Evandro Soares Nunes - Universidade Católica de Brasília

Transcrição

Evandro Soares Nunes - Universidade Católica de Brasília
Pró-Reitoria de Graduação
Curso de Direito
Trabalho de Conclusão de Curso
DIREITOS DO ADOLESCENTE PRIVADO DE LIBERDADE:
ESTUDO SOBRE A UNIDADE DE INTERNAÇÃO RECANTO
DAS EMAS
Autor: Evandro Soares Nunes
Orientador: Juvenal Delfino Nery
Brasília - DF
2013
EVANDRO SOARES NUNES
DIREITOS DO ADOLESCENTE PRIVADO DE LIBERDADE: ESTUDO SOBRE A
UNIDADE DE INTERNAÇÃO RECANTO DAS EMAS
Monografia apresentada ao curso de
graduação em Direito da Universidade
Católica de Brasília, como requisito
parcial para obtenção do Título de
Bacharel em Direito.
Orientador(a): Prof. Juvenal Delfino Nery.
Brasília
2013
Monografia de autoria de Evandro Soares Nunes, intitulada “DIREITOS DO
ADOLESCENTE PRIVADO DE LIBERDADE: ESTUDO SOBRE A UNIDADE DE
INTERNAÇÃO RECANTO DAS EMAS”, apresentada como requisito parcial para
obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade Católica de Brasília, em
______ de __________ de 2013, defendida e aprovada pela banca examinadora
abaixo assinada:
________________________________________________
Professor Juvenal Delfino Nery
Orientador
Curso de Direito – UCB
________________________________________________
Professor(a)
Curso de Direito – UCB
________________________________________________
Professor(a)
Curso de Direito – UCB
Brasília
2013
A minha querida mãe, Mersonia Soares
que sempre esteve ao meu lado, dedico.
AGRADECIMENTO
Agradeço primeiramente a Deus por ter me dado a oportunidade de ingressar
e concluir um dos mais respeitados cursos acadêmicos das ciências sociais. E por
ter sido fonte de força e coragem ao longo desses anos.
Aos meus familiares, meu pai, minha mãe e aos meus dois irmãos.
Aos professores Elvécio Diniz Silvério, Joel Arruda de Souza, Mauro Sérgio
dos Santos, Carlos André Bindá Praxedes, Karla Neves Faiad de Moura, Neide
Aparecida Ribeiro, Grace Maria de Fernades Mendonça, Hailton Cunha, Simone
Pires Ferreira de Ferreira Batana, Amaury Walquer e, em especial, ao meu
orientador, Juvenal Nery.
E aos meus grandes amigos Leonardo Ribeiro, Gildázio Barbosa Nascimento,
Willian Valério, André Alves Guimarães, Maria Aparecida, Jackson Miguel, Ícaro
Kunta Kinte, Vanessa Torres, Redson Rodrigo e Roney Gonçalves.
Instrui o menino no caminho em que deve
andar, e, até quando envelhecer, não se
desviará dele.
(Provérbios 22:6)
RESUMO
Referência: NUNES, Evandro Soares. Direitos do adolescente privado de
liberdade: estudo sobre a unidade de internação Recanto das Emas. 2013. 110
folhas. Monografia de Conclusão do Curso de Direito. Universidade Católica de
Brasília, Brasília/DF, 2013.
A proposta da presente monografia é fazer uma analise sobre a medida
socioeducativa de internação prevista no art. 121 e seguintes do Estatuto da Criança
e do Adolescente. Aborda ainda os direitos fundamentais da criança e do
adolescente, bem como a evolução da legislação voltada para esse publico no Brasil
e, em documentos internacionais. Faz considerações acerca do ato infracional, a
sua apuração, os direitos e garantias individuais dos adolescentes durante o
processo de apuração da infração, e a aplicação das medidas socioeducativas.
Enfoca na analise da medida socioeducativa de internação sob o prisma do Estatuto
da Criança do Adolescente e da Constituição Federal. Busca também averiguar os
princípios orientadores da medida de internação, e os três tipos de internação. E por
derradeiro faz uma breve analise acerca da execução da medida de internação na
Unidade de Internação Recanto das Emas, Situada no Distrito Federal, o que
demonstra a incapacidade do Estado em reeducar os adolescentes, e, além disso,
que os direitos do adolescente privado de liberdade estão sendo cerceados, e a
discrepância entre o que esta legislado e o que acontece na prática.
Palavras-chave: direito da criança e do adolescente; medida socioeducativa de
internação; estudo sobre a unidade de internação Recanto das Emas.
ABSTRACT
Reference: NUNES, Evandro Soares. Rights of adolescents deprived of liberty: a
study on the inpatient unit of the Emus Nook. 2013. 110 sheets. Monograph of
Course Completion of law. Catholic University of Brasilia, Brasilia/DF, 2013.
The purpose of this monograph is to make an analysis of the educational measure of
hospital under Article 121 and following of the Child and Adolescent. It also
discusses the fundamental rights of children and adolescents, as well as the
evolution of legislation aimed at this audience in Brazil and in international
documents. Raises questions about the offense, its determination, the individual
rights and guarantees of teenagers during the investigation of the offense, and the
application of educational measures. Focuses on the analysis of the educational
measure of hospital through the prism of the Statute of Children and Adolescents of
the Federal Constitution. It also seeks to determine the guiding principles of the
detention, and the three types of hospital. And last is a brief analysis on the
execution of the detention in hospital ward Recanto das Emas, Situated in the
Federal District, which demonstrates the State's inability to re-educate teens, and,
moreover, that the rights of private teen freedom is being curtailed, and the
discrepancy between what is legislated and what happens in practice.
Keywords: grand jury. rights of children and adolescents; the educational measure of
hospital; study on the detention in hospital ward Recanto das Emas.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS LEGISLAÇÕES RELATIVAS AOS DIREITOS DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ............................................................................ 12
2.1 A PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NOS DOCUMENTOS
INTERNACIONAIS .................................................................................................... 12
2.2 HISTÓRICO DA CONSOLIDAÇÃO DOS DIREITOS DA INFÂNCIA E DA
JUVENTUDE NO BRASIL ......................................................................................... 15
2.2.1 Código de Menores e a situação irregular ................................................... 15
2.2.2 Constituição Federal de 1988 ........................................................................ 18
2.2.3 Estatuto da Criança e do Adolescente ......................................................... 19
3 DO ATO INFRACIONAL E DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS ....................... 22
3.1 DO ATO INFRACIONAL...................................................................................... 22
3.1.1 Da apuração do ato infracional ..................................................................... 24
3.1.2 Dos direitos individuais dos adolescentes e das garantias processuais . 30
3.2 DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS ................................................................ 32
3.2.1 Advertência ..................................................................................................... 34
3.2.2 Obrigação de reparar o dano ........................................................................ 35
3.2.3 Prestação de serviços a comunidade........................................................... 36
3.2.4 Liberdade assistida ........................................................................................ 38
3.2.5 Regime de semiliberdade .............................................................................. 40
4 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO ........................................... 42
4.1 PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA MEDIDA ..................................................... 42
4.2 APLICAÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO .................... 45
4.2.1 Internação provisória ..................................................................................... 45
4.2.2 Internação definitiva....................................................................................... 47
4.3 DIREITOS DOS ADOLESCENTES PRIVADOS DE LIBERDADE ...................... 50
5 OS DIREITOS DO ADOLESCENTE PRIVADO DE LIBERDADE: ESTUDO
SOBRE A UNIRE (UNIDADE DE INTERNAÇÃO RECANTO DAS EMAS) ............. 58
5.1 AS UNIDADES DE INTERNAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL ............................ 59
5.2 ESTUDO SOBRE A UNIRE (UNIDADE DE INTERNAÇÃO RECANTO DAS
EMAS) ....................................................................................................................... 61
6 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 74
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 78
ANEXO A – REGULAMENTO DISCIPLINAR CIAGO ............................................. 81
ANEXO B – CARTILHA DO VISITANTE .................................................................. 99
ANEXO C – QESTIONÁRIOS DA PESQUISA DE CAMPO ................................... 104
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1 INTRODUÇÃO
Com o surgimento da Constituição Federal de 1988, e o Estatuto da Criança e
do Adolescente, Lei n° 8069, aconteceu uma quebra de paradigmas, a criança e o
adolescente passaram a ser sujeitos de direitos, diferentemente da antiga legislação
que trazia a figura do menor em situação em irregular, e ainda tratando a criança e o
adolescente apenas como objetos.
Dessa forma a criança e o adolescente receberam garantias e direitos, e
sendo protegidos pelo ordenamento jurídico Pátrio, de qualquer forma de
discriminação, abuso, omissão, tanto por parte do Estado, como dos pais e da
sociedade.
O assunto a ser abordado na presente monografia é a questão do jovem
infrator e as medidas a serem aplicadas, como forma de sanção, sendo que a mais
gravosa é a medida de socioeducativa de internação, que terá um cuidado especial
nesse trabalho.
A questão do jovem infrator é muito discutida atualmente, e muito se fala
acerca da redução da maior idade penal, sobre uma mudança na legislação infantojuvenil, e ainda que as atuais medidas sócio-educativas não tragam uma mudança
no comportamento do adolescente infrator. E muito se é questionado o porquê dos
jovens que cumprem medidas sócio-educativas, em especial a de internação voltam
a delinquir, ou como os populares falam “saem piores do que entraram”.
Dessa forma se mostra a importância de analisar a questão do adolescente
em conflito com a lei, e as medidas aplicadas a ele como meio de reintegrá-lo em
sociedade. E se o Estado esta cumprindo as suas obrigações, quanto garantidor dos
direitos dos adolescentes internados.
Preliminarmente serão feitas considerações acerca dos direitos da criança e
do adolescente, a sua evolução histórica nos documentos internacionais, e mudança
de paradigma na legislação nacional.
Posteriormente, tratara da questão do ato infracional, como se da a sua
apuração, e o sistema de garantias processuais que o adolescente em conflito com
a lei tem por direito, sendo alguns deles o contraditório e a ampla defesa, etc.
Por seu turno no terceiro capítulo aborda as medidas socioeducativas
aplicadas ao adolescente infrator de acordo com a Lei n° 8069/90, sendo elas a
11
advertência, obrigação de reparar dano, prestação de serviço a comunidade,
liberdade assistida, regime de semiliberdade. Logo em seguida, em capitulo próprio
será abordada a medida socioeducativa de internação, sua aplicação, os direitos do
adolescente privado de liberdade, etc.
E por derradeiro será abordada uma breve pesquisa de campo feita na
Unidade de Internação Recanto das Emas (UNIRE). Enfatiza nesse capitulo os
direitos dos adolescentes no cumprimento da medida no estabelecimento
mencionado.
Objetiva o trabalho analisar a medida socioeducativa de internação e se os
direitos inerentes ao adolescente privado de liberdade estão sendo cumpridos por
parte do Estado.
Para elaboração do presente trabalho será utilizada pesquisa bibliográfica, e
pela internet, apresentado conceitos, exemplos, e doutrina sobre o tema. E ainda
uma breve pesquisa de campo, com coleta de dados e visitação a UNIRE.
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2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS LEGISLAÇÕES RELATIVAS AOS DIREITOS DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
A criança e o adolescente ao longo da história tiveram tratamento diferente
em cada período, todavia a sua proteção é algo extremamente recente.
No Brasil a legislação teve uma mudança de paradigma com a constituição de
1988, trazendo em seu texto à doutrina da proteção integral nos termos dos arts.
227 e seguinte, afastando a legislação da situação irregular.
Neste capítulo far-se-á uma análise das legislações que tratam da criança e
do adolescente no âmbito nacional e no internacional, para melhor compreensão do
tema proposto.
2.1 A PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NOS DOCUMENTOS
INTERNACIONAIS
São vários os documentos internacionais que se referem aos direitos infantojuvenis, mas o primeiro instrumento internacional que visava à proteção da criança e
do adolescente foi a Declaração dos Direitos da Criança de 1924, promovida pela
Liga das Nações, conhecido como Declaração de Genebra. (MACIEL, 2010).
Segundo Shecaira (2008, p. 49):
Os princípios básicos que a Declaração de Genebra introduziu em nível
internacional constituíram o embrião para desenvolvimento progressivo das
normas internacionais de proteção à criança. O texto preconiza a ideia de
que a responsabilidade pelo cuidado da criança é coletiva e internacional.
Por ter uma preocupação muito mais teórica, sem consequências práticas,
muitas vezes é um texto considerado de menor relevância.
Com o fim da segunda guerra mundial em 1945, toda a humanidade estava
comovida e traumatizada, por causa dos horrores que ocorreram ao longo de todas
as batalhas, onde milhares de pessoas foram mortas, mutiladas, ficaram
desabrigadas, e ainda com os relatos da crueldade com que os judeus foram
tratados pelos nazistas nos campos de concentração, onde eram torturados de
varias formas, ficando com fome e sede, sofrendo castigos terríveis, e até mesmo
sendo mortos nas câmaras de gás. A comunidade mundial aspirava dias melhores,
13
com isso no dia 10 de dezembro de 1948 à Assembleia Geral das Nações Unidas,
pela resolução 217 A (III), proclama a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi fundada nos princípios da
dignidade da pessoa humana e na igualdade entre os povos, proclamando que
todas as pessoas nascem livres e iguais em direitos. Trazendo em arcabouço de
direitos, entre os quais estão o direito a vida, a liberdade, ao trabalho, entre outros.
Acerca da Declaração Universal dos Direitos Humanos, Braga (2010, p. 283)
declara:
Entendemos que, se a Carta das Nações Unidas é o suporte para os
demais instrumentos, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é o
grande marco da proteção internacional da pessoa humana após a Carta.
No seu art. XXV, a Declaração assegura alguns direitos ligados a família e a
infância, fazendo menção que a maternidade e a infância têm direito a cuidados e
assistência especiais.
Nesse sentido, entende Shecaira (2008, p. 50):
que ao assegurar um tópico específico à família e, em particular a infância,
abriu espaço para outros instrumentos posteriores, alguns dos quais
específicos sobre o menor, que permitiram consagrar uma especial
proteção aos menores de dezoito anos.
Já em 20 de novembro de 1959, a ONU adota a Declaração Universal dos
Direitos da Criança, proclamando as crianças como sujeitas de direitos através de
dez princípios visando o bem estar físico e mental da criança.
Dentre vários direitos a Declaração Universal dos Direitos da Criança
estabeleceu a proteção da sua integridade física e mental, o direito ao nome e a
nacionalidade, direito a saúde, o direito a educação, ao lazer, será protegida de
qualquer negligência, crueldade ou exploração, terá prioridade no socorro, será
protegida de qualquer tipo de discriminação, e não será jamais objeto de tráfico.
Em 20 de outubro de 1989, a Assembleia Geral da Organização das Nações
Unidas, aprovou por unanimidade de votos, a Convenção dos Direitos da Criança.
Logo em seu preâmbulo considera que “a criança, em virtude de sua falta de
maturidade física e mental, necessita proteção e cuidados especiais, inclusive a
devida proteção legal, tanto antes quanto após seu nascimento”.
Sobre a Convenção, aduz Shecaira (2008 p. 52-53):
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Essa convenção é o tratado de direitos humanos que teve a mais rápida e
ampla aceitação da história. Por seu caráter de lei internacional, obriga os
Estados – como tratado internacional que é – a observarem suas
disposições e a assegurarem sua aplicação a cada criança sujeita a sua
jurisdição, a promoverem as medidas necessárias para garantir a sua
proteção e, finalmente, a adaptarem a sua legislação interna ao seu texto.
Não se trata mais de um elenco de princípios como a Declaração de 30
anos antes.
Dessa forma, pode-se afirmar que a principal diferença entre a Declaração
Universal dos Direitos da Criança de 1959 com a Convenção dos Direitos da Criança
de 1989, é que aquela tratava apenas de princípios, que norteiam como deveriam
ser tratadas as crianças, ou seja, não tinha poder de obrigar os países assinantes,
todavia a Convenção de 1989 é uma lei internacional que vincula os Estados
assinantes e os obriga a adaptarem a suas legislações internas de acordo com os
comandos do tratado internacional.
A Convenção em seu artigo primeiro considera criança a pessoa menor de 18
anos, e reconhece a criança como sujeito de direitos, como o direito a vida, o direito
ao registro logo após o seu nascimento, a identidade e a nacionalidade, o direito de
convivência com os pais, exceto se afastamento seja determinado pelas autoridades
competentes, o direito a saúde, a educação, ao lazer, o direito a liberdade de
expressão, o direito a liberdade de pensamento, de consciência e de crença etc.
Em seu art. 37 a Declaração reza que nenhuma criança devera ser submetida
a penas cruéis, nem a tortura, e ainda não poderá ser submetida a pena de morte e
a prisão perpetua. A criança somente poderá ser privada de sua liberdade em
conformidade com a lei, e apenas como último recurso, e que toda criança privada
de sua liberdade ficará separada dos adultos.
Acerca da Convenção, Amin (2010, p. 12) assevera:
Pela primeira vez, foi adotada a doutrina da proteção integral fundada em
três pilares: 1°) reconhecimento da peculiar condição da criança e jovem
como pessoa em desenvolvimento, titular de proteção especial; 2°) crianças
e jovens têm direitos à convivência familiar; 3°) as Nações subscritas
obrigam-se a assegurar os direitos insculpidos na Convenção com absoluta
prioridade.
O Brasil ratificou a Convenção em sua totalidade pelo Decreto N° 99.710, de
21 de novembro de 1990, dessa forma o tratado se tornou lei interna.
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2.2 HISTÓRICO DA CONSOLIDAÇÃO DOS DIREITOS DA INFÂNCIA E DA
JUVENTUDE NO BRASIL
Para melhor compreensão do tema proposto faz-se necessário uma analise
das principais legislações que trataram acerca da criança e do adolescente em
âmbito nacional, dessa forma serão analisados o Código de Menores de 1927,
conhecido como “Código de Mello Matos”, o Código de Menores de 1979, a
Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente.
2.2.1 Código de Menores e a situação irregular
No ano de 1923, surgiu no Distrito Federal o primeiro Juizado de Menores do
Brasil, tendo José Cândido de Albuquerque Mello Mattos como seu primeiro Juiz. No
juizado de menores não era exigida defesa técnica, por meio de advogado, nem
mesmo se fazia necessário acusação, bastaria à presença do Magistrado, para
julgar o que achava melhor para o menor. (SHECAIRA, 2008).
Quatro anos depois do surgimento do Juizado de Menores, em 12 de outubro
1927, foi criado por meio do Decreto n° 17.943-A, o Código de Menores,
popularmente conhecido como Código Mello Mattos.
Acerca do Código de Menores de 1927, Lorenzi (2007), argumenta:
O Código de Menores visava estabelecer diretrizes claras para o trato da
infância e juventude excluídas, regulamentando questões como trabalho
infantil, tutela e pátrio poder, delinquência e liberdade vigiada. O Código de
Menores revestia a figura do juiz de grande poder, sendo que o destino de
muitas crianças e adolescentes ficava a mercê do julgamento e da ética do
juiz.
Em seu art. 1°, o Código Mello Mattos definia quem era objeto da lei:
Art. 1° O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinquente, que tiver
menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente ás
medidas de assistência e proteção contidas nesse código.
Segundo o Código, são divididos em três classes os menores abandonados:
os vadios (art. 28); os mendigos (art. 29); e os libertinos (art. 30). As medidas
aplicáveis a esses menores eram mais brandas e se encontravam nos arts. 55 à 67,
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que variavam desde a entrega do menor aos seus pais, tutor, ou pessoa
encarregada de sua guarda, até a internação em escola de preservação.
Já os delinquentes seriam aqueles de 14 (quatorze) aos 18 (dezoito) anos de
idade, autor ou cúmplice de fato classificado com crime ou contravenção penal,
esses menores seriam submetidos a um processo criminal especial, dessa forma os
menores de quatorze anos não estavam sujeitos a processo penal algum. Os
delinqüentes poderiam sofrer medidas de internação em escola de reforma, que
podia variar de um a cinco anos, liberdade vigiada, dentre outras.
Com relação ao Código Mello Mattos, reza Amin (2010, p. 6):
Já no campo infracional crianças e adolescentes até os quatorze anos eram
objeto de medidas punitivas com finalidade educacional. Já os jovens, entre
quatorze e dezoito anos eram passíveis de punição, mas com
responsabilidade atenuada. Foi uma lei que uniu Justiça e Assistência,
união necessária para que o Juiz de Menores exercesse toda sua
autoridade centralizadora, controladora e protecionista sobre a infância
pobre, potencialmente perigosa. Estava construída a categoria Menor,
conceito estigmatizante que acompanharia crianças e adolescentes até a
Lei n° 8.069, de 1990.
