Como organizar a ação Cáritas

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Como organizar a ação Cáritas
EXPEDIENTE
Cáritas Brasileira
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Módulo F
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Presidente: Dom Luís Demétrio Valentini
Vice-Presidente: Anadete Gonçalves Reis
Diretora Secretária: Ir. Francisca Erbênia de Sousa
Diretor Tesoureiro: Pe. Evaldo Praça Ferreira
Coordenação Colegiada
Diretora executiva nacional: Maria Cristina dos Anjos da Conceição
Coordenador: Ademar Bertucci
Coordenador: Luiz Cláudio Mandela
Texto: Ivo Poletto
Revisão: Ida Boing Magalhães de Sousa
Comunicação:
Ricardo Piantino/ Thays Puzzi/Fernanda Nalon ::
Secretariado Nacional - [email protected]
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NA SOLEIRA DA PORTA
- Bom-dia, Genésio! Como vai? – foi perguntando Padre Onofre.
- Bom-dia, Padre! A que devo a alegria de sua visita?
- É que o pessoal da Cáritas diocesana andou falando comigo para criar
uma Cáritas paroquial por aqui, e eu me lembrei de trocar umas ideias com
você sobre isso.
- Eu sei que Cáritas é coisa boa, mas entendo pouco do assunto. O que
sei se deve ao que tenho ouvido do pessoal que trabalha com ela.
- Pois é, eu também não tenho experiência. O que desejo é melhorar o
trabalho em favor dos mais empobrecidos/as do nosso município. Você acha
que a gente consegue isso organizando a Cáritas?
- Depende, não é, Pe. Onofre? Acho que se faltarem duas coisas, não
vai adiantar muito, não. A primeira é falar do assunto pra todo mundo, em
todas as comunidades; só assim o pessoal vai ficar sabendo da finalidade da
Cáritas, já que, pelo que ouvi, hoje em dia a Cáritas não quer fazer trabalho
social no lugar de ninguém; pelo contrário, ela, com seu exemplo, quer animar
as pessoas e as comunidades a serem solidárias. A segunda coisa é essa: que a
gente acerte na escolha das pessoas para fazerem este trabalho; já ouvi
histórias de gente que assumiu a Cáritas e só fez travar o trabalho social, ou
levou tudo pra ações assistencialistas.
- Concordo com você, Genésio. É por isso que preferi começar
trocando umas ideias com pessoas como você. E acho que se deve falar com
mais gente, espalhando a notícia de que se pensa em organizar a Cáritas por
aqui aos poucos. Você não acha que deveríamos falar disso com o Conselho
paroquial?
- Não será melhor começar falando com as pessoas responsáveis pelas
pastorais sociais? E também com as obras sociais, tipo os Vicentinos, a Casa da
Criança, o grupo que cuida de aidéticos?
- Boa ideia. Falando com esse pessoal, e, quem sabe, fazendo uma
reunião, ou até mais do que uma, a gente pense na criação da Cáritas tendo
presente o que se está fazendo. Isso pode ser até oportunidade para rever a
prática das pastorais e obras sociais.
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- Lembrando de novo o que falaram da Cáritas em reuniões de que participei,
ela não quer ocupar lugar de nenhuma pastoral; ela pode até reforçar a união,
a articulação das pastorais, mas nada de substituir ou de coordenar essa
articulação. O melhor acontece quando a Cáritas entra como uma irmã
colaboradora. Agora, junto com as pastorais sociais, cabe a ela, na verdade,
animar a comunidade cristã a estar atenta às pessoas em necessidade,
organizando sua ação amorosa e libertadora.
- O tempo de organização da Cáritas pode ser, então, um trabalho de
conscientização sobre a missão social de toda comunidade cristã?
- É claro, padre. Na verdade, não só pode, mas deve ser um tempo de
mobilização da comunidade. “Cáritas”, antes de ser um organismo pastoral, é
a prática do amor libertador que Deus planta no coração das pessoas; e de um
amor que precisa ser assumido livremente, como aconteceu com os
discípulos e discípulas que conviveram com Jesus. Ele mesmo disse que não
queria ninguém sem convicção; ele quer amigos e amigas, a quem Jesus
revela tudo que recebeu do Pai, e não servos, servas, que só fazem o que seu
senhor manda, sem conhecer suas intenções e objetivos. (Cf. Jo 15,15)
- Puxa, Genésio, como você está conhecendo a missão dos cristãos e
cristãs! Onde é que aprendeu isso?
- Na verdade, padre, isso tudo eu fui aprendendo nas reuniões dos
leigos/as, nos encontros e assembleias que nossa paróquia me deu
oportunidade de participar. E pra falar com franqueza, estava esperando uma
chance de falar sobre isso com você, pois ando meio cabreiro com a falta de
coerência da vida cristã em nossa paróquia; às vezes, nem mesmo vontade de
ir à missa tenho mais, pois acho que lá se fala de coisas muito bonitas, se
lembra de como Jesus deu a vida pelas pessoas que amava, mas se volta pra
casa sem mudar a prática da vida cotidiana. Fico pensando: se os cristãos/ãs
levassem pra vida de todo dia o exemplo de Jesus, se fossem discípulos/as
reais do Mestre, como a vida do povo poderia estar diferente!
- E você acha que o processo de criação da Cáritas pode despertar a
comunidade para essa maior autenticidade da vida cristã?
