Radiodifusão no Brasil: entre o serviço e o - Portal RP
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Radiodifusão no Brasil: entre o serviço e o - Portal RP
SERVIÇO PÚBLICO E INTERESSE PÚBLICO NAS COMUNICAÇÕES SUZY DOS SANTOS* [email protected] ÉRICO DA SILVEIRA** [email protected] Esta análise é parte de uma pesquisa mais abrangente sobre “As bases normativas de um novo modelo institucional para a comunicação social eletrônica brasileira”, realizada no Laboratório de Políticas de Comunicação do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade de Brasília. O propósito deste texto é contribuir para o esclarecimento de certa confusão estabelecida nas comunicações sobre o significado e o uso dos conceitos de Serviço Público e Interesse Público. Fato é que o mercado trabalhos acadêmicos, ou mesmo as legislações do setor não são precisos na delimitação do conceito de Serviço Público e usam, ora um termo, ora outro, sem respeitar sua distinção. Distinguí-los é uma necessidade para progredir na compreensão da natureza da comunicação em cada modelo. Para tanto, cumprimos três raciocínios complementares para garantir a resposta da natureza dos serviços em comunicação. A primeira trilha de raciocínio busca uma categorização do serviço de comunicação a partir do papel escolhido pelo Estado para oferecer aquele serviço à sociedade que representa. Deriva-se daí o segundo raciocínio deste trabalho, em que optamos por investigar dois processos contextualizados desta modalidade de serviço. A investigação culmina na aplicação das categorias aos modelos de comunicação comparados. A última interrogação persegue o significado de Serviço Público, originado no direito administrativo e desdobra-se sobre o campo da comunicação. Completa-se assim a investigação que estabelece como conceitos diferentes o Serviço Público de Comunicação do Serviço de Interesse Público de Comunicação. Palavras-chave: Radiodifusão, Serviço Público, Interesse Público. * Doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Facom/UFBA, Pesquisadora Residente no LapcomFAC-UnB com bolsa da Fundação Ford e apoio à pesquisa do CNPq. ** Mestre em Comunicação pela Fac/UnB, Pesquisador Residente no Lapcom-FAC-UnB com bolsa da Fundação Ford. O PAPEL DO ESTADO NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES Ao se olhar para o conjunto de leis e instituições que regulamentam as comunicações, se tem a impressão de uma estrutura complexa, repleta de normas específicas, causando confusão pelo volume de regras, leis e funções das instituições envolvidas. Junta-se a essa estrutura truncada as mudanças tecnológicas, implicando novos regulamentos, redefinindo necessidades públicas, reinventando serviços, misturando os meios de comunicação no que se cunhou como ‘convergência’ e confundindo ainda mais uma reflexão já complicada. Isto se já não bastassem as diferentes interpretações de diversos países, cada qual com uma visão da função que as comunicações devem desempenhar na sociedade, aumentando ainda mais a discussão, desdobrando-se em estudos comparados que multiplicam as alternativas de modelos de gestão para o setor. A saída para se estudar este campo, que se transforma ao sabor da política, do mercado e das inovações tecnológicas, não poderia ser outra senão um estudo dos princípios que definem o papel das comunicações na sociedade, a natureza do serviço prestado pelas instituições de comunicação, e o caminho escolhido parte da forma de participação do Estado, protagonista natural no processo de estudos de políticas. A discussão conceitual acerca da natureza dos serviços de comunicações não é de modo algum uma exclusividade do momento atual. Ela está presente em cada inovação que o setor sofreu, sofre e sofrerá. Por exemplo, na primeira regulamentação do rádio ou no surgimento da televisão, discussões levantavam os temas de segurança, soberania nacional, liberdade de expressão. Em toda inovação do setor, o questionamento da natureza do serviço se faz presente, instrumentando o embate de forças econômicas e políticas, culminando num contexto normativo reformulado. Como propôs Thomas Kuhn (1998), até a consolidação de um paradigma, em qualquer campo de estudo, há um embate de idéias, mas também de forças sociais, políticas e econômicas que culminam na prevalência de uma corrente. Se isto se mostra verdadeiro para uma ciência natural, mais se pode esperar das ciências humanas, principalmente em um campo intimamente ligado à política e ao poder. É justo, pois, que argumentos levantados anteriormente à consolidação de modelos e por hora adormecidos, possam ser resgatados a fim de esclarecer seus fundamentos. Assim se justifica este debate hoje, quando todas as mudanças sofridas pelas comunicações no seu processo de digitalização trazem de volta as mesmas discussões da época da Marconi Company e as primeiras regulamentações do rádio, na década de 20. 2 Tanto o rádio quanto, posteriormente, a televisão, tiveram papel fundamental não apenas na criação de uma indústria totalmente nova, a Indústria Cultural1, como também na divulgação da convicção de que era indissolúvel o casamento entre eficiência tecnológica e os valores morais de justiça, igualdade e bem público (Mosco, 1996 : 34). No entanto, este casamento, por ser ‘arranjado’, não reflete a felicidade ‘até que a morte os separe’: Whenever access to the communications and information resources required for full citizenship depends upon purchasing power (as expressed directly through customer payments or indirectly through the unequal distribution of advertising subsidies to production), substantial inequalities are generated that undermine the nominal universality of citizenship (Golding; Murdock, 1997b : 1042). Os serviços de comunicações, no que se refere ao provimento de conteúdo (radiodifusão) e o tráfego de informações (telefonia/transmissão de dados), cresceram e foram regulados sob lógicas e instâncias normativas distintas (Garnham, 1991; 1996; Richeri, 1995). As diferentes naturezas dos serviços fizeram com que a telefonia fosse regulada prioritariamente em relação à distribuição/transporte de informações e a radiodifusão em relação ao conteúdo. Os serviços de telefonia e transmissão de dados se consagraram historicamente como monopólio estatal, exceto nos EUA, e sua estrutura regulatória foi desenvolvida em relação à estrutura física, com base em três princípios genéricos: a) acesso universal (common carriage); b) interconexão; e, c) controle de preços (tarifas não discriminatórias). Encarado como questão estratégica nas políticas de desenvolvimento do século XX, o controle destes serviços era regido especialmente por um enfoque geopolítico e de segurança do Estado. O conteúdo das transmissões era considerado uma transação privada e jamais foi controlado, salvo em períodos de guerra ou convulsão social. 1 É importante ressaltar que, antes do rádio e da televisão, também o cinema, a indústria fonográfica e a indústria editorial gráfica (comics, fotonovelas, revistas femininas etc.) já ensaiavam a formação desta Indústria Cultural. A relevância do rádio e da televisão neste processo dá-se pelo intenso processo de mercantilização e estandardização destes meios. Sobre estes processos ver ADORNO; HORKHEIMER (1985); GARNHAM (1990); MIÈGE (1989); FLICHY (1996). 2 A referência da primeira publicação do texto é: MURDOCK, Graham; GOLDING, Peter. Information poverty and political inequality: citizenship in the Age of Privatized Communications. Journal of Communication. n. 39, v. 3, 1989, p. 180-195. Utilizamos aqui a versão apresentada no segundo volume da coletânea The Political Economy of Media, editada, em 1997, pelos mesmos autores. p. 100-115. 