A ameaça do capital estrangeiro na saúde
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A ameaça do capital estrangeiro na saúde
DR! Revista Nº 89 | 2016 Publicação do SIMESP Sindicato dos Médicos de São Paulo abril/maio/junho A ameaça do capital estrangeiro na saúde A ampliação da atuação de investidores internacionais na saúde suplementar deve provocar impacto direto no Sistema Único de Saúde e nas relações de trabalho em geral Páginas Verdes Áquilas Mendes Artigo Lucio Flávio Gonzaga Silva Revista DR! • 1 87 anos de história e cada vez mais presente para facilitar a defesa do médico e de seu trabalho 2 • Revista DR! Sumário Nº 89 | 2016 abril/maio/junho Sustentabilidade Horas Vagas Médico artista Espaço cultural 18 26 34 Iniciativas de pequenos Os palcos conquistaram Mergulhe no mundo agricultores e da o psiquiatra das bibliotecas, que comunidade em geral Saulo Ciasca, que se tornaram espaços defendem alimentos recentemente se tornou interativos de lazer sem agrotóxico ator profissional e cultura Alimento orgânico Cultura 5 Editorial 29 Redes Sociais 32 Crônica 39 Literatura 22 Especial Saúde do médico Revista DR! • 3 É mais tranquilo exercer a Medicina quando estamos seguros Condições especiais para os associados ao Simesp Expediente DIRETORIA Presidente Eder Gatti Fernandes [email protected] SECRETARIAS Geral Denize Ornelas P. S. de Oliveira Comunicação e Imprensa Gerson Salvador Administração Ederli M. A. Grimaldi de Carvalho Finanças Juliana Salles de Carvalho Assuntos Jurídicos Gerson Mazzucato Formação Sindical e Sindicalização Marly A. L. Alonso Mazzucato Relações do Trabalho José Erivalder Guimarães de Oliveira Relações Sindicais e Associativas Otelo Chino Júnior DR! Revista EQUIPE DA REVISTA DR! Diretor Gerson Salvador Editora-chefe e redação Ivone Silva Reportagem e revisão Adriana Cardoso Leonardo Gomes Nogueira Nádia Machado Fotos Osmar Bustos Relações-públicas Juliana Carla Ponceano Moreira Ilustração da capa Célio Luigi Redação e administração Rua Maria Paula, 78, 3° andar Bela Vista – São Paulo-SP 01319-000 Tel: (11) 3292-9147 [email protected] www.simesp.org.br PROJETO GRÁFICO Med Idea - Design para médicos Rua Oscar Freire, 2189, Pinheiros São Paulo/SP 05409-011 Tel: (11) 99897-8787 [email protected] www.medidea.com.br Editor de Arte e diagramação Igor Bittencourt Todos os artigos publicados terão seus direitos resguardados pela Revista DR! e só poderão ser publicados (parcial ou integralmente) com a autorização, por escrito, do Simesp. 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Muitas vezes, o Uma dessas ameaças é a am- que no primeiro dia na função de- empregador simplesmente afas- pliação da atuação do capital es- fendeu “rever o tamanho do SUS”, ta o profissional dando férias ou trangeiro no setor, em todos os declarou não ser possível garantir chegando ao extremo de demiti- segmentos. Uma lei assinada no os direitos que a Constituição de- lo. É urgente que esse tema deixe apagar das luzes do ano de 2014 termina e apontou, como saída, a de ser tabu e passe a fazer parte permite aos investidores estran- ampliação de oferta de saúde para das nossas discussões. geiros explorarem a saúde brasi- a população. leira, tornando-a um bem mera- Por fim, aproveitamos para in- Com os incentivos fiscais e a formar que o Simesp está inician- possibilidade de que empresas do a campanha salarial 2016 do A diretoria do Simesp preocu- comandadas pelo capital inter- setor privado, que inclui as organi- pa-se com os próximos capítulos nacional controlem tanto planos zações sociais e filantrópicas. Para dessa história. A partir dos oli- de saúde quanto hospitais, inclu- uma boa negociação, é importante gopólios que temos observado se sive filantrópicos, possivelmen- a participação de todos nas assem- formarem, a organização de nos- te assistiremos recursos de nos- bleias do Sindicato. O médico pode sos serviços de saúde passará por so trabalho e do erário público acompanhar as informações pelo grandes transformações que têm transferidos para os seus sócios site e pelo Jornal do Simesp, ou ain- a ver tanto com a dinâmica assis- nos diversos cantos do planeta. da, ligando para nosso canal de Re- tencial quanto com as relações Esse assunto está na reportagem lacionamento. Boa leitura! de trabalho. Com maior oferta de de Capa desta Revista DR!, com médicos e um menor número de ampla abordagem e opiniões de empresas dominando o mercado diversos especialistas. mente comerciável. haverá desafios para viabilizarmos Outro assunto em destaque um padrão razoável de vencimen- nesta edição chama a atenção tos e manutenção na qualidade de para a saúde do médico. Sim, insumos. muitas vezes somos displicentes com nós mesmos. Na rotina extenuante, inerente ao nosso tra- Revista DR! • 5 Páginas Verdes Áquilas Mendes “Devido à dominância do capital financeiro, é na sua esfera que novas fontes devem ser pensadas” O dinheiro que hoje faz tanta falta ao Sistema Único de Saúde (SUS) existe, mas está represado, por exemplo, no setor bancário brasileiro que, a cada trimestre, bate recordes de lucro (a despeito de qualquer crise ou quadro recessivo). Para Áquilas Mendes, professor doutor livre-docente de Economia da Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, é daí que poderiam vir os recursos necessários para garantir a sustentabilidade financeira de um sistema que hoje é subfinanciado. Ele propõe, entre outros, a criação de uma contribuição sobre grandes transações financeiras e também sobre as grandes fortunas do Brasil, garantindo que uma parte do dinheiro arrecadado tivesse como destinação exclusiva o campo da saúde. O professor é contra a lei que permite a entrada do capital estrangeiro na saúde brasileira por avaliar que um dos seus objetivos é o de abocanhar, por meio de renúncias, isenções fiscais e outros, os já escassos recursos públicos disponíveis. “Não resta dúvida que o aumento desses incentivos fiscais ao capital privado vem respondendo à necessidade de valorização desse capital no contexto do capitalismo financeirizado e sua crise”. O professor concedeu entrevista à revista DR! por e-mail, no final do mês de abril Leonardo Gomes Nogueira 6 • Revista DR! O senhor é contra a lei que permite a entrada do capital estrangeiro na saúde brasileira? É importante esclarecer que, ao lado de várias entidades vinculadas à saúde pública, mantemos nosso compromisso com a preservação do direito universal à saúde e com a responsabilidade do Estado na garantia desse direito. A Lei 13.097/2015, aprovada no ano passado, dentre outros aspectos, promove a abertura da saúde para que empresas e capitais estrangeiros possam instalar, operar ou explorar clínicas, hospitais gerais, inclusive filantrópicos, por meio da permissão de aquisição das santas casas – instituições que basicamente são financiadas pelo Estado brasileiro. Atualmente, a presença do capital externo já existe em outras áreas da saúde, a exemplo dos planos e seguros de saúde. Essa nova Lei altera a Lei Orgânica da Saúde (8.080/90), que originalmente proíbe os investimentos estrangeiros no setor, e fere também a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 199, em relação à proposta do SUS. A lei deve aprofundar os problemas na saúde pública? Entendemos que essa lei agrava e aprofunda ainda mais as dificuldades de nosso sistema público de saúde, ampliando uma concorrência privada que já tem sido totalmente desigual para o SUS, inibindo qualquer possibilidade de ampliação e consolidação desse sistema. Concordamos com as várias entidades vinculadas à saúde pública, como a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde (FNPS), que vem realizando esforços contrários a essa nova lei e defendendo que o Supre- “O Estado irá transferir recursos financeiros para o capital estrangeiro?” mo Tribunal Federal (STF) decida pela aprovação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin). Entendemos que essa luta não deve ser apenas jurídica, mas sobretudo política, no sentido de incorporarmos em nossa agenda o repúdio a essa medida e ao posicionamento do governo federal que vem mantendo o seu argumento a favor. Na realidade, o governo federal tem insistido que a primeira “brecha” para a entrada de capital estrangeiro no mercado de saúde brasileiro ocorreu em 1998, com a lei que regulamenta planos de saúde e, sendo assim, a 13.097 não constitui novidade nesse campo. A partir da lei de 1998, operadoras de saúde de capital internacional, sob a liderança do capital financeiro, foram autorizadas a comprar planos no Brasil. Sabe-se que, desde então, a empresa United Health adquiriu a Amil e o grupo americano Bain Capital - fundo de private equity e venture capital – comprou a Intermédica. Sem dúvida, a Lei 13.097 veio para agravar ainda mais a possibilidade de ampliarmos a conquista desse direito pela sociedade brasileira e assegurar a insaciabilidade do capital, sob a dominância do capital financeiro, na forma de apropriação do fundo público. Nesse sentido, cabem as indagações: como um hospital filantrópico pode ser vendido e, particularmente, a uma empresa estrangeira? Se a sua característica de filantropia não for alterada, continuando a receber recursos do SUS, significa que o Estado irá transferir recursos financeiros para o capital estrangeiro? A Lei de Responsabilidade Fiscal dificulta a ampliação dos gastos com saúde e até mesmo estimula o uso das organizações sociais na gestão desse sistema, correto? Há 16 anos, desde que a Lei Complementar 101/2000, denominada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), foi aprovada, as áreas Revista DR! • 7 Páginas Verdes Áquilas Mendes sociais, em especial a saúde, vêm sendo prejudicadas no tocante à execução das suas ações e serviços. Conforme o princípio maior da lei em que os entes públicos devem gastar bem menos do que arrecadam, vários limites são determinados ao poder Executivo, especificamente as despesas de pessoal que não podem ultrapassar 54% da receita corrente líquida do município. Caso isto venha a ocorrer, as penalidades são significativas, conforme indica a Lei 10.028/2000 que tipifica crime em finanças públicas. Tal exigência legal vem afetando o comprometimento das esferas de governo, em especial da instância municipal com a execução das ações e serviços públicos de saúde em geral, e com a Estratégia Saúde da Família em particular. Na realidade, o respeito a esse limite da LRF, por parte dos municípios, tem levado a que direcionem seus gastos para a despesa com serviços de terceiros - pessoa jurídica -, isto é, referente à contratação de organizações sociais da saúde (OSSs) ou organizações civis de interesse público (Oscips). Trata-se de uma grave distorção na aplicação dos recursos do SUS, 8 • Revista DR! “Sem dúvida, essas entidades privadas acabam por administrar parcela importante dos serviços da rede pública com a lógica mercantil” sendo usados prioritariamente para financiar essas entidades privadas, a fim de executarem as ações e serviços de saúde que deveriam ser de responsabilidade dos municípios. Sem dúvida, essas entidades privadas acabam por administrar parcela importante dos serviços da rede pública com a lógica mercantil. Entendemos ser urgente e fundamental que todos os defensores do SUS público, integral e de qualidade reúnam forças para solicitar a aprovação da proposta que exclui o limite das despesas de pessoal da LRF para a saúde. A ideia do capital estrangeiro, ao ingressar no Brasil, é capturar uma parte do dinheiro público oferecido ao setor privado por meio de renúncias e isenções fiscais? É importante começar essa discussão das renúncias e isenções fiscais concedidas pelo governo federal à saúde privada, na forma de redução de Imposto de Renda a pagar da Pessoa Física ou Jurídica e de tributos para as entidades sem fins lucrativos e para a indústria farmacêutica, por meio de seus medicamentos, relacionando-a com a questão do subfinanciamento do SUS. Como já é conhecido por muitos, um dos maiores problemas desse sistema é o seu subfinanciamento histórico que acaba refletindo no comportamento do gasto público em saúde brasileiro, que ainda é baixo (3,9% do PIB em 2014) em relação ao dos demais países que têm um sistema público universal. Para que o Brasil atinja o nível desses países, precisaria dobrar a participação do SUS em relação ao PIB (Produto Interno Bruto), a fim de equipará-lo à média dos países de capitalismo avançado (Reino Unido, Canadá, França e Espanha), isto é, 8%. Nota-se que o total desses benefícios tributários à saúde privada vem crescendo de forma considerada. Registre-se: R$ 3,67 bilhões em 2003, passando para R$ 8,70 bi- lhões em 2006 ; R$ 15,85 bilhões em 2009, e, por fim, R$ 19,98 bilhões em 2014 (dados extraídos da Secretaria da Receita Federal). Não resta dúvida que o aumento desses incentivos fiscais ao capital privado vem respondendo à necessidade de valorização desse capital no contexto do capitalismo financeirizado e sua crise. O senhor tem algumas ideias interessantes para garantir a sustentabilidade financeira do SUS... Devido à dominância do capital financeiro na fase contemporânea do capitalismo, é na sua esfera que novas fontes devem ser pensadas. Destacamos: 1) adoção de mecanismos de tributação para a esfera financeira, como por meio da criação de uma Contribuição sobre as Grandes Transações Financeiras (CGTF) progressiva ou, por exemplo, acima de uma renda de R$ 2 milhões mensais – sendo essa contribuição vinculada à Seguridade Social e com destinação de 50% para a Saúde; 2) estabelecimento da Contribuição sobre Grandes Fortunas com vinculação para a seguridade social, com destinação de 50% para a saúde; 3) aprofundamento dos mecanismos de tributação para a remessas de lucros e dividendos realizadas pelas empresas multinacionais, atualmente isentas na legislação, destinadas ao Orçamento da Seguridade Social (saúde, previdência e assistência social); 4) ampliação constante da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) para instituições financeiras; 5) revisão da tributação sobre heranças (ITMCD) e com parte de sua destinação à seguridade social (saúde). Há ainda outras propostas alternativas? Sim. Em outro plano de discussão sobre propostas de fontes alternativas, destacamos: 1) o fim das isenções de Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) com despesas médicas e do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), das empresas que prestam assistência médica a seus funcionários; 2) o estabelecimento de uma política de renúncia fiscal para entidades sem fins lucrativos e para a indústria farmacêutica; 3) a extinção dos subsídios públicos aos planos prwivados de saúde; 4) o repúdio à Lei 13.097/2015 que permite a entrada de capital estrangeiro na saúde pública. ! Revista DR! • 9 Capa Capital Estrangeiro O Capital no Século 21 A Lei 13.097, aprovada, sem debate, às vésperas de um recesso parlamentar, permite que o dinheiro estrangeiro atue em quase todos os setores da saúde brasileira Leonardo Gomes Nogueira 10 • Revista DR! No final da 54ª legislatura, às vés- O que alguns que acompanha- peras do início do recesso parla- ram o assunto, como a professo- mentar de fim de ano, escondida ra Ligia Bahia, da Universidade “Essa lei é manifestamente in- em meio a dezenas de artigos tra- Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), constitucional”, disse Silva. “Nos- tando dos mais variados assuntos, classificaram como “X Tudo” (o sa preocupação como membros o Congresso Nacional aprovou, sanduíche que reúne ingredien- do ministério público não é discu- em 10 de dezembro de 2014, regra tes em grande quantidade e tão tir a mão invisível do mercado de que amplia, em muito, o campo diferentes entre si quanto os ar- um lado ou as virtudes do Estado de atuação do capital estrangeiro tigos inseridos na lei do capital no controle da sociedade do outro. na saúde do Brasil. estrangeiro). Nós somos operadores jurídicos. E A presidente Dilma Rousseff, ignorando o pedido de diversas entidades e organizações que trabalham em defesa da saúde pública, aprovaria a mesma regra em 19 de janeiro de 2015. Antes restrito aos planos e seguros, agora o capital de fora pode, Especialistas criticam o fato de a lei ter sido aprovada sem o necessário debate Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste). nosso dever é defender a Constituição”, ressaltou. Oswaldo José Barbosa Silva, da Associação Nacional do Ministério Público de Defesa da Saúde (Ampasa), lembrou que o artigo 199 da Constituição brasileira veda a participação (direta ou in- de forma direta ou indireta, atuar “Não foi uma surpresa”, co- direta) de empresas ou capitais na assistência à saúde. O que in- mentou Ligia. “Era um pleito das estrangeiros na assistência à saú- clui hospitais (inclusive filantró- entidades do meio empresarial. de e acrescentou: “salvo nos casos picos), clínicas e laboratórios. É o Não teve oposição. Não há oposi- previstos em lei.” que diz, em resumo, o Artigo 142 ção a essa lei”, avaliou a professo- Ele acredita que os consti- da Lei 13.097 (que altera trechos da ra da UFRJ, citando o deputado fe- tuintes redigiram o texto dessa 8.080, de 19 de setembro de 1990), deral Ivan Valente como uma das maneira, prevendo algum tipo que definiria o âmago do futuro poucas vozes no parlamento que de exceção ao veto para casos ex- Sistema Único de Saúde (SUS). se opôs ao tema. cepcionais que obrigassem o país A lei sancionada pela presi- “É triste porque é uma mudan- a aceitar a entrada do capital de dente agora afastada tem 169 ar- ça constitucional. Como que uma fora. “Então, você tem uma regra tigos. Além do tamanho, também mudança constitucional ocorre e uma exceção. Só que essa lei chama atenção pelo fato de que os sem um grande debate na socie- transformou exceção em regra”, seus artigos têm pouco ou nenhu- dade?”, indagou. avaliou. ma relação entre si. O subprocurador-geral da Re- “Na prática designa-se, por Ela trata de coisas tão díspares pública, Oswaldo José Barbosa exceção, a possibilidade do capi- como a “Desoneração Tributária Silva, classificou o processo como tal estrangeiro entrar em toda e de Partes Utilizadas em Aerogera- “vergonhoso”. “Essa lei foi uma qualquer ação e serviço de saú- dores” e o “Descarte das Matrizes colcha de retalhos”, criticou, em de. Agora, a legislação brasileira Físicas no Processo Administrati- 25 de junho de 2015, durante de- sobre saúde traz duas políticas vo Eletrônico”. bate promovido pela Associação opostas na mesma norma”, escreRevista DR! • 11 Capa Capital Estrangeiro veu o professor Mário Scheffer brasileiras e criem um setor forte- em artigo (leia mais na página 16). mente oligopolizado, permitindo, Uma Ação Direta de Incons- dessa forma, que o poder de ne- titucionalidade questionando a gociação ou mesmo de imposição legalidade dessa lei aguarda julga- desses grupos cresça à medida que mento, desde fevereiro de 2015, no o dos trabalhadores diminui. Isto Supremo Tribunal Federal (STF). A somado ao fato de que, em poucos liminar, quando (e se) houver um anos, haverá uma maior oferta de julgamento da questão, será apre- médicos no mercado, tornando ciada pela ministra Rosa Weber. quase certo que a famosa lei da oferta e da procura favoreça os “se- O supermercado da saúde nhores da humanidade”. No mesmo debate promovido pela Associação Brasileira de Defesa do Relações trabalhistas Consumidor, o na época presiden- A entrada de investidores estran- te do Conselho Regional de Medi- geiros deve também provocar cina do Estado de São Paulo (Cre- grande impacto no mercado de mesp), Bráulio Luna Filho, avaliou trabalho, nas relações entre mé- que o ingresso do capital estran- dicos e empresas de saúde. “O ca- geiro pouco ou nada contribuirá pital estrangeiro é mais agressivo para o avanço da saúde ofertada no que diz respeito à obtenção do ao brasileiro ou mesmo para a me- lucro, essa é a prioridade máxima”, lhoria das condições salariais e de afirmou Eder Gatti, presidente do trabalho entre os médicos. Simesp. “Em dez anos, nós vamos ter Para Gatti, a busca desenfrea- não mais 300 mil médicos no país, da pelo lucro vai precarizar ainda vamos ter quase 500 mil. E os médi- mais as relações de trabalho de cos não vão ter alternativas”, disse todos os profissionais, inclusive Luna Filho, lembrando a tendência do médico. “A tendência é ampliar de que grandes grupos econômicos a terceirização, ao mesmo tempo estrangeiros adquiram empresas que não darão abertura para o mé- “Senhores da humanidade” 12 • Revista DR! Expressão criada pelo filóso- defensor do livre mercado e fo e economista Adam Smith dos benefícios da “mão invisí- para se referir aos indivíduos vel” desse (outro termo criado que concentram grande poder por ele), Adam Smith reconhe- econômico e, portanto, político cia, já no século 18, que essa eli- em suas mãos. Mesmo sendo a te se guiava pelo seguinte lema: figura que praticamente inau- “Tudo para nós e nada para os gura o liberalismo econômico, outros”. dico empreendedor. Serão criados grandes conglomerados, empresas menores serão absorvidas