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- Acho, sim. E como desejo que isso aconteça. Mudaria nossa presença
na sociedade, caminhando com os empobrecidos/as no enfrentamento de
seus problemas. E nossas celebrações também mudariam, ficando mais
ligadas aos momentos fortes de nossa prática do amor aos irmãos e irmãs,
como aconteceu com a celebração da Ceia de Jesus com os discípulos/as,
marcada pelo desafio de enfrentar a ameaça de prisão e até de morte por
causa do que estava fazendo.
- Bom. Muito bom. Posso contar com você?
- Se for para fazer isso, renovando a vida das comunidades, estou à
disposição.
- A gente volta a falar sobre isso, de preferência junto com outras
pessoas, e já para planejar como será feito o caminho para organizar a Cáritas
paroquial. Aliás, sinta-se convidado para ir falando com quem você acha que
pode participar dessa nova iniciativa pastoral.
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1º - UMA GRANDE QUESTÃO
A primeira pergunta que deve ser respondida por quem decide
organizar a Cáritas paroquial é essa: existem, na localidade, pessoas
empobrecidas que não contam com solidariedade que as ajude a enfrentar a
situação? Onde moram? Quais suas necessidades?
Em outras palavras, o motivo para criar Cáritas não está na estrutura
eclesial. É da situação da vida do povo que vem o convite de Deus para
organizar melhor a prática de amor libertador da comunidade cristã. Como
Jesus deixou claro que ele está nas pessoas mais necessitadas (cf. MT 25,3546), cabe à comunidade de seus seguidores/as estar atenta aos
necessitados/as, prestando a eles/as os serviços que os ajudem a superar a
situação em que se encontram.
O desafio é imenso: dar atenção a quem está faminto ou sem água de
boa qualidade, portanto, sem segurança alimentar; acolher as pessoas
migrantes, de modo especial as que vivem nas ruas, sem ter sequer com que
se vestir - sem ter garantidos seu direito ao trabalho com justa remuneração e
seu direito à moradia; visitar e libertar as pessoas que se encontram em
diferentes tipos de prisão, abandonadas, sem ter seus direitos humanos
respeitados; estar ao lado e libertar as pessoas que sofrem opressões, de todo
tipo – impedidas ou sem força para fazerem valer seus direitos sociais e
políticos; anunciar boas notícias a todas as pessoas empobrecidas,
despertando nelas a consciência de seu valor e dignidade, de seus direitos e
de seu poder; proclamar a todas as pessoas a profecia do Reino, do ano da
graça do Senhor, isto é: o amor libertador vencerá, e sempre será possível ir
criando um mundo melhor, mas justo, mais democrático, por mais que
pareçam invencíveis as forças da exploração e da dominação organizadas nas
sociedades de livre mercado globalizado.
Por isso, a decisão de criar a Cáritas depende de um primeiro
diagnóstico da realidade local. Um diagnóstico feito com ajuda de
instrumentos sociológicos, seguido de uma reflexão evangélica sobre a
realidade. É a realidade que vai dizer para que se deseja criar a Cáritas.
Entre as técnicas que podem ser utilizadas para o diagnóstico da
realidade local, sugerimos a aplicação do Diagnóstico Rápido Participativo
(DRP), que é uma metodologia que permite o autoconhecimento das
comunidades sobre suas potencialidades e limites e sobre sua relação com o
contexto. Além desse conhecimento, o DRP apóia a tomada de decisões sobre
o que se deve ou pode fazer para mudar a realidade em favor dos interesses
das comunidades.
Texto inspirado em Mt 25 25-36 e Lc 4, 16-22.
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ROTEIRO PARA A APLICAÇÃO DO DRP
1° passo – planejamento das atividades do DRP, com atividades, prazos e
responsáveis;
2° passo – coleta e organização dos dados secundários em relação à temática
ou problemática que se quer trabalhar. Podem ser pesquisadas fontes como:
IBGE, Censo da Educação, DATASUS, relatórios dos órgãos públicos, relatórios
de ONGs, mapas, fotos, estudos etc.;
3° passo – coleta e organização de dados primários, a partir das lacunas de
informações dos dados secundários. Para essa coleta, podem ser utilizadas
várias técnicas: observação direta, com anotações em diário de campo; rodas
de conversas com grupos; entrevistas com lideranças comunitárias,
educadores, funcionários públicos e autoridades; questionários com famílias;
elaboração coletiva do mapa da comunidade etc.;
4° passo – apresentação criativa dos resultados da coleta de dados para a
comunidade interessada. Nesse momento, a comunidade pode questionar
algumas informações, complementar os dados, modificar as conclusões e,
principalmente, sugerir ações que podem ser realizadas para enfrentar as
causas dos problemas analisados;
5° passo – elaboração de plano de ação – após o momento de apresentação
da comunidade, o grupo interessado em criar a Cáritas paroquial poderá
elaborar um plano de ação em torno das conclusões e sugestões da
comunidade. Assim, o início das atividades da Cáritas estará em sintonia com
as aspirações e necessidades da comunidade, ao invés de ser apenas um
conjunto de boas intenções do grupo.
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SUGESTÃO DE FORMULÁRIO PARA COLETA DE INFORMAÇÕES
1. Dados gerais do município
População geral
Distribuição por faixa etária
Distribuição por etnia
2. Dados da região a ser abrangida pela Cáritas paroquial
População geral
Principais atividades econômicas
Equipamentos públicos (saúde, educação, assistência social, segurança)
3. Como a população se organiza para defender seus direitos? Com quem
podemos construir parcerias?