3 Na radiodifusão, tanto a distribuição quanto o conteúdo eram controlados pelos Estados fosse nos modelos público/estatal ou comercial. Esta regulação incluía critérios culturais e econômicos, além dos políticos, estando baseada em princípios diversos das telecomunicações e mais próximos à lógica aplicada anteriormente à imprensa. Como sustenta Othon Jambeiro: Histórica e universalmente, os sistemas regulatórios desenvolvidos para governar a indústria da TV têm derivado diretamente dos instrumentos legais e aparatos burocráticos que os estados-nações criaram para tratar com a Imprensa. Na medida em que novas tecnologias deram origem a novos meios de comunicação de massa - o cinema, depois o rádio, em seguida a TV - aqueles instrumentos e aparatos foram consequentemente adaptados, muitas vezes para permitir que se pudesse continuar a policiar e controlar a mídia. Os sistemas regulatórios evoluíram em seguida para evitar danos morais, regular a relação trabalhista entre empregados e proprietários dos meios, prevenir excessiva concentração de poder, licenciar freqüências de rádio e TV, e - particularmente nas democracias liberais da Europa ocidental e nos Estados Unidos - garantir formas de competição econômica suficiente para frustrar o estabelecimento de monopólios (1997 : 148). Apesar das distinções no mercado e na natureza da regulação, estes serviços usualmente estão incluídos dentro de um setor único, genericamente chamado de comunicações, no qual o Estado assume as funções de proprietário, promotor ou regulador. Ainda segundo Jambeiro, Ele é Estado Proprietário, no que se refere, por exemplo, à bibliotecas, centros de documentação, ao espectro eletromagnético e às emissoras de rádio e TV que explora diretamente. É também Estado Promotor, porque traça as estratégias públicas para o desenvolvimento do setor, faz inversões de infra-estrutura, e concede incentivos e subvenções. E, finalmente, é Estado Regulador, na sua função de fixar regras claras de instalação e operação, que eliminem as incertezas e desequilíbrios" (Jambeiro, 2000 : 23). Alguns autores, como Alejandro Piscitelli (1995), consideram que o interesse central do Estado na radiodifusão está embutido na natureza educacional/cultural dos serviços. O período que este autor classifica como paleotelevisão, tomando emprestada aquela elaborada por Umberto Eco, está baseado num contexto de comunicação pedagógica no qual os ouvintes de rádio e telespectadores de televisão cumprem o papel de alunos. O objetivo destes meios seria a transmissão de conhecimentos dirigidos. Esta capacidade ‘doutrinária’ da radiodifusão seria responsável pelo interesse em torná-la disponível às massas e também pelo forte controle do setor. Próximo desta linha de raciocínio está o livro Elogio do Grande Público, de Dominique Wolton (1996). O autor traça um paralelo entre o uso massivo do rádio nos governos nazistas e fascistas para explicar as características nacionalistas, o modelo de Serviço Público com controle/propriedade estatal e o domínio de uma função de democratização cultural na radiodifusão. 4 Dessa forma, a radiodifusão, na primeira metade deste século, servia como uma espécie de curinga no baralho da acumulação fordista. No campo político, favorecia a difusão da ideologia capitalista, a mobilização e a formação de opinião pública buscando manter um consenso social. Já no campo econômico, estes serviços alavancavam a acumulação capitalista ajudando a criar um mercado para os equipamentos de recepção e funcionando como poderosos instrumentos de marketing para os bens de consumo de massas (Garnham, 1991, p.68). A regulamentação, portanto, está condicionada a promover uma infra-estrutura unificada que venha a atingir três objetivos básicos: a) assegurar a demanda de aparelhos de rádio e televisão; b) ajudar a criar audiências massivas essenciais ao marketing fordista; e, c) proporcionar um meio para a mobilização política das massas e para a formação da opinião pública. O acesso direto ao ambiente doméstico permitia, assim, a solução do que Garnham considera uma das potenciais contradições do fordismo: o estabelecimento das relações fordistas de produção e o boom do consumo doméstico e familiar, constituíam uma tendência de esvaziamento das formas tradicionais de organização e mobilização social e política. Para o autor, esse modelo estava fundamentado num equilíbrio entre três processos associativos: a) uma aliança entre o Estado e o consumidor nacional da indústria eletroeletrônica, suposta através do desenvolvimento das infra-estruturas da radiodifusão e da recepção; b) uma aliança entre o Estado e o setor coletivo de assinantes (indústrias fordistas), suposta através da mobilização de fontes de financiamento da programação; e, c) a articulação e mobilização da legitimidade política da indústria de televisão que dependia do Estado para obter acesso ao espectro eletromagnético (p. 69). Visando estes interesses, o chamado Estado Fordista, adotou as posições de proprietário, promotor ou regulador para garantir a existência de um mercado e um desenvolvimento estável no setor. Sob outro ponto de vista, a própria natureza da radiodifusão aponta para quatro razões centrais para o estreito controle estatal (François, 1990: 551-553): a) a propriedade pública das ondas radioelétricas; b) a reduzida quantidade de freqüências; 5 c) o argumento das “diferenças midiáticas”, baseado na idéia de que o conteúdo do rádio e da televisão são intrusivos na esfera doméstica; d) o conceito fiduciário, no qual se pressupõe que a licença é uma espécie de “empréstimo em confiança” do espaço público. Newman, McKnight e Solomon (1998:26-28)3 definiram um quadro (figura 1) que pretende a discussão dos princípios norteadores de qualquer modelo de regulação de telecomunicações (e que obviamente pode ser aproveitado para classificar a radiodifusão) quanto ao papel do Estado e do setor privado, classificando-os em quatro modelos tradicionais. (O quinto modelo do quadro é mais uma proposta que um modelo que exista em algum país ou outro contexto). Figura 1: Five regulatory traditions Paradigm Public ownership Common carriage Open infrastructure Public trustee Laissez-faire communication Public role Ownership and management of monopoly system Heavy regulation of entry, exit, tariff and management procedures Regulation focused on maintenance of competition and espectrum alocation Light regulation of procedure, initial regulation of entry Minimal regulation of business practice Private role Manufacturing only Ownership and management of monopoly system Ownership and management of competitive system Ownership and management of quase-competitive system Ownership and management; level of competition not determined Public ownership seria o modelo Estatal, onde o papel do Estado abrange a propriedade e a gestão de um monopólio do setor. Este modelo representa a grande maioria dos sistemas de telecomunicações ou comunicações do mundo, pelo menos até meados da década de 90. O papel do setor privado, neste modelo está apenas na manufatura, de aparelhos televisores ou telefônicos, por exemplo. Outro modelo, definido pelos autores, é conhecido como Common Carriage e tem a característica de uma regulamentação completa das atividades de comunicação pelo Estado em regime de monopólio. Difere do modelo anterior, porque cabe, neste, ao setor privado a propriedade do sistema de comunicação. Este sistema é um monopólio que o Estado arbitra a natureza do serviço, suas tarifas, garante o acesso universal e define e fiscaliza as empresas 3 A classificação desenvolvida no livro é uma gradação que pretende compreender todas as possibilidades de participação do estado e do mercado em qualquer modelo de comunicação. 