a prestação de serviços e o código de defesa do consumidor

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a prestação de serviços e o código de defesa do consumidor
A prestação de serviços e o Código de Defesa do Consumidor: Os cuidados que devem ser tomados pelo
fornecedor
Nathaly Campitelli Roque
A prestação de serviços e o Código de Defesa do Consumidor: Os cuidados que devem
ser tomados pelo fornecedor
Nathaly Campitelli Roque1
Resumo: Neste artigo, o objetivo é traçar o perfil da responsabilidade do fornecedor de prestação de serviços,
estabelecendo a forma de procedimento a ser adotada que melhor atenda às diretrizes do Código de Defesa do
Consumidor.
Palavras-chave: Código de Defesa do Consumidor; Prestação de serviços; Responsabilidade.
1. Introdução
A prestação de serviços é uma das que maior importância têm ganhado na economia
do Brasil. Além de responder por parte cada vez mais importante do PIB nacional, garante
acesso a empregos e disponibiliza cada vez mais facilidades à população em geral. Por isso,
os incentivos públicos e os investimentos privados para empreendimentos de serviços
aumentaram, tornando-se cada vez mais relevantes.
Para que a atividade de serviços atenda a suas finalidades, é imprescindível que o
cliente, seu destinatário final, tenha seus direitos respeitados, como consumidor que é. Nesse
sentido, o aumento da importância da atividade faz crescer a fiscalização por parte das
autoridades e as reclamações na Justiça contra descumprimentos dos serviços contratados.
Este artigo pretende introduzir o tema do direito do consumidor, expondo as principais
diretrizes da legislação aplicável e, com base em exemplos do cotidiano da prestação de
serviços, apresentar maneiras de se adequarem as práticas comerciais à legislação do
consumidor. Não se pretende dar todas as soluções, mas traçar critérios gerais, que servirão de
norte para a adequada relação entre fornecedor e consumidor.
Daí porque é importante, em primeiro, expor os conceitos de relação de consumo e de
seus componentes. Depois, será mencionado o tratamento trazido pelo Código de Defesa do
Consumidor aplicável aos prestadores de serviço, categoria em que se enquadra a atividade de
prestação de serviços. Por fim, como conclusão, um resumo das diretrizes básicas que devem
ser tomadas pelo fornecedor para melhor atendimento ao cliente, dentro das determinações do
Código de Defesa do Consumidor.
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Mestre e Doutoranda em Direito pela PUC/SP, Professora Assistente Mestre da PUC/SP, Procuradora do
Município de São Paulo, autora de livros e artigos jurídicos e palestrante.
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2. Conceito de relação de consumo
2.1 Conceitos de consumidor, fornecedor, produto e serviço
A proteção ao consumidor é um direito fundamental do ser humano 2 e um dos
fundamentos da organização econômica brasileira. Procura o legislador incentivar a
concorrência entre as empresas levando em conta que o interesse daquele que adquire os
produtos e serviços é essencial.
A legislação que trata das relações de consumo é o Código de Defesa do Consumidor,
Lei 8.078/90. O regime jurídico de proteção do consumidor é aplicável a toda atividade que se
constitua relação de consumo. Por isso devemos, em primeiro lugar, determinar o que se
entende por relação de consumo3.
O Código de Defesa do Consumidor não traz a definição de relação de consumo, mas
define seus participantes, o consumidor e o fornecedor, e o seu objeto, a aquisição de produtos
e serviços.
Nos termos do artigo 2°, do Código de Defesa do Consumidor, considera-se
consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final. Sendo assim, o que caracteriza o consumidor é o fato de ele ser o
destinatário final, ou seja, reverter o produto ou serviço para si próprio, não o transferindo a
outras pessoas.
Fornecedor será, conforme o artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor, toda
pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados (p. ex., sociedades irregulares ou sem registro – as chamadas sociedades de
fato),
que
desenvolvem
atividade
de
produção,
montagem,
criação,
construção,
transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços. Dessa forma, podem ser fornecedores indústrias, prestadoras de
serviços diversos, comércio em geral.
2
Direitos fundamentais, na definição de José Afonso da Silva, consistem naquelas prerrogativas e instituições
que ele concretiza em garantia de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas; no qualitativo
fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se
realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por
igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados; é a limitação
imposta pela soberania popular aos poderes constituídos do Estado que dela dependem, conforme a obra Curso
de Direito Constitucional Positivo (1998, p. 205).
3
Relação de consumo é uma categoria de relação jurídica. Por relação jurídica se entende o vínculo legal que
surge entre duas ou mais pessoas e que tenha em seu cerne uma prestação a favorecer uma delas ou a ambas. Ou
seja, a lei regrará os direitos e obrigações dos participantes.
