Corrie Ten Boom - Rede Mãos Dadas
Transcrição
Corrie Ten Boom - Rede Mãos Dadas
RUTH BELL GRAHAM 153 do lado de fora, cercados de árvores em Little Piney Cove. — Como nossa casa-ninho é praticamente toda de madeira, quase consigo imaginá-la no galho de uma árvore enorme — continuou a adolescente. Ruth ficou maravilhada de ouvir isso. — Fico feliz que ache isso — disse —, pois esse é o meu trabalho aqui: fazer um ninho para os Grahams, fazer um ninho para o papai. — Você nunca se acostumou com as viagens do papai, não é? — a garota perguntou. Ruth pensou antes de responder. — É o nosso modo de viver — disse com muito cuidado —, e Deus nos dá força para ficar longe um do outro e, ainda assim, nos amarmos muito. Mas, na verdade, nunca me acostumei a despedidas. — Mamãe — continuou a filha, sentindo de algum modo que Ruth estava disposta a conversar —, uma vez você disse achar que Deus a havia chamado para ser missionária, mas você não é missionária, é? Ruth sorriu para a adolescente e pensou em quanto a filha estava crescendo. 154 DEZ MENINAS QUE MUDARAM O MUNDO — Sim, eu sou missionária — respondeu —, porque o Senhor me permitiu falar com muitas pessoas sobre Jesus. Mas acho que meu ministério consiste em concordar com as viagens evangelísticas de seu pai e apoiá-lo. Eu sempre tive de enfrentar despedidas quando criança, e sempre foi difícil. Agora compreendo que, na realidade, estava sendo treinada para ser esposa de Billy Graham. — Deve estar certa — concordou a menina — porque, se você tivesse insistido para o papai se fixar numa igreja, ele não teria falado de Jesus a milhões de pessoas. Ruth apertava os olhos por causa do sol. — É mesmo surpreendente — disse com suavidade, como que para si mesma. — Ele pregou em mais de sessenta países, inclusive na Rússia comunista, e transmitiu a milhões e milhões de pessoas as boas-novas de que Jesus Cristo é o Salvador. — E vale a pena? — perguntou a filha. Ruth levantou-se instantaneamente e, bem desperta, respondeu: RUTH BELL GRAHAM 155 — Se vale a pena? Claro que sim! Fácil não é… mas cada doloroso adeus vale a pena. A garota se levantou e atiçou a brasa da churrasqueira. — Faltam só nove dias para o papai voltar — lembrou. Ruth sorriu. — E agora, onde coloquei minha lista? — perguntou. — Não posso me esquecer de comprar o chocolate quente preferido do seu pai, e a pipoca, e… — Calma, mamãe! — disse a filha, sorrindo. — Você tem nove dias inteiros para aprontar tudo até receber o papai de volta ao ninho, e já começou a agitação! l Você sabia? O rio Yang-tsé é o maior da China e o quarto maior do mundo. Ele tem 5 494 quilômetros de extensão, desde a nascente, no Tibet, até o ponto em que deságua no mar Oriental da China. Certa vez, o explorador Marco Polo comentou que lhe impressionava o número de barcos que navegavam por esse rio. Hoje em dia, 156 DEZ MENINAS QUE MUDARAM O MUNDO porém, as fortes chuvas de verão vêm causando enchentes desastrosas. Lembre-se: Ruth ficou aborrecida quando teve de ir para a escola e deixar os pais. Ficou deprimida e com muita saudade de casa. Mas, ao ler o livro de Salmos, descobriu que outras pessoas entendiam o que ela estava passando. Ruth também conseguiu perceber que Deus estava com ela. Quando você se sentir triste e deprimida, ore a Deus, peça a ele que lhe dê conforto por meio de sua Palavra, a Bíblia. Pense nisto: Ruth e Billy estavam envolvidos no ministério de evangelização. Evangelizar é contar às pessoas sobre Jesus Cristo. Você pode evangelizar em qualquer lugar. Pode evangelizar em outros países, em outras cidades e também em sua própria casa. É muito importante contar às pessoas que você conhece e ama que Jesus quer salvá-las do pecado. Mas Jesus também nos manda ir por todo o mundo pregar o evangelho. RUTH BELL GRAHAM 157 Vamos orar? Querido Deus, o Senhor é surpreendente e maravilhoso, é um Deus de amor. É o único Deus verdadeiro. Ajude-me a falar do Senhor para as pessoas e fazer a minha parte espalhando as boas-novas em todo o mundo. Amém. C ORRIE TEN B OOM O pai de Corrie ajeitou a lupa no rosto e examinou o mecanismo interno do relógio. Com uma chave de fenda minúscula, ajustou um parafuso do tamanhinho da cabeça de um alfinete. Corrie adorava ver o pai trabalhar. De tão concentrado no ofício, até se esquecia da filha a lhe fazer companhia. Embora tivesse apenas seis anos de idade, Corrie já havia aprendido a ficar quietinha enquanto o pai consertava relógios. Às vezes ela ficava curiosa para saber o que aconteceria se deixasse escapar um longo e escandaloso “atchimmm!”