Dissertao Juliana Fernandes Moreira
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Dissertao Juliana Fernandes Moreira
UIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA/ UIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESEVOLVIMETO E MEIO AMBIETE JULIAA FERADES MOREIRA LEGISLAÇÃO AMBIETAL E COFLITOS SÓCIO-AMBIETAIS: o caso da atividade de carcinicultura na APA da Barra do Rio Mamanguape- PB João Pessoa – PB 2008 JULIAA FERADES MOREIRA LEGISLAÇÃO AMBIETAL E COFLITOS SÓCIO-AMBIETAIS: o caso da atividade de carcinicultura na APA da Barra do Rio Mamanguape- PB Orientadora: Profª Drª Maristela Oliveira de Andrade João Pessoa – PB 2008 JULIAA FERADES MOREIRA LEGISLAÇÃO AMBIETAL E COFLITOS SÓCIO-AMBIETAIS: o caso da atividade de carcinicultura na APA da Barra do Rio Mamanguape- PB Trabalho apresentado ao Programa Regional de PósGraduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Federal da Paraíba/ Universidade Estadual da Paraíba, em cumprimento às exigências para a obtenção de grau de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Aprovado em: ___/___/___ BANCA EXAMINADORA _________________________________________ Profª Dra. Maristela Oliveira de Andrade - UFPB (Orientador) _________________________________________ Profª Dra. Loreley Gomes Garcia- UFPB (Examinador) _________________________________________ Profa. Dra. Lúcia Maria Góes Moutinho – UFRPE (Examinador) JULIAA FERADES MOREIRA LEGISLAÇÃO AMBIETAL E COFLITOS SÓCIO-AMBIETAIS: o caso da atividade de carcinicultura na APA da Barra do Rio Mamanguape- PB Trabalho apresentado ao Programa Regional de PósGraduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA, Universidade Federal da Paraíba/ Universidade Estadual da Paraíba, em cumprimento às exigências para a obtenção de grau de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Orientadora: Profª Drª Maristela Oliveira de Andrade João Pessoa – PB 2008 M838l MOREIRA, Juliana Fernandes. Legislação ambiental e conflitos sócio-ambientais: o caso da atividade de carcinicultura na APA da Barra do Rio Mamanguape-PB/ Juliana Fernandes Moreira.- João Pessoa, UFPB 2008. Orientadora: Maristela de Oliveira Andrade Dissertação (Mestrado) – UFPB/CCEN/PRODEMA. 1.Direito ambiental. 2.Conflitos sócio-ambientais. 3.Carcinicultura. UFPB/BC CDU: 349.6 Aos meus pais, exemplos de perseverança e amor. A minha irmã, companheira e amiga. Aos meus avós, exemplos de vida. A Siva, amiga de todas as horas. AGRADECIMETOS A elaboração e apresentação desta dissertação somente têm sentido com o agradecimento e reconhecimento da preciosa contribuição de todos aqueles que direta e indiretamente prestaram sua contribuição: meus pais, professores, amigos, índios Potiguaras, dentre outros. Agradeço especialmente àqueles sem os quais não teria sido possível a existência dessa dissertação. Assim sendo, ofereço meus humildes agradecimentos a Emanuel Falcão, a Profª Maristela Oliveira de Andrade, a Profª Loreley Garcia, a Profª Lúcia Maria Góes Moutinho e a Joana Resende de Albuquerque, bem como ao Sr. Fernando (sócio-proprietário da Aquafer), aos índios Potiguaras, sobretudo a seu Carapeba e aos índios que compõem a Cooperativa dos Carcinicultores de Tramataia Altino Figueirêdo da Silva. “Eu não tenho filosofia: tenho sentidos ... Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é, Mas porque a amo, e amo-a por isso, Porque quem ama nunca sabe o que ama Nem sabe porque ama, nem o que é amar ...” Fernando Pessoa RESUMO As Áreas de Proteção Ambiental (APA) são Unidades de Conservação (UC) criadas, geralmente, onde já existe ocupação humana, o que gera uma série de conflitos de interesses. Na APA da Barra do Rio Mamanguape, a única federal existente no estado da Paraíba, também se verificou a ocorrência desse fenômeno. Além disso, observa-se também o fenômeno da sobreposição desta sobre as Terras Indígenas Potiguara. Este trabalho de dissertação tem por objetivo analisar os conflitos sócio-ambientais decorrentes da atividade de carcinicultura realizada no interior desta Área de Proteção Ambiental. A metodologia aplicada consistiu na análise bibliográfica e documental, na pesquisa de campo, com aplicação de entrevistas, questionários e visitas regulares na área de estudo. Para fundamentar a análise procedeu-se ao estudo da evolução da legislação brasileira de proteção ambiental, particularmente a referente às APA’s onde há sobreposição em terras indígenas. A análise específica dos conflitos foi feita à luz das seguintes categorias teóricas: meio ambiente, território e conflito. O estudo efetuado confirmou a existência de conflitos entre os seguintes atores sociais: Ibama, Funai, fazendeiros de camarão, carcinicultores indígenas, e Poder Judiciário. A atividade carcinicultora praticada tanto pelos indígenas Potiguara, quanto pelos fazendeiros de camarão, desempenha um papel importante nas suas estratégias de sobrevivência, embora apresente agravos ao meio ambiente. Isso evidencia o conflito existente entre a legislação ambiental e a legislação indigenista, donde os princípios norteadores do Direito Ambiental servem como base à aplicação das decisões prolatadas pelo Poder Público referentes aos conflitos entre elas existentes. Palavras-chave: 1.Direito ambiental. 2.Conflitos sócio-ambientais. 3.Carcinicultura ABSTRACT The so called Environmental Protection Areas (APA - Áreas de Proteção Ambiental) are Units of Preservation (UC - Unidades de Conservação) usually created in those places where human occupation already exists, what causes a series of conflicts of interest. This phenomenon was verified at the APA of Barra do Rio Mamanguape, which is the only federal APA in the State of Paraíba. Beyond this, the phenomenon of superposition can also be observed, as this APA is located over the Potiguara Indigenous Lands. This thesis aims to analyse the social-environmental conflicts arising out of the shrimp farming activities taking place inside this Environmental Protection Area. The methodology applied consists of bibliography and documents analysis, field work with application of interviews and questionnaires, as well as usual visits to the studied area. The analysis is based on the study of the evolution of the Brazilian legislation on environmental protection, particularly the statements concerning APAs with superposition on indigenous lands. The specific analysis of conflicts was done considering the following theoretical categories: environment, territory and conflict. The performed study confirmed the existence of conflicts between the following social actors: Ibama (Brazilian Institute of Environment and Renewable Natural Resources), Funai (National Foundation for Indians), shrimp farm owners, indigenous shrimp farmers and the Judiciary branch. The shrimp rearing activities carried out both by the Potiguara Indians and by the shrimp farmers represent an important rule on their survival strategies, although these activities cause damages in the environment. This makes evident the conflict existing between the environmental legislation and the indigenous legislation, whence the guiding principles of environmental law are the basis for the application of the decisions of the Public Power concerning these conflicts. Keywords: 1. environmental law. 2. social-environmental conflicts. 3. shrimp farming LISTA DE FIGURAS Fig. 01 Viveiros de camarão no Equador ..................................................................... 50 Fig. 02 Mangue devastado pela prática da carcinicultura em Bangladesh ................... 52 Fig. 03 Aeradores utilizados na produção de camarão em viveiros ............................. 53 Fig. 04 Aeradores ......................................................................................................... 53 Fig. 05 Ração ................................................................................................................ 53 Fig. 06 Larvas ............................................................................................................... 53 Fig. 07 Assassinatos em decorrência dos conflitos oriundos da carcinicultura ........... 57 Fig. 08 Localização da APA da Barra do Rio Mamanguape ....................................... 64 Fig. 09 Rhizophora mangle. Vegetação típica de manguezal, encontrada no estuário do Rio Mamanguape onde se localiza a APA .................................................. 65 Fig. 10 Detalhe da espécie Avicennia schaueriana ainda no estágio de crescimento .. 66 Fig. 11 Territórios contidos na APA da Barra do Rio Mamanguape ........................... 68 Fig. 12 Bloco de cimento marcando o início da Cooperativa dos Carcinicultores de Tramataia Altino Figuêiredo da Silva .............................................................. 76 Fig. 13 Abertura da comporta para que a água que se encontra no viveiro escoe ....... 76 Fig. 14 Colocação dos depósitos próximos à comporta do viveiro para facilitar a coleta do camarão ............................................................................................ 76 Fig. 15 Colocação do mangote, espécie de rede utilizada na despesca ........................ 77 Fig. 16 Retirada da tela que impede a passagem dos camque os camarões passem .... 77 Fig. 17 Manuseio do mangote ...................................................................................... 77 Fig. 18 Retirada dos camarões do mangote .................................................................. 77 Fig. 19 Choque térmico dado nos camarões ................................................................ 77 Fig. 20 Transporte dos camarões nas basquetas (caixas de plástico) ........................... 77 Fig. 21 Camarões nas basquetas para escorrer a água e serem pesados ....................... 78 Fig. 22 Caminhão frigorífico onde são colocados os camarões após a pesagem ......... 78 Fig. 23 Viveiros da AquaFer e o sistema fechado de abastecimento d’água ............... 79 Fig. 24 Virolas utilizadas para colocar o alimento dos camarões ................................ 80 Fig. 25 Canal de abastecimento em atividade .............................................................. 93 Fig. 26 Cana de abastecimento desativado .................................................................. 93 Fig. 27 Viveiros em atividade ...................................................................................... 93 Fig. 28 Viveiros desativados ........................................................................................ 93 Fig. 29 Mapa etno-histórico de Curt Nimuendaju ........................................................ 95 Fig. 30 Invasão da sede da Funai-Pb em 08 de outubro de 2007 ................................. 97 Fig. 31 Situação fundiária das Terras Indígenas Potiguara .......................................... 98 Fig. 32 Viveiros de camarão situados nas TIs Potiguara ............................................. 99 Fig. 33 Mangue replantando em conformidade com o determinado pelo Ibama ......... 103 LISTA DE TABELAS Tab. 01 Áreas de Proteção Ambiental (APA) Federal .................................................. 41 Tab. 02 Município de Marcação – Número de propriedades por carcinicultores, viveiros por propriedades, área destinada à carcinicultura nas propriedades, percentual de viveiros por propriedade e viveiros em atividade (2006/2007) ... 75 LISTA DE GRÁFICOS Gráf. 01 Mão-de-obra assalariada e familiar na atividade camoroeira praticada no município de Marcação (2006/2007) ................................................................. 73 Graf. 02 Despescas realizadas ao ano em Marcação ........................................................ 74 Graf. 03 Marcação - Produção de camarão por Aldeia (2006/2007) ............................... 78 Graf. 04 Evolução das Importações de Camarão pelos Estados Unidos .......................... 81 LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS ART. - Artigo CF - Constituição Federal CMMAD - Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente DOU - Diário Oficial da União EIA - Estudo de Impacto Ambiental IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis LA - Licenciamento Ambiental LI - Licença de Instalação LO - Licença de Operação LP - Licença Prévia MPU - Ministério Público da União ONG - Organização Não-Governamental PCA - Plano de Controle Ambiental PNMA - Política Nacional do Meio Ambiente PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente PR - Procuradoria da República RIMA - Relatório de Impacto Ambiental SISNAMA - Sistema Nacional do Meio Ambiente STF - Supremo Tribunal Federal TAC - Termo de Ajuste de Conduta SUMÁRIO 1 ITRODUÇÃO ......................................................................................................... 17 2 FUDAMETAÇÃO TEÓRICA ........................................................................... 2.1 MEIO AMBIENTE .................................................................................................. 2.1.1 Princípios orteadores do Direito Ambiental .................................................. 2.1.1.1 Princípio do desenvolvimento sustentável ......................................................... 2.1.1.2 Princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais ......................................... 2.1.1.3 Princípio do usuário-pagador ............................................................................. 2.1.1.4 Princípio do poluidor-pagador ........................................................................... 2.1.1.5 Princípio da prevenção ....................................................................................... 2.1.1.6 Princípio da reparação ....................................................................................... 2.2 TERRITÓRIO .......................................................................................................... 2.2.1 Os Territórios Protegidos ................................................................................... 2.3 CONFLITO .............................................................................................................. 2.3.1 Conflitos Sócio-ambientais ................................................................................. 2.3.2 Conflitos Sócio-ambientais e a Atividade de Carcinicultura .......................... 2.3.2.1 Depleção dos recursos litorais ........................................................................... 2.3.2.2 O processo produtivo ......................................................................................... 22 22 26 27 29 30 32 34 35 36 40 42 45 49 50 54 3 FORMAÇÃO DO ESPAÇO E CRIAÇÃO DA APA ............................................ 3.1 O PROCESSO HISTÓRICO DE FORMAÇÃO DO ESPAÇO .............................. 3.1.1. Da Ocupação Pré-colonial às Formas Atuais de Ocupação ........................... 3.1.2 A Criação da APA da Barra do Rio Mamanguape ......................................... 3.1.3 Localização da APA e Caracterização do seus Aspectos aturais ................. 3.1.4 Ocupação Humana da APA da Barra do Rio Mamanguape e a Área de Sobreposição com a Terra Indígena ........................................................................... 59 59 59 61 64 4 APRESETAÇÃO DOS RESULTADOS: COFLITOS SÓCIOAMBIETAIS A APA DA BARRA DO RIO MAMAGUAPE ......................... 4.1 METODOLOGIA .................................................................................................... 4.2 A CARCINICULTURA NA ÁREA DA APA ........................................................ 4.2.1 A Carcinicultura Indígena ................................................................................. 4.2.2 A Produção de Camarão da Fazenda AquaFer (Aquacultura Fernando Ltda) .............................................................................................................................. 4.3 O CONFLITO DE COMPETÊNCIAS; SUPERPOSIÇÃO DA APA NA TERRA INDÍGENA POTIGUARA ............................................................................................ 4.3.1 Conflito de leis ..................................................................................................... 4.4 CONFLITO ENTRE EMPRESA CARCINICULTORA AQUAFER E O IBAMA .......................................................................................................................... 4. 5 CONFLITO SOCIOAMBIENTAL ENTRE ÍNDIOS CARCINICULTORES, O IBAMA E A FUNAI ...................................................................................................... 67 69 70 72 72 79 81 82 85 5 COSIDERAÇÕES FIAIS ................................................................................... 94 REFERÊCIAS ........................................................................................................... 104 AEXOS ....................................................................................................................... 117 1 ITRODUÇÃO O forte crescimento populacional, de um lado, e o elevado ritmo de expansão da produção possibilitado pelas inovações tecnológicas, por outro lado, têm aumentado a pressão sobre os recursos naturais não renováveis. Coloca-se, assim, o problema tanto do seu esgotamento como da acentuação da poluição ambiental. Como conseqüência tem-se que, a partir da segunda metade do século XX, foi se evidenciando os problemas ambientais que terminam por desenvolver/consolidar uma consciência em torno da questão ambiental. Daí resultou a necessidade de regulamentar o uso dos recursos naturais, na tentativa de protegê-los contra as investidas crescentes do homem. É nesse contexto que foram criadas no Brasil, as Áreas de Proteção Ambiental (APA’s). A primeira APA, a de Petrópolis, foi criada em 1982, no estado do Rio de Janeiro. No âmbito da Paraíba, a primeira APA federal criada foi a da Barra do Rio Mamanguape, sendo esta a única existente, em nível federal, no estado. As Áreas de Proteção Ambiental são demarcadas tanto em terras públicas quanto privadas, cabendo ao órgão gestor competente permitir a realização de atividades econômicas em seu interior. Elas têm por objetivo proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais. No caso da APA da Barra do Rio Mamanguape, o objetivo principal de sua criação foi garantir a conservação do habitat e a proteção do Peixe-Boi (Trichechus manatus). A este objetivo outros se somaram, tais como: a conservação da flora e dos recursos hídricos, a melhoria da qualidade de vida das populações residentes na área, o fomento ao turismo ecológico e a educação ambiental, Como as APA’s, via de regra, são criadas em áreas já ocupadas, e a sua criação implica em regulação do uso e manuseio dos recursos naturais aí existentes, é comum o surgimento de conflitos de interesses entre os diversos grupos econômicos aí presentes (proprietários fundiários, unidades agro-industriais, empresários do setor turístico, etc.), dentre eles pode-se destacar os movimentos ecologistas (ONG’s, associações de preservação, dentre outros.), órgãos governamentais e a população residente (pequenos produtores rurais, trabalhadores assalariados, populações indígenas, etc.). Na APA da Barra do Rio Mamanguape, a presença de carcinicultores, população indígena, e no seu entorno empresários de usinas de açúcar e álcool, grandes e pequenos proprietários de terra, posseiros, funcionários do IBAMA, veranistas, dentre outros, com interesses diversos propicia o desenvolvimento de conflitos de várias ordens. Dentre eles destacam-se: o conflito entre a comunidade indígena e o Estado em torno da luta pela homologação da demarcação da Terra Indígena Potiguara de Monte-Mor; o conflito entre carcinicultores e o Ibama em torno da liberação desta atividade numa área onde se localiza uma importante vegetação de mangue e, ainda, entre pessoas jurídicas de direito público integrantes do próprio Estado, sendo a Sudema a nível estadual e o Ibama a nível federal, e a Funai em torno de compreensões divergentes sobre a prática da carcinicultura pelos índios, dentre outros. O problema investigado no âmbito desta dissertação consiste na análise dos conflitos sócio-ambientais do ponto de vista social e jurídico, envolvendo uma área protegida e a atividade de carcinicultura, modelo de aqüicultura que está sendo realizada na APA da Barra do Rio Mamanguape. Assim sendo, o trabalho tem como objetivo geral analisar os conflitos sócioambientais decorrentes da atividade de carcinicultura realizada no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape a partir do processo de criação da referida APA. Além desse objetivo geral, o trabalho apresenta os seguintes objetivos específicos: a) estudar a evolução da legislação brasileira de proteção ambiental, particularmente, a pertinente às Áreas de Proteção Ambiental com sobreposição em terras indígenas; b) identificar e aprofundar o conhecimento sobre os interesses divergentes existentes e/ou surgidos com a criação da APA da Barra do Rio Mamanguape para caracterizar os conflitos sócio-ambientais existentes na área; c) estudar a intervenção dos entes governamentais e identificar os conflitos de competência entre eles, das ONG’s no âmbito da aplicação das leis aos casos que estejam em desacordo com a mesma, no que se refere a atividade de carcinicultura no interior da APA. d) analisar as formas de encaminhamento encontradas para a superação dos conflitos sócio-ambientais oriundos da carcinicultura na área de estudo. O estudo aqui delineado justifica-se por pelo menos quatro motivos principais, a saber: a) em primeiro lugar, por se tratar de uma área do Direito, a do Direito Ambiental1, que tem se desenvolvido com mais intensidade só recentemente, sendo necessário que se promovam investigações sistemática e continuamente avaliativas, a fim de que possam ser corrigidas as distorções porventura existentes e sejam reafirmados os aspectos positivos nela incorporados; b) a análise da problemática ambiental a partir dos conflitos constitui igualmente uma área que requer ainda muita investigação, pois a questão ambiental envolve uma série de conflitos intra-geracionais e inter-geracionais. Interessa, particularmente nesse estudo, os conflitos intra-geracionais, ou seja, os conflitos entre grupos da geração presente. Isto é, os choques de interesse entre os carcinicultores, a população residente e os órgãos de gestão do meio ambiente, com atuação na área definida como de preservação permanente, ou seja, na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) Manguezais da Foz do Rio Mamanguape, declarada como tal em 1985, por meio do Decreto nº 91.890. Vale salientar que, atualmente, essa ARIE se encontra no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape. c) a área escolhida como objeto de estudo foi transformada em APA recentemente, como já foi demonstrado e embora já existam alguns trabalhos de investigação sobre a mesma (OLIVEIRA, 2003; MARINHO, 2002; VIDAL, 2001, LIEDKE, 2007, dentre outros), estes tratam de alguma forma dos conflitos resultantes da ação humana sobre a área, mas não centram sua atenção na análise dos aspectos conflituosos existentes entre os carcinicultores, a população e o Poder Público; d) por envolver comunidades tradicionais e não tradicionais, múltiplos interesses e, ainda, pelo fato de existir uma legislação que regulamenta as APA’s, uma legislação que 1 Direito Ambiental é a expressão mais comumente utilizada para designar o ramo do Direito Público pertencente aos direitos difusos. Contudo há outras formas de denominá-lo, quais sejam: Direito Ecológico; Direito de Proteção da Natureza; Direito do Meio Ambiente. Para Milaré (2001), Direito Ambiental é o “complexo de princípios e normas coercitivas reguladoras das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações”. regulamenta a Terra Indígena e outra que trata da questão agrária no Brasil, o conflito estudado adquire um caráter mais complexo e instigante daí o interesse pelo tema. No que tange à metodologia aplicada, a pesquisa proposta é ao mesmo tempo um trabalho de investigação bibliográfica, no tocante à análise do direito ambiental e da legislação ambiental brasileira a respeito das APA’s (a sua origem e evolução, suas características, suas debilidades, etc.), e de estudo de caso no que se refere à análise dos conflitos sócio-ambientais surgidos a partir de interesses divergentes em torno da prática da carcinicultura realizada na APA da Barra do Rio Mamanguape. Com base no exposto entende-se que o “conflito sócio-ambiental” é aquele que envolve disputas de natureza socioeconômica e ambiental tais como as identificadas na APA da Barra do Rio Mamanguape e exprime uma relação de tensão entre sociedade/natureza. Nessa relação emerge um segundo elemento intrinsecamente relacionado ao de conflito: o território. Embora reconhecendo que este estudo não vá esgotar todas as questões inerentes à temática do conflito sócio-ambiental em sua dimensão jurídica entre o meio ambiente e a carcinicultura em Áreas de Proteção Ambiental, ele se propõe tão somente dar visibilidade a um problema que envolve tanto populações tradicionais quanto empresários, órgãos governamentais e não governamentais. Conflitos que implicam no confronto entre preservação ambiental, sobrevivência de algumas famílias e expectativa de lucro de empresários, inclusive os próprios índios, e proprietários fundiários, no caso específico da APA da Barra do Rio Mamanguape. Além desta introdução, esta dissertação se compõe de três capítulos. O primeiro é dedicado exclusivamente à revisão bibliográfica, pautada na apresentação das categorias que constituem o eixo central da análise quais sejam: ambiente, território e conflito. Nele busca-se não apenas contextualizar estas categorias analíticas, mas também inseri-las no quadro do direito ambiental, da lógica espacial e da representação social. O segundo capítulo atém-se a caracterização dos aspectos naturais, sociais e jurídicos da APA em questão e o processo de formação e ocupação deste espaço, com ênfase sobre o desenvolvimento recente da atividade carcinicultora. No terceiro capítulo, encontra-se a metodologia adotada e contempla-se a análise dos resultados através da descrição dos conflitos identificados no interior da APA envolvendo a atividade de carcinicultura e o meio ambiente Por fim, no quinto capítulo apresentam-se as considerações finais da dissertação. 