3 Vol XXI 2012 - Revista Nascer e Crescer

Transcrição

3 Vol XXI 2012 - Revista Nascer e Crescer
Vol. 21, nº 3, Setembro 2012
Revista de Pediatria do Centro Hospitalar do Porto
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Douro, CH V. N. de Gaia e Espinho, Hospital de Braga, CH São João, Hospital dde Santa Maria Maior, ULS
Revista de Pediatria do Centro Hospitalar do Porto | Departamento de Ensino, Formação e Investigação
Ano | 2012 Volume | XXI Número | 03
Directora | Editor-in-Chief | Sílvia Álvares; Director Adjunto | Associated Editor | Rui Chorão; Directora Executiva | Executive Editor | Margarida Lima
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PRÉMIO NASCER E CRESCER
MELHOR ARTIGO ORIGINAL 2012
A DIRECÇÃO DA REVISTA NASCER E CRESCER INSTITUIU O PRÉMIO ANUAL PARA O
MELHOR ARTIGO ORIGINAL PUBLICADO NA REVISTA. ESTA INICIATIVA VISA PROMOVER
E INCENTIVAR A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA NA ÁREA DA PEDIATRIA E PERINATOLOGIA.
REGULAMENTO
1. O Prémio será destinado aos autores do melhor Artigo Original publicado em cada ano na revista Nascer e Crescer
2. O Prémio equivalerá a um certificado e a um valor em dinheiro de 1 000,00 € (mil euros), que será entregue ao primeiro autor, caso
haja mais de um.
3. Um mesmo autor pode concorrer com mais de um Artigo Original
4. Todos os Artigos Originais serão candidatos ao Prémio, salvo indicação em contrário expressa pelos Autores
5. O processo de avaliação será conduzido por um júri de selecção a ser escolhido oportunamente pelos editores da revista
6. Na avaliação dos Artigos Originais, o júri de selecção analisará os seguintes itens:
a) Relevância e originalidade
b) Clareza e pertinência dos objectivos
c) Descrição dos métodos/procedimentos e análise estatística adequados
d) Apresentação clara e sintética dos resultados
e) Discussão fundamentada
f ) Importância para o avanço do conhecimento. Potencial de aplicabilidade e impacto dos resultados
7. Não caberá recurso contra as decisões do júri
8. A divulgação da atribuição do prémio será feita no 3.º número da revista Nascer e Crescer de cada ano
9. Cabe aos editores da revista Nascer e Crescer decidir sobre eventuais omissões neste regulamento
PRÉMIO NASCER E CRESCER
MELHOR ARTIGO ORIGINAL 2011
Os Editores da Revista Nascer e Crescer, após a apreciação pelo júri de selecção dos trabalhos originais publicados no ano de 2011,
atribuem o Prémio Nascer e Crescer para o Melhor Artigo Original ao seguinte artigo:
Silva E, Medina M, Rocha P, Bonet B, Sousa JAF, Enes C.
Atrésia das vias biliares extrahepáticas: estudo clínico retrospectivo. Nascer e Crescer, 2011, XX (1): 9-15
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
índice
número3.vol.XXI
125 Editorial
127 Artigos Originais
Paulo Sarmento
Hiperhidrose, simpaticectomia toracoscópica e satisfação dos adolescentes
Angélica Osório, João Moreira-Pinto, Joana Pereira,
Hernâni Lencastre, Fátima Carvalho
131
Recorrência do refluxo gastro-esofágico após fundoplicatura em crianças
João Moreira-Pinto, Angélica Osório, José Ferreira de Sousa,
Carlos Enes, Fernando Pereira, José Cidade-Rodrigues
135 Casos Clínicos
Hemoglobinúria paroxística ao frio: quando suspeitar?
Catarina Matos, Sandra Teixeira, Susana Lira, Emília Costa, José Barbot
138
Sequestro Vascular Intralobar: apresentação no primeiro ano de vida
Helena M. Silva, Marília Loureiro, José Monterroso,
Jorge Moreira, Rodrigues de Sousa, Sílvia Álvares
de Pediatria Inter-Hospitalar
142 Ciclo
do Norte
Tuberculose e cancro – pior que um só dois!
Cristiana Couto, Filipa Balona, Maria João Sampaio,
Ana Torres, Armando Pinto, Ana Maia Ferreira
145 Qual o seu Diagnóstico?
Caso dermatológico
Iolanda C. Fernandes, Susana Machado, Manuela Selores
147
Caso electroencefalográfico
Aida Sá, Rui Chorão
151
Caso endoscópico
Fernando Pereira
153
Caso radiológico
João Nascimento, Maria Gomes, Carla Moreira, Filipe Macedo
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
XXIV Reunião Anual de Pediatria, CHP
– Resumo das Intervenções
S156
Etiologia
Maria do Céu Rodrigues
Restrição de crescimento intra-uterino – Mesa
Redonda
S159
Vigilância pré-natal e decisão do parto
Cristina Dias
S167
Período neonatal
Ana Margarida Alexandrino
S169
Morbilidades futuras
Ana Cristina Braga
S172
Microbiota e cultura de arranque – Conferência
S174
Internet e as novas responsabilidade do
pediatra – Mesa Redonda
Microbiota e cultura de arranque
Helena Canário
Cyberbullying na adolescência
Hugo Tavares
S178
Panorama nacional do bullying
Mafalda Ferreira
S179
Hiperplasia supra-renal congénita – Mesa redonda
Formas clássicas
Teresa Borges
S180
Importância do estudo genético para o tratamento prénatal
- papel do endocrinologista
Anabela Giestas
S182
Doença inflamatória intestinal – Mesa redonda
S184
Pulmão e doença sistémica – Mesa redonda
Diagnóstico
Fernando Pereira
Vasculites
Guilhermina Reis
S189
Cardiopatia congénita
Telma Barbosa
S190
Doença gastrointestinal
Ana Ramos
S191 Resumo das Comunicações Orais
S200 Resumo dos Posters
213 Normas de Publicação
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
summary
number3.vol.XXI
125 Editorial
127 Original Articles
Paulo Sarmento
Hyperhydrosis, thoracoscopic sympathectomy and adolescents’ satisfation
Angélica Osório, João Moreira-Pinto, Joana Pereira,
Hernâni Lencastre, Fátima Carvalho
131
Recurrence of gastroesophageal reflux after fundoplication in a paediatric population
João Moreira-Pinto, Angélica Osório, José Ferreira de Sousa,
Carlos Enes, Fernando Pereira, José Cidade-Rodrigues
135 Case Reports
Paroxismal cold hemoglobinuria: when to suspect?
Catarina Matos, Sandra Teixeira, Susana Lira, Emília Costa, José Barbot
138
Intralobar sequestration presenting in the first year of life
Helena M. Silva, Marília Loureiro, José Monterroso,
Jorge Moreira, Rodrigues de Sousa, Sílvia Álvares
142 Paediatric Inter-Hospitalar Meeting
Tuberculosis and cancer – worse than one only two!
Cristiana Couto, Filipa Balona, Maria João Sampaio,
Ana Torres, Armando Pinto, Ana Maia Ferreira
145 What is your Diagnosis?
Dermatology Case
Iolanda C. Fernandes, Susana Machado, Manuela Selores
147
EEG case report
Aida Sá, Rui Chorão
151
Endoscopic case
Fernando Pereira
153
Radiological case
João Nascimento, Lurdes Morais, Filipe Macedo
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
XXIV Annual Meeting of Paediatrics
of CHP – Abstracts
S156
Intrauterine growth restriction – Round Table
Etiology
Maria do Céu Rodrigues
S159
Prenatal surveillance and child-bearing decision
Cristina Dias
S167
Neonatal period
Ana Margarida Alexandrino
S169
Future morbidity
Ana Cristina Braga
S172
Microbiota – Conference
S174
Internet and paediatrcian’s new responsibilities
– Round Table
Microbiota
Helena Canário
Cyberbullying in adolescence
Hugo Tavares
S178
Bullying: national situation
Mafalda Ferreira
S179
Congenital adrenal hyperplasia – Round Table
Classical forms
Teresa Borges
S180
Importance of genetic studies for prenatal treatment
- Endocrinologist’s point of view
Anabela Giestas
S182
Inflammatory bowel disease – Round Table
S184
The lung and systemic disorders – Round Table
Diagnosis
Fernando Pereira
Vasculitis
Guilhermina Reis
S189
Congenital cardiopathy
Telma Barbosa
S190
Bowel disease
Ana Ramos
S191 Oral presentations – abstracts
S200 Poster presentations – abstracts
213 Instructions for Authors
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
editorial
O Centro Materno Infantil Maternidade Júlio Dinis/Maria Pia será uma realidade em 2014.
Está previsto para o final do primeiro semestre de 2013 a localização das áreas
de internamento pediátricas, obstétricas e ginecológicas no edifício novo.
Durante o segundo semestre de 2013 e ano de 2014 serão efectuadas as
obras finais no edifício Maternidade, concluindo-se a obra.
Assim, após três décadas de discussão, às vezes polémicas, de avanços e de
recuos, verificar-se-á por fim a integração no mesmo edifício das áreas maternas
e pediátricas, quer da Maternidade Júlio Dinis, quer do Hospital Maria Pia, quer do
Hospital de Santo António.
Prevê-se ainda, a breve prazo a integração no Centro Hospitalar do Porto do
Instituto de Genética Médica Dr. Jacinto Magalhães.
A assunção na área do grande Porto de dois pólos (Centro Hospitalar S. João/
Valongo e Centro Hospitalar do Porto), altamente qualificados, com áreas de referência de excelência, possuindo capacidade de investigação e ensino universitário
será uma enorme valia para o Norte do País.
Todos nós, seremos capazes de manter a coesão necessária, bem como o
espírito de iniciativa, de que é exemplo a edição da revista “Nascer e Crescer” e a
realização anual da Reunião de Pediatria do Centro Hospitalar do Porto, que permitirá que o Centro Hospitalar, a cidade do Porto e a Região Norte, se orgulhem do
Centro Materno Infantil do Norte que muitos ajudaram a criar.
Paulo Sarmento
Director do Centro de Responsabilidade
Centro Materno-Infantil
editorial
125
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Hiperhidrose, simpaticectomia toracoscópica
e satisfação dos adolescentes
Angélica Osório1, João Moreira-Pinto1, Joana Pereira1, Hernâni Lencastre2, Fátima Carvalho1
RESUMO
Introdução: A hiperhidrose axilar e palmar (HAP) corresponde à sudorese excessiva das axilas e palmas das mãos, em
quantidades desmesuradamente maiores que as necessárias
para a normal termorregulação. Afecta muitos adolescentes e
a sua etiologia ainda não foi totalmente esclarecida. A simpaticectomia toracoscópica (ST) é uma opção terapêutica com resultados excelentes mas associa-se a sudorese compensatória
(SC).
Objectivo: Avaliação da interferência da HAP no dia-a-dia
dos adolescentes, antes e após a cirurgia, avaliação da presença de SC e avaliação da morbilidade cirúrgica associada.
Material e Métodos: Estudo prospectivo, incluindo quatro
doentes, (3♀,1♂; média de 17 anos de idade) submetidos a ST
bilateral T2-T4. A HAP foi avaliada recorrendo à “Hyperhidrosis
Disease Severity Scale”(HDSS-International Hyperhidrosis Society®).
Resultados: Pré-operatoriamente, todos os doentes tinham HDSS 4, todos tinham de mudar o vestuário mais de duas
vezes/dia e todos consideraram que a HAP interferia muito com
a sua auto-estima. No primeiro dia pós-operatório, nenhum apresentava HAP. Uma semana depois, três referiram SC no tórax/
joelhos. Um doente referiu SC gustatória. Na primeira semana
de pós-operatório, HDSS mudou para 2 num doente e para 1 nos
restantes. Aos seis meses e ao primeiro ano de pós-operatório,
a SC diminuiu em todos os doentes e a HDSS manteve-se no
mesmo valor que na primeira semana de pós-operatório. Sem
registo de complicações cirúrgicas.
Conclusões: A melhoria na HAP e satisfação dos doentes
foi imediata, acentuada e mantida no tempo. Apesar da pequena
amostra, os resultados demonstram que a HAP é uma condição
dramática para os adolescentes. Porém é facilmente tratada e
associa-se a uma SC bastante tolerável, devendo merecer mais
atenção em idade pediátrica.
Palavras-chave: Adolescentes, hiperhidrose axilar e palmar, simpaticectomia toracoscópica.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 127-130
__________
1
2
S. Cirurgia Pediátrica, CH Porto
S. Cirurgia Cárdio-Torácica, CH Vila Nova de Gaia-Espinho
INTRODUÇÃO
Hiperhidrose Focal Primária (HFP) define-se como a sudorese excessiva, em quantidades desmesuradamente maiores
que as necessárias para a normal termoregulação corporal. Atinge principalmente as palmas das mãos, axilas, plantas dos pés
e região crânio-facial.
Ao contrário do que acontece na Hiperhidrose Secundária
que se deve a uma causa bem definida, seja ela infecciosa, endócrina ou neurológica, a etiologia da HFP ainda não se encontra
totalmente esclarecida.
Em termos epidemiológicos é uma patologia mais frequentemente descrita nos adultos, notando-se o predomínio das mulheres no grupo submetido a correcção cirúrgica. Ao contrário do
que poderia pensar-se, tal não se deve a uma maior incidência
no sexo feminino mas sim a um maior grau de insatisfação com
essa condição nas mulheres e como tal maior predisposição a
tratamento definitivo. A HFP é subvalorizada nas crianças e adolescentes e na maior parte dos casos não é reconhecida como
patologia passível de correcção definitiva. Na realidade, estudos
publicados em 2004 (1) reportam uma incidência de 1,6% de HFP
em indivíduos com idade inferior a 18 anos. Em mais de 70%
dos casos, a HFP tem início em idade escolar e em 16-20% na
adolescência (2), sendo muito pouco frequente a apresentação
inicial desta patologia em idade adulta. A história familiar é positiva em 65% dos casos (1), sugerindo a possibilidade de uma
base genética.
Trata-se de uma patologia associada a perturbações emocionais e sociais fortes na medida em que tem grande impacto
na vida diária do doente. Tarefas simples do dia-a-dia ficam comprometidas com a presença do excesso de sudorese: o pegar
na caneta para escrever, o abrir portas, o aperto de mão para
cumprimentar e a prática de alguns desportos. Pode implicar a
mudança de vestuário mais que uma vez por dia, a incapacidade
de usar certo tipo de calçado e a impossibilidade de estar em
locais públicos, como alguns exemplos.
Se o adolescente por si só se encontra numa fase da vida
especialmente vulnerável, o adolescente com HFP sente-se ainda mais incapacitado na sua esfera bio-psico-social. A HFP gera
ansiedade, fobia social e até mesmo depressão no indivíduo
afectado.
Também o risco aumentado de infecções cutâneas não
deve ser desvalorizado. A presença de maior humidade da pele
facilita o aparecimento de dermatofitoses e verrugas.
Várias opções terapêuticas têm sido descritas para tratar
artigo original
original article
127
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
esta condição patológica (1). Em crianças e adolescentes, inclui-se como modalidade de tratamento a aplicação de agentes tópicos, antitranspirantes com o cloreto de alumínio. Estes quando
usados em concentrações mais elevadas podem provocar dermatites irritativas que são de tal forma exuberantes que tornam
o seu uso intolerável. Quando em concentrações mais baixas
não apresentam normalmente a eficácia terapêutica desejável.
A toxina botulínica tipo A em injecções intradérmicas promove
a diminuição de produção local de suor. Porém, a sua eficácia
é apenas transitória, desaparecendo ao final de seis a doze meses. Por outro lado, desenvolve-se resposta imunológica com
produção de anticorpos contra a toxina, implicando a sua ineficácia a médio prazo. Está ainda associada a efeitos secundários como fraqueza muscular generalizada e eventual dificuldade
respiratória. A iontoforese está descrita como sendo aplicável na
HFP palmar e plantar. No entanto, ainda não estão publicados
estudos da sua utilização para este efeito em crianças e adolescentes. A medicação sistémica com anti-colinérgicos, bloqueadores dos canais de cálcio, clonidina e benzodiazepinas promove
efectivamente a diminuição da sudorese. Para isso terão de ser
administradas doses elevadas e como tal associam-se a efeitos
secundários indesejados.
A simpaticectomia tem-se revelado como uma boa opção
terapêutica. A sua realização por toracoscopia alia todas as
vantagens inerentes a uma cirurgia minimamente invasiva a resultados claramente satisfatórios. Na população mais jovem, as
premissas associadas à cirurgia minimamente invasiva torácica
tornam-se ainda mais relevantes: melhor efeito estético, maior
facilidade da técnica cirúrgica, menor probabilidade de complicações e menor tempo de internamento.
No entanto, a realização da simpaticectomia, quer por toracotomia quer por toracoscopia, associa-se ao aparecimento de
sudorese compensatória (SC) noutras regiões corporais (3,4,5).
OBJECTIVO
Avaliação da interferência da Hiperhidrose Axilar e Palmar
(HAP) no dia-a-dia dos adolescentes, antes e após a cirurgia,
avaliação da presença de sudorese compensatória e avaliação
da morbilidade cirúrgica associada.
MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de um estudo prospectivo que inclui quatro doentes (três do sexo feminino; um do sexo masculino; idade média
17 anos) submetidos a simpaticectomia toracoscópica no nosso
Serviço entre 2008 e 2010.
O procedimento cirúrgico foi realizado no Bloco Operatório
sob anestesia geral com entubação selectiva com o doente posicionado em decúbito dorsal com tórax elevado a 60º e membros superiores abduzidos a 90º. Foram colocados dois trocars
de 5 mm no quarto espaço intercostal (um na linha médio-axilar
e outro na linha axilar anterior). A simpaticectomia foi realizada
por secção total de T2 a T4 por electrocoagulação (Figura 1). O
pneumotórax é drenado no final da cirurgia, não havendo necessidade de se colocar dreno torácico no pós-operatório. O mesmo
procedimento foi repetido bilateralmente. Excepto num caso, a
alta foi dada nas primeiras 24h subsequentes à cirurgia.
A informação foi colhida por entrevista pessoal e telefónica.
Antes da cirurgia, os doentes foram questionados se tinham de
mudar de roupa mais de duas vezes por dia por causa da HAP e
se consideravam que esta interferia muito com a sua auto-estima.
Também previamente à cirurgia, foi aplicada a “Hyperhydrosis
Disease Severity Scale”(HDSS) (International Hyperhydrosis Society®) (Figura 2).
Após a cirurgia, a HDSS foi novamente aplicada na primeira
semana, seis meses e um ano de pós-operatório.
“Como classificas a gravidade da tua hipersudorese?”
GRAU 1
A minha sudorese é imperceptível e nunca interfere com as minhas
actividades diárias
GRAU 2
A minha sudorese é tolerável mas às vezes interfere com as minhas
actividades diárias
GRAU 3
A minha sudorese é pouco tolerável e frequentemente interfere
com as minhas actividades diárias
GRAU 4
A minha sudorese é intolerável e interfere sempre com as minhas
actividades diárias
Figura 2 – HDSS (Hyperhydrosis Disease Severity Scale – International
Hyperhydrosis Society®)
Figura 1 – Interrupção do impulso nervoso em T2 e T3 da cadeia simpática torácica, por electrocoagulação toracoscópica
128
artigo original
original article
RESULTADOS
Pré-operatoriamente, todos os doentes tinham de mudar de
roupa mais de duas vezes por dia por causa da hiperhidrose e
todos os doentes consideravam que esta interferia muito com
a sua auto-estima. Também classificaram a sua HAP no grau
máximo da HDSS (“A minha sudorese é intolerável e interfere
sempre com as minhas actividades diárias”), correspondendo a
hiperhidrose grave.
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Uma semana após a cirurgia, no que diz respeito ao grau
de hiperhidrose, este traduziu-se num HDSS 2 em um doente e
HDSS 1 nos restantes três. Aos seis meses e um ano de pós-operatório a classificação HDSS foi idêntica (Figura 3). De notar
que imediatamente no primeiro dia de pós-operatório, os doentes constataram o desaparecimento da HAP.
4
H
D
S
S
3
dt 1
2
dt 2
1
dt 3
0
dt 4
pré-op
1
semana 6 meses 1 ano
pós ST pós ST pós ST
Figura 3 – Evolução da HDSS antes e após a simpaticectomia toracoscópica (ST)
Quanto à SC, esta manifestou-se desde a primeira semana
de pós-operatório. Em dois doentes foi apontada ao tórax, num
doente aos joelhos e noutro era do tipo gustatório. Apesar de
sempre presente (Figura 4), os doentes referiram que esta foi
diminuindo em quantidade ao longo de todo o tempo de seguimento.
Não houve registos de morbilidade cirúrgica associada.
DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Pré-operatoriamente, todos os doentes no nosso estudo
não só se incluíam no grau máximo de hiperhidrose da HDSS
(“A minha sudorese é intolerável e interfere sempre com as minhas actividades diárias”) como afirmavam que tinham de mudar
de roupa mais de duas vezes por dia por causa da HAP e que
esta interferia muito com a sua auto-estima, traduzindo um grau
elevado de insatisfação com a sua condição. De facto, e em concordância com o descrito na literatura, esta era uma situação
dramática na vida dos adolescentes (6).
Após a cirurgia, verificou-se não só a presença constante
da SC como também a sua precoce manifestação durante o período de seguimento destes doentes. Não obstante esse facto, em
todos houve uma melhoria acentuada no grau de hiperhidrose
como revelou a classificação HDSS do pós-operatório. Em três
doentes o HDSS 4 do pré-operatório alterou-se para HDSS 1 (“A
minha sudorese é imperceptível e nunca interfere com as minhas actividades diárias”) logo na primeira semana pós-cirurgia.
Num doente, no pós-operatório essa classificação foi HDSS 2
(“A minha sudorese é tolerável mas às vezes interfere com as
minhas actividades diárias”). Assim, em todos os doentes houve
pelo menos uma melhoria em dois graus na HDSS o que corresponde a uma melhoria de pelo menos de 80% na HAP inicial.
Esta melhoria não só foi imediata, como se constatou na primeira
semana após a ST, mas também foi mantida ao longo do primeiro ano de seguimento. Assim e apesar da presença da SC, os
adolescentes mostraram-se muito satisfeitos com a cirurgia e os
seus resultados.
No entanto, o elevado grau de satisfação apresentado no
pós-operatório pode ter sido condicionado pela influência negativa de uma grande insatisfação com a condição antes da cirurgia.
Independentemente dessa influência, o facto é que objectivamente houve melhoria da HAP. E essa mesma melhoria na HAP
e da satisfação dos doentes foi imediata, acentuada e mantida
ao longo do tempo.
Apesar da pequena amostra de doentes, os nossos resultados enfatizam o facto de que a HAP é uma condição dramática
para os adolescentes. Porém é facilmente tratada com a ST e
associa-se a uma SC bastante tolerável, devendo merecer mais
atenção em idade pediátrica.
4
3
tórax
2
joelhos
gustatória
1
0
1 semana depois
6m depois
1 ano depois
Figura 4 – Evolução da sudorese compensatória (SC) durante o primeiro
ano de pós-operatório
HYPERHYDROSIS, THORACOSCOPIC SYMPATHECTOMY
AND ADOLESCENTS’ SATISFATION
ABSTRACT
Introduction: Axillary and palmar hyperhidrosis (APH) affects many adolescents. Thoracoscopic sympathectomy (TS) is a
reliable therapeutic option with excellent results but is associated
with compensatory sweating (CS).
Aims: Evaluation of adolescents’ pre and post-operative
satisfaction concerning hyperhidrosis severity, surgical morbidity
and CS assessment.
Methods: Prospective study including four patients
(3♀,1♂;average 17 years-old) who underwent T2-T4 TS for APH.
artigo original
original article
129
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
APH was assessed by “Hyperhidrosis Disease Severity Scale”
(HDSS-International Hyperhidrosis Society®).
Results: Pre-operatively, all patients were HDSS 4, all had
to change their clothes more than twice/day and all stated that
APH much interfered with their self-esteem. On day one post-op none had hyperhidrosis. One week after, three complained of
CS from thorax/knees. One patient complained of facial flushing
when eating. At that time, HDSS improved to 2 in one and to 1 in
three patients. Six months and one year post-op, CS diminished
in all patients, and HDSS was the same as one week post-op.
There were no surgical complications.
Conclusion: Hyperhidrosis and patients’s satisfaction
improvement was prompt, marked and sustained. Despite the
small sample, our results strengthen the fact that adolescents’
hyperhidrosis is a devastating condition easily managed and associated with a bearable CS, hence deserving more attention in
paediatrics.
Keywords: Adolescents, axilary and palmar hyperhidrosis,
thoracoscopic sympathectomy.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 127-130
BIBLIOGRAFIA
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CORRESPONDÊNCIA
Angélica Osório
E-mail: [email protected]
130
artigo original
original article
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Recorrência do refluxo gastro-esofágico
após fundoplicatura em crianças
João Moreira-Pinto1,2, Angélica Osório1, José Ferreira de Sousa1, Carlos Enes1, Fernando Pereira3, José Cidade-Rodrigues1
RESUMO
Introdução e Objectivos: A fundoplicatura de Nissen é o
tratamento padrão da hérnia do hiato e da doença do refluxo
gastro-esofágico resistente à terapêutica médica. A recorrência
da doença (rRGE) é um problema comum. O objectivo deste estudo foi perceber em que doentes a rRGE será mais provável e
porquê?
Material e métodos: Análise retrospectiva dos processos
dos doentes submetidos a fundoplicatura de Nissen entre Fevereiro de 2000 e Março de 2009, na nossa Instituição. Dividiram-se os doentes em: grupo rRGE e grupo controlo (sem sinais
clínicos ou imagioológicos de rRGE). Compararam-se os dois
grupos quanto ao sexo, idade e percentil de peso à data da cirurgia, presença de hérnia do hiato, outras comorbilidades, presença de compromisso neurológico, história de convulsões, de
medicação pulmonar crónica, de necessidade de O2 e/ou antibióticos cronicamente no período pré-operatório, técnica usada
(aberta ou laparoscópica), colocação de gastrostomia, usando o
teste exacto de Fischer.
Resultados: 65 doentes foram submetidos a fundoplicatura
de Nissen. Foram incluídos no grupo rRGE 10 doentes (15,4%).
Dos parâmetros em análise, apenas foi encontrada diferença
significativa em relação à colocação de gastrostomia prévia ou
simultaneamente (50% no grupo rGE versus 13%, p=0,015).
Conclusões: No nosso estudo, a rRGE foi maior nos doentes a quem foi colocada gastrostomia prévia ou simultaneamente.
Este pode ser um sinal indirecto de um compromisso neurológico
mais grave, embora não fosse encontrado significado estatístico
para os restantes parâmetros comparados. Serão necessários
mais estudos e com um maior número de casos para conclusões
mais seguras.
Palavras-chave: Adolescente, criança, compromisso neurológico, gastrostomia, hérnia do hiato, recorrência, refluxo gastroesofágico.
INTRODUÇÃO
A doença do refluxo gastro-esofágico (DRGE) é definida
como o conjunto de efeitos patológicos da passagem involuntária
de conteúdo gástrico para o esófago (1). Na população pediátrica,
a DRGE tem uma variedade grande de formas de apresentação,
incluindo: vómitos persistentes, atraso no crescimento, dor abdominal ou pirose, hemorragia gastrointestinal, disfagia e broncospasmo (2). Quando à DRGE se associa a presença de hérnia do hiato ou quando a terapêutica médica falha, o tratamento
indicado é a cirurgia anti-refluxo (3). A fundoplicatura de Nissen
(aberta ou laparoscópica) é uma das cirurgias mais realizadas
por cirurgiões pediatras (Figura 1) (4). A primeira fundoplicatura de
Nissen laparoscópica foi realizada no adulto em 1991, e 2 anos
depois, na criança (5).
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 131-134
__________
1
2
3
S. Cirurgia Pediátrica, CH Porto
Instituto de Investigação em Ciências da Saúde e da Vida, Escola de
Ciências da Saúde , U Minho
S. Gastroenterologia Pediátrica, CH Porto
Figura 1 – Imagem endoscópica de uma fundoplicatura de Nissen, com
as típicas pregas do fundo gátrico torcidas à volta do endoscópio em
retroversão.
artigo original
original article
131
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
A incidência de recorrência do refluxo gastro-esofágico
(rRGE) em doentes submetidos a procedimentos anti-refluxo varia entre 3,2% e 45% (6, 7). Vários factores de risco para rRGE
têm sido apontados: compromisso neurológico grave, existência
de patologia pulmonar prévia, idade precoce, história de malformações esofágicas congénitas, presença de hérnia do hiato,
vómito forçado (retching) pós-operatoriamente, a colocação de
gastrostomia prévia ou durante a cirurgia anti-refluxo e a necessidade de dilatações no período pós-operatório (8-13). No entanto,
os estudos publicados não são concordantes na definição dos
factores mais determinantes, nem sobre a estratégia a determinar nesses casos específicos (13).
O objectivo deste estudo foi perceber em que doentes submetidos a cirurgia anti-refluxo será mais provável a recorrência
da doença e porquê, de forma a saber se existe alguma sub-população de doentes que mereça uma abordagem alternativa
à fundoplicatura de Nissen.
MATERIAL E MÉTODOS
Foi realizada uma análise retrospectiva dos processos dos
doentes submetidos a fundoplicatura de Nissen entre Fevereiro de 2000 e Março de 2009, no nosso Hospital Pediátrico. Os
doentes foram distribuidos por dois grupos: doentes com recorrência da doença (rRGE) e os doentes sem rRGE (controlo). Os
critérios de inclusão no grupo de rRGE foram: re-operação por
recorrência do RGE, RGE confirmado por endoscopia alta ou
outro exame auxiliar de diagnóstico, reinstituição de terapêutica
anti-refluxo por mais de 8 semanas após a cirurgia.
Os dois grupos foram posteriormente comparados quanto
ao sexo, idade e percentil de peso à data da cirurgia, à presença
de hérnia do hiato ou outras comorbilidades, à presença de compromisso neurológico grave, à história de convulsões, de medicação pulmonar crónica, de necessidade de O2 e/ou antibióticos
cronicamente no período pré-operatório, à técnica usada (aberta
ou laparoscópica), à colocação de gastrostomia (prévia ou simultaneamente). Para efeitos de comparação estatística foi usado o
teste exacto de Fischer, considerando-se significado estatístico
quando p<0,05.
crianças com compromisso neurológico grave, que representam
24-54% dos doentes pediátricos submetidos a fundoplicatura,
têm um risco maior de rRGE (2). No entanto, alguns estudos recentes apontam para o facto de o compromisso neurológico grave não ser um factor de risco independente para rRGE, sendo-o
apenas quando associado a convulsões (12, 14). Em 2007, Ngerncham et al. levaram a cabo um estudo retrospectivo de 116 casos
e 209controlos emparelhados para o cirurgião, para o tipo de
procedimento (aberto/laparoscópico), técnica (parcial/completa),
e data aproximada da intervenção (13). Este estudo concluiu que
são factores de risco independente para rRGE a idade menor
que 6 anos, a presença de hérnia do hiato, o vómito forçado pós-operatório e a dilatação esofágica. Mais, o estudo afirma que
o compromisso neurológico não é só por si um factor de risco
para rRGE.
O objectivo principal do nosso estudo foi perceber se, na
nossa população, alguns dos factores descritos representam risco para rRGE. Não foi incluído nos parâmetros avaliados o vómito forçado pós-operatório. Este conceito traduzido do Inglês retching é um comportamento mal definido, que parece ter origem
neurológica central e é comum nos doentes neurológicos graves,
quer pré- quer pós-operatoriamente (15). Na maioria das vezes ele
é confundido com engasgamento ou expressões faciais de dor e
é desvalorizado pelos pais e pelos clínicos. Daí que, não poderíamos afirmar com certeza que eles não existissem só pelo facto
de não os vermos registados no no processos clínico.
A taxa de incidência de rRGE encontrada no nosso estudo
(15,4%) é baixa. Se tivermos em conta apenas os doentes neurologicamente comprometidos operados (n=48), a taxa de inci-
Quadro I – Comparação entre doentes com recorrência da doença (rRGE) e os doentes sem rRGE (controlo).
rRGE
n=10
Controlo
n=55
Fisher
P
Sexo masculino
40% (4)
55,6% (30)
0,287
RESULTADOS
Durante o período em análise, 65 crianças foram submetidas a fundoplicatura de Nissen na nossa Instituição. Dez doentes
foram incluídos no grupo rRGE, o que equivale a uma incidência
de recorrência de 15,4%. Destes, dez tinham exames auxiliares de diagnóstico que mostravam a rRGE, dez necessitaram
de retomar medicação anti-refluxo e três foram reoperados por
rRGE. Todas as revisões de fundoplicatura foram realizadas por
via laparotómica.
Os parâmetros comparados estão resumidos no Quadro 1.
Nenhum dos doentes em rRGE tinha doença muscular ou doença cardíaca.
Idade <6 anos
40% (4)
31,5% (17)
0,425
Peso P<3
40% (4)
66,7% (36)
0,108
Hérnia do hiato
50% (5)
44,4% (24)
0,505
Atrésia do esófago
10% (1)
5,6% (3)
0,502
Compromisso neurológico
60% (6)
77,8% (42)
0,209
Convulsões
40% (4)
53,7% (29)
0,325
Medicação pulmonar crónica
40% (4)
33,3% (18)
0,471
O2 pré-operatório
10% (1)
9,3% (5)
0,659
ATB cronicamente pré-op.
10% (1)
13% (7)
0,635
DISCUSSÃO
Os factores de risco para recorrência de DRGE têm sido
alvo de um intenso debate. Tem sido genericamente aceite que
Laparoscopia
50% (5)
70,4% (38)
0,184
Gastrostomia prévia/simultânea
50% (5)
13% (7)
0,015
132
artigo original
original article
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
dência de rRGE é de apenas 12,5%. Por outro lado, a taxa de
incidência naqueles que necessitaram gastrostomia (n=12) sobe
para 41,7%. Estes valores não surpreendem, pois não diferem
do que é referenciado na literatura (6, 7, 15).
No nosso estudo, foi apenas possível estabelecer uma relação com significado estatístico (p<0,05) entre rRGE e a colocação de gastrostomia prévia ou simultaneamente à fundoplicatura
(Figura 2). Jolly et al. relacionam a colocação de tubo de gastrostomia com alterações nas pressões do esfíncter esofágico
inferior e que estas poderiam ser a causa do aumento de RGE
(11)
. Noutro estudo, os autores sugerem mesmo a confecção de
uma fundoplicatura profiláctica nos doentes com gastrostomia
(16)
. Este procedimento está longe de ser consensual, havendo
vários autores que defendem que o procedimento aumenta a
morbilidade cirúrgica, devendo ser reservado aos doentes que
mantêm RGE após a colocação do tubo de gastrostomia (17).
al. recomendam a dissociação esofago-gástrica total (DEGT) (18).
Esta técnica, que consiste na secção da junção esofago-gástrica
com posterior anastomose do esófago distal a uma ansa de jejuno em Y de Roux, tem uma pequena percentagem de complicações e uma incidência de rRGE de 0%. No entanto, trata-se
de uma cirurgia mais longa e agressiva do ponto de vista cirúrgico, exigindo três a cinco dias de internamento até a alimentação
ser restabelecida pela sonda de gastrostomia. Recentemente,
Boubnova et al. conseguiram fazer este procedimento, também
chamado de procedimento de Bianchi, por via laparoscópica em
duas crianças (20). Esta poderá ser uma boa opção em crianças
neurologicamente comprometidas com RGE dependentes de
sonda de gastrostomia para alimentação.
CONCLUSÕES
A fundoplicatura de Nissen tem uma pequena incidência
de rRGE. Esta é maior nos doentes a quem foi colocada gastrostomia prévia ou simultaneamente. Esta pode ser interpretada
como um sinal indirecto de um compromisso neurológico mais
grave, embora não fosse encontrado significado estatístico para
os restantes parâmetros comparados. Serão necessários mais
estudos e com um maior número de casos para conclusões mais
seguras.
RECURRENCE OF GASTROESOPHAGEAL REFLUX AFTER
FUNDOPLICATION IN A PAEDIATRIC POPULATION
Figura 2 – Imagem endoscópica de uma hérnia do hiato vista através de
um endoscópio introduzido através da gastrostomia.
Por outro lado, a necessidade de gastrostomia pode ser vista como um sinal indirecto da gravidade do compromisso neurológico. Analisando os dados recolhidos não foi possível graduar
o compromisso neurológico, mas a necessidade de gastrostomia
reflecte uma incapacidade na deglutição que geralmente está
presente nos casos mais graves. Para estes doentes, Morabito et
ABSTRACT
Introduction and aim: Nissen fundoplication is the standard treatment of hiatal hernia repair and treatment of gastroesophageal reflux resistant to medical therapy. Recurrence of the
disease (rGER) is a common problem. The aim of this study was
to understand in which patients rGER will most probably appear
and why.
Material and methods: Retrospective analysis of the charts
of patients submitted to Nissen fundoplication between February
2000 and March 2009 in our Hospital. Patients were divided in:
rGER group and control group (without rGER). We compared
both groups, concerning gender, age, and weight at the time of
surgery, diagnosis of hiatal hernia, other comorbidities, presence
of severe neurological failure, frequent seizures, chronic pulmonary medication, O2 supplementation, and/or chronic antibiotherapy pre-operatively, surgical technique (open or laparoscopic),
gastrostomy tube placement, using exact Fischer’s test.
Results: 65 patients were submitted to Nissen fundiplication. Ten patients were included in the rGER group (15,4%). After
analyzing the above parameters, we found only find statistical
significance for gastrostomy tube placement previous or simultaneously to the fundoplication (50% in rGER group versus 13% in
control group, p=0,015).
Conclusions: In our study, rGER was higher in patients in
whom a gastrostomy tube was placed previous or simultaneously. This could be an indirect sign of a worse neurological impair,
although no statically difference was found in the other param-
artigo original
original article
133
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
eters. Further studies with more cases will be necessary for more
reliable conclusions.
Keywords: Adolescent, child, gastroesophageal reflux, gastrostomy, hiatal hernia, mentally disabled persons, recurrence.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 131-134
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CORRESPONDÊNCIA
João Moreira-Pinto
E-mail: [email protected]
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Hemoglobinúria paroxística ao frio:
quando suspeitar?
Catarina Matos1, Sandra Teixeira1, Susana Lira1, Emília Costa 2, José Barbot 2
RESUMO
Introdução: A hemoglobinúria paroxística ao frio é uma forma rara de apresentação de anemia hemolítica auto-imune.
Caso Clínico: Descreve-se o caso de uma criança, de 23
meses de idade, com icterícia e urina escura de início súbito. Havia referência a infecção das vias respiratórias superiores uma
semana antes. Apresentava anemia grave com hemoglobinúria.
A DHL era elevada e a prova de Coombs directa era positiva
com especificidade anti-C3d. A positividade da prova de Donath-Landsteiner, ao demonstrar o carácter bifásico do autoanticorpo,
confirmou o diagnóstico de hemoglobinúria paroxística ao frio.
Conclusão: Com este caso os autores pretendem realçar
a importância do reconhecimento desta patologia e do seu carácter de hemólise intra-vascular, de forma a contribuir para um
diagnóstico e tratamento mais rápidos.
Palavras-chave: Exposição ao frio, hemoglobinúria paroxística ao frio, hemólise intra-vascular, idade pediátrica.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 135-137
INTRODUÇÃO
A hemoglobinúria paroxística ao frio (HPF), apesar de rara, é
uma das causas mais comuns de anemia hemolítica auto-imune,
representando 30% dos episódios em idade pediátrica(1-3).
Descrita pela primeira vez em 1872, em associação com
a sífilis, é em 1902, com Donath e Landsteiner, que é compreendida a sua fisiopatologia com a descoberta da hemolisina de
Donath-Landsteiner, um autoanticorpo IgG com especificidade
anti-P. Actualmente, a associação com a sífilis congénita ou adquirida é rara, em grande parte devido à diminuição da incidência
desta patologia (1,2).
Em termos clínicos, caracteriza-se por hemólise intravascular de inicio súbito, com anemia e hemoglobinúria, minutos ou
horas após exposição ao frio. A maioria dos episódios são auto-limitados e precedidos de infecções víricas inespecíficas (1,2).
Em termos fisiopatológicos, a hemólise intravascular ocorre pela formação de um autoanticorpo policlonal IgG dirigido,
na grande maioria dos casos, contra o antigénio P presente na
membrana dos eritrócitos- hemolisina de Donath-Landsteiner.
__________
1
2
S. Pediatria, U Padre Américo, CH Tâmega e Sousa
U. Hematologia Pediátrica, H Maria Pia, CH Porto
Esta hemolisina surge sete a dez dias após a infecção vírica e
persiste seis a doze semanas. Caracteriza-se por um comportamento térmico bifásico. A baixas temperaturas liga-se ao antigénio eritrocitário e fixa grandes quantidades de complemento.
A temperaturas mais elevadas o complemento fixado provoca
hemólise dos eritrócitos. Este diferencial térmico ocorre quando
perifericamente existe uma exposição ao frio com posterior retorno do sangue à circulação central (1,2,4).
Apresenta-se um caso de uma criança que desenvolveu
uma HPF e fazem-se algumas considerações quanto à melhor
orientação diagnóstica e tratamento.
CASO CLÍNICO
Criança, sexo masculino, 23 meses de idade, previamente
saudável, que recorre ao serviço de urgência do hospital da área
da residência, no mês de Dezembro, com quadro de icterícia,
anorexia e irritabilidade com 24 horas de evolução a que posteriormente se associou urina muito escura. Referência a infecção
das vias respiratórias superiores uma semana antes. Sem história aparente de exposição ao frio. Os exames complementares
iniciais revelaram: hemoglobina- 6,9g/dL, reticulócitos- 125 000/
uL, leucócitos- 11 700/uL (59,7% neutrófilos; 31,7% linfócitos),
plaquetas- 291 000/uL. Na bioquímica destaca-se: bilirrubina
total- 2,7mg/dL (directa-0,6mg/dL), ureia- 55mg/dL, creatinina0,5mg/dL, aspartato aminotransferase (AST)-64UI/L, alanina
aminotransferase (ALT)-18UI/L, desidrogenase láctica (DHL)- 2
290UI/L. O esfregaço de sangue periférico não apresentava alterações significativas. A tira teste urinária apresentava-se reactiva para hemoglobinúria/hematúria. O sedimento urinário não
apresentava eritrocitúria. O estudo da coagulação era normal.
O teste anti-globulina directo era positivo, selectivamente para
anticorpos monoespecíficos anti-C3d. As serologias para citomegalovírus, vírus Epstain- Barr, vírus herpes, hepatite A, B e C
eram negativas.
Foi transferida para a Unidade de Hematologia Pediátrica
para estudo de anemia hemolítica auto-imune. A suspeita do
diagnóstico de HPF foi confirmado pela positividade do teste de
Donath-Landsteiner.
Foi adoptada uma atitude expectante com manutenção em
ambiente aquecido, reforço hídrico e registo da diurese (1).
Durante o internamento observou-se uma normalização
progressiva da hemoglobina e dos marcadores de hemólise.
Como única intercorrência registou-se, em D6 de internamento,
a subida ligeira dos valores de creatinina (máximo de 0,65mg/
casos clínicos
case reports
135
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
dL), que resolveu rapidamente após reforço da hidratação. Teve
alta após 14 dias de internamento, clinicamente bem, com indicação de evicção de frio. Não foram registadas recidivas ou
qualquer outra complicação.
DISCUSSÃO
No caso clínico exposto, existiu, desde o início, uma forte
presunção do carácter hemolítico e auto-imune da anemia grave
que apresentava. A tríade clássica de anemia hemolítica - anemia, reticulocitose e hiperbilirrubinemia estava presente. Por outro lado, a positividade do teste de Coombs sugeria uma etiologia
auto-imune. O seu quadro hematológico revelava indicadores
adicionais que permitiam um raciocínio mais abrangente. O aspecto fortemente colúrico da urina - “urina cor coca-cola”-, a significativa elevação de DHL, em contraste com o carácter ligeiro da
hiperbilirrubinemia e a elevação da TGO, com uma normalidade
da TGP, sugeriam um mecanismo de hemólise intra-vascular. O
sedimento urinário reforçava este raciocínio, na medida em que
demonstrava que a coloração da fita teste urinária na zona da
hematúria/hemoglobinúria se devia a esta última, dada a ausência de eritrocitúria. A documentação do carácter intra-vascular
de uma hemólise é muito importante, na medida em que reduz
o leque de diagnósticos diferenciais. No caso presente, a positividade do teste de Coombs, selectivamente com soro monoespecífico anti-C3d, sugeria fortemente o diagnóstico de HPF. O
teste de Donath-Landsteiner, ao demonstrar o carácter bifásico
do anticorpo em causa, veio a confirmá-lo (1, 2, 4, 5, 7).
O teste consiste na visualização de hemólise de eritrócitos,
normais e do doente, suspensos em plasma do doente em vários
tubos submetidos a perfis térmicos diferentes. A hemólise é observável nos tubos previamente incubados a 4ºC com posterior
aquecimento a 37ºC.
Como eventual factor desencadeante da produção do anticorpo regista-se uma intercorrência infeciosa vírica das vias
respiratórias superiores uma semana antes. Apesar de não haver referência a um episódio particular de exposição ao frio é de
referir que a situação ocorreu no mês de Dezembro (8).