pelas maiores. E nesses conglomerados cria-se uma dinâmica de linha de produção: o médico será mais uma engrenagem nesse sistema”, enfatizou o presidente do Simesp. Atualmente já existem hospitais que trabalham numa dinâmica de telemarketing. No pronto-socorro, por exemplo, o médico sofre uma pressão por quantidade, >Segundo Ligia Bahia, a aprovação da lei atende pleito do meio empresarial tendo que atender rapidamente os pacientes. “As previsões não são “O setor privado de saúde em “Com volatilidade e vocação nada boas. Se hoje há exploração mercados oferece especulativa, investimentos es- e insegurança, o cenário só tende retornos atrativos para os inves- trangeiros escolherão leitos, exa- a piorar no setor privado”, avaliou. tidores. Em contrapartida, inves- mes e procedimentos que geram timentos estrangeiros em estru- altos retornos financeiros, prin- Sem sucesso turas privadas de saúde de países cipalmente O Brasil não é um caso isolado, de renda média e baixa melho- em valores e preferências parti- lembrou Luna Filho. Há uma ten- raram pontualmente a qualida- culares, e que praticam a seleção dência global de que empresas da de de serviços hospitalares alta- adversa, afastando-se do atendi- área de saúde procurem investir mente especializados acessíveis mento a populações que vivem em países emergentes. Lugares a clientela restrita, mas também em áreas distantes de recursos as- onde, até então, quase sempre foram responsáveis pela disputa sistenciais, do atendimento a ido- esse tipo de atividade era restrita, predatória por recursos huma- sos, crônicos graves, portadores ao capital local (fosse ele privado nos, agravando a falta de médicos de transtornos mentais e outros ou público). “Melhorou a saúde da e de outros profissionais de saúde pacientes que demandam aten- Índia?”, perguntou. “Não melho- nos estabelecimentos públicos e ção contínua”, diz o mesmo arti- rou”, o próprio respondeu. nas áreas remotas. No Brasil, os go, publicado em abril de 2015, na emergentes serviços baseados A médica sanitarista Maria padrões atuais já sugerem que revista mensal Cadernos de Saúde Angélica Borges também desta- o uso excessivo do setor privado Pública (produzida pela Escola cou, em programa disponível na promove desleal Nacional de Saúde Pública Sergio internet, a mesma onda que se com o setor público, drenando Arouca, ligada à Fundação Oswal- verifica, sobretudo, nos chama- serviços, recursos humanos e fi- do Cruz). dos países emergentes (como é o nanceiros do SUS”, escreveu Má- Na esteira da nova lei, em 28 caso, entre outros, do Brasil e da rio Scheffer, professor do Depar- de novembro de 2015, a Folha de S. China). No ano 2000, lembra a mé- tamento de Medicina Preventiva Paulo noticiou que a americana dica, a Índia abriu o país ao capi- da Faculdade de Medicina da USP, United Health comprou o Hospi- tal externo. “E ela não é nenhum no artigo “O capital estrangeiro e tal Samaritano de São Paulo por exemplo de sistema de saúde para a privatização do sistema de saú- cerca de US$ 1,3 bilhão. Em 2012, a população”, avaliou. de brasileiro”. a mesma companhia já havia ad- concorrência Revista DR! • 13 Capa Capital Estrangeiro quirido a operada Amil por US$ se idêntica, mudando apenas os 4,9 bilhões, ainda de acordo com a seus donos (leia entrevista a partir reportagem. da página 6). “Pelo alvo ser um hospital fi- A reportagem da Folha de S. lantrópico, a transação levanta Paulo levanta outra questão im- questionamentos. hospitais portante: os hospitais filantrópi- filantrópicos se beneficiam com Os cos, como é o caso do Samaritano, isenção tributária sobre patrimô- são obrigados por lei a destinar nios, rendas ou serviços – benefí- 60% da sua capacidade operacio- cio que contribuiu para formar a nal para atendimentos pelo Sis- estrutura que agora vai para uma tema Único de Saúde ou 20% dos empresa com fins lucrativos”, diz atendimentos em serviços gratui- a matéria assinada por Claudia tos. Isso será ou mesmo tem sido Collucci e Tatiana Freitas. respeitado? Para o professor Áquilas Men- 14 • Revista DR! des, da Faculdade de Saúde Públi- É o fim do SUS como conhecemos? ca da Universidade de São Paulo Dez dias antes de Dilma Rousseff (USP), é muito provável que ao aprovar, em definitivo, a lei 13.097, invés de injetar dinheiro no país, organizações da área da saúde di- empresas retirem vulgaram manifesto, em 9 de ja- mais capital do que o eventual- neiro de 2015, pedindo que a presi- mente investido. dente a vetasse. O texto é assinado estrangeiras Além disso, lembra Mendes, pela já citada Ampasa e ainda por fusões ou aquisições não signifi- entidades como o Centro Brasilei- cam, obviamente, um aumento ro de Estudos da Saúde (Cebes), a do número de leitos ou da capa- Associação Brasileira da Saúde cidade de atendimento já que a Coletiva (Abrasco) e a Associação estrutura, geralmente, mantém- Paulista de Saúde Pública. e aquisições. É uma intensificação disso”, avisou Maria Angélica. “Urge”, como escreveu o professor Mário Scheffer, “uma agenda nacional de pesquisas que ofereça terreno para acompanhar o impacto do capital estrangeiro no processo de privatização nos vários componentes do sistema de saúde: no financiamento, na prestação de serviços, na gestão e nos investimentos em saúde”. “A gente está em outra conjuntura. Era uma conjuntura de crescimento econômico”, lembrou Li“O domínio pelo capital estran- igualdade para entidades munici- gia Bahia sobre a época do grande geiro na saúde brasileira inviabili- pais, estaduais, controle social etc. lobby e da posterior aprovação da za o projeto de um Sistema Único de Nesse arcabouço, o SUS acaba até nova lei, o que, em sua opinião, Saúde e, consequentemente, o di- do ponto de vista da construção fez com que o capital estrangeiro reito à saúde, tornando a saúde um institucional que nós fizemos para ainda não se interessasse em in- bem comerciável, ao qual somen- ele”, avaliou no programa “Sala de gressar, de fato, no Brasil. te quem tem dinheiro tem acesso. Convidados”, do Canal Saúde, da Com a possibilidade do capital es- Fundação Oswaldo Cruz. Em 23 de junho passado, o tema foi abordado no Simesp Debate, trangeiro ou empresas estrangei- Afinal, o Sistema Único de Saú- evento promovido pelo Sindicato ras possuírem hospitais e clínicas de se estrutura com a participação para tratar de temas de interesse – inclusive filantrópicas, podendo dos três entes federativos (União, aos médicos. Na ocasião, Scheffer atuar de forma complementar no estados e municípios) e, além disso, conclamou entidades ligadas ao SUS –, ocorrerá uma apropriação há uma série de instâncias, como setor e aos trabalhadores a se mo- do fundo público brasileiro, repre- os conselhos de saúde, para que a bilizarem, a fim de que, daqui a sentando mais um passo rumo à população e representantes do po- alguns anos, “não cheguemos no privatização e desmonte do SUS”, der público possam acompanhar a ponto do que ocorreu com as OSs diz trecho do manifesto. gestão e garantir a execução dessa (organizações sociais), que foram Para a médica sanitarista Ma- política. Modelo que, na avaliação surgindo, se disseminando” e ti- ria Angélica Borges, pesquisadora da médica, estaria ameaçado pela veram sua existência legitimada da Escola Nacional de Saúde Públi- nova lei. “O arcabouço que a gente no país. ca Sergio Arouca, a nova lei sacra- demorou 30 anos para construir “Se há uma notícia boa nisso menta ou, ao menos, contribuirá e ter algum equilíbrio está jogado tudo, talvez seja a de que essa cri- bastante para o desmonte de toda por terra”, lamentou. se está reascendendo uma mobi- a estrutura legal construída ao Para a pesquisadora, a exemplo lização conjunta, de novo, em de- longo das últimas décadas na ten- de outros especialistas no tema, o fesa da saúde enquanto direito”, tativa de efetivação do SUS. resultado dessa abertura não será pontuou, complementando: “Essa “Todo o arcabouço do SUS é “a expansão da capacidade insta- situação precisa ser acompanha- desenhado para dar condição de lada”. “É um movimento de fusões da de perto”. ! Revista DR! • 15 Saúde em Questão A quem interessa o capital estrangeiro na saúde? Mário Scheffer Professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP Logo após a sanção pela presiden- ria em hospitais e outros serviços. retornos financeiros, e serviços te Dilma Rousseff, em 2015, a lei Talvez assustado com as crises por produção para atendimento que escancarou a saúde ao capital econômica e política, o “novo” ca- de demandas individualizadas, estrangeiro foi ovacionada pelo pital estrangeiro ainda não desem- como as clínicas populares de setor privado e por vários gestores barcou em peso. A origem da lei, no consultas nas periferias. do SUS. entanto, antecipou reais interesses Tal movimento integra pauta Agora liberado para se associar e expectativas. O tema foi inserido antiga dos planos de saúde, que a hospitais privados e até filantró- sorrateiramente, no apagar das lu- também pedem liberação de rea- picos, o capital estrangeiro já estava zes de 2014, em Medida Provisória justes de mensalidades, anistia de aí, nas empresas farmacêuticas, no (MP 656) que tratava de assuntos multas, mais subsídios públicos varejo de farmácias e nos laborató- sem conexão com a saúde. O au- e obrigatoriedade de plano pri- rios de diagnose, em muitas situa- tor da emenda, um deputado do vado para empregados, este últi- ções de forma ilegal mas consenti- PMDB que quase virou ministro mo o teor da PEC 451, de Eduardo da por órgãos governamentais. da Saúde, teve sua campanha fi- Cunha, mais um que recebeu di- nanciada por plano de saúde. nheiro do setor nas eleições. No caso dos planos de saúde, chamou atenção a rapidez com No rastro de delações premia- Com rede própria insuficiente que a ANS e Advocacia-Geral da das e da operação que apura nego- de média complexidade e especia- União (AGU) validaram a com- ciações em torno de MPs que vira- lidades, o setor público seria po- pra da Amil pela United Health ram leis e beneficiaram empresas tencial comprador desses serviços em 2013, mas desde 1998 esse tipo do setor automotivo, talvez pos- e, portanto, avalista da expansão de transação era previsto em lei. sam ser esclarecidas também as da rede privada via capital estran- Por interpretação marota, hospi- MPs que nos últimos anos atende- geiro, como, aliás, ocorreu na edu- tais que compõem rede própria de ram ao lobby do consórcio forma- cação, que expandiu a oferta de operadoras também já eram bene- do por planos de saúde e