6 que participarão do monopólio na garantia do cumprimento do Serviço Público designado pelo Estado. Estes modelos monopolistas são sustentados pela noção de monopólio natural, que defende que a natureza do serviço de comunicação, pelo alto custo de construção e manutenção da infra-estrutura da rede e a necessidade de interoperabilidade não justificam a construção de um sistema concorrente, por ser mais oneroso para a sociedade. Central a este modelo é a questão da garantia de acesso universal. Este sistema predominou os países europeus, que hoje avançam sua transição a um modelo concorrencial. Public Trustee é o modelo derivado da radiodifusão americana. O papel do Estado está na definição do fiducitário, concedendo licenças em confiança e definindo alguns aspectos do serviço. O setor privado é o proprietário e o gestor das comunicações em um sistema de competição limitada. O conceito que sustenta essa limitação reside na escassez de espectro para radiodifusão, exigindo a presença do Estado na organização, concedendo licenças, selecionando os Trustees dentro do número limitado de concessões que o Estado pode oferecer. O Public Trustee é a entidade física e/ou jurídica, dependendo do país, que recebe sua porção do espectro em confiança do Estado com o compromisso de cumprir algumas determinações em defesa do Interesse Público. Esta definição é essencial para este estudo. Laissez-Faire é a denominação dada pelos autores ao regime de competição livre onde o Estado pouco interfere, com regulamentação mínima sobre o negócio, deixando que a livre competição garanta a qualidade do serviço. Os defensores deste ponto de vista argumentam que liberdade de expressão é garantida pela exclusão quase completa do Estado do processo. O modelo apresentado pelos autores denominado Open Communication Infrastructure, definido pela ação do Estado na manutenção da competição e na alocação de espectro e o papel do setor privado estaria na propriedade e na gestão em regime competitivo, não é um modelo tradicional de comunicação, mas sim uma proposta dentro do modelo competitivo de caráter liberal, bem de acordo com a visão dos autores. Como este modelo é apenas uma idealização dos autores, uma proposta, não nos serve para o estudo dos princípios dos modelos de comunicação existentes. Embora sejam de extrema valia em termos didáticos, estes esquemas carecem de um olhar mais amplo acerca da organização das sociedades capitalistas avançadas. Tomando conceitos disponíveis na teoria política e sociológica, Vincent Mosco (1988 : 108-113) 7 desenha um quadro explicativo, fortemente baseado em Niklas Luhmann e Daniel Bell4, acerca dos mecanismos de forças sociais em conflito e das operações que transformam estes mecanismos em formas de governança (figura 2). Inicialmente, apresenta quatro modos de processamento das necessidades sociais: a) representação ou poder político; b) mercado ou poder monetário/cambial; c) controle social ou poder derivado da sociabilidade, valores culturais, normas etc; e, d) especialização ou poder baseado no conhecimento científico ou na detenção da informação. Estes modos de processamento desenvolvem outras quatro formas fundamentais de governança que, em certa medida, contextualizam o quadro de Newman, McKnight e Solomon, anteriormente abordado. São elas: Regulation, Competition, Expert Boards e Corporatism. Figura 2: Forms of governance for processing social claims in developed capitalist societies REPRESENTATION (Wide incorporation) Regulation Corporatism MARKET (Indirect) SOCIAL CONTROL (Direct) Competition Expert boards EXPERTISE (Narrow incorporation) 4 LUHMANN, Niklas. The Differentiation of Society. New York: Columbia University Press, 1982; e BELL, Daniel. The Cultural Contraditions of Capitalism. New York: Basic Books, 1976, apud Mosco, 1988: 108-113. 8 A forma de governança Regulation está vinculada a uma estrutura de mercado privado. Mosco exemplifica esta forma a partir da Federal Communications Commission estado-unidense que é responsável por representar o Interesse Público, levando em conta as necessidades daqueles que seriam naturalmente excluídos, ou teriam pouca voz, numa estrutura puramente mercadológica. Contudo, o FCC existe para garantir o bom funcionamento do mercado privado nas comunicações. Já a Private Competition é a forma mais amplamente discutida no ambiente que se refere ao tópico “comunicações”. Ela se refere ao ambiente no qual as opções tecnológicas, administrativas e de investimento são as mais apropriadas para se decidir o que produzir e como estruturar a distribuição de recursos. Mosco chama atenção para o fato de que, diferente do que se pode depreender numa leitura generalista, mercado não é um mecanismo auto-criador e auto-sustentável. Ao contrário, a questão chave da sua estrutura é justamente: quem cria e sustenta os mercados e para benefício de quem. Os Expert Boards configuram uma forma de governança baseada em princípios técnicos. Grupos de especialistas ou consultores de competência socialmente reconhecida que representariam uma ferramenta de ampliação do controle social. A forma Corporatism se refere a formas de governança que dão status de autoridade a indivíduos que representam componentes específicos na jogo de forças em questão. Por exemplo, representações sindicais, dos consumidores, dos diferentes negócios que compõem o setor. Naturalmente, por esta contextualização, Mosco está preocupado em retomar o papel central do Estado (e do ambiente político) num cenário no qual os discursos teóricos, em certos momentos, parecem rebaixar à categoria de coadjuvante. Nas palavras do autor: A fundamental premise of the discussion is that developed capitalim has no form for settling social claims that precludes state intervention. One can aknowledge degrees of state intervention within each mode, from low in a facilitative role to high in a directing capacity. But the state is involved in each form, including the market (1988 : 111-112). Na conclusão do artigo o autor resgata esta idéia em detrimento do papel central do ambiente econômico nas análises do setor: This article has been a modest effort, by no means Copernican, to suggest ways of accentuating the political in the political economy of telecommunications(...) Concretely, I have offered ways of expanding the discussion of policy issues beyond dichotomous thinking – to regulate or not to regulate – and ways of seeing the politics of policy that do justice to the central role of telecommunications in contemporary social life (1988 : 122). 9 A utilização destas classificações esclarece as possibilidades das ações do Estado praticadas pelos modelos de comunicação existentes e a contrapartida privada. Chamam atenção que a definição do papel que o Estado desempenha na gestão do modelo estabelece a natureza dos serviços de comunicações que uma sociedade se propõe, ou que a ela se impõe. A partir da classificação do papel do Estado, opta-se por simplificar os modelos em duas linhas básicas. Assim reduzidos, os modelos se classificam entre os que têm um serviço prestado pelo Estado, direta ou indiretamente, e os que têm o serviço prestado pela iniciativa privada. Procurando exemplos, chegamos à dualidade entre os modelos americano e europeu. No caso do europeu, devido a sua grande variedade, que vai do empreendimento estatal ao Serviço Público prestado indiretamente por entidade privada, escolhemos aquele que se destaca entre eles, pelo menos por tradição: o modelo britânico. O MODELO AMERICANO E O INTERESSE PÚBLICO O modelo americano tem suas raízes no livre mercado. Mesmo que os primeiros regulamentos e suas consequentes regulações colocassem que o espectro radiofônico era uma espécie de bem público, e mesmo sendo necessárias licenças dadas pelo governo federal para as radiodifusoras funcionarem, a radiodifusão americana era um empreendimento privado. Este é o grande ponto de contraste entre os Estados Unidos e a