O tratamento consiste na evicção do frio, fluidoterapia e vigilância da normalização dos valores analíticos. Pode haver a
necessidade de transfusões quando anemia grave ou de agravamento rápido (1).
Apesar de apresentar uma anemia grave (Hb-6,9g/dL) foi
decidido não proceder a transfusão de concentrado eritrocitário.
Esta decisão baseou-se na convicção do carácter auto-limitado
da hemólise, reforçada pelo facto de o doseamento da DHL ter
diminuído em cerca de 60% no espaço de 24h e da curva decrescente do valor da hemoglobina ter sido interrompida. Por outro lado, verificou-se que, no dia seguinte ao internamento, a reticulocitose já era marcada. No entanto, caso a transfusão fosse
considerada mandatória, por certo que não existiriam problemas
transfusionais relevantes mesmo face à transfusão de sangue
P positivo desde que fosse salvaguardada a não exposição do
sangue a temperaturas baixas.
O aumento ligeiro dos valores de creatinina, rapidamente
corrigido pelo reforço hídrico, reflecte a deposição do pigmento
136
casos clínicos
case reports
da hemoglobina nos tubúlos renais e a sua toxicidade. Se não
tivesse sido rapidamente revertida, esta situação poderia ter levado a insuficiência renal aguda, complicação rara mas possível
num processo de hemólise intravascular grave. Esta situação
alerta-nos para a importância da monitorização da diurese e função renal. O reforço hídrico assim como a alcalinização da urina
constituem medidas a ponderar.
Concluindo, a HPF é uma patologia cujo quadro agudo pode
ser de extrema gravidade e até mesmo potencialmente fatal. No
entanto, uma vez ultrapassada a fase aguda, tem um prognóstico excelente. Na maioria dos casos, o episódio de hemólise
intravascular é de curta duração, resolvendo geralmente em menos de um mês, com normalização dos valores de hemoglobina
e marcadores de hemólise. É neste contexto que, a evicção do
frio e a monitorização clínica e analítica durante o episódio agudo, são da maior importância. Para isso, é importante promover
a sua acuidade diagnóstica, já que o seu carácter auto-limitado
a torna uma patologia susceptível de ser sub-diagnosticada. As
recidivas são raras (2, 6).
PAROXISMAL COLD HEMOGLOBINURIA:
WHEN TO SUSPECT?
ABSTRACT
Introduction: The paroxysmal cold hemoglobinuria is a
rare form of presentation of autoimmune hemolytic anemia.
Case report: We describe the case of a 23 months-old child
with jaundice and dark urine of sudden onset. There was reference to upper respiratory infection a week earlier. He presented
severe anemia with hemoglobinuria. DHL was rised and the direct Coombs test was positive with specific anti-C3d. The positive
of Donath-Landsteiner proof, to demonstrate the biphasic nature
of the autoantibody, confirmed the diagnosis of paroxysmal cold
hemoglobinuria.
Conclusion: With this case report the authors aim to highlight the importance of recognizing this condition and the character of intravascular hemolysis, so that quicker diagnosis and
treatment can be made.
Keywords: Cold exposure, paroxysmal cold hemoglobinuria, intravascular hemolysis, pediatric age.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 135-137
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CORRESPONDÊNCIA
Catarina Matos
E-mail: [email protected]
casos clínicos
case reports
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Sequestro Vascular Intralobar:
apresentação no primeiro ano de vida
Helena M. Silva1, Marília Loureiro2, José Monterroso3, Jorge Moreira3, Rodrigues de Sousa3, Sílvia Álvares2
RESUMO
Introdução: O sequestro pulmonar é uma malformação
rara caracterizada por uma massa de tecido pulmonar não funcionante que recebe irrigação arterial proveniente de uma artéria
sistémica. Pode classificar-se em sequestro intralobar e sequestro extralobar. Os sequestros intralobares raramente são diagnosticados nos lactentes.
Caso clínico: Descrevemos o caso clínico de um lactente
de dois meses de idade, com quadro de insuficiência cardíaca
congestiva, cuja investigação revelou a presença de um sequestro intralobar. O cateterismo cardíaco confirmou a presença de
vaso anómalo com origem na porção inferior da aorta torácica
irrigando o lobo pulmonar inferior esquerdo. Foi submetido a lobectomia do lobo inferior esquerdo e laqueação do vaso, com
resolução do quadro.
Discussão/Conclusão: O sequestro pulmonar intralobar é
uma causa pouco frequente de insuficiência cardíaca no lactente.
O diagnóstico requer um elevado grau de suspeição clínica para
que seja instituído o tratamento eficaz e de forma atempada.
Palavras-chave: Insuficiência cardíaca congestiva, malformação broncopulmonar, sequestro intralobar, doença vascular.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 138-141
INTRODUÇÃO
O sequestro pulmonar é uma anomalia congénita rara,
integrada no espectro de malformação broncopulmonares, correspondendo a 0,15-6,4% de todas as malformações (1,2,3). É caracterizado por uma massa de tecido pulmonar não funcionante
que recebe a sua vascularização através de uma artéria sistémica e não tem comunicação com a árvore traqueobrônquica(1,2).
A localização mais frequente é nos segmentos basais medial
ou posterior do lobo inferior esquerdo (LIE) (4). A etiologia dos
sequestros pulmonares tem sido objecto de discussão. A teoria
mais amplamente aceite sugere que resulta da formação de um
esboço pulmonar acessório em posição caudal com os esboços
pulmonares normais, o que acontecerá entre a quarta e oitava
semanas de gestação (5).
___________
1
2
3
S. Pediatria, H Maria Pia, CH Porto
S. Cardiologia Pediátrica, H Maria Pia, CH Porto
S. Cardiologia Pediátrica, CH São João, Porto
138
casos clínicos
case reports
Tendo por base a relação com a pleura, são divididos em
sequestros extralobares e intralobares. Os sequestros intralobares são os mais comuns e a malformação encontra-se incorporada no parênquima pulmonar normal e recoberta por pleura
visceral.
Os sequestros extralobares constituem 25% de todos os
sequestros pulmonares. Localizam-se exteriormente à pleura visceral, acima do diafragma e em mais de 60% dos pacientes coexistem outras anomalias congénitas. São mais frequentemente
diagnosticados no período neonatal, podendo ainda ser detectadas através de ecografia realizada durante a gestação(2,5,6).
Nas duas formas de sequestro a vascularização arterial
provém da circulação sistémica, mais frequentemente da aorta
descendente. A drenagem venosa é, no caso dos sequestros intralobares para o território pulmonar e, no caso dos sequestros
extralobares, para uma veia sistémica (ázigos, hemiázigos ou
veia cava inferior) (2,3).
A história natural dos sequestros intralobares é variável.
Raramente se manifestam clinicamente antes dos dois anos de
idade. Apresentam-se sob a forma de pneumonia crónica ou recorrente na criança e adolescente (2,3,6). Metade dos casos atinge
os 20 anos de idade antes que o diagnóstico seja estabelecido(6).
O diagnóstico preciso requer um elevado índice de suspeição
associado à visualização de uma artéria sistémica anómala. O
tratamento consiste na ressecção cirúrgica.
Descrevemos o caso clínico de um sequestro intralobar
com apresentação sob a forma de insuficiência cardíaca congestiva nos primeiros meses de vida.
CASO CLÍNICO
Lactente do sexo masculino, filho de pais consanguíneos
(etnia cigana). A gestação foi de 36 semanas, sem intercorrências e com ecografias pré-natais normais. As serologias maternas para grupo TORCH, VIH, e AgHBs não indicavam infecção
activa. O parto foi eutócico, hospitalar, com Apgar de 9/10 ao 1´ e
5´ respectivamente e com uma somatometria adequada à idade
gestacional. O período neonatal decorreu sem intercorrências.
Aos dois meses de idade foi referenciado à consulta de
Cardiologia Pediátrica por apresentar um sopro cardíaco.
Ao exame objectivo apresentava um aspecto emagrecido (peso=3400gr, P<5), palidez cutânea, fácies incaracterístico.
SpO2 em ar ambiente de 100%, FC 156bpm, TA 60/37mmHg.
Apresentava sinais de dificuldade respiratória ligeira com tiragem
subcostal e polipneia; sem cianose. Na auscultação pulmonar os
NASCER E CRESCER
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
sons respiratórios eram presentes bilateralmente, sem ruídos adventícios; auscultação cardíaca com S1 e S2 presentes e rítmicos
e um sopro sistólico grau III/VI mais audível no bordo esternal esquerdo com irradiação para todo o precórdio. O bordo hepático era
palpável 3cm abaixo do rebordo costal na linha médio clavicular
direita. Os pulsos femorais eram normais e simétricos.
A radiografia de tórax (Figura 1) revelou cardiomegalia com
hipervascularização pulmonar, associado à presença de uma hipotransparência parahilar com extensão à região retrocardíaca
esquerda. No ECG apresentava taquicardia sinusal. O ecocardiograma bidimensional/Doppler (Figura 2) mostrava a presença
de foramen oval patente, septo interventricular intacto, cavidades
esquerdas dilatadas, função biventricular normal, válvulas aurículo ventriculares e sigmoideias normais. Na parte média da aorta
Figura 1 - Radiografia de tórax antero-posterior. Cardiomegalia com hipervascularização pulmonar, associado à presença de uma hipotransparência parahilar com extensão à região retrocardíaca esquerda.
VD
VE
descendente torácica observava-se um vaso anómalo, que emergia da aorta para um circuito de baixa resistência com shunt contínuo, laminar compatível com colateral aorta-artéria pulmonar.
Foi medicado com terapêutica anticongestiva (diurético)
tendo tido resposta clínica favorável.
O cateterismo cardíaco (Figura 3) realizado aos sete meses
de idade confirmou a presença de colateral com 7mm de diâmetro, com origem na porção inferior da aorta torácica, dirigindo-se
para o LIE com drenagem para a aurícula esquerda (circulação
venosa pulmonar). A arteriografia pulmonar (Figura 4) mostrou
irrigação muito escassa para o parênquima pulmonar do LIE. Os
aspectos descritos confirmaram o diagnóstico de sequestro pulmonar.
Aos sete meses e meio foi submetido a laqueação da colateral e lobectomia do LIE por toracotomia. A cirurgia e o período
pós-operatório decorreram sem intercorrências, tendo tido alta ao
sexto dia. Actualmente, com 14 meses de idade encontra-se assintomático e sem necessidade de terapêutica cardiovascular.
DISCUSSÃO
O sequestro pulmonar é uma malformação congénita rara,
caracterizando-se por uma massa de tecido pulmonar não funcionante, que recebe a sua vascularização arterial da aorta
descendente. A drenagem venosa é feita através das veias pulmonares para a aurícula e ventrículo esquerdos. Deste modo,
ocorre um shunt esquerdo-direito, que dependendo do calibre do
vaso anómalo, poderá causar uma sobrecarga de volume nestas
câmaras, cursando com dilatação e insuficiência (9,10).
Radiograficamente podem-se apresentar sob a forma de hipotransparência homogénea com margens irregulares, ou sob a
forma de uma massa uniforme com contornos lisos ou lobulados,
localizada no segmento posterior do lobo inferior esquerdo. No
entanto, pode ser de difícil visualização na radiografia de tórax.
O Ecocardiograma com Doppler aumenta a acuidade diagnóstica, ao identificar ou elevar o grau de suspeição para a pre-
(Ao)
AD
AE
(a)
(b)
Figura 2 – Ecocardiograma. (a) Plano para esternal quatro câmaras: dilatação da aurícula e ventrículo esquerdo.
(b) Plano supraesternal a nível do arco aórtico: vaso anómalo (seta), que emerge da aorta (Ao) para um circuito
de baixa resistência com shunt contínuo laminar compatível com colateral aorta-artéria pulmonar.
AE, aurícula esquerda; VE, ventrículo esquerdo; AD, aurícula direita; VD, ventrículo direito.
casos clínicos
case reports
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
sença de uma artéria de vascularização do sequestro com origem sistémica, frequentemente a aorta torácica (2).
A angio-TC não foi realizada no caso clínico apresentado,
mas reveste-se de grande importância para orientação diagnóstica através da visualização das alterações do parênquima pulmonar e identificação do vaso arterial anómalo, auxiliando na
planificação do tratamento cirúrgico. O cateterismo cardíaco com
angiografia é um método de diagnóstico tradicional, que suporta
o diagnóstico permitindo igualmente a planificação cirúrgica (1,7).
A terapêutica dos casos sintomáticos consiste na ressecção cirúrgica precoce de forma a controlar os sintomas e evitar as complicações (1). A lobectomia, ao contrário da ressecção
segmentar, é o tratamento de eleição, e a identificação e laqueação do vaso anómalo torna-se parte fundamental do procedimento. Deste modo, a ressecção pulmonar em combinação com
a oclusão do vaso, são cruciais para o tratamento definitivo de
um quadro de insuficiência cardíaca resultante do sequestro
intralobar(2).
Figura 3 - Angiografia na aorta descendente. Presença de colateral
com 7mm de diâmetro, com origem na porção inferior da aorta torácica,
dirigindo-se para o lobo pulmonar inferior esquerdo.
CONCLUSÃO
O sequestro pulmonar intralobar é uma patologia congénita
rara, com uma apresentação clínica pouco frequente no primeiro
ano de vida. Acresce o facto de a forma de apresentação mais
frequente ser a infecção pulmonar de repetição. Neste caso clínico pretendemos realçar a necessidade um elevado grau de suspeição perante uma criança com quadro clínico de insuficiência
cardíaca congestiva, sem anomalias estruturais intracardíacas.
INTRALOBAR SEQUESTRATION PRESENTING IN THE
FIRST YEAR OF LIFE
ABSTRACT
Introduction: Pulmonary sequestration is a rare abnormality characterized by an area of non-functioning abnormal lung tissue, which receives its blood supply from a systemic artery. It is
divided into two subtypes: intralobar and extralobar sequestration. Intralobar sequestrations are rarely diagnosed in infancy.
Case report: We describe the case of a two-months old
child presenting with congestive heart failure, whose investigation revealed intralobar sequestration. Cardiac catheterization
confirmed the presence of a vessel arising from the descending
aorta to the inferior lobe of the left lung. He underwent surgical
lobectomy of the left lower lobe and occlusion of the feeding vessel, with clinical resolution.
Discussion/Conclusion: Intralobar pulmonary sequestration
is an uncommon cause of heart failure in the infant. Diagnosis
requires a high index of suspicion in order to prompt adequate
treatment.
Keywords: Broncho-pulmonary malformation, congestive
heart failure, intralobar sequestration, vascular disease.
Figura 4 - Arteriografia pulmonar. Irrigação muito escassa para o parênquima pulmonar do lobo inferior esquerdo.
140
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Nascer e Crescer 2012; 21(3): 138-141
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
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CORRESPONDÊNCIA
Helena Moreira da Silva
E-mail: [email protected]
casos clínicos
case reports
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revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Tuberculose e cancro – pior que um só dois!
Cristiana Couto1, Filipa Balona2, Maria João Sampaio3, Ana Torres4, Armando Pinto5, Ana Maia Ferreira5
RESUMO
Introdução: A tuberculose é um problema de saúde global
e crescente. A doença pulmonar primária é a forma mais comum
de apresentação da tuberculose activa. A tuberculose esquelética é pouco comum e representa 10 a 20% das formas extrapulmonares no doente imunocompetente. Quando existe imunossupressão, esta forma é mais frequente podendo estar presente,
de modo isolado ou em associação com tuberculose pulmonar,
em quase metade dos casos. A sua apresentação clínica é inespecífica e o diagnóstico diferencial inclui diversas patologias,
sendo essencial um elevado índice de suspeição.
Caso clínico: Os autores apresentam o caso clínico de
uma criança com tumor de Wilms, em tratamento com quimioterapia, que desenvolveu tuberculose óssea.
Discussão: Salienta-se a importância do diagnóstico diferencial da tuberculose com doença oncológica (primária ou secundária), a limitação dos métodos imagiológicos, a importância
da confirmação diagnóstica através de estudos histopatológicos
e microbiológicos, e a necessidade de um plano terapêutico adequado e o mais precoce possível.
Palavras-chave: Neoplasias, tumor de Wilms, neoplasias
ósseas, tuberculose osteoarticular.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 142-144
INTRODUÇÃO
A tuberculose, que adquiriu maior importância nos últimos
anos pela resistência aos fármacos e pela predilecção pelos imunodeprimidos (1), é uma preocupação global (1,2). A sua incidência
crescente tem sido atribuída à infecção pelo vírus da imunodeficiência humana, imigração, más condições sociais e menor implementação dos programas de controlo (2,3). A doença pulmonar
primária é a forma mais comum de apresentação da tuberculose
activa (1). A tuberculose esquelética é pouco comum e representa
10 a 20% das formas extrapulmonares e 1 a 2% de todos os casos de tuberculose (2). No doente imunodeprimido, esta forma é
mais frequente podendo estar presente, de modo isolado ou em
__________
1
2
3
4
5
S. Pediatria, U Guimarães, CH Alto Ave
S. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia-Espinho
S. Pediatria, U Padre Américo, CH Tâmega e Sousa
S. Pediatria, H Viana do Castelo, ULS Alto Minho
S. Pediatria, IPOFG, Porto
142
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
associação com tuberculose pulmonar, em quase metade dos
casos (4). O seu diagnóstico diferencial inclui uma multiplicidade
de infecções (bacterianas, víricas e fúngicas), doenças autoimunes e neoplásicas, entre outras (1), pelo que um elevado índice
de suspeição é essencial para o diagnóstico precoce e para o
tratamento e cura da doença (2). Os autores apresentam o caso
clínico de uma criança com doença oncológica na qual, durante
o tratamento com quimioterapia, a infecção pelo Mycobacterium
tuberculosis foi considerada como causa possível de queixas
osteoarticulares “de novo”. Discutem-se as dificuldades diagnósticas, nomeadamente no que respeita ao diagnóstico diferencial
com doença metastática.
CASO CLÍNICO
Criança do sexo feminino, cinco anos, raça caucasiana,
natural e residente em Vila Nova de Gaia. Antecedentes patológicos, pessoais e familiares, irrelevantes. Em Novembro de 2008
é referenciada pelo hospital da área de residência para o Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil – Porto (IPOPFG)
por massa retroperitoneal, com o diagnóstico subsequente de
nefroblastoma do pólo superior do rim direito; o estadiamento
revela tratar-se de doença localizada. Inicia quimioterapia neo-adjuvante com actinomicina D e vincristina de acordo com o
protocolo da International Society of Paediatric Oncology (SIOP)
de 2001. Subsequentemente realiza exérese cirúrgica que inclui
nefroureterectomia direita. O exame anátomo-patológico revela
nefroblastoma de risco intermédio, do tipo regressivo no estadio
III, com base na classificação pós-tratamento, o que traduz uma
boa resposta à quimioterapia num tumor localmente avançado.
Prossegue tratamento com quimioterapia sistémica (actinomicina D, vincristina e doxorrubicina) e radioterapia do leito tumoral.
Em Abril do ano seguinte, em consulta de seguimento, refere dor
na região inguinal direita e claudicação da marcha, de carácter
intermitente. O exame objectivo revela dor desencadeada pela
rotação interna da articulação coxofemural direita. Considerando o carácter intermitente das queixas, adopta-se uma atitude
expectante. Na reavaliação após dois meses observa-se persistência da claudicação da marcha, ainda intermitente, nesta altura
associada a dor na região anterior e proximal da perna direita.
O exame objectivo demonstra dor à palpação da metade proximal da tíbia direita. Face à persistência das queixas, colocam-se como principais hipóteses de diagnóstico: doença óssea
metastática, artrite reactiva, infecção osteoarticular e neoplasia
primária musculo-esquelética. É realizado estudo complementar
NASCER E CRESCER
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
tização abdominal, nomeadamente hepática. A telerradiografia
e tomografia computorizada (TC) torácicas excluem alterações
pleuroparenquimatosas, de carácter metastático ou infeccioso.
Para esclarecimento etiológico realiza-se biópsia óssea guiada
por imagem: a citologia é inconclusiva, a histologia mostra escasso infiltrado inflamatório e ausência de células neoplásicas, e
o estudo microbiológico é negativo. Optou-se por biópsia óssea
cirúrgica no sentido de aumentar a representatividade da amostra: a histologia mostra fragmentos ósseos com focos de osteonecrose e espaços intertrabeculares preenchidos por exsudado
fibrinoleucocitário com espaços vasculares ectasiados, sem sinais de malignidade; o estudo microbiológico apresenta imunocitoquímica negativa, cultura em Lowenstein-Jensen negativa e
reacção em cadeia da polimerase (PCR) para Mycobacterium
tuberculosis complex positiva. Perante o
diagnóstico de tuberculose óssea, a criança
inicia terapêutica antituberculosa, incluindo
dois meses de terapêutica quádrupla (isoniazida, rifampicina, pirazinamida e etambutol) e, subsequentemente, dez meses
de terapêutica dupla (isoniazida e rifampicina). O rastreio de conviventes (realizado
no Centro de Doenças Pulmonares) foi
negativo. Actualmente, a criança encontra-se em seguimento no IPOPFG após terminar quimioterapia adjuvante em Agosto de
2009, sem recidiva local da doença oncológica ou sinais de metastização à distância.
Cumpriu terapêutica antituberculosa, com
melhoria sintomática significativa; o estudo
imagiológico demonstra alterações sugestivas de resolução do processo infeccioso
Figura 2 – Cintigrafia óssea: focos de hiperfixação dos difosfonatos na
e a cintigrafia óssea apresenta distribuição
extremidade proximal da tíbia direita, suspeitos de traduzir metástases.
do radiofármaco normal para a idade. DeRestante distribuição do radiofármaco normal para o grupo etário.
senvolveu sintomatologia dispéptica como
efeito adverso atribuível à terapêutica antituberculosa que controlou com inibidor da
bomba de protões.
Discussão: As neoplasias renais representam 6,3% dos tumores malignos
diagnosticados em menores de 15 anos de
idade (5), sendo o tumor de Wilms a forma
mais comum (1,5,6,7). Este ocorre sobretudo
em crianças menores de cinco anos (5) e
habitualmente manifesta-se sob a forma de
uma massa abdominal assintomática (6). Nos
centros europeus, o tratamento baseia-se
na quimioterapia pré-operatória, cirurgia e
tratamento pós-operatório que depende do
estadiamento (8,9). Actualmente a taxa de
sobrevida global ronda os 85% (6). O local
de metastização mais comum é o pulmão,
seguindo-se os gânglios linfáticos e fígado(9).
Figura 1 – RM da perna direita: diáfise proximal da tíbia direita com área
O tumor de Wilms raramente metastiza para
de ocupação da medular óssea que capta contraste, sugestiva de infiltração metastática. Sem outras alterações relevantes.
o osso, medula óssea ou cérebro (9).
analítico, incluindo hemograma e bioquímica sérica, de que se
salientam anemia (hemoglobina 9,7 g/dl), normocítica normocrómica, e elevação discreta dos marcadores de citólise hepática
(TGO e TGP), alterações expectáveis e não valorizáveis numa
criança em quimioterapia. Serologias para citomegalovírus, vírus
Epstein-Barr, vírus herpes simples e vírus da hepatite A, sem alterações sugestivas de infecção recente. Prova de Mantoux, negativa. Do estudo imagiológico destacam-se: telerradiografia da
anca e perna direitas sem alterações osteoarticulares valorizáveis; ressonância magnética (RM) da perna direita com alteração
de sinal na diáfise proximal da tíbia (Figura 1); e cintigrafia óssea
com foco de hiperfixação na extremidade proximal da tíbia direita, suspeitos de traduzir metástases (Figura 2). A ecografia abdominopélvica exclui recidiva local da doença neoplásica ou metas-
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
143
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
No caso apresentado, o estadiamento inicial do nefroblastoma revelou tratar-se de doença localizada. Não obstante, durante o período de terapêutica adjuvante, o aparecimento
de queixas álgicas osteoarticulares obrigou à consideração da
hipótese de metastização óssea. Na ausência de metastização
para outras localizações, foram consideradas outras hipóteses
nomeadamente a infecção osteoarticular, facilitada pela imunossupressão. A radiografia do osso envolvido pode ser útil, mas é
inespecífica (10) e neste caso foi normal. A RM da perna direita
e a cintigrafia óssea foram sugestivas de infiltração metastática
na tíbia direita. Todavia, apesar da importância reconhecida à
RM nestes casos, a ausência de achados patognomónicos obriga a outros testes para confirmação diagnóstica (10). Os exames
histológico e microbiológico são importantes para o diagnóstico, especialmente em associação com técnicas de detecção por
PCR(10). A colheita de tecidos por técnicas minimamente invasivas, guiadas por imagem, é actualmente o gold standard (10). No
doente imunodeprimido é frequente a anergia tuberculínica, os
granulomas são escassos, mal circunscritos, por vezes inexistentes, podendo também faltar a necrose caseosa (4). O prognóstico é habitualmente bom com o tratamento correcto; pode ocorrer incapacidade residual funcional, habitualmente resultando no
atraso diagnóstico (3).
Os autores pretendem reforçar a importância do reconhecimento da infecção por Mycobacterium tuberculosis nas crianças
sob terapêutica imunossupressora, mesmo na presença de manifestações clínicas frustres, evidenciando a importância do seu
diagnóstico diferencial com doença oncológica (primária ou secundária) (10,11), num contexto epidemiológico adequado, ou seja,
residência em área geográfica entre as de maior incidência (12).
TUBERCULOSIS AND CANCER – WORSE THAN ONE ONLY
TWO!
ABSTRACT
Introduction: Tuberculosis is a global and growing health
problem. Primary pulmonary disease is the most common form
of presentation of active tuberculosis. The skeletal tuberculosis is
uncommon and represents 10 to 20% of extrapulmonary disease
in immunocompetent individuals. In immunosupressed patients,
bone involvement is more common, either singly or in association with pulmonary tuberculosis, reaching half of the cases. Its
clinical presentation is nonspecific and the differential diagnosis
includes several pathologies, therefore a high index of suspicion
is required.
Case report: The authors report the clinical case of a child
with Wilms’ tumor who was diagnosed with bone tuberculosis
during the treatment of nephroblastoma.
Discussion: It is emphasized the importance of differential
diagnosis of tuberculosis with malignancy (primary or secondary),
the limitation of imaging methods, the importance of diagnostic
confirmation by histopathological and microbiological studies,
and the need for an appropriate treatment plan and as early as
possible.
Keywords: Neoplasms, Wilms tumor, bone neoplasms, osteoarticular tuberculosis.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 142-144
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CORRESPONDÊNCIA
Cristiana Couto
E-mail: [email protected]
AGRADECIMENTOS
À Dra. Lucília Norton.
144
ciclo de pediatria inter hospitalar do norte
paediatric inter-hospitalar meeting
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Caso dermatológico
Iolanda C. Fernandes1, Susana Machado1, Manuela Selores1
Uma criança do sexo feminino, com cinco anos de idade
e sem antecedentes patológicos pessoais/familiares relevantes,
foi referenciada à consulta de dermatologia pediátrica por espessamento e coloração amarelada das unhas dos háluxes, desde
o primeiro mês de vida. Sem outros sinais ou sintomas acompanhantes e sem história prévia de traumatismo.
Ao exame objectivo, observava-se o espessamento e desvio lateral das unhas de ambos os háluxes, exibindo uma colora-
ção amarelo-esverdeada e ainda a presença de múltiplas estrias
transversais (linhas de Beau), conferindo o aspecto semelhante
à “casca de ostra” (Figura1).
Foi realizado raspado subungueal para exame micológico
directo e cultura, que foram negativos.
Qual o seu diagnóstico?
Figura 1 - Desvio lateral, espessamento e coloração amarelo-esverdeada
das unhas de ambos os háluxes, conferindo o aspecto em “casca de ostra”
__________
1
S. Dermatologia, CH Porto
caso dermatológico
dermatology case
145
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
DIAGNÓSTICO
Desvio congénito ungueal dos háluxes.
COMENTÁRIOS
O desvio congénito ungueal do hálux foi descrito como entidade nosológica em 1983, por Baran et al e caracteriza-se pelo
desvio lateral do prato ungueal em relação ao eixo longitudinal
da falange distal (1). Outros achados clínicos adicionais incluem:
a coloração amarelo-esverdeada, a estriação ungueal transversal (linhas de Beau) e o espessamento da unha, com distrofia. A
patogénese da doença não se encontra totalmente esclarecida,
no entanto, tem sido relacionada com a rotação lateral da matriz
da unha, embora o desvio medial também esteja descrito (2). Adicionalmente, factores ambientais como a pressão intrauterina ou
alterações vasculares durante a gestação, podem ter um papel
importante na sua patogénese (3). Pode ocorrer de forma esporádica, no entanto, a existência de casos familiares sugere um
padrão de transmissão autossómico dominante (4).
Afecta igualmente ambos os sexos e geralmente está presente desde o nascimento, podendo manifestar-se apenas unilateralmente ou atingir outras unhas dos pés e mãos. O diagnóstico
diferencial faz-se essencialmente com a onicomicose (condição
rara nestas idades) e com formas adquiridas de desvio do prato
ungueal, resultantes de traumatismos ou intervenções cirúrgicas. Geralmente não são necessários exames complementares
de diagnóstico, dado a história clínica e o exame objectivo serem
suficientes. Não obstante, poder-se-á realizar o raspado subungueal para exame directo e cultura, com o intuito de excluir a
possibilidade de sobreinfecção fúngica, evitando assim a utilização inapropriada de antifúngicos em idade pediátrica. A infecção
e a unha encravada são as principias complicações. Pode ocorrer resolução espontânea em cerca de 50% dos indivíduos antes
dos 10 anos de idade. Em casos severos sugere-se o tratamento
cirúrgico, com aquisição de melhores resultados quando realizado antes dos dois anos (3). Como terapêutica adjuvante, poderão
ser utilizadas formulações com ureia, diminuindo a espessura
ungueal, o que resulta numa melhor aparência.
146
caso dermatológico
dermatology case
ABSTRACT
The authors describe a clinical case of a 5-year-old girl with
history of thickening and yellow discoloration of the great toenails
with lateral deviation, since her first month of life. The patient was
diagnosed with congenital malalignment of the great toenails.
The congenital malalignment of the great toenails was first
described as a nosological entity in 1983, by Baran et al. It is a
nail disorder in which the nail plates are laterally deviated with
respect to the longitudinal axis of the distal phalanx. Other additional clinical features include yellow-green discoloration, transverse ridging (Beau lines) and thickening with dystrophy.
Keywords: Child, congenital malalignment of the great toenails, onychomycosis.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 145-146
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CORRESPONDÊNCIA
Iolanda Gisela Conde Fernandes
E-mail: [email protected]
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Caso electroencefalográfico
Aida Sá1, Rui Chorão1,2
CASO CLÍNICO
Apresenta-se o caso de uma criança do sexo feminino, observada na consulta com oito anos de idade, enviada por episódios de paragem da actividade desde há cerca de meio ano,
tendo-se tornado progressivamente mais frequentes. Ocorriam,
nesta altura, numa frequência superior a 10 vezes por dia, aparentemente mais vezes quando estava menos interessada no
que estava a fazer, nas aulas e às refeições. Diziam que “parecia
hipnotizada” e nunca tinham notado pestanejo, mastigação ou
outras manifestações associadas. Recuperava rapidamente e
retomava o que estava a fazer anteriormente.
Nos antecedentes pessoais, a referir parto eutócico às 38
semanas, com circular do cordão, mas índice de Apgar 9/10.
Apresentava desenvolvimento psicomotor normal e não havia
história de convulsões febris, infecção do sistema nervoso cen),*85$6
tral ou traumatismo cranioencefálico. Sem antecedentes fami-
liares de epilepsia. O exame objectivo era normal. A prova de
hiperpneia realizada quando da primeira observação desencadeou duas crises de paragem da prova: revirou os olhos, teve
leve pestanejo e num teve pequena estremeção no final; duração de segundos, retomando a prova.
A monitorização de electroencefalograma com vídeo mostrou inscrição, no repouso vigil, sobretudo durante a hiperpneia,
de surtos generalizados de ponta-onda regular a 3 Hz, com duração de 5 a 8 segundos, com manifestações clínicas associadas
(abertura e revulsão oculares, ligeiro desvio ocular lateral, mioclonias palpebrais subtis) (Figura 1). No sono, surtos de pontas
frontais bilaterais e polipontas-ondas, com duração inferior a 1
segundo. (Figura 2).
Qual o seu diagnóstico?
Figura 1 - EEG durante uma crise ocorrida
na hiperpneia. Surto de pontas-ondas regulares a 3 Hz, generalizadas e síncronas,
com duração de cerca de 8 segundos.
__________
1
2
Consulta de Epilepsia Pediátrica, CH Porto
Serviço de Neurofisiologia, CH Porto
caso electroencefalográfico
EEG case report
147
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
DIAGNÓSTICO
Epilepsia de ausências da infância
Foi iniciada medicação com valproato na dose aproximada
de 20 mg/kg/dia. Alguns dias depois de atingida a dose alvo, não
foram observadas mais crises. Manteve-se sempre sem recorrência e os EEGs de controlo foram normais. A dose não foi ajustada ao peso e foi posteriormente reduzida, com suspensão ao
fim de três anos. Mantinha-se assintomática e com EEG normal
na reavaliação feita seis meses depois.
DISCUSSÃO
As ausências são um tipo de crises epilépticas generalizadas relativamente comuns em idade pediátrica. Podem surgir nas epilepsias generalizadas idiopáticas, mas também nas
sintomáticas. No primeiro grupo, como o do caso clínico apresentado, são denominadas ausências típicas: têm duração de
alguns segundos e o padrão electroencefalogáfico característico
de ponta-onda a 3-4 Hz. Contrastam com as atípicas, que têm
duração geralmente mais longa, início e fim menos abruptos e
associam-se a ponta-onda lenta (1,5-2,5 Hz).1
As epilepsias generalizadas idiopáticas com ausências típicas incluem várias síndromas definidas pela Liga Internacional
Contra a Epilepsia (ILAE) em 2001: a epilepsia de ausências infantil (EAI), a epilepsia de ausências juvenil (EAJ) e a epilepsia
mioclónica juvenil (EMJ).2 Outras síndromas com ausências típicas que não são oficialmente reconhecidos pela ILAE incluem as
mioclonias palpebrais com ausências e as mioclonias periorais
com ausências.3 O prognóstico destas síndromes epilépticas é
diferentes, daí a importância de uma classificação sindromática
o mais rigorosa possível de cada doente.
A incidência anual da epilepsia de ausências da criança varia entre 1,9 e 8 por 100.000 crianças1 e alguns estudos apontam
uma prevalência de 10-12% das crianças e adolescentes com
menos de 16 anos4. É mais frequente no sexo feminino (cerca
de 2/3 dos casos).1,4
148
caso electroencefalográfico
EEG case report
Figura 2 - EEG intercrítico no sono I-II.
Surtos de pontas e polipontas ou pontaonda irregular a 3 Hz, generalizados, com
duração de menos de 1 segundo.
O início das crises na EAI surge na grande maioria dos casos entre os 4 e os 10 anos de idade, com um pico aos 6-7
anos. A epilepsia de ausências juvenil tem um pico de incidência
aos 12-13 anos; contudo, pode haver sobreposição na idade de
aparecimento entre estas duas entidades e a idade de início não
é por si só um critério. Na EAI as ausências são muito mais numerosas (dezenas por dia) e têm uma duração que varia entre
os 4 e os 20 segundos (média de 10 segundos). Na EAJ são
menos frequentes, mas a probabilidade de ocorrer uma crise
tonico-clónica generalizada (TCG) é muito maior.4,5 As crises de
ausências ocorrem num terço dos doentes com EMJ, anos antes
dos outros tipos de crises que fazem parte dos critérios de diagnóstico desta síndroma, e são raras e breves. A idade de início
pode ocorrer entre os 8 e os 26 anos, embora a maioria apresente a primeira crise entre os 12 e os 18 anos.4 Classicamente, os
doentes têm abalos sobretudo dos membros superiores e axiais
- crises mioclónicas - ao despertar (muitas vezes desvalorizadas
pelo doente), culminando por vezes numa crise TCG, que é muitas vezes a que o leva a recorrer a cuidados médicos.
O principal diagnóstico diferencial é com a criança distraída, este facto mais vezes notado na escola do que em casa, mas
também com casos de síndroma de hiperactividade com défice
de atenção, sobretudo na sua variante desatenta. Outros diagnósticos diferenciais incluem as crises focais hipomotoras e as
crises psicogéneas.1 O exame neurológico é, por definição, normal.4 A hiperventilação durante pelo menos três minutos é a melhor forma de desencadear uma crise de ausência numa primeira
abordagem meramente clínica da criança. Tipicamente, não há
percepção das crises pela criança, que pára e logo a seguir retoma a actividade que estava em curso; contudo, pode haver breve
amnésia retrógrada.1,4 Noutras situações com ausências que não
a EAI, a suspensão da consciência pode ser apenas parcial. Nas
ausências típicas são admitidas mioclonias discretas das pálpebras ou das sobrancelhas, pequeno componente atónico ou
tónico, ligeiras clonias e automatismos, estes muito mais vezes
simples do que complexos. Contudo, se estes componentes são
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Quadro I – CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO DE EAI4 (Loiseau e Panayiotopoulos, 2005)
Critérios de Inclusão
1. Idade de início entre os 4 e os 10 anos de idade (pico aos 5-7 anos).
2. Exame neurológico e desenvolvimento psicomotor normais.
3. Episódios de ausência curtos (4-20 segundos) e frequentes (dezenas por dia) com
perda de conhecimento abrupta e marcada. São frequentes os automatismos,
mas sem significado no diagnóstico.
4. EEG ictal com surtos de ponta-onda (ou dupla ponta, no máximo três pontas),
generalizados e de grande amplitude. Os complexos são rítmicos, com frequência
de 3 Hz e uma diminuição gradual e regular da frequência desde o início para o
final da descarga. A duração varia entre 4 e 20 segundos.
Critérios de Exclusão
1. Presença de outro tipo de crises, como as tónico-clónicas generalizadas ou
mioclónicas, antes ou durante a fase activa das ausências.
2. Mioclonias palpebrais, periorais ou clonias dos membros ou mioclonias únicas ou
arrítmicas da cabeça, tronco ou membros. (Contudo, mioclonias discretas doa
olhos, pálpebras ou sobrancelhas podem ocorrer principalmente nos primeiros
3 segundos da ausência;
3. Perda de conhecimento discreta ou inexistente durante os surtos de ponta-onda
a 3-4 Hz.
4. Existência no EEG de surtos de ponta-onda a 3-4 Hz, com duração de menos
de 4 segundos, de polipontas (mais de três) ou fragmentação fragmentação das
descargas ictais.
5. Fotossensibilidade ou existência de outro precipitante sensorial de crises
clínicas.
exuberantes ou predominantes, devemos pensar noutro tipo de
crises epilépticas. Não ocorre queda e a incontinência urinária é
excepcional.4
O electroencefalograma (EEG) crítico caracteriza-se pela
presença de descargas generalizadas, rítmicas, de ponta-onda
(ou dupla ponta-onda, sendo permitido um máximo de três pontas no início do surto) a 3 Hz (não inferior a 2,7 Hz nem superior a
4 Hz), regular, com alta voltagem (maior nas regiões anteriores).
Tipicamente a frequência vai diminuindo gradualmente ao longo
do surto. Na fase inicial (1-2 segundos) podem as pontas-ondas
ser mais rápidas, irregulares e um pouco assíncronas.4,6 As alterações do EEG intercrítico ocorrem sobretudo no sono não REM,
sob a forma de surtos de ponta-onda muito breves, menos regulares. A presença de fotossensibilidade no EEG, assim como
a provocação de uma ausência típica de forma sistemática por
estímulos luminosos é considerado um critério de exclusão de
EAI.4 Os critérios de diagnóstico de Loiseau e Panayiotopoulos
encontram-se no Quadro I. Permitem definir com rigor o grupo
de doentes com EAI e, assim, definir com melhor o prognóstico. Contudo, sendo muito restritivos, há muitos doentes que não
se conseguem ser classificados como tal; o critério de exclusão
mais vezes encontrado numa série de doentes chineses foi o de
surtos de ponta-onda a 3-4 Hz com duração inferior a 4 segundos sem ou com suspensão apenas parcial da consciência.6
Relativamente ao tratamento, os antiepilépticos de primeira
linha são o valproato de sódio, a lamotrigina e a etossuximida
(este não disponível nas farmácias comerciais no nosso país),
em monoterapia ou em associação, com eficácia sobreponível5,
sendo que a primeira escolha depende da acessibilidade ou fármaco, da experiência pessoal e do perfil individual do doente. No
caso apresentado houve uma resposta terapêutica imediata com
valproato, o que nem sempre acontece e não implica necessariamente uma evolução menos favorável.
A taxa de remissão nos doentes com ausências típicas é
muito variável, dependendo de vários factores, mas sobretudo
da existência de outros tipos de crises. Na EAI a taxa de remissão é de cerca de 80%.4, Como no caso apresentado, é possível
suspender a medicação em idade pré-púbere. Contudo, segun-
do alguns autores, cerca de 10% poderá desenvolver pelo menos uma crise tonico-clónica generalizada na adolescência ou
idade adulta. O risco destas crises em idades é mais elevado na
EAJ, que tem maior probabilidade de evolução crónica; contudo,
há alguns casos de sobreposição entre estes estas duas síndromas, quer em relação à idade de início, quer à evolução. Já na
EMJ não medicada, o risco de recorrência de crises, nomeadamente TCG, na idade adulta é de cerca de 90%.4
ABSTRACT
Introduction: Typical absence seizures are quite common
in chidhood, in most cases fitting the criteria for childhood absence
epilepsy. Differential diagnosis is mainly with inattention and focal
hypomotor seizures. Response to adequate antiepileptic drug
therapy is usually very good.
Case report: We report a classical case of a school-age
girl with many episodes per day of staring and eye rolling with
a duration of some seconds. Hyperventilation during her first
appointment elicited short-duration absences with slight eye
blinking. The ictal video-EEG confirmed the diagnosis, showing
generalized synchronous bursts of 3 Hz spike-wave discharges
with a medium duration of eight seconds. The response to therapy
with valproic acid was dramatic, and medication was withdrawn
at the age of eleven with no recurrence of seizures.
Conclusion: The most frequent epileptic syndrome with
typical absences is childhood absence epilepsy. When inclusion
and exclusion criteria are taken in consideration, we can expect a
good prognosis, with remission by prepubertal age.
Keywords: Absence epilepsy, childhood, prognosis.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 147-150
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EEG case report
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NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Caso endoscópico
Fernando Pereira1
Um rapaz de 15 anos com Doença de Crohn (DC) ileocólica
com cerca de quatro anos de evolução e em tratamento com
azatioprina e messalazina, foi observado na consulta de Gastroenterologia Pediátrica por apresentar vómitos alimentares
vespertinos, epigastralgias, afrontamento após as refeições e
emagrecimento de cerca de 3 quilos em dois meses.
O doente tinha sido observado pela primeira vez na nossa consulta quatro anos antes, com quadro de emagrecimento, dores abdominais de localização hipogástrica, diarreia por
vezes com pequena quantidade de sangue vivo. Tinha história
familiar de DII, mãe com DC em tratamento. Ao exame objectivo
constatou-se dor à palpação da fossa ilíaca direita sem tumefações palpáveis e sem adenopatias ou organomegalias. O estudo
analítico mostrou discreta anemia hipocrómica e microcítica (10
g/100ml) com valores séricos de ferro e ferritina baixos, proteina
C elevada (30 mg/l) e VSG de 40 mm na 1ªhora. A radiografia
do tórax era normal e a prova de tuberculina negativa. Efectuou
endoscopia digestiva alta que revelou quadro de gastrite crónica
do corpo e antro sem a presença de infecção pelo Helicobacter
pylori (HP) e sem granulomas. A colonoscopia com ileoscopia
mostrou colite ulcerativa, mais intensa na metade direita do cólon, com lesões ulcerativas longitudinais e estreladas a par de
áreas de mucosa sensivelmente normal. Os sete centímetros de
ileum observados apresentavam igualmente quadro inflamatório
e ulcerativo. As biópsias cólicas e ileais revelaram a presença
Figura 1
Figura 2
de quadro inflamatório crónico extenso, com alguns eosinófilos
e raros granulomas não caseificados. O exame cultural da mucosa cólica foi negativo. Em face destes achados foi colocado o
diagnóstico de Doença de Crohn com envolvimento ileocólico e
iniciado tratamento com prednisolona oral, polivitamínico e ferro
oral, verificando-se melhoria clínica e laboratorial. Às seis semanas de tratamento o doente iniciou azatioprina e messalazina,
com progressiva redução dos corticóides até à sua completa
suspensão 12 semanas após o início do tratamento. A enterorressonância efectuada já após o início do tratamento revelou
quadro inflamatório atingindo cerca de 12 cm do ileum terminal
sem componente estenosante.
O doente manteve-se em observação periódica em consulta externa, cumprindo aparentemente o tratamento prescrito e
mantendo valores laboratoriais estáveis, sem sinais de significativa actividade inflamatória. Contudo o aparecimento dos sintomas acima referidos motivaram a realização de uma endoscopia
digestiva alta onde observamos as imagens que apresentamos.