. Mas quando sentia uma coceirinha irritar-lhe o nariz, Corrie sempre dava um jeito de segurar o espirro. 162 DEZ MENINAS QUE MUDARAM O MUNDO — Gostaria de ver isso com a lupa? — perguntou o papai Ten Boom. — Sim, papai! — respondeu Corrie entusiasmada, apesar da dificuldade de manter uma lupa tão grande num rosto tão miúdo. Tinha de ficar com os olhos arregalados e agüentar firme para conseguir a façanha. — São diamantes — informou o pai. — Você consegue contar quantos há? — Um, dois, três… quatro… cinco! De quem é este relógio? A dona deve ser milionária. O sr. Boom sorriu e disse: — De fato, é riquíssima. — O senhor deve ser o melhor relojoeiro da Holanda! — exclamou Corrie, maravilhada. — Se as mulheres mais ricas trazem o relógio para o senhor consertar… Adoro ficar aqui na loja com o senhor! — Também gosto que fique aqui — disse o papai Boom. — Você é tão quieta quanto um ratinho. Quando adulta, Corrie viu de perto a Holanda ser ocupada por soldados nazistas durante a CORRIE TEN BOOM 163 Segunda Guerra Mundial. Aviões alemães e ingleses cruzavam os céus a todo momento. Certa noite, o ruído dos aviões era tão intenso que Corrie e sua irmã Betsie não conseguiam dormir, então, desceram as escadas espirais de sua antiga e pitoresca casa holandesa e foram tomar uma xícara de chá enquanto conversavam. Quando Corrie voltou para a cama, encontrou estilhaços de granada em cima do travesseiro. — Se estivesse dormindo, teria morrido — desabafou com a irmã. Betsie confirmou e acrescentou: — Deus deve ter salvado sua vida por algum motivo. Corrie, que amava o Senhor Jesus, concordou sem discutir. — Mas que motivo será esse? — questionou. — Daria tudo para saber. Corrie não tardou a descobrir por que sua vida fora poupada. Poucos meses depois, a família Ten Boom conversava sobre a guerra durante uma refeição em que comiam pão de centeio e queijo gouda. 164 DEZ MENINAS QUE MUDARAM O MUNDO — Os nazistas estão obrigando os judeus a usar uma estrela de Davi amarela — comentou Betsie, — mas não entendo por quê. Papai Ten Boom parecia seriíssimo. — Nem eu, mas fico temeroso por eles. Não se marcam pessoas assim, por nada. E ele tinha toda a razão. Na semana seguinte, Corrie ouviu dizer que soldados nazistas insultaram meninos judeus só porque usavam estrela amarela. Depois, ficou sabendo que os judeus seriam levados para a prisão. Mas o pior estava por vir. Um dia Corrie viu famílias inteiras sendo arrastadas para caminhões de carga e levadas embora. No íntimo, ela sabia que essas famílias judias jamais voltariam para casa. “Precioso Jesus”, orou Corrie naquela noite , “o que posso fazer por essas pessoas tão necessitadas de ajuda?”. Quando Corrie se deitou, lembrou-se de que Jesus era judeu e isso só fez aumentar sua vontade de ajudar. — Tive uma idéia — disse mamãe Ten Boom às filhas depois de assistir à partida de outro CORRIE TEN BOOM 165 carregamento de judeus. — Nossa casa é um lugar tão curioso. Tem escadas espirais, quartinhos, sótão e porão… Nollie, a outra irmã de Corrie, interrompeu. — Estava pensando a mesma coisa. Podíamos esconder judeus aqui! Corrie e Betsie se entreolharam. — É como se fosse um labirinto — acrescentou Betsie. — Costumávamos brincar de esconde-esconde quando éramos pequenas e às vezes levava séculos para uma encontrar a outra! O coração de Corrie disparou. — Será que Deus quer que eu faça isso? — pensou. A família Ten Boom começou a fazer planos. Instalaram uma campainha no andar de cima para que, se algum nazista entrasse na oficina com a intenção de revistar a casa, quem estivesse na loja pudesse avisar a família e os judeus lá abrigados. Eles teriam apenas dois minutos para se enfiar num dos esconderijos. 