hospitais cursos superiores, mas sem con- ficiados por aportes estrangeiros. privados. trapartida de qualidade. Motivados por rendimentos Segundo seus patrocinadores a Em cenário de desfinancia- elevados e por generosidades fis- lei permitirá expandir a capacida- mento público, o capital estrangei- cais e legislativas, poderão vir de instalada de serviços hospita- ro chega como mais uma ameaça com mais intensidade os investi- lares, para que os planos de saúde à universalidade do SUS, pois fará mentos de empresas multinacio- possam aumentar sua clientela. aumentar as despesas privadas, a nais, grandes bancos ou fundos O capital que vem de fora tem segmentação de clientelas e as de- na preferência por leitos, exames sigualdades de acesso no sistema compra ou participação acioná- e procedimentos que dão altos de saúde brasileiro. especulativos, 16 • Revista DR! interessados Revista DR! • 17 Sustentabilidade Plantação de produtos orgânicos no meio acadêmico: a médica Thaís Mauad é coordenadora da horta comunitária da FMUSP. Ao lado, a feira do Parque da Água Branca 18 • Revista DR! utilização de agrotóxicos A A prática contribui para o Bra- em lavouras prejudica o sil ser o país que mais consome meio ambiente, conta- agrotóxico no mundo, conforme o mina o solo e também pode con- Relatório de Indicadores de Desen- taminar a água se atingir lençóis volvimento Sustentável do IBGE, freáticos, lagos, represas e rios. divulgado em 2015. São utilizados A terra que recebe grande quan- cerca de sete quilos de agrotóxicos tidade desses produtos quími- por hectare, mais que o dobro do cos é esgotada de tal forma que é que era usado há 12 anos no plantio. preciso ser renovada. Para isso, o Além de ser prejudicial ao meio agricultor tem que utilizar outras ambiente, tem alto custo para o áreas para o cultivo enquanto tra- produtor, como conta o agricul- ta o solo, geralmente com fertili- tor João Carlos Fonte Basso, que zantes químicos. utilizava o sistema. “A terra ficava Esse processo de renovação ruim, tínhamos que gastar muito é bem comum, já que em todo o para renová-la e ficávamos um pe- Brasil existem mais de cinco mi- ríodo sem plantar naquela área”, lhões de estabelecimentos agro- afirma. Ele destaca ainda que o pecuários que fazem o cultivo custo maior era com a saúde. “Tí- conhecido como sistema tradi- nhamos vários problemas respira- cional (com uso de agrotóxicos), tórios. Os médicos nos orientaram conforme dados do último censo a parar de utilizar agrotóxicos”. do setor, realizado em 2006 pelo A médica Thaís Mauad, profes- Instituto Brasileiro de Geografia e sora de patologia geral na Faculda- Estatística (IBGE). de de Medicina da Universidade Por uma vida com menos agrotóxicos Cultivo de alimentos orgânicos resultou em mais qualidade de vida para as famílias de pequenos agricultores, melhorou a renda e reduziu os danos à natureza Nádia Machado de São Paulo (FMUSP) alerta que Escola de Engenharia da USP em cheio para a proliferação de pra- o contato direto, por tempo pro- São Carlos, o agricultor pode ter gas. “Esse tipo de cultivo auxilia longado com agrotóxicos, também contato direto com o agrotóxico na renovação da terra, sem es- pode causar aumento da incidên- de diversas formas, entre elas, o gotá-la, e acaba deixando o solo cia de cânceres, doenças neuroló- manejo inadequado, a utilização mais úmido”, explica Maria Edna. gicas e infertilidade. incorreta dos equipamentos de Thaís coordena a Horta Comunitária da FMUSP, criada com proteção, e por meio de água con- Incentivo à agricultura familiar taminada com o veneno. O agricultor João Carlos Fonte Bas- o intuito de introduzir os concei- “O agrotóxico aplicado nas fo- so, que citamos anteriormente, tos de alimentação saudável, com lhas das plantas pode atingir o mantém uma pequena produção ampla diversidade alimentar. A solo, por meio da penetração da familiar na cidade de Jundiaí. A médica ressalta que o consumo de água da chuva, chegando aos len- terra é herança do avô, que chegou produtos com agrotóxicos incen- çóis freáticos que, muitas vezes, da Itália em 1913. Até os anos 1980, tiva a manutenção desse tipo de são fontes de poços, ou até mesmo o plantio era feito da forma tradi- produção. “Estamos fomentando ser levado pela enxurrada para cional. Após recomendação médi- que grande parcela da população lagos e represas, nos quais o pro- ca, a família optou pela produção brasileira, que lida diariamente dutor utiliza para o consumo pró- de alimentos orgânicos. “Hoje eu na lavoura com agrotóxicos, te- prio”, esclarece. trabalho tranquilo, a saúde dos nha a saúde prejudicada”, alerta. A produção orgânica é livre de meus filhos também melhorou”, Segundo Maria Edna Tenório produtos químicos porque a for- Nunes, pós-doutoranda em enge- ma do cultivo é diferente. Nela a A renda da família aumentou nharia agrônoma, ligada ao Nú- biodiversidade é responsável pela a partir de 2002, quando começa- cleo de Ecotoxicologia e Ecologia manutenção do solo, um organis- ram a comercializar seus produ- Aplicada, do Centro de Recursos mo protege o outro, ao contrário tos sem atravessadores, na Feira Hídricos e Estudos Ambientais da da monocultura que é um prato do Produtor Orgânico do Parque ressalta. Revista DR! • 19 Sustentabilidade da Água Branca. “Antes vendíamos na Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo), mas quase não tínhamos lucro”, relata. A feira é gerida pela Associação de Agricultura Orgânica (AAO). Para comercializar no local é necessário ter certificação de que o produto, processo ou servi- > Em São Paulo, apenas 3.371 estabelecimentos produzem alimentos orgânicos ço obedece às normas e práticas da produção orgânica, conforme Produção de orgânicos Paulo, dos mais de 200 mil estabe- estabelecido pelo Ministério da Outro objetivo da AAO é que o lecimentos agropecuários, apenas Agricultura, Pecuária e Abasteci- produto orgânico seja mais aces- 3.371 são voltados para a agricultu- mento (Mapa). sível à população. O secretário- ra orgânica. Destes, apenas 451 são O evento acontece há 25 anos executivo da associação acredi- certificados. e, atualmente, auxilia cerca de ta que a regulamentação da Lei Na contramão ao incentivo 150 famílias a comercializarem 16.140, de março de 2015, da Prefei- da produção de alimentos orgâ- produtos como frutas, verduras, tura de São Paulo, irá contribuir nicos, a Câmara dos Deputados legumes, laticínios, temperos e para isso, já que a proposta é ofe- instalou, em 12 de abril deste ano, comida pronta de 45 pequenos recer 100% de alimentos orgâni- uma comissão especial para ana- produtores. Ademais, é possível cos para toda a rede municipal de lisar o Projeto de Lei 3.200, de 2015, comer quitutes orgânicos, como ensino no prazo de 11 anos a con- que trata sobre a regulamentação salgados, bolos, tortas e até pizzas tar desde a implantação da lei. de agrotóxicos, o que não agra- “Para atender toda a deman- dou aos órgãos de defesa ambien- Um dos objetivos da associação da da cidade será necessário que tal. “A proposta é um retrocesso. é acabar com o mito de que pro- haja incentivo por parte do gover- Os ruralistas querem fazer com dutos orgânicos são mais caros. no para ampliar a produção. Atu- agrotóxico aquilo que consegui- “Quando o consumidor compra almente, a agricultura familiar ram fazer com transgênicos em direto do produtor ele paga mais ainda está em segundo plano”, la- 2005: liberar geral. Não bastasse o barato, porque não há interme- menta Stanziani. Segundo o Cen- Brasil ser o país que usa a maior diário”, explica Márcio Stanziani, so Agropecuário do IBGE, no Bra- quantidade de agrotóxicos no secretário-executivo da AAO e sil existem pouco mais de 90 mil planeta”, argumenta Rafael Cruz, completa: “E ele consegue pagar unidades de plantio de alimentos da Campanha de Agricultura do mais barato, ainda, quando está orgânicos. O mesmo levantamen- Greenpeace, em nota divulgada na época da safra do produto”. to mostra que, no estado de São pela instituição. e pastéis integrais. SERVIÇO A feira do Produtor Orgânico do Parque da Água Branca é realizada todas as terças-feiras, sábados e domingos, das 7h às 12h (Rua Francisco Matarazzo, 455, Barra Funda, zona oeste da capital paulista). 20 • Revista DR! Tecnologia Qual é o seu problema? App oferece lista de hospitais com as melhores indicações para o paciente buscar atendimento Adriana Cardoso Imagine se você tiver uma dor de cabeça e poder, com um clique, encontrar o melhor tratamento para o problema no melhor hospital, seja público ou privado, e o mais próximo de casa possível. Isso será factível por meio do aplicativo que vem sendo desenvolvido pelo psiquiatra Felipe Salles Neves Machado, 33 anos. O dispositivo seria lançado no início de julho para todas as plataformas existentes. A ideia do App nasceu no ano passado, a partir do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) para o Master em Liderança e Gestão Pública (MLG) do Centro de Liderança Pública (CLP), em parceria com a instituição americana Harvard Kennedy School, uma das melhores do mundo. A inspiração dele e de seu colega de curso, o engenheiro Rodolfo Fiori, veio dos sites e aplicativos de hospedagem, como o Booking.com e Trivago, pelos quais o usuário pode encontrar a melhor e mais bem avaliada oferta de hotéis por outros clientes. “Durante a minha rotina de trabalho, percebi a insatisfação das pessoas com o atendimento que re- cebem, muitas vezes atribuída à falta de humanidade do médico, quando na verdade o problema está mais na infraestrutura e falta de profissionais. A partir dessa percepção, nossa ideia foi a de organizar melhor o fluxo dessas informações para quem não trabalha na área de saúde e analisar os motivos da insatisfação dos usuários com o sistema de saúde”, conta. Após a conclusão do MBA, o médico fundou uma startup para que pudesse ir atrás de recursos para capitalizar seu projeto. Ele participou de um edital (Vai Tec) lançado pela Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Empreendedorismo da Prefeitura de São Paulo, dentro do projeto Tech Sampa promovido pela AdeSampa, lançado em 2014 justamente para promover projetos como os dele. Foi selecionado para receber R$ 25 mil. Com o dinheiro, ele contratou uma agência para desenvolver a plataforma. “Realizamos, com o apoio de um gabinete da câmara municipal, reuniões com as áreas técnicas da Secretaria Municipal de Saúde e com a Secretaria de Estado da Saúde para implementar este projeto nos estabelecimentos das redes pública e privada que atendam também pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A plataforma será o mais simples possível para permitir que qualquer cidadão faça uso dela”, diz. Basta clicar a patologia e a região onde está, e o usuário receberá uma lista com as melhores indicações de onde poderá buscar atendimento. O App também permitirá que os usuários deixem suas opiniões sobre os serviços prestados, com a finalidade de formar filtros nos mesmos moldes dos sites/aplicativos de hospedagem, para auxiliar nas escolhas dos outros. “Queremos, a partir dessas opiniões, promover a humanização da área da saúde, elencando os serviços mais e menos humanizados. Além disso, há equipamentos (públicos e privados) subutilizados que as pessoas nem sabem que são bons. Queremos fazer a divulgação de forma positiva”, conjectura. Mais informações do projeto podem ser encontradas no site www. saluz.me Revista DR! • 21 Especial Saúde do Médico Precisamos falar sobre a sua saúde As doenças que acometem médicos ainda permanecem um tabu, gerando uma série de consequências graves não só aos profissionais, mas à assistência à população Adriana Cardoso Há um dito que circula entre panela de pressão impedindo que Sócrates é um dos médicos da profissionais da área médica, de o vapor saia. Uma hora ela explode Unidade de Pesquisa em Álcool e que os médicos são bons para e é quando o médico adoece, seja Drogas (Uniad), serviço que ofe- cuidar dos outros, mas displicen- física ou mentalmente. Incapaz de rece auxílio psiquiátrico a depen- tes quando se tornam pacientes. pedir ajuda, muitos acabam recor- dentes de substâncias psicoativas A princípio, podemos até achar rendo ao álcool e às drogas. Para com apoio do Conselho Regional graça, mas o assunto é bastante piorar, muitas vezes os colegas de de Medicina do Estado de São Pau- grave, pois as agruras que afligem trabalho percebem o problema, lo (Cremesp). quem zela pela saúde do outro mas fazem vistas grossas. A principal queixa dos mé- “Os hospitais não têm serviço dicos que buscam auxílio, conta Pressionados durante a resi- de apoio (a profissionais com de- o psiquiatra, é da sobrecarga de dência médica; jornadas e plan- pendência química) e não sabem trabalho. “É uma constante desde tões extenuantes no decorrer do lidar com isso. Quando desco- a residência até os 50 anos de pro- exercício da profissão; carreira brem, ou os demitem, ou fazem fissão”, diz. nada atraente na rede pública; com que tirem férias, porém não Entre as especialidades mais planos de saúde que pagam va- solucionam o problema”, ressalta vulneráveis à dependência aten- lores irrisórios por consultas e o psiquiatra Daniel Sócrates, es- didos por Sócrates estão os clíni- procedimentos; e lidar com a li- pecialista em dependência quí- cos-gerais, anestesiologistas e ci- nha tênue entre a vida e a morte mica e doutor em psiquiatria pela rurgiões. A maioria é de homens e de quem está sob o seus cuidados. Universidade Federal de São Pau- em faixa etária economicamente É como abaixar a válvula de uma lo (Unifesp-SP). ativa (28 aos 50 anos). ainda permanecem um tabu. 22 • Revista DR! Célio Luigi Importante salientar que é ne- O silêncio é tão devastador que suspensos parcial ou totalmente cessário ter predisposição genéti- não são incomuns casos de pro- pelo Cremesp devido a problemas ca para tornar-se um dependente fissionais que morrem de over- relacionados à dependência quí- químico. Mas o que, segundo o dose nos banheiros de hospitais e mica ou outros desses males. Es- psiquiatra da Unifesp, diferen- unidades básicas de saúde, o que ses casos chegam ao conselho por cia a categoria é o fácil acesso à faz Sócrates lançar um alerta: “A meio de denúncias, muitas vezes medicação (e à automedicação), questão (da dependência química feitas pelos próprios pacientes especialmente a opioides, uma de médicos) precisa deixar de ser ou diretores das localidades onde das substâncias-base das anes- um tabu”. trabalham. Parece pouco, mas tesias com potencial altamente viciante. Tão tabu que a reportagem da Revista DR! tentou falar com al- o número corresponde apenas àqueles que chegaram ao órgão. “Essa questão do opioide é mui- guns profissionais que enfrenta- O presidente do Cremesp, o psi- to grave! Muita gente não fala, os ram o problema e nenhum deles quiatra Mauro Aranha, expõe que colegas não falam, a família não quis contar sua experiência nem a questão das drogas é o que mais fala porque na maioria dos casos mesmo sob anonimato. preocupa, pois afeta diretamente o profissional é o provedor do o trabalho e pode levar o profissio- lar. Dificulta muito o fato de nin- Outros males nal à morte. “O primeiro contato guém falar a respeito”, critica Só- Depressão, Burnout (esgotamen- começa já na faculdade. Há muita crates, que já se sentiu fracassado to), transtorno bipolar, síndrome oferta de drogas e bebidas. Além quando perdeu um paciente víti- do pânico também são recorren- disso, muitos estudantes usam es- ma de overdose após uma recaída. tes. Atualmente, 85 médicos estão timulantes cognitivos, como deri- Revista DR! • 23 Especial Saúde do Médico (Da esquerda para a direita) O presidente do Cremesp, Mauro Aranha, e os psiquiatras da Unifesp Luiz Antonio Nogueira Martins e Daniel Sócrates veem com preocupação a saúde dos médicos vados de anfetaminas, para conse- por dia para ganhar uma quantia guirem estudar”, relata. que valha a pena e isso é humana- Ele mesmo já atendeu e ainda Por isso, ele acredita que o ca- diversos em seu consultório par- minho para não surtar é buscar ticular. “A maioria dessas doenças compensações. Ele próprio en- têm fatores desencadeantes e há, controu as suas envolvendo-se obviamente, uma predisposição em pesquisas, participando de as- do paciente”, explica. sociações. Aranha salienta que o perfil O fim da linha pode ser a op- workaholic, aquele sujeito viciado ção por tirar a própria vida. Um em trabalho, está também entre estudo conduzido por Cremesp/ os mais suscetíveis a sofrer um Unifesp há alguns anos aponta colapso. que a taxa de morte por suicídio Os médicos normalmente tra- nessa população foi de 4,2 por 100 balham muito para conseguir mil no período de 2000 a 2009 no manter um padrão de vida que, estado de São Paulo. A taxa é com- muitas vezes, nem mesmo conse- parável à da população em geral guem desfrutar. Para o psiquiatra (4,6 por 100 mil). Luiz Antonio Nogueira Martins, Foram avaliados dados de 2.927 também da Unifesp, a culpa de declarações de óbitos de médicos o médico virar um workaholic é falecidos no estado naquele pe- precarização da medicina ocasio- ríodo, com idades entre 23 e 104 nada pelos planos de saúde. anos. O que mais surpreendeu é “A medicina piorou muito no geral. Mas, com o que pagam os 24 • Revista DR! mente impossível”, presume. atende médicos com distúrbios que a morte entre mulheres foi maior que a de homens. convênios, os médicos são obri- O balanço da saúde física dos gados a atender 20, 30 pacientes profissionais também preocu- Divulgação pa. Mauro Aranha conta que no “A residência é o ponto de con- como tirar um membro do corpo – mesmo levantamento feito pelo vergência da profissão. O médico ele perde a razão de existir. Parar, Cremesp as mulheres médicas se sente refém quando sai dela, assim como começar, também é morrem menos de câncer de colo pois é jogado no mundo, terá que um processo difícil que pode levá- de útero que as não médicas. Por decidir sozinho. Quando come- -lo a adoecer”, observa Martins. outro lado, o índice de óbitos é ça a trabalhar, ele está cheio de Mauro Aranha, do Cremesp, igual para câncer intestinal. Ele ideias, mas esbarra nas dificul- reforça ainda que, quando algo atribui isso à falta de exames dades do dia a dia, na falta de in- não vai bem na saúde, o médico periódicos, como de sangue nas fraestrutura e é quando começa a normalmente é culpabilizado. “As fezes, e uma alimentação desba- sua frustração”, salienta. iniciativas governamentais vão lanceada por conta de rotina de Ao longo da residência o pro- mais no sentido de culpá-lo pelos fissional passa a lidar com pro- problemas em vez de ajudá-lo em “É importante que os médicos blemas do mundo real, que não suas agruras.” reconheçam suas limitações e di- existiam na graduação, como a Diante da importância que o ficuldades, não se automediquem responsabilidade profissional, os médico tem na vida da popula- e busquem ajuda”, aconselha Ara- plantões, o assédio e as pressões. ção, é imprescindível que cuide nha. A concorrência entre os próprios de si. Aranha confessa que já teve residentes é bastante pungente depressão duas vezes (“não por nessa fase, segundo Martins. causa do trabalho, mas por proble- trabalho. Residência A saúde do médico passou a in- “O primeiro ano da residência mas pessoais”) e se tratou. Martins teressar Luiz Antonio Nogueira é o mais estressante. Basicamen- também já teve suas “crises” quan- Martins quando fazia residência te ele é muito inexperiente e tem do principiante e Daniel Sócrates na Unifesp. Ele fez uma pesquisa que lidar com o não saber”, avalia. cuida da mente para poder ajudar para o doutorado sobre o tema em Na outra ponta desse ciclo, o 1994, que acabou virando um li- fim da carreira também é difícil. Ter problemas, adoecer física vro (“Residência Médica, Estresse “Ele não fez outra coisa na vida. ou mentalmente é da condição e Crescimento”, Editora: Casa do Formou-se médico e vai morrer humana. É preciso falar disso sem Psicólogo). médico. Se deixa de fazer isso é culpa ou vergonha. os outros. Revista DR! • 25 Horas Vagas Teatro De médico ao louco O psiquiatra Saulo Ciasca, apaixonado pelo teatro, interpreta o interno de um hospício do século 19 em sua primeira experiência como ator profissional Leonardo Gomes Nogueira M etalinguagem é quan- queio criativo e, por isso, sofre A peça em si é metalinguística do usamos uma de- para levar adiante o seu novo fil- e mostra a encenação, feita pelos terminada linguagem me. O “branco” do cineasta fictício internos de um hospício em 1808, para falar da própria. Também é, toma a tela de Fellini de assalto, do assassinato do médico e revo- outra definição possível, a “lingua- inclusive e, sobretudo, na ofus- lucionário francês Jean Paul Ma- gem utilizada para descrever outra cante fotografia do filme. rat. “Dirigida pelo ferino Marquês linguagem ou qualquer sistema de Assim como a “loucura” to- de Sade, a peça apresenta embates significação”, segundo o dicioná- mará conta do psiquiatra Saulo fictícios entre o ex-marquês e o rio Aurélio. Não é incomum, por Ciasca