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Por produto entende-se qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. Serviço
é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as
de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de
caráter trabalhista, conforme definem os parágrafos 1o e 2o do artigo 3o do Código de Defesa
do Consumidor.
Tomando por base esses elementos, relação de consumo é aquela que envolver um
fornecedor de um lado, um consumidor (ou grupo de consumidores) de outro e, como objeto,
transações remuneradas envolvendo produtos e serviços. Vale a pela transcrever a definição
fornecida por José Geraldo Brito Filomeno:
Pode-se destarte inferir que toda relação de consumo: a) envolve basicamente duas partes bem
definidas, de um lado, o adquirente de um produto ou serviço (“consumidor”, e de outro, o
fornecedor ou vendedor de um produto ou serviço (“produtor/fornecedor”); b) tal relação
destina-se à satisfação de uma necessidade privada do consumidor; c) o consumidor, não
dispondo, por si só, de controle sobre a produção de bens de consumo ou prestação de serviços
que lhe são destinados, arrisca-se a submeter-se ao poder e condições dos produtores daqueles
mesmos bens e serviços. (2005, p. 26).
2.2 Os direitos do consumidor
Como antes mencionado, basta a existência de relação de consumo para que haja a
proteção ao consumidor, sendo indiferente a natureza da atividade empreendida pelo
fornecedor. Ou seja, a proteção do consumidor é a mesma em qualquer situação de consumo.
Constatada a existência de relação de consumo, o consumidor é presumido a parte
mais fraca da relação, já que, no contexto do mercado de consumo, o fornecedor é quem
detém, com exclusividade, informações sobre os bens e produtos e a decisão sobre quando,
onde e como disponibilizá-los para o consumidor.
Por conseguinte, a intenção do legislador é reequilibrar a situação de desigualdade,
não só econômica, mas também técnica e de decisão, que existe entre consumidor e
fornecedor. A forma para equacionar esta situação é dar preferência ao consumidor,
reconhecendo-lhe uma situação jurídica mais favorável, para ser equiparar suas vantagens às
do fornecedor e garantir a paridade de armas nas negociações de consumo.
Por esses motivos, é reconhecida ao consumidor uma série de direitos básicos, no
artigo 6º, do Código de Defesa do Consumidor. Dentre eles, destacamos:
a) a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no
fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
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b) a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços,
asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
c) a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem
como sobre os riscos que apresentem;
d) a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos
ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de
produtos e serviços;
e)
a
modificação
das
cláusulas
contratuais
que
estabeleçam
prestações
desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem
excessivamente onerosas;
f) a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais,
coletivos e difusos;
g) o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou
reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a
proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
h) a facilitação da defesa de seus direitos em juízo e fora dele;
i) a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral;
j) quaisquer outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o
Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas
autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do
direito, analogia, costumes e equidade.
Da leitura desse rol, verificamos que o fornecedor assume, por imposição de lei, a
responsabilidade de proceder com a máxima lisura em seu relacionamento com os
consumidores. Tal procedimento se aplica especialmente às seguintes atividades de negócios:
os contratos de consumo, a oferta dos serviços, a publicidade e a cobrança de dívidas.
3. Os contratos de prestação de serviços
3.1 Os contratos especiais e por adesão
Tecnicamente, chama-se contrato qualquer tipo de avença entre duas pessoas ou mais
pessoas, em que uma delas assume uma prestação de qualquer natureza em favor da outra, a
ser realizada em determinado momento e local.
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Como regra, os contratos podem ser livremente realizados, observadas apenas as
limitações estabelecidas pela lei. Por exemplo, não se pode negociar partes do corpo humano
ou dívidas de jogo, porque proibido por lei; há contratos que devem observar a forma escrita e
outras formalidades etc.
No caso dos contratos de prestação de serviços de turismo, as formalidades que se
devem observar, de forma geral, são a capacidade dos envolvidos (turista maior de idade ou
devidamente representado por seus pais ou responsáveis de um lado e empresa ou pessoa
física devidamente registrada nos órgão do Ministério do Turismo, de outro) e a licitude do
objeto (por exemplo, é proibido o turismo com fins de exploração sexual de menores).
Quanto à forma, pode ser ele verbal (não surge nenhum documento que expresse o
teor do combinado, como ocorre ao comprar o ingresso para um parque temático) ou escrito
(como se verifica no caso de haver a realização de um documento escrito contendo todos os
termos relacionados a um pacote turístico). Recomenda-se sempre a forma escrita, já que ela
proporciona maior segurança tanto para o consumidor quanto para o fornecedor.