2 FUDAMETAÇÃO TEÓRICA Este capítulo aborda as três categorias de análise que constituem o eixo central de suporte do estudo: ambiente, território e conflito. A discussão sobre a questão ambiental é realizada levando-se em conta os princípios do direito ambiental e a legislação brasileira sobre a proteção e preservação do meio ambiente. A análise levada a termo sobre território parte do resgate conceitual realizado pelas ciências naturais ainda no século XVII, até a discussão atual nas ciências sociais para chegar ao significado de território étnico. A contextualização conceitual sobre conflito é realizada buscando dar suporte à análise dos conflitos na APA da Barra do Rio Mamanguape em torno da carcinicultura. Assim, partindo-se da discussão geral sobre conflito, aborda-se a concepção de conflito sócio-ambiental. 2.1 O MEIO AMBIENTE A expressão “meio ambiente”, segundo Édis Milaré (2001), foi utilizada pela primeira vez em 1835 por Geoffroy de Saint Hilaire, naturalista francês, em sua obra Études progressives d’un naturaliste. Desde então ela vem sendo utilizada com freqüência por pesquisadores, doutrinadores, aplicadores do direito, dentre outros. Apesar de amplamente utilizada, não há, entre os especialistas, consenso acerca do significado dessa expressão. “Trata-se de uma noção ‘camaleão’, que exprime, queiramos ou não, as paixões, as expectativas e as incompreensões daqueles que dela cuidam” (MILARÉ, 2001: p. 63). Outra observação que é feita é a de que meio e ambiente são sinônimos, o que implica dizer ser o termo ‘meio ambiente’ um pleonasmo, onde não seria necessária a palavra ‘meio’ para complementar ‘ambiente’. Seguindo este entendimento temos Machado (2000), Mukai (2005), Fiorillo (2005), dentre outros. Segundo Fiorillo, “costuma-se criticar tal termo, porque pleonástico, redundante, em razão de ambiente já trazer em seu conteúdo a idéia de ‘âmbito que circunda’, sendo desnecessária a complementação pela palavra meio” (2005: p.19). Para Mukai, por meio ambiente entende-se “a interação de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida do homem” (2005: p. 03). Nebel define meio ambiente como sendo “a combinação de todas as coisas e fatores externos ao indivíduo ou população de indivíduos” (1990: p.576). Observa-se, assim, uma visão antropocentrista do autor Toshio Mukai e uma ausência do homem na definição de Nebel. Apesar de a Constituição Federal brasileira não trazer em seu bojo uma conceituação do que seja meio ambiente, a Lei 6938/81, que institui a Política Nacional do Meio Ambiente, assim o fez, ao prescrever, em seu artigo 3º, inciso I, que meio ambiente é “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. A legislação ambiental de Portugal, Lei nº 11/87, de 07 de abril, também conceitua ambiente, prescrevendo em seu artigo 5º, inciso 2, alínea a, que Ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos fatores econômicos, sociais e culturais com efeito direto ou indireto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida dos homens (PORTUGAL, 1987). Milaré entende que, tanto a Lei 6938/81 quanto a Lei Maior omitem-se sobre a consideração essencial de que o ser humano, considerado como indivíduo ou como coletividade, é parte integrante do mundo natural e, por conseguinte, do meio ambiente. Esta omissão pode levar facilmente à idéia de que o ambiente é algo extrínseco e exterior à sociedade humana, confundindo-o, então, com seus componentes físicos bióticos e abióticos, ou com recursos naturais e ecossistemas. É de observar que este equívoco passou para as Constituições Estaduais e, posteriormente, para as Leis Orgânicas de grande parte dos Municípios (2005: p. 67). Todavia, entendemos que, ao contrário do que alega o autor supramencionado, o ser humano foi, sim, incluído na conceituação de meio ambiente trazida pela Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, uma vez que o homo sapiens sapiens representa uma forma de vida que sofre influências e interações de ordem física, química e biológica. A atenção para os problemas relacionados com o meio ambiente no âmbito internacional tomou corpo a partir de um evento histórico, que foi a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano realizada em Estocolmo, na Suécia, em 1972. Este pode ser considerado como o primeiro momento de tomada de consciência mundial, da fragilidade dos ecossistemas que sustentam a vida no planeta bem como da necessidade de se realizar esforços para melhorar a qualidade da vida humana. Duas grandes preocupações afloraram nesta Conferência: a proteção às espécies ameaçadas (animais e vegetais) e a utilização de forma racional dos recursos naturais não renováveis. Ainda em 1972, como um dos resultados da mencionada conferência, a ONU criou o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - PNUMA, com sede em Nairobi. Passados mais de 10 anos da realização da Conferência de Estocolmo, só em 1985, é que a América Latina se mobilizará em torno da questão ambiental e realizará em Bogotá o I Seminário sobre Universidade e Meio Ambiente para América Latina e Caribe, numa promoção do PNUMA. Em 1987, foi constituída a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CMAD, responsável pela elaboração do relatório de Brundtland, mundialmente conhecido por dar relevo a questão ambiental e ao desenvolvimento sustentável. No Brasil, observa-se uma mudança de consciência em relação à preocupação com a proteção do meio ambiente, a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, primeira Constituição brasileira a trazer em seu bojo um capítulo dedicado à natureza, em seu artigo 225, caput,da CF/88, que prescreve: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Além desse capítulo específico, outros dispositivos constitucionais também fazem menção ao meio ambiente, bem como às terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Podemos citar, por exemplo, os artigos 20 e 23 da CF/88 abaixo relacionados. Art.20 – São bens da União: (...) II – as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; (...) XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Art. 23 É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...) VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as florestas, a fauna e a flora. Os dispositivos legais, acima transcritos, fazem uma associação entre o direito ao ambiente equilibrado e a qualidade de vida além de anunciar as responsabilidades da sociedade e do Estado em relação à natureza. Todavia, é necessário que fique claro não serem estes dispositivos legais os primeiros a tratar do assunto, pois normas infraconstitucionais anteriores a CF/88 já existiam, como é o caso da Lei nº. 6902/81, que dispõe sobre a criação de Estações Ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental e da Resolução Conama nº001, de 23 de outubro de 1986. O artigo 8º da Lei 6.902/81, ao determinar que o Poder Executivo poderá criar Áreas de Proteção Ambiental motivando seu ato no relevante interesse público, e o artigo 2º da Resolução Conama nº 001, estão, acima de tudo, cumprindo o que versa o princípio da prevenção, que será analisado mais adiante Art.8º - O Poder Executivo, quando houver relevante interesse público, poderá declarar determinadas áreas do Território Nacional como de interesse para a proteção ambiental, a fim de assegurar o bem-estar das populações humanas e conservar ou melhorar as condições ecológicas locais. (BRASIL, 1981) Art. 2º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental – RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA em caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente (...). (BRASIL, 1986) Porém, só a partir da realização da Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada em junho de 1992 no Rio de Janeiro, em conjunto com a ECO-92, da qual participaram mais de 35 mil pessoas, é que o Brasil irá incorporar de modo mais significativo a preocupação com as questões de conservação-preservação do meio ambiente. É no bojo dessa tomada de consciência que o direito ambiental adquire maior relevo em nível nacional, tornando-se um elemento de fundamental importância na mitigação e solução dos conflitos emergentes. 2.1.1 Princípios orteadores do Direito Ambiental O Direito Ambiental existe a muito mais tempo do que alguns possam imaginar. Já se observava a existência de relações jurídicas ambientais entre as mais antigas civilizações, como, por exemplo, na dinastia Chow (1122 AC – 255 AC) quando da recomendação imperial para conservação de florestas. Outro exemplo, mais recente, é o da floresta de Bialowieza, na Polônia, a mais antiga reserva de fauna existente, datando de 1921 a sua criação. No Brasil, as primeiras leis de proteção ambiental foram trazidas, importadas, de Portugal, onde, conforme a Ordenação de 9 de novembro de 1326, havia expressa proteção às aves e equiparava seu furto a qualquer outra espécie de crime (MAGALHÃES, 2002). Antes de darmos início ao estudo dos princípios norteadores do Direito Ambiental, faz-se necessário uma breve explanação acerca do vocábulo princípio, ou seja, do seu conceito, bem como do conceito de Direito Ambiental. Consoante Paulo Affonso Leme Machado, os princípios constituem-se em verdadeiros sustentáculos, alicerces, do Direito. É graças à existência de princípios próprios que se pode afirmar ser o Direito Ambiental uma disciplina autônoma. Afirma Fiorillo que: Aludidos princípios constituem pedras basilares dos sistemas políticojurídicos dos Estados civilizados, sendo adotados internacionalmente como fruto da necessidade de uma ecologia equilibrada e indicativos do caminho adequado para a proteção ambiental, em conformidade com a realidade social e os valores culturais de cada Estado (2005: p.26) Milaré define Direito Ambiental como um “complexo de princípios e normas reguladoras das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações” (MILARÉ, 2000; 109). Entendemos ser os princípios supracitados assaz suficientes para fundamentar normas jurídicas que tenham como objeto o meio ambiente. No que diz respeito ao Direito Ambiental, há alguns princípios gerais a serem seguidos e respeitados, são eles: princípio do desenvolvimento sustentável; princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais; princípio usuário-pagador; princípio poluidor-pagador; princípio da prevenção; princípio da reparação. Vale salientar que cada autor utiliza uma classificação distinta para os princípios que regem o Direito Ambiental, dificilmente se achando uma homogeneidade nas nomenclaturas utilizadas. Uma abordagem analítica dos princípios será feita, em seguida, com base nos autores Paulo Affonso Leme Machado, Edis Milaré, Celso Antonio Pacheco Fiorillo, Katheline Schubert, Guilherme Cano, Fabio José Feldmann, Gerd Winter, Hely Lopes Meirelles, dentre outros, e da legislação constitucional e infra-constitucional. Também será abordada a legislação internacional como forma de melhor contextualizar o uso desses princípios. 2.1.1.1 Princípio do desenvolvimento sustentável Este princípio é também denominado de princípio da precaução, já conhecido e comentado desde a década de 70 no Direito Alemão2. Por ele, entende-se que os recursos naturais não são infinitos, muito pelo contrário, logo, precisam ser utilizados de forma a não prejudicar as presentes e futuras gerações. Pode-se dizer que esse princípio tem seus fundamentos enraizados no Princípio 5 da Declaração de Estocolmo de 1972, que prescreve: Os recursos não renováveis do Globo devem ser explorados de tal modo que não haja risco de serem exauridos e que as vantagens extraídas de sua utilização sejam partilhadas a toda a humanidade. (grifo nosso) Constata-se, com esse princípio, que sendo os recursos naturais esgotáveis, deve-se evitar utilizá-los de forma irresponsável, tendo por escopo o desenvolvimento econômico. Pretende-se afirmar que tais recursos devem ser protegidos, resguardados, permitindo-se, 2 Eckard Rehbinder, professor da Universidade de Frankfurt, é um dos estudiosos do Direito Ambiental que defende a idéia de que a poluição deva ser combatida desde o início, ou seja, que o simples risco de se contaminar o meio ambiente seja evitado. Entende, ainda, que o recurso natural pode ser desfrutado, mas com base em um rendimento duradouro. apenas quando observado todos os requisitos necessários, como as licenças ambientais, por exemplo, sua utilização com fulcro no crescimento econômico. Busca-se, na verdade, compatibilizar o desenvolvimento com a necessidade da proteção ambiental para não comprometer a disponibilidade de recursos naturais para as gerações futuras, inclusive a continuidade de determinadas atividades produtivas (ex.: usinas de cimento que poluem o ar com a fumaça que sai de suas chaminés3). No que tange à legislação que dá respaldo ao princípio ora em estudo, podemos citar o artigo 225, caput, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), já transcrito anteriormente, bem como o artigo 170, inciso VI da CF/88 e dispositivo legal da Convenção para Proteção e Utilização dos Cursos de Água Transfonteiriços e dos Lagos Internacionais, de Helsinque, 1992, e o Princípio 1 da Declaração do Rio de Janeiro de 1992, abaixo transcritos. Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) VI – defesa do meio ambiente. (CF/88) Art. 2º, 5, c. Os recursos hídricos são gerados de modo a responder às necessidades da geração atual sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades (Convenção para Proteção e Utilização dos Cursos de Água Transfronteiriços e dos Lagos Internacionais, de Helsinque, 1992) Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva em harmonia com a natureza. (Princípio 1, Declaração do Rio de Janeiro, 1992) Assim sendo, a legislação não busca impedir o crescimento econômico em prol da conservação do meio ambiente, mas estabelecer um meio termo entre o desenvolvimento econômico de determinada sociedade ou país, e a proteção e conservação dos meios necessários ao desenvolvimento. Trata-se de ordenar o crescimento econômico de forma a permitir o usufruto dos recursos ambientais sem esgotá-los ou deixá-los inócuos às gerações futuras. Conforme Fiorillo: 3 A usina de cimento Cimepar, localizada no município de João Pessoa, devido a poluição que provocava em decorrência da ausência de filtros nas chaminés de sua usina, e do movimento liderado por D. José Maria Pires, arcebispo do Estado da Paraíba à época, para a melhoria do meio ambiente que estava sendo prejudicado pelas fuligens do processo de produção do cimento na mesma, adotou a utilização dos filtros necessários a minimização da poluição. Atualmente é ela a terceira maior produtora de cimento no país, obtendo recentemente o padrão ambiental ISO 14000. Busca-se, na verdade, a coexistência de ambos sem que a ordem econômica inviabilize um meio ambiente ecologicamente equilibrado e sem que este obste o desenvolvimento econômico. (2005: p. 28) Segundo Katheline Schubert, professora de Economia da Universidade de Paris 1 Panthéon-Sorbonne, França, o princípio da precaução deveria estar proximamente dotado na França de um valor constitucional pela lei referente à carta do meio-ambiente. O projeto da carta, apresentada pelo Governo Francês ao Conselho de Ministros em 25 de junho de 2003, estipula de fato, em seu artigo 5º, que, desde que a realização de um dano, ainda que incerto no estado dos conhecimentos científicos, possa afetar de maneira grave e irreversível o meio-ambiente, as autoridades públicas velam, pela aplicação do princípio da precaução, pela adoção de medidas de provisórias e proporcionadas a fim de evitar a realização do dano como também a execução de procedimentos de avaliação dos riscos causados.4 (tradução da autora) Esse valor constitucional presente na França não fica a ela adstrito, pois a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, por exemplo, também prevê, como foi visto anteriormente quando da citação do artigo 170 desta Constituição, a presença do mesmo em seu texto. Apesar de não se apresentar de forma expressa, diferentemente da Constituição Francesa, o princípio ora em estudo encontra-se sim na CRFB/88, mas de forma implícita ao prever o princípio da defesa do meio ambiente. 2.1.1.2 Princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais. Os recursos encontrados no meio ambiente tanto podem estar acessíveis ao homem de forma gratuita, como de forma onerosa. Todavia, quando o recurso natural é utilizado e colocado à disposição da sociedade, ele não pode possuir um valor que o torne inacessível à população, pois, assim, não se estaria observando ou cumprindo, o princípio do acesso eqüitativo aos recursos naturais. 4 Le principe de précaution (PP) devrait être prochainement doté en France d’une valeur constitutionnelle par la loi relative à la Charte de l’environnement. Le projet de charte, présenté par le gouvernement au Conseil des ministres le 25 juin 2003, stipule en effet, dans son article 5, que, « lorsque la réalisation d’un dommage, bien qu’incertaine en l’état des connaissances scientifiques, pourrait affecter de manière grave et irréversible l’environnement, les autorités publiques veillent, par application du principe de précaution, à l’adoption de mesures provisoires et proportionnées afin d’éviter la réalisation du dommage ainsi qu’à la mise en œuvre de procédures d’évaluation des risques encourus ». Por este princípio entende-se que todos têm direito de fruir dos produtos/serviços que são oferecidos à sociedade a partir da exploração dos recursos naturais. Ou seja, não se poderia cobrar um valor excessivamente elevado pela água consumida, pois grande parte da população brasileira de baixa renda vive em situações precárias, o que impossibilitaria o acesso à água pelos mesmos. E ela, dentre outros recursos, é essencial à própria existência da humanidade. Dentre os dispositivos legais que fazem menção a este princípio pode-se citar, dentre outros, o Princípio 3 da Declaração da Rio/92, que prescreve que “o direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas eqüitativamente as necessidades das gerações presentes e futuras”. 