VALÉRIA HERNADES COTEGIPE

Transcrição

VALÉRIA HERNADES COTEGIPE
Prof. Oscar Cirne Neto
Perícias Judiciais
Pareceres Médico-Legais
1
PARECER MÉDICO PERICIAL.
Preâmbulo.
Aos dezessete dias do mês de março do ano 2005, o
Perito Dr. OSCAR LUIZ DE LIMA E CIRNE NETO, designado pelo
Exmo. Sr. Desembargador relator da 84ª Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro, para proceder a parecer médico
pericial nos Autos do processo N.º: 2004.003.652570-3, em
Eufrásia HERNADES COTEGIPE, onde consta como Apelante
Laboratòrios do Continnente S/A. e/ Outro, descrevendo com
verdade e com todas as circunstâncias, o que vir, descobrir e
observar, bem como responder aos quesitos das partes. Estiveram
presentes para discutir o fato técnico no consultório deste
parecerista, o Ilustre Assistente Técnico da Autora, Dr. Affonso H.
Morais, farmacêutico e, como Assistente Técnico do 1º Réu. Dra.
Desedith De Queiroz CRM 52-332324-4. Em conseqüência, passa ao
exame pericial solicitado, as investigações que julgou necessárias, as
quais findas, passa a declarar:
Prolegômenos.
Trata-se o presente processo de discutir a realização de
um exame de laboratório, solicitado a título de triagem para
admissão da Autora, na prestação de Serviço Militar Voluntário
como médica veterinária do Ministério do Exército.
Os exames solicitados e, portanto, necessários para que a
Autora fosse considerada apta, encontram-se discriminados em um
impresso padronizado (fls. 26) dentre os quais há a solicitação de
um exame descrito como “SOROLOGIA PARA LUES”.
Ou seja, exige-se uma investigação laboratorial aleatória
da sífilis. O método de investigação laboratorial desta doença, não se
encontra definido no impresso do Ministério do Exército.
Os exames foram solicitados pelo Dr. Armando Flores
através do convênio UNIMED, colhidos em 24/10/01 e liberados
para avaliação do médico em 27/10/01 (fls. 23).
Neste exame, encontra-se o resultado motivo da presente
lide:
Reação do VDRL ------------------------------- Não Reagente;
Imunofluorescência para LUES (FTA- Abs) ----- Reagente.
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2
Ao receber o resultado do exame e entendendo-o positivo
para sífilis procurou a Dra. E. de Pinto de Muniz e, não a
encontrando, outro profissional fez o diagnóstico de sífilis.
Finalmente localizada a Dra. E., esta solicitou uma nova
coleta de exames, que foram realizados em outro laboratório, colhida
a nova amostra de sangue em 6/11/2001.
Cujo resultado foi:
Reação quantitativa de VDRL: Não reagente.
Treponema (FTA-Abs), anticorpo (IgG) não reagente;
Treponema (FTA-Abs), anticorpo (IgM) não reagente;
Discussão.
Trata-se de um processo de Responsabilidade Civil, por
alegado erro de laboratório.
Antes de enfrentarmos o cerne da questão, devemos
esclarecer ao Judicante sobre algumas questões de natureza médica.
A Sífilis, também chamada de Lues, outrora conhecida
como peste sexual, doença gálica, sifilose, doença britânica, doença
venérea, foi a precursora da moderna dermatologia já que, na
França do séc. XIX, a cadeira era de Dermatologie e Sfiligraphie.
É uma doença de certo risco, pois apresenta caráter
sistêmico. Isto é, difunde-se por todo organismo.
O agente causador da sífilis é uma bactéria, do gênero
espiroqueta (tem forma de saca-rolhas), chamada de Treponema
pallidum. É adquirida através da prática do sexo vaginal, anal ou
oral com pessoa contaminada, além de transfusão de sangue
contaminado. Também pode ser transmitida da mãe grávida e
contaminada para o seu feto.
A doença apresenta três fases distintas de evolução:
primária, secundária e terciária. No estágio inicial, denominada fase
primária, a doença é diagnosticada pelo surgimento de feridas
indolores com bordas altas, nítidas e endurecidas, denominadas
cancro duro ou cancro sifilítico na região genital, que também
podem aparecer em outros locais do corpo.
Esses sintomas desaparecem, mesmo sem o devido
tratamento médico, dando a impressão de falsa cura. Exatamente aí
reside seu grande perigo, pois a infecção sifilítica continua presente.