Quanto ao conteúdo, o contrato pode conter um conteúdo específico para aqueles
envolvidos (como o caso de um pacote de turismo feito com exclusividade para aquele
consumidor), ou ser realizado um contrato de adesão, ou seja, um contrato genérico, de
conteúdo preestabelecido pelo fornecedor, do qual o consumidor consente em participar.
3.1.1 Disposições comuns a ambos os tipos de contrato
Tanto o contrato específico, como aquele por adesão têm regime legal estabelecido
pelo Código de Defesa do Consumidor, que assim determina:
a) Os contratos que regulam as relações de consumo somente obrigarão os consumidores se
lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os
respectivos instrumentos forem redigidos de modo a facilitar a compreensão de seu sentido e
alcance. Caso contrário, o consumidor prejudicado poderá se negar a cumprir o contrato e
buscar junto ao Poder Judiciário o ressarcimento por todos os prejuízos que tiver (art. 46,
CDC).
b) As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor:
caso o contrato tenha termos ambíguos, contraditórios ou confusos e haja qualquer conflito
quanto a seu cumprimento, deverá se buscar o entendimento que melhor atenda aos interesses
do consumidor (art. 47, CDC);
c) As declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos
relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor, sendo possível ao consumidor exigir
em juízo seu cumprimento: mesmo não havendo contrato formal, qualquer documento escrito
(recibos, propostas, pré-contratos e similares) fazem as vezes do contrato, vinculando
fornecedor e consumidor (art. 48, CDC).
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Da leitura dos termos acima, podemos concluir que, com a proteção contratual,
pretendeu-se garantir a boa-fé entre os contratantes, de modo a trazer transparência e
harmonia nas relações de consumo, mantendo o equilíbrio entre eles (NUNES JR.;
SERRANO, 2005, p. 351), sem, com isso, prejudicar a liberdade de escolha do consumidor,
nem a livre iniciativa do fornecedor.
3.1.2 Disposições especiais aos contratos de adesão
No caso de contratos de adesão, a lei determina as seguintes particularidades:
a) pequenas alterações, como a inserção de cláusula no formulário não o desfigura, desde que
não seja o documento substancialmente alterado (art. 54, § 1º, CDC);
b) nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória, ou seja, aquela que estabelece o
desfazimento do contrato em caso de não pagamento ou não cumprimento das prestações,
desde que haja alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, sendo que a compensação ou a
restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terão descontados, além da vantagem
econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao
fornecedor. Neste caso, se, p. ex., o consumidor desistir da viagem contratada, pode ser retido
parte do pagamento (art. 54, § 2º, CDC);
c) os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos
e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua
compreensão pelo consumidor (art. 54, § 3º, CDC);
d) As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor (como, por exemplo, perda
de parte das parcelas pagas) deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e
fácil compreensão (art. 54, § 4º, CDC).
3.2 Cláusulas abusivas
Nos contratos de prestação de serviços de turismo (assim como nos demais contratos
de consumo), é vedado constar de seu texto as chamadas cláusulas abusivas. Cláusulas
abusivas são aquelas que preveem vantagens desproporcionais em favor do fornecedor. O
artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor traz exemplos deste tipo de disposição,
algumas das quais destacamos abaixo:
a) impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de
qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos:
não é admitida a disposição no contrato que, por exemplo, isente o fornecedor de indenizar por
danos sofridos pela perda de bagagens, furtos ou roubos ocorridos no estabelecimento de
hospedagem ou que submetam a indenização a prestações irrealizáveis (p. ex., provar quem foi
o assaltante ou onde as malas se perderam);
b) subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos em
lei;
c) transfiram responsabilidades a terceiros, como, por exemplo, no caso de transferir apenas
para o co-prestador a responsabilidade pelo descontentamento com o serviço prestado;
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d) estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em
desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade, ou seja, qualquer
postura que diminua os direitos do consumidor ou o coloque em desvantagem são proibidas;
e) imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor,
sendo proibido, por exemplo, estabelecer que o contrato de serviços bancários apenas será
realizado caso compre de determinado seguro de outra empresa;
f) deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o
consumidor; são aqueles em que o consumidor se compromete e o fornecedor escolhe se vai
prestar o serviço ou não;
g) permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral:
não é possível, por exemplo, estabelecer uma cláusula que estabeleça que o fornecedor vai
estipular, a seu total critério, a melhor forma de reajustar as prestações, caso o serviço seja
contratado a prazo;
h) obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual
direito lhe seja conferido contra o fornecedor, ou seja, se for igual a possibilidade para ambos
os negociantes, a cláusula é válida;
i) autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato,
após sua celebração; da mesma forma, se for prevista a renegociação com ambas as partes, a
cláusula está correta;
j) infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais, sendo proibido, por exemplo,
contrato de viagem para fins de caça em locais proibidos.