Europa, onde a radiodifusão foi tratada como bem público escasso e que deve ter a garantia de universalidade de acesso garantida pelo Estado (Hoynes, 1994). A idéia principal que sustenta o modelo americano para a radiodifusão nasce na Primeira Emenda (First Amendment), na liberdade de expressão. Nenhuma lei seria feita impedindo a liberdade de expressão. Porém, no caso da radiodifusão, a aplicação do princípio não poderia ser feita da mesma maneira que foi aplicada à imprensa escrita. Havia o entrave tecnológico: a escassez do espectro radiofônico somente permitia a existência conjunta e harmônica de um limitado número de emissoras. No início, a explosão do número de rádios gerou um caos no ar. Até meados de 1923, existiam 500 estações nos Estados Unidos, atingindo dois milhões de pessoas. Em 1924, o número cresceu para 1105 rádios, dividindo as mesmas 89 freqüências disponíveis. O cenário americano assustava os ingleses. Opiniões rechaçando o modelo americano eram 10 comuns, como a do pioneiro do rádio inglês, R. N. Vyvyan5, horrorizado com a falta de regulação, a interferência entre os sinais de rádio e a utilização massiva para fins publicitários. Se na Inglaterra o horror ao caos do modelo americano, a interferência de amadores nos serviços (que eram desenvolvidos pelo serviço postal britânico) e o caráter da utilização do espectro para fins de segurança, nortearam a escolha do modelo, nos Estados Unidos, a preocupação com a liberdade de expressão, juntamente com a explosão do negócio publicitário levaram o modelo para a direção oposta. Debates acerca da censura do novo meio eram comuns e a preocupação com o controle do Estado sobre a comunicação era central. Claro que também se falava na censura privada, aquela operada pelos próprios radiodifusores, mas esta era minimizada por seus defensores com dois argumentos: a multiplicidade de fontes e a opinião pública, ambas contribuiam como controle democrático. David Sarnoff, em nome da RCA, produtora de aparelhos de rádio, representava esse ponto de vista que minimizava o efeito do controle da comunicação pelos radiodifusores em relação à censura do governo e da regulação6. Porém, o ponto de vista da liberdade de expressão ainda encontrava o obstáculo da escassez do espectro. Como distinguir aqueles que seriam livres para utilizar o ar e aqueles que não seriam contemplados com as licenças? O dilema da liberdade de expressão e da escassez do espectro convencia até mesmo os mais liberais da urgência de alguma forma de regulação como uma necessidade tecnológica (Pool, 1983 : 122). Algum mecanismo precisava ser instaurado para que a concessão de licenças não ficasse livremente nas mãos do Estado, com decisão subjetivada de cada governante. A determinação do Radio Act of 1927 proibindo a censura por parte da Federal Radio Commission (a instituição que concedia as licenças, transformada em FCC em 1934) 5 Como narra Pool: “A characteristic attitude was expressed by one of Britain’s radio pioneers, R. N. Vyvyan: ‘[In the United States] newspapers and big retail stores soon saw that broadcasting offered a wonderful opportunity for addvertising their wares... ther was no regulations which fobade this... It did not matter whether one station were interfering with another...as ther was a boom in broadcasting, and everyone was going to get in on the aether By the middle of 1923 ther were over 500 broadcasteong stations in America and na audience of about 2 million. By 1924 the number was 1105, and the 89 wavelenghts available had to be shared by them; chaos in the aether was of course the result’ ” (1983 : 110). 6 “David Sarnoff countered that radio was becoming a major medium of opinion to which ‘the same principles that apply to freedom of the press should be made to apply.’He emphasized the danger of government censorship and minimized that of broadcaster controls. With over five hundred stations broadcasting to na estimated daily audience of tem million, there was no danger of anyone monopolizing what went out on ‘the vast reaches of the air.’The ‘real danger, he argued, was ín censorship, in over-regulation., Public opinion must be the test of what is broadcast” (Pool, 1983 : 120). 11 apareceu apenas com a observação de que o próprio poder de conceder licenças era, por si, um mecanismo de censura. É neste ponto do debate que surge o controvertido conceito do Interesse Público (Public Interest). O conceito surge como forma de reduzir a possibilidade de censura da comissão (e do governo, por conseqüência) e traduzir, em uma norma, o mecanismo de seleção de licenciados (Trustees)7. Restava (e ainda resta) a dificuldade de se interpretar o Interesse Público com propriedade. Apesar do conceito nunca ter sido claramente definido, alguns parâmetros foram se consolidando, tanto no discurso como na prática dos atores no modelo americano. Em 1928, a FRC publicava um documento de sete páginas no qual se definia o conceito de Interesse Público. Este documento, segundo a FRC, surgiu a partir da indicação do Radio Act, de 1927, de que a agência deveria organizar o mercado com a finalidade de garantir a igualdade no serviço de radiodifusão, tanto na transmissão quanto na recepção, partindo dos conceitos de interesse, conveniência ou necessidade pública. Após listar alguns critérios prioritários (qualidade técnica, distribuição justa dos diferentes tipos de serviço prestado, evitar duplicidade de programas e tipos de programação, evitar excesso de publicidade, dentre outros), a FRC concluía: Since the number of channels is limited and the number of persons desiring to broadcast is far greater than can be accommodated, the commission must determine from among the applicants before it which of them will, if licensed, best serve the public. In a measure, perhaps, all of them give more or less service. Those who give the least, however, must be sacrificed for those who give the most. The emphasis must be first and foremost on the interest, the convenience, and the necessity of the listening public, and not on the interest, convenience , or necessity of the individual broadcaster or the advertiser (Golding; Murdock, 1997b, p.2938). Outro documento, publicado em 1929, aponta que o Interesse Público requer a ampla exposição e competição de idéias opostas na radiodifusão: 7 “The Columbia Law Review made (...) the point: ‘The standard of ‘Public convenience and necessity’seems to afford a sufficiently effective device to guarantee the freedom of the air” (Pool, 1983 : 123). 8 A referência original deste texto é FEDERAL Radio Commission. Interpretation of the Public Interest: ‘statement made by the commission on august 23, 1928, relative to Public Interest, Convenience, or Necessity. [s.l.]: 2 FRC Ann. Rep. 166, 1928. In: KAHN, Frank J. (ed.). Documents of American Broadcasting. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, cap. 10, 3. ed.. p. 49-55. Utilizamos aqui a versão apresentada no segundo volume da coletânea The Political Economy of Media, editada por Peter Golding e Graham Murdock, p. 287-293. 