(Exemplos: associações de moradores, grupos de mulheres, grupos de
jovens, grupos culturais, pastorais, comunidades de base...)
4. Como funcionam as políticas públicas na região a ser abrangida pela
Cáritas paroquial?
(Exemplos: as escolas ficam muito distantes; os centros de saúde atendem
apenas durante o dia; não existe fiscalização da vigilância sanitária nas
feiras; a delegacia tem duas viaturas; as filas no centro de saúde são
enormes; os professores recebem baixos salários...)
5. Quais os principais problemas sociais existentes na região a ser
abrangida pela Cáritas paroquial?
(Exemplos: existem crianças fora da escola; muitas pessoas estão
desempregadas ou subempregadas; há muitos casos de violência na
comunidade com jovens, mulheres etc.; o lixo é lançado em terrenos
baldios; não existe rede de esgoto...)
6. Qual(is) desses problemas a Cáritas paroquial percebe como mais
importante(s) para enfrentar?
7. Planejem esse trabalho para superar esse(s) problema(s).
O que fazer?
Com que objetivos?
Quais as atividades/tarefas?
Quando serão realizadas?
Quem vai ser responsável pela realização?
Com quem contar pra realizar?
Com que recursos?
O PLANO DE AÇÃO pode ser organizado em um quadro, para facilitar o
acompanhamento.
O que fazer?
Objetivos
Atividades/tarefas
Quando
realizar?
Quem vai ser
responsável?
Com quem
contar?
Com que
recursos?
1.
2.
3.
2º - UMA GRANDE MISSÃO
A Cáritas Brasileira testemunha e anuncia o Evangelho de Jesus Cristo,
defendendo a vida, promovendo e animando a solidariedade libertadora,
participando da construção de uma nova sociedade com as pessoas em
situação de exclusão social, a caminho do Reino de Deus.
Esta é a missão que a Cáritas assume procurando ser fiel seguidora de
Jesus Cristo no Brasil e nos dias de hoje.
A Cáritas paroquial é a Cáritas Brasileira presente numa localidade,
num ambiente concreto. Sua missão deve ser, então, a mesma. Ela se faz
presente, encarna-se, realiza-se na vida das pessoas que assumem a Cáritas e
nas ações concretas que ela promove.
Cabe-lhe defender a vida, promover e animar a solidariedade
libertadora. Percebe-se logo que isso não pode ser feito só pelas pessoas
contratadas ou pelas que são voluntárias e que assumem a organização das
ações da Cáritas. Por quê? Porque defender a vida nos dias de hoje é algo tão
desafiador que só pode ser feito por muita gente, e gente que quer fazer isso e
se organiza para alcançar o objetivo. As pessoas que assumem a missão de ser
Cáritas precisam estar decididas a defender a vida até as últimas
consequências, como fez Jesus; só assim são testemunhas e anunciam Jesus
Cristo. Mas, como Jesus, os agentes da Cáritas vão ao encontro de outras
pessoas, descobrindo as que desejam defender a vida, despertando em
outras a vocação de defensoras da vida. É assim que se cria uma força
defensora e promotora da vida.
Onde começa e até onde vai a defesa da vida? Para começar, não há
preconceito que faça deixar de lado uma vida; toda pessoa humana, bem
como todo ser vivo e a própria Terra, têm direito à vida. É preciso ser radical
nesse ponto: ir às raízes do direito, da dignidade de toda forma de vida, e ser
coerente na sua defesa. Uma defesa que se faz com o outro/a, e não para ou
em seu lugar. Por isso, desde o início, a defesa da vida é também um convite
para a valorização da vida e para a ação conjunta em favor da própria vida.
Para que isso aconteça, a Cáritas assume promover e animar a solidariedade
libertadora. Não se trata de qualquer tipo de solidariedade, mas da que é
libertadora; As pessoas com quem se “age solidamente”, fechando fileira, como deve
ser a solidariedade, são portadoras de dignidade e direitos, capazes de enfrentar o
que limita sua existência. Trata-se, então, de ir ao encontro de quem está precisando
de um apoio que libere suas capacidades, uma presença que possibilite a prática
cidadã, um trabalho educativo que aposte no poder popular. Na sociedade
democrática, o povo é o soberano, e cabe a ele decidir como deve ser organizada a
vida em favor de todas as pessoas e da Terra, que é a casa e berço comum da vida.
2
Cabe à Cáritas paroquial promover esse tipo de solidariedade. É para isso
que ela cuida da comunicação popular, levando informação do que o povo é capaz de
fazer quando é apoiado pela solidariedade libertadora; cuida para que essas boas
notícias façam parte dos conteúdos de catequese, dos encontros bíblicos, das
celebrações litúrgicas; organiza, entre outras iniciativas, a semana da solidariedade
como um tempo especial para as comunidades descobrirem como é importante a
solidariedade no mundo atual.
3
Não basta promover a solidariedade. A Cáritas quer que, no ideal, todas as
pessoas sejam solidárias, pois isso faria que o mundo ser bem mais humano; em vista
disso, ela quer que todos os cristãos/ãs descubram o valor, apreciem e pratiquem
com alegria a solidariedade. Cristã mesmo, constituída por seguidores/seguidoras
de Jesus, só o é uma comunidade que tem entre suas qualidades a solidariedade
libertadora. Não se trata de uma dimensão que cada pessoa, grupo ou comunidade
pode querer ou não; ela é parte “irrenunciável de sua essência”, pois “ela tem raiz em
Jesus Cristo”, lembram os bispos latino-americanos e caribenhos no Documento de
Aparecida.