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Quando não devidamente tratada, de uma semana a seis
meses, após a manifestação dos sintomas evidenciados na fase
primária, a doença evolui para fase secundária.
Nesta fase, onde surgem os sintomas de febre,
inflamação da garganta (faringite), gânglios em várias regiões do
corpo, perda de cabelo, perda de peso, perda de apetite e erupções
cutâneas de aspecto avermelhado ou arroxeado, principalmente nas
palmas das mãos e plantas dos pés, denominadas roséolas
sifilíticas.
Também aparecem como lesões úmidas nas áreas
genitais que são muito contagiosas. Esses sintomas duram de três a
seis meses e também desaparecem.
O terceiro estágio da doença, também conhecido como
sífilis tardia, cujos sinais podem aparecer de dois a três anos após o
contágio, caracteriza-se pelo aparecimento de sérias doenças
cardiovasculares, cerebrais e da medula espinhal (neuro-sífilis),
olhos e em outros órgãos.
Nesta etapa, a pessoa infectada pela doença passa a
apresentar paralisias, insanidade, cegueira e até mesmo a morte.
Apesar de curável nesta fase, a sífilis deixará seqüelas para sempre.
Depois da AIDS, a sífilis é hoje a doença sexualmente
transmissível de maior prevalência em nosso meio.
A sífilis pode comprometer múltiplos órgãos: a pele, os
olhos, os ossos, o sistema cardiovascular e o sistema nervoso. Se
não tratada, pode até levar à morte.
Diagnóstico sorológico de Sífilis:
Os testes diagnósticos de sífilis são divididos em dois
grandes grupos principais de exames: os testes treponêmicos e os
testes não treponêmicos.
1) Testes Não Treponêmicos:
Nestes exames o que se usa é uma proteína chamada
cardiolipina, que atuam como antígeno.
Os mais usados são:
-
VDRL ( Venereal Disease Research Laboratory)
-
RPR (Rapid Plasma Reagin)
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Estes testes tornam-se positivos a partir da quarta ou da
quinta semana após o contágio. São testes quantitativos, fornecendo
resultados em titulagem (titulações seriadas ½, ¼,.........).
Constituem preferencialmente testes de rastreamento e
seguimento terapêutico.
Estes testes, por vezes podem apresentar-se falsamente
positivos e a causa principal, desta positividade falsa, divide-se em
duas categorias:
a) transitórias (permanecem positivos por menos
de 6 meses):
- Mononucleose
- Leptospirose
- Toxicômanos
- Tuberculose
- Endocardite
- Vacinações
- Gravidez
- Malária Aguda
- Viroses
b) persistentes (permanecem positivos por mais de
6 meses):
- Doenças auto-imunes (Lupus Sistêmico)
-Doença hepática crônica
- Malignidade (câncer)
- Síndrome Anti-fosfolipídica
- Uso de drogas endovenosas
- Infecção pelo HIV
- Hanseníase (Lepra)
- Mieloma
- Idade Avançada
- Múltiplas Transfusões
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Normalmente esses resultados falso positivos apresentam
uma titulagem baixa, por exemplo, menor que 1/8.
Testes Treponêmicos:
Estes testes têm uma especificidade muito maior que os
anteriores e utilizam o treponema como antígeno, detectando
anticorpos contra o agente etiológico da Sífilis.
São eles:
a) FTA-ABS (Fluorescent Treponema Antibody Absortion) –
teste de imunofluorescência indireta.
É frequentemente avaliado nas frações:
-IgM (infecção recente e em atividade, negativandose num tempo variável);
-IgG (mantém-se positiva permanentemente, não
sendo utilizada para controle terapêutico de cura da
infecção).
b) TPHA (Treponema
hemaglutinação passiva;
Pallidum
Microaglutinação)
c) ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay);
Estes testes que utilizam o treponema como antígeno,
têm maior especificidade e por isto, maior chance de corresponder a
verdade sorológica do paciente.
Em geral positivam-se a partir da terceira semana de
infecção concomitante ao aparecimento do cancro duro (lesão
primária da sífilis, ou seja, lesão dermatológica presente na sífilis
recente).
São reativos em 85% dos pacientes com sífilis primária,
em 99% na sífilis secundária e em pelo menos 95% na tardia; podem
ser os únicos testes sorológicos positivos na doença cardiovascular
ou neurológica.