2.1.1.3 Princípio usuário-pagador. Apesar dos princípios usuário-pagador e poluidor-pagador estarem diretamente associados entre si, segue-se um estudo individualizado de cada um. Nem todos os recursos naturais são economicamente apreciáveis, logo, não oneram o seu usuário, como é o caso, por exemplo, do ar que se respira. Todavia, há determinados bens que possuem valor econômico, e, em virtude dessa característica, oneram aqueles que os consomem. Ao utilizar recursos naturais que sejam considerados como bens econômicos, aqueles que deles fizerem uso deverão, via de regra, realizar um pagamento pelos mesmos. Esse pagamento pode ser inclusive, uma taxa ou até mesmo uma tarifa, a depender da situação em concreto. O que leva a onerar o usuário de determinado recurso não renovável pode ser, dentre outros elementos, a raridade do mesmo; o fato de sua utilização implicar na poluição do recurso natural; a prevenção de catástrofes; dentre outros. Vê-se, assim, que vários são os motivos que levam o usuário a respeitar, cumprir, o princípio denominado usuário-pagador. Outro elemento interessante, que não se pode deixar de trazer a baila, é o fato de não se poder excluir a população menos provida financeiramente da fruição de determinados produtos que tenham como base, ou que sejam em sua totalidade, um recurso natural, isso em decorrência do princípio anteriormente visto, ou seja, devido ao direito que a própria Lei assegura. A energia elétrica, por exemplo, não pode ser fornecida apenas àqueles que possuem condições financeiras de pagar por ela, eis aí o que ocorre com o projeto Luz Para Todos, do governo federal. Igualmente, não se pode imaginar que a população mais carente fique sem acesso a um dos maiores bens naturais necessários à sobrevivência humana, ou seja, a água. A Lei brasileira que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação - Lei nº 6.938/81 -, fundamenta o princípio usuáriopagador, em seu artigo 4º, inciso VII, onde prescreve que: Art. 4. A Política Nacional do Meio Ambiente visará: (...) VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos. (grifo nosso) O objetivo principal do princípio do usuário-pagador é, na verdade, proteger o meio ambiente, fazendo com que aquele que utiliza do recurso oriundo dele suporte o ônus necessário que torna possível a utilização do recurso e os custos advindos de sua própria utilização. Este princípio tem por objetivo fazer com que estes custos não sejam suportados nem pelos Poderes Públicos, nem por terceiros, mas pelo utilizador. De outro lado, o princípio não justifica a imposição de taxas que tenham por efeito aumentar o preço do recurso ao ponto de ultrapassar seu custo real, após levarem-se em conta as externalidades e a raridade (SMETS, 1998). Um trecho extraído da obra de Guilhermo Cano, que trata do assunto em epígrafe, diz: Quem causa a deterioração paga os custos exigidos para prevenir ou corrigir. É óbvio que quem assim é onerado redistribuirá esses custos entre os compradores de seus produtos (se é uma indústria, onerando-a nos preços), ou os usuários de seus serviços (por exemplo, uma Municipalidade, em relação a seus serviços de rede de esgotos, aumentando suas tarifas). A eqüidade dessa alternativa reside em que não pagam aqueles que não contribuíram para a deterioração ou não se beneficiaram dessa deterioração. (1983; 191) 2.1.1.4 Princípio poluidor-pagador. Este princípio traz, implicitamente, dois âmbitos de atuação, um deles é o de prevenção e o outro é de repressão. Ele tem por objetivo evitar a ocorrência do dano ao meio ambiente, embora este já tenha ocorrido, de modo que aquele que poluiu arcará com o ônus das conseqüências. Ou seja, o princípio poluidor-pagador será utilizado para fundamentar a atuação repressiva do Estado em relação àquele que poluiu ou causou danos a determinado recurso natural. Num primeiro momento, a legislação visa evitar a poluição do meio ambiente, favorecendo o uso das técnicas necessárias para tanto, como, por exemplo, a utilização de filtros nas chaminés das indústrias, que podem reduzir consideravelmente as emissões de gases poluentes na atmosfera. Outra forma de aplicação desse princípio, no caso do dano já ter ocorrido, é a determinação de que aquele que poluiu o ambiente venha a arcar financeiramente com os danos causados, embora nem sempre a punição seja apenas financeira. Um caso que pode exemplificar o princípio do poluidor-pagador, e este foi bem divulgado pela mídia, ocorreu quando da perfuração de 101 poços na Bacia de Campos, pela Petrobrás, sem que possuísse a devida autorização emitida pelo Ibama. Neste último caso, observou-se a aplicação de multa no valor de R$ 213,2 milhões à Petrobrás5. A Constituição da República Federativa do Brasil estabelece, em seu art. 225, parágrafo 3º, que: §3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. 5 Kelly Lima, em 13/2/2006, no jornal ‘O Estado de S. Paulo’. Assim sendo, temos a previsão constitucional do princípio aludido, bem como da previsão da responsabilidade civil, que não é excluída quando da apreciação do descumprimento legal cometido pelo poluidor. Contudo, há situações nas quais os danos são irreparáveis. Nesses casos, mesmo que haja a sanção penal e/ou administrativa, o ambiente não mais se recuperará. Desta forma, pode-se afirmar que nem sempre esse princípio gerará os efeitos necessários para proteger o meio ambiente. Com o passar dos anos, observou-se que a teoria da responsabilidade subjetiva do Estado, na qual cabia ao lesado o ônus da prova, era, pode-se dizer, inócua, em virtude de ser o lesado a parte hipossuficiente da relação. Em outras palavras, dificilmente conseguia-se provar a culpa (dolo e culpa stricto sensu) da Adminstração Pública. Assim sendo, passou-se a adotar a teoria da responsabilidade civil objetiva do Estado, cabendo não mais ao lesado o ônus da prova, mas sim ao Estado. Desta forma, pode-se afirmar, seguindo o entendimento de Rosa Maria Barreto Brrielo de Andrade Nery, citada na obra de Fiorillo (2005), que são considerados legitimados passivos aqueles que, de alguma forma, tenham causado o dano ambiental, sendo a responsabilidade arcada por eles denominada solidária, conforme prevê o artigo 927 do Código Civil brasileiro. Todo aquele que vier a causar um dano ao meio ambiente é responsável pelo dano. Talvez seja difícil imaginar como o consumidor de camarão proveniente de viveiros, que não atendam as normas de proteção ambiental como previsto em lei, pode ser responsável pelos danos causados por essa atividade econômica. Contudo, basta raciocinar no sentido de que se se está consumindo um produto de fonte ilegal, se está influenciando na continuidade da atividade, sem que seja ela legalizada. Apesar de, por vezes, confundir-se o objetivo principal do princípio, ora em estudo, com o vulgo ditado “poluo, mas pago”, o que se pretende, na verdade, é evitar a poluição e a degradação ambiental, através da tentativa de conscientização da população da fragilidade desses recursos não renováveis. 2.1.1.5 Princípio da prevenção. Para que se evite um dano ao meio ambiente é necessário que antes se saiba quais são os possíveis danos ou riscos que determinado empreendimento pode acarretar, pois só a partir desses dados é que se poderá de fato prevenir tais ocorrências danosas. Como o próprio vocábulo já diz, por esse princípio entende-se o fato de se prevenir, antes do dano ocorrer. Entende Edis Milaré que “prevenção é mais ampla do que precaução e que, por seu turno, precaução é atitude ou medida antecipatória voltada preferencialmente para casos concretos.” (2001: p. 118). Esse princípio parece-nos, talvez, um dos mais importantes dentre os elencados até então, pois é preciso prevenir o dano, antes que uma vez causado torne-se irreparável. Não se pode afirmar que o dano será reparado através de multa aplicada por órgão competente, ou, ainda, que o mesmo venha a ser “pago” através de uma ação não reparadora como por exemplo, com o asfaltamento de determinada rua, que não repara o dano causado. Considerese, por exemplo, como se poderia reparar o dano, no qual uma determinada espécie animal tornou-se extinta. Simplesmente não há como repará-lo, mas pode-se utilizar de mecanismos, sejam eles jurídicos, administrativos, dentre outros, para evitar que tal prejuízo irreparável ocorra. É nesse sentido que Fabio José Feldmann diz: (...) não podem a humanidade e o próprio Direito contentar-se em reparar e reprimir o dano ambiental. A degradação ambiental, como regra, é irreparável. Como reparar o desaparecimento de uma espécie? Como trazer de volta uma floresta de séculos que sucumbiu sob a violência do corte raso? Como purificar um lençol freático contaminado por agrotóxicos? (1992: p. 5) Como forma de demonstrar a importância do princípio da prevenção, o artigo 225, caput, da Constituição Federal de 1988, já transcrito no corpo deste trabalho, determina que ao Poder Público e à coletividade competem a obrigação de preservar o meio ambiente. A aplicação de tal dispositivo pode ser vista quando da criação de Áreas de Proteção Ambiental, sejam elas federais, estaduais ou municipais. Em nível estadual, encontra-se, no artigo 227 da Constituição do Estado da Paraíba, a competência do Estado da Paraíba no que tange à proteção do meio ambiente, trazendo em seu parágrafo único as determinações legais às quais o Estado deverá submeter-se. Art.227 – O meio ambiente é do uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, sendo dever do Estado defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (PARAÍBA, 1989) Antes de passarmos ao princípio seguinte, façamos um breve parêntese para distinguir “risco” de “perigo”, vocábulos semelhantes, mas não idênticos no significado. Gerd Winter é um dos autores que traz à baila tal distinção, afirmando que “se os perigos são geralmente proibidos, o mesmo não acontece com os riscos. Os riscos não podem ser excluídos, porque sempre permanece a probabilidade de um dano menor. Os riscos podem ser minimizados” (1996: p. 41). 2.1.1.6 Princípio da reparação. Por esse princípio entende-se que todo dano que vier a ser ocasionado deverá ser reparado por quem o causou, ou, até mesmo, por quem indiretamente contribuiu com o dano. A título de dispositivo legal temos o Princípio 13 da Declaração do Rio de Janeiro/92, que prescreve: Os Estados deverão desenvolver legislação nacional relativa à responsabilidade e à indenização das vítimas da poluição e outros danos ambientais. Os Estados deverão cooperar da mesma forma, de maneira rápida e mais decidida, na elaboração das novas normas internacionais sobre responsabilidade e indenização por efeitos adversos advindos dos danos ambientais causados por atividades realizadas dentro de sua jurisdição ou sob seu controle, em zonas situadas fora de sua jurisdição. (grifo nosso) Abramos um pequeno espaço para comentar a responsabilidade civil do Estado. A teoria adotada pela legislação brasileira a partir da Constituição de 1946 é a da responsabilidade civil objetiva (MEIRELLES, 2004), ou seja, quem exerce uma atividade que venha a lesionar o meio ambiente, deve assumir os riscos da mesma, independentemente de culpa. Todavia, ensina Silvio Rodrigues que, no direito brasileiro, a teoria da responsabilidade sem culpa foi ganhando espaço primeiramente em casos específicos, como ocorria no Código das Estradas de Ferro que é o mais antigo, a Lei dos Acidentes de Trabalho de 1934 e o Código Brasileiro do Ar de 1966 (SILVA, 2003: p. 6). Vale salientar, ainda, que nem sempre isso ocorreu, pois, a princípio, o que vigorava era a teoria da irresponsabilidade (MELLO, 2000), onde, no âmbito do Poder Público, o Estado não agia de forma irresponsável, utilizando-se da expressão “the king do no wrong”6. Contudo, essa teoria foi suplantada, em parte, pela teoria da responsabilidade subjetiva, cabendo ao lesado provar que o Estado, ou, no caso, o empreendedor, agiu com culpa, caso contrário não caberia mencionar a responsabilidade civil. 2.2 TERRITÓRIO O contato coloca um grupo indígena diante de lógicas espaciais diferentes da sua e que passam a ser expressas também em termos territoriais. As diversas formas de regulamentar a questão territorial indígena pelos Estados Nacionais não pode ser vista apenas do ângulo do reconhecimento do direito à “terra”, mas como tentativa de solução desse confronto (GALLOIS, 2004: p.37) A noção de território, como elemento do Estado, segundo Dallari (1995), aparece com o “Estado Moderno, embora, à semelhança do que ocorreu com a soberania, isso não queira dizer que os Estados anteriores não tivessem território” (p.73). Dallari ainda ressalta que: Na cidade-Estado, limitada a um centro urbano e a uma zona rural circunvizinha, não havendo ensejo para conflitos de fronteiras, não chegou a surgir a necessidade de uma clara delimitação territorial. Além disso, o tipo de relacionamento entre a autoridade pública e os particulares não tornava imperativa a definição da ordem mais eficaz num determinado local. Durante a Idade Média, com a multiplicação dos conflitos entre ordens e autoridades, tornou-se indispensável essa definição, e ela foi conseguida através de duas noções: a de soberania, que indicava o poder mais alto, e a de território, que indicava onde esse poder seria efetivamente o mais alto. De fato, o Imperador também tivera a pretensão da supremacia. Entretanto, a indefinição territorial, decorrente da vocação permanente expansionista do Império, foi uma das causas de se ter mantido sua autoridade apenas nominal, sem jamais conseguir concretizar-se. (1995: p. 73) 6 O que significa, “o rei não erra”. Tem-se, ainda, que a conceituação de território foi formulada no século XVII pelas ciências naturais, a Botânica e a Zoologia, para designar a área de influência e de predomínio de um determinado grupo de espécie animal ou vegetal. Todavia, para Jean Gottmann (1973), a idéia de território é anterior, já se encontrando presente em debates levados a efeito no século XV, sobre questões políticas próprias daquele momento histórico tais como a dominação de uma determinada área a exemplo do verificado nas cidades-estados gregas e em cidades romanas e italianas medievais (SAQUET, 2007). No século XVI, a noção de território aparece atrelada às concepções de soberania, de dominação e de exploração, influenciada pelo descobrimento e ocupação do chamado Novo Mundo. Desse modo, segundo Saquet, o território “é experimentado para além do habitat do homem, como receptáculo de suas atividades econômicas, principalmente, no decorrer dos séculos XVII e XVIII” (2007: p. 28). Saquet destaca a importância da obra “O Príncipe” de Machiavel, pela sua contribuição para o rompimento “com a tradição cristalizada até o Renascimento, da ordem de ligação do poder com a força e a vontade divina”. Para Machiavel, o território é entendido como “uma área controlada e fortificada que deve ser defendida e mantida sob domínio. O poder é exercido, na apropriação e dominação” (SAQUET, 2007: p. 28). Na Geografia, coube a Friedrich Ratzel, no final do século XIX, a primeira sistematização do conceito de território. Para ele, o território representa não só as condições de trabalho e de existência de um povo como também um dos elementos fundamentais da formação e da garantia de existência do Estado. Ele coloca no centro de suas análises a necessidade de domínio territorial pelo Estado e estabelece que as possibilidades de progresso ou a inviabilização de uma dada sociedade dependem dos limites e das potencialidades impostos pelas condições naturais. Desse modo, o território é para Ratzel, um “espaço vital” que tem como referência básica a relação entre sociedade e recursos disponíveis (RATZEL, apud CAPEL, 1981). De acordo com Saquet (2007), apesar de Ratzel ter tentado avançar na abordagem do homem (povo), ligado ao solo/ambiente, sinalizando para além da geopolítica através de elementos da cultura (religião) e da economia (comércio), em virtude de sua proposta metodológica de caráter institucional e burguês, ele não conseguiu abarcar essas três dimensões ao tratar de território. Por isso faz uma abordagem a serviço do Estado alemão de sua época, sem superar a visão naturalista de território, herdada de ciências como a biologia (...). Compreende o território como uma parcela do espaço, delimitada, com ou sem a presença do homem; com ou sem modificações provocadas pelos povos e com ou sem a presença e domínio do Estado (...) (SAQUET, 2007: p. 31-32). Negligenciada durante muito tempo, a questão do território emerge na atualidade de forma vigorosa, na esteira das mudanças econômicas, sociais e políticas que se processam em nível global. A discussão, porém, tem se pautado por uma falta de consenso sobre o seu significado, resultando numa multiplicidade de enfoques e conceitos. No contexto da emergência mais recente da abordagem territorial distingue-se a contribuição de Foucalt, Magnaghi, Léfèbvre, Raffestin, Haesbaert, Moreira e Targino entre outros. A contribuição de Foucault (1985) para a compreensão de território consiste na sua concepção de poder que vai além do entendimento de Machiavel e de Ratzel. Para ele a noção de poder implica: no estabelecimento de relações sociais conflituosas e heterogêneas (...) relações de forças que extrapolam a atuação do Estado e envolvem e estão envolvidas em outros processos da vida cotidiana, como a família, as universidades, a igreja, o lugar de trabalho, etc. (...) O território nesta multidimensionalidade do mundo, assume diversos significados, a partir de territorialidades plurais, complexas e em unidade (FOUCAULT apud SAQUET, 2007: p. 32). Da mesma forma que Foucault, Magnaghi entende as relações de poder e a apropriação territorial como multiformes, inclusive, materializando-se no movimento de organização social, por exemplo, de operários: há uma apropriação política do território através do uso do espaço, da migração de trabalhadores e da estrutura territorial. A apropriação política ocorre institucionalmente, por meio do Estado, e nos meios sociais, como comportamento coletivo de resistência organizado territorialmente (MAGNAGHI apud SAQUET, 2007: p. 32). Raffestin distingue “territórios concretos” de “territórios abstratos” ao diferenciar espaço de território. O espaço seria “a realidade material preexistente” e o território o produto de uma ação social de apropriação do espaço que se dá tanto de forma concreta como abstrata (RAFFESTIN, 1993). Como tal, “se inscreve sempre num campo de poder não apenas no sentido de apropriação física, material (através das fronteiras jurídico-políticas, por exemplo), mas também imaterial, simbólica” (HAESBAERT, 1997: p. 40). Lefèbvre (1986) distingue espaços dominados de espaços apropriados e considera que a apropriação e a dominação embora devessem aparecer juntas, a história (a da acumulação) é também a história da sua separação, da sua contradição. Para Oliveira, o território é concebido como: síntese contraditória, como totalidade concreta do processo/modo de produção/distribuição/circulação/consumo e suas articulações e mediações supraestruturais (políticas, ideológicas, simbólicas etc.) em que o Estado desempenha a função de regulação (OLIVEIRA, 2002: p. 74). Haesbaert prioriza a identidade espacial como produto de uma apropriação da dimensão simbólica e mais subjetiva do espaço (1997: p. 40). Moreira e Targino fazem menção a um “Território de Esperança”. Trata-se segundo os mesmos, daquele conquistado e construído pela luta dos trabalhadores (indígenas ou não) através de estratégias diversas e simboliza uma ruptura com o sistema hegemônico. Segundo os mencionados autores, o que eles denominam de Território de Esperança seria, (...) um território novo, construído com base na utopia e na esperança. “Território de Esperança”, “Território de Solidariedade” e também, parafraseando Félix Guattari, “Território de Desejo”, carregado de contradições, mas também de sinalizações de uma forma experienciada de organização social diferente daquela marcada pela subordinação, pela dominação, pela bestialidade da exploração. Desse modo, “Território de Esperança” representa a superação do “Território de Exploração” (MOREIRA e TARGINO, 2007: p.35). Pode-se afirmar que na APA da Barra do Rio Mamanguape, mais precisamente nas Terras Indígenas, desenvolveu-se e desenvolve-se uma luta pela construção de um “território de esperança”, marcado por uma organização social diferenciada. Esta vem sendo construída fundamentalmente com base num trabalho das comunidades em torno da luta pela garantia da demarcação das terras indígenas7 e da extrusão de pessoas que haviam se apropriado das mesmas, e em torno do desenvolvimento de atividades produtivas e sociais como forma de se opor a forte dominação capitalista na área, efetivada através da exploração da cana-de-açúcar. Alguns estudiosos têm utilizado o conceito de território na identificação de espaços de disputa pela construção de novas “territorialidades étnicas”. Nesta direção encontram-se os estudos sobre territórios quilombolas, territórios indígenas, entre outros. Neles, o território étnico se confunde com o território de luta de comunidades tradicionais pelo seu reconhecimento, pela delimitação e legitimação de seu espaço ocupado, pela garantia de poderem desenvolver atividades que garantam sua subsistência, pela preservação/restauração dos seus hábitos e de sua cultura (MARQUES e RODRIGUES, 2007; MOREIRA, 2007; ALMEIDA, 2001; MÜLLER, 2006). 2.2.1 Os territórios protegidos No que tange à criação de áreas destinadas a proteção e preservação do meio ambiente, em 1911, é criada a primeira reserva florestal do Brasil, através do Decreto nº. 8.843, de 26 de junho. A partir desse marco tem início a criação de outras reservas, bem como de áreas de proteção ambiental, sendo a primeira criada em 1982, no Estado do Rio de Janeiro, através do Decreto nº. 87.561, possuindo uma área de 59.049 hectares. As Áreas de Proteção Ambiental8, no Brasil, modalidade de unidade de conservação9 (UC), tiveram sua criação autorizada a partir da publicação da Lei nº 6902, de 27 de abril de 1981, que estabelece: 7 Um dos resultados dessa luta foi exatamente a demarcação das Terras Indígenas de Monte Mor. O “Ministério da Justiça, através da Portaria nº 2.135/07, publicada no Diário Oficial da União (DOU), em 17 de dezembro de 2007, declarou a posse permanente do povo indígena potiguara à terra de Monte Mor (Jornal o Norte, terça, 08 de janeiro de 2008). Essa área reconhecida como Terra Indígena dos Potiguara de Monte Mor possui aproximadamente 7.487 hectares. 8 “área extensa, com certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivo básico proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais. É constituída por terras públicas e privadas” (BRASIL/MMA, 2005). 9 Nos termos da Lei nº 9985/2000, a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), em seu artigo 2º, inciso I, entende-se por Unidades de Conservação o “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder O Poder Executivo, quando houver relevante interesse público, poderá declarar determinadas áreas do Território Nacional como de interesse para a proteção ambiental, a fim de assegurar o bem-estar das populações humanas e conservar ou melhorar as condições ecológicas locais (BRASIL, 1981: art. 8°). Com base nessa Lei e devidamente regulamentadas pelos decretos que se seguiram, existem, atualmente, 30 APA’s em todo o território brasileiro, na esfera federal (tabela 1). Tabela 01 – Áreas de Proteção Ambiental (APA) Federal 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 Área de Proteção Ambiental Petrópolis Piaçabuçu Bacia do Rio São Bartolomeu Bacia do Rio Descoberto Cairuçu Quapi-Mirim Jericoacoara Cananéia-Iguape e Peruíbe Serra da Mantiqueira Guaraqueçaba Fernando de Noronha Igarapé Gelado Cavernas do Peruaçu Castre de Lagoa Santa Morro da Pedreira Serra de Tabatinga Ibirapuitã Anhatomirim Barra do Rio Mamanguape Delta do Parnaíba Serra da Ibiapaba Chapada do Araripe Ilhas e Várzeas do Rio Paraná Costa dos Corais Meandros do Rio Araguaia Baleia Franca Nascentes do Rio Vermelho Planalto Central Bacia do Rio São João/Mico-LeãoDourado Tapajós UF RJ AL DF DF/GO RJ RJ CE SP MG/SP/RJ PR PE PA MG MG MG MA/TO RS SC PB PI/MA/CE PI/CE CE/PE/PI PR/MS AL/PE GO/MT/TO SC GO DF/GO RJ PA Decreto 87.561 88.421 88.940 88.940 89.242 90.225 90.379 90.347 91.304 90.883 92.755 97.718 98.182 98.881 98.891 99.278 529 529 924 Data criação 13/09/82 21/06/83 07/11/83 07/11/83 27/12/83 25/09/84 20/10/84 23/10/84 03/06/85 31/10/85 05/06/86 05/05/89 26/09/89 25/01/90 26/01/90 06/06/90 20/05/92 20/05/92 10/09/93 28/08/96 26/11/96 04/09/97 30/09/97 23/10/97 02/10/98 14/09/2000 27/09/2001 10/01/2002 27/06/2002 Área (ha) 59.049 8.600 84.100 32.100 33.800 14.340 6.800 202.832 402.517 291.500 2.700 21.600 150.000 35.600 66.200 60.000 318.000 3.000 14.640 313.800 1.592.550 1.063.000 1.003.059 413.563 357.126 156.100 176.159 13/12/2006 780.769 150.700 Fonte: Ibama/MMA Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção”. Dentre as APA’s federais criadas, encontra-se a da Barra do Rio Mamanguape, localizada no Estado da Paraíba. Ao analisar os objetivos que embasaram a criação dessa APA, observa-se a aplicação, sobretudo, do princípio da prevenção, pois se trata de uma região rica, no que tange à biodiversidade. É nela que se encontra o projeto Peixe-Boi, de conservação dos mamíferos aquáticos, por exemplo, espécie ameaçada de extinção. Também é uma área de manguezal, berçário e morada, dentre outras espécies, do caranguejo-uçá (Ulcides cordatus), também ameaçado de extinção. Com a criação de uma APA algumas restrições são impostas quanto à utilização dos recursos naturais nela existentes. Na Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape, objeto desse estudo, o Decreto 924/93 trouxe em seu texto dispositivos legais que determinaram a restrição de determinadas atividades, como, por exemplo, o exercício de atividades que possam vir a causar erosão ou assoreamento das coleções hídricas, bem como as que resultem em despejo nos cursos d’água de qualquer efluentes, resíduos ou detritos, em desacordo com as normas técnicas oficiais. 