Durante o governo do Presidente Getúlio Vargas, foi criado o Serviço de
Assistência ao Menor (SAM), em 1942, órgão ligado ao Ministério da Justiça, que
tinha função equivalente ao do sistema penitenciário, órgão esse de caráter
repressivo que lidava com menores delinquentes, e tinha caráter repressivocorrecional. (LORENZI, 2007).
Para Carvalho (2006):
O atendimento no SAM era diferenciado para o menor infrator e o menor
carente/abandonado. Estes eram atendidos em patronatos agrícolas e
escolas de aprendizagem, enquanto aqueles ficavam em reformatórios e
casas de correção.
Após anos de luta para o fim do SAM, que era considerado extremamente
repressivo e por não ter cumprido com seus objetivos, em 1964 foi criada pela lei
4.513, a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM). Com essa lei,
todos os serviços de assistência ao menor seriam de sua competência.
Em seu art. 7°, a Lei nº 4.513 atribuiu a seguinte competência à FUNABEM:
Art. 7º Competirá à Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor:
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I - Realizar estudos, inquéritos e pesquisas para desempenho da missão
que lhe cabe, promovendo cursos, seminários e congressos, e procedendo
ao levantamento nacional do problema do menor.
II - Promover a articulação das atividades de entidades públicas e privadas;
III - Propiciar a formação, o treinamento e o aperfeiçoamento de pessoal
técnico e auxiliar necessário a seus objetivos;
IV - Opinar, quando solicitado pelo Presidente da República, pelos Ministros
de Estado ou pelo Poder Legislativo, nos processos pertinentes à
concessão de auxílios ou de subvenções, pelo Governo Federal, a
entidades públicas ou particulares que se dediquem ao problema do menor;
V - Fiscalizar o cumprimento de convênios e contratos com êle celebrados;
VI - Fiscalizar o cumprimento da política de assistência ao menor, fixada por
seu Conselho Nacional;
VII - Mobilizar a opinião pública no sentido da indispensável participação de
toda a comunidade na solução do problema do menor;
VIII - Propiciar assistência técnica aos Estados, Municípios e entidades
públicas ou privadas, que a solicitarem.
No dia 10 de outubro de 1979, foi aprovado o novo Código de Menores, Lei n°
6.697, que consolidou a doutrina da situação irregular. Como o Código Mello Mattos,
o novo Código de Menores apresentava apenas medidas para os menores
infratores, abandonados ou carentes.
O novo Código de Menores não rompeu com o antigo paradigma da situação
irregular, tratando apenas do menor de dezoito anos de idade em situação irregular,
e conferindo amplos poderes a figura do Juiz de Menor.
O Código de Menores de 1979 estabelece as seguintes medidas para o
menor em situação irregular:
Art13. Toda medida aplicável ao menor visará, fundamentalmente, à sua
integração sócio-familiar.
Art14. São medidas aplicáveis ao menor pela autoridade judiciária:
I - advertência;
II - entrega aos pais ou responsável, ou a pessoa idônea, mediante termo
de responsabilidade;
III - colocação em lar substituto;
IV - imposição do regime de liberdade assistida;
V - colocação em casa de semiliberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional, ocupacional,
psicopedagógico, hospitalar, psiquiátrico ou outro adequado.
Art15. A autoridade judiciária poderá, a qualquer tempo e no que couber, de
ofício ou mediante provocação fundamentada dos pais ou responsável, da
autoridade administrativa competente ou do Ministério Público, cumular ou
substituir as medidas de que trata este Capítulo.
Art16. Para a execução de qualquer das medidas previstas neste Capítulo,
a autoridade judiciária poderá, ciente o Ministério Público, determinar a
apreensão do menor.
18
Sendo o Código de 1979 apenas uma releitura do antigo Código Mello Mattos,
não houve mudanças consideráveis como já dito, tinha vinculo assistencialista e
repressivo, tratando o menor como mero objeto, e não como sujeito de direitos.
2.2.2 Constituição Federal de 1988
Após anos de regime militar repressivo, a década de 80 foi marcada pela luta
por um país democrático. Em 05 de outubro de 1988, foi promulgada a Constituição
Federal (CF) do Brasil, conhecida como constituição cidadã, a Carta Magna
brasileira elencou em seu texto um arcabouço de direitos fundamentais, como o
direito a vida, a cidadania, a liberdade de crença, e que todos devem ser tratados de
maneira igualitária.
A CF/88 tem como um de seus direitos fundamentos a dignidade da pessoa
humana, dessa forma todos os homens são sujeitos de direitos e deveres, devendo
o Estado possibilitar uma vida plena e digna para todos os brasileiros e estrangeiros
residentes no país.
A Constituição de 1988 rompeu com vários paradigmas, sendo um deles o
tratamento dado a criança e ao adolescente, que não será intitulado mais como
menor. Com isso nasce no Brasil à doutrina da proteção integral, que revogou
totalmente com a antiga doutrina da situação irregular. Dessa forma, a legislação
brasileira deixa de lidar apenas com uma classe de pessoas menores de dezoito
anos, menores em situação irregular, para abranger como cidadãos e sujeitos de
direitos todas as crianças e adolescentes.
Acerca da doutrina da proteção integral, esclarece Elias (2005, p. 2):
Em suma, pode-se definir a proteção integral como sendo o fornecimento, à
criança e adolescente, de toda a assistência necessária ao pleno
desenvolvimento de sua personalidade.
A criança e o adolescente passam a ser protagonistas de direitos, sendo o
seu desenvolvimento saudável como responsabilidade do Estado, da sociedade e da
família.
Em seu art. 227, a CF/88 reza:
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Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
A CF/88 ainda traz vários direitos da infância e da juventude, como a idade
mínima para o trabalho, sendo de quatorze anos, como as garantias previdenciárias
e trabalhistas, como o acesso do jovem trabalhador a escola, o conhecimento do
que é intitulado ato infracional, o direito a igualdade processual e a defesa técnica.
As medidas socioeducativas privativas de liberdade deverão obedecer aos princípios
de brevidade, excepcionalidade e o respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento, a inimputabilidade dos menores de dezoito anos. Dentre outros
direitos a serem normatizados.
2.2.3 Estatuto da Criança e do Adolescente
Finalmente no dia 13 de julho de 1990, foi promulgada a Lei n° 8.069,
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com a finalidade de garantir a
efetividade dos direitos concedidos pela Constituição de 1988, e a doutrina da
proteção integral. Diferente do Código de Menores, que tratava apenas dos menores
em situação irregular, o Estatuto da Criança e do Adolescente tem por finalidade
assegurar os direitos de todas as crianças e adolescentes.
Dessa forma, a crianças e os adolescentes não devem ser mais tratados
apenas como mero objeto, mas sim como sujeitos de direitos, tendo em vista a sua
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
O Estatuto tem por fundamento a doutrina da proteção integral, como
assevera o art. 1°: “Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao
adolescente.”
Sobre o ECA, explica Amin (2010, p. 14):
Com o fim de garantir efetivamente à doutrina da proteção integral a nova
lei previu conjunto de medidas governamentais aos três entes federativos,
através de políticas sociais básicas, políticas e programas de assistência
social, serviços especiais de prevenção e atendimento médico e
psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, abuso e proteção
jurídico-social por entidades da sociedade civil.
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Esse diploma legal trata a criança e o adolescente como prioridade absoluta,
sendo dever do estado, da família e da sociedade, assegurar todos os direitos
elencados na norma, segundo o seu art. 3°, in verbis:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais
inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata
esta Lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,
mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Com a nova lei o termo menor foi substituído por criança e adolescente, que
são conceituados no seu art. 2°. Vide:
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze
anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos
de idade.
Acerca do conceito de criança e adolescente, esclarece Cabrera et al. (2006,
p. 11):
O Estatuto foi além, diferenciando a criança do adolescente. Criança é a
pessoa até 12 anos de idade incompletos. Adolescente é pessoa entre 12 e
18 anos de idade incompletos. A distinção decorre do tratamento
diferenciado que o estatuto dá aos sujeitos, como, por exemplo, a questão
referente às medidas socioeducativas (ECA, art. 112), aplicáveis apenas
aos adolescentes, ou a proibição de viajar para fora da comarca onde
reside, sem a expressa autorização dos pais ou responsáveis (ECA, art.
83), exigível apenas às crianças.
O ECA objetiva, como já visto, assegurar os direitos da infância e juventude,
como o direito a vida, a saúde, desde o atendimento pré e pós-natal, até o
tratamento para prevenir ou aliviar o estado puerperal. As crianças e adolescentes
tem direito a liberdade, a dignidade da pessoa humana, direito brincar, praticar
esportes, estudar, participar da vida política e religiosa, expressar a sua opinião,
participar da vida familiar e comunitária, buscar refugio e proteção, sendo inviolável
a sua integridade física, psicológica, e moral, sendo dever de todos velar pela sua
dignidade.
O ECA também regulamenta a colocação em família substituta, podendo ser
feita
mediante
guarda,
tutela
e
adoção,
o
ato
infracional,
as
medidas
socioeducativas, as medidas protetivas, a função do ministério público, do juiz, da
defesa técnica, os crimes praticados contra crianças e adolescentes etc.
21
De certa feita, o ECA é considerado uma lei extremamente avançada, por ser
muito abrangente e por seguir princípios dos tratados internacionais que lidam com
os direitos da criança e do adolescente.
22
3 DO ATO INFRACIONAL E DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
O presente capítulo tem por finalidade discorrer acerca das medidas
socioeducativas, entretanto faz-se necessário inicialmente dar um panorama acerca
do ato infracional e a sua apuração, tendo em vista que as medidas socioeducativas
serão aplicadas em detrimento do cometimento de ato infracional.
3.1 DO ATO INFRACIONAL
Segundo o art. 103, do ECA, considera-se ato infracional a conduta descrita
como crime ou contravenção penal. Dessa forma, a conduta deve ser previamente
tipificada para ser considera ato infracional, obedecendo assim o principio
constitucional da reserva legal, descrito no art. 5°, XXXIX, que reza:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia
cominação legal;
Acerca do ato infracional, entendem Moraes e Ramos (2010, p. 195):
Ato infracional é, portanto, a ação violadora das normas que definem os
crimes ou as contravenções; é o comportamento típico, previamente
descrito na lei penal, quando praticado por crianças e adolescentes. A
definição acima decorre do princípio constitucional da legalidade. É preciso,
por tanto, para a caracterização do ato infracional, que este seja típico,
antijurídico e culpável, garantido ao adolescente, por um lado, um sistema
compatível com o seu grau de responsabilização, e por outro, a coerência
com os requisitos normativos provenientes da seara criminal.
Sobre o assunto, relata Elias (2010, p. 143):
Há de se observar, portanto, se, à época da prática do ato, a conduta era
típica. Em caso afirmativo, o adolescente poderá ser processado, com todas
as garantias do denominado “devido processo legal” (arts. 110 e 111). Se
não configurar a tipicidade, somente poderão ser aplicadas as medidas
específicas de proteção. É imprescindível que a lei que define o crime ou a
contravenção seja anterior ao fato, conforme o princípio da absoluta
legalidade.
23
Para o Estatuto, são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos,
devendo ser considerada a idade do autor à data do fato. Dessa forma para o ECA
crianças e adolescentes não podem ser autores de crimes, mas sim de ato
infracional. A única distinção que o ECA faz em relação ao cometimento de ato
infracional por criança ou adolescente, é a medida a ser aplicada.
Dessa forma, as pessoas que tenham menos de dezoito anos não poderão
ser punidas com nenhum tipo de pena, o que tem gerado uma grande discussão na
sociedade, pois para muitos parece incongruente que uma pessoa de dezesseis
anos que pode votar, não possa responder por seus atos perante o Direito penal
como um maior de dezoito anos. A prática do ato infracional causa na sociedade um
senso de impunidade, pois para muitos não chega a ser proporcional que o autor de
um crime grave, como o homicídio, por exemplo, venha ser punido apenas com uma
possível medida socioeducativa de internação, que poderá ter duração de seis
meses a três anos.
Deixando a princípio de lado a questão da discussão acerca da diminuição da
idade penal, sobre o ato infracional cabe ressaltar, que a criança e os adolescentes
terão tratamento diferenciado quando da sua prática.
A criança não poderá ser punida com medida socioeducativa, a ela
corresponderão as medidas previstas no art. 101, do ECA, quais sejam:
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a
autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes
medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de
responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino
fundamental;
IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à
criança e ao adolescente;
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime
hospitalar ou ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
VII - acolhimento institucional;
VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;
IX - colocação em família substituta
Ao adolescente após o processo de apuração da prática de ato infracional,
caberá medida socioeducativa, que vão desde uma advertência, passando por uma
obrigação de reparar os danos, até uma possível medida de internação educativa.
24
Entretanto, se o ato infracional for cometido por adolescente, após o processo de
apuração o Juiz da Vara da infância e da juventude, a seu critério, aplicará uma das
medidas socioeducativas descritas no art. 112, do Estatuto, ou ainda uma das
medidas protetivas supracitadas. Todavia o Magistrado determinara a medida que
parecer mais eficiente para cada caso, visando assim uma mudança no
comportamento do adolescente.
3.1.1 Da apuração do ato infracional
O Estatuto estabeleceu o rito processual para a apuração da prática de ato
infracional por adolescente, que terá três fases, sendo a primeira à atuação policial,
a segunda as providencias do Ministério Público, a terceira a do processo judicial.
Esse procedimento terá que cumprir todos os requisitos legais em obediência à
doutrina da proteção integral.
A Fase policial da apuração de ato infracional, iniciara com a prisão em
flagrante do autor de ato infracional, que será encaminhado à autoridade
competente para a lavratura do auto. Todavia não se tratando de flagrante, terá
inicio a fase policial com o registro da ocorrência. Cabe ressaltar que se o
adolescente for apreendido, juntamente com maior de dezoito anos. Será
primeiramente levado o inimputável a delegacia especializada para as devidas
providencias e somente após tal procedimento o maior imputável será encaminhado
a delegacia própria, de acordo com o art. 172, do ECA. Veja-se:
Art. 172. O adolescente apreendido em flagrante de ato infracional será,
desde logo, encaminhado à autoridade policial competente.
Parágrafo único. Havendo repartição policial especializada para
atendimento de adolescente e em se tratando de ato infracional praticado
em co-autoria com maior, prevalecerá a atribuição da repartição
especializada, que, após as providências necessárias e conforme o caso
encaminhará o adulto à repartição policial própria.
Nos casos de ato infracional cometido mediante violência ou grave ameaça, o
adolescente for apreendido em flagrante, será lavrado o auto de apreensão, ouvida
as testemunhas e o adolescente, devera ser recolhidos os instrumentos utilizados na
infração, e devera ser requisitados exames e pericia para comprovação da
25
materialidade e da autoria, segundo o art. 173 do ECA. Apreendido o adolescente
devera ser comunicada a autoridade judiciária competente e a família do aprendido
ou pessoa por ele indicada.
Acerca do exposto, Maciel et al. (2010, p. 805):
Em caso de flagrante por ato infracional praticado mediante violência ou
grave ameaça à pessoa, como por exemplo os de roubo, latrocínio, estupro
e extorsão mediante seqüestro, deverá a Autoridade Policial adotar as
providências elencadas no art. 173 do ECA.
Se o ato infracional for cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, a
lavratura do auto poderá ser substituída por boletim de ocorrência circunstanciado.
Apreendido o infrator, comparecendo um dos pais ou responsável, devera ser
liberado o adolescente sob o compromisso de sua apresentação ao Ministério
Público, no mesmo dia ou quando não for possível no mesmo dia, no dia útil
posterior. Entretanto não será liberado o adolescente em razão da gravidade do ato
infracional e sua repercussão social, deva o infrator continuar internado para sua
segurança pessoal ou para manutenção da ordem pública, segundo o art. 174 do
ECA.
Sobre o assunto, relata Elias (2010, p. 237):
No que tange à gravidade do ato infracional, o melhor meio de efetuar sua
identificação é verificar, no Código Penal, nos delitos catalogados, aqueles
que são passíveis de pena de reclusão e os que têm uma maior dosagem
penal. O art. também se refere a certos atos que, pela sua repercussão
social, podem colocar em risco a segurança do próprio adolescente. Cada
caso deve ser cuidadosamente examinado pela autoridade policial que terá
de fundamentar sua decisão para não incidir nas penas do art. 234 do
Estatuto.
Torna-se pertinente apresentar o entendimento Marçura (apud MORAES;
RAMOS, 2010, p. 806):
Considerando que o legislador valeu-se dos conceitos de crime e
contravenção penal para definir o ato infracional (art. 103), devemos buscar
na lei penal o balizamento necessário para conceituação de ato infracional
grave. Nela, os crimes considerados graves são apenados com reclusão; os
crimes leves e as contravenções penais, com detenção, prisão simples e/ou
multa. Por conseguinte, entende-se por grave o ato infracional a que a lei
penal comina pena de reclusão.
26
Não sendo liberado o adolescente, a autoridade policial devera encaminhá-lo
ao membro do MP, juntamente com cópia da apreensão ou boletim de ocorrência.
Não sendo possível seu encaminhamento imediato o jovem será deslocado para
uma entidade de atendimento, que terá o prazo de vinte e quatro horas para
encaminhar o adolescente ao MP. Todavia se não houver entidade que possa
receber o infrator, o mesmo ficara na própria delegacia, mas ficara separado dos
maiores.
Mas se o adolescente for liberado, ou afastado da possibilidade de flagrante,
mas tendo indícios de participação na prática de ato infracional, a autoridade policial
encaminhara cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência, com relatório
das investigações e demais documentos ao MP, nos moldes do art. 177, do ECA.
A autoridade policial devera sempre adotar cuidados no transporte do infrator,
pois este não poderá ser conduzido em compartimento fechado de veiculo, nem em
condições atentatórias a sua dignidade, e nem em condições que possam incorrer
em risco a sua integridade física e mental.
O segundo momento para apuração de ato infracional é a fase Ministerial que
terá inicio com a apresentação do adolescente juntamente com o auto da apreensão
e o boletim de ocorrência, devidamente autuados pelo cartório judicial, juntamente
com os antecedentes do adolescente ao Promotor de Justiça. Que promovera a
oitiva informal do jovem, sendo possível a dos seus pais ou responsável, bem como
a da vitima e das testemunhas. Caso o adolescente não seja apresentado estando
ele sob responsabilidade dos pais ou responsável, o Promotor de Justiça notificará
os seus pais ou responsável para a apresentação do adolescente, e se preciso for,
com o uso de força policial.
Acerca da oitiva informal do adolescente, Moraes e Ramos (2010, p. 808)
lecionam:
Caberá ao Promotor de Justiça, na forma do art. 179, caput,doECA, ouvir
informalmente o adolescente, indagando acerca dos fatos, do seu grau de
comprometimento com a prática de atos infracionais, do cumprimento de
medidas anteriormente impostas, do seu histórico familiar e social, com
detalhes sobre o endereço da família, o grau de escolaridade, suas
atividades profissionais, locais onde possa ser futuramente encontrado,
dentre outras informações que considerar indispensáveis para avaliar
qual(is) a(s) providência(s) adequada(s) à sua ressocialização.
27
Ainda sobre a oitiva informal do adolescente, Cabreira et al. (2006, p. 74-75)
explicitam:
Conforme adverte Válter Kenji Ishida, existem duas correntes acerca da
necessidade do cumprimento do disposto no art. 179. 1ª Corrente: entende
que embora o BO possa servir de embasamento para a busca da
convicção, a oitiva refere-se a um direito do adolescente, pois nela pode
obter o arquivamento ou a remissão. 2ª Corrente: entende prescindível a
oitiva informal, já que, a contrario sensu, o menor poderia evadir-se e,
assim, se afastar de eventual representação processual. Sustentamos que,
em regra, a oitiva informal é obrigatória e necessária, pois significa a
aplicação dos princípios do contraditório e ampla defesa assegurados aos
acusados em geral (CF/88, art. 5°, inc.LV). Entretanto, frustrada a prática do
ato por ação ou omissão do próprio adolescente (fuga ou não
comparecimento injustificado), a oitiva poderá ser dispensada, posto que o
exercício da defesa direta é um direito do adolescente que, embora
irrenunciável, pode deixar de ser exercido.
Realizada a oitiva informal do adolescente, o membro do MP, poderá
promover o arquivamento dos autos, conceder a remissão, ou representar perante a
autoridade Judiciária para aplicação de medida socioeducativa, segundo o art.180,
do ECA.
Sempre que o representante do Ministério Público achar que o fato é
inexistente, ou que o adolescente não o participou, e ainda que o fato não configure
infração alguma, deverá promover o arquivamento dos autos.