12 [...] section 18 of the radio act of 1927, a broadcasting station is required to afford equal opportunities for use of the station to all candidates for a public office if it permits any of the candidates to use the station. It will be noticed, however, that in the same section it is provided that “no obligation is hereby imposed upon any licensee to allow the use of its station by any such candidate”. This is not only not inconsistent with, but on the contrary supports, the commission’s viewpoint. Again the emphasis is on the listening public, not on the sender of the message. It would not be fair, indeed it would not be good service to the public to allow a one-sided presentation of the political issues of a campaign […] the commission believes that the principle applies not only to addresses by political candidates but to all discussions of issues of importance to the public (Golding; Murdock, 1997b : 2962979). O ponto primeiro e importante é a preservação da liberdade de expressão, mantendo o governo fora do controle do conteúdo, como já foi colocado aqui. A liberdade de expressão é uma preocupação que busca evitar o monopólio da comunicação como mecanismo de poder. Seja monopólio do Estado ou seja ele um monopólio do mercado10. A Multiplicidade de vozes e consequentemente de conteúdo é a chave encontrada para se fugir ao monopólio e garantir o fundamento expresso na primeira emenda. A saída encontrada foi a pulverização do poder, com a dissolução de possíveis monopólios partindo de uma característica marcante da sociedade americana, seu espírito comunitário. O modelo seria orientado a conceder o acesso ao espectro de forma descentralizada, o que se convencionou chamar de localismo. A concessão de licenças locais pulverizou o poder e garantiu, até certo ponto, a multitude de vozes desejada (embora a concentração de propriedade tenha gradualmente pervertido o modelo original). O modelo americano do Interesse Público tem seus críticos. Patrícia Aufderheide (1998) pergunta: qual é o público que a regulação americana representa e a que interesses se refere? Se assume, a partir dos primórdios da comunicação e as regulações antimonopolistas, que o Interesse Público é a saúde econômica da sociedade capitalista 9 A referência original deste texto é Federal Radio Commission. The Great Lakes Statement: in the matter of the application of Great Lakes Broadcasting Co. FRC Docket n. 4900, 3 FRC Ann. Rep., 1929. In: KAHN, Frank J. (ed.). Documents of American Broadcasting. Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, cap. 10, 3. ed.. p. 56-62. Utilizamos aqui a versão apresentada no segundo volume da coletânea The Political Economy of Media, editada por Peter Golding e Graham Murdock, p. 294-300. 10 “This is what Secretary Hoover was referring to in 1924, when he boasted that under American policies, ‘radio activities are largely free. We will maintain them free – free of monopoly, free in program, and free in speech.’In 1926, Congressman Ervin Davis, citing Hoover, added: ‘we cannot allow any single person or group to place themselves in a position where they can censor the material which shall be broadcast to the public’ ” (Pool, 1983:136). 13 associada com a paz social e prosperidade11. Porém, o público vem cada vez mais sendo considerado uma aglomeração de consumidores ou de pontenciais consumidores12. O conceito de público deve abranger preocupações sociais e culturais, questões de acesso universal13, visões negligenciadas pelo modelo de financiamento publicitário. Um modelo baseado no financiamento da publicidade, com canais licenciados pelo governo em número limitado - o Interesse Público nem se coloca como Common carriage, nem como Laissez-faire, inventando uma categoria própria que chamamos de Public Trustee, anteriormente. Um modelo que valoriza a liberdade em relação ao Estado e está a ele atado pela concessão de licenças. Um modelo que valoriza a liberdade de expressão em relação ao setor privado, mas está a ele ligado pelo sistema de financiamento. Em um dos primeiros textos críticos sobre o modelo de comunicação de massa norteamericano, em 1973, Herbert I. Schiller mostrou que alguns destes conceitos da regulação aplicada nos EUA até então, poderiam ser percebidos como dispositivos de manipulação social. O autor discute cinco mitos centrais: a) o mito da individualidade e escolha pessoal, que tem a função de barrar a organização social coletiva através da visão de que os interesses individuais superam os interesses coletivos; b) o mito da neutralidade do estado como intermediário entre sociedade e mercado, que pressupõe a crença de que os governos em geral e as suas partes constituintes (os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário) são exclusivamente íntegros e apartidários; c) o mito da imutável natureza humana, que neutraliza questões políticas e econômicas a partir de imagens totalitárias sobre a natureza humana. Por exemplo, quando a programação televisiva mostra excessos de sensacionalismo, o faz porque é isso que o público quer ver. Desta forma, a empresa se exime de qualquer responsabilidade sobre toda influência social que possa ter; d) o mito da ausência de conflito social, que difunde uma imagem unificada e pacífica do ‘american way of life’; e, 11 “Who is the public that U.S,. policy represents, and what is its interests? It might be taken, as early communications and antitrust regulators took it, to be conterminous with the economic health of a capitalist society, associated with social peace and prosperity” (Aufderheide,1998 : 5). 12 “Another way to see the public is as na agglomeration of consumers, or potencial consumers” (Aufderheide,1998 : 5). 13 “There is also much in communication policy that reaches past traditional economic concerns, whether at the macro- or microlevel, and that reaches into social welfare considerations. Government regulators act as allies of and sometimes protectors of the weak and vulnerable in society (...) these policies ensure equality of access to a communication technology for everyone, no matter what is in their wallet or their pockets” (Aufderheide,1998 : 5). 14 e) o mito da pluralidade da mídia, baseado nos números de radiodifusores ou programas sem destinar importância às características de similaridade entre eles (Golding; Murdock, 1997a : 412-42614). A suposta perversão do conceito de Interesse Público tem sido apontada por diversos autores quando se referem à estreita vinculação dos interesses privados industriais ao processo de governança das comunicações nos EUA. Conforme aponta Horwitz: The most frequently cited general reason for the perversion of the public interest is the overidentification of the regulatory agency with the industry it regulates. Indeed, this is the most commom analysis of the regulation of broadcasting by the FCC. There are various explanations for this phenomenon, but most are “influence” models. They postulate that the regulated industries come to exercise (undue) influence on regulatory agencies (1989 : 27). Horwitz parece concordar com Schiller em relação ao fato de que se há um “desvio de conduta” na defesa do Interesse Público ele não está personalizado na FCC ou nos modos de processamento das disputas sociais, retomando Mosco (1988), mas é parte da contradição que o conceito carrega desde o berço liberal no qual foi produzido. O MODELO BRITÂNICO E O SERVIÇO PÚBLICO A lógica do modelo Britânico atribui maior responsabilidade ao Estado na prestação do serviço, aproximando seu sistema de comunicação ao Serviço Público. O conceito de Serviço Público é importante na observação do modelo britânico, que optou por um modelo misto, mais próximo à categoria de Common Carriage, ao criar uma autoridade independente para a radiodifusão: a British Broadcasting Corporation. A BBC, que representa originalmente o modelo inglês, obedece à lógica do serviço de utilidade pública15. O serviço de comunicação é um serviço a que todos os ingleses têm 14 A referência original deste texto é SCHILLER, Herbert I. Manipulation and the Packaged Consciouness. In: The mind managers. Boston : Beacon Press, cap. 1, 1973. p. 8-31, 192-193. Utilizamos aqui a versão apresentada no primeiro volume da coletânea The Political Economy of Media, editada por Peter Golding e Graham Murdock (412-437). 