Em face destas imagens qual lhe parece ser o diagnóstico
mais provável para o quadro actual do doente:
1 – Envolvimento gástrico pela Doença de Crohn
2 – Gastrite associada ao tratamento com azatioprina
3 – Gastrite crónica por Helycobacter pylori
4 – Doença de refluxo gastro-esofágico
Figura 3
__________
1
Serviço de Gastroenterologia
Hospital Maria Pia / CH Porto
caso endoscópico
endoscopic case
151
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
COMENTÁRIOS
A observação das imagens que mostramos permitem-nos
constatar o seguinte: na Figura 1 vemos a porção distal do corpo gástrico e o antro e adivinhamos o orifício pilórico ao fundo;
verifica-se existir intenso aspecto inflamatório generalizado da
mucosa gástrica com algumas erosões (setas), mais acentuado
na região pré-pilórica e ainda alguns restos alimentares. Não foi
possível ultrapassar o piloro e observar o duodeno. Em face deste quadro, colocamos a hipótese de se tratar de estenose pilórica por envolvimento gástrico pela DII. Efectuamos dilatação do
piloro com balão de 5 cm (Figuras 2 e 3), o que permitiu passar
seguidamente um endoscópio de 6 mm e verificar aspecto normal do duodeno. As biópsias gástricas confirmaram a presença
de intenso infiltrado inflamatório crónico e a presença de alguns
granulomas confirmando o diagnóstico de Doença de Crohn.
A gastrite por HP poderia apresentar-se com este aspecto
mas, como se referiu na primeira endoscopia alta efectuada ao
doente, não havia HP na mucosa (biópsias); a azatioprina não
é habitualmente responsável por quadros de gastrite desta natureza.
Estavamos assim perante um quadro de DC com envolvimento gástrico sob a forma de estenose pilórica, situação pouco
frequente, 6% na forma sintomática, por vezes de tratamento difícil. Optamos por fazer dieta líquida polimérica exclusiva durante
duas semanas, inibidores da bomba de protões e corticoterapia
Ev, verificando-se melhoria progressiva do quadro. Posteriormente, o doente iniciou tratamento com infliximab, suspendendo
a prednisolona e mantendo a azatioprina, com evolução favo-
152
caso endoscópico
endoscopic case
rável. Não foi necessário proceder a mais nenhuma sessão de
dilatação. O tratamento médico associado à dilatação endoscópica nem sempre é eficaz na resolução do quadro de estenose pilórica, havendo necessidade de recorrer à cirurgia (bypass
gastroduodenal ou gastro-jejunal).
Conclusão: Doença de Crohn com estenose pilórica.
ABSTRACT
We present a case of pyloric stenosis that occurred in a
patient with ileocolic Crohn’s disease without significant gastric
inflammation, and treated with azathioprine and messalamine.
Balloon dilatation, steroid therapy, omeprazol and polymeric enteral nutrition were successful to resolve the stenosis. Later the
patient was put on infliximab with good clinical response.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 151-152
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NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Caso radiológico
João Nascimento1, Maria Gomes2, Carla Moreira3, Filipe Macedo4
Criança do sexo feminino, 5 anos de idade, com asma persistente ligeira, medicada com corticóide inalado e antagonista
dos leucotrienos, recorre ao serviço de urgência por aparecimento súbito de edema ao nível da face, pescoço e região antero-superior do tórax. Apresentava desde há 2 dias quadro de pieira
audível e acessos de tosse frequentes, existindo noção parental
de melhoria com o broncodilatador inalado.
No exame físico, apresentava bom estado geral, apirexia,
ausência de sinais de dificuldade respiratória, SatO2 (ar ambien-
Figura 1 – TC cervico-torácica: plano da mandíbula
te): 98%. Constatou-se edema da face, região cervical e antero-superior do tórax com crepitação à palpação. Na auscultação
pulmonar os sons respiratórios encontravam-se globalmente
diminuídos.
Realizou radiografia torácica (má qualidade) e posteriormente TAC cervico-torácica (Figuras 1, 2 e 3).
QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?
Figura 2 – TC cervico-torácica: plano da transição cervico-torácica
Figura 3 – TC cervico-torácica: plano do terço
superior do tórax
__________
1
2
3
4
Serviço de Pediatria, Centro Hospitalar do Porto
Serviço de Pediatria, Hospital Escala Braga
Serviço de Pediatria, Hospital Escala Braga
Imagiologia, SMIC Porto
caso radiológico
radiological case
153
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Pneumomediastino e enfisema subcutâneo secundário a
asma.
DISCUSSÃO
As imagens revelam extenso enfisema subcutâneo, interessando o pescoço e o terço superior do tórax, associando-se
pneumomediastino.
O pneumomediastino e o enfisema subcutâneo são uma
complicação pouco frequente da asma, sendo causado pela rotura de alvéolos sobredistendidos por hiperinsuflação. Pode também ocorrer por perfuração brônquica ou esofágica, geralmente
por traumatismo ou corpo estranho. A comunicação entre os diversos espaços ao longo dos planos de clivagem do mediastino,
associada à grande difusão do ar nos tecidos moles explica a
extensão fácil para o pescoço e planos subcutâneos do tórax.
O tratamento é geralmente apenas de suporte e o prognóstico favorável.
IMAGIOLOGIA
RX de tórax
É geralmente suficiente para o diagnóstico, embora enfisemas de pequeno volume possam ser por vezes difíceis de
diagnosticar. Observam-se imagens radiolucentes lineares e em
banda, ao longo das paredes dos grandes vasos do mediastino
e da traqueia. O enfisema mediastínico distingue-se do pneumopericárdio porque este último é geralmente raro no doente não
ventilado, rodeia a totalidade do coração e não se estende ao
mediastino superior (1). No recém-nascido e lactente, em que o
timo é volumoso, o ar pode rodear completamente os lobos do
154
caso radiológico
radiological case
timo, elevando-os e causando a típica imagem radiográfica de
´´asas de anjo``(2). No enfisema subcutâneo as imagens radiolucentes distribuem-se pelas partes moles superficiais.
TC
Dá informação mais detalhada que o Rx convencional podendo ser útil nos casos de etiologia duvidosa e para caracterizar melhor a extensão do quadro bem como as complicações
associadas.
ABSTRACT
We present the case of a 5 year old asmathic girl admitted
to the hospital for acute non traumatic edema and crepitus of
the face, neck and upper thorax. Thoracic x-ray (not shown) and
thoracic and neck CT were performed, showing extensive subcutaneous and mediastinal enfisema. These are rare complications
of asthma. The imaging features are described.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 153-154
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18 A 21
XXIV REUNIÃO ANUAL DE
NOVEMBRO
PEDIATRIA DO CHP
2012
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NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Etiologia
Maria do Céu Rodrigues1
Restrição do crescimento fetal ou restrição do crescimento
intrauterino (RCIU) é o termo usado para designar as situações
em que o feto não atinge o seu potencial de crescimento, devido
a fatores genéticos ou ambientais.
É um problema obstétrico relativamente comum, afetando
5 – 10% de todas as gestações1. É também uma situação muito
complexa, já que se associa a um aumento da morbimortalidade
fetal – hipoxemia, acidemia, sofrimento e morte fetal pré e intra
parto – morbilidade neonatal e infantil – hipoglicemia, hipotermia,
policitemia, dificuldade respiratória, hemorragia intraventricular,
défice cognitivo e paralisia cerebral - e mesmo a patologia do
adulto, nomeadamente hipertensão crónica, diabetes e cardiopatia isquémica2.
Antes da aplicação sistemática da ecografia na prática obstétrica e da existência de tabelas ecográficas dos parâmetros
biométricos fetais, o diagnóstico de RCIU era clínico – pela medição da altura uterina – e muitas vezes, só efetuado na altura
do parto, pela observação de recém-nascidos (RN) com peso
inferior ao percentil 10 para a idade gestacional, RN leve para
a idade gestacional (LIG). No entanto, nem todos os fetos que
sofreram uma RCIU vão ser LIGs e inversamente RN LIGs podem ser fetos constitucionalmente pequenos. De facto, apesar
de muitas vezes se usarem como sinónimos, os conceitos de
RCIU e LIG, não o são.
Segundo a ACOG (The American Congress of Obstetricians
and Gynecologists) define-se RCIU como o peso fetal estimado
(PFE) abaixo do Percentil 10 para Idade Gestacional (IG). O exame ecográfico envolve a medição de vários parâmetros biométricos que incorporados numa fórmula, permitem o cálculo do peso
fetal estimado. Os parâmetros biométricos habitualmente usados
são o diâmetro biparietal (DBP), o perímetro cefálico (PC), o perímetro abdominal (PA) e o comprimento do fémur (CF). As duas
fórmulas para cálculo do peso fetal estimado mais comuns, são a
de Warsof’s com a modificação de Shepard e a de Hadlock, sendo esta última a mais usada. Estas fórmulas estão incluídas nos
programas dos ecógrafos e permitem comparar o crescimento
de cada feto com curvas de crescimento padrão.
As variações do peso dos fetos e RN normais são influenciadas por diversos factores entre os quais, a etnia, a altura e o
peso da grávida no início da gestação, a paridade e o sexo do
feto. A situação ideal seria o cálculo individualizado do potencial
__________
1
Maternidade Júlio Dinis, CH Porto
de crescimento de cada feto e não o recurso a curvas universais.
Em alguns países essas curvas já são usadas na prática clínica,
estando as fórmulas de cálculo disponíveis “on line”. De referir,
que em Portugal, está em curso o estudo, que vai permitir o conhecimento dos nossos padrões de normalidade de crescimento
fetal.
Por definição e genericamente, cerca de 10% dos fetos e
RN, têm um peso abaixo do Percentil 10. Destes, 70% são fetos
constitucionalmente pequenos, isto é, mantém o seu ritmo de
crescimento ao longo da gravidez, numa linha de percentil mais
baixa e são saudáveis. Os 30% restantes, são os fetos que não
atingem o seu potencial de crescimento e estes são, os fetos
em risco.
O crescimento fetal depende de fatores fetais – o seu potencial de crescimento geneticamente determinado; de fatores
maternos – a capacidade da mãe entregar oxigénio e nutrientes
à placenta; e de fatores placentares – a capacidade da placenta transferir oxigénio e nutrientes para o feto.
Os fatores genéticos, as anomalias congénitas, as infecções e a gravidez múltipla são os fatores fetais que podem
condicionar o crescimento fetal. De facto, os fatores genéticos
parecem contribuir cerca de 30 – 50% para o peso ao nascer,
cabendo a variação restante, aos fatores ambientais3,4. Embora
os genes maternos e paternos determinem o crescimento fetal, a
influência dos genes maternos parece ser maior. A suscetibilidade para a RCIU é também herdada, constatando-se que mulheres que sofreram, elas próprias, restrição de crescimento fetal,
têm maior risco de RCIU na sua descendência5. Por outro lado,
antecendes de RCIU numa gravidez anterior é um fator de risco
para RCIU.
As anomalias cromossómicas – Trissomias 13 e 18, Síndrome de Turner, Triploidias, deleções , cromossomas em anel - são
responsáveis por 20% dos casos de RCIU6, que habitualmente é
precoce. Cerca de 25% dos fetos com RCIU de instalação precoce, têm uma anomalia cromossómica, pelo que está indicado,
nestes casos, o estudo do cariótipo.
As anomalias congénitas major ou múltiplas, sem anomalias genéticas identificáveis, associam-se também a RCIU e são
responsáveis por 1 – 2% dos casos7.
As infeções são responsáveis por menos de 5% de todos
os casos de RCIU, sendo as infeções pelo vírus da rubéola e
pelo citomegalovirus (CMV) aquelas que estão claramente relacionadas com a RCIU. O efeito final da infeção por estes vírus,
é a diminuição do número total de células fetais. As infeções por
restrição de crescimento intra-uterino: decisões obstétricas com repercussão no RN – mesa redonda
S 156
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
parasitas como o Toxoplasma gondii e o Plasmodium, parecem
também influenciar negativamente o crescimento fetal. Em relação às infeções bacterianas, há menos evidência da sua relação
com a RCIU, embora em situações de RCIU se constate infeção
bacteriana da placenta. A infeção por CMV é a etiologia infecciosa mais frequente nos países desenvolvidos, embora a nível
global a principal associação é com a malária. Na presença de
RCIU, está indicado o estudo das serologias maternas para as
infeções do grupo TORCH.
A incidência de RCIU é significativamente maior na gravidez múltipla, estando o crescimento fetal inversamente relacionado com o número de fetos e com o tipo de placentação, sendo
a incidência maior nas placentas monocoriónicas. As complicações obstétricas e as anomalias da placenta e do cordão umbilical, mais frequentes na gravidez múltipla, são fatores adicionais
responsáveis pela maior incidência de RCIU, nesta situação.
Para o seu crescimento, o feto necessita de oxigénio, glicose e alguns aminoácidos essenciais para a síntese proteica.
Quando ocorre interrupção ou diminuição no fornecimento destes substratos, o desenvolvimento e em última instância, a sobrevivência do feto, está ameaçada. A chegada destes nutrientes
à placenta, dependem da sua existência em quantidade adequada no organismo materno e da integridade funcional do sistema
vascular materno. Entre os fatores maternos responsáveis pela
RCIU e dentro dos fatores relacionados com a quantidade de nutrientes disponíveis, podem considerar-se os fatores ambientais,
os fatores socioeconómicos e os hábitos nocivos. A patologia
materna prévia à gravidez associa-se por um lado, a lesões no
sistema vascular e muitas vezes é também causa de quantidade
inadequada de oxigénio e nutrientes em circulação.
A residência em locais de elevada altitude associa-se a hipoxemia crónica e a baixo peso ao nascer, existindo uma relação
inversa entre o aumento da altitude e o peso ao nascer8, em
altitudes acima dos 2000 metros.
O peso da mãe ao nascimento, o peso antes de engravidar
e o ganho de peso na gravidez são responsáveis por cerca de
10% da variação do peso fetal9. Pequenas variações na dieta
não têm repercussões no crescimento fetal, mas quando a entrada calórica é muito diminuída, ocorre uma diminuição no peso fetal. Tal facto foi constatado em situações de fome extrema, como
durante o cerco de Leninegrado, em que a média de peso ao
nascer caiu cerca de 500Gr. Um aumento ponderal materno insuficiente – inferior a 10 Kg – relaciona-se com o aumento de risco de RCIU10; desconhece-se se o fator determinante é o défice
global de nutrientes ou o défice de apenas, alguns nutrientes.
O tabagismo e as toxicodependências podem causar RCIU
por efeito citotóxico direto ou indiretamente por outros fatores,
como a inadequada ingestão calórica. O impacto do tabagismo
no crescimento fetal exerce-se sobretudo na 2ª metade da gravidez, pelo que a redução ou abstinência tabágica nessa altura,
tem um efeito positivo no crescimento fetal, sendo o peso de
RN de grávidas fumadoras que interromperam o consumo no 3º
trimestre, similar, aos das grávidas não fumadoras11.
As doenças vasculares maternas – hipertensão crónica,
nefropatia crónica, diabetes com vasculopatia, lúpus, doenças
vasculares do colagéneo – sendo causa de diminuição da perfusão uteroplacentar, constituem a entidade patológica mais diretamente relacionada com a RCIU, responsável por cerca de
25- 30% dos casos. Ter tido um RN com RCIU grave, tem sido
associado a um aumento do risco de doença cardiovascular
grave ou morte por doença cardiovascular, mais tarde na vida,
sugerindo que fatores cardiovasculares maternos podem afetar
a perfusão uteroplacentar e o crescimento fetal, ainda antes da
doença materna ser clinicamente aparente. As malformações
uterinas, podendo afetar a perfusão uteroplacentar, podem ser
causa de RCIU.
Hipoxemia materna crónica devido a patologia pulmonar,
cardiopatia cianótica ou anemia grave, conduzem a uma potencial diminuição crónica do aporte de oxigénio ao feto e risco de
RCIU. Na drepanocitose, à anemia, associam-se episódios de
trombose no espaço interviloso. O feto é capaz de, parcialmente,
compensar a hipoxia crónica pela hipertrofia da placenta, pela
redistribuição do fluxo sanguíneo para os órgãos nobres (cérebro, coração e supra renais), pela diminuição dos movimentos e
pelo aumento da extração de oxigénio dos tecidos.
Muitos casos de RCIU, particularmente naqueles em que
há recorrência numa gravidez posterior, resultam da isquemia
placentar. A função placentar depende de uma adequada invasão do trofoblasto. No 1º trimestre da gravidez, as células do
trofoblasto invadem as artérias espiraladas maternas, na decídua. No 2º trimestre, ocorre uma onda secundária de invasão
trofoblástica, com penetração nos segmentos intramiometriais
das artérias espiraladas, até ao ponto em que estas artérias se
destacam das artérias radiais, de que resulta a conversão das
artérias espiraladas, vasos de elevada resistência ao fluxo vascular, em canais vasculares dilatados e de parede fina, que se dilatam passivamente permitindo a passagem do fluxo sanguíneo,
extremamente aumentado, necessário para o feto em crescimento. Em certas condições, há uma falência desta invasão trofoblástica secundária, com subsequente isquemia placentar, alterações ateromatosas e insuficiência placentar, com diminuição
da capacidade da placenta, transferir oxigénio e nutrientes para
o feto. Desta placentação anormal, resulta a doença isquémica
placentar, que clinicamente se pode manifestar por RCIU, pré-eclampsia, descolamento prematuro de placenta normalmente
inserida ou uma combinação destas entidades.
Além da placentação anormal, os fatores placentares que
se associam a potencial diminuição crónica do aporte de oxigénio ao feto, são a placenta prévia, em consequência da inserção
placentar numa zona menos vascularizada do útero; as inserções anómalas do cordão umbilical, como a inserção marginal e
velamentosa; e os angiomas da placenta.
O mosaicismo confinado à placenta está presente em cerca
de 10% das placentas de fetos com RCIU idiopático12. A gravidade da RCIU depende dos cromossomas envolvidos, da percentagem do mosaico e da presença de dissomia uniparental.
Genericamente e em situações normais, o peso do feto
e da placenta são proporcionais. Num estudo, em que foram
avaliados e comparados o peso placentar e o peso dos RN em
1569 gestações simples de fetos cromossomicamente normais
restrição de crescimento intra-uterino: decisões obstétricas com repercussão no RN – mesa redonda
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 157
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
com RCIU e em 15047 gestações de RN com peso adequado
para a idade gestacional, constatou-se que em RN com RCIU o
peso placentar é 24% inferior, relativamente aos RN com peso
adequado13. No entanto a capacidade funcional da placenta, que
está habitualmente em excesso, não é apenas relacionável com
o seu peso ou tamanho. Determinadas alterações histológicas
placentares associam-se à RCIU, nomeadamente lesões vasculares – trombose, enfarte, deposição maciça de fibrina no espaço
perivilositário – lesões infeciosas crónicas e lesões inflamatórias
idiopáticas, sendo a vilite crónica difusa de etiologia desconhecida, o achado placentar mais comum, nos casos idiopáticos de
RCIU.
O conhecimento de fatores que se associam a RCIU,
permite-nos identificar algumas mulheres de risco e ao planear
uma futura gravidez, tratar ou melhorar patologias prévias, assim
como recomendar estilos de vida saudáveis.
Na suspeita de RCIU – peso fetal estimado inferior ao Percentil 10 para a idade gestacional – o conhecimento dos seus
fatores causais orienta a abordagem diagnóstica: estudo anatómico fetal, estudo analítico e serológico materno, estudo citogenético fetal e estudo hemodinâmico e funcional da unidade feto
placentar.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 156-158
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S 158
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Vigilância pré-natal e decisão do parto
Cristina Dias1
INTRODUÇÃO
A Restrição de Crescimento Intra –Uterino (RCIU) é ainda
nos dias de hoje um problema complexo para o Obstetra e também para o Pediatra por se associar a morbilidade e mortalidade
fetal/neonatal. Paralelamente à morbilidade associada à prematuridade e à asfixia intraparto associam-se outras complicações
neonatais, nomeadamente a lesão cerebral hipoxia com as respectivas sequelas, a enterocolite necrotizante, a hemorragia pulmonar, a retinopatia, a insuficiência renal, a trombocitopenia, a
policitemia, a hipoglicemia, a hipocalcemia, a hiperbilirrubinemia,
a instabilidade térmica e a sépsis.
A longo prazo estão descritos outros efeitos adversos, incluindo uma pequena diminuição no QI e uma redução nos scores das funções cognitivas, na memória visual e na coordenação
motora. Estes défices funcionais parecem ser diretamente proporcionais ao grau de prematuridade e às alterações de fluxo
das artérias umbilical e cerebral média(20,21,22,23).
Estão descritos ainda efeitos deletérios da RCIU na saúde
do adulto. Assim, segundo a Teoria de Barker, estes indivíduos
têm maior risco de mais tarde, já na vida adulta, apresentarem
alterações metabólicas-endócrinas que levam ao aparecimento
de hipertensão, dislipidemia, diabetes tipo 2 e doença isquémica
cardíaca(24,25).
DEFINIÇÃO
A definição mais comum de RCIU é um peso fetal estimado
(PFE) abaixo do percentil 10 para a idade gestacional. No entanto, esta definição não distingue os fetos constitucionalmente
pequenos (FCP) (70%) daqueles que têm realmente restrição
de crescimento (30%). Esta distinção é extremamente importante, condicionando não só a atitude do obstetra como também o
prognóstico fetal. Assim, um feto constitucionalmente pequeno
tem um bom prognóstico, ao contrário do feto com RCIU. O prognóstico fetal está também relacionado com a causa do RCIU. Assim, sempre que a causa se deve a fatores intrínsecos fetais, tais
como aneuploidias, malformações congénitas ou infeções congénitas, o prognóstico é mais reservado porque a maioria das
vezes não temos forma de melhorar estas condições. Por outro
lado, quando a causa se deve a insuficiência útero-placentar o
prognostico é melhor, mas, ainda assim associado a complica-
__________
1
Maternidade Júlio Dinis, CH Porto
ções. Cerca de 5-10% de todas as gravidezes apresentam um
feto com um crescimento abaixo da normalidade. No entanto,
este grupo de fetos não é homogéneo e inclui essencialmente
três tipos de fetos que correspondem a diferentes grupos etiológicos e a diferentes prognósticos obrigando assim a uma diferente atitude pelo obstetra:
• Fetos com RCIU por insuficiência placentar. Correspondem
a cerca de 50% dos casos e associam-se a situações de
pré eclampsia, visto que os processos fisiopatológicos são
comuns para ambas as patologias.
• Fetos pequenos para a idade gestacional sem anomalias.
São fetos constitucionalmente pequenos, representando o
espectro inferior do peso esperado para este feto.
• Fetos pequenos para a idade gestacional com anomalias.
Tratam-se de fetos pequenos por uma condição extrínseca
à placenta.
A função do obstetra passa por identificar um crescimento
abaixo do ideal, determinar a causa e severidade do mesmo,
conferenciar com neonatologistas e com uma monitorização fetal apertada, selecionar o “timming”ideal de nascimento e via de
parto mais apropriada para este feto.
Assim, para um correcto diagnóstico e orientação temos de
conjugar as seguintes variáveis: ecomorfologia detalhada, biometria para determinação do peso fetal, estudo anatómico fetal,
avaliação do índice de líquido amniótico, fluxometria doppler da
artéria umbilical, artéria cerebral media, ductos venoso e veia
umbilical.
FISIOPATOLOGIA
A fisiopatologia do RCIU mais aceite na actualidade é a vasoconstrição crónica das artérias espiraladas devido à invasão
trofoblástica inadequada. Nas fases iniciais desta situação patológica, o feto adapta-se diminuindo a velocidade de crescimento
e captando de uma maneira mais eficiente o oxigénio (desenvolvendo nomeadamente policitemia). No entanto, se a situação se
mantem, o feto entra numa fase de hipoxia que se pode prolongar durante semanas. Abaixo de determinado nível de saturação
de oxigénio são activados uma serie de quimiorreceptores que
poem em marcha todo um conjunto de alterações hemodinâmicas que por sua vez têm como principal função preservar o aporte de oxigénio aos órgãos nobres; é a chamada centralização.
São sinais desta situação:
• A vasodilatação cerebral ou “brain sparing”.
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• O oligohidramnios que se observa nos fetos com insuficiência placentar.
• A redistribuição cardíaca, que consiste na instalação de
uma situação que não é fisiológica. Ou seja, o ventrículo
esquerdo vai irrigar um território com baixa resistência que
é o cérebro, enquanto que o direito vai irrigar um território
de progressivamente alta resistência, a placenta.
Se a situação persiste, o feto poe em marcha mecanismos
de obtenção de energia por via anaeróbia, a partir da glicose,
que levam à acidose. Entre os órgãos mais afectados nesta fase
está o coração fetal, visto que as fibras do miocárdio sofrem fenómenos de necrose e são substituído por tecido fibroso, o que,
por sua vez vai induzir uma alteração da função diastólica. Se
esta situação persiste a morte fetal ocorre em horas.
CONDUTA OBSTETRICA
Diagnóstico
A monitorização fetal “óptima” dos fetos com RCIU ainda
não foi estabelecida. Uma avaliação ecográfica com biometrias
seriadas, perfil biofísico fetal, doppler arterial e venoso, estudo
citogenetico para despiste de cromossomopatias e um estudo
analítico para despiste de infecção fetal são as armas actualmente existentes à nossa disposição. O que nos propomos é
tentar identificar os fetos que estão em risco in útero e que poderão beneficiar de um parto pré termo. Este diagnóstico atempado
é de grande importância, inclusive em termos de saúde pública,
isto porque trabalhos recentes têm demonstrado que o risco de
complicações perinatais aumenta até 4 vezes nas gravidezes em
que não é detetado a RCIU durante a gravidez.
O diagnóstico passa então por:
• Correcta anamnese tendo como objectivo a identificação
dos factores de risco. Apesar de estes serem múltiplos e
nem sempre bem definidos, podemos identificar determinadas situações associadas a um aumento do risco de RCIU,
tais como:
- Historia previa de RCIU ou morte perinatal
- Fatores ambientais, tais como álcool, tabaco e outras drogas
- Infecções
- Doenças maternas como trombofilias, obesidade, diabetes HTA e doenças renais e vasculares.
• Exame físico através da palpação abdominal e determinação da altura uterina têm uma sensibilidade muito baixa,
cerca de 30%.
• Ecografia obstétrica é o método “standard” de avaliação do
crescimento fetal. Requer no entanto uma correcta determinação da idade gestacional com ecografia precoce.
Distinção entre RCIU e FCP
A distinção entre estes 2 grupos de fetos é essencial do
ponto de vista clínico visto que ambos vão apresentar grandes
diferenças no prognóstico, evolução e orientação ante natal. Os
parâmetros utilizados para diferenciar estes dois grupos são:
• Os fetos com um PFE inferior ao percentil 3 são considerados como sofrendo alterações severas do crescimento fe-
tal, pelo que são considerados, na maioria dos protocolos,
como RCIU independentemente de outros critérios.
• A fluxometria da artéria umbilical (AU) é o parâmetro essencial para distinguir entre RCIU e FCP, ou, por outras
palavras entre risco e ausência de risco. Os motivos pelos
quais a maioria dos protocolos utiliza este parâmetro para
diferenciar estes dois grupos resumem-se a quatro pontos:
- Todos os ensaios randomizados que demonstraram o
benefício do Doppler nos fetos com suspeita de RCIU
realizaram-se a nível da artéria umbilical.
- Na presença de um fluxo umbilical normal, a ocorrência
de mortalidade perinatal é um evento excepcional.
- Um fluxo anormal na AU é um bom estratificador do risco
de resultados perinatais adversos e alterações do desenvolvimento psicomotor.
- Existe evidência de que fetos pequenos com Doppler da
AU normal não requerem habitualmente internamento
hospitalar e não necessitam de controle intensivo.
• O crescimento fetal é diretamente influenciado por fatores
individuais, tendo cada feto o seu próprio potencial de crescimento. Assim, entre estas variáveis estão a raça, a idade,
a paridade, o peso e altura materna, o sexo do feto e o
número de fetos. Existe uma ampla e crescente evidencia
dos benefícios de ajustar as curvas de crescimento às características individuais. Estes valores ajustados reduzem o
número de falsos diagnósticos de RCIU.
Profilaxia e Tratamento
Apesar da maioria dos estudos concluírem que o tratamento com ácido acetilsalicílico diminui o risco de desenvolvimento de pré-eclampsia, não se demonstrou que diminui a
incidência de baixo peso ao nascer, nem de RCIU. Ensaiaram-se múltiplos tratamentos para o RCIU, entre eles o repouso
absoluto, hiperoxigenação materna, β-mimeticos, heparina de
baixo peso molecular, dadores de óxido nítrico, suplementos
nutricionais e expansores do plasma, no entanto nenhum deles demonstrou um efeito benéfico pelo que não estão recomendados.
Controle do bem-estar fetal
O controle do bem-estar fetal tem como objectivo decidir
qual é o momento otimo para finalizar a gestação, que será aquele em que os riscos de continuar a gravidez deixando o feto num
ambiente hostil serão maiores que os riscos da prematuridade.
A integração das diferentes provas de bem-estar fetal parece ser
a estratégia mais adequada, visto que se complementam. Estas
dividem-se em marcadores crónicos e agudos:
• Crónicos-Alteram-se nas fases de hipoxemia fetal e podem
persistir alterados durante semanas.
• Agudos-Alteram-se na fase de acidose e costuma preceder
a morte fetal em horas a dias.
Marcadores crónicos
Artéria umbilical – As alterações a nível da artéria umbilical são secundárias ao processo de vasoconstrição que ocor-
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re nas artérias espiraladas terciários (26). O fluxo ao nível da
artéria umbilical apresenta uma resistência crescente ao longo de deterioração fetal, pelo que em estadios avançados se
observa ausência e posteriormente inversão do fluxo diastólico. Cerca de 80% dos fetos apresentam fluxo diastólico nulo
duas semanas antes do feto mostrar sinais de acidose (27). Por
outro lado outros estudos mostram que 40% dos fetos com
acidose apresentam fluxo diastólico invertido (27). Este aparece
cerca de uma semana antes dos marcadores agudos pelo que
é considerado por alguns autores como um marcador subagudo (27) . Ainda que a associação entre fluxo invertido com
acidose e maus resultados perinatais esteja amplamente descrita (com sensibilidades e especificidades de cerca de 60%),
grande parte desta associação explica-se pela alteração concomitante dos marcadores agudos e pela prematuridade extrema. No entanto, uma atitude expectante num feto com fluxo
diastólico invertido e ausência de marcadores de sofrimento
fetal agudo é controverso (28).
Artéria cerebral media (ACM) – As alterações a nível da
ACM refletem o que foi já definido como vasodilatação cerebral. O aumento do diâmetro vascular reduz a impedância e
condiciona um aumento das velocidades diastólicas, com redução dos Índices de Pulsatilidade (IP) das artérias cerebrais.
O seguimento do Doppler da ACM durante o processo de deterioração fetal demonstra que este parâmetro altera-se de
maneira progressiva sem se observar nenhum ponto de inflexão (29). Em 80% dos fetos observa-se vasodilatação cerebral
duas semanas antes da alteração dos marcadores agudos (27).
Neste momento é objeto de debate e investigação se a vasodilatação cerebral é unicamente um fenómeno adaptativo do
feto sem repercussões posteriores no seu desenvolvimento
psicomotor. Existem resultados controversos, porem parece
observar-se que os fetos que apresentaram esta alteração
manifestam posteriormente um desenvolvimento psicomotor
inferior ao normal (30).
Avaliação do liquido amniótico (LA) -– O mecanismo fisiopatológico da existência de oligohidramnios nos casos de RCIU
não está claramente definido, podendo ser em parte explicado
pela diminuição da perfusão renal em situações de centralização hemodinâmica. A quantidade de LA em fetos com RCIU vai
diminuindo progressivamente(29). Em 20% dos casos observamos oligoamnios uma semana antes da alteração dos marcadores agudos (31). Um indice de líquido amniótico inferior a 5cm
associa-se a indice de Apgar patológico aos 5m, no entanto não
se conseguiu demonstrar associação com acidose (32).
Marcadores agudos
Veias precordiais – Perante a persistência de hipoxia crónica desenvolve-se uma situação de acidose metabolica que provoca a destruição das fibras miocardicas. Esta situação implica
uma diminuição de distensibilidade do miocárdio com aumento
das pressões telediastolicas, portanto, uma maior dificuldade
no retorno venoso ao coração direito. A associação entre as alterações a nível dos fluxos venosos e os resultados perinatais
adversos é clara e independente da idade gestacional (33). A sensibilidade e especificidade para a mortalidade perinatal é cerca
de 70% e 50% respectivamente (33).
Cardiotocografia (CTG) – Em situações graves de hipoxemia, estímulos provenientes de quimio e barorreceptores periféricos que geram estímulos parasimpaticos que provocam desacelerações no registo cardiotocografico. Para além disso, em estadios
avançados de compromisso fetal, o efeito da acidose sobre o SNC
e o efeito direto sobre a atividade cardíaca favorecem o aparecimento de desacelerações e a perda de variabilidade. A CTG tem
capacidade para detetar fetos doentes em cerca de 90% dos casos, porem com uma especificidade muito baixa (cerca de 40%),
devendo assim complementar-se com a informação do perfil biofísico. Apesar de CTG apresentar traçados não reactivos em fases
muito iniciais do processo de deterioração do feto com RCIU (31),
a perda da variabilidade precoce ocorre só uns dias antes da descompensação fetal, coincidindo com alterações dos fluxos venosos (29), sugerindo as alterações mais agudas do atingimento fetal
que ocorrem na fase terminal da deterioração fetal.
Perfil Biofísico Fetal (PBF) – Com a persistência da hipoxia
produz-se uma diminuição progressiva da quantidade de líquido
amniótico, sendo este um parâmetro do perfil biofísico que reflete cronicidade. Em estadios avançados de hipoxia um outro
fenómeno que se observa é o desaparecimento dos movimentos
respiratórios. Finalmente quando aparece a acidose há atingimento do tónus e dos movimentos grosseiros. A associação entre o perfil biofísico e a hipoxia é pobre ao contrário da correlação
com a acidose que parece aceitável, sendo que os parâmetros
melhor correlacionados são o tónus e os movimentos grosseiros.
A associação entre PBF alterado e a mortalidade perinatal foi
confirmado unicamente em estudos observacionais, ainda que
o número de casos confira validade aceitável. Apesar do PBF
apresentar uma sensibilidade muito boa tanto para a mortalidade
como para a morbilidade perinatal, a sua eficácia clínica vê-se
limitada pela taxa de falsos positivos que ronda os 50%, sendo a
CTG e o VLA de avaliação mais subjetiva e por consequência os
parâmetros individuais que mais agravam a especificidade.
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PROPOSTA DE PROTOCOLO DE ACTUAÇÃO
Diagnóstico provável: FETO CONSTITUCIONALMENTE PEQUENO
PFE • P5 e < P10
Estudo anatómico fetal normal
ILA • 5 e ” 25 cm
IP Artéria Umbilical ” P95 (normal)
Ecografia com avaliação de
PFE, ILA e IP Artéria Umbilical
PFE • P5 e < P10
ILA • 5 e ” 25 cm
IP Artéria Umbilical ” P95 (normal)
Alteração de algum parâmetro:
suspeitar de RCIU
Vigilância ecográfica
de 3 em 3 semanas
Conduta igual à RCIU
Parto às 37 – 38 s
Diagnóstico provável:
RESTRIÇÃO DE CRESCIMENTO INTRA-UTERINO
Se:
PFE < P5
ou
PFE ≥ P5 com ILA < 5 ou > 25 cm e/ou IP Artéria Umbilical > P95
Nestes casos propôr internamento onde devem ser efectua-dos/as:
Estudo da causa
• Estudo analítico (hemograma, plaquetas, funções renal e
hepática, sumário de urina, urina de 24h)
• Serologias maternas (CMV, rubéola, toxoplasmose, sífilis,
varicela)
• Ponderar cariótipo fetal (IG < 28-32s, hidrâmnios)
• Ecocardiografia fetal
Vigilância
• CTG diário
• ILA 2 a 7x semana
• Perfil Biofísico (PB) 2 a 7x semana
- ILA, CTG, Movimentos fetais, Tónus muscular, Movimentos respiratórios
• Fluxometria Doppler 2 a 7x semana
- artérias umbilical (AU) e cerebral média (ACM), ductus venosus (DV) e/ou veia umbilical (VU)
• Biometrias fetais (15-15 dias)
Atitude
• Repouso
• Indução da maturidade pulmonar segundo protocolo do serviço
Programação do parto
• Condição fetal
• Idade gestacional
• Patologia materna
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< 28s
•
•
•
•
•
Mais provável ser secundária a anomalia cromossómica/ genética
Morbilidade/ mortalidade associada à prematuridade extrema
Cada dia in utero aumenta a probabilidade de sobrevivência
Problemático o uso do CTG
Atitude intervencionista quase só por motivos maternos
Vigilância:
CTG, ILA, PB, Fluxometria da artéria
umbilical
Fluxo diastólico da artéria umbilical
NULO
INVERTIDO
Diariamente:
CTG, ILA, PB, Fluxometria da artéria umbilical
Fluxometria venosa
Ductus venoso com onda a nula ou invertida/
Veia umbilical pulsátil
PARTO
Causas maternas
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≥ 28s e < 34s
• Mortalidade neonatal diminui até às 32s e a morbilidade até às 34s
• Morbimortalidade maior nos fetos com RCIU
Vigilância:
CTG, ILA, PB, Fluxometria da
artéria umbilical
Fluxo
diastólico
da
artéria umbilical
NULO
INVERTIDO
Diariamente:
PB, Fluxometria da artéria
CTG, ILA,
PARTO
umbilical CTG anormal e/ou PB ” 4
ILA < 5 e/ou
Causas maternas
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≥ 34s
• Melhor prognóstico neonatal
• Grande percentagem de fetos Constitucionalmente Pequenos
Vigilância:
CTG
ILA
PB
Fluxometria das artérias umbilical e cerebral média
Fluxo diastólico da artéria
umbilical
nulo ou invertido
IP AU > P95
+
IP ACM < P5
Paragem de crescimento
fetal
(2 semanas)
PB ” 6 (ILA < 5 cm)
CTG anormal
PARTO
Causas maternas
PARTO
• Via de parto: vaginal/cesariana (ponderar em cada caso)
• Gasimetria do sangue do cordão umbilical
• Pedir sempre exame histológico da placenta
• Se RCIU precoce e grave e de causa desconhecida:
- Cariótipo da placenta
Após alta hospitalar referenciar para a Consulta de RCIU
• Rever toda a informação
• Solicitar exames considerados necessários
• Aconselhar sobre futuras gravidezes
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Período neonatal
Ana Margarida Alexandrino1
RCIU define-se como a taxa de velocidade de crescimento inferior ao normal para o potencial de crescimento do feto,
para uma determinada idade gestacional. Como consequência
resulta daí o nascimento de um recém-nascido leve para a idade
gestacional (LIG) isto é um recém-nascido com peso inferior ao
percentil 10 para aquela idade gestacional. A definição de LIG
não diferencia entre os LIG constitucionais, que alguns autores
referem rondar os 70%, os LIG com RCIU e os AIG com RCIU.
Daqui a importância do índice ponderal e da relação perímetro
braquial/ perímetro craniano para diferenciar, caracterizar qualitativa e quantitativamente estas situações. Os marcadores de
RCIU são então: o diagnóstico prénatal de RCIU, peso ao nascer <percentil 10 (LIG) e índice ponderal <percentil 10. Algumas
séries chamam a atenção para o facto de “… approximately one
third of antenatally diagnosed IUGR is not correct…” e de “…
only when the antenatal diagnosis of IUGR was confirmed by a
neonatal birth weight less than the 10th percentile was there a
correlation with adverse outcome.”
A insuficiência placentar compromete a transferência de nutrientes, tais como aminoácidos essenciais (ex. leucina), cálcio
e fósforo, podendo acompanhar-se de catabolismo proteico na
unidade feto-placentar e coexistir com alterações dos estados
de oxigenação e ácido-base. Dá-se a redistribuição do fluxo para
o SNC com diminuição do fluxo para o pâncreas, fígado, tubo
digestivo, rins, tecido hematopoiético. A composição corporal é
alterada com diminuição da massa gorda total, da massa muscular e do conteúdo mineral ósseo; diminuição do glicogénio no
fígado e no músculo esquelético. A malnutrição fetal condiciona
uma nova programação estrutural e funcional que é causa de
elevada mortalidade e morbilidade a curto, médio e longo prazo.
Os RN com RCIU não são todos iguais pois os factores
determinantes são múltiplos e condicionam graus de RCIU variados e com diferentes prognósticos. A hipertensão materna
pré-gestacional e as formas mais graves de HTA induzida pela
gravidez associam-se a RCIU mais grave com consequente prematuridade. O tabagismo > 10 cigarros/dia, a baixa estatura, o
IMC baixo e o baixo ganho ponderal estão mais vezes ligados a
RCIU de termo.
A prematuridade é uma das consequências da RCIU e
a incidência dos LIG aumenta com a idade gestacional mais
baixa; está descrito que constitui 10% dos RN de termo nos
__________
1
Maternidade Júlio Dinis, CH Porto
países desenvolvidos e cerca de 20% dos RN MBP (muito baixo
peso). Num estudo da Maternidade Júlio Dinis com análise dos
RN LIG entre 2000 e 2004 (n=406), 106 casos eram MBP constituindo 20% do total MBP desse período, confirmando-se pois
os dados da literatura. Nesse mesmo estudo foram procuradas
correlações entre os diferentes factores de risco de RCIU identificados e o prognóstico: muito baixo peso e imaturidade foram
factores determinantes para a mortalidade; muito baixo peso, a
idade gestacional <32 semanas, a hipertensão materna crónica,
multiparidade e doença genética tiveram forte correlação com a
morbilidade.
As análises que estabelecem a associação de RCIU com
menor mortalidade e menor morbilidade (justificadas com base
na maturação acelerada pelo stress) fazem-no num determinado
grupo de peso. É fundamental a análise por semana de idade
gestacional e com amostras suficientemente grandes em cada
semana. Estudo com 2 milhões de nascimentos, mostrou mortalidade fetal, neonatal e perinatal dos LIG termo, com pesos entre
1500 a 2500g, 20-30 vezes superior à dos AIG. E quando o peso
era inferior a 1500g a mortalidade era 70 -100 vezes superior.
Outro estudo mostrou que a mortalidade dos LIG aumenta com
a descida da idade gestacional (factor imaturidade) e com a descida dos percentis de peso (gravidade da RCIU). Abaixo do percentil 6 a mortalidade sobe a pique. Finalmente um estudo com
amostra de 29916 RN prétermo com RCIU, (Thomas J. Garite,
MD Reese C, James A. Intrauterine growth restriction increases
morbidity and mortality among premature neonates. American
Journal of Obstetrics and Gynecology, 2004), conclui que a RCIU
está associada a morbilidade e mortalidade aumentadas nos RN
prétermo.
As características clínicas dos recém-nascidos com RCIU
são bastante impressivas: pele fina, laxa e seca; diminuição marcada do tecido e da gordura subcutâneos e atrofia das massas
musculares; crânio anormalmente desproporcionado; face chupada, afilada de “de bruxinha”; cordão umbilical é frequentemente fino e a impregnação meconial não é rara. Os critérios físicos
de cálculo da idade gestacional estão alterados e tornam-se pouco fidedignos: a diminuição de vérnix leva a maior exposição ao
líquido amniótico pelo que a pele é mais pregueada (exemplo
- as plantas dos pés com pregas bem visíveis); botão mamário
menos visível, genitais femininos menos maduros e cartilagem
dos pavilhões auriculares reduzida. Os critérios neurológicos
pelo contrário são fidedignos desde que não haja lesões neurológicas.
restrição de crescimento intra-uterino: decisões obstétricas com repercussão no RN – mesa redonda
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As complicações e morbilidade são variadas a começar
pela própria prematuridade em si. Num estudo com 20000 RN
MBP, de idade gestacional <30 semanas, os LIG tiveram taxas
mais elevadas de mortalidade, enterocolite necrotizante, SDR e
retinopatia da prematuridade. Outro estudo multicentrico europeu com RN 24-31 semanas mostrou que a displasia broncopulmonar aumentou com a descida do percentil de peso; mas
que não houve associação da descida do percentil do peso com
a leucomalacia periventricular e a hemorragia intraventricular
mais grave. Além daquelas complicações são mais frequentes
a termorregulação diminuída, a hipoglicemia, a hipocalcemia, os
defeitos cardíacos congénitos, a policetemia, a trombocitopenia,
a neutropenia e a função imunológica alterada. Nos RCIU de
termo são de esperar mais situações de síndrome de aspiração
meconial, asfixia perinatal e hipertensão pulmonar persistente.
A programação do nascimento destas crianças num centro
perinatal é fundamental. A etiologia se ainda não está esclarecida, deve continuar a ser investigada tendo especial atenção para
as cromossomopatias, malformações e infecções congénitas. A
antecipação dos problemas que são mais frequentes é importante para uma intervenção mais atempada e eficaz. O suporte
nutricional é crucial e deve incluir não só alimentação parenteral
desde as primeiras horas de vida como também alimentação enteral trófica a iniciar nos primeiros dias de vida.