4
A Cáritas, então, é animadora da prática da solidariedade libertadora. Ela o
faz com seu próprio modo de ser e com suas práticas sociais. Com seu modo de ser,
ela quer, também, animar o conjunto das pessoas que fazem parte das comunidades
que formam a paróquia a serem cristãs integralmente. Com suas práticas, além das
comunidades, ela quer ser fermento na própria sociedade, contribuindo para que as
iniciativas sociais e as políticas públicas tenham a marca da solidariedade
libertadora.
Com toda sua vida e ação, a Cáritas quer participar da construção de uma
nova sociedade, e o faz com as pessoas em situação de exclusão social. Este é seu
ponto de chegada, como se verá logo adiante.
2 Ver o novo O Brasil que Queremos. Assembleia Popular, 2010.
3 A Semana da Solidariedade é realizada todos os anos na semana
Brasileira, que começou em 1956.
DA , 399
4 Cf.
em que esteja o dia 12 de novembro, data de aniversário da Cáritas
3º - O PORQUÊ DO CAMINHO
Já deve ter ficado claro que a Cáritas faz tudo isso por amor às pessoas que se
encontram em situação de pobreza, de abandono, de exploração e de exclusão social
e política. E ama as pessoas porque quer seguir os passos do seu Mestre, Jesus. Assim
mesmo, vale a pena indicar duas “razões de sua esperança”, como sugere o apóstolo
Pedro.5
A primeira está no modo como Jesus se relacionou com as pessoas
necessitadas, na sua prática da solidariedade libertadora. A segunda está no desafio
que ele próprio deixou aos seus seguidores e seguidoras: quem crê em mim fará as
obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas (Jo 14,12).
Jesus é o samaritano da parábola que desafiava o doutor da lei a descobrir
quem era o seu próximo. Isto é, ele é palestino, mas age também como samaritano; ou
melhor, ele vê a prática do amor libertador em quem outros só veem um estrangeiro,
pecador, infiel. Ele ama sem preconceitos e sem discriminação. Para dar atenção,
carinho, e sinalizar que os problemas dos empobrecidos podem e devem ser
enfrentados, não se limita ao permitido pelas leis de seu tempo, nem mesmo pelas do
sistema do Templo. Como nos lembraram os bispos em Aparecida,
Jesus, o Bom Pastor, quer comunicar-nos sua vida e colocar-se a serviço da
vida. O vemos quando se aproxima do cego do caminho (Mc 10,46-52), quando
dignifica à samaritana (cf. Jo 4,7-26), quando cura os enfermos (cf. Mt 11,2-6), quando
alimenta ao povo faminto (cf. Mc 6,30-44), quando liberta aos endemoninhados (cf.
Mc 5,1-20). Em seu Reino de vida, Jesus inclui a todos: come e bebe com os pecadores
(cf. Mc 2,16), sem importar-se que o tratem como comilão e beberrão (cf. Mt 11,19);
toca nos leprosos (cf. Lc 5,13), deixa que uma mulher prostituta unja seus pés (cf. Lc
7,36-50) e, à noite, recebe Nicodemos para convidá-lo a nascer de novo (cf. Jo 3,1-15).
Igualmente, convida seus discípulos à reconciliação
5
Cr. 1Pe 3,15
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(cf. Mt 5,24), ao amor aos inimigos (cf. Mt 5,44), a optar pelos mais pobres (cf.
14,15-24). 6
É com os pobres que ele abre o caminho da construção do Reino de Deus. Vêse isso nas pessoas que ele convida e atrai como discípulos e discípulas. E vê-se na
atenção que dá a todas as pessoas em necessidade, provocando-as a se libertarem de
todo tipo de trava que as impediam de viver normalmente e de tomar iniciativas para
transformar a realidade. De fato, a todos e todas ele provoca a darem passos novos, a
compartilhar sua missão. Há lugar para todos e todas. E se os convidados se negam a
participar, Deus chama os desocupados, os que vivem nos becos e vielas, e pede até
que sejam “forçados” a virem para a festa; sim, Deus quer que a vida seja uma festa, e
que, para isso, sejam superadas todas as formas de divisão, discriminação, opressão.
7
Para seus seguidores e seguidoras que, como nós, assumem sua missão mais
de dois mil anos depois de sua vida terrestre, junto com a memória de suas ações e
palavras, ele garantiu sua presença amiga, junto com o apoio do Espírito.8 Mas
lembrou, também, que cada tempo e lugar seriam diferentes e que, por isso, se
tivessem fé, fariam as obras que ele fez, e fariam até maiores do que elas. Ter fé é, ao
mesmo tempo, confiar-se à palavra de Deus e iluminar a vida com o olhar de Deus; é
“ouvir a Palavra de Deus e colocá-la em prática”. É com a luz e o olhar de Deus que nos
cabe perceber tudo que se pode fazer hoje para dar continuidade à missão de Jesus.
