro 2:2
Não se pode dar demasiada importância para os
cristãos novos e mais antigos estudarem diariamente a
Palavra de Deus. Nisto há poder. Sem esse alimento
espiritual e diário a fé se tornará sempre mais fraca, de
modo que quando as poderosas tentações do inimigo se
aproximarem, certamente cairão. Cairão apesar de terem o poder de Deus em si.
Podemos perguntar: »Como pode ser isto, visto o
poder de Deus ser o maior que existe e que o mesmo de
certeza é maior do que o pecado? Se esse poder está em
nós, como pode o pecado dominar-nos?«
Para mostrarmos que a presença do poder de Deus
na vida de alguém não é garantia de nunca mais pecar,
queremos analisar o seguinte exemplo:
Um exército poderoso, como por exemplo o de Júlio
César ou Alexandre Magno, avança para o combate. Os
exércitos que eles comandavam eram os mais poderosos
do seu tempo e não havia nenhum adversário que os
pudesse enfrentar. Considerando um desses exércitos
verificamos que tinha duas divisões principais: O general
que comandava o exército, e o poder colectivo desse
exército, composto de soldados a pé e cavaleiros. O
general em si sozinho nào tinha poder para combater o
mais pequeno adversário. O seu poder é o poder do
exército e somente da maneira como este lhe está sujeito
pode ele ir avante ao combate. Do mesmo modo precisa
o exército da direcção do general, para poder operar
eficientemente. O general significa a vontade do exército. Tudo depende da acção certa dessa vontade, para
que a vitória seja assegurada.
Suponhamos que um exército poderoso e sempre
vitorioso tem que vencer somente mais uma batalha
para alcançar a vitória final. Um inimigo relativamente
pequeno entrincheirou-se numa colina e o confronto
torna-se necessário para assegurar o controle daquele
país.
Mas o general e os seus conselheiros confiam em
demasia nas suas habilidades e forças, de modo que no
dia antes da batalha decidem festejar a vitória. O
general e os seus conselheiros mais íntimos, os subcomandantes e oficiais deixam o exército no acampamento
e dedicam as horas da noite aos seus festejos. O resultado é que na manhã Seguinte todos estão embriagados,
completamente inconscientes da situação real.
Suponhamos que é nesse momento que o inimigo
inesperadamente resolve atacar. De repente, alertados
pelos vigias, encara o exército o inimigo. Mais do que
nunca necessita o exército dos comíndos do general.
79
Mas esse, nesse momento, não está em condições de
tomar a mais pequena decisão, nem pode dar qualquer
ordem válida.
De repente encontra-se o exército sem comandante,
sem vontade e sem inteligência dirigente. É, digamos, o
exército mais potente do mundo, que está enfrentando
um inimigo fraco; mas quem ganhará sob essas circunstâncias? A resposta é: O inimigo.
A explicação deste exemplo é a seguinte: O grande
poder do exército é o símbolo da presença do poder de
Deus na vida. Esse poder é o mais forte que existe e não
há nada que lhe possa resistir. O comandante na experiência de Romanos oito é a vontade inteligente e
educada. O inimigo é a carne ímpia e pecaminosa,
através da qual o inimigo trabalha para vencer e destruir
o homem.
Enquanto o exército terrestre pode fazer algo sem a
vontade e direcção do seu comandante, nada pode, o
poder de Deus fazer em nós sem o consentimento da
nossa vontade. Portanto, se na hora da tentação não
tomamos a decisão firme, dizendo resolutamente ao
inimigo. »nao«, então o poder de Deus nada pode fazer
em nosso favor, e seremos, através da nossa carne caída,
as vítimas do poder de Satanás.
Por falta de compreensão caem muitos em poder do
inimigo, conquanto que a sua vida deveria ser um
cântico contínuo de vitória sobre o pecado. Uma atenção
especial deve ser dada à vontade de um lado, e à impiedade da carne caída do outro lado. Necessitamos, como
faziam os apóstolos, confessar a impiedade desta natureza, em vez de depositarmos confiança na carne ímpia.
Uma tal derrota é inevitável quando falta a fé.
Portanto devemos mante-la continuamente viva. Quan-
80
do a nossa vida nos é dada, ela é perfeita, como um
bebé recém-nascido. Para que esse bebé possa crescer,
deve ser ele alimentado e cuidado. O Senhor põe a
alimentação à nossa disposição, mas somos nós que a
devemos dar ao bebé. Deus não alimenta automaticamente dia após dia essa criança. Essa é a obrigação dos
pais. Assim também proveu Deus, na Bíblia, toda a
alimentação necessária para o bebé espiritual; mas é
nossa obrigação alimentá-lo. Deus não o fará por nós.
Uma Bíblia fechada é como um armazém fechado. Não
serve a ninguém.
VIGIAI
Jesus disse: »Vigiai e orai, para que não entreis em
tentação: na verdade, o espírito está pronto, mas a
carne é fraca.« Mat. 26:41
Entrar na vida cristã, significa estar inscrito no
exército do Senhor. A vida futura é uma luta dia após
dia. Não é uma viagem de recreio. Não nos encontramos em estado de guerra. O nosso inimigo está no
campo da batalha, procurando os pontos fracos para
nos poder vencer e destruir. «Sede sóbrios; vigiai;
porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor,
bramando como leão, buscando a quem possa tragar,«
1.Pedro 5:8
Não há exército algum que entre numa guerra, sem
ter sentinelas. Assim evita que o inimigo venha inesperadamente. Do mesmo modo deve o cristão, cada dia,
colocar as suas sentinelas nos devidos lugares. A Bíblia
revela claramente todas as tácticas de Satanás, de modo
que podemos saber onde e como podemos vigiar, e
como enfrentá-lo com a Palavra de Deus, para que não
possa ganhar vantagem.