2.3 CONFLITO A discussão sobre conflito, tanto no plano social, econômico, cultural, ambiental, organizacional entre outros, é extensa, e não é pretensão deste estudo tomá-la como elemento central, mas tão somente, a partir do resgate de algumas diferentes compreensões, chegar a uma definição de conflito sócio-ambiental que exprima a realidade estudada. Ou indagar se o conflito, conceito tão rico de sentidos, pode ser apreendido como categoria central de análise da relação sociedade/natureza estabelecida no caso da APA da Barra do Rio Mamanguape. Na literatura, o termo conflito pode ser entendido como o resultado de uma situação de antagonismo entre sujeitos diferentes, interesses diferentes, sentimentos contrários, que se opõem. Como tal, ele sempre esteve presente na história da humanidade expressando-se através da luta entre os homens e o meio natural, social, familiar e político, o homem e entidades sobrenaturais e até mesmo entre o homem e o seu mundo íntimo. Como bem o diz Theodoro: (...) os conflitos têm uma longa tradição na sociedade humana. Estiveram presentes na constituição dos hominídeos, em constante luta contra as intempéries da natureza, a escassez de bens e as ameaças dos predadores. O conflito aparece ainda no centro das grandes religiões, inclusive o Cristianismo. O conflito atravessa a vida de Cristo, de Pedro, de Judas e Pilatos, de Paulo, entre outros. Nas artes, o conflito está presente desde as suas origens. Ele é o cerne das tragédias gregas, desde Édipo até Helena de Tróia, e de toda a grande literatura, de Cícero a Dostoievski, passando por Shakespeare. Para alguns analistas, a vida humana em seu cotidiano é um permanente conflito entre as pulsões da morte e da vida. A própria origem da vida tem no conflito a sua base (2005: p. 52). Coube a Simmel desenvolver a teoria clássica dos conflitos. Para ele, o conflito é “uma das formas mais vivas de interação, constituindo um processo de associação” sendo os fatores responsáveis pela dissociação “o ódio, a inveja, a necessidade e o desejo” (SIMMEL, 1983: p. 53). Nesse sentido, o conflito objetiva: resolver estes dualismos divergentes, (...) reconstruir uma unidade perdida ainda que por meio da destruição de uma das partes envolvidas. (...) Nem sempre conduzem à conciliação podendo, por vezes, ser responsável pela desagregação. Mas não podem ser negados nem esquecidos e, sobretudo não possuem uma conotação negativa (THEODORO, 2005: p. 54). Levando em consideração o estabelecido pela teoria econômica marxista, o conflito se traduz na luta entre capital e trabalho e se expressa através do confronto entre classes antagônicas: a dos proletários e a dos burgueses (MARX e ENGELS, 2007). Essa compreensão, aplicada ao caso da APA da Barra do Rio Mamanguape levaria a um entendimento parcial do conflito uma vez que este vai além dos interesses de classes. Isto na medida em que envolve outros atores tais como o próprio Estado representado principalmente pelo seu aparelho judicial e comunidades tradicionais como os remanescentes indígenas, e ainda por comportar relações que não são especificamente de classes como as que se estabelecem entre o homem e a natureza. Burrel & Morgan (1979, apud HALL, 1984), estabelecem uma relação entre interesses, conflito e poder a qual se expressa através de três visões: a) a visão unitária através da qual o conflito é visto como um fenômeno raro e transitório que pode ser eliminado através de uma ação gerencial apropriada; b) a visão pluralista que concebe o conflito como uma característica intrínseca e inerradicável dos assuntos organizacionais e enfatiza seus aspectos potencialmente positivos e funcionais e; c) a visão radical, que encara o conflito como “força motora onipresente e causadora de rupturas, que impele às mudanças na sociedade em geral e nas organizações em particular” (BURREL & MORGAN, 1979, apud HALL, 1984: p. 93). Lukes (1980) faz menção aos conflitos abertos e encobertos, sendo os primeiros observáveis e os segundos os que não têm força para manifestar-se, mas estão presentes no burburinho, nos murmúrios, expressos na insatisfação não exposta que não é capaz de modificar o satus quo. Lukes identifica ainda ter um terceiro tipo de conflito que ele denomina de latente, isto é aquele que pode manifestar-se quando determinados atores podem tomar consciência do quanto seus verdadeiros interesses podem ser desconsiderados. Nesse caso Lukes amplia a clássica definição de poder segundo a qual: A tem poder quando faz B fazer algo que não faria se não fosse A. A também exerce poder sobre B ao influenciar, moldar ou determinar seus próprios desejos. Com efeito, não é o supremo exercício do poder levar outro, ou outros, a ter desejos que se queria que tivessem – isto é assegurar sua obediência controlando seus pensamentos e desejos? (LUKES, 1980: p. 18). Analisando essa abordagem de conflito, Cecílio (2005) afirma que a formulação de Lukes remete ao: campo da ideologia, da falsa consciência, da concepção gramsciana de hegemonia política e cultural de um grupo social sobre os subalternos, de forma que os excluídos ou os submetidos às várias formas de violência e dominação sequer chegam a estar conscientes dos seus interesses (CECÍLIO, 2005: p. 509). Barbanti Jr. (2002) identifica duas tendências atuais do enfoque de conflito. A primeira é denominada de “instrumentalização do tema”. Neste caso, o uso do termo conflito é dissociada de teorias de conflito, parecendo substituir o termo problema (BARBANTI JR, 2002). Assim sendo, os “problemas sócio-ambientais”, são tratados como “conflitos sócioambientais”. Para este autor, As contribuições feitas por esta tendência residem no aspecto descritivo de projetos que possuam alguma dimensão conflituosa, ainda que se possa argumentar que mesmo uma descrição deveria indicar qual é o marco teórico que ilumina o problema (2002: p.5). A segunda tendência identificada por Barbanti Jr. é a da “setorialização dos conflitos no escaninho terminológico ‘ambiental’ ou ‘sócio-ambiental’” (2002: p.5). Nessa tendência distinguem-se os trabalhos de Hannigan (1995) e Fucks (2001) influenciados pelo construtivismo e outros que dão ênfase à dimensão prática da ocorrência dos conflitos no embate com os atores sociais como Pacheco (2002). Fucks (2001), ao abordar os conflitos ambientais no Rio de Janeiro se debruça sobre a disputa acerca da compreensão pública dos assuntos e problemas sociais, considerando que esse processo ocorre no sistema denominado por Hilgartner e Bosk (1988), de “arenas públicas”. Nestas estariam em curso, “as atividades reivindicatórias de grupos, o trabalho da mídia, a criação de novas leis, os conflitos processados pelos tribunais e a definição de políticas públicas” (FUCKS, 2001: p.47). Visto por este prisma “um conflito não seria algo dado em si, mas algo construído nas relações sociais” (BARBANTI JR, 2002: p.5). Theodoro (2005) considera os conflitos sócio-ambientais como “modernos” e característicos da sociedade moderna. Para ela, nos tempos modernos os conflitos potenciais ou manifestos, sinalizam para uma transição de valores, de práticas e até de estilos de vida, uma vez que as discussões, não raro, remetem a uma compreensão da relação dos homens com a natureza ao longo do tempo, além da incorporação de alguns conceitos e dificuldades analíticas comuns em situações conflituosas (THEODORO, 2005: p. 54). Essa visão de “modernidade” dos conflitos sócio-ambientais de Theodoro, acha-se no nosso entender muito mais relacionada a questão da atualidade. Na verdade conflitos dessa natureza não são recentes, podendo serem identificados desde a Antiguidade através da luta dos povos em torno da água, da terra e dos produtos da natureza visando sua sobrevivência. 2.3.1 Conflitos sócio-ambientais Os conflitos10, nos quais o meio ambiente encontra-se envolvido, não são recentes. Todavia, vale ressaltar que, a princípio, em contendas jurídicas, o homem chamava ao processo, para que nele atuasse como pólo passivo, a própria natureza, podendo-se utilizar como exemplo o que ocorreu em 1545 quando “os habitantes da aldeia de Saint-Julien 10 Luta consciente e pessoal, entre indivíduos ou grupos, em que cada um dos contendores almeja uma condição, que exclui a desejada pelo adversário. intentaram instaurar junto ao juiz episcopal de Saint-Jean-de Maurienne, um processo contra uma colônia de gorgulhos que havia invadido os vinhedos, causando grandes estragos”. O resultado dessa contenda foi o ganho de causa para os insetos, que foram defendidos por um advogado designado para tanto, onde a argumentação levantada pelo mesmo foi a de que os animais criados por Deus têm o mesmo direito dos homens a se alimentarem dos vegetais. (FERRY, 1994). Todavia, a título internacional, o caso que mais se destacou, e é conhecido até os dias atuais como sendo uma referência obrigatória, foi o publicado pela Southern California Law Review em 1972, redigida pelo professor Christopher D. Stone. Este caso ocorreu no final dos anos sessenta, quando a sociedade Walt Disney decidiu por em prática seus planos de instalar uma estação de esportes de inverno no Mineral King Valley, um vale da Sierra californiana, conhecida por suas sequóias centenárias. Contudo, o Sierra Club, associação em defesa da natureza, se opôs de forma veemente ao projeto. Em 17 de setembro de 1970, o Tribunal de Apelação da Califórnia rejeitou a ação, alegando não possuir o Sierra Club interesse de agir, pois não sofria pessoalmente nenhum prejuízo. Em decorrência do entendimento manifestado pelo Tribunal de Apelação, Ch. Stone é solicitado para escrever urgentemente um artigo com o fulcro de levá-lo ao conhecimento dos juízes do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, antes que houvesse a deliberação dos mesmos sobre o caso em apreço. O artigo surtiu os efeitos desejados, apesar de não ter sido suficiente para influenciar na decisão da maioria dos juízes, o que levou a rejeição da ação movida pelo Sierra Club contra a Walt Disney, com uma votação de 4 votos contra 3. No entanto, a Walt Disney desistiu do projeto, e, em 1978 o Mineral King Valley foi incluído no Sequoia +ational Park11 (OST, 1995). No Brasil, pode-se afirmar que as discussões na esfera judicial incluem não apenas os problemas referentes à atuação de grupos empresariais, mas se estendem às opções 11 Mais c’est sans conteste à Ch. Stone que revient le rôle de pionner en la matière. Son essai de 1972 – Should Trees have Standing? Toward Legal Rights for Natural Objects -, tant par l’originalité et la radicalité de la thèse qu’il contient que par les circonstances dans lesquelles il a été écrit, est et demeure encore la référence obligée en la matière (dans la littérature américaine, l’article est souvent mentionné par le simple mot : Trees). (OST, 1995 : p.172) tradicionais de assentamentos das comunidades tradicionais, via de regra nas proximidades dos córregos d’água (ALEXANDRE, 2003). Segundo Leitão (2004), uma das questões mais relevantes no âmbito dos movimentos sócio-ambientais no Brasil é a referente à possibilidade da presença, ou não, de pessoas nas Unidades de Conservação (UCs). Dois são os grupos que defendem pontos de vista antagônicos, estando de um lado o que entende ser nociva à preservação do meio ambiente a presença de seres humanos no interior de UCs, pois a prática de atividades que façam uso dos recursos naturais causam impactos ao meio ambiente, e o objetivo da criação das Unidades de Conservação é exatamente o de impedir a depleção dos recursos oriundos da natureza; e, de outro lado, aquele que alega serem as UCs criadas em locais onde, via de regra, a presença de populações já se fazia presente, e, ainda, que o patrimônio ambiental a ser preservado também é resultante da relação decorrente dessas populações e dos recursos naturais existentes no local. Ainda segundo Leitão, “o mundo jurídico não fica alheio a esse debate, havendo setores que se perfilam ao lado de uma e de outra das correntes indicadas.” (2004: p.17) Paul E. Little, num estudo sobre a etnografia dos conflitos sócio-ambientais distingue alguns elementos da ecologia política que auxiliam na compreensão e na abordagem de tais conflitos, tais como: a) “a necessidade de lidar simultaneamente com as dimensões social e biofísica − portanto o termo sócio-ambiental − e não simplesmente o ambiental ou o social por separado, como fazem as ciências naturais e as ciências sociais, respectivamente” (LITTLE, 2004: p. 1); b) a utilização do princípio de simetria epistemológica. Este ocorre quando os agentes naturais e os atores sociais são ambos tratados como potenciais na construção de uma paisagem; Para tanto, o pesquisador em ecologia política precisa mapear as principais forças biofísicas, tais como a conformação geológica de uma região, a evolução biológica da fauna e flora e os fluxos hídricos, junto com as principais atividades humanas, tais como os sistemas agrícolas, os efluentes industriais lançados ao ambiente e a infra-estrutura de transporte e comunicação instalada na região Além de estar atento aos dois lados dessa causalidade, o pesquisador também procura identificar as novas realidades sócio-ambientais que surgem das interações entre esses dois mundos e que só uma abordagem ecológica é preparada em enxergar (LITTLE, 2004: p. 2). c) o fato da Ecologia Política se constituir numa metodologia na qual “as relações são o foco de análise”, o que implica em lidar com distintas esferas de interação, o que demanda uma abordagem transdisciplinar e, consequentemente, a incorporação de conceitos, métodos e enfoques de diversas disciplinas; d) a requisição da ampliação do marco temporal das pesquisas “para tratar as temporalidades geológica (expressa em milhões de anos), biológica (milhares de anos) e social (centenas de anos) em forma conjunta” (LITTLE, 2004: p. 2); e) a exigência de uma delimitação biogeográfica adequada para contar a história ambiental; f) o uso da macro-análise para contextualizar os conflitos dentro de um marco maior. Nesse sentido, conforme Little, A abordagem da economia política é a base da macro-análise e trata de temas como o sistema capitalista e o atual avanço as ideologia neoliberal, as situações de neocolonialismo político e cultural, os processos vertiginosos de globalização tecnológica e o novo quadro geopolítico e militar. Em muitos casos, essa abordagem levanta à vista os choques entre sistemas produtivos, os quais tem conseqüências diretas para o tema ambiental (2004: p. 3). O estudo etnográfico dos conflitos sócio-ambientais segundo Little, deve partir da identificação do foco do conflito, em seguida deve realizar a identificação e análise dos principais atores sociais envolvidos, buscando entender e mapear suas intenções e posições bem como “suas distintas cotas de poder” e ainda mapear as interações políticas na busca do entendimento da dinâmica própria de cada conflito (LITTLE, 2004). O mencionado autor chama ainda a atenção para se ter cuidado, na análise de um conflito sócio-ambiental com a postulação de resoluções “tecnicistas” quando afirma: Como antropólogo, não acredito que podemos determinar tecnicamente quais dos múltiplos usos de uma área é ótimo: uma terra indígena, por exemplo, onde o povo indígena reivindica controle sobre uma área com base nos seus direitos, pode ser propício para atividades de mineração ou exploração florestal desde uma perspectiva economicista, ou pode também servir para ser um parque nacional devido a suas características biofísicas únicas. A decisão sobre o uso depende, na última instância, nas valorizações em conflito e não em critérios técnicos ou econômicos de custo-benefício. É por isso que o foco principal da pesquisa sobre os conflitos sócio-ambientais desde as ciências sociais são os distintos atores sociais e suas respectivas reivindicações (LITTLE, 2004: p. 5). Essas considerações não devem ser entendidas como um desvio do foco central da pesquisa (os conflitos sócio-ambientais), mas como elementos presentes nesses conflitos. 2.3.2 Conflitos sócio-ambientais e a atividade de carcinicultura A carcinicultura é uma atividade praticada em vários países, destacando-se os localizados na Ásia e América Latina. Os fatores responsáveis pelo fato desses países constituírem-se nos principais produtores de camarão em viveiro do mundo estão relacionados às condições climáticas e à vegetação neles existente, pois a espécie de camarão que gera maior lucratividade desenvolve-se melhor em áreas de clima quente e úmido e em regiões estuarinas como as existentes nesses territórios. Todavia, não adiantaria haver essas condições naturais se não houvesse investimento por parte de quem detém o capital, ou seja, fez-se necessário, para a implantação dessa atividade, a presença do capital vindo, dentre outros lugares, do Banco Mundial, do Asian Development Bank e da Food and Agriculture Organization of the United Nations. Não podemos nos esquecer que no Brasil, na região Nordeste, o Banco do Nordeste também tem sido um dos financiadores nessa área. A atividade carcinicultora vem apresentando um crescimento mundial significante de nove por cento ao ano (9% a.a.), desde 1970. Isso se deve, dentre outros fatores, ao aumento do consumo de camarão no mundo, que passou de 5%, nos anos 80, para 28%, em 2003 (Environmental Justice Foundation, 2003). Todavia, os maiores consumidores do produto em apreço não são os países que o produzem, mas, sim, os Estados Unidos da América, Europa e Japão. Na medida em que ocorre o desenvolvimento crescente da carcinicultura, observa-se também a depleção dos recursos litorais em decorrência da prática da mesma. Uma vez sendo utilizadas áreas de manguezais para a prática dessa atividade, local considerado como sendo o refúgio e berçário de várias espécies de peixes, moluscos e crustáceos, e tendo-se a informação de que 38% da suplantação mundial dessas áreas decorrem da construção de fazendas de camarão, observa-se a interferência da atividade na biodiversidade da região em que é implantada. 2.3.2.1. Depleção dos recursos litorais De acordo com pesquisas realizadas pela Environmental Justice Foundation (EJF), tem-se notado que um dos problemas centrais da criação de camarão em viveiro é a conversão do sistema de usuários múltiplos para o de único proprietário/ usuário. Quer-se dizer com isso que áreas que pertenciam a toda uma comunidade passam a pertencer a um único proprietário, aquele que irá desenvolver a carcinicultura, inclusive, em algumas situações, impedindo a população a passagem até às margens do rio, de onde retiram o seu sustento. Vejamos na figura abaixo (fig.01) o que houve no Equador, onde uma área de mangue foi transformada, em parte, em fazendas de camarão. Fica claro, nesse caso, que a população deixou de ter o acesso a sua fonte de vida. Fig. 01 – Viveiros de camarão no Equador Fonte: Environmental Justice Foundation, 2003 Outro problema enfrentado, em decorrência dessa atividade, é a poluição causada pelos viveiros que pode vir a afetar os recursos naturais. As águas que são utilizadas nos viveiros, oriundas do estuário, são “enriquecidas” com cal e ração para camarão, produzida por laboratórios especializados, produtos químicos no momento da despesca e com os dejetos lançados pelos próprios camarões. Essa água deve ser tratada antes de ser lançada ao mangue, mas poucos são os empreendimentos que realizam esse tratamento. Dentre todos os poluentes citados, há um que se destaca, o metasulfite, produto extremamente nocivo que tem como função tratar o camarão para que possa ser vendido ao mercado externo. Outro dado importante é a queda na renda dos pescadores em decorrência da prática da carcinicultura nas regiões de mangue, podendo-se citar o que ocorreu em Kuala Muda, localizada em Kedah, Malásia, onde entre dois e três anos de liberação dos mangues para a criação de fazendas de camarão o decréscimo na renda foi de 16,67%. Pode-se citar, ainda o decréscimo de 62,5% da pesca no Sri Lanka, de 10% em Ramchandrapuram, na Índia, de 80% em Bangladesh (Environmental Justice Foudation, 2003). No Sri Lanka, outro fator observado foi a queda da pesca realizada pelos pescadores das lagunas, que chegou a 62,5%, e, no Equador, outro grande produtor de camarão em viveiro, houve um decréscimo da captura de larvas de camarão. No Brasil, o que se vem observando é a morte dos caranguejos, espécie em extinção, e que ainda serve como fonte de sustento para algumas famílias (Environmental Justice Foudation, 2003). A foto abaixo (fig.02) ilustra mais uma situação preocupante provocada pela retirada da vegetação de mangue. Conforme depoimento do Senhor Mohamed Ibrahim, habitante de Bangladesh, haviam ciclones, mas não como agora - as ondas eram paradas pelas florestas. Depois dos anos 60, com intensa desflorestação, os ciclones intensificaram-se. A vegetação funcionava como barreira natural às ondas formadas em decorrência dos ciclones, impedindo que as mesmas chegassem até às residências da população. A carcinicultura vem crescendo consideravelmente, no litoral da região Nordeste, responsável por mais de 90% da produção de camarões do Brasil. Atualmente, a Paraíba é o quinto Estado brasileiro produtor desse tipo de produção, apresentando o maior ritmo de crescimento da atividade. É interessante ressaltar que este tipo de aqüicultura encontra-se, no Brasil, em sua terceira fase. A primeira fase teve início nos anos 1970, com o cultivo da espécie Penaeus japonicus, que não obteve êxito, uma vez que as chuvas intensas e as apreciáveis variações de salinidade nas águas estuarinas prejudicavam o período de maturação dessa espécie. Em decorrência do insucesso no cultivo dela, buscou-se implementar outras espécies de camarão com o objetivo de se alcançar sucesso na produção, ou seja, lucro. Dá-se início, desta feita, a segunda fase da produção de camarão em viveiros no Brasil. Fig.02 – Mangue devastado pela prática da carcinicultura em Bangladesh Fonte: Environmental Justice Foundation, 2003 A segunda fase surge com o ingresso do cultivo das espécies nativas Litopenaeus subtilis, Litopenaeus paulensis e Litopenaeus schimitti, espécies estas que demonstraram ser viáveis, sobretudo na maturação, reprodução e larvicultura. Todavia, os níveis de produtividade alcançados, via de regra, sequer cobriam os custos diretos de produção, tornando-se inviável o seu cultivo. Assim sendo, surge a terceira fase da carcinicultura brasileira. Na terceira fase, que segue até os dias atuais, houve a interrupção da domesticação das espécies nativas supracitadas, e o ingresso da espécie Litopenaeus vannamei, onde suas póslarvas e reprodutores foram importados. Atualmente, essa é a espécie mais cultivada no Brasil, tendo em vista seu fácil manejo e retorno financeiro elevado. O sistema semi-intensivo de cultivo de camarões dessa espécie utiliza areadores mecânicos (figs. 03 e 04), alimentos concentrados (fig. 05) e larvas produzidas em laboratórios (fig. 06), ocorrendo uma densidade de povoamento entre 20 e 50 pós-larvas/m2. Fig. 03 – Aeradores utilizados na produção de camarão em viveiro Foto: Juliana F. Moreira Fig 04 – Aeradores Fig. 05 – Ração Fig. 06 – Larvas Aeradores movidos com energia elétrica. Há, ainda, os que são movidos a óleo diesel, nos locais em que não foi instalado, ainda a energia. Ração utilizada na engorda do camarão. Todos os entrevistados afirmaram utilizar essa marca de ração em seus viveiros. A Aquatec é a responsável pelas larvas que são adquiridas pelos carcinicultores da área objeto de estudo dessa pesquisa. Fonte: Pesquisa de campo Fotos: Juliana F. Moreira A carcinicultura, ao contrário do que alguns possam estar pensando, não atinge apenas a pesca, vai além. Reduz o acesso à água potável, em decorrência da salinização e poluição das águas dos rios através dos pesticidas, antibióticos e desinfetantes neles lançados. No Sri Lanka e Bangladesh, mulheres e crianças precisam caminhar de 5 a 6 km diariamente para buscar água potável. Além da redução ao acesso de água potável outra redução também vem ocorrendo, só que da produtividade na agricultura, decorrente da poluição do solo e da água. Em Vettapalem Mandal, na Índia, 620 ha de área de cultivo de arroz foram convertidos em viveiros de camarão e 344 ha perdidos devido a salinização da água. Em Ca Mau Province, no Vietnã, a situação não é diferente, em 2001 125.000ha de cultivo de arroz foram convertidos e a produção de arroz caiu para 460.000 toneladas. 