Analisando-se os exemplos acima, concluímos que toda a qualquer disposição que
traga desvantagens para o consumidor, reforçando a posição do fornecedor, é abusiva e, por
isso, é proibida pelo Código de Defesa do Consumidor.
Caso o contrato preveja cláusulas abusivas, estas são consideradas como não escritas,
ou seja, poderão ser desconsideradas pelo consumidor ou pelo juiz, caso exista ação judicial,
como estabelece o artigo 51, caput, CDC. É o que a lei chama de nulidade de pleno direito. O
restante da avença continua válido, a não ser que o contrato se mostre oneroso, seja para o
consumidor, seja para o fornecedor, por força da desconsideração da cláusula (art. 51, § 2º,
CDC).
Se houver outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor no
contrato, como ocorre, por exemplo, no parcelamento de viagens (em que há a participação de
uma instituição financeira), cabe ao fornecedor informar ao consumidor, previamente e com a
máxima clareza, sobre todos os aspectos da operação, como o preço do serviço em moeda
nacional, o montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros, acréscimos
legalmente previstos, número e periodicidade das prestações, a soma total a pagar, com e sem
financiamento, nos termos do artigo 52, CDC.
Nestes casos, as multas de mora decorrentes do inadimplemento de obrigações no seu
termo não poderão ser superiores a dois por cento do valor da prestação. Além disso, é
assegurada ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante
redução proporcional dos juros e demais acréscimos, como estipulam o art. 52, em seus
parágrafos 1º e 2º, CDC.
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3.3 Desistência do contrato de consumo
Em termos técnicos, qualquer tipo de contrato pode ser denunciado, ou seja, qualquer
dos participantes pode desistir de seus termos. Isso porque ninguém é obrigado a se manter
vinculado a um contrato que não mais atende a seus interesses.
Existem dois casos diferentes de desistência: uma, no caso de contrato celebrado no
estabelecimento do fornecedor e outra, no caso de realização por internet, telefone, correio,
fax ou outra forma de comunicação à distância ou ainda em domicílio (venda porta a porta).
Neste último caso, estabelece o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor que o
consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 (sete) dias a contar de sua assinatura ou
do ato de recebimento do produto ou serviço. Neste caso, os valores eventualmente pagos, a
qualquer título, serão integralmente devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.
No caso de desistência do contrato de turismo, sendo este celebrado no
estabelecimento do fornecedor, poderá o fornecedor reter, a título de indenização, parte dos
valores pagos, a fim de restituir valores já empregados com pagamentos de sinal e
adiantamento de despesas.
O Código de Defesa do Consumidor não oferece um parâmetro para estes casos.
Lembramos que o perdimento total é considerado abusivo. Para contratos de turismo, por
exemplo, é trazido um parâmetro na Deliberação Normativa 161 da Embratur: em casos de
desistência com mais de 30 dias de antecedência há retenção de 10% do valor. Entre 30 e 21
dias antes da saída 20% de retenção e a menos de 20 dias poderá haver maiores retenções,
desde que justificadas. Para passagens aéreas, deve ser observada a regulamentação do setor,
sempre com vistas à proteção do consumidor.
Para fins de proteção das partes, o pedido de desistência deve ser feito por escrito. O
fornecedor pode exigir esta formalidade, como forma de estabelecer a segurança tanto para si
quanto para o consumidor.
Além das hipóteses de desistência, o contrato de prestação de serviços poderá ser
desfeito em caso de descumprimento de seus termos por qualquer uma das partes.
4. O dever de informação
Como acima mencionado, a legislação do consumo se presta para proporcionar ao
consumidor uma situação mais vantajosa, de forma a colocá-lo em pé de igualdade com o
fornecedor. E, tendo em vista que, na grande maioria das vezes, é o fornecedor que detém
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todas as informações sobre os seus produtos e serviços, estabelece o Código de Defesa do
Consumidor o dever de informar o consumidor sobre a segurança dos produtos e serviços
colocados à disposição.
Por este motivo, estabelece a lei que os produtos e serviços colocados no mercado de
consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os
considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os
fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu
respeito, nos termos do artigo 8º, CDC.
Se o produto ou serviço for potencialmente nocivo ou perigoso à saúde ou segurança
do turista-consumidor deverá o fornecedor informar, de maneira ostensiva e adequada, a
respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas
cabíveis em cada caso concreto para diminuir os riscos (art. 9º, CDC).
Sendo assim, por exemplo, é dever do hotel informar a profundidade da piscina
colocada à disposição dos hóspedes; é dever do parque temático informar qualquer risco à
saúde que possa proporcionar a atração (p. ex., uma montanha russa); é dever da empresa de
dedetização informar se o produto pode comprometer a saúde de animais e plantas. Todas
estas informações devem ser de fácil compreensão, lembrando que poderá haver crianças ou
pessoas com dificuldade de leitura ou portadoras de necessidades especiais.