A LUTA E DO SENHOR
É muito importante que nenhuma tentativa seja feita
por nós, para enfrentarmos Satanás. O grande conflito
é entre Cristo e Satanás. Não tenteis lutar a luta que
pertence a Cristo. Quando Satanás se aproximar de vós,
entregai-o ao Senhor e deixai-O lutar com Satanás. Ao
fazerdes isto, Satanás fugirá de vós, porque sabe que
Cristo já o venceu.
Há muitos que podem achar ridículo o exemplo que
vou dar, mas verifiquei que tem sido muito válido:
Digamos que nos encontramos no Congo, num safarí.
Chega o dia em que devemos atravessar uma área particularmente densa e perigosa. Como não estamos familiarizados com aquela zona e com as diversas espécies de
animais que nela há, aceitamos os serviços dum guia
experimentado.
Na hora da partida apresenta-se ele com toda a
armadura necessária para eventuais lutas com os animais selvagens. Depois de algum tempo de marcha
perigosa estamos face a face com um grande e terrível
gorila que se prepara para nos atacar. Suponhamos que
o íamos enfrentar com as mãos vazias. Isto demonstraria
uma grande coragem. Mas nós não nos esquecemos do
guia contratado, de modo que o chamamos para nos
ajudar.
Qual seria a reacção do guia? Certamente gritaria:
»Volte para trás; não posso apontar a minha arma,
enquanto você não estiver fora do caminho.»
Assim a actuação do guia seria impedida e a nossa
destruição seria certa. De igual modo devemos deixar
Cristo fazer o que Lhe pertence. Quando o inimigo se
83
aproximar, não tentemos lutar com ele, «porque do
Senhor é a guerra«. 1.Samuel 17:47. »Pois a peleja não é
vossa, senão de Deus.« 2.Cor. 20:15
Nós não somos tão fortes como Satanás. Não podemos argumentar com ele. Lembrai-vos sempre de lhe
resistir com o poder da Palavra de Deus, e não com o
vosso próprio poder. Quando ele se aproximar de vós,
dizei-lhe simplesmente que está enganado, que a pessoa
que costumava responder às suas tentações não reside
mais em vós. Os tempos mudaram e a vida nova que
está agora em vós, não mais faz as coisas do passado.
Assim que Satanás ouve essa declaração de fé, foge e a
tentação passa.
PALAVRAS FINAIS
Todo aquele que aplicar os princípios descritos neste
estudo, conseguirá certamente o resultado desejado. As
experiências que faziam parte do homem de Romanos
sete pertencem ao passado e em vez disto começou a
liberdade de servir a Deus.
Desde que trabalhamos na manutenção e no desenvolvimento da vida espiritual, verificamos dia após dia
um crescimento. Virão tempos em que cometeremos
erros que nos levarão ao pecado. Mas que não sejamos
desanimados por isso. Analisemos o que nos levou ao
ponto de cairmos. Em seguida vamos a Jesus, a fim de
pedirmos a purificação, que certamente e de boa vontade nos será dada. Consideremos essa experiência como
uma lição educativa, que nos levará para o futuro, e
avancemos para novas alturas na experiência cristã.
Para conhecermos a beleza da vida cristã, devemos
ter tido algumas experiências, porque não há palavras
que a possam descrever adequadamente. Somente
aqueles que já ganharam essa experiência serão capazes
de compreender mais profundamente as palavras contidas neste estudo.
Devemos, porém, advertir que este estudo não
abrange todo o tema da experiência cristã. Pode ser
considerado somente como guia para entrar na experiência inicial de um verdadeiro renascimento. Há poucas
indicações que falam da manutenção desta experiência
uma vez alcançada, e nada foi dito sobre as grandes
obras de reforma e santificação, pelas quais diariamente
serão reeducados os nossos hábitos e ideias antigas. Mas
também não há necessidade de o compreendermos logo
85
no inicio, quando entramos como membros na familia
de Deus. Somente quando o primeiro passo for realizado, terá chegado o tempo de pensar nos próximos
passos maravilhosos, que nos guiarão a experiências
sempre mais altas e amplas.
Derrota traz-nos miséria e frustação. Isto, porém,
não é o plano de Deus para connosco. Para um cristão
há alturas e profundidades, que palavras não podem
exprimir.
Que esta pequena publicação vos guie para a alegria
completa que é a herança dos verdadeiros filhos de
Deus, não importando o lugar onde neste momento se
encontre, a igreja à qual pertence, ou se não professar
fé alguma. »Por causa disto me ponho de joelhos perante
o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, do qual toda a
família nos céus e na terra toma o nome, para que,
segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que
sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no
homem interior; para que Cristo habite pela fé nos
vossos corações; a fim de, estando arraigados e fundados
em amor, poderdes perfeitamente compreender, com
todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a
altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo,
que excede todo o entendimento, para que sejais cheios
de toda a plenitude de Deus. Ora, àquele que é poderoso
para fazer tudo muito mais abundantemente além
daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder
que em nós opera, a essa glória na igreja, por Jesus
Cristo, em todas as gerações, para todo o sempre.
Ámen.« Ef. 3:13-21
Aconselhamos para. continuidade do estudo presente as publicações seguintes:
O Caminho Consagrado para
a Perfeição Cristã
Carta aos Romanos
A.T. Jones
E.J. Waggoner
Raios de Luz Divina
(Compilação ilustrada de trechos escolhidos
da Carta aos Romanos)
E.J.Waggoner
Confissão Aceitável
F.T. Wright
Justificação pela Fé
F.T. Wright

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