Faz parte dessa fidelidade a opção pelos pobres. Ela está implícita na fé em Jesus
Cristo. Tudo que tem a ver com Cristo tem a ver com os pobres, e tudo o que está
relacionado com os pobres está ligado a Jesus Cristo: “quando o fizeram a um destes
meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizeram” (Mt 25,40).9
Estar atentos às possibilidades de amar o próximo com eficácia faz parte de
nossa espiritualidade. Se é possível, hoje, que toda a atenção solidária às pessoas seja
ligada à luta pelos seus direitos, e se essa luta pode tornar-se 'pública', exigindo
práticas políticas de Estado em favor de todas as pessoas, isso deve fazer parte das
'obras' que hoje podem e devem ser feitas pelos seguidores e seguidoras. Deixar de
fazer isso é perder oportunidades da graça de Deus, é ser infiel. Mais ainda: se
épossível, hoje, que os empobrecidos sejam protagonistas coletivos do poder popular
soberano, participando das decisões que definem o tipo de sociedade em que se quer
viver e o tipo de governante que se prefere, faz parte das 'obras' dos seguidores/as de
hoje promover essa possibilidade política; limitar-se a ações assistencialistas, nessa
situação, pode ser prática que limita a participação dos empobrecidos na construção
do Reino.
6
7
8
9
DA, 353
Cf. Lc 15.15-24
Cf. Jo 14,15-21
Cf. DA, 393
4º - POR ONDE COMEÇAR
A experiência tem ensinado que é melhor não começar com a
organização formal da Cáritas como entidade. Isso pode criar mais um peso,
em vez de um aumento da capacidade de ação. Como a forma de vida de Jesus
foi também preparada pelas ações de João Batista, vale inspirar-se nele para
dar os primeiros passos de uma Cáritas paroquial.
Como João Batista, o primeiro passo é a descoberta de algumas
pessoas que se sintam chamadas por Deus para descobrir o que ele deseja que
a Cáritas faça. Para isso, junto com o anúncio de que a Cáritas paroquial está
por ser organizada, cabe a essa equipe provocar as comunidades a tomarem
consciência da realidade social e política em que vivem as pessoas de cada
localidade e do município, provocando um processo de escuta sobre quais
necessidades a Cáritas deveria ajudar a enfrentar.
Em outras palavras, cabem a essa equipe duas tarefas, interligadas: a)
criar oportunidades para as comunidades que constituem a paróquia terem
conhecimento da missão da Cáritas brasileira, de suas prioridades e de como
está organizada (como aparecerá mais adiante nesta cartilha); b) fazer
levantamento da realidade social, anotando as situações da vida do povo e as
necessidades das comunidades para se organizarem para a prática da
solidariedade libertadora.
A primeira atividade tem como objetivo fazer que as comunidades
entendam que a Cáritas não irá realizar a dimensão do amor ao próximo no
lugar delas. Pelo contrário, a solidariedade libertadora deve ser uma qualidade
que marca o modo de ser, de viver e de celebrar da própria comunidade. A
Cáritas entra como um reforço, uma ajuda na organização mais eficaz do amor
da comunidade.
No levantamento da realidade, por outro lado, deverão ser levadas em
conta, também, as pastorais sociais, bem como as obras sociais de instituições
ligadas à igreja, que atuam na região; é necessário, igualmente, lembrar e
anotar o nome de movimentos, organizações e entidades da sociedade civil.
Isso é importante porque a Cáritas não se propõe substituir ninguém; pelo
contrário, cabe-lhe provocar a soma de forças, junto com a troca de
experiências que torne possível que todas as pessoas e instituições caminhem
na direção da solidariedade libertadora.
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5º - A IMPORTÂNCIA DO PONTO DE CHEGADA
O apóstolo Paulo lembrou que o esportista que deseja alcançar a
vitória faz todo tipo de exercício para alcançar seu objetivo. Para que não se
façam esforços inúteis, é necessário saber o que se deseja alcançar com a ação,
no caso, com a Cáritas que se vai organizar.
A Cáritas é um organismo da pastoral social; por isso, sua meta é a
construção do Reino de Deus. Faz parte dele a luta em favor da construção de
sociedades humanas que cheguem o mais perto que seja possível do que Deus
deseja para que seus filhos e filhas sejam felizes. Mesmo sabendo que nunca
serão sociedades perfeitas, o objetivo é avançar em tudo que seja possível, em
cada tempo e lugar, na direção da perfeição.
Por isso, o ponto de chegada da Cáritas como um todo é a
transformação do mundo, de tal forma que todas as pessoas tenham todos os
seus direitos garantidos; é construir um “outro mundo”, como se propõem as
forças que realizam o Fórum Social Mundial. Um mundo em que, como
expressou Jesus, “todas as pessoas tenham vida e a tenham em abundância”
(Jo 10,10).
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No caso da Cáritas paroquial, o ponto de chegada local está ligado à
atenção e mobilização de todas as pessoas excluídas em favor do
enfrentamento de seus problemas; em favor da exigência da garantia de seus
direitos; em favor do protagonismo popular nas lutas pelas transformações
estruturais necessárias para que a sociedade local tenha como fundamento a
justiça e o bem viver para todas as pessoas e para o meio ambiente.
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Dentro desta perspectiva, será importante prever passos
intermediários para chegar ao objetivo. Pode-se, por exemplo, começar num
bairro e com parte da população excluída, mas não abandonando o objetivo de
favorecer a todas as pessoas e em todas as localidades.