A avaliação da equipa de perinatologia é crucial para estimar a probabilidade de sobrevida e a antecipação de morbilidades graves futuras que podem ajudar os neonatologistas na
tomada de decisões terapêuticas e na agressividade do suporte
a instituir, sendo estas decisões mais prementes e críticas nas
idades gestacionais mais próximas do limite da viabilidade.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 167-168
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S 168
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Morbilidades futuras
Ana Cristina Braga1
Durante o desenvolvimento intrauterino o embrião humano
aumenta o comprimento 5000 vezes, a superfície corporal 60 milhões de vezes e o peso 6 mil milhões de vezes (1). O genoma fetal determina o potencial de crescimento in utero, mas o principal
determinante do crescimento realmente atingido é o ambiente
nutricional e hormonal em que o feto se desenvolve (2). A restrição de crescimento intrauterino (RCIU), que se estima atinja
cerca de 5% das gestações (3) é, cada vez mais, encarada como
um processo fisiológico de adaptação a um meio desfavorável.
O crescimento num ambiente de privação leva a adaptações metabólicas e circulatórias que, embora possam ter consequências
desfavoráveis no futuro, são importantes para a sobrevivência
fetal (4). Este processo representa aquilo a que Lucas se refere
como “programação”: um insulto sofrido numa fase crítica do desenvolvimento pode resultar num efeito duradouro da estrutura
ou da função do organismo (5).
O peso é, isoladamente, uma medida pobre do crescimento
intrauterino. A adição do comprimento e do perímetro cefálico
permite definir diferentes padrões de crescimento que têm diferentes consequências a longo prazo (6).
CONSEQUÊNCIAS METABÓLICAS
Estudos animais e em recém-nascidos (RN) leves para
a idade de gestação (LIG) mostraram existir associação entre
RCIU, resistência à insulina e aparecimento na vida adulta de hipertensão arterial, obesidade, diabetes mellitus tipo 2 e dislipidemia (síndrome metabólico). Estudos posteriores em RN prematuros, adequados e leves para a idade de gestação, confirmaram
que a prematuridade aumenta também a resistência à insulina,
com todas as referidas consequências futuras (7,8). O mecanismo
fisiopatológico responsável pelas alterações metabólicas será o
mesmo na restrição de crescimento intrauterino e na prematuridade, diferindo apenas no momento (intra ou extrauterino) da
exposição a condições desfavoráveis.
Em resposta à carência nutricional o feto diminui a sua dependência da glicose, e aumenta a oxidação de outros substratos, nomeadamente aminoácidos e lactato. A resistência periférica à insulina, que surge como mecanismo poupador de glicose,
pode perpetuar-se na vida adulta. Por outro lado, com a menor
__________
1
Assistente Hospitalar Graduada de Pediatria, S. Neonatologia,
U Maternidade Júlio Dinis, CH Porto
disponibilidade de nutrientes, diminui a produção de hormonas
anabólicas - insulina, IGF-1 e hormona do crescimento - e aumenta a de hormonas catabólicas, nomeadamente glicocorticóides (6).
Também o ganho ponderal pós-natal é um componente
importante na programação de doenças no adulto. Estudos epidemiológicos, clínicos e experimentais em animais realizados
em todo o mundo têm demonstrado que existe uma associação
entre crescimento lento pré-natal, aceleração do crescimento na
fase precoce da vida, e o aparecimento posterior de intolerância à glicose, resistência à insulina, diabetes tipo 2, obesidade
e doença cardiovascular (9,10). A discordância entre o fenótipo fetal, desenvolvido na adaptação a um ambiente desfavorável, e o
ambiente nutricional pós-natal tem consequências metabólicas
adversas (10). Investigadores compararam, durante a infância e
adolescência, indivíduos nascidos prematuramente que receberam fórmulas para prematuros com outros alimentados com leite
humano ou fórmula para lactentes. Concluiram que aqueles que
receberam fórmula com maior densidade calórica e proteica obtiveram resultados desfavoráveis no perfil lipídico, pressão arterial
e resistência à leptina e insulina, estabelecendo uma relação entre alimentação precoce e obesidade futura (11,12).
Factores genéticos poderão também dar o seu contributo
no desenvolvimento de complicações metabólicas em indivíduos leves para a idade de gestação. Investigação realizada pelo
Auckland Birthweight Collaborative study mostrou uma maior
prevalência de factores genéticos associados à obesidade e/ou
risco de diabetes tipo 2 nos indivíduos nascidos leves do que nos
adequados à idade de gestação (13).
NEURODESENVOLVIMENTO
Crianças que sofreram RCIU apresentam mais alterações
do neurodesenvolvimento do que os seus pares com a mesma
idade de gestação mas peso adequado à idade. Estudos em que
o controle é feito com crianças com o mesmo peso ao nascimento (e portanto de menor idade de gestação) não revelam esta
diferença (14). A presença de outros aspectos com implicações
no neurodesenvolvimento, como a prematuridade, a inclusão de
crianças constitucionalmente pequenas, ou a causa e o tipo de
RCIU, dificultam a identificação da responsabilidade da RCIU no
prognóstico destes indivíduos.
Tradicionalmente é atribuido pior prognóstico às crianças
com restrição simétrica do crescimento, por se considerar que
esta foi mais duradoura, mais grave e de instalação mais preco-
restrição de crescimento intra-uterino: decisões obstétricas com repercussão no RN – mesa redonda
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ce. Recentemente a RMN cerebral tem revelado atingimento do
crescimento cerebral mesmo quando o perímetro cefálico está
conservado, mostrando que crianças com restrição assimétrica podem ter um desenvolvimento cerebral anormal, apesar do
aparente fenótipo de “preservação cerebral” (15). Têm sido demonstradas alterações estruturais cerebrais em prematuros com
RCIU. Além da redução do volume intracraniano e da substância
cinzenta, parece haver uma vulnerabilidade cerebral regional
que atinge sobretudo o hipocampo e os lobos límbico e frontal. À
medida que se dá a maturação do SNC estas alterações podem
levar ao desenvolvimento de um perfil neuropsicológico particular (16). O seguimento desta população até à idade adulta tem
permitido identificar alterações subtis do neurodesenvolvimento
em indivíduos com QI normal e uma maior incidência de défice
de atenção-hiperactividade e impulsividade (15).
O padrão de crescimento extrauterino também se relaciona
com o desenvolvimento. Crianças que “recuperam” o crescimento (catch-up growth) têm os melhores resultados. Cerca de 10%
das RCIU não fazem esse “catch-up”, havendo autores que sugerem que nestas crianças haverá uma resistência ao IGF-1 e à
hormona de crescimento (HC) (15). Estudos demonstram melhoria
do QI, comportamento e auto-estima em crianças tratadas com
HC (17).
CONSEQUÊNCIAS RESPIRATÓRIAS
Tem sido aceite que recém-nascidos com restrição de crescimento, devido ao stress sofrido in utero, têm um melhor prognóstico respiratório. Contudo a restrição de crescimento intrauterino é descrita como um factor de risco independente para o
desenvolvimento de displasia broncopulmonar (DBP) (18). A DBP
é uma das principais morbilidades associadas ao intensivismo
neonatal. Cada vez mais se reconhece que há alterações na fisiopatologia da doença, com alguns RN a desenvolverem DBP
não precedida de Síndrome de Dificuldade Respiratória do RN
nem de ventilação mecânica; é neste grupo de crianças que a
RCIU pode ter responsabilidade etiológica (19), embora nem todos
os estudos estabeleçam esta relação. Pensa-se que os processos que limitam o crescimento fetal poderão também limitar o
crescimento e maturação pulmonar: desequilíbrio entre factores
angiogénicos e anti-angiogénicos, hipóxia fetal/pulmonar crónica, alteração do meio bioquímico pulmonar com redução da produção de surfactante (18).
Pieira e infecções respiratórias são mais comuns nas crianças que sofreram RCIU. O seguimento destas crianças tem mostrado que a sua função pulmonar é significativamente diferente da das crianças nascidas com peso adequado à gestação,
apresentando um aumento da resistência das vias aéreas (20). Os
volumes pulmonares, pelo contrário, relacionam-se não com o
peso ao nascimento mas com o peso na data da observação.
Consequências renais
Estudos têm mostrado que o peso ao nascimento é um forte determinante do volume renal, do número de nefrónios e do
tamanho glomerular. A malnutrição fetal na fase tardia da ges-
tação, fase de rápido crescimento renal, leva a uma diminuição
desse crescimento e a uma consequente diminuição do número
de células renais; esta poderá ser permanente uma vez que após
o nascimento parece não haver capacidade de replicação celular
renal para catch-up (6). A menor massa renal e menor número de
nefrónios associados ao baixo peso ao nascimento tornam o rim
mais susceptível à lesão, favorecem o desenvolvimento de HTA
e a evolução para doença renal crónica. O aumento da pressão
capilar e hiperfiltração levam à hipertrofia glomerular, hipertensão intraglomerular e hipertensão sistémica, dando início a um
ciclo de lesão glomerular progressiva (21).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A subnutrição fetal programa a resistência à insulina e a
diabetes tipo II, o que significa que as sementes da diabetes na
próxima geração foram lançadas e são já aparentes nas crianças
de hoje (6).
Estabelecida uma relação entre RCIU (e, em menor medida, também a prematuridade) e doenças do adulto, justica-se a
vigilância destas crianças até à vida adulta. A identificação dos
indivíduos em risco numa fase pré-clínica permitirá a tomada de
medidas que impeçam ou atrasem a manifestação da doença
(22)
.
As políticas de saúde devem intensificar esforços em medidas que promovam um adequado crescimento intrauterino e
nutrição pósnatal, estimulando o aleitamento materno. Evita-se
assim dilemas como promover ou não a rápida recuperação do
crescimento durante a infância (23).
Crianças com RCIU, nascidas de termo ou prétermo, têm
risco aumentado de alterações do desenvolvimento. Outros factores, como a prematuridade ou as condições sociais adversas,
frequentemente coexistem e têm efeito prognóstico aditivo. A
vigilância do seu neurodesenvolvimento deve ser portanto assegurada, de forma a garantir-se a optimização dos resultados (15).
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 169-171
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Microbiota e cultura de arranque
Helena Canário1
A mucosa do trato gastrintestinal (trato GI) constitui a maior
interface de contacto entre o organismo humano e o ambiente externo. Através da mucosa intestinal, o hospedeiro interage
com uma população microbiana de dimensão substancial que
está presente no lúmen intestinal e que se denomina de microbiota intestinal – incluindo tanto a microflora intestinal (microrganismos residentes) como todos os microrganismos ingeridos
pelo hospedeiro.
Uma vez que o trato GI funciona como uma barreira e, simultaneamente, é uma superfície de interação com o ambiente,
não é surpreendente que nele esteja presente a maior proporção
de tecido linfoide do organismo. Cerca de 80% de todas as células produtoras de imunoglobulinas encontram-se precisamente no trato GI, compondo o tecido linfoide associado à mucosa
intestinal (GALT – Gut Associated Lymphoid Tissue), um órgão
imunológico major.
O crescente corpo de evidências científicas continua a
elucidar-nos acerca dos potenciais benefícios do consumo de
microrganismos vivos, geralmente referidos como probióticos.
Através da modificação da composição da microflora intestinal,
e melhoria do “equilíbrio microbiano”, os probióticos conferem
benefícios ao hospedeiro, sobretudo através da modulação das
respostas imunológicas do GALT. Os probióticos podem assim
ser definidos genericamente como microrganismos não patogénicos presentes nos alimentos capazes de conferir benefícios
para a saúde do hospedeiro através de vários mecanismos. É
ainda de salientar que a palavra probiótico significa, literalmente,
“para a vida”.
Bactérias probióticas comuns incluem-se sobretudo nos
géneros Lactobacillus e Bifidobacterium, sendo este último componente predominante da microflora presente no cólon de lactentes alimentados com leite materno. O leite materno contém
inúmeros componentes, incluindo prebióticos (oligossacáridos).
Estes, tal como outros tipos de oligossacáridos presentes na alimentação de crianças e adultos, podem favorecer o crescimento
de Bifidobactérias e Lactobacillus.
In utero, o tracto GI é estéril. Imediatamente após o nascimento, inicia-se a colonização bacteriana do tracto GI. Nos primeiros 2 dias de vida extra-uterina o tracto GI do recém-nascido
é rapidamente colonizado com bactérias, maioritariamente enterobactérias. A alimentação influencia o desenvolvimento da mi__________
1
Medical Advisor Nestlé Materno Infantil
croflora intestinal, verificando-se um grande aumento de bifidobactérias, a par de aumentos, menos marcados, de Lactobacilli
e Bacteroides e diminuição do número de enterobactérias. De
salientar que lactentes alimentados com leite materno verifica-se
uma predominância de espécies pertencentes ao género Bifidobacterium (80 a 90% da microflora total).
Assim, em lactentes alimentados com leite materno, a microflora intestinal é bifidodominante, estando também presentes
espécies de Lactobacillus e algumas espécies de Staphylococcus. Pelo contrário, lactentes alimentados com fórmula com idades compreendias entre 1 e 4 meses apresentam uma microflora
mais complexa, dominada por coliformes e Bacteroides (Figura
1). Com a diversificação alimentar, a microflora intestinal do lactente começa a assemelhar-se à do adulto, variando de indivíduo
para indivíduo, mas permanecendo relativamente estável no próprio indivíduo.
De que modo é que o tipo de parte poderá influenciar a microbiota intestinal? O começo não é igual para todos os bebés.
Assim, podemos dizer que este começo estará dependente do
tipo de parto, tempo de gestação (prematuridade), bem como se
o bebé é sujeito a tratamento com antibióticos. Por outro lado, o
que se verifica é que os bebés que nascem por cesariana têm
um tipo de microbiota diferente dos bebés que nascem de parto
vaginal, tendo estes últimos uma contagem total de bifidobacterias mais elevada. A colonização nos bebés nascidos por cesariana é mais lenta. A questão que se coloca é: que impacto tem
na saúde futura do lactente? Parece haver uma correlação entre
tipo de parto e determinadas patologias tais como: asma, alergia
alimentar, infeções gastrintestinais etc.
Então qual será a melhor forma para modular a microbiota
intestinal? Obviamente que o leite materno é a melhor forma e
a mais natural. No entanto, face a novas evidências qual será a
melhor atitude a tomar? Repensar a alimentação dos bebés não
amamentados ou continuar a fornecer uma alimentação estéril?
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 172-173
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S 173
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revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Cyberbulling na adolescência
Hugo Tavares1
Bullying é definido como uma forma de agressão que é
intencional, repetida e que envolve um desequilíbrio de poder
entre vítima e perpetrador1.
Pode assumir formas diretas (física e verbal) ou indiretas
(relacional ou social) 2, descrevendo-se mais recentemente o
bullying eletrónico (cyberbullying) com o crescente uso de tecnologias de informação2.
Os intervenientes no processo de bullying podem ser provocadores, vítimas (forma clássica e vítimas-provocadores que
provocam reações nos agressores com as quais não consegue
lidar) ou testemunhas/observadores dos episódios de bullying.
Trata-se de um problema prevalente entre os adolescentes com repercussões a nível do rendimento escolar, bem-estar
psico-social e desempenho relacional tanto da vítima como do
agressor3-6.
Cyberbullying é definido como um ato hostil repetido e deliberado de ameaça e ofensa (denegrir, humilhar), recorrendo a
meios de tecnologia de informação nomeadamente telemóveis,
internet, entre outros7,8,9,10. Implica necessariamente que tanto o
abusador/provocador como a vítima tenham idade inferior a 18
anos, sendo que no caso de envolvimento de maiores de idade
se passa a denominar assédio de menores.
Não existe atualmente moldura penal para o cyberbullying
em Portugal já que este ato não é reconhecido como crime. Muitas das queixas relacionadas são classificadas como crimes informáticos, de índole sexual ou devassa da vida privada, o que
dificulta a obtenção de uma estatística real. Mais ainda, a inexistência da moldura penal dificulta o combate eficaz a este tipo
de bullying. A nível internacional tem sido feito um esforço para
criminalizar o cyberbullying destacando-se o Canadá e alguns
estados dos EUA onde é já considerado um ato criminal e existe
uma moldura penal adequada.
Os dados da última avaliação do HBSC (2010)11 apontam
para uma alteração consistente nos hábitos de socialização dos
jovens a nível mundial com o crescimento marcado do recurso
aos interfaces eletrónicos. Segundo os dados do INE (2011)12
atualmente 58% dos lares portugueses têm acesso à internet,
98% dos quais em banda larga (56,6% do total de agregados
familiares). A evolução nacional neste ítem, na última década,
foi marcada, tendo em conta que em 2002 apenas 15,1% dos lares portugueses tinham internet e 7,9% acesso a banda larga. A
__________
1
U Medicina do adolescente, CH Vila Nova de Gaia - Espinho
implementação do programa governamental “e-escolas”, no ano
de 2008, levou as crianças portuguesas à liderança a nível europeu no que diz respeito ao acesso à internet via computadores
portáteis, sendo que 93% tem acesso em casa e 67% no seu
quarto (EU KIDS ONLINE 2012)13. Também a disponibilização de
acessos à internet nas escolas (usada por 72%), em bibliotecas
(usada por 25%) e wi-fi em espaços públicos contribuiu para o
aumento da oferta de acesso com cobertura da grande maioria
da população portuguesa. Apesar da grande disponibilidade de
acesso à internet as taxas de reportação de uso da mesma pelas
crianças e jovens portugueses ainda colocam o nosso país no
grupo de baixo uso13. A maioria dos jovens reporta usar a internet
para trabalhos escolares, jogos, visualização de vídeos, troca de
emails e uso de redes sociais13. Tendo em conta os riscos reportados no seu uso, Portugal é considerado um país de risco
moderado13.
Existem em Portugal 157,9 cartões de telemóvel ativos por
100 habitantes (ANACOM, 2011)14, muitos deles com acesso à
internet o que alarga ainda mais a exposição da população às
diferentes tecnologias da informação.
A prevalência de cyberbullying a nível mundial é muito variável e provavelmente sub-reportada pelo receio de exposição,
represálias e vergonha de assumir ter sido vítima deste tipo de
agressão. Existem ainda diferenças significativas entre países
quanto ao veículo usado no cyberbullying, o que parece refletir
as diferentes expressões das tecnologias de informação nesses
países. Apesar da grande disparidade, a maioria das investigações aponta para um envolvimento de até 25% dos jovens em
comportamentos de cyberbullying.
Os dados sobre cyberbullying atualmente disponíveis em
Portugal resultam de projetos de investigação individuais, alguns
com representatividade questionável da totalidade da população
jovem portuguesa. Almeida et al (2008) descreve que 6 e 3% (raparigas e rapazes, respetivamente) de uma amostra de alunos
do 7º ao 9º anos de escolaridade referiam já ter sido vítimas de
cyberbullying através de telemóvel com uma percentagem semelhante de alunos a referir terem sido vítimas desta agressão
na internet. A percentagem de agressores por telefone e internet
era de 3/5% e 2/4% (rapariga/rapaz, respetivamente). Campos
M (2009), mostrou que 8,7% de uma amostra de 115 jovens alunos com idades entre os 10 e os 26 anos tinham sido vítimas de
cyberbullying e 6,1% reportavam terem sido agressores recorrendo a meios eletrónicos. Ventura (2010) descreveu uma taxa
de 10% de vítimas de cyberbullying entre 934 alunos do 3º ciclo;
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dois terços destes alunos referiam ser também vítimas de outras
formas de bullying. Por fim, o estudo Cyberbullying – o diagnóstico da situação em Portugal, financiado pelo FCT, encontra-se
atualmente a decorrer no nosso país com até 2013, tendo os resultados preliminares (ano de 2012) revelado que 15,6% haviam
sido vítimas e 9,6% perpetradores deste tipo de bullying. Não
foram encontradas diferenças na prevalência de comportamentos de cyberbullying tendo em conta a idade e o nível escolar
dessa amostra. Os provocadores eram maioritariamente do sexo
masculino, não havendo diferenças de género entre as vítimas. O
SMS era o veículo preferencialmente utilizado e 67,2% revelavam
não conhecer nenhuma vítima de cyberbullying (Armanda Matos,
2012, comunicação pessoal dos resultados preliminares do estudo Cyberbullying – o diagnóstico da situação em Portugal).
O estudo EU KIDS ONLINE13 revelou que apenas 2% das
crianças e jovens (9-16 anos de idade) portuguesas haviam sofrido
cyberbullying. Segundo esta avaliação de âmbito europeu Portugal
é mesmo o país europeu com a menor percentagem de abusadores e o segundo com menor taxa de vítimas de cyberbullying15.
O risco de ser um provocador online vs offline aumenta
48% se for rapariga, 30% por cada hora a mais passada na internet, 31% se o jovem tem outros comportamentos de risco na
internet13. Por outro lado, as vítimas e as provocadoras de cyberbullying são também as que são mais vulneráveis offline e é
frequente existir alternância de papéis de provocador/vítima de
cyberbullying entre os jovens13.
O cyberbullying reveste-se de algumas particularidades que
o diferenciam de outras formas de bullying, nomeadamente:
a) O tipo de agressão é apenas psicológica
b) Anonimato do agressor/vítima
1. Ao contrário de outras formas de bullying a identidade
do agressor nem sempre é conhecida podendo ser o
vizinho, colega de carteira ou alguém de outra cidade/
país. O desconhecimento da identidade do agressor
pode agravar consideravelmente a pressão e medos
associados.
2. O anonimato potencia a alternância de papéis agressor/vítima, o que necessariamente perpetua o processo de bullying.
3. O anonimato leva, também, frequentemente, a uma rutura com o modelo tradicional de bullying em que o elemento mais forte maltrata o mais fraco. É mesmo visto por muitas vítimas de bullying não eletrónico como
uma oportunidade de se vingarem dos seus agressores. Assim, a desproporção de forças que caracteriza
e define esta forma de agressão por vezes é invertida
no cyberbullying que pode ser perpetrado pelas “convencionais” vítimas.
c) A testemunha da agressão que tem habitualmente um
papel mais passivo nas formas tradicionais de bullying
(contribuindo com o seu papel para aumentar a vergonha
do abusado e a sensação de realização do agressor),
pode ter um papel mais ativo no cyberbullying agindo por
forma a perpetuar a agressão ao reencaminhar um email
difamatório para os seus contactos, comentando num
chat ou rede social, tornando-se muitas vezes também
ele um abusador.
Por outro lado, o contexto online da agressão contribui
para o aumento exponencial de testemunhas do abuso
quando comparado com o bullying convencional.
d) Espaço e tempo
1. No cyberbullying a agressão não se limita a um espaço
físico (escola, recreio, bairro) mas pode estender-se
a todo um universo cibernauta através dos diferentes
instrumentos da internet. Aumenta-se assim a exposição da vítima a um número maior de testemunhas e
o espaço de desconforto / sensação de insegurança
é aumentado de forma exponencial. A disponibilidade
quase universal de acesso às tecnologias de informação leva à dificuldade do jovem em encontrar um ambiente onde não possa ser exposto à agressão aumentando a pressão sobre a vítima.
2. Também a rapidez de disseminação de informação é
significativamente maior no cyberbullying.
3. A existência de um registo eletrónico (fotografia, filme,
blogue, tweet, comentário numa rede social) conduz à
perpetuação da agressão que pode ser reavivada em
diferentes ciclos.
As motivações dos agressores que recorrem ao cyberbullying são variadas e incluem a vingança, chantagem, afirmação social, promover o ostracismo das vítimas, frustração, revolta e diversão.
São vários os métodos usados neste tipo de agressão
que podem ser específicos de determinados veículos (telefone,
email, redes sociais):
a) Insulto | calúnia | difamação | chantagem – consiste no
envio de SMS, emails, tweets, publicações em blogues
e redes sociais, fotografias comprometedoras (reais ou
adulteradas) sobre a vítima. Esta agressão pode ser
pessoal e dirigida apenas à vítima ou ser distribuída a
toda uma comunidade cibernauta. Quando perpetrada de
forma constante e repetida pode assumir a dimensão de
moléstia ou agressão.
b) Roubo de identidade | Impersonalização – o abusador
usa a identidade da vítima (roubo de palavra passe ou
criação de utilizador em nome da vítima) para a denegrir
enviando emails/tweets/comentários/informações pessoais em seu nome.
c) Enganar – fazendo-se passar por uma outra pessoa o
abusador tenta enganar a vítima e apoderar-se de informação comprometedora desta que passa depois a usar
contra ela, expondo-a à comunidade cibernauta.
d) Exclusão – resulta do negar acesso a determinado grupo
(rede social) ou página web votando o pretendente a um
ostracismo com as consequentes repercussões psicológicas e sociais que se podem estender a outras áreas da
sua vida (incluindo a não virtual).
e) Sexting – resulta do envio de imagens (fotografias ou
vídeo) com conteúdo erótico/sexual recorrendo às tec-
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nologias de informação. Habitualmente as imagens são
trocadas numa fase inicial entre duas pessoas com o seu
consentimento mas posteriormente pode ocorrer disseminação das mesmas contra a vontade da vítima que se
vê, assim, exposta. Uma vez publicadas online a vítima
perde o controlo das mesmas podendo mesmo acabar
publicadas em sítios de pornografia infantil.
f) Outing – consiste no envio de fotografias e/ou vídeos
comprometedores com o conhecimento e autorização da
vítima. Estes registos são habitualmente de cariz erótico/
sexual ou potencialmente alvo de gozo. A vítima que ao
autorizar o envio pretende ser conhecida vê-se depois
envolvida em atos de cyberbullying ao ser gozada, perseguida, abordada.
Os instrumentos utilizados no cyberbullying estão em expansão em sintonia com o desenvolvimento de novas tecnologias de
informação. Na maioria das séries descritas sobre cyberbullying
o instrumento mais utilizado é o SMS que reflete a quase universalidade da distribuição de telemóveis entre os jovens. Estes são
usados para o envio de mensagens ameaçadoras, difamatórias
ou com insultos ou fotografias/vídeos. São também utilizados o
email (com possibilidade de envio de anexos - fotografias, vídeos), as redes sociais (twitter, facebook), os chats, os jogos online
e as chamada telefónicas via internet e videochamadas.
O cyberbullying, à semelhança de outras formas de bullying
pode ter consequências a nível da estabilidade psicológica,
auto-estima, rendimento académico e capacidade de socialização das vítimas que tendem a isolar-se e a ter dificuldade em
desenvolver relações sociais saudáveis16. Estas consequências
podem mesmo prolongar-se pela idade adulta e no limite têm
sido descritos casos de suicídio associados.
Segundo alguns autores as consequências deste tipo de
bullying podem mesmo ser mais destrutivas do que nas outras
formas de agressão, muito pelas razões apontadas aquando da
comparação com o bullying convencional (anonimato, espaço de
atuação alargado, facilidade e tempo de disseminação e a possível perpetuação da agressão no tempo)10.
Estas consequências podem afetar tanto as vítimas como
os provocadores, sendo que as vítimas reportam frequentemente serem vítimas de ostracismo e os provocadores procurarem
satisfazer o seu desejo de poder/supremacia sobre os pares.
A principal arma para combater o cyberbullying é a prevenção que deverá abranger não só os jovens como também os pais
e professores.
Preconiza-se o ensino dos jovens para o uso racional das
tecnologias de informação alertando-os para comportamentos de
risco como a partilha de dados pessoais (fotos, nome, data de
nascimento, morada, escola que frequentam, pormenores da sua
rotina diária, palavras passe), aceitação de “amigos online” que
desconhecem na vida real, pesquisa de sítios de internet não fidedignos ou conteúdo duvidoso (onde procuram os jogos e filmes/
vídeos preferidos), visualização de emails de proveniência desconhecida, de filmes online, adoção de comportamentos de cyberbullying (alertando-os para como alguns comportamentos podem
ser sentidos com bullying). Deverão ser motivados a restringir o
acesso às suas informações gerindo as definições de partilha nas
redes sociais e ensinado a respeitar o próximo e a usar de forma
adequada alguma informação que possuam sobre outros. Os jovens deverão ser também instruídos a comunicar qualquer tentativa de abuso a um adulto de referência (pais, professores).
A formação de pais e professores deve alertá-los para sinais que apontem para a possibilidade de um jovem ser vítima de
cyberbullying como a) alteração de comportamento e labilidade
emocional, b) comportamentos de hétero e auto-agressividade,
c) alteração de rendimento académico, d) isolamento social, e)
alteração do padrão de uso das tecnologias de informação. Os
pais e professores devem ser motivados a manter um acompanhamento real das atividades online dos filhos/alunos (evitando
o uso em isolamento, equilibrando as restrições de uso, discutindo as descobertas dos filhos, usando programas de controlo
parental). Por outro lado devem ser ensinados a agir de forma
adequada na suspeita de cyberbullying não subestimando os
casos reportados mas também não contribuindo para “castigar”
ainda mais o jovem impedindo-o de aceder às tecnologias de
informação para o “proteger”.
A denúncia do abusador junto do serviço web/rede social e
no limite às autoridades é também uma solução habitualmente
guardada para os casos mais dramáticos.
Existem atualmente diversos instrumentos disponíveis online para a formação, prevenção e aconselhamento sobre a melhor forma de atuação em casos de cyberbullying. Sugere-se a
consulta de alguns sítios desenhados com este propósito (www.
seguranet.pt, www.cybertraining-project.org, www.internetsegura.pt), assim como o recurso a algumas ferramentas de controlo
parental disponíveis, programas de prevenção e boas práticas
do uso na internet providenciados pelos próprios servidores de
que são exemplo a Microsoft® Portugal e a SAPO®.
Do exposto fica claro que a expansão da oferta e facilidade
de acessibilidade às diferentes tecnologias de informação nos
últimos anos tem contribuído para uma maior exposição dos jovens ao cyberbullying. A realidade atual do impacto do cyberbullying ainda não é conhecida em Portugal e é dificultada pela
sub-reportação e ausência de moldura penal para esta forma de
agressão.
O cyberbullying tem características específicas que o podem tornar ainda mais lesivo que as formas convencionais de
bullying e que devem ser reconhecidas para definir estratégias
de intervenção mais adequadas.
As formas de agressão e meios utilizados são variados e
exigem uma constante atualização para melhor compreender
esta realidade.
A prevenção é o principal instrumento de combate ao cyberbullying e deve envolver os jovens, que deverão ser educados
para o uso racional das tecnologias de intervenção, e os seus pais/
professores, que deverão monitorizar o seu uso de forma ativa.
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
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CORRESPONDÊNCIA
[email protected]
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Panorama Nacional do Bullying
Mafalda Ferreira1, Margarida Gaspar de Matos1 & Equipa Aventura Social
RESUMO
O estudo Health Behaviour in School-aged Children (HBSC)
é desenvolvido em colaboração com a Organização Mundial de
Saúde (OMS), e procura compreender os comportamentos de
saúde dos adolescentes em idade escolar, os seus estilos de
vida e os seus contextos sociais (www.hbsc.org; www.aventurasocial.com).
Este estudo foi iniciado em 1982 por investigadores da Finlândia, Noruega e Inglaterra, tendo sido adotado pouco tempo
depois pela OMS, sendo que neste momento, conta com a participação de 44 países, incluindo Portugal, membro associado
desde 1998.
Os estudos da rede internacional HBSC são realizados de
4 em 4 anos, com alunos de escolas públicas do ensino regular.
Portugal conta já com quatro estudos, realizados em 1998, 2002,
2006 e 2010 pela equipa do projecto Aventura Social (www.aventurasocial.com), coordenado pela Profª. Dr.ª Margarida Gaspar
de Matos na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade
Técnica de Lisboa, numa parceria com o Centro da Malária e
outras Doenças Tropicais da Universidade Nova de Lisboa (Laboratório Associado da Fundação para a Ciência e Tecnologia,
LA-FCT/MCES). Desde 1996, foram já inquiridos cerca de 25000
adolescentes, se incluirmos o estudo específico de 2005, realizado em áreas desprivilegiadas na periferia de Lisboa, e o estudo
piloto realizado em 1996.
O questionário utilizado no estudo HBSC inclui questões
demográficas (idade, género, estatuto socioeconómico) e questões relativas aos comportamentos de saúde dos adolescentes
e os seus contextos de vida, de acordo com o protocolo internacional.
O estudo HBSC criou e mantém uma rede internacional dinâmica nesta área, o que permite a cada um dos países membros contribuir e adquirir conhecimento através da colaboração
e troca de experiências com os outros países e intervir directa e
ativamente nas políticas públicas de Educação e da Saúde.
Esta comunicação pretende abordar a temática do bullying,
procurando não só apresentar os dados mais recentes mas também uma comparação com os dados dos últimos estudos nesta
área. Assim, de uma forma geral, verifica-se que a maioria dos
adolescentes refere não ter sido provocado na escola nos últi-
mos dois meses, tendo sido 2002 o ano de maior envolvimento
dos adolescentes em provocações enquanto “vítimas”. Desde
esse ano tem vindo a aumentar o número de adolescentes que
afirma que nunca foi provocado na escola.
Quanto a ser provocado duas vezes ou mais por semana
nos últimos dois meses, este comportamento diminuiu de 2006
para 2010. Desde 1998 o número de adolescentes que afirma
nunca provocar os colegas na escola tem vindo a aumentar, sendo 2010 o ano em que os adolescentes mais frequentemente
referem nunca ter provocado nenhum colega na escola.
Questionados sobre se assistiram a situações de provocação na escola, mais de metade declarou ter assistido e referem
que na escola os casos de provocação ocorrem mais frequentemente no recreio. Como já vem sido reportado, as situações
menos estruturadas da escola tendem a ser aquelas onde a provocação é maior, embora depois a continuidade da ocorrência
possa vir a perturbar as aulas. A organização do espaço dos recreios, do ponto de vista arquitectónico, da ocupação pró-social
do tempo de lazer, e da possibilidade de aí se usufruir de um
bem-estar psicológico parece assim uma excelente estratégia de
prevenção da provocação na escola.
Dos alunos que assistiram a casos de provocação na escola, a maioria afastou-se e não interveio, tornando-se assim
importante estabelecer com os alunos, a nível de toda a escola,
um conjunto de decisões partilhadas sobre o que se pode fazer
quando se assiste a um ato de provocação na escola.
Por outro lado, o acesso fácil à Internet ou outras tecnologias traz consigo mais um “canal” no conjunto de possibilidades
de ocorrência de violência interpessoal e, efectivamente, 15,9%
dos jovens reporta já ter sido ator de episódios de provocação
com utilização de novas tecnologias, principalmente através do
Messenger e SMS/MMS.
Estas situações urgem de uma acção eficaz e célere, facilitando nos jovens um aumento das suas competências pessoais,
na sua defesa não só face a estes novos meios mas também
contra si próprio.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 178
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1
Universidade Técnica de Lisboa, Faculdade de Motricidade Humana
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Formas clássicas
Teresa Borges1
A Hiperplasia Supra-renal Congénita (HSRC) é uma
patologia Autossómica Recessiva caracterizada pela alteração
da síntese do colesterol. Tem uma incidência estimada de
1:10000 a 1:20000 recém-nascidos, com variações étnicas e
raciais importantes.
A forma mais comum de HSRC, responsável por cerca de
95% dos casos, é provocada pela mutação / delecção do gene
CYP1A2, que codifica para a enzima 21-hidroxilase (P550C21).
Esta enzima converte a 17-hidroxiprogesterona (17OHP) em
11-desoxicortisol e a progesterona em desoxicorticosterona,
respectivamente, os precursores do cortisol e da aldosterona.
O bloqueio da síntese do colesterol leva à estimulação do córtex
da supra-renal, com acumulação dos precurssores do cortisol
que são desviados para a biossíntese das hormonas sexuais.
Cerca de 75% das formas clássicas da HSC têm deficiência de
aldosterona.
O gene que codifica para a 21-hidroxilase está localizado
na região III do complexo humano de histocompatibilidade, no
cromossoma 6. Existem mais de 100 mutações conhecidas do
CYP21A2. O estudo genético do gene permite detectar cerca de
95% dos doentes afectados.
As formas Clássicas da HSRC dividem-se em formas
Clássicas perdedoras de sal e formas Clássicas virilizantes
simples. Cerca de 75% dos doentes com HSRC forma clássica
têm deficiência de aldosterona – forma perdedora de sal. A
crise adrenal surge nas 1ªs semanas de vida e os sinais típicos
são: hiporreactividade; reflexo de sucção débil, dificuldades
alimentares, hiperpigmentação, vómitos, hipotermia, hipotensão,
desidratação e perda de peso. Analiticamente é caracterizada por:
hipoinatrémia; hipercaliémia; hipoglicemia e acidose metabólia.
As formas Clássicas condicionam virilização no RN do sexo
feminino, constituindo a causa mais comum de ambiguidade
sexual no feto geneticamente feminino. O grau de virilização
é muito variável, desde cliteromegalia simples até ao aspecto
de phalus. No feto do sexo masculino, os genitais externos não
estão afectados e na ausência da forma perdedora de sal, o
diagnóstico é protelado e condicionado pelo aparecimento de
pêlo axilar e púbico, acne, aceleração do crescimento e da idade
óssea.
O diagnóstico assenta na Prova de ACTH (250 ug) com
doseamentos hormonais da Supra-renal, aos tempos 0 e 60
minutos. A actividade da renina plasmática, ou melhor a relação
desta com a aldosterona, permite diagnosticar a deficiência
mineralocorticóide. Outros exames que podem ser úteis para o
diagnóstico são: o inonograma sérico; a gasimetria; a ecografia
abdominal e pélvica e o cariótipo de sangue periférico.
A terapêutica
engloba
os
glucocorticóide,
os
mineralocorticóide e os suplementos de sódio, estes dois últimos
na presença de deficiência mineralocorticóide. Durante a fase de
crescimento, o glucocoricóide indicado é a hidrocortisona porque
a sua semi-vida curta permite minimizar os efeitos adversos dos
glucocorticóides mais potentes e de acção mais prolongada,
principalmente ao nível da supressão do crescimento.
A monitorização da terapêutica inclui os doseamentos
hormonais periódicos, a avaliação do crescimento (velocidade de
crescimento cada 6 a 12 meses) e avaliação anual da idade óssea.
O objectivo é evitar o hipercortisolismo e o hiperandrogenismo
e permitir o crescimento e desenvolvimento adequados com o
atingimento da estatura alvo.
Segundo os consensos mais recentes (2010) o rastreio
universal dos recém-nascidos está recomendado. Actualmente
o rastreio endócrino-metabólico Português não incluiu o rastreio
da deficiência de 21-hidroxilase.
Dada a complexidade desta patrologia, estes doentes devem
ser seguidos em Centros de referência multidisciplinares que
englobem cirurgiões pediátricos, endocrinologistas pediátricos,
pedopsiquiatras / psicólogos e geneticistas com experiência na
área.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 179
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1
U. Endocrinologia Pediátrica, CH Porto
hiperplasia supra-renal congénita – mesa redonda
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 179
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Importância do estudo genético
para o tratamento pré-natal
- Papel do endocrinologista Anabela Giestas1
Hiperplasia suprarrenal congénita (HSRC) é uma doença autossómica recessiva decorrente da alteração de enzimas
que participam da síntese do cortisol. As manifestações podem
ser causadas pela deficiência do cortisol e, em alguns casos,
aldosterona e pela acumulação de precursores. A hiperplasia
suprarrenal congénita (HSRC) por deficiência da 21-hidroxilase
(21-OH) é o mais frequente dos defeitos enzimáticos adrenais,
ocorrendo em 95% dos casos de HSRC (1). A enzima 21OH participa na síntese dos glicocorticoides e dos mineralocorticóides,
e a redução da actividade desta enzima resulta na diminuição da
síntese de cortisol e consequente estimulação crónica do córtex
adrenal pelo ACTH com hiperplasia adrenal e excesso de produção dos precursores (17OH-progesterona) que são desviados
para a biossíntese de andrógenos.
Tradicionalmente é classificada em duas formas clínicas:
clássica, que inclui os subgrupos perdedora de sal e virilizante
simples, e não clássica. A forma virilizante simples caracteriza-se
por graus variados de virilização pré-natal da genitália externa no
sexo feminino e virilização pós-natal em ambos os sexos, com
aumento do clitóris ou pênis, pubarca precoce e avanço da idade
óssea com prejuízo na estatura final. A forma perdedora de sal,
além da hiperprodução androgénica, apresenta deficiência mais
severa na produção de aldosterona levando à desidratação e
choque. A forma não-clássica não apresenta virilização pré-natal
e os sintomas iniciam-se durante a infância ou adolescência, resultando em pubarca precoce, amenorreia primária ou secundária, hirsutismo, acne e infertilidade. A forma não clássica pode
ser assintomática com o mesmo perfil hormonal da forma sintomática, porém sem manifestações clínicas (2).
Os fenótipos descritos correlacionam-se com a actividade
enzimática da 21OH (gene CYP21) (3). Os indivíduos afetados
apresentam geralmente mutações diferentes em cada um dos
alelos (heterozigotos compostos) e uma minoria são homozigotos para uma mutação. A forma clínica no heterozigoto composto é conferida pelo alelo com maior atividade enzimática Assim,
indivíduos com o genótipo severo/severo apresentam, principalmente, a forma perdedora de sal, com os genótipos severo/
moderado e moderado/moderado apresentam, principalmente,
a forma virilizante simples e os com os genótipos severo/leve,
moderado/leve e leve/leve apresentam, principalmente, a forma
não clássica.
__________
1
Serviço de Endocrinologia, CH Porto
A principal complicação da HSRC-21OH é a virilização in
útero da genitália externa de fetos femininos afectados. O diagnóstico pré-natal tem sido utilizado em gestações de risco, ou
seja, nos casais que geraram uma criança com a forma clássica
e que são heterozigotos para a mutação da forma clássica, com
o objetivo de instituir a terapêutica a fim de suprimir a adrenal
fetal e evitar a virilização da genitália externa em fetos femininos
afetados (4).
Nos doentes com HSRC e que pretendem gravidez, o risco
de ter criança com forma clássica depende do seu genótipo e da
probabilidade do cônjuge ser portador, sendo importante o estudo genético para planificação da gravidez. Todos os adultos com
HSRC, incluindo as formas não-clássicas, e respectivos parceiros devem ser encaminhados a uma consulta de aconselhamento genético, porque estima-se que 1.6% da população geral é
portadora da mutação clássica e 2/3 das formas não-clássicas
podem ser portadoras de mutação severa.
Se ambos forem portadores de mutação clássica, o casal
deve ser informado sobre a possibilidade de tratamento pré-natal
com dexametasona e os seus potenciais riscos.
A dexametasona está indicada apenas no tratamento prénatal porque não é inactivada pela placenta (11 β-HSD2), e
tem uma semi-vida longa que permite uma maior supressão da
ACTH(5).
Como a diferenciação da genitália pode iniciar-se antes da
6ª a 7º semana de gestação, o tratamento deve ser iniciado assim que se confirmar a gestação, com dexametasona na dose de
20μg/Kg/dia, dividida em três tomas diárias. O diagnóstico prénatal é realizado a partir da 10ª a 12ª semana de gestação através da biópsia de vilosidades coriónicas para análise da determinação do sexo e estudo dos genes CYP21. A vantagem desta
técnica é a sua precocidade, o que permite interromper precocemente a exposição da mãe à dexametasona em caso do feto
não afectado. Alternativamente, o diagnóstico pré-natal pode ser
realizado através da determinação da 17OH-progesterona ou da
tipagem do HLA a partir da 15ª semana de gestação por amniocentese (6). Recentemente, a determinação do cromossoma Y no
sangue materno pelas 6-7 semanas permitiu a suspensão mais
precoce da terapêutica com dexametasona nos fetos do sexo
masculino (7).
Em caso de sexo masculino não há risco de problemas na
genitália e a terapia deve ser suspensa. Em caso de sexo feminino prossegue-se o tratamento e o estudo para determinação no feto das mutações, e se apresentar mutações com forma
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clássica deve-se continuar a terapêutica até o nascimento, caso
contrário o tratamento é interrompido.
O tratamento pré-natal é eficaz, ao evitar a virilização de
fetos femininos tratados pré-natalmente, em 80% dos casos. As
causas de falha da terapêutica pré-natal devem-se ao início tardio da terapia, dose inadequada de dexametasona ou não adesão ao tratamento (8).
Em geral a terapia é bem tolerada pelas grávidas, estando
descritas complicações em cerca de 10% dos casos, incluindo
aumento de peso, estrias violáceas, hirsutismo, hiperglicemia,
hipertensão e fácies cushingóide. A maioria dos efeitos colaterais
desaparece com a interrupção da terapia (9).
Relativamente à segurança fetal, existem casos descritos
de fenda no palato e lábio leporino quando administrada dexametasona em altas doses em estudos animais (10) e também em
humanos (11). Outros efeitos estão menos bem esclarecidos.
A terapêutica pré-natal ainda é controversa e desconhecese o impacto físico e psicológico a longo-prazo do tratamento
pré-natal durante a infância e puberdade, na estatura final e
perfil psicológico ou cognitivo das crianças submetidas ao tratamento. Além disso, mesmo nos casais em risco, somente um
entre oito fetos do sexo feminino será afectado, o que implica
que sete gestações serão submetidas desnecessariamente ao
tratamento com dexametasona, antes que seja determinado o
sexo e o genótipo. Por outro lado, a terapia é importante porque
permite a ocorrência de uma genitália externa normal evitando
ou diminuindo o trauma cirúrgico. O consenso publicado em
2010 pela Endocrine Society sugere que este tratamento seja
encarado como experimental e realizado em centros com grande número de doentes para avaliar a longo-prazo os efeitos da
terapêutica(12).