5. Das práticas comerciais
As práticas comerciais foram definidas por Antônio Herman de Vasconcelos e
Benjamin na obra coletiva Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do
Anteprojeto, como “os procedimentos, mecanismos, métodos e técnicas utilizados pelos
fornecedores para fomentar, manter, desenvolver e garantir a circulação de seus produtos e
serviços até o destinatário final” (1998, p. 200).
Assim, segundo o autor, estão abrangidas por esta ideia todas as atividades de prévenda, como o marketing (e a publicidade, um dos seus principais instrumentos) como as
relacionadas ao pós-venda, como as garantias por defeitos, os serviços de pós-venda, os
arquivos de consumo e as cobranças de dívidas (1998, p. 200).
Ainda na lição do autor, não se trata de impor limites rígidos e intransponíveis a estas
práticas, mas sim torná-las meio de satisfação plena do consumidor. Daí porque as regras
referentes a elas são genéricas, de modo a possibilitar a atualização sobre os avanços do
mercado (1998, p. 206-207).
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Justamente porque as práticas comerciais têm grande repercussão junto ao público, o
Código de Defesa do Consumidor estabelece algumas regras que devem ser seguidas pelos
fornecedores para a divulgação de seus produtos e serviços no mercado de consumo, com a
finalidade de facilitar a compreensão do consumidor sobre o que lhe é oferecido e sobre os
reais benefícios e riscos que apresentam os produtos e serviços.
5.1 Da oferta
Tecnicamente se chama “oferta” a proposta feita por um dos contratantes, dirigida de
maneira clara ao outro, a fim de que ambos realizem um contrato no futuro. É uma espécie de
“convite” para um vínculo contratual, que será detalhado e acertado pelos interessados.
No caso do mercado de consumo, a oferta tanto pode ser dirigida a uma ou algumas
pessoas determinadas, como pode ser dirigida a um grupo indeterminado de pessoas. Algumas
destas pessoas podem ter conhecimento técnico para discussão dos termos ofertados, como
podem ser completamente leigas neste assunto.
Daí porque estabelece o artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor que a oferta e
apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas,
ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade,
composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como
sobre os riscos que apresentam à saúde e à segurança dos consumidores.
Assim, fica o consumidor assegurado ao ter todo o tipo de informação acerca daquilo
que pretende adquirir, especialmente quanto aos riscos que possam representar ao
consumidor.
Em caso de oferta ou venda por telefone ou reembolso postal, além das informações
acima mencionadas, deve constar o nome do fabricante e endereço na embalagem,
publicidade e em todos os impressos utilizados na transação comercial (art. 33, CDC).
Além disso, estabelece o artigo 30, do Código de Defesa do Consumidor, que toda
informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de
comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o
fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.
Sendo assim, caso se ofereça um tratamento estético com determinados equipamentos
a determinado preço e que seja especializado, p. ex., para manchas da pele ou celulite, tais
dados, precisos que são, obrigam o fornecedor, mesmo que não estejam estabelecidos no
contrato a ser assinado pelo consumidor. A oferta, assim, faz parte integrante do contrato.
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Caso a oferta seja realizada por empregado do fornecedor ou por seus representantes
autônomos, o fornecedor do produto ou serviço responde por ela, não sendo lícito alegar que o
profissional exorbitou sua orientação para deixar de honrar com o prometido, conforme
determina o artigo 34, CDC.
Estabelece o artigo 35, CDC, que se o fornecedor de produtos ou serviços recusar
cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá optar por uma das
seguintes formas de ressarcimento:
a) exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou
publicidade;
b) aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;
c) rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada,
monetariamente atualizada, e a perdas e danos.
5.2 Da Publicidade
Uma das espécies mais importantes do marketing é a publicidade. Pela publicidade,
busca o fornecedor alcançar um número indeterminado de pessoas, para as quais se divulgam
os produtos e serviços oferecidos. Por seu caráter amplo, a publicidade teve especial atenção
do legislador, sendo impostas as limitações pelo Código de Defesa do Consumidor.
A primeira delas é relativa à identificação da publicidade. Por isso, estabelece o
Código de Defesa do Consumidor que a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o
consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal (art. 36, CDC).
Além disso, é ônus do fornecedor demonstrar a veracidade das informações constantes
da publicidade (art. 38, CDC). Se é dito no anúncio ou no comercial que a satisfação com
determinado serviço é de 85% (oitenta e cinco por cento), deve o fornecedor apresentar dados
que confirmem tal estatística.