Os testes tendem a permanecer positivos por toda a vida,
porém, 10 a 15% dos pacientes, podem se negativar em 2 ou 3 anos,
e, por isso não são usados para monitorar a cura do paciente, pois
podem permanecer positivos mesmo após a ela.
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Mas apesar da alta especificidade, há relatos de
reações falso positivas em 2% da população normal, para o
FTA-Abs e nos seguintes casos:
 Lepra
 Malária
 Mononucleose infecciosa
 Leptospirose
 Lúpus Eritematoso Sistêmico
 Doença de Lyme
A reação de hemaglutinação é também considerada teste
confirmatório. Resultados falso-positivos são relatados em diferentes
patologias. Sua sensibilidade é similar ao do FTA-ABS.
Portanto, todas as reações sorológicas para sífilis
dependem do perfil imunológico do examinado e, em todas elas,
existe sem nenhuma dúvida a possibilidade de falso positivo.
Chamamos de falso positivo, a reação laboratorial que
sugere uma patologia, que não se vem a confirmar em avaliações
posteriores e/ou que é incompatível com as manifestações clínicas o
paciente.
Certo é que não cabe hoje discutir, se a paciente tinha ou
não a patologia sífilis. Creio que para todos ficou demonstrado
inclusive para ela, pelo fato ser médica veterinária, que se trata de
uma reação falso positiva.
Mas qual teria sido a causa?
Argumenta com sabedoria o Assistente Técnico da Autora
que uma das fases da reação poderia ter sido “pulada”, ou seja,
poderia não ter sido realizada. Tal hipótese, perfeitamente viável,
seria de difícil comprovação mesmo no dia seguinte da execução da
reação.
Uma outra hipótese seria uma sensibilização prévia da
paciente pelo agente etiológico de alguma das patologias que podem
falsamente, positivar o teste sem que isto represente, uma falha
técnica de processamento do exame, um aparelho descalibrado ou
algo assim.
Ressalto que a situação clínica definida como “VDRL
negativo e FTA-Abs Reagente”, também como sabiamente evidenciou
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o assistente técnico da Autora, pode ocorrer em três situações
clínicas reais, quais sejam:
1)
No paciente que tinha sífilis
corretamente (cicatriz imunológica);
e
foi
2)
Em casos de infecção recente (sífilis primária);
3)
Em casos de infecção terciária;
tratado
Dai à necessidade da indicação correta do exame e da
presença no rastreamento, de um médico assistente, que não se
limite a pedir exames, mas que ouça a história do paciente e
examine este paciente. Ou seja, esteja evidentemente envolvido
no processo de detecção de uma doença.
Entendemos nós que a prevenção da evolução das
enfermidades ou execução de procedimentos diagnósticos e
tratamento destas patologias, são atos privativos dos médicos que,
portanto, tem de estar envolvido em todas as etapas do
procedimento diagnóstico.
Assim, além de conhecer o paciente em um sentido
amplo e do ponto de vista da profissão, examine detalhadamente
este paciente e, ao formular uma hipótese diagnóstica, solicite com
critério técnico um exame complementar (laboratório, Raios-X e etc.)
para elucidar a hipótese diagnóstica que formulou.
Exames de laboratório sempre são vistos pela medicina,
como procedimentos complementares aos diagnósticos e, não se
pode transferir ao laboratório, a responsabilidade de definir a
doença, fazendo o diagnóstico no lugar pelo médico.
Temos aqui, uma situação freqüente, mas, quase
absurda. Os exames foram aleatoriamente solicitados pelo exército,
sem nenhuma base clínica ou técnica, possivelmente para fins de
triagem.
Chamamos de triagem os exames realizados em grandes
populações, para definir um número de pacientes sadios e outros
que merecem investigação diagnóstica.
Como tal os exames de triagem são solicitados sem
história e sem exame dos pacientes, sendo o exame solicitado foi
sorologia para Lues e, a escolha do método VDRL e FTA-Abs, através
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do convênio UNIMED, competiu ao Dr. Armando Flores, pois para o
Exército qualquer método serviria.
Nenhuma informação temos, sobre a relação profissional
entre o Dr. Armando e a paciente.
Também desconhecemos o porquê destes exames não
terem sido apresentados a ele que os solicitou.