Pode-se enfrentar um determinado problema concreto, ou dar início a
um grupo de economia solidária, lembrando sempre que o objetivo é maior.
Pode-se iniciar com uma comunidade urbana e outra rural, mas a meta sempre
lembrada é o direito igual de todas as pessoas.
10
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Ver, mais uma vez, O Brasil que Queremos, em que a Assembleia Popular avança na elaboração do Projeto Popular através de
eixos ligados a todos os direitos de e para a Terra, toda a comunidade de vida e todas as pessoas.
Bom-viver é expressão dos povos indígenas ancestrais das Américas, e ela indica o modo simples, alegre e espiritual de as
pessoas viverem com seu povo e com a Terra, a Pachamama. Ele deve ser o centro da vida social e política, o objetivo também
da economia.
6º - COMO SE ORGANIZAR PARA AGIR
Sentida a necessidade, chegou a hora de a paróquia organizar a Cáritas. Isso é
feito numa assembleia com a presença de pessoas escolhidas pelas comunidades que
participaram dos passos de preparação e com a presença de pastorais sociais já
existentes.
De que jeito organizar a Cáritas: como um organismo da pastoral e uma
entidade da sociedade civil? Deve ter estatutos e registro imediatamente? Ou será
melhor começar como um organismo pastoral, mas sem registro como entidade civil?
Não há uma resposta única. Depende das necessidades e da capacidade de
organização local. Em muitas localidades, seria apenas um peso a organização civil,
pois ela exige cuidados administrativos bastante grandes. Em outras, o registro é
necessário por causa da perspectiva de acesso a recursos públicos. A decisão, por isso,
deve ser tomada com calma, examinando o que se apresenta como melhor.
A prática tem indicado que seria bom seguir duas orientações: 1) começar de
forma mais pastoral, deixando a burocracia de entidade civil para um segundo
momento; b) de toda maneira, evitar seu registro como uma nova entidade jurídica,
preferindo registrá-la como entidade filiada à Cáritas diocesana.
A depender da decisão, cabe à assembleia escolher as pessoas que serão
responsáveis pela Cáritas paroquial. Se a decisão for a de organizá-la como entidade
jurídica, será necessária a eleição da diretoria, como está definido nos Estatutos da
Cáritas diocesana; neste caso, será bom elaborar e aprovar o Regimento da Cáritas
paroquial, em que estarão as orientações sobre as responsabilidades das pessoas que
responderão por ela.
No caso de começar só como um organismo pastoral, vale ter presente o que
foi elaborado por um Regional da Cáritas que conta com experiência de organização
de Cáritas paroquiais:
A Cáritas Paroquial é constituída por um grupo de pessoas que ajudam a
paróquia na animação e testemunho do serviço da caridade. Mais que isso, são
aqueles e aquelas que desenvolvem, de forma organizada, o serviço aos pobres. O
objetivo da Cáritas Paroquial é animar, coordenar e promover o testemunho
comunitário da CARIDADE.
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Isto significa que os membros da Cáritas Paroquial podem desenvolver os
seguintes serviços:
·conhecer os pobres da comunidade a que pertencem;
·introduzi-los à comunidade;
·sensibilizar a comunidade a acolher os pobres;
·chamar atenção das comunidades sobre a pobreza e sensibilizá-las para o serviço da
caridade;
·valorizar experiências de animações e solidariedade existentes na paróquia;
·realizar momentos formativos sobre o testemunho da caridade e dos aspectos
específicos do serviço aos pobres;
·ajudar a comunidade a colocar a Cáritas como centro do testemunho cristão;
·ajudar a superar a mentalidade assistencialista pela caridade evangélica de
libertação dos pobres;
·projetar caminhos educativos para a libertação dos pobres;
·a Cáritas Paroquial deve estar atenta à vida das pessoas de sua comunidade. Ter a
tarefa do conhecimento concreto das condições de dificuldade e necessidade
existentes dentro da vida da comunidade;
·fazer um esforço para compreender as pessoas com seus problemas, os fenômenos
das emergências, a exclusão social e suas causas e os mecanismos de insensibilidade e
egoísmo individual e coletivo;
·coordenar iniciativas de caridade existentes na paróquia, sem substituir nenhuma
dessas, mas colocá-las como um ponto de partida;
·e, acima de tudo, manter sempre um relacionamento vivo com a Cáritas Diocesana
desde o começo até o fim de qualquer atividade, na perspectiva de uma abertura
ampla com a Igreja e com toda a rede Cáritas presente no Brasil e no mundo inteiro;
·quanto à questão jurídica e financeira, a Cáritas Paroquial não tem personalidade
jurídica própria. Ela está vinculada à Cáritas Diocesana e, consequentemente, não
movimentará recursos financeiros. Caso seja necessário mobilizar recursos para o
desenvolvimento de algum projeto, deverá ser feito por meio da Cáritas Diocesana.
A prática da colegialidade
É muito importante que haja trabalho de equipe. A Cáritas brasileira
tem como uma de suas orientações a colegialidade: em vez de um
coordenador/a, uma equipe colegiada de coordenação. Cada membro assume
determinada responsabilidade e, juntos, respondem pela coordenação. Os
demais membros assumem trabalhos determinados no planejamento das
ações, aprovados pela assembléia.
Em outras palavras, todo trabalho da Cáritas prima pela promoção da
participação das pessoas. As grandes linhas, as prioridades devem ser
definidas em assembleia, com participação de todas as pessoas que vão
assumindo a missão da Cáritas paroquial.