Por este motivo, estabelece a lei que, na publicidade de seus produtos ou serviços, o
fornecedor manterá em seu poder os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação
à mensagem, para informação dos legítimos interessados. Ou seja, se um consumidor quiser
ter acesso a estes dados, deverá o fornecedor permitir a informação sobre o ponto.
Também é vedada a publicidade enganosa ou abusiva.
Considera o Código de Defesa do Consumidor que é enganosa qualquer modalidade
de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por
qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito
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da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer
outros dados sobre produtos e serviços. A publicidade é enganosa tanto por omissão, quanto
por deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço (art. 37, §§ 1º e 3º, CDC).
É enganosa, por exemplo, a publicidade de um resort que menciona em um anúncio
ter fontes de águas medicinais, quando, na verdade, oferece aos clientes banho em água do
fornecimento geral, porém aquecida. Também é enganosa a publicidade que deixa de
informar que o preço de uma viagem a prazo é superior ao pagamento à vista.
É abusiva toda a publicidade que visa a impressionar indevidamente o consumidor,
valendo-se de sua fraqueza. O Código de Defesa do Consumidor dá exemplos desta prática: a
publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou
a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita
valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma
prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (art. 37, § 2º, CDC).
O fornecedor é responsável, nos termos da lei, pelo mau uso da publicidade e poderá
ser processado, podendo arcar com indenizações às vítimas, sem prejuízo de pagamento de
multas e de apuração criminal.
5.3 Das Práticas Abusivas
Além do cuidado com a oferta e com a publicidade, o Código de Defesa do
Consumidor proibiu práticas que põem o consumidor em desvantagem. O Código de Defesa
do Consumidor traz, em seu artigo 39, os seguintes exemplos:
a) condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou
serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos; é a chamada venda casada, que
ocorre, por exemplo, no caso de determinado passeio em local de turismo à aquisição de
determinado pacote turístico;
b) recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas
disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;
c) enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer
qualquer serviço, como ocorre com cartões de crédito enviados sem solicitação, mandando-se
posteriormente a cobrança;
d) prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde,
conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços, como é o caso
de vender um pacote turístico para Aparecida do Norte – SP (local de conhecida peregrinação
católica) para um turista de outra religião que seja analfabeto;
e) exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; como é o caso do perdimento
total do preço pago no caso de desistência do contrato;
f) executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do
consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes;
g) repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício
de seus direitos; como manter um cadastro dos turistas “reclamões”.
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h) colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as
normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas específicas não existirem,
pela Associação Brasileira de Normas Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho
Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro), como no caso de
serviços que necessitem de maiores procedimentos de segurança;
i) recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a
adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em
leis especiais;
j) elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços;
l) deixar de estipular prazo para o cumprimento de obrigação pelo fornecedor ou deixar a
fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério, como ocorreria de haver uma prestação de
serviços sem data prévia, devendo a data ser apontada pelo prestador;
m) aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido.
Também regulou o Código de Defesa do Consumidor a obrigatoriedade de
fornecimento do orçamento de prestação de serviços. Neste documento deverão estar
discriminados o valor da mão-de-obra, dos materiais e equipamentos a serem empregados, as
condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços, em seu art. 40.
O valor orçado terá validade pelo prazo de dez dias, contado de seu recebimento pelo
consumidor, podendo as partes estipular uma validade maior ou menor (art. 40, § 1º, CDC).
Uma vez aprovado pelo consumidor, o orçamento obriga os contraentes e somente pode ser
alterado mediante livre negociação das partes (art. 40, §2º, CDC). O consumidor não responde
por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços de terceiros não
previstos no orçamento prévio (art. 40, §3º, CDC).
No caso de fornecimento de produtos ou de serviços sujeitos ao regime de controle ou
de tabelamento de preços (como no caso dos custos com transportes), os fornecedores deverão
respeitar os limites oficiais. Caso cobrem a mais, deverão devolver a quantia recebida em
excesso, monetariamente atualizada, podendo o consumidor exigir, caso queira, o
desfazimento do negócio, sem prejuízo de outras sanções cabíveis (art. 41, CDC).
6. Cobrança de dívidas
6.1 A cobrança de dívidas
Apesar da franca expansão, o mercado do turismo, assim como os demais, também
sofre com o inadimplemento dos consumidores, o que além de comprometer o lucro do
negócio, pode, em casos graves, provocar até mesmo sua falência.
Sendo assim, é direito do fornecedor exigir o cumprimento do contrato por parte do
consumidor, especialmente no que toca ao pontual pagamento dos valores devidos. Porém,
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este direito deve observar as determinações do Código de Defesa do Consumidor para ser
legalmente realizado.