2.3.2.2 O processo produtivo O processo produtivo do camarão em cativeiro, segundo alguns autores12, ocorre, geralmente, em três fases: produção de larvas (Larvicultura), berçário, e engorda. A larvicultura se inicia com o cruzamento entre as matrizes e reprodutores de camarões, após o cruzamento da espécie, e posterior ovulação realizada em laboratório. Em seguida, as larvas são retiradas dos tanques do laboratório para outros tanques, até alcançar o estágio de póslarvas e serem comercializadas para as fazendas de engorda. Segundo Lima, “o ciclo de engorda do camarão pode durar de 90 a 150 dias, levandose em conta as condições de produção e o peso dos camarões a serem comercializados” (2004: p.95). Até que o camarão esteja pronto para a despesca é necessário, em geral, noventa dias. Posteriormente passam por um choque térmico com temperatura de 3ºC a 5ºC, para serem embalados em caixas com gelos, transportados e comercializados. É possível que se faça até duas ou três despescas por ano considerando que, para que ocorra a oxigenação, descanso da terra e a mineralização das matérias orgânicas, é necessário que haja um intervalo de aproximadamente 30 dias antes da inserção de novos camarões nos viveiros. A produção de camarão em viveiro, atividade que foi iniciada no Brasil na década de setenta, já se desenvolvia como demonstrado, em outros países da Ásia e das Américas Central, do Sul e do Norte, a exemplo de Bangladesh, Vietnã e México. É um mercado seletivo e exigente quanto à qualidade do produto. 12 LIMA (2004) e IGARASHI (2005). A espécie de camarão Litopenaeus vannamei, da Costa do Pacífico, região de clima semelhante área litorânea brasileira foi a que melhor adaptou-se, especialmente ao Nordeste. Essa espécie apresentou maior rentabilidade em cultivos semi-intensivos. Sendo técnica e economicamente viável, esta produção se consolidou no Brasil, embora o país também produza as espécies nativas, Litopenaeus schmitti, Fartantepenaeus brasiliensis, Fartantepenaeus subtilis, Fartantepenaeus paulensis, bem como algumas exóticas: M. japonicus, L. vannamei, L. stylirostris e Peanaeus monodon (IGARASHI 2005: p.11). Dentre os impactos ambientais causados pela carcinicultura, pode-se destacar: o aumento da erosão, da temperatura e da evaporação e perda da biodiversidade; mudança na paisagem com impacto visual; conflito com outros usos, como turismo; contaminação dos corpos hídricos pelo aumento da carga orgânica, substâncias químicas e geração de sedimentos; assoreamento, aumento de turbidez, eutrofização e redução da biodiversidade; dentre outros (CARVALHO, 2006: p. 300). Por agredir o meio ambiente, a criação de camarões em cativeiros vem sendo criticada pela sociedade. Algumas indagações são levantadas a este respeito, e, entre elas, as relacionadas ao desenvolvimento da carcinicultura em Área de Preservação Permanente (áreas de mangue). Os sistemas de produção de camarão no Brasil são dos tipos intensivo e semiintensivo13. Embora a produção do camarão L.vannamei se adapte bem às áreas estuarina, tem causado conflitos econômicos e impactos ambientais no Brasil. De outro modo, enfatiza Menezes (2005: p.81-84) que nesta tecnologia de engorda, sistema de produção com circuito fechado, inclui o reaproveitamento da água, gera menos riscos de degradação ao meio ambiente e, visa aumentar a produtividade. O conjunto dessas novas técnicas favorece o cultivo para os pequenos produtores rurais, pois sendo os viveiros de pequeno porte, apresentam-se mais fáceis de serem controlados14 em um regime fechado15, apresentando uma produtividade entre 6 e 12 toneladas por hectares, em cada ciclo do camarão L. vannamei. 13 O cultivo semi-intensivo se diferencia do intensivo basicamente pelo número de indivíduos que são colocados em cada viveiro. Enquanto no sistema semi-intensivo o número de camarões por m² varia entre 10 e 35 camarões, no sistema intensivo pode chegar até 100 camarões por m². Já no sistema semi-intensivo, o camarão aproveita uma parcela maior do alimento natural existente no viveiro. No sistema intensivo, onde a competição por alimento é maior, o alimento principal passa a ser a ração. 14 sobre as condições ambientais, como segurança contra, doenças, reduz o risco da espécie exótica ser liberada na área estuariana, maior estabilidade de temperatura dos taludes e menor variação de salinidade na água. Embora o Brasil tenha desenvolvido técnicas de produção dessa espécie de camarão em cativeiros comparáveis às do primeiro mundo, ainda não alcançou a excelência na fase de beneficiamento. Segundo Lima et al (2004: p.101) este processo é realizado no Brasil por empresas que apenas eliminam as impurezas provenientes dos taludes, classificando os camarões por seus tamanhos, enquanto no mercado outras formas de beneficiamentos estão disponíveis. Elas criam espaços para que surjam diferentes graus de agregação de valor ao camarão, seja pelo seu peso, por ser descabeçado ou não, pela embalagem, seja pelo congelamento, entre outras que compõem um conjunto de operações que podem ser realizadas no produto antes de sua comercialização. Neste sentido, o Brasil não agrega valor às suas exportações porque se restringe a beneficiar os camarões, fato economicamente desfavorável, pois o produto é re-trabalhado nos mercados para os quais o Brasil exporta. No mercado interno se destaca o Nordeste como maior produtor por possuir uma rica área estuarina, apropriada para o L.Vannamei. O Rio Grande do Norte e Ceará são os principais produtores. Segundo a ABCC, a Paraíba ocupou o quinto lugar entre 2002 a 2005 no rank nacional. No que tange aos conflitos oriundos da carcinicultura, observa-se deslocamento de comunidades em decorrência da instalação das fazendas de camarão. Esse fenômeno vem ocorrendo não apenas no Brasil, mas também nos demais países produtores de camarão. No Brasil, até 2002, foi constatado o deslocamento de 3000 famílias devido a carcinicultura, em Bangladesh o número ultrapassou 120.000 pessoas (Environmental Justice Foundation, 2003). Esse fenômeno se deu, e ainda se dá, devido ao direito sobre a terra ser minimizado ou até mesmo suplantado pelos produtores de camarão, que constroem os viveiros nas áreas de mangue, onde, anteriormente era praticada a pesca, por exemplo. Algumas mulheres, inclusive, vêm sendo violentadas pelos seguranças dessas fazendas, em Bangladesh, bem como tornando-se prostitutas. 15 Especialmente em relação à produção indígena de camarões, A Resolução CONAMA No 312 de 10/10/2002, em seu ART. 14, especifica que “os projetos de carcinicultura, a critério do órgão licenciador (IBAMA) deverão observar, dentre outras medidas de tratamento e controle dos efluentes, a utilização das bacias de sedimentação como etapas intermediárias entre a circulação ou o deságüe das águas sevirdas, ou quando necessário a utilização da água em regime de recirculação. Parágrafo Único-a água utilizada pelos empreendimentos da carcinicultura deverá retornar ao corpo d’água de qualquer classe atendendo as condições definidas pela Resolução do CONAMA No 20 de 18/06/1986.” Observa-se, ainda, que há fazendeiros de camarão que utilizam da intimidação, violência e até mesmo da suplantação da vida como forma de “defenderem” os seus interesses. É o que ocorreu com Edgar Mora, presidente da Zona de Administração Especial de Machala, no Equador, conforme depoimento do mesmo. Quando os fazendeiros descobriram que eu havia feito os relatórios [sobre corte ilegal de mangue], eu recebi ameaças telefonadas, contra mim, e minha família (EJF, 2003: p.14) Infelizmente, o Sr. Eliodoro de La Rosa, pescador e líder do grupo de pescadores contra a expansão da carcinocultura nas Filipinas, bem como o Sr. Jurin Ratchapol, ativista da Tailândia, e, no Brasil, os Srs. Sebastian Marques de Souza e João Dantas Brito não tiveram a mesma sorte de Edgar Mora, pois foram assassinados. Veja, abaixo, na figura 07, onde pessoas foram assassinadas devido à carcinicultura. Fig. 07 - Assassinatos em decorrência dos conflitos oriundos da carcinicultura Fonte: Environmental Justice Foundation, 2003. Apesar de se observar todos os conflitos supracitados, a justiça vem se manifestando em prol do meio ambiente, se assim pode ser dito. Em 1996 a Suprema corte determinou o fim da operacionalização de novas fazendas de camarão no Policat Lake ou no Orissa’s Chilika Lake, na Índia. No Brasil, tivemos, recentemente, decisão judicial prolatada em 2006 no sentido de que a Usina Jacuípe fechasse sua fazenda de camarão, que se encontrava localizada no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape. Levando em consideração as três categorias de análise, acima expostas, procurou-se montar uma metodologia de pesquisa, apresentada no capítulo seguinte. 3 FORMAÇÃO DO ESPAÇO E CRIAÇÃO DA APA Este capítulo apresenta de modo sucinto alguns aspectos relativos ao processo histórico de ocupação do espaço na região da APA da Barra do Rio Mamanguape e recupera o processo de construção da APA. Compreende que o processo histórico de construção dessa área acha-se intrinsecamente relacionado ao de produção do espaço da Zona da Mata Paraibana apresentando como particularidade a presença de uma população e de um território indígena que sobreviveu às mudanças ali ocorridas ao longo do tempo. 3.1 O PROCESSO HISTÓRICO DE FORMAÇÃO DO ESPAÇO 3.1.1. Da ocupação pré-colonial às formas atuais de ocupação A Área de Proteção Ambiental do Rio Mamanguape, como já mencionado anteriormente, foi criada em 1993. Trata-se de uma área na qual o processo de ocupação humana data do período pré-colonial. Segundo Borges (s.d.), os primeiros habitantes da região teriam sido os índios Potiguara da nação Tupi. Os registros históricos fazem menção ao século XVI, como aquele em que tem início o processo de apropriação do espaço pelo elemento europeu. As condições de navegabilidade do rio Mamanguape favoreceram, primeiramente, a extração de pau-brasil, que, ao longo do tempo, foi cedendo lugar a atividades econômicas de outra natureza, a exemplo da pecuária e da agricultura canavieira. O povoamento foi se dando em torno dos engenhos e no século XVII, surge a partir do trabalho dos jesuítas junto à população indígena, a Vila de Monte Mor – como sede de uma Freguesia que se estendia pela bacia do rio Mamanguape, abrangendo terras da Zona da Mata, do Agreste e do Brejo (www.ambientebrasil.com.br). A implantação de atividade canavieira na área deveu-se tanto aos interesses da metrópole colonizadora em produzir na Colônia um produto de exportação, no caso, o açúcar, de alto valor no mercado europeu como ao fato de que o açúcar produzido no vale do rio Mamanguape tinha facilidades de escoamento (ANDRADE, 1997). A evolução político-administrativa do estado da Paraíba se deu de forma muito lenta e dispersa nos primeiros duzentos anos da ocupação. A configuração dos espaços municipais nesse período é demonstrativa dessa dispersão do processo de ocupação. Na região onde se encontra a APA em estudo, porém, instalou-se em 1635, o segundo município criado no estado, o de Mamanguape, que originalmente ocupava 5.071,0 km² (MOREIRA et al, 2003) que alcançavam o Brejo Paraibano. Desse modo todos os municípios compreendidos pela APA surgiram do desmembramento do território de Mamanguape. Conforme Moreira (1988), até meados dos anos 70 do século XX, a ocupação do espaço nessa região se fazia com base na agricultura alimentar desenvolvida nas clareiras da Mata Atlântica sobre os tabuleiros, na pesca artesanal, na cata do caranguejo e do marisco pelas populações ribeirinhas e na produção canavieira, realizada por unidades agroindustriais e produtores de cana, nas várzeas do rio Mamanguape e de alguns dos seus afluentes. A partir de 1975, graças aos incentivos do Proalcool, a cana-de-açúcar expandiu-se na região alcançando os topos dos tabuleiros costeiros. Esta expansão se deu sobre a vegetação nativa e as terras de índios, de posseiros e arrendatários gerando a eclosão de inúmeros conflitos sociais. Na década de 90, motivados pela divulgação do êxito econômico alcançado pela produção de camarão em cativeiro no estado vizinho do Rio Grande do Norte, alguns atores sociais inseridos no interior da APA tais como usineiros, proprietários de terra e índios, introduzem esta atividade nas áreas de mangue. Atividade que vem se somar às demais atividades historicamente ali presentes dando origem a conflitos sócio-ambientais como o que se analisa neste trabalho. Além destas atividades produtivas outras são também identificadas atualmente na região, sendo algumas mais recentes como a do turismo, e outras mais antigas como a atividade artesanal e o pequeno comércio praticado por restaurantes e bares. A ocupação da área litorânea com residências secundárias tem se expandido notadamente a partir do final dos anos 90. No início dos anos 90 do século XX, segundo Moreira e Targino (1997), no bojo da crise de acumulação vivenciada pela atividade canavieira, e movido pela pressão do movimento ambientalista deslanchado a partir da Eco-92, é criada pelo Decreto 924 de 1993, a Área de Proteção Ambiental - APA da Barra do Rio Mamanguape, numa sobreposição às formas de ocupação pré-existentes no espaço. 3.1.2 A criação da APA da Barra do rio Mamanguape O processo de criação da APA do Barra do Rio Mamanguape foi uma iniciativa de técnicos do IBAMA. Durante a fase de sua criação, técnicos do Projeto Peixe-Boi Marinho procuraram o apoio da Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários (PRAC) da UFPB através do extensionista Emanuel Falcão, tendo em vista obter o esclarecimento e a adesão das comunidades residentes na área. Tal contato justificava-se pelo fato daquela Pró-Reitoria estar desenvolvendo, na época, vários projetos de extensão tanto em comunidades indígenas como com agricultores posseiros da Praia de Campina. Esse apoio da Universidade era fundamental, tendo em vista a pressão exercida por outros grupos (usineiros, proprietários com projetos de loteamento) contrários à criação da APA. As discussões levadas a efeito com as comunidades16 tiveram como objetivo principal informar a população residente na área sobre o que era uma APA e quais as suas implicações. Discutia-se, particularmente, as formas de manejo que poderiam ser utilizadas em uma Área de Proteção Ambiental. No bojo desse processo, foi também trabalhada a questão da criação da Associação dos Moradores de Praia de Campina e a luta pela utilização agrícola de uma área de paul17 reivindicada pelos proprietários da Usina Japungú. Nessas reuniões participaram técnicos da UFPB, do IBAMA e do Projeto Peixe-Boi Marinho. Elas tiveram 16 Foram dois anos de discussões sistemáticas realizadas semanalmente, com articulação nas comunidades de Praia de Campina, Sacos, Tanques, Tavares, Lagoa de Praia e Oiteiro. Nesse período, foi criada a associação dos moradores de Praia de Campina e houve um fortalecimento no trabalho desenvolvido na comunidade de Tavares, chegando até a comunidade de Aritingui. 17 Paul é uma área úmida e alagadiça, no caso em questão trata-se de uma zona úmida fluvial. Para promover a sua utilização agrícola foi preciso todo um trabalho de drenagem realizado manualmente pelos posseiros. início no segundo semestre de 1993. Porém, o processo de esclarecimento a respeito da APA, bem como a conscientização ambiental das comunidades perdurou mesmo após a publicação do Decreto nº 924/93 de 10 de setembro de 1993, que criou a APA da Barra do Rio Mamanguape. Os objetivos atinentes à APA criada são: garantir a conservação do habitat do Peixe-Boi Marinho; garantir a conservação de expressivos remanescentes de manguezal, Mata Atlântica e dos recursos hídricos ali existentes; proteger o Peixe-Boi Marinho e outras espécies, ameaçadas de extinção no âmbito regional; melhorar a qualidade de vida das populações residentes, mediante orientação e disciplina das atividades econômicas locais; e, fomentar o turismo ecológico e a educação ambiental como pode-se .constatar na transcrição do artigo 1º do Decreto nº 924/93. Art. 1° Fica criada a Área de Proteção Ambiental (APA) da Barra do Rio Mamanguape, localizada nos Municípios de Rio Tinto e Lucena, no Estado da Paraíba, envolvendo águas marítimas e a porção territorial descrita no art. 2° deste decreto, com o objetivo de: I - garantir a conservação do habitat do Peixe-Boi Marinho (Trichechus manatus); II - garantir a conservação de expressivos remanescentes de manguezal, mata atlântica e dos recursos hídricos ali existentes; III - proteger o Peixe-Boi Marinho (Trichechus Manatus) e outras espécies, ameaçadas de extinção no âmbito regional; IV - melhorar a qualidade de vida das populações residentes, mediante orientação e disciplina das atividades econômicas locais; V - fomentar o turismo ecológico e a educação ambiental. Nesse mesmo período, começou-se a discutir a pesca predatória do caranguejo, realizada por meio da prática da redinha, onde sacos plásticos são colocados no mangue, mas que nem todos são retirados antes da maré subir, o que causa a morte de inúmeros caranguejos, seja por asfixia, seja por excesso de calor ou falta de alimento. Utilizando-se uma perspectiva educacional da própria APA, buscou-se desenvolver a consciência ecológica dos pescadores praticantes da redinha, o que ainda hoje não alcançou muitos resultados positivos, ou seja, existem mais especulações da mudança de consciência quanto a esta prática de pesca do que resultados realmente comprovados. Já com os índios da região, ou seja, com os índios Potiguara que vivenciaram o fenômeno da superposição de áreas (APA sobre Terras Indígenas), o processo de criação da APA da Barra do Rio Mamanguape procedeu-se de forma mais traumática. Isso, talvez, pela interpretação da lei de forma dura, não flexível, por parte do Ibama, gerando conflitos de compreensão legislativa entre aquela autarquia, de um lado, e a Funai e alguns pesquisadores da Universidade que atuavam na reserva indígena Potiguara, de outro lado. Isto levou os índios a não verem com bons olhos a APA em questão. Em decorrência disso vários enfrentamentos vêm ocorrendo ao longo desses anos, com destaque para os de 1994 e 1998, quando a APA começou realmente a ser efetivada. Estes aspectos serão abordados no capítulo seguinte. Os órgãos competentes para fiscalizar e administrar a APA existentes no Estado da Paraíba são o IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente -, a SUDEMA – Superintendência de Defesa do Meio Ambiente –, o Batalhão de Polícia Florestal, do Estado da Paraíba, as Prefeituras dos Municípios de Rio Tinto e de Lucena e seus respectivos órgãos de meio ambiente, e organizações não-governamentais interessadas (art. 3º, Dec. 924/93). Aqueles que pretendam desenvolver alguma atividade no interior dessa APA, que possa vir a causar algum impacto ambiental, necessitam de licença ambiental, fornecida pelo Ibama, documento hábil, inclusive, para aquisição de empréstimo junto ao Banco do Nordeste para atividades de carcinicultura, conforme pode ser observado na transcrição dos artigos 8º e 9º. do Dec. 924/93. Art. 8° Na APA da Barra do Rio Mamanguape ficam proibidos: I - a implantação de atividades industriais poluidoras capazes de afetar o meio ambiente; II - o exercício de atividades capazes de provocar erosão ou assoreamento das coleções hídricas; III - o despejo nos cursos d’água de qualquer efluentes, resíduos ou detritos, em desacordo com as normas técnicas oficiais; IV - o exercício de atividades que ameacem as espécies da biota, as manchas de vegetação primitiva, as nascentes e os cursos d’água existentes na região; V - o uso de biocidas e fertilizantes, quando em desacordo com as normas ou recomendações técnicas oficiais. (BRASIL, 1993) Art. 9° Na área da APA objeto deste decreto, a abertura de estradas e de canais para construção de barragens em cursos d’água, a implantação de projetos de urbanização, de atividade minerária, de atividade industrial e agrícola, que causem alterações ambientais, dependerão de licenciamento do Ibama. (BRASIL, 1993) Dentre as normas jurídicas protecionistas dos manguezais destacam-se: a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seus artigos 24, 170 e 225; a Constituição do Estado da Paraíba - capítulo IV, Da proteção do meio ambiente e do solo (CARVALHO, 2002, v. III, p.98); Lei nº 4771/65 - institui o novo Código Florestal; Lei nº 6938/81; Lei nº 7661/88 - institui o plano nacional de gerenciamento costeiro, e dá outras providências; Instrução normativa n.1, de 15 de abril de 1999 - estabelece os critérios para o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades que envolvam manejo das faunas silvestres que menciona; Portaria n. 145-N, de 29 de outubro de 1998 - estabelece normas para a introdução, reintrodução e transferência de espécies aquáticas que especifica pra fins de aqüicultura, excluindo-se as espécies animais ornamentais; Decreto nº 99274/1990; Decreto nº 2869/98 regulamenta a cessão de águas públicas para exploração da aqüicultura, e dá outras providências; Instrução normativa interministerial MAA/ MA/Mpog/MIN/CM n.9, de 11 de abril de 2001; Resolução BACEN n. 2752, de 29 de junho de 2000; Decreto n. 750, de 1 de fevereiro de 1993 - dispõe sobe o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, e dá outras providências; dentre outras (CARVALHO, 2002, v. II). 