15 Segundo Cretella Junior (1989) acerca da natureza do Serviço Público, cabe compreender que quando o Estado permite que pessoas jurídicas de direito privado realizem serviços públicos, estes são tecnicamente chamados de Serviços de Utilidade Pública. “Os estabelecimentos de utilidade pública exercem também serviços públicos, mas serviços públicos impróprios; são determinados estabelecimentos, isto é, associações que são pessoas jurídicas de direito privado e que, no entanto, exercem serviços que interessam a uma grande quantidade de pessoas : os denominados serviços de utilidade pública.” Assim, Serviços de Utilidade Pública são os serviços públicos ou coletivos exercidos por pessoas jurídicas de direito privado, gozando estas corporações de benefícios legais. 15 direito de acesso e o modo que este serviço é garantido à sociedade se dá pelo Estado, que o define, tanto na forma de organização da rede, como na forma de financiamento, ficando, ao setor privado a prestação do serviço, sob encomenda e orçamento originados no mesmo Estado. O modelo inglês buscou uma instituição independente para garantir a isenção em relação ao Estado, para garantir o princípio da liberdade de expressão. A radiodifusão foi considerada pela Inglaterra como uma extensão dos serviços postais, tanto que Gluglielmo Marconi foi introduzido aos ingleses através do presidente do British Post Office da época, Sir William Preece (Pool, 1983 : 109). Amadores e empresas experimentavam o novo meio de comunicação, trocando informações, músicas e desenvolvendo o que viria a ser o rádio como hoje o conhecemos, dentre essas experiências, empresas como a Marconi Company. O serviço postal, juntamente com as forças armadas britânicas, acompanhavam o processo com a preocupação do controle e organização do Estado. Em 1920, quando uma transmissão de um programa de entretenimento interferiu nas comunicações de rádio de um avião que se perdeu no canal da Mancha, regulamentações restritivas foram impostas. Questões de segurança nacional, impunham uma organização do setor. As transmissões amadoras foram reduzidas a duas horas por dia, depois apenas a licenciados com comprovado interesse científico. Vários radiodifusores foram impedidos de transmitir. No começo, música não era permitido. Mas a pressão por uma utilização do serviço que a população inglesa pudesse usufruir foi o que levou a criação da BBC. Reivindicava-se o direito do povo britânico de saber o que acontece em seu ar, fazendo referência clara às ondas de rádio16. O cenário caótico e comercialista dos Estados Unidos, como já vimos, também contribuiu para que a Inglaterra rejeitasse o modelo privado e financiado por anúncios, seja pela desordem, seja pela desqualificação do conteúdo veiculado. Aqui chegamos no segundo argumento acerca da natureza do serviço pretendido pela Inglaterra. O primeiro, questão de segurança e ordem, vinculados ao papel de soberania, segurança e autoridade do Estado. O segundo, que a recente experiência americana no sistema de financiamento por publicidade não cumpria os interesses do serviço na divulgação cultural e no papel educativo. Nas 16 “The regulation were widely violated by amateurs, who repeatedly petitioned that every englishman is entitled to hear what is going on his aether” (Pool, 1983 : 110). 16 origens desse modelo está o vínculo direto da televisão e do rádio com a cultura, praticamente consagrados como um direito de todo inglês. Em toda a Europa, as comunicações foram colocadas como fomentadoras, ou pelo menos como extensões das atividades culturais e educativas. Assim foi criada a British Broadcasting Company, um monopólio, financiado por imposto recolhido no comércio dos aparelhos de rádio e mais tarde de televisão, controlado pelo estado e com a execução do serviço designada à iniciativa privada, num grupo de empresas que foram denominadas, à época, de Big Six. A BBC executaria o serviço, com relativa independência do governo, sem se preocupar com o financiamento, que seria garantido pelo Estado, através do fundo reservado da taxação da venda de aparelhos radiofônicos. As obrigações da BBC eram de promover a pluralidade cultural, com programas educativos, prestando um serviço entendido como de direito a todo o povo inglês. Mais tarde, a BBC foi transformada em corporação pública, em 1927, com a carta real que oficializa o contrato de prestação do serviço. O sistema inglês de televisão é dos mais complexos que se tem conhecimento, operando com uma estrutura mista de canais públicos e privados. Inicialmente, o modelo adotado foi o público; a BBC iniciou suas transmissões regulares no ano de 1936. Quatro anos depois, o serviço interrompia suas operações com o começo da Segunda Guerra Mundial. Na década de trinta, a programação da BBC era composta de eventos públicos, peças de teatro, ópera e cartoons infantis. Em 1939, o desenho Mickey Mouse estava sendo exibido no exato momento em que as transmissões televisivas foram interrompidas, por questões de segurança. Após quase sete anos fora do ar, em 8 de junho de 1946, este mesmo desenho marcou a volta das transmissões regulares da BBC reaberta para cobrir a Parada da Vitória (BBC History, 2000). Seis anos após o final da Guerra, o Partido Conservador assumiu o poder e optou por estabelecer um canal comercial para concorrer com a BBC. A decisão pelo estabelecimento de um segundo canal de televisão não significava que o Estado estava retirando poderes da BBC. Pelo contrário, o Partido Conservador via com bons olhos projetos como o de alfabetização de adultos, e estes estavam em total conformidade com a lógica do Estado de Bem-Estar Social que, neste período pós-guerra, estava se tornando hegemônico mundialmente. 17 Assim, também não é por acaso que o fim do período de exclusividade na operação de televisão da BBC coincide com o início da audiência massificada do veículo. Se em 1939 o público televisivo não passava de alguns milhares, em menos de uma década, após o retorno das operações, este público estava multiplicado e os costumes culturais começaram a mudar no Reino Unido. Um evento que marcou o início destas mudanças foi a coroação da rainha Elizabeth II, em 1953. Pela primeira vez na história, as portas da abadia de Westminster foram abertas para a transmissão ao vivo assistida por 20 milhões de súditos (BBC history : 2000). Paralelamente, o relatório de análise da imprensa entre os anos de 1947 e 1949, apresentado ao Parlamento pela autoridade Real, através da Royal Commission on the Press, trazia as indicações das funções sociais que deveriam ser aplicadas aos veículos de comunicação. Segundo o resumo elaborado por Peter Golding e Graham Murdock, a Comissão Real define que: 362. The democratic form of society demands of its members an active and intelligent participation in the affairs of their community, whether local or national. It assumes that they are sufficiently well informed about the issues of the day to be able to form the broad judgments required by an election, and to maintain between elections the vigilance necessary in those whose governors are servants and not their masters. More and more it demands also an alert and informed participation not only in purely political processes but also in the efforts of the community to adjust its social and economic life to increasingly complex circumstances (Golding; Murdock, 1997a : 15417). O artigo seguinte, n. 363, indica a responsabilidade da imprensa em atender estas necessidades e inclui o rádio, ainda que secundariamente, no mesmo estatuto. Na década seguinte, a televisão passou a integrar este processo regulatório. A partir do Television Act, em 1954, o sistema dual foi implantado para garantir a competição entre canais de naturezas distintas, pública e privada. Em 1954, com a aprovação do Independent Broadcasting Act e a inserção de um canal de televisão comercial, inicia-se o período de duopólio, que duraria trinta e cinco anos. O Reino Unido adaptava-se aos novos tempos, aos poucos e à sua maneira. Em 22 de setembro de 1955 nascia a ITV (Independent Television), o primeiro canal concorrente da BBC; em 1957, a Rainha transmitia pela primeira vez sua mensagem de Natal e, neste mesmo ano, o chamado Toddlers' Truce, que impunha uma hora de interrupção nas 17 A referência original deste texto é HMSO for exerpts. Royal Commission on the Press 1947-1949. Cmnd. 7700. Utilizamos aqui a versão apresentada no primeiro volume da coletânea The Political Economy of Media, editada por Peter Golding e Graham Murdock (p. 154-164). 