Por este motivo, na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto
a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça (art. 42, CDC).
O fornecedor pode e deve contar com os meios jurídicos de cobrança, ingressando em juízo se
necessário for. Porém, não poderá mandar cartas ao padrão do consumidor, para mencionar
que é ele devedor, nem pôr faixas na rua, cartazes em áreas comuns etc.
Além disso, estabelece o Código de Defesa do Consumidor que o consumidor cobrado
em quantia indevida tem direito à devolução do valor cobrado (chamado tecnicamente de
repetição do indébito), correspondente ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de
correção monetária e juros legais. O fornecedor apenas não arcará com esta indenização se
demonstrar ter ocorrido engano justificável (p. ex., homonímia entre diversos devedores,
existência de diversas dívidas, havendo cobrança por uma que está a ser discutida em juízo,
ainda sem conhecimento do credor etc. – art. 42, parágrafo único, CDC).
6.2 Cadastros de devedores
Também os cadastros de devedores têm limitações, de acordo com a legislação do
consumidor. É dado por lei o direito ao consumidor de ter acesso às informações existentes
em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como
sobre as suas respectivas fontes. Sendo assim, são proibidos cadastros secretos de maus
pagadores (art. 43, CDC).
Os cadastros de devedores e os dados referentes devem ser objetivos, claros,
verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão. Há um limite estabelecido por lei de cinco
anos para a abrangência do cadastro. Assim, uma dívida não paga há seis anos não poderá
causar a inscrição do consumidor no cadastro (art. 43, § 1º, CDC).
Sempre que o consumidor for cadastrado como devedor deverá ser comunicado por
escrito e terá direito a ter acesso a estes dados (art. 43, § 4º, CDC). O consumidor, sempre que
encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo
o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários
das informações incorretas (art. 43, § 3º, CDC).
7. A responsabilidade do fornecedor do serviço de turismo
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Como visto acima, todas as disposições referentes ao Código de Defesa do
Consumidor se voltam a garantir a boa-fé nas relações de consumo e de proporcionar a
paridade de armas entre seus participantes.
Caso o prestador de serviços de turismo execute mal o que foi contratado, ou traga
danos ao consumidor ou desrespeite outras determinações legais, poderá sofrer penalidades,
que podem ser a indenização pelos danos causados, refazimento do serviço, multas, restrição
de atividades ou até responsabilização criminal, que pode acarretar a prisão dos responsáveis.
Tem o prestador de serviços o dever de zelar pela correta prestação dos serviços
contratados. Assim, é vedado prometer serviços de nível superior e fornecer a prestação de
forma incompatível; mencionar que há compatibilidade com determinadas necessidades
especiais, as quais não existem, como, p. ex., dizer que há determinado tipo de atividade e
lazer em um spa ou hotel, quando este não existe, dizer que o serviço tem duração longa
quando, na verdade, não tem.
Nestas situações, em que o serviço seja prestado de forma inadequada, seja porque há
falhas que diminuem o valor do serviço, seja por haver disparidade com as indicações
constantes da oferta ou mensagem publicitária, o consumidor poderá exigir, até mesmo por
ação judicial, alternativamente e à sua escolha (art. 20, CDC):
a) a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
b) a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais
perdas e danos;
c) o abatimento proporcional do preço.
Além do mais, deve o prestador de serviços de turismo prestar todo o serviço e
garantir a segurança do cliente, além de evitar, em caso de problemas, aborrecimentos
desnecessários. Sendo assim, deve o prestador de serviços zelar para que não ocorra nenhum
dano a seus clientes, seja físico, seja financeiro, seja moral.
Caso estas situações aconteçam, o fornecedor de serviços responderá pela reparação
dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem
como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (art. 14, caput,
CDC). O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar (art. 14, § 3º,
CDC):
a) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste (ou seja, que a reclamação não tem nenhum
fundamento);
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b) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (que o consumidor desrespeitou as normas
de segurança, ou que o dano tenha sido causado por pessoa que não prestava serviços àquela
operadora, não estando incluídos no contrato).
Tanto no primeiro quanto no segundo caso, diz-se que a responsabilidade pela
indenização se impõe independentemente de culpa. Por este motivo, o fato de o fornecedor
não ter se informado adequadamente, ou não ter tido intenção em causar danos não é
considerada para esta finalidade. Somente se o prestador de serviços for profissional liberal,
deverá ser verificado se ele tinha intenção em causar dano ou se agiu com imperícia,
imprudência ou negligência (art. 14, § 4º, CDC).
E esta responsabilidade pelos danos causados pode atingir os sócios da pessoa jurídica
no caso de ser constatada uma das seguintes hipóteses (art. 28, caput, CDC):
a) em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei,
fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social;
b) quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa
jurídica provocados por má administração;
c) sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados aos consumidores.