No mesmo diapasão não há dados sobre o critério técnico
que levou o Dr. Armando Flores a pedir o FTA–Abs e o VDRL, se
para o Exército, qualquer um dos dois serviria.
Igualmente não há informações sobre a não solicitação
dos perfis quantitativos das imunoglobulinas (IgG e IgM) pelo Dr.
Armando Flores, o que seria lógico, tanto que assim procedeu a Dra.
Elizabeth mais tarde.
Portanto pelo que temos de informação, fica configurado
que temos um exame mal indicado, solicitado sem base clínica ou
técnica e equivocadamente interpretado pela Autora.
Persistindo no equívoco de interpretação, segundo a
inicial, haveria pelo menos um outro profissional médico, que ao que
parece, sem nenhum vínculo com a paciente, sem conhecer a sua
história pessoal, sexual ou qualquer dado sobre ela, emitiu um
“diagnóstico” sem base técnica (fls. 3, peça exordial), limitado ao
exame de laboratório.
Igualmente pelo que nos reporta a inicial, sequer foi por
este profissional considerada a hipótese de um falso positivo, o que
sugere pouca familiaridade com o exame que interpretava.
Criteriosa foi à ginecologista da Autora, Dra. Elizabeth,
que avaliando o resultado do exame e conhecendo a sua paciente,
inclusive a história sexual, prontamente identificou que os exames
não eram coerentes com os dados que possuía, pedindo
imediatamente a sua repetição e a complementação com a
verificação das imunoglobulinas, o que já deveria ter sido pedido no
primeiro exame, uma vez decidido realizar o teste FTA-Abs.
Rotular a Autora como portadora de sífilis não atende a
qualquer juízo lógico, mas nos parece, que quem apressadamente
rotulou a Autora como portadora desta doença, não observou os
critérios necessários para um correto diagnóstico.
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Chamou-nos, no entanto, a atenção o fato de a Autora
ser médica veterinária.
Uma das possibilidades da positivação falsa do teste
FTA-Abs, está exatamente na doença de Lyme.
A doença de Lyme é causada por uma bactéria (Borrelia
burgdorferi) do mesmo gênero do treponema, pois ambas são
espiroquetas.
Esta bactéria é transmitida pela picada de uma espécie
de carrapato muito comum na América do Norte, mas do qual já há
vários relatos no Brasil.
Não estou dizendo que a Autora é portadora de doença de
Lyme, mas na profissão que abraçou (medicina veterinária),
certamente está mais exposta a picadas de carrapatos e outros
vetores de zoonoses que outros profissionais.
Tendo questionado o Assistente Técnico da Autora, sobre
a possibilidade de outras bactérias transmitidas por picadas de
carrapato e outros artrópodes poderem sensibilizar o teste aqui
discutido (FTA-Abs), ainda que transitoriamente, ele nos relatou não
possuir qualquer informação a respeito.
Ao final, gostaríamos de informar que reações que
dependem de perfil imunológico, são sempre reações sujeitas a
imperfeições, pois o perfil imunológico de uma pessoa varia com o
passar dos dias.
Desta maneira, o exame de hemaglutinação passiva, feito
pelo banco de sangue e, datado de 5 de setembro 2001, sendo
realizado por outro método e face ao lapso de tempo decorrido, não
tem nenhum compromisso com o estado imunológico da paciente em
24 de outubro de 2001.
Da mesma forma o exame repetido, 15 dias depois,
também não tem compromisso com a realidade da paciente em
outubro, principalmente se considerarmos que foi feito em outro
laboratório, e assim, não pode refletir com segurança o que no
organismo havia, principalmente em se tratando de perfil
imunológico, 15 dias antes.
Por fim, abordo os questionamentos do Autor através de
seu assistente técnico quanto do descumprimento de obrigação de
re-convocar o paciente e, aplicabilidade da norma contida no site
www.anvisa.gov.br/divulga/public/sangue/hemovigilância/manual_
doença.pdf.
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Equivocadamente o Ilustre A. Técnico do Autor traz para
fazer prova de que o Réu descumpriu uma obrigação legal, uma
norma técnica de 2004, quando os fatos se deram em 2001.
Igualmente esta norma disciplina os serviços de banco de
sangue (hemoterapia) e não de laboratórios de análises clínicas.
Portanto a norma da Anvisa (Agencia Nacional de
Vigilância Sanitária) trazida à discussão não tem qualquer
aplicabilidade nos fatos motivos desta lide.
Conclusão.