18 transmissões entre as 18 e 19 horas para que os pais levassem as crianças para a cama, foi extinto. Aliado aos preceitos de forte controle da mídia no capitalismo fordista, o precoce aparecimento da televisão comercial na Inglaterra, se comparado com os demais países da Europa Ocidental, fez com que o controle sobre o sistema televisivo fosse muito rígido. As empresas produtoras de programas eram escolhidas pela autoridade de controle, e seus contratos não seriam renovados se fosse verificado um resultado negativo dos programas contratados. Outra disposição adicional requeria que uma 'proporção adequada' dos programas fossem de origem britânica, o que impedia o predomínio da programação americana. Não se podia incluir nos programas nada que fosse lesivo ao bom gosto e à decência ou suscetível de fomentar ou incitar ao delito ou conduzir à desordem ou ofender a sensibilidade do público. Alguns anos depois, a BBC manifestou a aceitação voluntária de tais princípios de boa conduta. A regulamentação inglesa, com o passar do tempo, organizou-se de acordo com as tecnologias de distribuição de conteúdo. Segundo Forgan e Tambini (2000), as regras foram, aos poucos, sendo elaboradas para atender às expectativas dos consumidores de acordo com suas diferentes finalidades. Até pouco tempo coexistiam diferentes regras de conteúdo para as televisões, o rádio e a indústria cinematográfica compostas por instrumentos legais diversos que incluem exigências estatutárias diretas, poderes compulsórios dados a um regulador, exigências das franquias ou licenças e códigos de conduta regulamentares ou arbitrários. De acordo com os autores, o neoliberalismo e a larga ampliação do volume das produções televisivas foram responsáveis por um deslocamento no sistema de regulamentação britânico. Com as normas tradicionalmente estabelecidas para a radiodifusão - especialmente a televisão aberta - o governo exercia um controle prévio do conteúdo a ser exibido. Com a expansão tecnológica do setor, cada vez mais, firmou-se um sistema de controle governamental pós-transmissão, baseado nas reclamações dos telespectadores, e, paralelamente, foram surgindo instâncias de auto-regulamentação do setor, baseadas na competitividade do mercado (Forgan e Tambini, 2000 : 03). Podemos dividir os serviços de televisão, em funcionamento na Inglaterra, em três categorias genéricas: 1) a televisão aberta, subdivida em cinco canais públicos, privados e mistos; 2) a televisão por assinatura (cabo e satélite); e, 3) as televisões por Internet. A partir deste cenário intenso, formou-se um complexo sistema de regulamentação composto por 19 órgãos reguladores e códigos de conduta cujas funções se perderam na fragmentação ou na sobreposição como pode ser observado no quadro a seguir. Figura 3: Órgãos Reguladores em relação ao conteúdo televisivo até 2003 Órgão BBC Board of Governors British Board of Film Classification (BBFC) Broadcasting Standards Commission (BSC) Independent Television Commission (ITC) Office of Fair Trading (OFT) Office of Telecommunications (OFTEL) Radiocommunications Agency Principais funções em relação ao conteúdo TV • Conselho de gestão da BBC, responsável pelo cumprimento das exigências para o Serviço Público, pela garantia da independência em relação ao governo, pelas políticas e estratégias de ação, por monitorar a performance dos canais e das reclamações de telespectadores, e, por garantir a transparências destes processos. • Auto-regulamentadora. • Elabora relatórios periódicos das reclamações. • Elabora códigos de conduta editorial para produtores independentes e para a BBC Internacional. • Agência independente, não governamental, criada pela indústria cinematográfica, em 1912. • Classifica filmes, vídeos, jogos interativos e todo o material de divulgação referente a estes produtos. • Agência independente, financiada pelo governo e pelas empresas de comunicação, cujo objetivo é fiscalizar o cumprimento dos Broadcasting Acts. • Monitora e tem poder de negociação com os canais para as reclamações dos consumidores de televisão pública e privada, aberta e por assinatura tanto em relação à programação quanto à publicidade. • Elabora relatórios anuais para os outros órgãos reguladores. • Elabora códigos de conduta. • Responsável pelas pesquisas oficiais sobre recepção televisiva. • Não tem poder de sanção. • Agência governamental que regula e controla as licenças de todos os serviços de televisão privados, abertos ou por assinatura, nacionais ou internacionais recebidos no Reino Unido. • Elabora códigos de conduta (ITC Programme Codes) sobre a programação, publicidade e patrocínios veiculados na televisão comercial. • Tem poder de sanção, desde advertências até a cassação das licenças. • Agência independente para a regulação e proteção ao bom funcionamento do mercado. • Atua como uma entidade de proteção ao consumidor para compras feitas por telefone, Internet, televisão digital etc. • Agência independente da indústria das telecomunicações. • Monitora todas as licenças de telecomunicações e a qualidade técnica de distribuição de serviços como video-ondemand, cabodifusão, satélites, etc. • Agência executiva do Departamento de Comércio e Indústria. • Formula as políticas públicas para o espectro eletromagnético. 20 Welsh Fourth Channel Authority • Conselho de gestão dos canais públicos do País de Gales, responsável pelo cumprimento das exigências para o Serviço Público, pela garantia da independência em relação ao governo, pelas políticas e estratégias de ação, por monitorar a performance dos canais e das reclamações de telespectadores, e, por garantir a transparências destes processos. • Auto-regulamentadora. • Elabora relatórios periódicos das reclamações, guias de conduta editorial para produtores independentes. Em dezembro de 2000, o governo inglês publicou um documento com as propostas para a unificação da regulação do setor de comunicações em uma única agência intitulado The Communications White Paper - A new future for communications. Este documento propunha a criação de uma agência independente, a Office of Communications, que agruparia as funções da BSC, do OFTEL, da ITC, da Radio Authority e da Radiocommunications Agency. Depois de quatro anos de preparação, a Office of Communications começou a operar em 2003 agregando cinco organismos anteriormente consolidados. São eles: 1) a BSC, Broadcasting Standards Commission; 2) a ITC, Independent Television Commission; 3) o OFTEL, Office of Telecomunications; 4) a Radiocommunications Agency; e, por fim, 5) a Radio Authority. Também o conceito de Serviço Público foi se degradando no ambiente britânico. Segundo Graham Murdock, nas sociedades capitalistas modernas, o papel das comunicações está em conectar o sistema produtivo, baseado na propriedade privada, ao sistema político que pressupõe uma cidadania cuja participação social efetiva depende, em partes, do acesso à maior gama possível de informação (Golding; Murdock, 1997a : 31118). O problema estaria em equacionar como um sistema de comunicações dominado pela propriedade privada poderia garantir a diversidade de informação requerida para uma cidadania efetiva. Contudo, a interconexão definida por Murdock permite apenas um retrato panorâmico do conceito de Interesse Público que justificou hegemonicamente o controle prévio dos 18 A referência da primeira publicação do texto é: MURDOCK, Graham. Redrawing the Map of the Communication Industries : concentration and ownership in the Era of Privatization. In: FERGUSON, Marjorie (Ed.). Public Communication. The new imperatives: future directions for media research. Londres: Sage, 1990, cap. 1. p. 1-15. Utilizamos aqui a versão apresentada no primeiro volume da coletânea The Political Economy of Media, editada, em 1997, por Peter Golding e pelo próprio Graham Murdock (p. 308-323). 