Dessa forma afiançam Cabreira et al. (2006, p. 75):
O arquivamento dos autos pressupõe a elaboração de termo fundamentado
(ECA, art.181), onde o representante do Ministério Público reconheça a
existência de excludente de ilicitude (legítima defesa, estado de
necessidade, estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular do
direito); inexistência do fato, a atipicidade deste último ou inexistência de
prova da participação do adolescente no ato infracional.
Como segunda hipótese, o Promotor de Justiça poderá requerer a remissão,
como forma de exclusão do processo. Neste caso, configurou o ato infracional,
todavia atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social,
bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no
ato infracional. (art. 126, caput, ECA). Ou seja, se o adolescente tem bons
antecedentes, ou se o ato infracional for de menor gravidade, e ainda se foi pequena
a sua participação o representante do MP poderá requerer a remissão.
Ambos os casos deverão ser bem fundamentados, pois em seguida serão
conclusos a autoridade judiciária para uma possível homologação. Caso o juiz da
28
infância e da juventude não concorde com a remissão ou com o arquivamento dos
autos, devera remetê-los ao Procurador-Geral de Justiça, para nova apreciação,
mediante decisão fundamentada. O Procurador-Geral de Justiça oferecerá
representação, designará outro Membro do MP para que o faça, ou ratificará o
arquivamento ou a remissão, que obrigará a autoridade judiciária a homologar tal
decisão.
Em terceiro plano, o Promotor de Justiça, não promovendo o arquivamento ou
concedendo a remissão, oferecerá representação a autoridade judiciária, iniciandose o procedimento judicial para apuração de ato infracional, para aplicação de
medida socioeducativa.
A representação sempre será oferecida por membro do MP, pois a ação
socioeducativa tem natureza pública incondicionada, dessa forma independe o tipo
de infração. A representação será oferecida por petição tendo um breve resumo do
fato, a classificação do ato infracional, e quando necessário o rol de testemunhas.
Oferecida à representação terá inicio a fase judicial. Assim como a denúncia
no processo penal, a representação estará sujeita a um juízo de admissibilidade, no
qual o magistrado poderá rejeitar de pronto a representação se o fato narrado não
constituir ato infracional, ou se o a pessoa representada tiver idade superior para a
aplicação de medida socioeducativa.
Recebida a representação o magistrado designará audiência para a
apresentação do adolescente e decidindo acerca da internação provisória, sua
decretação ou a sua manutenção caso o adolescente já esteja internado, segundo o
art. 184, caput, do ECA.
O adolescente e seus pais, ou responsáveis serão cientificados do teor da
representação, e notificados a comparecerem acompanhados por advogado a
audiência. (art. 184, § 1º, ECA). Não sendo encontrados os pais ou responsáveis do
adolescente será nomeado curador especial.
Não sendo localizado o adolescente o magistrado expedirá o mandado de
busca e apreensão, sobrestando o feito até a sua apresentação. No caso de o
adolescente tenha sido notificado e não tenha comparecido a audiência, será
designada nova data para audiência, e a condução coercitiva do adolescente.
Estando o jovem provisoriamente internado será requisitada a sua apresentação,
mas deverão ser notificados os pais ou responsáveis.
29
Decidindo acerca da internação provisória ou da sua manutenção, o jovem
não poderá cumpri-la em estabelecimento prisional. Não existindo na localidade
entidade de internação de adolescente, o jovem será transferido de imediato para a
localidade mais próxima. Sendo impossível a sua remoção, o adolescente aguardará
na repartição policial, em local apropriado, isolado dos adultos, todavia devera ser
removido no prazo máximo de cinco dias, sob pena de responsabilidade.
Na audiência de apresentação, deverão estar presentes o membro do MP, o
advogado do adolescente, seus pais ou responsável e o adolescente. O Magistrado
no ato judicial supracitado, ouvira o adolescente e seus genitores ou responsáveis,
podendo ainda solicitar a opinião de profissional qualificado.
Procedendo a oitiva, o Juiz da infância e da juventude pode entender cabível
a remissão, ouvindo o MP, e a concederá com ou sem medida socioeducativa, a
remissão não poderá ser cumulada com medida de internação, nem mesmo com
regime de semiliberdade.
Sendo o fato grave e não achando cabível a remissão, o magistrado nomeara
defensor para o adolescente, caso esse não tenha advogado constituído,
respeitando o princípio do devido processo legal, e designara audiência em
continuação, onde serão feitos os debates e procedera ao julgamento do feito,
podendo ainda designar diligencias.
O advogado constituído ou defensor nomeado terá prazo de três dias
contados da audiência de apresentação para oferecer defesa previa e rol de
testemunhas.
Na audiência em continuação serão ouvidas as testemunhas arroladas pelo
Ministério Público na representação, as testemunhas arroladas pela defesa, nessa
ordem. Em seguida, serão cumpridas as diligencias requeridas pelas partes e a
juntada do relatório da equipe interprofissional. Após esses procedimentos, serão
ouvidos o representante do Ministério Público e o advogado de defesa, nessa
ordem, pelo tempo de vinte minutos prorrogáveis por mais dez minutos, e logo após
a autoridade judiciária proferira decisão.
Cabe salientar que a autoridade judiciária não poderá aplicar qualquer
sentença, desde que seja provada a inexistência do fato, não estar provada a
existência do fato, estar provado que o fato não constitui ato infracional, ou ainda
que o adolescente não concorresse para a existência do ato infracional.
30
3.1.2 Dos direitos individuais dos adolescentes e das garantias processuais
O ECA trouxe um arcabouço de direitos e garantias processuais para o
adolescente acusado de cometer ato infracional, entre os quais consagrou em seu
art. 110 o princípio do devido processo legal, em consonância com o art. 5°, inciso
LIV, da CF/88, que assevera: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens
sem o devido processo legal.”
Acerca de tal princípio, assevera Moraes (2005, p. 93):
O devido processo legal configura dupla proteção ao individuo, atuando
tanto o âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no
âmbito formal, ao assegurar-lhe paridade total de condições com o Estado
persecutor e plenitude de defesa (direito a defesa técnica, à publicidade do
processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e
julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão
criminal).
O art. 110, do ECA assegura: “nenhum adolescente será privado de sua
liberdade sem o devido processo legal.” Dessa forma, nenhum adolescente poderá
ser privado de sua liberdade sem um processo, onde seja assegurado o
contraditório e a ampla defesa, devera ser julgado pelo juiz da Vara da infância e da
juventude competente para julgar a ação para apuração de ato infracional, será
obrigatória a presença de um advogado para defender o jovem, o processo deverá
seguir os requisitos legais etc.
Segundo o princípio supramencionado, o jovem acusado da pratica de ato
infracional poderá usar todos os meios de provas aceitos em direito, podendo de
todas as formas em direito admitido provar a sua inocência.
Além do direito a ampla defesa o legislador infraconstitucional assegurou ao
adolescente em conflito com a lei, outros direitos processuais elencados no art. 111,
do ECA. Vide:
Art. 111. São asseguradas ao adolescente, entre outras, as seguintes
garantias:
I - pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, mediante
citação ou meio equivalente;
II - igualdade na relação processual, podendo confrontar-se com vítimas e
testemunhas e produzir todas as provas necessárias à sua defesa;
III - defesa técnica por advogado;
IV - assistência judiciária gratuita e integral aos necessitados, na forma da
lei;
V - direito de ser ouvido pessoalmente pela autoridade competente;
31
VI - direito de solicitar a presença de seus pais ou responsável em qualquer
fase do procedimento.
Nota-se que o legislador demonstra a sua preocupação com o processo para
aplicação de medida socioeducativa, para que não ocorram excessos por parte dos
julgadores, não podendo de nenhuma forma minimizar o rigor das normas
processuais.
Acerca do direito ao pleno conhecimento da atribuição de ato infracional,
arrazoa Elias (2010, p. 152):
Assim conforme o inc. I, o adolescente deve saber do que está sendo
acusado, para melhor se defender. Daí a petição que dá inicio à ação
socioeducativa dever se assemelhar à denúncia que dá início ao processo
penal. Deve-se, portanto, descrever os fatos com todas as circunstâncias,
data e horário em que ocorreram e também, o dispositivo penal que foi
infringido, pois, conforme o art. 112 é necessário a prática de ato infracional
para que se aplique a medida socioeducativa, caso contrário, somente
poderão ser aplicadas as medidas específicas de proteção do art. 101 do
Estatuto. É oportuno recordar que a Carta Magna, no art.227, § 3°, III, entre
os direitos à proteção especial coloca a “garantia de pleno e formal
conhecimento da atribuição de ato infracional”. Se porventura, não se der tal
conhecimento, haverá nulidade absoluta.
Assim sendo, o adolescente deve ter ciência do que esta sendo acusado,
sabendo sobre o que versa tal acusação, podendo assim se defender de maneira
plena.
O inciso II, traz a paridade na relação processual, dando às partes envolvidas
a igualdade processual, dessa forma o adolescente pode confrontar todos os
argumentos das testemunhas e das vítimas, e pode ainda pedir que sejam
produzidas todas as provas necessárias para a sua defesa.
Dentre os direitos elencados no art. mencionado, um dos que se destacam é
o direito a defesa técnica por meio de advogado, a assistência gratuita aos
necessitados, na antiga legislação se não fazia necessário à presença de advogado
nos julgamentos dos menores, todavia a legislação atual exige paridade de armas,
pois de certa feita apesar de os menores infratores serem punidos de maneira
menos severa do os adultos, podem sofrer uma sanção de internação que podendo
perdurar até três anos, dessa forma faz se necessário à figura de um defensor para
dar equilíbrio ao processo, e para fiscalizar que excessos não sejam cometidos.
32
A autoridade competente não diz respeito apenas ao juiz natural, mas
também ao Membro do Ministério Público, que entrevistara o adolescente, sendo ele
parte legitima para propor a representação.
O adolescente faz direito ainda a solicitação da presença de seus pais ou
responsáveis no curso do processo, para que tenha todo o apoio necessário durante
o procedimento.
Todos os direitos elencados no art. supracitado devem ser rigorosamente
obedecidos, para que o processo para apuração de ato infracional não seja anulado,
e de certa feita sejam respeitados os direitos individuais do adolescente, que é a
parte hipossuficiente no procedimento.
Sobre a observância das formalidades do processo para a aplicação de
medida socioeducativo, pondera Cabreira et al. (2006, p. 65-66):
É que sob o argumento de que as medidas socioeducativas possuem
natureza pedagógica, se minimizava a observância do devido processo
legal, da ampla defesa e do contraditório, o que não mais se admite perante
ao ordenamento constitucional e infraconstitucional em vigor. Portanto, o
conteúdo pedagógico das medidas socioeducativas não afasta a
necessidade de procedimento formal onde sejam observados o contraditório
e o devido processo legal, sob pena de inconstitucionalidade e ilegalidade
da medida aplicada.
Assim sendo as formalidades do procedimento de apuração da prática de ato
infracional devem ser estritamente respeitadas, sob pena de nulidade no processo,
isto posto nada pode justificar a não observância da legislação.
3.2 DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
Após o procedimento formal judicial para apuração do cometimento de ato
infracional, a autoridade competente, verificada a prática de ato infracional aplicara
medida socioeducativa, ou uma das medidas de proteção, conforme os incisos do
art. 112, do ECA:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente
poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
33
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
A medida visa à reintegração na sociedade do adolescente em conflito com a
lei, ou seja, um caráter pedagógico, mas de certa feita tem seu caráter
sancionatório, pois o a medida será aplicada em resposta a uma conduta reprovada
do agente, e ainda a medida será aplicada mesmo sem a vontade do autor do ato
infracional.
Acerca do caráter educativo e sancionatório da medida socioeducativa,
preleciona Saraiva (2006 apud SCHECAIRA, 2008, p. 189):
[...] embora a sanção sócio-educativa tenha finalidade pedagógica, não há
como não lhe atribuir natureza retributiva, na medida em somente ao autor
de ato infracional se lhe reconhece aplicação. Como traço fundante da
medida de internação, por exemplo, tem-se a concretização de um castigo;
e ninguém pode ignorar que o recolhimento compulsório a uma unidade de
internamento, por melhor proposta educacional que apresente, tem caráter
punitivo. “Demais, o traço que distingue a sanção jurídica de outras técnicas
de controle social é exatamente o caráter de uma reprovação
institucionalizada pelo Estado.” Traduzindo em uma frase: a substância é
penal. A finalidade deve ser pedagógica.
Ao aplicar medida socioeducativa, a autoridade competente devera levar em
conta a capacidade do jovem em cumpri-la, as circunstancias e a gravidade da
infração. De sorte que não venha acontecer que um adolescente que cometeu um
ato infracional de natureza leve seja de pronto colocado em regime de internação ou
de semiliberdade, ou ainda, que um adolescente com problemas mentais seja
privado de sua liberdade juntamente com adolescentes sem problemas psicológicos.
Dessa forma a autoridade judiciária deverá sempre ter em mente a proteção
integral do adolescente, mesmo quando for para aplicar medida em resposta de ato
infracional, observando qual medida será mais eficiente para cada caso.
Cabe salientar, que não existe hierarquia entre as medidas, mas como já visto
deve ser observados alguns critérios para a aplicação de cada uma delas, para a
que não ocorram excessos por parte da autoridade julgadora.
A medida aplicada poderá ser substituída a qualquer tempo, podendo ser
aplicada de forma isolada ou cumulativamente, e ainda devera ser proporcional ao
ato infracional cometido, devendo ainda levar em conta as necessidades
pedagógicas e preferindo-se as que visem um fortalecimento familiar e comunitário.
34
O adolescente infrator deve ter a sua privacidade preservada, não podendo
ser a sua imagem vinculada ao cometido de ato infracional, e não podendo ser
mostrado em nenhum meio de comunicação.
Após breve relato acerca das medidas socioeducativas, passar-se-á a
discorrer acerca de cada uma delas.
3.2.1 Advertência
A advertência consiste na admoestação verbal do adolescente feita pela
autoridade competente, qual seja o Juiz da Vara da infância e da juventude, dessa
forma sendo verbal deve ser reduzida a termo, e assinada pelo adolescente, seus
pais ou responsáveis, segundo o art. 115, do ECA: “a advertência consistirá em
admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada.”
Tem por objetivo alertar o adolescente que sua conduta acarretará danos a
sua pessoa, e a sociedade, e se continuar com tais condutas terão consequências
piores, podendo ter que cumprir outras medidas socioeducativas.
Acerca da admoestação, Elias (2010, p. 157) declara:
A admoestação em questão deve ser esclarecedora, ressaltando, com
respeito ao adolescente, as consequencias que poderão advir se porventura
for reincidente na prática de atos infracionais. No que tange aos pais ou
responsável, deve-se esclarecê-los quanto à possibilidade de perderem o
poder familiar ou serem destituídos da tutela ou da guarda.
Para ser aplicada a advertência basta que seja provada a materialidade do
ato infracional e que haja indícios de autoria (art. 114, ECA). Dessa forma não
precisa estar provado que o jovem concorreu para o fato, precisando apenas de
elementos que indiquem sua autoria.
A medida supramencionada será aplicada para atos infracionais de natureza
leve, aqueles de pouca gravidade, por exemplo, os sem violência ou grave ameaça.
Sobre a medida socioeducativa de advertência, Shecaira (2008, p. 188) se
posiciona:
Mas a referência das medidas é sempre a da pena. A advertência,
materializada por meio da repreensão, da ameaça de sanções graves,
corresponde a uma punição que encontra parâmetros na admoestação da
Suspensão da Pena (art. 160 da Lei de Execução Penal).
35
Cabe ressaltar, que a advertência sempre será aplicada pelo Juiz
competente, não podendo ser delegada a outra pessoa.
3.2.2 Obrigação de reparar o dano
Sempre que o ato infracional tiver reflexos econômicos, e for possível o
ressarcimento patrimonial da vítima, será aplicada a medida obrigação de reparar o
dano, prevista no art. 116, do ECA, que dispõe:
Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais,
autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua
coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense
prejuízo da vítima. Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade,
medida poderá ser substituída por outra adequada.
a
a
o
a
Existindo alguma possibilidade da devolução da coisa para a vítima, o
magistrado determinara que isso seja feito pelo adolescente, não existindo nenhuma
possibilidade de devolução do bem, o jovem também poderá promover o
ressarcimento do dano ou ainda devera compensar o prejuízo da vítima.
Importa mencionar, que a medida é para o adolescente e não para os seus
pais, dessa forma o ressarcimento devera ser feito pelo adolescente, com os bens
do próprio adolescente, pois se for utilizado o patrimônio dos seus genitores ou
responsáveis, estará sendo utilizada a lei civil e não o ECA.
Dessa forma, aduz Shecaira (2008, p. 197-198):
No bojo dessas alterações legislativas, o instituto da reparação de dano a
vítima foi inserido no ordenamento juvenil. Discorda-se daqueles que
entendem que, se o adolescente não tiver condições de pagar, poderá fazêlo o responsável legal. Tal compensação do prejuízo resultaria da lei civil,
da chamada culpa in vigilando, matéria totalmente distinta daquela que
prevê o Estatuto, que guarda relação com medida de caráter penal.
Enquanto medida sócio-educativa tem objetivo de incutir no adolescente o
alcance de sua conduta, bem como projetar um ensinamento pedagógico da
importância do cumprimento da lei.
A obrigação de reparar o dano esta ligada a capacidade patrimonial do
adolescente, dessa forma se o adolescente não puder cumpri-la, esta devera ser
substituída por outra medida socioeducativa.
Para Elias (2010, p. 158):
36
Em caso de furto, roubo, apropriação indébita, sempre que possível, o
objeto da infração deve ser restituído. Porém, se o ato infracional causou
algum dano, é natural que haja uma compensação em dinheiro. Isso,
evidentemente, pode ocorrer se o adolescente possuir bens. Caso contrário,
o Juiz da Infância e da Juventude poderá aplicar outra medida.
Dessa forma a medida de obrigação de reparar dano apenas poderá ser
aplicada se o adolescente puder restituir a coisa para o seu dono, ou se tiver bens
para ressarcir o prejuízo causado, caso o jovem não consiga de nenhuma forma
reparar o dano causado, o Juiz da Vara da Infância e Juventude aplicará outra
medida.
3.2.3 Prestação de serviços a comunidade
A prestação de serviços a comunidade consiste na realização de tarefas
gratuitas de interesse geral, não podendo exceder o prazo de seis meses, conforme
versa o art. 117, do ECA:
Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de
tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis
meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros
estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou
governamentais. Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as
aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima
de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis,
de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de
trabalho.
As tarefas poderão ser realizadas, em repartições públicas, como por
exemplo, hospitais, postos de saúde, tribunais, escolas, bem como em entidades
congêneres. Cabe salientar que o adolescente não poderá prestar serviços que
passam atentar contra a sua saúde física e mental, não podendo ser atribuídas
tarefas para ao adolescente insalubre, perigosa, ou penosa.
Sobre a medida em tela, Elias (2010, p. 159) afirma:
Esta, sem dúvida, é uma medida adequada, com salutar conotação
pedagógica, pois seu principal efeito, a nosso ver, é de ordem moral. Assim,
o adolescente que agrediu a sociedade com seus atos tem a oportunidade
de, com seu trabalho, se redimir. Observa-se que as tarefas realizadas são
gratuitas.
37
As tarefas serão desempenhadas de acordo com as habilidades do
adolescente, dessa forma o jovem não poderá ser obrigado a desempenhar
nenhuma atividade que não seja capaz de exercê-la.
A medida socioeducativa de prestação de serviços a sociedade não se
confunde com a prestação de trabalhos forçados, rigorosamente proibido pelo
ordenamento jurídico Pátrio, na forma do art. 112, § 2°, do ECA:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente
poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação
de trabalho forçado.
Acerca dessa diferença, informa Shecaira (2008, p. 199):
O trabalho forçado não se confunde com a prestação de serviços à
comunidade. Esta tem forte apelo comunitário, é executada em consonância
com as aptidões do adolescente, além de ser trabalho livre, enquanto
aquele é feito a ferros e sem qualquer interesse reeducativo, senão o de se
tornar um plus de punição.
O jovem que estiver cumprindo a medida supracitada não poderá em nenhum
momento ser submetido a constrangimento, dessa forma prestara os serviços sem
vincular a sua a prática do ato infracional, por tal motivo o adolescente não poderá
de forma algum estar trajando, no cumprimento da medida, vestis diferentes dos
trabalhadores da instituição, para que de nenhuma forma seja alvo de discriminação
alguma.
Outra peculiaridade da medida consiste no fato de não poder ultrapassar a
jornada máxima de oito horas semanais, nos sábados domingos e feriados, ou dias
úteis de forma que não venha atrapalhar a frequência escolar, ou a jornada de
normal de trabalho, dessa forma o legislador tentou colocar a salvo a educação do
adolescente, tendo em vista se a medida atrapalhasse a rotina escolar do
adolescente, poderia perder a sua função de reeducar o jovem.