3.1.3 Localização da APA e caracterização dos seus aspectos naturais A APA da Barra do Rio Mamanguape está localizada na Mesorregião da Mata Paraibana, Microrregião do Litoral Norte do Estado da Paraíba. Distante cerca de 70 km da capital João Pessoa, compreende áreas dos municípios de Mamanguape, Rio Tinto, Marcação, Baía da Traição e Lucena (fig. 08). Fig. 08 – Localização da APA da Barra do Rio Mamanguape. Fonte: Antunes et al, s.d. O perímetro aproximado da APA é de 79,9 km totalizando uma área de 14.640 hectares (RODRIGUES; ANTUNES; RODOVALHO, 2005) dos quais 6.000 hectares são constituídos por manguezais. No que se refere aos aspectos naturais distinguem-se na APA, segundo Marinho (2002) três importantes unidades geomorfológicas: as planícies costeiras, as planícies aluviais ou planícies de inundação e os baixos planaltos costeiros. Essas unidades são formadas por terrenos sedimentares quaternários e terciários (MOREIRA, 1999). No que se refere à cobertura vegetal, destaca-se a presença de um amplo manguezal que cobre cerca de 60% da superfície da APA. O manguezal é um ecossistema costeiro de grande riqueza biológica o que faz com que o mesmo constitua-se num “berçário” natural tanto para espécies típicas desse ambiente como para peixes e outros animais que migram para as áreas costeiras. O manguezal do estuário do rio Mamanguape destaca-se por ser o mais amplo do estado, ocupando 5.400 hectares que representam 53,6% do total da área de manguezal da Paraíba18. Nele são encontradas as seguintes espécies arbóreas de mangue: Rhizophora mangle (fig. 09), Avicennia germinans, Avicennia schaweriana (fig 10), Laguncularia racemosa e Conocarpus erectus (Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, 1999). Fig. 09 . Rhizophora mangle. Vegetação típica de manguezal, encontrada no estuário do Rio Mamanguape onde se localiza a APA. Fonte: PALUDO, 1999. 18 Segundo levantamento feito pelo PNUD/FAO/IBAMA em 1994. Fig. 10. Detalhe da espécie Avicennia schaueriana ainda no estágio de crescimento. Fonte: PALUDO, 1999. A fauna dos manguezais é derivada dos ambientes marinhos e terrestres adjacentes. A distribuição é composta principalmente de elementos de origem terrestre como os insetos, aves e mamíferos e nas áreas submetidas a ação das marés elementos da fauna tolerante à salinidade, como moluscos, crustáceos e peixes (Universidade Federal do Ceará, 2005). No estuário do rio Mamanguape onde se situa a APA da Barra de Mamanguape, dentre as espécies da fauna dos manguezais existentes destacam-se o mariscopedra (Anomalocardia brasiliana), a ostra (Crassostrea brasiliana), o caranguejo-uçá (Ucides cordatus), o goiamum (Cardisoma guanhumi), o siri açú (Callinectes danae), o camarão (Pennaeus subtilis, Pennaeus schmitti) e o sururu (Mytella sp) (Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, 1999). Freqüentam a área do manguezal o peixe-boi marinho (Trichechus manatus manatus), o guaxinim (Procyun cacrivorus) , o sagui (Callithrix jacchus), ratos e o morcegopescador (Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, 1999). No que tange à hidrografia dois rios comandam a drenagem da APA: o Miriri e o Mamanguape. O Rio Mamaguape tem maior expressão em volume e extensão, no entanto, o mesmo não se pode afirmar acerca do Rio Miriri, que banha apenas uma pequena superfície ao sudoeste da referida APA. Merece destaque o estuário do rio Mamanguape, não só por sua importância como berçário de inúmeras espécies de peixes, moluscos e crustáceos, como por nele funcionar uma base do Projeto Nacional de Preservação do Peixe-Boi, onde são realizados experimentos de alimentação, comportamento e manejo desse animal, em cativeiro e em ambiente natural. 3.1.4 Ocupação humana da APA e a área de sobreposição com a terra indígena De acordo com Antunes et al. (2006), são 21 as comunidades existentes na APA e seu entorno. Cinco destas comunidades situam-se em área urbana, algumas são ribeirinhas e outras formadas por pequenos agricultores. Nas terras indígenas localizam-se várias Aldeias indígenas Potiguara tais como as de Acajutibiró, Caieira, Camurupim, Tramataia, entre outras (v. mapa em anexo), tendo sido estas duas últimas objeto da investigação direta. Essas comunidades e aldeias congregavam em 2004, uma população de 16.381 habitantes de acordo com os dados colhidos por agentes de saúde locais. A forma de organização social das comunidades situadas nas áreas rurais, ou que possuem atividades rurais, são as associações, cooperativas ou colônias de pescadores. No território da APA, encontram-se localizadas: a) porções das Terras Indígenas Potiguara e Potiguara de Monte-Mor; b) a ARIE Manguezais da Foz do rio Mamanguape (fig. 11); c) a sede do município de Rio Tinto; d) várias comunidades de pescadores e de pequenos produtores rurais como Praia de Campina, Barra, Oiteiro etc.; e) grandes propriedades rurais; f) núcleos habitacionais formados por residências secundárias voltados para as atividades de lazer e turismo. As atividades econômicas tradicionais desenvolvidas pelas comunidades indígenas no território da APA são: a agricultura, praticada tanto em terras de tabuleiros como nas terras de paul19, onde cultivam mandioca, macaxeira, milho, inhame, coco-de-praia e feijão; a coleta de pescado, caranguejo, camarão, marisco e frutas silvestres tais como o caju e a mangaba; a atividade artesanal e uma atividade pecuária bastante incipiente baseada na criação de algumas cabeças de gado e de aves. Na década de 90 do século XX, foi introduzida a atividade carcinicultora que, por ser considerada impactante ao ambiente, e tida pelos 19 Nas áreas de paul os indígenas realizam o plantio de verão uma vez que durante o inverno elas ficam alagadas. indígenas como uma atividade necessária à complementação da sua renda, tem sido objeto de conflito como será observado no capítulo subseqüente. Fig. 11 - Territórios contidos na APA da Barra do Rio Mamanguape Fonte: ROLLA; RICARDO. 2004 4 APRESETAÇÃO DOS RESULTADOS: COFLITOS SÓCIO- AMBIETAIS A APA DA BARRA DO RIO MAMAGUAPE Durante o período da pesquisa foram observados alguns conflitos, tais como: sobreposição da APA nas Terras Indígenas dos Potiguaras; conflito entre Ibama e Funai; Conflito entre os carcinicultores indígenas e o Ibama; conflito entre a população residente na APA e a usina Miriri; conflito entre carcinicultores particulares e Ibama; conflito entre Ibama e Sudema; empresários hoteleiros e Ibama, dentre outros. Dentre os conflitos observados, é notório logo no acesso à APA, o da onipotência da cana-de-açúcar. Como ressaltado no capítulo anterior, um dos motivos que levaram à criação da APA da Barra do Rio Mamanguape foi o avanço do plantio dessa lavoura, o que estava a gerar uma insegurança muito grande para a população moradora do local, que, inclusive, trabalhava, e ainda trabalha, na colheita da cana. Conforme relatos dos moradores da comunidade de Praia de Campina, localizada no interior da APA em questão, o proprietário da Usina Miriri chegou a dizer que era contra a instalação de uma Área de Proteção Ambiental naquela região, pois, alegou ele, iria prejudicar a população que estava, naquele momento, a favor de sua criação, pois prejudicaria o crescimento econômico do local. As terras onde se encontram as moradias da população da comunidade de Praia de Campina também pertencem à Usina Miriri, mas encontra-se sobre a fiscalização do Ibama, órgão responsável para tal, uma vez que estão situadas no interior da Unidade de Conservação APA da Barra do Rio Mamanguape. A seguir apresenta-se a metodologia utilizada, bem como o levantamento dos dados obtidos da produção de camarão em viveiro e um relato dos conflitos sócio-ambientais presentes na APA da Barra do Rio Mamanguape destacando suas origens, seu desenrolar e os atores envolvidos. 4.1 METODOLOGIA Para levar a efeito o estudo do conflito sócio-ambiental no território da APA da Barra do Rio Mamanguape, uma série de procedimentos e técnicas de investigação fizeram-se necessárias, quais sejam: a) Levantamento bibliográfico. Além do levantamento da produção bibliográfica sobre a referida APA, foi levantada e consultada uma ampla bibliografia de suporte para a abordagem teórica e metodológica. Toda a bibliografia utilizada e referenciada encontra-se elencada no final do trabalho; b) Levantamento documental. Foram levantados e consultados documentos referentes à criação da APA, aos processos judiciais sobre a carcinicultura no interior da APA em questão, à legislação indígena, cópias das doações feitas para cumprir a parte social e compensação ambiental do Projeto da Aquafer (Aquacultura Fernando Ltda.), ofícios e memorandos e documentos diversos referentes ao processo de licença ambiental da empresa citada, Resoluções do CONAMA, etc.; c) Trabalho de campo. A pesquisa direta foi de fundamental importância para a realização do estudo. Ela compreendeu várias etapas e vários procedimentos de investigação tais como: i) a realização de visitas: as visitas de campo foram realizadas para identificar os diferentes grupos econômicos e sociais presentes na região. A primeira delas ocorreu em fevereiro de 2006, com a companhia de Falcão20 quando a autora foi apresentada aos moradores da comunidade Praia de Campina, e a seu Carapeba, índio carcinicultor; ii) Nesse primeiro contato, foram relatadas as condições nas quais viviam os moradores, antes e depois da criação da APA da Barra do Rio Mamanguape. As demais visitas foram realizadas seja sozinha ou acompanhada de uma bolsista do PIBIC-UFPB, Joana Resende de Albuquerque que, por estar efetuando pesquisa na área, muito nos ajudou na aplicação dos questionários. 20 Técnico da UFPB que desenvolve trabalho de ação comunitária junto à população residente na APA. Estas visitas foram feitas utilizando tanto o transporte terrestre como o aquático representado por “balsas tradicionais”; iii) realização de entrevistas com os atores sociais envolvidos. Os principais atores sociais presentes na região, constatados pelas visitas realizadas, são os criadores de camarão privados, os pescadores, os catadores de caranguejo, as marisqueiras, usineiros e carcinicultores indígenas. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com: três carcinicultores indígenas; quatro representantes da população residente na Praia de Campina (comunidade instalada no interior da APA, que trabalham como canavieiros, catadores de caranguejo e na carcinicultura como assalariados); um técnico da Universidade Federal da Paraíba que desenvolve trabalho de assistência comunitária junto à população de origem indígena e à população residente nas comunidades existentes no interior da APA e que esteve envolvido no processo de criação da mesma; um dos sócios da usina Miriri; dois técnicos da Funai; um técnico da SUDEMA-PB e; um técnico do IBAMA. Através dessas entrevistas se procurou aprofundar quais os conflitos presentes com a criação da APA na visão de cada ator social, quais os encaminhamentos que foram e que estão sendo dados, quais os principais grupos de interesse oponentes ao grupo investigado, qual a relação deles com o aparelho do Estado, etc. iv) aplicação de questionários. Foi elaborado um questionário que compreendeu além da identificação do entrevistado e de dados a ele relacionados, aspectos sobre o processo de produção do camarão em viveiro e os fatores e conflitos ambientais (v. em anexo). Foram aplicados 13 questionários junto a índios carcinicultores da APA da Barra do Rio Mamanguape; v) tratamento dos dados. Um banco de dados com informações sobre sexo, idade, escolaridade, estado civil, ocupação, condições de trabalho e capacitação técnica dos entrevistados, além de informações sobre os viveiros (data de criação, área, número de taludes, espécies de camarão produzidos, finalidade do cultivo, formas de obtenção das larvas, despesca, sistema de produção, capital utilizado, destino da produção, comercialização), sobre as fontes de financiamento, a origem e as formas de tratamento das águas, a preocupação com a preservação dos mangues, os tipos de solo onde se localizam os taludes e a preocupação ambiental, foi elaborado. Com base no mesmo foram construídos gráficos e tabelas que posteriormente foram analisados; vi) realização de uma documentação fotográfica. Foram feitas fotografias em todas as visitas efetuadas de forma a possibilitar a organização de um acervo sobre o conflito e a APA estudada. 4.2 A CARCINICULTURA NA ÁREA DA APA As atividades econômicas desenvolvidas na APA da Barra do Rio Mamanguape estão relacionadas à agropecuária, a extração vegetal e a pesca, destacando-se na agricultura a monocultura da cana-de-açúcar. Porém, recentemente, a partir do início da década de 1990, foi desenvolvida e implantada a carcinicultura. Esta surgiu no município de Marcação, como uma alternativa para melhorar as condições sócio-econômicas da população. A atividade é desenvolvida no interior da APA tanto pela população indígena quanto por empresas privadas. 4.2.1 A Carcinicultura Indígena A aldeia de Camurupim inaugurou esta atividade na área indígena paraibana, no entanto, foi na aldeia de Tramataia que se construiu o maior número de viveiros entre 1997 e 1998, aproximadamente 115. Vale ressaltar que, embora a atividade agrícola familiar e a atividade de carcinicultura sejam alternativas à ocupação na monocultura canavieira, elas não garantem a independência dos produtores indígenas porque requer um certo capital inicial que só é obtido através de financiamentos bancários, nem sempre acessíveis aos mesmos. A atividade camaroeira desenvolvida pela comunidade indígena no município de Marcação tem base dominantemente familiar (Gráfico 01). Gráfico 01 - Mão-de-obra indígena assalariada e familiar na atividade camaroeira praticada no município de Marcação (2006 / 2007) Fonte: MOREIRA; RESENDE; MOUTINHO, 2007. Entretanto, alguns produtores também contratam mão-de-obra temporária, com duração de três meses, período do ciclo camarão, sendo o contrato renovado após um mês da despesca. Outro tipo de trabalho temporário é o do diarista, contratado informalmente para trabalhar no viveiro no dia da despesca. Os valores das diárias variam entre R$ 20,00 a R$ 30,00, acrescido de três quilos de camarão, conforme dados obtidos durante a pesquisa de campo. As atividades produtivas são realizadas por homens. Apesar de existirem duas mulheres proprietárias de viveiros são seus companheiros que gerenciam e executam os negócios. Os índios produtores de camarão de Marcação trabalham com viveiros de 15 a 20 camarões por m2, caracterizando o sistema semi-intensivo. A qualidade das pós–larvas colocadas nos viveiros pode aumentar, se os produtores colocarem aeradores em seus empreendimentos. Todavia, poucos são os empreendimentos que possuem este equipamento, devido ao custo elevado da sua utilização. Os equipamentos utilizados pelos índios para repassar a ração aos camarões na fase de engorda ainda são bastante rudimentares e constituise de pequenas telas presas a pneus de borracha com varas de madeira e são denominadas de virolas. Estes são postos em vários locais do viveiro como recipientes de rações. Em Marcação, 61% dos produtores realizam este procedimento quatro vezes ao ano, como pode ser verificar no Gráfico 02. Os motivos para esta modificação encontram amparo em alguns aspectos, tais como: queda do preço do camarão no mercado nos últimos tempos; busca de trabalhar com custos de produção mais baixos, tendo em vista que ele depende do tempo de cultivo. De acordo com a pesquisa de campo observou-se que a faixa etária predominante entre os produtores de camarão encontra-se entre 26 e 40 anos (46,15% da população investigada). Apesar de jovens, o nível de instrução formal é baixo: 23,1 % não possui instrução, 61,5% cursou o primeiro grau incompleto, 7,7% o primeiro grau completo e, 7,7% o segundo grau incompleto. Gráfico 02 – Despescas realizadas ao ano em Marcação 8% 31% 1 Despesca 3 Despescas 4 Despescas 61% Fonte: Pesquisa de campo Tramataia, Camurupim, Caeira e Brejinho são as aldeias de Marcação que até dezembro de 2007 produziam camarões. São 23 famílias explorando 26 viveiros. Marcação possui uma área de 123 km2, e as propriedades dos carcinicultores indígenas mapeadas que se destinam aos viveiros estão representadas na Tabela 02, a seguir. Tabela 02- Município de Marcação - Número de propriedades por carcinicultores, viveiros por propriedades, área destinada à carcinicultura nas propriedades, percentual de viveiros por propriedade e viveiros em atividade (2006 / 2007) Produtor* A B C D E F G H I J K L M Total Propriedade dos carcinicultores (ha) 7,5 2 12 9 2 1,5 3,5 1,9 2,5 5 10 3,3 5 65,2 Viveiros por propriedade 3 1 3 3 2 1 2 1 2 1 3 2 2 26 Área destinada à carcinicultura (ha) 6 2 12 9 2 1,5 3,5 1,9 2,5 2,5 6 3,3 5 57,2 Área dos viveiros na propriedade (%) 80 100 100 100 100 100 100 100 100 50 60 100 100 Viveiros em atividade 2 1 3 3 2 1 2 1 2 1 2 2 2 24 Fonte: MOREIRA; RESENDE; MOUTINHO, 2007 * Os nomes foram omitidos para não expor os produtores. Algumas propriedades foram desativadas por falta de capital, impossibilidade de obter crédito, e por serem embargadas pelo IBAMA. Em dezembro de 2007, foi criada a primeira cooperativa de carcinicultores indígenas, localizada em Tramataia, que recebeu a denominação de Cooperativa dos Carcinicultores de Tramataia Altino Figueiredo da Silva (fig. 12), em homenagem ao carcinicultor conhecido por Nato, falecido durante o processo de formação da cooperativa. O Governo do estado da Paraíba, através do Projeto Cooperar, deu assistência aos índios na criação dessa cooperativa com a aplicação de módulos ministrados por seus técnicos, através dos quais foi redigido e aprovado o estatuto da cooperativa, bem como dirimida as dúvidas existentes21. 21 Participamos do segundo módulo ministrado esclarecendo dúvidas sobre o vocabulário jurídico presente no Estatuto da Cooperativa. Fig. 12 – bloco de cimento marcando o início da Cooperativa dos Carcinicultores de Tramataia Altino Figueirêdo da Silva A primeira despesca do grupo enquanto cooperados, ocorreu em 15 de janeiro de 2008, obtendo-se aproximadamente 2,2 toneladas de camarão. Dessa quantia, 1,56 toneladas foram vendidas à Noronha Pescados, empresa de pescado do estado de Pernambuco, e o restante foi vendido para compradores avulsos e doados à comunidade. O processo dessa despesca pode ser visualizado nas figuras abaixo apresentadas. Fig. 13 – Abertura da comporta para que a Fig. 14 – Colocação dos depósitos próximos à água que se encontra no viveiro escoe comporta para facilitar a coleta do camarão Fig. 15 – Colocação do mangote, espécie de Fig. 16 – Retirada da tela que impede que os rede utilizada na despesca. camarões passem. Fig. 17 – Manuseio do mangote. Fig. 18 – Retirada dos camarões do mangote. Fig. 19 – Choque térmico dado nos camarões. Fig. 20 – Transporte dos camarões nas basquetas (caixas de plástico). Fig. 21 – Camarões nas baquetas para escorrer Fig. 22 - Caminhão frigorífico onde são a água e serem pesados. colocados os camarões após a pesagem. Fotos: Juliana F. Moreira Entre as aldeias pesquisadas, destaca-se a de Camurupim por contribuir com 46% do total de camarão produzido em viveiro. Logo em seguida vem Tramataia, responsável por 27% da produção (v. gráfico 03). Esta aldeia se destaca pela concentração de conflitos22, assim como pela experiência na busca de soluções coletivas para os mesmos. Nesse processo participa ativamente uma colônia de pescadores e carcinicultores denominada Colônia Antônio Izidoro da Silva – Z/14. Gráfico 03 - Marcação- Produção de camarão por Aldeia- 2006 / 2007 20% 27% 7% 46% Brejinho Camurupim Caeira Tramataia Fonte: Pesquisa de campo 22 Esses conflitos são os referentes à proibição por parte do Ibama da atividade carcinicultora nas Terras Indígenas, como será visto mais adiante. 4.2.2 A Produção de Camarão da Fazenda AquaFer (Aquacultura Fernando Ltda) Um dos empreendimentos de carcinicultura existentes na APA, situado na margem direita do Rio Miriri é a AquaFer – Aquacultura Fernando Ltda, com 31,93 hectares de área, contendo 7 (sete) viveiros de 3 (três) hectares cada (fig. 23), além do tanque destinado ao berçário das larvas, do tanque de decantação e do sistema fechado de fornecimento de água (fig. 21). Fig. 23 – Viveiros da AquaFer e o sistema fechado de abastecimento d’água Fonte: Pesquisa de Campo Foto: Juliana F. Moreira Trata-se de uma fazenda de camarão que faz uso de mão-de-obra assalariada. Esta é composta de 26 funcionários, cujas funções são: observar o nível de ph da água dos viveiros, inserindo, sempre que necessário, cal, para que a água mantenha-se adequada à sobrevivência dos camarões; alimentar os camarões, colocando a ração misturada com melaço nas virolas (fig. 24); retirar a vegetação que cresce ao redor dos viveiros; vigiar a fazenda; ligar os areadores, com o objetivo de manter os viveiros devidamente oxigenados, evitando, assim, que os camarões bóiem, ou seja, morram. Fig. 24 – Virolas utilizadas para colocar o alimento dos camarões Fonte: pesquisa de campo Foto: Juliana F. Moreira A despesca é feita de 30 em 30 dias, um viveiro por vez. A despesca dura cerca de 12 horas, fazendo-se necessário a contratação de diaristas para ajudar nesse processo. Após a despesca o viveiro é limpo e fica desativo por um determinado período, para que o solo possa se recuperar, antes do início do próximo ciclo. Ao realizar a despesca, os camarões são acondicionados em caminhões frigoríficos pertencentes aos “intermediários” que compram o camarão e o revende tanto para o mercado externo, quanto interno. Todavia, no início da atividade desse empreendimento, era mais rentável vender o produto para o mercado externo, pois a diferença no preço da grama do camarão era considerável. Contudo, com as mudanças surgidas no comércio do camarão, no que tange ao mercado externo, o que acarretou, inclusive, na quebra de algumas empresas que atuavam como intermediárias entre o produtor e o comprador estrangeiro. Fizeram com que a AquaFer reduzisse sua produção, e, consequentemente, dos lucros até então obtidos. Sabe-se que, a princípio, os principais importadores de camarão eram os Estados Unidos da América, a Europa e o Japão, contudo essa estrutura começou a mudar quando os EEUU passaram a incentivar/investir na produção carcinicultora em seu país, o que resultou numa diminuição do crescimento da importação de camarão para o mesmo, no que se refere a evolução que se vinha tendo até então. Veja no gráfico abaixo (gráfico 04) a evolução das importações de camarão pelos Estados Unidos. Gráfico 04 – Evolução das Importações de Camarão pelos Estados Unidos Fonte: ROCHA; ROCHA, 2007 Como o mercado, seja ele externo ou interno, é dinâmico, outra mudança está ocorrendo, a comercialização do camarão para exportação está, novamente, tornando-se viável financeiramente, apesar de não corresponder a mesmas realidade outrora vivenciada pelos produtores de camarão. 