21 conteúdos pelo Estado na regulação tradicional das comunicações19. Naturalmente, sabe-se que as diversas formas de aplicação de conceitos no capitalismo são passíveis de questionamentos, como apontam John Keane (Golding; Murdock, 1997b : 621-66720) e James Curran (Golding; Murdock, 1997b : 64-9921). Pode-se dizer que o sistema britânico foi o modelo que melhor garantiu o status de Serviço Público com múltiplos instrumentos de proteção aos interesses dos consumidores. CONSIDERAÇÕES FINAIS Cabe agora voltarmos à essência do conceito de Serviço Público, presente na noção de universalidade do modelo britânico. O que significa dizer que um serviço é público? O primeiro ponto que surge é o conceito de relevância à coletividade, mas que ainda é pouco para diferenciá-lo da definição de Interesse Público. Não há um Serviço Público por natureza. Segundo Grotti: A qualificação de uma dada atividade como Serviço Público remete ao plano da escolha política, que pode estar fixada na Constituição do país, na lei, na jurisprudência e nos costumes vigentes em um dado momento. Deflui-se, portanto, que não há um Serviço Público por natureza (GROTTI, 2002 : 45). Existem, porém, razões que levam o Estado a conduzir determinado serviço para a área pública. Dentre elas: “retirar da especulação privada setores delicados; realizar a justiça social; suprir carência da iniciativa privada; favorecer o progresso técnico, ordenar o aproveitamento de recursos finitos (como os hidroelétricos); controlar a utilização de materiais perigosos (como potenciais nucleares); favorecer o rápido desenvolvimento nacional; manter a unidade do país e assim por diante” (GROTTI, 2002 : 45). É verdade que nem todas estas razões se aproximam dos serviços de comunicações, mas alguns pontos são bastante afins, como é o caso do aproveitamento de recursos finitos 19 Othon Jambeiro enumera sete funções que historicamente justificaram a intervenção estatal no processo regulatório: a) assegurar a liberdade de informação; b) proteger a propriedade intelectual; c) regular o intercâmbio de serviços; d) regular as comunicações de massa; e) regular as telecomunicações; f) regular a indústria e os serviços de informação; e, g) garantir o acesso público às informações que sejam essenciais ao exercício da cidadania (2000 : 22-23). 20 A referência original deste texto é KEANE, John. Public Service Media? In: The media and democracy. Cambridge: Polity Press, 1991, p. 116-162. Utilizamos aqui a versão apresentada no segundo volume da coletânea The Political Economy of Media, editada por Peter Golding e Graham Murdock. 21 A referência original deste texto é CURRAN, James. Capitalism and Control of the Press, 1800-1975. In: CURRAN, James; GUREVITCH, Michael; WOLLACOTT, Janet (eds.). Mass communication and society. [s.l.]: Edward Arnold/Open University Press, 1977, cap. 8, p. 195-230. Utilizamos aqui a versão apresentada no segundo volume da coletânea The Political Economy of Media, editada por Peter Golding e Graham Murdock. 22 (que pode se aplicar à questão do espectro) e do favorecimento do progresso técnico, muito importante para um setor que tem como seu suporte a tecnologia. Manter a unidade nacional também passa pelos serviços de comunicações e ainda a questão da justiça social que está diretamente ligada ao conceito de universalização. As comunicações, portanto, contêm em suas características princípios que podem levar um Estado a colocá-laa no rol dos serviços públicos. Mas ser conceituado como Serviço Público, não exclui a possibilidade da existência privada na prestação de um serviço. Existindo assim a classificação de Serviço Público privativo e não-privativo do Estado (GROTTI, 2002 : 47). Se um serviço não é, por natureza, público, ainda assim ele tem, em sua natureza alguns princípios, como os elencados por Grotti. Dependência governamental (…), igualdade dos particulares perante todos os serviços públicos, a continuidade de seu funcionamento e a adaptação ou modificação em todo momento de sua organização; além da regularidade, generalidade, obrigatoriedade, generalidade, obrigatoriedade de prestação, neutralidade, cortesia, gratuidade, legalidade, isonomia, eficiência, transferência, segurança, qualidade,modicidade nas tarifas, pontualidade, responsabilidade, conforto (2002 : 48). Conceitos que diferem um pouco de abordagem a abordagem, mas que mantém um conjunto de propriedades semelhantes às listadas acima. O Serviço Público não privativo do Estado seria aquele que poderia ser cumprido pela iniciativa privada, sob autorização, permissão ou concessão, conceituação jurídica que não é necessário aqui delimitar. Basta, ao nosso estudo, a compreensão que o Serviço Público compreende uma série de características, como as elencadas acima e pode ser explorado de maneiras flexíveis, entre o Estado e a iniciativa privada, conforme vimos. A natureza dos serviços de comunicações, verificada nos modelos consagrados (americano e europeu), está assim classificada e dividida em duas categorias, tanto em seus princípios, como no breve relato da maneira como foram estabelecidos os modelos historicamente. A compreensão do que significa dizer Interesse Público ou Serviço Público, então, implica toda a discussão de modelos destacada neste estudo. A partir desta comparação, que metodologicamente centraliza o ponto de vista no papel do Estado, espera-se que ao se utilizar os termos Serviço Público ou Interesse Público para as Comunicações, não haja sinonímia possível. Se a escolha terminológica é por Interesse Público, fica claro que são as condições, omissas ou expressas, para a cessão do espectro à exploração de negócio privado. Ao se usar o termo Serviço Público, claramente se 23 refere à obrigatoriedade do Estado em garantir um direito aos cidadãos que representa, seja direta ou indiretamente. A melhor compreensão desses conceitos adventícios e de seus limites, podem balizar uma futura análise das políticas de comunicação no Brasil com relação ao que seja o modo de prestação dos serviços de radiodifusão aberta. É mister examinar a configuração legal no nosso ambiente para esclarecer a natureza conceitual do sistema brasileiro. Nossa hipótese inicial, para um próximo trabalho, é a de que o que existe no Brasil é uma espécie de “meio do caminho” entre o conceito clássico de Serviço Público – tal como originário na regulamentação britânica – e o conceito mais elástico de interesse, necessidade e conveniência pública originário da regulamentação dos Estados Unidos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACTS OF PARLIAMENT. The Broadcasting Act legislation.hmso.gov.uk/acts/acts1990/Ukpga_19900042_en_1.htm _____________. The Broadcasting legislation.hmso.gov.uk/acts/acts1996/1996055.htm Act 1990. 1996. http://www.ukhttp://www.uk- AUFDERHEIDE, Patricia. Cable Television and the Public Interest. Journal of Communication. Vol. 42, número 1, winter 1992. Oxford: Oxford University Press. _____________. Communication Policy and the Public Interest: The Telecommunication Act of 1996. Guilford Press, 1999. BBC. History. (2000) <http://www.bbc.co.uk/thenandnow/history>. BBFC (British Board of Film Classification). 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