A autora foi submetida a um rastreamento de triagem
sorológica sem qualquer indicação lógica do ponto de vista
clínico sendo que o Ministério do Exército não especificou o
método que preferia.
O rastreamento por dois métodos (um deles
incompleto), foi decidido por um médico que solicitou os
exames, sendo que estes exames são apresentados para
interpretação a um outro médico, que não conhecia a Autora,
tendo este médico feito o diagnóstico de sífilis para a paciente.
Reavaliada a situação pela médica assistente, que não
havia solicitado os exames, estes exames foram repetidos e não
foram compatíveis com a existência passada ou presente da
doença Sífilis.
Considerando a hipótese de que 2% da população
mundial pode apresentar, positividade para este exame, sem
qualquer patologia aparente e, considerando que há situações
clínicas que transitoriamente podem positivar o exame;
Considerando também a possibilidade de que picadas
de carrapatos, podem ocasionar uma doença que positiva a
reação estudada e, a profissão da Autora (médica veterinária),
entendemos que se trata de um exame falso positivo, atrelada a
uma das variantes imprevisíveis dos exames que trabalham com
perfil imunológico.
Pelos dados que existem nos autos, não é possível
firmar o diagnóstico de Sífilis passada ou presente, na Autora.
Resposta aos quesitos:
Da Autora. (Fls. 267-269).
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Devido ao extenso enunciado das assertivas a serem
avaliadas deixamos de transcrevê-las.
1)
O Perito concorda? Ou seja, ratifica a afirmação acima? Caso
contrário explique (fundamente suas razões);
R: Sim;
2)
O Perito concorda? Ou seja, ratifica esta afirmação? Caso
contrário explique (fundamente suas razões);
R: Sim, para fins de diagnóstico;
3)
Existem erros conceituais nestas afirmações acima citadas
(Fls. 79/80)? O que justificaria a presença destas afirmações
na
defesa
do
Laboratório
Réu?
Justifique/fundamente/explique;
R: Sim; não me cabe dizer o porquê o laboratório utilizou desta ou
daquela forma estes conceitos;
O resultado FTA-Abs reagente no caso em questão, pode ser
explicado por um erro na técnica, mais especificamente na
etapa de absorção? Justifique suas razões;
R: Sim; bem como pelo menos mais três situações clínicas como já
exemplificado no corpo do Laudo;
4)
O Perito concorda? Ou seja, ratifica estas 3 informações
acima? Caso contrário explique (fundamente suas razões);
R: Sim;
5)
6)
Segundo o “manual técnico para investigação de transmissão de
doenças pelo sangue / Ministério da Saúde, Agência Nacional de
Vigilância Sanitária. – Brasília: Ministério da Saúde, 2004” – O
PACIENTE DEVERÁ SER ESCLARECIDO, EM QUALQUER SITUAÇÃO?
6.1- E, ainda, o serviço ou o profissional de saúde tem a
responsabilidade de, se necessário, emitir atestado explicando o
fenômeno e a inexistência de doença ativa;
R: Trata-se de legislação posterior ao evento e referente a serviços
de hemoterapia e, portanto imprestáveis para o presente caso;
07) O que o Sr. faria se fosse o responsável técnico frente a este
resultado
apresentado?
Ou
qual
o
procedimento
correto/adequado/indicado que deveria ter sido pelo laboratório;
R: Prejudicado;
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08) Ao passar pelo responsável técnico do Laboratório, este laudo
deveria gerar estranheza? Explique (fundamente suas razões);
R: Não; existem situações clínicas em que estes resultados podem
aparecer como muito bem descritos na pergunta de n.º 5 e o
laboratório não possui a história completa do paciente;
09) E o Paciente deveria ser contactado para coleta de uma nova
amostra e repetição do teste;
R: Não encontramos legislação da época e nem atual que
obrigasse ao laboratório a proceder como argumentado;
10) A liberação do Laudo sem o devido esclarecimento da paciente
pode ser explicada pela possível presença de Assinatura
eletrônica;
R: Prejudicado; não encontramos legislação que verse sobre o
assunto;
Do 1º Réu. (Fls. 255-258).
1. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos esclarecer se
existe teste laboratorial 100% (cem por cento) seguro quanto
ao seu resultado;
R: Não; infelizmente não existe;
2. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar qual
significado, em medicina laboratorial, da aceitação de um teste
como “padrão ouro”;
R: Em medicina padrão ouro significa o que hoje é considerado o
melhor para este caso, seja sob o ponto de vista diagnóstico, ou
terapêutico;
3. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se um
determinado teste, a partir do momento em que é taxado como
“padrão ouro” pela ciência médica, pode ser considerado imune
à ocorrência de resultados desconformes;
R: Não, infelizmente não;
4. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se estes
resultados não esperados podem ser atribuídos a conduta
omissiva/comissiva do médico responsável pelo exame, ou se,
ao revés disso, são da própria natureza da atividade;
R: Ambas as possibilidades são corretas;
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5. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar, em
complemento ao quesito anterior, se é atualmente viável às
pessoas que exercem a atividade de medicina laboratorial, o
comprometimento com o resultado inquestionável do laudo, ou
se, ao revés disso, diversas variáveis endógenas e exógenas
podem interferir na evolução da análise;
R: Sim; variáveis endógenas e exógenas podem interferir em
resultado de exames principalmente quando se fala de perfis
imunológicos;
6. Considerando que o objetivo desta perícia é investigar eventual
falha do Laboratório na liberação de resultado falso-positivo
para Sífilis, queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos
informar, com base no laudo laboratorial de fl. 23, quais foram
os métodos utilizados pela Apelante para a pesquisa;
R: Já descrito no corpo do Laudo;
7. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se,
dentro da cadeia de investigação diagnóstica, referidos
métodos podem ser classificados como preliminares;
R: Só o VDRL;
8. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se o
valor preditivo positivo de um teste preliminar tem seu
percentual aumentado nos casos em que a solicitação ocorre
sem que haja real suspeita de contaminação. Queiram
esclarecer o que é “valor preditivo positivo” de um teste;
R: Nenhum exame complementar deveria ser pedido em
descompasso com pesquisa de diagnóstico, salvo em triagens
populacionais e o índice de falsos positivos deve ser maior;
9. Considerando
que o dano alegado pela Apelada advém
especificamente do fato de o resultado da pesquisa por
imunofluorescência indireta (FTA-ABS) ter sido reativo (fl. 23),
queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se esta
positividade pode ser considerada como um indicativo
inequívoco de contaminação atual pela Sífilis. Para esta
resposta, pede-se considerar como “atual” a data de expedição
do exame de Fl. 23;
R: Não;
10. Sobre esta mesma investigação (FTA-ABS), queiram os Srs.
Perito e Assistentes Técnicos informar se alguma das
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literaturas médicas transcritas
impropriedade técnica:
abaixo
contém
gritante
“existem relatos de reações falso-positivas em 2% da
população normal em pacientes com lúpus eritematoso
sistêmico, durante a gravidez, na lepra, mononucleose,
leptospirose, artrite reumatóide, cirrose biliar primária e
doenças associadas à produção de globulinas anormais”
(“Index Bronstein” / editores Mário Bronstein, Maria
Christina Cruz – Rio de Janeiro: Sextante. 2001; p. 349)
“a interpretação dos resultados FTA no CSF (fluido
cerebroespinhal) não é claramente definida. Podem ocorrer
resultados falso-positivos, particularmente se a amostra
não for absorvida antes do teste. Os Centros de Controle de
Doenças recomendam VDRL” (Laboratórios de Pesquisas de
Doenças Venéreas para o fluido cerebroespinhal, de forma a
auxiliarem no estabelecimento do diagnóstico da neurosífilis Imunologia e Sorologia; p. 394).
“podem ocorrer resultados falso positivos em algumas
situações, como: hanseníase, malária, mononucleose,
leptospirose, lúpus eritematoso sistêmico” (“MANUAL DE
DST
–
SÍFILIS”;
Ministério
da
Saúde;
www.aids.gov.br/assistencia/mandst99/man_sifilis.htm).
R: Não há impropriedades científicas;
11.
Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar
qual procedimento complementar deve ser adotado para
formação de um diagnóstico seguro quanto à contaminação da
Apelada pela Sífilis, nas hipóteses em que há fortes indícios de
um resultado falso-positivo. Queiram esclarecer a quem cabe a
iniciativa de requisitá-lo;
R: Repetição do exame imediatamente após a toma de
conhecimento do resultado; cabe ao médico assistente requisita-lo;
12.
Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se
a manifestação clínica tem papel importante na investigação
da efetividade desta patologia, esclarecendo se há
PREVALÊNCIA desta sobre o laudo de exames laboratoriais
preliminares;
R: Sim; há um aforismo médico muito antigo que reza: “ A CLÍNICA É
SOBERANA”;
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13. Caso a resposta ao quesito anterior seja positiva, queiram os
Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar se há nos autos
documentos e/ou declarações que indiquem que a Apelada
apresentava sinais clínicos de contágio pela Sífilis;
R: Não há dados nos autos que permitam qualquer conclusão
diagnóstica fundamentada;
14. Sendo negativa a resposta ao quesito acima, queiram os Srs.
Perito e Assistentes Técnicos informar se seria prudente
acreditar na existência da patologia, diante de um quadro
apresentado
pela
paciente
de
reatividade
para
imunofluorescência indireta, não-reatividade para reação de
VDRL, ausência de manifestação clínica e anamnese não
sugestiva. Para este último atributo, queiram os srs. Perito e
Assistentes Técnicos considerar a declaração da própria
Apelada de fl. 2, segundo a qual “participa ativamente de uma
Igreja Evangélica [Batista] desde os 4 (quatro) anos de idade.
Não tem relações sexuais, nunca fez transfusão de sangue”,
esclarecendo se efetivamente se trata de anamnese não
sugestiva para uma doença sexualmente transmissível (DST);
R: As declarações da Autora são incompatíveis com uma possível
infecção por sífilis;
15.
Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar
se, em casos como esses, a prática adotada pelos médicos
assistentes é solicitar a repetição do exame. Queriam
esclarecer, principalmente com base nos documentos de fls.
24/25 juntados pela própria Apelada, se há indícios
suficientes de que esta solicitação tenha sido feita no caso em
tela;
R: Sim;
16.
Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar a
quem cabe fazer referida solicitação, se ao médico assistente
ou ao laboratório. Queiram esclarecer quem é a pessoa mais
indicada para interpretar um laudo laboratorial;
R: Ao Médico Assistente cabe solicitar exames; laboratórios não
pedem exames eles os realizam;
17.
Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar de
quem é a responsabilidade pela formação de diagnóstico do
paciente;
R: Do médico Assistente;
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18.
Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos, com base
no conhecimento técnico acerca da matéria e amparados pelos
documentos e declarações insertas nos autos, informar se há
nos autos qualquer documento expedido pelo Laboratório ora
Apelante que permita diagnosticar, com segurança, a Apelada
como portadora de Sífilis em 27/10/2001;
R: Não;
19. Queiram os Srs. Perito e Assistentes Técnicos informar tudo o
mais o que considerem importante para esclarecer o ocorrido;
R: Veja o inteiro teor do Laudo;
É o parecer.
--------------------------------------------Oscar Luiz de Lima e Cirne Neto
CRM 52 32 861-0
Referências Bibliográficas:
1- Tavares Walter, Marinho LAC. Rotinas de Diagnóstico e
Tratamento das Doenças Infecciosas e Parasitárias.1ª Edição.
São Paulo: Atheneu 2004. p. 941-964.
2- Centers for Diseases Control and prevention (CDC). Sexually
Transmitted Diseases Treatment Guidelines 2002. MMWR –
Morb Mortal Wkly Rep 2002;51 (RR-6).
3- Santos Junior MFQ. Sífilis. In: Veronesi R, Focaccia R (ed).
Tratado de Infectologia. 2ª ed. São Paulo: Atheneu 2002
4- Soares Flores JMR et al. Métodos Diagnósticos. 1ª ed. Porto
Alegre : Artmed 2002. p. 597-600.
5- Wallace, J. Interpretation of diagnostic tests. 7ª ed. Lippincott
Wilkins, 2000.
6- Batista RS et al. Medicina Tropical: Abordagem atual das
doenças infecciosas e parasitárias. 1ª ed. Rio de Janeiro:
Cultura Médica, 2001.p. 571-578.
7- Schettini AP Mel al. Sífilis simulando Hanseníase BoderlineTuberculóide: Interfaces quanto ao contexto Histórico, Clínico
e de Saúde Pública. Jornal Brasileiro de Doenças Sexualmente
Transmissíveis 16(1): 67-72, 2004.
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8- Andriolo
Adagmar. Medicina Laboratorial, in Guias de
Medicina Ambulatorial e Hospitalar. 1ª Edição. São Paulo:
Manole 2005. p.159.
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