A duração máxima da medida consistira em seis meses, dessa forma a
autoridade judiciária devera levar em conta a capacidade de cumprimento da medida
pelo adolescente em conflito com a lei, e ainda necessitara atentar para as
circunstâncias que for cometido o ato infracional e a sua gravidade.
38
Caso o adolescente não cumpra a medida aplicada pelo Juiz da Infância e da
Juventude, poderá ser submetido à medida socioeducativa de internação, conhecida
como internação sanção.
Destarte, entende Cabrera et al. (2006, p. 81):
O cumprimento da medida pressupõe a voluntariedade do adolescente, pois
o seu não-cumprimento não implica a atribuição de trabalhos forçados, mas,
sim, a possibilidade de aplicação da medida de internação sanção, por até
três meses.
De certa feita, o Estado não obrigara de forma alguma o adolescente a
cumprir a medida de prestação de serviços a comunidade, pois se tentar de alguma
forma coagir o jovem a desempenhar alguma atividade, incorrerá no erro de
penalizar o individuo a trabalhos forçados, de toda sorte o caso o infrator não
cumpra por algum motivo a sua obrigação, assinalada em juízo, poderá sofrer
medida mais dura, podendo ser penalizado com até três meses de medida sócio
educativa de internação, de acordo com o art. 122, inciso III, do ECA.
3.2.4 Liberdade assistida
A liberdade assistida esta prevista nos arts. 118 e 119, do ECA, e que
registra:
Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a
medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente.
§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a
qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.
§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses,
podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por
outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.
Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade
competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:
I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes
orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou
comunitário de auxílio e assistência social;
II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente,
promovendo, inclusive, sua matrícula;
III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua
inserção no mercado de trabalho;
IV - apresentar relatório do caso.
39
A liberdade assistida é a medida socioeducativa mais rígida em meio aberto,
sendo ela restritiva de direitos, o adolescente devera cumprir alguns requisitos
quando do seu cumprimento. A medida terá prazo mínimo de seis meses, podendo a
qualquer tempo ser prorrogada revoga ou substituída por outra medida, ouvindo o
orientador, o Ministério Público e o defensor.
Aplicada normalmente para os adolescentes que cometeram infrações leves e
medias como, por exemplo, pequenos furtos, agressões leves, etc. Será submetido
ao regime de liberdade assistida o jovem que todas as vezes que efetuado o estudo
de caso, se mostrar a melhor medida para reeducação do adolescente.
Das medidas mais rígidas para muitos doutrinadores é a mais eficiente, e
cumpre melhor com a doutrina da proteção integral, tendo em vista que adolescente
infrator não é retirado do seu meio familiar, nem social, e com isso se torna mais fácil
uma mudança de comportamento por parte do adolescente.
A respeito da eficácia da medida de liberdade assistida, doutrina Elias (2010,
p. 161):
Entendem alguns que a liberdade assistida é o melhor meio para a
recuperação do menor infrator. Assim também entendemos, mas parecenos que deve haver um esforço conjunto entre entidades públicas e
privadas, no sentido de colocar o menor profissionalmente. Um dos grandes
problemas que por vezes impede a ressocialização do menor infrator é a
falta de oportunidades de trabalho. [...] Das medidas mais rigorosas, a
liberdade assistida é, sem dúvida, a melhor, porquanto pode ser aplicada
mantendo o adolescente na própria família. Nesta, que é o lugar natural, ele
poderá se recuperar, recebendo a ajuda externa que lhe for necessária.
Para o cumprimento da medida em estudo, a autoridade julgadora designará
um orientador que venha acompanhar o adolescente no seu cumprimento. O
orientador cumprira papel fundamental no desenvolvimento do adolescente e de sua
família, deverá ele acompanhar a vida do jovem e de sua família, inserindo o
socioeducando e
sua família
em programas governamentais, bem
como
matriculando o adolescente na escola e acompanhando a sua frequência escolar, e
ainda ajudando o jovem a se inserir no mercado de trabalho.
Acerca da função do orientador, Shecaira (2008, p. 201) destaca:
O trabalho do orientador é por demais complexo. Deve, nos termos do art.
119 do ECA, diligenciar para que adolescente e a família tenham orientação
e possam frequentar programas oficiais ou comunitários de auxílio e
assistência social. A complexidade de suas atividades demanda adequada
formação. Pode ser ele um assistente social, psicólogo, pedagogo, enfim,
40
pessoa que tenha adequada formação, pois cumprirá o papel de verdadeiro
educador. Em muitas cidades, há pessoas especificamente treinadas para o
exercício de tal função, chamados de educadores sociais. Sua atuação é
por demais relevante e suas ações de apoio e assistência devem ser
discutidas e acordadas com o adolescente, respeitando seu direito de
escolher seu próprio projeto pessoal e de vida, fazendo que o processo de
normalização das condutas do adolescente seja um processo dinâmico e
interativo. Esse compromisso do adolescente é parte de um processo
dialógico, em que o orientador se apresenta como alguém mais experiente
que possa sugerir caminhos conducentes à efetiva socialização do
adolescente.
O legislador ao preceituar a medida de liberdade assistida considerou apenas a
fixação de um prazo mínimo de seis meses, dessa forma o magistrado poderá aplicar
o prazo que achar suficiente para cada caso, todavia sempre obedecendo ao prazo
mínimo, entretanto devera periodicamente se manifestar acerca da sua revogação,
prorrogação ou substituição por outra medida, ouvindo o MP, o orientador e o
defensor do adolescente.
3.2.5 Regime de semiliberdade
A primeira medida socioeducativa privativa de liberdade é o regime de
semiliberdade, portanto é de caráter excepcional e esta prevista no art. 120, do ECA,
que versa:
Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início,
ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização
de atividades externas, independentemente de autorização judicial.
§ 1º São obrigatórias a escolarização e a profissionalização, devendo,
sempre que possível, ser utilizados os recursos existentes na comunidade.
§ 2º A medida não comporta prazo determinado aplicando-se, no que
couber, as disposições relativas à internação.
O regime de semiliberdade pode ser imposto desde o inicio da medida, ou
como forma de transição para o meio aberto, essa medida implica que o adolescente
poderá participar de atividades de escolarização e profissionalização fora da
unidade.
Sobre o regime de semiliberdade, entende Shecaira (2008, p. 202):
A medida de semiliberdade constitui a medida privativa de liberdade
intermediária entre a internação e as medidas de meio aberto. O Código de
Menores de 1927 não contemplava a semiliberdade, tendo sido pela
primeira vez prevista no art. 39 do Código de Menores de 1979, como forma
de transição para o meio aberto. Caracteriza-se pela privação parcial da
41
liberdade do adolescente que tenha praticado ato infracional grave. O
adolescente deverá recolher-se à instituição especializada durante a noite,
devendo frequentar a escola ou atividade profissional, sempre que possível.
Assim como a medida de internação, a medida socioeducativa de
semiliberdade não comporta prazo determinado, devendo a cada seis meses ser
reavaliada.
Nesse sentido, explana Elias (2010, p. 164-165):
O § 2° refere-se à questão do prazo da medida, preceituando que esta não
comporta um determinado, mas se lhe aplicam as disposições referentes à
internação. Neste passo, há de se atentar ao § 2° do art. 121, no que tange
à reavaliação da medida de seis em seis meses. Parece-nos também que o
período máximo não poderá exceder a três anos (art. 121, § 3°), e, atingindo
este limite, o menor, se for o caso, poderá ser colocado em regime de
liberdade assistida. Ademais, deverá ser liberado aos vinte e um anos de
idade (§ 5° do art. 121). Em qualquer das hipóteses, a determinação será do
Juiz da Infância e da Juventude, ouvido o Ministério Público.
A medida de semiliberdade fica entre as medidas restritivas de direito
(liberdade assistida, prestação de serviços a comunidade, obrigação de reparar o
dano, advertência), e a medida mais rígida e restritiva de liberdade (internação). A
medida de semiliberdade restringe parcialmente a liberdade do adolescente, mas
não o retira totalmente do convívio social, dessa forma o operador do direito deve
aplicá-la apenas quando for a mais indicada para reeducação do adolescente.
42
4 DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO
A medida socioeducativa de internação, assim como o regime de
semiliberdade, constitui medida privativa de liberdade e esta prevista no ECA, em
seu art. 12, ad litteris:
Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos
princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento.
§ 1º Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe
técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.
§2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção
ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis
meses.
§3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três
anos.
§ 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente
deverá ser liberado, colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade
assistida.
§5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.
§6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização
judicial, ouvido o Ministério Público.
A medida de internação será aplicada apenas para atos infracionais de
natureza grave, e quando nenhuma outra mostrar-se mais eficaz, e terá por
princípios basilares a brevidade, a excepcionalidade, e o respeito à condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Outros aspectos relacionados à medida socioeducativa de internação serão
abordados posteriormente.
4.1 PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA MEDIDA
De acordo com o art. 121, do ECA, são princípios norteadores da medida
socioeducativa de internação: a) da brevidade; b) da excepcionalidade; c) do
respeito a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Tais princípios são elencados no texto constitucional no art. 226, parágrafo 3°,
inciso V:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
43
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 3º - O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de
qualquer medida privativa da liberdade;
Segundo o princípio da brevidade o adolescente cumprira a internação no
menor tempo possível, tendo em vista o caráter punitivo da medida, a legislação
pátria privilegiar o convívio familiar do adolescente ao abrigamento.
A medida em tela não comporta prazo determinado, sendo cumprida no
mínimo de seis meses e no Maximo de três anos.
Acerca desse princípio, assevera Shecaira (2008, p. 206):
A ideia de brevidade decorre de mandamento constitucional e pressupõe
que a internação punitiva institucional deve ser cumprida pelo menor tempo
possível. A medida sócio-educativa não é fixada por tempo certo, devendo
se circunscrever em um prazo mínimo de seis meses e um máximo de três
anos. A única exceção fica por conta da chamada internação-sanção,
modalidade prevista no art. 122, III.
Sobre a exceção ao prazo mínimo de seis meses e máximo de três anos,
entende Liberati (2003, p. 114):
A exceção fica por conta do art. 122, § 1°, III, que estabelece o período
máximo de três meses de internação nas hipóteses de descumprimento
reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta; é a chamada
internação-sanção; o mínimo, neste caso, fica a critério do Juiz.
Dessa forma a medida deve ser breve, pois o adolescente esta em processo
de formação, e pelo fato da condição peculiar do adolescente como pessoa em
desenvolvimento.
O juiz aplicara a medida com uma sentença genérica que versara acerca do
prazo inicial da medida de seis meses, podendo perdurar até no máximo três anos,
avista disso o magistrado devera reavaliar a manutenção da medida.
O princípio da excepcionalidade instrui que a medida de internação apenas
será imposta quando todas as outras se mostrarem ineficazes, ou se tal medida se
mostrar a mais indicada para o caso concreto. Assim sendo se alguma outra medida
se mostrar melhor para o caso concreto, essa aplicará o magistrado.
Isto posto, apreende Liberati (2003, p. 115):
44
O princípio da excepcionalidade informa que a medida de internação
somente será aplicada, se for inviável ou malograr a aplicação das demais
medidas. Ou Seja, existindo outra medida que possa substituir a de
internação, naquele caso concreto, o juiz deverá aplicá-la, reservando a de
privação de liberdade para os atos infracionais considerados graves, isto é,
aqueles praticados, mediante grave ameaça ou violência à pessoa e por
reiteração no cometimento de outras infrações graves, como dispõe o art.
122, I e II, do Estatuto.
Esse princípio rege que a medida supra mencionada, somente será aplicada
para os atos infracionais mais graves, o que abordaremos posteriormente.
O princípio do respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento
demonstra que o adolescente sendo uma pessoa em processo de desenvolvimento
tanto físico, quanto mental e psíquico, o que devera ser levado em conta tanto no
momento da aplicação da medida, quanto em sua execução, tendo em vista que a
adolescência é um rito de passagem, a transição entre a infância e a vida adulta,
esse aspecto devera ser levado em conta, para que o adolescente venha ter um
desenvolvimento saudável mesmo cumprindo medida de internação.
A respeito desse princípio, garante Shecaira (2008, p. 207):
O respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento é um
princípio que volta sua observação ao agudo momento de transformação
física e psíquica por que passa o adolescente, reclamando especial atenção
para a conclusão do processo sócio-educativo já iniciado na infância.
Diferentemente do adulto, a evolução pedagógica da medida deve ser
acompanhada com mais parcimônia, em períodos mais curtos, daí por que
é recomendável a avaliação a cada seis meses, no máximo (art.121, §2.°,
do Estatuto).
Para Liberati (2003, p. 116):
Pelo princípio do respeito ao adolescente em condição peculiar de pessoa
em desenvolvimento, o Estatuto reafirma que é dever do Estado zelar pela
integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar todas as
medidas de contenção e segurança, conforme dispõe o art. 125 do Estatuto.
Segundo o princípio mencionado o Estado tem o dever de colocar o
adolescente a salvo, e para que isso seja possível adotara medidas de segurança
dentro dos centros de internação de adolescentes.
45
4.2 APLICAÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO
O ordenamento jurídico pátrio estabelece três tipos de internação de
adolescentes. A primeira a ser tratada é a internação provisória que não poderá
exceder quarenta e cinco dias, ou seja, perdurará enquanto o procedimento de
apuração do ato infracional ser concluído.
A internação definitiva ou estrita constitui a medida socioeducativa mais grave
e somente será aplicada para os casos em que se mostrar a mais eficiente, terá
duração de no mínimo seis meses e no máximo três anos.
Já a internação-sanção somente será aplicada para os adolescentes que
tenham descumprido de maneira reinterada medida anteriormente imposta. Cabe
salientar, que cada uma dessas medidas somente serão aplicadas mediante decisão
fundamentada do Magistrado, e ainda visando sempre o cumprimento da doutrina da
proteção integral.
4.2.1 Internação provisória
A medida socioeducativa de internação somente será aplicada nos casos
previstos no art. 122 do Estatuto, ou de maneira provisória segundo os arts. 108,
174, 183 e 184 do mesmo diploma legal.
A internação provisória não poderá exceder o prazo máximo de quarenta e
cinco dias, e será determinada pelo magistrado da infância e da juventude em
decisão fundamentada, segundo o art. 108, do ECA. Observe:
Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo
máximo de quarenta e cinco dias.
Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e basear-se em
indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade
imperiosa da medida.
Dentro do prazo de quarenta e cinco dias o processo para apuração de ato
infracional deverá ser concluído, respeitando o devido processo legal, o que já foi
abordado anteriormente. Logo, não podendo exceder a esse prazo sob o risco de
incorrer na sanção descrita no art. 235, do ECA:
46
Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta Lei em
benefício de adolescente privado de liberdade:
Pena - detenção de seis meses a dois anos
Conforme Moaraes e Ramos (2011, p. 1098), o excesso de prazo gera
constrangimento ilegal:
O retardo do desfecho processual gera constrangimento ilegal decorrente
da manutenção da apreensão do adolescente em caráter provisório e pode
ensejar a impetração de habeas corpus, visando à sua liberação. Contudo,
há que se ressaltar a existência de entendimento no sentido de que se o
atraso foi ocasionado por justo motivo não haveria razão para que o jovem
fosse liberado.
A internação provisória poderá ser determinada de ofício ou a requerimento
do MP, a decisão que decreta a internação provisória deverá ser fundamentada e
basear-se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a
necessidade imperiosa da medida.
Sobre o cumprimento do art. 108 do Estatuto, entende Tavares (2005 apud
MORAIS; RAMOS, 2011, p. 1096):
Admite a privação da liberdade do adolescente em caráter preventivo,
limitada aos 45 de internação, que será relaxada se até aí não houver sido
exarada sentença. O despacho do Juiz que determinou a internação
preventiva, diz o parágrafo único, deve conter fundamentação legal, a
evidenciar que o adolescente é mesmo o autor da infração, a concreta
realização dela, e que o interesse social exige a medida para sossego e
segurança públicos.
Cabe salientar, que para determinar a internação provisória do adolescente
não terá necessidade de o ato infracional cometido ser mediante violência ou grave
ameaça à pessoa, ou pelo cometimento de atos infracionais de natureza de forma
reinterada, ou seja, não precisa cumprir as exigências contidas no art. 122, incisos I
e II, do ECA, desta maneira o magistrado deverá apenas fundamentar a sua decisão
obedecendo ao princípio da legalidade, e pautar-se no art. 108, § único, do mesmo
diploma legal.
Acerca da “necessidade imperiosa da medida”, declara Elias (2010, p. 149):
Pela expressão “necessidade imperiosa da medida” há de se entender
aqueles casos em que, não só a sociedade, mas também o próprio
adolescente estarão correndo perigo se a internação não for determinada.
Cada caso deve ser examinado com muito cuidado, pois não se deve
determiná-la sem que seja de utilidade.
47
Portanto se por causa do ato infracional o adolescente estiver correndo algum
perigo, a medida de internação provisória devera ser aplicada para resguardar a vida
do jovem infrator, pois esse risco demonstra a necessidade imperiosa da medida.
Cabe salientar que é dever do Estado e da sociedade colocar o adolescente a salvo
de qualquer forma de perigo.
4.2.2 Internação definitiva
A internação definitiva constitui a mais grave das medidas aplicadas, por ser a
mais grave das medidas, por se tratar da restrição ao direito a liberdade, somente
será imposta pela autoridade judiciária, e após o devido processo legal, com direito a
ampla defesa e ao contraditório.
A medida de internação não comporta prazo determinado devendo ser
reavaliada periodicamente a cada seis meses, e esta limitada ao prazo máximo de
três anos, e em nenhuma hipótese o prazo poderá ultrapassar os três anos, dessa
forma completado os três anos o adolescente poderá ser colocado em liberdade, ou
em regime de semiliberdade ou liberdade assistida, como autoriza o Estatuto.
De acordo com a lição de Morais e Ramos (2011, p. 1100):
Esclareça-se que o fato de atingir o limite de três anos de cumprimento da
internação não confere ao adolescente a sua liberação automática. O § 4°
do art. 121 do Estatuto autoriza que o autor do ato infracional seja inserido
no regime de semiliberdade o de liberdade assistida, após o período dos
três anos de internação.
Ainda sobre o prazo máximo da medida, cabe salientar que poderá ser
prolongado após os três anos, se o jovem incorrer em outros atos infracionais
durante os três anos de cumprimento da medida.
Nesse sentido, esclarece Elias (2010, p. 166-167):
Regra absoluta é a do § 3°, pois em nenhuma hipótese o adolescente ficará
internado por mais de três anos. Como advertem com propriedade os
insignes mestres Cury, Garrido e Marçura, “computa-se no prazo máximo de
internação o tempo de internação provisória (arts. 108 a 183)” (Estatuto da
Criança e do Adolescente anotado, cit., p.65). Diferente, contudo, é o caso
do adolescente que, internado, comete outra infração penal grave. Aí,
então, parece-nos que, tratando-se de outro ato, seja conveniente aplicar
medida de internação, que, somada á primeira, pode exceder o período de
três anos.
48
Contudo, o adolescente ao completar vinte e um anos será colocado em
liberdade de maneira compulsória.
No decorrer do cumprimento da medida socioeducativa de internação, ao
adolescente será permitido à realização de atividades externas, a critério da equipe
multidisciplinar, salvo determinação contraria do magistrado, contudo o juiz poderá
rever a sua decisão a qualquer tempo.
Cabe ressaltar, que a internação somente poderá ser aplicada de acordo com
o art. 122 do Estatuto, sendo o rol desse artigo exaustivo ou taxativo, não podendo
ser aplicada a internação definitiva em outras hipóteses, reza o art. supracitado:
Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:
I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência
a pessoa;
II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves;
III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente
imposta.
o
§1 O prazo de internação na hipótese do inciso III deste art. não poderá
ser superior a 3 (três) meses, devendo ser decretada judicialmente após o
devido processo legal
§2º. Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra
medida adequada.
O primeiro inciso do artigo mencionado admite a internação para os atos
infracionais cometidos mediante violência ou grave ameaça à pessoa, são aqueles
atos quer requer o emprego de força física, para superar uma resistência ou
aparente resistência, ou ainda, aqueles atos cometidos mediante ameaça, como o
emprego de arma de fogo no delito, ou arma branca. O inciso I, elenca atos
infracionais análogos aos crimes de estupro, roubo, latrocínio, sequestro, cárcere
privado, homicídio, para tais atos infracionais poderá ser aplicada a internação, caso
seja a medida mais indicada para a reintegração do jovem a sociedade.