nos minutos que antece- revolucionário acerca da política, exemplo, a realização de peças ou dem um dos últimos ensaios da dos conflitos sociais e da própria filmes nos quais se fala da própria peça “Marat – Sade”, que ficou em condição humana”, diz o texto de montagem. cartaz entre os meses de maio e apresentação da peça. Um bom exemplo é “Oito e junho na cidade de São Paulo. A O psiquiatra Saulo Ciasca in- Meio” (ou apenas 8 ½), de Federi- montagem, do Teatro da Pequena terpreta um desses internos. “Um co Fellini, no qual o personagem Morte, é inspirada num drama louco bem louco”, brinca. “Eu faço interpretado por Marcello Mas- musical do autor alemão e tem di- um louco... O que eu acho muito troianni tem algum tipo de blo- reção de Reginaldo Nascimento. legal porque eu sou psiquiatra”, 26 • Revista DR! >Psiquiatra usa experiência com os seus pacientes para interpretar personagem na peça “Marat Sade” diz. “Quando eu faço o louco eu bremos que há uma peça dentro ação. Na data da entrevista, aliás, uso um monte de experiências que da outra), havia sido assassina- o médico estava a poucos dias de tive com pacientes meus”, afirma. do em 1793 (muitos anos antes, formalizar o registro, em sua car- “Naquela época, não eram só portanto, da montagem realiza- teira de trabalho, que atesta que pessoas com questões, proble- da pelos internos do hospício de agora ele é um ator profissional. mas mentais, tinham pessoas que Charenton sob direção do famoso também eram presos políticos”, escritor libertino). A partir de 2011, Ciasca começa a trabalhar no Ambulatório ressalta, ao explicar o perfil dos O médico, formado pela Facul- Transdisciplinar de Identidade de indivíduos internados, naquele dade de Medicina da Universidade Gênero e Orientação Sexual (Am- momento, nessas instituições. de São Paulo (FMUSP) em 2006, diz tigos), do Instituto de Psiquiatria Ele lembra que o próprio Sade que sempre gostou de teatro e que do Hospital das Clínicas da Facul- ficou internado no hospício no retomou contato com ele por meio dade de Medicina da USP. “A gen- qual se passa a peça. “É uma peça de uma pós-graduação em psico- te atende crianças e adolescentes dentro de uma peça”, resume, de drama. transgêneros”, resume. forma simples, a metalinguagem “É uma modalidade, uma téc- Boa parte ou, até o momento, a contida na montagem. “Um dos nica psicoterápica na qual a gente totalidade da trajetória profissio- loucos, um dos internos desse usa muitos elementos do teatro nal do médico está ligada ao ins- hospício, que é o Marquês de Sade, para atender pacientes”, explica. tituto de psiquiatria já citado. Ele dirige a peça”, diz. “Mas tem uma “Eu já gostava de teatro antes, re- foi residente em psiquiatria entre intenção por trás, que é fazer os solvi fazer psicodrama”, acrescen- os anos de 2007 e 2009 e preceptor loucos se revoltarem”, conclui. ta o psiquiatra. no mesmo instituto de 2010 a 2011. É importante contextualizar: Por causa do seu interesse pela De 2011 até hoje, ele se integrou ao 1808, ano no qual se passa a peça, área, Ciasca fez um curso profis- era um tempo de grande agitação sionalizante no tradicional Teatro “A gente tem alguns quadros política por causa da ainda recen- Escola Macunaíma. Ao se formar, que exigem internação. Mas são te, na época, é claro, eclosão da Re- em dezembro de 2015, ele foi con- breves”, diz. “A psiquiatria mo- volução Francesa, em 1789. O líder vidado para participar da peça que derna não preconiza mais uma revolucionário Jean Paul Marat, tem alguma ou bastante familiari- internação de longuíssimo prazo”, ao qual ambas se referem (lem- dade com a sua outra área de atu- ressalta. Amtigos. Revista DR! • 27 + SIMPLES + BENEFÍCIOS + INFORMAÇÃO BAIXE NOSSO APLICATIVO NO SEU CELULAR OU TABLET E FIQUE A POUCOS CLIQUES DAS NOVIDADES DO SIMESP+ E DAS NOSSAS PUBLICAÇÕES: • TV SIMESP • REVISTA DR! • JORNAL DO SIMESP • REDES SOCIAIS [email protected] ou 11 3292.9147 28 • Revista DR! Redes Sociais >"Há uma arrogância epistêmica de profissionais que fazem afirmações sem experimentações", diz Luís Cláudio Correia Ciência mais importante que a crença Cardiologista defende em blog a importância de se pautar condutas médicas em informações cientificamente comprovadas Adriana Cardoso Quando criou o blog em 2010, Correia pretendia promover, dentro de um espaço acessível a todos, discussões metodológicas de importantes trabalhos publicados na literatura médica. Usando tais artigos como exemplos, ele procura transmitir conhecimento de técnicas de análise crítica da confiabilidade e relevância de evidências, trazendo reflexões quanto à necessidade de hipóteses lógicas serem comprovadas experimentalmente antes da incorporação na decisão médica. “A ideia do blog partiu da percepção de uma lacuna entre o pensamento médico tradicional e a forma científica de Logo abaixo do nome do blog “Medicina Baseada em Evi- pensar. Por vezes, o pensamento médico é pouco científico dências”, uma linha fina traz a seguinte explicação: “in- e baseado em crenças que, por sua vez, são baseadas em terpretação de evidências científicas com foco especial na sofismas”, diz o também coordenador científico do Hospi- área cardiovascular e discussão de conceitos referentes à tal São Rafael, na capital baiana. metodologia científica”. O médico aponta para a necessidade de se colocar a Em um post de 12 de dezembro de 2014, o cardiologista arrogância sob o jaleco. “No paradigma científico devemos Luís Cláudio Correia, 46 anos, professor-adjunto da Escola experimentar em cima de hipóteses para ver se são verda- Bahiana de Medicina e Saúde Pública, em Salvador, sinte- deiras ou não, mas há uma arrogância epistêmica de profis- tiza a ideia de onde queria chegar quando decidiu colocar sionais que fazem afirmações sem experimentações”, frisa. tudo o que pensava sobre como deve ser um protocolo mé- No blog, o cardiologista também discute outros temas dico: “Não há evidência para tudo”. O título, na verdade, inerentes à prática médica, além de trazer vídeos com en- vai na contramão do que ele próprio pensa. Trata-se de uma trevistas, como a que fez com o médico alemão Franz Porz- assertiva – da qual Correia lança mão para provocar um de- solt, criador do conceito de “economia clínica”. bate sobre a postura profissional – comumente usada por médicos na promoção da “liberdade de definir condutas médicas com base em suas próprias crenças”. Mais informações: www.medicinabaseadaemevidencias.blogspot.com Revista DR! • 29 Simesp por Dentro Memória Associado A criação do estatuto do Sindicato Felipe Gonçalves Corneau Especialista em Medicina de Família e Comunidade Sindicalizado desde o ato de posse da atual gestão do Simesp (2014-2017), em junho de 2014, Felipe Corneau sempre foi engajado na defesa da categoria. Formado pela Faculdade de Medicina da USP, em 2011, participou do Centro Acadêmico Oswaldo Cruz e da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem). >Primeiro estatuto definia objetivos da entidade de forma abrangente Ele conta que acompanhou as discussões sobre o reajuste O primeiro estatuto do Sindica- o controle e fiscalização do Estado salarial dos médicos que pres- to dos Médicos de São Paulo (Si- durante um longo período. O Si- tam serviço à Prefeitura de São mesp) foi aprovado logo após sua mesp cuidava “apenas das ques- Paulo, por meio de organiza- fundação, em 1929. O documento tões de ordem moral” da categoria, ções sociais, na qual o Simesp com cinco capítulos estabelecia como explicou Flamínio Fávero, conquistou melhores reajus- os objetivos da entidade, ainda primeiro presidente da entidade, tes, além das denúncias contra de forma muito abrangente. No durante um discurso em 1931. as irregularidades na terceirização do serviço público. primeiro artigo do Capítulo 1, por Os objetivos estabelecidos no exemplo, definia como atribuição primeiro estatuto se confundem Felipe espera que o Simesp do Sindicato uma “(...) associação com os do conselho de ética pro- continue defendendo os mé- destinada a promover o estudo, a fissional, órgão que foi criado dicos e que consiga se envol- defesa e o desenvolvimento dos apenas três décadas depois, tra- ver cada vez mais na luta por interesses gerais da profissão mé- tando de temas como ética mé- um Sistema Único de Saúde dica e dos interesses profissionais dica, fiscalização e princípios da (SUS) de qualidade. “O Sindi- e econômicos de seus membros”. atividade profissional, além do cato é importante para termos O aprofundamento das dis- controle, fiscalização e denúncia nossos direitos respaldados, cussões, em defesa da categoria, do exercício ilegal da medicina. mas também para nos ajudar sobre as questões trabalhistas fo- As atividades dos membros do a construir um sistema que ram sendo moldadas nos anos se- Sindicato resultaram na elabora- nos permita cuidar melhor da guintes, pois o Sindicato ficou sob ção de um Código de Ética Médica. saúde das pessoas”, enfatiza. 30 • Revista DR! Artigo Pela qualidade da formação do médico brasileiro Lucio Flávio Gonzaga Silva Professor da Universidade Federal do Ceará e conselheiro do Conselho Federal de Medicina (CFM) O jornal O Estado de S. Paulo, na Os últimos anos testemunha- mativa do estudante de medicina, sua edição de 20 de julho de 2015, ram um exagero na abertura devolutiva para a escola e que haja publicou reportagem cuja man- de novos cursos de medicina no consequências, o que lamentavel- chete "Governo federal cria novos Brasil. Entre 1808, ano da inaugu- mente não tem ocorrido no Brasil. cursos de medicina em cidades ração da 1ª escola (Faculdade de Escolas mal avaliadas continuam sem estrutura" chamava a aten- Medicina da Bahia), e 1994 surgi- abertas, formando profissionais ção para um fato inquietante: ram 82 faculdades de medicina. de qualificação questionável. a proliferação de faculdades de De 1995 até o princípio deste ano Há duas frentes de ação: criou medicina em nosso país sem a de 2016, foram 184. Só nos últimos o CFM, em parceria com a Associa- preocupação com a qualidade da três anos, 88. ção Brasileira de Educação Médica O cenário posto é o de grande (Abem), o Sistema de Acreditação A reportagem trata de dois expansão de vagas e de cursos em das Escolas Médicas (Saeme) e ex- editais publicados pelo Ministé- nosso país. Há uma expectativa ternou integral apoio à Avaliação rio da Educação (MEC), que sele- de que teremos entre 350 e 450 Nacional Seriada dos Estudantes cionam e pré-selecionam muni- escolas de medicina na próxima de Medicina (Anasem). cípios para albergarem escolas de década, a persistir a tendência O Saeme está em progresso, medicina, todas particulares. O atual. Haverá infraestrutura ade- sob a coordenação do professor primeiro selecionou 36 cidades, quada, corpo docente qualificado, Milton Arruda, avaliando 31 esco- principalmente do Sul e Sudes- hospitais de ensino e cenários de las médicas que voluntariamente te, e o segundo pré-selecionou 22 prática para toda essa estudanta- se apresentaram para a acredita- para o mesmo fim, no Norte, Nor- da no Brasil? ção. Sua avaliação autônoma, ex- formação do médico brasileiro. São pontos de inquietação do terna e independente do governo Surpreendentemente, a maio- Conselho Federal de Medicina e o prestígio das instituições pro- ria das cidades não atende aos (CFM). Há preocupação com a motoras conferem ao programa próprios critérios definidos pelo qualidade da formação do médi- alta credibilidade. MEC para este fim: 20 dentre as co a refletir diretamente na qua- A Anasem, avaliação seriada 36 selecionadas não atendem ao lidade da assistência do paciente dos estudantes de medicina no 2º, critério de cinco leitos do SUS brasileiro. 