4.3 O CONFLITO DE COMPETÊNCIAS; SUPERPOSIÇÃO DA APA NA TERRA INDÍGENA POTIGUARA No que tange à superposição23 de uma Unidade de Conservação em terras já ocupadas pelo homem, surge uma das questões mais polêmicas no contexto dos movimentos sociais e ambientais no Brasil, conforme afirmam os estudiosos do assunto, dentre eles Leitão (2004). Essa questão gira em torno da permanência ou não das populações que já habitavam a região onde foi criada uma UC. Os que defendem a permanência do homem nas regiões superpostas alegam que ele não deveria ser retirado do local, pois o que se pretende proteger é o que resultou da sua interação com a natureza, ou seja, o patrimônio ambiental presente na APA da Barra do Rio Mamanguape. Entende-se, por essa linha de pensamento, que o meio ambiente existente nas 23 Superposição é o fenômeno no qual se é criada uma Unidade de Conservação em local já ocupado pelo homem. No que diz respeito às Terras indígenas Potiguara, observa-se a criação de uma ARIE – Área de Relevante Interesse Ecológico- e de uma APA – Área de Proteção Ambiental - onde já existiam índios morando. Diga-se, de passagem, que essa população indígena já existia no local antes mesmo do período colonial brasileiro. regiões povoadas não é mais “virgem”, intocado, ao contrário, já sofreu a interferência do homem, acarretando mudanças em relação a situação pré-existente. Em sentido diametralmente oposto encontram-se aqueles que entendem não ser possível a presença do homem nos locais em que são criadas algumas Unidades de Conservação, como por exemplo, as Unidades de Conservação de Proteção Integral e algumas das UC’s de Uso Sustentado, uma vez que, segundo esta corrente de pensamento, “tais populações e suas práticas de exploração da natureza causam sérios impactos à preservação do meio ambiente nas UCs” (LEITÃO, 2004: p.17). Com a criação da APA da Barra do Rio Mamanguape, em 1993, ocorreu o fenômeno denominado de superposição, ou seja, uma área já existente, com legislação própria (no caso em apreço, a legislação indigenista), passa a ser inserida em outra área que se sobrepõe àquela, onde a legislação que vige é a ambiental. Todavia não foi apenas a superposição da APA citada a ocorrida, apesar de ser a mais importante, mas, também, a da Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), conforme mostrado no mapa presente na fundamentação teórica (fig.11). Em decorrência dessa superposição surgem vários conflitos nos quais se encontra presente a carcinicultura, que buscaremos estudar a seguir. Com a superposição de áreas ocorre, consequentemente, superposição de leis e de interesses, o que gera novos conflitos, dentre eles o conflito de leis. 4.3.1 Conflito de leis O Estatuto do índio, Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, em seu artigo 2º, inciso IV, é claro ao determinar que: Cumpre à União, aos Estados e aos Municípios, bem como aos órgãos das respectivas administrações indiretas, nos limites de sua competência, para a proteção das comunidades indígenas e a preservação de seus direitos: IV - assegurar aos índios a possibilidade de livre escolha dos seus meios de vida e subsistência. A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, por sua vez, em seu artigo 231, caput, prescreve que: São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. Ora, mas como se pode dizer que os Potiguara têm direitos sobre as terras e a escolha dos seus meios de vida e subsistência, como preceituam os dispositivos legais transcritos acima, se para desenvolver atividades econômicas nas mesmas necessitam de autorização do Ibama, uma vez que sobre elas foi criada a Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape, bem como a Área de Relevante Interesse Ecológico?! Esta é realmente uma situação delicada, uma vez que a lei indigenista permite que os índios tenham o direito de escolher livremente o que desejam desenvolver a título de subsistência, e, por outro lado, a Resolução Conama nº 312, de 10 de outubro de 2002, veda a atividade da carcinicultura em áreas de manguezal, atividade esta escolhida por alguns índios Potiguara como fonte de sustento de várias famílias indígenas, que é realizada nas áreas de mangue. A princípio, tem-se que, conforme o artigo 2º da Resolução Conama nº 312, de 10 de outubro de 2002, é vedada a prática da carcinicultura em áreas de manguezal, ou seja, se fôssemos seguir a lei ao “pé da letra” os empreendimentos de criação de camarão em viveiro na ARIE existente no interior da Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape não seriam sequer permitidos. Todavia, surge o questionamento sobre o que fazer quando tal atividade aqüicultora já está em funcionamento antes da publicação desta Resolução. É preciso que o legislador use do bom senso ao aplicar a lei, afinal resta analisar se realmente o meio ambiente está sendo afetado, e não se pode esquecer que o ser humano também faz parte do meio, é meio ambiente. Assim sendo, de acordo com a Resolução supracitada, em seu artigo 3º, tem-se que: Art. 3º A construção, a instalação, a ampliação e o funcionamento de empreendimentos de carcinicultura na zona costeira, definida pela Lei nº 7.661, de 1988, e pelo Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, nos termos desta Resolução, dependem de licenciamento ambiental. Parágrafo único. A instalação e a operação de empreendimentos de carcinicultura não prejudicarão as atividades tradicionais de sobrevivência das comunidades locais. (BRASIL, 2002) Assim sendo, o que se observa, na prática, é a exigência legal da existência do licenciamento ambiental para que a atividade de criação de camarões em viveiros seja realizada legalmente, ou seja, sem que haja a aplicação de sanções administrativas ou judiciais por parte do órgão competente. Mas qual é o órgão competente para aplicar as sanções administrativas na APA da Barra do Rio Mamanguape? O Ibama ou a Sudema? A resposta a essa indagação gira em torno da pessoa jurídica de direito público que seria competente para autuar os empreendimentos, bem como fornecer o licenciamento ambiental. Há, aqui, duas óticas a serem analisadas, uma delas refere-se aos viveiros de camarão no interior das Terras Indígenas Potiguara, e a outra às fazendas de camarão situadas também no interior da APA, mas em terras privadas. Quanto à carcinicultura praticada nas TIs Potiguara não há discussão sobre a incompetência da Sudema e conseqüente competência do Ibama, pois, como depreende-se do artigo 20 da Constituição Federal de 1988, as terras indígenas são bens da União, competindo ao órgão federal controlá-la e fiscalizá-la. Art. 20 – São bens da União: (...) XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.” (grifo nosso) (BRASIL, CF/88, 2005) Contudo, esse entendimento gera discussões quanto aos empreendimentos de carcinicultura existentes nas terras privadas localizadas na APA Federal, situada no Estado da Paraíba (Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape). Há o entendimento que entende ser a competência concorrente, competindo tanto ao Ibama quanto à Superintendência de Desenvolvimento e Meio Ambiente o controle e fiscalização da região, do qual um dos procuradores da Sudema coaduna. O Ibama, por sua vez, possui entendimento contrário. Afirma ser sua a competência para controlar e fiscalizar essa APA, uma vez que é ela Federal, diferente das demais Áreas de Proteção Ambiental existentes no Estado da Paraíba, que são estaduais. Desta feita, as atividades econômicas que façam uso dos recursos naturais e as que acarretem impactos ambientais situadas nessa APA são de responsabilidade do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. O Decreto que criou a Unidade de Conservação “Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape” prevê que: Art. 3° A APA da Barra do Rio Mamanguape será implantada, supervisionada, administrada e fiscalizada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), em articulação com a Superintendência de Defesa do Meio Ambiente (Sudema) e com o Batalhão de Polícia Florestal, do Estado da Paraíba, as Prefeituras dos Municípios de Rio Tinto e de Lucena e seus respectivos órgãos de meio ambiente, e organizações não-governamentais interessadas. (BRASIL, 1993) 4.4 CONFLITO ENTRE EMPRESA CARCINICULTORA AQUAFER E O IBAMA A instalação do empreendimento AquaFer teve como ponto de partida os dados obtidos pelo proprietário junto ao Governo do Estado da Paraíba em setembro de 1998, através do relatório “Levantamento das áreas litorâneas do Estado da Paraíba com potencial para exploração comercial do cultivo de camarão marinho” fornecido pelo Programa de Desenvolvimento Sustentável da Paraíba (em anexo), que considerou a região propícia para a implantação de viveiros de camarão. Trata-se, ainda, de uma área própria com escritura e cadeia dominial anterior ao ano de 1910 denominada anteriormente de Propriedade Rural Barra de Mamanguape (v. Cadeia dominial da propriedade rual Barra de Mamanguape- Rio Tinto-PB, em anexo) e que pertence ao Sr. Fernando Gonçalves de Souza. Para entender o conflito entre a AquaFer e o IBAMA necessário se faz recuperar todo o processo responsável pelo mesmo. O conflito tem início quando, tomando ciência dos dados fornecidos pelo estudo do Governo Federal supracitado, o Sr. Fernando Gonçalves de Souza decide investir na carcinicultura, adquirindo 69,01 ha das terras dominiais de Barra de Mamanguape, em 2000, situados no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape, mais precisamente na Praia de Campina. Para que fosse possível dar início ao empreendimento de carcinicultura foi necessário a confecção de um projeto, que foi submetido à análise do IBAMA por meio do Processo Administrativo nº 02016.000426/01-83, em 2001, em anexo. Nesse mesmo processo solicitou-se, ainda, a análise de Plano de Controle Ambiental (PCA) e a viabilidade técnica e ambiental do empreendimento. No relatório de análise e vistoria técnica, referente ao projeto supramencionado, é colocado de forma clara que as obras que se fariam necessárias à implantação do empreendimento causariam impactos ambientais, conforme observa-se abaixo: Essas obras de construção provocarão inevitavelmente impactos negativos ao ambiente estuarino com a remoção do substrato formado de matéria orgânica e outros nutrientes vitais ao crescimento e formação dos bosques de mangue (Relatório de Análise e Vistoria Técnica) Foram elencadas, ainda, medidas mitigadoras que deveriam ser adotadas por ocasião da Implantação do Projeto, quais sejam: I- A área escolhida para implantação dos 31,93 ha de viveiros para cultivo do camarão (Litopenaeus vannamei) na Fazenda Barra de Mamanguape, embora o empreendimento seja implantado na área da fazenda de solo hipersalino e que mais da metade desta área já tenha sido antropizada, restando pouca vegetação típica de tabuleiro e de restinga. A implantação do projeto por si, descaracterizará a paisagem natural dando lugar a uma visão típica de tangues alagados para cultivo associada a vegetação do entorno do projeto, inerente a região estuarina que é o mangue e algumas espécies características de restinga. Dessa forma, sugerimos que seja feito um reordenamento da área de reserva legal, de acordo com as mudanças estruturais nos viveiros VE-06, VE-01, VE-02 recomendadas neste relatório de vistoria técnica. II- Recuar as faces norte dos viveiros VE-01 e VE-02 em 30m da faixa marginal do mangue. III- Transformar o viveiro VE-06 em tanque de decantação para efluentes do complexo produtivo. IV- Construir canal de drenagem interligando os viveiros VE-01 e VE-02 ao tanque de decantação proposto. V- Construir a estação de bombeamento recuada em 30m da faixa marginal do mangue, como medida de controle ambiental. VI- Adotar medidas preventivas de controle de eventuais vazamentos de óleo diesel na casa de bombas, inclusive dispor de bóias de contenção de óleo. VII- Realocar em planta a nova área de reserva legal e alterações nos viveiros e canal de abastecimento. No que tange às recomendações feitas, tem-se as seguintes: - A APA de Mamanguape deverá emitir um parecer sobre a implantação do projeto; - O Projeto de Mamíferos aquáticos do IBAMA deverá ser ouvido visto a proximidade de sua base, que tem seus tanques e viveiros no estuário de Rio Mamanguape; - Cumprir as medidas mitigadoras do projeto; - Apresentar outorga da água expedida pela SEMARH; - Averbar a área de reserva legal; - Apresentar ART dos técnicos responsáveis pela elaboração e execução do empreendimento. (RELATÓRIO DE ANÁLISE E VISTORIA) Por fim, o parecer conclusivo da comissão responsável pela análise e vistoria do projeto de carcinicultura AquaFer manifestou-se em sentido favorável à implantação do empreendimento, desde que o empreendedor cumprisse as recomendações técnicas especificadas no relatório. Isso não implica dizer que não serão feitas vistorias, pois elas devem ocorrer permanentemente. Obedecendo as recomendações, o proprietário da terra solicitou que a APA da Barra do Rio Mamanguape desse o seu parecer sobre o projeto. O Chefe da APA prolatou parecer favorável ao empreendimento, em 26 de novembro de 2001, abaixo transcrito: Diante do exposto, considerando os aspectos positivos e negativos da atividade carcinicultora, observa-se que a Aquafer teve a preocupação de elaborar um projeto sustentável, excluindo do projeto as áreas com vegetação de mangue e propondo a construção de uma lagoa de estabilização, para tratamento dos efluentes. Desta forma, verifica-se que a proposta atende os requisitos técnicos, portanto sou favorável a implantação do projeto. Para que fosse dado início à implantação do Projeto, a AquaFer – Aquacultura Fernando Ltda, solicitou autorização do Ibama para a realização da limpeza de 31,93 ha de sua propriedade, para que os viveiros pudessem ser instalados. Tal pedido foi deferido pelo Procurador Federal José Hilton Ferreira da Silva, em 09 de janeiro de 2002, por meio do parecer nº 004/2.002 abaixo transcrito. SUGIRO pelo DEFERIMENTO do pleito, para autorizar o postulante a efetuar a limpeza do terreno para implantação do projeto, cuja implantação dependerá do licenciamento ambiental da atividade. (PARECER 004/2002) Todavia, conforme se depreende do Parecer 004/2002, para que o empreendimento fosse instalado fazia-se necessário a obtenção do licenciamento ambiental. O licenciamento ambiental24, para inserção de empreendimentos impactantes em Áreas de Proteção Ambiental é fragmentado em 03 espécies, quais sejam: Licença Prévia (LP), Licença de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO). Desta feita, foi solicitado o licenciamento ambiental, sendo a Licença Prévia concedida em 22 de janeiro de 2002, através do Ofício nº 027/2002 – GAB/IBAMA/PB. Com posse desse documento oficial realizou-se a limpeza do terreno. A solicitação para obtenção da Licença de Instalação pela AquaFer foi efetuada em 18 de janeiro de 2002, junto ao Ibama, obtendo em 01 de março do mesmo ano o Parecer nº 01/2002-IBAMA/NLA/PB, onde constava não haver óbices à emissão da LI. Todavia, a LI não foi emitida o que levou a AquaFer a peticionar, em 18 de julho de 2002, ao Procurador da República Dr. Marcelo Alves Dias de Souza, pleiteando a interferência deste órgão junto ao IBAMA/BRASILIA, com o fulcro de que fosse agilizada tal licença. Diante deste pedido, o Procurador da República chamado a manifestar-se, reafirmou, a preocupação do Ministério Público Federal (MPF) pela demora, agora injustificada, na apreciação dos processos de licenciamento (pois que estão todos devidamente instruídos e com solução positiva sugerida pelo IBAMA/PB) ressaltando a responsabilidade do IBAMA-Brasília por qualquer retrocesso nas soluções até agora encontradas (Ofício nº 150/2002MPF/PR/PB/GAB). Em 30 de janeiro de 2003, passado-se aproximadamente um ano do pedido para solicitação da LI, a AquaFer peticionou ao Presidente do IBAMA solicitando às autoridades competentes a urgente liberação da LI. Alegou, nesse documento, que devido as informações fornecidas pelo IBAMA de que esta licença sairia em breve, realizou o financiamento de parte do projeto, tendo o Gerente do Banco financiador ligado para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, obtendo a informação de que dentro do mês de fevereiro de 2002 a licença de instalação sairia, motivo pelo qual foi concedido o financiamento com garantias registradas em cartório, ficando aguardando a LI para a liberação do dinheiro. 24 Procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. (Resolução Conama nº 237, de 19 de dezembro de 1997). Extraindo trecho do documento observa-se a indignação com a demora da emissão da LI, Resumindo, depois de comprar a área, fazer o projeto, abrir firma, outorga de água, registro de aqüicultor, alvará da prefeitura, CNPJ, inscrição estadual, registro de reserva legal, etc, estamos aguardando a Licença de Implantação a 18 meses, portanto já passou o prazo de 6 meses conforme a Resolução 237 de 19/12/1997, artigo 14. Art. 14 - O órgão ambiental competente poderá estabelecer prazos de análise diferenciados para cada modalidade de licença (LP, LI, LO), em função das peculiaridades da atividade ou empreendimento, bem como pra a formulação de exigências complementares, desde que observado o prazo máximo de 6 (seis) meses a contar do ato de protocolar o requerimento até seu deferimento ou indeferimento, ressalvados os casos em que houver EIA/RIMA e/ou audiência pública, quando o prazo será de até 12 (doze) meses. (RESOLUÇÃO CONAMA Nº 237/97, ART. 14) Em 09 de junho de 2003, o IBAMA, por meio do Ofício nº 792/2003 – IBAMA/DILIQ, determinou a obrigatoriedade da realização do Estudo de Impacto Ambiental e do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - EIA/RIMA do empreendimento, seguindo a determinação da Resolução Conama nº 312/2002. Art. 5º Ficam sujeitos à exigência de apresentação de EIA/RIMA, tecnicamente justificado no processo de licenciamento, aqueles empreendimentos: I - com área maior que 50,0 (cinqüenta) ha; II – com área menor que 50,0 (cinqüenta) há, quando potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente; III – a serem localizados em áreas onde se verifique o efeito de adensamento pela existência de empreendimentos cujos impactos afetem áreas comuns. (RESOLUÇÃO CONAMA Nº312/2002) Através deste ofício, foi informado ao Sr. Fernando Gonçalves de Souza, proprietário do empreendimento de carcinicultura Aquafer, que far-se-ía necessário a • Reelaboração do projeto do empreendimento, com a inserção do recuo de 30 metros dos taludes dos viveiros em relação ao manguezal adjacente e à área do canal sobre a influência de maré; e de recuo de 50 metros dos taludes dos viveiros em relação às áreas alagadiças; • Realocação da Bacia de Sedimentação do projeto original, de forma que sua localização e seu bueiro de descarga de efluentes, causem os mínimos impactos ambientais no canal de influência da maré e no mangue do entorno do empreendimento; • Inserção no projeto original de mecanismos de segurança mais eficiente para evitar perda de indivíduos durante a despesca, pela grande amplitude da variação no crescimento dos indivíduos, sendo recomendado a implantação de telas de segurança, após a rede de despesca, similares àquelas utilizadas antes das comportas dos viveiros, com malhas finas dispostas em série (OFÍCILO Nº. 792/2003 – IBAMA/DILIQ). Tal medida surpreendeu a Aquafer, pois entendia que o EIA/RIMA não seria exigível para o seu empreendimento, uma vez que a extensão do mesmo era inferior a 50,0 ha. Todavia, o IBAMA entendeu que o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental deveria ser realizado, pois levou-se em consideração a extensão total da propriedade, e não apenas a área destinada para a carcinicultura. Diante dessa situação, onde o IBAMA, primeiramente autorizou a emissão da Licença de Instalação, que nunca foi emitida, e que, posteriormente, após ter transcorrido mais de um ano dessa autorização, solicitou a confecção de novo projeto à Aquafer, retornando, assim, ao ponto inicial de todo o processo, a Aquacultura Fernando Ltda. solicitou ao Poder Judiciário a emissão de liminar para que pudesse dar continuidade ao empreendimento enquanto não se fosse emitida a LI, bem como a LO. O pedido foi indeferido no primeiro momento, sendo interposto o Agravo de Instrumento Nº. 50995 junto ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região, referente ao Processo de nº2003.05.00.023169-4, que deferiu o pedido de liminar, mas fez a seguinte ressalva: Por último, faz-se necessário esclarecer que caberá ao IBAMA a adoção das providências necessárias para efetivação do estudo conjunto, o que facilitará, inclusive, a sua realização pelos empreendedores, diante da economia de custos a ser obtida, não podendo haver qualquer embaraço à licença/autorização já concedida em face do estudo ora determinado, devendo qualquer medida relativa ao EIA/RIMA ser submetida previamente à apreciação do Judiciário. Apenas em 11 de setembro de 2003, conforme se depreende do Ofício nº68/2003 – COAIR/IBAMA, assinado pelo Coordenador de Avaliação e Análise de Risco, foi encaminhada ao Sr. Fernando Gonçalves de Souza Filho, diretor administrativo da Aquafer, a Licença de Instalação nº229/2003, referente ao empreendimento de carcinicultura. Contudo, essa licença ambiental só teria validade enquanto persistissem os efeitos inerentes à decisão judicial que concedeu a liminar . Esta Licença de Instalação terá validade enquanto persistirem os efeitos da decisão judicial referida, ou seja, da decisão judicial concessiva de liminar proferida pelo relator do agravo de instrumento nº 2003.05.00.023169-4, em sede de agravo regimental, perante o TRF da 5ª Região, decorrente do Mando de Segurança nº 2002.82.00.5899-2, em trâmite perante à 3ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba, observadas as condições a seguir. (Ofício 68/2003 – COAIR/IBAMA) O IBAMA, inconformado com a decisão prolatada pelo Desembargador Federal Luiz Alberto Gurgel de Faria, recorreu da decisão. Desse recurso obteve-se a cassação da liminar anteriormente concedida, em decorrência de decisão unânime prolatada pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região publicada em 12 de janeiro de 2006. A conseqüência dessa decisão foi o cancelamento da Licença de Instalação anteriormente concedida por força de decisão judicial que concedera a liminar. O IBAMA, através do Ofício nº 45/2006 – DILIQ/IBAMA, encaminhado ao Sr. Fernando Gonçalves de Souza, comunicou que em decorrência do cancelamento da LI nº 229/03, estava proibida a “continuidade da execução das obras de implantação e operação do empreendimento, não o eximindo das medidas legais cabíveis em relação à questão”. Neste mesmo documento destacou-se a obrigatoriedade da realização do EIA/RIMA no empreendimento. Após o recebimento deste comunicado, datado de 20 de janeiro de 2006, a Aquafer foi notificada, em 18 de julho de 2006, pelo IBAMA. A descrição contida nessa Notificação foi a seguinte: Considerando a Acórdão do Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRJ- 5ª Região), em sede de Apelação em Mandado de Segurança nº 89560-PB, que negou provimento à apelação interposta pela empresa Aquafer – Aquacultura Fernando Ltda., e declarou a nulidade da Licença de Instalação nº 229/03 e ainda considerando o Termo de Embargo/Interdição nº 0218965-C, lavrado pelo IBAMA em 12/05/2005, NOTIFICAMOS essa empresa para paralisar imediatamente as atividades do empreendimento (projeto de carcinicultura) instalado no interior da Unidade de Conservação Federal APA da Barra do Rio Mamanguape efetuando ainda, no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, contado a partir do recebimento desta NOTIFICAÇÃO, a despesca em todos os viveiros-berçários existentes no empreendimento, esvaziando-os por completo e vendando-se, ainda, o repovoamento desses viveiros. Informamos que as larvas e pós larvas dos viveiros-berçários não poderão ser liberadas no ambiente natural e sim incinerados, sob pena das cominações da lei. O não cumprimento da determinação contida nesta NOTIFICAÇÃO poderá constituir crime de desobediência, tipificado no artigo 330 do Código Penal e implicará na aplicação das sanções administrativas cabíveis, além do encaminhamento do caso ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal para apuração de responsabilidades. A Aquafer, ao receber a notificação, ficou apreensiva, afinal não haveria como realizar a despesca de todos os seus viveiros em 72 horas, sem que isso não acarretasse sérios prejuízos financeiros, bem como ambientais, uma vez que para a realização da despesca faz-se necessário, de acordo com a solicitação de prorrogação do prazo para despesca dos viveiros protocolada junto ao órgão ambiental competente (IBAMA): • Contratar a venda dos camarões; • Avaliar diariamente os camarões até constatar que estão prontos, com peso ideal e com a carapaça dura conforme exige o mercado; • Ter a disponibilidade do frigorífico para fazer a despesca e o processamento dos camarões; • No processo de despescagem, abaixa-se lentamente o nível do viveiro em torno de 50% do volume de água, o que leva de um a dois dias e só então abre-se a comporta para dar início a despesca, a água vai saindo para a bacia de sedimentação e os camarões vão sendo colhidos até o total esvaziamento do viveiro, o que leva mais de 12 horas aproximadamente; • A água que sai do viveiro permanece na bacia de sedimentação por alguns dias, e só então está pronta para retornar para outros viveiros ou ser liberada para o estuário. Desse pedido houve parecer desfavorável, ou seja, não foi autorizada a prorrogação do prazo para a realização da despesca nos viveiros da Aquafer. O que resultou de descumprimento da decisão por parte desse empreendimento, o que resultou na Ação Civil Pública interposta pelo IBAMA em face deste empreendimento de produção de camarões, gerando o Processo de nº 2006.82.7053-1 junto à Justiça Federal. A decisão prolatada pelo Juiz Federal Rogério Roberto Gonçalves de Abreu deu provimento parcial ao pedido do IBAMA: (...) Nesse sentido, considero presentes a plausibilidade jurídica da argumentação enfocada pelo IBAMA e o perigo da demora (art. 12 da Lei nº 7.347/1985) que acarretam a concessão da medida liminar exclusivamente em relação ao item “a.1” – “paralisar imediatamente o funcionamento de seu Projeto de Carcinicultura (fls. 13). 