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 180-181
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Diagnóstico
Fernando Pereira1
Se nos interrogamos sobre quando devemos pensar na Doença Inflamatória Intestinal (DII) a resposta genérica deverá ser,
cada vez mais e cada vez mais cedo. De facto a sua frequência
tem vindo a aumentar nas últimas décadas, em especial a Doença de Crohn e ocorre ou é diagnosticada em idades cada vez
mais jovens. Como é regra na actividade médica a abordagem
de um doente começa com uma história clínica bem conduzida
e um exame físico cuidado que induzem ou orientam os exames auxiliares de diagnóstico que permitirão confirmar ou não
a nossa suspeita. Uma criança com dor abdominal persistente
e recorrente, alterações do trânsito intestinal, especialmente
diarreia, com ou sem sangue nas fezes, palidez, perda de peso
ou anorexia e em que o exame objectivo evidencia, palidez das
mucosas, aftose oral, dor ou tumefacção na fossa ilíaca direita e
eritema nodoso e com fistula/s anais, a hipótese de ter uma DII é
muito provável e deve ser investigada. Se esta criança tem antecedentes familiares de DII a probabilidade aumenta. É claro que
nem sempre o quadro é tão completo e por vezes observamos
uma criança que tem apenas ligeiras e pouco valorizadas dores
abdominais e anemia ferropénica e que quando devidamente estudada se demonstra ter DII; em outros casos somos confrontados com criança que apresenta uma fístula anal frequentemente
recidivante após correcção cirúrgica e em que a hipótese de DII
deve ser sempre colocada; outros doentes apresentam-se com
quadro de anorexia acentuada, por vezes com o diagnóstico
de anorexia nervosa e de facto a sua doença responsável pelo
quadro é de facto uma DII. É assim muito claro que a doença
inflamatória intestinal e muito especialmente a D. Crohn, pode
apresentar-se clinicamente de formas muito diferentes (fenótipos), rica ou pobre em sintomas, o que está em grande parte
dependente da sua base genética, do grau de actividade da doença e da sua localização no tubo digestivo. Raras vezes, são as
manifestações articulares que levam o doente à consulta de Pediatria ou Reumatologia e depois de excluída patologia articular
primária somos conduzidos ao diagnóstico de DII. Nos doentes
com colite ulcerosa o quadro clínico inclui persistentemente aumento do número de dejecções, quase sempre diarreicas, diurnas e nocturnas e muito frequentemente associadas à presença
de sangue e muco. É muito importante referir a necessidade de
fazer um exame proctológico a todos os doentes em que a suspeita de DII é colocada.
__________
1
S. Gastroenterologia Pediátrica, CH Porto
Perante a suspeita de DII deveremos começar por efectuar
estudo analítico que deverá procurar sinais de actividade inflamatória (VSG, PCR, calprotectina fecal) anemia (hemograma),
ferropenia, hipoproteinemia, alterações da função hepática e renal (estudo bioquímico) e ainda a presença de alterações imunológicas (ANCA, ASCA e imunoglobulinas). Os resultados obtidos,
se confirmam a existência de actividade inflamatória e sobretudo
se se associa anemia, trombocitose, ferropenia e hipergamaglobulinemia, obrigam à observação endoscópica do tubo digestivo
na sua totalidade. Devemos portanto submeter o doente à realização de endoscopia digestiva alta e baixa, sobre sedação
profunda ou anestesia, com as quais iremos observar o esófago,
estômago, duodeno, colon e íleum terminal e efectuar biópsias
para estudo histológico da mucosa. Quando nenhum destes exames revela alterações deveremos então proceder ao estudo do
intestino delgado, que poderá ser efectuado por radiologia (enteróclise ou RMN) ou recorrendo à cápsula endoscópica, uma vez
que a doença pode estar limitada àquele segmento digestivo.
É altura de afirmarmos que o diagnóstico de DII dever ser
sempre efectuado com base em dados clínicos, endoscópicos
e/ou radiológicos e histológicos. Só desta forma será possível
fazer um diagnóstico de Doença de Crohn ou Colite ulcerosa e
da extensão e tipo de lesões do tubo digestivo, bem como da sua
gravidade. Por vezes quando existem apenas lesões do colon,
mesmo com todos aqueles elementos presentes, não é possível
fazer um diagnóstico definitivo e consideramos tratar-se de colite indeterminada que a evolução posterior acabará por permitir
classificar definitivamente.
A Doença de Crohn tem como sinais endoscópicos o quadro inflamatório da parede do tubo digestivo, com úlceras aftosas, lineares ou estreladas, em regra separadas por mucosa
de aspecto sensivelmente normal, estenoses inflamatórias e
poupando frequentemente o recto. O envolvimento esofágico
apresenta-se com sinais inflamatórios e úlceras e ao nível gástrico, gastropatia congestiva erosiva ou ulcerativa a que pode
associar-se estenose pilórica. A Colite ulcerosa envolve apenas
a mucosa e submucosa do colon de forma total ou parcialmente; nas crianças a tendência é para envolvimento mais extenso,
constituído por congestão, edema ulceração, friabilidade, perda
do padrão vascular, hemorragia fácil, alterações que envolvem
de forma difusa o segmento atingido e não poupando o recto.
Histologicamente a Doença de Crohn caracteriza-se infiltrado
inflamatório crónico com actividade, ulceração, granulomas não
caseificados, distorção das criptas e distribuição focal e a colite
doença inflamatória intestinal – mesa redonda
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ulcerosa por infiltrado inflamatório do mesmo tipo mais superficial, com abcessos crípticos, depleção das células de Goblet e
distribuição contínua.
Diagnóstico diferencial com infecções bacterianas ou víricas (CMV), incluindo de forma muito particular a tuberculose e
a colite por Clostridium difficile é obrigatório. Devemos proceder
à pesquisa de toxina nas fezes, ao exame microbiológico das
fezes e das biópsias intestinais.
Desta forma conseguimos fazer o diagnóstico de DII ou
excluí-lo e estabelecer um padrão de gravidade que permitirá
iniciar o tratamento mais adequado.
Tendo por objectivo tornar mais prática a nossa intervenção, apresentamos seguidamente, alguns casos clínicos, exemplificativos da forma diversa como a DII pode apresentar-se.
O primeiro caso refere-se a um rapaz de 12 anos com história de dor abdominal recorrente, mais intensa na fossa ilíaca
direita e sobretudo após as refeições e com duração de cerca de
seis meses. Recorreu ao serviço de urgência por apresentar episódio de dor aguda intensa na fossa ilíaca direita. A palpação abdominal revelava defesa na fossa ilíaca direita e leucocitose com
neutrofilia, elevação acentuada da PCR e moderada da VSG. Foi
efectuado o diagnóstico de apendicite aguda e o doente submetido a laparotomia. Durante a exploração da cavidade abdominal
foi diagnosticada ileíte terminal extensa com áreas de estenose,
colocando-se como hipótese de diagnóstico a D. Crohn. O estudo
endoscópico e radiológico seguidamente efectuado e as biópsias
do colon e ileum terminal, permitiram confirmar o diagnóstico de
D Crohn atingindo o colon direito e o ileum terminal, em forma
grave estenosante e penetrante.
O segundo dos nossos doentes era uma menina de 14
anos com dor abdominal recorrente periumbilical, pouco intensa
e quase diária e com astenia progressiva com perda de peso
significativa mas não quantificada. Referia igualmente período
de amenorreia de três meses. O seu exame objectivo não revelava alterações significativas. No estudo analítico efectuado
salientava-se a presença de anemia hipocrómica e microcítica com ferro e ferritina baixos, trombocitose e VSG 47mm/iªh.
A pesquisa de sangue oculto nas fezes foi negativa. Efectuou
endoscopia digestiva alta e colonoscopia que foram normais e
seguidamente enteroscopia por videocápsula que permitiu observar edema, congestão e ulceração no ileum sendo colocado
o diagnóstico de D Crohn ileal, forma inflamatória ligeira a moderada.
O nosso terceiro doente era uma menina com 10 anos que
nos procurou por ter há seis semanas, seis a oito dejecções diárias, diurnas e nocturnas por vezes com pequenas quantidades
de muco e sangue nas fezes associadas a mal estar abdominal
difuso, astenia e anorexia. A palpação abdominal era globalmente desconfortável mas sem organomegalias ou tumefacções. O
exame proctológico era normal. O estudo laboratorial mostrou
anemia hipocrómica microcítica, PCR elevada, VSG 52/1ªh,
hipoalbuminemia e hipergamaglobulinemia. O exame microbio-
lógico das fezes era negativo. A endoscopia digestiva alta era
normal e a colonoscopia com ileoscopia terminal e o trânsito do
intestino delgado permitiram o diagnóstico de extensa D Crohn
ileocólica com significativa estenose ileal terminal. As biópsias
cólicas mostraram diversos granulomas. Concluímos por D Crohn ileocólica com componente estenosante.
O doente seguinte, de 15 anos, queixava-se de diarreia
com sangue e muco com cerca de oito dejecções nas 24 horas. Não apresentava antecedentes patológicos relevantes e o
seu exame objectivo evidenciava palidez da pele e mucosas e o
toque rectal era indolor mas aparecia sangue na luva. O estudo
laboratorial apresentava anemia, trombocitose, elevação dos parâmetros inflamatórios e hipoproteinemia. Tinha ANCA positivo e
ASCA negativo e exame microbiológico e parasitológico de fezes
negativos. A endoscopia digestiva alta era normal bem como o
trânsito do intestino delgado. A colonoscopia esquerda mostrou
quadro inflamatório intenso e difuso dos segmentos observados
e envolvendo o recto, a histologia confirmou tratar-se de quadro
de colite ulcerosa e o clister opaco posteriormente realizado (tubolização cólica) permitiu diagnosticar uma doença com envolvimento quase total do colon
O nosso último doente era um rapaz de oito anos com
abcesso perianal seguido do desenvolvimento de um trajecto
fistuloso persistente. Dois meses depois aparecimento de novo
orifício fistuloso a meio do trajecto entre o ânus e o escroto. Observado por cirurgia foi submetido a tratamento conservador sem
êxito. O seu irmão gémeo tinha também duas fistulas anais em
evolução há cerca de três meses. O seu exame objectivo não
revelava qualquer alteração nomeadamente a palpação abdominal ou o toque rectal. O estudo analítico revelou hemograma
normal, trombocitose, VSG 55mm 1ªh, TGP 2xN, ferro baixo,
albumina diminuída, IgG elevada e ASCA positivo. O exame endoscópico não evidenciou alterações esófago-gastro-duodenais
e a presença de múltiplas ulcerações aftóides do colon esquerdo
e ulcerações profundas do colon direito e transverso. O estudo
radiológico do intestino delgado por enteróclise foi compatível
com ileíte terminal ligeira.
A idade do doente, a localização das lesões, o seu tipo e
a repercussão sobre o crescimento, na D. Crohn, bem como a
extensão no cólon e severidade das lesões, na Colite Ulcerosa,
permitem classificar a doença (Classificação de Montreal e Paris)
e dessa forma permitir uma orientação terapêutica mais correcta
desde o início. Os índices de actividade da D. Crohn (PCDAI) e
da Colite Ulcerosa (PUCAI) determinados de forma seriada são
úteis sobretudo na avaliação da resposta ao tratamento.
O diagnóstico da DII é como se pode ver um desafio, que
todavia se consegue ultrapassar se tivermos presente a sua natureza cada vez mais frequente e ocorrendo em idades mais jovens como afirmamos inicialmente.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 182-183
doença inflamatória intestinal – mesa redonda
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Pulmão e doenças sistémicas: Vasculites
M. Guilhermina Reis1
As manifestações pulmonares ocorrem em quase todas as
doenças reumáticas da infância, seja secundariamente à doença
subjacente, seja como efeito adverso do tratamento. Os sintomas na criança podem ser subtis e só surgirem com o tempo e,
embora pouco frequentes, são uma causa importante de morbimortalidade nestes doentes. Requerem um elevado índice de
suspeição e antecipação diagnóstica.
O sistema respiratório pode estar envolvido em todas as
vasculites sistémicas, embora com frequência variável. As vasculites pulmonares referem-se à inflamação de vasos de qualquer diâmetro, enquanto as capilarites pulmonares apenas se
referem à microcirculação pulmonar. Ambas podem ocorrer nas
vasculites sistémicas e nas doenças reumáticas. Mais frequentemente as vasculites pulmonares ocorrem nas vasculites sistémicas que afectam predominantemente pequenos vasos, que se
manifestam sobretudo por alterações pulmonares e/ou renais.
A hemorragia alveolar difusa (HAD) associada a vasculite é
um evento, potencialmente ameaçador de vida que após episódios repetidos poderá levar a fibrose pulmonar.
Serão abordados nesta apresentação:
1. Identificação de sinais e sintomas sugestivos de vasculite
pulmonar;
2. Avaliação clínica e laboratorial nas vasculites pulmonares;
3. Princípios do tratamento nas vasculites pulmonares.
As vasculites sistémicas são raras, com incidências de
20-100 casos/milhão e prevalência de 150-450 casos/milhão. A
mais recente classificação das vasculites na criança resulta dos
critérios de Consenso da EULAR e Sociedade Europeia de Reumatologia Pediátrica (Quadro I).
A doença pulmonar é muito comum e uma característica
importante nas vasculites associadas à presença de Anticorpos
anti-citoplasma dos neutrófilos (vasculites ANCA+), tais com a
Granulomatose de Wegener (GW), Síndrome de Churg-Strauss
(SCS) e Poliangeíte microscópica (PM).
Nas vasculites de grandes vasos o pulmão raramente é
afectado: na arterite de células gigantes a manifestação respiratória mais frequente é a tosse, geralmente não produtiva,
persistente e que responde aos corticosteroides; na Arterite de
Takayasu, o envolvimento respiratório é frequentemente subclínico e detectável por técnicas não invasivas.
__________
1
S. Pediatria, CH Porto
O envolvimento pulmonar é raro na Poliarterite nodosa, Doença de Kawasaki, Purpura de Henoch-Schönlein (PHS) e na
vasculite crioglobulinemica.
As vasculites pulmonares acompanham-se frequentemente de manifestações sistémicas, incluindo astenia, febre, perda
ponderal, artralgias, manifestações renais e exantemas. A hemorragia alveolar difusa (HAD) associada a vasculite, por lesão
da microcirculação alveolar (infiltração vascular neutrofilica dos
septos peribronquiolares e interalveolar, com a activação do processo inflamatório; disrupção anatómica capilar e libertação de
enzimas proteoliticas...) com formação de fibrina e necrose fibrinoide do interstício, é um evento, potencialmente ameaçador de
vida que, após episódios repetidos, poderá levar a fibrose pulmonar. Pode ser maciça e manifesta-se habitualmente por anemia,
hemoptises, infiltados alveolares na radiografia torácica e, se
grave, por insuficiência respiratória hipoxémica. A glomerulonefrite pode também ser rara com prodromos frustes. (Quadro II)
Quadro I – Nova classificação de vasculites em idade pediátrica*
I.
Vasculite predominantemente de grandes vasos
A. Arterite de Takayasu
II. Vasculite predominantemente de vasos de tamanho médio
A. Doença de Kawasaki
B. Poliarterite nodosa da criança
C. Poliarterite cutânea
III. Vasculite predominantemente de pequenos vasos
A. Granulomatosa
1. Granulomatose de Wegener
2. Síndrome de Churg-Strauss
B. Não-Granulomatosa
1. Púrpura de Henoch-Schönlein
2. Poliangite microscópica
3. Vasculite leucocitoclástica cutânea isolada
4. Vasculite urticariforme hipocomplementémica
5. Síndrome de Goodpasture
IV. Outras vasculites
A. Doença de Behçet
B. Vasculite secundária à infeção (incluindo poliarterite nodosa associada
a Hepatite B), neoplasias e drogas (incluindo vasculite de hipersensibilidade)
C. Vasculite associada a doenças do tecido conjuntivo
D. Vasculite isolada do Sistema Nervoso Central
E. Síndrome de Cogan
F. Não classificada
*(Adaptado de: O’Sullivan BP. Pulmonary Complications of Systemic
Vasculitides. Paediatric Respiratory Reviews 2012;13:37-43)
pulmão e doença sistémica – mesa redonda
S 184
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Qualquer criança com anemia e infiltados pulmonares deve
ser suspeita de ter hemorragia alveolar. Na pele devem procurar-se sinais de vasculite: purpura palpável, eritema nodoso, ulcerações, hemorragias subungueais; no nariz, orelhas e naso/
orofaringe sinais de hemorragia ou granulomas. No sedimento
urinário avaliar a presença de proteinúria, hematúria e cilindros.
O estudo imunológico com pesquisa de anticorpos (Ac´s)
é fundamental no diagnóstico das vasculites de pequenos vasos. O diagnóstico de Sindrome de Goodpasture (SG) assenta
na presença de Ac´s anti membrana basal glomerular; enquanto
a GW, PM e outras vasculites se associam à presença de anticorpos anti-citoplasma de neutrófilos (ANCA). A determinação
da ANCA por Imunofluorescência indirecta (IIF) deve ser complementada por técnicas de ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay - Ensaio de Imunoabsorção Ligado a Enzima), já que
a positividade por IIF é inespecífica, podendo ocorrer noutras
patologias: Lupus eritematoso sistémico (LES), Artrite Idiopática Juvenil (AIJ), etc. O teste de ELISA permite a diferenciação
de c-ANCA ou PR3-ANCA e p-ANCA ou MPO-ANCA. Os ANA
e Factor Reumatoide (FR) podem ser positivos nas vasculites
primárias, no entanto títulos elevados associados à presença de
Ac´s específicos (dsDNA, Anti-RNP, anti-JO-1,etc) podem identi-
ficar uma doença reumática subjacente. A determinação da IgE
é importante quando se coloca a hipótese de CSS.
A radiografia torácica ou TC (tomografia computorizada) podem evidenciar alterações ainda antes de manifestações clínicas
significativas; estas alterações são geralmente inespecíficas. Na
suspeita de HAD a identificação de cavidades, nódulos ou padrão
difuso em vidro despolido deve colocar a suspeita de vasculite.
A broncofibroscopia deve ser ponderada quando a clínica e
achados radiológicos, deixam dúvidas entre hemorragia versus
infecção.
A realização de biópsia pulmonar raramente será necessária na presença de outras alterações sistémicas, já que o risco
será menor se efectuada biópsia cutânea ou renal. Já nas doenças auto-imunes sistémicas a doença pulmonar crónica pode
ser a primeira manifestação e assim os achados histológicos poderão ser importantes para confirmar achados de vasculite ou
procurar outras causas de HAD.
Os síndromes pulmão-rim resultam das vasculites de pequenos vasos, estando habitualmente associados a componente
inflamatório. São raros, mas exigem um elevado índice de suspeição, já que o seu reconhecimento permite instituir tratamento
anti-inflamatório que é “life-saving”. (Quadro III)
Quadro II – Manifestações sistémicas das vasculites*
Renal
Neurológico
GW
+++
++
PMA
+++
++
SCS
++
+++
Cardíaco
++
++
+++
Cutâneo
+++
+++
+++
Musculoesquelético
Sintomas gerais
Infeccioso
Toxicidade de drogas
++
+++
++
++
+++
+++
++
++
++
+++
++
++
Comentários
Glomerulonefrite. Ocorre em 50-90% dos doentes com GW e em 95-100% com PMA
Muito comum em SCS. Habitualmente mononeurite múltipla
Principal causa de mortalidade associada a vasculite no SCS; pode apresentar miocardiopatia, arterite coronária,
atrasos conduçãp ou outras alterações.
Purpura palpável é a caracteristica clássica das vasculites cutâneas. Pode apresentar-se com nódulos, eritema, ulceras
ou vesiculas.
Artralgias e mialgias são comuns. Também podem apresentar-se com uma verdadeira artrite
Fadiga, mal-estar, febre, e perda de peso são comuns.
Causa importante de morbilidade e mortalidade. Pode ter apresentação atípica e/ou organismos atípicos.
Causa significativa de morbilidade.
GW – Granulomatose de Wegener; PMA – Poliangeíte microscópica; SCS – Síndroma de Churg-Strauss
*(Adaptado de: Frankel S. The diagnosis and treatment of Pulmonary Vasculitis. Chest 2008; 22:PCCSU Article | 04.01.08)
Quadro III - Achados clínicos e serológicos em doentes com síndromes de pulmão-rim*
Hemorragia pulmonar
Glomerulonefrite
Envolvimento das vias aéreas superiores
Erupção cutânea
Artralgia
Elevação da VS
Envolvimento abdominal
Serologia
PHS
GW
PM
LES
SGP
0a+
++++
0
++++
++++
+
++++
+++
++++
++++
+++
+++
++++
0
++
++++
++
+++
+++
++++
0
++++
++++
0
0a+
0
0
0
IgA+ IgM+
cANCA
(raramente pANCA)
pANCA,
cANCA
+ a ++
+++ a ++++
+ a ++
++++
++++
++++
0
ANA,
anti-ds-DNA
(raramente pANCA)
Anti-MBG,
(raramente pANCA)
0=ausente; crescente associação com o número crescente de (+) sinais.
PHS - Purpura de Henoch-Schonlein; GW – Granulomatose de Wegener; PM – Poliangite microscópica; LES – Lupus eritematoso sistémico; SGP –
Síndrome de Goodpasture; VS – velocidade de sedimentação glomerular; cANCA – anticorpos anti-citoplasma dos neutrófilos; pANCA – anticorpos
perinucleares dos neutrófilos; ANA – anticorpos antinucleares; MBG - membrana basal glomerular
*(Adaptado de: O’Sullivan BP. Pulmonary Complications of Systemic Vasculitides. Paediatric Respiratory Reviews 2012;13:37-43)
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A Purpura de Henoch-Schonlein (PHS) é a mais frequente vasculite de pequenos vasos (incidência de 10-14/100000) e a
que menos se associa a manifestações pulmonares; apresenta-se com pápulas eritematosas, seguida de púrpura palpável, não
trombocitopenica nos membros inferiores, tronco e face. Há envolvimento renal em 60% casos. (Quadro IV)
Quadro IV – Critérios de classificação de Purpura
Henoch-Schönlein*
Pelo menos um dos seguintes deverá estar presente na presença de púrpura
palpável (critério obrigatório):
. Dor abdominal difusa
. Qualquer biópsia mostrando depósitos de IgA, predominantemente
. Artrite ou artralgia
. Envolvimento renal (hematúria e/ou proteinúria
*(Adaptado de: O’Sullivan BP. Pulmonary Complications of Systemic
Vasculitides. Paediatric Respiratory Reviews 2012;13:37-43)
A hemorragia pulmonar é secundária à disrupção alveolo-capilar pelos complexos imunes circulantes. A HAD e a pneumonite intersticial são raras; Após o diagnóstico de PHS alguns
doentes tem manifestações pulmonares ligeiras como tosse, que
pode ser hemoptoica ou crepitações na auscultação pulmonar,
mas pode haver HAD suficiente para necessitar de Ventilação
mecânica e transfusão de hemáceas. O tratamento pode requerer, para além de corticoterapia (Cct), a utilização de ciclofosfamida, nos casos de hemorragia grave.
A hemorragia alveolar difusa (HAD) pode ocorrer na Purpura de Henoch Schonlein (PHS), no Sindrome de Goodpasture
(SG), vasculite crioglubinémica (VC) e outras colagenoses.
A oclusão da artéria pulmonar devido a trombose e aneurismas arteriais pulmonares são complicações graves da Doença
de Beçhet (DB).
A Granulomatose de Wegener (GW) caracteriza-se pela
tríade de inflamação granulomatosa das vias aéreas altas e baixas, vasculite necrotizante e PR3-ANCA; é rara na criança, que
frequentemente apresenta febre, artralgias ou artrite e exantemas cutâneos ou úlceras. As manifestações cutâneas podem
preceder em meses outras manifestações.
O atingimento respiratório é amplo: rinorreia (purulenta/
sanguinolenta), secura nasal, epistaxis, sinusite, otite, nariz em
sela por perfuração do septo nasal; tosse, hemoptise, dispneia,
dor torácica (pleurítica); estridor por estenose subglótica ou traqueobrônquica pode ser o sinal de apresentação. A hemorragia
alveolar é rara, mas pode ser maciça; o atingimento renal quando surge requer tratamento agressivo para evitar evolução para
insuficiência renal terminal.
A doença pulmonar desenvolve-se em cerca de 75% das
crianças com GW; um terço das alterações radiológicas nas
crianças com GW, não se associa a sintomas pulmonares; nódulos e massas pulmonares, solitários ou múltiplos, são os achados mais frequentes na radiografia e TAC torácicos. (Quadro V)
Quadro V – Critérios de classificação para Granulomatose de
Wegener*
Três dos seguintes seis deverão estar presentes:
. Análise de urina anormal**
. Inflamação granulomatosa na biopsia
. Inflamação naso-sinusal
. Estenose subglótica, traqueal ou endobrônquica
. Radiografia de tórax ou tomografia computorizada do tórax anormais
. Titulos elevados de proteinase 3 (PR3) ou coloraçaõ positiva para c-ANCA
*(Adaptado de: O’Sullivan BP. Pulmonary Complications of Systemic
Vasculitides. Paediatric Respiratory Reviews 2012;13:37-43)
** Se for realizada biópsia renal, caracteristicamente mostra glomerulonefrite necrotizante pauci-immune
Os testes laboratoriais são inespecíficos na GW, excepto
PR3-ANCA. Se clínica sugestiva, o PR3-ANCA tem valor preditivo positivo de 99% e pode ser dispensável o diagnóstico histológico para instituir tratamento.
A Poliangeite microscópica (PM) é uma vasculite necrotizante dos pequenos vasos, não granulomatosa e sempre associada a glomerulonefrite segmentar e focal. A sua incidência é de
1:100.00 e há escassos casos relatados na Pediatria.
A hemorragia alveolar difusa (HAD), expressa por hemoptises, dificuldade respiratória e anemia, devida à capilarite alveolar, ocorre em 1/3 dos doentes e é a manifestação mais frequente
do envolvimento pulmonar. A HAD pode ser subclinical, devendo
suspeitar-se na presença de infiltrados alveolares bilaterais de
novo, na radiografia torácica, associados à descida no valor de
hemoglobina. Verificam-se grandes atrasos no diagnóstico pela
inespecificidade dos sintomas: febre, perda ponderal, mialgias,
artralgias; a hemorragia alveolar pode surgir isoladamente; a fibrose pulmonar intersticial pode preceder em anos a vasculite
pulmonar e ser a primeira manifestação de PM.
O seu diagnóstico serológico é mais difícil do que na GW.
(Quadro VI)
Quadro VI – Distribuição da Serologia ANCA na GW e na PM*
Resultado ANCA
GW
PM
70 – 90%
35 – 45%
Positividade MPO ANCA/ p-ANCA
5 – 25%
45 – 55%
ANCA negativos
10 – 20%
10 – 20%
Positividade PR3 ANCA/ c-ANCA
*(Adaptado de: O’Sullivan BP. Pulmonary Complications of Systemic
Vasculitides. Paediatric Respiratory Reviews 2012;13:37-43)
O tratamento das vasculites ANCA+ (GW e MPA), desconhecida a sua etiologia, visa actualmente, a indução da remissão. As estratégias terapêuticas dependendo do estadio clínico.
(Quadro VII)
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Quadro VII – Definição dos estadios da doença nas vasculites ANCA associadas, de acordo com o EULAR*
Subgrupo clínico
Vasculite sistémica, Função de órgão
sem ONG e pulmão vital ameaçado
Outras definições
Creatinina sérica
(μmol/l)
Manifestações pulmonares
Localizada
Não
Não
Sem B-sintomas
ANCA tipicamente negativo
<120
Bronquite ulcerativa / estenose brônquica na GW
Massas pulmonares “granulomas” na GW
Sistémica precoce
Sim
Não
B-sintomas
ANCA positiva ou negativa
<120
O mesmo que acima
Generalizada
Sim
Sim
ANCA positiva
<500
O mesmo que acima
Capilarite pulmonar, alveolite
Grave (severa)
Sim
Falência de órgãos
ANCA positiva
>500
O mesmo que acima com falência de órgãos
Refratária
Sim
Sim
Refratária à terapêutica
habitual
qualquer
O mesmo que acima com existência à terapêutica
habitual
ONG – ouvido-nariz-garganta; EULAR – European League Against Reumatism
*(Adaptado de: Holle J, Moosig F, Dalhoff K, Gross W. Conditions in subjects with rheumatic diseases: pulmonary manifestations of vasculitides. Arthritis
Research & Therapy 2011;13:224)
A corticoterapia (Cct) sistémica e a ciclofosfamida são a
base terapêutica para a indução da remissão na doença sistémica (tal como na capilarite pulmonar), podendo ter de se fazer
recurso da plasmaferese ou de Ac´s monoclonais (Rituximab)
nas vasculites refractárias. Há evidência para uso de terapêutica de manutenção (Metotrexato, Azatioprina, Micofenolato de
Mofetil) em conjunto com a Cct na GW e na PM. O advento das
terapias biológicas traz esperança para melhor controle destas
entidades. As infecções respiratórias continuam a ser um problema major nos doentes com vasculites sob imunossupressão
intensiva, incluindo uso de agentes biológicos. A profilaxia da in-
fecção por Pneumocistis jirovecci parece ser eficaz nos doentes
sob ciclofosfamida. (Quadro VIII)
O Síndrome de Churg-Strauss (SCS) ou angeíte granulomatosa alérgica é um síndrome pauciimune pulmão-rim. Define-se por doença granulomatosa eosinofílica ANCA-associada,
que envolve o pulmão e seios perinasais. O sintoma cardinal é
a asma, frequentemente precedida de rinite alérgica, frequentemente complicada de polipose nasal e sinusite.
A tríade infiltração tecidular eosinofilica, vasculite necrotizante e granulomas extravasculares, raramente ocorre em simultâneo.
Quadro VIII – EUVAS – Classificação da gravidade das doenças e opções de tratamento*
Classificação da doença
Sintomas gerais
Função do órgão ameaçado
Doença activa
Opções terapêuticas
Regime de indução
Limitada
Não
Não
Corticosteroides ou metotrexato ou azatriopina
Precoce, generalizada
Sim
Não
Ciclofosfamida+corticosteroides
ou metotrexato+corticosteroides
Activa, generalizada
Sim
Sim
Ciclofosfamida+corticosteroides
Grave (Severa)
Sim
Sim**
Refratário
Sim
Sim
Remissão da doença
Não
Ciclofosfamida+corticosteroides+ plasmaferese
Considerar tratamento em ensaio clinico; centro terciário
Regime de manutenção
Não
azatriopina+/- corticoides
*(Adaptado de: Frankel S. The diagnosis and treatment of Pulmonary Vasculitis. Chest 2008; 22:PCCSU Article | 04.01.08)
* * Doença grave inclui doentes com Insuficiencia renal grave (creat > 5,7 mg/dl), hemorragia alveolar difusa, disfunçao de orgão ameaçadora de vida,
incluindo cardiaco, SNC ou GI.
pulmão e doença sistémica – mesa redonda
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O SCS é raro, sendo desconhecida a sua incidência e prevalência em Pediatria.
Para o diagnóstico requerem-se quatro dos seis critérios
(sensibilidade 85%, especificidade> 99%). (Quadro IX)
Quadro IX – Critérios de classificação do Síndrome de
Churg-Strauss*
Asma
Eosinofilia >10%
Neuropatia – mononeuropatia ou polineuropatia
Infiltrados pulmonares, não fixos
Anormalidade dos seios paranasais
Granulomas extravasculares
*(Adaptado de: O’Sullivan BP. Pulmonary Complications of Systemic Vasculitides. Paediatric Respiratory Reviews 2012;13:37-43)
A apresentação clínica do CSS ocorre por fases, que podem
distanciar-se em muitos anos: 1ª fase ou prodrómica com rinite
e asma, 2ª fase eosinofilia periférica e tecidular e 3ª fase com
vasculite sistémica. Na fase vasculítica pode ocorrer miocardite e
pericardite, verificando-se tamponamento cardiaco em cerca de
metade dos doentes. As manifestações cutâneas podem atingir
75% doentes (purpura, nódulos subcutâneos). O atingimento renal é menos grave e menos frequente na WG.
Infiltrados pulmonares alveolares focais e transitórios, são
o achado radiográfico mais comum, sendo menos frequente a
HAD. Na 2º fase da doença pode haver padrão de pneumonite
eosinofilica crónica.
Os exames laboratoriais evidenciam eosinofilia e elevação
da velocidade de sedimentação, podendo ser MPO-ANCA positivo. As crianças são mais frequentemente ANCA negativo. Pode
ser necessária a biópsia pulmonar se o pulmão é o unico orgão
envolvido, sendo que a biópsia transbronquica pode não ser produtiva, tendo de equacionar-se biopsia por video-toracoscopia.
O tratamento assenta na Cct, podendo ser considerados
outros imunossupressores nos casos refractários.
BIBLIOGRAFIA
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2. O’ Sullivan BP. Pulmonary complications of Systemic
vasculitides. Paediatr Respir Rev 2012. doi: 10: 1016/j.
prrv.2011.04.002
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JC, et al. EULAR/PReS endorsed consensus criteria for
the classification of childhood vasculitides. Ann Rheum Dis
2006;65:936-41.
4. Manganelli P, Fietta P, Carotti M, Pesci A, Salaffi F. Respiratory system involvement in systemic vasculitides. Clin Exp
Rheumatol 2006; 24:S48-59.
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2006;3:48-57.
6. Holle JU, Moosig F, Dalhoff K, Gross WL. Conditions in subjects with rheumatic diseases: pulmonary manifestations of
vasculitides. Arthritis Research & Therapy 2011;13:224.
7. Demirkaya E, Luqmani R, Ayaz NA, Karaoglu A, Ozen S, et
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vasculitis. Pediatric Rheumatol Online J 2011; 9:29.
8. Frankel S. The diagnosis and treatment of Pulmonary Vasculitis. Chest 2008; 22:PCCSU Article | 04.01.08
9. Rabinovich CE. Pulmonary complications of childhood rheumatic disease. Paediatr Respir Rev 2012; 13:29-36.
10. Esposito S, Corona F, Defilippi A, Petaccia A, Chidini G,
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life-threatning lung hemorrhage in a 7-year-old child. Rheumatol Int 2010; 30: 1665-8.
11. Jindal G, Cruz SD, Punia RP, Kaur R. Refractory anemia as a
presenting feature of microscopic polyangiitis: a rare vasculitis in children. Indian J Pediatr 2011; 78:1287-9.
As vasculites pulmonares são raras e condiçoes ameaçadores de vida. Se reconhecidas, podem ser tratadas com
sucesso.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 184-188
pulmão e doença sistémica – mesa redonda
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Cardiopatia congénita
Telma Barbosa1
INTRODUÇÃO
O coração e os pulmões funcionam como uma unidade,
partilhando o mesmo espaço físico e os mesmos mecanismos
fisiopatológicos, o que torna mais complexa a abordagem da doença cardíaca congénita (DCC) em idade pediátrica. As complicações pulmonares da DCC são essencialmente causadas por 2
mecanismos: alteração estrutural da via aérea por compressão
e edema pulmonar.
DISCUSSÃO
As DCC são comuns (aproximadamente 7 em cada 1000
nados-vivos) e por isso é essencial que os clínicos estejam sensibilizados não só para esta entidade mas também para todas
as alterações dela decorrente, nomeadamente pulmonares. Em
condições normais, existe uma correlação estreita entre as funções cardiovascular e respiratória. O fluxo sanguíneo pulmonar
depende da interacção entre o débito cardíaco e a resistência
vascular pulmonar. Uma grande variedade de estímulos fisiológicos e farmacológicos pode causar alterações na resistência
vascular pulmonar. O mais importante destes fatores é a hipoxia.
Alterações nas necessidades metabólicas são seguidas de alterações no débito cardíaco e na ventilação/minuto. Na presença
de DCC, este equilíbrio pode não existir. Nestas situações, a capacidade do coração aumentar o fluxo sistémico e/ou pulmonar
está muitas vezes limitada, a PaO2 arterial pode estar diminuída
pela presença de shunts e a oxigenação tecidular pode estar
comprometida. A DCC pode por si só alterar a função pulmonar,
causando sintomas/sinais que mimetizam doença respiratória
pura. Os sintomas referidos ao sistema respiratório podem ser
o primeiro e muitas vezes o único sinal de DCC, especialmente
em idades precoces. Frequentemente coexistem patologias em
ambos os sistemas, tornando o diagnóstico e a abordagem um
verdadeiro desafio. Muitas crianças com DCC estão em maior
risco de infecção, incluindo respiratórias, o que pode causar hospitalizações prolongadas.
CONCLUSÃO
Os sistemas cardíaco e respiratório funcionam como uma
unidade e as manifestações respiratórias ocorrem na maioria
das crianças com DCC. À medida que aumenta a sobrevivência
das crianças com DCC, aumenta também a incidência de complicações pulmonares associadas.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 189
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S. Pediatria, CH Porto
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Complicações pulmonares das doenças
gastrointestinais
Ana Ramos1
INTRODUÇÃO
A interacção do sistema gastrointestinal tem um papel, por
vezes controverso na sua extensão na causa de patologia pulmonar. O envolvimento pulmonar das doenças gastrointestinais
na criança são principalmente: Refluxo gastro-esofágico, Doença
inflamatória Intestinal, Síndrome hepatopulmonar e Pancreatite.
A doença de refluxo gastro-esofágico refere-se a um excessivo
refluxo com consequências deletérias para o lactente tais como:
atraso de crescimento, irritabilidade, dificuldades alimentares,
hemorragia e anemia. As manifestações extra-esofágicas da doença do refluxo gastro-esofágico incluem tosse crónica, obstrução das vias aéreas superiores por edema das cordas vocais,
bronquite recorrente ou pneumonia e exacerbação da hiperreactividade brônquica.
REFLUXO GASTRO-ESOFÁGICO COMO ETIOLOGIA DA
DOENÇA PULMONAR
Determinar uma possível contribuição do refluxo como factor etiológico da patologia pulmonar ainda é um desafio. A correlação com os eventos respiratórios incluindo apneia, broncospasmo e tosse requerem ainda uma melhor compreensão e testes
especializados. Os episódios de ALTES têm sido associados a
doença da via aérea consequente do refluxo gastro-esofágico.
COMPLICAÇÕES PULMONARES DAS DOENÇAS
GASTROINTESTINAIS
As manifestações broncopulmonares da doença gastrointestinal têm sido descritas raramente na criança. O envolvimento pulmonar pode incluir inflamação das vias aéreas grandes e
pequenas e atingimento do parênquima pulmonar. A forma mais
comum de doença parenquimatosa pulmonar na doença inflamatória intestinal é a bronquiolite obliterante com pneumonia
organizada e doença pulmonar intersticial. O envolvimento brônquico mais frequente incluiu a bronquite crónica, bronquiolite e
bronquiectasias.
SÍNDROME HEPATOPULMONAR
A doença hepática pode causar ou estar associada com
doenças pulmonares, sem uma etiologia ainda compreendida.
Contudo a doença hepática aguda associada a complicações
pulmonares pode resultar de infecções, medicação e toxinas. A
doença hepática crónica pode causar patologia pulmonar através de mecanismos que resultam na cirrose e falência hepática a
qual por sua vez causa doença pulmonar crónica. O transplante
hepático para crianças com síndrome hepatopulmonar pode estar indicado mesmo na ausência de cirrose.
DOENÇA PANCREÁTICA
Nas crianças com pancreatite tem sido descritos derrames
pleurais predominantemente do lado esquerdo, podendo existir
no lado direito ou serem bilaterais. Os derrames pleurais geralmente ocorrem logo após o inicio da pancreatite. A doença pancreática crónica como o pseudocisto, abcesso ou fístula pancreatopleural pode originar derrame pleural crónico.
COMENTÁRIOS
- O papel da doença de refluxo gastro-esofágico na causa
da doença pulmonar crónica é controverso, mas o tratamento do
refluxo pode melhorar a doença respiratória.
- O reconhecimento do envolvimento pulmonar nas doenças gastrointestinais é difícil, sendo necessário um alto índice de
suspeição e o uso de técnicas de diagnóstico especializadas que
permitem uma identificação precoce.
- A doença inflamatória intestinal pode directamente afectar o pulmão ou indirectamente sendo secundária à terapêutica
imunossupressora.
Nascer e Crescer 2012; 21(3): 190
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Resumo das Comunicações Orais
FILHOS DE MÃE AGHBS POSITIVO – ESTAREMOS A FAZER
A IMUNOPROFILAXIA ADEQUADA?
Ana Freitas¹, Cristina Godinho²
¹ S. Pediatria, CH Porto
² S. Neonatologia, CH Porto
Introdução: A transmissão vertical da infecção por vírus da
hepatite B (HBV) está associada a um risco elevado de infecção
crónica e consequente doença hepática crónica e hepatocarcinoma. A imunoprofilaxia adequada realizada aos recém-nascidos
filhos de mães com antigénio HBs positivo (AgHBs+) é a melhor
arma no combate a esta infecção. As recomendações nacionais
atuais advogam a realização de imunoglobulina até às 12 horas
de vida e esquema vacinal acelerado (0, 1 e 6 meses; ou 0, 1,
2 e 6 meses se peso ao nascer inferior a 2000g), associado a
pesquisa de serologias entre os 9 e 15 meses para determinar a
eficácia da imunoprofilaxia.
Objectivo: Estudo descritivo para determinar se a imunoprofilaxia para a transmissão vertical da infecção por VHB foi
realizada segundo as recomendações nacionais, numa amostra
de crianças nascidas no Centro Hospitalar do Porto - unidade
Maternidade Júlio Dinis (MJD).
Material e Métodos: Foram selecionados os recém-nascidos filhos de mãe AgHBs+ nascidos na MJD entre
Outubro/2009 e Março/2012. As variáveis analisadas foram obtidas pela consulta do processo hospitalar, contacto electrónico
com as unidades de cuidados de saúde primários e contacto telefónico com as mães.
Resultados: A amostra foi constituída por 28 crianças
com idades compreendidas entre os 3 e 31 meses (mediana
de 19,5 meses). A 1ª dose da vacina e imunoglobulina foi administrada nas primeiras 12 horas de vida em 27 crianças, a 2ª
dose de vacina foi administrada ao mês de idade em 7 crianças
(29%, N=24) e a 3ª dose foi administrada aos 6 meses de idade
em 17 crianças (89%, N=19). Uma das crianças tinha peso ao
nascimento inferior a 2000g tendo realizado vacina aos 0, 1.5
e 6 meses de idade. Todas as crianças que mantinham seguimento clínico na MJD aos 9 meses de idade realizaram serologias (N=6, todas com título elevado de anticorpo anti-HBs);
das crianças seguidas em unidades de cuidados de saúde primários e com mais de 15 meses de idade (N=10), apenas uma
tinha realizado serologias.
As restantes 9 crianças (90%, N=10) serão convocadas
para pesquisa de serologias na MJD.
Comentários: A amostra selecionada neste estudo é de
reduzidas dimensões, o que dificulta a extrapolação destes resultados para a comunidade. No entanto, salienta-se que nesta
amostra a imunoprofilaxia da transmissão vertical da infecção
por VHB não foi adequada na grande maioria das crianças. Os
autores sugerem a necessidade de reforçar a divulgação das recomendações nacionais nesta área.
ALEITAMENTO MATERNO NOS RECÉM-NASCIDOS DE
MUITO BAIXO PESO
Ana Cristina Barros1, Vanda Van-Dúnen1, Mariana Martins1, Cláudia
Ferraz1, Alexandrina Portela1, Rute Vaz1, Maria José Costa1
S. Neonatologia, Dep. da Mulher, da Criança e do Jovem, H Pedro
Hispano, ULS Matosinhos
1
Introdução: A alimentação dos recém-nascidos (RN) com
peso inferior a 1500 gramas é essencial para garantir o atingimento do seu potencial máximo de crescimento e neurodesenvolvimento.
Material e métodos: Análise retrospetiva dos processos
clínicos das crianças, com peso ao nascimento inferior a 1500
gramas, internadas no Serviço de Neonatologia do Hospital Pedro Hispano entre Janeiro de 2010 e Dezembro de 2011. Dados
complementados por entrevista telefónica.
Resultados: Durante o período de estudo estiveram internadas no Serviço de Neonatologia 59 RN. A idade média da mãe
na altura do parto era de 31,2 anos e 54% das mães tinha como
habilitações literárias o ensino superior. A idade gestacional média foi de 30 semanas e 3 dias, a média do peso ao nascimento
foi 1198g e havia restrição de crescimento intra-uterino em 39%
dos casos. A maioria dos RN iniciou alimentação entérica aos 3
dias de vida (82% fizeram leite materno, dos quais 50% em exclusivo). A duração média do internamento foi 43 dias e a idade
corrigida na alta de 35 semanas e 3 dias. No momento da alta
68% dos RN fazia leite materno, dos quais 50% em exclusivo.