166 DEZ MENINAS QUE MUDARAM O MUNDO — Uma coisa me preocupa — desabafou Nollie quando os preparativos estavam quase prontos. — Será que as crianças vão conseguir ficar em silêncio se tiverem de se esconder no porão ou no sótão? A poeira pode fazê-las espirrar. De repente, todos na sala ficaram apreensivos, exceto Corrie. — Sim — disse com firmeza. — As crianças vão ficar em silêncio e não vão espirrar. — De onde vem tanta certeza? — perguntou Betsie. — Quando éramos crianças — recordou Corrie —, ficávamos quietinhas como um camundongo enquanto papai consertava os relógios. Quando sentíamos vontade de espirrar, sempre dávamos um jeito de segurar. Muitos judeus foram salvos graças à família Ten Boom, mas houve momentos de verdadeiro apuro. Um dia toda a família e vários “hóspedes” estavam sentados à mesa da cozinha, quando de repente um limpador de janelas subiu na escada e, sem mais nem menos, começou a limpar o lado de fora do vitrô. Um dos judeus pensou rápido: CORRIE TEN BOOM 167 — Comecem a cantar “Parabéns a Você” — sugeriu baixinho. — Ele vai achar que é uma festa. E assim fizeram. Todos cantaram “Parabéns” para o papai Ten Boom e nunca ficaram sabendo se o limpador de janelas havia ido à casa errada ou se era um espião. Mas os nazistas acabaram descobrindo a “fortaleza”, e os Ten Boom foram detidos, tiveram de se separar e foram levados para a prisão. Parecia que demorava séculos até saberem notícias um do outro. Um dia Corrie recebeu uma mensagem codificada dizendo que não se preocupasse, todos os relógios estavam seguros no armário. Ela entendeu as entrelinhas. Os judeus escondidos em sua casa no dia da batida conseguiram escapar em segurança, Corrie vibrou de emoção e rendeu graças ao Senhor. Mas a próxima notícia partiulhe o coração. Papai Ten Boom havia morrido. — Vistam-se e arrumem suas coisas! — berraram os guardas logo cedo. Os prisioneiros se entreolharam com um misto de esperança e pavor. Corrie orou enquanto se debatia em meio às roupas. 168 DEZ MENINAS QUE MUDARAM O MUNDO Os guardas arrebanharam os prisioneiros em ônibus e furgões do lado de fora do campo. Não demorou muito para descobrirem que não seriam libertos nem mandados de volta para casa. Os ônibus e os furgões se enfileiraram ao lado da estação ferroviária, e os prisioneiros iam sendo arrastados para fora feito animais. Foi aí que aconteceu. Corrie viu Betsie! Ela se aproximou lenta e sorrateiramente da irmã, sem chamar a atenção dos guardas, e as duas se grudaram uma à outra. Apesar do alvoroço dos demais prisioneiros, Betsie conseguia ouvir Corrie dizer “Louvado seja Deus! Louvado seja Deus!”. Quando os vagões de carga pararam na plataforma, homens, mulheres e crianças foram socados para dentro dos compartimentos e, como sardinha em lata, apertavam-se uns contra os outros. Corrie e Betsie se deram o braço e continuaram juntas. E choraram juntas também, principalmente quando se recordavam do papai Ten Boom. — Eles estão nos levando para a Alemanha! — gritou um senhor. — Vamos passar perto de casa no caminho. CORRIE TEN BOOM 169 — O que farão conosco? O que farão com nossos filhos? — lamuriou uma senhora. — Nenhum de nós vai voltar vivo da Alemanha — disse alguém com voz pesarosa. E todos concordaram. — Preciso ir ao banheiro — choramingou uma criança. Houve um súbito silêncio no vagão. E a voz triste de uma mãe respondia à filha: — Sinto muito, você vai ter de fazer aqui mesmo. E todos no vagão esperavam chegar à Alemanha antes que precisassem ir ao banheiro e tivessem de fazer ali mesmo também. Corrie e Betsie foram levadas para Ravensbrück, um dos mais conhecidos campos de concentração de Hitler. Lá foram tratadas como animais. Todo dia tinham de se enfileirar nuas diante dos guardas, mesmo que a temperatura fosse das mais baixas. Os guardas de Ravensbrück não conheciam piedade. Certo dia, Corrie disse à irmã: — Não faço a menor idéia de quantas pessoas estão aqui.