A partir daí, a equipe responsável faz, em conjunto, um plano de ação.
Nesse plano devem estar previstas as ações, com seus objetivos, etapas,
prazos, as responabilidades, as formas de acompanhamento e as dinâmicas de
avaliação. É necessário prever os custos e as fontes dos recursos; nesse
particular, a relação permanente com a Cáritas diocesana facilitará o acesso ao
Fundo Diocesano de Solidariedade, como uma das fontes de recursos para
apoiar os trabalhos sociais.
Se necessário, caberá a esta equipe buscar recursos para cobrir custos
da contratação das pessoas que se dedicarão exclusivamente à Cáritas.
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7º - O SENTIDO DO TRABALHO VOLUNTÁRIO
Grande parte do trabalho de base realizado nas equipes de Cáritas
diocesanas e paroquiais é feito por pessoas que dedicam voluntariamente tempo de
sua vida. É por isso que, ao começar a organização da Cáritas Paroquial, é preciso ter
claro como apoiar e alimentar a motivação destes colaboradores.
As pessoas que decidem dedicar gratuitamente parte de seu tempo aos
trabalhos realizados pela Cáritas revelam que o engajamento nesta missão dá sentido
à vida. Como sabem os que assumem a mensagem de Jesus, a prática de amor aos
mais necessitados é prática de amor a Deus. Por isso, o voluntariado é uma forma de
amar a Deus e ser fiel ao seguimento de Jesus.
O voluntário/a pode ser uma pessoa que, vendo o que a Cáritas faz, deseja
contribuir com seus trabalhos pelo desejo de ser solidária, sem necessariamente ser
cristã praticante. Como se sabe que ser solidário é ser humano e ser divino,
independentemente das intenções, a Cáritas pode acolher sua contribuição, abrindo
espaços de vivência ecumênica e até macroecumênica.
Como estas pessoas não poderão dispor de todo o seu tempo, é fundamental
que suas contribuições estejam claramente definidas no planejamento das ações.
Para isso, é preciso que participem do próprio planejamento, definindo em que e
como darão sua contribuição. Não se deve insistir para que assumam mais do que lhes
é possível, evitando, por outro lado, que se sintam desvalorizadas por falta de
confiança em relação ao que podem fazer. Esse equilíbrio só acontecerá quando
houver um cuidadoso planejamento e as revisões forem bem realizadas, com
participação de todos os envolvidos.
Os voluntários/as, ao se apresentarem à Cáritas, já são movidos por uma
motivação espiritual profunda: a de dedicarem-se aos mais necessitados. Isso precisa
ser valorizado e aprofundado, em conjunto com todos os/as agentes da Cáritas. A
reflexão sobre a prática, iluminada por uma compreensão mais profunda da prática e
da mensagem de Jesus, levará a perceber que o amor libertador, nos dias de hoje,
toma necessariamente uma dimensão cidadã e política; exige, por isso, que não se
fique apenas em ações de socorro, pois isso levaria ao assistencialismo, que reduz as
pessoas a objetos da ação.
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O testemunho dos voluntários/as é, sem dúvida, um chamado para
mais pessoas se aproximarem, simpatizarem e desejarem participar das ações
que realizam a missão da Cáritas. O cuidado para que se sintam formando uma
verdadeira comunidade de pessoas que se querem bem, planejam em
conjunto, realizam as ações com alegria e esperança, avaliam as práticas,
sempre dispostas a fazer o melhor que são capazes, é certamente uma das
missões de quem anima e coordena especialmente equipes paroquiais e
diocesanas de Cáritas.
Por outro lado, para que haja transparência nas relações e para evitar
que o trabalho continuado configure relação de emprego, vale a pena acertar
com cada voluntário/a um termo de participação nos trabalhos da Cáritas.
Tudo deve ser fruto de diálogo, em que as pessoas sejam informadas do
caráter filantrópico da Cáritas, que exige auditorias em relação às suas ações,
ao uso de recursos em relação às pessoas que atuam nela.
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8º - SER DA REDE CÁRITAS E AGIR EM REDE
Ser Cáritas paroquial é ter certeza de que se faz parte de uma grande Rede
Mundial de solidariedade libertadora. É ser membro da Cáritas diocesana, que, por
sua vez, faz parte de um Regional de Cáritas, que faz parte da Cáritas Brasileira, que,
por fim, faz parta da Cáritas Internationalis. No Brasil, já existem 181 Cáritas
Diocesanas. Em conjunto, elas constituem a Cáritas Brasileira e definem suas
prioridades estratégicas em Assembleias Gerais, que acontecem a cada dois anos; a
diretoria é renovada a cada quatro anos.
Como é “entidade filantrópica”, seus diretores não podem ser remunerados
pelo seu trabalho. Por causa disso, a Cáritas brasileira, sob a direção jurídica e pastoral
da diretoria, é dinamizada por equipes de trabalho, contratadas conforme as
necessidades da programação das ações. Uma primeira equipe forma o Secretariado
Nacional, com sede em Brasília; o/a Diretor/a Nacional, que é cargo de confiança da
diretoria, conta com uma equipe Colegiada para realizar a coordenação das ações
nacionais; há ainda um corpo de assessores/as, responsáveis por programas
nacionais da Cáritas.