4º e 6º anos, por suas característi- deste e Centro-Oeste. por aluno. Apenas seis possuem O CFM tem um histórico de cas formativa, devolutiva e con- ou estão inseridas em regiões de luta pela avaliação do ensino mé- sequente, prospecta ótimas novi- saúde que contam com um hospi- dico no Brasil. Sempre pugnou por dades para a formação do médico tal de ensino. uma avaliação progressiva e for- brasileiro. Revista DR! • 31 Eu e a Medicina Crônica Morte Compensada Helio Begliomini Membro da Academia de Medicina de São Paulo; urologista do Hospital do Servidor Público Estadual e do Imuvi; e associado do Simesp D ona Brasilina representava o país até no nome. Era idosa, subnutrida, desletrada, mal cuidada e com pobre saúde bucal, infelizmente, físico, estudo radiológico, eletro- vítima das precárias condições cardiograma e exames laborato- sociais que desafortunadamen- riais era de se supor as dificulda- te teve. Contudo, sentia-se quase des que se tinha no aprendizado e que uma rainha pela atenção que no exercício da profissão. Um dos nós dávamos a ela, na enfermaria aforismos que muito sucesso fa- de mulheres, durante nosso inter- zia – repetido à exaustão desde o nato de clÍnica médica há quase ensino da semiologia – era de que quatro décadas. “A Clínica é Soberana”. Éramos instruídos a chamar o Dona Brasilina parecia não se paciente pelo nome. Sempre solíci- importar com a permanência de ta, não se furtava quando reitera- semanas e semanas ou até de me- damente era indagada pelos grupos ses internada numa enfermaria de internos que se revezavam – ávi- coletiva de cerca de 20 pacientes. dos em aprender! – em repetir in- Ao contrário, parecia que até gos- formações e em disponibilizar seu tava, pois fazia daquele singelo es- arqueado corpo para o estudo dos paço sua morada, além de ter sua sinais que lhe eram abundantes. autoestima elevada pela atenção e Numa época em que os recur- 32 • Revista DR! carinho que recebia. sos diagnósticos se baseavam tão Apesar do bom humor de dona somente na anamnese, exame Brasilina, em sua última inter- Célio Luigi nação ela apresentou um quadro preceptor sobre a possibilidade de bacilo de Koch se faz presente no incipiente de consumpção: ina- se instituir um teste terapêutico, escarro, e, curiosamente, outros petência, lento emagrecimento, tendo em vista a forte suspeita de parâmetros pesquisados encon- tosse e sudorese. Nas discussões tuberculose, apesar da ausência tram-se equilibrados. diárias com o preceptor, após a de comprovação laboratorial. De- A terapêutica para a tubercu- evolução da paciente, sempre co- balde. A intransigência era gran- lose fora prontamente ministra- gitávamos quadro de tuberculo- de de nosso orientador, visto que da, contudo, mostrara-se ineficaz, se. Por mais que pesquisássemos na clínica aprendíamos que era pois, em poucos dias sucessivos, radiológica e laboratorialmente indispensável saber o diagnósti- ela, já muito debilitada, veio a não conseguíamos ratificar essa co para se empreender a melhor óbito, perplexamente com diag- hipótese diagnóstica. Orientações conduta nóstico e compensada! para a correção dos distúrbios hi- estávamos lá para aprender e de- O conceito de medicina ba- droeletrolíticos, da albumina, da veríamos cumprir determinações seada em evidências viria a ser mecânica pulmonar com inala- superiores: persistir na pesquisa cunhado décadas depois. Hoje em ções e tapotagens, dentre outros, laboratorial, dar suporte clínico e dia, numa época em que predomi- parâmetros eram rotineiras. compensar parâmetros séricos em na o tecnicismo e o uso desmesu- desacordo com a normalidade. rado de aparelhos em detrimento Os dias foram se sucedendo e terapêutica. Ademais, o quadro clínico de dona Brasili- Mais alguns dias, e dona Bra- da propedêutica, seria anacrônico na ficava cada vez pior. Lembro- silina entra em estado de obnubi- dizer que “A Clínica ainda é Sobe- me que, muito aflitos, chegamos lação e se torna hiporreativa. Sur- rana”? Ou melhor: que o “Raciocí- até a discutir asperamente com o preendentemente a pesquisa do nio Clínico é Soberano”!? Revista DR! • 33 Cultura Bibliotecas modernizadas Elas deixaram de ser um espaço exclusivo para leitura, diversificaram seus serviços com inclusão de tecnologia, saraus literários, contação de histórias e continuam vivas, atraindo público de todas as idades e classe sociais Adriana Cardoso Desde o boom da internet, princi- Ruprecht, palmente ao longo dos anos 2000, Associação Paulista de Bibliotecas as bibliotecas foram forçadas a e Leitura (SP Leituras), uma orga- A própria construção da Bi- agregar a tecnologia para conti- nização social sem fins lucrativos blioteca de São Paulo possui mui- nuar atraindo público e existindo. responsável pela gestão de alguns tos significados. Muita gente deve Sim, a maioria delas ainda não dos símbolos mais importantes da lembrar-se que, por quase 50 anos, perdeu sua característica prin- cultura do estado, como a Sala São aquela área abrigou a Casa de De- cipal, que é a de ser um grande Paulo, a Pinacoteca e as duas úni- tenção de São Paulo, popularmen- acervo de livros. Mas tiveram que cas bibliotecas atreladas à esfera te conhecida como Carandiru, diversificar continuarem estadual na cidade – a Biblioteca que foi parcialmente demolida atraentes ao leitor. Com a dissemi- de São Paulo (BSP), no Carandiru, em dezembro de 2002 para dar lu- nação do acesso à rede mundial, região central, e seu braço caçula, gar ao Parque da Juventude, onde deixaram de ser apenas locais de a Biblioteca do Parque Villa-Lobos, fica a BSP. A prisão, famosa após o pesquisa (até porque muita gente na zona oeste. massacre de 111 presos pela polícia para diretor-executivo da está calcado na ideia de uma biblioteca viva”, elucubra. hoje faz isso do computador de O modelo de biblioteca como num episódio bastante controver- casa) para se transformarem em conhecemos, na opinião de Ru- so em 1992, hoje é um espaço de la- espaços lúdicos, com atividades precht, não corresponde mais à zer e cultura. para formar novos leitores, pro- realidade atual. “Há uma enorme O local recebe cerca de mil mover debates e entreter toda a diferença entre um local abarro- pessoas diariamente (27 a 28 mil família. tado de prateleiras de livros e uma por mês), sendo boa parte delas “A biblioteca é a casa da pala- biblioteca. O que diferencia uma formada por moradores de rua vra e o pensamento precisa de li- coisa da outra são as ações e ser- do entorno que vão ler jornais e berdade”, sintetiza Pierre Andre viços. Por essa razão, nosso projeto usar a internet gratuitamente. 34 • Revista DR! Renato Leary >No lugar onde antes era uma casa de detenção, Biblioteca de São Paulo virou um importante espaço de cultura e lazer Nos moldes do que acontece des- Em linha com a tecnologia, há E por que Mário é o seu patro- de sempre, os associados podem uma sala com jogos de videoga- no? Porque foi ele quem criou na emprestar livros e levá-los para mes, luaus literários e musicais, década de 1930 o departamento casa. Há também Kindles (leito- contação de histórias e um espaço que veio a ser, mais tarde, a Secre- res eletrônicos) disponibilizados lúdico (Bebelê) que busca incenti- taria Municipal de Cultura. Deste apenas no local para que as pes- var a leitura de crianças dos zero departamento, nasceu a ideia de soas os conheçam (“mas elas não aos quatro anos. uma biblioteca que agregasse toda se interessam muito”, diz Rupre- a história cultural da cidade e do cht, numa demonstração de que Mário de Andrade país. Mário, que também foi um nem nas bibliotecas esse modelo A biblioteca que leva o nome de grande ativista cultural, musicis- se popularizou). Há também sa- um dos maiores poetas e escrito- ta e folclorista, defendia a arte e a raus, debates e uma programa- res brasileiros, é a segunda maior cultura como um bem comum. A ção mensal variada. biblioteca pública do país (só per- BMA só ganhou seu nome na dé- Inaugurada em dezembro dendo para a Biblioteca Nacional, cada de 1960. de 2014, a Biblioteca do Parque no Rio de Janeiro) e, segundo Tar- Projetado pelo arquiteto fran- Villa-Lobos, mais voltada à fa- cila Lucena, supervisora do depar- cês Jacques Pilon, o prédio da mília, recebe gente não só que tamento de Ação Cultural da uni- BMA é considerado um marco vai ao parque exercitar-se, mas dade, a vigésima do mundo. Foi da arquitetura moderna do país a população da região metropo- inaugurada em 1926, na Rua Sete e, por essa razão, é tombado pelo litana, como Osasco e Franco da de Abril, como Biblioteca Munici- patrimônio histórico e cultural Rocha. São 2.500 por dia no fim pal de São Paulo, e só em 1942 mu- da cidade. Além disso, guarda um de semana e, segundo Ruprecht, dou-se para o prédio atual, na Rua acervo valioso de obras raras, her- a frequência só cresce. da Consolação, no Centro. dadas de bibliotecas particulares Revista DR! • 35 Sylvia Masini Cultura > As bibliotecas municipais Hans Christian Andersen e Monteiro Lobato são focadas no público infanto-juvenil de gente do calibre de Paulo Pra- mapas) ficou mais fácil. A tecno- do, poeta e escritor organizador da logia também ganhou lugar. “Não Semana de Arte Moderna de 1922 podemos encarar a cultura digital (da qual Mário também foi uma como ameaça”, frisa Tarcila. das vozes mais importantes); e de A rede Wi-Fi foi melhorada Batista Pereira, advogado e genro com a reforma (“pega em qualquer de Rui Barbosa. Na seção, há 52 lugar da biblioteca”, afirma Tarci- mil livros, quase 9 mil periódicos e la) e iniciou-se um grande projeto outros documentos que só podem de catalogação digital do acervo. ser consultados no local. “Temos outros projetos de longo A importância da Mário de An- prazo, como fazer uma platafor- drade para a cidade (e para o país) ma com lançamentos de e-books é tamanha que, em 2005, obteve (livros eletrônicos) em parceria status de departamento pela Se- com as editoras”, antecipa a super- cretaria Municipal de Cultura, ga- visora, que tem experiência de dez nhando, assim, autonomia admi- anos no mercado editorial. nistrativa. De 2007 a 2010, passou Outro projeto de sonho é levar a por uma grande reforma, tendo biblioteca para uma nuvem digital, sido reinaugurada em 2011. o que permitiria às pessoas acessa- Com a reforma, o contato do 36 • Revista DR! rem o acervo de qualquer lugar. público com o acervo (são mais de A programação cultural tam- 53 mil livros, além de periódicos, bém é diversificada, com música, Sylvia Masini > Localizada no coração de São Paulo, a Mário de Andrade é a segunda maior biblioteca pública do país debates, teatro, artes em geral. São as várias linguagens se encon- versas linguagens”, filosofa. Outro belo exemplo de ocupa- Abrir as portas das bibliotecas ção pela comunidade aconteceu à comunidade, como quem abre na Menotti Del Picchia, no bairro as portas de casa, tem sido a estra- do Limão, na zona norte. “A biblio- Vocação particular tégia utilizada para atrair público. teca fica num lugar escondido, Das 52 unidades diretamente li- Ainda, usufruir do potencial de numa rua sem saída. As pessoas gadas à coordenadoria do sistema cada uma. invadiam, depredavam o prédio, trando num mesmo lugar. municipal de bibliotecas, 28 pos- Dois bons exemplos são as vol- pois não havia uma interlocução suem telecentros para acesso à tadas ao público infantil Hans com a comunidade. Houve, então, internet. “Antigamente, as biblio- Christian Andersen, que home- uma aproximação com a popula- tecas eram mais voltadas a aten- nageia o escritor dinamarquês ção local, como cantores de hip- der o aluno. Com a proliferação da de livros infantis (quem nunca hop, e hoje, o espaço é totalmente internet, perderam muito dessa ouviu falar de “O Soldadinho de diferente”, elogia Nalles. função”, diz Waltemir Nalles, co- Chumbo” e “O Patinho Feio”?), no O coordenador defende que ordenador de bibliotecas da Secre- Tatuapé, zona leste da cidade; e a esses espaços públicos devem ir taria Municipal de Cultura. tradicionalíssima Monteiro Lo- atrás das pessoas em vez de espe- Por isso, investiu-se na diversi- bato (dispensa apresentações), no rá-las. “As bibliotecas são um lu- ficação de programações culturais, Centro, concebida por Mário de gar de interlocução e devem fazer pois, no entender de Nalles, os li- Andrade, e que completou 80 anos sentido para a comunidade, como vros não são a única ferramenta este ano. Ambas já tinham apelo escolas, moradores do entorno. para formar leitores. “O mundo aos pequenos e às mamães e a coor- Essa é a receita para serem um cir- forma leitores. A literatura tem di- denação aproveitou-se disso. cuito de sucesso”, acredita. Revista DR! • 37 Cultura Fabiola Rizzo Sanchez Anjos Frequência à biblioteca da FMUSP aumenta com redução de tempo em sala de aula > Estabelecimento disponibiliza documentos digitalizados que podem ser acessados de qualquer lugar A Faculdade de Medicina da Uni- filtro ao que é ou não mais rele- versidade de São Paulo (FMUSP) vante. Estão disponíveis também e-books que podem ser acessa- tem passado por uma mudança Apesar da possibilidade de aces- dos do celular dos alunos, atlas na grade curricular, para que so ao acervo a distância, a frequên- anatômicos em três dimensões, o aluno possa despender mais cia de alunos é grande. “A bibliote- além de uma série de iniciativas tempo em atividades de pesqui- ca dispõe de espaço interativo, com em andamento para facilitar o sa fora da sala de aula. Boa parte ambiente e equipamentos prepa- estudo. desse tempo, segundo a coorde- rados para tornar mais acolhedor nação da biblioteca da unidade, e descontraído o estudo. É um am- Serviço é despendido lá. biente que estimula a leitura, a pes- Para saber mais quisa e o aprendizado colaborativo Biblioteca Mário de Andrade dos estudantes”, diz. www.bma.sp.gov.br “A missão de uma biblioteca universitária é diferente da de Biblioteca de São Paulo uma biblioteca pública. Nosso Oficialmente conhecida como público-alvo é a comunidade aca- Divisão de Biblioteca e Documen- www.bsp.org.br dêmica e, mais especificamente, tação da FMUSP, a unidade foi Biblioteca Parque Villa-Lobos da área de medicina”, diz Rosa fundada em 1912, junto com a fa- www.bvl.org.br Maria Fischi, bibliotecária super- culdade. Teve apoio financeiro da Biblioteca da Faculdade visora do Serviço de Promoção e Fundação Rockfeller, dos Estados de Medicina da USP Divulgação da biblioteca. Unidos, e tem seu acervo (51.582 www.fm.usp.br/biblioteca Documentos foram digitali- livros, 11 mil teses entre outros) Para informações sobre as zados e podem ser acessados a organizado de acordo com a clas- bibliotecas do município de distância. É nesse ponto, segun- sificação da National Library of São Paulo do Rosa, que se torna muito im- Medicine (EUA), uma das mais re- www.prefeitura.sp.gov.br/ portante o papel da biblioteca, putadas, se não a mais, na área de cidade/secretarias/cultura/ de servir como uma espécie de medicina. bibliotecas 38 • Revista DR! Literatura Pedagogia do oprimido na saúde Leonardo Gomes Nogueira > Médico defende que discussão "saia da academia e passe para a prática, para a classe trabalhadora" O livro De que Adoecem e Morrem os Trabalhadores na “Esse livro, digamos assim, é de pedagogia na saúde. Era dos Monopólios - A Violência do Trabalho no Brasil, or- Pedagogia dos oprimidos na saúde”, sugere. O médico se ganizado pelo médico Herval Pina Ribeiro, é o capítulo final refere ao famoso método criado pelo educador Paulo Freire de um trabalho de mais de 30 anos. (1921-1997). Lançado no final do ano passado, o livro foi precedido No livro Pedagogia do Oprimido, escrito no final dos anos por uma obra anterior, de 1984, intitulada De que Adoecem 1960, Freire relaciona todo o aprendizado ao contexto social e Morrem os Trabalhadores. Ambas, ressalta o médico for- e defende que tanto o educador quanto o educando produ- mado pela Universidade Federal da Bahia, abordam as rela- zam conhecimento, ainda que distintos, e que deve prevale- ções entre trabalho e saúde. cer o diálogo e a troca de informações entre as partes. O lançamento em 19 de novembro de 2015, deu-se em “Os médicos deveriam se inserir nisso enquanto traba- meio a um ciclo de debates realizado na Faculdade de Saú- lhadores. E não o fazem”, avalia o médico que coordenou, de Pública da Universidade de São Paulo (USP). entre os anos de 1980 e 1984, o recém-criado Departamen- A ideia, conta o médico, doutor em saúde pública pela USP, é que essa discussão possa “sair da academia e pas- to Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho (Diesat). sar para a prática, para a classe trabalhadora”. “A preocu- Uma parte da tiragem inicial do livro, de dois mil exem- pação é justamente ter uma bibliografia, um conhecimento plares, já foi comprada por sindicatos. Outra pode ser que você possa, realmente, devolver aos trabalhadores”, adquirida de forma avulsa. Para quem tiver interesse na ressalta. publicação ou mesmo em promover um debate, o médico Não por acaso, Herval Pina Ribeiro tem realizado deba- disponibiliza o seu e-mail: [email protected] tes em sindicatos e outras organizações sociais para discu- Ele também sugere acessar a página do Centro Nacio- tir os assuntos abordados na obra. “A intenção é de forma- nal de Apoio em Pesquisas sobre as Relações de Trabalho ção de interlocutores”, resume. (Cenpras). Revista DR! • 39 Simesp+ Simesp+: benefícios para o associado Confira nossas parcerias + Seguros Instituto Brasileiro de Educação CW Tour Seguro de Responsabilidade Civil Profissional em Gestão Pública (IBEGESP) 10% de desconto no seguro viagem. 20% de desconto em cursos [+ benefícios no site do Simesp] DIT – Seguro de Diária por Incapacidade Temporária de curta duração, extensão e EAD. Seguro para Clínicas e Consultórios Seguro de Vida e Acidentes Pessoais Seguro Residencial e Casa de Veraneio Seguro Equipamentos Portáteis Seguro Automóvel Seguro Viagem + Capacitação BMJ e EVIMED 10 a 25% de desconto em cursos regulares. [+ benefícios no site do Simesp] CEL-LEP Idiomas 10% de desconto em cursos regulares de Inglês e Espanhol, extensivo aos dependentes. Cruzeiro do Sul 30% de desconto em graduação EAD (a distância) ou semipresencial. [+ benefícios no site do Simesp] Fast Move Idiomas 25% de desconto no módulo semestral de Inglês, Francês, Espanhol, Italiano e Português para estrangeiros. 40 • Revista DR! Grínberg’s Village Hotel - Socorro/SP + Lazer 20% de desconto nas diárias durante a Amanita Estalagem - Monte Verde/MG semana, em baixa temporada, e 10% de 10% de desconto nas diárias de hospeda- desconto nas diárias aos fins de semana. gem durante a alta e baixa temporadas. 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Revista DR! • 43 Benefícios Simesp+ Fast Shop Saraiva Amanita Estalagem Compra Certa Villa Di Mantova Cestas Michelli Costão do Santinho Pousada Villa Harmonia Capacitação Hotel Panorama Giuliana Flores TAM Viagens Tapeçaria Alemão Wet’n Wild Benefícios Serviços Quality Lavanderias Fast Move Idiomas HPlus Hotelaria NetShoes Lazer Seguro de Responsabilidade Civil IBEGESP Grínberg’s Village Hotel Seguro Viagem Rio Quente Resorts Aquário de São Paulo Havanna Beleza Investimentos C E L- L E P I d i o m a s Hotel Panorama Serviços diversos Seguro Automóvel Ofertas especiais Villa Di Mantova Resort Amanita Estalagem Fast Shop Subaru Colônia de férias Aojesp Avallon Blindagens Investimentos Saúde e Be Hot Park Seguro Equipamentos Portáteis Conube C Seguro para Clínicas e Consultórios Seguro Auto Instituto Brasileiro de Educação em Gestão Vento Haragano Morumbi Seguro Resid Roteiros de Charme Cestas Miche Simesp+ Simesp+ O novo programa de benefícios que chegou para fazer muito mais pelos médicos associados ao Simesp CAPACITAÇÃO | INVESTIMENTOS SAÚDE E BELEZA | OFERTAS ESPECIAIS LAZER | SERVIÇOS DIVERSOS › Associe-se e aproveite os benefícios: www.simesp.org.br/simesp+ [email protected] | 44 • Revista DR! 11 3292.9147 Simesp+