Cerca de 60% das crianças era alimentada com leite materno extraído. A duração média do aleitamento materno exclusivo foi de
2,5 meses e do aleitamento materno, suplementado com leite de
fórmula, de 7,5 meses. A retoma da atividade profissional da mãe
ocorreu, em média, 5,7 meses após o parto. O peso aos 6, 12 e
18 meses era superior ao percentil 5 em 36%, 49% e 65%, respetivamente. As crianças que não fizeram leite materno ou cuja
duração foi inferior a 2 meses apresentaram percentis de peso
resumo das comunicações orais
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
e comprimento, aos 6, 12 e 18 meses, superiores em relação às
que fizeram leite materno durante mais do que 2 meses.
Discussão: O leite materno é o melhor alimento para o RN,
independentemente do peso e da idade gestacional. A necessidade
de adicionar ao leite materno fortificantes ou suplementos explica
a percentagem significativa de RN alimentados com leite materno
extraído. Apesar de, nesta amostra, a evolução ponderal ter sido
melhor nas crianças alimentadas com leite de fórmula, a literatura mostra que os RN prematuros, a que se associa baixo peso,
alimentados com leite materno, apresentam um neurodesenvolvimento melhor, relativamente aos alimentados com leite de fórmula
(efeito paradoxal aparente do leite materno). Este conceito reforça a
necessidade de seguimento a longo prazo destes recém-nascidos.
HIDRONEFROSE: A PROPÓSITO DE 2 CASOS CLÍNICOS
Raquel Azevedo Alves¹, Liane Costa¹, Mariana Martins¹, Vânia
Gonçalves¹, Carlos Ferreira², Maria Eduarda Cruz¹
¹ S. Pediatria, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
² S. Urologia, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
Introdução: A obstrução do tracto urinário pode ocorrer durante o desenvolvimento fetal, infância e idade adulta. A etiologia
pode ser congénita ou adquirida. Em pediatria a maioria das lesões obstrutivas são de origem congénita. A manifestação clínica
mais comum é a cólica renal em contexto de hidronefrose.
Casos clínicos: Os autores apresentam duas adolescentes, 17 anos, com manifestações clínicas semelhantes mas etiologias diferentes. Caso 1: Internada a 01.05.2012 por dor lombar
e Murphy renal à dta, febre com 3 dias de evolução. Analiticamente leucocitose com neutroflia, PCR positiva, leucocitúria e
hematúria. Ecografia:“moderada dilatação pielocalicial à dta,
aparentemente causada por um cálculo com 10mm no uréter
proximal, após a junção pielo-ureteral; litíase renal à dta; inúmeros focos litiásicos em todos os grupos caliciais/medulas do
rim esq, podendo representar uma nefrocalcinose medular; sem
ectasia das cavidades excretoras. Internada 7 dias realizando
antibioterapia por PNA a Proteus Mirabilis. Submetida em D3 a
ureteropielografia retrógrada que revelou 2 imagens de subtração e realizada remoção transureteral dos cálculos com derivação urinária retrógrada cateter ureteral duplo J.
Caso 2: Seguida consulta de Pediatria em 2011 após episódio de abdominalgias, sem outros sintomas ou sinais. Ecografia
e TAC abdominal “rim esq com dilatação pielocalicial de 25mm,
compatível com provável síndrome de junção”. Cintigrafia renal
MAG-3 “rim esq com redução ligeira da função renal diferencial (38%) marcado compromisso da drenagem (estase pielo-calicial), sugerindo padrão obstrutivo”.
Internada a 02.05.2012 por dor lombar irradiando FIE e
febre com 2 dias de evolução. Analiticamente leucocitose com
neutrofilia, PCR positiva e leucocitúria. A ecografia “marcada hidronefrose à esq em relação com síndrome de junção; dilatação
piélica atingindo 26mm no sentido antero-posterior; sem sinais
ecográficos associados de hidronefrose ou de pielonefrite”. Internada 6 dias, realizando antibioterapia por PNA E. coli. D2 sub-
metida a ureteropielografia retrograda revelando ureter fino sem
tortuosidades, com aperto na junção pieloureteral e hidronefrose
volumosa com dilatação infundibulo-calicial. Derivação urinária
com cateter ureteral duplo J.
Discussão: Dois casos de síndrome de junção de etiologia
diferente, focando a importância da forma de apresentação clínica, assim como da necessidade de um diagnóstico e intervenção
terapêutica precoce.
MENINGITE POR ENTEROVÍRUS – A IMPORTÂNCIA DA
IDENTIFICAÇÃO RÁPIDA
Joana Magalhães¹, Maria João Vieira², Paula Mota³. Armandina
Silva², Ana Luísa Lobo²
¹ S. Pediatria, DCA, CH Porto
² S. Pediatria, CH Alto Ave
³ S. Microbiologia, CH Alto Ave
Introdução: Os enterovirus são a principal causa de meningite assética na criança, sendo importante diferencia-la dos
agentes que exigem terapêutica adequada e precoce. No Centro
Hospitalar do Alto Ave (CHAA) é feita identificação deste agente
no líquor por RT-PCR desde 2010 sempre que estudo citoquímico compatível, com resultado em 24h, sendo anteriormente
realizado fora do hospital, com resultado demorado.
Material e Métodos: Estudo retrospetivo, com consulta dos
processos clínicos das crianças internadas em 2008 e entre Julho de 2010 e Junho de 2011 às quais foi pedida pesquisa de
enterovirus no liquor, com o objetivo de comparar a conduta perante estes doentes antes e após a realização do teste no CHAA
e as suas implicações.
Resultados: Foram realizados 61 testes em 2008, 30 positivos e 10 (16%) desconhecidos. No período 2010/2011, foram
realizados 57 testes, 32 positivos. Verificou-se um predomínio
de meningite a enterovirus no sexo masculino, com média de
idades de 5 anos e maior prevalência no verão.
O estudo analítico revelou leucócitos no líquor e proteína c
reativa similares (p=0,687 e 0,436) mas menos leucócitos séricos e maior relação glicorráquia/glicemia nas meningites por enterovirus relativamente aos outros casos de meningite (26, sem
identificação de agente em 24).
Tiveram diagnóstico de meningite 48 crianças em 2008 (30
enterovírus), e iniciaram antibiótico (ATB) 12 (25%), 7 com resultado positivo. Em 2010/2011 foi diagnosticada meningite a 41 crianças (32 enterovírus) tendo iniciado ATB 17 (41.4%), 11 positivos.
Não houve diferença entre os anos na percentagem em
que foi instituído ATB quer nas crianças com meningite quer nas
crianças com resultado positivo (23% vs 34%, p=0,408). Porém,
em 2008 as 7 crianças completaram o tratamento, e em 2011 a
identificação do agente permitiu suspensão em 24h em 9 de 11.
A duração média do internamento foi respetivamente de
3,23 e 2,88 dias (p=0,69). Todos os doentes tiveram boa evolução clínica.
Conclusões: A disponibilidade rápida do resultado de PCR
para enterovirus no liquor não diminuiu o número de crianças
resumo das comunicações orais
S 192
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revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
que iniciaram ATB, provavelmente pela valorização da clínica,
rastreio sético e estudo citoquímico do líquor. Permitiu porém
suspensão precoce nos positivos, reduzindo custos inerentes á
terapêutica.
A ausência de diferença significativa na duração do internamento pode dever-se à possibilidade de completar antibioticoterapia em hospital de dia ou ao tamanho da amostra.
CONHECIMENTOS E ATITUDES DOS CUIDADORES
ACERCA DA EXPOSIÇÃO SOLAR EM IDADE PEDIÁTRICA
Joana Leite¹, Sara Domingues², Joana Sampaio³, Raquel Braga3
S. Pediatria, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
S. Pediatria, CH Tâmega e Sousa
3
USF Lagoa
1
2
Introdução: A exposição solar excessiva em crianças pode
contribuir para o aparecimento de cancro de pele na vida adulta,
sendo este grupo etário particularmente vulnerável aos efeitos
nocivos da radiação ultravioleta. Este estudo pretendeu caracterizar os conhecimentos e atitudes dos cuidadores de crianças
acerca da exposição solar.
Materiais e Métodos: Realizou-se um estudo observacional analítico entre Julho e Outubro de 2012, na Unidade de
Saúde Familiar Lagoa, com a realização de um questionário dirigido aos cuidadores das crianças frequentadoras da Consulta de
Saúde Infantil, dos 0 aos 18 anos, tendo-lhes sido entregue um
folheto informativo posteriormente. Os dados foram registados e
analisados com o programa SPSS®.
Resultados: Obtiveram-se 104 questionários, apresentando os cuidadores uma idade média de 36 anos e as crianças
de 14 anos. A maioria dos cuidadores (89.4% e 95.2%, respetivamente) tem conhecimento de que a exposição solar não é
nociva apenas no Verão e na praia. Cerca de 30% acredita que
o sol só tem efeitos nocivos na pele, 35% reconhece a exposição
solar mais nociva das 11 às 16 horas e 5.7% definem esse período igual ou inferior a três horas. A maioria usa protetor, chapéu,
sombras ou guarda-sol e evicção do sol nas horas de maior pico;
76% usa camisola de manga curta e 65.4% óculos de sol. Na
praia, 95.2% dos cuidadores aplica sempre protetor solar, enquanto noutras atividades ao ar livre apenas 28%. Quanto ao
Fator de Proteção solar usado nas crianças, 89.4% usa fator 50,
2.9% igual ou inferior a 20 e 1.9% não usa. Constatou-se que
11.2% dos cuidadores que responderam não ser suficiente aplicar protetor uma vez por dia não repetem a aplicação; 33.7%
dos que apontaram que o sol tem atingimento ocular não usam
óculos; 47.5% dos que sabem que se deve usar protetor nas
atividades ao ar livre não o aplicam sistematicamente.
Discussão: A maioria dos cuidadores demonstra conhecimentos teóricos sobre os efeitos nocivos da radiação ultravioleta, mas nem sempre os aplicam à prática. Salienta-se que só
cerca de 35% saibam o horário de exposição solar mais nociva e
cerca de 6% assinalem um período igual ou inferior a três horas,
o que pode levar ao aumento do risco de queimaduras solares
em idades precoces e subsequentemente de melanoma. Assim,
é fundamental fomentar hábitos de fotoproteção adequados na
infância e optimizar os conhecimentos dos pais, tendo sido essa
a principal finalidade do estudo traduzida na entrega do folheto
informativo.
TUBERCULOSE EM IDADE PEDIÁTRICA: EXPERIÊNCIA DE
UM HOSPITAL TERCIÁRIO DE 2000-2012
Joana Correia1, Catarina Mendes1, Lurdes Morais1, Margarida
Guedes1, Laura Marques1, Virgílio Senra1
1
S. Pediatria, CH Porto
Introdução: A tuberculose (TB) mantém-se um importante
problema de saúde pública. Na idade pediátrica está associada
a um maior risco de progressão para doença e manifestação de
formas graves.
Objetivos: Caracterização clínica e epidemiológica dos casos de tuberculose doença internados no serviço de Pediatria
do Centro Hospitalar do Porto, entre janeiro de 2000 e setembro
de 2012.
Métodos: Estudo observacional retrospetivo, baseado na
análise dos processos clínicos dos doentes internados com o
diagnóstico de tuberculose.
Resultados: No período estudado foram admitidos no internamento de pediatria 43 crianças com infeção por Mycobacterium
tuberculosis, das quais 35 apresentavam tuberculose doença. A
idade de diagnóstico variou entre os 6 meses e os 18 anos, com
uma mediana de 3 anos e média de 5,79. Todos os casos tinham
sido vacinados com BCG. Duas crianças (5,7%) tinham infecção
VIH. O diagnóstico baseou-se na história de contacto (83%), prova tuberculínica positiva (80%) ou teste IGRA positivo (positivo
em 7 de 8 doentes) e alterações imagiológicas. A radiografia do
tórax foi realizada em 97% dos casos (sensibilidade de 88%) e
a TAC torácica foi feita em 57% dos doentes, apresentando-se
alterada em todos. O M. tuberculosis foi isolado no suco gástrico
(positivo em 8 de 29 doentes) e na expetoração (2 de 4 doentes); identificou-se por técnica de PCR em 3 casos adicionais
(2 no LBA e 1 no LCR). Foram diagnosticados 29 casos de TB
pulmonar (um complicado com TB endobrônquica), 3 casos de
TB osteoarticular, 1 caso de TB miliar, 1 caso de TB cutânea e 1
caso de TB meningea. Instituiu-se terapêutica tripla em 57% dos
doentes e quadrupla em 34%; um dos doentes iniciou tratamento de TB multirresistente de acordo com antibiograma do caso
index. Nos casos de TB meníngea, miliar e endobrônquica foi
realizado tratamento adjuvante com corticoide.
Comentários: Os resultados encontrados estão de acordo com a literatura, sendo o atingimento pulmonar a forma mais
frequente da doença (82,9%). O diagnóstico da TB em idade
pediátrica é essencialmente clínico, não sendo possível o isolamento do agente na maioria dos casos. É de salientar a história
de contacto com um doente bacilífero em 83% dos doentes, pelo
que a progressão para doença poderia ter sido evitada por um
correto rastreio dos conviventes e instituição de quimioprofilaxia
ou tratamento de acordo com a situação clínica.
resumo das comunicações orais
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S 193
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
TRAUMATISMO CRANIANO EM IDADE PEDIÁTRICA –
CASUÍSTICA DE 1 ANO DO HOSPITAL DE AVEIRO – CHBV
Ana Ratola1, Estefânia Maia1, Ângela Almeida1, Raquel Zenha1,
Ana Nordeste1, Sílvia Almeida1
1
S. Pediatria, H Aveiro, CH Baixo Vouga
Introdução: Os traumatismos crânio-encefálicos (TCE)
são um motivo frequente de recurso ao Serviço de Urgência
Pediátrica (SUP) e exigem a avaliação do risco de lesão intra-craniana (LIC). Os TCE classificam-se em ligeiros, moderados
ou graves de acordo com a alteração do estado de consciência,
avaliado pela Escala de Coma de Glasgow (ECG). A maioria das
crianças sofre TCE ligeiros que corresponde a valores entre 13
e 15 na ECG.
Objectivos: Caracterizar as admissões por TCE num período de 12 meses para posterior elaboração de um protocolo de
actuação no SUP.
Material e métodos: Análise retrospectiva dos episódios
de urgência/internamentos por TCE do Serviço de Pediatria do
CHBV, entre Janeiro e Dezembro de 2011. Analisaram-se as seguintes variáveis: idade, sexo, antecedentes pessoais, manifestações clínicas, exames complementares e orientação.
Resultados: No período em estudo ocorreram 561 episódios de TCE no SUP (1,5% do total de admissões). A idade mediana foi de 3,99 anos (28,9% <2 anos) e 62,7% eram do sexo
masculino. Os principais mecanismos de traumatismo referidos
foram queda da própria altura ou até 1 metro. As áreas cranianas de impacto mais frequentes foram frontal (51,7%), occipital
(25,5%) e parietal (14,4%). Os sintomas maioritariamente referidos foram vómitos (14,3%), sonolência (9,4%), cefaleias (6,4%)
e perda de consciência (2,8%), permanecendo 66,3% dos casos
assintomáticos. Todos apresentaram TCE ligeiro (ECG≥14). As
principais lesões observadas ao exame objectivo foram hematomas epicranianos, feridas e escoriações.
Relativamente aos exames auxiliares de diagnóstico, 38,5%
das crianças realizaram radiografia de crânio, suspeitando-se de
fractura em 6 casos (2 não confirmados) e 5,8% foram submetidas a tomografia computorizada crânio-encefálica (TC-CE), que
revelou hematoma extra-dural num caso e fractura óssea em 5.
Houve necessidade de vigilância/internamento em 57 crianças
(tempo médio de 16,8 horas) e 3 foram transferidas para Hospital
Nível 3.
Conclusão: Neste estudo todos os TCE foram ligeiros, 5
crianças apresentaram fractura de crânio e apenas 1 LIC (valor
mais baixo do que obtido noutros estudos). Elevado número de
crianças realizaram radiografia de crânio, exame pouco sensível
e que necessita de treino na interpretação, sendo a TC-CE o
exame de referência. Realça-se a necessidade da valorização
clínica através da realização de protocolos de actuação, vigilância e realização ponderada de exames de neuro imagem.
USO DAS REDES SOCIAIS ONLINE EM ADOLESCENTES
DO ENSINO SECUNDÁRIO
Inês Ferreira¹, Cláudia Aguiar², Vasco Lavrador¹, Juliana Oliveira²,
Rita Santos Silva², Fátima Pinto³
¹ S. Pediatria, CH Porto
² S. Pediatria, CH São João
³ URAP, ACeS Porto Ocidental
Introdução: Entre os adolescentes tem-se verificado um
progressivo aumento do uso da internet como meio de comunicação e socialização. Pela menor capacidade de auto-regulação
e maior susceptibilidade pelos pares levantam-se preocupações
relativas a comportamentos impróprios online que possam pôr
em causa a segurança e perda de privacidade. O presente trabalho tem como objectivo caracterizar o comportamento dos adolescentes nas redes sociais online.
Material e Métodos: Estudo transversal desenvolvido
numa Escola Secundária Pública do Porto, através da aplicação de um questionário a 94 adolescentes do ensino secundário. Resultados: Excluídos 7 questionários por não usarem
redes sociais online. Dos restantes 87, 52,9% (N=46) eram do
sexo feminino, com idade média de 16,56 B1 1,20 anos e 66,7%
(N=58) frequentavam o 10B: ano. A totalidade tem computador
com acesso à internet em casa, sendo que 56,3% (N=49) têm
computador no quarto. A quase totalidade dos adolescentes
(96,6%; N=84) utiliza as redes sociais sozinho e 29,9% (N=26)
usam mais do que uma rede social. A idade média de início das
redes sociais foi de 11,95 B1 2,12 anos. Cerca de metade (N=46;
52,9%) dedica pelo menos uma hora diária às redes sociais e
70,1% (N=61) mais de cinco dias por semana. A quase totalidade
(97,7%; N=85) já recebeu pedidos de amizade de desconhecidos, 57,5% (N=50) incluem desconhecidos nas suas delistas de
amigos, 29,9% (N=26) entraram em contacto online com o desconhecido, tendo um deles estabelecido um encontro presencial.
Os adolescentes partilham informação pessoal como fotografia
(88,5%, N=77), data de aniversário (86,2%, n=75) e escola que
frequenta (86,2%, N=75). Verificou-se que as raparigas privam
mais a informação no seu mural (P=0,004). Os adolescentes que
aceitam pedidos de amizade de desconhecidos passam mais
horas por dia nas redes sociais (p=0,014) e privam menos informação (p=0,014). A maioria (58,6%; N=51) considera não correr
risco ao divulgar informações pessoais online.
Conclusões: Apesar das dificuldades inerentes a este
estudo, foi possível identificar um uso generalizado das redes
sociais online entre os adolescentes do ensino secundário, com
adopção de comportamentos de risco. Desta forma, é de salientar o papel do Pediatra no processo de consciencialização dos
adolescentes e famílias acerca dos riscos e complexidades do
mundo digital.
resumo das comunicações orais
S 194
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
MUITO BAIXO PESO E LEVE PARA A IDADE GESTACIONAL
– UMA ASSOCIAÇÃO DE MAU PROGNÓSTICO?
Joana Magalhães1, Catarina Resende1, Ana Cristina Braga1,
Ana Margarida Alexandrino1
1
S. Neonatologia, DCA, CH Porto
AVALIAÇÃO DOS CONHECIMENTOS E TÉCNICA NO
USO DOS DISPOSITIVOS INALATÓRIOS EM CRIANÇAS
ASMÁTICAS
Eliana Oliveira1, Ana Cristina Barros1, Natacha Fontes1, Ana
Paula Aguiar1, Cidrais Rodrigues1, Georgeta Oliveira1
Dep. da Mulher, da Criança e do Jovem, H Pedro Hispano, ULS
Matosinhos
1
Introdução: A restrição de crescimento intra-uterino (RCIU)
é descrita como fator de maior morbilidade nos recém-nascidos
(RN) pretermo, no período neonatal e a longo prazo. Frequentemente não há diagnóstico pré-natal, utilizando-se o conceito de
leve para idade gestacional (LIG).
Material e Métodos: Pretende-se analisar morbilidade precoce, crescimento e desenvolvimento dos RN de muito baixo
peso (MBP) LIG nascidos na Maternidade Júlio Dinis de 2004 a
2009, e comparar com RN nascidos no mesmo período, com a
mesma idade gestacional e peso adequado (AIG), por consulta
do processo clínico.
Resultados: Nasceram naquele período 95 RN MBP LIG,
com mediana de 31 semanas de gestação e 1000g de peso,
sendo a mediana de 1416g nos AIG. Houve 5 óbitos em LIG. Não
houve diferença entre os grupos na prevalência de hipertensão
e doença auto-imune materna, nas variáveis sociodemográficas,
índice de Apgar e necessidade de reanimação.
Nos LIG houve maior incidência de enterocolite necrotizante, persistência do canal arterial e retinopatia com necessidade
de cirurgia, assim como hemorragia cerebral e leucomalácia de
maior gravidade. Não houve diferença na necessidade de ventilação invasiva, que teve maior duração nos LIG, que tiveram
também maior incidência de trombocitopenia e anemia e internamentos mais longos.
A avaliação do crescimento e desenvolvimento após os dois
anos foi possível em 75 RN LIG, sendo a duração do seguimento
semelhante nos controlos.
1/3 dos LIG mantêm peso inferior ao percentil 10.
As alterações do neurodesenvolvimento sem paralisia cerebral (PC) são mais prevalentes nos LIG, mas a PC é mais prevalente nos AIG (6 para 1).
A avaliação de desenvolvimento segundo escala de Mary-Sheridan está mais frequentemente alterada nos LIG, sobretudo
áreas de linguagem e social, havendo mais LIG sob intervenção.
Um nível socio-cultural mais baixo correlaciona-se com maior
probabilidade do rastreio ter alterações.
Na avaliação com teste de Ruth Griffiths (40 LIG, 32
AIG), os LIG obtiveram resultados inferiores no quociente geral
(p=0,053) e todos os subquocientes, com significância no raciocínio prático.
Comentários: A morbilidade neonatal foi maior nos LIG,
comparativamente com AIG com a mesma idade gestacional.
Apesar da maior prevalência de PC nos AIG, globalmente o desenvolvimento psicomotor é pior nos LIG.
A RCIU agrava a morbilidade inerente à prematuridade. É
essencial que estas crianças tenham seguimento regular que
permita detetar alterações e orientar intervenção.
Introdução: A via inalatória constitui o método preferencial
para a administração de fármacos no tratamento das doenças
respiratórias, pelo que é imperativo a monitorização e ensino
desta técnica por parte dos profissionais de saúde.
Métodos: Foi realizado um estudo observacional analítico transversal numa amostra de conveniência, que incluiu as
crianças asmáticas seguidas na consulta de Imunoalergologia
Pediátrica do HPH, durante o mês de Maio e Junho de 2012. A
recolha da informação foi realizada através de um questionário
autoaplicado ao acompanhante da criança, que inclui informação
relativa a parâmetros sociodemográficos, conhecimentos sobre
a terapêutica inalatória e compreensão das orientações clínicas
recebidas. Efetuou-se o registo do desempenho do doente durante a demonstração da técnica inalatória.
Resultados: Durante o período de estudo obtiveram-se
64 questionários correspondentes a crianças com uma média
de idades de 10,1 anos, dp4,1, das quais 64,1% eram do sexo
masculino. Á data da avaliação, os doentes apresentavam um
tempo médio de uso de dispositivos inalatórios de 5,3 anos,
dp3,8 (mínimo-máximo: 0-17 anos); a média de idade de início
de terapêutica inalatória foi de 4,9 anos, dp3,5. Aproximadamente 65% das famílias apresentavam um Índice de Graffar: %4. Em
cerca de metade dos participantes havia história familiar de uso
de dispositivos inalatórios. Na avaliação do ensino, 53,1% dos
participantes reportou raramente ser necessário a correção da
técnica inalatória pela equipa de enfermagem. No dia de aplicação do questionário, 70,3% das crianças revelaram um bom
desempenho na demonstração da sua técnica inalatória. Em
apenas 6,5% dos casos, constatou-se uma discrepância entre a
real necessidade de correção, avaliada pela equipa de enfermagem, e a perceção dos inquiridos. As crianças em que foi referida
a necessidade de correção de técnica inalatória eram, em média,
mais novas e apresentavam menos anos de uso de dispositivos
inalatórios comparativamente com as que raramente precisavam
de correção, embora as diferenças não sejam estatisticamente
significativas. As famílias com Graffar: %4 apresentaram 3 vezes mais probabilidade de necessitarem de correção na técnica
inalatória, após ajuste para idade da criança e anos de uso de
dispositivo (OR=3,22, IC95%: 1,06-9,80).
Conclusão: O facto de quase metade da amostra referir
a necessidade de correção da técnica inalatória, reforça a importância de uma monitorização e reavaliação periódicas, procedimento sempre executado pela nossa equipa de enfermagem
previamente.
resumo das comunicações orais
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 195
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
ALERGIA ALIMENTAR - DA SUSPEITA AO DIAGNÓSTICO
Ana Cristina Barros1, Natacha Fontes1, Eliana Oliveira1, Ana
Paula Aguiar1, Georgeta Oliveira1
C. Imunoalergologia, Dep. da Mulher da Criança e do Jovem, H Pedro
Hispano, ULS Matosinhos
1
NECESSIDADES, DIFICULDADES E PREOCUPAÇÕES
DE PAIS COM BEBÉ INTERNADO NUMA UNIDADE DE
NEONATOLOGIA: PERSPETIVA DOS PROFISSIONAIS DE
SAÚDE
Zusana Diaz1, Susana Caires2, Susana Correia3
Instituto de Educação, Universidade do Minho,
Universidade do Minho
3
Universidade de Évora
1
Introdução: A alergia alimentar, com uma prevalência em
pediatria de 6 a 8%, caracteriza-se por uma reação imunológica
que pode ser, ou não, IgE mediada. As manifestações clínicas
variam desde o ligeiro prurido até à anafilaxia.
Material e métodos: Análise retrospetiva e prospetiva dos
casos de suspeita de alergia alimentar observados em consulta
de Imunoalergologia Pediátrica entre Abril e Junho de 2012.
Resultados: Durante o período de estudo observou-se em
consulta 52 casos de suspeita de alergia alimentar. A idade média na primeira consulta foi 3 anos e 5 meses (54% com menos
de 12 meses) e a dermatite atópica foi a patologia concomitante
mais frequente (52%). Existia história familiar de asma (33%), rinite (31%) e alergia alimentar (9,6%). Foram implicados em possíveis manifestações alérgicas 71 alimentos (12 casos referindo
dois ou mais alimentos), sendo mais frequente o leite (38%), peixe ou mariscos (18%), frutos secos (10%) e ovo (7%). A primeira
manifestação de reação adversa ao leite ocorreu em média aos 5
meses e aos outros alimentos aos 3 anos. Os sintomas cutâneos
foram os mais frequentes (urticária 38%, eritema peribucal 27%
e prurido 18%), seguido dos gastrointestinais (vómitos 14%) e
respiratórios (dispneia 4%). Foi referido atingimento de dois ou
mais sistemas com 13 alimentos. O teste Prick (realizado em 42
alimentos) foi positivo em 45% (n=19) e em 10 desses casos a
IgE específica foi negativa. Identificou-se alergia alimentar IgE
mediada (IgE específica com classe>2) em 28%. Realizou-se 20
provas de tolerância oral (leite, ovo e peixe) sem manifestações
imediatas nem tardias de alergia em 17 casos.
Comentários: A alergia alimentar pode ter um impacto significativo na qualidade de vida, pelo que é essencial o correto
diagnóstico. Na maioria das reações adversas a alimentos consegue demonstrar-se a ausência de mecanismos imunológicos,
excluindo-se assim o diagnóstico de alergia. Nos casos apresentados, as manifestações clínicas foram variadas e, apesar
de muitos sintomas serem sugestivos de um mecanismo imunológico IgE mediado, apenas se comprovou a presença de IgE
específica num quarto dos alimentos testados. No entanto, nos
restantes alimentos não é possível excluir a presença de reação
imune. A identificação dos casos de alergia alimentar e a realização de prova de tolerância oral evita dietas de exclusão restritas
e previne reações graves causadas por reatividade cruzada.
2
Resumo: De acordo com as investigações efetuadas no
âmbito das dificuldades, preocupações e necessidades sentidas pelos pais que têm um bebé internado numa Unidade de
Neonatologia (UN), o conhecimento das mesmas por parte dos
profissionais de saúde, permite-lhes agir de forma a garantir melhor qualidade da assistência oferecida ao bebé e sua família,
planeando uma assistência mais humanizada, ao considerar tais
vivências. Este é o ponto de partida para uma intervenção que se
pretende baseada nos cuidados centrados na família. Importa,
todavia, ter sempre em consideração que as necessidades, preocupações e dificuldades, são distintas de família para família,
que variam consoante o tempo de internamento do bebé, e o
mapeamento das mesmas revela-se de suma importância para
compreender o comportamento dos diferentes membros da família. Assim, com o objetivo de conhecer as vivências dos pais
com um bebé internado numa UN e de desenhar intervenções
visando minorar e/ou satisfazer as vivências menos positivas,
desenvolveu-se um estudo exploratório, centrado nas necessidades, dificuldades e preocupações destes pais, na sua própria
perspetiva (n=20), e na dos profissionais de saúde (n=13). No
presente trabalho são partilhados apenas resultados parciais do
estudo: os que se reportam à perspetiva dos profissionais de
saúde. De entre os resultados obtidos destacam-se as suas perceções relativamente às dificuldades financeiras dos pais; às dificuldades na separação do bebé; e, no assumir autonomamente
os cuidados do bebé aquando da alta (sem a retaguarda dos
profissionais e dos aparelhos que controlam os sinais vitais do
bebé). Necessidades de informação acerca do estado de saúde
atual do bebé; de estabilização do seu estado de saúde (para
poderem retomar a vida “normal”); e de acompanhamento psicológico sobressaíram, também, no discurso destes profissionais. Quanto às preocupações dos pais, os participantes deram
particular ênfase às que dizem respeito ao estado de saúde do
bebé; seu futuro (em termos de desenvolvimento, saúde, prognóstico…); e, à autonomia “forçada” nos cuidados do bebé após
o regresso a casa. No final, e em consonância, com a informação recolhida, são deixadas algumas reflexões e linhas de intervenção, a implementar pelos próprios profissionais de saúde,
no sentido de atenuar as vivências negativas associadas a este
processo. Entre estas, as abordagens centradas na família merecem particular destaque.
resumo das comunicações orais
S 196
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
INTERVENÇÃO NO BULLYING: O ANTES, O DEPOIS E
AINDA OS EFEITOS DA COMUNICAÇÃO SOCIAL
Rosário Pinho1, Joana Monteiro2, Catarina Carvalho1, Virgínia
Monteiro2
PHDA E ACIDENTES: SERÁ A REALIDADE PORTUGUESA
DIFERENTE?
Joana Monteiro1, Hugo Rodrigues2, Fátima Nunes1, Virgínia
Monteiro1
Divisão de Educação, Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis
(CMOA)
2
S. Pediatria, CH Entre Douro e Vouga
1
1
Introdução: O Município de Oliveira de Azeméis (Divisão
Municipal de Educação) desenvolveu em parceria com a Consulta de Desenvolvimento do CHEDV vários projetos no âmbito
da saúde escolar. Assumindo a escola como espaço privilegiado
para a aquisição de competências de relacionamento interpessoal, a equipe pretendeu com este projeto dotar os agentes educativos de habilitações para ajudar crianças e jovens a ultrapassar
as situações de violência em contexto escolar - Bullying.
Materiais e métodos: Realizaram-se ações de formação
para toda a comunidade educativa (professores, pais/encarregados de educação, assistentes operacionais e alunos) das
escolas da rede pública do concelho, do jardim-de-infância ao
ensino secundário. Foram desenvolvidas por psicólogas, com
o apoio de professores, alunos, associações de pais e agentes
de autoridade (Escola Segura). Incidiram nos seguintes aspetos: definição e tipos de bullying, perfil da vítima e do agressor,
identificação de situações em casa e na escola, formas de atuação e prevenção nos vários contextos. Posteriormente, a equipe
disponibilizou-se a organizar um trabalho em regime de consultadoria ao nível escolar, para apoiar a implementação de medidas práticas na deteção e orientação das situações existentes,
p. e. através da criação de regulamento anti abuso, criação de
grupos de pares, etc.
Resultados: Esta atividade teve um impacto significativo
na comunidade e provocou o reconhecimento de vários casos,
principalmente entre os encarregados de educação. Observou-se inicialmente algum interesse pelo tema por parte dos professores, apesar da relutância em aceitarem a sua existência.
Com a divulgação na comunicação social de situações concretas
de bullying, a atenção passou a ser crescente e os pedidos de
formação multiplicaram-se. Notou-se, no entanto, que o envolvimento da comunidade educativa nunca foi para além destas
formações, não se concretizando o trabalho em regime de consultoria que proporcionaria continuidade ao projeto. Coincidentemente ou não, ocorreu um “esquecimento” do assunto por parte
dos meios de comunicação.
Conclusões: Embora o bullying persista um problema atual, não parece constituir uma prioridade para a rede escolar em
causa, eventualmente por razões socioculturais. A comunicação
social desempenha um papel determinante na forma como a comunidade encara determinadas problemáticas e a recente mediatização deste tema poderá servir para renovar o interesse e a
procura de ajuda na sua abordagem.
2
S. Pediatria, CH Entre Douro e Vouga
USF Vale do Vouga, S. João da Madeira
Introdução: As lesões acidentais são a principal causa de
morbimortalidade em idade pediátrica e a sua incidência estima-se aumentada em crianças com Perturbação de Hiperatividade
e Défice de Atenção (PHDA). O objetivo do presente estudo foi
analisar a prevalência de acidentes com necessidade de observação médica hospitalar em crianças com PHDA, comparando-a
com a da população de crianças saudáveis.
Métodos: Revisão de processo clínico electrónico com registo de recorrências ao Serviço de Urgência do CHEDV, EPE
de crianças e jovens com diagnóstico de PHDA seguidos na consulta externa de Neurodesenvolvimento (grupo 1) e crianças e
jovens seguidos em Consulta de Saúde Infantil da USF de Vale
do Vouga, sem patologia neurodesenvolvimental (grupo 2). Os
grupos, divididos por género e faixas etárias, eram semelhantes
em número de elementos. Análise estatística com SPSS v17.
Resultados: A amostra estudada era constituída por 734
indivíduos, dos quais 304 (41.4%) apresentavam critérios de
diagnóstico para PHDA. Registou-se na população geral um predomínio do sexo masculino, sendo ligeiramente mais elevado no
grupo com PHDA (76%).
A média de idades foi 12.8±3.1 anos e mediana de 14.
Comparando os dois grupos, salientou-se uma maior prevalência de acidentes na amostra com PHDA (46.1% vs 43.5%,
p=0.491), com um número ligeiramente mais elevado de recorrências ao serviço de urgência (0.76±1.1 vs 0.67±1.04, p= 0.20),
embora sem significado estatístico. Observou-se também, ao
subdividir a amostra por faixas etárias, que os adolescentes com
PHDA com idade superior a 18 anos apresentavam uma significativamente maior prevalência de acidentes em relação à amostra controlo (p=0.020).
No grupo com PHDA, destaca-se o facto de os rapazes
apresentarem significativamente mais acidentes (49.4% vs
35.6%, p =0.040) e em maior número (0.84±1.2 vs 0.52±3.85,
p= 0.038).
Discussão: Os resultados mostraram um elevado número
de acidentes e ao contrário de múltiplos estudos publicados, no
nosso não se verificou uma maior prevalência na população com
PHDA, à exceção dos adolescentes mais velhos.
Este resultado surpreendente vem reforçar a noção de
que a população infanto-juvenil portuguesa tem um alto nível de
acidentalidade, o qual não está relacionado com a presença de
patologias predisponentes, como é o caso da PHDA, mas sim
com características socioculturais que dizem respeito à falta de
medidas de prevenção, entre outras.
resumo das comunicações orais
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 197
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
ENVOLVIMENTO CARDÍACO NA DISTROFIA MUSCULAR
DE BECKER
Joana Freitas1, Marília Loureiro3, Manuela Santos2, Sílvia
Álvares3
S. Pediatria, CH Porto
S. Neurologia Pediátrica, CH Porto
3
S. Cardiologia Pediátrica, CH Porto
1
2
Introdução: A distrofia muscular de Becker (DMB) associa-se a alterações cardíacas que são responsáveis por elevada
morbilidade e mortalidade, podendo ser mais importantes que o
atingimento do músculo esquelético. O envolvimento cardíaco é
variável, podendo ser subclínico, ou manifestar-se sob forma de
cardiomiopatia e insuficiência cardíaca congestiva. O objectivo
deste estudo é avaliar as alterações cardíacas presentes nos
doentes com DMB seguidos na consulta multidisciplinar de doenças neuromusculares.
Material e métodos: Análise retrospectiva dos processos
clínicos com registo da avaliação clinica, electrocardiograma e
ecocardiograma.
Resultados: O estudo inclui 11 doentes, com idades entre os 12 meses e os 16 anos, à data da primeira consulta de
Cardiologia Pediátrica, com um tempo médio de follow-up de
6,8+/-4,4 anos. A avaliação cardíaca foi anual ou mais frequente
de acordo com a evolução clinica. Só um adolescente referia
dispneia. A prevalência de doença cardíaca pré-clínica ou clínica
foi de 55%. Alterações electrocardiograficas estiveram presentes
em 9% dos casos. O ecocardiograma mostrou cardiomiopatia
dilatada em 55%, tendo sido iniciado medicação com inibidores
da enzima de conversão da angiotensina.
Conclusões: Salienta-se a importância da deteção precoce da disfunção miocárdica nos doentes com DMB, com o
objetivo de instituir terapêutica apropriada, bem como a implementação das recomendações de seguimento em centros com
experiência.
SÍNDROMA DE TURNER E DRENAGEM VENOSA
PULMONAR ANÓMALA PARCIAL
Raquel Themudo1, Silvia Alvares2, Isabel Sá3, Jorge Moreira4
1
S. Radiologia, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
S. Cardiologia Pediátrica, CH Porto
S. Cardiologia, CH Porto
4
S. Cardiologia Pediátrica, CH São João
2
3
Introdução: A incidência de cardiopatia congénita na síndroma de Turner é elevada, sendo recomendada uma avaliação
e seguimento regular em cardiologia. Os novos meios de diagnóstico de imagem têm permitido uma melhor deteção de malformações cardíacas, sobretudo na adolescência, uma vez que
a ecocardiografia transtorácica pode não ser o exame ideal para
diagnosticar as anomalias de retorno venoso pulmonar, uma patologia rara que se associa a esta doença.
Caso clínico: Adolescente com Sindrome de Turner, de
14 anos de idade, sem sintomas cardiovasculares, referenciada
aos 10 anos à Consulta de Cardiologia Pediátrica para rastreio
de cardiopatia congénita. Apresentava sopro sistólico de ejeção
no bordo esternal direito alto, bloqueio incompleto de ramo direito no electrocardiograma, dilatação das cavidades direitas
com movimento paradoxal do septo interventricular, sobrecarga de volume do ventrículo direito, septo interventricular (SIV)
e interauricular (SIA) intactos. Colocada a hipótese de drenagem
venosa pulmonar anómala parcial, realizou cateterismo cardíaco e angiocardiografia, reportado como normal (Qp/Qs=1). No
seguimento posterior na consulta de Cardiologia Pediátrica, esteve sempre assintomática, mantendo dilatação das cavidades
direitas no ecocardiograma. Efetuou RM cardíaca que demonstrou um shunt esquerdo-direito com Qp/Qs de 1.6; a angiografia
pulmonar com o método “4D Track” permitiu detetar drenagem
venosa pulmonar anómala parcial para a veia braquiocefálica ,
SIA intacto e dilatação das cavidades direitas. Repetiu cateterismo cardíaco que confirmou os achados na RM. Foi submetida a
cirurgia cardíaca corretiva com bom resultado.
Conclusão: A RM cardíaca permitiu definir com exatidão
a anatomia cardíaca e as anomalias vasculares extracardíacas,
bem com calcular o Qp/Qs. É um meio de diagnóstico cada vez
mais utilizado no seguimento dos doentes com Sindroma de Turner, para melhor esclarecimento da cardiopatia.
DISPLASIA BRONCOPULMONAR. CASUÍSTICA DA
UNIDADE DE CUIDADOS INTENSIVOS NEONATAIS DO
HOSPITAL PEDRO HISPANO, 2009-2011.
Eliana Oliveira1, Natacha Fontes1, Ana Cristina Barros1, Marta
Nascimento1, Cláudia Ferraz1, Isabel Martins1
1
Dep. da Mulher, da Criança e do Jovem, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
Introdução: A Displasia Broncopulmonar (DBP) constitui
uma das principais causas de doença pulmonar crónica na infância, com importante morbilidade e mortalidade associadas. Este
trabalho tem como objetivo a caracterização dos recém-nascidos
prétermo (RN PT) com o diagnóstico de DBP, internados na Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais (UCIN) do Hospital Pedro Hispano (HPH), entre 2009 e 2011.
Métodos: Foi realizado um estudo retrospetivo dos processos clínicos de todos os RN com o diagnóstico de DBP (dependência de O2 suplementar por um período ≥ 28dias), internados na UCIN do HPH entre 2009 e 2011. Foram recolhidos os
seguintes parâmetros: idade gestacional, sexo, peso, corticoide
pré-natal, tipo de parto, DMH, surfactante, sépsis, PCA, ventilação assistida, O2 suplementar, diuréticos, broncodilatadores,
corticoides pós-natais e tempo de internamento.
Resultados: Durante os 3 anos de período de estudo
estiveram internados na UCIN do HPH 26 RN com o diagnóstico de DBP, dos quais 43,9% eram do sexo masculino. A idade gestacional variou entre as 23S e as 32S (mediana 28S). O
peso médio ao nascimento foi de 1070g (500-1720g), sendo que
85% tinham peso <1500g. Em 88,5% das gestações foi realizada corticoterapia profilática pré-natal. A DMH estava presente em 69,2% dos casos e 84,6% dos RN efetuaram surfactante
resumo das comunicações orais
S 198
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
nas primeiras horas de vida. Foi diagnosticada sépsis e PCA a
76,9% e 15,4% das crianças, respetivamente. O apoio ventilatório
foi necessário em praticamente todos os RN (25), com 72% a requererem um modo invasivo e 28% a precisarem apenas de CPAPn. Durante o tempo de internamento, a necessidade de O2 suplementar
variou entre os 20 e os 136dias (mediana 42,5dias) e 40,9% dos RN
mantinham esta necessidade às 36S. Dezasseis crianças realizaram
tratamento com diuréticos durante uma média de 36dias, dp=31,5
(2-117dias), que foi iniciado entre o 16º e 51ºdias, e 3 fizeram broncodilatadores. Os corticóides foram usados em 5 RN, mas apenas
3 efetuaram corticoterapia sistémica. Cinco RN foram transferidos
para outras Unidades, tendo o tempo de hospitalização dos restantes oscilado entre os 36 e 136dias, o que correspondeu a altas entre
as 33S e os 2M de IC. Apenas 2 doentes mantiveram necessidade
de O2 suplementar no domicílio.
Conclusão: A etiopatogenia da DBP não está completamente
esclarecida, contudo a prematuridade, baixo peso ao nascimento,
sexo masculino e DMH têm sido associadas a esta patologia, e tal
como esperado, os resultados obtidos no nosso trabalho são concordantes com esta associação.
Na nossa amostra apenas 3 RN com evoluções menos favoráveis foram submetidos a corticoterapia sistémica, prática que se
coaduna com as recomendações atuais que consideram o seu uso
controverso, devendo ser limitado a situações excecionais. Apesar
de quase metade dos RN necessitarem de O2 suplementar às 36S
de IC, à data de alta apenas 2 mantinham esta necessidade.
FEBRE, DOR ABDOMINAL E DOR NO OMBRO NA
ADOLESCÊNCIA? DOIS CASOS CLÍNICOS ILUSTRATIVOS.
Manuel Ferreira-Magalhães1, Marta Guimarães2, Ana Azevedo3,
Conceição Costa4, Sónia Aires3, Cristina Rocha3
Hospital Pediátrico Integrado, CH São João
S. Cirurgia, CH Entre Douro e Vouga
3
S. Pediatria, CH Entre Douro e Vouga
4
S. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia-Espinho
1
2
A abdominalgia, associada ou não a febre, é uma das queixas
mais frequentes do SU. Um exame objetivo (EO) cuidadoso poderá
ser crucial.
Caso 1 -16 anos, masculino, admitido no SU por febre há 1
semana, astenia, recusa alimentar, cefaleias e tosse produtiva. EO:
emagrecido (-6Kg), orofaringe ruborizada, adenomegalias cervicais
(<1cm) e fígado palpável cerca de 2cm. Analiticamente apresentava hemograma normal, PCR 286 mg/L, AST/ALT sem alterações,
aPTT 35,4 (N 28,7), INR 1,7 e urina normal. Radiografia do tórax
com infiltrado intersticial. Internou-se para vigilância, tendo realizado
Mantoux, serologias víricas e culturas bacterianas.
Em D7 iniciou dor no ombro direito, efetuou eco abdominal
que revelou abcesso hepático de 56mm (confirmado por TC). Iniciou
antibioticoterapia e foi proposto para drenagem após transfusão de
plasma que rejeitou por argumentos religiosos. Por evolução desfavorável fez drenagem percutânea em D12 e laparoscópica em D14,
mantendo dreno até D33, altura em que ficou apirético. Alta em D35.