Quando uma região conta com diversas Cáritas diocesanas, e sente
necessidade de aumentar sua articulação e ter uma atuação em âmbito regional,
reforçando a ação do Secretariado nacional, cria-se um Regional. Já existem dez
Regionais de Cáritas – Norte II, Maranhão, Piauí, Ceará, NE 2, NE 3, Minas Gerais, São
Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul – e estão em fase de organização os do
Amazonas, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Paraná. Cada Regional, a depender da
necessidade, conta com um/a Coordenador/a, que é apoiado/a por uma Colegiada e
por assessores/as, praticamente sempre com tempo integral.
As Cáritas diocesanas contam com diretoria jurídica e pastoral, e são
animadas por equipes de agentes pastorais e assessores/as, conforme a necessidade.
Na medida da necessidade e das possibilidades de recursos, as equipes diocesanas
contam com pessoas liberadas para o trabalho da Cáritas. Mas a maioria dos/as
agentes são pessoas voluntárias, que dedicam parte de seu tempo para esta missão.
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Para se ter ideia das veias e laços que ligam organicamente a Cáritas no
mundo, ela também conta com seis grandes regiões, em que se articulam e se apóiam
as quase 200 Cáritas nacionais espalhadas pela Terra. O Brasil, por exemplo, faz parte
da Região Latino-americana e Caribenha, que articula as Cáritas desde o México até a
Argentina, incluindo os países da América Central e do Caribe. Mesmo dentro dessa
Região, contudo, o Brasil se relaciona mais diretamente com os vizinhos do Cone-Sul:
Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile.
A articulação internacional conta com uma diretoria e um secretariado,
constituindo a Cáritas Internationalis. Cabe a ela manter a unidade e cuidar das veias e
laços da Rede Cáritas no mundo. O seu potencial de presença e de pressão em favor de
um mundo de justiça é muito grande, mas ainda pouco eficaz. Poderá crescer muito se
o trabalho avançar em duas direções:
a) enraizando-se mais nas bases, nos lugares em que o povo vive, nas
comunidades cristãs, junto com as forças sociais e políticas aliadas nas muitas
localidades do Planeta – a exemplo da criação das Cáritas paroquiais;
b) melhorando os canais de comunicação e de articulação de ações solidárias
libertadoras em âmbito mundial. É por aqui que todas as Cáritas nacionais poderiam
ser reforçadas por meio de pressões solidárias em favor das mudanças estruturais
necessárias para que a justiça e os direitos das pessoas sejam promovidos e
garantidos.
Para que exista, de fato, a Rede Cáritas mundial, atuando com toda a força que
pode ter, é preciso que todas as pessoas que fazem parte da Cáritas contribuam. Sem
que as bases recebam as informações e sem a sua disposição de mobilizar-se em favor
de causas de outros povos, não funcionará a Rede. Sem que a articulação mundial
anime todos os nós da Rede a atuarem em sintonia, a Rede terá pouca eficácia.
Por isso, é fundamental aprender a atuar em rede desde o local, passando ao
regional e nacional. A criação de Cáritas paroquiais é parte da estratégia que procura
melhorar a capacidade de atuação em rede da Cáritas brasileira. Tanto no local, como
no regional e nacional, todos os pontos em que se cruzam os fios que formam a rede
são importantes; todos precisam fazer o que está ao seu alcance, e com vontade de
colaborar com os demais, gerando uma força estimuladora da ação em conjunto. Esta
é, certamente, uma frente educativa e organizativa em que toda a Cáritas precisará
investir muito mais.
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9º - ALIMENTAR A MOTIVAÇÃO SEMPRE
A semente, jogada na terra, se não contar com umidade e com as
demais energias do solo, bem como com o calor equilibrado dos raios solares,
não germinará; por mais que deseje germinar, sozinha estará fadada a secar ou
apodrecer sem gerar nova vida. Por outro lado, todos esses elementos
necessários para a germinação não gerarão vida sem que a semente se
disponha a transformar-se, a multiplicar-se em mais formas de vida.
Assim acontece com o/a agente da Cáritas, que se propõe ser fonte de
solidariedade libertadora. Se seu espírito, sua energia criativa, sua capacidade
de amor sem limites, se tudo que o/a faz ser vivo e gerador de vida não for
vivificado permanentemente, secará ou apodrecerá sem gerar nova vida. É a
isso, a este alimento do espírito humano, que se denomina espiritualidade.
Trata-se de um alimento que mantém viva, mais forte, mais corajosa, mais
criativa, a motivação, a mística – essa força interior que leva a pessoa a ser
capaz de dar a vida pelas pessoas que ama, a dar a vida pela libertação das
pessoas oprimidas.
A Cáritas já conta com cartilhas e materiais publicados com o objetivo
de manter, renovar, aprofundar a espiritualidade e a mística das pessoas que
assumem a sua missão. Basta, então, chamar atenção para esse cuidado das
pessoas, do seu espírito, quando se cria mais uma raiz de Cáritas, uma Cáritas
paroquial. Vale ter presente sempre o sentido simbólico da palavra “raiz”:
sozinha, de pouco vale; sem ela, a árvore não se alimenta, não floresce, não
frutifica; só com as energias que a cercam, vindas da umidade e gases da
atmosfera, dos seres vivos do subsolo, dos raios solares, contudo, ela se
mantém viva e fonte de vida.
Que cada Cáritas paroquial seja uma raiz viva e vivificadora de toda a
Rede Cáritas!
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