Sobre o inciso supra, arrazoa Shecaira (2008, p. 209-210):
A primeira razão para a internação é a prática de ato infracional cometido
mediante violência ou grave ameaça à pessoa. Como é cediço, violência
constitui o emprego da força física, enquanto ameaça diz respeito à
promessa de mal sério. Na primeira hipótese a força física vence resistência
a resistência real ou suposta, de forma a impedir a resistência da vítima,
resultando lesões ou até a morte. Na segunda hipótese o mal prenunciado
deve se revestir de certeza, ter verossimilhança, estar prestes a acontecer
(iminente) e ser inevitável.
49
Todavia, se houver alguma outra medida mais eficaz para o caso concreto,
essa deverá ser aplicada, tendo em vista que a internação é a exceção e não a
regra.
Nessa esteira, afiançam Morais e Ramos (2011, p. 1101):
Muitas vezes, no entanto, em que pese o ato infracional ter sido cometido
mediante grave ameaça ou violência a pessoa, a internação pode ser a
medida mais acertada. Existem jovens que cometem ato infracional desta
natureza, porém possuem bom referencial familiar, estão inseridos no meio
escolar, nunca se envolveram em outras práticas delituosas, demonstram
sério arrependimento pelo que fizeram e, portanto, outra medida pode se
apresentar capaz de promover a sua reintegração social de maneira mais
eficaz.
A segunda causa que pode ensejar internação é o cometimento de reiterados
atos infracionais de natureza grave, tais infrações não necessitam de violência ou
grave ameaça, é o caso dos crimes contra o patrimônio, podendo-se destacar, o
furto, o estelionato, apropriação indébita, outro caso que pode ensejar a internação,
o trafico de entorpecentes, todavia deve ser esse ato infracional cometido de
maneira reiterada.
A reiteração é caracterizada, quando o individuo comete no mínimo três atos
infracionais, ou seja, para ser aplicada a medida de internação do inciso II do art.
122, do ECA, o adolescente deverá incorrer na conduta de atos infracionais de
natureza grave, ou seja, o adolescente deverá repetir as condutas delituosas, por
pelo menos três vezes, cabe ainda salientar, que é necessário ter incorrido no
mesmo ato, podendo serem atos distintos, como por exemplo, dois furtos e um
trafico de drogas.
Cabe salientar, a diferença de atos infracionais cometidos de maneira
reiterada e reincidência, a reincidência acontece quando o adolescente comete ato
infracional e a decisão transita em julgado, e após esse transito em julgado comete
outro ato infracional.
Acerca do assunto, Shecaira (2008, p. 211) esclarece:
A segunda razão que enseja a medida de internação, prevista no inciso II do
art. 122 do Estatuto, é a reiteração no cometimento de outras infrações
graves. A única interpretação cabível é a de reiteração de outras medidas
graves que não estejam alcançadas pelas figuras do inciso precedente
(violência ou grave ameaça). Podem ser considerados casos de tráfico,
estupro com violência presumida, alguns casos de furto etc. Também não
há que se confundir a reiteração com a reincidência. Esta é conceito
50
objetivo, previsto no art. 63 do Código Penal, e que pressupõe o
cometimento de novo crime depois do trânsito em julgado de sentença que,
no país ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior. Pode
haver reiteração sem haver reincidência. Também pode haver reincidência
sem reiteração. É que já se assentou a idéia segundo a qual, para haver
reiteração, é necessária, no mínimo, a prática de três condutas graves.
A terceira hipótese para a decretação da internação, é a por descumprimento
reiterado e injustificado de medida anteriormente imposta, conhecida como
internação-sanção, só podendo ser aplicada por um prazo não superior a três
meses. E ainda somente será aplicada obedecendo ao devido processo legal, onde
o adolescente será ouvido, podendo se justificar pelo não cumprimento da medida
anterior.
No caso de internação-sanção, independe se o ato infracional foi cometido
com violência ou grave ameaça, ou ainda se foi cometido de maneira reiterada, o
adolescente será internado, pelo fato de não ter cumprido medida socioeducativa
anteriormente imposta, e não ter justificado tal descumprimento.
Sobre a internação-sanção, Liberati ajuíza (2003, p. 118):
A terceira condição é aquela determinada pelo descumprimento reiterado e
injustificável da medida anteriormente imposta. Ao incidir nessa hipótese, o
adolescente não deixará de cumprir a medida burlada, que será cumulada
com a que lhe será imposta, independentemente do ato infracional
praticado, após a instauração do devido processo legal, com ampla
oportunidade de defesa para o infrator. Trata-se, portanto, de internação
instrumental – também conhecida por internação-sanção-, destinada a
coagir o adolescente ao cumprimento da medida originalmente imposta, não
substituindo a medida objeto do inadimplemento. (grifo do autor).
Todavia sabendo que a internação é uma exceção e não regra, mesmo a
internação-sanção apenas será aplicada em ultimo caso, dessa forma se houver
outra medida mais adequada para o caso concreto essa devera ser aplicada, por
essa razão, o descumprimento de medida de liberdade assistida não justifica a
internação do jovem infrator.
4.3 DIREITOS DOS ADOLESCENTES PRIVADOS DE LIBERDADE
A medida socioeducativa de internação visa à reintegração do adolescente na
sociedade, e gerar no jovem infrator uma mudança de comportamento e valores,
51
dessa forma o adolescente não pode ser tratado como um objeto no cumprimento da
medida, mas sim como um sujeito de direitos.
Como foi tratado anteriormente, a adolescência é uma condição peculiar, uma
transição entre a vida de criança para a faze adulta, dessa forma a medida de
internação devera respeitar essa condição do adolescente, como pessoa em
desenvolvimento, tanto físico quanto mental, e ainda devera obedecer os direitos do
jovem.
Segundo o art. 123 do Estatuto:
Art. 123. A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para
adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida
rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da
infração.
Consequentemente, o legislador pretende que o adolescente venha cumprir a
medida em local adequado, pois a medida tem caráter educativo.
Os estabelecimentos educacionais de internação deverão obedecer ao critério
de separação de idade dos adolescentes internados, sendo que os jovens deverão
ser alocados na unidade juntos com adolescentes da mesma faixa etária, e ainda
com mesma compleição física, colocando assim os adolescentes a salvo de a
qualquer abuso por parte de outros socioeducandos.
A questão ligada à separação por critério de gravidade do ato infracional
cometido, visa a não escolarização do crime, ou seja, o adolescente por estar numa
faze de desenvolvimento poderá ser influenciado por outro para o cometimento de
atos infracionais de natureza mais gravosa, pois o adolescente poderia sofrer
influência negativa e ao invés de ser reintegrado na sociedade, poderia encerrar a
medida como um especialista em crimes.
Sobre esses critérios, sustenta Elias (2010, p. 169):
A separação por critério de idade e da compleição física é desejável, posto
que pode evitar prevalência de uns sobre outros menores, com abusos de
ordem sexual e outros que, infelizmente, podem suceder nesses
estabelecimentos. No aspecto da gravidade da infração, pode haver a
influência no tocante a uma “escolarização” para a pratica de atos
infracionais. Embora seja difícil na prática, bom seria que todos esses
critérios fossem obedecidos.
De acordo com o parágrafo único do artigo supracitado, durante a internação,
mesmo a provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas. Por conseguinte os
52
adolescentes deverão participar de atividades que visem o seu bem estar físico e
mental, e o seu desenvolvimento saudável, isso esta ligado ao caráter pedagógico
da medida, que tenta uma mudança de comportamento no adolescente infrator.
Segundo Liberati (2003, p. 116-117):
Hoje a medida sócio-educativa de internação não objetiva a “cura” do
infrator. A medida segregativa terá, por conseguinte, eficácia, se for um
meio, para conduzir o adolescente ao convívio da sociedade, nunca um fim
em si mesma. Disso decorre que internação deve ser cumprida em
estabelecimento especializado, de preferência de pequeno porte, e contar
com pessoal altamente especializado nas áreas pedagógica, psicológica,
até mesmo, com conhecimento de criminologia.
O art. 124, do ECA, elenca outros direitos do adolescente privado de
liberdade, esses direitos são de fundamentais importância para a reintegração do
jovem na sociedade. Tendo em vista que a medida de internação tem caráter
pedagógico, cada um dos direitos do infrator devem ser respeitados.
O adolescente no cumprimento de medida de internação poderá entrevistarse com o representante do MP no decorrer da medida, essa entrevista proporcionara
ao adolescente reclamar acerca do tratamento recebido na instituição educacional.
O jovem também poderá se comunicar reservadamente com o seu defensor, sendo
alem de um direito elencado pelo Estatuto, uma prerrogativa do advogado, segundo
a Lei nº 8.906 (Estatuto da OAB), art.7°, inciso III, que reza:
Art. 7º São direitos do advogado:
III - comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo
sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos
em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados
incomunicáveis;
O inciso II, do artigo mencionado da ao socioeducando o direito de peticionar
diretamente a qualquer autoridade, isso faz com que o jovem possa acessar as
autoridades superiores as do centro de internação para fazer reclamações acerca do
tratamento a ele ministrado, e ainda denunciar abusos por parte de servidores,
maus-tratos, abusos de autoridade etc.
O adolescente devera ainda ser informado acerca da situação processual,
sempre que solicitar. O adolescente também devera ser tratado com dignidade e
respeito, por ser uma pessoa em desenvolvimento a autoridade competente na
unidade de internação, terá o cuidado com a violação desse direito.
53
Segundo a CF/88, em seu art. 5°, inciso III, ninguém será submetido à tortura,
nem a tratamento desumano ou degradante, dessa forma o jovem infrator terá a sua
dignidade respeitada.
Os direitos elencados nos incisos VI e VII, dizem respeito ao convívio familiar.
Segundo o ECA a criança e o adolescente têm o direito de ser educada e criada no
seio da família (ECA, art. 19), como já visto anteriormente, a medida de internação é
uma exceção, sendo de preferência que o adolescente venha cumprir uma medida
em meio aberto, todavia quando o adolescente estiver cumprindo medida de
internação, terá o direito a convivência familiar.
Os incisos supramencionados garantem a convivência familiar, garantindo
que o adolescente seja internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao
domicílio dos seus pais ou responsáveis, que o socioeducando receba visitas, ao
menos semanalmente.
Cabe salientar, que um direito garante o outro, pois se o adolescente for
internado em uma localidade diferente do domicílio dos seus responsáveis,
impossibilitara as visitas de seus familiares, dessa forma é de fundamental
importância que o adolescente seja internado o mais próximo da residência de seus
pais.
O inciso VIII garante que o jovem infrator venha corresponder-se com seus
familiares e amigos, fortalecendo ainda mais os laços familiares.
Acerca desses incisos, Elias leciona (ano, p. 171):
Os incs. VI, VII e VIII têm em defesa faculdades ligadas ao indeclinável
direito à convivência familiar de que trata o art. 19 do Estatuto, que tem
base no art. 227 da Constituição Federal. A localidade próxima da família,
as visitas semanais e a liberdade de correspondência certamente
fortalecerão os vínculos que unem o menor a família.
Ainda acerca do direito de visitas, o adolescente internado terá o direito de
visita intima sendo ele casado ou comprovando a união estável, e também tem o
direito de visita de seus filhos, independentemente da idade desses, segundo o
Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), arts. 67-70, que
versam:
Art. 67. A visita do cônjuge, companheiro, pais ou responsáveis, parentes e
amigos a adolescente a quem foi aplicada medida socioeducativa de
54
internação observará dias e horários próprios definidos pela direção do
programa de atendimento.
Art. 68. É assegurado ao adolescente casado ou que viva,
comprovadamente, em união estável o direito à visita íntima.
Parágrafo único. O visitante será identificado e registrado pela direção do
programa de atendimento, que emitirá documento de identificação, pessoal
e intransferível, específico para a realização da visita íntima.
Art. 69. É garantido aos adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de internação o direito de receber visita dos filhos,
independentemente da idade desses.
Art. 70. O regulamento interno estabelecerá as hipóteses de proibição da
entrada de objetos na unidade de internação, vedando o acesso aos seus
portadores.
Mas as visitas poderão ser suspensas temporariamente de acordo com o
parágrafo segundo, do art. 124, que versa:
§2º A autoridade judiciária poderá suspender temporariamente a visita,
inclusive de pais ou responsável, se existirem motivos sérios e fundados de
sua prejudicialidade aos interesses do adolescente.
Todavia, a visita apenas será suspensa quando for necessário, ou seja, se a
visita estiver prejudicando o adolescente internado.
Acerca dessa suspensão, Elias (2010, p. 172) manifesta:
Somente em casos excepcionais, como preceitua o § 2°, é que as visitas
poderão ser suspensas, se bem que temporariamente. Cada caso deve ser
examinado tendo em mira os interesses do adolescente e não os de seus
pais ou de quem quer que seja. É bom repetir que ele é quem deve ser
beneficiado com qualquer medida, pois sujeito prevalecente de direitos.
O socioeducando também devera ter acesso aos objetos necessários à sua
higiene e asseio pessoal (inciso IX), dessa forma devera ser proporcionado para os
jovens produtos de limpeza como sabonete, papel higiênico, creme dental, dentre
outros.
Os alojamentos deverão ter condições adequadas de higiene e salubridade
(inciso X), o que é imprescindível para o desenvolvimento saudável do adolescente,
dessa forma o ambiente da internação devera ser limpo, livre de insetos, não
podendo ser úmido, sendo arejado, e livre de contaminações.
O inciso XI garante ao adolescente privado de liberdade, o direito a
escolarização e a profissionalização, de acordo com o art. 227 da CFRB, sendo que
a educação um prioridade para os jovens.
55
De acordo com o art. 205 da CF, a educação é um direito de todos e dever do
Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,
visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho. Sendo de obrigação do Estado
promover a escolarização dos jovens infratores, não apenas do ensino fundamental,
mas também do ensino médio.
A profissionalização do adolescente internado é de fundamental importância,
pois apenas adentrando no mercado de trabalho o jovem infrator poderá sair da
delinquência,
logo
as
unidades
de
internação
deverão
ofertar
cursos
profissionalizantes para os jovens, e ainda esses cursos deverão realmente facilitar
o ingresso do adolescente no mercado de trabalho, não bastando ser ministrado
qualquer curso, apenas para preencher horários, tem que ser de acordo com o que
esta sendo exigido no mercado atual.
Sobre o direito à profissionalização, Amin (2011, p. 82) aduz:
A profissionalização integra o processo de formação do adolescente e, por
isso, lhe é assegurada. Contudo, sua peculiar condição de pessoa em
desenvolvimento exige um regime especial de trabalho, com direitos e
restrições.
Segundo Elias (2010, p. 86):
O direito à profissionalização, de grande relevância, tem a ver com a
proteção integral que deve ser dada ao adolescente. Sua importância é de
tal monta que a Constituição Federal, no art. 227, caput, o coloca com
destaque especial entre os direitos fundamentais concernentes ao menor.
Os
adolescentes privados de liberdade têm o direito de realizar atividades
culturais, esportivas e de lazer, priorizando um desenvolvimento saudável em todos
os aspectos.
O adolescente também devera ter acesso aos meios de comunicação social,
como a televisão, jornais, revistas, tendo assim mais um contato com o que esta
acontecendo fora do estabelecimento, e ainda se mantendo informado.
O inciso XIV reza, que o adolescente tem direito “receber assistência
religiosa, segundo a sua crença e desde que assim deseje”, dessa forma as
instituições deverão disponibilizar projetos que visem tal assistência, e ainda o
ingresso de lideres religiosos para assistirem os adolescentes.
56
Todavia a assistência religiosa é facultada ao interesse do socioeducando,
pois se este não tiver interesse, deve ser respeitada a escolha do mesmo, e com
relação à assistência religiosa deve ser respeitado o pluralismo religioso, não
podendo ser colocado empecilhos de qualquer espécie, privilegiando algumas
religiões em detrimento de outras, pois o Estado é laico.
Ainda o jovem terá o direito de manter a posse dos seus objetos pessoais ou
de dispor de um lugar seguro para guardá-los, recebendo um comprovante dos que
porventura estiverem depositados. E quando da sua desinternação o adolescente
recebera seus documentos pessoais indispensáveis à vida em sociedade.
O adolescente nunca poderá ficar incomunicável, resguarda assim todos os
outros direitos, pois se o objetivo da internação é que o adolescente volte ao
convívio social e familiar, nunca poderá ser privado de manter contato com outras
pessoas, pois com a incomunicabilidade outros direitos do adolescente podem ser
prejudicados, ou seja, os jovens podem sofrer excessos de varias naturezas, como
por exemplo, agressões físicas, e até mesmo tortura.
Sendo que o dever do Estado é colocar o adolescente internado a salvo de
qualquer tratamento desumano ou degradante, e ainda sendo dever das instituições
zelar pela integridade física e mental dos adolescentes, como estatui o art. 125, do
ECA:
Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos
internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e
segurança.
Os estabelecimentos de internação de jovens infratores deverão adotar
procedimentos de segurança e contenção, adotando regimentos disciplinares
tipificando as condutas inapropriadas dos adolescentes, como se dará o
procedimento disciplinar, e ainda a duração da sanção para cada falta, de acordo
com o SINASE, capitulo VII, arts. 71-75.
O Estado ainda devera fiscalizar a conduta dos seus servidores, punindo os
excessos, e as condutas que prejudiquem o desenvolvimento saudável dos
adolescentes, instaurando processos administrativos disciplinares para aqueles que
agirem em desacordo da legislação vigente.
57
Os servidores deverão ser capacitados por meio de cursos e palestras para
cumprirem as suas funções com eficácia, estando preparados para lidar com
qualquer situação dentro das unidades de internação.
58
5 OS DIREITOS DO ADOLESCENTE PRIVADO DE LIBERDADE: ESTUDO
SOBRE A UNIRE (UNIDADE DE INTERNAÇÃO RECANTO DAS EMAS)
Neste capítulo trataremos de uma pesquisa de campo feita na Unidade de
Internação Recanto das Emas. Realizada por meio de questionários respondidos
pelas duas principais gerencias da unidade, sendo elas, a Gerência de Segurança e
a Gerência Socioeducativa, com o objetivo de se constatar se o adolescente em
regime de internação tem os seus direitos assegurados.
Cabe ressaltar, que a Unidade deverá cumprir as obrigações constantes no
art. 94 do ECA, que versa:
Art. 94. As entidades que desenvolvem programas de internação têm as
seguintes obrigações, entre outras:
I - observar os direitos e garantias de que são titulares os adolescentes;
II - não restringir nenhum direito que não tenha sido objeto de restrição na
decisão de internação;
III - oferecer atendimento personalizado, em pequenas unidades e grupos
reduzidos;
IV - preservar a identidade e oferecer ambiente de respeito e dignidade ao
adolescente;
V - diligenciar no sentido do restabelecimento e da preservação dos
vínculos familiares;
VI - comunicar à autoridade judiciária, periodicamente, os casos em que se
mostre inviável ou impossível o reatamento dos vínculos familiares;
VII - oferecer instalações físicas em condições adequadas de habitabilidade,
higiene, salubridade e segurança e os objetos necessários à higiene
pessoal;
VIII - oferecer vestuário e alimentação suficientes e adequados à faixa etária
dos adolescentes atendidos;
IX - oferecer cuidados médicos, psicológicos, odontológicos e
farmacêuticos;
X - propiciar escolarização e profissionalização;
XI - propiciar atividades culturais, esportivas e de lazer;
XII - propiciar assistência religiosa àqueles que desejarem, de acordo com
suas crenças;
XIII - proceder a estudo social e pessoal de cada caso;
XIV - reavaliar periodicamente cada caso, com intervalo máximo de seis
meses, dando ciência dos resultados à autoridade competente;
XV - informar, periodicamente, o adolescente internado sobre sua situação
processual;
XVI - comunicar às autoridades competentes todos os casos de
adolescentes portadores de moléstias infecto-contagiosas;
XVII - fornecer comprovante de depósito dos pertences dos adolescentes;
XVIII - manter programas destinados ao apoio e acompanhamento de
egressos;
XIX - providenciar os documentos necessários ao exercício da cidadania
àqueles que não os tiverem;
XX - manter arquivo de anotações onde constem data e circunstâncias do
atendimento, nome do adolescente, seus pais ou responsável, parentes,
endereços, sexo, idade, acompanhamento da sua formação, relação de
59
seus pertences e demais dados que possibilitem sua identificação e a
individualização do atendimento.
o
§ 1 Aplicam-se, no que couber, as obrigações constantes deste art. às
entidades que mantêm programas de acolhimento institucional e familiar
§ 2º No cumprimento das obrigações a que alude este art. as entidades
utilizarão preferencialmente os recursos da comunidade.