Cultura de líquido do abcesso positivo para Staphyloccocus aureus.
Caso 2 -12 anos, feminino, recorre ao SU por abdominalgia. EO
com dor abdominal difusa à palpação. Urina II com leucocitúria. Eco
abdominal sem alterações. Teve alta medicada com cefuroxima por
ITU (não confirmada posteriormente). Três dias depois regressa por
dor no flanco direito. EO com dor localizada nos quadrantes direitos e
defesa. Análises: 21000 leucócitos e PCR de 170 mg/L. Submetida a
apendicectomia, com diagnóstico intraoperatório de adenite mesen-
térica (isolamento posterior de Brevibacterium no líquido peritoneal e
histologia compatível com apendicite), sem antibioticoterapia pós-cirúrgica. Após alta hospitalar, 5º dia pós-operatório regressa ao SU por
febre com 24 horas, dor no flanco, região escapular e ombro direito.
EO: queixosa com dor à palpação profunda dos quadrantes direitos e
à inspiração profunda. Análises: 21000 leucócitos (79% neutrófilos),
PCR 119 mg/L e urina normal. Radiografia do tórax sem alterações.
Eco abdominal sem alterações. TC abdominal revelou abcesso hepático multilobulado (5,3cm). Iniciou antibioticoterapia e, um dia depois,
fez drenagem percutânea. Em D5 ficou apirética, retirou dreno em
D11 e teve alta em D12. Cumpriu total de 21 dias de antibióticos, com
boa evolução. Culturas foram negativas.
Os dois casos ocorridos num espaço de 2 meses demonstram
a importância diagnóstica precoce de uma patologia rara na pediatria
e em países desenvolvidos.
ENTEROCOLITE NECROTIZANTE NUMA UNIDADE DE
CUIDADOS INTENSIVOS NEONATAIS
Catarina Resende1, Andreia Dias1, Elisa Proença1, Alexandra
Almeida1, Carmen Carvalho1
1
S. Neonatologia, Maternidade Júlio Dinis, CH Porto
Introdução: A enterocolite necrotizante (NEC) é uma das emergências gastrointestinais mais comum nos recém-nascidos (RN).
Ocorre em 1-3 por 1000 nados-vivos. A incidência aumenta com diminuição da idade gestacional (IG) ocorrendo em 6-7 % nos RN com
muito baixo peso (RNMBP). A sua patogénese permanece desconhecida, tratando-se provavelmente de uma doença multifatorial.
Objetivo: Caracterizar a população de RN internados na UCIN
com o diagnóstico de NEC.
Metodologia: Estudo retrospetivo, com base na análise dos
processos clínicos dos doentes internados com o diagnóstico de NEC,
entre janeiro 2005 e dezembro 2011. Parâmetros analisados: fatores
de risco (IG, MBP, restrição de crescimento intrauterino (RCIU), persistência do canal arterial (PCA), asfixia, instabilidade hemodinâmica,
concentrado eritrócitário (CE), policitemia, leite de fórmula para prematuros, progressão alimentar rápida, cateterismo umbilical e antibioticoterapia prolongada prévia); diagnóstico; tratamento e evolução.
Resultados: Estabelecido o diagnóstico de NEC em 51 RN. Destes, 3 foram excluídos, resultando numa incidência global de 1,7 %,
2,7% nos pré-termos e 6,4% nos RNMBP. A IG mediana foi de 29 semanas (min:25; Max: 35). A idade média ao diagnóstico foi de 15,4 dias. O
peso médio ao nascer foi de 1124g e 31% dos RN apresentaram RCIU.
Em 21% dos RN documentou-se PCA com significado hemodinâmico.
Na altura do diagnóstico 31% dos RN estava sob alimentação trófica e
a maioria sob aleitamento materno (AM) exclusivo (65%). Tinham efetuado antibioticoterapia prolongada 64,6% dos RN e 7 RN fizeram CE.
Foram submetidos a cateterismo umbilical 19 RN (39,6%). Os principais
sinais à apresentação foram: distensão abdominal (95,8%) e resíduos
gástricos significativos (93,7%). Ocorreu pneumatose intestinal em
35,4% e pneumoperitoneo em 5 casos. Predominou o diagnóstico de
NEC grau I (20 casos; 41,7%). A NEC grau III foi descrita em 12 casos
(25%). Obtiveram-se hemoculturas positivas em 13 crianças. Efetuado
tratamento cirúrgico em 11 RN (22,9%). Constataram-se sequelas em
10 crianças. Verificaram-se 4 óbitos na sequência de NEC.
Discussão: Dos fatores de risco avaliados, os mais frequentes
foram a prematuridade (100%) e MBP (83,3%), seguido de antibioticoterapia prolongada e RCIU (64,6% e 31%, respetivamente). O AM,
considerado fator de proteção, foi a alimentação predominante neste
grupo. O tratamento da NEC depende da gravidade da doença, tendo sido necessária intervenção cirúrgica em 25% dos RN.
resumo das comunicações orais
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S 199
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
Resumo dos Posters
TALASSEMIA β HETEROZIGÓTICA COM FENÓTIPO
INCOMUM
José Fraga1, Clara Machado1, Isabel Guerra1, Emília Costa1,
José Barbot1
1
U. Hematologia Pediátrica, CH Porto
Resumo: Os síndromes β-talassémicos resultam de mutações dos genes β globínicos que comprometem a síntese de
cadeias β. A gravidade clínica resulta da natureza das mutações
em causa e, sobretudo, da sua presença em heterozigotia, homozigotia ou heterozigotia composta. Em situações raras esta
gravidade pode ser modificada pela ocorrência simultânea de
mutações em genes não β.
Uma mutação no gene β em heterozigotia, mesmo que
seja β0 (síntese nula de cadeias β), condiciona o fenótipo clínico
de β-Talassemia minor. A presença de um fenótipo mais grave
obriga a ponderar uma explicação adicional. Em primeiro lugar
é importante investigar situações genéticas que determinem um
excesso de produção de cadeias α. Estas situações, ao agravarem o desequilíbrio entre a produção de cadeias globínicas α e β,
vão determinar a formação de tetrâmeros α que são tóxicos para
as células precursoras eritróides.
De seguida descreve-se um caso de β-Talassemia intermédia como resultado da interacção de uma mutação β0 do gene
globínico β em heterozigotia com a quadriplicação de um gene α
também em heterozigotia (αα/αααα).
Adolescente, sexo masculino, 16 anos de idade, caucasiano, filho de pai portador de β-Talassemia minor, seguido em consulta de Hematologia Pediátrica por anemia, microcitose acentuada, reticulocitose e hiperbilirrubinemia ligeiras. A investigação
inicial revelou uma mutação β0 em heterozigotia. O fenótipo
intermédio conduziu à investigação de patologia da membrana
e do sistema enzimático do eritrócito que se revelou negativa.
Entretanto, foram enviadas amostras para o Laboratório de Hematologia Molecular do Centro Hospitalar de Coimbra que documentou a co-herança de uma mutação β0 (CD39 C-T) com a
quadriplicação de um gene α (αα/αααα).
O presente caso ilustra a complexidade genética subjacente a um fenótipo de talassemia intermédia e reforça a necessidade de investigar causas adicionais em crianças portadoras
de β-Talassemia heterozigótica com apresentação clínica mais
grave do que o expectável.
DO SONO AO DIAGNÓSTICO – UM CASO PRADER-WILLI-LIKE
Joana Magalhães¹, Natália Oliva Teles², Sílvia Pires², Bárbara
Marques², João Lopes³, M Guilhermina Reis¹
¹ S. Pediatria, DCA, CH Porto
² U. Citogenética, Dep. Genética, CGMJM – INSA, Porto
³ S. Neurofisiologia, CH Porto
Introdução: O síndrome de Prader-Willi (SPW) é uma
doença rara, associada a alterações na região cromossómica
15q11-q13, com fenótipo típico mas heterogéneo. Existem casos descritos de doentes com fenótipo semelhante e mutações
noutras regiões do cromossoma 15. As alterações do sono são
critério minor de SPW.
A perturbação respiratória do sono, associada a obesidade
e hipersónia diurna constitui o tipo adulto do SAOS, com repercussões importantes no comportamento, aprendizagem e risco
cardiovascular. As alterações do sono no SPW são frequentes e
multifatoriais, incluindo disfunção hipotalâmica, vias aéreas estreitadas, obesidade e hipertrofia linfoadenoideia, sendo a polissonografia (PSG) essencial na sua caracterização.
Caso Clínico: Menina de 9 anos, filha de mãe obesa. Antecedentes perinatais irrelevantes. Refluxo gastroesofágico nos
primeiros meses de vida, com exame objetivo e evolução ponderal normais.
Aos 5 anos avaliada por atraso global do desenvolvimento
(QGD 65, Escala de Ruth Griffiths), com dificuldades linguagem.
Adenoamigdalectomia aos 6 anos por infeções recorrentes e
roncopatia. Enviada a consulta de Pneumologia Pediátrica aos
8 anos por sonolência diurna excessiva. Com roncopatia e rinossinusite ligeira. Objetivadas altura no P58, obesidade (IMC
P99,7), cabelos de cor clara, olhos amendoados, mãos com dedos curtos.
O cariótipo com bandas de alta resolução sugeriu deleção
no cromossoma 15, confirmada por FISH [ish del(15)(q21.3q21.3)
(bA74K1-)].
Do estudo do sono, a referir poligrafia não sugestiva de
SAOS significativo e PSG, incluindo sono REM e não REM, sem
alterações a justificar intervenção, nomeadamente ventilação
não invasiva (VNI). A roncopatia melhorou com as medidas gerais (higiene nasal e perda peso), sem resolução da sonolência
diurna.
Mantém seguimento multidisciplinar em consulta e apoio do
Ensino Especial.
resumo dos posters
S 200
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
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revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
Comentários: Os autores apresentam uma doente com hipersonolência e fenótipo Prader-Willi-like, com monossomia parcial do cromossoma 15. Perante alterações do sono em crianças
com fenótipo sugestivo, este diagnóstico deve ser considerado e
o estudo do cariótipo deve ser complementado por estudo citogenético molecular (FISH).
Dados os poucos casos publicados, a evolução e o prognóstico destes doentes não estão estabelecidos.
As alterações do sono de causa multifactorial implicam
abordagem e seguimento multidisciplinar, com reforço das medidas de estilo de vida e orientação terapêutica, nomeadamente
pela eventual necessidade de VNI.
EXISTE RELAÇÃO ENTRE A INGESTÃO DE PEQUENO
ALMOÇO E O IMC?
Susana Rios1, Maria Inês Monteiro2, Ana Filipa Amorim2, Fátima
Nunes2, Lúcia Gomes2, Miguel Costa2
1
2
USF Sem Fronteiras
CH Entre Douro e Vouga
Introdução: A importância do pequeno-almoço (PA) é há
muito reconhecida, podendo ter um papel protetor contra a obesidade. A incidência desta patologia tem vindo a aumentar nos
últimos anos, segundo a OMS. Recentemente, foi estabelecida
uma relação entre a omissão de pequeno-almoço e o excesso de
peso/obesidade em crianças e adolescentes europeus.
Objetivos: Caraterizar os hábitos de pequeno-almoço e
estudar a associação entre a omissão de pequeno-almoço e o
excesso de peso/obesidade numa população pediátrica.
Metodologia: Aplicação de questionário a crianças e adolescentes (entre os 6 e os 18 anos), presentes na sala de espera da
consulta de Pediatria, entre março e maio de 2012. Foram avaliados as características do pequeno-almoço e variáveis sociodemográficas (sexo, idade, IMC, caracterização do agregado familiar).
Resultados: Foram recolhidos 400 inquéritos. A média de
idades foi de 11,3 anos, sendo 56,2% dos inquiridos do sexo
masculino, inserindo-se 69,5% em famílias nucleares. No dia
da entrevista, 94,8% dos participantes ingeriram o PA, sendo
na maioria dos casos constituído por leite com cereais (41,4%).
Dos 5,3% que não tomaram PA, o principal motivo referido foi a
falta de tempo (38,1%). Constatou-se obesidade em 24,7% dos
inquiridos e excesso de peso em 22,1%, sendo 55,7% do sexo
masculino. Dos que não tomaram pequeno-almoço, 55% tinha
excesso de peso e/ou obesidade, com ligeiro predomínio do
sexo feminino. Não foram encontrados relações estatisticamente
significativas entre o IMC e ingestão e constituição de PA, tipo de
família, sexo ou idade.
Discussão: Ficamos agradavelmente surpreendidos por
94,8% das crianças terem tomado o PA no dia da entrevista. No
entanto, 46,8% dos inquiridos apresentavam obesidade/excesso
de peso, refletindo a realidade mundial (e também a portuguesa),
o que demonstra a ineficácia das medidas preventivas adotadas.
Assim, é necessário continuar investir em todas as vertentes da
prevenção da obesidade.
PREMATURIDADE E SÍNDROME GENÉTICO: ATÉ AO
DIAGNÓSTICO DE SÍNDROME DE WILLIAMS
Joana Magalhães¹, Carla Zilhão¹, Ermelinda Silva¹, Marcia
Martins², M Guilhermina Reis¹
¹ S. Pediatria, DCA, CH Porto
² C. Genética, S. Neonatologia, DCA, CH Porto
Introdução: O Síndrome de Williams (SW) é uma doença
rara, frequentemente causada por mutações de novo. O fenótipo
é heterogéneo, evolutivo, e sem uma característica específica
para o diagnóstico. O cariótipo com técnica de FISH confirma a
deleção 7q11.23.
A colestase neonatal associada a dismorfia facial e alterações cardiovasculares impõe a investigação de síndromes
genéticos associados. As comorbilidades relacionadas com a
prematuridade podem dificultar o reconhecimento de quadros
sindromáticos.
Caso Clínico: Sexo masculino, 3 anos. Antecedentes de
prematuridade 30 semanas, com somatometria adequada à idade
gestacional. Internamento até aos 3 meses de vida registando-se
estenose pulmonar periférica, convulsões, pneumonia e pneumotórax, displasia broncopulmonar, dificuldades alimentares e
colestase. Fenotipicamente fronte alta, nariz pequeno, boca larga. Teve alta orientado para consultas de subespecialidade.
Evolução favorável da colestase, interpretada como multifactorial e transitória (sem embriotoxon). Estável do ponto de
vista cardiovascular e respiratório.
Pelos 6 meses tornou-se nítido um atraso de desenvolvimento psicomotor, com hipotonia axial e espasticidade dos
membros, orientado para intervenção. Com o crescimento constatado défice cognitivo grave (QGD 49) com atraso na linguagem
e alterações do comportamento: comportamento opositivo, hiperactivo, dificuldades persistentes na alimentação. Os exames de
imagem cerebral não apresentam alterações relevantes. Sem
alterações da calcémia ou do estudo metabólico. Ecografia renovesical normal.
Aos 16 meses, na avaliação cardiológica, identificada estenose aórtica supra-valvular, com gradiente máximo de 30mmHg;
manteve-se assintomático.
Aos 20 meses, por manter fenótipo morfológico e comportamental sugestivos foi solicitado estudo genético para Síndrome de Williams, que confirmou o diagnóstico. Cariótipo dos pais
normal. Mantém boa evolução estatural, com peso no percentil
5-10.
Comentários: O Síndrome de Williams é uma doença rara,
com apresentação heterogénea, mas cujo diagnóstico permite
programar a vigilância e intervenção multidisciplinar para prevenir e tratar precocemente as suas comorbilidades.
A colestase neonatal não é habitualmente uma característica do SW, podendo neste caso dever-se às intercorrências
neonatais.
As alterações do desenvolvimento nos prematuros, quando
não devidamente justificadas pelo seu contexto clínico, obrigam
a prosseguir a investigação diagnostica.
resumo dos posters
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 201
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
SÍNDROME DE TURNER – EXPERIÊNCIA DE UMA UNIDADE
DE ENDOCRINOLOGIA PEDIÁTRICA
Sofia Ferreira1, Mariana Costa2, Joana Magalhães3, Luís Ribeiro3,
Maria João Oliveira3, Maria Helena Cardoso3, Teresa Borges3
HEMORRAGIA CEREBRAL NÃO TRAUMÁTICA EM
PEDIATRIA – QUANDO SUSPEITAR
Liliana Branco1, Marta Santalha1, Marta Tavares2, Ana Luísa
Lobo1
1
CH Entre Douro e Vouga
ULS Alto Minho
3
CH Porto
1
2
2
Introdução: A Síndrome de Turner (ST) caracteriza-se por
monossomia total ou parcial do cromossoma X. A heterogeneidade fenotípica é considerável, sendo a baixa estatura e a disgenesia gonadal as características mais consistentes.
Objectivos: Descrição das características clínicas de
crianças e adolescentes com ST e avaliação da resposta ao tratamento com HC.
Material e métodos: Estudo retrospectivo, através da revisão dos processos clínicos dos doentes com ST em seguimento
na Unidade de Endocrinologia Pediátrica de um hospital de cuidados terciários. Análise estatística realizada pelo SPSS 17.0.
Resultados: Identificados 28 casos de ST: idade actual
média 11,2 ± 5 anos. O diagnóstico foi pré-natal em 17,9%. Nos
restantes, a idade média do diagnóstico foi de 6,8 ± 4,7 anos e
os motivos que conduziram ao diagnóstico foram: baixa estatura
(69,6%), baixa estatura com atraso pubertário (13%), linfedema
(7,1%) e cardiopatia congénita (8,7%). Em 32,1% verificou-se
monossomia total do X, em 32,1% monossomia parcial e em
35,7% mosaicismo. As características fenotípicas mais frequentes foram: baixa estatura (89,3%), cubitus valgus (60,7%) e palato arqueado (60,7%).
As alterações neurocomportamentais (39,3%), as alterações renais (35,7%) e excesso de peso/obesidade (21,3%) foram as co-morbilidades mais observadas.
Cinco adolescentes iniciaram terapêutica hormonal de
substituição (THS) com estrogénios com idade média de 13,8 ±
2,1 anos, 4 por via transdérmica, 1 por via oral. Em 3 a menarca
foi espontânea.
O tratamento com HC foi instituído em 19 doentes (67,9%).
Relativamente às 17 doentes sob HC há mais de 12 meses, a
idade média de início foi de 7,4 ± 3,5 anos, com uma duração
média de tratamento de 3,6 ± 2,3 anos. A média do SDS da estatura antes da HC (-2,66 ± 0,89) foi significativamente inferior
à média do SDS da estatura actual (-2,23 ±0,96) (p=0,022). O
SDS da estatura actual correlacionou-se significativamente com
o SDS da estatura antes da HC (p=0,00), mas não com a idade
de início da HC, a dose de início, a duração do tratamento e a
estatura alvo.
Discussão: O diagnóstico precoce do ST é essencial não só
para a instituição da terapêutica com HC e da THS em tempo útil,
mas também para a avaliação/orientação das co-morbilidades.
Na nossa amostra, apesar da duração média da terapêutica ser
ainda curta, a maioria beneficiou da HC, com um ganho significativo na estatura actual, de acordo com os dados da literatura.
S. Pediatria, U. Guimarães, CH Alto Ave
S. Pediatria, UAG Mulher e da Criança, CH São João
Introdução: A hemorragia cerebral não traumática, apesar
de ser uma entidade rara na população pediátrica, está associada a uma morbilidade e mortalidade significativa. A sua etiologia
é variada, sendo a malformação vascular (MAV) a causa mais
frequente neste grupo etário.
Caso clínico: Adolescente, sexo feminino, doze anos de
idade, sem antecedentes pessoais de relevo. Cerca de 12 horas antes da admissão, iniciou episódio súbito e intenso de
cefaleia parietal seguido de vómitos, incontinência dos esfíncteres e deterioração do estado de consciência. Sem história
prévia de traumatismo, infecção, ingestão medicamentosa
ou tóxica. Ao exame objetivo apresentava-se pouco reativa
(ECG 9), com pupilas isocóricas e fotorreactivas, apirética e
hemodinamicamente estável. Procedeu-se de imediato a sua
intubação, ventilação mecânica e administração de bólus de
NaCl a 3%, que manteve em perfusão. Analiticamente sem
alterações de relevo. Efetuou TAC-CE que revelou uma “extensa lesão hemorrágica cerebelosa bilateral com inundação
do sistema tetraventricular”. A adolescente foi transferida para
um centro hospitalar com cuidados neurocirúrgicos onde realizou angioTAC-CE que evidenciou a presença de ruptura de
malformação arteriovenosa na fossa posterior. Foi submetida
a remoção cirúrgica do hematoma intracerebral e dissecção
completa da MAV. No período pós-operatório, por apresentar
hipertensão intracraniana refratária ao tratamento médico, foi
submetida à craniectomia descompressiva. Posteriormente,
constatada uma evolução clínica favorável, com recuperação
rápida do estado de consciência. De salientar, à data de alta,
a presença de ataxia cerebelosa na marcha. No seguimento, verificou-se uma resolução gradual do déficit neurológico,
encontrando-se atualmente sem sequelas.
Conclusão: A MAV é uma condição patológica pouco frequente em pediatria. A maioria tem uma localização supratentorial sendo que, apenas 10% se situam na fossa posterior. A
apresentação clínica mais comum é a hemorragia cerebral. Os
autores salientam a importância de um elevado índice de suspeição e da avaliação estruturada do doente crítico como principais
determinantes para um diagnóstico e intervenção precoce, permitindo assim melhorar o seu prognóstico.
resumo dos posters
S 202
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
SÍNDROME DA CIMITARRA – A PROPÓSITO DE UM CASO
CLÍNICO
Joana Magalhães1, Luciana Sousa2, Isabel Sá3, Sílvia Álvares4,
M Guilhermina Reis1
PROPRANOLOL COMO TRATAMENTO DE PRIMEIRA LINHA
DOS HEMANGIOMAS DA INFÂNCIA
Joana Pereira1, Catarina Sousa1, Angélica Osório1, João
Moreira-Pinto1, José Banquart-Leitão1
S. Pediatria, DCA, CH Porto
S. Imagiologia, CH Porto
3
S. Cardiologia, CH Porto
4
S. Cardiologia Pediátrica, DCA, CH Porto
1
1
S. Cirurgia Pediátrica, CH Porto
2
Introdução: A Síndrome da Cimitarra é uma patologia rara
que se caracteriza pela drenagem anómala das veias pulmonares direitas na veia cava ou aurícula, podendo incluir múltiplas
malformações cardiopulmonares, sendo as mais frequentes dextroposição cardíaca, hipoplasia pulmonar direita e alterações na
irrigação arterial do pulmão direito. As manifestações clínicas
incluem desde hipertensão pulmonar grave na primeira infância,
até infeções recorrentes ou quadros com sintomas escassos e
diagnóstico na idade adulta.
Caso clínico: Adolescente de 13 anos, sem antecedentes
familiares relevantes. Internamento aos 6 meses por PNA a E
coli, com estudo normal. Nessa altura foi identificada radiologicamente assimetria pulmonar, investigada por tomografia, cintigrafia e broncoscopia, com diagnóstico de anomalia da segmentação brônquica, ecocardiograma normal.
Recorreu ao serviço de urgência por dor torácica sugestiva de nevrite intercostal, apresentando diminuição dos sons
respiratórios base direita. Foi realizada telerradiografia torácica
que evidenciou hipotransparencia na base direita, com desvio
ipsilateral do mediastino, com hiperinsuflação à esquerda. Sem
queixas respiratórias, com boa evolução estaturoponderal e bom
estado geral.
Na consulta externa, efectuada TAC torácica que revelou
hipoplasia do pulmão direito com desvio mediastínico homolateral e subida da hemicúpula diafragmática, associada a duas
veias de drenagem anómala para a veia cava inferior e para a
veia pulmonar inferior esquerda, sendo estas imagens sugestivas de Síndrome da Cimitarra. Provas de função respiratória
normais.
Na avaliação por cardiologia, de referir ECG normal e
ecocardiograma sem sinais de hipertensão pulmonar, sem alterações além da dextrocardia, que tornou a avaliação difícil. A
angio-RMN cardíaca confirmou as alterações descritas na TAC e
ausência de malformações intracardíacas.
Sempre assintomática.
Comentários: No caso apresentado o diagnóstico foi baseado num achado, com imagem torácica sugestiva, sendo confirmado por TAC. Uma vez que até 40% têm malformações cardíacas associadas e a insuficiência cardíaca é uma complicação
grave e frequente, é essencial a avaliação por Cardiologia e a
caracterização completa de cada doente, para exclusão da necessidade de Cirurgia. Nesta adolescente, assintomática, dever-se-á manter vigilância clínica.
Objetivo: Os hemangiomas são os tumores vasculares
mais frequentes na infância. Apresentam um padrão de crescimento típico e auto-limitado, a que se segue um período de
involução espontânea. Em aproximadamente 10% dos casos
ocorrem complicações que obrigam a intervenção. O propranolol foi recentemente adicionado ao arsenal de fármacos para o
tratamento destes doentes, e tem vindo a revolucionar a atitude
terapêutica perante os hemangiomas infantis. O objectivo deste
estudo é avaliar a eficácia do propranolol no tratamento dos hemangiomas da infância.
Material e Métodos: Efectuamos um estudo descritivo dos
doentes tratados com propranolol no Serviço de Cirurgia Pediátrica – Centro Hospitalar do Porto, entre Março de 2010 e Março de 2012. Foram considerados candidatos ao tratamento os
doentes com hemangiomas em fase proliferativa que apresentassem crescimento rápido, com risco de compromisso funcional e/ou estético. O tratamento foi realizado em ambulatório e a
dose de propranolol administrada foi de 2 mg/kg/dia, dividida em
três doses. Todos os doentes foram avaliados previamente por
Cardiologia, que manteve o seguimento durante o período de
tratamento. A resposta ao tratamento foi categorizada em completa, parcial ou ausente, foram também registados os efeitos
adversos ocorridos.
Resultados: Foram incluídos 14 doentes, com um total
de 18 hemangiomas. A localização mais frequente dos mesmos
era a cabeça e pescoço. Em 11 doentes os hemangiomas eram
focais e em 3 doentes multifocais (incluindo 1 segmentar). A indicação para o tratamento foi o risco de compromisso funcional
em 8 casos, deformidade estética em 5 casos e crescimento
rápido em 1 caso. A terapêutica com propranolol foi iniciada a
uma idade média de 4,7 meses (variando entre 2 e 9 meses) e a
duração média da mesma foi de 4,4 meses (variando entre 2 e
12 meses). Observou-se uma estabilização do crescimento dos
hemangiomas em 100% dos casos. Relativamente à regressão
esta foi completa em 11 hemangiomas e parcial em 3, o que
corresponde a um sucesso terapêutico de 78,6%. Os restantes
4 hemangiomas ainda se encontram em fase de tratamento. Em
apenas 1 caso foi necessário a interrupção do tratamento por
bradicardia.
Conclusão: Na grande maioria dos casos o propranolol
provocou uma regressão rápida e sustentada dos hemangiomas,
diminuindo assim a duração natural das lesões, com poucos
efeitos secundários. Consideramos o propranolol o fármaco de
primeira linha no tratamento dos hemangiomas da infância. Estudos ulteriores são necessários para delinear o melhor esquema terapêutico e de vigilância, bem como o perfil de segurança
deste fármaco.
resumo dos posters
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 203
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
KERION CELSI – IMPLICAÇÕES CLÍNICAS E
TERAPÊUTICAS
Maria Inês Monteiro1, Ana Luísa Leite2, Teresa Oliveira1, Manuel
Magalhães1, Joana Rodrigues1, Miguel Costa1, Cristina Rocha1
1
2
CH Entre Douro e Vouga
CH Vila Nova de Gaia-Espinho
Introdução: O Kerion Celsi é uma forma inflamatória de
tinea capitis causado por uma reação de hipersensibilidade
mediada por células T do dermatófito nos folículos capilares. O
reconhecimento clínico precoce evita procedimentos invasivos.
A hiperleucocitose que pode resultar é um reflexo do processo
inflamatório. Estas reações tipo leucemóide são uma alteração
hematológica reacional, que desaparece quando é corrigida a
condição subjacente. Os agentes mais frequentemente envolvidos são o Trichophyton verrucosum, o Trichophyton mentagrophytes, o Microsporum canis e o Microsporum gypseum. O
espectro clínico é muito variável.
Caso Clínico: Criança de 3 anos, previamente saudável,
observada no serviço de urgência por apresentar desde há 4
semanas lesões em crosta no couro cabeludo, acompanhadas
de febre intermitente. Ao 7º dia de doença tinha sido medicada
com corticóide oral e tópico, sem melhoria. História de contacto esporádico com cão de rua. Ao exame objetivo apresentava
massa inflamatória dolorosa no couro cabeludo com exsudado,
associada a zonas de lesões descamativas com consequente
alopécia. No tronco apresentava também lesões crostosas e pruriginosas. Sem outras alterações, nomeadamente adenopatias.
Analiticamente apresentava hiperleucocitose de 47.5 x 10^9/L,
80% neutrófilos (com granulações tóxicas), plaquetas e restante hemograma normal, proteína C reactiva 77.4 mg/L. Iniciou
terapêutica com itraconazol oral, flucloxacilina endovenosa e
cetoconazol tópico. Avaliada por Cirurgica Pediátrica, tendo-se
procedido a tricotomia alargada do couro cabeludo, drenagem
das lesões que apresentavam flutuação e limpeza local. Iniciou
lavagem local com cloro-hexidina e colocação de ácido fusídico
tópico. Evolução clínica favorável com normalização dos parâmetros analíticos. O exame cultural revelou-se positivo para Trichophyton mentagrophytes. Manteve fluconazol no domicílio até
perfazer quatro semanas. Atualmente apresenta boa evolução
clínica com seguimento em consulta externa.
Discussão/ Conclusão: O Kerion Celsi é uma forma exuberante de tinha do couro cabeludo que pode atingir a criança
com lesão tipo “colmeia de abelha”, muito dolorosa, com lesões
supurativas profundas. O diagnóstico e terapêutica adequada e
precoce podem prevenir complicações a longo prazo. O carácter
inflamatório intenso é traduzido pela hiperleucocitose encontrada. Como se verificou é uma proliferação benigna e transitória rapidamente resolvida com as medidas terapêuticas adequadas.
RESTRIÇÃO DO CRESCIMENTO INTRA-UTERINO: ANÁLISE
CASUÍSTICA DO 1º SEMESTRE DE 2012
Vieira B1, Lima T1, Braga A1, Soares S1, Dias C1, Rodrigues M1,
Braga J1, Oliveira T1
1
Serviço Obstetrícia do Centro Hospitalar do Porto
Introdução: A definição mais comum de Restrição de Crescimento Intra-Uterino (RCIU) é um peso fetal estimado (PFE)
abaixo do percentil 10 para a idade gestacional. A RCIU é um
problema complexo para a Obstetrícia e para a Pediatria por se
associar a um aumento da morbilidade e mortalidade fetal e neonatal.
Métodos Estudo: retrospectiva dos casos diagnosticados
com RCIU e parto na Maternidade Júlio Dinis (MJD) Centro Hospitalar do Porto, no primeiro semestre de 2012. Resultados No
período de tempo selecionado registaram-se um total de 55 casos de RCIU em 52 gravidezes - 4 casos em gravidez gemelar,
3 das quais com ambos os fetos afetados. A pré-eclémpsia foi a
causa materna mais frequentemente observada (n=10). A RCIU
foi diagnosticada em média C s 33+4 semanas de idade gestacional (mediana 34+1 sem; [24+3 : 39+2 sem]). Em 45,5% dos
casos o diagnóstico ocorreu antes das 34 semanas de gestação
(n=25). Observou-se ainda um PFE abaixo do percentil 5,0 em
50,9% (n=28), oligoémnios em 41,8% (n=23) e alterações no doppler da artéria umbilical em 21,8% (n=12). O parto ocorreu após
as 37 semanas em 42,8% dos casos (n=23). A idade gestacional
média no parto foi de 35+2 sem (intervalo 24+5 : 39+3 sem).
Relativamente à via de parto verificou-se cesariana em 61,8%
dos casos (n=34). A cesariana eletiva foi o método de eleição
em 12 casos, nos quais a finalização da gravidez foi decidida por
agravamento do estado materno, fetal ou de ambos. Em 18,2%
(n=10) a cesariana ocorreu na sequência de tentativa de indução do trabalho de parto. Verificou-se parto eutócico em 32,7%
(n=18) dos casos. O peso médio dos recém-nascidos (RN) foi
de 1982 g (mediana 2145g [370 : 2975g]) e 58,2% (n=32) eram
do sexo feminino. Oito RN apresentaram índice de Apgar (IA) <
7 no 1º: minuto (14,8%), e em 3 casos (5,6%) um IA < 7 no 5B:
minuto.
Conclusão: Distinguir os fetos constitucionalmente pequenos e os que tC*m realmente restrição de crescimento é extremamente importante, dado que condiciona a atitude do obstetra
e o prognóstico fetal. A função do Obstetra passa assim por identificar o crescimento abaixo do ideal, determinar a causa e severidade do mesmo, consultar a Neonatologia, providenciar uma
monitorização materno-fetal apertada, determinar e optimizar o
momento para finalizar a gravidez e ainda selecionar via de parto
mais apropriada. A incidC*ncia e gravidade dos casos de RCIU
observados são naturalmente condicionadas pelo facto da MJD
ser um centro de atendimento terciário.
resumo dos posters
S 204
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
SEGUIMENTO DE UM RECÉM-NASCIDO COM
HIPEREXCITABILIDADE
Maria João Vieira1, Andreia Costa1, Manuela Santos2, Luísa
Malheiro1
1
2
U. Neonatologia, U. Guimarães, CH Alto Ave
U. Neuropediatria, S. Pediatria, CH Porto
PREVALÊNCIA E FACTORES DE RISCO DE RETINOPATIA
DA PREMATURIDADE: ESTUDO RETROSPETIVO DE 12
ANOS
Marta Nascimento1, Bruna Cardoso Vieira2, Isabel Ribeiro2, Rui
Carvalho2, João Neves Martins2, Isabel Martins3
S. Pediatria, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
S. Oftalmologia, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
3
U. Cuidados Intensivos Neonatais, H Pedro Hispano, ULS Matosinhos
1
2
Introdução: A síndrome de Angelman é um distúrbio genético raro, que se carateriza pelo atraso do desenvolvimento psicomotor, alterações neurológicas e comportamentos peculiares
como o sorriso frequente. O diagnóstico clínico precoce é raro,
uma vez que o quadro clínico vai-se formando ao longo do tempo, podendo ser sobreponível a outras síndromes nos primeiros
anos de vida.
Caso-clínico: Criança do sexo masculino, sem antecedentes familiares de relevo. Gestação sem intercorrências, parto por
cesariana (incompatibilidade fetopélvica) às 41 semanas, índice
Apgar 9/10. Sem malformações aparentes ao nascimento e com
teste do diagnóstico precoce normal.
Nos primeiros dias de vida era evidente uma hiperexcitabilidade, associada a trémulo dos membros e dificuldades na
amamentação, tendo realizado ecografia transfontanelar que se
revelou normal.
Foi orientado para consulta hospitalar de neonatologia,
tendo-se constatado durante o seu seguimento um atraso do desenvolvimento psicomotor, sem perda de habilidades, sendo as
áreas mais afetadas a marcha e a linguagem. A nível comportamental destacava-se a hiperexcitabilidade, sorriso constante, hipercinésia e perda rápida de interesse pelos objetos, mantendo
bom contacto social. Verificou-se uma microcefalia progressiva,
apresentando a partir dos 12 meses um fácies peculiar com face
longa e discreto prognatismo.
Realizou pesquisa de CMV no cartão de Guthrie e estudo metabólico que não revelaram alterações. A RMN cerebral
mostrou áreas de desmielinização bilateral, apresentando um
eletroencefalograma com surtos de atividade delta generalizada, embora sem convulsões até ao momento. Aos 15 meses foi
requisitado o estudo molecular para Síndrome de Angelman que
mostrou a presença de apenas um alelo paterno para a região
15q11-q13, confirmando assim o diagnóstico.
Mantém-se sob tratamento de fisioterapia e estimulação
precoce desde os primeiros meses de vida e, posteriormente,
de terapia da fala.
Conclusões: A clínica da Síndrome de Angelman nos primeiros meses de vida é inespecífica, incluindo caraterísticas que
são sobreponíveis a outras síndromes. No entanto, a presença de
trémulo dos membros e instabilidade de movimentos previamente
à aquisição da marcha, numa criança com uma disposição alegre,
são achados sugestivos desta síndrome. Os autores apresentam
este caso clínico como uma chamada de atenção para a identificação destas caraterísticas que poderão permitir um diagnóstico
e uma orientação adequada mais precocemente.
Introdução: A retinopatia da prematuridade (ROP) é uma
doença vasoproliferativa, de etiologia multifatorial, secundária à
inadequada vascularização da retina em desenvolvimento. Nas
formas graves pode conduzir a importantes sequelas visuais,
incluindo a cegueira. Os autores avaliaram a prevalência e factores de risco de ROP nos RN prematuros nascidos no Hospital
Pedro Hispano num período de 12 anos.
Materiais e Métodos: Estudo retrospetivo dos RN prematuros submetidos a rastreio da ROP (por oftalmoscopia indireta e
a partir de 2012 com o auxílio da RetCam®) de Janeiro de 1999
a Junho de 2012. Idade gestacional (IG) ≤ 32 semanas, peso ao
nascimento (PN) ≤ 1500g e/ou curso clínico complicado foram os
critérios de inclusão no rastreio. Avaliaram-se a prevalência e os
potenciais fatores de risco relacionados com o desenvolvimento
de ROP. Para a análise estatística foi usado o SPSS® 20.0.
Resultados: Rastrearam-se 267 RN, 50.6% do sexo feminino, com IG média de 29 ± 2 semanas e PN médio de 1193
± 307g. A prevalência de ROP foi 22.1% (50.9% no estádio 1,
22.3% no estádio 2, 25% no estádio 3 e 1.8% no estádio 4B).
Não foram encontrados casos no estádio 5. Doença plus ocorreu
em 17.8% dos RN. Verificou-se associação estatisticamente significativa entre ROP e PN (p<0,001), IG (p<0,001), compromisso
hemodinâmico na primeira semana (p<0,001), hemorragia intraventricular (p<0,001), doença de membranas hialinas (p<0,001),
ventilação mecânica (p<0,001), oxigenoterapia (p<0,001), transfusões sanguíneas (p<0,001), uso de surfactante (p<0,001) e
eritropoietina (p= 0,001). O PN e as transfusões sanguíneas foram os fatores preditivos mais importantes. Foram tratados 13
RN: 6 com crioterapia, 6 com fotocoagulação a laser e 1 com as
duas técnicas. Todos os olhos apresentaram regressão com o
tratamento, excepto o RN com estádio 4 que desenvolveu descolamento de retina subtotal em ambos olhos. Nos casos sem
tratamento ocorreu regressão espontânea.
Conclusões: Observou-se uma prevalência da doença e
fatores de risco semelhantes a outros estudos internacionais em
países desenvolvidos. Diversos fatores de risco têm sido associados ao desenvolvimento de ROP, atribuindo-se à IG, PN e oxigenoterapia um papel de destaque. No nosso estudo, o PN e as
transfusões sanguíneas assumiram maior importância preditiva.
A prevenção do parto prematuro, o uso criterioso de oxigenoterapia e de transfusões sanguíneas são passos fundamentais para
a profilaxia da ROP.
resumo dos posters
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 205
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
SÍNDROME SEROTONINÉRGICA APÓS INTOXICAÇÃO COM
SERTRALINA
Marta Rios1, Joana Grenha2, Ana Garrido2, Hernâni Brito1, Sara
Gonçalves1, Paula Ferreira1
1
2
S. Cuidados Intensivos Pediátricos, CH Porto
S. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia - Espinho
Introdução: O diagnóstico de síndrome serotoninérgica é
clínico e caracteriza-se por sinais e sintomas de instabilidade autonómica, alteração do estado de consciência e hiperatividade
neuromuscular. A gravidade é variável, desde trémulo ligeiro a
hipertermia ou choque fatais. Em idade pediátrica, a maior parte
dos casos ocorre por intoxicação acidental ou intencional, mas
pode surgir após a primeira toma do fármaco, após aumento da
dose ou associação de outro medicamento com ação serotoninérgica.
Caso clínico: Criança do sexo feminino, 8 anos, medicada
com risperidona desde há 2 anos por perturbação de hiperatividade e défice de atenção e sertralina desde há 1 semana por
sintomatologia depressiva. Sem outros antecedentes de relevo.
Observada no Serviço de Urgência do hospital da área de residência por quadro de agitação e alucinações, 5h após ingestão intencional de 30 comprimidos de 50 mg de sertralina (60
vezes a dose prescrita). Na admissão, apresentava hipertermia,
hipertensão arterial, taquicardia, taquipneia, diaforese, sialorreia,
rubor facial, agitação psicomotora, mioclonias, trémulo e rigidez
muscular. Pesquisa de drogas de abuso na urina negativa. Instituída terapêutica com benzodiazepinas, clemastina e biperideno
sem resposta e perfusão de propofol com controlo temporário
dos sintomas, sendo necessário indução de coma barbitúrico e
curarização. Transferida para o Serviço de Cuidados Intensivos
Pediátricos do nosso hospital com o diagnóstico de síndrome
serotoninérgica, onde manteve terapêutica de suporte e iniciou
terapêutica antiserotoninérgica com ciproheptadina. Necessitou
de curarização durante 10 dias. Durante o internamento, apresentou hipertensão arterial controlada com propranolol, rabdomiólise e citólise hepática. Transferida para o hospital de origem ao
13º dia, clinicamente bem.
Conclusão: Apesar dos inibidores seletivos da recaptação
de serotonina (SSRIs) serem mais seguros do que os antidepressivos tricíclicos e os inibidores da MAO, não são isentos de
complicações, como demonstrado com este caso de síndrome
serotoninérgica. Dado o aumento progressivo do número de
crianças e adolescentes tratados com SSRIs, é importante que
os profissionais de saúde conheçam esta entidade, uma vez que
o diagnóstico e instituição terapêutica precoces são decisivos na
evolução favorável da doença.
ANEMIA FERRIPRIVA REFRACTÁRIA À TERAPÊUTICA
COM FERRO ORAL E INFECÇÃO POR HELICOBACTER
PYLORI - EXPERIÊNCIA DE 5 ANOS DE UMA UNIDADE DE
GASTROENTEROLOGIA PEDIÁTRICA
Inês Vaz Matos1, Sara Oliveira1, Rosa Lima1, Fernando Pereira1
1
U. Gastroenterologia Pediátrica, CH Porto
Introdução: A patologia gastrointestinal (GI) associada a
défice de absorção do ferro (Fe) é causa frequente de anemia
ferripriva (AF) refractária à terapêutica com Fe oral (FeO). Entre as etiologias possíveis estão a gastrite atrófica auto-imune
(GAAI) e a infecção por Helicobacter Pylori (HP). O papel do HP
na AF e o benefício da sua erradicação têm sido extensamente
estudados mas a sua relação ainda é controversa.
Objectivos: 1) Determinar a prevalência de infecção por
HP em crianças com AF refractária à terapêutica com FeO sem
outra etiologia determinada. 2) Avaliar o efeito da erradicação
do HP nos valores de hemoglobina (Hb), volume globular médio
(VGM), Fe sérico e ferritina das crianças com diagnóstico histológico de gastrite por HP.
Material e métodos: Estudo retrospectivo através da consulta dos processos clínicos dos doentes referenciados à consulta de Gastroenterologia Pediátrica por AF refractária ao FeO
que efectuaram endoscopia digestiva alta com biópsias gástricas
para esclarecimento etiológico no período de Julho de 2007 a
Junho de 2012. Exclusão dos doentes com diagnóstico prévio
de patologia GI (ex: doença celíaca ou doença inflamatória intestinal).
Resultados: A amostra incluiu 40 crianças com idade mediana de 12 anos (2-18 anos). Cinco (12,5%) não apresentaram
evidência de patologia GI, 8 (20%) tinham critérios serológicos e
anatomo-patológicos de GAAI e 30 (75%) apresentavam infecção por HP, sendo que apenas 2 referiam sintomas GI.No grupo
com diagnóstico exclusivo de gastrite por HP (n=24), foi efectuado tratamento em 21 doentes (87,5%). O esquema triplo com
amoxicilina, claritromicina e omeprazol foi o mais utilizado (62%).