Também as demais empresas participantes de um mesmo grupo podem ser
responsabilizadas pelos danos causados por outra empresa do mesmo grupo, nos termos
previstos em lei (art. 28, §§ 2º a 4º, CDC).
As infrações das normas de defesa do consumidor ficam também sujeitas, conforme o
caso, às seguintes sanções administrativas, a serem aplicadas pelas entidades competentes
(Municípios, órgãos de controle do turismo ou de defesa do consumidor, conforme
estabelecido em lei), sem prejuízo das demais penalidades (art. 56, CDC):
a) multa;
b) apreensão do produto;
c) inutilização do produto;
d) cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
e) proibição de fabricação do produto;
f) suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;
g) suspensão temporária de atividade;
h) revogação de concessão ou permissão de uso;
i) cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
j) interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade;
l) intervenção administrativa;
m) imposição de contrapropaganda.
Também há a previsão de crimes. Quem será responsabilizado criminalmente é o
fornecedor pessoa física ou os representantes da empresa prestadora de serviços de turismo.
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Os crimes de consumo e suas penas estão previstos nos artigos 63 a 80, do Código de Defesa
do Consumidor e, se demonstrados, podem resultar em prisão de até dois anos, dependendo
do crime.
Além das penalidades acima mencionadas, os maus prestadores de serviços de
turismo, assim como os demais maus fornecedores, poderão ser incluídos em cadastros de
reclamações geridos por órgãos públicos de defesa do consumidor que manterão cadastros
atualizados de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e serviços,
devendo divulgá-lo pública e anualmente. A divulgação indicará se a reclamação foi atendida
ou não pelo fornecedor.
Qualquer interessado pode ter acesso às informações ali contidas, inclusive o
fornecedor, que poderá requerer as correções das informações equivocadas e imprecisas.
8. Conclusão: a conduta do bom prestador de serviços
Como expusemos, é inquestionável que os contratos de prestação de serviços são
relações de consumo e, por isso, é aplicável a disciplina do Código de Defesa do Consumidor
para todas as atividades do setor. A seguir, sintetizamos os principais deveres a serem
observados pelos fornecedores de serviços:
a) os contratos, cujo teor será exibido ao consumidor, serão de fácil compreensão e não terão
cláusula que o coloque em desvantagem;
b) caso o contrato for de adesão, também deve-se atentar para que todas as cláusulas que
limitem de alguma forma direitos do consumidor sejam redigidas em destaque;
c) todos os riscos da atividade deverão ser ostensivamente informados ao consumidor;
d) toda oferta ao consumidor deve ser cumprida, independente de constar expressamente ou
não do contrato;
e) a publicidade deve ser adequada a informar corretamente o consumidor, não podendo trazer
informações falsas ou gerar comportamentos incompatíveis com a ação de boa-fé;
f) nenhuma prática comercial pode abusar da posição de supremacia que tem o fornecedor em
relação ao consumidor, de forma a eliminar sua possibilidade de negociação ou de reivindicar
seus direitos;
g) os cadastros de devedores devem conter informações corretas, precisas e de fácil
compreensão, as quais não podem se referir a dívidas existentes há mais de cinco anos.
É certo que problemas podem ocorrer na prestação de serviços, por mais que todos os
cuidados sejam tomados por parte do fornecedor. Ocorrendo qualquer falha, mesmo
imprevisível, deve o fornecedor anular ou minimizar o impacto desta no serviço a ser
usufruído pelo cliente, como impõe o Código de Defesa do Consumidor.
Seguindo-se as diretrizes estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor, além
de evitar indenizações e pendências com órgãos públicos, obtém-se a grande finalidade da
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prestação de serviços: agradar sempre o cliente, cativando-o e favorecendo contratos futuros,
pela confiança existente entre o cliente e seu prestador de serviços.
Referências Bibliográficas
FILOMENTO, José Geraldo Brito. Manual de Direito do Consumidor. 8. ed. São Paulo:
Atlas, 2005.
FRISO, Gisele de Lourdes. Código de Defesa do Consumidor Comentado. São Paulo:
Primeira Impressão, 2007.
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado
pelos autores do anteprojeto. 5. ed., rev. e atual., Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1998.
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2. ed.,
São Paulo: Saraiva, 2005.
NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano; SERRANO, Yolanda Alves Pinto. Código de Defesa do
Consumidor Interpretado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
ABSTRACT: In this article, the ends is to delineate the profile the responsibility of the provider of services,
establishing a form of procedure to be adopted that best meets the guidelines of the Code of Consumer
Protection.
Keywords: Code of Consumer Protection; Provider of services; Responsibility.
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