Portanto a responsabilidade das unidades de internação é extremamente
complexa, pois lidam com adolescentes em conflito com a lei, e por conseguinte
deverão ter um cuidado especial para com esses jovens, buscando sempre uma
mudança no comportamento do adolescente, tendo um ambiente capaz de respeitar
todos os direitos do adolescente.
5.1 AS UNIDADES DE INTERNAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL
As Unidades de internação de adolescentes do Distrito Federal são órgãos da
Subsecretaria do Sistema Socioeducativo vinculada a Secretaria de Estado da
Criança do Distrito Federal (SECRIA), que estão sob gestão da Gerência de
internação provisória e estrita (Geinpe).
A Geinpe tem por objetivo atuar junto das Unidades com o fim de os
adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação tenham
acesso ao sistema de garantia de direitos. (BRASÍLIA, 2013a).
No Distrito Federal existem cinco Unidades de internação de adolescentes,
são elas: Unidade de Internação de Planaltina (UIP); Unidade de Internação Recanto
das Emas (UNIRE); Unidade de Internação de São Sebastião (UISS); Núcleo de
Atendimento Integrado (NAI) e a Unidade de Internação do Plano Piloto (UIPP).
A UIP começou a funcionar em outubro de 2008, como o objetivo de reduzir a
superlotação da UIPP, e de atender adolescentes na faixa etária de 12 a 15 anos,
todavia tal objetivo não foi atingido tendo em vista que os primeiros 22 jovens
internados no até então CIAP (Centro de Internação de Adolescentes de Planaltina),
eram maiores de idade oriundos do DEP (Departamento de Polícia Especializada),
no mesmo ano foram acautelados mais 46 adolescentes, totalizando 68 no seu
primeiro ano. (BRASÍLIA, 2013b).
A UIP abriga apenas adolescentes do sexo masculino, e tem os seus
trabalhos são pautados nos princípios da doutrina da proteção integral e tem por
60
missão executar a medida de internação de acordo com os direitos humanos, e
sempre visando a efetivação do ECA e do SINSE.
Os projetos de maior visibilidade são: Espaço Conquista, Projeto fazendinha,
Curso de Cartazista, Espaço Escuta, Projeto Alimentação Saudável, Projeto
Qualidade de Vida do Servidor.
A UISS foi criada em 2003 com o objetivo de ampliar o número de vagas do
sistema socioeducativo do Distrito Federal, tem capacidade para 120 adolescentes
que são encaminhados pela VIJ (Vara da Infância e Juventude), para cumprimento
de medida de internação provisória de 45 dias.
A UISS é gerida pela Congregação Amigonianos nos termos do Convênio n°.
9/2003, em parceria com a SECRIA. (BRASÍLIA, 2013b).
A UIPP mais conhecida como CAJE (Centro de Atendimento Juvenil
Especializado), tem enfrentado ao longo dos anos vários problemas por causa da
super lotação e das péssimas condições de sua estrutura. Atualmente atende
apenas adolescentes do sexo masculino. E há muito tempo se estuda a
possibilidade de sua desativação, o que possivelmente aconteça até o final desse
ano com a entrega de novas unidades. Sendo que a primeira dessas a ser
inaugurada o NAI, e ainda serão entregues as Unidades de Brazlândia, São
Sebastião , e Santa Maria. (BRASÍLIA, 2013b).
A Unidade de Internação Recanto das Emas foi inaugurada em julho de 2006
com o nome de Centro de Internação de Adolescentes Granja das Oliveiras
(CIAGO), ao longo dos anos foi gerenciada por entidades não governamentais, por
intermédio de convênios e contratos, até julho de 2010, quando o Governo do
Distrito Federal assumiu o controle total da Unidade. (BRASÍLIA, 2013b).
São executadas na unidade as medidas de internação estrita, provisória e
Sanção, voltada para jovens e adolescentes da faixa etária de 12 a 21 anos
incompletos, atendendo tanto o gênero masculino, quanto feminino. Tem sua
capacidade máxima de adolescentes de 144 internos(as).
A partir do dia 24 de agosto de 2012, foram transferidas vinte e quatro
socioeducandas da UIPP para a UNIRE, com isso a UNIRE passou a atender
adolescentes do gênero feminino e adolescente em medida de internação provisória.
A unidade tem por missão institucional:
61
disponibilizar um acompanhamento integral aos(as) socioeducandos(as), a
partir de uma atuação multiprofissional qualificada, que abarca
socioeducadores(as), orientadores(as), psicólogos(as), assistentes sociais,
pedagogos(as), objetivando o desenvolvimento pessoal e social dos(as)
adolescentes e jovens acompanhados(as). Uma Unidade socioeducativa
deve ser capaz de impulsionar mudanças significativas nas vidas de
seus(suas) jovens e de estimulá-los(las) a serem protagonistas, construindo
sua identidade na relação com o(a) outro(a). Deve também fortalecer a sua
reintegração familiar, educacional e comunitária, para que possam assumir
com dignidade a condição de seres humanos e de cidadãos(ãs).
(BRASÍLIA, 2012).
Assim sendo todas as unidades de internação de adolescentes do Distrito
Federal, tem por finalidade o cumprimento da doutrina da proteção integral e ainda
uma mudança no comportamento dos jovens infratores, devendo elas obedecer
todos os princípios elencados no ECA e na Constituição da Republica.
5.2 ESTUDO SOBRE A UNIRE (UNIDADE DE INTERNAÇÃO RECANTO DAS
EMAS)
Passemos a analisar os dados colhidos dentro da UNIRE a luz do Estatuto da
Criança e do Adolescente e do SINASE.
A unidade em sua estrutura física é composta por oito módulos (casas),
possuindo em cada um dos seis primeiros duas alas, sendo denominadas de “A” e
“B”, onde acautelam os adolescentes, cada ala tem quatro quartos. Os dois últimos
módulos possuem doze quartos, sendo que apenas dez deles são autorizados a
moradia, tendo em vista que os outros dois não possuem banheiro.
A sua estrutura física ainda é composta por uma quadra poliesportiva, um
ginásio poliesportivo, um campo sintético e ainda uma piscina recentemente
reformada, dois blocos, compostos pelas salas de aula do ensino formal, algumas
salas destinadas aos cursos profissionalizantes, um auditório, um núcleo de saúde,
entre outros. Cabe salientar que nenhuma parte da unidade é composta por blocos
verticalizados.
A unidade de internação supracitada obedece ao art. 123, do ECA, sendo que
nela apenas são cumpridas medidas socioeducativas, não foi construído nem
mesmo próximo à presídios, e constitui local distinto ao destinado ao abrigo. Dessa
forma o adolescente esta a salvo da influência de detentos que possam persuadi-los
a uma conduta ainda pior. E ainda por serem inimputáveis devem cumprir a
62
internação em um ambiente adequado, longe dos presos imputáveis. Pois se eles
fossem acautelados juntamente com presos imputáveis poderiam sofrer uma
influencia negativa desses. E cabe salientar que nenhum adolescente deve cumprir
sua internação em prisão.
Com base na pesquisa de campo pode-se perceber que se trata de mais uma
unidade de internação superlotada, pois tendo como capacidade máxima 144 (cento
e quarenta e quatro) adolescentes, na data da pesquisa se encontrava com 193
(cento e noventa e três) jovens internados, dessa forma a unidade tem 49 (quarenta
e nove) adolescentes a mais do que a sua capacidade normal. Essa superlotação
pode prejudicar em vários aspectos o bom desenvolvimento da medida dos
socioeducandos, pois os atendimentos por parte dos profissionais da unidade não
serão prestados de maneira mais eficaz, por ter uma sobre carga de trabalho.
Essa superlotação traz alguns transtornos de ordem estrutural na unidade,
pois o espaço físico fica comprometido, ou seja, um quarto que deveria alojar
apenas três adolescentes acaba ficando com quatro ou até mesmo cinco jovens, o
que pode causar vários problemas, como por exemplo, se no quarto tem apenas três
camas, um dos adolescentes devera dormir no chão, correndo o risco de contrair
alguma doença, dentre outros problemas que possam acontecer.
Desses 193 adolescentes, 176 (cento e setenta e seis) cumprem medida de
internação estrita (definitiva), que não comporta prazo determinado, 8 (oito)
cumprem medida de internação-sanção, também conhecida como regressão de
medida, e 9 (nove) estão cumprindo medida de internação provisória, sendo que
estão internados provisoriamente apenas adolescentes do gênero feminino.
Os oito módulos acautelam adolescentes de 12 aos dezoito anos incompletos,
e ainda jovens adultos de 18 aos 21 anos incompletos. Dessa forma a distribuição
para que exista uma separação por critério de idade se torna muito difícil.
Com base em informações prestadas pelo servidor da Gerência de
Segurança da Unidade, as casas um e quatro é constituída apenas de adolescentes
maiores de dezoito anos, e os módulos três e seis apenas de adolescentes da faixa
etária de 12 aos dezoito anos incompletos. O módulo 2, abriga apenas adolescentes
do sexo feminino, sendo elas maiores e menores, cumprindo medida de internação
definitiva e medida de internação provisória.
Os demais módulos alojam tanto adolescentes, quanto jovens adultos, sendo
que apenas são separados por alas. E o módulo 7 tem algumas peculiaridades
63
tendo em vista ser o modulo de integração, que recebe adolescentes de todos os
outros módulos para o cumprimento de medida disciplinar, conforme regulamento
disciplinar unidade.
Cabe salientar, que essa separação por critério de idade estatuída no art.
123, do ECA, não dizia respeito apenas na separação de jovens adultos e
adolescentes, queria o legislador que os adolescentes fossem separados segundo a
sua faixa etária, o que não ocorre no caso dessa unidade, pois pode ter
adolescentes de doze anos convivendo no mesmo módulo de adolescentes de
dezessete anos. Dessa forma os mais velhos podem influenciar de maneira negativa
os mais novos.
Outro problema que a unidade enfrenta, talvez não só a estudada, mas
possivelmente quase todas no DF e no Brasil, é a questão da separação por critério
de compleição física, não sendo possível ainda tal separação, é um dos desafios a
serem encarados nos próximos anos, talvez pela pequena quantidade de unidades
não seja possível pelos gestores e servidores conseguirem alojar os adolescentes
obedecendo a esse critério.
Algo que dificulta muito isso é a super lotação, pois às vezes é muito difícil
para os gestores até mesmo alocar esses internos na unidade quanto mais separálos de acordo com esse critério.
Outra dificuldade da unidade é a separação por critério de gravidade de ato
infracional, o que não esta sendo possível atualmente, pois a logística da unidade
possibilita.
Todavia cabe salientar que não é qualquer adolescente que pode ser
internado, como foi tratado anteriormente para serem sentenciados para
cumprimento de medida socioeducativa de internação, os adolescentes devem ter
cometido ato infracional mediante violência ou grave ameaça (roubo, latrocínio,
homicídio, estupro etc.), ou ter cometido reiterados atos infracionais de natureza
grave (furtos, estelionatos, trafico, entre outros), dessa forma se torna complicado
separar segundo a gravidade do ato, pois a maioria cometeu atos dessa natureza.
Mas de qualquer forma essa separação é impossibilitada por causa da
superlotação das unidades educacionais de internação, e ainda pelo grande
crescimento da criminalidade infanto-juvenil.
64
Outro direito cerceado dos adolescentes internados é o de entrevistar-se
pessoalmente com o membro do MP, todavia não por culpa dos servidores da
unidade, mas sim pelo fato de serem raras as visitas deste na unidade.
Mas algo que chama a atenção é a questão das petições para as autoridades,
pois segundo a servidora entrevistada, os adolescentes têm o costume de enviar
cartas para as autoridades superiores, essas são entregues na forma de petições.
Nessas cartas eles acabam contando a sua situação atual na unidade e os desejos
para o futuro, como a possibilidade de saídas da unidade nos dias das mães e dos
pais, no natal, e ainda saídas sistemáticas.
Já ser informado sempre que solicite sobre a sua situação processual não é
possível tendo em vista que o processo corre em segredo de justiça, o que trás
certas dificuldades para os servidores do corpo técnico (pedagogo, assistente social
e psicólogo) ter acesso ao processo e estarem informando aos adolescentes. Mas
sempre que os defensores comparecem na unidade, eles informam o adolescente
acerca de como esta o processo.
A maioria dos adolescentes da UNIRE encontra-se próximos da localidade de
seus pais ou responsáveis, todavia para alguns isso ainda não é possível, tendo em
vista que para a proteção da integridade física deles as vezes é mais indicado a
internação em um centro educacional diverso da residência de seus pais ou
responsáveis.
Dessa forma o Estado deve zelar pela integridade física e metal do jovem, e
por esse motivo o colocar a salvo de possíveis algozes. Pois muitos dos
adolescentes ao longo da sua vida contraem muitas rixas na região onde moram, e
com isso na unidade de internação próxima da sua residência encontram muitos
adolescentes rivais, por essa razão a melhor forma de proteger o jovem é
deslocando este para outra unidade.
As visitas dos familiares dos adolescentes acontecerão semanalmente de
acordo com o manual do visitante. Cada casa terá um dia determinado sendo que
dos os procedimentos elencados na cartilha do visitante, que tem o intuito de
informar os familiares dos internos de alguns procedimentos da unidade.
A cartilha do visitante começa trazendo algumas informações gerais acerca
da unidade, como por exemplo, que na UNIRE se encontram adolescentes e jovens
na faixa etária que é de 12 a 20 anos.
Traz ainda como missão da UNIRE:
65
prestar assistência integral aos socioeducandos, em ambiente favorável ao
desenvolvimento pessoal e social, para o convívio sócio familiar e
comunitário, garantindo a integridade física e mental, zelando pelo
fortalecimento e garantia dos direitos humanos e promovendo a participação
em atividades socioeducativas (escolarização, iniciação profissional,
esporte, lazer e cultura) e acompanhamento com a equipe de referência.
(ANEXO B).
Essa cartilha direciona os pais ou responsáveis para entregarem a
documentação para a Unidade quando da sua internação. Todavia se o jovem só
tenha certidão de nascimento, devera ser entregue a original, para que seja possível
providenciar os demais documentos. Os familiares deverão entregar ainda o
Histórico Escolar para que o adolescente seja matriculado na escola.
A visita acontecera em três dias da semana, nos módulos (casas) 01, 02, 06 e
08, a visita será feita no sábado, nos horários das 08h às 11h, e das 14h às 17h, e
nos módulos 03, 04 e 05 a visita se dará no domingo nos mesmos horários do
sábado.
As pessoas autorizadas para visitar os adolescentes são: pais e/ou
responsáveis, cônjuge, parente, amigos, companheiros, companheiras, namoradas e
namorados. Sendo que a equipe de referência avaliara o cadastro dos visitantes,
excluindo quem exerça influência negativa para o adolescente, que possam
prejudicar no processo de socioeducação, e pode incluir pessoas influenciem os
jovens de maneira positiva. Os irmãos entre 12 e 17 anos somente visitarão os
internos, acompanhados de seus pais ou responsáveis.
Para conseguirem visitar os adolescentes as pessoas supracitadas deverão
primeiro se cadastrar, sendo exigidos alguns documentos, como por exemplo,
documento oficial com foto e copia de comprovante de residência. E a visita
somente será autorizada após analise dos antecedentes do visitante, dessa forma
também se exige o nada consta Criminal, esse procedimento não é exigido para os
pais ou responsáveis, apenas para os demais visitantes.
Os irmãos e filhos menores de 12 anos visitarão os socioeducandos nas
terças-feiras, horário contrário ao da escola do interno, e sempre deverão estar
acompanhados dos seus responsáveis legais.
Os visitantes não poderão trajar alguns tipos de roupas, tendo em vista serem
proibidos na unidade. E os aparelhos eletrônicos, como celulares, MP3, sacolas,
mochilas, entre outros, deverão ser deixados na portaria. Todos os visitantes serão
submetidos a procedimento de revista minuciosa.
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Os visitantes poderão levar alguns objetos para os socioeducandos, como
peças do vestuário, como por exemplo, calça de moletom, bermudas de tactel,
camisas mangas curtas ou longas, cuecas, pares de meias, esses objetos deverão
obedecer algumas normas, como por exemplo, as roupas regra geral serão nas
cores azul, branca e cinza.
Os adolescentes poderão receber ainda material eletrônico, como televisão e
DVD. O televisor deverá ter 14 polegadas, CRT, LCD ou LED, sem transformador e
o aparelho de DVD devera ser de plástico.
É permitida a entrada de uma mídia (CDs/DVDs) por semana, todavia a sua
entrega para o socioeducando, esta condicionada a uma analise prévia da Gerência
de Segurança, mídias que tenham conteúdo pornográfico ou de apologia a violência,
uso de drogas ou ao crime, estão proibidos.
Os visitantes poderão levar materiais de higiene pessoal para os
socioeducandos, papéis higiênicos, desodorantes em bastão sólido, sabonete,
sabão de barra, etc. A entrada de roupa de cama e banho é permitida na Unidade,
esponja de banho, toalha, cobertor, lençol, dentre outros.
A entrega de correspondências e fotos para os jovens e adolescentes, mas o
conteúdo desse serão analisadas, as consideradas inapropriadas será recolhido,
arquivadas ou devolvidas.
A cartilha do visitante caracteriza conteúdo inapropriado como sendo:
toda e qualquer informação que venha de antigos parceiros de atos
infracionais ou notícias vinculadas a práticas criminosas, e toda e qualquer
imagem de cunho libidinoso, como fotos de biquínis, decotes ou minissaias,
por despertarem o assédio e a cobiça dos demais colegas do quarto,
gerando desavenças e rixas. (ANEXO B).
Importa anotar, que segundo as respostas do servidor da Gerência de
Segurança, que os adolescentes internados na Unidade podem corresponder-se
com seus familiares normalmente, todavia com amigos apenas em casos
excepcionais.
Alimentos serão permitidos a entrada nos dias de visita, todavia deverão
passar pelo criterioso procedimento de revista, e nem todos os tipos de alimento são
permitidos na Unidade.
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As visitas poderão levar semanalmente para os socioeducandos cigarros, no
Maximo 04(quatro) carteiras de cigarro, com 20 (vinte) unidades, acondicionadas em
embalagens lacradas, e 01 (um) isqueiro por jovem ou adolescente a cada mês.
Os adolescentes receberem cigarros é algo extremante contraditório, tendo
em vista, que essa conduta é tipificada pelo ECA, em seu art. 243:
Art. 243. Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar,
de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos
cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda
que por utilização indevida:
Pena - detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não
constitui crime mais grave.
Respaldam essa conduta na justa causa, do artigo, tendo em vista que para
os gestores do Sistema Socioeducativo, pois o uso da substância acalma o
adolescente, e ainda que esses adolescentes entrem nas unidades com um nível
alto de dependência, o que causaria alguns transtornos na unidade a falta do
cigarro.
Todavia uma conduta nociva como o uso do cigarro, que destrói a saúde do
individuo, e pode causar até mesmo vários tipos de câncer, não pode ser justificada
tão facilmente. E como é dever do Estado, da família e da sociedade zelar pelo bem
estar físico e mental dos adolescentes, por serem pessoas em desenvolvimento
tanto físico, quanto mental, autorizar a entrada desse produto que causa
dependência, é no mínimo contraditório e contrario a tudo que busca uma medida
socioeducativa.
A UNIRE também disponibiliza materiais de higiene pessoal para os
adolescentes, como papel higiênico, sabonete, creme dental, etc. Os adolescentes
também recebem um presto barba por semana, mas a utilização desses fica sob a
supervisão da segurança, tendo em vista que pode facilmente ser utilizado como
arma. Assim sendo o adolescente recebe esse produto e tem em média uma hora,
para utilizá-lo e logo após o uso devolve para o servidor.
Em relação à salubridade do ambiente do centro educacional, o servidor
entrevistado não conseguiu responder com clareza, todavia em uma visita de uma
parlamentar do Distrito Federal na Unidade ela pode constatar que o ambiente é
extremamente insalubre, os quartos têm infiltração, o ambiente é sujo, com muitas
baratas e ratos. Em depoimento para essa parlamentar, um servidor diz: “A situação
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é gritante, tentamos fazer milagres por aqui, ajudando até na limpeza dos módulos.”
A situação da Unidade chega a ser preocupante, pois o risco de doenças é muito
alto. (KOKAY, 2011).
Já o direito a assistência religiosa é prestado na instituição, por meio do
Espaço Vida, feito por entidades parceiras que cumprem alguns requisitos
estabelecidos pela unidade, e que devem apresentar um projeto próprio, de
evangelização por exemplo. E ainda as pessoas que estarão participando dos cultos
e missas dentro da instituição deverão cumprir alguns requisitos, levar alguns
documentos, para possibilitar a sua entrada.