A bactéria foi eficazmente erradicada em 18 crianças (85,7%), na
maioria (66,7%) à primeira tentativa. Verificou-se uma subida nos
níveis médios de Hb (10,5±2,2 vs 12,8±1 g/dl; p=0,0048), VGM
(75,7±6,6 vs 79,8±7,3 fl; p=0,15), Fe (33,1±18,2 vs 57,5±25μg/
dl; p=0,0026) e ferritina (30,9±47,6 vs 38,7±32,8 ng/ml; p=0,482)
com a erradicação do HP. Conclusões: Os nossos resultados
sugerem uma relação entre infecção por HP e AF em idade pediátrica. Salientamos a elevada prevalência de infecção por HP
em doentes cuja única manifestação clínica foi a AF refractária
ao FeO. A erradicação da bactéria traduziu-se na melhoria dos
parâmetros analíticos, sendo a variação estatisticamente significativa para os valores de Hb e Fe. Os dados referidos alertam
para a importância da inclusão da pesquisa de HP na avaliação
dos doentes com AF refractária.
resumo dos posters
S 206
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
TOCILIZUMAB NA AIJ SISTÉMICA – CASO CLÍNICO
Carla Zilhão1, Helena Sousa2, Lurdes Palhau3, Margarida
Guedes1
U. Reumatologia Pediátrica, CH Porto
S. Pediatria, H Vila Franca de Xira
3
S. Fisiatria, CH Porto
1
2
QUANDO A MÁ EVOLUÇÃO PONDERAL É DE CAUSA
INFECCIOSA
Margarida Reis Morais1, Filipa Raposo1, Luísa Pimenta de
Castro2, Ana Catarina Carneiro2, Ana Rita Araújo2
1
2
Introdução: A grande actividade inflamatória associada
à Artrite Idiopática Juvenil sistémica, que pode cursar com um
síndrome de activação macrofágica, tem vindo a colocar várias
questões acerca da sua etiopatogenia. Na última década tem
sido implicada uma desregulação das citocinas IL-1, IL-6 e IL-18,
o que conduziu a uma nova abordagem terapêutica.
Caso clínico: Menino de 5 anos, 2º filho de pais jovens,
saudáveis, não consanguíneos. Antecedentes familiares irrelevantes. Aos 19 meses apresenta quadro de febre prolongada
associado a sintomas constitucionais (perda ponderal, astenia
e irritabilidade), exantema evanescente, serosite, hepatoesplenomegalia, adenomegalias e artrite das metacarpofalângicas,
interfalângicas proximais e do joelho esquerdo. Sem uveíte. Analiticamente, anemia e elevação importante dos marcadores de
inflamação (leucocitose, trombocitose, velocidade de sedimentação, ferritina e amilóide A sérico); ANA’s e Factor Reumatóide
negativos.
Tratamento inicial com prednisolona e metotrexato, com
melhoria apenas transitória dos sintomas constitucionais. Por
doença refractária, 1 mês depois inicia tratamento com anti-IL1
(Anakinra). Resposta parcial, com remissão da febre, mantendo
marcadores de inflamação positivos e actividade articular. Dois
anos após tratamento com Anakinra (+ PRD + MTX) e doença
poliarticular activa mantida, foi proposto para tratamento com
anti-IL6 (Tocilizumab).
Eficácia clínica, com noção subjectiva de melhoria em menos
de 48h. Com 1 mês de tratamento, sem manifestações sistémicas,
sem articulações activas, aumento ponderal de 1Kg e normalização dos valores da Hb e da VS, atingindo o PedACR70.
Sem efeitos laterais e boa tolerância ao tratamento. No entanto, aos 6 meses, mantém-se sem manifestações sistémicas,
com normalização dos parâmetros inflamatórios, mas com três
articulações activas.
Discussão: Esta criança apresenta vários factores de mau
prognóstico (poliartrite difusa com atingimento das pequenas articulações, manifestações sistémicas persistentes, idade de início precoce e corticodependência).
Com o AnaKinra obteve-se uma resposta moderada, com o
ónus de necessitar de injecções diárias, mal toleradas.
A resposta obtida vem reiterar estudos realizados que apontam o Tocilizumab como o tratamento de 1ªlinha na AIJ sistémica
resistente aos corticóides.
S. Pediatria ULS Alto Minho
Centro de Diagnóstico Pneumológico de Viana do Castelo
Resumo: Estima-se que a prevalência da má evolução ponderal nos países desenvolvidos ronde os 10-15% e que apenas
5% dos casos têm uma patologia orgânica como única causa. Os
autores apresentam o caso clínico de uma criança, actualmente
com 24 meses, com antecedentes de má evolução ponderal a
partir dos 10 meses, altura em que ingressa no infantário e inicia
episódios recorrentes de rinorreia, tosse e febre com dois internamentos e múltiplas vindas ao Serviço de Urgência. Ao exame
físico destacava-se bom estado geral, discreta palidez cutânea,
auscultação cardiopulmonar sem alterações e sinais sugestivos
de infecçãoo das vias aéreas superiores. O estudo efectuado
revelava uma velocidade de sedimentação de 103 mm, pelo que
se realizou a pesquisa de BK no suco gástrico permitindo o diagnóstico de tuberculose. Iniciou terapêutica bactericida tripla com
rifampicina, isoniazida e pirazinamida, notando-se uma recuperação significativa da evolução ponderal. Apesar das múltiplas
causas de má evolução ponderal, a tuberculose, ainda que rara,
deve ser uma hipótese a considerar.
UVEÍTE CRÓNICA – UM DESAFIO NA IDADE PEDIÁTRICA
Ana Freitas1, Carla Zilhão2, Manuela Selores3, Vasco Miranda4,
Mesquita Marques5, Margarida Guedes2
S. Pediatria, CH Porto
U. Reumatologia Pediátrica, S. Pediatria, CH Porto
3
S. Dermatologia, CH Porto
4
S. Oftalmologia, CH Porto
5
S. Oftalmologia, H Braga
1
2
Introdução: As uveítes crónicas são situações raras na idade pediátrica, mas potencialmente graves, podendo condicionar
défice visual em cerca de 45% das crianças. Englobam um grupo
muito heterogéneo de situações clínicas, podendo ser classificadas, do ponto de vista etiológico, como infecciosas ou não infecciosas. Neste último grupo a artrite idiopática juvenil é a causa
mais vezes identificada, apesar da uveíte idiopática ser mais frequente. O diagnóstico é um desafio, principalmente em idade pediátrica, visto ter um curso clínico frequentemente assintomático e
a precocidade da terapêutica condicionar o prognóstico.
Caso clínico: Criança do sexo feminino, 7 anos de idade,
com antecedentes de pieira recorrente e obstipação. Aos 4 anos
diagnosticada uveíte anterior bilateral não granulomatosa, com
evolução para uveíte crónica com sinéquias posteriores, apesar
da corticoterapia instituída (tópica, intra-ocular e sistémica). O
processo inflamatório veio a estabilizar apenas após a instituição
da associação de metotrexato e terapêutica biológica (infliximab).
Durante o seguimento foram detectados episódios de exantema
urticariforme associados a dor abdominal, aparecimento de má-
resumo dos posters
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 207
NASCER E CRESCER
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
culas tipo café-com-leite evanescentes e episódios esporádicos
e auto-limitados de artralgias e rigidez matinal. A investigação
laboratorial revelou uma diminuição dos níveis de complemento
C1q, C3 e C4, com anticorpos anti-C1q positivos e ANA negativos, que associada à clinica descrita foi compatível com o diagnóstico de vasculite hipocomplementémica urticariforme.
Comentários: O caso clínico apresentado traduz algumas
das complicações associadas à uveíte crónica, assim como as
dificuldades inerentes ao seu diagnóstico etiológico. Pela gravidade clínica e risco de sequelas graves, é cada vez mais consensual que a abordagem terapêutica seja agressiva, com uso
frequente de dois imunossupressores, e recurso à terapêutica
biológica sempre que indicado.
A REALIDADE DOS JOVENS A RESPEITO DA OCUPAÇÃO
DOS TEMPOS LIVRES
Joana Rodrigues1, Ana Azevedo1, Fátima Nunes1, Maria Inês
Monteiro1, Arménia Oliveira1
1
S. Pediatria, CH Entre Douro e Vouga
Introdução: A ocupação de tempos livres (OTL) é essencial
na educação das crianças, pois fomenta a promoção do seu desenvolvimento integral.
Objetivo: Descrever o modo como crianças/ adolescentes
ocupam os seus tempos livre e a sua relação com o aproveitamento escolar.
Material/Métodos: Análise restrospetiva de inquéritos realizados aos pais de crianças e adolescentes que frequentam
a consulta externa do CHEDV. Foram analisados parâmetros
como sexo, idade, IMC, OTL: televisão, leitura e atividades extracurriculares (desportiva e outras).
Resultados: Foram avaliados 100 inquéritos de crianças
e adolescentes, com idades compreendidas entre os 10 e 17A,
(mediana 14A) com um predomínio do sexo feminino (60%) e
com peso acima do P85 verificado em 44%.
Relativamente ao hábito da leitura, verificou-se que não
lêem qualquer livro (não escolar) 17%, sendo que cerca de 56%
o fazem apenas durante meia hora/dia. Constatou-se parecer
haver uma relação positiva entre o número de horas de leitura/
dia e um melhor aproveitamento escolar (p<0.001).
No que concerne ao uso da televisão, 65% refere que o
faz durante 2 ou mais horas/dia. Foi ainda referido em 63% a
existência de televisão no quarto. Em 65% dos casos, os pais
referem esclarecer as notícias do telejornal aos filhos, havendo
aparente repercussão positiva nas notas (p0.001).
Não foi constatada correlação com significado estatístico
entre o aproveitamento escolar e o nºhoras dispendido com a
televisão.
Quanto à prática de exercício físico extra-escolar, 21%
mencionou que não pratica qualquer desporto e a maioria fá-lo
durante 1h/dia, sendo que o desporto mais praticado é o futebol,
seguido da natação e voleibol.
Cerca de metade (48%) negou possuir qualquer tipo de
actividade extracurricular, sendo que quando comparado com a
média escolar, aparentemente as crianças com pior média frequentam menos atividades extracurriculares (p<0,05).
Conclusão: A prática de atividades extracurriculares parece tornar os adolescentes mais disciplinados, condicionando
um maior interesse pela escola, influenciando positivamente o
seu rendimento escolar, tal como é descrito nalguns estudos da
literatura. O modo como as crianças ocupam os tempos livres é
bastante importante nas suas vidas e, consequentemente, isso
reflecte-se na sua saúde, sendo nosso dever promovê-las, bem
como incentivar os pais a fazê-lo.
INFEÇÕES URINÁRIAS EM IDADE PEDIÁTRICA NO
CENTRO HOSPITALAR BAIXO VOUGA – RESISTÊNCIAS
AOS ANTIBIÓTICOS
Marta Machado¹, Rita Lacerda Vidal¹, Ângela Almeida¹, Elmano
Ramalheira², Sofia Figueiredo¹, Jorge Vaz Duarte¹, Paula
Rocha¹
1
2
S. Pediatria, CH Baixo Vouga
S. Patologia Clínica, CH Baixo Vouga
Introdução: As Infeções do Trato Urinário (ITU) em crianças exigem um tratamento atempado pelo risco de lesão renal
com sequelas a longo prazo. Deve ser direcionado para os agentes etiológicos mais frequentes, tendo em conta as resistências
antibióticas conhecidas na área geográfica em questão.
Objetivos: Estudar a prevalência das bactérias responsáveis por ITU diagnosticadas no nosso Serviço, analisar o respetivo padrão de suscetibilidade aos diversos antibióticos e, dessa
forma, contribuir para o conhecimento das resistências na área
de influência do Hospital de modo a propor um tratamento empírico inicial com maior probabilidade de eficácia. Comparação dos
resultados obtidos com os dados do estudo anterior (relativos ao
período 2005-2006).
Materiais e Métodos: Estudo retrospetivo das bactérias
identificadas nas ITU diagnosticadas no Serviço de Pediatria do
CHBV e respetivos Testes de Suscetibilidade Antibiótica (TSA),
durante 2010-2011. Na avaliação do TSA foram excluídas as ITU
de crianças sob profilaxia por ter sido verificada a existência de
uma diferença estatisticamente significativa relativamente às ITU
de crianças sem profilaxia.
Resultados: No período em estudo, foram diagnosticadas
515 ITU. O microrganismo mais frequentemente isolado foi a Escherichia coli (79,2%), seguido do Proteus mirabilis (14,7%). No
grupo de crianças sem profilaxia, as taxas de sensibilidade dos
microrganismos isolados (n=479) foram de: 98,7% para Cefotaxima, 96,6% para Cefuroxime-axetil, 96,2% para Gentamicina,
87,5% para a associação Amoxicilina e Ácido clavulânico, 84%
para Nitrofurantoína, 80,5% para Cotrimoxazol e 58,3% para
Ampicilina.
Discussão: Comparando com os dados do período 2005-2006, as resistências à Ampicilina (41,7%) permaneceram elevadas, justificando a não utilização da Ampicilina e da Amoxicilina no tratamento empírico das ITU. As percentagens de resistência e sensibilidade intermédia para a associação Amoxicilina
resumo dos posters
S 208
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
e Ácido Clavulânico diminuíram (de 21,1 para 12,5%), pelo que
este esquema poderá, eventualmente, ser considerado como
opção terapêutica. Face às sensibilidades encontradas neste
estudo, e tal como anteriormente, conclui-se que o Cefuroxime e
a Gentamicina são boas opções para o tratamento empírico das
ITU. A diminuição das resistências verificada para a maioria dos
antibióticos em relação ao estudo anterior, reforça a importância da sensibilização que tem sido efetuada na racionalização e
prescrição de antibióticos segundo protocolos.
DISÚRIA: VERDADE OU CONSEQUÊNCIA?
Maria Inês Monteiro1, Miguel Costa1, Lúcia Gomes1
1
CH Entre Douro e Vouga
Introdução: O aumento do limite de idade de atendimento
em serviços de urgência (SU) pediátricos confrontou os profissionais com situações peculiares da adolescência. As infeções
sexualmente transmissíveis (IST) são um destes novos desafios.
A idade de início da vida sexual está em mudança assim como
as taxas de IST. A pouca procura pelos cuidados médicos e falta
de tratamento favorece a disseminação de IST.
Caso Clínico: Sexo masculino, 17 anos, recorreu ao SU
por disúria. Referia estar medicado com aciclovir tópico e brivudina, por lesão herpética genital, mantendo dor. Sem outras
queixas. Restantes antecedentes irrelevantes. O exame objetivo revelou várias lesões ulcerosas penianas. Sem exsudados/
corrimento uretral. Sem outras lesões visíveis, nomeadamente
na região anal e oral. Na anamnese referiu múltiplos parceiros
sexuais, de ambos os sexos, incluindo relações sexuais em
grupo. Negava consumos de álcool ou drogas. Coitarca aos 13
anos. Frequentador habitual de bares/discotecas, onde conhecia
os parceiros. No SU colheu serologias. Foi medicado com Penicilina G benzatínica, azitromicina, ceftriaxone, aciclovir oral e
metronidazol. Efetuado reforço para a necessidade de aderir e
concluir o tratamento e explicadas medidas de educação sexual. Resultados analíticos: AgHBs, HCV, HIV, VDRL, Chlamydia
trachomatis e Neisseria gonorrhoeae negativos, Herpes 1 IgM
+, VDRL positivo. Foi encorajado a comunicar aos parceiros sexuais do último mês.
Em seguimento em Consulta de Adolescentes e Psicologia.
Atualmente sem complicações de IST.
Discussão/ Conclusão: Os adolescentes são um grupo
de alto risco para as IST e é imperativo fazer o seu diagnóstico
precoce de modo a prevenir potenciais complicações e interromper a cadeia de transmissão. Há que saber ouvir e encaminhar
os apelos que se escondem atrás do motivo evidente que trás
o adolescente a um SU. Neste caso a disúria, tão frequente na
idade pediátrica, levou a abordagem completamente distinta no
adolescente. Chamamos a atenção para a necessidade de exame físico completo, incluindo região genital, que se torna ainda
mais complexo nesta faixa etária. O atendimento de jovens exige
princípios fundamentais, como o sigilo profissional, uma atitude
não crítica com avaliação psicossocial importante e reconhecimento e orientação das necessidades com máxima intervenção
a cada oportunidade. Casos como o apresentado representam
apenas a ponta do iceberg das IST em Portugal, sendo que a
verdadeira taxa de incidência é desconhecida.
CRIANÇA COM VÓMITOS – O QUE FAZEM OS PAIS?
Catarina Rêgo1, Ana Luísa Leite2
1
2
USF Nova Via
S. Pediatria, CH Vila Nova de Gaia-Espinho
Introdução: Os vómitos são um sintoma frequente na criança e, como tal, são um motivo comum de consulta médica. O
seu espectro clínico pode ser muito variado, contudo, na maioria
das vezes é benigno e enquadrado num quadro de intolerância
digestiva leve. Frequentemente o seu tratamento é apenas sintomático. A prática clínica demonstra que existem muitas dúvidas
sobre a gravidade do quadro e a sua orientação, sendo um sintoma causador de muita preocupação nos pais.
Objectivos: O objectivo deste estudo foi avaliar os conhecimentos e atitudes dos pais e/ou cuidadores perante uma criança
ou adolescente com vómitos.
Metodologia: Estudo observacional e transversal, com
aplicação de um questionário anónimo e voluntário. A amostra
de conveniência incluiu pais ou mães de crianças até aos 18
anos que recorreram à consulta de Pediatria no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho, EPE de 11 de Setembro a 6 de
Outubro de 2012. Trataram-se os dados com o software SPSS
18.0®, procedendo-se à análise descritiva dos dados e usando-se o teste estatístico qui-quadrado para um nível de confiança
de 95% e um erro máximo de 5%.
Resultados: Analisaram-se 210 questionários, idade média
dos pais foi de 35,7 anos (desvio padrão=6,76), 41,4% desempregados, média de 1,72 filhos, a faixa etária do filho mais novo
mais representativa é a pré-escolar (2 a 5 anos). Apena 28%
distingue corretamente vómitos de náuseas e regurgitação, 80%
fazem uma pausa alimentar após o vómito, mas só 41% aguarda corretamente 30 minutos após o episódio, 5% dá medição e
apenas metade considera que vómitos nos recém-nascidos são
potencialmente mais graves. A solução de hidratação oral não é
dada por rotina, 20% considera que os vómitos não se resolvem
de forma natural, 18,1% referem que são o início de uma doença
grave e 67,3% recorre nas primeiras horas a um profissional médico. Verificou-se que pais mais novos são o que mais recorrem
a um profissional médico, enquanto pais com mais habilitações
aguardam mais tempo e não confundem tanto vómitos com náuseas e regurgitação (p<0,05).
Conclusão: Os pais em geral ficam preocupados com episódios de vómitos nas crianças, confundem os conceitos náuseas, regurgitação e vómitos e têm atitudes que não são adequadas. Enquanto profissionais de saúde é importante desmistificar
falsas crenças dos pais, esclarecer dúvidas e receios existentes,
bem como informar sobre as abordagens e tratamentos mais
adequados.
resumo dos posters
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S 209
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revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
COMO BRINCAM AS NOSSAS CRIANÇAS?
Sofia Ferreira1, Helena Silva2, Andreia Lopes3, Sofia Águeda3,
Ana Filipe Almeida3, Fátima Pinto4
QUANDO NÃO SE ENCONTRA A CAUSA…
Joana Correia1, Conceição Silva2, Sandra Ramos2, Joaquim
Silva Pereira2, Maria José Dinis2
1
CH Entre Douro e Vouga
CH Porto
3
CH São João
4
Pediatria, US Aníbal Cunha, ACES Porto Ocidental
1
2
2
Introdução: Brincar é fundamental para o desenvolvimento
cognitivo, físico, social e emocional da criança. No entanto, o
tempo para brincar tem vindo a sofrer uma redução, resultante
do estilo de vida actual, estrutura familiar, pressão com resultados académicos e oferta de actividades passivas.
Objectivos: Avaliar as actividades de ocupação dos tempos livres de crianças em idade pré-escolar, e relação com o
desenvolvimento psicomotor (DPM) e o quociente de inteligência (QI).
Métodos: Estudo transversal realizado num Centro de Saúde Urbano. Foram convocadas 118 crianças, sendo aplicado um
questionário aos pais e avaliado o DPM com a escala Schedule
of Growing Skills II (SGSII) e o QI com o teste do Desenho da
Figura Humana de Goodenough.
Resultados: Incluídas 67/118 crianças: 61,2% do sexo
feminino, idade média 53,7 ± 2,9 meses. Todos os pais consideraram a brincadeira livre importante. Brincavam com os filhos
1,7±1,1 h durante a semana, 4,5±2,9 h ao fim de semana. Liam
aos filhos diariamente 54,7% [início mais precoce associado a
maior escolaridade materna (p<0,05)]. Viam televisão diariamente 67,7% das crianças, ocupando 1,8±1 h/dia, e 58% jogavam
consola/computador 2-4 vezes/semana. Praticavam actividades
ao ar livre semanalmente 85,1%. Metade frequentava actividades extracurriculares.
Apresentaram ≥ 1 desvio padrão na SGSII 19,4%. O QI foi
normal em 67,1% e superior em 31,3%. Verificou-se uma associação significativa (p<0,05) entre algumas actividades e um
melhor score em áreas específicas da SGSII: a leitura na área
da audição/linguagem, as actividades ao ar livre na área da locomoção, as actividades extracurriculares nas áreas da audição/
linguagem e manipulação, a expressão plástica/motricidade fina
nas áreas da manipulação, fala/linguagem e cognição.
Conclusão: Apesar do possível condicionamento das respostas resultante do facto de o questionário não ser anónimo,
os pais parecem ter noção da importância do brincar, brincam
frequentemente com os filhos e as actividades praticadas são
adequadas. No entanto, as actividades de ecrã assumem já uma
dimensão preocupante nesta faixa etária. Observa-se uma relação entre algumas actividades e um melhor desempenho na
SGSII e no QI, embora a maioria dos resultados não seja estatisticamente significativa, o que pode estar relacionado com o
tamanho reduzido da amostra e/ou com os resultados uniformemente bons do DPM e QI.
CH Porto
CH Póvoa de Varzim-Vila do Conde
Introdução: A febre de origem indeterminada (FOI)
define-se como febre que persiste após 3 semanas de evolução ou após uma semana de internamento. Em idade pediátrica as principais etiologias são infeciosas, reumatológicas ou
neoplásicas. Em alguns casos, o diagnóstico etiológico não é
estabelecido.
Caso clínico: Criança de 3 anos, sexo feminino, previamente saudável. Plano de vacinação atualizado, sem vacinas
extra-calendário. Residente em ambiente rural, sem saneamento
básico; uso de água de poço para cozinhar e higiene. Contacto
com cães e aves. Antecedentes de internamento por gastroenterite um mês antes, mantendo desde então queixas de dor abdominal ligeira. Internada por febre elevada com 4 dias de evolução. Estudo analítico com anemia microcítica, sem leucocitose e
PCR elevada (8,44mg/dl). Radiografia do tórax normal. Em D2,
com hemocultura e urocultura negativas, repete estudo analítico, que mostra elevação da PCR (25,97mg/dl); inicia tratamento empírico com ceftriaxone, sem resolução do quadro. Na primeira semana de internamento, referência a dor abdominal por
vezes intensa, associada a elevação das transaminases (3x). A
ecografia abdominal revelou nódulo esplénico, compatível com
malformação artério-venosa na RMN. Durante o internamento
manteve febre elevada, razoável estado geral e recusa alimentar
parcial, sem perda ponderal. Manteve elevação dos parâmetros
de inflamação, inclusive da VS (máximo 112mm/1ªh). Em D14
de internamento apresentava trombocitose, com resolução da
citólise hepática. Da investigação realizada para esclarecimento
etiológico: exames culturais (sangue, urina, fezes e LCR) negativos. Prova tuberculínica anérgica e PCR M. tuberculosis no suco
gástrico negativa. Marcadores víricos, serologias, imunoglobulinas séricas, complemento, fator reumatoide, ANA, ANCA, ECA,
anti-dsDNA sem alterações. Ecocardiograma e ECG normais.
Observação por Oftalmologia sem sinais de inflamação ocular.
Medulograma sem alterações, com exames culturais da medula
óssea negativos. Ficou apirética em D25 de internamento, com
melhoria do estado geral e sem queixas.
Discussão: Frequentemente, a FOI resulta de uma apresentação atípica de patologias comuns. Em muitos casos, a
febre remite sem deixar sequelas, e sem que o diagnóstico definitivo seja estabelecido. Este tipo de situação traz grande ansiedade aos familiares e ao clínico, que na angústia de procurar
uma etiologia, vai progredindo na investigação, por vezes de
forma invasiva.
resumo dos posters
S 210
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ano 2012, vol XXI, n.º 3
TRANSMISSÃO MÃE-FILHO DA INFECÇÃO VIH: QUANDO
AS SEROLOGIAS NA GRAVIDEZ SÃO NEGATIVAS...
Nádia Guimarães1, Carla Teixeira1, Isabel Cunha1, Eurico
Gaspar1, Laura Marques1
1
U Infecciologia Pediátrica e Imunodeficiências, S. Pediatria, CH Porto
Introdução: A transmissão mãe-filho da infeção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) tem vindo a ser reduzida
devido ao rastreio universal das grávidas, à instituição de terapêutica antiretrovírica na gestação e de medidas profiláticas peri-parto à grávida e ao recém-nascido associadas à evicção do
aleitamento materno. Com as novas medidas instituídas a taxa
de transmissão mãe-filho desta infecção tem apresentado valores inferiores a 2% em Portugal. No entanto, pode ocorrer transmissão desta infecção não detectada no rastreio pré e peri-natal.
Os autores apresentam dois casos ilustrativos desta situação.
Casos clínicos:
Caso1: Criança com 9 anos de idade, nascido por parto
eutócico às 36 semanas de gestação. As serologias para o VIH
foram negativas durante a gestação e no parto. Foi amamentado
até aos 3 anos de idade. Em 2006 foi efetuado diagnóstico de
infeção VIH 1 à mãe e, posteriormente, ao pai que era usuário de
drogas endovenosas. Em 2011 desenvolve uma escabiose com
lesões extensas e múltiplas, refractária à terapêutica. Foi efectuado estudo analítico e diagnosticada trombocitopenia persistente
(83 000 plaquetas/mm3). A serologia do VIH1 foi positiva, confirmada por Western-blot em 2 amostras. A carga vírica era 170 000
cópias/ml e os linfócitos T CD4+ estavam muito diminuídos (56/
mm3). De acordo com a classificação do CDC encontrava-se no
estádio B3. Iniciou terapêutica anti-retrovírica combinada (TARc)
e profilaxia com Cotrimoxazol, com boa evolução clínica e analítica posterior. Caso 2: Criança com 6 anos de idade, nascido
por parto eutócico de gestação de termo. As serologias maternas
para o VIH eram negativas no 1º e 3º trimestre da gestação.
Amamentado até aos 2 anos de idade. Diagnóstico de infecção
pelo VIH1 no companheiro da mãe em contexto de estudo pré-operatório de cirurgia ortopédica, em 2012. Efectuado estudo
à mãe e à criança, confirmando-se infecção VIH1 em ambos.
Apresentava hipertrofia parotídea bilateral, hepatoesplenomegalia e pneumonia intersticial linfóide, uma carga vírica de 526 000
cópias/ml e 232 linfócitos T CD4+/mm3. Iniciou TARc com boa
evolução clínica e analítica posterior.
Discussão: É importante não esquecer a infecção pelo VIH
no diagnóstico diferencial de qualquer criança que apresente sintomas ou sinais de imunodeficiência, mesmo que as serologias
maternas tenham sido negativas na gestação ou no parto. Pode
ocorrer infeção materna durante a gestação e a grávida estar em
período- janela, com serologias que ainda não positivaram. Por
outro lado, pode ocorrer infeção materna no período pós-natal
com transmissão do vírus ao filho através do leite materno.
SÍNDROME NEUROLÉTICA MALIGNA – CASO CLÍNICO
Marta Rios1, Diana Gonzaga2, Inês Carrilho3, Céu Mota1, Paula
Rocha1, Paula Ferreira1
S. Cuidados Intensivos Pediátricos, CH Porto
S. Pediatria, CH Porto
3
S. Neuropediatria, CH Porto
1
2
Introdução: A síndrome neurolética maligna (SNM) pode
surgir em 0,02-3% dos doentes tratados com neuroléticos e
caracteriza-se por alterações do comportamento, hipertermia,
rigidez muscular e disautomonia. Habitualmente, surge durante
as primeiras 2 semanas de tratamento, mas pode ocorrer após
uma única toma ou após tratamento prolongado.
Caso clínico: Adolescente, sexo feminino, 16 anos, com
delírios persecutórios desde há 2 meses, internada no Departamento de Pedopsiquiatria por agitação psicomotora grave. Medicada com decanoato de haldol e diazepam e posteriormente
com olanzapina e risperidona. Ao 4º dia de internamento, aparecimento de febre e rigidez muscular, mantendo períodos de
agitação. O estudo analítico revelou elevação da CK (3756 UI/L),
da DHL (533 UI/L) e das transaminases (TGO 142 UI/L, TGP 93
UI/L); hemograma, PCR, ionograma e função tiroideia normais,
marcadores víricos e VDRL negativos. Transferida para o nosso
serviço em D8 por suspeita de SNM. Para exclusão de outros
diagnósticos (encefalite infeciosa/parainfeciosa ou autoimune,
encefalopatia metabólica, lesões do SNC), efetuou o seguinte
estudo: TC e RM cerebrais sem alterações; exame citoquímico,
bacteriológico e virológico do LCR normais; pesquisa de bandas
oligoclonais no LCR negativa; PCR Mycoplasma pneumoniae no
LCR e anticorpos anti-NMDA no soro e no LCR em curso; estudo imunológico, equilíbrio ácido-base, amónia e ceruplasmina
séricas e cobre urinário normais. Para além da suspensão dos
neuroléticos, foi instituída terapêutica de suporte (medidas de arrefecimento, midazolam, hiperhidratação, alcalinização da urina
e enoxparina profilática) e terapêutica específica com bromocriptina. Manteve alterações do comportamento, rigidez muscular
e hipertermia durante 2 dias, e apresentou HTA e taquicardia.
Constatou-se diminuição das transaminases e da CK, tendo sido
transferida para o hospital de origem ao 4º dia.
Comentários: O diagnóstico de SNM deve ser equacionado sempre que surjam pelo menos 2 dos 4 sinais que a caracterizam. Neste caso, a febre foi o principal indicador do diagnóstico,
entretanto suportado pela rigidez muscular, valores de CK superiores a 1000 UI/L e exclusão de outras causas. O diagnóstico
precoce, com suspensão dos fármacos implicados, monitorização, prevenção e tratamento das complicações e, nos casos
mais graves, terapêutica com agonistas dopaminérgicos como a
bromocriptina, são fundamentais para a evolução favorável deste quadro potencialmente fatal.
resumo dos posters
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
S 211
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
MENINGITE RECORRENTE: SIMPLES COINCIDÊNCIA OU
ALGO MAIS?
Maria João Vieira1, Sérgio Caselhos2, Joana Magalhães1, Ana
Luísa Lobo1
1
2
Serviço de Pediatria – CHAA – Unidade de Guimarães
Serviço de Otorrinolaringologia – CHAA – Unidade de Guimarães
Introdução: A meningite recorrente é uma situação rara e
potencialmente grave, com uma incidência estimada entre 1,3%
a 9,3%. A sua presença implica a investigação de possíveis fatores predisponentes, como defeitos anatómicos ou imunológicos.
Caso clínico: Criança do sexo feminino internada aos sete
anos por meningite pneumocócica, sem complicações. Sem antecedentes de traumatismos crânio–encefálicos, cirurgias, infeções recorrentes ou doenças heredofamiliares.
Aos dez anos recorre ao Serviço de Urgência com um quadro de febre, cefaleia frontal com fotofobia, diminuição da acuidade visual e vómitos com doze horas de evolução. Ao exame
físico apresentava–se com discurso incoerente, fotofobia intensa
e sinais meníngeos positivos.
Foi requisitada uma TAC crânio–encefálica que excluiu alterações do parênquima encefálico, mostrando no entanto sinais
de sinusite fronto–etmoidal esquerda e maxilar direita.
Realizou punção lombar, com saída de líquor turvo, estudo
citoquímico compatível com meningite bacteriana e antigénios
capsulares do pneumococo positivos, tendo de imediato iniciado
antibioterapia.
No decurso da investigação da meningite recorrente efetuou um estudo imunológico que não revelou alterações.
Foi pedida a colaboração de otorrinolaringologia, tendo sido
identificada no exame físico uma neoformação polipóide na fossa
nasal esquerda associada a rinorreia mucopurulenta ipsilateral.
Realizou uma TAC dos seios perinasais que confirmou a
neoformação de tecidos moles na fossa nasal esquerda, cuja
RMN mostrou tratar–se de um meningocelo.
Cinco meses após a segunda meningite foi submetida a microcirurgia nasal com correção de meningocelo, mantendo–se
assintomática até ao momento (cinco meses pós–cirurgia).
Conclusões: A meningite recorrente pode ter como base
várias patologias. Neste caso, o compromisso das leptomeninges constituiu uma porta de entrada de microorganismos (S.
pneumoniae) da cavidade nasal para o líquor, favorecendo a
ocorrência de meningites de repetição. Os exames de imagem
permitiram a identificação desta alteração anatómica e consequente correção cirúrgica.
HIPERPLASIA SUPRA-RENAL CONGÉNITA POR
DEFICIÊNCIA DE 21-HIDROXILASE: CORRELAÇÃO
GENÓTIPO-FENÓTIPO
Inês Vaz Matos1, Luís Ribeiro1, Ana Novo1, Maria João Oliveira1,
Helena Cardoso1, Teresa Borges1
1
U. Endocrinologia Pediátrica, CH Porto
Introdução: A hiperplasia supra-renal congénita (HSRC)
por deficiência de 21-hidroxilase (21-OHD) é uma doença autossómica recessiva comum. É causada por diversas mutações no
gene CYP21A2 e na maioria dos casos a gravidade da doença
correlaciona-se com a sua variação alélica.
Objectivo: Descrever o espectro mutacional do gene
CYP21A2 e avaliar a correlação genótipo-fenótipo nos pacientes
com 21-OHD seguidos na Unidade de Endocrinologia Pediátrica
do Centro Hospitalar do Porto.
População e métodos: O estudo molecular do gene
CYP21A2 foi efectuado em 23 pacientes com critérios clínicos e
laboratoriais de 21-OHD. Várias técnicas de genotipagem foram
utilizadas.
Resultados: Foram estudados 23 pacientes não relacionados: 4 perdedores de sal, 8 virilizantes simples e 11 com a
forma não clássica da doença. Todos apresentavam mutações
do gene CYP21A2. Sete (30,4%) eram homozigotos, 12 heterozigotos compostos (52,2%) e 4 heterozigotos pra uma mutação
(17,4%). As mutações mais frequentes foram: V281L (37,8%),
I172N (17,8%), I2 splicing (13,3%), Q318X (11,1%) e delecções/
conversões do CYP21A2 (6,7%). A taxa de concordância global
entre genótipo e fenótipo foi de 73,9%, sendo total no fenótipo
perdedor de sal.
Conclusão: A frequência relativa dos defeitos genéticos
encontrados na nossa amostra difere de outros estudos portugueses, provavelmente devido ao menor tamanho da amostra e
à utilização de técnicas de genotipagem diferentes. Na maioria
dos casos verificou-se uma boa correlação genótipo-fenótipo, o
que reforça a importância do estudo molecular do CYP21A2 na
predição da gravidade da doença e no aconselhamento genético
e pré-natal. As discrepâncias podem ser explicadas por novas
mutações, genotipagem incompleta, heterozigotia composta
para duas ou mais mutações e outras variações genéticas na
biossíntese ou na sensibilidade aos androgénios.
resumo dos posters
S 212
XXIV reunião anual de pediatria do centro hospitalar do porto
NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
INSTRUÇÕES AOS AUTORES
A Revista NASCER E CRESCER dirige-se a todos os profissionais de saúde com interesse na área da Saúde Materno Infantil e publica artigos científicos
relacionados com a Pediatria, Perinatologia, Saúde Mental da Infância e Adolescência, Bioética e Gestão Hospitalar. Os Editoriais, os artigos de Homenagem
e artigos de âmbito cultural são publicados a pedido da Direcção da Revista. A
revista publica artigos originais, de revisão, casos clínicos e artigos de opinião.
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Manuscrito: Os trabalhos devem ser enviados à Direcção da Revista
Nascer e Crescer – Centro Hospitalar do Porto – Largo do Prof. Abel Salazar –
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Consentimento informado e aprovação pela Comissão de Ética: É da
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deontológicos, bem como, a legislação e as normas aplicáveis, conforme recomendado na Declaração de Helsínquia. Nos estudos experimentais, é obrigatório que os autores mencionem a existência e aplicação de consentimento informado dos participantes, assim como a aprovação do protocolo pela Comissão de
Ética. Deve constar declaração de conflito de interesses ou financiamento.
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A Revista Nascer e Crescer subscreve os requisitos para apresentação
de manuscritos a revistas biomédicas elaboradas pela Comissão Internacional
de Editores de Revistas Médicas (Uniform Requirements for Manuscripts
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2008). Todos os elementos do trabalho incluindo a iconografia, devem ser enviados em suporte electrónico.
O trabalho deve ser apresentado na seguinte ordem:
1- Título em português e em inglês; 2- Autores; 3- Resumo em português
e inglês. Palavras--chave e Keywords; 4- Texto; 5- Bibliografia; 6- Legendas; 7Figuras; 8- Quadros; 9- Agradecimentos e esclarecimentos; 10- Em destaque.
As páginas devem ser numeradas segundo a sequência referida atrás.
No caso de haver segunda versão do trabalho, este deve também ser enviado
em formato electrónico.
Títulos e autores: Escrito na primeira página, em português e em inglês, o título deve ser o mais conciso e explícito possível. A indicação dos autores deve ser feita pelo nome clínico ou com a(s) inicial(ais) do(s) primeiro(s)
nome(s), seguida do apelido e devem constar os títulos ou cargos de todos
os autores, bem como as afiliações profissionais. No fundo da página devem
constar os organismos, departamentos ou serviços hospitalares ou outros em
que os autores exercem a sua actividade, o centro onde o trabalho foi executado, os contactos do autor responsável pela correspondência (endereço postal,
endereço electrónico e telefone).
Resumo e palavras-chave: O resumo deverá ser redigido na língua
utilizada no texto e sempre em português e em inglês. No que respeita aos
artigos originais deverá compreender no máximo 250 palavras e ser elaborado
segundo o seguinte formato: Introdução, Objectivos, Material e Métodos, Resultados e Conclusões. Os artigos de revisão devem ser estruturados da seguinte
forma: Introdução, Objectivos, Desenvolvimento e Conclusões. Relativamente
aos casos clínicos, não deve exceder 150 palavras e deve ser estruturado em
Introdução, Caso Clínico e Discussão/Conclusões. Abaixo do resumo deverá
constar uma lista de três a dez palavras-chave, em Português e Inglês, por
ordem alfabética, que servirão de base à indexação do artigo. Os termos devem
estar em concordância com o Medical Subject Headings (MeSH).
Texto: O texto poderá ser apresentado em português, inglês, francês ou
espanhol. Os artigos originais devem ser elaborados com a seguinte organização:
Introdução; Material e Métodos; Resultados; Discussão e Conclusões. Os artigos
de revisão devem obedecer à seguinte estrutura: Introdução, Objectivos, Desenvolvimento e Conclusões. Os casos clínicos devem ser exemplares, devidamente
estudados e discutidos e conter uma breve introdução, a descrição do(s) caso(s)
e uma discussão sucinta que incluirá uma conclusão sumária. As abreviaturas utilizadas devem ser objecto de especificação anterior. Não se aceitam abreviaturas
nos títulos dos trabalhos. Os parâmetros ou valores medidos devem ser expressos em unidades internacionais (SI units, The SI for the Health Professions, WHO,
1977), utilizando para tal as respectivas abreviaturas adoptadas em Portugal. Os
números de 1 a 10 devem ser escritos por extenso, excepto quando têm decimais
ou se usam para unidades de medida. Números superiores a 10 são escritos em
algarismos árabes, excepto se no início da frase.
Bibliografia: As referências devem ser classificadas e numeradas por
ordem de entrada no texto, com algarismos árabes. Os números devem seguir
a ordem do texto, e ser colocados superiores à linha. Serão no máximo 40 para
artigos originais e 15 para casos clínicos. Os autores devem verificar se todas
as referências estão conformes aos Uniform Requirements for Manuscript
submitted to biomedical journals (www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html) e se utilizam os nomes abreviados das publicações adoptadas pelo
Índex Medicus. Os autores devem consultar a página NLM’s Citing Medicine
relativamente às recomendações de formato para os vários tipos de referência.
Seguem-se alguns exemplos:
a) Revistas: listar os primeiros seis autores, seguidos de et al se ultrapassar 6, título do artigo, nome da revista (utilizar as abreviaturas do Index
Medicus), ano, volume e páginas. Ex.: Haque KN, Zaidi MH SK,et al.
Intravenous Immunoglobulin for prevention of sepsis in preterm and low
birth weight infants. Pediatr Infect Dis 1986; 5:622-65.
b) Capítulos em livros: nome(s) e iniciais do(s) autor(es) do capítulo ou da
contribuição. Nome e iniciais dos autores médicos, título do livro, cidade
e nome da casa editora, ano de publicação, primeira e última páginas do
capítulo. Ex.: Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and stroke. In: Laragh JH, Brenner BM, editors. Hypertension: pathophysiology, diagnosis,
and management. 2nd ed. New York: Raven Press; 1995. p. 465-78.
c) Livros: Nome(s) e iniciais do(s) autor(es). Título do livro. Número da edição. Cidade e nome da casa editora, ano de publicação e número de
página. Ex.: Berne E. Principles of Group Treatment. New York: Oxford
University Press, 1966:26.
Figuras e Quadros: Todas as ilustrações deverão ser apresentadas em
formato digital de boa qualidade. Cada quadro e figura deverá ser numerado
sequencialmente por ordem de referência no texto, ser apresentado em página individual e acompanhado de título e legenda explicativa quando necessário. Todas as abreviaturas ou símbolos necessitam de legenda. Se a figura
ou quadro é cópia de uma publicação ou modificada, deve ser mencionada a
sua origem e autorização para a sua utilização quando necessário. Fotografias
ou exames complementares de doentes deverão impedir a sua identificação
devendo ser acompanhadas pela autorização para a sua publicação dada pelo
doente ou seu responsável legal.
O total de figuras e quadros não deve ultrapassar os oito para os artigos
originais e cinco para os casos clínicos. As figuras ou quadros coloridos, ou os
que ultrapassam os números atrás referidos, serão publicados a expensas dos
autores.
Agradecimentos e esclarecimentos: Os agradecimentos e indicação
de conflito de interesses de algum dos autores ou financiamento do estudo
devem figurar na última página.
Destaque: Incluir três a quatro frases curtas (até 50 palavras cada) salientando os aspectos mais relevantes do trabalho. Estas deverão ser escritas
em português e em inglês.
Modificações e Revisões: No caso do artigo ser aceite mas sujeito a modificações, estas devem ser realizadas pelos autores no prazo de quinze dias. As
provas tipográficas serão enviadas aos autores em formato electrónico, contendo
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Revista. O não respeito do prazo desobriga a aceitação da revisão dos autores,
sendo a mesma efectuada exclusivamente pelos serviços da Revista.
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NASCER E CRESCER
revista de pediatria do centro hospitalar do porto
ano 2012, vol XXI, n.º 3
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Health with interest in the area of Maternal and Child/Adolescent Health and
publishes scientific articles related with Paediatrics, Perinatology, Childhood
and Adolescence Mental Health, Bioethics and Health Care Management. The
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words; 4- Text; 5- References; 6- Legends; 7- Figures; 8- Tables; 9- Acknowledgements; 10- Highlights.
Pages should be numbered according the above sequence. If a second
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Title and Authors: The first page should contain the title in Portuguese
and English. The title should be concise and revealing. A separate page should
contain name(s) degree(s), the authors’ professional affiliations, the name and
the contact details of the corresponding author (postal address, electronic address and telephone), and the name of the Institutions where the study was
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and Discussion/Conclusions. Do not use abbreviations. Each abstract should
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articles should include: Introduction, Past landmarks and Present developments
and Conclusions. The case reports should be unique cases duly studied and
discussed. They should contain: a brief Introduction, Case description and a
succinct Discussion or Conclusion. Any abbreviation used should be spelled
out the first time they are used. Abbreviations are not accepted in the titles of
papers. Parameters or values measured should be expressed in international
(SI units, The SI for the Health Professions, WHO, 1977), using the corresponding abbreviations adopted in Portugal. Numbers 1 to 10 should be written in full,
except in the case of decimals or units of measurements. Numbers above 10 are
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and in the order in which they are mentioned in the text. They should be limited
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given in references to (a) journals, (b) chapters of books by other authors, or (c)
books written or edited by the same author:
a) Journals: Names of all authors (except if there are more than six, in which
case the first three are listed followed by “et al.”), the title of the article,
the name of the journal (using the abbreviations in Index Medicus), year,
volume and pages. Ex: Haque KN, Zaidi MH SK,et al. Intravenous Immunoglobulin for prevention of sepsis in preterm and low birth weight infants.
Pediatr Infect Dis 1986; 5:622-65
b) Chapters of books: Name(s) and initials of the author(s) of the chapter or
contribution cited. Title and number of the chapter or contribution. Name
and initials of the medical editors, title of book, city and name of publisher, year of publication, first and last page of the chapter. Ex: Phillips
SJ, Whisnant JP. Hypertension and stroke. In: Laragh JH, Brenner BM,
editors. Hypertension: pathophysiology, diagnosis, and management. 2nd
ed. New York: Raven Press; 1995. p. 465-78.
c) Books: Name(s) and initials of the author(s). Title of the book. City and
name of publisher, year of publication, page. Ex: Berne E. Principles of
Group Treatment. New York: Oxford University Press, 1966:26.
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-