13). Relativamente ao item “a.2” – “desativar imediatamente os seus viveiros de carciniculutra”-, não seria prudente, por ora, proceder à desativação do empreendimento, tendo em vista os investimentos presumidamente nele realizados e diante de eventual e futura concessão de licença de operação se atendidos os requisitos exigidos pelo IBAMA. Da mesma forma, o atendimento liminar do item “a.3” – “apresentar ao IBAMA, em um prazo de trinta dias, Projeto de Recuperação da Área Degradada, prevendo a recuperação da área dos viveiros a serem desativados, bem como a recuperação de toda a área afetada direta ou indiretamente pelo Projeto, devidamente acompanhado de cronograma de execução com início em prazo não superior a quinze dias, após aprovação do IBAMA” – implicaria, de um lado, o deferimento do item “a.2” e, de outro, pressupõe que haja degradação ambiental decorrente do empreendimento, aspecto este que está sujeito à dilação probatória, porquanto não demonstrado de plano. Atendendo a decisão judicial os viveiros foram desativados e os 24 funcionários que trabalhavam no empreendimento foram despedidos. O que pode ser comprovado pelas fotos (figs. 25 a 28) tiradas durante a pesquisa de campo realizada no local em períodos diferentes, antes e depois da decisão judicial que determinou o desativamento do empreendimento. Fig.25 – Canal de abastecimento em atividade Fig. 26 – Canal de abastecimento desativado Canal de alimentação de água para os viveiros em pleno funcionamento, antes da decisão judicial que determinou a interrupção das atividades. Canal de abastecimento de água em inatividade, devido a decisão judicial, comprovando o cumprimento da mesma. Fotos: Juliana Fernandes Moreira Fig. 27 – Viveiros em atividade Fotos: Juliana Fernandes Moreira Fig. 28 – Viveiros desativados Buscando cumprir as determinações legais impostas, a AquaFer peticionou ao IBAMA, em 28 de abril de 2006, solicitando o fornecimento do Termo de Referência do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental, documento necessário para que se pudesse dar início ao EIA/RIMA. Em 05 de fevereiro de 2007, após 10 meses da requisição do Termo de Referência do EIA/RIMA, o IBAMA/BRASILIA, através do Ofício 35/2007, comunicou que tal documento estava sendo encaminhado em anexo. Mais uma vez observou-se a morosidade desse órgão ambiental em manifestar-se acerca do tema, o que prejudica consideravelmente todo e qualquer empreendimento que dele necessite. Até o último contato realizado com o empreendimento, há aproximadamente dois meses, o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) solicitado pela AquaFer ainda não havia sido emitido. Assim sendo, até aquele presente momento os viveiros continuavam paralisados e o EIA/RIMA já estava sendo providenciado, conforme consta na Declaração emitida pela Consultoria Ambiental Ltda., responsável pela realização desse estudo no local. 4. 5 CONFLITO SÓCIO-AMBIENTAL ENTRE ÍNDIOS CARCINICULTORES, O IBAMA E A FUNAI Para os povos indígenas, a terra é muito mais do que simples meio de subsistência. Ela representa o suporte da vida social e está diretamente ligada ao sistema de crenças e conhecimento. Não é apenas um recurso natural - e tão importante quanto este - é um recurso sóciocultural (RAMOS, Alcida Rita - Sociedades Indígenas). O processo de homologação das Terras Indígenas no Brasil ocorre por meio de processo administrativo composto pelas seguintes fases administrativas: estudo, delimitação, declaração, homologação e regularização da área. Este procedimento é imposto pela Legislação indígena, cujo art. 1º do Decreto nº. 1.775, de 08 de janeiro de 1996, determina que as TI sejam administrativamente demarcadas por iniciativa e sob a orientação da Funai. Vale ressaltar, nesse momento, que apesar de se falar do processo de demarcação como sendo o conjunto de procedimentos necessários para a delimitação da terra indígena, na verdade, trata-se apenas de uma das fases do processo demarcatório. Observe que o Decreto 1775/96, em seu preâmbulo, afirma que “dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas” (grifo nosso), enquanto, efetivamente trata do todo, ou seja, do processo demarcatório. A Terra Indígena (TI) Potiguara, localizada na zona costeira do Estado da Paraíba, foi demarcada em 1983 e homologadas em 1991. A TI Potiguara encontra-se dividida em três áreas contíguas, quais sejam: TI Potiguara, TI Potiguara de Monte-Mor e TI Jacaré de São Domingos, conforme mostra o mapa “Terras Indígenas Potiguara”, em anexo.Possuindo, em sua totalidade, uma área de aproximadamente 33.757,73 ha. Os conflitos atinentes às terras indígenas não são recentes, eles nos remetem ao período da colonização brasileira, onde, num primeiro momento temos a invasão dos portugueses, colonizando e desculturalizando os índios. Fazendo remissão aos Potiguaras, têm-se notícia de sua existência na costa nordestina entre as regiões em que se encontram atualmente a cidade de João Pessoa, no Estado da Paraíba, e a de Fortaleza, no Estado do Ceará, como mostra a figura 29, desde o ano de 1501. De acordo com SANTOS (2005), “a Baía da Traição é referida como o coração do território Potiguara na Paraíba, sendo conhecido, também pelo nome indígena de Acajutibiró, ou ‘terra do caju azedo’ ”. Fig. 29 - Mapa Etno-Histórico de Curt Nimuendaju Fonte: IBGE Como forma de garantir o direito às terras nas quais habitavam, os índios Potiguara reivindicaram a propriedade delas. Assim sendo, D. Pedro II, em 1859, doou aos índios duas sesmarias: São Miguel da Baía da Traição25 e Nossa Senhora dos Prazeres de Monte-Mor. Contudo, em 1862, por determinação do Imperador, foi nomeado Antônio Gonçalves da Justa Araújo para realizar o loteamento das duas Sesmarias doadas aos índios Potiguara, mas apenas a de Nossa Senhora dos Prazeres de Monte-Mor chegou a ser loteada, entre os anos 1866 e 1867, em 150 lotes, permanecendo a de São Miguel da Baía da Traição como propriedade coletiva (SANTOS, 2005). Não são poucos os conflitos referentes à propriedade da terra em relação aos índios Potiguara situados no Estado da Paraíba. Eles tiveram suas terras invadidas, conseguiram reaver a propriedade, e, novamente, estavam diante de uma situação organizacional políticosocial adversa a da sua cultura, ou seja, o individualismo estava sendo inserido na TI. Na década de 1950, a Companhia de Tecidos de Rio Tinto (CTRT) mandou atear fogo nas residências dos índios que habitavam na Vila de Monte-Mor, e, em decorrência disso os índios moradores desta Vila se viram não mais na condição de proprietários de suas terras, mas, sim, de inquilinos da Família Lundgren, os proprietários da CTRT26, que construíram casas no local, locando-as aos índios. (SANTOS, 2005) A TI de Monte-Mor ainda não foi regularizada, mas encontra-se em processo de demarcação. Em decorrência da não regularização, até o presente momento, dessas terras indígenas, 400 (quatrocentos) índios Potiguara, na liderança do cacique Aníbal Cordeiro Campos, invadiram a sede da Funai no Estado da Paraíba, no dia 8 de outubro de dois mil e sete, reivindicando a regularização das terras em questão (fig. 30). O prazo que foi dado à União, a quem compete privativamente legislar sobre populações indígenas (art.22, XIV, CF/88), pelos índios para a regularização da área citada foi novembro do ano em curso, caso contrário eles tomarão outras medidas, medidas essas que preferiram não mencionar. 25 A título de curiosidade, Baía da Traição recebeu este nome em decorrência dos índios Potiguara terem se aliado aos holandeses e franceses contra os portugueses no início da colonização. 26 A CTRT, Companhia de Tecidos de Rio Tinto, já não existe mais, foi extinta. Atualmente os herdeiros da família Lundgren é quem “brigam” pela propriedade das terras. Essas terras já foram identificadas pela Funai desde 1995, ou seja, a mais de dez anos atrás, e, no dia cinco de outubro de 2007 o presidente nacional da Funai, Márcio Augusto Freitas, emitiu relatório de identificação para o Ministério da Justiça, declarando a terra como indígena. Assim sendo, a invasão que ocorreu teve como objetivo agilizar a regularização das terras declaradas como indígenas, o que resultaria, dentre outras coisas, para os índios que residem nessas terras a desobrigação de pagar aluguéis que variam de R$ 40,00 a R$ 90,00 reais à extinta CTRT (ZENAIDE, 2004). Fig 30 – Invasão da sede paraibana da Funai, em 8 de outubro de 2007. Fonte: Jornal O Norte, 11 de outubro de 2007. Atualmente, em decorrência da delimitação da TI Potiguara, tem-se uma área total de aproximadamente 33.757,73 ha, dos quais cerca de 21.000 ha já se encontra regularizada, ou seja, o processo de demarcação previsto no Decreto 1775/96 já foi concluído, conforme mostra a figura abaixo (fig. 31). O conflito entre os índios Potiguara e o Ibama não é recente, ele existe desde a criação da Área de Proteção Ambiental da Barra do Rio Mamanguape, onde também está inserida a Área de Relevante Interesse Ecológico - ARIE. Fig. 31 – Situação Fundiária das Terras Indígenas Potiguara Fonte: http://www.funai.gov.br Conforme relatos do Administrador da Funai-PB, o Ibama vem agindo de forma a causar tensão e insegurança à população indígena. O último acontecimento narrado por este funcionário foi o da notificação dos índios carcinicultores por parte do Ibama. Todavia, ele, o Ibama, havia sido chamado para notificar aqueles que estavam realizando o corte ilegal de madeira em área considerada Área de Preservação Permanente (APP). Agindo dessa forma, conforme relato obtido durante a pesquisa, o Ibama, mais uma vez, corroborou com o clima de tensão que se gerou, pois os índios carcinicultores sentiramse ameaçados nas suas próprias terras, sobretudo pela possibilidade de serem impedidos de continuar praticando a criação de camarões em viveiros, sustento de muitas famílias indígenas. Contudo, não se pode afirmar que o Ibama age como um “vilão”, uma vez que, nesta situação, está agindo em conformidade com a legislação ambiental, notificando aqueles que estejam realizando uma atividade econômica no interior da APA que é Federal sem a devida licença ambiental. Fig. 32 – Viveiros de camarões situado nas TIs Potiguara Fonte: pesquisa de campo O Ibama exigiu que os índios Potiguara carcinicultores providenciassem o Estudo de Impacto Ambiental, bem como o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA), para que possam dar continuidade à criação de camarão em viveiros em suas terras. Todavia, surge outro questionamento: como realizar um EIA-RIMA se para isso se requer recurso financeiro significativo, valor esse que os índios não dispõem, situação oposta àquela que ocorre com as fazendas de camarão localizadas na outra margem do Rio Miriri, pertencentes à usina Jacuípe. Sentindo-se ameaçados, os carcinicultores indígenas dirigiram-se até a Funai-Pb, onde redigiram um abaixo assinado, documento 01, onde foram feitas algumas solicitações, dentre elas encontra-se a exigência da liberação de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) para custear o EIA-RIMA. Segundo relatos do Administrador da Funai-Pb, não foi esta a primeira vez que os carcinicultores Potiguara solicitaram verba para realização desse Estudo de Impacto Ambiental, mas, diferentemente do que sucedeu nas solicitações anteriores, dessa vez a Funai concordou em liberar a verba solicitada, conforme resta provado da leitura do documento 2. Documento 01 – Abaixo assinado realizado pelos índios Potiguara à Funai Brasília. Fonte: Funai-Pb Documento 02 – Resposta da Funai ao abaixo assinado dos Índios Potiguara Fonte: Funai-Pb Apesar de o recurso ter sido disponibilizado, o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental só serão realizados no primeiro semestre de 2008, em virtude de não ser possível o início e término dos mesmos ainda no ano de 2007. Observemos, assim, o conflito existente entre os índios Potiguara criadores de camarão no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape e o Ibama, que finda por gerar, também, um conflito entre os índios e a Polícia Federal, conforme se depreende dos relatos proferidos pelos índios, bem como do item dois do abaixo assinado acima transcrito. O motivo de não aceitarem o ingresso dos policiais federais em suas terras se dá em decorrência de que todas as vezes que houve o ingresso de tais agentes nas TIs estavam eles munidos de armas de fogo. Esse comportamento é repudiado pelos índios que se sentem ameaçados em suas próprias terras. Dentre os conflitos existentes na área objeto do nosso estudo destaca-se a existência de inúmeros viveiros em plena atividade sem que possuam as licenças ambientais necessárias, quais sejam: licença prévia (LP), licença de instalação (LI) e licença de operação (LO). A inexistência de uma dessas licenças implica na não autorização da realização dessa atividade econômica, pois significa dizer que o empreendimento não se encontra regular, de acordo com as exigências legais. Essas licenças são emitidas pelo Ibama, órgão competente para tanto. Contudo, apesar de não haver sido emitida a LO para os empreendimentos de carcinicultura na região, a atividade carcinicultora continua em plena atividade. Isso ocorre devido a existência da sobreposição de leis indígenas e ambientais na região em apreço, bem como de liminares que permitem que os empreendimentos localizados na outra margem do rio, ou seja, pertencentes a proprietários privados, continuem a funcionar. Observe-se, desta feita, que são vários os atores sociais envolvidos no conflito sócio-econômico-ambiental do local, quais sejam: a Funai, órgão tutor dos índios; Ibama; Organizações não governamentais (ONG’S); Organizações Governamentais, e os produtores privados. A título de ilustração, relembremos o que ocorreu em outubro de 2001, quando funcionários do Ibama foram mantidos reféns pelos índios, ao tentarem impedir a continuidade dessa atividade nas Terras Indígenas Potiguaras. Esse fato foi bastante veiculado pelos meios de comunicação na época. O Ibama, na qualidade de fiscalizador, observou a ocorrência de desmatamento de uma área do mangue, no interior das terras indígenas dos Potiguaras, localizada no interior da APA em apreço, para o fim de construção de um viveiro de camarão. Assim sendo, fazendose cumprir o princípio do poluidor-pagador, foi aplicada uma multa bem como a determinação de que fosse replantado no local a flora nativa do mangue, e assim foi feito (fig. 33). Fig. 33 – mangue replantado em conformidade com o determinado pelo Ibama Foto: Juliana F. Moreira Desta feita, não apenas o princípio poluidor-pagador foi utilizado como embasamento para a aplicação das sanções administrativas, mas também o princípio da reparação. 5 COSIDERAÇÕES FIAIS Com base no resgate conceitual levado a efeito, alguns aspectos de ordem metodológico merecem ser realçados. Em primeiro lugar, no âmbito da discussão sobre conflito, entendemos que o foco do estudo, o conflito gerado pela prática da carcinicultura na APA da Barra do Rio Mamanguape, enquadra-se no que se convencionou denominar de conflito “sócio-ambiental”. Isto na medida em que ele envolve interesses diversos que extrapolam os interesses de classe (ambientais, legais, econômicos), múltiplos atores sociais (remanescentes indígenas, proprietários de terra, usineiros, ONGs) e o próprio Estado através dos organismos de proteção ao meio ambiente, do seu aparato judicial e até mesmo policial e o meio ambiente, lidando assim, simultaneamente com as dimensões social e biofísica assinaladas por Little (2004). Em segundo lugar, entende-se que a APA da Barra do Rio Mamanguape é um “território”. Enquanto tal ele pode ser compreendido na sua multidimensionalidade, incorporando, por conseguinte, aspectos identificados por Foucalt, Magnaghi, Léfèbvre, Raffestin, Haesbaert e Moreira e Targino. Na sua base, estão as noções de apropriação e de dominação e, consequentemente, das relações de poder. Outro aspecto que não pode ser descuidado é que, o conflito sócio-ambiental envolvendo as comunidades indígenas potiguaras no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape, pode ser também considerado como uma manifestação da luta pela construção de novas “territorialidades étnicas”, no caso a territorialidade dos potiguaras na Paraíba. A disputa por frações desse território pelos diversos atores sociais envolvidos nos diferentes conflitos identificados, embora convirja para um mesmo objetivo, a liberação da atividade carcinicultora numa área de preservação ambiental, incorpora intenções diversas. De um lado, a procura da diversificação de atividades e de aumento da lucratividade por parte do setor empresarial sucro-alcooleiro; do outro, a busca da melhoria das condições de sobrevivência por parte dos remanescentes indígenas potiguaras. Objetivos aparentemente comuns, que, na verdade, camuflam interesses diversos resultantes do antagonismo de classes presente na área de estudo, que embora não se constitua no único determinante do conflito nele está presente assemelhando-se ao que Lukes (1980) denomina de conflito “encoberto”. Àqueles interesses somam-se os defendidos pelo Estado que assumem a aparência de interesses coletivos, materializados na busca de preservar uma área de manguezais e de produção de espécies animais em processo de extinção. Nessa medida, eles se contrapõem aos interesses privados de pessoas ou grupos que são regidos por objetivos imediatistas, que não levam em consideração a preservação do meio-ambiente, bem intergeracional por excelência. Todos estes aspectos reforçam a assertiva de que o conflito da APA da Barra do Rio Mamanguape é um conflito eminentemente socioambiental. Ao longo da análise efetuada ficou evidente a existência de pontos de vista antagônicos entre os carcinicultores, sejam eles empresários ou indígenas, e os órgão públicos responsáveis pela fiscalização e controle de atividades econômicas no interior da Área de Proteção Ambiental, objeto desse estudo. Apesar dos empreendimentos privados e indígenas estarem situados no interior da APA da Barra do Rio Mamanguape, os destes apresentam a especificidade de se encontrarem em área de sobreposição legal (legislação ambiental versus legislação indigenista), o que contribui para dar maior complexidade aos conflitos oriundos da implantação e da exploração da criação de camarões em viveiros. Pelos depoimentos colhidos, constatou-se que os carcinicultores indígenas sempre se sentiram ameaçados pelo Ibama. Entendem que aquela autarquia federal estaria “perseguindo-os”, uma vez que busca impedir que eles continuem a desenvolver essa atividade econômica no interior de suas próprias terras. Este sentimento, na realidade, parece exprimir um aspecto não bem resolvido da legislação ambiental. Ao generalizar a exigência da realização do EIA-RIMA para que os empreendimentos possam operar, a legislação não previu mecanismos para que produtores de menor poder aquisitivo pudessem atender tais exigências, pois a realização dos estudos de impacto ambiental e de relatórios de impactos ambientais é onerosa. No estudo em apreço, mostrou-se que várias foram as tentativas dos índios junto à Funai, para a obtenção de verba para o cumprimento da exigência do Ibama. Apenas no fim do ano de 2007 foi que a Funai, através de documento oficial (doc 01), informou a liberação de R$200.000,00 (duzentos mil reais) destinados à realização do Estudo de Impacto Ambiental, bem como do Relatório de Impacto Ambiental, a ser realizado no primeiro semestre de 2008. O ponto central do conflito entre os carcinicultores indígenas e o IBAMA, consiste na percepção que aqueles têm de que o uso da terra é a fonte de sua sobrevivência e que esse princípio teria precedência sobre os demais, inclusive sobre o da preservação do meioambiente, embora não desconsiderem a importância dessa preservação como ficou evidenciada em várias entrevistas realizadas. Por fim, vale ressaltar que, apesar das dificuldades de operacionalização da legislação ambiental e dos conflitos existentes entre ela e outras áreas do direito, é inegável o avanço conseguido pela legislação brasileira com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Esta conquista não pode ser desconsiderada, particularmente face à ameaça cada vez maior do aquecimento global, que coloca em questão a própria continuidade da sociedade humana. REFERÊCIAS ALEXANDRE, Agripa Faria. 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