As atividades culturais dentro da Unidade são promovidas por um
departamento próprio, que tem por nome Núcleo de Esporte Cultura e Lazer, e
normalmente todos os socioeducandos participam. Mas outras atividades culturais
podem ser promovidas pelas equipes multidisciplinares dos módulos.
O direito a escolarização dos adolescentes da UNIRE ao que parece esta
sendo respeitado, tendo em vista que a maioria dos jovens e adolescentes
frequentam o ensino formal. Alguns deles não estão matriculados, pois já concluíram
o ensino médio.
Mas existem alguns adolescentes que não frequentam as aulas, para a
preservação da sua integridade física, ou seja, alguns adolescentes no decorrer do
cumprimento da medida têm dificuldades de se relacionarem com outros
adolescentes, adquirem rixas tanto dentro da unidade, quanto fora dela, com isso o
seu comparecimento na escola traz sérios riscos para a sua vida, por essa razão em
um breve período esses adolescentes não freqüentam as aulas, até que sejam
transferidos de Unidade. Mas em regra a maioria dos adolescentes está matriculada.
A profissionalização dos internos acontece por meio de oficinas, na UNIRE
são disponibilizadas para os adolescentes as seguintes oficinas: panificação;
maquiador; operador de caixa, que são realizadas em parceria com o SENAC. E
ainda são desenvolvidos na instituição outros cursos, mas apenas de caráter
ocupacional sendo eles: horta; serigrafia; e bijuteria.
Todavia
nem
todos
os
socioeducandos
frequentam
os
cursos
profissionalizantes, como foram ditas pela servidora algumas delas tem critério de
idade e escolaridade, as ministradas pelo SENAC, e nem todos os socioeducandos
se encaixam no perfil da oficina. Outros adolescentes já frequentaram todas elas,
por essa razão a preferência fica para os que ainda não participaram de nenhuma.
69
Ainda tem o caso dos adolescentes em regime de proteção à integridade
física, que não podem se misturar com outros adolescentes, pois corre o risco de
serem agredidos. Tal atitude esta em conformidade com o art. 125 do ECA, que diz:
Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos
internos, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e
segurança.
A UNIRE adota um Regulamento disciplinar para contenção e segurança dos
adolescentes. Esse manual esta de acordo com o SINASE, arts. 71 e 75, que rezam:
Art. 71. Todas as entidades de atendimento socioeducativo deverão, em
seus respectivos regimentos, realizar a previsão de regime disciplinar que
obedeça aos seguintes princípios:
I - tipificação explícita das infrações como leves, médias e graves e
determinação das correspondentes sanções;
II - exigência da instauração formal de processo disciplinar para a aplicação
de qualquer sanção, garantidos a ampla defesa e o contraditório;
III - obrigatoriedade de audiência do socioeducando nos casos em que seja
necessária a instauração de processo disciplinar;
IV - sanção de duração determinada;
V - enumeração das causas ou circunstâncias que eximam, atenuem ou
agravem a sanção a ser imposta ao socioeducando, bem como os
requisitos para a extinção dessa;
VI - enumeração explícita das garantias de defesa;
VII - garantia de solicitação e rito de apreciação dos recursos cabíveis; e
VIII - apuração da falta disciplinar por comissão composta por, no mínimo, 3
(três) integrantes, sendo 1 (um), obrigatoriamente, oriundo da equipe
técnica.
Art. 72. O regime disciplinar é independente da responsabilidade civil ou
penal que advenha do ato cometido.
Art. 73. Nenhum socioeducando poderá desempenhar função ou tarefa de
apuração disciplinar ou aplicação de sanção nas entidades de atendimento
socioeducativo.
Art. 74. Não será aplicada sanção disciplinar sem expressa e anterior
previsão legal ou regulamentar e o devido processo administrativo.
Art. 75. Não será aplicada sanção disciplinar ao socioeducando que tenha
praticado a falta:
I - por coação irresistível ou por motivo de força maior;
II - em legítima defesa, própria ou de outrem.
Esse manual de procedimentos da UNIRE tem por nome Regulamento
Disciplinar do CIAGO (RDC), constando ainda o antigo nome do estabelecimento.
Esse regulamento disciplinar descreve primeiramente como se dará o
conselho para a apuração de falta disciplinar dos adolescentes, conselho esse
constituído por: representante da Gerência de Segurança; representante da
Gerência Socioeducativa (assistente social, pedagogo, ou psicólogo); técnico de
referência; ATRS (atendente de reintegração social, vulgarmente conhecido como
70
monitor); e o supervisor do módulo. Todavia o conselho poderá ser realizado com
apenas quatro servidores, e serão realizados nas terças-feiras e nas quintas-feiras.
Na parte geral do regulamento descreve os direitos, deveres e obrigações dos
socioeducandos. Direitos contidos no Estatuto, em seus arts. 106 a 109, no art. 124,
incisos I a XVI e no art. 94 do ECA, os quais especificam as obrigações das
entidades que desenvolvem programas de internação.
A parte dos direitos dos adolescentes esclarece alguns pontos importantes
com relação à medida de internação. A sua alínea q, relata o direito do adolescente
“ter acesso aos seus relatórios avaliativos, elaborados com intervalo máximo de seis
meses, dando ciência dos resultados do cumprimento de medida ao Juiz da Vara da
Infância e da Juventude.”
Segundo a servidora entrevistada o papel dela a confecção desse relatório,
era a do parecer psicossocial, que aborda todo o desenvolvimento do adolescente
no cumprimento da medida, seu relacionamento com sua família, se existe algum
fator de risco na família, se alguém da família esta submetido a algum tratamento,
etc. A segurança também fica responsável por parte do relatório, essa parte fala
acerca da conduta do socioeducando com relação aos seus deveres e obrigações, e
ainda parte do relatório é de responsabilidade dos pedagogos, que analisam a
situação do adolescente na escola e nos cursos profissionalizantes.
O regulamento logo em seguida descreve deveres e obrigações dos
adolescentes dentre essas obrigações se destacam: tratar os servidores, demais
socioeducandos e visitantes, com respeito e dignidade; contribuir para a
preservação da própria integridade física e mental, bem como a dos servidores e
demais socioeducandos; conservar as condições de habitação, higiene, salubridade
e segurança das instalações físicas da UNIRE; dentre outros.
O RDC ainda avalia e classifica as condutas dos adolescentes, classificandoas em: ótima, boa, satisfatória e insatisfatória.
Classifica também as faltas de
natureza disciplinar em: de natureza leve; de natureza média; de natureza grave; e
de natureza gravíssima. Além de tipificar as condutas determina as devidas
sanções.
As sanções disciplinares deverão estar de conformidade com o regulamento
podendo ser apenas uma advertência verbal ou até 20 dias de medida no módulo de
integração (casa 7). E as medias disciplinares deverão obedecer aos direitos
fundamentais dos adolescentes. Para aplicação da medida o conselho disciplinar
71
devera observar a trajetória do socioeducando no processo, seu histórico ao longo
da medida socioeducativa, sua idade, entre outros.
São quinze tipos de faltas disciplinares de natureza leve, que podem gerar até
05 (cinco) dias de medida disciplinar, todavia sem encaminhamento ao módulo 07,
turma de integração.
As faltas de natureza média podem gerar até 10 (dez) dias de medida
disciplinar, com o encaminhamento à turma de Integração, que são classificadas em
24 (vinte e quatro) condutas dos adolescentes. As de natureza grave podem gerar
até 15 (quinze) dias de medida disciplinar, com encaminhamento à turma de
Integração. São 13 (treze) tipos de faltas de natureza grave, podendo se destacar as
seguintes: Causar dano ao patrimônio público; manter em sua posse, mesmo que
armazenado no alojamento, instrumento capaz de ofender a integridade física de
outrem ou que possa contribuir ou ameaçar a segurança das pessoas da Unidade;
portar ou manter guardadas no alojamento armas de quaisquer natureza, mesmo
que confeccionada artesanalmente (estoque, faca artesanal, chicote, etc); proferir
ameaça a servidor ou a socioeducando; empreender fuga; agressão física ou
agressão mútua; etc.
As faltas de natureza gravíssima são: 1. Tentativa de homicídio; 2. Homicídio;
3. Estupro; 4. Lesão corporal grave; 5. Agressão física a servidor; Manter servidor
e/ou socioeducando sob cárcere privado (refém). Essas faltas podem gerar até 20
(vinte) dias de medida disciplinar, com o encaminhamento á turma de Integração.
Cabe salientar que essas faltas podem gerar outro processo, e ainda cumular mais
um período de medida socioeducativa de internação, sendo que os atos infracionais
tipificados são todos eles de com violência ou grave ameaça, e de natureza grave.
Todavia existem causas que justificam, atenuam e agravam as faltas
disciplinares. São causas que justificam as faltas disciplinares, o adolescente ter
cometido sob coação irresistível, em legítima defesa, ou em estado de necessidade.
São circunstâncias atenuantes: a primariedade em falta disciplinar; o baixo grau de
participação no cometimento da falta; os bons antecedentes na Unidade; a
imputabilidade relativa atestada por autoridade médica competente; ter procurado
diminuir as consequências de sua conduta; ter confessado, espontaneamente, a
autoria de infração ignorada ou imputada a outrem; assiduidade e bom
aproveitamento pedagógico.
72
As circunstâncias agravantes são: a reincidência em falta disciplinar; ter sido
o organizador ou promotor da infração disciplina ou ter dirigido a atividade de outros
participantes; ter coagido ou induzido outros socioeducandos à prática de infração;
ter praticado a infração com abuso de confiança ou mediante dissimulação, traição
ou emboscada; em concurso de dois ou mais socioeducandos.
Os adolescentes que cometem faltas de natureza disciplinar na Unidade
podem ser recolhidos de imediato para a turma de integração, de forma preventiva
ou não, o que será determinado apenas pela Gerência de Segurança ou pelo Chefe
de Plantão (C-2). O responsável pelo recolhimento do socioeducando para a turma
disciplinar deverá de imediato proceder à transferência dos pertences, como
colchão, material de higiene, roupa de cama e banho.
Quando do recolhimento a Equipe Técnica de Referência do socioeducando
devera comunicar aos pais ou responsáveis.
Durante o período que o adolescente estiver cumprindo medida disciplinar,
serão suspensos os seus benefícios de saídas semanais, quinzenais e especiais,
serão proibidos a entrada e o recebimento de quaisquer objetos ou alimentos
trazidos pelos visitantes, serão suspensas as atividades que o adolescente participa
menos escolarização e profissionalização, que não podem ser suspensos.
Como já abordado anteriormente a Turma de Integração é composta por 12
quartos, sendo que 02 (dois) quartos reservados para à pré-reflexão. Sendo ela
destinada apenas para medidas protetivas, ou seja, caso o adolescente esteja muito
exaltado, se auto-lesionando, dessa forma somente será utilizada para a proteção
da integridade física do socioeducando.
O socioeducando recolhido a turma disciplinar, poderá permanecer no
máximo por cinco dias úteis de maneira preventiva, o Conselho Disciplinar deverá
reunir-se nesse prazo, para deliberar acerca da sanção a ser aplicada.
O Conselho Disciplinara foi constituído para apurar as ocorrências
relacionadas às faltas disciplinares leves reiteradas, médias, graves e gravíssimas,
sendo órgão deliberativo, de apoio ao controle de comportamento que transgridem
as normas internas da Unidade.
O órgão mencionado anteriormente além de analisar e deliberar acerca das
faltas de natureza disciplinares pode avaliar uma possível suspensão temporária de
benefícios concedidos pela Vara da Infância e da Juventude, durante o período que
o adolescente estiver cumprindo medida disciplinar.
73
Após a deliberação do Conselho disciplinar devera ser elaborado um relatório
que conste o nome de todos os participantes, um breve relato dos fatos constantes
na ocorrência, a versão dada pelo socioeducando, pois esse será o primeiro a falar
durante o conselho, podendo assim se defender do ato a ele imputado. E se for o
caso também devera colocar as versões de possíveis vitimas ou testemunhas,
devera constar ainda no relatório as ponderações e as posições dos membros do
Conselho Disciplinar sobre o caso, além da medida disciplinar aplicada. Após a
confecção do relatório, todos que participaram do conselho deverão assinar, pois
devera ser remetida a Direção da Unidade, e no prazo de três dias úteis será
encaminhado para a Vara da Infância e da Juventude.
Dessa forma a UNIRE funciona e tenta reintegrar os adolescentes nela
internados em sociedade.
74
6 CONCLUSÃO
O presente trabalho objetivou demonstra os direitos do adolescente privado
de liberdade, tendo uma abordagem na prática, com a pesquisa de campo na
Unidade de Internação Recanto das Emas.
Cabe salientar que a medida socioeducativa de internação somente será
aplicada em ultimo caso, e ainda apenas para alguns tipos de atos infracinais, sendo
ela a ultima ratio, no que diz respeito à punição dos menores infratores.
Muitos são os que defendem uma punição maior para os jovens infratores, e
ainda arguem que as medidas aplicadas de acordo com a vigente legislação são
ineficazes, e geram um senso de impunidade por meio dos jovens infratores,
trazendo assim um aumento na criminalidade infanto-juvenil.
Todavia cabe salientar que apesar de mais de 20 anos de existência do
Estatuto da criança e do adolescente, na realidade nunca foi realmente efetivado. Os
direitos da criança e do adolescente no Brasil não são cumpridos, e é por vezes
tratado com descaso por parte dos governantes.
As políticas públicas voltadas para os jovens dessa nação são quase
inexistentes, o ensino é de péssima qualidade, quase não existem programas de
profissionalização e de inserção de jovens no mercado de trabalho, o que torna a
vida do adolescente muito complicada.
É evidente que a sociedade tem que procurar meios para coibir o aumento da
criminalidade, entretanto não me parece à melhor forma a mudança da legislação
atual, que como já dito nunca foi realmente cumprida.
A questão do jovem em conflito com a lei é extremamente complexa e
envolve uma infinidade de questões, como por exemplo, políticas voltadas para
prevenir a entrada de crianças e adolescentes na criminalidade.
Ressalta-se que isso não é de obrigação apenas do Estado, mas também de
toda sociedade e da família, mas pouco é feito por parte da sociedade para a
efetivação dos direitos dos adolescentes. A sociedade finge que não vêem, os
governantes poucos fazem, e as famílias têm dificuldades de cuidar dos seus
“Menores”. E com isso os jovens cada vez mais praticam atos infracionais, e até
mesmo morrem em conflitos com facções rivais.
Mas a sociedade só esta preocupada em como “punir de maneira mais
eficiente”, pensando sempre em mudar leis, pois nunca a lei esta de acordo com a
75
“realidade”, entretanto lutar para que essas leis sejam realmente efetivadas, isso
não, pois da muito trabalho.
A
questão
do
jovem
infrator
tomou
proporções
tão
grandes
que
provavelmente todos os dias sejam trazidos a tona pelos telejornais. Nas redes
sociais, cada um exprime a sua vontade para que o “menor seja punido”, pois se ele
cometeu o crime tem capacidade de receber uma “punição à altura”.
Mas todos sabem que mesmo se a legislação for mudada e mesmo que
venhamos punir de forma mais rigorosa sem mesmo se importar com a idade
daquele que esta sendo punidos, os índices de criminalidade provavelmente não
diminuiria.
Pois bem o jovem apenas é internado numa instituição para cumprimento da
medida estudada em ultimo caso, dessa forma o Estado e a sociedade tinham que
ter tentado de todas as formas retirar esse jovem da criminalidade, usando todos os
meios cabíveis. Mas na prática isso não acontece, vemos atualmente que alguns
adolescentes colecionam passagens por trafico de drogas, ou até mesmo por furto,
o que é o caso dos meninos em situação de rua, e nada é feito para mudar esse
quadro.
Em conversa informal com algumas pessoas da Unidade, chegou ao nosso
conhecimento as historias de adolescentes ali recolhidos, e uma delas chama muito
a atenção, e quero compartilhar nessa conclusão embora não possa falar o nome,
para preservar a identidade do jovem.
Tem um adolescente que já foi internado nessa unidade que logo que chegou
chamou muito atenção de todos os servidores, pois o garoto tinha compleição física
de uma criança, conversando com algumas pessoas a esse respeito, e como um
garoto tão novo se encontrava cumprindo medida socioeducativa de internação, que
a surpresa foi ainda maior, esse adolescente tinha apenas 12 (doze) anos e alguns
meses, mas tinha uma fixa bem extensa na delegacia com mais de vinte passagens
por tráfico de drogas, esperaram ele completar essa idade e ter mais algumas
passagens para interná-lo.
Com isso façamos a seguinte reflexão como foi possível uma criança adquirir
essa quantidade de passagens, e nada ser feito pelo Estado ou até mesmo pela
sociedade? Qual foi o trabalho que o Conselho Tutelar fez após a primeira
passagem desse jovem, foi aplicada alguma medida de proteção, ou ele foi inserido
em algum programa governamental, isso provavelmente não tenha acontecido.
76
Dessa forma como a servidora entrevistada disse a internação não é
“salvadora da pátria”, se o jovem esta internado é porque ele fez muitas coisas antes
de chegar a ser internado, e não vai ser uma medida de no máximo três anos que
vai conseguir mudar uma vida com toda a sua complexidade.
Mas alguns pontos devem ser discutidos aqui e que foram abordados ao
longo do trabalho. Como por exemplo, se os direitos do adolescente estão sendo
respeitados após a sua internação.
Com base em tudo feito até agora é notório que mais uma vez o Estado não
cumpri com as suas obrigações, a pesquisa de campo demonstrou que pelo menos
na UNIRE, quase nenhum direito do adolescente é respeitado.
Não existe separação por critério de idade, nem por compleição física, e o
que falar da separação por critério de gravidade de ato infracional, talvez em
nenhuma unidade isso aconteça. Nem mesmo o direito a educação em alguns casos
é respeitado, o direito a saúde, a profissionalização muito menos, mas o Estado
parece fazer tudo ao contrario mesmo.
Dessa forma se nem mesmo os direitos básicos dos adolescentes são
respeitados, quanto mais conseguir gerar uma mudança de comportamento no
jovem após a medida.
A grande realidade é que as unidades de internação do nosso país servem
apenas como deposito, ou seja, o jovem é colocado em um lugar que não tem
salubridade nenhuma, com péssimas condições de estrutura, com uma capacidade
de lotação que nunca é obedecida, ainda almeja uma mudança de comportamento
no jovem infrator.
Como por exemplo, se qualquer cidadão fornecer para um menor de 18 anos
substância que causa dependência segundo o art. 243 do ECA, poderá ser preso,
mas nas unidade de internação do DF, isso é possível e ainda com o intuito de
acalmar o jovem, e com a desculpa de que ele é viciado e pode se tornar agressivo
se não tiver como saciar o vício, isso demonstra uma inversão total de valores.
Como podemos verificar o ECA é uma legislação bem avançada e que nunca
foi realmente efetivada, todavia é necessário torná-lo efetivo, respeitar a doutrina da
proteção integral elencada na constituição cidadã. Mas esse é um trabalho árduo e
requer que toda a sociedade esteja empenhada nesse intuito, somente com isso
teremos
um
verdadeiro
respeito
à
condição
peculiar
de
pessoas
em
77
desenvolvimento das crianças e adolescentes, e uma possível diminuição dos atos
infracionais.
Mas cabe ainda salientar que a sociedade deve fiscalizar se realmente as
medidas socioeducativas estão sendo cumpridas, e se o Estado respeita o direito
dos jovens em conflito com a lei, pois é a sociedade que acaba pagando duras
penas, por não serem eficientes as medidas socioeducativas.
78
REFERÊNCIAS
BRAGA, Marcelo Pupe. Direito Internacional Público e Privado. 2. ed. São Paulo:
Método, 2010.
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Panorama Nacional: A Execução das
Medidas Socioeducativas de Internação. CNJ, [200-]. Disponível em:
<http://www.cnj.jus.br/images/pesquisasjudiciarias/Publicacoes/panorama_nacional_
doj_web.pdf>. Acesso em: 5 mai. 2013.
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1988. Disponível em:
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______. Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Promulga a Convenção
sobre os Direitos das Crianças. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
Poder Executivo, Brasília, DF, 22 de novembro de1990. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm>. Acesso em:
3 jun. 2013.
______. Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012. Institui o Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo (Sinase), regulamenta a execução das medidas
socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional; e altera as
Leis nos 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
7.560, de 19 de dezembro de 1986, 7.998, de 11 de janeiro de 1990, 5.537, de 21 de
novembro de 1968, 8.315, de 23 de dezembro de 1991, 8.706, de 14 de setembro
de 1993, os Decretos-Leis nos 4.048, de 22 de janeiro de 1942, 8.621, de 10 de
janeiro de 1946, e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo
Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 19 de janeiro de 2012.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20112014/2012/lei/l12594.htm>. Acesso em: 3 jun. 2013.
______. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e
do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa
do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 16 de julho de 1990. Disponível em:
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79
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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. ed. São
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80
ANEXOS
81
ANEXO A – REGULAMENTO DISCIPLINAR CIAGO
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ANEXO B – CARTILHA DO VISITANTE
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ANEXO C – QESTIONÁRIOS DA PESQUISA DE CAMPO
QUESTIONÁRIO PARA A GERÊNCIA DE SEGURANÇA
Função do entrevistado: Aldo R. Alves
Tempo na função: Gerente de Segurança da UNIRE
Formação: curso superior incompleto e, Gestão Publica servidor da carreira da
assistência social, Atendente de Reintegração Social
1) Qual é a capacidade máxima de adolescentes que comporta a unidade?
Resposta: Cento e quarenta e quatro Internos.
2) A unidade tem adolescentes do sexo masculino e feminino?
Resposta: Positivo as adolescentes do sexo feminino estão alojadas no modulo dois.
3) Qual a quantidade de adolescentes em internação provisória e dos
adolescentes em medida de internação estrita, de internação sanção?
Resposta: Estão cumprido internação-sanção 8 adolescentes, medida de internação
estrita 176 e de medida de internação provisória 9, totalizando 193 adolescentes
internados na UNIRE.
4) A unidade possui manual de procedimentos, e manual disciplinar?
Resposta: A UNIRE possui sim manual de procedimentos disciplinares, chamado de
regulamento disciplinar. Vide anexo.
5) Os adolescentes são separados por critério de idade, e compleição física?
Resposta: Por critério de compleição física não, mas por critério de idade sim. Sendo
que a unidade é constituída por módulos, e os módulos, tem separação entre ala “A”
e “B”. Em alguns módulos é possível ficar apenas adolescentes menores e em
outros maiores, mas tem alguns módulos que ficam adolescentes menores de um
lado (em uma ala), e os maiores do outro lado. Sendo que unidade tem oito
módulos, nos módulos 1 e 4 apenas maiores, e 3 e 6 adolescentes, e nos demais
maiores e menores separados apenas pelas alas. Sendo que a M7 é para
adolescentes em medida disciplinar.
6) Os adolescentes são alojados obedecendo o critério de separação por
gravidade do ato infracional?
Resposta: A logística da unidade não possibilita essa separação.
7) Os adolescentes podem se corresponder com os seus familiares e amigos?
Resposta: Com amigos quase que não, mas com os familiares sim, com os amigos
apenas em caso de excepcionalidade.
8) Os adolescentes internados encontram-se na mesma localidade ou na mais
próxima da residência dos seus pais ou responsáveis?
Resposta: Sim. A grande maioria de acordo com o ECA cumpre a medida próximo
aos familiares.
9) Quais são os dias de visitação dos familiares dos adolescentes?
Resposta: Nos sábados e domingos, e em alguns casos na terça-feira. Na terça-feira
para os jovens que possuem filhos menores de idade.
10) Existe algum manual do visitante?
Resposta: sim. Vide Anexo.
11) Todos os adolescentes frequentam a escola?
Resposta: Todos frequentam.
12) Como é oferecida a refeição para os adolescentes?
105
Resposta: São seis refeições diárias.
13) os adolescentes habitam em ambiente com condições de salubridade e
higiene?
Resposta: De acordo com as possibilidades de cada modulo, e com a ajuda dos
adolescentes.
14) o Membro do MP costuma visitar a unidade e conversar pessoalmente com
os adolescentes?
Resposta: Raramente acontece a visita do Membro do Ministério Publico.
15) O defensor do adolescente conversa reservadamente com o jovem?
Resposta: Sim. As visitas do defensor são freqüentes e quando entrevista o
adolescente é de maneira reservada.
16) Os adolescentes tem acesso a objetos necessários á higiene pessoal?
Resposta: Sim. É entregue papel higiênico, escova dental, sabonete, dentre outros
produtos de limpeza. E o presto barba é entregue uma vez por semana, com o
controle da segurança.
QUESTIONÁRIO PARA A GERÊNCIA SOCIOEDUCATIVA
Nome: Hiara
Tempo na função: trabalha no sistema socioeducativa desde 2008, e oito meses na
UNIRE. gerente psicossocial substituta
Formação: psicóloga
1) A equipe multidisciplinar atua na unidade?
Resposta: Na unidade atuam os profissionais das áreas de psicologia, assistência
social e pedagogia, nem todas as casas tem a equipe completa, mas é porque ta
com falta de alguns servidores, que podem estar de licença ou coisa semelhante. E
a equipe atua de forma mais multidisciplinar do que em outras unidades, do que no
CAJE por exemplo.
2) Todos os adolescentes freqüentam o ensino formal?
Resposta: Eu tenho noticia de que tem alguns adolescentes que ficam algum
período em situação de proteção a integridade física que não vão para a escola, e
tem outros adolescentes que concluíram o ensino médio e não estão mais
estudando. Mas regra geral todos estão matriculados, se não estão é por um
período breve, como por exemplo, alguns meninos que estão na M7, que estão sem
estudar mas agente tenta reorganizar a transferência para outras unidades que
possibilitam ele frequentar a escola. Pois é uma situação transitória quando ficam
sem estudar.
3) Quais são os cursos profissionalizantes oferecidos dentro da unidade?
Resposta: Hoje ta tendo panificação, maquiador, operador de caixa que são do
SENAC. Tem outros que são ocupacionais não são profissionalizantes, que é:
bijuteria, serigrafia, horta estava tendo, só que agora acho que vai acabar porque a
oficineira foi exonerada. Atualmente é isso: panificador, maquiador, operador de
caixa, horta, bijuteria e serigrafia.
4) Todos os Adolescentes participam dos cursos profissionalizantes?
106
Resposta: nem todos porque alguns não se encaixam em critérios da oficina como
por exemplo, o do SENAC que tem critério de escolaridade e de idade para poder
participar, e tem alguns que já freqüentaram todas, e tem alguns que estão na
preservação da integridade física também, mas sempre como uma situação
transitória, que temos que arrumar uma outra alternativa para eles. Nem todos mas
a intenção é que se não está, o mais breve possível que ele esteja em alguma
oficina, em pelo menos uma atividade. E tem meninos que estão em mais de uma.
5) Como a acontecem as atividades culturais dentro da unidade?
Resposta: Tem um núcleo para isso, o Núcleo de Esporte cultura e lazer, eles
organizam a maioria dos eventos o que não impede, que outros eventos sejam
propostos por outras equipes. Por exemplo, a nossa equipe da casa dois, da casa
das meninas, fez recentemente um dia das mães só nosso. Agente propôs, foi trás e
tudo mais, com ajuda da gerencia administrativa, esse foi a parte, mas geralmente é
o Núcleo de Esporte cultura e lazer que é destinado a isso, de promover eventos, de
trazer esportes, tudo relacionado a isso, é esse núcleo que organiza.
6) Algum adolescente da unidade realiza atividades externas, como por
exemplo, cursos profissionalizantes ou faculdade?
Resposta: Sim. Que eu tenho conhecimento tem um menino que esta freqüentando
faculdade, mas já teve outros que trabalhavam fora, que faziam estagio, atualmente
que eu saiba só esse menino que faz faculdade, mas eu não tenho certeza se tem
mais algum, o adolescente é do módulo 5.
7) Qual o seu papel no desenvolvimento do relatório semestral da equipe
multidisciplinar?
Resposta: O meu como psicóloga componho a parte do parecer psicossocial, mas
eu não faço sozinha, no meu caso da minha equipe, a gente senta junto
normalmente a não ser que alguém esteja de férias ou alguma coisa assim. Eu e
assistente social compomos a parte do parecer psicossocial que é um relatório que a
gente fala do desenvolvimento da maturidade do adolescente o quanto ele esta nos
atendimentos, o que se tem refletido sobre a trajetória dele, o que ele pensa sobre a
trajetória pessoal dele o que ele tem de planos para o futuro, e também a relação
dele com a família, como esta, o que tem de fator de risco e de proteção nessa
família, qual o trabalho que foi feito nessa família, se alguém da família foi
encaminhado para alguma rede externa, se tem alguma questão de demanda de
saúde mental que esteja sendo atendido, se esta inserido em algum tipo de
tratamento. É mais sobre isso que exerce a nossa parte. Ai a gente compila o
relatório, e a segurança faz a parte dela, que é o relatório feito pelo chefe de módulo,
e o pedagogo colhe as informações de como o menino esta na escola, e nas oficinas
e no esporte. Além da gente fazer esse parecer psicossocial, a gente junta isso tudo,
agente é responsável por formular e lança o relatório, e escrever uma conclusão,
que faz um fechamento final de tudo que foi falado sobre o menino, e a gente pode
ali fazer uma sugestão para o judiciário do que tem que acontecer com esse menino,
se ele pode receber um beneficio ou não, se ele tem que aplicar uma medida
protetiva como a inserção em algum tipo de tratamento com a família, ou alguma
coisa assim. E agente pode falar sobre continuidade ou não da medida, se já foi
suficiente a medida e que já esta bom dele ser liberado, ou receber uma progressão.
O nosso papel no relatório é esse.
8) Com atual estrutura da unidade, com os projetos pedagógicos é possível
uma reintegração na sociedade do adolescente internado, por quê?
107
Resposta: Essa é uma questão muito delicada. Eu penso que a vida do adolescente
não é só a internação NE. Tem toda uma questão lá fora de políticas publicas,
questões familiares as vezes, questão psicológica do próprio adolescente, e tudo
mais. Então a gente é um pedaço pequeno na vida de um menino que é muito mais
complexo. A vida de qualquer ser humano é muito maior do que a experiência que
passa numa internação. Eu acho que hoje temos um caráter muito mais
ressocializativo. Até pela minha experiência com a casa dois, que não tem uma
menina que saía de lá com uma oportunidade de ter uma vida diferente. Mas só que
aquilo as vezes é muito pouco diante de toda a complexidade que ela vive na vida
dela, de tudo que ela já viveu antes, da forma que o adolescente esta acostumado a
viver, a ganhar o dinheiro dele, a ter os relacionamentos sociais. A questão do uso
de drogas da família, e nem só disso outras coisas. As vezes é possível que o
adolescente sai daqui já encaminhado com um estagio, mas as vezes o salário do
estagio é de 400 reais e ele não tem onde morar. Dessa forma é muito maior do que
isso, mas a gente tem capacidade de ressocializar sim, mas eu não tenho uma visão
que a gente seja salvador da pátria e vai conseguir concertar a vida daquele menino,
e ele vai sair daqui perfeito, pois a gente é um pedaço na vida dele.
9) O adolescente sempre que possível é informado da sua condição
processual?
Resposta: Eles costumam ser informados sobre o seu processo quando o defensor
deles visita a unidade, pois nós temos pouco acesso tendo em vista que o processo
corre em segredo de justiça
10) Os adolescentes internados encontram-se na mesma localidade ou na mais
próxima da residência dos seus pais ou responsável?
Resposta: Na maioria das vezes isso é possível, mas tem alguns casos que é
melhor que o adolescente esteja numa unidade diversa daquela próxima a
residência dos seus pais, pois por ter muitas rixas com adolescentes de sua cidade,
se torna mais indicado ele esta em outra unidade para proteção da sua integridade
física. E atualmente com o cadastro único de vagas se torna mais fácil que o
adolescente seja colocado em uma unidade mais próxima de sua residência.
11) Quais os meios de comunicação que o adolescente tem acesso na
unidade?
Resposta: Os adolescentes tem nos seus quartos a televisão, e também na escola
eles tem acesso a jornais e revistas.
12) Os adolescentes conseguem peticionar para as autoridades competentes,
qual o procedimento?
Resposta: Sim. Atualmente foi bastante difundido o uso de cartas na unidade, os
adolescentes. Muitas dessas cartas são entregues para nós, que enviamos na forma
de petição para o judiciário.
QUESTIONÁRIO PARA O SOCIOEDUCADORES
Função do entrevistado: Atendente de Reintegração Social
Tempo na função: 2 anos
Formação: Nível Médio
1) Como são estabelecidas as normas de conduta do adolescente?
Resposta: A UNIRE – Unidade de Internação Recanto das Emas, a qual faço parte –
possui um corpo técnico composto por psicólogos, pedagogos, professores,
108
profissionais na área de segurança que decidem sobre quais serão as regras e
comportamentos dos adolescentes aceitos dentro da Unidade, normas estabelecidas
através de estudos e práticas acadêmicas, e se posso colocar minha opinião,
deveriam ser revistas.
2) Os adolescentes são separados obedecendo a critérios de idade e
compleição física dentro da unidade?
Resposta: Na maioria das vezes sim, porém pela dificuldade da super lotação
existem exceções.
3) Os adolescentes tem dificuldade de obedecer a normas?
Resposta: Completamente, digo isto porque grande maioria não está acostumada a
seguir princípios ou regras em suas comunidades e até mesmo em sua própria casa.
4) Os adolescentes se vangloriam dos atos infracionais cometidos?
Resposta: Por várias vezes presenciamos as conversas dos menores dentro de
seus alojamentos, com direito à representação teatral, de como cometeram os atos
infracionais (crimes). E até mesmo em conversa informal com os servidores eles
contam como mataram, roubaram, estupraram e demais atos infracionais que
possamos imaginar.
5) Existe alguma liderança por parte de adolescentes dentro da unidade?
Resposta: Este é um dos grandes problemas que os Centros de Internação enfrenta,
e acho que sempre vai existir, porque isso é do ser humano mesmo. A liderança não
é ruim, o problema é que os internos usam somente para fazer o que as regras não
permitem. Me lembro de uma ocasião em que um adolescente influenciava tanto os
outros internos que ele liderou uma rebelião em um módulo colocando fogo em
todos os quartos e na ala, muitos servidores saíram com queimaduras de primeiro e
segundo grau. Depois, por causa da liderança negativa que exercia sobre os outros,
teve que ser isolado e logo depois transferido para outra unidade.
6) Como é o relacionamento entre os adolescentes?
Resposta: Quase sempre conflitante, tendo que ser monitorado vinte e quatro horas
por dia, atualmente estou no módulo disciplinar e neste módulo é onde se encontra
todos os tipos de adolescentes, quer dizer, todos os tipos de “crimes” e alguns atos
infracionais não são aceitos nem mesmos entre eles, como por exemplo: estupros,
assassinatos de crianças e a da própria genitora. Há! Os internos também não
aceitam os homossexuais nem os afeminados.
7) Quais são as ocorrências disciplinares mais comuns dentro da Unidade?
Resposta: Dentro da Unidade a gente ver de tudo, mais acho que são as mais
comuns: agressões entre eles, dano ao patrimônio, não cumprimento dos
procedimentos regulares (revista corporal, horários, volume da televisão, andar
sempre em fila quando estão fora do módulo e vários outros). Porém,com certeza a
ameaça de morte aos servidores da área de segurança é a campeã. As frases que
mais escuto são: “...seu agente se eu matar você aqui não dá nada”, “...vou matar
você na rua seu agente” “...na rua o bagulho e diferente”, “...seu onde você mora e
vou matar toda sua família porque não dá nada mesmo, fico no máximo três anos”.
8) Você acha possível a reeducação do adolescente no atual sistema?
Resposta: A reeducação em sua plenitude, não. Acho o que ocorre com aqueles que
não voltam a cometer outros atos infracionais, que são a minoria, é um somatório de
ações fora do sistema, tais como: maior envolvimento dos pais com os filhos, a
perda da liberdade – questão que é muita valorizada na idade da adolescência,
aquisição de um trabalho, ou até mesmo a questão do falecimento do adolescente também muito comum.
109
QUESTIONÁRIO PARA O SOCIOEDUCADORES
Função do entrevistado: ATRS/AGENTE SOCIAL
Tempo na função: 2ANOS
Formação: PÓS GRADUADA EM SEGURANÇA PÚBLICA
1) Como são estabelecidas as normas de conduta do adolescente?
Resposta: ATRAVES DE UM REGULAMENTO DA PRÓRIA INSTITUIÇAO,QUE SE
BASEIA NO SINASE E ECA.
2) Os adolescentes são separados obedecendo a critérios de idade e
compleição física dentro da unidade?
Resposta: NÃO. O QUE DIFICULTA O NOSSO TRABALHO COMO AGENTE.
APENAS SE É MAIOR OU MENOR DE IDADE.
3) Os adolescentes tem dificuldade de obedecer a normas?
Resposta: SIM. ACHO QUE PELO FATO DE SEREM IMPOSTAS SEM UM PRÉVIO
AVISO POR PARTE DA DIREÇAO.
4) Os adolescentes se vangloriam dos atos infracionais cometidos?
Resposta: SIM. A PROVA É A REINCIDENCIA DOS FATOS. É SO GANHAR UM
BENEFICIO QUE VOLTAM A COMETER ATOS INFRACIONAL NA RUA.
5) Existe alguma liderança por parte de adolescentes dentro da unidade?
Resposta: SIM. COM CERTEZA. TODO MÓDULO EXISTE UM QUE QUER
COMANDAR OS OUTROS.
6) Como é o relacionamento entre os adolescentes?
Resposta: NA MAIORIA DAS VEZES UM RELACIONAMENTO RESPALDADO EM
“GUERRA” DE GANGUES. OU SEJA, HÁ MÓDULO QUE VOCE NÃO PODE
COLOCAR DOIS ADOLESCENTES JUNTOS QUE É UM RISCO.
7) Quais são as ocorrências disciplinares mais comuns dentro da Unidade?
Resposta: AGRESSOES ENTRE INTERNOS; DANO AO PATRIMONIO PÚBLICO E
AGRESSAO A SERVIDOR.
8) Você acha possível a reeducação do adolescente no atual sistema?
Resposta: INFELIZMENTE NÃO. POIS AS REGRAS NÃO SÃO EXECUTADAS DE
MANEIRA EFICAZ. NA TEORIA É MUITO FÁCIL, MAS A PRÁTICA É O INVERSO.
O ESTADO NÃO DÁ CONDIÇAO PARA QUE O INTERNO TENHA A
POSSIBILIDADE DE DAR CONTINUAÇAO NO METODO DE RESSOCIALIZAÇAO
QUE SE INICIOU NO CENTRO DE INTERNAÇAO. ELE SAI E NÃO TEM OUTRA
OPÇAO A NÃO SER COMETER OS MESMOS ERROS. AS POLÍTICAS PÚBLICAS
PARA ESSE PÚBLICO NÃO EXISTEM.
QUESTIONÁRIO PARA O SOCIOEDUCADORES
Função do entrevistado: Atendente de Reintegração Social
Tempo na função: dois anos
Formação:
1) Como são estabelecidas as normas de conduta do adolescente?
Resposta: As regras são estabelecidas através de um manual de disciplina
desenvolvido pela gerência de segurança baseada no que dispõe o eca, sinase e
Suas.
110
2) Os adolescentes são separados obedecendo a critérios de idade e
compleição física dentro da unidade?
Resposta: São separados na medida do possível, quando, o adolescente não
apresenta desavenças com outros adolescentes, tendo sempre a integridade física
do adolescente como prioridade em relação a lugares em que ele tem problemas de
convivência.
3) Os adolescentes tem dificuldade de obedecer a normas?
Resposta: Sim, Principalmente quanto ao uso de aparelhos televisores e som no que
diz respeito ao volume. Ir para escola, estar pronto nos horários.
4) Os adolescentes se vangloriam dos atos infracionais cometidos?
Resposta: Sim, não apenas dos atos infracionais, mas do tipo de vida que levam, ou
seja, cometendo atos análogos a crimes.
5) Existe alguma liderança por parte de adolescentes dentro da unidade?
Resposta: Sim. É a chamada liderança negativa , as vezes invocada para intimidar
outros internos e as vezes incitando outros adolescentes a se rebelarem contra as
regras.
6) Como é o relacionamento entre os adolescentes?
Resposta: No geral, não é bom, muitos tem rixas com outros internos provenientes
de brigas agressões e até assassinatos entre conhecidos e amigos desses
adolescentes.
7) Quais são as ocorrências disciplinares mais comuns dentro da Unidade?
Resposta: Agressões entre internos, descumprimento de procedimentos com
relação às normas disciplinares, uso de substâncias entorpecentes e agressões
entre internos.
8) Você acha possível a reeducação do adolescente no atual sistema?
Resposta: Não. Porque reeducar alguém nesse contexto sem apoio familiar e uma
real e efetiva ação do Estado no sentido de oferecer condições adequadas de
Escola, tratamento a dependentes químicos, uma profunda reformulação na
metodologia da educação primária e secundária oferecidas nas unidades e
principalmente, muita disciplina.

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